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Diz-se! Não se diz! SENTIDOS PORTUGUÊS @i esta língua! Manual de sobrevivência 10 ISABEL POÇO LOPES OFERTA

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Diz-se!Não se diz!

SENTIDOSPORTUGUÊS

@i esta língua! Manual de sobrevivência

10

ISABEL POÇO LOPES

OFERTA

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DIZ-SE! NÃO SE DIZ! @i esta língua! Manual de sobrevivência

Introdução

É comum ouvir os professores de todos os níveis de ensino afirmarem que os alunos

cometem muitos erros quando escrevem ou falam português. A prática de mais de 20 anos

de professora leva-me a partilhar da mesma opinião. Aliás, foi essa prática que me permitiu

ir construindo um corpus de erros mais comuns, extraídos das produções escritas e orais

dos alunos. É com base nesse corpus que este pequeno livro foi escrito.

Dirigido aos alunos que se encontram atualmente a frequentar o Ensino Secundário (mas

de interesse também para os que valorizam a língua portuguesa), Diz-se! Não se diz! assume-

-se como um pequeno manual que visa mostrar, explicar e corrigir alguns erros mais fre-

quentes e habituais que encontramos nas produções linguísticas deste público específico.

Não se trata, por conseguinte, de um livro que elenca de forma exaustiva todos os erros do

português, mas de uma pequena brochura escrita numa linguagem simples, intuitiva e pouco

técnica, que pretende, acima de tudo, levar os jovens a perceber o porquê dos erros e, dessa

forma, a corrigi-los mais facilmente.

As explicações sobre os erros e, por vezes, sobre a sua motivação constituem pistas que

visam permitir ao aluno uma reflexão apoiada acerca da sua própria prática linguística.

Tivemos em consideração a norma, por necessidade, conservadora, mas não esquecemos

que a língua é um organismo vivo em que a norma e o uso se digladiam constantemente e,

portanto, onde o certo e o errado têm nuances por vezes difíceis de definir.

Na apresentação da informação, optámos pela técnica de localização dos produtos nos

supermercados: mudámos a ordem e o esquema habitual, para que os utilizadores deste

manual, ao procurar o que precisam, sejam levados a encontrar outros atropelos também

comuns e habituais, memorizando-os e corrigindo-os, por impulso. Esperamos levar os lei-

tores a corrigir determinados erros, mesmo que não andem à procura deles!

Isabel Poço Lopes

Professora Auxiliar da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra

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ÍNDICE

I. Confusões com as formas do verbo haver! ................................................................................ 3

1. Há ou À? ........................................................................................................................................................................... 3

2. Hás de ou hades? ..........................................................................................................................................................4

3. Hão de ou hádem? ........................................................................................................................................................ 5

4. Houve ou houveram? .................................................................................................................................................. 5

II. Verbos com segredos escondidos! ..............................................................................................71. Intervim ou intervi? .......................................................................................................................................................7

2. Mantive ou manti? ........................................................................................................................................................8

3. Entreteve ou entreteu? ...............................................................................................................................................9

4. Pagado ou pago? ..........................................................................................................................................................9

5. Poder ou puder? .......................................................................................................................................................... 10

6. Pode ou pôde? .............................................................................................................................................................. 11

7. Vem, vêm ou veem? .................................................................................................................................................... 12

8. Fizeste ou fizestes? ..................................................................................................................................................... 13

9. Lesse ou lê-se? ............................................................................................................................................................. 14

III. Cuidado com a pronúncia! Cuidado com ortografia! .........................................................15

1. Possamos, façamos e tenhamos: como se pronuncia afinal? ......................................................................... 15

2. Desequilíbrio ou desiquilíbrio? ................................................................................................................................ 15

3. Saem ou saiem? ........................................................................................................................................................... 16

IV. Confusões na pronúncia e na ortografia ............................................................................... 17

V. Outras confusões habituais ......................................................................................................18

1. Senão ou se não? ......................................................................................................................................................... 18

2. Melhor ou mais bem? ................................................................................................................................................. 18

3. Onde ou aonde? ...........................................................................................................................................................20

4. Encontramo-nos ou Encontramos-nos? ..............................................................................................................20

5. Compramos ou compra-mos / comprarmos ou comprar-mos? .................................................................... 21

6. A fim de, a fim de que ou afim? ...............................................................................................................................22

7. Ter de ou ter que? ........................................................................................................................................................23

8. Gostar que ou gostar de que? ..................................................................................................................................24

9. Ir ao encontro de ou ir de encontro a? ..................................................................................................................24

VI. Concordâncias ........................................................................................................................... 25

1. Com expressões de percentagem ...........................................................................................................................25

2. A maioria dos alunos sabe ou a maioria dos alunos sabem?...........................................................................25

3. Um dos que fizeram ou um dos que fez? ...............................................................................................................26

4. Trata-se de ou tratam-se de? ................................................................................................................................. 27

5. Pesem embora os problemas ou pese embora os problemas? ........................................................................ 27

6. Obrigado ou obrigada; obrigados ou obrigadas? ...............................................................................................28

VII. Preposições: umas esquecidas outras inventadas! .......................................................... 29

1. Ter a certeza de que ou ter a certeza que? ...........................................................................................................29

2. Deve fazer ou deve de fazer? ...................................................................................................................................29

3. As relativas para baralhar! ......................................................................................................................................30

VIII. Palavras semelhantes, possíveis, mas diferentes! ...........................................................31

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I. Confusões com as formas do verbo haver!

O verbo haver é certamente um dos verbos mais maltratados da língua portuguesa. Seguem-se algumas perguntas cujas respostas podem ajudar a ultrapassar dúvidas acerca de algumas formas deste verbo.

1. Há ou À?

DIZ-SE

Não ligo o computador há dois dias.

Há vírus neste computador.

Não ligo o computador à dois dias.

À vírus neste computador.

NÃO SE DIZ

Há é uma forma do verbo haver. Nas frases acima há tem o sentido de: tempo decorrido – Não ligo o computador há dois dias. existir – Há vírus neste computador.

A diferença entre há e à é muito simples de explicar. Há é uma forma do verbo haver e à é uma contração da preposição a com o artigo a.

Como vês, uma coisa nada tem a ver com a outra. Mas isto talvez não chegue para saberes quando deves usar um ou outro.

Aqui vai mais uma ajuda:Quando dizes Não ligo o computador há dois dias, estás a dizer que já passaram dois

dias desde que não ligas o computador, utilizando o verbo haver para traduzir esse sen-tido.

Quando dizes Há flores no jardim, estás a dizer que existem flores no jardim. Isto é, podes usar os verbos passar e existir para traduzir os mesmos efeitos de sentido.

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Dica 1: Para saberes se deves usar há ou à, podes usar, em substituição de haver, os verbos passar ou existir, para traduzir a mesma ideia. Se o sentido se mantiver, é porque o que deves escrever é a forma do verbo haver (há). Por exemplo: Passaram dois dias desde que não ligo o computador; Existe um vírus neste computador.

Se não é cão é gato, claro! Nestes casos não podes usar à.

Dica 2: Por norma à aparece sempre depois de um verbo ou introduzindo um ele-mento móvel na frase: Vou à internet; À noite, as festas são mais divertidas.

Atenção: Um pormenor importante: há tem acento agudo (´) e à tem um acento grave (`).

2. Hás de ou hades?

DIZ-SE

Hás de cá vir pedir mais alguma coisa!

Hás de, hás de!

Hades cá vir pedir-me mais alguma

coisa! Hades, hades!

NÃO SE DIZ

Hás de é uma forma do verbo haver (2.a pessoa do singular do presente do indicativo), a que se junta a preposição de. Neste caso, logo a seguir vem outro verbo, no infinitivo, pelo que o verbo haver é aqui apenas auxiliar. Por isso mesmo é conjugado em todas as pessoas e significa “ser obrigado a”; “pretender”; “desejar”.

Hades é um deus da mitologia grega, o deus dos mortos, e nada mais do que isso. Aliás, é por isso que se escreve com maiúscula.

A razão pela qual se cometem tantos atropelos na construção das formas do verbo haver é simples.

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Os falantes do português têm a tendência para conjugar o verbo haver na expressão haver de, como se estivessem a conjugar um verbo terminado em -er (um verbo inven-tado como hader).

Compara: comes – *hádes; comem – *hádem. Esta última forma, um erro grosseiro também, aparece já de seguida!

(Nota: O * e a cor cinza marcam, sempre, a ocorrência errada dos exemplos.)

3. Hão de ou hádem?

DIZ-SE

Hão de dizer-me o que acham disto! Hádem dizer-me o que acham disto!

NÃO SE DIZ

Hão de é também uma forma do verbo haver (3.a pessoa do plural do presente do in-dicativo), a que se junta a preposição de.

A forma *hádem é usada como a forma alegadamente legítima de um suposto verbo *hader, que, como vimos acima, não existe.

*Hádem é, tal como *hádes, a forma que os falantes criam por analogia, mais uma vez, com a forma da 3.a pessoa do plural do presente do indicativo de verbos como beber: bebem – *hádem.

4. Houve ou houveram?

DIZ-SE

Ontem houve muitos aguaceiros. Ontem houveram muitos aguaceiros.

NÃO SE DIZ

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Nesta frase da página anterior, o verbo haver está sozinho e significa “existir”. Ora, com este sentido, haver só se conjuga na 3.a pessoa do singular. É o desconhecimento desta regra que leva os falantes a conjugar o verbo em todas as pessoas, como em haver de. Trata-se de um erro grave, infelizmente muito recorrente.

Atenção: O verbo haver, quando tem o sentido de “existir”, só se conjuga na 3.a pessoa do singular. Também não se diz *haverão, *haveriam ou *hajam, etc. Por isso mesmo, o auxiliar do verbo haver tem de respeitar essa regra di-tada pelo verbo principal: Vai haver aguaceiros amanhã e não *Vão haver aguaceiros amanhã.

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DIZ-SE! NÃO SE DIZ! @i esta língua! Manual de sobrevivência

II. Verbos com segredos escondidos!

1. Intervim ou intervi?

DIZ-SE

Eu intervim na conversa.

Tu intervieste na conversa.

O deputado interveio na conversa.

Nós interviemos na conversa.

Vós interviestes na conversa.

Eles/Vocês intervieram na conversa.

O João tem intervindo na conversa.

Eu intervi na conversa.

Tu interviste na conversa.

O deputado interviu na conversa.

Nós intervimos na conversa.

Vós intervistes na conversa.

Eles/Vocês interviram na conversa.

O António tem intervido na conversa.

NÃO SE DIZ

Intervim, intervieste, interveio, interviemos, interviestes, intervieram e intervindo são formas do verbo intervir. Este verbo, como podes observar, é constituído por dois elemen-tos; um deles é precisamente o verbo vir. Ora, acredito que saibas conjugar o verbo vir (vim, vieste, veio, viemos, viestes, vieram, etc.).

Pois é, não tem nada que enganar.

O verbo intervir conjuga-se como o verbo vir, tal como outros compostos e derivados desse verbo (advir, convir, desavir, desconvir, entrevir, etc.), pois manda a regra gramatical que os verbos compostos e derivados sigam o paradigma de conjugação do seu verbo de base.

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Mas por que motivo acontecem estes erros com o verbo intervir? Pensa bem! Talvez porque esquecemos que o verbo que estamos a conjugar é o verbo vir e não o

verbo ver (vi, viste, viu, etc.).

Decerto nunca mais te vais esquecer de como deves conjugar o verbo intervir!

2. Mantive ou manti?

DIZ-SE

Mantive a minha posição desde o início. Manti a minha posição desde o início.

NÃO SE DIZ

Mantive é uma forma do verbo manter que, por sua vez, se constrói com o verbo ter. Por isso mesmo, deve conjugar-se como ele.

Por outras palavras, tal como dizes eu tive, deves dizer eu mantive.

Por que razão cometemos aquele erro? Pensa bem!

Como é que formas a 1.a pessoa do pretérito perfeito simples de verbos como comer, conhecer, etc.? Comi, conheci, não é?

Ora, talvez esteja aí a resposta. Esquecemos que o verbo que estamos a conjugar é o verbo ter e conjugamos manter como se fosse igual a comer, por exemplo.

Será fácil não cometer este erro se pensares em todas as outras pessoas do verbo manter no pretérito perfeito simples do indicativo. Se não dizes tu *mantiste, porque hás de dizer eu *manti?

Fácil, não é?

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DIZ-SE! NÃO SE DIZ! @i esta língua! Manual de sobrevivência

3. Entreteve ou entreteu?

DIZ-SE

A educadora entreteve a Mafalda. A educadora entreteu a Mafalda.

NÃO SE DIZ

Entreteve é uma forma do verbo entreter, mais um composto do verbo ter. Por isso mesmo, deve conjugar-se como ele. Assim, tal como dizes ela teve, deves dizer ela en-treteve.

Por que razão as pessoas comentem este erro? Pensa bem!

Como é que formas a 3.a pessoa do pretérito perfeito simples de verbos como comer, conhecer, etc.? Comeu, conheceu, não é?

Ora tens aí a resposta. Estas formas servem de referência para a formação da forma de outros verbos, nomeadamente entreter, porque se desconhece que entreter, tal como manter, se deve conjugar como ter.

Decerto, agora as coisas ficaram ainda mais claras.

4. Pagado ou pago?

DIZ-SE

O Filipe tem pagado a renda todos os

meses.

O valor está pago.

O Filipe tem pago a renda todos os

meses.

O valor está pagado.

NÃO SE DIZ

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Há verbos que têm dois particípios (são chamados, por isso, verbos abundantes). O verbo pagar é um deles: tem um particípio regular (pagado) e outro irregular (pago).

Como pagar, também têm particípios duplos verbos como acender, eleger, limpar, ganhar, entre muitos outros.

É esta abundância, aliada ao desconhecimento da regra de utilização de cada uma destas formas, que cria dificuldades quando falamos, ouvimos ou lemos certas frases com estas formas.

Tudo fica mais claro se souberes que há uma regra gramatical que determina que a forma regular (pagado) emprega-se junto dos auxiliares ter e haver (isto é, na constituição de tempos compostos na voz ativa); a forma irregular (pago) emprega-se acompanhada do auxiliar ser (na formação dos tempos da voz passiva), mas também estar, ficar, per-manecer, parecer.

Apesar desta regra, desconhecida de muitos falantes, é certo, há uma certa tendência para reconhecer a forma irregular como a mais correta. Por isso, parece ser essa a mais usada, independentemente do verbo que a acompanha. Pode até acontecer que num futuro, que não conseguimos prever, esta tendência venha a tornar-se regra.

Para já, no entanto, esse argumento não é suficiente para desculpar o erro.

5. Poder ou puder?

DIZ-SE

Se puder, mando-te o email ainda hoje.

Para poder sair, tenho de acabar o tra-

balho.

Se poder, mando-te o email ainda hoje.

Para puder sair, tenho de acabar o tra-

balho.

NÃO SE DIZ

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DIZ-SE! NÃO SE DIZ! @i esta língua! Manual de sobrevivência

Puder e poder são formas legítimas da língua portuguesa, mas cada uma tem o seu lugar e uma pronúncia distinta:

puder é a forma do futuro do conjuntivo do verbo poder e pronuncia-se com e aberto. Usa-se em contextos como Se puder, mando-te um email ainda hoje; Saio quando puder; Enquanto puder, trabalho.

poder é o infinitivo do mesmo verbo, pronuncia-se com e semifechado e usa-se em frases como Para poder sair tenho de acabar este trabalho; Trabalho até poder.

E por que razão se confundem estas duas formas, sobretudo na escrita? O verbo poder, como também fazer ou dizer, é um verbo irregular. Isto quer dizer que

não segue, neste caso, o paradigma da conjugação dos verbos terminados em -er, em que não existe diferença nas formas usadas em Se comer muitos doces engordo e em Para comer, tenho de sair.

Por analogia, com os verbos regulares, usa-se invariavelmente a forma regular, não se apercebendo quem escreve do erro que está a cometer.

Dica: Na dúvida, lê a frase em voz alta e nunca te vais enganar a escrever a forma correta: puder lê-se “pud(é)r” e poder lê-se “pod(ê)r”.

6. Pode ou pôde?

DIZ-SE

O Carlos pode terminar o trabalho

agora.

Ontem, o Carlos não pôde terminar o

trabalho.

O Carlos pôde terminar o trabalho

agora.

Ontem, o Carlos não pode terminar o

trabalho.

NÃO SE DIZ

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A diferença entre pode e pôde parece pouca, mas é muita. Trata-se de duas formas do mesmo verbo (poder), na mesma pessoa, no mesmo modo, mas em tempos diferentes.

Pode é a forma da 3.a pessoa do presente do indicativo de poder e pôde é a forma da 3.a pessoa do pretérito perfeito do indicativo do mesmo verbo.

Não acredito que pronuncies pode quando queres dizer pôde e vice-versa. É provável, porém, que esqueças o acento circunflexo quando queres escrever pôde.

Dica: Lê a frase que queres escrever em voz alta e vais ver que não tens dúvidas quando quiseres escrever p(ó)de ou p(ô)de.

7. Vem, vêm ou veem?

DIZ-SE

A Sofia vem de Coimbra.

O Tomás e o pai vêm de Coimbra.

O Tomás e o Ricardo veem o filme.

A Sofia vêm de Coimbra

O Tomás e o pai veem de Coimbra.

O Tomás e o Ricardo vêm o filme.

NÃO SE DIZ

Vamos lá ver se nos entendemos! A diferença entre vem, vêm e veem reside em aspetos diferentes.

Em primeiro lugar, estas três formas pertencem a pessoas e a verbos diferentes: vem e vêm são formas do verbo vir.

Vem é a forma da 3.a pessoa do singular do presente do indicativo e vêm a 3.a pessoa do plural do mesmo tempo e modo; veem é uma forma do verbo ver, mais precisamente a 3.a pessoa do plural do presente do indicativo (que antes, da entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990, se escrevia com uma acento circunflexo no primeiro e).

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DIZ-SE! NÃO SE DIZ! @i esta língua! Manual de sobrevivência

Em segundo lugar, as três formas distinguem-se ligeiramente também na pronúncia: o acento circunflexo em vêm indica o timbre semifechado da vogal tónica e distingue esta forma de vem, tal como acontece com abstêm, advêm, contêm, convêm, detêm, en-tretêm, intervêm, mantêm, obtêm, etc.

Em veem há um e fechado em hiato (um encontro de duas vogais – ee), com a ter-minação -em, tal como acontece com creem, deem, descreem, desdeem, leem, preveem, releem ou reveem.

8. Fizeste ou fizestes?

DIZ-SE

Ricardo, ontem fizeste demasiado ba-

rulho!

Ricardo, ontem fizestes demasiado ba-

rulho!

NÃO SE DIZ

Fizeste é a 2.a pessoa do singular (tu) do pretérito perfeito do indicativo de fazer. Fizestes também existe, mas é a forma da 2.a pessoa do plural (vós) do mesmo tempo

e do mesmo modo. Poderíamos pensar que se trata de uma confusão de pessoas, quando usamos *fizestes

em vez de fizeste. Decerto não será essa a razão que justifica a recorrência do erro, até porque fizestes

(vós) é usado apenas em certas regiões de Portugal e em determinado tipo de discursos (o religioso, por exemplo), sendo quase sempre substituído pela 3.a pessoa do plural fizeram (vocês).

Então, por que razão se usa fizestes em vez de fizeste?

Se pensares na terminação das formas da 2.a pessoa do singular, como bebes, jogas, etc., verás que há uma certa analogia com *fizestes.

Pois é! Quem fala e escreve parece fazer essa analogia também.

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9. Lesse ou lê-se?

DIZ-SE

Perceberia melhor o texto, caso o lesse

em voz alta.

Este artigo lê-se bem!

Perceberia melhor o texto, caso o lê-se

em voz alta.

Este artigo lesse bem.

NÃO SE DIZ

Lesse e lê-se são duas formas do verbo ler. A primeira corresponde à 1.a ou 3.a pessoa do singular do pretérito imperfeito do conjuntivo e a segunda corresponde à 3.a pessoa do singular do presente do indicativo, conjugado com o pronome se separado deste por um hífen.

E então? – pensarás tu. Como é que sei se devo escrever com hífen ou não (que o mesmo é dizer: devo escrever lê-se ou lesse?

Aqui vai a dica! Coloca a frase na negativa: Perceberia melhor o texto, caso não lesse em voz alta; Este artigo não se lê bem. É assim, não é?

O que aconteceu afinal e por que razão aconteceu?O elemento não levou o pronome se a posicionar-se antes do verbo. Isso só aconteceu

na segunda frase, pois é aí que o verbo se encontra conjugado pronominalmente, claro (lê-se). Esta transformação não é consciente quando falamos, mas, na hora de tirar dúvi-das sobre a forma correta (lê-se ou lesse), pode ajudar.

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III. Cuidado com a pronúncia! Cuidado com ortografia!

1. Possamos, façamos e tenhamos: como se pronuncia afinal?

DIZ-SE

Talvez possamos ir ao cinema hoje.

Caso façamos o trabalho hoje, pode-

mos sair.

Talvez tenhamos tempo de ir ao ci-

nema.

Talvez póssamos ir ao cinema hoje.

Caso fáçamos o trabalho hoje, pode-

mos sair.

Talvez ténhamos tempo de ir ao ci-

nema.

NÃO SE DIZ

Possamos, façamos e tenhamos são formas dos verbos poder, fazer e ter (1.a pessoa do plural do presente do conjuntivo).

A sílaba tónica destas formas é a penúltima (-ssa-, -ça- e -nha-) e não a antepenúl-tima, como se assume na pronúncia incorreta. Na verdade, estas palavras são graves e não esdrúxulas e o a da sua sílaba tónica é fechado.

Aqui está o erro que se comete na pronúncia, provavelmente por analogia com as formas como possa, possas, possam (do verbo poder); faça, faças, façam (do verbo fazer); tenha, tenhas, tenham (do verbo ter).

2. Desequilíbrio ou desiquilíbrio?

DIZ-SE

O desequilíbrio do ginasta prejudicou

o salto.

O *desiquilíbrio do ginasta prejudicou

o salto.

NÃO SE DIZ

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A palavra desequilíbrio é geralmente pronunciada como *desiquelíbrio, o que faz com que, quando temos de a passar à escrita, haja a tendência para a escrever incorretamente.

Se pensares bem, nunca erras!

Ora vejamos: a palavra desequilíbrio deriva da palavra equilíbrio. Por isso mesmo, é fácil entender que as propriedades da base, ou seja, da palavra equilíbrio, se mantêm no seu derivado.

Esta é a dica que deves usar, sempre que tiveres dúvidas em relação à ortografia da palavra desequílibrio.

3. Saem ou saiem?

DIZ-SE

Os alunos saem da sala assim que

toca.

Os alunos saiem da sala assim que

toca.

NÃO SE DIZ

Se reparares na forma como pronuncias saem, decerto te aperceberás de que colocas um i quase imperceptível entre o a e o e. Na pronúncia isso é normal. Trata-se de uma forma de fazer a ligação entre as duas vogais, difíceis de articular separadamente.

O erro surge quando se escreve a forma como a pronunciamos: *saiem.

Agora que já percebeste a razão do erro, deixaste de ter justificação para errar.

Atenção: Há outros casos em que o erro pode acontecer: atraem, caem, constroem, contraem, distraem, subtraem, traem, entre outros.

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IV. Confusões na pronúncia e na ortografia

Acelerar

Antecipar

Com certeza

Extensão

Hesitar

Perspicaz

Pormenor

Pretender

Programa

DIZ-SE

Acelarar

Antcipar

Concerteza

Estensão

Exitar

Prespicaz

Promenor

Pertender

Pograma

NÃO SE DIZ

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V. Outras confusões habituais

1. Senão ou se não?

DIZ-SE

O Tomás não faz outra coisa senão estar

no computador.

Se não vieres à festa, vamos praxar-te.

O Tomás não faz outra coisa se não estar

no computador.

Senão vieres à festa, vamos praxar-te.

NÃO SE DIZ

É fácil confundir senão com se não, pois estas duas formas só se distinguem na escrita.

Senão é usado com sentido equivalente a: “pelo contrário”: Não digas isso, senão vais-te arrepender. “a não ser”: Não faz outra coisa senão jogar. “mas sim”: Não queria reclamar, senão sugerir.

Se não corresponde a “caso não”: Tentarei mais uma vez. Se não conseguir, desisto.

2. Melhor ou mais bem?

DIZ-SE

O José está mais bem preparado para

o exame do que o André.

O texto do José está melhor do que o

do André.

O José está melhor preparado para o

exame do que o André.

O texto do José está mais bem do que

o do André.

NÃO SE DIZ

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Vamos relembrar! O advérbio bem admite as formas melhor e mais bem para formar o comparativo de

superioridade e o superlativo, mas é necessário ter em conta o contexto da frase. Posso dizer: Esta música soa-me bem, mas aquela soa-me melhor. No entanto, tenho de dizer Este trabalho está mais bem organizado do que aquele.

Qual é a diferença? Na segunda frase aparece o particípio organizado, o que obriga ao uso de mais bem.

Mas por que motivo se ouvem frases como *O José está melhor preparado para o exame do que o André?

Provavelmente porque nos soa mal a expressão mais bem e a forma melhor nos parece mais correta e até mais elegante.

E porque é que nos soa mal mais bem? Talvez porque, desde pequenos, nos habituamos à correção constante: Não é mais bom;

é melhor! É verdade! Melhor é uma forma que também serve o adjetivo bom. Aliás, é para bom

a única forma possível. Talvez por comparação com o que acontece com bom, há a tendência para usar melhor

também quando o que está em causa é o comparativo ou superlativo de bem.

Em todo o caso, há particípios irregulares que suscitam menos dúvidas, ou em que ocorrem menos erros na formação do comparativo de superioridade ou superlativo de bem, como escrito, feito ou passado: Este trabalho está mais bem escrito do que o outro; O meu bife está mais bem passado do que o teu.

Aliás, não tenho memória de ver alguém a pedir ao empregado de um restaurante *Um bife melhor passado! Porventura, porque bem passado é já visto como uma expres-são cristalizada como bem-feito, bem-parecido, entre outras.

Em conclusão, quando uso o advérbio bem devo dizer Este trabalho está mais bem redigido do que aquele; Este trabalho é melhor do que aquele.

Quando uso o adjetivo bom, a única forma disponível é melhor: Este bolo é melhor do que aquele.

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3. Onde ou aonde?

DIZ-SE

A Sofia não disse aonde ia.

Onde está a Sofia?

A Sofia não disse onde ia.

Aonde está a Sofia?

NÃO SE DIZ

A confusão entre onde e aonde é bem fácil de desfazer. Onde usa-se com verbos estáticos ou dinâmicos que pedem preposição em: Onde está a Sofia? (estar em algum lugar) Onde anda a Sofia? (andar em algum lugar)

Aonde emprega-se exclusivamente em verbos de movimento que pedem preposição a: Aonde vai a Sofia? (ir a algum lugar) Aonde chegou o montanhista? (chegar a algum lugar)

Se te lembrares de outros casos em que não tens dúvidas, torna-se fácil perceber o erro:

Por onde passaram os atletas? De onde vieram as formigas? / Para onde foram os compu-tadores?, etc.

Neste caso, já existe uma preposição (por, de, para), pedida pelo verbo. Por isso mesmo soar--te-iam estranhas as frases Por *aonde passaram? / De *aonde vieram? / Para *aonde foram?

4. Encontramo-nos ou Encontramos-nos?

DIZ-SE

Encontramo-nos à saída da escola. Encontramos-nos à saída da escola.

NÃO SE DIZ

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DIZ-SE! NÃO SE DIZ! @i esta língua! Manual de sobrevivência

Ora aqui está mais um erro frequente! Encontramo-nos é uma forma que comporta encontramos (1.a pessoa do plural do

presente do indicativo de encontrar) e o pronome nos. Neste encontro, de encontramos com nos, dá-se um fenómeno que até já deves ter estudado nas aulas de Português, chamado assimilação. Com efeito, o -s final da forma encontramos é omitido devido à assimilação com a nasal inicial do pronome nos. Do ponto de vista da articulação, como podes verificar, até não é nada fácil dizer *encontramos-nos.

5. Compramos ou compra-mos / comprarmos ou comprar-mos?

DIZ-SE

Compramos muitas coisas de que não

precisamos.

Quando preciso de cadernos, o Pedro

compra-mos.

Era bom comprarmos os cadernos

ainda hoje.

Compra-mos muitas coisas de que não

precisamos

Quando preciso de cadernos, o Pedro

compramos.

Era bom comprar-mos os cadernos

ainda hoje.

NÃO SE DIZ

Compramos, compra-mos e comprarmos são formas corretas do verbo comprar.

Contudo, há diferenças!

Compramos é a 1.a pessoa do plural do presente do indicativo e comprarmos a forma da mesma pessoa, mas no futuro do conjuntivo.

Compra-mos é a mesma forma da 3.a pessoa do singular do presente do indicativo, mas conjugada pronominalmente. Mos corresponde à contração de dois pronomes: me + os (O Pedro compra-me [a mim] + os [os cadernos] = O Pedro compra-mos).

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Comprarmos é a forma da 1.a pessoa do plural do futuro do conjuntivo.

*Comprar-mos não existe simplesmente.

Mas por que razão se confundem as formas compramos e compra-mos, e ainda se inventa a forma *comprar-mos.

A confusão decerto é desencadeada pelas formas pronominais. Não te deixes levar pelas aparências! Antes de usares o hífen observa bem o que afinal

queres dizer. Casos semelhantes aos que acabámos de ver podem acontecer com outros verbos: entregamos/entrega-mos;

entregarmos/*entregar-mos;

devolvemos/devolve-mos;

devolvermos/*devolver-mos;

damos/dá-mos;

darmos/*dar-mos, etc.

6. A fim de, a fim de que ou afim?

DIZ-SE

O aluno interveio na aula a fim de co-

locar uma questão.

O João interveio a fim de que todos

percebessem que ele sabia a resposta.

O Tomás é afim da Sofia.

Lisboa é uma cidade afim de Barce-

lona.

O aluno interveio na aula afim de colo-

car uma questão.

O João interveio afim de que todos

percebessem que ele sabia a resposta.

O Tomás é a fim da Sofia.

Lisboa é uma cidade a fim de Barce-

lona.

NÃO SE DIZ

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DIZ-SE! NÃO SE DIZ! @i esta língua! Manual de sobrevivência

A fim de é usado com o sentido de “finalidade” e pode ser substituído por para: O aluno interveio na aula a fim de colocar uma questão.

A fim de que é também usado com sentido de “finalidade” e pode ser substituído por para que, inserindo uma oração: O João interveio a fim de que todos percebessem que ele sabia a resposta.

Afim de é usado no sentido de:– “parente”: O Tomás é afim da Sofia.– “semelhante”: A loja vende computadores, impressoras e outros produtos afins.

7. Ter de ou ter que?

DIZ-SE

Tenho de acabar este livro hoje.

Hoje não posso sair. Tenho que fazer.

Tenho que acabar este livro hoje.

Hoje não posso sair. Tenho de fazer.

NÃO SE DIZ

A tradição gramatical indica a forma ter de como a mais correta para traduzir o sentido de “obrigação”, “dever”, “necessidade”. Porém, hoje em dia, a expressão ter que parece ser a preferida dos falantes do português, apesar de o seu sentido original ainda estar presente em Hoje não posso sair, pois tenho que fazer (isto é, “tenho muitas coisas para fazer”).

Em todo o caso, e porque a norma é conservadora − porque assim tem de ser −, talvez se possa dizer que ter de tem hoje um valor mais formal e, portanto, deves sempre optar por ela quando o registo for cuidado.

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8. Gostar que ou gostar de que?

DIZ-SE

O Pedro gosta que o elogiem. O Pedro gosta de que o elogiem.

NÃO SE DIZ

Há várias opiniões sobre este problema, pelo que não se assume aqui que uma das opções está incorreta.

Em todo o caso, convém lembrar que só quando o verbo gostar é seguido de uma oração integrante é que se pode admitir a omissão da preposição de.

O uso desta preposição já é obrigatório quando o verbo gostar tem como complemento um nome (gosto de bolachas), um pronome (gosto de ti) ou um verbo no infinitivo (gosto de passear).

9. Ir ao encontro de ou ir de encontro a?

DIZ-SE

A solução é boa, porque vai ao encon-

tro das necessidades dos clientes.

A decisão não me agrada, porque vai

de encontro ao que eu gostava.

A solução é boa, porque vai de encon-

tro às necessidades dos clientes.

A decisão não me agrada, porque vai

ao encontro do que eu gostava.

NÃO SE DIZ

Ir de encontro a e ir ao encontro de parecem expressões muito semelhantes, quando, na verdade, encerram sentidos muito diferentes:

Ir ao encontro de tem o sentido de “estar de acordo com”.

Ir de encontro a equivale a “ir contra algo ou alguém”.

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VI. Concordâncias

1. Com expressões de percentagem

DIZ-SE

90% dos alunos tiveram boas notas.

1% dos alunos não passou de ano.

90% dos alunos teve boas notas.

1% dos alunos não passaram de ano.

NÃO SE DIZ

Diz a regra que, quando o sujeito é constituído por uma expressão de percentagem no plural (a partir de 2%), seguida de um termo introduzido por uma preposição, singular ou plural, o predicado concorda com este último termo. Isto é, o verbo fica no singular se este termo for singular ou vai para o plural se ele estiver no plural: 90% dos alunos tiveram boas notas; 10% da população das zonas do interior emigrou o ano passado.

Pelo contrário, se a expressão de percentagem for singular, tal determina que o verbo concorde com ela, ainda que o termo preposicionado se encontre no plural: 1% dos alunos não passou de ano.

2. A maioria dos alunos sabe ou a maioria dos alunos sabem?

DIZ-SE

A maioria dos alunos sabe a matéria. A maioria dos alunos sabem a matéria.

NÃO SE DIZ

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Teremos de admitir, como o fazem alguns gramáticos de renome, que ambas as al-ternativas estão corretas. Com efeito, nas frases começadas por a maioria, a maior parte, etc., o verbo tanto pode ir para o plural como para o singular.

Há contudo uma explicação que é necessário dar para que a resposta faça sentido. Na frase a maioria dos alunos sabe a matéria, o verbo concorda com a palavra maioria. Tra-ta-se de uma concordância ditada pelas regras da gramática. Na frase que vulgarmente é considerada errada – A maioria dos alunos sabem a matéria –, o verbo concorda com a totalidade dos alunos que são a maioria, isto é, dá-se uma concordância ao nível do sentido. Deixamos de ter uma concordância gramatical para ter uma concordância lógica.

3. Um dos que fizeram ou um dos que fez?

DIZ-SE

O Ricardo foi um dos que fizeram o

teste até ao fim.

O Ricardo foi um dos que fez o teste até

ao fim.

NÃO SE DIZ

A seguir à expressão um dos que, o verbo fica no plural, porque o predicado concorda com o sujeito representado pelo pronome que, o qual, por sua vez, se refere a os.

Pode substituir-se um dos que por um daqueles que. Neste caso, o sujeito que refere-se a aqueles.

A razão do erro de concordância deriva do facto de não se identificar o verdadeiro sujeito do verbo da expressão um dos que fizeram.

Quando usares a expressão um dos que, não te esqueças que o verbo que vem depois tem de aparecer na 3.a pessoa do plural.

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4. Trata-se de ou tratam-se de?

DIZ-SE

O governo decidiu hoje que todos os

portugueses terão de trabalhar mais

anos e descontar mais impostos. Tra-

ta-se de duas decisões muito penosas

para a sociedade.

O governo decidiu hoje que todos os

portugueses terão de trabalhar mais

anos e descontar mais impostos. Tra-

tam-se de duas decisões muito peno-

sas para a sociedade.

NÃO SE DIZ

Sempre que o sujeito indeterminado está representado pelo pronome se, o verbo usa--se na 3.a pessoa do singular, mesmo que o que vem depois seja plural: Trata-se de duas decisões muito penosas para a sociedade.

5. Pesem embora os problemas ou pese embora os problemas?

DIZ-SE

Pesem embora os vírus, o computador

funciona.

Pese embora os vírus, o computador

funciona.

NÃO SE DIZ

Pese(m) embora é uma construção de certo modo fixa, com o sentido “apesar de”, “não obstante”, e introduz uma expressão concessiva.

Em todo o caso, é formada pela conjunção embora, precedida do verbo pesar, que é o verbo da oração. Neste caso, deve concordar com o sujeito, que vem a seguir.

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6. Obrigado ou obrigada; obrigados ou obrigadas?

DIZ-SE

Ela disse: − Obrigada.

Ele disse: − Obrigado.

Eles disseram às amigas: − Obrigados.

Elas disseram aos amigos: − Obrigadas.

Ele disse: − Obrigada.

Ela disse: − Obrigado.

Elas disseram aos amigos: − Obrigados.

Eles disseram às amigas: − Obrigadas.

NÃO SE DIZ

Apesar de se ter generalizado o uso da forma obrigado, independentemente do facto de a pessoa que agradece ser do sexo masculino ou feminino, a regra manda que o adje-tivo obrigado (também particípio do verbo obrigar) varie em género e número, de acordo com o sujeito a que se refere.

Assim: obrigado deve ser utilizado por falantes do sexo masculino; obrigada deve ser utilizado por falantes do sexo feminino; obrigados deve ser utilizado por um grupo de falantes do sexo masculino ou femi-nino e masculino; obrigadas deve ser utilizado por um grupo de falantes do sexo feminino.

Entenda-se que obrigados e obrigadas é usado por um grupo numa situação em que este, enquanto grupo, agradece alguma coisa a alguém.

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VII. Preposições: umas esquecidas outras inventadas!

1. Ter a certeza de que ou ter a certeza que?

DIZ-SE

Tenho a certeza de que este livro é útil. Tenho a certeza que este livro é útil.

NÃO SE DIZ

Ter a certeza (de), ter a noção (de), ter a ideia (de) são exemplos de expressões que exi-gem a preposição quando se ligam a um nome.

Não te esqueças que, nestes casos, é erro esquecer a preposição de.

2. Deve fazer ou deve de fazer?

DIZ-SE

Ele deve fazer o trabalho. Ele deve de fazer o trabalho.

NÃO SE DIZ

Eis um erro muito comum.

Atenção: A seguir ao verbo auxiliar de modalidade dever usa-se o infinitivo do verbo principal (dever + infinitivo). Talvez, pela afinidade de sentido com ter de ou precisar de, sejamos leva-dos a colocar a preposição junto de dever. Mas agora já estás alerta! Não te esqueças: devo fazer, mas tenho de fazer; preciso de fazer.

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3. As relativas para baralhar!

DIZ-SE

O cão é o animal em que mais confio.

Era este assunto a que me referia.

O Filipe disse à mãe que era aquele com-

putador de que ele precisava.

O cão é o animal que mais confio.

Era este assunto que me referia.

O Filipe disse à mãe que era aquele com-

putador que ele precisava.

NÃO SE DIZ

E para baralhar ainda mais a questão do uso das preposições (e não só), há aquelas construções que nos trazem problemas acrescidos.

Os verbos das orações relativas continuam a ter as mesmas exigências (em termos de preposições, é claro), mesmo quando fazem parte destas construções. No entanto, como estão disfarçados, esquecemo-nos do que eles pedem.

Ninguém esquece a preposição em quando usa o verbo confiar, mas é preciso que o verbo esteja bem visível, como em Confio em ti.

Contudo, é comum que essa mesma preposição seja simplesmente omitida quando esse verbo faz parte de uma oração relativa, como em *O cão é o animal que mais confio. Trata-se, como vês, de um erro de omissão da preposição em exigido pelo verbo confiar.

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VIII. Palavras semelhantes, possíveis, mas diferentes!

Segue-se um quadro com uma pequena amostra de palavras que nos colocam sempre dúvidas, sobretudo do ponto de vista da forma como se devem escrever. São, na verdade, palavras semelhantes quer na pronúncia quer na ortografia, mas muito diferentes no que diz respeito ao seu significado.

PALAVRAS EXEMPLO EXEMPLO

Comprimento/cumpri-

mento

A sala tem 200 m2 de comprimento.

(“distância que vai de um

ponto ao outro”)

O Presidente fez-lhe um grande cumprimento. (“saudação”)

Descrição/discrição Ele fez a descrição da sala.(“representação fiel de

alguma coisa; relato”)

Ele atuou com discrição.(“reserva; modéstia”)

Descriminação/discrimi-

nação

Há países que lutam pela descriminação/ descriminalização do uso de drogas.(“tirar a culpa a outrem,

declarar inocente, absolver”)

O aluno fez uma boa discriminação dos problemas da turma.(“distinguir, separar,

diferenciar”)

O aluno foi vítima de discriminação.(“segregar; tratar de forma

desigual ou injusta”)

Despensa/dispensa A despensa da minha casa é grande.(“lugar onde se guardam

mantimentos”)

Hoje a patrão deu-me dispensa.(“desobrigação”)

Eminente/iminente A derrocada do prédio está iminente.(“prestes a acontecer”)

Einstein foi um eminente cientista.(“excelente; que excede

os outros”)

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PALAVRAS EXEMPLO EXEMPLO

Emergir/imergir As boas notas emergem do estudo.(“surgir; resultar;

manifestar-se”)

O barco imergiu nas águas do Atlântico.(“mergulhar; afundar”)

Tráfego/tráfico O tráfego está congestionado devido às obras.(“circulação de veículos”)

O tráfico de droga é um flagelo social.(“atividade ou negócio

ilegal”)

Revelar/relevar A Maria revelou às amigas que estava grávida.(“divulgar”)

A empresária relevou os problemas mais importantes.(“fazer sobressair, pôr em

relevo”)

Conselho/concelho O filho pediu conselho ao pai.(“parecer, opinião”)

Portugal tem muitos concelhos. (“divisão administrativa

de um distrito”)

Senso/censo É preciso senso para tomar boas decisões.(“capacidade, sentido

ou perceção”)

Pelo último censo, Portugal tem pouco mais que 10 milhões de habitantes.(“recenseamento”)

Trás/traz A cadeira caiu para trás.(“lado posterior”)

O Pedro traz o filho ao colo.(3.a pessoa do singular

do presente do indicativo

do verbo trazer)

O grama/a grama Comprei duzentos gramas de carne.(“unidade de peso”).

A grama tem de ser cortada.(“erva; relva”)

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