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POLÍTICAS PÚBLICAS URBANAS, ESPAÇO PÚBLICO E SEGREGAÇÃO EM UMA CIDADE MÉDIA: O CASO DE MARINGÁ – PR. RESUMO A presente pesquisa analisa a produção do espaço urbano em uma cidade de porte médio, polarizadora de uma região de larga abrangência: Maringá, localizada na região Norte Central do Estado do Paraná. Busca-se relacionar a produção do espaço com os campos da dominação e da apropriação a partir das ações políticas e as do mercado imobiliário. Constata-se que a produção do espaço urbano de Maringá propicia a segregação social, afastando os moradores de baixa renda para os municípios do seu entorno, cujos resultados são experimentados contemporaneamente numa conformação social que faz brotar as contradições mais perversas. Essas contradições legitimam a ordem que as reproduzem num claro percurso rumo ao esfacelamento das possibilidades de manutenção da coesão social. A produção de condomínios de luxo e a desafetação da função pública de áreas de terras municipais são exemplos atuais da reprodução dessas contradições. Por meio deste artigo, procuramos analisar o espaço urbano maringaense na perspectiva de sua produção, relacionando os campos da dominação e da apropriação a partir das ações políticas e as do mercado imobiliário. 1 INTRODUÇÃO O desenvolvimento urbano experimentado nas quatro últimas décadas não pode ser distinto de todos os que se incluem no sistema capitalista, que é fundamentado na desigualdade. Todavia, a implementação de espaços públicos num território urbano minimiza o impacto do crescimento, constituindo-se como uma garantia aos moradores de usufruto do direito à cidade. É no espaço público que convivem as questões coletivas; é onde se travam os diálogos e os encontros entre as diferenças; é o lócus privilegiado do exercício da democracia. Entendemos o espaço público como local pertencente a toda população, independente da posição que ocupa na sociedade capitalista; assim sendo é função desse

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POLÍTICAS PÚBLICAS URBANAS, ESPAÇO PÚBLICO E SEGREGAÇÃO EM UMA CIDADE MÉDIA: O CASO DE MARINGÁ – PR.

RESUMO

A presente pesquisa analisa a produção do espaço urbano em uma cidade de porte médio, polarizadora de uma região de larga abrangência: Maringá, localizada na região Norte Central do Estado do Paraná. Busca-se relacionar a produção do espaço com os campos da dominação e da apropriação a partir das ações políticas e as do mercado imobiliário. Constata-se que a produção do espaço urbano de Maringá propicia a segregação social, afastando os moradores de baixa renda para os municípios do seu entorno, cujos resultados são experimentados contemporaneamente numa conformação social que faz brotar as contradições mais perversas. Essas contradições legitimam a ordem que as reproduzem num claro percurso rumo ao esfacelamento das possibilidades de manutenção da coesão social. A produção de condomínios de luxo e a desafetação da função pública de áreas de terras municipais são exemplos atuais da reprodução dessas contradições. Por meio deste artigo, procuramos analisar o espaço urbano maringaense na perspectiva de sua produção, relacionando os campos da dominação e da apropriação a partir das ações políticas e as do mercado imobiliário.

1 INTRODUÇÃO

O desenvolvimento urbano experimentado nas quatro últimas décadas não pode ser distinto de todos os que se incluem no sistema capitalista, que é fundamentado na desigualdade. Todavia, a implementação de espaços públicos num território urbano minimiza o impacto do crescimento, constituindo-se como uma garantia aos moradores de usufruto do direito à cidade. É no espaço público que convivem as questões coletivas; é onde se travam os diálogos e os encontros entre as diferenças; é o lócus privilegiado do exercício da democracia. Entendemos o espaço público como local pertencente a toda população, independente da posição que ocupa na sociedade capitalista; assim sendo é função desse

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espaço satisfazer a todos. Essa satisfação se faz através do uso público e espontâneo de ruas e praças; na possibilidade de pessoas de diferentes grupos sociais passar e observar os outros passarem; admirar vitrines e fazer compras; praticar alguma atividade esportiva ou simplesmente não fazer nada; participar de manifestações políticas, culturais ou religiosas. Assim, os estudos dos espaços públicos como praças, ruas e avenidas de uma cidade média se revestem de fundamental importância, pois eles são, ao mesmo tempo, produto dos inúmeros agentes sociais que ao produzirem o consomem, mas também é, simultaneamente, condição de reprodução das relações sociais e meio indispensável para que essas relações aconteçam.

Constata-se que a forma de produção do espaço urbano de Maringá propicia a segregação social, afastando os moradores de baixa renda para os municípios do seu entorno, cujos resultados são experimentados contemporaneamente numa conformação social que faz brotar as contradições mais perversas. Essas contradições legitimam a ordem que as reproduzem num claro percurso rumo ao esfacelamento das possibilidades de manutenção da coesão social. É possível observar que ocorre um vertiginoso crescimento do setor imobiliário e a legislação urbanística maringaense, ao invés de estabelecer instrumentos de controle e reversão dessa segregação, tem reforçado essa situação. A produção de condomínios de luxo e a desafetação da função pública de áreas de terras municipais são exemplos atuais da reprodução dessas contradições. O órgão executivo de Maringá e dos municípios mais afetados por esse processo, não articulam políticas regionais, objetivando conter a segregação da população de menor poder aquisitivo.

Este trabalho discute o tema do espaço público maringaense, na perspectiva de sua produção, relacionando os campos da dominação e da apropriação a partir das ações políticas e as do mercado imobiliário. Utilizamos como fonte de reflexão os pressupostos teóricos que incluem os conceitos de desigualdade social, segregação, espaço urbano, público e privado, ou seja, um referencial contido na literatura nacional e internacional mais recente, adotada principalmente pelas áreas da geografia, da sociologia e do urbanismo. Utilizamos também, resultados de pesquisas efetuadas pelo Observatório das Metrópoles – Núcleo Região Metropolitana de Maringá, do qual fazemos parte.

2 A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO EM MARINGÁ

A cidade de Maringá (Figura 1) surgiu no final da década de 1940, criada com o objetivo de ser transformada em um pólo regional. Em 2010, com 63 anos, Maringá, com uma população estimada de 335.211 habitantes1, também chamada Cidade Canção2, é conhecida pelo verde intenso em suas ruas e avenidas. A cidade tem uma localização privilegiada no sistema rodoviário regional, o que permite o escoamento de sua produção, assim como a comercialização de mercadorias de uma forma mais intensa para toda a região (MENDES & GRZEGORCZYK, 2003). Além disso, é referência para uma vasta área no segmento de serviços, onde se destaca a rede de instituições de ensino, em especial

1 Estimativa populacional para 2009. Fonte: IBGE. 2 A denominação “Cidade Canção” é em razão de o nome Maringá ser referente a uma canção de autoria de Joubert de Carvalho, composta em 1932, grande sucesso à época da colonização da cidade, popularmente conhecida e cantarolada por todos os que trabalhavam na abertura da cidade.

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o superior, contando com 9 faculdades e uma universidade, a Universidade Estadual de Maringá (UEM), e também para a área de saúde, que é composta por inúmeros hospitais e clínicas, que dão cobertura a praticamente todas as especialidades e a intervenções de alta complexidade.

Fig. 1 Localização da Cidade de Maringá O que pode ser constatado é que Maringá foi implantada como cidade planejada, trazendo em sua concepção os pressupostos de ordem e controle. Desde o início, o projeto de Jorge Macedo Vieira3 determinou a ocupação do espaço urbano de tal maneira que, de antemão, sabia-se onde deveriam morar as diferentes camadas sociais da população. Nesse contexto, um lote de terras na Zona 2, custava até 10 vezes o valor de um lote de igual tamanho na Zona 3 (vila Operária); os bairros Zona 4 e Zona 5 eram destinados aos proprietários rurais, em sua maioria fazendeiros; A Zona 1 era destinada ao comércio e a Zona 7 à

3 Jorge Macedo Vieira (1894-1978), paulista, arquiteto e urbanista, que já constava em seu currículo projetos como o do Jardim Paulista da cidade de São Paulo e de Águas de São Pedro, no interior do estado de São Paulo, foi contratado pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná – CMNP para desenvolver o projeto de Maringá. Vale destacar que Vieira nunca veio à Maringá.

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colônia japonesa e aos trabalhadores braçais (carpinteiros, carroceiros, carregadores etc.). Nas palavras de Rodrigues (2004), “...as zonas residenciais do projeto de Maringá não se configuraram apenas enquanto espacialização de distintas funções, mas têm sua ocupação claramente definida por uma classificação socioeconômica: principal, popular e operária”. Na atualidade, os bairros, que inicialmente eram destinados às camadas mais pobres da população (Zona 7, Vila Operária, Mandacaru etc.), foram sendo incorporados, ao longo do crescimento da cidade, pelas classes mais abastadas, pois se localizavam em áreas contíguas à zona principal. Em termos da dinâmica urbana recente, constatam-se dois tipos de movimentos: parte dos segmentos de classe média e alta tende ao isolamento em condomínios horizontais fechados e as camadas trabalhadoras, por conta dos elevados valores dos terrenos urbanos em Maringá, buscam seu local de residência principalmente nos municípios de Sarandi e Paiçandu, que compõem com Maringá uma área de conurbação. Esse processo de segregação dos trabalhadores pobres tem sido objeto de várias pesquisas no âmbito das políticas públicas urbanas (Tonella e Rodrigues, 2003; Rodrigues, 2004).

3 A REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ

Para compreender o desenvolvimento urbano de Maringá é mister que se faça relação com a dimensão regional, pois a dinâmica da ocupação intraurbana que caracteriza Maringá só pode ser explicada pela dinâmica correspondente da ocupação dos municípios do entorno, hoje configurado na formatação de região metropolitana. A Região Metropolitana de Maringá (Figura 2) foi criada pela Lei nº 83/98, baseada no projeto de lei do deputado Joel Coimbra, constituída pelos municípios de Maringá, Sarandi, Marialva, Mandaguari, Paiçandu, Ângulo, Iguaraçu e Mandaguaçu. Por meio da Lei Complementar nº 13.565-2002, de acordo com o projeto de lei do deputado Ricardo Maia, foi incorporado o município de Floresta. Já em 2005, foi instituída a lei complementar nº 110, de autoria da deputada Cida Borghetti, sendo incluídos os municípios de Astorga, Itambé, Dr. Camargo e Ivatuba.

Apesar da RMM ser composta oficialmente por 13 municípios, a realidade mostra que apenas os municípios de Sarandi4 e Paiçandu5 conurbam com a cidade pólo6, propiciando que seus moradores executem movimento pendular em sua direção. Esse processo de conurbação, embora tenha sido iniciado na década de 1980, acentuou-se nos anos 1990, principalmente em decorrência das transformações econômicas ocorridas na região, e a política pública habitacional institucionalizada em Maringá nas duas últimas décadas, que resultou na expulsão gradativa de imenso contingente de pessoas para os municípios anexos, em especial Sarandi e Paiçandu.

4 Sarandi, que foi desmembrado do município de Marialva em 01/02/1983, conta com uma população de 79.686 habitantes (Contagem populacional, 2007. fonte: IBGE). 5 Paiçandu, que foi fundada em 19/11/1961, conta com uma população de 34.640 habitantes (contagem populacional, 2007. Fonte: IBGE). 6 Também é possível verificarmos esse processo de conurbação com a cidade de Marialva, mas o movimento pendular não acontece como em Sarandi e paiçandu.

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Fig. 2 Região Metropolitana de Maringá

Esses dados apresentados possibilitam que Maringá seja constantemente associada a uma imagem que a coloca entre as melhores cidades do país, quanto à qualidade de vida. Durante o ano de 2005 a cidade esteve em destaque na mídia: a revista Época (edição nº 359, de 04/04/2005) divulgou pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA), a partir da qual se construiu um Ranking no qual Maringá aparece em primeiro lugar no que se refere à taxa de homicídios. As forças econômicas e políticas locais, utilizaram essa classificação inferindo que a cidade era a menos violenta do Brasil e, portanto, uma cidade muito tranqüila no tocante à questão de segurança pública; o programa Globo Repórter da Rede Globo de Televisão veiculou grande matéria

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propagando as qualidades de vida da cidade, em especial a segurança de seus moradores; o jornal Gazeta Mercantil premiou Maringá por ter sido o município mais dinâmico de 2004; a revista Veja destacou os atletas que a cidade gerou para as Olimpíadas.

Em contrapartida, como qualquer cidade, Maringá não é perfeita, mas vem buscando manter essa imagem de “cidade segura, ajardinada e bela” (TONELLA & RODRIGUES, 2003). Para essas autoras, vem se produzindo na história da cidade, uma “cerca invisível”, que “se materializa na visão da população da sede regional ao considerar que todos os pedintes, as crianças e os malabaristas nos semáforos, sejam moradores das cidades vizinhas”.

4 O ESPAÇO PÚBLICO E A SEGREGAÇÃO EM MARINGÁ

O desenvolvimento urbano experimentado por esta espacialidade não poderia ser distinto de todos os que se incluem no sistema capitalista, que se fundamenta na desigualdade. Todavia, a implantação de espaços públicos num território urbano minimiza o impacto do crescimento, constituindo-se como uma garantia aos moradores de usufruto do direito à cidade. É no espaço público que convivem as questões coletivas; é onde se travam os diálogos e os encontros entre as diferenças; é o lócus privilegiado do exercício da democracia.

Sob esse prisma, a concepção moderna do espaço público coloca-o como um “possibilitador de encontros impessoais e civilizados que obedeciam e respeitavam a lógica do próprio sistema, assumidamente desigual” (SOBARZO MIÑO, 2004, p. 95). Para Corrêa (2004, p.8), nas cidades acontecem “as relações espaciais de natureza social, tendo como matriz a própria sociedade de classes e seus processos”. Esse autor considera que “o espaço da cidade capitalista é fortemente dividido em áreas residenciais segregadas, refletindo a complexa estrutura social em classes” (CORRÊA, 2004, p.8).

Fragmentada, articulada, reflexo e condicionante social, a cidade também é o lugar onde diversas classes sociais vivem e se reproduzem. Isto envolve o quotidiano e o futuro próximo, bem como as crenças, valores e mitos criados no bojo da sociedade de classes e, em parte, projetados nas formas espaciais: monumentos, lugares sagrados, uma rua especial etc. O espaço urbano assume assim uma dimensão simbólica que, entretanto, é variável segundo os diferentes grupos sociais, etários, etc. (CORRÊA, 2004, p.9).

Ainda conforme Corrêa (2004), o espaço urbano é cenário e objeto das lutas sociais, ferramentas imprescindíveis para se alcançar o direito à cidade, à cidadania plena e igual para todos.

Lefebvre (2004a, p.65) explica que as cidades são constituídas de dimensões. A dimensão simbólica, representada por monumentos, praças, avenidas e vazios, que simbolizam os cosmos, o mundo, a sociedade e o Estado; a dimensão paradigmática, que mostra as imposições, como as partes interna e externa, centro e periferia, o integrado à sociedade urbana e o não-integrado; por último a dimensão sintagmática, que é a ligação dos elementos, articulação das isotopias e das heterotopias. Assim, em seu nível específico,

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...a cidade se apresenta como um subsistema privilegiado porque é capaz de refletir, de expor os outros subsistemas e de oferecer como um “mundo”, como uma totalidade única, na ilusão do imediato e do vivido. Exatamente nesta capacidade residem o charme, a tonicidade, a tonalidade própria da vida urbana (LEFEBVRE, 2004a, p. 65).

Mas Lefebvre (2004b, p.51) alerta-nos que o fenômeno urbano contemporâneo surpreende por sua enormidade e complexidade, que acabam por ultrapassar os meios do conhecimento e os instrumentos da ação prática. Para esse autor, os fenômenos sociais vão de uma certa complexidade (relativa) a uma complexidade maior.

Maricato (2002, p.23) denomina essa complexidade por “tragédia urbana” e explica que esse fenômeno não é produto das décadas perdidas, mas, sim, “tem suas raízes muito firmes em cinco séculos de formação da sociedade brasileira, em especial a partir da privatização da terra (1850) e da emergência do trabalho livre (1888)”.

Castells (2000) considera que os processos de urbanização e autonomia do modelo cultural “urbano” se manifestam como processos paradoxalmente contraditórios. E explica:

O desenvolvimento do capitalismo industrial, ao contrário de uma visão ingênua muito difundida, não provocou o reforço da cidade e sim o seu quase desaparecimento enquanto sistema institucional e social relativamente autônomo, organizado em torno de objetivos específicos. Com efeito, a constituição da mercadoria enquanto engrenagem de base do sistema econômico, a divisão técnica e social do trabalho, a diversificação dos interesses econômicos e sociais sobre um espaço mais vasto, a homogeneização do sistema institucional, ocasionam a irrupção da conjunção de uma forma espacial, a cidade, e da esfera de domínio social de uma classe específica, a burguesia. b (CASTELLS, 2000, p. 45).

Ainda no entender de Castells (2000), as cidades atraem as indústrias devido a dois fatores essenciais, que são a mão-de-obra e o mercado consumidor, e em troca desenvolve a possibilidade de empregos, além de criar novos serviços para atender essas indústrias. Mas a recíproca também é importante, pois onde existem matérias-primas e meios de transporte, a indústria coloniza e provoca a urbanização. Com efeito, o desenvolvimento de técnicas em sistemas de transportes, produção e administração, expandiram as relações comerciais entre as pessoas e lugares, propiciando as constantes organizações dos espaços urbanos, onde os encontros comerciais acontecem.

È possível observar que as grandes zonas industriais brasileiras se desenvolveram próximas das grandes vias regionais, a princípio junto às ferrovias e num segundo momento ao longo das rodovias. Villaça (2005, p.165) aponta que isso pode ser observado em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre e Belo Horizonte.

Em várias dessas cidades as principais ferrovias e rodovias são muito próximas umas das outras, e não é possível saber se houve, por parte das indústrias, opção por uma ou por outra. Em quase todos os casos, entretanto, as principais zonas industriais se desenvolveram junto às vias regionais mais movimentadas, ou

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seja, aquelas que estabeleciam as ligações regionais mais importantes (VILLAÇA, 2005, p.135).

Nesse aspecto, o poder municipal (no caso a administração pública) se apresenta como o gestor dos interesses coletivos. Todavia, isso existe como um ideal não cumprido ou, ao menos, não cumprido em sua plenitude. É visível que a gestão do poder municipal mostra um misto de interesses públicos e privados, que pode ir de interesse político/financeiro do próprio gestor até aos interesses das elites dominantes que o apóiam.

5 ESPAÇO PÚBLICO, AGENTES IMOBILIÁRIOS E A ACUMULAÇÃO DE

CAPITAL

As cidades brasileiras recriam hoje a desigualdade através da implantação de condomínios de luxo, Shopping Centers, centros empresariais etc. e, em Maringá, isso igualmente ocorre. Como aponta Carlos (2001, p.29), “o espaço se revela como instrumento político intencionalmente organizado”, dominado pelo Estado – no caso o poder público municipal -, nas mãos de uma classe dominante. Nesse processo, os excluídos permanecem em órbita, e lutam para constituir ou adquirir uma identidade enquanto cidadão. Fora do sistema, esses pseudo-cidadãos tornam-se obsoletos frente à incorporação dos novos valores e tecnologias.

No entendimento de Sobarzo Miño (2006), “Esse espaço de dominação caracteriza-se por servir aos interesses do Estado de se apresentar como redutor das contradições, mesmo que somente no plano das aparências, porque a contradição é um aspecto marcante da sociedade capitalista e do espaço produzido por ela” (p..97).

Essa forma de dominação, ao invés de reduzir as contradições, produz a desigualdade. Essa desigualdade é bastante significativa nas condições de trabalho. Historicamente, na região maringaense, a divisão social do trabalho foi sustentada por uma matriz produtiva concentrada na atividade agropecuária (MOURA et al, 2007, p.10). Essa atividade agropecuária sofreu profundas mudanças principalmente a partir da década de 1980, com a substituição do cultivo do café, que correspondia a um modo tradicional de produção, por culturas de trato mais moderno como a cana-de-açúcar e a soja, tendo como conseqüência o êxodo rural. Entretanto, a espacialidade do trabalho vem se modificando devido à diversificação da indústria, a consolidação de um meio educacional e um pólo de prestação de serviços especializados (saúde e tecnologia da informação). Esta nova realidade, construída a partir da década de 1990, impõe a necessidade de uma especialização elevada que contribui para a precarização do trabalho no sentido de que não há oferta para todos, e também pela falta de capacitação/especialização exigida pela estrutura produtiva atual. Com isso, a desigualdade é ampliada com baixos salários, subemprego, alta rotatividade nos postos menos especializados. O reflexo mais importante se dá nas cidades conurbadas com Maringá: Sarandi e Paiçandu7, que vêem seus trabalhadores se sujeitarem a atividades marginalizadas como guardadores de carros (flanelinhas), catadores de lixo, prostitutas,

7 Como foi dito anteriormente, já é possível observarmos o processo de conurbação também com o município de Marialva, mas, diferentemente de Sarandi e Paiçandu, praticamente não verificamos o movimento pendular de moradores dessa cidade em direção à Maringá, pois nessa localidade verificamos uma grande oferta de trabalho em pequenas propriedades agrícolas que produzem uvas de mesa finas.

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esmoleres, mendigos, entre outros. Segundo Pasternak (1998, p. 11) esses cidadãos “são fruto da pauperização crescente, do desemprego e da degradação do tecido social”.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É fato que não existem mas estoques de terras no perímetro urbano de Maringá para atender segmentos populares, as chamadas classes C e D. Iniciativas recentes deflagradas pelo governo federal, instituiu pela Lei Federal 11.124/05, Sistema e o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS/ FNHIS) e seu Conselho Gestor, criando as condições legais e institucionais para a consolidação do setor habitacional como política de Estado. Já como resultado do novo sistema, a Secretaria Nacional de Habitação estruturou o Plano Nacional da Habitação (Planhab). O Planhab vem a se somar a um conjunto de ações e medidas de natureza institucional, econômica e jurídica que têm por objetivo dar corpo e consistência ao Sistema Nacional de Habitação. No ano de 2007 ocorreu a adesão de Estados e Municípios ao SNHIS. A adesão é condição necessária para o fortalecimento da nova organização institucional do setor, tendo como compromisso a elaboração de seus Planos de Habitação de Interesse Social, além da constituição do Fundo de Habitação de Interesse Social e seu Conselho Gestor.

Os dados quantitativos e qualitativos reunidos sobre as necessidades habitacionais apontam que os déficits mais expressivos concentram-se cada vez mais nas áreas urbanas e nas faixas mais baixas de renda da população e estão localizadas, principalmente, nas Regiões Metropolitanas. Calcula-se o déficit no Brasil em torno de 8 milhões de moradias. Em 2000, 88,2% do déficit habitacional urbano do País correspondiam a famílias com renda de até cinco salários mínimos. O déficit quantitativo tem se ampliado nas faixas de renda de até 2 salários mínimos, fenômeno que se verifica em todas as regiões do País, principalmente nas metropolitanas, e representa cerca de 4,2 milhões de moradia.

A qualidade das moradias existentes para a população com essa faixa de renda apresenta inúmeras deficiências: algum tipo de carência de padrão construtivo, situação fundiária, acesso aos serviços e equipamentos urbanos, entre outros.

Visando o segmento habitacional para a população de baixa renda foi lançado, também, o audacioso Programa “Minha Casa Minha Vida”, também focando a população de 0 a 3 salários e de 3 a 5 salários. Apesar de Maringá ter se habilitado para receber vultosos recursos para moradia social, a concretização de moradia popular esbarra na impossibilidade de locais acessíveis para a implementação dos projetos.

7 REFERÊNCIAS CARLOS, A. F. A. (2001) Espaço-Tempo na Metrópole: a fragmentação da vida cotidiana. Contexto, São Paulo.

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