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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Randolph Aparecido de Souza A estética do mashup MESTRADO EM TECNOLOGIAS DA INTELIGÊNCIA E DESIGN DIGITAL São Paulo 2009

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Aparecido de Souza.pdfManovich and Eduardo Navas. Thus, the analysis of the structure and functioning of mashups applications

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Randolph Aparecido de Souza

A estética do mashup

MESTRADO EM TECNOLOGIAS DA INTELIGÊNCIA

E DESIGN DIGITAL

São Paulo

2009

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Randolph Aparecido de Souza

A estética do mashup

MESTRADO EM TECNOLOGIAS DA INTELIGÊNCIA

E DESIGN DIGITAL Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Tecnologias da Inteligência e Design Digital – Processos Cognitivos e Ambientes Digitais, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da Profa. Doutora Lucia Isaltina Clemente Leão.

São Paulo

2009

Banca Examinadora ________________________________ ________________________________ ________________________________

Aos meus queridos pais Daniel e Lourdes.

Aos meus queridos irmãos Ralph e Raldina.

À minha amada noiva Elisabeth.

obrigado pelo carinho e apoio em todos os momentos...

pela paciência e compreensão durante minhas ausências.

AGRADECIMENTOS

À Deus, pela vida.

À Fundação São Paulo - Pontifícia Universidade Católica São Paulo, pela concessão

da bolsa de estudos destinada a esta pesquisa.

À Profa. Lucia Leão, orientadora e amiga, que sempre norteou o rumo a ser trilhado

com muita inspiração e sapiência, possibilitando assim a abertura de novos horizontes.

"O todo é mais que a soma de suas partes."

Aristóteles

RESUMO

SOUZA, Randolph Aparecido de. A estética do mashup. São Paulo, 2009. 110 p. Dissertação (Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Esta pesquisa discute a prática mashup, particularmente a de aplicativos web, enquanto estética própria, que traduz uma sensibilidade contemporânea, reflexo da cultura remix da qual emerge. Copiar, cortar ou colar agora são ações intrínsecas ao cotidiano do ciberespaço, em que a recombinação da informação evidencia-se como prática usual. Nesse contexto, como identificar e relacionar a estética do mashup? Tal cenário incita a um estudo mais aprofundado acerca dos mashups, em busca de traçar um panorama descendente e contemporâneo mediante investigação e identificação de sua origem, estrutura e prática no meio digital. Para debater estas questões foi realizado um resgate histórico, a fim de apresentar os conceitos e movimentos artísticos precursores relativos à sua essência. A compreensão de mashup avança no âmbito da esfera remix. As questões referentes à colaboração, interação e autoria, assim como a conceitualização da prática, fundamentada na maleabilidade do código binário e da transposição entre um meio a outro; sustentam-se a partir dos estudos de Lev Manovich e Eduardo Navas. Desse modo, a análise da estrutura e funcionamento dos mashups de aplicativos no meio digital, demarcada por meio das considerações de Duane Merril, consiste em melhor assimilação a estas reflexões, visto que especifica as características tecnológicas que os definem. No intuito de reorganizar os vários modelos de mashups encontrados na rede, efetua-se mapeamento inspirado na classificação de Merril, entretanto, propõem-se categorias próprias; amparadas em estudos de casos efetuados através da análise de web sites que se utilizam da técnica. Com efeito, constata-se que o processo formador do mashup, baseado na combinação de uma ou mais fontes para formação de algo novo, é o mesmo adotado nos diferentes períodos, ou seja, não é totalmente inovador; varia-se apenas a forma de emprego aplicada, no relacionamento dos conceitos antecessores à tecnologia e mídias emergentes. Por fim, ressalta-se a importância da classificação proposta para o mapeamento dos mashups na revelação de categorias “orgânicas”, que permitem assim ilustrar os movimentos fluidos de associações e inter-relações característicos de sua organização, num retrato acurado do universo de possibilidades ilimitadas de imbricamentos em que habitam. Palavras-chave: cultura remix, mashup, estéticas tecnológicas, arte, tecnologia.

ABSTRACT

SOUZA, Randolph Aparecido de. The mashup aesthetics. São Paulo, 2009. 110 p. Dissertação (Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

This research discusses the mashup practice, particularly the one of web applications, while own aesthetics, that translates a contemporary sensibility, reflex of the remix culture of which emerges. Copy, cut or paste are now intrinsic actions to the daily of the cyberspace, where the recombination of information is evidenced as usual practice. In this context, how to identify and relate the mashup aesthetics? Such scenery incites the further study concerning mashups, in search to trace a descending and contemporary overview by means of investigation and identification of its origin, structure and practical in the digital medium. To debate these issues was accomplished a historical redemption, in order to present the concepts and artistic movements precursors relative to its essence. The mashup comprehension advances in scope of the remix sphere. The issues referring to collaboration, interaction and authorship, as well as the conceptualization of the practical, based on the malleability of the binary code and the transposition between a medium to another one; will be sustained from the studies of Lev Manovich and Eduardo Navas. Thus, the analysis of the structure and functioning of mashups applications in the digital medium, demarcated by means of the considerations from Duane Merrill, consists in better assimilation to these reflections, since specifies the technological characteristics that define them. In intention to reorganize the several mashups models found in the net, it makes mapping inspired on Merrill’s classification, however, propose own categories; supported in case studies made through the analysis of web sites that use the technique. With effect, it verifies that the mashup process former, based on combination of one or more sources for formation of something new, is the same adopted in different periods, in other words, is not entirely innovative; varies only the form of employment applied, in the relationship of the predecessors concepts to the technology and emerging medias. Finally, it emphasizes the importance of the proposed classification for mashups mapping in the revelation of “organic” categories, that allow thus to illustrate the fluid movements of associations and inter-relationships characteristic of its organization, in an accurate portrait of the universe of unlimited possibilities of imbrication in which they inhabit. Keywords: remix culture, mashup, technological aesthetics, art, technology.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Fruteira e copo, 1912, por Georges Braque. .......................................................................... 20

Figura 2: L.H.O.O.Q., 1919, por Marcel Duchamp. ............................................................................. 23

Figura 3: Cena do filme “O Encouraçado Potemkin”, 1925, de Serguei Eisenstein............................. 25

Figura 4: Fountain, 1917, por Marcel Duchamp................................................................................... 28

Figura 5: Merzbau, 1930, por Kurt Schwitters...................................................................................... 30

Figura 6: O chapéu faz o homem, 1920, por Max Ernst. ...................................................................... 31

Figura 7: Le Violon d'Ingres, 1924, por Man Ray................................................................................. 32

Figura 8: Cadavre exquis, 1938, por André Breton, Jaqueline Lamba e Yves Tanguy. ....................... 35

Figura 9: Cadavre Exquis, 1926-27, por Man Ray, Yves Tanguy, Joan Miró e Max Morise. ............. 35

Figura 10: Exquisite corpses digitais criadas por usuários do site An Exquisite Corpse. ..................... 36

Figura 11: O que exatamente torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes?, (1956), por Richard

Hamilton....................................................................................................................................... 38

Figura 12: Marilyn, 1967, por Andy Warhol. ....................................................................................... 39

Figura 13: Capa do álbum The Grey Album, 2004, do DJ Danger Mouse............................................ 43

Figura 14: Exemplo figurado da constituição do mashup, 2007, por Semantic Focus. ........................ 59

Figura 15: Chicago Crime..................................................................................................................... 59

Figura 16: Símbolo RSS........................................................................................................................ 65

Figura 17: Yahoo! Pipes........................................................................................................................ 75

Figura 18: Microsoft Popfly.................................................................................................................. 76

Figura 19: Google Mashup Editor. ....................................................................................................... 77

Figura 20: Places Data.......................................................................................................................... 83

Figura 21: Visual Headlines.................................................................................................................. 84

Figura 22: Last.fm + YouTube = music TV goodness. .......................................................................... 85

Figura 23: Liveplasma........................................................................................................................... 87

Figura 24: Doggdot.us........................................................................................................................... 88

Figura 25: Idiomag. ............................................................................................................................... 88

Figura 26: Diagrama representativo das relações entre os limites das categorias dos mashups. .......... 91

Figura 27: Twittervision. ....................................................................................................................... 94

Figura 28: Iguide. .................................................................................................................................. 95

Figura 29: Tag Galaxy. ......................................................................................................................... 96

Figura 30: Exemplo de visualização de fotos no mashup Tag Galaxy.................................................. 97

LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Intercâmbio de mensagens entre aplicação local e web service no protocolo SOAP........... 69

Quadro 2: Tags mais freqüentes encontradas durante o mapeamento dos mashups. ............................ 80

Quadro 3: Classificação inicial dos mashups. ....................................................................................... 82

Quadro 4: Categorias propostas para classificação dos mashups.......................................................... 89

Quadro 5: Matriz de funcionalidades das categorias dos mashups. ...................................................... 91

Quadro 6: Matriz de aplicativos. ........................................................................................................... 92

Quadro 7: Quantidade de APIs em mashups......................................................................................... 93

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Tags mais freqüentes encontradas no mapeamento dos mashups........................................ 81

Gráfico 2: Tags mais frequentes encontradas no site ProgrammableWeb............................................ 81

Gráfico 3: Tags mais frequentes encontradas no site Mashups & Web 2.0 API Directory................... 81

Gráfico 4: Tags mais frequentes encontradas no site Mashups Awards. .............................................. 82

Gráfico 5: Número de mashups cadastrados em 2008 no site Programmableweb. .............................. 92

SUMÁRIO

RESUMO ...................................................................................................................................6

ABSTRACT................................................................................................................................7

LISTA DE ILUSTRAÇÕES......................................................................................................8

LISTA DE QUADROS ..............................................................................................................9

LISTA DE GRÁFICOS...........................................................................................................10

INTRODUÇÃO........................................................................................................................13

Capítulo 1: Arqueologia do mashup......................................................................................17

1.1 Conceitos.................................................................................................................................... 17 1.1.1 Colagem.............................................................................................................................................. 19 1.1.2 Bricolagem.......................................................................................................................................... 20 1.1.3 Paródia ................................................................................................................................................ 22 1.1.4 Montagem ...........................................................................................................................................23 1.1.5 Remake................................................................................................................................................ 25

1.2 Movimentos artísticos precursores.......................................................................................... 26 1.2.1 Dadaísmo ............................................................................................................................................ 26 1.2.2 Surrealismo ......................................................................................................................................... 33

1.2.2.1 Exquisite Corpse ......................................................................................................................... 34 1.2.3 Pop Art................................................................................................................................................ 37 1.2.4 Grupo Fluxus...................................................................................................................................... 39

1.3 Remix.......................................................................................................................................... 40 1.3.1 Origens: cenário audiovisual e musical............................................................................................... 41 1.3.2 Cultura remix...................................................................................................................................... 44

1.3.2.1 Prática VJ .................................................................................................................................... 48 1.3.3 Autoria ................................................................................................................................................ 50

Capítulo 2: Características tecnológicas do mashup............................................................53

2.1 Arquitetura do mashup............................................................................................................ 53 2.1.1 Fornecedores de APIs ou conteúdos ................................................................................................... 55

2.1.1.1 APIs Públicas: Google Maps, You Tube e Flickr ........................................................................ 56 2.1.2 Mashup site......................................................................................................................................... 58 2.1.3 Aplicação cliente................................................................................................................................. 60

2.2 Tecnologias relacionadas.......................................................................................................... 61 2.2.1 Web feeds............................................................................................................................................ 61

2.2.1.1 RSS..............................................................................................................................................63 2.2.1.2 Atom............................................................................................................................................ 66

2.2.2 AJAX .................................................................................................................................................. 66 2.2.3 Protocolos SOAP e REST – web services........................................................................................... 68 2.2.4 Screen Scraping.................................................................................................................................. 71 2.2.5 Web semântica e RDF......................................................................................................................... 72

2.3 Ferramentas de apoio para o desenvolvimento de mashups................................................. 74

Capítulo 3: Mapeamento dos Mashups .................................................................................79

3.1 Metodologia ............................................................................................................................... 79

3.2 Coleta de dados: fontes primárias e secundárias................................................................... 80

3.3 Classificação dos mashups........................................................................................................ 80 3.3.1 Mapas em mashups............................................................................................................................. 83 3.3.2 Vídeos e fotos em mashups................................................................................................................. 84

3.3.3 Busca e compras em mashups............................................................................................................. 85 3.3.4 Notícias em mashups.......................................................................................................................... 87

3.4 Categorias propostas ................................................................................................................ 89 3.4.1 Localização geográfica ....................................................................................................................... 89 3.4.2 Visualização de dados......................................................................................................................... 90 3.4.3 Rede social.......................................................................................................................................... 90 3.4.4 Busca................................................................................................................................................... 90

3.5 Relações entre as categorias propostas ................................................................................... 90

3.6 Matriz de aplicativos................................................................................................................. 92

3.7 Estudos de Caso em mashups: Twittervision, Iguide e Tag Galaxy....................................... 93 3.7.1 Descrição de funcionamento............................................................................................................... 94 3.7.2 Referências.......................................................................................................................................... 97 3.7.3 Interpretação ....................................................................................................................................... 98

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................99

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................103

GLOSSÁRIO..........................................................................................................................107

ANEXOS ................................................................................................................................109

13

INTRODUÇÃO

Atualmente vivenciamos uma cultura híbrida que se acentua desde o fim do século

XX. Esta hibridização envolve as matrizes da linguagem (SANTAELLA, 2001). Além disso,

novas práticas fragmentárias estão surgindo e transformando o modelo de desenvolvimento

web com a proliferação dos mashups.

Todas as hibridizações ou intersemioses de linguagens, já presentes no jornal, revistas, no cinema, especialmente na televisão, dada sua natureza altamente híbrida, capaz de deglutir canibalisticamente os outros meios, são apenas epifenômenos quando comparadas à grande hibridização permitida pela digitalização e pela linguagem hipermidiática por ela introduzida com seus processos de comunicação inteiramente novos, interativos e dialógicos. (SANTAELLA, 2007, p. 84).

Para Santaella, o fato da linguagem como coexistente à estrutura rizomática das redes,

denominado por ela de “arquiteturas líquidas”, contribui diretamente para este processo:

[...] Sons, palavras e imagens que, antes, só podiam coexistir, passam a se coengendrar em estruturas fluidas, cartografias líquidas para a navegação com as quais os usuários aprendem a interagir, por meio de ações participativas como num jogo. Esse é o princípio da hipermídia, um princípio que se instala no cerne da linguagem. Embora a hipermídia possa se configurar em suportes como o CD-Rom e o DVD, ela se constitui hoje, sem nenhuma dúvida, na rizomática e infinita linguagem das redes. (SANTAELLA, 2007, p. 85).

Inerente à cultura remix, o mashup atua como um tipo de serviço, consolidando-se

como estética na medida em que traduz uma sensibilidade contemporânea, razão pela qual se

decidiu adotar o conceito “estética do mashup”, ou seja, as pessoas desejam poder contemplar

dados combinados de fontes distintas e comentar. Este tipo de agenciamento cognitivo do

mashup é funcional no cotidiano da cibercultura.

Diante disso, como identificar e relacionar a estética do mashup neste cenário? Qual o

ponto de partida? Em que medida o mashup de aplicativos web se relaciona com as práticas

antecedentes e contemporâneas do meio digital?

Esta pesquisa, no empenho de encontrar respostas a tais questionamentos, tem por

objetivo traçar um panorama histórico e contemporâneo do mashup, através da investigação e

14

identificação de sua origem, estrutura e prática no meio digital. O mashup, à medida que

possibilita produção, distribuição e recepção de sentido, será estudado enquanto linguagem.

Para discutir a estética do mashup, vamos primeiro apresentar os conceitos inerentes à

sua essência. Em seguida, verificar os antecedentes desta prática na história da arte, e então,

analisá-la e relacioná-la frente ao meio digital. Concluída a fundamentação teórica, elaborar-

se-á estudo das características tecnológicas acerca das particularidades do objeto e, por fim,

será realizado o mapeamento e estudos de casos através da análise de web sites que adotam a

técnica.

No primeiro capítulo, serão abordados os conceitos relativos à compreensão do

mashup como estrutura híbrida, detendo antecedentes nas práticas de colagem, bricolagem,

paródia, montagem e remake, responsáveis pela definição de uma estética fragmentária

própria, ora presente no campo das artes. O percurso será trilhado entre os respectivos

movimentos artísticos que se caracterizam essencialmente da utilização de uma ou mais

fontes no processo de criação e produção; compreenderá o hibridismo pós-moderno, fruto do

surgimento dos meios de comunicação em massa; encerrando-se na cultura remix, que embora

detenha raízes no ambiente musical, instituiu-se e disseminou-se a outros domínios devido à

convergência das mídias no meio digital.

O mashup, preferencialmente de aplicativos web, será tratado no âmbito da cultura

remix, que apresenta delimitações mais amplas e conseqüentemente engloba outras práticas,

que de modo geral, não serão discutidas aqui. As reflexões acerca da prática de remixagem da

informação e o mashup web, colaboração e autoria serão sustentadas a partir dos estudos de

Lev Manovich e Eduardo Navas, teóricos com evidência no desenvolvimento de pesquisas e

experimentações artísticas pertinentes a este universo.

Para melhor assimilação a estas reflexões, torna-se necessário uma análise dos

mashups de aplicativos web, examinando sua estrutura e funcionamento no meio digital. No

15

segundo capítulo, discorreremos sobre as características tecnológicas que definem a prática,

segundo as impressões técnicas pioneiras dos autores Duane Merrill, Jesse Feiler e Roy

Fielding; acentuando-se as APIs públicas dos serviços Google Maps1, You Tube2 e Flickr3.

Serão especificados distintivamente os elementos componentes da arquitetura mashup e as

tecnologias e padrões emergentes suportados, citando-se exemplos encontrados na rede. No

intuito de tornar o texto mais fluido e organizar todas as definições no mesmo lugar, decidiu-

se escrever os termos técnicos no glossário.

Mashup em termos gerais significa uma aplicação para web que combina dados de

uma ou mais fontes em uma ferramenta única integrada. Nesse sentido o mashup cria um

serviço de web novo e distinto que não era disponível originalmente por nenhuma das fontes.

No entanto, alguns autores apresentam uma definição mais restritiva, na qual são

considerados mashups apenas os programas aplicativos que se baseiam em APIs de outros

programas. Nessa definição os compartilhamentos são características distintivas dos mashups.

Nesta pesquisa será adotada a definição primeira, considerando o mashup como

combinação de dados a partir de uma ou mais fontes, caracterizando-se estas como APIs ou

não.

Expandindo o leque, no tocante ao desenvolvimento, serão discutidas possibilidades

de combinação de dados e construção de mashups através de ferramentas de apoio online

criadas para esse fim, como Popfly (Microsoft), Pipes (Yahoo!) e Google Mashup Editor

(Google).

Por serem próprios do meio híbrido e metamórfico digital, encontra-se na web uma

infinidade de modelos mashups. No ímpeto de organizá-los, realizou-se no terceiro capítulo

um ensaio de mapeamento inspirado na classificação de Merrill, que os distinguem de acordo

com o conteúdo apresentado; porém sobre uma nova perspectiva, propondo-se categorias

1 Disponível em: http://maps.google.com 2 Disponível em: http://www.youtube.com 3 Disponível em: http://www.flickr.com

16

próprias segundo a função que desempenham, estabelecendo sobretudo, relações peculiares às

mesmas. Para ilustrar essas categorias, elaboraram-se estudos de casos em três fases, através

da análise dos aplicativos Twittervision, Iguide e Tag Galaxy. Inicialmente, será efetuada a

descrição de funcionamento destes sites quanto às interfaces. No segundo momento, serão

discutidas as referências e, por fim, a interpretação.

17

Capítulo 1: Arqueologia do mashup

A origem do termo mashup ou mash it up é jamaicana e significa to destroy, do inglês,

para destruir; que no contexto musical deste país, possuía conotação positiva, remetendo ao

ato de exaltação sobre certa atuação performática ou evento. O termo também foi empregado

no hip-hop, especialmente em cidades como Nova York, que possui grande população

jamaicana.

Nos meios de comunicação, o mashup emergiu da combinação de parte(s) de uma4 ou

mais fonte(s), para criação de outra composição, ou seja, da recombinação de amostras

(samples) e fragmentos.

Contudo, para compreensão do mashup e a cultura remix contemporânea, devemos

analisar sua prática, a priori, sob a luz dos conceitos que o cercam, considerando, sobretudo,

os movimentos artísticos do qual são predecessores.

1.1 Conceitos

Os conceitos que circundam o mashup sustentam-se em sua essência no hibridismo e

fragmentação, como elementos constitutivos da linguagem. A hibridização das matrizes da

linguagem a que se refere Santaella (2001).

São responsáveis por engendrar uma poética com origens no movimento cubista, que

pode ser denominada como “estética do fragmento”, compreendendo as práticas de colagem,

bricolagem e montagem que percorreram diversas escolas artísticas até alastrarem-se e

enraizarem-se à cultura contemporânea da tecnologia da informação. Num primeiro momento,

consistiu da técnica, na composição artística a partir do relacionamento de fragmentos de

materiais distintos; transpondo-se posteriormente aos múltiplos aspectos da cultura com a

4 Evidencia-se aqui a possibilidade de criação do mashup a partir da combinação e reorganização de elementos extraídos de uma única fonte, a ser tratada mais detalhadamente no terceiro capítulo deste trabalho.

18

tecnologia da informação, constituindo mosaicos como elementos modulares da linguagem

passíveis de permutação contínua – o que Janet H. Murray chama de “caleidoscópio

multidimensional”:

[...] Ele [o computador] nos proporciona um caleidoscópio multidimensional, com o qual podemos reagrupar os fragmentos tantas vezes quantas quisermos, e permite que transitemos entre padrões alternados de organização em mosaicos. (MURRAY, 2003, p. 155).

A noção de reaproveitamento evidencia-se como característica universal acerca de

determinadas práticas acerca do fragmento, com o propósito de construção de um novo

sentido, proporcionado pela reorganização de outro preexistente. Remetem às versões;

derivadas da fusão de técnicas e inter-relações estéticas, onde cada obra é original por si.

Contribuem na promoção de novas percepções de mundo, inspiradas pela busca de uma forma

coletiva de se pensar; viável até então apenas no plano das idéias, como a Noosfera5 do

filósofo francês Teilhard de Chardin.

Para Paulo Laurentiz, esse processo de incorporar a informação existente dentro do

universo do fazer artístico através da cooperação para reciclá-la em novos produtos culturais,

denominado por ele de “co-operação por reciclagem da memória cultural” determina novos

desafios:

Trabalhar com a memória, encarada pelo aspecto da materialidade, ou seja, com a informação contida na produção natural ou cultural já realizada, exige outras formas de operar [...] Agora é necessário incorporar a informação existente dentro deste universo, tornando a autoria, na atualidade, uma co-autoria, fruto de um processo co-operativo. [...] A incorporação da memória informacional aponta para processos operacionais que procuram reciclá-la em novos produtos culturais. [...] (LAURENTIZ, 1999, p. 21).

5 Do grego noos, mente – “Ninguém pode negar que uma rede mundial de filiações econômicas e psíquicas está sendo tecida numa velocidade que aumenta sempre, que abraça e constantemente penetra cada vez mais fundo em nós. A cada dia que passa, torna-se um pouco mais impossível para nós agir ou pensar de forma que não seja coletiva.” (CHARDIN, 1947 apud ERCILIA, 2000, p. 27).

19

Ora, a partir do esboço desses conceitos, pretende-se estabelecer a compreensão dos

processos operacionais influentes na formação da produção cultural da estética mashup, assim

como também de práticas correspondentes.

1.1.1 Colagem

A colagem pode ser considerada uma prática da cultura híbrida e fragmentária

estabelecida ao longo do século XX, e posteriormente ampliada com o surgimento das novas

tecnologias.

Técnicas de colagem foram utilizadas pela primeira vez na China com a invenção do

papel, cerca de 200 A.C., e limitadas até o século XX, quando os caligrafistas chineses

começaram a aplicar papel colado e texto nas superfícies, onde escreviam seus poemas.

Do francês coller6; colar, a colagem foi um termo cunhado por Georges Braque e

Pablo Picasso no movimento cubista, no início do século XX, quando passou a ser uma

técnica característica da arte moderna, inaugurando a poética do fragmento.

Utilizada primeiramente nas artes visuais, a colagem constitui-se da composição de

vários elementos distintos, como pedaços de papéis coloridos, revistas, jornais, fotografias, ou

até mesmo outras obras de arte, que são colados numa peça de papel ou lona, na criação de

um novo conjunto. Seu emprego expandiu o conceito bidimensional de pintura para além do

suporte físico da tela, extrapolando o limite entre pintura e escultura, permitindo ao artista,

ruir com o sentido esperado e convencional; parodiando-o através da desconstrução no

impacto gerado pelos elementos colados.

A obra “Fruteira e copo” (1912) de Georges Braque é considerada uma das primeiras

colagens da arte moderna.

6 Veja mais sobre colagem em: http://en.wikipedia.org/wiki/Collage

20

Figura 1: Fruteira e copo, 1912, por Georges Braque.

No dadaísmo, a colagem sofre radicalização nos métodos usuais, ampliando suas

possibilidades com Kurt Schwitters através do procedimento Merz – a ser tradado com maior

detalhamento no movimentos artísticos; ao dialogar com a bricolagem na construção do irreal,

que posteriormente seria aderida pelos surrealistas.

1.1.2 Bricolagem

A bricolagem7, como coexistente e análoga à colagem, difere-se desta, na medida em

que a técnica é improvisada, empregando-se das circunstâncias e materiais disponíveis.

Deriva do francês bricoleur; bricolador, que significa uma pessoa que faz vários tipos de

trabalhos manuais. Na cultura popular é conhecida como o faça você mesmo.

7 Veja mais sobre bricolagem em: http://en.wikipedia.org/wiki/Bricolage

21

Como característica da arte visual pós-moderna, os materiais e objetos utilizados nas

bricolagens poderiam ser de toda espécie, de produção de massa a simplesmente lixo; que,

dispostos numa nova composição, esgotavam seus significados de objetos outrora isolados,

empregando-lhes novas acepções, totalmente diferentes do propósito definido originalmente.

Na literatura, possui correlação na colagem de textos em determinada obra literária, se

assemelhando à intertextualidade8 de Barthes e Lacan em solução à crítica do estruturalismo,

que promoveria adiante a noção atual de hipertexto:

Nesse texto ideal as redes são múltiplas e se entrelaçam sem que nenhuma possa dominar as outras, este texto é uma galáxia de significantes e não uma estrutura de significados; não tem início; é reversível e nela penetramos por diversas entradas, sem que nenhuma delas possa qualificar-se como principal; os códigos que mobiliza perfilam-se a perder de vista, eles não são dedutíveis (o sentido nesse texto nunca é submetido a um princípio de decisão e sim por um processo aleatório); os sistemas de significados podem apoderar-se desse texto absolutamente plural, mas seu número nunca é limitado, sua medida é o infinito da linguagem. (BARTHES, 1992, p. 39).

Para o antropólogo Levi-Strauss, o pensamento mítico também é considerado uma

forma de bricolagem, pois é gerado pela imaginação humana, baseado na experiência pessoal,

onde as imagens e entidades provêm de coisas pré-existentes. Strauss contrapõe o método do

engenheiro, sistemático e planejado, que se utiliza da matéria prima e da certeza da ciência; ao

do bricoleur, imaginativo e de improviso, que trabalha com sobras, numa colagem entre

desconstrução e reconstrução.

[...] à maneira do bricoleur que cuida das peças de um velho despertador desmontado e eles ainda podem servir para o mesmo uso ou para um uso diferente, por pouco que sejam desviados de sua função primeira. (LÉVI-STRAUSS, 1989, p. 51).

8 “A noção de intertextualidade, surgida na década de 60, se constitui em um modo de pensar sobre textos e de ler textos, nascido da proposta desconstrucionista abraçada pelos teóricos e críticos pós-estruturalistas. Para tais autores, escritores ao criar textos ou usar palavras o fazem com base em todos os outros textos e palavras com que deparam e os leitores lidam com os textos da mesma forma. A vida cultural é, pois, entendida como uma série de textos em intersecção com outros textos que possam tê-lo afetado ou que afetam o próprio crítico ao lê-lo”. (DIAS: 2000). Veja mais sobre intertextualidade em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Intertextualidade

22

Neste sentido, na bricolagem o significado do primeiro objeto ainda é presente, o que

não ocorre necessariamente com a colagem.

Jacques Derrida expande o conceito de Strauss, ao dizer que cada discurso é uma

bricolagem, alertando para a volubilidade do texto.

Se chamamos bricolagem a necessidade de emprestar seus conceitos ao texto de uma herança mais ou menos coerente ou arruinada, é preciso dizer que cada discurso é bricoleur9. (DERRIDA, 1967, p. 418, tradução nossa).

1.1.3 Paródia

Dentro do modelo intertextual mencionado, destaca-se a paródia10, que se revela como

técnica de apropriação, rompendo com o modelo retomado, sutil ou abertamente; pervertendo

o texto anterior, deslocando-o. Do grego par; contra e ode; canção, uma ode que perverte

outra ode, ou seja, paródia significa um contracanto, uma imitação que se estabelece contra o

original visando à ironia ou à crítica.

Para os escritores romanos e a literatura francesa neoclássica, a paródia possuía

conotação humorística, com o propósito de imitar trabalhos de outros poetas ou escritores

para esse fim.

Nas artes visuais, um ícone de obra paródica é L.H.O.O.Q. de Marcel Duchamp, que

parodia a Mona Lisa de LeonardodaVinci, adicionando à mesma barbicha e bigode. Em

francês, quando as letras L.H.O.O.Q. são pronunciadas uma após outra, a frase soa como “elle

a chaud au cul” ou “ela tem o rabo quente”. Através do humor e sarcasmo presentes na obra,

Duchamp busca questionar o real significado da arte, ao desprezar os métodos de produção

artísticos convencionais da época.

9 Tradução livre de: “Si l’on appelle bricolage la necessité d’emprunter ses concepts au texte d’un héritage plus ou moins cohérent ou ruiné, on doit dire que tout discours est bricoleur”. (DERRIDA, 1979, p. 418). 10 Veja mais sobre paródia em: http://en.wikipedia.org/wiki/Parody

23

Figura 2: L.H.O.O.Q., 1919, por Marcel Duchamp.

1.1.4 Montagem

Ora, investigando a estética da fragmentação na arte cinematográfica, desde a primeira

exibição dos irmãos Lumière em 1895, Paris, evidencia-se a técnica da montagem11, surgida

no final do século XIX, que se resume da colagem dos planos filmados, dispondo-os em

ordem cronológica segundo narrativa designada pelo diretor, buscando como resultado a

tradução da composição numa obra audiovisual coesa e concisa.

Tal técnica de produção fílmica consistiu num primeiro momento da colagem entre

planos e imagens (cinema mudo), posteriormente faixas sonoras sobre imagens: sincronizando

a fala com a personagem que a pronuncia (in) ou sobre determinada imagem (off), e musical:

11 Veja mais sobre montagem em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Montagem

24

mediante execução sob o plano da imagem (bg ou background), ou em destaque como trilha

sonora ou soundtrack.

Esta definição de montagem se evidencia no cinema de Jean-Luc Godard, cineasta

francês, onde a colagem é propositalmente percebida:

Geralmente o cinema procura, pela montagem dos elementos visuais e sonoros, uma fluidez de discurso que permite ao espectador sentir-se confortável na ilusão de que ele assiste a uma realidade não fabricada, ver que ele está ali participando. Em Jean-Luc Godard, a colagem é propositadamente visível. Todo seu cinema procura acusar o processo de fabricação. É colagem, seja do domínio do visual, sublinhada pelas falsas-ligações (um plano sucede ao precedente contrariando a disposição espacial dos corpos, por exemplo), seja do domínio do auditivo pela repetição de uma frase, pela inserção de uma música ou sua brusca interrupção. Não sem freqüência encontramos, em Godard, um fim de frase de jazz colado secamente a um fim de quadra de Beethoven. (POURVALI, 2006).

Resultante deste trabalho de cortar e colar há o excedente, o descarte, atuando como

dejeto, que; ao contrário da colagem e bricolagem das artes visuais, geralmente não é passível

de reutilização.

A montagem cinematográfica desenvolvida pela extinta União Soviética, no início do

século XX, expandiu a técnica através da experimentação radical da associação entre

imagens. A obra do cineasta Serguei Mikhailovich Eisenstein, que atuou como diretor entre

1923 e 1945, se destaca neste cenário, instituindo-se como notável contribuição na construção

da linguagem audiovisual estabelecida.

Oriundo da carreira teatral, Eisenstein se lançaria ao universo do cinema com o

manifesto “A montagem de atrações”:

A atração tal como a concebemos é todo o fato mostrado, conhecido e verificado, concebido como uma pressão produzindo um efeito determinado sobre a atenção e a emotividade do espectador e combinado a outros fatos possuindo a propriedade de condensar a sua emoção em tal ou tal direção ditada pelos objetivos do espetáculo. Deste ponto-de-vista, o filme não pode contentar-se simplesmente em apresentar, em mostrar os acontecimentos, ele é também uma seleção tendenciosa desses acontecimentos, a sua confrontação, libertos das tarefas extremamente ligadas ao tema, e realizando, em conformidade com o objetivo ideológico do conjunto, um trabalho adequado ao público. (EISENSTEIN, 1923).

25

Eisenstein promove em seus trabalhos o emprego contínuo da técnica da montagem,

nomeada por ele de intelectual, propondo uma dialética comparativa onde cada plano se

sobrepõe e conflita com o sucessor, determinando a evolução rítmica da narrativa.

Influenciado pela teoria dos reflexos condicionados de Pavlov, busca por meio de estímulos,

as reações desejadas no espectador.

Figura 3: Cena do filme “O Encouraçado Potemkin”, 1925, de Serguei Eisenstein.

1.1.5 Remake

Abstraindo a essência intrínseca a tais técnicas, permite-se deslumbrar num segundo

plano, a extensão da compreensão dos conceitos de apropriação e resignificação, mediante

análise da prática remake12 que as habitam variavelmente. Entende-se por remake, do inglês

refazer, a técnica de resignificar uma obra ou acontecimento existente, mediante criação de

um(a) novo(a), sob nova perspectiva, não explorada anteriormente, podendo ou não ser fiel à

original - denominada também como releitura.

12 Veja mais sobre remake em: http://en.wikipedia.org/wiki/Remake

26

1.2 Movimentos artísticos precursores

Para legitimar as inter-relações entre tais práticas fragmentárias, se faz necessário,

entretanto, percorrer certo percurso através da história da arte, identificando escolas e

movimentos predecessores ao conceito de mashup, na costura de uma verdadeira colcha de

retalhos. Dentre os quais se destacam o cubismo, dadaísmo, surrealismo, grupo Fluxus e a pop

art.

Os experimentos artísticos destes movimentos podem ser considerados notáveis na

medida em que consolidam as técnicas do fragmento, revolucionam os métodos de produção

artística e promovem a gênese de novas narrativas, ávidas por entrar em cena e revolucionar a

estética cultural pós-moderna.

1.2.1 Dadaísmo

O movimento Dadá ou Dadaísmo inaugura a investigação desta trajetória; criado em

1946 em Zurique, por um grupo de artistas plásticos e escritores que tinha como principal

propósito romper com o racionalismo. Para isso, utilizou vários métodos de desconstrução da

linguagem, das ambigüidades e seus múltiplos sentidos. Apresentava intensa resistência

política à Primeira Guerra Mundial e se caracterizava pela negação da arte. A palavra Dada,

em francês significa cavalo de pau, encontrada ao acaso por Hugo Ball e Tristan Tzara num

dicionário alemão-francês, eleita para simbolizar o movimento exatamente pelo apelo non-

sense13 do termo. Para o grupo, ante a irracionalidade da guerra, a arte deveria refletir o

espírito humano e questionar os valores intrínsecos à sociedade da época. O que se tornou

possível somente com o advento Dadá, mediante a livre expressão e o rompimento com as

convenções do fazer artístico.

13 Não sentido. Termo que expressa contradições, paradoxos.

27

Dada foi a explosão de uma reviravolta da vontade de viver e da cólera; foi o resultado da absurdidade, da sacanagem dessa guerra estúpida. Nós, os jovens, voltamos da guerra atordoados e nossa indignação precisou manifestar-se de alguma forma. Isso aconteceu naturalmente através dos ataques aos fundamentos de nossa civilização que provocou a guerra, ataques à língua, à sintaxe, à religião, à lógica, à literatura, à pintura, e assim por diante. (ERNST, 1974, p. 13).

Suas principais formas de expressão foram o poema aleatório e o ready made14,

utilizando-se do experimentalismo e de técnicas que envolviam o acaso; como colagem de

imagens ou associação de objetos, imagens e sons do cotidiano.

A construção do poema consistia da montagem aleatória de palavras, na ordem que

fossem sorteadas. Já o ready made pode ser considerado a expressão máxima do dadaísmo, o

questionamento da arte e do campo da arte propriamente dita; e Marcel Duchamp, seu

representante mais significativo, na medida em que rompe com o “fazer artesanal” que existia

na arte ao se apropriar de objetos do cotidiano industrializados, alterando suas funções

práticas, descontextualizando-os ao empregar-lhes status de obra de arte.

Os ready-made são objetos anônimos que o gesto gratuito do artista, pelo único fato de escolhê-los, converte em obra de arte. Ao mesmo tempo esse gesto dissolve a noção de obra. A contradição é a essência do ato; é o equivalente plástico do jogo de palavras: este destrói o significado, aquele a idéia de valor. Os ready-made não são anti-arte, como tantas criações do expressionismo, mas a-Rtísticos. (PAZ, 2004, p. 23).

A obra Fontain (Fonte) de Duchamp é considerada o ready made mais expressivo do

movimento dadaísta, exercendo notória influência no campo da arte contemporânea. Consistia

de um urinol de louça apresentado de cabeça para baixo na exposição de 1917, em Nova York,

enviada sob o pseudônimo R. Mutt, pois Duchamp fazia parte da direção do evento e preferiu

não assinar a obra, que foi rejeitada pelo júri por não considerá-la como arte. A intenção de

Duchamp é desmitificar e questionar o real significado da arte, afirmando que tudo pode ser

considerado como tal, desde que assim o autor deseje: "será arte tudo o que eu disser que é

arte" (DUCHAMP, 1915).

14 Expressão criada pelo artista Marcel Duchamp em 1913, para designar a apropriação de qualquer objeto industrializado e tratá-lo como arte por opção própria.

28

Figura 4: Fountain, 1917, por Marcel Duchamp.

A colagem foi uma técnica de experimentação amplamente adotada pelos dadaístas na

manifestação do acaso e inconsciente, criando uma estética própria, fundamentada, como

crítica aos métodos tradicionais e convencionais de produção artística.

Max Ernst define a técnica de colagem, dizendo que:

A técnica da colagem é a exploração sistemática do encontro casual ou artificialmente provocado de duas ou mais realidades estranhas entre si sobre um plano aparentemente inadequado, e um cintilar de poesia que resulta da aproximação dessas realidades. (ERNST, 1974, p. 49).

A primeira experiência de colagem dadaísta, segundo Hans Richter, provém de Jean

Arp, ao rasgar seu desenho e jogar os pedaços no chão, considerando-o insatisfatório,

formando ao acaso uma nova composição, de modo totalmente aleatório, porém, mais

significativa que outrora.

29

Quando por acaso, após algum tempo, seus olhos voltaram a pousar sobre estes pedaços que se encontravam no chão, surpreendeu-o a sua organização. Ela possuía uma expressão, que ele procurara inutilmente todo o tempo. Como era lógica a sua disposição, como era expressiva! Tudo o que ele não havia conseguido antes, apesar dos esforços, lá estava, feito pelo acaso, pelo movimento da mão e dos pedaços esvoaçantes, isto é, a expressão. Ele aceitou o desafio do acaso, interpretando-o como “destino”, e cuidadosamente colou os pedaços de acordo com a ordem determinada pelo “acaso”. (RICHTER, 1993, p. 63).

Já para Kurt Schwitters, a colagem de sua obra não é formada pelo acaso, mas os

materiais utilizados na sua composição o são; como objetos encontrados passíveis de relações

entre si, possibilitando atribuir-lhes novos significados; de material descartado e inutilizável à

matéria prima, promovendo a poética visual do fragmento.

Schwitters vinha realizando colagens com materiais encontrados ao acaso. Papéis de bala, bilhetes, selos, etiquetas do cigarro, jornal, enfim, vários materiais que seriam considerados lixo sem valor eram utilizados por Schwitters. (LEÃO, 2002, p. 26).

Através de suas colagens, Schwitters decide romper com o dadaísmo e se dedicar à

estética própria, qual chamou de Merz (1919). “O nome, criado ao acaso a partir de uma

colagem onde se lia Kommerz und Prvatbank, é uma abreviação” (LEÃO, 2002, p. 26).

Posteriormente passou a efetuar colagens em ambientes, como sua casa, que nomeou

Merzbau; construção Merz. Sua obra é caracterizada pela constante mutação; nunca ficaria

pronta, agregando diariamente objetos encontrados na sua composição.

Schwitters realizou três Merzbaus durante sua vida: Alemanha, Noruega e Inglaterra,

onde apenas esta última se conservou original; as outras foram destruídas pela guerra.

30

Figura 5: Merzbau, 1930, por Kurt Schwitters.

Servindo-se de recortes de fotografias, revistas, gravuras, catálogos e estampas, Max

Ernst desenvolve outra forma de colagem dadaísta.

Na colagem É o chapéu que faz o homem (o estilo é do alfaiate), de 1920, os homens são construídos por colunas de chapéus recortados de catálogos para venda. Dadamax zomba do ditado popular que enquadra qualquer um pelo estilo do chapéu usado: categorias sócio-econômicas visíveis pelo mais supérfluo e simbólico do respeitável vestuário masculino, o chapéu. (PASSETTI, 2007, p. 16).

31

Figura 6: O chapéu faz o homem, 1920, por Max Ernst.

A superposição de elementos passa a ser adotada por Francis Picabia, na criação de

pinturas baseadas em formas humanas após abandonar o antimecanismo15, período adotado

pelo artista anteriormente como crítica dadaísta às máquinas, na representação das mesmas

como inúteis e desprovidas de função; da qual participou também Man Ray, que se destacou

pela utilização da técnica da fotomontagem16, criada pelos dadaístas de Berlim e empregada

posteriormente pela maioria dos integrantes do movimento.

15 Octavio Paz aborda elemento presente também em Duchamp: “As máquinas são agentes de destruição e daí que os únicos mecanismos que apaixonam Duchamp sejam os que funcionam de um modo imprevisível - os antimecanismos”. (PAZ, 2004, p. 13). 16 Veja mais sobre fotomontagem em: http://www.cutandpaste.info

32

Figura 7: Le Violon d'Ingres, 1924, por Man Ray

Outras formas de experiência também foram empregadas em diferentes áreas da

colagem dadaísta, como a colagem sonora, presente nas performances do Cabaret Voltaire,

Suíça de 1916, que consistia da declamação de palavras poéticas por vários autores

simultaneamente, produzindo novos poemas de improviso.

A essência do movimento dadaísta, baseada no acaso e na extravagância, propiciou o

surgimento de muitos movimentos artísticos do século XX, como a Pop Art, o

Expressionismo Abstrato e o Surrealismo, que embora tão próximo ao dadaísmo, diferia

deste, principalmente por sua vocação construtiva.

33

1.2.2 Surrealismo

O surrealismo17 foi um movimento artístico e literário fundado na França pelo poeta

André Breton, na década de 1920, numa Europa aflita e fragilizada com o fim da Primeira

Guerra Mundial, ávida por novas formas de analisar e representar a realidade. A priori possuía

apenas expressão literária e caminhava ao lado do dadaísmo, que já anunciava sua morte na

mesma época.

O Manifesto Surrealista, publicação assinada por André Breton em 1924, que marcou

historicamente o nascimento do movimento, define o surrealismo, termo criado em

homenagem a Guillaume Apollinaire - escritor e crítico de arte francês, como “Automatismo

psíquico puro pelo qual se propõe exprimir, seja verbalmente, seja por escrito, seja de

qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento. Ditado do pensamento, na

ausência de todo controle exercido pela razão, fora de toda preocupação estética ou moral”

(BRETON, 1924, p. 10).

O movimento surrealista foi fortemente marcado pela valorização da liberdade e da

busca do inconsciente, agregado a uma filosofia de liberdade e ação, expressas tanto pela

literatura como nas artes plásticas. Segundo Breton (1942): “[...] Para iluminar o mundo, a

liberdade deve fazer-se carne e para isso refletir-se e recriar-se incessantemente no verbo.”

Teve como principais expoentes, Hans Arp, Joan Miró, Kurt Schwitters, Marcel

Duchamp, Max Ernst, Salvador Dali, André Masson, René Magritte, entre outros.

As principais técnicas empregadas pelo surrealismo nas artes plásticas foram a

colagem e a frottage18; enquanto que a literatura servia-se da escrita automática19.

17 Veja mais sobre surrealismo em: http://www.historiadaarte.com.br/surrealismo.html 18 Do francês frotter; friccionar. Técnica surrealista criada por Max Ernst, que consiste em friccionar um lápis ou outro objeto de desenho sobre folhas de papel em superfícies texturizadas, gerando imagens de improviso e aleatórias, através do decalque. O desenho pode ser usado do modo como foi transferido ou como base para refinamento adicional. 19 Tipo de escrita imediata não preparada, que emana naturalmente de forma incontrolada. Para os dadaístas e surrealistas, o resultado deveria ser uma escrita incondicionada à lógica e razão, rompendo com os padrões literários convencionais, que Breton definiu como “pensamento falado”.

34

A colagem incongruente era amplamente utilizada no movimento surrealista,

explorando através do automatismo, a força criativa do inconsciente dos artistas, valorizando

o anti-racionalismo e a livre associação de pensamentos e sonhos. Para os surrealistas, o

racionalismo aprisiona o espírito humano, forçando-o a abdicar de sua criatividade que lhe é

própria, censurando a livre expressão dos seus pensamentos.

Na literatura, os poetas surrealistas utilizaram-se também da técnica da colagem,

criando obras de modo coletivo e automático, buscando a abolição total da forma e conteúdo,

associando entre si palavras que nunca antes assim estiveram. Tal técnica propiciou o

surgimento do jogo surrealista exquisite corpse20.

1.2.2.1 Exquisite Corpse

Inicialmente, praticada na forma verbal, a exquisite corpse consistiu da colagem

coletiva através da escrita automática, num jogo em que os poetas adicionavam palavras à

obra a partir de regras pré-estabelecidas quanto à estrutura frasal, sem tomar conhecimento

prévio do que fora escrito pelo participante antecessor, ocultado através das dobras do papel;

estendendo em seguida as etapas aos demais, sucessivamente, até que o círculo estivesse

completo e a frase pudesse então ser revelada ao grupo. A obra final, fluída pelo acaso e a

materialização do inconsciente, resulta da autoria coletiva casual e não mais exclusiva,

criando então ruptura na distinção entre privado e público e desmitificando a aura do artista.

Posteriormente, nas artes visuais, a exquisite corpse empregou-se das técnicas do

desenho e da colagem, ostentando o mesmo funcionamento da verbal, diferenciando-se desta

pela limitação de participantes, definidos em número de três e a questão das cores, que não

poderiam ultrapassar o número utilizado pelo primeiro interventor. O desenho deveria se

20 A exquisite corpse, cadavre exquis ou cadáver esquisito foi introduzido no início do século XX pelo movimento surrealista francês. O nome foi derivado de uma frase que resultou da primeira vez que os surrealistas aplicaram o jogo: Le cadavre exquis boira le vin nouveau (O cadáver esquisito beberá o vinho novo).

35

prolongar por duas ou três linhas, para que o próximo proponente prosseguisse com a

execução da obra.

Figura 8: Cadavre exquis, 1938, por André Breton, Jaqueline Lamba e Yves Tanguy.

Figura 9: Cadavre Exquis, 1926-27, por Man Ray, Yves Tanguy, Joan Miró e Max Morise.

No caso específico da técnica de colagem, de acordo com Mary Ann Caws (1997), as

imagens são recortadas anteriormente de revistas, dicionários ou enciclopédias por cada um

dos proponentes e são escolhidas e justapostas gentilmente por cada um, no desenrolar do

jogo.

Cabe salientar que, mesmo com todas essas regras, a intervenção do acaso pela ignorância dos participantes em relação ao que foi escrito ou desenhado anteriormente é a principal responsável pelo sucesso dos cadavres exquis tanto verbais como visuais, afinal com a existência desses fatores não há como prever de que modo os participantes integrarão as suas contribuições, uma vez que eles limitam o controle exercido pela razão. (PIANOWSKI, 2007).

Mesmo aparentemente possuindo estrutura mais rígida, as exquisite corpse visuais

apresentavam maior surpresa, visto que as imagens não existem no mundo racional, ao

36

contrário do que sucedem as verbais; que se valem do agrupamento de objetos encontrados,

que de algum modo, individualmente, já são conhecidos por artista e observador. Tal analogia

pode-se associar à técnica da colagem, porém, por se tratar de imagens, como nos desenhos,

busca-se a construção de um sentido, mesmo através da utilização de objetos totalmente

incongruentes entre si, constituindo imagens caóticas, instigantes, enigmáticas e únicas.

Na web há o site An Exquisite Corpse21 que atua como uma versão eletrônica para

realização das exquisite corpses visuais. Nesse experimento o processo de criação é o mesmo

utilizado pelos surrealistas, porém, agora digitalizado.

Figura 10: Exquisite corpses digitais criadas por usuários do site An Exquisite Corpse.

As colagens surrealistas, fundamentadas no inconsciente e na liberdade de expressão,

propiciaram fértil território para a continuidade e experimentação da técnica da colagem,

influenciando movimentos artísticos próprios da arte contemporânea, como a Pop Art.

21 Disponível em: http://www.anexquisitecorpse.net

37

1.2.3 Pop Art

Surgida na Europa em meados da década de 1960, em oposição ao expressionismo

abstrato e adquirindo maior exposição na sociedade de consumo americana pós II Guerra

Mundial, a Pop Art, diferentemente do surrealismo, encontra na sociedade racionalista da

época, grande repertório imagético, incorporando-se da visualidade moderna das histórias em

quadrinhos, fotografia, publicidade, televisão e cinema; trazendo elementos do cotidiano para

o campo da arte institucionalizada.

A construção desse cenário instituído pela Pop Art, dos produtos de consumo em

massa; refrigerantes, automóveis, enlatados às estrelas do cinema Hollywoodiano, constituiu-

se o símbolo principal do movimento. Nomes dos principais representantes americanos

emergiram nesse período; como Andy Warhol, Roy Lichtenstein, Claes Oldenburg, James

Rosenquist, Tom Wesselman e Robert Rauschenberg.

A obra pop de 1956, intitulada “O que exatamente torna os lares de hoje tão diferentes,

tão atraentes?”, do pintor inglês Richard Hamilton, amplia a técnica da colagem, compondo

simultaneamente elementos de anúncios publicitários, fotografias e história em quadrinhos,

anunciando a estética da colagem contemporânea.

38

Figura 11: O que exatamente torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes?, (1956), por Richard Hamilton.

Andy Warhol é considerado o artista pop por excelência, representando o verdadeiro

“estilo de vida americano”; tendo atuado como artista plástico, escritor, diretor de cinema e

apresentador de TV. Através da técnica da serigrafia, associou a reprodução mecânica à

indústria de produção em massa, nas reproduções das garrafas de Coca-cola e latas de sopas

Campbell. Criou também obras servindo-se de mitos e celebridades, que retratavam a

futilidade das quais as personalidades públicas representavam, como produtos prontos para o

consumo; objetos imagéticos fabricados pela mass media.

39

Figura 12: Marilyn, 1967, por Andy Warhol.

De certa forma, as obras de Warhol podem ser vistas como um “proto” database arte,

um início de uma forma de arte que se baseia em banco de dados, no caso, imagens advindas

da publicidade e dos meios de comunicação em massa.

1.2.4 Grupo Fluxus

Simultaneamente à paisagem pop, surge também na década de 1960, o movimento

Fluxus22; grupo de artistas de várias nacionalidades, organizado em 1961 por George

Maciunas através da revista Fluxus, com o propósito inicial de publicar textos dos artistas de

forma colaborativa. Participaram do grupo, artistas como John Cage, Nam June Paik, Wolf

Vostell e Yoko Ono.

22 Do latim, fluxo. Veja mais sobre o grupo Fluxus em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Fluxus

40

Posteriormente, o grupo Fluxus se destacou pela contestação do sistema museológico,

considerado mercantil, realizando obras claramente adversas às convenções artísticas da

época. Através de performances, happenings23, publicações e vídeos; transporta o cotidiano

para o campo das artes e valoriza a produção coletiva em rede, prenunciando a colagem do

meio digital.

Cercado de intensa influência pop e dadaísta, o grupo Fluxus foi responsável também

por várias experimentações. Destacando-se entre elas, a arte conceitual24, em que a idéia

possui maior relevância que a execução da obra em si, podendo esta, até ser realizada por um

terceiro, desde que orientado pelo artista; ou então, nem mesmo precisa ser produzida. Trata-

se da desmaterialização da obra de arte, transpondo-a para além do campo visual, como crítica

à sociedade materialista.

Atualmente há uma derivação do grupo Fluxus que permanece ativa, dando

continuidade às propostas do grupo original através de ações via internet25, concretizando a

experiência real de interação e colaboração dos seus membros, no intercâmbio de produções

artísticas e textuais.

1.3 Remix

Com a evolução dos meios de comunicação e a eclosão de novos aparatos

tecnológicos no meio eletroacústico e audiovisual, como os sintetizadores, o sampler e o

videocassete; novas formas de tratamento sonoro e visual passam a ser difundidas e

incorporadas pela cultura de massa, contribuindo para o surgimento de uma nova prática,

conhecida como remix ou remixagem.

23 Do inglês, acontecimento. Expressão artístico-cênica com elementos de improvisação. Difere-se da performance pelo caráter de imprevisibilidade inerente à sua realização, podendo envolver participação direta ou indireta do público expectador. 24 Veja mais sobre arte conceitual em: http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/ index.cfm? fuseaction= termos_texto&cd_verbete=3187 25 Disponível em: http://www.fluxus.org

41

Por definição, entende-se por remix, o conjunto de práticas sociais e comunicacionais

de combinações, colagens, cut-up26 de informação, que se expandiu do pós-modernismo,

atingindo o apogeu com as tecnologias digitais (LEMOS, 2005). Tal prática pode-se comparar

às colagens realizadas anteriormente no campo das artes visuais e da literatura, consistindo da

apropriação, desconstrução e reciclagem de fragmentos ou obras completas, próprias ou de

outros artistas, reinterpretando seu estado original, empregando-lhes novos significados.

1.3.1 Origens: cenário audiovisual e musical

Com o ingresso do video tape nos meio de produção televisiva e o lançamento

comercial do videocassete na década de 1970, torna-se possível o registro de imagens para

posterior exibição, revolucionando o modo de transmissão exclusivamente “ao vivo”

realizado pelas emissoras até então. Diante dessa nova forma de se produzir e ver televisão,

tais aparelhos instauram uma nova estética na cultura de massa, fundamentada na técnica de

edição, do cortar e colar, da composição e sobreposição de elementos imagéticos e sonoros,

concebendo uma nova linguagem audiovisual.

A técnica da edição do vídeo difere da montagem cinematográfica no suporte

magnético empregado, possibilitando sua manipulação tanto no meio comercial profissional,

como para o usuário doméstico, através do descarte do desnecessário e da atemporalidade,

criando um telespectador portador de escolha e de necessidades personalizadas de consumo

audiovisual.

Através da prática do vídeo e da edição, Godard expande a técnica da colagem,

servindo-se da imagem de outros vídeos, da televisão e recursos gráficos, como inclusão de

fotografias, textos, registros sonoros, etc.

[...] Seus filmes-ensaios, como Histoire(s) du cinema, oferecem uma colagem muito composta de citações de filmes de ficção, casos da atualidade, reportagens,

26 Veja mais sobre cut-up em: http://en.wikipedia.org/wiki/Cut-up

42

fotografias de arquivo, citações de filosofia, trechos de seus filmes, músicas, comentários pessoais, etc. É um cinema que entra cada vez mais no domínio da poesia. Mas o cineasta praticamente não filma mais neste tipo de cinema. Ele assiste, ele junta, ele mostra, ele cola um material pré-existente que se modifica27. (POURVALI, 2006, tradução nossa).

Na esfera sonora, os sintetizadores e o sampler28 impulsionam a prática remix. Surgido

no final da década de 1960 e início de 1970, o remix inicia-se com a música dos DJs na

cidade de Nova York, que recombinavam ou estendiam as músicas para adaptá-las às pistas

de dança; prática com raízes na música jamaicana. Geralmente um remix musical29 atua como

uma reinterpretação da canção pré-existente, mantendo sua essência original sobre a versão

remixada.

O artista e pesquisador Eduardo Navas classifica o remix em três categorias distintas

(extendido, seletivo e reflexivo), de acordo com seus antecedentes musicais:

O primeiro remix é o extendido, que é uma versão mais longa que a canção original, contendo longas seções instrumentais tornando-a mais mixável para o club DJ. [...] O segundo remix é seletivo; consiste da adição ou subtração de material da canção original. Este é o tipo de remix que tornou os DJs produtores populares na música mainstream [...] O terceiro remix é reflexivo; alegoriza e amplia a estética da amostragem, onde a versão remixada desafia a aura do original e reivindica autonomia até quando carrega o nome do original; material é adicionado ou excluído, mas as faixas originais são em grande parte mantidas intactas para serem reconhecidas.30 (NAVAS, 2007, tradução nossa).

27 Tradução livre de: “Ses films-essais, comme Histoire(s) du cinéma, s’offrent comme un collage très composite de citations de films de fiction, de bandes d’actualité, de reportages, de photographies d’archives, de tableaux de maîtres, de citations de philosophes, de bandes son de films, de musiques, de commentaires personnels, etc. C’est un cinéma qui entre, chaque fois davantage, dans le domaine de la poésie. Mais le cinéaste ne filme pratiquement plus dans ce type de cinéma-là. Il recadre, il assemble, il monte, il colle un matériau pré-existant qu’il métamorphose.” (POURVALI, 2006). 28 “Herdeiro do Fairlight CMI, desenvolvido pelos australianos Kim Rydie e Peter Vogel entre 1975 e 1979, e aperfeiçoado na dança anônima da música eletrônica, o sampler é um aparelho que grava e permite a manipulação de amostras sonoras. Com o sampler, compor torna-se também na música pop a arte de combinar sons e trechos de músicas. O procedimento remete às práticas da música eletroacústica, mas desenvolve-se com nome e atitude nos subúrbios das grandes cidades norte-americanas, sendo o rap nova-iorquino e a música criada para as warehouse parties de Detroit as manifestações pioneiras.” (BASTOS, 2005, p. 11). 29 Veja mais sobre remix musical em: ARANGO, Julián J. Homens, máquinas e homens-máquina: o surgimento da música eletrônica. Campinas, 2005, 182 p. Dissertação (Mestrado em Multimeios). Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas. 30 Tradução livre de: “The first remix is extended, that is a longer version of the original song containing long instrumental sections making it more mixable for the club DJ. […] The second remix is selective; it consists of adding or subtracting material from the original song. This is the type of remix which made DJs popular producers in the music mainstream. […]The third remix is reflexive; it allegorizes and extends the aesthetic of sampling, where the remixed version challenges the aura of the original and claims autonomy even when it

43

Em 2004, o DJ americano Brian Joseph Burton, mais conhecido como Danger Mouse,

combinou amostras instrumentais não autorizadas dos Beattles, álbum auto-intitulado LP The

Beatles, mais conhecido como The White Album, com a versão a cappella do Black Album do

rapper Jay-Z para criar o The Grey Album, mais polêmico e popular álbum remix. De acordo

com Navas, o The Grey Album pode ser classificado como um remix reflexivo, ou até mesmo

como um mashup prematuro, que reivindica autonomia própria através da apresentação de

faixas totalmente exclusivas, potencializando as fontes originais.

Figura 13: Capa do álbum The Grey Album, 2004, do DJ Danger Mouse.

Conseqüentemente, com a popularização do trabalho, Danger Mouse emerge a tensão

existente entre a indústria musical e as mídias emergentes no que se diz respeito à preservação

dos direitos autorais, do uso de amostras musicais e a prática da remixagem; culminando na

proibição do direito de distribuição do seu álbum através da Internet pela gravadora EMI,

detentora dos direitos autorais do White Album, alegando-se uso não autorizado de material

restritivo. carries the name of the original; material is added or deleted, but the original tracks are largely left intact to be recognizable.” (Navas, 2007).

44

1.3.2 Cultura remix

Após o aparecimento do computador pessoal na década de 1970, o remix vai se

afastando como prática exclusiva do meio musical e passa a integrar outras formas, como

vídeo, som, imagens, texto e dados.

Esta expansão se acentua no fim do século XX e início do XXI com o crescimento

vertiginoso do fluxo de informação gerado pela Internet, surgindo então a necessidade da

circulação dessa informação pelas pessoas, agora conectadas em rede; aliando-se ao fato, a

composição de toda produção informacional digital centrar-se no parâmetro universal do

código binário, instituindo a essência da “revolução digital” a que se refere Santaella:

O aspecto mais espetacular da era digital está no poder dos dígitos para tratar toda informação, som, imagem, vídeo, texto, programas informáticos, com a mesma linguagem universal, uma espécie de esperanto das máquinas. Graças à digitalização e compreensão de dados, todo e qualquer tipo de signo pode ser recebido, estocado, tratado e difundido, via computador. Aliada à telecomunicação, a informática permite que esses dados cruzem oceanos, continentes, hemisférios, conectando potencialmente qualquer ser humano no globo numa mesma rede gigantesca de transmissão e acesso que vem sendo chamada de Ciberespaço. Catalizados pela multimídia e hipermídia, computadores e redes de comunicação passam assim por uma revolução acelerada no seio da qual a internet, rede mundial das redes interconectadas, explodiu de maneira espontânea, caótica, superabundante [...] (SANTAELLA, 2003, p. 70-71).

Caminhando no mesmo sentido, Bastos (2005, p. 4) generaliza o conceito de sampler

para além do universo musical ao dizer que “[...] o uso de amostras como forma de

manipulação de linguagem em que há um novo tratamento de material previamente criado não

se restringe à música [...]”.

O computador unifica as práticas de tratamento de mídias, na medida em que as manipula todas a partir do parâmetro comum do código binário. Mesmo em micros domésticos é possível converter praticamente qualquer produto cultural em arquivos que podem ser armazenados, editados e distribuídos em formato digital. Nesse sentido, o scanner pode ser usado como um sampler de imagens, o OCR como um sampler de textos, o bloco de notas como um sampler de código-fonte, as placas de captura de vídeo como um sampler audiovisual e assim por diante (BASTOS, 2005, p. 4).

45

Complementando essa importante característica do meio digital, Murray destaca

também a capacidade enciclopédica que ele induz, estendendo e potencializando a memória

humana:

[...] Uma vez que toda forma de representação está migrando para o formato eletrônico e todos os computadores do mundo são potencialmente acessíveis entre si, podemos agora conceber uma única e compreensível biblioteca global de pinturas, filmes, livros, jornais, programas de televisão e bancos de dados, uma biblioteca acessível de qualquer parte do globo. É como se a versão moderna da grande biblioteca de Alexandria, que continha todo o conhecimento do mundo antigo, estivesse a ponto de se rematerializar na vastidão infinita do ciberespaço. [...] (MURRAY, 2003, p. 88).

Tal cenário estabelece a “cultura remix”, expressão difundida por Lawrence Lessig

para descrever uma sociedade que permite e encoraja a criação de trabalhos derivados, ou

seja, possibilita a criação e a prática de remixagem da informação a partir de qualquer tipo de

fonte disponível (textos, sons, imagens, vídeos, dados, etc.), proveniente ou não da rede;

através do uso de softwares31 específicos para esse fim, tornando-a posteriormente disponível

para outros mediante compartilhamento. Nesse sentido, pode-se dizer também, que a cultura

remix aflora o espírito colaborativo32 presente na rede.

Para Navas: “[...] a cultura remix pode ser definida como uma atividade global

consistindo de uma criativa e eficiente troca de informação possibilitada pelas tecnologias

digitais, suportada pela prática do copy and paste.33” (NAVAS, 2007, tradução nossa).

Hoje, Remix (a atividade de pegar exemplos de materiais pré-existentes para combiná-los em novas formas de acordo com o gosto pessoal) foi estendido para outras áreas da cultura, incluindo as artes visuais; exerce uma função vital na

31 De aplicativos profissionais de modelagem 3-D para desenvolvimento de animação gráfica para a indústria cinematográfica, como o Maya, aos domésticos para produção de textos como o Microsoft Word. 32 Veja mais sobre colaboração em: PASCOAL, Roger. Colaboração e Cognição na World Wide Web. São Paulo, 2008. Dissertação (Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 33 Tradução livre de: “[…] remix culture can be defined as the global activity consisting of the creative and efficient exchange of information made possible by digital technologies that is supported by the practice of cut/copy and paste.” (NAVAS, 2007).

46

comunicação de massa, especialmente na Internet.34 (NAVAS, 2007, tradução nossa).

Neste meio é inerente ao mundo do usuário a prática de recombinação, personalização

e interação, onde “[...] é esperado agora do usuário que toque com os arquivos (como um DJ

com os discos) e não somente ouça ou os veja passivamente, porque interagir, tocar, ou no

caso do usuário online, clicar, está agora integrado à cultura.35” (NAVAS, 2007, p. 4, tradução

nossa).

Para Manovich, o usuário não atua mais apenas como um mero receptor passivo, ele

agora filtra, remixa e compartilha a informação, atuando também como um emissor no ciclo

da cadeia informacional.

Se o modelo tradicional do século vinte da comunicação cultural descrevia a circulação da informação em uma direção da fonte para o receptor, agora o ponto de recepção é apenas uma estação temporária no caminho da informação. Se compararmos a informação ou objeto de mídia com um trem, então cada receptor pode ser comparado a uma estação ferroviária. A informação chega, é remixada com outra informação, e então o novo pacote viaja para outro destino onde o processo é repetido.36 (MANOVICH, 2005, p. 1, tradução nossa).

Em geral, pode-se dizer que a estética contemporânea da cultura remix define-se por

meio de remixes, fusões, colagens ou mashups, seja no campo da moda, música, design,

comida, artes ou aplicações web. Manovich (2007) vai além, ao pressupor que o remix

dominará esta década e a próxima (2001-2020), assim como o pós-modernismo definiu os

anos 1980.

34 Tradução livre de: “Today, Remix (the activity of taking samples from pre-existing materials to combine them into new forms according to personal taste) has been extended to other areas of culture, including the visual arts; it plays a vital role in mass communication, especially on the Internet.” (Navas, 2007). 35 Tradução livre de: “[…] the user now is expected to play with the files (like a DJ with records) and not just listen or view them passively, because interaction, touching, or in the case of the online user, clicking, is now integrated into culture.” (NAVAS, 2007:04). 36 Tradução livre de: “If a traditional twentieth century model of cultural communication described movement of information in one direction from a source to a receiver, now the reception point is just a temporary station on information’s path. If we compare information or media object with a train, then each receiver can be compared to a train station. Information arrives, gets remixed with other information, and then the new package travels to other destination where the process is repeated.” (Manovich, 2005, p. 1).

47

Diante essa paisagem, recursos como cortar, copiar e colar consolidam-se

amplamente, tornando-se vitais inclusive para as aplicações web no desenvolvimento dos

mashups.

No ambiente web, os mashups caracterizam-se pela remixagem de dados, combinando

e reconfigurando amostras de conteúdos de uma ou mais fontes distintas para acessar

informação específica mais eficientemente, formando uma nova aplicação, com novas

funcionalidades. A soma desses serviços integrados nas aplicações mashup possibilita sua

utilização de modo não previsto anteriormente por seus desenvolvedores, expandindo a

capacidade original dos aplicativos.

Cabe salientar aqui, que o mashup, mesmo possuindo raízes nos princípios explorados

inicialmente pela música, nem sempre pode ser considerado remix; mas um tipo específico

deste, aquele que potencializa o conteúdo de suas fontes subvertendo-as, que não é uma, nem

outra, mas algo novo, com identidade própria, independente, com características só possíveis

diante do hibridismo, inexistente ora nas fontes isoladas. Em outro sentido, poderíamos dizer

que o mashup web estaria mais para o remix reflexivo da classificação de Navas. Um tertium

quid37, onde dois ou mais elementos juntos formam uma terceira coisa, em que o todo é

diferente da soma das partes individuais.

Para melhor distinção, pode-se dizer que os mashups de aplicações web não são

definidos particularmente por softwares, mas modelos de vinculação de diferentes tecnologias

para preencher uma necessidade específica, geralmente um propósito prático, enquanto que os

mashups musicais são desenvolvidos para fins de entretenimento e supostamente consumidos

por prazer.

37 Do latim “terceira coisa”, foi um termo usado primeiramente nos debates Cristológicos do século IV para remeter aos seguidores de Apollinaris, que falava de Cristo como algo nem humano nem divino, mas uma mistura dos dois e, portanto uma “terceira coisa”.

48

1.3.2.1 Prática VJ

Própria da cultura remix, a prática VJ38, também conhecida como live images (imagens

ao vivo) ou vídeo ao vivo, consiste de performances de exibição de vídeos elaboradas através

da manipulação de imagens em tempo real, utilizando-se das técnicas de colagem,

apropriação e recombinação, na construção de narrativas videográficas geralmente síncronas

ao discurso musical produzido pelos DJs. Enquanto o DJ manipula a música, o VJ seleciona

fragmentos de vídeos ou imagens (loops) simultaneamente, aplicando efeitos sobre os

mesmos, como alteração de propriedades de cor, distorções ou transições, variando-os de

acordo com o ritmo estabelecido.

Como pioneiros na construção dessa relação sonora-imagética, destaca-se durante a

década de 1970 o grupo musical alemão Kraftwerk, servindo-se de um repertório

experimental fundamentado na construção de instrumentos e recursos eletrônicos próprios,

como filtros e amostras sonoras procedentes de ruídos da natureza.

Na prática VJ, o vídeo pode ser considerado obra do imprevisto, do acaso e do

aleatório, elementos constitutivos que o aproximam das colagens dadaístas (MELLO, 2004).

Seguindo uma lógica do imprevisto, do acaso e da aleatoriedade, já preconizados nas artes visuais tanto pelo dadaísmo de Schwitters como pelo Fluxus, na literatura por Mallarmé e na música tanto pelos improvisos do jazz quanto por John Cage e Pierre Boulez, há no vídeo ao vivo a manipulação e reordenação das imagens em tempo real a partir da seleção de um banco de dados pré-existente (formado por elementos apropriados da cena midiática, na maioria dos casos) ou não. (MELLO, 2004, p. 57).

O inacabamento ora apresentado no procedimento Merz de Schwitters aplica-se em

igual teor ao vídeo ao vivo, estabelecendo-se uma relação de construção-desconstrução

permanente, que, segundo Mello (2004), rompe com a idéia de vídeo como produto final

apresentada em suportes tradicionais, como a película, a fita magnética ou o cd/dvd digital. A

obra permanece aberta, suscetível a novas associações.

38 Do inglês Visual-Jockey, termo designado inicialmente aos apresentadores de videoclipes do canal de televisão MTV.

49

Os trabalhos de vídeo ao vivo estendem-se à cultura remix, na medida em que se

valem do reaproveitamento de amostras visuais pré-existentes para construção de um novo

significado, onde as imagens utilizadas (fixas ou em movimento) são de modo geral

reapropriadas de um banco de dados universal compartilhado (mídia impressa, televisão e

web), com ou sem permissão dos seus autores. A construção de sentido aqui, se dá através dos

expectadores mediante associações entre as imagens, como ocorre na “montagem intelectual”

de Eisenstein.

A principal referência para o vídeo ao vivo, segundo Lucas Bambozi (2003) em seu

texto “Outros Cinemas”, é o filme manifesto de Dziga Vertov “O Homem da Câmera” (1929),

editado de modo a subverter a noção de linearidade e de obra acabada; explorando os

múltiplos pontos de vista das pessoas (personagens) acerca do cotidiano nas ruas e no

trabalho, expondo concomitantemente o processo de produção do filme, tal como filmagem,

montagem e sua projeção em salas de cinema. Para Bambozi, a obra apresenta uma “[...] fina

sintonia com as linguagens do universo digital, que se utiliza de layers e sugere o hipertexto,

o fragmento, a repetição, a reciclagem e a simultaneidade.” (BAMBOZI, 2003, p. 63).

Mesmo a televisão que já apresenta usualmente programação ao vivo, pode

acompanhar experimentos mais radicais na prática VJ, como a transmissão de Wrap Around

The World de Nam June Paik para a abertura das Olimpíadas de Seul em 1988. Paik recebia

eventos ao vivo de diversos países, os manipulava e retransmitia ao mundo via satélite em

tempo real.

Para Mello, o experimentalismo da prática VJ, mais do que a obra em si, compreende

os gestos criativos em torno do tempo real e formação de ambientes sensoriais, na busca de

uma poética não-linear, “[...] que não permite a contemplação estática e que apela a todos os

sentidos” (2004, p. 63-64). Nesse meio, o remix apresenta-se como prática dominante.

50

1.3.3 Autoria

Para Lev Manovich, a cultura remix estabelece novos paradigmas acerca da questão

dos regimes de autoria39, que podem ser considerados ilusão, partindo-se do pressuposto que a

prática se desenvolve a partir da reconfiguração de amostras de seus autores. Como nas

exquisite corpse surrealistas, a autoria não é relevante na prática remix, mas sim o método de

produção.

[...] em um nível geral e abstrato, posso afirmar que um bom remix é um diálogo entre o autor do remix e os autores dos trabalhos que estão sendo remixados. E, já que muito freqüentemente os próprios músicos remixam suas músicas e letras antigas, o remix pode ser também um diálogo com o meu próprio eu antigo. (MANOVICH, 2007).

Confrontando o significado de apropriação e remix, Manovich atenta para

compreensão do primeiro como a indicação de posse de um signo, sem entretanto reestruturá-

lo. Tal conclusão parte da observação do urinol de Duchamp na obra “A Fonte”, concluindo

que: “[...] o efeito estético aqui é o resultado da transferência de um signo cultural de uma

esfera para outra, ao invés da modificação de um signo40” (MANOVICH, 2007, p. 3, tradução

nossa), enquanto que o sentido de remix aponta para o caminho oposto: “[...] sugere um re-

trabalho sistemático de uma fonte, significado qual ‘apropriação’ não possui [...]41”

(MANOVICH, 2007, p. 3, tradução nossa).

A polêmica discussão entre o que é remix ou apropriação, divide a opinião de artistas,

usuários e indústria, dificultando o estabelecimento dos seus limites. Com o advento da

cultura remix e a necessidade de compartilhamento constante, próprio das redes, expande-se a

“autoria por seleção”, tal como foi denominada por Manovich, em que o processo de seleção e

39 Veja mais sobre a questão autoral acerca das novas tecnologias da informação em: MAGALHÃES, Thásia. A criação no ciberespaço e as licenças autorais alternativas. São Paulo, 2008. Dissertação (Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 40 Tradução livre de: “[…] the aesthetic effect here is the result of a transfer of a cultural sign from one sphere to another, rather than any modification of a sign.” (MANOVICH, 2007:03). 41 Tradução livre de: “[…] it suggests a systematic re-working of a source, the meaning which ‘appropriation’ does not have […]” (MANOVICH, 2007, p. 3).

51

combinação dos elementos se manifestam como fundamentais em detrimento da propriedade

intelectual.

Diante dessa realidade, surge então a necessidade de repensar a estrutura estabelecida

e promover novas reflexões acerca do modus operandi das produções culturais, como o fazem

as iniciativas open source42 e creative commons43, agindo como alternativas frente ao cerne da

questão autoral.

42 Conjunto de princípios e práticas que promovem o acesso ao processo de produção e design de várias mercadorias, produtos, recursos, e conclusões técnicas. O termo é comumente aplicado ao código-fonte de softwares que são colocados à disposição do público em geral sem restrições à propriedade intelectual, ou restrições mínimas. Veja mais sobre open source em: http://www.opensource.org 43 Creative Common (CC) é uma organização não-governamental devotada à expandir o leque de trabalhos disponíveis legalmente para compartilhamento e re-utilização. Esta organização tem lançado diversas licenças de direitos autorais conhecidas como licenças Creative Commons. Algumas destas licenças restringem apenas alguns direitos, ou mesmo nenhum, sobre os trabalhos a que se referem. Veja mais sobre creative commons em: http://creativecommons.org.br

53

Capítulo 2: Características tecnológicas do mashup

2.1 Arquitetura do mashup

O mashup, como foi apresentado mais detalhadamente no capítulo um, utiliza

aplicativos e/ou conteúdos de uma ou mais fontes. Tanto o conteúdo como o aplicativo são

acessados através de uma interface pública ou uma API.

A interface de programação de aplicativos (API) compreende o conjunto de instruções

e padrões de programação fornecidos por um sistema operacional, biblioteca ou serviço, para

auxiliar seu acesso mediante solicitações efetuadas por aplicativos. Podem ser dependentes:

disponíveis a uma determinada linguagem de programação específica, através da utilização

restritiva de sua sintaxe e elementos; ou independentes: de modo que são construídas para

serem utilizadas por várias linguagens de programação, desvinculando-as de um processo ou

sistema isolado, estendendo assim as funcionalidades do aplicativo ou sistema computacional

a qual se referem.

John Musser, do site Programmableweb.com define API como:

Uma API, ou Interface de Programação de Aplicativos, é um conjunto de funções que faz um programa de computador disponível para outros programas para que eles possam conversar com eles diretamente. Existem muitos tipos de APIs: APIs de sistema operacional, APIS de aplicativos, ferramentas APIs e agora APIs de web site44. (MUSSER, 2005, tradução nossa).

Em termos de programação, uma API pode ser definida como uma linguagem de alto

nível, ou seja, pode ser compilada quando uma aplicação é construída, permitindo

compatibilidade de código fonte. Em contrapartida, uma interface binária de aplicativos (ABI)

caracteriza-se por descrever a interface de baixo nível (linguagem de máquina) entre um

aplicativo e o sistema operacional, permitindo compatibilidade binária.

44 Tradução livre de: “An API, or Application Programming Interface, is a set of functions that one computer program makes available to other programs so they can talk to it directly. There are many types of APIs: operating system APIs, application APIs, toolkit APIs and now web site APIs.” (Musser, 2005). Disponível em: http://programmableweb.com/faq#Q2

54

Tipicamente, as empresas publicam APIs através de políticas controladoras,

distribuindo-as somente para programadores licenciados, como algumas plataformas fechadas

de desenvolvimento de jogos para consoles de vídeo games (Sony Playstation); ou de forma

livre, como a Microsoft, que disponibiliza publicamente a API do sistema operacional

Windows, a fim de que possam ser desenvolvidos aplicativos para sua plataforma.

Embora existam APIs para sistemas operacionais, aplicativos e ferramentas de

programação, esta dissertação foca-se nas APIs para web sites e aplicações web.

No geral, uma aplicação mashup compõe-se por três elementos distintos, de acordo

com o proposto por Duane Merrill em Mashups: The New Breed of Web Applications45,

separadas lógica e fisicamente: provedores de conteúdos ou APIs, o mashup web site (onde

reside a lógica da aplicação) e a aplicação cliente (web browser).

Ilustração 1: Estrutura do mashup de aplicativos web.

45 Disponível em: http://www.ibm.com/developerworks/xml/library/x-mashups.html

Provedores de Conteúdos ou de APIs

Mashup Site (lógica da aplicação)

Aplicação Cliente (web browser)

55

2.1.1 Fornecedores de APIs ou conteúdos

Na web, empresas como a Amazon46 lançam APIs públicas com o propósito de

fornecer informações para que outros criadores de software, web sites ou mashups possam

desenvolver aplicativos acionados por seus serviços ou conteúdos. Com o uso da API da

Amazon, desenvolvedores podem facilmente incluir links dinâmicos sobre produtos da

empresa diretamente em seus próprios sites, com preços atualizados e a possibilidade de

compra imediata.

Sites como Google47, YouTube48, Flickr49, Amazon, Yahoo!50 entre outros,

disponibilizam APIs de seus conteúdos baseados nos protocolos (1), SOAP - web services, e

web feeds RSS, Atom, a serem descritos posteriormente.

No exemplo do mashup Flickrvision, os fornecedores de conteúdos são o Google,

através da API de mapas (Google Maps) e o Flickr, com sua API de imagens e fotos.

A eclosão das API’s permitiu considerável incremento de disponibilidade pública de

dados na rede, possibilitando aos usuários combiná-los da forma que desejarem, seja por meio

direto através de acesso ao código, ou ferramentas desenvolvidas e aperfeiçoadas dia a dia

para este propósito51, a fim de expandir a massa mashup presente na rede através da criação

de mashups de modo cada vez mais simples, criativos e interessantes; inovações ora

anteriormente consideradas improváveis no cenário web.

Entretanto nem todos os provedores de conteúdo foram preparados para serem

utilizados por outra aplicação, não disponibilizam suas APIs propositalmente ou geralmente

são incompletas. Dessa forma, mashups que utilizam conteúdos destes sites, o fazem através

46 Disponível em: http://www.amazon.com 47 Disponível em: http://www.google.com.br 48 Disponível em: http://br.youtube.com 49 Disponível em: http://www.flickr.com 50 Disponível em: http://br.yahoo.com 51 Veja mais sobre as ferramentas de desenvolvimento de mashups adiante.

56

da extração de dados realizada por uma técnica conhecida como screen scraping, a ser tratada

especificamente adiante.

2.1.1.1 APIs Públicas: Google Maps, You Tube e Flickr

Geralmente as APIs públicas são de uso gratuito, possuem documentação própria para

implantação e apresentam termos de uso para garantir que sejam empregadas conforme as

políticas estabelecidas por seus distribuidores.

A API do Googlemaps, serviço de localização geográfica online, foi disponibilizada

em junho de 2005 pelo Google em sua versão beta, para facilitar que desenvolvedores

integrassem mapas personalizados aos seus web sites. Desde então, foi aprimorada até ser

definitivamente liberada em 2006.

Essencialmente, a API do Googlemaps resume-se a um pequeno conjunto de classes

JavaScript, que permitem ao desenvolvedor sua integração na construção de aplicações para

exibição de mapas, com recursos interativos intuitivos nos moldes AJAX, como adição e

descrição de pontos de referência, funções de aproximação de escala (zoom) e

geocodificação52.

Para utilização da API, o desenvolvedor precisa solicitar uma chave própria,

vinculando-a ao site da sua inclusão. A criação da interface própria do mapa, e personalização

dos pontos de interesse requerem a adição de códigos e funções Javascript ao código fonte da

página web desejada.

Quanto aos termos de uso da API Googlemaps, o Google não impõe maiores

restrições, proibindo-o apenas às atividades consideradas ilícitas, que tentem

remover/camuflar o logotipo da empresa embutido nos mapas, ou a utilização dos mapas em

outros meios digitais que não as páginas detentoras da chave de autorização.

52 Processo utilizado para realizar consultas de coordenadas geográficas (latitude e longitude) a partir de outros dados geográficos, como endereços e códigos postais, possibilitando seu mapeamento e visualização.

57

O Youtube, site de compartilhamento de vídeos online também de propriedade do

Google, disponibiliza sua API para que os usuários possam integrá-la em suas aplicações, de

modo que desempenhem localmente as mesmas funções normalmente executadas no site do

Youtube, como exibição de vídeos, pesquisa e realização de comentários. Essa característica

pode ser considerada estratégica na medida em que contribuiu para que o Youtube se tornasse

líder no segmento de vídeo digital, visto que seus vídeos poderiam ser visualizados também

em qualquer página web que não necessariamente do próprio Youtube.

A API Youtube comporta as interfaces REST e XML-RPC para acesso a canais de

dados e estatísticas de vídeos. Para usá-la, assim como a API do Googlemaps, é necessário

também que o usuário solicite uma chave, no caso uma identificação única conhecida como

ID, que é vinculada à sua conta e perfil de desenvolvedor definidos no Youtube.

Novos recursos foram agregados a partir do lançamento da nova versão da API

Youtube, permitindo que sites, aplicativos web ou mashups possam autenticar-se como um

usuário para realizarem upload, atualização de vídeos, criação de listas de reprodução,

assinaturas de feeds, personalização de controles de exibição e acesso a perfis de usuários

diretamente do local que se encontram incorporadas tais APIs. Essa gama de possibilidades

viabilizou aos desenvolvedores a criação de sites completos com conteúdo de vídeo digital

proveniente da estrutura do Youtube, incorporado ao código fonte e interface local.

O Flickr, site de compartilhamento de fotos online, também disponibiliza sua API53

em diversos protocolos como REST, XML-RPC e SOAP. Seu emprego permite que os

programadores expandam os serviços do Flickr, criando aplicações com grande parte dos

recursos disponíveis aos usuários do site, tais como upload, atualização de fotos, comentários,

etc.

53 Veja mais sobre a documentação da API do Flickr em: http://www.flickr.com/services/api

58

O uso da API do Flickr, site de compartilhamento de fotos online, é permitido aos

desenvolvedores sob algumas restrições corriqueiras, de forma não comercial. Para fins

comerciais, há a possibilidade mediante acordo prévio e cumprimento de algumas diretrizes,

como atribuição de licença Creative Commons às fotos consentindo sua utilização, salvo a

existência de acordo com os proprietários dos direitos autorais das mesmas. De acordo com o

Flickr, a liberação da API é realizada através da análise de cada caso, e, como exigência, os

desenvolvedores devem também registrar uma chave para monitoramento do uso da API em

seus sites e aplicações.

Além da API, a comunidade de desenvolvedores Flickr oferece também kits API, que

são módulos não oficiais prontos para integrarem os recursos do Flickr às aplicações e web

sites, disponíveis em diversas linguagens de programação, como Action Script, C, Cold

Fusion, Delphi, Java, .NET, Perl, PHP, Python, Ruby, etc.

2.1.2 Mashup site

O mashup site ou mashup web site é onde o mashup reside, a lógica da aplicação

propriamente dita, porém, não necessariamente onde é executado, podendo partes da mesma

serem executadas diretamente no provedor de conteúdo através das APIs ou na aplicação

cliente (navegador). Estas possibilidades de combinação de dados nos três pontos da

arquitetura tornam o mashup web uma aplicação singular no panorama da computação

distribuída.

59

Figura 14: Exemplo figurado da constituição do mashup, 2007, por Semantic Focus.

Como exemplo de mashup web site temos o Chicago Crime (www.chicagocrime.org),

agora EveryBlock cities: Chicago - compreendendo também outras cidades, que utiliza

conteúdo do Google Maps (mapas) e dados de ocorrências criminais do departamento de

polícia de Chicago para criar uma representação cartográfica dos locais destas ocorrências.

Figura 15: Chicago Crime.

60

A combinação de conteúdos resultante da execução do mashup site pode ser criada a

partir de tecnologias dinâmicas realizadas no lado do servidor (server-side), semelhantes às

utilizadas freqüentemente em aplicações web, tais como CGI, servlets Java, PHP ou ASP; ou

no browser do usuário (client-side), através de scripts como JavaScript ou applets.

A tecnologia voltada para o cliente reúne código inserido diretamente no mashup web

site e de programação das APIs disponibilizadas pelos provedores de conteúdos; e podem ser

chamados também de RIA (rich internet application). Este tipo de tecnologia permite menos

carga no servidor onde se localiza o mashup, tornando a interação com o usuário mais

dinâmica, pois as páginas não necessitam recarregar completamente a todo o momento em

que houver alguma requisição, mas apenas as partes do conteúdo solicitadas.

Freqüentemente os mashups web utilizam tanto as tecnologias de servidor como de

cliente contiguamente para combinar os dados desejados, podendo ainda mesclá-los com

fontes de dados locais fornecidos por seus utilizadores, atuando como coletivos inteligentes54.

2.1.3 Aplicação cliente

A aplicação cliente consiste geralmente no navegador web, também conhecido como

web browser, executada no computador do usuário, onde a apresentação do conteúdo e as

interações são realizadas. Como já descrito anteriormente, além da apresentação dos mashups,

os navegadores também podem ser responsáveis pelo processamento e combinação de dados

através do emprego de alguma lógica voltada para o cliente.

Com a evolução dos navegadores web, o suporte para tecnologias client-side se

expandiu, difundindo novos padrões de desenvolvimento de aplicações (RIA), com interfaces

mais eficazes e dinâmicas, oferecendo ao usuário experiência próxima às aplicações desktop.

54 Conceito cunhado por Howard Rheingold em 2002 para designar as interconexões sociais promovidas pelas tecnologias da inteligência e o incremento de capital social e imaterial que elas podem gerar.

61

2.2 Tecnologias relacionadas

Assim como a investigação da estrutura tecnológica inerente à composição do mashup

se torna fundamental para o entendimento do seu funcionamento, apresentaremos as

tecnologias e padrões constituintes de tal prática pormenorizadas, fundamentando-se nos três

elementos formadores de uma aplicação mashup.

Dentre os protocolos e tecnologias emergentes utilizados na construção de um mashup

web, podemos destacar os web feeds (RSS e Atom), AJAX, protocolos web (SOAP e REST),

screen scraping e web semântica (RDF).

2.2.1 Web feeds

Do inglês feed, alimentar. Web feeds ou simplesmente arquivos feed, também

conhecidos como syndication55, são formatos de dados responsáveis pelo fornecimento de

conteúdo digital freqüentemente atualizado aos usuários.

Em Pro Web 2.0 Mashups: Remixing Data and Web Services, Raymond Yee descreve

a importância dos feeds para o remix e a combinação de dados, sobretudo na popularização

dos mashups:

Então, por que feeds importam? Feeds dão a você informação estruturada a partir de aplicações que é fácil de analisar e reutilizar. Feeds não só estão facilmente disponíveis, mas existem muitas aplicações que os utilizam—tudo requerendo nenhum ou pouquíssimo esforço de programação da sua parte. Com efeito, há toda uma ecologia de web feeds (os formatos de dados, aplicações, produtores e consumidores) que oferece grande potencial para o remix e combinação de informação—algumas das quais começam a ser percebidas hoje.56 (YEE, 2008, p. 77, tradução nossa).

55 Em inglês syndicate é o termo utilizado a uma agência de notícias que distribui material para publicação em vários meios de comunicação. 56 Tradução livre de: “So, why do feeds matter? Feeds give you structured information from applications that is easy to parse and reuse. Not only are feeds readily available, but there are many applications that use those feeds—all requiring no or very little programming effort from you. Indeed, there is an entire ecology of web feeds (the data formats, applications, producers, and consumers) that provides great potential for the remix and mashup of information—some of which is starting to be realized today.” (YEE, 2008, p. 77).

62

Seu funcionamento baseia-se na disponibilização de tais arquivos pelos web sites, que

são visitados e assinados diretamente pelos usuários através de softwares agregadores ou

leitores de feed, que recebem o conteúdo atualizado desejado assim que publicado, sem a

necessidade de visitar os sites toda vez que novas atualizações ocorram. Navegadores web

atuais como Opera, Safari, Firefox e Internet Explorer já possuem estas funções incorporadas

e alguns web sites atuam como leitores de feeds online independentemente da utilização de

softwares próprios a esta função, como os conhecidos agregadores offline (FeedDemon,

RSSOwl, NetNewsWire, Outlook 2007, Thunderbird, Liferea, entre outros).

Alguns mashups como iGoogle, NetVibes, My Yahoo, Pageflakes ou My MSN, atuam

como agregadores e leitores de feeds online, permitindo ao usuário a customização de

múltiplos serviços de diversos sites no mesmo espaço (notícias, informações meteorológicas,

econômicas etc.), criando uma página de conteúdo personalizado.

Os conteúdos entregues pelos web feeds são tipicamente páginas web (HTML), links

para outra páginas ou multimídia (áudio, vídeo e fotos), e geralmente são adotados por sites

de notícias, weblogs e podcasts.

A utilização de feeds apresenta vantagens em relação ao uso de e-mail (newsletter)

para transmissão de conteúdo freqüentemente atualizado nos web sites, visto que os usuários

não necessitam expor seus endereços de e-mail, evitando o recebimento de mensagens não

solicitadas (spam), vírus ou outras fraudes virtuais; não necessitam enviar e-mail pedindo para

serem removidos da lista de recebimento, bastando remover o feed do agregador ou leitor; e

as informações recebidas são organizadas automaticamente visto que cada item feed possui

seu próprio conjunto de entradas, ao contrário do que acontece com as caixas de e-mail, que

necessitam da criação de regras de ordenação e padrões de correspondência individuais para

cada grupo desejado.

63

Normalmente os web feeds são disponibilizados pelos mesmos editores de seus

conteúdos, porém, como ocorre com as APIs, nem todos os sites os disponibilizam, ficando ao

encargo de terceiros a leitura do web site através da técnica de screen scraping e a criação do

feed, sem que a distribuição do conteúdo seja concedida anteriormente com esse propósito por

seu proprietário.

Os principais formatos empregados na criação de arquivos feed são RSS e Atom,

ambos baseados em XML (dialetos XML), embora existam outros formatos como JSON57,

serialização PHP, e CSV.

2.2.1.1 RSS

Do inglês, acrônimo de Really Simple Syndication (Sindicação Realmente Simples),

RSS58 é um conjunto de formatos da família de web feeds baseado em XML, utilizado para

distribuir conteúdo web atualizado de modo padronizado. Atualmente duas versões de

especificações RSS são empregadas: 1.0 - RDF Site Summary (baseada em RDF59) e 2.0 -

Really Simple Syndication.

A primeira versão RSS (RSS 0.9), conhecida como RDF Site Summary, foi criada por

Dan Libby em 1999 para o portal da Netscape, seguida pelo RSS 0.91, fundamentado em

sugestões realizadas pelos usuários. Com a decisão da Netscape em encerrar as atividades do

grupo de desenvolvimento do formato, ocorreu uma verdadeira guerra pela sua detenção, que

ficou conhecida como RSS Fork. Então, duas frentes mantiveram seu desenvolvimento

isoladamente; Dave Winer prosseguiu com o RSS 0.91, enquanto outro grupo evoluiu para a

versão 1.0, criando um formato mais modular, porém ainda baseado em RDF.

57 Veja mais sobre JSON em: http://www.json.org 58 Veja mais sobre feeds RSS em: http://www.rssficado2.com.br/wiki/Projeto_RSSficado_2 59 Veja mais sobre RDF em: http://en.wikipedia.org/wiki/Resource_Description_Framework

64

Neste ponto, Winer insiste na versão 0.91 e após certo tempo, lança a versão 2.0 em

2002, alterando o significado da sigla RSS para Really Simple Syndication, pois agora o

formato estaria com uma sintaxe mais simples e livre do RDF.

O RSS 1.0, caracterizado por utilizar a especificação W3C RDF60, integra-se ao

projeto web semântica61 desenvolvido pela mesma organização, que se dedica à criação de um

framework62 comum em que dados possam ser compartilhados, reutilizados e compreendidos

tanto por pessoas como aplicações simultaneamente. Já o RSS 2.0, gerido atualmente pelo

Centro Berkman para Internet e Sociedade da Faculdade de Direito de Harvard63, representa-

se como herdeiro da linha de formatos XML que incluem as versões RSS 0.91, 0.92, 0.93 e

0.94.

O desenvolvimento do feed RSS consiste na criação de um arquivo padrão XML, onde

são inclusas informações sobre atualizações do site agregado, como título, link (URL do novo

conteúdo), descrição da alteração, data de criação e publicação do conteúdo, autor, etc. Após

alguns minutos o arquivo é atualizado, podendo ser lido por qualquer ferramenta capaz de

interpretar o formato XML do RSS (leitores e agregadores de feeds RSS), permitindo uma

sincronização entre fornecedores e consumidores de conteúdo de forma ágil, visto que o

formato dos dados limita-se a texto simples.

Para assinar um feed RSS, o usuário entra com seu link diretamente dentro do leitor

(off ou online) ou pode também “clicar” no ícone RSS feed do web site desejado, lançando

automaticamente o agregador do browser, que inicia o processo de assinatura. A partir de

então, o agregador utilizado se responsabilizará por verificar os feeds RSS assinados do

usuário, trazendo conteúdo atualizado para acompanhamento, através de interface própria,

assim que publicado. De acordo com o agregador utilizado, a leitura dos feeds RSS pode

60 Disponível em: http://www.w3.org/TR/REC-rdf-syntax/ 61 Veja mais sobre web semântica em: http://www.w3.org/2001/sw 62 Modelo de dados 63 Disponívem em: http://cyber.law.harvard.edu/rss/rss.html

65

ocorrer internamente ou através do oferecimento de links para os web sites de origem do

conteúdo publicado.

A utilização do formato RSS pelos sites, por um bom tempo foi representada por uma

imagem de cor laranja com a inscrição RSS juntamente com o indicativo XML, porém,

parceria entre a Mozilla Foundation e Microsoft na utilização do novo ícone em seus

browsers, Firefox e Internet Explorer 7 respectivamente, ajudou a promover e disseminar o

novo símbolo pela web.

Figura 16: Símbolo RSS.

Com a difusão do uso do RSS em 2000 pelas empresas de notícias como a CNN64,

BBC65 e Reuters66, o formato se expandiu para muitos outros propósitos que envolvem

atualização e publicação constante de conteúdo, como entrega de mídia digital, marketing,

negócios e, sobretudo, o mashup, ao se utilizar de tal tecnologia na combinação destes

elementos.

64 Disponível em: http://www.cnn.com 65 Disponível em: http://www.bbc.co.uk 66 Disponível em: http://www.reuters.com

66

2.2.1.2 Atom

Caracterizado também por se tratar de um protocolo de sindicação de conteúdo web, o

Atom (versão corrente Atom 1.0) surgiu em 2003, proveniente de discussões realizadas numa

wiki criada por Sam Ruby, com o objetivo de suprir as deficiências da família de formatos

RSS; congelada propositalmente na versão 2.0 através de declaração de documento da

especificação oficial, para impedir a realização de mudanças, alegando-se assim assegurar sua

estabilidade.

O novo formato de sindicação teria como princípios, ser totalmente neutro a outros

padrões, implementado por todos, extensível livremente por qualquer pessoa, e,

cuidadosamente documentado. Tais propósitos permitiram que o Atom rapidamente obtivesse

a adoção de grandes corporações como o Google.

Em 2004 o grupo decidiu deslocar o projeto para o órgão normatizador Internet

Engineering Task Force (IETF), buscando definir especificação e processo próprios.

Apesar da semelhança estrutural e conceitual, o Atom pode ser considerado uma

evolução do padrão RSS, na medida em que procura manter melhores metadados que este,

representando a informação de modo mais detalhado (completo); e, por fazer parte de um

órgão normatizador, apresenta-se mais estável, oferecendo documentação superior.

2.2.2 AJAX

Acrônimo em língua inglesa para Asynchronous Javascript And XML (Javascript

Assíncrono e XML), o termo foi utilizado pela primeira vez por Jesse James Garrett em 2005,

e segundo Merrill, AJAX pode ser melhor definido como “[...] um modelo de aplicação web,

em vez de uma tecnologia específica” (MERRILL, 2006), considerando-se que Javascript e

XML já fazem parte do cenário de desenvolvimento de conteúdo web há muitos anos.

67

O modelo AJAX serve-se do uso de várias tecnologias desenvolvidas na década de

1990, algumas delas em parceria com o projeto Microsoft Remote Scripting, atuando em

conjunto para prover novas funcionalidades na web: XHTML e CSS para apresentação de

conteúdo, Document Object Model (DOM) para exposição dinâmica e interação com dados,

XML e XSLT para intercâmbio e manipulação de dados respectivamente, objeto

XMLHttpRequest para comunicação assíncrona e Javascript para agrupá-las.

Jesse Feiler descreve AJAX sinteticamente em How to Do Everything with Web 2.0

Mashups:

[...] Apesar desta multiplicidade de tecnologias, o princípio é muito simples: uma página da Web pode recuperar e exibir dados sem ter que atualizar ou recarregar toda a página. Para fazer isso, a página precisa ter a sua própria lógica de programação (normalmente fornecida em JavaScript); ela precisa ser capaz de enviar uma solicitação de dados (normalmente feita com XMLHttpRequest), e ela também precisa ser capaz de carregar, e então descarregar, dados para e a partir de solicitações (geralmente feito com o XML, XHTML, e DOM)67 [...] (FEILER, 2008, p. 4, tradução nossa).

Sua aplicação consiste da utilização sistemática e conjugada de tais tecnologias,

presentes nos browsers68 (client-side), servindo-se de solicitações assíncronas, realizadas em

segundo plano através do compartilhamento de pequenos pacotes de dados com os servidores

de conteúdos (server-side), sem interferir na apresentação do conteúdo, com o objetivo de

criar aplicações web mais interativas (RIAs), tornando conseqüentemente a experiência de

navegação mais intensa e dinâmica aos usuários.

Enquanto o modelo de aplicação web tradicional baseia-se na requisição constante de

páginas ao servidor, AJAX utiliza-se do poder dos navegadores, processando requisições in

loco e comunicando-se mais eficientemente com o servidor ao solicitar apenas as porções de

67 Tradução livre de: “[…] Despite this plethora of technologies, the principle is quite simple: a Web page can retrieve and display data without having to refresh or reload the entire page. To do this, the page needs to have its own programming logic (usually provided in JavaScript); it needs to be able to send a request for data (usually done with XMLHttpRequest); and it also needs to be able to load, and then unload, data to and from requests (usually done with XML, XHTML, and DOM) […]” (FEILER, 2008, p. 4). 68 Somente os navegadores lançados após 2001 suportam Ajax: Mozilla Firefox, Internet Explorer 5 (ou mais recente), Opera, Konqueror, Safari e Google Chrome.

68

dados necessárias para a interação realizada; possibilitando ao usuário um fluxo de trabalho

coeso e contínuo, muito semelhante às aplicações desktop, livre de carregamentos forçados.

2.2.3 Protocolos SOAP e REST – web services

Os protocolos SOAP e REST são utilizados para implementação de web services e

responsáveis por realizar a comunicação entre aplicações e serviços remotos

independentemente de plataformas ou linguagens, ou seja, permitem a interação direta do

aplicativo cliente com estes serviços para realizar uma tarefa, sem que haja necessidade de

conhecimento do modelo empregado na implementação das plataformas subjacentes. Merrill

(2006) define que “[...] A funcionalidade de um serviço é percebida pela descrição das

mensagens que pede e pelas quais responde”.

Configurando-se como protocolo padrão para a construção de web services, o SOAP

Simple Object Access Protocol ou Protocolo de Acesso a Objeto Simples, fundamenta-se na

troca de informações estruturadas numa plataforma descentralizada e distribuída, como a web,

utilizando tecnologias baseadas em XML; e, como não se trata mais de um protocolo de

acesso a objetos, o acrônimo não é mais utilizado.

Na especificação SOAP há dois componentes essenciais, o primeiro é o uso de XML

para codificação de mensagens independente da plataforma, e o segundo, é a estrutura da

mensagem, dividida em cabeçalho e corpo.

Numa arquitetura voltada para serviços, a aplicação cliente envia e recebe solicitações

ao web service, que são codificadas pelos protocolos SOAP e transportadas geralmente via

HTTP69 no formato XML, padrão pelo qual os dados são representados e estruturados. O

UDDI (Universal Description, Discovery and Integration) é o protocolo responsável pelo

processo de publicação, pesquisa e descoberta de web services, atuando como um índice,

69 Outros transportes são igualmente viáveis, como FTP, SMTP etc.

69

tornando fácil a maneira de registrar e localizar serviços. Por fim, a descrição e representação

desses serviços são realizadas a partir da linguagem WSDL (Web Services Description

Language), funcionando como uma espécie de type library do web service.

Ilustração 2: Diagrama representativo do protocolo SOAP numa arquitetura voltada para serviços.

De modo geral, é realizada uma série de trocas de mensagens entre aplicação cliente e

web service, consistindo em requisições e respostas consecutivamente: primeiramente é

efetuada uma consulta ao UDDI para levantamento de web services disponíveis, em seguida,

solicitação do documento buscado, então, pedido de um documento WSDL e por fim, o

serviço propriamente dito; em que para cada solicitação efetuada pela aplicação cliente há

uma resposta subseqüente do web service.

aplicação cliente (requisições) web service (respostas)

1 - consulta ao UDDI UDDI fornece a lista de web services disponíveis

2 - solicitação do documento buscado documento é fornecido

3 - requisição de documento WSDL documento WSDL é fornecido

4 - solicitação de serviço serviço é fornecido Quadro 1: Intercâmbio de mensagens entre aplicação local e web service no protocolo SOAP.

SOAP

HTTP

Web Service

sistema remoto

Regras Documento

WSDL

Aplicação Cliente

sistema local

Solicitação do Serviço / Métodos

Resposta / Fornecimento de Informações

Publica o serviço e as regras

UDDI

Obtém regras

UDDI

XML

web

70

Em síntese, pode-se dizer que através do web service, o cliente obtém as regras e

métodos dos serviços e pode utilizá-los e combiná-los no desenvolvimento de uma outra

aplicação do modo que desejar.

Já o acrônimo REST (Representational State Transfer) ou Transferência de Estado

Representacional foi criado em 200070 por Roy Fielding71 em sua tese de doutorado, na qual

define uma arquitetura de software própria para sistemas hipermídia distribuídos como a

World Wide Web, utilizando-se apenas de HTTP e XML, tornando-a conveniente por ser livre

da complexidade apresentada pelos protocolos de trocas de mensagens, como o SOAP.

Fielding define o modelo de REST em sua dissertação como:

[...] O nome “Transferência de Estado Representacional” destina-se a evocar uma imagem de como uma aplicação Web bem concebida se comporta: uma rede de páginas web (um estado-máquina virtual), onde o usuário progride através da aplicação selecionando links (transições de estado), resultando na página seguinte (representando o próximo estado da aplicação) que está sendo transferida para o usuário e apresentada para seu uso.72 (FIELDING, 2000, p. 109, tradução nossa).

Dentre os princípios REST, destacam-se: o estado nulo ou sem estado, em que tanto o

cliente como servidor não necessitam gravar nenhum estado das comunicações entre

mensagens73; existência de recursos (fontes específicas de informação) com sintaxe universal

para identificação global individual dos mesmos (URI); suporte a um conjunto reduzido de

operações (POST, GET, PUT, DELETE) que se aplicam a todos os recursos de informação;

comunicação entre cliente e servidor via interface padrão (HTTP) com troca de

representações destes recursos, permitindo que documentos reais veiculem informação, como

o uso de hipermídia, em que a representação deste estado é normalmente HTML ou XML.

70 Embora o desenvolvimento da primeira edição de REST tenha se iniciado entre 1994 e 1995 como recurso para conceitos de comunicação web. 71 Cientista da computação americano, caracterizado como um dos principais autores da especificação do protocolo HTTP, citado como autoridade mundial em arquitetura de redes de computadores. 72 Tradução livre de: “[…] The name “Representational State Transfer” is intended to evoke an image of how a well-designed Web application behaves: a network of web pages (a virtual state-machine), where the user progresses through the application by selecting links (state transitions), resulting in the next page (representing the next state of the application) being transferred to the user and rendered for their use.” (FIELDING, 2000, p. 109). 73 Cada mensagem HTTP contém as informações completas necessárias para compreensão da requisição.

71

Por ser uma forma mais simples para implementação de web services, Feiler afirma

que o protocolo REST vem ganhando espaço na construção dos mashups em detrimento do

SOAP:

Outros protocolos estão disponíveis para implementar web services. Em particular, SOAP tem sido usado para aplicações altamente estruturadas. No mundo mashup, REST parece ser o protocolo escolhido, com algum interesse significativo em JSON. Porque REST pode suportar as necessidades do mashup e é mais simples de implementar que SOAP em muitos casos74 [...] (FEILER, 2008, p. 114, tradução nossa).

A base do argumento que REST seria mais adequado para a estrutura da web,

fundamenta-se no conceito de interoperabilidade como essencial para o ambiente aberto da

internet.

2.2.4 Screen Scraping

Como já mencionado, a ausência de APIs pelos provedores de conteúdos, como a

maior parte dos web sites públicos e governamentais, acaba forçando os construtores de

mashups a recorrerem a outras técnicas para reutilização de dados e funcionalidades de

aplicações e web sites. Uma destas técnicas, conhecida como screen scraping75 ou leitura de

tela, consiste num software específico, também chamado de screen scraper, que extrai dados

através da interface de usuário ao “ler” as páginas de um web site, para incorporá-los a outra

aplicação web ou repositório de dados. Encontramos tecnologia similar no scanner de

imagens que permite a conversão de textos impressos em texto digital através da utilização de

softwares OCR.

74 Tradução livre de: “Other protocols are available to implement Web services. In particular, SOAP has been used for highly structured applications. In the mashup world, REST appears to be the protocol of choice, with some significant interest in JSON. Because REST can handle mashup needs and is simpler to implement than SOAP in many cases […] (FEILER, 2008, p. 114). 75 Veja mais sobre screen scraping em: http://en.wikipedia.org/wiki/Screen_scraping

72

Geralmente o screen scraping ignora conteúdo binário, como dados multimídia e

formatação de documentos, atendo-se apenas ao essencial, que são os dados de texto

desejados pelo seu desenvolvedor.

A diferença do emprego de tal técnica em relação às APIs, consiste no tipo de saída

dos dados dos web sites; concebida inicialmente para exibição a usuários humanos e não

como entrada para outra aplicação.

2.2.5 Web semântica e RDF

Tarefas comuns realizadas pelas pessoas na web, como encontrar o significado de um

termo num dicionário online, pesquisar preços de livros numa loja virtual ou fazer a reserva

de hospedagem num hotel, não podem ser efetuadas por computadores sem instrução humana,

visto que as páginas web são constituídas para leitura humana e não para máquinas.

Devido a tal conclusão, surgiu em 2001 o conceito de web semântica, com a

publicação de artigo científico sobre o tema na revista Scientific American, por Tim Berners-

Lee76 em conjunto com James Hendler e Ora Lassila.

Porém, já em 1999 pode-se dizer que Tim Berners-Lee cria a visão de web semântica

ao dizer:

Eu tenho um sonho para a Web [em que os computadores] tornem-se capazes de analisar todos os dados da Web - o conteúdo, links, e transações entre pessoas e computadores. Uma "Web Semântica", que deverá tornar isso possível, ainda não emergiu, mas quando isso acontecer, os mecanismos do dia-a-dia do comércio, da burocracia e de nossa vida cotidiana serão manipulados por máquinas conversando com máquinas. [...] Os “agentes inteligentes” que as pessoas têm procurado há tempos finalmente se materializarão. [...]77 (BERNERS-LEE, 2000, p. 157-158, tradução nossa).

76 Timothy John Berners-Lee: renomado cientista da computação inglês, responsável pela invenção da World Wide Web e diretor do W3C (World Wide Web Consortium), que promove sua evolução. 77 Tradução livre de: “I have a dream for the Web [in which computers] become capable of analyzing all the data on the Web – the content, links, and transactions between people and computers. A ‘Semantic Web’, which should make this possible, has yet to emerge, but when it does, the day-to-day mechanisms of trade, bureaucracy and our daily lives will be handled by machines talking to machines. [...] The ‘intelligent agents’ people have touted for ages will finally materialize. […]” (BERNERS-LEE, 2000, p. 157-158).

73

Entende-se por web semântica a ampliação da web perante o estágio que se encontra,

possibilitando que os conteúdos presentes na rede sejam compreensíveis tanto por humanos

como por computadores, ou seja, tornando-os também inteligíveis às máquinas mediante

utilização de metadados78 para atribuição de significado. Tal estrutura vislumbra o

desenvolvimento de um modelo tecnológico, próprio ao armazenamento, compartilhamento,

reutilização e combinação automática de informação79 entre fontes múltiplas distribuídas em

toda a web, sem a ocorrência de intervenção humana direta, oferecendo uma plataforma

automatizada e descentralizada de conhecimento.

A especificação Resource Description Framework (RDF) da World Wide Web

Consortium (W3C) serve-se a este propósito, oferecendo meios para estabelecer uma

metodologia formal para descrição da informação presente na web, decompondo-a em partes

menores, compreendendo regras e relações entre si.

Embora o RDF se utilize de algumas linguagens, como o XML80, o Turtle, Notation 3

(N3) e N-Triples, não se caracteriza como tal; pois seu objetivo original baseia-se na

padronização da metainformação para codificação na web.

O modelo de dados RDF consiste da realização de declarações sobre recursos81 web na

forma de expressões sujeito-predicado-objeto, chamadas triplos, onde o sujeito denota o

recurso, o predicado denota traços ou aspectos deste recurso e exprime uma relação entre o

sujeito e o objeto. Dessa forma, para representação da noção tripla RDF da sentença “O mar

contém água salgada”: o sujeito seria denotado por “o mar”, o predicado por “contém água” e

o objeto por “salgada”.

O modelo simples e abstrato de dados apresentados pelo RDF, assim como sua

capacidade para modelos desiguais contendo vários formatos de arquivo de modo que um

78 Dados que descrevem outros dados (informação). 79 Segundo Merrill: “[...] No contexto da Web Semântica, o termo informação é diferente de dados; os dados tornam-se informação quando transmitem significado (isto é, são compreensíveis).” (MERRILL, 2006). 80 Compondo RDF/XML: RDF baseado em XML. 81 Considera-se como recurso, toda informação que pode ser descrita na web.

74

recurso ou triplo possa ser codificado variavelmente, permitem também sua aplicação em

outros domínios alheios à atividade de web semântica, como a gestão do conhecimento.

Atualmente, as aplicações para web semântica agem como categorizadoras de

conteúdos web, com a finalidade de promover a maximização do funcionamento das

ferramentas de busca presentes no meio para obtenção de melhores resultados com a

resolução de ambigüidades e contextualização da informação.

2.3 Ferramentas de apoio para o desenvolvimento de mashups

O desenvolvimento de mashups requer domínio de programação e de várias

tecnologias que o circundam. Considerando que a maioria das pessoas não possui

determinadas habilidades específicas, desenvolveram-se ferramentas web de apoio para a

construção de mashups que não necessitam necessariamente de programação via código fonte.

Tais ferramentas simplificam o processo de construção por meio de interface gráfica de

usuário (GUI), que se encarrega da tradução dos dados gerados pelo desenvolvedor para o

código necessário, democratizando, estimulando e expandindo a esfera de criação mashup a

qualquer usuário.

Ferramentas como o Pipes82 da Yahoo!, Popfly83 da Microsoft e o Google mashup

editor84 auxiliam nessa tarefa de construção, apresentando um repertório variado de opções

para combinação de informação.

O aplicativo web Yahoo Pipes da Yahoo! gera e publica mashups através de um

ambiente de programação visual, que permite ao usuário canalizar (piping) informações de

diferentes fontes, definindo as regras de como o conteúdo será combinado.

Apesar de possuir uma série de ferramentas úteis, o Pipes exige do usuário algum

conhecimento lógico inicial para criação da estrutura desejada, o que pode dificultar seu uso. 82 Disponível em: http://pipes.yahoo.com 83 Disponível em: http://www.popfly.com 84 Disponível em: http://editor.googlemashups.com

75

Para contornar este empecilho, permite realizar alterações em mashups já criados por outros

usuários a partir da clonagem destes, tornando conseqüentemente mais amena a curva de

aprendizagem. Dessa forma, uma vez habituado ao modelo de funcionamento do Pipes, o

usuário estará apto então a criar seus próprios mashups.

Figura 17: Yahoo! Pipes.

Como a Yahoo!, a Microsoft disponibiliza o serviço online Popfly baseado nos

mesmos princípios da ferramenta concorrente: permitir a criação de mashups aos leigos de

forma simples, ou seja, sem codificação de código fonte e disponibilizando-os

simultaneamente para clonagem e compartilhamento entre seus usuários através de rede

social própria; diferenciando-se por apresentar também recursos para criação de games e

páginas web.

A interface WYSIWYG modular do Popfly para desenvolvimento específico de

mashups remete à montagem de blocos de construção, efetuada de modo visual como no

Pipes. Os mashups são criados através da interconexão destes blocos, que também podem ser

76

construídos pelo usuário, que por sua vez se conectam a diversas APIs, como Flickr, Live

Spaces, Virtual Earth, etc., para combinação de dados. Além da interface visual, os usuários

possuem como alternativa, a alteração avançada de código dos blocos em AJAX, HTML e

Silverlight para exibição ou criação de suas aplicações.

Figura 18: Microsoft Popfly

Na prática, o usuário pode combinar blocos de serviços web como fotos do Flickr e

notícias da CNN, personalizando filtros de relacionamento entre as palavras chave dos

mesmos, a fim de obter uma listagem de fotografias referentes às manchetes das últimas

notícias de acordo com a editoria de seu interesse.

Oposto aos demais, o Google mashup editor criado pela Google, não oferece interface

gráfica para construção de mashups, mas um editor online para desenvolvimento em código

fonte, capaz de combinar HTML, Javascript, CSS, XML e algumas tags proprietárias de

forma simples, restringindo seu uso aos desenvolvedores mais experientes. O serviço oferece

componentes AJAX, marcação de código, preenchimento automático para digitação de tags,

77

verificador de erros e manipulador de feeds; possibilitando que todo o processo para o

desenvolvimento de mashups (criação, depuração e implantação) ocorra em apenas uma única

interface.

Após criado, o mashup pode ser publicado dentro do próprio ambiente de hospedagem

do Google85 ou testado numa área isolada anteriormente à sua publicação definitiva,

conhecida como sandbox.

Atualmente, o Google mashup editor encontra-se em fase de testes e seu acesso é

restrito a um pequeno número de desenvolvedores, com a possibilidade futura de

disponibilização a novos usuários.

Figura 19: Google Mashup Editor.

85 Disponível em: http://googlemashups.com

79

Capítulo 3: Mapeamento dos Mashups

3.1 Metodologia

Para o mapeamento dos mashups, foi criado na web uma conta no site delicious86,

serviço de cadastramento de sites favoritos em rede social, com a nomenclatura

webmashups87, onde foram selecionados e adicionados setenta e quatro mashups. Durante os

meses de julho a setembro de 2008, atuando como amostragem para a pesquisa, foram obtidos

dados estatísticos e característicos dos mesmos, a fim de analisá-los e categorizá-los.

Cada mashup incluído no delicious foi analisado individualmente e recebeu um grupo

de tags referentes ao tipo de aplicação na qual é utilizado. A partir da associação dessas tags

ao longo do mapeamento, foi possível determinar a ocorrência de características

predominantes. Em seguida, foram propostas categorias. O modelo de classificação adotado

tem semelhanças ao criado por Duane Merrill (2006), que propõe uma classificação de

mashups de acordo com o conteúdo presente em seu contexto.

Para o ambiente corporativo, os mashups se organizam conforme sua destinação:

consumer mashups (mashups de consumidores), data mashups (mashups de dados) e

enterprise mashups (mashups corporativos). Entretanto, em “Leveraging Critical Business

Data for Mashups, SOAs, and Enterprise Applications” 88, David Linthicum propõe uma

classificação baseada na origem e exibição da informação, como os mashups centrados em

apresentação (presentation-centric) e centrados em dados (data-centric).

Embora o sistema seja abrangente e proponha uma visão coerente e clara, a proposta

de classificação nesta dissertação de mestrado terá outra abordagem.

86 Disponível em: http://delicious.com 87 Disponível em: http://delicious.com/webmashups 88 Disponível em: http://www.kapowtech.com/pdf/collateral/wp_primer_enterprise_mashups.pdf

80

3.2 Coleta de dados: fontes primárias e secundárias

Para a realização da coleta de dados, foram considerados como fontes primárias os

mashups de conteúdos distintos, priorizando-se os que apresentam maior volume de usuários

e funcionalidades que emergem, agregam qualidades até então não disponíveis em outros

aplicativos. Como fontes secundárias, foram selecionados os portais segmentados em

conteúdo mashup: ProgrammableWeb89, Mashups & Web 2.0 API Directory90 e Mashup

Awards91, que oferecem índice com variado repertório; e conteúdos isolados em determinados

blogs, fóruns, artigos e comunidades.

3.3 Classificação dos mashups

Durante o mapeamento de mashups no delicious, observou-se que o ranking formado

pelas dez tags mais usadas, traduz de certa forma o universo da multiplicidade dos mashups

encontrados na rede. Em que a ordem decrescente gerada pelo total utilizado por cada tag

mostrou-se proporcional às categorias correspondentes proeminentes da web.

Tags Quantidade Utilizada

Localização 23 Mapas 19

Visualização 15 Fotos 13

Vídeos 8 Música 7 Busca 7

Notícias 6 Cidades 4

Rede 4 Quadro 2: Tags mais freqüentes encontradas durante o mapeamento dos mashups.

Através do comparativo entre as dez tags mais utilizadas para o mapeamento dos

mashups no site delicious e dos portais ProgrammableWeb, Mashups & Web 2.0 API

89 Disponível em: http://www.programmableweb.com 90 Disponível em: http://www.webmashup.com 91 Disponível em: http://mashupawards.com

81

Directory e Mashup Awards, verificou-se que há determinada relação entre elas,

considerando-se tags que representam conteúdos equivalentes, quanto à proporção na

distribuição dos vários tipos de mashups encontrados nos diferentes portais isoladamente, o

que revelou a disposição do cenário atual na rede do qual são próprios, onde a grande maioria

constitui-se na hibridização entre: mapas, conteúdo multimídia (vídeo, fotos e música), de

notícias e busca (gráficos 1, 2 e 3); salvo o portal Mashup Awards, que demonstrou certo

equilíbrio entre os modelos representados pelas tags disponíveis (gráfico 4).

Gráfico 1: Tags mais freqüentes encontradas no mapeamento dos mashups.

Gráfico 2: Tags mais frequentes encontradas no site ProgrammableWeb.

Gráfico 3: Tags mais frequentes encontradas no site Mashups & Web 2.0 API Directory.

82

Gráfico 4: Tags mais frequentes encontradas no site Mashups Awards.

Em suma, observou-se a utilização de mapas, conteúdo multimídia, redes sociais,

notícias e ferramentas de busca na hibridização criadora de mashups.

Através da análise das relações, foi possível constatar também que as tags pesquisadas

denotam certo grau de afinidade entre si. Tal percepção possibilitou posteriormente, efetuar o

agrupamento de tags semelhantes presentes no mapeamento do delicious, promovendo uma

classificação inicial dos mashups em categorias, perceptíveis segundo o conteúdo que

apresentam; coerente com proposto por Duane Merrill, que os distinguem em mashups de

mapas, de vídeos e fotos, de busca e compras, e de notícias.

Tags Quantidade Utilizada Categorias

Localização 23 Mapas 19

Visualização 15 Mapas

Fotos 13 Vídeos 8 Música 7

Vídeos e fotos

Busca 6 Busca e compras Notícias 6 Notícias Cidades 4 -

Rede 4 - Quadro 3: Classificação inicial dos mashups.

83

3.3.1 Mapas em mashups

Os mashups de mapas foram os responsáveis pela ebulição dos mashups na web,

caracterizando-se também como mashups de visualização de dados, em que os conjuntos de

dados são traduzidos graficamente e apropriados como mapas.

O Google atuou como catalisador destes mashups desde o lançamento da sua API do

Google Maps em 2005, serviço criado inicialmente para desenvolvedores, onde se pode reunir

todo o tipo de dados em mapas personalizados; como informações sobre milhares de cidades e

lugares ao redor do mundo, incluindo estatísticas demográficas, fotos e hotéis próximos

(Places Data92).

Figura 20: Places Data.

Em seguida, surgiram API’s de mapas de outras empresas, como Microsoft (Virtual

Earth), Yahoo (Yahoo Maps) e AOL (MapQuest), que expandiram as possibilidades para a

criação de novas aplicações.

92 Disponível em: http://www.placesdata.com

84

3.3.2 Vídeos e fotos em mashups

A expansão do armazenamento de fotografias e vídeos digitais em sites de redes

sociais, como o Flickr e o Youtube, a associação de metadados e a possibilidade de

compartilhamento dos seus conteúdos através de APIs, promoveram o surgimento de mashups

multimídia variados, combinando imagem, áudio ou vídeo com outras informações

simultaneamente.

Como exemplo pode-se destacar o site web Visual Headlines93, mashup de notícias

centrado em fotos sobre as manchetes do dia, distribuídas por categorias (principais notícias,

mundo, Estados Unidos, esportes, entretenimento e tecnologia). Atua na visualização de

dados, traduzindo o conteúdo textual das notícias em formato texto da rede CNN para o

imagético das fotos do Flick, através da combinação de tags correspondentes, presentes nas

imagens e palavras de ambos.

Figura 21: Visual Headlines

93 Disponível em: http://www.visualheadlines.com

85

Em conteúdo de vídeo, há o mashup de Tim Bormans Last.fm + YouTube = music TV

goodness94, que combina preferências musicais similares relacionadas a um usuário ou

determinado artista musical do Last.fm com vídeos do Youtube, exibindo vídeo

ininterruptamente como um canal de televisão.

Figura 22: Last.fm + YouTube = music TV goodness.

3.3.3 Busca e compras em mashups

Mashups com busca e compras existiam já há algum tempo, mesmo antes do termo ser

utilizado na web e do aparecimento das APIs, segundo Merrill (2006): “Serviços de

comparação de preços como BizRate, PriceGrabber, MySimon, e Froogle do Google

utilizavam combinações de tecnologias business-to-business para reunir dados comparativos

de preços”.

94 Disponível em: http://tv.timbormans.com

86

No Brasil, sites como o Buscapé95, Bondfaro96 e JáCotei97 estão entre os principais

serviços de busca de comparação de preços. Tais ferramentas podem ser consideradas

mashups na medida em que atuam como ferramentas de busca sofisticadas; utilizam-se de

outros aplicativos, que paralelamente cumprem o mesmo propósito a que servem as APIs,

integrando dados de vários sites de compras no mesmo ambiente.

Com o lançamento das APIs em web sites de compras como e-Bay98, Amazon e

Mercado Livre99, foi possível distribuir seus conteúdos através da combinação de dados com

outros sites, estendendo o apelo exclusivamente comercial apresentados por tais serviços,

agregando a estes, valor informacional característico e conseqüentemente, ampliando limites

de abrangência do seu mercado consumidor.

O mashup liveplasma100 apresenta tais características ao criar mapas de

relacionamento por afinidade entre filmes, livros ou álbuns musicais da Amazon, ampliando

suas possibilidades comerciais, permitindo o acesso a amostras de mídia, resenhas, fotos ou

mesmo alterar o núcleo da rede de relacionamentos no mapa conforme desejado. Atua

também como uma base de informação cultural.

95 Disponível em: http://www.buscape.com.br 96 Disponível em: http://www.bondfaro.com.br 97 Disponível em: http://www.jacotei.com.br 98 Disponível em: http://www.ebay.com 99 Disponível em: http://www.mercadolivre.com.br 100 Disponível em: http://www.liveplasma.com

87

Figura 23: Liveplasma.

3.3.4 Notícias em mashups

Sites de notícias como a BBC, CNN ou Reuters utilizam tecnologias conhecidas como

RSS e Atom para prover atualização constante de conteúdo aos seus usuários desde 2002.

Mashups de noticias atuam como agregadores na web, permitindo ao utilizador reunir

vários feeds ao mesmo tempo, criando um jornal personalizado, contendo apenas informações

estipuladas anteriormente pelo leitor através de filtros, como o MyCNN.com101. Já o

doggdot.us102, reúne feeds de três fontes sobre conteúdo de tecnologia diferentes no mesmo

local; digg, slashdot e delicious, onde as notícias podem remeter às fontes originais assim que

acessadas.

101 Disponível em: http://mycnn.com 102 Disponível em: http://doggdot.us

88

Figura 24: Doggdot.us.

Outro mashup interessante que se deve ressaltar é o idiomag103. Trata-se de uma

revista de notícias sobre música em formato multimídia, personalizada de acordo com o perfil

musical de contas de usuários de redes sociais ou de artistas escolhidos; onde o usuário pode

ter uma experiência de imersão através da leitura das informações textuais, visualização de

vídeo clipes e ao mesmo tempo, audição da obra musical propriamente dita.

Figura 25: Idiomag.

103 Disponível em: http://www.idiomag.com

89

3.4 Categorias propostas

Entende-se que a classificação inicial dos mashups web não satisfaz o propósito do

mapeamento proposto, visto que esta considera apenas o mashup quanto ao conteúdo

apresentado em sua estrutura. Para tanto, agrupamos as tags utilizadas para realização do

mapeamento de acordo com as funções a que os mashups se destinam, propondo as seguintes

categorias a serem estudadas: localização geográfica, visualização de dados, rede social e

busca. Em proporção, poderíamos dizer que as funções equivalem aos serviços aos quais os

mashups se dispõem a realizar.

Tags Quantidade Utilizada Categorias Propostas

Localização 23 Mapas 19

Localização geográfica

Visualização 15 Visualização de dados Fotos 13

Vídeos 8 Música 7 Notícias 6

Rede Social

Busca 7 Busca (search engines) Cidades 4 -

Rede 4 - Quadro 4: Categorias propostas para classificação dos mashups.

3.4.1 Localização geográfica

Localização geográfica compreende todos os mashups que apresentam serviços de

visualização de dados baseados em mapas, com o objetivo de realizar algum mapeamento da

informação, também conhecido como geoinformação104, que pode ser personalizada pelo

usuário ou definida anteriormente pelo desenvolvedor.

104 Abreviatura de informação geográfica. Toda informação sujeita à espacialização, abrigando vínculo geográfico, que pode ser um ponto, endereço, território, etc., permitindo sua localização.

90

3.4.2 Visualização de dados

Visualização de dados105 seriam os mashups que traduzem visualmente determinados

conjuntos de dados, graficamente ou não (apenas informação), apropriando-se dos mesmos e

apresentando-os sob novo contexto. Enquadrar-se-iam também nesta categoria, os mashups de

localização geográfica, porém, foram abstraídos desta por apresentarem-se em maior

aglomeração na rede, razão pela qual se decidiu dedicar aos mesmos categoria própria.

3.4.3 Rede social

A categoria rede social abrange os mashups que promovem a interação entre usuários

de uma ou mais comunidades virtuais no mesmo espaço, seja para compartilhamento de

informações ou conteúdo multimídia, agregando funcionalidades extras às oferecidas por

estes serviços, além estrutura própria.

3.4.4 Busca

Os mashups de busca incluem desde serviços de procura de conteúdo multimídia

específicos (música, vídeos ou fotos) à informação (empregos, notícias ou preços).

3.5 Relações entre as categorias propostas

O limite entre estas categorias não se apresenta de modo rígido e estático, é orgânico,

podendo haver intersecções entre elas (figura 2), integrando uma ou praticamente todas

simultaneamente, estendendo as funcionalidades do mashup. Para classificar tais mashups,

utilizou-se a lógica estabelecida, verificando-se em quais categorias poderiam se adequar,

segundo as características funcionais que apresentaram com maior incidência.

105 Veja mais sobre visualização de dados em: RIBEIRO, Daniel Melo. Visualização de dados na Internet. São Paulo, 2009. 132 p. Dissertação (Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

91

Figura 26: Diagrama representativo das relações entre os limites das categorias dos mashups.

Para analisar estas inter-relações, construiu-se uma matriz de funcionalidades

representando cada categoria e suas respectivas intersecções através de uma escala cromática.

1 – Localização

Geográfica 2 – Visualização de Dados

3 – Rede Social 4 – Busca

1 – Localização Geográfica

1 – mapas 5 – representação gráfica de determinado conteúdo em mapas

9 – criação de mapas personalizados

8 – procura de determinado conteúdo em mapas

2 – Visualização de Dados

5 – representação gráfica de determinado conteúdo em mapas

2 – representação gráfica ou informacional

6 – visualização de dados interativa e personalizada

10 – representação gráfica de sentenças ou tags pesquisadas em serviços de busca

3 – Rede Social 9 – criação de mapas personalizados

6 – visualização de dados interativa e personalizada

3 – personalização de conteúdo conforme preferências (customização)

7 – personalização de tipos de busca

4 – Busca 8 – procura de determinado conteúdo em mapas

10 – representação gráfica de sentenças ou tags pesquisadas em serviços de busca

7 – personalização de tipos de busca

4 – procura específica em um ou mais serviços de busca

Quadro 5: Matriz de funcionalidades das categorias dos mashups.

92

3.6 Matriz de aplicativos

Tais funcionalidades podem ser representadas também por uma matriz de

aplicativos106 para ilustrar a criação de mashups.

APIs Google Maps Twitter Flickr YouTube

Google Maps Guia Vá de Metrô Twittervision Flickrvision Spinvision

Twitter Twittervision Monitter Flussgeist 1 the Waiting Hurricane Ike

Flickr Flickrvision Sad Statements Tag Galaxy TagTV

YouTube Spinvision Hurricane Ike TagTV Infinitube

Quadro 6: Matriz de aplicativos.

Através desta matriz, nota-se que é possível criar mashups utilizando-se dos mesmos

aplicativos, como discutido anteriormente, ou da combinação de outros distintos. Com o

exponencial crescimento na criação de mashups nos últimos meses, segundo estatísticas do

ProgrammableWeb; constatou-se uma média de cem novos cadastrados mensalmente no site

durante o período de um ano. Nesse sentido, tal matriz serve-se apenas a título de exemplo,

pois seria impossível realizar um quadro com todos os mashups criados na web.

2800

2900

3000

3100

3200

3300

3400

3500

3600

3700

Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Jan

Gráfico 5: Número de mashups cadastrados em 2008 no site Programmableweb.

106 Veja mais sobre os mashups utilizados na matriz de aplicativos em anexos.

93

O número de APIs diversas encontradas na composição dos mashups também se

revela como fator relevante para determinar as relações às quais evidenciam. Existem

mashups de alta complexidade, que são compostos por várias APIs, como o Pageflakes107, site

para criação de página pessoal personalizada com conteúdo de vários serviços online, que

agrega cerca de vinte e uma APIs distintas em sua estrutura; e mashups mais simples,

compostos por apenas uma API, como o Housing Maps108, site para busca de imóveis

disponíveis para venda ou aluguel através de mapas, de acordo com localização geográfica

selecionada.

Aplicativos

APIs Iguide Twittervision Infinitube Doggdot.us Flickrvi sion TagTV Sad

Statments Housing

Maps

Delicious X

Digg X

Flickr X X X

Google Ad Sense

X

Google AJAX Search

X

Google Maps X X X X

Slashdot X

Twitter X X

Yahoo Terms X

YouTube X X X

TOTAL 4 2 1 3 2 2 3 1

Quadro 7: Quantidade de APIs em mashups.

3.7 Estudos de Caso em mashups: Twittervision, Iguide e Tag Galaxy

Com o objetivo de retratar aspectos essenciais e possibilitar melhor compreensão

funcional dos mashups, realizaram-se estudos de caso selecionando-se os aplicativos

107 Disponível em: http://www.pageflakes.com 108 Disponível em: http://www.housingmaps.com

94

Twittervision109, Iguide110 e Tag Galaxy111. Tais modelos foram eleitos por atuarem como

representações (isoladas ou não) das diferentes categorias propostas anteriormente.

3.7.1 Descrição de funcionamento

O mashup Twittervision, site de visualização em tempo real dos últimos posts

publicados no Twitter112 sobre o mapa do Google Maps de acordo com a localização

geográfica dos seus usuários, é formado pela união das APIs do Twitter e Google Maps,

retratando as funcionalidades de rede social via microblogging e localização geográfica em

mapas respectivamente. O aplicativo apresenta uma interface simples, praticamente a mesma

do Google Maps, com controles de navegação horizontal, vertical, aproximação e afastamento

sobre o mapa mundi, imprimindo sobre o mesmo um pequeno balão, contendo os dados do

post mais recente, como foto, nome do usuário, mensagem, tempo de publicação, cidade e

país de origem. O post permanece na tela e é substituído automaticamente em intervalos de

cinco segundos por outro mais recente, movendo o mapa para a localização geográfica da

origem deste, alterando-se assim continuamente.

Figura 27: Twittervision.

109 Disponível em: http://twittervision.com 110 Disponível em: http://iguide.travel 111 Disponível em: http://taggalaxy.de 112 Disponível em: http://twitter.com

95

O guia interativo de turismo Iguide, utiliza-se de quatro APIs (Google AdSense113 +

Google AJAX Search114 + Google Maps + YouTube) e screen scraping de conteúdos dos sites

WikiTravel115, Wikipedia116, GeoNames117, Placeopedia118 para oferecer um serviço amplo,

contendo informações sobre vôos, hotéis, mapas, resenha de viagens, vídeos, fotos, etc., a

respeito de milhares de destinos ao redor do mundo. Em síntese pode-se dizer que o aplicativo

apresenta as funcionalidades de visualização de dados; agregando e traduzindo visualmente o

conteúdo de vários web sites turísticos numa interface própria, e de localização geográfica;

utilizando-se de mapas interativos do Google Maps.

Figura 28: Iguide.

Inicialmente, como no Twittervision, o Iguide apresenta uma interface de navegação

baseada no mapa mundi para localização do destino desejado, que também pode ser realizada

por meio de um menu textual vertical lateral. Assim que selecionado algum ponto de interesse

no mapa, são exibidas fotos e o menu textual é expandido com o link para informações do 113 Disponível em: https://www.google.com/adsense 114 Disponível em: http://code.google.com/apis/ajaxsearch 115 Disponível em: http://wikitravel.org 116 Disponível em: http://pt.wikipedia.org 117 Disponível em: http://www.geonames.org 118 Disponível em: http://www.placeopedia.com

96

mesmo, que, quando acessado, exibe uma página com todas as informações existentes para o

destino agrupadas na mesma página, inclusive com links externos remetendo para suas fontes

de origem.

Diferenciando-se dos demais, o mashup Tag Galaxy, site de busca e visualização de

fotos dispostas em três dimensões da comunidade Flickr, é constituído apenas da API do

Flickr, entrelaçando as funcionalidades de rede social, visualização de dados e busca. As fotos

são pesquisadas através de uma ferramenta de busca, que compara a tag inserida pelo usuário

dentro do Tag Galaxy com as pertencentes às fotos do Flickr, exibindo como resultado

aquelas que apresentarem determinado nível de similitude entre si.

Figura 29: Tag Galaxy.

A interface Tag Galaxy se apresenta simples, como a maioria dos sites de busca,

oferecendo uma caixa de texto para procura logo na página inicial; porém, assim que se

realiza a primeira pesquisa, constata-se que esta simplicidade dá lugar à sofisticadas

animações tridimensionais realizadas na plataforma Flash, que simulam viagens virtuais

através do espaço. O resultado é exibido então por grupos de tags semelhantes, representados

97

por um sistema planetário virtual, em que a tag principal pesquisada é o planeta maior,

rodeado por outros menores, que representam as tags afins. Assim que acessado o planeta/tag

desejado, é possível navegar pelas imagens dispostas em formato de mosaico, manipulando-se

uma esfera em três dimensões, onde é possível ampliar determinada foto, ou acessá-la

diretamente no site de origem (Flickr) através de link próprio.

Figura 30: Exemplo de visualização de fotos no mashup Tag Galaxy.

3.7.2 Referências

Embora os mashups Twittervision e Iguide possuam interfaces semelhantes baseadas

em mapas devido à funcionalidade de localização geográfica, são também um pouco

diferentes, na medida em que o primeiro não requer a interação do usuário para exibição do

conteúdo, ou seja, é realizado de modo automático, atuando apenas como um visualizador de

dados específico; enquanto que o segundo necessita de tal interação para recuperar a

informação, agindo como um agregador de conteúdo de fontes diversas.

98

Já o Tag Galaxy, identifica-se com o Twittervision diante da funcionalidade distintiva

de rede social, onde o conteúdo, no caso fotos do Flickr e posts do Twitter respectivamente, é

inserido através da comunidade de usuários; distinguindo-se também do mesmo e

assemelhando-se ao Iguide no modo de visualização de dados, ao também requer a interação

do usuário para exibição do conteúdo desejado.

3.7.3 Interpretação

O Twittervision, apesar de ser interessante por exibir os posts mais recentes do Twitter

sobre o mapa mundi do Google Maps de modo dinâmico, simulando a visualização do

funcionamento em tempo real de uma comunidade ou rede social virtual; age de forma lúdica,

não apresentando uma utilidade prática imediata.

O Iguide se mostra como ferramenta muito útil para compras online de passagens

aéreas e reservas de hotéis, destacando-se também como guia turístico virtual por agregar

conteúdo de outros sites do gênero no mesmo espaço, agilizando e tornando prática a pesquisa

por informações sobre os destinos pretendidos.

Ora, como ferramenta de busca de imagens, o Tag Galaxy talvez não seja um

aplicativo prático para uso cotidiano, porém, assim como o Twittervision, proporciona a

visualização do agrupamento de tags das comunidades virtuais (Flickr) e como se relacionam,

também de forma lúdica, estimulando a interação do usuário para exploração do conteúdo por

meio da interface, metaforizando uma viagem galáctica.

99

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os caminhos trilhados durante esta pesquisa apontam para o entendimento das práticas

cotidianas do ciberespaço, sobretudo o mashup, como ascendentes a uma estética edificada ao

longo do tempo. Por se constituírem a partir de heranças adquiridas, pode-se afirmar que

apresentam origem definida e não se estabeleceram do acaso; ressaltando assim, a importância

do resgate histórico nessa investigação. Constatou-se que o processo de criação e produção a

partir da combinação de uma ou mais fontes para formar um novo elemento, nos diferentes

períodos é o mesmo, variando-se apenas o emprego conforme a época adotada, ou seja, não é

em sua totalidade inovador; o mashup se utiliza dos mesmos conceitos de desconstrução-

construção de seus antecessores, porém, relacionando-os à tecnologia e mídias emergentes.

Outra característica que devemos ressaltar no percurso de pesquisa, refere-se à

concepção da lógica de funcionamento do mashup, pormenorizando o “ecossistema”

tecnológico do qual habita. Tal abordagem contribui para iluminar a obscuridade concernente

à noção da composição técnica do mashup, entreabrindo novos horizontes para outros estudos

aprofundados dessa natureza.

Já o mapeamento dos mashups manifestou-se como uma árdua tarefa que se converteu

em surpreendente recompensa. Ao considerar que a sistemática aplicada em sua realização,

permitiu classificá-los sobre uma óptica funcional por ora não tratada, equiparando-os aos

serviços nos quais se destinam; revelaram-se categorias “orgânicas” intercambiáveis,

imperceptíveis até então, ilustrando os movimentos fluidos de associações e inter-relações

característicos de sua organização, retratando com maior precisão o universo de

possibilidades ilimitadas de imbricamentos do qual são próprios.

No desenrolar do trabalho, quando abordamos a questão do fragmento, pensamos em

caminhar em direção à prática da reciclagem, da “colcha de retalhos”, mas não foi possível

discutir estas questões, pois decidimos focar no objeto, nos movimentos artísticos e nas

100

estéticas tecnológicas, por motivo de se enquadrarem na linha de pesquisa decorrente da

orientação. Também poderíamos ter desenvolvido mais as questões dos processos de

produção e da contribuição das redes nas práticas de recombinação, que culminam no

favorecimento da eclosão dos mashups de informação; porém, por desviar do foco já

comentado e receando tornar o trabalho extenso, resolveu-se conservar esses espaços expostos

para continuidade de pesquisa futura.

A análise dos processos associativos da formação dos mashups descobriu-se

equivalente aos conceitos de mente e cérebro. A mente humana trabalha por associações, e ao

realizá-las, caracterizam-se interconexões em rede. Esta investigação pode ser um interessante

ponto de vista no entendimento das causas que conduzem as pessoas a se sentirem atraídas a

produzir por intermédio de associações, fragmentos, sobretudo o mashup no desenvolvimento

da cultura remix. Segundo Garcia (2007a apud SANTAELLA, 2007, p. 87-88), as interfaces

cada vez mais se aproximarão da forma como pensamos:

Na nossa cabeça não sonhamos, nem pensamos, nem sentimos em apenas texto, som ou imagem visual ou olfativa, o que passa pela nossa consciência ou inconsciência são combinações diversas de mixagens e seqüenciamentos, narrativas e fragmentações, falas e silêncios, construídos com todas as imagens que nos chegam dos sentidos e da memória, que fluem em níveis diversos de predominância e interação. A prioridade é definida pelo conteúdo, pela sintaxe e talentos infinitos da mente, e não por uma hierarquia entre linguagens.

Santaella (2007, p. 89) complementa que o processo de hibridização da hipermídia

permite simular o cérebro como um todo:

Ao integrar interativamente sons, imagens e textos escritos, a hipermídia “hibridiza a densidade simbólica com a abstração numérica, fazendo as duas partes do cérebro, até agora opostas, reencontrarem-se”.

Essas reflexões abrem possibilidades para continuidade da pesquisa em um nível mais

avançado, a serem tratadas futuramente em pesquisa de doutorado.

Em suma, devido o advento recente de tal fenômeno e da carência bibliográfica

específica sobre o tema no recorte proposto, entende-se que esta pesquisa poderá contribuir,

101

mesmo que modestamente, no preenchimento de uma lacuna dentro do vasto campo

inexplorado pertinente ao objeto de estudo.

103

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GLOSSÁRIO

AJAX - Acrônimo em língua inglesa para Asynchronous Javascript And XML (Javascript Assíncrono e XML). ABI - Acrônimo em língua inglesa para Application Binary Interface (Interface Binária de Aplicativos), descreve a interface de baixo nível entre uma aplicação e o sistema operacional. API - Acrônimo em língua inglesa para Application Programming Interface (Interface de Programação de Aplicativos). Conjunto de rotinas e padrões estabelecidos por um software para utilização de suas funcionalidades por programas aplicativos que desejam utilizar alguns de seus serviços. Atom - Tipo de especificação feed. Formato para divulgação de conteúdos web que são periodicamente atualizados, baseado em XML e metadados, identificados como application/ atom+xml media type. Feeds - Os arquivos feed são disponibilizados pelos sites e assinados diretamente pelos usuários através de softwares agregadores ou leitores, que recebem o conteúdo desejado sem a necessidade de terem que visitar o site toda vez que novas atualizações ocorrerem. Alguns navegadores web modernos já possuem estas funções incorporadas. Framework - Modelo de dados. GUI – Acrônimo em língua inglesa para Graphical User Interface (Interface Gráfica de Usuário). Interface representada por elementos gráficos, responsável por traduzir as informações visuais para o código de máquina e vice-versa, através da manipulação desses elementos, acionados pelos dispositivos de entrada controlados pelos usuários. Como exemplo, pode-se citar o sistema operacional Windows da Microsoft, lançado como sucessor ao MS DOS, até então de linha de comando. JSON - Acrônimo em língua inglesa para JavaScript Object Notation (Notação de Objeto JavaScript). Formato leve para intercâmbio de dados computacionais, com uso difundido devido sua simplicidade, especialmente como alternativa para XML em AJAX. Embora seja um subconjunto da notação de objeto de JavaScript, seu uso não requer JavaScript exclusivamente. Microblogging - O mesmo que micro-blog; contendo atualizações pessoais com apenas texto curto (menos de 140 caracteres) via SMS,

mensageiro instantâneo, e-mail, site oficial ou programa especializado. OCR - Acrônimo em língua inglesa para Optical Character Recognition (Reconhecimento Óptico de Caracteres). Tecnologia utilizada pelos scanners para conversão de texto impresso (analógico) em texto editável digital (via software). PHP - PHP é uma linguagem de script originalmente concebida para a produção de páginas web dinâmicas. Ela evoluiu para incluir uma capacidade de interface de linha de comando podendo ser utilizada em aplicações gráficas autônomas. Post - Do inglês, postar. Refere-se às entradas de texto efetuadas pelos usuários nos serviços de blogging. RDF - Acrônimo em língua inglesa para Resource Description Framework (Modelo de Dados para Descrição de Recursos). É uma especificação da World Wide Web Consortium (W3C) para representar informação na web, com o objetivo de oferecer uma semântica formal para modelos ou fontes de dados, conhecidos também como metadata (metadados), através do uso de recomendações pré-estabelecidas. RDF/XML - RDF baseado em XML. REST - Acrônimo em língua inglesa para Representational State Transfer (Transferência de Estado Representacional). RIA - Acrônimo em língua inglesa para Rich Internet Applications. Termo criado pela Macromedia em 2002 para retratar aplicações web ricas onde o processamento é realizado no lado do cliente, através do navegador de internet, porém, mantém a maior parte dos dados no servidor. Por reduzir o tempo de processamento, RIAs possibilitam conseqüentemente melhores experiências de interação com os usuários. RSS - Acrônimo em língua inglesa para Really Simple Syndication (Sindicação Realmente Simples). Tipo de especificação feed. SOAP - Acrônimo em língua inglesa para Simple Object Access Protocol (Protocolo de Acesso a Objeto Simples). Tags - As tags, rótulos ou etiquetas, são parte de um conceito de indexação informal, que permite a

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caracterização da informação através da associação de palavras-chave de acordo com preferência do autor, com o propósito de organizar e facilitar a busca e acesso dessas informações na web. Cada conteúdo pode possuir uma ou mais tags. Type library - Um arquivo ou componente dentro de outro arquivo que contém descrições padrão de objetos expostos, propriedades e métodos. Turtle, Notation 3 (N3) e N-Triples - Formatos de serialização concebidos para expressarem RDF de maneira simples, tornando fácil sua escrita à mão. UDDI - Acrônimo em língua inglesa para Universal Description, Discovery and Integration (Descrição Universal, Descoberta e Integração). URI - Acrônimo em língua inglesa para Uniform Resource Identifier (Identificador de Recurso Uniforme). Web services - Do inglês, serviços web, são também conhecidos como servidor de serviços, atuando como componentes que permitem às aplicações enviar e receber dados em formato XML. Cada aplicação pode ter a sua própria linguagem, que é traduzida para uma linguagem universal de estruturação de dados, o formato XML.

WYSIWYG – Acrônimo em língua inglesa para “What You See Is What You Get” (“o que você vê é o que você tem”). Trata-se de uma interface gráfica com o usuário em que o que é exibido durante manipulação na tela do computador é muito fiel ao resultado final a ser obtido, como a visualização de um documento de texto na forma que este terá quando impresso durante sua digitação, ou de uma página web quando publicada ainda em seu estágio de desenvolvimento. XML - Acrônimo em língua inglesa para eXtensible Markup Language (Linguagem Extensível de Marcação). XMLHttp Request (XHR) - É uma API que pode ser usada por JavaScript e outras linguagens de script para web browsers, responsável por transferir XML e outros dados em texto entre um servidor e um navegador web. XML-RPC – Acrônimo em língua inglesa para Remote Procedure Calls (Solicitações XML de Procedimento Remoto). São dados XML especialmente formatados postados numa URL, utilizando HTTP como transporte e XML como codificação.

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ANEXOS

Anexo A - Lista de mashups utilizados no desenvolvimento da matriz de aplicativos: Guia Vá de Metrô Disponível em: http://www.vademetro.com.br/index.php Descrição: Traça as linhas de metrô da cidade de São Paulo no Google Maps e exibe locais de interesse coletivo como cinemas, bares, teatros, shoppings, próximos às estações. Twittervision Disponível em: http://twittervision.com Descrição: Visualização dos últimos posts do Twitter em tempo real, apresentados no mapa mundial do Google Maps de acordo com a localização dos internautas. Flickrvision Disponível em: http://flickrvision.com Descrição: Visualização das fotografias dos últimos posts do Flickr em tempo real, apresentadas no mapa mundial do Google Maps de acordo com a localização dos internautas. Spinvision Disponível em: http://spinvision.tv Descrição: Visualização dos últimos vídeos postados do YouTube em tempo real, apresentados no mapa mundial do Google Maps de acordo com a localização dos internautas. Monitter Disponível em: http://monitter.com Descrição: Aplicativo que monitora o Twitter através da escolha de palavras-chave, exibindo o que as pessoas estão dizendo sobre determinado assunto em tempo real. Sad Statements Disponível em: http://sadstatements.com Descrição: Declarações tristes, melancólicas e depressivas são capturadas do Twitter e ilustradas via fotos do Flickr automaticamente. Hurricane Ike Disponível em: http://www.mibazaar.com/hurricanes.html Descrção: Exibe postagens sobre o Furacão Ike do Tweeter, mesclando-as com vídeos do YouTube.

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Flussgeist 1 the Waiting Disponível em: http://incident.net/works/flussgeist/waiting/flash/index.html Descrição: Cria narrativas textuais-imagéticas através de palavras ou frases aleatórias advindas de posts do Twitter, e as combinam com imagens do Flickr. Tag Galaxy Disponível em: http://taggalaxy.de Descrição: Visualização de imagens do Flickr em três dimensões, metaforizando uma viagem através do espaço pela galáxia. As imagens são agrupadas por tags semelhantes e representadas como planetas. TagTV Disponível em: http://www.onflex.org/TagTV Descrição: Busca de fotos do Flickr e vídeos do YouTube a partir de uma palavra-chave (tag) desejada. Infinitube Disponível em: http://infinitube.net Descrição: Exibe vídeos ilimitados do Youtube continuamente como uma TV através de uma palavra-chave (tag) desejada.