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3 Como assim Plantando Águas? Veja como saneamento, reflorestamento e monitoramento podem preservar os mananciais Primeiro semestre de 2014 REVISTA #01 O LIXO QUE VIRA ADUBO Aprenda como fazer a compostagem usando resíduos vENTREVISTA: JOSÉ ELI DA VEIGA Professor da USP desaprova Código Florestal, mas considera o CAR um avanço

Plantando água

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Revista da ONG Iniciativa Verde.A Iniciativa Verde, também conhecida como The Green Initiative (TGI), é uma associação civil com sede em São aulo (SP) que desde 2005 trabalha com temas como mudanças climáticas, recomposição florestal, manejo sustentável de florestas, serviços ambientais e educação ambiental.

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  • 3Como assim Plantando guas?

    Veja como saneamento, reflorestamento e monitoramento podem preservar os mananciais

    Primeiro semestre de 2014

    R E V I S T A #01

    O LIXO QUE VIRA ADUBO

    Aprenda como fazer a compostagem usando resduos

    vENTREVISTA: JOS ELI DA VEIGA

    Professor da USP desaprova Cdigo Florestal, mas

    considera o CAR um avano

  • 2 Revista Iniciativa Verde

    Mais difcil do que plantar804 Mil rvores plantar uMa ideia.

    iniciativaverde.org.br Tudo o que a gente faz tem um impacto na natureza e

    tudo o que a Iniciativa Verde faz para reduzir esse

    impacto, desde a compensao da emisso de gases

    de efeito estufa at os nossos programas de educao

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    climticas. At o momento, j plantamos mais de

    804 mil rvores, combatendo o aquecimento global e

    conservando a biodiversidade brasileira. Pode parecer

    muito, mas ainda h muito a ser feito. Acesse o nosso

    site e saiba como voc tambm pode ajudar.

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  • 3Mais difcil do que plantar804 Mil rvores plantar uMa ideia.

    iniciativaverde.org.br Tudo o que a gente faz tem um impacto na natureza e

    tudo o que a Iniciativa Verde faz para reduzir esse

    impacto, desde a compensao da emisso de gases

    de efeito estufa at os nossos programas de educao

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    climticas. At o momento, j plantamos mais de

    804 mil rvores, combatendo o aquecimento global e

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    muito, mas ainda h muito a ser feito. Acesse o nosso

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    Mi gua, su gua!A Revista Plantando guas mais um meio de comunicao do nosso Projeto. Alm de registrar as atividades dele e difundir conhecimen-tos sobre os temas relacionados, por meio dela queremos compar-tilhar experincias e discutir sobre sustentabilidade ambiental e socioeco-nmica no meio rural.

    A Iniciativa Verde, tambm conhecida como The Green Initiative (TGI), uma associao civil com sede em So Paulo (SP) que desde 2005 traba-lha com temas como mudanas climticas, recomposio florestal, manejo sustentvel de florestas, servios ambientais e educao ambiental.

    O Plantando guas, elaborado pela Iniciativa Verde e patrocinado pelo Programa Petrobras Ambiental, tem o objetivo de contribuir para adequar propriedades rurais do estado de So Paulo em diversos pontos da ques-to ambiental pensando na recuperao e conservao das guas. As aes so voltadas, principalmente, para a agricultura familiar, para apoiar sua regularizao formal perante a lei, a melhora das condies de sade e o aumento e diversificao da produo.

    Alm do atendimento legislao ambiental, o projeto trata de sanea-mento com tecnologias de baixo custo e de produo agroflorestal. Ele tam-bm tem um componente de formao e de educao ambiental, em espe-cial, com as atividades no Centro de Educao Ambiental (CEA) do Stio So Joo, em So Carlos (SP).

    O projeto feito reforando parcerias antigas da Iniciativa Verde e cons-truindo outras novas. So com associaes e cooperativas de agricultores fa-miliares dos assentamentos e comunidades participantes, rgos de atuao fundiria como o Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria (Incra), federal, e a Fundao Instituto de Terras do Estado de So Paulo (Itesp), do Es-tado de So Paulo; de ensino como a Universidade Federal de So Carlos (UFS-Car) e a Escola Tcnica Estadual (ETEC) de Piedade; e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (Embrapa Instrumentao), representando a pesquisa.

    Com esta revista queremos apresentar e discutir diversos assuntos como o novo Cdigo Florestal, agroecologia, educao ambiental, saneamento, agricultura e pecuria, acreditando que eles tm ligao e que podem obter solues conjuntas.

    Queremos, assim, contribuir para unir os temas proteo ambiental e produo agrcola, qualidade de vida e sade no meio rural.

    Roberto ResendePresidente da Iniciativa Verde

    Editorial

  • 4 Revista Iniciativa Verde

    QUEM SOMOS

    ExpedienteREVISTA PLANTANDO GUASPrimeira edioFevereiro de 20142.000 cpias

    ExpedienteJornalista responsvel e edioIsis Nbile Diniz (MTB: 44.170)

    Projeto grfico e diagramaoCyntia Fonseca

    PautaIsis Nbile DinizRoberto Resende

    TextosIsis Nbile DinizLucas PereiraReinaldo Canto

    Reviso de textoIsis Nbile DinizMariana Gomes

    Seleo de imagensJaqueline SouzaIsis Nbile DinizRoberto Resende

    Foto da capaPedro Barral

    Equipe da Iniciativa VerdeRoberto Ulisses Resende (presiden-te), Cristiane Oliveira (diretora ad-ministrativa), Lucas Pereira (diretor tcnico), Pedro Barral de S (diretor florestal), Margareth Nascimento, Isis Nbile Diniz, Jaqueline Souza, Jssica Carvalho Campanha, Julian-na Colonna, Laine Marinho, Magno Castelo Branco, Mariana Gomes, Reinaldo Canto, Neusa de Jesus, Vincius De Zorzi.

    AgradecimentosEmbrapa Instrumentao de So Carlos (SP), Fernando Silveira Franco, Jos Eli da Veiga, Loducca.

    Iniciativa Verde Rua Joo Elias Saada, 106, So Paulo (SP), CEP 05427-050Telefone: +55 (11) 3647-9293, [email protected], www.iniciativaverde.org.br

    PATROCNIO Esta publicao faz parte do projeto Plantando guas, elaborado pela ONG Iniciativa Verde em parceria com cerca de 20 instituies e aprovado em abril de 2013 pelo Programa Petrobras Ambiental. O projeto tem como ob-jetivo adequar propriedades rurais do estado de So Paulo de acordo com o que estabelece o novo Cdigo Florestal para recuperar e conservar os recursos hdricos. O Plantando guas contar com patrocnio da Petrobras por dois anos.

    Com o projeto, a Iniciativa Verde e seus parceiros pretendem: recuperar 20 hectares de reas de preservao permanente (APPs) de Mata Atlntica; executar 24 hectares de sistemas agroflorestais para fins produtivos; imple-mentar mais de 140 mdulos de saneamento; elaborar 110 planos de manejo de propriedades da rea rural; inscrever pelo menos 85 imveis no Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro obrigatrio para todas as propriedades rurais. Aproximadamente, 200 famlias sero beneficiadas diretamente em municpios do interior do estado.

    PARCEIROS Amigos do Ribeiro Feijo; Associao Amigos Produtores Rurais de Itapetininga; Associao dos Remanescentes de Quilombo Kabundu do Cafund; Cooperativa de Produo da Agricultura Familiar So Jorge (Coopas), Iper; Cooperativa de Produo e Prestao de Servios dos Assentados e Pe-quenos Agricultores de Porto Feliz (Coopap); Cooperativa Mista de Agricultores, Apicultores, Pecuaristas e Pescadores de Porto Feliz (Comapre); Empresa Bra-sileira de Pesquisa Agropecuria (Embrapa); ETEC Escola Tcnica Estadual de Piedade; Instituto de Terras de So Paulo (Itesp); Instituto Nacional de Coloniza-o e Reforma Agrria (Incra); Ncleo de Agroecologia da Universidade Federal de So Carlos (UFSCar/ Sorocaba); Prefeitura de Piedade; Servio Autnomo de guas de So Carlos (SAAE); Prefeitura de So Carlos.

    A reproduo desta obra permitida desde que citada a fonte. Esta publicao no pode ser comercializada.

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    PATROCNIO

  • 5Sumrio

    6 PROSAJos Eli da Veiga: O debate sobre o Cdigo Florestal continuarTemos que ter pacincia porque no vai demorar muito para a sociedade se dar conta da grande besteira que foi feita, dessa mudana no cdigo

    12 CONTRAPARTIDACarbon Free: rvores no lugar das emissesPrograma da Iniciativa Verde adiciona 30 hectares recompostos de mata atlntica complementando o objetivo do projeto Plantando guas

    18 MATRIA DE CAPAComo assim Plantando guas?Conhea o projeto que investe em saneamento, plantio de mudas e monitoramento para preservar mananciais

    26 HISTRIAFlvio Marchesin: Eu vivo de plantar rvoresEx-agricultor comeou a recompor terra desmatada pela famlia. At que, vendendo etiquetas, descobriu que a Iniciativa Verde procurava rea para reflorestar. Florescia, assim, o agente ambiental

    30 BIBLIOTECAUma direo aos agricultoresConhea algumas obras que so orientao de base para quem j trabalha em propriedades rurais

    28 COMO FAZERCompostagemMaterial mais que um simples adubo: fornece nutrientes e melhora a caracterstica do solo

    22 SANEAMENTOPobre pas ricoSaneamento rural no Brasil: questo de sade pblica e de verdadeiro desenvolvimento

    24 MATA ATLNTICAUm pacto pela vidaCentenas de iniciativas se unem pela sobrevivncia do bioma mais degradado do Brasil

    14 CENASDessa gua bebereiSob o calor terroso do interior do estado de So Paulo, tcnicos iniciam as atividades no campo durante o primeiro semestre do projeto Plantando guas

    13 ARTIGOA importncia das AgroflorestasAgroecologia e conservao dos recursos naturais com os Sistemas Agroflorestais

    8 CAPINADOSSaiba as novidades sobre a agricultura familiar, o Cdigo Florestal, o Cadastro Ambiental Rural e a Iniciativa Verde

    11 ARTIGOSaneamento e qualidade de vidaDoenas disseminadas pela gua contaminada podem ser evitadas com saneamento bsico

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  • 6 Revista Iniciativa Verde

    O professor dos programas de ps-graduao do Instituto de Relaes Internacionais da Uni-versidade de So Paulo (IRI/USP), Jos Eli da Veiga, 63 anos, acompanhou cada debate relacionado ao novo C-digo Florestal publicando uma srie de artigos na imprensa brasileira. A com-pilao desses textos est em seu mais novo livro, dos 20 que j tem publicado: Os Estertores do Cdigo Florestal, da Armazm da Cultura. A seguir, acom-panhe sua entrevista exclusiva sobre Cdigo Florestal, Cadastro Ambiental Rural (CAR) e propriedades rurais.

    Como podemos usar o novo Cdi-go Florestal ou as ferramentas legais para resguardar as reas e at recu-perar outras?No existe mais Cdigo Florestal. Essa lei um desastre, no houve respeito nenhum s reas de Preser-vao Permanente (APPs), um preju-zo legitimado. Tenho impresso que qualquer agrnomo concordaria que a conservao de rea de APP deve-ria ser considerada indiscutvel. J a Reserva Legal (RL), que toda proprie-dade precisa ter, mais discutvel. Deveria ser possvel fazer a compen-

    sao dela. Outro problema do Cdi-go Florestal, na tentativa de dizer que estava tentando ajudar o agricultor familiar, foi usar a ideia de imveis rurais em mdulos. Isso favoreceu a especulao imobiliria, pois stios de lazer se enquadram nesses mdulos.

    O que se aproveita da Lei Florestal?S o CAR, se for implantado com rigor. um escndalo as propriedades ainda no terem cadastro. No Brasil, prati-camente, no se paga imposto por se ter propriedade rural. O CAR ajudar nessa questo, por isso notamos certa resistncia a ele. Infelizmente, houve uma derrota de quem era pela susten-tabilidade, por conta das contradies e da dificuldade de explicar o problema da Lei Florestal opinio pblica. Por exemplo, uma das coisas mais cho-cantes, acho que nem citei no livro, que o empresariado brasileiro meio que quis lavar as mos.

    Por que isso aconteceu?Ainda hoje me pergunto. Na lista dos 200 maiores grupos, do Valor Econmi-co, apenas cerca de dez tm agroneg-cio. Embora no atue na rea, o empre-srio pode ter algum tipo de ligao. s

    Jos Eli da Veiga:

    O debate sobre o Cdigo Florestal continuarTemos que ter pacincia porque no vai demorar muito para a sociedade se dar conta da grande besteira que foi feita, dessa mudana no cdigo

    POR ISIS NBILE DINIZ E ROBERTO RESENDE

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  • 7 um raciocnio bacana se no estivs-semos em uma sociedade capitalista. Muitos casos s vo andar se assumi-rem essa lgica de mercadoria. Se for de interesse pblico, que vire reserva. Como o estado no capaz de viabilizar a desapropriao de vrias reas, voc fica de mos atadas se for purista.

    Muitos autores dizem que para conse-guir recompor necessrio tornar a floresta financeiramente vivel dentro do capitalismo. O senhor concorda?Algum tipo de rentabilidade o proprie-trio deve ter. Agora, se o local muito importante para sociedade, ele pode deixar de ser privado. Ningum paga para as reservas florestais, ecolgicas e indgenas serem preservadas. So re-as que fogem dessa lgica.

    Os jovens esto deixando o meio rural para morar na cidade. Que impacto isso causa na agricultura familiar?No necessariamente negativo que algum saia do meio rural. Os jovens so forosamente atrados a irem para as cidades para estudar e sair de um ambiente familiar geograficamente isolado com a famlia. A procura por locais com mais escolhas um pro-

    vezes, ele mesmo fazendeiro. Outra possvel explicao a complexidade do assunto. Mais grave o fato de algumas empresas terem conselho de meio am-biente e, mesmo assim, acho que eles nem chegaram a discutir o tema.

    Como os negcios no campo podem existir em harmonia com a preserva-o ambiental?Planejando. A primeira coisa procu-rar respeitar as aptides da proprieda-de. No adianta plantar algo exigente em uma terra que no corresponde. Alis, estas reas deveriam ser pre-servadas, como o escandaloso caso do cerrado. O mecanismo, neste caso, seria a compensao.

    Qual a sua opinio sobre pagamento por servios ambientais (PSA)? Estou ainda procura de experincias concretas que me deem mais clareza. Ainda no acredito que tenha se tor-nado um incentivo econmico como era a inteno.

    H um questionamento de ordem ti-ca sobre o PSA afirmando que a pes-soa vai ser paga para simplesmente cumprir a lei. O que o senhor acha?

    gresso. A discusso se a famlia ru-ral teve condies de prepar-lo para que possa fazer essa opo. Se ele teve acesso educao e, alm disso, se gosta de agricultura, provavelmente vai procurar algum meio de voltar ou atuar no campo. No necessariamente no mesmo lugar e nem diretamente.

    O desmatamento pouco palpvel para moradores urbanos. S com educao poderamos mudar isso?Eu discordo dessa palavra s, porque educao uma condio absoluta-mente necessria. E um processo sociocultural complexo mudar essa si-tuao. Pesam muito as presses que a sociedade faz sobre o estado como, por exemplo, esse debate todo sobre o Cdigo Florestal. Havia vises estrat-gicas completamente diferentes e aca-bou predominando a mais predatria. Temos que ter pacincia porque no vai demorar muito para sociedade se dar conta da grande besteira que foi feita, dessa mudana no cdigo. Os es-peculadores de terra que se disfaram de agronegcio tiraram vantagem. Vai chegar esse momento, tenho certeza disso e vamos ter outra vez esse deba-te. Os que perderam, vo ganhar. FO

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    CAPINADOS

    De rvore em rvore A Iniciativa Verde superou a marca de 804 mil rvores nativas plantadas em reas degradadas, principal-mente, em matas ciliares (vegetao das margens de rios, igaraps, lagos, nascentes e represas) da mata atlntica. Esses plantios correspondem a 480 hectares ou 685 campos de futebol. A quantia foi alcanada no fim do ano passado, coincidindo com o aniversrio de oito anos da organizao (comemorado no dia 28 de novembro).

    A maioria das rvores proveniente de projetos especficos com instituies como o Plantando guas,

    com patrocnio da Petrobras, e de organizaes que compensam suas emisses de carbono por meio do programa Carbon Free. Mais de 600 empresas aderi-ram voluntariamente ao Carbon Free ao longo dos anos, ajudando diretamente nessa reconstituio florestal.

    Segundo a Resoluo da Secretaria de Estado do Meio Ambiente de So Paulo (SMA 30, de 14-5-2009), apenas no estado h 1,7 milho de hectares dispon-veis para serem recompostos com cobertura florestal nativa. Portanto, a Iniciativa Verde e as suas parceiras tm um longo caminho a preencher.

    Margem do Ribeiro Feijo no Stio So Joo em So Carlos (SP), recomposta pela Iniciativa Verde

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    Uma mo para a famliaA agricultura familiar ganhou reforo internacional. A Organizao das Naes Unidas (ONU) declarou 2014 como o Ano Internacional da Agricultura Familiar (AIAF). O objetivo aumentar a visibilidade dela e dos pequenos agricultores, focando a aten-o em seu papel de erradicao da fome e pobreza, proviso de segurana alimentar e nutricional, melhora dos meios de sub-sistncia, gesto dos recursos naturais, proteo do meio ambiente e para o desen-volvimento sustentvel, particularmente, nas reas rurais. De acordo com a ONU, a

    agricultura familiar a forma predominan-te de agricultura no setor de produo de alimentos em pases em desenvolvimento e at nos desenvolvidos.

    Assim, durante este ano, haver di-versos eventos no mundo relacionados ao tema. No Brasil, o primeiro aconteceu em fevereiro, em Braslia: Seminrio Interna-cional PAA + Aquisio de Alimentos no Ano Internacional da Agricultura Familiar.

    ACESSE O SITE PARA SABER MAIS: www.fao.org/family-farming-2014/home/pt.

  • 9De olho na nova Lei FlorestalO novo Cdigo Florestal (Lei Federal n 12.651/2012) est em vigor desde 2012. Mas o que foi feito at agora? Como saber se a ferramenta est sendo usada para a preservao ambiental? Para acompanhar essas e outras discusses em torno do as-sunto, est no ar o site www.observatorioflorestal.org.br do Observatrio do Cdigo Florestal. No endereo, so publicadas notcias referentes ao Cdigo Florestal como sobre o Cadastro Ambiental Rural (CAR), publicaes e anlises, informaes jurdicas, legislaes florestais e notcias.

    O Observatrio do Cdigo Florestal tem como objetivo mo-nitorar a regulamentao e a implantao da nova lei e avaliar com transparncia, objetividade e consultas locais o desem-penho dos estados. Ele foi criado por instituies da sociedade civil. Atualmente, 14 organizaes participam do Observatrio a Iniciativa Verde entrou para a rede em 2013.

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    Cadastro de imveis ruraisOs proprietrios de imveis rurais que tm dificuldade de acesso internet podem realizar o Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro eletrnico obrigatrio para todos os imveis rurais, no modo offline (fora da internet) e gravar o formulrio em qualquer mdia (CD, DVD ou pendrive), segundo o Minist-rio do Meio Ambiente (MMA). Para ter acesso ao formulrio, os interessados devem procurar o auxlio de prefeituras, sindicatos, entidades representativas de classe ou tcnicos rurais. Quando o Sistema de Cadastro Ambiental Rural (SiCAR) estiver funcionando via internet, os cadastros podero ser enviados para o sistema central gerando um nmero de protocolo de inscrio.Os estados do Esprito Santo, Bahia, Par, So Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondnia e Tocantins tm sistema prprio de cadastramento que podem ser aces-sados pelo link www.car.gov.br. Em breve, todos os sistemas (federal e estaduais) sero integrados. O SiCAR s entrar em funcionamento total aps assinatura da Instruo Normativa pela Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, sem data definida. Aps a assinatura, o produtor ter o prazo de um ano, renovvel por mais um, para se inscrever no CAR.

  • 10 Revista Iniciativa Verde

    CAPINADOS

    O que o programa Petrobras Ambiental

    Desmistificando o Cdigo FlorestalA Iniciativa Verde lanou o livreto Sustentabilidade: Adequao e Legislao Ambiental no Meio Ru-ral, publicado por meio do projeto Plantando guas, patrocinado pela Petrobras. A publicao um roteiro simplificado que resume o Cdigo Florestal (Lei 12.651/12) e aborda diversas questes relativas apli-cao desta e de outras leis. Escrito pelo engenheiro agrnomo Roberto Resende, presidente da Iniciativa Verde, a publicao tem 40 pginas e pode ser baixada por meio do site www.iniciativaverde.org.br.

    Duas mil cpias do livreto foram impressas e sero distribu-das para os agricultores familiares, incluindo assentados rurais e qui-

    lombolas que participam do projeto Plantando guas. A publicao usada para orientar os trabalhos da instituio e dos parceiros e para auxiliar os participantes do projeto a adequarem ambientalmente os seus imveis rurais. O livreto trata de temas relativos ao novo Cdigo Florestal e de aspectos tcnicos para a adequao ambiental como bacias hidrogrficas, mata atlntica, recomposio flores-tal, uso e conservao do solo e licenciamento ambiental. Como o Plantando guas realizado no es-tado de So Paulo, o livreto tambm aborda outras legislaes a serem aplicadas na regio, como a Lei da Mata Atlntica.

    O projeto Plantando guas, da Ini-ciativa Verde em parceria com cerca de 20 instituies, patrocinado pela Petrobras por meio do Pro-grama Petrobras Ambiental. Ele se enquadrou no tema atual do Progra-ma: gua e Clima: contribuies para o desenvolvimento sustent-vel. Por meio do Programa, a Companhia destina R$ 102 mi-lhes a 46 projetos ambientais de todas as regies do pas - o maior investimento de todas as edies. A cada dois anos, a Petrobras faz selees pblicas.

    O Programa Petrobras Am-biental em seu ciclo de 2008/ 2012

    investiu R$ 500 milhes em pro-jetos voltados para preservao e recuperao do meio ambiente e da biodiversidade. Suas aes j envol-veram diretamente mais de quatro milhes de pessoas. De 2003 a 2008, o Programa Petrobras Ambiental investiu mais de R$ 150 milhes em projetos de pequeno, mdio e gran-de porte. Mais de cinco mil espcies nativas foram estudadas em uma rea de influncia direta de nove mil hectares, atendendo a 23 milhes de pessoas direta e indiretamente.

    SAIBA MAIS: sites.petrobras.com.br/minisite/ambiental/. FO

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    de conhecimento comum que gua fonte de vida!. Esta afirmao est incompleta, pois somente gua de boa qualidade oferece sade queles que a consomem. A gua contaminada, por outro lado, pode disseminar uma srie de doenas como diarreias, verminoses, clera, hepatite A, esquistossomose, entre outras. E como evitar isto? Promovendo o saneamento bsico, que compreende o tratamento de gua, esgoto, coleta de lixo e drenagem urbana.

    Estudo divulgado pelo Instituto Trata Brasil, em fevereiro de 2013, apresentou a face mais cruel da falta de saneamento: quase 400 mil brasileiros internados por

    diarreias em 2011, com gastos do SUS de R$ 140 milhes, sendo crianas de 0 a 5 anos a grande parte atingida.

    No pas, onde a rea rural e comu-nidades tradicionais isoladas agrupam um contingente de mais de 29 milhes de brasileiros, somente 36% dos moradores do campo tm acesso gua tratada e menos de 25% a sistemas de coleta e/ou tratamento de esgoto (IBGE PNAD, 2013). Os moradores restantes, mais de 21 mi-lhes, despejam o esgoto em fossas ru-dimentares, rios, valas, latrinas e at na bananeira no fundo do quintal. A coleta de lixo tambm no atende a imensa maioria das residncias.

    Para resolver o problema, existe a pre-viso do uso de recursos governamentais, contidos no Plano Nacional de Saneamen-to Bsico (Plansab), da ordem de R$ 508 bi para os prximos 20 anos. A rea rural tem expectativa de receber R$ 24 bi em investi-mentos no perodo.

    Alm dos investimentos na esfera go-vernamental, aes como as promovidas pela Iniciativa Verde e parceiros (Embra-pa, Stio So Joo, etc), com o patrocnio da Petrobras, sinalizam a preocupao de empresas e instituies do terceiro setor, bem como a sociedade em geral, em tor-nar a vida no campo mais sustentvel. Pro-mover o saneamento bsico no Pas uma das formas mais eficientes de melhorar a qualidade de vida. desejvel e urgente que na rea rural, essa seja uma realidade cada vez mais comum.

    POR WILSON TADEU LOPES DA SILVA Pesquisador da Embrapa Instrumentao

    ARTIGO

    Saneamento e qualidade de vidaDoenas disseminadas pela gua contaminada podem ser evitadas com saneamento bsico

    No Brasil, somente

    36% dos moradores

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  • 12 Revista Iniciativa Verde

    CONTRAPARTIDA

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    A Iniciativa Verde j recuperou cerca de 300 hectares de re-as degradadas, o equivalente a 430 campos de futebol, com o plan-tio de espcies nativas desde 2006 graas ao Programa Carbon Free. Agora, este complementa o projeto Plantando guas com o plantio de rvores em 30 hectares de matas ci-liares, que tem a ambiciosa misso de resguardar e impulsionar o vo-lume dos corpos dgua no interior do estado de So Paulo. As rvores podem ajudar a absorver at 80% da gua da chuva. Ao reter a gua no solo, as plantas ajudam a encorpar rios, nascentes, crregos e represas.

    O Programa Carbon Free, con-cebido pela Iniciativa Verde, permi-te que empresas, pessoas fsicas e eventos tenham compensadas a suas emisses de carbono por meio do plantio, principalmente, de rvores da mata atlntica em regies onde a floresta foi devastada. Mas, para o Programa ser contnuo, a instituio

    necessita das iniciativas voluntrias de empresas e de pessoas fsicas e da aceitao e envolvimento de pro-prietrios rurais - parte fundamental para o sucesso do Programa j que estes destinam reas para os plan-tios de rvores.

    Ao criar este mecanismo inova-dor para o plantio de rvores visando a preservao ambiental e climtica, a Iniciativa Verde possibilitou e tornou vivel uma nova fonte de financia-mento para a recomposio florestal. Os principais benefcios do Programa Carbon Free, alm da melhoria dos servios ambientais como o caso da gua, so: a absoro de carbo-no da atmosfera (ajudando a regular a temperatura do planeta), a criao de corredores para a biodiversidade (auxiliando na preservao das esp-cies), a conscientizao da sociedade (que passa a ter mais cuidado com o meio ambiente) e a gerao de renda no campo (incentivando o propriet-rio rural a preservar a natureza).

    Carbon Free: rvores no lugar das emisses

    Programa da Iniciativa Verde adiciona 30 hectares recompostos de mata atlntica complementando o

    objetivo do projeto Plantando guas

    POR LUCAS PEREIRA

    rea de plantio de rvores em So Carlos (SP), em 2012

    Mudas de guanandi preparadas no viveiro do Stio So Joo, em

    So Carlos (SP)

    Todos esses benefcios so di-retamente gerados pelos projetos de recomposio florestal. Impactantes, eles interferem positivamente tanto na regio que recebe o plantio como em toda a sociedade por meio da melhoria dos servios ambientais promovidos pelas florestas. Todos ganham com essa ao que visa um melhor futuro para as florestas, uma maior proximi-dade entre o empresrio e o agricul-tor, entre a cidade e o campo.

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    ARTIGO

    A importncia das AgroflorestasAgroecologia e conservao dos recursos naturais com os Sistemas Agroflorestais

    E m uma perspectiva agroecolgica, os Sistemas Agroflorestais (SAFs) ou Agroflorestas so uma tentativa de harmonizar as atividades da agricultura com os processos naturais de vida existen-tes em cada lugar em que atuamos. Eles representam grande potencial s regies tropicais ricas em biodiversidade por pro-teger os solos das intensas chuvas e da insolao direta e por garantir outros ser-vios ecossistmicos importantes. A diver-sidade de produtos, segurana alimentar, incremento da fertilidade do solo e reduo gradativa nos custos de produo fazem da agrofloresta uma excelente opo como prtica produtiva insero na agricultura familiar do Brasil.

    Do ponto de vista tcnico, os SAFs so formas de uso da terra combinando a produo de culturas agrcolas e a criao de animais com espcies florestais simul-taneamente ou em sequncia na mesma rea. Consideramos os SAFs no somen-te uma tcnica silvicultural, mas tambm

    POR FERNANDO SILVEIRA FRANCO Engenheiro florestal, professor adjunto da Universidade Federal de So Carlos e coordenador do Ncleo Apet-Caapu de Agroecologia (UFSCar, Campus Sorocaba).

    uma prtica agroecolgica de conservao da biodiversidade, solos e guas, porque combinam objetivos de desenvolvimento agrcola sustentvel aos agricultores com recursos escassos como os agricultores familiares, possibilitando mais benefcios ambientais e econmicos do que os obtidos com monoculturas.

    Um exemplo de insero dessa abor-dagem agroecolgica em termos de polti-ca pblica foi feito em So Paulo, por meio de uma resoluo da Secretaria de Meio Ambiente. No caso de pequena proprieda-de ou posse rural familiar, as Agroflores-tas foram reconhecidas como tcnica de restaurao florestal e manejo de Reserva Legal e reas de Preservao Permanente (APPs). No novo Cdigo Florestal, apesar de muito de seus artigos constiturem re-trocesso em termos de conservao, um ponto positivo foi a ampliao dessa per-misso que j vigorava em So Paulo e o estabelecimento de critrios mais simples para o agricultor usar essa possibilidade.

    O desenvolvimento do tema da conser-vao por meio dos SAFs deve ser visto em contexto integrado com o ordenamento ter-ritorial, considerando que a paisagem rural tende a ser uma matriz de retalhos de dife-rentes usos florestais e no florestais. Este mosaico de paisagem agroflorestal deve ser visto como reserva potencial de biodi-versidade em si, alm de serem considera-das a conservao da capacidade produtiva do solo e a produo de gua em quantida-de e qualidade de forma sustentvel, tendo como objetivo final a qualidade de vida das pessoas do campo e das cidades.

    Ela representa

    grande potencial

    s regies tropicais

    naturalmente ricas

    em biodiversidade

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    Dessa gua bebereiSob o calor terroso do interior do estado de So Paulo, tcnicos iniciam as atividades no campo durante o primeiro semestre do projeto Plantando guas

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    rvores nativas so plantadas na margem do Ribeiro Feijo,

    responsvel por parte da gua que abastece a cidade de So Carlos

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  • 16 Revista Iniciativa Verde

    Agricultor faz os beros, onde as mudas sero inseridas, no Stio So Nicolau (So Carlos); as novas rvores nativas ajudaro na recuperao da qualidade da gua do manancial, em So Carlos

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    Moradores do quilombo Cafun-d, alguns ainda usam palavras do dialeto africano cuppia ou falange, tiram dvidas sobre a implantao do projeto; assen-tamento rural Nova So Carlos receber Sistemas Agroflores-tais, que devem gerar alimento e renda aos moradores

  • 18 Revista Iniciativa Verde

    MATRIA DE CAPA

    Mata ciliar recomposta no Stio So Joo,

    em So Carlos (SP) FOTO

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    s sete horas da manh de ja-neiro, partimos de So Paulo em direo, primeiramente, ao assentamento rural Santa Helena, So Carlos, mais de 250 quilmetros distante da capital. Roberto Resende, presidente da Iniciativa Verde, dirigia pela rodovia dos Bandeirantes at en-contrarmos o bilogo Pedro Kawamu-ra, coordenador do projeto Plantando guas na regio de Iper (SP), e se-guirmos juntos no mesmo carro. Che-gando ao nosso destino, 25 produtores rurais nos esperavam no barraco do local para uma reunio. Discutiramos em quais propriedades seriam esta-belecidos os tratamentos de esgoto e plantadas as agroflorestas. Tambm tiraramos dvidas sobre o projeto, pa-trocinado pela Petrobras, responsvel pelas novas instalaes.

    Essa uma das rotinas do proje-to Plantando guas. A outra atividade diria, realizada dentro do escritrio e coordenada pela gestora ambiental Margareth Nascimento, receber as informaes coletadas em campo pelos tcnicos da Iniciativa Verde e das insti-tuies parceiras para criar mapas das reas do projeto. Mais de 200 famlias de seis municpios se beneficiaro di-retamente: Iper, Itapetininga, Pieda-

    de, Porto Feliz, So Carlos e Salto de Pirapora. Sem contar as rendas e os empregos indiretos gerados. A mo de obra a dos prprios interessados que, assim, se capacitam. O trabalho deve ser completado at a metade de 2015.

    A gua d, a gua levaA ideia do projeto, elaborado pela Inicia-tiva Verde, cuidar dos nossos recursos de gua. Alm da questo da recupe-rao das florestas, o objetivo traba-lhar a adequao ambiental no sentido mais amplo possvel abrangendo sane-amento e educao ambiental, ressal-ta Resende. Pode parecer que as metas so independentes, mas elas atuam na conservao ou na recuperao da gua se complementando.

    As rvores nativas, por exemplo, conseguem armazenar no solo at 80% da gua da chuva deixando os rios, indiretamente, mais caudalosos. Alm disso, elas evitam a eroso e, assim, que a terra e materiais corram para os rios. Sem contar, claro, que as rvores geram alimento, comida e abrigo aos animais. Esses so os cha-mados servios ambientais presta-dos pela floresta.

    O saneamento rural evita que os dejetos humanos sejam despejados di-

    Como assim Plantando guas?Conhea o projeto que investe em saneamento, plantio de mudas e monitoramento para preservar mananciais de So Paulo

    POR ISIS NBILE DINIZ

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  • 20 Revista Iniciativa Verde

    MATRIA DE CAPA

    retamente no rio. Vale ressaltar que a gua de esgoto que escorre em reas abertas pode transmitir doenas e que a fossa comum pode contaminar o solo e o lenol fretico. Um complemento ao saneamento o monitoramento da gua feito com o auxlio dos tcnicos an-tes e aps o saneamento ser instalado. Ele mostra se a gua est prpria para uso. A ideia que os moradores sejam capazes de avaliar a qualidade das suas guas, diz Resende.

    Por sua vez, os Sistemas Agroflo-restais (SAFs), que combinam rvores nativas com cultivos, tm o potencial de recuperar o solo, diversificar os tipos de produtos e as fontes de ren-da, melhorar o equilbrio ecolgico e conservar a biodiversidade. Como os SAFs podem gerar renda e alimento, esse um dos itens do projeto mais procurados. Pedro Kawamura preten-de consolidar as propostas neste pro-jeto para que as tcnicas tenham um carter demonstrativo e, assim, facili-tar a disseminao do SAF.

    O plano de manejo ajuda a ver

    qual a vocao da propriedade rural e, ao mesmo tempo, como poupar o meio ambiente. Alm disso, como o Cadastro Rural Ambiental (CAR) ser obrigatrio por lei, essa a chance de os proprietrios comearem a se en-quadrar e a se cadastrar nele. Ele a porta de entrada para o agricultor cumprir a nova lei e poder acessar seus benefcios, explica Resende.

    Construo sustentvelO projeto precisa ser propagado para que atinja mais pessoas. Para isso, est em implantao o Centro de Edu-cao Ambiental (CEA) com cerca de 100 m (uma sala para mltiplos usos) no Stio So Joo, em So Carlos. Ele construdo visando o menor impacto ambiental. As paredes sero feitas de taipa de mo (terra umedecida e com-pactada no local) e de adobe (uma es-pcie de tijolo que no cozido). As te-lhas de amianto sero substitudas por outras livres desse material que pode causar doenas. No teto, sero coloca-dos exaustores, manta trmica e forro

    VEJA AS PRINCIPAIS METAS:

    20 HECTARESde reas de Preservao

    Permanente (APPs) de Mata Atlntica

    RECUPERAR MAIS DE

    de sistemas agroflorestais para fins produtivos

    IMPLANTAR

    24 HECTARES

    ELABORAR

    de manejo de propriedades da rea rural

    110 PLANOS

    85 IMVEISno Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro

    obrigatrio para todas as propriedades rurais

    INSCREVER AO MENOS

    Estudantes aprendem como feita a recomposi-o florestal no Stio So Joo, em So Carlos

    INSERIR MAIS DE

    de saneamento rural140 MDULOS

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    de madeira para melhorar o conforto trmico. Haver a captao e o reu-so de guas das chuvas e da gua uti-lizada e o emprego de energia solar, conta Fernando Machado, engenheiro responsvel pela obra.

    Ao longo dos dois anos, o projeto prev atender 2.500 estudantes de en-sino fundamental e mdio. S no ano passado, mais de 700 jovens com ida-de mdia entre 15 e 16 anos passaram pelo local, mesmo antes das instala-es estarem concludas. A maioria das crianas nunca colocou a mo em um rio, no sabe o que mata ciliar e nunca viu um rio com tanta rvore em volta, diz a biloga Aline Gomes Zaf-fani, coordenadora de saneamento e monitoramento ambiental no projeto. Elas adoram. Se ao menos dois ou trs sarem realmente motivados pelo tema, eles j transmitiro para outros essas informaes importantes, diz.

    Compromisso socialOs assentados, quilombolas ou produ-tores rurais sero beneficiados com um

    ou mais itens de acordo com as neces-sidades. Os tcnicos da Iniciativa Verde e dos parceiros avaliam cada situao, lembrando que todas as propriedades favorecidas devem estar adequadas s leis. Todos os participantes recebem orientao para instalar o que com-binado e, alm disso, tm o dever de cuidar dos investimentos feitos.

    Por exemplo, no Assentamento Rural Santa Helena, em So Carlos, participante do projeto, moram 14 famlias reunindo aproximadamente 60 pessoas que j usam o Clorador Embrapa, um equipamento que clora a gua e evita doenas comuns como diarreia e hepatite. Portanto, l se-ro colocados complementos como os mdulos de saneamento Jardim Filtrante, que trata as guas das pias dos chuveiros, e a Fossa Sptica, que transforma os dejetos do esgoto em adubo. Segundo Lindamira Aparecida Teodoro Ribeiro, de 53 anos, presiden-te da Associao dos Trabalhadores Rurais dos Assentados (que preparou suco de maracuj orgnico, caf e

    bolo para a reunio), a ideia instalar os primeiros mdulos na rea coletiva para que todos aprendam e beneficiem e tambm para evitar discusses. No lote da Lindamira, ela quer implantar SAF com frutas para vend-las.

    No mesmo dia, passamos pelo Assentamento Nova So Carlos, no municpio de mesmo nome. Fomos at a casa de Wilson Jellmayer, 43 anos, que est articulando a instalao de mdulos de saneamento rural e do SAF. Isso porque parte da produo lo-cal vendida para a merenda escolar. Tento trabalhar sempre pelo coletivo, conta Jellmayer em p na entrada dos cmodos da casa com vasos de plantas cuidadosamente dispostos na sala de cho de terra batida. Aps tomarmos um caf com Jellmayer, voltamos So Paulo antes de escurecer. Ao che-gar em casa, abri a torneira para beber um copo de gua que refletiu os resul-tados do projeto. Graas ao Plantando guas e s outras aes socioambien-tais, ainda podemos contar com gua de qualidade para viver.

    No sentido horrio: os agricultores Jellmayer

    e Lindamira; e trator descompactando a terra

    para plantar rvores

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    SANEAMENTO

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    )F elizmente, saneamento bsico em nosso pas passou, ao me-nos nos ltimos anos, a ser visto como prioridade. O que no significa que a questo j esteja bem encami-nhada. Segundo dados do Ministrio das Cidades (Sistema Nacional de In-formaes sobre Saneamento, SNIS), mais da metade dos brasileiros ainda no possui acesso coleta de esgo-tos e de todo o esgoto gerado apenas 38% recebe algum tipo de tratamen-to antes de ser despejado em rios, crregos, represas, mar e lugares ainda menos recomendados. O que compromete a sade das pessoas,

    Pobre pas ricoSaneamento rural no Brasil: questo de sade pblica e de verdadeiro desenvolvimento

    POR REINALDO CANTO

    de nossas crianas expostas a con-trair verminoses, diarreias, hepatite e outras enfermidades diretamente ligadas a doenas de origem hdrica e colocam o Brasil no rol dos pases mais subdesenvolvidos. Enquanto na economia somos a stima do mundo, no ndice de Desenvolvimento Hu-mano (IDH, que mede itens ligados qualidade de vida), ocupamos vergo-nhosamente, a 85 posio.

    A esse estado de coisas temos nos acostumado nas grandes cidades ao vermos quase sem reao nossos rios poludos, o mau cheiro constante e esgotos cu aberto nas periferias.

    A Represa do Jaguari, em Joanpolis, abastece parte da

    cidade de So Paulo

    Mais desafios no campoSe nas cidades o desafio de univer-salizar a coleta e tratamento de es-goto difcil, pelo menos est bem contemplada no Plano Nacional de Saneamento Bsico (Plansab), a questo ganha contornos mais dra-mticos quando nos referimos s reas rurais do pas. Hoje, cerca de 23 milhes de pessoas no tem aces-so coleta e tratamento de esgoto nas reas rurais no Brasil (dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria, Embrapa). O Plansab, de maneira bastante otimista, prev a universalizao da coleta e trata-mento de esgotos nas reas urbanas para 2030. Mas mesmo essas metas so consideradas inviveis por espe-cialistas, como afirma Dante Raga-zzi Pauli, presidente da Associao Brasileira de Engenharia Sanitria e Ambiental (ABES): No ritmo atu-al, atingiremos a universalizao do saneamento bsico em no menos que 40 ou 50 anos. Na zona rural, caso todo o plano fosse executado perfeio, chegaramos a 77% da populao que mora no campo com coleta de esgotos. Portanto, at nas previses mais fantasiosas, o meio rural no teria a coleta de esgotos universalizada.

    Obviamente, o setor rural possui uma logstica muito mais complexa do que nas cidades. Comunidades isola-das e distantes umas das outras no poderiam mesmo receber as mes-mas solues utilizadas, por exemplo,

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    em reas metropolitanas. Conforme aponta o estudo Saneamento Rural no Brasil Impacto da fossa sptica biodigestora, realizado pela agrno-ma Cinthia Cabral da Costa, o mais comum no pas ainda a adoo de fossas spticas e rudimentares. Para a pesquisadora, o custo baixo deter-minante para a proliferao desses mtodos, mesmo levando em conta os grandes riscos ambientais e para a sade das pessoas.

    A chamada fossa rudimentar (aquela mais simples onde cavada a terra e jogados os dejetos) repre-senta a pior soluo, pois na maio-ria das vezes apenas buracos nos quais os dejetos humanos so depo-sitados e que no evita a contamina-o do solo, do lenol fretico e no impede que cheguem a rios, crre-gos e fontes de gua.

    J a fossa sptica acaba por de-sempenhar um papel um pouco me-lhor, pois capaz de realizar um tra-tamento bsico do esgoto evitando, em parte, a contaminao do solo e da gua. Ao mesmo tempo, ela no reci-

    cla os excrementos humanos, apenas contribui para a reduo deles, via decomposio dos dejetos, tornando o esgoto residual e em menor quan-tidade. Mesmo assim, a fossa sptica exige uma limpeza permanente, pois a existncia de organismos patognicos (vrus e bactrias) precisa ser elimi-nada, em virtude de seu potencial de causar doenas. Portanto, esse ma-terial slido depositado na fossa deve ser encaminhado por meio de um ca-minho especial para limpar fossas e descartado em um aterro sanitrio.

    Fossa sptica biodigestoraEntre as vrias tecnologias mais efi-cientes de tratamento de esgoto em zonas rurais que tm alcanado me-lhores resultados, podemos destacar a fossa sptica biodigestora colocada em prtica pela Embrapa Instrumentao. Alm de realizar a coleta, sistema trata os dejetos humanos utilizando o pro-cesso de biodigesto anaerbico, ou seja, decomposio da matria org-nica feita por bactrias, em caixas de gua enterradas e vedadas.

    A vedao impede a proliferao de insetos e animais peonhentos, diferente do que ocorre em outros processos de fossas convencionais. A decomposio transforma os de-jetos humanos em biogs e em um material que pode ser usado como adubo orgnico. Uma maneira bara-ta de transformar um problema em soluo. Isso demonstra que, apesar da dificuldade, a universalizao do atendimento ao tratamento e coleta de esgotos nas zonas rurais poss-vel. Com tanto que seja visto por to-dos como prioridade.

    Fossa sptica biodigestora em funcionamento no Stio So Joo, em So Carlos (SP)

    PLANTANDO GUASSolues para o saneamento rural

    O projeto Plantando guas, realizado pela Iniciativa Verde em parceria com cerca de 20 institui-es e com patrocnio da Petrobras, tem como uma de suas principais atribuies a implantao de fossas spticas biodigestoras com apoio tcnico da Embrapa de So Carlos (SP). A Iniciativa Verde entende que nosso campo, nossas reas rurais, prestam um servio essencial para a vida de todos os brasileiros. Os cuidados com a sade e preservao das fontes de gua, dos mananciais, da biodiversidade, das florestas e de recuperao de reas degradadas so fundamentais para garantir nosso futuro, nossos alimentos e mitigar os nefastos efeitos das mudanas climticas.

    85POSIO MUNDIAL NO

    NDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (IDH)

    OCUPAMOS A

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    MATA ATLNTICA

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    O usado e bastante ambicioso. Assim pode ser definido o Pac-to pela Restaurao da Mata Atlntica que tem como principal ob-jetivo a recomposio, at o ano de 2050, de 15 milhes de hectares ou o tamanho equivalente a cerca de 100 cidades de So Paulo. Tal meta, caso seja alcanada, ir recuperar 30% da cobertura original do bioma de-gradado sem trguas desde que por aqui chegaram os colonizadores por-

    tugueses h mais de 500 anos. Pode-mos mesmo cham-lo de um plano bastante ousado, pois restam apenas 8,5%, segundo a Fundao SOS Mata Atlntica, da exuberante e riqussima mata atlntica dos tempos da des-coberta do Brasil. Desde aquela poca, o bioma passou por uma ver-tiginosa ocupao praticamente sem um planejamento que buscasse a in-tegrao com o meio ambiente.

    O Pacto pela Restaurao da

    Um pacto pela vidaCentenas de iniciativas se unem pela sobrevivncia do bioma mais degradado do Brasil

    POR REINALDO CANTO

    Iniciativa Verde plantou, em 2009, 6.668 rvores nativas em assentamento rural, no

    municpio de Porto Feliz (SP)

    Mata Atlntica (www.pactomataatlan-tica.org.br) surgiu nesse cenrio com o objetivo de reunir e mapear as di-versas e diferentes iniciativas para estruturar um cadastro nacional de projetos de recomposio do bioma. Tambm com o intuito de contribuir para que seja possvel uma troca de informaes e experincias entre os diversos atores. Lanado em 2009, o Pacto vem contabilizando uma srie de conquistas importantes atingindo

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    a expressiva marca de 103 projetos e iniciativas cadastradas no site. So mais de 50 mil hectares em processo de recomposio provenientes do tra-balho de mais de 170 organizaes.

    O projeto tem se consolidado como um importante espao de con-sulta para pesquisadores, potenciais investidores e demais interessados em conhecer a realidade sobre as enormes oportunidades representa-das pelo bioma. Uma srie de docu-mentos, presentes no site, est dis ponvel para consulta como os Ma-peamentos de reas Potenciais para Restaurao na Mata Atlntica e de reas Elegveis para Restaurao em Mercados de Carbono.

    Um dos mais importantes desa-fios do portal o de conseguir investi-mentos que contribuam para ampliar os efeitos positivos dos projetos, ou seja, potencializando o alcance am-biental, social e econmico. Alm disso, a iniciativa busca contribuir para a implantao de polticas p-blicas em benefcio da recomposio da mata atlntica.

    SOBRE A FLORESTAMetrpoles do Brasil esto em suas terras

    Vale recordar que a mata atlntica original possua mais de um milho de quilmetros quadrados, ocupando uma rea em que hoje esto 17 dos mais populosos estados brasileiros. De acordo com a Fundao SOS Mata Atlntica, 62% da populao brasilei-ra ou mais de 118 milhes de pesso-as vivem na regio onde antes existia a floresta, uma densa cobertura de vegetao. Hoje, nela esto abrigadas muitas das nossas mais importantes cidades e capitais do pas.

    Se para alcanar o tal pro-gresso e desenvolvimento de-sordenado as agresses colocaram o bioma mata atlntica, segundo a Organizao das Naes Unidas (ONU), como um dos mais amea-ados do planeta, tal situao deu origem a inmeras organizaes e cidados conscientes dessa triste realidade e que passaram a atuar com objetivo de frear a destruio e, at mesmo, recompor parte do que foi perdido ao longo da histria.

    Uma das principais aes do Pacto refere-se ao aprofundamento dos mapeamentos das reas poten-ciais de restauro florestal e que hoje j representam cerca de 18 milhes de hectares, presentes em 14 dos 17 estados do bioma Mata Atlntica. A partir da identificao dessas reas possvel apontar seus benefcios como os servios ambientais pres-tados pela localidade, a conservao das fontes de gua, a biodiversidade florestal e as oportunidades de in-vestimento no mercado de carbono.

    A Iniciativa Verde uma das or-ganizaes participantes do Pacto. O presidente da organizao, Roberto Resende, considera esse trabalho es-sencial: Acreditamos ser muito im-portante a atuao conjunta dos diver-sos atores interessados no Pacto para, alm do intercmbio de informaes e aes conjuntas, a possibilidade de articular esforos ao aprimoramen-to de polticas pblicas relacionadas como aspectos normativos, tributrios e outros que facilitem essa importante e desafiadora misso.

    O Pacto pela Restaurao da Ma ta Atlntica tem, sem dvida, grandes ambies, entre elas, algo que deve interessar a todos os bra-sileiros: o principal objetivo, como divulgado no prprio portal, garan-tir s pessoas um ar limpo, gua boa para consumir, regular as condies climticas e com tudo isso ainda pro-piciar que essas aes de recupera-o florestal gerem empregos, renda e negcios sustentveis.

    Talvez seja pretensioso, mas com tantos ganhos e benefcios no hori-zonte, possvel sonhar com mais adeses, novas conquistas e bons re-sultados. No mesmo?

    Compromisso

    pretende recompor

    rea de floresta

    equivalente a cerca

    de 100 cidades de

    So Paulo at 2050

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    HISTRIA

    Flvio Marchesin:

    Eu vivo de plantar rvoresEx-agricultor comeou a recompor terra desmatada pela famlia. At que, vendendo etiquetas, descobriu que a Iniciativa Verde procurava rea para reflorestar. Florescia, assim, o agente ambiental

    DEPOIMENTO A ISIS NBILE DINIZ

    S eu sei a dificuldade que passei para conseguir chegar at aqui. Sustentava a famlia e o que so-brava investia no Stio So Joo, em So Carlos (SP), que meu pai deixou para meus dois irmos e para mim (tenho 48 anos) as trs irms pre-feriram ficar com a casa da cidade. Plantando rvores de mata atlntica para a Iniciativa Verde tirei o p da lama: 40 mil mudas at 2012. Ha-via alguma coisa dentro de mim que mostrava o caminho. No stio, con-segui fazer a biblioteca ambiental e o quiosque para receber estudantes;

    reformei uma casa para anteder at 50 pessoas almoando; e, agora, esta-mos construindo a sala do Centro de Educao Ambiental (CEA) por meio do projeto Plantando guas. Tambm produzo cerca de 20 mil mudas nati-vas por ano. Meu trabalho de plantar rvores comeou na terra onde So Carlos nasceu, no stio que j perten-ceu histrica Fazenda Pinhal.

    AgriculturaMeu pai, Vitrio Marchesin, comprou o stio em 1972. Antes disso, ele era meeiro: o fazendeiro tinha terra, meu pai plantava e dividia a produo com o dono. O sonho dele era um peda-o de terra para produzir, construir e deixar aos filhos. Em 1977, aos 57 anos, faleceu com o desejo realizado. Eu tinha sete anos. O stio hoje com 14 hectares no tinha nem energia. Meu pai precisou desmatar perto do rio para plantar arroz, milho e feijo. Na rea mais plana cultivava toma-te. Tinha criao de galinha e porco. O excedente trocava por leo, acar, sal. Depois da escola, ia ao stio aju-dar no trabalho. As rvores no ti-nham o valor de hoje. Quando meu pai desmatou, nunca achou que a gua ia acabar. Alm disso, todos os vizinhos estavam desmatando tambm.

    EmpenhoAos 14 anos, trabalhei na produo de fbrica. Minha famlia passou a inves-tir em horticultura diversificada. Em

    Flvio Marchesin ao lado das mudas de rvores de mata atlntica que ele plantou na rea ciliar do seu

    Stio So Joo, em 2006

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    1998, comearam as obras do Gaso-duto Bolvia-Brasil cortando o stio. Fiz um acordo com os engenheiros: se cavassem um tanque para criar peixe, poderiam guardar as mquinas no s-tio. Ao mesmo tempo, fiz graduao de administrao de empresas para me manter no cargo de Planejamen-to e Controle de Produo. Depois, troquei de emprego: vendia produtos agropecurios para ter mais tempo para estudar. Coloquei no tanque mil tilpias-vermelhas. Mas as aves co-meram metade, s sobraram 500! O jeito foi criar tilpia-do-Nilo, menos visvel. Reinvestindo, tenho quatro tanques. Constru dois quartos para passar o fim de semana com minha esposa e meu primeiro filho (tambm para alugar) me casei em 2000 e te-nho trs filhos. Vi que tinha chance de sobreviver do stio.

    Meio ambienteOuvi na rdio o Antonio Pereira de No-vaes, da Embrapa, falando da fossa que tratava o esgoto gerando adubo. Procurei Wilson Tadeu Lopes da Sil-va, que o representava, para aprender. No queria meus filhos nadando no rio com esgoto. Algo em mim desper-tava, queria ver o rio bonito. No Dia do Meio Ambiente, pegava cinco mudas doadas de ip, peroba, jequitib para plantar na mata ciliar erodida. No co-nhecia rvore pioneira, no pioneira... No sabia que tinha todo esse uni-verso de plantas. Estava trabalhando em um emprego como vendedor au-tnomo de etiquetas quando um so-brinho apareceu: Tio, est plantando muita rvore? O Ivo, que me atendia na empresa cliente, era amigo do Os-valdo Stella, um dos fundadores da Iniciativa Verde. Ele falou que em So Paulo plantavam rvores para seques-trar carbono. Nunca tinha ouvido so-bre esse sequestro! Liguei para ela. O bilogo Roberto Strumpf, na poca funcionrio, visitou o stio e disse que

    daria muda de rvore, adubo, calcrio e roadeira. De graa! Bastava entrar com a mo de obra e cuidar ele en-sinou como das 3.600 mudas, em 2006. Comecei a aprender sobre meio ambiente, mas ficava de lado nas ro-dinhas de conversa dos tcnicos. No entendia o que falavam.

    Educao ambientalFui Universidade Federal de So Car-los procurar algum para me ajudar a fazer projetos de educao ambiental. Cheguei at Odete Rocha, orientadora de doutorado do Magno Castelo Bran-co (hoje, coordenador do projeto Plan-tando guas em So Carlos). L, des-cobri que o rio que passa pelo stio, o Ribeiro Feijo, abastece a maior parte da cidade! Recebi a primeira turma de estudantes para aprender sobre meio ambiente no stio. Fiquei apaixonado. um prazer conhecerem seu trabalho e mostrar a importncia dele! Levei professora minha entrevista sobre stio ao EPTV, da Rede Globo. Se todos fi-zessem isso, o mundo seria diferente, ela disse. Depois, ouvi a frase milhares de vezes, mas a primeira vez a gente no esquece. Fiz o curso de extenso de educao ambiental. S tinha en-genheiro disso e daquilo na classe. No primeiro dia, todos se apresentaram. Eu fiquei sem graa, quieto. Quando chegou a minha vez, contei a minha histria. No intervalo, todos vieram conversar para saber mais. A, percebi que estava no meio do negcio, e no de fora. Ali, aprendi que o falado nas conversas de rodinha era mais fcil do que imaginava. Cursei ps-graduao em gerenciamento ambiental. Procu-rei parceria no Centro de Divulgao Cientfica e Cultural da Universidade de So Paulo. A Andreia Nasser Fi-gueiredo e a Aline Zaffani comearam a monitoria no stio. Reduzimos as quatro mil visitas de estudantes por ano para menos de trs mil para evitar degradar o local.

    FlorestaPor volta de 2010, a Iniciativa Verde pediu que conquistasse produtores para plantar rvores. Comecei pelos vizinhos que diziam: Dava uma in-veja boa ver as rvores em volta do rio. Nunca forcei nada, eles perce-biam que faziam algo bom. Sozinho, plantei 12 mil rvores nas vizinhas Fazenda Pinhal e Yolanda! Com mais de oito mil rvores por ano, ficou bom o retorno financeiro. Hoje, seu Valen-tim, de 67 anos, me ajuda. No tenho mais medo de falar, de expor quem sou. Hoje estou com a roupa limpa, tem dia, com ela suja. No tenho ver-gonha. Na minha agenda de 2010, eu tinha escrito: insistir, persistir e nunca desistir. A Andreia ajudou na correo do trabalho de concluso da ps, eu tinha dificuldade com referncias, e escreveu a frase do Guimares Rosa: A vida assim: es-quenta e esfria, aperta e da afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente coragem.

    Quando meu pai

    desmatou, nunca

    achou que a gua

    ia acabar.

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    COMO FAZER

    O s materiais orgnicos como esterco, palha (vegetais se-cos) e resduos de comida que vo para o lixo ou, simplesmente, so descartados de qualquer maneira sobre a terra podem ter um destino mais interessante: a compostagem. Ela um processo biolgico no qual os micro-organismos transformam esses resduos em um composto de alto valor nutritivo. O composto oti-miza o efeito benfico que os mate-riais orgnicos fornecem ao solo e s plantas e, o melhor, pode ser fabri-cado sem custo.

    O composto uma matria or-gnica em um estgio de decomposi-o avanado que j se transformou em hmus, explica o bilogo Pedro Kawamura, presidente do Instituto Terra Viva Brasil. O hmus aumenta a reteno de gua no solo, ajuda a recuper-lo, estabiliza a sua acidez e fornece nutrientes s plantas. melhor usar o hmus do que jogar o resduo na terra, pois ele ajuda a reter os nutrientes da matria org-nica decomposta, alerta o agrno-mo Roberto Resende, presidente da Iniciativa Verde.

    Os nutrientes dos resduos org-nicos, por exemplo, como a casca de laranja, deixados diretamente sobre o solo podem ser levados pela gua da chuva ou volatilizarem (irem para a atmosfera). Alm disso, os restos orgnicos podem queimar as plan-tas quando eliminados de qualquer

    CompostagemMaterial mais que um simples adubo: fornece nutrientes e melhora a caracterstica do solo

    POR ISIS NBILE DINIZ

    jeito perto delas, pois eles fermen-tam, gerando calor.

    Com o passar do tempo, a com-postagem gera um benefcio cada vez maior ao solo sem que haja gasto fi-nanceiro. Alis, possvel at ter uma fonte de renda com o material de alto valor, j que ele pode ser comerciali-zado. Fazer a compostagem s exige um esforo: tempo disponvel para mexer na pilha. Afinal, deve-se sem-pre cuidar dela para que o processo funcione corretamente.

    60%DO LIXO DOMSTICO RESDUO

    ORGNICO QUE PODE VIRAR COMPOSTO

    CERCA DE

    A composteira, como a do Stio So Joo em So Carlos (SP), pode ter alguma proteo para ser facilmente visualizada

  • 29

    Dicas teis Entre as camadas, pode-se colocar p de rocha. O processo biolgico ajuda a deixar os nutrientes minerais da rocha presos no hmus, aumentando o valor nutricional dele.

    Uma maneira de acompanhar como est a compostagem verificar a sua tempe-ratura. Para isso, coloque uma barra de ferro dentro da compostagem por cerca de um minuto. Os micro-organismos geram calor. Quando tirar a barra de ferro, colo-que a mo na parte que ficou dentro da compostagem. Se estiver muito quente, a ponto de no conseguir pegar a barra, re-volva o material e jogue gua para deix-lo

    mais mido. Se estiver fria, coloque mais esterco e gua no meio da composteira.

    No jogue produtos qumicos na compostagem.

    Triture o resto da poda, at que cada pedao fique pequeno, menor que a palma da mo, antes de coloc-la na composteira. Pedaos de galhos demo-ram mais para decompor.

    Faa pilhas de composteiras diferentes ao longo do tempo. Isso ajuda a terminar o processo de transformar todo o material de cada pilha em hmus para ele ser usado.

    As minhocas ajudam a acelerar o pro-cesso de compostagem (elas podem at aparecer na composteira). Porm, uma composteira base de minhocas requer mais trabalho, pois elas no gostam de alguns materiais como frutas ctricas e podem virar alimento de passarinhos e de galinhas. Na chamada vermicompos-tagem, a composteira deve ser fechada para evitar o problema.

    O volume da pilha reduz entre 50% e 60% quando o hmus est pronto.

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    Escolha um espao adequado: evite locais com

    gua corrente, enxurrada ou goteira. Se for uma

    composteira domstica, ela pode ficar perto da cozinha pela praticidade. Se estiver funcionando corretamente,

    a composteira no emite cheiro e nem atrai animais.

    Pode ser ao ar livre.

    Jogue palha em cima da composteira toda vez que descartar restos de comida. Ateno: cuidado ao colocar alimentos cozidos e tempe-rados. As comidas com leo devem ser evitadas, pois podem prejudicar a composta-gem. Espalhe bem e pique os restos de carne. No os deixe concentrados. O mais indicado fazer a compostagem com restos de alimentos crus.

    Teste o material esfregan-do-o na mo. Se ele pintar a palma de preto, o hmus est estabilizado. Ou seja,

    pronto para ser usado.

    A cada dois dias deve-se re-mexer o composto. Em cerca

    de dois meses, dependendo da regio e da poca do ano

    (o processo mais rpido em clima quente e mido), o

    material se estabiliza. Ele fica com cheiro adocicado.

    Se tiver disposio, coloque esterco de gado porque ele j tem micro-organismos do est-mago do gado bons para decompor a celulose.

    Passo-a-passoAprenda a fazer uma composteira

    23

    Em uma pilha de um metro de largura, faa uma camada de uma ou duas partes de material mais rico em

    carbono (como palha, serragem, folha seca, casca) para uma parte de ma-terial rico em nitrognio (esterco ou

    restos de comida) e siga intercalando.

    5 Adicione gua, mas no muita. Para medir o nvel de umidade adequado, aperte o composto com a mo. Se escorrer, h mais gua do que o necessrio.

  • 30 Revista Iniciativa Verde

    BIBLIOTECA

    Uma direo aos agricultoresConhea algumas obras que so orientao de base para quem j trabalha em propriedades rurais

    POR ISIS NBILE DINIZ

    Livro tcnico sobre solo oferece solues para o cotidiano

    O Manejo ecolgico do solo, da engenheira agrnoma e pioneira em agroecologia Ana Primavesi, uma publicao clssica para quem quer desenvolver uma prtica mais sustentvel de trabalho do solo. Apesar de ser um livro tcnico, a autora buscou usar uma linguagem descomplicada para ajudar a lidar com diversas questes fundamen-tais do manejo do solo como o preparo adequado, o cuidado com a compactao, o uso de adubos e as tcnicas ecolgicas de manejo e de restaurao da fertilidade. Interes-sante: ao final de cada captulo h um resumo do que foi abordado.

    Manual agroflorestal baseado em experincias

    O Instituto Rede Brasileira Agroflorestal (Rebraf), em parceria com a Rede de ONGs da Mata Atlntica (RMA), reuniu trabalhos acadmicos, experincias de agricultores e troca de informaes entre tcnicos e colaboradores para criar o Manual Agro-florestal para a Mata Atlntica, do Minis-trio do Desenvolvimento Agrrio (MDA). A publicao relata prticas de sucesso e tambm erros, para serem evitados. Ela aborda a implantao de agroflorestas para consumo prprio e para comrcio.

    Guia avalia melhores rvores para pastagens

    A arborizao de pastagens uma alter-nativa para diversificar a renda do produtor rural, oferecer mais conforto ao animal, melhorar a fertilidade do solo e aumentar a produtividade do rebanho. Para ajudar na escolha das espcies, a Embrapa lanou o Guia Arbopasto: manual de identificao e seleo de espcies arbreas para siste-mas silvipastoris. A publicao descreve 51 espcies que ocorrem naturalmente em pastagens. Elas foram divididas em dois grupos: para o fornecimento de servios (como a qualidade da sombra e dos frutos) e para a produo de madeira.

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