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1 Planejamento energético brasileiro: como as startups podem favorecer o cenário para a Energia 4.0 Adriana Ripka 1 Christian Luiz da Silva 2 RESUMO O planejamento energético brasileiro conta com desafios já conhecidos, tais como manter a segurança energética, expandir a geração e distribuição de energia, diversificar a matriz energética e gerir os recursos naturais ligados à energia, de forma a minimizar os impactos negativos ambientais e, consequentemente, sociais. Neste cenário, o avanço tecnológico tem papel de destaque para o alcance dos objetivos, e a Indústria 4.0 tem propiciado um novo desafio: o desenvolvimento da Energia 4.0. Na busca por melhorias e modificações estruturais, para maior eficiência, conectividade e outros elementos, que fazem parte da definição da Energia 4.0, as startups podem propiciar soluções ligadas à pesquisa, desenvolvimento e inovação. Foi observado que há um movimento de aproximação entre as startups de energia com as grandes indústrias de geração, distribuição e consumo de energia, que tende a impulsionar o desenvolvimento de tecnologias mais eficientes para o setor e que auxiliem na redução de diversos custos, sendo eles: econômicos, sociais e ambientais. No entanto, questões envolvendo regulação e limitações de financiamento das startups mostram-se como um gargalo ao aproveitamento destas de forma mais profunda na transformação do sistema energético. 1 Universidade Tecnológica Federal do Paraná 2 Universidade Tecnológica Federal do Paraná

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Planejamento energético brasileiro: como as startups podem

favorecer o cenário para a Energia 4.0

Adriana Ripka1

Christian Luiz da Silva2

RESUMO

O planejamento energético brasileiro conta com desafios já conhecidos, tais como

manter a segurança energética, expandir a geração e distribuição de energia,

diversificar a matriz energética e gerir os recursos naturais ligados à energia, de forma

a minimizar os impactos negativos ambientais e, consequentemente, sociais. Neste

cenário, o avanço tecnológico tem papel de destaque para o alcance dos objetivos, e

a Indústria 4.0 tem propiciado um novo desafio: o desenvolvimento da Energia 4.0. Na

busca por melhorias e modificações estruturais, para maior eficiência, conectividade

e outros elementos, que fazem parte da definição da Energia 4.0, as startups podem

propiciar soluções ligadas à pesquisa, desenvolvimento e inovação. Foi observado

que há um movimento de aproximação entre as startups de energia com as grandes

indústrias de geração, distribuição e consumo de energia, que tende a impulsionar o

desenvolvimento de tecnologias mais eficientes para o setor e que auxiliem na

redução de diversos custos, sendo eles: econômicos, sociais e ambientais. No

entanto, questões envolvendo regulação e limitações de financiamento das startups

mostram-se como um gargalo ao aproveitamento destas de forma mais profunda na

transformação do sistema energético.

1 Universidade Tecnológica Federal do Paraná 2 Universidade Tecnológica Federal do Paraná

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Palavras-chave: Energia, Startup, Planejamento energético, Indústria 4.0, Energia

4.0

ABSTRACT

Brazilian energy planning has already known challenges, such as maintaining energy

security, expanding energy generation and distribution, diversifying the energy matrix

and managing energy-related natural resources, in order to minimize negative impacts

on the environment and society. In this scenario, the technological advance has a

leading role in achieving the objectives and Industry 4.0 has provided a new challenge,

the development of Energy 4.0. In search of improvements and structural

modifications, for greater efficiency, connectivity and other elements, which are part of

the definition of Energy 4.0, startups can provide solutions related to research,

development and innovation. It has been observed that there is a movement of

approximation between the startups of energy with the great industries of generation,

distribution and consumption of energy, tends to impel the development of

technologies more efficient for the sector and that help in the reduction of diverse costs,

be they economic, social or environmental. However, the deficiency in regulation and

funding limitations of startups are as a bottleneck to the use of these in a more profound

way in the transformation of the energy system.

Keywords: Energy, Startup, Energy planning, Industry 4.0, Energy 4.0

1. INTRODUÇÃO

Os desafios inerentes ao planejamento energético brasileiro, em geral, não

têm apresentado grandes modificações ao longo das décadas, alinhados aos

objetivos ligados ao desenvolvimento nacional, em geral, tem relação com se manter

a segurança energética, expandir a geração e distribuição de energia, diversificar a

matriz energética, gerir os recursos naturais ligadas à energia, de forma a minimizar

os impactos negativos ambientais e, consequentemente, sociais.

Contudo, com o surgimento da Indústria 4.0, também nomeada como 4ª

Revolução Industrial, Manufatura Avançada ou Indústria Integrada, tem se destacado

a necessidade de se ampliar o dinamismo nas questões envolvendo a infraestrutura

de setores diversos. Assim, o setor de energia, como elemento transversal para a

efetivação da Indústria 4.0, também apresenta a necessidade de se adequar a

presente revolução.

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Os mais diversos elementos ligados aos objetivos da Indústria 4.0, baseados

em sistemas complexo e integrados, recebem o complemento “4.0”, nacional e

internacionalmente, como forma de se diferenciar tais elementos dos já estudados em

momentos anteriores ao avanço do conceito de Indústria 4.0. Isto é o que ocorre com

a Energia 4.0, que apesar de trazer em sua essência a busca por solucionar

problemas em sua maioria já conhecidos, tem como um desafio adicional a

necessidade de uma evolução tecnológica mais complexa e integrada, como por

exemplo a utilização de sistemas inteligentes e a conectividade entre máquinas.

Neste cenário, o avanço tecnológico tem papel de destaque para o alcance

dos objetivos traçados para o setor energético brasileiro, tornando a atenção nas

diversas formas de inovação indispensável para a sustentabilidade do setor. O

objetivo deste artigo foi verificar como as startups podem influenciar no planejamento

energético brasileiro a partir do contexto da indústria 4.0. Como apresentadas pelo

MCTIC (2017), as startups possuem em sua essência os conceitos da Indústria 4.0,

sendo assim estas têm potencial para propiciar um ambiente favorável para a Energia

4.0, potencial este que é discutido no presente artigo.

2. INDÚSTRIA 4.0 E ENERGIA 4.0

O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC)

conceitua a Indústria 4.0, ou manufatura avançada, como aquela que

[...] compreende a organização e administração de toda a cadeia de valor do

ciclo de vida dos produtos, propiciada pela integração de tecnologias e

sistemas digitais no desenvolvimento, produção e logística de produtos e

processos, com geração de valores nas cadeias produtivas, organização de

trabalho, modelos de negócios e prestação de serviços inteligentes de

internet a jusante, adequados às demandas dos consumidores. (MCTIC,

2017, p. 11)

O conceito de Indústria 4.0 surgiu na Alemanha, com um grupo de trabalho

criado pelo Research Union Economy - Science of the Federal Ministry of Education

and Research (BMBF) – instituição alemã –, cujo objetivo era indicar as ações para

que o país despontasse no cenário industrial, considerando desenvolvimento social e

tecnológico, juntamente a estruturas de cooperação entre todos os atores de inovação

da Alemanha. Em outubro de 2012 o grupo entregou o relatório "Implementation of

recommendations for the future project Industrie 4.0", no qual foram feitas as

recomendações consideradas necessárias para o desenvolvimento da Indústria 4.0.

(BMWI, 2018)

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Contudo, a origem deste conceito pode ser encontrada, em artigos e notícias,

atrelada à data de abril de 2013, que foi quando ocorreu na Alemanha a Feira de

Hannover. Nesta feira, foi feita a divulgação oficial do Plattform Industrie 4.0

(www.plattform-i40.de), como resultado do apoio de três associações, com mais de

6.000 empresas-membro, para a continuação e desenvolvimento do projeto voltado à

Indústria 4.0. (BMWI, 2018)

No Brasil, o conceito de Indústria 4.0 também pode ser associada aos termos

4ª Revolução Industrial, Manufatura Avançada ou Indústria Integrada. Indiferente da

nomenclatura, a Indústria 4.0 tem recebido atenção em diversas áreas da sociedade,

pois oferece uma discussão ampla dos elementos ligados à pesquisa e

desenvolvimento, incluindo questões sociais e ambientais.

Para Palma et al. (2017, p. 3), no conceito de Indústria 4.0 estão envolvidos a

“Internet das Coisas (Internet of Things – IoT), Internet dos Serviços (Internet of

Services – IoS), Internet dos Dados (Internet of Data – IoD), Sistemas de Produção

Ciber-Físicos (Cyber Physical Systems – CPS), Produtos Inteligentes”. Tais elementos

é que permitem maior inter-relação entre os atores, fazendo com que o conceito se

expanda para além da aplicação industrial.

A Figura 1 apresenta um resumo das revoluções até a Indústria 4.0, de forma

a deixar mais clara suas diferenças.

Figura 1 – Evolução tecnológica da produção (MCTIC, 2017, p. 5)

Na Indústria 4.0, ilustrada como 4ª Revolução na Figura 1, os sistemas

ciberfísicos representam a ligação entre os elementos computacionais e elementos

físicos, e é para esta ligação que a infraestrutura necessita se adequar, nos mais

diversos setores.

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Com o avanço do conceito da indústria 4.0, os novos equipamentos seguirão

a tendência de otimizar as informações, gerando informações importantes

para o processo, desde parametrização de componentes, dados de produção

e ferramentas de diagnóstico, proporcionando agilidade nas resoluções de

eventuais problemas que tenderão a existir. (CGEE, 2017, p. 131)

Para o pleno funcionamento do cenário descrito no trecho acima a energia é

um ponto essencial e, como em todas as revoluções industriais, na Indústria 4.0 ela

também é um elemento de base, o qual também se torna o foco de modificações,

evoluindo para a chamada Energia 4.0. A partir da observação de conteúdos

relacionados ao tema – artigos, relatórios, notícias, informes, entre outros –, assim

como apresentado na introdução, aos elementos ligados aos objetivos da Indústria

4.0 tem se atrelado o complemento “4.0”, seja em âmbito nacional ou internacional, e

isto é o que ocorre com a Energia 4.0.

Os desafios envolvendo energia, assim como podem ser vistos em CGEE

(2017) e EPE (2016), tratam-se de pontos já conhecidos, tais como eficiência na

alocação de recursos naturais, busca por novas fontes energéticas, desafios ligados

ao aumento da produção e consumo de energia, entre outros. Quando cita-se Energia

4.0, a discussão mantém o foco nos problemas já conhecidos, mas com a missão de

se evoluir a infraestrutura de forma a se alcançar o cenário-objetivo para o

desenvolvimento da Indústria 4.0. Desta forma, se faz necessário que o planejamento

energético contemple os objetivos ligados à Energia 4.0, bem como, que sejam

apontados os possíveis meios para isso.

No entanto, para que o planejamento energético seja efetivo, trazendo

objetivos viáveis e concisos, observa-se também a necessidade de se aprofundar as

pesquisas específicas sobre Energia 4.0. Isso pode ser confirmado ao se realizar uma

pesquisa simples, em buscadores na internet, ao se utilizar o termo em português

“Energia 4.0” o resultado é reduzido e em sua maioria direcionado ao idioma italiano.

O mesmo não ocorre com outros setores, também relevantes à Indústria 4.0, pois em

buscas simples consegue-se um maior volume de conteúdo específico, utilizando

termos como: Saúde 4.0, Educação 4.0, Direito 4.0, Sustentabilidade 4.0, Recursos

humanos 4.0, Transporte 4.0, Logística 4.0, entre outros.

3. PLANEJAMENTO ENERGÉTICO BRASILEIRO

A base para um planejamento energético são os estudos gerais e específicos

sobre o setor, para que se possa elaborar quais objetivos se pretende atingir,

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compreender quais problemas podem ser enfrentados e se os meios escolhidos

atendem a legislação em vigor. Em CGEE (2017) é destacada a tradição do Brasil em

estudos voltados para se planejar a oferta e a demanda de energia, o que contribuí

para guiar os investimentos em infraestrutura. Contudo, no mesmo documento,

chama-se a atenção para a necessidade de se direcionar esforços para o

planejamento da Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) no setor energético, e este é

um dos pontos pertinentes à Energia 4.0.

Outro ponto relevante à discussão é a complexidade no processo de

planejamento e de execução deste. Isso se deve ao fato de não ser possível se ater

somente a questões econômicas, mas à necessidade de se também atender questões

ambientais e sociais, para que haja a sustentabilidade do sistema. Os 17 objetivos do

desenvolvimento sustentável (ODS), por exemplo, envolvem metas que servem de

guia para a elaboração de estratégias de desenvolvimento em diversas áreas.

Em ONU (2018) pode-se observar que, para o setor de energia, o ODS 7 é

um dos objetivos principais no que se refere a elementos a serem considerados em

um planejamento energético. Intitulado Energia Limpa e Acessível, o ODS 7 apresenta

as seguintes metas:

7.1 Até 2030, assegurar o acesso universal, confiável, moderno e a preços

acessíveis a serviços de energia

7.2 Até 2030, aumentar substancialmente a participação de energias

renováveis na matriz energética global

7.3 Até 2030, dobrar a taxa global de melhoria da eficiência energética

7.a Até 2030, reforçar a cooperação internacional para facilitar o acesso a

pesquisa e tecnologias de energia limpa, incluindo energias renováveis,

eficiência energética e tecnologias de combustíveis fósseis avançadas e mais

limpas, e promover o investimento em infraestrutura de energia e em

tecnologias de energia limpa

7.b Até 2030, expandir a infraestrutura e modernizar a tecnologia para o

fornecimento de serviços de energia modernos e sustentáveis para todos nos

países em desenvolvimento, particularmente nos países menos

desenvolvidos, nos pequenos Estados insulares em desenvolvimento e nos

países em desenvolvimento sem litoral, de acordo com seus respectivos

programas de apoio (ONU, 2018, p. 1)

A partir dessas metas observa-se que a modernização, o foco em energias

limpas e a expansão da infraestrutura são elementos presentes, e para que estes

ocorram há a necessidade de pesquisas e investimentos. Em EPE (2016), um estudo

da demanda de energia a ser utilizado na elaboração do Plano Nacional de Energia

2050, apesar de os termos Indústria 4.0 e Energia 4.0 não serem mencionados

diretamente, verifica-se elementos ligados à modernização, à sustentabilidade e à

expansão da infraestrutura que podem ser relacionados ao tema. Contudo, os

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conteúdos voltados ao setor de energia carecem de maior suporte no que se refere a

aplicabilidade dos conceitos 4.0, para que o Brasil possa avançar nos demais setores

e isso pode ser observado na citação que segue.

Aplicar o conceito da indústria 4.0 é condição inegociável para a

competitividade do setor produtivo brasileiro. Por isso, são urgentes a

disseminação desses novos conceitos e a capacitação das indústrias que

representam setores transversais e estratégicos, indutores de produtividade

e de inovação. (BRASIL, 2017, p. 1)

Dentre os setores econômicos brasileiros, uma pesquisa encomendada pelo

MCTIC, apresenta a energia, com 78%, como sendo um setor promissor para a

aplicação da Indústria 4.0 (MCTIC, 2017). Mas este dado refere-se apenas ao

potencial, dado que no mesmo documento consta que “em razão da incipiência do

tema de manufatura avançada no Brasil, existe um déficit de disponibilidade de

infraestruturas para apoio à inserção das empresas no ecossistema de manufatura

avançada”. (MCTIC, 2017, p. 37)

Como forma de se minimizar esse déficit, o Plano de Ciência, Tecnologia e

Inovação, que destaca o setor energético como setor estratégico, tem como objetivo

para a Indústria 4.0, consequentemente para a Energia 4.0:

Propiciar condições de acesso e inserção das empresas brasileiras no

ecossistema de manufatura avançada, com suporte da ciência, tecnologia e

inovação para desenvolvimento de cadeias produtivas de setores

econômicos estratégicos e promissores para o País, que atendam a

demandas de alcance social. (MCTIC, 2017, p. 13)

Neste cenário, o planejamento energético, e execução deste, contribui com o

preenchimento de lacunas tecnológicas. Para tanto, políticas e medidas devem ser

coerentes com os objetivos elaborados no plano energético, caso contrário além de

não assumirem a função incentivadora podem, em certa medida, se tornarem

limitantes. Pode se citar como exemplo a LEI 9.991 de 2000 (Lei de eficiência

energética), que desde sua instauração sofreu mais de dez modificações, sendo a

última pela LEI 13.280 de maio de 2016, ainda não incorporou elementos do novo

ecossistema em desenvolvimento, criando lacunas na regulação. (MCTIC, 2017;

BRASIL, 2000; 2016)

No caso do Plano Inova Energia, o qual envolve Redes Elétricas Inteligentes

(Smart Grids) e Transmissão em Ultra-Alta Tensão (UAT), Geração de Energia

através de Fontes Alternativas e Veículos Híbridos e Eficiência Energética Veicular,

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este apresenta alinhamento com as metas do planejamento energético, estimulando

através de financiamento projetos que incorporam conceitos da Energia 4.0, apesar

de não citar diretamente o termo. (EPE, 2016; BNDES, 2013)

De forma resumida, os conteúdos voltados para o planejamento energético

brasileiro trazem elementos voltados à Energia 4.0 e as questões ligadas aos

investimentos em inovação são mencionadas, mas a possibilidade de interação

startup-indústria, no setor de energia, não se mostra clara e definida nos textos

analisados.

4. STARTUPS E A INOVAÇÃO NO SETOR ENERGÉTICO

Apesar de as startups, bem como sua relação com a indústria no setor

energético (principalmente nos casos de empresas públicas), não ser bem delimitada,

tem se notado um aumento do número de startups direcionadas ao setor, e estas têm

se mostrado como agentes com potencial de propiciar soluções ligadas à pesquisa,

desenvolvimento e inovação (PD&I). Isso pode ser atribuído ao fato de as startups

serem, em sua essência, empresas de base tecnológica e desta forma apresentarem

conceitos da Indústria 4.0. (MCTIC, 2017)

A startup, deve ser associada a algum tipo de inovação e pode ser definida

[...] como uma empresa, ou empreendimento, que tenha superado a fase

inicial de uma simples ideia de negócio e que esteja em seus estágios iniciais

de estabelecimento e teste de um modelo de negócios e nos primeiros passos

para estabelecer uma produção em escala mínima industrial/comercial. Não

é absolutamente necessário que seja de pequeno porte, embora esse seja o

tamanho mais comum, e talvez mais interessante, em que possa se

apresentar. (CAVALCANTE; RAPINI; SILVA, 2018, p. 9)

Por terem, em geral, um menor porte e receitas instáveis, Cavalcante, Rapini e

Silva (2018, p. 3) destacam que as startups têm “dificuldade em obter crédito via

instituições financeiras tradicionais”. Esta é uma questão que prejudica tanto a

ampliação do número de startups quanto o crescimento destas, apesar de apresentar

potencial ligado à inovação, dificilmente podem se beneficiar dos mesmos incentivos

que pequenas, médias e grandes empresas dispõem. Para contornar esta situação,

as startups contam com fontes alternativas como: “capital próprio ou de amigos,

crowdfunding, capital de risco, private equity e recursos de investidor anjo, entre

outros” (CAVALCANTE, RAPINI E SILVA, 2018, p. 3).

O financiamento das startups, voltadas para o setor energético, é um tema que

deve ser observado, dado que o desenvolvimento destas torna-se ponto positivo para

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o desenvolvimento da Energia 4.0. Como apresentado em CGEE (2107), exercícios

de projeção do consumo energético se mostra crescente e com possibilidade de, até

2050, se colocar muito acima da atual capacidade instalada, e “isso impõe o desafio

para o PD&I do setor que deverá estimular avanços e inovações, mas também

grandes oportunidades de novos negócios para o setor e toda a sua cadeia produtiva”

(CGEE, 2017, p. 22).

Os benefícios do desenvolvimento da Energia 4.0, considerando uma maior

aproximação das startups com empresas tradicionais, podem avançar, dado um

aumento no potencial de desenvolvimento de inovações no setor, para a redução de

custos financeiros nos processos de geração, distribuição e consumo, melhor gestão

dos recursos naturais relacionados ao processo de extração processamento e

consumo destes, e possibilidade de ampliação do usos de fontes de recursos

energéticos renováveis. Com estes pontos pode-se reduzir custos econômicos

(devido a tecnologias mais eficientes), reduzir custos ambientais (devido à mitigação

das externalidades negativas) e reduzir custos sociais (com o aumento do acesso à

energia, redução do preço e maior qualidade ambiental, o que minimiza riscos à

saúde).

Contudo, a interação entre as startups e as empresas tradicionais ainda precisa

ser melhor planejada, para que ambas possam impactar positivamente umas nas

outras. Pois como apresentado por Cavalcante, Rapini e Silva (2018)

As relações entre agentes privados (ou mesmo entre público e privado) regida

por contratos e as capacidades de produtor, demandante, regulador,

financiador e, principalmente, coordenador (planejador) do Estado, são

decisivos para definir o papel e os limites da startups no processo de

desenvolvimento de uma economia.

Já se pode observar a tentativa de aproximação de indústrias do setor

energético com o potencial das startups. Um exemplo é a Companhia Paranaense de

Energia (COPEL) que, em 2017, abriu uma chamada pública para a seleção de

startups voltadas ao setor de energia, cujas áreas de atuação estavam entre geração,

transmissão, distribuição e comercialização de energia, telecomunicações e

tecnologia da informação. Esta chamada foi elaborada com o objetivo de “prospectar

empresas que apresentem soluções inovadoras e com potencial de impacto positivo

no mercado, de crescimento rápido e contínuo [...], além de fomentar o ecossistema

de STARTUPS nos ramos de energia e tecnologia”. (COPEL, 2107, p. 3)

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Outro exemplo é a ENEL que, com três distribuidoras (Rio de Janeiro, Ceará e

Goiás), também em 2017 lançou uma chamada para startups sob o título “Energy

Start”. A chamada apresenta como objetivo “prospectar startups, pequenas e médias

empresas que apresentem soluções inovadoras” (ENEL, 2017, p.1) além da intenção

de estimular o ecossistema de startups do setor.

Em ambos os exemplos, fomentar os ecossistemas de startups no setor de

energia foi apresentado como objetivo, isso pode demonstrar o interesse por parte do

setor para que a aproximação da indústria com as startups não seja pontual e rara,

podendo ser uma ferramenta que venha favorecer a transição para a Energia 4.0 e

consequentemente apoiar a migração das empresas dos demais setores para

Indústria 4.0.

Além das chamadas de startups, feitas pelo setor de energia, outras ações

podem fomentar este ecossistema, trazendo o tema para discussão em eventos

expositivos, tais como: congresso, workshops, seminários, palestras, feiras e painéis.

Mas, para que a Energia 4.0 seja alcançada, é necessário que esta discussão seja

incorporada na elaboração do planejamento energético.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O conceito de Indústria 4.0 trouxe desafios principalmente para o setor de

energia, pois, como este é um elemento base para os demais setores da economia,

para que haja o avanço para a Indústria 4.0, exige-se também que a Energia 4.0 seja

alcançada.

A Energia 4.0 busca soluções para problemas já conhecidos no setor – como

eficiência na alocação de recursos naturais, busca por novas fontes energéticas,

desafios ligados ao aumento da produção e consumo de energia, entre outros –,

contudo, possui um desafio adicional que é evoluir a infraestrutura para um sistema

ciberfísico, no qual possa se verificar a ligação entre elementos computacionais e

elementos físicos.

Para que haja essa evolução da infraestrutura, no setor energético, surgem as

startups como elementos potenciais para este fim. Isso se deve ao fato de as startups

serem associadas a algum tipo de inovação e desta forma contribuir para o

desenvolvimento da Energia 4.0.

A aproximação das startups com as grandes indústrias do setor de energia tem

sido estimulada pela divulgação de chamadas para seleção de startups e eventos

expositivos, como por exemplo, feiras voltadas à inovação. No que se refere às

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startups ligadas à energia, existe uma diversidade de áreas de atuação de interesse

para a indústria, são elas: a geração, transmissão, distribuição e comercialização de

energia, telecomunicações e tecnologia da informação.

Apesar de elementos potenciais para o desenvolvimento da Energia 4.0, a falta

de regulação específica, sobre as formas de interação das startups com indústrias

tradicionais, mostra-se como uma limitação para uma maior interação entre estes

atores. Outro fator que pode ser considerado como limitante é que as startups, em

geral, não ter acesso as mesmas fontes de financiamento que empresas tradicionais

possuem, apesar de disporem de fontes alternativas esta limitação pode prejudicar o

avanço de projetos que poderiam fornecer soluções efetivas no setor.

Como forma de preencher as lacunas tecnológicas no setor de energia, surge

como potencial a interação da indústria com as startups. Contudo, o surgimento e

desenvolvimento dessas, bem como a regulação da interação indústria-startup, são

pontos que necessitam de atenção no planejamento energético brasileiro, para que a

Energia 4.0 seja alcançada e assim poder favorecer a transição das empresas dos

demais setores para a Indústria 4.0.

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