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Plantando novos sonhos, renovando a cultura Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 7 • nº1056 Julho/2013 Monteirópolis Cada lugar é marcado por uma tradição, uma cultura, uma característica. Uma coisa que faz de cada lugar único e especial. Pode ser sua gente. Pode ser a natureza. Pode ser as relações que se criam entre os dois. E, apesar das mudanças, que são tão naturais, certas coisas podem até se transformar, mas jamais se perdem totalmente. É o que tem acontecido no Sítio Bola, comunidade rural de Monteirópolis. Uma região marcada pela presença de fruteiras, principalmente do cajueiro. Essa fruta sempre esteve presente na história da comunidade. Antes como uma relação natural. O cajueiro nativo, aproveitado apenas para o consumo no período da safra. A venda da castanha nas feiras da região também sempre foi uma coisa comum. Como não davam conta de consumir toda a produção, vendiam pelo menos a castanha. Mesmo sendo vendida sem nenhum beneficiamento, já representava uma grande ajuda na renda das famílias. Hoje, a comunidade já começa a perceber essa riqueza e suas possibilidades. Eles vêm, aos poucos, mudando essa relação e de uma forma positiva. Plantando ao invés de cortar e mantendo a diversidade na produção. A família de Jaconias dos Anjos, mais conhecido como seu Jacó, foi uma das primeiras a perceber isto. Mas não é mais a única. Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Realização Apoio Como resultado das animadas manhãs de domingo, que sempre se encerram com uma feijoada, mais de 2 mil mudas já brotaram e crescem junto com a resistência desse grupo. Mas eles não vão parar no mutirão para produção de mudas. Quando terminarem essa fase, inicia a produção dos tijolos e depois a construção. Tudo será feito pelo grupo. A primeira meta do grupo é a construção da sede para o beneficiamento das castanhas, mas eles sabem que para isto precisam produzir e vender muitas mudas e muita castanha. Por isso se movem, mas sem perder a esperança, e com a certeza de que há muitas possibilidades além da venda das mudas e das castanhas. Enquanto faziam parte da associação em Olho D'água das Flores, um grupo de associadas, entre elas, a atual presidente da Associação de Cajucultores , participou de cursos e intercâmbios e aprendeu a aproveitar também o fruto. Joseilda conta que conheceu muitas experiências como a elaboração de diversos pratos com o fruto. Além dos doces tradicionais também aprenderam a fazer pratos salgados como coxinhas, tortas. Com os pratos que já conheciam e com os que descobriram a comunidade chegou a realizar festivais de caju na comunidade. Festividade que também pretendem recuperar. “A gente sabe que não é fácil. Vamos precisar trabalhar muito a aos poucos”, conclui Joseilda. Contudo o que une este grupo é mais que a produção de mudas ou o beneficiamento de castanhas de caju. A tradição, a cultura e a vontade de ter uma vida cada vez mais digna é o que move e mantém este grupo. Eles encontraram na tradição e na relação com a natureza uma forma de conquistar seus sonhos e viver em comunidade. Joseilda dos Anjos

Plantando novos sonhos, renovando a cultura

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Plantando novos sonhos, renovandoa cultura

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 7 • nº1056

Julho/2013

Monteirópolis

Cada lugar é marcado por uma tradição, uma cultura, uma característica. Uma coisa que

faz de cada lugar único e especial. Pode ser sua gente. Pode ser a natureza. Pode ser as

relações que se criam entre os dois. E, apesar das mudanças, que são tão naturais,

certas coisas podem até se transformar, mas jamais se perdem totalmente.

É o que tem acontecido no Sítio Bola, comunidade rural de Monteirópolis. Uma região

marcada pela presença de fruteiras, principalmente do cajueiro. Essa fruta sempre

esteve presente na história da comunidade. Antes como uma relação natural. O cajueiro

nativo, aproveitado apenas para o consumo no período da safra.

A venda da castanha nas feiras da região também sempre foi uma coisa comum. Como

não davam conta de consumir toda a produção, vendiam pelo menos a castanha. Mesmo

sendo vendida sem nenhum beneficiamento, já representava uma grande ajuda na

renda das famílias.

Hoje, a comunidade já começa a

perceber essa riqueza e suas

possibilidades. Eles vêm, aos

poucos, mudando essa relação e

de uma forma positiva. Plantando

ao invés de cortar e mantendo a

diversidade na produção. A

família de Jaconias dos Anjos,

mais conhecido como seu Jacó,

foi uma das primeiras a perceber

isto. Mas não é mais a única.

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Realização Apoio

Como resultado das animadas manhãs de domingo, que sempre se encerram com

uma feijoada, mais de 2 mil mudas já brotaram e crescem junto com a resistência

desse grupo. Mas eles não vão parar no mutirão para produção de mudas. Quando

terminarem essa fase, inicia a produção dos tijolos e depois a construção. Tudo será

feito pelo grupo.

A primeira meta do grupo é a construção da sede para o beneficiamento das

castanhas, mas eles sabem que para isto precisam produzir e vender muitas mudas e

muita castanha. Por isso se movem, mas sem perder a esperança, e com a certeza de

que há muitas possibilidades além da venda das mudas e das castanhas.

Enquanto faziam parte da

associação em Olho D'água das

Flores, um grupo de associadas,

entre elas, a atual presidente da

Associação de Cajucultores

, participou de

cursos e intercâmbios e

aprendeu a aproveitar também o

fruto. Joseilda conta que

conheceu muitas experiências

como a elaboração de diversos

pratos com o fruto. Além dos

doces tradicionais também

aprenderam a fazer pratos salgados como coxinhas, tortas.

Com os pratos que já conheciam e com os que descobriram a comunidade chegou a

realizar festivais de caju na comunidade. Festividade que também pretendem

recuperar. “A gente sabe que não é fácil. Vamos precisar trabalhar muito a aos

poucos”, conclui Joseilda.

Contudo o que une este grupo é mais que a produção de mudas ou o beneficiamento

de castanhas de caju. A tradição, a cultura e a vontade de ter uma vida cada vez mais

digna é o que move e mantém este grupo. Eles encontraram na tradição e na relação

com a natureza uma forma de conquistar seus sonhos e viver em comunidade.

Joseilda dos Anjos

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Além de transformar a relação com

a natureza, essas comunidades têm

mudado também a relação entre as

pessoas. A forma de produzir que

antes era solitária e sem articulação

começa a ganhar organização. Uma

organização que não envolve só o

Sítio Bola. A Associação de

Cajucultores de Monteirópolis

agrega hoje, 16 famílias das

comunidades Bola, Paus Pretos,

Ovelhas, Lagoa da Arara e Agreste

Velho.

Quando começaram a se organizar, em 2008, os associados participavam de uma

articulação maior, que entregava castanhas para beneficiamento em uma fábrica no

município vizinho de Olho D'água das Flores. Para isto, entraram com parte dos

recursos para compra de máquinas de beneficiamento e integravam as reuniões do

grupo gestor da indústria.

Ainda em 2008, o grupo conquistou

junto à prefeitura municipal de

Monteirópolis, a doação de 130

mudas de caju para cada um dos 18

associados. As mudas entregues

foram de caju anão precoce. Uma

variedade enxertada, que começou

a produzir 6 meses após o plantio.

Na época, toda a safra de castanhas

foi entregue para a fábrica.

A fábrica fechou, mas o grupo não

desistiu e agora busca nova forma de continuar seu trabalho. E por não terem

parado, outras conquistas vieram. O grupo conseguiu junto a prefeitura de

Monteirópolis as máquinas necessárias para o beneficiamento de castanhas. Agora

estão trabalhando, se organizando para construir o prédio onde irá funcionar sua

própria indústria.

Articulação Semiárido Brasileiro – Alagoas

Além das máquinas conseguiram também o local

para construir o prédio. Um dos sócios, seu

André Alves Feitosa, cedeu o terreno. Seu André

e sócio fundador da Associação de Cajucultores

e um dos mais antigos na tradição do plantio de

caju na comunidade. Ainda para a construção da

sede, o grupo conseguiu, através da mobilização

de autoridades locais, 38 sacos de cimento para

fazer os tijolos.

A esperança do grupo agora está nesta meta.

Conseguir, com seus próprios esforços,

construir na comunidade, um local de referência

para o beneficiamento das castanhas. Valorizar

ainda mais este produto que já trás tantos

benefícios para essas famílias.

E essa esperança tem se concretizado no

trabalho do grupo, que vem se reunindo semana

a semana para a produção de mudas dos

cajueiros. Todas as manhãs de domingo as

famílias já sabem de sua rotina. De forma

voluntária, sem a obrigação ou determinação de

um calendário. Quem se sentir a vontade se

junta para ensacar areia, colocar a castanha ou

aguar as mudas já prontas.

A maioria dos 16 sócios participa todos os

domingos, mas há domingos que o grupo se

divide em menor quantidade. As mudas são

feitas com castanhas de cajueiros nativos, mas

depois de plantadas, quando estiverem como

mais ou menos 70 centímetros, serão

enxertadas com o cajueiro anão precoce. Levam

cerca de 60 dias até ficarem prontas para o

plantio. As mudas já produzidas serão divididas

entre o grupo e vendidas na região.