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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC/SP CRISTIANE GOULART CHEREM MEDIDAS CAUTELARES EM FACE DA LEI 12.403/11 MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO 2013

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO ......eficiência do processo penal, em sendo adotadas as novas medidas cautelares. Durante a verificação, detectou-se que, de modo

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC/SP

CRISTIANE GOULART CHEREM

MEDIDAS CAUTELARES EM FACE DA LEI 12.403/11

MESTRADO EM DIREITO

SÃO PAULO

2013

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CRISTIANE GOULART CHEREM

MEDIDAS CAUTELARES EM FACE DA LEI 12.403/11

MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL PENAL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para obtenção do título de Mestre

em Direito Processual Penal sob a orientação da

Professora Doutora Eloisa de Sousa Arruda.

SÃO PAULO

2013

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Banca Examinadora

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Ao Rodrigo, meu esposo, por ter aparecido em minha vida. Por

ser o meu maior e melhor incentivo. Porque, ao seu lado, tenho a

plena certeza de que posso conquistar tudo o que quiser.

Obrigada.

À minha mãe Edite, pelo companheirismo e torcida, e também

por sempre me dizer, especialmente nos momentos mais

difíceis: “vai dar tudo certo!”.

Ao meu pai Valmir, por ter acreditado em minha vontade de

trillhar o caminho do Direito.

Aos meus irmãos Fernando e Tamiris, amigos e nobres juristas,

que assim como eu encontraram no Direito não apenas a

oportunidade de uma carreira ou profissão, mas principalmente

uma maneira de encarar e realizar a vida.

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AGRADECIMENTOS

Aos professores da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Dr. Marco

Antônio Marques da Silva, Dr. Cláudio José Pereira Langroiva, e Dr. Roberto F. Archanjo da

Silva, pelos incansáveis ensinamentos, que transcendem o Direito.

À professora Dra. Eloisa de Souza Arruda, pelas maravilhosas aulas de Processo

Penal, bem como pela orientação.

Aos colegas que conheci no Mestrado da Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo, especialmente à Mariana Stuart Nogueira, Leonardo Peret, Marcelle Tasoko e Manola

Barcos, pela parceria nos estudos.

A todos os professores e colegas da Unisul que incentivaram-me.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo analisar a Lei 12.403/11, especialmente em vista das

medidas cautelares pessoais diversas da prisão que passaram a integrar o sistema processual

penal. Para a consecução de tal finalidade, utilizou-se o procedimento metodológico dedutivo

e a técnica de pesquisa bibliográfica, com emprego de livros, doutrinas, artigos científicos de

revistas especializadas, jurisprudências e a legislação que envolve o conhecimento e o

desenvolvimento do assunto. O estudo do tema proposto justifica-se na medida em que a

referida Lei altera o paradigma processual penal que se concentrava basicamente na prisão

cautelar e na liberdade provisória, com ou sem fiança, estabelecendo várias providências

descarcerizadoras, as quais, se efetivamente aplicadas, tendem a desafogar o sistema

carcerário brasileiro, bem como melhor adequar o Código de Processo Penal à Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988. A cautelaridade no processo penal resta

revigorada com a inovação legislativa, o que também identifica a relevância do tema. Por

meio dos estudos realizados, busca-se estabelecer um panorama quanto à possibilidade de

eficiência do processo penal, em sendo adotadas as novas medidas cautelares. Durante a

verificação, detectou-se que, de modo geral, a nova Lei oferece mecanismos processuais

penais compatíveis com um processo penal constitucional, propiciando a efetivação de um

resultado justo. De outro lado, registra-se a necessidade de aplicação da nova Lei pelos

operadores do Direito, sob pena de, como tantos outros textos legislativos, tornar-se

esquecida, propiciando um abismo entre a teoria e a prática, perdendo-se grande oportunidade

de realizar-se o processo penal com proporcionalidade.

Palavras-chave: Medidas Cautelares Pessoais Advindas da Lei 12.403/11. Proporcionalidade

no Processo Penal. Aplicação.

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ABSTRACT

The present work aims to analyze the law 12.403/11, especially in view of the personal

protective measures, others than prison, that became part of the criminal justice system. To

achieve this purpose, was used the deductive methodology and technical literature, employing

books, doctrines, scientific articles in journals, case law and legislation that involves

knowledge and the subject's development. The study of the proposed topic is justified to the

extent that the said law changes the paradigm of criminal procedure which focused primarily

on the precautionary arrest and provisional freedom, with or without bail, setting several

measures of none-jail which, if implemented effectively, tend to vent the Brazilian prison

system, as well better suit the Criminal Procedure Code to the 1988 Constitution of the

Federative Republic of Brazil. The precaution in criminal proceedings remains invigorated

with legislative innovation, which also identifies the importance of the topic. Through the

studies, it is seek to establish an overview about the possibility of efficiency of criminal

procedure being adopted in the new precautionary measures. During the survey, it was found

that, in general, the new law provides criminal procedural mechanisms compatible with a

constitutional criminal procedure, allowing the realization of a just outcome. On the other

hand, evince the need to implement the new law by the judiciary operators, otherwise, like so

many other pieces of legislation become forgotten, providing a gap between theory and

practice, losing great opportunity to perform a prosecution with proportionality.

Keywords: Personal protective measures stemming from the law 12.403/11. Proportionality in

criminal proceedings. Enforcement.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................

2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO .........

2.1 O PROCESSO PENAL À LUZ DE UMA VISÃO PÓS-POSITIVISTA DO

DIREITO ..........................................................................................................................

2.2 O FUNDAMENTO DA DIGNIDADE HUMANA ...................................................

2.3 DEVIDO PROCESSO LEGAL .................................................................................

2.4 ACESSO À JUSTIÇA ...............................................................................................

2.5 MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS ..........................................................

2.6 LEGALIDADE ..........................................................................................................

2.7 CONTRADITÓRIO ...................................................................................................

2.8 AMPLA DEFESA ......................................................................................................

2.9 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA ...............................................................................

2.10 PRINCÍPIO DO “FAVOR REI” ..............................................................................

2.11 EFICIÊNCIA, EFICÁCIA E EFETIVIDADE DO PROCESSO PENAL ..............

2.12 PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE .................................................

2.12.1 A razoabilidade na duração do processo penal ...............................................

3. A CAUTELARIDADE NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO ........................

3.1 A RELAÇÃO ENTRE O PROCESSO CIVIL E O PROCESSO PENAL ................

3.2 CONCEITO DE MEDIDAS CAUTELARES ...........................................................

3.3 CLASSIFICAÇÃO ....................................................................................................

3.4 CARACTERÍSTICAS ...............................................................................................

3.5 PRESSUPOSTOS ......................................................................................................

4 AS PRISÕES CAUTELARES NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO – À

LUZ DA LEI 12.403/11 .................................................................................................

4.1 CONCEITO ...............................................................................................................

4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PRISÕES CAUTELARES ..................................

4.3 A FINALIDADE DA LEI 12.403/11 ........................................................................

4.4 ESPÉCIES ..................................................................................................................

4.4.1 Prisão em flagrante ...............................................................................................

4.4.1.1 Conceito e natureza jurídica .................................................................................

4.4.1.2 Sujeito ativo e sujeito passivo ..............................................................................

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4.4.1.3 Espécies de flagrante ...........................................................................................

4.4.1.4 Procedimento .......................................................................................................

4.5 PRISÃO PREVENTIVA ...........................................................................................

4.5.1 Conceito e finalidade .............................................................................................

4.5.2 Legitimidade ..........................................................................................................

4.5.3 Espécies e condições – visão geral ........................................................................

4.5.4 O “fumus comissi delicti” e o “periculum libertatis” na prisão preventiva ...

4.5.4.1 Análise dos pressupostos jurídicos do art. 313 do Código de Processo Penal ....

4.5.4.2 Análise dos pressupostos fáticos do art. 312 do Código de Processo Penal ......

4.5.4.2.1 Garantia da ordem pública ................................................................................

4.5.4.2.2 Garantia da ordem econômica ...........................................................................

4.5.4.2.3 Conveniência da instrução criminal ..................................................................

4.5.4.2.4 Asseguramento da aplicação da Lei Penal ........................................................

4.5.5 Vedação legal à prisão preventiva .......................................................................

4.5.6 Prisão domiciliar ..................................................................................................

4.6 PRISÃO TEMPORÁRIA ..........................................................................................

4.7 A (I)LEGALIDADE DA PRISÃO PARA AVERIGUAÇÕES ................................

4.8 FORMA DE CUMPRIMENTO DA PRISÃO CAUTELAR ....................................

4.8.1 Prisão especial .......................................................................................................

4.8.1.1 Prisão domiciliar - Lei n. 5.256/67 .....................................................................

4.8.1.2 Sala de Estado Maior ...........................................................................................

4.9 BANCO NACIONAL DE PRISÕES ........................................................................

5. O INSTITUTO DA LIBERDADE PROVISÓRIA DIANTE DA LEI 12.403/11 .

5.1 CONCEITO E FINALIDADE ...................................................................................

5.2 CABIMENTO ............................................................................................................

5.2.1 A discussão sobre a inafiançabilidade e a proibição da liberdade provisória..

5.3 ESPÉCIES .................................................................................................................

6. AS MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS DIVERSAS DA PRISÃO

ADVINDAS DA LEI 12.403/11 ................................................................................

6.1 REGRAS E CRITÉRIOS GERAIS PARA A IMPOSIÇÃO DAS MEDIDAS

CAUTELARES INTRODUZIDAS PELA LEI 12.403/11 .............................................

6.1.1 A aplicação das medidas com a prévia oitiva do imputado – contraditório

imediato ...........................................................................................................................

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6.1.2 Vedações à imposição de medida cautelar descarcerizadora ............................

6.2 INICIATIVA ..............................................................................................................

6.3 ESPÉCIES .................................................................................................................

6.3.1 Comparecimento em Juízo para informar e justificar atividades ....................

6.3.2 Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares ..............................

6.3.3 Proibição de manter contato com pessoa determinada .....................................

6.3.4 Proibição de ausentar-se da Comarca ou do País ..............................................

6.3.5 Recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga .....................

6.3.6 Suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza

econômica ou financeira ................................................................................................

6.3.7 Internação provisória do inimputável ou semi-imputável ................................

6.3.8 Fiança .....................................................................................................................

6.3.9 Monitoramento eletrônico ....................................................................................

6.3.10 Proibição de ausentar-se do País, com determinação de entrega do

passaporte .......................................................................................................................

6.4 MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS NÃO PRISIONAIS DISPOSTAS NA

LEGISLAÇÃO ESPECIAL .............................................................................................

6.5 A ESCALA DE GRAVIDADE DAS MEDIDAS CAUTELARES NÃO

PRISIONAIS ADVINDAS DA LEI 12.403/11..............................................................

6.6 A DETRAÇÃO PENAL E A LEI 12.403/11 ............................................................

6.7 O PRAZO DE DURAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES NÃO PRISIONAIS.

6.8 (IN)EXISTÊNCIA DO PODER GERAL DE CAUTELA JURISDICIONAL NO

PROCESSO PENAL BRASILEIRO ...............................................................................

6.8.1 O Poder geral de cautela do juiz no Código de Processo Civil .........................

6.8.2 A (im)possibilidade de aplicação no Processo Penal do poder geral de

cautela do juiz ................................................................................................................

6.9 A NECESSIDADE DE EFETIVA APLICAÇÃO DA LEI 12.403/11 E A

FISCALIZAÇÃO DAS MEDIDAS DESCARCERIZADORAS....................................

CONCLUSÃO ................................................................................................................

REFERÊNCIAS .............................................................................................................

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1 INTRODUÇÃO

A cautelaridade no processo penal restou revigorada depois da Lei 12.403, de 04

de maio de 2011, que inseriu no Código de Processo Penal instrumentos indispensáveis à

realização de um processo penal eficiente, adequado.

As medidas introduzidas pela nova Lei objetivaram tornar a prisão cautelar a

“ultima ratio” do sistema das providências cautelares pessoais, em observância ao que já

preconizava a Constituição da República Federativa do Brasil, trazendo ao juiz a possibilidade

de aplicação de medidas cautelares incidentes sobre a pessoa do indiciado ou réu, diversas da

prisão, visando a modificar o contexto pragmático que se sedimentou de banalização da prisão

processual.

Todavia, as medidas diversas da prisão trazidas pela referida Lei não podem ser

aplicadas de forma indiscriminada, dissociadas de condições indispensáveis à respectiva

imposição, traçadas pela lei e por princípios constitucionais.

Assim, no segundo capítulo, tratar-se-á dos princípios constitucionais mais

elementares do processo penal, tais como: dignidade humana, presunção de inocência, devido

processo legal e proporcionalidade, os quais norteiam a ideia de uma prestação jurisdicional

efetiva, em uma ótica pós-positivista, de construção do direito a partir de valores

constitucionais.

No terceiro capítulo, será analisada a cautelaridade no processo penal, seus

princípios norteadores, e sua relevância para a consecução de uma prestação jurisdicional

capaz de atenuar os riscos que o tempo pode trazer ao processo.

No quarto capítulo, far-se-á a abordagem da história das prisões cautelares até o

advendo da Lei 12.403/11, bem como as espécies de prisões processuais, com todas as suas

especificidades.

O instituto da liberdade provisória, bastante alterado com a reforma em questão,

também será objeto de estudo, precisamente no quinto capítulo, no qual poderá ser observado,

por exemplo, se a nova sistemática foi capaz de trazer uma solução viável à problemática

instalada já, há algum tempo, na doutrina e, em especial, na jurisprudência, sobre o cabimento

ou não da liberdade provisória em crime hediondo ou a ele equiparado.

Já, no sexto capítulo, discorrer-se-á sobre as espécies de medidas cautelares

diversas da prisão trazidas pela Lei 12.403/11, seus critérios de aplicação, bem como sobre

um instituto que costuma ser, de um modo geral, pouco analisado pela doutrina, que é o

chamado poder geral de cautela do juiz no processo penal brasileiro.

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O presente estudo adota como principais vetores o fundamento da dignidade

humana, inserto no art. 1º, inc. III da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

e a efetividade da prestação jurisdicional, que se traduz na necessidade de realização do “jus

puniendi” do Estado, sem descurar da liberdade do indivíduo, aplicando-se as regras

processuais em uma perspectiva principiológica constitucional de realização dos direitos

fundamentais.

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2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

2.1 O PROCESSO PENAL À LUZ DE UMA VISÃO PÓS-POSITIVISTA DO DIREITO

A história mostra que o modelo juspositivista, que traduz a ideia de que a justiça

necessariamente é encontrada na lei, preconizando, outrossim, a separação do direito da

moral, escondeu e mesmo legitimou arbitrariedades e tratamentos desumanos, uma vez que a

lei, em sentido formal, bastava ao Direito. Todavia, o modelo pós-positivista propugna uma

concepção do direito a partir de princípios constitucionais, ou seja, uma visão principialista,

rompendo com a compreensão de mera subsunção do fato à norma.

O intento pela adoção do modelo jurídico pós-positivista surgiu no final do século

XX, e visou vencer o modelo juspositivista, que imperou durante o referido século.

Atualmente, vivemos a era do pós-positivismo, em que o cumprimento da

Constituição compreende preocupação precípua, mormente no que atine a efetivação dos

direitos fundamentais.

O ordenamento jurídico, portanto, passa a ser encarado não apenas como um

conjunto de normas, cujo fundamento último de validade encontra a Constituição, mas

também como um sistema em que esta Lei Maior possui valores em si, a serem obedecidos

por todos os operadores do direito, em todas as esferas.1

Com a passagem do modelo juspositivista para o pós-positivista (também

chamado de “neoconstitucionalista” ou “constitucionalismo avançado”), o direito passou a ser

percebido não apenas como ele é, mas sim, como ele deve ser. Dessa forma, o direito passa a

ser visto não mais como mera descrição da forma de organização do poder, mas sim, como

um modelo axiológico, em que o direito positivo deve se enquadrar, conforme pontua

Baltazar.2

Nesse contexto, a Constituição ganha força normativa, não apenas porque contém

regras que delimitam a organização do poder, mas especialmente porque contém valores

axiológicos que devem nortear a atuação de qualquer pessoa ou entidade.

1 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 9-10. 2 BALTAZAR, Antonio Henrique Lindemberg. Neoconstitucionalismo – um novo pensar o Direito. Consulex, Brasília, DF, ano XIII, n. 300, p. 57, Jul. 2009.

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No juspositivismo “o modelo adequado para explicar (ou dar conta de) a estrutura

de um sistema jurídico é o modelo das regras. Por regras, deve-se entender normas que

correlacionam a descrição fechada de um caso com uma solução normativa.”3

Ademais, nesse modelo, normas abertas, imprecisas, constituem defeitos do

sistema jurídico, porque, ao exigirem decisão por parte de seus destinatários, “supõem sempre

um desvio do ideal regulador da certeza jurídica, da previsibilidade das consequências

jurídicas das condutas.”4

O modelo pós-positivista considera que “para se dar conta da estrutura de um

sistema jurídico deve-se considerar que, além de regras, há princípios jurídicos.”5 Isso implica

reconhecer que existem normas que propugnam uma solução normativa, mas que não definem

um caso.6

O direito, então, passa a ser contruído diante da situação em concreto, à luz dos

princípios que norteiam a Lei Maior.

Para se alcançar essa visão pós-positivista do direito, deve-se realizar uma leitura

moral da Constituição, identificando que o Direito é, em especial, constituído de valores,

princípios, adotando-se, outrossim, o critério da ponderação como técnica de interpretação de

solução de conflitos normativos, porque, nesse cenário, há uma coexistência de valores

aparentemente contraditórios, que devem ser harmonizados no caso concreto.

Não se olvide que essa nova maneira de pensar o direito também propugna o

fortalecimento dos direitos fundamentais, eis que a justiça não é mais necessariamente

encontrada na literalidade da lei. De outro lado, não se pode entender o pós-positivismo como

a negação de regras normativas, uma vez que admite a coexistência no ordenamento jurídico,

tanto de regras quanto de princípios, mas estes últimos em número maior, à luz do que

discorre Sanchis (apud Baltazar).7

3 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 105-106. 4 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 105-106. 5 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 105-106. 6 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 105-106. 7 BALTAZAR, Antonio Henrique Lindemberg. Neoconstitucionalismo – um novo pensar o Direito. Consulex, Brasília, DF, ano XIII, n. 300, p. 57, Jul. 2009.

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Neste cenário, pensamos que o processo penal não pode mais ser compreendido

apenas por regras, mas sim, com base em princípios, explícitos e implícitos, preconizados pela

Lei Maior, tais como: dignidade humana, liberdade e proporcionalidade.

Igualmente, tem-se que regras processuais penais insertas na lei

infraconstitucional não podem constituir empecilho ao direito fundamental à tutela

jurisdicional adequada, haja vista que, nessa perspectiva, todas as normas devem ser

compreendidas a partir da Lei Maior.

Nesta senda, Marinoni pontua:

[...] Os direitos fundamentais materiais, além de servirem para iluminar a compreensão do juiz sobre o direito material, conferem à jurisdição o dever de protegê-los (ainda que o legislador tenha se omitido), ao passo que o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva incide sobre a atuação do juiz como “diretor do processo”, outorgando-lhe o dever de extrair das regras processuais a potencialidade necessária para dar efetividade a qualquer direito material (e não apenas aos direitos fundamentais materiais) e, ainda, a obrigação de suprir as lacunas que impedem que a tutela jurisdicional seja prestada de modo efetivo a qualquer espécie de direito.8

Ou seja, nessa ótica de efetividade da tutela jurisdicional diante do conflito a ser

resolvido, o magistrado deve extrair das regras processuais penais todo o substrato

constitucional que a mesma deve resguardar. Ademais, interpretação isolada de texto de lei,

ainda que o dispositivo esteja inserto na Constituição, não se coaduna com a ideia de tutela

jurisdicional efetiva, adequada.

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça, construindo o direito diante das

especificidades do caso concreto, a partir de princípios provenientes da Lei Maior, admitiu a

possibilidade de interceptação telefônica, em hipóteses excepcionais, na esfera processual

civil. No caso cível em questão, foram apuradas evidências de subtração de menor, o que

encontra tipificação no art. 237 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Tal decisão

demonstra que, para se realizar uma tutela jurisdicional adequada, a letra da lei, isoladamente

considerada, ainda que inserta na Constituição, pode ser vencida no caso concreto.9-10

8 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil. Teoria geral do processo. Volume I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 133. 9 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 203405 / MS - Habeas Corpus. Relator: Min. Sidnei Beneti. Terceira Turma. Data do julgamento: 28/06/2011. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=203405+habeas+corpus&b=ACOR> . Acesso em: 09 de março de 2013. 10 A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 5º, inc. XII, dispõe que: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas,

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É nesta ótica de construção do direito com base em princípios constitucionais,

ponderando valores no caso concreto, que o estudo proposto é iniciado e finalizado, com

enfoque na aplicação das medidas cautelares pessoais trazidas pela Lei 12.403/11. Porém,

antes de adentrar-se no estudo propriamente dito da cautelaridade no âmbito do processo

penal, com as respectivas especificidades, discorrer-se-á sobre alguns princípios

constitucionais reputados basilares para a concepção e efetividade do processo penal.

2.2 O FUNDAMENTO DA DIGNIDADE HUMANA

Não constitui tarefa das mais fáceis conceituar o princípio da dignidade humana,

parecendo que se nos perguntarem o que ele é, não saberemos dizer, mas se não nos

perguntarem, saberemos do que ele trata.

O princípio da dignidade humana confere unidade ética e sentido ao ordenamento

jurídico, constituindo a razão de ser deste.11

Em uma acepção bastante abstrata, o princípio da dignidade da pessoa humana

pode ser compreendido como um supraprincípio, não admitindo restrição, sendo vedado

sujeitá-lo à ponderação, nem mesmo em prol de interesses coletivos.12

Ferreira Santos observa que:

Em virtude da primazia da dignidade da pessoa humana, esta há de permanecer inalterável qualquer que seja a situação em que a pessoa se encontre, constituindo, em consequência, um minimum invunerável que todo o ordenamento jurídico deve assegurar, e que nenhum outro princípio, valor, ser pode sacrificar.13

Isto porque o ser humano é um ser vivo que vem ao mundo como pessoa, sendo

dotado de inteligência, a qual não pertence a nenhum outro ser, como os animais ou os

vegetais.14

salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.” (BRASIL, 1988) 11 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo IV. Coimbra: Editora Coimbra, 2000, p. 180-181. 12 SARMENTO, Daniel. A Ponderação de Interesses na Constituição Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 73. 13 SANTOS, Fernando Ferreira. Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Fortaleza: Celso Bastos, 1999, p. 105. 14 MATOS, Inês Lobinho. A Dignidade da Pessoa Humana na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, mormente, em Matéria de Direito Penal e Direito Processual Penal. In, MIRANDA,

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Nesse sentido:

Todo o ser é digno, seja criminoso ou santo, atleta ou doente, bom ou mau. [...] Todas estas valorações são alheias a este princípio, pois tratam-se de critérios pré-definidos, que não transformam um ser mais ou menos merecedor de ter dignidade. Homem não escolhe se quer ter ou não dignidade, nem esta pode, em momento algum, ser olvidada. Em suma, estamos perante o valor dignidade como valia máxima que caracteriza os seres humanos e os singulariza em relação aos outros seres vivos.15

Todo e qualquer instituto de direito encontra como primeiro limite o princípio da

dignidade da pessoa humana, isto porque o ser humano deve ser o centro de preocupação do

Direito.

Jorge Miranda preleciona que a dignidade da pessoa humana, expressamente

consagrada como fundamento da República Federativa do Brasil, precisamente no art. 1º, inc.

III da Lei Maior torna o homem fundamento e fim da sociedade e do Estado.16

Tal valor também é previsto expressamente no Pacto Internacional sobre Direitos

Civis e Políticos de Nova Iorque (art. 10. 1), e Convenção Americana sobre Direitos

Humanos (art. 5º, 2), ambos ratificados pelo Brasil no ano de 1992.17-18

Entretanto, a dignidade como qualidade inerente à pessoa humana nem precisaria

estar prevista no ordenamento jurídico para ser reconhecida, já que não é o direito que a

concede, mas sim, a própria qualidade, essência humana.19

De qualquer forma, porque expressamente previsto tal princípio como fundamento

do Estado Democrático de Direito, possui ele “[...] status constitucional formal e material, de

Jorge; SILVA, Marco Antonio Marques da (Coord.). Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana. 2ª ed. atual. e amp. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 83-84. 15 MATOS, Inês Lobinho. A Dignidade da Pessoa Humana na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, mormente, em Matéria de Direito Penal e Direito Processual Penal. In, MIRANDA, Jorge; SILVA, Marco Antonio Marques da (Coord.). Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana. 2ª ed. atual. e amp. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 83. 16 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo IV. Coimbra: Editora Coimbra, 2000, p. 180-181. 17 BRASIL. Decreto do Poder Executivo Federal n. 678, de 06 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 27 de novembro de 1969. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 18 BRASIL. Decreto do Executivo Federal n. 592, de 6 de julho de 1992. Promulga o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, adotado pela XXI Sessão da Assembléia-Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm. Acesso em: 09 de março de 2013. 19 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

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eficácia plena e imediata, não sendo lícito a qualquer membro do poder desconsiderá-la, sob

pena de praticar ato inconstitucional.”20

Kant considera o ser humano um fim em si mesmo, e não um instrumento ou uma

coisa em que é possível atribuir-se um preço. O ser humano, por possuir um valor e não um

preço, conserva a qualidade da dignidade humana. Colhe-se de seus ensinamentos:

No reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade. [...] o que se faz condição para alguma coisa que seja fim em si mesma, isso não tem simplesmente valor relativo ou preço, mas um valor interno, e isso quer dizer, dignidade. Ora, a moralidade é a única condição que pode fazer de um ser racional um fim em si mesmo, pois só por ela lhe é possível ser membro legislador do reino dos fins. Por isso, a moralidade e a humanidade enquanto capaz de moralidade são as únicas coisas providas de dignidade.21

Não obstante a filosofia Kantiana, que considera o ser humano de valor

inestimável, e a posição de Sarlet, para o qual a dignidade da pessoa humana não é concedida

pelo ordenamento jurídico, constituindo qualidade da essência humana, verdadeiro valor, não

foram poucas as situações históricas em que seres, considerados humanos, destruíram seres

humanos, como por exemplo, a inquisição, a escravidão, o nazismo e as guerras em geral, as

quais, até os dias atuais, aniquilam pessoas e sua dignidade.

Na segunda metade do século XVIII os filósofos, moralistas e juristas passaram a

elaborar obras censurando a legislação penal que vigia, e defendiam sobretudo a liberdade e a

dignidade da pessoa humana.22

Assim, parece razoável e até mesmo desejável que a dignidade da pessoa humana

esteja contemplada nas Constituições em geral como fundamento de uma Nação,

especialmente para lembrar seu povo e os agentes políticos que o indivíduo constitui o

fundamento de toda e qualquer organização política.

Ressalta Greco Filho que o direito quiçá cronologicamente ajusta-se, coincide,

com o ser humano e a sociedade, não podendo, todavia, ser compreendido senão em razão da

efetivação de valores, no centro dos quais se localiza o valor da pessoa humana. A ordem 20 RANGEL, Paulo. A coisa julgada no processo penal brasileiro como instrumento de garantia. São Paulo: Atlas, 2012, p. 27. 21 KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos. Tradução: Leopoldo Holzbach, São Paulo: Martin Claret, 2004, p. 65. 22 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão - causas e alternativas. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 32.

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jurídica existe para a consecução desses valores. Assim, o valor da pessoa humana norteia o

direito positivo, antecede-o, conferindo-lhe razão de existir.23

E, ainda, nas palavras do autor:

Inegavelmente foi a doutrina cristã que mais valorizou a pessoa humana, definindo o homem como criado à imagem e semelhança de Deus. Mediante essa concepção, estabelecendo um vínculo entre o indivíduo e a divindade, superou-se a concepção do Estado como única unidade perfeita, de forma que o homem-cidadão foi substituído pelo homem-pessoa. Imediatamente, sentiu-se tal influência na mitigação das penalidades atrozes, no respeito ao indivíduo como pessoa e em outros campos. Todavia, atingindo Roma em pleno Império e assistindo sua decadência, teve de adaptar-se às condições da época, e atuou mais como fator suasório à consciência do soberano que como nova estrutura social, a partir do imperador Constantino.24

O estudo de qualquer instituto do processo penal, bem como dos direitos e

garantias constitucionais, não faria sentido algum se não fosse reconhecida a necessidade de

realização da dignidade da pessoa humana.

Nesse sentido, Fabio M. A. Delmanto assevera que:

É, pois, justamente a partir do reconhecimento da dignidade da pessoa humana, como elemento ínsito ao Estado Democrático de Direito, que todas as demais garantias encontram a sua razão de ser dentro do ordenamento jurídico.25

Jamais poderá ser esquecido que o princípio da dignidade da pessoa humana

cumpre duas funções, quais sejam, de relevante elemento de proteção dos direitos

fundamentais contra medidas arbitrárias, mas, ao mesmo mesmo, desempenha justificativa

para a determinação de restrições a direitos fundamentais. 26

O princípio da dignidade humana, tutelado em diversas culturas ocidentais, dentre

as quais a portuguesa e a brasileira, é o que confere legitimidade e, ao mesmo tempo,

limitação à persecução penal.27

23 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 21. 24 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 21. 25 DELMANTO, Fabio Machado de Almeida. Medidas Substitutivas e Alternativas à Prisão Cautelar. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 17. 26 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 123-124. 27 PIMENTEL; José Eduardo de Souza. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana no Processo Penal. In, MIRANDA, Jorge. SILVA, Marco Antonio Marques da (Coord.). Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana. 2ª ed. atual. e amp. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 680.

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Assim, constitui grande desafio do processo penal moderno a realização de um

sistema que assegure concomitantemente dois valores fundamentais, quais sejam, a eficiência

da persecução penal e o garantismo, entendido como a realização de garantias fundamentais

ao investigado ou acusado.28

A propósito, tendo o Estado Constitucional de Direito como princípio basilar a

dignidade da pessoa humana, em se tratando do Processo Penal, deve-se conferir um

tratamento digno, humano, ao investigado ou acusado da prática de uma infração penal, não

podendo este ser tratado como mero objeto, mas sim como sujeito de direitos.

Em se tratando de medidas cautelares pessoais alternativas à prisão, trazidas pela

Lei 12.403/11, e objeto do presente estudo, já é possível identificar, também, que a dignidade

humana não pode ser aniquilada em face de interesses da coletividade. Igualmente, tem-se que

a dignidade humana representa princípio constitucional de maior carga axiológica da

Constituição e, por conseguinte, possui eficácia jurídica (potencialidade para produzir efeitos

jurídicos) e aplicabilidade imediata.29

2.3 DEVIDO PROCESSO LEGAL

Podemos encontrar reminiscências do que hoje chamamos de devido processo

legal na Magna Carta outorgada pelo Rei João Sem-Terra a seus súditos, na Inglaterra, de

1215, porquanto estabelecia certa diminuição de poder do rei em prol de seus barões, o que

significava, de certa forma, a preconização de limites contra o Estado.

O princípio do devido processo legal resta universalmente previsto nos

ordenamentos jurídicos de todos os países que representam um Estado de Direito.30

Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, está previsto no art.

5º, inc. LIV, que assim dispõe: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o

devido processo legal.” 31

28 FERNANDES, Antonio Scarance; ALMEIDA, José Raul Gavião de. MORAES, Maurício Zanoide de (Coord.). Sigilo no Processo Penal - eficiência e garantismo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 10. 29 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar - A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 15-16. 30 TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro. Atualizado com a Lei da Prisão (Lei 12.403/2001). 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 79. 31 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em:

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O devido processo legal, individualizado ao processo penal, ou seja, o devido

processo penal, exige, para que seja efetivado, que o procedimento em que este se realiza

reste minuciosamente observado, com o cumprimento de todas as formalidades previstas em

lei, a fim de que se atinja “[...] sua finalidade solucionadora de conflito de interesses

socialmente relevevantes, quais sejam o punitivo e o de liberdade.”32

Tal princípio não deve ser concebido apenas no seu aspecto formal, sendo

necessário, em especial, sua conformação substancial, o que significa asseverar que as normas

não só decorram de um processo legislativo cuja elaboração esteja antecipadamente

estabelecida, mas também que tais normas não se apresentem injustas, desmedidas.33

Rangel fala em devido processo penal substantivo, asseverando que o Estado deve

proteger os “[...] direitos materiais do acusado, expandindo a visão, até então romântica, da

regra do devido processo penal, para uma visão mais protetora, de cunho de direito

substancial.”34

Pacelli de Oliveira observa que o devido processo penal constitucional almeja

efetivar uma justiça penal obediente à igualdade entre os sujeitos processuais (Estado-

acusação e acusado). Não se pode ainda esquecer que dentro dessa necessidade de o processo

realizar-se de forma justa, há, durante todo o trâmite do procedimento penal, desigualdade

material, em que o Estado se encontra em uma posição mais favorável, privilegiada, uma vez

que seus agentes atuam na investigação e na acusação, como regra, e com o monopólio da

jurisdição.35

No processo de elaboração da norma pelo Poder Legislativo, o princípio do

devido processo legal substantivo exige que a norma proposta se apresente “com razão de

ser”, sob pena de restar violado.36

Greco Filho identifica que o processo representa uma garantia ativa e ao mesmo

tempo uma garantia passiva. Garantia ativa porque, havendo alguma ilegalidade, a parte

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 32 TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro. Atualizado com a Lei da Prisão (Lei 12.403/2001). 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 79. 33 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 43. 34 RANGEL, Paulo. A coisa julgada no processo penal brasileiro como instrumento de garantia. São Paulo: Atlas, 2012, p. 21. 35 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª Edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 08. 36 SAMPAIO FILHO, Walter. Prisão em Flagrante (a aplicação do devido processo legal). São Paulo: Rideel, 2005, p. 33.

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violada em seu direito pode utilizar-se do processo para repará-la, por meio, por exemplo, a

depender da situação em concreto, do “habeas corpus”, do mandado de segurança e de

recursos ao Poder Judiciário. O processo constitui também garantia passiva, uma vez que veda

a autotutela, ou seja, a realização de justiça pelas próprias mãos, não sendo admitido, de outro

lado, que o Estado imponha restrições da liberdade sem a observância do devido processo

legal.37

2.4 ACESSO À JUSTIÇA

O princípio de acesso à Justiça está previsto na Constituição da República

Federativa do Brasil, no seu art. 5º, inc. XXXV, a saber: “a lei não excluirá da apreciação do

Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”38

O mencionado dispositivo da Lei Maior preconiza o direito de ação e de defesa, a

garantia de acesso à Justiça diante da lesão ou ameaça a um direito.

Referida garantia compreende o direito de acesso à uma ordem jurídica

materialmente justa.

Todavia, para que tal aconteça, a garantia do acesso à justiça ou o direito de ação

e de defesa deve passar do plano meramente formal, retórico, para um plano de efetividade.

O direito de acesso à Justiça compreende desde a linguagem utilizada pelo Direito

e seus aplicadores até a efetiva atenuação das diferenças, muitas vezes financeiras,

identificada entre as partes.

Sendo a lei mais compreensível, seguramente será mais acessível aos indivíduos,

especialmente aos menos favorecidos economicamente e de baixa escolaridade.39

Marques da Silva enumera e explica três obstáculos que devem ser transpostos

para que haja efetivo direito de acesso à Justiça:

O primeiro obstáculo é econômico, ou seja, quando o cidadão deixa de exercer ou de proteger um direito seu, por não ter nenhum acesso ou um acesso mínimo à informação e à assistência jurídica adequada [...] O segundo obstáculo é organizacional. O terceiro obstáculo é aquele afeto aos

37 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 33. 38 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 39 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Tradução: Ellen Gracie Northfleet. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988, p. 156.

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instrumentos técnicos jurídicos dos quais se valem os operadores do direito para a concretização da prestação jurisdicional.40

Na mesma senda, Dinamarco observa:

Acesso à justiça equivale a obtenção de resultados justos.[...] Não tem acesso à justiça aquele que sequer consegue fazer-se ouvir em juízo, como também todos os que, pelas mazelas do processo, recebem uma justiça tardia ou alguma injustiça de qualquer ordem. [...] Nunca é demais lembrar a máxima Chiovendiana, erigida em verdadeiro slogan, segundo a qual “na medida do que for praticamente possível, o processo deve proporcionar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ele tem o direito de obter.41

No processo penal só haverá efetivo acesso à justiça ao réu se este contar com um

advogado regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil que realize

de forma substancial, material, a respectiva defesa, e não apenas na fase processual, mas

também e, principalmente, ainda durante a fase investigativa.

Apesar de a titularidade da ação penal normalmente ser de incumbência do

Ministério Público, a vítima também deve ter efetivo acesso à justiça penal, de forma que não

pode restar em um plano secundário do processo, esquecida.

Ainda que tímidas, alterações no Código de Processo Penal determinaram ao

Estado uma maior atenção, cuidado, no tratamento com a vítima, as quais devem ser

efetivamente cumpridas, como, por exemplo, o direito de cientificação sobre as decisões que

são tomadas no processo, e sobre as datas de ingresso e saída do réu da prisão (art. 201,

parágrafo 2o do Código de Processo Penal); a separação, sendo necessário, entre a vítima e o

réu, durante as audiências judiciais (art. 201, parágrafo 4º, do Código de Processo Penal); a

inclusão da vítima em tratamento multidisciplinar, às expensas do Estado (art. 201, parágrafo

5º, do Código de Processo Penal), a partir da Lei n. 11.690/08.42

Obviamente que o órgão do Ministério Público também deve contar com meios

adequados à efetivação do “jus puniendi”, sobretudo porque possui o ônus da prova em

relação à acusação imputada, não podendo ser tolhido dentro do seu atuar legítimo e legal.

40 SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001, p. 79-80. 41 DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma do Código de Processo Civil. 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 21-22. 42 BRASIL. Lei n. 11.690, de 09 de junho de 2008. Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prova, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11690.htm#art1>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

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Assim, o direito de acesso à justiça no processo penal deve se realizar sob a ótica

de todos os sujeitos processuais principais envolvidos na relação processual, compreendendo

não apenas o direito de ação, mas sobretudo o direito de uma efetiva defesa do réu e de um

efetivo amparo à vítima.

2.5 MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS

Conforme é sabido, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em

seu art. 93, inc. IX, dispõe que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão

públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade [...].”43

Pontua Suannes que nosso sistema jurídico exige, então, que o julgador atenha-se

àquilo que está nos autos, “[...] e a partir desses elementos e de sua cultura jurídica, há de

decidir fundamentadamente a causa [...]”, constituindo dever ético do juiz a explicitação das

razões de seu convencimento, sendo vedado, de outro lado, fundamentar sua decisão em fatos

estranhos àqueles documentados no processo, salvo em relação às regras de experiência e aos

fatos notórios.44

Todas as decisões judiciais, sejam elas sentenças ou decisões interlocutórias (em

que o juiz, no curso do processo, resolve questão incidente), devem ser fundamentadas com

base em elementos concretos, extraídos dos autos, e não estranhos a eles.

Suannes observa também que “comodamente, não poucas vezes o julgador tem

como verdade sabida e inquestionável aquilo que se contém na letra da lei, à qual se reporta

sem maiores considerações.”45

A decisão que decreta qualquer espécie de prisão necessita de motivação com

base em elementos concretos extraídos dos autos, não se satisfazendo o princípio

constitucional em comento com a mera referência a termos jurídicos contidos na norma, tal

como a simples menção de que a prisão se mostra necessária para a garantia da ordem

pública, ou por conveniência da instrução criminal.

No que concerne às medidas cautelares trazidas pela Lei 12.403/11, não se olvide

que todas, quando impostas, necessitam de prévia motivação, porque deve existir uma razão 43 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 44 SUANNES, Adauto. Os Fundamentos Éticos do Devido Processo Penal. 2ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 257-258. 45 SUANNES, Adauto. Os Fundamentos Éticos do Devido Processo Penal. 2ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 262.

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para tanto, caso contrário, o indivíduo restaria em plena liberdade, que é a regra, sob pena de

flagrante violação à liberdade, eis que a restrição da mesma não pode ocorrer sem qualquer

motivo devidamente explicitado.

A prisão em flagrante, apesar de dispensar motivação judicial para a sua

efetivação, constitui medida sujeita ao imediato controle de legalidade pelo magistrado, razão

pela qual não viola qualquer garantia constitucional. De outro lado, para que o flagrante se

mantenha, não basta que o juiz mencione simplesmente que “está formalmente em ordem”,

mas sim, que explicite porque considera que a prisão ocorreu em condições de legalidade, e

também por que eventualmente manterá a segregação cautelar do indivíduo.

Não se pode aceitar que a liberdade de alguém possa ser privada sem

fundamentação judicial alinhada com o que estiver documentado nos autos, caso contrário

estará legitimado o arbítrio.

2.6 LEGALIDADE

Ferreira Filho observa que Montesquieu sedimentou que a “liberdade é o direito

de fazer tudo aquilo que as leis permitem”, o que resta garantido pelo inc. II do art. 5º da

Magna Carta, que assim dispõe: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma

coisa senão em virtude de lei.”46

O mesmo autor, após tais considerações, reflete que:

Se é reservado à lei determinar que se faça ou que não se faça alguma coisa, forçoso é reconhecer que os próprios poderes do Estado somente podem atuar dentro do campo estabelecido pela lei e segundo seus ditames. A Administração Pública e os órgãos jurisdicionais hão de aplicar a lei, o que significa que sua função vai, essencialmente, resumir-se em transformar em comandos individuais as ordens genéricas da lei, do legislador. Assim, Executivo e Judiciário não podem criar obrigações novas nem reconhecer direitos novos. Sua ação se limita ao cumprimento da lei.47

Achutti, inspirado nas lições de Ferrajoli, identifica como principal função do

princípio da legalidade a proteção dos direitos fundamentais. Critica o modelo juspositivista

clássico, que contentava-se com os procedimentos formais, sem uma preocupação com o

conteúdo da norma. Assim: 46 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. São Paulo: Saraiva, 1990, vol. 1, p. 28-29. 47 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. São Paulo: Saraiva, 1990, vol. 1, p. 28-29.

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A simples existência (vigência) da lei, mesmo que para tanto tenha respeitado os procedimentos formais, por si só não a torna substancialmente válida: é necessário que todas as normas respeitem o conteúdo da Constituição da República, quando se fará valer seu sentido substancial.48

Modernamente, para que a norma seja considerada obediente ao princípio da

legalidade, é preciso que atenda ao conteúdo da Lei Maior, e não apenas que tenha sido

elaborada dentro de critérios formalmente legais.

A exigência da legalidade traduz segurança jurídica, porque as normas gerais e

abstratas propiciam a ausência de surpresa em relação à inexistência de normas escritas e

também evitam decisões arbitrárias, desvinculadas ao ordenamento jurídico. Da mesma

forma, confere estabilidade ao Direito, pois a lei somente admite modificação desde que

sejam obedecidos certos procedimentos.49

Entretanto, a lei, embora deva ser aplicada a todos, não pode pretender regular,

minuciosamente, todas as situações possíveis, devendo observar a característica da abstração.

Na mesma senda, a Constituição representa a lei principal do Estado, constituindo fonte de

validade de todo o ordenamento jurídico infraconstitucional.50

Assim, oportunamente será analisado se a Lei 12.403/11, ao estabelecer diversas

medidas cautelares alternativas à prisão, alinhou-se ao princípio da legalidade, que deve ser

compreendido, à luz do posicionamento acima, não como a capacidade da norma de regular

todas as situações possíveis, mas sim, como a potencialidade de realizar a Constituição, em

seu sentido formal e material.

2.7 CONTRADITÓRIO

O processo penal, para que seja realizado de forma justa, precisa observar, durante

toda a sua tramitação, o princípio do contraditório, inserto na Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 5º, inc. LV, que assim dispõe: “aos litigantes, em

48 ACHUTTI, Daniel. Modelos Contemporâneos de Justiça Criminal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 48. 49 ÁVILA, Humberto. Segurança Jurídica – entre permanência, mudança e realização no Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 234. 50 GRECO, Rogério. Direitos Humanos, Sistema Prisional e Alternativas à Privação de Liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 52-54.

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processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e

ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”51

O contraditório, no processo, garante não apenas o direito à informação de tudo o

que restar alegado ou demonstrado pela parte adversa, mas sobretudo garante a participação

das partes.

Todo o processo penal deve ser norteado pelo contraditório, sendo este, inclusive,

condição para que a sentença proferida pelo magistrado seja considerada válida, sem mácula,

nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal, com a redação advinda da Lei n.

11.690/08.52

Muito se debate se o princípio do contraditório deve ser observado na fase do

inquérito policial. Rogério Greco entende que o inquérito policial possui natureza inquisitória,

razão pela qual:

A autoridade que preside as investigações leva a efeito a busca das provas que entender como necessárias, sem que esteja obrigada a permitir que o indiciado as contradiga, ou seja, o indiciado não terá o direito de contestar, naquela oportunidade, as provas que estão sendo trazidas para o bojo do inquérito policial.53

Todavia, os dispositivos processuais penais não proíbem a realização do

contraditório durante as investigações policiais, de forma que se a Autoridade Policial,

condutora do inquérito policial, vislumbrar que a adoção de tal princípio não irá comprometer

a efetividade das investigações, entendemos que possa aplicá-lo.

A Lei 12.403/11 trouxe a necessidade de observância do contraditório prévio à

imposição de medida cautelar pessoal, desde que a eficácia da mesma não seja comprometida,

o que será melhor discorrido oportunamente.54

51 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 52 Referido dispositivo legal assim dispõe: “art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.” (BRASIL, 1941). 53 GRECO, Rogério. Atividade Policial – aspectos penais, processuais penais, administrativos e constitucionais. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 62. 54 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

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2.8 AMPLA DEFESA

A preocupação com o direito de defesa não foi inaugurada nos tempos modernos.

Já, no direito antigo, o acusado possuía a garantia de comparecer pessoalmente ao processo, e

poderia ainda contar com um profissional especializado, capaz de confeccionar um relatório

de defesa. Posteriormente, sedimentou-se o costume de “[...] se fazer representar por

terceiros.”55

Goldschmidt, em 1936, observa que no processo inquisitivo, apesar da situação do

acusado ter piorado, o direito de defesa não chegou a ser estirpado, sendo que em casos

considerados graves, era inclusive obrigatório. Todavia, entendimentos pela exclusão no

procedimento do advogado também existiam, exemplo disso foi a Ordenação Criminal

Austríaca, de 1803. Na França, o Código Criminal de 1808 tornou a defesa obrigatória em

casos reputados graves. Na Inglaterra, a legislação de 1836 admitiu a participação do

advogado em todos os procedimentos, conforme pontua Souza.56

A ampla defesa, no sistema pátrio, está inserta ao lado do contraditório, no art. 5º,

inc. LV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, sendo constituída da

defesa técnica e da autodefesa.57

A autodefesa (direito de o investigado ou acusado, pessoalmente, apresentar a sua

versão sobre os fatos) é renunciável, o que decorre do direito ao silêncio.

Já, a defesa técnica, afigura-se indispensável na fase do processo, tendo em vista

que, nos termos do art. 133 da Magna Carta: “o advogado é indispensável à administração da

justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites

da lei.”58

A garantia da defesa ténica em prol do acusado, um dos elementos da ampla

defesa, vem sendo cada vez mais preconizada antes mesmo da formação do processo, ou seja,

antes mesmo da propositura da ação penal. O legislador vem tentanto, ao longo dos anos,

55 SOUZA, Fábio Luís Mariani de. A Defensoria Pública e o Acesso à Justiça Penal. Porto Alegre: Núria Fabris, 2011, p. 194. 56 SOUZA, Fábio Luís Mariani de. A Defensoria Pública e o Acesso à Justiça Penal. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2011, p. 195. 57 Assim dispõe o inc. LV, do art. 5º, da Lei Maior: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. (BRASIL, 1988) 58 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.

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tornar o Código de Processo Penal mais compatível com a Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, razão pela qual a defesa técnica passou a ser preconizada já na

fase da lavratura do auto de prisão em flagrante, de forma que a redação atribuída ao art. 306

do Código de Processo Penal encontra-se atualmente com a seguinte dicção:

Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. § 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.59

Registre-se que, embora o dispositivo legal acima referido encontra-se com a

redação que lhe atribuiu a Lei 12.403/11, foi com o advento da Lei 11.449/07 que o Código

de Processo Penal passou a prever a necessidade de a Defensoria Pública ser oficiada, para

atuar em prol do preso em flagrante, quando este não tiver um advogado.60

De outro lado, bastante problemática se afigura a efetivação da ampla defesa no

flagrante, na medida em que o autuado, pobre, nem sempre consegue contar com a presença

de um defensor no momento da documentação dessa prisão na Delegacia.

Embora a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no seu art. 5º,

inc. LVIII garante ao preso a assistência de um advogado, e embora o inc. LXXIV, do mesmo

artigo, estabeleça a responsabilidade do Estado em prestar assistência jurídica integral e

gratuita aos pobres, o Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida no Recurso

Extraordinário n. 136.239/SP, publicada em 14.08.1992, da relatoria do Ministro Celso de

Mello, já decidiu que a Autoridade Policial não está obrigada a providenciar tal assistência.

Assim, prevalecendo referida decisão, mencionadas garantias constitucionais não passam de

meras alegações teóricas.61

A Súmula do Supremo Tribunal Federal, vinculante, n. 14 também veio

sedimentar a necessidade da defesa técnica na fase investigativa, porquanto garante ao 59 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 60 BRASIL. Lei n. 11.449, de 15 de janeiro de 2007. Altera o art. 306 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11449.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 61 ERBELLA, Marcelo Augusto Custódio. A Defesa Técnica na Constituição Federal e no Procedimento Comum do Código de Processo Penal Brasileiro. In, SILVA, Marco Antonio Marques da (Coord.). Processo Penal e Garantias Constitucionais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 453.

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advogado do investigado acesso aos elementos de informação que foram colhidos e já

documentados no inquérito policial.62

Após a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, muitas alterações

têm sido realizadas na legislação em geral, em prol da defesa técnica ao réu e ao indiciado,

contudo, a realização dessa garantia também deve ocorrer no mundo dos fatos, especialmente

ao imputado pobre, pois só assim teremos um processo penal igualitário e efetivo.

Ademais, a defesa técnica deve ser substancial e não apenas formal. O advogado

não deve se portar durante o tramitar do procedimento como mera figura decorativa, mas sim,

como um profissional que sabe o quão penoso compreende um processo criminal, ainda mais

quando quem responde a ele é inocente.

2.9 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

O princípio da presunção de inocência foi sendo reconhecido pelas Constituições

modernas, por exemplo, “do Canadá (art. 11, “d”); da Espanha (art. 17); da Itália (art. 13); do

Japão (arts. 31,33 e 34) e de Portugal (art. 32º, 2).”63

Mas, adverte Ferrajoli que o princípio da presunção de inocência remonta ao

direito romano, tendo sido, todavia, esquecido, quiçá totalmente invertido, pela Inquisição

ocorrida na Baixa Idade Média.64

O mesmo autor, ainda observa:

Basta recordar que no processo penal medieval a insuficiência da prova, conquanto deixasse subsistir uma suspeita ou uma dúvida de culpabilidade, equivalia a uma semi-prova, que comportava um juízo de semiculpabilidade e uma semicondenação a uma pena mais leve. Só no início da Idade Moderna aquele princípio é reafirmado com firmeza.65

62 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante n. 14, de 2 de fevereiro de 2009. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/PSV_1.pdf>. Acesso em 12 de janeiro de 2013. 63 TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro. Atualizado com a Lei da Prisão (Lei 12.403/2001). 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 321. 64 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradutores: Ana Paula Zomer Sica, Fauzi Hassan Choukr, Juarez Estevam Xavier Tavares, Luiz Flávio Gomes. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 441. 65 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradutores: Ana Paula Zomer Sica, Fauzi Hassan Choukr, Juarez Estevam Xavier Tavares, Luiz Flávio Gomes. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 441.

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As Declarações Universais de Direitos do Homem proclamam o princípio da

presunção de inocência. No art. 9º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de

1789, consta previsto que: “Sendo todo homem presumido inocente, se for julgada

indispensável a sua prisão, todo rigor desnecessário à sua segregação deve ser severamente

reprimido pela lei.66

Assim, a prisão decretada antes do trânsito em julgado de sentença penal

condenatória deve observar requisitos estritos, traçados em lei, não podendo constituir a regra

do sistema, já que só poderá ocorrer em casos de comprovada necessidade, sob pena de

violar-se o princípio da presunção de inocência, que a Lei 12.403/11 procurou proteger.

Na Declaração Universal de Direitos Humanos, da Assembléia Geral das Nações

Unidas, em 10 de dezembro de 1948, também está reconhecido o princípio da presunção de

inocência, senão vejamos:

Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente, até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa (art. XI, n. 1).67

A Carta Magna de 1988, em seu art. 5º, inc. LVII proclama: “ninguém será

considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”68

É ínsito ao Estado Democrático de Direito a adoção do princípio da presunção de

inocência, que garante ao indivíduo a manutenção da sua condição de inocente até o trânsito

em julgado de sentença penal condenatória.

Alexandre de Moraes observa que o princípio da presunção de inocência garante,

ao menos, quatro funções basilares, quais sejam: a) limitação ao legislador; b) critério

norteador das interpretações das normas em vigor; c) critério de proteção extraprocessual do

indivíduo; e, d) imposição do ônus da prova sempre ao acusador.69

66 TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro. Atualizado com a Lei da Prisão (Lei 12.403/2001). 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 321. 67 BRASIL. Declaração Universal de Direitos Humanos da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 10 de Dezembro de 1948. Disponível em: http://unicrio.org.br/img/DeclU_D_HumanosVersoInternet.pdf.>. Acesso em 10 de janeiro de 2013. 68 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 69 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 393.

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Assim, à luz dos postulados internacionais ratificados pelo Brasil, bem como com

base na Lei Maior, em razão da presunção de inocência a regra deve ser a liberdade do

investigado ou acusado durante o processo, tanto em relação ao preso em flagrante, quanto ao

acusado solto.

2.10 PRINCÍPIO DO “FAVOR REI”

O princípio em questão é inerente ao Estado Democrático de Direito Republicano,

significando que, no conflito entre o poder de punir do Estado e o direito à liberdade do

acusado, deve prevalecer este último.

Em decorrência desse princípio, diversos são os dispositivos legais do Código de

Processo Penal que privilegiam a liberdade e a inocência do réu. Exemplificativamente, tem-

se a possibilidade de revisão criminal apenas “pro reo”, a imposição ao julgador de que a

sentença seja absolutória quando não existirem provas suficientes à condenação, e a

impossibilidade de ocorrer “reformatio in pejus” em se tratando de recurso exclusivo da

defesa.70

De outro lado, ainda que a opção política adotada pelo Estado Brasileiro

Republicano tenha sido pela liberdade e dignidade do réu, tais princípios acabam sempre

sendo moderados quando estão em jogo as liberdades públicas.71

2.11 EFICIÊNCIA, EFICÁCIA E EFETIVIDADE DO PROCESSO PENAL

Cumpre elucidar as definições acerca de eficiência, eficácia e efetividade do

processo penal, haja vista que, em não raras reflexões acadêmicas, tais expressões têm

recebido conotações diversas.

As terminologias eficiência, eficácia e efetividade não são próprias do mundo

jurídico, sendo muito utilizadas nos estudos das áreas de economia e administração.

Entretanto, são frequentemente empregadas em diferentes ramos do direito, tais como: no

direito administrativo, direito processual civil, direito processual penal.72

70 RANGEL, Paulo. A coisa julgada no processo penal brasileiro como instrumento de garantia. São Paulo: Atlas, 2012, p. 46. 71 RANGEL, Paulo. A coisa julgada no processo penal brasileiro como instrumento de garantia. São Paulo: Atlas, 2012, p. 46. 72 FERNANDES, Antonio Scarance. Reflexões Sobre as Noções de Eficiência e de Garantismo no Processo Penal. In, FERNANDES, Antonio Scarance; ALMEIDA, José Raul Gavião de. MORAES,

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Grinover, mencionada por Fernandes, considera que: “a eficiência se desdobra na

efetividade do processo penal e na eficácia dos direitos fundamentais. Em outras palavras, a

eficiência seria um conceito mais amplo e abrangeria os de eficácia e efetividade.”73

Dinamarco conceitua efetividade do processo com a ideia de que o “[...] processo

deve ser apto a cumprir integralmente toda a sua função sócio-política-jurídica, atingindo em

toda a plenitude todos os seus escopos institucionais.”74

Erival da S. Oliveira pontua que a eficácia é a capacidade da norma produzir

efeitos, ao passo que “a efetivação é a concretização da norma no meio social.”75

Após analisar comentários de diversos autores sobre a significação e diferenciação

dos vocábulos eficiência, eficácia e efetividade, Fernandes, Almeida, e Zanóide de Moares

observam que:

A eficiência expressa a capacidade, a força, o poder de algo que o leva a produzir um efeito. Portanto, o grau de eficiência é verificado pela maior ou menor qualidade do meio utilizado para que algo possa produzir um efeito, não pelo tipo de efeito por ele produzido. A eficácia é a qualidade do resultado produzido por algo. O grau de eficácia leva em conta o tipo de resultado atingido. Por fim, a efetividade é também a expressão do resultado produzido por algo, resultado esse que corresponde ao atingimento de determinadas finalidades. A efetividade é avaliada pelo sucesso dos resultados em cotejo com os objetivos esperados.76

Após as reflexões, nem sempre consonantes, observadas pelos mencionados

juristas, temos que o processo efetivo é o processo ideal, que realiza justiça, concretizando a

norma no mundo dos fatos. Precisamente, em se tratando de processo penal, é o processo

capaz de realizar o “jus puniendi” do Estado sem descurar das garantias individuais, tais

como: liberdade, devido processo legal, proporcionalidade e dignidade humana. É o processo

que foi eficiente, com a adoção dos meios adequados à consecução da finalidade almejada, e

Maurício Zanoide de (Coord.). Sigilo no Processo Penal – eficiência e garantismo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 17. 73 FERNANDES, Antonio Scarance. Reflexões Sobre as Noções de Eficiência e de Garantismo no Processo Penal. In, FERNANDES, Antonio Scarance; ALMEIDA, José Raul Gavião de; MORAES, Maurício Zanoide de (Coord.). Sigilo no Processo Penal – eficiência e garantismo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 16-17. 74 DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do processo. 5ª Edição. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 270. 75 OLIVEIRA, Erival da S. ARAUJO JR., Marco Antonio; BARROSO, Darlan (Coord.). Direito Constitucional. Direitos Humanos. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 162. 76 FERNANDES, Antonio Scarance; ALMEIDA, José Raul Gavião de. MORAES, Maurício Zanoide de (Coord.). Sigilo no Processo Penal – eficiência e garantismo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 18.

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eficaz, porque foi capaz de trazer um resultado satisfatório do ponto de vista da realização da

justiça.

2.12 PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE

A conformação do princípio da proporcionalidade foi no sentido de proteger o

indivíduo contra os excessos praticados pelo Estado, muito embora a ideia de

proporcionalidade fosse verificada já na Antiguidade. Aristóteles, em Ética a Nicômaco, por

exemplo, sustentava que a proporcionalidade era inerente ao próprio conceito de justiça.77

No século XVIII, correntes iluministas e humanitárias, defendidas por Voltaire,

Montesquieu e Roussseau, passam a censurar a legislação penal vigente, propugnando que a

finalidade da pena não mais possa consistir em atormentar o homem, ser sensível. Assim,

propunham que a pena devesse ser proporcional ao crime, e “[...] menos cruel para o corpo do

delinquente.”78

Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, nesse contexto, contribuiu imensamente

para a humanização da pena, pregando a proibição de excessos no tratamento com o infrator,

senão vejamos:

Devem ser escolhidas aquelas penas e aquele método de impô-las, que, respeitada a proporção, causem uma impressão mais eficaz e mais durável sobre o ânimo dos homens e que seja a menos dolorosa para o corpo do réu.79

Cesare Bonesana, então, não acreditava que as barbáries cometidas contra os

infratores pudesse perdurar, uma vez que nada poderia trazer de útil para o futuro, mas apenas

sedimentava, propiciava a vingança pelo ocorrido no passado. Suas ideias contribuíram para a

substituição da pena capital pela pena de prisão, a qual passou a ser adotada para vários

delitos graves. De outro lado, muitos dos seus questionamentos e reflexões permanecem sem

solução.

A partir de tais ideias, o princípio da proporcionalidade sedimentou-se como a

proibição de o Estado praticar excessos contra o acusado.

77 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução: Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Claret, 2003, p. 109. 78 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão – causas e alternativas. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 32. 79 BECCARIA, Cesare. De Los Delitos y de Las Penas. Tradução: Juan Antonio de Las Casas. Madrid: Alianza Editorial, 1986, p. 46.

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Mendes considera que o princípio da proporcionalidade está inserido na cláusula

constitucional do devido processo legal.80

Não se mostra tranquila a sua conceituação, sendo, tal qual a dignidade da pessoa

humana, um princípio que se afigura mais fácil de ser sentido do que definido. Não obstante,

o princípio da proporcionalidade norteia a atuação do Estado, preconizando que a medida a

ser adotada por este seja adequada e necessária ao objetivo apresentado pelo ente. Visa

amparar uma relação de proporcionalidade entre o bem resguardado pela atuação estatal e o

bem a ser atingido por aquela.81

Significa o princípio da proporcionalidade que o Estado não deve agir com

excessos na consecução de seus fins, assim como também não deve atuar de forma

insuficiente, precipuamente no que atine à efetivação de direitos fundamentais, o que, mais

modernamente, restou intitulado como “proibição da proteção insuficiente.”82

Neste sentido, Luís Virgílio Afonso da Silva observa que:

Conquanto a regra da proporcionalidade seja predominantemente entendida como instrumento de controle contra excesso dos poderes estatais, cada vez mais vem ganhando importância a discussão sobre a sua utilização para finalidade oposta, isto é, como instrumento contra a omissão ou contra a ação insuficiente dos poderes estatais.83

No Brasil, exemplo de clara violação ao princípio da proporcionalidade, ignorado

na época, foi a sentença de Joaquim José da Silva Xavier, conhecido pela alcunha Tiradentes,

executada em 21 de abril de 1792, no Rio de Janeiro, a qual estabelecia sua pena capital, da

forma mais brutal possível. Segue parte da referida sentença:

[...] Portanto condenam ao Réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas, a que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca e nela morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, aonde em lugar mais público dela será pregada, em um poste alto até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregado em postes pelo caminho de Minas no sítio da Varginha e das Cebolas, aonde o réu teve as suas infames práticas, e os mais

80 MENDES, Gilmar Ferreira. A Proporcionalidade e a Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: tributário, constitucional, administrativo. Repertório IOB de Jurisprudência, n. 14. São Paulo: 1994, p. 361-372. 81 BARROS, Wellington Pacheco; BARROS, Wellington Gabriel Zuchetto. A Proporcionalidade como Princípio de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2006, p. 41-42. 82 SILVA, Luís Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, Ano 91, n. 798, abril, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 27. 83 SILVA, Luís Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, Ano 91, n. 798, abril, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 27.

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nos sítios de maiores povoações até que o tempo também os consuma; declaram o réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens aplicam para o Fisco e a Câmara Real, e a casa em que vivia em Vila Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infâmia deste abominável Réu [...].84

Atualmente, quando a doutrina aborda a proporcionalidade costuma registrar que

na atuação desse princípio devem estar presentes, concomitantemente, três requisitos, quais

sejam, adequação, necessidade, e proporcionalidade em sentido estrito.

A adequação propugna que a restrição de um direito individual só será permitida

se o meio empregado se mostrar idôneo à realização do resultado almejado. Ou seja, por meio

do requisito da adequação, deve haver uma relação de meio e fim. Exemplificativamente, não

se concebe como adequada a prisão provisória de um acusado que, se vier a ser condenado na

sentença, não receberá pena de prisão, em vista da identificação, de antemão, dos benefícios

que poderá receber no caso de um decreto condenatório.

A necessidade significa que dentre os meios adequados para a consecução do fim

almejado, é preciso que seja identificado o meio mais idôneo. É o mesmo que dizer: dentre

todos os meios adequados à consecução do fim, deve ser aplicado o meio mais adequado.

Exemplo: se medidas cautelares pessoais menos gravosas que a prisão provisória forem aptas

para atingir a finalidade do processo, não haverá necessidade ou adequação na adoção da

medida mais gravosa.

A proporcionalidade em sentido estrito indica que em um aparente conflito de

interesses, deve-se verificar qual dos valores em jogo é mais caro à ordem constitucional,

detectando-se, assim, qual dos valores deverá prevalecer no caso concreto.

Realizados tais comentários sobre o princípio da proporcionalidade, cumpre agora

adentrar no princípio da razoabilidade, configurando eventuais diferenças e pontos

convergentes dentre as respectivas conceituações.

Ao que parece, foi o princípio da razoabilidade amparado na Carta Inglesa de

1215, uma vez que nela já constava o preceito de que o indivíduo não deveria ser punido pelo

cometimento de um delito, senão na medida desse mesmo delito. A evolução do princípio da

84 MACIEL, José Fabio Rodrigues; AGUIAR, Renan. História do Direito. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 138-140.

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razoabilidade esteve relacionada ao devido processo legal, do direito anglo-saxão, tendo sido

posteriormente respaldada nas 5ª e 14ª Emendas da Constituição norte-americana.85

Boa parte da doutrina e da jurisprudência não realiza qualquer distinção entre

princípio da proporcionalidade e princípio da razoabilidade. Todavia, o princípio da

proporcionalidade está relacionado à doutrina alemã, bastante desenvolvida a partir da 2ª

Guerra Mundial. Já, o princípio da razoabilidade, está ligado à tradição estadunidense.86

O princípio da proporcionalidade parece contar com critérios mais objetivos de

atuação; já, a concepção de razoabilidade, está mais aberta ao subjetivismo. A razoabilidade

significa a adoção da justa medida, objetiva impedir a realização de práticas que destoem da

ideia de equilíbrio.

Sarlet observa que ainda que possa haver certa divergência, segundo alguns

doutrinadores, na significação atribuída aos princípios da razoabilidade e da

proporcionalidade, a questão crucial reside em conceber o processo penal como um ramo

necessariamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana e, a partir daí, concebido

como vedação de excesso de intervenção.87

De outro lado, em uma visão mais recente do princípio da proporcionalidade o

Estado deve não apenas atuar sem excessos, sem arbitrariedades, como também deve

promover a efetiva realização dos direitos fundamentais, com posturas, portanto, não só

omissivas (inerente à proibição de excesso), mas também atuando de forma comissiva,

efetivando direitos fundamentais. Nesse contexto, o Estado não mais poderia ser entendido

como inimigo dos direitos fundamentais.

Assim, a ideia de proporcionalidade não se encerra na proibição de excesso, mas

também está ligada à proibição de insuficiência por parte do Estado, contra lesões ou ameaças

a direitos fundamentais praticados por terceiros. Dessa forma, pode-se asseverar que dupla é a

dimensão da proporcionalidade, porquanto atua como proibição de excesso e também como

proibição de insuficiência.88

85 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar – A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 34. 86 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar – A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 33. 87 SARLET, apud LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 208. 88 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e proporcionalidade: notas a respeito dos limites e possibilidades da aplicação das categorias da proibição de excesso e de insuficiência em matéria criminal. In: CHITTÓ GAUER, Ruth Maria (Org.) Criminologia e Sistemas Jurídico-Penais Contemporâneos. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2008, p. 208.

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A inserção no ordenamento jurídico de medidas cautelares diversas da prisão por

meio da Lei 12.403/11, colocando a prisão preventiva em seu devido lugar, como a “ultima

ratio” das providências cautelares, atende aos princípios da proporcionalidade e da

razoabilidade, haja vista que foram estabelecidos meios adequados à consecução da finalidade

do processo, que se preocupa com o resguardo da liberdade sem poder se esquecer do poder-

dever de punir do Estado.

2.12.1 A razoabilidade na duração do processo penal

Desde muito antes da preocupação atual com a razoabilidade na duração do

processo, Beccaria, à sua época, já proclamava que a tramitação do processo deve ocorrer sem

morosidade.89

Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a razoável duração do

processo passou a ser princípio expressamente previsto, a partir da Emenda Constitucional n.

45 de 2004, a qual inseriu o inc. LXXVIII ao art. 5º, que assim passou a dispor: “a todos, no

âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios

que garantam a celeridade de sua tramitação.”90

No entanto, a tramitação razoável do processo não se coaduna com atropelos de

garantias fundamentais, de forma que constitui, sem dúvida, grande desafio em nossos tempos

a realização do processo, observando-se, concomitantemente, duas importantes garantias,

quais sejam, a celeridade na duração do processo e a ampla defesa do acusado.

No processo penal, a razoável duração do processo ganha relevo ainda maior do

que em outros ramos do direito, na medida em que frequentemente os processos criminais

tramitam com o imputado encarcerado provisoriamente.

Messa pontua que o princípio da razoabilidade decorre do princípio do devido

processo legal, uma vez que compete ao Estado, titular do poder de punir, abastecer-se de

meios à aplicação da lei penal, sem que, contudo, imponha ao imputado constrangimento

ilegal, decorrente do excesso de prazo que ocasiona morosidade na finalização do processo.91

89 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Editora Martin Claret, 2000, p. 59. 90 BRASIL. Emenda Constitucional n. 45, de 30 de dezembro de 2004. Altera dispositivos dos arts. 5º, 36, 52, 92, 93, 95, 98, 99, 102, 103, 104, 105, 107, 109, 111, 112, 114, 115, 125, 126, 127, 128, 129, 134 e 168 da Constituição Federal, e acrescenta os arts. 103-A, 103B, 111-A e 130-A, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc45.htm. Acesso em 15 de janeiro de 2013. 91 MESSA, Ana Flávia. Prisão e Liberdade. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2009, p. 55.

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Lopes Jr. e Badaró aduzem sobre os principais fundamentos de uma rápida

tramitação do processo, sem que, com isso, sejam admitidos atropelos de garantias

fundamentais. Tais fundamentos, segundo os referidos autores, estão alicerçados no respeito à

“[...] dignidade do acusado, no interesse probatório, no interesse coletivo no correto

funcionamento das instituições e na própria confiança na capacidade da justiça de resolver os

assuntos que a ela são levados [...].”92

Para os mesmos autores:

O núcleo do problema da (de)mora, como bem identificou o Tribunal Supremo da Espanha na STS 4519, está em que, quando se julga além do prazo razoável, independentemente da causa da demora, se está julgando um homem completamente distinto daquele que praticou o delito, em toda complexa rede de relações familiares e sociais em que ele está inserido e, por isso, a pena não cumpre suas funções de prevenção específica e retribuição (muito menos da falaciosa “reinserção social”).93

O art. 5º, inc. LXXVIII da Lei Maior está coadunado com a doutrina do não

prazo, tornando indeterminados os critérios e conceitos, o que, ao que parece, constitui

situação que não poderá permanecer inalterada, necessitando da determinação de limites

normativos.94

Lopes Jr. considera que quatro deverão ser os parâmetros adotados pelos tribunais

pátrios, conforme já ocorre no Tribunal Europeu de Direitos Humanos e na Corte Americana

de Direitos Humanos, para a realização do processo dentro de um limite tolerável, quais

sejam: a) complexidade do caso; b) postura processual do imputado, que não poderá ser

premiado em face de sua própria atuação protelatória; c) a conduta das autoridades judiciárias

como um todo, incluindo-se policiais, Ministério Público, juízes, servidores etc; d) princípio

da razoabilidade.95

Lopes Jr. comenta que tais critérios servem para a realização de um processo em

tempo adequado enquanto não existir regulamentação normativa definidora de prazo, o que

considera essencial. De outro lado, pondera, observando que se afigura inadequado

92 LOPES JR., Aury; BADARÓ, Gustavo Henrique. Direito ao Processo Penal no Prazo Razoável. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 14. 93 LOPES JR., Aury; BADARÓ, Gustavo Henrique. Direito ao Processo Penal no Prazo Razoável. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 14. 94 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 209. 95 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 209.

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cientificamente estabelecer rigorosamente um prazo máximo padronizado, universal, para o

trâmite do processo penal.96

Entretanto, a Lei 11.719/2008, que alterou os procedimentos no Código de

Processo Penal criou alguns limites temporais para a tramitação do processo, passando a

prever, exemplificativamente, o prazo de sessenta dias para a realização da audiência de

instrumento e julgamento no procedimento comum ordinário, de acordo com o art. 400 do

Código de Processo Penal. Para o rito comum sumário, o prazo estabelecido pela referida lei

foi de trinta dias para a efetivação da instrução processual, de acordo com o art. 531 do

Código de Processo Penal.97

Em se tratando dos crimes de competência do Tribunal do Júri, a primeira fase

(instrução preliminar) deve ser finalizada em até noventa dias, conforme dispõe o art. 412 do

Código de Processo Penal. Já, em relação à segunda fase do procedimento do Tribunal do

Júri, o Código de Processo Penal passou a preconizar que o acusado (pronunciado) seja

levado ao julgamento popular em até seis meses, a contar do trânsito em julgado da decisão de

pronúncia, à luz do que dispõe o art. 428, parágrafos 1º e 2º.98

Todavia, o descumprimento de tais prazos não acarreta sanção, sendo prazos

impróprios. Somando-se a isso, tem-se a imprecisão legislativa, eis que apenas em relação ao

procedimento do Tribunal do Júri, precisamente quanto à segunda fase do procedimento,

consegue-se fixar o termo “a quo” para a contagem do prazo de seis meses.

A jurisprudência, ao longo dos últimos anos, estabeleceu, a partir da contagem de

prazos fixados à prática de atos processuais do procedimento comum ordinário, que o

processo deveria perdurar por, no máximo, 81 (oitenta e um) dias, se o réu estivesse preso, e

tal construção originou a dicção do art. 8º da Lei 9.034/95, que assim dispõe: “o prazo para

encerramento da instrução criminal, nos processos por crime de que trata esta Lei, será de 81

(oitenta e um) dias, quando o réu estiver preso, e de 120 (cento e vinte) dias, quando solto.”99

A preocupação com a fixação de tal limite temporal se deu, precipuamente, em

face da ausência de prazo limite para a prisão preventiva, o que poderia deixar o réu à sorte do

96 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 209-210. 97 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 98 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 99 BRASIL. Lei n. 9.034, de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9034.htm>. Acesso em: 20 de janeiro de 2013.

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Estado. Assim, descumprido referido limite, poderia ser impetrada ordem de “habeas corpus”,

pela caracterização de constrangimento ilegal.

Conforme já mencionado, com base no referido dispositivo legal, que regula o

prazo para o processamento das ações ligadas a organizações criminosas, o prazo máximo

para encerramento da instrução criminal, em caso de réu preso, seria de 81 (oitenta e um) dias,

e em se tratando de réu solto, de 120 dias.

Ocorre que tal posição restou sedimentada a partir da contagem de prazos

previstos aos atos processuais que integravam o procedimento comum ordinário, anterior à

reforma ditada pela Lei 11.719/08, de maneira que atualmente, à luz do novo procedimento,

tal posição encontra-se superada.

Ainda restou aplicado pelo Supremo Tribunal Federal o prazo de 81(oitenta e um)

dias em uma situação de homicídio qualificado, em que o processo se encontrava na fase do

sumário de culpa (antes da decisão de pronúncia), com demora na formação da culpa sem

motivo atribuído à defesa, razão pela qual foi verificado constrangimento ilegal no caso, e

concedido “habeas corpus” em favor do acusado.100

Todavia, a regra de 81 (oitenta e um) dias para a finalização da instrução

processual, a qual, no início de sua criação pela jurisprudência, afigurava-se quase que

estanque, com o passar do tempo foi cedendo à detecção, diante das especificidades do caso

concreto, da complexidade da instrução.

Em um caso de organização criminosa em delito de tráfico ilícito de

entorpecentes, o Supremo Tribunal Federal também decidiu que a regra é a observância do

prazo de 81 (oitenta e um) dias para a finalização da instrução, mas que eventual excesso pode

se justificar se a situação em concreto demonstrar complexidade, a ser dirimida em instrução

criminal.101

Na mesma senda, em outra oportunidade o Supremo Tribunal Federal também

sedimentou a regra dos 81 (oitenta e um) dias para a finalização da instrução processual, que,

no entanto, poderia ser abrandada em se tratando de instruções criminais complexas.102

100 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 78978 / PI – Piauí. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Nelson Jobim. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgamento: 09/05/2000. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28HC+78978+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/a8qy5un> . Acesso em: 22 de fevereiro de 2013. 101 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 97983 / SP – São Paulo. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Ellen Gracie. Julgamento pela Segunda Turma em: 02/06/2009. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Habeas+Corpus+97983+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyuratorl.com/bhpyvqo>. Acesso em 21 de janeiro de 2013. 102 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 89525 / GO – Goiás. Relator: Min. Gilmar Mendes. Julgamento pela Segunda Turma em: 14/11/2006. Disponível em: <

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Posteriormente, passou ainda a ser preconizado pelos Tribunais Superiores que

uma vez finalizada a instrução criminal, não haveria mais que se falar em excesso de prazo. O

Superior Tribunal de Justiça editou, inclusive, a Súmula 52, que assim dispõe: “Encerrada a

instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo.”103

Todavia, não se compreende razoável que o réu permaneça preso preventivamente

sem qualquer delimitação de prazo, porque se até em relação à condenação definitiva existe

prazo de duração para o seu cumprimento, que dirá antes do trânsito em julgado, em que paira

em favor do réu a presunção de inocência.

Ou seja, existem prazos para a comunicação da prisão em flagrante à Autoridade

Judiciária, bem como para a duração da prisão temporária, mas, para a prisão preventiva, que

com a Lei 12.403/11 se tornou a espinha dorsal das prisões cautelares decretadas durante o

processo, nenhum limite temporal existe, da mesma forma que também não existe limite

temporal para a duração das medidas cautelares diversas da prisão, das quais será

pontualmente discorrido em outro capítulo.

Conforme observa Roberto Delmanto Jr., a questão da delimitação temporal da

prisão preventiva é assunto dos mais importantes, tanto que “as constituições de alguns

países, como a espanhola, a portuguesa e a italiana, expressamente estipulam que a lei

ordinária definirá o prazo máximo de prisão cautelar”, precisamente nos seus arts. 17, 28 e 13,

respectivamente.104

Em nosso Código de Processo Penal, o “habeas corpus” pode ser impetrado

quando qualquer pessoa estiver presa por mais tempo do que determina a lei, nos termos do

que dispõe o art. 648, inc. II do Código de Processo Penal.105

Porém, com base no já ventilado alhures, sem a fixação de um limite temporal

pela lei, a prisão preventiva prevista no sistema pátrio segue durante o processo sem, muitas

vezes, previsão de término, em total desconformidade, assim, com o princípio da

razoabilidade na duração do processo, e em descompasso com a idéia de temporalidade da

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Habeas+Corpus+89525+goi%E1s+segunda+turma+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/b97qb8Acesso em: 08 de março de 2013. 103 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 52, de 17 de setembro de 1992. Disponível em: http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stj/stj__0052.htm>. Acesso em: 08 de março de 2013. 104 DELMANTO JR., Roberto. As Modalidades de Prisão Provisória e seu Prazo de Duração. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 238. 105 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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prisão, a qual, se deve ser observada nas condenações definitivas, não poderá deixar de sê-la

também, e com maior razão, durante o processo de conhecimento, norteado pela presunção de

inocência.

Assim, ocorre que no caso concreto, diante das especificidades deste, os

magistrados acabam tendo de decidir se a duração da prisão cautelar se apresenta ou não

adequada e, pior, muitas vezes tal análise somente acontece depois de longas datas (as vezes

longos anos) de prisão provisória experimentada pelo réu, tendo em vista que não há na lei

imposição ao juiz no sentido de ter de rever toda prisão preventiva em determinado espaço de

tempo. Exemplificando tal situação, tem-se um “habeas corpus” concedido pelo Superior

Tribunal de Justiça no mês de novembro de 2012, o qual não deixa dúvidas quanto ao excesso

de prazo de duração da prisão processual, considerando que o réu encontrava-se preso

cautelarmente desde o mês de fevereiro de 2002, tendo sido pronunciado em fevereiro de

2004. Apesar da gravidade das acusações imputadas ao réu em questão, homicídio

qualificado, furto, formação de quadrilha e ocultação de cadáver, a sua prisão provisória já

perdurava nove anos, sem qualquer previsão de submissão a julgamento pelo Tribunal do

Júri.106

O Supremo Tribunal Federal, em outro julgado, também reconheceu o excesso de

prazo na duração da prisão processual de indivíduo acusado de crime doloso contra a vida, em

que a segregação cautelar já perdurava cinco anos. Inclusive, na decisão em comento, restou

consignado que: “a gravidade da increpação não obsta o direito subjetivo à razoável duração

do processo (inciso LXXVIII, do art. 5º, da Constituição da República Federativa do

Brasil).”107

Em geral, nas decisões dos tribunais pátrios, a detecção da existência de excesso

de prazo de duração da prisão cautelar passa pela análise, por parte dos julgadores, da atuação

da defesa do réu, que não pode ter contribuído para tal demora.108

106 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 196.537 / SP – São Paulo. Relatora: Min. Alderita Ramos de Oliveira (Des. Conv. do TJ/PE), Sexta Turma,. Julgamento em: 13/11/2012. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=habeas+corpus+196537&b=ACOR>. Acesso em: 20 de fevereiro de 2013. 107 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 107798 / PE – Pernambuco. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Ayres Britto. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgamento: 20/09/2011. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+107798%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/afgvm72>. Acesso em: 12 de janeiro de 2013. 108 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 112599 / DF – Distrito Federal. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Joaquim Barbosa. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgamento: 25/09/2012. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+112599+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/bah3byz>. Acesso em: 08 de março de 2013.

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Registre-se que, no Projeto de Lei 156/09, que visa à reforma do Código de

Processo Penal, há a preocupação com a delimitação de prazos máximos de duração da prisão

preventiva, bem como a necessidade de reexame da segregação cautelar, conforme citado

abaixo:

Art. 559. Quanto ao período máximo de duração da prisão preventiva, observar-se-á, obrigatoriamente, os seguintes prazos: I – 180 (cento e oitenta) dias, se decretada no curso da investigação ou antes da sentença condenatória recorrível, observado o disposto nos arts. 15, VIII e parágrafo único, e 32, parágrafos 2º e 3º; II – 360 (trezentos e sessenta) dias, se decretada ou prorrogada por ocasião da sentença condenatória recorrível; no caso de prorrogação, não se computa o período anterior cumprido na forma do inciso I deste artigo. Art. 563. Qualquer que seja o seu fundamento legal, a prisão preventiva que exceder a 90 (noventa) dias será obrigatoriamente reexaminada pelo juiz ou tribunal competente, para avaliar se persistem, ou não, os motivos determinantes da sua aplicação, podendo substituí-la, se for o caso, por outra medida cautelar. Par. 1º. O prazo previsto no caput deste artigo é contado do início da execução da prisão ou da data do último reexame. Par. 2º. Se, por qualquer motivo, o reexame não for realizado no prazo devido, a prisão será considerada ilegal. (grifou-se).109

Contudo, o Conselho Nacional de Justiça, criou a Resolução n. 66 de 27 de

janeiro de 2009, que dispõe sobre os mecanismos de controle dos atos judiciais concernentes

aos decretos de prisão provisória. Assim, o art. 3º da mesma resolução, dispõe o seguinte:

“Art. 3º Verificada a paralisação por mais de três meses dos inquéritos e processos, com

indiciado ou réu preso, deverá a Secretaria ou o Cartório encaminhar os autos imediatamente

à conclusão do juiz para que sejam examinados.”110

Dessa forma, não obstante a falta de lei estabelecedora de um limite temporal de

duração ou de reexame da prisão preventiva, a referida Resolução criada pelo Conselho

Nacional de Justiça deve nortear os trabalhos dos magistrados que decretam prisões

cautelares, de forma que a cada três meses, no máximo, devem rever seus decretos prisionais.

109 BRASIL. Projeto de Lei do Senado n. 156, de 22 de abril de 2009. Reforma do Código de Processo Penal. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=90645>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013 110 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução n. 66, de 27 de janeiro de 2009. Cria mecanismo de controle estatístico e disciplina o acompanhamento, pelos juízes e Tribunais, dos procedimentos relacionados à decretação e ao controle dos casos de prisão provisória. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/323-resolucoes/12180>. Acesso em: 20 de fevereiro de 2013.

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De outro lado, cumpre também asseverar que não basta a previsão de prazos para

o desenrolar do processo, sendo necessário sobretudo que o prazo seja adequado para que os

sujeitos processuais possam realizar as suas atividades. Assim, não é qualquer prazo que irá

atender ao princípio da razoável duração do processo, mas sim um prazo adequado diante da

necessidade de atuação a ser desenvolvida.111

111 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 116.

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3 A CAUTELARIDADE NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

3.1 A RELAÇÃO ENTRE O PROCESSO CIVIL E O PROCESSO PENAL

Existe uma teoria unitária dos princípios e regras do processo sustentada por

alguns autores, tais como: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e

Cândido Rangel Dinamarco, os quais propugnam que seria aplicável tanto na esfera do

processo civil quanto na seara do processo penal.112

Todavia, em vista dessa teoria unitária do processo, a objeção que pode ser feita é

de que vários institutos que são importados do processo civil não cabem na “silhueta” do

processo penal. “É como se as roupas do processo civil ficassem pequenas ou grandes no

processo penal.”113

Apesar de o processo penal contar com princípios e regras próprias, o que garante

a sua autonomia, inclusive, em relação ao Direito Penal, não pode fechar os olhos para o

processo civil, que contém regras e princípios que, a propósito, com o passar do tempo,

passaram a também integrar o Código de Processo Penal.

Assim, não se pode acreditar que essa autonomia do processo penal em relação ao

processo civil seja absoluta, estanque, se os problemas, o indivíduo, que constituem aportes

fáticos do direito, são em muitos casos complexos, e requerem soluções jurídicas

transdisciplinares.

Inclusive, registre-se que o estudo sobre as medidas cautelares teve origem nos

postulados de processo civil. O processo civil, assim, apresentou-se como a base para os

estudos das providências cautelares no processo penal.

Freitas, inspirando-se nas lições de Luiz Antônio Câmara, considera que o

processo penal cautelar brasileiro possui autonomia no tocante ao processo civil, a qual não é,

todavia, absoluta. E conclui:

Enquanto no respeitante as medidas cautelares de natureza real penal existe enorme proximidade com suas congêneres do processo civil, no que concerne às medidas pessoais, leia-se prisões cautelares, as noções do processo penal e do civil afastam-se, sem guardar interdependência [...].114

112 RANGEL, Paulo. A coisa julgada no processo penal brasileiro como instrumento de garantia. São Paulo: Atlas, 2012, p. 77. 113 RANGEL, Paulo. A coisa julgada no processo penal brasileiro como instrumento de garantia. São Paulo: Atlas, 2012, p. 77. 114 FREITAS, Jayme Walmer. Prisão Temporária. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 38.

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No processo civil, o processo cautelar é autônomo em relação aos processos de

conhecimento e executório, muito embora mantenha relação de dependência com o processo

principal, cujo resultado aquele visa resguardar. O processo cautelar, na esfera processual

civil, deve ser manejado por meio de ação autônoma, preparatória ou incidental ao processo

de conhecimento ou de execução.

Realizadas tais reflexões, cumpre enfrentar a seguinte problemática: a tutela

cautelar penal segue a mesma sistemática do processo cautelar previsto no processo civil?

Teríamos um processo cautelar autônomo no processo penal, diferente do processo de

conhecimento e de execução?

Delmanto Jr. defende a inexistência de um processo penal cautelar, registrando

que o que existem são “medidas ou providências cautelares ínsitas ao processo de

conhecimento ou, inclusive, ao de execução.”115

Na mesma senda adverte Santos, ao considerar que a legislação processual penal é

diferente da legislação processual civil pátria, uma vez que apenas nesta última existe um

processo cautelar autônomo. O autor observa que o que existem no processo penal brasileiro

são:

Medidas cautelares preparatórias ou incidentais à ação penal condenatória, bem como incidentais ao processo de execução [...] Eventualmente as ações constitucionais impugnativas, como o habeas corpus e o mandado de segurança, são ajuizadas com propósito exclusivamente cautelar, consubstanciando verdadeiras ações cautelares, o que não é suficiente, todavia, para permitir a existência de um processo penal cautelar autônomo no processo penal [...].116

Temos, ainda, que no processo penal existem ações cautelares probatórias, como,

por exemplo, a busca e apreensão preparatória para oferecimento de queixa-crime em face de

delito cometido contra a propriedade industrial (art. 200 e seguintes da Lei 9.279/96), mas

que, à luz da posição acima referida, não constitui o bastante para sustentar a existência de um

processo cautelar autônomo no processo penal.117

115 DELMANTO JR., Roberto. As Modalidades de Prisão Provisória e seu Prazo de Duração. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 77. 116 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 13. 117 BRASIL. Lei n. 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7210.htm>. Acesso em: 07 de março de 2013.

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De outro lado, não se pode olvidar que as medidas cautelares no processo penal

estão unidas por requisitos e condições que lhe são comuns, não obstante cada instituto deva

ser estudado de uma maneira mais aproximada, observando-se as suas singularidades, que são

muitas.

Silva Jr. defende a existência de uma ação penal cautelar, quando identifica o

direito público subjetivo de provocar a jurisdição reclamando a ordenação de uma medida de

caráter provisório, necessária e conveniente para a efetivação da prestação jurisdicional

definitiva.118

E acrescenta:

Sendo a ação o direito de provocar a jurisdição, quando se tratar de assunto referente ao campo criminal, ela se denomina ação penal. Essa ação penal assume posições conforme o caso, pois pode se referir a um pedido definitivo, como pode se referir a um pedido provisório. Nesta última hipótese ela se denomina ação penal cautelar.119

Todavia, conforme já ventilado anteriormente, assim não entendemos, em vista de

as medidas cautelares penais, de um modo geral, deverem ser postuladas no próprio processo

que visam a resguardar, por simples petição, sem a sua documentação em autos apartados.

3.2 CONCEITO DE MEDIDAS CAUTELARES

A prestação jurisdicional não é entregue às partes de maneira imediata, tendo em

vista a necessidade de seguir-se os trâmites normais do processo, com fases delineadas para

que cada coisa aconteça a seu tempo. Todavia, em alguns casos, no decorrer desse tramitar

necessário inerente ao processo, podem ocorrer situações inesperadas, traduzindo algum risco

à eficácia e à utilidade da decisão final ou à parte dela.120

118 SILVA JR, Euclides Ferreira da. Prisão, Liberdade Provisória, Habeas Corpus. Teoria e Prática. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 06. 119 SILVA JR, Euclides Ferreira da. Prisão, Liberdade Provisória, Habeas Corpus. Teoria e Prática. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 06. 120 ARRUDA, Eloisa de Souza. As Medidas Cautelares Reais no Processo Penal Brasileiro. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1994, p. 25.

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Assim, durante o tramitar do processo, ou antes mesmo dele, ainda na fase de

investigação do crime e sua autoria, pode surgir “a necessidade de medidas cautelares, que

eliminem ou amenizem esse perigo.”121

Ainda acrescenta Fernandes que:

No intervalo entre o nascimento da relação jurídica processual e a obtenção do provimento final, existe sempre o risco de sucederem eventos que comprometam a atuação jurisdicional ou afetem profundamente a eficácia e utilidade do julgado. Há, então, a necessidade de medidas cautelares, que eliminem ou amenizem esse perigo. São providências urgentes, com as quais se busca evitar que a decisão da causa, ao ser obtida, não mais satisfaça o direito da parte e não realize, assim, a finalidade instrumental do processo, consistente em uma prestação jurisdicional justa.122

Não obstante o pedido cautelar seja autônomo em relação ao seu objeto, traduz

evidente relação de instrumentalidade com o processo principal, servindo de meio para

alcançar o resultado útil da prestação jurisdicional final.

Neste sentido, pontua Eloisa de Souza Arruda: “não encerram as medidas

cautelares um fim em si mesmas. Buscam tão-somente assegurar a execução das

definitivas.”123

Quando se assevera que as medidas cautelares servem à eficácia do processo

penal, não se pode esquecer de que este visa a tutela da liberdade, ao mesmo tempo em que

serve à efetivação do “jus puniendi” do Estado. Assim, as medidas cautelares devem ser

alinhadas com a finalidade do processo penal como um todo.

Essas medidas possuem finalidade provisória e instrumental, já que,

respectivamente, devem permanecer até que sobrevenha a decisão definitiva, que as

substituirá, ou mesmo até que uma circunstância superveniente denote a sua desnecessidade, e

não possuem objetivo em si mesmas, mas sim, existem em face de outro processo.124

Calamandrei (apud Greco Filho) designou a instrumentalidade das providências

cautelares de “instrumentalidade hipotética”, já que:

121 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 279. 122 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 279. 123 ARRUDA, Eloisa de Souza. As Medidas Cautelares Reais no Processo Penal Brasileiro. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1994, p. 26. 124 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 3ª vol. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 153.

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Além de estar a serviço de um processo, não depende da certeza da decisão favorável naquele processo. Protege-se um bem jurídico na hipótese de, sendo a sentença favorável ao requerente, o bem precisar estar íntegro para lhe ser entregue ou ser utilizado. A medida é concedida para o caso de aquele que a pleiteia ter razão.125

Conforme mencionam Tucci e Delmanto Jr. tem-se que as medidas cautelares no

processo penal são “providências, determinadas por autoridade competente, destinadas a

assegurar a definição de relação jurídica penal e, eventualmente, a sua satisfação.”126

Tais providências, pressupõem, em regra, a existência de infração penal

importante, bem como indícios suficientes de autoria delitiva. Todavia, cumpre lembrar que

existem medidas cautelares que dispensam a existência de indício de autoria, como, por

exemplo, o exame de corpo de delito (arts. 6º, VII e 158, do Código de Processo Penal), a

preservação e o exame do local do crime (arts. 6º, I, 169 e 171, do Código de Processo Penal)

e a perícia nos crimes de incêndio (art. 173, do Código de Processo Penal).127

Assim, as providências cautelares do processo penal podem ser determinadas

durante toda a persecução penal, abrangendo, portanto, as fases investigatória, da ação penal

(processo de conhecimento), e da execução da pena.

3.3 CLASSIFICAÇÃO

As medidas cautelares podem recair sobre os bens do imputado – medidas

cautelares reais; sobre a pessoa do acusado – medidas cautelares pessoais; e, finalmente,

podem ter finalidade de descoberta da verdade – medidas cautelares probatórias.

Na mesma senda, Nicolitt considera que a cautelaridade no processo penal está

delineada da seguinte forma: “a) medidas cautelares pessoais; b) medidas cautelares reais (de

natureza civil); c) medidas cautelares probatórias.”128

Ainda quanto à classificação das medidas cautelares, tomando-se por base as

disposições do Código de Processo Civil, do art. 796 ao art. 889, alguns processualistas

brasileiros como Humberto Theodoro Júnior, João Carlos Pestana de Aguiar, José Frederico

125 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 3ª vol. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 153. 126 TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JR., Roberto. Sistematização das Medidas Cautelares Processuais Penais. Revista do Advogado, São Paulo: AASP, v. 24, n. 78, p. 111-120, set. 2004. 127 TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JR., Roberto. Sistematização das Medidas Cautelares Processuais Penais. Revista do Advogado, São Paulo: AASP, v. 24, n. 78, p. 111-120, set. 2004. 128 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar – A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 09.

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Marques e outros, classificam as medidas cautelares de forma bipartida, ou seja, em típicas ou

nominadas, e atípicas ou inominadas. As medidas cautelares típicas ou nominadas são aquelas

previstas na lei com suas respectivas denominações (exemplos: arresto, sequestro, busca e

apreensão). Já as medidas cautelares atípicas ou inominadas, não estão previstas

expressamente na lei, possuindo denominação genérica.129

A denominação das medidas cautelares em típicas (ou nominadas) e atípicas (ou

inominadas), também se faz necessária no processo penal, e pelo mesmo motivo que no

processo civil, ou seja, para elucidar se a providência está ou não prevista expressamente na

lei.

Compulsando-se o Código de Processo Penal, vê-se que as medidas cautelares

encontram-se dispersas em diversos dispositivos legais. Igualmente, em leis especiais também

são identificadas medidas cautelares propaladas. Portanto, entendemos que uma boa

sistemática sobre a matéria não há.

As medidas cautelares pessoais, tais como a prisão cautelar, foram fortemente

afetadas pela Lei 12.403/11, que inseriu um rol considerável de tais providências no Código

de Processo Penal. Já, as medidas cautelares reais, recebem o título no Código de Processo

Penal de “Medidas Assecuratórias”, possuindo natureza civil. Existem, ainda, as medidas

cautelares probatórias, tais como a busca e apreensão, regulada no Código de Processo Penal

no seu Título “VII – Das Provas” a interceptação telefônica prevista na Lei 9.296/96, a

infiltração de agentes disposta na Lei 9.034/95, a ação controlada prevista na Lei 11.343/11

etc.130

Cumpre ressaltar que em tal classificação a fiança não assume um lugar bem

definido, isto porque a mesma incide sobre o patrimônio do imputado, e não diretamente

sobre a sua pessoa, não sendo, portanto, propriamente uma medida cautelar pessoal, ao

mesmo tempo em que foge do eixo de classificação das medidas cautelares reais (arresto,

sequestro e especialização de hipoteca legal, por exemplo), não se enquadrando, tampouco,

em cautelares probatórias. Por isso, talvez seja o caso de classificá-la como uma “medida

patrimonial penal”, fugindo em certa medida da classificação anteriormente proposta quanto

às providências cautelares.131

129 SILVA JR, Euclides Ferreira da. Prisão, Liberdade Provisória, Habeas Corpus. Teoria e Prática. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 07-12. 130 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar – A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 09-10. 131 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar – A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 09-11.

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Fábio Delmanto, inspirado nas lições de Campos Barros, de 1982, discorre que as

medidas cautelares são divididas em três grandes grupos, quais sejam: a) cautelas pessoais,

que compreenderiam as prisões provisórias, as medidas temporárias de segurança e de

interdições de direitos (previstas entre os arts. 373 a 380, do Código de Processo Penal), estas

últimas, porém, tacitamente revogadas em vista da Reforma Penal de 1984 e da Lei de

Execução Penal; 2) cautelas patrimoniais, divididas em 2.a) apreensão de coisas (art. 6º, do

Código de Processo Penal), 2.b) busca e apreensão (art. 240, do Código de Processo Penal),

2.c) arresto (art. 132, do Código de Processo Penal) e 2.d) sequestro (art. 125, do Código de

Processo Penal). E, ainda, as medidas relativas aos meios de provas compreenderiam o 3.a)

depoimento testemunhal antecipado, previsto no art. 225, do Código de Processo Penal, o 3.b)

exame de corpo de delito (art. 158 a 181, parágrafo único, do Código de Processo Penal), a

3.c) perícia complementar (art. 168, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal) e 3.d) o

exame de local do crime (arts. 169 a 173, do Código de Processo Penal).132

De outro lado, cumpre observar que se fala no processo penal também em contra-

cautela, que seria uma medida propícia a neutralizar o dano oriundo de uma medida cautelar

determinada, ou ainda, a ser imposta, exemplo: a fiança (contra-cautela) em vista da prisão

cautelar.133

Todavia, parece mais razoável o entendimento de que a prisão cautelar, assim

como a liberdade provisória, e as outras medidas cautelares em geral, são cautelas, porquanto

autônomas e independentes.134

No mesmo sentido, a propósito, pontuam também Marques da Silva e Freitas:

“Ficamos com Rogério Lauria Tucci, quando batiza todas de cautelares. Tanto a prisão

provisória como a liberdade provisória são cautelas.”135

Igualmente, cumpre registrar que o vocábulo contra-cautela parece designar

alguma medida inadequada ao processo, contrária à normalidade que se pretende instaurar, e

se espera do processo, razão pela qual no mínimo a expressão causa estranheza.

132 DELMANTO, Fabio Machado de Almeida. Medidas Substitutivas e Alternativas à Prisão Cautelar. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 108-109. 133 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 512. 134 TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro. Atualizado com a Lei da Prisão (Lei 12.403/2001). 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 264. 135 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 512.

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Com a reforma ditada pela Lei 12.403/11, parece que essa questão restou

superada, notadamente porque a liberdade provisória passou a ser possibilitada com ou sem

providências expressamente intituladas de medidas cautelares.

Para a elucidação do tema proposto na presente dissertação, sobreleva somente o

estudo das medidas cautelares que incidem sobre a pessoa, objeto da Lei 12.403/11.

3.4 CARACTERÍSTICAS

Toda e qualquer medida cautelar possui as seguintes características: a)

jurisdicionalidade; b) acessoriedade; c) instrumentalidade hipotética; d) provisoriedade; e, e)

homogeneidade.136

A jurisdicionalidade relaciona-se com a necessidade de análise judicial quanto à

adoção da medida cautelar, porque restringe direitos tutelados pela Lei Maior ou por

Convenções Internacionais. Assim, somente a Autoridade Judiciária competente, mediante

decisão fundamentada, poderá determiná-las. Mesmo que possa haver busca e apreensão em

domicílio do indiciado com o seu consentimento, sem prévia expedição de mandado judicial,

tal não dispensa o controle judicial sobre a legalidade da efetivação da medida.137

A acessoriedade significa que a medida cautelar é dependente da medida

principal, eis que, com o resultado do processo principal, a providência cautelar cessa a sua

eficácia. Ou seja, a medida cautelar subsistirá enquanto não for proferida a decisão final do

processo principal.

A instrumentalidade hipotética indica que a medida cautelar serve de meio à

consecução da medida principal. “É como se o direito material discutido no processo de

conhecimento fosse provável ao autor e o instrumento para se atingir este possível direito

fosse exatamente a medida cautelar.”138

A provisoriedade elucida que a medida cautelar perdura enquanto não existir a

medida do processo principal, bem como enquanto subsistirem seus motivos autorizadores.

A homogeneidade indica que a medida cautelar deve guardar relação de

proporcionalidade com o resultado que poderá ser obtido com a medida principal final.

Assim, por exemplo, não se afigura proporcional uma prisão cautelar se já, de antemão,

identifica-se que, se vier a ser condenado o acusado, não irá receber pena privativa de 136 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 734-735. 137 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 735. 138 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 735.

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liberdade, considerando que a situação admite a substituição da pena privativa de liberdade

por restritiva de direitos, seja pelo crime em tese praticado, seja em face dos antecedentes do

indivíduo. Ou seja, não se mostra proporcional que a medida cautelar se apresente mais

gravosa que a medida que poderá ser imposta com o provimento jurisdicional final.

Pensamos que a excepcionalidade também integra as características acima

mencionadas, inerentes às medidas cautelares, haja vista que, em um estado de normalidade

processual, sem riscos surgidos ao longo do processo, não haverá necessidade de imposição

de qualquer medida cautelar e, logo, o processo seguirá sem providências cautelares.

O critério ou princípio da excepcionalidade determina que a medida cautelar

“deve ser fixada como exceção à regra geral de manutenção de todos os direitos que

pertencem ao inocente.”139

3.5 PRESSUPOSTOS

Lopes Jr., inspirado nas lições de Calamandrei, menciona que toda medida

cautelar deve ser baseada em duas premissas indeclináveis, “fumus boni juris” e “periculum

in mora.”140

De outro lado, Goldschmidt, em 1935, já dizia que “grave problema existe no

paralelismo entre processo civil e processo penal, principalmente quando são buscadas

categorias e definições do processo civil e pretende-se sua aplicação automática no processo

penal”, conforme menciona Lopes Jr.141

Lopes Jr. explica que os pressupostos das medidas cautelares do processo penal

são dois, quais sejam: “fumus commissi delicti” e “periculum libertatis” e não propriamente

“fumus boni juris” e “periculum in mora”. Isso porque, segundo o mesmo autor reflete e

indaga, como se pode sustentar a decretação de uma prisão cautelar afirmando “[...] que o

delito é a fumaça do bom direito? Ora, o delito é a negação do direito, sua antítese!”. E

continua:

No processo penal, o requisito para a decretação de uma medida coercitiva não é a probabilidade de existência do direito de acusação alegado, mas sim,

139 CAMARGO, Monica Ovinski de. Princípio da Presunção de Inocência no Brasil. O Conflito entre Punir e Libertar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 258. 140 LOPES JR., Aury. A (in) existência de poder geral de cautela no processo penal. Boletim IBCCRIM São Paulo, ano 17, n. 203, p. 08-09, out., 2009, p. 49. 141 LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 193-194.

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de um fato aparentemente punível. Logo, o correto é afirmar que o requisito para decretação de uma prisão cautelar é a existência do fumus comissi delicti, enquanto probabilidade da ocorrência de um delito (e não de um direito), ou, mais especificamente, na sistemática do CPP, a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria.142

Já, em relação à terminologia “periculum libertatis”, a qual considera ser a mais

adequada às medidas cautelares penais, Lopes Jr. também considera:

O perigo não brota do lapso temporal entre o provimento cautelar e o definitivo. Não é o tempo que leva ao perecimento do objeto. O risco no processo penal decorre da situação de liberdade do sujeito passivo. Basta afastar a conceituação puramente civilista para ver que o periculum in mora no processo penal assume o caráter de perigo ao normal desenvolvimento do processo (perigo de fuga, destruição da prova) em virtude do estado de liberdade do sujeito passivo. Logo, o fundamento é um periculum libertatis, enquanto perigo que decorre do estado de liberdade do imputado.143

Todavia, pensamos que quando se propugna a existência de “fumus boni juris”

como requisito das cautelares do processo penal não se quer designar que o crime seja fumaça

do bom direito, mas sim, que a pretensão acusatória tenha probabilidade de êxito, tendo em

vista estar baseada em fortes elementos, que denotem a sua robustez, e aí sim, nesse sentido, o

próprio “fumus boni juris”.

Ademais, em se tratando das medidas cautelares reais, não parece inadequado

falar-se em “periculum in mora”, uma vez que é precipuamente a demora na tramitação do

processo, e não, necessariamente, o estado de liberdade do agente, que faz surgir a

necessidade da constrição de bens em prol da satisfação do dano à vítima, no arresto e na

especialização de hipoteca legal, sob pena de perecerem ou desaparecem por qualquer motivo.

142 LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 195. 143 LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 195-196.

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4 AS PRISÕES CAUTELARES NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO – À LUZ DA

LEI 12.403/11

4.1 CONCEITO

A prisão penal pode decorrer do trânsito em julgado de uma sentença penal

condenatória, mas pode também ser verificada durante o processo criminal, antes, porém, do

julgamento definitivo. Assim, nesta última hipótese temos a prisão cautelar, processual ou

provisória, e naquele temos a chamada prisão-pena.

Conforme preleciona Silva Jr.:

O sentido de prisão processual decorre do fato de não ter ainda a pessoa sofrido uma condenação. É a prisão que ocorre antes de uma eventual condenação e, apesar de se denominar processual (ocorre durante o transcorrer do processo), ela pode ocorrer antes, ou seja, durante o inquérito policial.144

A prisão processual é a que decorre da situação de flagrante delito ou de ordem

judicial, em razão da investigação criminal ou processo penal, sendo ainda necessários os

pressupostos de medida cautelar, constituindo, historicamente, a mais antiga das prisões.

Ademais, objetiva resguardar bens jurídicos envolvidos no processo.145

4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PRISÕES CAUTELARES

O encarceramento de infratores existe desde os tempos mais remotos, de forma

que na Antiguidade não possuía o caráter de pena, baseando-se em outras razões. Até o final

do século XVIII, a prisão tinha por finalidade exclusiva a contenção e a guarda de acusados,

para que fossem preservados fisicamente até que sobreviesse o momento do julgamento,

ocasião em que poderiam ser executados.146

Bitencourt também pontua:

Grécia e Roma, pois, expoentes do mundo antigo, conheceram a prisão com finalidade eminentemente de custódia, para impedir que o culpado pudesse

144 SILVA JR, Euclides Ferreira da. Prisão, Liberdade Provisória, Habeas Corpus. Teoria e Prática. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 29. 145 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 249-251. 146 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão – causas e alternativas. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 04.

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substrair-se ao castigo. [...] A finalidade da prisão, portanto, restrigia-se à custódia dos réus até a execução das condenações [...]. A prisão dos devedores tinha a mesma finalidade: garantir que cumprissem as suas obrigações.147

Na Idade Média, a situação não foi diferente, ou seja, a privação da liberdade

permanece sendo utilizada com o objetivo de custódia do indivíduo, até o seu julgamento,

momento em que recebia bárbaros tormentos, como a mutilação de vários membros do corpo,

ou mesmo era queimado na fogueira.148

Na Idade Moderna, a prisão-custódia é transformada em prisão-pena, não por

intuitos humanitários, mas porque os encarcerados deveriam se adequar ao capitalismo.

Surgem, então, as primeiras instituições de reclusão na Inglaterra e na Holanda. Assim,

Melossi e Pavarini (apud Bitencourt) pontuam que:

É na Holanda, na primeira metade do século XVII, onde a nova instituição da casa de trabalho chega, no período das origens do capitalismo, à sua forma mais desenvolvida. É que a criação desta nova e original forma de segregação punitiva responde mais a uma exigência relacionada ao desenvolvimento geral da sociedade capitalista que a genialidade individual de algum reformador.149

Em nosso ordenamento processual penal, a privação da liberdade do imputado,

anterior ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória, muito antes da legislação da

época do Império, precisamente as Filipinas, do século XIV, sempre foi justificada no risco de

não comparecimento do imputado no processo, para o julgamento.150

De outro lado, existiam diversas modalidades de liberdade provisória que

poderiam ser concedidas ao acusado para garantir a sua presença no dia do julgamento, como,

por exemplo, aquela concedida mediante fiança. Todavia, a liberdade do acusado preso em

flagrante durante o processo não constituía a regra, mas sim, a sua prisão. Tal benefício era

considerado mera faculdade do Poder Público e não um direito do indivíduo.151

147 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão – causas e alternativas. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 08. 148 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão – causas e alternativas. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 09. 149 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão – causas e alternativas. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 21-22. 150 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 572. 151 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 572.

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Ou seja, porque a presunção que imperava contra o imputado preso em flagrante

era de culpabilidade, durante todo o processo, é que só eventualmente se concedia ao mesmo

a liberdade, e isso explica a utilização até os dias de hoje da expressão liberdade provisória,

que nada mais indica do que um ranço dessa época de presunção de culpabilidade, em que o

que era provisória era a liberdade, parecendo que a prisão não.

A Constituição de 1824, chamada de “Constituição Política do Império do Brasil”,

outorgada por Dom Pedro I, em 25.03.1824, adotou a Monarquia como forma de governo,

dividindo os territórios em províncias, e instituiu além dos Poderes Executivo, Legislativo e

Judiciário, o Poder Moderador, exercido exclusivamente pelo Imperador.152

A Constituição de 1937, intitulada de “Constituição da República dos Estados

Unidos do Brasil”, foi inspirada na Constituição fascista da Polônia, e por isso ficou

conhecida como Constituição Polaca. Houve o fortalecimento do Poder Executivo Federal, de

forma que restaram concentrados nas mãos do Presidente da República os Poderes Executivo

e Legislativo. Inclusive, sob a égide de tal Constituição: “Getúlio Vargas legisla por via de

Decretos-leis que ele próprio depois aplicava como órgão do Executivo.”153

Assim, o Código de Processo Penal de 1941, apesar de ter sido o resultado de uma

ditadura imposta por Getúlio Vargas, sob a égide da Constituição pátria de 10.11.1937,

continuou o ideal de presunção de culpabilidade que imperava anteriormente, desde a época

das Ordenações do Reino.

O Ato Institucional n. 5, baixado em 13 de dezembro de 1968, durante o governo

do General Costa e Silva, mais conhecido como AI-5, representou ao País a não apreciação

pelo Poder Judiciário de diversas lesões a direitos praticadas pelos órgãos de repressão

política, porquanto o “habeas corpus” foi suspenso pelo referido ato institucional para os

chamados crimes políticos. Isso não significa que a violência, naquela época, era

institucionalmente permitida, mas também não havia como ser questionada.154

De outro lado, mesmo na época da Ditadura, de Vargas e a Militar, o Código de

Processo Penal de 1941 passou a evoluir para o caminho da liberdade. A Lei 5.349, de 03 de

novembro de 1967 acabou com a prisão preventiva obrigatória. A Lei 5.941, de 22 de

152 OLIVEIRA, Erival da S.; ARAUJO JR., Marco Antonio.; BARROSO, Darlan (Coord.). Direito Constitucional. Direitos Humanos. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 159. 153 BRASIL. Constituição (1937). Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de novembro de 1937. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao37.htm>. Acesso em: 10 de dezembro de 2012. 154 BRASIL. Ato Institucional n. 5, de 13 de dezembro de 1968. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-05-68.htm>. Acesso em: 10 de dezembro de 2013.

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novembro de 1973, que ficou conhecida como Lei Fleury, modificou o Código de Processo

Penal atual, passando a prever a possibilidade de o réu aguardar o trânsito em julgado do

processo em liberdade, desde que fosse primário e de bons antecedentes (antiga redação do

art. 408, parágrafo 2º do Código de Processo Penal).

Na mesma linha evolutiva de liberdade, a Lei 6.416 de 24 de maio de 1977 criou

muitas possibilidades de libertação de acusados antes da sentença com trânsito em julgado,

haja vista a inserção do parágrafo único ao art. 310 do Código de Processo Penal (atualmente

já alterado pela Lei 12.403/11) que previa a possibilidade de concessão de liberdade

provisória, desde que não presentes os requisitos da prisão preventiva, o que, segundo alguns

posicionamentos, inclusive de Tribunais, abarcou também os crimes inafiançáveis.

Não obstante todas essas leis tenham alterado dispositivos do processo penal em

questões atinentes à prisão e à liberdade durante o processo, a perspectiva teórica do Código

de Processo Penal, de 1941, permanecia inalterada, autoritária, sedimentada na presunção de

culpabilidade e de periculosidade do imputado “prevalecendo sempre a preocupação com a

segurança pública, como se o Direito Penal constituísse verdadeira política pública.”155

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, foi promulgada e

publicada em 05.10.1988, e ficou conhecida como a “Constituição Cidadã”, sobretudo porque

fundou o Estado Democrático de Direito, “[...] autolimitando o poder do Estado ao

cumprimento das leis que a todos subordinam.”156

A Magna Carta de 1988, fundamentada na dignidade humana, estabeleceu

garantias individuais bastante importantes, como a presunção de inocência (art. 5º, inc. LVII)

e todo um regramento a ser observado pelo Estado no tratamento com o preso (exemplo, art.

5º, incs. LXI a LXVI).157

O advento da Magna Carta de 1988 representou uma nova ordem constitucional.

Se antes o processo penal era visto como uma forma de aniquilar o acusado, com a nova Lei

Maior o processo penal passou a ser compreendido como uma maneira de realização do poder

155 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 08. 156 OLIVEIRA, Erival da S. ARAUJO JR., Marco Antonio; BARROSO, Darlan (Coord.). Direito Constitucional. Direitos Humanos. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 162. 157 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.

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de punir do Estado, mas também como um “[...] instrumento de garantia do indivíduo em face

do Estado.”158

Já, sob a égide da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a Lei

11.719 de 20 de junho de 2008 também contribuiu para a manutenção da liberdade dos

imputados antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, uma vez que, dentre

vários dispositivos que alterou e revogou, acabou com a necessidade de o réu, condenado

recorrivelmente, ter de recolher-se à prisão ou pagar fiança, esta quando fosse cabível, para

poder interpor recurso de apelação, razão pela qual foi revogado o art. 594 do Código de

Processo Penal, prevalecendo, assim, o duplo grau de jurisdição e a presunção de inocência.

Se as reformas anteriores foram pontuais, não chegando a sedimentar o paradigma

da liberdade como a regra durante o processo, antes do trânsito em julgado da sentença penal,

a Lei 12.403 de 04 de maio de 2011, ao menos demonstrou tal intento, uma vez que alterou

toda a sistemática das prisões cautelares, modificando o Código de Processo Penal, do art.

282 ao art. 350, deixando claro em várias passagens dos dispositivos legais que a prisão

preventiva constitui medida extrema, só devendo ser decretada quando as providências

cautelares descarcerizadoras, que inaugurou, entre os arts. 318 a 320 do Código de Processo

Penal, não se mostrarem adequadas e necessárias diante do caso concreto.

Greco Filho assinala que a Magna Carta de 1988 prevê várias disposições a

respeito do processo penal e da prisão, razão pela qual o Código de Processo Penal de 1941

necessita de uma interpretação que se coadune com a Lei Maior, que realize os princípios

desta. Enfatiza, por outro lado, que:

O tema prisão processual sofre, com mais intensidade, a carga emotiva do momento político, social e econômico do País, gerando normas casuísticas, medidas provisórias e leis (e até normas constitucionais), o que dificulta ainda mais uma formulação sistemática e coerente do tema. Todavia, um sistema existe. E bem delineado no Código.159

Com a Lei 12.403/11, pensamos que o sistema das prisões cautelares restou

melhor delineado no Código de Processo Penal, bem como mais comprometido com os

princípios da Lei Maior, em que pese a efetividade do sistema processual penal depender da

real aplicação dos ditames da nova lei, não bastando que fique apenas no papel.

158 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 08. 159 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 249.

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De qualquer maneira, não obstante a prisão, ainda mais processual, constituir

exigência amarga, demonstra também ser indispensável em alguns casos. Inclusive, a história

das prisões não identifica a sua paulatina abolição, senão a sua reforma. As reformas têm

preconizado o aperfeiçoamento da prisão, quando necessária, bem como a sua substituição,

quando possível e aconselhável.160

4.3 A FINALIDADE DA LEI 12.403/11

É inegável que mesmo o preso provisório vivencie todos os reflexos negativos do

encarceramento, não sendo melhorado por essa experiência, salvo raras exceções.

Quanto aos índices de reincidência, observados a partir de experiências com o

encarceramento, pontua Bitencourt que:

As estatísticas de diferentes países são pouco animadoras, tal como refletem as seguintes: nos Estados Unidos as cifras de reincidência oscilam entre 40% e 80%. [...] Na Espanha, o percentual médio de reincidência, entre 1957 e 1973, foi de 60,3%. Na Costa Rica, mais recentemente, foi encontrado o percentual de 48% de reincidência. Porém, os países latino-americanos não apresentam índices estatísticos confiáveis (quando os apresentam), sendo esse um dos fatores que dificultam a realização de uma verdadeira política criminal. Apesar da deficiência dos dados estatísticos, é inquestionável que a delinquência não diminui em toda a América Latina e que o sistema penitenciário tradicional não consegue reabilitar o delinquente; ao contrário, constitui uma realidade violenta e opressiva e serve apenas para reforçar os valores negativos do condenado.161

Assim, em vista dos problemas propiciados pelo sistema carcerário, que, ao que

parece, são vivenciados por diversos países, foi elaborada uma proposta de reforma do Código

de Processo Penal pela Comissão constituída pela Portaria nº 61, de 20 de janeiro de 2000,

integrada pelos juristas Ada Pellegrini Grinover, Petrônio Calmon Filho, Antônio Magalhães

Gomes Filho, Antônio Scarance Fernandes, Luiz Flávio Gomes, Miguel Reale Júnior,

Nilzardo Carneiro Leão, René Ariel Dotti, Rogério Lauria Tucci, Sidney Beneti e,

posteriormente, Rui Stoco. A proposta legislativa em comento, por iniciativa do Poder

Executivo, transformou-se no Projeto de Lei n. 4.208, de 2001, que encaminhou para a

160 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão – causas e alternativas. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 01-02. 161 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão – causas e alternativas. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 161.

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Câmara dos Deputados, a Exposição de Motivos n. 00022 – MJ, de 25 de janeiro de 2001, do

Ministério da Justiça.162

A Exposição de Motivos de uma Lei proclama o exato entendimento que se deve

conceder à nova lei.

Fernandes, dizia antes da Lei 12.403/11, que há muito tempo sente-se a

necessidade de ampliação do rol das medidas cautelares que incidem sobre a pessoa, como

procederam os códigos português e italiano.163

A Exposição de Motivos que iluminou a Lei 12.403/11 fez referência às modernas

legislações estrangeiras, mormente as da Itália e de Portugal, que preveem um amplo rol de

medidas cautelares pessoais alternativas à prisão, e, com isso, deixa também claro o seu

intento de propiciar que a prisão processual só ocorra em último caso.

Propugna também uma mudança de paradigma em relação ao tratamento que deve

ser conferido ao imputado, presumivelmente inocente, que ainda não possui contra si o

decreto de uma sentença penal transitada em julgado.

Menciona a necessidade de sistematização e estruturação das medidas cautelares e

da liberdade provisória, sobretudo porque o Código de Processo Penal se tornou desfigurado,

diante de tantas reformas anteriores que experimentou, muitas delas desprovidas de

preocupação com a coerência de todo o sistema jurídico.

A prisão preventiva passa a ser autorizada só para os crimes considerados mais

graves, objetivando, com isso, mudar o cenário de banalização de decretação da prisão

cautelar.

Restou bastante clara também a ideia de que qualquer que seja a prisão adotada

antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, deve ter natureza cautelar.

Ainda nesse contexto, propõe que a fiança seja revigorada, diante dos novos

critérios e valores estabelecidos, e da ampliação dos poderes da Autoridade Policial para o

arbitramento da medida.

É o que se extrai da Exposição de Motivos em comento que, em suma, objetiva:

162 BRASIL. Projeto de Lei n. 4.208, de 2001. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal – relativos à prisão, medidas cautelares e liberdade, e dá outras providências. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=D8775D42AA8160090AC2982AF3897030.node2?codteor=773516&filename=Tramitacao-PL+4208/2001>. Acesso em: 05 de março de 2013. 163 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 282.

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a) o tratamento sistemático e estruturado das medidas cautelares e da liberdade provisória; b) o aumento do rol das medidas cautelares, antes centradas essencialmente na prisão preventiva e na liberdade provisória sem fiança do artigo 310, parágrafo único; c) manutenção da prisão preventiva, de forma genérica para a garantia da instrução do processo e para a execução da pena e, de maneira especial, para acusados que possam vir a praticar infrações penais relativas ao crime organizado, à probidade administrativa ou à ordem econômica ou financeira consideradas graves, ou mediante violência ou grave ameaça à pessoa; d) impossibilidade de, antes de sentença condenatória transitada em julgado, haver prisão que não seja de natureza cautelar; e) valorização da fiança.164

No mais, no transcurso do presente estudo, serão observados outros comentários,

igualmente relevantes, desta Exposição de Motivos, dentro do contexto de cada instituto a ser

abordado.

4.4 ESPÉCIES

Pela sistemática ditada pela Lei 12.403/11 duas são as espécies de prisões

cautelares, quais sejam, prisão preventiva e prisão temporária.165

A prisão em flagrante, não há qualquer dúvida, constitui-se em medida pré-

cautelar, porquanto a mesma não mais se mantém se não estiverem presentes as condições que

autorizam a prisão preventiva, o que será melhor explicitado posteriormente.

A prisão administrativa restou expressamente revogada, e nem poderia ser

diferente, uma vez que as prisões, em regra, não dispensam prévia ordem escrita e

fundamentada de Autoridade Judiciária competente, à exceção do flagrante delito, e nos casos

de transgressão militar, ou crime propriamente militar, definidos em lei, nos termos do que

dispõe o art. 5º, inc. LXI da Magna Carta de 1988.166

164 BRASIL. Projeto de Lei n. 4.208, de 2001. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal – relativos à prisão, medidas cautelares e liberdade, e dá outras providências. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=D8775D42AA8160090AC2982AF3897030.node2?codteor=773516&filename=Tramitacao-PL+4208/2001>. Acesso em: 05 de março de 2013 165 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 166 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.

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A jurisprudência e a doutrina, a propósito, já vinham enunciando a

inconstitucionalidade da prisão administrativa, que constava expressa na antiga redação

atribuída ao art. 319 do Código de Processo Penal, a qual, ademais, não se baseava em

requisitos cautelares, haja vista que era prevista precipuamente para coagir o indivíduo ao

pagamento de valores.

Desde a reforma processual, ditada pela Lei 11.719/08, não mais existem a prisão

decorrente de pronúncia e a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível, que

estavam previstas, respectivamente, no art. 408 e art. 594, ambos do Código de Processo

Penal. Tais prisões, decorriam como regra automática das referidas decisões, sendo a

liberdade, a exceção.167

Isso não significa que na atual sistemática do processo penal não possam ser

decretadas prisões tanto na sentença condenatória que ainda não transitou em julgado, quanto

na decisão de pronúncia.

Todavia, a necessidade de decretação de prisões nas referidas fases do processo

(pronúncia e sentença condenatória recorrível) precisa sempre ser avaliada no caso concreto,

só podendo ser impostas se estiverem presentes as condições que autorizam a prisão

preventiva (arts. 312 e 313, do Código de Processo Penal). Isso porque a prisão preventiva se

tornou a espinha dorsal das prisões cautelares.

4.4.1 Prisão em flagrante

A Lei 12.403/11 trouxe certas alterações no instituto da prisão em flagrante.

Todavia, as modificações não alteraram a configuração da situação de flagrante delito, nem

tampouco as modalidades de flagrante e os legitimados à realização desta prisão.

Os arts. 306 e 310 do Código de Processo Penal é que receberam certas alterações,

as quais melhor adequaram esse digesto às garantias constitucionais, notadamente porque

passou a ser prevista expressamente, por exemplo, que a comunicação da prisão em flagrante

também seja realizada ao Ministério Público, bem como a necessidade dessa prisão ser

167 BRASIL. Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008. Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, relativos à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11719.htm>. Acesso em 10 de janeiro de 2013.

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convertida em prisão preventiva, para que a constrição da liberdade do indivíduo seja mantida

durante o processo, o que será melhor analisado posteriormente.168

4.4.1.1 Conceito e natureza jurídica

A palavra flagrante advém do latim “flagrare”, que significa queimar, arder. Ou

seja, o flagrante é o crime que está ardendo em chamas, que está sendo cometido ou acabou

de sê-lo.

A atualidade e a visibilidade constituem dois elementos indispensáveis à

configuração da prisão em flagrante. A atualidade é inerente à própria noção de flagrante, que

requer uma relação de imediatidade entre o fato delituoso e o momento da prisão ou início da

captura, na hipótese de perseguição. Já, a visibilidade, determina que alguém, por ter

presenciado o fato criminoso, possa testemunhar a sua ocorrência.169

O flagrante deve ser entendido como “termômetro e não como tempo”. “Se ainda

há ‘temperatura’ indicando a prática delituosa, poder-se-á identificar o flagrante.”170

A Lei 12.403/11 não deixou dúvidas de que a prisão em flagrante, por si só, não

se mantém durante o processo. Isso significa admitir que não mais poderão existir durante o

processo, se é que algum dia puderam, indivíduos presos apenas por conta da respectiva

autuação em flagrante.

Para que a prisão em flagrante possa ser mantida, os primeiros questionamentos

que o juiz deverá realizar assim que receber a comunicação do flagrante, são os seguintes: 1) é

legal ou ilegal esta prisão? Se a resposta for pela ilegalidade, a prisão deverá ser relaxada, sem

qualquer imposição de obrigações ao indivíduo. Todavia, se a resposta for pela legalidade da

prisão em flagrante, o juiz deverá homologá-la e realizar um segundo questionamento: 2) se

este indivíduo estivesse solto, seria o caso de ser decretada medida cautelar pessoal diversa da

prisão ou a prisão preventiva? Assim, só se se afigurar extremamente necessária e adequada a

prisão preventiva é que o indivíduo poderá ser mantido na prisão, o que importa em

considerar que para a manutenção do flagrante, este, necessariamente, deve ser convertido em

prisão preventiva. 168 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 169 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 296. 170 LIMA, Antônio Ferreira; NOGUEIRA, Ranieri Ferraz. Prisões e Medidas Liberatórias. São Paulo: Atlas, 2011, p. 119.

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A prisão em flagrante, no ponto, constitui uma medida precária, eis que não mais

se mantém por si só.

Esta natureza pré-cautelar da prisão em flagrante não foi inaugurada com a Lei

12.403/11. Sobre a questão, Lopes Jr. já pontuava antes da reforma ditada pela Lei 12.403/11:

A doutrina costuma classificar a prisão em flagrante [...] como medida cautelar. Trata-se de um equívoco, a nosso ver, que vem sendo repetido sem maior reflexão ao longo dos anos e que agora queremos (des)velar. [...] Exatamente porque existe a visibilidade do delito, o fumus comissi delicti é patente e inequívoco e, principalmente, porque essa detenção deverá ser submetida ao crivo judicial no prazo máximo de 24h. Precisamente porque o flagrante é uma medida precária, que não está dirigida a garantir o resultado final do processo, é que pode ser praticado por um particular ou pela autoridade policial.171

Assim, justamente porque não basta à manutenção de uma prisão cautelar o

“fumus boni iuris” ou, conforme prefere Lopes Jr., o “fumus comissi delicti”, mas sim

também o “periculum in mora” ou “periculum libertatis”, é que a prisão em flagrante não

possui natureza cautelar, de maneira que, para se manter, necessita estar alinhada com as

condições que autorizam a prisão preventiva, e nesse caso, não mais será prisão em flagrante,

mas sim, prisão preventiva, porque assim deve ser convertida.

O flagrante excetua a característica da jurisdicionalidade inerente às medidas

cautelares, haja vista que prescinde de expedição de mandado judicial de prisão, constituindo

situação autorizada pela lei, de imediatidade em relação ao cometimento da infração penal,

sendo duas as justificativas para a existência da prisão em flagrante: a) a reação social

imediata à prática do delito e, b) a colheita, também imediata, da prova.172

4.4.1.2 Sujeito ativo e sujeito passivo

O flagrante é facultativo ou obrigatório, a depender do sujeito que o realiza.

Sujeito ativo da prisão em flagrante é aquele que a realiza, e em nosso sistema

processual penal possui essa qualidade qualquer do povo. Registre-se que quando se tratar de

qualquer do povo, há apenas a faculdade de efetivação da prisão, ou seja, não há

obrigatoriedade de o indivíduo colaborar com o Estado na abordagem ou captura do

171 LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. 172 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 254.

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criminoso, nos moldes do que dispõe o art. 301 do Código de Processo Penal: “qualquer do

povo poderá [...].”173

Quando se tratar de Autoridade Policial ou um de seus agentes, existe obrigação

legal na efetuação do flagrante, porque o art. 301 do Código de Processo Penal deixa claro

que tais agentes públicos deverão prender quem quer que esteja em flagrante delito.174

Em se tratando de flagrante obrigatório, ou seja, a ser realizado pela Autoridade

Policial ou seus agentes, o não atendimento a esse dever poderá ocasionar ao respectivo

agente público omisso sanções administrativa e penal, uma vez que o crime de prevaricação

pode caracterizar-se.

Sujeito passivo da prisão em flagrante é aquele que é surpreendido cometendo a

infração, ou logo após tê-la cometido, ou seja, é quem pratica o delito e nessa situação acaba

sendo abordado.

Todavia, embora a regra seja a possibilidade de qualquer pessoa ser sujeito

passivo da prisão em flagrante, até mesmo o amental, há exceções.

Tratados ou Convenções podem estabelecer que certas Autoridades Diplomáticas

gozem do privilégio de não serem presas em flagrante, nos termos do que permite o art. 1º,

inc. I do Código de Processo Penal.175

A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas (de 1961), aprovada pelo

Decreto Legislativo n. 56.435, de 8 de junho de 1965, e a Convenção de Viena sobre Relações

Consulares (de 1963), aprovada pelo Decreto 61.078 de 26 de julho de 1967, estabelecem

imunidades diplomáticas, as quais impedem que Chefes de Estado, e representantes de

governos estrangeiros, sejam presos em flagrante delito, ante o cometimento de qualquer

delito.176

173 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Vol. 3. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 489. 174 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 175 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 176 BRASIL. Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 18 de abril de 1961. Promulgada pelo Decreto Legislativo n. 56.435, de 8 de junho de 1965. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Antigos/D56435.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013, e Convenção de Viena sobre Relações Consulares, de 24 de abril de 1963. Promulgada pelo Decreto Legislativo n. 6.1078, de 26 de julho de 1967. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D61078.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

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Isso porque tais Autoridades estão excluídas da jurisdição criminal dos países em

que exercem suas funções, embora estejam sujeitas à justiça do país de origem. Tal imunidade

também se aplica aos seus agentes diplomáticos, ao corpo técnico e administrativo das

representações, aos seus familiares e aos funcionários de organismos internacionais, como,

por exemplo, ONU (Organização das Nações Unidas).177

O Presidente da República não pode ser sujeito passivo de qualquer modalidade

de prisão cautelar. Ou seja, não pode ser preso em flagrante, não pode ser preso

preventivamente, nem mesmo temporariamente.

Esta imunidade conferida ao Presidente da República ocorre para que a prisão não

ocasione problemas econômicos ou de segurança nacional, ainda mais porque representa o

País não apenas internamente, mas também no âmbito internacional.178

Existem ainda as imunidades parlamentares previstas aos Deputados Federais e

Senadores, que só poderão ser presos em flagrante de crime inafiançável (art. 53, parágrafo 2º

da Carta Magna de 1988). Aos Deputados Estaduais, a Constituição da República Federativa

do Brasil de 1988, no seu art. 27, parágrafo 1º, estendeu as mesmas imunidades que

privilegiam os membros do Congresso Nacional.179

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional, Lei Complementar n. 35/79, no seu

art. 33, inc. II e a Lei Orgânica do Ministério Público Nacional, Lei n. 8.625/93, no seu art.

40, inc. III, também preveem certo privilégio ao magistrado quanto à prisão em flagrante, bem

como ao representante do Ministério Público. Isso porque somente admitem o flagrante em

caso de crime inafiançável.180

Na mesma senda, o Estatuto da Advocacia, no seu art. 7º, parágrafo 3º, aduz que

“o advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da profissão, em

caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste artigo [...]”. O inc. IV do

177 FEITOZA, Denilson. Direito Processual Penal: Teoria, Crítica e Práxis. 6ª ed. rev. amp.e atual. Niterói: Impetus, 2009, p. 841. 178 LIMA, Antônio Ferreira; NOGUEIRA, Ranieri Ferraz. Prisões e Medidas Liberatórias. São Paulo: Atlas, 2011, p. 128. 179 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 180 BRASIL. Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979. Dispõe sobre a Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp35.htm. Acesso em: 10 de janeiro de 2013; e Lei Complementar n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. Institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8625.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

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referido dispositivo legal impõe a presença de representante da Ordem dos Advogados do

Brasil (OAB), na realização da prisão em flagrante de advogado, por motivo relacionado ao

exercício da profissão, sob pena de nulidade da medida.181

A prisão em flagrante também não é permitida contra o menor de 18 (dezoito)

anos, considerado inimputável. Contudo, é de ser observado que o Estatuto da Criança e do

Adolescente, Lei n. 8.069/90, permite a apreensão do menor em flagrante quando o ato

infracional for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.182

Nos termos do art. 301 do Código de Trânsito Brasileiro, Lei n. 9.503/97, também

não poderá ser preso em flagrante o indivíduo que prestar pronto e integral socorro à vítima

em delito de trânsito.183

A apresentação espontânea do agente, suposto infrator, à Autoridade, em regra,

também não enseja prisão em flagrante, porque dentre as hipóteses de flagrante contempladas

no art. 302 do Código de Processo Penal, não se encontra a apresentação espontânea.184

Diz-se que tal situação, em regra, não enseja a prisão em flagrante porque

hipóteses excepcionais podem existir, autorizadoras, pensamos, da prisão em flagrante, como

na situação em que um homicida, com o corpo da vítima no interior de seu veículo, apresente-

se à Delegacia confessando a prática do crime e evidenciando a respectiva materialidade,

poucos minutos após ter cometido a infração.

De outro lado, registre-se que a apresentação espontânea já foi analisada pelo

Superior Tribunal de Justiça como hipótese desautorizadora da prisão em flagrante.185

181 BRASIL. Lei n. 8.906, de 04 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8906.htm>. Acesso: 24 de janeiro de 2013. 182 BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 201 183 BRASIL. Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997. Institui o Código de Trânsito Brasileiro. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9503.htm>. Acesso em: 12 de janeiro de 2013. 184 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 185 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 30527 / RJ – Rio de Janeiro. Habeas Corpus. Relator(a) Min. Felix Fischer. Quinta Turma. Data do julgamento: 19-02-2004. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=30527&b=ACOR> . Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

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4.4.1.3 Espécies de flagrante

Três são as espécies de flagrante previstos em nosso Código de Processo Penal,

quais sejam: 1) flagrante próprio ou real – quando o infrator é surpreendido praticando a

infração penal, ou quando acabou de cometê-la, nos moldes dos incs. I e II do art. 302 do

Código de Processo Penal; 2) flagrante impróprio ou quase flagrante – quando o infrator é

perseguido, logo após o cometimento da infração penal, em uma situação que faça presumir

ser ele o autor do fato criminoso, nos termos do inc. III do art. 302 do Código de Processo

Penal; 3) flagrante presumido, ficto ou assimilado – quando o infrator é encontrado, logo

depois ao cometimento do delito, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam

presumir ser ele o autor da infração.186

Deve haver relação de imediatidade entre o momento da prática do delito, e o

início da perseguição do infrator, empreendida por agente policial ou por terceiras pessoas, na

hipótese do inc. III do art. 302 do Código de Processo Penal. Isso porque quando o dispositivo

legal em questão menciona “perseguição do agente logo após o crime”, por certo, não admite

que o início da perseguição do infrator possa ocorrer muito tempo depois do cometimento do

crime.

A configuração do flagrante na modalidade presumido (art. 302, inc. IV do

Código de Processo Penal), da mesma forma, não admite um elastério temporal muito grande

entre o momento da prática do delito e a localização do suposto infrator, mesmo porque, nesta

situação, a certeza quanto a autoria já não é algo que se possa atestar, uma vez que nem

perseguição do agente houve, após a infração.187

Em relação ao flagrante nos crimes de ação penal pública condicionada e de ação

penal privada, a Autoridade Policial e seus agentes devem fazer cessar a prática da respectiva

infração, a fim de manter-se a paz social. Entretanto, a lavratura do auto de prisão em

flagrante resta condicionada à concordância da vítima (na ação penal privada e pública

condicionada à representação) e à requisição do Ministro da Justiça (na ação penal pública

condicionada à requisição de tal Autoridade).

186 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012 187 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 19312 / GO – Goiás. Habeas Corpus. Relator: Min. Edson Vidigal. Quinta Turma. Data do Julgamento: 26-03-2002. Disponível em: < http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=habeas+corpus+19312&b=ACOR>. Acesso em: 11 de janeiro de 2013.

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Tais exigências devem ser observadas no auto de prisão em flagrante porque a lei,

nas referidas ações penais, impôs certas formalidades, verdadeiras condições de

procedibilidade, sem as quais nem mesmo a ação penal pode ser intentada. Assim, se houver a

lavratura do auto de prisão em flagrante sem a observância de ditas formalidades, a prisão

será ilegal.

Em se tratando de crime permanente, considera-se o agente em flagrante delito

enquanto não findar a permanência, nos termos do art. 303 do Código de Processo Penal.188

Assim, por exemplo, nos crimes (permanentes) de sequestro ou cárcere privado

(art. 148 do Código Penal), extorsão mediante sequestro (art. 159 do Código Penal), e

quadrilha ou bando (art. 288 do Código Penal), enquanto não cessar a permanência, poderá

ser efetuada a prisão em flagrante.189

Os crimes habituais podem ensejar a prisão em flagrante, desde que sejam

angariadas, recolhidas, provas contundentes acerca da habitualidade no momento da prisão.

São exemplos de crimes habituais os seguintes: curandeirismo (art. 284 do Código Penal);

manutenção de casa de prostituição (art. 229 do Código Penal); e, exercício ilegal da

medicina, arte dentária ou farmacêutica (art. 282 do Código Penal).190

A propósito, por meio do “habeas corpus” n. 36.723, julgado em 27-05-1959, com

publicação no Diário da Justiça em 05-09-1960, o órgão Pleno do Supremo Tribunal Federal,

sob a relatoria do Ministro Nelson Hungria, deixou assentada a possibilidade de ocorrer prisão

em flagrante em crime habitual.191

Existem ainda quatro modalidades de flagrante, comumente tratadas pela

doutrina, as quais, em um primeiro momento, podem causar certa confusão, mas que, em

verdade, indicam situações distintas, com consequências jurídicas também diversas. Está-se

aqui falando dos flagrantes preparado, esperado, forjado e prorrogado.

O flagrante preparado ocorre quando o agente é instigado, de forma insidiosa, pela

polícia ou por particular, a praticar um delito, mas ao mesmo tempo são adotadas

providências que impedem a sua consumação.

188 Permanentes são aqueles crimes em que a consumação se prolonga no tempo, de acordo com a vontade do agente. 189 BRASIL. Decreto Lei n. 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 10 de dezembro de 2012. 190 Habituais são crimes que só restam caracterizados pela prática repetida de atos, e não com um ato isolado apenas, constituindo um estilo ou hábito de vida do agente. 191 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 755.

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O flagrante em questão é ilegal e, por conseguinte, autoriza o relaxamento da

prisão. A Súmula 145 do Supremo Tribunal Federal dispõe sobre o flagrante preparado nos

seguintes termos: “Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna

impossível a sua consumação”.192

Importante identificar que a referida Súmula exige dois elementos imprescindíveis

à configuração do flagrante preparado: preparação e não consumação do delito. Assim, se o

flagrante for preparado, mas houver consumação do crime, haverá delito e o indivíduo pode

ser preso em flagrante.193

O flagrante esperado, diferentemente, ocorre quando terceiras pessoas,

normalmente agentes policiais, recebem notícias a respeito da futura prática de uma infração

penal que irá acontecer em determinado lugar, e, assim, dirigem-se ao local indicado,

aguardando a ocorrência da mesma. Quando surpreendido na prática do delito, nessa situação,

o infrator será enquadrado em flagrante, que será legal.

O que ocorre no flagrante esperado é apenas uma situação de vigilância, em que

terceiras pessoas, normalmente policiais, aguardam o momento da prática da infração penal

para realizarem a respectiva abordagem do infrator, não havendo que se falar em instigação da

vontade deste, que age sem qualquer incentivo externo, mas sim, por sua exclusiva vontade.

O flagrante forjado ocorre quando agentes policiais inescrupulosos, abusando do

poder conferido pelo art. 244 do Código de Processo Penal, realizam buscas (pessoal ou

domiciliar) e, nessas ocasiões, colocam no bolso do indivíduo abordado ou no interior de sua

residência, instrumentos ou drogas ilícitas, por exemplo, a fim de incriminá-lo, falsamente.

Obviamente que, nesta situação, o agente abordado não cometeu crime, devendo ser relaxada

a prisão, porque ilegal, mas os agentes policiais sim, nos termos da Lei n. 4.898/65.194

De outro lado, o flagrante prorrogado, também chamado de diferido, retardado ou

ação controlada, previsto na Lei 9.034/95, permite que agentes policiais retardem a

abordagem do que se supõe ação praticada por organizações criminosas, desde que, nos

termos do art. 2º, inc. II da Lei em questão: “[...] mantida sob observação e acompanhamento

192 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n. 145, de 06 de dezembro de 1963. Disponível em: < http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stf/stf_0145.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 193 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 757. 194 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 757-758.

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para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação

de provas e fornecimento de informações.”195

Portanto, a não autuação em flagrante de imediato, por agentes policiais, de

indivíduos que, ao que tudo indica, fazem parte de organização criminosa, não configura

crime de prevaricação (art. 319 do Código Penal). Todavia, deve haver prévia observação e

acompanhamento por parte de agentes policiais sobre a organização criminosa, a fim de

concluir-se que a ação desenvolvida por um único agente, por exemplo, está ligada àquela

empresa do crime, pois, do contrário, a não realização de um flagrante “menor” poderá

constituir omissão do policial e, assim, configurar crime de prevaricação.

O flagrante prorrogado, desde que realizado nas referidas condições, e visar à

interdição de organização criminosa, é legal.

Oportuno ainda registrar que a Lei 11.343/06 também autoriza o flagrante

prorrogado nos crimes trazidos pela mesma (art. 53, inc. II), desde que o objetivo seja

identificar e responsabilizar o maior número de pessoas ligadas a operações de tráfico ilícito

de entorpecentes. Entretanto, nessa situação, deverá haver prévia autorização judicial para que

os agentes policiais possam retardar a sua atuação quanto à efetivação do flagrante, e o

Ministério Público deverá sempre ser ouvido previamente. Ademais, nos termos do que

dispõe o art. 53, parágrafo único da Lei 11.343/06: “[...] Parágrafo único. Na hipótese do

inciso II deste artigo, a autorização será concedida desde que sejam conhecidos o itinerário

provável e a identificação dos agentes do delito ou de colaboradores.”196

Assim, para poder haver retardamento da atuação policial quanto ao flagrante

delito em ações criminosas ligadas ao tráfico ilícito de entorpecentes, deve haver prévia

investigação policial, e a mesma deve ter identificado o trajeto provável dos autores e

colaboradores do delito.

195 BRASIL. Lei n. 9.034, de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9034.htm>. Acesso em: 20 de janeiro de 2013. 196 BRASIL. Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

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4.4.1.4 Procedimento

O devido processo legal, em matéria processual penal, deve ser compreendido no

sentido “lato”, abarcando também a fase de autuação do infrator em flagrante.

O auto de prisão em flagrante nada mais é do que a documentação da situação

verificada de flagrante, indispensável, até para que a legalidade da prisão possa ser analisada

posteriormente.

Essa documentação da prisão em flagrante não pode ocorrer sem a observância de

formalidades legais, sob pena de relaxamento da prisão em flagrante por vício formal.

Nos termos do art. 304 do Código de Processo Penal, uma vez apresentado o

preso à Autoridade Policial, “ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura,

entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso.”197

Em seguida à entrega do preso à Autoridade Policial, esta deverá colher o

depoimento das testemunhas e, após, realizar o interrogatório do suposto infrator “sobre a

imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a

autoridade, afinal, o auto.”198

Após a lavratura do auto de prisão em flagrante, a Autoridade Policial determinará

o recolhimento do autuado à prisão, desde que não se mostre cabível a liberação imediata do

mesmo por meio do arbitramento de fiança, nos termos do que prescreve o art. 322 do Código

de Processo Penal: “a autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de

infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.”199

Registre-se que a possibilidade de a Autoridade Policial conceder fiança foi

ampliada pela Lei 12.403/11, porque anteriormente à reforma só poderia fazê-lo em delito

apenado com detenção ou prisão simples.

Se por acaso a Autoridade Policial não se afigurar competente para o

prosseguimento do inquérito policial, deverá enviar os autos à Autoridade que o seja, nos

termos do art. 290 e art. 304, parágrafo 1º, ambos do Código de Processo Penal.

197 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 198 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 199 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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A nota de culpa também constitui uma garantia do preso em flagrante, sobretudo

para que o mesmo possa saber sobre os motivos de sua prisão. Tal formalidade deve ser

observada, de modo que a Autoridade Policial tem o prazo de 24 horas para entregar referido

documento ao preso, a contar da prisão, nos termos do art. 306, parágrafo 2º do Código de

Processo Penal.200

A prisão em flagrante deve, em regra, ser formalizada pela Autoridade de Polícia

Judiciária, mas a Magna Carta de 1988 não dispensa um controle judicial da legalidade dessa

medida, notadamente porque o art. 5º, inc. LXV dispõe que “a prisão ilegal será

imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”, e ainda no inc. LXII, prescreve que “a

prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao

juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.”201

A Autoridade Policial tem até 24 (vinte e quatro) horas, após a efetivação da

prisão, para encaminhar ao juiz competente o auto de prisão em flagrante, a fim de que possa

ser realizado o controle de legalidade da prisão, bem como o juízo de necessidade quanto à

sua manutenção.

Se no auto de prisão em flagrante, o autuado não informar o nome de seu

advogado, deverá ainda ser remetida cópia integral do auto para a Defensoria Pública.

A partir da Lei 12.403/11, o magistrado, ao receber o auto de prisão em flagrante,

não mais pode determinar simplesmente, se é que algum dia pôde, a espera do transcurso do

prazo para finalização do inquérito policial.

Nos termos do art. 310 do Código de Processo Penal, tão logo receba o

magistrado o auto de prisão em flagrante, deve analisar sobre a legalidade e, logo em seguida,

acerca da necessidade da prisão. Se desejar manter o autuado em flagrante na prisão, após

constatar a legalidade da medida, necessariamente deverá primeiro asseverar a sua respectiva

legalidade e, assim, homologar o flagrante, e deverá também converter a prisão em flagrante

em prisão preventiva, de forma fundamentada, se presentes as necessárias condições (arts. 312

e 313 do Código de Processo Penal).202

200 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 201 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 202 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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Dessa forma, assim que receber o auto de prisão em flagrante, o magistrado não

poderá determinar simplesmente o aguardo do prazo para finalização do inquérito policial,

devendo analisar a sua legalidade, bem como sobre a necessidade de privação cautelar da

liberdade do autuado.203

Há necessidade de conversão judicial da prisão em flagrante em prisão preventiva

para que a privação da liberdade do autuado permaneça no caso concreto. Nesse sentido, a

prisão em flagrante deve ser substituída pela prisão preventiva, se presentes os requisitos

desta.204

Registre-se que a reforma ditada pela Lei 12.403/11 também estabeleceu, por

meio do art. 306 do Código de Processo Penal, que a prisão em flagrante deve ser comunicada

imediatamente não apenas ao juiz competente, à família do preso ou à pessoa por ele indicada,

e à Defensoria Pública, se o preso não tiver advogado, mas também ao Ministério Público.205

Assim, o art. 306 do Código de Processo Penal passou a determinar que a prisão

em flagrante seja cientificada também ao Ministério Público, embora o parágrafo único do

mesmo dispositivo legal dispense a remessa de cópia do auto à mesma Autoridade. Contudo,

esta desnecessidade de remessa ao Ministério Público de cópia do auto de prisão em flagrante,

se deve ao fato deste ter ciência dos atos processuais nos próprios autos.

A grande questão é estabelecer em que momento o Ministério Público deve ter

vista dos autos, ou seja, se antes da decisão do magistrado sobre a ratificação ou não da prisão

em flagrante, ou depois dela.

Na sistemática anterior à reforma processual ditada pela Lei 12.403/11, ao receber

o auto de prisão em flagrante, antes de analisar sobre a concessão da liberdade provisória sem

fiança, o juiz deveria propiciar a prévia manifestação do Ministério Público, de acordo com a

antiga redação do art. 310, parágrafo único do Código de Processo Penal. Quando se tratava

203 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Processo: 2011.068085-7 (Acórdão). Habeas Corpus. Relator: Newton Varella Júnior. Origem: Joaçaba. Orgão Julgador: Primeira Câmara Criminal. Julgado em: 04/10/2011. Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/avancada.jsp?q=20110680857%20&cat=acordao_&radio_campo=integra&prolatorStr=&classeStr=&relatorStr=&datainicial=&datafinal=&origemStr=&nuProcessoStr=&categoria=acordao#resultado_ancora. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 204 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 108215 / MG – Minas Gerais. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Marco Aurélio. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgamento: 30/10/2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28108215+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/arsqruj. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 205 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

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de concessão da liberdade provisória mediante fiança, o juiz poderia determiná-la sem prévia

oitiva do Ministério Público, nos termos do art. 333 do Código de Processo Penal.

O art. 333 do Código de Processo Penal não restou alterado pela Lei 12.403/11, de

maneira que o Ministério Público continua tendo vista dos autos depois do arbitramento da

fiança pelo magistrado.206

Todavia, na sistemática atual, o art. 310 do Código de Processo Penal,

modificado, não mais prescreve a prévia manifestação do Ministério Público antes de o juiz

decidir pela manutenção ou não da prisão em flagrante.

Assim, acreditamos que em prol da razoabilidade na duração do processo e,

precisamente, diante da necessidade de celeridade quanto à verificação da soltura do autuado,

o legislador preferiu estabelecer a manifestação do Ministério Público após a decisão do

magistrado sobre a questão da prisão em flagrante, desde que este verifique, de plano, a

manifesta necessidade de soltura do autuado.

É que a liberdade constitui bem de valor inestimável, de maneira que a

necessidade de soltura do autuado não poderá ser ignorada, quando o magistrado, de plano,

evidenciar que é caso de imediata concessão da liberdade, mormente diante da evidente

impossibilidade de conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva.

Da mesma forma, pensamos que o magistrado deverá agir se detectar, de plano, a

necessidade de substituição da prisão em flagrante por medida cautelar diversa da prisão, a

despeito de o art. 282, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal estabelecer que antes do

processo o juiz não pode determinar medida cautelar de ofício.207

Todavia, se considerar ser o caso de imposição da prisão preventiva, antes de

decidir, deve o juiz ouvir o Ministério Público, não podendo decretá-la de ofício antes do

curso da ação penal.

Esta, ao que parece, é a interpretação que melhor prestigia a liberdade e a

dignidade do acusado, princípios estes, bastante colimados pela Lei 12.403/11 e pela Lei

Maior.

206 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 207 Dispõe o referido dispositivo legal: “Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). [...]§ 2o As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).” (BRASIL, 1941)

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Não se olvide que a prisão em flagrante constitui medida precária, porque sua

efetivação não ocorre a partir da verificação da existência de todos os requisitos exigidos à

tutela cautelar. Assim, se a necessidade de concessão de liberdade plena ou medida cautelar

descarcerizadora ao autuado for detectada de plano, pelo juiz, diante do auto de prisão em

flagrante recebido, pensamos que tal situação deverá ser imediatamente amparada.

De outro lado, não se quer aqui restringir a atuação do Ministério Público sobre a

análise da prisão em flagrante, e assim nem poderia sê-lo, mormente porque em todas as

demandas criminais o órgão é fiscal da lei e, na maioria das ações penais, é titular da ação

penal. Acreditamos apenas que, diante da sistemática atual, se for o caso de soltura imediata

ou da concessão de medida descarcerizadora, também identificada de plano, deve o juiz

deferir tais medidas, não podendo retardar o procedimento de soltura do autuado.

Isso porque a Lei 12.403/11 enalteceu as garantias constitucionais da liberdade e

da celeridade, o que deixa claro em diversos dispositivos legais, mormente quando registra

que a prisão cautelar é sempre medida excepcional. Se é assim com a prisão cautelar,

preocupação ainda maior deve existir com a prisão em flagrante, a qual constitui medida pré-

cautelar, que, por si só, não mais se mantém.

Em outro giro, não se pode deixar de mencionar que a Lei 12.403/11 não previu

expressamente no art. 310, do Código de Processo Penal, um prazo dentro do qual o

magistrado deve realizar a análise sobre a conversão da prisão em flagrante em preventiva, ou

concessão de liberdade provisória.

Não obstante tal silêncio legislativo, ao que parece, o prazo a ser observado pelo

magistrado é aquele constante no art. 322, parágrafo único, do Código de Processo Penal, o

qual, determina que o prazo para o juiz conceder fiança, nos casos em que a Autoridade

Policial não a arbitrou, é de 48 (quarenta e oito) horas.

Assim:

[...] Conclui-se que a autoridade policial dispõe de 24 (vinte e quatro) horas para remeter o auto de prisão em flagrante ao Juízo competente, ao passo que este terá 48 (quarenta e oito) horas para se pronunciar quanto à convalidação judicial da prisão em flagrante. Enfim, a partir do momento da captura do agente, o prazo global será de 72 (setenta e duas) horas, findo o qual a prisão em flagrante já deve ter sido relaxada, convertida em preventiva, ou ao acusado deve ter sido concedida liberdade provisória.208

208 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 897.

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Ou seja, parece que na atual sistemática processual penal, o indivíduo somente

poderá perdurar preso em flagrante por, no máximo, 72 (setenta e duas) horas, eis que ao

término desse prazo deverá ser adotada pelo magistrado uma das providências elencadas no já

referido art. 310 do Código de Processo Penal.

4.5 PRISÃO PREVENTIVA

4.5.1 Conceito e finalidade

A prisão preventiva é uma medida cautelar incidente sobre o investigado ou

acusado. Essa prisão tem o objetivo de, em linhas gerais, garantir o bom andamento do

processo ou das investigações, evitando que o réu, solto, cometa novos crimes, dificulte a

colheita de provas ou que fuja.

O art. 311 do Código de Processo Penal estabelece que em qualquer fase da

investigação policial ou do processo penal caberá a decretação da prisão preventiva.209

Todavia, a despeito de o referido dispositivo legal admitir a decretação da prisão

preventiva na fase investigativa, não acreditamos que, em regra, tal possa ocorrer.

Isso porque os requisitos indício suficiente de autoria e prova da materialidade,

que autorizam a decretação da prisão preventiva, também são os mesmos que autorizam a

propositura da ação penal.

Assim, pensamos que se existirem no caso concreto tais requisitos, a ação penal

primeiro deve ser intentada, para posteriormente, mesmo conjuntamente, poder ser decretada

a prisão preventiva.

É que a prisão preventiva constitui medida cautelar que justifica a deflagração da

ação penal. Assim, em uma interpretação sistemática, vê-se que se existem elementos

suficientes para a decretação da prisão preventiva, há, consequentemente, indícios também

suficientes para a propositura da ação penal. Com isso, “[...] para que exista prisão preventiva,

deve existir, ao menos, oferecimento da denúncia.”210

209 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 210 LIMA, Antônio Ferreira; NOGUEIRA, Ranieri Ferraz. Prisões e Medidas Liberatórias. São Paulo: Atlas, 2011, p. 111.

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De outro lado, se eventualmente não couber a decretação da prisão temporária, em

vista da natureza do crime, a prisão preventiva poderá, em tese, ser decretada durante o

inquérito, mas isso deve ocorrer de forma excepcional.211

A Lei Maior reconhece a possibilidade de prisão preventiva, quando, por

exemplo, prescreve que ninguém será preso, ou mantido na prisão, quando a lei admitir

liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 5º, inc. LXVI da Lei Maior). “A contrario

sensu”, quando não admitida liberdade provisória pode ser o caso de o agente ser preso ou

mantido na prisão, em decorrência das condições autorizadoras da prisão preventiva.212

A prisão preventiva é medida excepcional, porque se “ninguém será considerado

culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, inc. LVII da

Magna Carta), não pode, em regra, ter contra si uma prisão preventiva decretada, salvo em

casos efetivamente necessários.213

Este também é o norte estabelecido pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e

Políticos (1976), que no seu art. 9º, item 3, ao final, prevê: “A prisão preventiva de pessoas

que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral.”214

4.5.2 Legitimidade

O art. 311 do Código de Processo Penal, com a nova redação ditada pela Lei

12.403/11 possibilita a decretação da prisão preventiva de ofício pelo juiz somente na fase do

processo, ou seja, após a propositura da ação penal.215

Isso porque na fase das investigações policiais não se sabe se haverá ação penal,

considerando que a respectiva titularidade é conferida ao Ministério Público. Assim, o juiz só

211 LIMA, Antônio Ferreira; NOGUEIRA, Ranieri Ferraz. Prisões e Medidas Liberatórias. São Paulo: Atlas, 2011, p. 111. 212 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 213 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 214 BRASIL. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. 26 de março de 1976. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm >. Acesso em: 08 de março de 2013. 215 O Art. 311 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 12.403/11 restou com a seguinte dicção: “Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial”. (BRASIL, 1941).

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poderia agir, para decretar prisão preventiva na fase investigativa, a requerimento do

Ministério Público ou por meio de representação da Autoridade Policial.

De outro lado, acreditamos que a prisão preventiva não possa, em regra, ser

decretada durante as investigações policiais, mas apenas em casos remotos, quando a prisão

temporária não se mostrar possível. Isso porque, conforme já ventilado alhures, os mesmos

elementos que autorizam a prisão preventiva também impõem a propositura da ação penal.

Assim, o Ministério Público só poderia requerer o decreto da prisão preventiva ao

menos concomitantemente à propositura da ação penal.

De outro lado, ainda que somente na fase do processo, o art. 311 do Código de

Processo Penal confere ao juiz a possibilidade de decretar a prisão preventiva de ofício, o que,

segundo nos parece, representa situação excepcional, haja vista que, em regra, diante da

inércia da jurisdição, deverá fazê-lo por meio de provocação, seja do Ministério Público, do

querelante ou do assistente de acusação.216

A propósito, nos termos da nova redação conferida pela Lei 12.403/11 ao art. 311

do Código de Processo Penal, o assistente de acusação passou a ser legitimado ao pedido de

decreto da prisão preventiva.

Com isso, não se pode olvidar que a vítima ganhou maior acesso à justiça, bem

como restou melhor delineado seu papel no processo penal, que seguramente relaciona-se à

sua intenção legítima da busca pela realização de justiça, e não somente por eventual

reparação pecuniária.

É que a vítima está sendo revalorizada pelo Código de Processo Penal, já que,

lamentavelmente, nas últimas décadas, esteve esquecida durante o transcurso do processo

penal. Todavia, constitui tendência internacional um amparo melhor à vítima, o que vem

sendo demonstrado, por exemplo, em decisões proferidas por Cortes Internacionais de

Direitos Humanos, que concedem à vítima maior atuação no processo penal.217

Da legitimidade conferida ao assistente de acusação de postular a decretação da

prisão preventiva do acusado, decorrem duas conclusões implícitas: a) o assistente, diante de

eventual negativa do juiz quanto ao decreto prisional, poderá recorrer, pois se assim não for

entendido, o assistente restará sem possibilidade de efetivação de um direito concedido; b) o

assistente, poderá intervir diante de eventual “habeas corpus” impetrado pelo acusado, razão

216 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 217 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 226.

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pela qual a atual posição jurisprudencial dominante, que nega tal possibilidade, deve ser

repensada.218

Quanto à possibilidade de a Autoridade Policial representar pelo decreto da prisão

preventiva, tem-se que o momento oportuno para fazê-lo será no inquérito policial, quando

conduz as investigações.

4.5.3 Espécies e condições – visão geral

A prisão preventiva, forma clássica de prisão cautelar em nosso ordenamento

jurídico, foi sobremaneira alterada pela Lei 12.403/11, a qual reformulou as espécies da

medida.219

Atualmente, são cinco as modalidades de prisão preventiva advindas da Lei

12.403/11, quais sejam: 1) “prisão preventiva originária”, determinada ao indivíduo solto

(arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal); 2) “prisão preventiva derivada”, oriunda da

conversão de prisão em flagrante (art. 310, inc. II do Código de Processo Penal); 3) “prisão

preventiva sancionatória”, determinada em hipótese de descumprimento de outra providência

cautelar pessoal (art. 312, parágrafo único do Código de Processo Penal); 4) “prisão

preventiva protetiva”, prevista para garantir a efetivação de medida protetiva de urgência nas

situações de violência doméstica (art. 313, inc. III do Código de Processo Penal); e, 5) “prisão

preventiva esclarecedora”, imposta para o fim de elucidar-se a identidade de pessoa que se

mostre suspeita (art. 313, parágrafo único do Código de Processo Penal).220

A prisão preventiva, a partir da Lei 12.403/11, também pode ser classificada da

seguinte maneira: 1) “prisão preventiva autônoma”, em qualquer fase da persecução penal ou

do processo (art. 311 ao art. 313, do Código de Processo Penal), independentemente de

determinação anterior de medida cautelar ou de prisão em flagrante; 2) “prisão preventiva

como conversão da prisão em flagrante” (art. 310, II, Código de Processo Penal); e, 3) “prisão

preventiva subsidiária”, ante o descumprimento de medida cautelar pessoal anteriormente

estabelecida. Nas duas primeiras situações, somente poderá ser determinada a prisão

preventiva se presentes as condições do art. 312 e ainda do art. 313 do Código de Processo

218 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 226. 219 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 292. 220 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 292-293.

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Penal. Já, na terceira hipótese, a prisão preventiva entrará em cena diante do descumprimento

da medida cautelar anteriormente determinada, e desde que se mostre necessária ao caso, de

acordo com as condições do art. 312 do Código de Processo Penal, indenpendentemente,

todavia, das hipóteses elencadas no art. 313 do mesmo digesto processual.221

Em outras palavras, Pacelli de Oliveira defende que a prisão preventiva possa ser

determinada sem que preencha necessariamente alguma das situações do art. 313 do Código

de Processo Penal, desde que circunscrita às condições do art. 312 do mesmo código, quando

o caso evidenciar o descumprimento de medida cautelar alternativa à prisão anteriormente

imposta, pois, conforme registra:

Do contrário, a imposição de medida cautelar somente seria cabível para as situações descritas no art. 313, CPP, o que não parece corresponder, nem ao texto legal e nem à estrutura normativa das novas medidas cautelares pessoais.222

O próprio fato do descumprimento da medida cautelar anteriormente imposta seria

um indício da existência das condições do art. 312 do Código de Processo Penal.

Todavia, não se pode esquecer de que, mesmo diante do descumprimento da

medida cautelar descarcerizadora, o juiz não estará autorizado a aplicar automaticamente a

prisão preventiva, porque a nova sistemática do Código de Processo Penal não permite tal

conclusão.

Em diversas passagens de dispositivos do Código de Processo Penal, entre o art.

282 ao art. 350, a liberdade vem delineada como a regra, sendo a prisão cautelar a “ultima

ratio” do sistema das medidas cautelares. O parágrafo 4º, do art. 282 do Código de Processo

Penal, por exemplo, não deixa dúvidas quanto a isso:

Art. 282. [...] § 4o No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único).223

221 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 510. 222 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 510. 223 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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Assim, mesmo diante do descumprimento de providência cautelar pessoal

alternativa à prisão, cumpre registrar que não se pode alargar demasiadamente a possibilidade

de imposição da prisão preventiva. Ou seja, apesar de, em princípio, não se exigir a existência

de uma das condições dispostas no art. 313 do Código de Processo Penal para a decretação da

“prisão preventiva sancionatória”, deve-se buscar sempre equilíbrio entre os interesses da

acusação e da defesa, de modo que a realização deste “[...] não permite uma solução

apriorística e inflexível.”224

A advertência em questão se mostra salutar na medida em que o alargamento

desmedido das possibilidades de decretação da prisão preventiva, fora das hipóteses trazidas

pelo art. 313 do Código de Processo Penal, abarcaria infrações penais de pequena ou ínfima

gravidade, o que certamente traria subversão ao sistema processual penal pátrio.

Assim, para Fernandes:

A regra deve ser a exigência da presença das condições do art. 313, I e II, sob pena de imposição de preventiva para infrações que nem mesmo autorizam, normalmente, a prisão como pena, mas não deve ser aplicada de forma absoluta, admitindo-se que possa ser excepcionada em circunstâncias especiais quando isso for imprescindível para preservar a própria eficácia do sistema.225

Em qualquer das hipóteses de prisão preventiva, seja ela autônoma, decorrente da

conversão da prisão em flagrante ou decorrente do descumprimento de medida anteriormente

imposta, antes de decretá-la, o juiz deve realizar a si mesmo o seguinte questionamento: seria

necessário e adequado ao caso a imposição de medida alternativa à prisão? O questionamento

sobre a possibilidade de aplicação de medida alternativa à prisão, então, representa mais uma

condição à decretação da prisão preventiva, seja esta qual for.

4.5.4 O “fumus comissi delicti” e o “periculum libertatis” na prisão preventiva

O “fumus boni iuris” ou “fumus comissi delicti”, em se tratando de prisão

preventiva, representa a exigência da segunda parte do art. 312, “caput”, do Código de

Processo Penal, quando prevê, a existência do crime e indício suficiente de autoria. Já, o

“periculum in mora” ou “periculum libertatis”, encontra-se delineado pelos pressupostos da

224 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 292-295. 225 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 295.

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garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, por conveniência da instrução

criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, nos termos da primeira parte do art. 312

do Código de Processo Penal.226

A existência do crime pode ser verificada por meio de provas legalmente

admitidas em direito. Em se tratando de crimes que deixam vestígios materiais, pensamos que

não há necessidade de prova plena dos mesmos para a decretação da prisão preventiva,

podendo, por exemplo, a prova testemunhal suprir o exame pericial, desde que os vestígios do

crime tenham desaparecido ou a perícia ainda não tenha sido concluída.

O requisito “indício suficiente de autoria”, também exigido para a decretação da

prisão preventiva, representa uma conclusão a respeito do provável autor do delito. Tal

conclusão é extraída por meio de um raciocínio indutivo lógico, sobre uma circunstância

determinada.227

Os requisitos da “prova da existência do crime” e “indício suficiente de autoria”

são cumulativos, portanto, ambos devem estar presentes na situação em concreto para que seja

autorizado o decreto da prisão preventiva.

Todavia, apenas esses dois requisitos não bastam à efetivação da medida extrema,

mas sim, também ao menos um dos pressupostos dispostos na primeira parte do art. 312,

“caput”, do Código de Processo Penal, acima já referidos. Esses pressupostos, ao contrário

dos requisitos prova da materialidade e indício suficiente de autoria, são alternativos. Ou seja,

não precisa todos estarem presentes para o decreto prisional.

O art. 312, “caput”, do Código de Processo Penal apresenta expressões vagas,

imprecisas, que devem ser preenchidas no caso concreto pelos juízes. Dessa forma, diversos

têm sido os entendimentos sobre as situações que comportariam o preenchimento de tais

expressões, a seguir expostos.

226 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 293. 227 MANZINI, 1952, apud MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis. A prova por indícios no processo penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 28.

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4.5.4.1 Análise dos pressupostos jurídicos do art. 313 do Código de Processo Penal

O art. 313 do Código de Processo Penal elenca vários pressupostos jurídicos, não

cumulativos, em que a situação fática deverá se enquadrar, para que a prisão preventiva possa

ser decretada.228

De outro lado, ainda que algum dos requisitos do art. 313 do Código de Processo

Penal esteja presente no caso concreto, não será o bastante para a prisão preventiva estar

autorizada. É preciso, sempre, que os pressupostos fáticos do art. 312 do Código de Processo

Penal sejam vislumbrados no caso concreto para que a prisão preventiva seja, em princípio,

autorizada.

Por isso mesmo é que o “caput” do art. 313 do Código de Processo Penal, assim

proclama: “nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão

preventiva.”229

Ou seja, a decisão judicial que decretar a prisão preventiva sempre deverá fazer

referência a ambos dispositivos legais.

O inc. I do art. 313 do Código de Processo Penal autoriza a prisão preventiva:

“nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro)

anos.”230

Os delitos com pena privativa de liberdade máxima, aplicada na sentença, superior

a 4 (quatro) anos, são aqueles que, em regra, não admitem a substituição da prisão por

penalidade restritiva de direitos, nos moldes do art. 44, inc. I do Código Penal. Assim, porque

deve existir homogeneidade entre a medida cautelar e a providência final, não se pode olvidar

que a prisão preventiva só pode ser decretada em crimes graves, ou seja, considerados, em

regra, aqueles com pena privativa máxima cominada em abstrato superior a 04 (quatro) anos,

nos termos do que passou a preconizar o art. 313, inc. I do Código de Processo Penal.231

228 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 229 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 230 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 231 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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O critério da homogeneidade para a decretação da prisão preventiva restou

bastante enaltecido pelo legislador com a reforma em questão, o que demonstra sensatez, pois,

se, ao que tudo indica, não caberá prisão ao final do processo, não faz sentido esta poder ser

imposta ou mantida antes do provimento jurisdicional final, mesmo porque a regra é que a

medida cautelar não poderá constituir-se em providência mais gravosa do que aquela imposta

na sentença definitiva.

As qualificadoras e os privilégios, respectivamente, porque majoram ou diminuem

a quantidade mínima e máxima cominada ao tipo penal, devem ser levados em conta para a

verificação da penalidade máxima no caso concreto e, por conseguinte, para a detecção da

possibilidade de decretação da prisão preventiva.232

As causas de diminuição ou de aumento da pena com percentual variável, tal

como ocorre na tentativa em que há previsão de diminuição da pena, de um a dois terços,

também devem ser levadas em conta para fins de verificação sobre o cabimento ou não da

prisão preventiva.

Havendo causa de aumento de pena, deve-se ter como parâmetro o máximo do

aumento previsto, para que, justamente, possa ser verificada a pena máxima cominada em

abstrato ao delito. Já, em relação à causa de diminuição, deve-se utilizar o mínimo dela, pois

só assim também poder-se-á concluir pela pena máxima que o indivíduo poderá receber, em

caso de condenação.233

Contudo, em relação às circunstâncias agravantes ou atenuantes, porque não

integram o tipo penal, não podendo alterar os patamares mínimo e máximo da pena, não

servem de parâmetro à verificação da possibilidade de prisão preventiva.

O legislador nada mencionou sobre a hipótese de concurso de crimes, cujas penas

máximas somadas, superem quatro anos de pena privativa de liberdade cominada em abstrato.

Entendemos que, em se tratando de crimes dolosos praticados de forma conexa,

deve-se levar em conta o patamar a que se chegou, pelo somatório das penas máximas

cominadas. Ou seja, se o indivíduo tiver praticado um delito com apenação máxima de três

anos, e outro, igualmente doloso, com pena máxima de dois anos, será plenamente possível,

em tese, a decretação da prisão preventiva, sobretudo porque, pelo somatório das penas,

chegou-se a cinco anos.

232 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 238. 233 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 239.

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Este entendimento segue o critério da homogeneidade para a aplicação das

medidas cautelares, já que, havendo concurso de crimes, para fins de aplicação da pena e

eventual substituição da prisão por restrição de direitos, os patamares máximos cominados em

abstrato a cada delito não serão considerados isoladamente, mas sim, pelo somatório.

O inc. II do art. 313 do Código de Processo Penal também autoriza a prisão

preventiva: “se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em

julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de

dezembro de 1940 - Código Penal.”234

Dessa forma, ainda que se trate, por exemplo, de furto simples, portanto, com

pena máxima não superior a quatro anos, se o acusado tiver sido condenado por crime anterior

em sentença passada em julgado (reincidente), em princípio, pode ter a prisão preventiva

decretada.235

Também independentemente da pena máxima cominada ao crime, o inc. III do

Código de Processo Penal, a sua vez, autoriza a prisão preventiva: “se o crime envolver

violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou

pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.”236

As pessoas mencionadas no dispositivo legal em questão mereceram a elaboração

de legislações especiais, tais como o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90),

Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06). Enfermos e

portadores de necessidades especiais também contam com proteções especiais, traçadas em

diversos ramos do direito, em razão da condição de vulnerabilidade inerente ao problema

experimentado.

Todas elas, porque conservam qualidades ou histórico dignos de proteção, devem

receber o mesmo tratamento protetivo quando forem vítimas de crimes. Todavia, o inciso III

do art. 313 do Código de Processo Penal relaciona a proteção de tais pessoas (vítimas de

crimes) às situações de violência doméstica e familiar, o que implica registrar que a prisão

234 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 235 Reincidente é o indivíduo que pratica um novo crime depois de ter sido condenado, por crime anterior, em sentença penal transitada em julgado, nos termos do art. 63 do Código Penal. (BRASIL, 1940). 236 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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preventiva poderá ser decretada se qualquer delas for vítima de violência praticada no âmbito

das relações domésticas e familiares, nos termos da Lei Maria da Penha.

Assim, nos casos, por exemplo, em que a medida protetiva de afastamento do

agressor do lar conjugal restar descumprida, poderá se mostrar necessária a decretação da

prisão preventiva com base no referido inciso legal, precipuamente para que a medida

protetiva de urgência, anteriormente determinada, possa ser efetivamente cumprida.

Finalmente, o parágrafo único do mesmo art. 313 do Código de Processo Penal

prescreve que:

Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.237

Tal parágrafo também excepciona a regra da pena máxima maior do que quatro

anos, para o decreto da prisão preventiva. Todavia, pensamos que não excepciona a regra de a

prisão preventiva só poder ser decretada em delito doloso, em prol da homogeneidade das

medidas cautelares, que em todas as hipóteses devem guardar relação de proporcionalidade

com a penalidade a ser imposta eventualmente ao final.

A possibilidade de decretação da prisão preventiva com base neste motivo, repete,

em certa medida, a previsão do inc. II, do art. 1º da Lei 7.960/89, o qual autoriza a prisão

temporária: “quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos

necessários ao esclarecimento de sua identidade.”238

Todavia, parece que a inovação da Lei 12.403/11 não revogou a previsão da

prisão temporária, mormente porque, conforme será melhor elucidado em outro tópico, o inc.

II, exigido ao decreto da prisão temporária, deve estar alinhado a um dos crimes trazidos pela

Lei 7.960/89, para que esta possa ser decretada.

Assim, em se tratando de crimes não contemplados na Lei da prisão temporária,

em que o indivíduo não fornece reais informações sobre sua identidade ou não aponta

elementos capazes de sanar dúvidas sobre ela, não é o caso de aplicação da prisão temporária

237 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 238 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013.

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a fim de propiciar-se os respectivos esclarecimentos, mas sim, se for o caso, de decretar-se a

sua prisão preventiva.

Ademais, o referido dispositivo legal da prisão temporária é mais abrangente do

que a hipótese prevista no parágrafo único do art. 313 do Código de Processo Penal, já que

aquele contempla não somente a hipótese de dúvidas quanto à identidade do suspeito, mas

também respalda a medida quando este não possuir residência fixa.239

De outro lado, pensamos que a medida do parágrafo único do art. 313 do Código

de Processo Penal se apresentará excessiva quando a identificação do indivíduo puder ser

obtida por outros meios menos gravosos, tais como: busca e apreensão de documento,

mandado de condução coercitiva, ou até mesmo, através de uma simples ligação a familiares

do indivíduo a fim de que providenciem a entrega do documento de identidade deste, até

porque, em qualquer situação, a prisão preventiva será sempre medida excepcional.

Igualmente, não se pode olvidar que a prévia expedição de mandado judicial de

prisão, devidamente fundamentado, constitui medida imperativa para a legalidade da prisão

preventiva.

4.5.4.2 Análise dos pressupostos fáticos do art. 312 do Código de Processo Penal

Conforme já ventilado, as condições jurídicas elencadas no art. 313 do Código de

Processo Penal, não dispensam os pressupostos fáticos previstos no art. 312 do mesmo

código, para que a prisão preventiva possa ser decretada, os quais serão explicitados a

seguir.240

4.5.4.2.1 Garantia da ordem pública

O vocábulo garantia da ordem pública, parece o mais aberto de todos os

fundamentos que autorizam a prisão preventiva, motivo pelo qual muitas são as divergências

doutrinária e jurisprudencial sobre o seu significado.

Em vista disso, muitos excessos também são praticados, abarcando situações não

alinhadas com o sistema constitucional.

239 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 502. 240 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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Inclusive, na Exposição de Motivos do Ministério da Justiça n. 00022, de 25 de

janeiro de 2001, que iluminou a reforma do Código de Processo Penal trazida pela Lei

12.403/11, consta expressa sugestão de substituição das expressões garantia da ordem pública

e garantia da ordem econômica. Vejamos, no ponto, o respectivo texto da Exposição de

Motivos, com as razões da sugestão:

Sugere-se a substituição da referência à expressão “garantia da ordem pública” e da “Garantia da ordem econômica”, como motivos que autorizam a prisão preventiva, de conteúdo indeterminado, pela existência de fundadas razões de que o indiciado ou acusado venha a praticar infrações penais relativas ao crime organizado, à probidade administrativa ou à ordem econômica ou financeira consideradas graves, ou mediante violência ou grave ameaça à pessoa.241

Todavia, tais sugestões não vingaram, de maneira que o requisito garantia da

ordem pública permanece previsto no art. 312 do Código de Processo Penal, sendo

normalmente suscitado em decisões judiciais na hipótese de risco de reiteração da prática de

infrações penais, porém, não sem críticas por parte de doutrinadores.

Existem, na lição de alguns autores, dúvidas sobre a natureza cautelar do motivo

risco de reiteração da prática de infrações penais, sobretudo porque não se prestaria

propriamente a instrumentalidade do processo, já que a prisão não seria imposta por

necessidade do processo em que é determinada. Não obstante, o risco da reiteração na prática

de novos crimes serve de respaldo para o decreto da prisão preventiva em diversos países

“[...] revelando-se, assim, como uma necessidade do processo penal. O que se tem feito, como

sucedeu em Portugal, é restringi-la a crimes de maior gravidade.”242

Entretanto, o processo penal possui como objetivo não apenas a tutela da

liberdade, mas também a busca pela tranquilidade social. A busca pela paz social, a propósito,

não deve constituir uma preocupação somente na fase da prolação de uma sentença definitiva,

em que o Estado aplica a pena em decorrência do crime praticado, com a finalidade de

prevenção e repressão. Durante todo o processo, essa preocupação existe, e nem se diga que

com isso se estará fazendo referência à prevenção geral, como finalidade da pena.243

241 SENADO. Projeto de Lei 111, de 2008. n. 4.208, de 2011, na Casa de Origem. Disponível em: http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=53152&tp=1. Acesso em: 05 de março de 2013. 242 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 293. 243 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 266-267.

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Quando se decreta a prisão preventiva com base na garantia da ordem pública, a

prevenção que é buscada é concreta. Ademais, todas as Autoridades incumbidas da

persecução penal, em sentido “lato”, possuem esse poder-dever de prevenção concreta.

No sistema processual penal pátrio, com a reforma ditada pela Lei 12.403/11 o art.

282, inc. I do Código de Processo Penal passou a determinar expressamente “[...] que se

observe, na decretação de qualquer medida cautelar pessoal, a sua necessidade para evitar a

prática de novas infrações penais, devendo, assim, ser esse o fundamento principal para a

prisão preventiva fundada na garantia da ordem pública.”244

De outro lado, Lopes Jr. pontua que as prisões preventivas decretadas com base na

ordem pública não se afinam com o objetivo ínsito às providências cautelares, que é o da

instrumentalidade do processo, sendo, na sua visão, inconstitucionais. O autor ainda

complementa:

Trata-se de grave degeneração transformar uma medida processual em atividade tipicamente de polícia, utilizando-as indevidamente como medidas de segurança pública. Quando se mantém uma pessoa presa em nome da ordem pública, diante da reiteração de delitos e o risco de novas práticas, está se atendendo não ao processo penal, mas sim, a uma função de polícia do Estado, completamente alheia ao objeto e fundamento do processo penal.245

Lopes Jr. intitula de “absurdo exercício de vidência por parte dos julgadores, que

até onde temos conhecimento ainda não possuem um periculosômetro (diria Zaffaroni) à

disposição.”246

Todavia, conforme alhures exposto, assim não concordamos, haja vista que o

Estado busca, na ordem pública, a prevenção concreta.

A propósito:

Analisando a jurisprudência dos Tribunais Superiores, verifica-se que a indicação dessa concreta probabilidade de novas práticas delitivas poderá ser inferida por diversos fatores decorrentes do caso concreto, tais como: gravidade concreta – e não abstrata – do delito (em razão de circunstâncias que demonstrem que o agente voltará a delinquir, especialmente a

244 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 293. 245 LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 208. 246 LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 209.

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brutalidade e crueldade incomuns com que o delito foi cometido, periculosidade concreta do agente (que nada mais é do que o prognóstico que voltará a realizar ações criminosas), reincidência e antecedentes, forma reiterada de agir, personalidade voltada para o crime, modus operandi (especialmente quando integra organização altamente estruturada, com organização requintada ou complexa ou, ainda, quando pratica o delito com alto grau de sofisticação), grande quantidade de drogas apreendida, utilização do aparelho estatal para a prática do crime, principalmente pelo exercício de suas funções públicas, entre outras.247

Com a Lei 12.403/11, a regra passou a ser o decreto da prisão preventiva apenas

nos crimes mais graves, quando comprovada efetiva necessidade e adequação da medida

diante da situação em concreto, tanto que o art. 313, inc. I do Código de Processo Penal

inaugura a possibilidade de decretação da prisão preventiva com a previsão de que esta poderá

ser imposta “nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a

4 (quatro) anos”, atendendo-se à exposição de motivos da própria reforma.248

A gravidade em concreto do crime, demonstrada especialmente pelo “modus

operandi” do agente, aliada a outros elementos respalda a prisão preventiva com base na

garantia da ordem pública, na posição do Supremo Tribunal Federal.249

De outro lado, o Supremo Tribunal Federal consigna que a gravidade em abstrato

do crime, por si só, não autoriza a prisão preventiva.250-251

Ademais, o clamor público, por si só, também não autoriza o decreto da prisão

preventiva, e a fundamentação judicial pela segregação cautelar do indivíduo deve ser baseada

247 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 264-265. 248 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013 249 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 111046 / CE – Ceará. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Carmen Lúcia. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgamento: 11/12/2012. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Habeas+Corpus+111046+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/b9r3wj2>. Acesso: 10 de janeiro de 2013. 250 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RHC 100808 / MG – Minas Gerais. Recurso Ordinário em Habeas Corpus. Relator(a): Min. Marco Aurélio. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgamento: 20/11/2012. Disponível: em: < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RHC+100808+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.coliom/axezdjt>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 251 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 107903 / SP – São Paulo. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Luiz Fux. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgamento: 19/06/2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Habeas+Corpus+107903%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/al754xo>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

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em elementos concretos, extraídos dos autos, na visão do Supremo Tribunal Federal.252

4.5.4.2.2 Garantia da ordem econômica

A lei 8.884, de 11 de junho de 1994, inseriu no texto do art. 312 do Código de

Processo Penal o pressuposto garantia da ordem econômica, a respaldar a prisão preventiva.253

Para Lopes Jr.:

A prisão para garantia da ordem econômica é resultado da influência do modelo neoliberal e seria risível se não fosse realidade. Em um país pobre como o nosso, ter uma prisão preventiva para tutelar o capital especulativo envergonha o processo penal. É elementar que, se o objetivo é perseguir a especulação financeira, as transações fraudulentas, e coisas do gênero, o caminho passa pelas sanções à pessoa jurídica, o direito administrativo sancionador, as restrições comerciais, mas jamais pela intervenção penal, muito menos de uma prisão preventiva.254

Estamos com Lopes Jr., no sentido de que o direito administrativo sancionador se

mostraria suficiente à prevenção e repressão das práticas anticompetitivas e a concorrência

desleal, estabelecendo sanções administrativas à pessoa jurídica.

4.5.4.2.3 Conveniência da instrução criminal

Outro pressuposto autorizador para a decretação da prisão preventiva é a

conveniência da instrução criminal, que também deve ser preenchido no caso concreto, diante

da sua vagueza.

A doutrina, de modo geral, tem entendido que se afigura conveniente para a

instrução criminal a prisão preventiva quando restar detectado, por exemplo, ameaça ou

suborno a testemunha ou perito, praticado pelo acusado, eis que a produção da prova e a

busca da verdade estariam sendo comprometidas.

252 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 110132 / São Paulo. Relator: Min. Ricardo Lewandowski. Julgamento: 16/10/2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+110132%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/aoz4564>. Acesso em 12 de fevereiro de 2013. 253 A Lei 8.884/94 tratou da prevenção e repressão aos delitos praticados contra a ordem econômica – truste, tendo sido substituída pela Lei 12.529-11, a partir de 29 de maio de 2012. 254 LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Garantista). 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

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O Supremo Tribunal Federal autoriza a prisão preventiva com base em evidências

de ameaça a testemunhas, o que demonstra, na visão do respectivo tribunal, que a medida é

conveniente para a instrução criminal.255

Todavia, os elementos ensejadores da conclusão pela conveniência da instrução

criminal devem ser concretos e não mera suposição, dissociada de qualquer suporte fático.

4.5.4.2.4 Asseguramento de aplicação da lei penal

Elementos concretos constantes no processo que possam demonstrar o risco de

fuga do agente, preenchem o pressuposto “para assegurar a aplicação da lei penal”, previsto

ao decreto da prisão preventiva (art. 312, Código de Processo Penal), como, por exemplo, a

indicação de endereço falso no termo de compromisso de liberdade provisória e o fato de o

acusado estar foragido da justiça.256

4.5.5 Vedação legal à prisão preventiva

Não pode a prisão preventiva ser decretada em crimes culposos ou em

contravenções penais, porque os delitos culposos, quaisquer que sejam as penas aplicadas,

admitem a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, nos moldes do

que dispõe o art. 44, inc. I, última parte, do Código Penal, já as contravenções penais possuem

tratamento ditado pela Lei 9.099/95, a qual prevê medidas despenalizadoras, tais como a

transação penal (art. 76) e a suspensão condicional do processo (art. 89), que não culminam

em prisão do agente.257

255 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 112738 / SP – São Paulo. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgamento: 30/10/2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Habeas+corpus+112738+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/alne6xt>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 256 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 106000 / MG – Minas Gerais. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Rosa Weber. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgamento: 28/02/2012. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+106000+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/alncbrv>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.. 257 Andrey Borges de Mendonça e Eugênio Pacelli acreditam ser possível a decretação da prisão preventiva em crime culposo na hipótese do parágrafo único do art. 313 do CPP, conforme exposto na obra de MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 250.

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A Lei 12.403/11, trouxe ao art. 283, parágrafo 1o do Código de Processo Penal a

seguinte previsão: “As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a

que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade.”258

Assim, se a infração penal não cominar qualquer previsão de privação de

liberdade, não há que se falar na possibilidade de decretação da prisão preventiva.

Toda essa sistemática está atenta ao princípio da proporcionalidade, porque não se

concebe que a medida cautelar, qualquer que seja, possa se mostrar mais gravosa do que o

resultado a ser alcançado com o provimento jurisdicional final.

O art. 314 do Código de Processo Penal não admite a decretação da prisão

preventiva quando forem extraídos dos autos elementos que denotem que o agente praticou o

fato amparado por uma excludente de ilicitude (art. 23, incs. I, II e III do Código Penal).259

A vedação da prisão preventiva, nestes casos, apresenta-se mais do que

necessária, haja vista que as excludentes de ilicitude traduzem a probabilidade de absolvição

do réu. Ou seja, se há probabilidade de absolvição, e se toda e qualquer medida cautelar deve

guardar homogeneidade com o resultado final, a liberdade do indivíduo deve ser mantida

durante o processo.

A prisão preventiva também encontra limitações previstas no Código Eleitoral. O

art. 236 do Código Eleitoral (Lei n. 4.737/65) veda a prisão ou detenção de qualquer eleitor,

no período de cinco dias antes, e quarenta e oito horas depois da finalização das eleições,

salvo na hipótese de flagrante delito, em virtude de sentença penal condenatória por crime

inafiançável e também por desrespeito a salvo-conduto. O parágrafo primeiro do referido

dispositivo legal acrescenta que os membros de mesas receptoras e os fiscais do partido, assim

como todos os canditados, gozarão do mesmo benefício, sendo vedada a prisão ou detenção,

entretanto, quinze dias antes das eleições, e também quarenta e oito horas depois.260

O mencionado regramento proíbe a execução da prisão preventiva durante os

referidos períodos, e tal se deve ao objetivo propugnado pelo Código Eleitoral, qual seja, de 258 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 259 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 260 BRASIL. Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965. Institui o Código Eleitoral. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4737.htm>. Acesso em: 08 de março de 2013.

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propiciar o exercício do direito ao voto e do direito de ser votado da maneira mais tranquila

possível, realizando-se, assim, o direito político fundamental, reconhecido pela Magna Carta

de 1988.261

Cumpre registrar que a prisão temporária também resta abarcada pela vedação do

art. 236 do Código Eleitoral, apesar de que não haja expressa menção a ela. Todavia, há de ser

registrado que:

[...] Tanto a prisão preventiva quanto a temporária são prisões de natureza cautelares, devendo, no ponto, receber o mesmo tratamento. [...] Ao tempo do Código Eleitoral, não existia ainda a prisão temporária, daí porque impossível qualquer referência legislativa a ela.262

Sobre a questão da aplicação das medidas cautelares trazidas pela Lei 12.403/11

nos períodos mencionados pelo art. 236 do Código Eleitoral, dentro dos quais resta vedada a

efetivação da prisão preventiva e da prisão temporária, tal reflexão será realizada em tópico

destinado precipuamente às medidas cautelares diversas da prisão, mas adiante exposto.

4.5.6 Prisão domiciliar

A Lei 12.403/11 passou a prever no Código de Processo Penal, como medida a ser

adotada antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, a prisão domiciliar.

Tal medida não foi prevista de forma inédita no sistema processual, uma vez que

já constava na Lei de Execuções Penais ( n. 7.210/84). Todavia, a prisão domiciliar do Código

de Processo Penal difere da prisão domiciliar da Lei de Execução Penal não apenas pelo

momento processual em que ambas podem ser determinadas.

O art. 117 da Lei de Execução Penal, em suma, possibilita a prisão em residência

particular (prisão domiciliar) quando o apenado estiver em regime aberto e,

concomitantemente, enquadrar-se em uma das seguintes condições, previstas no mesmo

dispositivo legal: “I - condenado maior de 70 (setenta) anos; II - condenado acometido de

doença grave; III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; e IV -

condenada gestante.”263

261 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 560-561. 262 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 561. 263 BRASIL. Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7210.htm>. Acesso em: 07 de março de 2013.

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Já, a Lei 12.403/11, inseriu a prisão domiciliar no Código de Processo Penal com

os seguintes contornos: “art. 317 - a prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado

ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.”264

E, ainda, o art. 318 do Código de Processo Penal passou a prever que ao imputado

que estiver em uma das seguintes condições poderá ser imposta prisão domiciliar: “I - maior

de 80 (oitenta) anos; II - extremamente debilitado por motivo de doença grave; III -

imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com

deficiência; IV - gestante a partir do 7o (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto

risco.”265

Questão que salta aos olhos, decorrente da simples leitura e comparação dos arts.

117 da Lei de Execução Penal e 318 do Código de Processo Penal, é que as hipóteses de

cabimento da prisão domiciliar cautelar são mais fechadas, excepcionais, que aquelas

presentes no art. 117, o que equivale a dizer que aquele que já recebeu condenação definitiva

(e restou beneficiado com o regime aberto) possui maiores chances de ter concedida a prisão

domiciliar do que aquele que ainda conserva o estado de inocência, o que no mínimo viola o

princípio da proporcionalidade.

Não obstante, a Exposição de Motivos n. 00022 do Ministério da Justiça, de 25 de

janeiro de 2001, que deu azo à Lei 12.403/11, visou conferir proporcionalidade entre as

prisões domiciliares processual e penal, uma vez que estabeleceu que a nova prisão

domiciliar, poderia ser determinada, em linhas gerais, nas hipóteses que autorizam a prisão-

albergue no regime aberto (art. 117 da Lei 7.210/84 – de Execuções Penais). Todavia,

conforme delineado acima, não foi bem isso que restou aprovado.

Poder-se-ia pensar que o art. 317 do Código de Processo Penal estabelece a prisão

domiciliar como medida autônoma, não circunscrita às condições do art. 318 do mesmo

código. Entretanto, parece mais adequado o entendimento no sentido de a medida ser cabível

264 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 265 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

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apenas em substituição à prisão preventiva, ou seja, alinhada às hipóteses excepcionais do art.

318 do Código de Processo Penal.266

Porque a prisão domiciliar representa restrição total da liberdade, não se pode

alargar a aplicação do instituto. Assim, a prisão domiciliar, ao que parece, não pode ser

determinada de forma autônoma, diante de qualquer situação, mas sim, em substituição à

prisão preventiva, sempre que o imputado se enquadrar em uma das situações trazidas entre os

incs. I e IV do art. 318 do Código de Processo Penal.

Inclusive a Exposição de Motivos do Senado Federal n. 00022 do Ministério da

Justiça, de 25 de janeiro de 2001, não deixa dúvidas sobre a interpretação restritiva que deve

ser conferida à prisão domiciliar processual, de forma que resta possível apenas em

substituição à prisão preventiva, nas hipóteses taxativamente previstas em lei. Neste sentido,

vejamos nos exatos termos da Exposição de Motivos:

[...] Sobre a prisão preventiva, abre-se a possibilidade de o juiz substituí-la por prisão domiciliar em situações bem restritas, indicadoras da inconveniência e da desnecessidade de se manter o recolhimento em cárcere.267

A prisão domiciliar constitui forma humanitária de cumprimento da prisão

preventiva, adstrita às condições do art. 318 do Código de Processo Penal, bem como à

existência dos requisitos e pressupostos da prisão preventiva.268

Quando decide impor a prisão domiciliar, o magistrado deve estar convencido da

existência das condições que autorizam a prisão preventiva, haja vista que não seria o caso de

aplicar qualquer das medidas cautelares descarcerizadoras dos arts. 319 e 320 do Código de

Processo Penal. Assim, porque o legislador quis abrandar a forma de cumprimento da prisão

266 NICOLITT, André. Lei n. 12.403/2011 - O Novo Processo Penal Cautelar – A Prisão e das Demais Medidas Cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p.101. 267 BRASIL. Projeto de Lei n. 4.208, de 2001. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal – relativos à prisão, medidas cautelares e liberdade, e dá outras providências. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=D8775D42AA8160090AC2982AF3897030.node2?codteor=773516&filename=Tramitacao-PL+4208/2001>. Acesso em: 05 de março de 2013. 268 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

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preventiva em algumas situações, ou seja, naquelas elencadas no art. 318 do Código de

Processo Penal, é que o juiz pode decidir por impor a prisão domiciliar.269

Nessa linha, Marques da Silva e Freitas sustentam que a prisão domiciliar cautelar

é restrita às hipóteses trazidas pelo legislador no art. 318, não podendo tal rol ser ampliado,

sob pena de desnaturar-se o instituto. Complementam ainda que, se o magistrado entender que

em outros casos, não previstos, caberia a prisão domiciliar, melhor que estabeleça a liberdade

provisória, com a imposição de uma ou mais cautelares diversas da prisão.270

No mesmo norte, preleciona Pacelli de Oliveira:

A prisão domiciliar, portanto, não se inclui como alternativa à prisão preventiva, tal como ocorre com as medidas previstas no art. 319. Ela somente será aplicada como substitutivo da prisão preventiva e desde que estejam presentes algumas das hipóteses arroladas no art. 318, CPP.271

Cumpre registrar, de outra banda, que se o magistrado estiver diante de uma das

situações trazidas pelo art. 318 do Código de Processo Penal, não estará obrigado a

determinar a prisão domiciliar. Igualmente, caso determine a medida, havendo

descumprimento da mesma, pode o magistrado determinar a prisão preventiva, já que a

providência mais tênue se mostrou insuficiente no acautelamento do processo, em uma

interpretação condizente com o que dispõe o parágrafo único do art. 312 do Código de

Processo Penal, a saber: “Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada

em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas

cautelares (art. 282, § 4o).”272

Sobre a faculdade de o juiz substituir a prisão preventiva por prisão domiciliar

quando estiver diante de uma das hipóteses trazidas pelo art. 318 do Código de Processo

Penal, cumpre citar a reflexão de Marques da Silva e Freitas:

269 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 270 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 508. 271 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 561. 272 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

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Suponha uma pessoa presa em flagrante, cuja situação pessoal se insere em uma das referidas no dispositivo a ser estudado, a qual, comprovadamente, é líder de organização criminosa, ou conhecido estuprador, ou transportava quantidade expressiva de drogas etc.; teria direito ao benefício da prisão domiciliar substitutiva? O instituto da prisão domiciliar se constitui em uma faculdade judicial, e, por conseguinte, o juiz deverá analisar o caso concreto para concessão do benefício. A ordem pública restará fortemente prejudicada com a liberdade de pessoa que ostente semelhantes condições pessoais.273

De outro lado, no caso de o imputado apresentar grave doença, e demonstrar

extrema debilidade, parece necessário que o juiz conceda a prisão domiciliar, porque,

conforme pontuam Marques da Silva e Freitas: “[...] como o Estado não pode lhe dar um

tratamento compatível, analisado detidamente o caso, é de se conceder o benefício em

tela.”274

4.6 PRISÃO TEMPORÁRIA

A prisão temporária está prevista na Lei 7.960/89, e foi o resultado da conversão

da Medida Provisória n. 111, de 14 de novembro de 1989.275

Tal lei parece ter regularizado, de forma velada, a anterior prisão para

averiguação, considerada ilegal.

De qualquer maneira, a prisão temporária não dispensa prévia ordem judicial

fundamentada de juiz competente para se afigurar legal, constituindo abuso de Autoridade

primeiro prender-se para, depois, conseguir-se o mandado judicial de prisão, nos termos do

art. 2º, parágrafo 5º da Lei 7.960/89.276

Não há que se falar na possibilidade de decretação da prisão temporária após a

propositura da ação penal, pois a mesma só tem lugar durante as investigações policiais, com

persecução penal já instaurada, por meio de inquérito policial.

273 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 509. 274 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 509. 275 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 276 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013.

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O juiz não está autorizado à decretação da prisão temporária de ofício, mas

somente mediante requerimento do Ministério Público ou representação da Autoridade

Policial, nos termos do que dispõe o art. 2º, “caput” da Lei 7.960/89.277

A lógica da prisão temporária não pode ser aquela entendida por alguns autores,

no sentido de que primeiro se prende para, depois, investigar. A persecução penal

(investigação) já deve estar tramitando, e o investigado já deve ter sido apontado formalmente

pela Autoridade Policial como autor do delito, ou seja, o indiciamento já deve ter sido

realizado. O indivíduo, ademais, para ser preso temporariamente, precisa concretamente

atrapalhar a investigação criminal, comprometendo-a.278

Uma vez comprovada a vinculação da prisão temporária com a investigação,

estará demonstrada a sua necessidade e legalidade.279

A prisão temporária possui prazo certo de duração, a partir do qual não poderá

perdurar, sob pena de configurar constrangimento ilegal. O investigado poderá ficar preso

temporariamente por, no máximo, 05 (cinco) dias, prorrogáveis por mais 05 (cinco) dias. Tal

prorrogação não pode ser automática, sendo admitida apenas em caso de extrema e

comprovada necessidade, nos termos do que prescreve o art. 2º da Lei 7.960/89.280

Em se tratando de crime hediondo ou a ele equiparado, o prazo de duração da

prisão temporária se apresenta demasiadamente longo, conforme permissão da Lei 8.072/90, a

saber: “art. 2º. [...] § 4o A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei n. 7.960, de 21 de

dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias,

prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.”281

Terminado o prazo máximo de duração da prisão temporária, o preso deverá ser

colocado imediatamente em liberdade, salvo se já tiver sido decretada a sua prisão preventiva

(art. 2º, parágrafo 7º da Lei 7.960/89).282

277 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 278 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 70. 279 LIMA, Antônio Ferreira; NOGUEIRA, Ranieri Ferraz. Prisões e Medidas Liberatórias. São Paulo: Atlas, 2011, p. 107. 280 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 281 BRASIL. Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8072.htm>. Acesso em: 10 de março de 2013. 282 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013.

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O preso temporário deve conservar-se, obrigatoriamente, separado dos demais

detentos, nos termos do que prevê o art. 3º da Lei 7.960/89.283

Todavia, isto não significa que o preso temporário possui direito a uma cela

isolada, mas sim, que somente pode ficar preso com outros presos que também tiveram contra

si o decreto de uma prisão temporária.

Os requisitos trazidos pelo art. 1º da Lei 7.960/89 e seus incisos, os quais

permitem a decretação da prisão temporária, carecem de uma boa redação legislativa. Isso

porque não fica claro se tais condições seriam cumulativas ou alternativas.284

De outro lado, entendemos que outra não pode ser a interpretação a não ser a

seguinte: a prisão temporária só poderá ser decretada nos crimes elencados na Lei 7.960/89,

precisamente em seu inciso III, ou nos crimes trazidos pela Lei 8.072/90.285

Os delitos trazidos pelo art. 1º, inc. III da Lei 7.960/89 são os seguintes:

a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2°);b) sequestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1° e 2°); c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1° e 2°); e) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único); i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1°); j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285); l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal; m) genocídio (arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 2.889, de 1° de outubro de 1956), em qualquer de sua formas típicas; n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei n° 6.368, de 21 de outubro

283 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 284 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 285 O Art. 1º da Lei 8072-90 elenca os crimes hediondos, para os quais também se afigura cabível a prisão temporária: “I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V); II - latrocínio (art. 157, § 3o, in fine); III - extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2o); IV - extorsão mediante sequestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ lo, 2o e 3o); V - estupro (art. 213, caput e §§ 1o e 2o); VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o, 2o, 3o e 4o); VII - epidemia com resultado morte (art. 267, § 1o). VII-B - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1o, § 1o-A e § 1o-B, com a redação dada pela Lei no 9.677, de 2 de julho de 1998). Parágrafo único. Considera-se também hediondo o crime de genocídio previsto nos arts. 1o, 2o e 3o da Lei no 2.889, de 1o de outubro de 1956, tentado ou consumado.” (BRASIL, 1990). De acordo com o art. 2º da mesma Lei, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são crimes equiparados a hediondos. Registre-se, ainda, que o antigo art. 12 da Lei 6368/76 corresponde, a partir da Lei 11.343/06, ao art. 33, caput e par. 1º da mesma Lei).

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de 1976); o) crimes contra o sistema financeiro (Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986).286

Registre-se que o art. 213 do Código Penal foi alterado pela Lei 12.015/09, mas

continua sendo admitida a prisão temporária no crime de estupro. Já, o art. 223 do Código

Penal, foi revogado pela mesma lei. Em relação ao delito de atentado violento ao pudor, antes

da Lei 12.015/09, previsto no art. 214 do Código Penal, com a reforma, foi incluído no art.

213 do Código Penal, sendo passível de prisão temporária. Quanto ao delito de rapto violento

(art. 219 do Código Penal), este foi revogado pela Lei 11.106/05.287-288

Ou seja, a leitura dos crimes elencados na Lei 7.960/89 deve ser realizada

atentando-se para as reformas de direito material acima referidas.289

Existindo fundadas razões de autoria ou participação do investigado nos crimes

trazidos pela Lei 7.960/89 ou em crimes hediondos ou a ele equiparados, admite-se, em

princípio, a decretação de tal medida.290

De outro lado, a prática, em tese, de algum desses delitos não basta à decretação

da prisão temporária, sobretudo porque para a decretação de qualquer medida cautelar

necessita não apenas da presença do “fumus boni iuris” ou do “fumus comissi delicti”, mas

também e, principalmente, da existência do “periculum in mora” ou “periculum libertatis”.

Será preciso, então, que o investigado pratique algum dos crimes da Lei 7.960/89 ou da Lei

8.072/90, e ainda que estejam presentes quaisquer das situações trazidas pelos incs. I ou II do

art. 1º da Lei 7.960/89, quais sejam:

Art. 1º. [...] I - quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; II - quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade.291

286 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 287 BRASIL. Lei n. 12.015, de 07 de agosto de 2009. Altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12015.htm>. Acesso em: 07 de março de 2013. 288 BRASIL. Lei n. 11.106, de 28 de março de 2005. Altera os arts. 148, 215, 216, 226, 227, 231 e acrescenta o art. 231-A ao Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11106.htm. Acesso em: 21 de maio de 2013. 289 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 290 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013.

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Estas condições não são cumulativas, mas sim, alternativas, sendo necessária a

presença, dessa forma, de uma das situações trazidas pelos incs. I e II do art. 1º da Lei

7.960/89, aliada a um dos crimes elencados na mesma ou na Lei 8.072/90, para que a prisão

temporária possa ser decretada.

Neste sentido é o entendimento de Fernandes:

Não é possível exegese no sentido de ser bastante o preenchimento de um só dos requisitos dos três incisos para a prisão temporária. [...] Bastaria que alguém não tivesse residência fixa e em qualquer infração penal poderia ser preso, com base no inc. II do art. 1º.292

De outro lado, legislação posterior poderá estender a prisão temporária a outros

crimes, como ocorreu com a Lei 8.072/90, que a possibilitou nos delitos hediondos e a eles

equiparados.

A Lei 12.403/11 causou impacto na prisão temporária. Isso porque reforçou a

concepção, constitucional, de que prisão antes do trânsito em julgado de sentença penal

condenatória deve preencher requisitos cautelares.

Com a inserção, pela citada lei, no ordenamento jurídico, de várias medidas

cautelares pessoais alternativas à prisão, que possuem preferência em relação a essa, não se

pode olvidar que para a decretação da prisão temporária também deve estar presente a efetiva

impossibilidade de determinação de medida cautelar diversa da prisão.

Este entendimento se alinha com o sistema propugnado pela Lei 12.403/11, pois,

se a prisão em flagrante, que constitui a certeza visual do crime, não pode ser convertida

automaticamente em prisão preventiva, ou mesmo esta não pode ser autonomamente

decretada desde que se mostrarem suficientes e adequadas ao caso concreto quaisquer das

medidas alternativas à prisão, parece razoável compreender que, em relação a prisão

temporária, a averiguação quanto à possibilidade de aplicação de medida descarcerizadora

também deve ocorrer.

A prisão temporária constitui providência cautelar demasiadamente excepcional.

A fumaça do cometimento do crime exigida para a decretação da prisão temporária é menor

do que a exigida para a decretação da prisão preventiva ou à conversão da prisão em flagrante

291 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 292 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 303.

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em segregação preventiva, eis que o art. 312 do Código de Processo Penal exige prova da

existência do crime e indício suficiente de autoria.293

Então, se quando da decretação da prisão preventiva a propositura da denúncia ou

da queixa-crime é mais do que possível, sendo quase uma certeza, e ainda assim tal prisão só

pode ser decretada em casos de extrema necessidade, desde que não se mostre cabível

qualquer das providências descarcerizadoras, com maior razão tal sistemática deve ser

observada na prisão temporária, a qual contenta-se com uma “reles fagulha” de fumaça do

bom direito.294

Ademais, e aí talvez a maior afetação na prisão temporária, a Lei 12.403/11

estabeleceu que a prisão preventiva, espinha dorsal das prisões cautelares, em regra, só possa

ser determinada em crimes com pena máxima superior a 04 (quatro) anos.295

Analisando os crimes elencados na Lei 7.969/89, vê-se que os delitos de sequestro

ou cárcere privado simples (art. 148, “caput” do Código Penal), e de quadrilha ou bando

simples (art. 288, “caput” do Código Penal) não mais admitem prisão temporária, haja vista

que é inadmissível a prisão preventiva, já que as penas máximas isoladamente consideradas

não ultrapassam 04 (quatro) anos de privação da liberdade.296-297

Se este não for o entendimento, haverá incoerência no sistema das prisões

cautelares e, por conseguinte, no tratamento das situações em concreto, uma vez que durante a

investigação policial o indivíduo incidente em tais crimes poderia ficar preso

temporariamente, porém, uma vez proposta a denúncia, deveria ser imediatamente solto,

porque tais delitos, isoladamente, não comportam a decretação da prisão preventiva.

Assim, a saída, para os referidos crimes, deve ser a aplicação de uma das medidas

descarcerizadoras trazidas pela Lei 12.403/11, se presentes as condições que autorizam a

293 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 71. 294 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 71-72. 295 BRASIL. Lei n. 12.015, de 07 de agosto de 2009. Altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12015.htm>. Acesso em: 07 de março de 2013. 296 BRASIL. Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Dispõe sobre a Prisão Temporária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7960.htm>. Acesso em: 15 de janeiro de 2013. 297 BRASIL. Decreto Lei n. 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 10 de dezembro de 2012.

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prisão temporária e, ainda, se se mostrar cabível (necessária e adequada) a aplicação de tais

medidas alternativas.

De outro lado, nos referidos crimes, havendo o descumprimento de qualquer das

medidas alternativas impostas, aí sim poderá ser decretada a prisão temporária do investigado,

porque também poderia sê-la a prisão preventiva, caso fosse descumprida. Igualmente, se os

crimes em comento forem qualificados, porque as penas máximas superam 04 (quatro) anos

de pena privativa de liberdade, ou se, apesar de simples, tiverem sido praticados em concurso

ou de forma conexa a algum dos outros crimes dispostos na Lei 7.960/89, porque a prisão

preventiva também poderia ser aplicada nesses outros crimes, caberá a decretação da prisão

temporária. Na mesma lógica de harmonização do sistema das prisões cautelares, se embora

simples, os crimes de sequestro, cárcere privado ou quadrilha, o indiciado se afigurar

reincidente em crime doloso, também será possível a decretação da prisão temporária.

E nem se diga que para a decretação da prisão temporária não se mostra cabível

juízo de necessidade da prisão, porque se assim for entendido, a mesma pode ser extirpada do

processo penal, uma vez que será evidentemente desprovida de natureza cautelar e, assim,

mostrar-se-á ilegal, porque automática, antecipatória de pena.

4.7 A (I)LEGALIDADE DA PRISÃO PARA AVERIGUAÇÕES

A prisão para averiguações constitui medida ilegal e caracteriza crime de abuso de

autoridade (art. 4º, a, da Lei 4.898/65). Isso porque ela ocorre fora das situações de flagrante

delito e também sem qualquer expedição prévia de mandado judicial de prisão.298

Em julgado proferido pelo Tribunal de Justiça da Santa Catarina, foi reconhecida

situação de prisão para averiguação, considerada ilegal, uma vez que o indivíduo permaneceu

por mais de cinco horas detido em determinada Delegacia, sem qualquer motivo plausível

(flagrante ou ordem judicial).299

No entanto, a prisão para averiguação (medida ilegal) não pode ser confundida

com diligências rápidas, adotadas pela Autoridade Policial ou por seus agentes no próprio

local da abordagem do indivíduo, em caso de fundadas suspeitas sobre este, mormente porque 298 BRASIL. Lei 4.898, de 09 de dezembro de 1965. Regula o Direito de Representação e o processo de Responsabilidade Administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4898.htm>. Acesso em: 21 de maio de 2013. 299 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Recurso em Sentido Estrito: 2012.047040-0 (Acórdão). Relator: Ricardo Roesler. Origem: Capital. Orgão Julgador: Segunda Câmara Criminal. Julgado em: 13/11/2012). Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/avancada.jsp#resultado_ancora. Acesso em: 08 de março de 2013.

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tal decorre do poder de polícia. Inclusive, se houver indícios de que o indivíduo esteja

trazendo consigo armas ou quaisquer dos objetos descritos nas letras “b” a “f” e letra “h” do

parágrafo 1º do art. 240 é admitida busca pessoal.300

Obviamente que essas diligências, que não se confundem com prisão para

averiguação, podem ser eventualmente realizadas com discrição, sem abusos, não sendo

admitidas arbitrariedades e excessos.

Todavia, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, por meio do julgamento

do “habeas corpus” n. 107644, proveniente de São Paulo, de relatoria do Ministro Ricardo

Lewandowski, cuja decisão foi proferida em 06.09.2011, fez prevalecer o entendimento de

que a Magna Carta de 1988 assegura, no seu art. 144, parágrafo 4º a condução do suspeito à

Autoridade Policial para prestar esclarecimentos, ainda que fora das situações de flagrante

delito e sem mandado judicial de prisão decretada.301

Assim, não obstante a prisão para averiguações não seja permitida, existe uma

linha muito tênue entre essa medida e as mencionadas diligências rápidas, apenas para

esclarecimentos quanto ao eventual suspeito.

Contudo, o parâmetro para aferir-se a legalidade da medida será sempre a

dignidade da pessoa humana, o resguardo da intimidade e proporcionalidade, de forma que a

referida decisão do Supremo Tribunal Federal não parece ter sido acertada. Isso também

porque o poder de diligências previsto no referido dispositivo constitucional, não parece

conferir poderes à Autoridade Policial e a seus agentes, para que realizem prisões fora das

situações de flagrante delito ou de ordem escrita e fundamentada de Autoridade Judiciária

competente.

4.8 FORMA DE CUMPRIMENTO DA PRISÃO CAUTELAR

Conforme já observado anteriormente, a prisão preventiva poderá ser cumprida

em residência particular, quando se tratar de prisão preventiva humanitária, nas hipóteses do

art. 318 do Código de Processo Penal. Todavia, existem ainda outros ambientes que poderão

300 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 94. 301 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 107644 / SP - SÃO PAULO. Relator: Min. Ricardo Lewandowski. Julgamento: 06/09/2011. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+107644%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/ah2l9dv>. Acesso em: 01 de março de 2013.

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servir ao cumprimento das prisões cautelares em geral (temporária ou preventiva), a seguir

delineados.302

4.8.1 Prisão especial

O art. 295 do Código de Processo Penal dispõe sobre as prisões especiais, que são

cabíveis a algumas pessoas, “[...] em razão da função pública por ela exercida, da formação

escolar por ela alcançada e, finalmente, em razão do exercício de atividades religiosas.”303

A prisão especial constitui forma de cumprimento da prisão cautelar, e não da

prisão decorrente do trânsito em julgado da sentença, salvo em algumas situações, em que a

pessoa conserva, mesmo após a condenação definitiva, o direito de cumprir sua pena em

estabelecimento distinto daquele destinado a presos comuns, em razão da função que

desempenhava à época dos fatos, relacionada à persecução penal, nos termos do art. 84,

parágrafo 2º, e do art. 106, parágrafo 3º, ambos da Lei de Execução Penal (n. 7.210/84).304

A prisão especial garante ao preso cautelar o direito de ser recolhido em local

distinto da prisão comum. Todavia, não havendo estabelecimento específico ao preso

especial, este será mantido em cela distinta do estabelecimento destinado aos presos comuns.

Essa possibilidade de custódia do preso especial em idêntico estabelecimento destinado aos

presos comuns veio com a Lei 10.258 de 11 de julho de 2001, a qual, igualmente, passou a

prever que: “art. 295. [...] § 3o A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo,

atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração,

insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana.”305

O instituto da prisão especial não foi alterado com a Lei 12.403/11, uma vez que,

durante as discussões e votações a respeito, não houve consenso, especialmente porque

existem leis extravagantes que também concedem o benefício da prisão especial a outras

302 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 303 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, P. 567. 304 BRASIL. Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7210.htm>. Acesso em: 07 de março de 2013. 305 BRASIL. Lei n. 10.258, de 11 de julho de 2001. Altera o art. 295 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, que trata de prisão especial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10258.htm>. Acesso em: 03 de março de 2013.

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pessoas, como a Lei 8.906/94, que no art. 7º, inc. V, confere ao advogado o direito de cumprir

prisão cautelar em sala de Estado Maior e, na sua falta, em prisão domiciliar.306

A Lei n. 8.625/93, que trata da legislação orgânica do Ministério Público dos

Estados, a Lei Complementar n. 75/93, que cuida da legislação orgânica do Ministério

Público da União, e a Lei Complementar n. 35/79, legislação orgânica da magistratura,

também reservam a prisão especial aos seus respectivos membros.307-308-309

Entretanto, conforme será melhor elucidado em outro tópico, as categorias acima

referidas (advogados, membros do Ministério Público e magistrados), em verdade, possuem

direito a uma prisão que podemos chamar de “especialíssima”, já que sua forma de

cumprimento se dá em estabelecimento menos gravoso do que o destinado à prisão especial.

O art. 295 do Código de Processo Penal não é exaustivo, porque, com o passar do

tempo, diversas outras leis também estabeleceram tal garantia a outras pessoas ou categorias,

como, por exemplo, a Lei nº 2.860, de 31 de agosto de 1956 (arts. 1º e 2º), que estabelece

prisão especial aos administradores e dirigentes sindicais; a Lei nº 3.988, de 24 de novembro

de 1962 (art. 1º), que prevê prisão especial aos pilotos de aeronaves mercantes nacionais; e a

Lei nº 7.172, de 14 de dezembro de 1983 (art. 1º), que também preconiza tal garantia aos

professores de 1º e 2º graus.310-311-312-313

306BRASIL. Lei n. 8.906, de 04 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8906.htm>. Acesso: 24 de janeiro de 2013. 307 BRASIL. Lei Complementar n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. Institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8625.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 308 BRASIL. Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993. Dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp75.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 309 BRASIL. Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979. Dispõe sobre a Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp35.htm. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 310 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 311 BRASIL. Lei n. 2.860, de 31 de agosto de 1956. Estabelece Prisão Especial para os Dirigentes de Entidades Sindicais e para o Empregado do Exercício de Representação Profissional ou no Cargo de Administração Sindical. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L2860.htm>. Acesso em: 08 de março de 2013. 312 BRASIL. Lei n. 3.988, de 24 de novembro de 1961. Estende aos pilotos de aeronaves mercantes nacionais a regalia concedida pelo art. 295, do Código de Processo Penal, que trata de prisão especial. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l3988.htm>. Acesso em: 08 de março de 2013. 313 BRASIL. Lei n. 7.172, de 14 de dezembro de 1983. Outorga a regalia da prisão especial aos professores do ensino de 1º e 2º graus. Disponível

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Salvo nas situações relacionadas ao exercício de determinadas funções, ligadas à

realização da justiça penal, a distinção entre presos comuns e presos especiais, mormente

quando fulcrada no grau de escolaridade (art. 295, VII, Código de Processo Penal) parece ferir

o princípio da igualdade e revelar uma confissão estatal no sentido de que nossos

estabelecimentos prisionais devem ser destinados às classes sociais menos favorecidas, o que

indicaria ainda a seletividade do sistema penal.314

Convém registrar que o preso provisório não pode ser confundido com o preso

especial. Isso porque os presos provisórios, que conservam essa distinção até que sobrevenha

a condenação com trânsito em julgado, possuem direito de cumprir prisão cautelar em cela

distinta dos presos que já contarem com condenação definitiva, podendo, entretanto, “[...]

perfeitamente ficar segregados no mesmo estabelecimento dos condenados definitivos, mas

em galerias ou celas distintas [...].”315

Já, os presos especiais, em regra, deverão ser mantidos em estabelecimento

diverso daquele destinado aos presos comuns. Apenas na falta desse estabelecimento

diferenciado é que poderão ser conservados no mesmo estabelecimento dos presos comuns,

porém, em cela distinta dos demais presos, sejam estes provisórios ou com condenação

definitiva, conforme disposto nos parágrafos 1º e 2º do art. 295 do Código de Processo

Penal.316

De outra banda, a separação do preso provisório em relação ao preso com

condenação definitiva, restou enfatizada com a lei 12.403/11, que alterou o art. 300 do Código

de Processo Penal, assim preconizando: “Art. 300. As pessoas presas provisoriamente ficarão

separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da lei de execução

penal.”317

em:<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaNormas.action?numero=7172&tipo_norma=LEI&data=19831214&link=s>. Acesso em: 08 de março de 2013. 314 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 568. 315 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 65. 316 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 317 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013.

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Nos termos do parágrafo único do art. 300 do Código de Processo Penal: “o

militar preso em flagrante delito, após a lavratura dos procedimentos legais, será recolhido a

quartel da instituição a que pertencer, onde ficará preso à disposição das autoridades

competentes.”318

4.8.1.1 Prisão domiciliar – Lei 5.256/67

Não havendo estabelecimento adequado ao recolhimento do preso que possui

direito à prisão especial, a Lei 5.256/67 estabelece que o mesmo poderá cumpri-la na sua

própria residência:

Art. 1º Nas localidades em que não houver estabelecimento adequado ao recolhimento dos que tenham direito à prisão especial, o juiz, considerando a gravidade e as circunstâncias do crime, ouvido o representante do Ministério Público, poderá autorizar a prisão do réu ou indiciado na própria residência, de onde o mesmo não poderá afastar-se sem prévio consentimento judicial.319

Todavia, parece que a Lei 10.258/11, que modificou o Código de Processo Penal

nessa parte da prisão especial, acabou esvaziando o conteúdo da Lei 5.256/67, porque

determinou que não havendo estabelecimento específico para o preso especial, este pode ser

“recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento”, nos termos do parágrafo 2º do art.

295 do Código de Processo Penal.320

Nesse contexto, parece que a prisão domiciliar só poderia ser concedida ao preso

especial se, além da falta de estabelecimento distinto da prisão comum, também não existisse

cela distinta do mesmo estabelecimento, em uma interpretação teleológica, ou seja, que busca

a finalidade da norma.

318 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 319 BRASIL. Lei n. 5.256, de 06 de abril de 1967, dispõe sobre a prisão especial. Disponível em: http://www010.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/1967/5256.htm. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 320 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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4.8.1.2 Sala de Estado-Maior

Algumas categorias profissionais possuem direito ao cumprimento da prisão

cautelar em um compartimento mais especial do que aquele destinado ao cumprimento da

prisão especial anteriormente prevista, as chamadas “salas de Estado-Maior”.

Conforme já ventilado anteriormente, possuem direito à sala de Estado-Maior os

membros do Ministério Público (art. 40, inc. V, da Lei n. 8.625/93, e Lei Complementar n.

75/93, em seu art. 18, inc. II, alínea “e”), membros do Poder Judiciário (art. 33, da Lei

Complementar n. 35/79), membros da Defensoria Pública (art. 44, inc. III, e art. 128, da Lei

Complementar n. 80/94), e advogados (de acordo com o art. 7º, inc. V da Lei 8.906/94).321

A prisão especial não é o mesmo que sala de Estado Maior, esta, podemos dizer,

especialíssima, em relação àquela.

A definição do que vem a ser sala de Estado-Maior não foi elucidada pelo

legislador. Assim, o órgão Pleno do Supremo Tribunal Federal, por meio do julgamento da

Reclamação 4535/ES, ocorrido em 07/05/2007, que contou com a relatoria do Ministro

Sepúlveda Pertence, sedimentou o conceito de sala de Estado-Maior, nos seguintes termos:

[...] 1. Por Estado-Maior se entende o grupo de oficiais que assessoram o Comandante de uma organização militar (Exército, Marinha, Aeronáutica, Corpo de Bombeiros e Polícia Militar); assim sendo, “sala de Estado-Maior” é o compartimento de qualquer unidade militar que, ainda que potencialmente, possa por eles ser utilizado para exercer suas funções. 2. A distinção que se deve fazer é que, enquanto uma “cela” tem como finalidade típica o aprisionamento de alguém – e, por isso, de regra contém grades -, uma “sala” apenas ocasionalmente é destinada para esse fim. 3. De outro lado, deve o local oferecer “instalações e comodidades condignas”, ou seja, condições adequadas de higiene e segurança.322

De outro lado, a ideia de que uma sala de Estado-Maior não poderá conter grades,

já não prevalece, segundo julgado proferido pelo órgão Pleno do Supremo Tribunal Federal,

sendo indispensável para a sua configuração, ao que parece, somente que o compartimento

321 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 845. 322 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação n. 4535 / ES - Espírito Santo. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Julgamento: 07/05/2007. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28reclama%E7%E3o+4535+pertence%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/aryjryz>. Acesso em: 07 de março de 2013.

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seja de qualquer unidade Militar, e atenda às condições de salubridade, luminosidade e

ventilação.323

O art. 7º, que proclama os direitos do advogado, confere ao mesmo, no inc. V da

Lei 8.906/94, o direito de cumprir prisão provisória em sala de Estado Maior (registre-se que

a expressão, assim reconhecidas pela Ordem dos Advogados do Brasil, foi liminarmente

suspensa pela Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1127/8), de maneira que, não havendo

possibilidade de cumprir-se tal determinação, o advogado deve contar com o direito à prisão

domiciliar.324

Conforme elucidado anteriormente, muito embora a Lei 10.258/01 tenha

modificado substancialmente o regramento da prisão especial, uma vez que inseriu vários

parágrafos ao art. 295 do Código de Processo Penal, possibilitando que a forma de

cumprimento da prisão especial consista apenas em simples cela separada ou até mesmo em

alojamento coletivo, a previsão de Sala de Estado Maior aos advogados permanece intacta.

Isso porque o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil constitui Lei especial em relação

ao Código de Processo Penal e, utilizando-se o critério de resolução de antinomias, conforme

é sabido, a lei especial prevalece sobre a geral.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, por meio do “habeas corpus” n.

109213, proveniente de São Paulo, de relatoria do Ministro Celso de Mello, julgado em

28.08.2012, registrou que o advogado possui direito de cumprir a prisão cautelar em

estabelecimento considerado sala de Estado-Maior e, na sua falta, em prisão domiciliar, em

vista da especialidade do Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906/94) em relação à Lei 10.258/01,

que alterou o art. 295 do Código de Processo Penal.325

323 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação n. 6387 / SC – Santa Catarina. Reclamação. Relator(a): Min. Ellen Gracie. Julgamento: 23/10/2008 Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28reclama%E7%E3o+6387%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/b5m5m9t>. Acesso em: 10 fevereiro de 2013. 324 BRASIL. Lei n. 8.906, de 04 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8906.htm>. Acesso: 24 de janeiro de 2013. 325 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 109213 / SP – São Paulo. Relator(a): Min. Celso de Mello. Julgamento: 28/08/2012. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28109213+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/aszp7ey>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.

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4.9 BANCO NACIONAL DE PRISÕES

A Lei 12.403/11 determinou a criação de um banco de dados de mandados de

prisão para registrar as prisões decretadas em todo território nacional, a ser constantemente

atualizado pelo Poder Judiciário, de acordo com o art. 289-A do Código de Processo Penal.

Registre-se, ainda, que conforme determina a Lei, este banco nacional de prisões deve ser

regulamentado e mantido pelo Conselho Nacional de Justiça, o que já ocorreu por meio da

Resolução n. 137, de 13 de julho de 2011.326-327

Assim, os Tribunais do País restaram com a incumbência de alimentar referido

sistema, a fim de propiciar-se que, por exemplo, um policial do Estado de Santa Catarina,

possa cumprir um mandado de prisão expedido pelo Poder Judiciário do Ceará, bastando a

mera consulta sobre os mandados de prisão em aberto.

Sem sombra de dúvidas, este sistema permite a integração das informações quanto

aos indivíduos que possuem mandados de prisão em aberto, facilitando a efetiva aplicação da

lei penal, uma vez que, em muitos casos, esses indivíduos se encontram foragidos.

Parece que deve ser conferida interpretação extensiva ao art. 289-A do Código de

Processo Penal, para que as medidas cautelares diversas da prisão eventualmente impostas

pelo juiz, inseridas no sistema processual penal pela Lei 12.403/11, também possam ser

incluídas no referido cadastro nacional, mantido pelo Conselho Nacional de Justiça, a fim de

propiciar-se efetiva fiscalização.328

Assim, por exemplo, se o juiz determinasse ao imputado a medida cautelar de

proibição de ausentar-se da Comarca,

[...] Seria extremamente válido e importante que essa decisão também fosse incluída mo cadastro do Conselho Nacional de Justiça, possibilitando que autoridades policiais ou judiciais de outras Comarcas ou de outras unidades federativas tivessem conhecimento das restrições impostas ao agente, auxiliando seu cumprimento e fiscalização.329

326 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 327 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução n. 66, de 27 de janeiro de 2009. Cria mecanismo de controle estatístico e disciplina o acompanhamento, pelos juízes e Tribunais, dos procedimentos relacionados à decretação e ao controle dos casos de prisão provisória. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/323-resolucoes/12180>. Acesso em: 20 de fevereiro de 2013. 328 Será discorrido sobre as medidas cautelares pessoais diversas da prisão, advindas da Lei 12.403/11, a partir do item 6. 329 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 986.

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De outro lado, o cadastro de quaisquer medidas e, em especial, dos mandados de

prisões realizados neste sistema nacional, deve ocorrer de forma cautelosa, com informações

precisas, evitando-se, assim, providências e prisões indevidas.

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5. O INSTITUTO DA LIBERDADE PROVISÓRIA DIANTE DA LEI 12.403/11

Há muito tempo, a doutrina reclamava um tratamento sistemático da liberdade

concedida durante o processo, ao preso em flagrante, eis que o Código de Processo Penal em

muitos pontos não se coadunava com os princípios constitucionais mais diretamente ligados

ao tema, sobretudo em relação à proporcionalidade e presunção de inocência.

Assim, a Lei 12.403/11 melhor alinhou o instituto da liberdade provisória à

Magna Carta, dando uma maior coerência ao sistema, especialmente, porque, o Código de

Processo Penal passou a enfatizar em diversos dispositivos legais, a regra da liberdade durante

o processo, sendo a prisão medida extrema e excepcional.

5.1 CONCEITO E FINALIDADE

Conforme já observado alhures, vivemos o ranço de um modelo de processo penal

preconizado desde as Ordenações do Reino, que estabelecia, a partir de uma situação de

flagrante delito, a regra da prisão durante o processo, para propiciar a presença do réu em seu

julgamento. Ou seja, a presunção durante o processo era de culpabilidade, de forma que,

excepcionalmente, e sob várias condições, poderia ser concedido ao réu o direito de responder

ao processo em liberdade, daí o vocábulo liberdade provisória.

De plano, vê-se, então, que o vocábulo liberdade provisória, em verdade, afigura-

se inadequado dentro da sistemática constitucional de 1988, porque a prisão durante o

processo é que se constitui em providência provisória, e não a liberdade, que é a regra, em

vista do princípio constitucional da presunção de inocência.

Todavia, a própria Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 utiliza

a terminologia liberdade provisória quando proclama a excepcionalidade da prisão cautelar,

no art. 5º, inc. “LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a

liberdade provisória, com ou sem fiança.”330

O Código de Processo Penal, mesmo com o advento da Lei 12.403/11, manteve o

vocábulo liberdade provisória (art. 310, inc. III), não obstante tenha mencionado a fiança no

rol das medidas cautelares pessoais descarcerizadoras (art. 319).331

330 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 331 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade

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Quando concedida ao preso a possibilidade de responder ao processo em

liberdade, parece mais adequado falar-se apenas em concessão de liberdade, que pode vir

acompanhada, ou não, de medida cautelar, disposta nos art. 319 ou 320 do Código de

Processo Penal.332

Fernandes, embora por motivo diverso, também considera a expressão liberdade

provisória inadequada, porque, na sua concepção, não somente aquele que foi preso

processualmente e teve a restauração de sua liberdade poderá vê-la revogada, mas também

todo aquele “submetido a processo criminal tem uma liberdade provisória, eis que poderá vir

a ser preso em virtude de preventiva ou de condenação.”333

Observa ainda o mesmo autor que a Magna Carta de 1988 e o Código de Processo

Penal não empregaram a terminologia em questão com esse sentido. Isso porque a liberdade

provisória, à luz da Lei Maior e do Código de Processo Penal, é a liberdade concedida àquele

que se encontrava preso em flagrante, e por isso mesmo é que impõe ao acusado a sujeição a

certas condições, que se, descumpridas, podem culminar com a necessidade de decretação de

uma prisão cautelar. Assim, seguindo a acepção atribuída pelo Código de Processo Penal e

pela Lei Maior, no tocante à liberdade provisória, esta constitui um benefício que garante ao

investigado ou acusado que experimentou prisão provisória o direito de responder ao processo

penal em liberdade, até que sobrevenha a sentença penal com trânsito em julgado, quando

substituirá aquela, podendo confirmar a liberdade do imputado, no caso de absolvição ou de

extinção da punibilidade, ou impor uma pena, privativa de liberdade ou alternativa.334

A regra é que os acusados da prática de um crime possam responder ao processo

em liberdade, mesmo se tiverem sido presos em flagrante delito, porque à luz da Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988, a prisão em flagrante, por si só, não se mantém,

sendo indispensável a averiguação da necessidade de manutenção da medida, com base em

elementos concretos do processo, autorizadores da prisão preventiva (art. 311 ao 313 do

Código de Processo Penal).

provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 332 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 333 FERNANDES, Antonio |Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 311. 334 FERNANDES, Antonio |Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 311.

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A Magna Carta de 1988, preconiza em seu art. 5º, inc. LIV que “ninguém será

privado da liberdade ou de seus bens, sem o devido processo legal.” Dessa norma e daquela

disposta no já citado inc. LXVI do art. 5º, advém a consequência de que a liberdade provisória

constitui um direito público subjetivo do preso, sendo obrigatória a sua concessão quando

presentes as condições legais.335

A liberdade provisória visa substituir a prisão provisória e, quando concedida, em

regra, vincula o imputado a certas condições legais. É que, conforme observa, Marques da

Silva e Freitas:

É a situação do agente, que, embora livre, fica vinculado a certas condições legais. Tem liberdade de locomoção, mas preso a certas obrigações processuais. Não goza de plenitude libertária, e nem poderia ser diferente, porquanto responde a um processo e deve satisfações à justiça.336

De outro lado, registre-se que se afigura possível que o preso em flagrante seja

solto pelo magistrado sem a determinação de qualquer medida cautelar prevista dentre os arts.

319 e 320 do CPP, à luz do que dispõe o art. 283, parágrafo 1º do Código de Processo Penal:

“[...] § 1o As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for

isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade.” Ademais, o

art. 321 do Código de Processo Penal estabelece que o juiz, somente se averiguar a

necessidade, imporá medida cautelar juntamente com a concessão da liberdade provisória,

obedecendo aos critérios do art. 282 do mesmo código.337

A finalidade da liberdade provisória é a substituição da prisão processual, quando

não estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva.

Para o cabimento da liberdade provisória, a prisão processual precisa ser legal,

porém, a sua manutenção, desnecessária. Para toda e qualquer prisão ilegal, diferentemente,

caberá o seu relaxamento, nos moldes do que preconiza o art. 5º, inc. LXV da Lei Maior.338

335 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 336 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 475. 337 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 298-299. 338 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.

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O instituto da liberdade provisória se mostra incompatível com a prisão

preventiva ou com a prisão temporária, porquanto nestas prisões existe a necessidade de

segregação cautelar, “sendo incompatível transformá-la ou subrogá-la em direito de

liberdade.”339

5.2 CABIMENTO

Na sistemática atual, após várias reformas realizadas no Código de Processo

Penal, especialmente em vista da Lei 12.403/11, que procurou adequar a lei

infraconstitucional à Lei Maior, pode-se asseverar que, em linhas gerais, a liberdade

provisória mostra-se cabível quando não presentes as condições que autorizam a decretação

da prisão preventiva.

Antes mesmo das recentes alterações no Código de Processo Penal, a doutrina e a

jurisprudência já proclamavam que a liberdade provisória seria o contraponto da prisão

preventiva, e que seu cabimento deveria ser analisado caso a caso. Assim, quando presentes

no caso concreto os pressupostos fáticos (art. 312 do Código de Processo Penal) e de direito

(art. 313, do mesmo código) autorizadores da prisão preventiva, e não se mostrar cabível a

aplicação de qualquer das medidas cautelares diversas da prisão, a segregação cautelar se

impõe. “A contrario sensu”, não estando presentes as condições que autorizam a prisão

preventiva, a concessão da liberdade provisória deve prevalecer.

De outro lado, nesse contexto, não se olvide que várias leis esparsas vedam pura e

simplesmente a concessão da liberdade provisória para determinados crimes, com ou sem

fiança. Existem ainda os crimes considerados inafiançáveis pela Lei Maior (art. 5º, incs. XLII,

XLIII e XLIV) e pela Lei 8.0872/90.340-341

Todavia, ainda assim parece que a doutrina e a jurisprudência mais acertadas são

aquelas que preconizam a excepcionalidade da prisão cautelar, a despeito de algumas leis

vedarem a liberdade provisória e/ou a fiança, devendo a análise quanto à possibilidade da

liberdade provisória ocorrer caso a caso, à luz das condições que autorizam a prisão

339 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 475. 340 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 341 BRASIL. Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8072.htm>. Acesso em: 10 de março de 2013.

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preventiva, o que, salvo melhor juízo, é a interpretação que mais se coaduna com a Lei Maior,

especialmente, no tocante à presunção de inocência.342

5.2.1 A discussão sobre a inafiançabilidade e a proibição da liberdade provisória

Muito tormentosa é a questão da concessão de liberdade provisória em crime

hediondo ou a ele equiparado. Isso porque a Constituição da República Federativa do Brasil

de 1988, em seu art. 5º, inc. XLIII, grava tais crimes com a cláusula de inafiançabilidade: “a

lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o

tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes

hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se

omitirem.”343

Na dicção constitucional, então, a lei ordinária deve não apenas definir os crimes

hediondos, mas também caminhar na linha da proibição da fiança. Todavia, conforme

ventilado acima, a Lei Maior já gravou com a cláusula da inafiançabilidade alguns crimes,

considerados equiparados a hediondos, quais sejam: tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e

o terrorismo, o que a lei ordinária não poderá modificar. O inc. XLII do art. 5º da Magna

Carta de 1988 considera a prática de racismo também crime inafiançável, não sendo possível,

da mesma forma, que lei infraconstitucional estabeleça diferentemente. Igualmente, a ação de

grupos armados, civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático

também é considerada pela Lei Maior crime inafiançável (art. 5º, inc. XLIV).344

Por serem inafiançáveis tais crimes, seriam também insucetíveis de liberdade

provisória?

Muito já se sustentou que a inafiançabilidade traduz não apenas a impossibilidade

de o réu livrar-se da prisão no transcorrer do processo por meio da entrega ao Estado de

valores ou bens representativos da fiança, mas também na vedação da própria liberdade

provisória. Ou seja, para alguns, a inafiançabilidade cominada a determinados delitos seria

342 Como exemplo de lei que veda a liberdade provisória, com ou sem fiança, tem-se a Lei 9.034/95, que em seu art. 7º, assim prevê: “Não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa.” (BRASIL, 1995). 343 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 344 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.

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sinônimo de vedação também à liberdade provisória, porque se nem “pagando” o réu poderia

ter a sua liberdade restaurada durante o processo, não teria lógica poder ser agraciado com a

sua liberação sem qualquer pagamento.

Todavia, parece que a Lei Maior quer estabelecer, quando menciona a

inafiançabilidade a alguns crimes, que o sistema processual penal não poderá admitir

situações de liberdade provisória em que os vínculos do imputado sejam menos gravosos do

que a fiança, sob pena de subverter-se o modelo constitucional.345

Dentro dessa visão, os acusados da prática de crimes inafiançáveis não poderiam

ter a concessão de liberdade provisória nem mediante o arbitramento de fiança, nem, muito

menos, sem a imposição de qualquer vínculo. De outro lado, poderiam ser beneficiados com a

liberdade provisória vinculada a obrigações mais severas que a fiança, o que parece ter sido

bastante possibilitado com o advento da Lei 12.403/11, que trouxe diversas medidas

cautelares diversas da prisão, algumas seguramente mais graves do que o instituto da fiança,

como por exemplo, a suspensão de atividade laboral e, quiçá, a monitoração eletrônica.346

Na mesma senda, é o entendimento de Fernandes sobre a concessão de liberdade

provisória em crimes hediondos ou a ele equiparados:

O juiz não pode, em casos de flagrante por tais crimes realizar juízo amplo de necessidade de medida cautelar, pois fica impedido de conceder liberdade provisória com fiança. Admitir liberdade provisória com restrição menos grave do que a fiança significaria desprezar a vedação constitucional e o artigo 323, do CPP. Todavia, não se pode excluir liberdade provisória com medida cautelar de maior gravidade, como, por exemplo, as medidas de recolhimento domiciliar, de monitoração eletrônica (art. 319, incisos V, VI, IX) ou, até mesmo, a prisão domiciliar do artigo 318. Não há, por isso, necessidade de, nesses casos, ser sempre a prisão em flagrante convertida em preventiva. Isso ocorrerá se não for adequada a concessão de medida cautelar mais grave do que a fiança.347

De qualquer forma, atrelado a este problema, ainda existe a discussão sobre a

possibilidade ou não de a lei ordinária vedar a liberdade provisória para alguns crimes.

Defendendo a possibilidade disso ocorrer, tem-se: 345 ROCHA, Luiz Otavio de Oliveira; BAZ, Marco Antonio Garcia. Fiança Criminal e Liberdade Provisória. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 72. 346 BRASIL. Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12403.htm>. Acesso em: 09 de março de 2013. 347 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 323.

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A constituição não proibiu a vedação de toda e qualquer espécie de liberdade provisória pelo legislador ordinário. A lei ordinária excepcionalmente pode vedar qualquer espécie de liberdade provisória, caso em que o acusado deverá de aguardar preso o desfecho do processo.348

Isso porque a Constituição da República Federativa do Brasil, no art. 5º, inc.

LXVI, assim dispõe: “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a

liberdade provisória, com ou sem fiança.”349

Ou seja, em uma interpretação literal de tal norma, parece que a Lei Maior

conferiu ao legislador ordinário a possibilidade deste optar pela vedação ou não da liberdade

provisória em certos crimes, observando os valores tutelados constitucionalmente.

Alguns proclamam que o direito à liberdade provisória não é absoluto, sendo

admitido, portanto, que o legislador disponha a respeito. Nesse sentido:

Se é correto que há preceito constitucional a ditar que ninguém será privado da liberdade sem o devido processo legal (art. 5º, LIV), também é certo que a prisão em flagrante ou decorrente de prisão preventiva está constitucionalmente permitida (art. LXI). Daí não ser inconstitucional a proibição de liberdade provisória com ou sem fiança nos crimes tratados na Lei 8072/90 [...].350

Já as Constituições passadas faziam referência à lei para a regulação do cabimento

ou não da liberdade provisória, o que, de certa forma, trazia vagueza à norma

constitucional.351

Todavia, salvo melhor juízo, a sustentação de que o legislador ordinário poderia

vedar a liberdade provisória se apresenta cada vez mais vencida diante dos posicionamentos

em sentido contrário, explanados tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência.

Isso porque tem sido asseverado que a vedação automática, apriorística, pura e

simples da liberdade provisória viola o princípio da presunção de inocência, haja vista que

cria uma espécie de prisão preventiva obrigatória. Assim, o cabimento ou não da benesse deve

348 ROCHA, Luiz Otavio de Oliveira; BAZ, Marco Antonio Garcia. Fiança Criminal e Liberdade Provisória. 2ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 72. 349 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 350 ROCHA, Luiz Otavio de Oliveira; BAZ, Marco Antonio Garcia. Fiança Criminal e Liberdade Provisória. 2ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 73. 351 PONTES DE MIRANDA, apud FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 312.

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ser decidido pelo juiz caso a caso, sempre à luz das condições que autorizam a prisão

preventiva.

Ademais, não se pode olvidar que atualmente vivemos sob o “Império da

Constituição” e não mais, pura e simplesmente, sob o auspício da literalidade da lei. O

Direito, sob essa nova ótica, precisa ser constantemente construído, e não meramente

aplicado, sem apreensão dos valores tutelados pela Lei Maior.

Tem sido registrado também pela doutrina e pelos tribunais que a fundamentação

judicial sobre a prisão deve ser lastreada em elementos concretos, não sendo admitidas meras

abstrações, desvinculadas da situação extraída dos autos. Ademais, a gravidade abstrata do

crime, por si só, não tem autorizado a prisão cautelar.352-353

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal sedimentou entendimento no

sentido de que, em se tratando de crime hediondo ou a ele equiparado, não cabe liberdade

provisória nem com, nem sem fiança, já que a Magna Carta de 1988, ao proibir a fiança a tais

delitos, implicitamente também proibiu a liberdade provisória, não sendo admitido ao

legislador ordinário autorizá-la.354

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, no “habeas corpus” n. 109236,

proveniente de São Paulo, de relatoria da Ministra Carmen Lúcia, julgado em 13.12.2011,

proclamou que o fato de a Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos) ter sofrido reforma

ditada pela Lei 11.464/07, a qual retirou a vedação à liberdade provisória aos respectivos

delitos, permanecendo a inafiançabilidade, não indica que a liberdade durante o processo aos

respectivos infratores restou possibilitada, uma vez que a referida reforma só veio corrigir

uma redundância contida na Lei, já que inafiançabilidade indica também a impossibilidade de

liberdade provisória.355

352 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Habeas Corpus 2012.087493-8 (Acórdão). Relator: Leopoldo Augusto Brüggemann. Orgão Julgador: Terceira Câmara Criminal Origem: Palhoça. Julgado em: 15/01/2013. Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/avancada.jsp#resultado_ancora>. Acesso em 07 de março de 2013. 353 SANTA CATARINA.Tribunal de Justiça. Recurso em Sentido Estrito n. 2012.053325-2. Relator: Moacyr de Moraes Lima Filho Origem: Capital. Orgão Julgador: Terceira Câmara Criminal Julgado em: 16/10/2012. Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/avancada.jsp#resultado_ancora. Acesso em: 08 de março de 2013. 354 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 101503 / RJ – Rio de Janeiro. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgamento: 10/08/2010. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+101503+%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/a767sjq.> Acesso em: 07 de março de 2013. 355 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 109236 / SP – São Paulo. Relator(a): Min. Carmen Lúcia. Julgamento: 13/12/2011. Disponível em: <

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Em sentido oposto é a jurisprudência formada pela Segunda Turma do Supremo

Tribunal Federal, a exemplo da decisão proferida no “habeas corpus” n. 92751 de São Paulo,

de relatoria do Ministro Celso de Mello, julgado em 09/08/2011 e publicado em 23-10-

2012.356

No mesmo julgado acima mencionado, várias outras questões são postas como

fatores que, por si sós, não autorizam a prisão preventiva, como o clamor social, a preservação

da credibilidade das instituições, tendo sido, ademais, registrada a sempre excepcionalidade

da prisão cautelar.

Alinhada ao entendimento da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal foi a

decisão proferida por seu órgão Pleno, que considerou inconstitucional a vedação genérica,

abstrata e apriorística da liberdade provisória no crime de tráfico ilícito de entorpecentes,

contida no art. 44 da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas). Neste sentido, tem-se:

EMENTA: Habeas corpus. 2. Paciente preso em flagrante por infração ao art. 33, caput, c/c 40, III, da Lei 11.343/2006. 3. Liberdade provisória. Vedação expressa (Lei n. 11.343/2006, art. 44). 4. Constrição cautelar mantida somente com base na proibição legal. 5. Necessidade de análise dos requisitos do art. 312 do CPP. Fundamentação inidônea. 6. Ordem concedida, parcialmente, nos termos da liminar anteriormente deferida.357

Ou seja, na referida decisão, prevaleceu o entendimento de que a segregação

cautelar mantida apenas com base na vedação legal da liberdade provisória, considerada

inconstitucional, não é o bastante para “segurar” o imputado na prisão cautelar, sendo

imprescindível a existência das condições que autorizam a prisão preventiva, sob pena de

violação à Magna Carta.

Antes de tal decisão, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por meio do

julgamento proferido no “habeas corpus” n. 944078/MG, de relatoria do Ministro Eros Grau,

julgado em 05.02.2009, sedimentou a inconstitucionalidade da execução provisória da pena,

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+109236%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/cnrxk65>. Acesso em: 09 de março de 2013. 356 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 92751/ São Paulo. Relator: Min. Celso de Mello. Julgamento: 09/08/2011. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+92751%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/a4wvz62. Acesso em: 05 de março de 2013. 357 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 104.339 / SP –São Paulo. Habeas Corpus. Relator(a): Min. Gilmar Mendes. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Julgamento: 10/05/2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28pleno+104339+gilmar+mendes+habeas+corpus%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/bkxv5aq. Acesso em: 03 de março de 2013.

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asseverando que o fato de o acusado ter respondido ao processo preso, não significa que

deverá permanecer nesta situação automaticamente, diante de sentença ou acordãos

condenatórios recorríveis.358

A polêmica a respeito do cabimento ou não da liberdade provisória em crime

hediondo ou equiparado ainda não cessou, uma vez que a decisão no “habeas corpus” antes

referido (n. 104.339, de São Paulo, proferido pelo órgão Pleno do Supremo Tribunal Federal),

que considerou inconstitucional a vedação da liberdade provisória na Lei de Drogas foi

proferida de forma incidental, em controle difuso de constitucionalidade, valendo a decisão,

portanto, apenas “inter partes”.

Ademais, o assunto ainda está pendente de análise pelo Supremo Tribunal

Federal, diante de repercussão geral359 atribuída em recurso extraordinário.360

Não obstante, conforme já ventilado alhures, somos contrários à vedação

legislativa da liberdade provisória para qualquer crime, mas o juízo de cautelaridade, em se

tratando de crime hediondo ou a ele equiparado, ou mesmo em relação aos crimes

inafiançáveis estabelecidos pela Magna Carta, é restrito, eis que não poderá ser determinada a

medida cautelar de fiança, nem tampouco outra providência menos gravosa do que esta, como

a liberdade plena, sem qualquer condição imposta.361

358 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 944078/ Minas Gerais. Relator: Min. Eros Grau. Julgamento: 05.02.2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28habeas+corpus+84078+eros+grau+2009%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/bzpno2x.>. Acesso em: 04 de março de2013. 359 O requisito da repercussão geral consta no parágrafo 3º do art. 102 da Magna Carta de 1988, e foi inserido pela Emenda Constitucional n. 45 de 2004. A partir de então, qualquer recorrente que interpor recurso extraordinário ao STF, ainda que a matéria seja penal, deverá demonstrar: “art. 102 [...]§ 3º [...] a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.” Ou seja, as questões levantadas no recurso devem transcender os limites subjetivos da demanda, devendo representar temas afetos ao Direito Constitucional com relevância política, social, econômica ou jurídica. (BRASIL, 1988). 360 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 601384 RG / RS – Rio Grande do Sul. Repercussão Geral no Recurso Extraordinário. Relator: Min. Marco Aurélio. Julgamento: 10/09/2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28601384+repercuss%E3o+geral+rio+grande+do+sul%29&base=baseRepercussao&url=http://tinyurl.com/ap3fy4d>. Acesso em: 03 de março de 2013. 361 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 324.

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5.3 ESPÉCIES

A liberdade provisória, após a reforma, restou configurada da seguinte forma: a)

“liberdade provisória plena” – quando o juiz verifica o cabimento da liberdade plena, sem

cumulá-la com qualquer outra providência cautelar, nem mesmo a fiança, nos termos da

opção trazida pelo inc. III do art. 310 do Código de Processo Penal; b) “liberdade provisória

cumulada com outra medida cautelar” – quando o juiz concede a benesse com a imposição de

uma ou mais medidas cautelares, nos moldes do art. 319 e 320 do Código de Processo Penal.

c) “liberdade provisória excepcional” – quando o juiz detecta que o imputado praticou o delito

acobertado por uma das excludentes de ilicitude, dispostas no art. 23 do Código Penal,

devendo, então, conceder a liberdade, mediante termo de compromisso de comparecimento a

todos os atos processuais, sob pena de revogação, nos moldes do parágrafo único do art. 310

do Código de Processo Penal; d) “liberdade provisória especial” – aquela concedida quando o

juiz detecta que seria o caso de se arbitrar fiança, mas, em face da pobreza experimentada

pelo réu, deve a medida ser concedida sem fiança, devendo, no entanto, ser imposta as

obrigações previstas nos arts. 327 e 328 do Código de Processo Penal.362

Registre-se, que o juiz poderá conceder liberdade provisória sem a imposição de

ônus ao imputado, mesmo na hipótese do parágrafo único do art. 310 do Código de Processo

Penal, não sendo sempre obrigatório que determine o compromisso de comparecimento a

todos os atos do processo, sobretudo porque o art. 282 do mesmo código rege todo o sistema

das medidas cautelares de natureza pessoal, elucidando que a medida cautelar somente deverá

ser aplicada se necessária e adequada à situação em concreto.363

Nesse sentido, explica Fernandes que os critérios do art. 282 do Código de

Processo Penal:

[...] Rege todo o sistema de cautelaridade pessoal; assim, somente será aplicada medida cautelar se necessária para aplicação da lei penal, para a investigação ou para a instrução criminal, e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais. O mesmo pode acontecer na hipótese do art. 310, par. único, do CPP, também regido pelo art. 282,

362 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 476. 363 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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mesmo porque ficaria sem sentido, exatamente quando existente causa excludente de ilicitude, impor sempre limitação ao liberado.364

A concessão da liberdade provisória, no contexto dos crimes de menor potencial

ofensivo (delitos com pena máxima não superior a dois anos de privação de liberdade e todas

as contravenções penais), afigura-se obrigatória, desde que o infrator assine um termo de

compromisso de comparecimento ao Juizado Especial, não podendo ser imposta sequer

fiança, nos termos do que dispõe o parágrafo único do art. 69 da Lei 9.099/95:

Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima.365

Dessa forma, a liberdade provisória na hipótese de crime de menor potencial

ofensivo, não foi afetada pela Lei 12.403/11, de maneira que a liberdade, ora mencionada,

deve ser concedida pela própria Autoridade Policial, após a assinatura pelo infrator, do termo

de compromisso de comparecimento ao Juizado Especial Criminal.

364 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 298-299. 365 BRASIL. Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 08 de março de 2013.

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6 AS MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS DIVERSAS DA PRISÃO ADVINDAS DA

LEI 12.403/11

A Lei 12.403/11 introduziu imensa alteração na cautelaridade pessoal do processo

penal, sobretudo porque passou a prever providências antes não contempladas no Código de

Processo Penal, passíveis de aplicação durante o processo. Se antes o Código de Processo

Penal permitia, apenas a liberdade ou a prisão durante o processo, após a reforma várias

outras alternativas menos gravosas do que a prisão, as quais podemos intitular de medidas

descarcerizadoras ou cautelares não prisionais, se afiguraram possíveis de serem impostas, em

uma ótica de resguardo da liberdade, mas também de tutela do “jus puniendi” do Estado.

As medidas cautelares estabelecidas no Brasil pela reforma em questão, basearam-

se nas intituladas “medidas de coacção” do Código de Processo Penal Português, conforme

pode ser observado da leitura de seu art. 197 e seguintes. Tais providências cautelares

portuguesas, a seu turno, foram inspiradas no Código de Processo Penal Italiano, nos termos

do seu art. 280 e seguintes.366

As medidas cautelares diversas da prisão trazidas pela reforma, estão previstas

entre os arts. 319 e 320 do Código de Processo Penal. Salvo melhor juízo, o art. 318 do

Código de Processo Penal não contemplou propriamente uma medida cautelar diversa da

prisão, mas sim, uma forma de abrandamento no cumprimento da prisão preventiva, conforme

já exposto anteriormente.367

Contudo, antes de adentrar-se na análise de cada uma das medidas cautelares

descarcerizadoras, deve-se discorrer sobre os critérios gerais para a sua aplicação, sem os

quais, a providência não poderá ser imposta.

6.1 REGRAS E CRITÉRIOS GERAIS PARA IMPOSIÇÃO DAS MEDIDAS

CAUTELARES INTRODUZIDAS PELA LEI 12.403/11

O art. 282 do Código de Processo Penal prevê que as medidas cautelares

alternativas à prisão devam ser aplicadas com observância da “I - necessidade para aplicação

da lei penal, para a investigação ou instrução criminal e, nos casos expressamente previstos,

366 FRANCO, Paulo. Prisão, Liberdade e Medidas Cautelares. Campo Grande: Contemplar, 2011, p. 37. 367 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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para evitar a prática de infrações penais”; e “II – adequação da medida à gravidade do crime,

circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.”368

A necessidade aqui, aventada, está ligada à aplicação da lei penal, ou seja, ao

indispensável asseguramento da efetivação da penalidade a ser imposta na sentença definitiva.

Relaciona-se, ainda, com a indispensabilidade de que a investigação ou instrução criminal não

sejam frustradas, bem como com a prevenção da prática de delitos. A adequação da medida

liga-se à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do suposto infrator.

Assim, a medida cautelar alternativa, para que possa ser determinada, deve atender aos

referidos critérios.

Conforme pontua Fabio Delmanto, os critérios da necessidade e da adequação não

poderiam ser deixados de lado pelo legislador, especialmente diante da obrigatoriedade de

observância do princípio da proporcionalidade, o qual decorre de uma série de princípios e

garantias constitucionais, mormente do princípio do devido processo legal. Todavia, o mesmo

autor critica a redação atribuída ao art. 282 do Código de Processo Penal, uma vez que não

estaria exigindo para a imposição das medidas cautelares diversas da prisão, a presença do

“fumus comissi delicti”, que se traduz em prova da materialidade e indício suficiente de

autoria.369

Entretanto, em uma interpretação sistemática370 e constitucional do Código de

Processo Penal, vê-se que as medidas cautelares pessoais diversas da prisão não dispensam

para a sua aplicação a existência de prova da materialidade e indício suficiente de autoria, ou

seja, o chamado “fumus comissi delicti”, porque, se assim não for, estará sendo admitida a

imposição de ônus ao indiciado ou acusado, sem requisitos cautelares.

Lopes Jr. observa que as medidas cautelares pessoais diversas da prisão só podem

ser determinadas quando presentes os fundamentos da prisão preventiva, uma vez que, sendo

medidas cautelares, devem contar com a presença do “fumus comissi delicti” e “periculum

libertatis”. Entretanto, em vista da proporcionalidade, se houver a necessidade de imposição

368 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 369 DELMANTO, Fabio Machado de Almeida. Medidas Substitutivas e Alternativas à Prisão Cautelar. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 280. 370 Entende-se que a interpretação sistemática busca compreender a norma não de maneira isolada no sistema jurídico, mas sim integrada com todo o ordenamento, sendo possível, com isso, constatar a sua função.

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de medida cautelar no caso concreto, esta sempre deverá compreender a providência menos

gravosa a ser adotada na situação, sendo a prisão preventiva a “ultima ratio”.371

O magistrado deve questionar diante do caso concreto, se, por exemplo, embora

presentes indício suficiente de autoria e prova da materialidade, e ainda certo risco para o

processo e à efetivação da justiça criminal na manutenção da liberdade do imputado, não seria

necessária e adequada (suficiente) a imposição de uma ou mais medidas cautelares

descarcerizadoras.

Não se pode negar que certo grau de “periculum libertatis” deva estar presente no

caso concreto para que possa ser imposta ao indiciado ou acusado o cumprimento de uma

medida alternativa à prisão, porque do contrário, ou seja, caso inexistente qualquer perigo

com a liberdade plena do acusado (não obstante a existência de indício suficiente de autoria e

prova da materialidade), não haveria necessidade de impor-lhe qualquer obrigação cautelar.

Reitere-se que, se a lógica do sistema não for essa, a imposição de medida

cautelar pessoal diversa da prisão constituirá verdadeiro arbítrio, com a proliferação de

obrigações processuais aos acusados, dissociadas de essenciais requisitos cautelares.

A imposição de qualquer medida cautelar, ainda que não seja ela a prisão, implica

a restrição da liberdade ou de direitos, em menor ou maior grau, daí porque, para que seja

necessária a sua aplicação devem estar presentes, não apenas indício suficiente de autoria e

prova da materialidade, mas também certo perigo na manutenção da liberdade plena do

imputado durante a persecução penal ou do processo.

Tem-se, também, que as providências previstas nos arts. 319 e 320 do Código de

Processo Penal visam substituir a prisão preventiva, sendo odiosa a subversão do sistema

delineado (art. 282, parágrafos 4º e 6º do mesmo código), de modo que não se mostra possível

a imposição de uma prisão preventiva quando necessário e adequado se mostrar no caso

concreto a imposição de medida cautelar alternativa à prisão.372

De outro lado, cumpre registrar que as providências cautelares não prisionais

também poderão ser impostas de forma autônoma, ou seja, não propriamente substitutivas de

anterior prisão processual decretada, o que não significa defender que possam ser

determinadas sem a observância dos critérios necessidade e adequação, não dispensando, os

requisitos cautelares fumus “comissi delicti” e “periculum libertatis”.

371 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 119. 372 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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As medidas cautelares pessoais diversas da prisão servem ainda àqueles delitos

que não se enquadrem em qualquer das situações elencadas no art. 313 do Código de Processo

Penal, ou seja, para os quais não se mostre cabível, em princípio, a decretação da prisão

preventiva. Todavia, não poderá ser imposta qualquer medida cautelar se a infração penal não

contar com qualquer previsão de pena privativa de liberdade em seu preceito secundário, nos

termos do art. 283, parágrafo 1º, do Código de Processo Penal. Exemplificativamente, tem-se

que não poderá ser determinada qualquer medida cautelar no caso de o indivíduo restar

enquadrado no art. 28 da Lei 11.343/06, ou seja, porte de droga para consumo próprio, eis que

para esta infração não existe previsão de pena privativa de liberdade.373

À luz do que dispõe os parágrafos 4º e 6º do art. 282 do Código de Processo

Penal, a prisão preventiva só pode ser decretada em último caso, haja vista que ainda que

venha a ser descumprida a medida cautelar alternativa à prisão, poderá ser a hipótese de

aplicação de outra medida alternativa, em substituição à primeira, desde que necessária e

adequada ao caso.374

6.1.1 A aplicação das medidas com a prévia oitiva do imputado – contraditório imediato

Com a Lei 12.403/11 o art. 282, em seu parágrafo 3º do Código de Processo

Penal, estabeleceu, de forma geral, um contraditório prévio à análise do pedido de providência

cautelar pessoal, desde que, diante do caso concreto, não haja urgência ou perigo de ineficácia

da medida.375

Ou seja, a regra em questão obriga a existência de um contraditório imediato, não

diferido, toda vez que a medida cautelar puder ser determinada, e desde que a realização desse

contraditório não coloque em risco o bom andamento do processo.

Conforme pontua Santos, não obstante a inserção no ordenamento jurídico, salvo

exceções, da necessidade de observância do contraditório prévio à análise do pedido de

373 O art. 28, da Lei 11.343/06, que trata do porte de substância entorpecente ilícita para consumo próprio, prevê as seguintes penas: “I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.” (BRASIL, 2006). 374 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 375 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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medida cautelar, tal regramento será pouco realizado.376 Isso porque esse contraditório não se

mostra aplicável em relação às medidas cautelares que antecedem à propositura da ação penal,

o que chama de

“Medidas cautelares preparatórias à ação penal”, haja vista que exigir a oitiva preliminar do indiciado importaria tornar o contraditório e a ampla defesa elementos essenciais ao inquérito policial, desnaturando-lhe a inquisitoriedade (art. 14 do CPP).377

Todavia, apesar de o contraditório não ser obrigatório na fase do inquérito

policial, também não se pode sustentar que seja proibido. O inquérito policial é uma fase

judicializada, que conta com a atuação do juiz, mormente quando a medida está sujeita à

reserva de jurisdição378, como é o caso das providências cautelares pessoais, a exceção da

fiança arbitrada pela própria Autoridade Policial, nos casos em que a lei permite tal iniciativa.

Assim, o que, quiçá, a reforma também propugna, ainda que timidamente, é uma

mudança de paradigma em relação à condução do inquérito policial, pois mesmo na fase de

investigação pode surgir a necessidade de haver certa dialeticidade, com a posterior imposição

de uma medida cautelar pessoal.

Durante o processo, a observância do contraditório é obrigatória, mesmo porque é

inerente ao processo a dialeticidade, a qual, de forma acertada, foi prestigiada pela reforma,

sempre que não houver perigo de ineficácia da medida.

6.1.2 Vedações à imposição de medida cautelar descarcerizadora

O parágrafo 1º do art. 283 do Código de Processo Penal é claro ao vedar a

imposição de qualquer medida cautelar pessoal “à infração a que não for isolada, cumulativa

ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade.”379

376 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 14. 377 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 14. 378 A reserva de jurisdição indica que algumas matérias estão sujeitas à exclusiva esfera de decisão dos magistrados, diante de expressa determinação da Lei Maior, não podendo quaisquer outras pessoas ou Autoridades determiná-las. 379 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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Esta regra visa resguardar a homogeneidade exigida entre a medida cautelar e o

provimento jurisdicional final. Ou seja, se nem em tese há a possibilidade de prisão em caso

de condenação definitiva, não há porque se permitir a imposição de qualquer medida cautelar.

Ademais, conforme já ventilado alhures, o art. 236 do Código Eleitoral (Lei n.

4.737/65) determina certo período de tempo, antes e após as eleições, dentro do qual não pode

ser imposta prisão preventiva. Há de ser questionado, nesse ponto, se as medidas alternativas

à prisão, trazidas pela Lei 12.403/11 também estariam compreendidas em tal vedação.380

Parece que a efetivação das medidas diversas da prisão trazidas pela Lei em

comento, em princípio, não se mostrariam inadequadas no período eleitoral mencionado pelo

art. 236 do Código Eleitoral e seu parágrafo primeiro. Entretanto, “[...] a sua aplicação

somente seria possível por analogia, dado que a Lei 12.403/11 cuida de normas gerais,

enquanto a matéria eleitoral se põe como especial, impedindo o processo de revogação desta

por aquela.”381

Assim, a aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão trazidas pela Lei

12.403/11 resta vedada no período e nas situações aqui abordadas, porque não há dúvidas de

que a imposição de qualquer medida alternativa à prisão se apresenta mais gravosa do que a

regra da liberdade plena prevista no Código Eleitoral.

6.2 INICIATIVA

Não é de hoje a celeuma doutrinária a respeito da atuação de ofício do magistrado

em se tratando da imposição de providências cautelares e probatórias em geral.

Santos é veemente, ao considerar a impossibilidade de o magistrado atuar, de

ofício, ao longo do inquérito policial, eis que a intenção da Lei 12.403/11 foi de limitar a

380 Dispõe o referido art. 236 do Código Eleitoral: “Nenhuma autoridade poderá, desde 5 (cinco) dias antes e até 48 (quarenta e oito) horas depois do encerramento da eleição, prender ou deter qualquer eleitor, salvo em flagrante delito ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável, ou, ainda, por desrespeito a salvo-conduto. § 1º Os membros das mesas receptoras e os fiscais de partido, durante o exercício de suas funções, não poderão ser detidos ou presos, salvo o caso de flagrante delito; da mesma garantia gozarão os candidatos desde 15 (quinze) dias antes da eleição. § 2º Ocorrendo qualquer prisão o preso será imediatamente conduzido à presença do juiz competente que, se verificar a ilegalidade da detenção, a relaxará e promoverá a responsabilidade do coator.(BRASIL, 1965). 381 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 561.

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atuação oficiosa do magistrado no inquérito, em atenção ao sistema acusatório delineado pela

Magna Carta.382

Apesar de a prisão preventiva não poder mais ser decretada, de ofício, pelo juiz,

na fase do inquérito, inovação esta, oriunda da Lei 12.403/11, vedar o poder de atuação

oficiosa do juiz, ainda que na fase do inquérito, em relação à imposição de medida cautelar

diversa da prisão, não parece razoável, tendo em vista a grandeza do direito à liberdade. Dessa

forma, não poderia o magistrado, ao receber o auto de prisão em flagrante, determinar de

ofício a substituição da prisão em flagrante por medida descarcerizadora, em atenção à

necessidade e adequação vislumbrada no caso concreto?

Casos existirão em que o juiz verificará a legalidade da prisão em flagrante, mas

ao mesmo tempo a premente necessidade e adequação da concessão imediata de liberdade

provisória, cumulada ou não com medida cautelar diversa da prisão. Fora os casos em que o

magistrado também poderá identificar a necessidade de relaxamento imediato.

Assim, pensamos que, verificando o juiz de plano (assim que receber o auto de

prisão em flagrante) a necessidade e adequação de concessão de liberdade provisória com ou

sem a imposição de medida descarcerizadora ao autuado, deve agir de ofício, sem

necessidade, inclusive, de manifestação prévia do Ministério Público.

O sistema acusatório não traduz um juiz inerte, mas sim, um juiz imparcial, que

seja atento às desigualdades, às injustiças, à liberdade como bem inestimável, visando à

realização do poder punitivo do Estado, sem descurar da observância às garantias individuais

do imputado.

Todavia, conforme exposto alhures, pensamos que se for a hipótese de o juiz

detectar, especialmente ao receber o auto de prisão em flagrante, que talvez seja o caso de

decretação da prisão preventiva, deve, antes de decidir pela medida extrema, enviar os autos

ao Ministério Público, a fim de que este se manifeste pela decretação da prisão ou pela

imposição de medida descarcerizadora, à luz do que determina o art. 311 do Código de

Processo Penal.

6.3 ESPÉCIES

Várias foram as medidas cautelares pessoais diversas da prisão trazidas pela

reforma. O art. 319 do Código de Processo Penal passou a prever nove dessas medidas, 382 SANTOS, Marcos Paulo Dutra. O Novo Processo Penal Cautelar – à luz da lei 12.403/11. Bahia: JusPodivm, 2011, p. 29.

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enquanto o art. 320 do mesmo código trouxe também a imposição da entrega de passaporte,

com a proibição de o imputado ausentar-se do País. Ao todo, são 10 (dez) medidas cautelares

descarcerizadoras expressamente contempladas no referido código, se bem que a internação

provisória do inimputável constitui verdadeira privação da sua liberdade, hipótese

contemplada no rol do referido art. 319 do CPP.383

No mais, apesar de tais medidas se afigurem autoexplicativas, necessitam de

análise individualizada, sobretudo porque inovam a sistemática do Código de Processo Penal,

que antes trabalhava expressamente com o paradigma prisão e liberdade.

6.3.1 Comparecimento em juízo para informar e justificar atividades

O inc. I do art. 319 do Código de Processo Penal prevê a seguinte medida cautelar

alternativa: “I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo

juiz, para informar e justificar atividades.”384

Tal medida dispõe sobre a obrigação de comparecimento periódico em juízo.

Aqui, ao que parece, a determinação é para que o imputado compareça periodicamente em

juízo e não em atos da instrução processual. É que na liberdade provisória concedida com

base no parágrafo único do art. 310 do Código de Processo Penal, o dever é de

comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de eventual revogação da benesse.385

Entretanto, pensamos ser possível a imposição de comparecimento periódico do

imputado a todos os atos processuais, com base no poder geral de cautela do juiz, que será

melhor discorrido posteriormente, bem como em vista da possibilidade de utilização

subsidiária do art. 310, parágrafo único do Código de Processo Penal, que menciona a

determinação dessa providência cautelar quando o juiz verificar que o autuado em flagrante

praticou o fato amparado por uma excludente de ilicitude (art. 23, do Código Penal).

É que, segundo Renato de Lima:

383 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 384 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 385 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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[...] Se tal medida pode ser imposta àquele que possivelmente será absolvido ao final do processo (v.g., em face do reconhecimento da legítima defesa), não faz sentido não poder o juiz impor semelhante restrição ao acusado, quando verificar sua necessidade no caso concreto.386

Lopes Jr. critica o fato de o legislador não ter possibilitado (na medida prevista no

art. 319, inc. I, do Código de Processo Penal) o simples comparecimento perante a polícia

judiciária, mencionando, ainda, que tal possibilidade é consagrada nos sistemas português e

italiano. E, continua, considerando que o legislador brasileiro adotou um modelo de controle

judiciário da medida, quando deveria ter previsto um modelo que aproveitasse a estrutura

policial, uma vez que haveria maior eficácia do controle quanto ao cumprimento da

providência imposta.387

Cumpre registrar, de outra banda, que o legislador deixou a cargo do magistrado a

fixação do prazo e das condições a serem cumpridas pelo imputado, estabelecendo certa

discricionariedade àquela autoridade, oriundo, em nosso entender, do poder geral de cautela

jurisdicional.

Esse comparecimento deve ser pessoal, ou seja, não podendo ser permitido que

ocorra por meio de procuração ou por pessoa da família, considerando que tal medida tem em

vista a pessoa do imputado. De outro lado, residindo o acusado em outra comarca, o

acompanhamento dessa determinação pode ser realizado pelo juízo de sua residência, por

meio do cumprimento de carta precatória expedida pelo juízo processante.388

6.3.2 Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares

A providência de proibição de acesso ou frequência a determinados lugares está

prevista no inc. II do art. 319 do Código de Processo Penal, e pode se apresentar bastante

adequada àqueles autores de crimes violentos, praticados, por exemplo, em estádios de

futebol, de forma que poderão ser proibidos de frequentar certos jogos, em tais lugares. Na

mesma lógica, se o imputado praticou crime em casa noturna, pode ser proibido de

permanecer frequentando o respectivo ambiente.389

386 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 982. 387 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 122-123. 388 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 981. 389 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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Embora a norma processual não estabeleça expressamente o tipo de lugar que o

imputado poderia restar proibido de ter acesso ou de frequentar, parece razoável

compreender-se que “deve haver uma relação entre o local cujo acesso está proibido e a

prática do ilícito [...]. Além disso, por ocasião de sua adoção, deve o magistrado especificar

quais os lugares que o acusado não pode frequentar [...].”390

Não obstante o silêncio da lei quanto aos meios de fiscalização da providência

cautelar em questão, parece conveniente que o juiz, ao determiná-la, comunique

imediatamente às Polícias Judiciária e Militar, para que a sua eficácia seja propiciada, sob

pena de restar letra morta, sem possibilidade de efetivação.

6.3.3 Proibição de manter contato com pessoa determinada

O inc. III do art. 319 do Código de Processo Penal prevê a “proibição de manter

contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o

indiciado ou acusado dela permanecer distante.”391

Referida providência já era prevista na Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha),

precisamente em seu art. 22, inc. III, “b”, mas, com a previsão da medida no art. 319, inc. III

do Código de Processo Penal, o legislador desejou deixá-la mais abrangente, passando a

permiti-la também aos acusados que cometem crimes outros, que não apenas violência

doméstica ou familiar contra a mulher.

Cumpre registrar que a providência disposta no art. 319, inc. III do Código de

Processo Penal:

[...] Refere-se à proibição de manter contato com pessoa determinada, sem restringir a aplicação da medida apenas à vítima. Logo, é possível que ao acusado seja imposta a proibição de manter contato com a vítima, com testemunhas e, a depender da necessidade do caso concreto, até mesmo com eventuais corréus.392

Entendemos, também, que não apenas o contato pessoal do imputado poderá ser

proibido, mas também contatos telefônicos, por meio da internet (e-mail, redes sociais etc).

390 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 983. 391 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 392 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 985.

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Em relação à providência em comento, parece que há maiores possibilidades de

controle pelo Estado quanto ao seu cumprimento, uma vez que a própria pessoa protegida, ao

que parece, comunicará eventual descumprimento da medida.393

Entretanto, em que pese o silêncio da lei, pensamos que a pessoa protegida com a

medida deve ser cientificada de sua imposição, a fim de que, em caso de descumprimento,

possa comunicá-lo imediatamente ao Poder Judiciário, ao Ministério Público ou à Autoridade

Policial.

6.3.4 Proibição de ausentar-se da Comarca

O inc. IV do art. 319 do Código de Processo Penal estabelece a seguinte medida

cautelar: “proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou

necessária para a investigação ou instrução.”394

Lopes Jr. afirma que a medida em questão serve não apenas à eficácia da lei penal,

evitando-se o risco de fuga, mas também a tutela da prova, e por isso é que o autor a critica,

asseverando que o imputado não pode ser obrigado a produzir prova contra si mesmo.395

Na mesma linha, Lopes Jr. complementa:

Não vislumbramos fundamento legal em obrigar o réu a permanecer na Comarca ou País em nome da conveniência ou necessidade para investigação ou instrução, na medida em que pode usar o direito de silêncio em relação a qualquer ato probatório (inclusive o reconhecimento pessoal).396

Entretanto, não parece razoável tal entendimento, uma vez que o direito de não

produzir prova contra si mesmo não pode ser entendido de modo absoluto.

O direito ao silêncio visa resguardar a dignidade do investigado ou acusado, sua

integridade física e mental, não comportando a impossibilidade de que certas ingerências

sejam adotadas pelo Estado sobre o imputado, desde que baseadas em critérios da

proporcionalidade, bem como diante da imposição da lei.

393 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 126. 394 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 395 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 127. 396 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 127.

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Se o entendimento não for este, o reconhecimento de pessoas, por exemplo,

diligência básica que precisa ser adotada nos mais variados crimes, até para que seja evitado

erro judiciário, não mais seria admitida. Igualmente, a condução coercitiva do réu para fins de

propiciar-se a sua correta qualificação, também não mais seria possível.

Entretanto, não se olvide que para poder ser imposta qualquer medida cautelar

diversa da prisão deve ser detectado, diante da situação em concreto, certo risco de

manutenção da liberdade plena do acusado, caso contrário, a medida não pode ser

determinada, sob pena de restrição desnecessária à liberdade do indivíduo.

Assim, para poder ser imposta tal providência, esta não dispensa a existência dos

pressupostos das medidas cautelares em geral. Ou seja, verificada a respectiva necessidade de

imposição da providência, tal fato não pode ser ignorado, de maneira que o réu passa a ter

obrigações perante a Justiça.

6.3.5 Recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga

A medida prevista no inc. V do art. 319 do Código de Processo Penal é uma

espécie de prisão domiciliar parcial, uma vez que se mostra menos gravosa ao imputado do

que a prisão domiciliar prevista nos arts. 317 e 318 do mesmo código.397

De acordo com a medida prevista no referido inc. V do art. 319 do Código de

Processo Penal, o acusado somente se recolhe em seu domicílio no período noturno e nos dias

de folga, podendo laborar no período diurno. Nesse caso, é evidente que a restrição da

liberdade do indivíduo se apresenta mais branda do que na prisão domiciliar propriamente

dita.398

Além disso, o suposto autor do fato não necessita estar em uma das situações

previstas no art. 318 do Código de Processo Penal, nem tampouco deve conseguir autorização

judicial para ausentar-se da sua residência para trabalhar durante o dia.399

397 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 398 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 399 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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De outro lado, é de ser questionado se o juiz também poderá determinar a medida

disposta no art. 319, inc. V, do Código de Processo Penal, ao imputado que, embora não tenha

trabalho, realize estudo.

Pensamos que tal seja possível, porquanto, à luz da Lei de Execução Penal, que

restou alterada recentemente pela Lei 12.433/11, para fins de remição da pena, ao apenado

que esteja em regime fechado ou semiaberto, o fato de estar estudando “[...] deve receber

igual tratamento à hipótese em que estiver trabalhando.”400

6.3.6 Suspensão do exercício de função pública ou de atividade econômica ou financeira

A medida prevista no inc. VI do art. 319 do Código de Processo Penal parece

constituir uma das providências mais gravosas dentre todas as medidas cautelares diversas da

prisão trazidas pela Lei 12.403/11, a saber: “suspensão do exercício de função pública ou de

atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização

para a prática de infrações penais.”401

Essa medida encontra-se voltada, essencialmente, a delitos praticados por

funcionário público contra a administração pública, por exemplo, peculado, concussão,

corrupção passiva etc, e crimes contra a ordem econômico-financeira, tais como lavagem de

capitais (Lei n. 9.613/98), e gestão temerária ou fraudulenta de instituição financeira (Lei n.

7.492/86, art. 4º).402

Função pública constitui,

[...] Toda atividade desempenhada com o objetivo de consecução de finalidades próprias do Estado, por meio daquele que exerce cargo, emprego ou função pública, nos termos do art. 327 do Código Penal. Exercem função pública todos aqueles que prestam serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração indireta, aí incluídos os agentes políticos, os servidores públicos, assim como os particulares em colaboração com o Poder Público.403

Já o conceito de atividade econômica ou financeira está ligado ao tipo de crime

investigado, ou seja:

400 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 987. 401 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 402 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 987. 403 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 988.

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[...] Crimes contra a ordem econômico-financeira, os quais estão previstos nas leis: a) Lei n. 1.521/51 (crimes contra a economia popular); b) Lei n. 7.134/83 (crime de aplicação ilegal de créditos, financiamentos e incentivos fiscais); c) Lei n. 7.492/86 (crimes contra o Sistema Financeiro Nacional); d) Lei n. 8.078/90 (crimes previstos no Código de Defesa do Consumidor); e) Lei n. 8.137/90 (crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo); f) Lei n. 8.176/91 (crimes contra a ordem econômica); g) Lei n. 9.279/96 (crimes em matéria de propriedade industrial); h) Lei n. 9.613/98 (crimes de lavagem de capitais).404

A atividade desenvolvida pelo suposto infrator deve estar sendo utilizada para a

prática de delitos, e tal não pode ser presumido sem qualquer embasamento probatório, mas

sim, deve estar efetivamente noticiado e comprovado nos autos do processo, sob pena de

violação à presunção de inocência e à dignidade humana.

Esta providência é bastante gravosa, considerando que atinge o labor do acusado,

seu modo de vida e de sobrevivência, podendo, quiçá, representar “[...] a morte econômica de

pessoas e empresas por um lento processo de asfixia”, conforme considera Lopes Jr.405

O autor parece estar com a razão, motivo pelo qual o julgador deve tomar muita

cautela ao ordenar a referida providência.

6.3.7 Internação provisória do inimputável ou semi-imputável

No inc. VII do art. 319 do Código de Processo Penal também é encontrada medida

cautelar pessoal, consistente na “internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes

praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou

semi-imputável (art. 26 do Código de Processo Penal) e houver risco de reiteração.”406

Pela redação do citado dispositivo legal, vê-se que os requisitos para aplicação da

internação cautelar são cumulativos e não alternativos. Ou seja, há a necessidade de

concomitantemente estarem presentes: a) crime praticado com violência ou grave ameaça à

pessoa; b) inimputabilidade ou semi-imputabilidade comprovada nos autos; e c) perigo de

repetição da prática do crime.

404 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 988. 405 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 130. 406 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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Entretanto, referido dispositivo legal não estabelece qualquer diferença entre

quem já era inimputável ou semi-imputável à época da prática da infração penal e aquele cuja

doença mental sobreveio à infração, razão pela qual, ao que parece, a medida pode ser

imposta nas duas situações.

Essa medida contribui para a melhora do sistema processual penal, precisamente

porque, antes da reforma, a situação provisória do inimputável que praticasse um injusto penal

constituía verdadeira incógnita, pois este não poderia ser internado em hospital de custódia, já

que, nos termos do art. 171407 da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal) e do sistema

constitucional, tal só poderia ocorrer depois do trânsito em julgado da sentença, mas também

não deveria ser levado à estabelecimento prisional, lugar de acusados imputáveis, que

praticam crimes.

Não obstante, tínhamos precedentes asseverando que, embora a internação

provisória não fosse possível como efeito automático da constatação da inimputabilidade do

acusado, desde que presentes os pressupostos da prisão preventiva, e demonstrada a

periculosidade do indivíduo, seria possível a decretação da prisão preventiva, que deveria ser

cumprida em hospital de custódia, conforme decisão proferida pela sexta Turma do Superior

Tribunal de Justiça, em recurso ordinário constitucional n. 11.329, proveniente do Estado da

Bahia, de relatoria do Ministro Vicente Leal, publicada no Diário da Justiça em 10.09.2001.408

De qualquer maneira, a partir da Lei 12.403/11 não há dúvidas de que a

providência em questão, de internação provisória do inimputável ou semi-imputável, que

esteja nas condições do art. 319, inc. VII, do Código de Processo Penal, não poderá constituir

medida de segurança provisória, mas sim providência cautelar, que deverá, portanto, contar

com os requisitos “fumus comissi delicti” e “periculum libertatis”. Igualmente, não poderá a

internação provisória do inimputável ou semi-imputável ser cumprida em estabelecimento

prisional, mas sim em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, ou, na falta deste, em

outro local adequado, nos moldes do que dispõe o art. 96, inc. I, do Código de Processo Penal,

e o art. 99 da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal).409

Para que a medida possa ser determinada é necessário, também, que em princípio

o magistrado já conte com laudo de exame de insanidade metal realizado, atestando tal

407 Assim dispõe o art. 171 da Lei 7.210/84: “Transitada em julgado a sentença que aplicar medida de segurança, será ordenada a expedição de guia para a execução.” (BRASIL, 1984). Portanto, a internação só poderia ser iniciada após o esgotamento de recursos contra a sentença que determinou a medida. 408 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 992. 409 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 994.

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problema no acusado. De outro lado, como pode ocorrer excessiva morosidade na conclusão

desse laudo pericial, pensamos que possam ser utilizados outros meios de provas sobre o

estado mental do imputado, ao menos enquanto não é finalizado o exame de insanidade

mental. É que em muitas situações o acusado poderá demonstrar, de plano, nítidos sinais de

problemas mentais ao juiz, antes mesmo da conclusão do laudo.410

6.3.8 Fiança

A fiança esteve prevista em todas as Constituições brasileiras, com exceção da

Constituição de 1937, tendo sido igualmente disposta nos Códigos de Processo Penal pátrios,

bem como no Código de Processo Penal em vigor.411

A natureza jurídica da fiança sempre foi controvertida, uma vez que a medida não

incide diretamente sobre a pessoa, não parecendo, dessa forma, constituir providência cautelar

pessoal, fugindo, de outro lado, também da lógica das medidas cautelares reais, porque estas

visam precipuamente à satisfação do dano experimentado pela vítima, já a fiança não se

destina exatamente a esta finalidade.

A fiança criminal constitui caução, que assegura a liberdade provisória do

indiciado ou acusado, bem como representa a assunção por parte deste, dos deveres

provenientes de eventual condenação.412

A fiança também pode ser conceituada como garantia real de adimplemento das

obrigações processuais pelo imputado, nos termos do art. 330, “caput”, do Código de

Processo Penal.413

Conforme pontuam Marques da Silva e Walmer Freitas: “Atualmente não se fala

mais em fiança fidejussória, que era uma garantia pessoal, baseada apenas na palavra do

acusado. A fiança passou a ser uma cautelar nominada, prevista no art. 319, VIII, do CPP.”414

410 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 993. 411 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 316. 412 TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro. Atualizado com a Lei da Prisão (Lei 12.403/2001). 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 271. 413 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 414 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 518.

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Nos termos do art. 327 e 328 do Código de Processo Penal, a fiança concedida,

obriga o afiançado a comparecer perante a Autoridade, todas as vezes que restar regularmente

intimado para atos do procedimento (processual ou investigativo), sob pena de quebramento

da medida. Ademais, o réu afiançado, não poderá, sob pena de também ter quebrada a fiança,

modificar de residência, sem prévia autorização da Autoridade processante, ou ficar afastado

por mais de oito dias de sua residência, sem informar àquela Autoridade o local em que

poderá ser encontrado.415

O Código de Processo Penal não elenca os crimes afiançáveis, mas sim, as

hipóteses de inafiançabilidade, o que traduz a admissibilidade da concessão de liberdade

provisória mediante o pagamento de fiança toda vez que não houver proibição legal para

tanto. Registre-se, no entanto, que leis extravagantes também mencionam hipóteses de

inafiançabilidade a determinados delitos, como a Lei 9.034/95, precisamente no seu art. 7º,

aos agentes que tenham efetivamente contribuído com organização criminosa.416

Conforme já ventilado alhures, os crimes inafiançáveis, segundo determinação de

nossa Lei Maior, são: racismo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins,

terrorismo, e os definidos como crimes hediondos, e as práticas vinculadas à “ação de grupos

armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado de Direito”, nos termos

do art. 5º, incs. XLII, XLIII e XLIV da Magna Carta de 1988.417

O Código de Processo Penal repete a Lei Maior sobre as hipóteses de

inafiançabilidade, bem como estabelece algumas circunstâncias (art. 324 do mesmo código),

nas quais também não poderá ocorrer o arbitramento de fiança, quais sejam:

Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança: I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código; II - em caso de prisão civil ou militar; III - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011). IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312). 418

415 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 416 BRASIL. Lei n. 9.034, de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9034.htm>. Acesso em: 20 de janeiro de 2013. 417 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 418 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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Na dicção do dispositivo legal acima referido, que já consta com a redação ditada

pela Lei 12.403/11, aqueles que tiverem sido beneficiados com fiança e tiverem quebrado-a,

ou seja, infringido obrigações inerentes à condição de afiançado, não poderão ser novamente

beneficiados com a medida no mesmo processo em que tiveram a revogação da fiança.

Da mesma forma, não poderá ser concedida fiança na hipótese de prisão militar,

porque nesta justiça tal providência inexiste, nem tampouco poderá sê-la em se tratando de

prisão civil, pois o objetivo da constrição da liberdade nesta esfera é propiciar o pagamento de

uma dívida, proveniente de obrigação alimentar.419

Na mesma senda, quando presentes os pressupostos da prisão preventiva ou da

prisão temporária, a fiança não poderá constituir um sucedâneo destas.

A liberdade provisória em nosso País, durante muito tempo, foi concentrada na

fiança. Todavia, com o passar dos anos restou esquecida, mormente diante de reformas

introduzidas no Código de Processo Penal, que estabeleceram, como regra, a liberdade

provisória sem fiança.

Isso ocorreu, precipuamente, porque a Lei 6.416/77, inseriu o parágrafo único ao

art. 310 do Código de Processo Penal, propugnando que quando não presentes as condições

para a decretação da prisão preventiva, seria cabível a concessão de liberdade provisória sem

fiança. Dessa forma, quando não presentes as condições para a prisão preventiva, a regra

passou a ser a concessão de liberdade sem fiança, aos crimes afiançáveis e, também, porém

não sem críticas, aos delitos inafiançáveis.420

Com a reforma, a fiança foi revigorada, permanecendo a proibição quanto ao

cabimento da fiança aos crimes considerados inafiançáveis pela Magna Carta de 1988, o que,

inclusive, o legislador fez questão de reiterar no art. 323 do Código de Processo Penal.421

As situações do art. 324 do Código de Processo Penal, conforme verificado,

também não autorizam o arbitramento de fiança.

A Autoridade Policial também restou com poderes ampliados para a concessão da

fiança, haja vista que, sob a ótica da lei anterior, somente poderia arbitrar fiança nos crimes

419 O Orgão Pleno do STF, em 03 de dezembro do ano de 2008 decidiu, por unanimidade, no julgamento do RE 466343, pela impossibilidade de prisão civil do depositário infiel. 420 BRASIL. Lei n. 6.416, de 24 de maio de 1977. Alterou dispositivos do Código Penal (Decreto-lei número 2.848, de 7 de dezembro de 1940), do Código de Processo Penal (Decreto-lei número 3.689, de 3 de outubro de 1941), da Lei das Contravenções Penais (Decreto-lei número 3.688, de 3 de outubro de 1941), e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6416.htm>. Acesso em: 10 de dezembro de 2013. 421 SILVA, Marco Antonio Marques da; FREITAS, Jayme Walmer de. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 519.

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apenados com detenção ou prisão simples. Agora, poderá fazê-lo nos crimes com pena

máxima de até quatro anos de privação de liberdade, nos termos do art. 322 do Código de

Processo Penal. Nos demais casos, conforme determina o parágrafo único do mesmo art. 322

do Código de Processo Penal, a fiança deverá ser postulada ao juiz competente. 422

Importante pontuar que, em se tratando de crime inafiançável, ainda que a pena

máxima não supere quatro anos de privação da liberdade, é vedado o arbitramento da fiança

seja pela Autoridade Policial ou pelo Juiz.

Os patamares de reajuste do valor da fiança foram modificados também pela

reforma, nos termos do art. 325 do Código de Processo Penal. Todavia, o valor da fiança ficou

vinculado ao salário mínimo nacional, o que, segundo a Magna Carta de 1988 seria vedado,

nos moldes do que dispõe o seu art. 7º, inc. IV.423-424

O art. 326 do Código de Processo Penal menciona os critérios para o arbitramento

da fiança, a saber:

Para determinar o valor da fiança, a autoridade terá em consideração a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento.425

Registre-se que, quando a competência para o arbitramento da fiança for da

Autoridade Judiciária, ou seja, nos crimes com apenação máxima, superior a quatro anos de

privação de liberdade, ou nas hipóteses em que a Autoridade Policial demorar a conceder o

benefício, a lei preconiza que seja arbitrada a medida pelo magistrado sem prévia

manifestação do Ministério Público, nos moldes do art. 333 do Código de Processo Penal. A

422 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 423 Dispõe o art. 325 do CPP: “O valor da fiança será fixado pela autoridade que a conceder nos seguintes limites: I - de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos, quando se tratar de infração cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a 4 (quatro) anos; II - de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários mínimos, quando o máximo da pena privativa de liberdade cominada for superior a 4 (quatro) anos. § 1o Se assim recomendar a situação econômica do preso, a fiança poderá ser: I - dispensada, na forma do art. 350 deste Código; II - reduzida até o máximo de 2/3 (dois terços); ou III - aumentada em até 1.000 (mil) vezes”. (BRASIL, 1941). 424 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013. 425 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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propósito, esta já era a dicção do referido código anteriormente à reforma ditada pela Lei

12.403/11.

Tal não significa, todavia, que o Ministério Público não poderá ratificar ou rebater

eventual concessão judicial da medida, uma vez que terá acesso aos autos logo após a decisão

judicial, conforme também dispõe o art. 333 do Código de Processo Penal.

6.3.9 Monitoramento eletrônico

Existe não apenas em nosso ordenamento jurídico, constituindo-se em medida

prevista e empregada em diversos Países, mas também nas várias fases do processo.

Esta medida não constitui novidade no sistema processual penal, uma vez que a

Lei 12.258/10 a previu para a fase de execução penal, precisamente para a saída temporária do

reeducando no regime semiaberto e na prisão domiciliar, de acordo com a redação do art. 146-

B da Lei de Execução Penal. Contudo, a monitoração eletrônica do indiciado ou acusado

também constitui, a partir da Lei 12.403/11, medida cautelar possível, e visa a sua contínua

vigilância, por meio de pulseiras ou tornozeleiras que são colocadas no indivíduo, ligadas a

um sistema de posicionamento global (GPS), prevenindo-se, assim, o risco de fuga e a

reiteração da prática de delito.

A monitoração eletrônica passou a ser utilizada, a partir do ano de 1980, nos

Estados Unidos da América, difundindo-se, posteriormente, para outros países. É prevista em

Portugal, por exemplo, precisamente no art. 201, parágrafo 3º do Código de Processo Penal,

com regulamentação atribuída pela Lei 122/1999, de 20 de agosto.426

O monitoramento eletrônico pode ser utilizado com as seguintes finalidades: a)

visando a detenção do indiciado ou acusado, ou seja, a fim de mantê-lo em local

predeterminado, como na hipótese de ser imposta prisão domiciliar ou recolhimento

domiciliar nos períodos noturno e de folga; b) de restrição, para assegurar que o imputado não

acesse determinados lugares, ou para que não se aproxime de determinadas pessoas, tais como

testemunhas, corréus e vítimas; c) de vigilância, para que o agente seja continuamente

fiscalizado em relação à sua movimentação.427

Existem discussões sobre a constitucionalidade da imposição do monitoramento

eletrônico, considerando que a utilização de dispositivo eletrônico poderia ocasionar ao

426 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 459. 427 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 997.

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agente um constrangimento perante a sociedade, com violação da sua dignidade, e presunção

de inocência. Todavia, assim não pensamos, desde que tal dispositivo não se afigure

ostensivo.

Na mesma senda, pontua Renato de Lima:

[...] Deve ser assegurada a discrição dos aparelhos a serem utilizados – braceletes ou tornozeleiras eletrônicas, evitando-se que o agente sofra qualquer tipo de estigmatização perante a sociedade. A propósito, a evolução tecnológica tem permitido a diminuição desses dispositivos eletrônicos, permitindo que fiquem ocultos ou até mesmo imperceptíveis, assemelhando-se a acessórios geralmente utilizados pelas pessoas, como um relógio, por exemplo.428

Todavia, a medida em questão parece mais útil e eficaz quando ordenada

juntamente com outra providência cautelar, como por exemplo, a restrição domiciliar no

período noturno e nos dias de folga, e a prisão domiciliar.

A monitoração eletrônica quiçá pode se mostrar eficaz quando o intuito for evitar

a fuga do agente, uma vez que permite a localização geográfica do mesmo, podendo ser

detectado, por exemplo, quando o réu se ausenta de seu domicílio ou quando se aproxima de

limites fronteiriços de outro Estado ou de outro País.

Contudo, parece que não poderá evitar a reiteração criminosa, nem tampouco

ameças à testemunhas ou a destruição de provas em geral.

De outro lado, a efetiva implementação da medida em questão parece estar em

passos lentos, pois, apesar de já estar prevista há mais de dois anos na já citada Lei de

Execução Penal e no Código de Processo Penal, até novembro de 2012, apenas sete Estados

da federação já haviam implementado a monitoração eletrônica, quais sejam, Acre, Alagoas,

Ceará, Pernambuco, Rondônia, Rio de Janeiro e São Paulo.429

As dificuldades alegadas pelos Estados para a implementação e operacionalização

da monitoração eletrônica são muitas, tais como: entendimento de que a medida é ineficaz,

em vista da possibilidade de rompimento, pelo monitorado, do dispositivo eletrônico

(tornozeleira ou pulseira); morosidade quanto ao processo licitatório para implementação do

sistema eletrônico; demora na avaliação do custo-benefício das tecnologias de controle

eletrônico existentes no mercado; alegações de que a medida precisa ser regulamentada, com

428 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 999. 429 SOUZA, Bernardo de Azevedo e. O Estágio Inicial de Implementação do Monitoramento Eletrônico no Brasil. Publicação Oficial do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Ibccrim, São Paulo, SP, ano XXI, n. 244, mar. 2013.

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determinação de regras mais específicas ao monitoramento; e, ainda, precisamente em

Rondônia e no Amapá, problemas com sinal de satélite, em vista da expressiva vegetação, e a

inexistência de banda larga de internet, respectivamente.430

6.3.10 Proibição de ausentar-se do País, com determinação de entrega do passaporte

Dispõe o art. 320, do Código de Processo Penal: “A proibição de ausentar-se do

País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território

nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24

(vinte e quatro) horas.”431

Essa medida já vinha sendo determinada judicialmente antes da previsão expressa

da Lei 12.403/11, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal, com base no poder geral de

cautela do juiz.432

É uma forma de o Estado-juiz assegurar a liberdade do acusado, ainda que com

certa restrição, quando a sua liberdade plena representa certo risco para a aplicação da lei

penal.

Conforme já exposto no item 4.9, parece conveniente que a medida de probição

de saída do País, assim como a medida que proíbe a saída do imputado da Comarca, possam

ser registradas no Banco Nacional de Prisões que deve ser mantido pelo Conselho Nacional

de Justiça, em uma interpretação extensiva ao que dispõe o art. 289-A do Código de Processo

Penal, visando a uma fiscalização mais efetiva, encorajando, assim, os magistrados a

aplicarem providências cautelares descarcerizadoras.433

430 SOUZA, Bernardo de Azevedo e. O Estágio Inicial de Implementação do Monitoramento Eletrônico no Brasil. Publicação Oficial do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Ibccrim, São Paulo, SP, ano XXI, n. 244, mar. 2013. 431 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 432 Conforme melhor discorrido no item 6.7.2. 433 Dispõe o art. 289-A, do Código de Processo Penal: “O juiz competente providenciará o imediato registro do mandado de prisão em banco de dados mantido pelo Conselho Nacional de Justiça para essa finalidade. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).” (BRASIL, 1941).

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6.4 MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS NÃO PRISIONAIS DISPOSTAS NA

LEGISLAÇÃO ESPECIAL

Antes da Lei 12.403/11, que estabeleceu as medidas cautelares pessoais diversas

da prisão no Código de Processo Penal, a legislação extravagante já se mostrava preocupada

em prever alternativas ao magistrado para assegurar a eficácia do processo penal, sem

necessidade de impor a medida extrema da prisão cautelar. Em vista do princípio da

especialidade, tais medidas permanecem válidas, passíveis de aplicação, não obstante a partir

da Lei 12.403/11 o rol de medidas cautelares não prisionais tenha sido ampliado.434

Tem-se, como exemplo de medida cautelar pessoal não prisional, prevista fora da

Lei 12.403/11, a possibilidade de afastamento de prefeito do cargo nos crimes de

responsabilidade (nos termos do art. 1º, do Decreto-Lei n. 201/67, e art. 2º, inc. II, do mesmo

diploma legal).435

O Código de Trânsito Brasileiro, Lei n. 9.503/97, no seu art. 294, também prevê

que em qualquer fase da investigação ou do processo, desde que haja necessidade de garantia

da ordem pública, poderá o magistrado, estabelecer, de ofício, ou mediante requerimento do

Ministério Público ou de representação da Autoridade Policial, a suspensão da permissão ou

da habilitação para conduzir veículo automotor, ou a proibição de sua obtenção. Todavia, a

medida em questão tem sido admitida nos casos em que o preceito secundário da conduta

delituosa preveja a suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação para dirigir

veículo automotor, como nos crimes de homicídio culposo na direção de veículo automotor

(art. 302), lesões corporais culposas no trânsito (art. 303), embriaguez ao volante (art. 306), e

racha no trânsito (art. 308).436

A Lei 11.343/06, que tipifica o tráfico ilícito de entorpecentes e demais condutas

ilícitas a este relacionadas, precisamente em seu art. 56, parágrafo 1º, também prevê a

possibilidade de decretação pelo magistrado, ao receber a denúncia com imputação capitulada

nos arts. 33, “caput” e parágrafo 1º, e 34 a 37 do mesmo diploma legal, do afastamento

cautelar do denunciado de suas atividades, se este constituir funcionário público, devendo,

ainda, ser comunicado o respectivo órgão. Tal medida, de outro lado, somente será possível se

434 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 1000. 435 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 1000. 436 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 1000-1001.

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o funcionário público tiver utilizado as suas funções para a prática do delito de tráfico ilícito

de entorpecentes.437

A Lei 11.340/06, que trata da violência doméstica e familiar contra a mulher,

prevê extenso rol de medidas cautelares, intituladas de “protetivas”, no seu art. 22.438

Na mesma senda, a Lei Orgânica Nacional da Magistratura prevê que, havendo

recebimento de ação penal por crime grave, em tese praticado por magistrado, o Tribunal, ou

seu órgão especial, poderá, em decisão tomada pelo voto de dois terços de seus membros,

impor o afastamento do cargo do juiz denunciado, de acordo com o previsto na Lei

Complementar n. 35/79, no seu art. 29.439

Assim, tais providências cautelares não prisionais, previstas nas citadas leis,

permanecem podendo ser aplicadas, diante das situações concretas passíveis de

enquadramento nos respectivos diplomas legais, sendo, ademais, também permitida a

imposição das medidas trazidas pela Lei 12.403/11, inclusive aos delitos traçados pelas

referidas leis extravagantes.

6.5 A ESCALA DE GRAVIDADE DAS MEDIDAS CAUTELARES NÃO PRISIONAIS,

ADVINDAS DA LEI 12.403/11

Especial atenção deve ser conferida ao art. 319 do Código de Processo Penal, que

estabelece nove medidas alternativas à prisão. Todavia, da leitura dessas providências não é

possível depreender se foram elencadas, observando-se uma escala de gravidade, o que restou

diferente do sistema processual penal português.440

Não obstante, na Exposição de Motivos do Ministério da Justiça, n. 00022, de 25

de janeiro de 2001, que norteou a reforma trazida pela Lei 12.403/11, consta que as medidas

alternativas à prisão estão elencadas no rol do art. 319 do Código de Processo Penal seguindo

uma ordem de gravidade, ou seja, da menos grave para a mais grave. Dessa forma, a escala de

gravidade propugnada no referido documento, segue, exatamente, a ordem que foi dada nos

437 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 1000, 1001. 438 BRASIL. Lei n. 11.340, de 07 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal etc. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso em: 08 de março de 2013 439 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 1000-1002. 440 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 429.

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incs. do art. 319 do Código de Processo Penal, restando a fiança como a medida mais gravosa,

dentre todas as outras.441

A despeito da sequência disposta dentre os incs. do art. 319, Mendonça acredita

que a ordem de gravidade das medidas se apresenta um pouco diferente. Partindo da

providência que acredita ser a de menor gravidade, até chegar aquela de maior gravidade, o

autor elenca a seguinte sequência:

a) comparecimento periódico em juízo; b) proibição de acesso a determinados lugares; c) proibição de contatos; d) proibição de ausentar-se da comarca; e) proibição de ausentar-se do País; f) recolhimento domiciliar noturno; g) suspensão do exercício de funções; h) fiança; i) monitoração eletrônica; e j) internação provisória do acusado.442

Contudo, mais do que as sugestões apriorísticas quanto à escala de gravidade das

medidas, os critérios da necessidade e adequação é que guiarão o magistrado na escolha da

medida cautelar diversa da prisão, diante das circunstâncias do caso concreto, até porque,

exemplificativamente, a mesma fiança imposta em casos diversos, pode se afigurar

demasiadamente grave a um acusado, que pode não ter condições de adimpli-la, e sem

maiores problemas para outro imputado, que tenha ótima condição financeira.

6.6 A DETRAÇÃO PENAL E A LEI 12.403/11

Detração, segundo os léxicos, representa o ato de detrair, de abater. Assim,

detração da pena, indica a diminuição do tempo de condenação, porque neste se computa, ou

a prisão processual ou a internação no manicômio e hospital.443

A detração da pena constitui medida de justiça, haja vista que impede que o

apenado cumpra duas vezes a mesma reprimenda, atendendo, assim, a proibição do “bis in

idem”.

441 BRASIL. Projeto de Lei n. 4.208, de 2001. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal – relativos à prisão, medidas cautelares e liberdade, e dá outras providências. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=D8775D42AA8160090AC2982AF3897030.node2?codteor=773516&filename=Tramitacao-PL+4208/2001>. Acesso em: 05 de março de 2013. 442 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 430. 443 MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. Vol. IV. São Paulo: Bookseller, 1998, p. 96.

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A Lei 12.403/11 silenciou quanto à possibilidade de detração, quando houver o

cumprimento das medidas cautelares alternativas à prisão.

Não obstante, é sabido que, se for o caso de ocorrer prisão durante o processo, os

dias de recolhimento ao cárcere deverão ser detraídos da pena aplicada em definitivo, o que

também ocorre em se tratando da medida cautelar alternativa à prisão, consistente na

internação provisória do inimputável (art. 319, inc. VII do Código de Processo Penal), à luz

da expressa disposição do art. 42 do Código Penal.444

De outro lado, quanto às outras medidas cautelares alternativas que a Lei

12.403/11 elencou, ainda resta a dúvida se há a possibilidade de aplicação do instituto da

detração penal.

Contudo, não é difícil identificar que a prisão domiciliar (art. 318 do Código de

Processo Penal), verdadeira privação da liberdade que importa, deve ser levada ao cômputo da

detração penal.

A medida cautelar de recolhimento domiciliar, a seu turno, prevista no art. 319,

inc. IV do Código de Processo Penal (“recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias

de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos”), que não se

confunde com a prisão domiciliar, também deve ser detraída da pena, porque não se nega que

se trata de providência que limita a liberdade de locomoção, ainda que apenas no período

noturno e nas folgas do trabalho.445

Pacelli de Oliveira observa que:

E nem se diga que o desconto do tempo na pena seria incabível em razão da liberdade para o trabalho. Ora, sabe-se, ser esse um dos principais objetivos da execução da pena no Brasil, na perspectiva da ressocialização do condenado. O trabalho deve ser sempre incentivado, quando não oportunizado pelo Estado, instituindo-se, no ponto, como verdadeiro direito fundamental (art. 6º, da Constituição da República). É também nesse sentido a doutrina e a jurisprudência portuguesa sobre a matéria.446

444 Art. 42 do CP: “Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior”. (BRASIL, 1940). 445 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 446 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 511.

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Em uma visão atenta à evidente limitação da liberdade que ocorre, em se tratando

do recolhimento domiciliar, entende-se que o cumprimento dessa medida deve, então, ser

levado ao cômputo da detração penal, como se constituísse verdadeira prisão processual.

Repetindo o art. 42 do Código Penal, recentemente, a Lei 12.736/12 inseriu ao

“caput” do art. 387 do Código de Processo Penal a seguinte dicção:

Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: [...] § 2o O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012).447

Todavia, a Lei 12.736/12 não demonstra apenas repetição da regra disposta no art.

42 do Código Penal, na medida em que trouxe a necessidade de o juiz prolator da sentença no

processo de conhecimento já reconhecer nessa mesma decisão, os dias detraídos, o que, antes

da lei, em regra, só ocorria na fase da execução da pena, quando os autos do processo já

tivessem chegado ao juiz com competência na Vara de Execuções Penais, o que, seguramente,

levava algum tempo.

Referida regra colabora com o princípio da razoável duração do processo, bem

como com a vedação do “bis idem”, eis que propicia a adequação do regime inicial de

cumprimento da pena, já no final do processo de conhecimento.

Lamentavelmente, porém, o legislador não aproveitou a oportunidade para regular

a questão da detração penal nas demais medidas cautelares pessoais.

Se o réu tiver sofrido durante o processo prisão cautelar, e o juiz, na sentença, vier

a aplicar pena restritiva de direitos, muito embora não esteja expressamente contemplado na

lei, a doutrina e a jurisprudência têm admitido a detração penal, em atenção ao princípio da

proporcionalidade, à luz do julgado proferido em 14.09.2010, pelo Tribunal de Justiça de

Santa Catarina, em Embargos de Declaração em Apelação Criminal n. 2009.032713-0,

proveniente de Garopaba, de relatoria do Desembargador Robson Luiz Varella.448

As medidas de prisão domiciliar, recolhimento domiciliar e internação provisória,

conforme já mencionado, devem ser detraídas da condenação definitiva, não sendo necessária

447 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 448 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Embargos Declaração em Apelação Criminal n. 2009.032713-0 / Garopaba. Relator: Robson Luiz Varella. Julgamento: 14 de setembro de 2010. Disponível em: <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/avancada.jsp#resultado_ancora>. Acesso em: 10 de fevereiro de 2013.

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a elaboração de qualquer outra norma para que a detração seja possibilitada quanto a esses

institutos. Quanto às demais medidas cautelares elencadas no art. 319 do Código de Processo

Penal, porque elas importam na restrição da liberdade em maior ou menor grau, é de se

questionar se não poderiam ser detraídas da pena, seja esta de privação da liberdade ou de

restrição de direitos.

Não obstante o silêncio do legislador quanto à possibilidade de detração penal

nessas medidas cautelares pessoais, ao que parece, tal pode ser aplicada. Mas, para que possa

ser determinada a detração penal, as situações devem se apresentar semelhantes em termos de

gravidade, já que é o uso da analogia449 que poderá solucionar esta omissão legislativa.

Porém, adverte Mendonça, exemplificando, inclusive:

Se entender que há similitude, mesmo que aproximativa, entre as medidas, deverá conceder a detração, em atenção ao princípio da razoabilidade. [...] Por outro lado, se houver completa disparidade entre a gravidade da medida alternativa à prisão e a pena restritiva aplicada, deve-se negar a detração. Assim, por exemplo, se o magistrado impôs, a título cautelar, o comparecimento pessoal em juízo, tal medida não pode ser descontada da pena de prestação de serviços à comunidade, pois são medidas totalmente diversas em termos de gravidade.450

A análise sobre a similitude entre a medida cautelar e a penalidade definitiva deve

ser realizada pelo julgador, diante do caso concreto, para que a aplicação da detração penal

seja viabilizada ou não. Sendo cabível a detração, entendemos que deve ser reconhecida já na

fase da prolação da sentença do processo de conhecimento, em uma interpretação analógica e

proporcional ao que dispõe a Lei 12.736/12, anteriormente ventilada.

6.7 O PRAZO DE DURAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES NÃO PRISIONAIS

As medidas cautelares pessoais advindas da Lei 12.403/11 não contam com um

prazo máximo de duração previsto na legislação. Mas, em vista do que dispõe o art. 282, incs.

449 A analogia em processo penal, admitida pelo art. 3º do CPP, permite que uma norma expressamente contemplada no ordenamento jurídico para a solução de um ou vários casos, seja também utilizada para solucionar um caso semelhante, para o qual não haja expressa previsão legal de solução. 450 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 474.

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I e II do Código de Processo Penal, parece intuitivo entender que a duração de uma medida

cautelar condiciona-se à sua efetiva necessidade.451

Ademais, porque a característica da provisoriedade deve ser observada em toda e

qualquer medida cautelar, não poderia o réu restar indefinidamente com uma obrigação

processual.

Assim, não se pode olvidar que, porque a medida cautelar pessoal sempre

importará em certa restrição a direitos do acusado, deve existir preocupação com o tempo de

duração do processo, que deve ser razoável.

Os comentários realizados alhures quanto ao princípio da razoável duração do

processo devem aqui também ser lembrados, de maneira que os mesmos critérios que

norteiam a tramitação do processo, em caso de réu preso, em princípio, devem nortear a

situação dos acusados sujeitos a medidas cautelares pessoais não prisionais.

Ademais, com o advento de sentença absolutória, qualquer que tenha sido a

medida cautelar imposta, deverá ser revogada, nos termos do que dispõe o art. 386, parágrafo

único, inc. II, do Código de Processo Penal, com as alterações ditadas pela Lei 11.690-08.452

6.8 (IN)EXISTÊNCIA DO PODER GERAL DE CAUTELA JURISDICIONAL NO

PROCESSO PENAL BRASILEIRO

Em matéria de medidas cautelares pessoais, diversas da prisão, constitui relevante

a análise sobre a possibilidade de, no processo penal, o juiz aplicar providência cautelar não

contemplada expressamente na lei.

Ou seja, teria o juiz do processo penal o chamado poder geral de cautela, admitido

expressamente ao juiz do processo civil? A resposta para tal questionamento, será construída

a seguir, com base, especialmente, em ditames extraídos da Magna Carta de 1988, tais como o

princípio da efetividade do processo.

451 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012. 452 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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6.8.1 O poder geral de cautela do juiz no Código de Processo Civil

Grande é a celeuma doutrinária a respeito da existência ou não no processo penal

brasileiro do denominado poder geral de cautela do magistrado, previsto no art. 798 do

Código de Processo Civil de 1973.453

O poder geral de cautela constitui providência peculiar dentro da tutela cautelar,

haja vista que, por meio dele, pode o magistrado criar providências de segurança fora das

situações previstas em lei, “pois a tutela cautelar visa a evitar situações de perigo que possam

prejudicar a eficácia do processo principal e, por vezes, demandam medidas específicas para o

caso concreto.”454

Em regra, as providências cautelares devem ser requeridas pela parte interessada,

não obstante, o poder geral de cautela conceda a possibilidade de o juiz, de ofício, determiná-

las. Todavia, esse agir de ofício do magistrado se afigura excepcional, eis que a regra é a

observância do princípio dispositivo.455

Calamandrei, em 1936, sustentava que no processo civil é reconhecido o poder

geral de cautela dos magistrados, em vista do qual eles podem, sempre que seja evidenciada a

possibilidade de uma lesão oriunda da morosidade do procedimento principal, atuar de modo

preventivo, determinando uma providência antecipada, a fim de fazer cessar o perigo “[...]

utilizando a forma e o meio que considerem oportuno e apropriado ao caso.”456

Dinamarco assevera que o Código de Processo Civil admite o poder geral de

cautela do juiz, que permite, ou melhor, impõe, que este conceda providências cautelares

inominadas, sempre que se apresentarem adequadas à cessação dos males da morosidade e

presentes as condições gerais da tutela cautelar. E, acrescenta:

453 Dispõe o art. 798 do CPC: “Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação”. 454 REIS, Palhares Moreira. Tutela Jurisdicional Cautelar. Revista Prática Jurídica. Consulex: Brasília, DF, ano IX, n. 102, 30 de setembro de 2010, p. 65. 455 O princípio dispositivo também é denominado princípio da inércia da jurisdição, e indica que a iniciativa para a propositura da ação penal, bem como para as providências que envolvam a realização do processo, devem caber às partes, acusação e defesa. 456 CALAMANDREI, apud LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 10.

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Fugindo à tipicidade das medidas cautelares, o legislador também aqui confiou na sensibilidade do juiz, para que mais efetiva possa ser a própria atividade jurisdicional considerada como um todo.457

De acordo com o poder geral de cautela, previsto na esfera do processo civil, o

juiz possui amplo poder de determinar, de ofício, sem qualquer provocação, medida

acautelatória, ainda que não prevista expressamente na Lei, a fim de prevenir ou eliminar o

perigo ou a lesão.

É que no Código de Processo Civil, precisamente em seu art. 798, está previsto

expressamente o poder geral de cautela do juiz, que permite ao magistrado impor não apenas

medidas cautelares típicas, mas também medidas cautelares atípicas, não dispostas

expressamente na lei.

Greco Filho pontua que o poder geral de cautela do juiz no processo civil deve

entrar em cena quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da

demanda, ocasione ao direito da outra, lesão grave ou de difícil restauração.458

E, ainda, acrescenta o autor:

Neste caso, para evitar o dano, o juiz poderá autorizar ou vedar a prática de determinados atos, ordenar a guarda judicial de pessoas e depósito de bens e impor a prestação de caução (arts. 798 e 799). Este é o chamado poder cautelar geral do juiz, e que se justifica porque não poderia o legislador prever todas as hipóteses em que bens jurídicos envolvidos no processo fiquem em perigo de dano e muito menos todas as medidas possíveis para evitar que esse dano ocorra. O poder cautelar geral do juiz atua como poder integrativo da eficácia global da atividade jurisdicional.459

Greco Filho ainda pontua que o poder geral de cautela não visa substituir as

medidas cautelares típicas pelas inominadas, porquanto, se no caso concreto restar detectada a

inadmissibilidade das medidas típicas, por ausência de requisito legal, não poderiam as

providências atípicas vir “[...] acobertadas pelo manto do art. 798.”460

No processo civil, o juiz também pode lançar mão do poder geral de cautela

contra terceiro, estranho ao processo, que causar lesões a qualquer das partes, ou mesmo em

vista de riscos propiciados por fenômenos naturais. Além disso, cumpre registrar que o poder 457 DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do processo. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 260-261. 458 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 3ª vol. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 156-157. 459 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 3ª vol. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 156-157. 460 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 3ª vol. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 157.

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geral de cautela do juiz atua de duas maneiras: a) por meio da instauração preventiva ou

incidental de processo cautelar, em que a parte pleiteia providência não expressamente

prevista no Código de Processo Civil; b) nos mesmos autos do processo de conhecimento ou

de execução, sempre que uma circunstância emergencial surgir, exigindo atuação imediata do

juiz, ou seja, de ofício, sem qualquer instauração de processo cautelar.461

6.8.2 A (im)possibilidade de aplicação no processo penal do poder geral de cautela do

juiz

No Código de Processo Penal não temos expressamente contemplado o poder

geral de cautela do juiz, mas também não há qualquer proibição. Muito pelo contrário,

sobretudo porque o art. 3º do Código de Processo Penal assim dispõe: “a lei processual penal

admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos

princípios gerais de direito”, o que autoriza o entendimento de que o juiz penal poderia se

valer do poder geral de cautela previsto no art. 798 do Código de Processo Civil, para

estabelecer certas restrições de direitos na esfera do processo penal.462

Não se aventa qualquer possibilidade de o juiz penal poder impor prisões não

contempladas na lei, por meio do poder geral de cautela, porque tal constitui terminantemente

proibido pela Lei Maior e mesmo pelo Código de Processo Penal, os quais estabelecem todos

os tipos de prisões possíveis.

O que se propugna é a possível utilização pelo juiz penal do poder geral cautelar,

expressamente contemplado no Código de Processo Civil, para impor certas restrições a

direitos não contemplados expressamente no rol das medidas cautelares descarcerizadoras

(arts. 319 a 320 do Código de Processo Penal), considerando que o legislador não consegue

prever todas as situações de perigo que poderão reclamar medidas específicas no caso

concreto, não taxativamente previstas na lei.

A doutrina, quase de forma unânime, não tem admitido o poder geral de cautela

do juiz no processo penal. Gomes Filho entende que para que haja a limitação da liberdade,

indispensável se apresenta expressa permissão legal para tanto, porque:

461 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 3ª vol. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 157-158. 462 BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2012.

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O princípio da legalidade dos delitos e das penas não diz respeito apenas ao momento da cominação, mas à legalidade da inteira repressão, que põe em jogo a liberdade da pessoa desde os momentos iniciais do processo até a execução da pena imposta.463

Delmanto Jr., na mesma linha de entendimento, nega a existência do poder geral

de cautela do órgão jurisdicional na esfera do processo penal, em se tratando de restrições à

liberdade do acusado, da mesma forma que critica a existência de normas processuais penais

“absolutamente vagas e imprecisas”, uma vez que violam a garantia do devido processo legal

e a legalidade estrita, “eixos de nosso Estado Democrático de Direito.”464

Igualmente, Lopes Jr. considera que apesar de a Lei 12.403/11 ter alterado, em

parte, o sistema brasileiro das medidas cautelares, posto que a legislação agora contempla

providências antes desconhecidas, a vedação da imposição de medidas inominadas permanece

inalterada.465

Ou seja, o autor acima referido já criticava a posição adotada por alguns juristas

anteriormente à Lei 12.403/11, os quais, em algumas situações, decidiam pela revogação de

uma prisão preventiva, impondo, de outro lado, condições ao imputado não previstas em lei,

tais como: a entrega de passaporte, restrição de locomoção, dever de informar viagens etc. A

partir da vigência da referida Lei, segundo o mesmo autor, continuam ilegais as medidas

cautelares impostas sem qualquer previsão legal.466

Lopes Jr. entende pela inexistência do chamado poder geral de cautela do juiz no

processo penal, razão pela qual, na sua visão, não é possível a determinação de medidas

cautelares inominadas (não previstas taxativamente na lei), considerando ainda que:467

No processo penal, forma é garantia. Logo, não há espaço para poderes

gerais, pois todo poder é estritamente vinculado a limites e à forma legal. O processo penal é um instrumento limitador do poder punitivo estatal, de modo que ele somente pode ser exercido e legitimado a partir do estrito respeito às regras do devido processo. E, nesse contexto, o princípio da legalidade é fundante de todas as atividades desenvolvidas [...].468

463 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de Inocência e Prisão Cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 57. 464 DELMANTO JR., Roberto. As Modalidades de Prisão Provisória e seu Prazo de Duração. 2ª edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 69. 465 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 10. 466 LOPES JR., Aury. O Novo Regime Jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e Medidas Cautelares Diversas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2011, p. 10. 467 LOPES JR., Aury. A (in) existência de poder geral de cautela no processo penal. Boletim IBCCRIM São Paulo, ano 17, n. 203, p. 08-09, out., 2009. 468 LOPES JR., Aury. A (in) existência de poder geral de cautela no processo penal. Boletim IBCCRIM São Paulo, ano 17, n. 203, p. 08-09, out., 2009.

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Badaró, no mesmo norte, complementa no sentido de ser impossível a aplicação

no processo penal de medidas atípicas em razão do indeclinável princípio da legalidade que

vige, não apenas em matéria penal, mas também no âmbito do processo penal.469

Badaró também observa que embora o princípio da legalidade das medidas

cautelares não esteja expressamente contemplado no Código de Processo Penal, mesmo diante

da reforma ditada pela Lei 12.403/11, a resposta pela inadmissibilidade da aplicação de

medidas cautelares atípicas está na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

no direito à liberdade (art. 5º, “caput”), garantido pelo devido processo legal (art. 5º, inc.

LIII).470

E, ainda, discorre:

Mas, ainda que se queira uma norma mais expressa e explícita, tendo por objeto direto as medidas cautelares, é de se considerar que a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) , em seu art. 7º, ao assegurar o direito à liberdade pessoal, prevê: “7.1 Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais. 7.2 Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados-partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas.471

Para considerar a taxatividade das medidas cautelares previstas no Código de

Processo Penal, o mesmo autor pontua que, segundo entendimento do Supremo Tribunal

Federal, as normas da Convenção Americana de Direitos Humanos possuem aplicação

supralegal, de forma que o já ventilado art. 7.2 da mesma Convenção deve prevalecer sobre o

art. 3º do Código de Processo Penal, o qual admite a utilização da analogia, bem como sobre o

art. 798 do Código de Processo Civil, que estabelece o poder geral de cautela.472

469 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. As novas medidas cautelares alternativas à prisão e o alegado poder geral de cautela no processo penal: a impossibilidade de decretação de medidas atípicas. A Reforma do processo penal. Revista do Advogado. São Paulo: ano XXXI, setembro de 2011, p. 71-81. 470 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. As novas medidas cautelares alternativas à prisão e o alegado poder geral de cautela no processo penal: a impossibilidade de decretação de medidas atípicas. A Reforma do processo penal. Revista do Advogado. São Paulo: ano XXXI, setembro de 2011, p.71-81. 471 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. As novas medidas cautelares alternativas à prisão e o alegado poder geral de cautela no processo penal: a impossibilidade de decretação de medidas atípicas. A Reforma do processo penal. Revista do Advogado. São Paulo: ano XXXI, setembro de 2011, p. 71-81. 472 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. As novas medidas cautelares alternativas à prisão e o alegado poder geral de cautela no processo penal: a impossibilidade de decretação de medidas atípicas. A Reforma do processo penal. Revista do Advogado. São Paulo: ano XXXI, setembro de 2011, p. 71-81.

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Todavia, parece que os defensores da inexistência do poder geral de cautela do

juiz no processo penal, com a conseguinte vedação da imposição de medida cautelar

inominada, não estão com a razão.

Isso porque, considerar o rol de medidas cautelares diversas da prisão, trazido

pelo Código de Processo Penal, taxativo ou exaustivo subverteria o propósito do legislador de

tornar a prisão processual a “ultima ratio” das medidas cautelares aflitivas, tornando

incabível, em certos casos, medidas cautelares diversas da prisão, com a imposição de uma

prisão provisória, apenas porque não prevista a medida alternativa “ipsis literis” na lei, o que

seguramente não estaria alicerçado nos critérios da necessidade e adequação.

Não se pode sustentar, como considera Badaró, que se o magistrado estiver com

dúvida entre a aplicação da prisão preventiva e a medida cautelar descarcerizadora, e nada

encontrar de taxativo e adequado no rol dos arts. 319 e 320 do Código de Processo Penal,

deverá optar pela liberdade plena do acusado, ou pela medida menos gravosa.473

O magistrado, quando está por decretar a prisão ou impor uma medida cautelar

diversa da prisão, é porque vislumbra certo risco para o processo quanto à manutenção da

plena liberdade do acusado. Sendo assim, se não encontrar medida taxativa, ao que parece,

adotará a prisão cautelar, porque a liberdade plena do imputado, sem qualquer restrição,

mostrar-se-á um risco ao bom andamento do processo.

A falta de necessidade e de adequação pode ser detectada em três lados (ou

nortes), tanto para a decretação da prisão, quanto para a imposição de uma medida diversa da

prisão, disposta expressamente na Lei, quanto para a liberdade plena do imputado.

Logicamente que se o imputado se enquadrar nas condições que autorizam a

prisão preventiva, ou se uma das medidas cautelares pessoais não prisionais, previstas em lei,

mostrarem-se adequadas e necessárias, não haverá que se falar na possibilidade de imposição

de medida cautelar inominada.

No mesmo norte, se o acusado fazer jus à liberdade provisória sem qualquer

vinculação, deverá ter a concessão dessa medida.

A providência cautelar inominada jamais poderia substituir uma medida cautelar

nominada, quando esta se mostrar necessária e adequada ao caso. Assim como a liberdade

plena, quando esta se mostrar cabível no caso concreto, jamais poderá ser maculada pela

imposição de qualquer medida cautelar. 473 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. As novas medidas cautelares alternativas à prisão e o alegado poder geral de cautela no processo penal: a impossibilidade de decretação de medidas atípicas. A Reforma do processo penal. Revista do Advogado. São Paulo: ano XXXI, setembro de 2011, p. 71-81.

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Em se tratando de medidas cautelares nominadas, como a interceptação telefônica

(Lei 9.296/96) não se poderia admitir, igualmente, qualquer violação aos respectivos

requisitos traçados na lei.474

Da mesma forma, não se pode cogitar em matéria processual penal da violação de

procedimentos, relacionados, por exemplo, ao contraditório e a ampla defesa, o que significa

admitir que o poder geral de cautela jamais serviria para suprimir ou relativizar garantias

constitucionais do acusado.

Assim, deve ser concedida a ciência prévia ao acusado, acerca da pretensão

judicial de aplicação de medida cautelar pessoal, diversa da prisão, quando este contraditório

não importar em ineficácia da mesma.

A propósito, a supressão de garantias ao acusado não pode ser intitulada de poder

geral de cautela do juiz.

Todavia, não se admitir a possibilidade de efetivação de um processo adequado,

atento às necessidades do caso concreto, ou seja, a segurança e ao mesmo tempo à liberdade,

ambos direitos fundamentais, parece ilógico e descompromissado com o devido processo

legal substantivo e a dignidade da pessoa humana.

A pior das medidas cautelares pessoais se encontra expressamente prevista em lei,

que é a prisão. Sendo assim, o imputado jamais poderia ser surpreendido com uma prisão não

prevista em lei. Quanto à medida cautelar inominada, diversa da prisão, não se pode também

dizer que o acusado seria surpreendido com a mesma, porque o juiz, para poder impô-la, deve

analisar se dentre as medidas cautelares, expressamente previstas, alguma satisfaz os critérios

da necessidade e adequação, e apenas em hipótese excepcional, quando não prevista medida

suficiente ou adequada, poderia o magistrado, a partir das providências nominalmente

previstas, aplicar medida inominada.

A aplicação de medida cautelar inominada, alternativa à prisão, está longe de

poder constituir a regra, pois, em princípio, o legislador já contemplou as providências

necessárias, capazes de acalmar o risco que a liberdade plena do réu poderá ocasionar durante

o processo.

Neste sentido, pontua Mendonça que estabelecidos dois limites, quais sejam,

prisões processuais e providências cautelares típicas, sobre as quais não poderia incidir o

474 BRASIL. Lei n. 9.296/96, de 24 de julho de 1996. Regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5° da Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9296.htm>. Acesso em: 12 de fevereiro de 2013.

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poder geral de cautela do magistrado, haverá a possibilidade de aplicação desse instituto nas

medidas cautelares pessoais não prisionais.475

E, ainda observa:

É verdade que hoje com menor amplitude, após a reforma trazida pela Lei 12.403/11, mas nos parece que ainda persiste o poder geral de cautela no processo penal. O principal campo de atuação das medidas cautelares atípicas é aquele em que houver lacuna legal. Isto porque a realidade é muito mais ampla e variada que a imaginação do legislador. Haverá situações concretas que sequer foram imaginadas pelo legislador, em que o magistrado se verá diante de situações de risco que terão de ser enfrentadas. Nestes casos, surgirá a importância do poder geral de cautela.476

Esse entendimento se coaduna com a garantia do art. 5º, inc. XXXV da Magna

Carta, de acesso à justiça, que assegura uma tutela jurisdicional adequada, o que, por

conseguinte, traduz a necessidade de concessão ao julgador do chamado poder cautelar geral,

a fim de que a decisão final não se apresente inútil.477

Nesta linha, não basta que haja uma decisão judicial, é preciso que esta seja

efetivamente adequada, diante das peculiaridades do caso concreto, das quais o legislador não

conseguiria prever todas.

Mendonça ainda fundamenta a existência do poder geral de cautela do juiz, no

processo penal, da seguinte maneira:

O próprio princípio da proporcionalidade impõe que se admita o poder geral de cautela no processo penal, mesmo para medidas cautelares pessoais. [...] Se, diante do caso concreto, antevê uma medida cautelar que, embora não prevista em lei, poderá neutralizar o risco e, assim, evitar a prisão do acusado, deve decretá-la, até mesmo em atenção ao subprincípio da necessidade, que exige que as restrições aos direitos fundamentais sejam as menos graves possíveis.478

No mesmo norte, entende Polastri Lima, para o qual o juiz penal possui poder

geral de cautela em medidas pessoais não prisionais, o que decorre da regra do art. 3º do

475 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 80. 476 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 80. 477 LIMA, Marcellus Polastri. A Tutela Cautelar no Processo Penal. 2ª ed. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2009, p. 118. 478 MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Método, 2011, p. 81.

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Código de Processo Penal, que, a propósito, integra o princípio da legalidade (art. 5º, inc. II

da Lei Maior).479

E quanto ao direito à liberdade, pontua o mesmo autor que a livre locomoção das

pessoas não compreende garantia absoluta, encontrando limites “[...] no fato de ser necessária

a decretação da medida cautelar para assegurar os fins do processo ou do procedimento contra

o transgressor da lei.”480

O poder geral de cautela, seja na esfera cível, seja na esfera penal, constitui um

dos mais importantes instrumentos a ser manejado contra o esvaziamento do exercício da

função jurisdicional, porquanto permite que o magistrado sirva-se de mecanismos que

assegurem a sua jurisdição.481

Lacerda, no ponto, observa que se há diferenças entre o processo civil e o

processo penal:

[...] Perfeita a analogia, porém, ocorre no que concerne à aplicação do poder geral de cautela, em razão das situações concretas. Tendo-se em vista a importância dos valores humanos em confronto no processo penal, pode-se afirmar, mesmo, que nele a atuação das cautelas inespecíficas cresce em relevo. Infelizmente, a doutrina processual penal permanece na infância, e o tema fascinante queda inexplorado.482

Assim, é inerente à função jurisdicional o poder geral de cautela, em prol da

efetiva e adequada prestação jurisdicional.

Igualmente, o art. 3º do Código de Processo Penal constitui lei, e como tal,

autoriza a aplicação do poder geral de cautela do juiz no processo penal. Dessa forma, a

suposta alegação de violação ao princípio da legalidade não procede.

E nem se diga que em processo penal as leis não admitem certa abertura ou

criação jurisdicional, porque os exemplos de normas processuais que concedem ao magistrado

a possibilidade de uma atuação mais aberta, passível de preenchimento pelas situações fáticas,

são inúmeros. Tem-se, por exemplo, os requisitos da prisão preventiva, garantia da ordem

pública e conveniência da instrução criminal, acepções vagas, sem um conceito determinado

479 LIMA, Marcellus Polastri. A Tutela Cautelar no Processo Penal. 2ª ed. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2009, p. 114. 480 LIMA, Marcellus Polastri. A Tutela Cautelar no Processo Penal. 2ª ed. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2009, p. 115. 481 ALVES, Rogério Pacheco. O Poder Geral de Cautela no Processo Penal. In, Revista do Ministério Público. Rio de Janeiro: PGJ, n. 15, jan.-jun., 2002, p. 237. 482 LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil. Das Medidas Cautelares, vol. 7. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 181.

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pelo legislador, mas que são construídos diariamente pelos magistrados, diante das

necessidades do caso concreto.

O instituto da prisão em flagrante, na mesma senda, precipuamente em se tratando

das modalidades de flagrante impróprio (art. 302, inc. III, do Código de Processo Penal), e

flagrante presumido (art. 302, inc. IV, do mesmo Código), também admite o preenchimento,

no caso concreto, da noção de imediatidade que deve imperar em quaisquer das situações

elencadas no rol do referido dispositivo legal.

Além disso, o devido processo legal não se realiza com o fechar de olhos ou com

a indiferença às situações que são apresentadas no caso concreto, sendo indispensável para a

efetivação de tal garantia que o juiz seja muito mais do que o simples “boca da lei”, no

sentido de mero aplicador da literalidade da norma.

Dalmo Dallari pontua que a liberdade de pensamento do juiz é indispensável, não

podendo este “ser escravo de ninguém nem de nada, nem mesmo da lei”, registrando, ainda:

Ainda é comum ouvir-se um juiz afirmar, com orgulho vizinho da arrogância, que é “escravo da lei”. E com isso fica em paz com sua consciência, como se tivesse atingido o cume da perfeição, e não assume responsabilidade pelas injustiças e pelos conflitos humanos e sociais que muitas vezes decorrem de suas decisões. Com alguma consciência esse juiz perceberia a contradição de um juiz escravo e saberia que um julgador só poderá ser justo se for independente.483

Portanto, sem se descuidar do princípio da legalidade, com vistas ainda a outros

princípios constitucionais aplicáveis ao processo penal, igualmente relevantes, tem-se a

presença no processo penal do poder geral de cautela do juiz.

A questão em torno da existência ou não do poder geral de cautela do magistrado,

no processo penal, passa, antes de qualquer coisa, pela assunção pelos operadores do Direito

de que a Lei Maior preconiza a realização de um processo substancial, efetivo, justo, e não

meramente formal.

A concepção de um processo penal efetivo passa pela não admissão da “tolerância

zero”, mas também pela censura quanto a argumentos abolicionistas.484

483 DALLARI, Dalmo de Abreu. O Poder dos Juizes. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 82. 484 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e proporcionalidade: notas a respeito dos limites e possibilidades da aplicação das categorias da proibição de excesso e de insuficiência em matéria criminal. In: CHITTÓ GAUER, Ruth Maria (Org.) Criminologia e Sistemas Jurídico-Penais Contemporâneos. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2008, p. 208.

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Ou seja, a questão é muito mais complexa do que a simples subsunção “ipsis

literis” do fato à norma.

É preciso aceitar que vivemos na era do pós-positivismo jurídico, em que,

portanto, o Direito está constantemente em construção, à luz da Lei Maior, que irradia

princípios explícitos e implícitos.

Nessa linha, acrescenta Regla que:

O “científico” do Direito não é um mero observador de um objeto que está completamente fora dele e que, portanto, é suscetível de ser descrito. Pelo contrário, o jurista (tanto o teórico quanto o prático) é um participante em uma prática social muito complexa, como é o Direito, e neste sentido está comprometido com sua melhoria. O jurista, qualquer jurista (teórico ou prático) não é um mero observador de um objeto acabado que existe fora dele; é, antes, um participante em uma prática social que com seu discurso e suas ações contribui para o desenvolvimento e para a conformação desta.485

Os fatos desafiam as normas. Estas não conseguem prever todas as situações

inerentes às relações e aos conflitos humanos.

Neste sentido, parece inerente a uma visão meramente descritiva, formal, do

Direito sustentar-se a inexistência no processo penal do poder geral de cautela, eis que, em

uma concepção substancial, o Direito não constitui apenas o que está expresso na Lei, sendo

muito mais que isso, haja vista que constituído de regras e princípios, expressos e implícitos.

E não se trata, com isso, de negar-se o princípio da legalidade, essencial ao

Direito Penal e ao Processo Penal, mas sim, de conferir-se a devida interpretação ao mesmo, à

luz do “Império da Constituição” e não do “Império da Lei”.

A redução do Direito a uma mera objetivação, desconectado de uma realidade

social extremamente complexa e mutante, parece bastante equivocada. É que “o Direito não é,

pois, algo assim que está fora dos sujeitos, mas algo que depende centralmente muito de sua

própria prática social.”486

E continua Regla:

Não há, neste sentido, oposição entre a objetividade do Direito (normas e procedimentos) e sua prática. Isso supõe uma revisão total da própria noção

485 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 113. 486 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 113-114.

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do conhecimento jurídico, pois este já não pode pretender ser meramente descritivo (sem implicações valorativas e normativas), e passa a ser reconstrutor de uma prática social que, ainda que esteja dotada de sentido, nunca é tão homogênea para que, mediante observação, seja possível realizar uma descrição completa desta.487

O Estado, na atual conjuntura, não pode mais ser compreendido como inimigo dos

Direitos Fundamentais, e sim, como um ente que deve efetivá-los. O Estado, além de ter de

garantir a liberdade do acusado, deve efetivar a segurança, também direito fundamental (art.

5º, “caput” da Lei Maior), corolário da liberdade de cada indivíduo que compõe a sociedade.

Nesse contexto, cumpre registrar que a Declaração dos Direitos Humanos das Nações Unidas

(1948), precisamente no seu art. 29, assevera que os indivíduos possuem obrigações e limites

na vida em sociedade, de forma que os direitos e garantias de todos devem ser resguardados

pelo Estado.488

Reitere-se: não se está advogando a possibilidade de imposição de prisões não

previstas em lei, nem tampouco a violação de requisitos determinados às medidas cautelares

típicas, o que seguramente resta vedado pela Magna Carta de 1988, mas a possibilidade de

realização do processo penal, do ponto de vista da realidade e das necessidades que se

apresentam no caso concreto, (com todas as suas especificidades), aliada aos princípios da

proporcionalidade, razoabilidade, devido processo legal, dignidade da pessoa humana e, da

legalidade.

No julgado abaixo, o Superior Tribunal de Justiça deixa clara a ideia de que a

adoção ou escolha de qualquer medida cautelar, seja ela nominada ou inominada, deve estar

permeada pelo princípio da proporcionalidade, bem como pela razoabilidade na duração do

processo, sob pena de ilegalidade:

EMENTA. HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE. CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. IMPOSIÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES. PODER GERAL DE CAUTELA DO MAGISTRADO. CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. 1. Embora possível a aplicação de medidas cautelares como condicionantes à revogação de custódia antecipada, com fundamento no poder geral de cautela do magistrado, arts. 798 do CPC c.c. art. 3º do CPP, estas devem observar

487 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 113-114. 488 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Declaração Universal de Direitos Humanos da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 10 de Dezembro de 1948. Disponível em: <http://unicrio.org.br/img/DeclU_D_HumanosVersoInternet.pdf.>. Acesso em 10 de janeiro de 2013.

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critérios de razoabilidade e proporcionalidade. 2. Impostas as medidas de suspensão de habilitação para dirigir veículo automotor e restritiva de direitos consistente em deixar de residir e/ou transitar no local dos fatos, revela-se evidenciado o constrangimento se estas perduram por quase dois anos, além do que já se encerrou a instrução processual. 3. Habeas corpus concedido. (grifou-se).489

O Projeto de Lei do Senado Federal, n. 156, de 22 de abril de 2009, objetiva

alargar o rol de medidas cautelares pessoais descarcerizadoras, atualmente previstas nos arts.

318 a 320 do Código de Processo Penal, numa confissão tácita de que as necessidades do caso

concreto superam a previsão da Lei, conforme se depreende das possibilidades elencadas no

art. 521, a saber:

São medidas cautelares pessoais: I – prisão provisória; II – fiança; III – recolhimento domiciliar; IV – monitoramento eletrônico; V – suspensão do exercício de função pública ou atividade econômica; VI – suspensão das atividades de pessoa jurídica; VII – proibição de frequentar determinados lugares; VIII – suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, embarcação ou aeronave; IX – afastamento do lar ou outro local de convivência com a vítima; X – proibição de ausentar-se da comarca ou do País; XI – comparecimento periódico em juízo; XII – proibição de se aproximar ou manter contato com pessoa determinada; XIII – suspensão do registro de arma de fogo e da autorização para porte; XIV – suspensão do poder familiar. (grifou-se).490

Todavia, é flagrante a negação de efetividade ao processo penal, quando o art. 514

do Projeto 156/09 impede, expressamente, a utilização do poder geral de cautela pelo juiz no

processo penal, a saber:

Art. 514. As medidas cautelares dependem de expressa previsão legal e somente serão admitidas como meio absolutamente indispensável para assegurar os fins de persecução criminal e de reparação civil, ficando a respectiva duração condicionada à subsistência dos motivos que justificaram a sua aplicação. (grifou-se).491

489 BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. HC 114734/ES – Espírito Santo. Habeas Corpus. 2008/0194197-2. Ministro Paulo Gallotti. Sexta Turma. Data do julgamento: 17/03/2009. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=114734&b=ACOR>. Acesso em: 08 de março de 2013. 490 Projeto de Lei do Senado n. 156, de 22 de abril de 2009. Reforma do Código de Processo Penal. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=90645>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013. 491 Projeto de Lei do Senado n. 156, de 22 de abril de 2009. Reforma do Código de Processo Penal. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=90645>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

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Referido projeto não se coaduna com a Lei Maior no tocante à efetivação de

direitos fundamentais, quando nega o poder geral de cautela do magistrado.

Ao que parece, o projeto parte do pressuposto de que o réu será violado em sua

liberdade se conferir-se ao magistrado o poder geral de cautela. Todavia, tal não procede, haja

vista que o juiz só está autorizado a exercer o poder geral de cautela se estiverem presentes os

requisitos exigidos às tutelas cautelares, mas, à luz da necessária efetividade que deve conferir

ao processo penal, nada encontrar de adequado dentre as medidas taxativamente previstas.

Lembrando que as condições que autorizam a imposição das prisões cautelares e

das medidas cautelares diversas da prisão são as mesmas, quais sejam, “fumus boni juris” ou

“fumus comissi delicti” e “periculum in mora” ou “periculum libertatis”. Todavia, para

decretar uma prisão cautelar, o grau de risco quanto à manutenção da liberdade do acusado

deve ser maior em relação àquele detectado para a imposição de uma cautelar diversa da

prisão.

Negar ao magistrado a possibilidade de aplicar medidas cautelares diversas da

prisão mais adequadas à situação em concreto, é admitir que o legislador seja capaz de prever

todas as situações pragmáticas possíveis de resguardarem o processo, o que, seguramente, não

é verdade.

Absurda se afigurará a aprovação do projeto 156/09, no tocante à proibição do

poder geral de cautela, também por manifesta ausência de tratamento processual isonômico

aos conflitos criminais. Isto porque a Lei Maria da Penha (n. 11.340/06) expressamente

contempla o poder geral de cautela do magistrado no processo penal, previsto no art. 22, e seu

parágrafo 1º, não obstante apresente um rol de medidas protetivas de urgência (nominadas ou

típicas).492

492 Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei n. 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios. § 1o As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público. (Grifou-se). (BRASIL, 2006).

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A vingar a proibição do poder geral de cautela, disposto no Projeto 156, quem

praticar qualquer crime no âmbito da violência doméstica ou familiar, poderá contar com

medidas cautelares inominadas. Todavia, quem praticar qualquer crime fora das relações

domésticas ou familiares restará à sorte das medidas taxativamente previstas em lei, as quais,

muitas vezes, não se afigurarão adequadas ou necessárias à situação em concreto.

Efetividade é bem mais do que mera literalidade da lei. Efetividade é analisar o

processo com base nos valores preconizados pela Lei Maior, ponderando os princípios em

aparente colisão, fazendo prevalecer aquele que, à luz da situação em concreto, tornará o

processo mais adequado, justo.

O poder geral de cautela do juiz no processo penal não viola o princípio da

legalidade, mas integra-o, na sua forma mais substancial, pois não significa que o juiz possa

agir “do nada”, sem o apoio da lei, mas sim, que possa interpretá-la, teleológica e

sistematicamente, “olhando para todos os lados”, com atenção difusa.

Tal significa sustentar que as medidas cautelares, já previstas em lei, devem servir

de base para a aplicação de eventual medida inominada. O magistrado deve partir das

providências previstas no rol do Código de Processo Penal, e não, aleatoriamente, adotar

qualquer restrição.

O poder geral de cautela não é invenção brasileira dissociada do Direito

alienígena. No direito norte-americano, por exemplo, o poder geral de cautela do juiz é

contemplado mesmo na esfera do processo penal, e pode ser utilizado em face de condutas

ofensivas praticadas pelas partes, procuradores e até mesmo testemunhas.493

Antes da Lei 12.403/11, o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a

possibilidade de aplicação do poder geral de cautela do juiz no processo penal, em diversas

decisões, como no “habeas corpus” n. 94147, julgado pela Segunda Turma, proveniente do

Rio de Janeiro, de relatoria da Ministra Ellen Gracie, decidido em 27.05.2008, em que foi

consignado que tal possibilidade decorre do art. 3º do Código de Processo Penal. Nesse

julgado, ainda ficou registrado que a liberdade de locomoção não constitui direito absoluto,

devendo ser ponderada diante dos interesses em conflito.494

493 MARINS, Victor Alberto Azi Bomfim, Tutela Cautelar, Teoria Geral e Poder Geral de Cautela. Curitiba: Juruá, 1996, p. 217. 494 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 94147/ Rio de Janeiro. Relator(a): Min. Ellen Gracie. Julgamento: 27 de maio de 2008. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%2894147%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/c53qlwq. Acesso em: 03 de março de 2013.

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Antes da Lei 12.403/11 a constrição do passaporte do paciente também foi

confirmada pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, por meio do “habeas corpus”

n. 101830, julgado em 12.04.2011, oriundo de São Paulo, de relatoria do Ministro Luiz Fux,

no mesmo norte dos argumentos acima ventilados.495

No mesmo sentido, tem-se decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça,

que ratificou decisão de juiz monocrático, o qual determinou que os réus devessem requerer

autorização judicial para qualquer viagem ao exterior do País.496

O Superior Tribunal de Justiça, também já pontuou que o poder geral de cautela

do magistrado é inerente à atividade judicante.497

Se o juiz do processo civil, que lida muitas vezes com direito patrimonial,

disponível, pode aplicar medida cautelar inominada, por que não poderia fazê-lo o magistrado

do processo penal, em se tratando de medida cautelar pessoal diversa da prisão, para evitar

justamente uma medida extrema ou inadequada? Parece ilógico permitir tal poder ao juiz do

processo civil, e ao mesmo tempo, engessar as medidas cautelares diversas da prisão no

processo penal. É de ser questionado: os direitos fundamentais só devem ser realizados na

esfera de direitos disponíveis?

À luz do princípio da proteção integral, ou da vedação da proteção deficiente, a

proibição do poder geral de cautela ao juiz no processo penal não se coaduna com a

necessidade, constitucional, de realização dos direitos fundamentais. Lembrando que o

princípio da proporcionalidade exige não apenas que o Estado não cometa excessos, mas

também que efetive direitos fundamentais, em uma postura comissiva.

De outro lado, obviamente que no processo de operacionalização do Direito, o

qual implica a realização de escolhas dentre as tantas possibilidades contempladas, “tensão

interna”, as respostas (escolhas) devem ser justificadas e não meramente descritas.498

495 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 101830 / São Paulo. Relator(a): Min. Luiz Fux. Julgamento: 12 de abril de 2011. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28101830%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/amkae3o.> Acesso em: 14 de janeiro de 2013. 496 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, HC 113563/RS. Habeas Corpus. Relatora: Min. Laurita Vaz. Relator por acórdão: Min. Napoleão Nunes Maia Filho. Quinta Turma. Data do julgamento: 27.11.2008. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=113563+&b=ACORhttp://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=113563+&b=ACOR.> Acesso em: 08 de março de 2013. 497 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. HC 102124 / RJ. Habeas Corpus. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. Quinta Turma. Data do julgamento: 04/02/2010. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=102124&b=ACOR>. Acesso em: 03 de março de 2013.

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O que implica registrar que a adoção de qualquer medida cautelar, seja ela

nominada ou inominada, sempre deverá contar com coerente motivação judicial, a qual não

dispensa a justificação ante a escolha da providência.

Assim, para que a decisão judicial que determine medida cautelar pessoal

inominada diversa da prisão se apresente obediente à Constituição, deverá o magistrado

justificar a adoção de uma medida diferente de todas as medidas típicas, demonstrando, ainda,

porque as providências previstas em lei não cumpririam as condições da necessidade e de

adequação.

6.9 A NECESSIDADE DE EFETIVA APLICAÇÃO DA LEI 12.403/11 E A

FISCALIZAÇÃO DAS MEDIDAS DESCARCERIZADORAS

Conforme é sabido, no Brasil alguns estabelecimentos prisionais carecem de

condições mínimas para que um ser humano seja tratado com dignidade. Por isso, qualquer

determinação, ainda mais cautelar, da privação da liberdade, deve estar alinhada a casos de

extrema necessidade, onde efetivamente inexiste outra alternativa possível.499

A Lei 12.403/11 enalteceu a liberdade durante o processo, realizando o princípio

da dignidade humana, sem descurar da segurança, a qual o Estado também deve garantir à

sociedade. A proporcionalidade da providência cautelar também foi contemplada pela

reforma, em uma evidente preocupação do legislador entre meios e fins.

Assim, a efetiva aplicação da Lei 12.403/11 pode trazer promissores resultados

ao sistema prisional brasileiro e ao processo penal como um todo, na medida em que,

seguramente, contribuirá para o desafogamento da população carcerária, sem, contudo,

alinhar-se a uma política de liberdade plena do acusado quando necessária certa restrição, a

fim de que riscos concretos evidenciados no processo, possam ser neutralizados.

Não obstante a lei tenha trazido importantes mudanças na cautelaridade do

sistema processual penal, no processo de descarcerização propugnado pelo legislador, os

operadores do direito (magistrados, membros do Ministério Público, Autoridades Policiais,

seus agentes, e advogados) são essenciais, uma vez que a situação pode permanecer

inalterada, se a lei nova não vier a ser aplicada também com um novo olhar.

498 REGLA, Josep Aguiló. Do “Império da Lei” ao “Estado Constitucional”. Dois Paradigmas Jurídicos em Poucas Palavras. In, MOREIRA, Eduardo Ribeiro (Org.). Argumentação e Estado Constitucional. São Paulo: Ícone, 2012, p. 113-114. 499 CAMARGO, Monica Ovinski de. Princípio da Presunção de Inocência no Brasil. O Conflito entre Punir e Libertar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 258.

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A cultura de substituição das prisões cautelares por medidas cautelares

descarcerizadoras precisa ser formada pelos operadores do direito, evitando-se a continuidade

do sistema anterior à reforma, que legitimou o decreto de muitas prisões cautelares. Mas, não

é apenas isso.

A efetiva aplicação da lei depende, antes de tudo, da implementação de políticas

criminais processuais capazes de conferir operacionalização e fiscalização às mesmas.

Como adverte Renato de Lima:

[...] A criação dessas medidas cautelares diversas da prisão resultará absolutamente inócua se, concomitantemente, não for trabalhada uma estrutura adequada e eficiente para a sua operacionalização e fiscalização. Se isso não ocorrer, haverá um certo temor quanto à adoção de tais medidas, com o surgimento de uma natural resistência por parte de juízes e membros do Ministério Público, que irão se voltar novamente à prisão cautelar como o instrumento mais eficiente para tutelar a eficácia do processo, a despeito do sacrifício da liberdade de locomoção do agente.500

Uma das tendências do processo penal moderno, é a busca de equilíbrio entre a

exigência de proteção ao imputado, com a realização das garantias inerentes ao devido

processo legal, e a necessidade de maior eficiência do sistema processual penal em prol da

segurança social.501

Temos que as medidas cautelares inseridas pela reforma de 2011, se efetiva e

adequadamente aplicadas, cumprem a exigência de tratamento digno ao imputado,

privilegiando as garantias individuais a que possui direito, especialmente a liberdade, mas,

propiciam, de outro lado, a realização do “jus puniendi” do Estado, com a observância da

segurança, também direito fundamental, nos termos do art. 5º, “caput” da Magna Carta.

Calamandrei observa que as providências cautelares “representam uma

conciliação entre duas exigências geralmente constrastantes na Justiça, ou seja, a da

celeridade e a da ponderação.” E acrescenta:

Entre fazer logo porém mal e fazer bem mas tardiamente, os provimentos cautelares visam, sobretudo, a fazer algo, deixando que o problema do bem e do mal, isto é, da justiça intrínseca do provimento, seja resolvido mais tarde,

500 LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói, RJ: Impetus, 2013, p. 981. 501 FERNANDES, Antonio Scarance. O equilíbrio entre a eficiência e o garantismo e o crime organizado. Revista Brasileira de Ciências Criminais – n. 70. Jan. – fev. – ano 16. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 231.

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com a necessária ponderação, nas sossegadas formas do processo ordinário.502

Todavia, tal quiçá pode ser assim no processo civil, que trata de questões muitas

vezes afetas a direito disponível e patrimonial, pois, em se tratando de processo penal, não se

pode admitir a não análise imediata sobre a justiça intrínseca da providência cautelar,

sobretudo porque a liberdade do indivíduo, bem inestimável, é restringida com uma medida

cautelar pessoal.

Ou seja, não se pode deixar para resolver sobre a justiça ou não da providência

cautelar durante o transcorrer do processo, após a imposição desta, mas sim, no exato

momento da análise sobre o seu cabimento ou não.

Isso porque a liberdade não tem preço, mas sim, valor, e como tal não se coaduna

com qualquer interpretação que não seja a mais justa, proporcional, possível, ainda que no

momento da adoção de uma providência sumária.

Todas as medidas cautelares possuem requisitos a serem observados, conforme

verificado alhures, sem os quais não poderão ser impostas. De outro lado, não se pode

descurar que a medida cautelar diversa da prisão terá preferência em relação à esta, sempre

que se mostrar necessária e adequada ao caso concreto.

Nos termos do sustentado também alhures, a imposição judicial, por meio do

poder geral de cautela, de medida cautelar inominada, também possui critérios a serem

obedecidos, sem os quais não poderá ser estabelecida.

O legislador, por meio da reforma em questão, optou pela premente exigência de

cumprimento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a qual não concebe

a vulgarização da prisão cautelar.

A inovação legislativa evidencia uma proposta de mudança de paradigma aos

operadores do direito. O próprio legislador, com a Lei 12.403/11, demonstra que saiu das

amarras de ideias ditatorias que nortearam o Código de Processo Penal de 1941, e ingressou

nos ideais da Lei Maior, sobretudo de presunção de inocência, dignidade humana e

proporcionalidade.

Todavia, como efetivamente substituir a cultura da prisão provisória pelas

medidas não prisionais advindas da Lei 12.403/11 se o legislador nacional criou leis, mas não

previu fonte de recursos? Tornozeleiras eletrônicas, por exemplo, precisam ser efetivamente

502 CALAMANDREI, apud DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do processo. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 260.

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adquiridas pelos órgãos Executivos dos Estados, em quantidade satisfatória, propiciando

adequação às demandas criminais que delas necessitarem.

Não restam dúvidas de que políticas públicas devem ser implementadas em prol

da melhor efetivação da Lei 12.403/11, sem o que, restará, como tantas outras leis existentes

em nosso País, destoando de práticas cotidianas.

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178

CONCLUSÃO

O presente estudo adotou como principais vetores o fundamento da dignidade

humana, e a efetividade da prestação jurisdicional no âmbito do processo penal, que

compreende a preocupação de realização do “jus puniendi” do Estado, sem descurar-se da

liberdade do indivíduo, investigado ou acusado.

A análise dos princípios constitucionais do devido processo legal, legalidade,

contraditório, ampla defesa, presunção de inocência, proporcionalidade e razoabilidade,

também foram essenciais à compreensão do tema proposto, ou seja, a análise das medidas

cautelares advindas da Lei 12.403/11.

A ótica propugnada demonstrou a preocupação de construção do entendimento

sobre as medidas cautelares trazidas pela Lei 12.403/11, a partir de princípios constitucionais,

ponderando valores nas diversas situações apresentadas, num propósito de submissão destas à

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

A Lei 12.403/11, seguindo a tendência de outros países, tais como Portugal e

Itália, inaugurou no sistema processual penal pátrio um novo paradigma, prevendo medidas

cautelares pessoais não prisionais.

A nova sistemática preconiza a liberdade como a regra, sendo a prisão cautelar a

“ultima ratio” das medidas cautelares pessoais. Em diversas passagens do Código de Processo

Penal, restou contemplado esse norte.

A partir da reforma em questão apenas duas medidas se mantiveram como prisões

cautelares, quais sejam: prisão temporária e prisão preventiva. A prisão em flagrante passou a

constituir medida precária, desprovida de cautelaridade, uma vez que, por si só, não mais se

mantém durante o processo. A prisão preventiva, de outra banda, ganhou força, eis que passou

a constituir a espinha dorsal das prisões cautelares, ao mesmo tempo em que restou mais

branda para os casos previstos no rol do art. 318 do Código de Processo Penal, quando poderá

ser substituída por prisão domiciliar.

De outro lado, ressuscitou-se a cautelaridade no processo penal brasileiro, uma

vez que, antes da reforma, o Código de Processo Penal carecia de um rol de medidas

cautelares não prisionais, eis que “funcionava” apenas no paradigma prisões processuais e

liberdade provisória, providência esta que poderia ser concedida com ou sem fiança. Porém, o

instituto da fiança encontrava-se obsoleto e esquecido.

A reforma identifica a necessidade de os operadores do direito debruçarem-se

sobre o estudo da cautelaridade no processo penal, os critérios gerais de aplicação das

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respectivas medidas, princípios norteadores, e demais questões atinentes, uma vez que a

mudança em comento passa a preconizar um novo olhar para o processo penal.

O juiz restou incumbido de, assim que receber o auto de prisão em flagrante,

decidir, fundamentadamente, sobre a legalidade da prisão, relaxando-a, se ilegal, ou

homologando-a, se legal. Todavia, a análise do julgador não termina aí, haja vista que deverá

ainda realizar juízo de necessidade sobre a prisão, indagando se a prisão em flagrante, embora

legal, deve ou não ser convertida em prisão preventiva, e, ainda, se a imposição de

providência cautelar não prisional seria suficiente e adequada à neutralização do risco

eventualmente verificado no caso concreto, eis que as medidas descarcerizadoras possuem

preferência em relação à segregação cautelar.

Todavia, a imposição de qualquer providência cautelar não pode constituir a regra,

nem tampouco deve se afigurar decisão judicial automática, considerando que a análise

efetiva da presença dos requisitos cautelares no caso concreto, quais sejam, “fumus boni juris”

ou “fumus comissi delicti” e “periculum in mora” ou “periculum libertatis”, deve sempre ser

realizada, sob pena de proliferarem-se obrigações processuais aos indiciados e acusados sem

qualquer necessidade, subvertendo-se o sistema constitucional.

As providências cautelares não prisionais visam à substituição da prisão cautelar,

mas também podem ser determinadas autonomamente, possuindo como objetivo a

neutralização de riscos ao andamento da investigação ou do processo, mas sem descuidar-se

dos critérios da adequação e necessidade.

A Lei 12.403/11 preocupou-se com a relação entre meios e fins, não admitindo,

por exemplo, em princípio, a decretação de medida cautelar prisional ao acusado que, se vier

a ser condenado por ocasião do provimento jurisdicional definitivo, ao que tudo indica, não

terá a imposição de uma pena de prisão. Ademais, passou a prever expressamente a

impossibilidade de imposição de qualquer medida cautelar, ainda que não prisional, nos

delitos para os quais não haja qualquer cominação em abstrato de prisão.

Embora a Lei 12.403/11 não tenha realizado referência expressa à prisão

temporária, prevista na Lei 7.960/89, verificou-se que esta prisão cautelar, assim como a

prisão preventiva, deve se adequar a nova ótica, de forma que também passou a constituir a

“ultima ratio” das providências que poderão ser adotadas na investigação, eis que o rol de

medidas cautelares diversas da prisão possui preferência de aplicação em relação à segregação

temporária.

Verificou-se que, em regra, para os casos nos quais não mais se mostra cabível a

decretação da prisão preventiva, em vista do não enquadramento da situação em uma das

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hipóteses do art. 313 do Código de Processo Penal, salvo melhor juízo, também não se admite

a decretação da prisão temporária, em obediência à proporcionalidade do sistema processual

penal.

A fiança foi revitalizada, com novos critérios e valores, bem como com a

ampliação de poderes à Autoridade Policial para a concessão da medida, ou seja, nos crimes

com pena máxima cominada em abstrato não superior a quatro anos, ressalvadas as hipóteses

de inafiançabilidade, mormente naquelas dispostas pela Lei Maior.

Para os indivíduos presos em flagrante, enquadrados em crimes inafiançáveis, que

antes da Lei 12.403/11, em não raras situações, recebiam o benefício da liberdade provisória

sem qualquer ônus (sem fiança), a reforma mostrou uma saída para a incoerência que

imperava, qual seja, a possibilidade, em tese, de concessão de liberdade provisória, quando

não presentes os pressupostos da prisão preventiva, mas com a imposição de medidas

cautelares diversas da prisão e da fiança, como o recolhimento domiciliar nos dias de folga e

no período noturno, com possibilidade de trabalho durante o dia, e a monitoração eletrônica,

medidas estas, aliás, que poderão ser cumuladas no caso concreto, tudo a depender da

necessidade e adequação a ser vislumbrada.

A propósito, ao que parece, se a Constituição da República Federativa do Brasil

gravou alguns delitos com a cláusula de inafiançabilidade, como os hediondos e equiparados,

tal não traduz a impossibilidade de concessão de liberdade provisória, mas também não indica

a possibilidade de deferimento dessa benesse sem qualquer imposição de medida cautelar

diversa da fiança. Se assim não for entendido, a incoerência permanecerá inalterada,

liberando-se réus que em tese praticaram delitos inafiançáveis, considerados pela Carta

Magna de maior gravidade, sem qualquer ônus, enquanto que réus enquadrados em delitos

afiançáveis, em tese de menor gravidade, teriam de pagar fiança para receberem liberdade

provisória.

Em relação às vedações apriorísticas de concessão de liberdade provisória, para

qualquer crime, entendemos que tal fere a presunção de inocência, criando, ademais,

hipóteses de prisão preventiva obrigatória, o que não é admitido desde a reforma processual

penal de 1967. Ou seja, a análise sobre a concessão da liberdade provisória deve ser realizada

caso a caso.

Dez medidas cautelares pessoais diversas da prisão passaram a ser contempladas

no Código de Processo Penal (arts. 319 e 320), ou seja, comparecimento em juízo para

informar e justificar atividades, proibição de acesso ou frequência a determinados lugares,

proibição de manter contato com pessoa determinada, proibição de ausentar-se da Comarca ou

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do País, recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga, suspensão do

exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira, internação

provisória do inimputável ou semi-imputável, monitoramento eletrônico, determinação de

entrega de passaporte, estando a fiança, também, dentre essas medidas não prisionais.

Ou seja, o legislador, prevendo certos riscos que poderão advir no transcorrer da

persecução penal, considerou importantes as referidas providências não prisionais, de maneira

que, para cada situação verificada no caso concreto, poderá ser cabível a imposição de uma ou

mais providências cautelares.

Mas, a reforma também deixou a desejar em alguns aspectos. Primeiro, porque

não restou estabelecido qualquer prazo limite para a duração da prisão preventiva e para as

medidas cautelares não prisionais, não obstante a proporcionalidade preconizada pela Lei

12.403/11 e a característica da provisoriedade inerente a toda e qualquer medida cautelar.

Em vista de tal silêncio legislativo, a Resolução n. 66, de 27 de janeiro de 2009 do

Conselho Nacional de Justiça, embora determine, no seu art. 3º, que a prisão de indiciados ou

réus presos por mais de três meses deva ser revista pelo magistrado, desde que o processo se

encontre paralisado por igual tempo, pensamos, deve abarcar a situação do indiciado ou

acusado preso provisoriamente por igual tempo, independentemente de o processo se

encontrar paralisado ou não, mesmo porque é preciso realizar constante juízo de necessidade

de manutenção da prisão cautelar.

Os prazos estabelecidos à conclusão dos procedimentos comum ordinário,

sumário e do Tribunal do Júri também devem nortear o magistrado na fiscalização, que deve,

necessariamente, ser empreendida contra o excesso de prazo na prisão provisória.

Em relação às medidas cautelares pessoais não prisionais, embora sejam menos

gravosas do que a prisão processual, também devem ser revistas constantemente pelo

magistrado, somente podendo perdurar enquanto se mostrarem efetivamente necessárias.

Em outro ponto, embora não contemplado expressamente na lei 12.403/11 o poder

geral de cautela do magistrado, a discussão sobre a existência de tal instituto no processo

penal também se mostra relevante, na medida em que propicia um debate sobre os poderes

ínsitos à atividade judicante, bem como sobre a necessidade da prestação de uma tutela

jurisdicional efetiva, adequada, justa, dentro de um modelo pós-positivista de compreensão do

Direito.

Acreditamos que o poder geral de cautela do juiz no processo penal possa melhor

efetivar a Lei 12.403/11, porquanto contribui para o princípio da proteção eficiente,

possibilitando à Autoridade Judicial estabelecer, embora excepcionalmente, medidas

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cautelares pessoais inominadas, diversas da prisão, sempre em prol da neutralização do risco

identificado no processo, sem descurar, todavia, da dignidade da pessoa humana e da

liberdade como a regra.

Não obstante também tenha ocorrido silêncio do legislador quanto a possibilidade

de detração penal às medidas cautelares diversas da prisão, e em relação à prisão domiciliar

(arts. 317 e 318, do Código de Processo Penal), salvo melhor juízo, pensamos que tal

compensação poderá ser efetivada no caso concreto, a depender da similitude entre a

providência cautelar imposta e o provimento jurisdicional final, em atenção ao princípio da

proporcionalidade.

De maneira geral, os ideais advindos da Lei 12.403/11 parecem estar afinados

com a Lei Maior, adequando-se o Código de Processo Penal à esta, mormente no que

concerne à dignidade humana, presunção de inocência, e proporcionalidade.

Mas, não se pode olvidar que a necessidade de implementação de políticas que

permitam a real operacionalização e fiscalização das providências cautelares não prisionais

deve constituir preocupação do Estado, até mesmo para que os magistrados sintam-se

encorajados à aplicação dessas medidas menos gravosas.

A monitoração eletrônica, por exemplo, caso não seja compreendida como um

instrumento capaz de desafogar o sistema carcerário brasileiro, evitando os males da prisão,

somente permanecerá bonita no papel, como tantas outras leis em nosso País que “não

pegaram”.

A possibilidade de registro no Banco Nacional de Prisões, mantido pelo Conselho

Nacional de Justiça, não somente de mandados prisionais, mas também de medidas cautelares

diversas da prisão, tais como a proibição de saída da Comarca ou do País, também parece

constituir providência interessante, a fim de que real fiscalização seja empreendida, em uma

interpretação extensiva ao que dispõe o art. 289-A, do Código de Processo Penal.

Enfim, a Lei 12.403/11 mostra mais qualidades do que defeitos, mas a efetividade

do sistema processual penal depende, sobremaneira, da adoção de políticas públicas que

realizem, de fato, os seus propósitos, bem como da mudança de paradigma dos aplicadores da

norma, que não podem mais ficar no binômio prisão e liberdade. Todavia, quiçá a efetiva

aplicação pelos magistrados das medidas não prisionais dependa, antes de qualquer coisa, da

real implementação de meios fiscalizatórios ao cumprimento das providências

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