Plena Atencao

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    Plena Ateno

    Caminho para a imortalidade

    Ensinamentos sobre meditao

    Venervel Ajahn Sumedho

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    Agradecimentos

    Claro que em primeiro lugar tenho de agradecer a Luang Por Sumedho por ter realizadoo caminho sem o qual nada disto seria possvel. Obrigado Luang Por por ser o Graal,portador da verdade, que alberga em si os seres que praticam o desapego e a libertaodas correntes da vida.

    Os meus particulares agradecimentos a Helena Gallis e Maria Ferreira da Silva pela suaindispensvel ajuda na correco desta traduo.

    Que o fruto do vosso caminho seja a total libertao.

    Appamdo

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    As publicaes de Amarvat so para distribuio gratuita . Na maioria dos casos,

    isto possvel graas a doaes, de indivduos ou grupos, feitas especificamente

    para que as publicaes dos ensinamentos do Buddha possam estar disponveis de

    forma gratuita.

    Traduzido por Samanera Appamdo

    Traduo autorizada da edio inglesa:

    Mindfulness: The Path to the deathless

    Amaravati Publications 1987

    Amaravati Buddhist Monastery

    Great Gaddesden, Hemel Hempstead

    Hertfordshire HP1 3BZ

    England, United Kingdom

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    Contedos

    Introduo 7

    Uma nota antes de comear 8

    Investigao

    O que Meditao? 9

    Instruo

    Observando a respirao (npnasati) 15

    O mantra Buddho 17

    Esforo e Relaxamento 20

    Caminhando Atentamente (Jongrom) 24

    Amor Incondicional (Mett) 26

    Plena Ateno no Trivial 29

    Ouvir o pensamento 31

    Os obstculos e a sua cessao 35

    Vazio e forma 38

    Vigilncia Interior 41

    Reflexo

    A necessidade de Sabedoria no Mundo 44

    Refgios e Preceitos 51

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    Introduo

    O objectivo deste livro proporcionar uma instruo clara e uma reflexo sobre

    meditao budista, tal como ensinada por Ajahn Sumedho, um bhikkhu (monge) datradio Theravada. Os captulos seguintes foram editados a partir de palestras maioresque Ajahn Sumedho deu a meditadores, como uma abordagem prtica sabedoria doBudismo. Esta sabedoria tambm conhecida como Dhamma ou 'a forma como ascoisas so'.

    Somos convidados a usar este livro como um manual, passo-a-passo. O primeirocaptulo tenta apresentar a prtica do Budismo de uma maneira geral clara e as secessubsequentes podem ser tomadas uma a uma e seguidas de um perodo de meditao. Oterceiro captulo uma reflexo acerca da compreenso que se desenvolve atravs da

    meditao. O livro termina com a forma de tomar os Refgios e os Preceitos o queredimensiona a prtica da meditao dentro do contexto mais abrangente do trabalho ater com a mente. Estes podem ser pedidos formalmente a budistas ordenados (Sagha)ou serem assumidos pessoalmente. Eles constituem os pressupostos atravs dos quais osvalores espirituais so trazidos ao mundo.

    A primeira edio deste livro, em ingls, (2000 cpias) foi impressa em 1985 aquando da abertura do Centro Budista Amaravati - esgotaram-se, na altura,rapidamente os stocks. O livro foi muito apreciado e algumas pessoas ofereceram-separa ajudar a patrocinar uma nova impresso; desta forma fizemos uma reviso maismeticulosa do que aquela que tinha antes sido possvel realizar e adicionmos algumdesign para melhorar o livro como um todo; parte disso o texto manteve-se. Comoeste livro foi inteiramente produzido atravs de contribuies voluntrias e aces deservio ao Dhamma, pedido aos leitores que respeitem esta oferenda, mantendo-adisponvel de forma gratuita.

    Possam todos os seres realizar a Verdade.

    Venervel Succito

    Centro Budista Amaravati

    Maio 1986

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    Antesdecomear

    A maior parte destas instrues podem ser levadas a cabo quer estejamos sentados, de

    p ou a andar. Contudo, a tcnica da Plena Ateno da respirao ( npnasati)mencionada nos primeiros captulos geralmente realizada na postura de sentado, umavez que aquela potencializada quando realizada num estado fsico de quietude eestabilidade. Para este estado a nfase em sentarmo-nos de forma a que a coluna estejaerecta mas no em esforo, com o pescoo alinhado com a coluna e a cabea emequilbrio de forma a no pender para a frente. Muitas pessoas acham que a postura deLotus de pernas cruzadas (sentados numa almofada ou num tapete, com um ou ambosos ps colocados na coxa oposta, com as solas para cima) confere um equilbrio idealentre esforo e estabilidade aps alguns meses de prtica. bom treinarmo-nosgentilmente nesta direco, um pouco de cada vez. Uma cadeira de costas direitas pode

    ser usada se esta postura for muito difcil.

    Aps ter-se alcanado estabilidade e um certo equilbrio fsico, a cara e os braosdevem ficar relaxados, com as mos a descansar no colo, uma na palma da outra.Deixem as plpebras fecharem-se, relaxem a mente escolham o objecto demeditao.

    Jongrom, uma palavra Tailandesa derivada do Pli (linguagem das escrituras)

    cakamasignifica passear para a frente e para trs num caminho a direito. O caminhodeve ser medido, sendo o ideal vinte a trinta passos entre dois objectos claramenteidentificveis de modo a no ter que contar os passos enquanto pratica o jongrom. Asmos devero estar agarradas uma outra de uma forma suave, em frente ou por detrsdo corpo, com os braos relaxados. O olhar dever estar direccionado de uma maneirano focalizada no caminho, a uma distncia de aproximadamente dez passos frente,no para observar nada em particular mas para manter o ngulo mais confortvel para opescoo. O caminhar comea ento com uma postura composta e quando se chega aofim do percurso devemos permanecer imveis por um perodo que pode durar uma ouduas respiraes. Ento, conscientemente, viramo-nos e comeamos a andar novamente.

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    Investigao

    O que meditao?

    A palavra meditao uma palavra bastante usada nos dias de hoje, abrangendo umvasto leque de prticas. No Budismo fala-se de dois tipos de meditao samathaevipassan. A meditao samatha um tipo de meditao na qual se concentra amente num objecto ao invs de a deixar preambular por outras coisas. Escolhe-se umobjecto de meditao, tal como a sensao da respirao, colocando-se toda a atenonas sensaes da inalao e da exalao. Atravs desta prtica comeamoseventualmente a experienciar uma mente calma e tornamo-nos tranquilos, pois estamos

    a eliminar todas as outras impresses que captamos atravs dos sentidos.

    Os objectos usados para tranquilizar so tranquilizantes (nem valia a pena dizer!). Sequiserem excitar a mente vo para algum lugar excitante, no vo para um mosteiroBudista, mas sim a uma discoteca!... Excitao algo no qual fcil nosconcentrarmos? uma vibrao to forte que nos atrai imediatamente. Se formos aocinema e o filme for realmente excitante ficamos fixados no ecr. No temos que fazerqualquer esforo para observar algo que muito excitante, romntico ou repleto deaventuras. Mas, no estando acostumados, observar um objecto tranquilizante pode sertremendamente enfadonho. Quando estamos habituados a coisas muito mais excitantes

    o que que pode ser mais aborrecido do que ficarmos a observar a nossa prpriarespirao? Para o podermos fazer temos que forar a nossa mente uma vez que arespirao no interessante, romntica, cheia de aventuras ou cintilante simplesmente o que . Por isso temos de nos esforar pois no estamos a receberqualquer estmulo vindo do exterior.

    Neste tipo de meditao no tentamos criar qualquer imagem, apenas concentramo-nosna sensao normal do nosso corpo tal como ele est no momento, mantendo a nossaateno na respirao. Quando fazemos isto a respirao torna-se mais e mais refinada ens acalmamos conheo pessoas que prescreveram meditao samatha para a tensoarterial elevada pois acalma o corao.

    Assim, esta a prtica da tranquilidade. Podemos escolher diferentes objectos para nosconcentrarmos, para nos treinarmos a manter a nossa ateno at sermos absorvidos outornarmo-nos um s com o objecto. Na realidade sente-se uma noo de unidade com oobjecto no qual nos concentramos e isto o que chamado de absoro.

    A outra prtica vipassanou meditao de insight. Com a meditao de insightabrimos a mente para tudo. No escolhemos nenhum objecto em particular para nosconcentrarmos ou absorvermos, mas ficamos simplesmente a observar de forma acompreendermos as coisas tal como so. E o que podemos observar acerca de como as

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    coisas so que toda a experincia sensorial impermanente. Tudo o que vemos,ouvimos, cheiramos, saboreamos e tocamos; todas as condies mentais os nossossentimentos, memrias e pensamentosso condies mentais em constante mudana,as quais surgem e cessam. Em vipassan assumimos esta caracterstica daimpermanncia (ou mudana) como uma forma de olhar para toda a experinciasensorial que podemos observar enquanto estamos aqui sentados.

    No se trata de uma mera atitude filosfica ou de uma crena numa teoria budistaespecfica. A impermanncia para ser totalmente reconhecida em nosso interioratravs da abertura da mente para a observao e consciencializao das coisas tal comoelas so. No uma questo de anlise, assumindo que as coisas deveriam ser de umadeterminada forma e de, quando no o so, tentar perceber porque que assim . Com aprtica de insightno estamos nem a tentar analisarmo-nos, nem a tentar mudar algo demaneira a que isso se adeqe aos nossos desejos. Nesta prtica observamos

    simplesmente que tudo aquilo que surge, quer seja mental ou fsico, passa e desaparece.Isto inclui os prprios rgos dos sentidos, o objecto dos sentidos e a conscincia que

    surge aquando do contacto com esses objectos. Existem tambm as condies mentaisde gostar e no gostar do que vemos, cheiramos, saboreamos, sentimos ou tocamos; osnomes que atribumos e as ideias, palavras e conceitos que criamos volta daexperincia sensorial. Grande parte da nossa vida baseada em assunes feitas devidoa no se compreender e a no se investigar realmente a maneira como as coisas so. Avida, para quem no est desperto nem consciente, tende a tornar-se deprimente ouconfusa, especialmente quando algo nos decepciona ou alguma tragdia ocorre. Nessas

    alturas ficamos esmagados por no observamos as coisas como elas na realidade so.

    Na terminologia budista usamos a palavra Dhamma, ou Dharma, que significa, comoas coisas so, as leis naturais. Quando observamos e praticamos o Dhamma abrimosa nossa mente para as coisas tal como so. Desta forma j no estamos a reagircegamente experincia dos sentidos mas sim a compreend-la e, atravs dessacompreenso, comeamos a desapegarmo-nos. Comeamos a libertar-nos de sermosnaturalmente esmagados, cegados e iludidos pela aparncia das coisas. Estar conscientee desperto no uma questo de nos tornarmos nisso, mas de o sermos. Observemos ascoisas tal como elas so neste preciso momento ao invs de fazer algo agora para nos

    tornarmos conscientes no futuro. Observamos o corpo como ele , aqui sentado. Nopertence tudo natureza? O corpo humano pertence terra, precisa de ser sustentadopor coisas provenientes da terra. No podemos viver simplesmente do ar nem tentarimportar comida de Marte ou de Vnus. Temos que comer daquilo que vive e crescenesta Terra. Quando o corpo morre regressa terra, apodrece, desfaz-se e torna-senovamente um com a terra. Segue as leis da natureza, da criao e da destruio, donascimento e da morte. Tudo o que nasce no se mantm no mesmo estado: cresce, ficavelho e morre. Tudo na natureza, at o prprio universo, tem os seus perodos deexistncia, nascimento e morte, comeo e fim. Tudo quanto nos apercebemos e

    concebemos transitrio, impermanente, e portanto nunca nos poder satisfazer deforma permanente.

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    Na prtica do Dhamma podemos tambm observar o carcter insatisfatrio daexperincia sensorial. Reparem simplesmente na vossa prpria vida: quando esperamsatisfazer-se atravs de objectos ou experincias sensoriais, apenas o conseguem fazertemporariamente, talvez gratificados e felizes nesse momento, mas imediatamente aseguir isso muda. Isto acontece por no existir nada na conscincia sensitiva que tenhaessncia ou qualidade permanente, da a experincia sensorial ser uma constantemudana. Devido ignorncia e falta de compreenso dependemos imenso dessaexperincia; habituamo-nos a exigir, desejar e criar todo o tipo de coisas, apenas para deseguida nos sentirmos terrivelmente desapontados, desesperados, pesarosos eassustados. Essas mesmas expectativas e esperanas levam-nos ao desespero, angstia, lstima, dor, ao lamento, velhice, doena e morte.

    Esta a forma de examinar a conscincia sensorial. A mente pode pensar de formaabstracta, pode criar todo o tipo de ideias e imagens, pode criar coisas muito refinadas

    ou grosseiras. Existe toda uma gama de possibilidades desde estados muito refinados degraa, felicidade e xtase at s mais densas e dolorosas misrias: do cu ao inferno,usando uma terminologia mais pitoresca. Mas no existe nenhum Inferno permanente enenhum Cu permanente. Na verdade no existe nenhum estado permanente que possaser concebido ou criado. Ao meditarmos, assim que comeamos a perceber aslimitaes, a qualidade insatisfatria e a natureza transitria de toda a experinciasensorial, comeamos tambm a perceber que isto no o eu ou o meu, anatt ,no-eu.

    Quando tal realizado comeamos a libertar-nos da identificao com as condies

    sensoriais. Isto acontece no por criarmos averso a elas, mas por as compreendermostal como elas so. Trata-se de uma verdade a ser realizada, no de uma crena. Anatt no uma crena budista mas sim uma realizao. Mas se no despendermos algumtempo da nossa vida a tentar investigar e compreender, iremos provavelmente viversempre na convico de que somos o nosso corpo. Podemos a dada altura pensar Oh,eu no sou o meu corpo por termos lido alguma poesia inspiradora ou uma novaabordagem filosfica, podemos at achar que uma boa ideia no se ser o corpo, masainda no realizmos isso. Algumas intelectuais podem dizer Ns no somos o corpo, ocorpo no o eu diz-lo fcil, mas sab-lo realmente outra coisa. Atravs desta

    prtica de meditao, da investigao e da compreenso de como as coisas so,comeamo-nos a libertar do apego. Quando j no tivermos expectativas ou exignciasento, obviamente, j no iremos sentir o desespero, a pena e a angstia resultantes dequando no conseguimos aquilo que queremos. Ento este o objectivo Nibbnaoua realizao de no nos agarrarmos a nenhum fenmeno que tenha um princpio e umfim. Quando abrimos mo deste habitual e insidioso apego ao que nasce e morre,comeamos a realizar a no-morte.

    Algumas pessoas vivem simplesmente reagindo vida porque foram condicionadas afaz-lo, como os ces de Pavlov. Se no estivermos despertos para as coisas como elas

    so, ento, na verdade, no somos mais que uma mera criatura inteligente condicionadaao invs de um estpido co condicionado. Podemos olhar com ar de superioridade para

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    o co de Pavlov que saliva quando a campainha toca, mas reparem como fazemos coisasto semelhantes. Isto deve-se ao facto de que na experincia sensorial tudo condicionante, no se trata de pessoas, alma ou essncia pessoal. Estes corpos,sentimentos, memrias e pensamentos so percepes condicionadas na mente atravsde dor, devido a termos nascido como seres humanos, nas nossas respectivas famlias,classe social, raa, nacionalidade, etc.; dependendo se temos um corpo masculino oufeminino, atraente ou no, e por a adiante. Tudo isto so apenas as condies queno so nossas, que no somos ns. Estas condies obedecem s leis da natureza, asleis naturais. No podemos dizer No quero que o meu corpo envelhea. Bem,podemos diz-lo mas, no importa o quo insistentes sejamos, o corpo continuar aenvelhecer. No podemos esperar que o corpo nunca adoea ou sinta dor ou ainda quetenha sempre viso e audio perfeitas. Gostaramos, no verdade? Eu espero sersempre saudvel. Nunca serei um invlido e terei sempre uma boa viso, nunca ficareicego; tenho bom ouvido e por isso nunca serei uma daquelas pessoas de idade para as

    quais os outros tm de gritar e nunca ficarei senil e terei sempre controlo das minhasfaculdades at morrer aos noventa e cinco anos de idade, completamente desperto, coma mente clara e alegre. E morrerei naturalmente enquanto durmo, sem dor. Isto comotodos gostaramos que fosse. At pode ser que de entre ns alguns continuem a viverpor bastante tempo e morrer de forma bastante edlica ou tambm pode acontecer queamanh as nossas rbitas saltem dos olhos! No muito provvel mas pode acontecer!Contudo, o fardo da vida diminui consideravelmente quando reflectimos nas limitaesda nossa prpria vida. A sabemos aquilo que podemos alcanar, aquilo que podemosaprender. Tanta misria humana resulta de criarmos demasiadas expectativas e nunca

    sermos capazes de alcanar tudo aquilo que desejamos.Na nossa meditao e compreenso intuitiva das coisas tal como elas so, vemos que

    beleza, refinamento e prazer so condies impermanentes assim como a dor, misriae feiura. Se conseguirmos realmente compreender isso, poderemos desfrutar e aguentaro que quer que seja que nos acontea. Na verdade, grande parte da lio da vida consisteem aprender a suportar aquilo que no gostamos em ns prprios e no mundo nossavolta; sermos capazes de ser pacientes e calmos, e no fazermos um drama acerca dasimperfeies da experincia sensorial. Podemo-nos adaptar, suportar e aceitar ascaractersticas mutveis do ciclo do nascimento e da morte atravs do abrir mo e do

    desapego a esse mesmo ciclo. Quando nos libertamos dessa identificao,experienciamos a nossa verdadeira natureza, a qual brilhante, clara, sapiente, mas que

    j no algo pessoal, no eu ou meu no existem metas nem apegos. Apenas nospodemos apegar quilo que no a nossa conscincia pura!

    Os ensinamentos do Buddha so simples meios teis, formas de observar a experinciasensorial que nos ajudam a compreend-la. No so mandamentos ou dogmas religiososnos quais temos de acreditar e aceitar. So meras linhas guias que apontam para amaneira como as coisas so. Desta forma no estamos a usar os ensinamentos doBuddha apegando-nos a eles como um fim em si prprios, mas apenas para nos

    relembrarmos de estar despertos, alertas e conscientes de que tudo o que surge, cessa.

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    Esta uma contnua e constante observao e reflexo do mundo sensitivo visto esteexercer uma influncia forte e poderosa. Vivendo num corpo assim, na sociedade actual,as presses em todos ns so incrveis. Tudo se move to rapidamente a televiso e atecnologia desta era, os carrostudo tende a mover-se a um ritmo muito rpido. tudomuito atraente, excitante e interessante, e tudo atrai os nossos sentidos para o exterior.Simplesmente reparemos quando vamos a Londres como toda a publicidade chama anossa ateno para os cigarros e garrafas de whisky! A nossa ateno levada paracoisas que podemos comprar, reafirmando o renascer na experincia sensorial. Asociedade materialista estimula a avidez de forma a gastarmos dinheiro e ainda assim anunca estarmos contentes com o que temos. Existe sempre algo melhor, mais recente mais delicioso que aquilo que ontem era o mais delicioso e continua e continua,puxando-nos exteriormente para os objectos dos sentidos.

    Mas na sala de meditao, no vimos aqui para olhar uns para os outros ou para

    sermos levados ou atrados para qualquer um dos objectos na sala, mas para os usar deforma a nos relembrar. Somos relembrados quer a concentrarmos as nossas mentes numobjecto pacfico quer a abrirmos a mente, investigarmos e reflectirmos acerca damaneira como as coisas so. Cada um tem de experienciar isto por si prprio. No ailuminao de algum que vai iluminar os restantes. Este um movimento para ointerior; no o de olhar para fora, para algum que iluminado de forma a nosiluminarmos. Damos esta oportunidade de encorajamento e encaminhamento para queaqueles de vs que esto interessados em o fazer, o possam realizar. Aqui podemos, amaior parte do tempo, ter a certeza de que ningum nos vai roubar a mala! Hoje em diano podemos confiar em nada, mas o risco disso acontecer aqui menor do que setivssemos sentados em Piccadilly Circus. Os mosteiros Budistas so refgios para estetipo de abertura da mente. Esta a nossa oportunidade enquanto seres humanos. Comoseres humanos temos uma mente que pode reflectir e observar. Podemos observar querestejamos felizes ou miserveis. Podemos observar o dio, o cime ou a confuso nanossa mente. Quando estamos sentados e sentimo-nos realmente confusos e chateadosexiste em ns algo que o sabe. Podemos odiar e reagir cegamente contra isso, mas seformos mais pacientes conseguimos observar que isso uma condio temporria etransiente de confuso, dio ou avareza. Mas um animal no consegue fazer isso.Quando est zangado ele somente isso, perdidamente. Digam a um gato zangado para

    observar a sua raiva! Eu nunca consegui ir muito longe com a nossa gata, ela noconsegue reflectir sobre a gula. Mas eu consigo e tenho a certeza de que todos vocstambm o conseguem fazer. Quando vemos comida deliciosa nossa frente omovimento da mente o mesmo da nossa gata Doris. Mas ns conseguimos observar aatraco animal para coisas que parecem boas e que cheiram bem.

    Quando observamos e compreendemos o impulso estamos a usar sabedoria. Aquiloque observa a gula no gula. A gula no se pode observar a ela mesma, mas aquilo queno gula pode observ-la. Este observar aquilo a que chamamos Buddha ouSabedoria de Buddha a conscincia das coisas tal como elas so.

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    respirao. Estejam conscientes desse momento em que se sentem fartos ou sentemaverso ou impacincia, reconheam-no, deixem-no ir, e voltem de novo respirao.

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    O Mantra Buddho

    Se tiverem uma mente pensante muito activa, talvez possam achar o mantra* Buddho

    algo de grande ajuda. Inalem em Bude exalem em -dhode forma a pensarem nissoem cada inalao. Isto uma maneira de se manter a concentrao: durante os prximosquinze minutos faam a npnasati, colocando toda a vossa ateno, compondo a vossamente com o som mntrico Bud-dho. Aprendam a treinar a mente at terem clareza elucidez mental ao invs de naturalmente se afundarem em passividade. Isto requeresforo contnuo: uma inalao de Budcompletamente clara na vossa mente, o prpriopensamento presente e claro desde o princpio at ao fim da inalao. E dho naexalao. Nessa altura larguem tudo o resto. Esta agora a ocasio para fazermosexclusivamente istopodemos resolver os nossos problemas e os problemas do mundo

    a seguir. Neste momento s nos pedido isto. Tragam o mantra conscincia. Tornem-se completamente conscientes do mantra em vez deste ser apenas uma formalidadepassiva que deixa a mente dormente; energizem a mente de forma a que a inalao emBudseja uma inalao lcida, no apenas um som Budformal que vai desaparecendopor nunca ser avivado ou refrescado pelas nossas mentes. Podem visualiz-loortograficamente de forma a terem essa slaba completamente presente durante operodo de uma inalao, do princpio ao fim. Durante a exalao -dho pode serrealizado da mesma forma, de maneira a haver uma continuidade de esforo ao invs deespordicas tentativas, comeos e fracassos.

    Verifiquem se de seguida surgem alguns pensamentos obsessivosalguma frase tolaque talvez esteja a passar pela vossa mente. Se se deixarem naturalmente afundar numestado passivo, ento os pensamentos obsessivos iro tomar conta da mente. Mas aoaprenderem como a mente funciona e a us-la habilmente, podem ter este particular

    pensamento, o conceito de Buddho(o Buddha, aquele que sabe) e sust-lo na vossamente, no simplesmente como um pensamento comum obsessivo, mas como um usosaudvel da capacidade pensante, usando-o para manter a concentrao durante operodo de uma inalao - exalao, durante quinze minutos.

    A prtica essa, independentemente de quantas vezes falharem e a mente comear a

    vaguear, somente tm de reparar que esto distrados, ou que esto a pensar nisso ouque prefeririam no se importar com Buddho Eu no quero fazer isto. Prefirosomente sentar-me aqui e relaxar e no ter que fazer nenhum esforo. No sinto vontadede o fazer. Ou talvez tenham outras coisas na vossa mente nesta altura, surgindofurtivamente no limiar da conscinciareparem nisso. Verifiquem que estado de nimoest presente na vossa mente neste preciso momento no de forma crtica oudesencorajadora mas, calmamente e descontraidamente, reparem se isso vos tranquiliza

    *mantra: palavra de relevncia religiosa. A repetio de mantras pode ser utilizada como objecto demeditao.

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    ou se se sentem letrgicos e sonolentos; se estiveram a pensar durante todo este tempoou se estiveram a concentrar-se. Apenas para serem cientes.

    O obstculo para a prtica da concentrao a averso ao fracasso e o incrvel desejode sucesso. A prtica no uma questo de fora de vontade mas de sabedoria, de

    reconhecer a sabedoria. Com esta prtica podem aprender onde esto as vossasfraquezas, aonde que tendem a perder-se. Testemunhem o tipo de caractersticas depersonalidade que desenvolveram na vossa vida at esta altura, no para serem crticosmas para saber como lidar com elas sem serem escravos das mesmas. Isto significa umacuidadosa e sbia reflexo acerca de como as coisas so. Por isso observem ereconheam at os mais horrveis e confusos estados mentais, ao invs de tentaremevit-los a todo o custo. Essa uma qualidade de persistncia. Nibbna* muitasvezes descrita como sendo cool (fresca). Parece conversa de hippy, no ? Mas osignificado dessa palavra tem um certo sentido. Frescura em termos de qu? No sentido

    de que refrescante por no ser emaranhada em paixes mas sim desapegada, alerta eequilibrada.

    A palavra Buddho uma palavra que podem desenvolver nas vossas vidas como algopara preencher a mente ao invs de preocupaes e todo o tipo de hbitos poucosaudveis. Peguem na palavra, olhem para ela, escutem-na: Buddho! Significa aqueleque sabe, o Buddha, o desperto, aquele que desperto. Podem visualizar na vossamente. Ouam o que a vossa mente diz : bl, bl, bl continuamente por a fora, uminfindvel tipo de excremento de averses e medos reprimidos. Esto agora ento areconhecer isso. No estamos a usar a palavra Buddho como um cassetete para

    aniquilar ou reprimir coisas, mas como um meio inteligente. Podemos usar as maisrequintadas ferramentas para matar e prejudicar os outros, no podemos? Podemosagarrar na mais bela esttua do Buddha e esmagar a cabea de algum com ela! Isso noseria aquilo a que chamamos Buddhanussati, Reflexo em Buddha! Mas talvezfaamos isso com a palavra Buddho de forma a suprimir esses pensamentos ousentimentos. Isso no fazer um uso inteligente da palavra. Lembremo-nos que noestamos aqui para aniquilar mas para permitir que as coisas se desvaneam. Trata-se deuma prtica gentil de pacientemente impor Buddho sobre o pensamento, no porexasperao, mas de uma forma firme e deliberada.

    O mundo precisa de aprender a fazer isto, no ? Os Estados Unidos e a UnioSovitica poderiam faz-lo ao invs de agarrarem em metralhadoras e armas nucleares eaniquilarem coisas que se lhes intrometem no caminho, ou dizerem coisas horrveis eofensivas uns aos outros. At nas nossas vidas ns fazemos isso, no fazemos? Quantosde vocs disseram coisas desagradveis a algum recentemente, coisas que magoam,criticismo descorts e ofensivo, simplesmente porque a outra pessoa vos irrita, empataou assusta? Pratiquemos ento com as pequenas irritantes e desagradveis coisas que

    *Nibbna: Paz atravs do desapego, tambm se pode escrever Nirva.

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    esto na nossa mente, coisas que so tolas e estpidas. Usemos Buddhono como umcassetete mas como um meio inteligente de permitir que esses pensamentos sigam o seurumo; como um meio para os largarmos. Agora, durante os prximos quinze minutos,voltem aos vossos narizes, com o mantra Buddho. Vejam como us-lo e trabalhar comele.

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    Esforo e Relaxamento

    Esforo simplesmente fazer aquilo que temos que fazer. Varia de acordo com ascaractersticas e hbitos de cada um. Algumas pessoas tm muita energia tanta queesto sempre a mexer, procura de coisas para fazer. Vemo-las o tempo todo a tentarencontrar coisas para fazer, colocando tudo no exterior. Na meditao no estamos procura de algo para fazer como um escape, mas estamos a desenvolver um tipo deesforo interno. Observamos a mente e concentramo-nos no assunto.

    Se fizerem demasiado esforo, apenas ficaro agitados e se no puserem esforosuficiente tornam-se entorpecidos e o corpo fica mole. O nosso corpo algo muito bompara ter em ateno no que diz respeito ao esforo: colocar o corpo direito, alinh-lo,pr o peito para fora, manter a coluna vertebral direita, tudo isto requer muita fora devontade. Se estiverem demasiado moles iro simplesmente encontrar a postura maisfcil a fora da gravidade puxa-vos para baixo. Quando est frio tm de puxar aenergia para cima atravs da coluna de maneira a aquecerem o vosso corpo ao invs dese enfiarem debaixo de cobertores. Com npnasati, a plena ateno da respirao,concentram-se no ritmo. Considero isso muito til para aprender a acalmar em vez defazer tudo rapidamentetal como pensar; esto-se a concentrar num ritmo que muitomais lento que os vossos pensamentos. Mas npnasati requer que abrandem pois temum ritmo bastante brando que faz com que tal acontea. Paramos de pensar. Estamos

    contentes com uma inalao, uma exalao temos todo o tempo do mundo, s paraestar com uma inalao, desde o princpio ao fim.

    Se estiverem a tentar obter samdhi(concentrao) atravs de npnasati, ento jestabeleceram um objectivo para vs prpriosesto a faz-lo de forma a obterem algopara vs e, ento, npnasati torna-se uma experincia muito frustrante e ficamzangados com isso. Ser que podem estar somente com uma inalao? Estar satisfeitoscom uma simples exalao? Estar satisfeitos apenas com o breve espao de tempo quetm para se acalmarem?

    Quando pretendem alcanar jhnas (absores) a partir desta meditao e realmentecolocam bastante esforo nisso, no acalmam. Esto a tentar obter algo disso, a tentaralcanar ou conquistar ao invs de humildemente ficarem satisfeitos com umarespirao. O sucesso de npnasati simplesmente esseplena ateno durante umainalao, durante o perodo de tempo de uma inalao. Estabeleam a vossa ateno noprincpio e no fim ou no princpio, meio e fim. Isto d-vos alguns pontos definidospara reflexo de maneira a que, se a mente vagueia imenso durante a prtica, possamtomar especial ateno, escrutinando o princpio, o meio e o fim. Se no o fizerem amente voltar a vaguear.

    Todo o nosso esforo vai para a; tudo o resto suprimido durante esse tempo, oudescartado. Reflictam na diferena entre inalao e exalao examinem-na. De qual

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    que gostam mais? Por vezes a respirao parece que vai desaparecer, tornando-se muitorarefeita. O corpo parece respirar por si prprio e tm este estranho sentimento de queno vo respirar. um pouco assustador.

    Mas isto um exerccio; centrem-se na respirao, sem a controlarem de todo. Por

    vezes quando se concentram nas narinas, sentem que todo o corpo est a respirar. Ocorpo continua a respirar por si prprio.

    Por vezes levamos as coisas demasiado a srio, com uma total falta de alegria efelicidade, sem sentido de humor, apenas reprimindo tudo. Alegrem a mente, estejamdescontrados e vontade, tenham todo o tempo do mundo sem a presso de terem dealcanar algo importante: nada de especial, nada para atingir. Trata-se de algo simples,mesmo quando fazem apenas uma inalao com plena ateno durante a manh, isso melhor do que o que a maior parte das pessoas est a fazer e de certeza que melhor doque ser sempre disperso.

    Se forem muito negativos devem tentar ser algum que agradvel e com uma maiorauto-aceitao. Relaxem e no faam da meditao uma tarefa pesada para vs prprios.Vejam-na como uma oportunidade para estar em paz e vontade com o momentopresente. Descontraiam o corpo e estejam em paz.

    No esto a batalhar com as foras do mal. Se sentirem averso para com npnasati,reparem nisso. No sintam que algo que tm de fazer, mas vejam-na como um prazer,como algo que realmente gostam de fazer. No tm de fazer mais nada, podemsimplesmente estar perfeitamente descontrados. Tm tudo o que precisam; tm a vossa

    respirao, tm apenas de se sentar aqui, no h nada difcil para fazer, no precisam decapacidades especiais, no precisam nem mesmo de ser particularmente inteligentes.Quando pensam Eu no consigo faz-lo reconheam isso como uma mera resistncia,medo ou frustrao, e descontraiam.

    Se se sentirem muito tensos e rgidos por causa de npnasati, ento no o faam.No faam disso uma coisa difcil, no a tornem numa tarefa penosa. Se no oconseguirem fazer, ento sentem-se, simplesmente. Quando eu costumava entrar emestados terrveis eu apenas contemplava paz. Comeava a pensar: Eu tenho de Eutenho de Eu tenho de fazer isto. Entopensava: Fica simplesmente em paz, relaxa.

    Dvidas e inquietao, descontentamento e averso rapidamente reflectia acerca depaz, dizendo a palavra uma e outra vez, hipnotizando-me, relaxa, relaxa. As dvidaspessoais comeavam a vir: No estou a chegar a lugar nenhum com isto, intil, euquero obter algo. Mas logo ficava em paz com isso. Conseguimo-nos acalmar e quandodescontramos, conseguimos fazer npnasati. Se querem fazer alguma coisa, entofaam npnasati.

    No princpio a prtica pode ser muito aborrecida, sentimo-nos desesperadamentedesajeitados tal como quando estamos a aprender a tocar guitarra. Quando se comea atocar, os nossos dedos so desajeitados. desesperante! Mas aps algum tempo de

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    prtica ganha-se habilidade e torna-se bastante fcil. Estamos a aprender a testemunharo que se passa na nossa mente de forma a podermos saber quando comeamos a ficaragitados e tensos, com averso a tudo. Reconhecendo isso, no tentamos convencermo-nos de que de outra maneira. Estamos completamente conscientes das coisas tal comoelas so: e o que fazemos quando estamos tensos e nervosos? Descontramos.

    Nos meus primeiros anos com Ajahn Chah por vezes eu era muito srio no que dizrespeito a meditao chegando mesmo a ser demasiado solene e taciturno acerca demim prprio. Eu chegava a perder todo o sentido de humor e a ficar srio de morte,completamente rgido como um velho tronco. Costumava fazer imenso esforo, mastornava-se to doloroso e desagradvel pensar Tenho desou to preguioso. Sentia-me to terrivelmente culpado se no passasse o tempo todo a meditar um escuroestado mental desprovido de alegria. Passei a observar isso, meditando sobre mimprprio como um ramo seco. Quando tudo se tornava completamente insuportvel eu

    recordava-me do oposto:No tens de fazer nada. Nenhum stio para onde ir, no hnada para ser feito. Est em paz com a forma como as coisas so agora, descontrai,deixa. Passei a utilizar isto.

    Quando a vossa mente se encontra nesta condio, apliquem o oposto, aprendam alevar as coisas de uma forma suave. Vocs lem livros acerca de no fazer esforoalgumdeixem apenas acontecer de uma forma natural e pensam tudo o que tenhode fazer ser preguioso. O que acontece que normalmente caem num estadoentorpecido e passivo. Mas precisamente nessa altura que precisam de se esforar umpouco mais.

    Com npnasati podem manter o esforo durante uma inalao. E se no poderemsust-lo durante uma inalao ento faam-no durante pelo menos meia inalao. Destamaneira no esto a tentar ser perfeitos imediatamente. No tm de fazer tudo certinhodevido a alguma ideia de como poderia ser, mas trabalhem com os respectivos tipos deproblemas, tal como eles so. Se tivermos uma mente muito dispersa sbioreconhecer-se que assim isso um insight, uma realizao. Pensar que no deveriamser assim, detestarem-se ou sentirem-se desencorajados por serem de determinadamaneira, isso sim, ignorncia.

    Com npnasati reconhecem a realidade do agora e partem desse ponto: sustm avossa ateno por um pouco mais de tempo e comeam a perceber o que aconcentrao, tomando decises que podem manter. No decises de Super-homemquando no so o Super-homem. Faam npnasati por dez ou quinze minutos em vezde pensar que o conseguem fazer a noite toda. Vou fazer npnasati desde agora atao amanhecer. A falham e aborrecem-se. Estabeleam perodos que sabem que voconseguir cumprir. Experimentem, trabalhem com a mente at perceberem como aplicaresforo e como relaxar.

    npnasati algo imediato. Leva-nos realizao (insight)vipassan. A natureza

    impermanente da respirao no nossa, ou ? Tendo nascido, o corpo respira por siprprio. Inspirao e expiraouma condiciona a outra. Enquanto o corpo estiver vivo

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    assim que ser. No controlamos nada. Respirar pertence natureza, no a ns; no-eu. Quando observamos isto estamos a fazer vipassan. No algo excitante oufascinante ou desagradvel. natural.

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    Caminhando atentamente (Jongrom)

    Caminhar Jongrom* uma prtica de caminhar centrados no movimento dos ps.Trazemos a ateno para o caminhar do corpo desde o princpio de determinado

    percurso, at ao fim. Damos meia volta e paramos. Surge ento a inteno de andar eassim o fazemos. Reparem no meio do caminho e no fim, parando, virando, ficandoparado; os momentos em que acalmamos a mente quando esta comea a divagar emtodas as direces. Se no tivermos cautela podemos planear uma revoluo ou algoassim enquanto fazemos jongrom! Quantas revolues tero sido planeadas durantejongrom? Ento em vez de fazer coisas como essas usamos esse tempo para nosconcentrarmos naquilo que na verdade est a acontecer. No so sensaes fantsticasmas sim to comuns que nem reparamos nelas. Reparem que preciso esforo paraestar verdadeiramente consciente de coisas assim.

    Quando a mente vagueia e do por vs na ndia enquanto esto a meio do caminho do jongrom, ento reconheamOh! nesse momento esto despertos e por isso podemrestabelecer a vossa mente no que est realmente a acontecer, o corpo a andar de umponto para o outro. um treino de pacincia pois a mente vagueia por todo o lado. Seno passado tiveram momentos de graa enquanto faziam jongrom e pensarem noltimo retiro fiz meditao andando e realmente senti apenas o corpo a andar; senti queno havia eu e foi maravilhoso, oh, se o pudesse fazer de novo observem entoesse desejo de obter algo de acordo com uma memria de um momento feliz. Reparemnisso como uma condio pois isso um obstculo. Abram mo de tudo, no importa se

    da resultar um momento de graa ou no. Apenas um passo e depois um novo passo isso tudo o que preciso, um deixar ir, um ficar satisfeito com pouco ao invs detentarem obter um estado de graa que talvez tenha acontecido a dada altura, duranteeste tipo de meditao. Quanto mais tentarem pior ficar a vossa mente pois esto aperseguir o desejo de ter uma determinada experincia maravilhosa, de acordo com avossa memria. Fiquem satisfeitos com as coisas como elas so neste momento, aoinvs de se precipitarem a fazer algo agora de forma a obterem determinado estadodesejado.

    Um passo de cada vez reparem quo pacfico fazer meditao andando quandotudo o que temos de fazer estar presentes em cada passo. Mas se pensarmos que temosde desenvolver samdhi atravs desta prtica e a nossa mente viajar em todas asdireces, o que que acontece? Eu no suporto este tipo de meditao, no alcanonenhuma paz com ela; tenho praticado tentando ter este sentimento de andar semningum andar e a minha mente simplesmente vagueia por toda a parte isto aconteceporque ainda no percebemos como faz-lo; a nossa mente est a idealizar, a tentar

    *Jongrom (palavra tailandesa): andar para a frente e para trs num caminho a direito. Ver pg. 2

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    obter algo ao invs de simplesmente ser. Quando estamos a andar tudo o que temos defazer andar. Um passo, um prximo passo simples Mas no fcil, no ? Amente distrada, tentando perceber o que deveramos estar a fazer, o que est erradoconnosco e porque no o conseguimos fazer.

    Mas no mosteiro o que fazemos levantarmo-nos de manh, fazer os cnticos,meditar, sentar, limpar o mosteiro, preparar a comida, sentar, levantar, andar, trabalhar, o que quer que seja, simplesmente fazemos aquilo que surge para fazer, uma coisa decada vez. Ento, estar com as coisas como elas so desapego, isso que traz paz ealvio. A vida muda e podemos observ-la a mudar, podemo-nos adaptar mudana domundo dos sentidos, qualquer que seja. Quer seja agradvel ou desconfortvel, podemossempre aguentar e colaborar com a vida, acontea o que acontecer. Se realizarmos averdade, realizamos a paz interior.

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    Amor Incondicional (mett)

    Em ingls a palavra love (amor) refere-se a algo de que gostamos. Por exemplo Ilove sticky rice*, I love sweet mango. Na verdade quer dizer que gostamos dessas

    coisas. Gostar estar apegado a algo como por exemplo dada comida que apreciamosou adoramos. No a amamos.Mett significa amar o inimigo. Se algum nos quer matare dizemos Gosto desta pessoa, isso parece tolice! Mas podemos am-la, no sentido deque nos podemos abster de pensamentos desagradveis e de desejos de vingana, oumesmo de qualquer desejo de a magoar ou aniquilar. Mesmo que no gostemos dosinimigospessoas miserveis, vilesainda assim podemos ser amorosos, generosos ecaridosos para com eles. Imaginemos que um bbado imundo, nojento, feio emalcheiroso vinha a esta sala. Se, apesar de no haver nada nele que nos atrasse,dissssemos Gosto deste homem, seria ridculo. Mas podemos am-lo, no ficarmos

    imersos na averso, no sermos apanhados nas reaces perante esta desagradvelsituao. Isso o que queremos dizer com mett.

    Por vezes existem coisas que no gostamos acerca de ns prprios, mas mett significano ficarmos agarrados aos nossos sentimentos, problemas, atitudes e pensamentos damente. Isso torna-se numa prtica imediata de se ser muito consciente, atento. Serconsciente significa ter mett em relao ao medo na vossa mente, ou ao dio, ou aocime.Mett significa no criar problemas acerca das condies da existncia, permitirque estas se desvaneam, cessem. Por exemplo, quando o medo vem ao de cima podemter mett pelo medo, no sentido em que no criam averso ao medo. Podem

    simplesmente aceitar a sua presena permitindo, dessa forma, que este cesse. Podemtambm minimizar o medo reconhecendo que o mesmo tipo de medo que todas aspessoas tm e at mesmo os animais. No o meu medo, no um medo pessoal, ummedo impessoal. Comeamos a ter compaixo pelos outros seres quando percebemos osofrimento implicado na reaco ao medo em nossas prprias vidas a dor, porexemplo a dor fsica que tm quando algum vos d um pontap. Este tipo de dor exactamente o mesmo que um co sente quando pontapeado. Por isso podem sentirmett pela dor, no sentido da gentileza e pacincia que no permanecer em averso.Podemos trabalhar com mett internamente, com todos os nossos problemas

    emocionais. Se pensarem Quero me ver livre disto, isto terrvel isso uma falta demett por vs prprios, no ? Reconheam o desejo de se verem livres de. No sedeixem prender na vossa averso s condies emocionais existentes. No precisam defingir que aprovam os vossos erros. Com certeza no pensam Gosto dos meus erros.Algumas pessoas so tontas o suficiente para dizer As minhas falhas fazem de mim umser interessante. Tenho uma personalidade fascinante devido s minhas fraquezas.

    *sticky rice: arroz pegajoso consiste num tipo de arroz glutinoso que aps cozinhado torna-setranslcido e pegajoso. Este um prato bsico do dia-a-dia das populaes do norte e nordeste tailands,sendo tradicionalmente comido mo.

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    Mett no se condicionarem de forma a acreditarem que gostam de algo do qual nogostam de todo; simplesmente no viver em averso. fcil sentir mett por algo quegostamoscrianas pequenas e bonitas, pessoas com bom ar, pessoas agradveis e combons modos, cezinhos amorosos, flores maravilhosas podemos sentir mett por nsprprios quando nos sentimos bem: Agora sinto-me feliz comigo prprio. Quando ascoisas correm bem fcil sermos amveis para com aquilo que bom, bonito emaravilhoso. Nessa altura podemos ficar perdidos. Mett no apenas boas intenes,bons sentimentos ou pensamentos elevados; tambm algo muito prtico.

    Se formos muito idealistas e odiarmos algum, sentimos Eu no devia odiar ningum. Os Budistas deveriam ter mett por todos os seres vivos. Eu deveria amar toda a gente.Tudo isso surge de um idealismo impraticvel. Devem ter mett por essa averso quesentem, pela pequenez da mente, pelo cime, pela inveja. Isto significa co-existirpacificamente, no criar problemas, no tornar as coisas difceis ou criar problemas a

    partir de coisas que surgem na vida, nos vossos corpos e mentes.Em Londres costumava ficar muito aborrecido quando viajava no metropolitano.

    Costumava odiar aquelas estaes de metro horrorosas com posters publicitriosrepelentes e as enormes multides de pessoas naqueles comboios horrveis edeprimentes, que produziam um tremendo rudo ao longo dos tneis. Costumava sentiruma total falta de mett (pacincia-amabilidade). Costumava viver na averso a tudoisso quando decidi fazer da minha prtica uma meditao paciente/amvel quandoviajava no Metropolitano de Londres. Ento passei realmente a desfrutar ao invs deviver em ressentimento. Comecei a sentir-me amvel para com as pessoas. A averso e

    o queixume desapareceram completamente.

    Quando sentirem averso em relao a algum reparem na tendncia que temos paraadicionar algo: Ele fez isto e aquilo e ele assim e no deveria de ser. E quandorealmente gostamos de algum Ele consegue fazer isto e consegue fazer aquilo. Ele

    bom e generoso. Mas se algum diz Aquela pessoa mesmo m! sentimo-noszangados. Se odiarem algum e outra pessoa fala bem da primeira, sentem-se zangados.No querem ouvir o quanto o inimigo bom. Quando esto cheios de dio noconseguem imaginar que algum que odeiam possa ter qualidades virtuosas e mesmoque tenham, vocs nunca conseguem se lembrar de nenhuma. Apenas se lembram de

    tudo o que mau. Quando gostam de algum at mesmo as suas falhas podem seradorveis - pequenas falhas que no fazem mal algum.

    Reconheam isto na vossa prpria experincia; observem a fora do gostar e do nogostar. Bondade paciente, mett, um instrumento muito til e efectivo para lidar comtodas as pequenas trivialidades que a mente cria volta das experincias desagradveis.

    Mett tambm um mtodo muito til para quem tem mentes muito crticas ediscriminativas. S conseguem ver os defeitos em tudo, mas nunca olham para si

    prprios, apenas vm o que est l fora.

    Nos dias de hoje bastante comum as pessoas queixarem-se constantemente do tempoou do governo. A arrogncia pessoal d lugar a estes comentrios bastante antipticos

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    acerca de tudo, ou a comearem a falar acerca de algum que no est presente,dilacerando-o de forma bastante acutilante e objectiva. So to analticos que sabemexactamente o que aquela pessoa precisa, o que deveria ou no fazer e porque desta oudaquela maneira. impressionante ter uma mente crtica to aguada e saber o que suposto os outros fazerem. Claro que o que esto a dizer que Na verdade sou muitomelhor que eles.

    No tm de pr a mo frente dos olhos para no ver as falhas e os defeitos em tudo.Tm apenas de coexistir pacificamente com eles, sem exigir que sejam de outramaneira. Mett por vezes significa no tolerar o que est de errado convosco e com osoutros no significa que no reparam nessas coisas, significa no criar problemasacerca delas. Esse tipo de indulgncia acaba ao serem ternos e pacientes coexistindopacificamente.

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    Plena Ateno no Trivial

    Durante a prxima hora vamos praticar caminhando, usando o movimento do andarcomo objecto de concentrao, colocando a nossa ateno no movimento dos ps, e na

    presso destes ao tocarem o cho. Tambm podem usar o mantra Buddho Budpara a direita e -dho para a esquerda, usando o espao de tempo do caminho dojongrom. Tentem estar inteiros nisso, plenamente atentos na sensao do andar desde oprincpio do caminho do jongrom at ao fim. Usem um ritmo normal; depois podemabrandar ou acelerar. Desenvolvam um ritmo normal, pois a nossa meditao move-semais ao redor de coisas simples do que das extraordinrias. Usamos a respiraonormal, no uma especial tcnica de respirao; usamos a postura de sentados e no a denos apoiarmos na nossa cabea; andamos normalmente ao invs de correr, marchar ouandar metodicamente devagar a um ritmo naturalmente descontrado. Estamos a

    praticar com o que h de mais comum porque tomamos essas coisas como certas. Masagora colocamos a nossa ateno em tudo o que tommos como garantido e no qualnunca reparmos, tal como a mente e o corpo. At mdicos licenciados em fisiologia eanatomia no esto na realidade com o seu corpo. Eles dormem com os seus corpos,nascem com os seus corpos, envelhecem, tm de viver com eles, aliment-los, exercit-los e ainda assim eles iro falar-vos acerca do fgado como estando num quadro. maisfcil olhar para um fgado num quadro do que sermos conscientes do nosso prpriofgado, no ? Ento olhamos para o mundo como se de alguma forma no fizssemosparte dele e aquilo que mais comum, que mais vulgar, deixamos passar, pois

    estamos sempre a olhar para tudo o que extraordinrio.A televiso algo extraordinrio. Aparecem todo o tipo de coisas fantsticas,

    romnticas e cheias de aventura na televiso. uma coisa miraculosa e portanto algoem que muito fcil concentrarmo-nos. Podemos ficar hipnotizados pela TV. Equando o corpo se torna extraordinrio, digamos por exemplo, quando fica muito doenteou doloroso, ou quando sentimos xtase ou sentimentos maravilhosos, tambmreparamos nisso! Mas a simples presso do p direito no cho, o simples movimento darespirao, o mero sentir do corpo sentado no seu assento quando no realiza nenhumtipo de sensao extrema estas so coisas para as quais estamos agora a acordar.

    Estamos a pr a nossa ateno na forma como as coisas so na vida comum.

    Quando a vida se torna extrema, ou extraordinria, apercebemo-nos que somoscapazes de colaborar bastante bem com ela. Pacifistas e objectores de conscincia sofrequentemente abordados com a famosa questo Se no acreditas em violncia o quefarias se um manaco atacasse a tua me? Isso algo com que a maior parte de nsnunca teve de se preocupar muito! No o tipo de ocorrncia diria comum na nossavida. Mas se tal situao extrema surgisse, tenho a certeza de que faramos algoapropriado. At mesmo algum muito doido consegue ser consciente em situaesextremas. Mas na vida do dia-a-dia enquanto no acontece nada de extremo, quando

    estamos apenas aqui sentados, podemos ser completamente loucos, no ? A disciplinado Ptimokkha* diz que ns, monges, no devemos magoar ningum. Ento fico aqui

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    sentado a pensar no que faria se um manaco atacasse a minha me?! Acabo por criarum enorme problema moral nesta situao to vulgar, em que estou aqui sentado, semsequer a minha me estar presente. Em todos estes anos nunca houve a menor ameaa vida da minha me por parte de manacos (mas da parte de condutores californianoshouve!). s grandes questes morais podemos responder facilmente de acordo com otempo e lugar se, no presente, estivermos conscientes deste tempo e deste lugar.

    Estamos assim a dar ateno trivialidade da nossa condio humana: a respirao docorpo, o andar desde uma ponta do caminho de meditao at outra, os sentimentos deprazer e dor. medida que os dias de retiro vo passando, examinamos absolutamentetudo, observamos e reconhecemos tudo tal como . Esta a nossa prtica de vipassanconhecer as coisas como so e no segundo alguma teoria ou pressuposio acercadelas.

    *Ptimokkha: o cdigo monstico composto por 227 regras e observncias que governam a conduta dosmonges Budistas da tradio Theravada.

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    Ouvir o Pensamento

    Quando abrimos a nossa mente, ou abrirmos mo, focamos a ateno num nico pontoao observarmos, ao sermos a testemunha silenciosa que est consciente do que surge edo que passa. Com a vipassan (meditao de percepo), usamos as trscaractersticas, anicca (impermanncia), dukkha (insatisfao) e anatt (no-eu) paraobservar fenmenos fsicos e mentais. Estamos a libertar a mente da represso cega, deforma a que, se ficarmos obcecados com quaisquer pensamentos comuns, medos,dvidas, preocupaes ou iras, j no precisamos de os analisar. No temos de descobrirporque que os temos mas apenas de os trazer por completo nossa conscincia.

    Se estiverem verdadeiramente assustados com algo, estejam conscientementeassustados. No fujam mas reparem nessa tendncia de se tentarem ver livres disso.Tragam completamente conscincia o objecto do vosso medo. Pensemdeliberadamente nisso, e escutem os vossos pensamentos. Isto no para analisarmosmas sim para levarmos o medo ao seu absurdo, onde se torna to ridculo que podemosnos comear a rir dele. Escutem o desejo, a loucura do Quero isto, quero aquilo, tenhode ter, no sei o que farei se no tiver isto, e quero aquilo Por vezes a mente podeestar somente a gritar Eu quero isto! e ns conseguimos ouvir isso.

    Estive a ler sobre confrontos, quando gritamos uns aos outros e dizemos todas ascoisas que esto reprimidas na nossa mente: isto um tipo de catarse mas sem umaatitude consciente. Falta-lhe a capacidade de observar esse acto de gritar como umacondio, ao invs de simplesmente deixarmo-nos ir na onda e dizer tudo o quepensamos. Aqui no existe uma quietude mental, disposta a suportar os mais horrveispensamentos e com a qual j no acreditaramos que esses so problemas pessoais.Poderamos ento levar, mentalmente, o medo e a ira a uma posio absurda, onde elesso vistos como uma simples progresso natural do pensamento. Estaramos a pensardeliberadamente em tudo quanto temos medo de pensar, no cegamente, masobservando e escutando tudo como condies da mente e no como problemas ou falhas

    pessoais.

    Assim, nesta prtica, comeamos a deixar as coisas seguirem o seu curso. No tm deandar s voltas procura de algo especfico, mas quando continuam a surgirpensamentos obsessivos que vos aborrecem e vocs esto a tentar-se livrar deles, entotragam-nos ainda mais luz da conscincia. Pensem deliberadamente neles em voz altae oiam, como se estivessem a ouvir algum a falar do outro lado da cerca, como queuma velha varina: Fizemos isto e fizemos aquilo, e depois fizemos isto e depoisfizemos aquilo e a velha senhora naturalmente continua a divagar! Agora, comoprtica, tentem ouvir a mente como se fosse a voz dessa senhora, ao invs de a julgaremdizendo Oh, no! Espero que isto no seja eu, esta no a minha verdadeira natureza

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    ou tentando cal-la dizendo Eh, velhota, desaparece, vai-te embora! Todos temosessa tendncia; at mesmo eu a tenho. somente uma condio da natureza, no ? No uma pessoa. Ento esta tendncia inoportuna que temos Eu trabalho tanto, nuncaningum me agradece uma condio, no uma pessoa. Por vezes, quando estamosrabugentos, ningum faz nada como deve de ser mesmo quando fazem tudo bem,esto sempre a fazer mal. Essa outra condio da mente, no uma pessoa. Arabugice, o estado rabugento da mente conhecido como uma condio: aniccatransitrio; dukkhano satisfatrio; anatt no uma pessoa. Existe o medo doque que os outros pensaro de ns se chegarmos tarde: adormecemos, entramos ecomeamos a preocupar-nos sobre o que todos esto a pensar de ns por termoschegado tardeEles pensam que sou preguioso. A preocupao com o que os outrospensam uma condio da mente. Pode tambm acontecer que estamos sempre aqui ahoras e quando algum chega tarde ns pensamos Chegam sempre tarde; ser quenunca conseguem chegar a horas?! Tambm isso outra condio da mente.

    Estou a trazer as coisas triviais para um nvel completamente consciente, todas aquelascoisas que simplesmente pomos de lado justamente por serem triviais. No queremosnos preocupar com as trivialidades da vida! Mas quando no nos importamos, tudo issofica reprimido e tornando-se num problema. Comeamos a sentir ansiedade, a sentiraverso a ns prprios ou aos outros, ou a ficar deprimidos; tudo isso vem derecusarmo-nos a permitir que as condies, trivialidades ou coisas horrveis, se tornemconscientes.

    Surge assim o estado mental da dvida, que nunca tem a certeza do que fazer: surge o

    medo, a incerteza e a hesitao. Tragam deliberadamente ao de cima o estado deincerteza e descontraiam nesse ponto em que a mente se estabelece quando no estamosagarrados a nada em particular. O que devo fazer, devo ir ou devo ficar, devo fazer istoou aquilo, devo fazer npnasati ou vipassan? Observem isso. Coloquem-sequestes que no podem ser respondidas, como Quem sou eu? Reparem no espao detempo vazio antecede o pensamento. Estejam alerta, fechem os olhos e imediatamenteantes de pensarem quem, observem: a mente est bastante vazia, no est? Segue-sequem sou eu? e de seguida um espao depois da interrogao. Esse pensamento vai evem do nada, do vazio, no ? Quando estamos pura e simplesmente emaranhados no

    processo pensante habitual no conseguimos observar o pensamento a surgir, ouconseguimos? No conseguimos ver, somente conseguimos reparar no pensamentodepois de o termos comeado a pensar. Ento comecem a pensar deliberadamente deforma a apanharem o comeo do pensamento, antes de na verdade comearem a pens-lo. Agarrem deliberadamente empensamentos como Quem o Buddha?. Pensem issointencionalmente e vero o comeo, a formao e o fim do pensamento, e tambm oespao que o envolve. Esto a observar os pensamentos e os conceitos em perspectivaao invs de apenas lhes reagirem.

    Imaginem que esto zangados com algum. Pensam Isso o que ele disse, ele disse

    isto e aquilo e fez isto e no fez aquilo como deve ser, fez tudo mal; ele to egosta e ainda me lembro quando ele fez aquilo quele, e depois Uma coisa leva outra,

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    no ? So naturalmente apanhados nesta dinmica em que uma coisa leva outra, deuma forma contnua, motivada pela averso. Em vez de serem apanhados nessacorrente, ou torrente, de pensamentos e conceitos associados, pensem deliberadamente:Ele a pessoa mais egosta que j conheci. E o trmino de seguida, o vazio. Ele umovo podre, um rato sujo, ele fez isto e aquilo. Podemos observar e at se tornaengraado, no ? Quando fui a primeira vez para Wat Pah Pong costumava ter imensodio e averso sempre a virem ao de cima. Por vezes sentia-me muito frustrado por nosaber o que realmente se passava e no me queria conformar tanto como ali era suposto.At deitava fumo pelas orelhas. Ajahn Chah l continuava ele podia dar duas horas depalestras em Laoenquanto isso eu estava com dores terrveis nos joelhos e ento tinhapensamentos do gnero: Porque que no paras de falar? Eu pensava que Dhamma erasimples, porque que ele tem de levar duas horas para dizer alguma coisa? E tornava-me muito crtico para com todos. Comecei ento a reflectir nisto e a ouvir-me a mimprprio a ficar zangado, a ser crtico, a ser malicioso, com ressentimentos Eu no

    quero isto, no quero aquilo, no gosto disto, no vejo porque que tenho de me sentaraqui. No quero ser incomodado com estas coisas tolas. Eu no sei e por a fora.Ao mesmo tempo pensava: Quem diz isto uma pessoa gentil? assim que tu queresser, essa coisa que est sempre a queixar-se e a criticar, a procurar defeitos; esse o tipode pessoa que queres ser? No! Eu no quero ser assim.

    Mas tive de o tornar completamente consciente para o poder realmente ver e noapenas acreditar. Senti-me como que justiceiro comigo prprio e quando nos sentimos

    justiceiros e indignados e achamos que os outros esto errados, podemos facilmenteacreditar neste tipo de pensamentos: No vejo nenhuma necessidade para este tipo decoisas; na realidade, o Buddha disse o Buddha nunca iria permitir isto, o Buddha;Eu sei muito acerca de budismo! Tragam-no ao de cima conscientemente, de maneira apoderem ver, tornem-no absurdo e ento tero uma perspectiva sobre o assunto, o quetorna tudo bastante interessante. Podemos ver o que a comdia! Levamo-nos muito asrioEu sou uma pessoa to importante, a minha vida to importante que devo sersempre bastante srio acerca dela. Os meus problemas so to importantes, tosobejamente importantes. Tenho de passar muito tempo com os meus problemas poiseles so to importantes. Achamo-nos sempre muito importantes. Portanto pensem,deliberadamente pensem: Eu sou uma pessoa muito importante e os meus problemas

    so muito importantes e srios. Quando estamos a pensar isso parece engraado, soameio tolo, pois na verdade apercebemo-nos que no somos assim to importantes nenhum de ns o . E os problemas que criamos acerca da vida so coisas triviais.Algumas pessoas podem arruinar as suas vidas por criarem problemas sem fim elevarem-nos todos to seriamente.

    Se pensarem que so pessoas muito srias e importantes no querero coisas triviais outolas. Se quiserem ser boas pessoas, pessoas santas, ento as condies malvolas soalgo que tm de suprimir da vossa conscincia. Se quiserem ser um tipo de ser amorosoe generoso, ento qualquer tipo de maldade ou cime ou mesquinharia algo que tm

    de aniquilar ou de reprimir na vossa mente. O que quer que seja que, nas vossas vidas,

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    mais tenham medo de ser, pensem-no em voz alta e observem. Podem fazer confisses:Eu quero ser um tirano! Eu quero ser um traficante de herona!; Eu quero ser ummembro da Mfia!; Eu quero O que quer que seja. J no estamos preocupadoscom a qualidade disso, mas apenas com o facto de isso ser uma condio impermanente,insatisfatria, pois no contem nada que nos possa realmente satisfazer. Vem e vai e no-eu.

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    Os obstculos e a sua cessao

    Quando ouvimos interiormente comeamos a reconhecer as sussurrantes vozes da culpa,dos remorsos e desejos, dos cimes e do medo, da luxria e da gula. Por vezes pode-se

    ouvir o que a concupiscncia nos diz: Eu quero, eu tenho de ter, eu tenho de ter, euquero, quero! Por vezes nem sequer tem qualquer objecto definido. Mas no podemsentir essa cobia sem um objecto e por isso depressa encontram um. Podem ouvir odesejo de obter algo Eu quero algo, eu quero algo! Tenho de ter algo, eu quero se escutarem a mente. Normalmente encontramos um objecto para a luxria, tal como osexo; ou podemos passar o nosso tempo a fantasiar.

    A sensualidade pode tomar a forma de procurar algo para comer, ou algo no qual nospossamos absorver, tornarmo-nos algo, unir-nos com algo. Est sempre procura,

    sempre em busca de algo. Pode ser um objecto atraente permitido a monsticos, talcomo um bonito robe ou uma tigela para oferendas ou qualquer comida deliciosa. Nestecaso podemos observar a tendncia para querer, tocar, tentar de alguma forma obter,possuir, tornar nosso, consumir. E isso a cobia, uma fora da natureza que temos dereconhecer e observar, no a condenando, dizendo simplesmente Eu sou uma pessoaterrvel porque tenho cobia! pois isso reforar o ego, no ? Como se no fossesuposto ter cobia, como se houve-se algum ser humano que no experienciasse odesejo por algo!

    Isto so condies da natureza que devemos reconhecer e observar, no as condenando

    mas sim compreendendo. Podemos assim conhecer, dentro nossa mente, o movimentoda concupiscncia, da cobia, do buscar algo. Podem tambm testemunhar o desejo dese quererem livrar de algo que tm, de alguma situao ou mesmo da prpria dor.Quero-me ver livre da dor que tenho, quero-me ver livre das minhas fraquezas, quero-me ver livre desta letargia, quero-me ver livre da minha agitao, da minhaconcupiscncia. Eu quero-me ver livre de tudo o que me chateia. Porque que Deuscriou os mosquitos? Quero-me ver livre das pragas.

    O desejo sensual o primeiro dos obstculos (nvarana). Averso o segundo anossa mente assolada com o no querer, com pequenas irritaes e ressentimentos e

    ento a tentamos aniquil-los. Isso um obstculo para a vossa viso mental, umentrave. No estou a dizer que deviam tentar se livrar desse obstculo isso seriaaverso mas sim conhec-lo, conhecer a sua fora, compreend-lo tal como oexperienciam. S ento reconhecem o desejo de se quererem ver livres de coisas em vsprprios, o desejo de se verem livres de coisas vossa volta, o desejo de no estaremaqui, o desejo de no estarem vivos, o desejo de no mais existirem. por isso quegostam de dormir, no ? A podem no existir durante um bocado. Na conscincia dosono no existimos pois j no existe o sentimento de se estar vivo. Isso aniquilao. por isso que algumas pessoas gostam de dormir muito pois viver demasiado

    doloroso para elas, demasiado enfadonho, demasiado desagradvel. Ficam deprimidas,

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    cheias de dvidas e desesperadas e procuram um escape dormindo, tentando aniquilaros problemas, forando-os a sair da sua conscincia.

    O terceiro obstculo a sonolncia, a letargia, o entorpecimento, a preguia, o sono, amoleza, a lassido normalmente reagimos a isto com averso. Mas tambm isto pode

    ser compreendido. A lassido pode ser compreendida o peso do corpo e da mente,lento e trpego movimento. Testemunhem a averso que sentem a isso, o quererem-selivrar disso. Observam a sensao de lassido no corpo e na mente. At mesmo oconhecimento da lassido muda, insatisfatrio, no-eu (anicca , dukkha, anatt ).

    A agitao o oposto da lassido, sendo o quarto obstculo. No ficamos moles nemsonolentos mas sim irrequietos, nervosos, ansiosos e tensos. De novo, pode no ter umobjecto especfico. Ao contrrio da sensao de querer dormir, a agitao um estadomais obsessivo. Quer-se fazer algo, correr para aqui fazer istofazer aquilofalar, irde um lado para o outro, correr de um lado para o outro. E se tiverem de se sentarparados por um pouco quando esto irrequietos, sentem-se presos, enjaulados. Spensam em saltar, fugir dali para fora, fazer algo. Tambm podem testemunhar isso,especialmente quando esto contidos numa forma na qual no podem seguir a vossaagitao. Os robes que os bhikkhus vestem no so conducentes a subir s rvores e abaloiar nos troncos. No podemos agir de acordo com esta tendncia galopante damente e por isso temos de observ-la.

    Dvida o quinto obstculo. Pode ser que, por vezes, as nossas dvidas pareammuito importantes e que gostemos de lhes dar muita ateno. Deixamo-nos iludir pela

    sua qualidade, pois elas parecem ser to substanciais Sim algumas dvidas sotriviais, mas esta uma Dvida importante. Tenho de saber a resposta. Tenho de ter acerteza. Tenho de saber definitivamente, devo fazer isto ou devo fazer aquilo! Estou afazer bem? Deverei ir ou deverei ficar um pouco mais? Estou a desperdiar o meutempo? Tenho estado a desperdiar a minha vida? O Budismo o caminho certo ouno? Talvez no seja a religio certa! Tudo isto dvida. Podemos passar o resto davida a preocupar-nos se devamos fazer isto ou aquilo. Mas se h algo que podemossaber que a dvida uma condio da mente. Por vezes isso pode ser muito subtil eilusrio. Na nossa posio, como aquele que sabe, sabemos que dvida dvida, querseja importante ou trivial, apenas dvida e pronto. Deverei ficar aqui ou deverei ir a

    algum outro stio? dvida. Deverei lavar as minhas roupas hoje ou amanh? duvida. Esta no uma dvida muito importante, mas tambm existem as importantesJ atingi a Entrada na Corrente? De qualquer forma, o que a Entrada na Corrente?Ajahn Sumedho um Arahant (ser iluminado)? Ser que existe algum Arahantpresentemente?e entretantopessoas de outras religies vm e dizem A vossa religioest errada, a nossa que est certa!. E nspensamos Se calhar eles tm razo! Talveza nossa esteja errada.. Tudo o que podemos saber que a existe a dvida. Isso ser asabedoria, saber que podemos saber, saber que no sabemos. Mesmo quando estoignorantes de alguma coisa, se estiverem conscientes do facto de que no sabem, ento

    essa conscincia conhecimento.

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    Isto ser o saber, estarmos cientes de que nos possvel saber. Estas cincodificuldades/obstculos so vossos professores pois no so os inspiradores e radiantesgurus que aparecem nas imagens dos livros. Elas podem ser bastante triviais,mesquinhas, tolas, aborrecidas e obsessivas. Esto sempre a pressionar-nos, a empurrar-nos e a deitar-nos abaixo at lhes darmos a devida ateno e compreenso, at j noserem um problema. por isso que temos de ser muito pacientes; temos que ter toda apacincia do mundo e humildade para aprender com esses cinco professores.

    E o que aprendemos? Que estas so apenas condies na mente; surgem e cessam, soinsatisfatrias e so no-eu. Por vezes existem mensagens muito importantes na vidade cada um. H a tendncia para se acreditar nessas mensagens, mas o que podemossaber de certeza que elas so condies em mudana e se, pacientemente,prosseguirmos, as coisas mudam automaticamente, por si s. Temos ento a abertura eclareza mentais de agir espontaneamente ao invs de apenas reagirmos s condies.

    Com pura ateno, com plena conscincia, as coisas processam-se por si s. No tm dese ver livres delas, pois tudo o que comea, acaba. No h nada do qual se tenham delivrar, tm apenas de ser pacientes com as situaes e permitir que as coisas tomem oseu rumo natural em direco cessao.

    Quando so pacientes, permitindo que as coisas cessem, ento comeam a conhecer acessaosilncio, vazio, clarezaa mente torna-se clara, tranquila. A mente continuaa ser vibrante e no inconsciente, reprimida ou dormente; e podem ouvir o seu silncio.

    Permitir que a cessao ocorra significa que temos de ser muito atenciosos, amveis,

    pacientes e humildes, sem tomar partidos, nem do bom, nem do mau, nem do prazer,nem da dor. O reconhecimento sereno permite que as coisas mudem de acordo com asua natureza, sem interferncias. ento que aprendemos a deixar de procurarabsorvermo-nos nos objectos dos sentidos. Encontramos a nossa paz no vazio da mente,na sua clareza, no seu silncio.

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    Forma e vazio

    Quando a mente est tranquila, se escutarem podem ouvir aquele som vibrante na

    vossa menteo som do silncio. O que ? um som dentro ouvido ou um som quevem de fora? o som da mente ou o som do sistema nervoso, ou o qu? O que quer queseja est l sempre e pode ser usado na meditao como objecto de foco.

    Reconhecendo que tudo o que surge, cessa, comeamos a olhar para o que no surgenem cessa, para o que est sempre presente. Se comearem a pensar acerca desse som, adar-lhe um nome ou proclamarem ter atingido algo a partir dele, ento bvio que oesto a usar de forma errada. Ele simplesmente um padro ao qual se referem quandoatingem o limite da mente, o fim da mente, o ponto at onde a conseguem observar.Podem ento comear a observar a partir dessa posio. Podem pensar e ainda assim

    ouvir o som (quando por exemplo pensam deliberadamente), mas assim que se perdemnum pensamento, ento esquecem-no e j no o conseguem ouvir. Se se perderem nosvossos pensamentos, a partir do momento em que se aperceberem que esto de novo apensar, voltem-se para esse som e escutem-no durante um longo perodo de tempo.Enquanto anteriormente seriam levados pelas emoes e obsesses ou pelasdificuldades que surgiam, agora podem praticar reflectindo gentil e pacientemente, nascondies particulares da mente como anicca, dukkha e anatt e ento deixar fluir,abrindo mo at mesmo dessas condies. um deixar ir subtil e suave e no umasbita e violenta rejeio de qualquer condio. Assim a atitude, a correcta compreenso

    mais importante que qualquer outra coisa. No faam nada a partir do som do silncio.As pessoas ficam excitadas a pensar que alcanaram ou descobriram algo, mas isso em si mesmo outra condio que se cria volta do silncio. Esta uma prtica muitoneutra, nada excitante; usem-na gentil e habilmente para abrir mo, ao invs de seagarrarem ideia de que obtiveram algo! Se existe alguma coisa que nos bloqueia ameditao a ideia de que obtivemos alguma coisa a partir dela!

    Agora podem reflectir nas condies do corpo e da mente e concentrarem-se nelas.Podem percorrer todo o corpo e reconhecer sensaes tais como as vibraes nas mosou nos ps, ou ainda concentrarem-se em qualquer ponto do corpo. Sintam a sensao

    da lngua na boca, tocando no palato ou do lbio superior tocando no inferior, ousimplesmente tragam conscincia a sensao da boca molhada, ou o peso da roupa nocorpoaquele tipo de sensaes subtis, nas quais no nos preocupamos em reparar. Aoreflectirem nessas tnues sensaes fsicas, concentrem-se nelas e o vosso corpo irrelaxar. O corpo humano gosta que lhe dem ateno. Ele gosta que se concentrem nelede uma maneira pacfica e amvel. Se no o tiverem em considerao e o odiarem, eletornar-se- mesmo bastante insuportvel. Lembremo-nos que temos de viver com estaestrutura para o resto das nossas vidas, portanto melhor que aprendamos como vivernela com uma boa atitude. Dizemos: Ah, o corpo no importa, apenas algodesagradvel que envelhece, adoece e morre. O corpo no interessa, a mente queconta. Essa uma atitude bastante comum entre os Budistas! Mas, na verdade,

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    preciso pacincia para nos concentrarmos no corpo, sem ser por vaidade. A vaidade um mau uso do corpo humano mas uma contemplao consciente do corpo bastantetil. No enfatiza a noo do ego e consiste num simples acto de boa vontade econsiderao por um corpo vivoo qual, alis, no somos ns.

    Neste momento a vossa meditao est focada nos cinco khandhas* e no vazio damente. Investiguem-nos at compreenderem totalmente que tudo o que surge cessa e no-ser. Nessa altura j no se agarraro a nada como sendo vs e ficam livres dessedesejo de se tentarem conhecer enquanto qualidade ou substncia. Isto a libertao donascimento e da morte.

    O caminho da sabedoria no o de desenvolver a concentrao at se entrar numestado de transe, ficando alterado e afastado das coisas. Tm de ser muito honestos noque respeita vossa inteno. Estamos a meditar para fugir das coisas? Estamos a tentarentrar num estado em que podemos suprimir todos os pensamentos? Esta prtica desabedoria uma forma muito suave na qual se deixa surgir at mesmo os mais horrveispensamentos, deixando-os ir de seguida. Temos uma sada de emergncia; como umavlvula onde podemos soltar o vapor quando existe demasiada presso. Normalmente,quando sonham muito durante o sono, conseguem descomprimir bastante. Mas da novem nenhuma sabedoria, ou vem? ser-se simplesmente um animal irracional:desenvolvem o hbito de fazer algo at exausto e consequente colapso, erguendo-sede seguida para ento fazerem algo de novo e colapsar novamente. Mas este caminho uma investigao completa e uma compreenso das limitaes da condio mortal docorpo e da mente. Mas agora esto a desenvolver a habilidade de sair do condicionado e

    de se libertarem da vossa identificao com o que mortal. Esto a irromper dessailuso de que so seres mortais mas tambm no estou a dizer que so criaturasimortais, porque se no iriam tentar-se agarrar a isso! A minha verdadeira natureza uma s com a Verdade ltima. A Verdade absoluta. Sou um com o Senhor. A minhareal natureza a imortalidade, a eternidade intemporal da Graa. Mas reparemos que oBuddha absteve-se de usar frases poticas inspiradoras, no que elas estivessem erradas,mas porque nos apegaramos a elas. Iramos nos estabelecer nessa identificao com arealidade ltima, com Deus ou com a graa eterna do Reino da Imortalidade, e por aadiante. Fica-se com os olhos brilhantes quando se dizem coisas assim. Mas muito

    mais til observar essa tendncia de querer atribuir um nome ou de conceber o que inconcebvel, de falar disso a outra pessoa, ou de o descrever pura e simplesmente parasentir que alcanmos algo. mais importante observar essa tendncia do que agirlevados por ela. No que no se tenha realizado nada, mas necessrio ser-se bastantecuidadoso e vigilante para no haver apego essa realizao, pois se isso acontecer slevar, claramente, de novo ao desespero.

    *khandas: as cinco categorias nas quais o Buddha sumarizou o ser humano existencial, i.e. o corpo(rpa), sentimentos (vedan), percepes (sa), as formaes mentais (sakhr) e a conscincia

    sensorial (via). Em termos simples: o corpo e a mente.

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    Se forem levados pelos pensamentos, assim que se aperceberem disso, parem. Nofiquem s voltas com o assunto sentindo-se culpados ou ficando desencorajados, masapenas parem. Acalmem-se e deixem a coisa ir, soltem-na. Reparem como as pessoas

    religiosas tm realizaes espirituais ficando de seguidacom um forte brilho no olhar.Born-again Christhians* (Cristos Renascidos) esto radiantes com este fervor.Tambm muito impressionante! Tenho de admitir, muito impressionante ver pessoasto radiantes. Mas no Budismo esse estado chamado de saa-vipallsaloucurada meditao. Quando um bom professor v que estamos nesse estado, pe-nos numabrigo, l longe, nos bosques e diz-nos para no nos chegarmos perto de ningum!Lembro-me de ter ficado assim em Nong Khai, no meu primeiro ano, antes de ir ter comAjahn Chah. Pensei que estava completamente iluminado, simplesmente ali sentado naminha cabana. Sabia tudo, compreendia tudo. Estava simplesmente to radiante e

    mas eu no tinha ningum com quem falar. No sabia falar tailands e por isso eu nopodia ir incomodar os monges tailandeses. Mas acontece que o Cnsul Britnico doVietname um dia apareceu e algum o trouxe minha cabana e eu realmente atirei-lhe com tudo para cima, e a dobrar! Ele ali se sentou, completamente espantado e, sendoIngls, ele era muito, muito educado e de cada vez que se levantava para se ir embora euno o deixava. Eu no conseguia parar, era como as cataratas do Nigara, esse enormepoder a vir para fora e no havia maneira de eu o parar por mim prprio. Finalmente elefoi-se embora, conseguiu de alguma forma escapar e nunca mais o vi. Porque ser?!

    Quando passamos por esse tipo de experincia importante reconhec-la. No nada de

    perigoso se soubermos o que . Temos de ser pacientes, no acreditarmos nem nosentregarmos a ela. Se repararmos, os monges budistas nunca andam por a a falar muitosobre qual o nvel de iluminao que possuem algo que simplesmente no paraser relatado. Quando as pessoas nos pedem para ensinar ns no ensinamos acerca danossa iluminao mas sim acerca das Quatro Nobres Verdades como caminho para ailuminao. Nos dias de hoje existe todo o tipo de pessoas que clamam ser iluminadasou seremBuddhasMaitreyas ou avatares, e todos tm grandes multides de seguidores.As pessoas querem muito acreditar nisso! Mas esta particular nfase do Buddha a dereconhecer as coisas como elas so, ao invs de acreditar no que as outras pessoas nos

    contam ou dizem. Observa e v: sabbe sakhr anicca todos os fenmenoscondicionados so impermanentes; sabbe dhamma anatt todas as coisas so no-ser.

    *Born again Christhian (Cristo Renascido) expresso inglesa que caracteriza um indivduo que,estando previamente ligado ao Cristianismo, reaviva a sua f de forma muito fervorosa, aps ter tidodeterminada experincia mstica, adquirindo por vezes um caracterstico e evidente brilho no olhar.

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    Vigilncia interior

    Agora vamos falar da prtica da plena ateno. Concentrao quando colocamos anossa ateno num objecto, mantemos a nossa concentrao nesse ponto (como por

    exemplo no tranquilizante ritmo da respirao), at nos tornarmos nele e a noo desujeito e objecto diminuir. A plena ateno, na meditao vipassan, a abertura damente. J no nos concentramos num s ponto, mas observamos interiormente ereflectimos nas condies que vo e vm e no silncio da mente vazia. Fazer istoimplica abrir mo de um objecto. No estamos presos a nada em particular mas apenasobservamos que tudo o que surge, cessa. Isto a meditao de percepo ouvipassan.

    Com aquilo que chamo ouvir interiormente, podem ouvir os barulhos que esto na

    vossa mente, o desejo, os medos, coisas que reprimiram e das quais nunca se permitiramser totalmente conscientes. Mas agora, mesmo que existam pensamentos obsessivos oumedos, emoes a virem ao de cima, tm de ter a fora de vontade de se permitir torn-los conscientes de forma a que possam deix-los ir, rumo sua prpria cessao. Se noexiste nada a ir ou a vir, podem simplesmente estar no vazio, no silncio da mente.Podem ouvir um som de alta frequncia na mente, um som que est l sempre e que no um som do ouvido. Podem voltar-se para ele quando abrirem mo das condies damente. Mas tm de ser honestos nas vossas intenes. Se se voltarem para o silncio, osilencioso som da mente, por terem averso s condies, isso ser novamente apenasde uma represso; no purificao.

    Se a vossa inteno no a correcta, mesmo que se concentrem no vazio, no iroobter um bom resultado, pois desencaminharam-se. No reflectiram sabiamente, nodeixaram nada fluir, apenas viraram as costas por averso, dizendo apenas No querover isso e deram meia volta. Esta uma prtica que requer pacincia, a pacincia deestar disposto a suportar o que parece ser insuportvel. um estado de vigilnciainterior olhando, ouvindo, at mesmo experienciando. Nesta prtica a correctacompreenso o ponto importante, mais do que o vazio ou a forma ou qualquer coisado gnero. A correcta compreenso surge da reflexo de que tudo o que surge, cessa;reflexo de que at mesmo o vazio no-ser. Se alegarmos que somos algum querealizou o vazio como se tivssemos alcanado algo, isso , por si s, uma intenoincorrecta, no ?

    Pensar que so algum que, a nvel pessoal, realizou ou alcanou alguma coisa algoque vem de uma noo de um eu. Por isso no alegamos coisa alguma. Se existe algodentro de vs que quer proclamar algo, observem isso como uma condio da mente.

    O som do silncio est sempre presente e portanto podem utiliz-lo como um guia, nocomo um fim em si prprio. S nesse caso que esta prtica de observao e de escutase torna muito til, ao invs de apenas reprimirem condies por lhes terem averso.Mas a, na realidade, o vazio bastante enfadonho. Estamos acostumados a ter mais

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    entretenimento. De qualquer forma, durante quanto tempo conseguem estar dias inteirosa meditar, conscientes de uma mente vazia? Reconheam que esta no uma prticapara se apegarem paz, ao silncio ou ao vazio como um fim em si mesmos, mas paraus-los como um meio engenhoso para serem o Saber e estarem alerta. Quando a menteest vazia podem observar continua a haver conscincia mas j no esto a procurarrenascer em nenhuma condio, pois no existe uma noo de eu implcita. O eusurge sempre com a busca de algo ou com o querer vermo-nos livres de algo.

    Ouam o eu a dizer: Quero alcanarsamdhi,Tenho de alcanar osjhnas. Isso oego a falar: Tenho de alcanar o primeirojhna e o segundojhna antes de conseguirfazer alguma coisa essa ideia de que se tem de fazer algo antes de. O que podemsaber quando lem os ensinamentos de diferentes professores? Podem saber quandoesto confusos, quando esto a duvidar, quando esto a sentir averso ou falta deconfiana. Podem saber que esto a ser o Saber, ao invs de tentarem decidir qual

    professor o certo.A prtica de mett significa usar de amvel ateno ao sermos capazes de suportar

    aquilo que julgamos ser insuportvel. Se tiverem uma mente obsessiva que no pra eque tagarela e resmunga, normalmente querem ver-se livres dela mas quanto maistentarem suprimi-la, pior . Por vezes a mente pra e pensamos Ah, consegui livrar-me,foi-se. E logo comea tudo de novo e pensamos Oh no! Pensava que j me tinhalivrado disto. Ento no importa quantas vezes vai e vem, ou o que quer que seja;aceitem o que est a acontecer. Dem um passo de cada vez. Quando estiveremdispostos a ter toda a pacincia do mundo para estarem presentes na condio existente,

    conseguem deix-la cessar. O resultado que da advm, comearem a experienciaralvio por perceberem que j no carregam coisas que costumavam carregar. De algumaforma, coisas que costumavam deixar-vos muito zangados, na verdade j no vosincomodam tanto, e isso surpreende-vos. Comeam a sentir-se vontade em situaesnas quais anteriormente nunca se tinham sentido confortveis, pois agora esto apermitir que as coisas cessem, ao invs de se agarrarem a elas e criarem medos eansiedades. At o estado doentio daqueles vossa volta j no vos influencia. J noreagem falta de vontade dos outros, ficando vs prprios tensos. Isso resulta dedeixarem as coisas flurem e cessarem por si mesmas.

    Em linhas gerais, o plano agora ter esta vigilncia interior e reparar em qualquer coisaobsessiva a vir ao de cima. Se isso continuar sempre a surgir ento significa que estoobviamente apegados de alguma forma seja por averso ou por paixo. Comecemento a reconhecer os apegos ao invs de apenas tentarem-se ver livres deles. Quando osconseguem compreender j os conseguem largar e ento podem virar-se para o silncioda mente, pois fazer outra coisa j no faz sentido. No faz sentido agarrarem-se scondies mais que o necessrio. Deixem-nas cessar. Quando reagimos quilo quesurge criamos um ciclo de hbitos. Um hbito algo cclico, continua a acontecer emcrculos, no tem como cessar. Mas se os largarmos, e deixarmos as coisas em paz,

    ento o que surge, cessa. No se torna um ciclo.

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    O vazio no livrarmo-nos de nada, no ficarmos em branco (termos uma branca),mas um potencial infinito para que a criao surja e cesse, sem nos deixarmos iludir porela. A ideia de mim como um criador, com os meus talentos artsticos, exprimindo-me amim prprio uma incrvel viagem do ego, no ? Isto o que eu fiz, meu. As

    pessoas dizem Oh, s muito habilidoso, no s? s um gnio! E ainda assim tanta daarte criativa tende a ser regurgitaes dos medos e desejos das pessoas. No realmentecriativa, trata-se apenas de recrear coisas. No vem de uma mente vazia, mas sim de umego, o qual no tem uma mensagem real para dar, a no ser a de que est repleto demorte e de egosmo. A um nvel universal no tem outra mensagem seno a de Olhem

    para mim!, como pessoa, como um ego. Ainda assim a mente vazia tem um potencialinfinito para a criao. No existe um eu que pensa em criar coisas, mas a criaopode ser feita sem esse eu, sem algum a faz-laela acontece.

    Ento deixamos a criao para o Dhamma ao invs de pensarmos que isso algo pelo

    qual somos responsveis. Tudo o que temos de fazer agora, tudo o que necessrio parans (falando de uma forma convencional, como seres humanos, como pessoas) deixarfluir no nos apegarmos. Libertem as coisas. Pratiquem o bem e refreiem-se depraticar o malestejam plenamente atentos. uma mensagem bastante bsica.

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    Reflexo

    A necessidade de Sabedoria no mundo

    Estamos todos aqui com um interesse comum. Em vez de esta ser uma sala cheia deindivduos em que cada um segue os seus prprios pontos de vista e opinies, esta noiteestamos todos aqui devido ao comum interesse na prtica do Dhamma. Quando todasestas pessoas se juntam a um Domingo noite, comeamos a ver o potencial daexistncia humana, uma sociedade baseada no comum interesse da verdade.Mergulhamos no Dhamma. Aquilo que surge, passa, e na sua passagem est a paz.Ento quando comeamos a abrir mo dos nossos hbitos e apegos ao mundofenomnico, condicionado, comeamos a realizar a totalidade e a unidade da mente.

    Isto uma reflexo muito importante para estes tempos, nos quais acontecem tantasdisputas e guerras devido ao facto de as pessoas no conseguirem concordar em nada.Os chineses contra os russos, os americanos contra os soviticos, e por a fora. Acercado qu? Esto a lutar pelo qu? Pelas percepes que cada um deles tem do mundo.Esta a minha terra e eu quero isto desta forma. Eu quero este tipo de governo e estetipo de sistema poltico e econmico e por a adiante, at ao ponto em queesquartejamos e torturamos at termos destrudo a terra que estvamos a tentar libertar,escravizando ou confundindo todas as pessoas que tentvamos liberar. Porqu? Por noentendermos as coisas como elas realmente so.

    O caminho do Dhamma o de observar a natureza e harmonizarmos as nossas vidascom as foras naturais. Na civilizao europeia nunca olhmos realmente para o mundodessa maneira. Idealizmo-lo. Se tudo fosse um ideal ento deveria ser de determinadamaneira, e