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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Rafael Donisete Bellettato Terras, Pedras, Sucos Concretos e Metais: Edward Jorden e a Composição das Águas Minerais MESTRADO EM HISTÓRIA DA CIÊNCIA SÃO PAULO 2013

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Rafael Donisete Bellettato

Terras, Pedras, Sucos Concretos e Metais: Edward Jorden e a Composição das Águas Minerais

MESTRADO EM HISTÓRIA DA CIÊNCIA

SÃO PAULO

2013

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Rafael Donisete Bellettato

Terras, Pedras, Sucos Concretos e Metais: Edward Jorden e a Composição das Águas Minerais

MESTRADO EM HISTÓRIA DA CIÊNCIA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em História da Ciência, sob a orientação da Prof.ª, Doutora Maria Helena Roxo Beltran.

SÃO PAULO

2013

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Banca Examinadora

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Dedicatória

Aos meus pais, Luiz Roberto Bellettato e Maria José de Barros Bellettato, por todo o apoio ao longo de mais esse percurso.

À minha orientadora, Maria Helena Roxo Beltran, pela atenção, paciência e dedicação durante a realização do trabalho.

Aos amigos que em tantos momentos me auxiliaram nessa caminhada, em especial à Márcia Sacay, Diogo Calazans e Henrique Vidal, pelo abrigo sempre que necessário, e pelas discussões sempre que possível.

Aos professores e funcionários do Programa de Estudos Pós Graduados em História da Ciência.

À Capes e ao CNPQ, pelas bolsas concedidas, sem as quais este trabalho não seria possível.

A esses, e a outros tantos que não caberiam aqui, dedico este trabalho, e os meus mais sinceros agradecimentos.

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Resumo

Esta dissertação estuda alguns aspectos químicos abordados por

Edward Jorden (1569-1633) na análise de águas minerais no início do século

XVII. Para tanto, foram revistos os históricos da análise de águas minerais à

época, assim como algumas idéias sobre a classificação dos minerais. Esse

tema foi escolhido após o contato com a obra ao analisar o teste para

identificação de “sais” e “sucos azedos” utilizados pelo autor, e perceber a

quantidade de informações sobre o conhecimento químico do período presente

em seu trabalho. Devido à importância do teste com o indicador de tecido

escarlate, foi realizado um histórico do uso de indicadores com mudança de

cor. Neste trabalho, priorizamos o conceito e a classificação dos minerais

dados por Jorden, utilizando como base a edição de 1633 de seu Discourse of

Naurall Bathes and Minerall Waters.

Palavras Chave:

Historia da Ciência, Edward Jorden, Águas Minerais, Análise Química, Século

XVII

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Abstract

The purpose of this dissertation is the study of some chemical aspects

discussed by Edward Jorden (1569-1633), during the analysis of mineral waters

in the beginning of the 17th century. An historical of mineral waters analysis, and

proposals on the classification of minerals are also considered on this work. The

theme was chosen after the contact with Jorden’s work, during the research

about the identification test for “salts” and “sowre juices” made by the author,

and realized the amount of information about the chemical knowledge of the

period in his work. Due the importance of the test with the “scarlet cloath”

indicator, a historical of the indicators with color changes was made. In this

work, we gave priority to the concept and classifications of the minerals given

by Jorden, using as base the 1633 edition of his Discourse of Naturall Bathes

and Minerall Waters.

Keywords:

History of Science, Edward Jorden, Mineral Waters, Chemical Analysis, 17th

Century

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Sumário

Introdução .................................................................................................... 2

Capítulo 1 – A Análise de Águas Minerais ................................................... 4

1.1 – A análise de águas minerais ............................................................... 5

1.2 – A cidade de Bath e as propriedades curativas das águas .................. 8

Capítulo 2 – Discourse of Naturall Bathes and Minerall Waters ................ 14

2.1 – A relevância da obra ......................................................................... 14

2.2 – O uso de indicadores com mudança de cor ...................................... 17

2.3 – O teste com o tecido escarlate ......................................................... 20

2.4 – Das origens dos banhos e da água simples ..................................... 22

2.5 – Dos Minerais e dos Sais encontrados na água ................................. 29

2.6 – Das causas das virtudes medicinais ................................................. 44

Considerações Finais ................................................................................ 51

Bibliografia ................................................................................................. 54

Anexos ....................................................................................................... 59

Proposta de Aplicação da História dos Indicadores com Mudança de Cor

no Ensino de Química para o Ensino Médio .............................................. 59

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Introdução

Esta dissertação tem por objetivo principal analisar, sob a perspectiva da

História da Ciência, as teorias referentes à geração dos minerais na natureza,

assim como o modelo químico utilizado por Edward Jorden (1569-1633) em

sua obra intitulada A Discourse of Naturall Bathes and Minerall Waters,

publicada pela primeira vez em 1631. A obra teve quatro edições, nos anos de

1632, 1633, 1669 e 1673.1 Esse documento foi escolhido inicialmente devido

às constantes referências ao seu trabalho na identificação de ácidos e bases

na análise de águas minerais, porém, ao analisar a obra e conhecer o extenso

trabalho na área dos minerais, optou-se por centralizar a dissertação nesse

tema, devido à minuciosa descrição e classificação dos minerais.

A partir dessa pesquisa, pretende-se compreender aspectos da química

do início do século XVII, o contexto das análises químicas das águas minerais

e possíveis reflexos dos métodos propostos pelo autor em obras de outros

estudiosos.

Foram encontrados trabalhos sobre as análises de águas minerais em

diversos autores, dos quais somente alguns poucos tratam mais

profundamente do texto produzido por Jorden. Dentre esses, destaca-se o

professor Allen G. Debus (1996-2009), que demonstra conhecer de forma

extensa o trabalho do autor e a questão das análises qualitativas do período.

Outros textos relevantes sobre o tema são encontrados no trabalho da

professora Ana Maria Alfonso-Goldfarb, do professor Noel G. Coley e do

professor Albert Baker.

1 Neste estudo utilizou-se a edição de 1633.

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Quanto às dificuldades encontradas, ressalta-se a escassez de

informações sobre o autor, sendo as poucas informações encontradas a seu

respeito as descritas pelo médico e escritor Thomas Guidott (1638-1706),

responsável pelas edições a partir de 1669, os registros de entrada no Royal

College of Physicians, e uma denúncia de erro médico em que é acusado de

receitar erroneamente para um cliente, do qual se defende culpando o

boticário.

Além do documento selecionado, A Discourse of Naturall Bathes and

Minerall Waters de Edward Jorden, também analisaram-se trechos de De Re

Metalica (1556) e De Natura Fossilium (1546) de Georgius Agricola (1494-

1555) tratando sobre a origem e a composição dos minerais.

Este trabalho estrutura-se em dois capítulos. No primeiro capítulo,

encontra-se um histórico dos estudos sobre análises de águas minerais e da

cidade de Bath, na qual se procura apresentar de maneira sucinta as condições

das análises e os principais métodos utilizados pelos autores mais comentados

e a importância de obras como a de Fallopius, Thurneisser e Libavius, assim

como a importância das piscinas de Bath para a cidade e para os estudos

médicos na Inglaterra dos séculos XVI e XVII. No segundo capítulo, aborda-se

a obra de Jorden, apresentando-se teorias desenvolvidas e utilizadas pelo

autor para explicar as qualidades quente e fria dos elementos, as origens da

água, dos minerais, e das propriedades medicinais das águas das fontes e

banhos. Neste capítulo, trata-se também da classificação dos minerais feita por

Jorden segundo suas características e qualidades.

Por fim, o trabalho se encerra com a discussão dos resultados e as

conclusões a que se chegou com a pesquisa durante os capítulos.

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CAPÍTULO 1

O ESTUDO DAS ÁGUAS MINERAIS

Diversos estudos sobre as águas minerais, sua composição e suas

propriedades curativas foram realizados a partir do século XII. Na Europa, um

aumento do número de estudos nesse campo se dá entre os séculos XVI e

XVIII. Na Inglaterra, em especial na cidade de Bath, as águas minerais dos

banhos foram largamente estudadas na tentativa de explicar as origens de

suas propriedades, cuja fama a muito trazia visitantes em busca da cura ou de

conhecer seu funcionamento.

“King’s and Queen’s Baths”, entrada atual para os banhos da cidade de Bath.

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1.1 – A análise de águas minerais

A formação e as transformações da natureza despertam curiosidade que

é intrínseca ao ser humano. O desejo compartilhado por milhares de pessoas

em diversas épocas em desvendar os mistérios e tentar domar a força

surpreendente da natureza levou diversos homens a pesquisar acerca de suas

inúmeras facetas, para os mais variados fins. Na área da medicina, uma das

vertentes que ganhou impulso principalmente entre os séculos XVII e XIX foi a

análise das águas minerais.

O desejo de sintetizar águas minerais em laboratório assim como ocorre

na natureza é na verdade o motor de toda essa investigação sobre as águas. A

possibilidade de engarrafar as virtudes da natureza abre oportunidades para

diversas especialidades, como produção de água mineral artificial ou a

produção de águas mineralizadas balanceadas em termos de sais, terras e

gases de acordo com as necessidades médicas do paciente, que poderia

contar com a segurança da água manipulada, sem as possíveis impurezas das

águas naturais, no conforto de sua casa.2

Entretanto, apesar de todos esses benefícios já citados, havia uma outra

motivação para essa investigação, para essas análises que se popularizaram

por todo o continente e que foram realizadas por séculos. Assim como toda

investigação da natureza, esta proporcionava mais detalhes sobre o

funcionamento da mesma, e assim

2 Alfonso-Goldfarb. “Estudos químico-médicos”, 203.

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“o sucesso dos estudos sobre a composição das águas

minerais significava mais um tento a favor da então moderna

tese: quanto mais se conhece o tecido da natureza, mais fácil

seria domar seu mecanismo de funcionamento” 3.

A análise dos componentes das águas de nascentes e lagos com

possíveis poderes curativos, os banhos naturais e as fontes termais, já era no

século XVI uma área bem explorada, como se pode ver no De medicatis aquis

atque de fossilibus de Gabriel Fallopius (1523 – 1562), de 1564, ou no Pison de

Leonhart Thurneisser (1531 – 1595), de 1572, nos quais se descrevem

processos de identificação de sais presentes na água4.

Os registros mais antigos conhecidos sobre a análise de águas minerais

são de médicos ligados à Universidade de Pádua, na Itália, no século XII.

Pietro da Eboli (1170-1220) escreveu em 1195 seu Bagni di Pozzuoli. No final

do século XV, o trabalho de Johannes Michael Savonarola (- 1461) em De

balneis et termis naturalibus omnibus ytalie abordava a análise de águas, e

teve influência por mais de um século.5

Os testes de pureza da água têm sua importância reconhecida por

Vitrúvio ( ~ 70 - 25 a. C.) e Plínio (23 d.C. – 79 d.C.). Até meados do século

XVI, os processos utilizados para essa identificação consistiam em destilação,

cristalização, dissolução, e fusão dos sais encontrados6. Thurneisser descreve

bem esse método, dando os possíveis resultados em detalhes, das cores e

formatos dos cristais aos testes de solubilidade realizados. Em seu trabalho, 3 Ibid.

4 Debus. “Sir Thomas Browne”, 29-36.

5 Debus. The Chemical Philosophy, 15.

6 Ibid., 14-5.

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descreve uma amostra sendo pesada (utilizando-se para isso da Marca de

Nuremberg7 como unidade de medida), filtrada, destilada e pesada novamente,

além de testes com os cristais do resíduo através da recristalização na

presença de madeira, reação ao calor de carvão em brasa, solubilidade em

água morna, cor da chama e analisando as formas dos cristais. 8

Outro meio de identificação, este conhecido desde a História Natural de

Plínio e ainda empregado no século XIX, é o uso da noz de galha para

identificação da presença de ferro no vitríolo, e a pureza do alume. Este

método, mesmo sendo amplamente utilizado ao se realizar esse tipo de

análise, não trazia certeza do resultado, havendo casos em que se chegava a

conclusões diferentes. Exemplo disso está na análise das águas de Caldas da

Rainha, em Portugal no século XVIII, pelos médicos José Martins da Cunha

Pessoa (1745 – 1822) e Juan Nunes Gago, que com o mesmo procedimento,

chegaram a resultados discordantes sobre a presença de ferro nas águas das

fontes termais.9

Ainda no século XVI, outra publicação importante sobre o tema, porém

não tão expressivo quanto o trabalho de Fallopius ou Thurneisser, é o De

indicio aquarum mineralium de Andreas Libavius (1555 – 1616), publicado em

1597 em seu livro Alchemia. De Indicio apresenta sua investigação sobre as

águas minerais, utilizando muitos dos métodos propostos por Thurneisser. Com

ênfase na medida do peso da água, utiliza um método descrito por Andreas

7 Marca de Nuremberg: Durante a idade média, várias unidades de medida eram utilizadas, e a cidade

de Nuremberg foi local do desenvolvimento de várias dessas unidades durante seu período de “cidade

livre”. De acordo com uma farmacopeia publicada em 1555, a unidade padrão para peso de Nuremberg

seria equivalente a 12 onças (aproximadamente 373g). 8 Debus, Chemical Philosophy, 110.

9 Ferraz, “Análisis y estúdios”, 171-180.

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8

Baccius (1524 – 1600) em 1571 ao molhar e pesar um pedaço de tecido,

pesando-o antes e depois de seco, faz uso também da noz de galha,

percebendo a reação tanto com vitríolo azul quanto verde. Essa obra também

serviu como ponto de partida para seu colega, o qual provavelmente conheceu

no curso de medicina na Universidade de Pádua e que cita entre os amigos

que ofereceram informação para este livro e será analisado nos próximos

capítulos deste trabalho, Edward Jorden (1569 – 1633), que viveu na cidade de

Bath entre 1600 e 1633, e publicou em 1631 um discurso sobre suas águas. 10

1.2 – A cidade de Bath e as propriedades curativas das águas

A cidade de Bath se localiza no sudoeste da Inglaterra, a 156km de

Londres. É conhecida por sua arquitetura que mescla o estilo romano e

georgiano, assim como por seus banhos naturais.

As fontes termais da região já eram apreciadas pelos celtas, mas foi sob

o domínio romano por volta de 43 a.C que os banhos ficaram conhecidos por

toda a Europa. O grande complexo de piscinas era o centro da cidade romana

de Aquae Sulis, que teve seu declínio no início do século V, e com o colapso

romano, as estruturas se tornaram ruínas. Com o crescimento do domínio

cristão, as fundações das construções romanas eram muitas vezes saqueadas

e desmanchadas para servir de material para as novas construções. 11

10

Debus. The Chemical Philosophy. 346. 11

Manco, Bath Past.

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9

Cabeça da deusa Minerva e pórtico da entrada dos banhos, remanescentes do domínio romano e

encontradas nas escavações realizadas para reconstrução dos banhos, já no século XX.

Durante a Idade Média, Bath ficou conhecida pela confecção de roupas,

mas no século XVI, as fontes aquecidas reivindicaram seu status como

principal atração da cidade após a crise no comércio de lã.

Apesar da reconstrução da cidade durante o domínio saxão, os banhos

não passavam de piscinas aquecidas com bancos ao redor para aproveitar a

água. Foi no século XVI, após reivindicações de médicos e moradores, que

ocorreu uma reforma geral, com ampliação das piscinas e da estrutura, com

instalações de sistemas de drenagem e abastecimento das piscinas, assim

como diferentes entradas para pessoas sadias e doentes, homens e mulheres.

Essa reforma, assim como a da abadia de Bath, foi apoiada pela Rainha

Elizabeth, a qual visitou a cidade de 1574 para reforçar seu apoio.

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10

O complexo contava com diversos banhos. King’s Bath, o mais quente

de todos, Hot Bath, o segundo mais quente, Queen’s Bath, de calor moderado,

e o Cross Bath, o mais frio, além de um apêndice ao Hot Bath, chamado de

“Leapers Bath”, reservado para as pessoas “imundas”.12

A fama das propriedades curativas das águas é antiga, de tal forma que

a própria história da fundação da cidade é envolta por uma lenda na qual um

príncipe leproso, que havia perdido seu direito ao trono e exilado como tratador

de porcos devido à doença, teria visto seus animais também sucumbidos à

enfermidade entrarem nas águas das fontes e saírem curados. O príncipe teria

entrado também na fonte e se curado, e assim que restituído ao trono,

construiu ali uma cidade.

Outra versão da história conta que o então Rei Bladud, que viveu no

tempo de Elias, teria descoberto os banhos e testado suas qualidades em seu

próprio filho.

Apesar de não haver indícios de que essa historia seja real, a estátua do

Príncipe Bladud ainda saúda os visitantes sobre a placa na qual é nomeado

como o fundador da cidade. 13

12

Jorden, 133. 13

Ibid.

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11

Estátua do Príncipe Bladud em Bath. Na inscrição, lê-se: “Bladud, filho de Ludhudibras, oitavo rei dos Bretões

de Brute. Grande filósofo e matemático, nascido em Athenas e lembrado como primeiro descobridor e fundador desses

banhos oitocentos e sessenta e três anos antes de Cristo, o que é dois mil quinhentos e sessenta e dois anos do

presente ano de 1699”.

Essa fama atraiu inúmeros doentes em busca de cura, assim como

muitos médicos em busca do conhecimento sobre suas propriedades

medicinais. Durante o final do século XVI e início do XVII, a maioria das casas

ao redor das piscinas pertenciam aos médicos que ali trabalhavam. Os

pacientes curados, como agradecimento, doavam anéis de bronze, que

enfeitam as colunas ao redor das piscinas até hoje14.

14

Manco, Bath Past.

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12

Anéis de bronze doados pelos pacientes curados, adornando as colunas ao redor das piscinas.

William Turner (1508 – 1568), decano de Wells, doutor em medicina em

Bologna ou Ferrara, foi um dos primeiros a escrever sobre as propriedades das

águas de Bath. Calvinista, viveu no continente durante as revoluções mais

conservadoras, onde se tornou amigo de Conrad Gesner. Apesar de usar

muitas citações e descrever com pouca clareza de detalhes sobre os

procedimentos empregados em seu livro A Booke of the natures and properties

as well of the bathes in England as of other bathes in Germanye and Italye,

Turner se estende um pouco mais ao falar sobre as águas de Bath, de onde

extraiu do fundo algum “lodo, lama, ossos, e pedras que juntas evidentemente

cheiram a enxofre”, concluindo que o principal ingrediente seria enxofre,

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13

embora devido a alguns minérios encontrados na região, acredite na presença

de algum cobre também. 15

Um dos médicos atraídos pela fama da cidade foi Edward Jorden.

Formado em Pádua entre 1591 e 1593, aceito pelo Royal College of Physician

em 1595 e se tornando membro em 1597. Jorden se muda para Bath por volta

de 1600, onde permanece até sua morte em 1633.

Em seu livro A Discourse of Naturall Bathes and Minerall Waters, Jorden

analisa as águas dos banhos de Bath, seguindo a metodologia já conhecida de

destilação, cristalização, solubilidade, exposição ao fogo, além de medidas da

massa da água. Porém, critica o uso unicamente destes métodos, e o que

torna seu trabalho diferente dos anteriores é a utilização de um indicador de

ácidos, um tecido escarlate que muda de cor em presença destes. Entretanto,

Jorden não se detém na descrição do teste, apenas citando seu uso entre

outros testes a serem realizados com a água. 16 Até então, a identificação dos

ácidos era feita através das propriedades organolépticas, como gosto e textura,

ou através de reações com outras substâncias, portanto, a utilização de um

indicador que dispensasse as possíveis falsas interpretações das reações se

tornaria uma grande vantagem durante a análise.

15

Debus, “Solution Analyses”, 51-52. 16

Jorden, Discourse of Naturall Bathes, 122-4.

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14

CAPÍTULO 2

A DISCOURSE OF NATURALL BATHES AND MINERALL WATERS

“Discurso sobre os Banhos Naturais e Águas Minerais,

onde primeiramente a origem das fontes em geral é declarada.

E então a natureza e diferenças dos Minerais, com exemplos

de Banhos em particular para a maioria deles. Em seguida, a

geração dos minerais na terra de onde ambos, seu calor e suas

virtudes, comprovadamente procedem. Também por quais

meios as Águas Minerais devem ser examinadas e

descobertas. E finalmente, da natureza e uso dos Banhos, mas

especialmente dos Banhos de Bath em Sommerset-shire.”17

2.1 – A relevância da obra

Sua obra A Discourse of Naturall Bathes, and Minerall Waters Wherein

the First the Originall of Fountaines in Generall is Declared foi publicada

primeiramente em 1631. Em 1632, a edição “em muitas partes aumentada” foi

publicada e serviu de base para as edições posteriores, que ocorreram em

1633, 1669 e 1673, sendo que a partir de 1669, o editor Thomas Guidott

acrescenta à obra a biografia do autor. A única outra obra publicada por

Jorden, foi A briefe discourse of a disease called the Suffocation of the Mother, 17

Ibid., Folha de rosto.

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15

no qual relata um caso em que foi chamado a investigar uma suposta

possessão demoníaca, no qual refutou os relatos sobrenaturais e atribuiu a

enfermidade à causas naturais. 18

O autor, em sua dedicatória e durante o primeiro capítulo, revela sua

paixão pela cidade e seu grande descontentamento com a maneira pela qual

os Banhos teriam sido tratados durante a sua reforma.

Em sua carta ao Lord Francis Cottington, Barão de Hanworth, aclamado

por Jorden como um dos “mais honoráveis membros do conselho de Sua

Majestade” 19, pede por um patrono que proteja os Banhos, assim como a ele,

alegando:

“Muito poucos escreveram algo sobre eles, e eles não

mencionaram, nem mesmo passaram superficialmente sobre

seus muitos pontos concernentes às suas causas e origens,

contentando-se com seu uso empírico.” 20

Como justificativa para seu trabalho, diz ainda que “Eu faço isso para o

uso de meu país”. 21

Além do pedido de cuidado para com os Banhos, a obra apresenta um

discurso claro, embasado em leituras de textos elaborados por antigos, árabes

e contemporâneos. Discute questões como a origem dos minerais presentes

18

Debus, Chemical Philosophy, p. 346. Nesse caso, Jorden atribui a doença a um problema do útero,

que teria pressionado os pulmões da paciente e levado às convulsões. 19

Jorden. “The Epistle Dedicatory” in Discourse of Naturall Bathes. 20

Ibid. 21

Ibid.

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16

nas águas, assim como as propriedades da água simples22 e a própria origem

da água. O autor tenta, à sua maneira, se desvencilhar dos Antigos, os quais

segundo ele deixaram coisas “imperfeitas, duvidosas, obscuras, controversas,

e talvez, falsas”. 23

Seu extenso estudo sobre as origens e as propriedades dos minerais

encontrados nas fontes foi bastante utilizado por outros médicos e

mineralogistas, que recorrem à sua obra para tratar da análise do conteúdo de

fontes, para a geração dos minerais na terra e sua presença nas águas, ou até

mesmo para refutar sua teoria referente ao como as águas seriam aquecidas.

Entre os que citam a obra de Jorden, encontramos Lodowick Rowzee, Thomas

Johnson, John French, Robert Witty. 24

A obra é mais comumente citada nos trabalhos atuais em História da

Ciência devido ao teste proposto por Jorden para analisar o tipo de minerais

presentes nas águas, pois, além de explorar os procedimentos já conhecidos,

Jorden se utilizaria ainda de um tecido escarlate para a identificação de Sais e

Sucos Azedos.

Devido ao interesse despertado por esse teste utilizando um tecido

escarlate, considerado um dos primeiros testes para identificação ácido-base

de que se tem notícia, abordaremos alguns aspectos do histórico dos

indicadores.

22

Sobre as água simples, Jorden se refere à água sem mistura, que não possui substâncias que alterem

suas qualidades. Voltaremos a tratar deste tema mais à frente. 23

Jorden, Discourse of Naturall Bathes, 6. 24

Debus, “Solution Analyses”, 56.

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17

2.2 – O uso de indicadores com mudança de cor

Um dos indicadores com mudança de cor mais antiga relatados, e

considerada por muitos livros de química analítica como uma das primeiras

análises qualitativas registrada, é o indicador de noz de galha. Esse indicador,

como já foi dito, aparece no livro História Natural, de Plínio, no século I d.C. A

noz de galha seria um indicador para detectar a presença de ferro, em que uma

tira de papiro embebida em seu extrato era mergulhada na solução analisada,

e na presença de ferro, a tira do papiro se tornaria preta. A noz de galha foi

utilizada também por Fallopius, porém na forma de decocção, para identificar a

presença de ferro no alume. 25

À época de Plínio, um dos testes empregados para classificar a dureza

da água também envolvia alterações de cor. Para saber se a água era mais ou

menos dura, analisava-se o grau de alteração na coloração do vinho.

No século XVII, vários outros testes com alteração de cores apareceram.

Henry de Heer em seu Les Fontaines de Spa de 1630, sugere o uso da noz de

galha como teste para o vitríolo, e a madeira de pau-brasil para o alume. O

mais conhecido Jean Beguin utiliza folhas secas de rosas e tintura de violetas

no teste com espírito de vitríolo, embora atribua a alteração de cor mais à

característica da planta que à acidez do espírito. Pierre Gassendi, em sua obra

25

Baker, “A History of Indicators”, 147.

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póstuma de 1658 Syntagmatis Philosophici utiliza rosas na presença de ácido

vitriólico e em óleo de tártaro.26

Na Inglaterra, Edmund Deane publica em 1626 seu Spadacrene Anglica,

em que ao analisar as águas de Knearesborough utiliza a noz de galha para

verificar a presença de vitríolo, observando que uma quantidade diluída em um

copo de água da fonte passaria de roxo aos poucos para a cor de vinho claro,

além de detectar a presença de enxofre evidenciada pela alteração da cor de

objetos de metais claros, como a prata, colocados nela.27 No mesmo ano, e

novamente em 1632, Michael Stanhope utiliza, além da noz de galha, ramos de

carvalho verde, o qual dá uma tintura azul-safira.

Outro importante estudioso das águas minerais é o também inglês

Robert Boyle (1627-1691), o qual investigou a fundo os indicadores de ácidos,

chegando a conclusões relevantes a respeito deles. Primeiramente, Boyle

percebeu que as tinturas vegetais de cor púrpura, qualquer delas, alteravam

sua cor para vermelho na presença de ácidos. A partir disso, percebeu a

possibilidade de um novo critério para a classificação dos materiais, chamando

de alcalinos as que têm propriedades contrárias aos ácidos e mudam a cor da

tintura púrpura dos vegetais para azul. Além disso, durante análises de águas

minerais, percebeu que algumas substâncias não alteravam a cor da tintura,

chegando à conclusão de que estas não pertenceriam a nenhuma das

classificações então conhecidas, ressaltando a necessidade de se investigar as

águas para que se conhecesse melhor sua composição.28

26

Debus, “Solution Analyses”, 50-51. 27

Deane, Spadacrene Anglica, 6, 11. A edição consultada foi a de 1736. 28

Alfonso-Goldfarb, Da Alquimia à Química,

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O trabalho de Boyle com os indicadores foi tão importante, que grande

parte dos livros didáticos atuais o declaram como o “inventor” dos indicadores

ácido-base. Em seu Short Memoirs for the Natural History of Mineral Waters,

um livreto que segundo ele deveria ser uma carta a um amigo, há um trabalho

completo sobre a análise dos sais presentes na água, no qual evidencia a falta

de uma pesquisa e classificação nova dos sais ainda sem nome descobertos. A

partir disso, prova através de alguns experimentos, a possibilidade de sintetizar

alguns desses sais em laboratório, no que ele afirma serem processos

equivalentes aos que ocorrem no seio da terra. Tudo isso, em apenas 112

páginas.29

No seu livro Experiments and Considerations Touching Colours, Robert

Boyle descreve uma série de experimentos. Dentre eles, alguns que se referem

ao comportamento do xarope de violeta, concluindo que o comportamento se

repete com todo ácido, e de maneira diferenciada em presença de alcalinos30.

Mais do que isso, afirma que todo suco vegetal de coloração púrpura se

comporta da mesma maneira.31

Outros já haviam percebido o comportamento do xarope de vegetais e

sua alteração em contato com determinados ácidos. Essa mudança de cor

ocasionada, assim como a de outros indicadores, era bastante utilizada por

tintureiros, que conseguiam assim novas cores de maneira mais prática e de

baixo custo. 32

29

Alfonso-Goldfarb, “Estudos químico-médicos”, 204. 30

Alfonso-Goldfarb, Da alquimia à química, 202. 31

Eamon, “Robert Boyle”, 204. 32

Ibid., 205.

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20

É nesse meio que encontramos Jorden e seu teste para identificação de

“Sais” e “Sucos Azedos”.

2.3 – O teste com o tecido escarlate

No capítulo 15, intitulado “By what meanes it may be discovered what

minerals any water containeth”33, Jorden critica os métodos de análise

empregada na época, que se contentavam apenas com a mera destilação ou

evaporação da água e observar seus sedimentos.

Propõe então uma maneira de identificar os minerais a partir da

Sublimação, pela qual os reconhece pela forma dos cristais gerados. Na página

124 da edição de 1633, Jorden declara que:

“Pela Sublimação, quando trazido ao estado de

congelamento, e varas de madeira são colocadas dentro dela,

dentro de alguns dias, os sucos concretos34 irão se depositar

na madeira; em Agulhas, se for Nitro; em quadrados, se for Sal;

e em torrões ou pedaços se for Alúmen ou Caparrosa35, e as

outras substâncias minerais que a água tenha recebido, irá ou

incorporar uma tintura com ela, ou se for mais terrosa, irá se

acomodar e se separar dela, e ao secar em um fogo gentil, irá

33

“Por quais meios podem ser descobertos quais minerais qualquer água contém” 34

Por “sucos concretos”, Jorden se refere aos minerais que, uma vez extraída sua umidade, retomam

sua característica concreta, como veremos mais adiante. 35

Caparrosa é o nome dado para diversos sulfatos.

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21

mostrar de qual classe veio, ou pela cor, gosto, cheiro, ou

virtude”.

Em seguida propõe um outro método, esse por precipitação, e é na

descrição desse método que Jorden apresenta o experimento de identificação

de ácidos e bases, ainda que não descreva em detalhes sua utilização.

“Há uma outra maneira por precipitação, pela qual essas

substâncias minerais são precipitadas dos sucos concretos que

as mantêm, pela adição de alguma substância oposta. E essas

são de dois tipos: ou Sais, como Tártaro, Cinzas para Sabão36,

Kelps, Urina, etc. ou sucos azedos como Vinagre, Limões, Óleo

de Vitríolo, Enxofre, etc. Nos quais observei que os Sais são

próprios para azular cores, e o outro para avermelhar: por

exemplo, pegue uma peça de tecido escarlate, e molhe em

Óleo de Tártaro (o mais forte desse tipo) e ele torna-se azul:

mergulhe novamente em Óleo de Vitríolo, e ele se torna

vermelho novamente.”

Temos, assim, nessa breve descrição, indicios da aplicação de um teste

para a identificação de duas qualidades diferentes nas águas. Embora não

descreva como realiza esse procedimento, ou o tipo de tintura utilizado nesse

tecido, pode-se presumir que o método se assemelhe ao utilizado por Plínio

com a noz de galha, que mergulha uma tira de pergaminho embebida com

solução no recipiente com a amostra. Quanto à tintura do tecido, apesar da

dificuldade em se saber ao certo qual era a utilizada, sabe-se que à época a

36

O termo usado no original é Soap-Ashes.

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tintura de pau-brasil era bastante conhecida pelos tintureiros, sendo a base

para diversos tons de vermelho. De fato tintura de pau-brasil foi utilizada na

identificação ácido-base até o século XIX e existe a possibilidade de Jorden ter

chegado a esse indicador a partir do conhecimento passado pelos tintureiros.37

2.4 – Das origens dos banhos e da água simples

No primeiro capítulo, Jorden se dedica a contar uma breve história dos

Banhos, sobre o uso e como eram vistos por diversos povos. Cita Plínio sobre

a construção dos banhos em Roma por Agripa em 170, e descreve a

ostentação dos Banhos construídos por Antonio e Diocleciano com seus

inúmeros pilares de mármore. Ao falar do uso dos Banhos por turcos e

romanos, exalta as qualidades dos Banhos ingleses, pois, além de servir às

atividades comuns de limpeza, ainda possuíam usos medicinais e muito

superiores para diversas doenças. 38

Sobre as origens dessas propriedades milagrosas, fala sobre a falta de

informações nos autores Antigos, mesmo em Aristóteles (388 a.C. – 322 a.C.),

Hipócrates (460 a.C. – 370 a.C.) ou Galeno (130 – 200), e da crença de que

essas virtudes viriam diretamente de Deus, ou ao menos dos Corpos

Celestiais, mencionando as piscinas de Bethesda e o Rio Jordão39 que

reforçam essas ideias de milagre e poder sobrenatural criado na mente dos

37

Debus, “Solution Analyses”, 56. 38

Jorden, 2-3. 39

As piscinas de Bethesda, na Bíblia, é o local onde Jesus curou um leproso, e onde se dizia que anjos

desciam e agitavam as águas, e quem entrasse na água depois disso, era curado de qualquer

enfermidade (João: 5, 1-15). O Rio Jordão é citado no antigo testamento, onde Naamã teria se curado ao

entrar no rio por sete vezes (II Reis : 5, 14).

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23

homens “especialmente onde eles veem esses estranhos efeitos e não

conseguem reduzir a causas naturais” 40.

Encontra nos antigos Latinos e Árabes, como Plínio, Seneca, Lucrécio,

Avicena e Rhasis, entre outros, breves menções aos banhos naturais, e algum

uso de águas com sais, nitros e alumens, embora não haja nada de mérito

acerca das causas naturais delas. Exalta ainda os esforços nos estudos das

minas e das “entranhas da terra”, acrescentando um conhecimento melhor que

os Antigos tiveram, principalmente nos trabalhos de Fallopius, Agricola,

Bacchius, Mathesius, Solinander, Libavius, etc. que segundo ele, aumentaram

muito o conhecimento sobre esse ponto, e ainda “corrigiram muitos erros e

enganos nos autores antigos” 41.

No segundo capítulo, no qual se propõe a definir as Águas Minerais, e a

mostrar as qualidades e usos da Água Simples, encontra-se um interessante

debate sobre a natureza das propriedades da água.

Jorden define as águas minerais como sendo aquelas que “além de sua

própria natureza simples, receberam e embeberam-se de alguma outra

qualidade ou substância das Minas Subterrâneas” 42. Segue dizendo que essas

águas mantém suas características naturais de liquidez, frio e umidade, mesmo

que aquecida por uma fonte externa, pois ao cessar o calor, elas retomam suas

características iniciais.

O termo “embebido” é utilizado para diferenciar as águas minerais das

misturas terra/água, pois no caso das misturas, a terra se deposita no fundo 40

Jorden, 4. 41

Ibid., 6. 42

Ibid., 7

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24

enquanto as águas embebidas são tão misturadas que a água retêm suas

qualidades, sejam espíritos, sucos dissolvidos ou tinturas. Já o termo “Minas

Subterrâneas” é utilizado para diferenciar as substâncias de origem animal e

vegetal “como decocções de ervas, carnes, etc.” 43.

As águas Minerais podem ser simples ou compostas, sendo simples

quando participa com apenas um Mineral Subterrâneo, ou composta quando

participa com mais de um. E essas águas podem ser quentes ou frias, devido a

causas Subterrâneas.44

Quanto à Água Simples, deixa claro que esta não se trata do “Elemento

da água”, mas sim a “água livre de qualquer mistura heterogênea, a qual possa

alterar seu sabor, cor, aroma, peso, consistência, ou qualquer outra qualidade,

que possa ser discernida ou por seus sentidos ou por seus efeitos”. Sendo

assim, “esta água, portanto, deve ter cor e gosto corretos, sem sabor ou cheiro,

sutileza, leveza, frio e umidade; se alguma dessas propriedades faltar, ou

alguma exceder, está misturada e infectada”45.

A seguir, fala sobre as qualidades fria e úmida da água, discutindo sobre

a opinião dos estóicos. Segundo estes, e confirmado por Seneca e Libavius, o

ar seria mais frio que a água. Sua explicação seria o fato de o ar ser formado

por água, retirando desta sua qualidade fria. Entretanto, essa afirmação leva à

conclusão de que a água é que seria mais fria, e não o ar. Fala ainda da teoria

de Aristóteles sobre o ar ser mais quente que a água, e sobre Galeno e a

43

Ibid. 44

Ibid., 20. A respeito das “causas subterrâneas” para explicar o calor das águas, Jorden trata mais

profundamente do assunto ao falar das propriedades medicinais. Esse tema será tratado mais à frente. 45

Ibid., 7-8.

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25

tenuidade que pode ser alterada tanto pelo calor quanto pelo frio, não julgando

se seria quente ou fria.

Para Jorden, o ar seria mais frio, tornando-se quente somente por fonte

externa de calor que, uma vez retirada, faz o ar voltar ao seu frio natural. Como

exemplo para essa afirmação, diz ainda:

“Então nós vemos que entre os trópicos na Zona Torrida,

enquanto o Sol está no horizonte, e atinge o ar com seus raios

perpendiculares, é excessivamente quente, especialmente nos

vales, onde a reflexão é maior: tanto que Aristóteles sustenta

que essas partes do mundo seriam inabitáveis, devido ao

extremo calor. Mas após o Sol se pôr, o ar retorna ao seu frio

natural, até o Sol aparecer novamente.”46

Descarta ainda a ideia de “Antiperístase” 47 para explicar o frio na região

média, dizendo que esse frio seria devido à qualidade fria do ar. Segundo ele:

“Não seria tão frio próximo aos Pólos, se o próprio ar

fosse quente. Mas a longa falta do Sol nessas partes, e os

raios oblíquos quando presentes permitem ao ar aproveitar seu

frio natural, então é provável que ele seja mais frio que a água,

vendo seu grande poder de condensação, em relação à água,

como nós o vemos congelando a água em gelo, neve, granizo,

etc. o que a água não poderia fazer sozinha. Nas entranhas da

terra, onde o ar não pode passar livremente, a água nunca é 46

Ibid., 9. 47

Antiperístase seria o fortalecimento ou aumento de uma qualidade pela adição de uma qualidade

contrária.

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26

encontrada congelada, a menos que seja comprimida com

alguma outra substância equivalente ao ar em frio, como

Mercúrio, Nitro, etc.”. 48

Trata ainda da característica úmida da água, mostrando a discussão

entre Aristóteles e Galeno sobre a umidade da água e do ar. Ao tratar da

tenuidade da água, cita as observações de Hipócrates e Galeno quanto à

fervura da água, utilizando o aquecimento e o resfriamento da água para

comprovar sua tenuidade, sendo que Galeno a usa para ferver ervilhas e

feijões. 49 Estranhamente, a partir dessa afirmação, Jorden inicia um histórico

sobre o uso de feijões e suas qualidades, seguido da produção de bebidas a

partir de grãos, como a cerveja em países que não possuem uvas, as quais

são extraídas dos grãos pela pureza e a tenuidade da água, pelos meios com

os quais se conseguem extrair os Caldos, Xaropes, Emplastros, etc. como um

menstruum50, para receber as qualidades de todos os medicamentos e

nutrientes.

Encerra o capítulo tratando da leveza da água, e a dificuldade de se

conseguir balanças de precisão suficiente para diferenciar as impurezas uma

vez que “águas simples diferem muito pouco nesse ponto, assim como muitas

águas misturadas, se elas estiverem infectadas somente com Espíritos, e não

com substâncias corpóreas”, embora Agricola tenha encontrado diferença entre

o peso das águas dos rios Pyrene e Euleus, e os rios Tigre e Eufrates. 51

48

Ibid., 10. 49

Aqui Joden cita Hipocrates, De Aere Aquis et Locis, e De Morbis Popularibus 50

Sobre o conceito de menstruum, vide Andrea Bortolotto, Os Diferentes Saberes Utilizados na

Elaboração do Método “Químico” Mineral de Johann Andreas Cramer no Século XVIII (2012). 51

Jorden, 13. Nesse ponto, remete ao livro De Natura Eorum quæ Effluunt ex Terra (1546) de Agricola.

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27

Sobre as origens da água simples52, afirma que existem

respectivamente três:

- Dos vapores úmidos congelados pelo frio no ar;

- Da terra;

- Da percolação do Oceano.

Quanto à primeira, diz que é certo que as fontes e rios recebem uma

grande quantidade de água dessa maneira, seja pela chuva, neve ou granizo, e

uma quantidade ainda maior que pode ser percebida pelo aumento do volume

dos lagos e rios durante o verão, que vem do derretimento do gelo preso no

topo dos Alpes e montanhas, como pode ser visto nos rios Reno e Danúbio.

Afirma que é devido a isso que em locais com pouca chuva, há pouca água,

como em algumas partes da África próximas à região do Equador.

Porém, esse método não seria suficiente para manter perpetuamente as

fontes, uma vez que a maior parte dessa água é levada pelos rios para o

Oceano, e segundo Seneca, essa água não seria capaz de se aprofundar mais

que dez pés terra adentro, mesmo que houvesse passagens nas entranhas da

terra para isso. Antes de explicar sobre a origem das fontes e rios pelos

Oceanos, discute a ideia de Ovídio sobre a transformação dos elementos, e a

possibilidade de a terra se transformar, nas entranhas da Terra, em água.

Descarta essa possibilidade desde o início, além de outras teorias, como a de

que a Terra seria um animal, tendo os rios como veias e sugando as águas em

alguns pontos e regurgitando em outros.

52

Ibid., 14-20.

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28

Sobre a origem da água nos Oceanos, Jorden comenta sobre a teoria de

Agricola, e fala sobre fontes frescas com água percolada do Oceano por

bancos de areia que viu em suas viagens, e afirma:

“Não tenho dúvidas de que a água do Mar deve servir

todas as outras Fontes e Rios de todos os tipos, mesmo ambos

estando distantes do Mar, e em posição alta. Nem precisamos

nos precipitar por ajuda a esses monstruosos conceitos de

Agitação, Compulsão, Compressão, Sucção, Atração pelo Sol,

etc. Mas sustentando o sagrado Cânone das Escrituras, de que

todos os Rios são do Mar, etc. eu persuadi a mim, de que há

uma razão natural para a elevação dessas águas para as

cabeceiras das Fontes e Rios, embora isso ainda não tenha

sido descoberto”. 53

Após apresentar sua teoria de que a água seria levada por declinação

do ponto mais alto dos oceanos (pois os oceanos são mais altos ao redor do

equador que próximo aos pólos), Jorden encerra o capítulo admitindo que

estava com receio de publicá-la, e que enviara uma carta ao professor

Brigges54 de Oxford, mas a mesma chegou apenas após o falecimento do

professor, e com isso, se aventurou a publicar.

53

Ibid., 18. Ao afirmar que todos os rios são do mar, Jorden parece se referir a Eclesiastes, “Todos os

rios vão para o mar, e contudo o mar não se enche; ao lugar para onde os rios vão, para ali tornam eles

a correr." (Eclesiastes 1:7). 54

Aqui Jorden parece se referir ao professor Henry Briggs (1561-1631), professor de geometria em

Oxford, que publicou trabalhos ligados à navegação como “A Table to find the Height of the Pole, the

Magnetical Declination being given” (1602) e "Tables for the Improvement of Navigation" (1610).

(http://global.britannica.com/EBchecked/topic/79504/Henry-Briggs)

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29

2.5 – Dos Minerais e dos Sais encontrados na água

Jorden entende os minerais como sendo “todo corpo perfeito Inanimado,

criado nas entranhas da terra”. Essa definição lembra em muito a de Agricola,

que os classifica como “corpos subterrâneos inanimados” 55. Já na origem dos

minerais, as teorias se diferenciam enormemente. Para Agricola, os minerais

se originam da mistura entre os elementos, na qual a água penetra a terra e

carrega consigo propriedades da terra que, ao ser aquecida, forma uma

mistura perfeita, e ao ser resfriada, congela a mistura dando forma aos

minerais. A distinção entre os minerais (terra, pedra, sucos sólidos e metais) se

daria pelo tipo de suco formado e pela maneira pela qual ele se condensou,

seja pelo calor ou pelo frio. 56

Para Jorden, entretanto, os elementos Aristotélicos não teriam influência

durante a formação dos minerais. Até mesmo os conceitos de calor e frio como

causa dos minerais são contestados, sendo seus efeitos reduzidos a apenas

participantes do processo, e não fonte das características físicas do mineral

como se acreditava. Para descartar de vez essa teoria, usa como exemplo os

sucos untuosos, como os óleos e graxas, que na presença de fogo são

consumidos, não são de água pois a água não se mistura com eles, nem de ar,

pois este é seco, ou de terra, pois esta é sólida. Reforçando a idéia, cita dois

axiomas de Hipócrates, “tudo pode ser dissolvido naquilo de que é feito”, o que

excluiria assim a água e a terra, e “somos nutridos por aquilo de que

consistimos”, o que exclui também o fogo e o ar, já que o acréscimo destes não

nutre os minerais. Entretanto, ao fazer a descrição dos minerais, tenta reduzir

55

Agricola, De Natura Fossilium, 17. 56

Agricola, De Re Metallica, Lib. I, 1-3.

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30

suas qualidades às dos Elementos, classificando-os como quente, frio, seco,

úmido, etc. 57

Até mesmo a idéia de que a geração dos minerais seria originada pelo

movimento dos astros é colocada em dúvida, quando lançando mão das

Escrituras, afirma que os minerais devem ter sido criados no terceiro dia, junto

com as plantas e animais, enquanto os corpos celestes teriam sido criados

apenas no quarto dia. A influência do Sol, apesar de não descartada, é

questionada por sua incapacidade de penetrar nas entranhas da terra com

seus raios, e a pouca interferência do seu calor no processo.

Sua teoria então sugere que os corpos minerais sejam formados por

meio do que chama de “Espírito Seminal”. Assim como as plantas, estes teriam

a necessidade de crescer e reproduzir, sendo a única diferença o fato de não

possuírem sementes. Porém, como visto em diversos locais onde o trabalho de

mineração parecia ter esgotado a capacidade da terra de produzir estanho,

chumbo, prata, ferro, entre outros, e após vários anos de abandono o terreno

se apresenta novamente repleto destes minérios, relatado por Agricola,

Bacchius e Virgilio, chega-se a conclusão de que estes são gerados por

alguma causa eficiente que reúna as qualidades necessárias da terra e as

transforme. Ao contrário das plantas, que quando nutridas aumentam

rapidamente interna e externamente, os minerais aumentariam apenas

externamente, pela adição do material misturado por esse espírito. 58

57

Jorden, 72, 77. 58

Ibid., 69-69.

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31

O Espírito Seminal seria responsável então por unir matéria e elemento,

e através de sua força essencial, inicia um processo de fermentação,

semelhante ao que ocorre na produção de cerveja, e essa fermentação

forneceria o calor necessário para as alterações necessárias na estrutura do

mineral, gerando assim suas características de cor, brilho, dureza, etc. 59

Embora não pretenda dividir os minerais de acordo com as dicotomias,

já que de suas leituras os autores ou não o fizeram, ou fizeram

insatisfatoriamente, classifica os minerais em sete: Terra, Pedra, Betume, Sais

(que ele divide em Sal, Nitro, Alume e Vitríolo60), Espíritos Minerais, Semi-

metais e Metais.61.

Sobre a terra, refere-se às misturas encontradas e sobre a terra simples.

A terra simples não está misturada com nenhuma outra substância, sendo

seca, fria e adstringente, mas é comum esta terra estar misturada, e nesse

caso, ela altera suas propriedades de acordo com a mistura, assim como as

principais terras encontradas em diversas fontes nas quais a mistura com nitro,

alume, cobre, betume, entre outros, dá á essa terra características diferentes.

Das Pedras, fala sobre a dificuldade na classificação já que muitas

características são semelhantes às de outros minerais, sendo alguns

diferenciados pela dissolução por calor ou umidade e outros pela dureza. As

Pedras seriam, assim como a terra, substâncias minerais concretas, porém

mais pesadas. Sobre a pureza e o uso das Pedras, conclui que quanto mais

duras e perfeitas estas forem, mais resistentes ao ataque da água e do fogo,

59

Ibid., 84-85. 60

Os conceitos dos sais: sal, nitro, alúmen e vitríolo, serão analisados detalhadamente mais adiante. 61

Jorden, 20.

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mas que devido a isso elas não seriam de utilidade nos Banhos, pois as águas

não poderiam tirar delas suas qualidades por não se dissolverem, a não ser

antes de se tornarem concretas, na forma de succo lapidescente. Fontes em

que ocorre a petrificação de madeiras e outros materiais, teriam essa

capacidade devido à presença desse succus lapidescens na água. 62

Do Betume, ao qual dedica o capítulo seis, classifica como “substâncias

Minerais que queimam e se gastam no fogo sem fusão metálica” sendo eles

sólidos (como âmbar e carbofossilis) e ou líquidos (como petróleo e nafta)63.

Diz que o Betume tem grande poder de combustão, apesar disso, discorda de

Agrícola que acredita ser o Betume o responsável por queimar redes de

pescadores que as jogam próximas ao fundo em um lago entre Strapela e

Seburgh, e afirma que isso se deve à qualidade dos sais, que por

possivelmente serem mais pesados que a água se acumulam no fundo. Afirma

ainda que quanto mais pesado e ligado à terra for o sal, mais corrosivo ele é.

Por isso Aristóteles afirma que a água do mar é mais salgada no fundo do que

no topo, e Plínio sobre as águas de um lago serem doces no topo e nitrosas no

fundo. 64

Os sucos Minerais concretos, que segundo Jorden são chamados pelos

alquimistas de Sais, são classificados como “substâncias minerais solúveis em

água” e seriam os meios de comunicação entre os outros minerais e a água65.

São chamados de concretos, pois, apesar de serem encontrados muitas vezes

dissolvidos em água, ao se retirar essa umidade acidental se tornam concretos.

62

Ibid., 27-28. 63

Ibid., 29. 64

Ibid., 31. Nesse trecho, Jorden cita a Meteorologica de Aristóteles, assim como o De Natura Eorum

quæ Effluunt ex Terra de Agricola. 65

Ibid., 37.

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33

O autor dedica o sétimo capítulo, um dos mais extensos da obra, a tratar

desses Sais.

Enquanto outros autores como Agricola os dividem em vários tipos

(Enxofre, Betume, Ouropigmento, Sandaraque, Sori, Melanteria, etc.), de

acordo com os muitos minerais presentes (terra – sal e nitrum; metal –

crisocola, verdigris e azurita; ou composto mineral – cadmia), Jorden afirma

que se forem examinados devidamente, ou não são solúveis em água como

esses sucos devem ser, ou podem ser reunidos em apenas quatro grupos: Sal,

Nitro, Alume e Vitríolo.

Descreve os sais e suas características, diferenciando-os pela forma dos

cristais gerados ao secar os minerais, e ensina dessa forma a determinar, por

exemplo, a qualidade do salitre. Se os cristais do sal formarem agulhas, o

salitre é de boa qualidade, porém se formar quadrados ou ângulos, o salitre

está misturado e não serve para fazer remédios ou pólvora, pois a mistura

enfraquece o sal. 66

Em seguida, Jorden apresenta os quatro tipos de sucos concretos. Sal,

em sua concepção, é uma substância:

“fixa, não volátil ao fogo, adstringente, detergente,

purgante, dispersante, repelente, atenuante, cicatrizante, e

preserva da putrefação, como Dioscórides nos informa e

Galeno confirma e acrescenta que é quente” 67.

66

Ibid., 38. 67

Ibid., 40.

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34

Para contradizer essa ultima afirmação de Galeno, utiliza a própria obra

galênica:

“E todas as coisas adstringentes são frias, como ele

anuncia, lib. 4. cap. 6. Acida acerba, & astringentia omnia

frigida. Agora se o sal for adstringente, ele deve ser frio pela

própria regra de Galeno, e não é suficiente dizer que possui

partes aquecidas nele, mas sendo uma substância uniforme,

devemos determinar se isso ex predominio” 68

Afirma ainda que as qualidades cicatrizantes e de preservação se devem

às qualidades seca e fria, posto que a umidade e o calor são agentes de

geração e corrupção.

Ao falar das propriedades purgativas de alguns minerais, Jorden lamenta

o uso da calcinação pelos Químicos para a extração de sais, pois assim ele

perde virtudes que são consumidas pelo fogo. Propõe então, três maneiras

pelas quais seria possível extrair os sais, mantendo essas virtudes.

Primeiramente, o uso de um licor que não alterasse as qualidades do sal e

precipitaria as outras partes do suco ou mistura, podendo o sal ser separado

por evaporação ou cristalização. Outra maneira seria secar a amostra até que

essa se tornasse pó, e então adicionar o espírito do vinho, que não dissolveria

o sal. Assim, após várias aplicações, sobraria apenas o espírito do vinho com o

sal precipitado no fundo. A terceira maneira, seria a putrefação de uma grande

68

Ibid. A obra de Galeno a que se refere é De Simplicium Medicamentorum Facultatibus.

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quantidade de ervas, “até que elas se tornem terra”, e então, através de

infusões com água, extrair os sais presentes. 69

O Nitro “é uma substância volátil que seca e atenua mais do que o sal, e

embora não seja tão adstringente quanto é dito que o Sal seja, aparenta esfriar

mais que o Sal, talvez devido à suas partes diluentes, e penetra mais, e é essa

a razão pela qual serve melhor para a dissolução de Metais” 70. Raramente

encontrado sozinho, mas misturado com outros minerais, as fontes nitrosas

foram utilizadas em algumas partes para a extração desse sal. Jorden observa

que o solo próximo as águas nitrosas são melhores para o desenvolvimento de

plantas em sua perfeição.

Ao falar sobre o sal amoníaco, borax, entre outros tipos de nitro, cita o

uso de Sal álkali e Urina ou Vinagre para sua fixação. Em seguida, ao falar da

semelhança entre esses e Alume e Vitríolo, argumenta que apesar da

propriedade corrosiva pela intensa acidez, que faz acreditar que por isso

devem ser quentes, é mais provável que sejam frias, pois além de

adstringentes, a corrosão se deve à qualidade perfurante, e não ao calor.

Esses acidula são utilizados para extinguir o calor de febres.

Jorden diferencia o salitre do nitro antigo através da calcinação,

afirmando que “a diferença entre o Salitre e o Nitro antigo, aparece quando,

sendo queimada uma libra de Nitro, esta deixa quatro onças de cinzas; Salitre

não deixa nenhuma”. 71

69

Ibid., 42. 70

Ibid., 43. 71

Ibid., 48. A identificação do nitro e do salitre é um tanto controversa, e envolve uma enorme

discussão a respeito de suas definições até o início do século XIX. Uma pesquisa ampla sobre a

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Do Alume, Jorden se limita a falar sobre os locais onde se relatam a

existência de fontes desse sal. Em relação ao Vitríolo, diz que podem restar

dúvidas sobre a distinção entre ele e o Alume, sendo que a destilação do óleo

de Vitríolo gera Alume, provavelmente a base do Vitriolo seja essa. Ele pode

ser encontrado em duas formas nas águas minerais 72:

Quando corpo e substância estão dissolvidos (“como no Chipre, a qual

Galeno descreve, onde a água é verde”), na qual ao se adicionar ferro, essa

precipita cobre. A explicação para esse fenômeno seria a familiaridade com o

metal, pois estando essa água embebida de um metal, ao adicionar outro mais

familiar a ela, este é dissolvido e o que estava misturado a ela anteriormente se

precipita. O “mestre das minas” do Imperador da Bohemia, Lazarus Ercker, diz

ter mudado de opinião quanto a essa teoria da familiaridade ao ver precipitado

mais cobre do que a água possuía anteriormente, e junto a ele, prata.73

Quando não o corpo ou substância, mas o espírito, vapor ou qualidade

está dissolvido, em contato com a água, como a maioria dos Banhos de

Vitriolo, e são saudáveis e azedas na predominância deste.74

Jorden encerra esse sétimo capitulo tratando da característica azeda

dos espíritos do alume, vitríolo e enxofre, que sendo as partes terrestres

desses minerais, não se vão ao ferver ou destilar, e são mais pesados que a

água. A água azeda por meio desses espíritos, ao evaporar, se torna mais

azeda que antes.

identificação do salitre e a questão do nitro foi realizada pelo Centro Simão Mathias, e parte desse

trabalho pode ser encontrada nas Atas do Colóquio Cesima Ano X. 72

Ibid., 48-51. 73

Ibid., 49-50. 74

Ibid.

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Os Espíritos minerais são voláteis e não se fundem como os metais, e

ao serem misturados com um metal, alteram sua cor e diminuem sua

maleabilidade e a capacidade de fusão. Usa como exemplo o Mercúrio,

Enxofre, Arsênico, Rusma e Cadmia. Jorden discorre rapidamente sobre eles,

pois estes seriam menos úteis que os anteriores, mais raros e mais obscuros.

Apesar de sua ignorância com relação ao Mercúrio, o qual admite não

conseguir reduzir às qualidades elementares, e das informações conflitantes

que tem sobre ele (“uns reconhecem como sendo quente e seco, e alguns frio

e úmido), faz uma descrição de fontes onde é encontrado, e da característica

venenosa atribuída as águas em que está presente em alguns lugares e

saudável em outros. Mathiolus é citado ao falar do uso contra vermes, sífilis e

lepra. 75

Classifica o enxofre como tendo um calor manifesto, embora não

intenso, e gorduroso, sendo esta última qualidade a responsável por sua

combustibilidade. Segundo Galeno, coisas gordurosas seriam levemente

quentes e melhor como nutrientes que como medicamentos. Sobre seu fumo,

descreve como frio e seco, e afirma que “Estou convencido de que não há

melhor fumo para corrigir ares venenosos e infectados, que esse do Enxofre,

ou para remoção de infecções de quartos, roupas, roupas de cama,

embarcações, etc.”. 76 Essa declaração deixa evidente sua convicção de que

os ares seriam responsáveis por causar males à saúde. Na sequência,

discorre sobre as fontes sulfurosas declarando que embora os Banhos da Bath

sejam classificados entre os sulfurosos, não concorda com essa classificação 75

Petrus Andreas Mathiolus (1501-1577), médico e botânico formado em Pádua. 76

Ibid., 53. Sobre o uso do gás de enxofre na medicina, vide Paulo Porto, Em busca da longevidade: J.B.

van Helmont e o bálsamo do enxofre (2010).

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pois embora haja um toque de enxofre nelas, a proporção entre enxofre e

betume é pequena.

O arsênico é um “mineral venenoso”, e para Jorden “é provável que

essas águas e vapores venenosos que matam de repente, provêm do

Arsênico”. Por arsênico Jorden compreende ouropigmento, realgar,

sandaraque e rusma. Descreve as fontes de arsênico como amargas,

extremamente quentes e putrefatas. 77

Do Cadmia descreve dois tipos: o natural, muito corrosivo e perigoso

quando líquido, segundo Agricola, e o artificial, encontrado com o cobre,

moderadamente quente e boa para os olhos, como a calamina e a tutia.

Os semimetais, sexta classificação dos minerais feita por Jorden, são

minerais que, apesar de se fundir como os metais, não são maleáveis, e

quando misturados a um metal, os torna quebradiços. Estes são o bismuto,

antimônio, e estanito78, chamado de Magnesia por Geber. São mais voláteis

que os metais, porém mais difíceis de sublimar que os Espíritos.

Sobre o bismuto, Jorden afirma que este era desconhecido pelos

antigos, e que não tem conhecimento de águas que participam com esse

mineral, não podendo falar muito de suas qualidades. Quanto ao antimônio,

recorre a Dioscórides e Galeno, para extrair as afirmações de que este seria

frio, seco, ligante, abre obstruções e é bom para os olhos. Entretanto, nenhum

deles cita a propriedade purgante, embora tenha fortemente esse efeito “tanto

por cima quanto por baixo”, e mesmo não havendo relatos de águas que 77

Ibid., 55. 78

O estanito é um sal obtido pela interação de um composto estanhoso e um álcali. O termo utilizado

pelo autor é “Bell-metal”.

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participam com esse mineral, pode-se presumir que as águas que possuem

esse efeito purgante sejam infectadas por ele. Quanto ao estanito, que supõe-

se que seja uma mistura de estanho e cobre, não conhece águas infectadas

por ele, nem qualquer uso dele na Medicina.

Por último, Jorden discorre sobre os Metais, que ele, assim como

Agricola, divide em seis tipos: Ouro, Prata, Ferro, Cobre, Estanho e Chumbo.

Entre esses, os divide ainda entre puros (ouro e prata), e impuros, que são

novamente divididos em duros (que resistem ao calor antes de derreter, ferro e

cobre) e moles (que derretem rapidamente, chumbo e estanho).

Inicialmente, Jorden se detêm no estudo das minas e no processo de

separação dos minerais. A principal crítica apresentada pelo autor nesse

assunto é sobre o processo de separação, cujos fundidores, se fossem mais

habilidosos, poderiam conseguir uma quantidade maior de metais puros.

Quanto à produção de ferro, lamenta o uso de um grande número de

madeiras boas para produzir um ferro tão ruim, diz ainda que este deveria

derreter rapidamente como outros metais, e ser duro, não quebradiço, e não

tão pretenso a enferrujar.

Ao tratar do estanho, Jorden deixa claro que fez experimentos com

carvão mineral para sua extração. O uso do carvão mineral é de grande

interesse, pois como relata, os locais onde o estanho cresce são pobres de

madeira, tendo que buscá-la de longe, e o uso do carvão possibilitaria o uso

dessa madeira em outros locais, não alterando a qualidade do metal.

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Do chumbo, classifica os melhores métodos para os minerais macios e

duros, utilizando para isso solventes ou aditamentos em parceria com fogo e

água. Os aditamentos também seriam úteis na separação dos espíritos ou

outros metais dos minérios, e facilitando a fusão.

A partir desse ponto, Jorden retoma o assunto sobre a natureza e as

qualidades dos metais.

Começando pelo ouro, o classifica como o mais sólido e pesado dos

metais, tendo poucas impurezas ou outras substâncias misturadas a ele. Não é

sujeito a corrupção por fogo ou água, e não perde sua substância para eles,

sendo inúteis as tentativas de muitos de fervê-lo em caldos para conseguir

alguma força dele. O uso de ouro em medicamentos e pílulas também é inútil,

pois este sai do corpo assim como entrou, sem misturar, alterar ou diminuir. Se

dissolvido em água-forte, ele retorna à sua forma metálica. Crollius diz que há

no mundo um menstruum capaz disso, mas que não o conhece. Porém,

mesmo que fosse possível dissolvê-lo, ainda não se conhecem quais seriam

suas qualidades e possíveis usos na medicina, mas por não perder substância,

sabe-se que não pode machucar, por isso é utilizado em cauterizantes, e para

suavizar cerveja ou vinho. Apesar de alguns afirmarem que os metais não

passariam qualquer qualidade para a água, a maioria dos que escreveram

sobre os Banhos discorda, pois se excluíssem a influência dos metais,

deveriam excluir de todos os outros minerais, exceto os sucos concretos.

Porém, devido à escassez de ouro nas entranhas da terra, dificilmente haveria

uma fonte que possuísse suas qualidades, embora digam que há Banhos em

que a água participa com o ouro.

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Em seguida, a prata. Esta é tida como inferior ao ouro em sua pureza,

como se pode perceber pela sua dissolução e pela tintura azul que produz. Não

se sabe muito sobre suas qualidades, e é considerada fria, seca, adstringente e

emoliente. Não há Banhos na Inglaterra que participem com a prata, talvez

porque a natureza não produza o suficiente para infectar as águas, embora

John Bauhinus defenda que haja prata nos Banhos de Boll, onde ao examinar

uma pirita de 50 libras, se extraiu duas drams de prata, uma proporção muito

pequena para sustentar essa opinião.

Quanto ao ferro, o “mais impuro dos metais”, assim como o aço, é tido

por Galeno como terroso, e por isso frio. Muitos médicos são de mesma

opinião, exceto por Fallopius, que o tem como quente, pois é prescrito para

úlceras na bexiga. Nesse caso, entretanto, a cura ocorre não pelo calor, mas

pela secura do metal, e por isso segundo Galeno, deve ser frio. Sobre as fontes

que participam com o ferro, há muitos exemplos tanto de fontes quentes quanto

frias, sendo possível comprovar suas qualidades não apenas pelos relatos de

quem escreveu sobre elas, mas pelas minas de onde vem, por seu sabor ou

suas virtudes.

O cobre se aproxima da natureza do ferro, porém é mais puro e de fusão

mais fácil, e quase todo ele se converte em vitríolo. Pela natureza semelhante

ao ferro, pode-se aceitar a similaridade das qualidades, como o frio. É mais

puro e adstringente que o ferro, e segundo Rhasis, é purgante.

Estanho e chumbo, segundo ele, são duas das “commodities” inglesas,

sendo produzidos “não apenas para uso próprio, mas para suprir outros

países”. O estanho, encontrado no minério cassiterita, é seco e frio. Seu

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processo de produção é caro e com grandes perdas, pois o uso da madeira

que é transportada de longe e a repetição do processo várias vezes para refino

desperdiça o material. Jorden afirma que o processo poderia ser mais rentável

com o uso de carvão marinho e que embora se encontre ouro e prata entre o

minério, sem desperdício de estanho não se conseguiria extrair.

O chumbo, assim como a prata, é derretido a partir do minério que Plínio

chama de galena. Agricola fala sobre um minério de chumbo que não contém a

prata, mas Ercker, por sua experiência, discorda da existência deste.

Abundante na Inglaterra, o chumbo é frio e seco. Apesar dos Banhos em

Lorayne chamados Plumbaria, não se conhece águas afetadas por esse metal,

sendo esse nome dos Banhos derivados provavelmente da referência ao calor

das águas, que chegava a ser usada para escaldar aves para depenar, à

deplumando em francês, como supõe Pictorius.79

Essa divisão dos minerais feita por Jorden foi resumida na forma de

tabela pelo editor Thomas Guidott, na edição de 1669 80, na qual se encontram

os tipos de minerais e as principais características ligadas a cada um deles.

79

Ibid., 66. 80

Coley, “Cures Without Care”, 192.

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43

Classificação dos minerais segundo Jorden. Esta tabela foi organizada pelo editor Thomas Guidott. 81

2.6 – Das causas das virtudes medicinais

81

Coley, Cures without care, 193.

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Jorden atribui aos minerais embebidos à água as virtudes medicinais

encontradas nas fontes, lagos e Banhos. Pode-se perceber essa posição

quando, ao falar da terra simples, afirma que esta

“rende por si mesma apenas água lamacenta, e de

nenhum uso na Medicina, mas se misturada com outros

Minerais, faz com que a água participe com as qualidades

desses Minerais também” 82.

Em seu décimo terceiro capítulo, Jorden se propõe tratar das causas do

calor e das virtudes medicinais das águas minerais, as quais une por

dependerem da mesma causa. Ao longo do capítulo, apresenta diversas

teorias sobre como as águas das fontes se tornam aquecidas, rejeitando as

ideias de calor do Sol, combustão pelo ar, e até mesmo pelas chamas do

inferno. Descarta a idéia de que o ar ou as exalações existentes abaixo da

terra, assim como seu movimento e o da água, sejam os responsáveis, sendo

que nesse caso haveria um grande barulho e agitação para gerar o calor

necessário, e mesmo em lugares nos quais há essa agitação, como nas

cachoeiras, a água permanece fria.

Quanto ao Sol, este deveria ser muito quente para conseguir esse feito,

penetrando pelos poros da terra, e ainda passar pelo ar que há no caminho

que, sendo frio, esfriaria também os raios solares. Quanto à origem desse calor

do Sol, argumenta sobre a possibilidade de se dever ao movimento deste sobre

seu próprio eixo, ou ao redor do globo terrestre, mas ao imaginar o movimento

do globo solar, que é dito ser “166 vezes maior que o globo da terra”, de

82

Jorden, 22.

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maneira rápida e perpétua, chama a agitação de “monstruosa”, e concorda com

o termo “insanus motus” dado a ele. 83

Além disso,

“se podemos impedir os raios solares colocando uma

parede de barro, ou fazendo adegas a seis pés de

profundidade, como esses raios poderiam se aprofundar tanto

na terra e aquecer a água que está lá? [...] E se os raios do Sol

não são capazes de aquecer uma piscina parada em meio ao

verão, como poderiam aquecer as águas subterrâneas que

estão sempre em movimento, especialmente no inverno?” 84

Lembrando que as águas mantêm-se com o mesmo calor tanto quando

o sol está mais quente, quanto na ausência dele, isso não explicaria também o

fato de algumas fontes serem quentes, enquanto tantas outras são frias.

A ideia de antiperístase de que o aumento de uma qualidade induz a um

aumento da qualidade contrária, também é descartada. Usando o exemplo do

corpo humano, que no inverno faz com que os poros se fechem impedindo o

frio de passar e assim aumentando o calor do corpo, fala sobre a

impossibilidade de acontecer o mesmo, sabendo que a natureza da água é fria

e no corpo esse calor é gerado pela agitação do coração, não tendo as águas

uma fonte direta de calor. “Nem mesmo o calor por si só é capaz de fazer um

corpo mais quente, a não ser que seja maior que o próprio calor desse corpo”.

Jorden utiliza ainda outros argumentos para expressar seu desacordo com

83

Ibid., 91. 84

Ibid., 92.

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46

essa teoria, que segundo ele é “uma invenção inútil para manter esse

propósito”. 85

A cal é citada também como uma das possíveis fontes, devido á sua

capacidade de aquecer rapidamente a água, e de acender substâncias

combustíveis. A esta, Jorden declara que sendo uma coisa artificial, não

encontrada nas entranhas da terra, seria improvável que pudesse ser uma

fonte, e em caso de encontrá-la na terra, esta seria extinta após a primeira

fusão com a água, restando apenas uma terra morta que não renderia mais

calor, não mantendo o calor perpétuo das fontes.

Em seguida, trata da ideia de que as águas seriam aquecidas pelo fogo

subterrâneo, falando da necessidade de um calor intenso (seja pela

propagação do fogo, como no caso de uma vela sendo acesa por outra, ou

pelo movimento, como na colisão ou fermentação, etc.) e um corpo

combustível para a existência do fogo. Classifica o fogo de acordo com seu

grau, sendo o mais alto o que provoca chamas (como enxofre, betume líquido,

óleo e gordura), e o menor o que provoca brasas (como é o caso de alguns

carvões minerais). Entre os que provocam chamas, dispõe os gerados a partir

de enxofre, espírito do vinho, nafta e petróleo. Nesse momento, inicia uma

discussão a respeito do fogo aparente dos cometas, que acredita não serem de

substâncias inflamáveis, pois não suportariam manter o fogo por tanto tempo, e

ocasionariam chuva de enxofre e betume, além de estarem acima da lua, onde

não deveria haver corpos corruptíveis. 86

85

Ibid., 95. 86

Ibid., 97-8.

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Quanto aos fogos em brasa, devem ser acesos e ter ventilação para

seus vapores fuliginosos. Falam de um fogo subterrâneo que aceso por enxofre

ou betume, se dispersa, incendiando minas de mesma natureza. Ao falar do

inferno, não nega sua existência, porém não aceita a teoria de que esteja no

centro da terra e seja a origem das fontes, ventos, terremotos, vulcões, etc.

Sobre a localização, afirma que não poderia ser no centro da terra por ele não

ser vazio, e se estivesse em alguma concavidade entre o centro e a superfície,

essas seriam preenchidas pelas águas dos oceanos, o que não sustentaria o

fogo, a não ser que houvesse grandes recipientes onde a água seria aquecida,

e esses vapores deveriam ser mais quentes do que a água suportaria, pois ao

passar entre as rochas perderia muito desse calor (caso contrário não se

converteriam em água novamente), chegando frias à superfície, como acontece

na destilação das águas de rosas.

O fogo por si mesmo não poderia existir nessa profundidade, pois

precisaria de mais ar para ventilar seus vapores do que é possível atravessar

os poros da terra, e onde há fogo, há fumaça, e assim seriam visíveis as

exalações secas provenientes dessas chamas, as quais não são encontradas

nos Banhos. E como não há chamas eternas, deveria haver um combustível

para alimentá-lo, sendo que os únicos combustíveis encontrados nas entranhas

da terra são o enxofre e o betume, porém, como se sabe das fontes, “nem toda

água quente é sulfurosa, assim como nem toda água sulfurosa é quente”. 87

Porém é no capítulo seguinte que o autor apresenta sua opinião sobre

as causas do calor das águas e às propriedades medicinais delas, indicando

87

Ibid., 100-2.

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pontos falhos nas teorias apresentadas e defendendo a origem dos minerais a

partir da fermentação dos mesmos. Começa o capítulo dizendo estar

convencido de que esta opinião seja a mais verdadeira e certa, embora não

tenha sido mencionada por nenhum outro autor que ele tenha conhecimento, e

espera, em caso de erro, não ser culpado, pois o faz ao procurar a verdade.

Retorna à idéia das sementes minerais, repletas de seus espíritos, que

em contato com a matéria conveniente gera os diferentes minerais de acordo

com sua natureza e aptidão à matéria, porém, isso não ocorreria sem uma

força superior. O movimento entre espírito e matéria produz um calor que serve

como instrumento para favorecer esse processo, e sendo natural e não violento

ou destrutivo, favorece gerações. Nessas gerações, é necessário o calor e a

umidade para que ocorram a corrupção e a geração dos minerais. Essas

gerações, ao contrário das que ocorrem, por exemplo, com os grãos, que são

rápidas, podem levar anos com corpos mais duros como os minerais. Como

elas não terminam com uma produção, enquanto a semente possuir força, o

processo continua por tempos, e raramente termina. “São meios suficientes

para a perpetuidade de nossas Fontes quentes; se o calor atual proceder disso,

não há dúvidas de sua continuidade, ou de seu igual nível de calor.”

Dessa forma, por não ser um calor destrutivo e sim generativo, não

precisaria de ar para ventilação como seria preciso caso houvesse fogo.

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Esta idéia de fermentação dos minerais está diretamente ligada à teoria

seminal de geração apresentada por Paracelso, e adotada por, entre outros,

Van Helmont, Basil Valentine e Sendivogius. 88

Quanto à aplicação das águas na medicina, faz distinção entre os usos

internos e externos. Do uso interno, recomenda as águas de acordo com suas

propriedades quente, fria, amena e adstringente, indicando para quais males

estas seriam mais apropriadas, além de indicar em que seriam proveitosas as

águas embebidas de alguns minerais, especialmente dos sucos concretos.

Sobre o uso externo, faz considerações sobre o uso dos banhos da maneira

habitual, da água retirada por baldes ou bombas e até mesmo da aplicação da

lama, e conclui que, se mantido o calor característico, seriam eficientes e com

a vantagem de serem aplicadas sobre a região onde é necessária.89

Em seguida, Jorden trata das enfermidades que podem ser curadas

pelas águas de Bath. Descreve os minerais encontrados nas análises e os que

supõe-se estarem presentes, e assim indica as inúmeras enfermidades e quais

seriam os minerais responsáveis por sua cura.90

No último capítulo, no qual finalmente propõe as alterações que julga

necessárias para o melhor uso dos banhos da cidade de Bath, Jorden orienta

os pacientes quanto à maneira de se banhar, devendo sempre que possível ter

recomendação de um médico, para que esse possa indicar águas mais ou

menos quentes, e a proteger as regiões do corpo que podem ser “atacadas”

pelo calor das águas, como a cabeça e os rins. Por fim, conclui dizendo que

88

Debus, Chemical Philosophy, 348. 89

Jorden, 125-36. 90

Ibid., 137-8.

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omitiu informações que a seu ver, competem somente ao médico, e não

poderiam ser declaradas aos pacientes sem enganos perigosos, e somente o

médico teria as competências necessárias para indicá-las pois, como diria

Galeno, “a Arte da Medicina caminha sobre duas pernas, Razão e Experiência,

e se uma delas for defeituosa, a Medicina pode se tornar manca”.91

A partir então do conteúdo apresentado por Jorden em sua obra,

podemos concluir que em sua concepção, as propriedades curativas das águas

se devem aos espíritos dos minerais de que a água está embebida, e esses

minerais surgem na natureza devido à fermentação ocasionada pelos espíritos

seminais do mineral em contato com condições adequadas para sua geração,

sendo esta fermentação também a responsável pelo aquecimento das águas

nas fontes termais.

Considerações Finais

91

Ibid., 142. Citação a Galeno, De Compositione Medicamentorum Secundum Locos (1537), Livro 8,

capítulo.

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O objetivo deste trabalho foi, de acordo com a proposta inicial,

apresentar os conceitos químicos utilizados na Inglaterra do século XVII

através do trabalho de Edward Jorden. Para apresentar o contexto histórico ao

leitor, foram abordados o histórico das águas minerais, passando pelos

médicos de Pádua desde o século XII, chegando aos químico-médicos ingleses

do século XVII, e para entender a importância dos banhos da cidade de Bath,

apresentou-se um histórico da cidade, relevando a importância destes para a

cultura local.

Ao trabalhar com a obra de Jorden, devido à importância da menção a

um teste para identificar ácidos e álcalis, apresentamos um histórico dos

indicadores com mudança de cor, passando pelos indicadores de noz galha,

pau-brasil, entre outros, até chegar à Boyle. Com a pesquisa, concluímos que o

uso de um tecido escarlate por Jorden se deve, provavelmente, ao

conhecimento adquirido com os tintureiros, que utilizavam à época diferentes

tinturas e solventes para obter as cores que almejavam. A partir de um estudo

do professor Allen Debus, acreditamos que a tintura utilizada no tecido que

Jorden faz uso em seu teste seja a de pau-brasil, amplamente utilizada no

período para conseguir diferentes tons de vermelho.

Quanto ao conhecimento de Jorden em relação aos minerais,

observamos uma extensa leitura por sua parte de textos de diferentes autores

de diferentes períodos, citando frequentemente Agricola, Aristoteles, Libavius,

e criticando sempre que possível as obras de Galeno, as quais foi aconselhado

a ler quando de sua primeira tentativa de integrar o Royal College of

Physicians.

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Jorden demonstra um profundo conhecimento das teorias existentes

sobre a geração dos minerais e do calor das águas, podendo refutá-las a partir

de detalhes lógicos, e quando estes faltam, recorre às escrituras sagradas para

afirmar sua perspectiva do assunto. Como homem de sua época, sua crença

na religião é visível nas recorrentes citações à bíblia, assim como na motivação

que dá ao seu trabalho. À parte, dialoga com autores antigos e medievais, de

diversas culturas, e apresenta um raciocínio lógico auxiliado pelo conhecimento

empírico que leva a conclusões coerentes, como a refutação do fogo

subterrâneo.

Ao descartar o Sol como a fonte do aquecimento das águas, deixa clara

sua posição quanto à cosmologia, adotando o geocentrismo ao dizer que o Sol

se move ao redor da Terra, e criticando a incorruptibilidade das estrelas fixas

ao falar dos cometas.

Em relação à proposta principal desta dissertação, pudemos observar

na obra de Jorden uma Química já bem desenvolvida, com conhecimentos

derivados de estudos mineralógicos – conhecimentos esses adquiridos tanto

através de leituras quanto do estudo de campo, o qual ele afirma ter viajado

“onde nenhum caminho é visto, onde nenhum pé conhecido já esteve”.92 Sua

descrição dos minerais demonstra um conhecimento empírico, assim como

seus testes para identificação destes. Em seus testes, percebe-se o uso de

métodos simples, como a evaporação e a cristalização dos minerais, assim

como métodos um tanto mais elaborados como a precipitação, em que se

dissolve uma substância oposta à presente na água, o que força a substância a

retornar ao estado de suco concreto, se precipitando. A aplicação desse teste

92

Jorden, 103.

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indica um conhecimento intenso das qualidades das substâncias, e Jorden

indica esse teste de precipitação para os sais e sucos azedos, os quais ele

afirma mudarem a cor de um tecido escarlate.

Sua influência sobre os estudos posteriores foi expressiva, o que pode

ser percebido pelo número de edições após sua morte e pelas frequentes

indicações feitas pelos estudiosos das águas minerais para que se buscasse

em sua obra as classificações dos minerais analisados, as origens dos

minerais, ou mesmo para criticar suas teorias.

Finalmente, concluímos que o trabalho de Jorden foi de grande

importância na história da Química, seja por sua classificação, por suas teorias

de geração, ou por seus testes de identificação. A riqueza de informações que

podem ser obtidas a partir de seus relatos das fontes e de suas propriedades

nos seria de grande utilidade para conhecermos mais dos aspectos

mineralógicos e medicinais, e diversos trabalhos poderiam ser realizados sobre

esses conteúdos. Neste trabalho, porém, priorizamos o aspecto químico dessa

obra, procurando analisar os trabalhos de autores de diferentes períodos para

constituir as bases para o estudo, mas tendo como fonte principal a obra

original. Espera-se que este trabalho sirva de base para pesquisas futuras,

entendendo que muito há para se explorar dentro desse tema, e que a

discussão e a agregação de ideias contribuem para a ampliação do

conhecimento.

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Anexos

Proposta de Aplicação da História dos Indicadores c om Mudança de Cor no Ensino de Química para o Ensino M édio

Durante a pesquisa para a elaboração desta dissertação, um dos temas

que atraiu grande interesse foi a utilização de um indicador com mudança de

cor para indicar materiais ácidos e alcalinos. O estudo de ácidos e bases, pelo

estereótipo causado pela mídia em filmes e desenhos, atrai a atenção do aluno

que lembra das cenas exageradas, além de ser uma das poucas oportunidades

que o professor têm de aplicar um experimento em sala, graças ao seu baixo

custo e disponibilidade de material. A partir disso, foi elaborada uma proposta

para a aplicação em sala de aula do estudo sobre a história do uso dos

indicadores, a ser utilizada por professores do Ensino Médio.

Inicialmente, foi realizado um levantamento sobre a abordagem de dois

dos periódicos mais relevantes na área do ensino de Química sobre o uso de

indicadores de pH. Os periódicos, Química Nova e Química Nova na Escola,

foram escolhidos devido à abrangência de sua circulação, estando entre os

mais conhecidos da área. Foram analisados 67 números da Química Nova e 46

da Química Nova na Escola. Durante o levantamento, percebeu-se um número

pequeno de publicações relacionadas com indicadores de pH, e ao analisá-los,

encontrou-se pouquíssimo conteúdo sobre o histórico de seu uso. Nos artigos

que se davam ao trabalho de incluir um histórico do experimento, a maioria se

limitava a citar Boyle e seu estudo sobre as cores. Dos dois textos que

continham aspectos históricos relacionados ao conceito de ácido-base, apenas

um possuía uma estrutura interessante, tratando do histórico do uso dos

indicadores, do uso e do funcionamento das antocianinas, do experimento e da

aplicação. 1

Devido à importância da abordagem histórico-cultural no

estabelecimento de fundamentos teóricos, foi desenvolvida uma proposta que

1 Terci, Daniela B.L. & Adriana V. Rossi. “Indicadores Naturais de pH: usar papel ou solução?”, Química

Nova 25, nº4 (jul/ago 2002): 684-688.

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consiste na apresentação de um histórico do tema de maneira oral, falando da

função dos tintureiros e curtidores e o uso das tintas, assim como os pintores e

ilustradores. Sobre a análise das águas minerais, o uso dos indicadores e a

importância de Boyle para esses estudos, pode-se trabalhar com textos, como

o “Estudos Químico-médicos: as águas minerais e seu histórico”2 de Ana Maria

Alfonso-Goldfarb, e “Indicadores naturais de pH” de Terci e Rossi.

A leitura de textos científicos é de grande importância para o

desenvolvimento do aluno, que passa assim a entrar em contato com termos e

idéias que ignorava, porém, para evitar uma leitura monótona em sala, o

professor pode explicar, oralmente, ou montar uma apresentação digital com as

principais informações encontradas.

Para que o professor possa argumentar sobre a análise de águas

minerais no século XVII, recomenda-se a leitura do capítulo “The Chemical

Analysis of Spa Waters”3 do professor Allen Debus, onde encontra-se um

levantamento sobre a análise das águas minerais, detalhando os métodos

empregados nessas análises pelos autores relevantes no estudo das águas,

pois mostra ao aluno os testes, muitos deles ainda utilizados largamente na

análise qualitativa, e quais eram os meios disponíveis à época.

Em seguida, pode-se realizar o experimento com diferentes indicadores

vegetais (repolho-roxo, xarope de violeta, beterraba, etc.). Nesse momento, o

aluno já terá conhecimento sobre como o estudo dos indicadores ocorreu e

poderá, a partir disso, chegar a conclusões sobre o funcionamento e a validade

destes experimentos.

Finalmente, cabe a habitual explicação sobre o funcionamento das

antocianinas na identificação do pH.

Esta proposta foi aplicada em uma sala de 2º ano de Ensino Médio de

uma escola pública da cidade de Guarulhos. Os resultados dessa aplicação

levam a concluir que, dessa maneira, o aluno compreende mais facilmente as

2 Alfonso-Goldfarb, Ana Maria. “Estudos Químico-Médicos: as águas minerais e seu histórico”, Química

Nova 19, nº2 (1996): 203-205. 3 Debus, Allen G. “The Chemical Analysis of Spa Waters”, in The Chemical Philosophy: Paracelsian Science

and Medicine in the Sixteenth ans Seventeenth Centuries, 109-112. Mineola: Dover, 2002.

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variações vistas e as conclusões a que chegaram, pois compreendem como o

experimento se originou e todo o raciocínio envolvido para que ele seja

utilizado posteriormente, tendo a oportunidade de criar seu próprio conceito

sobre a validade do experimento.

Nota: esta proposta deu origem a um resumo e pôster apresentados no XVI

Encontro Nacional de Ensino de Química, realizado entre 17 e 20 de Julho de

2012, na Universidade Federal da Bahia, Salvador/BA, além de um artigo

publicado no periódico História da Ciência e Ensino: Construindo Interfaces,

vol. 6.