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POESIA CONCRETA
1956 - 2006
FACULDADES JORGE AMADOCURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIALMônica Rodrigues da Costa
apresentação em aulas, 2007 , 2008 nas disciplinas: Semiótica Geral
e Semiótica Aplicada
Seleção de Poemas de: Augusto de Campos, Décio Pignatari, Haroldo de Campos, Apollinaire, Blaise Cedrars, Marcel Duchamp, Mallarmé, Maiakovski, Hans, Arp, Ezra Poud, Eugen Gomringer, Erthos Albino de Souza, Edgard Braga, José Lino Grünevald, Arthur Rimbaud, Seiichi Nikuni, Li Po (Rihaku), Matsuó Bashô em ensaio verbi – voco – visual realizado com a colaboração do poeta Paulo Pedro Pepeu
50 ANOS
Poesia concreta, um manifesto
- a poesia concreta começa por assumir uma responsabilidade total perante a linguagem: aceitando o pressuposto do idioma histórico como núcleo indispensável de comunicação, recusa-se a absorver as palavras com meros veículos indiferentes, sem vida sem personalidade sem história - túmulos-tabu com que a convenção insiste em sepultar a idéia.
- o poeta concreto não volta a face às palavras, não lhes lança olhares oblíquos: vai direto ao seu centro, para viver e vivificar a sua facticidade.
- o poeta concreto vê a palavra em si mesma - campo magnético de possibilidades - como um objeto dinâmico, uma célula viva, um organismo completo, com propriedades psicofisicoquímicas tacto antenas circulação coração: viva.
- longe de procurar evadir-se da realidade ou iludí-la, pretende a poesia concreta, contra a introspecção autodebilitante e contra o realismo simplista e simplório, situar-se de frente para as coisas, aberta, em posição de realismo absoluto.
- o velho alicerce formal e silogístico-discursivo, fortemente abalado no começo do século, voltou a servir de escora às ruínas de uma poética comprometida, híbrido anacrônico de coração atômico e couraça medieval.
- contra a organização sintática perspectivista, onde as palavras vêm sentar-se como "cadáveres em banquete", a poesia concreta opõe um novo sentido de estrutura, capaz de, no momento histórico, captar, sem desgaste ou regressão, o cerne da experiência humana poetizável.
- mallarmé (un coup de dés-1897), joyce (finnegans wake), pound (cantos-ideograma), cummings e, num segundo plano, apollinaire (calligrammes) e as tentativas experimentais futuristasdadaistas estão na raíz do novo procedimento poético, que tende a imporse à organização convencional cuja unidade formal é o verso (livre inclusive).
Poesia concreta, um manifesto
- o poema concreto ou ideograma passa a ser um campo relacional de funções.
- o núcleo poético é posto em evidencia não mais pelo encadeamento sucessivo e linear de versos, mas por um sistema de relações e equilíbrios entre quaisquer parses do poema.
- funções-relações gráfico-fonéticas ("fatores de proximidade e semelhança") e o uso substantivo do espaço como elemento de composição entretêm uma dialética simultânea de olho e fôlego, que, aliada à síntese ideogrâmica do significado, cria uma totalidade sensível "verbivocovisual", de modo a justapor palavras e experiência num estreito colamento fenomenológico, antes impossível.
- POESIA-CONCRETA: TENSÃO DE PALAVRAS-COISAS NO ESPAÇO-TEMPO. (Publicado originalmente na revista AD - Arquitetura e
Decoração, n° 20, São Paulo, novembro/dezembro de
1956)
... mallarmé (un coup de dés -1897), joyce (finnegans wake), pound (cantos-ideograma), cummings e, num segundo plano, apollinaire (calligrammes) e as tentativas experimentais futuristasdadaistas...
GUILLAUME APOLLINAIRE1880 -1918
num segundo plano, apollinaire (calligrammes) e as tentativas experimentais futuristasdadaistas...
MARCEL DUCHAMP 1887 – 1968
pintura sobre vidroready madescartaz dadaista
La Prose Transsiberienet de la Petite Jehanne de France, 1913
Pourtant, j’etais fort mauvais poète.Je ne savais pas aller jusqu’ au bout.J’avais faim.
No entanto, eu eraum poeta muito ruim.Não sabia ir até o finalEu tinha fome.
MODIGLIANI
BLAISE CENDRARS1887 - 1961
Augusto de Campos
1973
1953
1970
POETAMENOS
1960
ENIGMAGENS
EQUIVOCÁBULOS
1953
ouça o poeta
POETAMENOS 1953
POPCRETOS 1966
flor da boca da pele do céu
pele do céu da flor da boca
céu da flor da boca da pele
boca da pele do céu da flor
1954 - 1960
ENIGMAGENS 1973
atrocaducapacaustiduplielastifeliferofugahistoriloqualubrimendimultipliorganiperiodiplastipublirapareciprorustisagasimplitenaveloveraivivaunivoracidadecity cité
atrocaducapacaustiduplielastifeliferofugahistoriloqualubrimendimultipli
organiperiodiplastipublirapareciprorustisagasimplitenaveloveraivivaunivoracidade
city
cité
atrocaducapacaustiduplielastifeliferofugahistoriloqualubrimendimultipliorganiperiodiplastipublirapareciprorustisagasimplitenavelo
veraivivaunivoracidadecity cité
1963
1961
1965
1975
Caetano Veloso
1975
ouça o poeta
2002
Décio Pignatari
r a t e r r a t e rr a t e r r a t e rr a t e r r a t e rr a t e r r a t e r r a t e r r a t e rr a t e r r a t e r ra r a t e r r a t e rr a r a t e r r a t er r a r a t e r r a te r r a r a t e r r at e r r a r a t e r r a
1958NOIGANDRES 4
“Quem é que passa neste rio – ele ou eu? Rio da vida...Com barragens e barreiras de livros religião medo e um amor que se odeia a se mesmo, detive o ímpeto desse riso, inverti seu curso, joguei torrente contra nascente, agora é preciso derruir tudo – e partir!”
a, rosa e lixa maum perfume deio e os RR encium
Noa Noa Noa Noa Noa Noa
Quando os raios do sol penetraram na caverna da mente deserta, pôs-se a lamber, bonita e coquete, o sangue das patas e do focinho; ao bocejar, exibia a sua terrível máquina dental e uma língua estupenda, rosa e lixa macia. Em ondulações de intensidade variável, um perfume denso acompanhava os movimentos do seu corpo e os RR enciumados: rru... rru... Como em mulher formosa, passava as mãos pelos pêlos da fera, dos cabelos à cauda nervosa de músculos sensíveis; arranhava devagar a nuca e os flancos sedosos e quentes; ela recolhia as garras nos estojos das paras feitos de veludo vivo, num ronrosnar de prazer: rru... rru... Artimanhosamente, entremostrava, exibia os seus indefiníveis encantos. O deserto passou a ficar como que povoado, passou a revelar-lhe todas as suas belezas sublimes – e a solidão, todos os seus segredos.
1992
nossas (vozes de (corpo (se entediam)
e (o tempo (dentadura (vagarosa (das máguas carniceiras) vai cariando) e curando) a caicol) o sentimento)como os novos) ares) a um)
ovo furado
polpa (tremente e (surpresa (onde só
longe na pele a (minha (sua mão na (nucasentem o nu (do tato: (viram seus olhos esse (gomo (vermelho ( que eu fui na
onde (se vive um (corpo (inteiro (gozando de (gritar e (devorado?
e esse (corte na sombra (sorriso na
face de um (pêssego (inclinado
verna da mente desert
o sangue das patas
sua (boca
Haroldo de Campos
o azul é puro?o azul é pus
de barriga vazia
o verde é vivo?o verde é vírus
de barriga vazia
o amarelo é belo?o amarelo é bile
de barriga vazia
o vermelho é fúcsia?o vermelho é fúria
de barriga vazia
a poesia é pura?a poesia é para
de barriga vazia
NASCEMORRE
senascemorre nascemorre nasce morre renasce remorre renasce remorre renasce remorre re
redesnasce
desmorre desnasce desmorre desnasce desmorre
nascemorrenascemorrenascemorrese
umaunhade estóriao quartzocrescente
oolho centralrosácearosaberta
palafitassuspendemojejum
estesmínimosmins
sangrabertaa rosáceao olhoo centro ao sul
o azulcônsulruiu
tetopassárofogossolroxoorouxinol
uguísuum nítidorisco
suspenasapenaspenso
POEMANDALA
na
gaiola do lá
entrar
sem que os
passáros-nomes
arrulhem
VIA CHUANG-TSÉ 1
os cupins se apoderaram da bibliotecaouço o seu áfono rumoro canto zero das térmitasos homens desertaram a bibliotecapalavras transformadas em papelos cupins ocupam o lugar dos homensgulosos de papel peritos em celuloseo orgulho dos homens se abate madeiraroída
tudo é vão
a lepra dos cupins corrói o papel os livroso gorgulho mina o orgulhoassim ficaremos cadáveres verminosos
escrevo este elogio da térmita
POEMA QOHELÉTICO 2 : ELOGIO DA TÉRMITA
Crisantempo, 1988
1.
se a mente é clarao quarto escurotem um céu azul :se a mente é escurao quarto claroescurece de sol
2.
o olho vê a mãoe não se vêo tacto é o olhoda mãoo olho táctila mão vidente
o tactolharda mão-olhotactilvê-se
Crisantempo, 1988
VARIAÇÕES SOBRE AFORISMO ZEN
circuladô de fulô ao deus ao demodará que deus te guie porque eu não posso guiá eviva quem já me deu circuladô de fulô e ainda quem falta me dá
soando como um shamisen e feito apenas com um arame tenso um cabo e uma lata velha num fim de festafeira no pino do sol a pino mas para outros não existia aquela música não podia porque não podia popular aquela música se não canta não é popular se não afina não tintina não tarantina e no entanto puxada na tripa da miséria na tripa tensa da mais megera miséria física e doendo doendo como um prego na palma da mão um ferrugem prego cego na palma espalma da mão coração exposto como um nervo tenso retenso um renegro prego cego durando na palma polpa da mão ao sol
circuladô de fulô ao deus ao demodará que deus te guie porque eu não posso guiá eviva quem já me deu circuladô de fulô e ainda quem falta me dá
o povo é o inventalínguas na malícia da maestria no matreiro da maravilha no visgo do improviso tenteando a travessia azeitava o eixo do sol
circuladô de fulô ao deus ao demodará que deus te guie porque eu não posso guiá eviva quem já me deu circuladô de fulô e ainda quem falta me dá
e não peça que eu te guie não peça despeça que eu te guie desguie que eu te peça promessa que eu te fie me deixe me esqueça me largue me desamargue que no fim eu acerto que no fim eu reverto que no fim eu conserto e para o fim me reservo e se verá que estou certo e se verá que tem jeito e se verá que está feito que pelo torto fiz direito que quem faz cesto faz cento se não guio não lamento pois o mestre que me ensinou já não dá ensinamento
circuladô de fulô ao deus ao demodará que deus te guie porque eu não posso guiá eviva quem já me deu
circuladô de fulô Caetano Veloso
poetas
SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO
SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO
SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO
SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO
SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO SILÊNCIO
EUGEN GOMRINGER
ras gar gar rasras gar gar rasras gar gar ras
ERTHOS ALBINO DE SOUZACÓDIGO 1976
toda regra tem exceção
esta regra tem exceção nem toda regra tem exceção
nem esta regra tem exceção
JOSÉ LINO GRUNEVALDvai e vem nº 3
CÓDIGO 1976
EDGAR BRAGAvocábulo 1966
EDGAR BRAGAalfabegrama
poetas & ideogramas
They who are skilled in fire
shall read tan the dawn
Ezra Pound, Canto 91
O ideograma Aurora, dialoga com o texto em inglês como imagem do nascer do sol.
Eles que são hábeis em fogo
devem ser a cor do amanhecer
femme
MATSUÓ BASHÔ
1686
sapo(ideograma chinês)
furu ike yakawasu tobikomumizu no oto
velha lagoao sapo salta o som da água
(Paulo Leminski)
velho tanque rã salt’ tomba rumor de água
(Haroldo de Campos)
velha lagoa
uma rã merg ulha uma rã
águaágua. (Décio Pignatári)
Ode 274DA “ANTOLOGIA CLÁSSICADEFINIDA POR CONFÚCIO
EZRA POUNDAugusto de Campos
Mão de Rei Wunão cai, só sua.Não faz qual solluz só de dia.
Shang- Ti (no céu)fez reis Ch’eng e K’ang;mol dou os réis;ta lhou -lhes luz.
Gongo, flau ta soam,tam- tam no tom,som do bom grãose ou ve en tão.
Quem faz, faz bem.Quem não tem fim.Um dom do chãovem com o grão.
A idéia do que seria a América se os clássicos tivessem ampla circulação perturba o meu sono.
Cantico del sole
CathayEZRA POUND, 1915Augusto de Campos
Lamento do guardião da fronteiraLAMENT OF THE FRONTIER GUARD
By the north gate, the wind blows full of sand,Lonely from the beginning of time until now!Trees fall, the grass goes yellow with autumn,I climb the towers and towersto watch out the barbarous land:Desolate castle, the sky, the wide desert.There is no wall left to this village.Bones white with a thousand frosts,High heaps, covered with trees and grass;Who brought this to pass?Who was brought the flaming imperial anger?Who has brought the army with drums and with kettle-drums?Barbarous kings.A gracious spring, turned to blood-ravenous autumn,A turmoil of wars-men, spread over the middle kingdom,Three hundred and sixty thousand,And sorrow, sorrow like rain.Sorrow to go, and sorrow, sorrow returning.Desolate, desolate fields,And no children of warfare upon them,No longer the men for offence and defense.Ah, how shall you know the dreary sorrow at the North Gate,With Rihaku's name forgottenAnd we guardsmen fed to the tigers
Pelo Portão do norte sopra o vento carregado de areia,Solitário desde a origem do tempo até agora!Árvores caem, no outono a relva amarelece.Galgo torres e torres para vigiar a terra bárbara:Desolado castelo, o céu, o amplo deserto.Nenhum muro de pé sobre esta aldeia.Ossos alvos com milhares de geadas,Altas pilhas, cobertas de árvores e grama;Quem fez com que isso acontecesse?Quem trouxe a cólera imperial flamante?Quem trouxe o exército com tambores e atabales?Bárbaros reis.De uma primavera suave a um outono de saque e sangue,Tumulto de guerreiros dispersos pelo reino,Trezentos e sessenta mil,E tristeza, tristeza como chuva.Tristeza para ir, tristeza no regresso.Desolados, desolados campos,E nenhuma criança da campanha sobre eles, Não mais os homens para a ofensa e a defesa.Ah! Como sabereis de toda tristeza no Portão do Norte,Como o nome de Rihaku esquecidoE nós, guardiões, pasto dos tigres?
Alan Davis-DrakeGutemberg Project
RIHAKU(Li Po)
The moon’s snow falls on the plum tree;
A neve da lua cai sobre a ameixeira;
Its boughs are full of bright stars.
Seus galhos estão cheios de estrelas brilhantes.
We can admire the bright turning disc;
Podemos admirar o brilhante disco que gira;
The garden right above there, casts its pearls to our weeds.
O jardim lá de cima, lança suas pérolas sobre as ervas daninhas.
ERNEST FENOLLOSAEzra PoundHaroldo de Campos
Li Po / Haroldo de Campos
montanha verdeazul além da torre norte
água clara em redor da cidade este
aqui afinal nos separamos:
milhas e milhas através da relva seca
nuvens voláteis: a ânimo de quem viaja
o adeus sol posto a um velho amigo
mãos ondulando na partida
ao ríspido nitrido dos cavalos
o texto chinês esta disposto à maneira ocidental – esquerda -> direita
12. Eu Qohélet O-que-Sabe § eu fui rei §de Israel § em Jerusalém
13. E do meu coração eu me deia indagar e inquirir § com saber §§sobre o todo § de tudo o que é feito § sob o céu §§§
17. E do meu coração eu me dei § a saber o sabere saber da loucura § e da sandice §§soube §§ também isto § é o vento-que-some
18. Pois § em muito saber § muito sofrer §§§E onde a ciência cresce § acresce a pena
II1. Eu disse § para o meu coração §§vem § vou provar-te no prazer § e prover-te do melhor §§§E isto também isto § névoa-nada
III1. Para tudo § seu momento §§§E tempo para todo evento § sob o céu
2. Tempo de nascer § e tempo de morrer §§§Tempo de plantar §§ e tempo § de arrancar a planta
3. Tempo de matar § e tempo de curar §§Tempo de destruir § e tempo de construir
4. Tempo de pranto § e tempo de riso §§
do ECLESIASTES QOHÉLET ( O-QUE-SABE)Haroldo de Campos
minha especialidade é viver - era a legenda de um homem (que não tinha renda porque não estava à venda)
olhar à direita - replicaram num segundo dois bilhões de piolhos púbicos do fundo de um par de calças (morimbundo)
o céu era açuc ar lu minoso comestível vivos cravos tímidos limões verdes frios s choc olate s. so b, uma lo co mo tiva c uspi ndo vi o letas .
E. E. CUMMINGS1894 – 1962Augusto de Campos
MAIAKÓVSKI
poema-anel Liu bliú (Amo) na tradução gráfica de Lissitzki, para o livro Dliá Gólossa (Para Voz), publicado em berlim, 1923
1893 - 1930
BORIS SCHNAIDERMAN
AUGUSTO E HAROLDO
DE CAMPOS, 1982
a tarde ardia com cem sóis
Augusto de Campos
MAIAKÓVSKI
Euà poesiasó permito uma forma:concisão,precisão das fórmulasmatemáticas.Às parlengas poéticas estou acostumado,eu ainda falo versos e não fatos.Porémseeu falo “A”este “a”é uma trombeta - alarma para Humanidade.Se eu falo“B”É uma nova bomba na batalha do homem.
Augusto de Campos
MAIAKÓVSKI
Sei o pulso das palavras a sirene das palavrasNão as que se aplaudem do alto dos teatrosMas as que arrancam os caixões da trevae os põem a caminhar quadrúpedes de cedroÀs vezes as regalam inauditas inéditasMas a palavra galopa com a cilha tensaressoa os séculos e os trens rastejam para lamber as mãos calosas da poesiaSei o pulso das palavras Parecem fumaçaPétalas caídas sob o calcanhar da dançaMas o homem com lábios alma carcaçaMAIAKÓVSKI
Augusto de Campos
MAIAKÓVSKIAugusto de Campos
A chuva lúgubre olha de travésAtravés.da gra-de magraos fios elétricos da idéia férrea –colchão de penas.Apenas as pernasdas estrelas ascendentesapoiam nele fácilmente os pés.Mas o destroçar dos faróis,reisna coroa do gásse faz mais doloroso aosbuquêshostisdasprostitutasdotrotoar.No aro troardo riso-espinho dos motejos –das venenosas rosasamarelas se propagaem zig-zag.Ag-rada olhar detrás do alardee do medo:ao escravodas cruzesquieto-sofrido-indiferentes,e ao esquife das casas suspeitaso orientedeita no mesmo vaso em cinza e brasas.
Vad
im R
igin
/ d
o ma
i.com
MAIAKÓVSKI
Talvez quem sabe um dia Por uma alameda do zoológicoEla também chegará Ela que também amava os animaisEntrará sorridente assim como estáNa foto sobre a mesaEla é tão bonita Ela é tão bonita que na certa Eles a ressuscitarãoO Século Trinta vencerá O coração destroçado já Pelas mesquinharias Agora vamos alcançar Tudo o que não podemos amar na vidaCom o estrelar das noites inumeráveisRessuscita-meAinda que mais não sejaPor que sou poeta E ansiava o futuro
O Amor (Sobre o poema de Wladimir Maiakovski)
Ressuscita-me Lutando contra as misériasDo cotidiano Ressuscita-me por isso Ressuscita-meQuero acabar de viver o que me cabeMinha vida Para que não mais existam Amores servis Ressuscita-me Para que ninguém mais tenha De sacrificar-se Por uma casa, um buracoRessuscita-me Para que a partir de hoje A partir de hoje A família se transforme E o pai seja pelo menos o Universo E a mãe seja no mínimo a Terra A Terra, a Terra
Caetano Veloso
Gal Costa
fragmento 1
o ovo de fogo. o ovo de água. o ovo de vento
no saco de seda. o ovo de ar.
o homem de pé e a mulher de pé. o homem sentado
e a mulher sentada. o homem deitado e a mulher deitada
a escada de osso encostada no tronco de carne
o homem tem uma bengala de osso. a mulher
tem uma bengala de carne
o ovo de pé. o ovo sentado. o ovo deitado.
fragmento 5
o ovo. o fogo. a água. a terra. o ar o
homem. a mulher.
o ovo veste um chapéu e um avental de fogo.
a água veste uma blusa com um botão de ar.
o homem veste uma gravata de fogo.
a mulher veste um avental de água.
isto excita as flo
res masculinas.
HANS ARP(1886 - 1966) tradução: Mônica Costa / Anita HirschbruchCORPO EXTRANHO 1982
UM LANCE DE DADOS
STÉPHANE MALLARMÉ
(1842 – 1898)
tradução Haroldo de Campos, 1974
JAMAIS
MESMO QUANDO LANÇADO EM CIRCUNSTÂNCIAS
ETERNAS
DO FUNDO DE UM NAUFRÁGIO
SEJA que o Abismo
branco estanco iroso sob uma inclinação plane desesperadamente
de asa a sua de
antemão retombada do mal de alçar o vôo e cobrindo os escarcéus cortando cerce os saltos
no mais íntimo resuma
a sombra infusa no profundo por esta vela alternativa
até adaptar à envergadura
sua hiante profundeza enquanto casco de uma nau pensa de um ou de outro bordo
O MESTREexsurto inferindo dessa conflagração
que se
como se ameaça o único Número que não pode
hesita cadáver pelo braçoantes de jogar maníaco encanecido a partida em nome das ondas uma naufrágio esse
fora de antigos cálculosonde a manobra com a idade olvidada
outrora ele empunhara o leme
a seus pés do horizonte unânimeprepara se agita e mescla no punho que o estreitavaum destino e os ventosser um outro Espírito para o arrojar na tempestade repregar-lhe a divisão e passar altivo apartado do segredo que guarda
invade a cabeçaecoa barba submissa
direto do homem
sem nau não importa onde vã
ancestralmente em não abrir a mão crispada para além da inútil testalegado na desaparição a alguém ambíguo o ulterior demônio imemorial tendo de regiões nenhumas induzidoo velho versus esta conjunção suprema com a probabilidade
aquele sua sobra puerilafagada e polida e devolta e lavada suavizada pela vaga e subtraída aos duros ossos perdidos entre as pranchas nato de um embate as águas pelo ancião tentando ou o ancião contra as águas Núpcias cujo véu de ilusão ressurto ânsia instante como o fantasma de um gesto vacilará se abaterá insânia
JAMAIS ABOLIRÁ
COMO SE Uma insinuação simples ao silêncio enrolada ironia ou o mistério precipitado uivado nalgum próximo turbilhão de hilaridade e horror
esvoaça em torno ao vórtice sem o juncar nem fugir
e lhe embalança o indício virgem
COMO SE
que a encontre ou eflore um gorro de meia-noite e imobilize no veludo enrugado por uma gargalhada sombria
essa brancura rígida derrisória em oposição ao céu muito para não marcar exiguamente quem quer que
príncipe amargo do escolho
dela se coife como de algo heróico irresistível mas contido por sua pequena razão viril relâmpago
pluma solitária perdida
salvo
angustioso expiatório e púbere mudo
o lúcido e senhorial penacho à fronte invisível cintila então sombreia uma estatura frágil tenebrosa em sua torsão de sereia
com impacientes escamas últimas
riso que
SE
de vertigem
ereta
o tempo de esbofetear bifurcadas
uma rocha solar falso de súbito evaporado em brumas que chantava um marco no infinito
Cai a pluma rítmico suspense do sinistro sepultar-se nas espumas primordiaisde onde há pouco sobressaltara seu delírio a um cimo fenescidopela neutralidade idêntica do abismo
FOSSEêxito estelar
O NÚMERO
EXISTIRIA diverso da alucinação esparsa da agonia
COMEÇARIA E CESSARIAsurdindo assim negado e ocluso quando aparente enfimpor alguma profusão expandida em raridade
CIFRAR-SE-IA
evidência da soma por pouco una
ILUMINARIA
SERIA pior não mais nem menos indiferentemente mas tanto quanto
O ACASO
NADA
da memorável crise ou se houvesse
o evento
cumprido em vista de todo resultado nulo humano
TERÁ TIDO LUGAR uma elevação ordinária verte a ausência
SENÃO O LUGAR
inferior marulho qualquer como para dispersar o ato vazio abruptamente que senão por sua mentira teria fundado a perdição
nessas paragens do vago onde toda realidade se dissolve
EXCETO
à atitude TALVEZ tão longe que um local
se funde com o além
afora o interesse quando a ele assinalado em geralsegundo tal obliqüidade por tal declive de fogosversus deve ser o Setentrião também Norte
UMA CONSTELAÇÃO
fria de olvido e dessuetude não tanto que não enumere sobre alguma superfície vacante e superior o choque sucessivo sideralmente de um cálculo total em formação
vigiando duvidando rolando brilhando e meditando
antes de se deter em algum ponto último que o sagre
Todo Pensamento emite um Lance de Dados
RIMBAUD
www.sciam.comVOWELS
AA negro, E branco, I rubro, U verde, O azul, vogais, Ainda desvendarei seus mistérios latentes: A, velado voar de moscas reluzentes Que zumbem ao redor dos acres lodaçais;
E, nívea candidez de tendas e areais, Lanças de gelo, reis brancos, flores trementes;
I, escarro carmim, rubis a rir nos dentes Da ira ou da ilusão em tristes bacanais;
U, curvas, vibrações verdes dos oceanos, Paz de verduras, paz dos pastos, paz dos anos Que as rugas vão urdindo entre brumas e escolhos;
O, supremo Clamor cheio de estranhos versos, Silêncios assombrados de anjos e universos: - Ó! Ômega, o sol violeta dos Seus Olhos!
VOGAISAUGUSTO DE CAMPOS
RIMBAUD
A noir, E blanc, I rouge, U vert, O bleu:voyellesJe dirai quelque jour vos naissances latentes:Qui bombinent autour des puanteurs cruelles,
Golfes d'ombres; E, candeurs de vapeurs et des tentes,Lances de glaciers fiers, rois blancs, frissons d'ombelles;
I, pourpres, sang craché, rire de lèvres bellesDans la colère ou les ivresses pénitentes;
U, cycles , vibrements divins des mers virides,Paix de pâtis semés d'animaus, paix des ridesQue l'alchimie imprime aux grands fronts studiex;
O, suprême Clairon plein de strideurs étranges,Silences traversés des Mondes et des Anges:
- O! 'oméga , rayon violet des Ses Yeux!
VOYELLES
RIMBAUD
EDGAR BRAGAcanto das vogais
Referências / agradecimentos
www.ubu.comwww.poesiaconcreta.com.brThe Project Gutenberg, EBook – E Pound Cathay Revistas: Código; Qorpo Estanho; Poesia em GreveMusa Paradisíaca, Josely Vianna BaptistaCaetano Veloso, (Você; Circulador; Gal Costa)Edgar Braga, DesbragadaHaroldo de Campos, (Xadrez de Estrelas, Eclesiastes Ideograma, lógica, poesia e linguagem)Décio Pignatári (Toda Poesia; Panteros)Augusto de Campos (Poesia 1949-1979, Poesia em risco)www2.uol.com.br/augustodecampos/poesiaconc.htmMallarméMarjorie Perlof O Movimento Futurista
e desculpas à algumas fontes www não citadas