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Publicação da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ISSN 1413-4969 ./ / 200 Publicação Trimestral Ano XV - Nº 4 Out Nov. Dez. 6 Revista de Desempenho da política de garantia de preços via contratos de opção de venda e prêmios para escoamento de produto Pág. 24 Inovação tecnológica e desenvolvimento do agronegócio Pág. 59 A oportunidade da agroenergia e uma opção transitória para o Brasil Ponto de Vista Pág. 118 Dimensões estratégicas e dilemas das Centrais de Abastecimento no Brasil Pág. 37

Pol Agr 04-2006 - agricultura.gov.br · mudança da agricultura familiar tradicional para a agricultura familiar capitalista, em cujo ambi-ente os fatores de produção têm custo

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Publicação da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

ISSN 1413-4969

./ / 200

Publicação TrimestralAno XV - Nº 4

Out Nov. Dez. 6

Revista de

Desempenho dapolítica de garantiade preços viacontratos de opçãode venda e prêmiospara escoamentode produto

Pág. 24

Inovaçãotecnológica edesenvolvimentodo agronegócio

Pág. 59

A oportunidade daagroenergia e umaopção transitóriapara o Brasil

Ponto de Vista

Pág. 118

Dimensões estratégicas edilemas das Centrais deAbastecimento no Brasil

Pág. 37

ISSN 1413-4969Publicação Trimestral

Ano XV – Nº 4Out./Nov./Dez. 2006

Brasília, DF

SumárioCarta da Agricultura

Agricultura familiar ........................................................... 3Eliseu Alves

Desempenho de estabelecimentos do Pronaf.................... 5Eliseu Alves / Geraldo da Silva e Souza / Carlos Alberto Vasconcelos de Oliveira

Desempenho da política de garantia de preçosvia contratos de opção de venda e prêmios paraescoamento de produto.................................................. 24Aline Cristina da Cruz / Erly Cardoso Teixeira

Dimensões estratégicas e dilemas dasCentrais de Abastecimento no Brasil ............................... 37Altivo Roberto Andrade de Almeida Cunha

Distribuição geográfica da pecuária leiteira no Brasil ...... 47Rosangela Zoccal / Airdem Gonçalves de Assis / Silvio Roberto de MedeirosEvangelista

Inovação tecnológica e desenvolvimento do agronegócio .. 59Dante Daniel Giacomelli Scolari

Negociação na rede de poder na cadeia vitivinícolabrasileira – O caso do vinho tinto de mesa a granel ........ 74Mariano Marques

O risco de base para a sojaem Sinop e Lucas, Mato Grosso ...................................... 85Flávio Borges Botelho Filho / Gotardo Machado de Souza Júnior

Tipificação dos estabelecimentos rurais deprodutores assentados – Análise de conglomerados........ 98Daniela de Paula Rocha / Geraldo da Silva e Souza /Mauro de Rezende Lopes / Ignez Vidigal Lopes

Sistema Nacional de Certificaçãode Unidades Armazenadoras ....................................... 109Pedro Sergio Beskow / Denise Deckers do Amaral /Aroldo Antonio de Oliveira Neto

Ponto de VistaA oportunidade da agroenergia euma opção transitória para o Brasil ............................... 118Frederico Ozanan Machado Durães

Conselho editorialEliseu Alves (Presidente)

Edilson GuimarãesIvan WedekinElísio ContiniHélio Tollini

Antônio Jorge de OliveiraRegis N. C. Alimandro

Biramar Nunes LimaPaulo Magno Rabelo

Marlene de Araújo

Secretaria-geralRegina M. Vaz

Coordenadoria editorialMierson Martins Mota

Antônio Jorge de Oliveira

Cadastro e distribuiçãoViléia Oliveira Reis

Revisão de texto etratamento editorial

Raquel Siqueira de Lemos

Normalização bibliográficaSabrina Ruas Lopes

Celina Tomaz de Carvalho

Projeto gráfico e capaCarlos Eduardo Felice Barbeiro

Foto da capaLuís Carlos Vissoci

Thais Lorenzini (montagem)

Impressão e acabamentoEmbrapa Informação Tecnológica

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 2

Todos os direitos reservados.A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte,

constitui violação dos direitos autorais (Lei nº 9.610).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Embrapa Informação Tecnológica

Revista de política agrícola. – Ano 1, n. 1 (fev. 1992) - . – Brasília: Secretaria Nacional de Política Agrícola, Companhia Nacionalde Abastecimento, 1992-

v. ; 27 cm.

Trimestral. Bimestral: 1992-1993.Editores: Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura,

Pecuária e Abastecimento, 2004- .Disponível também em World Wide Web: <www.agricultura.gov.br>

<www.embrapa.br>ISSN 1413-4969

1. Política agrícola. I. Brasil. Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento. Secretaria de Política Agrícola. II. Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento.

CDD 338.18 (21 ed.)

Interessados em receber esta revista, comunicar-se com:

Ministério da Agricultura, Pecuária e AbastecimentoSecretaria de Política Agrícola

Esplanada dos Ministérios, Bloco D, 7º andarCEP 70043-900 Brasília, DF

Fone: (61) 3218-2505Fax: (61) 3224-8414

[email protected]

Empresa Brasileira de Pesquisa AgropecuáriaSecretaria de Gestão e Estratégia

Parque Estação Biológica (PqEB), Av. W3 Norte (final)CEP 70770-901 Brasília, DF

Fone: (61) 3448-4336Fax: (61) 3347-4480

Mierson Martins [email protected]

Esta revista é uma publicação trimestral da Secretaria dePolítica Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento, com a colaboração técnica da Secretariade Gestão e Estratégia da Embrapa e da Conab, dirigida atécnicos, empresários, pesquisadores que trabalham como complexo agroindustrial e a quem busca informaçõessobre política agrícola.

É permitida a citação de artigos e dados desta Revista, desdeque seja mencionada a fonte. As matérias assinadas nãorefletem, necessariamente, a opinião do Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento.

Tiragem5.000 exemplares

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 20063

O programa para agricultura familiar querfazer crescer o excedente que cada família pro-duz para ser comercializado, como um dos ca-minhos para aumentar sua renda e bem-estar.Ou seja, admite-se que existe uma solução naagricultura para o problema da pobreza rural.

Mantendo-se invariante a relação preçosde produtos para preços de insumos, o exce-dente só pode ser aumentado pelo cultivo demais área ou fazendo cada hectare produzirmais.

Os agricultores familiares dispõem de pe-quenas áreas, mas, mesmo assim, mantêm ter-ra ociosa, porque a mão-de-obra familiar dis-ponível, sendo baixo o nível de mecanização,como de fato acontece, é insuficiente para eli-minar a capacidade ociosa do estabelecimen-to. Assim, dar acesso à mecanização é muitoimportante para a agricultura familiar, de modoque possa explorar toda a área, além de reali-zar as operações agrícolas na hora certa, comprecisão e menos sofrimentos. Sem a mecani-zação, a tecnologia que faz diretamente cadahectare produzir mais não revela todo seu po-tencial.

Mas a maneira mais eficiente de elimi-nar a restrição do tamanho do estabelecimentoé pela tecnologia bioquímica, como sementese animais mais produtivos, fertilizantes, rações,herbicidas, plantio direto e outras práticasconservacionistas.

Estamos, assim, diante da inovaçãotecnológica. Ela requer conhecimento e capi-

Agricultura familiar

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tal para viabilizar a nova tecnologia. O capitale o conhecimento estão casados, unidos de for-ma inseparável. Sem conhecimento, o capitalproduzirá a falência. Sem o capital, o conheci-mento é inútil.

A forma de capitalizar a agricultura fami-liar é pelo crédito rural, a parcela de investi-mento. Mas investimento sem crédito de cus-teio redunda em nada, ou seja, redunda emdeixar o capital ocioso, como é regra na nossaagricultura. Por isso, o crédito de custeio éigualmente importante.

Como é o conhecimento, principalmenteo novo conhecimento, que move a agricultura,a extensão rural, comandada pelos agriculto-res familiares e financiada pelo governo, é fun-damental.

Na agricultura familiar, o estabelecimen-to e a família se interpenetram, mas as ligaçõesse modificam e enfraquecem com o avanço dafamília na direção do agronegócio. Na fase quese vive, a família e o estabelecimento necessi-tam, no planejamento, ser considerados, comoum todo, para se garantir o sucesso econômicodo empreendimento. Nos primórdios da exten-são rural, essa visão reinou absoluta. Com adominância da visão produtivista das décadasde 1970 e 1980, ela se perdeu, e hoje é ignora-da. Como também a administração rural, tãoindispensável como disciplina, perdeu todo oespaço no treinamento dos extensionistas.Assim, hoje se busca o incremento dos rendi-mentos, sem cuidar das suas implicações paraa família e para o lucro.

1 Eliseu Alves é assessor do diretor-presidente e pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

Eliseu Alves1

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Vê-se que a tecnologia, o crédito rural, aextensão e a administração rural são inseparáveisno trato dos problemas da agricultura familiar.Dois livros que a Embrapa lançará brevementediscutem em profundidade esses temas, quando

relacionam as tecnologias criadas pela Empresae estudam a economia da agricultura familiar. Sãoeles: Agricultura Familiar na Dinâmica da Pes-quisa Agropecuária e Migração Rural–Urbana,Agricultura Familiar e Tecnologia.

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Desempenho deestabelecimentosdo Pronaf

Eliseu Alves1

Geraldo da Silva e Souza2

Carlos Alberto Vasconcelos de Oliveira2

1 Assessor do diretor-presidente e pesquisador da Embrapa.2 Pesquisadores da Embrapa.

Resumo: As famílias estudadas são enquadráveis no Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf).Não foi possível verificar se – à época da coleta dos dados –, elas foram diretamente beneficiadas pelaação desse programa. Pertencem a cinco bases de dados, sendo quatro do Nordeste e uma da RegiãoSul. As bases de dados estão armazenadas na Sede da Embrapa, em Brasília, DF, na Secretaria deGestão e Estratégia (SGE). O processo de produção é analisado em detalhes, dividindo-se os estabele-cimentos em dois grupos: de renda líquida não negativa e negativa. Vários indicadores de desempe-nho, como a renda bruta, produtividades parciais, produtividade total dos fatores e taxas de retorno sãoavaliados – em termos da influência de variáveis contextuais – via modelos robustos de análise devariância. O processo de produção das regiões estudadas é investigado via ajuste econométrico defunções de produção da família (Douglas-Cobb). Vários erros de alocação de recursos foram encontra-dos, e recomenda-se mudança de visão, em relação à administração rural, insumos modernos, meca-nização da agricultura, crédito rural e extensão rural.

Palavras-chaves: agricultura familiar, custos de produção, produtividade e produção rural.

IntroduçãoNo caso da agricultura familiar, tem sido

dito que ela é um estilo de vida, que escapa aoscritérios de eficiência. Contudo, é difícil aceitarque os agricultores familiares estejam dispostos apagar pelo prazer de trabalhar a terra. Se issoocorresse em anos sucessivos, eles teriam quevender o patrimônio para pagar as dívidas acu-muladas, ou, então, utilizar recursos de fontesexternas, como doações e aposentadorias, parao mesmo fim. Acresce, ainda, que a família é par-te desse estilo de vida, e pressionada pelos meiosde comunicação modernos, ela quer ter acesso àeducação, à saúde e ao conforto que a socieda-de moderna oferece. Assim, não há como fugirdos critérios de eficiência, quando o objetivo éaumentar o bem-estar da família.

Quando o estabelecimento e a família for-mam um todo fortemente entrelaçado, não hácapital a depreciar, a terra não demanda fertili-zantes e outros insumos e faltam oportunidadesde emprego, o salário médio dos membros da fa-mília é dado pela renda bruta dividida pelo nú-mero de membros. Contudo, esse mundo não exis-te entre nós: o mercado de trabalho tem presençamarcante, de dimensão nacional e, sendo assim,o trabalho tem custo de oportunidade. Ainda, asterras são pobres e pragas e doenças precisamser combatidas. Por isso, existem insumos a se-rem adquiridos e os membros da família estão deolho nas oportunidades de emprego disponíveis.No mundo externo à porteira, prevalece o capi-talismo, o qual penetra, rapidamente, os mean-dros do conjunto família/estabelecimento, impon-do novas regras operacionais, as quais trazem a

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mudança da agricultura familiar tradicional paraa agricultura familiar capitalista, em cujo ambi-ente os fatores de produção têm custo de oportu-nidade, sem nenhuma exceção.

É bem verdade que, quando o agricultor édono dos meios de produção, a remuneração delespelo custo de oportunidade fica com a família, ouseja, é componente da renda familiar gerada peloestabelecimento. Pelo nosso método, a depreciaçãopura é excluída dessa renda. Assim, a renda familiarrepresenta o que ela tem para gastar e pagar com-promissos feitos. Então, por que não desconsiderar aremuneração dos meios de produção?

Dentro da hipótese inverossímil de que nãoexiste custo de oportunidade, ou seja, terra, má-quinas, equipamentos ou parte deles, não podemser alugados a terceiros, ou mesmo vendidos, enão há emprego fora da porteira, não há porqueremunerar os bens de produção, terra, trabalhofamiliar e capital. Aceita a hipótese inverossímil,pelo menos a renda familiar tem que ser não ne-gativa. Se ela for negativa, os custos variáveisexcedem a renda bruta, e o agricultor está conde-nado a pagar pelo prazer de amanhar a terra, e, semfontes externas para socorrê-lo, irá à falência.

Quando o trabalho, capital e terra são re-munerados pelo custo de oportunidade, o agricul-tor tem compensada sua decisão de ser agricul-tor, se a renda líquida for, pelo menos, não nega-tiva. Ou seja, a opção pela vida do campo nãolhe traz nenhum desconforto econômico. Portan-to, ele fica indiferente entre ser agricultor e outrasopções de vida. Assim, deve-se optar pela rota deremunerar todos os fatores de produção, e verifi-car quais são as pedras do caminho. É precisoexplicar por que tantos estabelecimentos têm ren-da líquida negativa, e mesmo renda familiar ne-gativa. Não é objetivo comparar uma amostracom a outra, mas verificar quais são os erros dealocação comuns.

Portanto, procura-se entender por que tan-tas famílias se encontram nessa situação (comrenda líquida negativa), para que se possam indi-car soluções. Em regime de competição, a teoriade produção da firma orienta a busca.

A análise é de natureza comparativa entreos dois grupos de renda líquida, região-a-região.Fatores externos ao estabelecimento, como se-cas, queda de preços de produtos e elevação dosinsumos podem, em curto prazo, explicar a ren-da líquida negativa. Para contornar esse proble-ma, e sob a hipótese de que os dois grupos derenda foram similarmente afetados pelos fatoresexternos, a análise comparativa é indicada. Comoo grupo de renda líquida não negativa teveperformance muito melhor, o trabalho procuraráresponder por que isso ocorreu3. O trabalho ex-plora os conceitos elaborados em (ALVES; SOU-ZA, 2006), no contexto das amostras FGV (referi-das como Sul), Xingó, Ceará/Rio Grande do Nor-te, Semi-Árido baiano e Vale do Gavião, na Bahia.

Descrição resumidade cinco amostras

Sul

Em termos de critérios de desenvolvimentotecnológico e influência do Mercosul, a Funda-ção Getúlio Vargas selecionou nove regiões eaplicou 1.806 questionários detalhados, comamostra de cada região. Os dados foram coletadosem 1997 e em 1998, e se referem ao Ano Agríco-la 1996–1997. O presente trabalho explora osdados do ponto de vista do Pronaf, e restringe-seà Região Colonial do Rio Grande Sul e àquelaformada por pequenos agricultores do oeste, donoroeste e do plantio direto do Paraná, com a fi-nalidade de estabelecer contraponto com a Re-gião Nordeste. Detalhes sobre a amostra da FGVpodem ser vistos em (ROCHA, 2006).

As quatro bases de dados do Nordeste es-tão armazenadas na Secretaria de Gestão e Es-tratégia (SGE) da Embrapa, em Brasília, DF.

Xingó

Abrange 29 municípios de Pernambuco,Bahia, Alagoas e Sergipe, quase todos às margens

3 Os dados da amostra não documentaram a presença de fatores desfavoráveis ou favoráveis.

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do Rio São Francisco, no perímetro de influênciadireta das usinas hidrelétricas de Paulo Afonso,Itaparica e Xingó, e pertencem à área de cercade 40.000 km². A amostra compreende nove mu-nicípios, embora em estados diferentes, perten-cem à mesma região. São eles Canindé do SãoFrancisco e Poço Redondo, ambos em Sergipe;Olho d’Água do Casado, Piranhas e DelmiroGouveia, em Alagoas; Jatobá e Petrolândia, emPernambuco; e Paulo Afonso e Nova Glória, naBahia. A base de dados contém 1.220 observa-ções, sendo aproveitadas 1.122. A coleta de da-dos, a definição dos municípios e a definição dasvariáveis estiveram a cargo do Programa Xingó,financiado pelo convênio CNPq/Cesf/Sudene. Osdados referem-se ao Ano Agrícola 1999.

Ceará/Rio Grande do Norte

No Ceará, os 616 questionários são dosmunicípios de Bela Cruz, Barbalha, Senador Sá,São José do Amarante, Carnaubal, Viçosa do Ce-ará, Massapê, Meruoca, Caucaia, Cascavel, Li-moeiro do Norte, Morada Nova, Itapiúna, PiquetCarneiro, Arneirós, Jucás, Mauriti, Tianguá, Icapuíe Farias Brito. Ao todo, são 20 municípios.

No Rio Grande do Norte, os 588 questionári-os apresentados são de Lagoa Nova, Currais Novos,Lajes Pintadas, São Miguel, São Paulo do Potengi,Angicos, Jandaíra, Areia Branca, Governador Dix-Sept Rosado, Pedra Grande, Mossoró, Assu,Ipanguassu e Baraúna. Um total de 14 municípios.

As Emateres participaram da definição dasvariáveis, seleção dos municípios dos dois esta-dos e fizeram a coleta dos dados, os quais dizemrespeito ao Ano Agrícola 1998.

Semi-Árido baiano

No Semi-Árido baiano, os 1.183 questioná-rios preenchidos são dos municípios de Ribeirado Pombal, Ribeira do Amparo, Euclides da Cu-nha, Tucano, Uauá, Morro do Chapéu, Ibiassucê,Pindaí, Aracatu, Várzea do Poço, Serrolândia,Bom Jesus da Lapa, Candeal, Cotegipe, Ipitanga,Formosa do Rio Preto, Sítio do Quinto, Jeremoabo,Andaraí, Luiu e Xique-Xique. São, ao todo, 21

municípios. A Empresa Baiana de Desenvolvimen-to Agrícola (EBDA), colaborou na definição dasvariáveis e fez a coleta de dados, os quais refe-rem-se ao Ano Agrícola 1997.

Vale do Gavião, na Bahia

A amostra é do Vale do Gavião, BA, com1.274 questionários referentes aos municípios deAnagé, Belo Campo, Caraíbas, Condeúba, Cor-deiros, Guajeru, Jacareci, Licínio de Almeida,Maetinga, Mortugaba, Piripá, Jânio Quadros eTremendal, sendo aproveitados apenas 1.177questionários, em 13 municípios. A Companhia deAção Regional (CAR), vinculada à Secretaria dePlanejamento do Estado da Bahia, responsabili-zou-se pela coleta dos dados, que se referem aoAno Agrícola 1999. Ressalte-se que os dados nãosofreram os efeitos do programa de desenvolvi-mento a cargo da CAR, visto que a coleta antece-deu sua entrada em operação.

Definições de termos utilizadosRenda bruta – Equivale ao valor da produ-

ção do estabelecimento durante o ano. Inclui oconsumo da família. Ou seja, cobre mais que aprodução vendida. Não se aplicam juros sobreesse valor, porque não havia informações sobreas datas das receitas.

Aluguel da terra – O aluguel da terra, ouseja, seu custo de oportunidade, foi obtido apli-cando-se 4% sobre seu valor.

Máquinas e equipamentos – Aplicou-se aTabela Price, sendo a vida útil igual a 30 anos, ovalor igual ao valor de compra, como se novofosse, e os juros de 6%. A prestação correspondeao custo de oportunidade.

Benfeitoria – O valor da benfeitoria é igualao valor da sua construção, como se fosse nova.A vida útil foi estimada em 50 anos. Em seguida,no caso de máquinas e equipamentos, usou-se aTabela Price, com taxa de juros de 6%.

Depreciação pura – Corresponde ao valordo bem dividido pela vida útil.

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Animais – Aplicou-se a taxa de juros de 6%sobre o valor do estoque de animais, para se ob-ter o custo de oportunidade.

Capital – É a soma dos fluxos dos dispêndi-os em terra, benfeitorias, máquinas, equipamen-tos, lavouras permanentes e animais, acima defi-nidos. Portanto, trata-se de conceito de fluxo, com-patível com o valor de produção.

Mão-de-obra familiar – Obteve-se, para oano, o número de dias/homens equivalentes, e seaplicou o salário mínimo do período da coleta dedados como valor do dia/homem.

Mão-de-obra assalariada – O entrevistadoinformou o salário e dias trabalhados. Uma sim-ples multiplicação obteve o fluxo de gastos comesse fator, o qual se divide em mão-de-obra per-manente e temporária.

Insumos – Valor de compra na porteira da fa-zenda. O grupo poupa-terra corresponde aos insumosque visam a aumentar a produtividade da terra. En-tre eles, estão fertilizantes, agrotóxicos, calcário, ra-ções, medicamentos, sementes e adubos.

Renda líquida – É igual ao valor da produ-ção menos a soma dos dispêndios em aluguel deterra, máquinas e equipamentos, benfeitorias, ani-mais, trabalho assalariado, mão-de-obra familiare insumos comprados ou produzidos no estabele-cimento. Não foram incluídos os impostos nãoembutidos nos insumos e despesas com o trans-porte da produção. A renda líquida correspondeao conceito dentro da porteira e antes dos impos-tos que não incidem sobre insumos ou produtos.

Renda líquida do capital – É igual à rendalíquida + aluguel de terra + dispêndios em máqui-

nas, equipamentos, benfeitorias e animais, menos12 salários mínimos mensais, que é o salário atri-buído ao empreendedor.

Renda líquida familiar – Corresponde à ren-da líquida, adicionada do valor imputado à mão-de-obra familiar, aluguel de terra, juros sobre adepreciação de máquinas, equipamentos, animais ebenfeitorias4. A renda líquida familiar mede a remu-neração que a família recebe do estabelecimento.

Renda familiar de fontes externas – É a somados valores recebidos de aposentadorias, trabalhofora do estabelecimento e de outras fontes.

Renda familiar total – É a soma dos itens13 (Renda líquida familiar) e 14 (Renda familiarde fontes externas).

Critérios deenquadramento no Pronaf

Para selecionar o grupo de estabelecimen-tos enquadráveis no Pronaf, aplicaram-se os cri-térios da Resolução do Bacen nº 2.629, de 10 deagosto de 1999 (Tabela 1). Foi necessáriodeflacionar os valores da referida resolução, parao respectivo ano agrícola. Para isso, escolheu-seo IPR – Brasil (ROCHA, 2006).

Critérios de análise

Indicadores de produtividade

O objetivo do estudo é encontrar erros deadministração que expliquem a enorme diferen-ça de desempenho entre os grupos de renda lí-

4 Isto vale para os bens que pertencem ao chefe de famílias, porque, de fato, não houve desembolso.

Tabela 1. Critérios de enquadramento no Pronaf, Resolução Bacen nº 2.629, de 10 de agosto de 1999.

Área em módulos fiscaisPorcentagem da renda familiar gerada pelo estabelecimentoTrabalhadores assalariados permanentesResidência do chefe da família no estabelecimento e proximidadesTítulo de posse: proprietário, parceiro, arrendatário ou ocupantePredominância do trabalho familiar

Critério

Fonte: Rocha (2006).

Limite

≤ 4≥ 80≤ 2

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quida não negativa (RL ≥ 0) e nega-tiva (RL < 0), região a região, dife-rença esta muito maior nas quatrobases de dados da Região Nordes-te. Os indicadores de produtivida-de registram eficiências e ineficiên-cias, mas sem explicá-las. Tais in-dicadores funcionam como um ter-mômetro.

Analisam-se os meios de pro-dução disponíveis, porque eles es-tabelecem limites para renda brutae afetam os indicadores de produti-vidade. Por isso, construiu-se a Ta-bela 2, que mostra as diferenças depatrimônio, renda bruta, renda líqui-da e renda familiar para situar o lei-tor, e, ainda, indicar quão dísparessão as famílias do Pronaf, Nordestevis-à-vis Sul. Nesse caso – e somen-te nele –, o salário mínimo é a moe-da. Vejamos os critérios:

Produtividade totaldos fatores (PTF)

A interpretação natural da PTFé quanto um real de custo de pro-dução traz de renda bruta. Assim, éuma medida da produtividade detodos fatores, daí se segue o nomeque tem. É influenciada tanto pelaescolha da função de produçãocomo pela combinação de insumos.Tendo-se em conta que RB repre-senta a renda bruta e CT o custo to-tal e RL a renda líquida, virá: PTF<1, se somente se RL <0. Como sesabe PTF = RB / CT, logo, PTF <1implica em RB < CT, e RB < CT, por-tanto renda líquida negativa, a qualimplica em se ter PTF < 1. Outra in-terpretação da PTF é dada por PTF- 1 = (RB - CT) / CT. Como RB - CT éa remuneração do empreendedorpelo fato de correr o risco de produ-zir, o quociente ao lado dá essa re-muneração do empreendedor em Ta

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1999

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14

61

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s

9,6

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9s

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7,1

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2,96

0,45

3,41

26,4

875

,96

RL

< 0

RL

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3

1996

–199

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Sul

RL

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011,

131,

1231

,06

7,65

RL

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1999

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Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 10

relação ao dispêndio na produção (CT), ou seja,em relação ao que gastou. Portanto, trata-se dataxa de retorno do empreendedor, e, novamente,esta só é negativa se a renda líquida for negativa.Assim, a taxa de retorno do empreendedor, a PTFe a renda líquida contam a mesma história.

Num regime de competição, a PTF deveser igual a 1, a menos de omissões de insumos eerros de medida. Empiricamente, deve-se espe-rar que a PTF flutue em torno de 1. Quando a PTFé <1, significa que se ficou aquém do nível deprodução factível para a cesta de insumos obser-vada. Ou seja, não se tem conhecimento e a ha-bilidade necessária para usar eficientemente osinsumos. Na comparação de dois grupos de agri-cultores, diferenças de PTF refletem diferenças deescolhas de função de produção, de escolha dacesta de insumos e erros de medida. Como va-mos comparar dois grupos de agricultores damesma região, os erros de medidas devem afetaruniformemente os dois grupos. Como a escolhacorreta da função de produção e da combinaçãode insumos também depende de conhecimentos,segue-se que PTFs desiguais refletem desigual-dade de conhecimentos. Mas, quando os custostotais de produção são iguais, num ambiente emque as tecnologias usadas sejam semelhantes, di-ferenças de PTF indicam que as funções de pro-dução divergem5.

Da análise, a lição que se tira, quando as PTFsdivergem, é que um grupo dispõe de conhecimen-tos (função de produção e cesta de insumos) nãopartilhados pelo outro. A rota mais fácil é descobrirquais são esses conhecimentos e difundi-los. Assim,a PTF é importante medida de tecnologia.

Taxas de retorno (do empreendedore taxa interna de retorno)

Como vimos, a taxa de retorno do empre-endedor conta a mesma história da PTF. A taxainterna de retorno (TIR) pode ser computada. Nocaso, toma-se o patrimônio como sendo o vultodo investimento a fazer. No ano da coleta dosdados, computa-se a renda líquida do capital, ena hipótese que ela se repita em 30 anos, compu-ta-se a taxa interna de retorno. Taxas internas deretorno desiguais refletem diferenças detecnologias, de combinação de insumos e de vul-to de investimento. A taxa interna de retorno éprópria para comparar investimentos.

Pode-se indagar qual é a taxa de retornodo capital referente ao ano. Ela é o quociente darenda líquida do capital, referente ao ano, dividi-da pelo valor do patrimônio.

Produtividades parciais (terra e trabalho)

A produtividade da terra corresponde à ren-da bruta dividida pela área do estabelecimento,em hectares. Obviamente, somente numa agri-cultura primitiva, que usa terra e trabalho comoinsumos, e, em quantidade, trabalho é proporcio-nal à terra, a produtividade da terra mede suacontribuição à renda bruta. Nas cinco amostras,terra, benfeitoria e trabalho correspondem a maisde 50% do custo total de produção6 (Tabela 3).Nas quatro sub-regiões nordestinas, esse valorultrapassa 65% para a classe de renda líquidanegativa. Assim, a produtividade da terra é umaaproximação, de razoável para fraca, de sua con-tribuição à renda bruta, e a aproximação é maisacurada para a classe de renda líquida negativa.No Nordeste, essa classe está mais próxima deuma agricultura primitiva. A produtividade do tra-

5 Custos totais iguais significam que, no nível deles, os dois grupos não encontraram restrições.6 Considera-se as benfeitorias, porque elas se incorporam à terra.

Tabela 3. Participação (em %) da terra, benfeitorias e trabalho no custo total.

Colonial RS, plantio direto e norte e oeste do ParanáXingóCeará/Rio Grande do NorteSemi-Árido baianoVale do Gavião, BA

Região RL ≥≥≥≥≥ 0

52,963,065,953,155,8

RL < 0

54,674,272,665,565,7

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200611

balho tem a mesma dificuldade de interpretaçãodaquela da terra.

Indicadores de administraçãoOs indicadores de produtividade apontam

deficiências de desempenho entre os dois gruposde renda líquida, mas não explicitam as causasde uma melhor performance. O que se pretendecom os indicadores de administração é identificá-las. Dividimo-los em dois grupos: indicadores detamanho e de modernidade.

TamanhoComo estamos comparando dois grupos (RL

≥ 0 e RL < 0), é importante saber como divergem,quanto à área do estabelecimento e patrimônio,porque eles podem influenciar o desempenho.

ModernidadeA tecnologia cristaliza-se em insumos. Em

alguns deles, podemos enxergar a modernidadedo estabelecimento. Estabelecimentos modernosusam mão-de-obra qualificada, e o trabalho temmenor peso no custo total, ganhando relevânciaa tecnologia poupa-trabalho, como máquinas,equipamentos e herbicidas. Da mesma forma,decresce a importância da terra, e avulta a dosinsumos poupa-terra, como fertilizantes, defensi-vos, rações e medicamentos. Assim, a terra temmenor importância no custo total. Em relação aotipo de agricultura sob análise, podemos fundirterra, benfeitoria e trabalho num só insumo, comoindicador de modernidade. No patrimônio, destaca-se a participação de máquinas e equipamentos.

Os estabelecimentos analisados têm áreapequena, e ela pode ser “ampliada”, com o usodos insumos poupa-terra. Assim, a participaçãodos insumos poupa-terra no custo total mostra di-ferenças de modernidade.

O modelo de análise de variância

À exceção da amostra Ceará/Rio Grandedo Norte, o modelo estatístico usado em cada

tabela decompõe a soma dos quadrados da vari-ável dependente y nos efeitos aditivos índice(index), região (regio) e na interação index * regio.A variável índice (index) vale 0 para a classeRL ≥ 0 e 1 para a classe RL < 0.

Em algumas tabelas, como as tabelas 2, 8 e9, a variável dependente y é evidente. Por exem-plo, na tabela 2, a renda bruta é uma das variá-veis dependentes. A variável dependente y foiordenada (procedimento rank do SAS) e o testefoi aplicado às ordenações obtidas. A finalidadeda transformação da variável dependente emposições (ranks) é contornar o efeito das observa-ções extremas, e o procedimento usado é nãoparamétrico.

Os testes foram realizados pelo procedi-mento GLM (generalized linear method) do SAS.Para o índice (index), têm-se dois níveis, assim onível de significância do Teste F, já testa a dife-rença entre eles. Aplicou-se o procedimento des-crito na seção Resultados: a função de produçãopara se testar a endogeneidade de índice e solu-cionar o problema que ela causa.

Formalmente, o modelo corresponde a: yij= µ+θi+βj+(θβ)ij+εij, em que µ é média geral, θi =efeito da i-ésima região, βj = efeito do j-ésimo ín-dice, e (θβ)ij é a interação região x índice. No Sul,a variável Região (regio) corresponde a três regi-ões amostrais, Região Colonial, no Rio Grande doSul, plantio direto e pequenos produtores do oes-te e do noroeste do Paraná. Em Xingó, no Semi-Árido baiano e no Vale do Gavião, na Bahia, aregião são os municípios. No Ceará/Rio Grandedo Norte, há os efeitos estado (região) e município, eo modelo é: yijk(j) = µ+θi+βj+ζk(j)+(θβ)ij+(θζ)ik(j)+εijk(j),onde µ = média geral, onde, θi = efeito da i-ésimaregião, βj = efeito do j-ésimo índice, ζk(j) = efeitodo k-ésimo município dentro do j-ésimo índice.(θβ)ij = interação região x índice, (θζ)ik(j) =interação índice região dentro de município, (in-corporada ao erro aleatório visto ser insignifican-te), e εijk(j) = erro aleatório. Não existe a interaçãomunicípio e região, já que os municípios são dis-tintos para cada região. Similarmente não existea interação tripla município região índice.

Os resultado dos modelos estão nas tabelas2, 8 e 9. Na apresentação dos resultados, não se

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 12

detém na análise de cada um deles. Contudo, elessubstanciam a avaliação de desempenho que éfeita, que é o objetivo do trabalho. A comparaçãoé entre o grupo de renda líquida não negativa e ogrupo de renda líquida negativa. O símbolo s sig-nifica que a hipótese da igualdade das médias foirejeitada no nível de 5 % de probabilidade, pelomenos. Caso contrário, se utiliza o símbolo ns.

Resultados do modelo: rendaestabelecimento e família,e custo total

Para a agricultura não irrigada, as condi-ções sulinas são muito melhores que as nordesti-nas. Contudo, é importante realçar diferenças derenda entre os dois grupos de bases, Sul e Nor-deste, com a finalidade de chamar a atenção paraque as políticas de crédito e extensão e antiêxodorural se adaptem às condições locais.

No Sul, uma solução agrícola para o pro-blema de pobreza rural é factível, no contexto daagricultura não irrigada. E a solução agrícola, emcondições de Semi-Árido, é complicada, a nãoser no contexto da agricultura irrigada, conside-rando-se as evidências que serão apresentadas:para manter o homem no campo, numa condiçãode renda familiar per capita de um salário míni-mo, somente com a agricultura como está, nãoparece possível. É preciso acoplar políticas detransferência de renda e de seguro rural. No Nor-deste, o grupo mais bem-sucedido, de RL ≥ 0, nãoalcançou renda da família, a gerada pelo estabe-lecimento, de um salário mínimo mensal7. O ou-tro grupo, o mais numeroso, de RL < 0, muitosdeles pagam para ser agricultores, pois a rendalíquida da família gerada pelo estabelecimentotem média menor que 0, e é negativa na seguinteproporção: Xingó, 51,7 %; Ceará/Rio Grande doNorte, 37,0 %; Semi-Árido baiano, 48,7 % e Valedo Gavião, na Bahia, 44,3 %.

A renda líquida remunera o empreendedorpelo risco que corre. Essa remuneração não exis-te para um grande número de estabelecimentos

das cinco bases de dados, mas a proporção é muitomaior para aquelas nordestinas: Sul, 53,4%; Xingó,73,8%; Ceará/Rio Grande do Norte, 81,9%; Semi-Árido baiano, 79,4% e Vale do Gavião, na Bahia,75,8%.

Sem proteção do risco pelo governo, osbancos fogem dos produtores que não remune-ram todos os fatores de produção. Considerando-se essa condição, no Nordeste estudado, menosde 30% dos estabelecimentos enquadráveis noPronaf são elegíveis. No Sul, menos de 50 %. Emparte, isso explica por que o Pronaf é muito maisvolumoso no Sul (CASTRO; TEIXEIRA, 2006).

Especificamente, cabe salientar:

Não é surpresa que a renda seja muito bai-xa, porque o Pronaf foi criado para os agricultorespobres, e para os quais se supõe existir uma solu-ção na agricultura, compreendida nessa a indús-tria caseira e o emprego fora do estabelecimentopara o excesso de mão-de-obra familiar. Os da-dos captam as diversas fontes de renda.

A renda bruta mede a renda gerada peloestabelecimento, e corresponde ao valor da pro-dução, vendida e autoconsumo e abrange a in-dústria caseira. A renda bruta per capita é muitobaixa: No Sul (família de quatro membros), trêssalários mínimos mensais para o grupo RL ≥ 0, edois salários mínimos mensais para o grupoRL < 0. Nas quatros sub-regiões do Nordeste (fa-mília de cinco membros), é menor que um saláriomínimo e muito menor que esse valor para o gru-po RL < 0. Ou seja, o estabelecimento, sem nadadescontar como dispêndio para produzir, não ofe-rece condições de sustento para a família. No Sul,o problema existe, mas é menos grave.

Depois de remunerar os dispêndios para pro-duzir, a renda líquida remunera o empreendedor pelorisco de produzir. Como vimos, ela é negativa para amaioria dos estabelecimentos: Sul, 53,4 %; Xingó,73,8 %; Ceará/Rio Grande do Norte, 81,9 %; Semi-Árido baiano, 79,4 %; e Vale do Gavião, na Bahia,75,8 %. Portanto, a maioria dos estabelecimentos nãoremunera o empreendedor, e se essa situação per-sistir, esses estabelecimentos são inviáveis.

7 A família tem, pelo menos, cinco membros e quatro no Sul.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200613

Como a família é dona dos meios de produ-ção, é de interesse computar a renda familiar ge-rada pelo estabelecimento. Agregam-se à rendalíquida, o valor dos salários imputados ao traba-lho familiar, juros sobre a depreciação debenfeitorias, máquinas, equipamentos, plantasperenes e animais e o aluguel da terra. Correspon-de ao que a família dispõe para pagar emprésti-mos, compromissos outros e consumir, como ren-da gerada pelo estabelecimento. Resta saber seas atividades da agricultura sustentam a família.

Quando negativa, a renda da família gera-da pelo estabelecimento implica que se paga paraproduzir, vendendo-se o patrimônio ou utilizan-do-se de outras fontes. No Sul, apenas 12 produ-tores dos 313 constantes da amostra, pagam paraproduzir, mas a renda familiar per capita média éde 1,44 salário mínimo mensal para o grupo derenda líquida não negativa e de 0,74 salário míni-mo mensal para o grupo RL < 0. E esse últimogrupo corresponde a 53,3% dos 313 estabeleci-mentos da amostra sulina. Mesmo no Sul, a famí-lia tem uma remuneração pela agricultura muitobaixa.

Nas quatro bases do Nordeste, a situação ébem pior. A renda familiar per capita, gerada peloestabelecimento, para o grupo RL ≥ 0, os maisbem-sucedidos, somente no Semi-Árido baianovale 0,86 salário mínimo mensal, e é menor que0,5, para outras três bases. Essa renda familiarmédia é negativa para o grupo RL < 0. É numero-so, no Nordeste, o grupo de renda familiar negati-va gerada pelo estabelecimento totalizando37 % dos estabelecimentos: Xingó, 51,7 %; Cea-rá/Rio Grande do Norte, 37,0 %; Semi-Áridobaiano, 48,7 %; e Vale do Gavião, BA, 44,3 %.

Numa situação em que o estabelecimentonão mantém a família, ou a mantém de formainsatisfatória, é natural buscar-se fontes de rendasexternas para melhorar o potencial de consumoda família e cobrir déficits. Somando-se a rendafamiliar gerada pelos estabelecimentos às fontesexternas, tem se renda familiar total. A Tabela 4nos permite determinar a participação das fontesexternas na renda familiar total. Quando a rendafamiliar gerada pelo estabelecimento é negativa,

a participação excede 100 %. No Sul, e para osestabelecimentos de RL ≥ 0, essa participação émuito menor, porque a performance da agricultu-ra, embora em níveis baixos, é melhor.

Ainda resta um grupo de famílias de rendafamiliar total negativa. Estas vão ter que venderativos para saldar dívidas deixadas pelos estabe-lecimentos, visto que os recursos das fontes exter-nas não foram suficientes: é o grupo mais vulne-rável, e ele é bastante expressivo no Nordeste.No Sul, são 10 estabelecimentos (3,2 %); no Xingó,185 (20,0 %); no Ceará/Rio Grande do Norte , 118(10,7 %); no Semi-Árido baiano, 175 (15,8 %); eVale do Gavião, BA, 109 (10,0 %).

A renda bruta é gerada pelo custo total, oqual é fundamental no patrimônio, que mede osrecursos que o agricultor comanda. No Vale doGavião, BA, o grupo de RL < 0 tem, estatistica-mente, maior custo total que o de RL ≥ 0. Nasdemais bases de dados, o custo total não divergeentre os dois grupos. No entanto, a renda bruta émuito maior, a favor do grupo RL ≥ 0. No Sul,37,4 % maior; Xingó, 439,7 %; Ceará/Rio Grandedo Norte, 261,4 %; Semi-Árido baiano, 772,1 %;e Vale do Gavião, BA, 350 %.

A renda bruta tem um papel muito relevan-te, visto que, à exceção do Ceará/Rio Grande doNorte e do Vale do Gavião, na Bahia, os custostotais dos dois grupos de renda líquida não diver-gem, estatisticamente, e nesses casos, é o grupode renda líquida negativa que tem custo totalmaior. Por isso, decidimos, detalhar a distribuição darenda bruta, apresentando os valores máximo e mí-nimo e as separatrizes do primeiro décil e dos quartis25 %, 50 % e 75 % (Tabela 5). Outra razão é presen-ça de valores destoantes, como se pode notar pelosvalores máximos e mínimos. Conforme já foi expli-cado, nos testes, essa influência foi contornada pelatransformação da variável dependente em posições(ranks). As separatrizes, máximos e mínimos, são sis-tematicamente maiores para o grupo RL ≥ 0, comoocorreu com a média. A diferença de renda brutaentre os dois grupos de renda líquida cresce com arenda bruta, em termo das separatrizes. Portanto, essadiferença se mantém ao longo da distribuição darenda bruta.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 14

Tabela 4. Participação (%) das fontes externas na renda familiar total.

SulXingóCeará/Rio Grande do NorteSemi-Árido baianoVale do Gavião, BA

Bases de dados RL ≥≥≥≥≥ 0

5,224,531,715,725,7

RL < 0

13,2120,2106.0106,9100,4

Tabela 5. Distribuição da renda bruta, em R$ da coleta, para as cinco bases de dados.

Sul

Xingó

Ceará/RioGrande do Norte

Semi-Áridobaiano

Vale doGavião, BA

Bases de dados Classe

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

Mínimo

3.794,25855,00

492,000,00

410,006,00

240,008,00

812,09,00

10 %

5.716,503.695,00

1.617,0062,40

1.000,00250,00

1.072,0070,00

1.850,0080,00

25 %

8.762,006.035,00

3.038,40184,20

2.290,00567,00

3.050,00205,50

2.901,00303,00

Mediana

15.143,7310.824,50

5.200,00595,00

4.670,501190,00

6.500,00485,00

4.255,00886,25

75 %

24.241,2016.376,00

8.267,601.649,40

9.568,002.295,00

10.460,001.156,50

6.850,001.848,00

Máximo

48.725,0044.844,00

41.260,0016.900,00

91.900,0080.000,00

49.415,009.680,00

60.246,0020.169,50

O custo total segue o padrão inverso da ren-da bruta (Tabela 6). As separatrizes do grupo derenda líquida negativa são maiores que as do gru-po de renda líquida não negativa. No Semi-Áridobaiano, nem todas as separatrizes seguem esse

padrão, mas as diferenças entre os dois grupossão muito pequenas. Pelo custo máximo, perce-be-se a existência de valores destoantes, que,certamente, influenciam as médias, mas não ostestes, como já foi explicado.

Tabela 6. Distribuição do custo total, em R$ da coleta, para as cinco bases de dados.

Sul

Xingó

Ceará/RioGrande do Norte

Semi-Áridobaiano

Vale doGavião, BA

Bases de dados Classe

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

Mínimo

2.021,002.789,42

378,44305,45

297,62286,23

186,46198,29

319,18521,63

10 %

4.325,605.095,90

1.182,601.261,38

702,851.414,12

844,20860,47

1.149,011.388,79

25 %

6.383,888.326,26

1.874,752.370,28

1.599,212.196,24

2.040,261.513,45

1.292,222.034,18

Mediana

11.908,4913.894,62

3.266,803.845,68

3.050,233.672,60

3.671,212.656,42

1.945,013.287,39

75 %

19.910,1621.161,42

5.398,316.190,11

6.113,576.014,73

5.747,664.439,34

2.839,675.181,05

Máximo

46.123,5450.516,64

18.990,5122.021,81

19.718,2080.930,59

17.820,6622.847,64

4.032,5632.707,57

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200615

nas dimensões função de produção, cesta de insumose disciplina na aplicação das prescrições, atecnologia é responsável pela enorme diferença.

A Tabela 7 mostra a distribuição da razão(RL ≥ 0 dividido por RL < 0) das produtividadestotais dos fatores para a média, mediana, mínimo,separatrizes de 10 %, 25 %, 75 % e máximo.A menor razão ocorre entre as separatrizes do ter-ceiro quartil, e mesmo assim, os valores são mui-to elevados: Sul, 1,57; Xingó, 4,48; Ceará/RioGrande do Norte, 3,20; Semi-Árido baiano, 5,31;e, finalmente, Vale do Gavião, BA, 3,69.

Entre os dois grupos de rendas e nas cincobases de dados, não há diferença nos tipos deinsumos usados, embora elas existam nas quanti-dades, portanto o efeito tecnologia está na esco-lha da cesta de insumos e na aplicação corretadas prescrições. Não se exigem investimentos emcapital físico para produzir os enormes ganhos,nas proporções acima documentadas. Basta queo grupo de renda líquida negativa siga aquilo queo grupo de renda líquida não negativa faz. A ex-tensão rural tem aí um veio lucrativo para atuar,criando condições para troca de experiênciasentre grupos de agricultores.

O esperado é que o conhecimento fluíssenaturalmente de um grupo para o outro. Comoisso não ocorre, há impedimentos à difusão deconhecimento entre os dois grupos, nas cincobases de dados. Infelizmente, os dados não per-mitem esclarecer quais barreiras são essas. Note-se que não falamos de novos insumos, e, sim, doseguir regras corretas de uso, incluindo-se nelasa escolha da cesta de insumos.

Em síntese, o grupo de renda negativagasta igual ou mais para produzir bem menos,e no Nordeste essa diferença é mais notória.Por que é assim? A resposta está em tecnologia,escolha da combinação de insumos e aplica-ção da tecnologia. Tecnologia, como cristali-zada na cesta de insumos, não explica tama-nha diferença de renda bruta, pois os dois gru-pos praticam uma agricultura bastante tradicio-nal, com pouco uso de máquinas, equipamentose insumos bioquímicos. É no usar a tecnologia –escolher a combinação de insumos e seguir asprescrições corretamente –, que reside a maiordiferença. Constata-se que grupo de renda lí-quida não negativa, também muito tradicional,sabe mais e é mais disciplinado que o outro nolidar com a mesma cesta de insumos.

Resultados: medidas de desempenhoA produtividade total dos fatores mede o

efeito da tecnologia, seja na escolha datecnologia, no seguir corretamente as prescriçõese na escolha correta da combinação de insumos.Quando ela é menor que 1, a renda líquida é ne-gativa, e assim, ela é menor que 1 para o grupoRL < 0.

Cada real de custo total produz muito maisno grupo de renda líquida não negativa (RL ≥ 0).Sul, 1,7 vez (70 % mais); Xingó, 7,4 vezes (640 %mais); Ceará/Rio Grande do Norte, 4,4 vezes(340 % mais); Semi-Árido baiano, 6,9 vezes(590 % mais); e, finalmente, Vale do Gavião, BA,5,6 vezes (560 % mais). Conforme já explicado,

Tabela 7. Distribuição das razões das produtividades totais dos fatores entre os dois grupos de renda líquidapara média, mediana, mínimo e separatrizes de 10 %, 25 %, 75 % e máximo.

MédiaMedianaMínimo10%25%75%Máximo

Item Sul

1,671,495,601,891,541,572,57

Xingó

7,387,17

637,5044,7618,42

4,4831,03

Ceará/Rio Grandedo Norte

4,373,70

232,8811,886,213,20

15,19

Semi-Áridobaiano

6,927,37

186,4227,2313,50

5,3110,18

Vale doGavião, BA

5,585,10

333,7338,8813,37

3,6927,15

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 16

O outro lado da moeda da produtividadetotal dos fatores é taxa de retorno do empreende-dor – em porcento, a renda líquida dividida pelocusto total. Como as duas medidas de desempe-nho equivalem-se, não é surpresa que espelhema mesma realidade: quanto é pior o desempenhodo grupo RL < 0 vis-à-vis o grupo RL ≥ 0.

A renda líquida do capital é igual à rendalíquida + aluguel de terra + dispêndios em máqui-nas, equipamentos, benfeitorias, árvores frutíferase animais – 12 salários mínimos mensais, que é osalário atribuído ao empreendedor. O capital, naacepção dos bens que o estabelecimento coman-da, é muito mais bem remunerado pelo grupoRL ≥ 0. Por isso, as duas taxas de retorno calcula-das são muito mais elevadas para o grupo RL ≥ 0.São elas a taxa anual de retorno – em porcento, arenda líquida do capital dividida pelo patrimônio,e taxa interna de retorno, a qual é taxa que igualao valor presente do fluxo de renda, em 30 anos,ao valor do patrimônio. Em cada 1 dos 30 anos, arenda (r) é igual à renda líquida do capital, mantidaconstante. Pergunta-se qual é a taxa que iguala ovalor presente desse fluxo de renda ao valor dopatrimônio. Ou ainda, considerando-se o fluxo derenda r, que se estende em 30 anos, qual é a taxade retorno do investimento correspondente aovalor do patrimônio? Formalmente, determina-se i, na equação a seguir:

Como a renda líquida do capital é negativanas quatro bases do Nordeste, quando se trata dogrupo RL < 0, não existe i ≥ 0 que solucione aequação acima. Por isso, a taxa interna de retor-no foi calculada somente para o grupo de rendalíquida não negativa. Ela está acima de 10 % paraas quatro bases, o que compara bem com rendi-mento da poupança depois de descontada a in-flação. Assim, o grupo de renda líquida não nega-tiva, RL ≥ 0, justifica o investimento do valor cor-respondente ao patrimônio. Contudo, esse grupoopera numa escala que não remunera adequada-mente os membros da família, mesmo conside-rando-se a renda total dessa família. Portanto, épreciso remover os obstáculos à expansão do

negócio, entre eles, o crédito agrícola, tanto decusteio como de investimento.

No Sul, a taxa interna de retorno do grupoRL ≥ 0 igualou-se a 6,12 % e é negativa, igual a-5,42 % para o grupo RL < 0. Assim, justifica-se oinvestimento igual ao valor do patrimônio, somen-te para o grupo de renda líquida não negativa.

As produtividades parciais contam a mes-ma história, e realçam grande diferença a favordo grupo de renda líquida não negativa, como sepode ver na Tabela 8. O grupo RL < 0 gasta muitomais trabalho, capital e terra para produzir umaunidade de produto, fundamentalmente porquetem renda bruta bem menos elevada por unidadede custo.

Além de terra e trabalho, contam-se comtrês tipos de insumos em nível de estabelecimen-to: poupa-terra – aqueles bioquímicos, como fer-tilizantes, rações, defensivos, medicamentos, etc;e poupa-trabalho – máquina e equipamentos; e,finalmente, aqueles de administração, que pou-pam todos os insumos. Não dispomos de dadossobre dispêndios nesse tipo de insumos.

À exceção do Sul, o grupo de renda líquidanão negativa apresenta maior dispêndio relativoao custo total em máquinas e equipamentos, maso dispêndio é menor que 10 %. Trata-se, assim, deagricultura de nível baixo de mecanização, ba-seada no trabalho, o que é esperado entre os ele-gíveis pelo Pronaf, programa que visa empregara mão de obra familiar e não substituí-la pelasmáquinas e equipamentos, e quer manter o agri-cultor no campo. Contudo, é preciso lembrar quemáquinas e equipamentos também complemen-tam o trabalho, porque ajudam a ocupar a frontei-ra interna do estabelecimento, além de realizar,com muito mais precisão e menos sacrifícios, astarefas que a agricultura e a pecuária requerem.Sem elas, será difícil resgatar da pobreza o grupoestudado. Entre as restrições que precisam serremovidas do caminho dos agricultores pobres,está o acesso à mecanização. No caso de com-petição com a mão-de-obra familiar, devem-seampliar as ocupações dentro e fora de estabele-cimento, sem jamais restringir a mecanização.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200617

Os insumos do tipo poupa-terra visam au-mentar a produtividade da terra. Sem a irrigaçãoe a proteção de seguro, em regiões semi-áridas,são pouco usados pelos agricultores. Estes, paraevitar risco de perda, procuram minimizar as com-pras de insumos. No entanto, esse tipo de insumoé fundamental para remover a restrição da áreado estabelecimento. Como vimos, mesmo os es-tabelecimentos mais bem-sucedidos não ofere-cem, nas bases de dados nordestinas, uma remu-neração satisfatória. Portanto, carecem de ampli-ar a produção, e, para isso, os insumos poupam-terra são indispensáveis.

No Nordeste, a exceção à regra de minimi-zar o dispêndio em insumos poupa-terra é Xingó.Lá, o gasto com esse tipo de insumo chega a21 % para o grupo de RL ≥ 0 e 14% para a classeRL < 0. Nas três outras bases, o dispêndio é me-nor que 7 % do custo total. No Sul, os insumospoupa-terra têm participação no custo total bemmais significante: RL ≥ 0 – 28 % e RL < 0 – 22 %.No Sul, em Xingó e Ceará/Rio Grande do Norte,estatisticamente, o grupo RL ≥ 0 gastou mais nes-se tipo de insumo, relativamente ao custo total,que o grupo RL < 0. Nas outras duas bases dedados, não se encontrou diferença significante.

Em resumo, o grupo de renda líquida nãonegativa gasta mais que outro grupo em mecani-zação e nos insumos que fazem cada hectare pro-duzir mais. Em mecanização, como é esperado,os gastos são pouco importantes em relação aocusto total. Ou seja, trata-se de agriculturas debaixo índice de mecanização. À exceção do Sule de Xingó, o gasto em insumo poupa-terra é pe-queno em relação ao custo total, falha séria dealocação desse tipo de custo.

Em relação ao custo total, nas agriculturasmais evoluídas gasta-se muito menos em traba-lho, porque o objetivo é aumentar a produtivida-de do trabalho.

É usual afirmar-se que é preciso respeitar arestrição de manter o emprego da mão-de-obrafamiliar, mas esaa restrição só é válida, se a agri-cultura pagar o custo de oportunidade dos mem-bros da família. Caso contrário, há dois caminhos,não exclusivos: aumentar a renda bruta por uni-Ta

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Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 18

dade de custo total e buscar emprego fora da fa-zenda, para o excesso de trabalho familiar. O gru-po de renda líquida não negativa exemplifica apossibilidade de aumentar a renda bruta, semmudança estrutural no estabelecimento.

No Sul, em relação ao custo total, o traba-lho caiu para o nível de 25 % (26 %, RL < 0), e osdois grupos de renda líquida não diferem estatisti-camente. Nas quatro bases do Nordeste, o grupode renda líquida não negativa gasta menos emtrabalho, relativamente ao custo total. Assim,mostra sinais de evoluir para o nível do Sul. Aliás,o Semi-Árido baiano, a classe RL ≥ 0 se aproxima doSul, e o Vale do Gavião não está muito distante. Nessasquatro bases do Nordeste, o grupo de renda líquidanegativa gasta mais de 47 % do custo total em traba-lho, um sinal claro de agricultura tradicional.

Nas agriculturas mais evoluídas, quando seinclui o aluguel da terra, se gasta menos deR$ 1,00 (de trabalho) por real de capital. No PronafSul, isso já ocorreu. Nas quatro bases do Nordes-te, novamente o Semi-Árido baiano atingiu essamarca. As outras bases de dados estão longe des-se padrão.

O patrimônio representa os recursos que oagricultor dispõe para produzir. Os dispêndios emcapital derivam-se do patrimônio, como aluguelde terra, depreciação e juros sobre depreciaçãode benfeitorias, máquinas, equipamentos, ferra-mentas e animais. Espera-se que o grupo de agri-cultores mais bem-sucedidos tenha maior dispên-dio por unidade de capital. De acordo com a Ta-bela 9, isso ocorreu no Sul. Em função de maiordispêndio em trabalho, o oposto ocorreu nas qua-tro bases nordestinas, o que é usual em agricultu-ras menos capitalizadas e tradicionais. Ressalte-se, anda, que para produzir, as quatro bases doNordeste comandam um patrimônio muito menorque o Sul.

Resultados: área comandadapor estabelecimentos

A Tabela 10 traz a distribuição da área totaldo estabelecimento. O grupo RL < 0 tem asseparatrizes dos décis e quartis, valores máximos Ta

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BA

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200619

e mínimos maiores, ou pouco menores, que o gru-po RL ≥ 0 no Sul e Ceará/Rio Grande do Norte. Oinverso ocorre em Xingó, no Semi-Árido baiano eno Vale do Gavião. Portanto, a área não tem tan-to poder para explicar o desempenho sofrível dogrupo RL < 0, e, ainda em defesa desse ponto devista, convém salientar que as separatrizes custototal, que geram a renda bruta, têm valores me-nores para o grupo de RL ≥ 0. Ou seja, emboracom áreas menores em três bases de dados, o gru-po de RL < 0 teve dispêndio igual ou maior que ogrupo RL ≥ 0.

Pelo menos 10 % dos estabelecimentos têmárea muito pequena, e somente com uma agri-cultura de elevada produtividade por hectare po-dem manter a família.

Resultados: a função de produçãoNos logaritmos, estimou-se a seguinte fun-

ção de produção:

rb = B(terra)b1+b3*índice(trabalho)b2+b4*índice eb5*índice,

em que rb é a renda bruta, terra (o aluguel é 4 %do seu valor estimado nos questionários) incorpo-ra os insumos poupa-terra, trabalho é valor gastono ano com mão-de-obra familiar e assalariada,incorpora máquinas e equipamentos, e, finalmente

índice assume o valor zero para RL ≥ 0 e um paraRL < 0. O modelo descreve uma agricultura ba-seada, principalmente, em terra e trabalho, por-tanto, bastante, primitiva.

Como índice pode estar correlacionadocom o termo do erro, usou-se o modelo apropria-do para analisar o efeito de tratamento (model fortreatment effects, for bias correction), como indi-cado por Heij et al. (2004, p. 504) e de acordocom as duas etapas do procedimento deHeckman. Na primeira etapa, estima-se um mo-delo, tipo probit, para o índice, e além de terra etrabalho, entraram, como variáveis exógenas, noslogaritmos, tamanho da família, áreas de culturaspermanentes, pastagens, lavouras tradicionais ecomerciais, inventário animal e inventário. Cons-truiu-se o inverso do Mills ratio. Na segunda eta-pa, adicionou-se uma função do Mills ratio comovariável exógena, com o nome de Mills, ao mo-delo acima. O modelo foi estimado pelo procedi-mento model do SAS, com as opções, kernel(BART, 1,0) e gmm (generalized method ofmoments) para se corrigir heteroscidesticidade.Na base do Sul, a variável Mills não foi signifi-cante (o coeficiente igualou-se a -0,21 e p-valorcorrespondeu a 0,16), por isso, eliminou-se a pri-meira etapa, como recomendado por Johnston eDinardo (1997, p. 450). Nas bases do Nordeste,ela foi significante no nível de 0,0001. Por isso, nocaso dessas bases, foram usadas as duas etapas.

Tabela 10. Distribuição da área do estabelecimento para as cinco bases de dados: separatrizes, em hectaresdo décil e dos quartis, valores mínimo e máximo.

75 %

32,0034,00

27,5019,00

42,0039,80

50,0030,65

50,0040,00

Máximo

80,0080,00

99,40100,00

100,00250,00

100,00100,00

252,00310,00

Mediana

22,4523,60

13,007,00

19,2521,00

28,0015,00

30,0021,25

25 %

13,0017,00

6,003,00

6,007,80

10,505,00

13,0010,00

10 %

9,0012,00

2,501,00

3,003,00

4,802,00

6,004,00

Mínimo

4,002,30

0,300,20

1,000,40

1,000,30

2,000,50

Classe

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

Sul

Xingó

Ceará/Rio Grandedo Norte

Semi-Áridobaiano

Vale doGavião, BA

Bases de dados

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 20

Os resultados estatísticos estão na Tabe-la 11. Na coluna da direita, estão os resultados doíndice. Quando a renda líquida é negativa (índi-ce = 1), os valores dos coeficientes do índice adi-cionam-se, respectivamente, ao intercepto, tra-balho e terra. Por exemplo, no caso do interceptopara Xingó, 1,72 = 1,20 + 0,52. O índice tem ou-tra utilidade: indica se as elasticidades dos doisgrupos diferem estatisticamente. Por exemplo, emXingó, o intercepto e as elasticidades de trabalhoe terra não divergem estatisticamente, pois oscoeficientes referentes à variável índice não sãoestatisticamente diferentes de zero.

Conforme expresso pelo R2, o ajuste é bomna base Sul, fraco em Xingó e apenas razoávelnas demais bases do Nordeste. As elasticidadestêm o sinal esperado, positivo, e à exceção deterra em Xingó, são diferentes de zero. Nas basesdo Nordeste, as elasticidades da terra têm valo-res menores que a de trabalho. Assim, acrésci-mos de dispêndios em trabalho trazem maior res-posta que em terra.

Numa agricultura baseada em terra e tra-balho, em que os agricultores dispõem de poucaterra e de abundância de mão-de-obra familiar,deveria esperar que a elasticidade de terra fosse

Tabela 11. Estimativa dos coeficientes de regressão, em duas etapas, sendo a primeira pelo proc logistic doSAS, link = probit, e a segunda pelo Proc Model, com variância heteroscedástica.

-0,550,470,641,12

1,721,010,14

1,15

2,630,680,40

1,08

2,280,750,13

0,88

1,180,930,24

1,17

1,980,250,620,87

0,520,980,09

1,07

1,290,820,24

1,07

2,370,690,35

1,03

1,580,820,09

0,92

Coeficientes

<0,0001<0,0001<0,0001<0,0001

0,45<0,0001

0,090,0001

0,46

<0,0001<0,0001<0,0001

0,0689

<0,0001<0,0001<0,0001

<0,0001

<0,0001<0,0001

0,0140

<0,0001

0,1259<0,0001<0,0001<0,0001

<0,0001<0,0001

0,00080,0001

0,03

<0,0001<0,0001<0,0001

0,0836

<0,0001<0,0001

0,002

<0,0001

0,0005<0,0001<0,0001

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-2,530,220,02

-

1,200,030,05

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--

-0,090,07

-0,22--

-0,410,110,14

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0,69-

0,140,750,45

--

0,00180,02050,0003

--

0,83930,31

<0,0001--

0,40880,12250,0057

--

InterceptoTrabalhoTerraEscala

InterceptoTrabalhoTerraMillsEscala

InterceptoTrabalhoTerraMillsEscala

InterceptoTrabalhoTerraMillsEscala

InterceptoTrabalhoTerraMillsEscala

Item

Sul (R2= 0,89)

Para escala, Teste de Wald, PR > ChiSq.

Xingó (R2= 0,42)

Ceará/Rio Grande do Norte (R2= 0,61)

Semi-Árido baiano (R2= 0,61)

Vale do Gavião, BA (R2= 0,55)

-1,87

-1,09

-1,02

-1,34

-1,87

<0,0001

<0,0001

<0,0001

PR > |t| Índice

RL ≥≥≥≥≥ 0 RL < 0 RL ≥≥≥≥≥ 0 RL < 0 Coeficiente PR >|t|

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200621

elevada e a de trabalho fosse pequena. Isso nãoocorreu no Nordeste. Uma explicação é que, emregiões onde chove pouco, é preciso corrigir aárea pelo inverso da quantidade de chuva. Comoisso não foi feito, o valor do insumo terra está su-perestimado. Por isso, tem elasticidade menor queteria, se tivesse sido corretamente medido. No Sul,onde chove normalmente, a elasticidade da terra émais elevada que a de trabalho, como esperado.

A presença de retorno constante ou cres-cente à escala indica que os agricultores estãoenfrentando restrições para expandirem sua pro-dução via incremento de todos os insumos, namesma proporção, como, por exemplo, dobrartodos os insumos (Tabela 12). O grupo de rendalíquida negativa só fará isso na presença de retor-no crescentes. Para o grupo de renda líquida nãonegativa, basta retornos constantes para compen-sar dobrar todos os insumos. Para cobrir o risco deprodução e de preço, as restrições podem ser decrédito, de conhecimentos e de um seguro quecubra os riscos de produção e de preço.

No grupo de renda líquida negativa, não seespera a presença de retorno decrescente à es-cala, mas há uma exceção apenas, que é a basede dados do Semi-Árido baiano. Nesse grupo,constatou-se a presença de retorno crescente nasbases de dados do Sul, de Xingó e do Vale doGavião, BA. Nesses casos, as restrições à expan-são de todos os insumos também concorrem paraque a renda líquida seja negativa.

Considerações finaisSão numerosos os estabelecimentos que

apresentam renda líquida negativa: base de da-dos Sul, 53,4 %; Xingó, 73,8 %; Ceará/Rio Gran-de do Norte, 81,9 %; Semi-Árido baiano, 79,4 %;e Vale do Gavião, na Bahia, 75,8 %.

A renda líquida da família representa os re-cursos oriundos do estabelecimento que ela dis-põe para pagar compromissos e para consumo.Nesse aspecto, há a ressaltar seu montante percapita (por membro da família), que é muito bai-xo: no Sul 1,7 salário mínimo para a classe RL ≥ 0e 0,74 salário para RL < 0. Nas bases do Nordes-te, o maior montante é para o grupo de renda lí-quida não negativa: 0,86 salário mínimo. A médiadessa renda é negativa para a classe RL < 0, e,ainda, sua distribuição para as duas classes épreocupante: nas bases de dados do Nordeste, elaé negativa na seguinte proporção: Xingó, 51,7 %;Ceará/Rio Grande do Norte, 37,0 %; Semi-Áridobaiano, 48,7 %; e Vale do Gavião, BA, 44,3 %.No Sul, apenas 12 estabelecimentos têm a rendafamiliar negativa. Quando a renda familiar é ne-gativa, o agricultor paga pelo prazer de trabalhara terra e viver nos campos.

Os recursos para cobrirem a renda familiarnegativa vêm de fontes externas, de crédito oude venda de patrimônio. Não apuramos essa com-ponente. Adicionando-se a fontes externas à ren-da da família, obtém-se a renda familiar total.

Tabela 12. Tipos de retorno à escala por base de dados.

Sul

Xingó

Ceará/Rio Grande do Norte

Semi-Árido baiano

Vale do Gavião, BA

Região Grupo de renda líquida

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

RL ≥ 0RL < 0

Retorno à escala

DecrescenteCrescente

`ConstanteCrescente

ConstanteConstante

ConstanteDecrescente

DecrescenteConstante

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 22

Contudo, a renda familiar total é negativa paramuitos estabelecimentos, e, nesse caso, somentea venda de patrimônio ou empréstimo equilibraas finanças: no Sul, são 10 estabelecimentos(3,2 %); no Xingó, 185 (20,0 %); no Ceará/Rio Gran-de do Norte, 118 (10,7 %); no Semi-Árido baiano,175 (15,8 %); e no Vale do Gavião, BA, 109(10,0 %).

Pela relação renda bruta e custo total, po-demos ver o desempenho dos dois grupos: cadareal de custo total produz muito mais no grupo derenda líquida não negativa (RL ≥ 0). Sul, 1,6 vez(60 % mais); Xingó, 7,4 vezes (640 % mais); Cea-rá/Rio Grande do Norte, 4,3 vezes (330 % mais);Semi-Árido baiano, 7,0 vezes (600 % mais); e, fi-nalmente, no Vale do Gavião, BA, 5,6 vezes(560 % mais).

Por que diferenças tão notáveis?

Retorno crescente à escala no grupo de ren-da líquida negativa do Sul, Xingó e Vale do Ga-vião mostra que esse grupo sofre bloqueios à ex-pansão do negócio, e tem a ganhar com a expan-são. No Semi-Árido baiano e Ceará/Rio Grandedo Norte, é o grupo de renda líquida não negati-va que apresenta retorno constante à escala, eexpandindo o negócio, o que convém fazer, fica-rá, ainda, mais distante do outro grupo. Por quenão é possível dobrar as quantidades dos insumos?Certamente, para muitos deles, a área do estabe-lecimento é muito pequena, apresenta-se comorestrição séria. No entanto, essa restrição podeser removida pelo uso, em maior quantidade, dosinsumos poupa-terra, alugando ou comprando terra.

No caso do Nordeste, há que superar osriscos climáticos: irrigação, seguro de produçãoe contra calamidade são políticas recomendáveis,também necessárias no Sul. E sem superar essesriscos, pelo que se viu nas quatro bases do Nor-deste e na do Sul, a solução agrícola do problemade pobreza é muito difícil.

As diferenças no saber aplicar a tecnologiaexplicam por que o grupo bem-sucedido tem de-sempenho tão melhor que o outro. O que tem queser feito é imitar o que o grupo bem-sucedido fazno Sul, onde o ganho é de 60 %. Nas bases de

dados do Nordeste, o ganho é de pelo menos qua-tro vezes. À exceção de Xingó, a tarefa de imitaré mais difícil, uma vez que as funções de produ-ção são diferentes.

Ao fazer fluir o conhecimento do grupobem-sucedido para o de renda líquida negativa,a extensão rural tem aí desafio importante a en-frentar, e bem-sucedida na empreitada, veja quãolucrativa ela é.

A mão-de-obra tem uma participação mui-to elevada no custo total. Tem que sercomplementada com a mecanização, pois estapermite realizar as tarefas da produção em tem-po e melhor qualidade. Atividades como indús-tria caseira, redefinição da cesta de produtos eindústria rural, mesmo fora do portão do estabele-cimento, são recomendáveis, como alternativasde emprego.

Para serem solucionados, os erros dealocação de recursos exigem competência emadministração rural. Assim, o treinamento dosextensionistas tem que enfatizar a administraçãorural. Como visão do negócio, o crédito rural temque ter como base o estabelecimento, e não selimitar a financiar tão-somente novas tecnologias.O montante do empréstimo deve nascer do pla-nejamento do estabelecimento, e tem que cobrir,também, os dispêndios com o trabalho familiar.

Por que não arrendar máquinas e equipa-mentos e obtê-los pelo leasing? Sem esses instru-mentos, a opção é comprar, pedra de tropeço di-fícil de ser removida do caminho dos pequenosprodutores. Por sua vez, o crédito de investimen-to precisa ser modernizado, para considerar oestabelecimento como um todo.

O Pronaf quer fazer da agricultura opçãoviável para a agricultura familiar, mas para issotem que mudar sua visão com relação à adminis-tração rural, insumos modernos e mecanizaçãoda agricultura, além de continuar o esforço pelo apri-moramento do crédito rural e para dar voz de co-mando ativa aos agricultores na extensão rural: polí-tica correta que está no seu escopo de trabalho.

Os agricultores teriam mais controle daextensão rural se fosse assinado um contrato en-

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tre as duas partes, prescrevendo as responsabili-dades mútuas com multas e foro para dirimir dú-vidas. O foro deve ser formado por pessoas dacomunidade. O contrato pode referir-se a grupode agricultores, associações ou ser individual.

A tecnologia moderna gerada pela pesqui-sa do governo não discrimina o pequeno produ-tor, pois ela é divisível, sendo a maior parte delacristalizada em insumos como sementes, fertili-zantes, combate integrado de praga e doenças,práticas de manejo de culturas e animais. É claroque a aplicação correta e disciplinada dessatecnologia é fundamental ao sucesso. Além domais, há arranjos que favorecem uma moderni-zação em etapas. Há problemas de treinamentodos extensionistas, a administração rural sumiudo mapa de sua formação, e há preconceitos con-tra a capacidade de aprender dos agricultorespobres, e também por isso, se apega à idéia datecnologia simples e de não substituir a culturalocal. Contudo, convém lembrar que a soluçãoagrícola do problema de pobreza rural passa pelaimperiosa necessidade de aumentar o excedente

do estabelecimento, e é possível fazê-lo sem osinsumos modernos? Caso sim, quem poderá sercontra!

ReferênciasALVES, Eliseu; SOUZA, Geraldo da Silva. Estudo de caso defamílias enquadráveis no Programa de Fortalecimento daAgricultura Familiar (PRONAF). Agricultura São Paulo, SãoPaulo, v. 53, n. 2, p. 107-124, jul./dez. 2006.

CASTRO, Eduardo Rodrigues; TEIXEIRA, Erly Cardoso.Desenho de mecanismo de crédito rural para assegurar oacesso do agricultor familiar à tecnologia: relatório final.Brasília, DF: Embrapa-SGE, 2006.

HEIJ, Christian; BOER, Paul de; FRANSES, Philip Hans;KLOEK, Teun; VAN DIJK, Herman K. Econometric methodswith applications in business and economics. New York:Oxford University Press, 2004.

JOHNSTON, Jack; DINARDO, John. Econometric methods.4. ed. New York: McGraw-Hill, 1997.

ROCHA, Daniela de Paula. Relatório final: classificação ecaracterização dos estabelecimentos enquadráveis e nãoenquadráveis no Pronaf: amostra do perfil da agriculturabrasileira. Brasília, DF: Embrapa-SGE, 2006.

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Desempenho da políticade garantia de preços viacontratos de opção devenda e prêmios paraescoamento de produto

Resumo: A variabilidade dos preços impõe dificuldades no planejamento da produção e no abasteci-mento do mercado, além de acarretar acentuados impactos alocativos e distributivos. Esta pesquisatem o objetivo de avaliar a eficácia dos Contratos de Opção de Venda (COV) e dos Prêmios de Escoa-mento de Produto (PEP) para referenciar e estabilizar os preços nos mercados de arroz, algodão, milhoe trigo. Faz-se análise dos coeficientes de variação dos componentes da receita agrícola, além dadecomposição da variância da receita, a fim de identificar a fonte mais importante de instabilidade dareceita agrícola desses produtos. Os resultados indicam queda da instabilidade da receita nos merca-dos analisados no período 1995–2005 em decorrência, sobretudo, da diminuição da variabilidade depreços. A mudança da política agrícola visando à menor retenção de estoques pelo governo, além doincentivo ao financiamento privado da estocagem, via COV e PEP, tem promovido maior estabilidadena comercialização agrícola nos mercados agrícolas analisados. No caso do milho, as oscilações deoferta interna reduziram a eficácia dos instrumentos quanto à sustentação dos preços. As mudançascambiais em 1999 acabaram por apresentar impactos negativos sobre a estabilidade da receita agrí-cola, mais que compensando o efeito estabilizador da política de preço.

Palavras-chave: estabilidade, preços, comercialização.

Abstract: The variability of the prices imposes difficulties in the planning of the production and in theprovisioning of the market, besides carting accentuated allocation impacts and of distribution. Thisresearch has the objective of evaluating the effectiveness of the Contracts of Option of Sale (COV) andof the Prizes of Drainage of Product (PEP) to do reference and to stabilize the prices in the markets ofrice, cotton, corn and wheat. It is made analysis of the coefficients of variation of the components of theagricultural income besides the decomposition of the variance of the income in order to identify themost important source of instability of the agricultural income of these products. The results indicate fall

Aline Cristina da Cruz1

Erly Cardoso Teixeira2

1 Mestranda em Economia Aplicada, Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Economia Rural, CEP 36570-000, [email protected] Ph.D., professor titular, Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Economia Rural, CEP 36570-000, teixeira@ufv,br.

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of the instability of the income in the markets analyzed in the period 1995-2005 in consequence, aboveall, of the decrease of the variability of prices. The change of the agricultural politics seeking to smallestretention of stocks for the government, besides the incentive to the private financing of the stockpiling,through COS and PEP, it has been promoting larger stability in the agricultural commercialization in theanalyzed agricultural markets. In the case of the corn, the offer oscillations intern reduced the effectivenessof the instruments as for the sustentation of the prices. The exchange changes in 1999 ended for presentingnegative impacts about the stability of the agricultural income, more than compensating the effectstabilizer of the price politics.

Key-words: stability, prices, commercialization.

IntroduçãoA conjuntura econômica da agropecuária

revelou resultados desfavoráveis em 2005. Segun-do informações da Confederação da Agriculturae Pecuária do Brasil (2006), a safra de grãos de2005 apresentou queda de 18 %. O PIB daagropecuária reduziu-se de R$ 169,65 bilhões em2004 para R$ 153,04, em 2005, o que indica umaqueda de 9,79 %. Isso significa que os produtoresrurais perderam, no ano passado, R$ 16,6 bilhõesde receita. A principal causa dessa redução foi aforte queda nos preços de alguns produtos, acom-panhada de quebra de safra, além da elevaçãoda oferta internacional das commodities agríco-las que reduziu os preços da maior parte dos grãos.A variabilidade dos preços impõe dificuldades noplanejamento da produção e no abastecimentodo mercado, além de acarretar acentuados im-pactos alocativos e distributivos no setor e na eco-nomia. Conseqüentemente, nota-se um aumentoconsiderável dos riscos da atividade, o que reduzos investimentos, e ameaça de endividamento.Outro problema causado pela variação de pre-ços é o processo de transferência de receita deprodutores rurais para os outros segmentos pre-sentes no fluxo de comercialização, como ataca-distas, varejistas e consumidores.

É nesse contexto que se destaca a impor-tância do governo, atuando via política de garan-tia de preços, como agente regulador sistemáticovisando à estabilização dos preços e da receitado setor agrícola e também da oferta dos produ-tos agrícolas. Diante da relevância da política depreços, torna-se importante fazer uma análise deseu desempenho no que se refere ao objetivo deestabilidade de preços e conseqüentemente dagarantia de receita do meio agrícola.

A análise da ação do governo federal em2005, de acordo com a CNA, foi ineficiente quantoaos mecanismos de sustentação de preço e deacesso a crédito. Os principais instrumentos daPolítica de Garantia de Preços Mínimos (PGPM)que são as Aquisições do Governo Federal (AGF)e os Empréstimos do Governo Federal sem opçãode venda (EGF-SOV) foram poucos. O mesmo seobservou sobre a política de garantia de preçospor meio de operações de Contratos de Opçãode Venda (COV) e de Prêmio de Escoamento deProduto (PEP). No que tange às AGF e aos EGF-SOV, havia estimativa de que seria necessário umtotal de R$ 2,5 bilhões, mas apenas R$ 1,2 bilhãofoi operacionalizado, ou seja, menos da metadedo necessário. Nesse sentido, é importante fazeruma análise do desempenho da política públicade preços quanto ao objetivo de garantia de pre-ços e da estabilidade da receita. Essa avaliaçãovisa fornecer informações que auxiliem na formu-lação e no direcionamento da política agrícolade preços.

Especificamente, esta pesquisa tem o obje-tivo de avaliar o desempenho dos instrumentosde comercialização agrícola criados mais recen-temente. São eles os Contratos de Opção de Ven-da (COV) e os Prêmios de Escoamento de Produto(PEP) cujas funções são de balizadores de preçosde negociação da produção agrícola. Além dis-so, faz-se uma avaliação da Política de Garantiade Preços Mínimos (PGPM) recente. Seguindoessa linha de pesquisa, Conceição (2002) anali-sou a aplicação do COV e PEP para os mercadosde arroz e milho no período de 1994 a 2001. Aautora ressalta que houve um considerável au-mento na utilização desses instrumentos ao tem-

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po em que ocorria uma redução na formação deestoques públicos. Destaca ainda a necessidadede fixação de preços de exercícios mais atrativosnos contratos de opção de venda de forma a esti-mular a estocagem privada. O presente estudoinvestiga o desempenho dos contratos de opçãode venda e dos prêmios para escoamento de pro-duto e da PGPM nos mercados de arroz, milho,algodão e trigo, ampliando o período de análisepara 1994 a 2005.

Além da introdução e das consideraçõesfinais, o trabalho é constituído de mais três seções.A segunda expõe uma visão geral sobre a políticade preços mínimos nos últimos anos. A terceirafaz uma avaliação do desempenho desse instru-mento de apoio à comercialização agrícola noperíodo 1998–2005. Na terceira parte, analisam-se os resultados sobre a eficácia de COV, PEP parareferenciar e estabilizar os preços de negociaçõesdos produtos analisados. Essa última análise é re-sultado da aplicação da metodologia3 a despeitoda variabilidade dos preços agrícolas, mais espe-cificamente, fazendo uso de coeficientes de vari-ação e da decomposição da variância da receitatotal nos mercados analisados.

Política de garantia de preçosNo Brasil, a Política de Garantia de Preços

Mínimos (PGPM) tem sido o principal instrumentode política agrícola pela qual o governo atuacomo agente regulador sistemático, visando àestabilização dos preços e da receita do setoragrícola. A receita agrícola está ligada à produ-ção e ao preço recebido pelo produtor. A produ-ção está relacionada à produtividade dos fatorese à área plantada. Essas variáveis apresentam ins-tabilidade em virtude da flutuação dos preços,além da suscetibilidade aos problemas climáticosque envolvem a atividade de riscos e incertezas.Tais fatos promovem alocações ineficientes de re-cursos no setor e na economia como um todo. Alémdisso, a PGPM tem como objetivo promover a ofertaadequada dos produtos agrícolas de modo a garantiro abastecimento interno e as exportações.

Até meados dos anos 1990, a PGPM eraexecutada por meio das aquisições e dos emprés-timos do governo federal (com e sem opção devenda). Segundo Delgado e Conceição (2005), aPGPM era de certa forma passiva por meio daformação de estoques públicos de alimentos apreços mínimos. No entanto, com o advento daliberalização comercial, houve elevação substan-cial de estoques públicos e a PGPM tornou-se dedifícil administração. Os instrumentos decomercialização vigentes eram dispendiosos parao orçamento do Estado e, visando ao equilíbriodas contas públicas, a diminuição da presençado Estado na comercialização agrícola era umanecessidade. No período imediatamente após aimplantação do Plano Real, os preços agrícolassofreram quedas sucessivas em virtude, obviamen-te, da estabilização resultante da política econô-mica adotada. Além disso, o mercado aberto per-mitiu o aumento das importações de commoditiesdiante de um câmbio sobrevalorizado e de umcenário de grande liquidez externa. Esses fatoresexigiram a intervenção do governo por meio dapolítica de preços e contribuíram para elevar subs-tancialmente os estoques públicos. O padrão debaixa dos preços agrícolas, aliado aos grandesestoques públicos, exigiu mudanças consistentesna política agrícola a partir do plano de safra1995–1996. Rezende (2002), em seu estudo, res-salta que a mudança da política agrícola brasilei-ra após 1995 teve por objetivo, sobretudo, desen-volver instrumentos de ação capazes de promo-ver a estocagem privada e estimular o financia-mento privado da comercialização.

A partir do plano de safra 1995–1996, osinstrumentos de comercialização agrícola utiliza-dos são as Aquisições do Governo Federal (AGF)e os Empréstimos do Governo Federal sem opçãode venda (EGF-SOV). Se, por um lado, as AGFpermitem ao produtor vender diretamente ao go-verno sua produção a preços mínimos, por outrolado, os EGF-SOV são uma forma de financiamen-to ao produtor para que este não lance mão desua produção para saldar seus compromissos.Segundo o mecanismo dos EGF-SOV, o produtor

3 Aspectos metodológicos ver Cruz e Teixeira (2006).

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recebe o montante equivalente a sua produçãoavaliada a preços mínimos e, de posse desses re-cursos, pode administrar suas despesas de cus-teio e outras, além, é claro, de ter a possibilidadede buscar preços melhores no mercado na épocada entressafra. Entretanto, esse instrumento nãoconcede garantia de que o governo irá adquirir aprodução no caso de preços de mercado inferio-res aos preços mínimos.

Como reflexo da nova conjuntura econô-mica da segunda metade da década de 1990, umadas mudanças na política de garantia de preçosfoi a criação de novos instrumentos de comercia-lização agrícola. No plano de safra 1995–1996,instituiu-se o Prêmio para Escoamento de Produto(PEP), e no plano de safra 1996–1997 criaram-seos Contratos de Opção de Venda (COV).

O Contrato de Opção de Venda (COV) foicriado para casos em que há falta de recursos parasustentar os preços de mercado no nível dos pre-ços mínimos. A operação é feita por meio de lei-lões nos quais o produtor paga um prêmio que lhedá a garantia de venda do produto ao governo,numa data futura, previamente definida, a um pre-ço superior (preço de exercício) ao preço míni-mo. No entanto, o COV não permite a venda ime-diata da produção ao governo. Por meio do COVo produtor adquire prazo para buscar no merca-do preços melhores para o produto. Assim, o COVfunciona como um seguro contra queda de preçodo produto. Na data de vencimento do COV, se opreço de mercado for inferior ao preço de exercí-cio, o produtor poderá exercer a sua opção devenda. Caso contrário, vende a produção ao mer-cado sem, contudo, ser reembolsado quanto aoprêmio pago.

O Prêmio para Escoamento de Produto (PEP)é um instrumento de garantia de preços ao produ-tor e é utilizado em situações em que o preço demercado é inferior ao preço mínimo. O governose compromete a pagar a diferença entre o preçode mercado e o preço mínimo. Essa diferença é oprêmio ou subsídio e é definida por meio de lei-lões públicos nos quais os compradores (iniciati-va privada) disputam o direito de adquirir deter-

minado volume de produção pelo preço mínimo.Dessa forma, o governo, visando à sustentaçãodo preço mínimo para o produtor, pode, em vezde comprar e estocar o excedente e incorrer emdespesas de armazenagem, optar por pagar aosagentes de comercialização um prêmio.

Segundo Rezende (2000), mediante essareforma da política de preços, o governo teve apossibilidade de comercializar grande parcela dosestoques provenientes das safras anteriores. Issoocorreu a partir do segundo semestre de 1995 e,sobretudo, durante o ano de 1996, em virtude daquebra da safra 1995–1996 e da alta dos preçosinternacionais das commodities agrícolas. Segun-do Gasques e Villa Verde (2003), dentre as princi-pais razões da redução dos gastos públicos coma agricultura nos últimos anos estão as mudançasligadas à política de preços e de estoques. Osautores ainda ressaltam que atualmente os dis-pêndios com essas políticas são pouco expressi-vos quando comparados aos anos 1990.

Desempenho dos instrumentos deapoio à comercialização agrícola

Contratos de Opção de Venda (COV)

Primeiramente, faz-se uma análise da utili-zação dos contratos de opção nos mercados dosprodutos aqui analisados. No momento de ade-são ao COV o produtor faz uma comparação en-tre o preço mínimo, o preço de mercado e o pre-ço de exercício definido para o contrato. Dessemodo, somente demandará um COV caso o pre-ço de exercício seja superior aos outros preços.Por sua vez, à época de vencimento dos contra-tos de opção de venda, a expectativa é de quequanto mais próximos estiverem os preços demercado e os preços de exercício, menor o nú-mero de contratos de opção exercido pelos pro-dutores. Ou seja, quanto maior a razão entre opreço de mercado e o preço de exercício, maiseficaz terá sido o COV. Isso porque, uma vez ad-quirido o COV, o intuito da política de garantia depreço ao produtor se efetivará se o produtor não

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exercer seu direito de venda ao governo. Por umlado, o Estado fica livre dos custos ligados à ar-mazenagem da produção e, por outro lado, o pro-dutor terá obtido um preço de mercado satisfatório.A Fig. 1 mostra o volume de contratos de opçãode venda vendidos no período de 1997 a 2005.

Primeiramente, pode-se destacar que osmaiores volumes de vendas de COV são de mi-lho e arroz. No mercado de milho, as operaçõesde COV de maior volume ocorreram nos perío-dos de safras de 2000 a 2003, com a safra de 2000–2001 apresentando um montante comercializadoem torno de 2.132 mil toneladas de milho em grão.Apesar de uma demanda por COV relativamenteinferior, os produtores de arroz também apresen-tam uma quantidade substancial de compras des-se tipo de instrumento de comercialização agrí-cola. As maiores comercializações foram nas sa-fras de 1999–2000 (832 mil toneladas) e de 2001–2002 (611 mil toneladas).

Somente na safra de 2000–2001 o governopassou a disponibilizar contratos de opção para acomercialização de trigo. Nesse período, foramvendidas 282 mil toneladas. Nas últimas safras(2003–2004 e 2004–2005) foram comercializadasem torno de 518 mil e 650 mil toneladas de trigopor meio de contratos de opção. O mercado de

algodão apresenta uma política decomercialização agrícola pouco ativa, haja vistaque o número de contratos de opção é baixo, che-gando a ser nulo na maioria dos anos. Houvecomercialização via COV no mercado de algo-dão apenas nas safras de 1998–1999 e de 1999–2000. A Tabela 1 auxilia na avaliação do desem-penho dos contratos de opção de venda, poismostra o percentual de contratos que foram efeti-vamente exercidos, além de indicar a relaçãopreço de mercado e preço mínimo e também en-tre preço de mercado e preço de exercício.

Primeiramente, merece destaque o grandepercentual de COV realizado no mercado de ar-roz logo após a implantação desse instrumento.Cerca de 80 % e 92 % dos COV vendidos foramexercidos nas safras de 1998–1999 e de 1999–2000, respectivamente. Nesses anos, embora ospreços de mercado estivessem maiores que ospreços mínimos, foram inferiores aos preços deexercício, conforme se observa na Tabela 1. Oprodutor, de posse do COV, adquiriu um prazo parabuscar no mercado preços mais satisfatórios, masisso não ocorreu e os produtores, na sua maioria,exerceram seu direito de venda da produção aogoverno, tornando a política de comercializaçãoagrícola ineficiente. No entanto, esse cenário semodifica a partir da safra de 2000, pois as razões

Fig. 1. Comercialização de contratos de opção de venda (em toneladas) nos mercados de arroz, algodão, milhoe trigo no período de 1997–2005.Fonte: Conab.

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Tabela 1. Relações preço mercado/preço mínimo e preço mercado/preço exercício e percentual de contratosde opção efetivamente realizados no período 1998–2005.

Nota: Pme = preço de mercado; Pmi = preço mínimo e Pexer = preço de exercício.Fonte: Conab

79,2891,73

0,000,720,000,00

100,00

Ano %exercido

1999200020012002200320042005

1,641,571,511,621,671,761,90

Pme/Pmi

0,970,83

-1,16

--

1,06

Pme/Pex

Arroz

0,0034,3039,10

0,000,000,000,00

%exercido

1,031,071,070,951,121,291,28

Pme/Pmi

-0,940,92

----

Pme/Pex

Algodão

1,724,656,272,580,080,100,00

%exercido

1,261,441,481,141,511,171,15

Pme/Pmi

1,441,430,961,191,081,09

-

Pme/Pex

Milho

0,000,000,000,000,00

29,3688,75

%exercido

0,971,061,191,081,171,131,02

Pme/Pmi

-----

0,930,80

Pme/Pex

Trigo

entre preços de mercado e preços mínimos e, prin-cipalmente, entre preços de mercado e preços deexercício foram maiores que a unidade. O resul-tado foi que nessas safras o volume de contratosexercidos foi baixo ou mesmo nulo. Na safra 2004–2005, a relação preço de mercado/preço de exer-cício foi 1,06. O que se percebe é que, apesardos preços de mercado não serem menores queos preços de exercício, estiveram muito próximose o resultado foi que todos os contratos de opçãode venda vendidos foram exercidos. É importan-te considerar que os níveis de preços considera-dos neste estudo são valores médios e que, por-tanto, podem ser afetados por valores discrepan-tes. No entanto, no mês de setembro de 2005,período de vencimento dos contratos de opçãodo ano de 2005, o preço de mercado da saca dearroz era de R$ 27,60, enquanto o preço de exer-cício era de R$ 28,80. Isso justifica o fato de quetodos os contratos de opção de venda foram exer-cidos no ano de safra de 2004–2005.

Os produtores de algodão recorreram aoCOV apenas nas safras de 1999/2000 e 2000/2001.Nesses períodos, exerceram o direito de vendaao governo num montante de cerca de 34 % e39 % dos contratos comprados. Nessas safras, ospreços de mercado foram inferiores aos preçosde exercício, conforme a Tabela 1, e os produto-res, buscando reduzir seus prejuízos, lançarammão do direito de venda da produção ao gover-no. Apesar disso, a relação entre preço de mer-cado e preço mínimo mostrou-se superior à uni-

dade em praticamente todas as safras, com ex-ceção da safra de 2001–2002, quando apresen-tou valor de 0,95.

No mercado de milho, o COV mostrou-seum instrumento eficaz, haja vista que as parcelasde contratos exercidos foram baixas, atingindomenos de 10 % do total comercializado. As ra-zões entre preços de mercado e preços de exer-cício comprovam a eficácia do instrumento, hajavista que se mostraram superiores à unidade emquase todos os anos. Apenas em 2001, a razãopreço de mercado/preço de exercício foi inferiorà unidade (0,96) e a resposta para preços de mer-cado pouco satisfatórios foi a elevação da por-centagem de COV exercida com relação a 2000,apesar de permanecer em nível baixo. Importan-te observar também que, em todos os anos, ospreços recebidos pelo produtor foram superioresaos preços mínimos.

A comercialização de trigo recebeu apoiovia COV apenas nos anos de 2001, 2004 e 2005,e em 2001 não houve volume de COV exercido.Nas safras de 2004 e 2005, houve maior necessi-dade dos produtores de exercer direito de vendaao Estado, pois os preços de mercado não foramsatisfatórios. Nesses anos, as razões entre preçosde mercado e preços de exercício do governomostraram-se inferiores à unidade. Em 2005, ospreços de mercado foram muito baixos, confor-me mostra a razão de 0,80 entre preço de merca-do e preço de exercício. Diante desse cenário, asolução foi buscar preços melhores por meio dagarantia de venda da produção ao governo. Per-cebe-se que o percentual de COV de trigo efeti-

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 30

vamente realizado em 2005 esteve elevado, atin-gindo a casa dos 88 %. Apesar dos níveis de pre-ços de mercado não satisfatórios nas duas últimassafras, os preços agrícolas estiverem superioresaos preços mínimos definidos nos planos de safra.

Prêmio para Escoamento de Produto (PEP)

A Fig. 2 permite visualizar que o prêmiopara escoamento de produto é um instrumento deapoio que tem sido utilizado com maior intensi-dade nos mercados de milho e trigo. Não há re-gistro de comercialização de PEP em transaçõesque envolvam produtores de arroz.

O produtor de algodão, apesar do volumerelativamente inferior, tem feito uso de PEP. Nasafra de 2000–2001, foram efetuadas transaçõesenvolvendo 289 mil toneladas de algodão. Na safrade 2004–2005, foram comercializadas via PEP136.500 toneladas do produto.

Os produtores de milho têm recorrido forte-mente ao PEP. Os maiores montantes comercia-lizados foram nas safras de 2000–2001 e de 2001–2002, cujas transações estiveram na casa de 937mil e 1,3 milhão de toneladas de milho. Na safrade 2004–2005, foi intermediado um volumeequivalente a 760 mil toneladas. Quanto àscomercializações via PEP de produções de trigo,

nota-se que os maiores montantes são observa-dos nas safras de 1998–1999 e de 2004–2005,cujas quantidades ultrapassam 1,1 milhão de to-neladas.

Resultados e discussão

Variabilidade dos preços agrícolas:coeficientes de variação

Nesta seção, calcula-se o coeficiente devariação (CV) para as quantidades produzidas epara as receitas e preços médios auferidos pelosprodutores de arroz, milho, trigo e algodão noperíodo 1985–2005. São feitas análises para osseguintes subperíodos: 1985–1994, 1995–2005,1994–1996 e 1997–1999, além de 2000–2005. Aanálise dos subperíodos 1985–1994 e 1995–2005tem por objetivo comparar a variabilidade da re-ceita agrícola diante de transformações de extre-ma importância da economia nacional. Enquantono subperíodo 1985–1994 o País enfrentava umcomplicado processo inflacionário, dificuldadesde abastecimento e, principalmente, a liberaliza-ção comercial, a partir de 1994 tem-se a implan-tação de um plano de estabilização econômicaseguido de mudanças na política agrícola. Impor-tante destacar que entre 1985 e 1994 a política

Fig. 2. Comercialização de prêmios para escoamento de produto (em toneladas) nos mercados de algodão, milhoe trigo no período de 1997–2005.Fonte: Conab.

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metade dos anos 1990, isto é, da implantação doPlano Real, com a maior estabilização dos pre-ços na economia, além da implantação da novapolítica de garantia de preços. Nos mercados dealgodão e de arroz, a redução da variabilidadeda receita dos produtores foi obtida em decorrên-cia da diminuição do CV dos preços, pois se per-cebe elevação da variabilidade da produção en-tre 1995 e 2005.

As políticas macroeconômicas da segundametade da década de 1990 mostram um aumen-to da variabilidade da receita dos produtores demilho no período 1995–2005 em relação a 1985–1994. Apesar da queda da variabilidade de pre-ços, o aumento da instabilidade da quantidadeproduzida mais que compensou a diminuição dainstabilidade dos preços nesse mercado.

De acordo com os intervalos de valores decoeficientes de variação definidos em Gomes(1985), observa-se que, no período 1995–2005,os CV de receita de arroz e trigo se mostrarammuito elevados (acima de 40 %), em razão doselevados CV da produção. Nos mercados de ar-roz e milho, todos os CV indicam nível médio devariabilidade.

Tendo por objetivo isolar os efeitos do Pla-no Real (1994) dos demais fatores que influenci-am a estabilidade da receita agrícola a partir demeados dos anos 1990, é feita uma comparaçãoda estabilidade no subperíodo 1994–1996 vis-à-vis 1985–1994. No subperíodo 1994–1996, asAGF e os EGF (COV e SOV) são usados na políti-ca de garantia de preços. A Tabela 3 mostra osvolumes comercializados de AGf e EGF entre1994 e 2001.

agrícola de comercialização fazia uso das aqui-sições do e dos empréstimos do governo federal(com e sem opção de venda), visando à garantiade estabilização da renda e de preços agrícolas.No subperíodo 1995-2005, ocorreram inserção denovos instrumentos de política de garantia de pre-ços e extinção do EGF-COV. Além disso, o mer-cado cambial, até então sob regime de câmbiofixo, passa para o sistema flutuante em 1999, re-sultando em desvalorização da moeda nacional.Todos esses fatores causaram impactos significa-tivos sobre a instabilidade da receita agrícola.Diante disso, visando à distinção dos efeitos des-ses fatos econômicos e das alterações na políticaagrícola, são feitas análises dos subperíodos defi-nidos anteriormente. Os coeficientes de variaçãopara as receitas agrícolas e de seus componentespara todos os subperíodos analisados estão apre-sentados na Tabela 2.

Primeiramente, faz-se uma comparação davariabilidade da receita agrícola no período 1995–2005, cujo cenário é, principalmente, de estabili-dade econômica vis-à-vis 1985–1994, cujas ca-racterísticas remetem a altos níveis de inflação,dentre outros fatos, que contribuíam para causarmaior instabilidade dos preços agrícolas e, con-seqüentemente, de seus componentes. O cenárioeconômico caótico no período 1985–1994 com-promete a eficácia das AGF e dos EGF (COV eSOB) quanto à estabilidade agrícola. Observan-do a Tabela 2, nota-se que houve redução doscoeficientes de variação da receita agrícola detodas as culturas selecionadas, exceto milho, noperíodo 1995–2004. Isso ocorre em decorrênciadas mudanças na política econômica da segunda

Tabela 2. Coeficientes de variação de preços recebidos, quantidade e receita dos produtores de arroz,algodão, milho e trigo no Brasil.

Fonte: Estimativas do autor.

2814101014

PeríodoPreço

1985–19941995–20051994–19961997–19992000–2005

1013

91711

Quant.

3526182426

Receita

Arroz

3211798

Preço

2044282224

Quant.

4746331838

Receita

Algodão

251198

15

Preço

1213

74

13

Quant.

2123161126

Receita

Milho

611610

810

Preço

4744351525

Quant.

4744351837

Receita

Trigo

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Observando a Tabela 3, nota-se que osmaiores volumes comercializados de AGF e EGFforam nos anos de 1994 e 1995, com montantesde R$ 3.902,9 e R$ 4.490,0 milhões, respectiva-mente. Essas observações permitem indicar queno período 1994–1996 a política agrícola via AGFe EGF auxiliou a nova política de estabilizaçãoeconômica na promoção de menor variabilidadede preços e de renda agrícola.

há redução da instabilidade da receita de todosos produtos, com exceção do arroz, no períodode lançamento de COV e de PEP. Isso indica queo apoio à comercialização agrícola nesse perío-do mostrou-se eficiente quanto à garantia de mai-or estabilidade da receita dos agricultores. Embo-ra a Tabela 2 mostre coeficientes de variação depreços menores no período 1997–1999 em todosos mercados, exceto de algodão, os efeitos dosnovos instrumentos de apoio ao mercado agríco-la são distintos para cada um dos produtos.

Conforme se observa na Fig. 3, no merca-do de algodão os produtores se defrontam commaior instabilidade de preços com a introduçãode COV e de PEP. No entanto, a variação da pro-dução caiu, o que contribuiu para menor variabi-lidade da receita dos produtores no período 1997–1999. O aumento da volatilidade de preços é maisque compensado pela queda da variabilidade daprodução.

A política de garantia de preços por meiode COV e de PEP não tem impacto imediato nosetor de produção de arroz. Há um aumento dainstabilidade da receita em razão do aumento davariabilidade da produção, pois o coeficiente devariação dos preços de arroz mantém-se idênti-co ao do período anterior.

No subperíodo 1994–1996, tem-se CV re-lativamente inferior. Nota-se também que o Pla-no Real causou reduções substanciais da variabi-lidade de todos os componentes da receita agrí-cola dos produtos analisados. Apenas a produ-ção de algodão mostrou CV maior no subperíodo1994–1996 em comparação com 1985–1994. Issoconfirma a eficácia do Plano Real ante o objetivode estabilidade econômica.

No período 1997–1999, a política decomercialização agrícola sofre mudanças. Sãolançados os novos instrumentos (COV e PEP) emediante adesão a um EGF não há mais a opçãode venda da produção ao governo. Somente oEGF-SOV permanece em uso. Nesse contexto, afim de verificar a eficácia dos novos instrumentosde comercialização agrícola (COV e PEP), faz-seuma análise da variabilidade da receita agrícolano período 1997–1999, quando então tais instru-mentos são lançados, em comparação com o pe-ríodo 1994–1996 que capta os efeitos do PlanoReal. Primeiramente, é importante ressaltar que

Fig. 3. Coeficientes de variação (em %) para mercadosde algodão e arroz, 1994–1996 e 1997–1999.Fonte: Estimativas do autor.

Os produtores de milho e trigo obtiveramreceitas menos instáveis no período 1997–1999vis-à-vis 1994–96 (Fig. 4). No mercado de trigo, a

Tabela 3. Gastos públicos com Aquisições doGoverno Federal (AGF) e Empréstimos do GovernoFederal (EGF) de 1994 a 2001 (em milhões de reais).

Fonte: Ministério da Fazenda – Balanço Geral da União.

3.902,94.490,02.354,72.952,11.605,41.053,7

831,2746,2

Ano Volume de AGF e EGF (SOV e COV)

19941995199619971998199920002001

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redução da instabilidade da produção é elevadae contribui fortemente para a queda da volatili-dade da receita desse setor. Há queda da variabi-lidade da receita do mercado de milho, entretan-to, as mudanças não são tão grandes, mas é tam-bém a diminuição do CV da produção desse perí-odo que contribui para uma maior estabilidadeda receita dos produtores de milho com a introdu-ção de COV e de PEP. Enfim, pode-se afirmar quehá maior estabilidade da receita agrícola com aimplantação de COV e de PEP, no entanto, é im-portante ressaltar que o cenário é de estabilidadeeconômica e, portanto, contribui para que a polí-tica de garantia de preços agrícolas seja mais efi-caz nesse período.

Seguindo o critério de Gomes (1985) sobreintervalos definidos para valores dos CV, obser-va-se que, no período 1997–1999, os CV referen-tes a preços podem ser considerados baixos, poissão inferiores a 10 %. Os coeficientes de varia-ção da produção enquadram-se como médios, poisestão situados entre 10 % e 20 %. Apenas o mer-cado de arroz revela um CV alto (24 %) de recei-ta que indica alta instabilidade da receita dessesetor.

A análise do período 2000–2005 tem porintuito captar a influência da mudança no regimede câmbio em 1999 sobre a volatilidade no mer-cado agrícola. De acordo com a Tabela 2, ocorreaumento da instabilidade da receita agrícola detodos os produtos analisados em virtude do au-mento da variabilidade de seus dois componen-

Fig. 4. Coeficientes de variação (em %) para mercadosde milho e trigo, 1994–1996 e 1997–1999.Fonte: Estimativas do autor.

tes (preço e quantidade). Apenas o CV dos preçosde algodão e de produção de arroz apresentamqueda no subperíodo 2000–2005.

Em suma, conclui-se que o Plano Real deestabilização com a ação das AGF e dos EGF(COV e SOB) contribuiu para reduzir fortementea instabilidade da receita agrícola em razão, so-bretudo, da queda da variância dos preços con-forme resultados de 1994–1996. A avaliação davariabilidade de 1997 a 1999 revela que, apesarde efeitos relativamente menores, a política decomercialização agrícola via COV e PEP surgepara reforçar os efeitos positivos do Plano Realsobre a estabilidade das receitas agrícolas no pe-ríodo. No entanto, há de se ressaltar que o efeitosobre a variância da receita é por meio da redu-ção da variância da produção. Houve impactoda nova política agrícola via COV e PEP, mas foipouco no que se refere à maior estabilização dospreços agrícolas desses mercados. Mas há de seressaltar que as alterações no regime de câmbioa partir de 1999 agem para elevar a instabilidadeda receita agrícola.

Decomposição da variância

Nesta seção, faz-se a decomposição davariância da receita obtida nos mercados agríco-las estudados. O método permite desagregar avariância da receita recebida pelos produtores emseus componentes: preço, quantidade produzidae interação entre estes. O termo de interação re-presenta o efeito resultante da variação conjuntados componentes preço e quantidade captando acorrelação que existe entre tais componentes dareceita. A análise é feita de acordo com ossubperíodos analisados na seção anterior. A Ta-bela 4 demonstra a participação relativa de cadaum desses componentes na variabilidade da re-ceita total.

No período 1985—1994, é importante des-tacar que a variância de preço domina a explica-ção da variância da receita total dos produtoresem todos os mercados, com exceção do merca-do de trigo. Tal resultado condiz com o cenáriode instabilidade de preços verificada nesse perío-

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Tabela 4. Decomposição da variância da receita dos produtores de algodão, arroz, milho e trigo, Brasil,1985–1994 e 1995–2005.

Fonte: Estimativas do autor.

45,7386,3282,8734,82

Produto

Período 1985–1994

AlgodãoArrozMilhoTrigo

Variação do preço (%) Variação da produção (%) Interação (%)

18,5110,9961,4520,40

35,75Ns

-44,3244,77

5,8633,2923,46

8,41

Período 1995–2005

AlgodãoArrozMilhoTrigo

93,1626,7242,5564,59

Ns39,9833,9827,00

3,9831,4930,17

8,13

Período 1994–1996

AlgodãoArrozMilhoTrigo

71,7522,6620,5592,46

24,2845,8649,28

Ns

26,5214,5554,8658,72

Período 1997–1999

AlgodãoArrozMilhoTrigo

165,5044,8310,69304,12

-92,0340,6234,45

-262,83

12,3030,9919,0513,03

Período 2000–2005

AlgodãoArrozMilhoTrigo

53,8421,1830,0257,83

33,8647,8350,9329,13

do. No setor de algodão, o termo de interaçãotem maior impacto que a variância da produçãosobre a variabilidade da receita dos produtores.

Ao contrário do que ocorre no mercado dealgodão, o termo de interação não se mostrou sig-nificativo para explicar variações na receita dosprodutores de arroz. Na análise do mercado demilho, o termo de interação contribui para redu-zir a variância da receita. No mercado de trigo,observa-se que os três componentes possuemparticipações relativamente próximas apesar dea correlação entre variações de preço e de quan-tidade deter a maior participação na variância dareceita dos produtores do setor.

A avaliação do segundo subperíodo(1995–2005) mostra, primeiramente, que o preçodeixa de ser a variável mais importante como fontede instabilidade da receita. Isso remete aos efei-tos positivos da política econômica de estabiliza-ção e da ação dos novos instrumentos decomercialização agrícola sobre a estabilidade dospreços. No mercado de arroz, o termo de interaçãodetém a maior importância explicativa da varia-bilidade da receita, embora sua participação re-lativa seja próxima do componente preço. Nosmercados de algodão e trigo, a variável quanti-dade é a variável de maior expressão na instabi-lidade da receita dos produtores desse setor. Nes-ses mercados, o peso relativo da variância de pre-

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ços não atinge sequer 10 %. Observa-se tambémque a interação entre as variâncias de preço e dequantidade não se mostrou significativa para in-fluenciar a volatilidade da receita dos produtoresde algodão.

No período 1994–1996, marcado pela es-tabilidade monetária, no entanto, sem a ação dosnovos instrumentos COV e PEP, nota-se que a ins-tabilidade da produção é o componente que agecom maior influência para elevar a variância dealgodão e trigo. Nos setores de algodão e trigo, asimportâncias relativas da variabilidade dos pre-ços são baixas e não atingem 10 %. Nos merca-dos de arroz e milho, as principais fontes de vari-abilidade da receita são: a interação entre asvariâncias de preço e de produção e a variabili-dade dos preços. A interação entre as variânciasda produção e dos preços não se mostrou signifi-cativa para influenciar a variância da receita dosetor de trigo.

O subperíodo 1997–1999 é marcado, so-bretudo, pela inserção dos novos meios de apoioà comercialização agrícola: COV e PEP. Umaobservação importante é que esses instrumentosmostram-se eficientes para estabilizar os preçosagrícolas, tendo em vista que, nesse período, comexceção do mercado de milho, a variância dospreços não é a principal fonte de instabilidade dareceita agrícola. Nos mercados de arroz e de al-godão, a importância da variância da quantidadeproduzida é superior à variância dos demais com-ponentes. No entanto, o termo de interação con-tribui para reduzir a variabilidade da receita dosetor de algodão e possui efeito contrário sobre areceita de arroz. O mercado de trigo mostra con-tribuições elevadas da variância da produção edo termo de interação, embora este último atuereduzindo a instabilidade da receita dos produ-tores.

Poder-se-ia concluir que no setor de milhoa nova política de garantia de preços não é efi-caz sobre a estabilidade dos preços agrícolas noperíodo 1997–1999. Duas são as razões que cor-roborariam tal conclusão: esse é o mercado commaior volume comercializado via COV e PEP, eainda os resultados mostram que, entre 1997 e

1999, a variabilidade dos preços apresenta-semais expressiva para influenciar a variância dareceita total. No entanto, há algumas peculiari-dades desse setor que merecem ser menciona-das. A primeira é que no ano de 1997 a produçãode milho aumenta consideravelmente, implican-do queda de preços. A segunda é que na safra1999–2000 o mercado de milho atinge seu maiorvolume de exportações, atingindo a casa das7 mil toneladas, reduzindo a oferta interna e ele-vando os preços domésticos. Esses fatores agemem conjunto para causar maior variabilidade dospreços de milho no período 1997–1999, reduzin-do a eficácia dos novos instrumentos de comer-cialização.

Por fim, a análise do período pós-mudan-ça cambial (2000–2005) revela que nos merca-dos de algodão e trigo a quantidade é a principalfonte de instabilidade da receita dos produtores.Nos mercados de arroz e milho, a interação entrevariabilidade de produção e preços é o compo-nente que domina a explicação da variância dareceita dos produtores e atua elevando a variânciada receita dos produtores. Mas há de se destacarque no mercado de arroz a contribuição da vari-ação dos preços é relativamente alta e superior àcontribuição da variância da produção.

Resumindo, em primeiro lugar, apesar dapresença de instrumentos de comercialização taiscomo AGF e EGF no período 1985–1994, o cená-rio de crise econômica reduz a eficácia da políti-ca de garantia de preços. Em segundo lugar, oPlano Real promoveu maior estabilidade dos pre-ços agrícolas com a ação das AGF e dos EGFentre 1994 e 1996. Em terceiro lugar, com exce-ção das peculiaridades do mercado de milho, oscontratos de opção de venda, os prêmios paraescoamento de produto e os EGF-SOV mostram-se eficazes, concedendo maior estabilidade dareceita e preços agrícolas no período 1997–1999.Em quarto lugar, as mudanças cambiais a partirde 1999 atuam aumentando a instabilidade dareceita agrícola dos mercados aqui estudados.

ConclusõesHouve queda da instabilidade da receita

nos mercados de todos os produtos no período

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governo na elaboração e condução da políticaagrícola, remetendo à redefinição do novo papeldo Estado no setor com objetivo de desenvolvi-mento da agricultura e da economia brasileira.

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DELGADO, G. C.; CONCEIÇÃO, J. Políticas de preçosagrícolas e estoques de alimentos: origens, situação atual eperspectivas. Revista Paranaense de Desenvolvimento,Curitiba, n. 108, p. 25-32, jan./jun. 2005.

GASQUES, J. G.; VILLA VERDE, C. M. Gastos públicos naagricultura: evolução e mudanças. Bahia Análise & Dados,Salvador, v. 12, n. 4, p. 133-154, mar. 2003.

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CRUZ, A. C.; TEIXEIRA, E. C. Estabilização dos preçosagrícolas: análise da eficácia dos instrumentos de apoio àcomercialização agrícola. Viçosa, MG: UniversidadeFederal de Viçosa-Departamento de Economia Rural, 2006.Trabalho em andamento.

1995–2005 em decorrência, sobretudo, da dimi-nuição da variabilidade de preços. A estabiliza-ção econômica decorrente do Plano Real contri-buiu substancialmente para reduzir a instabilida-de nos mercados agrícolas. A inserção dos con-tratos de opção de venda (COV) e dos prêmiospara escoamento de produto (PEP) permitiu maiorestabilidade dos preços agrícolas e, conseqüen-temente, das receitas agrícolas. A nova políticaagrícola de comercialização mostrou eficácia,pois promoveu menor volatilidade aos mercadosagrícolas selecionados. No caso do milho, as os-cilações de oferta interna reduziram a eficáciados instrumentos quanto à sustentação dos pre-ços. As mudanças no regime de câmbio em 1999acabaram por apresentar impactos negativos so-bre a estabilidade da receita agrícola desses se-tores, mais que compensando o efeito estabiliza-dor da política de preço.

A mudança da política agrícola visando àmenor retenção de estoques pelo governo, alémdo incentivo ao financiamento privado daestocagem, tem promovido maior estabilidade nacomercialização agrícola.

Diante da atual crise do agronegócio, liga-da, sobretudo, à queda de preços agrícolas, reco-menda-se, dentre outras medidas, maior atençãoà fixação dos preços de exercício dos contratosde opção de venda. O quadro recente de quedade preços agrícolas requer uma maior atuaçãodo governo por meio da política de garantia depreços, seja na fixação dos preços de exercíciocomo na definição dos prêmios.

A necessidade de uma política agrícola maisativa é um dos fatores fundamentais para o forta-lecimento da agricultura. As alterações noenfoque na política econômica do País, que pre-gam que o Estado deve cada vez menos intervirno mercado, se por um lado aliviam o peso daUnião, por outro fragilizam o mercado agrícola.Não se pode abrir mão de uma ativa atuação do

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Dimensões estratégicase dilemas das Centraisde Abastecimentono Brasil

Resumo: Este artigo aborda os principais dilemas e desafios enfrentados pelas Centrais de Abasteci-mento Brasileiras, as Ceasas, a partir de uma visão de sua estruturação na década de 1970 aos anos2000. O papel das Ceasas é rediscutido, à luz das experiências internacionais, a partir da proposiçãode análise em quatro dimensões estratégicas: dimensão empresarial, de coordenação, de logística ede ação em rede. O trabalho analisa a importância e a oportunidade de estruturação do ProgramaBrasileiro de Modernização do Mercado Hortigranjeiro (Prohort), como arranjo estratégico para ade-quar as Centrais Atacadistas brasileiras a um novo contexto na Política Nacional de AbastecimentoAlimentar.

Palavras-chave: Ceasa, comércio atacadista, Prohort.

Altivo Roberto Andradede Almeida Cunha1

1 Engenheiro agrônomo, mestre em Economia. Diretor de Assuntos Governamentais da Associação Brasileira de Centrais de Abastecimento (Abracen). E-mail:[email protected].

IntroduçãoÉ quase um consenso tomar como ponto de

partida na análise dos papéis das Centrais deAbastecimento a dicotomia público-privada: deum lado, a função pública de regulamentação docomércio e das normas de uso do espaço decomercialização, e, de outro, a função logística,de realização econômica do comércio atacadis-ta de alimentos e bens complementares. Essasduas dimensões explicariam a permanência deCentrais de Abastecimento sob a regulação e pro-priedade pública e as dinâmicas privadas de co-mércio atacadista, estabelecendo dois eixos deproblematização, com dilemas e desafios própri-os dessas dimensões, ainda que imbricados emsuas conseqüências. À administração públicacaberia, principalmente, regular as atividades domercado e gerir o espaço comercial, enquanto a

questão logística seria relacionada a um funcio-namento puramente comercial submetido às re-gras do mercado (GREEN, 2003, p. 24).

Ainda que tal dicotomia seja válida e sufi-ciente para entender a dinâmica das Centrais deAbastecimento em países desenvolvidos, com ins-tituições sólidas, não permite compreender ple-namente a evolução e os dilemas que revelam aexperiência latino-americana de mercados ata-cadistas e, em especial, a brasileira.

O que há de peculiar nesses casos é o pa-pel que as Centrais de Abastecimento termina-ram por exercer ao cumprirem funções de Esta-do, seja pela ausência ou omissão deste. Esse papelpúblico de quase-estado se revela na conduçãoou implementação de políticas públicas em di-versas áreas setoriais, com influência inclusive noaspecto microlocacional, urbano, estendendo-se

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até um papel similar ao de agências de desenvol-vimento, definindo normas e padrões com efeitosde coordenação a montante e a jusante do seg-mento atacadista. A limitação desse modelo estána estrutura organizacional interna das empresasque, em geral, não está preparada para cumprirtais tarefas e tampouco preparar-se para o cresci-mento e expansão necessários para essas novasfunções.

Este texto procura pontuar a análise das fun-ções e principalmente os dilemas da experiênciabrasileira das Centrais Atacadistas a partir de qua-tro eixos de análise, ou dimensões: empresarial,logística, urbanística e ação em rede (network),apontando a necessidade de caminhar para umaação coordenada tanto na esfera pública quantoprivada.

Para a compreensão do caso brasileiro, énecessário contextualizar a evolução institucionale os fatores que determinaram a atual conforma-ção dessa atividade no País.

Um pouco de história:evolução institucional brasileira2

No início da década de 1970, os meca-nismos de comercialização de hortigranjeiros noBrasil passavam por um processo de estrangula-mento, por conta, sobretudo, da precariedade dosequipamentos disponíveis e da falta de regulamen-tação para o setor.

O modelo institucional das Centrais de Abas-tecimento brasileiras, implementado a partir dadécada de 1970, foi desenvolvido em uma pers-pectiva sistêmica, com a constituição do SistemaNacional de Abastecimento (Sinac). Inspirado eassessorado pelo modelo espanhol (Mercasa), oSinac tinha como proposta inicial o estabeleci-mento de uma rede de informações técnicas en-tre todas as unidades atacadistas regionais paraservir como ponto de referência aos negóciosentre produtores e distribuidores, propiciando omelhor ponto de equilíbrio da oferta e dos preços.

Em articulação com os estados e municí-pios, foram implantados, no âmbito do Sinac,21 empresas denominadas de Centrais de Abas-tecimento, as Ceasas, incluindo 34 MercadosAtacadistas Urbanos, 32 Mercados AtacadistasRurais e diversos mercados varejistas de portesvariados, em centros urbanos de grande e mé-dio porte.

O Sinac, no entanto, foi implementado semdispor de uma visão estratégica definida, cujo rit-mo de expansão acompanhava o período de gran-des investimentos em infra-estrutura que o Brasilexperimentou na década de 1970. Ainda assim,foi capaz de implantar estruturas físicas decomercialização nos principais centros urbanosbrasileiros. O programa gerou, sem dúvida, be-nefícios para o produtor e consumidor, impactandoqualitativamente os segmentos de produção ecomercialização.

A implementação do Sinac não pode serdissociada do ambiente institucional do períodode autoritarismo, que se estendeu de 1964 a 1985,no Brasil e da trajetória expansionista da econo-mia brasileira na década de 1970, com o cresci-mento financiado pela abundância de recursosfinanceiros internacionais. Consoante com o pro-cesso de modernização da agricultura brasileira(GRAZIANO da SILVA, 1998), o Sinac definiu eimpôs padrões e normas técnicas na ausênciade um padrão estruturado de mercado. Assim,estabeleceu normas de embalagens, informa-ções de mercado, técnicas de produção e for-matos organizacionais, produtivos e comerci-ais e, sem dúvida, logrou uma transformaçãodo sistema produtivo brasileiro de frutas, legu-mes e verduras (FLV).

A estruturação de um arranjo organiza-cional impositivo, cujo esquema de incentivosestava baseado em vantagens e benefícios eco-nomicamente artificiais, como subsídios e vanta-gens privadas, fez com que as Ceasas brasileirascrescessem sob o duplo estímulo da força coerci-tiva, associada a leis de proibição de comércioatacadista fora dos espaços delimitados dos

2 Beneficio-me largamente das argumentações e análises e textos técnicos do economista Carmo Robilotta Zeitune, da Ceagesp, que constituíram alguns dostermos de referência do Prohort sobre este ponto.

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entrepostos (a “lei do perímetro”), com vantagenseconômicas, incentivos e privilégios aos comer-ciantes atacadistas recém-instalados. Essa situa-ção de duplo estímulo, com a criação de umempresariado regulado e ao mesmo tempo privi-legiado, foi útil, mas, ao fim, limitador da expan-são do modelo Ceasa. Generalizou-se, nesse pe-ríodo, uma imagem de apropriação privada debenesses públicas dos agentes privados, comointermediários não funcionais ou como forças decartel.

Já no final de 1986, com a crise fiscal doEstado brasileiro, levou-se a cabo o desmonte doSistema Nacional de Abastecimento brasileiro,com a transferência do controle acionário dasCeasas para os estados e municípios. Como talmedida não foi precedida de qualquer regra detransição, institucional ou gerencial, rompeu-se abase central de todo o arcabouço metodológicoque norteava a concepção sistêmica da interven-ção governamental no setor. O propósito do esta-belecimento de uma rede nacional integrada deinformações, ampliação dos avanços tecnológi-cos e de comercialização interagentes foi defini-tivamente prejudicado e as Ceasas assumiram in-dividualmente suas próprias linhas operacionais.

A partir dessa desarticulação, boa parte dasCeasas brasileiras passou a apresentar uma sériede deficiências estruturais e conceituais. Tais de-ficiências implicaram, em maior ou menor grau,a obsolescência das estruturas físicas decomercialização e apoio, bem como a precarie-dade dos métodos de gestão empresarial. Muitasvezes submetidos a interesses políticos locais, ouà influência dos agentes privados, que virtualmen-te se apropriaram da gestão, pressionando por ta-rifas e preços irreais, foi solapada a capacidadede sustentabilidade financeira de boa parte dasempresas gestoras. Essa perda refletiu-se tambémna ausência de uma visão estratégica de longoprazo, e na falta de aproximação e interação en-tre os agentes envolvidos no processo de produ-ção, comercialização, distribuição e consumo.

Algumas empresas, como as Centrais deAbastecimento de Minas Gerais (Ceasaminas),

conseguiram manter nesse período uma trajetó-ria de crescimento e desenvolvimento tecnológico,cuja sustentabilidade financeira foi ancorada emum modelo de integração público-privada, utili-zando a força dos investimentos privados paraexpansão da infra-estrutura e diversificação dasatividades comerciais abrigadas nos entrepostos.

O período que vai da metade da década de1980 a meados dos anos 1990 marcou um perío-do de forte instabilidade e expressivas mudançasinstitucionais (CUNHA, 2002). O Brasil navegounesse período sob quatro mandatos presidenciais,imediatamente após o fim da ditadura militar, emambientes econômica e politicamente conturba-dos e instáveis. O País teve promulgada uma novaConstituição (1988), passou por sete planos deestabilização econômica, conheceu seis moedas,atravessou uma hiperinflação (1989) e uma forterecessão (1991), experimentou pela primeira veza formação de um bloco comercial regional(Mercosul) e a abertura externa (1991) e, por fim,um período de estabilidade monetária e inflaçãobaixa (1994-95). As atividades das Ceasas passa-ram a ser reguladas pela Lei de Licitações (Lei nº8.666/93), um avanço institucional expressivo, mascujo caráter geral não contempla as especifici-dades das concessões (ou permissões de uso) pró-prias do comércio atacadista, constituindo umnovo freio institucional para expansão da ativi-dade.

No final dos anos 1990, dentro do processode renegociação das dívidas dos estados brasilei-ros com a União, duas das maiores empresas ata-cadistas, que representam conjuntamente mais de60 % do comércio atacadista nacional de FLV, aCeagesp (SP) e a Ceasaminas (MG), foramfederalizadas, para posteriormente seremprivatizadas. Essa visão de perda de papel públi-co das Ceasas aprofundou ainda mais a crise dosistema, uma vez que o processo de privatizaçãonão foi acompanhado de uma reestruturação dosetor, sendo unicamente motivado peloequacionamento de questões fiscais.

Ainda que as empresas de abastecimentoenfrentassem crises de gestão, algumas sereestruturaram e passaram a cumprir papéis e fun-

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ções típicas de Estado. Essas ‘novas funções’ dasCeasas foram possibilitadas pelo seu caráter em-presarial (a maioria é de empresas de sociedadeanônima com posse acionária majoritária de es-tados e municípios), que, livres das restrições fis-cais da administração governamental direta, semostraram mais ágeis para implementação deprojetos de diversas áreas temáticas sociais. Sãoexemplos iniciativas nas áreas de saúde, educa-ção, segurança alimentar (tanto food safety quan-to do food security), inclusão digital, principalmen-te voltadas para os espaços urbanos em que seinserem.

Três mudanças institucionais relevantes al-teram o cenário das Ceasas nos anos 2000. O pri-meiro é a ênfase na agricultura familiar, a partirdo Programa Nacional de Fortalecimento da Agri-cultura Familiar (Pronaf), que contou com recur-sos crescentes voltados para a inserção no mer-cado de produtores familiares. O segundo foi oconjunto de programas e ações gestados sob aégide do Programa Fome Zero, principalmente nosanos 2003–2004, que fortaleceu a aproximaçãodas Ceasas com iniciativas de food security, comobancos de alimentos e iniciativas para reduzir odesperdício. O terceiro marco foi a promulgaçãodo programa federal, coordenado pela Compa-nhia Nacional de Abastecimento (Conab), derevitalização das Ceasas brasileiras – o Progra-ma Brasileiro de Modernização do MercadoHortigranjeiro (Prohort), a partir da recomposiçãode um sistema, não mais amarrado por uma parti-cipação acionária, mas como uma iniciativa vo-luntária de adesão voltada para a integração dasbases de dados, da troca de informações e dacriação de mecanismos comuns de capacitaçãotecnológica.

Não obstante esse processo, as duas maio-res centrais brasileiras continuam, em 2006, ain-da sob processo de privatização, gerando incer-tezas sobre o futuro do setor.

Atualmente, o conjunto de Ceasas originá-rias do Sinac conta com 57 entrepostos em 21estados brasileiros, comercializando uma quanti-dade estimada em 8,7 milhões de toneladas deFLV anuais, cifra expressivamente superior à

verificada em países como França (5 milhões detoneladas) e Espanha (5,5 milhões de toneladas).

O papel das CeasasO histórico recente da evolução institucio-

nal do setor aponta movimentos contraditórios,cujos efeitos sobre o papel do segmento atacadis-ta ainda não são claros.

Do ponto de vista teórico e normativo, háessencialmente falta de clareza das instânciasgovernamentais e dos órgãos de coordenaçãosetorial sobre qual é o papel das Ceasas e paraonde devem se orientar suas ações.

Existem alguns pontos essenciais, aindaque simples, que geralmente não são compreen-didos sobre o papel das Ceasas. Primeiro, asCeasas são espaços de regulação normativa queinfluenciam o sistema a montante e a jusante, noestabelecimento de normas de horários, de pa-drões de embalagem, sanidade, informação depreços e origens. Segundo, que a capacidadeefetiva de regulação tem um componenteendógeno (empresarial, da empresa gestora) eexógeno (ambiente institucional, governo, merca-dos, concessionários, produtores), cuja interaçãodita as possibilidades de alcance e efetividade desuas normas. A incapacidade de adotar um pa-drão obrigatório disseminado de rotulagem de FLV,a despeito do aparato legal que o torna obrigató-rio, é um exemplo claro da necessidade de coor-denação de ações com diversos agentes da pro-dução para efetivar normas. E terceiro que, deforma geral, são pouco percebidas pelas instân-cias governamentais as possibilidades e os gan-hos de coordenação possíveis nesse espaçonormativo. Assim, nem sempre é percebido pelasinstâncias governamentais, ou pelos gestores depolíticas setoriais, pelos agentes da cadeia, oupelos consumidores urbanos que:

a) As Ceasas geram valores que são apro-priados privadamente na forma de sobrelucros,ou posição estratégica ou informações privile-giadas.

b) Que é o espaço cujo bem público estra-tégico, mais do que a localização, é a informa-ção e sua isonomia.

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c) Que as informações constituem um bempúblico e que influenciam a organização do sis-tema de abastecimento.

d) Que um sistema coordenado de informa-ções permitiria tanto ao governo quanto à inicia-tiva privada detectar com mais rapidez e eficiên-cia as variações de oferta e preços, riscos e opor-tunidades.

e) Que existe um conhecimento do funcio-namento do mercado, na forma de conhecimentotácito, mais do que conhecimento formal, dos fun-cionários em coordenação operacional de mer-cado e que tais conhecimentos estão pouco siste-matizados gerencialmente.

f) Que esse espaço, pelo poder de nor-matização, ditado pela influência dos fatoresendógenos e exógenos, pode ser visto como ummicrocosmo de relações administrativas, polí-ticas e operacionais que se constituem em umverdadeiro laboratório social, econômico e em-presarial.

Dimensões estratégicasA partir das considerações acima, são ana-

lisados os dilemas, desafios e estrangulamentospor que passam as Centrais brasileiras, a partir dequatro dimensões: empresarial, logística, urbanís-tica e ação em rede (network). Dado o escopodeste texto, e seu caráter de discussão, serão ape-nas pontuadas as principais questões em debatesobre esses aspectos.

Dimensão empresarial

Ceasa como prestadorade serviços monopolistas

Dois aspectos da dimensão empresarial sãoressaltados na compreensão dos desafios e dile-mas das Centrais de Abastecimento brasileiras: asua função e a gestão empresarial.

Do ponto de vista privado, as Ceasas sãoprestadoras de serviços monopolísticos de apoioà comercialização, referentes ao provimento de

infra-estrutura – energia, água e esgoto, normasde trânsito, urbanização, manutenção básica devias – e dos serviços de fiscalização, limpeza evigilância, e serviços de informação. Tais servi-ços são geridos pela empresa gestora de formadireta, ou por meio da gestão de contratos e re-munerados pelas tarifas de “aluguel”(concessãode uso) e “condomínio” (tarifas de serviços).

Sendo monopolista na oferta de serviçosbásicos de apoio à comercialização e sendo taisserviços remunerados pelos concessionários, es-tabelece-se uma relação fornecedor–cliente quese orienta por um conjunto de objetivos comuns,embora com interesses estratégicos diferentes,algumas vezes conflitantes.

Para a empresa prestadora de serviços, co-locam-se como orientações a regência das nor-mas legais e as normas internas. Para os conces-sionários, a eficácia, a economicidade e a previsi-bilidade das despesas são os principais objetivos.

O grande desafio para as Ceasas é ofere-cer serviços que sejam eficientes e eficazes e quesejam capazes de atender demandas operacionaisem larga escala, e ainda prover os serviços ne-cessários para acompanhar o ritmo de expansãodos negócios privados que regula.

Essencialmente, tal desafio passa pelaprofissionalização dos métodos gerenciais e pormétodos organizacionais que podem e, preferen-cialmente, devem contar com conselhos de usu-ários capazes de contribuir consultivamente comuma gestão mais eficiente e orientada para aten-der aos objetivos econômicos das empresasoperantes nos entrepostos. Assim, é paradigmáticoo exemplo da “Central de Abasto da Cidade doMéxico”. Essa Central pública, controlada pelogoverno federal em parceria com a municipa-lidade da cidade do México, designa o diretor-executivo, que preside um comitê formado pordez representantes do poder público federal emunicipal e dez representantes do setor privado,atacadistas e prestadores de serviços. O Comitêdecide sobre questões essenciais como as ativi-dades operacionais e políticas de investimento emodernização do entreposto. Segundo Favero

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(2005, p. 13) “este sistema de coordenaçãoparitária, integra nas instancias de decisão os re-presentantes dos operadores privados, e facilita atomada de decisões seja em relação aos investi-mentos necessários ou em atitudes operacionais.”

Ceasa como coordenadora do sistema

Em adição à função de prestadora de servi-ços, as Ceasas assumem um importante papel deregulação pública, ainda que não necessariamen-te estatal.

Essencialmente, a função de coordenaçãodas Ceasas enfrenta dois grandes desafios. O pri-meiro é o de garantir a eficiência do sistema pormeio de uma ação de geração de informações,redução das assimetrias e diminuição dos custosde transação entre os agentes econômicos. Es-sencialmente, trata-se de “desprivatizar” os benspúblicos gerados por uma posição estratégicalocacional dos agentes operadores no mercado.Nesse sentido, é exemplar a citação deZylbersztajn et al. (1997, p. 634) de que “a apro-priação privada de parte do excedente gerado noprocesso produtivo indica a presença de inefici-ências associadas a(s) Ceasa(s), plenamente re-conhecida pelos agentes privados que se utilizamdas facilidades construídas pelo Estado.”

O segundo aspecto refere-se à capacida-de de implementação e efetivação das normasde regulamentação, os instrumentos de ação dasCeasas.

Em relação a esse aspecto é importanteobservar que as tensões inerentes à implemen-tação efetiva dessas normas são tanto maioresquanto menos difundidos os padrões de regula-mento de mercado, com os mercados informais,menos exigentes em termos de organização ecapacitação, exercendo pressão constante para“contaminar” os mercados mais exigentes. Esseaspecto é especialmente crítico na implemen-tação de padrões de normatização de embala-gem, peso e rastreabilidade, cujos padrões defi-nidos em normas federais têm tido performancelimitada em termos de adoção, com efeitos dano-

sos para os segmentos a jusante da comerciali-zação atacadista, tanto em termos de preço quantoem termos de tipificação de produtos e padrõessanitários.

A efetivação das normas de regulamenta-ção depende não apenas da eficiência adminis-trativa gerencial das Ceasas, mas de um ambien-te institucional que oriente para a modernizaçãodo sistema, fazendo com que os padrões de exi-gência dos mercados consumidores (interno eexterno) consigam gerar fluxos de informaçõesadotados pelos segmentos produtivos a montan-te. Nesse sentido, dois segmentos exercem umpapel fundamental. O comércio varejista, em es-pecial o setor supermercadista, cuja atividade nosetor de FLV é crescente no País, e as empresaspúblicas de assistência técnica e extensão e pes-quisa. Os mecanismos dessa interação podem serformais, de integração privada como no modelonorte-americano do Produce Market Association(PMA) ou pela coordenação pública em comitêsou conselhos ou câmaras setoriais. A experiênciabrasileira demonstra que o papel do Estado nesseformato organizacional é tanto mais eficientequanto mais coordenador e menos executivo forseu papel.

Dilemas de gestão

O desenvolvimento histórico das Ceasasbrasileiras indica uma perda paulatina da capa-cidade de gestão empresarial, decorrente de di-ferentes tipos e graus de ingerências políticas edos objetivos das empresas orientados para inte-resses locais, e não para uma visão de longo pra-zo. Em decorrência, muitas das Ceasas experi-mentaram uma descontinuidade gerencial e au-sência de capacitação profissional.

Geralmente, as Centrais brasileiras enfren-tam problemas de sustentabilidade econômicadecorrente da baixa rentabilidade sobre o capitalfixo, da inelasticidade de receitas e da baixa ca-pacidade de investimentos. Alie-se a isso a faltade mecanismos eficientes de controle de gestãodo ponto de vista financeiro e os custos excessi-vos não orientados para o crescimento empresa-rial.

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Fatores institucionais também interferemfortemente na capacidade de expansão e cresci-mento das Ceasas, sendo destacada a ausênciade um marco legal específico que regulamenteconcessões comerciais. Dois aspectos são forte-mente limitadores: o obstáculo à realização detransferências de concessões, vedado pela Lei nº8.666, que não alcança o conceito de fundo decomércio, e o tempo de concessão dos contratos,que é limitador das expectativas de expansão ecrescimento empresarial. Efetivamente, a lei fe-deral nº 8.666 não é adequada para permitir ocrescimento do setor atacadista, nem tampoucoassegurar o caráter público dessas concessões.

Que direções tomar?

A questão da capacidade de investimentodeve necessariamente incorporar a visão de par-ceria público-privada na realização de investi-mentos em infra-estrutura, a exemplo do que acon-teceu na Ceasaminas na década de 1980, queassegurou a expansão de mais de 60 % da capa-cidade comercial instalada. Para tanto, é neces-sário um novo marco legal que possibilite e esti-mule essas parcerias.

Ainda do ponto de vista financeiro, é im-portante que as Ceasas ofereçam crescentementeas possibilidades de expansão de suas receitaspor meio da prestação de serviços de apoio anegócio, serviços de informação, assistência téc-nica para qualidade, tratamento de informações,de forma a superar a questão da inelasticidade desua renda, baseada em ganhos fundiários.

Do ponto de vista das empresas gestoras,muito pode ser feito, sendo necessário conduzirações e arranjos organizacionais visando dimi-nuir a ingerência política na gestão dessas em-presas, seja pela reestruturação gerencial, parti-cipação nos lucros para funcionários e transpa-rência administrativa. Um exemplo interessantea ser analisado é o do mercado de Toronto (OntarioFood Terminal), no Canadá, maior entreposto dopaís, cujo staff administrativo é indicado pelogoverno, mas cujos gerentes são profissional-mente selecionados no mercado profissional detrabalho.

Outro aspecto importante e fundamentalnesse processo é que a gestão seja acompanha-da pelos agentes operadores, concessionários eprodutores, como no exemplo citado da experi-ência da Central de Abasto da Cidade do Méxi-co. No entanto, essa relação deve-se dar nãoapenas na interação com as associações de re-presentação desses agentes, muitas vezes sujei-tas a falta de representatividade ou controle porparte de um grupo restrito de representantes, maspor intermédio de um arranjo mais transparente eobjetivo.

Nesse sentido, sendo as Ceasas monopo-listas na oferta de serviços, é importante incluiros agentes de mercado como co-formuladoresdo planejamento estratégico das atividadesoperacionais.

Dimensão logística

Alguns dos desafios inerentes à dimensãologística são bem retratados no que Green (2003)define como o ‘decálogo dos mercados de tercei-ra geração’, que expressam as tendências e de-safios colocados para os mercados europeus.

O decálogo de Green (2003) pode ser ana-lisado sob a perspectiva funcional. Na função fí-sica, constituem-se desafios: 1) a ampliação dagama de serviços e atividades complementaresna direção de pólos alimentares multimodais; 2) oinvestimento em modernização das instalações(climatização, TI e logística); 3) a gestão urbanís-tica que permita investimentos privados de longoprazo; 4) uma gestão ambiental voltada para otratamento de resíduos.

Na função econômica, os desafios referem-se a: 1) homogeneização de normas e formas deorganização e sistemas internacionais decertificação; 2) promoção de boas práticas comer-ciais no mercado.

Na função informação: 1) promoção dodesenvolvimento da segurança alimentar, comsistemas coletivos de rastreabilidade; 2) difusãode informações comerciais pela internet.

Dois elementos desse decálogo relacio-nam-se a outro tipo de função, a função de coor-

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denação de padrões e fluxos decorrente danormatização do comércio atacadista que influ-encia e molda a forma de organização dos agen-tes a montante (produção agrícola) e a jusante dosistema (comércio varejista e serviços alimenta-res), colocando-se como desafios: 1) reforçar oapoio a pequenas e médias empresas do setor; 2)promover atividades permanentes de formaçãoem qualidade e segurança de alimentos.

Para o caso brasileiro, enfatizam-se trêsgrandes desafios: o primeiro, já anteriormente ci-tado, é a busca pela oferta de novos serviços vol-tados para apoiar a atividade comercial ataca-dista, expressa em serviços de trânsito e tratamen-to de informações e dados, assistência técnicavoltada para a qualidade e a rastreabilidade decentros de apoio aos negócios, apoio para nego-ciações internacionais, publicidade, etc.

Do ponto de vista de infra-estrutura, a ques-tão ambiental é talvez a maior fragilidade dasCeasas brasileiras. Os grandes entrepostos brasi-leiros, em dissonância com seus similares de paí-ses desenvolvidos, ainda não incorporam um pa-drão consistente de gestão ambiental e de recur-sos não-renováveis eficientes e voltados para aredução de desperdício e utilização racional derecursos, não obstante serem comuns iniciativaspontuais e alguns exemplos bem sucedidos. Agestão de resíduos orgânicos e não-orgânicos é oponto crítico operacional desse sistema, que po-deria ser o difusor de novos padrões para os nú-cleos urbanos.

Finalmente, a promoção da qualidade dosalimentos, da sanidade dos produtos e darastreabilidade, por meio das normas de Análisede Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC)e de programas permanentes de qualificação, é oterceiro grande desafio brasileiro.

Dimensão urbanística

Outra dimensão relevante das grandes uni-dades das Centrais de Abastecimento é a sua di-mensão urbanística, que pelo porte de suas insta-lações, pela complexidade operacional e pelaforte implicação social, que assemelha seus

entrepostos a cidades situadas dentro de cidades.Questões como segurança, trânsito, meio ambi-ente, abastecimento de água, energia elétrica,coleta de resíduos, bem como desafios sociais tí-picos de uma cidade, estão presentes no dia-a-dia dos entrepostos.

Diversos e importantes programas desen-volvidos e administrados pelas Centrais de Abas-tecimento brasileiras têm relação mais estreitacom programas de inclusão e representação so-cial típicos de cidades do que funções logísticas.Os programas de segurança alimentar, hoje ra-zoavelmente difundidos nas Centrais brasileiras,por meio de uma gama de projetos que incluembancos de alimentos, programas de distribuiçãode gêneros alimentícios, fábricas de concentradoalimentar, programas de educação alimentar enutricional, beneficiam um grande número de ins-tituições assistenciais e reduzem a pressão daspopulações do entorno dos entrepostos.

Os programas de segurança alimentar de-senvolvidos nas Centrais têm expressiva signifi-cância em termos de benefício social e comuni-tário, embora poucas Centrais tenham desenvol-vido uma metodologia consistente de operaciona-lização e articulação social, ou de relacionamentocom esferas administrativas governamentais, queenvolva a participação social na gestão ealocação desses benefícios.

Essa lacuna pode ser atribuída tanto pelanatureza desses projetos, cuja metodologiaoperacional difere das atividades tipicamenteempresariais, quanto pela possibilidade de utili-zação oportunista desses recursos para fins políti-cos. De qualquer forma, esse é um aspecto cujaarticulação e padronização das ações transcen-de a órbita logística ou empresarial, cujos proble-mas e soluções encontrados têm forte significânciano campo das relações urbanas.

Também são tipicamente urbanas as ativi-dades de comércio varejista que diversosentrepostos atacadistas abrigam, como feiras dealimentos, alimentação e comércio informal, mui-tas com significativa expressão cultural local,colocando dentro dos entrepostos tanto o consu-midor final de alimentos quanto o cidadão embusca de alternativas de lazer.

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A concentração da população transeuntenas Centrais exerce uma forte pressão organiza-cional de trânsito e segurança pública – cuja de-manda, em geral, não é atendida a contento pe-las instâncias públicas responsáveis por esses ser-viços, em função do caráter “condominial” dasCentrais. No entanto, essas pressões – trânsito esegurança – têm forte implicação na própria or-ganização do espaço urbano de seu entorno.

Outra característica marcadamente urba-na das grandes Centrais é a demanda por servi-ços de apoio de informação, saúde e educaçãopara atendimento tanto da população flutuante –consumidores, produtores, caminhoneiros, etc., –como da “população residente” dos empregados,carregadores, cuja pressão é, em alguns casos,superior à de muitas cidades médias pela con-centração populacional em um espaço restrito econcentrado temporalmente.

O que é necessário para lidar com os dile-mas urbanísticos é investir esforços para que osentrepostos possam ser como modelo e vitrine deracionalização de recursos e insumos (uso deenergia, água, tratamento de resíduos, reduçãode desperdício) e oferecer alternativas de servi-ços públicos sociais para o público circulante edo entorno (serviços de capacitação, orientação,saúde, segurança).

Dimensão de rede

A quarta dimensão relevante para análisedas Centrais de Abastecimento é a dimensão dearticulação em rede de todo o sistema. Trata-sede reconhecer o papel de coordenação ou deemissão de ordens para o sistema, de articulaçãocom políticas setoriais e de integração do própriosistema de centrais atacadistas. Dado o escopodeste trabalho, esse tópico foca a emergência dorecente programa de integração das Ceasas, oPrograma Brasileiro de Modernização do Merca-do Hortigranjeiro, Prohort, sob coordenação daCompanhia Nacional de Abastecimento (Conab).

O Prohort é uma resposta brasileira que se-gue as tendências verificadas na Europa Ociden-

tal de recriação de uma rede de mercados, maissintonizada com o modelo italiano de mercatiassociati do que com a forma de coordenaçãoverticalizada e articulada acionariamente comoa existente nos modelos francês (dos MIN), espa-nhol, (Mercasa) e português (Simab) (GREEN,2003).

O Prohort está estruturado em oito grandesdiretrizes e objetiva: 1) desenvolver e integrar osbancos de dados estatísticos das Ceasas; 2)universalizar as informações, reduzindo suasassimetrias com o público; 3) modernizar os pro-cessos de gestão técnico-operacional e adminis-trativa das Ceasas; 4) estimular a agregação detecnologia à cadeia produtiva, orientada às exi-gências de mercado de consumo; 5) adequar emodernizar a infra-estrutura física, tecnológica eambiental das Ceasas; 6) modernizar os serviçosde apoio disponibilizados pelas Ceasas; 7) esti-mular a interação das Ceasas com as universida-des, órgãos de pesquisa, ONGs e as Políticas Pú-blicas de Abastecimento e de Segurança Alimen-tar; 8) ampliar as funções das Ceasas, tornando-as áreas privilegiadas para execução e difusãodas políticas públicas, no âmbito da saúde, edu-cação e segurança alimentar.

O significado desse programa é o redesenhode um sistema integrado entre Centrais de Abas-tecimento brasileiras, não mais regidas vertical-mente por um acionista comum, mas um progra-ma de adesão voluntária de cada empresa, cujosistema de incentivos baseia-se em alcançar umobjetivo estratégico comum.

Partindo de uma estratégia gradualista, esem impor um formato gerencial unificado, o pro-grama resgata as funções públicas das Ceasas,principalmente no tocante à redução deassimetrias informacionais, visando alcançar aprodução de informações estratégicas que bene-ficiam todo o sistema. O incentivo à informati-zação das Ceasas, nesses moldes, respeita osdesenvolvimentos e os modelos informacionais decada empresa individual, estimulando a criaçãode interfaces entre os diversos bancos de dados eoferecendo uma alternativa de software de ges-tão estatística e técnica para as empresas que ain-

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da não dispõem desse recurso. Neste sentido, asetapas iniciais do programa já lograram a cria-ção de Portal de internet, integrando informaçõesde comercialização das principais centrais deabastecimento do País, com informações diáriase preços e quantidades comercializadas dos prin-cipais produtos, inclusive com cotação de preçosem moedas internacionais.

A segunda etapa, fundamental para o êxitodo programa, já se iniciou com a criação de es-tratégias de desenvolvimento de um programa detreinamento e capacitação de recursos humanosde toda a cadeia do abastecimento e envolvendoprodutores, comerciantes, carregadores, compra-dores, operadores de mercado, administradorese gerentes de centrais de abastecimento, a partirde convênio com a Universidade Federal de Vi-çosa, por intermédio do Centro Nacional de Trei-namento em Armazenagem (Centreinar).

A terceira etapa do programa dependerádo vigor e do avanço dessas etapas, para inte-grar as Ceasas a linhas programáticas setoriaisde forma ativa, com a criação de grupos inte-restaduais para desenvolver trabalhos nas áre-as de tecnologia, qualidade de alimentos e in-formações de mercado.

Ao restabelecer para as Ceasas uma dire-triz estratégica comum, a partir da capacitação edo desenvolvimento tecnológico, o programa es-tabelece bases muito mais sólidas para articularo acesso a linhas de financiamento públicas e pri-vadas em infra-estrutura.

Dessa forma, é necessário e imprescindí-vel que o Prohort inicie seu processo de diagnós-tico amplo do sistema que se propõe a estruturar,de forma a compreender e potencializar o alcan-ce e a dinâmica de um segmento que mobilizadiretamente, apenas em valor de vendas, ummontante de pelo menos US$ 5 bilhões anuais.Quantos consumidores são clientes diretos e indi-retos dos ‘Sistema Ceasa’? Quantos produtores equantos hectares produzidos o ‘Sistema’ envol-ve? Quantos empresários o ‘Sistema’ coordena e

quantos postos de trabalho gera, direta e indireta-mente? De onde vêm os produtos e qual a efici-ência do ‘Sistema’ nacional de abastecimento epreços? Pode a sazonalidade da produção sercompensada internamente por fluxos comerciaismais racionais e eficientes? Qual, então, o impactosobre preços e oferta? Qual o avanço do setorsupermercadista no comércio de FLV e qual seugrau de interação com as Ceasas? A difusão denovas embalagens para FLV agrega quanto devalor e economia ao País? Qual a capacidade decrescimento do comércio internacional do FLVbrasileiro?

É incompreensível que o Brasil, em plenoséculo 21, ainda não conheça e não utilize estra-tegicamente essas informações. Mas nunca é tar-de demais para buscá-las.

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Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200647

Distribuição geográficada pecuária leiteirano Brasil

IntroduçãoA importância da pecuária de leite no de-

sempenho econômico e na geração de empre-gos no país é incontestável (EMBRAPA GADO DELEITE, 2006). A produção total de leite em 2004foi de 23,5 bilhões de litros, gerando uma receitade, aproximadamente, R$ 12 bilhões. (IBGE, 2005).O setor primário envolve cerca de 5 milhões depessoas, considerando, também, os 1,3 milhão deprodutores de leite (ASSIS et al., 2005).

A Região Sudeste continua líder na produ-ção, contribuindo, em 2004, com 39,1 % da pro-dução de leite nacional, enquanto as regiões Sule Centro-Oeste participaram com 26,6 % e15,4 %, e as regiões Nordeste e Norte com11,5 % e 7,1 %, respectivamente. De 2001 a 2004,a participação das regiões Norte, Nordeste e, es-pecialmente, Sul cresceu de forma consistente,enquanto a participação da Região Centro-Oestemanteve-se, praticamente, inalterada e da RegiãoSudeste decresceu de 41,8 % para 39,1 % da pro-dução nacional.

O conhecimento da estrutura e da distribui-ção espacial da pecuária leiteira no Brasil é degrande relevância para definição de políticas deinfra-estrutura, transporte, logística, análise de vi-abilidade de projetos de desenvolvimento regio-nal e setorial e de programas de colonização eassentamento. É também importante para o esta-belecimento de estratégias de vigilância sanitá-

Rosangela Zoccal1

Airdem Gonçalves de Assis2

Silvio Roberto de Medeiros Evangelista3

1 Zootecnicista, M. Sc. [email protected] Engenheiro agrônomo, Ph. D., [email protected] Estatístico, Ph. D., [email protected].

ria, rastreabilidade, avaliação de risco geográfi-co de doenças e estudos de dinâmica do setoragropecuário.

O presente trabalho tem por objetivo forne-cer informações sobre a distribuição geográficada pecuária leiteira no Brasil, focando as dimen-sões de efetivo bovino, volume produzido de lei-te, número de vacas ordenhadas e produtividadeanimal.

MetodologiaA distribuição espacial da pecuária leiteira

foi realizada tendo-se como base a classificaçãode microrregiões homogêneas e os dados da Pes-quisa Pecuária Municipal do IBGE (2005). Emanálises de dados censuais de produção de leite,freqüentemente, ordena-se as microrregiões pelovolume de produção, podendo, assim, se referir àmaior ou menor microrregião em função da quan-tidade de leite produzida. No entanto, há grandevariação de área entre microrregiões, principal-mente nas regiões Norte e Sudeste. Desse modo,por exemplo, no conjunto das microrregiões queperfazem 25 % da produção, podem não estarpresentes algumas microrregiões onde o produtotem uma presença tradicional e importante.

No presente trabalho, para suprimir o efei-to do tamanho da microrregião nas variáveis re-ferentes à população animal (número de bovinos

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 48

e de vacas ordenhadas) e à produção de leite(volume, em litros), considerou-se o conceitode densidade, como nos censos demográficosem que se expressa o número de habitantes porquilômetro quadrado. Assim, para cadamicrorregião, dividiu-se o número de cabeçasou a quantidade produzida de leite por sua res-pectiva área em quilômetros quadrados, cujoíndice resultante pode indicar o grau de impor-tância do leite na região. Com base neste índi-ce, procedeu-se a um ordenamento dasmicrorregiões e, em seguida, à divisão emquartis baseada no valor total da variável.

Resultados e discussãoO efetivo bovino nacional é composto de

204,5 milhões de cabeças, divididos em quartisde 51.128 milhões (Tabela 1). O primeiro quartilagrega as 53 microrregiões que apresentaram,em 2004, os maiores índices de densidade ani-mal (≥78 cab./km2) e totalizaram 25 % do reba-nho bovino brasileiro. O segundo quartil, for-mado por 76 microrregiões, apresentou índicesde densidade animal variando de 52 cab./km2 a77 cab./km2 e somou mais 25 % do rebanho.Esses dois quartis juntos congregam as 129microrregiões (23 % do total) que, em 2004, de-tinham 50 % do rebanho nacional. No terceiroe quarto quartis estão agrupadas as 429microrregiões (77 %) com índices de densida-de animal abaixo de 51 cab./km2 que, juntas,representam a outra metade do rebanho bovi-no nacional.

A Tabela 2 mostra as 53 microrregiões erespectivas mesorregiões que apresentaram, em

2004, as maiores densidades de bovinos (≥ 78 cab./km2). Essas microrregiões estão agrupadas em 12zonas de produção (B1 a B12). Observa-se quedas 53 microrregiões, 16 (30 %) localizam-se noEstado de São Paulo, 10 (19 %), no Paraná, 9(17 %), em Goiás, e 6 (11%), no Mato Grosso doSul. Anicuns, no centro de Goiás, e Três Lagoas,no leste de Mato Grosso do Sul, foram as micror-regiões que apresentaram, respectivamente, amaior densidade (124,4 cab./km2) e a maior po-pulação bovina (4,3 milhões de cabeças) doPaís.

Na Fig. 1, as 558 microrregiões brasilei-ras estão distribuídas espacialmente em quatroquartis de acordo com os índices de densidadeanimal calculados da pesquisa municipal de 2004(IBGE, 2005). Das 12 zonas formadas pelasmicrorregiões de maior densidade bovina(≥ 78 cab./km2), sete (B1 a B7) destacam-se nomapa pela extensão territorial e efetivo bovinosuperior a 1 milhão de cabeças. A zona de maiormagnitude (B1), que começa na região de Bauru,Estado de São Paulo, e termina no sudoeste doMato Grosso do Sul, passando pelo sul de Goiás enoroeste do Paraná, cobre uma superfície de, apro-ximadamente, 300 mil km2 (Tabela 2) e contémuma população de 28,2 milhões de bovinos, cer-ca de 14 % do efetivo nacional.

Mais cinco zonas de menor extensãoterritorial completam o quartil de maior densida-de bovina. Essas zonas correspondem às seguin-tes mesorregiões do IBGE: Norte PioneiroParanaense, Norte Central Paranaense, Noroes-te Fluminense, Litoral Norte Espírito-Santense eItapetininga, SP (Tabela 2).

Tabela 1. Distribuição do rebanho bovino nas microrregiões homogêneas, em quartis.

Fonte: IBGE (2005) – Pesquisa Pecuária Municipal, 2004.

5376

139290558

QuartisQuantidade

1º2º3º4ºTotal

9,513,624,952,0

100,0

%

Microrregiões

51.12851.12851.12851.128

204.512

Mil cabeças

25252525

100

%

Rebanho bovino

≥7852 a 7730 a 51

≤29

Cab./km2

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200649

Tabela 2. Zonas de maior densidade de bovinos (≥78 cab./km2) e respectivas microrregiões homogêneas emesorregiões.

SP

PR

MG

MS

GOGO

RORS

PAMT

PRSCPR

PR

RJ

ES

SP

Zona

B1

B2

B3B4

B5B6

B7

B8

B9

B10

B11

B12

Total/Média

AraçatubaBauruMaríliaPresidente Prudente

São José do Rio Preto

Noroeste ParanaenseNorte CentralParanaense

Triângulo Mineiro/Alto ParanaíbaLeste do MatoGrosso do SulCentro do MatoGrosso do SulSudoeste doMato Grosso do SulSul GoianoCentro GoianoNoroeste Goiano

Leste RondonienseSudoesteRio-GrandenseSudeste ParaenseSudoesteMato-GrossenseSudoeste ParanaenseOeste CatarinenseNorte PioneiroParanaenseNorte CentralParanaenseNoroeste Fluminense

Litoral NorteEspírito-SantenseItapetininga

UF(1) Mesorregião

Andradina, Araçatuba e BiriguiBauru e LinsMarília e TupãAdamantina, Dracena ePresidente PrudenteAuriflama, Fernandópolis, Jales,Nhandeara e VotuporangaParanavaí e UmuaramaAstorgaFrutal e ItuiutabaNova Andradina, Paranaíba eTrês Lagoas

Campo Grande

Bodoquena e Iguatemi

Quirinópolis

Anápolis, Anicuns, Ceres,Goiânia e IporáAragarças, Rio Vermelho e SãoMiguel do AraguaiaCacoal e Ji-ParanáCampanha Meridional eCampanha CentralRedençãoJauru

Capanema e Francisco BeltrãoSão Miguel d’OesteIbaiti, Jacarezinho e WenceslauBrazFaxinal e Ivaiporã

Itaperuna e Santo Antônio dePáduaMontanha

Tatuí

Microrregiõeshomogêneas

296.193

96.539

49.61031.922

21.27017.281

12.009

8.971

8.350

5.443

2.986

2.244

552.817

Área(km2)

28.220.738

8.424.673

4.748.7462.690.434

2.292.9161.949.585

1.037.697

744.751

681.110

482.750

301.406

181.860

51.756.666

Bovinos(cabeças)

99,7

92,2

95,784,4

107,8112,8

86,2

82,8

80,8

90,1

100,9

81,0

95,1

Cab./km2

O mesmo procedimento de cálculo de den-sidade animal adotado na análise do efetivo bo-vino foi utilizado na análise do número de vacasordenhadas. Neste caso, as 558 microrregiõesforam classificadas em quatro quartis de acordo

com os seus índices de densidade de vacas orde-nhadas. As 20 milhões de vacas ordenhadas em 2004,incluindo animais de rebanhos leiteiros, duplo pro-pósito e corte, foram divididas nos quatro quartis, comcerca de 5 milhões de vacas cada (Tabela 3).

(1) Unidade da Federação.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 50

Fig. 1. Distribuição do rebanhobovino nacional, em quartis (Q),nas microrregiões homogêneas,no ano de 2004.

Tabela 3. Distribuição do rebanho de vacas ordenhadas nas microrregiões homogêneas, em quartis.

Fonte: IBGE (2005) – Pesquisa Pecuária Municipal, 2004.

5696

120286558

QuartisQuantidade

1º2º3º4ºTotal

10,017,221,551,3

100,0

%

Microrregiões

5.0055.0055.0055.005

20.022

Mil cabeças

25252525

100

%

Vacas ordenhadas

≥127 a 12

3 a 6≤2

Cab./km2

O primeiro quartil, composto por 56 micror-regiões (10 % do total), agrupa as microrregiõesde maior densidade (≥12 vacas/km2) e contém25% das vacas ordenhadas no País. O segundoquartil, formado por 96 microrregiões (17,2 %),apresenta índices que variam de 7 cab./km2 a12 cab./km2. Nesses dois quartis estão contidas50 % das vacas ordenhadas no Brasil, abrangen-do 27 % das microrregiões.

Dentre as 56 microrregiões de maior den-sidade de vacas (Tabela 4), 21 (38 %) localizam-se em Minas Gerais (média de 15,3 vacas/km2),

7 (13 %) no Estado de São Paulo (20,1 vacas/km2),6 (11 %) no Rio Grande do Sul (16,6 vacas/km2), 5(9 %) no Estado do Rio de Janeiro (19,1 vacas/km2) ecinco (9 %) em Goiás (17,7 vacas/km2). SãoMiguel d’Oeste, no Oeste Catarinense, e Ji-Paraná,no Leste Rondoniense, foram as microrregiões queapresentaram, respectivamente, a maior densida-de (29,5 vacas/km2) e a maior população de va-cas ordenhadas (487 mil vacas) do País

As microrregiões de maior densidade devacas ordenhadas (≥ 12 vacas/km2) estão distri-buídas, predominantemente, em dez zonas de pro-

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200651

dução (V1 a V10), como assinaladas na Fig. 2.Observa-se que não existe uma grande zona demaior densidade de vacas ordenhadas, como nocaso do efetivo bovino cuja zona B1 se estendedo Oeste Paulista até o sudoeste do Mato Grossodo Sul, ocupando uma superfície contínua de qua-se 300 mil km². No caso das vacas ordenhadas,existem zonas menores, dispersas geograficamen-te nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul, cujassuperfícies variam de 30 mil km2 a 55 mil km² erebanhos de 500 mil a menos de 1 milhão de va-cas ordenhadas (Tabela 4).

As zonas de maior densidade de bovinos(Tabela 2; Fig. 1) nem sempre são as de maiordensidade de vacas ordenhadas (Tabela 4; Fig.2). A grande zona de efetivo bovino (B1) reduz-se, em termos de vacas ordenhadas, a uma áreasete vezes menor (V2) que abrange parte do Tri-ângulo Mineiro e a região de São José do Rio Pre-to, no Estado de São Paulo. Embora o número devacas ordenhadas não seja um indicativo diretoda característica leiteira da região, esses dadossugerem que somente uma pequena área da zonaB1 (isto é, V1) é dedicada à pecuária de leite. Porsua vez, a zona B5 (Sudeste Paraense), de altadensidade bovina (107,8 cab./km²), não apareceentre as 56 microrregiões de maior densidade devacas ordenhadas, indicando uma tendência deespecialização da região em pecuária de corte.

As microrregiões tradicionais de pecuárialeiteira estão contidas nas zonas V4 (Vale doParaíba Paulista e sul/sudoeste de Minas), V5(Campo das Vertentes, oeste, metropolitana, cen-tral e Triângulo Mineiro) e V6 (Zona da Mata Mi-neira e noroeste, centro e sul Fluminense) cujasdensidades variam de 14,5 vacas/km2 a 16,9 va-cas/km² (Tabela 4). Além dessas dez zonas deprodução, aparecem pequenas manchas no mapa(Fig. 2), de maior densidade de vacas ordenha-das, dispersas em áreas litorâneas e próximas agrandes centros consumidores das regiões Nor-deste e Sudeste do País.

Na análise dos dados de produção de lei-te, adotou-se o mesmo procedimento anterior, ouseja, a distribuição espacial das microrregiõesmais produtoras de leite baseou-se no índice de

densidade da produção/km² (Tabela 5). Observan-do o primeiro quartil (≥ 21,4 mil litros de leite/km²)verifica-se que 25 % da produção nacional con-centrou-se em apenas 39 das 558 microrregiões(7 %). O segundo quartil é formado por 60 micror-regiões, com índice variando de 13,1 mil litros/km2 a 21,3 mil litros/km². Essas 99 microrregiões(17,7 % do total) responderam por 50 % da produ-ção de leite nacional (11,7 bilhões de litros/ano).

Na Tabela 6 estão relacionadas as microrre-giões, e as respectivas mesorregiões, de maiordensidade da produção de leite (≥ 21,4 mil litros/km²), agrupadas em nove zonas de produção (L1a L9). Dentre as 39 microrregiões de maior densi-dade da produção, 12 (31 %) localizam-se no Es-tado de Minas Gerais que, juntas, produziram8,3 % da produção nacional. O Rio Grande doSul teve 10 (25,6 %) microrregiões de maior den-sidade de leite que contribuíram com 5,4 % daprodução nacional, e o Paraná, 6 (15,5 %) querepresentaram 5,3 % da produção nacional. SãoMiguel d’Oeste, em Santa Catarina, além de apre-sentar a maior densidade de vacas ordenhadasdo País (29,5 vacas/km²), foi a microrregião demaior densidade da produção de leite (77,6 millitros/km²). Meia Ponte, no sul de Goiás, e Ji-Paraná, no leste de Rondônia, foram as duasmicrorregiões de maior produção de leite do Bra-sil, com cerca de 370 milhões de litros anuaiscada. Destaque, ainda, para as quatro microrre-giões do Oeste Catarinense (São Miguel d‘Oeste,Chapecó, Concórdia e Xanxerê) que juntas pro-porcionaram a maior média de densidade da pro-dução de leite do País (52 mil litros/km2) e produ-ziram um volume de leite correspondente a 4 %da produção nacional.

Na Fig. 3, observa-se que as 39 microrre-giões de maior densidade da produção de leiteestão distribuídas, predominantemente, em 2 zo-nas de produção da Região Sul (L1 e L5), 5 daRegião Sudeste (L2, L3, L4, L7 e L9), 1 da RegiãoCentro-Oeste (L6) e 1 do Nordeste (L8). Na Re-gião Sul, a produção concentra-se em uma longafaixa (L1) que se estende do Oeste Paranaense(Toledo e Foz do Iguaçu), passa pelo OesteCatarinense (Chapecó e São Miguel d’Oeste) eNoroeste Rio-Grandense (Santa Rosa, Passo Fun-

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 52

V1

V2

V3

V4

V5

V6

V7V8

V9V10

Outras

Total/Média

Tabela 4. Zonas de maior densidade de vacas ordenhadas (≥12,6 vacas/km2) e respectivas microrregiõeshomogêneas e mesorregiões.

GO

SP

MG

PR

SCRS

MG

SPMG

MG

RJ

ROMG

ES

PRRS

ALES

RN

Zona

Centro Goiano

Sul GoianoSão José do Rio Preto

Triângulo Mineiro/Alto ParanaíbaSudoeste Paranaense

Oeste CatarinenseNoroesteRio-Grandense

Sul/Sudoeste de Minas

Vale do Paraíba PaulistaCampo das VertentesOeste de MinasCentral MineiraMetropolitana deBelo HorizonteTriângulo Mineiro/Alto ParanaíbaZona da Mata

Noroeste Fluminense

Centro FluminenseMetropolitanado Rio de JaneiroSul FluminenseLeste RondonienseVale do MucuriVale do Rio DoceNoroesteEspírito-SantenseOeste ParanaenseCentro OrientalRio-GrandenseNordesteRio-GrandenseSertão AlagoanoCentralEspírito-SantenseSul Espírito-SantenseLeste Potiguar

UF(1) Mesorregião

Anápolis, Anicuns,Ceres e GoiâniaMeia PonteAuriflama, Fernandópolis, Jales,Nhandeara, São José do RioPreto e VotuporangaFrutal

Capanema e Francisco BeltrãoChapecó, Concórdia e SãoMiguel do OesteCerro Largo, FredericoWestphalen, Santa Rosa e TrêsPassosAlfenas, Itajubá, Passos,Pouso Alegre, Santa Rita doSapucaí, São Lourenço eSão Sebastião do ParaísoGuaratinguetáLavrasFormiga, Oliveira e DivinópolisBom DespachoPará de Minas

Patos de Minas

Cataguases, Juiz de Fora,Muriaé e UbáItaperuna e São Antôniode PáduaCantagalo–CordeiroVassouras

Barra do PiraíJi-ParanáNanuqueMantenaBarra de São Francisco

ToledoLajeado–Estrela

Guaporé

BatalhaVitória l

Cachoeiro de ItapemirimNatal

Microrregiõeshomogêneas

54.986

41.510

35.967

34.957

37.122

31.801

25.02414.347

8.716 7.671

4.940

297.041

Área(km2)

922.970

762.905

740.545

550.016

531.158

508.631

486.910205.135

120.381113.447

79.696

5.021.794

Vacasordenhadas

17,7

19,9

20,5

16,1

14,5

16,9

19,515,3

13,814,7

15,5

16,5

Vacas/km2

(1) Unidade da Federação.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200653

Fig. 2. Distribuição do rebanhonacional de vacas ordenhadas,em quartis (Q), nas microrregiõeshomogêneas, no ano de 2004.

Tabela 5. Distribuição da produção de leite nas microrregiões homogêneas, em quartis.

Fonte: IBGE (2005) – Pesquisa Pecuária Municipal, 2004.

3960

122337558

QuartisQuantidade

1º2º3º4ºTotal

7,010,721,960,4

100,0

%

Microrregiões

5.8685.8685.8685.868

23.475

Milhões de litros

25252525

100

%

Produção de leite

≥21,413,1 a 21,3

5,1 a 13,0≤5,0

Mil litros/km2

do e outras) e termina no Nordeste Rio-Grandense(Guaporé e Caxias do Sul). Essa zona cobre umaárea de 83 mil km² que produziu mais de 3 bi-lhões de litros de leite no ano de 2004 (Tabela 6),13,5 % da produção nacional.

Outra zona de alta densidade de leite elarga dimensão (L2) está localizada em MinasGerais (Fig. 3), estendendo-se do Campo das Ver-tentes (Lavras) ao sul/sudoeste de Minas (Passos),oeste de Minas (Oliveira e Divinópolis), metropo-litana de Belo Horizonte (Pará de Minas) e cen-

tral mineira (Bom Despacho), terminando no Tri-ângulo Mineiro/Alto Paranaíba (Araxá e Patos deMinas). Essa zona de produção tem área de qua-se 54 mil km² e produziu cerca de 1,5 bilhão delitros de leite (Tabela 6), 6,5 % da produção naci-onal.

Com relação à produtividade animal(L/vaca/ano), considerou-se a produção total di-vidida pelo número total de vacas ordenhadas pormicrorregião. As 558 microrregiões foram orde-nadas de acordo com a produtividade e divididas

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 54

L1

L2

Tabela 6. Zonas de maior densidade da produção de leite (≥ 21,4 mil litros/km2) e respectivas microrregiõeshomogêneas e mesorregiões.

SC

RS

PR

MG

Zona

Oeste Catarinense

NoroesteRio-Grandense

Centro-OesteRio-GrandenseNordesteRio-GrandenseSudoeste Paranaense

Oeste ParanaenseTriângulo Mineiro/Alto ParanaíbaCentral MineiraSul/Sudoeste de MinasOeste de MinasCampo das VertentesMetropolitanade Belo Horizonte

UF(1) Mesorregião

São Miguel d'Oeste, Chapecó,Concórdia e XanxerêSanta Rosa, Três Passos, Não-Me-Toque, Cerro Largo, PassoFundo, Ijuí e SananduvaLajeado-Estrela

Guaporé e Caxias do Sul

Capanema, Francisco Beltrãoe Pato BrancoToledo e Foz do IguaçuAraxá e Patos de Minas

Bom DespachoPassosDivinópolis e OliveiraLavrasPará de Minas

Microrregiõeshomogêneas

83.094

53.768

Área(km2)

3.174.568

1.533.284

MilLitros/ano

38.424

30.175

Leite/km2

Fig. 3. Distribuição da produçãode leite nacional, em quartis (Q),nas microrregiões homogêneas,no ano de 2004.

Continua...

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200655

L3

L4

L5

L6L7L8L9

Total/Média

Continuação da tabela 6.

MG

SPMGRJ

PR

GOSPALSP

Zona

Sul/Sudoeste de Minas

Vale do Paraíba PaulistaZona da Mata de MinasNoroeste Fluminense

Centro OrientalParanaenseCentro GoianoCampinasSertão AlagoanoSão José do Rio Preto

UF(1) Mesorregião

Santa Rita do Sapucaí,São Lourenço e ItajubáGuaratinguetáCataguasesItaperuna e SantoAntônio de PáduaPonta Grossa

AnápolisSão João da Boa VistaBatalhaAuriflama

Microrregiõeshomogêneas

12.800

9.296

6.706

8.3585.4291.7972.312

183.560

Área(km2)

330.748

268.140

270.497

181.314119.008

74.03957.668

6.009.266

MilLitros/ano

25.691

27.381

40.336

21.69421.91941.20124.942

30.195,9

Leite/km2

em estratos de até 999, de 1.000 a 1.999, de 2.000a 2.999, e igual ou superior a 3.000 litros por vacaordenhada/ano (Tabela 7). Observa-se que 25 %do leite nacional foi produzido em apenas 45microrregiões (8 % do total), com produtividadesacima de 2.000 L/vaca/ano. Por sua vez, quasemetade da produção nacional (49 %) foi produzi-da em 216 (39 %) microrregiões com produtivi-dades entre 1.000 L/vaca/ano e 2.000 L/vaca/ano.

Na Tabela 8 estão listadas as 45 microrre-giões, e respectivas mesorregiões, com produti-vidade igual ou superior a 2.000 L/vaca/ano (1º e2º quartis), agrupadas em 11 zonas de produção(P1 a P11). Apenas quatro microrregiões foramclassificadas no 1º quartil (≥ 3.000 L/vaca/ano), asaber: Ponta Grossa (3.564 L) e Toledo (3.047) noParaná, Não-Me-Toque (3.218 L) no Rio Grandedo Sul, e Limeira (3.218 L), em São Paulo. Ponta

Grossa, no Centro Oriental Paranaense foi amicrorregião que apresentou a maior produtivi-dade de leite do Brasil e posicionou-se em 11º emvolume de produção (270 milhões de litros) e em10º lugar em densidade da produção (40,3 mil li-tros/km²).

As 45 microrregiões de maior produtivida-de (≥ 2.000 L/vaca/ano) alcançaram, em 2004,uma produtividade média de 2.452 L/vaca/ano eproduziram cerca de 6 bilhões de litros de leite,representando 25,4 % da produção nacional (Ta-bela 8). Dentre as 45, 15 (33 %) localizam-se noRio Grande do Sul e apresentaram, em 2004, pro-dutividade média de 2.455 L/vaca/ano, com umvolume de 1,52 bilhões de litros de leite, corres-pondente a 6,5 % da produção nacional. Novemicrorregiões (20 %) localizam-se em Minas Ge-

Tabela 7. Distribuição das microrregiões homogêneas em quartis de produtividade animal.

Fonte: IBGE (2005) – Pesquisa Pecuária Municipal, 2004.

4 41216297558

QuartisQuantidade

≥ 3.0002.000 a 2.9991.000 a 1.999≤ 999Total

0,7 7,3 38,7 53,3100,0

%

Microrregiões

708 5.25311.492 6.02223.475

Milhões de litros

3,0 22,4 49,0 25,6100,0

%

Produtividade animal (L/vaca/ano)

(1) Unidade da Federação.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 56

P1

P2

P3

P4

P5

P6

P7P8P9P10

P11

Total/Média

Tabela 8. Zonas de maior produtividade de leite (≥ 2.000 L/vaca/ano) e respectivas microrregiões homogênease mesorregiões.

MG

RS

PR

SC

PR

PR

SP

ALRJPRRS

SC

Zona

Triângulo Mineiro/Alto ParanaíbaCentral MineiraMetropolitana deBelo HorizonteOeste de MinasCampo das VertentesNoroesteRio-Grandense

Centro-OesteRio-GrandenseNordesteRio-GrandenseMetropolitana dePorto AlegreSudoeste ParanaenseCentro-Sul ParanaenseOeste Catarinense

Norte CatarinenseOeste ParanaenseSudoeste ParanaenseCentro OrientalParanaenseMetropolitana deCuritibaCampinasAraraquaraPiracicabaSertão AlagoanoSul FluminenseCentro-Sul ParanaenseSudoeste Rio-GrandenseGrande Florianópolis

UF(1) Mesorregião

Araxá, Patos de Minase PatrocínioBom Despacho e Três MariasSete Lagoas

Divinópolis e OliveiraLavrasCarazinho, Cruz Alta, Ijuí,Não-Me-Toque, Passo Fundo, Sananduva,Santa Rosae Três PassosLajeado-Estrela

Caxias do Sul e Guaporé

Gramado-Canela, Montenegroe Porto AlegrePato BrancoPalmasChapecó, Concórdia, Joaçaba, São Migueld'Oeste e XanxerêCanoinhasFoz do Iguaçu e ToledoCapanemaJaguariaíva e Ponta Grossa

Lapa

São João da Boa VistaSão CarlosLimeiraBatalhaVale do Paraíba FluminensePitangaCampanha Meridional

Tabuleiro

Microrregiõeshomogêneas

1.842.840

1.480.461

1.254.087

610.435

332.705

168.604

74.03969.45459.83939.615

28.324

5.960.403

MilLitros/ano

2.242

2.460

2.499

2.578

2.970

2.712

2.0032.1142.1572.386

2.278

2.400

Leite/km2

rais e apresentaram produtividade média de 2.242L/vaca/ano, com produção anual de 1,84 bilhõesde litros (7,9 % da produção nacional); outras 9(20 %) localizam-se no Paraná, com produtivida-de média 2.659 L/vaca/ano e produção de 1,16bilhão de litros (5 % da produção nacional) e 7(16 %) localizam-se em Santa Catarina, com mé-dia de 2.448 L/vaca/ano e produção de 1,12 bi-lhão de litros (4,8 % da produção do País).

Na Fig. 4, observa-se a distribuição geo-gráfica das 558 microrregiões de acordo com aprodutividade animal e as 11 zonas de maior pro-dutividade (P1 a P11). Destacam-se no mapa trêsgrandes regiões de maior produtividade: a zonaP1, que se estende do Campo das Vertentes deMinas Gerais ao Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba,com produtividade média de 2.242 L/vaca/ano eprodução anual de 1,84 bilhão de litros de leite; a

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200657

zona P2, que começa na região metropolitana dePorto Alegre e vai até o Noroeste Rio-Grandense,com produtividade média de 2.460 L/vaca/ano eprodução anual próxima de 1,5 bilhão de litros; ea P3, que abrange microrregiões do sudoesteparanaense e do Oeste e Norte Catarinense, comprodutividade média de, aproximadamente, 2.500L/vaca/ano e produção de 1,25 bilhão de litrosanuais.

Comparando os dados de densidade debovinos (Tabela 2) com os dados de vacas orde-nhadas (Tabela 4), produção de leite (Tabela 6) eprodutividade animal (Tabela 8), observa-se quedas 53 microrregiões de maior densidade de bo-vinos, 16 participaram da classe de maior densi-dade de vacas ordenhadas. Destas 16 microrre-giões, 7 estão no grupo de maior densidade daprodução de leite (Auriflama, SP, Anápolis, GO,Santo Antônio de Pádua, RJ, Itaperuna, RJ, Fran-cisco Beltrão, PR, Capanema, PR e São Migueld’Oeste, SC) e apenas 3 figuram entre as microrre-

Fig. 4. Distribuição dasmicrorregiões homogêneas, emquartis (Q), de produtividade deleite (L/vaca/ano), no ano de2004.

giões de produtividade igual ou superior a 2.000L/vaca/dia. Esse resultado permite afirmar que das53 microrregiões de maior densidade bovina(≥ 78 cab./km²), apenas Campanha Meridional,RS, Capanema, PR e São Miguel d’Oeste, SC ex-pressaram uma clara especialização em pecuá-ria leiteira.

No entanto, comparando os dados de den-sidade de vacas ordenhadas com os de produçãode leite e produtividade, pode-se observar que das56 microrregiões com maior densidade de vacas(≥ 12 vacas/km²), 28 apresentaram densidade deprodução igual ou superior a 21,4 mil L/km². Des-sas 28, somente uma, Toledo, PR, apresentou pro-dutividade superior a 3.000 L/vaca/ano, enquan-to 14 (50 %) apresentaram produtividades entre2.000 L/vaca/ano e 3.000 L/vaca/ano. Se a pro-dutividade animal acima de 2.000 L/vaca/ano forconsiderada como um bom indicativo de especi-alização, pode-se concluir que, das 56 microrre-giões de maior densidade de vacas ordenhadas,

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 58

somente 15 são especializadas na produção deleite.

Ao se analisar os dados de densidade deprodução com os de vacas ordenhadas e produti-vidade, verifica-se que das 39 microrregiões demaior densidade de produção (≥ 21,4 mil litros/km²), 28 (72 %) pertencem ao quartil de maiordensidade de vacas ordenhadas (≥ 12 vacas/km²).Dessas 39 microrregiões, 3 microrregiões (8 %)situaram-se no estrato de alta (3.000 L/vaca/ano),23 (59 %) no estrato de média (2.000 a 2.999 L/vaca/dia) e 13 (33 %) no estrato de baixa (1.000 L/vaca/ano a 2000 L/vaca/ano) produtividade ani-mal. Das quatro microrregiões com mais de 3.000L/vaca/ano, somente Ponta Grossa e Toledo, noParaná, situaram-se entre as microrregiões demaior densidade e volume de produção, com 40,4mil litros/km2 e 42,7 mil litros/km², e 270 milhõese 367 milhões de litros anuais, respectivamente.Em contraste, a microrregião da Campanha Me-ridional, no Rio Grande do Sul, apesar de ter altadensidade de bovinos (85,9 cab./km²) e produtivi-dade de 2.386 L/vaca/ano, teve baixa densidadede vacas ordenhadas (1,1 vaca/km²) e produçãode leite (2.712 L/km²).

Esses resultados indicam o efeito dominan-te da escala (número de vacas ordenhadas, emvalores absolutos ou densidade) sobre o volumede produção quando comparado com o efeito daprodutividade. Contudo, altos níveis de produtivi-dade podem compensar o baixo número de va-cas ordenhadas, como é o caso de Toledo, noParaná. Com um rebanho de vacas ordenhadasigual a 1/3 e 1/4 dos rebanhos de Meia-Ponte, GOe Ji-Paraná, RO, microrregiões de maior volumede produção de leite em 2004 (370 milhões delitros), Toledo alcançou produtividade média su-perior a 3.000 L/vaca/ano e produziu, aproxima-

damente, o mesmo volume de produção de leite(367 milhões de litros/ano) das outras duas. Emmenor proporção, destacou-se, também, amicrorregião de Ponta Grossa, PR (produtividadeacima de 3.500 L/vaca/ano) que, mesmo com umrebanho de vacas ordenhadas muito inferior aosde Meia Ponte e Ji-Paraná (24 % e 16 %), produ-ziu o correspondente a 73 % da produção dessasduas microrregiões.

ConclusõesA análise da distribuição geográfica da pe-

cuária de leite, utilizando os dados de 2004 daPesquisa Pecuária Municipal do IBGE, permite asseguintes conclusões:

a) Das 39 microrregiões de maior densida-de de produção (≥ 21,4 mil litros/km²), 28 (72 %)apresentaram densidade de vacas ordenhadasacima de 12 vacas/km² e 26 (67 %) apresentaramprodutividade superior a 2.000 L/vaca/dia.

b) O efeito do número de vacas ordenha-das na produção de leite é marcante, contudo aalta produtividade pode compensar, parcialmen-te, o número reduzido de vacas ordenhadas dealgumas microrregiões.

ReferênciasASSIS, A. G.; STOCK, L. A.; CAMPOS, O. F.; GOMES, A. T.;ZOCCAL, R.; SILVA, M. R. Sistemas de produção de leite noBrasil. Juiz de Fora: Embrapa Gado de Leite, 2005. 6 p.(Embrapa Gado de Leite. Circular técnica, 85).

EMBRAPA GADO DE LEITE. III Plano Diretor da EmbrapaGado de Leite 2004-2007. Juiz de Fora, 2006, 28 p.(Embrapa Gado de Leite. Documentos, 107).

IBGE. Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA.2005. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>.Acesso em: 20 out. 2006.

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Inovação tecnológicae desenvolvimentodo agronegócio

Resumo: O objetivo deste trabalho foi apresentar as principais características da inovação tecnológicanos países desenvolvidos e em desenvolvimento, as características da produção agrícola nacional, ademanda mundial por produtos agrícolas e o potencial produtivo do setor agropecuário brasileiro. Faztambém uma análise sobre a crise de liquidez atual da agricultura e suas possíveis conseqüências euma avaliação crítica e sugestões sobre a reorganização do sistema brasileiro de Ciência, Tecnologiae Inovação (C,T&I) para o setor agropecuário, enfatiza a necessidade de criação de novos modelosinstitucionais, legislação complementar, mudanças no perfil profissional de técnicos e cientistas, ne-cessidade de estimular e fomentar a integração entre as universidades, instituições científicas etecnológicas (ICTs) públicas e empresas privadas, além da profissionalização da gestão.

Palavras-chave: inovação tecnológica, agronegócio, desenvolvimento, Brasil.

Dante Daniel Giacomelli Scolari1

IntroduçãoCom a globalização, o comércio internaci-

onal de bens e serviços está mais competitivo, ainovação tecnológica permanente e contínua,com descobertas científicas e avanços técnicossignificativos, com novos métodos de produção enovos produtos e com muitas cadeias produtivasintegradas. Países mais desenvolvidos mantêmelevados investimentos públicos em pesquisa edesenvolvimento e corporações transnacionaisinvestem na geração de novos conhecimentos quepossam ser protegidos por meio de mecanismoslegais e liberados para uso em diferentes setoresda economia por meio de contratos comerciais.A grande maioria dos pedidos de patentes feitasno mundo e a maioria das marcas comerciais in-

1 Pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Assessor técnico da Presidência da Comissão de Agricultura e Política Rural, daCâmara dos Deputados. Foi vice-presidente da Associação Brasileira das Instituições de Pesquisa Tecnológica (Abipti) e diretor-executivo da Embrapa (1995a 2003). E-mail: dante.scolari@câmara.gov.br. Endereço postal: Comissão de Agricultura. Câmara dos Deputados. Esplanada dos Ministérios. Anexo II. Térreo,Ala C, Sala 38, 70.160.900. Brasília, DF.

ternacionais são de propriedade de pessoas oude organizações de países desenvolvidos.Nos organismos internacionais existe grande con-cordância sobre a importância da inovaçãotecnológica para o desenvolvimento. A Organi-zação das Nações Unidas (ONU) reconhece ex-plicitamente essa importância no seu Relatório deDesenvolvimento Humano (2001) em que desta-ca que as novas tecnologias podem desempenharpapel central na redução da pobreza mundial erefuta o ponto de vista de que tecnologia é umluxo acessível apenas aos países ricos.

Essa nova “economia do conhecimento”em que o principal insumo é o capital intelectualcoloca os países mais desenvolvidos como líde-res no processo de inovação nos produtos de altatecnologia, reservando aos demais países papel

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secundário. Como conseqüência, esses paísesestão sempre nas primeiras posições no rankinginternacional de competitividade2. Nos países emdesenvolvimento, como é o caso do Brasil, o ca-pital intelectual como gerador de novos conheci-mentos e de inovações tecnológicas em diferen-tes setores da economia ainda é pouco utilizado.Como conseqüência, o País é pouco competitivo,ocupando posições secundárias no ranking inter-nacional de competitividade (65º lugar em 2005).

O agronegócio é um dos setores da econo-mia em que a inovação tecnológica tem sidomarcante e, graças aos investimentos feitos nopassado, esse setor mostrou-se extremamentecompetitivo no mercado internacional, responsá-vel por 4% do comércio mundial de produtos agrí-colas. Mas os desinvestimentos feitos nos últimosanos, principalmente nas instituições científicas etecnológicas (ICTs) públicas, a falta de uma estru-tura legal adequada, a baixa renovação na equi-pe de cientistas, a perda de foco e a ingerênciapolítica na nomeação de dirigentes e gestores,conjuntamente com posições ideológicas, estãocausando considerável atraso no potencial brasi-leiro de desenvolvimento tecnológico do setoragropecuário.

A demanda mundial adicional por produtosagrícolas nos próximos 20 anos é substancial epode ser uma excelente oportunidade para au-mentar a participação brasileira nesse mercado,gerando mais renda e mais empregos. Mas, paracontinuar competitivo, o País precisa vencer de-safios e equacionar vários problemas que limitamo crescimento dos negócios e o desenvolvimentodo setor agropecuário – e o desenvolvimento denovas tecnologias é um dos mais importantes de-safios a serem vencidos.

Características da inovaçãonos países desenvolvidos

Nos países desenvolvidos os investimentosem ciência, tecnologia e inovação (C,T&I) são

elevados e representam parcela significativa doProduto Interno Bruto (PIB), podendo chegar a maisde 5 %, como no Canadá e na Austrália (período1992–1994), ou acima de 3 % (Inglaterra, Holandae Japão). Grande parte dos cientistas e engenhei-ros trabalha na iniciativa privada (81 % nos Esta-dos Unidos, 74 % no Canadá, 64 % no Japão e60 % na Alemanha) e os trabalhos científicos ge-ram grande número de pedidos e registros de pa-tentes, modelos de utilidade, design e marcas co-merciais. O conhecimento produzido é protegi-do e rapidamente transformado em inovaçãotecno-lógica em diferentes segmentos da econo-mia, gerando novas riquezas. O número de pes-quisadores/milhão de habitantes é acima de 3 mil,enquanto nos países em desenvolvimento esse va-lor, em média, não ultrapassa 500. Existe umaestrutura legal adequada e modelos de gestãoproativos, com forte participação de recursos doEstado na geração de novos conhecimentos (in-clusive com expressiva renúncia fiscal), fato queestimula forte participação do setor privado, prin-cipalmente na inovação tecnológica. A culturaempresarial é empreendedora, pois as inovaçõespatenteadas podem gerar receitas milionárias emcurto espaço de tempo, ou seja, existe forte mer-cado de tecnologias.

Nos últimos anos, os pedidos de patentesna World Internacional Patent Organization(Wipo)3 (Tabela 1) foram predominantemente depaíses do primeiro mundo: os Estados Unidos re-gistraram 7.718 pedidos em 1990 e 45.454 em2005, o Japão evoluiu de 1.748 pedidos para24.800 e a Coréia de 24 para 4.422. Dos paísesem desenvolvimento, a China evoluiu de zero para2.501 pedidos e o Brasil de 22 para apenas 275.Nos pedidos de modelo de utilidade está ocor-rendo forte predomínio da China e da Coréia. En-quanto o Brasil, nesses últimos 4 anos, solicitoumenos de 10 mil pedidos, a Coréia solicitou qua-se 160 mil e a China mais de 200 mil. Tão impor-tante quanto o registro internacional de patentese modelos de utilidade são as marcas comerciais

2 O Ranking de Competitividade é um índice (GCI-Growth Competitiveness Index, em inglês) elaborado pelo Fórum Econômico Mundial (World Economic Forum)para medir a competitividade entre países. É formado por três componentes: índice de tecnologia, índice de instituições públicas e índice de ambientemacroeconômico. www.weforum.org.

3 World Internacional Patent Organization (organização mundial responsável pelo registro de patentes e marcas de validade internacional). Acesso em julhode 2005. www.wipo.int/ipstats.

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de referência mundial, que exercem forte atra-ção sobre os consumidores. A grande maioria dasmarcas mundiais está registrada em nome deempresas dos países desenvolvidos. No agrone-gócio mundial destacam-se: Nescafé (café, Suí-ça), Budweiser (bebida, EUA), Pfizer (defensivosagrícolas, EUA), Kellogg’s (alimentação, USA),Novartis (defensivos agrícolas, Suíça), Heinz (ali-mentação, EUA), Nestle (alimentação, Suíça),Danone (lácteos, EUA), Moët & Chandon (bebi-da, França), Smirnoff (bebida, Inglaterra), Starbuks(café, EUA) e Lewi’s (vestuário, EUA). Em termosde valores, as marcas mais valiosas do mundo sãoa Coca-Cola (bebida, US$ 67 bilhões), a Microsoft(informática, US$ 56,9 bilhões), a IBM (informá-tica, US$ 56 bilhões) e a GE (US$ 49,9 bilhões),todas americanas. Não figura nenhuma marcabrasileira entre as cem mais valiosas do mundo.

Características da inovaçãonos países em desenvolvimento

Nos países em desenvolvimento as ativi-dades de C,T&I são caracterizadas pela existên-cia de estrutura legal inadequada, investimentosmajoritariamente públicos, baixos e descontínuos,baixa participação do setor privado, modelos degestão ineficientes e mercado de tecnologias ain-da limitado. De um modo geral os investimentostotais representam pequena parcela do PIB (me-nos de 1%), há concentração de cientistas nasuniversidades públicas, a produção científica nemsempre é protegida, os artigos científicos geramnúmero limitado de patentes ou de pedidos depatentes e a cultura empresarial não estimula oempreendedorismo tecnológico.

O Brasil também apresenta essas caracte-rísticas mesmo com as inovações recentes, comoa criação dos Fundos Setoriais4, a Lei de Inova-ção5 e a chamada Lei do Bem6, que objetivamacelerar o processo de inovação tecnológica nas

empresas brasileiras. Além disso, o País investepouco em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D): osetor público investe 0,6 % do PIB e as empresasprivadas investem 0,4 % do PIB, percentual muitomenor do que ocorre nas empresas privadas empaíses como Coréia (1,9 %) e Estados Unidos(1,8 %). Somente um pequeno percentual da ci-ência produzida é transformado em patentes e/ou pedidos de patentes e ocorre uma grande con-centração de cientistas nas universidades e/ou nosinstitutos públicos. Segundo Engenhar (2005), oBrasil é responsável por 1,9 % do PIB mundial epor 1,7 % da produção científica mundial. Mas,de acordo com o Patent Cooperation Treaty (PCT),em 2004, o Brasil era responsável por apenas0,2 % dos pedidos mundiais de registro de paten-tes – nesse ano, os EUA foram responsáveis por35 % do total dos pedidos, seguidos do Japão, com15 %, e da Alemanha, com 12,7 %.

PatentesEUAJapãoCoréiaChinaBrasil

Modelos de Utilidade(a quarta coluna refere-se a 2002).

BrasilCoréiaChinaJapão

Tabela 1. Pedidos solicitados na Wipo.

País

7.7181.748

240

22

2.91122.654

01.243

1990

17.1132.775

196103

67

3.01459.85643.74114.886

1995

38.0079.5671.580

784178

037.16368.815

9.587

2000

45.45224.800

4.4222.501

275

3.52839.19393.139

8.603

2005

108.20938.890

6.2223.388

453

9.453158.866205.66534.319

Total(1)

(1) Total: soma desses 4 anos.Wipo (World International Patent Organization – Julho 2006).

Quanto aos registros no Brasil, período1999–2003, o somatório dos dez maioresdepositantes de pedidos de invenção (PI) e mo-

4 Os Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia têm como objetivo garantir a ampliação e a estabilidade do financiamento para a área e a criação de um novomodelo de gestão, fundado na participação de vários segmentos sociais, no estabelecimento de estratégias de longo prazo, na definição de prioridades e comfoco nos resultados. Maiores detalhes em http://www.mct.gov.br/Fontes/Fundos/info/fundos.htm

5 Lei nº 10.793, de dezembro de 2.004, regulamentada pelo Decreto n.º 5.563, de 13/10/2005, que estimula e incentiva a inovação tecnológica no País.6 Lei nº 11.196, de 21/11/2005, que cria incentivos fiscais e não fiscais (subvenção econômica) para empresas que investem em inovação tecnológica, em vigor

a partir de 1º de janeiro de 2006.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 62

delos de utilidade (MU) somaram apenas 1.116documentos {Unicamp (191), Petrobras (177),Arno (148), Multibras (110), Semeato (100), Cia.Vale do Rio Doce (89), Fapesp (83), Embraco(81), Dana (71) E UFMG (66)}7. Neste mesmoperíodo, o somatório de todos os pedidos depatentes (PCT e não PCT) no Instituto Nacionalde Propriedade Industrial (Inpi) foi de 101.125,com grande concentração de solicitações fei-tas por não residentes.

Uma comparação entre o Brasil e a Coréia,países que na década de 1960 eram ambos basi-camente economias agropecuárias, permite ve-rificar algumas diferenças. A produção científicaacadêmica brasileira no período 1998–2000 ébastante semelhante à da Coréia, quando ambosos países publicavam ao final de 2000 pouco maisde 10 mil trabalhos acadêmicos. Mas, enquantoa Coréia, em 2004, exportava US$ 254 bilhões, oBrasil não ultrapassava os US$ 96,5 bilhões. Ainovação tecnológica na economia coreana, aocolocar no mercado internacional novos produ-tos ou produtos similares com inovaçõesmarcantes, é que faz essa grande diferença.

Como conseqüência, os países em desen-volvimento dificilmente conseguem se destacarno ranking global de competitividade. Dos paíseslatino-americanos o mais bem colocado em 2005foi o Chile, em 23º lugar, seguido de Uruguai (54º),México (55º), El Salvador (56º) e Colômbia (57º).A produção científica nacional cresce 8 % ao ano,a formação de doutores evolui a 14 % ao ano,mas a taxa de inovação tecnológica na indústriabrasileira não chega a 1 % ao ano. No País aindanão existe entre a academia e a iniciativa priva-da uma parceria proativa para a formação profis-sional de cientistas e engenheiros para o trabalho“no chão das fábricas”, e o “gap tecnológico” emalguns setores da economia tem aumentado, mes-mo com os fortes investimentos feitos recentemen-te na importação de tecnologias. Uma parcela daeconomia não conseguiu incorporar as inovaçõesdisponíveis e demanda tratamento diferenciado.A conseqüência é que em 2005 o Brasil caiu oito

posições no ranking internacional de competitivi-dade (GCI) em relação a 2004, ficando em 65ºlugar, sendo o quinto país no ranking latino-ame-ricano. Nos subíndices verifica-se o baixo desem-penho em inovação, com o 50º lugar em tecnolo-gia, ficando ainda pior em instituições públicas,na 70ª posição, e em ambiente macroeconômico,em 79º lugar.

Uma análise sobre as exportações de pro-dutos industriais classificados por intensidadetecnológica em 2005 ajuda a entender o porquêdessa classificação, principalmente no subíndicetecnologia: 9,1 % das exportações são de bensde alta tecnologia, 30,9 % são de média-altatecnologia, 23,9 % são média-baixa tecnologia e36,2 % são de baixa tecnologia8. O lado bom éque existem possibilidades concretas de cresci-mento nas exportações de bens com média-altae alta tecnologias.

No País, predomina uma cultura empresa-rial com visão limitada da importância estratégi-ca da inovação para a competitividade. Sonda-gem feita pela Federação das Indústrias de SãoPaulo (Fiesp) em outubro de 2005, com 37 em-presas de diferentes tamanhos e setores industri-ais do estado mais desenvolvido do Brasil, reve-lou que mais de 90 % das empresas tinham pou-ca ou nenhuma informação sobre as atividades eo desempenho dos órgãos de fomento para as ati-vidades de P&D. Observou-se que quase 64 %não entendiam ou não tinham capacidade de usaros incentivos governamentais. A pesquisa retra-tou um alto grau de desconhecimento e desubutilização dos incentivos existentes na legis-lação para atividades de inovação, o que demons-tra falha nas duas direções nas relações acade-mia-empresa.

Existem setores na economia brasileira ondeocorreu expressiva inovação tecnológica, comona automação bancária, na aviação comercial,na exploração de petróleo em águas profundas eno agronegócio, que é uma grande cadeia queenvolve vários elos, passando pelo fornecimentode bens e serviços, produção, comercialização,

7 Fonte: INPI/Pintec 2003 (Base EPODOC, acesso em nov 2005).8 Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), Secretaria de Comércio Exterior (Secex), Departamento de Planejamento (Depla). 2005.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200663

processamento, distribuição e consumo. Nessecaso, o mérito é devido ao conjunto de fatores ede ICTs, em que se destaca o trabalho desenvol-vido pela Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária (Embrapa) com as universidades eempresas estaduais de pesquisa agropecuária detodo o País.

Características deagronegócio brasileiro

O País apresenta uma série de fatores favo-ráveis ao desenvolvimento da agropecuária, des-tacando-se: oferta ambiental favorável, grandedisponibilidade de terras, com 103 milhões dehectares como área de reserva apropriada para aagricultura, tecnologia disponível, recursos hu-manos qualificados em vários elos da cadeia, boacapacidade de gestão, competitividade na pro-dução dentro da porteira da fazenda e grandepotencial de produção de bioenergia. Nos últi-mos 15 anos houve crescimento significativo nosíndices de produção e produtividade da maioriadas culturas. De uma produção média de grãos(arroz, feijão, milho, sorgo, soja e trigo) de poucomais de 50 milhões de toneladas no período 1980–1990, o País alcançou uma produção média de114 milhões de toneladas no período 2004–2005.Os destaques foram a produção de soja (49,2 mi-lhões de toneladas) e milho (41,8 milhões de to-neladas). Em 2004, a oferta de carnes (bovina,suína, caprina, ovina e de aves) somava 19,9 mi-lhões de toneladas, a produção de cana-de-açú-car, 410,9 milhões de toneladas, a produção demadeira bruta, 239,6 milhões de m³, a produçãode citrus, 20,6 milhões de toneladas e a produçãode café, 2,457 milhões de toneladas. Houve sig-nificativo aumento na oferta de frutas e olerícolas,grande expansão da indústria de máquinas eimplementos agrícolas, abertura de novas áreasde produção e construção de uma estrutura deapoio à produção e à comercialização de produ-tos agrícolas. Ocorreu um processo acelerado demodernização do setor agrícola e, em 2005, ape-nas 16 % da população era rural, com 154 mi-lhões de brasileiros morando nas cidades.

Parte desse sucesso deve-se aos investi-mentos feitos nas décadas de 1970 e 1980, naformação dos recursos humanos das ICTs, na qua-lificação do corpo docente de um número expres-sivo de universidades, na modernização debases físicas, na construção de laboratórios e notreinamento e formação de milhares de técnicos(engenheiros agrônomos, médicos veterinários,zootecnistas, engenheiros agrícolas, engenheirosflorestais, técnicos agropecuários de nível médio,etc.) que atuam nos segmentos de produção pri-mária, processamento, distribuição e exportação.Toda essa inovação foi feita a partir dos conheci-mentos baseados no uso intensivo de adubos quí-micos, calcário, produtos fitossanitários, irrigaçãoe sementes melhoradas pelo método convencio-nal, além de intenso processo de mecanizaçãodo campo e capacitação de agricultores, o queelevou substancialmente a produtividade da mão-de-obra rural. O setor privado investiu pesada-mente na instalação de um parque mecanizado ena abertura de novos mercados. A não incidên-cia de tributação na exportação de produtos agrí-colas e a adoção de uma política cambial delivre flutuação, num momento em que haviapreços remuneradores e grande demanda por pro-teína vegetal, carnes, madeira e celulose, couroe artigos de couro, açúcar, café e frutas no mer-cado internacional, foram importantes catalisa-dores da inovação tecnológica, da formação decapital no campo e da renda agrícola. O governorenegociou as dívidas rurais existentes e abriunovas linhas de financiamento para investimen-tos na atividade, com destaque para o programaModerfrota, que acelerou a renovação da frotaagrícola sucateada na época. Os produtores res-ponderam a esse conjunto de eventos, foram em-preendedores e aumentaram substancialmente aprodução agropecuária.

O agronegócio é responsável por 37 % dosempregos, com quase 18 milhões de trabalhado-res, 34 % do PIB e 43 % das exportações (2004).Em 2005, foram exportados quase US$ 40 bilhões(complexo de soja, carnes, madeiras e derivados,açúcar, café, couro, fumo entre outros) principal-mente para a União Européia, Estados Unidos,alguns países da Ásia e China. O Brasil participa

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com 4 % do comércio mundial de produtos agrí-colas, mas participa com menos de 1 % do co-mércio mundial. Os principais beneficiários des-sa inovação tecnológica no agronegócio foramos consumidores brasileiros, que nos últimos 30anos tiveram acesso a alimentos de melhor quali-dade e a preços reais médios com permanenteredução. No período abril de 2003 a abril de 2006,a inflação, medida pelo Índice de Preços ao Con-sumidor no Atacado (IPCA), foi de 25,5 %, os pre-ços administrados pelo governo subiram 37,5 %,os semiduráveis cresceram 31,4 %, os serviçospassaram de 25 % e o item alimentação teve cres-cimento nominal de apenas 9,3 % (MELLO, 2006).Nunca o consumidor brasileiro pagou tão baratopelos itens que formam a cesta de alimentação –no período 1975–2000, a queda anual no preçode uma cesta básica de produtos agrícolas foi de5,25 % ao ano.

A literatura existente mostra que investimen-tos em pesquisa agropecuária apresentam impac-tos econômicos elevados. Trabalhos desenvolvi-dos na Embrapa por Ávila et al. (2005), usando ométodo do excedente econômico, mostraram queos benefícios econômicos em 2004 de uma amos-tra de 66 tecnologias em uso no País foram deR$ 5,96 bilhões. Os impactos gerados pelos lan-çamentos de cultivares da Embrapa (algodão, ar-roz, feijão, milho, soja e trigo) foram estimados eo excedente econômico encontrado foi de R$ 5,7bilhões, o que gera um valor agregado de quaseR$ 12 bilhões. Igualmente importantes são os ser-viços de extensão rural e assistência técnica.Gasquez et al. (2004) estimaram que na produti-vidade total na agricultura brasileira o papel dapesquisa e da extensão é muito mais importantedo que o do crédito. Para continuar competitivo,o País deve investir em ciência e tecnologia, pro-movendo constantemente a ampliação dos conhe-cimentos tecnológicos, aumentando a eficiênciaprodutiva com preservação ambiental. A deman-da mundial por alimentos e fibras deve crescersubstancialmente nos próximos 20 anos e podeser uma excelente oportunidade para o País con-quistar uma fatia maior do mercado internacionalde produtos agrícolas.

Demanda mundialpor alimentos e fibras

O mercado mundial de insumos agrope-cuários, alimentos e fibras são de bilhões de dóla-res e será ainda maior no futuro. Assim, é naturalque questões políticas e sociais estejam relacio-nadas com o poder de mercado atual e futuro dasgrandes empresas transnacionais, sejam elas pro-dutoras de sementes, defensivos agrícolas, má-quinas ou equipamentos.

Ao longo dos últimos 40 anos a oferta mun-dial aumentou substancialmente em função douso de novas tecnologias de produção relacio-nadas aos chamados insumos modernos (semen-tes melhoradas, fertilizantes, calcário, produ-tos fitossanitários, irrigação, maquinaria agrícolamais desenvolvida), maior profissionalizaçãodos produtores, melhores canais de comerciali-zação e apoio mais intenso dos governos, sen-do suficiente para atender a demanda mundial.Mas, a partir da segunda metade da década de1980, os índices mundiais de crescimento daprodutividade ficaram estabilizados para vári-os cultivos importantes, o que sinaliza certaexaustão tecnológica com o conhecimento con-siderado tradicional (Fig. 1).

Segundo a FAO (2006), em 2005 a popula-ção mundial foi de 6,453 bilhões de pessoas e para2025 estima-se 7,851 bilhões. É preciso alimen-tar, dar moradia, vestir e ofertar fontes de energiapara essa população adicional de 1,398 bilhão, amaioria com renda per capita baixa e com fortedemanda por carboidratos, que em grande parteestará residindo em países pobres ou em desen-volvimento. Existem poucos países no mundo comáreas aptas não cultivadas para a agricultura e90 % estão na América do Sul e África. Esses pa-íses não possuem recursos humanos, econômicosnem dominam tecnologias para produzir nessasterras ainda não cultivadas.

As vantagens tradicionais estão desapare-cendo rapidamente com o surgimento aceleradoe crescente dos novos conhecimentos que pro-gressivamente estão sendo incorporados às dife-rentes cadeias produtivas em vários países. Os

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Fig.1. Oferta mundialper capita de produtosvegetais.

países desenvolvidos estão investindo de formaintensa em pesquisas biotecnológicas, para asse-gurar vantagens futuras nas negociações agríco-las. A China e a Índia estão investindo em pesqui-sas para se transformarem em superpotênciasbiotecnológicas. Esses países já perceberam quea economia do conhecimento, protegida por pa-tentes, acordos e tratados, será o principalcatalisador do desenvolvimento socioeconômicodas nações. Para a obtenção de ganhos de pro-dutividade, sem a derrubada adicional de flores-tas e sem depleção maior do capital natural domundo, é indispensável o auxílio de processosmodernos e sustentáveis de produção. Dessa for-ma, é possível aumentar a oferta de alimentos,fibras e serviços ambientais sem comprometimen-to maior do meio ambiente, preservando novosecossistemas da destruição.

Existem vários artigos, com base em dife-rentes modelos econômicos, que procuram de-terminar a demanda mundial futura por alimen-tos, madeiras e fibras. Trabalhos descritos sinali-zam que haverá grande demanda futura por ali-mentos de origem vegetal e animal. Na maioriadesses trabalhos, o Brasil não é mencionado comouma alternativa viável para suprir parte dessasnecessidades futuras. A rigor, a prioridade maior

é estabelecer o montante da demanda mundialfutura sem indicar quem irá produzir, onde produ-zir e como produzir. Na Tabela 2 está apresenta-da uma estimativa da demanda mundial por pro-dutos agrícolas em 2025, com base no aumentovegetativo da população e melhoria nos níveisde renda dos consumidores mundiais. A deman-da adicional por produtos agrícolas será signifi-cativa: o mundo vai consumir mais 921 milhõesde toneladas de cereais, quase 156 milhões detoneladas a mais de oleaginosas, mais de 111 mi-lhões de toneladas de carnes, quase 8 milhões detoneladas a mais de fibras e mais de 746 milhõesde metros cúbicos de madeira.

Se não houver o aporte de novas e revolu-cionárias inovações tecnológicas na produçãoprimária, haverá necessidade de incorporar maisalguns milhões de hectares ao processo produti-vo, com a derrubada de florestas para transfor-mação em lavouras e pastagens para alimenta-ção de animais, com conseqüências negativasmarcantes para o meio ambiente mundial. Mas,para participar efetivamente de uma parcela maiordeste mercado mundial de produtos agrícolas, énecessário se conhecer bem quais as reais vanta-gens e quais as grandes limitações que existemno agronegócio brasileiro.

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O potencial produtivoda agropecuária9

O agronegócio brasileiro possui muitos pon-tos fortes: recursos humanos profissionais e quali-ficados, boa capacidade de gestão na produçãoe comercialização, oferta ambiental favorável,bom nível de desenvolvimento tecnológico, altacapacidade de produção de maquinaria agríco-la, colheitadeiras e tratores; baixo custo de pro-dução; extensa área de reserva que pode serincorporada ao processo produtivo; a produtivi-dade dos principais cultivos e explorações pecu-árias ainda é baixa e pode ser aumentada de for-ma significativa, mesmo com o conhecimento tra-dicional. Além disso, possui grande contingentede jovens produtores rurais com motivação e vi-são empreendedora. Mesmo em estado precário,o País possui uma malha viária terrestre que aten-de a todas as regiões de produção, com boa ca-pacidade de escoamento. Com parcerias públi-co-privadas e marcos regulatórios definidos, pode-se expandir significativamente a capacidade decarga ferroviária, aumentar a capacidade de ar-mazenagem e fazer a modernização e o aumen-to da capacidade de escoamento dos portos.

O apoio efetivo dado ao setor agrícola éuma parcela muito pequena do PIB, de apenas

0,5 %, abaixo da China (3,6 %), do Japão (1,4 %)e da União Européia (1,2 %). Quando o nível deapoio é calculado sob forma de porcentagem dareceita bruta da propriedade rural (período 2002–2004), o valor no País é de 3 %, enquanto na Chi-na é de 8 %, nos Estados Unidos é de 17 %, naUnião Européia é de 34 % e no Japão é de 58 %(ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DE-SENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2005). Isso sig-nifica que o setor agrícola brasileiro é um dos maisdesprotegidos do mundo, fato que pode ser positi-vo para aumentar a competitividade. Todo esseconjunto de características significa que o Brasilpossui grande vantagem – o potencial produtivoda agropecuária. O país participa com apenas4 % do comércio mundial do agronegócio e temreais possibilidades de suprir uma parcela impor-tante dessa demanda adicional futura de fibras ealimentos a preços competitivos. Possui uma áreatotal de 851, 5 milhões de hectares, dos quais 835,6milhões são de terras e 15,9 milhões são cobertospor lâminas de água. Da área total de terra, 284,23milhões de hectares (34,02 %) são utilizados naagricultura, 410 milhões (49,07 %) são de áreasprotegidas, florestas naturais e cultivadas e16,91 % (141,32 milhões) são áreas de reserva eoutros usos (Tabela 3).

Na agricultura, são usados 49,23 milhõesde hectares em cultivos anuais, 15 milhões emcultivos permanentes e 220 milhões de hectaresem pastagens permanentes. Da área de florestas,apenas 5 milhões de hectares são utilizados naforma de florestas plantadas para produção demadeira. Sob forma de área agrícola de reservaainda existem 103,32 milhões de hectares Umaparte substancial dessa área de reserva encon-tra-se na Região Centro-Oeste e no chamado“Arco da Amazônia”, nos estados do Pará,Maranhão, Piauí e Tocantins.

É possível incorporar mais 45,944 milhõesde hectares ao processo produtivo de modo sus-tentável, aumentando a área de terras protegidase as áreas de florestas. Existe espaço para aumentara área total da agricultura para 321 milhões dehectares, ocupando menos de 39 % da área total

CereaisOleaginosas

PerenesAnuais

Carnes(¹)

AvesSuínosBovinos

CaféFibrasMadeira(²)

Tabela 2. Produção mundial e demanda poralimentos e fibras (milhões de toneladas).

Produto

2.219,40595,01242,81352,20264,70

80,00103,40

63,507,72

28,503.401,90

Produçãoatual

(2005)

(1) Todas as carnes consumidas.(²) Em metros cúbicos.

3.140,40750,97321,99437,98376,49113,70146,80

90,409,40

36,374.148,40

Demandaestimada

(2025)

921,00155,96

70,1885,78

111,7933,7643,6026,30

1,687,87

746,50

Produçãoadicionalnecessária

9 Mais detalhes podem ser encontrados em Scolari (2006).

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de terras, percentual muito inferior ao existentena China (que usa na agricultura 59,39 % do totaldas terras do país) e nos Estados Unidos, que ocu-pam no setor agrícola 44,97 % do total da terradisponível no país. Ainda assim restariam 40 mi-lhões para usos variados e uma área de reservatécnica de 44,556 milhões de hectares, equiva-lente a 5,33 % de toda a área de terras do País.

O Brasil pode ocupar com cultivos anuaisou bienais 84,56 milhões de hectares, 16,44 mi-lhões com cultivos perenes e os atuais 220 mi-lhões de hectares em pastagens. Com florestas,poderia passar para 430 milhões de hectares, cor-respondente a 51,46 % da superfície total de ter-ras do País, incorporando mais 10 milhões de hec-tares para a produção de madeira na forma deflorestas cultivadas. Por sua vez, a existência de15,9 milhões de hectares sob lâmina de água ofe-rece uma grande oportunidade de utilização daaqüicultura na produção de espécies conhecidasde animais aquáticos, principalmente peixes. Paraalgumas espécies, os protocolos de reproduçãoartificial são dominados e já existe tecnologiaconhecida de produção e processamento.

Para cultivos anuais (soja, milho, arroz, fei-jão, trigo, sorgo, aveia e cevada), existe potenci-al de cultivar uma área de 84,56 milhões de hecta-

Área totalÁrea de terrasÁrea de águas

Na agriculturaCultivos anuaisCultivos permanentesPastagens permanentes

Florestas e áreas protegidasAmazôniaFlorestas cultivadasÁreas protegidas

Outros usos e áreas de expansãoOutros usosÁrea agrícola de reserva

Tabela 3. Uso atual e potencial da terra no Brasil (em milhões de hectares) em 2005.

Uso das terras

851.488835.556

15.932284.233

49.23315.000

220.000410.000350.000

5.00055.000

141.32338.000

103.323

Total

Fontes: Faostat (2004). IBGE. MAPA.

Atual

-100,00

-34,02

5,891,80

26,3349,0741,89

0,536,58

16,914,55

12,36

%

851.488835.556

15.932321.000

84.56016.640

220.000430.000350.000

15.00065.00084.55640.00044.556

Total

Potencial

-100,00

-38,4210,12

1,9726,3351,4641,89

1,807,78

10,124,785,33

%

res, com a incorporação de áreas principalmen-te nas regiões Centro-Oeste (MT, TO e GO), Nor-te (RO, RR, PA) e parte do Nordeste (BA, PI e MA).Com a tecnologia já disponível e adequada paracada região, pode-se produzir 271,3 milhões detoneladas de grãos, com destaque para o poten-cial de milho (125 milhões) e soja (90 milhões).

Quanto à madeira, o potencial de produ-ção com a incorporação de 10 milhões de hecta-res nos estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste,com forte utilização de áreas já desmatadas e debaixa produtividade agropecuária, é de 450 mi-lhões de metros cúbicos, valor conservador, já queconsidera uma produtividade média de apenas30 m³/ha/ano.

A produção de carne bovina e leite é outrogrande potencial para o País, já que existem 220milhões de hectares de pastagens permanentes,dos quais metade (115 milhões de hectares) é depastagens cultivadas10, parcialmente degradadase com baixa produtividade. Desse total, 198 mi-lhões são utilizados para a produção de carne e22 milhões para a produção de leite. Na média,as pastagens produzem de 38 kg a 40 kg de car-ne por hectare ao ano e pouco mais de 1.000 kgde leite por hectare ao ano. Com as tecnologiasexistentes e já em uso, principalmente com o siste-

10 Existem divergências quanto ao real tamanho da área de pastagens cultivadas no Brasil. A maioria das citações considera um valor ao redor de 110 milhõesa 115 milhões de hectares, embora fontes como a Embrapa Acre tenham uma estimativa de 135,06 milhões de hectares.

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ma de integração lavoura–pecuária11, a produti-vidade dessas pastagens pode ser grandementeaumentada, podendo alcançar 300 kg de carnepor hectare ao ano e 5 toneladas de leite por hec-tare ao ano. O processo de renovação consistena utilização de calcário, fertilizantes, sementesmelhoradas, manejo de solos, rotação de cultivose uso de tecnologias de manejo e sanidade derebanhos. Resultados alcançados por unidades depesquisa da Embrapa (Embrapa Acre, EmbrapaGado de Corte, Embrapa Gado de Leite, EmbrapaPecuária Sul, Embrapa Pecuária Sudeste) repor-tam valores ainda maiores, para diferentesregiões do País. No caso do leite, foi consideradotambém um processo de seleção e substituiçãode matrizes de baixa produtividade por animaismelhorados, sadios e bem alimentados. Neste tra-balho, foi considerada uma produtividade médiade apenas 113 kg de carne por hectare ao ano ede 3 toneladas de leite a pasto por hectare aoano12. Portanto, o potencial de produção sem ex-pansão de nenhum hectare de pastagem é de22,10 milhões de toneladas de carnes por ano,em 195 milhões de hectares de pastagens reno-vadas, e de 75 milhões de toneladas de leite porano, em 25 milhões de hectares também em pas-tagens renovadas.

O potencial de produção de carne de suí-nos e aves é estimado por muitos técnicos comode vários milhões de toneladas. Na realidade, opotencial é limitado por vários fatores, diferenci-ado pelas regiões do País. Nas zonas tradicionaisde produção na Região Sul, a limitação é a con-taminação ambiental pelo grande volume dedejetos animais e pelo custo de oportunidade daterra e da mão-de-obra com relação a outras ex-plorações, como produção de madeira ou frutas,por exemplo, ou uso da mão-de-obra em empre-gos parciais nas cidades. Na Região Centro-Oes-te, principal produtora de milho e soja, o potenci-al é muito maior, já que não existe o problema decontaminação ambiental com dejetos de suínos eaves. Esses dejetos são benéficos quando incor-porados aos solos, pois melhoram as condições

químicas e físicas, aumentando o nível de maté-ria orgânica disponível, que naturalmente é mui-to baixo. Foi estimada uma taxa anual de cresci-mento da produção de 3 % e o potencial de pro-dução estimado em 5,785 milhões de toneladasde carne de suínos. No caso de aves, da mesmaforma que no de suínos, o grande potencial deprodução está na Região Centro-Oeste. Foi con-siderada uma taxa potencial de crescimento de4 % ao ano, e o valor assim estimado foi de 19,817milhões de toneladas.

Com esses dados, fica evidente que o Bra-sil possui grande potencial a ser utilizado se aslimitações existentes forem devidamenteequacionadas.

Limitações do agronegócioNo comércio mundial, o domínio e o uso

de novas tecnologias e de novas ferramentas doconhecimento, em áreas estratégicas comobiotecnologia, nanotecnologia, processamento dealimentos, agroenergia, agropecuária de precisãoe tecnologia de informação, já passam a desem-penhar papel de fundamental importância. Asempresas do conhecimento, que estão surgindorapidamente em vários países, são formadas ba-sicamente por capital intelectual em que os prin-cipais ativos são intangíveis e estão representa-dos pelos ativos do conhecimento, sistemasgerenciais e valor das marcas comerciais. Muitasdetêm patrimônio em capital intelectual muitomaior que o valor de prédios e laboratórios. Pes-quisadores de diversos países realizam grandeesforço de pesquisa na busca de novas e origi-nais soluções para diferentes segmentos da eco-nomia relacionados à saúde humana, saúde ani-mal, meio ambiente, agronegócio, instrumenta-ção, química fina, enzimas, etc.

Para ser competitivo, o País precisa de umacultura exportadora, com conceitos desenvolvi-dos de qualidade, conformidade a padrões glo-

11 Sistema de rotação entre cultivos anuais e pastagem em que, a cada ano, uma parte da área utilizada para cultivos anuais é substituída por pastagens e umaárea de pastagem de mesmo tamanho é incorporada à produção agrícola, com o uso de calcário e fertilizantes. As produtividades obtidas são superiores àsobtidas nos sistemas sem rodízio de cultivos.

12 Embrapa Gado de Corte (dados oficiais fornecidos pelo pesquisador Ademir Hugo Zimmer).

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bais, preços competitivos e sustentabilidadeambiental (produtos e processos limpos, com ori-gem, rastreabilidade e certificação) e visão estra-tégica de integração de cadeias produtivas. Énecessário o desenvolvimento de mecanismos econdições que possibilitem a geração de rendaadicional e de novas oportunidades de negócios,com escalas adequadas de produção, especiali-zação, diferenciação de processos produtivos ede produtos, agregação de valor e relaçõescontratuais como prática corriqueira. Nesse con-texto, a agricultura familiar pode desempenharimportante papel, na conquista de nichos especí-ficos de mercados, com geração de produtos dequalidade e criação de marcas diferenciadas,gerando renda e aumentando o nível de empregoe de renda no setor rural.

Para participar ativa e competitivamente naconquista e na manutenção de mercados é preci-so equacionar uma série de importantes proble-mas que limitam o crescimento dos negócios e odesenvolvimento do País. De um modo geral, oBrasil conseguiu aumentar a oferta interna dosprodutos alimentares básicos de origem vegetal eanimal, de peixes, das fibras vegetais e de ma-deira nas últimas décadas, sem grandes aumen-tos na área cultivada/explorada com essas cultu-ras no País, mas ainda persistem vários proble-mas, alguns de demorada solução. Existem bar-reiras a serem transpostas, e a mais importante éa ainda baixa qualidade da educação no País. Nosetor agropecuário existem limitações específicas,que reduzem a competitividade e a capacidadefutura de o Brasil atender a uma crescente de-manda mundial por alimentos e fibras. Não res-tam dúvidas de que a política macroeconômicapraticada ao longo dos últimos anos tem sido, jun-tamente com a elevada carga tributária, a buro-cracia e o mau preparo das instituições governa-mentais, o que mais limita o desenvolvimentoeconômico do País. E um dos setores mais afeta-do é o setor agropecuário, que no período 2005 e2006 tem atravessado uma grave crise de liquidez.

De forma específica, pode-se detalhar asseguintes limitações que estão afetando substan-cialmente a competitividade do agronegócio na-cional (Scolari, 2006): 1) situação atual precária

em termos de transporte, armazenagem, portos ea possibilidade de faltar energia no País; 2) atrasona inovação tecnológica, principalmente embiotecnologia; 3) falta de profissionalização nasnegociações internacionais; 4) políticas públicasdeficientes e não integradas; 5) juros elevados elimitações na disponibilidade de recursos finan-ceiros; 6) carga tributária elevada; 7) desrespeitoaos contratos e direitos de propriedade; 8) poucaintegração das cadeias produtivas; 9) baixa agre-gação de valor; 10) problemas sociais no campo(movimentos organizados). O País enfrenta difi-culdades na conquista e manutenção de merca-dos externos. Existem barreiras comerciais e nãocomerciais que afetam e restringem o livre co-mércio de produtos agrícolas. Além dos elevadossubsídios dados pelos países desenvolvidos (maisde US$ 1 bilhão por dia), pode-se citar as barrei-ras ambientais, éticas e sociais. O fracasso ocor-rido nas negociações recentes no âmbito da Or-ganização Mundial do Comércio(OMC), na Ro-dada de Doha, comprovam as dificuldades e afalta de visão estratégica dos nossos negociado-res internacionais.

A crise de liquidez da agropecuáriaO fato atual mais marcante desse conjunto

de limitações é a grave crise de liquidez que as-sola a agropecuária brasileira. Os preços dos pro-dutos agrícolas tiveram grande desvalorização: oÍndice de Preços Agrícolas no Atacado (IPA) caiu14,4 % e o IPA Cereais e Grãos, 22,5 % no perío-do compreendido entre outubro de 2003 e abrilde 2006 (Castro, 2006). O juro real para váriossegmentos da agropecuária cresceu de 12 % parapróximo de 25 % nas duas últimas safras e o realteve grande valorização nesse mesmo período,com grandes aumentos no custo de produção.Como conseqüência, o valor da produção agrí-cola, que atingiu R$ 114 bilhões em 2004, caiupara R$ 96 bilhões em 2006. Segundo a Confede-ração Nacional de Pecuária e Agricultura (CNA),a perda acumulada foi de R$ 30 bilhões no perío-do. Para piorar a situação, o setor de carnes en-trou em crise com o surgimento de doenças nosrebanhos (febre aftosa em bovinos e febre das aves)

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e o fechamento de tradicionais mercados impor-tadores. A crise está mais relacionada ao setor degrãos (soja, milho, arroz, trigo, sorgo e feijão), al-godão e carnes.

Analistas têm culpado o dólar e defendemuma desvalorização do real como solução para acrise de renda. Esquecem que a valorização édevida a vários fatores como a manutenção dataxa Selic elevada, a redução da dívida pública,os superávits comerciais, o montante das reser-vas internacionais, a redução do risco Brasil, ofluxo líquido de investimentos externos e as taxasde juros em outros mercados, principalmente nosEstados Unidos. Mantida a atual políticamacroeconômica, na ausência de fatos relevan-tes, o real continuará valorizado. Na realidade, oproblema maior são os custos de produção, emascensão desde 1996. Como exemplo, o custo dasoja (60 kg) que era R$ 13,00 (2004) aumentou260 %, passando para R$ 34,00 em 2006, de acor-do com a Organização das Cooperativas doParaná (Ocepar). No período compreendido en-tre 1977 e 2004, esse aumento geral de custos foineutralizado pela evolução positiva dos preçosagrícolas. Mas em 2005 e 2006 ocorreu quedaacentuada nos preços recebidos, elevação doscustos de produção, achatamento das margenslíquidas e a conseqüente crise de liquidez.

O agronegócio movimenta anualmentecapital de giro de R$ 110 bilhões, sendo R$ 33bilhões de crédito oficial e R$ 77 bilhões de for-necedores privados. Desse total, R$ 21 bilhõessão aplicados a juros anuais de 8,75 % e R$ 89bilhões a juros livres de mercado, o que resultaem juros médios anuais pagos pelos produtoresda ordem de 25 %. O principal agente financeirooficial, o Banco do Brasil, realiza um “mix” nataxa de juros, financiando parte da produção ajuros fixados e parte a juros livres, que na médiaresulta em uma taxa nominal próxima aos 16 %ao ano. Os fornecedores privados utilizam a mes-ma lógica, embora com ganhos financeiros mai-ores, já que uma parte substancial dos emprésti-mos concedidos aos produtores são captados noexterior a juros nominais (em dólar) de 4 % a 5 %ao ano e emprestados a juros médios de próxi-mos de 20 % ao ano. Desse modo, as empresas

vendedoras de insumos ganham na operaçãocomercial e na operação financeira. Para os pro-dutores, os custos continuam elevados e a agri-cultura até então “a âncora verde da economia”em 2006 passou a ser o “o patinho feio da econo-mia”.

Independente da crise atual, vários desafi-os continuam existindo: reduzir os custos finaisdos produtos agrícolas, aumentar a integração dascadeias produtivas, implementar um seguro ru-ral, abrir e manter novos mercados, promover osprodutos brasileiros no exterior, promover novasparcerias públicas e privadas e melhorar a orga-nização do agronegócio. E, como destaque, au-mentar os investimentos em capital intelectual,tornando as ICTs do agronegócio ágeis e dinâmi-cas, capazes de responder proativamente aosdesafios de viabilizar novas soluções tecnológicaspara o agronegócio nacional.

Problemas e desafios para asinstituições científicas e tecnológicas

O paradigma de inovação tecnológica naagropecuária foi alterado profundamente nos úl-timos anos com o surgimento de novas ferramen-tas, principalmente as biotecnológicas. Além dis-so, os desafios atuais de disponibilizar inovaçõestecnológicas para demandas em mercadosglobalizados são cada vez mais complexos, prin-cipalmente pela presença e forte concorrência deempresas privadas, muitas formadas por capitaistransnacionais. Existe uma nova lógica de P&Drepresentada por exigências do mercado consu-midor, que pode ser resumida na forma de “pro-dutos limpos obtidos por processos limpos” doponto de vista social, ambiental, ético e moral,em que valores culturais e até psicossociais de-vem ser considerados. Muitas vezes esses con-ceitos são utilizados para proteção da produçãodoméstica em muitos países do primeiro mundo.O mercado de “marcas éticas”, os chamados“produtos responsáveis” com o selo internacio-nal de fairtrade, já começa a ganhar espaço nospaíses mais desenvolvidos (café e chá, principal-mente) com base nos conceitos de produção com

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justiça social, boa qualidade e transparência, fatoque tem possibilitado a obtenção de pequenosnichos de mercado por alguns países africanos.Mas não se pode esquecer que as barreiras nãocomerciais e as elevadas proteções nos preçosinternos dos produtos agrícolas nos países desen-volvidos são uma realidade no comércio interna-cional, que dificilmente serão eliminadas emmédio prazo.

O mercado consumidor global está ficandomais exigente com relação às características ino-vadoras, principalmente nos produtos alimenta-res. Isso significa considerar nos projetos de pes-quisa o uso sustentável dos recursos naturais, asrepercussões sociais, as barreiras para acesso amercados, a ocorrência e os problemas futuros apartir das mudanças climáticas globais (estressestérmicos, hídricos e nutricionais nos trópicos), adiversificação e especialização de processos eprodutos, orientados para mercados diferenciados,etc. Mas nas ICTs orientadas ao agronegócio nãotem ocorrido renovação significativa no quadrode pesquisadores com relação a maior capaci-tação nas novas e emergentes áreas do conheci-mento agropecuário. As empresas estaduais pra-ticamente desapareceram do mercado de inova-ções tecnológicas. O número de doutores forma-dos no País aumentou, mas as ICTs orientadas parao agronegócio não conseguiram contratar nemalterar substancialmente o perfil técnico científi-co dos pesquisadores com agregação de novos etalentosos cientistas em algumas áreas-chaveportadoras de futuro, como a biotecnologia, agri-cultura de precisão, agroenergia e nanotec-nologia. Até na Embrapa, a grande responsávelpela massiva inovação tecnológica no agronegó-cio, o orçamento tem sido decrescente, deR$ 1,432 bilhão em 1996 (R$ de 2005) paraR$ 955,5 milhões em 2005, uma redução real deR$ 477,0 milhões13.

Esse desinvestimento contínuo e sistemáti-co aliado ao baixo nível de salários praticados jácompromete seriamente a capacidade do País degerar novas e competitivas soluções tecnológicas.A persistir essa tendência, a capacidade futura de

inovação tecnológica no agronegócio estará se-riamente comprometida. Os jovens capacitados,empreendedores e talentosos migrarão para asorganizações que ofertam os maiores salários.

Além disso, o modelo institucional dá cla-ros sinais de fadiga criativa e obsolescência nageração de novas soluções, competitivas e sus-tentáveis, do ponto de vista ambiental e socioeco-nômico. É um sistema pesado, extremamente de-pendente do governo, com pouca capacidade deatrair parceiros privados para P&D e muito lentono processo de tomada de decisões. É baseadoem uma lógica de aumento da produção agrope-cuária via aumentos da produtividade física dosfatores de produção, com base no paradigma dabioquímica e da chamada “revolução verde”, emque o agricultor era o maior cliente e havia pou-ca participação dos consumidores urbanos. A le-gislação atual e os sistemas gerenciais criaramgrandes dificuldades operacionais e conceituaise muitas instituições não conseguem operar em“redes integradas de pesquisa e desenvolvimen-to”. Além do corpora-tivismo, que limita a imagi-nação criadora, essencial para manter viva essasorganizações, a dispersão e a falta de foco emmuitos projetos de pesquisa, aliadas à inexistênciade objetivos e metas claramente definidos e au-sência de indicadores de desempenho, são pro-blemas marcantes de difícil solução em curto pra-zo. Esse conjunto de problemas acaba influenci-ando de forma negativa o ambiente interno nes-sas organizações, limitando ainda mais a capaci-dade de geração de novas e criativas soluçõestecnológicas.

Comentários finais“O homem que não sonha

não tem futuro”

Embora já existam no País mecanismos deapoio ao desenvolvimento, principalmente os fun-dos setoriais, importantes no financiamento pú-blico das atividades de pesquisa, ainda persistemalgumas questões fundamentais com relação àsICTs orientadas para o setor agropecuário, que ne-

13 Fonte: Embrapa-DAF (valores corrigidos pelo IGP-DI/FGV). Fevereiro de 2005.

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cessitam de um encaminhamento mais adequa-do. Caso contrário, a “fadiga tecnológica” podeacontecer prematuramente em vários elos doagronegócio brasileiro.

A reorganização e a reinserção competiti-va dessas ICTs, no atendimento de demandas es-pecíficas e na geração de novos conhecimentosque possam ser transformados em inovações nomercado de tecnologias agropecuárias, passampela criação de um novo modelo institucional queestimule a criatividade, a integração e oempreendedorismo dos pesquisadores, em umambiente adequado e desafiador. Nessa reorga-nização do sistema nacional de C,T&I para oagronegócio, é necessário coragem, vontade po-lítica e ousadia para profissionalizar a gestão e agerência das organizações públicas, eliminandoe impedindo a ocupação de cargos por indica-ção política. O que deve prevalecer é um siste-ma baseado na meritocracia, onde os indivíduosmais competentes e mais talentosos possam defato liderar esse processo de administração pro-fissional. É necessário que haja “um choque degestão” para dotar as ICTs de mecanismos ágeis emodernos de administração e gerência einternalizar novos modelos mentais, seja no pla-nejamento das atividades de pesquisa, seja no dia-a-dia da administração, com ações efetivas porparte de todos os atores envolvidos nas ativida-des relacionas à CT&I, inclusive a criação de no-vos marcos regulatórios.

O primeiro passo é “desengessar” a admi-nistração, de tal forma que as ICTs possam sergerenciadas a partir da base conceitual e dos prin-cípios estabelecidos na Lei de Inovação. A admi-nistração deve ser regida por legislação específi-ca dentro de uma estrutura legal adequada emoderna, que permita agilidade operacional si-milar às empresas privadas. Significa, na prática,a valorização e o fortalecimento institucional, porparte do Estado e do governo, e o reconhecimen-to que inovação tecnológica deve ser entendidae tratada como cultura permanente da sociedadebrasileira. É forçoso reconhecer que muitas deci-sões ainda são tomadas com base na legislaçãoque rege a administração pública no País, extre-mamente morosa e burocrática, fato que aumen-

ta custos e atrasa sobremaneira a capacidade deresposta dessas instituições.

O segundo passo é estabelecer um mode-lo adequado de gestão, em que o estabelecimen-to de metas e indicadores seja feito com base nasdemandas atuais e futuras do agronegócio nacio-nal. Isso significa reconhecer que as ICTs públi-cas devem ser orientadas para a viabilização desoluções tecnológicas, em que o progresso técni-co, socialmente desejável e economicamente vi-ável, seja sustentável do ponto de vista ético eambiental e idealizado para melhorar as condi-ções de vida do cidadão. Tão ou mais importantedo que a publicação de artigos científicos, basesfundamentais para o avanço do conhecimento, éa capacidade de gerar pedidos de patentes ou demodelos de utilidades, indicadores imprescindí-veis na avaliação de desempenho de qualquerinstituição de pesquisa e desenvolvimento para osetor agropecuário. A integração e as parceriascom universidades e empresas privadas devemser estimuladas e fomentadas de tal modo que os“pesquisadores novos empresários empreendedo-res” possam auferir uma parte dos ganhos finan-ceiros obtidos pelas ICTs quando do uso comerci-al das suas descobertas, conforme já estabeleci-do na Lei de Inovação.

O terceiro passo é criar condições para queocorra um forte engajamento do setor privado,com parcerias estratégicas, recursos específicosde financiamento, utilização de cientistas e en-genheiros privados em todo o processo de pes-quisa e desenvolvimento. As parcerias devemchegar “até no chão das fábricas” e os cientistaspúblicos devem estar preparados para trabalharem estreita cooperação e parceria com a iniciati-va privada. As ICTs devem ter uma política de“portas abertas” para a cooperação técnico-ci-entífica, em que direitos, deveres, responsabili-dades, dividendos, recompensas simbólicas oufinanceiras sejam baseadas em relação contratualplenamente reconhecida pela legislação. As uni-versidades devem reconhecer que os interessesda sociedade prevalecem sobre interesses aca-dêmicos específicos e também formar profissio-nais para atender demandas específicas de em-presas privadas de diferentes setores da econo-

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mia. Os cientistas públicos devem ser encoraja-dos a desenvolver uma mentalidade empreende-dora, tornando-se “empresários do conhecimen-to” comprometidos com o sucesso da inovação eo desenvolvimento do País.

O quarto passo é qualificar e capacitar ospesquisadores e técnicos no uso das novas ferra-mentas de trabalho proporcionadas pelo novoparadigma da biotecnologia. Isso pode ser feitopor meio de reciclagem ou de contratações emgrande número de novos pesquisadores, públicose privados. O Brasil poderia utilizar mecanismosfiscais amplamente utilizados em países desen-volvidos para criar as condições de “uma novaarrancada biotecnológica para o agronegócio”.Para tanto, são necessárias ações integradas eempreendedoras em diferentes níveis: governo,universidades, instituições científicas e tecnoló-gicas e empresas privadas, inclusive com o forta-lecimento de “redes integradas de geração desoluções tecnológicas”.

O quinto passo seria a garantia de uma fon-te permanente de recursos orçamentários e finan-ceiros para o pleno funcionamento da capacida-de brasileira de inovação no agronegócio. Nosestados, isso pode ser feito com base na constitui-ção estadual. No governo federal, o grande indutorde projetos específicos de ciência, tecnologia einovação, a garantia de recursos deve ser feitacom políticas públicas adequadas, com visão demédios e longos prazos, “comprando soluçõestecnológicas”, com uma visão de “governançaintegrada”. Nas empresas privadas, com uma vi-são empresarial moderna do “fazer melhor, maiscedo e mais barato”, em que investimentos emP&D são parte da estratégia mercadológica deconquista e manutenção de mercados. A criaçãoe a disseminação de “Fundos Voluntários” (fundofinanceiro constituído de contribuições voluntári-as feitas por produtores, comerciantes, agroindus-triais, etc., visando ao desenvolvimento de ativi-dades de pesquisa, desenvolvimento e inovação,marketing e orientação de empresários doagronegócio e consumidores), pode ser uma al-ternativa atraente para o setor privado participar

mais ativamente, com ganhos econômicos priva-dos e benefícios sociais, do esforço brasileiro empesquisa e desenvolvimento.

A manutenção da capacidade brasileira deinovação tecnológica no agronegócio é essenci-al para manter o País competitivo no comérciomundial de produtos agrícolas e para continuarofertando produtos alimentares e fibras a preçosreais decrescentes no mercado doméstico. A per-sistir o atual desinvestimento nas ICTs orientadaspara o setor agropecuário, o Brasil perderá mer-cados externos, gerando novas crises e mais de-semprego no meio rural, provocando aumento nospreços domésticos dos produtos agrícolas.

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Negociação na redede poder na cadeiavitivinícola brasileiraO caso do vinho tintode mesa a granel

Mariano Marques1

Resumo: A cadeia vitivinícola localizada na Região da Serra Gaúcha tem características próprias: suaausência de contratos formais entre as partes, e que funciona apesar disso, o poder de mercado que vaipraticamente de uma concorrência perfeita entre produtores de uva, até o oligopsônio das empresasque compram a granel na Serra e das grandes redes varejistas. Compreender as relações de poder aolongo da cadeia permite, dentre outras coisas, que o setor público aja de forma mais eficaz, não só nafixação do preço mínimo da uva, como também exerça seu poder na fiscalização das empresasprocessadoras de uva.

Palavras-chave: relações de poder, economia dos custos de transação, poder de mercado.

1 Economista, Ms.C., técnico em Planejamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

irrecuperáveis são objeto da terceira seção; naquarta seção, tem-se a caracterização da econo-mia dos custos de transação e das relações depoder na cadeia vitivinícola. As relações de po-der dentro da cadeia e a formação de preços sãotratadas na quinta seção.

Situação atual da cadeia –Panorama internacional

O mercado de vinho está numa situaçãoestrutural em que há uma diminuição na produ-ção mundial, que por sua vez é reflexo da dimi-nuição do consumo nos principais países produ-tores, e um aumento nas exportações. Isso podeser observado na Fig. 1.

IntroduçãoPode-se dizer que a cadeia vitivinícola da

Região da Serra Gaúcha está estabelecida comoum complexo agroindustrial efetivo desde a dé-cada de 1970. A evolução histórica da vitivini-cultura brasileira, que culminou com a consoli-dação do complexo agroindustrial, é um proces-so político com condicionantes institucionais eestruturais, movidos por arranjos entre organiza-ções representativas de interesses vinculados aosprodutos específicos. Neste trabalho é discutidaa relação de poder dentro da cadeia e sua econo-mia de custos de transação. A situação atual dacadeia é discutida na segunda seção, que estásubdividida em panorama internacional, panora-ma nacional, produção nacional, comercia-lização e preços. A ação do Estado e os custos

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Quando mais de 25 % da produção de vi-nhos é exportada, a disputa pelos mercados inter-nacionais de um modo geral é acentuada. Umponto a favor dos países produtores tradicionais éque o vinho que eles fazem não pode ser consi-derado uma commodity, isto é, não serpadronizável como um grão ou uma oleaginosa;tem nichos de mercado, que são ocupados pelospaíses da Europa – notadamente França, Itália eEspanha – que, juntos, perfazem mais de 50 % daprodução mundial. No caso específico do vinhode mesa a granel produzido no Brasil, pode-seafirmar que se trata de uma commodity, pois écomprado em caminhões-tanque em diversasempresas processadoras, para posterior envasa-mento nas indústrias de outros estados.

Como se verá adiante, os efeitos de umaestratégia agressiva por parte dos principais paí-ses exportadores são sentidos de forma atenuadano mercado nacional, pois o vinho importado ébasicamente proveniente de uvas viníferas, qua-se não concorrendo com o vinho de mesa que éproveniente de uvas americanas e híbridas.

Situação atual da cadeia –Panorama nacional

Há uma melhora no consumo médio percapita no País, conforme mostra a Tabela 1. A maiorparte do consumo é de vinho de mesa, com pos-sibilidades de expansão desse consumo, que éconsiderado baixo para os padrões mundiais.

Fig.1. Evolução daprodução e exportaçãode vinho no mundo(milhões de toneladas)Fonte: FAO

O aumento no consumo per capita aparen-te não foi suprido apenas pela produção nacional(Tabela 2). Notam-se aumentos de um modo ge-ral: no volume de importações, nos estoques e naprodução nacional de vinho (que atingiu o seupico no ano de 2004). Essa conjunção de fatoresexerce pressão baixista nos preços.

Observe-se que, segundo dados da Orga-nização das Nações Unidas para Agricultura eAlimentação (FAO), o Brasil é o 24º mercadomundial em termos de volume importado de vi-nho; além disso, a Argentina é o 9º maior expor-tador de vinho. No ano de 2005, o preço médiode importação por litro oriundo da Argentina foide U$ 2,00. Isso equivale a R$ 7,00 a garrafa de750 mL nas gôndolas de supermercado no Estadode São Paulo. Mas pode haver preços menorespara esses vinhos provenientes da Argentina, che-gando, em março de 2006, a R$ 4,50 a garrafa.

19981999200020012002200320042005

Tabela 1. Evolução do consumo aparente per capitade vinho no Brasil.

Ano

166.252.088168.753.552171.279.882173.821.934176.391.015178.985.306181.586.030184.184.264

População

Fontes: População – IBGE; Consumo aparente – UVIBRA e MDICT.

228.120.103256.365.250279.116.566274.212.010322.065.429313.872.173344.189.052383.147.914

Consumoaparente(hab./L)

1,371,521,631,581,831,751,902,08

Consumoper capita

(L/hab.)

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Situação atual da cadeia –Produção nacional

O Rio Grande do Sul é responsável por pelomenos 90 % da produção nacional. A série histó-rica (de 2000 a 2005) da produção de uvas e in-dustrialização de vinhos nesse estado é objeto daTabela 3. Acrescente-se que são cerca de 15 milfamílias de produtores, concentradas na Região

da Serra Gaúcha, que trabalham em média 2,5hectares de parreirais, com uma produtividademédia de 19 toneladas por hectare. Estima-se quehá 35 mil hectares no estado produzindo uvas,sendo 95 % desse total situado na Serra Gaúcha.Há mais de 600 empresas processadoras (que sãochamadas de cantinas), a maioria pequenoscantineiros. Apenas 16 cantinas têm capacidadede estocagem para mais de 10 milhões de litros.

Estoque de vinhosEstoque de derivadosProdução de vinhosProdução de derivadosImportação de vinhos(1)

Importação de derivados(1)

Suprimento de vinhosSuprimento de derivadosConsumo de vinhosConsumo de derivadosExportação de vinhos(1)

Exportação de derivados(1)

Saldo de estoque de vinhosSaldo de estoque de derivados

Tabela 2. Quadro de suprimento – 2002–2005 (milhões de litros) – e evolução percentual – Brasil.

Discriminação

172,019,2

323,754,226,3

1,9522,0

75,3322,1

52,42,76,2

197,216,6

2002

(1) Fonte: Secex – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.Fonte: União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra) (Nacionais).

197,216,6

258,040,529,9

0,5485,1

57,6313,9

33,81,85,9

169,418,0

2003

169,418,0

396,461,134,0

0,5599,8

79,6344,2

37,23,97,6

251,834,8

2004

251,834,8

330,060,043,3

0,9625,1

95,6383,1

50,04,71,2

241,945,7

2005

14,64-13,36-20,30-25,2213,62

-72,32-7,07

-23,42-2,54

-35,54-35,32

-5,60-14,08

8,15

2002–2003%

-14,088,15

53,6550,9013,75-4,5723,6538,07

9,6610,18

119,1028,9648,5993,53

2003–2004%

48,5993,53

-16,75-1,8227,3870,72

4,2120,1611,3234,1920,96

-83,74-3,9131,42

2004–2005%

200020012002200320042005

Tabela 3. Produção de uvas e elaboração de vinhos no RS – 2000–2005.

Ano

74.70950.01347.76643.39162.59470.609

Uvas viníferas

Fonte: Cadastro Vinícola – Mapa / SAA-RS / Ibravin.

447.742384.920426.633339.985516.396422.638

Uvas comuns

522.451434.933474.399383.376578.990493.247

Total

Uvas (t)

56,234,231,729,942,945,5

Viníferas

273,0228,9259,6203,9314,0226,0

Comuns

329,2263,1291,3233,8356,9271,5

Total

Vinhos (milhões de litros)

43,733,548,736,651,953,2

Outrosprodutos

372,9296,6340,0270,4408,8324,7

Totalgeral

200020012002200320042005

14,3011,5010,0711,3210,8114,32

85,7088,5089,9388,6889,1985,68

100100100100100100

15,0711,529,31

11,0510,5014,01

73,2177,1976,3675,4176,8069,61

88,2988,7185,6786,4687,3083,62

11,7111,2914,3313,5412,7016,38

100100100100100100

Participação (%)

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200677

A maior parte da produção é de uvas co-muns, com mais de 80 % do total produzido. Omesmo raciocínio se aplica à elaboração de vi-nhos comuns, também responsáveis em média por85 % do total elaborado.

Situação atual da cadeia –Comercialização

O forte da comercialização é na forma degranel, em caminhões-tanque (Tabela 4), commaior participação do vinho de mesa do que ovinho fino. Este último é mais comercializado naforma engarrafada, o que agrega mais valor aoproduto final. Deve ser acrescentado que o vinhoque sai do Rio Grande do Sul no formato de gra-nel também pode ser transformado em outrossubprodutos, tais como “sangria” e “cooler”, queestão aumentando o seu consumo no País.

Esse tipo de comercialização é dominadopor cinco empresas, sendo três do Estado de SãoPaulo (24,10 % do total vendido), uma do Estadodo Rio de Janeiro (14,59 %) e uma do Paraná(10,37 %). Juntas, são responsáveis pela comprade 49,06 % do vinho a granel, o que caracterizaum oligopsônio. As demais empresas que tambématuam nes te mercado não detêm mais de 2 % dototal comercializado.

Situação atual da cadeia – PreçosPara ser elaborado, o vinho demora algum

tempo nos tonéis maturando até ser colocado àvenda, a depender de seu tipo. O vinho de mesamatura cerca de 7 meses. Os vinhos finos levammais tempo no processo, maturando, em média,por 2s anos. Assim, é de se esperar um volumealto de estoques, havendo anos em que o nível deestoques tem quase o mesmo volume que a ela-boração do vinho (Tabela 2).

A conseqüência principal é uma pressãobaixista nos preços, notadamente porque algumasempresas processadoras de vinho são cooperati-vas, que detêm 25,44 % da capacidade estáticade estocagem do setor. Estas têm de receber auva dos seus cooperados. Se os tonéis estiveremcheios, ou houver uma necessidade de fazer cai-xa, as cooperativas fazem uma “liquidação”, di-minuindo o preço do vinho.

Isso faz com que a trajetória dos preços nãoacompanhe a sazonalidade da quantidade ven-dida. Na Fig. 2 estão os preços nominais e as quan-tidades de uva comercializadas entre janeiro de1998 e setembro de 2005. O preço é do vinho demesa a granel, sem ICMS, posto na cantina.

Nota-se uma sazonalidade acentuada nasquantidades vendidas e suavizada nos preços. Emalguns pontos é que uma queda nos preços equi-

Vinho de mesaVinho finoTotalVinho de mesaVinho finoTotalVinho de mesaVinho finoTotalVinho de mesaVinho finoTotalVinho de mesaVinho finoTotal

Tabela 4. Comercialização de vinho desdobrado por embalagem no RS – milhões de litros.

Produto

50,727,878,438,3

3,241,5

4,10,14,2

135,93,2

133,7228,9

34,2263,1

2001

Fonte: Ibravin.

19,2610,5529,8114,56

1,2015,76

1,540,051,59

51,641,20

50,8287,0013,00100,0

Part.(%)

48,025,066,736,3

2,038,3

3,90,14,1

171,44,5

143,1259,6

31,7291,3

2002

16,488,59

22,8912,45

0,6813,14

1,350,051,40

58,851,55

49,1489,1310,87100,0

Part.(%)

47,127,668,029,5

1,430,9

3,70,13,8

153,60,8

137,6203,9

29,9233,8

2003

20,1311,7929,0712,61

0,6113,21

1,580,031,61

65,690,35

58,8787,2212,78100,0

Part.(%)

Engarrafado

Garrafão

Barril

Granel

Total

Embalagem

49,040,766,423,8

1,024,9

3,20,13,3

237,91,1

148,9314,0

42,9356,9

2004

13,7311,4118,59

6,680,296,960,910,020,92

66,660,31

41,7387,9812,02100,0

Part.(%)

43,043,658,118,7

0,919,6

2,90,13,0

161,40,9

138,9226,0

45,5271,5

2005

15,8316,0621,41

6,900,327,221,070,031,10

59,440,34

51,1583,2416,76100,0

Part.(%)

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vale a um aumento na quantidade comerciali-zada. A partir de outubro de 2004, os preços en-traram em queda, principalmente em função deuma liquidação ocorrida em uma grande coope-rativa, que é líder no setor. Houve aumento nasquantidades vendidas em novembro e dezembro,que são meses tradicionais de venda, mas a umpreço abaixo do de setembro do mesmo ano.

Em resumo, tem-se uma situação em que ovinho de mesa é o mais produzido; são pequenosprodutores de uva, concentrados na Região daSerra Gaúcha; é mais comercializado na formade granel, o que diminui o valor adicionado aoproduto dentro do Rio Grande do Sul; há o au-mento da importação de vinhos mais baratos ori-ginários da Argentina, o que estabelece um tetosuperior ao preço do vinho engarrafado nasgôndolas dos supermercados; e que há um ver-dadeiro oligopsônio na venda a granel.

Ação do EstadoA partir da segunda metade da década de

1980, inicia-se, na economia brasileira, um pro-cesso de desregulamentação, que se intensificoua partir da década de 1990. Grandes alteraçõesinstitucionais ocorreram nas cadeias agroindus-triais que alteraram, profundamente, as relaçõesentre os agentes desses sistemas, já que se extin-guiram regras estabelecidas anteriormente.

Nessa cadeia, o Estado age basicamentena fixação dos preços mínimos da uva (a forma-ção dos preços será vista adiante) e na fiscaliza-ção das cantinas. Os fatores que influenciaram odesarranjo das formas de governança consolida-das nos anos 1990 são, em um plano maisabrangente, a abertura comercial, a formação doMercado Comum do Cone Sul (Mercosul) e oaprofundamento da crise fiscal do Estado. O go-verno passou a disponibilizar menos recursos,principalmente para o setor agropecuário. As seretirar, gradativamente, do manejo e da gestãodas políticas agrícolas, o Estado abriu espaço paraos grupos econômicos com maior inserçãosetorial. No plano específico, tem-se o crescimen-to do peso do elo da distribuição na cadeia e aentrada de novas firmas transnacionais no comér-cio e processamento de produtos agrope-cuários.Todos esses fatores nos permitem afirmar que oComplexo Agroindustrial brasileiro passa a sub-meter-se a uma crescente perda do poder deregulação, a partir dos anos 1990 (BELIK, 1998).

Com a retirada gradativa do Estado no fi-nanciamento da agricultura, estabelecem-se no-vas formas de financiamento com pouca ou ne-nhuma relação com o Crédito Rural. O antigopapel orientador da modernização, estabelecidopelo Crédito Rural tradicional, é substituído porrelações privadas entre os diferentes agentes doelo da cadeia produtiva. Acrescente-se uma cres-cente desintermediação que leva ao financiamen-

Fig.2. Evolução dos preçosnominais (R$/L) e daquantidade comercializada(milhões de litros) de vinhode mesa.

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to dos agentes produtivos por meio de esquemasde quase-integração, venda antecipada, ou atémesmo agiotagem, no pior dos casos. Cabe aosinteresses privados definir aspectos como mar-gens, classificação e diferenciação de produtos,mudanças de tabelas de preços, etc.

O resultado dessa estratégia de “livre mer-cado” para a agropecuária é que uma parcela deprodutores não articulados do complexo fica de-samparada. Em outras palavras, ocorre um des-gaste nas tradicionais alianças que tinham comobase o enorme feixe de interesses que, por suavez, permitem uma governança setorial.

A desregulamentação da economia brasi-leira, a crise fiscal do Estado e seu enfraqueci-mento como gestor da política econômica, e atémesmo como empresário, aconteceram simulta-neamente ao processo de consolidação dos com-plexos agroindustriais no País, com a alteraçãonas suas formas de regulação e a rearticulaçãodos interesses hegemônicos por meio do proces-so de integração das agroindústrias com parcelaconsiderável da agricultura, postos sob uma novadinâmica: a da articulação dos capitais financei-ro, industrial, agrário e comercial.

Custos irrecuperáveisUma característica da cadeia são os cus-

tos irrecuperáveis (sunk costs); sendo uma cultu-ra permanente, requer pelo menos 3 anos para aprimeira colheita. Os investimentos são específi-cos para a cultura, não havendo praticamentemobilidade. O efeito da presença de tais custossobre o padrão de concorrência manifesta-se pelaelevação de barreiras à saída em um dado mer-cado, pois essa saída implica a renúncia ao retor-no associado a esses investimentos. A retraçãodo mercado conduz a uma situação de excessode capacidade produtiva diante da demanda. Issopode levar a uma guerra de preços, deprimindo arentabilidade geral. Em função dos custosirrecuperáveis, as empresas continuam operan-do mesmo se a rentabilidade obtida não permitira remuneração dos custos irrecuperáveis. Bastaque a receita supere os custos variáveis para que

a empresa continue operando. No caso de ex-pansão do mercado, poderá haver restrições anovos investimentos, na medida em que esse novoinvestimento não tenha a liquidez desejada. So-mente haverá novos investimentos se as margensforem suficientemente altas para atraí-los. Haven-do crescimento da demanda não acompanhadoimediatamente de novos investimentos, será ob-servado um arrefecimento da concorrência e umaumento de margens (AZEVEDO, 2000). Esse ra-ciocínio se aplica tanto ao produtor como às can-tinas.

Caracterização da economia doscustos de transação e das relaçõesde poder na cadeia vitivinícola

Conforme a Economia dos Custos de Tran-sação (MORAES, 1998), a decisão sobre a qual omodo mais eficiente de transacionar seus insumose produtos vai além das estratégias empresariaisque buscam reduções dos custos de produçãoenvolvidos, devendo considerar outros custos –os custos de transação – que são aqueles que fa-zem o sistema econômico funcionar e que sur-gem ao se utilizar o sistema de preços comoalocador de recursos, em um ambiente não neu-tro. Adota-se uma visão contratual da firma, a qualé entendida como um nexo de contratos que dis-ciplina as transações, entendidas como as trans-formações de um produto por meio de interfacestecnologicamente separáveis, com a unidadeanalítica passando a ser a transação. As transa-ções, por sua vez, apresentam atributos mensu-ráveis, ou seja, apresentam dimensões relaciona-das com especificidade dos ativos envolvidos,com incerteza, com freqüência das transações,com duração e com complexidade destas quedefinem as formas organizacionais mais eficien-tes. No caso da cadeia vitivinícola, não existecontrato de compra e venda formal entre as par-tes, sendo verbal, ou mesmo tácito. De qualquerforma, o contrato, quando existe, é informal. Naessência, a Economia dos Custos de Transaçãoconsidera incentivos de eficiência com base nodesenho de arranjos institucionais, que tanto po-dem ser contratos formais ou outras formas de

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coordenação amparadas por reputação ou laçossociais.

A ausência do contrato não representa aredução da articulação de interesses entre as as-sociações das partes. Ao contrário, pois a cres-cente especialização das propriedades rurais co-loca uma problemática específica para cada pro-duto, tanto em relação aos mercados a que se di-rigem, como em relação à política agrária quedemandam os agricultores. O estabelecimento dedemandas cada vez mais específicas e diferenci-adas torna cada vez maior a articulação em tor-no de organizações com caráter setorial, por pro-dutos. O resultado final dessa tendência àsetorialização das reivindicações é a crescenteintegração dos agricultores de determinado pro-duto aos demais segmentos agroindustriais docomplexo, criando base para a continuação dasorganizações interprofissionais. Isso, em princípio,lhes dá mais poder de barganha.

Por organizações interprofissionais enten-de-se aquelas que agrupam, em uma mesma es-trutura de representação, associações de agricul-tores e associações de empresas agroindustriais,sejam produtoras de insumos agrícolas ou empre-sas processadoras e/ou comercializadoras de pro-dutos agrários processados ou não. Essas organi-zações buscam a defesa integrada de um supostointeresse comum a todos os grupos envolvidos nocorrespondente Complexo Agroindustrial. A cons-tituição de uma organização interprofissional podeser entendida como resultado da institucionaliza-ção das relações entre os segmentos de determi-nado Complexo Agroindustrial e deste com osdemais setores da sociedade com o Estado(ORTEGA, 1998).

Especificidade dos ativosA especificidade de lugar refere-se à exis-

tência de perda de valor no caso de deslocamen-to físico; a uva tem que ser bem acomodada emcaixotes de polipropileno, de forma a não sofrerlesões durante o trajeto até a cantina; estas ficamnum raio de no máximo 30 km das propriedadesrurais. A temporal é exemplificada por produtosque exijam investimentos para a sua produção,

mas cujo valor de mercado cairá drasticamentecaso não seja processado ou comercializado den-tro de certo período. É o que ocorre dentro dacadeia, pois a uva, depois de colhida, só podeficar armazenada no máximo 2 dias, pois vai per-dendo suas propriedades e oxidando. A especifi-cidade de capital humano é associada ao conhe-cimento acumulado pelos indivíduos em algumasatividades, cuja aplicabilidade em uma outra élimitada. Nesse caso, o plantador de uva tem ha-bilidades específicas; nas cantinas, o enólogo é oprincipal responsável pelo processo de vinifica-ção, sendo nula a aplicação desta mão-de-obraaltamente especializada em outra atividade.

Conclui-se pela alta especificidade dos ati-vos. Isso significa que uma ou ambas as partesenvolvidas na transação perderão, caso esta nãose concretize, por não encontrarem uso alternati-vo que mantenha o valor do ativo desenvolvidopara determinada transação.

OportunismoHá, por parte dos participantes da cadeia,

um forte oportunismo, o que implica o reconheci-mento de que esses agentes não apenas buscamo auto-interesse, e podem fazê-lo lançando mãode critérios baseados na manutenção de informa-ção privilegiada, rompendo contratos ex post coma intenção de apropriar-se de quase rendas asso-ciadas àquela transação. Assume-se a possibili-dade da presença de oportunismo pós-contratual,que associada a investimentos em ativos especí-ficos leva os agentes a antecipar e mitigar os pro-blemas pós-contratuais, desenhando medidas deprecaução. Na cadeia, pelo fato de não havercontrato escrito, o comportamento oportunista porparte dos produtores é vender a sua uva para ou-tra cantina, se esta paga um pouco mais. A medi-da de precaução por parte do cantineiro é feitaex post, não aceitando a uva daquele produtor nasafra seguinte. Por parte dos cantineiros, o com-portamento oportunista seria não pagar a uva nograu glucométrico (teor de açúcar) devido, poishá um ágio para cada grau a mais a partir de umabase. Neste caso, a medida cabível é a fiscaliza-ção do Estado.

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Freqüência e duração das transaçõesA freqüência e a duração das transações

na cadeia podem ser consideradas como “recor-rentes” e duradouras. Portanto, fica caracteriza-da uma dependência bilateral, ou seja, tanto dolado do produtor (que faz fortes investimentos nosparreirais), como da cantina (que depende do pro-duto). São vantajosas as relações freqüentes eduradouras, emergindo contratos de médio e lon-go prazo, ou mesmo a integração vertical ou aqui-sição de parreirais próprios por parte doscantineiros. Diante disso, a freqüência das tran-sações somente se traduzirá em reputação se aeconomia de custos de transação for maior do queo aumento dos custos de transformação. Maisimportante do que a reputação é o estabelecimen-to de um compromisso confiável entre as partes,que pode ser um resultado de transações corren-tes. Quanto maior a freqüência de uma transa-ção, ceteris paribus, maior o valor presente dosganhos futuros e, portanto, maior o custo associa-do à atividade oportunista. O compromissoconfiável é suficiente para garantir o comporta-mento cooperativo das partes participantes docontrato (AZEVEDO, 1997).

IncertezaA incerteza das transações na cadeia está

relacionada com as dificuldades inesperadasencontradas nas transações, decorrentes dos di-ferentes estados da natureza e do comportamen-to estratégico dos agentes envolvidos nas tran-sações. Na cadeia, além da incerteza intrínse-ca da atividade rural associada ao clima e aostratos fitossanitários, tem-se a incerteza do pe-ríodo que o produtor receberá pela uva que eleentrega ao processador. No que se refere àscantinas, existe a incerteza ex ante da quali-dade da uva entregue.

Uma forma de diminuir a incerteza é a cons-trução de uma reputação. A reputação economi-za, portanto, custos de transação. No entanto, elapode implicar aumento dos custos de transforma-ção, decorrente de esforços de controle da quali-dade. Um exemplo é dado a seguir. O custo va-

riável é calculado pelo governo segundo uma pro-dutividade de 20 mil quilos de uva por hectare;para se produzir uma uva de mesa dentro das re-comendações agronômicas ótimas, ter-se-ia umaprodutividade de 18 mil quilos por hectare. O queo produtor estaria perdendo por hectare, ganha-ria no grau glucométrico da uva; isto faria comoque as cantinas preferissem a uva daquele produ-tor, pois um grau glucométrico maior implicamenos gastos com açúcar de cana, de modo adar o grau exato para a vinificação. No caso dascantinas, a reputação se constrói a partir da ga-rantia, pelo menos verbal, de adquirir a uva dosprodutores próximos a ela e pagar de uma formadiferenciada do costume da região (analisada aseguir).

Conclui-se, portanto, dados os níveis deespecificidade dos ativos, das incertezas encon-tradas, da freqüência e duração das transações(classificadas como recorrentes e duradouras), queas formas organizacionais mais eficientes são asrelações mistas ou hierárquicas, ou seja, desdecontratos informais entre cantinas e produtores atéa integração vertical, isto é, cantineiros peque-nos ou cooperativados que processam a sua pró-pria uva.

Relações de poder dentro dacadeia e formação de preços

A análise das relações de poder entre osatores que atuam na cadeia permite, dentre ou-tras coisas, que o Estado – dentro da sua limita-ção – possa delinear políticas mais efetivas parao setor, bem como agir de forma eficaz comomediador. Um estudo pioneiro nesse sentido foi ode Paulillo (2001), que estudou as negociações eexclusão de poder na rede citrícola. Conformeesse autor, “a interdependência dos atores, acomplementaridade dinâmica dos segmentos, abusca de recursos de poder e a orquestração dosinteresses mostram a ocorrência de interaçõesinstitucionais diferenciadas”. Isso se verifica for-temente na região, como se verá a seguir. A redede poder é uma abordagem que possibilita res-ponder a certas indagações preponderantes para

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o conhecimento da estrutura e da dinâmica dosagentes sociais aí envolvidos.

As principais associações de classe que atu-am dentro da cadeia são:

a) União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra).

b) Associação Gaúcha de Vitivinicultores(Agavi).

c) Sindicato da Indústria do Vinho do Esta-do do Rio Grande do Sul (Sindivinho).

d) Federação das Cooperativas Vinícolas doRio Grande do Sul (Fecovinho).

e) Sindicato dos Trabalhadores Rurais daRegião Vitícola do Rio Grande do Sul e SantaCatarina.

As três primeiras são representativas do se-tor processador (cantineiros); a quarta representaas cooperativas e o último, os produtores rurais.Deve ser notado que as fronteiras entre produto-res e cantineiros não são, de um modo geral, níti-das, pois muitos cantineiros produzem uva, e háum grande número de pequenos cantineiros. Issopode ser visto na Tabela 5.

Nota-se que é grande o número de peque-nos cantineiros e que as grandes cantinas detêm30,28 % da capacidade total de estocagem; porsua vez, as grandes cooperativas têm, conformejá citado, 25,44 % da capacidade total. Das apro-ximadamente 15 mil famílias de produtores deuvas, 5.667 são sócias em cooperativas. Assim, égrande a assimetria do poder de barganha, quese reflete quando da discussão da matéria-prima,isto é, o preço básico da uva.

O poder dos agricultores é reduzido, poisestes atuam em um mercado muito mais compe-titivo. Estes aumentam o seu poder por intermé-

dio de sua capacidade de organização para rela-cionar-se, de forma coletiva, com as agroindústrias.Quanto às relações de poder dentro dainterprofissão, ressalte-se que, para as agroindús-trias, este advém, fundamentalmente, do seu po-der econômico e da própria facilidade em seposicionar de acordo com seus competidores, jáque constituem um número relativamente redu-zido. Com isso, evidencia-se, uma vez mais, quea constituição de uma interprofissão não significaa extinção dos conflitos no interior do ComplexoAgroindustrial, mas que esses conflitos existem esão reconhecidos pelos agentes neles envolvidose são mediatizados por estratégias corporativistasde interlocução.

A fixação dos preços resulta de intensasnegociações dos diversos setores interessados naprodução da uva. Assim, interagem, sob a coor-denação da Companhia Nacional de Abasteci-mento (Conab), as entidades dos processadores,de um lado, e a entidade representativa dos pro-dutores, do outro. Como a Fecovinho tem interes-se de ambos os lados, de um modo geral, é neutrana negociação. Há também a participação deentidades públicas como a Secretaria de Agricul-tura do estado, a Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária (Embrapa) e a Empresa de Assis-tência Técnica e Extensão Rural (Emater) estadu-al, que eventualmente participam como órgãosde consulta.

Os preços mínimos da uva são diferencia-dos em função da cultivar e do teor de açúcar,sendo o preço mínimo básico determinado peloGrupo III (uvas de mesa), subgrupo tintas I comteor de açúcar de 15 graus babo. A variação dopreço em função do teor de açúcar varia de 7 %a 10 % para cada grau.

Até 1> 1 a < 5

> 5

Tabela 5. Capacidade de estocagem – Empresas Vinícolas do RS.

Capacidade de estocagem(milhões de litros)

Fonte: Ibravin.

58

12

Unidades

1,615,5

202,8

Estocagem

PequenaMédiaGrande

Tipo decantina

Cooperativas

465101

23

Unidades

123,6212,4241,4

Estocagem

Outros

470109

35

Unidades

125,2227,8444,1

Estocagem

Total

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200683

A Conab, empresa federal ligada ao Minis-tério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento,atua no financiamento da produção desde 1978por meio do Banco do Brasil mediante emprésti-mos para comercialização (Empréstimo do Go-verno Federal sem opção de venda ao Governo(EGF/SOV)), atualmente a juros fixos de 8,75 %ao ano e, até 1990, também adquiriu a uva paraposterior transformação em vinho por meio dasAquisições do Governo Federal (AGF). A garan-tia dos financiamentos (EGF) é o vinho deposita-do nas cantinas e cooperativas, uma vez que auva é produto perecível. Os beneficiários desseempréstimo são os produtores ou grupo de produ-tores, mediante formalização de um contrato en-tre produtor e cooperativa ou indústria paraprocessamento de uva e seus derivados. Na prá-tica, o que ocorre é que o produtor entrega a uvamediante preenchimento da nota de “talão deprodutor” (fornecido pela Secretaria da Fazendado estado) e recebe da cantina uma nota fiscal(fatura), não recebendo em geral nenhum paga-mento na hora da entrega.

Cabe aqui um esclarecimento. A cantina sóé obrigada a pagar o preço mínimo estabelecidopelo governo – chamado na região de preço detabela – se contrai o EGF nos bancos oficiais.

Aqui entra em ação o poder das canti-nas. Dependendo da percepção da safra da uva,isto é, se a oferta de uva é grande ou pequenaem relação ao que o mercado pode absorverde vinho, a cantina paga ao produtor da formaque se segue. Se o preço mínimo estabelecidopelo governo – que em geral só cobre o custovariável de produção – for maior do que o pre-ço que as cantinas estão dispostas a pagar, elaspagam o preço delas. Foi o que aconteceu nasafra 2004–2005. O preço mínimo estipuladopelo governo foi de R$ 0,42 por quilograma dauva de mesa ‘Isabel’ (que é o parâmetro bási-co, a partir do qual vêm ágios em função davariedade e grau glucométrico) e as cantinasresolveram pagar R$ 0,35.

A forma de pagamento é feita da forma quese segue, independentemente de ser pago o pre-ço mínimo ou não. De um modo geral, elas não

pagam à vista; fazem um adiantamento de 10 %quando da entrega da uva (nos meses de feverei-ro e março), que dá para o produtor pagar os dia-ristas que trabalharam na colheita, o combustívelusado para o transporte e outras despesas geraisligadas à colheita. Se a cantina faz uso do EGF(liberado em junho), ela paga o restante, sem ne-nhuma correção. Caso contrário, isto é, se a can-tina usa recursos próprios, paga 50 % do saldodevedor também sem correção. O restante elapaga até dezembro, corrigindo esse saldo segun-do os juros da caderneta de poupança (TR +0,5 %). Dessa forma, o produtor rural praticamen-te financia o custeio da cantina. E isso explicaporque poucas cantinas recorrem ao EGF, pois po-dem esperar vender o produto – a uva entregueentre fevereiro e março é vinificada e o vinho estápronto para consumo entre setembro e outubro –para depois pagar ao produtor.

Já as empresas “graneleiras” pagam umpreço às cantinas basicamente previamentecombinado entre elas. Das cinco maiores cita-das, as três do Estado de São Paulo são da mes-ma cidade – Jundiaí – o que torna mais fácil umpossível conluio de preços. Exceção é feita quan-do há uma quebra de safra, pois aí as cantinasaumentam sua margem de lucro.

No caso vitivinícola, o poder de mercadoimplica relações comerciais entre os produtoresde uva e as cantinas; as cantinas e as indústriasgraneleiras; e as indústrias graneleiras e as gran-des redes varejistas. A posse de uma disposiçãomaior de recursos por parte de um agente possi-bilita maior capacidade na negociação. Dessaforma, o poder de mercado pode ser definido pelacaracterística estrutural da indústria, e pelo qualse determinam a conduta e o desempenho nomercado. As posições em que se encontram asempresas são vantajosas, não só nas negociaçõesindividuais como nas relações comerciais pormeio de suas associações, já que as principaiscaracterísticas referentes à posição no mercadolhes concedem maior poder de barganha no pro-cesso de negociação da matéria-prima. Isso por-que, como se viu, as cantinas podem pagar ounão o preço mínimo estipulado pelo governo. Nacontinuação da cadeia, as indústrias que compram

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o vinho a granel podem ditar o preço em funçãodo seu poder de oligopsônio, a depender da safrada uva; se esta é abundante, aumenta seu poderde mercado; caso contrário, as cantinas podemaumentar sua margem de rentabilidade. Esse vi-nho a granel é vendido pelas graneleiras na for-ma de garrafa de 750 mL ou garrafão de4.600 mL, quer na forma de vinho ou de algumderivado, como a sangria. O comprador final se-riam as redes varejistas, que também podem im-portar vinhos mais baratos da Argentina. Assim,no final das contas, é o vinho barato argentinoque funciona como teto ao preço do vinho de mesabrasileiro, ditando as margens de comercializaçãodas empresas que compram o vinho de mesa agranel no Rio Grande do Sul.

ConclusõesO setor, mesmo sem a assinatura formal de

contratos entre as partes, é altamente organiza-do, tendo seus representantes voz ativa quandoda fixação de preços pagos ao produtor de uva.Por sua vez, as grandes empresas que vêm aoestado comprar vinho tinto de mesa a granel pro-curam exercer o seu poder de barganha, sendoeficazes nesse ponto. Por seu turno, as grandesredes varejistas se utilizam também do seu poderde mercado para ditar os preços para as empre-sas graneleiras.

Assim se dá a cadeia de transmissão depoder de mercado: as grandes redes varejistas,ao importarem vinho mais barato da Argentina,impõem um teto de preço para o vinho tinto demesa vendido pelas empresas que compram essevinho a granel no Rio Grande do Sul. As empre-sas que compram a granel impõem um preço às

cantinas se a safra for maior do que o esperado;caso contrário, diminuem a sua margem de lucroe aceitam um preço mais próximo ao custo devinificação acrescido de uma margem. As canti-nas pagam posteriormente ao produtor um preçoque, mesmo sendo o preço mínimo estipulado pelogoverno, ao se atualizar o valor pela data de re-cebimento efetivo do produtor, fica abaixo dessemínimo.

ReferênciasAZEVEDO, P. F. de. Concorrência no agribusiness. In:ZYLBERSZTAJN, D.; NEVES, M. F. (Org.). Economia & gestãodos negócios agroalimentares. São Paulo: Pioneira, 2000.p. 61-80.

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BELIK, W. Estado, grupos de interesse e formulação depolíticas para a agropecuária brasileira. Revista de Econo-mia e Sociologia Rural, Brasília, DF, v. 36, n. 1, p. 9-33, jan./mar. 1998.

MORAES, M. A. Alterações nas relações contratuais dacadeia sucroalcooleira, decorrentes da desregulamentaçãoanalisadas sob a ótica da nova economia das instituições.Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, DF, v. 36,n. 3, p. 55-79, jul./set. 1998.

ORTEGA, A. C. Corporatismo e novas formas de represen-tação de interesses na agricultura: uma abordagem teórica.Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, DF, v. 36,n. 4, p. 9-37, out./dez. 1998.

PAULILLO, L. F. Negociação e exclusão na rede de podercitrícola brasileira. Agricultura em São Paulo, São Paulo, v.48, n. 2, p. 101-118, 2001.

UNIÃO BRASILEIRA DE VITIVINICULTURA. Dadosestatísticos. Disponível em: <http://www.uvibra.com.br/>.Acesso em: 19 jun. 2006.

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O risco de basepara a soja emSinop e Lucas,Mato Grosso1

Flávio Borges Botelho Filho2

Gotardo Machado de Souza Júnior 3

Resumo: O presente trabalho propôs-se a analisar, dentro da dinâmica da função econômica dos mer-cados futuros, o risco de base de modo a levantar a discussão sobre o gerenciamento de risco nosistema de comercialização das firmas ou produtores na Região Centro-Oeste, levando em considera-ção a soja produzida ao longo da BR 163, no Estado de Mato Grosso, tomando-se como exemplounidades produtivas localizadas em Sinop e Lucas do Rio Verde. O assunto foi objeto de análise aolongo da dissertação de mestrado em agronegócios, Hedge para produtores de soja, na Universidadede Brasília, em 2006. Observa-se que, após a Constituição de 1988, a criação da Organização Mundi-al do Comércio (OMC), o fortalecimento econômico de blocos e países, novas corporações e gruposde interesses setoriais, o Estado passa por um processo de esvaziamento decorrente da sua crise fiscale da falta de legitimidade de políticas socialmente sustentáveis. As mudanças no padrão de interven-ção, que passou de uma completa regulação estatal para uma tendência à desregulamentação, comreduzida intervenção do Estado, estão contribuindo para o surgimento de novas formas decomercialização – que, mais inteligentes, permeiam a dinâmica e o processo de funcionamento domercado. Por isso, apesar de se mostrar efetiva a prática de hedge na Bolsa de Chicago (CBOT), nãofaz parte da maioria dos produtores da região gerenciar os riscos do negócio da firma de produçãoagrícola na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F). Essa situação tende a persistir, pois o Estado (emseus três níveis de poder: federal, estadual e municipal), em conjunto com a iniciativa privada e de-mais organizações não-governamentais, não consegue estabelecer um padrão de comportamento emdefesa do fortalecimento do uso de instrumentos e mecanismos de gerenciamento e neutralização deriscos. Corroboram para isso a falta de conhecimento técnico, acrescido da ausência institucional,levando produtores a não operarem com mercados futuros na região, aumentando, dessa forma, orisco de seus próprios negócios.

Palavras-chave: bolsa, firma de produção agrícola, hedge, gerenciamento de risco, mercado de futu-ros, soja, portfólio, produtores de soja.

Abstract: To the present job it intended to study the possibilities of base risk in the dynamics of theeconomic function of the future marketing, to bring up the discussion of risk management of the producers

1 Artigo de mestrado em Agronegócios, da Universidade de Brasília (UnB), por ocasião de encerramento do curso após a apresentação da dissertação - Junhode 2006.

2 Prof. Dr. do Mestrado em Agronegócios, da Universidade de Brasília (UnB).3 Economista , funcionário da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), [email protected].

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commercialization system in the area of Center-west, taking into account the soy produced along BR163, in the State of Mato Grosso, being taken as example, located productive units in Sinop and Lucasdo Rio Verde. The meaning of the subject belongs to the master dissertation – Hedge to Soy Producer,presented on last march 2006, in University of Brasilia. It is observed that, after the Constitution of 1988,the creation of OMC, the economical invigoration of blocks and countries, new corporations and groupsof sectorial interests, the State raisin for an emptying process due to it fiscal crisis and of the lack oflegitimacy of politics socially maintainable. The changes in the intervention pattern that passed of acomplete state regulation for a tendency to the deregulation with reduced intervention of the State arecontributing to the appearance in new commercialization ways - that more intelligent they permeatethe dynamics and the process of operation of the market. Therefore, in spite of showing it executes thehedge practice in CBOT, it is not part of most of the producing of the area to manage the risks of thebusiness of the firm of agricultural production in the BM&F – Brazilian Board of Trade. That situationtends to persist once and for all that the State (in their three levels of power: Federal, State and Munici-pal) together with the private initiative and other no government organizations, it doesn’t get to establisha pattern of behavior in defense of the invigoration of the use of instruments and administrationmechanisms and neutralization of risks. They corroborate for that the lack of added technical knowledgeof the institutional absence, taking producers operate not with future markets in the area, increasing, inthat way, the risk of their own businesses.

Key-words: board of trade, firm of agricultural production, futures market, Hedge, portfolio, riskadministration, soybeans, soybeans producers.

IntroduçãoApós a Constituição de 1988, a criação da

Organização Mundial do Comércio (OMC), o for-talecimento econômico de blocos e países, no-vas corporações e grupos de interesses setoriais,o Estado passa por um processo de esvaziamentodecorrente da sua crise fiscal e da falta de legiti-midade de políticas socialmente sustentáveis.

As mudanças no padrão de intervenção,que passou de uma completa regulação estatalpara uma tendência à desregulamentação, comreduzida intervenção do Estado, estão contribu-indo para o surgimento de novas formas decomercialização – que, mais inteligentes,permeiam a dinâmica e o processo de funciona-mento do mercado. Por isso, apesar de se mostrarefetiva a prática de hedge na Bolsa de Chicago(CBOT), não faz parte da maioria dos produtoresda região gerenciar os riscos do negócio da firmade produção agrícola na Bolsa de Mercadorias &Futuros (BM&F). Essa situação tende a persistir,pois o Estado (em seus três níveis de poder: fede-ral, estadual e municipal), em conjunto com a ini-ciativa privada e demais organizações não-go-

vernamentais, não consegue estabelecer um pa-drão de comportamento em defesa do fortaleci-mento do uso de instrumentos e mecanismos degerenciamento e neutralização de riscos.

Mas, para se chegar à condição de otimi-zação do gerenciamento de risco por meio deoperações de hedge nas bolsas mercantis, sejano Brasil ou nos EUA, é preciso conhecer melhoros mecanismos de funcionamento dos riscos eincertezas que se pretende gerenciar e comocalculá-los de modo que a compreensão de talassunto possa traduzir-se em conhecimento apli-cável.

Assumir a administração de risco comoprincipal motivo de os agentes operarem em bol-sa, na opinião de Working (1953), é desviar a aten-ção do que seria possivelmente o mais importan-te serviço desse tipo de mercado, que é o de pro-mover um ajuste econômico desejável dos esto-ques de commodities, com conseqüente reduçãoda flutuação dos preços.

Williams (1986) questiona sobre o risco debase e o que seria dito sobre hedging se o merca-do futuro estivesse implícito enquanto o mercado

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de financiamento ou de crédito fosse explícito?Segundo o autor, os economistas estão acostuma-dos a explicar as motivações dos traders em con-dições que contradizem suas explicações habi-tuais de hedging. É a explicação convencionalde hedging e de mercado futuro que está errada.A relação de equilíbrio para mercados de crédito/financiamentos deriva de uma relação de equilí-brio que envolve cinco preços. O preço para en-trega imediata, mais taxas de armazenagem, maisgastos de capitais, menos um custo de uso ou en-cargos para a commodity igualando-se ao preçopara entrega futura PEI + PTA + PCC – PUC = PEF.

Na verdade, o que Williams (1986) propôsfoi explicar como as taxas de armazenagem e oscustos de capital juntos formam os custos dearmazenamento físico, também conhecidos comocustos de carregamento ou encargos. Esses cus-tos, por sua vez, juntam-se aos gastos com trans-portes e formam a base geográfica. Quando umaoperação de comercialização dá-se em um ter-mo para entrega futura, diz-se que, além do com-ponente da base geográfica, incorre-se num perí-odo de incerteza sobre a expectativa de preço deum ativo (uma commodity) transcorridos algunsdias, semanas, meses ou anos – temporalidadeda base ou base temporal.

Mercados futuros agropecuáriosEssa análise é importante para justificar a

relevância de mercados futuros nesse segmentoeconômico, mas também em virtude de sua ori-gem estar diretamente relacionada com acomercialização de produtos agrícolas.

Andrade (2004) lembra que um fato impor-tante acerca da literatura especializada é que osmercados de futuros agrícolas foram alvo de trans-formações significativas, tomando como exemploas mudanças efetuadas pelos governos do Cana-dá e dos Estados Unidos, que há algum temposaíram de um papel altamente regulador, passan-do a dar maior ênfase à administração de riscopor parte dos próprios agentes. Essas mudançasafetam sobremaneira os seus incentivos e as suaspercepções quanto ao uso de mercados futuros.

Leuthold et al. (1989), por sua vez, expuse-ram que, nos mercados futuros norte-americanos,os contratos agrícolas tiveram grande importân-cia no aumento do volume negociado no iníciodos anos 1970 em razão da elevação dos preçosde commodities e energia. Posteriormente, umsegundo aumento no volume de contratos nego-ciados ocorreu diante da introdução de instrumen-tos financeiros, o que, em que mudanças na con-juntura mundial, fizeram crescer o interesse so-bre contratos futuros de índices. Tais mudançasno início dos anos 1980 foram tão dramáticas quea participação das commodities agropecuárias,nos Estados Unidos, caiu drasticamente.

Mesmo assim, o mercado de derivativosmundial ainda possui grande relevância nacomercialização de diversas commodities, prin-cipalmente naquelas que possuem um ativo co-mércio internacional. Para exemplificar a impor-tância dessa modalidade de negociação, a Tabe-la 1 mostra que o volume negociado de soja, emuma das principais bolsas do mundo (a ChicagoBoard of Trade (CBOT)), é algumas vezes superiorà produção mundial.

Tabela 1. Volume negociado do Complexo Soja Equivalente por Produto da CBOT (2001 a 2004).

Fonte: Chicago Board of Trade (CBOT).

12.150.3696.034.3256.743.772

24.928.466

Número decontratos

1.653.422164.227674.377

2.492.027

Equivalênciaem produtos

(1.000 t)

GrãoÓleoFareloTotal

Produto

2001

14.475.1006.816.4837.174.507

28.466.090

Número decontratos

1.969.772185.514717,451

2.872.736

Equivalênciaem produtos

(1.000 t)

2002

17.641.8147.469.7568.219.942

33.331.512

Número decontratos

2.400,70203.293821.994

3.425.986

Equivalênciaem produtos

(1.000 t)

2003

18.846.0217.593.3148.569.243

35.008.578

Número decontratos

2.564.567206.656856.924

3.628.147

Equivalênciaem produtos

(1.000 t)

2004

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Esse volume relativamente expressivo denegociações de algumas commodities, mais es-pecificamente no setor agropecuário, pode, se-gundo Marques e Mello (1999), gerar algumasvantagens como:

a) Todos aqueles que têm interesse em umadeterminada mercadoria física podem se prote-ger contra oscilações de preço desfavoráveis nofuturo.

b) Por meio das expectativas de oferta edemanda, os mercados futuros são os melhoressinalizadores dos preços futuros, ou seja, têm afunção de “descobrir preço”.

c) Além de assegurar determinada rentabi-lidade, contribuem para diminuir a sazonalidadede preços da produção agropecuária.

d) Os mercados futuros atraem capital derisco (investidores e especuladores). Dessa forma,estes assumem os riscos e contribuem para umamaior liquidez do mercado.

e) Em virtude da conseqüente diminuiçãode risco por meio do hedge, produtores rurais po-dem ter melhores condições de adquirir financia-mentos nas instituições financeiras.

Entretanto, a função econômica dos mer-cados futuros vai muito mais além de simples aná-lises de neutralização de risco ou hedge para umportfólio. Na visão de J. Williams (1986), há umespaço enorme para uma análise, cuja metodolo-gia explique, por exemplo, alguns instrumentosde políticas públicas que se compatibilizam e seinteragem com o mercado de futuros. Essa é umavisão macro que aponta, entre outras coisas, paraa existência do target price como instrumento deum mecanismo de disparo automático cujainteração revela-se no momento da operacionali-zação dos countercyclical payments. Como osfundos e especuladores são compradores de T –bonds (títulos da dívida pública), o disparo dessesinstrumentos gera gastos que desequilibram ostesouros, ainda que de forma tênue; todavia, o quese está analisando é o compartilhamento e ainteração convergente de políticas públicas, cujosresultados vão muito além do que uma simplesoperação no mercado de futuros.

Com relação à participação no processo degerenciamento de risco, Demsetz (1968) obser-vou um fenômeno que tratou da dificuldade ementrar e sair do mercado durante seu período defuncionamento. Mencionada dificuldade foi de-nominada como custo de liquidez, e buscou-seanalisar em que proporção os custos de transa-ção eram afetados pela escala de negociação nomercado de ações da bolsa de Nova Iorque.

CenárioAtualmente, o balanço de oferta e deman-

da mundial para a soja mantém os Estados Uni-dos como principais produtores, em uma áreaequivalente a 30 milhões de hectares, que produ-zem aproximadamente 85 milhões de toneladasdo grão. O Brasil caminha a passos firmes e como auxílio do principal interessado no crescimentodo plantio da soja brasileira: o mercado internaci-onal, as grandes corporações que comercializamo grão no mundo, Bunge, Cargill, ADM, acresci-das de novos empreendimentos formados por par-cerias a partir das indústrias de defensivos, semen-tes e adubos, em conjunto com grandes tradingse companhias de armazéns gerais.

No momento, o suprimento mundial de sojaaproxima-se de 325 milhões de toneladas parauma demanda que vem crescendo ano após anoe, dependendo do consumo e da renda dos paí-ses asiáticos, pode ultrapassar, dentro em breve,a casa dos 270 milhões de toneladas. A Fig. 1 apre-senta o crescimento de área colhida, produção,estoque inicial e exportações, além do suprimen-to mundial.

Em 2003, o Brasil figura como o segundoprodutor mundial, responsável por 52 milhões, das194 milhões de toneladas produzidas no âmbitoglobal, ou 26,8 % da safra mundial. Em 2005, devemanter a mesma posição, todavia com uma pro-dução estimada em 54 milhões de toneladas, em,aproximadamente, 23 milhões de hectares,correspondendo a cerca de 23,47 % da produçãomundial.

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No que concerne aos preços ao produtorpraticados na região de Sinop e Lucas, MT emrelação aos preços de mercado cotados ou for-mados na CBOT (Fig. 2), pode-se verificar queaté outubro de 2004 havia uma previsão de re-cuperação dos preços ao produtor em funçãoda variação da base e do comportamento está-

vel na demanda pela commodity soja no mun-do. Ainda assim, a queda no câmbio ocorridaao longo de 2005 exigiu e continuará exigindouma nova formatação na operacionalização dosnegócios da firma de produção agrícola, espe-cialmente no que tange à gestão de risco, alémde mudanças organizacionais que se manifes-tam no âmbito dessa nova formatação.

Fig. 1. Suprimento mundial de soja.Fonte: USDA.

Fig. 2. Comparativo da evoluçãodos preços de soja na CBOT e dospreços ao produtor em MatoGrosso – Comportamento damédia móvel e do dólar noperíodo.Fonte: Conab, Bacen e CBOT.Elaboração: Mestrado em Agronegócio –Universidade de Brasília (UnB) em 3/2005.

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O conceito de hedge e abase nos mercados de futuros

Leuthold et al. (1989) afirmam que hedgearé mais uma ação de mercado do que uma açãotécnica de precisão. Segundo os autores, não épossível definir hedge como uma ação isolada.Hedegear significa coisas diferentes para pesso-as distintas, por isso existem várias definições.

Hieronymus (1977) contribuiu com três de-finições: primeiro, o processo técnico de hedgingimplica tomar uma posição equivalente a umaposição oposta em ativos disponíveis ou dinhei-ro4. Igual em tamanho ou volume e oposta emrelação ao mercado spot ou à vista, conforme ocaso: comprado – long – ou vendido – short – nomercado futuro.

Se se considerar um caso de uma opera-ção de aquisição de grãos no mercado spot notempo t+0, no preço S0 e ao mesmo tempo ven-der um contrato de futuros no preço F0, um nego-ciador estará comprando no mercado spot e ven-dendo no mercado futuro, o que significa umaposição hegeada. No tempo t+1, o negociadorvende seu estoque em dinheiro pelo preço S1 eliqüida ou compra um contrato de futuro ao preçoF1.

O resultado R, lucro ou prejuízo, da transa-ção após a operação de hedge será representadopela mudança relativa dos dois preços, à vista efuturos, ou pela mudança na base:

R = (S1-S0)+(F0-F1) (4.1)

= (S1-F1)+(S0-F0) (4.2)

= B1-B0=∆B (4.3)

em que B1 = S1 - F1 ; B0 = S0 - F0; com B represen-tando a base e ∆B, a mudança de base.

Como a base é a diferença entre o preçono mercado spot e a cotação do contrato no mer-cado futuro, pode assumir valores positivos e ne-gativos. O valor da base pode ser positivo, quan-do o preço spot da localidade estiver maior doque a cotação no mercado futuro. De outra for-ma, a base pode assumir um valor negativo quan-

do o preço à vista for menor do que a cotação nomercado futuro. A variação que significa aumen-to na base, ou seja, a diferença entre o preço àvista e o futuro aumenta, ocorrendo o enfraqueci-mento ou alargamento da base. Quando ocorre ocontrário, é chamado de fortalecimento ouestreitamento da base.

Esse processo, com o passar do tempo, e àmedida que o vencimento do contrato futuro seaproxima, ocasiona a diminuição dos custos decarregamento em virtude de o período de arma-zenagem e incidência de juros e encargos dimi-nuir. Por isso, no vencimento do contrato, chega-se ao ponto em que a diferença entre o preço àvista e o futuro reflete tão-somente os custo detransporte entre as diferenças de localidades deorigem da transação e os pontos de entregas daBolsa.

Para que haja hedge perfeito, o valor dabase deverá ser o mesmo da data de contrataçãoquando do seu encerramento. Vale mencionarque isso dificilmente ocorre porque os prêmios derisco em razão do tempo de maturidade do con-trato, da taxa de juros, do custo de carregamento,da localização e da qualidade do produto seremcaracterísticas implícitas na comercialização –de acordo com Williams (1986), essas são variá-veis que influenciam ou modificam-se ao longodo período de maturação de um contrato.

Quando ocorre um fortalecimento da base,ou seja, o preço à vista e o preço futuro se aproxi-mam, os detentores de posições vendidas (short)serão beneficiados. Já no caso de uma situaçãooposta, os detentores de posições compradas (long)em contratos futuros serão beneficiados.

Em relação ao risco de base, é de se obser-var que os preços à vista e futuro se movem emdireções quase semelhantes, porque esse movi-mento, além de não ser simultâneo, não ocorrecom igual intensidade. Toda vez que os movimen-tos são imprevistos ou desconhecidos, provavel-mente em função do conjunto de informações in-disponíveis à maioria, geram movimentos deimprevisibilidade os quais são normalmente defi-nidos como risco de base.

4 Hieronymus in Economics of Future Trading, 107.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200691

A variabilidade, a independência e os prê-mios nos mercados spot e futuros fazem com quenem sempre os preços se movam na mesma dire-ção e proporção. Segundo Marques e Mello(1999), isso cria a possibilidade de perdas paraespeculadores, investidores e até hedgers.

Hull (1996) entende que quando uma ope-ração de hedge se inicia no instante t1 é encerra-da no instante t2. A partir da definição de base,tem-se que:

B1 = p1- f1 (4.4)

B2 = p2- f2 (4.5)

em que B1 e B2 são as bases, p1 e p2 são os pre-ços à vista e f1 e f2 são os preços futuros nos ins-tantes t1 e t2, respectivamente. Se no instante t2,vende-se ou compra-se um ativo pelo preço domercado à vista, ou seja, p2, o lucro ou prejuízoda posição futura será dado pela diferença entref1-f2. De acordo com Hull (1996), o preço efetivoque o contratante pagará ou receberá pelo ativo(P) será:

p = p2 + f1 - f2 (4.6)

substituindo a equação 5 em 6, tem-se que:

p = f1+ b2 (4.7)

O risco de hedge é a incerteza associada ab2, também conhecido como risco de base, umavez que f1 é conhecido no instante t1, mas b2, não.Hull (1996) destaca que, se b2 também fosse co-nhecido naquele instante, ter-se-ia um hedge per-feito.

Portanto, não existe operação perfeita, comrara coincidência, em função do risco de base.Nos casos de baixa rentabilidade de um ativo ouproblemas que acarretem enfraquecimento dabase, ou seja, caso a diferença entre o preço àvista e o preço futuro aumente, os preços à vistadeclinarão em função do alargamento da base.Por isso, quanto menor for o risco de base, maiorserá a utilidade dos contratos futuros como instru-mento e mecanismo de neutralização de riscos ede manutenção de resultados para os hedgers.

Risco de basePara se conhecer as bases para o mercado

da soja da região em análise e para as demais

praças que se pretende comparar, é necessáriose adotar o critério a seguir: como o valor da basea ser considerado é obtido pela diferença entre opreço spot e o preço futuro, tem-se que:

BtT = Pst - FtT

em que: BtT = valor da base no período t para omês de vencimento T;

Pst = preço no mercado físico para o mês t;

FtT = preço do contrato em t, para o venci-mento T.

A avaliação dos valores de base, conside-rando os vencimentos para maio e agosto dos anosde 2000 a 2005, levou em conta, para efeito decálculo, a média mensal dos preços spot em rela-ção à média mensal dos preços futuros e respec-tivo vencimento.

O risco de base foi calculado tomando-se odesvio-padrão das bases encontradas, de acordocom a expressão seguinte:

Em que:

RB = Valor do risco de base;

MB = Valor da base - média para cada lo-calidade;

BtT = Valor da base -média no período tpara o mês de vencimento T;

n = número de bases consideradas nas re-giões ou localidades em análise.

De acordo com Silveira (2002), num perío-do bem próximo da data da primeira chamadapara/ou do início do período para os fechamen-tos/encerramento dos contratos, 5 dias, indepen-dentemente de tratar-se de contango oubackwardation, os preços à vista e futuros nor-malmente convergem para uma base histórica.Nesse contexto, baseando-se na hipótese de queos preços à vista e futuros tendem a encontrarem-se no período que antecede o encerramento ou o

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 92

vencimento do contrato, aumentando sua relação,as variações de base seriam explicadas exclusi-vamente pelo risco de base. Mantidas as devidasproporções, buscou-se na diferença das médiasmensais do período o risco médio da base ou orisco de base médio mensal.

A informação sobre o comportamento dabase no período de vencimento dos contratos éde grande interesse para o mercado e para os seususuários em virtude do impacto que se pode atri-buir às transações, inclusive nos contratos de ex-portação de commodities, como é o caso da soja.Numa outra linha, se os operadores ou agentespossuem conhecimento dos valores históricos debase para as regiões e localidades (base geográ-fica), pode-se, em função das cotações no mer-cado futuro, estimar os preços a serem observa-dos no mercado físico, mantidas as condições dequalidade do produto. É exatamente nessa pers-pectiva que as tradings, integradoras e firmas decomercialização de insumos utilizam as cotaçõesde mercado futuro como referencial para o mer-cado físico.

Análise sobre os riscos de basePara efeito de cálculo, os contratos obser-

vados na Bolsa de Chicago foram aquelesvencíveis em maio e agosto durante o período emanálise, janeiro de 2000 a dezembro de 2005. Deacordo com a literatura, a base possui uma fun-ção fundamental para o processo decisório noâmbito dos operadores de mercado ou dos agen-tes, produtores e indústria, que necessitamconhecê-la bem para evitar tropeços em suasposições.

Nesse contexto, a análise do comportamen-to da base para diferentes contratos tem impor-tante significação para os agentes, produtores eindústria, quando da assunção de posições short(vendida) ou long (comprada) nas operações dehedge, respectivamente.

Na verdade, uma vez que os agentes te-nham conhecimento da base em suas localida-des no momento de entrar no mercado, ou fazer

uma operação na bolsa de futuro na aquisição deum contrato, portanto, início da operação shortou long, a estimativa da base para o momento deencerramento do contrato proporciona maior se-gurança e efetividade nessas operações de hedge,seja para a firma de produção agrícola, seja paraa indústria.

De acordo com a literatura, buscou-se cal-cular o risco de base em função da média dasbases encontradas das diferenças dos 4 meses queantecederam o mês de vencimento de cada con-trato, para os contratos vencíveis em maio. Nocaso dos contratos vencíveis em agosto, conside-rou-se o período de 7 meses que antecederam omês de vencimento de cada contrato, respecti-vamente.

Na Tabela 2, pode-se observar os valoresdas médias para os contratos futuros de soja comvencimento em maio na CBOT, de acordo comas localidades do centro-norte de Illinois, EUA,Paranaguá, PR, Lucas do Rio Verde e Sinop, MT,considerando o período entre 2000 e 2005. O valorda base média do período em análise, de acordocom cada localidade, foi negativo. Isso significaque, em média, os preços praticados nessas loca-lidades são menores do que aqueles cotados naCBOT (tomando-se a CBOT como referência, po-deria-se considerar a BM&F, porém a bolsa brasi-leira não consegue desenvolver o mercado dasoja).

Na Tabela 3, observa-se uma situação se-melhante sob o ponto de vista de se calcular amédia geral das bases, porém com horizontes tem-porais diferentes, 7 meses antes do vencimentodo contrato futuro de agosto.

Isso ocorre em função da formação do pre-ço futuro, conforme os exemplos baseados emWilliams (1986) apresentados nas Fig. 3 e 4 a par-tir da localidade de Sinop.

As Fig. 3 e 4 exibem dois exemplos de basepara a formação do preço no período de 2004 e2005; os componentes por trás das bases são es-truturas hipotéticas de preços para a soja a serentregue em Sinop comparado à entrega futurade soja em Paranaguá.5

5 O exemplo original de J. Williams propôs uma trajetória de Teoria para Chicago em A função econômica dos mercados futuros. 1986.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200693

Tabela 2. Valores da base média com vencimentoem maio.

Fonte: Resultado de pesquisa.

-0,37-0,41-0,43-0,89-0,41-0,07-0,120,04

-0,010,02

-0,06-0,04-0,24-0,18-0,10-0,17-0,060,02

-0,14-0,42-1,98-0,54-1,09-0,84-0,241,030,510,67

-0,06-0,02-0,22

0,54

Illinois

0,47-0,04-0,89-1,40-1,32-0,03-0,81-1,48-1,17-1,460,95

-0,09-0,76-0,68-0,35-0,98-0,38-0,46-0,22-1,25-2,07-3,28-3,96-3,95-4,631,810,462,160,930,18

-0,82

1,58

Paranaguá

2000–20012000–20022000–20032000–20042000–20052001–20012001–20022001–20032001–20042001–20052002–20012002–20022002–20032002–20042002–20052003–20012003–20022003–20032003–20042003–20052004–20012004–20022004–20032004–20042004–20052005–20012005–20022005–20032005–20042005–2005Base médiaRisco debase (σ)

PeríodoBase média – Maio

-1,96-2,65-3,56-4,08-3,95-2,15-3,19-3,66-3,29-3,40-1,03-2,48-3,18-2,82-2,19-1,91-3,04-3,23-2,88-3,69-4,92-6,86-7,50-6,75-7,11-1,60-3,46-2,14-3,45-4,03-3,54

1,63

Sinop

Grãos US$/sc 60kg

Tabela 3. Valores da base média com vencimentoem agosto.

Fonte: Resultado de pesquisa.

-0,37-0,41-0,43-0,89-0,41-0,240,08-0,11-0,07-0,120,04

-0,010,02

-0,10-0,37-0,08-0,06-0,04-0,24-0,18-0,10-0,12-0,400,14

-0,17-0,060,02

-0,14-0,42-0,120,220,00

-1,98-0,54-1,09-0,84-0,240,611,470,781,030,510,67

-0,06-0,02-0,51-0,340,14

-0,12

0,53

Illinois

0,47-0,04-0,89-1,40-1,32-0,79-0,07-0,09-0,03-0,81-1,48-1,17-1,46-0,45-0,330,090,95

-0,09-0,76-0,68-0,35-0,72-2,79-0,20-0,98-0,38-0,46-0,22-1,25-0,70-0,580,03

-2,07-3,28-3,96-3,95-4,63-4,51-3,400,091,810,462,160,930,180,04

-0,361,06

-0,80

1,50

Paranaguá

2000–20012000–20022000–20032000–20042000–20052000–20062000–20072000–20082001–20012001–20022001–20032001–20042001–20052001–20062001–20072001–20082002–20012002–20022002–20032002–20042002–20052002–20062002–20072002–20082003–20012003–20022003–20032003–20042003–20052003–20062003–20072003–20082004–20012004–20022004–20032004–20042004–20052004–20062004–20072004–20082005–20012005–20022005–20032005–20042005–20052005–20062005–20072005–2008Base médiaRisco debase (σ)

PeríodoBase média – Agosto

-1,96-2,65-3,56-4,08-3,95-3,44-2,71-2,66-2,15-3,19-3,66-3,29-3,40-2,49-2,35-1,89-1,03-2,48-3,18-2,82-2,19-2,56-4,45-2,11-1,91-3,04-3,23-2,88-3,69-3,13-2,85-2,33-4,92-6,86-7,50-6,75-7,11-6,66-5,68-2,71-1,60-3,46-2,14-3,45-4,03-4,33-4,72-0,55-3,41

1,56

Sinop

Grãos US$/sc 60kg

O custo de uso é a favor do proprietário dasoja em Sinop. Por conseguinte, a soja de Sinopestá abaixo do preço de Paranaguá.

Na verdade, o que está implícito é a dife-rença que se aplica em função dos gastos incorri-dos com armazenagem, transporte, custo de usodo dinheiro e impostos que são necessários parao deslocamento da soja do local de origem até oporto de Paranaguá (considerando-se como pra-ça de entrega para a soja sul-americana nego-ciada na CBOT), em caso de eventual liquidação docontrato diante de entrega física da mercadoria.

-1,86-2,55-3,46-3,98-3,85-2,05-3,09-3,56-3,19-3,30-0,93-2,38-3,08-2,72-2,09-1,81-2,94-3,13-2,78-3,59-4,82-6,76-7,40-6,65-7,01-1,50-3,36-2,04-3,35-3,93-3,44

1,63

Lucas

-1,86-2,55-3,46-3,98-3,85-3,34-2,61-2,56-2,05-3,09-3,56-3,19-3,30-2,39-2,25-1,79-0,93-2,38-3,08-2,72-2,09-2,46-4,35-2,01-1,81-2,94-3,13-2,78-3,59-3,03-2,75-2,23-4,82-6,76-7,40-6,65-7,01-6,56-5,58-2,61-1,50-3,36-2,04-3,35-3,93-4,23-4,62-0,45-3,31

1,56

Lucas

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 94

Fig.3. Base para a soja em Sinop – R$/sc 60 kg (spot janeiro–futuro maio de 2004).Adaptado do exemplo dado por J. Williams em A Função Econômica dos Mercados Futuros.

Fig. 4. Base para a soja em Sinop – R$/sc 60 kg (spot janeiro –futuro maio de 2004).Adaptado do exemplo dado por J. Williams em A Função Econômica dos Mercados Futuros.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200695

Dessa forma, a base média para cada con-trato no período analisado foi obtida tomando-sea média total do período, conforme apresentadona Tabela 4, no período de 2000 a 2005. No en-tanto, essa média não reflete as características eespecificidades dos contratos vencíveis em maioe agosto, mas serve para que se tenha umreferencial do papel da base em relação à forma-ção dos preços futuros de acordo com Hull (1996),Leuthold et al. (1989) e Williams (1986).

Já na Tabela 5 os cálculos foram procedi-dos tomando-se a média mensal das últimas qua-tro bases de cotações no mercado físico (spot) efuturos imediatamente anteriores à data de ven-cimento do contrato, uma vez que esse procedi-mento encerra o pressuposto de convergênciaentre preços spot e futuros, admitindo-se, portan-to, que a base convirja para o seu valor histórico,de acordo com cada localidade em função dos

custos de transporte da soja, do custo de uso dodinheiro e das taxas de processamento (entrada esaída do armazém) caso fosse necessária a liqui-dação física do contrato.

Processo semelhante ocorre na Tabela 6 emque os cálculos foram procedidos tomando-se amédia mensal das últimas sete bases de cotaçõesno mercado físico (spot) e futuros imediatamenteanteriores à data de vencimento do contrato, vis-to que esse procedimento encerra o pressupostode convergência entre preços spot e preços futu-ros. Como no procedimento anterior, admite-se,portanto, que a base convirja para o seu valor his-tórico, de acordo com cada localidade em fun-ção dos custos de transporte da soja, do custo deuso do dinheiro e das taxas de processamento (en-trada e saída do armazém) caso fosse necessáriaa liquidação física do contrato.

Tabela 6. Participação do risco de base nos preços spot – Contratos Futuros (CF) agosto no período 2000a 2005.

Fonte: Resultado de pesquisa.

12,790,53

4,14 %

Preços spot no período de maturidade – Agosto

12,111,50

12,38 %

Paranaguá

Preço médio no mercado físico (US$ 60 kg) (a)Risco de base (b)Risco em relação ao preço médio (%) b/a

Características

9,591,56

16,29 %

LucasIllinois

9,491,56

16,46 %

Sinop

Tabela 5. Participação do risco de base nos preços spot – Contratos Futuros (CF) maio no período 2000 a2005.

Fonte: Resultado de pesquisa.

12,670,54

4,23 %

Preços spot no período de maturidade – Maio

12,071,58

13,11 %

Paranaguá

Preço médio no mercado físico (US$ 60 kg) (a)Risco de base (b)Risco em relação ao preço médio (%) b/a

Características

9,451,63

17,24 %

LucasIllinois

9,351,63

17,43 %

Sinop

Tabela 4. Participação do risco de base nos preços spot no período 2000 a 2005.

Fonte: Resultado de pesquisa.

12,520,56

4,46 %

Preços spot no período 2000 a 2005

12,371,50

12,16 %

Paranaguá

Preço médio no mercado físico (US$ 60 kg) (a)Risco de base (b)Risco em relação ao preço médio (%) b/a

Características

9,961,65

16,59 %

LucasIllinois

9,861,65

16,76 %

Sinop

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 96

ConclusõesAs técnicas desenvolvidas pela teoria do

portfólio, quando aplicadas às commodities, e,principalmente, em razão da abordagem de HarryMarkowitz (1952) na seleção e combinação deinvestimentos de ativos, possuem grande depen-dência do nível de aversão a risco, levando-seem conta o comportamento da base.

Como o objetivo deste trabalho era o dedemonstrar os problemas vividos pelas firmas deprodução agrícola da região em análise, buscou-se, a partir das informações secundárias, estabe-lecer um parâmetro de comparação. Dessa for-ma, acrescentou-se as informações referentes àregião centro-norte de Illinois, nos EUA, e ao Por-to de Paranaguá, PR, que, a partir de março de2005, passou a ser local de entrega dos contratosde futuro da CBOT da Soja S.A.

Portanto, neste trabalho, procurou-se co-nhecer o risco de base geral, levando em consi-deração os contratos vencíveis em maio e agos-to, considerando as seguintes situações: geral, pormeio da série de preços total e por meio de con-tratos vencíveis em maio e agosto. Fez-se o cál-culo da correlação entre os preços spot e os pre-ços futuros, tomando-se as relações de 4 e 6 me-ses de antecedência ao preço futuro.

O risco de base considerando a série depreços geral em análise foi de 4,46 % para o cen-tro-norte de Illinois; 12,16 % para Paranaguá;16,59 %, em Lucas do Rio Verde, MT, e 16,79 %,para Sinop, MT. Apesar do cálculo ter considera-do diferentes períodos em relação aos vencimen-tos de contratos futuros em maio e agosto, Lucase Sinop alcançaram o maior risco de base quan-do considerado o período de comercialização atémaio, tomando como referência os contratos fu-turos da CBOT para maio, 17,24 % e 17,43 %,respectivamente. Os riscos de base diminuíramquase 1 % em relação aos contratos de agosto.

Finalizando, o risco de base a que estãosubmetidos os produtores e as firmas de produçãode soja nas localidades de Sinop e Lucas do RioVerde revela-se muito acima da média obtida noperíodo para a região centro-norte de Illinois,aproximadamente, 13 %, e acima de 5 % em re-lação a Paranaguá. Isso significa que os produto-

res e as firmas de produção de soja da região sãomuito mais vulneráveis à variabilidade no com-portamento dos preços. Em outras palavras, pos-suem elevado risco de base e, caso não estejamgerenciando seus riscos, com certeza, estarãoproduzindo com a tecnologia atual, porémcomercializando com a tecnologia do início doséculo passado.

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Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 98

Tipificação dosestabelecimentosrurais de produtoresassentadosAnálise de conglomerados

Daniela de Paula Rocha1

Geraldo da Silva e Souza2

Mauro de Rezende Lopes3

Ignez Vidigal Lopes4

IntroduçãoO presente artigo tem por objetivo identifi-

car os fatores que influenciam a sustentabilidade/estabilidade econômica dos estabelecimentos fa-miliares paradigmáticos dos assentamentos. Paratanto, tipificar-se-á, por meio da análise de con-glomerados, os padrões de estabelecimentos ru-rais de produtores assentados, com base em umgrupo de produtores rurais que possuem estabe-lecimentos do mesmo porte extraídos de umasubamostra de estabelecimentos da agriculturabrasileira. A partir do conhecimento dos fatoresque viabilizam a sustentabilidade dos produtores,pode-se dispor de elementos para sugerir políti-cas para os assentamentos capazes de garantir apermanência das famílias nos projetos.

A questão da sustentabilidade é primordial,uma vez que o número de assentamentos ruraisvem crescendo nos últimos anos, intensificando-se mais pronunciadamente a partir da década de1980. Segundo os levantamentos do Instituto Na-cional de Colonização e Reforma Agrária (Incra),contam-se mais de 2 mil assentamentos sob a res-ponsabilidade do governo federal, além de umnúmero também considerável sob responsabili-

1 Pesquisadora do Centro de Estudos Agrícolas (CEA), da Fundação Getúlio Vargas (FGV).2 Pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).3 Pesquisador do Centro de Estudos Agrícolas (CEA), da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e professor da FGV.4 Chefe do Centro de Estudos Agrícolas (CEA), da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

dade dos governos estaduais. Os fatores que cau-sam esse aumento são as tensões sociais, a pres-são dos movimentos sociais, as tensões da açãosindical ou mesmo, em alguns casos, as pressõesresultantes de iniciativas de autoridades locais.

A implantação de um número cada vezmaior de assentamentos faz da viabilização eco-nômica desses a principal prioridade para o êxi-to da reforma agrária e a concretização de seusobjetivos. Dos projetos de assentamento implan-tados, alguns atingiram um bom desenvolvimen-to, garantindo para as famílias assentadas a gera-ção de empregos e a produção de alimentos paraa subsistência e a obtenção de renda monetária.Não obstante, existem outros assentamentos quenão conseguiram garantir tais condições ou asviabilizaram apenas em parte.

De acordo com essa perspectiva, esse arti-go definirá critérios que caracterizem o estabele-cimento típico do futuro assentamento, cujas ati-vidades sejam sustentáveis do ponto de vista eco-nômico, auxiliando desse modo a formulação depolíticas que contornem o problema do relativoinsucesso dos projetos e do abandono do lote,migrando a família ou parte dela para os centros

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 200699

urbanos. Essa caracterização também auxiliarána execução de um plano de emancipação dosprojetos de assentamento rural, de acordo com oque determina a regulamentação do Incra, a par-tir da Resolução nº 170/92.

No artigo, são abordadas as condições deinfra-estrutura socioeconômica dos produtores,uso da mão-de-obra familiar, tecnologias utiliza-das nas explorações, treinamento necessário parao exercício da atividade agrícola, propensão amigrar dos produtores, perfil da participação dosprodutores no mercado, acesso ao crédito, aces-so às políticas públicas, participação em formasde organização e associações produtivas.

Definição da subamostraPara definir a amostra do público-alvo que

serve de base para tipificar os agricultores dosassentamentos, tomou-se uma subamostra dosestabelecimentos da amostra da Pesquisa sobre operfil da agricultura brasileira5 realizada pela Fun-dação Getúlio Vargas (1998), que abrange umamplo levantamento de campo, com a aplicaçãode questionários em 1.8066 estabelecimentos ru-rais. O objetivo dessa pesquisa foi o de traçar umperfil atualizado da agricultura brasileira, por meiodos dados qualitativos e quantitativos levantadosno questionário. A pesquisa de campo abrangeunove regiões representativas de sistemas de pro-dução distintos7, localizadas nos estados de RioGrande do Sul, Santa Catarina, Paraná, EspíritoSanto, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais,Goiás, Mato Grosso, Pernambuco e Ceará.

Subamostra para estudodos assentamentos

A subamostra utilizada neste estudo é com-posta por produtores com área equivalente à dosprojetos de assentamentos. Para definir a

subamostra, tomou-se como parâmetro a áreamédia e o desvio-padrão da área dos projetos deassentamentos, de responsabilidade do Incra, dosestados em que foi realizada a Pesquisa sobre operfil. Em cada região foram considerados ape-nas os estabelecimentos com tamanho de áreamenor ou igual à área média mais um desvio-pa-drão dos assentamentos rurais. A área limite (mé-dia + desvio) dos assentamentos rurais, o total daamostra do perfil8 para cada região da pesquisa ea subamostra estão demonstrados na Tabela 1.

A subamostra é, portanto, formada por 726estabelecimentos que representam 40,20 % daamostra pesquisada em 1998 pela FGV.

Esses estabelecimentos servirão comoparadigmas, auxiliando a avaliação da sustentabi-lidade dos produtores assentados em projetos decolonização e reforma agrária.

Tipificação dosestabelecimentos rurais

Com base na subamostra, procurou-setipificar os paradigmas dos estabelecimentos ru-rais por meio da análise estatística multivariada.De um modo geral, as técnicas de análise estatís-tica multivariada são instrumentos que têm porobjetivo a análise estatística de variáveis (aleató-rias) multidimensionais medidas num conjunto deindivíduos. Nesse contexto, foram usadas as téc-nicas conhecidas como análise de conglomera-dos e análise discriminante. A primeira tem porobjetivo identificar a existência de padrões entreindivíduos que permitam classificá-los em gruposhomogêneos segundo variáveis pré-selecionadase foi utilizada para tipificar os produtores. A se-gunda tem por objetivo classificar um indivíduoem um de um número finito de grupos previamentedefinidos, segundo os valores de um conjunto tam-bém finito de variáveis discriminantes. Essa téc-nica foi utilizada com o intuito de validar o pro-

5 Contém informações sobre a tipologia dos produtores rurais de regiões representativas dos principais sistemas de produção praticados na agricultura brasileira(ALVES, 1998b, 1998d; ALVES et al., 1999).

6 Os questionários da pesquisa estão armazenados em um programa chamado Perfil, elaborado por um programador, e são acessados por meio do softwareParadox.

7 E a concentração populacional.8 O Centro-Oeste não foi considerado na subamostra, por apresentar apenas cinco estabelecimentos com área equivalente à dos projetos de assentamentos.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 100

cesso de tipificação executado por meio da aná-lise de conglomerados.

Na análise de conglomerados, utilizou-seo Método de Ward aplicado às ordenações oupostos (ranks) das variáveis. O procedimento énão-paramétrico e é robusto relativamente à pre-sença de atipicidades (outliers) nos dados(CONOVER, 1998). A validação do processo deagrupamento foi levada a efeito com o uso daanálise discriminante também aplicada aos ranksdas variáveis utilizadas na análise. Deve-se ob-servar que o processo de classificação estudadona análise discriminante foi submetido a valida-ção cruzada (cross validation), como sugerido emEverit e Der (1996).

A metodologia contorna os problemas declassificação decorrentes da presença de indiví-duos atípicos que é comum nos tipos de variá-veis utilizadas, não havendo, portanto, a necessi-dade de eliminação desses indivíduos. Por essarazão, a nossa opção foi de utilização de ranks,em vez de métodos paramétricos.

Processo adotado paraa definição dos grupos

Para a tipificação, as variáveis discrimi-nantes foram definidas, em sua maioria, a partir

de critérios que medem a eficiência e a tecno-logia dos estabelecimentos e que estão relacio-nadas com sua estabilidade/sustentabilidade. Porpressuposto, no novo cenário de abertura e de li-berdade de comércio, vão permanecer na ativi-dade os produtores capazes de competir no mer-cado.

A eficiência foi medida por dois indicado-res de desempenho dos estabelecimentos: peloíndice output/input9 e pela renda líquida de longoprazo. A relação output/input indica qual o valorda produção obtido por unidade do gasto total doestabelecimento. Os dados da pesquisa indicamuma grande variedade de desempenho entre osprodutores da amostra.

A renda líquida de longo prazo é outra me-dida de eficiência. Ela mede a renda líquida obti-da após a dedução de todos os gastos, inclusivecom depreciação de máquinas e equipamentos,benfeitorias e terra. A tipificação dos produtoresdeve mostrar o perfil do grupo que possui melhore pior resultado em relação a esse indicador deeficiência. Os grupos com baixo desempenho emrelação à renda possuem pouca possibilidade desobreviver em um meio competitivo (ALVES, 2000).

Tabela 1. Definição da subamostra.

Obs.:Região 1.2 - Agricultura do tipo colonial (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná).Região 1.3 - Monocultura (São Paulo).Região 1.4 - Norte e oeste do Paraná.Região 1.5 - Sul do Paraná.Região 2.1CE - Região Nordeste (Semi-Árido).Região 2.1PE - Região Nordeste (pobreza rural).Região 2.2 - Agricultura do tipo tradicional (Rio de Janeiro e Espírito Santo).Região 2.3 - Agricultura do tipo tradicional (Minas Gerais).

28,9534,5230,4030,4045,9526,0315,7564,48

1.21.31.41.52.1 (CE)2.1 (PE)2.22.3Total

RegiõesÁrea dos

assentamentos(média + desvio)

21,5523,5722,6022,6034,5615,8410,8540,94

Áreamédia dos

assentamentos

16,5817,7019,0117,8326,2410,3410,6530,55

Áreamédia da

subamostra

394142218163254224183130

1.708

Amostrado perfil

23447815577

1342276

726

Subamostra

9 Indica qual o valor da produção obtido por unidade de gastos totais do estabelecimento (ALVES, 1998b).

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006101

A tecnologia do estabelecimento tambémé um critério importante de classificação dos pro-dutores, na hipótese de que vão permanecer naagricultura os produtores mais competitivos. Atecnologia poupa-terra representa os gastos comsementes, adubos e fertilizantes químicos. Seuefeito é aumentar a produção por unidade de área.A tecnologia poupa-trabalho representa os gastoscom máquinas e equipamentos. Seu efeito é asubstituição do trabalhador. Tem pouco efeito iso-ladamente sobre a produção (ALVES, 1997a,1997b).

Diversos índices/medidas de tecnologiapoupa-terra e poupa-trabalho foram utilizadoscomo variáveis discriminantes: índice detecnologia poupa-terra em relação aos gastos to-tais com insumos modernos (poupa-terra + pou-pa-trabalho + administração); índice de tecnologiapoupa-trabalho em relação aos gastos totais cominsumos modernos; produto/trabalhador (produti-vidade do trabalho), produto/área (produtividadeda terra); área/trabalhador. O índice de tecnologiatotal, que mede os gastos com todos os tipos detecnologia em relação aos dispêndios totais doestabelecimento, também foi usado na determi-nação dos grupos (ALVES, 1998b, 1999).

Além das relações descritas, outros indica-dores serviram como variáveis discriminantes:capital/trabalho, capital/área, capital/produto, ren-da líquida da família e as outras fontes de renda.Os três primeiros podem ser utilizados para com-parar a ociosidade do capital entre os grupos.

A renda líquida da família e as outras fontesde renda são de extrema relevância para o grupode produtores estudado. As outras fontes de rendasão recursos que auxiliam, muitas vezes, o pro-dutor na compra de insumos indispensáveis à pro-dução. Não seria, portanto, conveniente retirá-los da análise.

Resultados da tipificação

Aplicando-se a técnica de análise de con-glomerados, constatou-se a existência potencialde três grupos. Isso é percebido por meio da aná-lise dos valores (Tabela 2) das estatísticas SPRSQ,

RSQ, ERSQ, CCC (Cubic Clustering Criterion),Pseudo-F (PSF) e Pseudo-T (PST). Essas estatísti-cas estão descritas em detalhes no manual do SASv9.1.3 e CCC e RSQ também podem ser vistasem Everitt e Der (1996). O comportamento dosvalores das variáveis citadas na vizinhança deNCL (número de conglomerados) = 3 sugere umatipificação com três grupos, notadamente CCC.Esses resultados foram validados pela análisediscriminante, que não revelou erros de classifi-cação mesmo quando os indivíduos foram sub-metidos ao processo de validação cruzada(EVERITT; DERR, 1996).

Tabela 2. Estatísticas da análise de conglomerados.

Fonte: Pesquisa do Perfil da Agricultura. Centro de Estudos Agrícolas.IBRE/FGV.

0,01780,01780,02990,03600,03780,04100,05500,10900,1939

987654321

NCL SPRSQ

0,5600,5440,5240,5010,4710,4310,3760,2420,000

ERSQ

0,5200,5020,4730,4370,3990,3580,3030,1940,000

RSQ

-7,3-7,6-9,5

-12,0-12,0-11,0-9,5-6,40,0

CCC

95102105110117132154171

-

PSF

312940475551631117

PS

Em suma, os resultados obtidos fornecemelementos para afirmar que os paradigmas dosestabelecimentos podem ser tipificados em trêsgrupamentos, quando se utilizam como variáveisclassificatórias medidas/índices de eficiência etecnologia e demais variáveis descritas anterior-mente.

A análise das variáveis discriminantes utili-zadas na tipificação da tecnologia dominante e ogrupo que é considerado mais eficiente é levadaa efeito utilizando a mediana como medida re-presentativa. Se uma mediana for nula, dentro deum certo grupo, isso quer dizer que zero é típicodo grupo.

Analisam-se aqui os valores típicos das va-riáveis discriminantes diretamente envolvidas nadefinição dos grupos. Adiante, será analisado ocomportamento de outras variáveis relevantes,

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 102

cujos valores medianos e/ou percentuais foramcalculados para cada grupamento, como a rendabruta, área, acesso às políticas públicas, tipo deexploração mais freqüente, formas de financia-mento, nível de escolaridade, idade, infra-estruturasocioeconômica, distância do estabelecimento à sededo município mais próximo, além de outras.

Os valores das variáveis utilizadas para acaracterização dos grupos, especificamente asrelacionadas à eficiência, indicam que o grupo 1apresenta os melhores resultados para ambos osindicadores propostos: o índice output/input teveo maior valor da mediana (1,08) entre os trêsgrupamentos e a renda líquida de longo prazo foipositiva, com valor mediano igual a R$ 869,00. Ovalor da renda foi muito superior ao dos demaisgrupos, que tiveram renda líquida com valor me-diano negativo (Tabela 3).

Dos resultados obtidos, conclui-se que ogrupo 1 é o mais eficiente, quando comparado ao2 e 3, por apresentar a mediana da relação output/input maior que 1 e da renda líquida de longo pra-zo positiva. Esse agrupamento contém 25,5% dosestabelecimentos da subamostra, sendo o menosnumeroso.

Quanto ao tipo de tecnologia dominante,destaca-se no grupo 1 a tecnologia poupadora deterra. A tecnologia poupa-terra baseia-se no usode sementes, adubos, fertilizantes químicos queaumentam a produção por unidade de área. Osresultados são consistentes com esse tipo detecnologia, ficando evidenciado pelo valor medi-ano do indicador poupa-terra/insumos modernos(0,61) e pela produtividade da terra, que foi maiselevada nesse grupo, com o valor da medianaigual a R$ 715,00 por hectare explorado. Tam-bém espera-se que a tecnologia poupa-terra te-nha impacto maior sobre a produção, o que tam-bém se verifica no grupo 1, onde a mediana doíndice output/input foi maior que nos demais.

Com relação ao índice capital/produto, osresultados indicam que a ociosidade é menorno grupo 1 em relação aos demais grupos. Mes-mo assim, esse grupo poderia melhorar muitoseu desempenho se utilizasse mais insumos mo-dernos.

O grupo 3 apresenta o segundo melhor va-lor do índice input/output (0,70), mas possui o piorresultado para a renda líquida de longo prazo(- R$ 5.350,33), evidenciando-se, portanto, um qua-

Tabela 3. Variáveis discriminantes (subamostra).

Fonte: Pesquisa do Perfil da Agricultura. Centro de Estudos Agrícolas. IBRE/FGV.

Mediana1,08

869,97

0,330,610,30

715,6613,79

3,9057,110,02

3.104,32

8.047,411.440,00

182(25,53 %)

EficiênciaOutput/inputRende líquida de longo prazo

Tecnologia(Poupa-trabalho+pouca-terra+administração)/gastos totaisPoupa-terra/insumos modernos (poupa-terra+poupa-trabalho+administração)Poupa-trabalho/insumos modernos (poupa-terra+poupa-trabalho+administração)Índice produto/área (produtividade da terra)Índice produto/trabalhadorÍndice capital/produtoCapital/trabalhoÍndice área/trabalhoCapital/terra

Outras variáveisRenda líquida da famíliaValor total de outras fontesN

Descrição Grupo 1

Mediana0,70

-5.350,33

0,520,230,71

707,7019,32

7,50150,27

0,035.487,82

4,193,770,00222

(31,14 %)

Grupo 3

Mediana0,45

-2.878,80

0,160,500,27

188,083,919,48

34,180,02

2.066,67

4.607,331.940,00

309(43,34 %)

Grupo 2

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006103

dro inconclusivo para o critério de eficiência. Pelovalor do output/input, há indícios de que o grupo3 seja o segundo relativamente “mais eficiente”.Analisando-se os índices de tecnologia, haverámais elementos para uma definição melhor. Esseagrupamento contém 31,2 % dos estabelecimen-tos da amostra.

Com relação ao tipo de tecnologia domi-nante, temos no grupo 3 um perfil diferente dogrupo anterior, com predominância da tecnologiapoupa-trabalho. Esse tipo de tecnologia está as-sociado ao uso preponderante de tratores, máqui-nas e outros implementos que economizam emtrabalho. Os indicadores para o grupamento 3apresentam um resultado consistente com o es-perado: maiores medianas para o índice poupa-trabalho/insumos modernos (0,71) e para o índiceárea/trabalhador (0,03), e valor mais elevado paraa produtividade do trabalho, medida também pelamediana do índice produto/trabalhador (19,32). Oimpacto da tecnologia poupa-trabalho sobre oaumento da produção tende a ser pequeno, o queé consistente com o menor índice output/input(0,70) observado no grupo 3.

Com relação à ociosidade do capital, o gru-po 3 apresentou o maior índice capital/trabalho,quando confrontado aos outros dois agrupamen-tos. Isso quer dizer que o agrupamento é formadopor estabelecimentos em que há predominânciade capital, mas este não está sendo alocado demaneira eficaz, o que indica ociosidade de capi-tal. A renda gerada no estabelecimento é insufici-ente para cobrir a depreciação das máquinas eequipamentos, benfeitorias, terra e animais. O tra-balho também não está sendo utilizado de ma-neira eficiente, como visto anteriormente. Tam-bém o índice capital/terra indica que a ociosida-de é maior no grupo 3 em relação aos demais.

Com relação ao nível tecnológico total,deve ficar claro que o índice (poupa-terra + pou-pa-trabalho + administração)/gastos totais indicaque, para todos os grupamentos, o nível é relati-vamente baixo (0,16; 0,33 e 0,52).

Quanto à renda líquida da família e outrasfontes de renda, percebe-se que o grupo 1 apre-senta valores elevados para as duas variáveis. O

grupo 1 tem o maior valor da renda líquida dafamília.

Os resultados da tipificação revelam que ogrupo 2 se destaca pelo baixo desempenho emquase todas as variáveis. Este grupo apresenta opior resultado para o indicador de eficiência me-dido pelo critério output/input. Apresenta ainda umvalor negativo para a mediana da renda líquidade longo prazo, podendo ser considerado o piorgrupo em termos da medida de eficiência propos-ta. Com relação aos índices tecnológicos poupa-terra/insumos modernos e poupa-trabalho/insumosmodernos, perde para o grupamento 1 em termosdo índice poupa-terra, e para o grupo 3, em ter-mos do índice poupa-trabalho. A sobrevivênciadesse grupo se deve a outras fontes de renda (Ta-bela 5).

O grupo 2 é o que possui o maior valor doíndice capital/produto. Esse índice fornece indi-cação a respeito da eficiência na utilização docapital. Mais especificamente, mede a ociosida-de relativa do capital fixo. Constata-se que nesseagrupamento se recorre a um maior gasto de ca-pital para produzir R$ 1,00 de produto – há ne-cessidade, em valores médios, de R$ 16,08 decapital para produzir R$ 1,00 de produto. Emsuma, esse agrupamento é o menos eficiente nautilização do capital. Na verdade, em quase to-dos os outros índices – com exceção do índicecapital/trabalho – é o que apresenta pior desem-penho. Pode-se inferir que a sobrevivência dosestabelecimentos do grupo 2 é decorrente de ou-tras fontes de renda. Esse grupamento é o queapresenta o maior valor para essa variável(R$ 1.940,00).

Resumindo, os paradigmas de estabeleci-mentos são formados por três grupos de produto-res. Os resultados indicam uma tipologia bemconsistente para os grupos 1 e 3 no tocante à tecno-logia dominante. O grupo 1 incorpora tecnologiapoupadora de terra e apresenta resultados melho-res para os indicadores de eficiência. O grupo 3incorpora tecnologia poupadora de trabalho e temdesempenho muito inferior em eficiência, sobre-tudo no critério de renda líquida de longo prazo.

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 104

Neste grupo, incluem-se estabelecimentos quepossuem considerável capital, mas usado de for-ma ineficaz. O grupo 2 apresentou baixo uso re-lativo de tecnologia e se destacou entre os de-mais pelo baixo desempenho das variáveis querefletem a eficiência dos estabelecimentos. Tra-ta-se de um agrupamento de estabelecimentos queterá dificuldade de sobreviver na agricultura.

Caracterização adicional dos grupos

Nesta seção, faz-se uma breve descriçãodo comportamento de outras variáveis que aju-dam a caracterizar os grupos, como a renda bru-ta, área, acesso às políticas públicas, exploraçõesdominantes no estabelecimento, nível de escola-ridade, idade, infra-estrutura socioeconômica, dis-tância do estabelecimento à sede do municípiomais próximo, além de outras. Os valores media-nos e/ou percentuais dessas variáveis foram cal-culados para os estabelecimentos que compõemcada um dos tipos definidos pelas variáveisclassificatórias.

O grupo 1 aparece com valores elevadospara a mediana em algumas variáveis relevan-tes, o que ajuda a explicar o desempenho superi-or do grupo em termos de eficiência. Observa-seque há, em relação aos demais agrupamentos,uma parcela maior de estabelecimentos desen-volvendo atividades de alto valor (28,57 %) e umaparcela menor de atividades de baixo valor(40,66 %) (Tabela 4). Portanto, a composição dasatividades exploradas no estabelecimento foi umimportante fator para o melhor desempenho cons-tatado nesse grupo.

O grupo 1, com menor quantidade de capi-tal e gastos com insumos, quando comparado aogrupo 3, consegue ser mais eficiente. Na verda-de, o que ocorre é uma melhor combinação dosfatores produtivos. A receita líquida de curto pra-zo, que não considera como despesas os valoresimputados aos fatores fixos como terra,benfeitorias, máquinas, equipamentos e animais,foi mais elevada no grupo 1 (Tabela 5).

Quase 70 % dos estabelecimentos do gru-po 1 utilizam fertilizantes químicos, um indicador

Tabela 4. Caracterização dos conglomerados (subamostra).

(1) Com frutas, hortaliças, avicultura, suínos, café e cana-de-açúcar.Fonte: Pesquisa do Perfil da Agricultura. Centro de Estudos Agrícolas. IBRE/FGV.

46,8621,8611,557,74

64,84

28,5730,7740,66

93,9651,65

Características socieconômicasProporção de membros da família (%)

Com escolaridade entre 1 e 4 anosCom escolaridade entre 5 e 8 anosCom escolaridade acima de 9 anosNão alfabetizadosAcesso à educação pública

Exploração dominanteProporção dos estabelecimentos (%)

Com atividade de alto valor(1)

Com atividade de médio valorCom atividade de baixo valor

Outras características dos estabelecimentosProporção dos estabelecimentos (%)

Com responsáveis proprietáriosAssociado a cooperativa de produção (%)

Descrição

Grupo 1

42,7928,1214,65

2,3661,26

28,839,46

61,71

91,4470,72

Grupo 3

55,1812,61

6,4519,0962,78

11,9732,0455,99

90,6131,39

Grupo 2

Grupos de estabelecimentos(%)

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006105

Tabela 5. Caracterização dos conglomerados (subamostra).

Fonte: Pesquisa do Perfil da Agricultura. Centro de Estudos Agrícolas. IBRE/FGV.

9.550,00869,97

4.180,898.047,411.440,00

3,0048,5034,42

4,004,27

37,12

16,807,003,62

20.200,0013.000,001.550,003.677,50

808,001.541,07

458,34220,65

1.920,000,000,00

422,5044,0010,00

0,00109,50255,30

1.761,05

Geração de renda (R$)Receita bruta da produçãoRenda líquida do estabelecimento de longo prazoRenda líquida do estabelecimento de curto prazoRenda líquida da famíliaOutras rendas autoferidas (Total)

Características socieconômicasNúmero médio de pessoas da famíliaIdade do responsávelIdade média da família (anos)Escolaridade do responsável (anos)Escolaridade média dos membros da família acima de 14 anos (anos)Experiência do responsável na agricultura (anos)

Características dos estabelecimentosÁrea média (ha)

Do estabelecimentoEm culturas temporárias e permanentesEm pastagens naturais e cultivadas

Valor médio (R$)TerrasBenfeitoriasMáquinas e equipamentosAnimais

Amortização (R$)TerrasBenfeitoriasMáquinas e equipamentosAnimais

Gastos com mão-de-obra (R$)FamiliarFixaTemporária

Uso de insumos modernosValor médio dos gastos (R$)

FertilizantesHerbicidasInseticidasFungicidasMedicamentosRaçõesValor médio dos gastos totais com insumos (R$)

DescriçãoGrupo 1

(Mediana)

12.907,50-5.350,333,616,884,193,77

0,00

4,0050,0035,67

4,005,33

38,03

19,0010,25

2,46

42.250,0023.850,0014,585,00

3.320,00

1.690,001.904,324.956,58

199,20

2.400,000,000,00

850,00300,00

12,500,00

150,00100,00

2.370,00

Grupo 3(Mediana)

2.780,40-2.878,80

-269,004.607,331.940,00

3,0055,0040,75

2,002,50

43,46

15,004,004,80

10.875,008.000,00

370,001.837,50

414,001.395,77

23,60110,25

1.915,000,000,00

0,000,000,000,00

32,0090,00

300,00

Grupo 2(Mediana)

de nível tecnológico dos estabelecimentos, sen-do essa porcentagem menor que o nível de utili-zação observado no grupo 3, que foi de 87 % (Ta-bela 6). Os resultados analisados anteriormente

demonstram, entretanto, que a quantidade utili-zada deveria ser maior para aumentar a eficiên-cia dos estabelecimentos do grupo 3. O baixo ní-vel de utilização não decorre, portanto, do des-

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 106

conhecimento desses insumos, já que a propor-ção dos que utilizam insumos modernos é rela-tivamente elevada. O valor mediano dos gas-tos totais com insumos modernos foi deR$ 1.761,05 no grupo 1 e de R$ 2.370,00 nogrupo 3 (Tabela 5).

Uma das razões pode ser encontrada noacesso a crédito bancário, que foi muito baixo paratodos os agrupamentos. No grupo 1, apenas 21 %dos estabelecimentos tiveram acesso ao créditode custeio, porcentagem menor do que no grupo3 em que o acesso ao custeio bancário atinge33 % dos estabelecimentos. Os produtores lança-ram mão de recursos próprios para despesas cominsumos. Essa fonte de recursos foi utilizada por72 % dos estabelecimentos no grupo 1 e 66 % nogrupo 3, sendo a principal fonte de recursos decusteio dos estabelecimentos desses grupos (Ta-bela 6).

Com relação aos fatores sociais, a escolari-dade mediana do grupo 1 foi semelhante à do gru-po 3 (cerca de 50 % dos responsáveis pelos esta-belecimentos têm acima de 4 anos) e é pratica-mente igual ao número mediano de anos de es-colaridade observado na amostra da Pesquisa doPerfil da Agricultura Brasileira (4,4 anos), que en-globa estabelecimentos sem restrição de tama-nho. Não houve diferença entre os grupos em re-lação à mediana da idade média dos membrosda família.

O grupo 3 apresentou maior mediana, quan-do comparado aos outros dois agrupamentos, emvariáveis importantes, destacando-se a renda bru-ta, a área total e a área em culturas temporárias epermanentes dos estabelecimentos.

Outras formas de capital foram mais utili-zadas no grupo 3 em relação aos demais, espe-

Tabela 6. Caracterização dos conglomerados (subamostra).

Fonte: Pesquisa do Perfil da Agricultura. Centro de Estudos Agrícolas. IBRE/FGV.

69,7880,77

24,1821,43

1,105,492,20

71,98

11,5486,2650,0038,4670,8886,26

1,1019,23

9,34

Uso de insumos modernosProporção dos estabelecimentos (%)

Que usam fertilizantesQue usam medicamentos

Financiamento dos estabelecimentosProporção dos estabelecimentos (%)

Com crédito bancárioCom crédito de custeio bancárioCom crédito de comercializaçãoCom crédito de investimentoCom recursos de terceirosCom recursos próprios

Acesso às políticas públicasProporção dos estabelecimentos (%)

Que possuem telefoneQue possuem televisãoQue possuem fossa sépticaQue possuem automóvelQue possuem água encanadaQue possuem energia elétricaQue participam do ProagroQue recebem assistência técnica governamentalQue recebem informações de pesquisadores públicos

DescriçãoGrupo 1

(%)

87,3979,73

31,0832,88

0,0010,36

1,8066,22

20,7295,9570,7272,0793,6998,65

0,0021,1713,51

Grupo 3(%)

35,9270,55

6,804,850,000,970,65

82,85

4,2167,9629,7713,9244,3474,76

0,0013,59

3,24

Grupo 2(%)

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006107

cialmente terras, máquinas e benfeitorias. Desta-cou-se também nos gastos com insumos moder-nos e gastos com mão-de-obra familiar.

Apesar de o grupo 3 possuir característicasbastante favoráveis, especialmente vinculadas aocapital e utilização de insumos modernos, meta-de dos estabelecimentos desse grupo tem rendalíquida de longo prazo abaixo de - R$ 5.350,33(Tabela 5). Constata-se considerável imobilizaçãode capital em terra. As máquinas e equipamentose os insumos estão sendo alocados de maneiraineficiente.

Quanto à principal atividade, parcela con-siderável de estabelecimentos desenvolve ativi-dades de baixo valor (61,71 %), sendo maior quenos outros dois agrupamentos. Aproximadamen-te, 28,83 % exploram atividades de alto valor (Ta-bela 4).

Além disso, o grupo 3 destaca-se bastanteno acesso à infra-estrutura socioeconômica. Umaporcentagem bem maior de estabelecimentos emrelação aos demais grupos possui telefone, tele-visão, automóvel. Esses estabelecimentos são ser-vidos por fossa séptica, água encanada e energiaelétrica. Mais de 20 % nesse agrupamento rece-bem assistência técnica governamental, maiorpercentual entre os grupos (Tabela 6). É possívelque esse grupo de estabelecimentos tenha sidorelativamente mais afetado pela drástica restriçãoda disponibilidade de crédito de custeio para osetor, o que justifica seu baixo desempenho e ele-vada ociosidade.

Por último, o grupo 2 apresenta uma situa-ção menos satisfatória em termos de sustentabi-lidade econômica. O valor do capital empregadoem máquinas, equipamentos, benfeitorias e ani-mais é muito inferior ao dos demais agrupamen-tos (Tabela 5). O acesso ao crédito é restrito a pou-

cos, menos de 5 %, o que faz com que menos de36 % dos produtores utilizem fertilizantes (Tabela 6).O valor mediano para os gastos totais com insumosmodernos é de R$ 300,00, muito inferior ao obser-vado para os demais agrupamentos (Tabela 5). Aparcela de produtores que utiliza recursos própri-os chega a 83 %. Aproximadamente 50 % dosresponsáveis pelos estabelecimentos possuemmenos de 2 anos de escolaridade (Tabela 5). Issoleva a concluir que é muito difícil, ou mesmo im-possível, que esses produtores venham a adotarnovas tecnologias. O mais alarmante é que43,33 % dos estabelecimentos da subamostra es-tão inseridos nesse grupo. Ressalta-se também quecerca de 50 % dos estabelecimentos possuemrenda líquida de longo prazo abaixo de-R$ 2.878,90. Ou seja, pelo menos a metade dosestabelecimentos desse grupo está prestes a de-saparecer. É o único agrupamento com renda lí-quida de curto prazo negativa, ou seja, a receitaé insuficiente diante das despesas com insumos,mão-de-obra familiar e contratada, resultando umvalor mediano igual a -R$ 269,00 (Tabela 5). Oque sustenta esses produtores no curto prazo sãooutras fontes de renda, especialmente aposenta-dorias e trabalho fora, cujos valores médios sãoR$ 1.193,12 e R$ 1.655,29, respectivamente. Cer-ca de 45,63 % dos estabelecimentos indicaram orecebimento de aposentadorias e 34,95 %, de tra-balho fora (Tabela 7). A participação de outras fon-tes de renda na renda total (renda bruta + outrasrendas) está acima de 46,25 % para cerca de 50 %dos estabelecimentos desse grupo (Tabela 8).

Pode-se afirmar que o grupo 1 é formadopor agricultores avançados, o grupo 2, por atra-sados e o grupo 3, por produtores em transição,que tanto podem migrar para o grupo dos atrasa-dos, quanto para o dos avançados. Também hácomo opção o fechamento do estabelecimento.

Tabela 7. Caracterização dos conglomerados (subamostra).

Fonte: Pesquisa do Perfil da Agricultura. Centro de Estudos Agrícolas. IBRE/FGV.

30,2224,1859,34

AposentadoriaTrabalho foraOutras fontes de renda (total)

DescriçãoGrupo 1

(%)

27,4813,0649,55

Grupo 3(%)

45,6334,9582,52

Grupo 2(%)

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006 108

Considerações finaisA análise de conglomerados foi utilizada

para identificar o desempenho dos produtores depequeno porte, e caracterizar os tipos mais bem-sucedidos.

Foram identificados três grupos, com de-sempenhos distintos, cabendo as seguintes con-clusões:

a) Muitos estabelecimentos – concentradosnos grupos 2 e 3 – são inviáveis: renda líquida delongo prazo negativa. A tendência é o desapare-cimento no longo prazo (ALVES; LOPES, 1998).

b) Os estabelecimentos inviáveis não sãohomogêneos: os que pertencem ao grupo 3 usamtecnologia, sobretudo máquinas e equipamentos;os que pertencem ao grupo 2 não usamtecnologia.

c) As políticas para esses dois grupos sãobastante distintas: os estabelecimentos pertencen-tes ao grupo 3 podem melhorar se tiverem acessoa recursos para a compra de insumos para com-binar com o capital fixo. Para os estabelecimen-tos desse grupo, uma política de crédito éindicada.

d) Os estabelecimentos do grupo 2 nãousam tecnologia e sobrevivem graças a outrasfontes de renda, como aposentadoria, trabalhofora. Neste caso, as políticas aplicadas devemvisar ao aumento da demanda por trabalho tem-porário (menos encargos trabalhistas, formascontratuais não flexíveis como os consórcios deempregadores); e formação de consórcios e con-domínios que associem produtores. Essa última

proposta viabiliza a compra e utilização conjun-ta de insumos modernos e de máquinas e equipa-mentos.

ReferênciasALVES, E. Apuração de custo: orientação geral: pesquisa doperfil dos agricultores. Brasília, DF, 1998a. Mimeo.

ALVES, E. Linhas gerais da metodologia: pesquisa do perfildos agricultores. Brasília, DF, 1998b. Mimeo.

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ALVES, E. O problema e sua importância: pesquisa doperfil dos agricultores. Brasília, DF, 1998c. Mimeo.

ALVES, E. Pontos a considerar: pesquisa do perfil dosagricultores. Brasília, DF, 1997a. Mimeo.

ALVES, E. Relatório da Finep: observações: pesquisa doperfil dos agricultores. Brasília, DF, 1998d. Mimeo.

ALVES, E. Tecnologia e emprego: pesquisa do perfil dosagricultores. Brasília, DF, 1997b. Mimeo.

ALVES, E. Tópicos de administração rural. Brasília, DF,2000. Mimeo

ALVES, E.; LOPES, M. R. Tecnologia e emprego: pesquisado perfil dos agricultores. Brasília, DF, 1998. Mimeo.

ALVES, E.; LOPES, M.; CONTINI, E. O empobrecimento daagricultura brasileira. Revista de Política Agrícola, Brasília,DF, ano 8, n. 3, p. 5-19, jul./set.1999.

CONOVER, W. J. Practical nonparametric statistics. NewYork: Wiley, 1998.

EVERITT, B. S.; DER G. A handbook of statistical analysesusing SAS. New York: Chapman & Hall, 1996.

FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. O perfil da agriculturabrasileira: suas principais tendências e implicações para otreinamento dos pequenos proprietários e trabalhadoresrurais. Rio de Janeiro: Centro de Estudos Agrícolas, 1998.

Tabela 8. Caracterização dos conglomerados (subamostra).

Fonte: Pesquisa do Perfil da Agricultura. Centro de Estudos Agrícolas. IBRE/FGV.

7,02Geração de rendaProporção da renda auferida fora (%)

DescriçãoGrupo 1

(Mediana)

0,00

Grupo 3(Mediana)

46,25

Grupo 2(Mediana)

Ano XV – Nº 4 – Out./Nov./Dez. 2006109

Sistema Nacionalde Certificaçãode UnidadesArmazenadoras

Pedro Sergio Beskow1

Denise Deckers do Amaral2

Aroldo Antonio de Oliveira Neto3

Resumo: O Sistema Nacional de Certificação de Unidades Armazenadoras exige regras e procedi-mentos de gestão para qualificação e habilitação de armazéns, visando à guarda e conservação deprodutos agropecuários. A certificação é obrigatória para as pessoas jurídicas que prestam serviçosremunerados de armazenagem de produtos a terceiros. Poderá haver a ampliação da exigência paraoutras unidades armazenadoras e não há restrição para a participação voluntária por parte de unida-des armazenadoras. A certificação traz vantagens importantes para o sistema de armazenamento,pois promove melhorias na imagem das unidades armazenadoras, nas suas relações comerciais, naqualificação dos seus serviços, na sua avaliação comercial, na viabilização dos mercados, na avalia-ção dos procedimentos pelos usuários e na sustentabilidade do negócio. Esse Sistema está baseado emtrês pilares: 1) os requisitos técnicos operacionais; 2) a capacitação da mão-de-obra que trabalha nosarmazéns e, 3) a documentação que comprova o manejo adotado pelo armazenador. Para a implanta-ção do sistema foi necessário definir os requisitos técnicos e o regulamento de avaliação da conformi-dade das unidades armazenadoras. A implementação ocorrerá no médio e longo prazo e exigiráesforço e determinação dos grupos de interesse para o crescimento e a modernização do sistema dearmazenamento.

Palavras-chave: armazenamento, certificação, requisitos, conformidade.

1 Pedro Sergio Beskow é diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e coordenador do Grupo de Trabalho responsável pela elaboração dosRequisitos Técnicos Recomendados ou Obrigatórios para a Certificação de Unidades Armazenadoras em Ambiente Natural e do Regulamento de Avaliaçãoda Conformidade das Unidades Armazenadoras - Portaria Interministerial do Mapa e MDIC nº 40, de 5/3/2004 (publicada no DOU de 8/3/04 seção 2),[email protected] ou [email protected]

2 Denise Deckers do Amaral é superintendente de Armazenagem e Movimentação de Estoques da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab),[email protected]

3 Aroldo Antonio de Oliveira Neto é técnico da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), [email protected]

IntroduçãoO sistema de armazenagem, no momento

atual, se destaca como um dos principais elosentre a produção e o consumo e deve ser obser-vado, principalmente, sob o aspecto econômico,tecnológico, logístico, social, político e ambiental.

O armazenamento, sob o enfoque econô-mico, apresenta uma contribuição relevante uma

vez que as decisões relativas ao processo de ar-mazenar provocam alterações no equilíbrio domercado e, conseqüentemente, no bem-estar deconsumidores e produtores, tanto no período deformação de estoques quanto naquele relativo àliberação do mesmo para as questões relativasao abastecimento (FERRARI, 2006).

Sob o aspecto tecnológico, o armazena-mento é uma atividade essencial para a manu-

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tenção e conservação da qualidade dos produ-tos agrícolas. É também atividade fundamentalpara as etapas de transporte e comercialização,pois a localização das unidades armazenadoras(próximas à produção, mercados consumidores,portos e agroindústrias) possibilita a racionaliza-ção do custo de transporte, a alocação estratégi-ca de estoques e facilita o comércio inter-regio-nal (FERRARI, 2006). A função social do armaze-namento é clara a partir do momento em que oresultado do processo é para o benefício da cole-tividade. Politicamente, o armazenamento é es-sencial para o atendimento dos interesses coleti-vos e oferece as condições para a implementa-ção de políticas públicas.

Do ponto de vista ambiental, a operacio-nalização de uma unidade armazenadora podegerar impactos negativos – emissão de materialpoluente, produção de ruídos, concentração deanimais e insetos que prejudicam a populaçãolocal, riscos de explosão etc., – e impactos positi-vos – geração de emprego, agregação de valorao produto, redução de perdas, ampliação de ar-recadação de tributos etc. (SILVA, 2007).

Pela sua importância no contexto da agro-pecuária, a gestão do sistema de armazenagemtem que buscar a uniformização de procedimen-tos, que devem ser avaliados constantemente nointuito de se ter a sua modernização técnica eoperacional. Além disso, as suas atividades de-vem ser transparentes e regulamentadas, de for-ma que todo esse esforço se traduza no fortaleci-mento de sua credibilidade e no atendimento dosinteresses coletivos.

Com esse espírito, foi instituída a Lei nº9.973, de 10 de maio de 2000, regulamentada peloDecreto nº 3.855, de 3 de julho de 2001. Dentreas várias e importantes inovações introduzidas nalegislação, destaca-se a criação do Sistema Na-cional de Certificação de Unidades Armazena-doras, que será o enfoque deste artigo.

Nesse texto, os autores pretendem contri-buir com a divulgação desse Sistema de Certifi-cação, destacando os requisitos técnicos obriga-tórios ou recomendados e as principais medidasrelacionadas com o regulamento de avaliação da

conformidade. Além disso, procuram externar aspreocupações relacionadas com a implementa-ção do sistema de certificação.

O presente artigo deve ser entendido comoparte inicial do processo de comunicação e nãopretende esgotar o assunto, que é extenso e, cer-tamente, será tema de diversos outros trabalhostécnicos.

Requisitos Técnicos e o Regulamentode Avaliação da Conformidade

O Sistema de Certificação está sob a coor-denação do Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento (Mapa), com a participação doMinistério do Desenvolvimento, Indústria e Co-mércio Exterior (MDIC). Seu desenvolvimento seráde acordo com as normas do Sistema Brasileirode Avaliação da Conformidade (SBAC) e tem porobjetivo estabelecer um conjunto de regras e pro-cedimentos de gestão para qualificação e habili-tação de armazéns, visando à guarda e conser-vação de produtos agropecuários.

Pela legislação, a certificação é obrigató-ria para as pessoas jurídicas que prestam servi-ços remunerados de armazenagem de produtos aterceiros, inclusive de estoques públicos, poden-do o Mapa ampliar a exigência para outras uni-dades armazenadoras. As unidades armazenado-ras não certificadas não poderão ser utilizadaspara o armazenamento remunerado de produtosagropecuários. Importante frisar que não há res-trição para que os armazéns não enquadradoscomo obrigatórios na legislação participem vo-luntariamente do sistema e do processo de certifi-cação.

A certificação traz vantagens importantespara o sistema de armazenamento, pois promovemelhorias na imagem das unidades armazenado-ras, nas suas relações comerciais, na qualifica-ção dos seus serviços, na sua avaliação comerci-al, na viabilização dos mercados, na avaliaçãodos procedimentos pelos usuários e na sustenta-bilidade do negócio. Destaca-se, também, que aimplementação desse Sistema possibilitará umaumento na credibilidade brasileira quando das

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exportações dos produtos agrícolas, melhorando,assim, a competitividade do produto nacional di-ante dos mercados externos.

O Sistema de Certificação de UnidadesArmazenadoras terá como um dos seus objetivoso fortalecimento da relação do setor armazena-dor com o setor produtivo e a sociedade, aumen-tando o profissionalismo do setor e, sobretudo,reduzindo as perdas que ocorrem durante o pro-cesso de armazenamento.

Para a implantação do sistema foi necessá-rio definir os requisitos técnicos para certificaçãoe o regulamento de avaliação da conformidadedas unidades armazenadoras. Para tanto, foi cons-tituído grupo de trabalho, com representantes dosetor público e da iniciativa privada.

Por se tratar de uma certificação compul-sória e, também, visando incentivar à participa-ção de todo segmento e especialistas no assunto,as regras e procedimentos, propostas pelo grupo,foram submetidas à consulta pública, entre no-vembro/2006 e fevereiro/2007, pelo Mapa. O gru-po de trabalho analisou todas as contribuições eapresentou a proposta final das normas e proce-dimentos para a certificação de unidades arma-zenadoras em ambiente natural.

Com relação aos requisitos técnicos é im-portante fazer alguns comentários e esclarecimen-tos para o seu melhor entendimento, tais como:

a) Os requisitos foram definidos, a princí-pio, para os armazéns em ambiente natural (grãose fibras). As regras para o armazenamento de pro-dutos agropecuários, seus derivados, subprodu-tos e resíduos que são estocados na forma líquidae em ambiente artificial serão oportunamentedefinidas.

b) O conceito de certificação: é o reconhe-cimento formal, concedido por um organismoautorizado, de que uma entidade tem competên-cia técnica para realizar serviços específicos. Éum indicador para os usuários que as atividadesdesenvolvidas por um prestador de serviços aten-dem a um padrão mínimo de qualidade; que pos-suem os requisitos técnicos mínimos estabeleci-dos no regulamento para o exercício daquela ati-vidade.

c) Os requisitos técnicos foram classifica-dos como obrigatórios (O) e recomendados (R).Os primeiros foram subdivididos em (O¹) – obri-gatórios no momento da vistoria da unidade ar-mazenadora pela entidade certificadora; (O²) –obrigatórios para todas as unidades armazenado-ras cujo início das obras se dará após a homolo-gação pelo Mapa do Sistema Nacional de Certifi-cação de Unidades Armazenadoras; (O³) – obri-gatórios que deverão ser cumpridos no prazo deaté 3 anos após a homologação pelo Mapa doSistema Nacional de Certificação de UnidadesArmazenadoras e (O4 ) – obrigatórios que deve-rão ser cumpridos no prazo de até 5 anos após ahomologação pelo Mapa do Sistema Nacional deCertificação de Unidades Armazenadoras.

d) Os requisitos recomendados são aquelesque deverão ser observados pelos armazenado-ras como indutores na melhoria da gestão da ati-vidade, razão pela qual a orientação expressa nasregras não impede que as unidades armazenado-ras possuam tais recursos.

e) Os requisitosforam divididos em: “ca-dastramento”, “localização”, “infra-estrutura”,“isolamento e acesso”, “ambiente de atendimen-to ao público”, “escritório”, “sistema de pesagem”,“sistema de amostragem”, “determinação da qua-lidade do produto”, “sistema de limpeza”, “siste-ma de movimentação de produto”, “sistema dearmazenagem”, “sistema de segurança” e “de-mais requisitos”.

f) A inclusão nos requisitos de Programa deTreinamento e Aperfeiçoamento Técnico demons-tra a importância da capacitação para os empre-gados que atuam nas unidades armazenadoras.Toda unidade armazenadora deverá possuir pro-grama de capacitação dos empregados.

g) As regras exigem documentação opera-cional que tem como objetivo maior transparên-cia na atividade de guarda e conservação, vistoque a unidade armazenadora deverá registrar to-dos os procedimentos adotados com os produtosmantidos sob sua responsabilidade. 8) além dosrequisitos técnicos, a unidade armazenadora éobrigada a atender ao determinado na legislaçãoe nas normas pertinentes à atividade de armaze-namento, que por serem regras legais, muitas nãoestão contidas nos procedimentos destacados nonormativo.

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h) Os requisitos técnicos propostos procu-ram aumentar o profissionalismo do setor, tendosido evitada a implementação de ações e proce-dimentos rigorosos que promovessem aumentosdemasiados de custos para adequação das uni-dades armazenadoras às novas exigências.

i) A intenção é de avaliar constantemente oprocesso e discutir a revisão dos requisitos demaneira a incluir novas exigências como formade melhorar sistema de armazenamento no Bra-sil. Essa avaliação será realizada pelo ComitêTécnico Consultivo, que será constituído peloMinistério da Agricultura, Pecuária e Abasteci-mento.

Para conhecimento e compreensão sobreo assunto, na Tabela 1 pode-se observar os requi-sitos e as indicações acerca dos requisitos técni-cos obrigatórios ou recomendados.

A outra parte importante para sustentar oSistema de Certificação se refere ao Regulamen-to de Avaliação da Conformidade (RAC), que podeser definido como um processo sistematizado, comregras preestabelecidas, devidamente acompa-nhado e avaliado, de forma a propiciar adequadograu de confiança de um produto, processo ouserviço, ou ainda um profissional, que atende arequisitos preestabelecidos.

A Avaliação da Conformidade busca atin-gir dois objetivos fundamentais: deve atender pre-ocupações sociais, estabelecendo com o consu-midor uma relação de confiança de que os servi-ços estão em conformidade com requisitos espe-cificados e, não pode tornar-se um ônus para aprodução, isto é, não deve envolver recursosmaiores do que aqueles que a sociedade está dis-posta a investir. Dessa forma, a Avaliação da Con-formidade é duplamente bem-sucedida na medi-da em que proporciona confiança ao consumi-dor, ao mesmo tempo em que requer menor quan-tidade possível de recursos para atender as ne-cessidades do cliente.

A transparência do Sistema de Avaliaçãode Conformidade é condição indispensável paraa sua aceitação por parte do mercado e, em par-ticular, para possibilitar o reconhecimento mútuodas atividades. Nesse regulamento, elaborado

pelo grupo de trabalho citado anteriormente, pode-se destacar:

a) Conceito do RAC: documento contendoregras e condições específicas, elaboradas e apro-vadas pelo Mapa e MDIC, para a certificação deunidades armazenadoras de produtos agropecu-ários, seus derivados, subprodutos e resíduos devalor econômico, exceto líquidos e produtos ar-mazenados em ambiente artificial.

b) O Instituto Nacional de Metrologia, Nor-malização e Qualidade Industrial (Inmetro) seráresponsável pela publicação do regulamento epelo reconhecimento do Organismo de Certifica-ção de Produto (OCP) que é o nome dado à em-presa certificadora.

c) O selo de identificação da conformidadepelas unidades armazenadoras está vinculado àlicença emitida pelo OCP e o seu uso está relaci-onado com as obrigações assumidas pelo deposi-tário, formalizadas por meio de termo de compro-misso firmado entre o OCP e o depositário.

d) O selo de identificação não poderá serutilizado, em hipótese alguma, no produto agro-pecuário que transitou nas dependências do ar-mazém certificado, pois a certificação é para aunidade armazenadora e não tem nenhuma rela-ção com o produto estocado ou que tenha sofridoprocessamento no âmbito de um armazém.

e) O depositário licenciado tem responsa-bilidades técnica, civil e penal em relação ao ser-viço por ele operado, e sobre todos os documen-tos referentes à certificação, não havendo hipó-tese de transferência desta responsabilidade aoMapa, Inmetro ou OCP.

f) A responsabilidade pela solicitação dacertificação a um OCP é do depositário, que paraingressar no programa de avaliação da conformi-dade tem que estar obrigatoriamente registradona Companhia Nacional de Abastecimento (Co-nab). Tal obrigação se deve à atribuição da Com-panhia pelo controle do Cadastro Nacional deUnidades Armazenadoras, na forma do art. 34 doDecreto nº 3.855/2001.

g) As unidades armazenadoras, que não sãoobrigadas a obter a sua certificação na forma da

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legislação em vigor, poderão voluntariamentesolicitá-la a um OCP.

h) O processo de certificação é divididoem etapas. A primeira é a análise da documen-tação, que, se apresentando correta, terá comoseqüência a auditoria inicial que tomará comobase os requisitos técnicos e verificará a con-formidade da unidade. A terceira etapa será aanálise do processo pela Comissão de Certifi-cação do OCP que poderá conceder, manter ecancelar a certificação.

i) O OCP será responsável pelo controle eacompanhamento da concessão da licença e usoda identificação da certificação. As auditoriasserão a cada 5 anos, mas no fim do terceiro ano oOCP deverá verificar o cumprimento dos requisi-tos técnicos. Constatada alguma não-conformida-de, o OCP poderá suspender temporariamente ouexcluir a licença para o uso da identificação dacertificação.

j) O depositário deverá manter as condiçõestécnico-organizacionais que serviram de basepara a obtenção da licença para o uso da identifi-cação da certificação. No caso de alterações nascondições técnicas e operacionais, e na documen-tação pertinente, para qualificação dos armazéns,o depositário deverá comunicar o fato ao OCP,que deverá determinar se as mudanças anuncia-das exigem auditorias adicionais.

Os requisitos técnicos para certificação e oregulamento de avaliação de conformidade dasunidades armazenadoras poderão ser alteradospelo Comitê Técnico Consultivo, que será institu-ído pelo Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento. Para tanto, deve consultar as par-tes interessadas e promover a publicação e divul-gação nos termos da legislação e dos regulamen-tos pertinentes. O OCP é que deverá notificar asalterações aos depositários e promover as audito-rias dentro do prazo estabelecido pelos novos re-gulamentos.

ConclusãoÉ importante comentar alguns assuntos que

são cruciais para a implementação do Sistema de

Cerificação. O primeiro é que o prazo para a en-trada em vigor dos requisitos técnicos deve ser apartir de 2009, salvo se houver novo entendimen-to sobre a proposta do grupo de trabalho peloMapa. Contudo, os prazos para adaptação dosarmazéns aos normativos serão contados a partirda publicação da portaria relativa aos requisitose ao regulamento de avaliação de conformidade.

Outro ponto que merece ser ressaltado é aexigência da formação de auditores e a constitui-ção dos Organismos de Certificação de Produto(OCP). Sobre o assunto, os ministérios envolvidosestão tomando as providências para organizaçãode cursos preparatórios e discutindo a melhor for-ma de induzir a criação de empresas, que pos-sam prestar, no momento adequado, com quali-dade e ao menor custo, os serviços de certifica-ção.

Com relação aos investimentos nas unida-des armazenadoras que deverão advir das exi-gências constantes dos requisitos técnicos, doisaspectos devem ser observados. Um se refere aoprazo de adaptação, que foi estabelecido de acor-do com as condições de oferta por parte do setorde máquinas e equipamentos. O segundo aspec-to é o custo dos investimentos por parte do seg-mento armazenador. Nesse ponto, haverá neces-sidade de se ter avaliações constantes sobre osinvestimentos e suas perspectivas, além das con-dições de financiamento existentes.

A distribuição espacial das unidades arma-zenadoras, a não-uniformidade dos recursos tec-nológicos nos armazéns, as dificuldades ineren-tes à percepção e entendimento dos agentes di-reta ou indiretamente envolvidos acerca da im-portância do tema aqui tratado, entre outros fato-res, são variáveis que devem ser gerenciadas deforma a possibilitar a regular e apropriada gera-ção, coleta, disseminação, compreensão e avali-ação das informações relacionadas com a imple-mentação do Sistema Nacional de Certificaçãode Unidades Armazenadoras.

Todas essas preocupações estão na agen-da do governo e, certamente, são comuns aosoutros agentes que são ligados ao sistema de ar-mazenamento. O esforço para manter todos no

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mesmo sentido será enorme e exigirá determina-ção dos envolvidos no processo. O compartilha-mento dos problemas e dos objetivos deve serparte de deliberação conjunta de todos os gruposde interesse.

Por fim, é essencial registrar que as exigên-cias para a certificação de unidades armazena-doras fazem parte de um processo de transiçãode médio e longo prazo, que tem como finalida-de o crescimento, a modernização e o profissio-nalismo do sistema de armazenamento.

ReferênciasFERRARI, Renata Cristina. Utilização de modelo matemáti-co de orimização para identificação de locais parainstalação de unidades armazenadoras de soja no Estadodo Mato Grosso. 2006. 01. Dissertação (Mestrado emEconomia Aplicada) – Escola Superior de Agricultura Luizde Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2006.

SILVA, Luís César. Unidades Armazenadoras: Planejamentoe Gerenciamento Otimizado. Universidade Federal doEspírito Santo. Departamento de Engenharia Rural. BoletimTécnico AG 01/06, em 18/06/06. http://www.agais.com/ag0106_planejamento_gerenciamento_ua.pdf. Acesso em:12. fev. 2007.

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A oportunidade daagroenergia e umaopção transitóriapara o Brasil

O mundo tem fome de energia e o Brasiltem espaço e competência para apresentar re-sultados com a agroenergia. Precisamos ampliarinvestimentos e adequar organização.

Modismo para alguns, incerteza para ou-tros, e desafio para outros tantos são as impres-sões que se podem colher em meios bem varia-dos. Entretanto, é oportuno registrar que um temaé incluído na pauta de políticas públicas por trêscritérios básicos, a saber: 1) crise; 2) greve; 3)oportunidade. Todos legítimos, interligados e es-senciais para uma opção consolidada. Fatos e atossão fundamentais para integração, resultados eimpactos de ações relativas ao tema. E fatos eopiniões são importantes, mas podem diferir es-sencialmente em realidades e suposições.

A matriz energética mundial e brasileira estáfundamentada em matéria fóssil e apresenta si-nais de alerta à população geral diante dos as-pectos de recursos finitos, efeito estufa e mudan-ças climáticas, geopolítica de concentração–dis-tribuição–domínio e flutuação de preços, etc.Uma máxima anônima nos ensina que a “idadeda pedra passou, não por falta de pedras ...”, enovas opções de energia renovável estarão sen-do crescentemente desenvolvidas e utilizadas emtodo o mundo. Daí, não falamos em crise de ener-gia.

Também é fato que a população mundialcresce em informação e consciência sobre as

Frederico Ozanan Machado Durães1

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questões globais, incluindo necessidades de ali-mentação, de balanço de energia, de uso e con-sumo de água limpa, e de sustentabilidade de sis-temas de produção com aderência e ajustamentoambiental, dentre outros apelos universais, comosegurança, educação, saúde, paz e prosperida-de. E o homem está no meio do ambiente. Agro-energia pode ser encarada como oportunidade erisco. Daí, embora como instrumento legítimo depressão, não falamos em greve por conta deagroenergia.

Raciocinemos todos sob a égide da oportu-nidade para as questões da agroenergia no mun-do e no Brasil. Conhecendo-se as evoluções his-tóricas de dados sobre as reservas potenciais ede utilização das várias fontes de energia, e fa-zendo-se uma análise no tempo presente e futurodos povos, podemos depreender que fontes fós-seis (petróleo, gás natural, carvão mineral) ourenováveis, como a energia de biomassa, são, emúltima análise, resultado da conversão da ener-gia solar radiante, em diferentes eras, em formasde energia utilitária. A tendência é de uma utili-zação cada vez mais direta de energia solar, dehidrogênio e nuclear. Isso define um importantepapel de transição para a energia de biomassa,em suporte às mudanças da atual matrizenergética, e em preparo de condições absoluta-mente estratégicas para as novas utilizaçõesenergéticas, doravante.

1 Frederico Ozanan Machado Durães, Ph.D., é chefe-geral da Embrapa Agroenergia.

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A agroenergia, que sustenta o desenvolvi-mento científico, tecnológico e de utilidade daenergia de biomassa, é a “bola da vez” sem mo-dismos. Apresenta incertezas porque diz respeitoa crescimento de oferta e demanda energéticarenovável futura, mas a informação e o conheci-mento são crescentes. É um grande desafio por-que as questões da agroenergia se apresentamcomo uma oportunidade para o novo – novos con-ceitos, novos arranjos produtivos, nova geopolí-tica, etc. Uma mentalidade diferenciada está sen-do formada. Arranjos produtivos sustentáveis eeficiência produtiva agrícola e industrial em con-versão energética estão sendo crescentementerequeridos. Novos pólos e clusters de desenvol-vimento estão sendo formados. A estratégia emagroenergia é que ela deve ser construída e am-pliada de forma competitiva com cooperação.Mais competência e menos competição serão astônicas reais para as parcerias estratégicas inter-nas e internacionais. E um forte componente deinovação será o elo que unirá os agentes e os gru-pos de interesse em agroenergia.

O Brasil, por ser um país continental, compredominância de climas tropical e subtropical,apresenta amplas condições de liderança com-petitiva em agroenergia. Alta radiação solar inci-dente, áreas de terra disponível para o negóciode agroenergia, água com distribuição bastanteconsiderável, clusters regionalizados ou eixos dedesenvolvimento em franca organização, redesde pesquisa e de inovação com experiência com-provada nas atividades do agronegócio tropical,histórico exitoso de relevantes iniciativas emagroenergia em diferentes plataformas (sucroalco-oleiro – cana, biodiesel – oleríferas, florestasenergéticas e resíduos) e uma Agenda Brasil depolíticas públicas e privadas constam entre as ra-zões objetivas para justificar a competitividadebrasileira em relação a uma matriz energéticamundial em transição.

Os marcos regulatórios brasileiros para amatriz energética renovável, especialmente debiomassa, acumulam melhorias estratégicas eoperacionais, especialmente nesses últimos 35anos, e abrigam quatro grandes plataformas:etanol, biodiesel, florestas energéticas e resíduos,

descritas no Plano Nacional de Agroenergia2006–2011.

O Proálcool brasileiro é um dos melhoresexemplos mundiais de produção e crescimentoenergético de biomassa. Nesse particular, credi-tam-se os esforços públicos e privados para esseêxito, e é destaque que a iniciativa privada deuum exemplo magnífico de investimento e de or-ganização produtiva agroindustrial, de logística,e de visão de mercado. Por certo, esses esforçosserão ampliados consideravelmente, por neces-sidade de ajustamento de demandas e ofertas, nosmédio e longo prazos. O Brasil não produzirá ál-cool apenas, mas deverá ter parceiros estratégi-cos para ampliar as ofertas de conhecimento e detecnologia embarcada com maior e eficientelogística. A plataforma de biodiesel no Brasil épotente e inclusiva por três razões básicas:

a) É legal (Lei nº 10.974/04).

b) Tem potencial diversidade de matérias-primas.

c) Tem efeito distributivo regionalizado, emfunção de diferenciada adaptabilidade e/ou dis-ponibilidade das matérias-primas (vegetal ou ani-mal), arranjos produtivos regionalizados e neces-sidades internas de energia renovável.

Florestas energéticas objetivam desenvol-ver, otimizar e viabilizar alternativas ao uso defontes energéticas tradicionais não renováveis, viabiomassa florestal sustentável, e integrando o po-tencial de reflorestamento e de manejo sustentá-vel de florestas nativas. Resíduos orgânicos urba-nos e rurais se associam a amplas possibilidadesenergéticas, a exemplo de produção de biogás eoutras fontes geradoras de eletricidade ou com-bustíveis, bem como a produção de novos produ-tos e co-produtos.

Nesse esforço nacional de mudança damatriz energética, as iniciativas públicas e priva-das estão sendo ampliadas e requerem ajustamen-tos articulados. Urge, dessa forma, a agregaçãode esforços visando ao aumento de eficiência,para encurtar caminhos, reduzir despesas e pou-par energia. A Embrapa Agroenergia, de recentecriação, está sendo implantada focando a organi-

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zação estratégica e operacional das ações dePesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I).Esse chamamento nacional para o cumprimentode uma agenda de inovação impõe à Embrapaum foco concentrado em prioridades regionais depesquisa dentro das quatro grandes plataformasde PD&I (etanol, biodiesel, florestas energéticase resíduos). Parceiros tradicionais e futuros, públi-cos e privados, participantes da exitosa campa-nha nacional para o desenvolvimento doagronegócio de alimentos, incluindo as Unidadesde Pesquisa centrais e descentralizadas daEmbrapa, estão agora também concentrando es-forços na agricultura de energia. Doravante, es-sas parcerias estarão sendo reformatadas paracumprir com igual êxito as associações de temasrelevantes, como agricultura de alimentos e agri-cultura de energia, agricultura e balançoenergético, agricultura e água, agricultura e am-biente.

Novas oportunidades estão se abrindo parao negócio agrícola e industrial nacional. O Brasildeverá, por certo, contribuir decididamente paraalterações substantivas na matriz energética mun-dial e nacional, em franca mudança. O desafio éenorme, o potencial é grande, e o diferencial estácentrado na necessidade, como elementobalizador para definir estratégias de investimentoe de organização.

O Brasil tem uma agenda para a agroener-gia nacional, e dá-se ênfase ao esforço e oportu-nidade das diretrizes do Plano Nacional deAgroenergia 2006–2011. O momento inspira aelaboração de um amplo programa integrado co-operativo para o desenvolvimento da agroenergiano Brasil, e estaremos todos focando prioridades,metas, recursos, responsabilidades, resultados eimpactos, buscando agentes e interlocutores qua-lificados de longo prazo. O Brasil necessita e pedepassagem.

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1. Tipo de colaboração

São aceitos, por esta Revista, trabalhos que se enquadrem nasáreas temáticas de política agrícola, agrária, gestão e tecnologiaspara o agronegócio, agronegócio, logísticas e transporte, estudosde casos resultantes da aplicação de métodos quantitativos equalitativos aplicados a sistemas de produção, uso de recursosnaturais e desenvolvimento rural sustentável que ainda não forampublicados nem encaminhados a outra revista para o mesmo fim,dentro das seguintes categorias: a) artigos de opinião; b) artigoscientíficos; d) textos para debates.

Artigo de opinião

É o texto livre, mas bem fundamento sobre algum tema atual e derelevância para os públicos do agronegócio. Deve apresentar oestado atual do conhecimento sobre determinado tema, introduzirfatos novos, defender idéias, apresentar argumentos e dados,fazer proposições e concluir de forma coerente com as idéiasapresentadas.

Artigo científico

O conteúdo de cada trabalho deve primar pela originalidade, istoé, ser elaborado a partir de resultados inéditos de pesquisa queofereçam contribuições teórica, metodológica e substantiva parao progresso do agronegócio brasileiro.

Texto para debates

É um texto livre, na forma de apresentação, destinado à exposiçãode idéias e opiniões, não necessariamente conclusivas, sobretemas importantes atuais e controversos. A sua principal carac-terística é possibilitar o estabelecimento do contraditório. O textopara debate será publicado no espaço fixo desta Revista,denominado Ponto de Vista.

2. Encaminhamento

Aceitam-se trabalhos escritos em Português. Os originais devemser encaminhados ao Editor, via e-mail, para o endereç[email protected].

A carta de encaminhamento deve conter: título do artigo; nomedo(s) autor(es); declaração explícita de que o artigo não foi enviadoa nenhum outro periódico para publicação.

3. Procedimentos editoriais

a) Após análise crítica do Conselho Editorial, o editor comunicaaos autores a situação do artigo: aprovação, aprovaçãocondicional ou não-aprovação. Os critérios adotados são osseguintes:

• adequação à linha editorial da revista;

• valor da contribuição do ponto de vista teórico, metodológico esubstantivo;

• argumentação lógica, consistente, e que ainda assim permitacontra-argumentação pelo leitor (discurso aberto);

• correta interpretação de informações conceituais e de resultados(ausência de ilações falaciosas);

• relevância, pertinência e atualidade das referências.

b) São de exclusiva responsabilidade dos autores, as opiniões eos conceitos emitidos nos trabalhos. Contudo, o editor, com aassistência dos conselheiros, reserva-se o direito de sugerir ousolicitar modificações aconselhadas ou necessárias.

c) Eventuais modificações de estrutura ou de conteúdo, sugeridasaos autores, devem ser processadas e devolvidas ao Editor, noprazo de 15 dias.

d) A seqüência da publicação dos trabalhos é dada pela conclusãode sua preparação e remessa à oficina gráfica, quando entãonão serão permitidos acréscimos ou modificações no texto.

e) À Editoria e ao Conselho Editorial é facultada a encomenda detextos e artigos para publicação.

4. Forma de apresentação

a) Tamanho – Os trabalhos devem ser apresentados no programaWord, no tamanho máximo de 20 páginas, espaço 1,5 entre linhase margens de 2 cm nas laterais, no topo e na base, em formatoA4, com páginas numeradas. A fonte é Times New Roman, corpo12 para o texto e corpo 10 para notas de rodapé. Utilizar apenasa cor preta para todo o texto. Devem-se evitar agradecimentos eexcesso de notas de rodapé.

b) Títulos, Autores, Resumo, Abstract e Palavras-chave (key-words) – Os títulos em Português devem ser grafados em caixabaixa, exceto a primeira palavra ou em nomes próprios, com, nomáximo, 7 palavras. Devem ser claros e concisos e expressar oconteúdo do trabalho. Grafar os nomes dos autores por extenso,com letras iniciais maiúsculas. O resumo e o abstract não devemultrapassar 200 palavras. Devem conter uma síntese dos objetivos,desenvolvimento e principal conclusão do trabalho. É exigida,também, a indicação de no mínimo três e no máximo cinco pala-vras-chave e key-words. Essas expressões devem ser grafadasem letras minúsculas, exceto a letra inicial, e seguidas de doispontos. As Palavras-chave e Key-words devem ser separadaspor vírgulas e iniciadas com letras minúsculas, não devendo conterpalavras que já apareçam no título.

c) No rodapé da primeira página, devem constar a qualificaçãoprofissional principal e o endereço postal completo do(s) autor(es),incluindo-se o endereço eletrônico.

d) Introdução – A palavra Introdução deve ser grafada em caixa-alta-e-baixa e alinhada à esquerda. Deve ocupar, no máximoduas páginas e apresentar o objetivo do trabalho, importância econtextualização, o alcance e eventuais limitações do estudo.

e) Desenvolvimento – Constitui o núcleo do trabalho, onde que seencontram os procedimentos metodológicos, os resultados dapesquisa e sua discussão crítica. Contudo, a palavra Desenvol-vimento jamais servirá de título para esse núcleo, ficando a critériodo autor empregar os títulos que mais se apropriem à natureza doseu trabalho. Sejam quais forem as opções de título, ele deve seralinhado à esquerda, grafado em caixa baixa, exceto a palavrainicial ou substantivos próprios nele contido.

Em todo o artigo, a redação deve priorizar a criação de parágrafosconstruídos com orações em ordem direta, prezando pelaclareza e concisão de idéias. Deve-se evitar parágrafos longosque não estejam relacionados entre si, que não explicam, quenão se complementam ou não concluam a idéia anterior.

f) Conclusões – A palavra Conclusões ou expressão equivalentedeve ser grafada em caixa-alta-e-baixa e alinhada à esquerda dapágina. São elaboradas com base no objetivo e nos resultadosdo trabalho. Não podem consistir, simplesmente, do resumo dosresultados; devem apresentar as novas descobertas da pesquisa.Confirmar ou rejeitar as hipóteses formuladas na Introdução, sefor o caso.

g) Citações – Quando incluídos na sentença, os sobrenomes dosautores devem ser grafados em caixa-alta-e-baixa, com a dataentre parênteses. Se não incluídos, devem estar também dentro

Instrução aos autores

do parêntesis, grafados em caixa alta, separados das datas porvírgula.

• Citação com dois autores: sobrenomes separados por “e”quando fora do parêntesis e com ponto-e-vírgula quandoentre parêntesis.

• Citação com mais de dois autores: sobrenome do primeiroautor seguido da expressão et al. em fonte normal.

• Citação de diversas obras de autores diferentes: obedecerà ordem alfabética dos nomes dos autores, separadas porponto-e-vírgula.

• Citação de mais de um documento dos mesmos autores:não há repetição dos nomes dos autores; as datas das obras,em ordem cronológica, são separadas por vírgula.

• Citação de citação: sobrenome do autor do documentooriginal seguido da expressão “citado por” e da citação daobra consultada.

• Citações literais que contenham três linhas ou menos devemaparecer aspeadas, integrando o parágrafo normal. Após oano da publicação acrescentar a(s) página(s) do trecho citado(entre parênteses e separados por vírgula).

• Citações literais longas (quatro ou mais linhas) serão desta-cadas do texto em parágrafo especial e com recuo de quatroespaços à direita da margem esquerda, em espaço simples,corpo 10.

h) Figuras e Tabelas – As figuras e tabelas devem ser citadas notexto em ordem seqüencial numérica, escritas com a letra inicialmaiúscula, seguidas do número correspondente. As citaçõespodem vir entre parênteses ou integrar o texto. As Tabelas eFiguras devem ser apresentadas no texto, em local próximo aode sua citação. O título de Tabela deve ser escrito sem negrito eposicionado acima desta. O título de Figura também deve serescrito sem negrito, mas posicionado abaixo desta. Só são aceitastabelas e figuras citadas efetivamente no texto.

i) Notas de rodapé – As notas de rodapé devem ser de naturezasubstantiva (não bibliográficas) e reduzidas ao mínimo necessário.

j) Referências – A palavra Referências deve ser grafada comletras em caixa-alta-e-baixa, alinhada à esquerda da página. Asreferências devem conter fontes atuais, principalmente de artigosde periódicos. Podem conter trabalhos clássicos mais antigos,diretamente relacionados com o tema do estudo. Devem sernormalizadas de acordo com a NBR 6023 de Agosto 2002, daABNT (ou a vigente).

Devem-se referenciar somente as fontes utilizadas e citadas naelaboração do artigo e apresentadas em ordem alfabética.

Os exemplos a seguir constituem os casos mais comuns, tomadoscomo modelos:

Monografia no todo (livro, folheto e trabalhos acadêmicospublicados).

WEBER, M. Ciência e política: duas vocações. Trad. de LeônidasHegenberg e Octany Silveira da Mota. 4. ed. Brasília, DF: EditoraUnB, 1983. 128 p. (Coleção Weberiana).

ALSTON, J. M.; NORTON, G. W.; PARDEY, P. G. Science underscarcity: principles and practice for agricultural research

evaluation and priority setting. Ithaca: Cornell University Press,1995. 513 p.

Parte de monografia

OFFE, C. The theory of State and the problems of policy formation.In: LINDBERG, L. (Org.). Stress and contradictions in moderncapitalism. Lexinghton: Lexinghton Books, 1975. p. 125-144.

Artigo de revista

TRIGO, E. J. Pesquisa agrícola para o ano 2000: algumasconsiderações estratégicas e organizacionais. Cadernos deCiência & Tecnologia, Brasília, DF, v. 9, n. 1/3, p. 9-25, 1992.

Dissertação ou Tese

Não publicada:

AHRENS, S. A seleção simultânea do ótimo regime dedesbastes e da idade de rotação, para povoamentos depínus taeda L. através de um modelo de programaçãodinâmica. 1992. 189 f. Tese (Doutorado) – Universidade Federaldo Paraná, Curitiba.

Publicada: da mesma forma que monografia no todo.

Trabalhos apresentados em Congresso

MUELLER, C. C. Uma abordagem para o estudo da formulação depolíticas agrícolas no Brasil. In: ENCONTRO NACIONAL DEECONOMIA, 8., 1980, Nova Friburgo. Anais... Brasília: ANPEC,1980. p. 463-506.

Documento de acesso em meio eletrônico

CAPORAL, F. R. Bases para uma nova ATER pública. SantaMaria: PRONAF, 2003. 19 p. Disponível em: <http://www.pronaf.gov.br/ater/Docs/Bases%20NOVA%20ATER.doc>.Acesso em: 06 mar. 2005.

MIRANDA, E. E. de (Coord.). Brasil visto do espaço: Goiás eDistrito Federal. Campinas, SP: Embrapa Monitoramento por Satélite;Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2002. 1 CD-ROM.(Coleção Brasil Visto do Espaço).

Legislação

BRASIL. Medida provisória nº 1.569-9, de 11 de dezembro de1997. Estabelece multa em operações de importação, e dá outrasprovidências. Diário Oficial [da] República Federativa doBrasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 14 dez. 1997. Seção 1, p.29514.

SÃO PAULO (Estado). Decreto nº 42.822, de 20 de janeiro de1998. Lex: coletânea de legislação e jurisprudência, São Paulo,v. 62, n. 3, p. 217-220, 1998.

5. Outras informações

a) O autor ou os autores receberão cinco exemplares do númeroda Revista no qual o seu trabalho tenha sido publicado.

b) Para outros pormenores sobre a elaboração de trabalhos aserem enviados à Revista de Política Agrícola, contatar diretamenteo coordenador editorial, Mierson Martins Mota, ou a secretária-geral, Regina Mergulhão Vaz, em:

[email protected]; telefone: (61) 3448-4336

[email protected]; telefone: (61) 3218-2209

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

CG

PE6253

Colaboração