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razões para o predomínio do alto rendimento.
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i
FUNDAO GETLIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAO DE EMPRESAS DE SO PAULO
LUCIANO BUENO
POLTICAS PBLICAS DO ESPORTE NO BRASIL: razes para o predomnio do alto rendimento.
SO PAULO
2008
ii
LUCIANO BUENO
POLTICAS PBLICAS DO ESPORTE NO BRASIL: razes para o predomnio do alto rendimento.
Tese apresentada Escola de Administrao
de Empresas de So Paulo da Fundao
Getlio Vargas, como requisito para
obteno do ttulo de Doutor em
Administrao Pblica e Governo
Linha de Pesquisa: Polticas Pblicas e
Transformaes do Estado
Orientador: Prof. Dr. Fernando Luiz Abrucio
SO PAULO
2008
iii
Bueno, Luciano.
Polticas Publicas do esporte no Brasil : razes para o predomnio do alto rendimento / Luciano Bueno - 2008
200 f.
Orientador: Fernando Luiz Abrucio.
Tese (doutorado) - Escola de Administrao de Empresas de So Paulo.
1. Esportes e estado - Brasil. 2. Esportes Brasil - Legislao. 3. Brasil Ministrio do Esporte. I. Abrucio, Fernando Luiz. II. Tese (doutorado) - Escola de Administrao de Empresas de So Paulo. III. Ttulo.
CDU 796(81)
iv
LUCIANO BUENO
POLTICAS PBLICAS DO ESPORTE NO BRASIL: razes para o predomnio do alto rendimento.
Tese apresentada Escola de Administrao
de Empresas de So Paulo da Fundao
Getlio Vargas, como requisito para
obteno do ttulo de Doutor em
Administrao Pblica e Governo
Linha de Pesquisa: Linha de Pesquisa:
Polticas Pblicas e Transformaes do
Estado
Data de aprovao: 19 de maio de 2008
Banca examinadora:
____________________________________
Prof. Dr. Fernando Luiz Abrucio (Orientador)
FGV-EAESP
____________________________________
Prof. Dr. Mrio Aquino Alves
FGV-EAESP
____________________________________
Prof. Dr. Francisco Jos Fonseca
FGV-EAESP
____________________________________
Prof. Dr. Dante de Rose Junior
USP-LESTE
____________________________________
Prof. Dr. Luiz Henrique de Toledo
SO PAULO
2008
v
Dedico esta tese a memria de meu pai Oswaldo Bueno, que embora apreciasse e
praticasse muito o esporte em geral no teve a oportunidade de atingir seu sonho juvenil de
ser professor de Educao Fsica. Ele sempre me chamava de doutor Luciano o que poder
faz-lo com mais propriedade.
vi
Agradecimentos:
Agradeo: ao meu orientador Fernando Luiz Abrucio por sua conduta cordial e segura ao
longo do desenvolvimento no trabalho e por sua gentileza na reviso; aos professores Peter
Spink e Marta Farah que endossaram minha entrada no programa; aos meus amigos do
mestrado e doutorado pelo companheirismo e apoio constante ao longo de todo o trajeto;
FGV-EAESP, seus funcionrio e ex-funcionrios. Ao P. E. minha famlia e a todos que de
uma forma ou outra me ajudaram a alcanar esta importante meta em minha vida. Tambm
agradeo aos professores da banca: Mrio Aquino Alves, Francisco Jos Fonseca, Dante de
Rose Junior e Luiz Henrique de Toledo pelas consideraes e sugestes para a melhoria deste
trabalho.
vii
Resumo:
Esta tese tem por tema o estudo da evoluo da Poltica Pblica do Esporte no Brasil. Seu
objeto de estudo o predomnio do esporte de alto rendimento. Para tanto, define as trs
categorias de manifestao esportiva com as quais trabalha: esporte de alto rendimento,
esporte educacional e esporte participativo. Igualmente apresenta a estrutura terica a ser
utilizada, a Advocacy Coalition Framework ACF, que se utiliza de estrutura de crenas e
valores formatada pelo autor para o estudo do campo esportivo, tratado pela ACF com um
subsistema ou rea especfica de poltica publica.
Procurando melhor embasar o estudo, a tese resgata os principais conceitos histricos e
sociolgicos relacionados ao campo do esporte e refora a interao deste com os aspectos
sociais, econmicos e polticos. Em seguida, aborda a gnese do esporte e sua vinda ao
Brasil, no incio do sculo passado, passando pela criao das entidades desportivas e
apresentando as razes de seus conflitos de interesses. Ainda nesta parte, aborda a
discusso sobre os valores e contra valores que permearam a discusso entre intelectuais a
favor e contra o desenvolvimento do esporte.
No perodo do Estado Novo a tese discute as razes que levaram o Estado a intervir no setor
esportivo e a estrutur-lo institucionalmente com o Decreto Lei 3.199, de 1941. Com j
apontado por outros autores, este decreto representou acentuada ao do Estado em favor
do esporte de alto rendimento, fortalecendo propositadamente sua coalizo de atore, aqui
chamada de pr-EAR, bem como reflete seu desejo de implementar valores higienistas e
eugenistas que permeavam a sociedade intelectualizada de ento. A tese aborda o carter
autoritrio e corporativista do Decreto e como estas caractersticas foram usadas no perodo
populistas para desenvolver bases clientelistas na estrutura formal do esporte.
Na fase do regime militar, a tese discute o projeto de transformar o Brasil em uma potncia
olmpica nos moldes do futebol e como tal ideal determinou ao deliberada de
incorporao do setor esportivo educacional aos princpios e valores do esporte de alto
rendimento, o denominado como modelo piramidal. O estudo contempla a reao de parte
da comunidade acadmica e da prtica educacional da rea esportiva e tambm o
surgimento do movimento do esporte para todos. O que assumido pela tese como o incio
da coalizo contrria ao alto rendimento, aqui chamada de pr-EPE (esporte participativo e
educacional).
Na seqncia, analisa o importante perodo da constitucionalizao do esporte, que
implicou no embate entre as duas coalizes dentro do processo constituinte, quando, a
despeito da supremacia da pr-EAR, redundou em importantes conquistas para a pr-EPE ao
se estabelecer o esporte como um direito social e ao se dar prioridade ao esporte
educacional na ao do Estado. Ainda como parte do processo de liberalizao do esporte
analisa o papel da Lei Zico na reestruturao do subsistema esportivo.
No perodo mais recente a tese se concentra, por um lado, na evoluo institucional do
esporte dentro de Estado, significando a passagem do nvel de secretaria para o de
ministrio. Por outro lado, o esforo legislativo para aprimorar a legislao, acentuadamente
a favor da modernizao do futebol e do esporte de alto rendimento. tambm o perodo
viii
em que a tese faz sua real contribuio ao abordar a distribuio desproporcional de
recursos pblico e a representao no rgo de aconselhamento nacional do esporte entre
as trs categorias de manifestao esportiva. Em funo das evidncias apresentadas, a tese
conclui pelo fortalecimento da coalizo pr-EAR e seu o efeito no aumento do predomnio
do alto rendimento.
ix
Abstract:
This dissertation aims to study the evolution of the public policy of Sports in Brazil. The
subject of study is the prevalence of elite sports (EAR, esportes de alto rendimento). It
defines the three categories of sport activities analyzed in this work: elite sports, educational
sports, and participatory sports. It also presents the theoretical framework of the studythe
Advocacy Coalition Framework (ACF), which draws from a structure of beliefs and values
adapted by the author for the study of the field of sports, dealt by ACF as a subsystem or
specific area of public policy.
In order to provide a background, this dissertation revisits the main historical and
sociological concepts related to the field of sports, and reinforces the interaction between
those and the social, economical, and political aspects. It then presents the genesis of sport
and its arrival in Brazil, in the beginning of the last century, including the creation of sport
organizations, and presenting the rationale of its conflicts of interest. It also presents the
discussion regarding the values and counter-values that permeated the discussion among
intellectuals both in favor of and opposed to the development of sport.
In the Estado Novo (New State) period, this dissertation discusses the reasons that led the
State to intervene in the Sports sector and to institutionally structure it by the Decree-Law n.
3,199, from 1941. As already pointed by others, this decree represented a profound
movement by the State in favor of the elite sport, purposefully enabling its coalition of
actors, referred to here as pr-EAR (pro elite sport), as well as reflecting its desire to
implement hygienic and eugenic values that permeated the intellectual society then. The
dissertation shows the authoritarian and corporativist nature of the decree, and how those
characteristics were used in the populist periods in order to develop clientelistic bases in the
formal structure of sport.
With regards to the authoritarian regime, the dissertation discusses the project to transform
Brazil in an Olympic power, as it was in soccer, and how such ideal determined a deliberate
action of incorporating the sport sector to the principles and values of elite sport, known as
the pyramidal model. This study comprises the reaction from part of the academic
community and from the educational practice of sport, and also the rise of the movement
sports for all, which is assumed by this dissertation as the beginning of the coalition
contrary to elite sport, referred to here as pr-EPE (Esporte Participativo e Educacional, pro
participatory and educational sport).
It then analyzes the important period of constitutionalization of sport, which involved the
struggle between the two coalitions in the constitutional process, when, despite the pr-EAR
supremacy, resulted in important accomplishments for the pr-EPE, establishing the sport as
a social right, and giving priority to the educational sport in the State service provision. Also
as part of the process of sport liberalization, it analyzes the role of the Zico Act in the
restructuring of the sports subsystem.
In the more recent period, the dissertation focus, on one hand, in the institutional
development of sport within the State, which meant the passage from a Department status
to a Ministry status; on the other hand, the legislative efforts to improve the legislation,
x
markedly in favor of the modernization of soccer and of elite sports. It is also the period in
which the dissertation makes its real contribution by dealing with the disproportional
distribution of public resources and of representation in the organ of national counseling of
sport between the three categories of sport activities. In light of the evidences presented,
the dissertation concludes for the strengthening of the pr-EAR coalition and its effect over
the increase in the prevalence of elite sports.
xi
Lista de figuras, grficos, quadros e tabelas:
Figura 1 - Viso geral da estrutura da ACF.......................................................................... 22 Figura 2 - Camadas de crenas ............................................................................................. 29 Figura 3 - A dinmica de policy-oriented learning ............................................................... 35 Figura 4 - Estruturao do Sistema Esportivo ................................................................... 119 Figura 5 - Modelo de Alocao de Recursos ..................................................................... 142 Figura 6 - Modelo Piramidal.................................................................................................. 142 Figura 7 - Reestruturao do Sistema Esportivo Nacional.............................................. 149 Figura 8 - Fluxo do processo constitucional....................................................................... 182 Figura 9 - Sistema Esportivo Nacional (Lei Zico). ............................................................. 196 Figura 10 - Sistema Brasileiro do Desporto Lei Pel. ................................................... 206 Figura 11 - Organograma do Ministrio do Esporte.......................................................... 227 Figura 12 - Transformao de modelo................................................................................ 230 Figura 13 - Atuais fontes de recursos para o esporte. ..................................................... 238
Grfico 1 - Evoluo dos custos dos Jogos Olmpicos em bilhes de dlares americanos 1972 a 2012. .................................................................................................... 65 Grfico 2 - Evoluo do nmero de recursos humanos envolvidos nos Jogos Olmpicos 1984 a 2004. .......................................................................................................................... 66 Grfico 3 - Destinao de recursos do MEC entre 1983 e 1987. ................................... 175 Grfico 4- Gastos realizados no esporte entre 2003 e 2008........................................... 240 Grfico 5 - Evoluo dos gastos do ME. ............................................................................ 240 Grfico 6 - Evoluo dos gastos reais com o EAR e Lei Agnelo-Piva........................... 241 Grfico 7 - Evoluo dos gastos por ano e por categoria esportiva.......................................... 258
Quadro 1 - Estrutura do sistema de crenas das elites de polticas pblicas ................ 28 Quadro 2 - Camadas de crenas e reas de conflito ......................................................... 30 Quadro 3 - Estrutura de crenas e valores para o subsistema do esporte..................... 38 Quadro 4 - Comparativo das razes da ao do Estado no setor esportivo .................. 48 Quadro 5 - Crticos e Apologistas do Esporte entre 1890 e 1930. ................................... 83 Quadro 6 - Correntes eugenistas........................................................................................... 87 Quadro 7 - Crticos e Apologistas do Esporte entre 1930 e 1947. ................................... 99 Quadro 8 - Coalizes: amadorismo - profissionalismo..................................................... 101 Quadro 9 - Comparativo da ordem corporativista. ............................................................ 117 Quadro 10 - Comparativo de ordem esportiva e dominante. .......................................... 118 Quadro 11- Estrutura de crenas e valores para o subsistema do futebol ................... 250
Tabela 1 Populao participante no esporte. ................................................................... 64 Tabela 2 - Institucionalizao das modalidades esportivas. ............................................. 88 Tabela 3 - Oramento para o PNED entre 1976 e 1979 (em 1.000 de Cruzeiros)...... 152 Tabela 4 - Recursos da SEED/MEC por rea de execuo............................................ 158 Tabela 5 - Destinao de recursos MEC/SEED entre 1983 e 1988. ............................. 176 Tabela 6 - Pases e ano de constitucionalizao do esporte. ......................................... 179 Tabela 7 - Composio do Conselho Superior de Desportos. ........................................ 193
xii
Tabela 8 - Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro CDDB ................. 205 Tabela 9 - Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro CDDB. ................ 209 Tabela 10 - Propostas da Cmara Setorial do Esporte.................................................... 211 Tabela 11 - Conselho Nacional do Esporte CNE........................................................... 212 Tabela 12 - Usos dos recursos para o desporto educacional pelo COB....................... 215 Tabela 13 - Gastos realizados no esporte entre 1995 e 2002. ....................................... 217 Tabela 14 - Resumo das propores de gastos realizados entre 1995 e 2002........... 218 Tabela 15 - Programas e recursos oramentrios executados - 1995 INDESP....... 219 Tabela 16 - Conselho Nacional do Esporte (2003 2008).............................................. 225 Tabela 17- Gastos realizados no esporte entre 2003 e 2008. ........................................ 239 Tabela 18 - Gastos entre categorias de manifestao esportiva para o perodo de 2003-2008 (janeiro-maro), incluindo recursos ao Pan-2007 e Lei Agnelo-Piva (valores a 1995) ..................................................................................................................................... 242 Tabela 19 - Comparativo de gastos entre governos e categorias esportivas ........................... 258
Tabela 20 Evoluo da representatividade no rgo superior de aconselhamento ............. 259
Glossrio de termos da ACF (estrutura terica):
Aspectos centrais (policy core). Posies fundamentais de poltica pblica relacionadas s estratgias bsicas para atender aos axiomas normativos do centro profundo.
Centro profundo. Normas fundamentais e axiomas ontolgicos.
Aspectos secundrios. Decises e informaes instrumentais necessrias para implementar as polticas pblicas dos aspectos centrais.
Enlightenment function. Funo esclarecedora operada pelo acmulo de conhecimento, ao longo do tempo, proporcionado por estudos e pela ao prtica em polticas pblicas.
Policy-oriented learning. Processo de produo de poltica pblica por meio do embate poltico entre propostas embasadas em conhecimento tcnico e terico.
Fair play. Comportamento justo, tido como prprio de um cavalheiro. Mainstream. Corrente principal de pensamento, ideologia ou interesse.
Teste-makers. Produtores e testadores de gostos
xiii
Sumrio: Introduo..................................................................................................................................... 2
Captulo 1 - Definies, estrutura terica e o problema de pesquisa........................................... 9
Definio dos conceitos ............................................................................................................ 9
Esporte e Lazer .................................................................................................................... 10
Esporte, Educao Fsica e Atividade fsica (ginstica)........................................................ 12
Definio das trs categorias de esporte: Rendimento, Lazer, Escolar. ............................. 14
Esporte escolar, esporte educacional ou esporte-educao .......................................... 16
Esporte de alto rendimento (AER), esporte de alta competio ou esporte-performance
......................................................................................................................................... 17
Esporte participao, esporte de lazer ou esporte recreativo ou de tempo livre .......... 18
Estrutura terica - Advocacy Coalition Framework................................................................. 18
A ACF e a superao dos estgios heursticos..................................................................... 19
Premissas da ACF................................................................................................................. 20
A Estrutura analtica da AFC ................................................................................................ 21
Fatores externos que afetam as mudanas de polticas dentro dos subsistemas.......... 22
Parmetros relativamente estveis .................................................................................. 23
Sistema dinmico de eventos. ........................................................................................ 24
Subsistemas: atores, coalizes e mediadores..................................................................... 24
Advocacy Coalitions e Polticas Pblicas ............................................................................. 26
O sistema de crenas........................................................................................................... 27
Conjunto de hipteses internas da ACF .............................................................................. 30
A dinmica de policy-oriented learning (aprendizagem por poltica pblica orientada).... 32
Cenrio para o uso da anlise e do processo de policy-oriented learning.......................... 34
Predomnio e Hegemonia........................................................................................................ 35
Valores e contra-valores do esporte ....................................................................................... 36
Estrutura de crenas e valores para o subsistema do esporte ............................................... 37
O problema em questo ......................................................................................................... 38
Questes/hipteses a serem testadas.................................................................................... 41
Captulo 2 - O campo esportivo e seu contexto .......................................................................... 42
Razes para o envolvimento do Estado no setor esportivo.................................................... 42
A importncia do esporte como fenmeno social .................................................................. 49
Principais teorias histricas e sociolgicas do esporte ....................................................... 49
Eric Hobsbawm................................................................................................................ 50
xiv
Norbert Elias e Eric Dunning ........................................................................................... 51
Pierre Bourdieu ............................................................................................................... 53
Jean-Marrie Brohm ......................................................................................................... 60
Cincia dos esportes........................................................................................................ 62
A expanso da dimenso social........................................................................................... 62
O aspecto econmico do esporte. .......................................................................................... 63
O aspecto Poltico.................................................................................................................... 67
As grandes competies e a poltica ................................................................................... 68
Mdia esportiva e poltica .................................................................................................... 71
Captulo 3 - A gnese do esporte no Brasil ................................................................................. 73
O surgimento do esporte moderno ........................................................................................ 73
A antiguidade e renascimento ............................................................................................ 73
A Inglaterra burguesa e as Public Schools ........................................................................... 74
Do imprio at Vargas............................................................................................................. 77
Intelectuais: aficionados e opositores................................................................................. 78
Apologistas ...................................................................................................................... 79
Crticos............................................................................................................................. 80
O movimento higienista e eugenista .................................................................................. 83
O esporte na Repblica Velha ............................................................................................. 87
A gnese do Astro Rei Futebol e a criao da Confederao Brasileiro do Desporto - CBD
......................................................................................................................................... 89
O elitismo e racismo das prticas esportivas .................................................................. 90
Ao do Estado versus autonomia social ........................................................................ 93
O incio da Era Vargas.............................................................................................................. 97
A evoluo do debate sobre o esporte nos anos 1930....................................................... 98
O Profissionalismo e nova diviso no futebol ................................................................... 100
A reao das demais modalidades olmpicas.................................................................... 102
O nascimento da mdia esportiva nacional ....................................................................... 103
O que concluir do perodo?................................................................................................... 103
Captulo 4 - A Implantao da poltica pblica de esportes...................................................... 105
O Estado Novo e a estatizao do esporte ........................................................................... 106
A Educao Fsica nos planos do Estado ........................................................................... 107
O peso do futebol.............................................................................................................. 110
O DL 3.199 ......................................................................................................................... 111
xv
Resultados como poltica pblica.................................................................................. 119
Oposies? .................................................................................................................... 123
Sntese do perodo Vargas............................................................................................. 124
O perodo democrtico corporativista do esporte (1945-1964)........................................... 125
O que ficou do populismo? ............................................................................................... 130
Sntese para o perodo .......................................................................................................... 131
Captulo 5 - O perodo militar (1964/85): a ampliao do modelo hegemnico pr-EAR........ 133
A reestruturao tecnoburocrtica do setor esportivo (1969-1974) ................................... 133
Centralizao de recursos ................................................................................................. 135
O incio da esportivisao da escola .............................................................................. 137
O movimento do Esporte Para Todos ............................................................................... 138
O modelo piramidal........................................................................................................... 140
O Plano de Educao Fsica e Desporto PED .................................................................. 143
A Campanha Nacional de Esclarecimento Esportivo CNED............................................ 144
As tenses entre tcnicos e dirigentes ............................................................................. 145
A primeira Lei para o Esporte................................................................................................ 146
A tentativa de cooptao poltica na base esportiva ........................................................ 150
O Plano Nacional de Educao Fsica e Desportos - PNED................................................ 151
O movimento Esporte para Todos - EPT no Brasil ............................................................ 153
A SEED e a pseudo-crtica ao modelo piramidal ............................................................... 154
A entrada das empresas no EAR ........................................................................................... 158
E o futebol? ........................................................................................................................... 159
A crise de identidade na comunidade acadmica de Educao Fsica .............................. 162
O incio da democratizao no setor esportivo .................................................................... 163
Sntese para o perodo .......................................................................................................... 165
Captulo 6 - O esporte como direito social na letra da lei: a Constituio de 1988.................. 167
A Comisso de Reformulao do Esporte ............................................................................. 168
A atuao do CND na nova conjuntura poltica .................................................................... 172
A SEED e o CND ................................................................................................................. 174
Incapacidade de outros setores se representarem .............................................................. 176
A Constitucionalizao do esporte........................................................................................ 178
O processo constituinte e o Artigo 217 da CF ................................................................... 179
A exegese .......................................................................................................................... 185
O perodo ps constitucional ................................................................................................ 188
xvi
Lei Zico............................................................................................................................... 189
Interesses envolvidos, setores excludos .......................................................................... 197
Sntese para o perodo .......................................................................................................... 199
Captulo 7 - Do Ministro Extraordinrio ao Ministrio do Esporte ........................................... 201
A era FHC............................................................................................................................... 201
A Lei Pel ........................................................................................................................... 203
As reestruturaes organizacionais e as mutaes na Lei Pel ........................................ 208
Lei Maguito e a novela do Bingo ................................................................................... 208
CPIs do Futebol e adies legislao esportiva .......................................................... 213
Lei Agnelo-Piva .............................................................................................................. 213
Empresas estatais.......................................................................................................... 215
Os gastos com o esporte na era FHC................................................................................. 217
A era Lula e o Ministrio do Esporte ..................................................................................... 220
A volta do Bingo ................................................................................................................ 221
Novas leis para o esporte (futebol) ................................................................................... 222
Misso do ME e o novo Conselho ..................................................................................... 223
Comisses.......................................................................................................................... 226
Programas do atual Ministrio.......................................................................................... 226
Secretaria Nacional de Alto Rendimento - SNAR .............................................................. 227
Olimpadas Escolares e Olimpadas Universitrias........................................................ 227
Jogos da Juventude ....................................................................................................... 228
Rede Cenesp.................................................................................................................. 228
Descoberta do talento esportivo .................................................................................. 229
Secretaria Nacional de Desenvolvimento do Esporte e de Laser - SNDEL ........................ 229
Conferncias Nacionais de Esporte............................................................................... 231
Programa Esporte e Lazer da Cidade ............................................................................ 232
Jogos dos povos indgenas ............................................................................................ 233
Rede Cedes.................................................................................................................... 233
Cedime .......................................................................................................................... 234
Secretaria Nacional de Esporte Educacional - SNEE.......................................................... 234
Segundo Tempo ............................................................................................................ 234
Projetos esportivos sociais ............................................................................................ 234
Recentes Leis para o esporte ............................................................................................ 234
Bolsa Atleta ................................................................................................................... 234
xvii
Lei de Incentivo Fiscal.................................................................................................... 235
Timemania..................................................................................................................... 237
Uso de recursos................................................................................................................. 238
A evoluo dos gastos para todo o perodo (1995-2007) ................................................. 240
O legado do Pan de 2007 .............................................................................................. 242
Sntese para o perodo 1995-2007........................................................................................ 243
O futebol ........................................................................................................................... 243
A evoluo institucional .................................................................................................... 244
Como ficaram as coalizes no perodo?............................................................................ 245
Consideraes finais.................................................................................................................. 247
A aderncia da ACF. .............................................................................................................. 247
Consideraes sobre novo subsistema: o futebol. ........................................................... 248
A criao................................................................................................................................ 250
A ampliao e hegemonia ..................................................................................................... 252
Constitucionalizao ............................................................................................................. 253
A ministerializao ............................................................................................................. 255
A evoluo organizacional..................................................................................................... 256
Questes a serem respondidas ............................................................................................. 256
Bibliografia ................................................................................................................................ 262
Livros e artigos: ..................................................................................................................... 262
Internet: ................................................................................................................................ 271
Apndice I Figuras da evoluo institucional do esporte....................................................... 292
xviii
1
Poltica Pblica do esporte no
Brasil: razes para o predomnio
do alto rendimento
2
Introduo
Por que uma tese de doutorado de aluno da FGV-EAESP em Administrao Pblica e
Governo, tradicionalmente dedicada a questes de economia, poltica e polticas pblicas em temas como finanas, sade, educao, governo local, federalismo, entre
outros, deveria abordar o esporte? Mais especificamente, por que o esporte como objeto de poltica publica? A resposta a esta questo est na simples considerao do fenmeno
esportivo nas ltimas dcadas e de como isto afetou e envolveu polticas governamentais especficas para o setor.
A expanso do esporte considerada fenmeno mundial. Os grandes eventos esportivos como os Jogos Olmpicos, Copa do Mundo, Formula1, finais de campeonatos internacionais e nacionais passaram a ser acompanhados por bilhes de expectadores por todo o mundo. Grande parte deste pblico passou igualmente a despertar para a
necessidade e o direito de participao na prtica esportiva.
Tais fatos fazem do esporte irresistvel vitrine para finalidades polticas e/ou promoo de ideologias, bem como torna inevitvel o envolvimento dos Estados na regulao, promoo e mesmo explorao dos recursos e diversos tipos de dividendos do setor esportivo. Tanto assim que, a partir dos anos de 1960, diversos pases centrais passaram a constituir secretarias e ministrios destinados especificamente ao desenvolvimento do esporte e de suas subdivises.
A despeito do crescimento da importncia do esporte como fenmeno social ao longo do sculo XX, seu estudo no Brasil ficou, durante muitas dcadas, relegado aos profissionais de Educao Fsica preocupados com a historicidade e desenvolvimento de sua cincia, bem como a jornalistas dedicados a uma ou outra modalidade, em geral, o futebol.1 Os estudos de carter sociolgico e a interface do Estado com o esporte ficou
limitado aos estudos do direito esportivo. Apenas nos anos 1990 em diante, profissionais da rea de Educao Fsica e de outras cincias scias que tambm 1 Gilmar Mascarenhas de Jesus tem a seguinte observao sobre a carncia de estudos sobre o esporte: Considerado como uma faceta menor da totalidade social, o esporte foi sistematicamente relegado a segundo plano durante dcadas de investigao acadmica, seja pela corrente da histria oficial de matriz positivista, seja pela via de um marxismo pretensamente ortodoxo, fundado no economicismo. (JESUS, 1999).
3
elegeram o tema do esporte, mostraram-se preocupados e interessados na ao estatal e se propuseram a desenvolver estudos tendo por objeto as aes e omisses do Estado na rea esportiva. Aes e omisses que fazem lembrar a definio de Thomas Dye sobre poltica pblica: [...] is whatever governments chosse to do or not to do. (DYE, 2002, p. 1).
A rea de poltica pblica para o esporte ainda incipiente e procura por seu lugar e legitimidade dentro das diversas disciplinas que orbitam entorno ao fenmeno esportivo. Evidncia disso se encontra neste apontamento de Melo sobre o aumento de artigos de poltica pblica, mas em encontros dedicados histria da Educao Fsica e
do esporte:
O nmero de trabalhos publicados ligados a poltica pblica tem sido bastante significativo, o que para ns no se justifica em um evento cientfico dedicado a discutir aspectos hitricos. A no ser que o estudo seja dedicado a uma anlise histrica de polticas pblicas [...] Sem dvida, os estudiosos de poltica pblica em Esporte, Educao Fsica e Lazer ainda no tem um espao especfico para suas discusses. (MELO V. A., 2004, p. 48).
O envolvimento do Estado para o desenvolvimento do esporte se configura em rico objeto de anlise de polticas pblicas, podendo ser abordado sob variadas perspectivas: uso ideolgico de apoio ao sistema poltico, propaganda governamental, avaliao da atuao institucional de rgos dedicados, regulamentao do mercado esportivo, accountability2 sobre recursos pblicos aplicados nos trs nveis governamentais e para os destinados a confederaes, federaes e ligas esportivas, e tambm pela tica da transparncia dos modelos e das prticas de gesto destas entidades.
A nfase do governo federal em reconhecer a necessidade de formular uma slida poltica nacional para o Esporte, assegurando maior participao e representatividade
dos atores envolvidos em sua produo, o esforo de reestruturar a gesto e o
2 A traduo comum de accountability para o portugus responsabilizao. Contudo, o termo traduzido no fiel ao significado mais amplo que perpassa a responsabilizao legal, abrangendo sanes e procedimentos que aferem objetivos e resultados da ao e/ou omisso de agentes (indivduos e organismos) estatais e mesmo sociais por seus pares e superiores, definido modernamente por Guillermo O'Donnell como accountability horizontal e vertical (O'DONNELL, 1998).
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financiamento do esporte dando-lhe maior accountability e o esforo de estender o acesso s prticas esportivas maior parte da populao no so recentes, embora sejam recorrentes de governo para governo, e mesmo assim, tais tpicos so objetos de raros estudos acadmicos.
No Brasil, literatura recente tem expressado a preocupao com a constituio de
mencanismos de controle e de accountability para enfrentar antigos problemas: a concentrao de poder nas mos do executivo e a fragilidade nos mecanismos de representao e participao da sociedade (ABRUCIO & LOUREIRO, 2004, p. 100). O setor esportivo estatal deve fazer parte deste esforo de modernizao, especialmente na
medida em que almentam os recursos pblicos destinados a esta rea diretamente pelo oramento da unio, por meio de recursos de loterias ou mesmo pelo patroccio de
empresas estatais s entidades de administrao do esporte em seus vrios nveis.
Parte da literatura esportiva que trata das relaes do Estado com o esporte ressalta antigo problema no modelo de desenvolvimento do esporte no Brasil: o fato do mesmo
ser centrado no esporte de alto rendimento, o que o torna excludente das demais categorias de manifestao esportiva: o esporte participativo e o esporte educacional. O
debate em torno ao tema vem se aprofundando e se especializando desde meados dos anos 1970, quando teve iniciou a produo de literatura mais crtica sobre o assunto. Outro aspecto levantado a preponderncia do futebol sobre as demais modalidades e a forma como o Estado vem respondendo com legislao centrada nesta modalidade.
Outra parte da literatura trata o esporte sob a tica da prtica esportiva como atividade
de integrao social, ldica, de lazer e como atividade educacional. Desta forma, o Esporte abortado pela rea da sociologia sob a questo da incluso e excluso social, e
como fator de expanso da cidadania. A psicologia estuda os aspectos ldicos, o comportamento competitivo, o lazer por meio do esporte e seu uso como atividade teraputica, abordando fatores como a motivao e a ansiedade nas prticas esportivas. A rea da Educao se dedica s questes de metodologia de ensino e de aplicao das
prticas esportivas nas escolas, bem como nas questes pertinentes reforma educacional onde a disciplina de Educao Fsica sempre teve destacado papel.
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O Esporte tambm fascina os socilogos e antroplogos por prover um rico e vasto material para estudos sobre o conflito estruturado e a competitividade em ambiente controlado, raramente reproduzidos em outros aspectos da vida social. Outros campos de estudo contemplados so o da dinmica de grupo, organizaes sociais, subculturas,
processos comportamentais, agrupamentos sociais, desigualdades, socializao e redes organizacionais (FREY & EITEZN, 1991).
Parte da pretenso deste trabalho contribuir para que as anlises de polticas pblicas encontrem seu lugar junto aos estudos histricos e atuais sobre o esporte em seus variados aspectos. Especialmente sobre qual foi e est sendo o papel do Estado no nvel
federal, e de como isto foi e influenciada e/ou determinada pelas circunstncias histricas sob fortes interesses de grupos estabelecidos no setor.
No primeiro capitulo, so definidos os principais conceitos a serem utilizados ao longo do trabalho, especialmente para as trs categorias de manifestao do esporte: rendimento, participativo (lazer) e escolar. Tambm abordo a interao do esporte com sua cincia principal, a Educao Fsica, e suas relaes com o conceito de lazer. Aspecto importante, j que o estudo envolve quase um sculo, a explicao sobre o critrio de periodizao.
Em seguida apresento a estrutura terica da Advocacy Coalition Framework - ACF como instrumento privilegiado de anlise. Desde sua formulao inicial, em 1993, a ACF vem tendo grande utilizao nos EUA, Europa e Oceania, para os mais diversos temas de polticas pblicas e em todos os nveis governamentais.3 J h estudos internacionais sobre poltica pblica do esporte utilizando a ACF (GREEN & HOULIHAN, 2004). A ACF procura explicar a produo de poltica pblica, considerando mudanas no espao de tempo de mais de uma dcada, como
conseqncia da interao entre coalizes opostas que se realizam e se estabelecem em diferentes nveis ou anis centrais e perifricos de crenas. Em tal estrutura h um
subsistema de interaes condicionadas por parmetros: atributos do problema, distribuio de recursos, valores culturais, estrutura social e regras legais, bem como por
3 Os mais recentes estudos tratam at de sua aplicao para estudos organizacionais e mesmo sobre
estruturas religiosas e seus efeitos sobre a produo de poltica pblica (IKE, 2006).
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eventos externos, ou seja, mudanas socioeconmicas, alteraes no sistema de coligao governamental e transformaes produzidas pelo subsistema.
Em seguida exponho o problema a ser tratado pela tese e as questes/hipteses a serem
respondidas/testadas. Para tanto, procedo estruturao das crenas e valores que servem de base para a definio das coalizes segundo os pressupostos tericos.
No segundo captulo, abordo as razes para o envolvimento do Estado no setor esportivo, procurando atender a questes utilitaristas como o preparo para a atividade militar e prestgio internacional, por meio de conquistas esportivas de seus atletas, ou
por razes mais meritrias, visando ao lazer e sade da populao. Tambm exploro trs aspectos de profunda interao com o esporte: o social, o econmico e o poltico.
Dedico especial ateno ao social, procurando resgatar as idias dos grandes pensadores desta interao com o esporte.
O terceiro captulo desenvolve um pequeno histrico do desenvolvimento do esporte
moderno. Originrio da Inglaterra, ganha o mundo num processo de expanso poucas vezes visto em outras reas da atividade humana. Chegou ao Brasil, no incio do sculo
passado, encontrando solo frtil a seu desenvolvimento e gerou expressivo debate entre a intelectualidade que se dividiu entre contra e a favor o seu desenvolvimento, debate que segue at a revoluo de 1930, quando Getlio Vagas j sinaliza o apoio do Estado, especialmente ao futebol. O contexto higinico-eugnico e a face elitista-racista tambm so mencionados como parte das crenas e valores que permearam a elite esportiva e governamental de ento. Obviamente, o tema da poltica publica para o esporte como o de tantas outras reas econmica e sociais comea em Vargas e a partir de estruturao inicial bastante autnoma e pluralista que caracterizou o ambiente das primeiras associaes e clubes.
O quarto captulo trata do incio da interveno estatal no esporte que se seguiu
implantao do Estado Novo. O heri e vilo do perodo foi o famoso Decreto 3.199, de 1941, que estruturou, de cima para baixo e contrariando a descentralizao inicial, todo o setor esportivo com base no modelo rgido e hierarquizado do movimento olmpico, tendo por rgo fiscalizador o Conselho Nacional do Desporto. Nada mais apropriado
para ao regime que instituiu o corporativismo estatal como modelo de governo para
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regular as relaes estado e sociedade, inclusive para o setor esportivo. O captulo ainda aborda a fase da volta democracia, em 1945, o chamado de perodo populista, no qual a tnica foi a continuidade do corporativismo atrelado ao clientelismo das elites polticas com os dirigentes de federaes.
O desenvolvimento da poltica esportiva no regime militar o objeto do quinto capitulo, fase de forte uso da viso tecnoburocrtica, sintetizada na realizao do Diagnstico da Educao Fsica e dos Desportos no Brasil. Do Diagnstico resultou a eleio do setor educacional como base alternativa para o desenvolvimento do esporte de alto rendimento, o que segundo aquele projeto, levaria o Pas a se tornar uma potncia olmpica. Esta fase conhecida como a da esportivisao escolar. O Departamento Educao Fsica de Desportos teve destacado papel na centralizao das aes e dos
recursos do governo federal. A centralizao ajudou e controlou a estrutura do esporte (clubes, federaes e confederaes), especialmente o futebol, de acordo com a orientao do regime.
Foi tambm neste perodo que surgiu na Europa o movimento do Esporte para Todos, se colocando como alternativa ao esporte de alto rendimento. O modelo implementado
pelos militares na escola passou a ser chamado de modelo da lgica piramidal e teve sua critica realizada pela comunidade acadmica de educao fsica. Os planos produzidos no redundaram no sucesso esperado, cabendo ao futebol a salvao da reputao do projeto esportivo militar como a conquista do Tri no Mxico, em 1970. Todo o sistema esportivo foi reformulado em 1975 e permaneceu intocvel at 1993.
O sexto captulo analisa o contexto de redemocratizao do pas, com nfase nas mudanas produzidas pela Constituio de 1988 em particular por meio do artigo 217. O esporte ganhou um novo status e passou a demandar poltica publica condizente com
essa situao. Tambm foi importante no perodo a Comisso de Reformulao do Esporte, que conseguiu estabelecer uma agenda de mudanas. Em seguida, opera-se a
modificao infraconstitucional com a Lei Zico. Em contexto de enxugamento do Estado, a Lei foi apresentada como a salvao para o esporte de alto rendimento pela utilizao de mecanismos de mercado. Contudo, foi combatida pelo setor do futebol por avanar demais na estrutura institucional dos clubes.
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O stimo captulo retrata a evoluo institucional recente de Ministrio Extraordinrio ao Ministrio do Esporte. O perodo de grande produo legislativa, iniciando se com a Lei Pel, que modificou a estrutura esportiva formal sem alterar a primazia do apoio estatal ao esporte de alto rendimento. As maiores atenes estiveram, novamente, com o
futebol, quando sucessivas leis desfizeram parte do avano da Lei Pel. Marcante foram as CPIs do futebol, em 2001, que estabeleceram nova agenda legislativa para o setor,
parte dela j efetuada com a aprovao, em 2003, da Lei de Moralizao dos Clubes e com o Estatuto do Torcedor.
O trabalho tem por tema a evoluo da Poltica Pblica do Esporte. Seu objeto de estudo a predominncia e/ou hegemonia do esporte de alto rendimento sobre as demais categorias de manifestao esportiva esporte de participao (lazer) e esporte educacional. Seu objetivo a verificao da alterao ou no deste padro, analisando a evoluo dos gastos do governo federal no perodo de 1995 a 2007 e a proporcionalidade de representao no rgo mximo de aconselhamento do esporte nacional como resultado da ao de coalizes dentro do subsistem a esportivo.
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Captulo 1
Definies, estrutura terica e o problema de pesquisa
Definio dos conceitos
Procuro nesta parte inicial definir os principais conceitos a serem trabalhados ao longo do texto. Em primeiro lugar, o conceito de desporto ou esporte. No Brasil, o uso
indiferente, contudo, a predominncia de esporte. Lira Filho faz famosa discusso desta variao. Diz que na Frana usavam desport significando prazer, descanso, espairecimento, recreio etc. Termo que e foi posteriormente transformado para sport e depois incorporado ao ingls na mesma grafia. J espanhis usavam deporte; italianos deport; portugueses, desporto. A despeito de consulta a Antenor Nascente que justificou o uso do termo esporte, Lira Filho preferiu o arcasmo e ficou com desporto (LYRA FILHO, 1973). Desporto , alias, o termo mais usados nos textos de leis, decretos e a prpria Constituio Federal, mas acompanhado a tendncia geral, sempre que possvel
usarei o termo esporte.
Outro aspecto importante a periodizao. H variaes nas periodizaes utilizadas para o estudo da histria da Educao Fsica e do esporte no Brasil. Por exemplo, as
utilizadas por Castellani Filho, Guiraldelli Junior, Linhales, Venons, Malhes e Tubino entre outros, obedecem aos grandes ciclos polticos-administrativos da histria brasileira
(CASTELLANI FILHO L. , 1988; GUIRALDELLI JNIOR, 1988; TUBINO M. J., 1996).4 Porem, alguns crticos ressaltam que este tipo de periodizaes, focada no aspecto poltico, apresenta o problema de estarem deslocadas de seu principal objeto de estudo.
History of Physical Education whatever its particular subject matter can be shaped by political history, but it is essential, even when studying a particular subject, to organize in a comprehensive way some causal uniformity []The adoption of a periodization centralized in a political and institutional framework is, in fact, submerging the peculiarity of the History of Physical Education and the selection and interpretation of
4 Tubino usa a seguinte periodizao: Brasil Colnia ao Estado Novo (1500-1930); Estado Novo Nova Repblica (1945-1985); Nova Republica (1985, 1989); Perodo Collor (1990 a 1992) (TUBINO J. M., 1996, p. 10).
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the facts are directed by another subject matter rather than that which we are focusing. (GEBARA A. , 1995).
Victor Andrade de Melo argumenta na mesma linha de Gebara:
A periodizao continua a se submeter a especificidades exteriores ao objeto, alm de referendarem uma impresso de continuidade e linearidade, sempre to presente em todas as fases anteriores; a histria entendida como responsvel por explicar linearmente o presente, fato agravado por uma compreenso que parte do presente com hipteses traadas j basicamente confirmadas, o que praticamente faz forjar no passado os elementos necessrios para provar a hiptese inicial; a exasperao da crtica ao carter documental-factual das obras anteriores findou por muitas vezes no dispensar de datas, fatos e nomes, to importantes em qualquer estudo historiogrfico. (MELO V. A., 2007).
Tambm Bourdieu tem na periodizao importante questo: a histria do esporte uma histria relativamente autnoma que, mesmo estando articulada com os grandes acontecimentos da histria econmica e poltica, tem seu prprio tempo, suas prprias leis de evoluo, suas prprias crises, em suma, sua cronologia especfica.
(BOURDIEU, 1984).
Procuro fugir a este problema justificando que o foco desta tese justamente o aspecto poltico-administrativo traduzido em poltica publica para o esporte. Assim, por este
critrio, tenho como natural e prpria a seguinte diviso de perodos: Repblica Velha (1889-1930), Perodo Vargas (1930-1945), Populismo (1945-1964), Ditadura Militar (1964-1985), Redemocratizao (1985 a 2008).
Esporte e Lazer
H profunda inter-relao entre esporte de lazer, o que dificulta a identificao de quando esto juntos ou separados. Nem sempre o esporte lazer e o lazer no se resume absolutamente ao esporte. Em realidade, so categorias que apresentam reas em comum, o que dificulta a conceituao segundo os bons preceitos de categorizao, medio e de cuidado em no esticar o conceito (conceptual stretching). Ou seja,
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quanto mais vaga a definio do que seja o esporte e o lazer, enquanto categorias de atividades, mais se pode alargar o conceito e permitir sobreposies (SARTORI, 1970).
A importncia do lazer para a qualidade de vida e sua funo de consumo na sociedade
moderna hoje inquestionvel e por razes similares tambm abarcado pela mesma estrutura terica do esporte: o uso do tempo livre ou de no-trabalho assim definido
como: uma ocupao escolhida livremente e no remunerada escolhida, antes de tudo, porque agradvel para si mesmo (ELIAS & DUNNING, 1992, p. 107).
Como fenmeno social, comumente definido como produto do processo urbano-
industrial do sculo XIX, na Europa, especialmente na Inglaterra, em funo de demandas individuais e coletivas dos trabalhadores, por maior tempo de folga. A
separao entre tempo de trabalho e tempo livre trouxe a necessidade de organizar prticas e vivencias em tempo e locais apropriados.
Na esfera do trabalho, a seriedade e a disciplina no admitia passatempos e o tempo
livre foi justificado como necessrio ao repouso para a manuteno e reproduo da fora de trabalho. No ambiente social, ter passatempo passou a significar poder e
distino, prprios aos burgueses que dispunham de recursos para inmeras atividades em seu tempo de lazer (WERNECK, 2003). Como sintetiza Gutierrez: O lazer, como instancia distinta e especfica da vida social, s percebido com o advento da Revoluo Industrial e a separao dos espaos familiares, comunitrios e profissionais, ou seja, existe no objeto lazer um aspecto histrico de no-trabalho (GUTIERREZ, 2001, p. 6).5
Diversos estudos apontam que o estabelecimento formal do direito ao tempo livre pela classe operria gerou polmica e apreenso no mundo burgus, pois nada garantia que
esse tempo seria preenchido por atitudes socialmente aceitas pela burguesia. O receio era que fosse destinado a atividades degradantes ou pior, para tramar contra a prpria
burguesia. Da a tentativa desta, no incio do sculo XX, de exercer maior controle
5 Conforme Rodrigues (2006, p. 15), tambm no Brasil, desde o sculo XIX as preocupaes com o lazer aparecia nos discursos dos engenheiros e sanitaristas responsveis pelas reformas urbanas em algumas cidades do Pas, contudo sua efetivao deu-se a partir das conquistas sociais da dcada de 1930, depois sedimentadas com o desenvolvimento econmico na dcada de 1970, momento em que a palavra se incorpora ao vocabulrio comum.
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sobre o tempo livre dos trabalhadores (RODRIGUES M. A., 2006, pp. 71-72). Neste aspecto a burguesia teve o auxlio dos governos de regimes autoritrios como no Brasil com Getlio Vargas (ALMEIDA M. A., 2006).
A despeito destes controles, o lazer se configura como conquista social do trabalho, cujo desenvolvimento, atrelado ao crescimento do tempo livre, o desenvolvimento do esporte
guarda correlao.
Esporte, Educao Fsica e Atividade fsica (ginstica)
Educao Fsica, a atividade fsica e o esporte so conceitos que possuem elementos interligados e o modo de definio de um repercute sobre a forma de definir os outros
dois e vice-versa, principalmente quando se leva em considerao os aspectos subjetivos, tanto da motivao para as prticas quanto da matriz terica utilizada.
No percorrer das leituras sobre o esporte recorrente a meno e inter-relao deste com o a Educao Fsica e a atividade fsica. Esta, em muitos textos, citada como ginstica, no sentido de fazer exerccio fsico. Da o grande uso da citao de Bracht: claro que o esporte, assim como a ginstica, um fenmeno polissmico, ou seja, apresenta vrios sentidos/significados e ligaes sociais. (BRACHT, 1999, p. 75). A polissemia e o polimorfismo so tambm compreendidos como o pluralismo do esporte (GAYA, 2007, p. 2).
H variadas definies segundo a poca e correntes tericas, prprias da cincia da Educao Fsica, cujo aprofundamento vai alm dos objetivos desta tese. Vale o alerta de que a falta de clara conceitualizao do que seja Educao Fsica, atividade fsica e esporte, fez com que em muitos estudos tais elementos fossem tomados de forma misturada, onde o rigor conceitual deu lugar ao senso comum (GEBARA A. , 1995).
Apesar das diferenas conceituas h grande dificuldade da populao e mesmo dos alunos em distinguir as duas reas. Pesquisa de Lovisolo perguntando a alunos sobre
qual a diferena entre a Educao Fsica e o Esporte indica que 47,5% responderam no existir qualquer diferena entre a Educao Fsica e o Esporte; 34,7% no foram
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capazes de emitir qualquer opinio e somente 12,8% responderam existir diferenas, mas no foram capazes de dizer quais so. O que levou o autor a concluir pela perda da especificidade da Educao Fsica e pelo compartilhamento de sua identidade com o esporte (LOVISOLO, 1993).
Tendo tais alertas em mente, procuro dar delimitao prpria (pessoal) e mnima, mas suficientemente clara para os objetivos deste trabalho, cujo objeto no a atividade fsica ou a educao fsica ou mesmo esporte, mas a poltica pblica para o esporte, produzida na esfera federal, e que para tanto demandara, em muitas passagens, abordar aspectos e circunstncias destes conceitos.
Embora temor antigo e em desuso, defino por Ginstica a execuo de grupo de exerccios corporais realizados apenas com o corpo ou com o auxlio de aparelhos, cuja ordem de execuo e freqncia foram sistematizados pelas chamadas escolas ou mtodos como o alemo, sueco e francs. O termo tambm traduzido como exerccio fsico.6 A atividade fsica termo mais amplo que engloba a ginstica e outros modos formais e informais de movimentao corporal que procuram prover o corpo humano com flexibilidade, agilidade, fora muscular e capacidade aerbica. Envolve tanto
atividades esportivas quanto recreacionais e mesmo brincadeiras e atividades culturais como a dana.
J Esporte freqentemente entendido como conjunto especfico de atividades fsicas vigorosas, normatizadas (institucionalizadas) praticadas individualmente ou em grupo, com a finalidade simultnea ou dissociada da busca do ldico, do prazer, do condicionamento fsico e, sobretudo, da competio.7
6 O Atlas do Esporte (2004, p. 14.17), no verbete Educao Fsica Escolar, cita o uso de exerccios
ginsticos, tendo o termo Ginstica se originado no sculo XVIII. J Barbante (1994, p. 129) d ao termo o mesmo significado de exerccio e estabelece sua origem etimolgica a partir dos antigos gregos. 7 Esta definio, no aspecto ldico, contraria Huizinga que em sua obra seminal sobre o Homo Ludens. Ele afirma que o esporte corrompe uma das principais caractersticas do jogo, isto , sua espontaneidade, substituindo o aspecto ldico pela tecnicidade e racionalidade. Huzinga define o jogo como: uma atividade livre, conscientemente tomada como no-sria e exterior vida habitual, mas ao mesmo tempo capaz de absorver o jogador de maneira intensa e total. uma atividade desligada de todo e qualquer interesse material, com a qual no se pode obter lucro, praticada dentro de limites espaciais e temporais prprios, segundo uma certa ordem e certas regras (HUIZINGA, 1992, p. 16).
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A definio de Educao Fsica bem mais complexa. Foi inicialmente definida como educao do fsico pelo uso da ginstica e do esporte, depois ampliou para educao pelo fsico, envolvendo aspectos do desenvolvimento moral (por envolver valores sociais), cerebral (dada a reflexo necessria coordenao e preciso do movimento) e mesmo intelectual (ao abordar criticamente as funes e usos do esporte). Assumo a definio mais ampla de cincia da motricidade humana, qual seja: conhecimentos sistematizados e empregados com a finalidade de entender e educar os movimentos do corpo, de forma individual ou coletiva e de discutir seus significados e efeitos sobre o fsico, psicolgico, social e cultural.8 A mesma idia expressa na seguinte passagem:
As metas traadas pelo professor poderiam ser desenvolver o preparo fsico dos alunos (aspecto biolgico), aumentar sua auto-estima atravs da realizao do movimento (aspecto psicolgico), melhorar sua socializao (aspecto sociolgico), realizar atividades conhecidas e aceitas naquela regio (aspecto cultural) e, por ltimo, relacionar esses aspectos, lembrando que todos sero trabalhados praticamente ao mesmo tempo. (E.EDUCACIONAL, 2007).
H uma disputa no meio acadmico sobre qual vem primeiro, ou qual maior, se a
educao fsica ou o esporte. Em geral, profissionais de educao fsica tendem a colocar sua disciplina em destaque. Todavia, para socilogos ou aqueles que percebem
o uso da educao fsica como instrumento do esporte, principalmente para o de alto rendimento, tendem a colocar o fenmeno esportivo em primeiro plano. Ressalto que a ginstica, atividade fsica e o esporte foram aqui definidos como atividades, ao passo que a Educao Fsica tratada como ramo cientfico e componente curricular.
Definio das trs categorias de esporte: Rendimento, Lazer, Escolar.
Entre muitas definies sobre o esporte, as mais comuns o vinculam prtica do jogo, e como j dito anteriormente, devido presena do exerccio fsico, do carter competitivo, da funo ldica e do efeito psicossomtico, este ltimo usado para 8 Esta definio, bastante divulgada no meio profissional acadmico da Educao Fsica, encontra raiz na tradio racionalista ocidental, a partir de Immanuel Kant que divide o processo educacional em trs partes: a educao fsica ou corporal, por outro a educao intelectual e por fim a educao moral (BRACHT, 1999).
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justificar sua funo higinica. Segundo Tubino (1987, p. 25), tal referencial competitivo vem do francs Roger Caillois, para quem o esporte a forma socializada de competio.9
Nos anos de 1960 surge, na Europa, movimento produzido por alguns intelectuais em oposio ao predomnio do esporte de extrema competio. Tal movimento ajudou tambm a promover a sociologia do esporte. Muitos estudiosos se ocuparam da caracterizao do termo, tanto no sentido individual como coletivo (ANTONELLI, 1963; DIEM, 1966; BOUET, 1968; MAGNANE, 1969; EPPENSTEINER, 1973). Bracht observa que diversos estudos citam a dcada de 1960 como o momento mais importante dessa inflexo (BRACHT, 1999, p. 74). A crtica a predominncia da competio seguiu pela dcada de 1970 com outros autores enfatizando aspectos do esporte escolar e de participao (FEIO, 1978; CAGIGAL, 1979; PIETRO CARZOLA, 1979).
Alm deste movimento, rgos internacionais importantes produziram documentos que
orientaram as reflexes da comunidade internacional sobre o esporte. O Conseil Internationale dEducation Physique Et Sport CIEPS, vinculado UNESCO divulgou em 1964 o documento Manifesto Mundial do Esporte que o conceituou e o dividiu em trs grandes reas para as quais dedica captulos especficos: a) esporte na escola, esporte escolar, esporte educacional ou esporte-educao; b) esporte participao, esporte de lazer ou esporte de tempo livre; c) esporte de alto rendimento (EAR), esporte de alta competio ou esporte-performance.10 Os dois primeiros itens so a novidade, pois at ento s o terceiro compreendia todo o espectro do fenmeno esportivo. Contudo, o mesmo documento atribui ao esporte escolar funo de desenvolver o talento esportivo, o que vinculou o esporte escolar ao de alto rendimento.
9 Roger Caillois deu seqncia ao trabalho de Huizinga sobre o papel dos jogos na sociedade embora divergindo deste em alguns aspectos. Para Caillois, as categorias de jogo so estabelecidas a partir das sensaes e experincias que proporcionam, classificou os jogos em: a) agon (jogos de competio), alea (jogos de azar); mimicry (jogos de mmica); iimix (jogos de vertigem) ((CAILLOIS, 1994). 10
H outras categorizaes como, por exemplo, a de Carzola Pietro (1979) que divide o esporte em: a) esporte como instrumento de sade fsica e mental; b) esporte de entretenimento ou de lazer; c) esporte espetculo ou profissional; d) esporte de alta competio; e) esporte-educao ou Educao Fsica. Dentro da categorizao adotada para este trabalho, entendo o item a como parte do b, o item d como variao do c e o item e como base para os quatro primeiros. J nos anos 1930, no Brasil, Tomas Mazzoni props a seguinte categorizao: a) espetacular, dividida entre profissional e amador; b) esporte diverso, dividido em recreativo e turstico (SANTOS J. A., 2000, p. 181). J Manhes prefere as categorias: a) desporto seletivo, b) desporto participativo.
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Est, portanto, neste documento, a origem da categorizao do esporte que desde ento perdura na maior parte do mundo, inclusive no Brasil desde sua institucionalizao pelo regime militar. Razo pela qual, tal diviso, ser tambm adotada neste trabalho.
Esporte escolar, esporte educacional ou esporte-educao
O esporte educacional voltado majoritariamente a crianas e adolescentes nas escolas de 1 e 2 grau, com a finalidade de desenvolv-las fsica, moral e mentalmente. Ele est diretamente relacionado aplicao da educao fsica como instrumento cientfico de
orientao, controle e desenvolvimento das capacidades e habilidades dos alunos. Contudo, outras atividades fsicas como danas e jogos esto tambm sendo utilizadas dentro do conceito de esporte educacional. A vertente adulta do esporte educacional aparece nas universidades, as quais, apesar das dificuldades em sua implementao, passaram recentemente por reestruturao e reativao. Nesta categoria, o esporte
praticado dentre de escolas e percebido como instrumento educativo, operacionalizado pela educao fsica.
Deve-se ressaltar que os termos esporte educacional e esporte-educao englobam
outras formas de educao pelo esporte, externo s escolas, como nas atividades desenvolvidas em academias, clubes e escolinhas de esporte, majoritariamente as de futebol. Neste contexto, do esporte como instrumento de educao, vem sendo aplicado por governos e ONGs como forma de atender s populaes carentes que tenham crianas e jovens fora da escola ou escolas sem estrutura para a prtica esportiva.
Normativamente, no esporte escolar procura-se desenvolver prioritariamente, desde cedo, o hbito para a prtica esportiva, a conscincia de sua importncia para a sade e
o convvio social e o uso do esporte como meio de formao do carter. Entretanto, como conseqncia natural do ambiente esportivo escolar, h o surgimento de atletas de
grande potencial para o alto rendimento, sendo estes conduzidos ao sistema esportivo formal dos clubes, associaes e federaes, para desenvolvimento paralelo e complementar do esporte amador, de onde os com maior destaque seguem para a carreira esportiva de atletas profissionais. A grande crtica que se faz ao esporte escolar,
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a ser discutida posteriormente no trabalho, a inverso da prioridade do educar e despertar pelas atividades fsicas para o a lgica do alto rendimento.
Esporte de alto rendimento (AER), esporte de alta competio ou esporte-performance
O esporte de alto rendimento (EAR) compreende todas as atividades esportivas fundamentadas na competio sob regras gerais. Seu propsito fundamental a busca da superao, do recorde e da vitria. Exige alto grau de dedicao, o que implica a
busca do profissionalismo, contando geralmente os atletas com remunerao direta por contrato com entidades esportivas e/ou formas de patrocnio. No estgio anterior de semi-profissionalismo os atletas contam com patrocnio e/ou provisionamento de bolsas ou outra forma de renda alternativa que lhes permitam iniciarem e permanecerem em
regime de dedicao compatvel com o nvel de rendimento esperado.
O EAR tem como sustento o espetculo comercial produzido pelos atletas nas mais diversas formas de competies em datas especficas anuais e em campeonatos e torneios sazonais. Est baseado, portanto, no mercado e no mundo privado. Como tal, seletivo e excludente, tanto em termo de sua prtica como em seu consumo. O fetiche
da competitividade do alto rendimento entendido como maior fator responsvel pela expanso do fenmeno esportivo e de sua crescente popularizao em todo o mundo.
O esporte de alto rendimento produzido, gerenciado, organizado e desenvolvido por estruturas internacionais e nacionais, hierarquizadas em comits, confederaes, federaes e ligas que juntas constituem o sistema esportivo dos pases, regies, estados e mesmo municpios. O movimento olmpico o mais completo paradigma desta categoria esportiva. Por sua importncia poltica na esfera das relaes internacionais, muitos pases optaram por modelos de forte apio estatal para o desenvolvimento do EAR, seja de forma indireta, financiando organizaes no governamentais e quase governamentais dedicados ao seu desenvolvimento, como na maioria dos pases
ocidentais, seja por direo direta do Estado.
Diegel apresenta os seguintes elementos gerais do EAR: a) aparato de procura, desenvolvimento e financiamento de talentos bancados pelo Estado; b) pequeno nmero
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de atletas que vivem do esporte-espetculo; c) massa de consumidores que financiam parte do esporte; d) meios de comunicao de massa que so tambm organizadores do esporte-espetculo; e) sistemas de gratificao que varia de acordo como o sistema poltico-societal (DIEGEL, 1986, apud BRACHT, 1997, p. 13).11 Na anlise de linha marxista, o EAR aquilo que o apelo da competio transforma em mercadoria.
Esporte participao, esporte de lazer ou esporte recreativo ou de tempo livre
De modo geral, a literatura faz tanto referncia ao esporte recreativo como tambm esporte de lazer. No obstante, a expresso utilizada pela legislao esporte de participao. Ele engloba a participao em atividades tidas como esportivas, com caractersticas formais ou informais, pela populao em geral, sem o compromisso da
competio ou com esta sendo limitada ao aspecto ldico. Est diretamente relacionado ao uso do tempo livre e ao conceito de bem estar fsico e psicolgico, sendo defendido
por vrias categorias profissionais como importante componente para a sade pblica. Tem, portanto, como objetivo a diverso, o relaxamento, a desconcentrao, a interao social e mais recentemente a interao com a natureza, despertando a conscincia ecolgica na populao.
Obvio que h interao entre o esporte participao com caractersticas de mercado
prprias do esporte de alto rendimento, pois este estabelece o modelo para o consumo de equipamento, material, vesturio e mesmo as prticas em moda como no caso das academias de ginstica ou musculao.
Estrutura terica - Advocacy Coalition Framework
Paul A. Sabatier e Hank C. Jenkis-Smith argumentam que as teorias funcionam como
lentes, instrumentos para melhor enxergar o processo de produo de polticas pblicas. com esta recomendao que procurarei utilizar a estrutura terica da Advocacy
11 DIEGEL, H. ber den Wandel der Werten in Gesellschaft, Freizeit und Sport In: DSB (Hrsg.) Die Zukunft des Sports. Materialien zum Kongress Menschen im Sport 2000. Schorndorf: Karl Holfmann, 1986, p. 14-43.
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Coalition Framework (ACF), proposta por estes autores em 1993 para o estudo da produo e modificao das polticas pblicas (SABATIER & HANK, 1993).
Como estratgia argumentativa, ao longo dos captulos, medida que discorrer sobre a
evoluo, em nvel federal, da poltica pblica para o esporte no Brasil, estruturarei progressivamente a problemtica central da Tese: a predominncia e/ou hegemonia histrica do esporte de alto rendimento e os embates recentes, a partir da Constituio de 1988, para mudar esta situao. Ao percorrer as diversas fases de implementao do tema, destacarei os pontos de aderncia da teoria com a realidade apresentada, para resgat-los, na concluso do trabalho, juntamente com a apreciao das questes e hipteses iniciais do trabalho.
Tenho nesta estratgia dois propsitos: primeiro, utilizar instrumento terico central que ilumine todo o processo de construo do objeto de estudo. Segundo, apreciar a aderncia deste instrumento rea especfica de poltica pblica do esporte no Brasil, uma vez que este veio analtico foi inicialmente desenvolvido para o contexto poltico
dos EUA. Ou seja, pretendo avaliar a portabilidade da estrutura terica ao contexto brasileiro e para a poltica pblica do esporte.
A ACF e a superao dos estgios heursticos
O estudo das polticas pblicas um subcampo da Cincia Poltica. Seu desenvolvimento se deu sobretudo nos EUA, a partir do trabalho inicial de Harold
Lasswell (1951) e David Easton (1965)12, que dividiram o policy process stream (correntes do processo de poltica pblica) em subprocessos funcionais e temporais. Motivado pela proliferao dos programas federais americano da dcada de 1960 (The Great Society programs, da administrao L. B. Johnson), o campo deu um grande salto nas dcadas seguintes, estabelecendo o uso metafrico de estgios de polticas pblicas, teorizados principalmente por Charles Jones (1977), James Anderson (1979) e B. Guy Peters (1986).
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David Easton foi o primeiro a adaptar ao estudo das polticas pblicas o modelo sistmico de input, processamento, output e feedback.
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O paradigma dos estgios enfatiza o conceito de padro de atividade ou processo que desagregado em estgios especficos que representam grupos de atividades: identificao de problemas, estabelecimento da agenda, formulao de poltica pblica, legitimao ou adoo, implementao e avaliao (DYE, 2002, p. 15). Para estes tericos, tais estgios interagem num amplo ambiente que moldado pelo federalismo, instituies polticas e governamentais, cultura poltica, opinio pblica e por uma srie
de outros constrangimentos.
Sabatier (1993) adjetiva os estgios de heursticos por proverem grande ajuda ao entendimento do processo, mas ressalta seus limites metodolgicos, tais como: a) no se constituem realmente em uma teoria causal; b) no possuem um conjunto de pressupostos que especifique as foras que dirigem o processo de um estgio para o
outro; c) no dispem de nmero razovel de hipteses falseveis. Por essas deficincias, o autor defende a substituio dos estgios heursticos e metafricos por novas alternativas de estruturas tericas. Uma delas a de Policy Streams (Correntes de Polticas Pblicas) desenvolvida por John Kingdon (1995) e outra, a prpria Advocacy Coalition Framework - ACF (Estrutura de Coalizes Advocatcias).
Premissas da ACF
Os autores estruturam a ACF com base em quatro premissas:
1. Considerar um espao de tempo de uma dcada ou mais. Uma razovel estrutura terica sobre polticas pblicas deve abordar o espao de uma dcada ou mais, pois, as anlises de curto tempo subestimam a influncia da produo de pesquisa aplicada e o papel do debate tcnico sobre crticos aspectos de polticas pblicas. A ACF salienta que a informao tcnica altera, no tempo, a percepo e os conceitos dos policy makers (fazedores de poltica pblica) atravs da enlightenment function (funo esclarecedora). Portanto, o efeito cumulativo de estudos e conhecimentos tem grande influncia no redirecionamento das polticas pblicas.
2. Estabelecer o conceito de subsistema como a mais til unidade de anlise para entender mudanas em polticas pblicas. Um subsistema composto e
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delimitado por grupo de atores (instituies e rgos governamentais, empresas, ONGs, pesquisadores, jornalistas, personalidades, demais indivduos) de uma comunidade que esto ativamente envolvidos em um especfico problema ou rea de poltica pblica, tais como: poluio ambiental, produo de energia,
sade mental, controle de armas, esporte etc.
3. Os subsistemas tm natureza ampla e intergovernamental. Os subsistemas so compostos por atores formados a partir das mais variadas
organizaes sociais, governamentais e privadas. Seu escopo deve inclui vrios nveis governamentais ativos na formulao e implementao da poltica pblica
e deve considerar centenas de instituies, dezenas de eleies e de tringulos de ferro.13
4. As polticas pblicas so conceituadas como sistemas de crenas (belief systems). Polticas pblicas incorporam teorias sobre como atingir determinados objetivos, portanto envolvem valores, prioridades, relaes causais e percepes da magnitude dos problemas e da eficcia dos instrumentos de interveno. A
possibilidade de relacionar crenas e polticas pblicas oferece melhor condio de anlise da influncia de vrios atores no tempo.
A Estrutura analtica da AFC
H na estrutura dois conjuntos de variveis exgenas, um bastante estvel e outro mais dinmico. Ambos afetam a rea de recursos (oportunidades) e de restries aos atores. Dentro do subsistema operam as advocacy coalitions,14 compostas por atores que agem em unidade por compartilharem conjunto de crenas normativas e causais. Cada coalizo adota estratgias especficas que visam manter o status quo ou estabelecer
inovaes institucionais de acordo com seus interesses e objetivos.
13 A literatura de Cincia Poltica define triangulo de ferro como a interao promscua existente entre agncia administrativa governamental, comit legislativo e um especfico grupo de interesse afetado pela regulao e controle governamental. 14
Quando no usarmos o termo em ingls, o traduziremos por coalizo, em vez de coligao, para no dar o mesmo sentido atribudo comumente coligao de partidos polticos.
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As mediaes e decises geram programas governamentais expressos por polticas pblicas que produzem efeitos no nvel operacional, realimentando interna e externamente os parmetros do problema em questo. A percepo da adequao das decises governamentais avaliadas com base nos impactos resultante da poltica
pblica, bem como as novas informaes que chegam da dinmica dos eventos externos, fora as coalizes a reverem suas estratgias e metas ou mesmo a alterar suas
crenas. A figura 1 esquematiza a estrutura da ACF.
Figura 1 - Viso geral da estrutura da ACF
Parmetros relativamente estveis
1. Atributos bsicos da rea.2. Distribuio de recursos
naturais.
3. Estrutura social e valores socioculturais fundamentais.
4. Estrutura constitucional bsica (regras).
Eventos externos (Dinmicos)
1. Mudanas em condies socioeconmicas.
2. Mudanas na opinio pblica.
3. Mudanas no sistema de coligao governamental.
4. Impactos de polticas pblicas e de decises de outros subsistemas.
Recursos e restries dos atores
do subsistema
Coalizo Aa. crenas b. recursos
Coalizo Ba. crenas b. recursos
mediadores
EstratgiaA1
EstratgiaB1
Decises soberanas
(Parlamento, Cortes, populao)
Recursos de agncias e orientao geral de poltica pblica
Produtos da poltica pblica
Impactos da poltica pblica
Subsistema = rea de poltica pblica
Fonte: (SABATIER & HANK, 1993, p. 18 2 224).
Fatores externos que afetam as mudanas de polticas dentro dos subsistemas
A ACF pressupe a existncia de inmeros subsistemas inter-relacionados compondo
um sistema poltico maior em que os fatores estveis devem ser distinguidos dos mais dinmicos ou no to estveis. Os parmetros relativamente estveis podem se manter
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inalterados por dcadas, o que desencoraja os atores a torn-los objeto de suas estratgias. Esses fatores podem limitar a amplitude de alternativas possveis ou podem afetar os recursos e crenas dos atores dentro do subsistema.
Parmetros relativamente estveis
Os seguintes parmetros, relativamente estveis, constrangem significativamente as
opes disponveis para os atores de um subsistema.
1. Atributos bsicos da rea problemtica (bens). A teoria da escolha pblica tem mostrado como vrias caractersticas dos bens, como a excludncia, afetam
as opes institucionais de polticas. Ostrom (1990) tipificou a tragdia dos comuns sobre reas de explorao de recursos naturais em que o mercado no
consegue regular eficientemente e necessita o apoio do Estado.
2. Distribuio bsica de recursos naturais. A abundncia ou carncia de recursos naturais disponveis em uma sociedade condicionam suas possibilidades de desenvolver diferentes setores econmicos e determinam a viabilidade das opes de polticas pblicas.
3. Estrutura social e valores culturais fundamentais. Significativas mudanas no poder, na influncia e nos recursos financeiros de vrios grupos sociais
normalmente requerem diversas dcadas. Para muitos grupos de interesse, os recursos polticos, ou mesmo a falta deles, mudam muito lentamente no tempo e
os atores dentro de um subsistema devem levar isso em conta na formulao de suas estratgias de curto e de mdio prazo.
4. Estrutura constitucional. Na maioria dos sistemas polticos a estrutura legal
mais profunda muito resistente a mudanas. o caso da Constituio dos EUA. As tradies legais como as regras dos tribunais e as normas fundamentais
que regem os atos administrativos tambm tendem a permanecer estveis por longos perodos.
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Mudar profundamente estes parmetros no impossvel, porm difcil, pois requerem um esforo concentrado de uma coalizo por ao menos uma dcada.
Sistema dinmico de eventos.
H mudanas em fatores que podem ocorrer em um espao de uma dcada ou menos.
Tais mudanas afetam profundamente os recursos e oportunidades dentro de um subsistema e representam desafio constante aos atores pela necessidade de antecip-las
e de responder a elas de maneira consistente com as crenas e interesses que os coligam. Por vezes os atores em uma advocacy coalition operam por anos para obter alguma vantagem comparativa frente aos seus competidores e, repentinamente, podem ver seus esforos comprometidos por eventos externos sobre os quais no tm controle. So os
seguintes os fatores dinmicos do sistema:
1. Condies socioeconmicas e tecnolgicas. Alteraes nessas reas podem afetar substancialmente um subsistema a ponto de enfraquecer os pressupostos causais que justificam a atual poltica pblica ou podem alterar o suporte poltico determinada coalizo.