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ISSN 2176-1396 COMO A LITERATURA PODE DESVENDAR A CULTURA DE UMA ÉPOCA: UMA PROPOSTA DE TRABALHO COM “O MEZ DA GRIPPE” Patrícia dos Santos Oga 1 - FATEBE Grupo de Trabalho - Educação, Complexidade e Transdisciplinaridade Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo Este artigo tem como objetivo apresentar parte de uma pesquisa em que foi realizada como trabalho de conclusão do curso de especialização em Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Extensão (IBPEX). A premissa original deste trabalho era a elaboração de uma proposta de trabalho interdisciplinar possível de ser aplicada em sala de aula, em especial no Ensino Médio, a partir de um livro de literatura brasileira. Partindo da possibilidade de trabalhar interdisciplinarmente diferentes conteúdos das disciplinas escolares em sala de aula, este artigo apresenta uma proposta de desenvolvimento didático que explora uma obra literária de metaficção historiográfica e permite investigar detalhes do contexto histórico da época retratada. A obra escolhida foi “O Mez da Grippe”, de Valêncio Xavier, publicada em 1998. Esse livro (re)conta a história da epidemia de gripe espanhola em Curitiba durante os três últimos meses de 1918 por meio da colagem de diversos documentos da época, como recortes de jornal. Essa obra tem uma estrutura ímpar, pois os textos são organizados de maneira não linear e várias histórias vão se entrelaçando a cada nova informação. Para este artigo, dois anúncios de jornal foram selecionados para serem analisados e a metodologia de análise contemplou os seguintes aspectos: variantes linguísticas; fala e escrita; texto em função da área; elementos não-verbais; aspectos culturais. O resultado da análise desses aspectos permitiu identificar características culturais, históricas e linguísticas que podem enriquecer a experiência de leitura de alunos e professores em sala de aula. Palavras-chave: Metaficção. Literatura. História. Interdisciplinaridade. 1 Mestre em Letras Inglês pela UFSC, especialista em Desenvolvimento Editorial com Ênfase em Materiais Didáticos pela PUCPR e em Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura Brasileira pelo IBPEX. Professora do curso de Bacharelado em Teologia da FATEBE. Realiza estudos sobre material didático, gêneros textuais, ensino de Língua Inglesa, Língua Portuguesa e Artes. E-mail: [email protected].

ÉPOCA: UMA PROPOSTA DE TRABALHO COM “O MEZ DA GRIPPE” · 2015. 11. 1. · experiência de leitura de alunos e professores em sala de aula. Palavras-chave: Metaficção. Literatura

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ISSN 2176-1396

COMO A LITERATURA PODE DESVENDAR A CULTURA DE UMA

ÉPOCA: UMA PROPOSTA DE TRABALHO COM “O MEZ DA

GRIPPE”

Patrícia dos Santos Oga1 - FATEBE

Grupo de Trabalho - Educação, Complexidade e Transdisciplinaridade

Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Este artigo tem como objetivo apresentar parte de uma pesquisa em que foi realizada como

trabalho de conclusão do curso de especialização em Metodologia do Ensino de Língua

Portuguesa e Literatura Brasileira pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Extensão (IBPEX).

A premissa original deste trabalho era a elaboração de uma proposta de trabalho

interdisciplinar possível de ser aplicada em sala de aula, em especial no Ensino Médio, a

partir de um livro de literatura brasileira. Partindo da possibilidade de trabalhar

interdisciplinarmente diferentes conteúdos das disciplinas escolares em sala de aula, este

artigo apresenta uma proposta de desenvolvimento didático que explora uma obra literária de

metaficção historiográfica e permite investigar detalhes do contexto histórico da época

retratada. A obra escolhida foi “O Mez da Grippe”, de Valêncio Xavier, publicada em 1998.

Esse livro (re)conta a história da epidemia de gripe espanhola em Curitiba durante os três

últimos meses de 1918 por meio da colagem de diversos documentos da época, como recortes

de jornal. Essa obra tem uma estrutura ímpar, pois os textos são organizados de maneira não

linear e várias histórias vão se entrelaçando a cada nova informação. Para este artigo, dois

anúncios de jornal foram selecionados para serem analisados e a metodologia de análise

contemplou os seguintes aspectos: variantes linguísticas; fala e escrita; texto em função da

área; elementos não-verbais; aspectos culturais. O resultado da análise desses aspectos

permitiu identificar características culturais, históricas e linguísticas que podem enriquecer a

experiência de leitura de alunos e professores em sala de aula.

Palavras-chave: Metaficção. Literatura. História. Interdisciplinaridade.

1 Mestre em Letras Inglês pela UFSC, especialista em Desenvolvimento Editorial com Ênfase em Materiais

Didáticos pela PUCPR e em Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura Brasileira pelo IBPEX.

Professora do curso de Bacharelado em Teologia da FATEBE. Realiza estudos sobre material didático, gêneros

textuais, ensino de Língua Inglesa, Língua Portuguesa e Artes. E-mail: [email protected].

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Introdução

Muitos leitores têm dificuldade de analisar um texto que seja literário (em oposição ao

de caráter apenas informativo). Duarte & Werneck (2005) afirmam que “os alunos ao

chegarem ao ensino médio apresentam imensas dificuldades de leitura / interpretação de

textos e que as aulas de Língua Portuguesa até então, não estão privilegiando a leitura e sim a

gramática normativa.” (s/p). Mesmo se entendem que o texto foi escrito num determinado

momento histórico e que sofreu influência de fatores culturais e sociais, a maioria dos leitores

insiste em tratar essa leitura como algo “imutável”, ou seja, olhar para o texto como

“narração” que independe da realidade atual ou antiga e descobrir “o que o autor quis dizer”.

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (BRASIL,

2000), o estudo da Língua Portuguesa deve considerar linguagem verbal “construção humana

e histórica de um sistema linguístico e comunicativo em determinados contextos. [...] na

gênese da linguagem verbal estão presente o homem, seus sistemas simbólicos e

comunicativos, em um mundo sócio-cultural [sic].” (p. 18). São listadas também por esse

documento algumas competências a serem desenvolvidas e uma delas (Investigação e

Compreensão) é o foco desta pesquisa, pois pretende:

Analisar os recursos expressivos da linguagem verbal, relacionando

textos/contextos, mediante a natureza, função, organização, estrutura, de acordo com

as condições de produção, recepção (intenção, época, local, interlocutores

participantes da criação e propagação de ideias e escolhas, tecnologias disponíveis).

Recuperar, pelo estudo do texto literário, as formas instituídas de construção do

imaginário coletivo, o patrimônio representativo da cultura e as classificações

preservadas e divulgadas, no eixo temporal e espacial. (BRASIL, 2000, p. 24).

Assim, este artigo está organizado em três tópicos. No primeiro, procura-se

desenvolver uma breve reflexão sobre a possibilidade de ler imagens, uma vez que os textos

selecionados para análise neste artigo trazem elementos não verbais que podem ser lidos e

interpretados. O segundo item conceitua metaficção historiográfica e apresenta a obra

escolhida para esta pesquisa e o contexto ao qual ela faz referência. Por fim, no terceiro item

está a análise dos textos selecionados e informações que podem ser utilizados na aplicação

desta proposta em sala de aula.

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Da leitura de imagens para a leitura de mundo

Sabe-se, atualmente, que são vários os elementos presentes numa única imagem e que

desempenham uma determinada função, ou seja, transmitem uma mensagem. Para atingir a

compreensão, é preciso, no entanto, aprender a “ler” o que não está registrado por palavras

escritas. Segundo Chartier (1996, p.117), “Lemos uma carta, um poema, um livro: como é ler

um desenho, um quadro, um afresco? [...] [pois] uma página escrita é, de um lado, leitura, de

outro lado, quadro e visão; o legível e visível têm fronteiras e lugares em comum”.

Ao nos depararmos com as imagens usadas nos anúncios veiculados em jornais, por

exemplo, podemos perceber que há muitas informações não-ditas, mas presentes, seja pelo

uso de determinada cor, imagem, fontes de peso diferente, recortes e destaques. Se o anúncio

ocupar apenas um espaço de poucos centímetros ou se ocupar uma página inteira, isso

também traz significado e pode ser interpretado.

Para Santaella (1987), a imagem pode ser observada na qualidade de signos que

representam aspectos do mundo visível, assim sendo, procuram indicar, reproduzir,

representar algo e produzir efeitos no “leitor”. De acordo com essa autora, “o exame

cuidadoso do símbolo nos conduz para um vasto campo de referências que incluem os

costumes e valores coletivos e todos os tipos de padrões estéticos, comportamentais, de

expectativas sociais etc.” (SANTAELLA, 2002: 37).

Essas leituras de elementos não linguísticos são essenciais numa sociedade que se

torna cada vez mais multissêmica2. Nesse sentido, a abordagem multimodal3 permite explorar

esses outros elementos, pois a língua deixa de ser o centro da comunicação e os aspectos

extralinguísticos são considerados nesse processo de leitura. Afinal, com o crescente uso em

nossa sociedade atual de outras formas de linguagem (imagens e sons, por exemplo), o

enfoque multimodal permite destacar a importância de se considerar outros elementos além da

linguagem e, ao considerar a língua num processo integrado a essas outras formas de

construção de significado, os estudos multimodais têm como objetivo observar a produção de

significados em determinado contexto.

2 As interações sociais que se realizam pela fala como pela escrita são multissêmicas pois a fala serve-se da

gestualidade, da mímica, da prosódia e a escrita serve-se da cor, do tamanho, da forma das letras e do uso de

símbolos. A dimensão multissêmica das palavras permite que elas apresentem inúmeros significados, que não se

esgotam em definições estáticas e dicionarizadas. Além disso, há a realização simultânea de palavras, gestos,

mímica, imagens, cores, como também de elementos logográficos, icônicos e pictóricos, entre outros, para fins

expressivos. 3 A premissa fundamental da multimodalidade é a de que o sentido é produzido, recebido, interpretado e

reconstruído por meio de vários recursos, incluindo imagem, olhar, gesto, movimento, música, fala e efeitos

sonoros.

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Para Cockell (2009, p. 84), “Em uma perspectiva do letramento, o trabalho realizado

com gêneros textuais em sala se aula está intimamente ligado aos conceitos de

multimodalidade dos textos.”. Pois o letramento4 exige fluência de leitura de imagens, sejam

elas provenientes de obras de arte, anúncios veiculados em jornais e revistas, gráficos e

infográficos ou cartazes afixados no ônibus.

No caso deste artigo, o anúncio de jornal é investigado a partir das modalidades de

linguagem icônica e linguística, ou seja, duas estruturas básicas: as imagens e as palavras.

Atualmente, os anúncios de jornal podem ser coloridos em quatro cores e até mesmo ocupar

página dupla. No início do século, no entanto, essa mídia dispunha de recursos bem mais

limitados, devido principalmente à tecnologia disponível na época. Por outro lado, nessa

época, o jornal era a principal fonte de informação dos letrados e o telégrafo permitia que as

notícias chegassem quase simultaneamente aos fatos ocorridos. No entanto, de acordo com o

texto Imprensa Brasileira – dois séculos de história,

[...] ao final do Império, mais de 90% da população viviam na área rural e 85% eram

analfabetos, inclusive grande parte dos proprietários de terras. Esse quadro impunha

barreiras intransponíveis ao desenvolvimento da imprensa brasileira que, entretanto,

supera a fase dos efêmeros pasquins panfletários, dando origem a jornais mais

estáveis e estruturados. (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE JORNAIS, s/d, p.5)

No início do século XX, no entanto, novas tecnologias como a máquina de escrever e

o uso de linotipos e rotativas permitiram aumentar as tiragens e melhorar a qualidade da

impressão (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE JORNAIS, s/d, p.7).

Para Nóbrega (2008),

Textos jornalísticos servem muito satisfatoriamente como objeto de estudo na sala

de aula. Em geral eles não são muito longos e fazem uma conciliação entre o

registro formal e o informal, ou seja, apresentam uma linguagem cuidada, renovada,

sem exageros. Outra vantagem é a abordagem de fatos que permitem que os alunos

definam posicionamentos importantes sobre temas da atualidade. (NÓBREGA,

2008, p. 6-7)

O anúncio de jornal pode ser facilmente encontrado pelo professor, seja num jornal de

circulação nacional ou no exemplar que é publicado com as notícias do bairro. De acordo com

Costa (2008), o anúncio informa e procura convencer novos consumidores, seja para comprar

determinado produto ou para adquirir determinado serviço. Normalmente apresenta texto

breve, direto e positivo, valorizando o objeto anunciado. Imagens ou ilustrações são de grande

4 Letrado é aquele que sabe ler e escrever e que responde adequadamente aos contextos sociais, históricos e

culturais das práticas sociais da leitura e da escrita.

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importância ao explorar o ideal que deve ser desejado pelo leitor. Espera-se que a mensagem

seja clara e a linguagem objetiva e direta, evitando imprecisões e percepções equivocadas.

A pesquisa de Santos (2006) aponta que houve grandes mudanças na mídia e nos

modos de comunicação durante as últimas décadas,

Os periódicos da década de 60 eram impressos em preto e branco, e cobertos de

caracteres escritos; a partir da década de 90 são coloridos, cheios de imagens, e em

muitos deles, principalmente no ocidente, os caracteres escritos têm quase

desaparecido das páginas. [...] A notícia televisiva passa a informação,

principalmente, na forma de imagens. O som (não o da leitura ou de comentários

verbais, mas a trilha sonora, a música, o barulho do ambiente) também é outro

elemento importante. O cenário da comunicação, a partir dos anos 90, é

irrefutavelmente multimodal. (SANTOS, 2006, p.58-59)

Além disso, essa autora também observa que essa multimodalidade não deve passar

despercebida pela escola, pois “é impossível ler prestando atenção apenas na mensagem

escrita” (SANTOS, 2006, p. 59). As primeiras imagens criadas pelas crianças são vistas mais

como autoexpressão que comunicação, ou seja, como algo que as crianças fazem

espontaneamente, sem que seja preciso ensiná-las a fazer. Com o passar dos anos, as

ilustrações são deixadas de lado e o texto escrito recebe mais atenção e é mais constante na

produção escolar. Fora da escola, no entanto, as imagens estão cada vez mais presentes.

Portanto, ao analisar como determinado texto é produzido e realizado, pode-se identificar

particularidades, regularidades e valores de uma cultura ou contexto histórico-social

específico.

O texto que recria o fato histórico

É pertinente ressaltar que a metaficção historiográfica procura problematizar o

conhecimento histórico e confrontá-lo, questionado as verdades históricas. De acordo com

Jacomel & Silva (2007, p. 741), “A metaficção historiográfica revela uma leitura alternativa

do passado como uma crítica à história oficial.”. Assim, pode explorar a intertextualidade e as

diferentes funções da linguagem, oferecendo estratégias de representação do “real ficcional”,

de modo a desconstruir a História oficial.

Conforme a opinião defendida por Sfalcin (2002), a metaficção historiográfica

aproveita-se da impossibilidade de se conhecer o passado como ele realmente aconteceu para

transformar suas “verdades absolutas” em ficção, explorando os personagens históricos de

modo mais humano e menos idealizado. Assim, essa obra parte da ideia de que determinada

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situação histórica permite explorar várias possibilidades. Desse modo, esse texto procura

“recuperar” as possibilidades perdidas, entrelaçando as histórias real e potencial.

Por ser uma obra literária, ela pode ser considerada em relação ao espaço e ao tempo

em que foi publicada, observando-se que tem por objetivo repassar um conjunto de ideias,

mesmo que estejam nas entrelinhas. Afinal, a construção do texto, ou seja, a escolha

vocabular, a estrutura sintática adotada, as imagens evocadas e descritas e a distribuição do

texto na página podem expressar o ponto de vista e as ideias defendidas pela obra.

No caso específico deste artigo, a obra de metaficção escolhida para explorar como a

Literatura e a História podem ser trabalhadas de forma interdisciplinar foi O Mez da Grippe

do autor brasileiro Valêncio Xavier.

O Mez da Grippe

Inicialmente publicada pela Fundação Cultural de Curitiba, O Mez da Grippe foi

comprado pela editora Companhia das Letras que publicou, em 1988, O Mez da Grippe e

Outros Livros, uma coletânea de novelas e contos escritos por Valêncio Xavier e que reúne

seus quatros primeiros livros: O Mez da Grippe, Maciste no inferno, O Mistério da Prostituta

Japonesa & Mimi-Nashi-Oichi, O Minotauro e o livro de contos inéditos 13 Mistérios + O

Mistério da Porta Aberta. A partir dessa publicação, Valêncio Xavier passou a ser

reconhecido nacionalmente. Apesar de chamar a atenção da crítica brasileira, principalmente

pela inovação de seus textos, essa obra está esgotada e não há previsão de reimpressão.

Ambientada em Curitiba, O Mez da Grippe explora a pandemia da gripe espanhola

que ocorreu no início do século XX, matando cerca de 20 a 40 milhões de pessoas em todo o

mundo. Além disso, consegue articular um plano da História (Curitiba nos três últimos meses

do ano de 1918), com as publicações de notícias de dois jornais (um governista e outro de

oposição), além de relatórios, propagandas de medicamentos, fotografias antigas, cartões-

postais, com a ficção (por exemplo, a narrativa elaborada a partir das reminiscências de D.

Lúcia, uma “testemunha” dos fatos) e o fantástico (os poemas e versos que descrevem um

sujeito que entra nas casas e faz sexo com moças acamadas pela febre).

De aproximadamente 80 recortes de jornal da obra O Mez da Grippe, há aqueles que

se referem a fatos políticos da 1ª Guerra Mundial (notícias e reportagens), há os que se

referem à gripe (inclusive, um dos recortes teve o corpo da notícia censurado na época da

publicação), outros se referem a recomendações para a população sobre como comportar-se

durante a epidemia (cinemas fechados, evitar aglomerações, cultos suspensos, comentários

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sobre as políticas públicas de higiene) e há aqueles que podem ser classificados como

anúncios. Alguns desses textos apresentam várias informações, ou seja, poderiam ser

classificados em mais de uma categoria.

Dos anúncios, há aproximadamente onze que são anúncios classificados ou avisos

(procura-se empregada, precisa-se se cocheiros, avisos de óbitos e de celebrações de missas,

empresas desculpando-se por estarem fechadas pelo surto de gripe e, depois, anunciando que

estão de volta ao serviço) e oito que podem ser considerados exclusivamente publicitários, ou

seja, anunciam produtos que podem (devem) ser usados para prevenir-se da gripe. Dois desses

anúncios publicitários foram escolhidos e ambos exemplificam fatores culturais da época.

Outras características relevantes para essa seleção foram a apresentação visual, a estrutura do

texto e a sua distribuição no espaço e os destaques dado aos elementos anunciados.

Ao realizar a atividade de exploração desses elementos em sala é importante que seja

feita uma breve pesquisa com os alunos sobre a sociedade brasileira do início do século XX,

seus usos e costumes, a 1ª Guerra Mundial e a pandemia de Gripe Espanhola. A partir desses

conhecimentos, a leitura dos recortes poderá ser mais acessível aos leitores.

Sobre a Gripe de 1918

Em meados de 1918, pouco se sabia no Brasil sobre a epidemia que assolava a Europa,

pois outras notícias causavam alvoroço: o fim da guerra mundial e a falta de gêneros

alimentícios no Brasil, principalmente devido à exportação. O pouco que foi publicado sobre

a gripe espanhola afirmava ser uma epidemia de gripe que durava três ou quatro dias, causava

coriza, dores no corpo, tosse e um pouco de febre, em geral sem grandes complicações.

No entanto, com a confirmação da existência de gripados e mortos pela doença e a

publicação de informações sobre o navio Demerara que, vindo da Europa, trouxera

passageiros enfermos, notícias sobre os gripados foram ganhando as páginas dos jornais. As

cidades portuárias foram as primeiras a registrar a doença. Medidas de profilaxia individual

eram recomendadas: ingestão de sais de quinino e rigorosa antissepsia da boca e nariz.

De acordo com Bertucci,

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Em 1918, os brasileiros, de norte a sul do país, tiveram seu cotidiano modificado

devido à gripe espanhola, e assistiram os locais públicos (como escolas, parques,

teatros, cinemas, etc.) serem fechados; as reuniões noturnas, inclusive as religiosas,

tornarem-se proibidas (a diferença de temperatura, dentro e fora desses locais já

favoráveis à propagação da doença, poderia ser fatal para as pessoas e para a difusão

da moléstia), e os enterros com acompanhamento a pé serem vedados. Visitas foram

condenadas e beijos e abraços desaconselhados. Até mesmo cumprimentar as

pessoas com aperto de mão passou a ser ato indesejado. (BERTUCCI, 2009, p. 462)

Durante a gripe, o medo do contágio e do ‘outro’ ganhou força: qualquer pessoa

poderia ser portadora da doença. As prescrições feitas para que fossem evitadas as

aglomerações e contatos mais íntimos cultivavam a repugnância pelos objetos ‘do outro’,

mesmo que devidamente limpos. Assim, roupas e sapatos usados eram desprezados, mesmo

que ainda estivessem em condição de uso. Simultaneamente, houve o medo crescente da

hospitalização, pois os doentes estavam reunidos nesses lugares. Entretanto, houve

internações generalizadas para reunir os doentes e as pessoas com sintomas – pois isso os

isolaria dos ‘saudáveis’. Naquela época, ser hospitalizado era um estigma, afinal, estar em

uma “casa de misericórdia” era sinônimo de pertencer às classes menos abastadas. Apenas os

pobres, por seus “hábitos pouco recomendáveis” (morando em lugares com péssimas

condições sanitárias) foram categorizados como o ‘outro’, coincidentemente, foram também

os mais atingidos pela epidemia.

Lendo a história da gripe espanhola a partir dos anúncios de jornal de “O Mez da

Grippe”

A metodologia de análise adotada contemplou os seguintes aspectos, 1. variantes

linguísticas; 2. fala e escrita; 3. texto em função da área; 4. elementos não-verbais; 5. aspectos

culturais. Esses são alguns dos 25 passos citados para a elaboração de um roteiro de leitura de

acordo com Almeida (2010) e serão desenvolvidos de modo simultâneo na análise dos textos.

No primeiro item, variantes linguísticas, serão observadas as estruturas próprias da língua

portuguesa do início do século XX em oposição às atuais, pós Acordo Ortográfico. Ao

“trabalhar com os alunos para que eles percebam que uma língua é viva, modifica-se e toma a

nuance da comunidade em que ela ocorre” (ALMEIDA, 2010, p. 91), podemos indicar

também como a própria sociedade brasileira se modificou, em seus usos e costumes.

O item “fala e escrita” permite contrapor as características pertencentes à oralidade e à

escrita e como (e se) elas se apresentam nos textos analisados. Já em “texto em função da

área” pode-se identificar a área específica do conhecimento humano a que os textos

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pertencem, o que permite caracterizá-lo. Ao ter contato com textos de diferentes gêneros e

temáticas textuais, “surgirá o que chamamos de letramento [...] que se tornará uma ferramenta

com intenção e com possibilidades de intervenção social” (ALMEIDA, 2010, p. 93).

Em “elementos não-verbais” serão explorados o tipo de fonte, o tamanho da fonte, o

destaque do texto, os espaços em branco, as ilustrações. Ao realizar a leitura dessas

informações, podemos desenvolver um senso mais apurado dos sentidos, pois “os elementos

não-verbais apresentados no texto funcionam como críticas paralelas que precisam ser

percebidas pelo leitor” (ALMEIDA, 2010, p. 95). Por fim, “aspectos culturais” permite

identificar – ou, ao menos, pressupor – questões sociais, econômicas e políticas próprias da

comunidade em que o texto foi criado e a quem se dirige. No entanto, “antes de se fazer uma

crítica a determinados pontos [...] é necessário resgatar com o aluno ou o leitor o que ele

pensa daquelas particularidades vivenciadas; não basta criticar simplesmente uma realidade

em função de um dever” (ALMEIDA, 2010, p. 99). Somente após esse processo de reflexão é

que será possível apreciar o texto como ele é: um documento característico da época e da

sociedade em que foi criado.

Os recortes de anúncio de jornal selecionados e as propostas de análise

Os recortes de anúncios de jornal selecionados dessa obra são os de produtos e de

medicamentos para a prevenção ou combate à epidemia. Esses textos foram escolhidos por

representar não apenas os produtos comercializados à época, mas também o conhecimento

científico que existia até então.

Figura 1 - Anúncio de Bálsamo Santa Helena.

Fonte: XAVIER, Valêncio. O Mez da Grippe e outros livros. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 60.

Imagem escaneada do livro pela autora deste artigo.

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Ao analisar a Figura 1, pode-se explorar diversas situações que podem ser propostas e

desenvolvidas em sala de aula. Num primeiro momento, esses dados podem ser usados para

explorar e identificar o momento histórico a que esse texto se refere: uma época em que o

grande perigo era a “Hespanhola”; nesse período, o sistema monetário brasileiro usava uma

simbologia diferente da atual para indicar valores; os métodos de proteção da saúde eram

diferentes, pois o uso de um bálsamo como desinfetante e empregado em gargarejos promete

combater a doença; além disso, podemos caracterizá-lo como um texto “antigo” (em oposição

a “atual”) devido à ortografia utilizada. Culturalmente há ainda a questão do conhecimento

médico e científico, pois, naquela época, acreditava-se que as doenças podiam ser causadas

por “maus ares” e ainda não havia estudos de microbiologia nem o conhecimento da

penicilina enquanto antibiótico, para citar dois exemplos.

Para abordar a questão das variantes linguísticas, por exemplo, pode-se trabalhar

ortografia (hespanhola, desinfectante, máu, affecções, pharmacias), o significado das palavras

(antiputrido, balsamo), além da estrutura sintática, a semântica e a pragmática. Pode-se

também contrapor e comparar essa estrutura do texto escrito à fala, explorando a possibilidade

de esse anúncio ser veiculado, exatamente como se encontra, no rádio, por exemplo.

Ao investigar o texto em função da área, o gênero textual pode ser caracterizado e esse

texto pode ser comparado a outros, atuais. É possível, também, propor uma retextualização,

em que os alunos são convidados a elaborar um texto de outro gênero textual a partir desse,

por exemplo, um anúncio veiculado na televisão ou uma carta escrita para o(a) namorado(a).

Semioticamente, os elementos não-verbais permitem identificar a importância de

determinadas informações em relação a outras pelo destaque dado (fonte diferente, maior, em

negrito), por exemplo, o nome do produto, o preço e a chamada “Cuidado com a

Hespanhola!”, que, aliás, parece referir-se a uma pessoa e não à epidemia em si. Isso pode

referir-se, por exemplo, à transmissão da doença, que é por contato físico e de secreções, o

que pressupõe proximidade. Ao discutir com os alunos o porquê dessas escolhas pode-se

identificar a função predominante desse gênero de forma mais explícita.

Por fim, os aspectos culturais: como era entendida a saúde e a doença naquela época, o

que se acreditava que causavam doenças, o que é balsamo, para que serve, como se usa e qual

o função médica e terapêutica desse produto, qual a importância para a cultura de 1918 de o

Balsamo Sta. Helena ser o “inimigo do máu cheiro”, o que significava ser vendido em

pharmacias (como era o atendimento médico na época, abordando o costume do “médico de

família”, o medo que as pessoas tinhas das “casas de misericórdia”) e o fato de ser

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comercializado em vidros (seria um creme, cápsulas ou pó) que custavam 1$500 (de acordo

com o site do Dieese5, Mil Réis foi a moeda brasileira de 8/10/1833 a 31/10/1942 e o valor

aproximado era calculado em relação ao ouro, ou seja, 2$500 = 1/8 de ouro de 22 k).

Figura 2 - Anúncio de Xarope de Grindelia.

Fonte: XAVIER, Valêncio. O Mez da Grippe e outros livros. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 47.

Imagem escaneada do livro pela autora deste artigo.

O que mais chama a atenção no Anúncio 2 é a ilustração. Nela, podemos ver uma

mulher enferma, na cama, e um homem, de pé, ao seu lado. Na parte inferior dessa imagem,

podemos ler o diálogo que se desenvolve entre esses personagens. O uso de uma ilustração

num anúncio de jornal demonstra o interesse em explorar os desejos de consumo dos leitores,

pois a ilustração, ao ser elucidada pela leitura da “legenda”, traz argumentos de venda que são

apelativos. Como se fosse um retrato de um evento real, essa imagem explora as

características da sociedade da época ao mesmo tempo em que critica/ensina que não se deve

procurar outro remédio senão o Xarope de Grindelia para curar-se das “moléstias do peito” e

da tosse. O trabalho com esse texto permite explorar e identificar, novamente, o momento

5 Disponível em www.dieese.org.br/esp/salmin/unidsistmonet.xml. Acesso em 25/02/2011.

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histórico a que se refere; além disso, podemos caracterizá-lo como um texto “antigo” (em

oposição a “atual”) devido à ortografia e à sintaxe utilizadas. No entanto, o uso de um xarope

para acalmar a tosse pode ser identificado como um elemento que permaneceu até hoje.

Ao avaliar a questão das variantes linguísticas, pode-se trabalhar ortografia (usae,

apellar), o uso de determinadas expressões (vos), além da estrutura sintática, a semântica (a

tosse vos persegue) e a pragmática. Pode-se explorar o diálogo transcrito comparando-o à

fala, observando quem são os falantes e porque falam o que falam (teria a doente autoridade

para recomendar ao médico o uso de determinado medicamento?). Ao investigar o texto em

função da área, pode-se também retextualizar esse anúncio, observando as modificações que

seriam (ou não) necessárias para que ele fosse veiculado em outro meio, por exemplo.

Esse diálogo permite também explorar a ambiguidade do termo remédio, o qual

permite realizar duas leituras: como solução para uma enfermidade (enquanto medicamento,

ou seja, preparado usado no tratamento de uma doença) e como solução para um problema

(metaforização). Assim, quando a paciente diz “que não ha remedio senão apellar para o

XAROPE DE GRINDELIA”, há um trocadilho, uma vez que uma interpretação possível seria

que todos os outros remédios não ineficientes e que apenas o xarope (enquanto medicamento)

é a solução; outra interpretação seria que o xarope não seria um remédio, pois ela já havia

tomado todos os remédios possíveis e a única solução seria apelar para um não-remédio.

Apesar de o sentido de remédio como “solução para” continuar o mesmo nas duas

formas de interpretar a proposição; a ambiguidade fica em definir xarope como remédio ou

como não-remédio. Afinal, uma solução preparada pela fervura de água e açúcar também

pode ser chamada de “xarope”, assim, ao adicionar uma planta, faz-se xarope de framboesa,

xarope de guaco, xarope de cenoura, o que seria um preparado sem rigor farmacêutico6, ou

seja, um não-remédio. Afinal, etimologicamente falando, xarope é uma palavra italiana

sciroppo, que veio originalmente do árabe sharab, significando “bebida, vinho”.

Naquela época, xaropes, tisanas e chás eram vistos como remédio, como medicamento

que solucionaria o problema de saúde. Atualmente, no entanto, para ser um “xarope”, é

preciso seguir as características mínimas de qualidade definidas pelo Regulamento Técnico

para Fixação dos Padrões de Identidade e Qualidade estabelecido pelo Ministério da

Agricultura e do Abastecimento, pela Portaria nº. 544, de 16 de novembro de 1998, como

6 De acordo com o Dicionário Houaiss, “xarope n. substantivo masculino. 1. Rubrica: farmácia. Substância

medicamentosa, de natureza líquida e adocicada, geralmente utilizada com finalidades terapêuticas. 2.

Derivação: por extensão de sentido. Preparado caseiro e sem rigor farmacêutico; tisana. 3. Qualquer solução

preparada através da fervura de água e açúcar.”.

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“produto não gaseificado, obtido pela dissolução em água potável, de suco de fruta, polpa ou

parte do vegetal e açúcares, numa concentração mínima de 52º Brix, à 20ºC, adicionado

unicamente de água potável para o seu consumo.”7

Os elementos não-verbais permitem identificar e caracterizar, além de explorar

elementos e os aspectos culturais de uma época em que as camas tinham dossel8, eram

cobertas com cortinas (muitas vezes de tule) e os médicos iam visitar seus pacientes em casa.

Pode-se supor que essa doente pertence a uma família abastada, pois está sendo atendida por

um médico em casa, deitada sobre uma cama notadamente dispendiosa, o que indica que ela

provavelmente mora numa cidade (em oposição ao meio rural).

Nos destaques dados às informações do texto escrito, seja ao “título” MOLESTIAS

DO PEITO (fonte diferente, maior, letras maiúsculas em negrito), ao “diálogo” entre o

médico e a doente da ilustração (fonte menor, vozes do diálogo identificadas por rubrica e em

maiúsculas, o uso de maiúsculas no texto escrito, em especial, no nome do medicamento –

estará a doente gritando?), ao nome do medicamento destacado por sublinhado duplo ou o uso

de letras maiúsculas para indicar o imperativo, o nome do fabricante e o slogan, por exemplo,

percebe-se que cada informação tem uma importância e deve, portanto, ter um impacto

diferente no leitor. Pode-se, também, supor que o anúncio procura conquistar o público

feminino, pois indica ser a ele direcionado. Esse xarope, que, aliás, ainda é comercializado

sob outros nomes comerciais como expectorante, tem o nome de uma planta também

conhecida por malmequer-do-campo9, possivelmente seu principal ingrediente. Novamente,

ao discutir com os alunos o porquê dessas escolhas, pode-se identificar a função predominante

desse gênero de forma mais explícita.

Considerações Finais

A importância do uso de leituras multimodais em sala de aula permite desenvolver nos

alunos a capacidade de compreensão das realidades propostas pelas mídias. Ao explorar

diferentes áreas do conhecimento e conhecimentos de semiótica, o professor pode também

ampliar as oportunidades de letramento. No caso específico deste artigo, indica-se a

possibilidade de investigar, também, trechos de uma obra literária que procura recriar o fato

7 Disponível em www.engetecno.com.br/port/legislacao/beb_rtfiq_xarope.htm. Acesso em 20/04/2011. 8 De acordo com o Dicionário Houaiss, “cobertura, geralmente de tecido, presa a uma parede e a dois postes ou

esteios dos pés de uma cama”. 9 De acordo com o Dicionário Houaiss, “designação comum às ervas e arbustos do gênero Grindelia, da família

das compostas, com cerca de 55 espécies, nativas do Noroeste e Sul do continente americano, algumas cultivadas

como ornamentais. m.q. malmequer-do-campo (Grindelia camporum)”.

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histórico, preenchendo as lacunas por meio de recortes de realidade (anúncios de jornais) que,

muitas vezes, não são usados para contar a História Oficial.

Como pudemos observar, as imagens dos anúncios de jornais, mesmo quando

apresentam apenas texto ou imagem em preto e branco, apresentam características específicas

do momento sociocultural e histórico em que foram criados e, como exemplares do discurso

histórico, permitem explorar fatos históricos, eventos linguísticos, semânticos e semióticos,

pois, as informações não-ditas também expressão uma determinada visão de mundo e de ação,

no caso, de procurar convencer o leitor a comprar/usar determinado produto.

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