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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC SP Márcio Roberto Camarotto Novas técnicas e práticas de gestão no setor da saúde e seus impactos sobre os trabalhadores (médicos e enfermeiros): o hospital Stella Maris DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS São Paulo SP 2014

PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC SP Roberto... · Márcio Roberto Camarotto Novas técnicas e práticas de gestão no setor da saúde e seus impactos sobre os trabalhadores

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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC – SP

Márcio Roberto Camarotto

Novas técnicas e práticas de gestão no setor da saúde e seus impactos sobre

os trabalhadores (médicos e enfermeiros): o hospital Stella Maris

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

São Paulo – SP

2014

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Márcio Roberto Camarotto

Novas técnicas e práticas de gestão no setor da saúde e seus impactos sobre

os trabalhadores (médicos e enfermeiros): o hospital Stella Maris

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

Tese apresentada à banca examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo, como exigência parcial para

obtenção do título de Doutor em Ciências

Sociais sob a orientação da Profª. Doutora

Noêmia Lazzareschi

São Paulo

2014

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Banca Examinadora

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À Adriana, com amor.

Aos meus filhos Victor, Gustavo e

Lucas, fontes de vida e motivação.

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Agradecimentos

A Deus, que sempre, me protegeu e acompanhou nessa caminhada.

Aos meus pais Alberto e Rosaly, pelo incentivo aos estudos e apoio incondicional em

todos os momentos importantes da minha trajetória.

À minha orientadora Prof(a) Nôemia Lazzareschi pelo acolhimento, pela dedicação,

pela paciência, pelas correções e pelos ensinamentos que me proporcionaram uma visão

analítica mais abrangente das questões sociais.

Aos professores do Programa de Ciências Sociais que tive a oportunidade de conhecer,

conviver e aprender ao frequentar as aulas do curso.

As irmãs da Congregação Filhas de Nossa Senhora Stella Maris que abriram as portas

do hospital e possibilitaram a pesquisa junto aos trabalhadores do hospital.

A Irmã Sebastiana e a Laine, secretária executiva do hospital, pelas informações

disponibilizadas, pelo apoio e contribuição no levantamento de dados.

Aos médicos e enfermeiros entrevistados no hospital Stella Maris, pela disponibilidade

de tempo e boa vontade em responder as questões propostas.

As escolas de ensino superior e seus profissionais que nos últimos 19 anos me

proporcionaram trabalho como docente de ensino superior: Unicid, Unicastelo, FMU,

FIAP, Unisal, Anhembi Morumbi, PUC-SP, Mackenzie, FAAP, SENAC-SP, UBS e

Fatec-SP.

Aos meus amigos Marcelo Antonio Treff e Luiz Claudio Gonçalves que de diversas

formas, ao longo dos últimos anos, me incentivaram a elaborar essa tese.

Aos milhares de alunos que me proporcionaram a atividade docente.

Ao professor Mauro Neves Garcia (em memória), orientador da minha dissertação de

mestrado. Pela sua imprescindível contribuição em minha formação acadêmica.

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“O que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado.

Cuidar é mais que um ato; é uma atitude. Portanto,

abrange mais que um momento de atenção. Representa

uma atitude de ocupação, preocupação, de

responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro.”

Leonardo Boff

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RESUMO

O propósito desta tese foi identificar as mudanças no trabalho vivenciadas por

médicos e enfermeiros no ambiente hospitalar. Nos últimos anos surgiram inovações,

novas tecnologias e práticas de gestão que impuseram a esses profissionais esforços de

adaptação em uma realidade crescentemente complexa. Além disso, há outros “atores”

importantes no Sistema de Saúde que, direta ou indiretamente, tomam decisões que

afetam o cotidiano e o trabalho desses profissionais. Assim, a pesquisa demonstrou

como a implantação de Políticas Públicas, a necessidade de aquisição de novas

competências e as mudanças no atendimento realizado ao paciente afetaram o trabalho

de médicos e enfermeiros no espaço hospitalar. O método de investigação utilizado foi o

estudo de caso, com entrevistas semiestruturadas junto aos sujeitos, no hospital Stella

Maris, localizado na cidade de Guarulhos. Os resultados indicaram que a Saúde

continua “doente” no Brasil, embora o SUS tenha proporcionado alguns avanços em

relação à situação anterior. Ademais, as transformações tecnológicas e as novas práticas

de gestão não contribuíram, considerando-se a população que demanda por serviços

públicos de saúde, para uma melhora na qualidade do trabalho de médicos e enfermeiros

e dos serviços prestados.

Palavras-Chave: Saúde no Brasil, Hospitais, Médicos, Enfermeiros, Inovação

Tecnológica

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ABSTRACT

The goal of this thesis was to identify the changes on the work experienced by

physicians and nurses on the hospital environment. During the last few years have

emerged innovations, new technologies and management practices that imposed to these

professionals efforts to adapt in a reality that is increasingly complex. Thereby, the

research evidenced how Public Policies implementation, acquisition of new

competences and changes on the care delivered to the patient affected the work of

physicians and nurses on the hospital environment. The investigation method used was

the case study, with semi-structured interviews held with the subjects in Stella Maris

Hospital, located in the city of Guarulhos. The results indicated that the Health in Brazil

is still “sick”, although SUS has provided a few advances over the previous situation.

Nonetheless, the technological transformation and the new management techniques

have not contributed, considering the population demand for public health services, to

an improvement on the quality of the work provided by physicians and nurses and the

services provided.

Key-words: Health in Brazil; Hospitals; Physicians; Nurses; Technological Innovation

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Lista de Figura

Figura 1: O Sistema Brasileiro de Saúde ......................................................................... 33

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Lista de tabelas

Tabela 1 Beneficiários dos Planos Privados de Saúde (2000 – 2011)............................ 51

Tabela 2 Receita (R$) de contraprestações e despesa assistencial das operadoras de

plano de saúde (2000 – 2011)......................................................................................... 52

Tabela 3 Taxa de variação do número de beneficiário por tipo de contratação............. 53

Tabela 4 Beneficiários de planos privados de assistência médica por sexo e faixas

etárias.............................................................................................................................. 54

Tabela 5 Distribuição de médicos por região..................................................................91

Tabela 6 Piso salarial de enfermeiros............................................................................108

Tabela 7 Atendimentos Realizados no Hospital Stella Maris em 2012........................111

Tabela 8 Exames e procedimentos realizados no Hospital Stella Maris em 2012........113

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Lista de abreviaturas e siglas

ABH - Associação Brasileira de Hospitais

ABI - Associação Brasileira de Imprensa

AMB - Associação Médica Brasileira

ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar

ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária

CAP - Caixas de Aposentadoria e Pensão

CEP - Controle Estatístico do Processo

CEQ - Controle estatístico da qualidade

CES - Conselhos Estaduais de Saúde

CFM - Conselho Federal de Medicina

CIB - Comissões Intergestores Bipartites

CIT - Comissão Intergestores Tripartite

CMS - Conselho Municipal de Saúde

CNAS - Conselho Nacional de Assistência Social

CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

CNES - Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde

CNS - Conselho Nacional de Saúde

COFEN - Conselho Federal de Enfermagem

CONASEMS - Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde

CONASS - Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde

COREN - Conselho Regional de Enfermagem

COSEMS - Conselho Estadual de Secretários Municipais de Saúde

CRM - Conselho Regional de Medicina

DENERU - Departamento Nacional de Endemias Rurais

EAD - Educação à Distância

FBH - Federação Brasileira de Hospitais

FMI - Fundo Monetário Internacional

FSESP - Fundação de Serviços Especiais de Saúde Pública

FUNRURAL - Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural

GC - Gestão do Conhecimento

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GQT - Gestão da Qualidade Total

HMCA - Hospital Municipal da Criança e do Adolescente

HMPB - Hospital Municipal Pimentas

HMU - Hospital Municipal de Urgência

IAP – Institutos de Aposentadoria e Pensões

IAPB - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários

IAPC - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários

IAPETEL - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Estivadores e Transportadores de

Cargas

IAPI - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários

IAPM - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INAMPS - Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social

INPS - Instituto Nacional de Previdência Social

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

MCT - Ministério de Ciência e Tecnologia

MS - Ministério da Saúde

OAB - Ordem dos Advogados do Brasil

OMS - Organização Mundial de Saúde

OPAS - Organização Pan Americana de Saúde

PAI - Programa Ampliado de Imunização

PIB – Produto Interno Bruto

PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PNI - Programa Nacional de Imunizações

PTB - Partido Trabalhista Brasileiro

RUTE - Rede Universitária da Telemedicina

SAMDU - Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência

SBS - Sistema Brasileiro de Saúde

SES - Secretaria Estadual de Saúde

SIMESP - sindicato dos médicos de São Paulo

SIPS - Sistema de Indicadores de Percepção Social

SNVS - Sistema Nacional de Vigilância Sanitária

SUCAM - Superintendência de Campanhas da Saúde Pública

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SUDS - Sistema Único Descentralizado de Saúde

SUS - Sistema Único de Saúde

TI - tecnologia de informação

TIC - tecnologias de comunicação e informação

TII - Tecnologias de Comunicação e Internet

TQC - Total Quality Control

TQM - Total Quality Management

UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

URV - Unidade Real de Valor

UTI – Unidade Tratamento Intensivo

WHO - World Health Organization

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Sumário

Introdução ........................................................................................................................ 1

Problema .......................................................................................................................... 7

Objetivos .......................................................................................................................... 7

Hipóteses ......................................................................................................................... 8

Metodologia ..................................................................................................................... 8

Capitulo 1 – Os Sistemas de Saúde ............................................................................... 15

1.1Características dos Sistemas de Saúde Existentes em alguns países do Mundo ...... 17

1.2 A Saúde no Brasil .................................................................................................... 21

1.2 a Antecedentes do Sistema Brasileiro de Saúde ..................................................... 21

1.2.1 Dos anos 1500 até o 1º Reinado (1890) .................................................... 21

1.2.2 Início da República até 1930 .................................................................... 23

1.2.3 O Nascimento da Previdência Social..........................................................25

1.2.4 Previdência Social no Estado Novo............................................................26

1.2.5 Saúde Pública no Brasil nos anos 30 a 60..................................................28

1.2.6 O Regime Militar e suas consequências para a Saúde Nacional................29

1.2.b Saúde no Brasil e o SUS (Sistema Único de Saúde).............................................32

1.2.1 A Criação do Sistema Único de Saúde.......................................................35

1.2.2 Estrutura e Funcionamento do Sistema Único de Saúde............................37

1.2.2.1 O Sistema de Imunização e as Vacinas...................................................39

1.2.2.2 Medicamentos Genéricos........................................................................40

1.2.2.3 Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)............................43

1.2.2.4 Saneamento Básico e Saúde....................................................................45

1.2.c Sistema Privado de Saúde Brasileiro.....................................................................47

1.2.1 O Impacto dos Planos de Saúde no Sistema Privado Brasileiro.................50

Capítulo 2 – Os Hospitais no Sistema Brasileiro de Saúde.............................................55

2.1 Contexto Histórico.....................................................................................................55

2.2 Os Hospitais no Brasil...............................................................................................58

2.3 Os Hospitais Filantrópicos.........................................................................................61

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2.4 Os Hospitais e seus “Atores”.....................................................................................63

2.5 A Gestão Hospitalar...................................................................................................65

2.5.1 Especificidades da Gestão Hospitalar.........................................................67

2.5.2 A Produção na Saúde..................................................................................69

Capítulo 3 – Novas Tecnologias e Formas de Gestão.....................................................71

3.1 Globalização..............................................................................................................71

3.2 Globalização da Saúde...............................................................................................73

3.3 Impactos de Tecnologia no Setor de Saúde...............................................................76

3.4 Novas Tecnologias em Saúde....................................................................................80

3.5 Impactos da Tecnologia para o Trabalhador de Saúde..............................................84

3.6 Impactos da Tecnologia nas Novas Formas de Gestão da Saúde..............................88

3.7 Impactos da Tecnologia na Qualificação dos Profissionais de Saúde.......................95

3.8 Gestão de Qualidade na Saúde..................................................................................97

3.8.1 O Conceito de Qualidade............................................................................99

3.8.2 Gestão de Qualidade.................................................................................101

3.8.3 Gestão da Qualidade na Saúde..................................................................103

Capítulo 4 – O Estudo de Caso......................................................................................108

4.1 A Pesquisa...............................................................................................................116

4.1.1 As Entrevistas...........................................................................................117

5. Considerações Finais.................................................................................................143

Referências Bibliográficas............................................................................................ 148

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INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 em seu título VIII, capítulo II, seção II

determinou as regras da Saúde para o Brasil. Segundo o artigo 196, “a Saúde é um

direito de todos e um dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e

econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso

universal igualitário as ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Poucos anos antes, em 1986, o conferencista Antonio Sergio da Silva Arouca, então

presidente da Fundação Oswaldo Cruz proferiu a palestra “Saúde é Democracia”. Nos

Anais da 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986, p. 37) Arouca afirmou: “Saúde não é

simplesmente ausência de doença, mas é bem estar físico, mental, social e político; as

sociedades criam ciclos que são de miséria ou de desenvolvimento. Ao acontecer o ciclo

de miséria, é vital que ele seja transformado, rompido”.

Tanto o artigo quanto a afirmação acima são audaciosos e pretensiosos tendo em

vista a realidade vivenciada pela sociedade. Constata-se, mais de 20 anos após a

promulgação da Constituição, que muitos milhões de brasileiros ainda não se

beneficiaram de sua boa intenção.

A questão da saúde certamente é uma das mais complexas no Brasil, marcado

por diversos tipos de demandas sociais, políticas e econômicas. A Constituição nacional

define que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”, mas também, como tantas

outras obrigações do Estado brasileiro para com seus cidadãos, tem sido historicamente

difícil de ser atendida.

Ao se voltar para tempos mais distantes, A Declaração dos Direitos do Homem

e do Cidadão de 1789 (declaração culminante da primeira fase da revolução francesa)

foi um dos documentos mais importantes referentes aos papéis do Estado em relação

aos cidadãos. Segundo o artigo 1º da Declaração, “os homens nascem e são livres e

iguais em direitos. As destinações sociais só podem fundamentar-se na utilidade

comum”. No que diz respeito à saúde, não é exagero afirmar que, no Brasil, e mesmo

em outros países classificados como desenvolvidos, esse artigo ainda é uma utopia

longe de ser realizada. Observa-se que a Declaração Universal dos Direitos Humanos

de 1948 afirma em seu artigo 25 que “toda pessoa tem direito a um padrão de vida

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adequado para a saúde e bem estar próprio e de sua família, inclusive alimentação,

vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito a

segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou falta de meios

para subsistência em circunstâncias fora de seu controle”. (grifo do autor).

Entender o setor da saúde no Brasil ou em outras partes do mundo continua

sendo uma tarefa complexa e interdisciplinar. Em outras palavras, há várias causas para

erros e acertos.

Em se tratando da política de saúde brasileira, há um longo caminho a percorrer,

seja sob o aspecto do equacionamento da capacidade do Estado de financiar sua

obrigação constitucional, seja pela busca de soluções alternativas mediante o que se

convencionou chamar de saúde suplementar.

O Direito à Saúde ficou à margem de diversas constituições no Brasil. Ribeiro e

Julio (2010) afirmam que as constituições de 1824 e 1891 não “cuidaram” do tema da

saúde. A Carta Magna de 1934 foi à primeira constituição a fazer uma referência ao

Direito à Saúde onde, no artigo 10 inciso II, afirma ser de competência concorrente da

União e dos Estados o cuidado com a Saúde. Já a Constituição de 1937, outorgada por

Getúlio Vargas, não apresentou nenhuma efetividade aos direitos fundamentais e repetiu

a tímida iniciativa da Constituição anterior, mencionando no artigo 16 inciso XXVII

que caberia à União legislar privativamente sobre “normas fundamentais da defesa e da

proteção a saúde, especialmente da saúde da criança”.

A Constituição de 1946 e a Carta Constitucional de 1967 (outorgada com o

intuito de legitimar o golpe de 1964) também abordaram a questão da Saúde de modo

superficial e pouco efetivo. Em 1969, foi outorgada a Emenda Constitucional número 1

que não previu, novamente, o Direito a Saúde. No entanto, no inciso IV do artigo 25

apresentou uma inovação ao determinar que os municípios aplicassem 6% do repasse da

União a título de fundo de participação dos municípios na Saúde.

A ausência de legitimidade e as arbitrariedades cometidas durante o regime

militar fizeram com que diversas organizações (tais como a Ordem dos Advogados do

Brasil – OAB, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB e a Associação

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Brasileira de Imprensa – ABI) mobilizassem a sociedade na busca de uma participação

política democrática. O movimento das Diretas Já levou Tancredo Neves à presidência

da República em 1985. Com a morte deste, José Sarney, seu vice-presidente, assumiu a

presidência em novembro de 1985. Logo após a sua posse, Sarney convocou a

Assembléia Nacional Constituinte.

Assim sendo, foi com a Constituição de 1988 que se institui o Sistema Único de

Saúde (SUS), no qual a universalidade, a eqüidade e a integralidade da assistência à

saúde de todos os cidadãos são preceitos básicos. Configurou-se aí o lema "Saúde,

direito de todos e dever do Estado". Embora o conceito do SUS tenha sido um enorme

avanço em relação à situação anterior, já que abriu a perspectiva de atendimento a

parcelas da população inteiramente desassistidas, a realidade tem sido muito mais

desafiadora do que a pretensão dos legisladores e a capacidade dos executores públicos.

A saúde é premissa básica no exercício da cidadania, pois essa diz respeito à

qualidade de vida, escopo de todo cidadão, no exercício de seus direitos. Todavia,

conforme destaca Pires (2007), a construção da política de saúde no Brasil foi um

último suspiro do Welfare State1, assim como um paciente na UTI, que após súbita

melhora, volta ao estágio de letargia indicando a parada das funções vitais.

A Constituição Federal de 1988 foi um importante ensaio de garantias legais e

expansão de direitos. Entretanto, os indivíduos devem efetivamente ter acesso a esse

direito, fato que muitas vezes não ocorre em nosso país. Garantir os direitos e,

conseqüentemente, o acesso à saúde é condição sine qua non para que uma sociedade

assegure maiores oportunidades de igualdade social e cidadania.

Os direitos à vida e à saúde devem ser garantidos pelo Estado que pretende ser

democrático, como já afirmou Antonio Arouca na Conferência Nacional de Saúde em

1986. É função do Estado garantir o acesso a todos aos meios de recuperação de saúde:

conforme texto da Constituição Federal brasileira, “a saúde é direito de todos e dever do

1 “O Welfare State representou um esforço de reconstrução econômica, moral e política.

Economicamente, significou um abandono da ortodoxia da pura lógica do mercado, em favor da

exigência de extensão da segurança do emprego e da justiça social, solidariedade e universalismo”.

(ESPING-ANDERSEN, 1995, p.75)

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Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco

de doença e de outros agravos ao acesso universal igualitário às ações e serviços para

sua promoção”. Porém, o que se pode avaliar é que, após todo o tempo decorrido da

promulgação da Constituição de 1988, a saúde padece de enfermidades profundas,

fazendo com que o direito à saúde, enquanto direito fundamental não tenha a total

efetivação conforme os ditames constitucionais.

Dessa forma, o cumprimento do direito à saúde é de responsabilidade da

sociedade civil e do Estado, porém entre o legal e o real constata-se um hiato. Nesse

sentido, basta a consulta a jornais locais que cotidianamente fornecem inúmeras notícias

com informações a respeito da violação desse direito, seja pela falta dos serviços

necessários, ou por sua baixa qualidade. Em pesquisa publicada em 09 de fevereiro de

2011, o Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS), órgão ligado ao Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgou os resultados de uma pesquisa sobre a

percepção da população em relação aos serviços públicos e privados de saúde.

Destacam-se nesse relatório:

- o atendimento em centros/ postos de saúde foi classificado como ruim ou muito ruim

por 31,1% dos entrevistados pacientes. Para os acompanhantes, o percentual é

praticamente o mesmo, ou seja, 31,4%;

- o atendimento de urgência/ emergência obteve 31,4% de avaliações classificadas como

ruim ou muito ruim;

- a falta de médicos especialistas foi identificada como grande problema para 18,8% dos

entrevistados (media Brasil).

Outros agravantes e contrastes sociais impactam diretamente nos serviços de

saúde: um dado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2009

indica que 40,9% das residências brasileiras não tinham acesso a saneamento básico e

sua ausência implica altos custos sanitários. Segundo estudos publicados pelo instituto

Trata Brasil, a universalização do acesso à rede de esgoto traria uma economia de R$

745 milhões anuais em internações, apenas ao Sistema Único de Saúde (SUS).

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Assim como em outras partes do mundo, a qualidade do gasto público no Brasil

encontra-se no centro dos debates relativos ao setor da saúde. Segundo Perillo e

Amorim (2011), há notório problema de gestão que emperra a máquina pública e suga

recursos sempre escassos em face das necessidades.

O setor da saúde foi impactado ainda pela queda da produtividade do sistema

capitalista, alta da inflação em determinados períodos e tímido crescimento econômico

(especialmente nas duas últimas décadas do século XX). Outro agravante: muitos países

tiveram aumento no déficit orçamentário ou imposição, como aconteceu com o Brasil,

do Fundo Monetário Internacional (FMI) em atuar com superávits fiscais anuais. A

queda da produtividade e os impactos dos fenômenos acima afetaram a acumulação de

capital e os lucros de empresas privadas de diversos setores.

Constatou-se ainda uma crescente pressão por parte do setor privado sobre o

modo de atuação do Estado em relação ao financiamento de programas sociais, dentre

os quais aqueles relacionados à área da saúde (proliferação de políticas neoliberais).

A crise instalada em cada país ocasionou redução na demanda e o capital passou

a circular mais intensamente no mercado internacional. Houve, então, um incremento da

concorrência acentuada pelas facilidades de sua operacionalização graças ao uso de

novas tecnologias e sistemas de informação. Não é exagero afirmar que organizações de

todos os setores precisaram se adaptar a esse novo cenário. O setor hospitalar (hospitais,

prestadores de serviços, fornecedores, indústrias farmacêuticas) precisou se reinventar

também.

Com o propósito de alcançar melhor produtividade e se beneficiando do

surgimento dessas novas tecnologias, as empresas do ramo industrial iniciaram, nos

anos 1970, a implantação de mudanças em suas estruturas produtivas com destaque para

técnicas japonesas implantadas naquele país e que permitiram maior competitividade e

maiores lucros. De acordo com Alves (2000), as características mais importantes dessas

técnicas são: just in time – produção de acordo com a demanda, estoque quase zero,

produção ajustável às oscilações do mercado possibilitando flexibilidade na produção,

diminuição da estabilidade do trabalhador no emprego, trabalhador multifuncional,

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terceirização e uso de novas tecnologias. As práticas descritas acima foram utilizadas e

adaptadas por organizações ocidentais estabelecidas na Europa e nos Estados Unidos

com o propósito de manter sua competitividade e, em alguns casos, sua própria

sobrevivência, uma vez que o cenário econômico era de crise. Posteriormente,

organizações estabelecidas nos países em desenvolvimento, dentre os quais o Brasil,

adotaram muitas dessas técnicas em suas práticas de gestão.

No Brasil, até meados dos anos 1980, as políticas desenvolvimentistas

vigoraram com importante participação do Estado na economia. Nos anos 1990, já com

presidentes eleitos democraticamente, as diretrizes do Estado, na visão de Figueiras

(2000) foram: liberalização comercial e financeira, privatizações, câmbio valorizado,

desregulamentação, abertura de mercado e flexibilização do mercado de trabalho.

Para as organizações de saúde localizadas no Brasil, o cenário esteve conturbado

na década de 1990 uma vez que o câmbio estava valorizado artificialmente, houve uma

diminuição dos investimentos do governo e a revolução tecnológica estava em curso.

De modo geral, os hospitais, como um dos importantes agentes desse setor, passaram

por muitas dificuldades, pois os recursos eram escassos e os custos crescentes.

Conforme Alzuguir (2005), o plano real de 1994 agravou ainda mais a situação

financeira da saúde, na medida em que a fixação de valores em Unidade Real de Valor

(URV), baseada na paridade do dólar, não levava em consideração o avanço dos preços

dos insumos hospitalares e dos medicamentos, calcados no valor do mercado

internacional.

Considerando-se a primeira década do século XXI, muitas organizações já

haviam implantadas mudanças para se adaptar à nova realidade competitiva, mais

acirrada e disputada em praticamente todos os setores empresariais.

Em meio a todas essas transformações presentes nas organizações de saúde,

mudanças tecnológicas com novos equipamentos e procedimentos, informações mais

apuradas, pacientes mais exigentes e sabedores de seus direitos e diferentes agentes se

inter-relacionando, tais como o Estado em suas diversas esferas, os convênios médicos,

as cooperativas médicas e fornecedores de insumos e materiais, torna-se relevante

investigar os impactos no cotidiano do trabalhador da saúde, especificamente dos

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médicos e enfermeiros, justamente aqueles que diretamente executam e/ou coordenam a

realização do atendimento.

Assim, esta tese tem o seguinte problema de pesquisa:

Quais foram os impactos das mudanças organizacionais, tecnológicas e sociais no

cotidiano e no desempenho do trabalhador de saúde do setor hospitalar, bem como no

atendimento à população?

Dessa forma, pretende-se investigar o que mudou no trabalho executado por

profissionais de enfermagem e médicos uma vez que se trata de uma atividade

fundamental para a sociedade e para os cidadãos. O profissional da saúde trabalha com

a vida humana em seu momento mais vulnerável, quando debilitado e, em seu dia a dia,

se vê obrigado a enfrentar problemas de toda ordem.

A partir desse problema, essa pesquisa tem como principal objetivo investigar

como efetivamente as práticas e as exigências do trabalho em hospitais que impactam o

cotidiano, o desempenho e o atendimento do profissional de saúde do setor hospitalar.

Em termos específicos, o trabalho tem os seguintes objetivos:

- Apresentar o que mudou para o trabalhador (médicos e profissionais de enfermagem)

com as novas técnicas de gestão no que se refere ao seu cotidiano e ao seu desempenho

no trabalho.

- Identificar as conseqüências para esses profissionais com a implantação de políticas

públicas e privadas das novas práticas no serviço prestado em hospitais.

- Analisar como impactou no trabalhador a necessidade de aquisição de novas

competências profissionais, especialmente em função do surgimento de novas

tecnologias no setor.

- Verificar o que mudou, pela óptica de médicos e enfermeiros no atendimento realizado

junto aos pacientes.

No que se refere ao trabalho de coleta de dados, a presente tese fará uso de uma

pesquisa qualitativa a ser realizada por meio de entrevistas com médicos e enfermeiros,

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que atendem tanto pelo Sistema Único de Saúde (SUS) como pelo sistema de saúde

suplementar.

Por fim, a partir das afirmações expostas nos parágrafos anteriores, o presente

trabalho apresenta as seguintes hipóteses:

- A luta por maior competitividade, pela sobrevivência e pela obtenção de taxas

elevadas de lucros graças às novas técnicas de gestão não respeitou as especificidades

da atividade médica e o funcionamento do atendimento de enfermagem em hospitais;

- Boas condições de trabalho e alocação de recursos necessários para um atendimento

digno ao paciente não são prioridades para os órgãos públicos e para as empresas

privadas de saúde suplementar no atendimento hospitalar, tanto na rede SUS quanto nos

serviços prestados por convênios e seguradoras médicas, ocasionando elevados níveis

de stress e problemas para a execução do trabalho de médicos e profissionais de

enfermagem.

Montmollin (1990) apud Segura (2004), define condições de trabalho como tudo

o que caracteriza uma situação de trabalho e permite ou impede a atividade dos

trabalhadores. O autor distingue as condições:

- Físicas, que se referem às máquinas, equipamentos, instrumentos e ambiente da

posição (exposição a perigos, intensidade de ruídos, poeira, temperatura);

- Temporais, que diz respeito à jornada de trabalho;

- Organizacionais, que são os regulamentos, regras, ritmos impostos, ou seja, o que se

relaciona com o conteúdo do trabalho em si;

- Aspectos subjetivos que incluem idade, saúde e formação;

- Condições sociais que envolvem remuneração, transporte, em certos casos alojamento

e vantagens sociais.

Cabe também aqui explicitar que o método de investigação a ser usado nessa

pesquisa é o Estudo de Caso, que permite uma investigação significativa de

experiências vivenciadas pelos trabalhadores entrevistados, objetivo central desta tese.

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9

A respeito dessa metodologia, Yin (2005) considera que o estudo de caso é uma

investigação empírica de um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto de vida

real. Esse autor entende também que o estudo de caso é adequado quando há dificuldade

em se determinar os limites entre fenômeno e o contexto da investigação.

Ao se comparar o método do Estudo de Caso com outros métodos, Yin (2005)

diz ser necessário refletir sobre as questões colocadas pela pesquisa. De modo geral, o

Estudo de Caso é recomendado para responder questões explicativas (como e porque) e

trata de relações ao longo do tempo, diferentemente de investigações que demandam

incidências e freqüências.

Yin (2005) ressalta que outra vantagem desse método refere-se à variedade de

documentos, evidências, observações e entrevistas que podem ser usados na coleta de

informações. Para Bell (1993), o método do Estudo de Caso é adequado em análises

profundas de um sujeito considerado individualmente. Por sujeito, entende-se uma

unidade que nessa pesquisa é o Hospital Stella Maris, espaço de atuação dos médicos e

enfermeiros que serão entrevistados. Esse autor considera interessante ainda a

possibilidade de se concentrar em um caso específico para identificar os diversos

processos interativos em curso.

Na realização da pesquisa serão utilizadas entrevistas semi estruturadas com a

utilização de um roteiro previamente elaborado. Para Quaresma (2005), o pesquisador

deve seguir um conjunto de questões previamente definidas, mas ele o faz em um

contexto muito semelhante ao de uma conversa informal. Assim, cabe ao entrevistador

dirigir, quando oportuno, a discussão para o assunto que o interessa fazendo perguntas

adicionais para elucidar questões que não ficaram claras ou ajudar a recompor o

contexto.

. Para Triviños (1987, p.146) “a entrevista semi-estruturada tem como

característica questionamentos básicos que são apoiados em teorias e hipóteses que são

relacionados com o tema de pesquisa”. O foco principal seria colocado pelo

investigador/ entrevistador. Complementa Triviños (1987, p.152), “a entrevista semi-

estruturada favorece a descrição dos fenômenos sociais, sua explicação e a compreensão

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de sua totalidade, além de manter a presença consciente e atuante do pesquisador no

processo de coleta de informações.”

Para Manzini (1990, 1991, p. 154), “a entrevista semi-estruturada está focalizada

em um assunto sobre o qual confeccionamos um roteiro com perguntas principais,

complementadas por questões inerentes às circunstâncias momentâneas à entrevista.” O

autor ressalta que dessa forma, as respostas não estão condicionadas a uma

padronização de alternativas e que as informações podem emergir de modo mais livre.

Manzini (1990, 1991) recomenda ainda que o pesquisador estabeleça perguntas básicas

e principais para se atingir o objetivo da pesquisa.

Para o presente trabalho, as questões básicas que nortearam a entrevista foram:

1) O Senhor (a) obteve sua formação em que ano?

Pretendeu-se entrevistar principalmente profissionais que estejam atuando como

médicos ou enfermeiros há pelo menos 10 anos. Considerou-se esse tempo de

experiência ser necessário para que o entrevistado tenha condições de observar as

mudanças que são objeto de investigação desse trabalho.

2) Nos últimos anos (desde os anos 2000) O Senhor (a) observou mudanças nas

práticas da administração hospitalar? (exemplos de mudanças: diminuição dos

estoques de insumos, redução de custos com pessoal e insumos, pressão por

maior produtividade, maior rapidez no atendimento, terceirização de serviços de

apoio como segurança e limpeza). Em caso afirmativo quais foram os efeitos

dessas mudanças nas relações estabelecidas dentro do hospital entre os diversos

setores e para os pacientes?

O eixo dessa pergunta visa identificar como esses profissionais lidaram com as

mudanças sob as orientações dos gestores para o atendimento efetuado por médicos

e enfermeiros. Observa-se que os hospitais, como inúmeros outros tipos de

empresas no sistema capitalista, buscam cada vez maior produtividade para

sobreviver em um mercado crescentemente competitivo.

3) As políticas públicas (desenvolvidas pelo SUS que propõe o tratamento integral)

implementadas nos últimos anos favoreceram uma melhora na qualidade do

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atendimento hospitalar? Houve alterações nas condições e na execução do seu

trabalho? Se sim, quais foram essas alterações?

Com esse questionamento busca-se analisar, ao longo dos anos, se as Políticas

Públicas, no que se refere ao Sistema Único de Saúde (SUS), contribuíram para uma

evolução na qualidade dos serviços prestados em hospitais e de que forma as

condições e a execução do trabalho foram afetados, ou seja, como os profissionais e

os pacientes foram impactados com as políticas governamentais.

4) As empresas de saúde suplementar (operadoras, convênios, etc) utilizam os

hospitais para atender os seus “clientes/ pacientes”. A saúde suplementar

contribuiu nos últimos anos para uma melhora na qualidade dos serviços

prestados aos pacientes? As condições e a execução do seu trabalho foram

afetadas de alguma maneira? Se sim, como?

Nos últimos anos houve um crescimento de mercado no setor de convênios

médicos e seguros saúde. A pergunta acima busca analisar, ao longo dos anos, se a

atuação dessas empresas privadas contribuiu para uma evolução na qualidade dos

serviços prestados em hospitais e de que forma as condições e a execução do

trabalho foram afetados, ou seja, como os profissionais e os pacientes foram

afetados pelas práticas dessas empresas.

5) Novas tecnologias, métodos de tratamento e de execução do trabalho surgiram

na área da saúde nos últimos anos. O senhor (a) precisou adquirir novas

competências profissionais em função disso? Se sim, houve algum apoio ou

recurso disponibilizado para aquisição desses conhecimentos? (exemplos de

apoio: dispensa do trabalho para participação de cursos e congressos, recursos

financeiros do SUS, do hospital ou das operadoras de saúde)

Com essa questão pretende-se analisar o processo de aquisição de competências

profissionais nos últimos anos e como o entrevistado avalia se está atualizado na sua

área de atuação. Procurar-se-á também investigar se há apoio e recursos para

aquisição dessas competências.

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6) Quais são os seus critérios de avaliação quanto ao seu desempenho? Esses

critérios sofreram alterações nos últimos anos? Eles estão em sintonia com

aqueles que o motivaram a escolher a sua profissão?

Essa pergunta pretende investigar se aquilo que o profissional considera bom

desempenho difere ou não daquilo que os gestores consideram em relação à

performance do trabalho executado.

7) Em seu cotidiano, a carga de trabalho que o Senhor (a) executa é compatível

com o tempo disponível necessário para um atendimento adequado às

responsabilidades de sua função? Quais são os impactos de sua resposta para os

usuários/ pacientes?

Essa pergunta procurou analisar se há sobrecarga de trabalho para médicos e

enfermeiros e em caso de resposta afirmativa investigar como isso interfere em seu

cotidiano e na qualidade dos atendimentos realizados.

8) A área da Saúde possui especificidades (como os protocolos) e o trabalho do

médico (ou do enfermeiro) é acompanhado por órgãos como o Conselho

Regional de Medicina (CRM) e o Conselho Regional de Enfermagem

(COREN). As práticas e técnicas implantadas pela administração nos últimos

anos respeitaram essas especificidades e acataram as recomendações desses

órgãos? Há algum impacto, positivo ou negativo, no atendimento realizado ao

paciente?

O eixo dessa pergunta investiga como o profissional entrevistado executa sua

função recebendo diversas orientações e abordagens. Os conselhos de classe acima

zelam pelo trabalho ético de seus profissionais e possuem papel fiscalizador

importante. Eles examinam periodicamente os locais e as condições de trabalho,

elaboram determinações que minimizem os riscos de imprudência e imperícia e

analisam o dimensionamento de pessoal. Em entrevista à Revista de Enfermagem,

publicada em dezembro de 2012, Marcelo Santos, gerente de fiscalização do

COREN de SP, afirma que as instituições não realizam as adequações de pessoal

com a alegação de falta de recursos orçamentários e afirma que tanto em hospitais

públicos como em privados o número de profissionais é insuficiente. Enquanto os

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conselhos regionais fiscalizam o cotidiano e as atividades desenvolvidas,

hierarquicamente, o profissional está subordinado aos gestores hospitalares. Como

esses interesses e essas prioridades divergentes afetam o seu trabalho? Como isso

afeta o paciente?

Estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2012

apontam que vivem no município de Guarulhos cerca 1.244.000 habitantes, o que o

coloca como o 13º município brasileiro em quantidade de habitantes.

A cidade possui apenas três hospitais municipais: O HMU (Hospital Municipal de

Urgência), o HMCA (Hospital Municipal da Criança e do Adolescente) e o HMPB

(Hospital Municipal Pimentas) no povoado bairro do Bonsucesso. Há um hospital

público estadual, o complexo hospitalar Padre Bento e uma Organização Social de

Saúde, o Hospital Geral de Guarulhos.

Estão também instalados na cidade três hospitais particulares: o Hospital Bom

Clima, o Hospital Carlos Chagas e o Hospital Saúde Guarulhos.

Complementam a rede de assistência dois hospitais filantrópicos: a Associação

Beneficente Jesus, José e Maria e o Hospital Stella Maris que permitiu que a presente

pesquisa fosse realizada.

Foram entrevistados 9 médicos de diversas especialidades e 9 enfermeiros que

possuem, em sua grande maioria, vasta experiência profissional (a maior parte dos

entrevistados atua profissionalmente há mais de 10 anos). O tempo de experiência

tornou-se necessário para que a análise efetuada pelo entrevistado considere mudanças e

transformações do trabalho ao longo do tempo.

O estudo foi realizado no Hospital Stella Maris, localizado na cidade de Guarulhos.

Trata-se de um hospital fundado por uma ordem religiosa católica nos anos 1960,

filantrópico, que atende tanto o Sistema Único de Saúde (SUS) como a rede conveniada

(seguradoras e convênios médicos). O atendimento ao SUS representa cerca de 70% dos

procedimentos realizados pelo hospital Stella Maris. A rede conveniada representa 25%

dos atendimentos e os outros 5% são os atendimentos particulares.

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O Hospital Stella Maris é um dos principais estabelecimentos de saúde de

Guarulhos. A seguir algumas informações sobre essa organização hospitalar:

- trata-se de um hospital geral com capacidade de atendimento de 220 leitos;

- possui aproximadamente 800 funcionários, sendo a maior parte deles alocada no setor

de enfermagem;

- único hospital da cidade e da região que atende emergências cardíacas com estrutura

para cirurgias complexas;

- principal hospital da cidade que realiza partos pelo Sistema Único de Saúde (SUS);

- principal centro de atendimento em Hemodiálise da região;

- único hospital de grande porte da cidade que possui uma escola de formação de

auxiliares e técnicos de enfermagem;

- único hospital de Guarulhos com vários programas de residência médica.

O Hospital Stella Maris é o típico hospital filantrópico brasileiro: foi fundado

por uma ordem religiosa católica, passa por dificuldades financeiras crônicas, enfrenta

desafios diários de toda ordem para atender os pacientes que batem à sua porta e tem

procurado se re-inventar como organização empresarial para atender a missão das irmãs

fundadoras que colocaram como objetivo central da entidade, nos anos 1940, a proteção

à vida e dignidade humana.

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CAPÍTULO I - OS SISTEMAS DE SAÚDE

1. SISTEMA DE SAÚDE

Para um maior e melhor entendimento da estrutura do Sistema Brasileiro de Saúde

(SBS), sugere-se inicialmente a explicitação do conceito de sistema de saúde e seus

principais objetivos.

Para tal, recorre-se à Organização Pan Americana de Saúde (OPAS, 2007), a qual

menciona que um sistema de saúde, como todo sistema social, depende da história e das

condições políticas e socioambientais da cada país. Os sistemas de saúde refletem

importantes valores sociais que se expressam nos limites jurídicos e institucionais

relacionados com a formulação e implantação das políticas de saúde de uma

determinada nação. Consequentemente, os objetivos e os limites são específicos de cada

nação, conforme valores e princípios próprios. Sendo assim, Roemer (1993) e Mendes

(2002) reiteram que são respostas sociais organizadas deliberadamente para as

necessidades, demandas e representações das populações em determinada sociedade e

em determinado momento. Dessa forma, os Sistemas de Saúde são sistemas sociais que

se propõem e se organizam com o intuito de prestar assistência à saúde a uma população

definida.

Com relação à definição de sistemas de saúde, a Organização Mundial de Saúde

(OMS) destaca que esses podem ser entendidos como “o conjunto de atividades cujo

principal propósito é promover, restaurar e manter a saúde de uma população” (World

Health Organization - WHO, p.8, 2000). Nessa definição, os sistemas de saúde

englobam, além dos próprios estabelecimentos de saúde, os cuidados de saúde nos

domicílios, os fornecedores privados, compreendendo também ações de outros setores

que impactam direta e indiretamente no setor de saúde.

Em se tratando dos impactos dos sistemas de saúde para a população e sociedade,

Mendes (2001) salienta que, embora toda sociedade compartilhe das crenças de que a

Saúde tem um valor intrínseco para as pessoas e que os serviços de saúde são

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necessários para manter a vida e aliviar o sofrimento das pessoas, os objetivos dos

sistemas de saúde variam de um país para outro, assim como as suas concepções, ainda

que se explicitem valores subjacentes bastante semelhantes, tais como o alcance da

eqüidade (ou superação das desigualdades) e o bem-estar de toda a população. Na

realidade, sob a ótica desse autor, apesar da explicitação desses valores, a estruturação e

o funcionamento dos sistemas de serviços de saúde estão longe de cumprirem os

requisitos mínimos para alcançá-los. Além disso, ainda que os objetivos e valores se

mantenham, as propostas de reforma e de mudanças nem sempre possibilitam

transformações positivas.

Com relação aos objetivos dos Sistemas de Saúde, Mendes (2002) afirma que,

independente da forma de organização social e econômica, a maioria dos países tem

objetivos comuns com relação a esses sistemas. Segundo esse autor, os principais

objetivos dos Sistemas de Saúde são:

alcance de um nível ótimo de saúde, distribuído de forma eqüitativa;

garantia de uma proteção adequada dos riscos para todos os cidadãos;

acolhimento dos cidadãos;

a efetividade dos serviços de saúde;

a eficiência dos serviços de saúde.

Assim, para atingir esses objetivos, os Sistemas de Saúde devem atuar na

articulação de atores sociais envolvidos no processo com o intuito de mediar os seus

interesses e conflitos. Os principais componentes de um sistema de saúde são a

população e as instituições prestadoras de serviços, embora existam outros atores

importantes como o Governo, as universidades, os conselhos profissionais, a indústria

farmacêutica, dentre outros.

Para maior compreensão do Sistema de Saúde no Brasil, torna-se relevante

investigar aspectos importantes de Sistemas de Saúde de outros países uma vez que

muitas práticas dessa área são introduzidas após sua implantação em outros países.

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1.1 CARACTERÍSTICAS DOS SISTEMAS DE SAÚDE EXISTENTES EM

ALGUNS PAÍSES DO MUNDO

Com relação às características dos sistemas de saúde pelo mundo, Almeida

(1996a) destaca que, nos Estados Unidos, embora os gastos com a saúde tenham se

elevado acima da inflação, as políticas neo-liberais excluem milhões de cidadãos de

atendimentos básicos em saúde. Sendo assim, para Almeida (1999), a atenção

gerenciada (managed care), precursora da competição gerenciada (managed

competition), tem longo percurso histórico nos Estados Unidos. Nos anos 1970, o

governo Nixon institucionalizou o managed care (atenção gerenciada) com a aprovação

da lei Health Maintenance Organizations Act (1973), uma alternativa política para

preservar a assistência médica empresarial e, ao mesmo tempo, diminuir a taxa de

crescimento com gastos sanitários. Essa proposta foi fruto do trabalho conjunto de

executivos de grandes empresas e seguradoras e desenvolveu-se de modo consistente

durante os anos 1980 (ALMEIDA, 1996a).

A mesma autora destaca que a atenção gerenciada (managed care) diz respeito a

um pré-pagamento do plano de saúde que fornece assistência médica para grupos

específicos por meio de pacotes negociados. Fazem parte desses grupos específicos:

pessoas com mais de 65 anos de idade; pessoas com alguma deficiência e menos de 64

anos; pessoas de qualquer idade com doença renal em estágio terminal. O objetivo do

programa é controlar o uso de serviços, articular a sua prestação, trabalhar

simultaneamente seu financiamento, além de diminuir custos favorecendo o

atendimento generalista e dificultando a atenção especializada. Há uma rigidez com os

profissionais da saúde devido à preocupação com os valores gastos nos procedimentos,

procurando-se conter, especialmente, a demanda por procedimentos mais onerosos.

Segundo Andrade e Lisboa (2000), cerca de 70% da população americana

possuem seguros de saúde privado, oriundos principalmente da sua relação de emprego.

Esses mesmos autores afirmam ainda que o Estado americano desenvolveu políticas de

atendimento apenas para idosos e pessoas de baixa renda e que, mesmo assim, gastam

cerca de 14% do PIB (Produto Interno Bruto) com a saúde. A justificativa se dá com os

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altos custos com pesquisa e tecnologia, mas há evidentes sinais de ineficiências no

sistema.

A administração do presidente Barack Obama conseguiu, após enfrentar forte

oposição da direita americana representada pelos deputados e senadores do Partido

Republicano, aprovar em março de 2010 a reforma da saúde nos Estados Unidos da

América. Dois dos principais aspectos dessa reforma foram:

- passaram a ter direito à Saúde cerca de 16% dos habitantes do território americano

(mais de 46 milhões de pessoas) que estavam excluídos de qualquer atendimento;

- foram desenvolvidos mecanismos para controlar os excessivos valores cobrados pelos

seguros de saúde privados sem comprometimento da qualidade dos serviços prestados.

O desenvolvimento do novo programa de saúde teve como premissa a entrada do

governo na disputa pelo mercado, o que ocasionaria uma pressão sobre os concorrentes

privados, levando a uma diminuição dos preços, à uma melhoria na qualidade dos

serviços pela criação de subsídios que proporcionassem o atendimento da população de

baixa renda. Nota-se que a reforma apresenta, no geral, pontos positivos para a

população americana. Porque tantas críticas e controvérsias? A votação no congresso foi

bastante equilibrada e a reforma foi aprovada com 219 votos contra 212 votos

contrários. Além das questões políticas e de outros interesses que envolvem a aprovação

de uma reforma dessa magnitude, torna-se importante identificar o que há por trás das

críticas e que argumentos preocupam os profissionais da área e os administradores e

estudiosos das questões públicas. Para o economista Bandow (2010), a reforma de

saúde deveria ser feita visando à capacidade de escolha dos pacientes e não a partir de

profissionais decidindo que direitos os pacientes deveriam ou não possuir. O autor

argumenta ainda que, se a essência do problema diz respeito aos custos altos, é

inevitável que esses custos continuem aumentando em função das novas tecnologias

médicas e dos novos produtos farmacêuticos. Para o autor, uma maior atuação do

governo servirá para a realização de um serviço de baixa qualidade com provável

aumento de gastos, o que implicará em aumento de impostos.

Observa-se que as controvérsias se repetem no modo como diversos países

estabelecem os serviços de saúde para a população.

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Segundo Almeida (1999), um Sistema de Saúde com características específicas

interessantes é o canadense, onde as províncias e o governo federal sustentam em

conjunto a operacionalização do processo de atendimento. Nessa parceria, cabe ao

governo federal parte do financiamento (cerca de 25%) e a determinação de regras para

os planos de seguro, enquanto as províncias são responsáveis pelo gerenciamento, pelo

planejamento e pelo atendimento médico - hospitalar. Nesse sistema, as províncias

recebem recursos per capita e está determinado que todo cidadão canadense tem direito

ao acesso aos serviços de saúde públicos. Observa-se que a escolha do médico é livre e

que o mesmo, diferentemente das práticas observadas no modelo americano, tem

autonomia para designar o tratamento que julgar conveniente. Cabe ao médico, ainda,

na busca pela racionalização, selecionar os pacientes que devem ser atendidos

prioritariamente. Os médicos são remunerados por tarefa e na maioria das províncias é

proibida a criação de seguros privados que ofereçam os mesmos serviços que os

providos pelo seguro público. Normalmente, os serviços privados são complementares,

ou seja, estão relacionados àquilo que não é ofertado pelo Estado, como enfermagem

qualificada e transporte de ambulância para não urgências.

Conforme Butler (1994) e Andrade e Lisboa (2000), o modelo de sistema de

saúde utilizado na Inglaterra está na vanguarda do sistema europeu de saúde, sendo que

o National Health Service foi implantado a partir de 1948, para promover a sua

nacionalização e a universalização do acesso aos serviços de saúde. Enfermeiros,

médicos especialistas e o pessoal das áreas administrativas eram financiados pelo

Estado, enquanto os médicos generalistas permaneceram como autônomos e mantinham

sua remuneração por meio de captação e reembolso por consultas. Faziam o

atendimento primário encaminhando os pacientes, quando necessário, para profissionais

especialistas. A alta nos gastos do Estado ao longo dos anos com esse sistema o tornou

insustentável, uma vez que a demanda por serviços era crescente e o acesso integral e

irrestrito levou à superutilização do sistema. A situação foi ainda agravada pela

demanda de recursos e investimentos em novas tecnologias e pelo envelhecimento da

população. Assim, em 1989, foi implantada a reforma inglesa no sistema de saúde em

um ambiente político que exacerbava e generalizava a ineficiência do Estado na

utilização de recursos. O governo da primeira ministra Margaret Thatcher priorizava o

setor privado como “espaço“ mais adequado para a execução de políticas, ademais,

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defendia a predominância dos princípios econômicos, em detrimento da proteção social,

e do mercado versus a hierarquia burocratizada (BUTLER, 1994).

A reforma ocorrida no sistema de saúde inglês reiterou os princípios de acesso e

integralidade e enfatizou-se a eficiência do uso dos recursos com mudança nos métodos

de alocação e fortalecimento do Estado na regulação do sistema. Foco gerencial e

adoção de políticas de terceirização, sobretudo nos serviços de hotelaria, representaram

esforços na contenção dos crescentes custos que se apresentavam. Segundo Andrade e

Lisboa (2000), os grandes dilemas do sistema não foram solucionados com a reforma e

o racionamento continua funcionando como o mecanismo de alocação dos recursos e

contenção da demanda, ou seja, os ganhos obtidos não foram suficientes para garantir a

sustentabilidade financeira necessária do sistema no longo prazo.

Por fim, sendo considerado um dos melhores sistemas de saúde do mundo, na

França, segundo Wdson (2009), a saúde é um dos componentes do Sistema de

Seguridade Social, de solidariedade social e de natureza pública, sob a base de cotização

obrigatória de empregados e empregadores. Apresenta como princípios de organização

a coexistência do setor público de prestação de serviços ao lado do privado, com ou sem

fins lucrativos, a livre escolha de profissionais e estabelecimentos de saúde, a autonomia

para a instalação de consultórios; o pagamento direto, pelos usuários, aos profissionais e

serviços de saúde, com reembolso parcial das despesas, a liberdade de prescrição e o

segredo profissional.

Na prática, ainda conforme Wdson (2009), o sistema de saúde francês, após as

reformas ocorridas nos anos 90, representa um programa de seguro público

compulsório, que tanto remunera médicos particulares pela assistência, quanto exerce

relativo controle regulador sobre o valor de consultas e procedimentos. Por sua

característica mista, esse sistema de saúde disponibiliza, ainda, serviços de natureza

pública e privada aos usuários. Trata-se de um sistema com alto nível de recursos e

prestação de serviços, cobrindo a assistência médico-odontológica, farmacêutica,

domiciliar de enfermagem, transportes sanitários, curas termais e fornecimento de

órteses e próteses, incluindo óculos.

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1.2 A SAÚDE NO BRASIL

1.2.a ANTECEDENTES DO SISTEMA BRASILEIRO DE SAÚDE

De acordo com Polignano (2001), a crise do sistema de saúde no Brasil está presente

no nosso dia a dia sendo constatada por meio de fatos amplamente conhecidos e

divulgados pela mídia, como:

filas freqüentes de pacientes nos serviços de saúde;

falta de leitos hospitalares para atender a demanda da população;

escassez de recursos financeiros, materiais e humanos para manter os serviços de

saúde operando com eficácia e eficiência;

atraso no repasse dos pagamentos do Ministério da Saúde para os serviços

conveniados;

baixos valores pagos pelo SUS aos diversos procedimentos médicos-

hospitalares;

aumento de incidência e o ressurgimento de diversas doenças transmissíveis;

denúncias de abusos cometidos pelos planos privados e pelos seguros de Saúde.

Em pesquisa divulgada em 09 de fevereiro de 2011 e realizada pelo Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) para o Sistema de Indicadores de Percepção

Social (SIPS), os maiores problemas da saúde no Brasil são: a falta de médicos, a

demora para se conseguir atendimento nos centros de saúde ou nos hospitais da rede

pública e a demora para se conseguir ser atendido por um médico especialista.

Para que se possa avaliar a realidade hoje existente, é necessário conhecer os

determinantes históricos envolvidos nesse processo. Dessa forma, como somos frutos

do nosso passado e da nossa história, o setor da saúde também sofreu as influências de

todo o contexto político-social pelo qual o Brasil passou ao longo do tempo, conforme

descrito a seguir.

1.2.1 Dos anos 1500 até o 1º REINADO (1890)

Um país colonizado, basicamente por degredados e aventureiros desde o

descobrimento até a instalação do império, o Brasil não dispunha de qualquer modelo

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de atenção à saúde da população e tampouco o interesse, por parte do governo de

Portugal, em criá-lo.

Desse modo, a atenção à saúde limitava-se aos próprios recursos da terra

(plantas, ervas) e àqueles que, por conhecimentos empíricos (curandeiros),

desenvolviam as suas habilidades na arte de curar. A vinda da família real ao Brasil

criou a necessidade de organização de uma estrutura sanitária mínima, capaz de dar

suporte ao poder que se instalava na cidade do Rio de Janeiro (POLIGNANO, 2009).

Sendo assim, até 1850, as atividades de saúde pública no país estavam limitadas ao

seguinte:

1 - Delegação das atribuições sanitárias às juntas municipais.

2 - Controle de navios e saúde dos portos.

Dessa forma, o interesse primordial estava limitado ao estabelecimento de um

controle sanitário mínimo da capital do império, tendência que se alongou por quase um

século.

A carência de profissionais médicos no Brasil Colônia e no Brasil Império era

enorme. Como exemplo, conforme cita Salles (1971), no Rio de Janeiro, em 1789, só

existiam quatro médicos exercendo a profissão. Em outros estados brasileiros a situação

era similar, em alguns casos não havia médicos.

A inexistência de uma assistência médica estruturada fez com que proliferassem

pelo país os Boticários (farmacêuticos). Aos boticários cabia a manipulação das

fórmulas prescritas pelos médicos, mas a verdade é que eles mesmos tomavam a

iniciativa de indicá-los, fato comum até hoje.

Não dispondo de um aprendizado acadêmico, o processo de habilitação na

função consistia tão somente em acompanhar um serviço de uma botica já estabelecida

durante um certo período de tempo, ao fim do qual prestavam um exame perante a

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fisicatura2 e, se aprovado, o candidato recebia a “carta de habilitação”, e estava apto a

instalar sua própria botica (SALLES, 1971).

Em 1808, Dom João VI fundou na Bahia o Colégio Médico Cirúrgico no Real

Hospital Militar da Cidade de Salvador. No mês de novembro do mesmo ano foi criada

a Escola de Cirurgia do Rio de Janeiro, anexa ao real Hospital Militar.

1.2.2 INÍCIO DA REPÚBLICA ATÉ 1930

Segundo Polignano (2009), naturalmente, a falta de um modelo sanitário para o

país deixavam as cidades brasileiras à mercê das epidemias.

No início do século XX, a cidade do Rio de Janeiro apresentava um quadro

sanitário caótico caracterizado pela presença de diversas doenças graves que acometiam

a população, como a varíola, a malária, febre amarela e, posteriormente, a peste, o que

acabou gerando sérias conseqüências tanto para saúde coletiva quanto para outros

setores, como o do comércio exterior, visto que os navios estrangeiros não mais queriam

atracar no porto do Rio de Janeiro em função da situação sanitária existente na cidade.

O então presidente do Brasil, Rodrigues Alves, nomeou Oswaldo Cruz Diretor

do Departamento Federal de Saúde Pública, que se propôs a erradicar a epidemia de

febre-amarela na cidade do Rio de Janeiro.

Foi criado um verdadeiro exército de 1.500 pessoas que passaram a exercer

atividades de desinfecção no combate ao mosquito, vetor da febre-amarela. A falta de

esclarecimentos e as arbitrariedades cometidas pelos “guardas-sanitários” causaram

revoltas na população.

Esse modelo de intervenção ficou conhecido como “campanhista”, e foi

concebido dentro de uma visão militar segundo a qual os fins justificam os meios e o

uso da força e da autoridade eram considerados os instrumentos preferenciais de ação

(POLIGNANO, 2009).

2 Assim denominada a instituição reguladora das profissões da área de saúde em Portugal e no Brasil, no

período compreendido desde a época da Colonia até 1828 quando o imperador Dom João VI extingue o

cargo de fisico-mor do império.

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A população, com receio das medidas de desinfecção, trabalho realizado pelo

serviço sanitário municipal, revoltou-se tanto que, certa vez, o próprio presidente

Rodrigues Alves chamou Oswaldo Cruz ao Palácio do Catete, pedindo-lhe para, apesar

de acreditar no acerto da estratégia do sanitarista, não continuar queimando os colchões

e as roupas dos doentes.

A onda de insatisfação se agravou com outra medida de Oswaldo Cruz, a Lei

Federal nº 1261, de 31 de outubro de 1904, que instituiu a vacinação anti-varíola

obrigatória para todo o território nacional. Surge, então, um grande movimento popular

de revolta que ficou conhecido na história como a “revolta da vacina”.

Apesar das arbitrariedades e dos abusos cometidos, o modelo campanhista

obteve importantes vitórias no controle das doenças epidêmicas, conseguindo inclusive

erradicar a febre amarela da cidade do Rio de Janeiro, o que fortaleceu o modelo

proposto e o tornou hegemônico como proposta de intervenção na área da saúde

coletiva durante décadas.

Nesse período, Oswaldo Cruz procurou organizar a diretoria geral de saúde

pública, criando uma seção demográfica, um laboratório bacteriológico, um serviço de

engenharia sanitária e de profilaxia da febre-amarela, a inspetoria de isolamento e

desinfecção e o instituto soroterápico federal, posteriormente transformado no Instituto

Oswaldo Cruz.

Para Bravo, (2001) foi em 1920 que Carlos Chagas, sucessor de Oswaldo Cruz,

reestruturou o Departamento Nacional de Saúde, então ligado ao Ministério da Justiça e

introduziu a propaganda e a educação sanitária na técnica rotineira de ação, inovando o

modelo campanhista de Oswaldo Cruz que era puramente fiscal e policial.

Criaram-se órgãos especializados na luta contra a tuberculose, a lepra e as

doenças venéreas. A assistência hospitalar, infantil e a higiene industrial se destacaram

como problemas individualizados. Expandiram-se as atividades de saneamento para

outros Estados além do Rio de Janeiro e criou-se a Escola de Enfermagem Anna Nery.

Enquanto a sociedade brasileira esteve dominada por uma economia

agroexportadora, apoiada na monocultura cafeeira, o que se exigia do sistema de saúde

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era, sobretudo, uma política de saneamento destinado aos espaços de circulação das

mercadorias exportáveis e a erradicação ou controle das doenças que poderiam

prejudicar a exportação. Por esta razão, desde o final do século passado até o início dos

anos 60, predominou o modelo do sanitarismo campanhista (MENDES, 1992).

Gradativamente, com o controle das epidemias nas grandes cidades brasileiras, o

modelo campanhista deslocou a sua ação para o campo e para o combate das

denominadas endemias rurais, dado ser a agricultura a atividade hegemônica da

economia da época. Este modelo de atuação foi amplamente utilizado pela Sucam

(Superintendência de Campanhas de Saúde Pública) no combate a diversas endemias

(Chagas, Esquistossomose, e outras), sendo esta posteriormente incorporada à Fundação

Nacional de Saúde.

1.2.3 O NASCIMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

Como se sabe, no início do século a economia brasileira era basicamente

agroexportadora, assentada na monocultura do café. A acumulação capitalista advinda

do comércio exterior tornou possível o início do processo de industrialização no país,

que se deu principalmente no eixo Rio-São Paulo.

Tal processo foi acompanhado de uma urbanização crescente e da utilização de

imigrantes, especialmente europeus, como mão-de-obra nas indústrias, visto que

possuíam grande experiência neste setor, já muito desenvolvido na Europa. Os operários

na época não tinham quaisquer garantias trabalhistas, tais como: férias, jornada de

trabalho definida, pensão ou aposentadoria.

Os imigrantes, particularmente os italianos, traziam consigo a história do

movimento operário na Europa e dos direitos trabalhistas que já tinham sido

conquistados pelos trabalhadores europeus e, assim, procuraram mobilizar e organizar a

classe operária no Brasil na luta pela conquistas dos seus direitos.

Em função das péssimas condições de trabalho existentes e da falta de garantias

de direitos trabalhistas, o movimento operário organizou e realizou duas greves gerais

no país, uma em 1917 e outra em 1919.

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Por meio desses movimentos os operários começaram a conquistar alguns

direitos sociais;

Em 24 de janeiro de 1923, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei Eloy

Chaves, marco inicial da previdência social no Brasil (BRASIL, 2012).

Na visão de Marques (2003), por meio dessa lei foram instituídas as Caixas de

Aposentadoria e Pensão (CAP’s).

A propósito desta lei devem ser feitas as seguintes considerações:

a lei deveria ser aplicada somente ao operariado urbano. Para que fosse aprovada

no Congresso Nacional, dominado na sua maioria pela oligarquia rural, foi

imposta a condição de que este benefício não seria estendido aos trabalhadores

rurais. Fato que na história da previdência do Brasil perdurou até a década de 60,

quando foi criado o FUNRURAL.

Outra particularidade refere-se ao fato de que as caixas deveriam ser organizadas

por empresas e não por categorias profissionais.

A criação de uma CAP também não era automática, dependia do poder de

mobilização e organização dos trabalhadores de determinada empresa para

reivindicar a sua criação.

A primeira CAP criada foi a dos ferroviários, o que pode ser explicado pela

importância que este setor desempenhava na economia do país naquela época e

pela capacidade de mobilização que a categoria dos ferroviários possuía.

A criação das CAP’s deve ser entendida, assim, no contexto das reivindicações

operárias no início do século, como resposta do empresariado e do Estado à crescente

importância da questão social (MENDES, 2003).

Em 1930, o sistema abrangia 47 caixas, com 142.464 segurados ativos, 8.006

aposentados, e 7.013 pensionistas.

1.2.4 PREVIDÊNCIA SOCIAL NO ESTADO NOVO

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No que tange a previdência social, a política do estado pretendeu estender a

todas as categorias do operariado urbano organizado os benefícios da previdência.

Dessa forma, as antigas CAP’s são substituídas pelos Institutos de Aposentadoria e

Pensões (IAP). Nesses institutos os trabalhadores eram organizados por categoria

profissional (marítimos, comerciários, bancários) e não por empresa (POLIGNANO,

2009).

Em 1933, foi criado o primeiro Instituto de Aposentadoria e Pensões: o dos

Marítimos (IAPM). Seu decreto de constituição definia, no artigo 46, os benefícios

assegurados aos associados:

a) aposentadoria;

b) pensão em caso de morte para os membros de suas famílias ou para os beneficiários,

na forma do art. 55;

c) assistência médica e hospitalar, com internação até trinta dias;

d) socorros farmacêuticos, mediante indenização pelo preço do custo acrescido das

despesas de administração.

§ 2o - O custeio dos socorros mencionados na alínea c não deverá exceder à importância

correspondente ao total de 8% da receita anual do Instituto, apurada no exercício

anterior, sujeita a respectiva verba à aprovação do Conselho Nacional do Trabalho.

Mendes (2003) destaca que, os IAP’s foram criados de acordo com a capacidade

de organização, mobilização e importância da categoria profissional em questão. Assim,

em 1933, foi criado o primeiro instituto, o de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos

(IAPM); em 1934, o dos Comerciários (IAPC) e dos Bancários (IAPB); em 1936, o dos

Industriários (IAPI) e, em 1938, o dos Estivadores e Transportadores de Cargas

(IAPETEL). Ainda segundo essa mesma autora, além de servir como importante

mecanismo de controle social, os IAP’s tinham, até meados da década de 50, papel

fundamental no desenvolvimento econômico deste período, como “instrumento de

captação de poupança forçada” por meio de seu regime de capitalização.

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Polignano (2009) salienta que, as seguidas crises financeiras dos IAP’s, e,

mesmo o surgimento de outros mecanismos captadores de investimentos,

principalmente externos, fizeram com que progressivamente a previdência social

passasse a ter importância muito maior como instrumento de ação político-eleitoreira

nos governos populistas de 1950-64, especialmente, pela sua vinculação clara ao Partido

Trabalhista Brasileiro (PTB), e a fase áurea de “peleguismo sindical”.

Até o final dos anos 50, a assistência médica previdenciária não era importante.

Os técnicos do setor a consideram secundária no sistema previdenciário brasileiro e os

segurados não faziam dela parte importante de suas reivindicações.

Em 1949, foi criado o Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência

(SAMDU) mantido por todos os institutos e as caixas ainda remanescentes.

1.2.5 SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL NOS ANOS 30 A 60

Na visão de Bertolozzi & Greco (1996) e Polignano (2009), na era do Estado

Novo poucas foram as investidas no setor da saúde pública, destacando-se:

- Em 1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, com desintegração das

atividades do Departamento Nacional de Saúde Pública (vinculado ao Ministério da

Justiça), e a pulverização de ações de saúde a outros diversos setores como: fiscalização

de produtos de origem animal que passa para o Ministério da Agricultura (1934);

higiene e segurança do trabalho (1942) que se vincula ao Ministério do Trabalho.

- Em 1941, instituiu-se a reforma Barros Barreto, em que se destacam as seguintes

ações:

instituição de órgãos normativos e supletivos destinados a orientar a assistência

sanitária e hospitalar;

criação de órgãos executivos de ação direta contra as endemias mais importantes

(malária, febre amarela, peste);

fortalecimento do Instituto Oswaldo Cruz, como referência nacional;

descentralização das atividades normativas e executivas por 8 regiões sanitárias;

destaque aos programas de abastecimento de água e construção de esgotos, no

âmbito da saúde pública;

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atenção aos problemas das doenças degenerativas e mentais com a criação de

serviços especializados de âmbito nacional (Instituto Nacional do Câncer).

A escassez de recursos financeiros associada à pulverização desses diversos órgãos

e setores, aos conflitos de jurisdição e gestão e superposição de funções e atividades, fez

com que a maioria das ações de saúde pública no Estado Novo se reduzisse a meros

aspectos normativos, sem efetivação no campo prático de soluções para os grandes

problemas sanitários existentes no país naquela época (BERTOLOZZI & GRECO,

1996).

Em 1953, foi criado o Ministério da Saúde, que, na verdade, limitou-se a um mero

desmembramento do antigo Ministério da Saúde e Educação sem que isto significasse

uma nova postura do governo e uma efetiva preocupação em atender aos importantes

problemas de saúde pública de sua competência.

1.2.6 O REGIME MILITAR E SUAS CONSEQUÊNCIAS PARA A SAÚDE

NACIONAL

A repressão militar seria incapaz de sozinha justificar por um longo tempo um

governo ditatorial. Diante deste quadro, o regime instituído procura atuar através da

formulação de algumas políticas sociais na busca de uma legitimação do governo

perante a população (BRAVO, 2001).

Visto que os Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP’s) eram limitados a

determinadas categorias profissionais mais mobilizadas e organizadas política e

economicamente, o governo militar procurou garantir para todos os trabalhadores

urbanos e os seus dependentes os benefícios da previdência social.

Segundo Nicz (1982), o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS),

produto da fusão dos IAP’s, sofreu forte influência dos técnicos oriundos do maior

deles, o IAPI. Esses técnicos, que passaram a história conhecidos como “os cardeais do

IAPI”, de tendências absolutamente privatizantes, criam as condições institucionais

necessárias ao desenvolvimento do “complexo médico-industrial”, característica

marcante deste período.

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A criação do INPS, conforme destacam Nicz (1982) e Bravo (2003), propiciou a

unificação dos diferentes benefícios ao nível do IAP’s. Na medida em que todo o

trabalhador urbano com carteira assinada era automaticamente contribuinte e

beneficiário do novo sistema, foi grande o volume de recursos financeiros capitalizados.

O fato do aumento da base de contribuição, aliado ao crescimento econômico da década

de 70, o chamado milagre econômico, do pequeno percentual de aposentadorias e

pensões em relação ao total de contribuintes, fez com que o sistema acumulasse um

grande volume de recursos financeiros.

Para Scorel (1998), ao unificar o sistema previdenciário, o governo militar se viu

na obrigação de incorporar os benefícios já instituídos fora das aposentadorias e

pensões. Um desses era a da assistência médica, oferecido pelos vários IAPs, sendo que

alguns já possuíam serviços e hospitais próprios.

O sistema desenvolvido pelos IAPs foi se tornando cada vez mais complexo

tanto do ponto de vista administrativo quanto financeiro dentro da estrutura do INPS, o

que acabou levando à criação de uma estrutura própria administrativa, o Instituto

Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), em 1978.

Com relação ao período do regime militar, segundo Polignano (2009), no campo da

organização da saúde pública no Brasil foram desenvolvidas as seguintes ações:

Promulgação do Decreto Lei 200 (1967), estabelecendo as competências do

Ministério da Saúde: formulação e coordenação da política nacional de saúde;

responsabilidade pelas atividades médicas ambulatoriais e ações preventivas em

geral; controle de drogas e medicamentos e alimentos; pesquisa médico-

sanitário.

Em 1970, criou-se a SUCAM (Superintendência de Campanhas da Saúde

Pública) com a atribuição de executar as atividades de erradicação e controle de

endemias, sucedendo o Departamento Nacional de Endemias Rurais (DENERU)

e a campanha de erradicação da malária.

Em 1975, foi instituído no papel o Sistema Nacional de Saúde, que estabelecia

de forma sistemática o campo de ação na área de saúde dos setores públicos e

privados, para o desenvolvimento das atividades de promoção, proteção e

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recuperação da saúde. O documento reconhece e oficializa a dicotomia da

questão da saúde, afirmando que a medicina curativa seria de competência do

Ministério da Previdência e a medicina preventiva de responsabilidade do

Ministério da Saúde.

Entretanto, o governo federal destinou poucos recursos ao Ministério da Saúde que,

dessa forma, foi incapaz de desenvolver as ações de saúde pública propostas, o que

significou na prática uma clara opção pela medicina curativa, mais cara e que, no

entanto, contava com recursos garantidos através da contribuição dos trabalhadores para

o INPS.

O fim do regime militar é marcado pelo movimento das “Diretas Já” e a eleição de

Tancredo Neves, fatos esses que geraram diversos movimentos sociais, inclusive na

área de saúde, que culminaram com a criação das associações dos secretários de saúde

estaduais (CONASS) ou municipais (CONASEMS), e com a grande mobilização

nacional por ocasião da realização da VIII Conferência Nacional de Saúde (Congresso

Nacional, 1986), a qual lançou as bases da reforma sanitária e do SUDS (Sistema Único

Descentralizado de Saúde). Esses eventos ocorreram concomitantemente com a eleição

da Assembléia Nacional Constituinte em 1986 e a promulgação da nova Constituição

em 1988.

De acordo com Polignano (2009) é necessario fazer aqui um pequeno corte nessa

seqüência para se entender como o modelo médico neo-liberal procurou se articular

nesse momento da crise. O setor médico privado que se beneficiou do modelo

médico-privativista durante quinze anos a partir de 64, tendo recebido nesse período

vultuosos recursos do setor público e financiamentos subsidiados, cresceu, desenvolveu-

se e “engordou”.

A partir do momento em que o setor público entrou em crise, o setor liberal

começou a perceber que não mais poderia se manter e se nutrir daquele e passou a

formular novas alternativas para sua estruturação. Direcionou o seu modelo de atenção

médica para parcelas da população, com destaque para a classe média e categorias de

assalariados, procurando por meio da poupança desses setores sociais organizar uma

nova base estrutural. Desse modo foi concebido um subsistema de “Atenção Médico-

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Supletiva” composta de cinco modalidades assistenciais: medicina de grupo,

cooperativas médicas, auto-gestão, seguro-saúde e plano de administração

(POLIGNANO, 2009).

1.2.b Saúde no Brasil e o SUS (Sistema Único de Saúde)

No que se refere ao Sistema Brasileiro de Saúde (SBS), Paim (2006, 2011)

salienta que esse é constituído por uma variedade de organizações públicas e privadas

estabelecidas em diferentes períodos históricos. No início do século XX, conforme já

destacado anteriormente, campanhas realizadas sob moldes quase militares implantaram

atividades de saúde pública. A natureza autoritária dessas campanhas gerou oposição de

parte da população, políticos e líderes militares. Tal oposição levou à Revolta da

Vacina, em 1904, episódio de resistência a uma campanha de vacinação obrigatória

contra a varíola sancionada por Oswaldo Cruz, o então Diretor Geral de Saúde Pública.

Cabe destacar que o modelo de intervenção do Estado brasileiro na área social data das

décadas de 1920 e 1930, quando os direitos civis e sociais foram vinculados à posição

do indivíduo no mercado de trabalho.

Ainda nas visões de Paim (2011) e Freire (2009), o SBS é formado por uma rede

complexa de prestadores e compradores de serviços que competem entre si, gerando

uma combinação público-privada financiada tanto por recursos públicos como por

recursos privados. O SBS apresenta três subsetores: o subsetor público, no qual os

serviços são financiados e providos pelo Estado nos níveis federal, estadual e municipal,

incluindo os serviços de saúde militares; o subsetor privado (com fins lucrativos ou

não), no qual os serviços são financiados de diversas maneiras com recursos públicos ou

privados; e, por último, o subsetor de saúde suplementar, com diferentes tipos de planos

privados de saúde e de apólices de seguro, além de subsídios fiscais. Os componentes

público e privado do sistema são distintos, mas estão interconectados, e as pessoas

podem utilizar os serviços de todos os três subsetores, dependendo da facilidade de

acesso ou de sua capacidade de pagamento (PAIM, 2011).

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Corroborando com a descrição da estrutura do SBS, Freire (2009) destaca que

este está segmentado em público e privado (figura 1). O sistema público, tal como

preconizado na Constituição nacional, busca garantir à população atenção integral,

acesso universal e gratuito às ações e serviços de saúde e envolve tanto os prestadores

públicos como os privados. Já o sistema privado abrange o sistema de saúde

suplementar (operadoras de planos, seguros de saúde, etc.) e o sistema de desembolso

direto, representado pelos serviços de saúde adquiridos em prestadores privados

mediante gastos diretos dos bolsos das pessoas ou das famílias.

Figura 1: O Sistema Brasileiro de Saúde

Fonte: Freire (2009)

No intuito de explicitar a atual estrutura do SBS, é necessário destacar que,

apesar da imensa relevância de outros eventos históricos para a estruturação do referido

sistema de saúde, a presente pesquisa, apoiada em diversos autores, considera que o

marco fundamental para a sua efetiva reestruturação foi a promulgação da Constituição

Brasileira de 1988, por meio do seu capítulo VIII da Ordem Social, na seção II referente

à Saúde, a qual, de acordo com Polignano (2001), buscou aplicar os conceitos de

Universalidade (acesso garantido à saúde a todas as pessoas; Equidade (igualdade da

assistência à saúde a todas as pessoas) e Integralidade (as pessoas são vistas como um

todo, para que as ações de saúde atendam a todas as suas necessidades) na criação de

um modelo de sistema de saúde voltado às reais necessidades da população.

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Sendo assim, conforme salientam Freire (2009) e OPAS (1998), o SBS passou

por uma profunda reestruturação a partir da Constituição Brasileira de 1988, nos seus

artigos 196 a 200, com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS)3 na tentativa de

instituir a universalidade de acesso público aos serviços de saúde em nosso país4. A

proposta de criação do SUS de caráter público, federativo, descentralizado, participativo

e de atenção integral foi de grande importância no contexto da saúde brasileira, pois

que, até então, o sistema vigente discriminava a população com relação à assistência à

saúde em três classes: aqueles com condições de pagar pelos serviços de saúde, por

meio de convênios ou de recursos próprios; os que tinham direito à assistência prestada

pela rede pública por serem contribuintes do Instituto Nacional de Assistência Médica

da Previdência Social (INAMPS), e os que não tinham condições financeiras nem

direito à assistência, pois não pertenciam ao mercado formal da economia. Esses

últimos disputavam a assistência médico-hospitalar prestada, principalmente, pelas

instituições filantrópicas. Apesar de o SUS ter sido definido pela Constituição de 1988,

esse somente foi regulamentado em 19 de setembro de 1990, por meio da Lei 8.080, a

qual definiu o seu modelo operacional, propondo a sua forma de organização e de

funcionamento.

Dessa forma, conforme Barros, Piola, Vianna (1996) e Brasil (2001), o SUS foi

regulamentado em 1990, constituindo-se em um conjunto de ações e serviços de saúde,

prestados por instituições públicas federais, estaduais e municipais ou por instituições

privadas contratadas, cujo principal objetivo é organizar um sistema público de saúde de

3 O SUS é definido pelo artigo 198 do seguinte modo:

“As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada, e constituem um

sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I. Descentralização , com direção única em cada esfera de governo;

II. Atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços

assistenciais;

III. Participação da comunidade:

Parágrafo único - o sistema único de saúde será financiado, com recursos do orçamento da seguridade

social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes”. 4 A luta pela instituição do SUS basicamente partiu da sociedade, cujas reinvindicações nortearam o

movimento conhecido por “Movimento Sanitarista”, as quais fundamentalmente foram apresentadas por

meio dos secretários municipais de saúde e foram catalisadas na 8ª Conferência Nacional de Saúde,

realizada em 1986.

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forma descentralizada, regionalizada e hierarquizada, visando garantir o acesso integral

da população a todos os níveis de atenção médico-hospitalar.

1.2.1. A CRIAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

Para um melhor entendimento das razões que levaram à criação do SUS, cabe

aqui alguns esclarecimentos a respeito de fatos e instituições relevantes desse processo.

Nesse sentido, de acordo com Brasil (2002) e Souza (2002), anteriormente a

criação do Sistema Único de Saúde (SUS), o Ministério da Saúde (MS), com o apoio

dos estados e municípios, desenvolvia quase que exclusivamente ações de promoção da

saúde e prevenção de doenças, com destaque para as campanhas de vacinação e controle

de endemias. Essas ações eram desenvolvidas com caráter universal, ou seja, sem

nenhum tipo de discriminação com relação à população beneficiária. Na assistência à

saúde, o MS apenas atuava por meio de poucos hospitais especializados nas áreas de

psiquiatria e tuberculose, além da ação da Fundação de Serviços Especiais de Saúde

Pública (FSESP) em algumas regiões específicas, com destaque para o interior do Norte

e Nordeste.

Souza (2002) destaca que a grande atuação do poder público nessa área se dava

por meio do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) que depois, como já

relatado, passou a ser denominado Instituto Nacional de Assistência Médica da

Previdência Social (INAMPS), autarquia do Ministério da Previdência e Assistência

Social criada pela lei 6.439 em 1977, cuja responsabilidade era prestar assistência à

saúde de seus associados, o que justificava a construção de grandes unidades de

atendimento ambulatorial e hospitalar, como também da contratação de serviços

privados nos grandes centros urbanos onde estava a maioria dos seus beneficiários.

Na visão de Tanaka et al. (1992), a criação do INAMPS acarretou um processo

de centralização técnico-administrativa das decisões no âmbito da assistência médica

individual de caráter curativo. Entretanto, esse tipo de assistência à saúde desenvolvida

pelo INAMPS beneficiava apenas os trabalhadores da economia formal, com “carteira

assinada”, e seus dependentes, ou seja, não tinha o caráter universal que passa a ser um

dos princípios fundamentais do SUS (BRASIL, 2002).

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O INAMPS aplicava nos estados, por meio de suas Superintendências

Regionais, recursos para a assistência à saúde de modo mais ou menos proporcional ao

volume de recursos arrecadados e de beneficiários existente. Portanto, quanto mais

desenvolvida a economia do estado, com maior presença das relações formais de

trabalho, maior o número de beneficiários e, consequentemente, maior a necessidade de

recursos para garantir a assistência a essa população. Dessa forma, o INAMPS aplicava

mais recursos nos estados das Regiões Sul e Sudeste, mais ricos, e nessas e em outras

regiões, em maior proporção nas cidades de maior porte. Essa diretriz na aplicação de

recursos intensificou a desigualdade já existente tanto entre as regiões quanto no interior

dos diversos estados. Por essa lógica, os Estados e Municípios mais ricos recebiam mais

recursos, enquanto os mais carentes amargavam sérias dificuldades e escassez em todo

o funcionamento do sistema de saúde. Nota-se que essa ambigüidade teve

conseqüências que podem ser observadas até os dias de hoje.

Ainda segundo Brasil (2002), em função da crise de financiamento da

Previdência, que começa a se manifestar a partir de meados da década de 70, o

INAMPS adotou várias providências para racionalizar suas despesas e começou, na

década de 80, a “comprar” serviços do setor público (redes de unidades das Secretarias

Estaduais e Municipais de Saúde), inicialmente por meio de convênios. A assistência à

saúde prestada pela rede pública, apesar do financiamento do INAMPS apenas para os

seus beneficiários, preservou o seu caráter de universalidade da clientela.

Tanaka et al. (1992) e Brasil (2002) salientam que, também nessa época, o

INAMPS passa a dar aos trabalhadores rurais, até então precariamente assistidos por

hospitais conveniados com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural

(FUNRURAL), um tratamento equivalente àquele prestado aos trabalhadores urbanos.

Mesmo com a crise que já se abatia sobre o INAMPS, essa medida significou uma

grande melhoria nas condições de acesso dessa população aos serviços de saúde,

particularmente na área hospitalar.

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37

Já no final da década de 80, conforme Souza (2002), o INAMPS adotou uma

série de medidas que o aproximaram ainda mais de uma cobertura universal de clientela,

dentre as quais se destaca o fim da exigência da Carteira de Segurado do INAMPS para

o atendimento nos hospitais próprios e conveniados da rede pública. Esse processo

culminou com a instituição do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS),

desenvolvido por meio da celebração de convênios entre o INAMPS e os governos

estaduais.

Dessa forma, sob a ótica de Souza (2002) e Brasil (2002) pode-se verificar que

se iniciava no Brasil um sistema de saúde com tendência à cobertura universal, mesmo

antes da aprovação da Lei 8.080 que instituiu o SUS. Esse fato foi motivado pela

crescente crise de financiamento do modelo de assistência médica da Previdência Social

existente no período e também pela forte mobilização política dos trabalhadores da

saúde, de centros universitários e de setores organizados da sociedade, que constituíam

o então denominado “Movimento da Reforma Sanitária”, no contexto da

democratização do país.

1.2.2 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

De acordo com o Brasil (2000), o SUS é formado pelo conjunto de todas as

ações e serviços de saúde prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais

e municipais, da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder

Público, sendo que é permitida a participação da iniciativa privada nesse sistema de

modo complementar.

Em termos gerais, segundo o Brasil (2000), o SUS é um sistema de saúde de

abrangência nacional, que coexiste na forma de subsistemas em cada estado (SUS

estadual), e em cada município (SUS municipal). Dessa forma, a totalidade das ações e

de serviços de atenção à saúde prestados pelo SUS é desenvolvida em um conjunto de

estabelecimentos organizados em rede regionalizadas e hierarquizadas, disciplinados

segundo os subsistemas municipais de saúde, voltados ao atendimento integral da

população local, devidamente integrados aos subsistemas estadual e nacional de saúde.

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Os estabelecimentos desses subsistemas municipais não obrigatoriamente

necessitam ser de propriedade da prefeitura local, tampouco necessitam ter sede no

território do município. Suas ações podem ser desenvolvidas pelas unidades estatais

(próprias, estaduais ou federais) ou privadas (contratadas ou conveniadas, com

prioridade para as entidades filantrópicas). Entretanto, essas ações devem estar

plenamente organizadas e coordenadas, de modo que o gestor municipal possa garantir

à população do respectivo município o total acesso aos serviços e meios para o

atendimento integral.

Conforme apresentado anteriormente, em se tratando do modelo de descentralização

adotado pelo SUS, sua estrutura define como gestores co-responsáveis os três níveis de

governo com mecanismos previstos para negociação e pactuação das políticas adotadas

na saúde. Nesse contexto, surgem as Comissões Intergestores Bipartites (CIBs) no

âmbito estadual e a Comissão Intergestores Tripartite (CIT) no âmbito nacional:

As CIBS - são compostas igualmente de forma partidária, sendo integrada pelas

representações da Secretaria Estadual de Saúde (SES) e do Conselho Estadual de

Secretários Municipais de Saúde (COSEMS) ou órgão equivalente. Um dos

representantes dos municípios é o secretário de saúde da capital. A Bipartite

pode operar com subcomissões regionais.

A CIT – é composta paritariamente por representantes do Ministério da Saúde

(MS), do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) e do

Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS).

Sendo assim, fica evidente que a responsabilidade de gestão do SUS é

solidariamente compartilhada entre municípios, estados, Distrito Federal e União, por

meio de seus respectivos órgãos gestores.

Outro órgão obrigatório e imprescindível para o funcionamento do SUS é o

Conselho de Saúde5, também estruturado nos três níveis de governo, ou seja, existe um

5 Conselho de Saúde é um órgão colegiado de caráter permanente e deliberativo, em cada esfera do

governo, integrante da secretária de saúde dos estados e municípios, com composição, organização e

competências visando consolidar a efetiva participação da sociedade organizada na discussão das

políticas de saúde e gestão do SUS. Como exemplo da importância dos Conselhos de Saúde na gestão do

SUS, salienta-se que, os municípios somente podem receber recursos do Ministério da Saúde, ou estarem

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conselho de saúde em cada município, denominado de Conselho Municipal de Saúde

(CMS); um em cada estado, que são os Conselhos Estaduais de Saúde (CES) e outro no

contexto federal, que é o Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Além dos órgãos, conselhos e secretarias de saúde devem ser observados outros

aspectos e agentes que apresentam relevância no Sistema de Saúde no Brasil. A seguir

serão apresentadas algumas evoluções e ambigüidades existentes no Sistema Brasileiro

de Saúde (SBS).

1.2.2.1 O SISTEMA DE IMUNIZAÇÃO E AS VACINAS

Segundo Gadelha & Temporão (1999), a partir da década de 1970 houve uma

intensificação no esforço internacional contra doenças de maior incidência por meio de

iniciativas de diversas agências, tais como a Organização Mundial de Saúde (OMS), o

Fundo das Nações Unidas para Criança (Unicef) e a Organização Pan-Americana de

Saúde (OPA). Os recursos e esforços internacionais conseguiram erradicar a varíola na

década de 1960 e contribuíram para o alcance da redução quase total da poliomielite, do

sarampo e do tétano neonatal em diversos países.

Conforme abordado anteriormente, a história da vacinação no Brasil teve inicio

em 1904 com a introdução da vacina contra a varíola. Ao longo do século XIX, esse foi

o principal mal a ser combatido. Em 1887, houve uma epidemia no Rio de Janeiro e em

1904 tornou-se obrigatória a vacinação contra a varíola. Essa campanha foi idealizada

por Oswaldo Cruz que enfrentou forte oposição daqueles que eram contra a

obrigatoriedade da vacina. O movimento conhecido como Revolta da Vacina conseguiu

que sua obrigatoriedade fosse revogada e seguiu-se uma epidemia que ocasionou a

morte de milhares de vítimas. Já nas primeiras décadas do século XX a febre amarela

preocupou os agentes de saúde. Em 1942, após muitos esforços do Estado, a febre

amarela urbana foi considerada erradicada.

Na década de 1960, houve o início da produção nacional de vacina contra a

varíola e se realizaram as primeiras campanhas com a vacina oral contra a poliomielite.

Em 1972, foi promovida a primeira campanha anti-sarampo. habilitados aos programas desse, somente se o conselho municipal existir e estiver em pleno

funcionamento (BRASIL, 2000).

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Com o objetivo de integrar as ações de imunizações realizadas no país, em 1973

o governo brasileiro criou o Programa Nacional de Imunizações (PNI). Dentre as

primeiras ações do programa, destacam-se a determinação do 1º calendário de

vacinação para crianças e gestantes e a realização de campanhas contra o sarampo em

diversos Estados brasileiros. Obteve-se ainda a Certificação Internacional da

Erradicação da Varíola no Brasil.

Em 1974, foi criado o Programa Ampliado de Imunização (PAI), vinculado a

OPAs e a OMS.

Desde a criação do PNI constatou-se significativo avanço no controle de doenças

classificadas como imunopreveníveis. Segundo relatório sobre o PNI da SAÚDE

(2003), além da varíola e da febre amarela, em 1989 conquistou-se a erradicação da

poliomielite. O relatório também apontou outras conquistas importantes, dentre as quais

se destacam a grande redução nos anos 1990 do sarampo e o sucesso das campanhas de

vacinação contra a gripe. Observa-se que na área de imunização houve grande avanço e

diminuição de epidemias.

1.2.2.2 MEDICAMENTOS GENÉRICOS

Outra área de destaque diz respeito aos medicamentos genéricos. Sob a ótica de

Vandergrift et al. (1997), as políticas de saúde e as políticas industriais enfrentam

claros conflitos já em seus objetivos primeiros: o governo, ao mesmo tempo em que

busca a contenção dos custos para fazer frente aos orçamentos crescentes da saúde, é

responsável pelo apoio à indústria, dentre elas as da saúde. Sua integração, entretanto, é

tão delicada como necessária, dado que o segmento de assistência à saúde e os

segmentos industriais que o abastecem são elos de uma mesma cadeia produtiva. Nesse

sentido, Gadelha, Quental e Fialho (2003) salientam que a favor dessa integração está

ainda o fato de o governo desempenhar papel forte na dinâmica desses setores, através

da prestação de serviços assistenciais, da compra de bens e serviços e das atividades

regulatórias, que delimitam as estratégias dos agentes econômicos. No Brasil, segundo

Brasil (1990) são responsabilidades do Estado a formulação e execução de políticas

econômicas e sociais que visem estabelecer condições que assegurem acesso universal

às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde. Neste contexto se

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insere a política nacional de medicamentos, cujo propósito, conforme Brasil (1998) é

garantir o acesso da população aos medicamentos considerados essenciais, bem como a

sua necessária segurança, eficácia e qualidade.

Dentre as estratégias para a promoção do acesso a medicamentos, encontra-se a

política de medicamentos genéricos, que são, em geral, mais baratos que os

medicamentos inovadores devido, em grande parte, ao fato de não recaírem sobre o

genérico os custos relativos ao desenvolvimento da nova molécula e dos estudos

clínicos necessários. Outro fator que contribui para um custo mais baixo é o menor

investimento em propaganda para tornar a marca conhecida. De acordo com Brasil

(2000), os medicamentos genéricos são medicamentos similares a um produto de

referência ou inovador, que pretende ser com esse intercambiável, geralmente produzido

após a expiração ou renúncia da proteção por patente ou de outros direitos de

exclusividade, comprovada a sua eficácia, segurança e qualidade.

De acordo com Universia-Knowledge (2006), a história dos genéricos no Brasil

teve início a partir da definição da Lei de Patentes, que regulamentou o instituto das

patentes no país, dando caráter internacional a essa noção de que há direitos de

exploração sobre um determinado produto, serviço ou ideia inovadora. Diante da

proteção aos direitos dos detentores de patentes, o governo brasileiro decidiu

regulamentar o setor de medicamentos, um dos mais criticados até então por não

respeitar os direitos internacionais. Em 1999, o governo aprovou a Lei dos Genéricos,

permitindo às empresas fabricar legalmente medicamentos que são cópias perfeitas das

drogas cujo prazo de patente expirou. O resultado foi a introdução dos genéricos no

Brasil, uma situação que incomodou, de início, os grandes laboratórios.

Conforme Brasil (1998, 2000), a regulamentação da Lei dos Genéricos por meio de uma

Resolução da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA), em 1999, possibilitou, naquele momento, a introdução de conceitos nunca

antes empregados para o registro de um medicamento no Brasil, como, por exemplo, a

equivalência farmacêutica (comprovada por ensaios in vitro) e a bioequivalência

(comprovada por ensaios in vivo). Desse modo, a Lei dos Genéricos estabeleceu um

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novo padrão para o desenvolvimento e o registro de medicamentos no país. Em um país

repleto de desigualdades e com grande parte de sua população com baixa renda, a

implementação dessa política pública possibilitou um significativo acesso a

medicamentos para parcela importante da população.

Os medicamentos genéricos devem apresentar o mesmo fármaco, na mesma

quantidade e forma farmacêutica do medicamento eleito como referência, ou seja,

devem ser caracterizados como um equivalente farmacêutico do medicamento de

referência, devendo também cumprir os requisitos dos estudos de bioequivalência. O

medicamento de referência é, geralmente, o inovador cuja biodisponibilidade foi

determinada durante o desenvolvimento do produto e que teve sua eficácia e segurança

comprovadas por meio de ensaios clínicos antes da obtenção do registro para

comercialização (BRASIL, 2000).

A implantação da política de genéricos no Brasil, iniciada em 1999, meses após

a criação da ANVISA, segundo Maciel et al. (2010) refletiu um esforço do Ministério

da Saúde de reduzir significativamente os custos da terapia farmacológica por meio dos

medicamentos genéricos, possibilitando acesso de maior parcela da população aos

tratamentos. Além disso, a instituição de uma política de genéricos visava também

disponibilizar ao mercado brasileiro medicamentos com qualidade assegurada, tendo em

vista sua intercambialidade com o medicamento de referência que, em geral,

corresponde ao medicamento inovador registrado após a comprovação de sua eficácia e

segurança.

Entretanto, para Quental et al (2008) e Maciel et al. (2010), a promulgação da

Lei dos Genéricos tornou necessária a sua regulamentação técnica para normatizar os

procedimentos adequados aos estudos de bioequivalência. Após essa primeira

regulamentação, observou-se que a ANVISA adotou um processo de revisão constante,

que culminou na publicação de novas resoluções que visavam à introdução de novos

procedimentos ou ao aprimoramento daqueles já existentes.

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Em síntese, a política de genéricos se mostrou acertada, permitiu ganhos

estáticos de aumento da oferta e redução de preços, mas ainda deve avançar no sentido

de sua contribuição para a superação das duas lacunas centrais do complexo industrial

da saúde: a base empresarial local de inovação e o comprometimento com as condições

de saúde da população brasileira.

1.2.2.3 AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITÁRIA

(ANVISA)

Corroborando com as afirmações anteriores, Pimenta (2004) destaca que as

ações voltadas ao controle sanitário do exercício da medicina e da farmácia, da

produção, circulação e venda de produtos de interesse da saúde, assim como da

circulação de pessoas, apresentam, no Brasil, uma trajetória vinculada à constituição dos

serviços sanitários iniciada no começo do século XIX, com a instalação da Corte

portuguesa, em 1881. Desde então, foram criados um imenso conjunto normativo e

vários órgãos públicos destinados a esses serviços, em resposta às características de

ordem econômica, política, institucional, sociosanitária e técnico-científica, nos diversos

contextos. Entretanto, a singularidade desses serviços somente se consolidou como um

saber específico na área da Saúde Coletiva no final do século XX, requerendo para tanto

trabalhadores com formação especializada (COSTA, 2004).

Assim sendo, de acordo com Costa (1999), Vigilância Sanitária (VISA) pode ser

entendida como subárea da Saúde Coletiva e campo singular de articulações complexas

entre o domínio econômico, o jurídico-político e o médico-sanitário, englobando

atividades de natureza interdisciplinar, multiprofissional e interinstitucional. Suas ações

preventivas e de caráter regulatório perpassam todas as práticas médico-sanitárias e

demandam conhecimentos de diversas áreas do saber que se intercomplementam de

forma articulada. Ainda na visão de Costa (2004), as funções de VISA envolvem o

controle de riscos de variados objetos, tanto aqueles que respondem às necessidades

sociais em saúde, quanto outros desenvolvidos pelo mercado para necessidades

artificialmente criadas. Tais funções são compartilhadas com os diferentes níveis de

gestão do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), componente do Sistema

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Único de Saúde (SUS) e outros setores institucionais, como Agricultura e Pecuária,

Meio Ambiente e Trabalho.

Para tal, no Brasil, foi criada pela Lei 9.782 de janeiro de 1999, a Agência

Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), visando proteger a saúde do cidadão, por

meio do controle sanitário da produção e comercialização de produtos e serviços

submetidos à vigilância sanitária. Esse órgão também exerce controle de portos,

aeroportos e fronteiras e faz a interlocução do Ministério das Relações Exteriores com

instituições estrangeiras para tratar de assuntos internacionais na área de vigilância

sanitária. É uma autarquia vinculada ao Ministério da Saúde e trabalha em regime

especial, caracterizado pela independência administrativa, estabilidade de seus

dirigentes e autonomia financeira. A gestão da ANVISA está sob responsabilidade de

uma Diretoria Colegiada, composta por cinco membros, e abre espaços para a sociedade

opinar sobre assuntos importantes na área da saúde e garantir a transparência na atuação

regulatória (ANVISA, 2012).

Conforme Brasil (1999), a ANVISA, primeira agência reguladora na área social

do país, é responsável pela execução de um conjunto de atribuições no âmbito federal e

coordenação do SNVS. Surgiu em 1999, no contexto da reforma gerencial do Estado

brasileiro, cuja política foi expressa no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do

Estado. Esse plano buscava a evolução do modelo burocrático de administração, focado

em padrões hierárquicos rígidos e no controle de processos, para um modelo de

administração gerencial, baseado na eficiência, controle de resultados e atendimento

com qualidade ao cidadão. Essa agência reguladora deveria substituir a estrutura

burocrática e ultrapassada da Secretaria ministerial de Vigilância Sanitária, combater os

graves e históricos problemas sanitários nacionais relacionados a produtos e serviços e

fornecer respostas mais ágeis ao mercado globalizado.

Para Costa (1999), o novo modelo organizacional instituído pela ANVISA foi

caracterizado pela independência administrativa, estabilidade de dirigentes e autonomia

financeira, características essas que propiciaram uma maior autonomia para a realização

de ações em prol da saúde dos cidadãos.

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1.2.2.4 SANEAMENTO BÁSICO E SAÚDE

Um aspecto diretamente relacionado à Saúde e que afeta o SBS como um todo é

o saneamento básico. Sob a ótica de Souza (2002), o saneamento básico, em seu sentido

lato, abrange um conjunto de ações que o homem estabelece para manter ou alterar o

ambiente, no sentido de controlar doenças, promovendo saúde, conforto e bem-estar.

Incorpora, pois, políticas de abastecimento d’água, esgotamento sanitário, sistemas de

drenagem, coleta e tratamento dos resíduos sólidos. Reflete e condiciona diretamente a

qualidade de vida determinada historicamente através de políticas públicas envolvendo

aspectos socioeconômicos e culturais e mantendo uma interface com as políticas de

saúde, meio ambiente e desenvolvimento urbano.

Ainda segundo Souza (2002), o saneamento básico deve ser incluído, pois, no

conjunto dos indicadores de qualidade de vida. Além de cuidar da água, esgoto e

resíduos sólidos, o saneamento básico envolve, também, ações referentes à recuperação

de mananciais e de reservatórios d’água poluídos, eliminando-se as fontes

contaminadoras, a drenagem pluvial por meio de galerias fechadas ou a céu aberto, a

implantação e manutenção de parques urbanos e aos problemas da sub-habitação.

Já para Philippi Jr. (2004), tendo em vista a definição elaborada pela

Organização Mundial de Saúde (OMS), saneamento básico é entendido como o

gerenciamento ou controle dos fatores físicos que podem exercer efeitos nocivos ao

homem, prejudicando seu bem-estar físico, mental e social.

Em se tratando da íntima relação existente entre Saneamento Urbano e Saúde,

Rosen (1994) salienta que o reconhecimento da importância do saneamento básico e de

sua associação com a saúde humana remonta às mais antigas culturas. Nesse sentido,

ruínas de uma grande civilização ao Norte da Índia, com mais de 4.000 anos, indicam

evidências da existência de hábitos higiênicos, incluindo a presença de banheiros e

sistemas de coleta de esgotos sanitários nas edificações, além da drenagem nos

arruamentos. Já os egípcios dispunham de sistemas de drenagem de água e grandes

aquedutos. Destacam-se também os cuidados com o destino dos dejetos na cultura

creto-micênica e as noções de engenharia sanitária dos romanos.

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Mais de um bilhão de habitantes na Terra não têm acesso à habitação segura e a

serviços básicos, embora todo ser humano tenha direito à uma vida saudável e

produtiva, em harmonia com a natureza. No Brasil, as doenças resultantes da falta ou de

um inadequado sistema de saneamento, especialmente em áreas pobres, têm agravado o

quadro epidemiológico (BRASIL, 2006).

No Brasil, no início da década de 1990, a Lei 8.080 que dispõe sobre o

funcionamento dos serviços de saúde no país, reconheceu em seu artigo III que a saúde

tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, o saneamento básico.

Logo, houve o reconhecimento legal da existência de uma relação de causalidade entre

condições inadequadas de saneamento básico e o quadro epidemiológico existente

(BRASIL, 1990).

Mais recentemente, conforme Brasil (2007), a Lei 11.4456, chamada Lei do

Saneamento Básico, estabeleceu que os serviços públicos de saneamento básico serão

prestados com base em 12 princípios fundamentais, destacando-se: a universalização do

acesso; a integralidade dos diversos serviços de saneamento básico; a prestação dos

serviços de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos

resíduos sólidos realizados de formas adequadas à saúde pública e à proteção do meio

ambiente; e a disponibilidade, em todas as áreas urbanas, de serviços de drenagem e

manejo das águas pluviais adequados à saúde pública e à segurança da vida e dos patri-

mônios público e privado.

Cabe destacar que, segundo Guimarães, Carvalho, Silva (2007) e o PNUD

(2006b), na atualidade o benefício mais difundido do saneamento básico está

relacionado com sua característica de prevenção. Estudos comprovam que para,

aproximadamente, cada 1 real investido em saneamento básico, tem-se uma economia

de 4 reais com assistência médica. Com o acesso à água potável e condições mínimas de

higiene, inúmeras doenças podem ser evitadas, dispensando o tratamento e todos os

custos implicados.

6 Lei que foi regulamentada pelo então presidente Lula, por decreto nº 7217 no dia 21/06/2010, após

quase dez anos de discussões no Congresso.

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Com relação ao cenário internacional, dados preliminares do segundo relatório

da ONU sobre o recursos hídricos no mundo apontam que aproximadamente 2,4 bilhões

de pessoas não têm condições básicas de saneamento, o que multiplica o número de

mortes por diarréia e malária. Esses dados alertam que a precariedade do saneamento

reflete na situação da saúde global. Segundo a United Nations Educational, Scientific

and Cultural Organization (UNESCO), enfermidades relacionadas à diarréia e à malária

podem matar, em média, anualmente, cerca de mais de 3,5 milhões de pessoas pelo

mundo. A UNESCO afirma ainda que aproximadamente 1,6 milhões de vidas poderiam

ser salvas anualmente com o fornecimento de água potável, saneamento básico e

higiene (PNUD, 2006a, 2006b).

Nota-se com esses órgãos e iniciativas avanços e esforços em diversas áreas para

promoção da saúde. Por outro lado, há diversas reclamações e insatisfação,

especialmente das classes menos favorecidas. Faltam médicos em diversas regiões,

costumeiramente greves afetam o setor, há um sucateamento das instalações, diversos

hospitais apresentam sérias dificuldades para se manter em funcionamento. Essas

ambigüidades serão detalhadas no próximo capítulo dessa tese.

1.2.c SISTEMA PRIVADO DE SAÚDE BRASILEIRO

A assistência médica suplementar constitui parte significativa do mercado de

serviços privados de saúde no Brasil7 e, na década de 1990, apresentou crescimento

expressivo, pari passu à implantação do Sistema Único de Saúde (ALMEIDA, 1998).

Para delimitar a área sob análise, o que caracteriza o mercado de serviços

privados de saúde é a natureza mercantil-contratual das relações entre atores que, por

sua vez, confere à demanda caráter seletivo. Segundo Burgos et al. (1991) e Medici

7 Em seu trabalho pioneiro, Médici (1991a) identificou os seguintes segmentos no mercado privado de

saúde no Brasil: 1) segmento privado contratado pelo setor público, que são clínicas (ambulatoriais e de

exames complementares para diagnóstico) e hospitais (lucrativos e filantrópicos) que vendem serviços

para atendimento de uma clientela indiferenciada; 2) segmento médico assistencial das empresas que, por

meio de diversas modalidades, atendem a clientelas específicas vinculadas ao mercado formal de

trabalho; 3) segmento médico assistencial das famílias, cujas modalidades, atendem a indivíduos e/ou

famílias que voluntariamente compram serviços diretamente aos prestadores ou estabelecem contratos por

meio de planos e seguros de saúde; e 4) segmento beneficente filantrópico, voltado para clientelas abertas

e fechadas.

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(1991, 1994), nessa perspectiva, o mercado de serviços privados de saúde é composto

pelas formas de produção e gestão da assistência médico-hospitalar que têm por

objetivo atender a determinada demanda ou clientela restrita.

Portanto, a exigência básica é o pagamento pela utilização dos serviços (ou seja,

é a sua compra), que pode assumir diferentes modalidades, desde as mais tradicionais,

compra direta pelo usuário ao prestador de serviços, até as mais complexas, que

envolvem a intermediação de terceiros, contratos entre indivíduos-famílias/ empresas

com a medicina de grupo, cooperativas médicas e seguradoras, além dos programas

suplementares de saúde autogeridos por empresas empregadoras (públicas e privadas).

Com relação às principais formas de serviços privados de assistência de saúde

disponíveis no Brasil, Almeida (1998) aponta que esses podem ser classificados em:

a) Medicina de Grupo: constituída por empresas médicas que administram planos de

saúde para empresas, indivíduos ou famílias, e trabalham com vários tipos de planos. É

a forma dominante no mercado. A abrangência das empresas de medicina de grupo em

geral é regional e os maiores grupos atuam nas grandes cidades. A estrutura de

atendimento compõe-se de serviços próprios e credenciados, sendo que as diferentes

empresas combinam ou não as duas formas de oferta. O acesso à rede própria ou

credenciada é livre e o uso de serviços não credenciados é previsto nos planos mais

caros, implicando o ressarcimento dos gastos segundo valores calculados por múltiplos

da tabela da Associação Médica Brasileira (AMB) e da Associação Brasileira de

Hospitais (ABH), o que não garante a reposição total das despesas efetuadas.

b) Cooperativas Médicas: é a modalidade em que os médicos são simultaneamente

sócios e prestadores de serviços e recebem pagamento de forma proporcional à

produção de cada um (tipo e quantidade de atendimento), valorada segundo a tabela da

Associação Médica Brasileira (AMB), além de que participam do rateio do lucro final

obtido pelas unidades municipais. Operam com planos de pré-pagamento e a maioria de

seus beneficiários é proveniente de convênios-empresa.

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c) Planos de Saúde Próprios das Empresas: são aqueles em que as empresas ou

administram programas de assistência médica para seus funcionários (autogestão) ou

contratam terceiros para administrá-los (co-gestão ou planos de administração). Na

maior parte dos casos das empresas/instituições estatais e da administração pública, os

programas são geridos pelas próprias empresas ou por instituições privadas sem fins

lucrativos (caixas e fundações), promovidas e mantidas pelas empresas/instituições

(patrocinadoras) juntamente com seus funcionários. Em geral, a autogestão combina a

compra de serviços de saúde administrada pela própria empresa com outras

modalidades e algumas empresas ainda acrescentam o auto-seguro para contornar a

ampliação dos limites para uso da livre escolha e a cobertura adicional para

aposentados. Em ambos os casos o ônus adicional é coberto pelo empregado.

d) Seguro-Saúde: trata-se da modalidade em que há intermediação financeira de uma

entidade seguradora que cobre ou reembolsa gastos com assistência médica, ao

prestador ou ao segurado, segundo as condições estabelecidas em contrato. Sendo

assim, as seguradoras não seriam prestadoras de serviços, mas cobririam os custos por

ocasião de sinistros relativos à saúde, segundo a apólice de seus segurados. Os produtos

das seguradoras são apólices, que se transformam em prêmios pagos aos beneficiários

do sistema de acordo com o valor de ressarcimento estabelecido em contrato. A atual

legislação faculta às seguradoras o credenciamento de prestadores e os convênios com

empresas, associações profissionais e/ou grupos específicos.

Para Almeida (1998), de uma forma geral, todas as modalidades mencionadas

anteriormente, em maior ou menor medida, prestam assistência por meio de serviços

tanto próprios quanto credenciados, assim como reembolsam as despesas efetuadas

pelos usuários com prestador de sua livre escolha segundo valores estabelecidos em

tabela ou um teto anual por usuário. Isso é válido, porém, apenas para a atenção

ambulatorial, pois a assistência hospitalar tem regras mais rígidas, tanto no que se refere

à livre escolha quanto ao reembolso. Na realidade, a restrição aos serviços próprios ou

contratados e a combinação com a possibilidade do reembolso são o que distingue um

plano do outro, em uma mesma modalidade e determina também os diferentes preços,

conseqüentemente, a segmentação interna de clientela em uma mesma modalidade.

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50

Todavia, a atenção hospitalar de alta complexidade, internações de longo prazo e

doenças crônicas, em razão das restrições impostas pelos planos, acabam por ser

prestadas pelo setor público, principalmente naqueles casos em que o paciente não tem

condições financeiras de bancar o custo adicional por seus próprios meios.

1.2.1 O IMPACTO DOS PLANOS DE SAÚDE NO SISTEMA

PRIVADO BRASILEIRO

De importância vital para a expansão e investimentos do mercado de saúde

nacional, os planos de saúde exercem enorme impacto no sistema privado de saúde,

pois, de certa forma, quanto maior é o número de beneficiários dos planos de saúde,

menor é a pressão de atendimento no SUS (MINISTÉRIO DA SAÚDE BRASIL,

2012).

Conforme o Ministério da Saúde do Brasil (2012), esse cenário se iniciou há 12

anos, com o surgimento da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que ficou

responsável pela regulamentação do setor e proporcionou um crescimento desse

mercado8, haja vista que, mesmo com o total de operadoras ligeiramente reduzido de

1.418, em 2003, para 1.386, em 2011, o número de beneficiários dos planos de saúde

cresceu cerca de 50% nesses últimos oito anos, atendendo a quase 48 milhões de

beneficiários e registrando um faturamento de R$ 81,3 bilhões, três vezes maior que em

2003. Esses dados demonstram, de modo consistente e ininterrupto, forte demanda

pelos serviços privados e uma clara indicação de que os serviços prestados pelo SUS

não atendem as expectativas e anseios de boa parte dos cidadãos.

8 O crescimento de 4,2% em relação ao mesmo mês do ano anterior (2010) é bem inferior ao observado

entre dezembro/2009 e dezembro/2010 (8,5%). O crescimento no trimestre de 1,04% (setembro/2011 a

dezembro/2011), entretanto, demonstra uma recuperação do crescimento do mercado, o qual apresentava

reduzidas taxas desde o primeiro trimestre de 2011 (BRASIL, 2012).

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51

Tabela 1: Beneficiários dos planos privados de saúde (2000-2011)

Data Beneficiários

Fonte: Ministério da Saúde Brasil (2012)

A tabela a seguir mostra a evolução ano a ano desde 2000 das receitas de

contraprestações e das despesas assistenciais. Nota-se que os dois indicadores crescem

de modo consistente e indicam significativo crescimento no dispêndio de recursos com

a saúde.

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52

Tabela 2: Receita (R$) de contraprestações e despesa assistencial das operadoras

de planos de saúde (2000-2011)

Fonte: Ministério da Saúde do Brasil (2012)

Em termos gerais, hoje no Brasil existem dois grandes tipos de planos de saúde:

1) Individual ou familiar – o próprio beneficiário escolhe as características

desejadas e faz a contratação diretamente com a operadora.

2) Coletivos – aqui, o beneficiário é incluído em um plano de saúde contratado por

uma empresa ou órgão público (coletivo empresarial), associação profissional,

sindicato ou entidade profissional (coletivo por adesão). Nesses casos, um

representante negocia e define as características gerais e cabe ao beneficiário

avaliar a compatibilidade entre seus interesses pessoais e os da organização que

fez o contrato.

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53

Tabela 3: Taxa de variação do número de beneficiário por tipo de contratação

Fonte: Ministério da Saúde do Brasil (2012)

A tabela 4 (a seguir) apresenta a distribuição de planos privados por faixa etária.

Nota-se que a maior parte dos beneficiários (cerca de 72,4%) possui até 39 anos.

Observa-se que os planos privados preferem e estimulam a comercialização para a

população mais jovem, uma vez que ela utiliza os serviços disponíveis de modo mais

esporádico do que a população mais madura e idosa. Assim, maiores lucros são obtidos

pelas operadoras dos planos.

Essa é uma importante contradição do sistema, uma vez que a população que

inspira mais cuidados e que demanda maior número de atendimentos e procedimentos

não interessa, do ponto de vista comercial, às empresas que vendem planos privados de

assistência médica. Em outras palavras, quanto mais idoso (a) a pessoa fica, mais difícil

se torna o seu acesso da mesma aos planos privados. Esse aspecto reforça a importância

do SUS que, além de atender a grande massa de cidadãos que não tem acesso aos planos

privados, atende também as populações madura e idosa, as que mais necessitam de

atendimento médico hospitalar.

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Tabela 4: Beneficiários de planos privados de assistência médica por sexo e faixas

etárias.

Faixa Etária (anos) Homem (milhões) Mulher (milhões) Total (milhões)

0 – 9 3,24 3,12 6,39

10 – 19 2,95 2,94 5,89

20 – 29 4,42 4,82 9,24

30 – 39 4,31 4,83 9,14

40 – 49 3,18 3,55 6,73

50 – 59 2,26 2,66 4,92

60 – 69 1,18 1,58 2,76

70 -79 0,62 0,97 1,59

Maior ou igual a 80 0,30 0,59 0,89

Fonte: Adaptado de Ministério da Saúde do Brasil (2012)

A gestão, a estruturação e a operacionalização dos sistemas de saúde

representam um dos maiores desafios para os gestores públicos. Diversos países,

inclusive os classificados como desenvolvidos, enfrentam dificuldades e obstáculos

complexos para atender com dignidade suas respectivas populações. Considerando-se a

situação brasileira, observa-se que alguns passos foram dados nas últimas décadas, mas

ainda há muito por fazer, especialmente para a população mais carente e distante dos

grandes centros. No próximo capítulo serão detalhados os hospitais, uma vez que é no

espaço dos hospitais que acontece a maior parte da prestação dos serviços.

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55

CAPÍTULO II – OS HOSPITAIS NO SISTEMA BRASILEIRO DE

SAÚDE

Os hospitais estão no centro dos cuidados da saúde no Brasil. Afirma Boff

(2002) que o que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado. Complementa o autor

que cuidar é uma atitude de ocupação, preocupação, responsabilização e de

envolvimento afetivo com o outro.

Quando está doente, boa parte dos brasileiros vai diretamente para o hospital na

falta de um “médico da família” ou de uma rede primária de atendimento. Os hospitais

representam parte crítica do orçamento do governo, absorvendo aproximadamente 70%

das despesas públicas em saúde (FORGIA & COUTTOLEC, 2009). Ainda na visão

desses autores, as instituições hospitalares lideram a prestação de serviços de saúde e

empregam os principais profissionais da área no País. Observa-se também que é no

espaço hospitalar que novas tecnologias são adotadas e treinamentos para capacitação

profissional são realizados. Ademais, os hospitais influenciam o fluxo e refluxo das

carreiras de políticos quando as suas mazelas chegam às manchetes dos jornais ou os

refletores recaem sobre eles com alto ou baixo desempenho. Assim, os hospitais estão

na vanguarda das discussões políticas no Brasil. As discussões refletem a promessa dos

hospitais como centros de inovação tecnológica e avanços médicos, bem como a

unânime preocupação com relação ao seu custo e qualidade. Os hospitais brasileiros são

importantes para muitas pessoas por diferentes motivos. Embora seja fácil compreender

o que torna os hospitais importantes, é mais difícil entender o que os leva a prestarem

um atendimento de qualidade de forma eficiente ou não. Antes da análise do contexto

brasileiro faz-se necessária a apresentação de uma abordagem histórica do tema.

2.1 Contexto Histórico

A palavra hospital é de raiz latina (Hospitalis) e de origem relativamente

recente. Vem de hospes – hóspedes, porque antigamente nessas casas de assistência

eram recebidos peregrinos, pobres e enfermos. O termo hospital tem hoje a mesma

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56

acepção de nosocomium, de fonte grega, cuja significação é – tratar os doentes – como

nosodochium quer dizer receber os doentes.

Hospitium era chamado o lugar em que se recebiam hóspedes. Desse vocábulo

derivou-se o termo hospício. A palavra hospício foi indicada para os estabelecimentos

ocupados por pobres, insanos e incuráveis. Sob a denominação de hospital ficaram

designados os locais para tratamento temporário dos enfermos.

Desde o antigo Egito o hospital significa um espaço especial, pois era

representado pelo templo de Saturno e o médico era tido em alta conta. Na Odisséia

(Livro IV-182), Homero afirma que os médicos excediam todos os homens:

“De fono Egípcia espôsa, cuja terra

Os reproduz saudáveis ou nocivos

E onde o médico excede os homens todos

E de Peon descende. Helena exclama,

Preparada a poção: “De heróis procedem,

Sim, divo Menelao; mas poderoso

Dispensa o Eterno as máguas e os prazeres.

Discursando o festim saboremos;”

Já no antigo Egito a medicina era subdividida em especialidades e cada médico

tratava uma determinada especialidade. Médicos eram mantidos pelo Estado para tratar

os enfermos durante as guerras e as viagens. O mesmo acontecia com os exércitos

romanos, pois estes exigiam cuidados médicos. Nas viagens de navio, por exemplo,

havia constante presença desses profissionais que tinham o posto de “profissional”,

respondendo diretamente para o comandante.

Os hospitais militares romanos tinham cozinha, farmácia e enfermarias que se

comunicavam por corredores com um pátio central quadrangular. Foram encontradas

ruínas dessas instituições próximas das margens do rio Danúbio. Outras cidades da

Europa, como Viena, na Áustria, e Baden, na Suíça, apresentavam estruturas

semelhantes.

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57

Na Idade Média, houve forte influência religiosa na constituição das instituições

hospitalares. Diversas congregações religiosas católicas desenvolveram projetos de

assistência hospitalar sob várias denominações, tais como os beneditinos e os

seguidores de São Vicente de Paula.

Com o passar dos anos, os monges passaram a exercer a prática médica fora dos

conventos, atendendo ao chamado da comunidade. O Concílio de Viena, reunido em

1312, determinou que o tratamento dos enfermos não seria realizado por religiosos e

sim por leigos, cabendo aos religiosos a assistência espiritual.

Nos séculos seguintes, houve altos e baixos na evolução e no crescimento das

instituições hospitalares em função de movimentos, como a Reforma, quando alguns

retrocessos foram verificados. O consistente desenvolvimento científico a partir do

século XVII alavancou também a área da saúde com inovações no atendimento

hospitalar e nas construções com separação dos enfermos em pavimentos previamente

planejados.

O século XVIII foi marcado pelas grandes construções hospitalares,

especialmente na França. Já naquela época, a Academia de Ciências de Paris elaborou

recomendações, dentre as quais se destacam:

1- Redução do número de leitos de cada hospital – 1200 leitos (máximo);

2- Redução do número de leitos de cada enfermaria;

3- Maior isolamento de salas, umas das outras;

4- Nova disposição das salas de modo a permitir a abertura de todos os lados para

renovação do ar;

5- Colocação dos pavilhões em ordem paralela e orientados de modo criterioso.

O século XIX foi marcado pelo intenso uso de novas tecnologias aplicadas tanto

na construção de hospitais como nas metodologias de tratamento. Nos Estados Unidos,

hospitais arranha-ceús (com 6 a 8 pavimentos) estavam em operação nas primeiras

décadas do século XX em diversas cidades, tais como Detroit e Nova Iorque.

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58

Com melhores instalações e rápido progresso científico, a qualidade das

cirurgias evoluiu significativamente. No entanto, essa melhora demandou instalações e

tecnologias mais complexas e dispendiosas. Especialidades médicas, como a neuro -

cirurgia, a oftalmologia e a cirurgia estética se desenvolveram. A primeira grande guerra

mundial (1914 a 1918) foi um campo experimental, especialmente para a cirurgia. É

importante observar que nessa época os hospitais tiveram aumento em seus custos para

aquisição e manutenção de aparelhos indispensáveis para execução dos serviços.

Os hospitais precisaram ainda de profissionais técnicos especializados para lidar

com novos serviços de laboratórios, tais como a imunologia, a bacteriologia e

parasitologia, entre outros. Esses serviços tiveram também forte impacto nas despesas

dos hospitais ao longo do século XX, levando a área da saúde ao centro dos debates

políticos em diversos países devido à necessidade crescente de maior alocação de

recursos para o cuidado da população. Nas últimas décadas do século XX e no início do

século XXI, esse continuou sendo o cenário da saúde em todos os lugares, uma vez que

novas patologias e novos métodos de tratamentos surgiram e ainda surgem com

freqüência. Ressalta-se que a pesquisa e a implantação de novos tratamentos demandam

investimentos crescentes e são realizados costumeiramente por empresas privadas que o

fazem com o objetivo de lucro para remuneração do capital investido.

2.2 Os Hospitais no Brasil

Para Santos (2007), a história dos hospitais no Brasil está ligada à história da

medicina brasileira, onde alguns agentes como a igreja e o exército atuaram para o

surgimento desse tipo de organização. Em 1727, têm início os serviços do primeiro

hospital militar que deu origem ao hospital Real Militar. Paralelamente, as Santas Casas

atendiam excluídos diversos, tais como, as mães solteiras, os idosos e os cidadãos das

classes menos favorecidas.

As comunidades estrangeiras também prestavam serviços médicos, com

destaque para as Beneficências Portuguesas que atendiam os recém chegados de

Portugal. Em 1855, foi inaugurado o Real Hospital Português de Beneficência do

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59

Recife. Posteriormente, surgiram as Beneficências Portuguesas nas cidades de Salvador,

Rio de Janeiro e São Paulo.

Com o advento da República, uma nova forma de organização política – jurídica

foi estabelecida. Essa nova forma do Estado assegurou apenas as condições formais de

representação, especialmente pelo voto direto. Tradicionalmente, no entanto, o controle

político representava os interesses capitalistas agrários e era exercido pelos grandes

proprietários de terra (os chamados coronéis). Diante desse quadro político, os

investimentos em saúde se demonstravam insuficientes, ou seja, continuavam aquém

das necessidades da população menos abastada.

No início do século XX, com o incremento do número de imigrantes, outras

comunidades estimularam a criação de hospitais para o atendimento de seus patrícios.

Isso ocorreu especialmente nas regiões Sul e Sudeste, localidade onde o maior número

de imigrantes se estabeleceu. Para ilustrar, em 1923, foi inaugurado um hospital alemão

em São Paulo (depois batizado por Oswaldo Cruz); em 1924, a comunidade japonesa

abriu as portas do hospital Santa Cruz e, em 1927, a cidade de Porto Alegre inaugura

seu hospital alemão (depois chamado de Moinhos de Vento).

As campanhas sanitárias, no início do século XX, que objetivavam combater

epidemias, como a febre amarela, a peste bubônica e a varíola, contribuíram para o

surgimento de hospitais públicos de porte e especializados. Essa tendência espalhou-se

pelo país e algumas organizações hospitalares públicas se associaram a faculdades de

medicina, de onde surgiram os hospitais escola. Esses são, até nos tempos atuais,

considerados fundamentais para:

- Formação de mão de obra especializada;

- Desenvolvimento de pesquisas;

- Atendimento a demanda de cirurgias complexas.

Ernesto Campos coordenou um censo nos hospitais do Brasil nos anos de 1941 e

1942.

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60

Esse trabalho durou 20 meses. Segundo o Ministério da Saúde do Brasil (1944),

em 1942, havia cerca de 1225 instituições hospitalares no Brasil e a população do país

era de cerca de 41 milhões de habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística (IBGE).

O estudo do autor apontou uma série de deficiências no sistema, dentre eles:

- a organização e a administração hospitalar não estão devidamente sistematizadas por

especialidade;

- falta de enfermagem técnica;

- falta tratamento adequado ao doente, especialmente àqueles das classes menos

favorecidas.

Sete décadas se passaram e não é exagero afirmar que as deficiências relatadas

permanecem, embora com outros números e em novo contexto.

Nas últimas décadas do século XX, o setor hospitalar cresceu de forma

exponencial e continua ascendendo em importância e economicamente. Segundo site da

Federação Brasileira de Hospitais (FBH – www.fbh.org), em junho de 2011, havia 6801

hospitais, ou seja, em aproximadamente 70 anos houve um crescimento de quase 6

vezes no número de estabelecimentos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística (IBGE – 2010), a população passou dos 190 milhões de habitantes em 2010.

Ainda segundo a FBH, os hospitais estão assim distribuídos:

- 4616 hospitais privados, sendo 2761 lucrativos e 1855 sem fins lucrativos;

- 2011 hospitais públicos, sendo 1502 municipais, 456 estaduais e 53 federais;

- 174 hospitais universitários e de escola.

Os hospitais públicos são geridos pelas esferas governamentais e são financiados

quase que exclusivamente pelo poder público, principalmente pelos Estados e

Municípios. Cabe ao governo federal a administração dos hospitais universitários por

meio dos Ministérios da Saúde e da Educação.

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61

Na esfera privada, segundo Grabrielli (2009), 70% das unidades hospitalares

recebem financiamento público. O mesmo autor ressalta que os recursos públicos

contribuem com o funcionamento integral ou parcial de cerca de 80% das unidades

hospitalares. O autor ressalta ainda que, de 1976 a 2002, o setor público ganhou 1620

hospitais que aumentaram em 27000 unidades a oferta de leitos. Esses números

apresentam uma média de 16,6 leitos por hospital, ou seja, representou um grande

avanço de pequenas unidades hospitalares. As políticas de investimentos do Sistema

Único de Saúde (SUS) e a descentralização no atendimento da rede pública com o

propósito de melhorar o atendimento explicam essa opção na distribuição dos recursos

governamentais. Para La Forgia & Couttolenc (2009), políticos se valeram de emendas

parlamentares para alocar investimentos em pequenas unidades hospitalares e, assim,

auferiram benefícios políticos em suas respectivas bases eleitorais com a construção

dessas pequenas unidades. Por outro lado, a manutenção e o custeio dessas unidades

ficaram em segundo plano. Muitas unidades funcionam de modo precário e com

recursos escassos e demonstram claramente as dificuldades sistêmicas do setor que

envolve muitos agentes, como poderá ser observado a seguir.

2.3 Os Hospitais Filantrópicos

A palavra filantropia tem origem do grego, philos, que significa “aquele que

gosta de” e anthropos, que significa homem.

Dados do Portal da Saúde (http://portal.saude.gov.br), acesso em 11/04/2013, o

Brasil conta com 3594 hospitais filantrópicos que representam cerca de 44% das

unidades hospitalares do SUS. Esses hospitais disponibilizam aproximadamente 123000

leitos para o SUS, ou seja, 34% do total da rede assistencial do Sistema Único de Saúde.

Estão instalados no Estado de São Paulo mais de 800 desses hospitais que, em seu

conjunto, oferecem em torno de 34000 leitos para atendimento do SUS. Constata-se,

com esses números, a grande importância desse tipo de instituição para o sistema de

saúde brasileiro.

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62

Pela regulamentação vigente, são consideradas filantrópicas as entidades

portadoras do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social. Tal certificado

é concedido pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), órgão subordinado

ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Dentre as exigências para

os hospitais obterem esse certificado estão: oferta e efetiva prestação de 60% ou mais de

internações ao SUS; na impossibilidade de contratação de 60% de internações SUS, a

entidade deverá aplicar um percentual de receita bruta em gratuidade de 5% a 20%.

Os números acima mostram que a saúde é umas das áreas em que a iniciativa

privada vem ocupando espaços e atribuições do Estado. Para Wanderlei (2009), houve

uma publicização do privado pela intervenção dos poderes públicos na manutenção da

ordem social, na regulação da economia, na promulgação de leis e diretrizes para as

políticas sociais (na saúde, educação, etc). O autor afirma ainda que houve também uma

privatização do público, expressa pela apropriação privada dos recursos públicos.

Ressalta-se que os setores dominantes, sobretudo as elites, abocanham parcela

significativa dos recursos públicos em função da força de seus lobbies e maior acesso às

altas esferas do Estado.

Esse cenário é bastante visível no setor da saúde onde algumas instituições

recebem apoio e verbas, os hospitais filantrópicos lutam por sua sobrevivência e muitos

estão à beira de um colapso financeiro. Dentre os diversos aspectos que originaram essa

situação está a defasagem do valor repassado pelo SUS aos hospitais. Em 2011, as

Santas Casas, por exemplo, gastaram R$ 14,7 bilhões de reais em atendimentos do SUS

e receberam, por esse trabalho, R$ 9,6 bilhões de reais, uma diferença que implicou em

um alto endividamento desses hospitais. Segundo a Federação das Santas Casas e

Hospitais Beneficentes de São Paulo, para cada R$ 100 reais investidos/ gastos pelo

instituições no atendimento aos pacientes SUS, apenas R$ 60 reais são repassados pelo

Estado às entidades (www.globo.com).

Segundo levantamento da Confederação Nacional das Santas Casas de

Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas, a dívida acumulada dos hospitais

chegou a R$ 11 bilhões em 2012 (www.fehosp.com.br,), o que para muitos é impagável.

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63

Diante desse contexto, muitos hospitais permanecem com suas portas abertas

com inúmeras dificuldades. Em trabalho apresentado no Simpósio em Gestão e

Tecnologia, Bernard et al (2010) afirmam que a maior parte dos hospitais filantrópicos

sofre com a falta de recursos para custeio e investimentos e que muitas caminham para a

insolvência financeira.

2.4 Os Hospitais e seus “Atores”

Segundo La Forgia & Couttolenc (2009), o Brasil tem um sistema hospitalar

altamente pluralista, composto por arranjos financeiros, organizacionais e são de

propriedade pública e privada.

Esses e outros aspectos, como a própria natureza dos serviços prestados, tornam

o funcionamento dos hospitais bastante complexo. Trata-se de um espaço onde diversos

atores com objetivos e interesses distintos se encontram.

Como o Estado é o principal financiador do sistema, determinados atributos

devem ser executados nas Políticas Públicas. Para Wanderley (2010), atributos

interconectados e que não podem ser ignorados numa perspectiva de conjunto devem

ser manifestados nas Politicas Públicas. São eles, para o autor: a Universalidade, que

implica no atendimento de toda uma população, sem discriminações de qualquer tipo; a

Visibilidade Social, que supõe transparência nas ações governamentais e nas ações dos

atores sociais; o Controle Social que significa acesso de instâncias governamentais e da

Sociedade Civil na fiscalização sobre as regras, uso de recursos e prestação de contas;

Sustentabilidade, que trata do equilíbrio entre objetivos e orçamentos, recursos

materiais e humanos, necessidades da administração, atendendo a legislação do país;

Cultura Pública, que supõe a superação da cultura privatista de apropriação do público

pelo privado, do autoritarismo, do fisiologismo, do paternalismo, vigentes

historicamente nas sociedades latino-americanas) e Democratização que implica em

sistemas abertos e autônomos de representação e de escolhas de representantes

(WANDERLEY, 2010, p.125).

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64

Um importante papel do Estado na questão da Saúde é a regulação do sistema. A

regulação refere-se às normas sobre a disposição privada dos recursos e está no campo

da política onde forças e interesses se encontram até que as decisões sobre a regulação

se concretize. Assim, os hospitais podem ser públicos (controlados pelo Estado) ou de

controle privado e, nesse caso, o Estado atua como regulador, uma vez que a área da

saúde é de interesse público.

O Estado possui, portanto, um papel ativo na cobertura de demandas de saúde e

suas intervenções ocorrem de diversas formas, dentre as quais se destacam: regulação

da utilização privada, compra de serviços de prestadores privados e financiamento.

Observa-se ainda que o Estado historicamente regulamentou a atividade dos médicos e

serviços de saúde especialmente no que diz respeito às normas sanitárias e certificações.

Também fazem parte da cadeia hospitalar os fornecedores de insumos, sendo os

medicamentos e os equipamentos os mais relevantes. Conforme Andreazzi (2002), os

insumos representam fortes impactos nos custos e na qualidade dos serviços prestados.

Cabe ao Estado oferecer subsídios aos hospitais para investimentos e consumo por meio

de contratos de custeio.

Além das 03 esferas do Estado e dos fornecedores citados acima, há os

profissionais que trabalham na área da saúde, na administração hospitalar e os

convênios, seguradoras e operadoras dos planos de saúde complementar.

Como já observado no capítulo anterior, os planos privados de saúde tiveram

constante crescimento no número de beneficiários nos últimos anos e representam um

importante agente do sistema. Segundo relatório da Agência Nacional de Saúde (ANS,

2012), em dezembro de 2011, mais de 47 milhões de brasileiros eram filiados à uma

operadora ou seguradora. Esse dado ilustra a importância desses planos privados

especialmente porque atendem parcela significativa da população e possuem poder

econômico e politico para estabelecer barganha com o Poder Público. Ressalta-se que

muitos hospitais atendem tanto o SUS quanto os pacientes encaminhados pelas

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operadoras privadas e precisam negociar tabelas de preços com ambos. Assim, os

hospitais enfrentam difíceis negociações, pois o seu poder de barganha é menor do que

os daqueles que financiam seus serviços (o Estado que possui recursos limitados em

relação à demanda por verbas públicas e as Operadoras que, como empresas capitalistas,

buscam o maior lucro possível).

Os profissionais da área da saúde são aqueles que efetivamente fazem as coisas

acontecerem nos hospitais. Esses profissionais precisaram se adaptar às mudanças que

tiveram início nas últimas duas décadas do século XX e que ainda estão em curso. Sob a

ótica do Observatório de Recursos Humanos em Saúde (ORHS, 2004), no Brasil houve

uma precarização das relações laborais, a municipalização do emprego em saúde, o

crescimento do mercado de trabalho da medicina supletiva e o crescimento do mercado

informal de trabalho. Assim como aconteceu em outros setores da economia, houve

movimentos de terceirização e flexibilização da produção e serviços do setor. Esses

impactos afetam o funcionamento do hospital e o atendimento dos pacientes.

2.5 A Gestão Hospitalar

Na visão de Bernardes et al (2006), vive-se hoje um crescente processo de

racionalização das práticas médico-hospitalares. A medicina se integra cada vez mais na

atividade econômica global: assim, é suscetível a avaliação custo benefício como

acontece em outros setores empresariais. Nesse processo, o hospital passa a ser pensado

como empresa, tornando-se um estabelecimento central para as estratégias das

indústrias de equipamentos, bem como para a indústria farmacêutica. Ademais, decisões

cruciais para os hospitais são tomadas em instâncias e órgãos externos a ele, o que

muitas vezes causa transtornos e dificuldades para seus trabalhadores e pacientes que

ficam à mercê dessas decisões que nem sempre consideram as peculiaridades e o

contexto de cada hospital em atividade.

Ainda conforme Bernardes e outros (2006), a decomposição do ato médico em

atividades isoladas, diversificadas e centralizadas pela organização hospitalar,

decorrente da intensificação da especialização, implica novos e complexos problemas

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no processo de coordenação do trabalho de um grande número de profissionais que se

mobilizam em torno do cuidado dos pacientes.

O cuidado depende do trabalho de vários profissionais e, por isso, possui

natureza multidisciplinar. Para Cecilio e Merhy (2003), o cuidado, de forma idealizada,

recebido/ vivido pelo paciente é constituído pela somatória de um grande número de

pequenos cuidados parciais que vão se complementando, de maneira mais ou menos

consciente e negociada, entre os vários cuidadores que circulam e produzem a vida do

hospital. Sendo assim, atos, procedimentos, rotinas e processos (fluxos) vão compondo

o que se classifica como cuidado em saúde. Como as diversas atividades estão

fragmentadas não há uma visão holística do paciente.

O fracionamento do trabalho, com impactos sobre os profissionais de saúde e

pacientes, prejudica a integralidade do atendimento. Observam ainda Cecilio e Merhy

(2003) que a atenção integral de um paciente no hospital seria o esforço de uma

abordagem completa, holística, portanto integral, de cada pessoa portadora de

necessidades de saúde que, por um certo período de sua vida, precisasse de cuidados

hospitalares. Essa abordagem implicaria disponibilizar as tecnologias de saúde para

prolongar e melhorar a vida e também o oferecimento de um ambiente humanizado que

proporcionasse conforto e segurança para o hospitalizado. Os mesmos autores

consideram que as necessidades singulares dos pacientes devem ser o ponto de partida

para qualquer intervenção hospitalar.

Há duas perspectivas quanto à analise da intervenção hospitalar: uma delas

refere-se aos trabalhadores que atuam no hospital (o hospital em si) e outra diz respeito

àqueles que analisam a partir do hospital, tendo como referência a sua inserção como

elemento do Sistema de Saúde.

Considerando-se a intervenção hospitalar sob a óptica dos trabalhadores

alocados em hospitais, constatam-se grandes dificuldades por parte da gerência em

coordenar os atos fragmentados, especializados e diversificados executados pelos

trabalhadores em seu cotidiano. Nicacio, apud Silveira (2003), afirma que é possível

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pensar o trabalho em equipe como somatória de ações específicas de cada profissional,

como linha de montagem no tratamento da doença, com hierarquia e rigidez de papéis.

No entanto, torna-se necessário pensar arranjos institucionais que resultem em um

trabalho em equipe que possibilite uma atuação mais solidária e participativa dos

envolvidos com o cuidado do paciente.

A análise, a partir do hospital, o considera como elemento do Sistema de Saúde.

A noção de sistema implica uma visão harmoniosa de partes em relação ao todo. Em

outras palavras, a boa funcionalidade de cada parte contribui para um melhor

funcionamento do todo. Para Cecilio e Merhy (2003), o conceito de saúde denota uma

concepção idealizada, de caráter normativo, que não se sustenta na prática. Isso porque

possuí várias lógicas de funcionamento, múltiplos circuitos e fluxos de pacientes, nem

sempre racionais que são, algumas vezes, interrompidos e truncados. Ademais são

submetidos a interesses e protagonismos que não se submetem à uma racionalidade

institucional ordenadora. Tem-se, como conseqüência, grande dificuldade em se

conseguir a integralidade do cuidado, bem como inconvenientes de toda ordem para o

trabalhador da saúde executar as atividades que estão sob sua responsabilidade.

2.5.1 Especificidades da Gestão Hospitalar

Convivem nos hospitais muitas formas de coordenação apoiadas por lógicas

diferentes. Isso ocorre porque profissões diferentes convivem sistematicamente com

prioridades e preocupações distintas. O pessoal de enfermagem, por exemplo,

estabelece escalas de trabalho, trocas de plantão e rotinas de atendimento. Os médicos

cobrem escalas, solicitam uma “segunda opinião” de colegas e, costumeiramente,

possuem diversificada atuação profissional (atuam em clínicas, consultórios, hospitais,

etc). Na assistência ao paciente há ainda outros profissionais de nível superior, tais

como os fisioterapeutas, os nutricionistas, os assistentes sociais e os dentistas.

A coordenação das atividades executadas pelos profissionais das diversas áreas

segue, muitas vezes, a lógica de unidades de produção onde pacotes de serviços

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prestados são classificados como “produtos”. Nesses pacotes, além do atendimento,

estão incluídos os insumos usados no cuidado ao paciente. Destaca-se que a

administração desses insumos, os processos de trabalho e a oferta desses pacotes de

serviços implicam uma lógica diferente daquela que forma médicos e enfermeiros.

Acrescenta-se ainda que as chefias procuram defender seus espaços de poder e

autonomia.

Para Feuerwerker e Cecilio (2007), o hospital funciona como um subsistema de

um sistema social mais amplo. Esse subsistema consome insumos (humanos, materiais,

tecnológicos, financeiros) para desenvolver processos internos que resultam em serviços

para seus clientes. Considerando-se a lógica do mercado, é esse feedback da satisfação

do usuário que realimenta o sistema e fecha o ciclo.

Sob a óptica de Cecilio e Merhy(2003), sobrevive o hospital que oferece

melhores produtos/ serviços com a utilização de tecnologias e aprimoramento de

processos e controles internos. Os autores salientam ainda que quem não se atualiza

buscando reengenharias internas e não moderniza seus processos de gestão termina

ultrapassado pela onda de modernização, competitividade e eficiência, aspectos

marcantes nos tempos atuais.

Carapinheiro, apud Cecilio e Merhy (2003), aborda aspectos sociais no que se

refere à gestão hospitalar. A autora afirma que o hospital é uma instituição burocrática

especial por também possuir características adocraticas (sistema temporário variável e

adaptativo). Ressalta ainda que o poder, enquanto disciplina, merece consideração

especial uma vez que os médicos o exercem sobre a instituição hospitalar, os pacientes e

outras categorias profissionais presentes nos hospitais.

Dessa forma, o hospital é espaço onde atuam atores institucionais com certo grau

de liberdade, de construção complexa de redes de contratos e onde se configuram

coalizões e grupos de interesse e disputa.

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69

O conjunto dessas características que envolvem o funcionamento e a

administração dos hospitais afeta diretamente o trabalho e o cotidiano dos profissionais

de saúde que se vêem obrigados a se adaptar e a se reciclar em função das várias

mudanças em curso.

2.5.2 A Produção na Saúde

A produção em saúde não resulta em um produto físico comercializável, sendo o

produto indissociável do processo. A manutenção da vida, a recuperação da saúde e o

restabelecimento do bem estar exigem cada vez mais novas competências profissionais

e isso impõe aos gestores e profissionais da área condições de aprendizagem que

atendam as novas demandas.

Para Cianciarullo (2003), a maioria dos hospitais brasileiros, ainda hoje, tem

dificuldade para adotar modelos de gestão ágeis e voltados para as necessidades dos

cidadãos.

Afirma Zarafian (2003) que a renovação e o revigoramento requerem mudanças

nos hospitais e que as atividades inovadoras e empreendedoras precisam ser aprendidas

pelos profissionais para o aumento da competência dos serviços prestados. Na óptica de

Pereira (2005), a inovação na gestão deve ser voltada para resultados. Indicam

Emmerick e outros (2007) que o modelo de gestão é a filosofia e as práticas

administrativas incorporadas como competências pelos membros da organização. Os

autores afirmam ainda ser necessária a priorização da aprendizagem organizacional para

que ocorra uma evolução do estado presente para a criação de novas competências.

Aponta Berwick (1997) que a criação do ambiente de aprendizagem começa pela

criação de oportunidades de participação para todos.

Segundo Emmerick e outros (2007), na Sociedade do Conhecimento a

aprendizagem é a verdadeira atividade produtiva, tendo efeito imaterial e intangível na

atividade produtiva. Senge (1998) corrobora com essa idéia ao afirmar que o pleno

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desenvolvimento das pessoas é a mudança mais radical em relação às praticas

tradicionais de gestão. Para o mesmo autor, baixas capacidades de aprendizagem

coletiva restringem a possibilidade da mudança. Em outras palavras, se os grupos de

trabalho não tiveram capacidade de aprender, a organização também não terá.

Ao se considerar as particularidades dos hospitais, o estimulo à aprendizagem é

difícil porque as equipes são integradas por especialistas e profissionais de diferentes

áreas técnicas.

De acordo com Merhy e Franco (2009) a produção do cuidado se dá por uma

complexa trama que tem como protagonistas sujeitos individuais e coletivos, carregados

de certas intencionalidades onde eles mesmos produzem o cuidado. Os autores

observam ainda que nesse cenário há diferentes objetivos, interesses e rede de relações

nos processos de trabalho que se mantêm dinâmicos e têm sofrido alterações em grande

velocidade impulsionadas pela transição tecnológica em curso.

Os trabalhadores se veem, então, diante de um cenário que os obriga a constante

atualização, pressionados por um sistema em transformação, repleto de ambigüidades.

Ademais, se relacionam com profissionais de áreas diferentes da sua, lidam com pessoas

(pacientes) muitas vezes em seu estado mais vulnerável e devem seguir várias regras,

protocolos e regulamentos.

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CAPÍTULO III – NOVAS TECNOLOGIAS E FORMAS DE

GESTÃO

Mudanças de toda ordem estão em curso desde a intensificação do fenômeno da

Globalização e novas tecnologias e formas de gestão têm surgido com frequência,

afetando de muitas maneiras as relações de trabalho e o modo como são realizadas e

vivenciadas pelo trabalhador.

3.1 GLOBALIZAÇÃO

Para Santos (2005), a Globalização é um fenômeno social complexo e

multifacetado com dimensões sociais, culturais, políticas, jurídicas e religiosas, em

relação ao qual ainda não existe uma uniformidade teórico-conceitual, embora numa

avaliação objetiva seja definido como o incremento dos fluxos de bens e serviços entre

nações. Nesse sentido, há aqueles que optam por entender a globalização como um

estágio superior da internacionalização, expressão usada como referência a fenômenos

que envolvem investimentos externos, estruturas de mercado, organização da produção

e tecnologia.

Na visão de Vasconcelos et al (2008), a expressão Globalização passou, de fato,

a incorporar o repertório vocabular do mundo dos negócios a partir da década de 70,

refletindo o gradativo aprofundamento das relações entre países e grupos econômicos.

As diferentes datas atribuídas ao início da globalização decorrem das diferentes

definições existentes e do foco de abordagem. Esses autores destacam que existem

aqueles que atribuem à globalização uma origem remota e ressaltam, visivelmente, a

abordagem econômica do fenômeno. Já os que atribuem uma origem mais recente,

enaltecem, como elementos de abordagem, as dimensões políticas, comunicacionais e

culturais.

Ainda em relação ao entendimento do termo “Globalização”, Pereira (2008)

afirma que tem sido usado pelos meios de comunicação de massa em parte como forma

de construção de um senso comum em torno da palavra, que significaria um movimento

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inexorável e que incluiria, entre outras coisas, a liberalização do comércio internacional,

com a abertura das fronteiras para a entrada de bens e serviços, certas políticas

econômicas, como o controle inflacionário, e também certos padrões de organização

política, como a democracia representativa liberal, além de outros ditames sociais e

culturais.

Tendo em vista a explanação acima citada, Santos (2000, p. 23) ressalta que “a

Globalização é, de certa forma, o ápice do processo de internacionalização do mundo

capitalista”. A partir desse pressuposto, pode-se afirmar que há um novo delineamento

do modo capitalista de produção, que pode ser traduzido pela aceleração das mudanças

espaciais e territoriais em diferentes escalas.

Dessa forma, Santos (2000) vê a Globalização como fábula e falácia, pois

esconde as verdadeiras dimensões da pobreza, da fome e do desemprego que estão se

difundindo nos diferentes países, principalmente aqueles tidos como periféricos. Ao

invés da homogeneização do planeta, conforme atestam os defensores do mundo global,

ampliam-se as diferenças. Para esse autor, na verdade, há uma busca de uniformidade ao

serviço dos atores hegemônicos. Porém, o mundo se torna menos unido, tornando mais

distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente universal (SANTOS, 2000).

Com a Globalização, as interações transnacionais se intensificam a cada dia e

assumem formatos distintos: variam, em escala, desde a internacionalização do sistema

produtivo e financeiro à disseminação e compartilhamento de informações de toda

natureza (VASCONCELOS et al., 2008). Assim sendo, é um processo que coloca a

sociedade como um sistema aberto onde os acontecimentos locais podem ser

influenciados ou condicionados por fatos ocorridos em localidades distantes. Essa é

uma característica que ressalta a Globalização como um processo não-linear ou mesmo

uniformizador porque nem a compreensão de seu significado é uniforme ou consensual:

A globalização, longe de ser consensual, é, como

veremos, um vasto e intenso campo de conflitos

entre grupos sociais, Estados e interesses

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hegemônicos, por um lado, e grupos sociais,

Estados e interesses subalternos, por outro; e

mesmo no interior do campo hegemônico há

divisões mais ou menos significativas (SANTOS,

p. 27, 2005).

Para Vieira (2002), a Globalização surge por meio das mais diversas dimensões,

sendo elas: econômica, política, social, ambiental e cultural. Nessa classificação, o autor

destaca o papel da economia e da cultura no cenário da globalização.

Nesse contexto de interpretações, outros autores, dentre esses, Therborn (2001) e

Santos (2000) indicam que um dos principais elementos da Globalização é a dimensão

econômica, a qual se refere a novos padrões de comércio, investimento, produção e

empreendimento. Outro elemento, geralmente derivado do primeiro, é o sócio-político,

concentrando-se no papel cada vez menor do Estado e de um tipo de organização social

a ele associada. Em terceiro lugar, a globalização surgiu como centro de um discurso e

de um protesto sócio-crítico, como uma nova forma que assume forças adversas: o

inimigo da justiça social e de valores culturais particulares. Há também outros dois

entendimentos, mais especializados e igualmente importantes, acerca dos papéis da

Globalização. Existe o discurso cultural, dos estudos antropológicos e culturais, que

apresenta a globalização como fluxo, encontros e hibridismo culturais. E por fim, como

responsabilidade social, a globalização é parte de um discurso ecológico e de

preocupações ambientais planetárias (THERBORN, 2001).

3.2 GLOBALIZAÇÃO DA SAÚDE

Segundo Faria & Bortolozzi (2009), as maiores preocupações da ciência no

limiar do século XXI estão relacionadas com as condições da existência humana. O

discurso dos problemas sociais, ambientais e de saúde de proporções internacionais

ganhou consistência e recentemente alarmou a sociedade mundial sobre a possibilidade

de um aquecimento global irreversível. Ainda que as consequências desse processo

sejam distribuídas desigualmente nas diversas regiões do mundo, essas questões

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começam a preocupar os países desenvolvidos, já que a natureza não reconhece as

fronteiras territoriais.

As mudanças impostas pela sociedade moderna, que se desenvolveram a partir

da década de 1970, vêm fortalecer a categoria espaço e território nas pesquisas em

saúde pública. Por um lado, as mudanças no perfil de morbimortalidade da população,

caracterizada pela redução das doenças infecciosas e o aumento das doenças crônico-

degenerativas. Por outro, a emergência de novas enfermidades, como a Aids, são

responsáveis pela crise que se instaura na ciência epidemiológica no sentido de buscar

formas mais eficientes de entender a doença como manifestação coletiva (FARIA &

BORTOLOZZI, 2009).

Conforme Pinheiro et al. (2010), quando se foca o olhar nas repercussões da

Globalização na saúde das populações, notam-se diversos impactos sensivelmente

preocupantes. A disseminação das doenças infectocontagiosas, o bioterrorismo e os

novos padrões comportamentais em saúde são alguns deles. Nos anos 90, as doenças

transmissíveis se tornaram uma prioridade de saúde em âmbito global, contrariando a

expectativa de que tais doenças estavam sendo efetivamente controladas. Essa

concepção linear explicitava-se no modelo da transição epidemiológica, o qual

identificava o risco de morte por doenças transmissíveis e a alta prevalência de doenças

endêmicas causadas por agentes infecciosos como atributos exclusivos do chamado

“subdesenvolvimento” socioeconômico. Pinheiro et al (2010) ressaltam, também, que a

pandemia da AIDS foi o evento decisivo que obrigou a uma revisão dessa perspectiva.

Na atualidade, associa-se também a pandemia de gripe causada pelo vírus H1N1 que,

em 2009, afetou cerca de 400.000 pessoas em todo o mundo.

Diante dessa perspectiva de Globalização da saúde, segundo Sabroza & Waltner-

Toews, (2001) é necessário entender a saúde e as doenças como um processo vivido

pelos seres humanos individualmente, todavia com fortes influências de dimensões

coletivas, e, a partir daí, busca-se identificar as relações entre as condições de saúde e

seus determinantes biológicos, culturais, socioeconômicos e ambientais, nos

ecossistemas modificados pelo trabalho humano.

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Corroborando com a afirmação acima citada, segundo Pinheiro et al. (2010), a

saúde deve ser encarada como questão global e como um bem e um valor, pelos quais se

deve trabalhar de modo explícito e programado, consenso em nível mundial. Desse

modo, a luta contra as desigualdades é um poderoso estímulo para esse objetivo. Pode-

se observar que, com a Globalização, o direito à saúde no mundo vem sofrendo uma

relativa regressão nas últimas décadas. Nos países emergentes, dentre esses o Brasil, a

ameaça mais grave é a sobreposição de perfis epidemiológicos em que se observa a

difusão de doenças decorrentes de diferenças nas condições ambientais, na nutrição, na

organização social e cultural e pela presença ou ausência de agentes e de vetores

biológicos das doenças transmissíveis. A partir desse cenário, doenças como a varíola, o

sarampo, a febre amarela e a sífilis, entre outras, mostraram quadros epidemiológicos

muito desiguais que rapidamente afetam diversas partes do planeta com surtos cíclicos.

Além desses e de outros danos e riscos provocados pelas infecções, pode-se acrescentar

a escala global da poluição ambiental, da utilização de tóxicos e da violência.

Segundo o World Bank (2001), em um cenário de mundo Globalizado,

destacam-se os avanços positivos no campo da comunicação e da biotecnologia.

Todavia, a sua repercussão na saúde da população mundial pobre tende a ser muito mais

negativa do que positiva, uma vez que a pobreza está intimamente relacionada às

condições e expectativas de saúde. Nesse sentido, World Bank (2001) destaca que, na

virada do milênio, dos cerca de 6 bilhões de habitantes do mundo, 2,8 bilhões, ou seja,

quase a metade, viviam com menos de 2 dólares por dia e 1,2 bilhões com menos de 1

dólar por dia, sendo que 44% viviam no Sul da Ásia. Passados treze anos, o estado de

pobreza continua o mesmo, além do incremento de 1 bilhão de pessoas a mais. Dessa

forma, os países com grandes populações pobres têm a seu cargo 90% das doenças que

ocorrem no mundo, mas não têm mais de 10% dos recursos globalmente gastos em

saúde, o que reflete no inexpressivo desenvolvimento econômico desses países devido à

perda de pessoas em idade jovem e produtiva. Crianças com menos de cinco anos na

África têm 7 vezes mais probabilidade de morrer do que as crianças da Europa, assim

como pessoas com idade entre 15 e 59 anos na África têm 4,5 vezes mais probabilidade

de morrer do que as pessoas na Europa, sendo que as taxas de mortalidade materna são

16 vezes mais altas na África do que na Europa (WORLD HEALTH

ORGANIZATION, 2002).

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Para François (2008), o sistema institucional de saúde no Brasil apresenta

deficiências que impedem a assistência a todos por inacessibilidade de numerosos

segmentos da população ao atendimento que são consequência da inexistência ou

escassez dos serviços de saúde, devendo-se, entre outras, a questões de ordem

geográfica, cultural, econômica e funcional. Esse autor destaca também que o acesso à

saúde, além da proporcionalidade entre serviços e usuários, implica uma relação

dinâmica entre as necessidades, aspirações e cultura da população, a demanda de

serviços e os recursos disponíveis para satisfazê-la. Ademais, o acesso à saúde depende

de recursos como informação e conhecimento, meios para superar os desafios logísticos

(percorrer distâncias para executar o atendimento) e verbas para cobrir os custos que

isso requer. No Brasil, com suas grandes distâncias e desigualdades econômicas,

populacionais e de distribuição, significa vencer um longo e difícil caminho entre a

doença e a cura.

Em se tratando do processo de trabalho no setor de saúde, cabe salientar que ele

vai se ajustando às transformações de mercado próprias da globalização: de um lado, os

trabalhadores com vínculos empregatícios e direitos trabalhistas preservados atuam na

assistência direta, nos serviços de apoio diagnóstico e terapêutico, na gerência, no

ensino e na produção de tecnologia. E, do outro lado, os trabalhadores terceirizados e

em situações de vínculo empregatício precário, que também atuam na maioria dos

setores, excetuando-se a gerência institucional. Essa dimensão do trabalho no setor

saúde é semelhante ao que vem ocorrendo em outros setores do mundo do trabalho

(MEDEIROS & ROCHA, 2004).

3.3 IMPACTOS DA TECNOLOGIA NO SETOR DE SAÚDE

Com relação aos impactos trazidos pelo uso intensivo de tecnologias no setor de

saúde, Castells (2005) ressalta que o nosso mundo está em um intenso processo de

transformação estrutural desde há duas décadas. Trata-se de um processo

multidimensional, associado à emergência de um novo paradigma tecnológico, baseado

nas tecnologias de comunicação e informação (TIC), as quais começaram a tomar forma

nos anos 60 e que se difundiram de forma desigual por todo o mundo. Para esse autor,

essas tecnologias não determinam a sociedade, nem a sociedade determina o curso da

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transformação tecnológica, visto que muitos outros fatores, como criatividade e

iniciativa empreendedora influenciam o processo de descoberta científica, inovação

tecnológica e aplicações sociais, de forma que o resultado depende de todo um conjunto

de fatores. Para Castells (2005), embora não determine a evolução histórica e a

transformação social, a tecnologia incorpora a capacidade de transformação das

sociedades, bem como o uso que as sociedades decidem dar ao seu potencial

tecnológico. Entretanto, cabe salientar que, por outro lado, é a sociedade que dá forma à

tecnologia de acordo com as necessidades, valores e interesses das pessoas que a

utilizam. Além disso, as tecnologias de comunicação e informação são particularmente

sensíveis aos efeitos dos usos sociais da própria tecnologia.

Falar especificamente dos impactos da tecnologia no setor de saúde, segundo

Lima (2003), implica fazer-se referência obrigatória ao processo mundial de

reestruturação produtiva, intensificado a partir da década de 1970, e suas incursões nos

diversos setores da economia.

Com o processo de reestruturação produtiva, Pires (2008) ressalta que, a partir

das três últimas décadas do século XX, ocorreu grande destaque para a inovação

tecnológica na reorganização da produção, na utilização da força de trabalho e na

estrutura das empresas; as expressões “novas tecnologias”, “high technology ou

hightech”, “tecnologia de ponta” e “inovação tecnológica” assumem um lugar de

destaque na mídia e na literatura científica. As inovações tecnológicas estão presentes

nos diferentes setores da economia mundial, dentre esses, os serviços de saúde, sendo

que sua utilização e impactos são influenciados por diversos fatores e pelo contexto

histórico-social em que ocorrem (PIRES et al, 2010).

Corroborando com a afirmação anterior, Barra et. al (2006) salientam que o

processo de industrialização trouxe consigo, além da modernização, o avanço

tecnológico e a valorização da ciência que ocasionaram transformações no cotidiano do

homem. Esses sensíveis avanços tecnológicos também ocorreram no setor de saúde,

com a introdução da informática e do surgimento de equipamentos sofisticados que

acarretaram muitos benefícios e rapidez na luta contra as diversas doenças. Essa

moderna tecnologia, desenvolvida pelo homem para o homem, tem em larga escala

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contribuído para a solução dos problemas no setor de saúde, provocando ou

possibilitando melhores condições de vida e saúde para os pacientes.

Ainda de acordo com Barra et al. (2006), a tecnologia é inseparável de qualquer

realidade, permeando todas as atividades do homem. Nesse sentido, esses autores

alegam que, na atualidade, todos vivenciam uma era tecnológica, na qual muitas vezes a

concepção do termo tecnologia tem sido na prática diária utilizada de forma equivocada,

uma vez que é concebida corriqueiramente somente como um produto ou equipamento.

Cabe aqui explicitar que a temática tecnologia não deve ser tratada apenas por meio de

uma concepção reducionista ou simplista, associada somente às máquinas.

A incorporação das tecnologias de ponta nos cenários de assistência, segundo

Barbosa, (1999) implicou um redimensionamento do espaço do cuidado, com

repercussões diretas no trabalho dos enfermeiros e dos médicos, na medida em que traz

mais uma atribuição para eles que, além de cuidarem do cliente/ paciente, devem

controlar a(s) máquina(s) e todo o arsenal de equipamentos e artefatos inerentes a

determinadas terapias. Embora se pense que as tecnologias são utilizadas na prática

hospitalar como ferramentas auxiliares, suprindo as necessidades crescentes do aumento

da complexidade do cuidado oferecido por médicos e enfermeiros e possibilitando a

prestação de um serviço de saúde de qualidade, com obtenção de maior eficácia e

redução do tempo gasto na realização dos procedimentos, é também necessário avaliar

os sensíveis efeitos que esse avanço tecnológico acarreta na vida dos profissionais

envolvidos.

Nita et al. (2010) afirmam que tecnologias em Saúde incluem um amplo

conjunto de intervenções, tais como medicamentos, equipamentos e procedimentos

técnicos, sistemas organizacionais, educacionais, de informação e de suporte e os

programas e protocolos assistenciais, por meio dos quais a atenção e os cuidados com a

saúde são prestados à população.

Barbosa (1999) ressalta ainda que a ampla difusão dessas novas tecnologias vem

imprimindo mudanças gradativas nos cuidados prestados em hospitais. Isso, por vezes,

tende a gerar medo e angústia para alguns, enquanto para outros representa status,

incentivo à busca de aperfeiçoamento técnico-científico, determinando condutas

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ambivalentes de maior proximidade ou afastamento do cliente/paciente. Enfim, esse

fenômeno da tecnologia em saúde, pela complexidade e demandas diferenciadas que por

vezes acarretam no manejo do cuidado ao cliente, faz com que os profissionais pensem,

reflitam, discutam e troquem experiências profissionais em um ambiente tecnológico.

Para DallSasso & Barbosa (2000), o crescente avanço científico e tecnológico na

área da saúde cria a necessidade dos profissionais buscarem intensiva atualização.

Assim, a utilização da informática se constitui em suporte que impulsiona o rápido

acesso às informações e ao conhecimento expandido mundialmente. Isso exige do setor

atualização contínua de conhecimentos, por meio de cursos de especialização,

treinamentos e formação fornecidos pelos hospitais, fornecedores, faculdades, etc.

Embora essa seja a realidade em todas as profissões, há na área da saúde o emprego

obrigatório de maquinários para a aprendizagem.

As inovações na área da saúde são intensas e abrangentes, dizem respeito a uma

diversidade de situações vivenciadas por médicos, enfermeiros e incluem:

- novos aparelhos de ressonância magnética, ecocardiográfico, raio x, etc;

- novos aparelhos de imagem específicos para especialidades, dentre elas, a neurologia,

a angiografia e a oncologia;

- novos equipamentos hospitalares para as especialidades, tais como, anestesia,

reanimação e cardiologia;

- diversos tipos de aquecedores, aspiradores cirúrgicos, balanças digitais,

broncoscópios, etc.

Os exemplos acima representam pequena amostra da revolução que atinge o

setor. Essa velocidade nas mudanças expõe as fragilidades e as contradições do Sistema

de Saúde vigente e escancaram as desigualdades sociais do país. Por um lado, tem-se

uma elite com acesso a hospitais particulares que possuem recursos e capacidade de

investimento para oferecer a seus pacientes/ clientes tratamentos de excelente qualidade

(equipamentos de última geração e pessoal qualificado para executar os procedimentos).

Por outro lado, há o atendimento do SUS, único acesso à saúde para a maior parcela da

população. O SUS possui orçamento apertado e apresenta inúmeras dificuldades de

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operacionalização do sistema. Há problemas de estrutura nos postos de saúde e nos

hospitais credenciados. A aparelhagem está defasada, faltam materiais com frequência e

os investimentos são insuficientes para a demanda existente. As consequências dessa

situação estão expostas na mídia sistematicamente e foram alvo das manifestações de

junho de 2013 em todo país. Para os médicos e enfermeiros essa situação é motivo de

stress e preocupação. Observa-se também que muitos médicos não aceitam trabalhar em

postos de saúde e hospitais que não apresentam condições para o bom exercício da

medicina. Há falta de médicos em muitos Estados brasileiros e em algumas

especialidades faltam médicos até nos grandes centros. Em reportagem publica no portal

UOL em 19 de agosto de 2013 (www.folha.uol.com.br), levantamento efetuado pelo

Observatório de Recursos Humanos em Saúde de Minas Gerais indica que, entre 2008 e

2011, aumentou de 32,1% para 66,8% o número de hospitais com “imensa dificuldade”

para contratar pediatras. O estudo apontou que há carência também nas áreas de

psiquiatria, anestesia e neurologia. Em meados de 2013, o governo federal iniciou o

processo de contratação de centenas de médicos estrangeiros, principalmente cubanos,

que atuarão em diversos munícipios desassistidos até mesmo de atendimento básico.

A proliferação de novas tecnologias representa, para a área da saúde, mais um

desafio a ser superado. Para Siqueira (2009), uns terão todo acesso à tecnologia

disponível enquanto outros pouco ou nada receberão. O autor afirma que a medicina de

alto custo (tecnologia de ponta) será para parcelas cada vez menores da sociedade; de

outro lado, longas e intermináveis filas de despossuídos e, portanto, desassistidos.

3.4 NOVAS TECNOLOGIAS EM SAÚDE

No que se refere às tecnologias aplicadas ao setor de saúde, recorre-se a Mehry

et al (1997), os quais salientam que a tecnologia compreende certos saberes constituídos

para a geração e utilização de produtos e para organizar as relações humanas, podendo

ser aplicadas na saúde, de acordo com três categorias de classificação, a saber:

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a) Tecnologia dura: representada pelo material concreto como equipamentos, mobiliário

permanente ou de consumo. Aparelhos de ressonância magnética e de tomografia são

exemplos de tecnologia dura.

b) Tecnologia leve-dura: incluindo os saberes estruturados representados pelas

disciplinas que operam em saúde, a exemplo da clínica médica, odontológica,

epidemiológica, entre outras.

c) Tecnologia leve: que se expressa como o processo de produção da comunicação, das

relações, de vínculos que conduzem ao encontro do usuário com necessidades de ações

de saúde.

Nesse contexto, a tecnologia em saúde não está relacionada apenas com

procedimentos, máquinas e instrumentos. Westin et al (2012) afirmam que ela se refere

também a aplicação de conhecimentos e processos organizacionais, e, para que isso

ocorra, é necessário embasamento teórico e científico proporcionado pelas pesquisas

feitas na área.

Ainda com relação a essa classificação das tecnologias aplicadas à saúde, Barra

et. al. (2006) acreditam que as três categorias apresentadas anteriormente estão

estreitamente interligadas e presentes no agir do setor de saúde, embora nem sempre de

modo transparente.

Em termos dessas novas tecnologias e seus impactos, Santos e Marques (2006)

ressaltam que globalmente a tecnologia de informação (TI) aplicada à saúde vem se

consolidando desde a década de 60, e que, atualmente, a internet tornou-se uma

ferramenta para todas as instâncias profissionais. A utilização da Internet cresce

vertiginosamente em países desenvolvidos, e é frequentemente utilizada pela estrutura

universitária de saúde, acarretando diversos benefícios para essa área. Já nos países em

desenvolvimento, a utilização desses recursos varia de acordo com a tecnologia

disponível de país a país e com as iniciativas locais.

Tendo como base o uso da internet, Guimarães, Martin e Rabelo (2005)

salientam que a Educação à Distância (EAD) é uma das estratégias de ensino-

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aprendizagem que permite acesso a um grande volume de profissionais a programas

educativos, independente de tempo e localização dos interessados.

Cabe também destacar que, igualmente, para a educação em saúde do paciente,

família e comunidade, os recursos das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC)

têm sido utilizados com maior frequência e abrangência, seja por meio de ambientes

virtuais de aprendizagem, seja por meio de web conferências, dentre outras estratégias

de ensino-aprendizagem. O que se torna importante em tal prática é a relação

construtiva e dialógica dos sujeitos envolvidos no processo educativo. (SANTOS &

MARQUES, 2005)

Já para Brownson (2005), a busca das áreas de saúde pelo aprimoramento

educacional e pela qualificação profissional é uma premissa básica e as tecnologias de

informação e comunicação (TICs) empregadas são um efetivo recurso no intuito de se

obter êxito nesse processo. Brownson (2005) e Jang et al. (2005) alegam ainda que,

dentre as TICs, a internet vem sendo utilizada como um recurso que suplanta as

barreiras físicas e possibilita a interatividade com troca de informações entre os

participantes, obtendo grande vantagem em custo x benefício.

Essa busca de conhecimentos e aprimoramento profissional na área de saúde

com o suporte de recursos tecnológicos, segundo Behring et. al. (2012), também

acontece no Brasil por meio de um esforço conjunto do Ministério de Ciência e

Tecnologia (MCT) e do Ministério da Saúde (MS), que incentivam a utilização das

TICs para a educação permanente e educação em saúde, com a manutenção do

programa Telessaúde Brasil9e a Rede Universitária da Telemedicina (RUTE).

Cabe também destacar que, conforme Pereira (2009), nos últimos anos, vem

ocorrendo uma relevante e sensível revolução na área da tecnologia de diagnóstico por

9O Programa Telessaúde Brasil Redes é uma ação nacional que busca melhorar a qualidade do

atendimento e da atenção básica no Sistema Único da Saúde (SUS), integrando ensino e serviço por meio

de ferramentas de tecnologias da informação, que oferecem condições para promover a Teleassistência e

a Teleducação.

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imagem. Pesquisas realizadas por médicos, engenheiros e físicos, trazem novas

descobertas e desenvolvem as mais diversas aplicações da radiação em equipamentos de

diagnóstico por imagem. Dessa forma, de acordo com Funari & Queiroz (2011), a

figura do antigo médico radiologista trabalhando muitas vezes longe do paciente em

uma sala escura, tem ficado cada vez mais remota. O médico “imaginologista”, como é

chamado atualmente, representa um papel fundamental nas decisões clínicas

relacionadas aos pacientes, participando ativamente não somente do diagnóstico e

estabelecimento da conduta, como também da terapêutica instituída. Os avanços na área

de diagnósticos por imagem têm permitido diagnósticos mais precisos de diferentes

doenças, possibilitando um planejamento terapêutico mais precoce e adequado ao

paciente.

Funari & Queiroz (2011) afirmam ainda que a maior precisão dos equipamentos

de tomografia, ultrassonografia, ressonância magnética e raios X tem contribuído para

melhorar a acurácia diagnóstica e guiar procedimentos intervencionistas, como biópsias

e punções aspirativas dos mais variados órgãos e estruturas, drenagem de coleções

líquidas (com a substituição, muitas vezes, de atos cirúrgicos de menor morbidade e

consequente redução do tempo de internação e custos hospitalares), terapêuticas

ablativas (radio, crioablação e, mais recentemente, o laser, aplicados na terapia

oncólogica). Nesse sentido, na última década, a radiologia intervencionista vascular

apresentou grande evolução com os angiógrafos digitais, guiando a realização de

angioplastias, introdução de stents e, mais recentemente, embolizações de miomas,

tumores e aneurismas cerebrais, tornando a imaginologia cada vez mais integrada à

assistência global ao paciente.

Em se tratando ainda dos impactos das tecnologias no setor de saúde, Pires

(2010) salienta o fato de a literatura registrar que, em termos gerais, a introdução de

uma inovação tecnológica implica mudança de processos e na prática da assistência em

saúde. Essas mudanças tendem a resultar, ao menos na fase inicial, em aumento do

volume de trabalho, com efeitos sobre as cargas de atividades desenvolvidas, pois os

trabalhadores necessitam ser capacitados para o manuseio dos novos equipamentos ou

para trabalhar de outra maneira. Sendo assim, em um primeiro momento, o trabalhador

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necessita utilizar o “novo” e o “velho” modos de fazer, aumentando o volume do

trabalho, devido à necessidade de adaptação visando avaliar o seu domínio sobre a

tecnologia, bem como se essa se mostra segura e efetiva no âmbito da assistência em

saúde.

Ademais, sua vida e seus afazeres pessoais são afetados, uma vez que ele precisa

dedicar parte de seu tempo livre para adquirir conhecimento e competências

profissionais para acompanhar a acelerada evolução tecnológica em curso.

3.5 IMPACTOS DA TECNOLOGIA PARA O TRABALHADOR DE

SAÚDE

De acordo com Malagutti (2012), o avanço da tecnologia, associado à

globalização, faz com que os profissionais de saúde estejam cada vez mais direcionados

ao saber-fazer, focando suas habilidades para prestarem assistência aos pacientes, com

qualidade no cenário de saúde atual, sejam essas de caráter assistencial, administrativa,

educativa e/ou gerencial.

Para Pires (2010), o setor saúde tem sido bastante sensível à inovação

tecnológica, especialmente a do tipo material, utilizada na realização de exames

diagnósticos e em ações terapêuticas, além do significativo uso da informática.

Dessa forma, Mourão & Neves (2007) afirmam que a informática na área de

saúde tem como principal objetivo colocar o computador no ponto de assistência, ou

seja, no consultório médico, ambulatorial, enfermaria, sala de cirurgia e no próprio leito

hospitalar, permitindo o acesso à informação clínica, medicamentos, prontuário do

paciente e monitoração dos sinais. Sem um sistema adequado de informações, a criação,

o armazenamento e a recuperação das informações dos pacientes são feitos de forma

trabalhosa e redundante, exigindo muito tempo e esforço para documentar e permitir o

compartilhamento das informações a todos os profissionais que delas necessitam.

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Tendo em vista a aplicação dos sistemas informatizados à saúde, Hannan, Ball,

Edwards (2009) verificaram que os sistemas de informação em uso na área da saúde

podem ser genericamente classificados em três tipos:

1) O primeiro é composto de sistemas limitados quanto ao objetivo e ao escopo. O

mais comum é o sistema isolado (stand-alone) direcionado à uma área específica

de aplicação. Como exemplos, destacam-se aqueles dedicados a calcular a carga

horária dos enfermeiros dos hospitais. Nos hospitais, os sistemas incluídos nesse

grupo são direcionados a laboratórios, controle financeiro, radiologia,

eletrocardiografia, controle de funções pulmonares, sistema de farmácia e

nutrição. Na área da saúde pública, os sistemas de imunização podem ser

considerados como outro bom exemplo dessa categoria.

2) O segundo tipo é composto de sistema de informação hospitalar que, com

frequência, consiste de uma rede de comunicação, um componente clínico e um

componente administrativo e financeiro. O componente de comunicação geral

integra essas três grandes partes em um sistema de informação mais coeso. Um

sistema típico de informação hospitalar nessa categoria possibilita ter terminais

de computadores em cada posto de enfermagem, assim como terminais que

estão ou podem ser acessados em cada área do hospital. Os terminais são unidos

por meio de um ou mais computadores de grande porte, que podem estar no

local ou fora dele. Em geral, são direcionados para a prestação de cuidado

intensivo e organizados de acordo com as funções dos departamentos.

3) O terceiro tipo, os sistemas corporativos de informação em saúde, estão em

expansão nos ambientes de saúde. Tais sistemas capturam e armazenam

informações mais completas, provenientes da assistência à saúde contínua

realizada por diferentes organizações, usando um modelo integrado de prestação

de serviços. Esses registros são capturados e depositados em diversos tipos de

mídia, incluindo som, imagem, animação e impressão. Os registros podem ser

armazenados de modo central, em um formato total e abstrato, usando a

abordagem dos datawarehouse (sistemas que realizam tratamento de dados

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armazenados). Como alternativa, esses registros podem ser fisicamente

armazenados no ponto de captura e interligados a um registro virtual, que será

unido somente quando for solicitado. Esses sistemas são caracterizados por focar

o paciente que está recebendo o cuidado, em diversos setores (por exemplo,

ambulatório, unidade de tratamento intensivo, internação de longa permanência),

com uma estrutura própria e muito bem organizada.

Em se tratando da aplicação de tecnologias de informação móveis no setor de

saúde, Vogt (2012) observa que a utilização dessas tecnologias vem ganhando cada vez

mais espaço em todo o mundo, principalmente nos últimos cinco anos. Nesse sentido,

pesquisas realizadas pelo instituto Manhattan Research, nos Estados Unidos, apontaram

que 71% dos médicos consideram o uso de um smartphone essencial para a sua prática,

enquanto 84% citaram que a Internet é fundamental para o cotidiano da profissão.

Esse mesmo autor salienta que o uso dessas tecnologias impacta diretamente o

trabalho da equipe médica e o atendimento ao paciente. Atualmente é comum ver

profissionais da saúde circulando com tablets e celulares em mãos, visando acessar

desde informações na Internet até dados clínicos dos pacientes via Prontuário

Eletrônico, recurso que faz toda a diferença na tomada de decisão, pois ao ter acesso às

informações clínicas dos pacientes, (tais como doenças pré-existentes, medicação e

alergias), a qualquer hora e a qualquer lugar é possível traçar um diagnóstico mais

preciso e rápido ou até mesmo fazer uma prescrição médica.

Um estudo americano apontou ainda que o uso desses aparelhos vai além da

simples consulta, incluindo também o compartilhamento de informações entre médicos

e pacientes, possibilitando-os entender melhor seu estado clínico. Com um tablet em

mãos, o médico tem a mobilidade necessária para mostrar imagens de qualquer lugar do

hospital e não apenas da sala de consulta (VOGT, 2012). Outro fator que vem

influenciando a classe médica a adotar a mobilidade é a redução de erros gerada pela

eliminação do trabalho manual. Vogt (2012) afirma ainda que algumas pesquisas

recentes realizadas pela empresa Motorola relatam que funcionários que utilizam

aplicações móveis podem reduzir os erros manuais em até 31%. Quando o assunto é a

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área de saúde, onde um erro humano pode ser a diferença entre a vida e a morte, reduzir

riscos é primordial.

Conforme Massahud (2005), a medicina, bem como outras áreas de cuidado com

a saúde vem, nos últimos anos, passando por intensas transformações e disseminação de

informações e descobertas, originárias de um intenso progresso das Tecnologias de

Comunicação e Internet (TII) em todo o mundo. O advento das ferramentas de

Tecnologia da Informação trouxe à prática médica a oportunidade de otimizar as

atividades de armazenamento e recuperação mais estruturada de dados clínicos.

De acordo com Wen (2000), o crescente interesse pela informatização de

consultórios e clínicas começou quando os microcomputadores ficaram mais baratos e

suas capacidades de armazenamento e processamento alcançaram uma boa relação

custo-benefício para uso diário. Entretanto, cabe destacar que esse processo de

informatização mal planejado e executado em consultórios e clínicas provocou a

médicos prejuízos e perdas diretas com equipamentos mal empregados e aproveitados,

gastos com treinamento para uso de sistemas informatizados, e foram abandonados

pouco tempo depois. Esse mesmo processo também trouxe perdas indiretas, como

provocar diminuição da confiança das pessoas envolvidas nesses processos de

informatização em termos do surgimento de sensíveis dúvidas acerca da efetividade dos

sistemas e consequente resistência às futuras implantações (WEN, 2000).

Em função da ocorrência dos fatos acima citados, Wen (2000) destaca que foi

necessária a qualificação de um profissional com formação híbrida: um médico com

conhecimentos em informática ou um profissional da informática com conhecimentos,

no mínimo razoáveis, em medicina. Esse profissional tem a função de conduzir um

processo de informatização de forma dinâmica e independente, inclusive nas questões

referentes à concepção de recursos computacionais específicos para as atividades

médicas, com definição de recursos de software, hardware e capacitação humana

visando a integração efetiva de um sistema computacional em um ambiente médico.

Nesse sentido, a Residência de Informática Médica, relacionada ao grupo responsável

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pela Disciplina de Informática Médica do Departamento de Patologia da Faculdade de

Medicina da USP, busca formar médicos especialistas nessa área (WEN, 2000).

Muitas das novas tecnologias aplicadas à medicina têm resultado em impactos

de grande significação, tanto positivos quanto negativos, sobre a maneira como a

própria medicina é exercida. Essas tecnologias influenciam o modo como os médicos

diagnosticam e tratam os problemas de saúde e o modo como se relacionam com o

paciente, podendo também ter contribuído para um maior distanciamento entre paciente

e profissional de saúde, conforme avaliação de Grouse (1981) no editorial do Journal of

the American Medical Association, o qual formulou a seguinte questão: “Será que a

máquina se tornou o médico?”.

Por fim, cabe uma nova reflexão acerca da utilização da tecnologia na área de

saúde. Dessa forma, recorre-se a Koerich et al. (2006) ao destacarem que a ampla

aplicação e difusão das tecnologias no setor de saúde certamente remetem a uma gama

infinita de possibilidades e a negação dessa questão seria mero reducionismo. Por outro

lado, aceitá-las passivamente, sem questionamentos, consequentemente leva à adesão às

novas tendências e as suas possíveis influências no modo de “bem-viver”. Isso não

significa que se deva questionar a intenção benéfica de sua aplicabilidade, mas

considerando o crescente avanço dessas tecnologias e suas implicações no cenário

social e nas relações sociais, deve-se sim lançar sobre essas um “olhar crítico” no que se

refere ao impacto que podem causar.

3.6 IMPACTOS DA TECNOLOGIA NAS NOVAS FORMAS DE

GESTÃO DA SAÚDE

De acordo com Herédia (2004), o processo de introdução de novas tecnologias

no cenário competitivo contemporâneo acarretou uma série de efeitos sociais que

afetaram os trabalhadores e sua organização. Esses efeitos impactaram nos processos de

trabalho, na qualificação dos trabalhadores, nas condições de trabalho e na saúde do

trabalhador. A utilização dessas novas tecnologias trouxe para muitos países a redução

do trabalho necessário, repercutindo na economia líquida do tempo de trabalho, haja

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vista que, com o crescimento dos processos automatizados, tem início uma diminuição

dos coletivos operários, bem como a transformação na estrutura e organização dos

processos de trabalho. Para Borba & Kliemann (2008), as transformações ocorridas nos

processos de trabalho em todos os segmentos da economia, aliadas à ampliação dos

sistemas de saúde e ao aumento da complexidade do atendimento, têm fortalecido a

importância de uma gestão mais efetiva sobre os recursos do setor e a qualidade do

atendimento. Nesse contexto, diferentes práticas de gestão, somente utilizadas no setor

industrial, têm sido adaptadas à área de saúde. Dentre essas práticas, destacam-se;

Gestão da Qualidade Total (GQT), Gestão do Conhecimento (GC), Pensamento Enxuto

(Learn Thinking) e a Terceirização (Outsourcing) que serão apresentadas a seguir:

a) Gestão da qualidade total (GQT)10

– na visão de Campos (1999), a Gestão da

Qualidade Total pode ser definida como uma filosofia de gestão com o foco no

cliente, que faz uso da melhoria contínua (Kaizen)11

como um de seus princípios

visando alcançar os melhores resultados. Nesse sentido, segundo Johnson &

Omachonu (1995), no atual contexto competitivo globalizado, as organizações

de saúde públicas e privadas, que não fazem uso da prática de gestão da

qualidade em seus processos, acabam por empregar seus recursos de forma

ineficiente e ineficaz, impactando não apenas nos seus resultados, como também

afetando a sua capacidade de sobrevivência no mercado, tornando-as incapazes

de acompanhar tanto a evolução tecnológica e epidemiológica, no setor de

saúde, bem como a regulação estatal e a busca da excelência no atendimento e

cuidados a seus clientes.

A saúde no Brasil enfrenta demandas crônicas, como sobrecarga de

atendimentos de urgência, longos períodos de espera por uma consulta na rede

pública, falta de equipamentos e déficit de vagas em hospitais.

10

Em função da importância da Gestão da Qualidade Total no contexto da saúde, esse tema está

detalhado no item 3.8 desse capítulo.

11 Segundo Imae (1999, p.3) “A essência do Kaizen é simples e direta: Kaizen significa melhoramento.

Mais ainda, Kaizen significa contínuo melhoramento, envolvendo todos, inclusive gerentes e operários.

A filosofia do Kaizen afirma que o nosso modo de vida, seja no trabalho, na sociedade ou em casa

merece ser constantemente melhorado”

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Uma das críticas mais comuns ao SUS refere-se ao uso ineficiente dos recursos

disponíveis. O ministério da Saúde receberá, em 2013, um montante de R$ 99,8

bilhões para investimentos, custeio e financiamentos (www.globo.com, acesso

em 19/08/2013). Em 2012, os valores destinados à saúde foram de R$ 91, 7

bilhões (www.portalsaude.gov.br) e, em 2011, de 77 bilhões

(www.brasil.gov.br).

Nos anos anteriores, os números foram inferiores aos de 2011 e esse aumento

significativo de recursos financeiros não impactou positivamente na qualidade

do serviço oferecido ao paciente. Em pesquisa realizada em 2012 por Heider

Pinto, 63% dos usuários classificaram como regular, ruim ou muito ruim os

serviços prestados pelo SUS (www.portalsaude.gov.br). A pesquisa traz

números mais positivos na avaliação de médicos e enfermeiros e o autor ressalta

avanços em relação a períodos anteriores. Em 2013, muitas matérias jornalísticas

relataram graves problemas em diversos Estados brasileiros. Em matéria

divulgada pelo site www.estadao.com.br em 10 de agosto de 2013, a presidente

Dilma Rousseff reconheceu que a falta de médicos não é o único problema da

saúde do país, embora ela o considere o mais grave.

b) Gestão do Conhecimento (GC) - de acordo com Gonçalo e Borges (2010), as

organizações de saúde, reconhecidas como intensivas em conhecimento,

requerem que o conhecimento seja gerido como um recurso essencial e

estratégico. Assim sendo, necessitam implantar um processo contínuo de “ga-

rimpar” e “compartilhar” experiências vivenciadas em todas as atividades

participantes da cadeia de valor da prestação dos serviços de saúde. A gestão

dos recursos e a qualidade do atendimento no setor da saúde vem recebendo

maior atenção devido ao aumento da complexidade do atendimento, bem como

da ampliação dos sistemas de saúde. Todavia, tendo em vista esse cenário,

Porter & Teisberg, (2007) salientam que as organizações de saúde necessitam

estabelecer tanto estratégias mais eficazes, quanto modelos de gestão mais

efetivos, buscando incentivar o desenvolvimento do conhecimento como um

recurso que agrega valor na cadeia de serviços e, em particular, que agrega valor

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para os pacientes. Para tal, surge a teoria de gestão de conhecimento em saúde

para alinhar pessoas, processos e tecnologias e otimizar informações,

colaboração, especializações e experiências com habilidade para impactar

positivamente a performance organizacional. Guptill (2005) ressalta que o

processo de gestão do conhecimento tende a ocorrer no longo prazo e

proporciona um compromisso sustentado para a mudança da cultura nas

organizações de saúde, tornando-as mais colaborativas, transparentes e

pró-ativas.

Há em todo país uma crise sistêmica de formação profissional que, somada à

desigual distribuição de mão-de-obra por regiões, deixa a saúde brasileira em

péssima situação. Além dos problemas na formação profissional, há falta de

médicos. Dados do Conselho Federal de Medicina indicam que o país possuía

388.015 médicos registrados em 2012 (www.cremesp.org.br). A tabela 5

apresenta a distribuição dos médicos no Brasil por região.

Tabela 5 Distribuição de médicos por região

REGIÕES

MÉDICOS REGISTRADOS NO CFM

CENTRO-OESTE 29.634

SUL 57.851

SUDESTE 217.460

NORTE 16.538

NORDESTE 66.532

TOTAL 388.015

Fonte: CFM, Pesquisa Demográfica Médica, 2012

Nota-se que 71% dos médicos atuam nas regiões sul e sudeste, o que

demostra a carência de profissionais nas demais regiões do país. Considerando-

se o número de médicos por 1000 habitantes, pode-se observar grandes

discrepâncias (dados do cremesp 2012):

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- 1,01 médicos por mil habitantes na região norte;

- 1,23 médicos por mil habitantes na região nordeste;

- 2,05 médicos por mil habitantes na região centro-oeste;

- 2,09 médicos por mil habitantes na região sul e

- 2,67 médicos por mil habitantes na região sudeste.

Ademais, dados do Conselho Regional de Medicina de São Paulo indicaram, em

pesquisa realizada em 2012 que 54% dos médicos não obtiveram aprovação

mínima em prova elaborada aos formandos que se cadastram no conselho.

(www.cremesp.org.br). Nota-se a gravidade na situação ao se constatar:

- faltam médicos;

- parcela significativa dos médicos disponíveis apresenta deficiência em sua

formação.

A realidade dos trabalhadores em enfermagem também é preocupante em função

da formação deficitária existente na área. Procedimentos simples, como a

retirada de curativos e a aplicação de soro, são realizados de modo impróprio

algumas vezes. Especialistas, como o presidente do COFEN (Conselho Federal

de Enfermagem), apontam para a formação inadequada e a falta de consciência

sobre a função exercida como as principais causas de erros de enfermagem

(www.r7.com). Silva et al (2007) afirmam que erros na medicação representam

uma triste realidade no trabalho de enfermeiros com sérias consequências para

pacientes e para a organização hospitalar. As autoras ressaltam ainda que,

quando o erro é identificado, ações punitivas são adotadas imediatamente. Elas

observam que faltam iniciativas educativas para que os erros não ocorram

novamente.

Constata-se, portanto, que a má formação dos profissionais de saúde ocasiona

diversos transtornos para a sociedade e as perspectivas são pouca animadoras

pois há necessidade de apoio e investimentos em capacitação para que a longo

prazo essa realidade seja transformada positivamente.

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c) Pensamento Enxuto - em muitos países, dentre esses o Brasil, o setor de saúde

está marcado por custos crescentes na assistência, juntamente com uma piora na

qualidade dos serviços e restrições crescentes no acesso aos serviços pela

população (ARAUJO, 2007). Nesse sentido, ainda segundo Araujo (2007), os

serviços de saúde apresentam fortes evidências de fontes de ineficiência e

problemas de qualidade que constituem um verdadeiro desafio para os gestores

dessa área. No intuito de solucionar os problemas de ineficiência e qualidade

apontados no setor de saúde, surge a teoria de pensamento enxuto, a qual,

conforme Ben-Tovin et al (2007), trata-se de um abordagem de gestão baseada

de princípios e métodos12

desenvolvidos e amplamente aplicados nas indústrias

de manufatura, principalmente a indústria automotiva, que tem como principal

objetivo aumentar a satisfação do cliente por meio da melhor utilização dos

recursos. Como a indústria automotiva, o setor de saúde também enfrenta

enormes desafios visando atender a elevada demanda que exige alta velocidade e

flexibilidade, associados a altos padrões de qualidade e segurança, fato que

justifica o crescimento da aplicação daquela prática.

Torna-se necessário vincular pensamento enxuto e gestão do conhecimento uma

vez que novas competências são fundamentais para que resultados mais efetivos

sejam alcançados. Os princípios do pensamento enxuto demandam novas

práticas e métodos, bem como mudanças de comportamento dos profissionais na

execução dos trabalhos. A implantação dessas transformações exige a

participação dos envolvidos no processo, sejam gestores ou profissionais da

saúde e devem ser orquestradas pelo Estado.

d) Terceirização (Outsourcing) - segundo MacDonald & Horton (2009), as

mudanças tecnológicas, políticas e sociais das décadas de 1970 e 1980 alteraram

profundamente o ambiente de operações das empresas, dentre essas as de saúde,

imprimindo diretrizes de reorganização competitiva que popularizaram

conceitos como subcontratação ou terceirização, que reconfiguraram o processo

12

De acordo com Åhlström (2004) esses princípios e métodos podem ser resumidos em: Eliminação de

desperdícios (Muda), Zero Defeito, Puxar ao invés de empurrar, Equipes multifuncionais,

Descentralização de responsabilidades, Sistemas verticais de informação, Melhoria Contínua (Kaizen).

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de flexibilização do trabalho. Para Cherchglia (1999), Terceirização

(Outsourcing é o termo original em inglês) é um neologismo derivado da

palavra “terceiro”, entendido como intermediário, interveniente, que, na

linguagem empresarial, caracteriza-se como uma técnica de gestão por meio da

qual se interpõe um terceiro, geralmente uma empresa, na relação típica de

trabalho. Pode-se, assim, definir a terceirização como o processo pelo qual a

empresa, visando alcançar maior qualidade, produtividade e redução de custos,

repassa a uma outra empresa um determinado serviço ou a produção de um

determinado bem. A atual e crescente tendência de terceirização da contratação

de trabalho no setor da saúde vai além dos serviços gerais de limpeza, vigilância,

alimentação, manutenção, etc, já tradicionais, e atinge, também, os serviços

profissionais e técnicos de saúde (laboratórios, serviços de imagem, pronto-

socorro e até atendimento médico).

Em entrevista publicada pelo portal UOL em 03 de novembro de 2012, o

médico e presidente do sindicato dos médicos de São Paulo (SIMESP), Cid

Carvalhães, afirmou que a terceirização da saúde pública cria diversos

problemas, pois gera a mercantilização de um sistema que por dever é de

responsabilidade do poder público. Além disso, a terceirização gera uma

rotatividade desastrosa, pois os profissionais são contratados sem concurso

público e muitos não possuem a qualificação adequada, o que gera

desassistência aos usuários do sistema (www.uol.com.br).

Em entrevista publicada pelo Repórter Brasil em 09 de dezembro de

2012, o procurador geral do Ministério Público do Trabalho, Luis Antonio

Camargo de Melo afirmou que há problemas decorrentes da terceirização, como

o aumento no número de acidentes de trabalho e a dificuldade do trabalhador em

pleitear seus direitos na Justiça. Os setores da saúde, da construção civil e

bancário estão entre os que mais terceirizaram nos últimos anos

(www.reporterbrasil.org.br).

Segundo Girardi et al (1999), a terceirização ganhou espaço e vem

atingindo de forma crescente áreas antes protegidas, como os serviços

profissionais especializados e essenciais, a gerência dos serviços e inclusive a

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gestão financeira. Para os autores, o aumento da produtividade e da eficiência na

produção de serviços via transferência dos custos dos passivos trabalhistas e da

administração dos conflitos para os agentes terceiros contratados se colocava

entre as principais vantagens comparativas da terceirização. Assim, a

terceirização na saúde apresenta aspectos positivos, especialmente em função da

redução de custos para a gestão hospitalar mas, por outro lado, implica,

costumeiramente, a precarização dos direitos dos trabalhadores.

3.7 IMPACTOS DA TECNOLOGIA NA QUALIFICAÇÃO DOS

PROFISSIONAIS DE SAÚDE

Sob a ótica de Bomfin (2010) e Ciuffo & Brant-Ribeiro (2008), as

transformações tecnológicas e organizacionais ocorridas a partir dos anos 90, aliadas ao

processo de globalização, tornaram o mercado de trabalho mais complexo e dinâmico,

exigindo de todos os profissionais uma maior qualificação visando uma eficiência para

aumentar ganhos, racionalizar processos e alta capacidade de adaptação às constantes

mudanças do cenário econômico mundial.

As implicações oriundas dessas transformações criaram um mercado de trabalho

cada vez mais competitivo, bem como clientes mais exigentes e organizações que

incorporam os termos qualidade, redução de custos, flexibilidade e qualificação

profissional em suas estratégias.

Dessa forma, na visão de Bonfim (2010), o atual desenvolvimento científico e

tecnológico vem causando transformações constantes nos ambientes de trabalho e,

consequentemente, exigindo um profissional com perfil mais aberto e capaz de adaptar-

se às mudanças, instrumentalizado e motivado a continuar aprendendo ao longo de sua

vida. Nesse contexto, as organizações de saúde foram obrigadas a desenvolver um novo

perfil dos profissionais do setor por meio do investimento e desenvolvimento de novos

cursos de saúde e no incentivo à formação continuada.

Para Bonfim (2010), o novo perfil do profissional de saúde possui educação

especializada, é aberto as novas técnicas e práticas de sua área de atuação e participa de

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treinamentos para aprimoramento contínuo de suas habilidades. Ele deve ser capaz de

avaliar e identificar problemas de cuidados de saúde de pacientes em situações de crise.

Além disso, esse profissional deve ser capaz de: estabelecer prioridades, avaliar a

situação do paciente e auxiliar as famílias no contexto do cuidado. Afirma Palmeira

(2011) que o profissional de saúde deve ter habilidade técnica e prática para cuidar de

pacientes em situação de emergência. Esse autor afirma também que o profissional deve

ter raciocínio lógico para resolução de problemas em qualquer ambiente. Além dessas,

há outras competências a serem desenvolvidas por médicos e profissionais de

enfermagem, tais como:

- conhecimento técnico e capacidade de utilização dos equipamentos disponíveis em sua

área de atuação;

- autocontrole e equilíbrio emocional;

- autocrítica e motivação para busca de um aprimoramento contínuo;

- capacidade de administrar o tempo escasso e de trabalhar sob pressão.

Assim, esse profissional é importantíssimo em todo o percurso clínico.

Silva, Ogata e Machado (2007) afirmam que é necessária a formulação de novas

estratégias e métodos de capacitação para melhorar os resultados dos trabalhadores da

saúde. Para esses autores, a adequação profissional exige modificações nas

capacitações, pois muitas vezes os cursos, treinamentos e outras modalidades de

educação ocorrem desarticulados do contexto dos serviços e de uma visão integral. Para

atender a esta perspectiva é fundamental estabelecer um modelo de capacitação que

considere a articulação de saberes e práticas profissionais a partir de um conceito

ampliado de saúde, que promova a atenção integral à saúde, alicerçado na aprendizagem

significativa: a Educação Permanente em Saúde.

A Educação Permanente em Saúde ainda é uma utopia para os profissionais da

saúde no Brasil.

Para Silva, Ogata e Machado (2007), poucos profissionais participam de cursos

de capacitação, mesmo os gratuitos, em função de motivos tais como: falta de estímulo

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financeiro, falta de um plano de cargos e salários, necessidade de custear transportes e

oferta de cursos fora do expediente.

Quanto aos cursos pagos, acrescenta-se a dificuldade em se obter recursos

financeiros uma vez que a grande maioria das instituições hospitalares não destina

verbas para capacitação de médicos e enfermeiros. Agrava ainda mais essa situação a

sobrecarga de trabalho da maioria dos profissionais, o que diminui o tempo para

reciclagem, e os baixos salários, especialmente na área da enfermagem, que limitam ou

impedem investimentos próprios em formação continuada.

Assim, a falta de profissionais com perfil adequado e competências

desenvolvidas é um dos principais obstáculos para a melhoria da qualidade e da

efetividade dos serviços de saúde.

Considerando-se a realidade brasileira, existem ilhas de conhecimento, pesquisa

e usos de tecnologias de ponta, especialmente em hospitais como o Sírio Libanês e o

Albert Einstein, ambos localizados na cidade de São Paulo.

No entanto, para a grande maioria da população, que é atendida pelo SUS ou por

convênios médicos que oferecem serviços de qualidade duvidosa, há falta de

investimentos em tecnologia e não há programas de capacitação continuada para os

profissionais da saúde que atendam as expectativas e demandas da população.

Assim, causa indignação constatar que tecnologias existem, salvam vidas e

oferecem tratamentos significativamente melhores apenas para pequena parcela de

indivíduos. Por outro lado, a grande maioria da população é atendida por profissionais

pouco qualificados e em hospitais com equipamentos tecnológicos ultrapassados.

3.8 GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE

De acordo com Rosa et al. (2011), a preocupação com a Qualidade surgiu no

ambiente industrial, sobretudo influenciada pela produtividade e competitividade da

indústria automobilística. No princípio, no final do século XIX, a ênfase era com a

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inspeção dos produtos e a preocupação com as necessidades dos clientes foi deixada de

lado. Após a I Guerra Mundial, a ênfase da qualidade passou a ser a incorporação das

técnicas estatísticas substituindo a inspeção final pelo Controle Estatístico do Processo

(CEP), isso é, a Qualidade deveria ser avaliada por amostragem ao longo do processo de

produção. Cabe destacar que, a II Guerra Mundial contribuiu sensivelmente para uma

nova mudança na forma de definir Qualidade e, a partir dessa data a Qualidade passou a

ser associada a ausência de falhas, de modo a possibilitar a produção de produtos com

garantia.

A crise econômico-financeira decorrente da Guerra influenciou para que as

organizações se preocupassem com a qualidade de modo a reduzir custos com a

produção sem defeitos. Nesta mesma época, o Japão que saiu arruinado da II Guerra

Mundial definiu o movimento da qualidade como a estratégia de sair da crise e eliminar

as perdas. Dessa forma, percebeu-se uma modificação na forma de se definir qualidade,

ao buscar e incorporar os comprometimentos das pessoas da organização na

implantação das ferramentas e técnicas que objetivam a satisfação do cliente (ROSA et

al., 2011).

Nesse sentido, segundo Campos (2004) é nesse momento que surge o Total

Quality Control (TQC), o qual se tornou um movimento que contribuiu para a inserção

das empresas japonesas no mercado internacional com qualidade e produtividade.

Assim, a gestão da qualidade deixou de ser preocupação apenas do setor industrial e

tornou-se um diferencial também para as empresas prestadoras de serviço. A abordagem

de Qualidade predominante deixou de ser apenas focada na correção de defeitos

passando a ser direcionada à prevenção desses, desde o projeto de desenvolvimento do

produto.

A partir dos anos 80, os países do ocidente implantaram o momento conhecido

como Total Quality Management (TQM) como uma reação a perda de mercado

competitivo em função do avanço japonês. A partir de então, a qualidade passou a ser

vista como uma estratégia competitiva integrada com as demais estratégias da

organização. A qualidade tornou-se um dos critérios competitivos inserindo a

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preocupação com a satisfação dos clientes, com os fornecedores ao longo da cadeia de

produção e com o envolvimento de todos na organização. Assim, a gestão da qualidade

deixou de ser preocupação apenas do setor industrial e tornou-se um diferencial também

para as empresas prestadoras de serviço. A abordagem predominante deixou de ser a

correção de defeitos para a prevenção desde o projeto de desenvolvimento do produto.

3.8.1 O CONCEITO DE QUALIDADE

Na visão de Juran e Gryna (1991), a palavra Qualidade possui dois significados:

1) O primeiro - Qualidade é um conjunto de características do produto que satisfaz

as necessidades dos clientes, que leva a satisfação em relação ao produto.

2) O segundo - Não deverão existir falhas em um bem a ser consumido.

Para Feigenbaum (1994), o significado de Qualidade, em termos de bens e serviços,

nada mais é do que a combinação de características que envolvam ações de Marketing,

produção e manutenção, visando atender às expectativas dos clientes. O importante é

reconhecer que questões como a confiança, acesso e manutenção de bens ou serviços

são exigências naturais para a determinação da qualidade e fidelidade do cliente, ou

seja, é necessário sempre haver um planejamento da qualidade.

Já na abordagem de Crosby (1999), Qualidade é investimento. Para garantir esse

investimento é preciso que todas as pessoas envolvidas dentro de uma organização,

desde a alta direção até os departamentos, comprometam-se a desempenhar sua função

o melhor possível. A questão de garantir a qualidade, com o comprometimento de

todos, pode ser estimulada pelo profissional responsável pela qualidade da empresa.

Todavia, sob a ótica de Paladini (2012), definir a qualidade não é uma tarefa fácil,

isso por que essa não diz respeito a apenas um aspecto isolado. O primeiro passo para

definí-la é considerá-la como um conjunto de elementos ou atributos que compõem o

bem ou serviço. Dessa forma, Paladini (2012, p.28) ressalta que uma definição

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adequada considera que a Qualidade “[...] envolve muitos aspectos simultaneamente, ou

seja, uma multiplicidade de itens [...]” e “[...] sofre alterações conceituais ao longo do

tempo, isto é, trata-se de um processo evolutivo”. É um grande equívoco considerar que

a Qualidade possa ficar restrita, apenas, a um ou alguns aspectos conceituais.

Em função da dificuldade em se definir corretamente Qualidade, baseado em

estudos comparativos entre o número de falhas norte-americanas e japonesas, David A.

Garvin, professor da Harvard Business School, desenvolveu uma obra voltada ao

esclarecimento do conceito e aplicação da Qualidade. Nas palavras desse autor “se a

qualidade deve ser gerenciada, precisa ser primeiro entendida”. Assim sendo, Garvin

(1992), ao invés de apenas uma abordagem, identificou a existência de cinco principais

abordagens para a definição da qualidade, conforme segue:

1) Abordagem Transcendental – sob a visão transcendental, a Qualidade é

sinônimo de excelência absoluta e universalmente reconhecível, marca de

padrões irretorquíveis e de alto nível de realização. Há algo de intemporal e

duradouro nas obras de alta qualidade. Percebe-se, com essa visão, que a

Qualidade não é passível de análise e que se aprende a reconhecê-la apenas pela

experiência.

2) Abordagem baseada no Produto – em relação à abordagem fundamentada no

produto, a Qualidade é considerada uma variável precisa e mensurável. As

diferenças de Qualidade são refletidas nas diferenças de algum ingrediente ou

atributo do produto. Essa abordagem confere uma dimensão vertical ou

hierárquica à Qualidade, pois os produtos podem ser classificados de acordo

com a quantidade do atributo desejado. Entretanto, uma classificação sem

ambiguidade só se torna possível se os atributos em questão forem classificados

com o mesmo critério praticamente por todos os usuários.

3) Abordagem baseada no Usuário – a premissa básica da abordagem

fundamentada no usuário é de que a qualidade está diante dos olhos de quem a

observa. Admite-se que cada cliente tem diferentes desejos e necessidades, e que

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o produto que melhor atender às suas preferências será por esse considerado o de

melhor qualidade. Trata-se de uma visão pessoal e, portanto, subjetiva da

qualidade.

4) Abordagem baseada na Produção – a abordagem focada na produção, sobretudo,

se interessa pelas práticas relacionadas diretamente com a engenharia e a

fabricação. Essa identifica a Qualidade conforme as especificações, ou seja, uma

vez estabelecido o projeto, qualquer desvio implica queda de Qualidade. A

partir daí surge o conceito: fazer certo da primeira vez. Essa mesma abordagem

vale para a prestação de serviços. Seu enfoque básico é interno, porque se supõe

que um bem ou serviço que se desvie das especificações, provavelmente será

malfeito e não confiável, proporcionando menos satisfação ao cliente.

5) Abordagem baseada no Valor: essa abordagem é tida como um passo adiante em

relação às anteriores. Define Qualidade em termos de preço e benefícios

ofertados. Dessa forma, um produto de qualidade oferece desempenho ou

conformidade a um preço aceitável. Pelo fato de trabalhar com dois conceitos

relacionados, mas, distintos, essa abordagem também é de difícil aplicação

prática, porque seus limites não são bem definidos, além de depender da

variabilidade das necessidades e opiniões de cada cliente.

3.8.2 GESTÃO DA QUALIDADE

Conforme Paladini (2012), a gestão da qualidade é entendida como a abordagem

adotada e o conjunto de práticas utilizadas para obter-se, de forma efetiva, a Qualidade

pretendida para o produto. A gestão da qualidade de uma empresa envolve seus

processos e se estende aos fornecedores e clientes.

Garvin (1992) considera que a gestão da qualidade evoluiu, ao longo dos

tempos, em quatro estágios, que denomina “eras” da qualidade: inspeção, controle

estatístico da qualidade, garantia da qualidade e gestão estratégica da qualidade. São

elas:

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1) Inspeção: refere-se ao período em que a gestão da qualidade se limitava apenas a

inspeção dos produtos acabados. Trata-se de um enfoque meramente corretivo

de inspeção do produto acabado, com o propósito de segregar as unidades não

conformes. De modo geral, as práticas adotadas não são baseadas em métodos

científicos.

2) Controle estatístico da qualidade (CEQ): corresponde à era do desenvolvimento

das ferramentas estatísticas de amostragem e de controle estatístico de processo,

orientadas à avaliação da qualidade no processo. O controle do processo é um

enfoque preventivo centrado no acompanhamento e controle das variáveis do

processo que podem influir na qualidade final dos produtos. Foi responsável por

um grande salto nos padrões de qualidade da indústria e pela elevação do

controle da qualidade ao status de disciplina científica.

3) Garantia da qualidade: aqui, a gestão da qualidade, de uma teoria restrita ao chão

de fábrica ou à produção fabril, assume um papel mais proeminente no

gerenciamento da empresa. Deixa de ser apenas a aplicação de técnicas

estatísticas para a prevenção e o controle da qualidade, assumindo o papel de

garantir a qualidade em todas as áreas e atividades da empresa por meio de

sistemas da qualidade. Os sistemas de garantia da qualidade estão associados a

um enfoque relativamente mais amplo e preventivo que procura, por meio de um

gerenciamento sistêmico, garantir a qualidade em todas as etapas do ciclo do

produto, desde a identificação das necessidades, ao uso e descarte do produto.

4) Gestão estratégica da qualidade: essa é a fase de evolução, na qual a gestão da

qualidade se encontrara atualmente, passando a ter uma dimensão estratégica.

Nessa etapa, as empresas gerenciam a qualidade de forma pró-ativa como fonte

de vantagem competitiva, utilizando-se de um processo de planejamento

estratégico para a qualidade e de um amplo conjunto de ações (programas,

treinamento, grupos de melhoria, ferramentas de análise e melhoria de

processos, qualidade no desenvolvimento do produto, etc.) visando atingir os

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objetivos de satisfação total do cliente. Essa era se concretiza por meio da gestão

da qualidade total, que se refere a uma visão de como gerenciar globalmente os

negócios com uma visão orientada para a satisfação total do cliente e para a

melhoria contínua, sendo composta por um conjunto integrado de princípios,

ferramentas e metodologias que apoiam a melhoria contínua dos processos e

produtos.

3.8.3 GESTÃO DA QUALIDADE NA SAÚDE

De acordo com Johnson & Omachonu (1995) e Lima (2006), o movimento de

gestão da qualidade no setor de saúde iniciou sua expansão bem depois do movimento

da qualidade na área industrial, e nos primórdios era muito questionável se os conceitos

e ferramentas da qualidade poderiam ser aplicados também na área de saúde.

Para Nogueira (1996), a preocupação com a qualidade na prestação de serviços

em saúde é antiga. Destaca-se como exemplo a pioneira Florence Nightingale (1820-

1910), enfermeira inglesa que implantou o primeiro modelo de melhoria contínua de

qualidade em saúde no ano de 1854, baseando-se em dados estatísticos e gráficos. Sua

participação na guerra da Criméia foi impressionante. Seis meses após sua chegada ao

Hospital Scutari, as taxas de mortalidade recuaram de 42,7% para 2,2%, com os rígidos

padrões sanitários e de cuidados de enfermagem por ela estabelecidos.

Nogueira (1996) destaca também como outro exemplo das aplicações iniciais da

gestão da qualidade no setor de saúde, o fato do médico Donald Berwick, professor de

Pediatria da Universidade de Harvard que, em 1987, coordenou um estudo patrocinado

pela Fundação John A. Hartford e pelo Harvard Community Health Plan, com o

objetivo de comprovar ou não a aplicabilidade dos conceitos e práticas da gestão da

qualidade industrial na área da saúde. Assim sendo, grupos de trabalho de vinte e uma

instituições de saúde foram assistidos por consultores de qualidade oriundos de

empresas da área industrial de conhecido êxito nos seus programas de qualidade,

consultores que não possuíam maiores conhecimentos ou experiência na área da saúde.

Sob a orientação desses consultores, os grupos trabalharam problemas específicos de

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suas instituições, utilizando os mesmos métodos e ferramentas aplicadas na indústria.

Os resultados do estudo apontaram diminuição dos custos, melhoria na qualidade,

aumento de produtividade, apresentando, assim, forte tendência que a gestão da

qualidade poderia ser também aplicada à área da saúde.

Apesar dos exemplos Lima (2006) ressalta que alguns cuidados devem ser

tomados com a aplicação da teoria da gestão da qualidade no setor de saúde, em função

das características do setor, pois, muito embora um hospital possa ser visto como uma

instituição humanitária, apresenta características operacionais diferenciadas, bem como

os mesmos problemas econômico-financeiros das outras empresas. A grande diferença

entre um hospital e outras empresas prestadoras de serviços é que, ele recebe um

paciente enfermo e deve, caso seja possível, devolvê-lo ou permitir a sua saída com

saúde. Dessa forma, o paciente é o cliente cuja saúde e o próprio corpo não funcionam

adequadamente. Trata-se, portanto, de um ser humano, em um momento frágil,

debilitado, que sofre e que se desequilibra. O ser humano é a razão da existência das

Organizações de Saúde, sendo imprescindível que seja muito bem recebido,

compreendido e devidamente assistido.

Pereira, Galvão e Chanes (2005), com relação ao setor hospitalar, abordam a

relevância e necessidade do desenvolvimento e aplicação de um modelo de gestão da

qualidade que deve estar baseado na premissa de que o paciente é o centro da

assistência, e é por ele que a prestadora de serviços hospitalares se propõe a definir suas

estratégias e focar suas ações. O produto resultante das atividades de um hospital é o

cuidado com o paciente e ele não pode e não deve ser considerado como uma simples

peça de uma linha de produção. A maioria dos serviços de saúde tem como

peculiaridade o fato de que esses serviços vinculam-se diretamente às pessoas. O

serviço de saúde somente tem a sua razão de ser no momento em que atende às

necessidades de saúde do paciente.

Na visão de Lima (2006), é natural questionar se as práticas da gestão da qualidade

industrial realmente poderiam auxiliar nos processos de assistência à saúde, haja vista

que são nítidas as diferenças entre uma linha de montagem e um consultório médico.

Nesse sentido, existem três básicas características dos hospitais, que muito diferem de

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outras empresas e que constituem grandes desafios à aplicação bem sucedida da teoria

de gestão da qualidade:

Falta de clareza de quais atividades estão acarretando quais resultados clínicos,

bem como as relações de causa e efeito raramente definidas.

Os pacientes têm dificuldade em distinguir o atendimento de elevada qualidade

do de baixa qualidade.

Os hospitais muitas vezes operam com linhas distintas de autoridade, ou seja, o

administrativo, de enfermagem e médico, em vez da pirâmide única de

autoridade comum na indústria.

As organizações hospitalares, sejam públicas ou privadas, estão inseridas em um

ambiente complexo e singular que as condiciona a um funcionamento inadequado

diante da lógica da acumulação lucrativa dos mercados (NOGUEIRA, 1996).

Independentemente de sua natureza, ambas as condições estão subordinadas a princípios

éticos e legais que normatizam o setor da saúde e às políticas governamentais que

colocam os hospitais frente a uma diversidade de interesses divergentes a contemplar.

Os hospitais, no que se refere à Qualidade, apresentam alguns problemas

comuns ao setor industrial, como a cultura do desperdício, a falta de planejamento e

mapeamento dos processos e a estrutura fragmentada e complexa desta organização.

Trata-se de um ambiente onde há fortes interações entre profissionais de diversas

especialidades, com muitos procedimentos e rotinas. Diante dessa complexidade, é

importante investir nas pessoas, a fim de conseguir o atendimento que todos desejam

(MELLO, 2011). Portanto, há fortes indícios que os processos dos serviços de saúde

também podem ser melhorados com a implantação da gestão da qualidade.

Apesar das possibilidades de aplicação da gestão da qualidade no setor de saúde,

Berwick (1994a, 199b) ressalta que, no setor hospitalar, observa-se uma grande

resistência aos programas de Qualidade em função dos médicos que, historicamente,

detêm o poder dentro dessas organizações e não veem com bons olhos a ideia de

contenção de custos, nem uma avaliação do seu trabalho em uma perspectiva de medir a

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qualidade, por se sentirem fiscalizados e terem medo de perder sua autonomia na

condução clínica dos pacientes. Há também o fator financeiro que não atrai a

participação da categoria médica nesses processos. Remunerados, em sua maioria, pela

produção de serviços, os médicos não desejam desperdiçar o horário de trabalho com

programas dessa natureza (BERWICK, 1994a). Além disso, a formação médica ainda é

fundamentada no modelo flexneriano13

, que dá ênfase à clínica em sua dimensão

biológica e no qual os aspectos sociológicos, políticos e administrativos ficam relegados

ao segundo plano. Na visão da OMS (1994), essas questões são pouco observadas nos

currículos das escolas médicas, por isso há obstáculos à adesão dos médicos aos

programas de qualidade por deficiência e limitação na sua formação.

De modo geral, conforme Gutierres (2008), o setor de serviços médico-

hospitalares, tanto no Brasil como em outros países, principalmente nos países em

desenvolvimento, deixa a desejar em termos de desempenho em qualidade.

Normalmente, os clientes estão acostumados com serviços de baixa qualidade,

prestados pelo setor privado e, principalmente, pelo setor público, no caso brasileiro. O

Brasil investe, anualmente, em saúde cerca de 7% de seu Produto Interno Bruto (US$

204 per capita), enquanto os Estados Unidos aplicam 15,4% do PIB, (US$ 3.000 per

capita); o Canadá, 9,8% (US$ 2.400 per capita); e a Argentina, 9,6% (US$ 251 per

capita) (VINHAL, 2008). Assim, sobram poucos recursos para investimentos na

melhoria da qualidade.

Observa-se, ainda, considerando-se a visão de Vinhal (2008), que o desperdício

de recursos e a falta de padronização das práticas no setor de saúde são flagrantes, fatos

que podem ser observados a partir de dados do Ministério da Saúde como, por exemplo,

a taxa de 15,6% de infecção hospitalar que atinge cerca de 700 mil usuários por ano. Por

fim, segundo alguns estudos internacionais, o custo de um usuário que contrai infecção

hospitalar é de duas a cinco vezes mais alto (em torno de oito mil dólares) do que o

custo com um usuário sem infecção. Tendo em vista esses dados, Damaceno (2009)

afirma que iniciativas que contemplem a melhoria de processos e a sistematização de

13

O modelo Flexneriano recebeu esse nome em homenagem a Flexner, autor do relatório que

fundamentou, em 1911, as faculdades de medicina americana e canadense.

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atividades, como a implantação de Sistemas de Gestão da Qualidade, mostram-se

bastante oportunas diante desse contexto.

Constata-se, portanto, que as novas tecnologias e formas de gestão não estão

verdadeiramente incorporadas ao setor da saúde. O Estado, as organizações privadas e

filantrópicas, de modo geral, têm sido incompetentes na disseminação e no uso das

novas tecnologias e práticas de gestão. Os benefícios não chegam para a ampla maioria

dos usuários do sistema, o que causa inúmeros problemas pessoais e sociais.

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108

CAPÍTULO IV – O ESTUDO DE CASO

Para demonstrar a revolução na saúde e seus impactos no trabalho e na vida do

trabalhador foi realizado um estudo de caso.

A pesquisa ocorreu nos meses de fevereiro e março de 2013 junto a

trabalhadores médicos e enfermeiros que atuam no Hospital Stella Maris (HSM),

localizado na cidade de Guarulhos, município pertencente a grande São Paulo.

Praticamente todos os entrevistados estão no mercado de trabalho há mais de 10

anos e atuam no hospital frequentemente (observa-se que alguns médicos costumam

visitar e atuar em diversos hospitais. Parte dos enfermeiros também possui outras

atividades profissionais). Dos nove médicos entrevistados, apenas um atua

exclusivamente no Stella Maris. Das nove enfermeiras entrevistadas, somente três

trabalham exclusivamente no Stella Maris. Nota-se, assim, que mesmo tendo uma carga

horária mínima de 36 horas/ semana no HSM, seis enfermeiras entrevistadas possuem

outro emprego, e em outro hospital, o que implica jornadas de trabalho que ultrapassam

doze horas diárias. A maior parte dos entrevistados, é importante frisar, afirmou que tem

como principal fonte de renda os serviços prestados no HSM.

O salário dos enfermeiros tem como base o piso da categoria e o plano de cargos

e salários está constituído conforme demonstra a tabela 6.

Tabela 6 – Piso salarial de enfermeiros

Cargo Horas trabalhadas/ semana Salário Bruto

Enfermeiro Junior 36 R$1.702,84

Enfermeiro Pleno I 44 R$ 2.081,20

Enfermeiro Pleno 36 R$ 2.731,21

Enfermeiro Pleno 44 R$ 3.337,40

Fonte: Hospital Stella Maris

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109

Nota-se, na tabela acima, que o salário dos enfermeiros é bastante baixo quando

se consideram as responsabilidades e atribuições de sua função. O enfermeiro é um

profissional de nível superior que, dentre outras coisas, trabalha pelo cuidado, faz

curativos, administra remédios com orientação médica, aplica injeções, e é um dos

responsáveis pela promoção, prevenção e recuperação da saúde dos indivíduos. O

exercício das atividades e tarefas exige cautela e atenção total, pois erros muitas vezes

causam danos irreparáveis aos pacientes. A falta de preparo e jornadas excessivas de

trabalho são fatores que aumentam a incidência de erros que, nos últimos anos, foram

amplamente divulgados pela mídia e estão no centro dos debates sobre esse setor.

Os médicos do hospital Stella Maris são remunerados como prestadores de

serviços. Nesse modelo, grupos de profissionais são responsáveis por determinadas

atividades e áreas de atendimento obtendo sua remuneração por tempo dedicado e

atendimentos realizados. Ao final do mês, as equipes médicas emitem nota fiscal de

prestação de serviços conforme os trabalhos executados. Como os principais recursos

do hospital são repassados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), metas de produtividade

são exigidas, conforme determinações do Ministério da Saúde. Assim, o hospital recebe

os repasses de acordo com o número de atendimentos e procedimentos realizados,

classificados como pequena, média ou alta complexidade. Tais recursos devem

remunerar as equipes médicas e custear despesas com pessoal administrativo e de

enfermagem, além dos custos com insumos, manutenção, medicamentos e

investimentos. Ressalta-se que o hospital Stella Maris, assim como grande parte dos

hospitais brasileiros que atendem principalmente o SUS, é deficitário, uma vez que os

repasses efetuados pelo sistema são insuficientes para custear todos os gastos que

envolvem as atividades hospitalares.

O Hospital Stella Maris foi inaugurado em 03 de junho de 1965 por irmãs

católicas da Congregação Filhas de Nossa Senhora de Stella Maris. Ao longo desses 47

anos de história, a estrutura e as instalações do hospital se desenvolveram e, nos dias de

hoje, ocupam importante espaço no atendimento hospitalar do município de Guarulhos

e cidades vizinhas.

A história do hospital, cujo princípio norteador é o atendimento humanizado, e

da Congregação Religiosa se misturam, pois se trata da principal finalidade das irmãs

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católicas. Embora a Congregação possua outras obras, tais como o internato Santa

Teresinha na cidade de Carapicuíba e um parque infantil de mesmo nome em

Guarulhos, o hospital representa a principal obra das Irmãs, isso porque atendeu

milhares de pacientes nas últimas décadas e é um dos mais tradicionais do município.

Em 1965, o hospital foi inaugurado com um ambulatório e 25 leitos. Onze anos

depois, em 1976, um prédio com cinco andares já estava em pleno funcionamento. Ao

longo das décadas de 1980 e 1990, o hospital cresceu em estrutura e serviços oferecidos

e disponibiliza mais de 240 leitos distribuídos em vários pavimentos.

O hospital está localizado no bairro de Itapegica, próximo ao entroncamento das

rodovias Presidente Dutra e Fernão Dias, e é classificado como um hospital geral.

Fazem parte dos serviços oferecidos:

- Pronto Atendimento Cardiológico.

- Habilitação para Cirurgias Cardíacas, Implante de Marcapasso e Angioplastias, todos

procedimentos de alta complexidade.

- UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) Geral com doze leitos, três deles destinados a

Cardiologia.

- Cento e oitenta e dois leitos habilitados em 2013 no CNES (Cadastro Nacional de

Estabelecimentos de Saúde).

- Atendimento cardiológico que contempla Cirurgia Cardíaca, Hemodinâmica,

Cardiologia Clínica, Ecocardiograma, Holter, MAPA, Teste Ergométrico e

Eletrocardiograma.

- UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) neonatal.

Outros serviços oferecidos:

Maternidade/ Obstetrícia; Hemodiálise; Oncologia e Radioterapia; Pronto Atendimento

Geral; Cirurgia Pediátrica; Cirurgia Geral; Urologia; Cirurgia Plástica; Oftalmologia;

Ortopedia; Métodos de Diagnósticos por Imagem; Métodos de Diagnósticos

Laboratoriais; Gastroenterologia; Endoscopia, Broncoscopia e Colonoscopia;

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Otorrinolaringologia; Pneumologia; Cirurgia Vascular; Bucomaxilofacial; Ginecologia;

Clínica Médica; Neuropediatria; Fonoaudiologia; Fisioterapia; Psicologia; Nutrição e

Dietética; Farmácia.

Esse conjunto de serviços oferecidos possibilita milhares de procedimentos com

as mais diversas finalidades. A tabela abaixo informa a quantidade de atendimentos

realizados no ano de 2012.

Tabela 7: Atendimentos Realizados no hospital Stella Maris em 2012

Atendimentos Internações Altas Óbitos Pacientes/Dia

Pacientes SUS 8.599 8.514 85 19.623

Pacientes

Convênios

3.512 3.448 55 9.953

Pacientes

Particulares

583 579 4 953

Total 12.694 12.541 144 30.529

Fonte: Hospital Stella Maris (2012)

A tabela 7 apresenta um total de 30.529 pacientes atendidos pelo hospital em

2012. Nota-se que prevalece o atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) que

representa entre 60% e 70% dos atendimentos e procedimentos realizados pelo hospital.

O Stella Maris, como hospital filantrópico, representa importante braço do atendimento

público de saúde à população da região de Guarulhos.

Mesmo com essa importante quantidade de atendimentos, o hospital apresentou

ocupação média de 48,8% de seus leitos em 2012, um percentual bastante aquém de sua

capacidade. Esse baixo percentual se deve principalmente à falta de profissionais de

enfermagem, à escassez de equipamentos e à necessidade de reformar alguns setores

desgastados pelo tempo. Tais aspectos refletem a dificuldade financeira que o hospital

enfrenta desde 2008 em função do alto endividamento ocasionado por diversos fatores,

dentre os quais, os baixos valores da tabela SUS que, quando repassados pelo Estado,

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são insuficientes para custear o sistema de atendimento. Como acontece com grande

parte dos hospitais filantrópicos que operam no Brasil, faltam recursos, tanto para os

investimentos como para o custeio.

No que diz respeito a investimentos, o hospital apresenta déficit de

equipamentos e tem enorme dificuldade em adquirir aparelhagem com tecnologia

moderna, o que o impede de oferecer melhores tratamentos aos pacientes que o

procuram. Em relação ao custeio das atividades operacionais, há atraso no pagamento

de médicos e fornecedores, o que traz problemas de toda ordem. Já o alto

endividamento bancário agrava essa situação, uma vez que parte importante do

faturamento é destinada a pagamento de juros da dívida contraída ao longo dos anos.

Considerando-se os altos juros praticados no Brasil, tem-se obtido déficits consecutivos

no Balanço Contábil do hospital.

Diante desse cenário, em maio de 2013, o hospital operava com uma oferta de

180 leitos, número inferior há 10 anos atrás quando chegou a disponibilizar 243 leitos.

Ainda em maio, havia duas alas fechadas, sem atendimento de nenhuma ordem.

Observa-se que, mesmo com uma diminuição no total de atendimentos, o Stella

Maris ainda é um dos principais hospitais da cidade. Em algumas especialidades, como

cardiologia, hemodiálise e obstetrícia é o que oferece maior número de atendimentos

pelo SUS.

A cidade vive uma situação tão dramática na área da saúde que há relatos de

casos de pessoas que chegaram a perder a vida pela ausência de um pronto socorro

cardiológico. Até meados de 2012, os cidadãos que sofriam de ataque cardíaco eram

conduzidos para São Paulo, muitos deles para o hospital Beneficência Portuguesa,

distante vários quilômetros de Guarulhos. Sabe-se que a demora nesse tipo de

atendimento de urgência influencia diretamente no salvamento da vítima. Em 2013, esse

problema diminuiu porque o Hospital Stella Maris passou a ser habilitado para esse tipo

de atendimento. De todo modo, ainda há muito a ser feito nessa especialidade para uma

cidade/ região tão populosa. Outras demandas da Saúde, como atendimentos de

pediatria e de obstetrícia, também não são atendidas a contento.

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A tabela 8 apresenta o total de alguns dos principais exames e procedimentos

realizados pelo Stella Maris no ano de 2012.

Tabela 8 Exames e procedimentos realizados no hospital Stella Maris em 2012

Exames/

Procedimentos

SUS Convênios Particulares Total

Tomografia 586 84 77 747

Ressonância 2228 149 570 2947

Radiologia (no

centro cirúrgico)

304 36 1 341

Radiologia 18.588 9.064 932 28.584

Mamografia 4.127 34 177 4.338

Laboratório

Clínico

176.938 89.284 11.017 277.239

Atendimento

Ambulatorial

73.354 6.429 8.236 88.019

Serviços de

Diagnose

(Audiometria,

colonoscopia, etc)

4.132 1.589 578 6.299

Partos Realizados 2.043 489 120 2.652

Hemodinâmica 2.281 278 13 2.572

Cardiologia 16.548 136 394 17.078

Cirurgias

Realizadas

4.988 1.345 285 6.618

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Hemodíalise 12.730 3.641 0 16.371

Fonte: Hospital Stella Maris (2012)

A tabela 8 mostra a importância dos serviços prestados pelo hospital Stella

Maris. Alguns números apresentados merecem destaque:

- foram realizados 2.652 partos em 2012, o que significa uma média de 5,5 partos por

dia (aproximadamente 15% dos partos da cidade são realizados no Stella Maris);

- os diversos pacientes que necessitam dos serviços de hemodiálise receberam 16.371

atendimentos/ procedimentos no ano, o que representa uma média de 44,8 atendimentos

por dia;

- pelo atendimento ambulatorial passaram 277.239 pacientes, um número expressivo

que demonstra a importância do hospital para a região;

- mais de 6.000 cirurgias são realizadas anualmente nas instalações do hospital,

números que apontam para uma média de 18 cirurgias efetuadas por dia.

Observa-se também que em todos os serviços oferecidos é significativa a participação

do SUS.

Ressalta-se ainda que Guarulhos é um munícipio importante da Grande São

Paulo. Faz divisa com as cidades de Nazaré Paulista, Itaquaquecetuba, Arujá e Santa

Isabel. Além dessas cidades, distritos de São Paulo marcados por exclusão social, tais

como: Cangaíba, Ermelino Matarazzo, São Miguel Paulista e Jardim Helena também

estão na região fronteiriça de Guarulhos. Essa população busca serviços públicos nos

dois municípios (Guarulhos e São Paulo).

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010) indicam

que Guarulhos representa o 2º maior PIB do Estado de São Paulo, o 9º maior do país e

uma população de pouco mais de 1.300.000 (um milhão e trezentas mil pessoas). O

Plano Municipal de Guarulhos (2010-2013) ilustra grave desigualdade social e

diferenças significativas na condição sócio econômica da população. Dentre essas:

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- 48,8% dos trabalhadores ganham até 03 salários mínimos;

- 3,03% dos trabalhadores ganham acima de 30 salários mínimos;

- cerca de 23% da população não possuem acesso a saneamento básico;

Ademais, como acontece em muitos outros municípios brasileiros, milhares de

habitantes vivem em moradias precárias, falta acesso às condições básicas de higiene e

enfermidades de todo tipo acometem essa população carente.

A cobertura municipal de coleta de esgoto sanitário é de 77,09% (SEADE,

2000). Além da dificuldade na coleta, há problemas na destinação do esgoto que é quase

totalmente jogado in natura nos corpos de água. Apenas em 2010 iniciou-se o

tratamento de esgoto no município com a construção de redes coletoras, coletor-tronco e

interceptores.

Com relação ao atendimento, Guarulhos possui os seguintes hospitais públicos

municipais:

- Hospital Municipal de Urgência (HMU) no bairro do Bom Clima;

- Hospital Municipal da Criança e do Adolescente (HMCA) localizado no centro;

- Hospital Municipal Pimentas (HMPB) no bairro imperial em Bonsucesso.

Há ainda 02 hospitais filantrópicos conveniados SUS: O hospital Jesus, José e Maria no

bairro Parque Renato Maia e o Hospital Stella Maris no bairro de Itapegica.

Também está estabelecido na cidade o complexo hospitalar Padre Bento, no

bairro de Tranquilidade, sob a administração do poder público estadual. Há ainda 03

hospitais privados: Hospital Bom Clima, Hospital Carlos Chaga e o Hospital Saúde

Guarulhos.

Com uma grande população, a oferta de hospitais em Guarulhos é deficitária

pelo tamanho e importância da cidade para a região. Segundo reportagem do Diário de

Guarulhos de fevereiro de 2011, há um déficit de 40% nos leitos oferecidos para a

população. A portaria número 1.102/2002 do Ministério da Saúde determina que um

município deve disponibilizar de 2,5 a 3 leitos para cada mil habitantes. Considerando a

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população da cidade (1.300.000 no censo de 2010) pelo IBGE, o número de leitos

ofertados deveria ser de 3.575. O total ofertado em 2011 era de 2.153, ou seja, havia um

déficit de 1.422 leitos. Esse déficit ocasiona transtornos e necessidade de grandes

deslocamentos para muitos moradores do município.

4.1 A Pesquisa

Foi realizada uma pesquisa qualitativa com amostra não probabilística junto a

médicos e enfermeiros que atuam no Hospital Stella Maris. Procurou-se entrevistar

profissionais, em sua grande maioria, com vasta experiência profissional, em áreas e

especialidades diferentes e que consideram seu trabalho no Stella Maris a principal ou

uma de suas principais ocupações profissionais.

As entrevistas foram semiestruturadas e buscou-se permitir que o entrevistado

aprofundasse as respostas de acordo com suas experiências e vivências no contexto

social do hospital.

É importante lembrar que a pesquisa apresenta os seguintes objetivos:

- Apresentar o que mudou para o trabalhador (médicos e profissionais de enfermagem)

com as novas técnicas de gestão no que se refere ao seu cotidiano e ao seu desempenho

no trabalho.

- Identificar as consequências, para médicos e enfermeiros, da implantação de políticas

públicas e privadas das novas práticas no serviço prestado em hospitais.

- Analisar o impacto sobre o trabalhador da necessidade de aquisição de novas

competências profissionais, especialmente em função do surgimento de novas

tecnologias no setor.

- Verificar o que mudou, pela óptica de médicos e enfermeiros, no atendimento

realizado junto aos pacientes.

Foram entrevistadas nove enfermeiras com vasta experiência que atuam em

setores e escalas de trabalho diferentes. Procurou-se obter a visão geral dos

trabalhadores da área. O mesmo critério foi adotado na escolha dos médicos. Abaixo as

especialidades médicas dos nove trabalhadores entrevistados:

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- 01 Oftalmologista.

- 01 Pediatras.

- 01 Cirurgião Geral.

- 01 Ginecologista.

- 01 Anestesista.

- 01 Cardiologista.

- 01 Nefrologista.

- 01 Cardiologista e Auditor Médico.

- 01 Cirurgião Plástico.

4.1.1 As Entrevistas

a) A primeira pergunta abordou o tempo de formados dos entrevistados. Como

o objetivo era verificar as mudanças ao longo do tempo, buscou-se constatar há quanto

tempo o trabalhador atua em sua profissão.

Das nove enfermeiras entrevistadas, quatro atuam há mais de vinte anos na

profissão. Três atuam entre dez e vinte anos, uma há nove anos e uma há dois anos.

Optou-se por entrevistar uma profissional com menos tempo de formação para que

fosse possível identificar padrões de respostas diferentes.

Sete dos nove médicos atuam em hospitais em suas respectivas especialidades há

mais de 20 anos. Um deles há treze anos e outro há seis anos.

Assim, com relação à experiência profissional, a larga experiência de

praticamente todos os profissionais entrevistados possibilitou o atendimento da

principal expectativa do presente trabalho que era investigar as mudanças provocadas

pelas novas técnicas e práticas de gestão no setor da saúde para médicos e enfermeiros.

b) A segunda pergunta convidou os médicos e enfermeiros a expressarem se

ocorreram, e em caso afirmativo, como ocorreram, as mudanças nas práticas de gestão

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hospitalar. Ainda nessa questão buscaram-se informações sobre o impacto dessas

mudanças nas relações estabelecidas no cotidiano dos profissionais de saúde e dos

pacientes.

De modo geral, as profissionais de enfermagem entrevistadas consideram que há

grande foco na redução de custos e uma crescente preocupação com o uso racional dos

materiais utilizados. Técnicas muito difundidas, como a eliminação de desperdícios e a

diminuição de estoques, disseminadas há várias décadas pela administração japonesa,

estão presentes. Segundo uma das enfermeiras entrevistadas, o estoque baixo representa

riscos e estresse. Nas palavras dela:

- “o atraso de medicamentos pela ausência de estoque causa estresse no

enfermeiro, já que o paciente sabe exigir seus direitos”.

Uma entrevistada ressaltou:

- “a administração e a assistência (enfermagem) dificilmente caminham juntas,

já que os administradores olham apenas para os números e a enfermagem olha para as

pessoas”.

Outra trabalhadora da área destaca que:

- “a enfermagem em si não está preparada adequadamente para que essas

mudanças ocorram de maneira benéfica”.

A necessidade de maior orientação também foi comentada por outra enfermeira

que disse:

- “se existe boa orientação quanto às mudanças, o atendimento é impactado

positivamente”.

Outras entrevistadas abordaram também essa questão, uma vez que os cursos de

enfermagem pouco ou quase nada enfatizam as questões administrativas da área. Uma

das entrevistadas considerou que as enfermeiras de meia idade e mais experientes

apresentam dificuldades em se adaptar ao uso das novas tecnologias e não aceitam a

nova cultura da eficiência em primeiro lugar.

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119

As práticas de gestão disseminadas nas últimas décadas adotam, dentre outras

ideias, o uso racional de recursos e disseminam o conceito e a aplicação de estoques

baixos.

Esses métodos, quando bem implementados, proporcionam à gestão resultados

mais efetivos, ocasionando redução de custos e de desperdícios com armazenagem,

pessoal, tempo e espaço físico. Ademais, estoques altos geram perdas e afetam

negativamente o fluxo de caixa da organização.

Deve-se frisar que baixos estoques requerem a formação de redes empresariais,

o que implica, na gestão hospitalar, integração entre laboratórios, farmácias, indústrias e

prestadores de serviços. Além disso, torna-se necessário capacitar os profissionais

envolvidos, tanto os usuários dos materiais, nesse caso as enfermeiras, como os

compradores desses insumos que atuam na área administrativa. As mudanças devem

considerar a cultura organizacional e as consequências que atingem os trabalhadores

envolvidos.

A administração eficiente, no que diz respeito ao uso racional dos recursos,

promove mudanças proporcionando capacitação técnica e comportamental para os

trabalhadores. Na gestão hospitalar, é preciso conscientizar as enfermeiras da

importância do uso dos recursos e os compradores e gestores devem estimular a

participação e o entendimento de todos em algumas decisões como, por exemplo, na

definição de estoques mínimos que eliminem a falta de materiais de atendimento. Da

mesma forma, fornecedores e prestadores de serviços precisam ser envolvidos nesse

processo. Assim, são respeitadas as especificidades da área e torna-se possível a

implantação das práticas que reduzam custos para a organização envolvida.

Na organização hospitalar, o distanciamento entre os profissionais da saúde e os

administradores gera ruídos de comunicação e divergência de interesses que impactam

negativamente para o hospital e os pacientes. As respostas das enfermeiras nos levam a

essa constatação.

Os médicos, em sua maioria, entendem que as mudanças na administração

hospitalar trouxeram problemas para o exercício da atividade uma vez que os

profissionais são pressionados a atender com agilidade e rapidez. Há uma

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supervalorização da redução de custos, o que muitas vezes diminui a qualidade dos

materiais e instrumentos utilizados. Um dos médicos afirmou:

- “a segurança está em risco em função da redução de custos”.

Outra observação comum a vários profissionais refere-se à pequena ou

inexistente participação dos médicos nas decisões administrativas, o que causa muitos

conflitos entre os diversos setores do hospital. Um dos médicos declarou:

-“a gestão está preocupada em cortar custos, não ter desperdício e sofre

pressão das fontes pagadoras. Há muito estresse. Nessa cadeia sobra para os

pacientes”.

Outro entrevistado afirmou:

-“o sistema quer redução de custos mas não há treinamento para diminuição de

desperdícios”.

Outro profissional comentou:

- “houve muitas mudanças ao mesmo tempo. Se elas viessem separadas haveria

maior assimilação dos envolvidos. Concordo que há necessidade de diminuição de

estoque, mas para isso, a logística deve ser adequada”.

Outro médico afirmou:

- “existia um desperdício exagerado e hoje a situação foi para o outro extremo,

ou seja, o médico é obrigado a trabalhar no limite”.

Um exemplo em relação a essa afirmação é o chamado “kit cirurgia”, que inclui

os insumos e materiais para determinado procedimento. Os médicos não podem usar

materiais extras. Iniciativas como essa combatem o desperdício e melhoram a

produtividade. No entanto, é preciso haver bom senso e definição de regras e critérios

para casos excepcionais, pois há médicos que chegam a ser penalizados quando utilizam

materiais extras e não seguem os trâmites burocráticos para explicar essa necessidade.

Também foi abordada a falta de integração para os processos funcionarem

adequadamente. Muitos hospitais e pesquisadores da área criticam a “indústria dos

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exames”, ou seja, a solicitação exagerada de exames sem necessidade. Trata-se de uma

maneira encontrada pelo médico para agilizar o atendimento. Nesse processo, o

profissional faz duas ou três perguntas ao paciente sobre os sintomas e já solicita uma

série de exames. Segundo alguns críticos, alguns deles sem real necessidade. Em

seguida o médico analisa os exames e dá sequência ao tratamento. Essa é uma das

consequências da falta de integração entre os diversos agentes envolvidos.

No que se refere às relações entre os setores médico e de enfermagem, houve

respostas divergentes, ou seja, alguns colocaram que há certa harmonia, enquanto outros

ressaltaram os conflitos que são comuns no dia a dia de trabalho. Isso ocorre por

diversos motivos, dentre os quais: quantidade insuficiente de profissionais, falta de

materiais, sobrecarga de trabalho e rotatividade do pessoal de enfermagem.

Quanto as relações entre a administração e os médicos, ocorrem constantes

conflitos do ponto de vista da maioria dos entrevistados. Isso em função de metas

estabelecidas, exigência na rapidez, qualidade dos materiais e atrasos nos pagamentos (é

importante ressaltar que os pagamentos repassados pelo Estado são auditados e variam

de acordo com a produtividade estabelecida pelo SUS).

Um profissional afirmou:

-“gosto de examinar os pacientes e sou pressionado para atender mais rápido.

Atender bem é difícil”.

No que diz respeito a esses conflitos uma médica afirmou:

- “a relação com a administração não é muito boa porque, ao invés de haver

uma adaptação, as mudanças se estabelecem como imposições”.

Reforça ainda esse entendimento dos médicos o comentário de um deles:

-“médicos pedem mas não são atendidos, há pouca participação dos médicos

nas decisões administrativas”.

As diversas mudanças que aconteceram nas últimas décadas atingiram

frontalmente os médicos e enfermeiros que atuam em hospitais. Simultaneamente foram

impostas mudanças como a otimização no uso de materiais, pressão por produtividade e

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rapidez no atendimento. Para que essas mudanças sejam efetivas, é preciso estabelecer

diversas políticas e iniciativas, tais como:

- melhorar significativamente a formação profissional dos médicos e

enfermeiros;

- valorizar os trabalhadores (especialmente os enfermeiros), oferecendo uma

remuneração mais digna e condizente com suas responsabilidades;

- capacitar sistematicamente os trabalhadores (tanto os aspectos técnicos de sua

área quanto as questões éticas e comportamentais).

- habilitar os trabalhadores para o uso das novas tecnologias que se impõem.

As inter-relações entre as áreas médica, de enfermagem e administrativa são

tensas e conflitos acontecem com certa frequência. Entre os médicos e os enfermeiros,

os conflitos são menos intensos uma vez que, em relação aos pacientes, “eles estão no

mesmo barco”, ou seja, possuem interesses comuns, como proporcionar um

atendimento digno ao paciente. Com a administração, o relacionamento é mais tenso e

as responsabilidades e interesses são divergentes. Os gestores trabalham para otimizar o

uso dos limitados recursos disponíveis e buscam atender os objetivos financeiros

necessários à sobrevivência e manutenção da organização hospitalar. Com esse foco,

suas decisões afetam as atividades desenvolvidas por médicos e enfermeiros

interferindo, inclusive, na qualidade dos serviços prestados ao paciente. Assim, as

diferentes responsabilidades das áreas representam fontes de potenciais conflitos.

Causa indignação, ainda em relação a essa temática, a postura passiva do Estado,

representado pelo SUS, que, ciente dessa situação, se omite e não promove políticas e

práticas que visem soluções para os problemas estruturais do setor da saúde. Ademais,

esses aspectos implicam no não aproveitamento do desenvolvimento da medicina.

c) A terceira questão colocada aos entrevistados solicitou uma análise quanto à

implementação das Políticas Públicas, considerando que o SUS se propõe ao tratamento

integral. Procurou-se, então, identificar como a execução e as condições de trabalho

foram atingidas por essas políticas.

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123

A análise e a avaliação das Políticas Públicas implementadas por meio do SUS

foram controversas entre os profissionais de enfermagem em determinados aspectos.

Alguns entrevistados acreditam que houve uma melhora no atendimento e que o modelo

SUS trouxe melhorias para a Saúde como um todo. As seguintes afirmações de alguns

profissionais demonstram essa visão:

- “o cliente SUS possui mais benefícios hoje do que há alguns anos”;

- “o SUS oferece bom atendimento ao paciente”;

- “o conceito e o modelo do SUS são muito bons”;

- “O SUS trouxe melhorias e cobre cirurgias que os convênios, às vezes, não cobrem.

Outros, no entanto, criticaram o Sistema Único de Saúde. Algumas alegações:

- “os hospitais recebem menos do governo do que gastam com os pacientes, o que

causa inúmeros problemas, como a longa espera”;

- “a má remuneração do SUS causa transtornos no atendimento, pois com menos

recursos a qualidade cai”;

De modo mais crítico, umas das enfermeiras afirmou:

- “o SUS não melhorou o atendimento dos pacientes, pois o sistema não libera verbas

para medicamentos, aparelhamento e contratação de funcionários. Precariedade e falta

de atendimento são marcas do SUS”.

Os médicos também veem as Políticas Públicas do SUS sob ângulos divergentes.

Alguns fazem severas críticas, como afirmações a seguir:

- “os hospitais que atendem SUS estão sucateados ou fechados. Não houve

melhora nas condições de trabalho.”

- “o SUS remunera mal e não dá para fazer atendimento de qualidade”.

Corrobora um colega de profissão ao afirmar:

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- “não houve melhora, o médico trabalha mais e em condições piores, com falta de

materiais e de recursos de toda ordem. O paciente é prejudicado, pois os hospitais

estão sucateados”.

Observa de modo completamente diferente outro médico que afirmou:

- “o SUS é um sistema nacional que ajudou médicos e pacientes......olhando de

20, 10, 5 anos pra cá só vejo melhora”.

Seguindo essa linha de raciocínio, uma das entrevistadas afirmou:

- “o conceito SUS é excelente, mas a implantação é deficiente em vários

aspectos. Houve uma grande melhora no atendimento dos pacientes. As esperas são um

grande problema do SUS, mas ainda assim as melhoras são mais notáveis”.

Ainda considerando essa questão, um dos entrevistados criticou o uso político

dos recursos ao colocar:

- “o SUS conceitualmente é bom, mas é usado politicamente pelas secretarias de

saúde. O SUS libera recursos sob pressão e parte de uma lógica não real. O SUS cria

uma dependência política porque paga mal e os hospitais precisam solicitar mais

verbas constantemente. Se a estrutura não funciona, o resultado final é ruim”.

Nota-se que parte dos entrevistados gosta do modelo e do conceito proposto pelo

SUS. Parece haver certa compreensão quanto à complexidade dos problemas do setor da

saúde e o SUS trouxe melhoras, considerando-se o cenário caótico e excludente anterior

à sua implantação.

Entretanto, há muito a fazer e o Estado enfrenta enormes dificuldades para

atender os anseios dos trabalhadores envolvidos no atendimento. Assim, o Estado

enfrenta desafios consideráveis, dentre eles:

- necessidade de investimento em equipamentos, instalações e demandas de

hospitais;

- insatisfação dos hospitais e seus gestores que recebem repasses de verbas

insuficientes para uma prestação de serviços de qualidade;

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- necessidade de capacitação dos diversos agentes do sistema e aumento da

capacidade de atendimento para minimizar problemas de fila;

- falta de médicos em diversas especialidades e localidades.

d) A quarta questão procurou investigar se a participação das empresas que

prestam serviços de saúde suplementar contribuiu com um aumento da qualidade para

os pacientes e com as condições de trabalho de médicos e enfermeiros. Ressalta-se que

a saúde suplementar ocupa papel crescentemente importante no sistema de atendimento

à saúde no Brasil.

A maior parte das enfermeiras acredita que os convênios precisam melhorar

muito, especialmente na autorização de procedimentos. Praticamente todas as

entrevistadas relataram que vivenciam situações constrangedoras frequentemente em

função da demora na autorização dos convênios quanto aos procedimentos definidos

pelos médicos. Um dos entrevistados afirmou:

- “o enfermeiro é prejudicado, pois ele lida com os pacientes e suas reações em

relação às permissões ou negações dos convênios. O enfermeiro fica encurralado já

que não pode resolver um problema que não depende dele”.

Como são empresas com fins lucrativos, as organizações que comercializam a

saúde suplementar oferecem, em muitos casos, um serviço aquém das necessidades

básicas de seus conveniados. Disse uma das entrevistadas:

-“os convênios pensam no lucro final, travam exames e procedimentos, afetando

assim as condições de trabalho de médicos e enfermeiros”.

Uma enfermeira afirmou:

- “às vezes os pacientes ficam dias na fila. Existe essa espera para que haja

desistência dos pacientes ou dos médicos”.

Alguns entrevistados observaram ainda que parte dos pacientes de convênio tem

a expectativa de receber atendimento diferenciado e que, em determinados hospitais, os

enfermeiros são levados a dedicar atenção especial a esses pacientes, uma vez que a

remuneração tende a ser melhor do que a do SUS e a administração dos hospitais tem

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interesse em fidelizar esses pacientes que oferecem melhor rentabilidade. Essa não é

uma orientação das religiosas que estabelecem as diretrizes do hospital Stella Maris.

Eis um dos relatos:

- “os convênios oferecem mais qualidade e acesso rápido. O enfermeiro é

conduzido a dar mais apoio aos pacientes de convênio, a segregação se dá, na maioria

dos hospitais, graças à falta de recursos oferecidos pelo governo”.

Os médicos foram ainda mais críticos na questão relativa à participação dos

convênios no Sistema de Saúde. Alguns acreditam que alguns convênios atendem seus

pacientes pior do que o SUS, tamanho é o descaso com seus clientes. Eles afirmam que

a burocracia imposta pelo uso do serviço inviabiliza inúmeros atendimentos. Um dos

médicos mencionou:

- “aumentou a quantidade de pacientes e os médicos não conseguem atender.

Há filas enormes e médicos mal remunerados, prejudicando os pacientes. A lógica do

lucro das operadoras prejudica a qualidade do atendimento”.

Outro entrevistado disse:

- “existe uma pressão em cima do médico, feita pelos convênios, para que baixe

o custo de exames e procedimentos”.

Como existem muitas empresas que comercializam esse serviço, um dos

entrevistados pontuou:

- “Há aqueles que oferecem serviços de alta qualidade e outros que são tão

burocráticos para autorizar procedimentos que demoram mais do que o SUS”.

De modo assertivo, um entrevistado observou:

- “a lógica da operadora de saúde é o lucro e pagar o mínimo possível. O que

importa para essas empresas é o custo do atendimento e não a qualidade dele, inclusive

em situações de vida ou morte! Para os médicos isso é desmotivante, frustrante”.

Outro médico afirmou:

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- “a saúde suplementar não contribuiu para uma melhora nos serviços

hospitalares porque houve um aumento na quantidade de pacientes e as operadoras

não conseguem atender a demanda. Há filas enormes e médicos mal remunerados. A

lógica do lucro das operadoras prejudica a qualidade do atendimento”.

Os demais entrevistados fizeram afirmações similares às acima.

As respostas dadas por médicos e enfermeiros escancararam as contradições

relativas aos convênios médicos. Como são empresas capitalistas, buscam o lucro em

seus processos administrativos e comerciais. É claro que os pacientes que utilizam os

serviços e demandam atendimento atrapalham os resultados financeiros, pois há custos

altos envolvidos em muitos tratamentos e procedimentos. A agência nacional de saúde

(ANS) já puniu diversas vezes pelo não cumprimento de suas obrigações contratuais

com seus clientes/ pacientes. Os médicos e enfermeiros ficaram reféns, em muitas

situações, das operadoras de planos de saúde. Elas, como fonte pagadora que são,

exercem poder sobre os hospitais e seus profissionais para que seus objetivos sejam

atingidos.

Essa situação faz com que os profissionais se deparem, em seu trabalho, com o

seguinte dilema: de um lado, a vida do paciente e todos os cuidados que envolvem o

atendimento; de outro, as operadoras de planos de saúde que exigem uso racional de

recursos, questionam pedidos de exames e procedimentos e atrasam autorizações com

propósitos mal esclarecidos. Ilustra essa realidade a simples afirmação de uma das

enfermeiras:

- “onde eles enxergam números, nós, os profissionais da assistência, vemos

pessoas”.

Nota-se também em relação a essas respostas um descaso do Estado que

“terceiriza” sua obrigação constitucional de atendimento universal e integral a empresas

cuja lógica capitalista expõe ao risco, inclusive de morte, milhões de brasileiros.

Observa-se que cerca de 50 milhões de brasileiros possuem convênio particular e muitos

deles estão sujeitos a empresas que não cumprem as exigências de atendimento da

Agência Nacional de Saúde. Nos últimos anos, dezenas dessas empresas já foram

autuadas e algumas foram impedidas de vender novos planos enquanto não

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melhorassem a qualidade dos serviços prestados. Nesse cenário, a população se vê

diante de escolhas quase sempre ruins: buscar o atendimento do SUS e ficar à mercê da

falta de estrutura, da demora no atendimento e da qualidade duvidosa; ou buscar o

atendimento privado e correr o risco de não receber (ou recebê-lo com péssima

qualidade) o serviço que contratou. Considerando-se os últimos anos, o Estado

demonstra incapacidade de oferecer as respostas que a sociedade espera.

e) Na quinta questão, perguntou-se aos profissionais sobre as novas tecnologias e

métodos de tratamento que surgiram nos últimos anos e ainda estão em curso. A questão

teve o objetivo de investigar aspectos relacionados à atualização profissional, tais como,

disponibilização de recursos e apoio para aquisição de competências e se os

profissionais têm por hábito buscar novos conhecimentos e de que forma, em caso

afirmativo.

As respostas dadas pelos enfermeiros quanto a esse questionamento foram

praticamente as mesmas. Todos os entrevistados consideram ser de fundamental

importância a aquisição de novas competências dada a velocidade no surgimento de

novos tratamentos, medicamentos e diagnósticos. Embora haja clareza quanto à

necessidade de aquisição de novos conhecimentos e habilidades, todos os entrevistados

indicaram que não recebem apoio nem tampouco recurso algum para esse tipo de

demanda. Uma das enfermeiras entrevistadas afirmou:

- “não existe apoio das instituições para bancar um treinamento, curso ou

congresso, e nem apoio quanto às horas ficadas no curso, ou seja, se o profissional vai

buscar uma especialização, além de gastar com o preço do curso, deixa de ganhar e as

vezes é até descontado pela falta no trabalho. ”

Uma das entrevistadas observou:

- “é preciso adquirir novas competências e atualização dos conhecimentos já

adquiridos.” O enfermeiro se atualiza no horário que tem livre e às suas custas.”

Uma enfermeira afirmou:

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- “há nítida defasagem de conhecimento de parte dos enfermeiros que atuam

nos hospitais”.

Outra entrevistada disse:

- “é preciso desenvolver uma política para aprimoramento das habilidades dos

enfermeiros”.

Os relatos dos médicos quanto às competências profissionais estão em sintonia

com os das enfermeiras. Eles, em sua totalidade, reconhecem a necessidade e a

importância da atualização em suas respectivas áreas de atuação e, em sua maioria,

afirmaram que fazem esforços sobre-humanos para adquirir essas competências. Há

apoios pontuais promovidos por indústrias farmacêuticas e por convênios, como a

Unimed, que estão cada vez mais escassos, segundo os relatos obtidos. Ressalta-se,

nessa questão, a resposta de um médico que disse:

- “estudo na internet e de madrugada. Só durmo três horas por dia para me

atualizar. Tudo eu pago por minha conta, me atualizo com meus recursos”.

Muitos médicos afirmaram que se atualizam participando de congressos e

fazendo cursos de especialização. Outra ferramenta utilizada é a internet.

Um dos médicos relatou:

- “no geral os médicos frequentam poucos congressos porque são caros e as

pessoas não estão se atualizando. Os médicos estão defasados em competência

profissional. Cada um se atualiza por conta e recurso próprio. Não há apoio nenhum

para atualização profissional”.

Uma médica disse:

- “novas doenças surgem rapidamente assim como novos tratamentos e exames.

Meus livros de medicina estão todos desatualizados.”

Outra médica confirmou essa constatação:

- “tudo muda muito rápido na medicina.”

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Observa-se pelo conjunto de respostas a essa pergunta que não há apoio

institucional para o aprimoramento profissional de médicos e enfermeiros. Os esforços

para capacitação profissional ficam a cargo dos indivíduos e não há direcionamento ou

coordenação de competências a serem adquiridas. Quando um novo equipamento chega,

o fornecedor ensina seu mecanismo para um grupo de profissionais e esses repassam a

técnica para os colegas. Muitas vezes as ações não são registradas e oficiais. Os

entrevistados concordaram com alguns pontos: as novas tecnologias estão aí e

continuam chegando; a atualização é necessária e importante; não há apoio praticamente

de nenhum tipo, seja de hospitais, operadoras ou do SUS para capacitação de médicos e

enfermeiros.

Para o setor, torna-se necessária a atualização contínua de conhecimentos e é

fundamental que as instituições envolvidas deem importância a essa demanda: na saúde,

o emprego de maquinário é obrigatório para a aprendizagem; novas patologias e

métodos de tratamento e de procedimentos surgem com frequência e não há esforços

coordenados para construção de conhecimentos e atualização profissional para médicos

e enfermeiros. O Estado, como responsável pelo SUS, deveria estimular e coordenar

esse trabalho. Como reflexo houve, em meados de 2013, muitos protestos espalhados

pelo país. Ocorreu uma vasta pauta de reinvindicações quanto aos serviços públicos, e,

dentre elas, a saúde. Em reportagem de capa da revista Época, publicada em 02 de

setembro de 2013, um dos subtítulos afirmou: “As faculdades de medicina brasileiras

estão na UTI”. Nota-se, assim, que além dos problemas na atualização acima

destacados, há também desafios imensos na questão da formação de médicos. E na área

da enfermagem não é diferente.

As incongruências são evidentes. É clara a falta de direcionamento e de

planejamento do setor. Exige-se qualidade, utilização racional de recursos, atendimento

rápido e ágil de profissionais que não possuem boa formação, não se atualizam, estão

sob pressão e ficam submetidos às empresas de saúde suplementar e às diretrizes do

SUS, que muitas vezes não consideram as especificidades das diversas regiões.

f) A sexta questão procurou investigar aspectos relacionados ao desempenho

profissional dos entrevistados. Os médicos são prestadores de serviços, ou seja,

suas equipes são remuneradas como pessoa jurídica de acordo com as

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responsabilidades assumidas em contrato. Por exemplo, há uma equipe

responsável pelo Pronto Atendimento. Ela faz a prestação de serviços e recebe

uma remuneração pelo funcionamento da área. Em outros casos, a remuneração

é vinculada à produtividade da equipe determinada pelo SUS: nesse caso, a

equipe deve realizar um determinado número de atendimentos e/ou

procedimentos e recebe sua remuneração de acordo com essa quota de trabalhos

executados. Isso ocorre porque o SUS repassa os valores para o hospital com

base nessas quotas e o hospital remunera os médicos com base nesses repasses.

Essa situação é fonte de conflitos porque os valores que o SUS repassa são

considerados insuficientes para cobrir os custos totais envolvidos no

atendimento. Além disso, os médicos são pressionados a realizar o seu trabalho

rapidamente para que a produtividade determinada pelo SUS seja atendida.

Como já informado, as enfermeiras são funcionárias do hospital e seus salários

são definidos pelo piso da categoria, que é considerado baixo pelos sindicatos

considerando-se as responsabilidades do cargo.

Em relação ao desempenho, parte das enfermeiras apontou questões técnicas

como as mais importantes no atendimento. Algumas respostas, no entanto, enfatizaram

aspectos comportamentais e de humanização como as mais relevantes:

- “Muitos profissionais saem da faculdade com conhecimento técnico, mas lidar

com o paciente é aprendido na prática.”

Essa afirmação de uma das entrevistadas sinaliza uma das deficiências das

faculdades, a formação prática.

Uma enfermeira declarou:

- “meu critério é o ser humano. Alguns hospitais e profissionais tratam o

paciente como número, há uma indiferença e um desrespeito pelo ser humano”.

Outra afirmou:

- “o comprometimento e a responsabilidade são meus critérios de desempenho,

além da ausência de críticas da gerência”.

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132

Outras respostas apontaram a satisfação dos pacientes como critério de avaliação

de desempenho e houve duas menções destacando a satisfação dos colegas já que as

equipes de enfermagem apresentam significativa interdependência na execução do

trabalho. Destaca-se também o comentário de uma enfermeira em relação a essa

questão:

- “eu busco trabalhar em empresas que tenham valores alinhados com os meus,

pois se isso não acontecer, os interesses da administração ficam em conflito com meus

valores pessoais”.

Uma enfermeira afirmou:

- “os resultados e a eficácia dos processos são meus critérios, além da

satisfação do paciente e a redução de custos”.

Essa foi à única resposta do grupo de enfermeiras entrevistadas que citou um

critério considerado importante para a administração: a redução de custos.

No que diz respeito aos médicos, significativa parte das respostas apontou para a

satisfação do paciente como principal critério de desempenho. O médico anestesista

afirmou:

- “o paciente acordar bem é meu critério de desempenho”.

Além dessa, houve outras respostas pragmáticas:

- “conjunto entre equipe de trabalho próxima, o paciente e sua família. O

resultado no paciente. Esses são os meus critérios”.

Outro médico relatou:

- “ajudar as pessoas é meu critério de desempenho, escolhi ser médico para

ajudar o próximo, não me importo com o dinheiro”.

Seguindo a mesma linha de raciocínio outro afirmou:

- “médico que é médico coloca a qualidade em primeiro lugar. É preciso ter

ética e respeito ao ser humano”.

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133

Também foram abordadas a família dos pacientes e o feedback das equipes de

trabalho como importantes critérios de avaliação de desempenho. Houve, no entanto,

uma resposta controversa às respostas acima. Um dos entrevistados afirmou:

-“a sociedade muda e o médico muda junto com a sociedade. Hoje, a

remuneração ocupa boa parte de minhas preocupações”.

É importante observar nas respostas acima que os entrevistados não consideram

o cumprimento de metas ou a utilização produtiva dos recursos como critério de

avaliação de desempenho, o que demonstra que para médicos e enfermeiros as

deliberações e determinações dos administradores hospitalares não interferem em suas

autoavaliações de desempenho.

Uma das médicas, inclusive, disse:

- “existe um hiato entre a administração hospitalar e as exigências feitas pelos

conselhos que regem as regras da medicina, um exemplo, na área da pediatria: o

requerimento do SUS é para que o médico atenda um paciente a cada 15 minutos. É

impossível atender a todos se seguirmos esse requerimento pois a demanda é muito

superior a quatro pacientes por hora. Dá a impressão, pra nós médicos, que eles

desconhecem nossa rotina.”

Ao se analisar essas respostas, verifica-se que os objetivos traçados pelos

gestores, que buscam a adoção de práticas de administração racional e melhor uso

possível dos recursos, não são considerados relevantes para os entrevistados. As

respostas indicam que os gestores do SUS e do hospital não focam nem priorizam o

aspecto humano do atendimento, enquanto os profissionais da saúde declaram que

escolheram sua profissão justamente por isso, para atender, ajudar e, sempre que

possível, recuperar a saúde dos pacientes.

Esse hiato entre as expectativas e metas de áreas interdependentes é fonte de

conflitos, desconfiança e prejudica as relações no ambiente hospitalar. Ademais, há

muitos agentes, como o Estado, os gestores e os diversos profissionais da saúde, com

prioridades distintas interagindo sistematicamente. Eles parecem não falar a mesma

língua e a comunicação é repleta de ruídos. Assim, como é sabido em nosso país, os

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pacientes são os maiores prejudicados por essa falta de integração e sintonia entre os

diversos agentes.

g) Na sétima questão, foi perguntado aos pesquisados se há sobrecarga de trabalho

considerando o tempo disponível para atendimento e execução dos

procedimentos. Além disso, procurou-se identificar quais são as consequências

para os pacientes da resposta dada.

Quanto às horas diárias de trabalho, as enfermeiras, em sua grande maioria,

afirmaram que o tempo disponível não é suficiente para atender as demandas que

surgem. Uma das entrevistadas relatou:

- “a cada 48 horas eu trabalho 36 horas. Tenho três horas de sono por dia, na

média”.

Outra entrevistada respondeu:

- “em média a cada 24 horas descanso 4 horas, ou seja, trabalho 20 horas por

dia”.

Esses foram os dois depoimentos mais impressionantes no que diz respeito à

carga de trabalho das enfermeiras. Destaca-se que seis das nove enfermeiras

entrevistadas possuem outro emprego, a maior parte em outros hospitais. Apenas três

das nove respondentes disseram que trabalham entre oito e nove horas por dia,

justamente aquelas que atuam apenas no hospital Stella Maris. As outras seis

entrevistadas atuam mais de 10 horas por dia.

Uma delas afirmou:

- “existe uma sobrecarga muito grande para a maioria dos enfermeiros, a

questão é salarial. Trabalho muito para ganhar um pouco melhor.”

Outra disse:

- “Há uma demanda exagerada sobre os enfermeiros e isso afeta nossa vida

profissional e pessoal.”

Uma enfermeira se emocionou ao dizer:

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- “fico triste e deprimida pois não tenho tempo nem pra mim nem pra minha

família.”

Nessa questão, as respostas daquelas que possuem dois empregos seguiram as

afirmações acima. Quanto as que trabalham de 8 a 10 horas, houve duas respostas

diferentes. Uma delas disse:

-“o estresse é normal na profissão do enfermeiro, com o tempo o profissional

amadurece. Tenho tempo para a família e o lazer.”

Outra enfermeira declarou:

- “consigo organizar meu tempo e tenho horas para o descanso e o lazer.”

Com relação aos efeitos para os pacientes, todos os enfermeiros entrevistados

acreditam que a qualidade dos serviços prestados é diretamente afetada pela sobrecarga

de trabalho. Abaixo alguns depoimentos:

- “o paciente sofre com o mau estado do enfermeiro, já que o profissional cansado está

mais sujeito a erros, seja pela desatenção ou pelo cansaço;”

- “o paciente é prejudicado pois a sobrecarga de trabalho afeta o enfermeiro

negativamente e o atendimento perde qualidade;”

- “a sobrecarga de trabalho aumenta o número de erros, veja o número de prescrições

erradas.”

Alguns entrevistados comentaram que os erros de enfermagem, amplamente

divulgados na mídia, estão relacionados ao excesso de horas trabalhadas por

enfermeiros.

Considerando-se a sobrecarga de trabalho segundo as respostas acima é possível

entender alguns dos erros absurdos que foram cometidos por profissionais de

enfermagem nos últimos anos e noticiados pela média. Nota-se que a baixa

remuneração leva esses trabalhadores a buscar novas fontes de renda, o que prejudica

seu desempenho, tanto em função do cansaço e da enorme fadiga, quanto seu tempo

livre, que fica resumido a poucas horas diárias.

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136

Os médicos afirmaram, em sua maioria, que também possuem uma jornada de

trabalho bastante extensa.

Apenas dois médicos trabalham entre 8 e 10 horas por dia. Um deles disse:

- “trabalho 8 horas por dia. O atendimento ao paciente piora muito quando há

sobrecarga de trabalho.”

O outro afirmou:

- “quando o médico excede a carga, fica sonolento, perde a atenção, fica

estressado e desanimado.”

Os outros sete entrevistados, no entanto, dedicam mais de 12 horas diárias à

medicina, todos atuam em outras clínicas e/ou hospitais além do Stella Maris. Um deles

afirmou:

- “minha jornada de trabalho é das seis da manhã às oito da noite, não tenho

tempo para família, esportes ou lazer”.

Outro entrevistado disse:

-“saio de casa às cinco da manhã e volto às nove da noite. Isso impacta na

minha família e não tenho tempo para meus afazeres pessoais”.

Um depoimento marcante deu um dos médicos quanto à sua rotina diária:

-“às vezes saio de caso às três, três meia da manhã para passar as visitas e

cumprir com minhas obrigações durante o dia. Trabalho de dezoito a vinte horas,

inclusive aos sábados e domingos. O paciente recebe de mim a mesma atenção. Eu me

prejudico para não transparecer ao paciente minha situação física. Minha esposa e

filha reclamam minha ausência. Converso com meus colegas, a média de trabalho dos

médicos é de dezesseis horas”.

O conjunto das respostas a essa pergunta ilustra um dos problemas mais

intrigantes da saúde no Brasil. Os pacientes e a sociedade, de modo geral, esperam

receber atendimento digno e atenção dos profissionais que os atendem, especialmente

porque trata-se de momentos em que as pessoas estão fragilizadas, clamando por

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melhora, atenção e cuidado. Costumeiramente, cada enfermo ou parente possui enorme

expectativa de que o melhor possível estará sendo realizado em termos de procedimento

e de atenção e cuidados.

No entanto, a maior parte dos profissionais demonstrou alto grau de esgotamento

físico para o exercício do trabalho. Tanto aqueles que possuem uma jornada compatível

(a minoria), quanto os que possuem carga excessiva, concordaram que a qualidade do

atendimento é diretamente afetada pelo cansaço, estresse e alto número de atividades

profissionais.

O pior, a incidência de erros, seja da área médica ou de enfermagem, aumenta

em função desse aspecto. Quantos pacientes e cidadãos já sofreram danos ou perderam a

própria vida em situações que poderiam ter sido evitadas se os trabalhadores tivessem

uma jornada de trabalho menos intensa?

Ressalta-se que menos intensa é seguir a jornada de trabalho mais comum, 8

horas diárias ou no sistema de plantão, trabalhar 12 horas e descansar 36 horas.

Ora, quais são os danos para os trabalhadores e para os pacientes ao se constatar

jornadas de 14, 16 e até 20 horas diárias?

h) a oitava questão procurou identificar se as práticas e técnicas de administração

implantadas nos últimos anos respeitaram e acataram as recomendações dos

órgãos de classe a que pertencem médicos e enfermeiros.

Os enfermeiros entrevistados ressaltaram, em sua totalidade, a importância do

trabalho desenvolvido pelo Conselho Regional de Enfermagem (COREN) que

determina regras e procedimentos de atendimento buscando maximizar a segurança dos

pacientes.

O COREN acompanha, por meio de visitas sistemáticas e esporádicas, o trabalho

de enfermagem realizado nos hospitais. É bastante comum a aplicação de multas, em

função do não atendimento de regras estabelecidas na legislação. Dentre as

recomendações do COREN, destacam-se:

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- determinação de intervalos obrigatórios de descanso para a área de enfermagem

durante o expediente de trabalho;

- determinação de número limite de leitos a serem assistidos por enfermeiro, conforme a

área de atuação e a especialidade que demanda os atendimentos;

- dimensionamento do pessoal de enfermagem, para qualquer tipo de instituição de

saúde e considerando a assistência requerida: cuidados mínimos, intermediários,

cuidados semi-intensivos e cuidados intensivos. Nesse caso, trata-se da resolução do

Conselho Federal de Enfermagem, COFEN número 293/ 2004.

Todavia, muitos entrevistados observaram que os hospitais não conseguem

cumprir as recomendações devido aos altos custos para serem implantadas. Disse uma

das enfermeiras:

- “a instituição precisa desrespeitar as regras impostas pelo COREN, já que o

ideal para o Conselho é muito distante do possível a ser feito”.

Os entrevistados acreditam que há uma relação direta entre qualidade e

segurança do atendimento e cumprimento das recomendações do COREN. As

afirmações a seguir foram pronunciadas nas entrevistas:

- “o não cumprimento das normas do COREN faz com que o atendimento seja básico ou

até precário”;

- “o respeito e o atendimento das normas do COREN leva a uma maior eficiência do

trabalho de enfermagem, o paciente é beneficiado com isso”;

- “se as recomendações não são cumpridas o paciente acaba recebendo um tratamento

pior.”

Algumas respostas indicam que os gestores hospitalares desconhecem as

responsabilidades dos enfermeiros, o que causa estresse e conflito.

O gestor hospitalar precisa possuir diversas competências para executar bem sua

função. A organização hospitalar demanda ampla gama de conhecimentos e habilidades,

eis alguns deles:

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139

- conhecimentos pertinentes à administração, como finanças, planejamento,

custos, logística, recursos humanos, suprimentos, sistemas, etc;

- conhecimento de aspectos legislativos relativos ao SUS e aos principais órgãos

de classe, como o COREN e o CRM;

- habilidades de comunicação, negociação, relacionamento interpessoal, etc.

Assim, há carência de profissionais com esse conjunto de competências. Para

realizar a interface entre os médicos e a administração, os hospitais possuem um diretor

clínico, que é um médico que representa o corpo clínico junto a administração. Há

também um médico que deve ocupar o cargo de diretor técnico que, além de assessorar

a instituição em assuntos técnicos, tem como incumbência garantir boas condições de

trabalho, coordenar os serviços técnicos desenvolvidos e observar o cumprimento das

normas.

Embora esses cargos possam contribuir para a melhoria da gestão hospitalar,

normalmente apresentam perspectivas diferentes e sua falta de sintonia ocasiona

problemas no cotidiano dos trabalhadores.

Segundo as entrevistadas:

- “a dificuldade financeira é a primeira justificativa dos hospitais para não

cumprirem as regras estabelecidas pelo COREN.”;

- “O administrador não tem conhecimento sobre o trabalho de médicos e

enfermeiros e é essa falta de conhecimento que causa o descumprimento das exigências

do COREN.”

- “O paciente é afetado, já que pode receber atendimento de má qualidade e

falta de atenção.”

Ressalta-se que as atividades laborais dos enfermeiros seriam mais harmônicas

caso fossem seguidas as regras, determinações e procedimentos estabelecidos pelos

Conselhos de Enfermagem que estabelecem limites quanto à quantidade de pacientes

por profissional e tempo para descanso e escala.

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140

As respostas dadas pelos médicos para essa questão indicaram que, no geral, há

um desconhecimento dos gestores hospitalares no que se refere às especificidades da

área médica. Para um dos entrevistados:

-“o gestor hospitalar não leva a sério como devem ser os protocolos e as

determinações porque a bomba sempre estoura na mão dos médicos e acaba afetando

os pacientes e a imagem do hospital”.

Outro médico disse:

-“existe um gap entre médicos e administração”.

Ainda outro afirmou:

- “a administração não respeita, não conhece as especificidades e os

regulamentos. Os médicos não participam de reuniões sobre isso com a

administração.”

Diferentemente das respostas dadas pelas enfermeiras entrevistadas que

elogiaram a atuação do COREN, alguns médicos criticaram os métodos de trabalho da

Associação Médica Brasileira (AMB) e dos Conselhos Federal e Regional de Medicina

(CFM e CRM). Em relação aos órgãos de classe médica, abaixo algumas declarações

dos entrevistados:

- “ao invés de oferecer educação continuada para a Saúde, eles brigam entre si e não

suportam os trabalhadores da área.”

- “os profissionais não são ouvidos nesses órgãos viciados. Eles deveriam se preocupar

menos com dinheiro e mais com o trabalho”.

- “o CRM é punitivo, não ajuda os médicos”.

- “existe um hiato entre os órgãos de medicina e os profissionais que estão na ponta,

executando os trabalhos.”

Nota-se que os médicos entrevistados não identificam apoio para o exercício de

suas atribuições e responsabilidades. Relataram nessa última questão que os interesses e

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141

preocupações da administração e dos órgãos de classe são divergentes daqueles que

estão em sintonia com seus valores e expectativas em relação ao trabalho.

Ao se analisar as respostas dos enfermeiros nessa questão, constata-se uma certa

admiração e entendimento quanto ao trabalho dos conselhos de enfermagem. Nota-se

que há concordância quanto as regras, regulamentações e recomendações. No entanto,

existe grande distância entre o recomendável e o realizado. Com o tempo, parece haver

um conformismo e uma aceitação passiva, pois a justificativa é sempre a mesma: não há

recursos para cumprir as normas do COREN.

Em relação aos médicos, a situação é mais dramática: tanto a administração

hospitalar quanto os órgãos de classe (Associação Médica Brasileira e os Conselhos

Federal e Regional) parecem ignorar suas reivindicações, preocupações e anseios. É

notório que os resultados do trabalho executado são afetados de alguma forma.

O conjunto de respostas indica que as novas técnicas e práticas de gestão no

setor da saúde foram negativas para médicos e enfermeiros. A velocidade, os métodos e

as políticas de implantação dessas técnicas e práticas não ocasionaram melhora no

atendimento do paciente também.

Algumas forças propulsoras das empresas capitalistas, que buscam

produtividade e eficiência, custe o que custar, aumentaram a carga de trabalho e a

pressão sobre médicos e enfermeiros.

Ademais, os gestores hospitalares parecem desconhecer as especificidades da

área da saúde. Da mesma forma, os profissionais da área não estão capacitados em

gestão e ainda não compreenderam/ aceitaram a importância da racionalização do

trabalho e a necessidade de otimização no uso de recursos para uma gestão que

possibilite a viabilidade financeira da unidade hospitalar.

Assim, faltam capacitação e competência para implantação de melhorias

significativas ao Sistema de Saúde. O Estado, gestor do SUS, por sua vez, embora tenha

dado alguns passos positivos, está longe de oferecer soluções consistentes que

proporcionem significativas melhorias ao sistema, mesmo no longo prazo. As Políticas

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Públicas constituídas não tiraram proveito das novas tecnologias. O mesmo ocorreu

com os novos métodos de gestão.

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143

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O setor da saúde é um dos mais complexos e problemáticos da sociedade

brasileira. É marcado por contradições e inúmeras demandas sociais, políticas e

econômicas. Não é exagero afirmar que, de modo geral, a Saúde no país continua

“doente”.

Historicamente, o Direito à Saúde ficou à margem das diversas constituições

promulgadas pelo Governo Federal, exceção feita à Constituição de 1988 que instituiu o

SUS.

Considerando que a saúde é premissa básica no exercício da cidadania, a

Constituição de 1988 representou um ensaio de garantias legais que, passados mais de

25 anos, não se efetivou.

O Sistema de Saúde existente, como sistema social, reflete o contexto histórico e

as condições políticas e socioambientais do país. Assim como ocorre com outras

demandas da sociedade, em relação à área da Saúde o Estado não é eficaz na promoção,

restauração e manutenção da saúde da população, e esses são, justamente, os propósitos

desse setor.

No entanto, é necessário e justo ponderar que houve alguns avanços nas últimas

décadas, especialmente porque a situação anterior era excludente para ampla parcela da

população. É importante lembrar que o INPS, e posteriormente o INAMPS, ofereciam

assistência médica apenas à uma parcela da população (trabalhadores das metrópoles

com carteira assinada, depois esse direito foi estendido ao trabalhador rural). Foi essa

situação que alguns entrevistados na pesquisa consideraram que o SUS melhorou o

atendimento à população. Mas essa melhora é pequena e insuficiente para as exigências

e demandas atuais da sociedade.

Embora o Estado seja o principal agente e o responsável pelas políticas a serem

implementadas pelo Sistema de Saúde, setores privados, como os convênios médicos,

ocuparam crescente espaço na complexa rede de empresas que, direta e/ou

indiretamente, executam a prestação de serviços nessa área. Essas empresas, como

organizações capitalistas, atuam sob a lógica do lucro. Essa é a finalidade para a qual

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foram criadas e, independentemente das consequências dessa lógica, seguem esse

propósito mesmo que isso signifique aumentar os riscos para a saúde do paciente. Pode-

se afirmar, nessa perspectiva, que os números são mais importantes que o cuidado das

pessoas. Isso significa que o Estado e a sociedade ao aceitarem essa situação estão em

profunda crise.

Observa-se que há instrumentos e instituições, como a Agência Nacional de

Saúde, que regulamentam as atividades e monitoram a prestação dos serviços privados.

Para os entrevistados, porém, muitas dessas empresas, na prática, oferecem péssima

assistência à população. Essa realidade causa diversos transtornos no cotidiano de

médicos e enfermeiros no exercício do trabalho.

Os hospitais são o principal espaço para os cuidados da saúde. Como

praticamente inexistem médicos de família e redes primárias de atendimento, boa parte

dos brasileiros vai diretamente para o hospital quando está doente. Assim, os hospitais

absorvem cerca de 70% do orçamento do governo federal para a área.

Mesmo com tantos recursos (o Ministério da Saúde é o que recebe mais recursos

do Governo Federal, supera inclusive o Ministério da Educação), causam indignação e

perplexidade a falta de aparelhamento, a não adoção das inovações tecnológicas e o

fraco desempenho médico nos hospitais. Embora existam ilhas de excelência nas

principais metrópoles, a maior parte dos hospitais, sejam públicos ou privados, está

sucateada e administra dívidas altíssimas, o que limita de modo crucial a melhora na

gestão e impede investimentos que elevem a qualidade do atendimento aos pacientes e

as condições de trabalho para os profissionais da área.

O Brasil possui mais de 3500 hospitais filantrópicos (aproximadamente 40% das

unidades hospitalares do SUS) e o Hospital Stella Maris, como típico estabelecimento

filantrópico, passa pelas dificuldades expostas acima.

O ambiente hospitalar possui diversos atores que possuem interesses comuns e

divergentes: fornecedores de insumos, de equipamentos e de serviços específicos e de

apoio; os trabalhadores, médicos, enfermeiros, equipe administrativa e outros

profissionais da saúde; indústria de equipamentos e de medicamentos; órgãos de classe

como o CRM e o COREN; o Estado, responsável pela regulação, manutenção e controle

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do sistema; convênios médicos e seguradoras; o paciente e aqueles que o acompanham,

os usuários do sistema. Esses diferentes grupos possuem visão parcial e não atuam de

modo sintonizado e integrado. Faltam planejamento e perspectiva de longo prazo. A

gestão hospitalar adotou algumas novas práticas e técnicas, mas não houve competência

na implementação de novas formas de trabalho e atuação.

Na gestão empresarial contemporânea, a aprendizagem contínua e o uso

eficiente das novas tecnologias são a verdadeira atividade produtiva. Seu efeito possui

evidências físicas, mas é essencialmente intangível. As respostas das entrevistas, tanto

dos médicos como dos enfermeiros, indicam que não há estímulos à aprendizagem.

Também são escassos os recursos para investimentos em novas tecnologias. Assim, o

setor hospitalar no Brasil, com raras exceções, está desatualizado e não tirou proveito do

progresso tecnológico e dos novos conhecimentos existentes nessa área. O efeito dessa

situação é sentido pelo paciente e pelos trabalhadores responsáveis pelo cuidado, dentre

eles, médicos e enfermeiros.

A Globalização, as novas tecnologias e práticas de gestão, somadas à natureza

do trabalho, afetaram de modo contundente o trabalho de médicos e enfermeiros. Isso

porque novas exigências e demandas são apresentadas todos os dias e não há apoio e

preocupação em preparar os trabalhadores para aquisição dos conhecimentos e

habilidades que surgiram com essas transformações. É como se “cada um estivesse por

conta própria”.

As mudanças das novas técnicas de gestão não foram positivas para os

trabalhadores entrevistados. Todos os entrevistados observaram mudanças na

administração hospitalar, especialmente nos seguintes aspectos: redução de custos,

pressão por maior produtividade, que no trabalho de médicos e enfermeiros refere-se à

execução do trabalho de modo mais rápido. Os efeitos dessas mudanças foi negativo nas

relações entre administradores, médicos e enfermeiros. Também para o paciente, na

visão dos entrevistados, houve diminuição na qualidade do serviço prestado.

A visão dos entrevistados em relação ao SUS foi heterogênea. Alguns acreditam

que houve avanços no atendimento à população e outros criticaram enfaticamente,

especialmente a implantação das políticas públicas. O conceito e a proposta de

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atendimento integral do SUS trouxeram algum progresso à área da Saúde no Brasil. No

entanto, há muitas falhas e aspectos a serem trabalhados, tais como:

- os cálculos de custos dos procedimentos autorizados pelo SUS são inferiores

aso custos efetivos, o que ocasiona prejuízos constantes aos hospitais conveniados ao

sistema;

- os investimentos são inconstantes e realizados, muitas vezes, por motivações

políticas e técnicas;

- o foco está, essencialmente, baseado em produção, ou seja, em números de

atendimentos e procedimentos. A qualidade do trabalho realizado está em segundo

plano;

- falta um plano de capacitação e educação continuada para os trabalhadores do

setor executarem suas atribuições de modo mais competente.

Em relação à atuação das empresas privadas, em especial os seguros e convênios

médicos, a realidade é caótica. Médicos e enfermeiros vivenciam, costumeiramente, a

falta de preocupação com a vida humana. Onde as organizações veem números, esses

profissionais veem seu semelhante. Assim, os conflitos são constantes. Diante desse

cenário, o Estado, nos últimos anos, tem punido diversas empresas que não cumprem as

regulamentações do setor e não entregam aos seus clientes aquilo que venderam

(atendimento e procedimentos de saúde particular). Infelizmente, essas punições não

surtem efeitos e nem as multas aplicadas são pagas pelas empresas. Muitas delas vão à

justiça e discutem por anos essas penalidades, tirando proveito da morosidade da

aplicação de penas no Brasil. Ademais, o Estado parece “perdido” diante da

complexidade dos problemas da área. Uma estratégia e uma linha de ação de médio e

longo prazo inexistem. Em outras palavras, os problemas são resolvidos quando

surgem, ou melhor, quando os escândalos são amplamente divulgados pela mídia.

Nesses casos, “apagam-se os incêndios” a fim de acalmar a população e dar uma

resposta política às injustiças praticadas.

A revolução tecnológica em curso também na área da saúde beneficiou apenas

as parcelas mais abastadas da população. Isso porque os recursos para investimentos em

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novos equipamentos e maquinários são insuficientes diante das demandas existentes.

Além disso, não há programas de capacitação em massa para médicos e enfermeiros. O

cotidiano desses profissionais é absorvido essencialmente no atendimento e nos

procedimentos que precisam realizar. Não estão previstas, no expediente de trabalho,

horas para atualização, treinamento, capacitação. Cada profissional deve buscar o

aprimoramento profissional por conta própria e em seu tempo livre. Assim, boa parte

desses profissionais desconhece o uso e o benefício das novas tecnologias e práticas de

gestão. Há resignação e conformismo com a dura realidade do cotidiano (recheada de

sobrecarga de trabalho e conflitos) e as motivações que um dia conduziram esses

profissionais a escolher o nobre trabalho que executam vão diminuindo com o passar do

tempo.

Por outro lado, ainda há esperança. Os entrevistados demonstram que o foco do

seu trabalho está no paciente. Enfermeiros e médicos se avaliam segundo os benefícios

que conseguem proporcionar aos pacientes. Cabe ao Estado e aos outros agentes do

sistema demonstrarem, efetivamente, que eles não estão sozinhos nesse objetivo. Faltam

conhecimento e ações planejadas para promover um alinhamento dos diversos atores

para que esse objetivo chegue efetivamente para a população assistida.

Portanto, as considerações finais dessa tese reforçam a necessidade urgente de

uma profunda revisão no modelo de saúde em vigor. O clamor das ruas, ocorrido nos

protestos espalhados pelo país em meados de 2013, comunicaram a evidente

insatisfação da sociedade no que diz respeito aos serviços públicos.

Cabe ao Estado promover reformas e avanços no sistema que provoquem as

transformações necessárias com maior agilidade e assertividade. Médicos e enfermeiros

devem participar desse debate como protagonistas. Afinal, o cuidado ao usuário é

executado por esses profissionais que, desde sempre, ficaram à mercê das decisões

tomadas por políticos e empresários do setor.

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