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JANEIRO 2002 Nº 71 www.revistapesquisa.fapesp.br TECNOLOGIAS LIMPAS COM ECONOMIA DE CUSTOS NOVAS ESTRATÉGIAS PARA COMBATER O AMARELINHO Fumaça produzida na grande São Paulo pode chegar a cidades a 400 km de distância Poluição de longo alcance

Poluição de longo alcance

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Pesquisa FAPESP - Ed. 71

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Page 1: Poluição de longo alcance

JANE

IRO 2

002N

º71 www.revistapesquisa.fapesp.br

TECNOLOGIAS LIMPAS COM ECONOMIA DE CUSTOS

NOVAS ESTRATÉGIASPARA COMBATER O AMARELINHO

Fumaça produzida na grande São Paulo pode chegar a cidades a 400 km de distância

Poluição de longoalcance

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 3

Capa: Hélio de Almeida sobre foto de Eduardo Cesar

28A poluição de São Paulo

agora é um problemaregional: a fumaça

da região metropolitanapode chegar a cidades

distantes até 400 km

18Projeto Genoma Brasileiro finaliza o seqüenciamento da bactéria Chromobacterium violaceum, realizado por 25 laboratórios de todo o país

70Banco de dados alimentaráanálises e previsões demédio e curto prazos sobreos resultados da inserçãobrasileira no mercado global

56As vantagens das chamadastecnologias limpas que promovem a reciclagem,diminuem os resíduos de matéria-prima, provocammenos danos ao ambiente e são mais econômicas para as empresas

CARTAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4EDITORIAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5MEMÓRIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

POLÍTICA CIENTÍFICAE TECNOLÓGICA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8ESTRATÉGIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

SEMINÁRIO DEBATE PESQUISA E MERCADO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

CGEE ANALISARÁ DESCENTRALIZAÇÃO DE RECURSOS DO MCT . . . . . . . . . . . . . . . . 14

CONSÓRCIO VAI SEQÜENCIAR GENOMA DO CAFÉ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

CNPQ INVESTE EM LABORATÓRIOS DE BIOINFORMÁTICA . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

TIDIA VAI AVALIAR 123 PRÉ-PROJETOS . . . 22

CIÊNCIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24LABORATÓRIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

AS DESCOBERTAS SOBRE A AGROBACTERIUM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

POR QUE OS POVOS DA AMÉRICA DO SUL SÃO DIFERENTES . . . . . . . . . . . . . . 42

COPAÍBA CONTRA O CARUNCHO . . . . . . . 46

COMO O UNIVERSO SE ILUMINOU . . . . . . 48

TECNOLOGIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52LINHA DE PRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . 52

MANTA DE FIBRAS ÓPTICA CURA ICTERÍCIA EM BEBÊS . . . . . . . . . . . . . 62

NARIZ ELETRÔNICO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66

VIDRO RECICLADO VIRA FILTRO PARA USO NA AGRICULTURA . . . . . . . . . . . 68

HUMANIDADES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70UM ESTUDO SOBRE A SOCIOLOGIA DA CULTURA . . . . . . . . . . . . . 74

A MORTE DE VILMAR FARIA . . . . . . . . . . . . 77

PROJETO FAZ ANÁLISE DA OBRA DE TOMIE OHTAKE . . . . . . . . . . . . . . . 78

LIVROS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80LANÇAMENTOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81ARTE FINAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82

36Estudos indicam quais as novasestratégias de combate à praga doamarelinho, que ataca os laranjais

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C A R TA SC A R TA S

gia Molecular e Engenharia Genéti-ca (CBMEG) da mesma universida-de. Adoro a revista.

GISELE CHAN

Campinas, SP

Há algum tempo acompanhocom interesse as edições da revistaPesquisa FAPESP, emprestando osexemplares de colegas. Recentemen-te assumi a responsabilidade peladisciplina de Metodologia Científi-ca de nossa unidade, fazendo meuinteressse pela revista aumentar,pois por meio das reportagens bus-co informações atualizadas e subsí-dios para discussões em aula.

ROGÉRIO N. OLIVEIRA

FACULDADE DE ODONTOLOGIA/USP São Paulo, SP

Gostaria de cumprimentar a re-vista Pesquisa FAPESP pela excelen-te qualidade das informações cien-tíficas que tanto contribuem para odesenvolvimento de novas tecnolo-gias e o despertar científico para mui-tos jovens, como eu.

ALEXANDRE DOS SANTOS

Lavras, MG

A Biblioteca da UniversidadeAutónoma de Lisboa é uma estru-tura de apoio direccionada a alunose professores. No âmbito das suascompetências é nosso intuito esta-belecer um quadro de colaboraçãocom diversas entidades que desen-volvem ou acompanham activida-des de interesse para a nossa comu-nidade de utilizadores. Pelo facto deser leccionada na Universidade Au-tónoma de Lisboa, a pós-graduaçãoem Ciências Documentais, temostodo o interesse em adquirir a pu-blicação Pesquisa FAPESP, da qualtivemos acesso a um exemplar e quese revelou de grande utilidade paraesta mesma área.

MADALENA ROMÃO MIRA

Diretora das BibliotecasLisboa, Portugal

Carta ao diretor científico

Foi com muito prazer que oouvi explicar no Conselho de Pós-Graduação (CPG) da Universidadede São Paulo (USP) a política daFAPESP em relação a nossos jovensdoutores e pós-doutores. É raro veruma instituição de interesse alta-mente público defender os interes-ses nacionais ao invés de se render àmarca fatal do mimetismo cultural.O esforço dessa Fundação por man-ter nossos pesquisadores e professo-res qualificados no Brasil, quandohá tantas pressões para retê-los noexterior, evidenciado no seu relato,foi uma das afirmações que me co-moveram, incluindo o episódio dacientista que foi convidada a desen-volver pesquisa em febre amarela edengue no Brasil em vez de perma-necer nos Estados Unidos a convitede norte-americanos. Creio queprecisamos de mais administrado-res e instituições que defendam ointeresse do país.

ERMÍNIA MARICATO

Presidente da CPG da Faculdade de Arquitetura

e Urbanismo/USPSão Paulo, SP

Políticas Públicas

Gostaria de fazer uma correçãosobre uma informação dada no su-plemento especial sobre políticaspúblicas/ensino público, que acom-panha a edição de número 68 darevista Pesquisa FAPESP. No suple-mento consta uma reportagem(Maravilhas da modernidade), napágina 35, sobre o projeto quecoordeno. Gostei muito da reporta-gem, mas o nome da escola, contu-do, saiu errado: em vez de EscolaEstadual de Primeiro Grau Mariza,chama-se Escola Estadual Professo-ra Marina Cintra.

SANDRA MAGINA

São Paulo, SP

Revista

Estou concluindo minha gradua-ção, realizada na Faculdade de Filo-sofia, Ciências e Letras da Universi-dade de São Paulo (FFCLRP/USP),no curso de Ciências Biológicas. Em2002 pretendo terminar a licencia-tura em biologia e no final destemesmo ano prestar mestrado na Es-cola Superior de Agricultura Luiz deQueiroz (Esalq) para trabalhar commelhoramento vegetal de plantas.Tive recentemente acesso à revistaPesquisa FAPESP e fiquei impressio-nada com a quantidade de reporta-gens científicas presentes, que, alémde ensinar-me muita coisa, levou-me ao conhecimento dos laborató-rios em que estão sendo realizadas.Achei fabulosa a existência de umarevista como essa. É pena que mui-tos alunos de graduação não a co-nheçam. Não tenho condições fi-nanceiras de assinar jornal e nemqualquer tipo de revista científicaque possa proporcionar-me um co-nhecimento tão diversificado e dequalidade realizados na área bioló-gica. Maravilhoso poder aprenderum pouco sobre tantos assuntos di-ferentes, que por facilidade estãoagrupados em uma única revista.

GISELE C. DEDEMO

Ribeirão Preto, SP

Por casualidade, passou pornossas mãos uma edição da Pesqui-sa FAPESP. Foi amor à primeiravista. Promovemos reuniões, pa-lestras, debates, conferências e se-minários sobre igualdade de gêne-ro, raça e etnia e certamente essapublicação muito nos ajudará.

VALKÍRIA ORTEGA DONOSO

Fórum de Mulheres de SantosSantos, SP

Sou aluna de graduação de bio-logia na Universidade Estadual deCampinas (Unicamp) e faço Inicia-ção Científica no Laboratório deBioInformática no Centro de Biolo-

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 5

Pesquisa FAPESP faz sua entradaneste ano de 2002 trazendo no-vas e não exatamente alvissarei-

ras notícias sobre dois fenômenos –articulados, aliás – que com certa fre-qüência se imiscuem nas conversas dospaulistanos: o clima e a poluição am-biental. Sobre o clima: ele mudou, defato, em São Paulo, como insistem to-dos que vivem na cidade há mais de 40anos. Os dias de verão, relata o editorCarlos Fioravanti na reportagem de ca-pa que começa na página 28, são cadavez mais quentes, enquanto os de in-verno, mais secos, baniram quase quetotalmente da paisagem a garoa pau-listana. A temperatura média está 1,3°Celsius mais alta do que há quatro dé-cadas. Sobre a poluição: a Região Me-tropolitana de São Paulo – a capital eos 38 municípios vizinhos – é um po-deroso centro exportador de poluentes,a tal ponto que seu ar carregado de ga-ses indesejáveis e poeira pode chegar acidades que estão a até 100 quilôme-tros da capital – é bem verdade queem concentrações mais baixas. Pior:se carregado por ventos fortes, podealcançar Bauru, a nada menos que350 quilômetros.

Se do ponto de vista de saúde pú-blica e da preservação do meio am-biente essas são constatações muitopreocupantes, do ponto de vista dosobjetivos da pesquisa científica elassão valiosas. Primeiro, porque tradu-zem conhecimento novo – o traba-lho enfocado na reportagem, longede deter-se nas constatações, detalhade forma inédita, rica, a dinâmica dacirculação do ar em grande escala, ouseja, penetra nos porquês do com-portamento da poluição em SãoPaulo, tal como se apresenta. E, se-gundo, porque ao oferecer esse co-nhecimento abre espaço para a for-mulação de políticas públicas quetornem possível um controle bemfundamentado da poluição e de seusefeitos sociais.

Esta edição da revista, de qualquersorte, traz outros resultados de pesqui-sa que não precisam ser relativizadosna base do é ruim por um lado, masbom por outro. São bons e ponto. Esseé o caso, por exemplo, da reportagemque começa na página 36 sobre as es-tratégias de combate à praga do ama-relinho,anunciadas em dezembro pelospesquisadores responsáveis pelo pro-jeto do Genoma Funcional da Xylellafastidiosa. Tudo indica que a mais pro-missora delas deverá ser o desenvolvi-mento de plantas geneticamente altera-das, nas quais seja agregada algumaproteína que mate a bactéria, funcio-nando, portanto, como um potenteinseticida natural, ou atrapalhe seuprocesso de adesão ao xilema da planta.A primeira variedade de laranja docegeneticamente modificada, obtida apartir de tecido adulto, é mais queuma bela promessa nesse caminho.

No campo da genômica, contudo,há que se destacar também o anúnciodo projeto de seqüenciamento do caféarábica, por meio de um consórcioformado pela Embrapa e FAPESP.

Uma visão ampla da pesquisa denovas tecnologias limpas em váriossegmentos industriais, que resultamem melhor aproveitamento das maté-rias-primas, redução de resíduos e re-ciclagem de produtos e sobras indus-triais, é oferecida na reportagem quecomeça na página 56. Ela deixa paten-te que, além dos benefícios diretos so-bre o meio ambiente, tais tecnologiasproduzem considerável economia decustos. E, por falar em economia, emHumanidades há que se ressaltar a re-portagem que tem início na página 70,sobre um temático ambicioso a pontode poder ser comparado a uma espé-cie de projeto genoma da economia.Ele deverá resultar num banco de dadoscapaz de alimentar análises e previsõesde curto e médio prazos sobre os resul-tados da inserção brasileira no merca-do global. No mais, boa leitura.

De poluição,genética e economia

EDITORIAL

GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO

SECRETARIA DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

PESQUISA FAPESP É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL

DA FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PROF. DR. CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZPRESIDENTE

PROF. DR. PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADOVICE-PRESIDENTE

CONSELHO SUPERIORADILSON AVANSI DE ABREUALAIN FLORENT STEMPFER

CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZCARLOS VOGT

FERNANDO VASCO LEÇA DO NASCIMENTOHERMANN WEVER

JOSÉ JOBSON DE ANDRADE ARRUDAMARCOS MACARI

NILSON DIAS VIEIRA JUNIORPAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO

RICARDO RENZO BRENTANIVAHAN AGOPYAN

CONSELHO TÉCNICO-ADMINISTRATIVOPROF. DR FRANCISCO ROMEU LANDI

DIRETOR PRESIDENTE

PROF. DR. JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLERDIRETOR ADMINISTRATIVO

PROF. DR. JOSÉ FERNANDO PEREZDIRETOR CIENTÍFICO

EQUIPE RESPONSÁVELCONSELHO EDITORIAL

PROF. DR. FRANCISCO ROMEU LANDIPROF. DR. JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER

PROF. DR. JOSÉ FERNANDO PEREZ

EDITORA CHEFEMARILUCE MOURA

EDITORES ADJUNTOSMARIA DA GRAÇA MASCARENHAS

NELDSON MARCOLIN

EDITOR DE ARTEHÉLIO DE ALMEIDA

EDITORESCARLOS FIORAVANTI (CIÊNCIA)CLAUDIA IZIQUE (POLÍTICA C&T)

MARCOS DE OLIVEIRA (TECNOLOGIA)

EDITOR-ASSISTENTEADILSON AUGUSTO

REPÓRTER ESPECIALMARCOS PIVETTA

ARTEJOSÉ ROBERTO MEDDA (DIAGRAMAÇÃO)

LUCIANA FACCHINI (DIAGRAMAÇÃO)TÂNIA MARIA DOS SANTOS

(DIAGRAMAÇÃO E PRODUÇÃO GRÁFICA)

FOTÓGRAFOSEDUARDO CESARMIGUEL BOYAYAN

COLABORADORESALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ

JOSÉ TADEU ARANTESLARA LIMA

LILIANE NOGUEIRALUCAS ECHIMENCOMARIA INÊS NASSIF

RENATA SARAIVARICARDO ZORZETTOSÉRGIO ADEODATO

TÂNIA MARQUESVANDA JORGE

PRÉ-IMPRESSÃOGRAPHBOX-CARAN E GRÁFICA AQUARELA

IMPRESSÃOPADILLA INDÚSTRIAS GRÁFICAS S.A.

TIRAGEM: 24.000 EXEMPLARES

FAPESPRUA PIO XI, Nº 1500, CEP 05468-901

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Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESPÉ PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DE TEXTOS E FOTOS SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO

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M E M Ó R I AM E M Ó R I A

6 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

mundo científico habituou-se a ver o físico francês HenriBecquerel e o casal

franco-polonês Pierre e Marie Curiecomo os primeiros desbravadores do mundo das partículas radioativas.Isso é verdade em parte. Sem as experiências e observações deles e de outros físicos, apresentadas a partirde 1896 na Academia de Ciências de Paris, não haveria oportunidade para novas descobertas e hipóteses.Mas foi o trabalho teórico de dois físicos, Ernest Rutherford, da NovaZelândia, e Frederick Soddy,

Centenário de uma teoria

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Acima, trajetória daspartículas muon (verde) eelétron (vermelho):mundo do infinitamente pequeno continua fascinando os físicos

Rutherford e Soddy explicaram,em 1902,como ocorrem as transformações radioativas

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Frederick Soddy Ernest Rutherford

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 7

da Inglaterra, que efetivamenteexplicou como ocorrem as atividades radioativas. Entrenovembro de 1902 e maio de 1903, eles publicaram uma série de cinco artigos em que apresentavam a hipótese de que a radioatividade está associada a fenômenos atômicos de desintegração, que levam à transformação de um elementoquímico em outro. Em 1904,a hipótese dos dois, ganhadores do Nobel de Química de 1908,estava consolidada e aceita por outros pesquisadores. Ou seja,a compreensão moderna dessesfenômenos começou a existir há 100 anos. Até então, o que sesabia sobre radioatividade eramdescrições de experiências de laboratório com “substâncias que brilham”, como sulfeto de zincofosforescente, sulfeto de cálcio,estrôncio, bário e urânio, entre outras. Embora esteja entre os pioneiros desse tipo de pesquisa,Becquerel descobriu “coisas” que

não entendia bem o que eram eacabou por desinteressar-se delasdepois de alguns anos. “O casalCurie teve também um papelimportante, percebendo que a radioatividade era algo novo,não influenciável por luz ou calor,e descobrindo novos elementosradioativos além do urânio”, explica

Pierre e Marie Curiebatizaram

o fenômeno recém-descoberto de radioatividade

e descobriram diversos outros

elementos com amesma característica

do urânio

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Emissão de partículas alfa do rádio: descoberta de Rutherford e Soddy

Roberto de Andrade Martins,professor do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e especialista no assunto.“Rutherford e Soddy deram, então,um passo fundamental,esclarecendo o que acontecia dentro dos materiais radioativos.”

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8 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

E S T R AT É G I A SE S T R AT É G I A S

A confiança da UE nos transgênicos

Dois fatos divulgados emmeados de dezembro de2001 colocaram mais com-bustível na discussão sobreos transgênicos. O primeirofoi um estudo da União Eu-ropéia realizado num perío-do de 15 anos (entre 1985 e2000) sobre o uso e aplica-ção de organismos geneti-camente modificados. O re-sultado indicou que osalimentos transgênicos sãotão seguros para o consumohumano quanto para o am-biente. E mais: eles podemser ainda mais seguros queas plantas convencionais. Oestudo acompanhou todo oprocesso, do desenvolvi-mento até o consumo dosalimentos. No total, o tra-balho teve 81 projetos feitospor mais de 400 equipes desaúde, nutrição, biotecnolo-

■ Elas avançam, mas eles ainda dominam

Um relatório da AcademiaNacional de Ciências dos Es-tados Unidos mostrou que aparticipação feminina na co-munidade científica aumen-tou, mas elas ainda ficamatrás dos homens na con-quista de títulos acadêmicos ecargos de tempo integral, deacordo com informações darevista Nature (22 de novem-bro de 2001). Há 25 anos, asmulheres quase não tinhamrepresentação no mundo daciência. Em 1995, já estavamrespondendo por cerca deum terço dos novos títulosacadêmicos em vários cam-pos. No entanto, ainda há

cado o gene do Bacillus thu-ringienses (Bt), injetadopropositalmente pelo ho-mem nas culturas transgê-nicas por ter a propriedadede produzir uma toxina le-tal para pestes nocivas àsplantações. Os pesquisado-res não sabem precisar deonde vieram os componen-tes externos descobertos nocódigo genético do milhode Oaxaca. Formulam ape-nas hipóteses. Presente em

■ Nature e Sciencejuntas, na Internet

Desde 3 de dezembro de2001, o site www.scidev.netreúne alguns artigos das duasprincipais publicações cien-

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grande disparidade. Se nasciências biológicas elas já sãodonas de 40% de todos osPhDs, em engenharia respon-dem por apenas 7% das gra-duações e 5% dos empregosem nível de doutorado. •

gia aplicada à agricultura eà indústria de alimentos.No site http://europa.eu.int/comm/research/quality-of-life/gmo/index.html há orelatório completo com oestudo.

Um estranho no milho -Vem das montanhas do Es-tado de Oaxaca, no sul doMéxico, o outro fato im-portante para a discussãosobre transgênicos. Cientis-tas da Universidade da Cali-fórnia encontraram mate-rial originário de plantasgeneticamente modificadasinserido no DNA de umaespécie selvagem de milho,cultivada apenas por fazen-deiros da região, informa arevista Nature (29 de no-vembro de 2001). No meiodesse material, foi identifi-

versões modificadas de mi-lho e outras culturas trans-gênicas plantadas nos Esta-dos Unidos e importadasatualmente pelo Méxicocomo ração para animais, ogene Bt pode ter “escapado”dessas plantas e se dissemi-nado pelo país. Há tambéma possibilidade de a trocagenética ter ocorrido antesde 1998, quando o Méxicoainda permitia o cultivo demilho transgênico. Por fim,existe ainda a suspeita deque fazendeiros mexicanosestejam cultivando clandes-tinamente espécies transgê-nicas e cruzando-as comvariedades nativas. •

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Milho transgênico:a polêmica continua

tíficas do mundo: a revistabritânica Nature e a norte-americana Science. O site temnotícias sobre ciência, tecno-logia e desenvolvimento gra-tuitamente. “A iniciativa éimportante para ajudar acriar uma ponte entre os He-misférios Norte e Sul com oobjetivo de reduzir a distân-cia entre as duas regiões nosetor científico”, diz DavidDickson, diretor do Scide.-Net. Ele acredita que a medi-da é uma forma de promo-ver atividades destinadas amelhorar a comunicação so-bre C&T, especialmente empaíses em desenvolvimento.A Academia de Ciências doTerceiro Mundo é uma dasparceiras do projeto. •

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 9

dos quânticos, em vez de in-formação clássica, podere-mos solucionar problemasque nunca seriam resolvidoscom tecnologia clássica”, afir-ma. Ele explica que, atual-mente, os melhores computa-dores levam vários meses paraencontrar os fatores primosde um número de 130 dígi-tos, e levariam 10 bilhões deanos para fatorar um númerode 400 dígitos – quase a idadeinteira do universo. Um com-putador quântico seria capazde fatorar um número de 400dígitos em um minuto. •

em diversas áreas, incluindofísica, ciência da computaçãoe matemática, segundo o di-retor fundador John Preskill,professor de física teórica noCaltech. “A meta do IQI serádominar os princípios da físi-ca quântica que possam serexplorados para melhorar aperformance da transmissão,processamento e aquisição dedados”, informa o pesquisa-dor. O assunto que o deixarealmente entusiasmado é apossibilidade de criação deum computador quântico.“Se pudermos processar esta-

■ Televisão perde espaço para a web

Ela entrou nas casas comouma curiosidade e logo con-quistou um espaço privile-giado na sala de estar. Agora,porém, a velha televisão vêseu reinado ameaçado poroutro monitor, o da Internet.É o que está acontecendonos Estados Unidos, onde aUniversidade da Califórnia(UCLA) realizou pesquisa em2 mil residências. E constatouque os americanos usuáriosde Internet ficam menostempo à frente da TV – 4,5horas a menos por semanaem relação aos não-usuários.O Projeto Internet, financia-do pela Fundação Nacionalde Ciência (NSF), foi criadopara investigar mudanças dehábitos provocadas por essatecnologia. Pretende-se en-trevistar usuários e não-usu-ários por uma geração inteirae, assim, traçar um quadroglobal de como a Internetafeta a sociedade. Na opiniãode Jeffrey Cole, diretor doCentro de Políticas de Comu-nicação da UCLA, eles estãofazendo, hoje, um trabalhoque deveria ter sido iniciadonos anos 40, em relação à TV.Atualmente, mais de 72% dosamericanos têm acesso à In-ternet, em relação a 67% em2000. Sua popularidade jápode ser medida pela hora dabronca, segundo a pesquisa:agora, quando querem casti-gar os filhos por algum moti-vo, as mães estão deixando deproibir a TV – mas o compu-tador fica desligado. •

■ Um instituto para a informação quântica

A Fundação Nacional deCiência (NSF) dos EstadosUnidos concedeu uma bolsade US$ 5 milhões ao Institutode Tecnologia da Califórnia(Caltech, na sigla em inglês)para a criação de uma novainstituição dedicada à ciênciada informação quântica –campo que pode culminar nodesenvolvimento dos sonha-dos computadores quânticos.O novo Instituto para Infor-mação Quântica (IQI) atuará

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Os Nobel contra os economistas As comemorações do cen-tésimo aniversário do Prê-mio Nobel foram marca-das por uma desconcer-tante polêmica: quatro des-cendentes do inventor sue-co defendem retirar onome da família do prêmiode Economia. “Economianunca esteve no testamen-to de Alfred Nobel e nãotem o espírito de seus prê-mios”, afirmou ao jornalinglês Financial Times (24de novembro de 2001) Pe-ter Nobel, advogado espe-cialista em Direitos Huma-nos e bisneto do irmão deAlfred, Ludvig. Alfred nãodeixou descendência dire-ta. Três outros descenden-tes de Ludvig – AndersAhlqvist, Johan Ahlqvist eJohn Hylton – concordamcom Peter. As outras cinco

banco central sueco. Paraos quatro Nobel, Riksbankdeveria ser o nome do prê-mio conferido aos econo-mistas. Eles argumentamque essa premiação contra-ria declarações do próprioAlfred de que os prêmiosdeveriam ser outorgadostodos os anos àqueles quetivessem dado “o maior be-nefício à humanidade”. “Amaioria dos prêmios deeconomia vai para pessoasque refletem o pensamentoocidental dominante. E te-mos dúvidas se esse é real-mente um benefício a todaa humanidade”, afirma Pe-ter Nobel. Não por acaso,os vencedores do prêmiode economia de 2001 –George Akerlof, MichaelSpence e Joseph Stiglitz –são dos Estados Unidos. •

categorias do prêmio –Paz, Literatura, Física, Quí-mica e Medicina – foramdiretamente mencionadasno testamento do inventore concedidas já na primeiraedição do Nobel, em 1901.Economia só foi incorpo-rada em 1968, em come-moração aos 300 anos defundação do Riksbank, o

Nobel: discussão inusitada

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E S T R AT É G I A SE S T R AT É G I A S

Envie sua sugestão de site científico para [email protected]

Ciência na web

habitare.infohab.org.br/habitare.htm

Site do Programa Habitare sobre tecnologia de habitação e pesquisas deC&T sobre o setor da construção civil.

www.argiropolis.com.ar/ameghino/marco.htm

Textos fundamentais da produção científica argentina ao longo de suahistória, documentos e biografias.

www.chemkeys.com/bra/index.htm

Endereço de fácil navegação, com informações específicas para o ensinode química e ciências afins.

Quantos são os doutores brasileiros

O estudo mais recente so-bre doutorado no Brasil re-velou 32.500 pesquisadorescom essa titulação em ativi-dade e uma esperada con-centração nos Estados deSão Paulo e do Rio de Janei-ro. “Mas indicou também ocomeço da descentralizaçãodos doutorados em direçãoao Nordeste e ao Sul”, dizReinaldo Guimarães, pro-fessor da Universidade doEstado do Rio de Janeiro econsultor do Conselho Na-cional de DesenvolvimentoCientífico e Tecnológico(CNPq). Guimarães foi umdos autores do trabalho,junto com Silvana Cosac eRicardo Lourenço, ambosligados ao CNPq. Para o es-tudo, eles usaram dados do

entre 1996 e 2000. Para che-gar a esse número, foramconsiderados os que estãonas instituições de pesquisacom perfil acadêmico, masnão os que trabalham compesquisa e desenvolvimento

Diretório dos Grupos dePesquisa no Brasil e doscurrículos Lattes. A pesqui-sa confirma o boom de pes-quisadores dos anos 90. Ospesquisadores acharam8.339 doutores formados

em órgãos do governo eempresas, por falta de da-dos disponíveis. Um dadosurpreendente é o cresci-mento da participação deoutros Estados na formaçãodo pesquisador. Até 1965,São Paulo era responsávelpor 70,4% dos doutoresformados no país. Em 2000,caiu para 55,7% e outroscentros tornaram-se maisatuantes. O Rio passou de10,2% para 18,1%, no mes-mo período. Santa Catarina,Bahia e Pernambuco, quenão formavam ninguém,hoje titulam 3% e 0,9% (BAe PE) dos doutores, respec-tivamente. Minas Gerais eRio Grande do Sul deramum ligeiro salto: ambos fo-ram de 5,1% para 7,3%. •

tados Unidos, mas mantémintensa atividade como arti-culista de jornais brasileiros,sempre escrevendo sobre ciên-cia. Seus textos saíram emdois livros: Retalhos Cósmicos

e A Dança do Universo. O físi-co vai receber US$ 4,5 mil eum diploma. Gleiser é profes-sor do Departamento de Fí-sica e Astronomia do Dart-mouth College, nos EUA. •

(CNPq), Esper Cavalheiro,entregou dia 17 de dezembroo Prêmio José Reis de Divul-gação Científica para o físicoMarcelo Gleiser, ganhador de2001. Gleiser trabalha nos Es-

■ Prêmio José Reis para Marcelo Gleiser

O presidente do ConselhoNacional de Desenvolvimen-to Científico e Tecnológico

Fonte: CNPq/CGINF, Diretório v.4.0 e CV Lattes

Período de formação

Pesquisadores doutores segundo o ano de doutoramento

169 334 8591.237

2.189

3.327

6.261

8.339

Até1965

19661970

19711975

19761980

19811985

19861990

19911995

19962000

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 11

que acompanharam o cresci-mento das atividades da ins-tituição. O recém-lançado li-vro Os 25 Anos da Unesp sob oOlhar da Imprensa conta ahistória da universidade des-de 17 de setembro de 1975,quando foi anunciado que oentão governador Paulo Egy-dio Martins assinaria suacriação, até 1 de agosto de2001, data de reportagem so-bre a abertura de 500 novasvagas em 13 cursos de gra-duação. A obra traz farto ma-

terial publicado em 19 jor-nais e revistas da capital e dointerior de São Paulo. Os arti-gos retratados em fac-símile eos textos produzidos pela As-sessoria de Comunicação eImprensa da Unesp, com oapoio do Centro de Docu-mentação e Memória, estãoagrupados cronologicamente.Por eles, é fácil acompanharas diversas etapas e a naturalevolução da instituição,i des-de a elaboração dos estatutosaté a expansão dos cursos. •

■ Engler é renomeado diretor administrativo

mente divulgadas pelo Con-selho de Informações sobreBiotecnologia (CIB), órgãocriado por empresas e insti-tuições do setor, como aMonsanto, Cargill, DuPonte Associação Brasileira dasIndústrias de Alimentação(Abia), entre outras. Segun-do Belmiro Ribeiro da SilvaNeto, diretor executivo doCIB, os brasileiros ainda des-conhecem o assunto e, mui-tas vezes, recebem somenteuma versão da informação.“Pesquisa realizada pelo Ibo-pe em julho de 2001 apon-tou que apenas 31% da po-pulação demonstra ter conhe-cimento suficiente sobre bio-tecnologia”, afirma. SegundoSilva Neto, com a criação doCIB, essa situação pode mu-dar. “Agora, há uma entidadeque pode falar em nome dosque estudam e desenvolvema biotecnologia em nossopaís com total isenção e cre-dibilidade.” O CIB contoucom R$ 500 mil em 2001 eprevê R$ 1 milhão em 2002,que serão investidos em pu-blicações, seminários, cam-panhas publicitárias e no sitewww.cib.org.br, que preten-de atingir dos alunos do en-sino fundamental até a co-munidade acadêmica. •

■ Os 25 anos da Unesp em livro

A Universidade Estadual Pau-lista (Unesp) comemorou 25anos em 2001 e não deixoude fora reportagens e artigos

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Joaquim José de CamargoEngler, diretor administrati-vo da FAPESP, foi renomeadopelo governador GeraldoAlckmin para o cargo. É aquarta vez que assume o pos-to. Engenheiro agrônomo,PhD em Economia, livre do-cente e professor titular doDepartamento de Economia,Administração e Sociologiada Escola Superior de Agri-cultura Luiz de Queiroz daUniversidade de São Paulo(Esalq/USP), Engler publicou82 artigos científicos e relató-rios de pesquisa. Foi diretorda Esalq, coordenador da Co-missão de Especialistas deEnsino de Ciências Agráriasdo Ministério da Educação,coordenador e prefeito docampus da USP em Piracica-ba, professor visitante do Ins-tituto Gulbenkian de Ciência,de Portugal, e coordenadorgeral de Administração daUSP, entre outros cargos. •

■ Mais informações sobre biotecnologia

A criação de insulina maisbarata e segura, arroz comprovitamina A, plantas comcapacidade de extrair metaispesados do solo. Essas e ou-tras possíveis conquistas daspesquisas com transgênicosserão, agora, sistematica-

Engler: currículo extenso

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Capa do livro: comemoração

Novo conselheiro

O governador GeraldoAlckmin nomeou o pro-fessor Marcos Macari co-mo integrante do Conse-lho Superior da FAPESP.A designação visou a es-colha de um representan-te dos institutos de ensi-no superior e pesquisa doEstado de São Paulo (ofi-ciais e particulares). Ma-cari foi o nome mais vota-do (383 votos) de umalista tríplice enviada aogovernador, resultado daeleição que ocorreu entreos dias 26 e 30 de novem-bro de 200 1em que con-correram 14 candidatos.O biomédico Marcos Ma-cari é pesquisador e pro-fessor titular do Depar-tamento de FisiologiaAnimal da Faculdade deCiências Agrárias e Vete-

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Stempfer(ao lado) no comandodo processoe Macari:renovaçãoparcial doConselho

rinárias da UniversidadeEstadual Paulista (Unesp),em Jaboticabal. Todo oprocesso eleitoral foi fei-to, pela primeira vez, deforma eletrônica, via In-ternet, o que facilitou avotação de quem estavadistante da capital. AlainFlorent Stempfer, conse-lheiro da FAPESP, presi-diu a comissão que co-mandou a eleição. •

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12 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Mundial, lembrou que, antes de pros-pectar recursos, é fundamental que severifique se a tecnologia objeto da pes-quisa ainda não foi inventada e se elatem oportunidades no mercado. O pas-so seguinte é encaminhar o registro dapatente. Esse processo, frisou, tem deser iniciado antes da publicação dotrabalho – o que, evidentemente, nãosignifica que os resultados da pesqui-sa não devam ser publicados.“A publi-cação prematura desfecha um golpemortal sobre qualquer perspectiva decomercialização futura”, disse. “Osanalistas recebem centenas de planosde negócios e simplesmente eliminam,logo na primeira triagem, aqueles nosquais o problema da propriedade in-telectual não está contemplado”, disse.

Sherwood afirmou que, na buscade capital, o mais difícil é conseguir fi-nanciamento para a pesquisa. Ressal-vou que essa é uma dificuldade que ospesquisadores brasileiros praticamen-te não conhecem em função dos me-canismos de fomento disponíveis.“Ain-da são raros, porém, os casos em quea imensa criatividade dos brasileirosrende frutos do ponto de vista comer-cial. E os contribuintes, que financiama pesquisa, têm o direito de condenar afalta de preocupação com o potencialeconômico das tecnologias desenvol-vidas no Brasil.”

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

PATENTES

Oque leva tecnologias ao mer-cado não é só o seu potencial

comercial nem seu teor de inovação.Regras do mundo dos negócios tam-bém são necessárias, e a correta ade-quação a elas é ainda mais importan-te quando se trata de captar recursos,e encontrar mercados, no exterior. Pa-ra discutir o tema,o Instituto de Pesqui-sas Tecnológicas (IPT) realizou, como apoio da FAPESP, o seminário Co-mercialização Internacional de Tecno-logia Brasileira, na sede do instituto,em 29 de novembro do ano passado.“Todos nós temos muito que apren-der sobre esse assunto”, afirmou EdgarDutra Zanotto, coordenador do Nú-cleo de Patentes e Licenciamento deTecnologia (Nuplitec), da FAPESP.

Abordando os desafios que se co-locam para a comercialização da tec-nologia brasileira, o norte-americanoRobert Sherwood, consultor que cola-borou para a reforma dos sistemas depropriedade intelectual de 11 paísestrabalhando para o Banco Interame-ricano de Desenvolvimento e o Banco

Seminário avalia estratégiaspara levar a pesquisa aomercado com sucesso

Receita para bons negóciosNa avaliação de Sherwood, a len-

tidão dos processos de patenteamen-to no país pode ser um obstáculo àobtenção de recursos. Lembrou queiniciar o processo de registro de pa-tentes pelo Brasil não é a única pos-sibilidade. Como alternativa, ele su-geriu iniciar pelos mercados em quea aplicação da tecnologia tenha maiorpotencial comercial. Afirmou tam-bém que a legislação brasileira, ape-sar dos avanços registrados em 1997,ainda deixa os investidores receososcom, por exemplo, o poder de deci-são do governo sobre quebra de pa-tentes por razões de interesse públi-co, ou a impossibilidade de patentearalguns bens, como material transgê-nico e software.

O especialista ressaltou que é ne-cessário proteger informações relati-vas a tecnologias patenteáveis porcontratos de confidencialidade – oschamados non-disclosure agreements– com redação clara. Em projetos quepresumem pesquisa compartilhada,convém que os contratos estabeleçamnitidamente a responsabilidades decada uma das partes envolvidas.

Walter Bayer, vice-presidente da GELicensing, divisão da General Electricdedicada exclusivamente ao licencia-mento de patentes, definiu o licencia-mento de tecnologias como um negó-

Page 12: Poluição de longo alcance

cio. Na avaliação de Bayer, um bomplano de negócios começa pela identi-ficação dos interessados. Apenas deteros direitos de propriedade intelectualsobre determinada tecnologia nãobasta, se não houver potencial efetivode licenciamento. As expectativas deretorno dos investimentos devem serquantificáveis. “Argumentos como‘qualquer lojinha vai vender’ não de-vem ser usados”, adverte Bayer.

No que diz respeito ao registro depatentes propriamente dito, Bayerlembrou que idéias não podem serpatenteadas: em qualquer parte domundo, é preciso contar com algotangível. Da mesma forma, os chama-dos segredos comerciais não são pas-síveis de proteção por patente – sãofórmulas, ou mesmo processos, queas empresas guardam a sete chaves porseu valor como diferencial competiti-vo. Nesse sentido, o exemplo mais co-nhecido é o da receita da Coca-Cola,mas há milhares de outros, bem me-nos evidentes. “Em uma companhiade software, uma idéia se transformaem código, e código-fonte pode cons-tituir um um segredo comercial.” Nocaso, o que pode ser patenteado é oproduto de software, que ganha tangi-bilidade por meio de gravação, diga-mos, em um CD. A decisão de paten-tear uma tecnologia ou tratá-la comosegredo comercial depende de umaavaliação dos riscos envolvidos e deuma comparação cuidadosa dos cus-tos e benefícios de cada opção. A pa-tente é a escolha mais segura.

Na visão de Bayer, uma política delicenciamento bem-sucedida deve, en-tre outras coisas, apoiar-se em um

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 13

portfólio amplo e competitivo. Mes-mo quando se trata de licenciar ape-nas uma tecnologia, a capacidade deantever as aplicações possíveis, imedia-tas ou futuras, faz diferença. O planode negócios deve se fundamentar, po-rém, nos resultados a curto prazo eutilizar um estilo de argumentaçãoagressivo. Do ponto de vista comercial,também é preciso manter a flexibili-dade, dando abertura para o futuro li-cenciado realizar as modificações queforem de seu interesse. “Uma patentenão é um monopólio”, disse Bayer.

Conflitos de interesse - ChristopherOstrovski, presidente da TechnologyPartners International, agência especia-lizada em transferência de tecnologiacom sede em Guelph, no Canadá, co-mentou um estudo realizado por eleque tinha como objetivo uma melhorcompreensão dos conflitos de interes-se que muitas vezes permeiam a relaçãoentre universidades e empresas. “Osobjetivos do pesquisador incluem odireito de publicar seus trabalhos, trans-ferir propriedade intelectual para a so-ciedade e o compromisso com o de-senvolvimento da pesquisa”, enumerou.“Por sua vez, a empresa quer vantagemcompetitiva, a construção de uma ba-se tecnológica e uma visão das novastecnologias.” A solução desse conflitoestá na consciência das necessidadesda outra parte, e uma das questões a se-rem equacionadas é a que antepõe aproteção de direitos de propriedadeintelectual à publicação dos trabalhos.

Ostrovski acredita que as duas par-tes devem estar dispostas a estabelecerrelações de longa duração para desen-

volver confiança recíproca e que umdos caminhos mais fáceis para chegar aisso é a aproximação. “Para fazer omarketing de suas tecnologias, a uni-versidade deve nomear representantescom habilidades de comunicação ecapazes de administrar as diferençasfilosóficas entre a academia e a indús-tria.” No que diz respeito à prospec-ção de recursos, Ostrovski aconselhouos pesquisadores a prestar atenção aosdiversos tipos de investidores possí-veis – de amigos dispostos a apostarem uma tecnologia a bancos, dos cha-mados “anjos” (indivíduos muito ri-cos que gostam do setor tecnológico eagem quase como os mecenas das ar-tes) aos investidores institucionais e,no caso de empresas de base tecnológi-ca, abertura do capital.

A advogada Juliana L.B. Viegas, daTrench, Rossi e Watanabe, fez uma ex-planação sobre a evolução do concei-to de propriedade intelectual no con-texto da legislação brasileira. “Commais de 30 anos de carreira, vi muitoscasos de importação de tecnologia eno máximo dois ou três casos de ex-portação de tecnologia brasileira, etalvez este seja o momento da virada.”Ela afirmou que o país, do ponto devista legal, não tem o conceito de li-cenciamento de tecnologia – o queexiste é só transferência permanente.Outra dificuldade apontada por ela éa limitação da remessa de royalties eda dedutibilidade para fins fiscais en-tre 1% e 5% das vendas líquidas e aobsolescência da definição de essencia-lidade que pauta a aprovação das im-portações de tecnologia, que data deuma portaria de 1958. •

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volvimento e outros parceiros locais.Essas ações, batizadas como Progra-ma de Cooperação Científica e Tec-nológica para o Desenvolvimento Re-gional, têm como objetivo identificarprioridades e vocações locais, orga-nizar arranjos produtivos e alavancarinvestimentos. As ações centralizadasda União devem se traduzir em açõesseletivas nos Estados. Lembrou, aindaque a agenda de política científica etecnológica nacional vai muito alémda estrutura de fomento. “Existe difi-culdade de entender essa agenda, quetende a ser subavaliada, como se seresumisse ao fomento, que é uma ati-vidade central, mas que representauma parcela pequena dos gastos.”Acrescentou que, apesar dos de terampliado o seu orçamento com re-cursos dos Fundos Setoriais, o MCTadministra só 50% dos gastos fede-rais com C&T. E concluiu: “Não é tri-vial falar em descentralização”. Nasua avaliação, qualquer mudança naforma de distribuição dos recursospara o fomento exigirá alteraçõesnos valores básicos para o pagamen-to de bolsas. O valor das bolsas, noâmbito federal, está vinculado aossalários básicos dos professores dasuniversidades federais. “Nos Estadosnão existe esse compromisso e issopode trazer problemas.”

Sistema heterogêneo - A descentrali-zação já pauta as relações do CNPqcom as FAPs, lembrou Cavalheiro.“Hoje temos 12 ações com as funda-ções”, contabiliza Cavalheiro. O pro-blema são as discrepâncias que existementre elas. “Existem FAPs atuantes,não-atuantes e aquelas que não exis-tem”, afirmou. Num sistema hetero-gêneo, avaliou, a descentralização dofinanciamento pode ser um proble-ma. “Tem que haver articulação coma política nacional e entre as FAPs, e

14 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

ma que as FAPs tiveram, em 2001,uma receita de R$ 600 milhões,“muito aquém do deveriam”, obser-va. Com verbas do governo federalserá possível consolidar parcerias comos Estados, acrescentou Naftale Katz,diretor científico da Fundação deAmparo à Pesquisa de Minas Gerais(Fapemig). “Esperamos que esta par-ceria com o MCT permita definir umaagenda de operação comum com con-trapartida efetiva do governo federal”,completou Jocelino Francisco de Me-nezes, presidente da FAP de Sergipe.

Arranjos produtivos - O MCT vê compreocupação a idéia da descentraliza-ção. Mas, durante o Fórum Nacionaldas Fundações e Entidades de Ampa-ro à Pesquisa dos Estados e DistritoFederal, realizada na FAPESP, no dia7 de dezembro, o secretário-executi-vo do MCT, Carlos Américo Pacheco,aceitou analisar o assunto e propôs aformação do grupo de trabalho noCGEE. Também participaram do Fó-rum o secretário-adjunto de Ciência,Tecnologia e Desenvolvimento Eco-nômico do Estado de São Paulo, Os-waldo Massambani; Evandro Mirra,presidente do CGEE; Esper AbrãoCavalheiro, presidente do CNPq;Mauro Marcondes, presidente da Fi-nep; José Galisia Tundisi, ex-presi-dente do CNPq e que hoje integra oInstituto Internacional de Ecologia;José Seixas Lourenço, do MCT; Bea-triz Tess, do Ministério da Saúde;Cláudio Marinho, presidente do Fó-rum das Secretarias estaduais, e pre-sidentes de FAPs.

Pacheco acredita que descentrali-zação só terá relevância se as FAPs sevincularem aos projetos de desenvol-vimento local, como os clusters e ar-ranjos produtivos, que estão sendodesenvolvidos pelo MCT junto como CNPq, a Finep, agências de desen-

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

FAPs

OCentro de Gestão e EstudosEstratégicos (CGEE) vai abri-

gar um grupo de trabalho cuja tare-fa será avaliar estratégias de induçãode políticas regionais de Ciência eTecnologia e, dentro dessa perspecti-va, estudar medidas de descentrali-zação das políticas de planejamentodo Ministério da Ciência e Tecnolo-gia (MCT). O grupo será formadopor representantes das Fundações deAmparo à Pesquisa (FAPs), das Secre-tarias Estaduais de Ciência e Tecnolo-gia, do Conselho Nacional de Desen-volvimento Científico e Tecnológico(CNPq) e da Financiadora de Estu-dos e Projetos (Finep).

A FAPs defendem a descentraliza-ção das políticas e dos recursos deC&T para estreitar parcerias com osgovernos locais. Propõem assumir,por exemplo, a distribuição dos re-cursos de fomento à pesquisa e à for-mação de recursos humanos, queatualmente são de responsabilidadedo Conselho Nacional de Desenvol-vimento Científico e Tecnológico(CNPq) e da Capes, conforme explicaFrancisco Romeu Landi, diretor-pre-sidente do Conselho Técnico-Admi-nistrativo da FAPESP e presidente doFórum das FAPs. A descentralização,ou melhor, uma gestão compartilha-da, irá permitir o uso da capilaridadeestratégica que têm as FAPs, o seu co-nhecimento local de pesquisadores,laboratórios, empresas e problemasregionais/locais.

Sérgio Bampi, diretor-presidenteda Fundação de Amparo à Pesquisado Rio Grande do Sul (Fapergs), esti-

Grupo de trabalho vaiavaliar descentralizaçãode políticas de C&T

Gestão compartilhada

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 15

claro, no entanto, que o país carece depesquisa básica. “Temos de trabalharde forma a construir estratégias coo-perativas e desenhar ações conjuntas.”

Mauro Marcondes, da Finep, tam-bém apontou a articulação entre asFAPs como o caminho para o desen-volvimento de uma agenda comum deações nos Estados. “Temos parceriacom os Estados nos arranjos produti-vos locais. Estamos articulando novasagências e bancos de desenvolvimen-to, com esse objetivo”, afirmou.

Projeto Piloto - A idéia de descentra-lização proposta pelas FAPs já está seconsubstanciando num projeto pilo-to que está sendo implementado peloMinistério da Saúde, em parceria, pormeio de convênios, com Fundaçõesde Amparo à Pesquisa e Secretariasestaduais de Saúde em sete Estados:Alagoas, Goiás, Paraíba, Pernambu-co, Piauí, Sergipe e Mato Grosso doSul. O convênio com as FAPs doNordeste foi assinado no dia 13 de de-zembro. O objetivo é promover a arti-culação e a integração entre os siste-

mas estaduais de saúde e os deciência e tecnologia. Coube

ao ministério identificar asações de desenvolvimen-to científico e tecnológi-co no setor. A propostafoi fechada no 1º FórumIntersetorial de Desenvol-vimento Institucional emCiência e Tecnologia emSaúde, que reuniu técni-cos do ministério e dezFAPs.

O ministério deverá re-passar R$ 2,68 milhões, que

serão destinados ao financiamentode pesquisas em áreas consideradasprioritárias para o desenvolvimentoregional e institucional das secreta-rias estaduais e das FAPs. “Pelo me-nos 70% dos recursos vão para pes-quisa e 30% para a infra-estrutura erecursos humanos”, afirmou BeatrizTess. O Mato Grosso do Sul, porexemplo, contará com R$ 63 mi-lhões. Os pesquisadores tambémcontarão com recursos da adminis-tração direta. •

não um trabalho de competição, masde respeito a particularidades locais.”Lembrou o exemplo do Instituto doMilênio para Políticas do Mar, quereuniu grupos de pesquisa do Rio deJaneiro, Rio Grande do Sul e Per-nambuco que, antes, trabalhavamisolados. “É preciso que as discussõessejam centralizadas, e o CGEE é o lu-gar certo para fazer isso.”

Mirra, que já presidiu o CNPq, ga-rantiu que o CGEE vai acolher essa“força-tarefa” formada por represen-tantes das FAPs e da Secretarias esta-duais. “Precisamos diagnosticar aspossibilidades e a rede de obstáculos”,afirmou. O primeiro obstáculo, eleapontou, está na lógica orçamentáriado setor público.“Não é possível fazerprevisões sequer de curto prazo. Hoje,o CNPq ainda não sabe qual o orça-mento deste ano.” Isso decorre do

atraso na votação do orçamento peloCongresso e na aprovação posteriorda execução orçamentária que estabe-lece limites de empenho. Apesar dessasdificuldades, ele diz, o CNPq assumeriscos e apóia estratégias regionais.

Mirra deixou claro, no entanto,que a indução não é condição indis-pensável para o desenvolvimento depesquisas afinadas com as necessida-des regionais ou do país. Revelou quepelo menos 85% do orçamento doCNPq financia pesquisas espontâ-neas,“sem qualquer indução política”.Das 1.600 linhas de pesquisa sobreCiências da Vida, por exemplo, cons-tatou-se que 70% estão alinhadas comas oito prioridades nacionais da Saú-de. “O exame das linhas de pesquisarevela gratas surpresas, revelando queos nossos pesquisadores estão madu-ros”, disse. Essa avaliação deixou

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Aviso importante

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 17

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

PARCERIA

Depois do seqüenciamento dosgenes da Xyllela fastidiosa, que

ataca os pomares de laranja, e do geno-ma da cana-de-açúcar, é a vez de deci-frar o código genético do café arábica.Um consórcio formado pela EmpresaBrasileira de Pesquisa Agropecuária(Embrapa) e a FAPESP, no âmbito doPrograma de Inovação Tecnológica (PI-TE), está implementando o ProjetoGenoma EST-Café, que vai produzir200 mil seqüências de genes do café.

A tarefa de seqüenciamento dosgenes será dividida entre o ProgramaAgronomical and EnvironmentalGenome (AEG), da FAPESP, e o Cen-tro Nacional de Recursos Genéticos(Cenargen), da Embrapa. Os clonesseqüenciados por cada um dos par-ceiros serão mantidos nas respectivasentidades e intercambiados ao finaldo projeto.

O Genoma EST-Café está orçadoem R$ 1,92 milhão, que serão dividi-dos entre a Embrapa e a FAPESP. AFAPESP participa com R$ 480 mil. Oprazo previsto para a execução do pro-jeto é de 12 meses, mas, na avaliação deLuiz Eduardo Aranha Camargo, daEscola Superior de Agricultura Luiz deQueiroz, de Piracicaba, deverá ficarpronto em quatro meses.

Banco de dados - As 200 mil seqüên-cias geradas serão depositadas no Ban-co de Dados do Laboratório de Bioin-formática (LBI), da UniversidadeEstadual de Campinas (Unicamp), eficarão à disposição dos interessadospara consulta, de acordo com AranhaCamargo. Terão acesso ao banco de

Consórcio vai seqüenciar genoma da planta

Café sem mais segredos

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dados, além das instituições partici-pantes do consórcio, outras institui-ções públicas e privadas.“A análise fun-cional ficará por conta do interesse edas áreas de investigação de cada insti-tuição ou pesquisador”, afirma AranhaCamargo, citando como exemplo osInstitutos Agronômicos de Campinase do Paraná e as Universidades Fede-rais de Lavra, Viçosa e Uberlândia, emMinas Gerais. A solicitação de acessoao banco de dados será feita medianteassinatura de Termo de Compromissoe Confidencialidade.

O consórcio prevê que a Embrapae a FAPESP dividirão a titularidade dequalquer patente que vier a ser geradapelo projeto. Os custos para a obten-ção e manutenção das patentes serãoproporcionais aos direitos de royaltiesnas seguintes proporções: a Embrapaficará com 30%,o Cenargen,com 20%,a FAPESP, com 20%, e a instituição àqual pertencer o inventor, 30%.

Qualidade da bebida - O café é o ter-ceiro maior produto da agriculturapaulista, atrás da laranja e da cana-de-açúcar. E é o quinto produto na pautanacional de exportações, depois da soja,carne, celulose e papel e o açúcar. Nes-te ano, a produção brasileira de café de-verá atingir 26,7 milhões de sacas, 14%a menos do que a safra anterior. Nosúltimos anos,doenças como a ferrugem,fungo que ataca as folhas, e o nematói-de, verme que corrói a raiz, compro-meteram a produtividade dos cafezaise fizeram reduzir os investimentos.

A iniciativa da pesquisa partiu doConsórcio Brasileiro de Pesquisa eDesenvolvimento do Café, que reúneprodutores de todas as regiões dopaís. O objetivo é, numa segunda faseda pesquisa, avaliar a resistência daplanta a doenças. A expectativa é quea análise funcional do genoma do cafétambém permita melhorar a qualida-de da bebida. •

Seqüenciamento do gene do café dará pistas para melhorar a qualidade da bebida

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18 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Trabalhoavançado

GENÔMICA

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

Programa Genoma Nacional finalizaseqüenciamento da bactéria Chromobacterium violaceum

seqüenciamento da bactéria Chromobacte-rium violaceum, do Projeto Genoma Brasilei-ro (BRGene), que integra 160 pesquisadoresem 25 laboratórios espalhados pelo país, estáconcluído. A bactéria é encontrada em

regiões tropicais como, por exemplo, no rio Negro, na Ama-zônia. Acredita- se que ela poderá ser utilizada no trata-mento de algumas doenças como o mal de Chagas e a leis-hmaniose. “A definição de uma possível continuidade parao trabalho dependerá de decisões de caráter técnico-cientí-fico”, diz Ana Lúcia Assad, coordenadora-geral do Progra-ma Nacional de Biotecnologia do Ministério da Ciência eTecnologia (MCT). Este é o primeiro resultado das pesqui-sas desenvolvidas pela Rede Nacional do Projeto GenomaBrasileiro, lançada em dezembro de 2000, que abrange 480instituições de ensino e pesquisa e reúne 240 cientistas, como objetivo de disseminar pesquisas na área de biotecnologiaem todo o território nacional.

De maneira geral, houve avanços significativos nas de-mais redes regionais integrantes do projeto. “As redes já estãoconsolidadas no que diz respeito à participação dos grupos,aos processos e procedimentos do trabalho colaborativo e àcapacitação dos recursos humanos”, conta Ana Lúcia. A inte-gração das redes está possibilitando a construção de umimenso banco de dados que, no futuro, poderá contribuirpara reduções bastante significativas no prazo de apresenta-ção de resultados da pesquisa genômica.

Segundo Ana Lúcia, algumas das instituições envolvidasnos projetos regionais ainda esperam a chegada de equipa-mentos importados, mas muitas delas já operam a todo va-por e, em alguns casos, estão até negociando possíveisparcerias com a iniciativa privada. “A primeira rodada deacompanhamento in loco será realizada no início deste ano,quando verificaremos se há necessidades ainda não con-templadas”, diz ela. A partir daí, observa, serão analisadoseventuais aportes adicionais de recursos.

Das sete redes regionais, quatro trabalham na área de saú-de, pesquisando novos medicamentos e alternativas para aprevenção de doenças endêmicas. As outras três dirigiram ofoco dos estudos para a área agrícola, com o intuito de com-bater pragas e aumentar a qualidade e produtividade nocampo. No total, as sete redes estão recebendo investimentosde R$ 13 milhões do MCT e mais R$ 13 milhões de fontes di-versas. “A maior parte dos recursos complementares vem dasfundações de amparo à pesquisa estaduais”, explica Ana Lúcia.

Crinipellis perniciosa - Entre os trabalhos em estágio avança-do está o projeto de ampliação da rede de genômica do Esta-do da Bahia, que tem por alvo o fungo parasítico Crinipellisperniciosa, causador da vassoura-de-bruxa, que devasta os ca-caueiros baianos e provoca prejuízos de US$ 1,6 bilhão, desde1989.“Esse valor leva em conta apenas as vendas que deixaramde ser realizadas”, ressalva Gonçalo Amarante Guimarães Pe-reira, coordenador do Laboratório de Genômica e Expressãoda Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do pro-jeto. “Considerando-se outros aspectos, como o nível de em-

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TÂNIA MARQUES

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 19

prego, as perdas facilmente superamUS$ 10 bilhões.”

Pereira afirma ainda que a desati-vação dos cacaueiros, em decorrênciada vassoura-de-bruxa, também teveforte impacto ambiental sobre a faixade Mata Atlântica no sul da Bahia. Asplantações de cacau continham o des-matamento, já que preci-savam da sombra dafloresta. A doença é omaior problema fito-patológico das regiõesprodutoras de cacau nocontinente americano eatinge também os Esta-dos do Pará, Rondônia,Amazonas, Mato Gros-so e Acre. Até hoje, ne-nhum fungicida se reve-lou eficaz no combateao Crinipellis pernicio-sa, que vem sendo estu-dado com técnicas con-vencionais há cerca decem anos.

“Depois de definir ascaracterísticas básicas damolécula de que preci-saríamos para conter oavanço da vassoura-de-bruxa, passamos a bus-cá-la no mercado”, contaPereira. Essa molécula,fornecida por uma em-presa que atua na áreade defensivos agrícolas,mas nunca tinha sidoutilizada no combateà vassoura-de-bruxa,apresentou excelentesresultados no laborató-rio. “Em dezembro, co-meçaram os testes decampo.”

O projeto recebeu R$ 1,3 milhãodo MCT e R$ 1,2 milhão do governobaiano e conta com a participação,além da Unicamp, do Centro de Pes-quisas do Cacau, da Universidade Esta-dual de Santa Cruz (Uesc), da EmbrapaRecursos Genéticos e Biotecnologia, daUniversidade Estadual de Feira de San-tana (UEFS), da Universidade Federalda Bahia (UFBA) e da Universida-de Católica de Salvador (Ucsal). “Um

tam do início da década de 90. “Ago-ra, buscamos novas drogas inibidorasda ação do parasita e, possivelmente,uma vacina para prevenir a contami-nação”, afirma Naftale Katz, coorde-nador do projeto e diretor científicoda Fundação de Amparo à Pesquisade Minas Gerais (Fapemig).

Segundo Katz, a es-quistossomose atingealgo em torno de 7 mi-lhões de pessoas no Bra-sil, com forte concentra-ção nas regiões costeirasdo Nordeste e no Estadode Minas Gerais. “Como fluxo migratório domeio rural para o urba-no, focos de esquistos-somose têm aparecidoem áreas metropolita-nas.” Katz conta que, nosúltimos anos, dois no-vos medicamentos compoucos efeitos colateraisdesenvolvidos com baseem descobertas realiza-das por pesquisadoresbrasileiros possibilita-ram o controle da formahepato esplênica da do-ença, que atinge entre5% e 10% do total deportadores do parasita epode levar a óbito. Arecontaminação seguesendo, porém, um pro-blema grave – mesmoas manifestações maisbrandas da esquistosso-mose podem, por exem-plo, incapacitar para otrabalho. Em todo omundo, cerca de 200 mi-

lhões de indivíduos são portadores dadoença.

“O projeto recebeu R$ 1,8 milhãodo governo federal e R$ 2 milhões daFapemig, em uma de suas primeirasiniciativas de indução de demanda”,conta Katz. Cerca de 40 pesquisado-res estão trabalhando no projeto.“Vislumbramos a possibilidade deestabelecer parcerias interessantescom empresas”, diz Katz. “Estamospatenteando tudo.”

está sendo desenvolvido por um gru-po de seis laboratórios paulistas, sob acoordenação de Sérgio Verjovski. Jáestão sequenciados metade dos 120mil ESTs previstos no projeto. Minasjá tem tradição no estudo do parasita– os primeiros estudos no Estado en-volvendo o Schistosoma, realizados noInstituto de Ciências Biológicas daUniversidade Federal de Minas Gerais(UFMG) e no Centro de PesquisasRenê Rachou (CPQRR/Fiocruz), da-

Paracoccidioides brasiliensis está sendo mapeado pelo Centro Oeste

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dos aspectos importantes do projeto éa difusão da genômica”, diz Pereira.

Schistosoma mansoni - A Rede Geno-ma do Estado de Minas Gerais usacomo modelo o genoma expresso doSchistosoma mansoni, causador da es-quistossomose. Projeto semelhante

Page 19: Poluição de longo alcance

Paracoccidioides brasiliensis - OProjeto em Rede do Centro-Oestequer mapear o genoma funcionaldiferencial do Paracoccidioides bra-siliensis, fungo responsável pelaparacoccidioidomicose, micoseendêmica que pode ser fatal emcrianças, para o desenvolvimentode novos medicamentos. Segundoestimativas, o número de pessoasinfectadas na América Latina che-ga a 10 milhões, sendo 80% dos ca-sos no Brasil.

O Programa de Implantação doInstituto de Biologia Moleculardo Paraná, trabalhando com a ge-nômica funcional do processo dediferenciação celular do Trypanoso-ma cruzi, que provoca a doença deChagas, busca os genes com expres-são regulada durante a diferenciaçãocelular do parasita (metaciclogêne-se), seleção e caracterização de novosgenes e a análise de alvos quimioterá-picos inovadores. A experiência acu-mulada no processo poderá sertransferida para outros projetos degenoma.

gênio acumulado pelo vegetal. Oprojeto visa à construção de novasestirpes da bactéria, com níveis deeficiência ainda maiores. Seus auto-res acreditam que o uso desses or-ganismos pelos produtores ruraispode gerar economia de R$ 840milhões em fertilizantes nitroge-nados.

Ácido glucônico - Com objetivos se-melhantes,o Programa de Implanta-ção da Rede Genoma do Estado doRio de Janeiro (RioGene) tem comometa o seqüenciamento do genomada Gluconacetobacter diazotrophicus,outra bactéria endofítica fixadora

de nitrogênio. Presente em culturascomo cana-de-açúcar, café e batatas-doces, a bactéria também pode reduzirsignificativamente o uso de fertilizantesnitrogenados, promovendo economiaestimada em R$ 60 milhões anuais sóna plantação de cana. A bactéria tam-bém produz substâncias que estimu-lam o crescimento vegetal e metabóli-tos de interesse industrial, como oácido glucônico. •

20 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

Herbaspirillum seropedicae - Já o Pro-grama Genoma do Estado do Paranátem por objeto o genoma estrutural efuncional da Herbaspirillum seropedi-cae, uma bactéria fixadora de nitro-gênio cuja interação com as plantaspode trazer benefícios para ambas aspartes. Nesse sentido, o caso do arroz éexemplar: em algumas amostras de se-mentes, a Herbaspirillum seropedicaechega a fornecer 54% de todo o nitro-

Trypanosoma é objeto de pesquisa no Paraná

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Nordeste decifra genoma de protozoárioCom R$ 8,2 milhões em caixa,

20 grupos de pesquisa dos nove Es-tados nordestinos, reunidos no Pro-grama Genoma Nordeste (Progene),trabalham para vencer até a meta-de deste ano o primeiro grande de-safio genético da região: o seqüen-ciamento da Leishmania chagasi,protozoário transmissor da leshma-niose visceral. A doença atinge 5 milpessoas por ano no Brasil – 95%no Nordeste. No mundo, são regis-trados anualmente 500 mil novoscasos, principalmente na Índia, noPaquistão e em Bangladesh.

Três máquinas seqüenciadorasestão em pleno funcionamento –duas em Pernambuco e uma emAlagoas. Piauí e Maranhão já com-praram os equipamentos, devendoimpulsionar de imediato a produti-vidade da rede regional para 5 mil

seqüências por semana. Para atingirrapidamente a meta de processar150 mil seqüências do protozoário,os demais estados estarão equipa-dos até março, com recursos pró-prios e do Conselho Nacional deDesenvolvimento Científico e Tec-nológico (CNPq), que liberou R$1,7 milhão em julho do ano passa-do para a compra de máquinas esuprimentos. “Montada a estrutu-ra ideal, poderemos voar alto”,planeja o pesquisador Paulo Paes,da Universidade Federal de Per-nambuco (UFPE), coordenador doProgene. O próximo passo será o se-qüenciamento de um microrganis-mo de importância agrícola para oNordeste, como fizeram cientistasde São Paulo com a bactéria Xylel-la fastidiosa, causadora de doençasnos laranjais.

Os grupos de pesquisa do Pro-gene optaram por não trabalharcom o código genético completo daLeishmania, mas somente com osgenes expressos, aqueles que efetiva-mente exercem funções no parasita.Cerca de 4 mil deverão ser estuda-dos.“Seqüenciar todo o genoma se-ria um trabalho longo, para o qualainda não temos tecnologia”, expli-ca Paes. Os desdobramentos estãosendo negociados. O cientista enca-minhou ao CNPq um projeto deR$ 3 milhões para adquirir equi-pamentos e ir além nos estudos como protozoário da leishmaniose, pas-sando a analisar as funções das pro-teínas existentes no DNA. Mais R$250 mil serão investidos na criaçãode parasitos transgênicos, necessá-rios para a identificação detalhadadas atividades genéticas.

Page 20: Poluição de longo alcance

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 21

Genoma Brasileiro e os projetos ge-nomas regionais. Os laboratórios re-ceberão recursos para a aquisição deequipamentos, materiais de consumoe serviços diversos, de forma a dar su-porte às pesquisas em genômica, pormeio do desenvolvimento de softwa-res e programas de apoio. “Atualmen-te, o Laboratório Nacional de Com-putação Científica (LNCC) processatodo o genoma brasileiro. A nossa in-tenção é descentralizar esse processa-mento, distribuindo-o a outros labo-ratórios do país”, diz Fábio PaceliAnselmo, consultor da Coordenado-ria de Biotecnologia do CNPq. A ex-pectativa é que, além de apoio aosprogramas Genoma, os laboratóriosde bioinformática também desenvol-vam novos projetos de pesquisa.

Entre os projetos selecionados, dezforam propostos por universidades einstitutos de pesquisa paulistas. Entreeles, está o de anotação genômica edesenvolvimento de fármacos, coor-denado por Goran Nesic e que tem co-

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

INFRA-ESTRUTURA

OConselho Nacional de Desen-volvimento Científico e Tec-

nológico (CNPq) está investindo R$ 3milhões no aperfeiçoamento e na im-plementação de núcleos de bioinfor-mática em todo o país, com o objetivode ampliar a infra-estrutura de pes-quisa dos programas de seqüencia-mento e análise de genoma patroci-nados pelo Ministério da Ciência eTecnologia (MCT).

O CNPq, o MCT e a Financiadorade Estudos e Projetos (Finep) selecio-naram 28 laboratórios de bioinfor-mática instalados em 32 instituiçõeslocalizadas nas regiões Nordeste, Cen-tro-Oeste, Sudeste e Sul, envolvendocerca de 200 pesquisadores. Boa partedesses laboratórios integra o Projeto

CNPq investe R$ 3 milhõesna implementação de núcleos de bioinformática

Rede ampliada

mo parceiros a Empresa Brasileira dePesquisa Agropecuária (Embrapa), oLaboratório de Estrutura Molecular daUniversidade de Brasília (UnB), o La-boratório Nacional de Luz Síncrotron(LNLS) e os 16 laboratórios paulistasque participam da Rede de BiologiaMolecular Estrutural (SmolBnet). Oprojeto contará com R$ 240 mil para,entre vários objetivos, instalar, auto-matizar e avaliar processos de identifi-cação de alvos protéicos, identificadosa partir de seqüências de genomas,para o desenvolvimento de fármacose desenho de drogas.

Também contará com recursos doCNPq o projeto coordenado por Die-go Gervasio Frías Suárez, do Labora-tório de Genômica da UniversidadeEstadual de Santa Cruz, em Ilhéus, naBahia. O laboratório receberá R$ 80mil para implementar a utilização detécnicas de inteligência artificial naidentificação de genes e seqüências re-guladoras do fungo Crinipellis perni-ciosa, agente causador da vassoura-de-bruxa no cacaueiro.

Anotação de proteoma - A Rede dePesquisa e Desenvolvimento em Bio-informática do Centro-Oeste, umconsórcio que reúne a Embrapa, aUniversidade de Brasília e a Univer-sidade Católica de Brasília, integra alista de projetos aprovados. O grupo,coordenado por Georgio Joannis Pap-pas Júnior, utilizará os R$ 250 mil re-passados pelo CNPq para criar umaestrutura de banco de dados para ar-mazenamento e manipulação de se-qüências, montar uma plataforma, viaweb, para a validação de seqüências emineração de dados e integrar ferra-mentas e sistemas para anotação au-tomática de genoma e proteoma.

A CNZ Indústria e Comércio Ltda.,empresa incubada no Centro Incuba-dor de Empresas Tecnológicas (Cietec),em São Paulo, é o único laboratórioprivado contemplado com recursos doCNPq. O projeto aprovado prevê o de-senvolvimento de produto com tecno-logia capaz de propiciar as reações emcadeia de polimerase para aplicaçõesem biologia molecular computacio-nal e em genômica computacional. •

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22 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

das pelas redes acadêmicas. O apoioà pesquisa atende ao segundo objetivodo programa, que é formar especialis-tas em desenvolvimento de tecnolo-gias para a Internet.

Tecnologia de rede - Os temas de pes-quisa propostos nos 123 projetos tam-bém surpreenderam pelo equilíbrioem torno de dois temas: aplicações deInternet e tecnologia de rede propria-mente dita. “Metade das propostas detrata pesquisas em telemedicina, tele-ducação, governo virtual, biblioteca vir-tual, entre outras. Temíamos que só opessoal de rede atendesse ao edital”,comemora Ruggiero.

Uma primeira análise dos proje-tos revelou também a falta de intera-ção entre o grupo de pesquisadores

AVALIAÇÃO

Os coordenadores do ProgramaTecnologia da Informação no

Desenvolvimento da Internet Avan-çada (Tidia) têm, nos próximos trêsmeses, uma dura tarefa: analisar econsolidar propostas de 123 pré-pro-jetos encaminhados à FAPESP em res-posta à chamada de edital lançado emoutubro. “Foi uma agradável surpre-sa”, diz Carlos Antônio Ruggiero, doInstituto de Física da Universidade deSão Paulo, em São Carlos, um dos co-ordenadores do Tidia. “O mais oti-mista do grupo apostava que onúmero de pré-projetos nãopassaria de 80.”

Todos serão analisados, clas-sificados e reunidos em um pe-queno número de projetos coo-perativos, em torno de temas eobjetivos comuns. Os resulta-dos da análise dos projetos se-rão publicados em fevereiro oumarço deste ano.

O Tidia tem como objetivotransformar a Internet em objetode pesquisa. Prevê a criação deuma rede de fibras ópticas comvelocidade de 400 gigabits/s,construída em parceria com a ini-ciativa privada, ligando, inicial-mente, São Paulo, Campinas eSão Carlos e, posteriormente,outros municípios do Estado deSão Paulo. Essa rede será umcampo de testes (test bed) com ar-quitetura capaz de suportar umlaboratório comunitário paramultiusuários, onde serão desen-volvidas pesquisas encaminha-das ao programa e implementa-

Programa de Internetavançada vai analisar123 pré-projetos

Tidia em altacom propostas de pesquisa sobre aaplicação da Internet e o grupo quepretende investigar a infra-estruturada rede. “São grupos distintos. Ao in-tegrarmos os projetos no Tidia esta-remos forçando o trabalho coopera-tivo”, afirma. No decorrer da análisedos projetos, a coordenação do pro-grama poderá consultar a comunida-de sobre a consolidação dos pré-pro-jetos e, eventualmente, abrir espaçopara novas propostas.

Os projetos contarão com recur-sos da FAPESP de, no mínimo R$ 10milhões, mas também receberãoapoio de empresas privadas, futurasparceiras do programa. “Estamos emcontato com fabricantes de equipa-mento de telecomunicações, conces-sionárias de telecomunicações, pro-vedores de acesso e alguns órgãos dogoverno paulista. Todos já demons-traram interesse em participar do pro-grama.” Apesar de os projetos seremde conteúdo aberto, Ruggiero não temdúvidas de que o Tidia contará com oapoio significativo dos parceiros.

Cada empresa poderá participarem áreas de interesse específico,como acontece nos Estados Uni-dos, onde a Internet 2 não é sóum projeto de rede de alta velo-cidade, mas também de coope-ração com a iniciativa privada.O apoio do governo também éconsiderado fundamental, querseja na condição de parceiro,quer seja na condição de agen-te facilitador, já que o progra-ma necessitará, por exemplo,de autorização para utilizar osdutos de fibra óptica que se es-tendem ao longo das rodoviaspaulistas.

O novo programa consolidaa participação da FAPESP na his-tória da Internet no Brasil, quecomeçou com a criação da redeANSP, em 1989. A Fundaçãotambém já foi o único e princi-pal link internacional, respon-sável pelo tráfego acadêmico e,por solitação do Comitê Gestorda Internet, é atualmente res-ponsável pelo registro de do-mínios no país. •

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SciELO – Scientific Electronic Library Online é uma biblioteca de revistas científicas disponí-vel na Internet. Uma biblioteca virtual que reúne 64 publicações científicas brasileiras. Suainterface permite o acesso fácil aos textos completos de artigos científicos, por meio das ta-belas de conteúdos dos números individuais das revistas ou da recuperação de textos pornome de autor, palavras-chaves, palavras do título ou do resumo.

A SciELO publica também relatórios atualizados do uso e do impacto da coleção e dos tí-tulos individuais das revistas. Os artigos são enriquecidos com enlaces dinâmicos a bases dedados bibliográficas nacionais e internacionais e à Plataforma Lattes no CNPq.

SciELO é produto do projeto cooperativo entre a FAPESP, a BIREME/OPAS/OMS e editorescientíficos brasileiros, iniciado em 1997, com o objetivo de tornar mais visível, mais aces-sível e incentivar a consulta das mais conceituadas revistas científicas brasileiras. Em 1998,a coleção SciELO Brasil passa a operar normalmente na Internet e projeta-se rapidamentecomo modelo de publicação eletrônica de revistas científicas para países em desenvolvimen-to, em particular da América Latina e Caribe. Ainda em 1998, o modelo é adotado pelo Chi-le e em 1999 começa a operar a coleção SciELO Saúde Pública, com as melhores revistascientíficas de saúde pública ibero-americanas. Outros países estão em processo de incorpo-rar-se à rede de coleções SciELO.

O modelo SciELO destaca e valoriza a comunicação científica brasileira. Ao mesmo tempo,proporciona mecanismos inéditos de avaliação de uso e de impacto das nossas revistas cien-tíficas, em consonância com os principais índices internacionais de produção científica.

Adote a SciELO como sua biblioteca científica.

As publicações científicas brasileiras estão ao alcance de suas mãos. Não importa

em que parte do mundo você esteja

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Page 23: Poluição de longo alcance

24 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

CIÊNCIA

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Como corrigir defeitos de nascimento

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ARO cirurgião pediatra brasi-

leiro Dario Fauza, da Fa-culdade de Medicina daUniversidade Harvard, Es-tados Unidos, supervisio-nou duas pesquisas, umacom fetos de animais e ou-tra com fetos humanos,que envolvem o uso de cé-lulas do líquido amnióticocomo matéria-prima paraa engenharia de tecidos fe-tais. O objetivo é a recons-trução cirúrgica para tratarcertos defeitos de nasci-mento – como hérnia dia-fragmática e problemas nasparedes abdominal ou to-rácica – sem necessidade detocar no feto. Em experi-mentos conduzidos pelopesquisador Amir Kaviani,as células extraídas foramcultivadas e manipuladasin vitro na fase final da ges-tação, para a criação de umabioprótese que possa serimplantada logo depois doparto. O conceito de enge-nharia de tecidos fetais temsido aplicado com sucessoem experimentos com ani-mais para a reconstruçãode deformidades de bexiga,pele e diafragma. As expe-riências são promissoras,embora haja riscos de le-sões no feto ou de induçãoa parto prematuro.

Tecido fetal - “Uma apro-ximação menos invasivapara a obtenção de célulasfetais poderia tornar esteconceito mais amplamenteaplicável”, diz Fauza. Ospesquisadores partiram dahipótese de que células fe-tais humanas obtidas por

amniocentese – punção noabdome materno para aretirada de líquido amnió-tico – podem ser isoladas eexpandidas em laboratóriopara aplicações em enge-nharia de tecido fetal. Cé-lulas obtidas de mulheresentre 15 e 19 semanas degestação foram cultivadasnum meio contendo 20%de soro fetal bovino e fatorde crescimento de fibro-blasto. Células morfologi-camente distintas foramisoladas do restante e ex-pandidas seletivamente. Oestudo mostrou que o flui-do amniótico pode servir

como fonte de células paraengenharia de tecido fetal.“Nossos resultados indica-ram que uma amostra de 2mililitros de fluido amnió-tico obtido por amnicentesepode conter células sufi-cientes para criar um teci-do pronto para a implanta-ção imediatamente após onascimento”, explica Fauza.Ele afirma que o risco daamniocentese, conduzidapor especialistas, é de umataxa de aborto espontâ-neo de 1% ou menos. Opesquisador observa que aaplicação clínica requermais estudos. •

Gestante: possibilidade de tratamentos menos invasivos

Jaraguá: fuga de escorpiões

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■ O menor réptil do mundo

Com seu 1,6 centímetro donariz à ponta do rabo, o jara-guá cabe com folga dentro deuma moeda de dez centavosde dólar e tem de tomar cui-dado para não virar comidade lacraias e escorpiões –embora seja um lagarto, oSphaerodactylus ariasae é pro-vavelmente a menor espéciede réptil do mundo, segundoseus descobridores, os biólo-gos Blair Hedges, da Universi-dade do Estado da Pensilvâ-nia, e Richard Thomas, daUniversidade de Porto Rico.Eles encontraram o minúscu-lo lagarto em três pontos daIsla Beata, uma pequena ilhacaribenha pertencente à Re-pública Dominicana, e acre-ditam que esse seja o únicolocal do mundo habitado poressa curiosa espécie. A desco-berta foi relatada no Caribbe-an Journal of Science (n° 37).Segundo o pesquisador nor-te-americano Michael Smith,especialista em biodiversida-de caribenha, o achado podese transformar numa bandei-ra preservacionista – o Caribejá sofre os efeitos do desmata-mento de 90% de sua mataoriginal. Além do lagarto, olocal é também é o hábitatdos menores pássaro, sapo ecobra do mundo. •

Page 24: Poluição de longo alcance

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 25

■ O magnetismo oculto do gol

Depois de analisar os resulta-dos de 135 mil jogos de fute-bol, realizados entre 1999 e2001 nos principais campeo-natos internos de 169 países,físicos da Universidade deWarwick, em Coventry, In-glaterra, concluíram que golatrai gol. John Greenhough eseus colegas britânicos perce-beram que, durante uma par-tida, a chance de uma dasequipes mandar a bola para arede do adversário guarda re-lação direta com a quanti-dade de gols já marcados.Quanto mais dilatado estivero placar da disputa num de-terminado momento, maiora probabilidade de haver umnovo gol. Ou seja, é mais fácilmandar a bola para rede numjogo com escore parcial de 3 a3 ou 4 a 1 do que numa par-tida com placar temporáriode 0 a 0 ou mesmo 1 a 0. Se-gundo os cientistas, a regravale para o futebol praticadoem todo o planeta – menosna Inglaterra, onde goleadassão mais raras. As estatísticasdos físicos mostram que acada 300 jogos realizados nomundo um deles tem mais dedez gols. Os estudiosos de

Jogador inglês (de branco): defesa boa ou ataque ruim?

Os três anos de sucesso do programa Biota

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FP ■ As causas da “barriga de cerveja”

Um dos dramas masculinos,aquela adiposidade no abdo-me conhecida como “barrigade cerveja”, recebeu uma aju-da da ciência no mês passado,de acordo com o jornal norte-americano The Boston Globe(14 de dezembro de 2001).Pesquisadores do Centro Mé-dico Beth Israel Deaconess,em Boston, Estados Unidos,identificaram uma enzina emcélulas de gordura que as levaa se concentrar na região ab-dominal. Se for possível “des-ligar” essa enzima, provavel-mente será mais fácil eliminara gordura. O fato seria bem-vindo pelos médicos: essetipo de gordura está relacio-nado a várias doenças, comorisco de diabetes, hipertensãoe doenças cardíacas. •

Em março, o Biota-FAPESPcompleta três anos de su-cesso. A opinião é do Co-mitê Científico Consultivo,composto por pesquisado-res estrangeiros que avaliamanualmente os avanços doprograma. O Biota coorde-na cerca de 40 projetosdestinados a mapear a bio-diversidade e os recursosnaturais do Estado de SãoPaulo. “Em um ano, o pro-grama avançou muito e al-guns projetos já estão ama-durecendo”, afirmou FrankBisby, diretor do Centro deDiversidade de Plantas daUniversidade de Reading,Inglaterra, e coordenadordo projeto Species 2000,um esforço internacionaldestinado a catalogar todasas espécies de vegetais, ani-mais, fungos e micróbiosdo mundo. Bisby e outros

três membros do comitê –Arthur Chapman, do De-partamento de Meio Am-biente e Patrimônio da Aus-trália, Donald Potts, daUniversidade da Califór-nia, e Barry Chernoff, doField Museum of NaturalHystory, de Chicago – esti-veram em São Paulo em

dezembro para acompa-nhar o andamento do Bio-ta. Entre os fatos destaca-dos figuram a montagem eentrada em funcionamen-to de sua base de dados on-line, o sistema SinBiota, e acriação de seu jornal cien-tífico, a revista Biota Neo-tropica, também on-line. •

Planta da mata Atlântica: elogios ao programa

Warwick só não souberam res-ponder a uma questão: saempoucos gols nos campeonatoslocais por que os goleiros e asdefesas das equipes inglesassão muito boas ou por que osataques são muito ruins? •

■ Pata-de-vaca éinsulina vegetal

A espécie amazônica conhe-cida como pata-de-vaca (Bau-himia forficata link), usadapopularmente como plantamedicinal, tem fama de sereficaz no tratamento da dia-betes e apresentar proprie-dade purgativas e diuréticas.Agora, ela começa a ser estu-dada pela Universidade doAmazonas, com apoio daFundação de Apoio Institucio-nal Rio Solimões e financia-mento do Banco da Amazônia.Serão investigadas as substân-cias químicas de ação farma-cológica da planta e definidasformas de plantio, manejo ecoleta para a difusão do usofitoterápico. A pata-de-vaca éutilizada como uma espéciede insulina vegetal por regu-larizar a glicemia. •

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Page 25: Poluição de longo alcance

26 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

O perigo das pedras no espaçoNos livros e filmes de ficçãocientífica, os vôos espaciaispodem ser ameaçados porchoques com meteoritos,sabotagem e até ataquesalienígenas. Na vida real, osriscos podem ser mais pro-saicos, mas não menos des-trutivos. Uma das maiorespreocupações dos especia-listas da Nasa é evitar que osastronautas sofram com pe-dras nos rins, informa a re-vista New Scientist (10 denovembro de 2001). Quemjá teve, sabe: a dor provoca-da por um cálculo renalpode colocar fora de açãomesmo o ser humano maistreinado a suportar condi-ções adversas – e um únicomembro de tripulação espa-cial incapacitado pode pôr aperder toda a missão. Estu-

tas era significativamentemais baixo do que o normaldurante e até um mês apósas viagens. A perda de mas-sa óssea que ocorre em con-dições de microgravidade éuma das causas do proble-ma. O cálcio que é liberadodos ossos pode ir para a uri-na, levando à formação docálculo. Uma forma de tra-tamento e prevenção seriatomar litros de água e elimi-nar grande quantidade deurina, uma medida quaseimpossível de ser adotadano espaço. Uma soluçãomais prática pode estar nossuplementos de citrato depotássio e magnésio. O ci-trato, encontrado nas frutasfrescas de que os astronau-tas carecem, inibe a forma-ção dos cálculos. •

dos realizados na extinta es-tação espacial russa Mirmostram que os astronautassão mais susceptíveis a terpedras nos rins do que osseres humanos com os pésna terra. Nos vôos que du-ram mais de 18 dias o risco

é ainda maior. Foram cole-tadas amostras de urina deastronautas da Mir antes,durante e depois de váriasmissões realizadas entre1995 e 1999. Os pesquisado-res descobriram que o volu-me de urina dos astronau-

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Astronautas no espaço: cálculo renal pode abortar missão

imunoglobulina E (IgE),proteína-chave do processoalérgico, de acordo com a re-vista New Scientist (17 de no-

■ Irmão caçula espirra menos

Ser o mais novo numa famí-lia grande pode significarvestir sempre roupa usa-da e levar a pior nas brigas.E virar o xodó da mamãeé uma vantagem duvido-sa. Há, porém, uma outra:ser menos suscetível a aler-gias. As mudanças hormo-nais sofridas pelas mulhe-res após várias gestaçõespodem explicar por queos primeiros filhos têmmais tendência a desen-volver alergia do que oscaçulas. A tese é do pes-quisador Wilfried Kar-maus, da Univer-sidade do Estado doMichigan, Estados Uni-dos, que encontrou nosprimogênitos recém-nas-cidos níveis maiores da

vembro de 2001). O epidemi-ologista inglês David Stra-chan foi o primeiro a relatarmaior ocorrência de proces-

sos alérgicos como asma,febre do feno e eczemanos filhos mais velhos. Aprincípio, ele atribuiu ofenômeno a uma questãode higiene: o sistema imu-nológico dos primeiros fi-lhos ficaria desordenadose eles não fossem expos-tos aos desafios do ambi-ente desde cedo. Já os ca-çulas, convivendo com os

germes e poeira trazi-dos pelos irmãos, esta-

riam menos sensíveisaos potenciais alérge-nos. Agora, porém, aspesquisas de Karmaus

revelam que a vantagemdos caçulas pode começarainda mais cedo, no úte-ro materno. •

■ Reconstrução do Buda afegão

A estátua gigante de Buda,destruída em março de 2001quando o Taliban ainda domi-nava o Afeganistão, será recons-truída com ajuda de imagensem três dimensões usandofotografias com alta definiçãofeitas nos anos 70, informa arevista New Scientist (1º dedezembro de 2001). O traba-lho será feito por pesquisado-res da Universidade de Zuriquee Museu da Basiléia, ambosda Suíça, e artesãos do Insti-tuto Afegão. A imagem origi-nal tinha 53 metros de altura,mas a réplica terá 6 metros.Eles esperam que a cópia esti-mule a população afegã a semobilizar para recriar o Budade 53 metros, uma vez que opaís se torne politicamenteestável. •

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L A B O R AT Ó R I OL A B O R AT Ó R I O

Page 26: Poluição de longo alcance

■ Confirmada datação de Lagoa Santa

A datação pelo método docarbono 14 de carvões asso-ciados às covas onde foramencontradas partes de trêsossadas humanas em sítiospré-históricos de Matozinhos,na região mineira de LagoaSanta, confirmou as previ-sões iniciais do bioarqueólo-go Walter Neves, do Institutode Biociências da Universi-dade de São Paulo (USP),que coordenou em julho de2001 uma expedição de 25pesquisadores aos ancestraiscemitérios da área: os frag-mentos de esqueletos desen-terrados em meados do anopassado têm entre 8.360 e8.800 anos. A obtenção de os-sadas na região é importantepara o trabalho de Neves, quedefende uma nova teoria so-

bre o povoamento da Améri-ca a partir da análise da mor-fologia cranial de antigos es-queletos resgatados em Lagoa

Santa. Para dar suporte aostrabalhos de campo do proje-to de Neves, financiado pelaFAPESP, uma base de apoio

é mantida oano todo emMatozinhos,com a ajudade cientistas eestagiários lo-cais. •

■ Castanha combate câncer de próstata

Estudo feito a partir da Uni-versidade Stanford, na Califór-nia, Estados Unidos, mostrouque as castanhas brasileiras e oatum ajudam a prevenir ocâncer de próstata. A pesqui-sa, publicada no Journal ofUrology (volume 166), da As-sociação Norte-Americanade Urologia, indicou que es-ses alimentos são ricos em se-lênio, substância químicocuja ausência está associada àmaior probabilidade de riscode contrair a doença. Deacordo com o autor do traba-lho, James Brooks, pesquisa-dor de Stanford, a falta de se-lênio no sangue aumenta dequatro a cinco vezes o riscode contrair esse tipo de cân-cer. O problema para os ho-mens mais velhos é que,quanto mais avançada a ida-de, menor a quantidade doelemento no sangue. O estu-do é promissor e vem em boahora: um outro trabalho feitocom 1.400 pessoas em setepaíses europeus (EstadosUnidos, Reino Unido, França,Alemanha, Itália, Espanha eSuécia) pelo centro de pes-quisas britânico NOP Heal-thcare indicou que apenas39% dos homens têm conhe-cimentos básicos sobre o pro-blema. O câncer de próstata éo segundo mais letal namaioria dos países ocidentaise em sua fase inicial não apre-senta sintomas. O problemasé que a pesquisa feita na Eu-ropa constatou que a maioriadas pessoas acha que é possí-vel perceber os sintomas dadoença ao urinar – não maisde 1% sabe que a doença nãose manifesta, no início. NoBrasil, o tumor na próstata sóé superado pelo câncer depele, de acordo com estimati-vas do Instituto Nacional doCâncer. •

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 27

A fórmula do canto

Uma equipe formada porcientistas norte-america-nos e argentinos conseguiutraduzir três notas do can-to de um canário em umafórmula física. O trabalhoé importante para ajudarna compreensão da pró-pria fala humana. Emborao canto de pássaros comoos canários, por exemplo,seja formado por comple-xos padrões acústicos, en-volvendo notas de muitasfreqüências e comprimen-tos, os pesquisadores daUniversidade Rockefeller,dos Estados Unidos, e Uni-versidade Ciudad, na Ar-gentina, afirmam que osprocessos físicos que pro-duzem esses sons são sur-preendentemente simples.Eles compararam o órgão

vocal dos pássaros, a sirin-ge, a um oscilador harmô-nico – aparelho baseadonuma partícula que oscilaem torno de uma posiçãode equilíbrio. À medidaque o pássaro expele ar, asiringe abre e fecha paraproduzir notas com fre-qüência entre 1 e 2 quilo-hertz. Dois fatores contro-lam como os sons sãoproduzidos – a pressão doar entrando no órgão e a

elasticidade do tecido queo reveste. Quando a pres-são do ar excede determi-nado nível, o tecido oscila.Os pesquisadores reconhe-ceram esse comportamen-to como semelhante aosmovimentos de um oscila-dor harmônico simples,como um peso em umamola, por exemplo. Então,eles usaram as equaçõesque descrevem tal fenôme-no para estudar variáveiscomo pressão do ar e elas-ticidade e criaram um mo-delo para descrever trêsnotas do repertório do ca-nário. A compreensão dosprocessos físicos pode aju-dar a desvendar o cantodos pássaros e, de quebra,o próprio fenômeno dafala humana, pois os pássa-ros aprendem a cantar exa-tamente como os bebêsaprendem a falar: ouvindoos adultos. •

Canário: fórmula física

Anzol (alto) e ponta delança: peças confirmam a teoria de Neves

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Noroeste da capital e pico do Jaraguá: poluição é barrada pela serrada Cantareira, considerada de “ar puro”, e ali se acumula

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METEOROLOGIA

Mais quente e sem garoa,São Paulo espalha a fumaça que produz

para cidades distantes até 400 km

CARLOS FIORAVANTI

Estufa que exporta

poluição

CAPA

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 29

Page 29: Poluição de longo alcance

clima de São Paulo mudou. Os dias de verão sãocada vez mais quentes e os de inverno, mais se-cos. A temperatura média da maior cidade doBrasil está 1,3ºC (grau Celsius) mais alta do quehá quatro décadas. E, ao contrário do que se po-

deria imaginar, os efeitos da urbanização, sobretudo a imper-meabilização do solo e o excesso de veículos, não são os princi-pais responsáveis pela mudança: respondem por cerca de 30%nas alterações, enquanto os 70% cabem às forças naturais, prin-cipalmente ao aquecimento do Oceano Atlântico nesse período.

Além de explicar essas alterações, as pesquisas coordenadaspor Pedro Leite da Silva Dias, do Instituto de Astronomia, Geofí-sica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), mostram algo pior: a Região Metropolitana de São Paulo– capital e 38 municípios vizinhos – é um centro exportador depoluentes. Cercada ao sul pela serra do Mar, que separa a planí-cie litorânea do planalto – e ao norte pela serra da Cantareira,de cerca de 1.200 metros de altitude, a região ocupa um quadri-látero de 200 por 150 km (quilômetros), onde vivem 17 milhõesde pessoas. Seu ar poluído, principalmente no inverno, podechegar a cidades situadas a até 100 km da capital, ainda que emconcentrações menores do que nas imediações das avenidas ouplantas industriais onde é produzido. Silva Dias estima que, confor-me a época do ano, de 20% a 30% da poluição de Campinas, Tatuíe Sorocaba, por exemplo, venha de São Paulo.

A poluição tornou-se, portanto, um problema não mais ape-nas local, mas regional. Má notícia para os próprios paulistanosque, nos finais de semana e férias, vão se refugiar na montanhaem busca de ar puro, um dos atrativos de cidades serranas pró-ximas. Modelagens feitas em computador atestam que o ar podenão ser tão puro assim, por causa da poluição trazida sorrateira-mente pelos ventos que sopram da capital. Quem vive mais lon-ge nem sempre escapa. Se embalado por ventos mais intensos, oar poluído da metrópole pode alcançar Bauru, a quase 400 km.

Delineou-se outro problema para os vizinhos de São Paulo:há lugares onde a concentração de ozônio (O3) perto do solochega a superar a da capital. Formado pelos poluentes emitidospelos carros, esse ozônio é prejudicial, ao contrário do que exis-te numa camada atmosférica elevada, que protege o planeta deradiações danosas. Na alta atmosfera, essa forma de oxigênio fil-

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Túnel Jânio Quadros:medições valiosas nesse “laboratório” livre da radiação solar, que acelera as reações entre poluentes

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tra os raios ultravioleta do Sol, mas junto do solo pode ir-ritar os olhos e causar rinite, tosse e outros problemas res-piratórios. É tóxico também para as plantas.

Em Barueri, Embu e Jundiaí, por exemplo, o teor des-se ozônio poluente pode ser até 50% maior que na praçada Sé ou no vale do Anhangabaú – nesses pontos, em ple-no centro, a média horária de ozônio, de 60 ppb (partespor bilhão), oscila conforme a época do ano e às vezes ex-cede o limite de segurança, que é de 80 ppb.

uando se pensa em soluções, surge um com-plicador. Quem deve assumir a responsabi-lidade pelos problemas de saúde causadospela poluição: o município que exporta po-luentes ou o que os recebe? Nem os especia-listas em Direito Ambiental da Europa ou

dos Estados Unidos se entendem a respeito.Na capital, também há surpreendentes pontos de for-

mação de ozônio, como a serra da Cantareira e o pico doJaraguá. Embora considerados refúgios de ar puro, são re-giões altas, e por isso barram a passagem do ar e podem teras mesmas concentrações de ozônio que áreas densamenteurbanizadas, segundo levantamentos do IAG e do Institutode Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen).

A situação preocupa porque hoje o ozônio é o poluen-te que mais ultrapassa o limite de segurança, sobretudo nosbairros paulistanos do Ibirapuera e da Mooca, bem comoem Cubatão, na Baixada Santista. A formação de ozônioem locais distantes dos pontos de origem dos poluentes éum problema comum aos grandes centros. Silva Diasacredita que haja muito ozônio nos arredores de Brasíliae Curitiba, por exemplo, já que o fenômeno costumaocorrer em cidades com mais de 400 mil habitantes.

O trabalho conjunto de físicos, químicos, meteorolo-gistas e matemáticos mostra por que hoje a Terra da Garoanão passa de uma lembrança. Esse apelido de São Paulo serefere a uma situação que persistiu até os anos 60, quandoa chuvinha fina era assídua e se somava ao clima mais frio:

no inverno, os paulistanos não dispensavam casacos gros-sos, luvas e cachecóis. Hoje praticamente não há garoa, en-quanto são mais freqüentes as chuvas torrenciais, causado-ras de inundações na estação quente.

Os pesquisadores analisaram as condições meteoroló-gicas – variação de temperatura e umidade, distribuiçãode chuvas, freqüência de nevoeiros e ventos – que determi-nam o transporte dos poluentes e concluíram: as forças na-turais são decisivas para e transformação da São Paulo daGaroa numa cidade de chuvas torrenciais. “Há uma fortecorrelação entre as mudanças do clima da capital e as ocor-ridas no Atlântico Sul, cuja temperatura média anual au-mentou 1,4ºC em 40 anos”, explica Silva Dias.

Influências marinhas -Embora não se possa garantir que oaquecimento do oceano seja a causa direta do aquecimen-to da capital, a hipótese é plausível. Medições feitas desde1933 na estação meteorológica do IAG na Água Funda,junto ao Jardim Zoológico, apontam para uma mudançadrástica no regime pluviométrico: aumento das chuvas in-tensas no verão e diminuição das chuvas leves no inverno.Disso resultou uma mudança no teor de umidade do ar. Oar mais seco que passou a predominar no inverno dificul-ta a dispersão dos poluentes gerados pelos 6 milhões deautomóveis, 400 mil caminhões e ônibus e cerca de 30 milinstalações industriais da Região Metropolitana.

Apoiados ainda em medições de 1999 e 2000, que se so-maram a informações colhidas rotineiramente pela Compa-nhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental do Estado de SãoPaulo (Cetesb), os pesquisadores passaram a entender me-lhor não só as mudanças climáticas, mas também as origense os movimentos das massas de ar que se desfazem, estacio-nam ou mudam de rota ao encontrar as serras e os corredo-res de prédios. São os ventos originados mais freqüentemen-te no mar que carregam a poluição produzida na cidade,principalmente por veículos, em volumes nada desprezíveis:1,6 milhão de toneladas de monóxido de carbono, 380 miltoneladas de hidrocarbonetos e 64 mil toneladas de aeros-

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Cubatão, ao pé da Serra do Mar: brisa marinha leva ao planalto poluentes dessa cidade industrial

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sóis (material particulado) por ano. Além de mostrar queesses poluentes afetam a qualidade de vida na capital e nosmunicípios vizinhos, o estudo é provavelmente o primeiroa medir a origem e o destino do ar respirado em São Paulo.

A Região Metropolitana produz a maior parte de seuspoluentes: de 70 a 80%. O resto vem do interior ou de ou-tros Estados: entre fins de outubro e começo de novem-bro, cerca de 10% da poluição da metrópole é resíduo dequeimadas, principalmente de cana, feitas a até 300 km dedistância, nas regiões de Piracicaba ou Ribeirão Preto. Mes-mo as cinzas de queimadas no sul da Amazônia podem che-gar à maior cidade do Brasil, dependendo da direção e daintensidade dos ventos – a movimentação diária dos ventospode ser acompanhada na página www.master.iag.usp.br,construída com os resultados da pesquisa.

análise do movimento e da qualidade do arbaseou-se numa metrópole ampliada em raio de

100 km – inclui parte da Baixada Santista (San-tos e Cubatão), do Vale do Paraíba (até São Josédos Campos) e de áreas mais planas,como So-

rocaba e Campinas. Foi essa visão abrangente que permitiuconhecer os pontos e os processos de formação de ozônio.

Já se sabia que há menos ozônio no centro ou em Con-gonhas, porque os próprios poluentes dessas áreas –sobretudo óxidos de nitrogênio – o consomem. É pela fal-ta desses poluentes que pode haver mais ozônio no parquedo Ibirapuera do que na vizinha avenida 23 de Maio.

Levados pelas massas de ar, os poluentes emitidos peloscarros – formadores do ozônio – saem da capital e partici-pam de reações promovidas pela luz solar, que demoramde duas a três horas para se completar – tempo suficientepara que cheguem a municípios vizinhos ou estacionemnas encostas das serras. A situação se agrava em novem-bro, quando há muitos dias ensolarados e sem nuvens.

O detalhamento do processo foi um trabalho duro. Avice-coordenadora Maria de Fátima Andrade, do IAG, es-tudou a formação e interação de poluentes. Com os valores

do inventário de emissões, estudou a formação de ozônioa partir de óxidos de nitrogênio, hidrocarbonetos e radi-cais livres (fragmentos de moléculas formadas a partir deoxigênio). O programa de previsão de formação de ozônioque ela usou tem cerca de 200 reações com 90 poluentes.

Tampa de panela - Ficou clara a importância da brisa ma-rinha – corrente de ar de baixa intensidade que nasce nooceano, como resultado da diferença de temperatura entreo mar e o continente. É essa brisa, ao circular a 500 metrosda superfície, que ameniza a temperatura da capital e intensi-fica a dispersão de poluentes, sobretudo quando associadaaos ventos de Sudeste, correntes mais intensas, tambémoriginadas no mar. O efeito refrescante desses ventos mari-nhos, descobriram os pesquisadores, pode chegar até SãoCarlos ou Pirassununga, a 230 km da capital.“São Paulo temsorte de estar perto do mar”, diz o coordenador.“O clima se-ria pior, do ponto de vista do impacto sobre a saúde pública,sem a brisa.” Dias quentes e abafados são dias em que a bri-sa marinha não atinge a cidade.

A equipe fez também um perfil tridimensional dasmassas de ar na Região Metropolitana: é a camada-limiteplanetária, região baixa da atmosfera onde os poluentes rea-

gem entre si. Descrita num artigo publicado emabril de 2001 em Atmospheric Environment, essaregião ocupa de 50 a 100 km ao redor do centrode São Paulo.Sua altura depende da força dos ven-tos que abriga, mas durante o dia chega a 1.500

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metros do solo. À noite, o limite cai para 400 metros ou me-nos e, como o volume ocupado pelo ar urbano diminui, aconcentração de poluentes aumenta.

ar piora com um fenômeno típico do inver-no paulistano: inversão térmica. Na chega-da de uma frente fria, a temperatura sobecom a altura, ao contrário do habitual: nor-malmente a temperatura cai 1ºC a cada 100

metros de altitude. Em 1999 e 2000 houve observaçõespor meio do Sodar – Sounding Detection and Ranging ousondador acústico, aparelho que emite sinais sonoroscomo um radar de submarino e traça o perfil da variaçãotérmica a até 1.500 metros do solo. Apurou-se que, sobforte inversão térmica, a camada-limite pode cair para 200metros. Ela funciona como uma tampa de panela e, quantomais baixa, mais concentração de poluentes. “Para os mo-radores da cidade, é a pior situação”, diz Fátima.

O Sodar evidenciou também dois fenômenos que afetama qualidade do ar. Um deles é o dos “jatos noturnos”, ventosverticais intensos que resultam de mecanismos atmosféricosde maior escala, como as frentes frias – massas de ar vin-das do sul do continente. Os jatos quebram a estabilidadeda camada-limite noturna e podem trazer para baixo poluen-tes como o ozônio, aumentando sua concentração perto dasuperfície. Além disso, a mistura do arprovocada pelos jatos também podecontribuir para a diminuição da con-centração de poluentes produzidos nasuperfície, como a poeira.

A situação pode melhorar com o se-gundo fenômeno,o das ondas de gravida-de. Mais intensas à noite, assemelham-seàs ondas de água que batem numa bar-reira: ao subir a Cantareira, o ar originaoscilações, análogas às ondas de água, oque contribui para reduzir a poluição.

“Esta foi a primeira vez que se estu-

dou o perfil tridimensional da poluição na Região Metro-politana”, comenta Paulo Artaxo, pesquisador do Institutode Física da USP que participou do trabalho. Para chegaronde chegaram, os especialistas soltaram balões parecidoscom os de festas de aniversário, que sinalizam a direção e aintensidade dos ventos.Valeram-se também de um avião Ban-deirante do Instituto Nacional de Pesquisas Espacial(Inpe). Em quatro vôos, nos invernos de 1999 e 2000, co-letaram amostras de ar das cidades de São Paulo, Soroca-ba, São José dos Campos, Campinas e Cubatão, voando a200 metros do solo, abaixo do tráfego aéreo.

Variação brusca - Os pesquisadores analisaram a concen-tração dos gases poluentes ozônio, óxidos de nitrogênio,monóxido de carbono e dióxido de enxofre. A concentra-ção de material particulado foi analisada por uma técnicaque analisa os raios X gerados por uma amostra num ace-lerador de partículas. Foram analisados tanto o materialfino, de menos de 2 micra (1 mícron é a milésima parte domilímetro), que entra na corrente sanguínea e atinge os al-véolos pulmonares, quanto o grosso, acima de 2 micra,que causa rinite, tosse e resfriado.

Primeira conclusão: a concentração de poluentes podevariar bruscamente num local. Em medição do dia 13 deagosto de 1999 no aeroporto Campo de Marte, havia 9.000

partículas por centímetro cúbico (cm3) a1.000 metros de altitude. A 1.500 me-tros, o teor de material particulado caíapara 2.000 por cm3. A diferença tambémvaria muito com a distribuição geográ-fica: “Das áreas litorâneas para o centroda cidade, a concentração de materialparticulado subiu 20 vezes”, diz Artaxo.E as fontes desses poluentes variam noano. Num estudo feito no inverno, adistribuição de material particulado finofoi esta: veículos, 28%; poeira do solo,25%; sulfatos de fontes industriais,

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Beleza enganadora:as cores do pôr-do-sol na metrópole se devem ao excesso de poluição

O PROJETO

Meteorologia e Poluição Atmosféricaem São Paulo

MODALIDADE

Projeto temático

COORDENADOR

PEDRO LEITE DA SILVA DIAS – InstitutoAstronômico e Geofísico – USP

INVESTIMENTOR$ 1.411.210,01

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23%; e queima de óleos industriais, 18%. Já no verão, a par-ticipação dos carros cai para 24% e se destacam a poeira dosolo (30%) e a queima de óleo residual (21%).

icou claro que a emissão de poluentes se casacom as condições meteorológicas para deter-minar a qualidade do ar. O problema é queuma lógica ainda misteriosa rege essa combi-nação. “Se reduzíssemos a emissão de poluen-

tes pela metade, pode ser que a poluição não caísse pelametade”, diz Artaxo. “Em algumas condições meteoroló-gicas, poderia cair muito pouco.”

Estudos mais refinados do Instituto de Física indica-ram que o material particulado afeta o comportamentodas camadas mais baixas da atmosfera. Já se descobriuque a poeira, sobretudo a mais fina, absorve e reflete luz,além de aquecer o ar ao redor – o ar poluído a 1 km dosolo é mais quente que o ar puro na mesma altitude. Aspartículas também diminuem a visibilidade e dificultama dispersão de poluentes – e oferecem o pôr-do-sol aver-melhado típico da capital. Já se conhece a composiçãodessa poeira da cidade: há partículas de pelo menos 13elementos, como enxofre, cloro, titânio, ferro, níquel, zin-co, bromo e chumbo. No particulado fino, predomina oenxofre e no grosso elementos vindos do solo, como silí-cio, cálcio e ferro. Nessa sopa aérea também circulam es-poros de fungos e bactérias.

Só não se sabe de onde vem mais material particulado,se dos carros ou das indústrias. Por isso, Fátima e a equi-pe do Instituto de Química da USP coordenada por Lí-lian Carvalho viveram dois dias desconfortáveis fazendomedições e coletas em dois túneis da cidade: o Jânio Qua-dros, por onde só passam veículos leves, e o Maria Maluf,que também recebe caminhões. São laboratórios onde semisturam poluentes que ainda não reagiram entre si – en-tre outras razões, porque ali não há radiação solar. Nospróximos meses, à medida que o grupo concluir as análi-ses, conhecerá melhor a contribuição dos veículos.

O aprofundamento da pesquisa evidencia mais as solu-ções. Estudos semelhantes em Santiago do Chile permiti-ram reduzir pela metade a concentração de poluentes, cujadispersão é barrada pela cordilheira. Segundo Artaxo, foisimples: depois de se descobrir que a poeira era o maiorpoluente, concluiu-se ser mais viável investir em caminhõesque varrem as ruas toda noite do que controlar a emissãode poluentes por indústrias e veículos.“Poluição do ar temsolução”, diz Artaxo. “Basta criar um plano de controlebem embasado cientificamente, com metas claras e multaspara quem não cumpri-las.”

Soluções à mão - Para ele, não se trata de criar, mas de im-plantar medidas já anunciadas: mais investimento notransporte urbano coletivo, controle anual de emissõesveiculares e substituição dos ônibus a diesel por equivalen-tes a gás. “Se essas medidas houvessem sido aplicadas hádez anos, a poluição hoje seria de 30 a 50% menor.” Hámudanças em andamento. Já funciona no pico do Jaraguáuma estação móvel da Cetesb que mede o teor de materialparticulado, dióxido de enxofre, monóxido de carbono eozônio a 300 metros do solo. Há outras 23 estações fixas eduas móveis na Região Metropolitana e seis fora: Cubatão(duas), Campinas, Paulínia, Sorocaba e São José dos Campos.

Atentos ao futuro, pesquisadores da USP buscam o es-tudo da poluição por imagens de satélites com resoluçãode 1 a 5 km. O satélite Terra, lançado no ano passado pelaNasa, a agência espacial dos Estados Unidos, mostra serpossível detectar ao menos o teor de partículas na faixa daluz visível e de monóxido de carbono no infravermelho.Em dez anos, quando a Região Metropolitana fundir-secom Campinas e São José dos Campos, como se prevê, tal-vez seja difícil administrar centenas de sensores para sabercomo está o ar do dia. De imediato, o estudo ensina a teruma idéia da qualidade do ar só com uma olhada no céu.Se há nuvens, é bom sinal, pois elas funcionam como aspi-radores: sugam o ar poluído das camadas baixas da atmos-fera e o expelem para o alto. •

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CIÊNCIA

GENÔMICA

Engenharia genéticacontra a Xylella

Pesquisas definem novas estratégias de combate à praga das laranjas

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RICARDO ZORZETTO

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primeira variedade de laran-ja doce geneticamente mo-dificada, que abre cami-nho para a produção delaranjeiras resistentes a

doenças, e uma série de bactérias mu-tantes, nas quais foram desativados ge-nes considerados prejudiciais às plan-tas. Essas são algumas das novidadesdo 1º Simpósio Genoma Funcionalda Xylella fastidiosa, realizado de 10a 13 de dezembro em Serra Negra.Ali, os coordenadores dos 21 gruposde pesquisa do projeto Genoma Fun-cional, financiado pela FAPESP,anunciaram as estratégias de combateà Xylella fastidiosa, bactéria causadorada doença conhecida como amareli-nho – ou clorose variegada de citrus(CVC). Transmitida por um inseto – acigarrinha –, essa é uma praga que,com sintomas mais graves ou maisamenos, atinge 65 milhões de laran-jeiras no Estado de São Paulo (36%do total) e, a cada ano, torna impro-dutivas cerca de seis milhões delas.

Os alvos dos pesquisadores estãoclaros: são os genes que permitem à Xy-lella desencadear a doença (lhe confe-rem patogenicidade) ou determinam aagressividade (virulência) com que aplanta será infectada. O trabalho, ini-ciado há dois anos, converge agora paraa busca de mecanismos – como plan-tas ou bactérias alteradas genetica-mente – que bloqueiem a ação dessesgenes maléficos, permitam o desen-volvimento de inseticidas mais eficien-tes para impedir que a cigarrinha trans-mita a bactéria a plantas saudáveis ouque levem ao desenvolvimento de plan-tas resistentes, produtoras de proteínascapazes de impedir a sobrevivência daXylella.

Começa assim uma nova etapa naluta contra a bactéria causadora doamarelinho, deflagrada em 2000 como vitorioso seqüenciamento de seu ge-noma em programa financiado pelaFAPESP. Além das técnicas já em uso– controle dos insetos transmissores euso de mudas livres de contaminação,que ao menos evitam o alastramentodo problema para plantas ainda intac-tas –, será possível contar com os re-cursos da engenharia genética para

construir bactérias ou plantas modifi-cadas geneticamente. Com isso se pre-tende bloquear o desenvolvimento dapraga, que traz um prejuízo anual paraa citricultura paulista estimado emUS$ 100 milhões.

No simpósio de Serra Negra, parauma platéia de cerca de 100 pesquisa-dores, Beatriz Mendes, do Centro deEnergia Nuclear na Agricultura (Cena),e Francisco Alves Mourão Filho, da Es-cola Superior de Agricultura Luiz deQueiroz (Esalq), ambos da Universi-dade de São Paulo (USP), apresentarama primeira variedade de laranja docegeneticamente modificada, obtida apartir de tecido adulto.

Conquista decisiva - Em 2000, Beatrize Mourão já haviam obtido umaplanta transgênica a partir de tecidocítrico jovem, isto é, obtido logodepois da germinação da semente,mas não ficaram satisfeitos com o re-sultado: a planta pode demorar decinco a oito anos para frutificar. Tra-balharam durante um ano e meioavaliando os fatores que influenciamas condições de crescimento da plan-ta – como o meio de cultura, o tempode incubação e a temperatura. Final-mente, tiveram sucesso com a laran-jeira da variedade Hamlin, a partir deseu tecido adulto, que frutifica maiscedo: cerca de dois anos.

É uma conquista que promete serdecisiva para a próxima etapa do pro-jeto, com término previsto para mea-dos deste ano. “Quando tivermos umgene que proporcione à planta resis-tência contra a bactéria, poderemosproduzir plantas para testar no cam-po em uns dois anos”, calcula Beatriz.

Mais pesquisas devem amadurecereste ano. Na linha de frente dos resul-tados está João Lúcio de Azevedo, co-ordenador do Núcleo Integrado deBiotecnologia (NIB) da Universidadede Mogi das Cruzes (UMC) e profes-sor titular aposentado da Esalq. Ele de-senvolve uma Xylella mutante na qualpoderá ser bloqueado o gene da enzi-ma endoglucanase A, um dos associa-dos à produção da goma fastidiana. Éessa goma que a bactéria utiliza paraaderir ao xilema, o sistema de vasos

que transporta água e sais mineraisatravés de toda a planta.

A goma fastidiana está ligada ain-da ao entupimento do xilema e, emconseqüência, à manifestação dos sin-tomas da doença – manchas amarela-das – nas folhas da laranjeira. Azevedoespera obter já em 2002 os primeiros re-sultados da inoculação da bactéria mo-dificada na planta maria-sem-vergonhaou vinca (Catharantus roseus),usada co-mo modelo nesse tipo de experimen-to, bem como em citros.“Se funcionar”,diz ele, “podemos estender a técnicapara as bactérias do gênero Xantomo-nas, que atacam citros e hortaliças”.

Para avançar, não se conta apenascom informações sobre como a bacté-ria provoca a doença e a agressividadecom que a planta é infectada. Esses da-dos já foram aprofundados pelo conhe-cimento acumulado sobre o genoma daXylella, cujo seqüenciamento contoucom quase todos os pesquisadores queagora participam do Genoma Funcio-nal. Também se avançou bastante noconhecimento das proteínas produzi-das pela causadora do amarelinho – jásão 130 as identificadas pelo Labora-tório de Química de Proteínas do Ins-tituto de Biologia da Universidade Es-tadual de Campinas (Unicamp) – e,de modo mais amplo, na epidemiolo-gia da doença.

Experimentos conduzidos sobre-tudo na Esalq mostram que tanto oamarelinho quanto a cigarrinha se pro-pagam mais intensamente nas regiõesmais quentes do Estado, onde a escas-sez de água é comum. Assim, na áreados municípios de Barretos e Bebe-douro, norte do Estado, 48% das la-ranjeiras estão infectadas, enquandonos arredores de Limeira e Itapetinin-ga, ao sul, não passam de 17%, segun-do levamento que o Fundo de Defesada Citricultura (Fundecitrus), manti-do pelos agricultores, fez em 2001.

“As etapas mais importantes já fo-ram vencidas”, comenta Jesus Apare-cido Ferro, da Universidade EstadualPaulista (Unesp) em Jaboticabal, umdos coordenadores do Genoma Fun-cional: “Com certeza o progresso serámais rápido daqui para a frente”. Seráainda mais rápido no que depender

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da bióloga Patrícia BrantMonteiro, do Fundeci-trus: ela produziu co-lônias de bactérias mu-tantes estáveis para 12genes, que regulam, en-tre outras coisas, a pato-genicidade e a produçãode toxinas para a plan-ta ou de polissacarídeos(açúcares) que destrui-rão o xilema.

Tanto Patrícia comoAzevedo trabalham natécnica de interrupçãode genes. É a “leitura”do gene que determinaa produção de proteí-nas específicas. Ao secolocar um trecho deDNA no meio de umgene, essa leitura ficaperturbada e, assim, eleé “desligado”. A bacté-ria que resulta dessamodificação é uma mutante: ela pas-sa a carregar o gene alterado no seumaterial genético.

atrícia foi pioneira naconstrução de uma Xylellamutante, resistente à in-corporação de materialgenético exótico – vindo

de outros organismos – ao seu genoma.Ela superou o problema ao utilizarcomo vetor um plasmídeo (segmentode DNA circular) desenvolvido em la-boratório e que continha um peque-no trecho de material genético daprópria bactéria.

Esse trabalho abriu caminho paraoutros grupos. As pesquisadoras daUSP Marilis Marques, do Instituto deCiências Biomédicas, e Suely Gomes,do Instituto de Química, também ob-tiveram sucesso na produção de bacté-rias mutantes. Utilizando uma estra-tégia diferente, desenvolveram umplasmídeo que permitiu a incorpora-ção de DNA exótico no genoma daXylella. Marilis e Sueli desenvolveramcolônias de Xylella que têm o genegspD alterado. Esse gene é responsá-vel pela produção de uma proteínaque forma canais na parede da bacté-

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ria, por onde são secretadas as enzimasque destroem os vasos do xilema.

Recentemente, testes feitos com ouso de material radiativo para marca-ção de genes comprovaram que umaem cada oito colônias de bactérias mu-tantes mantém incorporado o trecho deDNA alterado, mesmo depois de dezciclos reprodutivos.“Começamos a do-minar a técnica de transformação daXylella, o que é importante para deter-minar a função de cada gene na doen-ça”, revela Marilis. Agora ela procuraproduzir bactérias mutantes usandotransposons (pedaços de DNA que mu-dam de lugar no cromossomo) comovetores, no lugar de plasmídeos. A van-tagem disso seria obter, a partir do usode um único tipo de vetor, várias colô-nias de bactérias transformadas, cadauma com um gene diferente desligado.

Pesquisas integradas - Dominar a téc-nica de produção de mutantes foiigualmente essencial para o grupocoordenado em Piracicaba por SérgioPascholati, da Esalq. Ele trabalhou naidentificação de genes que codificamexoenzimas – proteínas que a bactériaproduz e servem para obter nutrien-tes e colonizar a planta. Valendo-se

Colônias de Xylella crescendo dentro dos vasos condutores de seiva: ação começa a ser contida

das informações do genoma da Xylella,identificou oito possíveis exoenzimase, em testes de laboratório, caracteri-zou três delas: são três celulases, enzi-mas que digerem celulose e a transfor-mam em glicose, molécula essencialpara qualquer organismo obter ener-gia. Próxima etapa: desenvolver bacté-rias com genes alterados que impeçama produção dessas proteínas.

Outro gene que os pesquisadoresde Piracicaba querem desligar é oXf1940, produtor da enzima metioninasulfóxido redutase. Essa enzima parti-cipa do mecanismo de adesão da bacté-ria à parede do xilema e a outras bac-térias, para formar colônias, segundomodelo desenvolvido por Breno Leite,da equipe de Pascholati. A metioninatambém estaria relacionada à fixaçãoda Xylella no aparelho bucal da cigar-rinha. Eles acreditam poder chegar aum mecanismo de controle da doen-ça, se bloquearem a ação desse gene.

Pascholati trabalha em conjuntocom especialistas do Fundecitrus, liga-dos também à equipe de Azevedo e aoNIB de Mogi das Cruzes, que interageainda com a Esalq e o Instituto Agro-nômico de Campinas (IAC). Não sebusca uma estratégia única para deter

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Page 38: Poluição de longo alcance

o estrago provocado pelo amarelinhona citricultura paulista.

A própria equipe de Azevedo,além de bloquear genes, trabalha emoutra forma de controlar a praga: pormeio de microrganismos endofíticos,bactérias que convivem com a Xylella nalaranjeira, mas não provocam a doençana planta. Seu grupo identificou novegêneros de bactérias endofíticas de citros.Entre elas está a Pantoea agglomerans,na qual os pesquisadores já consegui-ram introduzir um gene que produz axantanase. Essa enzima impedea formação da goma xantana,produzida pelas bactérias do gê-nero Xantomonas e semelhanteà goma fastidiana.

Alvos selecionados - “Temos detestar todas as possibilidades”,diz o coordenador Ferro, daUnesp: “Não sabemos qual vaidar certo”. Patrícia pretendetestar os mutantes em plantasainda este ano, mas sabe que háincertezas: “Será sorte se conse-guirmos uma Xylella não-pato-gênica, pois metade dos genesdos organismos em geral codi-ficam proteínas de funções ainda des-conhecidas”.

Para que o combate à praga sejaeficiente, os cientistas tiveram de criarinstrumentos que ajudem a determinaros melhores alvos. Entre eles está o mi-croarranjo (microarray), também cha-mado biochip, uma lâmina de micros-cópio onde são depositados os genesda bactéria. O biochip indica, de umavez só, quais os genes – entre todos dogenoma – estão mais ativos em deter-minada situação.

Foi o grupo de Regina de Oliveira,do NIB de Mogi das Cruzes, que con-cluiu a terceira versão do biochip daXylella, com cerca de 2.500 genes – 93%dos cerca de 2.700 que compõem o ma-terial genético da bactéria. “É como setirássemos uma fotografia da expressãogênica da célula em determinado mo-mento”, explica Luiz Nunes, do NIB.Ele já identificou um conjunto de ge-nes que a bactéria aciona, por exemplo,em resposta ao estresse oxidativo –que ocorre quando é atacada por for-

Marcos Antônio Machado, do Cen-tro de Citricultura do IAC, utilizou obiochip para comparar a expressãogênica da bactéria em duas situações decrescimento: a de isolamento primá-rio, quando é recém-retirada da plan-ta, e a de cultivos sucessivos, depois de25 ciclos de reprodução em laborató-rio. No primeiro estado, a Xylella sedesenvolve lentamente em cultura ar-tificial, mas, quando inoculada, colo-niza a planta rapidamente. No segun-do caso, ocorre o inverso.

Banco de proteínas - A comparaçãodas duas situações mostrou que al-guns genes, ligados à capacidade deadesão, tornam-se menos ativos quan-do a Xylella é cultivada fora da planta.“Esses resultados comprovam que acapacidade de colonização está asso-ciada à de agregação”, diz Machado.“Talvez possamos desenvolver algumaforma de reduzir a ação desses genes.”Para conhecer os genes mais ativos nabactéria em determinada situação, os

especialistas do Laboratório de Quí-mica de Proteínas do Instituto de Bio-logia da Unicamp adotam uma abor-dagem diferente. Em vez de analisardiretamente os genes, observam o re-sultado final: as proteínas.

Em quatro meses, esse grupo deCampinas, único que estuda o Pro-teoma (conjunto de proteínas) da Xy-lella, coordenado por José CamilloNovello, identificou 130 proteínasproduzidas pela bactéria. As princi-pais estão associadas aos processos de

adesão e agregação, à captaçãoe ao armazenamento de ferro eà eliminação de toxinas. Tam-bém foram encontradas pro-teínas de membrana, queatuam na captação de nutrien-tes. Até o final da atual etapado Genoma Funcional, previs-ta para terminar em meadosdo ano, a equipe da Unicampespera formar um banco dedados com 250 a 300 proteí-nas caracterizadas.

Meio de cultura - O encontrode Serra Negra marcou ainda asuperação de uma das etapas

mais complicadas do Genoma Funcio-nal: o desenvolvimento de um meiode cultura definido, no qual se conhe-cem todos os nutrientes – vitaminas,minerais, hidrocarbonetos e amino-ácidos – necessários ao crescimentoda bactéria. Ao fim de dois anos detrabalho, as pesquisadoras Eliana deMacedo Lemos e Lúcia Carareto Al-ves, da Faculdade de Ciências Agráriase Veterinárias da Unesp em Jaboti-cabal, produziram um meio de cul-tura mínimo, que tem como únicafonte de nitrogênio o ácido aspártico(C4H7NO4). “O estudo das vias me-tabólicas mostrou que a bactéria podecrescer num meio relativamente sim-ples, em condições muito próximas àsdo xilema”, diz Eliana. A determina-ção do meio de cultura é uma ferra-menta importante para quem trabalhacom fisiologia ou genética da Xylella,pois permite conhecer os genes expres-sos em determinada condição e auxiliana seleção de formas mutantes da bac-téria. A Xylella que se cuide. •

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 39

Fungos que digerem a goma xantana:contra o amarelinho

mas reativas de oxigênio, como o pe-róxido de oxigênio, liberadas pelo sis-tema de defesa da planta hospedeira.

Regina e Nunes trabalham em co-operação com Sílvio Lopes, da Unida-de de Biotecnologia da Universidadede Ribeirão Preto (Unaerp), que estu-da a atividade dos genes de cepas da Xy-lella que infectam plantas diferentes.“Já identificamos vários genes que acre-ditamos estar ligados à patogenicidadeda bactéria e à sua especificidade comrelação ao hospedeiro”, diz Nunes.

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Um dos melhorespós-doutoramentos

do mundo ficabem aqui pertinho:

em São Paulo.

Projetos Temáticos

Programa CEPID

Programa GENOMA

Programa BIOTA

Programas JovensPesquisadores

Um dos melhorespós-doutoramentos

do mundo ficabem aqui pertinho:

em São Paulo.

Projetos Temáticos

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Programas JovensPesquisadores

Rua Pio XI, 1500 - Alto da Lapa05468-901 - São P aulo - SP

Tel.: (11) 3838 4000 - www.fapesp.br

Secretaria daCiência, Tecnologiae DesenvolvimentoEconômico

Projetos Temáticos (150 projetos de pesquisa)Grandes equipes formadas por pesquisadoresde diferentes instituições em buscade resultados científicos, tecnológicose socioeconômicos de grande impacto.

Programa Genoma (60 laboratórios)Projetos com o objetivo de pesquisar genomas,identificar e analisar genes com impacto sobreo conhecimento genômico, a saúde humana ea produção agropecuária.

Programa CEPID (10 centros de pesquisa)Centros para desenvolver pesquisas inovadorasna fronteira do conhecimento, transferir seusresultados para os setores público e privadoe contribuir para a criação de novas tecnologiase empresas.

Programas Jovens Pesquisadores (270 projetos)Programa que fomenta a formaçãode novos grupos de pesquisa em centrosemergentes do Estado de São P aulo.

Bolsas de pós-doutoramento da FAPESP.O sistema brasileiro de pesquisa se expande.

A FAPESP está revolucionando sua política de pós-doutoramento, ampliando o prazo de duração das bolsas e possibilitandoestágios no exterior dentro de uma concepção que torne o intercâmbio com centros de pesquisa de outros países produtivo paraa ciência brasileira. Os bolsistas devem vincular-se aos mais importantes programas de pesquisa financiados pela Fundação. Sãocentenas de projetos, em todas as áreas do conhecimento, que permitem uma sólida formação aos jovens doutores integrados agrupos de excelência. Para mais informações, acesse www.fapesp.br ou ligue (11) 3838 4000.

Programa Biota (25 projetos)Projetos que visam ao levantamento enovos conhecimentos sobre abiodiversidade do Estado de São Pauloe outras regiões do país.

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 41

CIÊNCIA

diz João Paulo Kitajima, um dos coor-denadores do LBI, ligado à rede ONSA(Organização para Análise e Seqüencia-mento de Nucleotídeos), criada pelaFAPESP. João Carlos Setúbal, outrocoordenador do LBI, trabalhou duran-te um ano e meio como professor visi-tante na Universidade de Washington,próximo aos biólogos que cuidavamdo mapeamento da Agrobacterium.

BIOTECNOLOGIA

Opáreo foi difícil. Com a reta-guarda do Laboratório de Bio-

informática (LBI) da UniversidadeEstadual de Campinas (Unicamp), aUniversidade de Washington con-cluiu o seqüenciamento do genomade uma das bactérias mais utilizadasna produção de plantas transgênicas, aAgrobacterium tumefaciens. O artigocientífico com os resultados saiu naedição de 14 de dezembro da revistaScience, sucedido por outro, assinadopor pesquisadores da Cereon Geno-mics, subsidiária da Monsanto, comoutra versão do mesmo genoma.

A Science concedeu a capa aoseqüenciamento da linhagem C58 daA. tumefaciens, que, de acordo comum artigo comentado da própriarevista, deve dar novo impulso às pes-quisas em biotecnologia. A Agrobacte-rium exibe uma capacidade natural detransferir parte de seu DNA para asplantas, cujo genoma passa a expres-sar os genes recebidos. Em cerca de600 espécies de plantas, entre elas ro-seiras e videiras, a bactéria causa a ga-lha da coroa, um tipo de câncer vege-tal: o crescimento desordenado dascélulas origina galhas (tumores) najunção do tronco com a raiz (coroa)ou na própria raiz. O conhecimento daestrutura do DNA (ácido desoxirribo-nucléico, que contém o código genéti-co) do microrganismo deve elucidarseu mecanismo de ação, exploradodesde os anos 80 para inserir materialgenético em culturas agrícolas.

“Não pensávamos que fosse sairna Science, porque os dados já haviamsido divulgados para o GenBank”,

Publicação do genoma da Agrobacterium fortalece bioinformática nacional

Liderança brasileiraNalvo Almeida Jr., que comparou ogenoma da Agrobacterium com o deoutras bactérias.

Trabalhando separadamente, aequipe da Universidade de Washing-ton, formada também por membrosda empresa DuPont, e a da Cereon,em conjunto com a Universidade deRichmond e o Hiram College, chega-ram a resultados semelhantes. O geno-ma do microrganismo tem cerca de5,6 milhões de pares de bases e poucomais de 5 mil genes (5.419 para o gru-po de Washington e 5.299 para o daCereon). O material genético está con-tido em dois cromossomos, um circu-lar e um linear, e em dois pedaços me-nores de DNA, os plasmídeos.

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Os bioinformatas paulistas fize-ram a parte mais sofisticada do traba-lho, a anotação do genoma (interpre-tação de dados e identificação degenes), além de montarem o banco dedados do projeto, que se encontra numsite mantido pela Unicamp. Partici-pou ainda um pesquisador da Univer-sidade Federal do Mato Grosso do Sul,

Agrobacterium (ao lado): bactéria que vive no solo e transfere o DNA ao infectar 600 espécies de plantas

No artigo publicado na Science, aequipe de Washington destaca que aA. tumefaciens deve ter um ancestralcomum com a Sinorhizobium meliloti,bactéria que também vive no solomas não causa doenças: o cromosso-mo circular das duas é bastante pare-cido. Agora o desafio é entender comose diferenciaram, ao longo da evolu-ção. Os pesquisadores da Cereon des-cobriram que a Agrobacterium nãodispõe dos genes normalmente utili-zados por outros organismos para in-fectar o hospedeiro – indício de que abactéria deve usar outras partes doDNA nessa tarefa. •

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Ameríndios eram siberianos

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CIÊNCIA

Estudo da UFMG desvenda por meio da genética uma história não-escrita dos povos pré-colombianos

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 43

evolução genética dos indí-genas sul-americanos ao

longo de milênios é des-vendada no modelo queos geneticistas Eduardo

Tarazona, Sérgio Pena e Fabrício San-tos, da Universidade Federal de MinasGerais (UFMG), começaram a elabo-rar em 1999. Segundo o modelo suge-re, as populações indígenas do oeste edo leste da América do Sul se distin-guem por terem seguido padrõesopostos em sua história genética. Ospesquisadores também concluíram queos indígenas das três Américas têm amesma e bem demarcada ori-gem:dois povos siberianos cu-ja linhagem ainda sobrevive.Confirmaram ainda a teoriacorrente, de que os antepassa-dos dos ameríndios chegaramda Ásia pelo estreito de Bering,quando havia ali uma faixade solo firme. E demonstra-ram que todos os ameríndiostêm grande similaridade ge-nética: por isso acreditam quevieram juntos, numa grandeonda migratória.

Uma constatação básicainspirou o estudo: popula-ções geneticamente isoladaspreservam as identidades ge-néticas que tinham antes dosgrandes movimentos migra-tórios ocorridos no mundodepois das grandes navega-ções do século 16. Por isso osgeneticistas se interessam poressas populações isoladas –como os esquimós, os Yano-mami do Brasil e da Vene-zuela, e mesmo os berberes do Saara eos finlandeses – e tentam traçar suasorigens e rotas de migração, que emgeral a história não pôde registrar.

O estudo mostra que as contribui-ções do Projeto Genoma Humanopodem servir não só à área médica,mas para descobrir aspectos do nossopassado: “É o primeiro estudo mais

Homem do povo Xavante: um dos gruposincluídos na pesquisa genética que rastreou a origem remota dos ameríndios

Adetalhado do ponto de vista genômico,de populações nativas da América doSul, a sugerir um modelo coerentecom questões históricas, arqueológi-cas, lingüísticas e climatológicas”, afir-ma Fabrício Santos, do Instituto deCiências Biológicas da UFMG, queorienta o doutorado de Tarazona.

Para chegar ao modelo evolutivoproposto, os pesquisadores optaram porestudar a variabilidade molecular docromossomo Y em sul-ameríndios.Essecromossomo é de linhagem paterna:transmitido apenas pelo pai para os fi-lhos do sexo masculino, passa inalte-

rado ao longo das gerações, até queocorra uma mutação (variação no DNA,o ácido desoxirribonucléico, portadordo código genético). Com isso, quise-ram descobrir o que aconteceu desdeo início do povoamento.“Fazemos umaespécie de arqueologia molecular”, dizTarazona, “e isso é possível porque asvicissitudes demográficas pelas quaisuma população passa deixam umamarca na distribuição de seus genes.Por meio da análise do DNA, conse-guimos identificar essas marcas, quenos dizem o que aconteceu”.

Fabrício Santos explica que, ini-cialmente, buscavam uma respostagenética para a relação entre os povosdos Andes e os de outras regiões sul-americanas. Até então, a maior partedos estudos sobre variabilidade mole-cular em populações nativas eraorientada de modo a responder apenasquando e como os primeiros povoschegaram ao continente americano. Des-ta vez, os pesquisadores procurarammaior profundidade.

Realidades opostas - Para isso, estuda-ram grupos andinos do Peru e do

Equador. E, aos dados dessesgrupos, somaram os de indí-genas brasileiros – gruposXavante, Wai-Wai, Karitiana,Ticuna, Gavião, Zoró e Suruí– previamente estudados porDenise Carvalho Silva (domesmo grupo da UFMG),bem como de tribos argenti-nas e paraguaias já estudadaspelo grupo de Nestor Bian-chi, de Buenos Aires.

Pela análise das amostrasdo DNA de 192 indivíduos,em 18 grupos indígenas desete países, concluíram queas populações do leste e dooeste seguiram padrões decomportamento demográfi-co opostos, o que se refletiuna diferenciação genética.

Assim, na região andina,os grupos indígenas têm po-pulações grandes e experi-mentaram entre si maioresníveis de fluxo gênico – tro-cas de material genético

nos cruzamentos. Isso implica, de umlado, uma tendência à homogeneiza-ção no plano geral, e, de outro, maiordiferenciação genética entre indíví-duos da mesma população.

O contrário ocorreu no leste, entreos grupos da Amazônia, do PlanaltoCentral Brasileiro e do Chaco. Essestêm populações menores e níveis bai-xos de fluxo gênico de um grupo paraoutro. Disso resultam tendências amuitos grupos isolados e genetica-mente diferenciados, bem como à ho-mogeneidade dentro de cada grupo.

Indígena siberiano: ancestrais em comum com nossos ameríndios

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Page 43: Poluição de longo alcance

Desse modo, as populações andi-nas, ainda que numerosas e geografi-camente distantes entre si, experi-mentaram um intenso fluxo gênico emantiveram uma identidade culturalcomum, compartilhando costumes elíngua, o quéchua – outras línguas daregião, como aimara e araucano, sãomuito parecidas com o quéchua do-minante e pertencem à mesma famí-lia lingüística. Dentro de cada tribo hámuita diferenciação genética e, noglobal, muitas semelhanças entre gru-pos que vivem a até mais de 3 mil qui-lômetros de distância um do outro, doPeru ao norte da Argentina.

Já as tribos das regiõesbrasileiras e do Chaco mos-tram características opostasàs andinas. Estão fisicamen-te mais próximas do que,por exemplo, os andinos donorte e os do sul. Dado oseu isolamento mútuo, con-tudo, apesar da maior pro-ximidade, estão longe de umnível de similaridade cultu-ral, falam línguas bem di-versas e revelam pouca dife-renciação genética entre osindivíduos de cada tribo.

Geleiras e florestas - Dadospaleoecológicos, lingüísticose históricos se combinambem para fundamentar omodelo proposto. Por exem-plo, no último período gla-cial – que durou de 60 mil a 13 milanos atrás –, a altitude das geleiras nosAndes era muito menor e o frio bemmais intenso, o que limitava o povoa-mento. Já a leste, predominava umambiente aberto de savana, pratica-mente sem matas fechadas, o que poralgum tempo favoreceu a comunica-ção e o fluxo gênico.

Há 12 mil anos, entretanto, ocor-reu a transição Pleistoceno-Holocenoe isso mudou radicalmente. Nos An-des, o nível das geleiras subiu bastan-te, permitindo a colonização humanaem ampla escala, o que favoreceu o de-senvolvimento cultural homogêneo,evidente até hoje. “As geleiras”, diz Ta-razona, “liberaram os Andes, permi-

de Silvia Fuselli e Davide Pettener, daUniversidade de Bolonha, Itália, ondeTarazona fez um doutorado em antro-pologia. Os resultados, segundo Tara-zona, estão sendo altamente consis-tentes com o modelo.

Na verdade, o modelo de variabili-dade do cromossomo Y é a terceiraetapa do estudo que Fabrício Santosiniciou em 1993, quando se doutoravana UFMG, orientado por Sérgio Pena.Santos relata que o grupo tem feitoimportantes contribuições por meiodo estudo das linhagens paternas:“Nossas primeiras publicações, em

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tindo que as populações humanas seassentassem e desenvolvessem em co-mum um complexo cultural – e bio-lógico, segundo este estudo –, o quefacilitou as migrações”.

á no leste, as mudanças climáticascausaram a expansão dos refúgiosisolados de floresta tropical, queforam ocupando e fechando os es-

paços da savana, até formar a imensaFloresta Amazônica – mata fechada que,ao contrário da savana, passou a limi-tar o fluxo gênico. Disso resultou frag-mentação populacional e isolamento

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cultural.Assim, a transição Pleistoceno-Holoceno seria uma espécie de inter-ruptor evolutivo,determinando padrõesdivergentes de variabilidade genética.É por isso que povos andinos de áreasbem distantes se parecem mais do que,por exemplo, os Ticuna do Amazonase os Suruí de Rondônia.

Pela Beríngia - O grupo está amplian-do os estudos e testando seu modelo,baseado nas variações do cromosso-mo Y. O passo seguinte será confron-tar esses dados com os do DNA mi-tocondrial, que é transmitido porlinhagem materna, da mãe para os fi-lhos de ambos os sexos. Os estudos doDNA mitocondrial têm a colaboração

Indígenas andinos: grupos distantes mais parecidos entre si que os do leste da América do Sul

1995 e 1996, revelaram uma identi-dade genética entre os povos nativosdas três Américas, como se todosdescendessem de um único pai – oAdão americano –, que vivera entre12 e 25 mil anos atrás. Em 1999, ou-tra publicação revelou o retrato ge-nético de ancestrais dos nativos ame-ricanos, que habitavam a Ásia entre20 mil e 30 mil anos atrás. É como sefizéssemos uma série de exames depaternidade envolvendo milhares degerações passadas”.

Os estudos iniciais confirmaram ateoria corrente, de que os antepassa-dos dos nativos americanos chegaramao continente entre 40 mil e 13 milanos atrás – há muita divergência em

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AMÉRICA DO NORTE

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Linhacosteirada glaciação

À direita, as forçasevolutivas que moldama estrutura genética de povos da América do Sul.O tamanho dos círculosindica as proporções das populações.As setas representamos níveis do fluxo gênico.Cayapa

TicunaWai Wai

Xavante

Gavião, Zoró e SuruíKaritianaTayacaja

Arequipa

Susque e Huamahuaqueño

Lengua e Ayoreo

Toba, Chorotee Wichi

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Fonte: UFMG

torno das datas. Mas limitaram a datade chegada numa faixa mais restrita,entre 15 mil e 30 mil anos atrás. Tam-bém confirmaram que os ameríndiosvieram pela Beríngia, faixa de solo fir-me que na época das glaciações ligavaa Ásia ao Alasca, onde está hoje o Es-treito de Bering (daí o nome Beríngia).Mas foram mais longe: demonstraramque os nativos das três Américas têmgrande similaridade genética, a des-peito da alta diversidade lingüística ecultural, o que sugere que todos vie-ram juntos da Ásia numa onda mi-gratória principal.

Indo mais além, em 1999 concluí-ram que os ancestrais dos nativos ame-ricanos foram povos siberianos dosgrupos lingüísticos keti e altai. Os al-tais são do grande grupo das línguas

túrquicas, o mesmo dos povos daMongólia e do Japão. Já os ketiscompõem um grupo lingüísticoisolado, sem similar no mundo, ecuja língua original está pratica-mente extinta.Em algumas etapas, o grupo pesqui-

sou com equipes de outras universida-des do Brasil (especialmente o grupode Francisco Salzano, da UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul), de ou-tros países sul-americanos, da Mongó-lia e da Inglaterra. Já em 1995, Santose Sérgio Pena publicavam em NatureGenetics o trabalho Principal EfeitoFundador nas Populações IndígenasAmericanas. No ano seguinte, umgrupo da Universidade de Stanford(EUA) confirmou as conclusões dosbrasileiros e usou uma nova variaçãode DNA, o DYS199, com duas basesdiferentes: o alelo C, presente em to-dos os europeus, asiáticos e africanos,e o T, característico dos ameríndios.

Depois, outros americanos da Uni-versidade de Tucson também confir-maram os dados dos brasileiros, que em

1999 apontaram os ketis e os altais, en-tre vários grupos siberianos examina-dos, como aqueles de maior grau deparentesco com o principal cromosso-mo Y dos nativos americanos.

O Modelo de Evolução para as Po-pulações Nativas da América do Sul, ela-borado por Tarazona e Fabrício Santos,foi apresentado em abril de 2001 noevento Portugalia Genetica, em setem-bro no 10º Congresso Internacionalde Genética em Viena e em outubrono Congresso Brasileiro de Genéticaem Águas de Lindóia. Também ren-deu artigo publicado em junho últi-mo no American Journal of HumanGenetics. Agora, os geneticistas minei-ros pretendem pesquisar outros mis-térios, como a origem específica dospovos tupis que povoavam a costa naépoca do Descobrimento e tiveraminfluência decisiva na formação dopovo brasileiro. Também queremconfrontar, com os dados genéticosreunidos, outras teorias sobre a ori-gem dos povos da Amazônia e do Pla-nalto Central brasileiro. •

Distribuição dos povos daAmérica do Sulincluídos no estudo genético

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ra (FAO), as perdas por ele causadasrepresentam 10% da produção totalde grãos. No Brasil, o prejuízo médiofica em torno de 20%, mas em algunslugares pode chegar a 70%. “O carun-cho”, comenta Marangoni, “causa re-dução direta no peso e na qualidadedas sementes, que se tornam inviáveistanto para o consumo quanto para oplantio. Esse é um sério problema dealimentação, já que a principal fontede proteína das populações mais ca-rentes é justamente o feijão”.

A ação devastadora começa já nocampo, com o ataque aos grãos de ce-reais. Num só grão de feijão, milho ousoja, cada fêmea põe de 60 a 80 ovos.Desencadeia-se aí uma progressão ge-ométrica que os inseticidas não con-seguem parar. O ataque prossegue noarmazenamento, atravessa o proces-samento e chega até o alimento in-dustrializado. É por isso que se en-contram carunchos até em pacotesfechados de macarrão guardados noarmário: os ovos sobreviveram à moa-gem do trigo e à manufatura da mas-sa e só vão morrer em contato com aágua fervente do preparo da comida.

Proteína fatal - Marangoni e Silvapartiram de um perfil de 20 anos detrabalho do Laboratório de Químicade Proteínas da Unicamp. Durantetrês anos, testaram muitos vegetais,até verificar que o extrato protéico dassementes de copaíba, usadas comoalimento por pássaros, mostrou-se re-sistente ao desenvolvimento das lar-vas do inseto. Os pesquisadores têmestudado vários inibidores de semen-tes, entre eles inibidores de pata-de-vaca (Bauhinia variegata) e flamboy-ant (Delonix regia).

CIÊNCIA

BIOLOGIA

semente da copaíba (Co-paifera langsdorffii), ár-vore de até 30 metrosde altura que margeiao rio Paraná no Cen-

tro-Oeste paulista, numa área detransição entre a Mata Atlântica e oCerrado, contém uma proteína queinibe o metabolismo e o crescimentodas larvas do caruncho (Callasobru-chus maculatus), inseto de ação devas-tadora sobre a agricultura. O estudo,de Sérgio Marangoni e seu doutoran-do José Antônio da Silva, do Institutode Biologia da Universidade Estadualde Campinas (Unicamp), tambémabre perspectivas de elaboração de in-seticidas naturais, menos tóxicos.

Também conhecido como broca,gorgulho e carpinteiro, o carunchotem um ciclo de vida de apenas 20 a 30dias. Ainda assim, consegue destruircerca de metade da safra brasileiraanual de feijão-de-corda (Vigna un-guiculata), largamente consumido noNorte e Nordeste, e, de modo geral,causa perdas de 30% a 40% nos prin-cipais grãos colhidos no país – princi-palmente milho, trigo, soja e arroz.

O inseto ataca tanto as vagens ver-des quanto o feijão armazenado. Oataque começa no campo, com umainfestação de cerca de 2% das semen-tes, mas a perda principal ocorre noarmazenamento. No mundo inteiro,segundo a Organização das NaçõesUnidas para Alimentação e Agricultu-

Sementes da árvore nativamostram-se fatais para agrande praga da agricultura

Copaíba contrao caruncho

A

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 47

Encontrada a trilha, ambos senti-ram-se encorajados para estudar asproteínas das sementes de copaíba e,no ano 2000, identificaram uma queinibe a ação da serinoprotease tripsina– enzima digestiva do caruncho. “Nofeijão, alimento natural do caruncho,existe uma proteína inibidora da trip-sina, mas o caruncho já desenvolveuum mecanismo de resistência a ela”,conta Marangoni. Já a proteína que osdois pesquisadores descobriram, cha-mada inibidor de serinoprotease ouTDI, bloqueia o processo digestivo docaruncho, que pára de se alimentar edefinha até morrer, em poucos dias.

Em laboratório, definido o interes-se pela copaíba, as sementes foram tri-

O trabalho reforça a hipótese deque os inibidores de tripsina estejamligados a mecanismos de defesa dasleguminosas, como o feijão. A próxi-ma etapa é transportar o gene do ini-bidor da copaíba para grãos trans-gênicos. Outra vertente é o uso daproteína na fabricação de iscas natu-rais contra o caruncho.

Sob orientação de Marangoni, Sil-va estuda a seqüência completa daproteína com cristalografia de raio-X,em colaboração com o LaboratórioNacional de Luz Síncrotron (LNLS), eelabora um modelo tridimensional daproteína. Já descobriu que é pequena.Aos poucos, a modelagem descortinaos mecanismos de interação da proteí-

O PROJETO

Isolamento e Caracterização Bioquímicade Inibidores de Proteinases Serínicasde Sementes de Copaifera langsdorffii.Estudo da Ação Antifungicida e Resistência contra o Bruquídeo callosobruchus Maculatus

MODALIDADE

Linha regular de auxílio à pesquisa

COORDENADOR

SÉRGIO MARANGONI – Instituto de Biologia da Unicamp

INVESTIMENTO

R$ 101.807,60

Caruncho: ação devastadora sobre os grãos

turadas. Do pó resultante foi retiradoo TDI inibidor da tripsina e, a partirdele, produzidas sementes artificiais,que foram postas como alimento paralarvas do caruncho. Ao se alimentar dafalsa semente, o inseto começava a de-finhar e morria, já que o TDI inibe aação das enzimas proteolíticas (ouproteases) do seu tubo digestivo.

na com as enzimas digestivas e sugereestratégias. Para Silva, não há preocu-pação com efeitos sobre a saúde hu-mana, já que o TDI é da mesma famí-lia de proteínas já existentes no feijão,com a vantagem de que esse inibidorenzimático mostrou-se mais resisten-te por estar presente em espécies evo-lutivamente distintas. O problema écomo manter a modificação genética.

“A originalidade do trabalho dasemente da copaíba foi encontrar naflora brasileira um agente eficientecontra uma praga da nossa agricultu-ra”, diz Marangoni. O desafio de en-contrar na biodiversidade nacionalum produto natural de combate auma praga agrícola de tal dimensãofoi vencido e reconhecido com o rela-to da identificação do inibidor detripsina este ano no Journal of ProteinChemistry. “De todo modo”, conclui,“ainda serão necessários alguns anosde pesquisa até que seja possível redu-zir a voracidade do caruncho”. •

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Sementes de copaíba: um efeito mortal

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im da idade dastrevas” e “renas-cimento cósmi-co”: foi assimque astrônomos

do Instituto de Tecnologiada Califórnia (Caltech),dos Estados Unidos, qua-lificaram um momentocrucial da história do uni-verso, que conseguiramobservar em 2001. Trata-se da reionização do cos-mo – ou seja, a formação damatéria em núcleos atô-micos positivos e elétronsnegativos – fenômeno ocor-rido há cerca de 12 bilhões de anos,previsto em modelos teóricos, mas nun-ca antes comprovado. O grupo autorda inédita observação é coordenadopelo iogoslavo naturalizado norte-americano George Djorgovski e tem aparticipação principal da brasileiraSandra Castro, que se doutorou noInstituto Astronômico e Geofísico daUniversidade de São Paulo (IG-USP),fez pós-doutoramento no Observató-rio Nacional do Rio de Janeiro (ON) eembarcou para o Caltech em 1999.

48 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

CIÊNCIA

F

A reionização,fenômeno que pôs fim ao universo opaco,é comprovada pela primeira vez

ASTROFÍSICA

Universo remoto se ilumina

sistema solar, chegam a brilhar 100 ve-zes mais que uma galáxia. Foram elesque reionizaram a neblina primitiva,tornando o universo transparente.Essa neblina era constituída por hi-drogênio neutro, que absorve facil-mente a luz. Com a reionização, osátomos de hidrogênio foram des-membrados em prótons e elétrons,que não mais retêm a radiação lumi-nosa. Como resultado, o gás perdeu aopacidade e fez-se a luz.

Peça fundamental – A existência da-quele meio denso e neutro, depois rei-onizado, era uma peça fundamentalno quebra-cabeça da evolução do cos-mo, até então não encontrada. A ma-neira de achá-la era observar o uni-verso em grande profundidade,penetrando épocas cada vez mais re-motas. “Foi o que ocorreu com a des-coberta do quasar SDSS 1044-0125.Na análise espectroscópica de sua ra-diação, verificou-se que ela havia so-frido a absorção característica de ummeio denso e neutro. Na faixa corres-pondente às freqüências absorvidas, ográfico também apresentou pequenospicos de emissão, típicos de objetos

JOSÉ TADEU ARANTES

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O quasar SDSS 1044-0125, que levou às descobertas

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“Antes da reionização, era como seo universo estivesse cheio de uma ne-blina opaca e escura”, diz Sandra.“En-tão os fogos se acenderam e queima-ram através da neblina, produzindo aluz e a claridade”. Os “fogos” a que serefere, em linguagem quase bíblica,são os mais antigos quasares, um dosquais, o SDSS 1044-0125, que Sandraestudou a fundo, levou a equipe doCaltech a sua grande descoberta.

Os quasares são objetos cósmicosextraordinários: pouco maiores que o

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 49

primordiais em reio-nização”, informa Rei-naldo Ramos de Car-valho, do ObservatórioNacional, que trabalhoucom Djorgovski na observa-ção de mais de 100 quasares – a maiorcoleção desses objetos já estudada – eorientou o pós-doutoramento deSandra Castro.

Na longa viagem desde o SDSS1044-0125 até a Terra, a luz do quasaratravessou parte da espessa neblina quepreenchia o cosmo, o que deixou umamarca no espectro luminoso do objeto:seu gráfico indica que a radiação ele-tromagnética diminui na faixa do ul-travioleta, que corresponde aos fótonscom energia suficiente para ionizar ohidrogênio atômico. Isso revela queforam os quasares da geração do SDSS1044-0125 que arrancaram o univer-so de sua idade das trevas e promove-ram o renascimento cósmico.

Maior telescópio - Considerada a dis-tância do objeto, a análise espectros-cópica do SDSS 1044-0125 é umaproeza que exigiu grandes recursos.Para isso, a equipe do Caltech usounada menos que o telescópio maispoderoso do mundo: o Keck II, situa-do no topo do monte Mauna Kea, noHavaí, e dotado de espelho coletor de10 metros de diâmetro. Sandra conta:“Observamos esse quasar pelo perío-do de 1 ano, totalizando 5 horas emeia de exposições, e só conseguimosidentificar o efeito produzido pela rei-onização depois de combinarmos to-das as imagens obtidas numa única”.

Ao ser descoberto, o SDSS 1044-0125 era o mais antigo objeto já ob-servado. É difícil determinar a distân-cia ou a idade de um quasar comoesse. O que se pode fazer, com equipa-mento de ponta persistência, é calcu-lar o desvio para o vermelho (redshift)da radiação eletromagnética que eleemite – uma conseqüência direta daexpansão do universo.

O 3C 273, o quasar mais próximo da Terra,a 2,1 bilhões de anos-luz: afastando-se

a 50 mil km por segundo, com jatos intensos de partículas na região central

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Ocorre que a radiação que viaja pe-lo espaço acompanha a métrica do es-paço: se ele se expande, ela se expandetambém, de modo que chega ao ob-servador com um comprimento deonda maior do que ao ser emitida. Nocaso da luz visível, isso corresponde aum desvio para o vermelho – a faixade radiação que tem o maior compri-mento de onda –, daí o nome redshift.Dizer que um objeto tem redshift maiordo que outro equivale a afirmar quesuas emissões viajaram por mais tem-po no espaço, sofrendo mais prolon-gadamente os efeitos da expansão douniverso, até atingir a Terra – e, por-tanto, ele está mais distante.

desvio para o vermelho(representado por z) é,assim, um modo indi-reto de quantificar adistância – e, conse-

qüentemente, a idade – de um objeto.Se a luz chega ao observador com odobro do comprimento de onda comque saiu do objeto, ela tem um red-shift igual a 1; se chega num compri-mento de onda seis vezes maior, seudesvio para o vermelho é 5 – o valorde z é sempre uma unidade menor doque o do comprimento de onda final.A radiação do SDSS 1044-0125 apre-sentou o desvio z = 5,73. Há estrutu-ras ainda mais recuadas, mas os recur-sos atuais não permitem observá-las,devido ao obstáculo imposto pela ne-blina de hidrogênio neutro.

Nasce um quasar - A verdadeira natu-reza dos quasares ainda não é questãoresolvida, mas os estudos avançarammuito desde que eles foram descober-tos, na década de 60. Hoje a maioriados pesquisadores os considera pro-dutos do colapso gravitacional daenorme quantidade de gás e de estre-las que se acumula no centro das ga-láxias. Quando toda essa matéria secomprime por efeito gravitacional, oresultado é um buraco negro super-massivo – local onde a força da gra-vidade é tão grande que não deixa es-capar sequer a luz –, com massaequivalente de 100 milhões até 1 bilhãode sóis. Essa entidade imensa passa a

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O Fim da EscuridãoA Reionização deixa o Universo transparente

Big BangUniversopreenchido porgás ionizado

O Universotorna-se neutro e opaco

Começa a Idade das Trevas

Galáxias e quasares iniciam a reionização

RenascimentoCósmicoFim da Idadedas Trevas

Reionizaçãocompletada.O Universotorna-se transparentenovamente

Galáxias sedesenvolvem

Forma-se oSistema Solar

Tempo desde o Big Bang (em anos)

300 mil

500 milhões

1 bilhão

9 bilhões

13 bilhões

Fonte: George Djorgovski e Digital Media Center, Caltech

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verso a uma temperatura de 2,7 K. Essaradiação é uma relíquia da era da re-combinação: proporciona aos estudio-sos um fantástico instantâneo do uni-verso naquele momento crucial. Suadescoberta, na década de 60, forneceuum poderoso argumento a favor dateoria do Big Bang. Agora, a compro-vação observacional da reionizaçãovem reforçar ainda mais esse modelo.

Rivais unidos - Essa comprovação sedeve à sinergia involuntária de duasequipes rivais. O primeiro passo foido Grupo Sloan, formado por pesqui-sadores da Universidade de Princeton,do Fermilab (Fermi National Accele-rator Laboratory, dos EUA) e de ou-tras instituições. Reinaldo de Carva-lho informa: “Com detectores tipoCCD, 20 vezes mais eficientes que asantigas chapas fotográficas e capazesde medir o fluxo da fonte emissoraem cada pixel da imagem, eles estãomapeando todo o céu do HemisférioNorte em vários comprimentos deonda. E já encontraram dois quasarescom redshifts em torno de 5,7 – osmais distantes e portanto mais anti-gos descobertos até o momento”.

Ao definir como alvo um dessesquasares, o SDSS 1044-0125, o GrupoCaltech entrou em ação. “O Caltechdispõe de 45% do tempo de operaçãodos dois melhores telescópios ópticosdo mundo, os Keck I e II, do Havaí,frutos da doação milionária de umparticular à Universidade da Califór-nia”, revela Carvalho. Esse equipamen-to excepcional permitiu a Sandra e seuscolegas fazer seu primoroso trabalhode espectroscopia, que sugere clara-mente a reionização.

“Até o momento, esse evento erauma aposta dos modelos teóricos. Esua comprovação não teria sido pos-sível sem um observatório como oKeck”, reconhece Sandra.“O universo dehoje é complicado e cheio de padrõesdifíceis de entender. Os grandes teles-cópios nos aproximam de uma épocaem que o universo era simples. Elesnos proporcionam a visão de como amatéria começou a se organizar, pas-so a passo, para formar os bilhões degaláxias e estrelas que vemos hoje”. •

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 51

CA

LTEC

H

atrair o gás e as estrelas das vizinhanças,criando uma estrutura conhecida co-mo disco de acreção (aglomeração).

ntes de engolidas pelo bu-raco negro, as partículas dodisco são violentamenteaceleradas em espiral. Africção entre elas aque-

ce o disco e produz parte da extraordi-nária radiação do quasar. O restante daradiação se deve a outro fenômeno.Por efeito combinado da pressão deradiação e do campo magnético, gran-de número de partículas é arremessa-do para fora, num jato perpendicularao disco, próximo de sua borda interna.Esse fluxo é constituído por elétronsrelativísticos, com velocidades muitopróximas à da luz, e por uma forteemissão eletromagnética.

O nascimento dos quasares é pos-terior ao surgimento das galáxias, poisa atração gravitacional precisa de, nomínimo, meio bilhão de anos paraacumular, no centro galáctico, aquelamassa crítica de 100 milhões a 1 bi-lhão de sóis. E foi necessária umaquantidade significativa de quasarespara a reionização alcançar a escala douniverso inteiro. Em ordem decres-cente de redshifts (dos eventos maisdistantes e antigos para os mais próxi-mos e recentes), pode-se atribuir àsprimeiras galáxias o redshift 10; aosprimeiros quasares, entre 10 e 5; e àreionização, entre 6 e 5 – conforme aequipe do Caltech verificou.

Universo recombinante - Mas o uni-verso se estende muito além – na distân-cia e no passado. O momento de forma-ção da densa neblina que preencheu ocosmo antes da reionização corres-ponde ao fantástico redshift 1500! Es-tima-se que tenha ocorrido 300 milanos depois do Big Bang – o eventoque, pelo modelo cosmológico domi-nante, originou o universo há cerca de15 bilhões de anos. O fenômeno de for-mação da neblina foi chamado de re-combinação: nele, após o universo se terresfriado da temperatura infinita do BigBang até o modesto patamar de 3 milKelvin (o zero da escala Kelvin,ou zero ab-soluto,é igual a -273,16 graus Celsius), oselétrons e os fótons, que antes interagiamintensamente, se separaram. Foi o desa-coplamento entre matéria e radiação.

Livres da ação dos fótons, os elé-trons puderam então ser capturadospor núcleos atômicos simples, com-pondo os primeiros átomos. E essesátomos – basicamente de hidrogênio– formaram a neblina que preencheuo universo em sua idade das trevas. Arecombinação fez com que a matéria,antes totalmente ionizada – constituí-da de núcleos atômicos positivos eelétrons negativos –, se tornasse ele-tricamente neutra. A neblina domina-ria a cena por meio bilhão de anos, atéque a matéria fosse reionizada.

Liberados no desacoplamento, osfótons primordiais compõem hoje a ra-diação cósmica de fundo, um mar demicroondas que preenche todo o uni-

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Farol do Passado

Nuvens de hidrogênio filtram

a luz emitida pelo quasar

Bolhas de gás ionizado,as primeiras estruturas

que se adensaram e formaram estrelas

Nenhuma luz atravessa o gás

opaco que forma oUniverso primordial

Quasar

A luz que chega do quasar denuncia as nuvens de hidrogênio,material neutro que de outra forma não seria visto

Fonte: George Djorgovski e Digital Media Center, Caltech

Quasares contam a história do Universo

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L I N H A D E P R O D U Ç Ã OL I N H A D E P R O D U Ç Ã O

cia entre mulheres em todo omundo. A descoberta foi fei-ta por cientistas do Centro dePesquisas em Ciência, Tecno-logia e Engenharia da ESA,com sede na Holanda. O apa-relho será usado tanto parafazer diagnósticos mais pre-cisos do tumor quanto paraauxiliar os médicos durante

as cirurgias. No aparelho daESA as falhas – na detecçãodas células doentes no inícioda doença – existentes nosaparelhos atuais vão desapa-recer. “O sistema é completa-mente digital e permitirá aocirurgião estudar toda a re-gião afetada, identificando aspartes potencialmente cance-

■ Do espaço sideralpara os hospitais

Uma câmera de raios X de-senvolvida pela Agência Es-pacial Européia (ESA) paracapturar imagens do espa-ço sideral é a mais nova ar-ma no combate ao câncer demama, o de maior incidên-

TECNOLOGIA

O tráfego aéreo mundial de-ve duplicar na próxima déca-da, aumentando ainda maisos congestionamentos nos ae-roportos. Para evitar o caos,pesquisadores do mundointeiro buscam soluções quemelhorem a eficiência e asegurança dos espaços aero-portuários. O Órgão Nacio-nal de Estudos e PesquisasAeronáuticas (Onera), daFrança, até criou um progra-ma, batizado de Aeroportosdo Futuro, para propor saí-das para o problema. Segun-do reportagem divulgada noinformativo França-Flash,do Centro Franco-Brasileirode Documentação Técnica eCientífica (Cendotec), entreas várias alternativas estu-dadas estão os aeroportosflutuantes e novas tecnolo-gias, baseada, no uso de sen-sores, para melhorar o con-trole de tráfego aéreo pertodos aeródromos. O aeropor-to flutuante tem uma pis-ta com quatro quilômetros(km) de extensão e 800 me-tros de largura. Fica numaplataforma no meio do mare deve entrar em operaçãoem 2025. Um projeto simi-lar, batizado de Mega-Float,já está em testes, há dois

Soluções para os aeroportos do futuro

lógicas adversas. Simulaçõesmostraram que o novo sis-tema trará melhorias signi-ficativas ao tráfego aéreo,especialmente em aterrissa-gens com visibilidade precá-ria, quando até os avançadosinstrumentos ILS (sigla eminglês para sistema de pouso

anos, na Baía de Tóquio, noJapão. Além desse estudo, aOnera criou um sistema desensores instalados no aero-porto e nos aviões capaz demelhorar a capacidade ope-racional dos aeródromos,principalmente quando es-tão sob condições meteoro-

Concepção futurística de um aeroporto no mar: perto da cidade e com quatro km de pista

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por instrumentos), usados a-tualmente,apresentam limita-ções.Esses projetos têm o ob-jetivo de dispor de meios quepossibilitem o desenvolvimen-to de novos sistemas ou queauxiliem às indústrias a en-contrar novas soluções paraos aeroportos do futuro. •

rosas”, afirma Tone Peacock,um dos coordenadores do pro-jeto. Segundo o cientista, nãoé surpresa que um aparelhoprojetado para observar emis-sões de raios X no espaço pos-sa ter finalidade médica.“Afinal,os raios X são os únicos queatra-vessam o corpo humano”, dizPeacock. •

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 53

■ Baratas resistentes aos inseticidas

Um estudo feito com baratas(Blattella germanica) em es-tabelecimentos comerciaisde São Paulo e do Rio de Ja-neiro mostrou que elas estãodesenvolvendo resistência aosprodutos mais usados pelasempresas de desinsetização,como deltametrina (piretrói-de), clorpirifós (organofosfo-rado) e suas misturas. Segun-do o professor Celso Omoto,do departamento de Ento-mologia Agrícola da EscolaSuperior de Agricultura Luizde Queiroz (Esalq), de Pira-cicaba, que coletou e pesqui-sou as amostras, a variabili-dade genética nas linhagensestudadas confere resistênciaaos dois inseticidas. Mas nãoforam observadas resistênci-as cruzadas com o fipronil, umnovo inseticida em gel usadoem iscas. “Não é possível de-terminar um índice único deresistência, pois essa porcen-tagem varia conforme o localde coleta”, explica Omoto.“Ogrande problema é o contro-le irracional, com doses mui-to altas de inseticidas ou desuas misturas, contaminandopessoas e o ambiente, e ele-vando os custos de controle.Não existem muitos produ-tos no mercado e as alterna-tivas não surgem facilmente.É preciso saber se há resis-tência das baratas e qual aporcentagem dela, em cadaum dos locais onde as colô-nias são encontradas, para aindicação do inseticida cer-to e da dose adequada ao ex-termínio dos insetos. “Essemonitoramento deve ser per-manente e aliado a outrasmedidas, como a limpeza e ahigiene dos ambientes”, ob-serva Omoto, que também éconsultor do Comitê Brasi-leiro de Ação à Resistência aInseticidas. •

zação de testes que detectamadulterações em remédios quecontêm como princípio ati-vo a dipirona (analgésico eantitérmico encontrado emmedicamentos como Noval-gina, Magnopirol, Busco-pan, Dorflex e Neosaldina) ea hexamina, também conhe-cida como urotropina, uti-lizada para combater infec-ções urinárias. “Remédiosfalsificados ou adulterados

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trazem sérias conseqüênciase até a morte de pacientesque os utilizam”, explica oprofessor Leonardo Pezza,que elaborou a metodologiadesses kits em conjunto coma professora Helena Redigo-lo Pezza. Os resultados dostrabalhos dos pesquisadores,que pertencem ao Instituto deQuímica da Unesp, foram pu-blicados em periódicos inter-nacionais. Os kits permitematé cem análises e custam deR$ 6,00 a R$ 8,00 cada. “Jáestamos desenvolvendo téc-nicas para detecção de outrosprincípios ativos, como raniti-dina, diclofenaco de sódio ede potássio, captopril e para-cetamol. A intenção dos pes-quisasdores é elaborar mé-todos mais rápidos e maisbaratos para a venda de kitsem farmácias e para o usoem laboratórios farmacêuti-cos e de controle de qualida-de industrial. •

Diagnóstico da diabetes pelo olhoQuantificar a glicemia– a taxa de açúcar nosangue – a partir daanálise da cor da íris.Esse sistema inovadorfoi desenvolvido porum grupo de pesqui-sadores do CentroTecnológico e do Ins-tituto de EngenhariaBiomédica da Univer-sidade Federal de San-ta Catarina (UFSC).“Nossas pesquisas,iniciadas há três anos,mostraram que a corda íris muda quandoocorrem alterações nonível de glicemia”, a-firma Armando AlbertazziGonçalvez Junior, professordo Departamento de Enge-nharia Mecânica da UFSCe coordenador do projeto.

tizado de Glucoíris.Graças a um sistemaespecial de ilumina-ção, uma câmera fo-tográfica digital regis-tra e envia para ocomputador uma fo-to de alta qualidade daíris. A imagem é pro-cessada, e a glicemia,calculada. Hoje, todosos glicosímetros têmação invasiva ou semi-invasiva. “O Glucoírispoderá ser o primeiroaparelho para quanti-ficação de glicemia to-talmente não invasivo”,diz o pesquisador.“Mas

para isso estamos à procurade interessados em investirUS$ 150 mil, que nos pos-sibilitem avançar com aspesquisas.” •

Cálculo da glicemia em foto da íris

Taxas altas de glicemia in-dicam que a pessoa temdiabetes. Para fazer a medi-ção, os pesquisadores desen-volveram um protótipo ba-

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■ Teste identifica remédios falsificados

Descobrir se alguns tipos demedicamento foram ou nãofalsificados tornou-se uma ta-refa bem mais simples, rápi-da e barata com o kit desen-volvido pela UniversidadeEstadual Paulista (Unesp) deAraraquara. Composto detubo de ensaio e reagentes, oequipamento permite a reali-

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54 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

L I N H A D E P R O D U Ç Ã OL I N H A D E P R O D U Ç Ã O

compostos de fosfolipídios(componentes de gordura dasmembranas celulares) quepossibilitam a diminuição dasdoses dos medicamentos, di-recionando o fármaco para ór-gãos ou regiões específicas docorpo, além de permitir me-lhor biodisponibilidade nacirculação sanguínea”, explicaMaria Palmira. Ela conseguiupreparar lipossomas de fár-macos esquistossomicidas ecomprovar sua eficácia na re-dução de ovos e de indivíduosdo verme Schistosoma man-

■ Drogas mais eficazescom lipossomas

A professora Maria PalmiraDaflon Gremião, da Faculdadede Ciências Farmacêuticas daUniversidade Estadual Pau-lista (Unesp) de Araraquara,conseguiu um melhor apro-veitamento de medicamentoscontra a esquistossomose aoutilizar lipossomas, que sãopartículas capazes de encapsu-lar outras substâncias e levá-lasa um local preciso do organis-mo.“Lipossomas são sistemas

A cena é impressionante.Uma van modelo Besta, daKia, transforma-se numrobô de seis metros de al-tura que fala, emite luzes,solta fumaça de gelo seco etoca música. Chamado deRobocar, ele é o principalartefato construído peloautodidata Olésio da Silva,um profissional especiali-zado em efeitos especiaispara filmes de publicidadeque já desenvolveu robôsde vários tamanhos. Todostêm a função de servir co-mo atração promocionalem eventos. Assim, além doRobocar, que custou R$120 mil, Olésio, 50 anos, eseus dois filhos, MarcusVinicius da Silva, 25 anos,estudante de engenharia, eMarco Aurélio da Silva, 17,construíram um robô comcabeça de radiogravador eespaço no peito para anun-ciantes que se locomove efala, transformando-se naalegria das crianças. Outraconquista da família é umaréplica perfeita de um tele-fone celular da Motorola

Criatividade e técnica na usina de robôs fabricado em escala de 1:10que se abre automatica-mente, levanta a antena epassa a mensagem do fa-bricante. “Estamos agoradesenvolvendo um robôdidático para servir as es-

Robocar: espetáculo de transformação com luzes esom atrai espectadores

soni, em testes realizados invivo com camundongos. São8 a 10 milhões de infectadoscom esquistossomose no Bra-sil e apenas dois fármacos parao tratamento: oxamniquinae praziquantel, ambos commuitos efeitos colaterais. Emaltas doses comprometem osrins e possibilitam o apareci-mento de algumas cepas re-sistentes do parasita. O melhor

processo obtido pela pesqui-sadora foi com lipossomas depraziquantel. “Observamos aredução de parasitas e ovos emcamundongos”, diz Maria Pal-mira. Antes dos testes em hu-manos, vamos avaliar outrasformulações de lipossomas enovas vias de administração,como a injetável, porque tes-tamos os fármacos apenas emcomprimidos.” •

colas técnicas de eletrônicanas aulas de princípios derobótica”, diz Marcus Vini-cius. A família também temoutros planos para o fu-turo. “Nossa intenção ago-ra é trabalhar com gruposde pesquisa do meio aca-dêmico para desenvolveroutros tipos de robôs quepossam ser úteis em fun-ções diferentes da promo-cional”, garante Olésio. •

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 55

■ A energia dasondas do mar

Gerar energia a partir das on-das do mar não é mais coisa dofuturo. Há mais de um ano,uma usina construída emIslay, na costa da Escócia, temgerado energia suficiente paraabastecer 400 residências. Emjulho do ano passado, uma se-gunda planta foi instalada naIlha do Pico, no arquipélagode Açores, em Portugal. Com400 kW de potência, ela for-nece energia para mil pessoas,ou 10% do total da ilha. Dian-te dos bons resultados atingi-dos e por ser uma fonte deenergia limpa, renovável e debaixo impacto ambiental, aCoordenação dos Programasde Pós-Graduação de Enge-nharia (Coppe) da Universi-dade Federal do Rio de Janei-ro firmou convênio com oInstituto Nacional de En-genharia e Tecnologia Indus-trial (Ineti) de Portugal paraacompanhar o funcionamen-to da usina de Açores. Pesqui-sadores dos dois países tam-bém vão estudar as condiçõesdo litoral brasileiro para ava-liar o uso dessa matriz ener-gética. Indicadas para peque-nas comunidades, as usinasde ondas custam cerca de R$1 milhão e são relativamentesimples. São feitas de uma es-trutura de concreto, de cercade 12 metros quadrados desuperfície e 14 metros de al-tura, na zona de arrebentaçãodas ondas. O vaivém da águaprovoca uma compressão edescompressão de ar no inte-rior de um vão, fazendo giraruma turbina. Essa, por suavez, aciona o gerador de ele-tricidade. Segundo o profes-sor Antônio Carlos Fernandes,chefe da área de hidrodinâ-mica da Coppe, o maior desa-fio aos pesquisadores é manteruma constância, porque asondas são irregulares e têm ta-

liuretano, como isolante tér-mico e acústico, na composi-ção de tintas, vernizes, fibrasde carbono e resinas fenóli-cas do tipo baquelite, empre-gadas em cabos de panelas epeças internas de automóveis.Segundo Vânya Pasa, sua equi-pe possui vários estudos sobre oreaproveitamento do piche doalcatrão na indústria de mate-riais poliméricos.“Nossas pes-quisas mostram como aprovei-tar de forma mais eficiente osresíduos da fabricação do car-vão”, afirma Vânya. •

■ Na vanguarda dastelecomunicações

Um dos casos de sucesso deempresas residentes em incu-badoras é a Suntech de Flo-rianópolis (SC). Em menosde dois anos, essa empresa queoferece serviços para redes de

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telecomunicações já está per-to de atingir R$ 1 milhão defaturamento. A Suntech nas-ceu no Centro Empresarialpara Laboração de Tecnolo-gias Inovadoras (Celta), in-cubadora com 31 empresasque faturam juntas R$ 32milhões e empregam 500 pes-soas. A empresa desenvolveuum sistema de gerenciamen-to de qualidade de redes detelecomunicações e já possuiclientes como Algar TelecomLeste, Companhia TelefônicaBrasil Central (CTBC) e TimTelecelular Sul. No final do anopassado, a empresa fechoucontrato com a Tess, opera-dora de telefonia celular doVale do Paraíba e litoral deSão Paulo, para oferecer umserviço de localização de veí-culos, voltado principalmen-te para os caminhões. Com onovo sistema, o TrackNet Car,será possível gerenciar frotasde veículos em tempo real esaber o histórico da trajetó-ria desses veículos com basena cobertura oferecida pe-las células do sistema. •

■ Experimentos em microgravidade

A Agência Espacial Brasilei-ra (AEB), vinculada ao Minis-tério da Ciência e Tecnologia(MCT), divulgou a relação dascinco pesquisas seleciona-das para integrar o ProjetoMicrogravidade (veja no sitewww.mct.gov.br) que serãoembarcadas ainda neste anonos foguetes de sondagem VS-30, fabricados pelo CentroTécnico Aeroespacial (CTA)do Ministério da Aeronáutica.O vôo do VS-30 proporcionaaos experimentos três minu-tos em ambiente de microgra-vidade, a uma altitude de 90quilômetros. Para 2002, estãoprevistos dois lançamentos. Oprimeiro será em maio, o ou-tro no segundo semestre. •

Ondas na Ilha do Pico, nos Açores: 400 kW de energia elétrica

manhos diferentes. A primei-ra usina piloto do país deveráser construída no Arraial doCabo, no litoral fluminense.“Esperamos que fique prontaaté o início do próximo ano”,afirmou Fernandes. •

■ Polímeros com piche de alcatrão

Pesquisadores do Departa-mento de Química do Insti-tuto de Ciências Exatas daUniversidade Federal de Mi-nas Gerais (UFMG), coorde-nados pela professora VânyaPasa, desenvolveram váriasalternativas para o reaprovei-tamento do piche de alcatrão,um resíduo do carvão vegetalutilizado nas siderúrgicas. Osestudos, iniciados há seisanos, mostraram que o pro-duto tem ampla utilidade: nafabricação de espumas de po-

O vaivém das ondas dentro da câmara de concreto provoca

compressão e descompressão do ar, movimento que aciona o gerador de eletricidade

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TECNOLOGIA

ENGENHARIA

s setores produtivos nacionais têm recorri-do, com maior freqüência, a processos e sis-temas de trabalho mais eficientes e limposcom o objetivo de melhorar o aproveita-mento das matérias-primas, diminuir os re-

síduos e buscar a reciclagem de produtos e de sobras indus-triais. O resultado dessa seqüência de novos procedimentos éa redução substancial de custos e a possibilidade de conquis-tar mercados externos, cada vez mais exigentes em relação aprocessos de produção que causem menos agressões ao am-biente. “A adoção de tecnologias limpas leva as empresas aeconomizar muito dinheiro e a aumentar seu faturamento”,diz o professor Luis Nunes de Oliveira, coordenador adjuntodas áreas de exatas da diretoria científica da FAPESP. “Alémdisso, a empresa deixa de ser multada em casos, por exemplo,de descarte de resíduos em rios.”

Dentro dessa política estratégica para o país, sete projetosfinanciados pela FAPESP ampliam e lançam novas perspecti-vas para o uso e desenvolvimento de tecnologias limpas. Essesprojetos englobam desde a construção civil até a reciclagemde metais e o aproveitamento de embalagens. “A construçãocivil é o ramo da economia que mais agride a natureza, devi-do à grande quantidade de recursos naturais que demanda”,reconhece Vahan Agopyan, engenheiro civil e professor da Es-cola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP).

Os estudos de Agopyan são centrados em projetos quetêm como objetivo reutilizar o que é descartado como lixo.Entre os mais importantes está o que transforma a escória deresíduo da produção do aço, sem nenhum valor, em compo-nente importante na fabricação de um cimento inovador:

Tecnologias recentes promovem a reciclagem,diminuem os resíduosindustriais e não poluem o ambiente

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Eficientes,limpas eeconômicas

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solução está em análise pelacâmara técnica de controleambiental do Conama.

A construção civil ainda tem umgrave problema a resolver. É a presen-ça do amianto na composição das te-lhas. O uso desse mineral é proibidoem 21 países, devido aos problemasde saúde que provoca. A partir de ja-neiro de 2005, a decisão valerá para to-dos os países membros da União Eu-ropéia. Mas no Brasil a fibra mineralcontinua a ser utilizada pelos fabri-cantes de caixas d’água, telhas e pasti-lhas de freio. O projeto de lei federalque bania definitivamente o amiantoda indústria brasileira sob o argumen-to de que esse material é cancerígenoe causa doenças no pulmão não foiaprovado, mas substituído por outro,que estabelece o seu uso controlado.

Fibras vegetais - Mas a substituiçãodo amianto nas telhas brasileiras jáestá a caminho com um projeto doPITE – Desenvolvimento de Tecnolo-gia para Fabricação de Telhas de Fi-brocimento sem Amianto –, desenvol-vido em parceria com as empresasInfibra-Permatex, de São Paulo, e Im-bralit, de Santa Catarina. A principalfunção do projeto é eliminar o ami-anto e introduzir fibras vegetais eplásticas na fabricação das telhas. Ouso crescente desses materiais é umatendência mundial na construção ci-

duas vezes mais resistente e40% mais barato que o cimen-to comum.

No novo cimento, que ren-deu o registro de uma patente,a escória desempenha funçãofundamental. Combinada comativadores, que são substânciasformadas por compostos de si-licatos de sódio, sulfatos e hi-dróxidos de cálcio, o cimentoganha baixa alcalinidade, oque permite acrescentar fibrasna mistura. Fibras de vidro fa-zem do cimento de escóriamaterial resistente e fácil demoldar. “A escória tinha umvalor irrisório. Nossa pesquisaagregou valor a esse rejeito,transformando-o num exce-lente material do ponto de vista in-dustrial”, diz Agopyan, que coorde-nou o projeto Painéis de Cimento deEscória Reforçados com Fibra de VidroE, desenvolvido no âmbito do Progra-ma Parceria para Inovação Tecnológi-ca (PITE) da FAPESP.

Dois anos atrás, quando esse pro-jeto foi concluído, as siderúrgicas nãotinham outra alternativa senão pagarpara deixar esses resíduos em aterrosindustriais. Devido aos altos custos,grande parte da escória era abando-nada no meio ambiente, contaminan-do o solo e a água. “Com o tempo, aescória endurece e forma rochas com-postas por metais pesados que conta-minam o lençol freático”, diz Ago-pyan. A cada ano, as siderúrgicasbrasileiras obtêm, como subprodutoda obtenção do aço, cerca de 6 mi-lhões de toneladas de escória de alto-forno. Hoje, não só economizam oque gastavam com destinação finalcomo ainda faturam com a escória.

Venda de escória - A Companhia Side-rúrgica de Tubarão (CST), em Vitó-ria, no Espírito Santo, apoiou o proje-to e fatura, atualmente, US$ 9 milhõespor ano com a venda da escória paraquatro cimenteiras. Antes, toda a suaprodução, de 1,7 milhão de toneladaspor ano, tinha como destino apenasduas empresas que estocavam o pro-duto em terrenos. “Nossos clientes

não sabiam o que fazer com tanta es-cória”, diz Paulo Lana, gerente devendas especiais da CST.

gopyan é o primeiro brasi-leiro a integrar a diretoriado Conselho Internacio-nal de Pesquisa e Inova-ção em Construção Ci-

vil (CIB), entidade existente há maisde 50 anos, como vice-presidente.“Essa preocupação com o meio am-biente não é modismo”, diz. Tanto queo CIB, que muda o tema de seus con-gressos a cada três anos, em 2001 re-tomou o mesmo assunto abordadoem 1998: a construção sustentável.

Outra contribuição de Agopyanpara esse tema – junto com outrospesquisadores da USP – foi colaborarno texto de uma resolução do ConselhoNacional do Meio Ambiente (Cona-ma) sobre “Resíduos da ConstruçãoCivil”, que dará mais responsabilida-des aos municípios para fiscalizar em-preiteiras e transportadoras na gera-ção e no transporte de entulhos deconstrução civil. A partir dessa reso-lução, haverá mais regras a cumprirpor parte das empreiteiras e dos pro-prietários das caçambas, que tambémserão responsáveis pelo depósito deresíduos. No momento, o texto da re-

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Escória estocada na Companhia Siderúrgica de Tubarão para ser transformada em cimento

CST

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vil. O cimento, quando misturado àsfibras vegetais, torna-se apropriado àprodução de equipamentos delgadose mais resistentes a esforços dinâmi-cos. “A indústria brasileira tem comogrande desafio desenvolver tecnolo-gias para o uso de fibras que sejam, aomesmo tempo, limpas e viáveis econo-micamente”, diz o coordenador doprojeto, professor Holmer SavastanoJúnior, da Faculdade de Zootecnia eEngenharia de Alimentos da Univer-sidade de São Paulo (USP).

O projeto prevê a fabricação de te-lhas reforçadas com fibras plásticas ede celulose. Matéria-prima renovável,as fibras de celulose são aceitas interna-cionalmente. A intenção é utilizar fibrasde eucalipto e de pinus, para reforçaras telhas, e fibras plásticas, que dão re-sistência a longo prazo. Na fase atual,os pesquisadores testam essas matérias-primas em escala de laboratório.

Casca de arroz - Outra fibra vegetalque pode ser útil como matéria-pri-ma em insumos para a construção ci-vil é a casca de arroz. Não in natura,mas com a extração da sílica existentenessa fibra para compor concretos es-truturais. A casca de arroz é hoje umgrande problema ambiental no Brasil.Por ano, são descartados 10 milhões

de toneladas de casca de ar-roz – e 400 mil toneladas desílica –, que são queimadas

ou deixadas sobre a terra. Para apro-veitar o potencial desse resíduo, naUSP de São Carlos desenvolve-se oprojeto Concretos de Alto Desempenhocom Sílica de Arroz, coordenado peloprofessor Jefferson Libório, do Labo-ratório de Engenharia Civil do De-partamento de Arquitetura e Urba-nismo da Escola de Engenharia. Ospesquisadores desenvolveram ummétodo para extrair a sílica da cascado arroz e comprovaram sua aplica-ção em concretos estruturais.

Libório desenvolveu a tecnologiajunto com o professor Milton de Sou-za, do Instituto de Física e Ciência dosMateriais da USP. O trabalho conjun-to já possui um pedido de patente eestá prestes a ser colocado no merca-do. “Várias empresas estão interessa-das, mas temos de manter os nomesem sigilo enquanto elas fazem os en-saios”, diz Libório.

Outro foco do desenvolvimentode tecnologias limpas está na recicla-gem de produtos descartados. Embo-ra seja popular a destinação de lati-nhas de cervejas e refrigerantes para areciclagem, apenas 229 mil toneladasde alumínio de sucata recuperadaparticiparam do 1,5 milhão de tonela-das produzidas no Brasil durante oano 2000, segundo levantamento fei-

to pela Associação Brasileirado Alumínio (Abal). Na avalia-ção do professor Antonio Car-los da Cruz, do Instituto dePesquisas Tecnológicas do Es-tado de São Paulo (IPT), essaproporção deve aumentar gra-dativamente. Entre as muitasvantagens, a reciclagem conso-me muito menos energia elé-trica do que a necessária paraproduzir alumínio a partir dabauxita, 5% no máximo. Mas,para que os processos de reci-clagem tornem-se realmentelimpos, novas tecnologias pre-cisam ser aperfeiçoadas.

Cruz coordena uma pes-quisa considerada inovadora,pelo fato de dispensar o uso de

sais na reciclagem de alumínio. Usa-dos para proteger o próprio alumíniocontra a oxidação, os sais geram resí-duos que contaminam o ambiente. Oprojeto Reciclagem do Alumínio: De-senvolvimento de Inovações Tecnológi-cas prevê o controle da atmosfera doforno, impedindo ao máximo a pre-sença de oxigênio, e substitui a combus-tão, que requer o uso desse gás, pelouso de plasma térmico para aquecer oforno. Esse produto é obtido pela pas-sagem de corrente elétrica em um gás,formando o plasma, substância capazde atingir a temperatura de até 20 milgraus Celsius.

Escala industrial - Os recursos investi-dos no projeto pela FAPESP e por seisempresas representadas pela Abal via-bilizaram tanto a tecnologia como oforno rotativo, com capacidade paraprocessar 300 quilos de material – vo-lume suficiente para demonstrar odesempenho em escala industrial.Falta apenas a inspeção das condiçõesde segurança, para que o forno come-ce a operar, reciclando borra de alumí-nio, latinhas, panelas, blocos de motore esquadrias usadas em janelas e portas.

A vantagem do plasma para a reci-clagem de alumínio está no fato deesse processo não produzir resíduosnem efluentes tóxicos e perigosos.Uma das empresas candidatas a se va-ler dessa nova tecnologia é a Latasa,

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 59

No Brasil, sobram 10 milhões de toneladas de casca de arroz por ano: problema ambiental

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(kW) para cerca de 4 kW porquilo de alumínio reciclado pro-duzido. Com essas inovações e

outras modificações no processo, eleconstruiu uma célula de refino eletro-lítico, obtendo alumínio com 99,8% depureza a partir de sucatas.

Ciclo de vida - Se o destino das lati-nhas de alumínio foi a reciclagem em78% do total de unidades produzidas

que fabrica 6 milhões de latinhas,metade com alumínio reciclado.Hoje, o processo utilizado para re-ciclagem das 40 mil toneladas de alu-mínio da empresa utiliza sais que pre-cisam ser descartados e geram umcusto adicional para eliminá-los comsegurança. O gerente do Centro deReciclagem da Latasa em Pindamo-nhangaba, no Vale do Paraíba, Anto-nio Paulo Galdeano Damiance, nãorevela a quantidade de sais utilizadosna reciclagem nem o custo com a des-tinação final, mas assegura que, nosúltimos três anos, a Latasa reduziu ossais, e, conseqüentemente, os resíduos,em 45%. Segundo o gerente, isso sedeve à aplicação de tecnologias norte-americanas no processo. Com a ajudados pesquisadores da USP, a empresatem chances de zerar esse índice.

Menos energia - Os avanços na áreade reciclagem de alumínio não parampor aí. Um novo tipo de refino eletro-lítico do alumínio, um dos processosde reciclagem desse metal, tornou-seviável economicamente devido a umatecnologia desenvolvida nas instala-ções do Instituto de Pesquisas Energé-ticas e Nucleares (Ipen), por meio doprojeto Desenvolvimento de um Pro-cesso de Refino Eletrolítico (reciclagem)de Sucatas de Alumínio em Banhos deCloretos Fundidos. Até pouco tempo,esse processo exigia tanta energia elé-

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trica quanto a consumida na produ-ção do alumínio primário. Ao substi-tuir os sais de fluoretos (compostos deflúor) pelos cloretos (à base de cloro)e, a partir disso, reestruturar o pro-cesso, o professor Marcelo Linardi,do Ipen, diminuiu o gasto de energiaem dois terços, de 15 quilowatts

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Na USP: corpos de prova e protótipos de telhas fabricadas com fibras vegetais

Projeto Instituto/Empresa Modalidade Investimento

Cimento com escória USP e Owens Corning PITE R$ 13.900,00 e US$ 196.651,60Filberglass (FAPESP) e R$ 415.000,00

(Owens Corning Filberglass)

Telhas com fibras USP, Infibra-Permatex PITE R$ 213.749,00 e US$ 95.496,33vegetais e plásticas e Imbralit (FAPESP) e R$ 1.576.560,00

(Innfibra-Permatex e Imbralit)

Concreto com sílica USP Projeto R$ 230.993,27 e US$ 166.979,51de arroz temático

Reciclagem de alumínio IPT e Abal PITE R$ 161.924,00 e US$ 129.107,36com plasma (FAPESP) e R$ 192.700,00

(Abal)

Reciclagem eletrolítica Ipen Linha regular de R$ 28.542,71 e US$ 3.150,54do alumínio auxílio à pesquisa

Ciclo de vida das Ital e Fundepag PITE R$ 92.800,00 e US$ 138.200,00embalagens de papelão (FAPESP) e R$ 280.00,00 e

US$ 45.000,00 (Fundepag)

Embalagens de papelão Ital e ABPO PITE US$ 52.520,00 (FAPESP)para hortifrutícolas R$ 41.040,00 (ABPO)

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no Brasil em 2000, as outras embala-gens ainda não têm o mesmo sucesso.Embora exista tecnologia para reci-clagem, papel e plástico, por exemplo,ainda não atingem alto índices de re-aproveitamento. O principal motivo éque o quilo desses materiais custabem menos que o do alumínio. Masem inferioridade não vale para os es-tudos com embalagens de papel e pa-pelão, vidro, madeira, plástico, aço ede leite longa vida. No campo da pes-quisa acadêmica, essas embalagensmerecem a mesma atenção.

O Brasil já possui um vasto ban-co de dados com os resultados dasavaliações desses materiais, comnúmeros e tabelas de consumo decombustível, energia, água e todos osoutros insumos necessários à fabrica-ção e ao ciclo de vida dessas emba-lagens. Esse banco de dados foi com-posto durante o projeto Análisedo Ciclo de Vida de Embalagenspara o Mercado Brasileiro, doPITE, finalizado em 1999 e de-senvolvido por pesquisadores doCentro de Tecno-logia de Embala-gem (Cetea), doInstituto de Tec-nologia de Ali-mentos (Ital), de Campinas.

Segundo Anna Lúcia Mourad, quí-mica que integra o grupo de pesquisa,o banco de dados, cuja primeira ver-são foi concluída em 1998, passa porfreqüentes atualizações. “Fizemos olevantamento completo, detalhado, detudo o que se consome para obteruma caixa de papelão”, exemplificaAnna Lúcia, responsável pela área demateriais celulósicos da pesquisa.

Papelão ondulado - Esse não é o únicoprojeto do Cetea afinado com a pro-posta de produção mais limpa. Umoutro, desenvolvido no âmbito do PI-TE, intitulado Desenvolvimento de Sis-temas de Embalagens de Papelão On-dulado para Hortifrutícolas, tambémtem forte caráter ambiental. Em par-ceria com a Associação Brasileira dePapelão Ondulado (ABPO), o Ceteadesenvolveu três tipos de caixas de pa-pelão ondulado para armazenamento

o Desenvolvimento Industrial e doPrograma das Nações Unidas para oMeio Ambiente. Nos últimos anos,essas entidades ajudaram a instalarcentros de tecnologia limpa em 22países em desenvolvimento. O centrorecebe apoio e está instalado no pré-dio do Serviço Nacional de Aprendi-zagem Industrial (Senai).

“A destinação final dos resíduoscusta caro às empresas. Quando elasreduzem esses resíduos na origemdo processo, tornam-se mais compe-titivas”, diz Hugo Springer, diretordo CNTL. Com o apoio desse cen-tro, empresas ligadas ao Senai torna-ram sua produção mais limpa emvários setores da indústria: calçadis-ta, moveleiro, metal-mecânico, ali-mentos e celulose.

O empenho nesse esforçocomum conta tam-bém com a Associa-

ção Brasileira de Nor-mas Técnicas (ABNT).

Referência para o em-presariado,a ABNT pres-

tou, em novembro do anopassado, sua mais recente

contribuição, com o lança-mento da ISO 14040, que vem

somar-se ao conjunto de nor-mas ISO 14000 dirigidas à prote-

ção ambiental. Segundo HubmaierLucas de Andrade, coordenador do

subcomitê de ciclo de vida na ABNT,a nova norma orienta as empresas narevisão de toda a cadeia produtiva,por meio da análise do ciclo de vidado produto. “A ISO 14040 é uma fer-ramenta voluntária que não é certi-ficável, mas ajuda as empresas a tomardecisões para aperfeiçoar o processo”,diz Andrade. Na avaliação do coorde-nador, a aplicação da norma facilita adefinição de prioridades no desen-volvimento de tecnologias limpas.

“No Brasil, temos de construir umarranjo institucional que permita àsempresas levantar seus dados de ciclode vida, desde o uso da matéria-primaaté o pós-consumo”, avalia Andrade.Por tudo isso, o novo século apontapara a perspectiva das tecnologias lim-pas. Uma condição para que o plane-ta continue vivendo outros séculos. •

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e transporte de tomate, laranja, uva,berinjela, pepino, pêssego e cenoura.Desde 1999, quando o projeto foi con-cluído, as caixas de papelão estão dis-poníveis para a cadeia de hortifrutíco-las, que anteriormente não tinha opçãopara as caixas de madeiras tipo K.

Normas técnicas - O papelão ondula-do tem pelo menos duas vantagensem relação à caixa K. A primeira pelofato de ser descartável e reciclável, oque aumenta o nível de limpeza dasfrutas e verduras comercializadas. Aoutra está relacionada à maior com-patibilidade do papelão com a fragili-dade dos produtos. Nas caixas K, as

perdas dos hortifrutícolas chegam a30%. Segundo a engenheira de ali-mentos Eloísa Garcia, pesquisadorado Cetea,“a perda de produtos por fa-lha de embalagem traz conseqüênciasnegativas ao ambiente, muitas vezesmaiores que o custo ambiental da fa-bricação e disposição final de umaembalagem adequada”.

Do cimento às embalagens, todosos setores buscam a excelência emprodutos e sistemas menos tóxicos eque gastem menos energia. Iniciati-vas por um mundo mais voltado paraos conceitos de tecnologia limpa sãoincentivadas, inclusive, pela Organi-zação das Nações Unidas (ONU).Desde 1995 a capital gaúcha, PortoAlegre, é a sede brasileira do CentroNacional de Tecnologias Limpas(CNTL), fundado com o apoio daOrganização das Nações Unidas para

Papelão reciclável substituicaixas de madeira para tomates

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nemia, mais conhecida como icteríciafisiológica, causada pela incapacidadede o organismo do bebê eliminar a bi-lirrubina do sangue. Em condiçõesnormais, esse pigmento biliar é filtra-do pela placenta ou eliminado pelo fí-gado. Nos casos mais graves, a icterí-cia pode causar danos ao sistema

TECNOLOGIA

BIOENGENHARIA

WANDA JORGE

Um dos produtos pioneiros de-senvolvidos dentro do Progra-

ma de Inovação Tecnológica em Pe-quenas Empresas (PIPE) está prontopara entrar no mercado. É a manta pa-ra fototerapia em recém-nascidos daempresa Komlux, de Campinas. Como nome comercial de Blanket Lux, oequipamento aguarda apenas a certi-ficação do Ministério da Saúde, quevai fazer a última fiscalização no novoprédio construído pela empresa. AKomlux também se prepara para a cer-tificação ISO 9000, um pré-requisitopara obter a marca CE, da Comuni-dade Econômica Européia. “A expec-tativa é abrir um profícuo mercado naárea médica brasileira e também noexterior”, diz Cícero Lívio Omegna deSouza Filho, diretor-proprietário daempresa, que já recebe pedidos paraentrega em março deste ano.

A Blanket Lux é uma manta teci-da com fibras ópticas que emite luzazul para tratamento fototerápico derecém-nascidos com hiperbilirrubi-

A Komlux finalizou oBlanket Luz,equipamentopara o tratamento da icterícia,doença que atinge 200 mil bebês por ano no Brasil

nervoso central e surdez, sendo o efei-to mais visível a presença do tomamarelado na pele. A icterícia é co-mum no Brasil e afeta cerca de 5% dototal de crianças nascidas a cada ano,o que equivale a 200 mil bebês.

A fototerapia é o tratamento maisutilizado atualmente para eliminar a

Saúdena mantaazul

Trajetória exemplarCícero Omegna Filho sonhava ser

engenheiro, mas acabou se formandoem análise de sistemas. Ele viu omundo das fibras ópticas entrar emsua vida a partir do estágio que fezem 1977 como técnico em eletrônicano Instituto de Física da Unicamp.Em 1986 a Komlux nascia no porãode sua casa e tinha como sócio o en-genheiro mecânico Marco Kairala. Aempresa foi formada para produzirponteiras odontológicas para fotopo-limerização, equipamento que secaem segundos a massa utilizada na re-construção dentária. Esse projeto foi

posteriormente vendido para a mul-tinacional 3M, e a sociedade desfeita.Omegna Filho continuou com aKomlux e ganhou um fôlego de trêsmeses ao fechar um contrato de pres-tação de serviços com a Elebra, tam-bém de Campinas, onde já trabalha-va na área de produção de fibraóptica para telecomunicações. Masos sucessivos planos econômicos dei-xaram a empresa à míngua e, em1993, apenas três funcionários havi-am sobrado dos dez existentes em1989. Naquele ano, Omegna Filho foipara os Estados Unidos prospectar

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 63

próximas para nãoprovocar queima-duras, o calor pro-voca desconfortoe o bebê permane-ce mais tempo nohospital.

A manta resol-ve muitos dessesinconvenientes:pode ser usada di-retamente sobre apele do bebê, é pe-quena, acoplada aum fio de fibrasque fica distantedo corpo, diminu-indo riscos. Alémdo conforto, reduzcustos hospitala-res, filtra o calor eas faixas indesejá-

veis do espectro da luz, sobretudo a in-fravermelha e a ultravioleta, deixandopassar apenas a azul, que resolve oproblema da bilirrubina.

Manta portátil – A inovação da mantaé que ela foi fabricada com fibras óp-ticas modificadas. Elas emitem luz la-

teralmente de forma controlada aolongo da manta. Com a manta fotote-rápica não existe a necessidade de in-terromper o tratamento para amamen-tação, como no sistema convencional.Ela é portátil e pode ser usada emcasa. “A grande vantagem da manta éque ela pode ser usada dentro da in-cubadora em casos de bebês prematu-ros, por exemplo”, afirma o professorFernando Facchini, do Centro de As-sistência Integral à Saúde da Mulher(Caism) da Universidade Estadual deCampinas (Unicamp). Aliás, a idéiade produzir a manta foi dele. “Eu es-tava interessado em usar uma mantade fibra óptica – já existente no exte-rior – e procurava alguma forma deproduzi-la no Brasil. Aí eu procurei oCentro de Bioengenharia da Unicampe eles me indicaram a Komlux.”

O desafio de produzir o equipa-mento nacional foi lançado em 1997.Foram dois anos e meio de pesquisase seis meses para o lançamento.“A man-ta está apta para os berçários do país edo exterior”, diz Omegna Filho. Opreço está estimado em R$ 3,3 mil, in-cluindo a distribuição do produto,enquanto o similar japonês Homedacusta US$ 4 mil. O tratamento con-vencional, com fototerapia halógena,fica entre R$ 2 mil e R$ 4 mil.

No segundo semestre, quandoOmegna Filho espera estar com o sis-tema de comercialização da manta

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bilirrubina.A luz decompõe a substân-cia, que é eliminada pelo organismo.Mas os inconvenientes são grandes:durante horas ou dias, o bebê permane-ce no berço, apenas com fralda e olhosvendados, submetido à luz que sai delâmpadas fluorescentes ou halógenas.As lâmpadas não podem ficar muito

Manta tecida comfibras ópticas éusada diretamentesobre a pele do bebêsem provocar calor

“A chegada dos pesquisadores pos-sibilitou dar uma guinada na especia-lização da empresa, que saiu das tele-comunicações para a área biomédica”,diz Omegna Filho. Nessa mesma épo-ca, entre 1994 e 1995, teve início o de-senvolvimento do produto com o apoiodo Ministério da Ciência e Tecnologia(MCT), por meio do Programa deApoio ao Desenvolvimento Científicoe Tecnológico. Omegna Filho fez par-te do Grupo Técnico de Instrumenta-ção do MCT por dois anos, o que lhepermitiu visitar várias universidadese entender suas demandas.

Abriu as portas de sua empresapara a cultura da pesquisa. Conseguiu

do Programa de Capacitação de Re-cursos Humanos para Atividades Es-tratégicas, do MCT, seis bolsas para aKomlux. Naquele momento, já come-çava a ficar evidente para OmegnaFilho a primeira conclusão dessasparcerias: “Não adianta direcionar re-cursos exclusivamente para equipa-mentos e plantas industriais, é funda-mental formar pessoas”. A segundaveio agora, quando se prepara para ogrande desafio da comercialização edivulgação da manta. “Minha empre-sa sempre teve uma relação umbilicalcom a universidade e a pesquisa e,certamente, pelas próprias pernasnão teria resistido.”

novos negócios. E quase ficou por láporque recebeu um convite do con-sultor de empresas Abraham Szulepara que montasse sua empresa emterritório norte-americano.

Mas, uma semana após voltar aCampinas, foi procurado por pes-quisadores da Unicamp e da Unifesppara desenvolver os endoscópiosaplicados à Medicina. Até então, suaexperiência com esses equipamentoslimitava-se aos de modelo rígido,para atender às encomendas da em-presa Iochpe-Maxion, utilizadospara inspecionar o interior da câma-ra de combustão de motores dieselusados em tratores.

Page 63: Poluição de longo alcance

consolidado e já su-perada a fase de qua-lificação, a expectati-va é vender toda acapacidade de produ-ção da Komlux, que éde 50 conjuntos (man-ta mais fonte de luz)por mês.“Na verdade,diante da receptivida-de que temos alcan-çado com o produto,acreditamos que a de-manda será bem mai-or que esse volume.”

A Blanket Lux foiapresentada aos par-ticipantes do XVIICongresso Brasileiro de Perinatolo-gia, realizado em Florianópolis (SC),em novembro do ano passado. “Suaestréia ao público especializado tevemuito sucesso e provocou interesse demercado em nichos que ainda nemhavíamos cogitado”, diz Omegna Fi-lho. É o caso de uma grande coopera-tiva de saúde, que identificou na man-ta a solução de seus problemas deprolongamento da internação nasmaternidades, uma vez que o uso do-méstico do produto já é uma práticautilizada nos Estados Unidos, onde re-cebe o nome de biliblanket.

Novo produto - A Komlux tambémdesenvolve dois tipos de videoendos-cópio, um com haste rígida para apli-cação em otorrinolaringologia (nariz,ouvido e garganta) e outro flexível,para investigação clínica do estômagoe do intestino. Os dois projetos tam-bém têm apoio do PIPE. O endoscó-pio é um instrumento que permite aobservação de locais com acesso limita-do. A maior utilização é na medicina,para visualizar cavidades do corpo.

O endoscópio da Komlux estaráacoplado a uma câmara de vídeo, per-mitindo o registro das imagens em fi-tas de vídeo para futuras análises oupara banco de dados. A redução dospreços de câmeras, monitores e grava-dores de vídeo, bem como de acessó-rios para digitalizar imagens e mani-pulá-las em microcomputadores,viabilizou o uso em larga escala.

Segundo Omegna, a estimativa évender de 50 a 100 conjuntos por mêsdo videoendoscópio com haste rígida,quando for lançado comercialmenteem 2003. O preço também prometeser competitivo. O endoscópio e todoo sistema de vídeo da Komlux custaráde R$ 3,5 mil a R$ 4 mil, enquanto seusimilar hoje custa o dobro: só o siste-ma de câmeras está em R$ 3,5 mil.

O otimismo de Omegna Filho fun-damenta-se em números. A empresafatura hoje em torno de R$ 180 milpor mês, depois de quase ter dobradosua receita em um ano e meio. Asperspectivas para o mercado de fibrasópticas, onde atua com uma linha de200 produtos, só crescem.

Quando o professor Hugo Frang-nito, do Instituto de Física da Uni-

camp, e os professoresPedro Mangabeira Al-bernaz e Aníbal Ar-raes, da UniversidadeFederal de São Paulo(Unifesp), procurarama Komlux para desen-volver o videoendos-cópio para aplicaçãoem otorrinolaringolo-gia, eles queriam sim-plificar a aparelhagemexistente. A alternativada Komlux é um equi-pamento parecido comuma caneta, com mi-crocâmeras que cap-tam e enviam ima-

gens para um monitor de vídeo oucomputador, onde serão analisadas.Ele terá modelos para várias especiali-dades. O aparelho para a boca já estápronto e para ouvido e laringe estáem andamento. Outro equipamentopronto, fruto de desdobramento dapesquisa, é o intra-oral, para auxiliaro dentista em várias funções.

A pesquisa desenvolvida pelaKomlux para montar um protótipode endoscópios flexíveis, destinados aexames de esôfago, estômago e intesti-no, está sendo realizada em parceriacom o Centro de Diagnóstico em Do-enças do Aparelho Digestivo (Gastro-centro) da Unicamp.

Manter a fibra - Os resultados maisimediatos desses projetos são a novafábrica em Campinas, com 1,1 milm2, quase o dobro do antigo espaço,de 600 m2, e aumento no número defuncionários, de 19 para 40. MasOmegna Filho sabe que, sozinho, nãoconseguirá entrar nesse mercado do-minado por multinacionais. “Creioque não devemos gastar energia paradisputar o mercado distribuidor comempresas já estabelecidas. Prefiro man-ter nossa identidade na área de de-senvolvimento e aplicações de fibrasópticas”, diz. Ele acrescenta que, des-de a fase embrionária dos projetos, jácomeça a buscar parceiros e clientespara que o produto tenha condiçõesde entrar no mercado tão logo saia dafase de protótipo. •

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Videoendoscópio sob encomenda: aparelhagem mais simples de manusear

OS PROJETOS

Projeto e Desenvolvimento de Equipamento para Fototerapia Neonatal baseado em Fibra Óptica Corrugada Desenvolvimento de Videoendoscópiocom Óptica Gradiente

MODALIDADE

Programa de Inovação Tecnológicaem Pequenas Empresas (PIPE)

COORDENADOR

CÍCERO LÍVIO OMEGNA DE SOUZA FILHO –Komlux

INVESTIMENTOS

R$ 169.209,40 e US$ 125.296,00 (manta) e R$ 167.287,00 e US$ 79.500,00 (videoendoscópio)

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Page 64: Poluição de longo alcance

Agora você tem 3 oportunidades para inscrever o seu projeto no PIPE – Programa de Inovação Tecnológica em

Pequenas Empresas – até 31 de março, 31 de julho e 30 de novembro. A FAPESP oferece financiamento para

projetos de pesquisas de empresas com até 100 funcionários, sediadas no estado de São Paulo. A proposta

deve descrever claramente a inovação tecnológica pretendida, seja em produtos, processos ou serviços, a

viabilidade comercial e a metodologia a ser usada.

A primeira fase do PIPE, com duração de 6 meses e financiamento de até R$ 75 mil, é focada na pesquisa de

viabilidade técnica da inovação proposta. A segunda fase, com duração de até 2 anos e financiamento de até

R$ 300 mil, destina-se propriamente ao desenvolvimento do projeto de pesquisa.

Acesse www.fapesp.br/pipe.htm e consiga mais informações. Se preferir, escreva para [email protected]

Milhares de boas idéias nunca saíram do lugarpela falta de um mero detalhe: financiamento.

Secretaria daCiência, Tecnologiae DesenvolvimentoEconômico

Rua Pio XI, 1500 - Alto da Lapa05468-901 - São Paulo - SPTel.: (11) 3838-4000www.fapesp.br

Page 65: Poluição de longo alcance

elétrica geradas pelos gases são trans-formadas em padrões, armazenados nobanco de dados. As informações sãointerpretadas por sistemas de redes neu-rais, “treinados” pela equipe de inteli-gência artificial da UFPE para reco-nhecer os odores correspondentes aosdiversos gráficos de condutividade.

Diferença imperceptível – O projetocomeçou com a detecção de odores deprodutos mais simples em termosmoleculares, como os solventes orgâ-nicos etanol e metanol. “São substân-cias de diferenças imperceptíveis aoolfato humano, mas uma delas, o me-tanol, pode matar”, destaca o físicoFrancisco Luiz dos Santos, da Unicap.

Com o sucesso da experiência, ogrupo passou a distinguir eletronica-mente diferentes tipos de vinho –branco, tinto e rosé. O nariz artificialconseguiu também diferenciar vinhode uísque, até que os cientistas decidi-ram testar a identificação de vinhostintos nacionais das safras de 1995,1996 e 1997. Os mais novos têm maiorteor de dióxido de enxofre, detectado

pelo sensor.“O desafio tecnológico foiformar padrões nítidos para as dife-rentes safras”, diz Santos. O sistemateve 90% de acerto. Os resultados, quejá renderam uma tese de mestrado eduas de doutorado, foram publicadosna revista científica Synthetic Metals.

A tecnologia de narizes eletrônicosestá entre as que mais crescem nomundo, acompanhando a efervescên-cia científica no setor de polímeros.As propriedades elétricas desses mate-riais deram, em 2000, o Prêmio Nobelde Química a cientistas japoneses enorte-americanos. Das indústrias ali-mentícias ao auxílio no diagnósticode doenças associadas a odores exala-dos pelo organismo, são inúmeras asaplicações da tecnologia. No Brasil, ofoco, agora, é o setor petrolífero. Umacentral de gás com painel de controlefoi instalada em novembro do anopassado na Unicap, ao custo de R$ 30mil, para verificar a sensibilidade dossensores ao metano, etano, butano,propano e monóxido de carbono. Sãogases explosivos e tóxicos, alguns ino-doros ao ser humano. Engenheiros

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TECNOLOGIA

ENGENHARIA QUÍMICA

Pesquisadores pernambucanosconseguiram, há dois anos, ana-

lisar eletronicamente e identificar,com o auxílio do computador, os aro-mas e as safras de diferentes tipos devinho. Totalmente nacional, a tecno-logia, já aperfeiçoada e dominada emtodas as fases, está sendo adaptadapara a detecção de gases tóxicos e ex-plosivos em plataformas e refinariasde petróleo. Com recursos de R$ 1milhão, repassados em 2001, o narizeletrônico, fruto de parceria entre aUniversidade Católica de Pernambu-co (Unicap) e a Universidade Federalde Pernambuco (UFPE), está entre osprincipais projetos aprovados pelofundo setorial do petróleo, o CTPetro.

A união entre eletrônica e “olfato”se dá por meio de polímeros conduto-res de eletricidade, materiais que alte-ram a resistência elétrica na presençade gases. A equipe do Laboratório dePolímeros da Unicap utiliza o polipirrol,dopado com reagentes que lhe confe-rem propriedades elétricas em tempe-ratura ambiente. O material é deposi-tado sobre lâminas de vidro condutor– os sensores do nariz eletrônico. “Ainovação está em projetar a melhorfórmula desses reagentes”, afirma oengenheiro químico Edson Gomes deSouza, da Unicap. Cada lâmina é co-nectada por fios a um aparelho medi-dor de corrente elétrica, ligado a umcomputador que armazena as medi-ções. O sistema para a coleta de dadosfoi desenvolvido na universidade per-nambucana, por intermédio de umsoftware de linguagem gráfica, o Lab-View. As alterações de condutividade

Setor petrolífero investeem sensor portátilpara áreas de risco

Fonte de recursos para universidadesPernambuco não produz petróleo,

mas está na linha de frente das pesqui-sas com esse combustível e seus deriva-dos.A UFPE tem 20 projetos aprovadospela Financiadora de Estudos e Pro-jetos (Finep) e pelo Conselho Nacio-nal de Desenvolvimento Científico eTecnológico (CNPq), com recursos deR$ 5 milhões do CTPetro. Outros seissão cooperativos, conduzidos em vá-rios Estados do Norte e Nordeste, sobcoordenação da universidade pernam-bucana. Como ocorre com o narizeletrônico, vários grupos estão dire-

cionando as pesquisas para o setor depetróleo e gás natural, dono de umadas maiores fontes de recursos para uni-versidades. “Nunca recebemos tantodinheiro”,comemora o engenheiro quí-mico César Abreu, coordenador doLaboratório de Processo Catalítico daUFPE. Só o Departamento de Enge-nharia Química, responsável pelo la-boratório, desenvolve 13 projetos, novalor de R$ 3,7 milhões.

Um dos mais importantes é a re-forma catalítica do gás natural, tec-nologia baseada em reações químicas

Nariz artificial detecta gases

Page 66: Poluição de longo alcance

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 67

químicos estão aperfeiçoando a ar-quitetura dos tubos de testes e utili-zando novos reagentes. O objetivo éaumentar de oito para 30 o número desensores contidos no nariz artificial,que no futuro será usado para detec-tar com rapidez e precisão.

Novo modelo – Ao mesmo tempo, ospesquisadores pernambucanos desen-volvem a terceira geração de narizesartificiais. Trata-se de um protótipoportátil, capaz de ser transportado emáreas industriais de risco. O programade miniaturização do “nariz” tem R$500 mil do CTPetro. Todos os progra-mas de inteligência artificial estãosendo adaptados para o novo modelo.O protótipo anterior funcionava den-tro de uma pasta tipo executivo, quetinha computador laptop e aparelhocoletor de gases com os sensores. Nanova versão, a tela do laptop é substi-tuída por um mini-display de cristal lí-quido, e o processador do computador,por um chip microcontrolador. O obje-tivo é processar os dados on-line paraidentificação imediata dos gases. “Já te-mos a tecnologia. Nosso atraso é co-mercial”, diz Santos.

O processo, do começo ao fim, foidesenvolvido no país. Tudo começou hásete anos, quando a mulher do físico, aanalista de sistemas Marizete Silva San-tos, da UFPE, concluía a tese de mes-

trado sobre centrais multimídia paraatendimento público.“Esses aparelhoscomeçavam a reproduzir sentidos hu-manos, como a visão, a audição e o tato,mas faltava o olfato”, conta Santos.“Co-mo físico, assumi o compromisso de en-contrar uma solução.” O assunto esta-va em estudo nos Estados Unidos e naEuropa, mas a literatura era rara.A des-coberta aconteceu por acaso. Como tra-balhava com polímeros condutores deeletricidade, o físico decidiu borrifarálcool sobre alguns deles para saber oque acontecia. Verificou a mudança naresistência elétrica. E começou a mon-tar o primeiro e rudimentar protótipo,fixando o material em agulhas de serin-gas de injeção. Como acontecia no Ja-pão na era dos transistores, pacientese cuidadosas estagiárias juntavam aspontas das agulhas sob o microscópio.Mas nada daquilo era novidade.“Sou-bemos que já existiam protótipos dogênero na Inglaterra”, ressalta Santos.Foi melhor assim. “Isolados no Nor-deste, começamos o trabalho do zero ehoje estamos na vanguarda.” •

Nariz eletrônico conectado a laptop consegue diferenciar vinho de uísque em testes na Universidade Católica de Pernambuco

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para transformar o produto em subs-tâncias de maior valor agregado.Atualmente, o gás natural é utilizadosomente em processos de queima, nacombustão de automóveis ou na ge-ração de calor e energia. Mas tem uti-lidades mais nobres. Associado aodióxido de carbono – poluente elimi-nado pelas chaminés das usinas deálcool –, gera monóxido de carbonoe hidrogênio. Eles são matéria-primapara produzir combustíveis líquidos,como gasolina sintética, metanol,hidrocarbonetos pesados e hidrogê-nio. “Na forma líquida, os combus-tíveis geram menos riscos no trans-porte e armazenamento”, diz Abreu.

Page 67: Poluição de longo alcance

Assim nasceu o projeto. Para co-meçar, era preciso usar um materialde fácil acesso e baixo custo. Foi esco-lhido o vidro reciclado e moído, parafuncionar como meio poroso. “Todosos outros materiais, cerâmica, metais,polímeros, são mais caros”, afirma As-sis. As garrafas, coletadas em lugarespúblicos, foram quebradas e moídasnuma escala de 10 mícrons – mícroné a milésima parte do milímetro –,compactadas e sinterizadas, ou seja, aspartículas foram reagrupadas poraquecimento formando um novo ma-terial. As membranas resultantes fica-ram com o formato de uma pequenabolacha circular cheia de poros, tendode 0,6 a 4 milímetros de espessura por

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mero de partículas baixa para 14 milpor m3. E um grau ainda melhor seriachegar aos 99,9999%, o que deixaria aágua com 140 partículas por m3.

Maior eficiência - Missão até hoje nãocumprida porque, devido à impossi-bilidade de retenção de alguns poluen-tes na água, os custos com tratamentopodem crescer 400% para uma me-lhoria mínima de eficiência. “Quandocomeçamos a trabalhar no assunto,em 1999, estávamos atrás de um siste-ma que tornasse possível tanto bara-tear a filtragem quanto melhorar suaeficiência, principalmente para a re-moção de resíduos deixados por agro-tóxicos”, relata Assis.

TECNOLOGIA

ENGENHARIA DE MATERIAIS

s empreendimentosrurais somam cercade 5,8 milhões noBrasil, dos quais 4,3milhões praticam a

agricultura de subsistência. Eles exer-cem enorme pressão sobre o lençolfreático, devido à existência de fossassépticas, pocilgas e matadouros, alémde grandes lavouras que depositamagrotóxicos no solo. A água, nesses ca-sos, pode contaminar e poluir os riose o subsolo. Com essa preocupação, ofísico especializado em engenharia demateriais Odílio Benedito Garrido deAssis, da Embrapa InstrumentaçãoAgropecuária, sediada em São Carlos,acaba de encerrar um projeto que lan-ça as bases para o barateamento eaprimoramento dos processos de fil-tragem de água no meio rural.

Assis começou o estudo pela aná-lise de dados que mostravam que,nos lugares poluídos, a água pode tercerca de 140 milhões de partículas depoluentes por metro cúbico (m3). Umproblema para o qual os melhores sis-temas convencionais de purificaçãoconseguem remover em torno de90% a 98%, explica Assis, índice atébem aceitável em termos mundiais.

Mas a parte restante dessa emprei-tada é árdua. Os 2% a 10% de poluen-tes que sobram na água podem signi-ficar milhões de partículas. Limpar aágua numa faixa de 50% a 90% é rela-tivamente fácil, diz Assis. A partir daí,os ganhos de eficiência começam a sermedidos em unidades cada vez maiscurtas e igualmente mais caras. Com99,99% de filtragem eficiente, o nú-

Vidro reciclado e moído é base de composto testado para remover resíduos de agrotóxicos

Filtro inovador na agricultura

EDU

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DO

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A membrana temporos que medemde 8 a 16 mícrons de diâmetro

Page 68: Poluição de longo alcance

3 a 4 centímetros de diâmetro. Os po-ros estão num intervalo de 8 a 16 mí-crons de diâmetro.

Nova fase - Essas membranas foram omaterial da primeira fase de testes,chamada de filtragem mecânica, istoé, capaz de reter partículas apenascomo obstáculo físico. “Toda partícu-la que fosse maior do que os poros se-ria retida”, explica Assis. Mas as bacté-rias e os componentes químicos sãogeralmente ainda menores que os po-ros das membranas. Os primeiros tes-tes mostraram que novos arranjos pre-cisavam ser feitos. Uma nova fase seiniciou num encontro deAssis com o professor Sér-gio Campana Filho, do de-partamento de Química eFísico-Química de Macro-moléculas do Instituto deQuímica da Universidadede São Paulo (USP), emSão Carlos. Desde 1993,Campana pesquisa compos-tos químicos que revelampotencial para estabelecerligações com vários ele-mentos, entre eles metaispesados, resíduos deixadospelos agrotóxicos e atéradioisótopos. “Nada exa-tamente novo como idéia,mas pouco explorado emtermos práticos, pois re-quer muito estudo e ex-perimentação”, acrescenta Campana.

A junção dessas linhas de pesquisafoi o que tornou o trabalho inovador,com direito a uma apresentação dosresultados por Assis como palestranteconvidado, no ano passado, no work-shop Fronteiras da Ciência dos Mate-riais, em Trieste, na Itália. Além disso,o trabalho ganhou as páginas de pu-blicações científicas internacionais.“Nosso plano foi adicionar ao filtromecânico uma função bioquímica,recobrindo a membrana de vidrocom filmes em que houvesse elemen-tos químicos que reagissem de formaespecífica com os poluentes em meioaquoso”, lembra Campana.

Alguns desses agentes testados fo-ram a lisozima, uma enzima natural

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 69

de origem animal que, em contato comas bactérias, destrói a camada prote-tora desses microrganismos. Nessamembrana de vidro também podemser adicionados alguns tipos de polis-sacarídeos – cadeias de moléculas deaçúcares – como a quitosana, um pro-duto obtido pelo processamento daquitina, matéria-prima tirada da cas-ca de crustáceos, que reage fortemen-te com metais pesados, e a carboxime-tilcelulose, que cumpre a função desolubilizar os componentes testados.

Numa série de experimentos reali-zados, sempre em escala de laborató-rio, os pesquisadores fizeram passar

água contaminada pelabactéria Escherichia colipor uma membrana pro-cessada sem qualquer re-cobrimento. Depois repe-tiram a operação, masusando membrana reco-berta com lisozima. “Osresultados foram impres-sionantes”, destaca Assis.“As placas em que asamostras foram coletadasmostram dois extremos.Sem lisozima, o grau depermanência da bactériafoi de 70% a 92%. Já coma enzima, os resultadostambém variaram, masem um dos experimentosa taxa de eliminação ficoupróxima de 90%.”

Efeitos residuais - Segundo Assis, osresultados mais promissores foramobtidos com quitosana, que reagiu,ainda em níveis baixos, aos agrotóxi-cos. “Isso foi muito importante paraconstatar a possibilidade de interaçãocom agrotóxicos”, diz Campana. Se-gundo Assis, o maior problema é afuncionalidade dos agrotóxicos. Paramostrar resultados econômicos, “elessão feitos para não reagir aos elemen-tos que os dissolvem, por isso seusefeitos residuais são tão poderosos”.Nos testes feitos no âmbito do projetode membranas porosas, o grau de re-ação aos poros, e a conseqüente elimi-nação dos poluentes, foi da ordem de12%, aquém dos índices esperados.

O PROJETO

Desenvolvimento de MembranasPermoseletivas Bioativadas paraEmprego na Descontaminação de Águas Contaminadas

MODALIDADE

Linha regular de auxílio à pesquisa

COORDENADOR

ODÍLIO BENEDITO GARRIDO DE ASSIS –Embrapa

INVESTIMENTO

R$ 40.199,76 e US$ 22.652,00

EDU

AR

DO

CES

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Filtro: menos bactérias

Apesar de esse experimento reve-lar baixo índice de eficiência, os pes-quisadores recarregaram suas bateri-as, tanto na Embrapa InstrumentaçãoAgropecuária quanto no Instituto deQuímica da USP. Eles têm agora novealunos trabalhando em pesquisas quecomplementam o projeto inicial, trêsem níveis de doutorado e seis de mes-trado. “Precisamos ver novas reações,testar em escalas maiores”, diz Cam-pana. Uma idéia é montar um filtrofeito somente de quitosana comparti-mentada. “Nos testes aqui na USP vi-mos que a quitosana tem uma capa-cidade muito grande de absorverbactérias. Precisamos desenvolver ma-neiras de, uma vez montado esse fil-tro, formularmos soluções para a ma-nutenção do seu formato, já que emcontato com meio ácido a quitosanase desfaz. Quando conseguirmos esseformato, poderemos usar o filtro dequitosana centenas de vezes, pois bas-tará eliminar o estoque de bactériasque ele é capaz de estocar.”

Polpa frágil - Para Assis, já existe outrocaminho para seus estudos. Segundoele, as membranas mostraram que,além de filtrar, funcionam tambémcomo sensores. Isso quer dizer que po-derão indicar a presença de elementosquímicos indesejáveis em meios di-versos como alimentos que tenhammassa permeável ou polpa na formade massa, como tomates e morangos,pela interação direta com os filmesativos imobilizados sobre superfíciesvítreas. Entre esses agentes contami-nantes estão os compostos organofos-forados, que são cancerígenos. •

Page 69: Poluição de longo alcance

Projeto cria banco de dados para analisar e prever resultados da inserção brasileira na globalização

70 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

HUMANIDADES

CIÊNCIAS ECONÔMICAS euforia neoliberal dos anos 80/90 não faz maisdogmas. Os mandamentos do novo capitalismo

produziram ao longo da década efeitos reais,palpáveis. Eles são “lidos” tanto nas séries his-tóricas e nos indicadores macro e microeco-

nômicos como nas imagens reais dos miseráveis. No Brasil,depois de mais de uma década de um processo de inserçãoglobal que estabilizou a economia, mas deixou um rastroenorme de perdas, já é possível desenhar o DNA da interna-cionalização. Os contrários a esse modelo já podem se de-fender dos rótulos simplistas de “neobobos”.

O projeto temático Liberalização, estabilidade e cresci-mento: balanço e perspectivas da experiência brasileira nosanos 90, realizado por economistas da Universidade Estadu-al de Campinas (Unicamp), é quase um genoma da econo-mia brasileira. Coordenado pelo economista Luiz Gonzagade Mello Belluzzo e com a subcoordenação de Ricardo deMedeiros Carneiro, o projeto, financiado pela FAPESP, re-sultará ao seu final num banco de dados capaz de alimentaranálises e previsões de médio e curto prazos sobre os resul-tados da inserção brasileira no mercado global. O projeto

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O genoma da

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também mobiliza especialistas de dentro e de fora das uni-versidades para analisar esse período.

Os “de fora”, segundo Belluzzo, cumprem o papel de evi-tar “a reiteração das próprias hipóteses do grupo”, isto é,exercem um papel crítico em relação às formulações dospesquisadores. Isso garante a honestidade científica no tra-tamento dos dados colhidos pela equipe do projeto, embo-ra não seja uma vacina contra o mau uso desses dados poroutros agentes. “Em economia é possível torturar os dadosaté que eles digam o que você quer ouvir. Isso é ideológico,mas também uma desonestidade científica”, diz.

Em fase final de testes, o banco de dados já dispõe deaproximadamente 7,5 mil séries econômicas, 220 publica-ções e 41 instituições. No futuro, ele estará disponível paratoda a comunidade acadêmicada Unicamp. O trabalho de for-mulação de hipóteses e a pró-pria concepção do banco de da-dos, além dos seminários feitosentre a equipe e com professoresconvidados, já resultaram num

Bolsa de Valores de São Paulo e fábrica da Renault

no Paraná: estabilização e globalização, mas

com perdas enormes

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Page 70: Poluição de longo alcance

economia brasileira

Page 71: Poluição de longo alcance

trabalho bastante avançado de diagnóstico da economiabrasileira na última década. Mais do que isso, está dandosuporte para a discussão de propostas alternativas demodelo econômico, também um papel da universidade.

O projeto de diagnóstico da economia brasileira tem,na sua origem, um trabalho feito por Belluzzo e por Ma-ria da Conceição Tavares para a Comissão Econômica daOrganização das Nações Unidas para América Latina eCaribe (Cepal) e para o Instituto de Pesquisa EconômicaAplicada (Ipea), intitulado Desenvolvimento no Brasil: re-lembrando um velho tema, e a tese de livre-docência deCarneiro, ambos bastante definidos sobre o processo deintegração brasileiro.

as hipóteses levantadas nos dois trabalhosque originaram esse projeto, a equipe já con-seguiu comprovar várias delas. Os estudosfeitos sobre a base de dados de dez anosconstatam uma completa distorção do câm-

bio e dos juros. O subprojeto que estuda o tema empregoe salário chegou à conclusão de que a aprovação da propos-ta de flexibilização das leis trabalhistas, na verdade, ape-nas institucionalizará uma informalização do trabalho quejá ocorreu na prática. O acompanhamento das fusões e dasincorporações de empresas, ao longo do período de inser-ção na economia global, mostra, segundo Belluzzo, que oBrasil seguiu ipsis litteris a tendência mundial, impondo umaacelerada desnacionalização da economia brasileira.

Já no trabalho para a Cepal, Belluzzo e Conceição alinha-varam os pontos de estrangulamento do modelo brasileirode inserção – sem, no entanto, assumirem suas críticas comooposição pura e simples ao projeto de globalização. “Nãoé uma recusa à inserção, que é inevitável, mas à formacomo ela está sendo feita”, diz Belluzzo.“A globalização é umlocus de oportunidade e, ao mesmo tempo, de bloqueios– os resultados dependem de como você decide a sua in-serção no processo global.” Os exemplos de que os proble-mas estruturais originários da forma de inserção brasileirapoderiam ser evitados são a China e a Índia. “Na épocaem que escrevemos esse estudo, não estavam ainda tãoclaros os acertos dos dois países. Hoje o Banco Mundialos incensa, dizendo que fizeram a in-serção correta.”

Belluzzo e Conceição consideraramdefinitiva a mudança que ocorreu nospadrões de concorrências e nas estra-tégias de localização das empresastransnacionais e a predominância daentrada de capital mais volátil no mer-cado periférico. Também rejeitaramcomo anacrônico o modelo desenvol-vimentista dos anos 50/60, de substitu-ição de importações. Mas constataramos prejuízos decorrentes da entrada doBrasil sem defesas nesse novo patamarda economia internacional.

A aceitação plena do mercado livre e da abertura in-condicional, por exemplo, pode ter produzido o efeito deum grande ganho de competitividade para algumas em-presas brasileiras, concorda Belluzzo. Mas os númerosmostram que, do ponto de vista do perfil industrial bra-sileiro, houve uma “regressão relativa”, isto é, perto doavanço dos demais países, o Brasil andou menos.

Da mesma forma, a convicção, embutida no Consensode Washington, de que as taxas flutuantes de câmbio garan-tem maior estabilidade que as fixas, tornaram a economiamais sujeita a sobressaltos, além do efeito que elas têm so-bre os preços. Um movimento muito pequeno das taxaspode deixar o exportador de um país periférico entre oprejuízo e o lucro. Isso cria uma grande incerteza no de-sempenho da balança comercial. “Para os que entraramde cabeça na etapa gloriosa da globalização, este é umproblema particularmente grave”, observa Belluzzo.

Da mesma forma, as privatizações sem regras e aabertura da economia sem controle produziram outradistorção estrutural: as empresas sediadas no Brasil têm,em geral, um grande déficit em sua balança comercial,isto é, desnacionalizaram a sua produção. Um surto dedesenvolvimento econômico, em vez de produzir superá-vits na balança comercial brasileira, pode torná-la maisdeficitária.

“As taxas de crescimento dos últimos anos desenhamuma montanha-russa”, compara Belluzzo. “Isso porque,freqüentemente, a economia encontra uma restrição se-vera do ponto de vista do balanço de pagamentos, que aca-ba obrigando o Banco Central a manejar a política mo-netária de maneira restritiva”, afirma. Um movimentocumulativo de desvalorização do real, por exemplo, podeprovocar uma mudança abrupta no portfólio dos agen-tes econômicos.

As pesquisas feitas na Unicamp comprovam tambémque a instabilidade financeira do Brasil – como da maio-ria dos países periféricos do Consenso de Washington – éregistrada em ciclos, que estão cada vez mais curtos. “Umpequeno ciclo de euforia é seguido por um de retração, eaí volta de novo, e no outro momento torna a refrear aeconomia por conta da miopia que toma o mercado de

curto prazo.” Os reflexos da crise ar-gentina sobre o Brasil, segundo ele,são um exemplo dessa variação cícli-ca, embalada pelos humores dos in-vestidores.

Seguir a expectativa do mercado,respondendo ora às expectativas dosinvestidores internacionais, ora às ne-cessidades dos agentes econômicos in-ternos, é um risco para os dois preços-chave da economia, câmbio e juros.“Já há uma certa convergência de opi-niões de que devemos proteger a taxade câmbio real”, diz o economista. AChina, por exemplo, fez uma grande

72 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

O PROJETO

Liberalização, estabilidade e crescimento: balanço e perspectivas da experiência brasileira nos anos 90

MODALIDADE

Projeto temático

COORDENADOR

LUIZ GONZAGA DE MELLO BELLUZZO –Unicamp

INVESTIMENTO

R$ 208.808,00

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desvalorização de sua moeda em 1994 – devastando ospaíses vizinhos – e passou a exportar o que pôde. “Oschineses perceberam que países daquele tamanho –como também do tamanho do Brasil e da Índia – nãopodem ter uma economia sem nenhum controle”, afirmao economista. O governo chinês adotou um controle se-letivo de capital externo que, ao ingressar no país, eraobrigado a obedecer a determinadas regras e a trabalharem consonância com a estratégia econômica de cresci-mento do governo local.

a opinião de Belluzo, é equivocado situar aglobalização como o grande vilão da histó-ria – mas é igualmente errado acreditarque as amarras do processo de inserçãobrasileiro são inexoráveis. “Nós entramos

com o pé errado e temos todas as condições para entrarcorretamente”, afirma o economista, deixando claro queessa é uma posição pessoal.

“Entrar errado”é aceitar sem críticas o discurso de libera-lização plena da economia.“No final dos anos 80, começo dosanos 90, havia uma grande pressão ideológica que se refletianos pronunciamentos empresari-ais e no comportamento da mí-dia”, lembra Belluzzo. “Houveuma idéia de rejeitar o passadocomo um erro fatal: o próprioGustavo Franco veio com a frasede que vínhamos de 40 anos deburrice”, diz.

O tempo, no entanto, mos-trou que o liberalismo sem controle dos países periféricosque levaram a ferro e fogo o Consenso de Washington erauma ingenuidade. As economias dos próprios países ricosnão são tão livres assim. “O mundo é uma combinação deprotecionismo e abertura.” Belluzzo remete à discussão so-bre a Alca. Os Estados Unidos estão no seu papel: queremo máximo de concessões do outros países envolvidos nanegociação e fazer o mínimo delas. “O Brasil, então, é aco-metido por uma oscilação moral: de um lado, os que sãocontra a Alca; de outro, os que são a favor”, diz. A questão,segundo o economista, não é aceitar as imposições dos Es-tados Unidos ou recusar o bloco comercial, mas “jogar ojogo”, isto é, conseguir o máximo de concessões dos outrospaíses e fazer o mínimo.

A necessidade de o Estado brasileiro assumir uma po-lítica ativa de desenvolvimento é a contraposição naturalàs distorções estruturais do modelo econômico atual. Noestudo de Belluzo e Conceição Tavares, eles concluemque o Estado deveria ter desempenhado um papel maisativo no decorrer do processo de liberalização da econo-mia, para criar instrumentos de poupança de longo pra-zo, fazer a reestruturação produtiva da empresa nacional,investir em produção de tecnologia e alterar a estruturade gastos públicos, de forma a reduzir a pobreza e a mádistribuição de renda.

PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 73

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Os dois autores reconhecem que as condições interna-cionais não favorecem uma mudança de rumo da econo-mia brasileira, mas, de outro lado, não acreditam no fôlegodo atual modelo. O Plano Real produziu resultados me-díocres e instáveis. Eles propõem um “projeto contra a cor-rente”, ao pregarem “uma intervenção mais forte, abran-gente e contínua do Estado Nacional e das instânciaspúblicas subnacionais”. Para eles, este é um papel do Es-tado – a sociedade civil e os movimentos sociais não po-dem ficar com a responsabilidade de construção de um“Estado do Bem-Estar”. •

Inserção brasileira deveria ter seguido

os modelos da Índia (acima) e China,agora elogiados pelo

Banco Mundial

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O Plano Real fez a opção pelo capital externo de cur-to prazo, apostou na melhora da eficiência dos investimen-tos públicos com a privatização; no investimento externopara equilíbrio do balanço de pagamentos; e na aberturacomercial como o desafio capaz de modernizar as em-presas nacionais. A conclusão do estudo é de que houve“perda de controle nacional sobre as empresas e os ban-cos” e a desarticulação dos “mecanismos de governança ede coordenação estratégica da economia brasileira”.

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HUMANIDADES

SOCIOLOGIA

Estudo explora a relação entre sociedade ecultura na metrópole

A São Paulodo meio do século 20

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 75

da cidade e estabelecendo uma novaordem de percepções que abriu espa-ço para uma consciência moderna. Ostrês focos engendram formas peculia-res de apreensão dessa nova realidade.

“A linguagem do Florestan é árdua,cheia de conceitos, mas à medida quefui trabalhando com a obra dele, per-cebi que as interpretações existentesnão davam conta do objeto. Ora eleaparecia como o grande revolucioná-rio socialista, ora ele era visto comoum funcionalista que mais tarde setorna marxista. Essas interpretaçõessão esquemáticas, não me satisfize-ram. Quando li seus primeiros escri-tos sobre a cidade de São Paulo, perce-

bi que ele apostava no que chamoude ‘sociedade moderna nos trópi-cos’, e São Paulo estava no centrodisso”, afirma. Por outro lado, o so-ciólogo estava preocupado em cons-truir uma linguagem científica, teó-rica, que conferisse legitimidadeacadêmica à disciplina. O tema dapesquisa foi sendo ampliado a partirda leitura da obra de Florestan. “Aospoucos fui percebendo que haviauma relação entre a linguagem daciência do Florestan e a poética nãoconteudística dos concretos: umaidéia de universalidade da lingua-gem, independente dos contextos”,afirma o pesquisador.

Em sua empresa de renovaçãoda linguagem poética, os concretosrecusaram o legado estetizante dageração anterior. Sua sintaxe se ba-

seava em premissas visuais, espaciais,desprezando o verso. O poema era en-carado como objeto de linguagem, co-mo técnica. Exprimia a sua própriaestrutura como objeto “em si e por simesmo”, refletindo os novos traços dasociabilidade urbana, numa metró-pole que se moderniza com a indús-tria, a sociedade de consumo, a pro-paganda. “Perseguiram uma poesia deanulação do tempo, de exclusão dahistória, de afirmação do presente”, es-creve Maria Arminda. Nas artes plás-ticas, o concretismo se insurgiu con-tra o figurativismo, concebendoformas e cores como dados eminente-mente visuais, universais, em detri-mento da expressão de conteúdos. A

de sistema. “A cultura em São Paulo émais fragmentada, menos orgânica doque em Minas. Tive dificuldades paraentendê-la como sistema”, afirma.Durante o andamento da pesquisa, anoção de linguagem revelou-se maisprodutiva, pois deu conta da plurali-dade cultural paulista. “A cultura doModernismo se caracteriza por lin-guagens fragmentadas, referidas aseus próprios termos. O que procurodemonstrar no livro é como essas lin-guagens estavam ligadas a um con-texto particular, a cidade de São Pau-lo, no momento que sua vida culturalse transformava profundamente.”

A partir do pós-guerra, certos ar-

Centro de São Paulo nos anos 50:encarando a cultura paulistana como uma questão urbana

tistas e intelectuais emergem, cons-truindo novas identidades. A aproxi-mação do problema da cultura nametrópole pela via da linguagem per-mitiu à autora articular os três focosque compõem sua reflexão, que surgemnessa época: o teatro de Jorge Andra-de, a sociologia de Florestan Fernan-des e a renovação poética empreendidapelas vanguardas concretistas, organi-zadas em torno de Haroldo de Cam-pos, Augusto de Campos e Décio Pig-natari. Esses três focos desenvolvemalgumas questões levantadas pelos in-telectuais do Modernismo, que foramos primeiros a encarar a cultura comouma questão urbana, dando expres-são estética à modernização da vida

partir da segunda metadedo século 20, a cidade deSão Paulo passou a ser opólo da modernidadecultural brasileira. A

industrialização, a imigração massiva,a institucionalização da vida universi-tária, a criação de museus, companhiasde teatro e cinema criaram uma atmos-fera cosmopolita, propícia ao debate eà proliferação de linguagens. Em vezde estudar esse período confrontandovisões diferentes de uma mesma ativi-dade cultural, a socióloga Maria Ar-minda do Nascimento Arruda escolheuo exame de experiências culturais ino-vadoras, aparentemente desvinculadasentre si, procurando estabelecer cor-respondências entre elas que permi-tissem mostrar como a sociedadeestá presente na cultura. Essa abor-dagem original faz de Metrópole eCultura – São Paulo no Meio SéculoXX (São Paulo, Edusc, 2001, 482 pá-ginas) um estudo sem precedentesna sociologia da cultura feita noBrasil. A pesquisa foi apresentadaoriginalmente como tese de livre-do-cência no Departamento de Socio-logia da FFLCH-USP.

Habituada a pensar as relaçõesentre cultura e sociedade sob umviés regional, Maria Arminda é au-tora de Mitologia da Mineiridade. OImaginário Mineiro na Vida Políticae Cultural do Brasil (São Paulo, Bra-siliense, 1990), estudo em que traba-lhou com material muito diverso –escritores como Carlos Drummondde Andrade, Fernando Sabino, Gui-marães Rosa, autores intérpretes deMinas e discursos políticos. “Conse-gui mostrar que havia uma relaçãomuito mais próxima do que se imagi-nava entre, por exemplo, a poesia deDrummond e o discurso de TancredoNeves, explicitando assim a presençada noção genérica de sistema cultu-ral”, explica a autora. No caso de Me-trópole e Cultura, Maria Arminda teveproblemas para lidar com o conceito

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imagem se torna autônoma, auto-referente, designando assim o tem-po presente, o próprio modo de vi-ver contemporâneo. A representa-ção se apaga, para que a presençase imponha.

A autora destaca o papel desem-penhado pela leitura do livro Vie-na Fin-de-Siècle, de Carl Schorske,uma importante fonte de sugestões.“Notei duas possíveis aproximaçõesentre a Viena do fim do século 19 ea São Paulo de meados do século20: havia uma dinâmica culturalmuito viva, em dois contextos peri-féricos. Eram duas propostas cul-turais universalistas e a-históricas,contra a cultura do passado, mes-mo que tivessem motivações dife-rentes – em Viena, ela estava ligadaà crise do liberalismo, e em SãoPaulo ela se articulava com a idéiade cultura universal, embutida nanoção de progresso”, comenta. Nosdois casos, a recusa da história se fezpela multiplicação de experiências so-ciais, que instauram a fragmentação, adescontinuidade das linguagens.

Jorge Andrade faz parte desse pro-cesso, pois sua obra sintetiza as ten-sões características da cultura paulis-tana, os dilemas de uma sociedade emtransformação, numa postura céticadiante das visões otimistas identifica-das com o progresso. Sua dramaturgiaé um teatro da memória, que não bus-ca atualizar o passado para apropriar-se dele nos termos propostos por Wal-ter Benjamin, mas procura reconstituiro passado para esquecê-lo e assim li-bertar-se dele. Andrade quer acertarcontas com o passado e assim poderolhar para o futuro. A urbanidade estámuito presente em sua obra, pois a ci-dade pressupõe uma dinâmica queataca a velha ordem agrária.

Sob o ponto de vista da lingua-gem, a dramaturgia de Jorge Andradeé essencialmente moderna, pois dige-re um amplo espectro de referências,que vão do teatro grego a Brecht. An-drade deu expressão universal a ques-tões locais, ligadas ao ambiente cul-tural de São Paulo, sempre compreocupações sociais, presentes noexame da condição dos deserdados da

modernidade. A universalidade desua linguagem foi demonstrada pelatradução das peças em línguas estran-geiras e pelas montagens no exterior.

Fio condutor da análise, a lingua-gem fornece a lógica que determina aordem dos capítulos. O estudo abordaAndrade primeiro, pois é, entre ostrês, o menos inovador no uso da lin-guagem. Em seguida aparece Flores-tan – os concretos vêm depois, já quea linguagem ocupa lugar decisivo naproblemática que levantaram. A pers-pectiva crítica em relação à moderni-dade é mais presente em Florestan eAndrade do que nos concretos, que ti-nham um olhar otimista, uma con-cepção positiva da modernidade.

Crítico e pessimista - Florestan semprefoi crítico, mas ficou pessimista a par-tir de A Integração do Negro na Socie-dade de Classes, tese de cátedra defen-dida poucos dias antes do golpe militarde 1964. “Florestan constata que oprojeto de modernidade vigente, noqual ele acreditava, não integrava o ne-gro. Ele termina o texto dizendo que, senão resolvermos essa questão, nãoconseguiremos construir um suportede civilização moderna. A partir daí, oprojeto de Florestan entra em crise.Com sua expulsão da universidade, em

1969, é todo o seu projeto de vidaque vem abaixo”, afirma.

O movimento concreto tambémentrou em crise antes de 1964.A dis-sidência neoconcreta – surgida em1959, no Rio de Janeiro, em tornode Ferreira Gullar e Mário Pedrosa– ataca o mecanicismo e a ortodoxiaidealista dos concretistas paulistas,que se situavam fora da história,desprezando a participação políticae social. No período imediatamen-te posterior, a questão da partici-pação se acirrou, e o concretismosofreu novas cisões. Assim comoaconteceu na trajetória de Flores-tan, as vanguardas perdem força echegam aos anos 60 num profun-do desencanto com a modernida-de brasileira. A crise do teatro deJorge Andrade também é destaépoca. “Como Florestan, Andradequis construir um projeto profissio-

nal, estabelecer-se como dramaturgo,viver disso. O projeto fracassa, e An-drade vai sofrendo críticas de todos oslados: os setores ligados à cultura departicipação diziam que seu teatroera passadista, pois falava da memó-ria. Quando ele tentou entrar no de-bate e escreveu peças claramente polí-ticas, caiu no esquematismo, perdeusubstância. Por outro lado, seu teatrotambém não se adaptava ao gosto bur-guês, pois Vereda da Salvação selou acrise do TBC”, analisa. “Andrade é asíntese de um tempo, pois colocou emcena a tensão entre necessidade e im-possibilidade da exclusão do passado.”

Com o golpe de 1964, os limites des-sa modernidade cultural se explicitaram.Diante da indústria cultural, que setorna o sistema dominante, as lingua-gens não conseguem responder ade-quadamente. A história derrapa, oprojeto de pensar uma modernidadecultural é atropelado pelas condiçõespolíticas. “Como escreveu Florestan,não há revolução burguesa no Brasil,pois a burguesia não se autonomizoupara implantar seu projeto moderno,mas se aliou com a oligarquia rural, es-cravista. A face mais moderna dessaburguesia é a que se refere ao mercado.Em relação ao projeto cultural, ela éproblemática”, conclui. •

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Maria Arminda: fragmentos modernos em SP

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José Arthur Giannotti, em artigopara o jornal Folha de S.Paulo,

deu a melhor definição da perda re-cente do amigo que, como ele, tam-bém foi presidente do Centro Bra-sileiro de Análise e Planejamento(Cebrap): “Vilmar Faria se foi comosempre viveu: discretamente, um pei-xe de fundo de mar”. O sociólogo,morto em novembro de 2001, aos 59anos, vítima de um aneurisma, efeti-vamente era um homem discreto quepreferia passar despercebido. Essacaracterística, porém, escondia umdos mais importantes articuladoresde políticas públicas e sociais do go-verno do presidente Fernando Hen-rique Cardoso desde 1995, quandofoi chamado a Brasília para integrar aequipe de base do recém-eleito.

“Sou apenas um assessor do go-verno”, costumava dizer, com modés-tia. Mas até 1999, Faria era o Secretá-rio de Coordenação da Câmara dePolítica Social da Presidência e era acabeça pensante por trás dos princi-pais projetos de Fernando Henriquena área. Foi Faria o responsável pelaelaboração da chamada “rede de pro-teção social do governo”, que incluíao Projeto Alvorada, que pretendiacombater a pobreza nas cidades compequeno Índice de DesenvolvimentoHumano (IDH). Além de conselhei-ro oficial, Faria foi amigo do casalFernando Henrique e Ruth Cardoso.“Era um homem discreto e compe-tente, um intelectual comprometidocom as mudanças do país. O Brasilperdeu um eventual ministro daEducação”, lamentou o presidente.

ções. Ele era um canal direto do siste-ma de pesquisa com o presidente.”

Vilmar doutorou-se na Universi-dade Harvard (com a tese Marginali-dade Ocupacional, Emprego e Pobrezano Brasil Urbano) e, depois do Cebrap,também ajudou na fundação do De-partamento de Ciências Sociais daUniversidade de Brasília. Sua área deestudo mais importante era a análisedos problemas das grandes cidades eas complexas problemáticas da po-breza e do emprego.

Dava uma especial atenção às di-ficuldades da pesquisa científica noBrasil, ajudou o desenvolvimento daSociedade Brasileira para o Progres-so da Ciência e, durante a sua gestãoà frente do Cebrap, Faria conseguiufazer uma ponte entre a velha e a no-va geração de pesquisadores. Fez omesmo durante a sua estada no Pla-nalto, um importante elo entre go-verno e mundo acadêmico. Era umotimista. “Problema social do Brasil écomo um copo d’água: você pode vero que falta para encher, mas eu prefi-ro ver até onde encheu”, dizia. •

O discreto articulador socialPERSONALIDADE

Vilmar Faria,morto aos 59anos,era o responsável pelaspolíticas públicas de FHC

HUMANIDADES

A morte de Faria foi muito sentidatambém na comunidade acadêmica.“Afora a perda de uma pessoa porquem eu tinha grande amizade pesso-al, ressalto que a comunidade científi-ca brasileira perde um importante in-terlocutor com o governo federal”, dizJosé Fernando Perez, diretor científicoda FAPESP. “Vilmar tinha uma visãomoderna do sistema de pesquisa dopaís e teve atuação decisiva, por exem-plo, na preparação de medidas provi-sórias relativas à lei 8.666, eliminandoa necessidade de licitação sob bens depesquisa com recursos financiadospelas agências de fomento. Tambématuou na questão de como se deviacalcular o imposto devido de funda-

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A pobreza da cidade grande e seu estudioso, Vilmar Faria

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tor do instituto, e pelo professor Mi-guel Wady Chaia, coordenador doNúcleo de Estudos de Arte, Mídia ePolítica (Neamp) da Pontifícia Uni-versidade Católica de São Paulo(PUC-SP).

A idéia surgiu há quatro anos,quando Ricardo percebeu a necessi-dade de realizar uma catalogaçãomais ampla da obra da artista, distri-buída entre dezenas de galerias, cole-cionadores e acervos de diversos Esta-

dos do Brasil – sem contar ostrabalhos localizados no exterior.Um primeiro levantamento ti-nha sido feito na ocasião de umaretrospectiva da obra de Tomierealizada em 1983 no Museude Arte Moderna de São Paulo(Masp). Naquele tempo, cerca de480 obras tinham sido levanta-das nos Estados do Rio e de SãoPaulo e em Brasília.

A nova busca por obras deTomie, que também teve apoiofinanceiro do Banco Santos, le-vou a um salto de 480 para 1.200trabalhos conhecidos – mais deuma dezena fora do país. Essecrescimento quantitativo foiacompanhado de uma melhoraqualitativa, proporcionada pelametodologia de pesquisa empre-gada por Miguel Chaia. “Acha-mos importante que não fossefeita apenas uma catalogação,mas também que se finalizasse apesquisa com uma análise daobra e da trajetória de Tomie”,diz o professor, que teve a cola-boração de um pesquisador noRio e dois em São Paulo.

Chaia contou com uma aju-da de R$ 61.597,00 da FAPESP,valor empregado principalmenteno fornecimento de equipamen-

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HUMANIDADES

ARTES PLÁSTICAS

Projeto financiado pela FAPESP contabiliza 1.200 trabalhos da artista distribuídos por todo o país e no exterior

A obra de Tomie Ohtake

recente inauguração do Insti-tuto Tomie Ohtake, no bair-

ro de Pinheiros, em SãoPaulo, reacendeu o brilho

no olhar de quem se ressentia pornunca mais ter visto o surgimento, nacidade, de novos equipamentosculturais de grande porte desde aabertura do Centro Cultural SãoPaulo, há 20 anos. Vinculado aum centro comercial de escritó-rios, esse espaço parece ter nasci-do sob a nova égide que dire-ciona os negócios culturais: aparceria com a iniciativa privada.Projetado por Ruy Ohtake, umdos filhos de Tomie, o institutotem 12 salas para exposições,quatro salas de espetáculos, res-taurante, livraria, loja de design eum café. O prédio inteiro levouquatro anos para ser concluído efoi financiado pelo LaboratórioAché, com um custo total de R$100 milhões.

O apoio que a FAPESP deu aoProjeto Tomie Ohtake (de cata-logação e análise da obra da ar-tista) também contribuiu para osucesso do instituto, que já é vis-to com bons olhos nos meios cul-turais, principalmente por causados eventos que o inauguraram –uma retrospectiva da carreira deTomie Ohtake, uma mostra daartista mineira Rosângela Rennóe duas exposições coletivas, dearquitetura e design. A pesquisafoi encabeçada por Ricardo Oh-take, outro filho da artista e dire-

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Série Grandes Formatos: consistência artística

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 79

tos, como computadores ecâmaras fotográficas. OBanco Santos entrou comR$ 77.600,00, utilizados,entre outras coisas, para opagamento dos salários dospesquisadores. “Essa foiuma feliz parceria entre aFAPESP e o Banco Santos”,avalia Ricardo Ohtake. Oresultado já pode ser vistono belíssimo livro TomieOhtake, lançado juntamen-te com a abertura do insti-tuto. A publicação, realiza-da com apoio do InstitutoTakano, tem textos de Pau-lo Herkenhoff, Frederico Morais, Ag-naldo Farias (curador para artes visu-ais do Instituto) e do próprio Chaia.

O próximo fruto da pesquisa esta-rá em um site que reunirá reprodu-ções de cada uma das obras (200 delassó foram localizadas em reproduções,ou seja, não se encontraram os origi-nais), fichas descritivas do históricode cada trabalho – a que colecionado-res já pertenceu, de que exposições fezparte, qual a técnica utilizada –, tex-tos escritos por especialistas (MiguelChaia, Frederico Morais, Cecília Al-meida Salles, Dorothea Passetti, Ag-

pesquisa também contri-bua para o entendimentodo significado de sua obrano contexto em que ela foiproduzida.

“Tomie é uma artistaque surgiu de repente (pin-tou o primeiro quadro aos39 anos) e logo mostrouuma grande consistênciaartística”, avalia Chaia. “Elaune a arte geométrica aoinformalismo e ao gestualde forma única. Sua obratem uma dimensão cósmi-ca, que nos faz refletir sobreas relações entre arte e

ciência”, diz o professor. “A pesquisatambém nos ajudou a ver a dimensãode suas obras públicas”, continua.

Para Ricaro Ohtake, o projeto fi-nanciado pela FAPESP tem impor-tância fundamental também para aju-dar a organizar as informações sobrea arte brasileira. “Ele vai ajudar mui-to o trabalho de curadores, historia-dores, críticos de arte e estudantes”,afirma o pesquisador. “Se um traba-lho desses fosse feito para cada umdos artistas brasileiros, seria muitomais fácil fazer a história da artebrasileira”, encerra. •

Obra de 2001:“Tomie une a arte geométrica ao informalismo e ao gestual de forma única”, avalia o pesquisador Miguel Chaia

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Tela de 1952: projeto ajudaa organizar informações sobre arte brasileira

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naldo Farias e Fernando Cocchiaralli)e gravações, em vídeo, de depoimen-tos sobre a artista. A página estará dis-ponível na Internet em dois meses eos textos dos especialistas devem serpublicados com apoio da FAPESP.

Os pesquisadores do Projeto To-mie Ohtake também encontraram vá-rios documentários sobre a artista, umdeles realizado pelo cineasta WalterSalles Jr, Retrato de Tomie, de 1988.Chaia fez um levantamento bibliográ-fico de tudo o que já foi publicado emlivro e na imprensa sobre Tomie e tra-çou sua trajetória artística, para que a

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80 • JANEIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

CLÁUDIA BARCELLOS

Mestre em encerrarhistórias com am-bigüidade e em

usar metáforas envolvendoespelhos, tigres e labirintos,imagens que o perseguiamantes e depois da cegueira eseriam suas marcas regis-tradas, o escritor argentinoJorge Luis Borges nunca es-creveria um romance nemganharia o Prêmio Nobel de Literatura. Mas se con-sagraria como o mais original e criativo escritor daAmérica Latina na opinião de boa parte da críticaliterária, de pesquisadores e de incontáveis leitores.

Para esse extenso público, o livro Borges no Bra-sil, organizado pelo professor da Universidade deSão Paulo (USP) Jorge Schwartz, é uma rara opor-tunidade de conhecer as ligações afetivas e literá-rias que trouxeram o escritor ao país em três di-ferentes ocasiões e o levavam a citar Euclides daCunha como um dos grandes nomes da literaturauniversal. Pergunta Borges, em trecho do livro:“Quem sou eu para ombrear-me com Euclides daCunha, Camões ou Montaigne?”

O professor Schwartz, que também organizouos cinco volumes com as obras completas de Bor-ges em português, coordenou uma equipe de di-versos pesquisadores bolsistas ao longo de quatroanos de trabalho. O resultado é um volume de ex-cepcional qualidade e abrangência, que traça am-plo perfil de Borges e reúne textos inéditos e outrosaté então dispersos ou de circulação restrita – casodo Boletim Bibliográfico Mário de Andrade, fruto deduas jornadas literárias do escritor em São Paulona década de 80.

Borges, nascido em 1899, esteve pela primeiravez no Brasil em data imprecisa na década de 30,quando viu, pela única vez em sua vida, um ho-mem ser morto em Santana do Livramento, no RioGrande do Sul. Pouco antes disso, em 1928, o visio-nário Mário de Andrade publicava um laudatóriocomentário a respeito de Borges no Diário Nacio-nal, de São Paulo.

“Jorge Luis Borges é opoeta e ensaísta que parece apersonalidade mais salienteda geração moderna da Ar-gentina”, escrevia Mário nojornal. Quase duas décadas sepassariam até que Borges pu-blicasse Ficções, em 1944, e OAleph, em 1949, verdadeirasobras-primas que o levariamao reconhecimento e reno-me internacionais. A segun-da vez em que visitou o Bra-

sil foi bem menos traumática e mais lucrativa.Borges esteve em São Paulo em 1970, para rece-

ber um prêmio literário de US$ 25 mil, à épocamenor, em valor, apenas do que o Nobel. O escri-tor recebeu o cheque das mãos do empresário Cic-cilo Matarazzo. A foto da ocasião encontra-se nofinal do volume, junto com outras que trazem sur-presas – como Borges em palestra no anfiteatro docurso de madureza Santa Inês.

Mas foi em 1984, na última passagem por SãoPaulo, dois anos antes de morrer, que o escritorbrilhou à altura da qualidade de seus escritos.Pouco antes de seu 85º aniversário, acompanhadoda inseparável Maria Kodama, ele participou deduas jornadas de literatura e recebeu um exem-plar da primeira edição de Os Sertões, presente dobibliófilo José Mindlin, das mãos do diretor daFaculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP,Rui Coelho, no auditório do Museu de Arte deSão Paulo.

O registro dessas pouco conhecidas passagensde Borges pelo país, ao lado das 51 páginas da Bi-bliografia Borges no Brasil (1970-1999), que compi-lam tudo que foi escrito por e sobre o autor noBrasil, já valeriam a edição do volume. Mas os lei-tores poderão encontrar também os artigos das pa-lestras proferidas durante o ciclo Borges 100, naUSP, em 1999 – ano do centenário de nascimentodele – e algumas das entrevistas que o escritor con-cedeu a jornalistas de televisão e revistas.

Visitas afetivas e literárias

L I V R O SL I V R O S

Borges no Brasil

Organização deJorge Schwartz

Editora Unesp/Imprensa Oficial do Estado/FAPESP

608 páginasR$ 40,00

Livro revela detalhes das passagens de Jorge Luis Borges pelo Brasil

CLÁUDIA BARCELLOS é jornalista.

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PESQUISA FAPESP • JANEIRO DE 2002 • 81

Brazilian Journal of Medicaland Biological ResearchVolume 34 - número 12Virtual Symposium

Em seu último número de 2001 a revista da Associação Brasileira de Divulgação Científica traz um simpósio virtual sobre o cérebro com os artigos The BrainDecade in Debate (Sensory and

Motor Maps: Dynamics and Plasticity e Neurobiology of Sleep and Dreams). Também no volume de dezembro:The Brazilian Investment in Science and Technology,de Pinheiro-Machado e Oliveira; Circulating Forms of Parathyroid Hormone Detected with anImmunofluorometric Assay in Patients with PrimaryHyperparathyroidism, de I.S. Kunii; entre outros.

Brasil, um Século de TransformaçõesCompanhia das LetrasPaulo Sérgio Pinheiro, Jorge Wilheim e Ignacy Sachs (org.)522 páginas / R$ 42,00

São 19 textos fundamentais paraque se possa entender o Brasil em toda a sua multiplicidade.Os intelectuais querem analisar

as escolhas feitas no passado para tentar direcionar as dofuturo. Entre os artigos, análises escritas por: Celso Lafer(Brasil e o Mundo); Renato Ortiz (Sociedade e Cultura);Luiz Carlos Bresser Pereira (Do Estado Patrimonial ao Gerencial); Lídia Goldenstein (Uma Avaliação daReestruturação Produtiva); Gilberto Dupas (Os GrandesDesafios da Economia Globalizada); Jorge Wilheim(Metrópoles e Faroeste no Século 21); Paulo SérgioPinheiro (Transição Política e Não-Estado de Direito).

O Pensamento MestiçoCompanhia das LetrasSerge Gruzinski398 páginas / R$ 38,00

O historiador francês inicia seu livromostrando admiração por uma frasede um poema de Mario de Andrade:“Sou um tupi tangendo um alaúde”.Esse é o ponto de partida para queele investigue de que forma se deu a assimilação da cultura invasora

européia pelos povos vencidos do México. Para Gruzinski,o que, ao primeiro olhar, parece uma derrota cultural é, naverdade, uma “antropofagia” de modelos europeus e cristãosque, após deglutidos, foram reelaborados pelos mexicanos.É o caso do pintor índio que trata temas da mitologia clássicacom objetos do seu cotidiano, entre outros exemplos.

O Desafio da Sustentabilidade:Um Debate Socioambiental no BrasilEditora Fundação Perseu AbramoGilney Viana e Nilo Diniz (org.)364 páginas / R$ 30,00

O livro reúne uma série de artigosescritos por importantes acadêmicostendo como tema o conceito dedesenvolvimento sustentável, ou seja,a sabedoria de retirar o necessário

da natureza sem, no entanto, tirar das gerações futuras a herança ecológica exigida para sua sobrevivência.Os textos indicam caminhos para que o governo possamanter o funcionamento do país com responsabilidade.

LANÇAMENTOSLANÇAMENTOS

Revista Brasileira de Ciências SociaisVolume 16 - número 47

A publicação quadrimestral, umaedição feita pela AssociaçãoNacional de Pós-Graduação ePesquisa em Ciências Sociais, trazem seu número mais recente umadeliciosa entrevista com AntonioCandido, uma raridade nos

dias de hoje. A entrevistadora não é menos brilhante:Heloísa Pontes. O resultado é uma conversa saborosasobre cultura e civilidade. Ainda no mesmo volume,os seguintes artigos: Comida e Antropologia, de SidneyMintz; Anotações sobre Religião e Globalização,de Renato Ortiz; Candomblé, de Reginaldo Prandi.

Revista USP2001 - volume 50

A revista da Universidade de SãoPaulo (USP) chega número 50,num total de quase 13 anos de sucesso trazendo artigos deprimeira linha para seus leitores.Para celebrar a data, mais do querespeitável, os editores da RevistaUSP reuniram textos de grandespensadores, escritos especialmente

para comemorar a passagem do cinqüentenário.Entre esses: Sobre Bandeira e Cabral, de Luiz Costa Lima;Lezama Devora o Magro Virgílio, de Teresa Barreto;O Silenciar de Crátilo, de Antonio Medina; Pessoa:Personagens e Poesia, de Milton Vargas; Basílio da Gammae a Ilustração, de Sergio Paulo Rouanet; Ilíada Recriada,de Trajano Vieira; e Diadorim, de Willi Bolle.

R E V I S TA SR E V I S TA S

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A R T E F I N A LA R T E F I N A L

FERNANDO GONSALES