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Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Administração Júnia Fátima do Carmo Guerra A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOBRE GESTÃO SOCIAL: Um estudo da relação entre acadêmicos e praticantes Belo Horizonte 2015

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

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Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Administração

Júnia Fátima do Carmo Guerra

A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOBRE GESTÃO SOCIAL:

Um estudo da relação entre acadêmicos e praticantes

Belo Horizonte

2015

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Júnia Fátima do Carmo Guerra

A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOBRE GESTÃO SOCIAL:

Um estudo da relação entre acadêmicos e praticantes

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Administração da Pontifícia Universidade Católica

de Minas Gerais como requisito parcial para

obtenção do título de Doutor em Administração.

Orientador: Armindo dos Santos de Sousa Teodósio

Belo Horizonte

2015

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FICHA CATALOGRÁFICA

Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Guerra, Júnia Fátima do Carmo

G934p A produção de conhecimento sobre gestão social: um estudo da relação entre

acadêmicos e praticantes / Júnia Fátima do Carmo Guerra. Belo Horizonte, 2015.

235 f.: il.

Orientador: Armindo dos Santos de Sousa Teodósio

Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Programa de Pós-Graduação em Administração.

1. Ciências sociais - Pesquisa. 2. Gestão do conhecimento. 3. Pesquisadores. 4.

Produção do conhecimento. I. Teodósio, Armindo dos Santos de Souza. II.

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em

Administração. III. Título.

CDU: 658.01

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Júnia Fátima do Carmo Guerra

A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOBRE GESTÃO SOCIAL:

Um estudo da relação entre acadêmicos e praticantes

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Administração da Pontifícia Universidade Católica

de Minas Gerais como requisito parcial para

obtenção do título de Doutor em Administração.

_____________________________________________________________

Prof. Dr. Armindo dos Santos de Sousa Teodósio – PUC Minas (Orientador)

______________________________________________________

Prof. Dr. Alexandre Reis Rosa – UFES (Banca Examinadora)

_____________________________________________________________

Prof.ª. Drª. Lucília Regina de Souza Machado – UNA (Banca Examinadora)

________________________________________________________

Profª. Drª. Paula Chies Schommer – UDESC (Banca Examinadora)

_____________________________________________________

Profª. Drª. Rosa Maria Fischer – USP (Banca Examinadora)

Belo Horizonte, 27 de fevereiro de 2015

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Dedicatória

Dedico aos meus pais, que mesmo ausentes sempre se fizeram presentes.

Aos que torceram por mim.

A todos que contribuíram para que essa pesquisa se realizasse.

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AGRADECIMENTO

São tantos os agradecimentos!

Primeiro a Deus, OBRIGADA!!!

Agradeço a minha família, ao meu amado Guerrinha e querido marido pelo incentivo sempre

amoroso, pela força e pela carinhosa paciência.

Aos meus filhos, Joana, Bárbara e Arthur por ficarem ao meu lado mesmo quando eu não

podia ficar com eles. Pela doçura e alegria, ajudando-me a caminhar com mais leveza.

As Vieirinhas! Irmãs queridas e sobrinhos amados por ficarem sempre ao meu lado com

humor e graça.

Aos amigos do coração pela torcida e incentivos de coragem.

Ao meu orientador e querido amigo Téo por me ajudar a trilhar o conhecimento por

caminhos mediados de reflexão e crítica e pela generosidade de sempre.

Aos amigos do PPGA, queridos professores, amigos da secretaria que estão sempre com um

sorriso no rosto. Ao carinho e amizade revestidos de dádivas da velha guarda do NUPEGS,

Dani Viegas, Maria Flávia, Dani Cardoso, Danusa, Raquel, Yasmini e aos novos

companheiros, obrigada por tudo!

A todos que, de uma maneira ou de outra, me ajudaram na trajetória do Doidorado!

OBRIGADA!

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"Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e aos homens.

Não é possível a pronúncia do mundo, que é um ato de criação e recriação se não há amor que a infunda.

Sendo fundamento do diálogo, o amor é, também, diálogo.

Daí que seja essencialmente tarefa de sujeitos e que não possa verificar-se na relação de dominação”.

Paulo Freire em “A Essência do Diálogo”

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RESUMO

A tese busca analisar a relação entre academia e praticantes no contexto brasileiro de

produção de conhecimento sobre Gestão Social. Defende-se que a produção de conhecimento

sobre Gestão Social, mediada pela abordagem socioprática de aprendizagem, a qual se

constitui como resultado de interações e práticas compartilhadas pelos atores sociais dinamiza

e transforma o seu campo de atuação. É no limiar das relações entre acadêmicos e praticantes

e, a partir dos desafios que envolvem a universidade contemporânea, que reside a pergunta de

pesquisa, “como se dá a produção de conhecimento sobre Gestão Social a partir da relação

entre acadêmicos e praticantes desse campo?” A fim de responder essa pergunta buscou-se

explorar e discutir as abordagens cujos preceitos alinhassem às perspectivas da Gestão Social

e das relações que precedem as suas dinâmicas e articulações. Nesse âmbito, as discussões se

apoiaram nas abordagens de campos de poder associadas às perspectivas de habilidade social

e saberes híbridos. A metodologia utilizada é de natureza qualitativa, com análise dos

depoimentos, oriundos das entrevistas semiestruturadas realizadas com dezoitos acadêmicos e

praticantes da Gestão Social, e dos dados secundários provenientes dos sítios eletrônicos,

pesquisas e artigos relativos a produção de conhecimento dos centros de estudo e pesquisa e

das organizações da sociedade civil investigadas. Os resultados demonstram que a produção

de conhecimento sobre Gestão Social a partir das relações entre acadêmicos e praticantes vem

se efetivando através de disputas de poderes no seu campo. Nessa disputa se vislumbra um

aspecto tradicional da universidade contemporânea, assinalado pelo funcionalismo e pelo

instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto

inovador o qual busca nos preceitos das ciências pós-moderna formas de interação e

dinâmicas permeadas pela habilidade social e por saberes híbridos. Este quadro evidencia

possibilidades de transformação e ressignificação do campo da Gestão Social ao observar que

a produção de conhecimento se baseia em saberes múltiplos e em propósitos que envolvem a

noção de coletividade social.

Palavras-chaves: Relação entre academia e praticantes. Gestão Social. Produção de

Conhecimento.

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ABSTRACT

The thesis aims to analyze the relationship between academia and practitioners in the

Brazilian context of knowledge production on Social Management. It is argued that the

production of knowledge on Social Management, mediated by social practice approach to

learning, which is as a result of interactions and practices shared by social actors streamlines

and transforms their field. It is on the threshold of the relationship between academics and

practitioners, and from the challenges concerning contemporary university, lies the research

question, "how is the production of knowledge about Social Management from the

relationship between academics and practitioners in this field? "In order to answer this

question we sought to explore and discuss approaches whose precepts align the prospects of

Social Management and relations preceding their dynamics and articulations. In this context,

discussions supported the approaches of power fields associated with the prospects of social

skill and knowledge hybrids. The methodology used is qualitative, with the testimonies

coming from the semi-structured interviews with eighteen scholars and practitioners of Social

Management, and secondary data from the electronic sites, research and articles on the

production of knowledge of study and research centers and civil society organizations

investigated. The results show that the production of knowledge on Social Management of the

relations between academics and practitioners has been effecting through powers of disputes

in their field. In this dispute in sight a traditional aspect of the contemporary university,

marked by functionalism and the instrumentalism present in the axis of teaching, research and

extension and an innovative aspect which seeks the precepts of postmodern science forms of

interaction and dynamic permeated by social skills and hybrid knowledge. This table shows

possibilities of transformation and redefinition of the Social Management field to note that the

production of knowledge is based on multiple knowledge and purposes involving the notion

of social community.

Keywords: Relationship between academia and practitioners. Social management. Knowledge

production.

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1. Temas e Abordagens na Produção de Conhecimento em Gestão Social.............. 44

FIGURA 2. Verbetes Presentes no Campo da Produção de Conhecimento em Gestão Social

.................................................................................................................................................. 45

FIGURA 3. Diagrama Conceitual das Esferas Pública e Privada que Localizam a Sociedade

Civil ......................................................................................................................................... 73

FIGURA 4. Campos de poder da Gestão Social ...................................................................... 97

FIGURA 5. Relações no Campo da Gestão Social: Perspectivas e Limites na Produção de

Conhecimento ......................................................................................................................... 194

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - Configuração dos Centros de Estudos e Programas de Pesquisas Vinculados a

Gestão Social ......................................................................................................................... 103

QUADRO 2 - Organizações da Sociedade Civil Investigadas ............................................. 108

QUADRO 3 - Perfil dos Entrevistados: acadêmicos

................................................................................................................................................ 116

QUADRO 4 - Perfil dos Entrevistados: praticantes .............................................................. 117

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LISTA DE SIGLAS

ABONG - Associação Brasileira das Organizações não Governamentais

ABRINQ – Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos

ANPAD – Associação Nacional da Pós-Gradução em Administração

AVSI- Associação de voluntários para o Serviço Internacional

CAPES – Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior

CBBC - Centro de Biologia da Conservação

CDM - Cooperação para o Desenvolvimento e Morada Humana

CEAPG - Centro de Estudos em Administração Pública e Governo

CEATS - Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor

CEBS - Comunidades Eclesiais de Base

CIAGS - Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social

CNPJ – Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica

CNPQ – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

DNA – Ácido Desoxirribonucleico

EAESP - Escola de Administração de Empresas de São Paulo

EBAPE - Escola Brasileira de Administração Pública

EnANPAD – Encontro da Associação Nacional da Pós-Gradução em Administração

ENAPEGS – Encontro Nacional de Pesquisadores em Gestão Social

ESCAS - Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade

FASFIL – Mapeamento das Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos

FEA - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade

FGV – Fundação Getúlio Vargas

FGVTV - Fundação Getúlio Vargas de Televisão

FIA - Fundação Instituto de Administração

FIEMG - Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

IES - Instituições de Ensino Superior

MBA - Master in Business Administration

MG - Minas Gerais

NEATS - Núcleo de Estudos de Administração do Terceiro Setor

NIPETS - Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas e Estudos Sobre o Terceiro Setor

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NUPEGS - Núcleo de Pesquisa em Ética e Gestão Social

NYU – New York University

ONG - Organização não Governamental

OSCs - Organizações da Sociedade Civil

OSCIP - Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

PEGS - Programa de Ensino de Gestão Social

PDG - Projeto de Desenvolvimento de Gestão

PDGS - Programa de Desenvolvimento e Gestão Social

PGPC - Programa de Gestão Pública e Cidadania

PPGA – Programa de Pós-Graduação em Administração

PUC - Pontifícia Universidade Católica

RAP – Revista de Administração Pública

RGS – Rede de Pesquisa em Gestão Social

REBRAMA - Rede Brasileira de Avaliação

SEKN - Social Enterprise Knowledge Network

UFBA - Universidade Federal da Bahia

UFRGS - Universidade do Rio Grande do Sul

USP – Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 14

2 GESTÃO SOCIAL: TEMÁTICAS QUE PERMEIAM O SEU CAMPO .................... 30

3 PERSPECTIVAS DE PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOCIOPRÁTICA

INTEGRADAS AO CAMPO DA GESTÃO SOCIAL ...................................................... 49

3.1 Produção de conhecimento sobre Gestão Social no âmbito dos praticantes: desafios e

possibilidades ......................................................................................................................... 53

3.2 Produção de conhecimento acadêmica sobre Gestão Social: perspectivas que se

apoiam no ensino crítico da Administração

.................................................................................................................................................. 61

4 RELAÇÃO ENTRE ACADEMIA E PRATICANTES: CAMPOS DE PODER QUE

SE CONECTAM .................................................................................................................. 72

4.1 Campos de poder da universidade contemporânea

.................................................................................................................................................. 75

4.2 Dinâmicas de produção de conhecimento entre acadêmicos e praticantes da Gestão

Social ...................................................................................................................................... 85

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................................................... 99

5.1 Estratégias de coleta de dados ...................................................................................... 112

6 ANÁLISE DOS DADOS: A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOBRE GESTÃO

SOCIAL ENTRE ACADÊMICOS E PRATICANTES .................................................. 121

6.1 A trajetória dos acadêmicos e praticantes do campo da Gestão Social ................... 122

6.2 Habilidade social: possibilidades de ampliação da produção de conhecimento sobre

Gestão Social ........................................................................................................................ 135

6.3 A produção de conhecimento sobre Gestão Social: transformação e ressignificação

do campo? ............................................................................................................................ 143

6.3.1 Concepções críticas que permeiam a noção sobre Gestão Social ............................. 168

6.4 Relações entre academia e praticantes: desafios e possibilidades para o campo da

Gestão Social ........................................................................................................................ 177

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 199

REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 210

APÊNDICES ....................................................................................................................... 228

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1 INTRODUÇÃO

A Gestão Social tem sido amplamente pesquisada e discutida no Brasil desde a década

de 1990. Porém, existem importantes debates e divergências acerca de sua constituição e

natureza, bem como sobre o campo em que se manifesta e reproduz na vida social

contemporânea. Esses debates podem ser percebidos tanto entre os acadêmicos dessa área de

conhecimento, que notoriamente se concentra na Administração, quanto entre os praticantes

que operam as organizações da sociedade civil.

No âmbito dos acadêmicos destacam-se autores como Tenório (1997, 1998, 1999,

2004, 2005, 2008), R. M. Fischer (2001, 2002, 2005), Dowbor (1999, 2003, 2006, 2010),

Junqueira (2000, 2008, 2009), T. M. D. Fischer (2001, 2002, 2006), Carrion (2001, 2005,

2006, 2008), Boullosa e Schommer (2005, 2008), França Filho (2003, 2004), Pinho (2005),

Cançado (2011, 2013) e Araújo (2012). Suas abordagens revelam que o termo Gestão Social

permeia um campo teórico em construção, cuja discussão envolve temas que precedem às

dinâmicas do poder local, do território, das articulações entre Estado, sociedade e

organizações privadas.

Tais abordagens apontam os aspectos distintivos em relação a outros campos da

gestão e outras maneiras de gerir, como a gestão privada e a gestão pública. Sob essa

perspectiva, observa-se que a utilização do termo pode estar relacionada aos atores sociais que

a emprega, ao universo organizacional em que é exercida, às finalidades que se pretende

atingir ou, ainda, às características do processo de gestão a que se refere (R. M. Fischer, 2001,

Schommer & França-FIlho, 2008). Nesse aspecto, destacam-se as características

organizacionais vigentes no campo das organizações da sociedade civil, da Economia

Solidária e relativas à Responsabilidade Social Empresarial (Hoffman, 2001, Junqueira, 2010,

Teodósio, 2010, Abramovay, 2009). Além disso, elevam-se esforços em compreender os

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aspectos vinculados a participação social, a emancipação e o desenvolvimento social,

podendo associá-los aos princípios que norteiam as políticas públicas (T. M. D. Fischer, 2002,

Tenório, 2005, Boullosa e Schommer, 2009, Cançado, Pereira & Tenório, 2013).

O interesse em pesquisar e discutir a Gestão Social não se vincula somente às ciências

administrativas. Outros campos de conhecimento buscam compreender e integrar em suas

abordagens os aspectos que sustentariam a Gestão Social. Dentre eles, pode-se citar o Serviço

Social, a Comunicação, a Pedagogia e as Ciências Sociais. Entretanto, nota-se no campo da

Administração uma grande presença de investigadores, centros de pesquisa e iniciativas

visando desenvolver estudos referentes aos elementos atribuídos à Gestão Social, incorrendo

em uma acentuada participação nas discussões que a envolvem (Cançado, 2011, Mendonça,

Gonçalves-Dias & Junqueira, 2012).

Desse quadro surgiu a Rede de Pesquisadores sobre Gestão Social, que se constituiu a

partir da iniciativa de professores e pesquisadores de Administração e Serviço Social. As

propostas de produção e compartilhamento de conhecimento acerca das temáticas da Gestão

Social têm encontrado nos Encontros Nacionais de Pesquisadores em Gestão Social

(ENAPEGS), que estão hoje na sua oitava edição, um espaço para reunião de acadêmicos e

praticantes da Gestão Social.

A crescente visibilidade e importância da Gestão Social nos últimos anos, tanto no

meio acadêmico quanto empresarial e governamental, propiciou a oferta de estruturas de

formação acadêmico-profissional cujos pressupostos didático-metodológicos têm sido alvo de

discussões. Tais discussões, impulsionadas por hipóteses construídas sobre os temas

emergentes da Gestão Social, conduzem a significativas reflexões e críticas sobre as propostas

pedagógicas dos cursos em vigor no país com foco na formação do gestor. Segundo

Schommer e Boullosa (2010), é possível notar dinâmicas estruturais que favorecem a

instrumentalização dos cursos, os quais detêm processos de ensino e aprendizagem

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tradicionais. Este procedimento contribuiria para delimitar precocemente um conceito ainda

em construção, uma vez que alimenta a perspectiva de um campo definido e orientado por

aqueles que o dominam e o ensinam sobre aqueles que o apreendem (Schommer e Boullosa,

2010).

Todavia, há dinâmicas de ensino-aprendizagem que buscam consolidar os preceitos da

Gestão Social por meio de práticas que se configuram na participação e na interação social.

Destacam-se no processo de consolidação de diferentes centros de investigação sobre Gestão

Social no país, experiências que buscam, sob diferentes óticas e baseadas em variadas

epistemologias e metodologias, reconfigurar os processos de produção de conhecimento,

ensino e aprendizagem em gestão voltada à formação de pessoas para atuar no campo da

Gestão Social.

Um dos exemplos dessa busca é a consolidação da chamada Social Enterprise

Knowledeg Network (SEKN), uma rede de investigação do campo da Gestão Social

envolvendo pesquisadores de diferentes países, sendo representada pelo Centro de

Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (CEATS) da Universidade de

São Paulo (USP), que tem procurado estabelecer um diálogo mais equilibrado entre centros de

pesquisa baseados em países centrais e em economias emergentes e em desenvolvimento, bem

como difundir nas escolas de administração o reconhecimento de empreendimentos que

muitas vezes passam despercebidos ou se tornam invisíveis para projetos de pesquisa

centrados no ethos tradicional funcionalista-gerencialista em Administração. Além disso,

experiências atuais de formação na pós-graduação levadas a cabo pelo CEATS/USP em

articulação com o Instituto IPÊ, se dando fora de instituições de ensino e processos

tradicionais de ensino-aprendizagem, são outro exemplo dos esforços de reconfiguração da

produção de conhecimento em Gestão Social levadas a cabo no contexto brasileiro.

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Outra importante frente de trabalho é a da chamada Residência Social metodologia de

ensino apoiada na inserção do aluno no contexto investigado. Oriunda dos estudos de T. M.

D. Fischer e Melo (2006) e Carrion (2006), sua concepção e atuação são disseminadas por

trabalhos científicos e por experiências concretas de formação. Seguindo essa trilha, outras

pesquisas foram desenvolvidas no âmbito do processo de ensino-aprendizagem, “revelando

uma multiplicidade de interpretações que a temática alcança, assim como a diferença de

componentes curriculares e estratégias de ensino-aprendizagem” (Boullosa, Araújo, Melo,

Schommer & T. M. D. Fischer 2010 p. 380). Nesse aspecto, salientam-se os estudos de

Schommer e Santos (2010) que se apoioram na pesquisa “Comunidades de Práticas com

Bases da Aprendizagem em Processos de Desenvolvimento Sócio-territorial”, realizada entre

2006 e 2009. Durante este período, as pesquisadoras buscaram ampliar a compreensão de

processos de aprendizagem organizacional com base em comunidades de práticas no âmbito

de programas acadêmicos que visam contribuir para o desenvolvimento sócio-territorial no

Estado da Bahia. (Schommer e Santos, 2010).

Ainda no escopo dessa discussão, observam-se trabalhos que propõem a reflexão sobre

o significado da Gestão Social e sua importância para a Administração. Conduzidos por

práticas metodológicas de cunho integrativo e compartilhados tais trabalhos não buscam uma

posição hegemônica da academia sobre os atores investigados (Ospina, Godsoe & Schall,

2001, T. M. D. Fischer e Melo, 2006, Carrion, 2006, Boullosa e Schommer, 2010, Gianella,

2008). Percebe-se nesse contexto diversas iniciativas com metodologias que pretendem

reconfigurar e ressignificar a relação entre sujeito investigador, geralmente um acadêmico, e o

objeto investigado, geralmente um coletivo de sujeitos envolvidos na prática de um campo, os

praticantes da Gestão Social, no caso específico do foco desta tese.

Destaca-se que alguns constructos teóricos que delimitam a discussão sobre

aprendizagem da Gestão Social se fundamentam na abordagem socioprática, cujos

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pressupostos apoiam-se no resultado das interações e práticas compartilhadas pelas pessoas,

manifestando-se nas posturas cotidianas. Segundo Easterby-Smith, Araujo (2001) e Lave,

Wenger (1999), a aprendizagem não deve ser encarada como um objeto a ser analisado, um

produto ou um processo técnico que aconteceria na mente dos indivíduos, mas sim como uma

prática social que seria parte do processo de construção da realidade, entrelaçada com a

cultura e com a política.

Compreende-se que a noção de aprendizagem baseada na abordagem socioprática

vincula-se intrinsecamente ao conhecimento que é produzido no campo da Gestão Social. Isso

se deve ao fato de se observar uma busca de integração do conhecimento já existente neste

campo com as dinâmicas sociais, políticas, econômicas e culturais que envolvem os atores no

processo de ensino-aprendizagem. Nesse sentido, pressupõe-se que a produção de

conhecimento precede as relações entre atores de campos diferentes que, ao interagirem por

meio da convergência ou divergência de ideias, induz a reflexão e a transformação de

significados. Essa perspectiva comunga com as temáticas que ancoram a Gestão Social ao

denotar possibilidades de envolvimento das pessoas, do relacionamento humano com vistas

ao desenvolvimento social (França Filho, 2008, Carrion & Calou, 2008). Ressalta-se ainda

que, o conhecimento configurado na ação socioprática implica no envolvimento de saberes

híbridos, os quais se traduziriam na interdisciplinaridade (Santos, 2004, Leff, 2001, Gianella,

2008, Campos, Mendonça & Alves, 2012).

Esse pressuposto permite analisar a relação entre academia e praticantes no contexto

brasileiro de produção de conhecimento sobre Gestão Social como um rol de interações

sociais que carregam em si possibilidades e limites para a transformação do seu campo. A

escolha desses dois grupos de atores (acadêmicos e praticantes) se deu por observar ações

orientadas para a produção de conhecimento sobre Gestão Social marcadas por articulações e

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interações, mesmo que revestidas de divergências e conflitos, que resultam em conhecimento

mediado por suas interpretações de mundo.

Vale destacar que o interesse primário em estudar e investigar a relação entre

academia e praticantes no contexto brasileiro de produção de conhecimento sobre Gestão

Social foi guiada pela trajetória acadêmica e profissional da autora da presente tese. O

trabalho desenvolvido como Secretária Municipal de Educação do município de São João del

Rei/Minas Gerais, no período de 2006 a 2009, foi um dos pilares para se refletir,

compreender, entusiasmar e desanimar com as com as maneiras inventivas e as agruras do

cotidiano que os diferentes atores envolvidos com a educação do município vivenciavam. Esta

experiência a conduziu para o mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento

Local do Centro Universitário UNA de Belo Horizonte/MG, a qual buscou analisar a

implementação da Pedagogia Empreendedora na rede municipal de ensino em São João Del

Rei com o intuito de discutir suas implicações e desdobramentos para o desenvolvimento

local. Motivada pelas discussões e pelas temáticas que abrangiam a Gestão Social, bem como

pela experiência acadêmica em lecionar disciplinas de cunho tradicional no âmbito da

Administração, na Universidade Federal de São João del Rei/MG, a pesquisadora seguiu para

o doutorado em Administração na PUC Minas, dando continuidade aos estudos sobre Gestão

Social e educação.

A participação no Núcleo de Pesquisa em Ética e Gestão Social (NUPEGS) do

Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da PUC Minas foi outro fator indutor

para a investigação da produção de conhecimento sobre Gestão Social e as relações derivadas

do envolvimento dos atores deste campo, uma vez que é um núcleo de pesquisa aberto não

somente a comunidade acadêmica, mas também aos praticantes interessados em discutir,

dividir, dialogar e refletir sobre suas práticas, dinâmicas e articulações no campo da Gestão

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Social. Todos esses fatores foram relevantes para a escolha do tema e objeto de pesquisa aqui

desenvolvidos.

Percebe-se que na tentativa de aprofundar a interação entre acadêmicos e praticantes,

muitos desafios, dilemas, armadilhas e controvérsias se apresentam. Alguns deles remetem à

questões estruturais envolvendo o papel que o conhecimento científico e seus agentes,

notadamente as universidades, exercem nos tempos atuais. A universidade contemporânea se

destaca por ela incidir na construção e ampliação do conhecimento como fonte de

desenvolvimento do indivíduo e da sociedade. Nesse âmbito, nota-se a relevância da tríade

ensino, pesquisa e extensão, a qual envolve as relações entre academia e praticantes que, por

vezes, denotam os dilemas vivenciados pela universidade na atualidade (Chauí, 1999, Santos,

1997, 2004).

Tais dilemas a conduziram a ações contraditórias ao se aproximar dos preceitos

impostos pela lógica de mercado, configurando assim, uma crise institucional (Santos 1997).

Nota-se que essa crise coloca a especificidade organizativa da universidade contemporânea

em causa, de modo que modelos vigentes em outras instituições tidas como mais eficientes

são impostos às demais (Santos, 1997, Chauí, 2003, Bauman, 2008, Ribeiro, 2003). Neste

cenário, observam-se processos sociais que colocam em xeque a hegemonia do conhecimento

científico e das universidades na própria produção de conhecimento. Diferentes atores sociais,

de fora e de dentro da própria universidade, têm cada vez mais questionado a compreensão de

mundo que colocam a ciência e a universidade como únicas e exclusivas formas de produção

de conhecimento relevante (Santos, 2004).

A partir deste contexto, a universidade contemporânea se depara com outro dilema que

se apoia na legitimidade do conhecimento produzido por ela. Tal quadro se destaca em face

da contradição entre a hierarquia dos saberes especializados que passam a ter acesso restrito e

da credenciação das competências, e as exigências sociais e políticas da democratização da

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universidade contemporânea (Santos, 2004, 1997). Essas crises se refletem na tríade ensino-

pesquisa-extensão, ao não conceber de forma mais pujante no âmago de suas diretrizes a

interrogação, reflexão, crítica, descoberta, invenção e criação. Pelo contrário, a atividade

científica seria cada vez mais mediada e dominada por processos burocráticos, pouco

inventivos e criativos de produção de conhecimento (Chauí, 1999).

No campo de conhecimento da Administração, nota-se um quadro crítico semelhante e

que parece, muitas das vezes, tornar ainda mais agudos esses desafios, contradições e dilemas.

Salienta-se o interesse de grande parte das Instituições de Ensino Superior (IES) em fortalecer

o ensino em detrimento da pesquisa, como forma de reproduzir a lógica do mercado e, com

isso, estabelecer laços mais sólidos com as corporações. Neste sentido, haveria forte interesse

em ampliar a participação no mercado de ensino corporativo e criar produtos e serviços

atrativos para esses atores (Paes de Paula e Rodrigues, 2006, Alcadipani, 2011, Spink e Alves,

2011).

O cenário acadêmico sempre foi marcado pela presença dos chamados praticantes,

visto que a suposta separação entre academia e mundo da vida ou entre teoria e prática,

comumente presente em discursos construídos pelos atores sociais, não passa de uma

racionalização e idealização sobre a própria realidade. A universidade, seus atores (os

acadêmicos como se denomina na presente tese) e seus processos de produção e difusão de

conhecimento se inserem e acontecem sempre dentro da sociedade e mediados por interações

com atores que estão dentro e fora do espaço acadêmico per si. Em muitos momentos da vida

acadêmica, a aproximação com atores que se vinculam a instituições não acadêmicas se torna

mais evidente e intensa, quer seja nos processos de ensino, pesquisa e ou extensão. Ainda

assim, no presente estudo mantém-se a denominação de praticantes para aqueles atores

vinculados à organizações não acadêmicas que se situam no campo da Gestão Social,

notadamente as organizações da sociedade civil (OSCs), como recurso para melhor estruturar

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o processo investigativo desta tese e não como adesão à uma compreensão que remete à eles

apenas o papel de ativistas ou "fazedores". Em suma, acadêmicos e praticantes são, em

diferentes medidas e formas, atores que desenvolvem ação social (agem) e produzem

diferentes formas de conhecimento simultaneamente.

As interações oriundas desses atores demonstram perspectivas de relações que, mesmo

imbuídas de interesse comum, se afirmam mediante a presença de saberes híbridos e a

processos conflituosos. Ao serem observados a partir da visão complexa de mundo, a qual

desafia a compreensão da “multiplicação das formas de vida que convivem uma ao lado da

outra” (Gianella, 2008 p. 19), a própria natureza do conhecimento produzido mudaria de

traço, pois, “se trata de reconstruir juntos o sentido das diversas visões coexistentes e tentar

resolver os problemas derivantes da convivência” (Gianella, 2008, p. 19). Nesse sentido, o

problema do conhecimento se desloca para os efeitos da relação entre o saber e o ser em um

processo de reapropriação do mundo no qual se observa interações sociais complexas dentro

de um campo e a presença de saberes e formas de conhecimento híbridos (Leff, 2001, Morin,

2008).

A apropriação e produção de conhecimento que se manifesta por meio da abordagem

socioprática não se opõe aos processos cognitivos de aprendizagem. Ao contrário, eles são

compreendidos como complementares, sem hierarquias e sem a imposição da visão

dicotômica apregoada pelo paradigma positivista, no qual se observa oposições entre teoria e

prática (Santos, 1997, Gianella, 2008).

É nesse aspecto que reside a relevância em se analisar a relação entre academia e

praticantes no contexto brasileiro de produção de conhecimento sobre Gestão Social o qual

demonstra espaços de interação, de confronto relativo aos diferentes modos de ver, de

entender, dotados de possibilidades e de limites para a transformação do seu campo.

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A outra questão que justifica a analise da relação entre academia e praticantes no

contexto brasileiro de produção de conhecimento sobre Gestão Social vincula-se a uma lacuna

teórica presente na literatura científica brasileira. Se por um lado percebe-se uma importante

trajetória de pesquisas e debates sobre a formação de gestores vinculados as discussões sobre

o ensino e aprendizagem em Gestão Social, por outro ainda reside um espaço para se explorá-

la. Este espaço se constitui da carência de estudos direcionados ao conhecimento que é

produzido sobre Gestão Social nas relações convergentes e/ou divergentes que se afirmam

entre acadêmicos e praticantes desse campo.

Infere-se que essas relações são constituídas por processos de colaboração e de

disputa. Porém, destaca-se que a disputa não se apoia em espaços sociais excludentes e

distintos, mas sim sobrepostos e híbridos. Conforme Bourdieu (1989, 1996), elas se

tencionam em campos de poder que são munidos de interesses comuns e individuais, de

práticas e dinâmicas que se convergem e que se divergem, permitindo observar a produção de

conhecimento sobre Gestão Social entre atores distintos.

As discussões procedentes dessa perspectiva teórica podem contribuir para se

problematizar com maior consistência e vigor a produção de conhecimento em Gestão Social,

bem como outras abordagens cujo cerne de seus pressupostos subsidia a produção

socioprática de conhecimento. Partiu-se do pressuposto que atores dotados de habilidade

social, a qual representa capacidade de fazer o outro a cooperar para um fim comum

(Fligstein, 2007), detém um demonstrativo de força a se converter a favor de um campo. Em

outras palavras, atores dotados de habilidade social contribuem para o fortalecimento de um

campo, no caso, o próprio campo da Gestão Social frente a outros campos de produção de

conhecimento em Administração. Por outro lado, apreende-se que, as perspectivas que

circundam a produção de conhecimento socioprático, assumida por esta tese como o cerne no

processo de construção de conhecimento da Gestão Social, podem ser compreendidas e

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aprofundadas pelas discussões sobre saberes híbridos, gerados pelos atores sociais tanto no

âmbito da universidade quanto na prática da Gestão Social.

O conceito de hibridismo, oriundo das ciências biológicas, tomou uma dimensão mais

heterogênea ao ser adotado por outras ciências como possibilidade de mistura, de mesclagem.

Essa denotação, baseada nas relações entre atores sociais distintos, permite se considerar que

a produção de conhecimento sobre Gestão Social constitui-se de saberes híbridos, os quais,

conforme o tipo de relação prevalecente entre eles, mais autoritária ou mais colaborativa,

poderão se traduzir na força de um campo (Leff, 2001, Morin, 2008).

Mediante as discussões propostas que se vinculam ao objeto de estudo desta tese, as

relações entre acadêmicos e praticantes do campo da Gestão Social, se delineou a seguinte

pergunta de pesquisa: “Como se dão as relações entre acadêmicos e praticantes no contexto

brasileiro da produção de conhecimento sobre Gestão Social”?

A fim de avançar na investigação proposta pela pergunta de pesquisa que organiza a

presente tese foram selecionados sete centros de estudo e pesquisa em Gestão Social, bem

como seus programas de pós-graduação stricto sensu e oito organizações da sociedade civil.

Com relação aos acadêmicos, buscou-se investigar centros de estudos e pesquisas que

se destacassem por meio de práticas sociopráticas de produção de conhecimento em Gestão

Social a partir da interação entre o ensino, a pesquisa e a extensão. Ressalta-se que alguns

desses centros de pesquisas são marcados pela presença de pesquisadores seniores que

contribuíram para a constituição deste campo de estudo no país.

Nesse contexto, as unidades de análise elegidas foram: o Centro de

Empreendedorismo Social e Administração do Terceiro Setor (CEATS), do Departamento de

Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da

Universidade de São Paulo (USP), o qual se destacou por evidenciar um interesse em

desenvolver um olhar ampliado das questões sociais ao efetivar parcerias com universidades

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de outras nacionalidades, passando a constituir a rede de pesquisadores Social Enterprise

Knowledge Network (SEKN).

O Programa de Estudos em Gestão Social (PEGS), vinculado à escola Brasileira de

Administração Pública e de Empresas (EBAPE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), foi outra

unidade de análise selecionada por ter sido pioneira no Brasil em apresentar o campo de

estudo da Gestão Social vinculado às relações sociedade-Estado, trabalho-capital e sociedade-

mercado.

Em uma vertente semelhante, porém pautada na perspectiva de apoio a iniciativas

inovadoras no campo da ação pública, elegeu-se o Centro de Estudos em Administração

Pública e Governo (CEAPG), pertencente a Escola de Administração de Empresas de São

Paulo (EAESP), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), juntamente com o Programa de Gestão

Pública e Cidadania (PGPC).

O Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social da Universidade

Federal da Bahia (CIAGS/UFBA) foi outra unidade de análise escolhida. Ao se instituir

movido pelas abordagens do desenvolvimento sócio-territorial e por intervir na gestão pública

e gestão social por meio de dinâmicas ancoradas no ensino e a pesquisa, se destaca como um

lócus acadêmico que visa a produção e difusão de conhecimento em Gestão Social de cunho

integrativo e visando reconfigurar a relação entre acadêmicos e praticantes.

Outras unidades de pesquisa foram selecionadas, tais como o Núcleo Interdisciplinar

de Pesquisas e Estudos Sobre o Terceiro Setor (NIPETS) da Universidade Federal do Rio

Grande do Sul (UFRGS); o núcleo de Estudos de Administração do Terceiro Setor (NEATS)

da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e o Núcleo de Pesquisa em Ética

e Gestão Social (NUPEGS) da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC

Minas). Esses núcleos de estudos se destacaram por objetivarem contribuir para o

desenvolvimento dos diferentes segmentos da sociedade civil por meio da interação com

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praticantes da Gestão Social. Além disso, outro critério relevante nessa escolha se deve à

antiguidade desses núcleos de pesquisa, dado que será mais bem explicado e justificado no

capítulo sobre procedimentos metodológicos.

No campo dos praticantes, foram selecionadas unidades de análise de forma

heterogênea com o intuito de abranger instituições da esfera pública, do Estado e do mercado,

uma vez que, apesar de trazerem em seu âmago as temáticas que envolvem a Gestão Social,

se constituíram a partir de realidades e grupos de atores sociais distintos, desenvolvendo

também dinâmicas diferentes de atuação na produção de conhecimento.

A relevância de suas práticas para a Gestão Social apoiadas na interseção e no diálogo

com atores de outros campos foi também outro ponto designado como crucial para a sua

escolha, a qual se deu a partir da observação em sítios institucionais de OSCs do Brasil que

apresentavam diferentes atividades e processos de produção de conhecimento sistematizadas

através de parcerias com diversos atores do campo da Gestão Social, em especial com os

acadêmicos. A pesquisa em periódicos científicos nacionais e internacionais, bem como

relatórios institucionais gerados por OSCs do Brasil, foi outra fonte que serviu para se

levantar a relevância sobre a produção de conhecimento desses atores investigados.

Mediante tais dados, foi possível observar que nas últimas décadas houve uma

expansão de pesquisas realizadas por diferentes praticantes da Gestão Social, a saber,

organizações da sociedade civil como a Fundação AVINA e a Associação Brasileira de

Organizações Não Governamentais (ABONG), fundações empresariais como o GIFE e o

Instituto Ethos, organismos internacionais como o Banco Mundial e o Banco Interamericano e

órgãos governamentais como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Nota-se

que todos eles têm procurado produzir conhecimento sobre a realidade social, disputando

espaço com os acadêmicos na produção de compreensões sobre os aspectos políticos,

culturais e econômicos contemporâneos que perpassam os debates do campo da Gestão

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Social. Ora trabalham em articulação e parceria com os acadêmicos, notadamente as

universidades, ora produzem conhecimento com seus próprios recursos, inclusive humanos.

Neste âmbito, foram investigadas as seguintes organizações sociais: Fundação AVINA,

Fundação AVSI, Cooperação para o Desenvolvimento e Morada Humana (CDM), Instituto

Hartmann Regueira, Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), Grupo de Instituições,

Fundações e Empresas (GIFE), Instituto Camargo Corrêa e a Federação das Indústrias do

Estado de Minas Gerais (FIEMG).

A partir dessa realidade sobre a relação entre atores acadêmicos e praticantes da Gestão

Social, foram delimitados os seguintes objetivos de pesquisa.

Objetivo Geral:

Analisar a relação entre academia e praticantes no contexto brasileiro de produção de

conhecimento sobre Gestão Social.

Objetivos Específicos:

Identificar atores acadêmicos e praticantes da Gestão Social relevantes nos processos

de produção de conhecimento no Brasil;

Discutir a compreensão que acadêmicos e praticantes constroem sobre a produção de

conhecimento em Gestão Social;

Analisar as habilidades sociais e o hibridismo que se manifestam nas relações entre

acadêmicos e praticantes envolvidos no campo da Gestão Social no contexto

brasileiro;

Discutir possibilidades e limites para a superação dos problemas que envolvem a

produção de conhecimento sobre Gestão Social a partir da relação entre acadêmicos e

praticantes desse campo no Brasil.

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A proposição de analisar a relação entre academia e praticantes no contexto brasileiro

de produção de conhecimento sobre Gestão Social remete a aspectos ontológicos que

permeiam a subjetividade da realidade e do fenômeno investigado. Essa premissa exige uma

pesquisa fundamentada não somente nos fatos em sim, mas principalmente, que busque

alcançar o âmago de sua ocorrência e recorrência, de modo a observar todas as nuances que a

configuram, dando destaque às dinâmicas da ação social pautadas nas habilidades sociais e

nas possibilidades híbridas de conhecimento. Mediante esses aspectos optou-se pela pesquisa

qualitativa como epistemologia e metodologia estruturantes da investigação.

A tese foi estruturada em vários capítulos que se iniciam a partir do capítulo 2,

“Gestão Social: temáticas que permeiam o seu campo”, cuja discussão aborda a Gestão Social

como área interdisciplinar de conhecimento e de atuação. Buscou-se caracterizá-la conforme

os aspectos do contexto social no Brasil de forma a discutir as temáticas que a envolvem e

fundamentar o conhecimento que é produzido no seu campo de atuação. Na parte seguinte,

mais especificamente no capítulo 3, intitulado “Perspectivas de produção de conhecimento

socioprática integradas ao campo da Gestão Social”, analisaram-se as abordagens que

preconizam a produção de conhecimento socioprática, de forma a apontar sua interelação com

os pressupostos da Gestão Social e os seus desdobramentos entre acadêmicos e praticantes

dentro de um mesmo campo. O capítulo 4, “Relação entre academia e praticantes: campos de

poder que se conectam”, dedica-se a problematizar as relações estabelecidas entre academia e

praticantes, ancoradas pela discussão de campos de poder, considerando os desafios

vivenciados pela a universidade contemporânea, bem como as iniciativas desenvolvidas pelas

universidades como forma de enfretamento aos desafios apontados. Adiante, no capítulo 5,

“Procedimentos Metodológicos”, apresentam-se os recortes epistemológicos e metodológicos

da investigação, seguidos pela discussão dos procedimentos de coleta de dados. No capítulo 6,

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intitulado “Análise dos dados: a produção de conhecimento sobre Gestão Social entre

academia e praticantes”, é analisada os dados de forma integrada às perspectivas teóricas

assumidas por essa tese. Por fim, nas considerações finais, foi retomado cada ponto explorado

na pesquisa com o intuito de desenhar o cenário da produção de conhecimento da Gestão

Social no Brasil associado às possibilidades de ressignificação e transformação do campo em

evidência a partir das interações entre acadêmicos e praticantes. Além disso, se propôs uma

nova agenda de pesquisa sustentada por temas paralelos, mas ainda não investigados, de

forma a suprir algumas lacunas referentes ao tema proposto.

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2 GESTÃO SOCIAL: TEMÁTICAS QUE PERMEIAM O SEU CAMPO

O presente capítulo discute, brevemente, o cenário organizacional oriundo do quadro

industrial brasileiro marcado pelos os seus limites e desafios os quais vêm conduzindo as

novas abordagens de gestão orientada para a lógica social. Nesse âmbito, destaca-se a Gestão

Social como área interdisciplinar de conhecimento e de atuação. Porém, busca-se contemplar

os seus pressupostos e correntes temáticas apresentadas no campo da Administração, uma vez

que se propôs a pesquisar a produção de conhecimento sobre Gestão Social nos interstícios

das relações entre academia e praticantes envolvidas em organizações da sociedade civil.

A Gestão Social pode ser apreendida como uma forma de compreensão das

organizações e do gerenciamento que surge em um contexto marcado por uma “sociedade

managerial”, cujas características decorrem das ideias capitalistas como categorias

dominantes do pensamento econômico e do mercado, atribuindo à empresa e as práticas de

gestão um espaço central, de dominação e alienação da maioria (Chanlat, 1999 p. 16, Sachs,

Lopes & Dowbor, 2010).

Este fenômeno coloca em evidência as expressões gestão, gerir e gestor vinculadas aos

princípios administrativos da empresa privada, que elegeriam atributos como a eficácia,

produtividade, performance, competência, empreendedorismo, qualidade total, cliente,

produto e desempenho como prerrogativas de excelência organizacional (Aktouf, 1996).

Originário da indústria nascente, o universo da gestão é dominado pelos engenheiros

que escreveram os primeiros manuais de economia para manufaturas, predominando as

manifestações técnicas e econômicas em detrimento de outros aspectos sociopolíticos que

permeiam as organizações e sua gestão (Chanlat, 1999). O crescimento do tamanho das

empresas em alguns setores industriais e a expansão dos serviços, da produção e do mercado,

mais particularmente, no final do século XIX, levaram as empresas a se ampliar, aumentando

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paralelamente a necessidade de regulamentação das funções de gestão e de controle das

corporações (Aktouf, 1996, Chanlat, 1999, Dowbor, 1999).

“A partir desse momento, a gestão de empresas conhece um grande desenvolvimento e

transforma-se em outra manifestação do crescimento da racionalização do mundo ocidental”

(Chanlat, 1999 p. 32). Esse movimento, sob a influência financeira e em nome da

globalização, é marcado por várias formas: as fusões e as aquisições, as reestruturações em

massa, a utilização de técnicas que buscam reduzir o tempo de resposta e os custos

operacionais das organizações que, até o presente momento, estão longe de alcançar os

objetivos estabelecidos inicialmente (Chanlat, 1999, Sachs et al, 2010).

Decorrente desse contexto, a “era das certezas pautada no pensamento mecânico

passou, levando muitos a olharem com surpresa e ansiedade a boa administração, as riquezas,

a produtividade e a eficiência econômica em detrimento da degradação da natureza e da

qualidade de vida” (Aktouf, 2001 p. 14).

Em face aos graves problemas afrontados pela sociedade, fragmentação do social,

empobrecimento, precariedade, exclusão, risco ecológico, urge a necessidade de se ampliar os

horizontes dos aspectos propriamente humanos. Assim, a dimensão social do

desenvolvimento deixa de ser um "complemento", para se tornar um dos componentes

essenciais da transformação social (Chanlat, 1999, Dowbor, 1999).

No decorrer de meio século, passamos de uma visão filantrópica, de

generosidade assistencial, de caridade, de um tipo de bálsamo tranquilizador

para as consciências capitalistas, para a compreensão de que a área social se

tornou essencial para as próprias atividades econômicas. Esta mudança

profunda de enfoque foi positiva. As áreas empresariais, com suporte de

numerosos estudos do Banco Mundial, passaram a entender que não se trata

de simples cosmética social, mas das próprias condições indispensáveis para

a produtividade empresarial (Dowbor, 1999 p. 8).

No cenário apontado, se observaria o retorno do ator social ao se destacar que toda

pessoa pode se constituir em um sujeito ativo e que a realidade das organizações se produz,

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reproduz e se transforma por meio da interação dos diferentes grupos e indivíduos que as

compõem (Chanlat, 1999, Dowbor, 2005).

A partir do reconhecimento deste sujeito coletivo, imbuído de subjetividade, crítica e

reflexão de si mesmo, nasce a Gestão Social. Marcada pela ideia de centralidade do sujeito

nas esferas sociais, suas dinâmicas tentam articular o pensamento técnico dos que trabalham

com os processos econômicos com o pensamento imbuído de valores sociais. Essa

perspectiva, ainda que assinalada por aspectos que buscam mediar as “deformações das

prioridades que levou aos dramas atuais”, (Araújo, 2012 p. 15), sinaliza as dificuldades e os

conflitos presentes em processos no qual se prevê a interação entre o social, o econômico e o

político (Abramovay, 2012, Dowbor, 2010).

Tal visão aproximaria a Gestão Social a valores e práticas fundados na democracia e

cidadania, tendo em vista, o enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos

direitos humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de

nova civilidade (Dowbor, 2008). “Estes referenciais apontam a práxis da Gestão Social,

enquanto mediação para a cidadania, que se contrapõe à perspectiva instrumental e mercantil

que vem sendo dada a este tema” (Maia, 2005 p. 16).

Vale destacar que a popularização do adjetivo "social" atrelada à gestão gera muita

ambiguidade sobre o que se está falando e tratando efetivamente (Pinho, 2010 p. 22), podendo

incorrer à prática da gestão dos problemas sociais ou ambientais e não a forma articulada de

organizar o conjunto para que funcione (Sachs et al, 2010). Nesse aspecto, poderia se

constituir uma "gestão contra o social", que conforme defende Maia (2005), se vinculam aos

processos de gestão no campo social, porém implementados a partir dos valores e propósitos

pouco democráticos, distantes da ampliação da cidadania e difusores de uma abordagem

extremamente tecnicista de gestão, além de alicerçar valores capitalistas. A partir desse foco,

os valores e propósitos do modelo de gestão adotado ficam facilmente identificados ao

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reconhecer o homem neste projeto como objeto e não sujeito desse processo, já que a

centralidade da gestão residiria na técnica e no capital (Maia, 2005). Em decorrência disso, os

discursos e agendas de ação na esfera das políticas públicas, estratégias empresariais e

iniciativas da sociedade civil reduziriam a magnitude de transformação do campo da Gestão

Social ao traduzi-la em ações gerenciais na busca da eficiência e da eficácia de seus

resultados.

Por se tratar de um tema recentemente explorado no cenário brasileiro e por estar

associado às temáticas relativas às transformações do tecido social, o seu campo se encontra

em construção ou “in progress” (Bollousa, 2009). Percebe-se que a utilização do termo pode

se relacionar aos atores sociais que a empregam, ao universo organizacional em que é

exercida, às finalidades que se pretende atingir por meio da Gestão Social ou, ainda, às

características do processo de gestão a que se refere (Schommer e França-Filho, 2008). Esses

atributos têm motivado reflexões a respeito do significado da Gestão Social e de suas

características distintivas em relação a outros campos da gestão e outras maneiras de gerir.

Em meio a essas propriedades, assinala-se uma aproximação, mesmo que ainda tímida,

com o campo do trabalho social, decorrente da primazia dos valores democráticos e da defesa

de direitos, bem como pela essencial necessidade de inovação nas práticas de gestão, de modo

que se tornem mais relacionais e humanitárias (Araújo, 2012). Essa perspectiva estaria

aprofundado o discurso da Gestão Social no âmbito do Serviço Social, apontando novos

meios de implementar e gerir as políticas públicas territoriais com vistas à garantia dos

direitos para a promoção da cidadania (Maia, 2005).

Segundo Maia (2005), o Serviço Social constitui-se em um importante campo para a

afirmação da práxis da Gestão Social, especialmente pelo conjunto de compromissos e

referenciais ético e políticos, teórico e metodológicos e técnico e operativos, que objetivam a

afirmação dos valores da cidadania, democracia e justiça social. A autora ainda afirma que os

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assistentes sociais contam com aportes significativos para contribuir na ampliação desse

debate, produções e práticas.

De forma similar, nota-se no campo da Administração um interesse não só em

desmistificar as "proezas convencionais" da gestão técnica e racional por meio de debates

teóricos e práticos relacionados à Gestão Social, como também em “construir novos

elementos, formas e finalidades de gerir as organizações e interorganizações voltadas para o

desenvolvimento socioterritorial” (Araújo, 2012 p. 19).

Nesse quadro, podem-se destacar as contribuições da Rede de Pesquisadores de

Gestão Social (RGS) as quais demonstram tentativas de desenvolver articulações

democráticas mediante uma visão intersetorial e interorganizacional (Mendonça, Gonçalves-

Dias & Junqueira, 2012).

A trajetória da Rede de Pesquisadores de Gestão Social iniciou em 2003,

informalmente, a partir da integração entre pesquisadores que já se articulavam

conjuntamente em diferentes iniciativas sócio organizacional. Decorrente dessa integração,

outros encontros de discussão e interações sob a perspectiva da Gestão Social foram

desenvolvidos, contemplando a apresentação de trabalhos científicos provenientes do campo

da Administração e áreas afins. Tais encontros eram e são promovidos pelo Encontro

Nacional de Pesquisadores em Gestão Social (ENAPEGS) que, desde 2007, vem buscando

ampliar o intercâmbio entre pesquisadores e atores sociais interessados na Gestão Social.

Segundo Cançado (2011) e Mendonça et al (2012), o evento pode ser considerado,

hoje, no país, o principal espaço de discussão da temática, o que é confirmado pela quantidade

de artigos submetidos no período de 2010 a 2012, alcançando mais de 350 (trezentos e

cinquenta) submissões. Além das contribuições da Rede de Gestão Social, observa-se um

movimento de construção desse campo a partir do surgimento de centros de pesquisas que se

dedicam ao estudo da temática. Nesse contexto, destaca-se a criação do Programa de Estudos

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em Gestão Social, vinculado à escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da

Fundação Getúlio Vargas (PEGS/EBAPE/FGV), em 1990, como centro pioneiro no estudo da

Gestão Social no Brasil (Cançado, 2011). Em seguida, o estudo da Gestão Social se prolifera

por meio do Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social da Universidade

Federal da Bahia (CIAGS/UFBA), bem como, pelo o Centro de Empreendedorismo Social e

Administração em Terceiro Setor da Universidade de São Paulo (CEATS/USP). O Núcleo

Interdisciplinar de Pesquisas e Estudos Sobre o Terceiro Setor da Universidade Federal do

Rio Grande do Sul (NIPETS/UFRGS) e o núcleo de Estudos de Administração do Terceiro

Setor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (NEATS/PUC-SP) também se

apresentam como espaço de debates para essa construção.

Conforme Araújo (2012), como precursores da discussão que embasa o estudo da

Gestão Social, destacam-se as contribuições de Tenório (1998); Dowbor (1999); T. M. D.

Fischer (2002); Carrion (2006) e Junqueira (2008).

Em sua trajetória científica, Tenório (2008) aponta a Gestão Social como

“possibilidade de uma gestão democrática, participativa, quer na formulação de políticas

públicas, quer naquelas relações de caráter produtivo” e faz uma crítica ao termo quando esse

é associado à “gestão de políticas sociais, de organização do terceiro setor, do combate à

pobreza e até ambiental” (Tenório, 2008 p. 148).

Destacam-se também as produções da professora Tânia Fischer, criadora do Programa

de Desenvolvimento e Gestão Social (PDGS), em 2001, institucionalizado como CIAGS na

UFBA, a partir das várias pesquisas e experiências de ensino que desenvolve (Araújo, 2012).

No âmbito de suas proposições, a autora remete à Gestão Social a gestão do território social,

ancorado-a ao contexto local e nas articulações dos vários atores que o constituem (T. M. D.

Fischer, 2002). Nessa vertente, Dowbor (1999, 2008), sugere a redefinição das relações entre

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o político, o enconômico e o social, como ponto crucial para se repensar as formas de

organização social.

Ainda, conforme as abordagens iniciais da Gestão Social, Carrion (2007) e Junqueira

(2008) ampliam a temática com discussões oriundas do combate à pobreza, garantia dos

direitos de cidadania e promoção do desenvolvimento (Araújo, 2012).

Apreende-se que a compreensão da complexidade da realidade na qual a Gestão Social

se insere contribuiria para destacar o seu caráter interdisciplinar, uma vez que, complexidade

em latim, “Complexus significa aquilo que é tecido junto, entrelaçamentos múltiplos”

(Mariotti, 2000). Essa proposição integraria conhecimentos orientados para a solução de

problemas que afetam pessoas, organizações e a realidade social na qual se inserem

(Mendonça et al 2012). Nesse sentido, observa-se que o campo da Gestão Social vem se

constituindo por meio de múltiplos saberes, definições e práticas que precedem a lógica

social, não se limitando a um conceito único.

Alguns autores como Tenório (2004, 2005), Boullosa e Schommer (2005), Gondim, T.

M. D. Fischer e Melo (2006) e França-Filho (2008) destacam a abordagem da participação

como elemento fundamental da Gestão Social. Dessa forma, a participação é reconhecida

como um processo baseado não somente na estratégia, mas, especialmente, na comunicação e

no diálogo, em espaços nos quais todos compartilham o direito à fala e o direito de participar

das decisões sobre objetivos e meios para atingi-los (Gondim, T. M. D. Fischer & Melo,

2006).

Conforme os argumentos acima, Gondim et al (2006, p. 70) afirmam que “a Gestão

Social deve estar a serviço de muitos, de interesses sociais e do bem comum”, de forma que, a

identificação desses interesses, desejos e opiniões daqueles que pretendem servir a Gestão

Social se constitui por meio da “participação dos próprios beneficiários da gestão, em

interação e por meio de relações dialógicas” (Gondim et al 2006 p. 70).

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Ao utilizar a razão a partir do consenso alcançado por ação social baseada, sobretudo,

na comunicação e no diálogo, evidenciar-se-ia a necessidade de acordos alcançados

comunicativamente (Tenório, 2004). Em outras palavras, a Gestão Social segundo Tenório

(2004), se orientaria para um processo de governança no qual se buscaria a inclusão daqueles

atores sociais que em outros contextos e modelos de gestão são tomados como meros objetos

e elementos passivos no processo administrativo. A solidariedade também apareceria como

um dos motivos constitutivos da própria gestão, que se encontraria em discordância com o

que se manifesta, sobretudo em muitas das abordagens e intervenções gerenciais no universo

das organizações empresariais privadas (Tenório, 2005). “Enquanto na gestão estratégica

prevalece o monólogo, o indivíduo, na Gestão Social deve sobressair o diálogo, o coletivo”

(Tenório, 2005 p. 36).

Ao destacar a inclusão dos autores em processos organizacionais de bases dialógicas,

observa-se que a Gestão Social contribuiria para a emancipação das pessoas, se colocando

como uma “gestão no qual o ser humano se desenvolve e com isto, a própria sociedade se

desenvolve nas mais variadas dimensões: ambiental, econômica e cultural” (Cançado, 2011 p.

124). Em relação à hegemonia da tradição positivista, centrada na racionalidade utilitária do

pensamento administrativo, compreende-se que Gestão Social poderia ser considerada como

uma “linha de fuga” na qual os agentes do processo, administradores e administrados,

desenvolvem suas ações de forma emancipatória” (Tenório, 2008 p. 31).

Nota-se que, a abordagem da Gestão Social atrelada aos preceitos que incorporam a

noção da participação e da emancipação social representa os meios no qual ela se articula,

configurando-se em processos. Porém, “a ideia de Gestão Social orienta-se à gestão das

demandas e necessidades do social” (França-Filho, 2008 p. 29), conferindo a ela a noção de

fim ou como uma finalidade a ser alcançada. Este escopo teria surgido no seio da

modernidade em uma sociedade na qual a esfera econômica desempenha efetivamente um

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papel determinante, já que se vive em uma sociedade do trabalho e na qual o "social" seria

identificado como um dos espaços do não trabalho (França-Filho, 2008). Neste âmbito, nota-

se certa confusão ao compreender Gestão Social com gestão pública cuja ideia é contestada

por alguns autores como França-Filho (2008) Pinho (2010), T. M. D. Fischer (2008), Tenório

(2004).

Essa noção crítica permite orientar a discussão da Gestão Social para um novo

paradigma de interação entre Estado e sociedade (Boullosa & Schommer, 2005). Um modelo

no qual o Estado reveria sua suposta primazia na condução de processos de transformação

social e assumiria a complexidade de atores e de interesses em jogo como definidora dos

próprios processos de significação e construção de bens públicos. A partir dessa visão, o

público corresponderia a um espaço de interações entre diversos interesses que, articulados,

definiriam valores comuns, envolvendo os direitos dos cidadãos e sua participação na gestão

(Boullosa & Schommer, 2005, Gondim et al, 2006).

Além dessa aproximação teórica, observa-se que o termo Gestão Social se inseriria

também nos debates sobre a noção de desenvolvimento social orientado pela “transição entre

modelos do século passado e novas formas comprometidas com utopias de desenvolvimento

local, que os tempos de crise fazem emergir” (T. M. D. Fischer, 2006 p. 797).

Essa proposição parte das considerações apontadas por autores como T. M. D. Fischer

(2002), Carrion e Calou (2008) e Gondim et al (2006), ao considerarem a gestão do

desenvolvimento social ou gestão social como um processo de mediação que articularia

múltiplos níveis de poder na sociedade (T. M. D. Fischer, 2002). Nessa perspectiva, a gestão

não se constituiria em uma função exercida apenas por um gestor, mas por um coletivo que

poderia atuar em grau maior ou menor de simetria/assimetria e delegação, o que traria uma

carga potencial de conflito de interesses entre atores envolvidos e entre escalas de poder (T.

M. D. Fischer, 2002).

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T. M. D. Fischer (2002, p. 29) amplia essa discussão ao definir desenvolvimento social

como um espaço “reflexivo das práticas e do conhecimento constituído por múltiplas

disciplinas”, permitindo significar a Gestão Social como gestão orientada para o social

(enquanto finalidade) e pelo social (enquanto processo), norteada pelos princípios da ética e

da solidariedade” (T. M. D. Fischer & Melo, 2006, p. 17). O local tornar-se-ia a esfera por

excelência da Gestão Social, e essa articulação levaria à construção de estruturas de

governança, com significativa participação da sociedade local, configurando um novo modo

de se tecer o desenvolvimento (Carrion & Calou, 2008 p. 17).

A noção de Gestão Social vinculada ao desenvolvimento social se insere em espaços

intersticiais de sobreposições com a esfera estatal e do mercado, nos quais se apresentariam

organizações com múltiplas configurações e, em vários casos, de natureza híbrida (Alves,

2002, Teodósio, 2010). Essas organizações, constituídas da conexão da sociedade civil,

Estado e mercado, ao mesmo tempo em que ganham identidade, se tornariam peças

estratégicas no jogo dos chamados poderes espacialmente localizados (T. M. D. Fischer &

Melo, 2006).

Suas características em relação ao tamanho, grau de formalização, volume de recursos,

objetivos institucionais e forma de atuação variariam de forma expressiva. Mas, nota-se um

consenso vinculado ao poder que desenvolvem relativo a auto-organização, ao potencial de

transformar suas estruturas e estratégias de regulação de seu próprio destino (Martelleto,

1997).

A identificação com a ética do bem comum e o uso do espaço público como contexto

de referência seriam outros atributos preponderantes na formação dessas organizações, que

permitiriam a elas serem interlocutoras importantes no campo das políticas públicas e das

ações de desenvolvimento socioterritorial (T. M. D. Fischer & Melo, 2006).

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Sem incorrer no risco de reduzir as organizações da sociedade civil ao campo de ação

denominado terceiro setor, este espaço no qual se reconhece a atuação dessas organizações

seria constituído por “agentes de natureza privada que praticam ações visando a fins públicos”

(Alves, 2002 p. 2). Segundo Evers (1995, p. 161) as organizações podem ser traduzidas

“como um subespaço do espaço público nas sociedades civis, isso é, como um campo de

tensão sem fronteiras muito definidas, no qual diferentes racionalidades e discursos coexistem

e se interceptam”. As organizações do terceiro setor teriam características polivalentes,

incluindo fatores políticos e sociais. Seriam organizações híbridas e mesclariam recursos e

racionalidades de diversos setores (Evers, 1995, Salamon & Anheier, 1997) as quais são

vistas por muitos como as organizações centrais no campo de estudos e de ação da Gestão

Social. Em ambientes de políticas públicas caracterizadas pelo pluralismo, enfatiza-se no

terceiro setor, a mistura sinergética de recursos e de racionalidades, e passam para o plano

secundário os processos de mera substituição de uns setores por outros na promoção de

serviços e bens públicos (Alves, 2002).

Essa noção circunda o campo da Gestão Social ao se identificar programas públicos e

agentes governamentais, bem como atores empresariais privados vinculados à estratégias de

responsabilidade social. O resultado de tudo isso são múltiplas dimensões de ação e natureza

de ser na Gestão Social, trazendo encontros e desencontros, alianças e embates, racionalidades

híbridas e não necessariamente centradas na auto-organização comunitária, nem tampouco na

estrita racionalidade técnica e burocrática do mercado ou do Estado. Isso traria complexidade

à produção de conhecimento em Gestão Social, bem como ao campo no qual atores

acadêmicos e ligados à práxis da Gestão Social se encontram e desencontram.

Nas décadas de 1980 e 1990, há um crescimento mundial das organizações não

governamentais e tem início também uma fase de fortalecimento da ideia de responsabilidade

social (R. M. Fischer, 2005, Junqueira, Vinhas, Perret, & Teixeira, 2009). Nesse contexto,

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nota-se aspectos que denotam a conscientização dos gestores sobre o próprio papel como

cidadãos, colocando em primeiro plano a vontade de colaborar com a sociedade com a qual

convivem antes da expectativa de vantagens para a organização que dirigem (Pinto, 2008 p.

409). Infere-se que essa perspectiva permite expressar ações e temáticas que fundamentam a

Gestão Social. Em outras palavras, exibe uma ideia ligada ao conceito de ética, de “boa

consciência”, estabelecendo a “certeza de agir como convém” (Durozoi & Roussel, 1996, p.

66).

Observa-se outra vertente que destaca a responsabilidade social da empresa

caracterizada pelo o interesse da administração em tomar decisões e ações que irão contribuir

para o bem-estar da sociedade. Ou seja, a responsabilidade dos dirigentes da empresa não se

restringiria exclusivamente à gestão do negócio para a obtenção do lucro, mas também a

respectiva influência de suas ações no âmbito social (Azevedo, 2002, Schwartz, 2003,

Abramovay, 2012).

Makover (1994) corrobora esta ideia ao afirmar que uma empresa socialmente

responsável procuraria ter uma visão de que tudo que ela faz gera uma variedade de impactos

diretos e indiretos dentro e fora dela, atingindo desde os consumidores e empregados até a

comunidade e o meio ambiente. Por definição, a responsabilidade social empresarial

ancoraria-se na noção de que as corporações possuem a obrigação de trabalhar para a

melhoria do bem-estar social (Frederick, 1994, Schwartz, 2003, Marini, 2005).

Intera-se que as perspectivas apontadas colocam as organizações em uma posição de

centralidade no qual seus interesses são evidenciados como prioridade. Nesse aspecto, a

sociedade deixa de ser o ator principal na relação com as empresas e outros setores, dando

continuidade a hierarquia de poderes estabelecida entre a economia e o social (Alves, 2002,

Azevedo, 2002, Abramovay, 2008, Sachs et al, 2010).

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Outra dimensão organizacional na qual a literatura brasileira atribui aspectos de cunho

social, do bem coletivo e de articulação entre múltiplos atores é o da economia solidária,

entendida como o a construção de práticas solidárias entre trabalhadores sob o capitalismo

(Singer, 2000). Para Costa e Carrion (2006), a economia solidária compreenderia uma

pluralidade de tipos de empreendimentos, cooperativas, associações, grupos não formalizados

de geração de trabalho e renda pautados pela gestão coletiva, propriedade comum dos meios

de produção e relações de trabalho reguladas pelos princípios de autogestão, participação,

cooperação, desenvolvimento humano e igualitarismo.

Os autores ressaltam que a desigualdade insustentável da contemporaneidade,

conforme qualificou Boff (2001), estaria sensibilizando atores sociais de distintas ideologias

em torno de propostas alternativas de desenvolvimento, cenário esse no qual se institui a

perspectiva de uma economia solidária, como vetor de um desenvolvimento alternativo à ideia

clássica capitalista.

Porém, vale ressaltar que “a economia solidária se propõe ir além dos atributos

econômicos, pois ela compreende a inserção da dimensão política no mercado” (França-Filho

& Laville, 2004, p. 48). No entanto, é a ausência dessa dimensão política que mais

prejudicaria a tarefa de se promover um desenvolvimento alternativo segundo Cordeiro Neto,

Alves e Rigo, (2011). Conforme Furtado (1984, p. 12), “nenhum avanço real é exequível sem

desenvolvimento político, sem democracia substantiva. Nosso real atraso é político e não

econômico”.

Segundo França-Filho e Laville (2004), o entrelaçamento entre os campos econômicos

e políticos, é que constituíram o cerne da economia solidária. “Desse enlace a solidariedade

entre os indivíduos não dispensaria a participação estatal, mas esta última estaria articulada à

sociedade civil, que não seria um apêndice das políticas, possuindo autonomia e identidade

própria” (Cordeiro Neto et al, 2011, p. 176).

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Além dessas vertentes temáticas, outros termos foram cunhados. São expressões que

ressignificam alguns temas já expressos neste campo, bem como termos oriundos de outro

campo, como o da “Outra Economia” (Cattani, 2009 p. 9), que denotam uma proximidade

conceitual com a Gestão Social.

A “Outra Economia”, expressão utilizada por Cattani (2009 p. 7), designa alternativa

material e humana superior à economia capitalista. Mediada por termos tais como “economia

solidária, economia do trabalho, novo cooperativismo e outros, essas formas são regidas pelos

princípios da solidariedade, da sustentabilidade, da inclusão, enfim, da emancipação social”

(Cattani, 2009 p. 7). Nota-se que esses termos amparam as articulações da Gestão Social e

buscariam traduzir nos anseios de atores que intermediam diferentes campos de ação social.

A abordagem política conferida à práxis da economia solidária, bem como das

discussões que permeiam a “Outra Economia” (Cattani, 2009 p. 7) permitiria recorrer às

múltiplas visões decorrentes de diferentes campos de estudo dentro da Gestão Social. O

mesmo se daria quanto à práxis da Gestão Social. Em linhas gerais, essa multiplicidade de

tipos organizacionais, racionalidades, propostas de gestão e intervenção socioambiental e

estabelecimento de objetivos podem ser compreendidas a partir de três frentes: sociedade civil

e suas organizações; programas e projetos governamentais visando a cidadania; a redução da

desigualdade e a democratização da sociedade; estratégias e ações de responsabilidade social

empresarial.

A Figura 1 “Temas e Abordagens na Produção de Conhecimento em Gestão Social”

apresenta, de forma sintética, as principais abordagens teóricas que se manifestam no campo

da produção de conhecimento sobre a Gestão Social.

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Figura 1. Tema e Abordagens na Produção de Conhecimento em Gestão Social.

Destaca-se na Figura 1 “Temas e Abordagens Produção de Conhecimento em Gestão Social” uma sobreposição

dos temas que expressam a Gestão Social a fim de contemplar as convergências e disputas interpretativas,

teóricas e conceituais existente entre eles.

Fonte: Produção Própria

A partir desse arcabouço conceitual é possível vislumbrar processos de Gestão Social

heterogêneos orientados para um fim comum, representados pela noção de participação,

emancipação e desenvolvimento social. Essa perspectiva aponta uma construção mediada por

múltiplos saberes que contribui para a sua pluralidade discursiva e para a constituição de um

campo híbrido, no qual o aspecto econômico deixa de ser uma prioridade, acentuando-se a

centralidade na dimensão política (Schommer & França-Filho, 2008).

Como conexão entre a Figura 1 “Temas e Abordagens na Produção de Conhecimento

em Gestão Social” a Figura 2 “Verbetes Presentes no Campo da Produção de Conhecimento

em Gestão Social” apresenta um conjunto de verbetes construídos pela evolução crescente de

Organizações da Sociedade

Civil Alves (2002); Teodósio (2010); Tenório

(1999); Ever (1995).

Processo

Participação, Emancipação,

Desenvolvimento Social Fischer (2002, 2006, 2008); Boullosa e Schommer (2005);

Carrion & Calou (2008); Gondim et al (2006); Fischer e

Melo (2006); Cançado (2011); Tenório (2002, 2004,

2008); Marteleto (2012); França-Filho (2008); Pinho

(2010)

Finalidade

Responsabilidade Social Junqueira et al (2009); Pinto (2008);

Durozoi; Roussel (1996); Daft (1999);

Makover (1994); Frederick (1994).

Processo

Economia Solidária Singer (2000); Costa e Carrion (2006); Boff

(2001); França-Filho e Laville (2004);

Cordeiro Neto et al (2011).

Processo

Organizações da

Sociedade Civil

Processo

Participação, Emancipação,

Desenvolvimento Social

Finalidade

Economia Solidária

Processo

Responsabilidade Social

Processo

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um cenário ancorado na lógica social e disseminado pelas redes que o compõem.

Figura 2. Verbetes Presentes no Campo da Produção de Conhecimento em Gestão Social

Como forma de expor o mapa conceitual da Gestão Social, a Figura 2 - “Verbetes Presentes no Campo da

Produção de Conhecimento em Gestão Social” traz contribuições de campos diferentes que enfatizam a

pluralidade de temas cujo alicerce se ergue em torno dos princípios da solidariedade, do coletivismo e da

transformação social como ato de cidadania.

Fonte: Boullosa, 2014; Cattani e Holzmann (2006); Cattani, Laville e Gaiger (2009).

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Ressalta-se a intenção de demonstrar que todos os verbetes se enquadram nas esferas

da sociedade civil, do Estado e do Mercado sem uma lógica sequencial, o qual buscou

assinalar expressões e noções que os atravessam e os interligam, formando um campo de ação

para acadêmicos e praticantes.

Os pressupostos sobre Gestão Social apresentados nesse capítulo foram pesquisados a

partir das produções científicas nacionais. Porém, apesar do termo Gestão Social não ser

disseminado dessa forma na literatura internacional, há várias temáticas discutidas que

contemplam os fundamentos da Gestão da Social aqui analisados.

Estes temas podem ser identificados nas produções científicas internacionais ao

considerar as abordagens acerca do capital social, empreendedorismo social, voluntariado e as

delimitações conceituais sobre o terceiro setor. Tais abordagens discorrem sobre os processos

de engajamento social, consciência coletiva, confiança estruturada por meio de interesses

comuns, dialógicos e solidariedade (Leana e Pil, 2006, Fredette & Bradshaw, 2012), o que

permite inferir uma proximidade relacional com os estudos desenvolvidos pela produção

científica brasileira.

Os aspectos conceituais apontados pela literatura internacional cuja relevância se apoia

nos recursos sociais, ganharam destaque nos estudos sobre gestão e governança (Adler &

Kwon, 2002, Nahapiet & Ghoshal, 1998), ao demonstrarem aumentar desempenho coletivo,

partilha de informação e redução de conflito (Jehn, Northcraft & Neale, 1999). Porém, essas

temáticas não foram denominadas de Gestão Social. Compreende-se que esta terminologia é

uma apropriação da produção científica brasileira ao adicionar o adjetivo social a gestão, o

que permitiria expressá-la como um ato relacional que se estabelece entre pessoas, em

espaços e tempos relativamente delimitados, objetivando realizações e expressando interesses

de indivíduos, grupos e coletividade (T. M. D. Fischer, 2006).

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Lewis (1998) argumenta que, a produção científica internacional ao abordar as

organizações não lucrativas ou do terceiro setor, direcionam seus estudos para características

gerenciais e organizacionais. Dessa forma, o autor evidencia duas categorias distintas de

pesquisa acadêmica ao considerar os países no qual são realizadas.

Em países do norte ou industrializados os trabalhos seriam focados na gestão das

organizações e em países do sul ou em desenvolvimento, a literatura sobre o Terceiro Setor se

apoia nas Organizações não Governamentais (ONGs), terminologia característica das

pesquisas desses países, que tem estado interessada no crescimento e evolução de suas

funções. Nesse sentido, destaca-se o trabalho focado na mudança social, pautados em assuntos

políticos sobre a relação das ONGs com o Estado e doadores, e com as comunidades no qual

estão inseridas (Lewis, 1998). Em geral, a literatura sobre ONGs tem focado as suas funções

nas práticas de desenvolvimento.

Em contraste, a produção científica sobre Organizações não Lucrativas, terminologia

característica das pesquisas realizadas em países do norte ou ocidentais, tem definido suas

prioridades diferentemente (Lewis, 1998). Tem se concentrado mais na prestação de serviços

de caráter organizacional do que organizações voltadas para a defesa de direitos e para a

mudança social (Billis, 1993, Salamon, 1994), dando mais prioridade à estrutura

organizacional e temas sobre gerenciamento interno das organizações (Lewis, 1998).

Corroborando essa ideia, os estudos de Mirabella e Young (2012), apontam que esta

distinção categorizada por Lewis (1998) pode ser explicada ao considerar que cada país tem

uma combinação diferente de sistemas jurídicos e políticos, desenvolvimento econômico ou

histórico e religioso o qual permite identificá-los como variáveis explicativas que determinam

a escala, o escopo e as funções do setor. Tais aspectos demonstram possibilidades de diálogos

mais adequados, menos hierárquicos e mais avançado entre tradições de pesquisas, saberes,

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sociedade, atores sociais, centros de investigação e universidades (Teodósio, 2008, Alves,

2002).

Este capítulo, norteado pela questão, “Como se dão as relações entre acadêmicos e

praticantes no contexto brasileiro da produção de conhecimento sobre Gestão Social”

buscou destacar que existem inúmeros atores, acadêmicos e praticantes no campo da Gestão

da Social, com múltiplas abordagens e pressupostos sobre diferentes temas e focos de estudo,

produção de conhecimento e frentes de ação que configuram a Gestão Social, desde a inclusão

social, passando pela redução das desigualdades, pela promoção do desenvolvimento local

sustentável até chegar na governança compartilhada e democrática e no controle social do

mercado, das corporações e do próprio Estado. Apreende-se que todos esses aspectos tornam

o campo da Gestão Social um espaço social rico em embates, debates, conflitos, disputas de

poder e formas de ação, tanto em termos nacionais quanto internacionais, fazendo dele um

rico objeto de estudo sob o ponto de vista da produção de conhecimento.

Adiante, analisaram-se as abordagens que preconizam a produção de conhecimento

socioprática a fim de apontar sua interelação com os pressupostos da Gestão Social e os seus

desdobramentos entre os acadêmicos e os praticantes. Em outras palavras, entre o campo do

conhecimento científico e o campo do senso comum, empírico.

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3 PERSPECTIVAS DE PRODUÇÃO SOCIOPRÁTICA DE CONHECIMENTO

INTEGRADAS AO CAMPO DA GESTÃO SOCIAL

É importante destacar que, “na gestão e, especialmente na Gestão Social, estão

compreendidas muitas formas de aprendizagem” (Schommer & Boullosa, 2010 p. 16). Por

outro lado, “na aprendizagem estão presentes as formas da gestão, por se tratarem ambas de

atos integradores entre pessoas que detém, em um determinado momento, em um espaço

delimitado, poderes assimétricos sobre resultados desejados e sobre os itinerários a escolher”

(Schommer & Boullosa, 2010 p. 16).

Supõe-se que a geração de conhecimento seria mediada por dimensões de cunho social

e organizativo, ao se conceber que a aprendizagem, embora possa ser verificada e analisada

no campo individual e psicológico, se fundamentaria em processos sociais (Schommer &

Boullosa, 2010, Bauman, 2008).

Essa concepção de aprendizagem derivaria da abordagem social ou socioprática cujos

aspectos fundamentam o estudo da produção de conhecimento adotado por esta pesquisa.

Partiu-se do pressuposto que a aprendizagem se constitui como resultado de interações e

práticas compartilhadas pelos atores sociais, manifestando-se nas posturas, formas de ação e

interação social cotidiano. A aprendizagem não seria compreendida como um objeto a ser

analisado, um produto ou um processo técnico que aconteceria na mente dos indivíduos, mas

sim como uma prática social que seria parte do processo de construção da realidade,

entrelaçada com a cultura e com a política (Easterby-Smith, Araujo, 2001, Lave & Wenger,

1991).

Para Schommer e Boullosa (2010) mais importante do que analisar processos

cognitivos individuais é perceber contextos culturais e sociais dos quais as pessoas interagem,

constroem suas práticas compartilhadas e seus repertórios cognitivos e emocionais. Contudo,

destaca-se que a percepção de aprendizagem configurada na prática social considera a prática

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não como oposta da teoria ou de reflexão, mas como práxis, de ação e reflexão

permanentemente imbricadas, sempre em relação a um contexto em que faz sentido para o

praticante (Freire, 1987). “Ler, ouvir, pesquisar, parar, aquietar-se, refletir sobre o que foi

vivido, sistematizar conhecimento, tudo isso faz parte do processo de aprendizagem”

(Schommer & Boullosa, 2010 p. 21).

Esse processo estaria relacionado à reestruturação contínua do sistema de significados

e significantes, permitindo a consolidação da aprendizagem, que não se realizaria em um

contexto livre de modelagem (Schommer & Boullosa, 2010 p. 21). Pelo contrário, a

abordagem social ressalta que a aprendizagem aconteceria no seio das estruturas sociais e

culturais, enfatizando a interdependência relacional entre sujeito, mundo, atividade,

significado, cognição, aprendizagem e conhecimento. Este, num mundo socialmente

constituído, seria mediado pelo contexto histórico que o cerca e que se apresentaria aberto

para as mudanças (Lave & Wenger, 1991). Partindo dessas premissas, infere-se que onde há

aprendizagem há produção de conhecimento dinamizada pelas relações instituídas entre os

indivíduos.

Silva (2004) aponta para as diversas definições dadas para o conhecimento que

normalmente consideram diferenciações hierárquicas. Esta noção, em sua maioria, baseia-se

na ideia de que “conhecimento é formado por informação, que pode ser expressa, verbalizada

de cunho relativamente estável ou estática” (Silva, 2004 p. 145). Por sua vez, está em

“completo relacionamento com uma característica mais subjetiva e não palpável, que está na

mente das pessoas e que é relativamente dinâmica, envolvendo contextos, interpretação e

reflexão” (Silva, 2004 p. 145).

Tais proposições permitem observar duas partes constituintes do conhecimento que

seriam intrinsecamente relacionadas, o conhecimento subjetivo, identificado pelas habilidades

inerentes a uma pessoa; sistemas de ideias, percepção e experiência, bem como o

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conhecimento formalizado, codificado, transferido por meio de textos, gráficos, tabelas,

figuras, desenhos; facilmente organizado em bases de dados e em publicações em geral

(Nonaka & Takeuchi, 1997). Estes dois tipos de conhecimento se apoiam no conhecimento

tácito e no conhecimento explicito.

Segundo Nonaka & Takeuchi (1997) um trabalho efetivo com o conhecimento

somente é possível em um ambiente em que possa ocorrer conversão entre esses dois

formatos (Silva, 2004).

Albagli e Maciel (2004) ampliam essa discussão ao destacarem a relevância do

conhecimento como capacidade de processar e recriar significados e, mais ainda, na

capacidade de converter esse conhecimento em ação, ou, mais especificamente, em inovação.

Essa concepção, ao elevar os aspectos do conhecimento e suas implicações para a

transformação social, orientam as bases epistemológicas deste estudo. Pressupõe-se, na

presente investigação, que a produção de conhecimento sobre Gestão Social a partir das

interações sociais, possibilitaria a mobilização, a ressignificação de saberes diversificados e

compartilhamento entre os atores do campo científico e os atores da sociedade envolvidos nas

lutas sociais.

A fim de expor as perspectivas e os limites acerca do conhecimento gerado pelos

acadêmicos e pelos praticantes da Gestão Social, as sessões adiante apresentam os contextos

nos quais esses atores estão inseridos e os processos de conhecimento decorrentes da

abordagem socioprática, como pano de fundo para essa discussão.

Para fins deste trabalho, a noção de praticantes vincula-se aos aspectos analisados por

Ospina et al (2001), que os considera como atores sociais reflexivos e trabalhadores ou

profissionais que visam em alguma medida encontrar novos conhecimentos aplicáveis ao

próprio contexto de trabalho. Compreende-se que os praticantes estão presentes ou podem

transitar tanto no âmbito acadêmico como no âmbito pertencente ao chamado mundo da vida.

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Porém, ao se propor analisar a produção de conhecimento sobre Gestão Social a partir das

relações entre acadêmicos e praticantes, estabelece-se um quadro de dimensões que, apesar de

integrados, são compostos por atores que se articulam de forma diferente e que são

constituídos por distintos propósitos. À academia foi considerado, primordialmente, o aspecto

que caracteriza o seu campo institucional, o de produção e de disseminação do conhecimento

científico. Quanto aos praticantes consideraram-se os atores que estão inseridos em contextos

práticos da vida vinculados a processos organizacionais de cunho social. Todavia, se

reconhece que os praticantes podem transitar entre a práxis da Gestão Social e o espaço

acadêmico de investigação, produção e transmissão de conhecimento, construindo não

espaços sociais díspares, excludentes e distintos, mas sim sobrepostos, fluídos e híbridos.

Ainda assim, considera-se que acadêmicos e praticantes se constituem em grupos de atores

sociais distintos no campo da Gestão Social.

Nesse sentido, contemplaram-se na primeira parte os pressupostos teóricos e

evolutivos acerca das organizações da sociedade civil, bem como as possibilidades de

produção de conhecimento dos praticantes pertencentes a esse campo. Adiante, discutiram-se

as perspectivas que norteiam o conhecimento produzido pela academia as quais se ancoraram

nas abordagens do ensino crítico da Administração. A discussão guiou-se a partir dos aspectos

críticos do ensino da Administração por observar um intenso interesse de pesquisadores e

estudiosos deste campo sobre a Gestão Social e por nela residir perspectivas fundamentadas

nas possibilidades e nos limites da cientificidade pós-moderna a qual se considera basear as

discussões que permeiam a Gestão Social.

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3.1 Produção de conhecimento sobre Gestão Social no âmbito dos praticantes: desafios e

possibilidades.

No domínio da esfera pública, salienta-se a articulação de diversas organizações,

oriundas de movimentos da sociedade civil, em torno de experiências de formação e

construção de novos conhecimentos. Porém, se observa um caráter reducionista ao tratá-las

como um todo do Terceiro Setor. Em outras palavras, as organizações não-lucrativas seriam

uma parte constitutiva da Sociedade civil, não sua totalidade (Alves, 2004).

Segundo Alves (2004, p.142), a alusão ideológica ao Terceiro Setor evoca “duas

formas de falseamento da realidade”. A primeira se expressa na tentativa de “reduzir o

aspecto político da Sociedade Civil ao transformá-la em um espaço de prestação de serviços

com a finalidade substituir o Estado” (Alves, 2004 p. 143). E a segunda, “excluindo

organizações de finalidade lucrativa da Sociedade Civil, os novos ideólogos pretendem

despolitizar o mercado, tornando-o apenas objeto de considerações técnicas” (Alves, 2004 p.

143).

A Sociedade Civil ao se constituir em um espaço de ação para indivíduos e

organizações de natureza múltipla (Sobottka, 2002, T. M. D. Fischer & Melo, 2006,

Teodósio, 2010, Alves, 2004) no qual se observa um continuum com o Estado, denota um

caráter político e não somente estrutural de delimitação da sociedade.

Esse aspecto político pode ser observado no cenário de atuação das organizações da

Sociedade Civil no Brasil, o qual seria composto por uma variedade de agentes e

organizações, sendo que alguns deles, historicamente, e por diferentes óticas e programas de

ação, vêm tentando ampliar a democratização da sociedade (Schommer, 2002, Alves, 2004,

Teodósio, 2010).

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Derivadas dos ideais dos movimentos populares a favor da redemocratização no país,

a sua origem está ligada a tradição de mobilização de base brasileira, a qual alcançou o seu

auge na década de 1960, quando a sociedade organizou diferentes frentes de luta por reformas

no país (T. M. D. Fischer & Melo, 2006, Paes-Paula, 2005). Após o golpe de 1964, essas

mobilizações retornaram na década de 1970, período no qual a Igreja Católica catalisou a

discussão de problemas coletivos nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), inspirada pelos

ideais da teologia da libertação e da educação popular (Paes-Paula, 2005).

Este movimento se consolidou como um espaço alternativo para a mobilização política

ao estimular a participação popular no debate das dificuldades cotidianas, contribuindo para a

formação de lideranças populares (Paes-Paula, 2005). Alguns outros grupos também

protagonizaram mobilizações pelos direitos de cidadania, como, por exemplo, os movimentos

que protestavam contra o custo de vida, o desemprego, a repressão política e a opressão da

mulher (Gohn, 1995).

A partir da década de 1980, Centros Populares constituídos por militantes políticos

para facilitar sua atuação nas CEBs e nas bases comunitárias em atividades como as de

assessores, educadores e organizadores da mobilização popular, passaram a ser denominados

de Organizações não Governamentais (Paes-Paula, 2005).

No desenvolver de sua atuação, as ONGs ganharam importância por serem potenciais

parceiras do poder político, em decorrência de sua estruturação (Gohn, 1997). “Essa relação

de parceria passou a ser estimulada, uma vez que o discurso neoliberal pressupõe a retirada do

Estado de uma série de atividades e a primazia do mercado” (T. M. D. Fischer & Melo, 2006,

p. 27). Nesse cenário, observa-se uma reconfiguração do modelo de financiamento às ONGs

cujo caráter assistencialista submete-se a auto sustentabilidade (Gohn, 1997).

Sem deixar de trabalhar as consciências dos sujeitos das classes populares, nos últimos

anos, a ação das organizações da sociedade civil passa a interceder, por meio da

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instrumentalização, as camadas populares, de modo que estas participem, junto ao poder

público, das decisões relativas à elaboração e implantação de políticas que resultem em

melhores condições de vida para a população (Marteleto & Ribeiro, 1997).

Destaca-se que os ideais que fundamentaram as ações das organizações da sociedade

civil se apoiaram na educação problematizadora de caráter libertador de Freire (1987). Para o

autor a libertação compreendia a luta de classes por meio da reflexão crítica sobre a própria

ação, a qual permitia descobrir por que razões atuam desta ou daquela maneira (Freire, 1987).

Apreende-se que essa perspectiva associa-se aos termos hoje empregados na Gestão Social os

quais demonstram orientar uma produção de conhecimento para a formação e para a ação no

campo. Todavia, ressalta-se a existência de organizações da sociedade civil desprovidas do

ideal politizador cujos propósitos se sustentam em serviços assistenciais e relacionados à ação

social de empresas.

A mediação com o Estado, sociedade, bem como com o mercado, conferem as

organizações da sociedade civil aspectos paradoxais e controversos por advogarem

autonomia, auto-organização e estratégias de regulação de seu próprio destino em

consonância com a ética do bem comum e do uso do espaço público como contexto de

referência (T. M. D. Fischer et al, 2006). “Sua legitimidade deriva das ações que empreendem

e do impacto que elas têm na sociedade civil em que se originam e que, de forma especial,

espelham” (T. M. D. Fischer et al, 2006, p. 791).

Essa perspectiva basearia-se em um pressuposto por elas construído historicamente,

que entende que o seu espaço de ação corresponde a um vazio criado, dentre outros fatores,

pela omissão do Estado no atendimento às necessidades básicas da população marginalizada e

pelo meio acadêmico, capaz de atender à sociedade com soluções técnicas, mas ainda de

forma crítica para o desenvolvimento social (Marteleto & Ribeiro, 1997).

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Nesse âmbito, lhes seria incumbida a tarefa de construir novas transversalidades entre

espaços institucionais (Meister, 1992), possibilitando assim, em seu campo de formação e

ação, interseções simbólicas com os campos políticos, econômicos e científicos (Marteleto &

Ribeiro, 1997).

Tais interseções podem ser observadas através de sua atuação em empresas privadas

por meio de suas estratégias de responsabilidade social empresarial em que se vislumbram

ações e dinâmicas além da lógica de mercado. Nesse sentido, vale destacar que, de acordo

com a noção de espaço público, constituído por agentes com características diferentes, mas

com certos objetivos comuns, “parecem emergir valores e a consciência de que os desafios da

atualidade são responsabilidades de todos e somente o compartilhar de competências pode ser

capaz de enfrentá-los” (Schommer, 2002 p. 94).

Essa perspectiva permite salientar as dinâmicas que envolvem o investimento social

das empresas que, num sentido restrito, direcionam recursos de impacto direto nas

comunidades sem se relacionar diretamente à sua cadeia produtiva (Schommer, 2002,

Junqueira, 2010). Esta ação social pode ser protagonizada por empresas, fundações e

institutos de origem empresarial ou instituídos por famílias ou indivíduos (Junqueira, 2010 p.

302) nos quais se inserem os praticantes da Gestão Social.

No âmbito do Estado, também é possível verificar manifestação de praticantes da

Gestão Social por meio dos conselhos de políticas públicas que defendem diferentes agendas

como as causas socioambientais relativas ao combate a pobreza, desenvolvimento local,

redução das desigualdades, dentre outros. Esses canais de participação popular fazem parte do

processo de redemocratização, onde se busca a reforma do Estado e a construção de um

modelo de gestão pública capaz de torná-lo mais aberto às necessidades dos cidadãos

brasileiros, mais voltado para o interesse público e mais eficiente na coordenação da

economia e dos serviços públicos (Paes-Paula, 2005).

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Institucionalizado no Brasil a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988,

os conselhos de políticas públicas atuam como canais de participação política, de controle

público sobre a ação governamental, de deliberação legalmente institucionalizada e de

publicização das ações do governo (Carneiro, 2002, Paes-Paula, 2005). São também

mecanismos de ação, que inserem na agenda governamental as demandas e os temas de

interesse público para que sejam absorvidos, articulados politicamente e implementados sob a

forma de políticas públicas (Gohn, 2004). Portanto, “mais do que um canal comunicacional

para ressonância das demandas sociais, os conselhos possuem dimensão jurídica e têm poder

de tornar efetivos as questões, os valores e os dilemas vivenciados no espaço da sociedade

civil” (Carneiro, 2002 p. 151).

Ressalta-se que, apesar das proposições legais que os amparam, os conselhos de

políticas públicas se deparam com dificuldades vinculadas aos processos de participação e de

democratização, os quais se configuram na concentração do poder do Estado ancorado na

eficiência gerencial ao controle social por meio da delegação e formulação de políticas

públicas direcionadas aos burocratas (Paes-Paula, 2005).

Nessa vertente, ainda que munidos de limites de ordem operacional e cultural, a

possibilidade de interação com atores de diferentes setores providos de experiências e saberes

híbridos fomentaria processos recursivos de cognição capazes de gerar conhecimento.

Associado a esfera do Estado nota-se também a presença de praticantes da Gestão

Social que desenvolveram carreira no âmbito do governo federal, estadual e municipal no

Brasil orientados pela luta das minorias, do desenvolvimento local e ampliação dos direitos

sociais.

Destaca-se que a atuação dos praticantes imbuídas pelo engajamento e pela

experiência prática, as quais envolvem atividade mental ancorada na ação e reflexão e a

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perspectiva de produção de conhecimento compartilhada, contribuiriam para processos que

muitos autores designam de comunidades de práticas.

No Brasil, as comunidades de prática são pesquisadas por Souza-Silva e Davel (2006),

Schommer e França Filho (2008), Moura e Andrade (2006), Lucena e Melo (2006), dentre

outros investigadores. Elas podem ser entendidas como grupos de pessoas que interagem

regularmente, engajadas mutuamente em atividades compartilhadas, orientadas por um senso

de propósito comum, empreendimento coletivo (Kimble & Hildreth, 2004). No cotidiano do

processo de engajamento, as pessoas aprenderiam pelos outros e com os outros, assumindo

diferentes papéis e responsabilidades ao longo do tempo e em cada situação. Os membros

desenvolveriam um repertório próprio e habilidades para atingir objetivos e enfrentar desafios

(Schommer & França-Filho, 2008).

Wenger (1998) argumenta que as comunidades de prática surgiriam naturalmente nos

contextos de interação social, desenvolvendo um domínio de conhecimento que lhes é

próprio, o qual constitui o núcleo do engajamento voluntário e mútuo entre os seus membros.

Dessa forma, objetivam, por meio da busca de empreendimentos comuns, a partilha de

conhecimentos e geração de aprendizagem. Esses conhecimentos estariam intimamente

conectados à prática dos membros dessa comunidade. (Wenger, 1998).

Vale salientar que os pressupostos sobre engajamento implicariam em formas de

interação que se consolidam ao promover ganhos mútuos (Evans, 1997). As condições

favoráveis para a promoção do engajamento estariam associadas às estruturas sociais, a

percepção do indivíduo, a redefinição de problemas e a capacidade de ação coletiva que, por

outro lado, seriam influenciadas pela natureza dos conflitos sociais e pela natureza e extensão

das desigualdades entre as partes (Campos, Mendonça & Alves, 2012).

Essa perspectiva, ao apontar os conflitos e as desigualdades entre as parte relacionais,

permitiria aprofundar a compreensão sobre o conhecimento produzido pelas comunidades de

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práticas. Segundo Yakhlef (2012), a aprendizagem de novos conhecimentos não requer,

somente, a participação na produção de conhecimento, pois essa pode ser insuficiente quanto

aos aspectos interacionais e reflexivos na obtenção de resultados de aprendizagem. Para o

autor, os indivíduos teriam acesso diferenciado aos recursos relativos a mudança de práticas,

além de apresentarem diferentes capacidades cognitivas, possibilitando contribuições

múltiplas para a constituição ou transformação da subjetividade.

Esse argumento pode contribuir para o enfretamento da dicotomia que envolve as

discussões sobre a aprendizagem individual e socioprática, ao conceber o conhecimento como

esquemas de aprendizagem e de conhecimento individual e social como complementares,

interdependentes e não opostos. Em outras palavras, sugere-se uma unidade constituída por

indivíduos em interação, uma posição que nem institui o individuo como fonte soberana e

independente da ação, e nem o assume como submisso em suas práticas ao contexto social

que o envolve (Yakhlef, 2012).

Yakhlef (2012) ainda destaca os pressupostos que norteiariam os fundamentos sobre a

participação ao afirmar que ela seria diferente de mero engajamento em uma prática. Os

indivíduos podem participar em graus variados de uma ação no âmbito da sociedade. Nessa

perspectiva, os indivíduos recém-chegados desfrutariam de uma participação limitada e

periférica, ao passo que participantes plenos atuam no núcleo da comunidade.

Segundo Handley, Sturdy, Fincham e Clark (2006), aqueles indivíduos que transitam

com sucesso de um caminho periférico para a participação plena podem ser classificados

como participantes. Sendo assim, o processo de conhecimento passaria pela perspectiva de

participar com competência necessária na complexa teia de relações entre as pessoas e nas

atividades que são desenvolvidas em sociedade (Freire, 1987, Schommer & Boullosa, 2010,

Yakhlef, 2012).

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Conforme esse aspecto, na medida em que o resultado da aprendizagem de uma

prática transforma um praticante, não só para saber sobre a prática, a aprendizagem torna-se

um conhecimento, um modo de ser e tornar-se parte de processos sociais (Freire, 1987). Os

praticantes, rumo ao processo de plena participação, mais do que viver a sua prática,

necessitariam refletir sobre ela, para possivelmente, mudá-la. Sua atuação envolveriam

momentos reflexivos (Schommer & Boullosa, 2010, Yakhlef, 2012).

Sabendo que a prática exige o conhecimento que a concebe, além do engajamento dos

indivíduos com a atividade, seria necessária também a reflexão de experiências passadas que

podem estar ausentes, mas recordadas ou representadas na mente dos indivíduos (Yakhlef,

2012, Write, & Robinson, 1998). Essa proposição destaca que não é possível interpretar as

experiências dos indivíduos sem acesso a algum quadro de inteligibilidade, que ofereça um

contexto significativo para a experiência. Em outras palavras, a reflexão seria sempre

contextualizada e situada, marcada por seus condicionamentos sociais (Freire, 1987). Assim,

cognição e reflexão não são consideradas como bens armazenados, como pensamento,

representações, memórias e planos, mas sim como pensar reapresentando, lembrando e

planejando processos ativos que não podem ser reduzidos a interações retidas isoladamente do

contexto social (Yakhlef, 2012).

A partir desse enfoque e, conforme o objeto de pesquisa deste trabalho que se apoia

nas relações entre acadêmicos e praticantes do campo da Gestão Social, observa-se a

complexidade do processo de construção do conhecimento, ancorado nas questões que

permeiam tanto a aprendizagem cognitiva individual quanto a aprendizagem socioprática.

Nota-se que os praticantes da Gestão Social movidos pelo engajamento na intervenção

socioambiental e pelas perspectivas de formação de comunidades práticas, imbuídas de

conflitos e de formas distintas de participação, são mediados por processos de aprendizagem e

de produção de conhecimento que se pressupõe interpretação e reflexão contínua.

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Segundo Marteleto e Ribeiro (1997), esses processos ressaltam o caráter mediador das

organizações da sociedade civil nas ações de democratização do acesso e emprego dos

conhecimentos produzidos socialmente. Para a autora, a promoção de espaços de interlocução

entre diferentes esferas do conjunto social, o Estado, o mercado e a sociedade, relacionados

aos valores da solidariedade, direito à igualdade e diferença, “cria foros comunicacionais de

natureza pública, nos quais fluem informações e constroem-se significados que levam a uma

leitura das potencialidades do conhecimento produzido pelos coletivos sociais em sua

conformação em redes” (Marteleto & Ribeiro, 1997 p. 5).

Ao considerar as possíveis relações que esses praticantes desenvolvem com os

acadêmicos do campo da Administração, um dos campos de conhecimento mais profícuos na

produção de conhecimento e de debates sobre Gestão Social no Brasil contemporâneo, a

próxima sessão apresenta uma análise teórica acerca dos caminhos e descaminhos que a

universidade contemporânea tem vivenciado. Destacaram-se nesse contexto as abordagens do

ensino crítico da Administração por compreender que os seus fundamentos ao evidenciarem

críticas à lógica técnica e mercadológica acerca do processo de ensino e aprendizagem da

Administração, contribuem para a compreensão dos desafios, possibilidades e armadilhas da

própria produção de conhecimento sobre a Gestão Social.

3.2 Produção de Conhecimento em Gestão Social: perspectivas que se apoiam no ensino

crítico da Administração

A discussão a seguir orientou-se, primeiramente, a partir dos fundamentos que

norteiam os aspectos do ensino crítico da Administração. Essa escolha se deu por observar

críticas às características tecnicistas e fundadas em uma pretensa racionalidade mercantil

unívoca que caracterizaria a gestão em qualquer realidade social, que tem se constituído na

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base de expansão da pesquisa, ensino e extensão relacionada à Administração no país. Além

disso, muitos dos esforços de produção de conhecimento e formação em Gestão Social

surgiram e tem buscado se consolidar como antítese a essa visão dominante sobre a natureza

da gestão, das organizações e da ação administrativa.

Os fundamentos que embasam as perspectivas do ensino crítico da Administração se

apoiariam em três proposições centrais: intenções desvinculadas da performance, visão

desnaturalizada da administração e reflexividade (Grey, Knights & Willmott 1996, Grey,

2005).

Conforme Alcadipani (2011), uma intenção desvinculada da performance envolveria

deslocar a ideia da racionalidade meios-fins, que reforça as relações de poder vigentes, em

direção à consideração de novas formas de ordenamento social. “A desnaturalização envolve

o reconhecimento de que a maneira como as coisas estão não pode ser vista como natural nem

inevitável; portanto, pode ser diferente” (Alcadipani, 2011 p. 346). Finalmente, a

“reflexividade envolve a rejeição da ausência de reflexão constituída em uma suposição

positivista de que a realidade existe lá fora, aguardando para ser apreendida pelo pesquisador”

(Alcadipani, 2011 p. 346). Ao invés disso, se reconhece o papel do analista na construção do

conhecimento (Alcadipani, 2011).

Tais proposições derivam das ciências administrativas fundamentadas nas teorias da

administração científica e clássica e de seus métodos, os quais “objetivavam o

aperfeiçoamento do desempenho gerencial dos profissionais e a solução de problemas ligados

à racionalização da administração das empresas em geral” (Conselho Federal de Educação,

1993 p. 289).

Nessa concepção, nota-se que a formação do administrador apenas obedece à lógica

proposta por autores tradicionais do pensamento administrativo como Taylor e Fayol que,

mesmo revista sob um enfoque sistêmico, representa todo um referencial teórico cujas bases

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remontam à Revolução Industrial. Aponta-se que tais fundamentos têm hoje suas principais

características sob profundos questionamentos (Nicolini, 2003).

A partir dessa perspectiva, constituiu-se um currículo mínimo do ensino da

Administração que, segundo Nicolini (2003) buscava implementar um currículo pleno,

personalizado em cada escola, de acordo, pelo menos teoricamente, com as especificidades

regionais e necessidades de desenvolvimento setoriais (Nicolini, 2003).

A ordenação das matérias que os compõem, não seria o problema fundamental dos

currículos, mas sim a inter-relação delas. Nesse sentido, a divisão do estudo e a fragmentação

do saber ganhariam contornos preocupantes quando os mecanismos de interação entre as

matérias são constantemente esquecidos, ignorados ou mesmo desconhecidos (Nicolini,

2003).

Essa problemática trouxe consequências desfavoráveis, evidenciando a carência da

prática interdisciplinar cujos pressupostos derivam da convergência de matérias, componentes

básicos do curso e dinâmicas, atuando solidariamente no sentido de formar no aluno a visão

do todo no campo do conhecimento (Nicolini, 2003).

Tal aspecto merece destaque ao se observar que a visão do todo carrega em sua

essência a relação intrínseca adquirida por meio do equilíbrio entre a pesquisa e o ensino,

efetivados nos cenários externos da universidade, ou seja, no mundo da vida (Santos, 2004,

Chauí, 1999).

Mintzberg (2006 p. 368) afirma que “a pesquisa acadêmica sobre organizações e

gestão sofre de dois grandes problemas. Em primeiro lugar, não é muito eficiente. Em

segundo lugar, não é muito acessível”. Considerando a primeira problemática, o autor

argumenta que a pesquisa é contributiva quando traz à tona alguma coisa inesperada, em

outras palavras, quando viola a sabedoria convencional. Em relação à acessibilidade, tem-se

que entre os acadêmicos a pesquisa é bastante fechada, decidida, conduzida, julgada e

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controlada por eles mesmos e, portanto, costuma ser impenetrável para outros atores,

sobretudo os praticantes da gestão.

Os aspectos de cunho tecnicista, racionalista e mercadológico evidenciados na práxis

acadêmica do campo da Administração demonstram que a demanda por ensino é muito maior

do que a por pesquisa e, por este motivo, os programas de ensino (principalmente no nível de

pós-graduação stricto e lato sensu) passariam a ser tratados como verdadeiras "vitrines" que

estreitariam os laços com a comunidade corporativa (Wood & Paula, 2004).

Por um lado, refletem o interesse de grande parte das Instituições de Ensino Superior

(IES) em fortalecer o ensino em detrimento da pesquisa, como forma de estabelecer laços

corporativos. Haveria forte interesse em ampliar a “participação no mercado de ensino”

corporativo e criar produtos e serviços atrativos (Calderón, 2004 p.107). Por outro lado, outra

parte das instituições defende o fortalecimento das pesquisas, sob o argumento de que “a

ausência da pesquisa impossibilita a reflexão crítica sobre a sociedade” (Calderón, 2004

p.107). Assim, uma universidade poderia ter fins essencialmente lucrativos ou uma “vocação

mais pública; poderia ainda ser uma universidade empreendedora em termos empresariais, ou

conservadora” (Calderón, 2004 p. 107). Este último aspecto nivelaria o status das

universidades à característica de empresa destinada a competir no mercado de ensino

universitário, sujeita a rankings, sistemas de avaliação e informações visando os

consumidores de conhecimento e formação (Oliveria & Sauerbronn, 2007).

Ao utilizar esta perspectiva, a universalização do acesso ao ensino de administração

incorreria no risco apontado por alguns autores como Paula & Rodrigues (2006) de se

fundamentar na tecnologia de fast food, ou no processo de Mcdonalização, como nomeiam

Alcadipani e Bresler (2000) esse processo, visando padronizar informações e maximizar a

quantidade de alunos. Segundo Paula & Rodrigues (2006 p.11), “nas universidades-

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lanchonete”, professores “adestrados” apresentariam “receitas de bolo” e “doutrinas sagradas”

dos manuais de gestão.

Convergindo com esta ideia, Alcadipani (2011, p. 12) complementa argumentando que

a Mcdonalização do ensino da Administração promove os “cursos enlatados, o esvaziamento

da reflexão, os ataques à liberdade acadêmica”, a busca por ensinar aquilo que supostamente

funcionaria, o uso desenfreado de apostilas, a transformação do aluno em cliente, a difusão de

formas de avaliação de desempenho de professores similares a de empresas e a quantificação

da produção acadêmica.

A partir desses aspectos, vale ressaltar o papel do estudante na relação ensino-

aprendizagem, cuja produção acadêmica seria encarada como um fim em si mesmo

(Alcadipani 2011). Nesse contexto, os alunos fariam parte de uma geração que não pesquisa a

fundo, não apreende e não se desenvolve; apenas publica, “distanciam-se, assim, de seu papel

como sujeitos do processo de aprendizagem” (Nicolini, 2003 p. 51).

Este quadro pode ainda ser mais obscuro ao se considerar a subordinação dos

investigados, relegando-os ao potencial de consumidores dos resultados acadêmicos, e não

como integrantes ativos de um processo de produção de conhecimento, para o qual podem

contribuir efetivamente (Ospina & Dodge, 2005).

Essa discussão é destacada por Ospina et al (2001) ao argumentar que as evidências

sugerem que a colaboração mútua entre pesquisadores e praticantes podem oferecer

oportunidades promissoras construir a conexão entre teoria e prática. Neste sentido, o que se

propõe é muito diferente da vontade de contribuir apenas para a qualidade da pesquisa

acadêmica (Ospina et al, 2001). O proposto é contribuir também para a prática dos

investigados, desenvolvendo um trabalho de mão dupla, cuja relação entre pesquisadores e

pesquisados não precede a hegemonia do saber científico ao senso comum.

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Mediante o cenário da Administração como campo de conhecimento aqui apresentado,

evidenciou-se uma complexidade nos processos de ensino dos estudos organizacionais que

nota-se promover uma dificuldade natural para apreendê-lo (Spink & Alves, 2011).

Compreende-se que esse aspecto se agravaria ao considerar as poucas décadas de efetiva

discussão (Spink & Alves, 2011). Contudo, ainda que as abordagens do ensino crítico da

Administração sejam complexas, a importância da consciência crítica vinculada a dinâmicas

metodológicas reflexivas elevariam a compreensão dos fenômenos organizacionais de forma

local e ao mesmo tempo global.

Nesse aspecto, se destacariam iniciativas no eixo da pesquisa, ensino e extensão do

campo da Administração e, mais especificamente, no campo da Gestão Social que

desenvolvem novos e válidos conhecimentos respaldados nos princípios da coletividade, do

diálogo e da transformação social. Essa perspectiva não se baseia em uma dualidade na qual

se observa metodologias ou propostas de ensino e aprendizagem melhor ou superior às outras

existentes, até por que essa ideia fomentaria a noção de hegemonia tão criticada no âmbito da

universidade. O que se pretende demonstrar é que a produção de conhecimento envolve

distintas áreas de conhecimento as quais permitem propor metodologias apoiadas em uma

visão multiparadigmática.

A Coprodução de Conhecimento é uma metodologia que se insere nesse contexto, ao

se constituir por meio da ação e reflexão de práticas, das interações sociais e do

desenvolvimento cognitivo, na qual se estabelece um trabalho de investigação conjunto entre

pesquisadores acadêmicos e praticantes (Schommer & Santos, 2010).

Nesse âmbito, destacam-se as pesquisas desenvolvidas no Research Center for

Leadership in Action (RCLA) da Wagner School of Public Service da New York University

(NYU), a partir dos estudos de Ospina et al (2001), as quais têm gerado produtos que são

coproduzidos pelos os pesquisadores e pesquisados. Essas investigações consideram os

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praticantes de diferentes agendas do ativismo social como sujeitos do processo de pesquisa,

produção e sistematização do conhecimento. Essa perspectiva apresenta-se contrária às

práticas tradicionais de pesquisa que, mesmo quando se propõem a dar centralidade aos atores

sociais, sobretudo àqueles excluídos e marginalizados, acaba por trata-los como meros

“objetos” de investigação. Tal dinâmica requer a aceitação de cada um dos pontos de

referência e valorização do que cada ator social traz para a discussão. Baseia-se na

experiência de ambos os envolvidos no processo, praticantes e estudiosos, sem privilegiar um

conjunto de experiência ou habilidades sobre o outro (Ospina et al, 2001).

Nota-se nas dinâmicas que norteiam a pesquisa coproduzida noções que fundamentam

a aprendizagem socioprática pautadas nas diversas formas de participação e nos processos

cognitivos que cada praticante carrega consigo, ampliando as possibilidades de conhecimento

e de transformação do meio.

Um resultado evidente nesse tipo de trabalho, segundo Ospina et al (2001), é uma

prática fundamentada na pesquisa, que por outro lado pode ser revertida em informação para

outras experiências. Essa dinâmica permite aumentar a produtividade da pesquisa e, em

muitos casos, a qualidade, bem como uma ligação mais estreita e robusta entre teoria e prática

(Ospina et al, 2001).

O que se propõe é muito diferente da vontade de contribuir apenas para a qualidade da

pesquisa acadêmica, ao observar uma contribuição múltipla, em que os praticantes e os

acadêmicos se beneficiam dos estudos e pesquisas aplicadas na sua prática.

Apreende-se que a concepção da Coprodução de Conhecimento associa-se a algumas

correntes e abordagens da Gestão Social, ao tomar como pressuposto as relações horizontais e

dialógicas atuantes em processos de planejamento e avaliação de práticas, tendo como pano

de fundo, a produção de conhecimento em novas bases, capazes de superar e transformar, pelo

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68

menos em parte, os problemas e riscos presentes nos processos tradicionais de pesquisa,

ensino e extensão protagonizados pelas universidades contemporâneas.

Essa possibilidade se efetiva “na medida em que todos os participantes têm

oportunidade de manifestar seus saberes e de se engajarem na construção de novos saberes,

com legitimidade para definir, adaptar ou interpretar as ações e seus significados” (Schommer

& França-Filho, 2008. p 77), o que permitiria associar a prática da pesquisa a uma

participação plena, rumo ao cerne das discussões e decisões coletivas.

É pertinente destacar que nem sempre essa lógica de participação mútua e construtiva

vinculada à teoria e a prática é evidente e real. Entre as muitas experiências de buscas

projetadas ou planejadas de produção de conhecimento, denota-se uma característica

específica em que muitas vezes se considera que o outro, geralmente o não pesquisador ou

aquele que está em posição de demanda de apoio em termos de alguma intervenção ou

consultoria, está em situação social inferior a qual deveria ou poderia estar (Schommer &

Boullosa, 2010).

Tal premissa pressupõe um conjunto de conhecimento unidirecionado de um grupo de

atores para outro grupo, em outras palavras, os que ensinam e os que aprendem (Schommer &

Boullosa, 2010). Quando isso ocorre, tem-se que a produção de conhecimento é limitada e

enviesada, pois o sistema de aprendizagem passa a ser compreendido como um “sistema de

ensinamento, onde, no máximo, se ajusta o modo de ensinar ao público local que deve

aprender, respeitando as suas práticas, mas não as assumindo como unidade de pesquisa”

(Schommer & Boullosa, 2010 p. 36).

Ospina e Dodge (2005) corroboram esta ideia ao afirmar que pesquisadores com

credenciais acadêmicas tendem a fazer a maioria das pesquisas no campo, a partir da

subordinação do papel dos praticantes investigados, relegando-os ao potencial de

consumidores dos resultados acadêmicos. Este cenário pode se traduzir em uma pesquisa

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produzida em laboratório, cuja compreensão daqueles que serão pesquisados segue

independente de seus interesses no desenvolvimento da teoria (Opina & Dodge, 2005,

Pettigrew, 2001).

Numa tentativa de inibir o contexto unidirecionado da produção de conhecimento no

âmbito do ensino-pesquisa-extensão, a chamada “Investigação Narrativa” se apresentaria

como uma forma de pesquisa interpretativa, na qual a narrativa dos pressupostos e práticas de

investigação ilustram formas de integrar rigor e relevância como duas dimensões inseparáveis

(Ospina, 2005, p. 288). Este tipo de pesquisa é destacado por Ospina e Dodge (2005) ao

observar que há espaço para uma maior fluidez nos papéis tradicionais do pesquisador e do

pesquisado. “Levando a sério a narrativa das práticas e os pressupostos que a compõem foi

possível dar aos praticantes um papel mais significativo no processo de pesquisa” (Ospina &

Dodge, 2005 p. 287).

Essa proposição pode-se beneficiar com a conversão de parte do conhecimento tácito

dos praticantes em algum tipo de conhecimento explícito ao ser transformado em conceitos e

hipóteses configurados em metáforas ou dedução e indução (Yakhlef, 2012). Essa dinâmica

faz uso da linguagem figurada na tentativa de externalizar a maior fração possível do

conhecimento que lhes é próprio (Yakhlef, 2012), de modo a contribuir para a ressignificação

e reflexão dos saberes múltiplos que a cerca, bem como o compartilhamento de seus

conhecimentos com a academia.

Outra metodologia de produção de conhecimento que tenta superar as visões

tradicionais acerca da pesquisa e da formação em Gestão Social é a chamada Residência

Social. Essa metodologia, desenvolvida por algumas universidades brasileiras, sinaliza a

capacidade de empreender a tríade ensino, pesquisa e extensão a partir de saberes

interdisciplinares que permitam a valorização não apenas do saber acadêmico formal, mas

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também dos saberes dos atores sociais envolvidos no processo de formação (Schommer &

França-Filho, 2006).

Esta é uma tecnologia de ensino que busca proporcionar ao aluno um espaço de

aprendizagem prático-reflexiva a partir da sua imersão continuada em contextos práticos

organizacionais diferentes dos seus contextos habituais de ação. Estes espaços podem ser

organizações, instituições, empresas ou mesmo projetos ou programas interorganizacionais,

desde quando interessados em acolher experiências de compartilhamento de saberes. Tal

imersão buscaria dar condições para que o estudante desenvolvesse capacidades e

competências inerentes à função de gestor social (Schommer & França-Filho, 2006), a partir

da articulação de três dimensões de ação prática-reflexiva, socialização de diferentes saberes,

compreensão mais complexa da realidade e, conexões entre ensino, pesquisa e extensão

(Boullosa & Barreto, 2010).

Considerando a sua atuação em cursos, programas ou centros de estudos que articulam

a Gestão Social, observa-se que a Residência Social é uma metodologia de importante

relevância para a produção de conhecimento. Isso se dá, sobretudo, porque busca aprofundar

as interações e o envolvimento entre os diversos atores sociais, trazendo os seus saberes, suas

perguntas e suas incertezas, bem como sua disposição para o diálogo para o processo de

produção de conhecimento e formação em gestão, embora alguns dos participantes nem

sempre estejam preparados para esse diálogo (Schommer & França-Filho, 2006).

Apreende-se que as metodologias de ensino como a Coprodução do Conhecimento,

Investigação Narrativa e Residência Social contribuiriam para a produção de conhecimento

sobre Gestão Social ao promoverem construções coletivas e de bem comum, intermediadas,

respectivamente, pelas percepções e experiências vividas pelos praticantes e pela

sistematização do conhecimento teórico que a academia desenvolve.

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Entretanto, para que tal ocorra, há necessidade de um elevado grau de diálogo e

reflexão entre acadêmicos e praticantes amparados pela a valorização do conhecimento prévio

e da vivência de cada parte envolvida.

Compreende-se que essa perspectiva vincula-se a ideia de relação a qual será discutida

no próximo capítulo por meio das abordagens que explicitam a noção de campos de poder e

de habilidade social.

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4 RELAÇÃO ENTRE ACADEMIA E PRATICANTES: CAMPOS DE PODER QUE

SE CONECTAM

A discussão proposta neste capítulo buscou contextualizar as relações estabelecidas

entre a academia e praticantes, oriundas da interseção entre diferentes campos, considerando

os limites desafiantes vivenciados pela a universidade contemporânea, bem como as possíveis

articulações e dinâmicas promovidas por ela como forma de enfretamento aos desafios

apontados. Nesse intento, buscou-se analisar as possibilidades de produção de conhecimento

em Gestão Social como perspectiva de transformação e ampliação do seu campo.

A fim de compreender a constituição das relações entre a universidade e os

praticantes, desenvolveu-se nesse capítulo uma discussão orientada pela noção de campos de

poder conforme os compreende Bourdieu (1989, 1996). Apreende-se que essa perspectiva

possibilita a análise do conhecimento que é produzido entre os atores envolvidos nas tramas

objetivas e subjetivas articuladas pela universidade e os praticantes da Gestão Social, as quais

seriam revestidas de habilidade social, saberes híbridos e de interesses múltiplos que, por

vezes, são conflituosos.

A Figura 3 “Diagrama Conceitual das Esferas Pública e Privada que Localizam a

Sociedade Civil”, representada pelo modelo explicativo das esferas da sociedade (Janoski,

1998 p. 13) permite exibir uma visão que pode ser considerada "meso" das relações entre

academia e praticantes, por explicitar o campo macro em que atuam e as possíveis interseções

e movimentos precedidos por eles. Infere-se que essas dinâmicas não se determinam pela

imposição das estruturas sociais sobre a ação social, nem tampouco se determinam guiadas

pelos pressupostos da agência sobre a transformação social, segundo os quais a mudança

social se daria fundamentalmente a partir da ação dos atores sociais, independentemente das

estruturas sociais. Ao contrário, assume-se nessa pesquisa que a ação social é fruto da

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articulação entre instituições e seus atores sociais, que criam dimensões "meso" de vida em

sociedade, nas quais se pode manifestar a transformação social e possibilidades para os atores

sociais.

Figura 3. Diagrama Conceitual das Esferas Pública e Privada que Localizam a Sociedade

Civil.

Na Figura 3 “Diagrama Conceitual das Esferas Pública e Privada que Localizam a Sociedade Civil” observa-se

uma articulação e sobreposição entre as esferas públicas, privadas, de mercado e estatal, derivadas das

complexas relações entre diferentes atores, interesses, racionalidades e valores, no qual é possível oferecer

elementos de propriedade analítica sobre as sobreposições, influências recíprocas e ampliação e retração das

esferas privadas, públicas, do Estado e do mercado na sociedade contemporânea.

Public

Sphere

e

Private

Sphere

Market

Sphere

Executive Police

Military

Judiciary Secrety Police

Espionage

Bureaucracy

State Sphere

Political

parties

Public Welfare state, media,

education &

R&D

Voluntary

associations:

welfare, public interest, religious

Self-help groups

Private media,

Education healt

Social movements

People’s private

lives disclosed in

the media & courts

Union federations

Employer associations

Consumer associations

Defense Regulation

contracting

Firms Unions

Market

Family firms

& elite club

network

Family

Friends &

acquaintances

Love and

affection

Sexual relations

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Fonte: Janoski, T. (1998). Citizenship and Civil Society: A Framework of Rights and Obligations in Liberal,

Traditional, and Social Democratic Regimes. Cambridge: University Press.

A perspectiva apresentada por essa Figura 3, intitulada “Diagrama Conceitual das

Esferas Pública e Privada que Localizam a Sociedade Civil”, a partir do objeto de pesquisa

proposto, relações entre academia e praticantes do campo da Gestão Social, recorre a visões

sobre ação social tais como a ideia de estruturação de Giddens (2003) e de habilidades sociais

de Fligstein (2007), que pressupõem também que as estruturas sociais não determinam

inexoravelmente a ação social, nem que os atores são livres das limitações e imposições

sociais para construir sua ação. A produção de conhecimento entendida a partir das

habilidades sociais, da estruturação proposta por Giddens (2003) e da própria ideia de campos

de poder de Bourdieu (1989, 1996) pressupõe que os atores podem reconstruir suas práticas

de pesquisa, ensino, extensão e transmissão, bem como elaboração coletiva de saberes, ao

mesmo tempo em que têm sua ação delimitada por instituições e níveis meso de interação

social, tais como os campos de poder que permeiam seu fluxo de ação vis-a-vis a coletividade.

Destaca-se que o interesse em contextualizar as relações entre academia e praticantes

vincula-se ao caráter institucional de produção de conhecimento que a universidade detém por

meio da tríade ensino, pesquisa e extensão, o qual denota relações além dos muros que a

delimitam.

Essa ideia permite inferir processos de produção de conhecimento ancorados na

aprendizagem cognitiva individual e, sobretudo, na aprendizagem social, cujos arranjos

provêm da interação e integração entre múltiplos saberes oriundos dos atores acadêmicos e

não acadêmicos ou praticantes, no caso do recorte da presente pesquisa, praticantes da Gestão

Social. Nesse sentido, parte-se do pressuposto da relevância da pesquisa em sintonia com o

ensino e a extensão ao direcioná-la para o mundo real. Isso, segundo Bushouse and Sowa

(2011), supõe o equilíbrio teoria e prática, bem como criar pesquisa que não seja apenas

teórica, mas também promotora de insights que possam ser utilizados na prática.

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Além do caráter institucional de produção de conhecimento decorrente da

universidade contemporânea, compreende-se que os praticantes oriundos do campo da Gestão

Social, a partir das articulações que os envolvem, carregariam consigo “ações definidoras do

seu ethos”, as quais por definição estariam relacionadas às dinâmicas de conhecimento

(Marteleto e Ribeiro, 1997 p.7).

Nesse sentido, aponta-se como atividade principal das organizações da sociedade civil

uma “relação de assessoria contratual, associada à transmissão de alguma competência de

conhecimento, que envolve confiança mútua e certa afinidade de propósitos” (Fernando &

Carneiro, 1991 p. 8). Assessoria, neste caso, seria com frequência uma “forma de relacionar

intelectuais, de um lado, e organizações ou movimentos sociais, de outro, sem que este

relacionamento implique um vínculo hierárquico entre as partes” (Fernando & Carneiro, 1991

p. 8).

As próximas sessões norteadas pela abordagem de campos de poder se estruturaram

com o intuito de avançar na compreensão da produção de conhecimento em Gestão Social a

partir dessa perspectiva.

4.1 Campos de Poder da Universidade Contemporânea

No mundo contemporâneo, os questionamentos e as alusões sobre as limitações das

ciências modernas assinaladas no século XX, configuram-se em apelos por mudanças de

conduta relacionadas ao papel que a ciência e tecnologia desempenham para a sociedade,

evidenciando a complexa situação em que se encontra a universidade e os desafios em

produzir dinâmicas de conhecimento que estejam em sintonia com um contexto

multiparadigmático (Bursztyn, 2002, Santos, 1997, Bauman, 2008, Leroy & Pacheco, 2006,

Gianella, 2008).

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É nesse contexto que se destaca a relação entre academia e praticantes, ao

compreender que a articulação entre saberes plurais, um dos pilares da universidade,

contribuiria para a produção de conhecimento em Gestão Social.

Apreende-se que as relações objetivas ou subjetivas se configuram em espaços sociais

constituídos de campos de poderes que se configuram em capital (Bourdieu, 1989). Por sua

vez, conforme Bourdieu (1989 p. 61), o capital é um conhecimento adquirido e também um

haver que ele considera como um habitus. O habitus, a hexis (equivalente grego de habitus),

indica a “disposição incorporada”, quase postural, de um agente em ação. Trata-se de chamar

a atenção para o “primado da razão prática” (Bourdieu, 1989 p.61). Pode, portanto, ser

descrito como um senso prático que incentiva os agentes a atuar e reagir sem a utilização do

cálculo específico, que não é caracterizado pela obediência consciente a regras (Bourdieu,

1996). “Ele é o princípio gerador e unificador que retraduz as características intrínsecas e

relacionais de uma posição em um estilo de vida unívoco, isto é, em um conjunto unívoco de

escolhas de pessoas, de bens, de práticas” (Bourdieu, 1996 p. 22).

Nesse aspecto, salienta-se que ser um indivíduo em um espaço, é ser diferente, é ser

significativo. “É ser dotado de categorias de percepção, de esquemas classificatórios, de um

gosto que lhe permite estabelecer diferenças” (Bourdieu, 1996 p. 23).

Em um mundo social, constituído em várias dimensões, espaços, os agentes ou grupos

de agentes se definem pelas suas posições relativas neste espaço. Em outras palavras, por suas

diferenças, sejam elas objetivas ou subjetivas. Cada um está disposto numa posição ou classe

em uma região determinada do espaço (Bourdieu, 1989). “Na medida em que a propriedade

tida em consideração para se construir este espaço são propriedades atuantes, ele pode ser

descrito também como campo de força, quer dizer, como um conjunto de relações de forças

objetivas impostas a todos os que entrem nesse campo” (Bourdieu, 1989 p. 134).

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Tais propriedades atuantes ou forças constituiriam diferentes espécies de poder ou de

capital, que ocorrem nos diferentes campos. O capital poderia se configurar em forma de

propriedade ou em um estado incorporado, capital cultural, representando um poder sobre um

campo num dado momento e, mais precisamente, sobre o produto acumulado do trabalho

passado (Bourdieu, 1989).

As espécies de capital são os poderes que definem as probabilidades de ganho num

campo determinado. A posição de um determinado agente no espaço social poderia assim ser

definida pela posição que ele ocupa nos diferentes campos, ou seja, na distribuição dos

poderes que atuam em cada um deles, seja, sobretudo, o capital econômico, nas suas

diferentes espécies, o capital cultural, o capital social e o capital simbólico, geralmente

reconhecido como prestígio e reputação (Bourdieu, 1989).

Segundo Flinsgtein (2007), o surgimento de novos campos ocorre quando um número

significativo de membros de diferentes grupos percebe oportunidades de transformação da

realidade social e seus campos. A crise dos novos campos reflete o fato de que não surgiram

regras estáveis de interação e que os grupos estão ameaçados de extinção.

Compreende-se que ao considerar o campo característico da universidade

contemporânea, o qual sinaliza um forte capital simbólico intelectual, agregam-se a ele alguns

desafios vigentes na perspectiva de integração entre a ciência e o senso comum, cujas

implicações, segundo Santos (2004) conduziram-na para uma crise da hegemonia, de

legitimidade e institucional, evidenciando campos de poderes por vezes antagônicos.

Morin (2008) corrobora essa ideia ao ressaltar que o desenvolvimento científico,

técnico e social está cada vez mais em inter-retroação. Em outras palavras, significa que a

experimentação científica constitui por si mesma uma técnica de manipulação e o

desenvolvimento das ciências experimentais desenvolve os poderes manipuladores da ciência

sobre as coisas físicas e vivas (Morin, 2008, Francelin, 2004, Santos, 2002). Este favorece o

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desenvolvimento das técnicas, que remete a novos modos de experimentação e de observação,

que nesse contexto, potencializaria a manipulação no caráter da ciência (Morin, 2008).

Em função desse processo de inter-retroação, a situação e o papel da ciência na

sociedade teriam se modificado profundamente, de forma que, hoje ela tornou-se uma

poderosa instituição no centro da sociedade, subvencionada, alimentada e controlada pelos

poderes econômicos e estatais (Morin, 2008).

Por outro lado, há concepções que revelam outras proposições para a ciência, as quais

não a reduzem somente a experimentos. O critério de cientificidade, ou seja, o experimento

científico seria um dos pontos fundamentais para o desenvolvimento das ciências exatas e

biológicas ou da natureza, mais bem representadas pela física e pela biologia, especialmente

através de seus desdobramentos disciplinares nas últimas décadas do século XX. Porém, esse

mesmo “cientificismo” não seria partilhado pelas disciplinas que compõem as chamadas

ciências humanas e sociais (Francelin, 2004, Teixeira, 2004 p. 58).

Nesse aspecto, o pensamento científico não se forma nem se transforma apenas pelo

experimento, pelo contrário, anterior à práxis científica estão as ideias, o pensamento, o

“conhecimento do conhecimento” e a filosofia da ciência, que trariam à tona as discussões em

torno da epistemologia, dos paradigmas, da ética, da moral e da política. Enfim,

características relacionadas e inter-relacionadas ao desenvolvimento do conhecimento e aos

possíveis desdobramentos e consequências que possam trazer sobre a realidade social

(Francelin, 2004).

Decorrente dessa ideia, Francelin (2004) redefine a gênese científica, justificando a

necessidade de uma aproximação entre ciência e senso comum. Conforme argumenta, os

conceitos que nascem no cotidiano (senso comum) são apropriados pelo meio científico e

tornam-se científicos ao romperem com esse cotidiano, com esse senso comum.

Complementando esta ideia, Santos (2002, p. 10) propõe um "novo senso comum" que

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parte do desaparecimento da distinção hierárquica entre conhecimento científico e

conhecimento vulgar. Nesse sentido, a “prática será o fazer e o dizer será a filosofia prática”

(Santos, 2002, p.10).

O autor lembra que a ciência moderna “construiu-se contra o senso comum”,

considerando-o “superficial, ilusório e falso” e a ciência pós-moderna vem para reconhecer os

valores (“virtualidades”) do senso comum que enriquecem a “nossa relação com o mundo”,

ou seja, o senso comum também produz conhecimento, mesmo que ele seja um

“conhecimento mistificado e mistificador” (Santos, 2002, p.12).

Na mesma linha de análise sobre a ciência moderna, Ribeiro e Aguiar (2006)

compreendem que a modernidade representaria uma forma de organização social centrada na

razão científica, empiricista, mecânica e dicotômica. Marcada pela “flecha irreversível do

tempo, a modernidade orienta-se por uma noção de tempo avante em direção a um estado

civilizacional superior e universal, centrado na perspectiva do devir” (Ribeiro & Aguiar, 2006

p. 4). O pensamento moderno seria baseado na dualidade, no “ou isto ou aquilo”, o qual

impõe uma racionalidade dicotômica presente entre razão/mito, sujeito/objeto,

objetividade/subjetividade, progresso/atraso e sociedade/natureza, sustentadas pela a “ciência

como saber superior e antagônico a todas outras formas de conhecimento” (Ribeiro & Aguiar,

2006 p. 4).

Quanto a ciência na pós modernidade, Santos (2002) observa que as ciências se

deparam com a oportunidade de se tornarem “enfim verdadeiras sabedorias, assumindo uma

face filosófica, pela recuperação de uma espécie de ‘douta ignorância’ e por um novo estilo de

aproximação da natureza, mais qualitativo, mais holista, mais dinâmico e, por isso, mais

humano” (Ribeiro & Aguiar, 2006 p. 8). As “ciências teriam, agora, a chance de se redimirem

dos prejuízos de sua estratégia reducionista, analítica, quantitativa, estática perante uma

natureza que não merecia tanta indiferença” (Ribeiro & Aguiar, 2006 p. 8).

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Tais proposições permitem anunciar modos de participação e de deliberação, isto é,

“de adesão ao novo acordo civil que substitui a apartação natureza e sociedade pelo conceito

uno de coletivo” (Ribeiro & Aguiar, 2006 p. 9). Latour (2001) e Ribeiro Aguiar (2006)

percebem que a crise da modernidade não significa seu colapso, mas sim o surgimento de

novas possibilidades de configuração da relação entre atores na produção de conhecimento.

A partir dessa noção, no qual a “compreensão da ciência exige não a contemplação,

mas a aplicação prática, o modo de pensamento que nele se exprime” (Bourdieu, 1989 p. 64),

destacam-se os desafios que a universidade contemporânea vivencia configurados pela luta

entre campos de poderes precedidas pela força do senso comum, imbuída de capital cultural, e

pela força do conhecimento científico, oriundo do capital intelectual.

Na esteira dessa discussão, destacam-se três fins principais da universidade

contemporânea, a investigação, o ensino e a prestação de serviços que, apesar do atrofiamento

da dimensão cultural e da dominância do seu uso conteudista, utilitarista e produtivista,

explodiram em uma multiplicidade de funções por vezes contraditórias entre si (Santos,

1997). A fim de explicitar esse quadro, é preciso recorrer às contribuições analíticas que

Santos (1997, 2001, 2002) confere aos dilemas que a universidade contemporânea vivencia,

destacando que essas contribuições apenas servem de pano de fundo para melhor

compreender as relações entre acadêmicos e praticantes da Gestão Social no Brasil.

Segundo esse autor, as funções contraditórias decorrem de um processo de crise que se

apoiam nas questões de cunho hegemônico, de legitimidade e institucional. A primeira, entre

conhecimentos exemplares e conhecimentos funcionais, manifesta-se a crise de hegemonia

que se apresenta “sempre quando uma dada condição social deixa de ser considerada

necessária, única e exclusiva” (Santos, 1997 p. 190). A segunda contradição revela-se como a

de legitimidade. “A universidade sofre uma crise de legitimidade na medida em que se torna

socialmente visível a falência dos objetivos coletivamente assumidos” (Santos, 1997 p. 190).

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A terceira e última contradição, entre autonomia institucional e produtividade social,

apresenta-se como a crise institucional, em que a sua especificidade organizativa é posta em

causa e modelos vigentes noutras instituições tidas como mais eficientes são impostos ao

espaço acadêmico, notadamente os modelos empresariais de gestão universitária (Santos,

1997).

Dentre elas, nota-se que a crise hegemônica seria a mais ampla em sentido histórico,

por que nela está em causa a exclusividade dos conhecimentos que a universidade produz e

transmite, evidenciando a fragilidade da reflexão crítica e da consciência própria da

universidade e dos atores acadêmicos acerca da realidade humana e social contemporâneas

(Santos, 1997, Bauman, 2008).

Ressalta-se que a centralidade da universidade na condição de lugar privilegiado da

produção de alta cultura e conhecimento científico avançado é um fenômeno do século XIX.

Esse escopo agregado à exigência posta no trabalho universitário intelectual, a liberdade de

discussão, o espírito crítico, a autonomia e o universalismo dos objetivos fizeram da

universidade uma instituição única, dotada de grande prestígio social e considerada

imprescindível para a formação das elites (Santos, 1997). Porém, esta concepção da

universidade, no período do capitalismo liberal (até finais do século XIX), já se encontrava

em relativa dissintonia com as exigências sociais, entrando em crise, sobretudo a partir dos

anos sessenta. A universidade como espaço de provisão de capital cultural e simbólico

encontra-se em xeque, em questão, deixando espaço para que novos atores e seus processos

de produção de conhecimento, notadamente os praticantes da gestão, da Gestão Social no

contexto específico da presente pesquisa, também construam posições de maior poder e

influência em um determinado campo social, o próprio campo da Gestão Social.

Com a demanda pelo envolvimento da universidade e do conhecimento por ela

produzido na resolução de problemas econômicos e sociais prementes, denota-se uma

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proximidade imperativa entre senso comum e conhecimento científico, cujas bases

questionariam a dicotomia entre a teoria-prática e as tensões decorrentes geradas por

mecanismos diferentes institucionais relacionados à academia (Santos, 1997).

A universidade teria passado a vivenciar uma problemática que se traduz em dois

princípios: a da natureza da investigação básica e das virtualidades e limites da investigação

aplicada no espaço acadêmico (Santos, 2002). O primeiro princípio tornou-se problemático

devido aos seus custos aumentarem exponencialmente e pela conversão progressiva da ciência

em força produtiva, que acabou por pôr em causa a própria validade da distinção entre

investigação básica e aplicada. Santos (2002) argumenta que a questão dos custos agravou-se

com a crise financeira do Estado e com a multiplicação dos centros universitários. Em

consequência, a exclusividade da universidade na investigação básica passou a ser problema

contabilizado como custo.

Esta característica pode ser notada na transformação das grandes empresas

multinacionais, as quais criaram seus próprios centros de investigação básica e aplicada, de

forma que a excelência de seus resultados pode rivalizar com os dos centros universitários. O

Estado também inaugurou centros de investigação não universitário e, além disso, procurou

selecionar as universidades e os centros de investigação com maior capacidade de

investigação para concentrar neles os recursos financeiros disponíveis (Santos, 1997).

Observa-se que este cenário caracteriza a crise de legitimidade ao considerar a

revolução tecnológica permanente e continuada, que transformaria a técnica adquirida e os

hábitos aprendidos em desvantagens, e não mais em bens. Além disso, seria encurtado

drasticamente o período de vida de habilidades úteis, que muitas vezes perdem sua utilidade e

poder habilitante em menos tempo do que se leva para adquiri-los e certifica-los por meio de

um diploma universitário (Chauí, 1999, Santos, 1999, Bauman, 2008).

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Consequentemente, numa tentativa desesperada de fazer da necessidade uma virtude,

os intelectuais, coletivamente degradados pela competição de mercado, estariam se

convertendo em promotores zelosos de critérios de mercado na vida universitária: este ou

aquele curso ou projeto é bom se tem boa abertura para o mercado, se vende bem, sendo que a

capacidade de vender se encontra com a demanda de satisfazer as necessidades humanas

contidos nos critérios supremo dos currículos, cursos e títulos adequados (Bauman, 2008).

Este seria o contexto que caracterizaria tanto a crise hegemônica quanto a crise de

legitimidade. A universidade, ao responder a crise hegemônica por meio da incorporação

limitada da cultura de massas, da formação profissional, da investigação aplicada e da

extensão à comunidade (Santos, 1997), estaria buscando legitimidade diante de um quadro

marcado pela produtividade baseada em critérios de natureza mais mercadológica do que

acadêmicos per si.

Quanto à crise institucional, destaca-se o quadro socioeconômico no qual se inserem

os seus fundamentos. Chauí (1999) contextualiza essa crise a partir das premissas da Reforma

do Estado brasileiro, que pretendeu modernizar e racionalizar as atividades estatais,

redefinidas e distribuídas em setores, um dos quais é denominado Setor dos Serviços Não-

Exclusivos do Estado, isto é, aqueles que podem ser realizados por instituições não estatais,

na qualidade de prestadoras de serviços. Nesses serviços estariam incluídas a saúde, a cultura

e a educação, entendidas como “organizações sociais” prestadoras de serviços que

celebrariam “contratos de gestão” com o Estado (Chauí, 1999 p. 12).

A partir deste princípio, a universidade tenderia a vigorar como organização e não

mais como instituição social. Observa-se que o valor que está em causa na crise institucional é

a autonomia universitária (Chauí, 1999, Santos, 1997). Essa autonomia se reduziria à gestão

de receitas e despesas, de acordo com o contrato de gestão pelo qual o Estado estabelece

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metas e indicadores de desempenho, que determinam a renovação ou não renovação do

contrato (Chauí, 1999, Santos, 1997).

Dessa forma, as universidades poderiam ficar por vezes a mercê dos resultados que

atores não acadêmicos esperam receber, perdendo autonomia dos objetivos científicos e

educacionais a que gostaria de se dedicar e reproduzindo em seu seio um espírito empresarial,

empenhado em maximar a rentabilidade do investimento em educação (Santos, 1997, Leff,

2001).

As abordagens acerca da crise da universidade contemporânea evidenciam a

necessidade da academia em atender as prerrogativas de caráter econômico para sustentar as

demandas do mercado, o que contribuiria para a não legitimação de seu campo, uma vez que

seria induzida a subverter os princípios do conhecimento científico. Este, por outro lado, ao

não reconhecer o conhecimento popular ou o senso comum, cria um campo antagônico

revestido pela dicotomia entre a teoria e a prática, reverberando e ampliação sua crise

hegemônica.

Apreende-se que essas duas contradições limitariam a completude de seu campo, pois

descrevem um quadro do que se espera da universidade como instituição de formação

científica do conhecimento que precisaria aderir a outras exigências para contribuir na

transformação do meio no qual ela se insere.

Misoczky (2003) reforça essa interpretação ao salientar os argumentos proferidos por

Bourdieu (1996), o qual afirma que a prática em um campo é aquela que atingiu o status de

ser considerada como fato dado, não sujeita a questionamentos. Passa, então, a compor o

capital cultural do campo; é parte do que aqueles que estão no campo são capazes de

identificar como natural e legítimo. Quando este tipo de capital cultural se perde, o campo se

torna aberto a questionamentos e redefinições. “Esta noção de tipos de capital leva,

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naturalmente, a uma reavaliação das concepções a respeito do ambiente na perspectiva

institucional” (Misoczky, 2003 p.25).

Reconhece-se que as interações entre acadêmicos e praticantes, quando manifestada a

partir das tramas apontadas por Santos (2002), Bauman (2008) e Chauí (1999) implicariam

em riscos para a produção de conhecimento academicamente adequado e efetivamente

relevante para a sociedade. Todavia, consideram-se as possibilidades de transformação dos

campos de poder por meio das habilidades sociais e dos conhecimentos gerados que envolvem

as ações dos atores inseridos nessa trama. Ações essas que não sobrepõem e nem são

sobrepostas pelas bases sociais estruturantes impostas.

4.2 Dinâmicas de Produção de Conhecimento entre Academia e Praticantes da Gestão

Social

Reconhece-se que a delimitação dos campos de forças não precede a uma lógica

racional e determinística ao se considerar a presença de relações de poder objetivas e

subjetivas. A partir desse aspecto, “os atores, em condições institucionais tanto estáveis

quanto instáveis, não se limitariam apenas aos significados compartilhados em seus campos,

entendidos como roteiros que devem ser interpretados por profissionais ou burocratas do

governo” (Fligstein, 2007 p. 66). Eles emergem como contraponto à concepção racionalista da

ação, ao demonstrar que “não podem processar todos os dados sensoriais num cálculo

racional e que fazem uso e formam conceitos que, baseados em sua experiência anterior, os

ajudam a tomar decisões e a agir” (Carvalho, Goulart, & Vieira, 2005 p. 3).

Nesse sentido, verifica-se a possibilidade de formação de processos relacionais

complementares, que permitiriam diminuir o antagonismo entre os campos e dentro de

determinado campo, o que possibilitaria a ampliação da produção de conhecimento.

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Tais processos relacionais podem se apoiar em uma visão sociológica da ação que

Fligstein (2007 p. 61) denomina de “habilidade social”. Segundo o autor, a ideia é que atores

precisam induzir a cooperação dos outros. “A habilidade de motivar os outros a tomar parte

de uma ação coletiva é uma habilidade social que se prova crucial para a construção e

reprodução de ordens sociais locais” (Fligstein, 2007 p. 61).

Essa abordagem destaca que atores sociais hábeis compreendem a percepção dos

conjuntos de atores de seu grupo em relação às suas múltiplas concepções de interesse e

identidade em situações específicas para proporcionar uma interpretação da situação e

determinar ações que estejam de acordo com os interesses e as identidades existentes

(Fligstein, 2007).

A partir deste propósito, vale ressaltar o conceito de agência, que segundo Selznick

(1992) denota competência, intencionalidade e calculabilidade. Ser um agente é atuar com

propósito. Giddens (1984) também associa agência à intencionalidade. Contudo ele admite

que a intenção é aspecto relevante, porém, não o suficiente para explicar a capacidade de

agência. Assim considera que agência não consiste, tão somente, na intenção que os

indivíduos possuem de realizar as coisas, mas na sua habilidade de fazer tais coisas em

primeiro lugar, o que implica em poder.

Nesses termos, agência seria a capacidade de interferir em eventos, não necessariamente

de modo intencional. Agir, mais do que pretender algo, é ser significativo na sua ocorrência,

na medida em que a “ação depende da capacidade do indivíduo de fazer uma diferença em um

estado pré-existente de coisas ou cursos de eventos” (Giddens, 1984, p.14).

Conforme essa noção específica de agência associada à perspectiva da habilidade social,

Machado-da-Siva et al, (2005) entendem que se torna possível, enfim, visualizar a

interdependência entre estruturas e ações sociais, sem sucumbir à ideia de causalidade linear

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entre elas. Os autores afirmam que seria nesse sentido que Giddens (1984) entende estruturas

como traços da memória que se manifestam, se reproduzem e se expressam como tal.

Misoczky (2003, p.42) contribui com essa ideia ao recorrer ao “estruturalismo

construcionista”, presente nos estudos de Bourdieu (1990, p. 149), o qual designaria uma

“articulação dialética entre objetivismo e subjetivismo na sua teoria, ou seja, a articulação

dialética entre estruturas mentais e sociais”.

É no escopo dessa abordagem que se destaca a produção de conhecimento, como

resultado da aceitação de determinada ação que, ao ser condicionado por atores constituídos

de habilidade social e interpretado como legítima, seria reproduzida pelos agentes na prática

social, fortalecendo os campos de poder no qual se inserem. Apreende-se que esse aspecto

vincula-se a abordagem socioprática da aprendizagem, uma vez que decorre de relações

estabelecidas entre múltiplos atores sociais que, por outro lado acolhem determinados

preceitos da Gestão Social ao se consolidar a partir de interações pautadas na participação e

no interesse comum.

Essa perspectiva permite verificar a possibilidade de produção de conhecimento cujos

pilares se baseiam na convergência e na cooperação entre os campos, bem como nos distintos

poderes que são precedidos de conflitos por se fundarem pela multiplicidade de saberes e de

interesses.

Nessa ordem, observam-se algumas proposições apontadas por metodologias e

práticas reflexas e dialógicas da universidade, no sentido de responder aos desafios por ela

vivenciados.

Em um contexto macro, evidenciam-se maneiras das instituições em lidar com as

crises, reagindo à mudança no ambiente, articulando problemas e buscando soluções.

Compreende-se que esse é um modo de colocar a questão, o de um observador interno. Outro

modo de colocar a questão e que se aproxima da abordagem dialética entre estrutura e agência

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seria a de um observador externo cujas crises seriam notadas como produtos comuns da

percepção da situação, como crítica, de forma que vá ao encontro do que a situação torna

possível e/ou desejável (Bauman, 2008).

Nesse aspecto, algumas ideias-mestras presidem a uma reforma criativa e democrática

da universidade de hoje. Talvez a primeira questão seja saber quem são os sujeitos das ações

que seriam preciso empreender para enfrentar eficazmente os desafios que defrontam a

universidade (Santos, 2004). Mas, para identificar os sujeitos é necessário definir previamente

o sentido político da resposta a tais desafios.

Observa-se que o contexto global, além de se dispor à globalização neoliberal, disporia

também de espaço para articulações nacionais e globais baseadas na reciprocidade e no

benefício mútuo (Santos, 2004). A partir desse pressuposto, Santos (2004) argumenta que a

reforma da universidade contemporânea deveria refletir um projeto de país centrado em

escolhas políticas solidárias, que qualifiquem a sua inserção em contextos de produção e de

distribuição de conhecimentos cada vez mais transnacionalizados.

Essa proposta se assentaria nas novas tecnologias de informação e de comunicação e

na constituição de redes nacionais e globais, nas quais circulam novas pedagogias, novos

processos de construção e de difusão de conhecimentos científicos e também novos

compromissos sociais, locais, nacionais e globais. O objetivo consistiria em resituar o papel

da universidade contemporânea na definição e resolução coletiva dos problemas sociais que,

sendo locais ou nacionais, não são resolúveis sem considerar a sua contextualização global

(Santos, 2004).

No eixo dessa discussão, o projeto político teria de ser sustentado por forças sociais

disponíveis e interessadas em protagonizá-lo, o que pode ser feito, primeiramente, pela

própria universidade, ou seja, quem nela está interessado em uma globalização alternativa,

configurando-se assim, no primeiro sujeito de ação (Santos, 2004).

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Infere-se que essa concepção traduz a articulação dialógica entre estrutura e agência ao

perceber que as bases institucionais da universidade podem ser modificadas a partir das

demandas sociais, constituídas de atores (agentes) imbuídos de habilidade social e de saberes

híbridos. Esse aspecto evidencia uma via de mão dupla, na qual universidade e sociedade

podem agir coletivamente no enfrentamento dos problemas sociais que marcam a produção de

conhecimento. As propostas epistemológicas de construção e difusão do saber em Gestão

Social, notadamente a Coprodução, a “Investigação Narrativa” e a Residência Social podem

assumir papel relevante como estratégias para alterar as posições de poder nesse campo, de

forma a democratizar a universidade, reconhecer e dialogar com saberes não acadêmicos,

tradicionais e hegemônicos e produzir novas compreensões e alternativas de ação social frente

aos problemas sociais e ambientais contemporâneos.

Chauí (2003) responde a esse princípio de reforma da universidade ao destacar alguns

pontos que podem ser a condição e a forma dessa mudança. Um desses pontos é a própria

universidade se colocar claramente contra a exclusão como forma da relação social definida

pelo neoliberalismo e pela globalização. Outra questão pertinente englobaria a percepção da

educação superior como um direito do cidadão, “na qualidade de direito, ela deve ser

universal” (Chauí, 2003 p. 14). Além disso, a autora defende a universidade contemporânea

tanto pela ampliação de sua capacidade de absorver, sobretudo, os membros das classes

populares, quanto pela firme recusa da privatização dos conhecimentos. Nesse sentido, apesar

da crise da instituição universitária percebe-se também que novas possibilidades de

reconfiguração democrática da universidade brasileira têm aparecido nos últimos anos, tais

como os programas de bolsas para alunos oriundos de grupos de baixa renda e as cotas, ainda

também que reações contrárias e críticas agudas acompanhem essa abertura da academia a

públicos que tradicionalmente enfrentam grandes dificuldades de inserção nesse espaço.

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Outro agente da resposta aos desafios seria o Estado nacional sempre e quando ele

optar politicamente pela globalização solidária da universidade (Santos, 2004). Essa

perspectiva toma a educação pelo prisma do investimento social e político, o que só seria

possível se a educação for considerada um direito e não um privilégio, nem um serviço

(Chauí, 2003).

Nesses termos, propõe-se uma universidade comprometida com novos paradigmas de

formação. Não haveria mais lugar para sujeitos passivos e conformistas ou para simples

demandantes de emprego (Ribeiro, 2003). A universidade brasileira precisaria ser capaz de

educar cidadãos empreendedores e criativos, preparados para serem mestres da ação solidária

(Chauí, 1999). Destaca-se a importância à dialética das múltiplas dimensões interativas entre

tempos e espaços, conhecimentos e interesses, vivências e práticas sociais que conformariam

os seres humanos e as sociedades como singulares e interdependentes, individuais e coletivos,

desiguais e combinados, particulares e universais (Ribeiro, 2004).

Nesse contexto, os objetivos e fins da universidade precisariam ser estabelecidos a

partir de uma dinâmica social dialógica, culturalmente comprometida, e não simplesmente a

partir de um compromisso abstrato e alienado com uma racionalidade desprovida de qualquer

inserção social local (Mello, Almeida, & Ribeiro, 2004).

Em um âmbito micro, o enfrentamento aos desafios da universidade contemporânea

busca ações acadêmicas sob novos paradigmas de formação, o qual exigiria a formulação de

políticas pedagógicas que articulem o ensino, a pesquisa e a extensão. A articulação dessa

tríade propõe viabilizar a relação transformadora entre universidade e sociedade, mobilizando

para o ensino, possibilidades, metodologias e estratégias alternativas no exercício da

aprendizagem e na construção do conhecimento (Chauí, 1999, Carrion, 2005, Santos, 1997).

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Dessa forma, requer-se fomento suficiente, regular e sustentado a programas de

extensão voltados, em todas as áreas do conhecimento, à solução e/ou assistência de

problemas socialmente relevantes (Chauí, 1999).

Este critério se estabelece na ideia de formação, explicito em 1996, a partir da Lei n.

9.394, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a qual reafirma e detalha, entre os

objetivos da universidade, a extensão universitária. Atribui-se a ela o “processo educativo,

cultural e científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a

relação transformadora entre Universidade e Sociedade” (Plano Nacional de Extensão, 1988).

A extensão universitária é concebida ainda como uma via de mão dupla, com trânsito

assegurado à comunidade acadêmica, que encontraria na sociedade a oportunidade de

elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico (Plano Nacional de Extensão, 1988).

Esse fluxo que estabelece a troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, teria

como consequências a produção do conhecimento resultante do confronto com a realidade

brasileira e regional, a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da

comunidade na atuação da universidade. Além deste processo dialético, presente no campo da

teoria/prática, a extensão se constituiria em um trabalho interdisciplinar que favorece a visão

integrada do social. (Plano Nacional de Extensão, 1988).

É sabido que alguns cursos já incorporam em seus projetos pedagógicos atividades de

extensão, como é o caso dos estágios supervisionados (Chauí, 1999). De forma mais incisiva,

há experiências que se denominam de “socialização de conhecimentos práticos”. Nelas

prevalecem a aprendizagem com a prática e o desenvolvimento de competências sociais,

criando assim, espaço para a adaptação de modelos teóricos (Carrion, 2005 p. 22).

Outras práticas de extensão são observadas. Entre elas precedem a aprendizagem em

três níveis inter-relacionados: aprendizagem de indivíduos, planejada e acompanhada com

base em um marco desejado de competência; aprendizagem do coletivo e dos indivíduos em

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interação; e a aprendizagem das interorganizações (Carrion, 2008 p. 180). Este é um tipo

especial de atividade de aprendizagem prático-reflexiva que supõe a imersão do estudante em

empreendimentos/programas/projetos de natureza diversificada (T. M. D. Fischer, Roesch &

Melo, 2006).

Numa perspectiva interdisciplinar, busca-se articular conhecimento teórico e prático,

análise e/ ou intervenção organizacional, consolidando, assim, a formação universitária

engajada a habilitar os alunos a lidar com problemas práticos e de interesse coletivo, por meio

da associação inteligente e criativa do conhecimento e da técnica (Chauí, 1999). Essa lógica é

imposta pela superação de uma visão puramente instrumental ou tecnicista do conhecimento,

que rejeita os reducionismos inerentes à linearidade e fragmentação do saber (Santos, 2004,

Bauman, 2008).

Observa-se que processos de aprendizagem ancorados em dinâmicas que vislumbram

a interação entre a teoria e a prática, seja por meio da extensão universitária ou por meio de

outros mecanismos interdisciplinares, podem contribuir para a ampliação de relações mais

horizontais entre estrutura e agência. Esses processos detém o potencial de contribuir para a

produção de conhecimento em Gestão Social, uma vez que se apoiam em relações de poder,

geradas por mecanismos de compartilhamento entre atores acadêmicos e praticantes.

A revalorização da pesquisa também se destacaria nesse cenário ao estabelecer as

condições de sua autonomia, as condições materiais de sua realização, a criação de novos

procedimentos de avaliação que sejam regidos pelas noções de qualidade e de relevância

social e cultural (Chauí, 2003). Em outras palavras, a autonomia precisaria ser pensada como

autodeterminação das políticas acadêmicas, dos projetos e metas das instituições

universitárias e da autônoma condução administrativa, financeira e patrimonial (Chauí, 2003).

Essa autonomia se relacionaria com o princípio de uma universidade preocupada em

adotar ações alternativas, de forma a superar a globalização neoliberal (Santos, 2004). Cabe a

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ela haver, internamente, o funcionamento transparente e público das instâncias de decisão;

realizar, externamente, de modo público e em períodos regulares fixados, o diálogo e o debate

com a sociedade civil organizada e com os agentes do Estado, tanto para oferecer a todos as

informações sobre a vida universitária, como para receber críticas, sugestões e demandas

vindas da sociedade e do Estado (Chauí, 2003). Desse modo, a universidade asseguraria o

acesso a ela pela qualidade e pelo nível dos outros graus do ensino público (Chauí, 2003).

Além de a pesquisa ser pensada como possibilidade de autodeterminação das políticas

acadêmicas, a de se atribuir a ela as perspectivas de transformação do campo de poder quando

desenvolvidas a partir de interações múltiplas e imbuídas de saberes híbrido. Nesse sentido, o

pesquisador seria compreendido como agente capaz de influenciar a estrutura do

conhecimento disponível no campo (Fligstein, 2001, 2007). Entende-se que esse aspecto está

associado à interpretação da realidade social, compreendida como capacidade de monitoração

reflexiva do ator social em processar cognitivamente determinados contextos coletivos, sob a

concepção da racionalidade limitada, e atribuir significado a estímulos contextuais (Machado-

da-Silva, Fonseca & Fernandes, 2000; Machado-da-Silva et al, 2005). Todavia, ainda em

acordo com esses autores e em consonância com Giddens (2003), não se atribui prioridade à

agência individual, mas à reciprocidade entre os atores sociais, que em interação constroem e

reconstroem os sistemas sociais em que estão imersos, o que ocorre por meio de práticas

sociais que acessam os quadros de referência (estruturas) disponíveis e resultantes da

atividade social. Em outras palavras, o conhecimento quando produzido socialmente a partir

da interação entre agentes múltiplos possibilitaria novos arranjos sociais acompanhados pela

transformação do campo de poder.

Cronin (1994) e Leydesdorff (1998) apresentam outras possibilidades que a pesquisa

traria para a academia ao considerar que as práticas sociais de produção científica influenciam

a estrutura intelectual da área, seja pela interação social entre pesquisadores ou por sua

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representação substantiva nas comunicações acadêmicas. Em face disso, tem sentido

considerar que pela atividade social se promove o compartilhamento de um quadro de

referência que serve como estoque de conhecimento. Tal quadro pode ser definido por

esquemas de interpretação expressos na forma de artigos e nas práticas rotineiras de produção

científica, desde a seleção do conhecimento válido por autores no ato de citar suas fontes, até

o modo como esse processo representa práticas valorizadas socialmente (Cronin, 1994,

Leydesdorff, 1998).

Outra questão que presidiria uma reforma democrática e voltada à emancipação na

universidade contemporânea e que contribuiria para a sua legitimação é o estabelecimento de

parcerias com os cidadãos individualmente ou coletivamente organizados como os grupos

sociais, sindicatos, movimentos sociais, organizações da sociedade civil e suas redes,

interessados em fomentar articulações cooperativas entre a universidade e os interesses sociais

que representam (Santos, 2002). Esses atores sociais ou agentes são reconhecidos como

praticantes no âmbito do presente estudo cujo poder pode se traduzido em capital cultural e

simbólico, que por sua vez, evidenciam a presença de habilidades sociais.

Segundo Flisgtein (2007), todos os seres humanos teriam alguma habilidade social em

função de sua atuação em grupo. Nesse sentido, compreende-se que os atores se compõem em

grupos constituídos de habilidade social ao tentarem obter cooperação entre os diferentes

agentes que se relacionam em um campo ou arena de natureza diversa.

A partir dessa concepção se destaca a relação dos praticantes das organizações da

sociedade civil com a universidade por meio de articulações de caráter cooperativo. Vale

ressaltar que o termo cooperação tem sua origem na “tradição sociológica, sendo uma das

formas de ação coletiva intrínsecas à sociedade” (Arruda, 2012 p. 4). Tal conceito envolve a

relação entre os atores sociais e a noção do esforço compartilhado, convergência de objetivos

e coordenação em níveis diferenciados (Arruda, 2012).

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Compreende-se que essa definição vincula-se à ideia de sinergia, cujo significado

associa-se a noção de engajamento da sociedade como uma forma de interação capaz de gerar

ganhos mútuos (Campos, Mendonça & Alves, 2011). Essa percepção, evidenciada por Evans

(1997), vincula-se as estruturas sociais, a redefinição de problemas e a capacidade de ação

coletiva o qual é influenciada pela natureza dos conflitos sociais e pela natureza e extensão

das desigualdades entre as partes (Campos et al, 2011). Nesse sentido, a fim de alcançar

objetivos sociais comuns, o conceito de sinergia implicaria certo grau de colaboração entre as

partes interessadas cuja capacidade de produzir benefícios para ambas as partes, não é

constituído, necessariamente, por um processo harmonioso, pelo contrário, é geralmente

permeada por conflitos particulares (Campos et al, 2011).

A abordagem sobre cooperação permeada pela ideia de sinergia e engajamento entre

atores de campos diferentes, além de permitir a universidade trilhar caminhos convergentes

com as demandas sociais, contribuiria para a produção de conhecimento sobre Gestão Social

apoiada na interação entre diversos atores constituídos de saberes híbridos que, em oposição a

especialização de saberes da ciência moderna, incentivaria a auto-reflexividade, a

compreensão dos processos que conectam conceitos, proposições e realidades.

Rodrigues e Barbieri (2008) corroboram esta ideia ao considerarem que diferentes

proposições de produção de conhecimento decorrem da diversidade dos contextos e de atores

com distintos valores e interesses. Tal diversidade poderia ser caracterizada pelos

pressupostos que norteariam o conceito de hibridismo que, segundo Ribeiro e Aguiar (2006),

associa-se à noção de resultado de cruzamento de espécies. Entretanto, o uso deste conceito

tem, no senso comum, diversos alcances, todos associados a ideia de mistura, de “novo ser”,

de múltiplas origens (Ribeiro & Aguiar, 2006 p. 11).

A conjunção de saberes híbridos imbuídos em contextos de produção de conhecimento

se desdobra como estratégias de enfrentamento aos limites desafiantes da universidade

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contemporânea ao propor, concomitantemente, possibilidades de “transgressão do modelo de

racionalidade hegemônica, bem como novas perspectivas de inteligibilidade da vida por meio

das múltiplas linguagens científicas” (Ribeiro & Aguiar, 2006 p. 7). Porém, compreende-se

que essa perspectiva não é a proposição de um novo método totalizante, tal como apregoava a

ciência moderna na busca de formas mais concretas e efetivas de produção de conhecimento.

Como dito anteriormente, é uma possibilidade.

Com o propósito de sintetizar as concepções abordadas no construto teórico que se

apoiaram na pergunta de pesquisa “Como se dão as relações entre acadêmicos e praticantes

no contexto brasileiro da produção de conhecimento sobre Gestão Social”? a Figura 4

“Campos de Poder da Gestão Social” apresenta o campo de poder da Gestão Social

caracterizado pelas articulações entre os acadêmicos e praticantes.

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Figura 4. Campos de Poder da Gestão Social

Na Figura 4 “Campos de Poder da Gestão Social” observa-se o campo social redimensionado no centro das

esferas sociais o qual demonstra estar ocupando o eixo das interseções entre as esferas pública, do Estado, do

mercado e privada. Esta posição permite destacar a constituição do campo social que se ancora em atores

organizacionais híbridos cuja atuação, mesmo oriunda de outros campos, convergiria para dinâmicas de cunho

social.

Fonte: Produção própria adapatada por Janoski, T. (1998). Citizenship and Civil Society: A Framework of Rights

and Obligations in Liberal, Traditional, and Social Democratic Regimes. Cambridge: University Press.

A noção que se pretendeu exprimir nesta Figura 4, “Campos de Poder da Gestão

Social”, baseia-se na perspectiva de que se trata de campos fluídos e em transformação, nos

quais se manifestam interesses entre atores que ora se colidem e ora se convergem.

Campo da

Gestão Social

Saberes híbridos

Habilidade Social

Esfera

Privada

Esfera

do

Mercado

Esfera

Pública

Esfera

do

Estado

“Como se dão as relações entre acadêmicos e praticantes no contexto

brasileiro da produção de conhecimento sobre Gestão Social”?

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O tracejado que delimita o campo da Gestão Social demonstra que este se encontra em

construção, podendo se ampliar a partir de processos de interação entre agentes e estrutura.

Nessa perspectiva, nota-se uma fluidez entre para a esfera pública e estatal, na qual se

encontram os praticantes pertencentes às OSCs, às universidades e aos Centros de Estudos.

Na esfera mercadológica, pode se observar a presença do campo da Gestão Social por meio da

inserção dos praticantes atuando em empresas privadas. E na esfera privada, ressaltam-se

atores individuais, imbuídos de habilidades sociais que levam outros atores sociais a

cooperarem para determinado processo de produção de conhecimento em Gestão Social.

A fim de responder a pergunta de pesquisa, “Como se dão as relações entre

acadêmicos e praticantes no contexto brasileiro da produção de conhecimento sobre Gestão

Social”? o capítulo subsequente apresenta as estratégias e o planejamento da pesquisa

adotados na produção desta tese, que, conforme já apontado anteriormente, se fundamentou

na pesquisa qualitativa.

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99

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O procedimento metodológico desta pesquisa baseou-se na pesquisa qualitativa por

entender que ela permite se analisar com maior profundidade a interpretação que os atores

sociais estabelecem de sua realidade, permitindo se avançar na compreensão de como o

campo em que atuam se organiza e quais seriam as dinâmicas que marcam a produção de

conhecimento e as relações entre acadêmicos e praticantes da Gestão Social nesse campo.

A escolha por esse método justifica-se também pelos aspectos conferidos a pesquisa

qualitativa a qual se fundamenta na apreensão e explicação do fenômeno social com o menor

afastamento possível do ambiente investigado (Godoi & Balsini, 2006). Nesse cenário, não se

buscam regularidades, mas o que levou os agentes a agirem de forma singular. “Essa

empreitada só é possível se os sujeitos forem ouvidos a partir da sua lógica e exposição de

razões” (Godoi & Balsini, 2006 p. 91).

Considerando que a Gestão Social envolve diferentes temáticas, cujos processos são

marcados por interações híbridas, apreende-se que o conhecimento gerado nesse campo

necessita ser observado mediante uma perspectiva multiparadigmática. Nesse sentido, o

objeto a ser analisado depende de uma pesquisa cunhada pela integração entre investigador e

mundo social, na qual se observaria atores subjetivos tomados de racionalidades múltiplas.

Tal lógica permite exprimir o fenômeno social que se pretende investigar, localizado no nível

do não verificável, mas do interpretável mediante a atribuição de um sentido (Godoi &

Balsini, 2006).

O recorte observacional para se analisar a produção de conhecimento sobre Gestão

Social a partir das relações entre acadêmicos e praticantes deu-se em função dos aspectos

contidos na estrutura de seu campo, bem como nos aspectos de suas ações. Tal recorte se

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100

configura na dimensão meso caracterizada pelo campo e pelo espaço social da estruturação no

qual é possível observar a movimentação dos campos de poderes.

A partir desta dimensão, manifesta nas esferas sociais conforme o modelo explicativo

elaborado por Janoski (1998), foram selecionadas quinze (15) instituições de cunho

acadêmico e social, sendo sete (07) centros de estudo e programas de pesquisa provenientes

de universidades públicas e privadas e oito (08) organizações da sociedade civil.

A seleção das unidades de análise foi realizada de maneira intencional, tendo em vista

a possibilidade de reunir informações relevantes para o conhecimento das categorias básicas

de análise. Destaca-se que as unidades institucionais em evidência foram escolhidas mediante

a sua natureza representativa no mundo social, permitindo classificá-las como acadêmicos e

praticantes ambos do campo da Gestão Social. Nessa vertente, os praticantes se configuram

em profissionais atuantes no cenário sócio político e interessados em desenvolver novos

conhecimentos aplicáveis ao próprio trabalho (Ospina et al, 2001). Apreende-se que, os

acadêmicos também podem se inserir nessa perspectiva ao atuarem por meio do ensino,

pesquisa e extensão, no âmbito social. Todavia, consideraram-se os aspectos de sua

constituição, um de natureza cultural, em que se evidencia o conhecimento fundamentado

mais na ordem científica, e outro de cunho social, ancorado pelo conhecimento oriundo do

senso comum, do mundo da vida. Porém, conforme a análise social, quando se denomina

determinado ator como acadêmico e outro como praticante, não se pressupõe que uma

condição ou status elimina o outro, visto que praticantes podem se inserir, e muitas vezes o

fazem, no ambiente acadêmico por um período determinado ou mesmo indefinidamente, o

mesmo se dando com os chamados acadêmicos.

A característica fundamental que provocou o interesse em pesquisar os acadêmicos e

praticantes selecionados para análise nessa pesquisa se orientou pelos princípios de

valorização e articulação do conhecimento sobre Gestão Social. Não se trata de uma amostra

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101

que represente qualquer conjunto e tão pouco não se constitui em um grupo que deve ser

tomado como caso de sucesso sobre a de produção de conhecimento em Gestão Social. São

unidades de análise diferentes entre si, mas permeadas por relações de influência mútua que,

convergentes ou divergentes, produzem conhecimento que está relacionado aos temas e áreas

de atuação que compreendem o campo da Gestão Social no Brasil contemporâneo. Enfim, são

atores sociais relevantes e reconhecidos como tal por outros atores envolvidos na Gestão

Social.

No âmbito dos acadêmicos, os centros de estudo e programas de pesquisa escolhidos

para se analisar a produção de conhecimento sobre Gestão Social desempenham atividades

científicas dinamizadas sob a forma de serviços e produtos que atendam às demandas das

comunidades envolvidas. O foco de atuação dessas unidades acadêmicas corresponde as

organizações da sociedade civil, governamentais e corporações que visam o desenvolvimento

de ações e estratégias de responsabilidade social empresarial. Sua ação, segundo informam os

dados secundários analisados, busca por princípios que postulam o desenvolvimento social

apoiado na cidadania, na democracia substantiva, no empreendedorismo social, na ética e

sustentabilidade sócio-empresarial.

Feito o recorte com base na dimensão meso foram objeto de investigação os seguintes

centro de estudos e programas de pesquisa acadêmicos: o Centro de Empreendedorismo

Social e Administração do Terceiro Setor (CEATS), do Departamento de Administração da

Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo

(FEA/USP); o Centro de Estudos em Administração Pública e Governo (CEAPG),

pertencente a Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP), da Fundação

Getúlio Vargas (FGV), juntamente com o Programa de Gestão Pública e Cidadania (PGPC); o

Programa de Estudos em Gestão Social, vinculado à escola Brasileira de Administração

Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (PEGS/EBAPE/FGV); o Centro

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102

Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social da Universidade Federal da Bahia

(CIAGS/UFBA); o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas e Estudos Sobre o Terceiro Setor da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (NIPETS/UFRGS); o núcleo de Estudos de

Administração do Terceiro Setor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

(NEATS/PUC-SP) e o Núcleo de Pesquisa em Ética e Gestão Social da Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais (NUPEGS/PUC Minas).

No Quadro 1, intitulado “Configuração dos Centros de Estudos e Programas de

Pesquisas Vinculados a Gestão Social”, tem-se um panorama geral desses centros de estudo e

programas de pesquisa demonstrando alguns aspectos que configuram o seu campo de

atuação. Este foi construído a partir das informações constantes nos seus respectivos sítios

eletrônicos institucionais, na análise de artigos científicos, bem como por meio das entrevistas

concedidas pelos docentes investigados. Essas informações procuraram caracterizar em linhas

gerais as dinâmicas de ação e as articulações provenientes de seus arranjos institucionais.

Page 104: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

103

Quadro 1

Configuração dos Centros de Estudos e Programas de Pesquisas Vinculados a Gestão Social

IES

Centro/Programa

Missão Linhas de Pesquisa e projetos Produções científicas e

técnicas

Parcerias

CEATS/FEA/USP

Constituído em 1988

Gerar e disseminar conhecimentos e

práticas de gestão em

empreendedorismo social por meio

de pesquisas, cursos e publicações

focados no desenvolvimento

socioambiental sustentável.

Alianças Intersetoriais;

Avaliação de Projetos Sociais;

Desenvolvimento Sustentável;

Direitos da Criança e do Adolescente;

Empreendedorismo Social;

Gestão no Terceiro Setor;

Responsabilidade Social

Livros e capítulos de livros;

Artigos relacionados ao

Empreendedorismo Social e ao

Terceiros Setor;

Teses e dissertações;

Relatórios de pesquisa

Fundações e Instituições;

Empresas e Grupos de

Empresas;

Escolas, Instituições de Ensino e

Grupos de Pesquisa;

Social Enterprise Knowledge

Network (SKEN)

Organizações da Sociedade

Civil;

Organizações Governamentais

CEAPG/EAESP/

FGV

Constituído em 1998

Aprofundar o conhecimento sobre

governança pública, com foco no

desenvolvimento local e na garantia

de direitos da cidadania, por meio de

abordagem que priorize a pesquisa de

campo, produzindo, armazenando,

sistematizando e disseminando ideias,

dados e informações, com especial

atenção à inovação na ação pública.

Análise de Políticas Públicas Locais -

Educação;

Desenvolvimento Local;

Segurança Pública;

Grupos Vulneráveis;

Meio-ambiente;

Redução de desigualdades e Cultura.

Articulação, Estado e Sociedade -

Estado, movimentos sociais e agentes

privados; Transparência e Controle

Social.

Formação, Treinamento e Produção

Acadêmica - Registro de Experiências

Inovadoras; Redes de pesquisadores;

Formação de Gestores Públicos

Periódico: Cadernos Gestão

Pública e Cidadania;

Casos: coleção "20 Experiências

de Gestão Pública e Cidadania";

Livros: publicações do CEAPG,

derivadas de projetos e

pesquisas realizados pelo

Centro;

Vídeos: produzidos pelo

CEAPG, disponíveis em um

canal exclusivo no FGVTV;

Áudio: programas de rádio

produzidos pelo CEAPG

GVpesquisas

Portal do Conhecimento da

FGV – apoia e fomenta o

desenvolvimento da pesquisa

científica e aplicada;

Centro de Estudos em

Sustentabilidade – GVces;

Fundação Ford

Page 105: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

104

PEGS/EBAPE/

FGV

Constituído em 1990

Desenvolver atividades de ensino,

pesquisa e extensão a fim de

institucionalizar o campo de estudos

em gestão social nas relações

sociedade-Estado, trabalho-capital e

sociedade-mercado.

Gestão Social, ensino, pesquisa e

prática;

Transferência de Tecnologia em

Gestão Social;

Participação e Cidadania nos

Conselhos Municipais;

Turismo em comunidades pacificadas

Livros e capítulos de livros

publicados;

Periódico Cadernos

EBAPE.BR;

Relatórios de pesquisa;

Dissertações

Escola de Administração

Pública e de Empresas

(EBAPE) Fundação Getúlio

Vargas (FGV)

CIAGS/UFBA

Constituído na

década de 1990

Promover o desenvolvimento sócio-

territorial mediante a criação de

tecnologias sociais reaplicáveis, a

partir de conhecimentos gerados pela

qualificação de gestores do

desenvolvimento social, nos âmbitos

da graduação e pós-gradução

Ensino, pesquisa e intervenção em

gestão pública e gestão social;

Economia solidária e sustentabilidade

ecológica;

Gestão criativa, diversidade e

interculturalidade;

Políticas públicas, políticas sociais e

gestão;

Gestão e responsabilidade

socioambiental;

Gestão do desenvolvimento territorial,

interorganizações e tecnologias sociais;

Marketing social;

Intersetorialidades na gestão de

políticas em gênero e raça/etnia

Livros e capítulos de livros;

Periódico Caderno de Gestão

Social;

Teses e dissertações;

Relatórios de pesquisa

Rede Brasileira de Avalição

(REBRAMA);

Procomitê Gestor do Artesanato

Baiano

NIPETS/UFRGS

Constituído em 1998

Contribuir através da pesquisa, do

ensino e da extensão, para a

construção democrática no plano

regional e global, salientando as

questões de inclusão social, de

pobreza, desigualdade, políticas

sociais e Terceiro Setor

Relação Estado-sociedade;

Processo de reconstrução democrática

e inclusão de países de extrema

precariedade;

Gestão do Terceiro Setor articulada aos

movimentos sociais globais;

Movimentos Sociais locais;

Economia Solidária;

Governança

Livros e capítulos de livros;

Artigos científicos;

Teses e dissertações;

Relatórios de pesquisa

Escola de Administração

UFRGS

Page 106: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

105

NEATS/PUC-SP

Constituído em

1998

Produzir e difundir conhecimento

interdisciplinar sobre o Terceiro Setor

e áreas afins, contribuindo para o

desenvolvimento dos diferentes

segmentos da sociedade civil

Gestão de Organizações Sem Fins

Lucrativos;

Gestão Social e Terceiro Setor;

Pensando o Direito;

Educação para Sustentabilidade

Livros e capítulos de livros;

Artigos científicos;

Teses e dissertações;

Relatórios de pesquisa

Escola de Administração da

PUC/SP

NUPEGS/PUC

Minas

Constituído em

2004

Contribuir para a pesquisa e

dinâmicas sociais centradas nos

estudos da Ética Empresarial, Gestão

Social e Responsabilidade Social

Empresarial

Ética Empresarial e Responsabilidade

Social Empresarial;

Gestão Ambiental e Desenvolvimento

Sustentável;

Gestão Social e Gestão Pública

Artigos científicos;

Teses e Dissertações

Programa de Pós-Graduação em

Administração (PPGA) - PUC

Minas;

Federação das Indústrias do

Estado de Minas Gerais

(FIEMG);

Fundação Avina do Brasil

Fonte: elaboração própria com base em análise de documentos e entrevistas.

Page 107: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

106

Observa-se no Quadro 1 “Configuração dos Centros de Estudos e Programas de

Pesquisas Vinculados a Gestão Social” que as unidades acadêmicas selecionadas apresentam

no escopo de suas intenções e arranjos institucionais o interesse em contribuir e expandir com

o campo que permeia a Gestão Social. Esse interesse se expõe por meio das linhas de

pesquisas e projetos desenvolvidos, atrelado à produção de conhecimento científico e às

dinâmicas sociais.

Destaca-se que a data de constituição, originária da década de 1990, e os propósitos de

cada centro de estudo e programa de pesquisa evidenciam um contexto histórico marcado pela

institucionalização e expansão das organizações sociais no Brasil (T. M. D. Fischer & Melo,

2006, Marteleto e Ribeiro, 1997), cujos objetivos eram “promover o desenvolvimento

econômico local, impedir a degradação ambiental, defender os direitos civis e atuar em áreas

onde o Estado era incipiente” (Gohn, 2004 p. 29). Esse aspecto denota um interesse da

academia em compreender o movimento sociopolítico que a sociedade brasileira vivenciava à

época.

No contexto das organizações da sociedade civil primou-se pela seleção de

instituições, fundações e organizações da sociedade civil que tivessem no seu âmago

prerrogativas do campo da Gestão Social. Em outras palavras, objetivou-se analisar as

possibilidades e desafios da produção de conhecimento sobre a Gestão Social em

organizações cuja constituição e trajetória profissional atendessem as demandas sociais e

políticas de transformação socioambiental da realidade.

Destaca-se que os aspectos relevantes dessas organizações decorrem dos processos de

conhecimento gerados pelo apoio sistemático de intensas pesquisas sobre problemas sociais e

ambientais. As estratégias criadas para disseminar esse conhecimento a um maior leque de

profissionais da sociedade civil foi outra questão se considerou para os fins dessa pesquisa.

Page 108: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

107

Com base nessas perspectivas, foram selecionadas oito (08) unidades de análise:

Fundação AVINA, Fundação AVSI, Organização da Sociedade Civil Cooperação para o

Desenvolvimento e Morada Humana (CDM), Instituto Hartmann Regueira, Instituto de

Pesquisas Ecológicas (IPÊ), Grupo de Institutos e Fundações GIFE, Instituto Camargo Corrêa

e a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG).

Feito esse recorte, realizou-se uma investigação documental nos sítios eletrônicos de

várias organizações da sociedade civil que permitisse pesquisar o objeto de estudo proposto.

Apreende-se que, as unidades de análise escolhidas se inserem num campo

institucional cuja dimensão apresenta organizações que, mesmo de caráter social, são

heterogêneas tanto na sua constituição como na sua atuação. Portanto, essas unidades de

análise não definem e nem servem de exemplo de práticas de produção de conhecimento

sobre Gestão Social, elas contribuem para responder o problema de pesquisa em questão e,

concomitantemente para a construção do campo da Gestão Social ao se analisar o

conhecimento proveniente de sua atuação e interação social.

De forma sintética, os aspectos institucionais de cada organização social podem ser

visualizados no Quadro 2 “Organizações da Sociedade Civil Investigadas”. A sua elaboração

se deu a partir da observação documental e por meio das entrevistas semiestruturadas

realizadas com os gestores das respectivas organizações.

Page 109: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

108

Quadro 2

Organizações da Sociedade Civil Investigadas

Organizações da

Sociedade Civil

Missão Agendas Produções técnicas e científicas Parcerias

Fundação AVINA

Constituída em 1999

(Brasil)

Área de atuação – Onze

países da América

Latina

A partir da América Latina,

contribuir para o

desenvolvimento

sustentável, viabilizando os

processos de articulação e

colaboração entre atores

diversos, de todos os setores.

Acesso a água;

Cidades sustentáveis;

Energia;

Estratégia para o bioma amazônico;

Grande Chaco americano;

Indústrias extrativas;

Institucionalidade democrática;

Migrações;

Reciclagem inclusiva e solidária

Livros - publicações de estudos e

pesquisas relativos as área de

atuação;

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Vídeos Institucionais de práticas

em projetos e programas;

Produções técnicas para download

no sítio eletrônico

Fundações e Instituições;

Empresas e Grupos de Empresas;

Escolas, Instituições de Ensino e

Grupos de Pesquisa; Organizações

da Sociedade Civil

Fundação AVSI Brasil

Associação Voluntários

para o Serviço

Internacional

Constituída na década de

1980 (Brasil)

Área de atuação países

da África, leste Europeu

e América Latina

Promover a dignidade da

pessoa por meio de

atividades de cooperação ao

desenvolvimento, com

especial atenção à educação.

Desenvolvimento urbano;

Direitos humanos;

Educação,

Energia e ambiente;

Formação profissional e Geração de

renda;

Responsabilidade social corporativa

Livros - publicações de estudos e

pesquisas relativos as área de

atuação;

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Vídeos Institucionais de práticas

em projetos e programas;

Produções técnicas para download

no sítio eletrônico

Organizações internacionais;

Organizações nacionais públicas e

privadas;

Fundações, ONGs, Associações e

Universidades

Cooperação para o

Desenvolvimento e

Morada Humana

(CDM)

Constituída em 1986

Área de atuação Brasil

– Estados de Minas

Gerais, Rio Janeiro e

Bahia

Promover e sustentar o

desenvolvimento humano e

social de pessoas e

realidades locais, com

particular atenção à

educação e à promoção da

dignidade da pessoa humana

em todas as suas expressões,

em sintonia com os

ensinamentos da Doutrina

Social da Igreja Católica.

Educação;

Desenvolvimento urbano;

Saúde;

Trabalho e renda

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Vídeos Institucionais de práticas

em projetos e programas;

Produções técnicas para download

no sítio eletrônico

Organizações internacionais;

Organizações nacionais públicas e

privadas;

Fundações, ONGs, Associações e

Universidades

Page 110: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

109

Instituto Hartmann

Regueira

Organização da

Sociedade Civil de

Interesse Público

(OSCIP)

Constituída em 2003

Área de atuação Brasil –

Estado de Minas Gerais

Fortalecer a gestão de

organizações para que elas

cumpram sua Missão Social

Programa de Desenvolvimento em

Gestão para Organizações de

Terceiro Setor – PDG.org;

Programa avançado de formação,

com foco em gestão destinado às

organizações sociais;

Anti-bullying;

Alô Cidadão;

Universo Social;

Fórum de Investidores Sociais

Fóruns, blogs e boletins

eletrônicos, com estudos de caso e

relatos de experiências;

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Vídeos Institucionais de práticas

em projetos e programas

Secretaria de Estado de Educação

de Minas Gerais;

Fundação AVINA;

Federação das Indústrias do Estado

de Minas Gerais (FIEMG);

Oi Futuro;

Fundação Roberto Marinho;

Instituto Unibanco;

Banco Mundial;

Instituto Votorantim;

Instituto Camargo Corrêa;

Fundação Itaú Social e

Universidades.

Instituto de Pesquisas

Ecológicas (IPÊ)

Organização da

Sociedade Civil de

Interesse Público

(OSCIP)

Constituído em 1992

Área de atuação Todas

as regiões do Brasil

Desenvolver e disseminar

modelos inovadores de

conservação da

biodiversidade que

promovam benefícios

socioeconômicos por meio

de ciência, educação e

negócios sustentáveis.

Promoção de cursos de curta

duração e mestrado

Agendas/Projetos por região e

localização

Pontal - Grande Reserva do Pontal do

Paranapanema;

Nazaré Paulista - projetos de pesquisa

e educação ambiental, atrelados a

ações de conservação na região;

Baixo Rio Negro (Amazonas),

projetos que visam à conservação da

biodiversidade e a sustentabilidade

socioambiental;

Superagüi-Ariri, região do Parque

Nacional do Superagüi (PR);

O Pantanal - Iniciativa Nacional de

Conservação da Anta Brasileira;

Região de Buri - Programa de

Conservação para o Mico-leão-preto

Artigos publicações de estudos e

pesquisas relativos as área de

atuação;

Dissertações;

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Relatórios anuais;

Produções técnicas para download

no sítio eletrônico

Instituições e Fundações nacionais

e internacionais;

Organizações privadas, públicas e

não governamental;

Pessoas físicas (parceiros e

colaboradores individuais);

Financiadores nacionais e

internacionais.

Page 111: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

110

Grupo de Institutos e

Fundações

Empresariais GIFE

Constituído em 1995

Área de atuação Todas

as regiões do Brasil

Aperfeiçoar e difundir

conceitos e práticas do uso

de recursos privados para o

desenvolvimento do bem

comum.

Promoção do desenvolvimento

sustentável do Brasil, por meio do

fortalecimento político-institucional e

do apoio à atuação estratégica de

institutos e fundações de origem

empresarial e de outras entidades

privadas que realizam investimento

social voluntário e sistemático,

voltado para interesse público.

Congresso GIFE/Espaços de

articulação/Eventos/Advocacy;

Censo GIFE

Livros - publicações de estudos e

pesquisas relativos as área de

atuação;

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Vídeos Institucionais de práticas

em projetos e programas;

Produções técnicas para download

no sítio eletrônico

Associados;

Fundação/Institutos Empresariais;

Independentes; Familiares;

Comunitários e Empresariais;

Universidades.

Instituto Camargo

Corrêa

Constituído em 2000

Área de atuação Brasil –

cidades no qual as

unidades de negócios do

grupo estão presentes

Articular e fortalecer

organizações que

contribuam para a formação

integral de crianças,

adolescentes e jovens,

visando ao desenvolvimento

comunitário sustentável

Desde 2007 - atuação focada em

quatro áreas: Primeira Infância;

Educação Básica; Juventude e

Voluntariado

Livros - publicações de estudos e

pesquisas relativos as área de

atuação;

Revista Ideal Comunitário;

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Vídeos Institucionais de práticas

em projetos e programas;

Produções técnicas para download

no sítio eletrônico

Os parceiros variam por programas

e localidades. São organizações da

sociedade civil, do poder público e

outras empresas dos municípios

onde os projetos são implantados;

Rede Interamericana de Fundações

e Ações Empresariais para o

Desenvolvimento de Base

(RedEAmérica); Movimento

brasileiro Todos pela Educação

Federação das

Indústrias do Estado

de Minas Gerais

(FIEMG)

Área de interesse

Desenvolvimento

Socioambiental –

constituída na década de

2000 -

Assessorar e apoiar em áreas

vitais as indústrias do Estado

de Minas Gerais.

Desenvolvimento

socioambiental Equilibrar

as dimensões econômica,

social e ambiental para a

criação de negócios

sustentáveis

Atendimento a Indústria;

Conhecimento e Mobilização;

Gestão de Recursos Hídricos;

Gestão de Resíduos Sólidos;

Inclusão de Pessoas com Deficiência

na Indústria;

Licenciamento Ambiental;

Minas Sustentável;

Produção Sustentável;

Relacionamento com a Sociedade

Livros - publicações de estudos e

pesquisas relativos as área de

atuação;

Relatórios e pareceres;

Guias, manuais e cartilhas;

Vídeos Institucionais de práticas

em projetos e programas

Indústrias mineiras associadas,

organizações privadas e públicas,

organizações não governamental,

instituições do Ensino Superior

Fonte: elaboração própria com base em análise de documentos e entrevistas

Page 112: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

111

Conforme evidência o Quadro 2 “Organizações da Sociedade Civil Investigadas”, a

natureza, bem como a missão das organizações investigadas, guiadas pelo propósito do

desenvolvimento social, local e sustentável, permite identificá-las como praticantes da Gestão

Social. Nesse contexto, destacam-se suas produções técnicas, sociais e científicas as quais

evidenciam sistematizar e disseminar o conhecimento que é gerado por meio da interação

colaborativa com outros atores da Gestão Social, aspecto esse pouco expressivo na atuação de

outras organizações da sociedade civil.

Outra característica relevante é a estrutura organizacional dessas OSCs dinamizada

pelas parcerias entre atores da sociedade civil, Estado e mercado a qual permite perceber

interesses oriundos de esferas sociais distintas conectados por propósitos comuns. Esses

atores são provenientes da esfera privada, como o Instituto Camargo e Corrêa que pertence ao

Grupo Camargo e Correa, os representantes de empresas através da Federação das Indústrias

do Estado de Minas Gerais (FIEMG) e o grupo de organizações privadas que se articulam por

meio da Fundação GIFE. Em conformidade estão as organizações da sociedade civil AVINA,

AVSI e CDM, bem como as OSCIPs representadas pelo Instituto IPÊ e pelo Instituto

Hartmann Regueira que se originaram na esfera pública e do Estado. Tais características

denotam a presença de interações setoriais híbridos, característica que permeia a noção

multiparadigmática da Gestão Social.

A próxima seção apresentará as bases epistemológicas que nortearam a escolha dos

instrumentos de coleta de dados implementados nessa pesquisa e os critérios que motivaram a

utilização da análise do discurso para se apreender o fenômeno investigado. Destaca-se que as

escolhas metodológicas se guiaram tendo em vista a visão ontológica referente ao objeto de

estudo, a qual envolve a noção de processos históricos e sociais precedentes às ações e

práticas sociais.

Page 113: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

112

5.1 Estratégias de Coleta dos dados

As estratégias de coleta de dados permearam a visão ontológica que norteia a

compreensão do objeto de estudo desta tese ao considerar o conhecimento produzido sobre

Gestão Social como processo dinâmico e dialético produzido a partir de realidades sociais

historicamente construídas.

Nessa vertente e, ao tomar a produção de conhecimento sobre Gestão Social a partir da

noção de aprendizagem socioprática, assume-se um multiparadigma epistemológico cujas

bases se fundamentam através de relações entre atores de natureza distinta, acadêmicos e

praticantes, mas com fins próximos, direcionados para algum ou alguns dos temas centrais da

Gestão Social, ou seja, que marcam a intervenção social visando a solução de problemas

socioambientais (Cançado, Pereira & Tenório, 2013).

A fim de explorar a produção de conhecimento sobre Gestão Social sem incorrer o

risco de prescrevê-la em bases tradicionais dos processos de ensino e aprendizagem (Boullosa

& Schommer, 2008) a coleta de dados se processou através de ampla pesquisa a bases de

dados científicas e acesso a fontes secundárias e primárias de informações acerca da produção

de conhecimento sobre Gestão Social.

Para a revisão bibliográfica e mapeamento da produção sobre temas e objetos de

investigação relevantes para a Tese, foram consultadas bases como a da Comissão de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Portal CAPES de Períodicos, J-

STOR e Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Além da pesquisa em bases virtuais,

foram consultados livros que versam sobre os pressupostos e perspectivas sobre a Gestão

Social, sobretudo aqueles oriundos das edições do ENAPEGS.

Nesses levantamentos, ficou evidenciado que a produção científica sobre o

conhecimento gerado em Gestão Social a partir das relações entre acadêmicos e praticantes é

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pouco expressiva e torna-se mais insignificante quando se busca discussões acerca de seus

desdobramentos e implicações para a ressignificação do campo da Gestão Social.

Para o levantamento de informações das instituições produtoras de conhecimento

sobre Gestão Social foram realizadas visitas aos sítios dos programas e projetos na Internet,

análise de relatórios, de cartilhas, leitura de material de divulgação e acesso a artigos

publicados sobre as experiências analisadas, o que se constituiu nas principais estratégias de

levantamento de informações secundárias nessa investigação. Destaca-se que ela foi útil por

permitir que os documentos pudessem ser usados como entradas para o roteiro de entrevista,

bem como por traçar a história das instituições, confirmando declarações feitas por pessoas

chave a posteriore (Meyer, 2001).

A coleta de dados primários envolveu a realização de dezessete entrevistas

semiestruturadas com os atores imbricados nas dinâmicas e interações das instituições

pesquisadas. Procurou-se coletar os dados de forma a favorecer a interação comunicativa

entre entrevistado e entrevistador, de forma a provocar leves reações e comportamentos

linguísticos (Mattos, 2006), de parte a parte, determinando o verdadeiro significado das

respostas e o rumo das falas.

Os critérios utilizados para a escolha dos atores entrevistados se pautaram na

vinculação formal com as instituições investigadas. Para tanto, se considerou os aspectos

histórico-políticos, de representatividade e legitimidade. A acessibilidade aos dados e aos

sujeitos constituintes da amostra foi outro fator relevante.

As entrevistas foram individuais, com roteiros semiestruturados (Apêndice A, B e C)

com as mesmas questões, porém direcionadas para cada perfil do grupo de entrevistados,

acadêmicos e praticantes. O roteiro se estruturou em dezenove e vinte questões abertas,

desmembradas em subitens, a fim de reorientar a entrevista durante a coleta das informações

(Gaskell, 2002). As questões foram definidas segundo os aspectos do campo que os

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114

constituem, bem como as dimensões temáticas predefinidas no planejamento do referencial

teórico.

O roteiro foi dividido em cinco blocos de perguntas: caracterização da trajetória

profissional do entrevistado vinculada à instituição de atuação (2 questões); compreensão

sobre a Gestão Social e as dinâmicas representativas de sua ação (3 questões); noção do

conhecimento sobre a Gestão Social gerado pela instituição investigada e pelo o seu campo

organizacional (7 questões); análise da relação entre organizações da sociedade civil e

universidades, tendo a produção de conhecimento sobre a Gestão Social como pano de fundo

(6 questões); futuro da instituição investigada e da produção de conhecimento sobre a Gestão

Social no Brasil e no mundo (2 questões). Essas temáticas foram discutidas de forma a fazer

emergir no discurso e na reflexão os significados que os atores atribuem às ações, as práticas

interativas, valores, interesses, recursos e jogos de poder envolvidos na produção de

conhecimento sobre gestão, além das suas implicações na construção do campo da Gestão

Social.

A construção dos roteiros de entrevista buscou gerar instrumentos de coleta de dados

capazes de se evitar respostas idealizadas ou construções conceituais, de modo a captar a

vivência dos atores pesquisados. Este propósito exigiu esforço analítico e reflexivo redobrado,

o qual se efetivou por meio da análise do discurso dos depoimentos dos respondentes.

Realizadas no período compreendido entre setembro de 2013 a janeiro de 2014, as

entrevistas foram efetivadas presencialmente e a distância, usando o recurso tecnológico do

Skype, que proporcionou compatibilizar das disponibilidades dos pesquisados e do

pesquisador. Apenas uma entrevista foi realizada por telefone, o que não comprometeu a sua

objetividade. Todavia, algumas dificuldades relativas à acessibilidade e a disponibilidade

foram observadas entre alguns atores que se buscou investigar. As duas situações derivaram

do universo das organizações da sociedade civil, sendo que uma delas teve o contato

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estabelecido, porém sem a concretização da entrevista decorrente da ausência do indivíduo a

ser entrevistado nos momentos agendados. Na outra situação, houve várias tentativas de

contato com o agente de interesse, mas não se obteve sucesso em nenhuma delas.

Vale destacar que as duas primeiras entrevistas foram realizadas presencialmente, no

Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração

(EnANPAD) em setembro de 2013, junto a dois respondentes selecionados do campo

acadêmico com o intuito de testar o roteiro de entrevista elaborado.

Cada entrevista durou em média de uma a duas horas, sendo integralmente gravadas e

transcritas. Todos os entrevistados tiveram explicações prévias sobre a pesquisa e autorizaram

a análise e a reprodução dos relatos. Durante as etapas da análise, o vocabulário dos

entrevistados e dos documentos foram respeitados e utilizados na íntegra, visando unicamente

a auxiliar na definição de temas e categorias e registrar com fidelidade a percepção dos

sujeitos entrevistados.

Porém, a fim de garantir o anonimato dos entrevistados, a sua identificação se deu por

meio de códigos que indicassem o seu campo de atuação. O Quadro 3 “Perfil dos

Entrevistados: acadêmicos” e o Quadro 4 “Perfil dos Entrevistados: praticantes” exibem uma

lista codificada, acompanhada pela descrição da formação acadêmica e profissional de cada

um com o intuito de evidenciar a relevância dos entrevistados nos processos de produção de

conhecimento sobre Gestão Social decorrente das interações entre academia e praticantes. Nas

análises e transcrições de trechos de falas, foram utilizados os códigos em evidência.

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116

Quadro 3

Perfil dos Entrevistados: acadêmicos

Setor

Código Local de Trabalho Formação Acadêmica Cargo de Ocupação

Acadêmico

Centros de Estudo e

Programas de

Pesquisa

ACAD 1 CEATS/FEA/USP Graduação em Economia e Mestrado e Doutorado em

Administração

Coordenadora do CEATS/FEA/USP

ACAD 2 CEATS/FEA/USP Livre Docência, Mestrado em Ciências Sociais, Doutorado em

Ciências Políticas e Pós-Doutorado USP (Brasil)

Fundadora e Coordenadora do

CEATS/FEA/USP

ACAD 3 CEAPG/EAESP/FGV Graduação em Direito, Mestrado em Administração de

Empresas, Doutorado em Administração de Empresas e Pós-

Doutorado – área Administração (Canadá)

Membro pesquisador do

CEAPG/EAESP/FGV

ACAD 4 CEAPG/EAESP/FGV Graduação em Psicologia e Doutorado em Psicologia

Organizacional

Membro e fundador do

CEAPG/EAESP/FGV e um dos fundadores

do Programa de Gestão Pública e Cidadania

(PGPC)

ACAD 6 NEATS/PUC-SP Graduação em Ciências Sociais, em Filosofia, Mestrado em

Saúde Pública e Doutorado em Administração da Saúde

Coordenador Geral do NEATS/PUC-SP

ACAD 7 NIPETS/UFRGS

Graduação em Sociologia, Mestrado em Sociologia das

Organizações, Doutorado em Administração e Pós-Doutorado

em Institute de Recheche Pour Le Développement (França)

Coordenadora do NIPETS/UFRGS

ACAD 8 NUPEGS/PUC Minas Graduação em Filosofia e Psicologia, Mestrado em

Administração e Doutorado em Administração

Vice Coordenador do NUPEGS/PUC Minas

ACAD 9 PEGS/EBAPE/FGV Graduação em Administração, Mestrado em Educação e

Doutorado em Engenharia da Produção

Coordenador Geral do PEGS/EBAPE/FGV

ACAD 10 CIAGS/UFBA Graduação em Pedagogia, Mestrado em Administração e

Doutorado em Administração, Pós-Doutorado em França,

Estados Unidos, Canadá e Espanha

Coordenador Geral do CIAGS/UFBA

Fonte: elaboração própria.

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Quadro 4

Perfil dos Entrevistados: praticantes

Praticantes

Organizações da

Sociedade Civil

PRAT 1 Cooperação para o

Desenvolvimento e

Morada Humana

(CDM)

Graduação em Contabilidade e

Tecnologia Informacional

Diretor de Gerenciamento de Projeto

PRAT 2 Fundação AVSI Graduação em Economia das instituições internacionais Responsável pela sede de administração da

fundação AVSI no Brasil

PRAT 3 Federação das

Indústrias e Empresas

de Minas Gerais

(FIEMG)

Graduação em Serviços Sociais Coordenadora do setor de Responsabilidade

Social

PRAT 4 Instituto IPÊ Graduação em Ciências Biológicas, mestredo e doutorado em

Educação Ambiental

Vice presidente do IPÊ e Reitor da Escola

superior de conservação e sustentabilidade

PRAT 5 Fundação AVINA Graduação em Pedagogia e Especialização em Pedagogia

Social

Diretor de Alianças Estratégicas

PRAT 6 Instituto Camargo e

Corrêa

Graduação em Administração Diretor do Instituto Camargo Correia

PRAT 7 Instituto Hartmann

Regueira

Graduação em Terapia Sistêmica Diretora Executiva do Instituto Hartmann

Regueira

PRAT 8 Grupo de Institutos e

Fundações GIFE

Graduação em Ciências Sociais Coordenadora da Área de Gestão de

Conhecimento

Fonte: elaboração própria.

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Conforme demonstra o Quadros 3 “Perfil dos Entrevistados: acadêmicos” e o Quadro

4 “Perfil dos Entrevistados: praticantes”, buscou-se pesquisar atores cujo cargo de ocupação

na instituição representasse um potencial investigativo acerca dos objetivos dessa pesquisa.

Essa perspectiva fundamenta-se pela escolha metodológica da análise do depoimento dos

respondentes que prevê organizar a reconstrução dos sentidos das respostas em sua situação

micro e macrossocial de enunciação (Godoi, 2005). Guiada pela fenomenologia, pela

etnologia e pela Teoria Crítica da Sociedade, objetivou-se encontrar um modelo de

representação e de compreensão do texto concreto em seu contexto social e na historicidade

de suas proposições (Alonso, 1998, p. 188), o que se pressupôs ser possível por meio da

investigação de atores que exprimissem maior conhecimento sobre os fatores macro e

microssociais relativos à instituição a qual representam.

O Quadro 3 “Perfil dos Entrevistados: acadêmicos” e o Quadro 4 “Perfil dos

Entrevistados: praticantes” também descrevem a formação acadêmica de cada um, sendo

possível se observar no âmbito dos praticantes uma preponderância na área das Ciências

Sociais Aplicadas. A mesma observação pode ser feita para os acadêmicos cuja formação

além de contemplar a área das Ciências Sociais Aplicadas, também se concentra no campo de

conhecimento da Administração. Esses dados permitem notar uma formação em áreas de

conhecimento similares.

Destaca-se que o intuito do Quadro 3 “Perfil dos Entrevistados: acadêmicos” e do

Quadro 4 “Perfil dos Entrevistados: praticantes” foi apenas de descrever, de forma sintética,

o perfil dos entrevistados. A análise dos dados primários se efetivará no próximo capítulo,

cuja base metodológica se ancorou na análise dos depoimentos dos respondentes selecionados

em bases da pesquisa qualitativa.

A análise dos depoimentos ancorou-se nas concepções teóricas e temáticas que

ancoram o campo da Gestão da Social as quais, para fins desta tese, consideraram-se as que se

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fundamentam na ação racional substantiva, intersubjetiva e dialógica entre interorganizações,

voltadas para o desenvolvimento social do território (T. M. D. Fischer, 2002, Tenório, 2005,

Carrion, 2008, Boullosa & Schommer, 2008).

Apreende-se que essa aproximação teórica exige do investigador, uma visão pautada

no indeterminismo e nas diferenças microssociais de cada ator investigado, o que requer uma

análise abrangendo um domínio mais vasto que o da conversação no sentido estrito, incluindo

aspectos não verbais da comunicação (Godoi, 2005). O discurso não pode ser analisado no

vácuo contextual, lembra Godoi (2005) a partir de Lakoff (2005), visto que ele é inerente à

vida social. Dessa forma, buscou-se observar as “diferenças e descontinuidade dos planos de

onde o sujeito fala” (Godoi, 2006, p. 387), não se pretendendo considerar as “regularidades no

discurso, mas sim a dispersão” (Godoi, 2006, p. 387).

A partir desta perspectiva e em consonância com as abordagens teóricas adotadas

nessa pesquisa, procurou-se identificar e explorar: I) a noção que os atores investigados

constroem sobre a produção de conhecimento em Gestão Social a partir das ações e dinâmicas

representativas desse campo; II) as habilidades sociais e o hibridismo que se manifestam nas

relações entre organizações da sociedade civil e universidades, tendo como pano de fundo a

perspectiva de campos de poder; III) as possibilidades e os limites para a superação dos

problemas que envolvem a produção de conhecimento sobre Gestão Social a partir da relação

entre acadêmicos e praticantes desse campo no Brasil. Destaca-se que tais categorias serviram

como suporte na orientação da análise dos dados coletados, sem, entretanto, engessar o

conteúdo das respostas que se deu de forma integrada com as observações e argumentações

do entrevistador. Em outras palavras, a análise apresentada não foi fragmentada por blocos de

falas divididos em categorias, mas sim pela conjunção de ideias que respondiam o item a ser

observado. A realização dessa dinâmica se revelou em um desafio, pois, a todo o momento os

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relatos tinham que ser analisados buscando-se uma integração com outras questões

ponderadas pelos atores entrevistados e em consonância com a discussão teórica apresentada.

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6 ANÁLISE DOS DADOS: A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOBRE GESTÃO

SOCIAL ENTRE ACADEMICOS E PRATICANTES

A análise inicial abrangeu as categorias de análise vinculadas a noção e a compreensão

acerca da Gestão Social, considerando as características que contribuíram para a estrutura

desse campo vinculado às possibilidades de habilidade social. Nessa perspectiva, vale

destacar os fatores que nortearam e que orientam os trabalhos desenvolvidos pelas unidades

de análise que, conforme demonstrado pelos atores investigados, são provenientes de um

contexto sociopolítico marcado pelos movimentos sociais reivindicatórios dos anos 1980 e

1990.

Este período, caracterizado por Gohn (1995) como dois momentos de ativismo

brasileiro, evidenciou um conjunto de práticas que se traduziram numa cultura de cidadania.

Segundo a autora, era algo “novo num país de tradição centralizadora, autoritária,

patrimonialista e clientelística. As ações abriram espaço que demarcaram novos lugares para a

ação política, especialmente ao nível do poder local” (Gohn, 1995, p. 63).

Tais movimentos decorreram de organizações da sociedade civil que, em 1980

geraram um cenário de grande participação civil, seguido pela criação de espaços de

interlocução entre o Estado e a sociedade civil e pela transição democrática no país (Gohn,

1995). Esse advento, apoiado pela promulgação da nova Constituição brasileira orientou-se

para a união da democracia direta à democracia participativa visando a “participação na

definição das formas de gestão dos equipamentos e serviços, a definição da implantação das

Leis Estaduais e Municipais, a construção dos diferentes Conselhos e Câmaras de

interlocutores do Estado com a sociedade” (Gohn, 1995, p. 64).

A perspectiva de inserção no Estado por meio de canais interlocutores e participativos

da sociedade civil e o surgimento ou renascimento de novas lutas sociais de caráter cívico,

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bem como a criação das redes de economia informal ou comunitária, determinou a mudança

no tipo predominante de associativismo nos anos 1990 (Gohn, 1995, Marteleto & Ribeiro,

1997, T. M. D. Fischer & Melo, 2006).

Observou-se que, este cenário influiu na trajetória inicial de alguns centros de estudo e

programas de pesquisa investigados, notadamente, o CEATS/USP, o CEAPG/FGV, o

CIAGS/UFBA e o NEATS/PUC-SP. Essa observação será evidenciada no item a seguir, o

qual discutirá as características que permeiam a ação dos atores investigados apreendidos por

meio das entrevistas semiestruturadas e pesquisa documental.

6.1 A trajetória dos acadêmicos e praticantes do campo da Gestão Social

Segundo a fundadora e coordenadora do CEATS/USP, o surgimento do centro de

estudos e pesquisa se deu a partir de uma observação constante e sistematizada de

movimentos da sociedade civil que vinham se organizando e adquirindo CNPJ, tal como as

organizações sem fins lucrativos dos Estados Unidos (ACAD 2, 2013).

(...) Com todas essas ideias de terceiro setor que eu observava nos Estados

Unidos, aí eu disse: bom, temos que encontrar essas organizações e criar

projetos onde elas se liguem com o governo, com empresas locais para o

desenvolvimento local. Veja que interessante né, surge o conceito de parceria

de alianças estratégicas e isto é mais ou menos em 1991 e 1992, estes

projetos tomaram um corpo muito forte dentro da faculdade onde nós

resolvemos criar um espaço de estudo do terceiro setor e foi assim que surgiu

o CEATS (ACAD 2, 2013).

Essa percepção adicionada ao crescente número de organizações do terceiro setor no

Brasil, desde meados dos anos 1980, refletiu no “reconhecimento da magnitude e da

importância que o terceiro setor vinha adquirindo no universo das organizações que

conformam a sociedade contemporânea” (Scaico, 1997 p. 74). Com o aumento da demanda de

apoio consultivo, palestras e conferências dos docentes, assim como no desdobramento do

interesse dos pesquisadores por esse fenômeno organizacional, em 1997, o CEATS/USP foi

concebido não somente com o intuito de “nuclear atividades acadêmicas e científicas, mas

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também para, concomitantemente, dinamizá-las sob a forma de serviços e produtos que

atendessem às necessidades da comunidade” (Scaico, 1997 p. 74).

O CEAPG/FGV, outra unidade acadêmica observada sob esse aspecto, foi fundado a

partir de um contexto no qual se aglutinavam ideias que iam além da administração das

políticas públicas. Conforme o relato do professor fundador desse centro de estudo, a

Administração pública ampliava o discurso para outras formas de relacionamento com a

sociedade civil, “não era só administração pública e governo, era muito mais amplo” (ACAD

4, 2013). Essa perspectiva, associada a um novo curso de mestrado em Administração Púbica

e Governo oferecido pelo CEAPG/FGV contribuiu para que esse centro de pesquisa, a partir

de 1989, orientasse os seus propósitos para questões mais amplas da administração pública.

Essas questões concentram o interessem em aprofundar o conhecimento sobre governança

pública, com foco no desenvolvimento local e na garantia de direitos da cidadania.

Quanto ao CIAGS/UFBA, o seu processo de ensino e pesquisa sobre a Gestão Social,

iniciou inspirado nos ideais de uma comunidade solidária que era liderada por uma pessoa

aberta e que dialogava com todas as correntes de movimentos políticos e populares, a

professora Ruth Cardoso (ACAD 10, 2014). Sob essa perspectiva, o centro de estudo se

consolidou no início da década de 1990 como um espaço de articulação entre saberes teóricos

e práticos voltados para a promoção e aproximação entre discentes, professores e

pesquisadores de Gestão Social com o Estado, a sociedade civil e empresas.

Já o NEATS/PUC-SP foi influenciado pelo interesse de alunos da PUC/SP, que

vinham observando um movimento de estudos e pesquisas na USP sobre o terceiro setor. Em

1998, o núcleo de estudo surgiu mobilizado por alunos e professores da PUC/SP empenhados

em melhor compreender a sistemática do terceiro setor. Cadastrado desde 2000 no CNPQ

com a linha de pesquisa Gestão de Organizações Sem Fins Lucrativos, Gestão Social e

Terceiro Setor, este núcleo de estudo tem por objetivo realizar pesquisas, atividades de

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formação e de consultoria, produzir e difundir conhecimentos, articular redes e apoiar a gestão

de organizações do terceiro setor, bem como a gestão das políticas sociais.

Destaca-se que essas dinâmicas da ação social foram também observadas sob a ótica

de uma praticante do campo da Gestão Social que, ao atuar em diversas organizações privadas

interessadas em atender uma demanda social e política em São Paulo, ilustrou um quadro bem

similar ao apresentado pelos docentes, evidenciando a relevância do papel dos praticantes e

acadêmicos nesse processo de construção e de disseminação de ações de interesse público.

O primeiro estudo que eu vi para o social sendo desenvolvido pelas empresas

em São Paulo foi do instituto C&A, realizando trabalhos diretamente na

comunidade durante a década de 1990. Depois entrou a Associação Brasileira

dos Fabricantes de Brinquedos (ABRINQ) e mais adiante o movimento do

voluntariado com a professora Ruth Cardoso. Em São Paulo a questão do

voluntariado já estava borbulhando, ai eu percebi uma relação interessante

por que a Fundação Getulio Vargas de lá entrou com uma formação para

administradores para gerir o social, diretamente para o terceiro setor, e eles

montaram um centro para o terceiro setor. Isso deve ter sido em 1995. Em

1998 foi fundado o Instituto Ethos. Nesse período eu trabalhei em outra

empresa cujo diretor geral mais outros 24 gestores e diretores fizeram o 1º

curso MBA para altos executivos da USP. Nesse curso foi proposto uma

agenda para o século XXI no qual houve um ponto unanime entre eles que

era construir um trabalho de desenvolvimento social. Esses alunos, após o

termino do curso continuaram se reunindo aos sábados, mais ou menos duas

vezes por mês para entender o que era esse social por detrás das empresas, e

desses encontros se formou a associação dos alunos dos MBAs da USP. Logo

após, já na segunda turma de MBA da USP, a gente começou uma discussão

sobre as possibilidades da USP em oferecer uma especialização como a da

Fundação Getulio Vargas, que era direcionada para as questões do terceiro

Setor. O propósito era pegar o conhecimento de gestão que esses executivos

tinham para trabalhar a gestão social. Depois foi criado o CEATS da USP.

Daí a associação dos ex-alunos conseguiu, apesar da competição entre USP e

Fundação Getulio Vargas juntar essas duas instituições para construir

algumas coisas que a gente percebia que eram importantes, de algo que fosse

útil para a sociedade (PRAT 3, 2013).

Esse relato corrobora com o cenário desenhado pelos acadêmicos ao identificar, por

exemplo, atores como a professora Ruth Cardoso, que é vista como uma figura central para os

estudos sobre solidariedade e voluntariado. Neste ínterim, além da presença de fundações

como a C&A, a ABRINQ e o instituto Ethos, a USP e a Fundação Getúlio Vargas foram

apontadas como universidades mediadoras e promotoras dessa discussão, sinalizando um

ambiente marcado por atores de diversos setores, porém, guiados pela perspectiva de atender

uma demanda que se afirmava no âmbito social, econômico e político na década de 1990.

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A atuação das instituições praticantes investigadas foi influenciada pelo mesmo

quadro sociopolítico desenhado pelos acadêmicos, no qual se percebia uma movimentação no

âmbito da sociedade civil organizada. A fim de melhor compreender esse quadro, vale

destacar algumas tipologias criadas por Gohn (1997, p. 12 - 14), que caracterizaram as OSCs

atuantes no Brasil dos anos 1990, visto que, das 8 (oito) unidades analisadas, 7 (sete) se

constituíram nesse período.

A década de 1990, marcada por uma desconcentração de várias atividades estatais na

área social, levou a transferência da operacionalização de vários serviços para o setor privado

sem fins lucrativos e para organizações sociais que, segundo Gohn (1997), podem ser

sintetizadas como OSCs caritativas, OSCs desenvolvimentistas, OSCs cidadãs e OSCs

ambientalistas.

As primeiras, referenciadas como caritativas concentravam suas ações a partir de

categorias específicas e assistencialistas, voltadas para atores do cenário urbano como os

menores, mulheres e idosos. A sua atuação envolvia espaços de trabalho com meninos e

meninas de rua e de educação infantil oferecida por creches que, mais adiante, atendendo as

exigências constitucionais substituiu o caráter filantrópico para creches conveniadas o qual

ampliou as possibilidades de OSCs bem articuladas nessa área.

As OSCs desenvolvimentistas teriam surgido a partir de propostas de intervenção no

meio ambiente. Baseiam-se em propostas de desenvolvimento sustentável, intervindo

regionalmente em áreas de barragens, reservas ecológicas e naturais, reservas indígenas ou de

produção alternativa de produtos do mercado popular. Articulam-se, por vezes, em redes de

caráter internacional.

Direcionadas para a reivindicação dos direitos de cidadania, as OSCs cidadãs atuariam

no espaço urbano, orientadas para a construção de redes de solidariedade que promovem ou

participam de programas e serviços sociais básicos e emergenciais e para atuação junto a

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minorias discriminadas. Elas têm uma ampla inserção junto aos canais de comunicação e em

nível de políticas públicas.

As OSCs ambientalistas, sob a premissa do desenvolvimento sustentável na área

urbana, contribuiriam para a mudança do perfil das cidades brasileiras. “Praças e prédios

históricos são recuperados por força de suas ações” (Gohn, 1997, p. 14).

Destaca-se que, essas tipologias não descrevem todas as características de formação e

de organização das OSCs no Brasil; elas apresentam os aspectos gerais que as abrangem, pois

são marcadas pela pluralidade de sua constituição e pelos ideais que as norteiam no campo de

sua atuação (Gohn, 1997, Marteleto & Ribeiro, 1997, Alves, 2002, Teodósio, 2005, T. M. D.

Fischer & Melo, 2006).

Apreende-se que os aspectos apontados relativos a formação e atuação híbrida das

OSCs no Brasil contribuem para melhor compreender o cenário sociopolítico no qual elas se

constituíram, trazendo perspectivas que elucidam as características do campo que as

envolvem.

Duas fundações e institutos originários da esfera do mercado salientaram aspectos

similares com relação ao quadro sociopolítico no qual se formaram o Grupo de Institutos e

Fundações Empresariais GIFE e a FIEMG.

O GIFE, organização que prevê em seu escopo de atuação a articulação de institutos,

fundações e empresas diretas interessadas em discutir e dinamizar o investimento social foi

marcada, no cenário de sua concepção, por pressões da sociedade civil de São Paulo a qual

questionava os impactos dos negócios das empresas sobre a sociedade e o meio ambiente. A

coordenadora do setor de Gestão do Conhecimento relatou que a fundação “surgiu muito a

partir de um movimento do campo empresarial, preocupados com a pressão que eles vinham

sofrendo da sociedade” (PRAT 8, 2013). Consolidada em 1995, a partir de um amplo período

de discussões entre empresários e executivos interessados em compreender as contribuições

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que o investimento social poderia repercutir para a sociedade civil, a Rede GIFE é marcada

pela diversidade de seus investidores, que reúne hoje centro e trinta (130) associados,

operando projetos próprios ou viabilizando os de terceiros. Suas ações se orientam para a

articulação, diálogo e troca de experiências entre os associados, bem como para a difusão dos

conhecimentos provenientes dessas articulações. Dessa forma, seus documentos oficiais

afirmam que a organização busca aprimorar o investimento social por meio de troca de

experiências e pela construção de referências para a atuação de investidores. Outra iniciativa

seria desenvolvimento de um trabalho de representação perante o governo e outras redes e

associações, acompanhando e influindo no ambiente regulatório do Terceiro Setor. Essas

linhas de atuação congregam suas forças para a articulação, gestão do conhecimento e para a

advocacy (PRAT 8, 2013).

Na FIEMG, observou-se um quadro semelhante influenciado pelas pressões da

sociedade civil. Esse órgão de representação das indústrias mineiras criou no início da década

de 2000 um núcleo com o objetivo de fomentar o espírito voluntariado nos empresários,

denominado Voluntariados das Gerais. “Esse trabalho tinha a intenção de se tornar

independente, como uma ONG, uma coisa que o torna da sociedade, só que ele tornou algo de

extrema importância para a FIEMG, a qual resolveu chamá-lo de responsabilidade social”

(PRAT 8). Posteriormente, este núcleo veio a se consolidar como um espaço institucional da

FIEMG representativo da responsabilidade social das indústrias associadas.

Percebe-se que essas instituições não se enquadram nas tipologias desenhadas por

Gohn (1997), mas retratam OSCs que podem ser observadas como do terceiro setor, por se

caracterizarem como organizações/empresas que atuam na área da cidadania empresarial,

incorporando critérios da economia de mercado do capitalismo para a busca da qualidade e

eficácia de suas ações (Gohn, 1995). Elas também atuam segundo “estratégias de marketing e

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utilizam a mídia para divulgar suas ações, bem como desenvolvem uma cultura política

favorável ao trabalho voluntário nos seus projetos” (Gohn, 1995 p. 65).

Essas características permeiam o escopo de atuação do Instituto Camargo Corrêa que,

assim como o Instituto e Fundações Empresariais GIFE, desenvolve iniciativas de

investimento social, porém, oriundas do Grupo Camargo Corrêa. Em outras palavras, a sua

atuação considera a diversidade e abrangência dos negócios do grupo e das comunidades

envolvidas.

De acordo com o diretor do instituto, o propósito de integração estratégica aos

negócios do grupo ocorreu a partir de 2007, ano em que ele iniciou sua trajetória na

instituição. Antes, o objetivo do instituto permeava os desígnios do desenvolvimento social,

todavia ancorado na perspectiva filantrópica e assistencialista, no qual as empresas apenas

aportavam recursos para que pudesse desenvolver os projetos sociais na área da infância e

alguns na área da educação. A partir de 2007, os objetivos da instituição se concentraram em

três programas chamados estruturantes, sendo eles, Infância Ideal, Escola Ideal e Futuro Ideal.

Além desses, há um quarto programa que permeia os três, denominado Ideal Voluntário.

Segundo o relato do diretor do Instituto, o trabalho é direcionado para a “defesa dos direitos

da infância, melhoria da qualidade da educação publica de ensino fundamental e num outro

programa, empreendedorismo e geração de renda focada em jovens” (PRAT 6, 2013).

Outras três unidades de análise pesquisadas, pertencentes ao grupo das organizações

da sociedade civil e de característica propositiva semelhante às tipologias empregadas por

Gohn (1989), sinalizaram, a partir da análise dos dados secundários e primários um cenário

sociopolítico mediado por pressões de natureza ética com propósitos direcionados, não só

para as questões ambientais, bem como para as possibilidades de relacionamento entre o

Estado e a sociedade.

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Destaca-se que, entre essas três OSCs, duas são de cunho internacional e um dos

aspectos que apontam a centralidade de suas ações reside no interesse acerca dos problemas

sociais mundiais, oriundos, principalmente de países emergentes.

A Fundação AVINA é uma das OSCs internacionais pesquisadas. Com sede na Costa

Rica, e tendo como foco de atuação a América Latina, essa organização, a partir da presença

do seu fundador na Rio-92, o qual lhe conferiu a possibilidade de conhecer melhor o ambiente

das organizações sociais latino americana, incrementou a sua atuação na região ao verificar

que poderia complementar a contribuição que vinha sendo destinada para o crescimento da

região via investimento social (PRAT 5, 2013).

A partir da abertura de um escritório na Argentina, em 1994, a Fundação AVINA cujo

objetivo central era investir em pessoas com interesse e com agendas criativas, apoiadas pelos

princípios éticos, inovadores e empreendedores para um desenvolvimento sustentável,

ampliou seu território de atuação na América Latina. O Brasil se tornou um foco de atenção

para os investimentos da Fundação, ao observarem um contexto social dotado de criatividade

e de práticas empreendedoras sociais diversificadas. Em 1997, criou-se um escritório no Rio

de Janeiro denominado “Centro de Serviços” da AVINA destinados aos seus aliados no Brasil

e para as pessoas que já trabalhavam no país (PRAT 5, 2013).

Segundo o Diretor de Alianças Estratégicas da Fundação AVINA,

depois que ela passa a se institucionalizar, como eu digo, quando

deixa de ser um investimento social do fundador e passa ser um

investimento social das empresas com as quais o fundador estava

mais vinculado, aí entra uma fase de institucionalização da AVINA

no Brasil. Então, o trabalho da AVINA resultou da experiência dos

aprendizados que tinha feito nos outros países, resultou da

identificação do ambiente positivo para a AVINA atuar dentro da

lógica que ela trabalhava, apoiando os líderes sociais e indivíduos

empreendedores (PRAT 5, 2013).

A outra fundação investigada, também de origem internacional, foi a AVSI que tem

em seu âmago o intuito de apoiar a valorização da dignidade da pessoa por meio de ações de

fortalecimento da sociedade civil, através da adesão a família, a criança, às organizações

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comunitárias e a parcerias com diversos atores sociais, pertencentes a países emergentes ou

em desenvolvimento.

Ela iniciou a sua trajetória profissional de atendimento a populações carentes e

vulneráveis no Brasil na década de 1980, concentrando inicialmente os seus trabalhos na

região do nordeste que, posteriormente foram expandidos para os Estados de Minas Gerais e

Rio de Janeiro.

Apreende-se, baseado nos princípios que a norteiam, que o cenário brasileiro

composto por questões sociais, políticas e econômicas emergentes foi o fator indutor para o

empreendimento de suas ações.

A organização não governamental Cooperação para o Desenvolvimento e Morada

Humana (CDM), surgiu em meados da década de 1980 como uma alternativa de qualificação

profissional para jovens de uma comunidade carente que se localizava em um bairro

periférico de Belo Horizonte. Parceira e similar em alguns aspectos propositivos com a

Fundação AVSI, a CDM atua por meio de projetos e prestação de serviços sociais voltados à

redução da pobreza de populações residentes em áreas que concentram pobreza e degradação

humana, social e física. Tem o objetivo de contribuir com a promoção e o desenvolvimento

integral da pessoa humana nos âmbitos econômico, social, físico, urbanístico, ambiental,

cultural, educativo e formativo. Todos esses aspectos permite inferir que os fatores

motivacionais que dinamizaram o início de suas atividades vinculam a um quadro social

característico de comunidades desprovidas de garantias sociais e econômicas, no qual se

percebeu a necessidade de qualificação profissional de jovens para inserção no mercado.

(...) Então era um grupo de amigos que se juntou para desenvolver

ações de trabalho e renda para pessoas de comunidades carentes.

Depois, sendo chamada de Centro de Solidariedade, ela criou uma

serie de alternativas com essa finalidade, criou uma pizzaria, uma

loja de tecelagem e construiu um primeiro embrião no terreno em

que se encontra hoje a CDM (PRAT 1, 2013).

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Destaca-se que essas três OSCs assemelham às características das OSCs cidadãs

proferidas por Gohn, (1997) que, por meio da atuação em áreas urbanas e ambientais

vulneráveis, se articulam através de redes e parcerias sociais e solidárias para a dinamização

de suas práticas. O exemplo disso é o envolvimento da Fundação AVINA com várias outras

organizações sociais tais como a FIEMG, o GIFE e o Instituto Hartmann Regueira, bem como

a parceria entre a Fundação AVSI e CDM. Nota-se que essas parcerias oriundas de

organizações de natureza similar demonstram o poder de um campo no qual se observa

possibilidades dele se ampliar e de se empoderar.

O Instituto de Pesquisa Ecológica (IPÊ) e Hartmann Regueira, outros dois das oito

organizações praticantes da Gestão Social investigadas, são constituídos legalmente como

Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP).

O Instituto Hartmann Regueira foi criado como decorrência de experiências anteriores

relacionadas a um pequeno grupo de terapeutas que trabalhavam em uma clínica de terapia

sistêmica. Suas atividades em comunidades carentes, ainda como clínica terapêutica,

iniciaram após um convite da Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, a qual

solicitou atendimento a uma escola municipal que vinha apresentando sérios problemas de

violência. Conforme relatou a fundadora e coordenadora do instituto, como era um trabalho

sistemático, as intervenções não poderiam focar somente nos problemas da escola. Decidiram,

assim, incidir também na família dos alunos e na comunidade no qual estava inserida.

Posteriormente, a comunidade sensibilizada com o fato de uma clínica terapêutica

querer conhecê-la melhor, bem como discutir e fomentar as fortalezas locais apontou outras

demandas as quais o grupo buscou contribuir por meio da formação de uma associação de

pais de amigos da escola e um projeto de liderança jovem (PRAT 7, 2013).

Movidos pela vulnerabilidade da comunidade atendida, o pequeno grupo de terapeutas

decidiu continuar os seus trabalhos oferecendo atendimento na clínica. Entretanto, os demais

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profissionais que ali exerciam suas atividades em parceria não concordaram, implicando na

separação do grupo e na criação do Instituto Hartmman Regueira.

Conforme a entrevistada “o instituto foi fruto de uma pressão social que não fazia

parte da sua visão de futuro, direcionado para um trabalho social na dimensão que chegou-se

a fazer” (PRAT 7, 2013).

De perspectiva de atuação diferente das demais, o IPÊ foi impulsionado por motivos

que, apesar de se apoiarem em lacunas de natureza social, se relacionavam com questões

distintas das demais unidades de análise. Como o seu próprio nome aponta, Instituto de

Pesquisa Ecológica, o cerne de sua atuação está vinculado à pesquisa. Entretanto, conforme

relatado por seu fundador e coordenador, o instituto é fruto de uma demanda que a

universidade contemporânea não conseguiu suprir, principalmente, na área que envolve a

biodiversidade. Convencido de que a universidade brasileira, por se pautar em profundos

processos burocráticos não conseguiria atender uma demanda ambiental na qual exigia, não

somente a pesquisa, mas também a prática no campo, o IPÊ foi criado com o seguinte

princípio, “nós fazemos pesquisa não para as prateleiras da universidade, mas para a ação de

mudanças” (PRAT 4, 2013). O IPÊ seria o “braço não governamental” (PRAT 4, 2013) para

fazer na academia o que ele não conseguiu fazer. “Então eu falei: vou sair, se eu não consigo

fazer dentro da academia, eu vou fazer isso fora da academia, vou transferir tudo para uma

organização do terceiro setor” (PRAT 4, 2013).

Essa perspectiva, que se apoia nos dilemas enfrentados pela universidade

contemporânea, os quais são apresentados nesta tese como um dos elementos estruturais

relevantes para se discutir a produção de conhecimento sobre Gestão Social, fica mais

evidente quando o entrevistado diz que, “no mundo acadêmico era uma pesquisa muito mais

aplicada do que aquelas que vinham sendo feitas até aquele momento, tentando pesquisar

soluções para os problemas que estávamos vivendo no mundo moderno” (PRAT 4, 2013).

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Junto a esse fator central, outra questão que influenciou o início da trajetória do IPÊ

foi a frustração de vários pesquisadores da área da biologia da conservação que percebiam

tratar de um tema em extinção no qual eles ficavam apenas estudando.

Era um grupo de pesquisadores importante na ecologia, que estava

disposto a dar energia para reduzir o impacto que estava sendo

causado na natureza e na biodiversidade, não só no mundo

acadêmico, mas no mundo das ações também (PRAT 4, 2013).

Fundado em 1992, o IPÊ segundo o entrevistado, nasceu da confluência desses fatores,

da frustração com a burocracia da Universidade de São Paulo, da disposição em fazer

pesquisa científica com o cunho de responder perguntas mais objetivas no ramo da biologia

da conservação e de um grupo de jovens entusiasmados que o elegeram como mentor para a

implementação das ações. Compreende-se que esse último aspecto denota as perspectivas que

embasam a habilidade social, por demonstrar a habilidade de um ator em promover a sinergia

e o engajamento de outros atores de um mesmo campo.

Nós somos acadêmicos, mas somos acadêmicos que estamos

dispostos a publicar menos e fazer mais. Então, a gente faz pesquisa

e faz ação, fazemos as duas coisas. O gráfico que eu fiz no começo

da nossa trajetória é um gráfico de pizza com três fatias, onde eu

dizia para os jovens: quem trabalha aqui tem que fazer 3 coisas, tem

que fazer pesquisa e publicar como é no mundo acadêmico e a outra

fatia é, tem que fazer ação oriundas destas pesquisas e a terceira é

tem que captar recursos, porque eu não sou patrão de ninguém.

Então, eles são meus companheiros na criação de uma instituição.

Agora, o tamanho da fatia, cada um faz o seu tamanho, mas as três

coisas tem que fazer, não importa se é pequena ou grande a fatia.

Assim tem sido o IPÊ, nasceu disso e funciona desta forma até hoje

(PRAT 4, 2013).

Todos esses relatos foram apresentados com o intuito de evidenciar as características e

o poder de um campo cujo senso comum ancorado em uma racionalidade integrada a uma

ordem subjetiva que alimenta e externaliza um lugar próprio contribuiu para dimensionar o

capital que ele tem como perspectiva de transformação do campo.

O capital abrange uma série de disposições que vão envolvendo a compreensão dos

atores sobre a realidade social e direcionando o que consideram relevante, legítimo, desejável

e apropriado para a atuação em determinado campo. Nesse sentido, o que foi se construindo

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de comum entre os acadêmicos e praticantes, caracterizando a emergência de uma

transformação do campo da Gestão Social, é a constatação da necessidade de se criar novas

formas de atuação no âmbito da sociedade civil, do próprio Estado e das organizações de

mercado. Quanto aos problemas socioambientais observa-se que seria preciso formar pessoas

para atuar nessa transformação, sobretudo a partir de uma visão de profissionalização da

gestão das organizações e dos programas e projetos voltados aos temas socioambientais.

Concomitantemente, nota-se a necessidade de estabelecer novas formas de atuação da

academia, mais direcionadas e conectadas com a realidade social. Essa mesma perspectiva se

insere no contexto das OSCs e das empresas, as quais passaram a voltar mais a sua atenção

para os grandes processos de transformação que as envolvem, induzindo-as a gerar

conhecimento sobre a realidade social de forma não só a entendê-la mas, sobretudo, a

transformar a realidade social em que atuam. Esse é o campo que vai se transformando.

O campo de poder, além de se configurar nas interações entre estrutura e agência

também se explicita por meio das habilidades sociais, que representa a capacidade de atores

envolverem outros atores a cooperar para um bem comum em determinada ação. Acredita-se

que a análise desse aspecto a partir dos depoimentos dos respondentes contribui para a

compreensão da produção de conhecimento sobre Gestão Social entre acadêmicos e

praticantes por nela incidir a ideia de integração colaborativa entre atores diferentes.

A próxima seção discutiu as habilidades sociais observadas em algumas unidades de

análise investigadas com o intuito de avançar na análise das possibilidades e limites que esta

perspectiva pode trazer para a produção de conhecimento em Gestão Social. Foram também

ressaltadas as dinâmicas e articulações que assinalaram a trajetória inicial de alguns centros de

estudos e pesquisa a fim de demonstrar a sua contribuição para a produção de conhecimento

sobre Gestão Social.

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6.2 Habilidade social: possibilidades de ampliação da produção de conhecimento sobre

Gestão Social

A ideia que atores são dotados de capacidade para motivar outros atores de setores

diferentes a tomar parte de uma ação coletiva, a qual implica a transformação e a reprodução

de ordens sociais locais (Fligstein, 2007), motivou o propósito de discutir os traços de

habilidade social presente entre os atores que constituem as unidades de análise dessa

pesquisa.

Por meio dos relatos dos entrevistados e dados secundários constantes nos sítios

eletrônicos de cada um, foi possível notar em algumas das organizações da sociedade civil

investigadas, além das influências do contexto local, a presença de habilidade social entre os

seus gestores. Este traço demonstrou ter sido relevante para a atuação em conjunto com atores

de natureza diferente e primordial para a ampliação da produção de conhecimento sobre

Gestão Social.

Neste contexto, a Fundação AVINA e o GIFE manifestaram práticas e ações que

induziram a produção de conhecimento sobre a Gestão Social a partir da atuação em redes

solidárias de perspectiva social.

Essa perspectiva se baseia no depoimento do Diretor de Alianças Estratégicas da

AVINA o qual relatou que o objetivo inicial da organização se pautava no apoio a líderes

sociais individuais e organizacionais que tinham em sua agenda uma proposta de

desenvolvimento social, independente do tema que estava sendo explorado. Mas que, na

segunda etapa de sua atuação, a Fundação AVINA, buscou articular líderes sociais com

agendas similares em processos de rede. “Eram organizações que não trabalhavam com as

mesmas coisas, mas que se complementavam. O propósito era apoiar projetos de rede,

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projetos de agendas compartilhadas sempre com base nos territórios de atuação da fundação”

(PRAT 5, 2013).

Compreende-se que os aspectos apresentados nesta segunda etapa de atuação da

AVINA cujos processos podem ser reconhecidos como comunidades de prática por conseguir

organizar em rede vários interesses e ações para um fim comum, se apoiam nos princípios que

integram o conceito de habilidade social. Parte-se do pressuposto, que a consolidação de uma

rede de atores demanda habilidade social na conversão de ideias distintas. Essa convergência,

mesmo que conflituosa, reflete na produção de conhecimento entre os atores envolvidos

conforme aponta o entrevistado, “esta segunda etapa da AVINA demonstrou muita

aprendizagem, pois processos similares estavam acontecendo” (PRAT 5, 2013).

O Grupo de Fundações e Instituições GIFE também se apoia na perspectiva da

articulação para fomentar o investimento social. Esse aspecto é ressaltado pela Coordenadora

da Área de Gestão de Conhecimento ao afirmar que “o processo de articulação é o DNA da

organização” (PRAT 8, 2013). Segundo a respondente, o GIFE que é uma associação de

investidores, é uma rede na qual se reúne fundações, institutos empresariais, institutos

familiares independentes e também empresas que fazem o serviço social indiretamente, sem o

apoio de uma fundação ou de um instituto para se articula (PRAT 8, 2013).

Essa articulação se amplia ao se conectarem com outros atores de diferentes esferas

sociais com o propósito de produzirem conhecimento sobre investimento social corporativo

no Brasil. Como exemplos foram citadas parcerias com universidades, principalmente em São

Paulo a qual a entrevistada salientou a Fundação Dom Cabral, bem como instituições do

governo como o Instituto de Pesquisa em Economia e Aplicada (IPEA) e o Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE). Por meio dessas duas últimas parcerias é desenvolvida uma

pesquisa chamada Mapeamento das Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos

(FASFIL) que conta também com a participação da ABONG. Esta é uma pesquisa realizada

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com todas as organizações sem fins lucrativos no Brasil que ocorre a cada quatro ou cinco

anos e recebe a contribuição do governo por meio do banco de dados nacional disponibilizado

pelo IBGE (PRAT 8, 2013).

Através desta pesquisa é possível ter uma dimensão do tamanho do

setor de investimento social no Brasil que tem hoje duzentos e

noventa mil ONGs, segundo a última Fácil. Há mais de dez anos que

esta parceria deu certo e este é um outro nível de atores que

contribuem para a produção de conhecimento. Sem duvida estes

órgãos governamentais contribuem muito e tem muito a contribuir

(PRAT 8, 2013).

Apreende-se que esse quadro sinaliza articulações que demandam habilidade social

para se conseguir motivar outros atores a tomar parte de uma ação coletiva (Fligstein, 2007) e

aponta como consequência a produção e sistematização de conhecimento sobre Gestão Social

mais robusta por ela se apoiar em diferentes olhares e ideias, cada qual carregando as suas

características, o que contribui para um conhecimento multiparadigmático, peculiar dos

pressupostos que circundam a Gestão Social.

Outro aspecto que emerge do GIFE referente à habilidade social ancora-se na criação

da organização, a qual foi marcada por um movimento empresarial informal sustentado pela

perspectiva de discutir o que cada empresário/organização estava fazendo sobre

responsabilidade social e investimento social (PRAT 8, 2013). O grupo cresceu e se afirmou a

partir dessa vertente, sendo institucionalizado na década de 1990.

O GIFE surgiu, informalmente, no finalzinho da década de oitenta, a

partir de um grupo de empresários e de executivos que passaram a se

reunir lá na Câmera de Comércio Americana para conversar sobre

responsabilidade social, investimento social. Na época este termo

ainda era usado, mas eles eram empresários, executivos que

percebiam a cobrança da sociedade por uma maior responsabilização

das empresas em relação ao impacto dela gerado pelo negocio. Aí,

eles passaram a se reunir para discutir um pouco o que cada um

estava fazendo em relação a isso. Este grupo foi se reunindo

informalmente, durante cinco anos. Em 1995 o GIFE foi

formalmente fundado. Este grupo decidiu institucionalizar a criação

de um grupo de instituto de fundações e empresas (PRAT 8, 2013).

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Considera-se também relevante explicitar as dinâmicas empreendidas por alguns

atores envolvidos nesta pesquisa por nelas conterem aspectos que contribuíram para tornar o

seu campo de atuação como referência na produção de conhecimento da Gestão Social.

Relativo aos acadêmicos do campo da Gestão Social observou-se que o CEATS/USP,

assim como a sua fundadora e coordenadora aponta, foi uma extensão da sua estória de vida.

Veja, tudo tem muito haver com a estória de vida da gente. Nada

acontece na vida profissional que não tenha jeito com a forma que

fomos criados e como nos formamos. Eu vim da escola de ciências

sociais da USP, na década de 1969, 1970 que foi uma época muito

difícil para nós os estudantes e para a universidade. A universidade

perdeu os seus principais quadros em virtude da repressão. Nas

ciências sócias nós tínhamos uma formação extremamente rigorosa

em metodologia de pesquisa, em filosofia e etc... Tínhamos também

uma militância política alguns mais radicais outros menos, mas isso

de alguma forma, a grande maioria dos alunos e professores tinha

uma ideologia de esquerda. Desde a minha adolescência eu

trabalhava com populações faveladas, era um misto de filantropia e

ideologia política. Só que ao mesmo tempo eu sou uma pessoa muito

pragmática e quando eu termino o curso de ciências sociais e já

começo o mestrado com professores como o Fernando Henrique

Cardoso, Ruth Cardoso, Francisco Belfort eu começo a ficar ainda

muito atraída pelo perfeccionismo acadêmico, pela precisão

metodológica que havia nas ciências sociais, mas muito descontente

com a falta de pragmatismo (...) o que me levou a fazer o meu

concurso público para docente da universidade aqui na faculdade de

economia e administração. (...) Isso tudo influiu muito na minha

formação pessoal que me fez uni essas duas vertentes da minha

formação. Fiz o mestrado e o doutorado nas ciências sociais, na

ciência política e apesar de ser professora aqui, mas isso é permitido

dentro da universidade, acabei vindo a fazer a livre docência e a

titularidade aqui na FEA. (...) Eu tinha as minhas ideias consideradas

revolucionárias do tipo: “porque que vamos ensinar para o aluno que

administrar é administra empresas? Porque não administrar

organizações, hoje chamadas, de terceiro setor? Elas também

necessitam de administração. Porque que a gente forma o nosso

aluno só para disputar emprego no mercado de capitais, para

disputar emprego em áreas de marketing em grandes corporações e a

gente não foca o aluno para outras oportunidades profissionais? Isso

começou a já ser um diferencial na minha atuação e desempenho

aqui dentro e eu comecei a introduzir discussões sobre

desenvolvimento social, sobre os problemas da exclusão

socioeconômica para disciplinas que não tinham este objetivo ou que

não tinham este foco (ACAD 1, 2013).

Agregada à sua formação profissional, a entrevistada relatou que teve a oportunidade

de oferecer projetos de consultoria através da Fundação Instituto de Administração (FIA) para

trabalhadores "boia frias" nas agroindústrias o qual “eram projetos como consultoria que

realmente faziam a mudança acontecer” (ACAD 1, 2013).

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Nessa perspectiva, ela observou-se que “não estava estudando teoria da

responsabilidade social” (ACAD 1, 2013). Como estava trabalhando com os usineiros e com

donos de indústria, mostrando a eles que, ao terem responsabilidade com os seus empregados

eles teriam mais vantagens do que desvantagens (ACAD 1, 2013), notou-se um processo de

mediação orientado para a integração de interesses o qual convergia para a sustentabilidade do

trabalho.

Esses aspectos no qual se buscava envolver abordagens de ordem mais humanística,

política e social no campo da administração foram determinantes para que o CEATS/USP se

consolidasse na Faculdade de Economia e Administração (FEA). Juntamente a esse fator,

pode-se inferir que a presença de outros atores acadêmicos interessados em compreender e

atuar nas dinâmicas do terceiro setor foi primordial para a evolução do centro de estudos.

O PEGS da EBAPE/FGV foi outro programa o qual teve como ponto de apoio as

iniciativas de seu coordenador que, oriundo de uma linha em que o mercado não era um

determinante e interessado em redirecionar as discussões da gestão pública, introduziu

“temáticas de responsabilidade social vinculada à questão da sustentabilidade, governança e

etc” (ACAD 9, 2013).

Conforme o entrevistado,

a intenção era manter aquela preocupação anterior da sociedade com

o estado, por meio da cidadania e eu pensei a mesma coisa em

relação ao mercado. Então, daí veio a ideia de criar o grupo de

estudos para a Gestão Social, em 1990. Junto a isso eu já vinha

trabalhando um projeto com comunidades aqui do Rio de Janeiro e

isso facilitou a discussão (ACAD 9, 2013).

Observa-se que a iniciativa do coordenador foi essencial para que o PEGS/FGV se

consolidasse como um programa cujo objetivo centra-se nas discussões da sociedade como

fator central nas relações com o mercado e com o Estado. “A ideia foi manter aquela

preocupação, que também é uma preocupação de outra linha de pensamento existente, como é

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o pessoal Frankqfurtiano ou próprio Guerreiro Ramos, que vai discutir a necessidade de você

pensar a sociedade determinando as demais relações” (ACAD 9, 2013).

O NEATS/PUC/SP iniciou as suas atividades com o objetivo de discutir sobre o

terceiro setor, tendo como pano de fundo a intersetorialidade. Esse aspecto vincula-se a

formação profissional do fundador e coordenador do núcleo de estudo que teve participação

em processos de políticas públicas no setor da saúde no qual desenvolveu tentativas de

integração com outras áreas do poder público. Nota-se que essa habilidade se espelhou na

constituição do núcleo de estudos que hoje abrange grupos interdisciplinares de

administradores, advogados, psicólogos, sociólogos e de praticantes do terceiro setor.

Segundo o entrevistado

O nosso grupo é aberto. Nós trabalhamos com pesquisas, buscamos

temas e financiamento. Estamos trabalhando também com editorial

interinstitucional. Estamos também participando desta questão de

Gestão Social com o grupo lá da Bahia, o observatório da Rosana.

Fizemos no ano passado, pelo NEATS, o congresso do Enapegs e

participamos do PRÓ-ADM (ACAD 6, 2013).

O outro centro de estudos e pesquisas no qual foi possível observar a importância das

dinâmicas de seu coordenador para a produção de conhecimento sobre Gestão Social foi o

NIPETS/UFRGS. Observou-se que os objetivos iniciais e atuais do núcleo de estudo e

pesquisa contemplam a trajetória de formação acadêmica e profissional da coordenadora a

qual é formada em sociologia e em administração na área da sociologia das organizações.

Orientada pela temática que envolve a construção democrática em contexto local e

internacional por perceber que as questões sociológicas no âmbito do trabalho não

conseguiam respostas, as ações do NIPETS orientam-se para fatores sociais que se relacionam

com o terceiro setor, porém de forma mais abrangente. Essa perspectiva é possível de ser

verificada no relato da entrevistada.

Ele surge no programa de pós graduação trabalhando com as questões de

inclusão social, de pobreza, desigualdade, politicas sociais e desenvolvimento

para tentar entender elementos da economia solidária por exemplo. Uma

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linha, eu diria que hoje o NIPETS está voltado para a questão da

compreensão de um lado de como se dá o processo de reconstrução e

inclusão de países de extrema precariedade, como no caso do Haiti e da

Bósnia. Como se dá a reconstrução democrática! Isso esta muito mais voltado

para a questão da democracia do que Terceiro Setor, entende? Num país

como o Haiti, que tem uma crise brutal, um país como Cabo Verde por

exemplo, um país onde se tinha pobreza mas não tinha miséria e este país

entra de uma forma assim, avalanche, no termo do capitalismo globalizado.

Como a sociedade reage? Então, é a sociedade frente ao Estado com as suas

políticas de inclusão. E aí entrando também, as agencias internacionais de

cooperação, e aí também as ONGs, super voltadas para a questão dos

movimentos sociais, mas tudo isso se articulando com o plano do local. Local

no internacional (ACAD 7, 2013).

O NUPEGS/PUC Minas e o NIPETS/UFRGS surgiram dentro de programas de Pós-

Graduação em Administração (PPGA). O primeiro deles teve forte influência, em sua criação,

da temática da ética filosófica e empresarial, que constitui um das expertises de pesquisa de

dois de seus fundadores. Convencido de que, “onde há um programa de pós-graduação tem

que haver pesquisa” (ACAD 8, 2013), convidou dois professores da PUC Minas,

caracterizados por ele como pares a fim de criarem o núcleo de pesquisa. A partir de então, o

NUPEGS/PUC Minas desenvolve pesquisa sobre responsabilidade social, sustentabilidade e

estão social.

Posteriormente, com a transformação do tema responsabilidade social para

sustentabilidade que, conforme o entrevistado “é um tema mais adequado para os fins

econômicos da empresa, ficando restrito a alguns projetos sociais e a fundações” (ACAD 8,

2013), o foco do NUPEGS/PUC Minas passou a ser sustentabilidade. Hoje, o núcleo de

estudo concentra suas pesquisas na Gestão Social em virtude da coordenação estar sob a

responsabilidade de um dos professores fundadores que detém em sua práxi acadêmica e

profissional as temáticas “sobre intersetorialidade e parcerias em prol de uma sociedade

melhor” (ACAD 8, 2013).

Apreende-se que as dinâmicas empreendidas pelos coordenadores e fundadores dos

centros de estudos e programas investigados denotam as intenções de alteração do campo da

administração por meio do combate ao tecnicismo, à noção unidirecionada relegada ao estudo

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e conceito da gestão estratégica. Tais dinâmicas se destacam nas lutas que eles estavam

empreendendo, como a criação de estudos com foco em problemas sociais e ambientais

quando ninguém ou pouquíssimos atores no campo da administração pensavam que se devia

estudar isso, bem como o reconhecimento à época da relevância da responsabilidade social

empresarial. A inserção de uma visão de estudos da administração pública voltada mais para a

sociedade civil do que para o Estado foi outro ponto a ser considerado como um

enfrentamento as abordagens tradicionais deste campo de conhecimento.

No âmbito dos praticantes, duas OSCs investigadas também apresentaram atores cuja

ação contribuiu para o fomento da produção de conhecimento sobre Gestão Social.

A CDM foi uma organização social que se despontou através de práticas que induzisse

a produção de conhecimento. De acordo com o relato do Gerente de Projetos desta

organização social sua trajetória inicial contou além da equipe de trabalho, com o ativismo de

um dos gestores da instituição que o convidou para desenvolver um setor de cartografia a fim

de delimitar as áreas de pobreza da região atendida (PRAT 1, 2013). Compartilhando a ideia

de desenvolver tal projeto, ele se dispôs a compreender o programa AUTOCAD, necessário

para a sua realização, utilizando vários manuais que tinham disponíveis. Em seguida, com a

atuação de outro agente social, de nacionalidade italiana, que veio ao Brasil a fim de

implantar o georprocessamento, o trabalho de cartografia se consolidou contribuindo para o

desenvolvimento dos projetos propostos pela OSC e para a produção de conhecimento,

mesmo que não sistematizada (PRAT 1, 2013).

Nessa vertente, vale destacar o relato do coordenador do NEATS/PUC/SP sobre o

surgimento do ENAPEGS, o qual foi induzido e mobilizado pela fundadora e coordenadora

do CIAGS/UFBA (ACAD 6, 2013). “Isso foi criado no fundo pela Tânia Fischer, pessoa que

tem uma liderança enorme. Foi ela quem começou a discutir a Gestão Social, essa rede veio

dela” (ACAD 6, 2013).

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Com o intuito de aprofundar na análise da produção de conhecimento sobre Gestão

Social na seguinte seção buscou-se observar o conhecimento que é produzido entre os atores

investigados sob a ótica que eles têm da Gestão Social a partir de suas dinâmicas

desenvolvidas neste campo.

6.3 A produção de conhecimento sobre Gestão Social: estratégia de transformação e

ressignificação do campo?

A presente tese baseia-se no pressuposto que a produção de conhecimento sobre

Gestão Social a partir das relações entre acadêmicos e praticantes contribui para a

transformação do seu campo, fomentado pela interação entre o ensino, a pesquisa e a extensão

e pelas dinâmicas que marcam a produção de conhecimento tácito, informal, local e

tradicional no âmbito dos praticantes.

A fim de responder a esse pressuposto, buscou-se analisar o conhecimento produzido

no âmbito dos atores investigados atrelado a noção que eles detêm sobre a Gestão Social,

considerando as suas dinâmicas e articulações no seu campo de atuação.

Um primeiro aspecto realçado pelos respondentes e que se julgou de extrema

relevância, por nele apresentar a base para se dinamizar as proposições que envolvem a

Gestão Social, foi a ideia de que os problemas sociais, políticos e econômicos não são de

responsabilidade de um setor ou de uma esfera só, são de todos, de modo a incidir em

soluções compartilhadas.

Essa primeira compreensão permite integrar à Gestão Social os pressupostos que

envolvem as abordagens relativas a visão intersetorial. Além dessa inferência, apreende-se

que a noção intersetorial conduz a ideia de interdisciplinaridade, devido a necessidade de

envolver campos de conhecimento diferentes, que se interagem, de forma convergente ou

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divergente, com o intuito de ampliar as possibilidades de enfrentamento às questões sociais

impostas.

Outro aspecto considerado apoia-se na perspectiva de que relacionamentos

intersetoriais expressam o poder derivado da interação dos campos em disputa, mas que se

aproximam movidos por uma lógica comum. Nesse sentido, compreende-se que a

intersetorialidade induz a alteração de posições de poder no campo ao permitir inaugurar o

discurso da parceria como melhor e desejável em detrimento do conflito entre OSCs e

empresa e das OSCs em relação ao Estado. Todavia, acredita-se que essa ideia merece um

olhar atento ao contribuir para a formação de parcerias que acabariam por fomentar uma

democracia fraca, visto que a ausência de conflito poderia suprimir o debate e o embate

presente em qualquer tipo de relação, expressando um consenso que não existe, baseado

inclusive em uma relação autoritária.

Apreende-se que esse cenário marcado pela visão intersetorial contribuiria para elevar

a habilidade social por que vai exigir que atores distintos, com racionalidades e lógicas

distintas, ao atuarem articulados entre atores de outras esferas se abririam na tentativa de

compreender a lógica de cada campo envolvido.

Destaca-se que todos os respondentes analisados apresentaram no escopo de sua

atuação relações com diversos setores sociais, implicando em ações e articulações

intersetoriais. Entretanto, buscou-se ressaltar as organizações da sociedade civil e os

programas de estudo e pesquisa que salientaram esse aspecto como primordial para o avanço

no campo da Gestão Social.

O relato do Diretor da Fundação AVSI quando questionado sobre os desafios que a

fundação precisa superar, traduziu bem essa ideia.

Novos desafios estão sendo enfrentados com o envolvimento do

setor privado no âmbito do setor social, porque cada vez mais é

necessário um trabalho onde todas essas atividades estejam

envolvidas. Não pode ser um programa só do governo ou só das

ONGs, mas sim realizadas em conjunto. Portanto o principal desafio

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é adequar a nossa organização com o ponto de vista de trabalho da

divisão das responsabilidades a este novo cenário econômico,

geopolítico, social que estamos atravessando (PRAT 2, 2013).

Nota-se que essa preocupação teve implicações no processo de gerenciamento do

conhecimento criado pela OSC entre 2011 e 2012 cujo objetivo é sistematizar em cada país de

sua atuação o conhecimento gerado a partir de suas dinâmicas e articulações sociais. Todas as

informações e conhecimento produzidos são sustentados por um centro de gestão localizado

na Itália o qual é dividido em setores, sendo cada um responsável por uma agenda alimentada

pelas diversas experiências vivenciadas nos países sede da AVSI. Além do enfoque nas

práticas vigentes em cada país, os documentos gerados, que não são manuais, apresentam

discussões e pesquisas permeadas pela experiência da organização, por exemplo, sobre como

a AVSI compreende a responsabilidade social. Segundo o entrevistado, espera-se que o

conhecimento sistematizado gere diretrizes corporativas comuns e que possam ser construídas

e compartilhadas entre todos os envolvidos e entre aqueles que tiverem interesse (PRAT 2,

2013). “Esse processo conduz a um esforço de permeabilidade do conhecimento por envolver

culturas distintas em contextos econômicos e político sempre em mudanças” (PRAT 2, 2013).

Observou-se que a tentativa de buscar conhecimentos comuns entre países com

culturas diferentes é possibilitada por fatores que se assemelham entre quase todos eles

(PRAT 2, 2013). Tal fator envolve a responsabilidade social corporativa de empresas privadas

que, ao investirem em países emergentes ou em desenvolvimento impõem diretrizes as quais

os receptores terão que respeitar seja na educação, na saúde ou em qualquer outra área (PRAT

2, 2013).

Esse relato permite inferir a presença de uma conduta hegemônica, a qual prevalece os

interesses daqueles que se encontram na situação de doador e que vai à contramão das

discussões que apoiam a Gestão Social por demonstrar não haver diálogos precedidos de

decisões deliberativas. Esse contexto aproximaria das abordagens de Santos (1997, 2004)

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sobre os dilemas da universidade contemporânea ao percebê-la como mera prestadora de

serviços de consultoria para a sociedade, para as empresas e para as OSCs, impondo por

vezes, a força de seu capital o qual se apoiaria no conhecimento científico.

No âmbito do CEATS/USP, esse aspecto não foi observado, segundo relato dos

entrevistados. Uma de suas coordenadoras exprimiu a ideia de integração entre atores de

diversos setores em prol de objetivos comuns ou paralelos, ao evidenciar uma das propostas

do centro de estudo a qual associava a visão intersetorial.

A fundadora do CEATS sempre teve uma discussão na sociologia. E

quando ela entra na Administração ela vai para o campo da gestão de

pessoas, da cultura e poder. É quando ela vê a oportunidade de

maior integração entre órgãos públicos, sociedade civil e também a

contribuição de empresas no desenvolvimento sustentável. Então, é

um campo novo que foi surgindo muito por uma observação

empírica e que foi estimulado por alguns financiamentos

internacionais que começaram a incentivar a intersetorialidade

(ACAD 1, 2013).

Nota-se que a perspectiva de integração entre diferentes setores em um campo como o

da Administração o qual é marcado por discussões e abordagens funcionalistas, implicaria em

soluções que envolveria atores de diversos setores. Em sintonia com essa proposta de atuação,

a noção expressada sobre Gestão Social comunga com os aspectos que sustentam a visão

intersetorial.

Olha, eu acho que tem um reconhecimento de que a problemática

social não é um problema de um único ator, é a reversão da pobreza.

O que é pobreza e como eu reverto situações de desigualdades é um

problema coletivo, é um problema de todos nós. Como é um

problema de todos nós, ninguém é onipotente, ninguém é dono da

solução. Então, as soluções elas partem de um trabalho colaborativo,

quem colabora com quem. Então, acho que tem o reconhecimento

do esgotamento do Estado, no sentido dele conseguir sozinho dar

conta, embora, seja premissa de um direito de você ter acesso a

educação, a saúde, ou moradia. Mas de fato, ele nasceu dessa

capacidade de provisão? Então, se é incapaz, ao invés da gente ficar

discutindo isso, por que não pensamos em como os outros atores

podem de fato contribuir para essa questão, que é também um

problema deles, não só um problema do Estado. O maior avanço que

eu vejo é de você incluir a temática de Gestão Social na pauta de

todos os atores. Assim como em atores mais alienados, como eram

as empresas, onde já há um reconhecimento que a própria

sobrevivência da empresa passa por um olhar do que esta

acontecendo no entorno, em como ela lida com os diferentes setores.

Então ela também vai procurar a dimensão do social. A gente pode

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criticar que é muito lenta e que às vezes é só superficial, mas que há

um reconhecimento de que todos devem agir, de que todos são

culpados e que todos de alguma maneira são responsáveis pela

solução há. Então, Gestão Social e a responsabilidade social são

incorporadas como um valor da sociedade (ACAD 1, 2013).

Essa visão demonstrou incidir nas atividades desenvolvidas pelo CEATS/USP o qual,

segundo a entrevistada, teve relevante participação na criação de uma rede de pesquisadores

Iberoamericana, o Social Enterprise Knowledge Network (SEKN), de iniciativa de um

professor da universidade de Harvard. “Essa rede foi muito interessante por que foi uma

forma de sair desse mundo, dessa realidade brasileira, onde os problemas são continentais,

que pouco se basta com o um único olhar” (ACAD 1, 2013).

Tal perspectiva permitiu ao CEATS/USP integrar seus trabalhos a eixos de pesquisas

orientados pelo SEKN o qual contemplava um “olhar daquilo que acontecia no Brasil

concomitantemente, direcionados para aquilo que insurgia na América Latina e que era

emergente no campo social” (ACAD 1, 2013). O primeiro eixo de pesquisa desenvolvido foi

Alianças Intersetoriais, o segundo eixo foi a Gestão de Empreendimentos Sociais e o terceiro

Negócios Inclusivos.

A fundadora e também coordenadora do CEATS/USP, ao relatar o surgimento do

centro de estudo apontou as mesmas demandas de trabalho interdisciplinar orientada para o

terceiro setor por meio de parcerias com governo e empresas locais e, posteriormente, através

da associação com o SEKN, no período de 2001 a 2002.

Destaca-se que essa associação ocorreu quando o CEATS/USP já havia acumulado

uma experiência de dez anos de trabalho com OSCs como o Instituto Ethos, o GIFE e

pesquisas realizadas para Fundação Ford, o qual lhe rendeu um patrimônio de conhecimento,

incentivando o convite da Harvard. “O propósito era contribuir na formação de um Network

de empresas que pudesse construir conhecimento sobre, inicialmente, parcerias entre

empresas com responsabilidade social e organizações sem fins lucrativos” (ACAD 2, 2013).

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Este propósito possibilitou uma pesquisa comparativa com outros países associados ao

SEKN que, por estarem trocando informações, rendeu-lhes um senso de realidade para saber

como caminha o ensino, a pesquisa e mesmo a consultoria dentro destes temas (ACAD 2,

2013).

A proposta de criação do CEATS/USP integrada a visão intersetorial demonstra

fomentar a produção de conhecimento socioprática da Gestão Social. Essa perspectiva se

baseia na articulação e produção de pesquisas as quais se desenvolveram por meio da

integração com atores de diversos setores, inclusive de outras nacionalidades e que incidiu na

ampliação do olhar acerca dos problemas sociais que não se limitavam somente aos

problemas locais. Ressalta-se que esses aspectos apenas ilustram alguns elementos que

constituem a abordagem socioprática de conhecimento a qual foi analisada pela ideia de

intersetorialidade, visão essa apontada entre todos os respondentes da pesquisa.

Outra questão relevante, segundo a fundadora e coordenadora do CEATS/USP se

traduz na compreensão da emergência gerencial tomada pelas ONGs cuja notoriedade se deu

a partir da vinculação com o SEKN, permitindo-lhes avançar nos estudos do terceiro setor e

responsabilidade social em direção ao empreendedorismo social.

Vimos isso acontecer na realidade com as organizações do terceiro

setor, tendo que se tornar autossuficientes financeiramente e, então,

começaram a se capacitar, a serem quase empresas, a terem

atividades geradoras de renda e a saber sobre receitas e etc. Ao

mesmo tempo vemos um fenômeno, que eu acho que é o mais atual

e que tem duas vertentes. Uma é o surgimento de empreendimentos

que já aparece, já são criados com finalidade socioambientais. São

empreendimentos que são empresas normais, empresas de mercado

com investidores, mas são empresas que querem gerar além do valor

econômico um valor social. A segunda vertente desse fenômeno, que

são empresas tradicionais, que estão buscando gerar algum valor

social é ter o social no próprio negocio, na própria forma de se fazer

o negócio... Esses são os fenômenos que eu considero como os mais

atuais (ACAD 2, 2013).

A intersetorialidade, enquanto elemento chave para se conduz a Gestão Social foi

observada no relato de outros atores investigados como o Diretor de Alianças Estratégicas da

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Fundação AVINA. A fim de ilustrar a sua concepção sobre as práticas intersetoriais no âmbito

da Fundação, ressaltou-se as diferentes fases de arranjos organizacionais a qual ela passou.

Na primeira etapa, o foco de ação se concentrava no indivíduo empreendedor social, o

qual a AVINA investia com o intuito de dinamizar os seus propósitos. Eram diversos líderes

sociais, cada qual, com um tema ou agenda vinculada ao desenvolvimento social, “o

importante era o perfil destes indivíduos, não tanto as agendas nas quais eles estavam” (PRAT

5, 2013).

Na segunda etapa, as ações da AVINA se direcionaram para o apoio a projetos de

rede, projetos de agendas compartilhadas com base nos territórios. Em outras palavras, ela

investia na articulação de líderes com agendas contendo alguns aspectos similares em

processos de rede. “Eram organizações que não trabalhavam com as mesmas coisas, mas se

complementavam” (PRAT 5, 2013).

A terceira etapa, empreendida no período de 2008 a 2012, focou na construção de

agendas coletivas por meio de trabalhos em rede com alcance continental. Nessa fase

procurou-se articular organizações de interesses diversos oriundas de campos diferentes como

empresas privadas, OSCs, governos, academia, movimentos de base.

A atual fase, iniciada em 2013, é denominada de AVINA facilitadora e tem o

propósito de promover a viabilização de processos de colaboração, em âmbito continental,

entre atores e organizações de interesses diversos vinculados as várias agendas temáticas

criadas pela Fundação.

A missão dessa nova fase, segundo o entrevistado é:

A partir da América Latina, implicar no desenvolvimento

sustentável, viabilizando os processos de articulação e colaboração

entre atores diversos. Agora a AVINA passa a atuar com atores de

todos os setores, porque entende que para a superação dos desafios

que nós temos não dá para dizer que a liderança vai ser da sociedade

civil, ou vai ser do empresariado, ou vai ser do governo, ou vai ser

das universidades, sinal que é necessário uma concertação de

articulação, de alinhamento entre os vários interesses e entre os

vários setores (PRAT 5, 2013).

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Ao longo dos processos de arranjos organizacionais da AVINA notou-se que na

primeira fase o foco de ação recaia no discurso e na formação de líderes individuais, mesmo

que pertencentes a setores diferentes. Infere-se que essa ação não contribuiria para formar

líderes da sociedade civil como um todo o que implicaria em uma contradição em relação à

proposta de atuar coletivamente, de transformar a realidade social a partir de várias frentes de

ação. Além disso, reproduziria um cenário, mesmo que com foco na Gestão Social, de um

ethos gerencial nos mesmos moldes das escolas tradicionais de formação de executivos, de

administradores, ou seja, foco no gestor, que teria capacidade de liderar os demais, sendo ele

sim, o foco da mudança social.

Quanto às outras etapas de atuação da Fundação AVINA, observou-se um propósito

de integração entre atores de diferentes setores com agendas similares o que se acredita ter

incidido em ações de caráter intersetorial. Nessas etapas percebe-se a presença de esforços de

transformação do campo, porém, esses esforços se dão dentro dos campos e de suas lógicas,

das características vigentes e suas relações de força, podendo representar mudanças de menor

envergadura, não mudanças mais agudas e profundas, podendo representar a continuidade de

velhos poderes dentro de um discurso de novidade.

Ainda assim, foi possível perceber nas diretrizes do desenvolvimento sustentável que

amparam a Fundação perspectivas de produção de conhecimento híbrida e multidisciplinar.

A expressão, desenvolvimento sustentável, deveria permanecer em

nossa missão, porque se percebe que na sociedade vem crescendo

uma compreensão e clareza que a promoção do desenvolvimento

sustentável depende muito de um fator, que nós não considerávamos

muito na primeira etapa, que é o fator das relações de poder. Assim,

o desenvolvimento sustentável não é compromisso só de um setor ou

de outro, ou de determinadas praticas das empresas ou dos governos,

na medida que tomam as decisões de políticas publicas. Para

promovê-lo nós temos que incidir em como as grandes decisões são

tomadas sejam no âmbito da empresa, seja no âmbito da sociedade

civil, seja no âmbito dos governos. O que a gente tá querendo dizer é

que desenvolvimento sustentável se alcança na medida em que

gerarmos bens públicos, daqueles bens que sejam acessíveis a todos

com a mesma quantidade e qualidade. Aí a gente fala da promoção

de processos de colaboração entre atores diversos que chegam ao

mesmo diálogo com interesses diversos. A AVINA entende que é

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possível quitar espaços de concertação, não de consenso, mas de

concertação. É possível conviver com certas coisas que não sejam

exatamente como eu penso e nestes espaços a gente vem entendendo

que os novos diálogos são cada vez mais estratégicos (PRAT 5,

2013).

Esse relato exprime o poder das relações entre campos diferentes que, ao se depararem

com uma demanda, caracterizada pela lógica econômica e política que não se configurou em

solução para os problemas atuais, se vêm induzidos a transformar a estrutura interna. Nesse

processo, se vislumbra atores sociais dotados de habilidade social, mas interessados em um

cooperar para um fim comum.

Alinhada à perspectiva de desenvolvimento sustentável, a produção de conhecimento

gerada pelas dinâmicas e articulações da Fundação AVINA se materializam por meio da

“capacidade de experimentação e de aprendizagem com o outro” (PRAT 5, 2013). Segundo o

entrevistado, a AVINA não tem uma área de gestão do conhecimento. Entretanto, se

“reconhece a necessidade de acompanhamento, de atenção àquilo que vai sendo gerado dos

diversos processos e pelas relações entre os vários interlocutores a fim de repensar e

reposicionar a sua prática, sua forma de contribuir, repensar o seu papel nessas relações”

(PRAT 5, 2013).

Outra forma de consolidação do conhecimento se dá por meio do apoio a publicações

de livros, cartilhas e material institucional das organizações e de empreendedores sociais

aliados. Conforme demonstra o Diretor de Alianças Estratégicas da AVINA, “a gestão do

conhecimento que é produzido por todos envolvidos, a gestão das relações, a gestão social

que a Fundação promove ou participa dela, deve ser sólida. Se ela não servir para o conjunto

dos aliados associados não servirá para a AVINA” (PRAT 5, 2013).

Esse testemunho reflete a importância que a Fundação dá as formas de produção de

conhecimento ao expressar interesse na eficiência dos serviços ofertados a seus aliados, nas

contribuições que seus aliados oferecem às agendas, no compartilhamento desses serviços e,

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em que medida isso é possível de ser aplicado em cada realidade concreta para que tenham a

capacidade de gerar o máximo de impacto (PRAT 5, 2013).

Nota-se que, o conhecimento ao ser compartilhado exprime interlocução entre pessoas,

entre setores cunhados por relações de cooperação e de competição o qual possibilita ação

reflexiva e dialógica entre os envolvidos.

O Instituto Hartmann Regueira também exerce as suas ações por meio de dinâmicas

intersetoriais. Baseado no fortalecimento do capital social e do capital humano o Instituto foca

no fortalecimento da gestão das organizações sociais já existentes de forma a fomentar a

liderança dentro das organizações. Esse trabalho que vigora a mais de oito anos, designa-se

como Projeto de Desenvolvimento de Gestão (PDG). Iniciado em organizações sociais de

Minas Gerais, hoje ele atua em doze Estados do Brasil, contabilizando cem turmas atendidas

nesse processo de colaboração.

Segundo a fundadora e coordenadora do Instituto, as organizações sociais acolhidas

têm características distintas e precisam de recursos para sobreviver que, por vezes, são

oferecidos por grandes empresas construtoras e extrativistas, cujo débito social que geram as

induz a investir nas comunidades na qual estão inseridas. Nesse processo, o Instituto

Hartmann Regueira é contratado por empresas corporativas, como o Grupo Camargo Corrêa a

fim de fortalecer a gestão e as ações sociais dessas organizações.

Outras organizações como prefeituras municipais e secretarias estaduais de governo

também se associam ao Instituto para que ele realize o PDG em instituições sociais vinculadas

ao seu quadro de atuação.

O PDG é a missão específica do Instituto. Nós fazemos consultoria

para empresa, nós fazemos consultoria para o Estado. Nós agora, por

exemplo, estamos tentando construir uma parceria com as

prefeituras para a gente apoiá-las junto as organizações sociais, por

que o Governo sozinho não dá conta, então nós precisamos ajudar.

As organizações sociais têm dificuldade de fazer a prestação de

conta da prefeitura. Então, esse tipo de trabalho é a missão do

instituto, esse é o papel da sociedade civil organizada, de fazer parte

(PRAT 7, 2013).

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Além das parcerias firmadas as ações do Instituto primam pela interação entre os

setores privados e sociais a fim de alcançar sustentabilidade que, de acordo com a fundadora e

coordenadora “esse é um processo que no Brasil está começando a se desenvolver” (PRAT 7,

2013).

Conforme o relato nota-se a compreensão sobre o papel da sociedade civil organizada

na esfera social como parte relevante no processo de integração entre diversos atores para o

desenvolvimento social. Esse aspecto agrega-se às formas de produção de conhecimento

conduzidas pelo Instituto que tem como premissa registrar e compartilhar os resultados

alcançados com os envolvidos no processo, bem como todas as outras organizações que se

interagem com o Instituto. De acordo com a entrevistada o compartilhamento se dá por meio

da web, utilizando o blog e o sítio eletrônico do Instituto como canal de discussão e troca de

experiências o qual a mesma atesta como um processo muito rico (PRAT 7, 2013).

Todas as experiências são compartilhadas. Se tem alguma parceria

com algum município, nós também avisamos para as organizações

locais daquele município para que eles entrem em contato. Quando

nós visitamos ou nós fazemos uma capacitação, nós fazemos um

coach para fazer um trabalho com as organizações no local em que

elas funcionam (PRAT 7, 2013).

Os propósitos de atuação e de produção e disseminação de conhecimento firmada pelo

Instituto Hartmann Regueira demonstram que no campo da Gestão Social há diferentes visões

sobre competências e a formação necessária a um gestor social. Para alguns, os gestores do

campo social, das OSCs devem aprender com os gestores empresariais, para outros, há uma

especificidade na Gestão Social que precisa ser respeitada. O Instituto defende o

empresariamento das OSCs, gerenciadas com as competências e ferramentas da gestão

empresarial. Nessa vertente, observa-se que o CIAGS/UFBA caminha a partir da visão que as

ações devem valorizar a Gestão Social de cada praticante como específica de cada contexto,

tentando contribuir a partir de suas demandas sociais.

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Essas perspectivas de atuação no campo da Gestão Social aponta para uma tensão ora

cunhada em aspectos contraditórios as abordagens que permeiam a Gestão Social e ora a

favor de suas especificidades, o que demonstra que a prática nem sempre é congruente com as

temáticas científicas discutidas

O relato de um dos fundadores do CEAPG/FGV sobre as parcerias que são firmadas

entre atores de diferentes organizações para a promoção do desenvolvimento social ou para

consolidação da Gestão Social corrobora com a perspectiva apresentada pela Fundadora do

Instituto Hartmann Regueira e vai mais adiante ao apresentar uma crítica que se debruça na

utilidade do conceito híbrido para essa questão.

Para o entrevistado, os aspectos que norteiam a definição de hibridismo são úteis até

certo ponto. O que está em questão é a interface entre duas espécies que são distintas sem

haver a sobreposição de uma sobre a outra (ACAD 4, 2013). Nesse sentido, ele apresenta

como exemplo as práticas organizacionais de empresas privadas e estatais ao ofertarem

“cursinhos para as organizações sociais aprenderem a preencher os formulários da prefeitura”

ou outro mecanismo de atuação que elas podem vir a ter (ACAD 4, 2013).

É aquela coisa, quero ser bonzinho e captar dinheiro da prefeitura

para a nossa empresa. Ao invés de você dizer, escuta eles tem uma

maneira de organização, porque se não, eles não estariam lá. Nós

temos uma maneira de organização, nós temos que criar um terceiro

espaço que não subordina nem A e nem B, mas que permite um

contato com A e B e que atenda as diferentes que são importantes

para eles sem perder a sua entidade. Isso é trabalhar junto, e esta é a

grande questão. Onde estão estes trabalhos (ACAD 4, 2013).

Esse aspecto foi apontado pela ex-coordenadora do setor de Responsabilidade Social

da FIEMG ao argumentar que a prestação de contas exigida das organizações da sociedade

civil parceiras de órgãos públicos e privados difere da valorização do processo de gestão. “Em

Minas tem muita tradição de verbas governamentais. Para esse governo é importante que as

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instituições prestem contas, se não ela está fora. Não interessa se ela é valorizada ou se tem

gestão para isso” (PRAT 3, 2013).

Esse argumento sinaliza relações que, mesmo demonstrando convergência, apontam

para um aspecto nefasto, a hegemonia de processos que se dizem parceiros, mas que se

configuram em aspectos de domínio de um setor sobre outro. Talvez, para essas dinâmicas

intersetoriais se efetivarem como parcerias colaborativas, devessem aferir quais são as

práticas de gestão e organização de cada parte para depois, juntos, definirem aquelas que irão

satisfazer a todos. Essa perspectiva de atuação que se configura em possibilidades limitadas

àquilo que se deseja ensinar poderia reduzir processos hegemônicos de atuação que dificultam

a transformação de um campo.

Este quadro se aproxima das dinâmicas propostas pelo Instituto Hartmann Regueira,

ainda que providas pelo desejo de desenvolvimento social por meio do fortalecimento do

capital humano e social das comunidades atendidas.

A intersetorialidade também pôde ser observada nas dinâmicas e articulações

conduzidas pelo CEAPG/FGV cuja produção de conhecimento e a noção que envolve a

Gestão Social se instituem a partir das relações que são estabelecidas entre os atores e

organizações objeto de estudo e de assistência prática do centro de estudos.

Ela tornou-se evidente no Programa de Gestão Pública e Cidadania criado em 1995,

que tinha como objetivo premiar as práticas inovadoras na gestão pública subnacionais dos

governos brasileiro. Estruturado em rede por pesquisadores em torno do Brasil, envolvendo

atores de organizações não governamentais, governos e universidades, as pesquisas se

efetivavam no local investigado, conduzidas por um roteiro de entrevista (ACAD 4 e ACAD

3, 2013). Segundo o entrevistado, o interesse em compreender o propósito e, sobretudo, saber

quais secretarias ou órgãos do governo estava envolvido no projeto, foi o elemento propulsor

para entender as dinâmicas que emergiam de suas práticas.

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A pesquisa baseada nesses argumentos demonstrou que, somente em 20% dos casos a

atividade que estava sendo comunicada a eles era realizada por uma única repartição pública

sobre o clássico “eu e o meu projeto” (ACAD 4, 2013). Nos demais 80% dos casos, havia

outras organizações públicas, organizações da sociedade civil ou ambos envolvidos nas

dinâmicas propostas.

Para o fundador e ex-coordenador do CEAPG/FGV a “necessidade demonstrada em

elaborar contatos, relações, apoios, construindo redes de relações que, mais tarde seria

reconhecido como parcerias ou coisas assim, foi o que mais chamou atenção do grupo”

(ACAD 4, 2013).

Associado a isso, outro fator destacado refere-se ao perfil das organizações da

sociedade civil parceiras dos programas ou projetos públicos.

Elas não eram as ONGs ou as novas formas organizacionais sociais

das empresas que estavam e ainda continuam interessadas nos seus

próprios projetos do que nos projetos dos outros. Elas eram

organizações locais de base, pequenas empresas como as

organizações religiosas, sindicatos e associações sindicais de

trabalhadores agrícolas, associações comerciais, de moradores e

algumas vezes as universidades locais (ACAD 4, 2013).

Mediante esse quadro, o entrevistado chama atenção para o modo como os acadêmicos

do campo da Gestão Social observam as organizações de base de fé que, segundo ele, não são

apontadas nos estudos. Para ele, essas organizações que não são de cunho religioso, mas sim,

de base composta pela fé e, que por isso, chamam as pessoas para junto, são de extrema

relevância para se compreender, por exemplo, o cenário de 1970 até os dias de hoje (ACAD 4,

2013).

Vale destacar, segundo outro professor e membro do CEAPG/FGV que, o Programa

de Gestão Pública e Cidadania detém um acervo muito grande de experiências catalogadas

provenientes de quase novecentos municípios brasileiros (ACAD 3, 2013). Sua contribuição

ancorada no conhecimento produzido se refletiria nos dias atuais no acervo virtual do centro

de estudo. Nele constam as publicações do periódico Cadernos de Gestão Pública e

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Cidadania, uma coleção de 20 experiências de Gestão Pública e Cidadania, que reúne textos

sobre as iniciativas finalistas de cada um dos ciclos de premiação, bem como livros, vídeos e

áudios, apresentando e discutindo os projetos e pesquisas realizados pelo centro.

Mediante esse aspecto, observaram-se traços de conhecimento socioprático mediado

por articulações interacionais com a realidade pesquisada. Tais conhecimentos eram

sustentados a partir do que os atores envolvidos tinham a oferecer e ao considerarem os locais

e o território de sua constituição como espaços de inovação (ACAD 3, 2013).

Destaca-se que, apesar de buscar a inovação no reconhecimento de novos saberes, em

bases não estritamente científicas, ou seja, em bases que integram ação e prática, muitas vezes

as ações, tanto de atores da academia, quanto da sociedade civil, do Estado e das empresas

resultam em produtos derivados da construção de conhecimento tradicional. Estes podem ser

observados a partir da produção de livros ou outros instrumentos que recorrem a

procedimentos tecnológicos novos como sítios e bancos de dados, mas que acaba

reproduzindo lógicas clássicas de coleta, análise, tratamento de dados e disseminação de

conhecimento.

A noção de território, assim como assinalada pelo CEAPG/FGV também circunda os

trabalhos desenvolvidos pelo CIAGS/UFBA cujas premissas abrangem a noção de Gestão

Social intercedida pelos aspectos da intersetorialidade. Conforme os dados secundários

obtidos pelo site do centro de estudo, este é um espaço no qual se busca o desenvolvimento

sócio-territorial mediante a criação de tecnologias sociais replicáveis, considerando os

conhecimentos gerados pela qualificação de gestores do desenvolvimento social, nos âmbitos

da graduação e pós-graduação.

Este objetivo prevê uma aproximação entre discentes, professores e pesquisadores da

Gestão Social com o Estado, a sociedade civil e empresas por se compreender que o

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desenvolvimento territorial e da Gestão Social estão referenciados a um território que, por sua

vez, expressa a construção cultural (ACAD 10, 2014).

Nesse sentido, a fundadora e coordenadora do CIAGS/UFBA apresenta o quadro de

atuação do centro, mediante um exemplo vivenciado por ela no qual relata a sua relação com

o mundo do Estado, das políticas públicas, dos moradores líderes de comunidades baianas,

das empresas privadas e dos alunos que os compõem, traduzindo-os em “praticantes e

interlocutores que alimentam o centro” (ACAD 10, 2014).

Eu tive uma reunião hoje de manhã com a prefeitura de Salvador,

com pessoas que representam as secretárias, o secretário adjunto, o

da administração e com outro grupo que esta trabalhando com a

recuperação de espaços públicos, como as praças, especialmente

aquelas que estão próximas das igrejas e dos terreiros de candomblé.

Bom, depois eu estive em uma reunião com o secretário de

administração que discutiu comigo a entrada da cidade de salvador

no mestrado que oferecemos. Bom, ontem nós tivemos contato com

esses representantes das prefeituras do interior. Ao mesmo tempo,

teremos amanha e depois, outro encontro para um projeto que

estamos desenvolvendo que é agitação de base a pedido da Caixa

Econômica Federal para os Programas Minha Casa Minha Vida que

vai ser uma escola digital para jovens que não estudam e nem

trabalham. Nós vamos até lá nos relacionarmos com os praticantes

de um desses empreendimentos. Lá estarão os jovens, os líderes,

dentre estes líderes você tem cinco pastores que se uniram para

tentar conter o que é um certo crescimento de lideranças

inconvenientes em todos os sentidos, em todo espaço público.

Enfim, nós vamos fazer uma primeira reunião com eles. Então, eu

diria que considero praticante todos esses atores que nós nos

envolvemos (ACAD 10, 2014).

Nota-se que as dinâmicas e articulações que sustentam o CIAGS/UFBA vigoram em

bases multidisciplinares de interlocução intersetorial, evidenciadas por preceitos sociais que

se desdobram por meio dos conflitos territoriais e atuais.

Essa perspectiva demarca a compreensão que o centro anuncia sobre a Gestão Social,

amparada pela noção que ela “não é a gestão da exclusão ou da pobreza, ela é a gestão da

sociedade, e que precisa ser resignificada conforme as demandas contemporâneas. Por isso é

chamada de social” (ACAD 10, 2014).

A Gestão Social não é um voto ou um adjetivo que dure para

sempre. Quando ele não for necessário, ele cai. Então, na verdade, a

gestão social é um circunstancia. A não ser que a gente esteja

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absolutamente sempre sensível às novas demandas da gestão e da

sociedade. É um problema não pensado e é um problema social,

temos problemas novos. Estamos hoje com essa dificuldade de

relacionamento mais sensível com os novos problemas da sociedade

e pela a sociedade. Como que a sociedade se gere? E como é que nós

pensamos nos diferentes territórios que constituem a sociedade tanto

físicos, quanto virtuais (ACAD 10, 2014)?

O NIPETS/UFRGS também agrega em seu plano de atuação a ideia de transformação

dos problemas sociais, configurada por tensões que vão se alterando a medida que a sociedade

vai evoluindo. Segundo a coordenadora do núcleo de estudos, hoje os questionamentos

envolvem discussões sobre movimentos sociais e não mais sobre orçamento participativo. “As

coisas vão se modernizando, antes se trabalhava com pobreza e agora com a desigualdade”

(ACAD 7, 2013).

Tal compreensão corrobora com as proposições apresentadas por Cançado et al (2013)

ao sustentar as categorias temáticas que envolvem a Gestão Social pela ótica da dialética

cujos fundamentos baseiam-se no modo de se pensar as contradições da realidade que estão

em permanente transformação. Em outras palavras, o construto Gestão Social, caminha na

incongruência do sistema hegemônico.

O PEGS/FGV ao ser instituído como um programa no qual se discute as relações da

sociedade com o Estado e com o mercado por meio da cidadania, propõe, enquanto base

epistemológica, a interdisciplinaridade. Suas dinâmicas e articulações derivadas desse aspecto

se efetivam em campos de conhecimento distintos à Administração o que enuncia relações

múltiplas entre setores da esfera social.

O relato do fundador e coordenador do programa elucida essa ideia ao significar a

Gestão Social a partir de dimensões amplas e interdisciplinares por entender que, como ela se

apoia na sociedade que é múltipla, somente um campo de conhecimento não conseguiria

discuti-la em sua totalidade (ACAD 9, 2013).

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Associado a esse princípio, o entrevistado aborda algumas questões críticas sobre a

visão limitada desenvolvida por alguns acadêmicos sobre a Gestão Social. Para ele, quando as

pessoas discutem a questão social permeiam muito a linha do assistencialismo, do terceiro

setor com preocupações direcionadas às políticas públicas. “Quando discutimos Gestão Social

no grupo, desde a década de 1990, é feito numa linha da democratização das relações sociais.

O assistencialismo, as políticas públicas e o terceiro setor fazem parte, mas o fundamento é

que o social parte da interação das pessoas” (ACAD 9, 2013).

A partir dessa ideia sobre Gestão Social, o programa desenvolve alguns projetos

apoiados pela lógica de conhecimento socioprático. Um deles é financiado pela CAPES e é

denominado de Gestão Social e Prática cujas dinâmicas operam em parceria com outras dez

universidades para o desenvolvimento do tema “Território de Cidadania” (ACAD 9, 2013).

Há o projeto que realiza um laboratório de transferência de tecnologia social junto a algumas

comunidades do Rio de Janeiro. Neste há curso direcionado para a gestão comunitária e

sustentabilidade. Há também outro destinado a formação de conselheiros municipais. Além

dessas iniciativas, acrescentam-se as publicações de livros e artigos científicos (ACAD 9,

2013).

A perspectiva de se discutir as relações entre sociedade, Estado e mercado, como

sendo o cerne da Gestão Social também norteia os trabalhos desenvolvidos pelo

NIPETS/UFRGS.

Segundo a fundadora e coordenadora do núcleo de estudo os temas abordados

concentram-se na reconstrução da democrática local e global para o estudo da reação da

sociedade frente ao Estado e as suas políticas de inclusão vinculadas a agências internacionais

de cooperação, as ONGs e aos movimentos sociais.

Para ela, a lógica social relaciona-se a uma situação global de problematização da

democracia que se conecta com a questão da governança a qual a mesma questiona as

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possibilidades de se estudar diferentes atores. “O nosso debate é realmente de sociologia

política, sempre voltada para o local” (ACAD 7, 2013).

Apreende-se que esse depoimento vigora nas linhas de pensamento dos outros atores

investigados e citados, principalmente os coordenadores do CIAGS/UFBA e do PEGS/FGV

os quais desenvolvem uma abordagem sobre Gestão Social proveniente das situações locais,

dos territórios integrados aos aspectos sociais de ordem democrática. Nesse eixo, observam-se

processos que demandam a práticas intersetoriais que, por sua vez, remete a

interdisciplinaridade, a saberes híbridos os quais merecem especial atenção para não serem

conduzidos sob a ótica hegemônica, assim como proferiu o fundador do Programa de Gestão

Pública e Cidadania do CEAPG/FGV.

O GIFE, que tem como finalidade o investimento social, desenvolve também suas

atividades sustentadas pela a ideia da intersetorialidade. Essa afirmativa deriva das formas de

atuação que o grupo efetiva no âmbito da responsabilidade social e que se traduz na sua

concepção e na produção de conhecimento.

Segundo a coordenadora da área de Gestão de Conhecimento, o tema responsabilidade

social advém de um movimento antigo, que ficou forte e evidente na década de 1990. Sua

influência incidiu no fortalecimento da sociedade civil organizada a qual teve um papel claro

e determinante vinculado a questionamentos, a reivindicações de cunho social (PRAT 8,

2013).

A tentativa era de chamar a atenção das empresas, mostrando que

elas eram também responsáveis pelas mudanças, pelas

transformações sociais, econômicas e políticas. Não era só o Estado

responsável pelos problemas sociais, mas as empresas também. A

partir daí iniciaram-se diversos movimentos sociais, o GIFE é um

sintoma disso (PRAT 8, 2013).

Além do aspecto relativo a sua constituição, destaca-se o conhecimento produzido

pelo grupo que se atribui à articulação entre diversos atores e que se consagrou em 2010 como

o ponto vital da organização (PRAT 8, 2013).

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De acordo com a entrevistada, o GIFE apresenta uma série de iniciativas para a

socialização e disseminação das experiências e conhecimentos relativos ao investimento

social dos associados. Tais iniciativas se traduzem em projetos realizados regularmente, como

uma pesquisa que se realiza a cada dois anos para se analisar a histórica evolução do

investimento social no Brasil e traçar tendências. A partir desta pesquisa gera-se uma série de

materiais que são disponibilizados pela Web. São artigos produzidos a partir de dados

derivados de pesquisas quantitativas e qualitativas extensas, relatórios e um senso com dados

específicos e atuais dos associados do GIFE (PRAT 8, 2013). “Espera-se que a base do

conhecimento possa ser expandida para outras organizações e outras pessoas” (PRAT 8,

2013).

A partir do exposto e, conforme dados oriundos do sítio eletrônico da organização,

observou-se que as tendências traçadas por se tratar de experiências práticas provenientes das

empresas associadas esboçam interesses que são comuns a elas, traduzindo-se em dinâmicas

que têm como eixo central a empresa doadora. Esse aspecto exprime as disputas entre campos

diferentes os quais revelam a hegemonia das empresas investidoras sobre as instituições e

comunidades receptoras, manifestando-se em limites para a ampliação e consolidação da

Gestão Social.

De constituição e natureza similar, o Instituto Camargo Corrêa também exprimiu

perspectivas de atuação uni direcionada ao exercer o papel de investidor social alinhado aos

negócios do grupo empresarial. Esse propósito partiu do pressuposto de se potencializar todo

o conhecimento existente dentro da empresa para atender as demandas das comunidades

envolvidas (PRAT 6, 2013), elevando assim, a supremacia do seu conhecimento sobre os

demais em prol dos interesses dos negócios do grupo e não das comunidades na qual se

inserem.

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Congruente a isso e, em sintonia com as preocupações expressadas pela Coordenadora

de Gestão do Conhecimento do GIFE, a compreensão sobre responsabilidade social anunciada

pelo diretor do Instituto denota inquietações acerca da necessidade das organizações privadas

se posicionarem mais próximas da sociedade civil.

Eu acho que a responsabilidade social como um todo é um tema que

cada vez mais está presente do dia-a-dia das empresas né. O

Instituto, dentro desse guarda chuva maior da responsabilidade

social, cuida do chamado investimento do social privado que é mais

a relação com as comunidades próximas da empresa. Então a gente

percebe uma evolução muito grande no sentindo das empresas

perceberem cada vez mais o valor do investimento social até para

próprio negocio (PRAT 6, 2013).

Segundo o diretor do Instituto, todos os projetos são criados e desenvolvidos, bem

como monitorados e avaliados de forma interativa por meio de um portal. Porém, não foi

possível observar se essa interação é de fato efetivada com a participação das comunidades e

nem como se processa essa participação.

Quanto à produção de conhecimento, esta é fomentada a partir do processo interativo

via portal eletrônico e ação direta nas comunidades o qual é difundido por meio de uma

revista trimestral que apresenta os quatro programas desenvolvidos pelo Instituto (PRAT 6,

2013). “Há uma tiragem de cerca de dez mil exemplares que circulam tanto internamente

quanto externamente. Então, é uma forma da gente difundir um pouco mais e criar a cultura

de investimento social nas empresas” (PRAT 6, 2013).

Nota-se que esse processo de construção coletiva, agrega possibilidades de

conhecimento socioprático por promover uma interação mediada por diversos interlocutores e

suas disposições sociais, entretanto, essa perspectiva pode ser minada se prevalecer os

domínios decorrentes das proposições e dinâmicas do Instituto.

A noção de Gestão Social expressada pelo coordenador do NEATS/PUC/SP se

debruça na visão intersetorial e interdisciplinar as quais envolvem ideia de coletividade. Para

ele a Gestão Social é todo processo de trabalho na área social com o objetivo de coletividade

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(ACAD 6, 2014). Entretanto, destacou que, apesar da saúde, educação e outros setores

desenvolverem trabalhos direcionados para os mesmos grupos de atores, estes são elaborados

e efetivados isoladamente por meio de programas e projetos diferentes (ACAD 6, 2014).

O fundamental é o coletivo e pra mim política pública é isso, política

social é isso, então você não pode falar que não tem a gestão. O que

é gestão? É você mobilizar recursos para conseguir agir e trabalhar

neste social. A questão pública ela se caracteriza por lidar com o

coletivo, o bem público. Isso não vai ser outra coisa. O social é

complexo, gerenciar isso é também difícil. Então, você tem que

gerenciar e mobilizar para que as pessoas tenham uma qualidade de

vida e isso passa pela forma que você olha a realidade e lida com

ela. Isso é uma questão fundamental, o coletivo social é o que

interessa, a realidade social é o que interessa e, ser social é ser

complexo (ACAD 6, 2013).

Conforme o relato nota-se que a intersetorialidade se traduz como um meio de

expressão dos interesses sociais, os quais podem ser dinamizados pela mobilização de

recursos dotados de habilidade social. Porém, o envolvimento de atores de diferentes setores

com diferentes saberes para causas comuns não significa em integração. E este aspecto,

segundo o entrevistado, decorre da complexidade das relações sociais.

Adotando o princípio da coletividade, o conhecimento produzido pelas dinâmicas de

trabalho do núcleo de estudo é aplicado em projetos direcionados ao terceiro setor de forma

interdisciplinar. Como exemplo, ele cita um projeto concebido a partir de um edital do

Ministério da Justiça no qual houve uma ampla integração entre o pessoal do Direito e da

Administração, implicando em uma vasta repercussão (ACAD 6, 2014).

O nosso grupo é aberto. Nós trabalhamos com pesquisas,

buscamos temas e financiamento. Estamos trabalhando

também com editais interinstitucionais e participando desta

questão da Gestão Social com o grupo do observatório da

Rosana, na Bahia. Fizemos no ano passado, pelo NEATS, o

congresso do ENAPEGS e participamos também do Pró-

ADM, que foi mais com o pessoal da Administração porque

ele é mais administração (ACAD 6, 2013).

O entrevistado também mencionou um curso de extensão ofertado pelo núcleo de

estudo que é uma especialização direcionada a projetos sociais e organizacionais para o

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terceiro Setor cuja relevância o conduziu a formação de sete turmas. Há outras iniciativas no

âmbito da extensão que são cursos menores de 20 horas e 60 horas para o campo das políticas

públicas e para a educação destinada à sustentabilidade, bem como um curso chamado

Introdução ao Terceiro Setor, de 40 horas, o qual é realizado aos sábados em parceria com o

grupo comunitário da PUC/SP (ACAD 6, 2014). “Este é o nosso forte, os cursos de

formação” (ACAD 6, 2014).

Observou-se que a intersetorialidade também permeia as dinâmicas do IPÊ ao

desenvolver atividades guiadas pelo modelo IPÊ de Conservação que tem na base o que eles

chamam de Programa Integrado de Conservação e Desenvolvimento. É um modelo de ação

integrado que inclui pesquisa de espécies ameaçadas, educação ambiental, restauração de

habitat, envolvimento comunitário com desenvolvimento sustentável, conservação da

paisagem e envolvimento comunitário com desenvolvimento sustentável, conservação da

paisagem e envolvimento em políticas públicas. O propósito é combinar desenvolvimento

regional com a conservação da biodiversidade (PRAT 4, 2013).

Esse modelo surgiu com base nas experiências dos anos de trabalho que, segundo o

fundador do instituto, iniciou com a pesquisa de campo onde eles atuavam seguidos pela

formação das pessoas envolvidas por meio da oferta de cursos curtos. Entretanto, essas

dinâmicas não se traduziam na solução para a conservação da fauna e flora brasileira. Para o

entrevistado, havia presença de outras variáveis que se exprimiam na ação humana e não só

no conhecimento sobre biodiversidade (PRAT 4, 2013).

A partir dessa constatação, as atividades do instituto passaram a aglutinar

conhecimentos biológicos com educação ambiental na expectativa de envolver as pessoas no

processo com foco na mudança do comportamento para a conservação da natureza (PRAT 4,

2013). Porém, essa iniciativa também não foi o suficiente, se estendendo, de forma integrada

a economia regional, as necessidades do território e das paisagens que, por outro lado,

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demonstrava a relevância do governo na elaboração das políticas públicas, as quais passaram

a ser foco de intervenção na tentativa de influenciá-las a favor dos territórios naturais e sociais

(PRAT 4, 2013). De acordo com o entrevistado,

isso virou um gráfico que parece uma cebola, que tem a

biodiversidade na base e vai crescendo para o habitat, educação

ambiental, economia regional e paisagem e políticas públicas. De

um lado tem envolvimento comunitário e do outro lado tem

pesquisa. Este gráfico ficou apelidado de Cebolão do CP, mas na

verdade, por muitos anos ele virou o nosso modelo de conservação,

que hoje nós expandimos para vários locais do Brasil (PRAT 4,

2013).

No âmbito da produção de conhecimento, notou-se que o histórico do instituto

contribuiu de forma determinante para a práxis de sua atuação, o qual demonstra preocupação

com o compartilhamento do conhecimento adquirido em suas pesquisas. As informações

constantes em seu sítio eletrônico corroboram essa ideia ao divulgar os trabalhos acadêmicos

e práticos oriundos do Centro de Biologia da Conservação (CBBC) e da Escola Superior de

Conservação Ambiental e Sustentabilidade (ESCAS), universidade criada em parceria com a

Natura e Instituto Arapyaú.

Destaca-se que essa universidade, sediada em Nazaré Paulista junto ao IPÊ, dispõe de

mais de trinta cursos de curta duração, MBA em Gestão de Negócios Socioambientais e

Mestrado Profissional em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento Sustentável.

Por ano, seus cursos são responsáveis pela capacitação de cerca de 500 pessoas do Brasil e

exterior, oferecidos na sua sede, em sedes de parceiros ou ainda in company.

Mas, o que mais chama atenção é a “geração de conhecimento com espírito aplicado e

independente em relação às tentativas de inovação” (PRAT 4, 2013). Este propósito

fundamenta-se na perspectiva que o mundo das organizações socioambientais sofre influencia

das grandes organizações internacionais que, são em geral, as criadoras de inovação e que

dominam, em certa medida, o cenário cientifico e de governança, criando padrões de

conservação da biodiversidade (PRAT 4, 2013).

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Se você não é um criador, você acaba sendo um aplicador de padrão

e isso te põe em uma situação de não ter poder decisório. Nós

compreendemos isso há muitos anos atrás e fazemos um esforço

grande para não nós deixarmos levar pelo canto da seria e não

virarmos um prestador de serviço para ganhar dinheiro com isso e

perder o poder, ainda que pequeno para se criar novos modelos

(PRAT 4, 2013).

Nota-se que essa preocupação expressa uma tentativa de superação aos desafios

institucionais vivenciados pelas universidades contemporâneas cuja autonomia precede o

modelo desenhado pelo mercado e pelo campo organizacional no qual se está inserido. Ao

propor a geração e aplicação do conhecimento produzido entre academia e comunidades afins,

além de ressignificar o conhecimento científico, este demonstra ser legitimado por todos os

envolvidos.

Conforme o entrevistado, hoje a atuação do IPÊ se dá a partir de três braços. O

educacional e, considerado por ele, como “o mais forte”, um de ação no modelo IPÊ de

conservação da biodiversidade e outro que é o dos negócios (PRAT 4, 2013).

O envolvimento do IPÊ com este último braço se apoia em negócios sustentáveis ou

no “business sustentável”, o qual é desenvolvido por uma empresa prestadora de serviços com

o intuito de “gerar negócios que rendam recursos para as comunidades locais, transformando

as externalidades negativas da economia em positivas” (PRAT 4, 2013).

A perspectiva intersetorial, observada como um meio para se exprimir as dinâmicas da

Gestão Social, carrega em seus preceitos noções de interdisciplinaridade por supor a interação

entre conhecimentos distintos e constituídos por saberes múltiplos gerados por distintos

atores. A noção interdisciplinar, apesar de ter sido evidenciada no âmbito das dinâmicas e

proposições dos grupos de atores investigados foi considerada por alguns acadêmicos como

um desafio a ser superado ao enfatizar a necessidade de se reconhecer a concepção da Gestão

Social atrelada a outros campos de conhecimento. Além disso, a noção da Gestão Social

desenvolvida na prática foi outro aspecto crítico relatado por alguns praticantes investigados,

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os quais demonstraram haver uma inconformidade do termo com a prática. Essas percepções

são apresentadas na sessão seguinte.

6.3.1 Concepções críticas que permeiam a noção sobre Gestão Social

A constituição do campo da Gestão Social, segundo o fundador e ex-coordenador do

CEAPG/FGV pouco se considera as organizações de base de fé. Para ele há um déficit

coletivo em termos de conhecimento sobre o tema no âmbito da grande rede ENAPEGS, pois

as pessoas já identificaram as organizações cultuadas como base para se estudar o fenômeno.

Os estudos foram feitos, mas não foi capturado coletivamente o

suficiente das massas dessas organizações para intervir de alguma

maneira. Nós estamos com uma agenda que só focaliza as

organizações de Gestão Social e os novos tipos de organização com

uma agenda que está apoiando os contornos da sua intercessão com

o Estado. Então, essa agenda de investigação me preocupa” (ACAD

4, 2013).

A fundadora e coordenadora do CIAGS/UFBA traça uma ideia paralela ao expor a

noção de Gestão Social aplicada pelo centro de estudos. Ela destaca que o tema era discutido

e dinamizado nos primórdios da história do Brasil pela igreja católica. As instituições

internacionais também tiveram papel importante neste cenário, bem como os movimentos

sociais dos anos de 1980 e 1990 que se consagraram como antecedentes práticos e

acadêmicos (ACAD 10, 2014). “Então eu diria que nós não antecedemos, fomos uma geração

intermediária, temos que reconhecer os que nos antecederam e que isso não é invenção nossa”

(ACAD 10, 2014).

Essa visão, segundo a coordenadora do centro de estudos se expande para as

abordagens que envolvem a responsabilidade social que, uma vez mais ampla, mais

territorializada, implicando em relações sociais que vislumbram individuo e sociedade, grupos

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sociais, sociedade-sociedade, se constitui na Gestão Social (ACAD 10, 2014). Para ela, “o

momento atual compreende uma revisão de rumos no qual se observa uma polissemia, pelo

fato das pessoas compreenderem a Gestão Social de maneiras diferentes” (ACAD 10, 2014).

Outra perspectiva crítica acerca da compreensão que os atores acadêmicos detêm sobre

a Gestão Social deriva do campo da Administração e que é salientada pela coordenadora do

NIPETS/UFRGS. Sua percepção dialoga com o campo da Administração decorrente da

experiência de desenvolver temáticas sobre Gestão Social no âmbito de uma escola de

Administração centrada no bussiness. Segundo ela, um curso oferecido nesta escola fora do

eixo empresarial era denominado de Administração Pública e Gestão Social, mas não era

reconhecido como um curso novo e no diploma o título conferia habilitação em

Administração. “Hoje a escola é constituída de profissionais de várias áreas como a

psicologia, a antropologia a matemática, mas digamos que quem está no poder é o pessoal da

ANPAD” (ACAD 10, 2013).

Para a entrevistada, as temáticas que circundam a Gestão Social já emergiam na

discussão sobre desenvolvimento local e sobre políticas públicas os quais foram fomentados

no NIPETS/UFRGS pelos estudos oriundos da metodologia de ensino denominada Residência

Solidária (ACAD 10, 2013). Entretanto, para o campo da Administração, essa discussão era

algo estranho por associar ciência política e estudar pobres. A

questão da vulnerabilidade social não cabe na escola bussiness. Na

administração tem vários nichos, então alguns se reúnem, foi a

minha visão, mas me preocupa a Gestão Social, porque de modo

geral é uma discussão que nasce dentro da administração. Tem que

entrar profundamente na sociologia e antropologia, com o método,

tem que entrar o sujeito da psicanálise e isso me preocupa porque

não acontece na administração! Isso me preocupa muito (ACAD 10,

2013).

O coordenador do NEATS/PUC-SP evidenciou o mesmo dilema ao relatar o início dos

trabalhos envolvendo a Gestão Social no curso de Administração na PUC/SP os quais lhe

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renderam críticas como: “que absurdo eu ouvindo sobre voluntariado e terceiro setor aqui na

PUC! Eu fui quase rechaçado” (ACAD 6, 2013).

A coordenadora do NIPETS/UFRGS exprimiu outra preocupação relativa a concepção

da Gestão Social ao considerar que não há teorias profundas para se formar um campo de

conhecimento. Para ela a “Gestão Social tenta abraçar tudo sem ter uma construção teórica

robusta para dar conta realmente de tudo que é proposto. O que falta é um olhar integrado”

(ACAD 10, 2013).

Tal preocupação também se evidenciou no relato do Fundador do CEAPG/FGV ao

afirmar que a Gestão Social traz consigo uma “discussão bastante confusa” (ACAD 4, 2013).

Segundo ele, há integração com os aspectos relativos ao social, com intercessões entre a área

pública e outras organizações que estão presentes em suas dinâmicas e vice-versa (ACAD 4,

2013). “O que acontece é que nós ficamos em terrenos minados com opiniões e nós não

somos capazes de analisar mais claramente o que é viver nestes espaços diferentes. Pode falar

hibrido, mas é muito diferente de como você faz isso acontecer efetivamente” (ACAD 4,

2013).

Para o coordenador do NEATS/PUC-SP, o conhecimento científico que é produzido

no Brasil se debruça muito na palavra Gestão Social. Ele cita como exemplo a compreensão

que lhe é conferida tomando como pressuposto as ideias de Habermas baseadas na

racionalidade substantiva e nas relações permeadas pela participação deliberativa. Essa

perspectiva “desqualifica a gestão que é estratégica”, afastando a Gestão Social do campo da

Administração (ACAD 6, 2013).

No campo dos praticantes notou-se que a noção crítica acerca da Gestão Social recaiu

sobre a ideia equivocada que os atores deste campo formam sobre o terceiro setor. Observou-

se também que o termo Gestão Social não é utilizado por eles como forma de expressão e de

descrição dos processos, dinâmicas e articulações desenvolvidas em suas práticas.

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171

Nessa vertente, destaca-se o relato do Coordenador da Fundação AVSI, que aponta no

Brasil uma visão amadora sobre o terceiro setor ao ser configurado como um grupo de

pessoas que se une para atuar respondendo as necessidades específicas dos cidadãos. Para ele,

até certo ponto, está perspectiva se comprova pelo fato de existirem ONGs que ainda

precisam incluir nos seus processos elementos que aumentem a eficácia dos seus recursos.

“Não basta ter só boa vontade para fazer algo de boa qualidade” (PRAT 2, 2013). Outro

aspecto observado pelo entrevistado se debruça na imagem que a sociedade civil detém sobre

o terceiro setor ao relacioná-lo a problemas de corrupção do governo ou de outras instituições.

Elas também são notadas como um instrumento que vai resolver algo que o setor público não

consegue responder. Esta concepção não é compartilhada pelos propósitos que sustentam a

Fundação AVSI o qual salienta que cada sociedade exige certa eficiência (PRAT 2, 2013).

O Diretor de Gerenciamento de Projeto da CDM apresentou uma percepção critica

paralela ao do Coordenador da Fundação AVSI sobre a noção que os praticantes do campo do

terceiro setor detêm sobre ele que, inclusive, é assinalada pelos técnicos da CDM.

O que eu ouço muito, inclusive dos nossos técnicos é que a

gente precisa sempre estar fazendo uma conversão, é que o

terceiro setor sempre existe onde o Estado não esta

presente. E esse é um equivoco que eu tento sempre

combater porque o terceiro setor ele é uma expressão

legitima da sociedade. Assim como a iniciativa privada

parte de uma necessidade, de uma pessoa, o terceiro setor

também percebe essa necessidade e ele não faz disso

necessariamente uma atividade lucrativa, então eu acho que

esta é a diferença entra a iniciativa privada e o terceiro

setor.

Sua percepção sobre o terceiro setor no Brasil remete a uma desorganização e

desarticulação da sociedade civil, pelo fato de não haver nenhuma entidade expressiva que o

represente. O entrevistado citou o GIFE e a ABONG como organizações pouco significativas

em se tratando do número de ONGs que há no Brasil. Ressaltou também que as organizações

que compõe a ABONG operam mais no âmbito das lutas por direitos humanos do que no da

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educação. Para ele o setor é pouco valorizado, mesmo nos centros de pesquisa universitários

que, de uns anos para cá, iniciaram uma discussão sobre o campo (PRAT 1, 2013).

As possibilidades de produção de conhecimento gerada pela CDM foi outro desafio

apontado pelo Coordenador o qual envolve a sistematização e a difusão dos resultados

provenientes dos trabalhos desenvolvidos pela a organização entre as suas equipes.

Nós temos projetos em áreas separadas com equipes específicas.

Para fazer esse conhecimento se tornar um conhecimento transversal

para todos é algo muito difícil porque não parte da necessidade das

pessoas. Em determinados projetos elas não tem, necessariamente,

essa necessidade de aprender a respeito dos outros projetos que a

gente envolve, estão muito mais empenhadas em desenvolver

atividades livres. Então, fazer as pessoas também participarem do

patrimônio intelectual da CDM é um desafio gigante para a gente

(PRAT 1, 2013).

Observou-se que o dilema relativo à qualificação dos profissionais que atuam no

campo do terceiro setor é outro desafio vivenciado pela OSCs. Conforme o entrevistado, “a

retenção de talentos é muito difícil, por que para retê-los é necessário seguir uma lógica de

remuneração do mercado e isso, por vezes, inviabiliza a permanência de pessoas importantes

no quadro profissional da CDM” (PRAT 1, 2013).

Além dessas percepções críticas relativas à noção sobre Gestão Social outra

abordagem foi evidenciada por um acadêmico cuja perspectiva decorre do termo

responsabilidade social empresarial e sustentabilidade.

Segundo o ex-coordenador do NUPEGS/PUC Minas, a temática da responsabilidade

social empresarial orientava as discussões iniciais do núcleo de pesquisa. Nesse contexto, o

entrevistado apontou duas percepções sobre a compreensão que a comunidade academia havia

desenvolvido sobre a responsabilidade social. A primeira é que o conceito estava sendo

construindo de forma genérica, não acompanhando a percepção das pessoas. A noção sobre

“responsabilidade social foi crescendo do ponto de vista conceitual, muito influenciado pelo

Instituto Ethos que, na época era uma referência utilizada para esse diálogo” (ACAD 8, 2013).

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Dessa forma, o conceito caminhou para a ideia que a empresa deveria ser responsável

por todos os stakeholders, abrangendo uma dimensão ética. Entretanto, a atuação da empresa,

conforme dados científicos, não envolvia todos os stakeholders e não envolvia a questão ética,

que está em outro patamar (ACAD 8, 2013).

De acordo com a percepção do ex-coordenador do núcleo de pesquisa, a academia

estava contribuindo para as empresas usarem o conceito que era ideológico.

a empresa faz algo parcial num setor que traz para ela um marketing

para a marca dela, ou um setor que esta ligado ao negocio dela.

Então ela consegue se apropriar, agregar valor a esse investimento

social, dando a entender que toda empresa ética faz isso, o conceito é

amplo. Então, tem a dificuldade enorme de comunicação, por mais

que a gente usasse esse conceito, na pratica ele não era esse. Havia o

uso ideológico do conceito pelas empresas de uma maneira (ACAD

8, 2013).

Essa perspectiva contribuiu para desenvolver no entrevistado uma visão crítica em

termos teóricos sobre a responsabilidade social cuja definição remonta de uma tradição

epistemológica consequencialista, ou seja, “quem é responsável por definição é quem

responde por seus atos, então, ser responsável é arcar com as consequências dos seus atos, é

responder por” (ACAD 8, 2013).

Outra influência apontada por ele remete a um conceito discutido pela literatura

internacional a qual o associa a sustentabilidade. Este conceito nasce com a preocupação das

consequências da atuação empresarial e industrial, na natureza, na população e na economia,

com o princípio de adesão social (ACAD 8, 2013). Em outras palavras, essa noção indaga

“como ganhar dinheiro preservando o meio ambiente, promovendo o bem social”. Na visão

do entrevistado o termo sustentabilidade é mais interessante” (ACAD 8, 2013).

A perspectiva da sustentabilidade enquanto fator crítico foi um quesito apontado pelo

fundador e coordenador do IPÊ ao ser questionado sobre como as organizações da sociedade

civil compreendem a gestão socioambiental. Conforme explicitado por ele, “na vida tudo

segue uma espécie de moda que vem de padrões internacionais criadas por algumas

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organizações e grupos de grande expressividade, como o Banco Mundial o qual exprime uma

grande influência no âmbito socioambiental” (PRAT 4, 2013). O entrevistado ainda ressaltou

que as influências se associam às possibilidades de captação de recursos, sendo este um dos

interesses primários destes órgãos (PRAT 4, 2013).

Outras perspectivas relativas à responsabilidade social foram observadas, porém,

oriundas do campo dos praticantes. A ex-coordenadora do setor de Responsabilidade Social

da FIEMG traçou algumas considerações acerca da compreensão que as organizações da

sociedade civil no Brasil têm sobre a responsabilidade social, possibilitando inferir que há

uma polaridade em termos geográficos e culturais.

Segundo a entrevistada, há uma diferença do que é responsabilidade social em São

Paulo e em Minas Gerais.

Em São Paulo as instituições sociais construíram uma

relação, uma aliança com as empresas. Houve um

crescimento nesse sentido muito fomentado pela

universidade, podendo citar o CEATS/USP com a

profissionalização do terceiro setor, fortalecendo o seu

conhecimento. Essa foi uma união entre empresas,

organizações da sociedade civil e universidade que

aconteceu de forma muito forte na cidade e que ajudou a

quebrar a distância entre eles. Lá as organizações são vistas,

são reconhecidas, são referências, a mídia procura, as

universidades procuram, as empresas procuram, essa

relação é diferente, ela está estruturada, ela se posiciona

(PRAT 3, 2013).

Sua percepção sobre as organizações sociais de Minas não aponta relações

intersetoriais, visão e prática destacada como relevante pelos atores entrevistados por esta

pesquisa. “As mobilizações são entorno de temas que são trabalhados em um determinado

período, mas não há interesse de nenhuma parte que isso se torne uma coisa grande, que tenha

sustentabilidade, que tenha continuidade” (PRAT 3, 2013). A possibilidade de

relacionamentos sustentáveis apoia-se no perfil do ator dotado pelo estigma do herói ou da

heroína, sem proximidade com a profissionalização e formação do sujeito (PRAT 3, 2013).

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175

Em contrapartida, as empresas percebem as organizações sociais como um

componente importante para elas, porém, com relações que se aproximam do assistencialismo

(PRAT 3, 2013).

Este cenário comunga com a noção que o ex-coordenador do NUPEGS proferiu sobre

a responsabilidade social exercida pelas empresas ao abordar uma relação com os seus

stakeholders mais vinculada a construção de uma imagem positiva do que a uma proposição

de cunho ético.

Nesse contexto, segundo a entrevistada, se as organizações sociais procuram as

empresas elas estão mendigando. Se fizerem parceria com as empresas por meio de um edital

ela irá selecionar o projeto que ela quer desenvolver orientado pelo interesse da empresa

escolhida (PRAT 3, 2013). “Nessa relação ela não é reconhecida, o processo de gestão não

tem valor. E se ela se profissionalizar ela corre o risco de não sustentar tal relacionamento,

pois poderá demonstrar que ela não precisa mais de ajuda” (PRAT 3, 2013).

Outra questão que a ex-coordenadora do setor de Responsabilidade Social da FIEMG

chamou atenção recai na profissionalização dos atores que atuam na Gestão Social. Assim

como apontou o Diretor da Fundação AVSI, este é um setor em que se percebe profissionais

dotados de boa vontade, mas amadores e mal remunerados (PRAT 3, 2013).

Indo mais adiante, a compreensão que ela tem sobre as organizações sociais é que

essas percebem a responsabilidade social proferida pelas empresas como possibilidade de

arrecadar fundos de dinheiro para sobreviver (PRAT 3, 2013). Todavia, ela ressalta que “tem

empresas que ainda não ouviram e não sabem como tratar a responsabilidade social, e tem

outras que estão lá na frente. Isso demonstra um tema crescente que ainda não congrega um

público muito grande, ele ainda está distante” (PRAT 3, 2013).

A análise sobre a noção que os atores investigados têm acerca da Gestão Social

atrelada as suas dinâmicas e articulações permitiu observar possibilidades de produção de

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conhecimento significativas para a transformação e ampliação do campo da Gestão Social.

Porém, conforme os acadêmicos, a falta de teorização robusta sobre o tema e de um olhar que

contemple não só as políticas sociais, mas, principalmente as relações provenientes de atores

de diferentes setores engajados em solucionar problemas comuns, se traduzem em limites para

a transformação do campo da Gestão Social.

Outro desafio apontado e relevante refere-se à condução dos processos práticos da

Gestão Social. Constatou-se em algumas situações a presença de interações distantes e de

caráter hegemônico precedidas pela imposição dos interesses provenientes das empresas

privadas, governo e universidade sobre as organizações sociais. Este aspecto pode se

configurar em um empecilho para a produção de conhecimento em Gestão Social e para a

ampliação do seu campo de poder. Observou-se que tal situação pode ter um impacto mais

negativo quando as organizações sociais validam as ações impostas pelas empresas e governo

na tentativa de obter financiamento para suas atividades, diminuindo o caráter de partilha de

soluções para os problemas sociais.

Nessa vertente, destaca-se a tensão que permeia o campo da Gestão Social apoia-se na

disseminação da ideia de que o assistencialismo representa um aspecto arcaico que deveria ser

substituído por uma nova visão tanto por acadêmicos que analisam a Gestão Social quanto

pelos os praticantes desse campo. Alguns em busca dessa transformação defenderam ou

defendem a substituição do assistencialismo pelo pragmatismo e pelas competências

gerenciais de orientação e influência da gestão privada. Outros enxergam esse campo como a

ampliação dos direitos de cidadania e de conquista da emancipação democrática.

Essas tensões e lutas se traduzem nas perspectivas e práticas empregadas no campo da

Gestão Social. A Fundação AVINA, o GIFE, o Instituto Hartmann Regueira, Instituto

Camargo e Corrêa, bem como o CEATS/USP empreendem ações mais na linha do fim do

assistencialismo via eficiência gerencial empresarial. O CIAGS/UFBA, PEGS/FGV,

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NIPETS/UFRGS, NEATS/PUC-SP e o IPÊ se articulam mais na linha da emancipação e

avanço da democracia.

No final das contas, o que está em jogo são as formas como se representa o que é a

Gestão Social renovada, avançada no Brasil contemporâneo e isso envolve uma leitura, uma

produção de saberes e conhecimentos capazes de justificar a prevalência de uma visão de

mundo, de determinados poderes.

Com o intuito de ampliar a compreensão acerca dos limites e possibilidades de

produção de conhecimento sobre Gestão Social, a próxima sessão analisará as relações

estabelecidas entre acadêmicos e praticantes, considerando as disputas entre os campos

envolvidos.

6.4 Relações entre academia e praticantes: desafios e possibilidades para o campo da

Gestão Social

Esta tese partiu do pressuposto que as relações entre academia e praticantes do campo

da Gestão Social, convergentes ou divergentes, ampliam a produção de conhecimento que,

por sua vez, contribui para a transformação do seu campo. A fim de analisar essa perspectiva

buscou-se verificar a compreensão que os atores entrevistados têm sobre a relação entre

academia e praticantes, considerando a ideia de disputa entre campos de poder.

As indagações decorrentes deste item tentaram problematizar e explorar as

possibilidades de interação entre academia e praticantes por meio do ensino, da pesquisa e da

extensão, bem como a importância do diálogo entre acadêmicos e praticantes para a produção

de conhecimento sobre Gestão Social.

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A primeira questão observada, conforme o relato de alguns entrevistados demonstrou

interações distantes e incipientes entre academia e praticantes, reverberando os próprios

dilemas vivenciados pela universidade contemporânea.

Esta perspectiva foi apontada pelo ex-coordenador do CEAPG/FGV, o qual anunciou

que a relação entre academia e praticantes “vai mal por viver sob a égide de um apartiamento

da universidade com a sociedade” (ACAD 3, 2013). O entrevistado destacou que essa não é

uma discussão nova e que decorre de uma lógica produtivista (ACAD 3, 2013). Conforme a

sua reflexão esse contexto contribuiu para fortalecer o campo da Gestão Social cujas bases

apoiadas na ação e reflexão emergiu como resposta ao enfraquecimento do capital intelectual

da universidade contemporânea.

Outro membro e também ex-coordenador do CEAPG/FGV corrobora este cenário, ao

qualificá-lo como perigoso ao ser conduzido por pesquisas de gabinete. Esta se sustenta por

meio de uma base de dados secundários, induzindo o pesquisador a permanecer no gabinete

que, por sua vez, fica desconectado da realidade a ser investigada (ACAD 4, 2013). “Esse

processo ao ser avaliado não ajuda por que a pesquisa de gabinete é bem rápida, focada e

contribui para publicar” (ACAD 4, 2013). Infere-se que esse aspecto, assim como profere

Mintzberg (2006), induz ao arquivamento das pesquisas em prateleiras de bibliotecas as quais

se distanciam da sociedade.

O entrevistado argumentou que há um preço para coletar e ficar conectado com

sociedade. A investigação leva mais tempo, há a necessidade de ganhar o direito de ficar e

exige responsabilidade com aquilo que é coletado. “Na área que estamos as pessoas não veem

claro o que foi produzido” (ACAD 4, 2013).

Nesse contexto, destaca-se uma pesquisa realizada pelo CEAPG, que envolveu os

fóruns locais de uma determinada região no qual foram conectados os atores que estão no dia-

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a-dia destes territórios para, progressivamente, descobrir que havia outros atores e que eram

aqueles que não seriam encontrados pela porta da frente (ACAD 4, 2013).

Este exemplo demonstra a relevância de uma pesquisa de campo robusta ao

possibilitar produção de conhecimento socioprática integrada a interpretação, a reflexão,

gerando novos olhares capazes de ampliar a compreensão do campo do investigado. Segundo

o entrevistado,

esses processos geram muito conhecimento, conhecimento sobre as

tensões entre as organizações de base e o Estado, recuperando

história dos movimentos que estão ocorrendo em São Paulo sobre

mobilidade, por que as organizações locais querem estas histórias.

Este caminho permitiu reconstruir a ponte para se chegar de volta na

comunidade e recriar outras bases, mostrando que, primeiro é

possível e que, sair do gabinete tem um preço... E que você tem que

aguentar este preço. Por outro lado você reconecta em bases mais

horizontais (ACAD 4, 2013).

Essa perspectiva foi ampliada pela coordenadora do CIAGS/UFBA ao argumentar que

“um programa de Gestão Social não pode se inserir em uma academia impondo modelos”

(ACAD 10, 2013). A mesma explicitou que as categorias utilizadas na academia para se

desenvolver uma pesquisa ou um projeto de extensão não são compreendidas da mesma forma

pelos atores sociais envolvidos, exigindo uma construção com as palavras pertencentes ao seu

eixo de atuação o qual poderá incidir em uma proposta coletiva (ACAD 10, 2013).

De forma semelhante, o ex-coordenador do NUPEGS/PUC-Minas apontou a sua

percepção mediante as interações entre universidade e praticantes ao argumentar que o

discurso da academia é completamente distinto ao do praticante e que, ao direcioná-lo a ele o

mesmo não o compreende, não conseguindo colocá-lo em prática. Este cenário se expressou

em uma experiência vivenciada pelo entrevistado. O mesmo relatou que o conhecimento

acadêmico é citado por pessoas que querem a formação. No entanto, os praticantes com quem

ele estava interagindo não pretendiam a formação, queriam a orientação prática. “Essa

experiência foi absolutamente diferente do que a gente fazia, ela era muito mais popular”

(ACAD 8, 2013).

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Uma das coordenadoras do CEATS/USP também caracterizou a relação entre a

universidade e sociedade como insuficiente. Para ela esta interação é um pouco tímida e

necessita sempre estar em busca de mais, bem como a construção e o resgate de uma

democracia que iniciou de um processo em 1988, incidindo em trinta e vinte anos sem a

ditadura (ACAD 1, 2013). Apreende-se que essa construção ou arranjo precede uma

compreensão de mundo vigente no qual se vislumbra um núcleo de poder mais pulverizado e

menos hegemônico (ACAD 10, 2013). Essa percepção vincula-se a universidade não mais

como a única a ofertar processos de produção de conhecimento, mas como mais uma dentre

outros espaços intelectuais (ACAD 10, 2013).

Vislumbrando uma perspectiva de enfrentamento para esses dilemas o ex-coordenador

do NUPEGS/PUC Minas apontou como alternativa o financiamento de programas de

extensão por agências de fomento e a sua valorização pela CAPES. O mesmo compreende

que se a extensão fosse pontuada tanto quanto a produção científica o governo daria uma

indução para esse diálogo (ACAD 8, 2013).

No âmbito das abordagens da responsabilidade social o entrevistado assinalou que há

uma produção de conhecimento científica na literatura brasileira dividida em duas dimensões.

Uma provém de um grupo de autores considerados ingênuos por abraçarem o conceito dado,

direcionando-o a prática na empresa. Esse grupo é caracterizado como acríticos por eles

colocarem o conceito de responsabilidade social a serviço da empresa, do investimento social.

A outra dimensão é oriunda daqueles que são críticos, mas que não apresentam muita solução

(ACAD 8, 2013). Na sua concepção, esse grupo dificulta o diálogo entre a universidade e a

sociedade, pois não leva conhecimento útil ao praticante. “Ele não propõe, ele só destrói”

(ACAD 8, 2013).

A percepção que os praticantes entrevistados apresentaram sobre a relação entre

academia e sociedade se aproxima da visão dos acadêmicos ao caracterizá-la como distante e

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insuficiente, apesar de terem destacado que, no âmbito das empresas em que atuam

vivenciaram experiências positivas com a academia.

Essa visão é apontada pelo diretor da Fundação AVSI ao relatar que a relação das

universidades com a fundação é muito positiva. Ele agrega esse aspecto ao fato de que o

terceiro setor precisa de um apoio teórico para a sistematização e produção de seu

conhecimento, convergindo com as características que compõem um praticante cuja definição

se apoia no profissional reflexivo e interessado em obter novos conhecimentos para a

ressignificação de sua atuação prática (Ospina, 2001).

No caso da AVSI, o entrevistado apontou uma relação direta com as universidades

como a PUC Minas que contribui com o conhecimento teórico por meio de sua aplicação em

alguns setores e assessora na criação de associações e formação profissional para o terceiro

setor.

Na verdade a produção de estudos acadêmicos sobre o

funcionamento e o papel do terceiro setor são muito legais,

inclusive, utilizamos como referencial teórico para a nossa

projeção. Quando você se aproxima daquele que tem a

oportunidade de colocar um ideal em ação ele pode

complementar aquilo que você pensa (PRAT 2, 2013).

Esse processo de proximidade entre atores de campos diferentes ainda foi destacado

por ele como uma oportunidade de construir conhecimento acadêmico a partir de uma

realidade a qual permite avaliar ou reavaliar uma hipótese (PRAT 2, 2013).

Entretanto, quando se trata de atuar diretamente no território com os beneficiários

direto das organizações sociais, o diretor da Fundação percebe uma limitação derivada da

forma como os acadêmicos se expressam para esses grupos, utilizando uma linguagem

científica e que não se traduz no que os praticantes gostariam de receber.

Outro aspecto que o entrevistado chamou atenção relaciona-se às dinâmicas

provenientes do trabalho de extensão das universidades. Essas demonstram apenas cumprir

uma meta, o de fazer extensão (PRAT 2, 2013). Para ele, o beneficiário não se sente completo

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nessa circunstância, incidindo em uma necessidade de aprimorar a relação, sobretudo no

âmbito social (PRAT 2, 2013). “O relacionamento entre empresas e universidades é diferente.

O da universidade como avanço tecnológico funciona bem, já no social é preciso trabalhar

mais as formas de se fazer isso” (PRAT 2, 2013).

Essas percepções evidenciam os critérios da cientificidade vivenciados pela

universidade contemporânea ao valorizar mais os experimentos e o conhecimento das ciências

naturais e de cunho tecnológico do que os das ciências humanas e sociais (Francelin, 2004,

Morin, 2006), revelando aspectos da crise hegemônica e de legitimidade (Santos, 2004).

Nesse sentido, observa-se o interesse da universidade em investir em inovações tecnológicas

que se propõem a suprir as demandas do mercado, demonstrando uma hierarquia do

conhecimento em que as ciências humanas parecem se posicionar em segundo plano.

No contexto de atuação da OSC CDM foi possível notar um quadro semelhante ao

ilustrado pelo diretor da AVSI. De acordo com o Diretor de Gerenciamento de Projetos a

organização tem vários projetos desenvolvidos em parceria com as universidades. Existe uma

proposição de determinados temas o que promove ações mais aderentes (PRAT 1, 2013). Para

ele “a própria relação em si gera uma grande quantidade de conhecimento que decorre da

interação de histórias e de vivências, o que facilita o aprendizado mutuo” (PRAT 1, 2013).

Ao longo dos anos, o entrevistado destacou que a CDM tem vivenciado uma

expressiva aprendizagem em termos de tecnologia, metodologia e conteúdo com as

universidades. Em consonância com esse aspecto, o mesmo apontou que as universidades

parecem aprender com a diversidade de cunho prático (PRAT 1, 2013).

Numa perspectiva de ordem mais instrumental e racionalista o diretor do Instituto

Camargo Corrêa relatou que a organização busca se aproximar da academia quando observa

que ela pode ser uma parceira na operação de algum projeto do instituto. “Nós não temos

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nenhuma relação com a academia no sentido de estimular, investir ou apoiar que seja o estudo

da academia sobre o terceiro setor” (PRAT 6, 2013).

Na sua concepção a relação entre academia e praticantes é insignificante e

descontínua, elas não precedem a um objetivo comum. “As ONGs não demonstram essa

preocupação de interação com a academia, a parceria quando surge é somente quando há o

interesse em desenvolver algo em prol de suas necessidades” (PRAT 6, 2013). As

universidades demonstram a mesma intenção, se aproximam do campo dos praticantes

quando se faz necessário a sua observância para o aprimoramento do conhecimento teórico.

Mesmo uma necessitando da outra para o desenvolvimento de suas atividades, percebe-se que

as iniciativas de interação são induzidas por interesses pontuais, somente de ordem técnica

(PRAT 6, 2013). O entrevistado salientou que a iniciativa parece surgir das academias por

meio dos centros de estudos, sem vínculo com os cursos de graduação.

Quando questionado sobre a importância do diálogo para a relação entre academia e

praticantes o mesmo argumentou ser fundamental, destacando que ele contribuiria muito se

tivesse uma relação mais estreita, cada qual desempenhando o seu papel. Para o entrevistado,

a academia tem a capacidade, a competência para gerar e

sistematizar conhecimento, então essa experiência é muito

importante para fortalecer o terceiro setor e promover o seu

crescimento e desenvolvimento. As organizações do terceiro setor

são organizações em geral que lutam para sobreviver e no seu dia-a-

dia consomem muito tempo, muita energia com isso. Então, da parte

delas eu acho que dificilmente partiria essa iniciativa de ir até a

academia e sugerir uma parceria e com isso produzir conhecimento.

Eu acho que a iniciativa deveria acontecer a partir da academia, das

universidades, elas é quem deveriam ter um olhar mais atento ao

terceiro setor e buscar essa aproximação, então cabe mais a elas a

busca dessa aproximação (PRAT 6, 2013).

Observou-se nesse relato traços da hegemonia do saber acadêmico sobre os praticantes

por meio da separação dos papéis de cada ator, indicando a dissociação da teoria com a

prática, bem como o posicionamento daqueles que ensinam sobre aqueles que aprendem. Essa

noção evidencia uma posição de inferioridade dos praticantes aos lhes atribuir apenas a

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função da prática sem nela constar a capacidade de produção de conhecimento, traduzindo-se

em limitação para se recriar e transformar o campo.

A ex-coordenadora do setor de Responsabilidade Social da FIEMG também observou

um distanciamento na relação entre academia e praticante ancorada na falta de legitimidade da

universidade frente aos praticantes. Segundo ela, a presença da universidade na empresa é

muito questionada. Há pessoas que aceitam e há aquelas que acreditam ser perda de tempo, de

dinheiro e energia devido ao baixo aproveitamento do produto gerado enquanto resultado

dessa relação. “Se é feito um manual contra a corrupção em parceria com a acadêmica a

empresa não vai utilizar. Mas, se ele é trabalhado somente pelos praticantes, a organização a

qual ele será destinado vai utilizá-lo por nele conter uma linguagem prática, que é bem

diferente da academia” (PRAR 3, 2013).

A Diretora Executiva do Instituto Hartmman Regueira compartilha da mesma ideia,

porém percebida por outro ângulo. Sua observação recaiu na pouca importância e apoio que

os professores dão aos alunos quando esses vão a campo para algum tipo de inserção na

comunidade. “Parece que, não só os professores, mas os alunos também têm pouco tempo

para fazer a pesquisa ou o trabalho em parceria com as comunidades” (PRAT 7, 2013).

Constatou-se que essa compreensão se aproxima das colocações apontadas pelo diretor da

Fundação AVSI ao argumentar que o trabalho de extensão das universidades demonstra

apenas cumprir uma meta.

Vale destacar que, em termos de pesquisa, a entrevistada relatou parecer haver uma

curiosidade relativa aos trabalhos desenvolvidos no Instituto, explicitando já ter sido

procurada pelos alunos da Universidade Federal de Minas Gerais, pelos da PUC Minas e da

Fundação Dom Cabral para responder aos questionários dirigidos (PRAT 7, 2013).

Convergente com a noção de distanciamento entre academia e universidade, o Vice

Presidente do IPÊ relatou que não há uma parceria real entre esses campos, mas sim algumas

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tentativas mais significantes em determinadas instituições. Para ele, a academia deveria ser a

“casa do novo” (PRAT 4, 2013). Porém, “ela exprime ações conservadoras e socialistas que

se traduzem em dilemas, envolvendo a sua legitimidade mediante uma sociedade no qual se

observa uma gestão de conhecimento bem diferente do que era antes” (PRAT 4, 2013).

Quando questionado sobre o posicionamento que a Escola Superior de Conservação e

Sustentabilidade do Instituto tem em relação a este contexto o mesmo relatou que eles se

consideram uma escola diferente, que busca se arranjar independente dos modelos vigentes.

“A gente quer se posicionar de forma criativa no mundo da educação e isso significa dar

importância a outras formas de aprendizagem fora da sala de aula. O mundo das novas

tecnologias é parte também desse mundo moderno” (PRAT 4, 2013).

Apreende-se que essa concepção de ensino acadêmico apresenta-se como

possibilidade de enfrentamento aos desafios vivenciados pela universidade contemporânea

que, conforme os relatos relacionam-se á hegemonia do saber científico sobre o senso comum

e a sua legitimidade. Nota

Notou-se que o instituto IPÊ conseguiu romper com alguns condicionantes impostos

por agências de regulação da produção científica que dificultam e delimitam realidades para a

ação dos atores de determinado campo ao atuar academicamente em novas bases e em espaço

institucional não tradicional da universidade. Nessa vertente, infere-se que o que está em

xeque não é o papel que ela desempenha enquanto produtora de conhecimento científico, mas

as formas de interação com outros atores sociais.

Essa compreensão corrobora com uma tentativa mais articulada e eficiente dos

próprios acadêmicos da Gestão Social, como a Rede de Pesquisadores que busca alterar esse

quadro institucional ao valorizar o produtivismo por meio de novas formas de produção e

disseminação de conhecimento. Estas se configuraram por meio dos livros publicados pelo

ENAPEGS, quando só há valor junto ao CNPQ para os artigos de revistas científicas, nas

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pesquisas aplicadas, palestras não acadêmicas, produções técnicas como vídeos e filmes de

curta metragem apresentados como produto científico no ENAPEGS.

Por outro lado, a partir do depoimento do ex-coordenador do CEAPG/FGV, nota-se

uma visão mais arraigada ao aspecto tradicional da universidade ao proferir que a ela é

legítima por ela funcionar dentro da legalidade, dentro de critérios que a própria sociedade a

imagina como esfera pública de capacidade científica. Porém, assina-la se ai um risco de se

incorrer a “pesquisas de gabinete" que, por sua vez, são expostas nas prateleiras das

universidades (Mintzberg, 2006). Tal percepção demonstra o seu afastamento da sociedade e

dos praticantes da Gestão Social cujas consequências incidem na produção de conhecimento

por essa se apoiar nas abordagens da aprendizagem socioprática.

Nos demais depoimentos, notou-se outro aspecto que sustenta a crise da universidade

contemporânea. Este se configura no dilema institucional que, ao se apoiar no produtivismo

acadêmico, de uma maneira ou de outra, mina as pesquisas empíricas e fortalece as pesquisas

de gabinete. O trabalho de extensão, assim como apontado pelos praticantes entrevistados,

denota também aspectos desafiantes da universidade contemporânea ao se traduzir em

interesses pontuais e divergentes da sociedade.

A Coordenadora da Área de Gestão de Conhecimento do GIFE demonstrou

compreender a relação entre academia e praticantes de maneira semelhante aos demais

entrevistados ao explicitar que a interação hoje ocorre em níveis diferentes e com um baixo

grau de aproveitamento dos praticantes em relação aos conhecimentos científicos que a

universidade pode oferecer.

Entretanto, a sua percepção ancora-se nos princípios que fomenta a hegemonia da

universidade contemporânea ao considerar que seu conhecimento científico antecedente ao

conhecimento da base ou do senso comum dos praticantes. No âmbito do GIFE, que está

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sediado em São Paulo, a entrevistada apontou uma interação benéfica com as universidades

parceiras da organização apoiada nessa visão hegemônica.

O GIFE é uma associação que esta inserida em um meio

onde se tem muito acesso a informação bruta e para ele ter

mais credibilidade é sempre bom trabalhar junto a

universidade que tem o corpo técnico, que vai conduzir da

forma mais rigorosa possível as pesquisas e os projetos de

conhecimento. Ela tem, com certeza, um aporte muito

grande de conhecimento anterior em cima deste novo

conhecimento que está sendo gerado pelo GIFE. Aqui a

gente não tem uma capacidade institucional tão grande

assim, a gente não tem funcionário suficiente para produzir

tanta coisa assim de conhecimento e nós poderíamos

aproveitar muito melhor as parceiras com a universidade

para gerar mais conhecimento a partir do conhecimento que

já é gerado dentro do GIFE (PRAT 8, 2013).

Conforme a entrevistada, a universidade, contribui para dar mais credibilidade e

sustentação aos trabalhos desenvolvidos pelas organizações, as quais possuem um

conhecimento de base (PRAT 8, 2013).

Notou-se nesse relato a legitimidade da academia sendo expressa mediante o seu

reconhecimento enquanto instituição produtora de conhecimento científico, porém, “tal

relação seria muito favorável se ela fosse mais bem aproveitada” (PRAT 8, 2013).

A partir desse contexto, a mesma ressaltou que o GIFE tem intenção de estimular a

mudança no eixo das parcerias que são firmadas com as universidades. Essas não seriam

somente contratadas como fornecedoras, mas parceiras em desenvolver projetos que não

sejam nem do GIFE e nem da FGV por exemplo. Nessa vertente, a entrevistada disse

compreender que esse processo é mais penoso, demandando tempo para negociações e

superação dos conflitos os quais ela acredita ser um dos fatores dificultador na relação entre

praticantes e academia (PRAT 8, 2013).

Congruente com a percepção relativa aos benefícios que uma parceria pode trazer para

acadêmicos e praticantes, o Diretor de Alianças Estratégicas da Fundação AVINA citou a

atuação da Pontifícia Universidade Católica de Córdoba no movimento latino Nossa Córdoba

cuja participação significante incide em uma contribuição de mão dupla (PRAT 5, 2013).

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A fim de evidenciar essa possibilidade de relação mútua, o mesmo relatou um

depoimento do reitor da universidade ao ser questionado sobre os motivos que os levaram a

ser um dos líderes nesse movimento.

todos os elementos que o Nossa Córdoba vem trabalhando,

os indicadores que vem-se discutindo, as experiências que

vem promovendo na relação com o município, a

mobilização dos vários setores para participar devem servir

de referência para a graduação. A graduação deve estudar

estes indicadores, a Arquitetura tem que estudar isso, a

Engenharia, a Pedagogia, o Serviço Social... Então o Nossa

Córdoba tem contribuído para novas funções e para a nossa

universidade. Para a extensão isso é muito relevante, os

nossos estudantes podem estar nas organizações que fazem

parte do Nossa Córdoba. Então quem estava estudando

Sociologia, Ciência Política, Relações Internacionais, pode

ter no Nossa Córdoba aprendizagem, estágios, que nós não

teríamos. Depois a Pós-graduação deve aprofundar o

conhecimento sobre isso que está acontecendo para que, na

medida que se estuda e aprofunda seja possível devolver ao

Nossa Córdoba novas formas de compreensão do

movimento, novas formas de agir, de contribuir com

movimento (PRAT 5, 2013).

Apreende-se que este tipo de articulação traz como perspectiva possibilidades de

enfrentamento aos desafios postos pela universidade contemporânea por permitir uma

aproximação entre teoria e senso comum mediada por um processo no qual um contribui com

o outro.

Mediante os relatos expostos, destacam-se os argumentos do Fundador e ex-

coordenador do CEAPG/FGV, ao exprimir a sua compreensão sobre as tensões que a

academia vivencia que, segundo ele, são historicamente construídas, se reconstruindo

constantemente (ACAD 4, 2013).

Ela é um pedaço fundante da sociedade civil no momento que nós

começamos a debruçar para além da bíblia... O movimento

escolástico que tinha como base os mosteiros. As universidades

tradicionais são de base religiosa, é uma reflexão que emerge a partir

disso. Você diz que a universidade de hoje vive tensões, eu vou

dizer que eles sempre viveram tensões mesmo! Ela nasceu

tensionada! Os intelectuais da idade média estavam lá... O formato

das universidades clássicas seguia o formato dos mosteiros da

Inglaterra. Há sempre tensões. Você pode pegar a universidade de

Chicago na década de 1930 que começa a romper com o modelo que

existia e que foi muito importante para as ciências sociais, pois foi

um lugar fora da universidade trabalhando nos lugares do dia-a-dia,

fazendo pesquisa de campo trazendo a experiência antropológica

para dentro da universidade. Há as novas universidades da França e

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em outros lugares onde tem aquela tensão de estar envolvido. Como

qualquer tensão, ela tem este cabo de guerra... as vezes você vai pra

lá e as vezes você consegue avançar para cá (ACAD 4, 2013).

Infere-se que esse argumento incide na noção crítica sobre o curso de Administração o

qual o entrevistado revelou sofrer da tendência de ser ahistórico. Ou seja, o ensino e a

pesquisa se debruçam naquilo que está acontecendo agora, reduzindo as possibilidades de se

compreender as modificações ocorridas (ACAD 4, 2013). “As fotos são tiradas, mas não tem

filmes” (ACAD 4, 2013).

Tais argumentos demonstram que a historia dos acontecimentos no contexto da

universidade contemporânea amplia as perspectivas epistemológicas de pesquisa ao fornecer

dados e fatos ainda não revelados e analisados.

Considerando o objeto de estudo dessa pesquisa que se ancora nas relações entre

acadêmicos e praticantes do campo da Gestão Social, julgou-se pertinente analisar a

importância que os atores investigados dão ao diálogo presente nessas relações. A partir dessa

perspectiva considera-se que o diálogo promove a socialização e a reflexão. Este por sua vez

se apoia no conhecimento prévio e cognitivo de cada parte envolvida, se traduzindo em

processos de produção de conhecimento.

Para o coordenador do PEGS/FGV o diálogo deveria ser acentuado, entretanto isso

não ocorre por que a intenção das universidades é preparar o aluno para o mercado de

trabalho que, por sua vez, remete apenas a lógica racional instrumental no qual há pouco

espaço para a dialogicidade. O entrevistado ainda salientou que essa é uma leitura da

universidade brasileira desde a década de 1980 a qual exprime a importância de se estar bem

com o mercado de trabalho, com o mundo empresarial dotado de estratégias. Nesse âmbito, se

“percebe a desvalorização do estado mínimo, das políticas públicas, aspecto que não permite a

conectividade da prática universitária com a sociedade” (ACAD 9, 2013).

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A fundadora e coordenadora do CEATS /USP exprimiu uma compreensão congruente

com as abordagens que delimitam os limites da universidade contemporânea e que se

aproxima da visão de alguns atores entrevistados. Segundo ela, “há certa prepotência de quem

está na academia, de um olhar de que tudo eu sei, de querer ensinar e não de ser humilde na

postura de que eu preciso aprender com quem eu estou fazendo, e talvez, ordenar e dar

sentido para o que aquela pessoa está fazendo ou faz” (ACAD 2, 2013). Essa perspectiva

muda o propósito da interação ao não apontar as falhas o qual permite ao outro rever o que se

está fazendo, possibilitando a reflexão (ACAD 2, 2013).

A atuação do CEATS/USP neste cenário é sustentada pela metodologia da

pesquisação, dinâmica que os aproximou dos praticantes (ACAD 2, 2013).

Sempre procurei trabalhar com técnicas e metodologias que

trouxesse o sujeito da pesquisa para dentro da pesquisa. O

fato de estar acontecendo todos os movimentos das

organizações sociais fazia com a gente estivesse refletindo,

analisando, escrevendo, publicando sobre tais movimentos

e, ao mesmo tempo, participando deles, conhecendo os

líderes desses movimentos, fazendo um network, com isso

(ACAD 2, 2013).

O relato proferido pelo ex-coordenador do CEAPG/FGV converge com as ideias

apontadas acima ao argumentar que “a universidade tem que trabalhar dando voz as pessoas”

(ACAD 3, 2013). Seus processos de produção de conhecimento se dão a partir das pessoas,

dos locais, da inovação explícita que não é dada pela academia. Nesse sentido, “busca-se o

diálogo não para apartar a sociedade da universidade” (ACAD 3, 2013). Indo mais além, para

ele a natureza dos conflitos entre academia e praticantes está na não observância da relevância

do outro por não considerá-lo como sujeito de conhecimento, mas como objeto de pesquisa.

Complementando, o mesmo destacou que o praticante, por sua vez, não considera relevante o

trabalho produzido pela academia (ACAD 3, 2013).

O fundador e também ex-coordenador do CEAPG/FGV externalizou a sua

compreensão sobre a importância do diálogo nas relações entre academia e praticantes em

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uma única frase a qual evidenciou que o conhecimento emerge do diálogo, logo, se não há

diálogo, não se produz conhecimento (ACAD 4, 2013).

Para o diretor da Fundação Avina, o diálogo é fundamental, sem ele não há interação e

essa perspectiva pode conduzir a universidade a um “encapsulamento” (PRAT 5, 2013).

Quando a gente entra no campo da administração, na gestão

social, na sociologia, ciências humanas e tal, eu vejo que

quanto maior e mais plena for esta relação maior pode ser o

ganho de lado a lado. Você que está na universidade tem

mais vivência do que eu e deve compreender isso melhor,

as interações com a academia parece muito com isso, o meu

conhecimento, a minha pesquisa, o meu campo de

aprofundamento. E isso eu acho que é limitador. Acredito

que quanto maior é a relação, digamos uma relação com

maior porosidade com o outro setor, maior será a

oportunidade de reconhecimento e de posicionamento da

academia com o setor fora dela (PRAT 2, 2013).

Os relatos evidenciaram a relevância do diálogo nas relações entre academia e

praticante, demonstrando perspectiva de interação mais convergente e reflexiva entre os

atores envolvidos. Essa compreensão se traduz em possibilidade de enfrentamento aos

dilemas vivenciados pela academia ao se debruçar em processos de produção de

conhecimento socioprática que se apoiam na interação com a realidade vivida conectada a

experiências passadas. Nota-se que o diálogo também contribui para fomentar a habilidade

social ao promover interações entres atores diferentes que ao lidarem com as divergências e

conflitos oriundos dessas relações terão que desenvolver processos colaborativos para um

mesmo fim.

Nessa vertente, destacam-se algumas contribuições da academia para a produção de

conhecimento sobre Gestão Social. Essas se apoiam na tríade ensino, pesquisa e extensão.

Para o coordenador do PEGS/FGV, o convívio com a comunidade, a partir das

dinâmicas extensionistas do programa, tem promovido produção de conhecimento sobre

Gestão Social cujos produtos, além do material gerado acerca das pesquisas, podem ser

verificados na forma de livros. Segundo o entrevistado, já foram lançados quatro livros,

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relatando as experiências sobre as atividades de extensão do programa junto às comunidades

envolvidas e, para 2015 serão divulgados mais dois livros com o mesmo propósito (ACAD 9,

2013).

No CEAPG/FGV, conforme afirmou o fundador e ex-coordenador do programa, a

aprendizagem é derivada da integração com a comunidade investigada no qual se observa o

outro. “Este outro pode ser o governo que patrocina a pesquisa, bem como as pessoas

envolvidas em uma determinada associação” (ACAD 4, 2013).

As pesquisas, a partir dos programas de mestrado e doutorado são realizadas,

basicamente, no âmbito social dos atores investigados e são disseminadas a partir de uma

“espécie de colegiado solto no qual os professores, pesquisadores e alunos, conversam sobre o

que estão vendo, formando um processo mais horizontal, permeado de ideias que vão fluindo

de um lugar para outro” (ACAD 4, 2013). De acordo com o entrevistado, esta é uma dinâmica

voluntária e não um coletivo que fixa posições. Para ele, isso é considerado satisfatório, por já

haver regras suficientes na universidade (ACAD 4, 2013).

Outro ponto destacado pelo entrevistado ancora-se na distinção entre ensino, pesquisa

e extensão que ele compreende como uma “estratificação de um modelo codificado para se

entender melhor as coisas” (ACAD 4, 2013). Conforme a sua percepção, o ensino está

acontecendo em todos os lugares, ele promove a fluidez do conhecimento, mesmo que de

forma menos codificada. Ele deriva da conversa, das interações entre as pessoas. Para ele o

conhecimento permite avançar sobre aquilo que te sustenta, consequentemente, o diálogo é a

base da produção de conhecimento. Tal perspectiva sinaliza uma interseção dinâmica da ação

entre ensino, pesquisa e extensão, “a separação não faz muito sentido, por que não acontece

um primeiro e depois outro” (ACAD 4, 2013).

Seguindo a mesma lógica, as dinâmicas de trabalho do CEATS/USP evidenciam

propostas participativas as quais, segundo a fundadora e coordenadora do centro de estudo,

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“permite observar o conhecimento sendo aplicado, validado, revisto e criticado” (ACAD 2,

2013). A mesma apontou como exemplo a participação ativa de alunas orientandas do

mestrado com o fenômeno investigado, promovendo a ressignificação do que entendiam sobre

empreendedorismo social ou Gestão Social, bem como a transformação da realidade da qual

estavam pesquisando (ACAD 2, 2013).

Para o ex-coordenador do NUPEGS/PUC Minas a produção de conhecimento,

principalmente no campo da Administração seria mais dinâmica se houvesse uma articulação

próxima com as incubadoras de empresa e com os praticantes, de forma a auxiliá-los no seu

crescimento. Entretanto, essa perspectiva é somente observada no âmbito da graduação. Aos

cursos de Pós-Graduação orientados para o mestrado acadêmico e profissional a formação

baseia-se na pesquisa, na produção científica o que ocasiona em uma lacuna orientada para a

extensão, pois, poucos são os alunos egressos que irão continuar desenvolvendo pesquisas

(ACAD 8, 2013). A maioria irá lecionar ou direcionar-se para o âmbito empresarial e/ou

social, buscando aplicar o que aprendeu sem antes, porém, ter tido uma integração com a

comunidade e com o local a ser trabalhado (ACAD 8, 2013). Conforme o entrevistado, não

existe uma integração da pesquisa com a extensão que possibilite o desenvolvimento das

competências desenvolvidas nos cursos. “Essa é uma articulação muito aquém do desejado”

(ACAD 8, 2013).

Decorrente da pergunta de pesquisa que indagou sobre as relações entre acadêmicos e

praticantes no contexto brasileiro da produção de conhecimento sobre Gestão Social

desenhou-se, em consonância com o referencial teórico algumas categorias analíticas a fim de

guiar a discussão proposta. Nessa vertente, destacaram-se os aspectos oriundos de cada campo

de poder pesquisado, o traço de habilidade social entre os atores investigados como

perspectiva de transformação da estrutura social, a produção de conhecimento sobre Gestão

Social a partir das relações entre acadêmicos e praticantes apoiadas em saberes híbridos.

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A Figura 5 “Relações no Campo da Gestão Social: perspectivas e limites de produção

de conhecimento”, ancorada na interseção das esferas sociais concebidas por Janoski (1998),

apresentam as instituições investigadas, destacando seus campos de poder e as conexões que

os envolvem.

Interações entre acadêmicos e praticantes

Interações entre acadêmicos e acadêmicos

Interações entre praticantes e praticantes

Figura 5. Relações no Campo da Gestão Social: perspectivas e limites na produção de

conhecimento

CEATS/USP

CEAPG/FGV

PEGS/FGV

CIAGS/UFBA

NIPETS/UFRGS

NEATS/PUC/SP NUPEGS/PUC

Minas

AVSI

AVINA

Esfera do

Estado

CDM

FIEMG

Camargo

Correia

IPÊ

GIFE

Hartmann

Regueira

Saberes

Híbridos

Habilidade

Social

Intersetorialidade

Interdisciplinaridade

Esfera

Pública

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195

As setas indicam as relações observadas entre os acadêmicos e praticantes investigados, no entanto, outras

interações no campo da Gestão Social se manifestam, seja entre os acadêmicos ou entre os praticantes.

Fonte: Produção própria adaptado de Janoski, T. (1998). Citizenship and Civil Society: A Framework of Rights

and Obligations in Liberal, Traditional, and Social Democratic Regimes. Cambridge: University Press.

A Figura 5 “Relações no Campo da Gestão Social: perspectivas e limites na produção

de conhecimento” ao evidenciar as esferas pública, privada, de mercado e estatal exprimiu

uma teia de relações entre atores distintos permeados por interesses, racionalidades e valores

que, ora se convergem e ora se divergem no âmbito de sua atuação. Esse aspecto interacional

permitiu alocar as instituições pesquisadas conforme as relações instituídas por seus atores e a

natureza constitutiva de cada um no âmbito da Gestão Social que é representada pela

circunferência central, indicando a presença e a permeabilidade desse campo nas diversas

esferas sociais. Concomitantemente, as abordagens analisadas que sustentaram a discussão da

Gestão Social foram apresentadas e orientadas para o eixo central do campo da Gestão Social

a fim de ilustrar os fatores que permeiam as relações entre acadêmicos e praticantes.

A partir dessa perspectiva, os acadêmicos se concentram, principalmente, na esfera

pública, cuja estrutura acolhe instituições sociais heterogêneas. Porém, eles se posicionam nas

intercessões das esferas pública, do Estado e privada por manifestarem interações com os

atores e instituições oriundas dessas esferas. Ressalta-se a presença de todos os acadêmicos na

esfera privada por se tratarem de centros de estudos e programas de pesquisas de cunho

educacional, ocasionando a formação de um quadro discente.

Outro ponto a ser destacado refere-se a posição do CEATS/USP. Este foi disposto de

forma a adentrar mais na esfera do mercado por manter um número significante de interações

com organizações privadas provenientes das parcerias realizadas com fundações e instituições

desta esfera.

Quanto aos praticantes, às relações instituídas por esses atores, bem como a origem de

cada organização social promoveram agrupamentos distintos nas esferas sociais. Essa

perspectiva permite posicionar a AVSI, CDM e IPÊ vinculados à esfera pública, com pouca

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proximidade com a esfera do mercado. A Fundação AVINA se posiciona entre todas as

esferas sociais por apresentar interações oriundas do trabalho que é desenvolvido nas agendas

por eles propostas. Entretanto, buscou-se situá-lo mais próximo da esfera de mercado por

notar uma fluidez nas relações com atores pertencentes a este campo. Já os Institutos Camargo

Corrêa, Hartmann Regueira, FIEMG e GIFE se concentram na esfera do mercado por se

envolverem de forma predominante com os atores oriundos desse campo.

Ao considerar a produção de conhecimento sobre Gestão Social a partir das relações

entre acadêmicos e praticantes no âmbito de suas dinâmicas e articulações, observaram-se

interações entre as instituições investigadas, sendo algumas do mesmo campo de poder. Entre

os acadêmicos, esse aspecto foi demonstrado por meio das setas com traçado de cor verde e

direto, indicando as relações que as conectam. Nessa vertente, buscou-se explicitar, conforme

a análise dos dados secundários, as interações entre esses acadêmicos mediados pela Rede de

Pesquisadores da Gestão Social.

Referente aos praticantes buscou-se assinalar as relações entre a Fundação AVINA,

FIEMG, GIFE e Instituto Camargo Corrêa que foram apontadas pelas setas de cor vermelha e

traçado pontilhado. Tais relações orientam-se para a disseminação do papel das organizações

privadas no campo da responsabilidade socioempresarial e ambiental.

No âmbito das relações entre atores de campos diferentes, destacaram-se, através das

setas de cor preta e de traçado pontilhado as interações da Fundação AVINA com dois centros

de pesquisas, NUPEGS/PUC Minas e CEATS/USP que se manifestaram por meio de

dinâmicas de difusão de conhecimento sobre a Gestão Social.

O NUPEGS/PUC Minas também evidenciou relações orientadas para a socialização e

disseminação do conhecimento sobre Gestão Social com organizações da sociedade civil.

Dentre elas, ressaltaram-se a Fundação AVINA, AVSI, CDM, Hartmann Regueira e a

FIEMG.

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As dinâmicas que envolvem as unidades de análise investigadas se configuraram na

visão intersetorial, na habilidade social e nas interações entre atores diferentes que, por vezes,

demonstraram parcerias entre academia e praticantes ainda que configuradas em relações de

interesse pontuais e unidirecionais. Tal perspectiva permite traduzir o velho aspecto da

universidade contemporânea ancorado na hierarquia entre aqueles que detêm o conhecimento

científico e aqueles que detém o conhecimento prático, o senso comum. Ou entre aqueles que

acreditam que o fomento das lideranças sociais devem se pautar na gestão empresarial, por

isso a necessidade de se profissionalizar as OSCs. Perspectivas essas compreendidas pelo

instituto Hartmann Regueira, Camargo Corrêa e FIEMG.

Todavia, as relações demonstraram dinâmicas concretas de enfrentamento e superação

desse quadro ao observar tentativas de inovação e transformação da produção de

conhecimento em Gestão Social pautados em diferentes caminhos. Tais dinâmicas podem ser

representadas pelas ações empreendidas pelo CIAGS/UFBA, que buscam interagir com os

praticantes, sejam da Gestão Social ou de outros campos, por meio de uma relação na qual

não se impõem as diretrizes da universidade como um contrato, uma condição, mas como

atores que compartilham de um mesmo problema territorial social.

Outro exemplo que ilustra essa perspectiva são os esforços do Instituto IPÊ que

mesmo sendo caracterizado por esta pesquisa como praticante se articula no campo dos

acadêmicos criando metodologias de ensino onde se observa a valorização não só da

integração com atores das comunidades na qual atuam, como da produção de conhecimento

que tenta atender as necessidades de todos os envolvidos. Ressalta-se ainda que, o fato desta

instituição transitar tanto no campo acadêmico como no campo dos praticantes permitem a

eles desenvolverem saberes híbridos que se compreende contribuir para o diálogo, para a

reflexão e para a práxis do campo da Gestão Social.

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A Figura 5 “Relações no Campo da Gestão Social: Perspectivas e Limites na Produção

de Conhecimento” buscou sintetizar as relações que permeiam a produção de conhecimento

sobre Gestão Social baseadas nos aspectos que envolvem este campo de poder.

Adiante, nas considerações finais, evidenciaram-se sinteticamente, as análises que

decorreram da relação entre academia e praticantes no contexto brasileiro de produção de

conhecimento sobre Gestão Social.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se que à Gestão Social são conferidos aspectos da vida social que a tornariam

singular mediante os tipos de gestão assumidos pelas organizações no âmbito da sociedade

civil, do Estado e do mercado.

Nessa realidade, destaca-se a centralidade do ator social caracterizado como agente de

um campo conforme as ações empregadas na estrutura social. Observam-se também processos

de aprendizagem e de produção de conhecimento apoiados na intercessão entre diferentes

atores da sociedade, destacando-se uma relação mediada pelo diálogo, aproximação e

articulação colaborativa, mas também por conflitos, resistências, embates e disputas, que

algumas vezes são marcadas pelo domínio de um determinado grupo ou conjunto de atores

sobre o outro.

É no limiar dessas relações que se torna relevante a pergunta de pesquisa “Como se

dão as relações entre acadêmicos e praticantes no contexto brasileiro da produção de

conhecimento sobre Gestão Social”?

A fim de responder essa pergunta buscou-se explorar e discutir as temáticas cujos

preceitos alinhassem às perspectivas da Gestão Social e as relações entre acadêmicos e

praticantes presentes em seu campo. Nesse âmbito, as discussões teóricas caminharam para

dimensões que sustentassem as possibilidades e os limites de transformação de um campo

apoiadas nas abordagens de campos de poder. A habilidade social compreendida como

possibilidade de conexão entre agente e estrutura foi outro elemento teórico relevante na

análise, bem como a perspectiva de estar alinhada a processos de produção socioprática de

conhecimento entre atores de saberes híbridos (Lave & Wenger, 1991, Bourdieu, 1996,

Fligstein, 2001, Machado-da-Silva, 2005).

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Na condução da pesquisa proposta, destaca-se a relevância do marco teórico

construído para a investigação por nele residir os aspectos ontológicos relativos à Gestão

Social. Infere-se que ao considerar a Gestão Social enquanto campo de poder inserem-se nele

perspectivas de conexão entre atores de campos diferentes permeados por embates, conflitos,

aproximações colaborativas e ações que se apresentam como possibilidade de transformação

de um campo.

A partir dessas perspectivas que podem ser observadas como visão intersetorial, o

recorte empírico ancorou-se em bases epistemológicas que buscassem responder de forma

mais consistente a pergunta de pesquisa. Nesse sentido, foi possível observar uma relação

estreita entre as discussões apontadas no marco teórico e os achados oriundos da pesquisa de

campo, permitindo constatar que a produção de conhecimento sobre Gestão Social que vem

se efetivando a partir das relações entre acadêmicos e praticantes é marcada por diferentes

poderes no seu campo. Nesse campo se vislumbra um aspecto tradicional da universidade

contemporânea, assinalado pelo funcionalismo e pelo tecnicismo presente no eixo do ensino,

da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador que busca nos preceitos da pós-

modernidade formas de interação e dinâmicas permeadas pela habilidade social e por

saberes híbridos. Este quadro evidencia possibilidades de transformação e ressignificação do

campo da Gestão Social ao observar que a produção de conhecimento, mesmo mediada por

embates, se baseia em saberes múltiplos e em propósitos que envolvem a noção de

coletividade social.

A fim de melhor explicitar as ideias que ancoraram os achados desta investigação,

teceram-se algumas considerações. Os objetivos dessa tese conduzidos pela pergunta de

pesquisa serão a seguir explicitados sinteticamente a luz da análise realizada.

A primeira questão que se colocou referiu-se a noção que os acadêmicos e praticantes

detêm sobre a Gestão Social a partir das ações e dinâmicas representativas de seu campo de

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201

atuação. Observou-se que a noção sobre a Gestão Social, tanto dos acadêmicos quanto dos

praticantes foi marcada pelo contexto sociopolítico brasileiro dos anos 1980 e 1990

caracterizado pela forte presença de movimentos sociais reivindicatórios. Este cenário

sociopolítico mediado por pressões de natureza ética e democrática na busca de novas formas

de relacionamento entre o Estado, a sociedade e o mercado, gerou um interesse comum em

querer compreender e atender às demandas sociais vigentes, influenciando decisivamente a

práxis de cada um que se traduziu em dinâmicas e articulações de cunho coletivo.

A ideia de coletividade, observada como princípio norteador na busca de soluções para

os problemas sociais, econômicos e políticos demonstrou constituir a noção que todos os

atores investigados têm sobre a Gestão Social. Essa percepção, relatada por todos os

entrevistados baseia-se na ideia de que “o problema é de todos e por isso a solução deve vir de

todos também”.

Tal aspecto permitiu observar outra noção que circunda uma das temáticas discutidas

sobre a Gestão Social, a ideia de desenvolvimento social marcada pela noção de território. Tal

perspectiva foi constante nos relatos apontados por diferentes atores entrevistados, como por

exemplo do CIAGS/UFBA, do NIPEGS/UFRGS, do CEAPG/FGV, do instituto IPÊ, da

fundação AVINA, do GIFE e das OSCs AVSI e CDM.

A visão intersetorial, aspecto apontado pelos respondentes como crucial nas relações

que são efetivadas no campo da Gestão Social é legitimada pela necessidade de conexão entre

atores de diferentes setores, o que conduz à ideia de interdisciplinaridade e de possibilidades

de formação de saberes híbridos, bases para a produção de conhecimento mediada pela

abordagem socioprática. Vale destacar que esta abordagem pareceu ser a mais adequada para

embasar a produção de conhecimento sobre Gestão Social por ela se ancorar em aspectos que

se referem à construção coletiva, intermediada, respectivamente, pelas percepções e

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202

experiências vividas pelos praticantes marcadas pelas dinâmicas e interseção com outros

contextos sociais.

Outra questão explorada decorre da análise do campo de poder da Gestão Social

mediado pela possibilidade de habilidade social e do hibridismo que se manifestam nas

relações entre acadêmicos e praticantes.

No campo da Gestão Social notou-se a presença de um aspecto constituído de uma

simbologia retratada pelo poder intelectual dos acadêmicos e por um aspecto marcado pelo

poder do conhecimento derivado da experiência profissional dos praticantes. Estes dois

poderes configuram-se em embates no campo da Gestão Social. Ao manifestarem-se em bases

interativas percebeu-se que por vezes a relação entre acadêmicos e praticantes acabava por

legitimar, mesmo que a intencionalidade da ação não fosse essa, processos de produção de

conhecimento que tornavam hegemônico o campo científico. Porém, notou-se também a

presença de relacionamentos em que se evidenciou a valorização de atores de outras esferas e

setores da Gestão Social, bem como o conhecimento de suas práticas o que os conduziu a

novas reflexões e práxis da Gestão Social.

Estes aspectos podem ser percebidos nos relatos dos acadêmicos ao apontarem

interações com os praticantes da Gestão Social mediadas pela valorização de seus saberes e

práticas que demonstravam se configurar em aprendizagem e em conhecimento para todos os

envolvidos. Todavia, tanto os acadêmicos como os praticantes disseram observar um

distanciamento entre esses dois tipos de atores, ao afirmarem que a academia ainda pouco

dialoga com os praticantes e que quando o faz é movida por interesses individuais. Tal

interesse pontual e unilateral também foi observado no campo dos praticantes ao

evidenciarem que estes se aproximam da academia por iniciativa própria (e não

necessariamente de suas organizações) a fim de adquirir base teórica para sustentar suas

práticas e projetos.

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203

A presença da habilidade social foi outro elemento analisado como característica de

um campo capaz de contribuir para a sua transformação. Mediante esse aspecto que se baseia

na capacidade de envolver outros atores a colaborarem para um mesmo fim, pode-se destacar

as dinâmicas e articulações que nortearam a aglutinação de esforços de atores acadêmicos e

praticantes da Gestão Social, seja dentro de uma esfera, como por exemplo do mercado, seja

cruzando as fronteiras entre a esfera estatal, pública e do mercado e, com isso, aprofundando

o hibridismo organizacional e as próprias formas que o conhecimento sobre Gestão Social

adquire.

Observou-se a presença de outro elemento derivado da análise, a formação de saberes

híbridos. Essa perspectiva mostrou-se possível mediante as articulações entre atores diferentes

as quais permitiram criar novas atividades, serviços e produtos distintos de sua natureza. De

forma a ilustrar esse quadro destacam-se as práticas do NEATS/PUC-SP que se apoiam em

projetos e pesquisas constituídos por atores e alunos de cursos variados e, mesmo orientados

para o terceiro setor, direcionam as discussões e produções de conhecimento para outros

campos de conhecimento como o do Direito e do Serviço Social.

O instituto IPÊ pode ser outro exemplo de formação de saberes híbrido no campo da

Gestão Social, uma vez que ele se constituiu como uma OSCIP e, ao mesmo tempo oferece

cursos acadêmicos na área da conservação ambiental.

A Fundação AVINA, conforme dados secundários observados, ao firmar parcerias

com diferentes atores da esfera social como a academia, o Estado e as empresas produzem

trabalhos e pesquisas de diferente natureza que trazem aspectos e saberes de cada campo

envolvido, contribuindo não só para os praticantes, mas também para os outros atores

envolvidos.

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Atrelado a perspectiva de campo de poder, outro objetivo proposto se apoiou nas

possibilidades e limites para a superação dos problemas que envolvem a produção de

conhecimento entre praticantes e acadêmicos.

Neste âmbito, notou-se que tanto no campo dos acadêmicos quanto no dos praticantes

as dinâmicas que sustentam a produção de conhecimento apoiam-se na visão intersetorial por

nela expressar possibilidades de compartilhamento de responsabilidades.

Entre as instituições acadêmicas investigadas, observou-se que o conhecimento

produzido no seu campo de atuação é amparado pela visão intersetorial e pela

transversalidade das ações de ensino, pesquisa e extensão. Apreende-se que tais dinâmicas

comungam com as abordagens que fundamentam a Gestão Social, ao ressaltarem propostas

metodológicas de participação entre os atores envolvidos de modo a possibilitar a reflexão da

práxis vigente nos territórios.

Essa percepção contribuiu para inferir que o conhecimento produzido pelos centros de

estudos e pesquisas sobre Gestão Social integra-se às propostas de superação dos dilemas

enfrentados no ensino da Administração, principalmente, por se alinharem a proposta de

trabalho interdisciplinar ancorada pela integração de saberes híbridos. Todavia, notou-se no

relato de alguns atores acadêmicos uma crítica relativa aos cursos de Administração por não

identificarem a Gestão Social como perspectiva relevante e integrativa desse campo de

conhecimento, relegando-a, quando implementada, como discussão paralela e transversal.

Esse apontamento demonstra um limite presente no âmbito dos acadêmicos que pode ser

expresso pela restrita noção de interdisciplinaridade, reduzindo as possibilidades de produção

de conhecimento sobre a Gestão Social.

Outra crítica que os acadêmicos entrevistados denunciaram e que se compreende

traduzir em um desafio para a produção de conhecimento sobre Gestão Social vincula-se ao

seu campo de construção. A ausência de teorização robusta é um desses limites, caracterizado

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205

pela falta de um olhar integrado que contemple não só as temáticas apontadas, mas as relações

provenientes desse campo. Outra questão que se evidencia como um limite decorre do fato de

que muitos atores, sejam eles praticantes ou acadêmicos acreditam que ainda imperam na

Gestão Social o assistencialismo, o voluntarismo e a baixa profissionalização.

Enquanto possibilidades de geração de conhecimento congruentes com os preceitos da

Gestão Social e com a abordagem socioprática destacam-se as práticas adotadas pelo

CEATS/USP cujos estudos e pesquisa se estendem para um universo fora da realidade

brasileira e contam com a parceria de um grupo de universidades internacionais interessadas

em pesquisar assuntos que refletem o campo da Gestão Social.

O IPÊ, cuja constituição deriva do campo dos praticantes, mas com forte atuação

acadêmica, merece também atenção especial. Observou-se que o processo de aprendizagem e

de produção de conhecimento circundam propostas de interação com os diversos atores

envolvidos em um ecossistema de forma recíproca e mútua e que há uma preocupação em

enfrentar o dilema institucional vivenciado pela universidade contemporânea ao não se

submeter aos apelos econômicos vigentes e/ou aos modelos burocráticos e gerencialistas de

condução de instituições acadêmicas.

No campo dos praticantes a noção que impera sobre a Gestão Social também é

marcada pela visão intersetorial e pela ação coletiva. Todavia, observou-se a presença de

processo de produção de conhecimento munido pela perspectiva hegemônica ao se constituir

através de parcerias em que há a presença de uma hierarquia de conhecimento. O Estado

quando se articula com as organizações da sociedade civil impõe suas regras ancoradas em

princípios previamente definidos sem maior interação e diálogo com atores de outras esferas.

Por outro lado, as organizações da sociedade civil que desempenham o papel de assessoria e

consultoria a outras instituições sociais, reproduzem a mesma característica ao difundirem

para outros atores praticantes da Gestão Social soluções pré-programadas, formatadas e

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difundidas como verdadeiras "receitas de sucesso", muitas vezes baseadas em um ethos

gerencial privado ou empresarial.

Outro aspecto que se configurou em desafio para a produção de conhecimento sobre a

Gestão Social entre os praticantes refere-se a forma como os atores deste campo a reconhece.

Conforme o relato de alguns entrevistados, a perspectiva de Gestão Social permanece

associada às dinâmicas oriundas do terceiro setor e a práticas de responsabilidade social,

sendo que, esta muitas vezes não é compreendida como ato de cidadania, de coletividade para

o bem comum, mas apenas como meio para as organizações sociais conseguirem um apoio e

investimento financeiro.

Todos os entrevistados julgaram relevante reconfigurar as bases das relações que

constituem o campo da Gestão Social, de forma a promover uma maior aproximação entre os

atores através de interações baseadas no interesse comum, trocas que resultem em ganhos

efetivos para os envolvidos na colaboração e valorização das partes envolvidas, relativizando,

mitigando ou mesmo eliminando relações de poder que levam a hierarquias e hegemonias a

partir da natureza (científica ou não, profissionalizada ou não, ...) dos atores e dos saberes

(científico ou não, formalizado ou não, ...) que produzem. Entretanto, apontaram essa

realidade ainda como muito distante e incipiente, por nela se observar desafios que emergem

dos dilemas vivenciados pela universidade contemporânea como a presença da hegemonia

acadêmica sobre o senso comum do outro que não é acadêmico e a institucionalização da

academia por sofrer pressões do mercado, induzindo a produção de conhecimento sustentada

pela "pesquisa de gabinete" e pelo "produtivismo acadêmico".

O diálogo nessa interação evidenciou-se essencial, mas também marcado pelo

distanciamento com que a universidade se relaciona com os praticantes, o que dificulta as

conexões recursivas e, concomitantemente, a produção de conhecimento sobre Gestão Social.

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207

A percepção de um relacionamento distante e, por vezes, divergente da academia

também foi apontada pelos praticantes investigados, apesar de todos terem demonstrado

vivenciarem experiências positivas com as universidades que têm contato.

No campo de atuação da Gestão Social foi perceptível a sobreposição do

conhecimento acadêmico sobre o senso comum dos praticantes como legítimo da

universidade e, por isso passível de reproduzir uma relação hegemônica, mesmo que

acompanhada por interações cordiais e cooperativas.

As formas de condução e de organização das dinâmicas que integram a extensão

universitária também foram questionadas pelos praticantes ao observarem que tais práticas

muitas vezes são desenvolvidas com o intuito de suprir uma demanda que é da academia e

não necessariamente da própria sociedade.

Como perspectiva de enfretamento aos dilemas apresentados, observou-se que o

diálogo entre os atores dotados de saberes híbridos, mediado pela convergência de interesses e

sem fortes assimetrias de poder seriam os elementos propulsores para dinâmicas capazes de

fazer avançar para novas e mais promissoras formas de produção de conhecimento no campo

da Gestão Social. No entanto, essa noção de aproximação e diálogo não pode ser idealizada e

romantizada, como muitas vezes acontece no discurso de atores de diferentes esferas, seja da

sociedade civil, do Estado ou mesmo do mercado, quando estão em jogo empreendimentos

compartilhados e coletivos, no presente estudo, empreendimentos que visam a produção de

conhecimento no campo da Gestão Social. Conforme destacam Rosa, Tureta e Paço-Cunha

(2006), as propriedades formais das palavras, alicerçadas pelas abordagens de Bourdieu

(1996), “desvelam seu sentido apenas se estiverem articuladas às suas condições sociais de

produção, ou seja, às posições ocupadas por seus autores no campo de produção” (Rosa,

Tureta & Paço-Cunha, 2006 p. 7).

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208

A partir dos resultados encontrados, concluiu-se que as formas de conhecimento

produzidas entre acadêmicos e praticantes do campo da Gestão Social possibilitam a

transformação e a ampliação de seu campo, mesmo este sendo tencionado conforme os

moldes delimitados pelos acadêmicos. Observou-se que há um embate entre acadêmicos e

praticantes na medida em que os mesmos demonstram a necessidade de serem reconhecidos e

legitimados como atores relevantes na produção de conhecimento, ou seja, de compreensões

gerais válidas sobre o próprio campo da Gestão Social. Essa percepção baseou-se nos limites

apresentados perante as relações estabelecidas entre eles e que se expuseram revestidos de

alternativas de enfrentamento e de superação dos dilemas recorrentes.

A presente pesquisa buscou avançar na compreensão da relação entre academia e

praticantes no contexto brasileiro de produção de conhecimento sobre Gestão Social.

No seu decorrer foi possível analisar não somente os atributos que circundam a prática

da Gestão Social como também as relações que se estabelecem em seu âmbito e que foram

apontadas pelos próprios entrevistados como elementos relevantes de análise quanto à

produção de conhecimento.

No processo de construção desse campo novas agendas de pesquisa vão surgindo e

novas lacunas vão sobressaindo, ressaltando a necessidade de investigações ulteriores acerca

das circunstâncias sociais e locais que vão surgindo. Conforme ressaltado por um dos

acadêmicos entrevistados, a Gestão Social se consolida nos territórios mediante as demandas

vigentes.

Agendas futuras de investigação que se fazem relevantes e promissoras envolvem a

problematização dos saberes ambientais e sua inserção na construção de conhecimento em

Gestão Social, a relação entre centros de investigação baseados nos países centrais e em

países emergentes e periféricos, a trajetória de indivíduos que alternam carreiras entre o

espaço acadêmico e a prática da Gestão Social e a relação entre o contexto sociopolítico e os

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temas centrais que originam pesquisas, análises e diferentes produtos de divulgação de

conhecimento científico e saberes produzidos por praticantes desse campo. Esses são alguns

dos temas que espera-se sejam constitutivos de novas investigações que acabem por,

recursivamente, levar os atores acadêmicos e praticantes da Gestão da Social a repensar seu

lugar, ação e sentido nesse campo.

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228

APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA DE TESTE

APLICADA AOS ACADÊMICOS

1) Fale sobre sua trajetória profissional e seu envolvimento no centro de estudo e

pesquisa.

2) Como surgiu o centro de estudo e pesquisa? Qual a proposta e os objetivos iniciais

dele? Como o centro de estudo e pesquisa evoluiu ao longo do tempo? Quais são as

principais atividades desenvolvidas atualmente por ele? Quais os avanços obtidos e os

desafios a serem superados?

3) Na sua avaliação, qual a compreensão que a comunidade acadêmica brasileira

desenvolveu ao longo dos anos sobre a Gestão Social? Quais são os grupos de

pesquisa e pesquisadores mais relevantes nessa trajetória?

1) Como o centro de estudo e pesquisa compreende a Gestão Social? Quais são os

principais elementos que compõem o campo da Gestão Social para o centro de estudo

e pesquisa? Como deve ser estudada a Gestão Social segundo o centro de estudo e

pesquisa?

2) Qual o papel dos seguintes elementos na produção de conhecimento em Gestão Social:

a) Interdisciplinaridade;

b) Articulação entre teoria e prática;

c) Formação crítica para o exercício da gestão;

d) Politização das discussões e análises.

3) Quais são os principais atores que compõem os chamados praticantes da Gestão

Social? Qual o papel dos praticantes na produção e difusão de conhecimento sobre

Gestão Social?

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229

4) Como você avalia a produção de conhecimento sobre Gestão Social gerada por ONGs,

órgãos governamentais, organismos internacionais e mídia? O que essa produção

contém de relevante? Quais são os desafios a superar?

5) Como você analisa a relação entre universidade e sociedade hoje no Brasil? Você acha

que a legitimidade da universidade está em xeque nos dias atuais? Quais avanços

aconteceram nessa interação? E os desafios ainda por superar? Como o centro de

estudo e pesquisa se posiciona nesse contexto?

6) Como você analisa a relação entre ensino, pesquisa e extensão na produção de

conhecimento sobre Gestão Social? Como se dá a relação entre o ensino, pesquisa e

extensão no centro de estudo e pesquisa? Como ele tenta superar os problemas da

desarticulação entre ensino, pesquisa e extensão?

7) Como você analisa o chamado produtivismo acadêmico? Quais os seus impactos na

produção e difusão de conhecimento sobre Gestão Social? Como o centro de estudo e

pesquisa tenta fazer frente aos problemas gerados pelo produtivismo acadêmico?

8) Qual a importância do diálogo entre acadêmicos e praticantes para a produção de

conhecimento sobre Gestão Social? Quais são os fatores que facilitam e dificultam a

aproximação entre acadêmicos e praticantes da Gestão Social? Qual o impacto desses

fatores na produção e difusão de conhecimento sobre Gestão Social?

9) É possível gerar conhecimento academicamente consistente que também seja capaz de

gerar impactos relevantes sobre a realidade dos praticantes da Gestão Social? Quais

são os desafios a serem superados? Como o centro de estudo e pesquisa procura atuar

para que isso aconteça?

10) Como se dá a aprendizagem dos praticantes da Gestão Social a partir do

conhecimento gerado pelo centro de estudo e pesquisa?

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11) E como se dá a aprendizagem pelo centro de estudo e pesquisa daquilo que é

produzido pelos praticantes da Gestão Social? Quais os principais avanços e os

desafios a superar na inserção de acadêmicos na realidade dos praticantes da Gestão

Social?

12) Qual o papel do público beneficiário na produção de conhecimento sobre Gestão

Social? Como o centro de estudo e pesquisa trabalha a relação com o público

beneficiário em seus projetos de investigação e produção de conhecimento? Quais os

elementos que facilitam e dificultam a interação com o público beneficiário?

13) Qual o projeto desenvolvido pelo centro de estudo e pesquisa que teve maior

relevância para a produção e difusão de conhecimento em Gestão Social? Quais

elementos levaram esse projeto ter essa projeção?

14) Como ocorre atualmente o financiamento da produção de conhecimento sobre Gestão

Social? Quem são os principais financiadores da pesquisa sobre Gestão Social

atualmente? Quais os avanços alcançados e os desafios a serem superados quanto ao

financiamento de pesquisas sobre Gestão Social?

15) Como você enxerga o futuro do centro de estudo e pesquisa? Quais são os desafios a

superar?

16) E o futuro da produção de conhecimento sobre Gestão Social no Brasil e no mundo?

17) Você gostaria de acrescentar alguma informação?

Escolaridade/Formação:

Tempo de Trabalho:

Atual organização onde trabalha:

Cargo no centro de estudo e pesquisa:

Tempo de Trabalho no centro de estudo e pesquisa:

Presta consultoria?

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APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTAS SEMIESTRUTURADA

APLICADA AOS ACADÊMICOS

18) Fale sobre sua trajetória profissional e seu envolvimento no centro de estudo e

pesquisa.

19) Como surgiu o centro de estudo e pesquisa? Qual a proposta e os objetivos iniciais

dele? Como o centro de estudo e pesquisa evoluiu ao longo do tempo? Quais são as

principais atividades desenvolvidas atualmente por ele? Quais os avanços obtidos e os

desafios a serem superados?

20) Qual a sua avaliação sobre a compreensão que a comunidade acadêmica brasileira

desenvolveu ao longo dos anos sobre a Gestão Social? Quais são os grupos de

pesquisa e pesquisadores mais relevantes nessa trajetória?

21) Como o centro de estudo e pesquisa compreende a Gestão Social? Quais são os

principais elementos que compõem o campo da Gestão Social para o centro de estudo

e pesquisa? Como deve ser estudada a Gestão Social segundo o centro de estudo e

pesquisa?

22) Qual o papel dos seguintes elementos na produção de conhecimento em Gestão Social:

e) Interdisciplinaridade;

f) Articulação entre teoria e prática;

g) Formação crítica para o exercício da gestão;

h) Politização das discussões e análises.

23) Quais são os principais atores que compõem os chamados praticantes da Gestão

Social? Qual o papel dos praticantes na produção e difusão de conhecimento sobre

Gestão Social?

Page 233: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

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24) Como você avalia a produção de conhecimento sobre Gestão Social gerada por ONGs,

órgãos governamentais, organismos internacionais e mídia? O que essa produção

contém de relevante? Quais são os desafios a superar?

25) Como você analisa a relação entre universidade e sociedade hoje no Brasil? Você acha

que a legitimidade da universidade está em xeque nos dias atuais? Quais avanços

aconteceram nessa interação? E os desafios ainda por superar? Como o centro de

estudo e pesquisa se posiciona nesse contexto?

26) Como você analisa a relação entre ensino, pesquisa e extensão na produção de

conhecimento sobre Gestão Social? Como se dá a relação entre o ensino, pesquisa e

extensão no centro de estudo e pesquisa? Como ele tenta superar os problemas da

desarticulação entre ensino, pesquisa e extensão?

27) Como você analisa o chamado produtivismo acadêmico? Quais os seus impactos na

produção e difusão de conhecimento sobre Gestão Social? Como o centro de estudo e

pesquisa tenta fazer frente aos problemas gerados pelo produtivismo acadêmico?

28) Qual a importância do diálogo entre acadêmicos e praticantes para a produção de

conhecimento sobre Gestão Social? Quais são os fatores que facilitam e dificultam a

aproximação entre acadêmicos e praticantes da Gestão Social? Qual o impacto desses

fatores na produção e difusão de conhecimento sobre Gestão Social?

29) É possível gerar conhecimento academicamente consistente que também seja capaz de

gerar impactos relevantes sobre a realidade dos praticantes da Gestão Social? Quais

são os desafios a serem superados? Como o centro de estudo e pesquisa procura atuar

para que isso aconteça?

30) Como se dá a aprendizagem dos praticantes da Gestão Social a partir do

conhecimento gerado pelo centro de estudo e pesquisa?

Page 234: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

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31) E como se dá a aprendizagem pelo centro de estudo e pesquisa daquilo que é

produzido pelos praticantes da Gestão Social? Quais os principais avanços e os

desafios a superar na inserção de acadêmicos na realidade dos praticantes da Gestão

Social?

32) Qual o papel do público beneficiário na produção de conhecimento sobre Gestão

Social? Como o centro de estudo e pesquisa trabalha a relação com o público

beneficiário em seus projetos de investigação e produção de conhecimento? Quais os

elementos que facilitam e dificultam a interação com o público beneficiário?

33) Qual o projeto desenvolvido pelo centro de estudo e pesquisa que teve maior

relevância para a produção e difusão de conhecimento em Gestão Social? Quais

elementos levaram esse projeto ter essa projeção?

34) Como ocorre atualmente o financiamento da produção de conhecimento sobre Gestão

Social? Quem são os principais financiadores da pesquisa sobre Gestão Social

atualmente? Quais os avanços alcançados e os desafios a serem superados quanto ao

financiamento de pesquisas sobre Gestão Social?

35) Como você enxerga o futuro do centro de estudo e pesquisa? Quais são os desafios a

superar?

36) E o futuro da produção de conhecimento sobre Gestão Social no Brasil e no mundo?

37) Você gostaria de acrescentar alguma informação?

Escolaridade/Formação:

Tempo de Trabalho:

Atual organização onde trabalha:

Cargo no centro de estudo e pesquisa:

Tempo de Trabalho no centro de estudo e pesquisa:

Presta consultoria?

Page 235: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

234

APÊNDICE C – ROTEIRO DE ENTREVISTAS SEMIESTRUTURADA

APLICADA AOS PRATICANTES

1) Fale sobre sua trajetória profissional e seu envolvimento na OSC.

2) Como surgiu a OSC? Qual a proposta e os seus objetivos iniciais? Quais são as

principais atividades desenvolvidas atualmente pelos projetos da OSC?

3) Como você observa a compreensão que as organizações da sociedade civil, privadas e

públicas desenvolveram ao longo dos anos sobre a responsabilidade social?

4) Como a OSC compreende a responsabilidade social?

5) Como a OSC compreende o conhecimento que é gerado a partir de suas práticas e

articulações intersetoriais? De que forma esse conhecimento é produzido e

disseminado por ele?

6) Quais são os principais atores que compõem os chamados praticantes da

responsabilidade social? Qual o papel desses praticantes na produção e difusão de

conhecimento sobre o desenvolvimento social?

7) Como você avalia a produção de conhecimento sobre a responsabilidade social gerada

por ONGs, órgãos governamentais, empresas privadas?

8) Como você analisa a relação entre organizações da sociedade civil, privadas e públicas

e universidade hoje no Brasil? Você acha que a legitimidade da universidade está em

xeque nos dias atuais? Como a OSC se posiciona nesse contexto?

9) Qual a importância do diálogo entre praticantes e acadêmicos para a produção de

conhecimento sobre a responsabilidade social? Quais são os fatores que facilitam e

dificultam a aproximação entre praticantes da responsabilidade social e acadêmicos?

10) Existem conflitos entre praticantes do campo das organizações privadas e

acadêmicos? Qual a natureza desses conflitos? Por que eles ocorrem? Qual o impacto

deles na produção e difusão de conhecimento sobre a responsabilidade social?

Page 236: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa …...instrumentalismo presente no eixo do ensino, da pesquisa e da extensão e por um aspecto inovador o qual busca nos

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11) É possível gerar conhecimento sobre a responsabilidade social consistente que

também seja capaz de gerar impactos relevantes sobre a realidade da academia? Quais são

os desafios a serem superados? Como a OSC procura atuar para que isso aconteça?

12) Como se dá a aprendizagem dos praticantes das organizações privadas a partir do

conhecimento gerado pela OSC?

13) E como se dá a aprendizagem pelos praticantes das organizações privadas daquilo que

é produzido pela academia?

14) Qual o projeto/programa desenvolvido pela OSC que teve maior relevância para a

produção e difusão de conhecimento sobre o Desenvolvimento social? Quais

elementos levaram esse projeto/programa a ter essa projeção?

15) Como ocorre atualmente o financiamento da produção de conhecimento sobre a

responsabilidade social no âmbito dos praticantes? Quais os avanços alcançados e os

desafios a serem superados quanto a esse tipo de financiamento?

16) Como você enxerga o futuro da OSC?

17) E o futuro da produção de conhecimento sobre a responsabilidade social no Brasil e

no mundo?

18) Você gostaria de acrescentar alguma informação?

Escolaridade/Formação:___________________

Idade: _________________________________

Tempo de Trabalho: ______________________

Organização Atual: _______________________

Cargo na OSC:_________________________

Tempo de Trabalho na OSC:______________

Presta consultoria?_________________________