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Pontos críticos no ensino de português a falantes de espanhol - da observação do erro ao material didático 1 Daniele Marcelle Grannier e Elzamária Araújo Carvalho Universidade de Brasília 2. Introdução Retomando a discussão sobre a necessidade (ou não) 2 de uma metodologia específica para o ensino de português a falantes de espanhol (FE), apresentamos, neste trabalho, uma aplicação da proposta heterodoxa de Grannier 3 (no prelo) à elaboração de material didático, a partir de um estudo preliminar sobre os erros dos aprendizes no processo de aquisição/aprendizagem (A/A). Inicialmente, apresentamos um ensaio de análise da A/A de português por FE, que nos permitiu fazer um levantamento objetivo de um conjunto de erros persistentes. 4 Nesta análise procuramos identificar (1) alguns tipos de erro devidos à transferência e (2) como se explica essa transferência. Em seguida, exemplificamos, com parte de uma unidade temática extraída de um projeto de material didático, a combinação do trabalho baseado em textos – que podem ser de diversos tipos: filme, texto jornalístico, canção e excertos, entre outros, e visam a proporcionar o contato comunicativo básico usando a língua portuguesa – com um conjunto de atividades e técnicas variadas para estimular a atenção nas semelhanças e nas diferenças entre o português (P) e o espanhol (E) e promover uma reflexão sobre os pontos críticos da A/A do português por FE. Neste material, o foco-na-forma é feito de maneira predominantemente indutiva, a partir de textos em português: o aprendiz depreende inicialmente as regularidades e os usos próprios da língua e, num segundo momento, trabalha esses pontos de modo que, nas novas exposições ao português, possa testar e reformular suas hipóteses iniciais, na medida em que for necessário. 3. Levantamento dos erros Apresentamos, a seguir, um levantamento dos erros encontrados na produção escrita em português por falantes de espanhol de diferentes níveis de A/A do português. Consideramos como pontos críticos aqueles tipos de erros que persistem mesmo entre aprendizes mais avançados. 1 Agradecemos a Adrián Canteros e a Orlene Carvalho a leitura prévia que fizeram e os seus valiosos comentários. A presente versão se beneficiou de diversas sugestões e correções apontadas por eles. 2 Quanto à não necessidade de uma metodologia específica, cf. J. C. Paes de Almeida Filho (1995) e, sobre abordagens e materiais específicos para o ensino de português a FE, v. Akerberg (1994), Lombello et al. (1983), Lombello e Baleeiro (1983), Silva Gomes, et. al (1987), Simões (1995) e Coudry e Fontão (2000). 3 O quadro da proposta heterodoxa para o ensino de português a FE se apoia nos argumentos do movimento do "redespertar do foco-na-forma", nos termos de Doughty e Williams (1998), para o ensino de línguas estrangeiras, iniciado por Long (1991). com respeito à conscientização através do foco-na-forma, adotamos, entre outras, proposta de Fotos (1992), citada em Fotos (1993) e de Swain (1998). Na aplicação à elaboração de materiais, revisitamos antigos exercícios, até mesmo o ditado e a tradução. 4 Outras análises de erros e/ou análises contrastivas visando à aplicação ao ensino: Jensen (no prelo), Júdice (no prelo) e Ferreira (1995 e 1997). 1

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Pontos críticos no ensino de português a falantes deespanhol -

da observação do erro ao material didático 1

Daniele Marcelle Grannier e Elzamária Araújo CarvalhoUniversidade de Brasília

2. IntroduçãoRetomando a discussão sobre a necessidade (ou não)2 de uma metodologia específica para oensino de português a falantes de espanhol (FE), apresentamos, neste trabalho, uma aplicação daproposta heterodoxa de Grannier3 (no prelo) à elaboração de material didático, a partir de umestudo preliminar sobre os erros dos aprendizes no processo de aquisição/aprendizagem (A/A).

Inicialmente, apresentamos um ensaio de análise da A/A de português por FE, que nos permitiufazer um levantamento objetivo de um conjunto de erros persistentes.4 Nesta análise procuramosidentificar (1) alguns tipos de erro devidos à transferência e (2) como se explica essa transferência.

Em seguida, exemplificamos, com parte de uma unidade temática extraída de um projeto dematerial didático, a combinação do trabalho baseado em textos – que podem ser de diversos tipos:filme, texto jornalístico, canção e excertos, entre outros, e visam a proporcionar o contatocomunicativo básico usando a língua portuguesa – com um conjunto de atividades e técnicasvariadas para estimular a atenção nas semelhanças e nas diferenças entre o português (P) e oespanhol (E) e promover uma reflexão sobre os pontos críticos da A/A do português por FE. Neste material, o foco-na-forma é feito de maneira predominantemente indutiva, a partir de textosem português: o aprendiz depreende inicialmente as regularidades e os usos próprios da língua e,num segundo momento, trabalha esses pontos de modo que, nas novas exposições ao português,possa testar e reformular suas hipóteses iniciais, na medida em que for necessário.

3. Levantamento dos errosApresentamos, a seguir, um levantamento dos erros encontrados na produção escrita emportuguês por falantes de espanhol de diferentes níveis de A/A do português. Consideramos comopontos críticos aqueles tipos de erros que persistem mesmo entre aprendizes mais avançados.

1 Agradecemos a Adrián Canteros e a Orlene Carvalho a leitura prévia que fizeram e os seus valiosos comentários. Apresente versão se beneficiou de diversas sugestões e correções apontadas por eles.

2 Quanto à não necessidade de uma metodologia específica, cf. J. C. Paes de Almeida Filho (1995) e, sobre abordagens emateriais específicos para o ensino de português a FE, v. Akerberg (1994), Lombello et al. (1983), Lombello e Baleeiro(1983), Silva Gomes, et. al (1987), Simões (1995) e Coudry e Fontão (2000).

3 O quadro da proposta heterodoxa para o ensino de português a FE se apoia nos argumentos do movimento do"redespertar do foco-na-forma", nos termos de Doughty e Williams (1998), para o ensino de línguas estrangeiras, iniciadopor Long (1991). com respeito à conscientização através do foco-na-forma, adotamos, entre outras, proposta de Fotos(1992), citada em Fotos (1993) e de Swain (1998). Na aplicação à elaboração de materiais, revisitamos antigos exercícios,até mesmo o ditado e a tradução.

4 Outras análises de erros e/ou análises contrastivas visando à aplicação ao ensino: Jensen (no prelo), Júdice (no prelo) eFerreira (1995 e 1997).

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Utilizamos, como base do levantamento, quinze provas do exame CELPE – Brás (2000)5,distribuídas em três grupos, de acordo com o grau de certificação obtido pelos candidatos: segundocertificado (2), primeiro certificado (1) e sem certificado (S).

Os erros encontrados foram classificados, inicialmente, através de um critério puramentelingüístico. Para cada tipo, indicamos alguns exemplos, seguidos da forma correspondente emespanhol e em português Os números e a letra que se seguem ao exemplo indicam a localizaçãodo mesmo: 592 – IV / S (592 é o número da prova, IV corresponde à tarefa em que se encontra oexemplo e S indica a certificação obtida naquela prova).

O primeiro grupo, dos erros lexicais, reúne aqueles que incidem em algum aspecto da seleçãolexical (na sua forma ou na sua adequação semântica).

O segundo grupo, dos erros morfossintáticos, apresenta aqueles que afetam a estrutura interna dapalavra e seus vínculos a outras palavras, tais como erros de regência e de gênero.

Consideramos como um terceiro grupo, de erros sintáticos, os que se encontram num nívelpuramente sintático, tais como erros de ordem dos constituintes e de conetivos.

No quarto grupo, os erros definidos por “questões léxico-sintático-semânticas”: são erros queincidem em dois ou mais itens lexicais em pelo menos uma das duas línguas e envolvemdiferenças de recorte semântico e/ou uso em diferentes estruturas sintáticas. No quinto grupo, reunimos as inadequações de registro e de estruturas.

1. Erros lexicais

Dentre os erros lexicais, neste trabalho, consideramos que não constitui propriamente erro (ou errocom o mesmo grau de interesse que os demais), tanto o primeiro subtipo, o uso da forma emespanhol, como o segundo subtipo, o uso da forma (quase) em português; pois o primeiro subtipoindica apenas uma falta de contato (suficiente, pelo menos) com o item lexical em português e oúltimo podem ser considerados mais como uma falta de atenção às regras ortográficas doportuguês do que erros de língua.

O terceiro subtipo, denominado o “uso de formas mistas”, apresenta erros que revelam melhor odesenvolvimento do processo de aquisição / aprendizagem do português naqueles pontos em queo aprendiz pode se beneficiar de um ensino que propicie uma conscientização das semelhanças ediferenças entre P e E.

1.1. Uso da forma em espanhol

compartir (E. compartir, P. compartilhar) 621 – II / 1

precios (E. precios, P. preços)

592 – IV / Sreceta

(E. receta, P. receita)573 – I / 2

sur (E. sur, P. sul)

593 – I / S

1.2. Uso da forma (quase) em português

55 Agradecemos à SesuMEC e à Comissão Técnica do exame CELPE-Bras pela disponibilização das provas realizadas em2000.

2

Consideramos como um grupo à parte (quase “não erros”) os exemplos que apresentam apenaserros de acentuação gráfica, tais como

tambem (P. também)

603 – I / S horario (P. horário )

603 – I / Séxtase (P. êxtase)

594 – II / 2bém (P. bem)

592 – II / S

1.3. Uso da forma mista

(1) Interferência ortográfica

Convém distinguir os erros decorrentes apenas da interferência das regras ortográficas doespanhol na escrita do português. Como a ortografia de cada língua, a rigor, não faz parte dosistema lingüístico, mas é apenas um meio de representação convencional dessas línguas,podemos considerar que os erros ortográficos em geral (assim como os erros de acentuação,acima) não constituem erros, propriamente ditos, de língua portuguesa.

Dessa maneira, podemos supor que, se os exemplos abaixo, ao invés de serem produzidos porescrito, tivessem sido produzidos oralmente, eles teriam sido pronunciados corretamente.

aprossimar (E. aproximar, P. aproximar) 594 – III / 2

asim (E. así, P. assim)

603 – I / S assessorio (E. accesorio, P. acessório)

604 – I / 1

(2) Interferência fonológica

Neste tipo incluímos os erros em que a forma fonológica da palavra em parte é espanhola e emparte é portuguesa.6

(a) O erro pode ser um indício de uma diferença sistemática entre os sistemas fonológicos doportuguês e do espanhol. Um tipo bastante recorrente é o que envolve as letras b e v e revelamuma dificuldade para distinguir os fonemas correspondentes em português.

escrebe (E. escribe, P. escreve)

573 – I / 2pobo (E. pueblo, P. povo)

592 – II / S6 Consideramos "forma fonológica" de uma palavra desde (a) a forma de seus morfemas (os fonemas de que sãoconstituídos): por exemplo, em "besinho", [bes-] apresenta a forma (com fonemas) do espanhol enquanto o sufixoapresenta a forma (com fonemas) do português, passando por (b) (ir)regularudades de natureza morfofonológica: o verbo"dormir" em português apresenta variações do radical diferentes das variações do radical do (aparentemente) mesmoverbo em espanhol, até (c) aspectos que permitem inferir a situação do sistema fonológico da interlíngua do aprendiz.

3

posivilidade (E. posibilidad, P. possibilidade) 603 – I / Spovre

(E. pobre, P. pobre)594 – III / 2

(b) O erro pode ser decorrente de uma estrutura transitória, uma tentativa de aproximação da formaem português

besinho (E. beso, P, beijinho)593 – II / S

edade(E. edad, P. idade)

627 – I / 2

letura (E. lectura, P. leitura)

592 – IV / S

(3) Regularização morfológica

A irregularidade do português ainda não foi adquirida ou só foi parcialmente adquirida. Em algunscasos, a correspondência é conhecida, mas é aplicada em item lexical no qual não ocorre acorrespondência ou é aplicada em um ponto inadequado da palavra (vevir).

durme (E. duerme, P. dorme)

592 – II / Ssoamente (E. solamente, P. somente)

609 – IV / 1vevir (E. vivir, P. viver)

592 – III / S

(4) Inadequação semântica

alargar (E. alargar, P. alongar)

604 – IV / 1 (1) 7

entrar (E. entrar, P. colocar)

573 – I / 2 (2)trocou (E. cambió, P. mudou)

621 – II / 1 (3)

2. Erros morfossintáticos

3.2. Usos de preposições

(1) Regência verbal

7

V. o contexto dos exemplos numerados no anexo I, “Contexto dos exemplos citados” .

4

Consideramos erro de regência verbal o uso de preposição em complemento direto, a falta depreposição em complemento preposicionado ou o uso de uma preposição não aceitável por outra,em complemento preposicionado.

ajudar a (P. ajudar Ø)

604 – III / 1 (4)aprender deles (P. aprender com eles)

603 – III / S(5)

descordar com (P. discordar de)627 – IV / 2

(6)olhar em (P. olhar Ø)

609 – III / 1(7)

(2) Outros usos de preposição

Constituem erros de natureza próxima do erro lexical, a substituição de preposições de uso fixo, emformas-feitas, por outras. 8

de mal em pior (P. de mal a pior)

604 – II / 1 (8)

iguais que nós (P. iguais a nós)603 – III / S

(9)nesse respeito (P. a esse respeito)

601 – IV / S(10)

no longo prazo (P. a longo prazo)588 – III / 2

(11)

2.2. Gênero

Erros de concordância de gênero geralmente refletem a transferência do gênero da palavracorrespondente em espanhol. Em alguns casos, entretanto, como deste vez e de palavrasterminadas em –ão essa explicação não se aplica.

as outras costumes

593 – III / S(12)

(P. os outros costumes)

deste vez (P. desta vez)

588 – IV / 2(13)

o sua situação (P. a sua situação)603 – IV / S

(14)o viaje (P. a viagem)

8 Curiosamente, os exemplos recolhidos coincidem na preposição substituída: em todos eles deveria ocorrer a preposiçãoa. Além disso, em três deles, o a foi substituído por em. (Em apenas um exemplo houve substituição do a por que.)

5

609 – II / 1(15)

seus preocupações

601 – II / S(16)

(P. suas preocupações)

2.3. Determinantes e indefinidos

Um tipo de erro comum é o uso de artigos em estruturas onde o português não os aceita, assimcomo a sua omissão nas estruturas em que são obrigatórios. Entre os pronomes e adjetivosindefinidos, os erros mais freqüentes incidem nas formas tudo e todo(s).

a longo do trajeto (P. ao longo...)

620 – II / 2 (17)a outra única coisa (P. a única coisa)

620 – II / 2(18)

algum(P. alguém)

592 – II / S(19)

toca o sanfone (P. toca sanfona)620 – II / 2

(20)todo

(P. tudo)601 – II / S

(21)tudos

(P. todos)609 - II / 1

(22)

3. Erros sintáticos

Entre os erros sintáticos mais comuns destacam-se os erros de ordem dos constituintes.

ajudar para que o indivíduo

604 – IV / 1 (23)(P. ajudar o indivíduo para que)

eu só lhe posso dizer

621 – II / 1 (24)(P. eu só posso lhe dizer)

meu chato dia

627 – II / 2(25)

6

(P. meu dia chato)

não todos somos iguais

627 – III / 2 (26)(P. não somos todos iguais)

4. Questões léxico-sintático-semânticas

À primeira vista, os erros que envolvem questões léxico-sintático-semânticas poderiam serconsiderados erros de seleção lexical, tais como o uso de ser por estar. Um exame mais detidorevela que o erro se deve a distribuições em estruturas diferentes e/ou a recortes semânticos(parcialmente) diferentes de uma língua para a outra.

estou a favor (E. estoy a favor, P. sou a favor)

627 – IV / 2 (27)

estar em contra(E. estar en contra, P. ser contra)

613 – III / 1 (28)

prestar ouvidos(P. dar ouvidos / prestar atenção)

609 – II / 1 (29)

é tão mau (E. P. está tão mau)592 – II / S

(32)

acostumo (E. acostumbro, P. costumo)604 – IV / 1

feria (E. feria, P. feira)

592 – IV / S

trocou (E. cambió, P. mudou)

621 – II / 1

5. Inadequações

5.1. De registro

(1) Uso de pronome átono em texto informal

tem que fazê-lo agora

613 – III / 1(P. deve fazê-lo agora / tem que fazer isso

agora)

7

(2) De estrutura

(a) Uso de relativa por estrutura com possessivo

em relação à natureza, não devemos esquecer que a qualidade mais importanteque tem é [...]

613 – III / 1(P. [...] à natureza, não devemos esquecer que a (sua) qualidade mais importante[...])

(b) Uso de relativa por estrutura com infinitivo

em relação à natureza, [...] a qualidade mais importante que tem é que é única.

613 – III / 1(P. em relação à natureza, [...] a qualidade mais importante é ser única)

1. Análise contrastivaUma classificação de base contrastiva se faz necessária para distinguir os pontos para os quaisexiste a possibilidade de se depreender uma regularidade na correspondência entre P e E daquelespara os quais não há uma generalização suficientemente econômica.

Convém notar que, embora nem todos os pontos críticos analisados contrastivamente ofereçamresultados aplicáveis a atividades de depreensão de regularidades no ensino de PFE, isso nãoinvalida a sua adoção.

Em primeiro lugar, mesmo que, de toda a análise contrastiva, apenas uma parte se usasse paraesse tipo de atividade (e o resto fosse posto de lado), esse recurso não deveria ser desprezado,pois fornece elementos ao professor e ao elaborador de material didático que, em aula, permitirãoao aprendiz fazer descobertas úteis sobre o que sente como dificuldades, acrescentando um novosentido à aula, fazendo com que percorra o processo de A/A com segurança.

Por outro lado, o "resto", como os pontos isolados resultantes da análise contrastiva (por exemplo,a inadequação semântica (v. (4) em 1.3.), servem a vários propósitos: na seleção de textos9, e deatividades, para permitir contato repetido com esses elementos. Caso sejam notados pelo aprendizou caso sejam realçados no material (através de negrito, por exemplo) poderão ser enfocadosdurante a aula.

Concordamos com Akerberg (1994) quando afirma que

"a análise contrastiva é apenas um ingrediente entre vários, na gramática pedagógica [...] talvezseja mais factível chamar a atenção do professor para a importância e o estudo da mesma”.

pois o conhecimento das semelhanças e diferenças entre o espanhol e o português permite aoprofessor entender melhor e identificar com maior precisão os pontos que causam dificuldade aoaprendiz. Examinaremos a seguir os pontos que serão utilizados para ilustrar a aplicação à elaboração demateriais didáticos com foco na forma.

9 "Textos" em sentido amplo: textos verbais (orais e escritos), textos visuais (desenhos, fotos, etc.), textos mistos (anúnciospublicitários, reportagens, textos ilustrados), obras de artes plásticas, filmes e vídeos.

8

3. b / v: pobo e posivilidade

Os erros que envolvem b e v requerem um exame em vários níveis, pois, de acordo com aortografia do espanhol, essas duas letras constituem representações de um mesmo fonema e nãoserviriam para indicar a distinção fonológica entre o fonema /b/ e /v/ do português.

Podemos afirmar com bastante segurança, portanto, que na grafia pobo não houve intenção derepresentar o fonema /b/ assim como em posivilidade não houve a intenção de representar ofonema /v/.

Esses erros, entretanto, não constituem meras “confusões de letras” mas são indícios de que oaprendiz provavelmente ainda não distingue os fonemas /b/ e /v/ em português. E, mesmo que elejá os distinga em algumas palavras, ele ainda não sabe qual dos dois ocorre em outras (como empossibilidade e em povo).

4. O viaje

O gênero dos substantivos em espanhol e a concordância que eles provocam correspondem, namaioria das vezes, ao que se encontra em português.

Alguns substantivos isolados (nariz, leite, sangue, costume, árvore, etc.) e todos os derivados como sufixo –agem, entretanto, não apresentam essa correspondência.

la narizo nariz

la sangre o sanguela leche

o leitela costumbre o costume

el viejo árbol a velha árvore

el viajea viagem

el coraje a coragemel garaje a garagem

5. descordar com, ajudar a alguém

Alguns erros de uso de preposição, como descordar com, não se devem à transferência doespanhol (pois nessa língua o que se encontra é discordar de) enquanto outros, como ajudar aalguém é um uso diretamente calcado na regência do espanhol.

Por outro lado, a análise do português demonstra que há necessidade de se distinguir, como indicaCarvalho (no prelo), os usos gramaticais das preposições dos usos com significados distintos.Além disso, a autora salienta que a preposição de, por sua vez, apresenta um complicador: alémde ocorrer com esses dois usos, vários outros de seus usos são limítrofes, tornando aanálise demasiadamente complexa para uma aplicação econômica ao ensino.

A análise contrastiva confirma os resultados da análise das preposições do portuguêspor Carvalho: (1) a regência, tanto verbal como nominal é propriedade do item lexical e, emborahaja muitas coincidências, não se submete a correspondências regulares de uma língua para outra,enquanto (2) nos usos com significados distintos, é possível depreender regularidades.

9

6. soamente

Em espanhol, assim como em português, nas palavras derivadas com –mente, a base apresenta aforma feminina: P. primeiramente – E. primeramente. A regra é válida, nas duas línguas, também,para as palavras que têm apenas uma forma tanto para o feminino como o masculino: P.tradicionalmente – E. tradicionalmente, P. simplesmente – E. simplemente, P. fortemente – E.fuertemente, etc. nas quais a base, embora com formas invariáveis, têm gênero feminino.

O erro acima se deve ao fato de, em espanhol, a palavra correspondente encontrar-se no primeirogrupo, das palavras que apresentam uma forma marcada como feminina: solamente, enquanto, emportuguês a base tem uma forma invariável, independentemente do gênero: somente.

2. A aplicação ao ensinoO material didático apresentado aqui corresponde aproximadamente à metade de uma unidadebaseada no filme Eu Tu Eles. Essa primeira parte é centrada numa reportagem sobre o filme. Nasegunda parte, depois de assistir ao filme, pode-se desenvolver atividades análogas às da primeiraparte, seja com base no próprio filme (uma atividade com foco-na-forma (léxico), pode ser, porexemplo, uma prática oral controlada sobre meios de locomoção, pois a protagonista se deslocausando vários meios, entre os quais, anda de burro/jegue, de ônibus e a pé) seja com base no textoda canção “Esperando na Janela“ de Gilberto Gil ou, ainda, com base em pequenos textosinseridos incidentalmente, mas de forma integrada, de acordo com a necessidade de ampliar otrabalho dos pontos com foco na forma.

As atividades propostas a partir de textos têm por objetivo propiciar (como foi mencionado naintrodução deste trabalho), tanto (1) a interação em sala de aula,10 como (2) o trabalho da língua,com foco-na-forma.

O critério básico para optar por uma ou outra atividade ou por um ou outro ponto crítico é a análisedo próprio texto,11 e a identificação do potencial que ele oferece. Por outro lado, os tipos deatividades selecionados devem atender às indicações da proposta heterodoxa.

A partir desses dois critérios, qualquer atividade pode ser considerada para inclusão no materialdidático. Revisitamos algumas atividades tais como o ditado e a tradução e adaptamos exercíciosde análise lingüística (fonética, fonológica, morfossintática e semântica). Incluímos um "teste Cloze"clássico, como exercício, pelo desafio de "busca de pistas" que envolve e pela integraçãolingüística que proporciona.

Além disso, consideramos a discussão da "correção" do teste Cloze, oralmente, em aula, umaatividade que proporciona um foco-na-forma descontraído, pois a proposta, na forma clássicadessa atividade, já prevê respostas variadas, mais ou menos precisas em que o que se procuranão é uma resposta única e certa (a que ocorre no texto), mas qualquer preenchimento que façasentido e até mesmo uma informação sobre o tipo de palavra que poderia ocorrer. É, como se vê,uma excelente oportunidade para o aprendiz verbalizar suas dúvidas. É o momento, também, deuma interação aluno/professor e aluno/aluno para uma reflexão sobre os variados aspectos quecada escolha de palavra requer.

Um conjunto de unidades temáticas desse tipo permite desenvolver a primeira fase de um cursoque atenda às características da proposta heterodoxa, mencionada acima, proporcionandoelementos para:

(1) o contato com a língua portuguesa e com a cultura brasileira através de filmes, textos einteração em sala de aula, com ênfase na compreensão. (V. no desenvolvimento da

10 V. atividades desenvolvidas em Henriques e Grannier (2001).11 Esse processo, aparentemente simples, torna-se bastante complexo na medida em que o elaborador de materiaisdidáticos procura integrar a quantidade de textos necessários para um curso completo.

10

unidade abaixo: itens 1 e 2.1. a 2.3. que envolvem compreensão oral e compreensão detexto);

(2)produção oral controlada (v. abaixo: questionário de múltipla escolha, correção do testeCloze e atividades propostas em 3.1. e 3.6.) – é nessas atividades que professor e alunopodem dedicar parte da sua atenção para a precisão tanto da gramática quanto dapronúncia;

(3) foco na forma: léxico (V. abaixo: 3.1. e 3.6.);(4) foco na forma: regularidades som/letra (V. 3.3.) com ênfase na distinção fonológica e na

precisão da pronúncia. A atenção às regularidades ortográficas do português fornece umapoio valioso, para o FE, na aprendizagem da forma fonológica das palavras do português;

(5) foco na forma: correspondências gramaticais entre o E e o P e regularidades do português(V. 3. 2. a 3.5.);

(6) produção escrita intensiva e extensiva. (V. abaixo: 4.)

Entremeamos junto com a apresentação/descrição do material didático alguns comentários sobre odesenvolvimento das atividades em sala de aula.

UNIDADE / Filme Eu Tu Eles

1. Trailer do filme Eu Tu Eles (aquecimento).

1.1. Compreensão e discussão do tema.1.2. Foco na percepção auditiva.

11

2. O texto básico.

O texto escolhido foi “Quadrilátero Sertanejo”, de Cléber Eduardo e Sílvio Ferreira, que constitui aseção Cultura/Cinema da revista Época, de 14 de agosto 2000 (pp. 116 -117), reproduzido, emparte, a seguir. (V. reprodução do texto completo no anexo II.)

2.1. Análise prévia

Comentários sobre o título, fotos e chamadas.

2.2. Leitura do texto

Apenas os dois primeiros parágrafos da reportagem são reproduzidos aqui, pois serão examinadosmais detalhadamente para a amostra de material didático.

Quadrilátero sertanejoAmbientado no cenário favorito dos filmes brasileiros, Eu Tu Eles conta a história de uma

mulher e três maridos.

Andrucha Waddington esperava preguiçosamente diante da televisão, em agosto de 1995,o fim de mais um típico domingo. O premiado diretor de videoclipes e sócio da produtoraConspiração Filmes, hoje com 30 anos, arregalou os olhos diante de uma reportagem noFantástico. Era a história de Maria Marlene Sabóia da Silva, de 49 anos, que vivia com um marido edois amantes em Quixelô, lugarejo com 200 habitantes no interior do Ceará. Andrucha queria fazerseu primeiro longa-metragem, mas ainda não tinha encontrado um bom enredo. Vislumbrou nareportagem a semente da singela comédia Eu Tu Eles. “O machismo dos brasileiros tolera umhomem com várias mulheres, mas uma senhora com três companheiros é insólito." Afirma.

A opção pelo inusitado está gerando boa colheita. Eu Tu Eles foi aplaudido de pé em uma mostraparalela do Festival de Cannes, tem exibição garantida em vários países, estréia em mais de 90salas no Brasil e é forte candidato a uma vaga para o Oscar de produção estrangeira. O roteiroconta como a faceira e fogosa camponesa Darlene, interpretada por Regina Casé, recebe ajuda doacaso para atrair e manter três homens em casa (Lima Duarte, Stênio Garcia e Luiz CarlosVasconcelos). O quadrilátero é retratado com bom humor. A exploração do lado cômico depersonagens matutos e das saborosas expressões regionais não faz pouco dos sertanejos. Eu TuEles representa-os de forma afetuosa até quando tem cruéis ataques de sinceridade. Para nãoreduzi-los a estereótipos, a produção usou como modelos os moradores da pequenina Junco deSalitre, na Bahia, local das filmagens. Também contou com palpites de Gilberto Gil, autor da trilhasonora.

2.3. Compreensão de texto: questionário de múltipla escolha.

Um questionário de múltipla escolha proporciona enunciados que levantam pontos de diversasnaturezas, os quais serão avaliados em sua correspondência ao conteúdo do texto. O aluno devepoder justificar a escolha que faz, dentre as diferentes respostas enumeradas.

Apresentamos aqui duas questões possíveis, referentes aos dois primeiros parágrafos do texto:

12

2.4. “Teste Cloze” 12

2.4. Teste Cloze11

1. Preencha cada lacuna com uma palavra.

Quadrilátero sertanejo12

11 Neste exemplo de um “Teste Cloze”, adotamos a eliminação de cada sétima palavra. Os nomes próprios e os numeraisforam considerados como uma só palavra. Adotamos aqui o critério de contar as palavras ortográficas. As contrações depreposição e artigo, portanto, também foram contadas como uma só palavra. Na apresentação final, no material didático,as lacunas devem ser numeradas.

13

Depois de ler o texto acima, responda às seguintes perguntas.

1. A reportagem dá a entender que o filme deve fazer sucesso porque

(1) O filme mostra as dificuldades enfrentadas, no dia-a-dia, por uma família brasileiratípica.

(2) Os brasileiros, assim como os estrangeiros, gostam de filmes com temas polêmicos.(3) O filme deve ser muito bom, já que está sendo apreciado pelos estrangeiros. (4) O filme é baseado em uma história fantástica, bem ao gosto dos brasileiros.

2. Os autores escolheram diferentes palavras para se referirem a pessoas do sexomasculino e feminino em “um homem com várias mulheres” e “uma senhora com trêscompanheiros” porque

(1) É bom evitar a repetição de palavras num mesmo período. (2) Nos textos jornalísticos, costuma-se selecionar palavras que produzam impacto no

leitor.(3) Queriam mencionar uma realidade chocante de forma suavizada.(4) Não ficaria bem falar de “uma mulher com três homens”.

Ambientado no cenário favorito dos filmes brasileiros, Eu Tu Eles conta a históriade uma mulher e três maridos.

Andrucha Waddington esperava preguiçosamente diante da televisão,____________ agosto de 1995, o fim de ____________ um típico domingo. Opremiado diretor ____________ videoclipes e sócio da produtora ConspiraçãoFilmes, ____________ com 30 anos, arregalou os olhos ____________ de umareportagem no Fantástico. Era ____________ história de Maria Marlene Sabóia daSilva, de 49 anos, ____________ vivia com um marido e dois ____________ emQuixelô, lugarejo com 200 habitantes ____________ interior do Ceará. Andruchaqueria fazer ____________ primeiro longa-metragem, mas ainda não tinha____________ um bom enredo. Vislumbrou na reportagem ____________semente da singela comédia Eu Tu Eles. “O machismo ____________ brasileirostolera um homem com várias ____________, mas uma senhora com trêscompanheiros ______________ insólito”, afirma. A opção pelo inusitado ____________ gerando boa colheita. Eu Tu Eles foiaplaudido ____________ pé em uma mostra paralela do Festival de Cannes,____________ exibição garantida em vários países, estréia ____________ maisde 90 salas no Brasil ____________ é forte candidato a uma vaga ____________o Oscar de produção estrangeira. O ____________ conta como a faceira e fogosa____________ Darlene, interpretada por Regina Casé, recebe ajuda____________ acaso para atrair e manter três ____________ em casa (LimaDuarte, Stênio Garcia e Luiz Carlos Vasconcelos). ____________ quadrilátero éretratado com bom humor. ____________ exploração do lado cômico depersonagens ____________ e das saborosas expressões regionais não____________ pouco dos sertanejos. Eu Tu Eles representa-os ____________forma afetuosa até quando têm cruéis ____________ de sinceridade. Para nãoreduzi-los _____________ estereótipos, a produção usou como modelos____________ moradores da pequenina Junco de Salitre, na Bahia,____________ das filmagens. Também contou com palpites ____________Gilberto Gil, autor da trilha sonora.

14

2. Compare suas respostas com as palavras retiradas do texto.

1. em

2. Mais

3. Diante

4. a

5. que

6. amantes

7. no

8. seu

9. encontrado

10. a

11. dos

12. mulheres

13. é

14. está

15. pé

16. para

etc

15

3. Foco-na-forma

3.1. Produção oral controlada: léxico 1.13

Com base nas informações do quadro abaixo

1. Identifique e descreva o tipo de lugar onde se passa a história do filme Eu Tu Eles.2. Fale sobre outros lugares.

1.000.000 de habitantes

300.000 habitantes

açude

área rural: criações / plantações

arranha-céus

avenidas asfaltadas

bancos

metrô / hospitais / teatros

palácio do governo

praça da igreja

rede de água e esgoto

ruas de terra

shoppings

13 No material didático, esta página teria, como fundo, fotos de cidades de diferentes tamanhos, com algumas dascaracterísticas citadas. Dois textos que poderiam se ligar a esta atividade, substituindo o quadro ou complementando-o,são os anúncios publicitários em que aparecem (1) uma rua de uma cidade grande e suas "entranhas" e (2) umacamionete passando por vários tipos de terrenos (areia, lamaçal, etc.), debaixo de chuva, de sol, etc.(v. anexo III).

16

a metrópole

a cidade

a capital

o lugarejo

o vilarejo

17

3.2. Preposições e contrações

(1) Contrações

1. Leia os dois primeiros parágrafos do texto e anote as ocorrências de em, no, nos,na, nas, de, do, dos, da, das e das palavras que as acompanham. Depois, respondaàs perguntas abaixo.

No texto Em espanholem agosto en agosto em Quixelô en Quixelô no interior en el interioretc.

No texto Em espanholda televisão de la televisióno fim de mais el fin de másdo Ceará del Cearáetc.

(1) Por que, em espanhol, quando o nome que se segue é feminino, há duas palavras:de la e quando o nome é masculino, há

apenas uma?(2) Esse mesmo tipo de explicação pode ser aplicado ao português?

(3) Como fica o quadro das correspondências entre as formas subjacentes e as formascontraídas? Complete o quadro:

de + o do em + o no

(2) Usos de preposições

1. Examine as palavras que tinham sido eliminadas no exercício de lacunas e respondaàs perguntas que se seguem:

1. ____em____ agosto de 19952. lugarejo com 200 habitantes _____no______ interior do Ceará. 3. O machismo _____dos_____ brasileiros4. Eu Tu Eles foi aplaudido _____em_____ pé5. estréia _____em_____ mais de 90 salas no Brasil6. é forte candidato a uma vaga ____para_____ o Oscar de produção estrangeira7. recebe ajuda _____do_____ acaso para atrair e manter três amantes8. Para não reduzi-los _____a______ estereótipos9. Também contou com palpites _____de_____ Gilberto Gil, autor da trilha sonora.

(1) Observe a expressão em pé. Existe uma expressão equivalente em espanhol?(2) Qual é a idéia expressa nas demais frases (1, 2 e 5) com em ou no (em + o)? (3) A que você atribui o uso de a na frase 8?(4) Na frase 6 seria possível inserir um verbo depois de para. Qual poderia ser?(5) A que você atribui o uso de de na frase 7?(6) Caracterize o uso de de nas demais frases (3 e 9), com de ou dos (de + os).

18

2. Tente organizar as suas conclusões na tabela abaixo

Verbo X + YUsos com significado

tempo/lugar finalidade Nome + nome14 Casos especiaisreduzir + a

receber +em pé

3. Complete o texto abaixo com a, de, em, para. Se for necessário escreva a formacontraída (no, dos, etc.).

Embora tenha aprovado o resultado, a inspiradora ____________ (+o) projeto,Maria Marlene, ficou desconfiada dos truques ____________ (+a) ficção. “Como ela meimita se ela não me conhece?”, questionou, ao assistir à interpretação de Regina Casé.Comediante ____________ humor indômito e estilo estridente, Regina conteve os gestos eas palavras ____________ (+as) filmagens. “Eu me senti ____________ (+um) monastério.Quase não falava.”, exagera. O elenco, aliás, é irrepreensível. Lima Duarte interpreta opreguiçoso e ranzinza Osias, com quem Darlene se casa por conveniência. Stênio Garciaparece em estado ____________ graça, como o ingênuo e subserviente Zezinho [...] Opapel ____________ sedutor ficou com Luiz Carlos Vasconcelos. O trio masculinoexperimenta o ciúme, o desejo e o medo ____________ (+a) solidão. Todos sãomanipulados pela esperteza ____________ Darlene.

Enquanto corria atrás ____________ (+o) dinheiro para Eu Tu Eles, o diretorAndrucha Waddington fez o suspense Gêmeas (1999), baseado ____________ crônica____________ Nelson Rodrigues. Já o novo filme possibilitou a transição ____________ (+a) cena urbana ____________ a rural. O bem-sucedido rapaz ____________ (+a) ZonaSul ____________ (+o) Rio de Janeiro, marido ____________ (+a) atriz Fernanda Torres,mergulhou ____________ (+a) paisagem mais exportada pelo cinema brasileiro: o sertãonordestino. “Descobri esse mundo fascinante, seu código ____________ ética próprio, asabedoria ____________ (+os) habitantes e tentei mostrar isso ____________ (+a) tela”,afirma o diretor. [...].

Eu Tu Eles exibe as características essenciais ____________ (+o) cotidiano desseuniverso. Mostra a seca, a fome, os sacrifícios e o desemprego. Os personagens moramem casas ____________ barro, dormem ____________ redes, não têm televisão nem luzelétrica e só trabalham ____________ (+o) período ____________ (+a) colheita. Que nãose espere, contudo, um enfoque politizado, como ____________ (+os) anos 60. “Minhageração não usa o cinema ____________ expor um projeto ____________ país”, explicaAndrucha. “Nós nos preocupamos com a história, não com mensagens ou denúncias.”

O interesse maior ____________ (+o) jovem diretor está em mostrar como suas figurasnordestinas fogem ____________ (+as) receitas tradicionais ____________ tentarsaborear um pedacinho ____________ felicidade. E o fato de usar o humor ____________narrar a trajetória dessas pessoas não impede Eu Tu Eles de retratar o Brasil.

14 Quando há coincidência de uso em P e em E, principalmente da preposição de, não é econômico detalhar a análise dosignificado.

19

3.3. Distinção /b/ - /v/15

Bb / Vv

1. Pronúncia

bela

vela

[b]: som oclusivo bilabial

[v]: som fricativo labiodental

15 Os exercícios de pronúncia são inspirados nos treinamentos fonéticos (de lingüistas). Mantém-se aqui apenas oselementos metalingüísticos que podem ser úteis para o aprendiz FE. Não há necessidade de utilizar a terminologia técnica.O professor e o aluno poderão se referir aos mesmos fatos utilizando os termos que lhes parecerem mais sugestivos.Exercícios desse tipo já haviam sido introduzidos no ensino de PLE por Grannier-Rodrigues e El-Dash em materialexperimental elaborado na Unicamp, em 1979.

20

No material didático, ilustração:figura de uma bela mulher

No material didático, ilustração:figura de uma vela acesa

Dica: os lábios são apertados um contrao outro, impedindo completamente apassagem do ar e abrem-serepentinamente, como em espanhol, eminício absoluto de enunciado, porexemplo: ao chamar alguém: ¡Victor!¡Beatriz! Ou quando segue m: sombra,cambiar.

No material didático: foto de boca de frente, pronunciando [v]: lábio inferior encosta contra incisivos superiores , que podem ser vistos.

Dica: o lábio inferior é encostado nosdentes incisivos superiores reduzindo aabertura por onde passa o ar,continuamente, como na pronúncia de[f] em português ou em espanhol. Osom [v] não existe em espanhol.

No material didático: foto de uma boca vista

de frente, pronunciando

[b]: lábios fechados,

2. Grafia

[b] sempre se escreve b: ambientado, brasileiros, habitantes, bom, boa, recebe, pobre,saborosas, Bahia, também, Gilberto, embora, cabra, baseado, possibilitou, urbana, bem-sucedido, descobri, sabedoria, diabo, trabalho, barro, etc.

[v] sempre se escreve v (excepcionalmente se escreve w, em alguns nomes próprios:Walter): favorito, esperava, televisão, videoclipes, vivia, vislumbrou, várias, festival, vaga,aprovado, conteve, palavras, falava, conveniência, subserviente, lavar, Vasconcelos, novo,tiver, universo, livre, livro, etc.

o inverso é verdadeiro:

b sempre se lê [b]

SUPERDICA!v sempre se lê [v]

3. Exercícios

1. DitadoAssinale a palavra ouvida

A B

1. o boto o voto2. bate vate3. libra livra4. taba (es)tava

5. juba chuva6. bento vento

7. cabo cavo8. caba cava9. berço verso10. abelha a velha

2. Leitura em voz altaEscolha um trecho do texto “Quadrilátero sertanejo” e leia, prestando atenção àpronúncia das palavras com b e com v. Faça uma gravação em fita cassete ou emvídeo e observe como você pronunciou as palavras com esses sons.

3. Coloque na tabela abaixo as palavras com b e com v que ocorrem no texto e, aseguir, responda às perguntas abaixo.

b v Em espanholfavorito favorito

televisão televisión videoclipes videoclipes

boa buena recebe recibe

bom bueno

21

palavras palabras possibilitou posibilitó

cabra cabra visões visiones

etc. etc.

22

(1) Por esse levantamento, o que é mais comum em português: palavras com b ou com v?(2) Quando uma palavra se escreve com b (ou com v) numa língua, pode-se predizer comque letra ela se escreve na outra língua?(3) Você conhece outras palavras que se escrevem com b ou com v em português e nãocoincidem com a escrita em espanhol? Quais são?

3.4. Palavras terminadas em –agem

1. Observe as seguintes frases do texto “Quadrilátero sertanejo” e indique, sempre quepossível, o gênero (M) ou (F) das palavras terminadas em -agem:

1. [...] na Bahia, local das filmagens. 2. [...] diante de uma reportagem do Fantástico. 3. Andrucha queria fazer seu primeiro longa-metragem.4. Vislumbrou na reportagem [...]5. A exploração do lado cômico de personagens matutos [...]6. Regina conteve os gestos e as palavras nas filmagens.7. [...] mergulhou na paisagem [...]8. O Nordeste emprestou imagens [...]9. Também foi cenário de abordagens políticas [...]10. [...] imagens do Nordeste [...]11. Os personagens moram em casas de barro [...]12. Nós nos preocupamos com a história, não com mensagens [...]13. Walter Salles apresenta uma viagem [...]

2. Agora, responda às seguintes perguntas:

(a)Qual é o gênero da maioria das palavras terminadas em –agem?

(b)Pelos exemplos em que ocorrem, não é possível depreender qual é o gênero deimagens e de mensagens. O que você pode supor sobre o gênero dessaspalavras? Confira com seu professor ou procure num dicionário a confirmação desua hipótese.

(c)Como explicar o gênero de personagens? Pergunte ao seu professor ou consulte um dicionárioe/ou uma gramática para saber o que se diz sobre o gênero dessa palavra.

(d)Na frase 3, como se explica que longa esteja na forma feminina e seu primeiro na formamasculina? Converse com seus colegas e seu professor a respeito.

23

M/F

1. ( ) 2. ( )3. ( )4. ( )5. ( )6. ( )7. ( )8. ( )9. ( )10. ( )11. ( )12. ( )13. ( )

3.5. Palavras formadas com –mente

1. Observe a seguinte frase do texto “Quadrilátero sertanejo” e compare a palavraterminada em –mente com as formas correspondentes em 1 e 2, abaixo.

[...] esperava preguiçosamente diante da televisão o fim de mais um típico domingo.

(a) Lima Duarte interpreta o preguiçoso e ranzinza Osias [...](b) A personagem de Regina Casé, Darlene, não é nem preguiçosa nem ranzinza [...]

2. Observe o conjunto de exemplos abaixo:

3. Passe para o espanhol:

Espanhol

feminino singular

un típico domingo típica tipicamente

Português

feminino singular

um típico domingo típica tipicamente seu primeiro filme primeira primeiramenteo lado cômico cômica comicamenteas expressões regionais regional regionalmentede forma afetuosa afetuosa afetuosamentea trilha sonora sonora sonoramenteum problema difícil difícil dificilmenteé forte candidato forte fortementeuma receita simples simples simplesmenteo novo filme nova novamenteum homem só só somenteas receitas tradicionais tradicional tradicionalmente

24

4. Responda às seguintes perguntas:

(a) Em que exemplos a forma feminina não se distingue da masculina?

Em português Em espanholregional regional

(b) Você conhece outras palavras em português (e/ou em espanhol) que nãodistinguem forma masculina de feminina?___________________________________________________________ ___________________________________________________________

5. Agora, observe as palavras terminadas em –mente que ocorrem nos seguintes textose teste suas conclusões:

25

No material didático: montagem com os textos publicitários oujornalísticos (ou parte deles), com ilustrações, de onde foramextraídas as frases abaixo.

1. Toda vez que usar seu cartão Credicard você automaticamenteconcorre a um dos 30 DVDs Gradiente que a Credicard estarásorteando no fim do mês. (Época, 14 de agosto de 2000, p. 115.)

2. No Afganistão, como na era de Hitler, quem pertence a minorias temde usar distintivo. [...] O pedaço de pano amarelo que deve ser pregadona roupa serve somente para os homens. (Veja, 30 de maio de 2001,p. 58.)

3. As pessoas raramente mudam alguns tipos de comportamento.Pessoas são o que são. Elas nasceram e vão morrer assim. (Você,S.A. junho de 1999, 31.)

4. Sua vida no trabalho pode parecer tensa – e freqüentemente é. Vale apena, então, conhecer a experiência de profissionais que vivem otempo todo trabalhando com riscos extremos. (Você S. A., setembro de1999, p. 64.)

5. Iasa Terragrés não é o mais caro. Simplesmente vale muito mais.(Veja, 18 de outubro de 1995, 65.)

6. Quando transmitimos idéias às pessoas, não é necessário convencê-las totalmente. Basta que acreditem que você está do lado delas.(Você S. A., setembro de 1999, p. 85.)

7. "Vive quem ousadamente vive." Goethe. (Ícaro, Revista de bordo daVARIG, setembro de 2001, p. 14.)

3.6. Produção oral controlada: léxico 2.

Com base nas informações do quadro abaixo, fale sobre o filme.

Personagens centrais

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Darlenefaceira fogosa esperta

Osiaspreguiçosoranzinza

Zezinhosubserviente“cabra” dedi-cado a ...

Cirojovemsedutor

ciúmes desejo medo da solidão

4. Atividades extraclasse.

4.1. Produção escrita com base no quadro “Personagens centrais”.

4.2. Atividade extensiva

Filme: Eu Tu ElesProdução escrita: resumo e comentários.

3. ConclusãoAplicando os princípios da abordagem heterodoxa, propomos que se leve em conta os

aspectos específicos do processo de A/A de português por falantes de espanhol. Destacamos (1)atividades proativas predominantemente indutivas, que promovam a conscientização dassemelhanças e diferenças entre P e E, através do foco-na-forma (a partir do uso da língua emcontexto significativo), (2) o controle da produção oral e, como instrumento para atingir essesobjetivos, (3) a priorização da leitura e da produção escrita.

No desenvolvimento de uma metodologia específica, ilustrada neste trabalho, pretendemos

demonstrar a necessidade do empenho no conhecimento mais aprofundado da!língua portuguesaefetivamente usada no Brasil e do contraste entre essa língua e o espanhol para a fundamentaçãodo ensino e para a elaboração de material didático.

Concordamos com a afirmação de Doughty e Williams (1998)16 (referindo-se ao trabalho deLong e Robinson) quanto à “ineficiência de deixar o aprendiz adulto por conta de seus própriosrecursos”,17 quando, por outro lado, a instrução que utiliza o foco-na-forma pode proporcionaratalhos úteis. Nesse processo, o papel do professor torna-se fundamental para fornecer elementosprovocadores para uma reflexão sobre os pontos críticos na A/A do português por FE.

BibliografiaAKERBERG, MARIANNE (1994) "Análise contrastiva na gramática pedagógica: um ingrediente útil noensino de português a falantes de espanhol." 3º Congresso Internacional de Ensino de Portuguêscomo Língua Estrangeira. 19 a 21 de outubro de 1994, Pp. 96-102.

-------------, MARIANNE (1996) A transferência na situação de duas línguas próximas: o caso deportuguês e de espanhol. 4º Congresso Internacional do Ensino de Português como LínguaEstrangeira. Pp. 13-46.

ALMEIDA FILHO, JOSÉ CARLOS PAES DE (1995) “Uma metodologia específica para o ensino de línguaspróximas?" in: Português para Estrangeiros.Interface com o espanhol, José Carlos Paes deAlmeida Filho. Campinas: Pontes. Pp. 13-21.

CARVALHO, ORLENE LÚCIA DE SABOIA (no prelo) "Transparência semântica e polissemia: distinçõesauxiliares no ensino das preposições".

DOUGHTY, CATHARINE E WILLIAMS, JESSICA (1998) Focus on Form in Second Language Acquisition.Cambridge: Cambridge University Press. Pp. 1-11.16 Na apresntação do livro, descrevendo o trabalho de Long e Robinson, o segundo capítulo do livro Focus on Form inClassroom Second Language Acquisition.17 Tradução de DMG.

27

FERREIRA, ITACIRA ARAÚJO (1995) “A interlíngua do falante de espanhol e o papel do professor.Aceitação tácita ou ajuda para superá-la?” in: Português para Estrangeiros. Interface com oespanhol, José Carlos Paes de Almeida Filho. Campinas: Pontes. Pp. 39-48

FERREIRA, ITACIRA ARAÚJO (1997) “Interface português/espanhol" in: Parâmetros atuais para o ensinode Português Língua Estrangeira, José Carlos Paes de Almeida Filho. Campinas: Pontes. Pp.141-151.

FERREIRA, ITACIRA ARAÚJO (no prelo) "Reflexão crítica sobre o lugar da gramática no ensino deportuguês para falantes de espanhol". Anais do III Congresso da SIPLE, Universidade de Brasília –2000.

GRANNIER, DANIELE MARCELLE (no prelo) “Uma proposta heterodoxa para o ensino de português afalantes de espanhol”. Anais do III Congresso da SIPLE, Universidade de Brasília – 2000.

HENRIQUES, EUNICE RIBEIRO E GRANNIER, DANIELE MARCELLE (2001) Interagindo em Português – Textos eVisões do Brasil, Brasília, Editora Thesaurus.

JENSEN, JOHN B. (no prelo) “O papel do espanhol como fonte de erro em português: o caso do alunobilíngüe em espanhol e em inglês”. Anais do III Congresso da SIPLE, Universidade de Brasília –2000.

JÚDICE, NORIMAR (no prelo) “Ensino de português para hispanofalantes: transparências e opacidades”.Anais do III Congresso da SIPLE, Universidade de Brasília – 2000.

LOMBELLO, LEONOR CANTAREIRO E BALEEIRO, MARISA DE ANDRADE (1983) Português para falantes deespanhol (edição experimental). Campinas: Unicamp/Funcamp/MEC.

LONG, MICHAEL (1991) “Focus on form: a design feature in language teaching methodology” citado porDoughty, Catharine e Williams, Jessica (1998) Focus on Form in Second Language AcquisitionCambridge: Cambridge University Press. Pp. 1-11.

MARRONE, CÉLIA SIQUEIRA (1990) Português-espanhol: aspectos comparativos. São Paulo: Editora doBrasil.

SILVA GOMES, HELENA MARIA, PESSOA, FRANCISCO LAGE E CASTRO, BRUNO ALVES DE (1993) Curso Ativo.México: Universidad Nacional Autonoma de México, CELE.

SWAIN, MERRILL (1998) “Focus on form through concious reflexion” in: Doughty, Catharine e Williams(Eds.), Jessica, Focus on Form in Second Language Acquisition, Cambridge: Cambridge UniversityPress. Pp. 64-80.

Obras de consultaDICCIONÁRIO PARA LA ENSEÑANZA DE LA LENGUA ESPAÑOLA PARA BRASILEÑOS. 1ª edição, Junho de 2000,Universidade de Alcalá de Henares. Madrid. São Paulo: Livraria Martins Fontes Ltda.

NEVES, MARIA HELENA DE MOURA (2000) Gramática de usos do português. São Paulo: UNESP.

28

Anexo I

Contexto dos exemplos citados1. "Alargaria o período das vendas e ninguém sairia perdendo."

604 – IV/ 1

2. “Eu acho que o médico consegui entrar todos os dados que precisa…".573 – I / 2

3. "Eu só lhe posso dizer que meu dia trocou completamente…" 621 – III / 1

4. “O governo deve estabelecer leis para ajudar aos índios." 604 – III / 1

5. “Que ainda temos muito que aprender deles , eles conhecem mais estas terra."

603 – III / S

6. "… e descordo com o senhor Hickmam contrário a essa ventagem para nós…"

627 - IV/ 2

7. "Eu sou Argentino e deixe passar muitos anos sem olhar em meus indios."

609 – III / 1

8. "… o negócio foi de mal em pior." 604 – II / 1

9. "não fazer diferença entre brancos e indios, porque eles são iguais que nós"

592 – II / S

10. "Os editores teriam que fazer um esforço nesse respeito e manter os mesmos preços doslivros…"

601 – IV / S

11. “Os governantes devem ficar cientes e até falar abertamente de que os resultados não serãoimediatos, mas no longo prazo.

588 – III / 2

12. "As costumes da civilização não tem que mudar as outras costumes ansestrais delesindígenas…"

29

593 – III/ S

13. "E sugere um bônus para desconto em outra compra, deste vez fora da feira, nas lojas…"

588 – IV / 2

14. "porque os preços são elevados o sua situação econômica não deixa você ir?"

603 – IV / S15. “como a música é relaxante, muitos deles continuam o viaje, deixando passar seu ponto deônibus."

609 – II / 1

16. "…e também os passageiros que desse modo deixavam de lado seus preocupações, o calor etalvez suas tristezas."

601 – II /S

17. "Eu experimentei uma paz esquisita que foi aumentando a longo do trajento"

620 – II / 2

18. "… por isso mudou e a outra única coisa que sabia fazer era tocar o acordeão."

620 – II / 2

19. "… a gente diverte-se toda mas algum não da ouvido e durme."592 – II / S

20. " José é um negro que toca o sanfone num ônibus." 620 - II / 2

21. "Foi, Rogério, um dia diferente e todo graças a José…" 601– II /S

22. “Mas não tudos prestam ouvidos para José…"609 – II / 1

30

23. "A prática da leitura ajuda para que o indivíduo seja melhor…"604 – IV / 1

24. "eu só lhe posso dizer que meu dia trocou."

621 – II / 1

25. “… alegrou meu chato dia…"

627 – II / 2

26. “Reconhecer que não todos somos iguais…" 627 – III / 2

27. "Eu estou a favor a manutenção do 20% de desconto…"627 – IV / 2

28. "Ninguém pode estar em contra o progresso…"613 – III /1

29. "Mas não tudos prestam ouvidos para José…"609 – II / 1

30. "Como você conhece, estou de férias em Rio de Janeiro."609 – II / 1

31. "… o consumidor tem que ter em conta que o público…"576 – IV / 2

32. "…mais o dia não é tão mau quando viajo no onibus…"592 – II / S

31