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Universidade do Vale do Itajaí Centro de Educação São José Curso de Relações Internacionais Possibilidades da internacionalização da tecnologia flex-fuel brasileira Adolph R. Cardoso Trabalho de Conclusão de Curso apresentado a banca examinadora do curso de Relações Internacionais como parte das exigências para a obtenção do título de bacharel em Relações Internacionais, pela Universidade do Vale do Itajaí Professor Orientador: Paulo Jonas Grando UNIVALI- São José SÃO JOSÉ - 2008

Possibilidades da internacionalização da tecnologia flex ...siaibib01.univali.br/pdf/Adolph Cardoso.pdf · 2 Desde janeiro de 2007 a alta de preços dos alimentos vem sendo atribuída

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Universidade do Vale do Itajaí

Centro de Educação São JoséCurso de Relações Internacionais

Possibilidades da internacionalização da tecnologia flex-fuelbrasileira

Adolph R. Cardoso

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado a banca examinadora do curso de Relações Internacionais como parte das exigências para a obtenção do título de bacharel em Relações Internacionais, pela Universidade do Vale do Itajaí

Professor Orientador: Paulo Jonas Grando

UNIVALI- São José

SÃO JOSÉ - 2008

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RESUMO

Palavras-chave: flex-fuel, internacionalização, transnacionais, indústria, montadoras

Abstract

Keywords: flex-fuel, internationalization, transnational, industry, automakers

Este artigo tem como objetivo apresentar a possibilidade de adoção internacional da tecnologia

flex-fuel brasileira na cadeia produtiva internacional das grandes montadoras. A pesquisa

buscou caracterizar o setor automobilístico brasileiro observando sua implantação no país, em

seguida inseriu o contexto da indústria automobilística após os anos 90 e o desenvolvimento da

tecnologia flex-fuel com foco na nacionalização da produção e na geração de produtos em

função das características de mercado nacional. Por fim, avalia-se a possibilidade de adoção

pelas matrizes e filiais localizadas em outros países de produtos e tecnologia criada pela

engenharia automobilística brasileira com foco no motor flex-fuel. Entre as possibilidades para a

internacionalização desta tecnologia os seguintes aspectos foram levantados, discutidos e sua

viabilidade foi apontada. Entres estas, destacam-se a possibilidade de reconversão de parte da

indústria automotiva norte-americana por carros de baixa cilindrada e mais econômicos. As

tentativas em criar condições para transformar o etanol em uma Commodity internacional, além

das intenções de governos como o sueco e dinamarquês de utilizarem o etanol e a tecnologia

flex.

This article aims to present the possibility of international adoption of Brazilian flex-fuel

technology in the productive chain of major international carmakers. The study sought to

characterize the Brazilian automobile sector deployment in the country. Then insert the context

of the auto industry after the 90s and the development of flex-fuel technology in Brazil with

focus on the nationalization of production and generation of products depending on the

characteristics of the domestic market. Finally, evaluate the possibility of adoption by the

matrices and subsidiaries located in other countries of products and technology created by the

Brazilian automotive engineering with a focus on flex-fuel engine. Among the possibilities for

the internationalization of this technology the following points were raised, discussed and its

feasibility was identified. Among these, stand out the possibility of converting part of the North

American automotive industry for cars with low capacity and lower cost. The Attempts to create

conditions to transform the ethanol in a commodity, as well the intentions of the Danish

government in the adoption of ethanol plus the flex-fuel technology.

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Possibilidades da internacionalização da tecnologia flex-fuel brasileira

Adolph R. Cardoso

Sumário: Introdução; 1. A Implantação da indústria automotiva no Brasil; 2 – Do Proálcool aos motores flex-fuel: o desenvolvimento e a utilização da tecnologia; 2.1 – O motor flex: amadurecimento e evolução da indústria automotiva nacional; 3 – A adoção da tecnologia flex-fuel na estrutura internacional da indústria automotiva; 3.1 A possibilidade de internacionalização da tecnologia brasileira flex-fuel; Considerações finais; Referências

Introdução

No Brasil, a adoção dos motores com tecnologia flex1 permitiu a expansão da

utilização de biocombustíveis como o etanol. Acredita-se que o potencial destas tecnologias

serem utilizadas em outros mercados também se ampliou, pois os motores com tecnologia

flex-fuel possibilitam utilizar diferentes tipos de combustíveis e, para atender a crescente

demanda, a produção nacional de biocombustíveis vem recebendo grandes investimentos.

Ainda, o avanço dos problemas ambientais2, entre os quais se destaca a emissão de gases

poluentes que contribuem para ampliar o aquecimento global, e a eminente escassez de

combustíveis fósseis (principal matriz energética utilizada como combustível no setor

automotivo) vem preocupando as empresas montadoras e a cadeia produtiva. Esta tendência é

marcante nas montadoras, expostas às pressões da legislação ambiental em vigor.

Nesse contexto, quando se observa o atual cenário automotivo mundial é possível

identificar que este passa por uma profunda transformação. Entre as suas características

destacam-se o redirecionamento de investimentos para países emergentes e a atual revolução

tecnológica, que prioriza a redução do consumo de combustíveis fósseis e a maior utilização

de biocombustíveis como etanol, biodiesel, hidrogênio, híbridos etc. Em função destes

aspectos, o tema em discussão assume importância também para a área das Relações

Internacionais econômicas.

1 Segundo o dicionário do carro: carros que podem ser abastecidos com odis combustíveis diferentes ou funcionar com estes misturados em qualquer proporção. A eletrônica de bordo, pelo sensor de oxigênio no escapamento, reconhece a composição exata do combustível no momento e efetua em poucos segundos os ajustes da mistura ar-combustível e avanço de ignição. A flexibilidade no caso brasileiro é para gasolina e álcool etílico hidratado carburante ou etanol.2 Desde janeiro de 2007 a alta de preços dos alimentos vem sendo atribuída principalmente a utilização dos bicombustíveis e conseqüentemente do etanol que vem ocupando espaços agrícolas, antes destinados ao cultivo de alimentos. O principal vilão do aumento dos preços apontados por organizações internacionais é o etanol feito a partir do milho ( produzido principalmente nos EUA) o que acarretou no aumento do preço desta commodity. Ao contrario do Etanol proveniente da cana-de-açúcar que vem sem mostrando muito mais eficiente energeticamente como na quantidade de terras ocupadas pela produção do mesmo.

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O trabalho delimita-se nos possíveis ganhos que a indústria automotiva nacional pode

auferir a partir da adoção da tecnologia de motores multicombustíveis pelas corporações

multinacionais que atuam no setor. A questão que orientou as reflexões de pesquisa observa

que a indústria automotiva nacional, detentora do know-how no desenvolvimento dos motores

flex-fuel, atua como extensão das montadoras de automóveis transnacionais. Diante desta

constatação, qual é a perspectiva da adoção da tecnologia flex-fuel por suas matrizes e filiais

no restante do mundo?

O argumento que orienta as discussões e a redação do trabalho assume que, embora o

Brasil tenha desenvolvido tecnologias eficientes na área de motores e de combustíveis, a

atuação das multinacionais automotivas instaladas no Brasil é coesa com a estratégia mundial

de suas respectivas matrizes multinacionais. Mesmo com a observação deste aspecto, o país

pode auferir ganhos ao atender possíveis demandas externas por esta nova tecnologia, já que

no Brasil mais de 80% dos veículos leves produzidos já estão equipados com propulsores do

tipo flex (ANFAVEA, 2008).

O crescente papel das transnacionais no desempenho exportador dos países é um

fenômeno cada vez mais evidente, pois são grandes indutoras dos investimentos diretos

estrangeiros e do comércio internacional. Com mais de 850 mil filiais espalhadas pelo globo e

um patrimônio aproximado em 30 trilhões de dólares, as corporações transnacionais são

responsáveis por mais de 50 milhões de empregos diretos. A atuação destas corporações gera

um faturamento anual de US$ 19 trilhões e elas são responsáveis por 66%3 das exportações

mundiais. Em países como o Brasil, sua participação é responsável por parcela significativa de

nossas exportações. Esse desempenho é especialmente verificado no caso do setor

automobilístico que apresentou um crescimento extraordinário nos últimos anos.

Entender as estratégias das montadoras transnacionais é um esforço importante nesta

proposta de pesquisa e implica na compreensão dos fatores que produzem mudanças nas

organizações. Também é fundamental identificar as estratégias empresariais no marco da

internacionalização das cadeias de produção, dado que diferentes partes da produção final são

instaladas em regiões que oferecem melhores condições de competitividade, o resultado desse

processo é que o comércio de partes e componentes tem assumido crescente papel no

comércio internacional.

Decorrente do exposto, a pesquisa investigou as perspectivas da adoção dos motores

multicombustível pelas matrizes e filiais das empresas automobilísticas transnacionais. Dado o

3 Disponível em: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1136745-EI7095,00.html

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objetivo, na primeira seção busca-se caracterizar o setor automobilístico brasileiro observando

sua implantação no país. Em seguida, na segunda seção do trabalho, descreve-se o contexto da

indústria automobilística após os anos 90 e o desenvolvimento da tecnologia flex-fuel no

Brasil com foco na nacionalização da produção e a geração de produtos em função das

características de mercado nacional. Por fim, no tópico três, investiga-se a possibilidade de

adoção pelas matrizes e filiais localizadas em outros países de produtos e tecnologia criada

pela engenharia automobilística brasileira com foco no motor flex-fuel e no tópico três ponto

um, a possibilidade de internacionalização da tecnologia brasileira flex-fuel.

1. A Implantação da indústria automotiva no Brasil.

O embrião da indústria automotiva no Brasil se constituiu em 1919, com a instalação

da primeira linha de montagem inaugurada pela Ford e em 1925 foi a vez da General Motors.

No ano seguinte a International Harvester começa a montar caminhões, seguida pela Fiat em

1928. Em 1930, a General Motors (ANFAVEA, 2006) instala sua montadora CKD (do inglês

Complete Know down ou completamente desmontados), processo pelo qual, ao chegar às

montadoras aqui já instaladas, os carros apenas eram retirados das caixas e remontados

(AZEVEDO, 1989).

Durante o governo Vargas foram dados os primeiros passos concretos para a futura

instalação da indústria automotiva. Em 1938, durante a Segunda Guerra Mundial, Getúlio

Vargas cria a FNM (Fábrica Nacional de Motores), designada para produção de motores de

avião. Por mais de dez anos a FNM foi responsável pela reposição dos propulsores das

aeronaves do Correio Aéreo Nacional e aviões de treinamento da FAB (Força Aérea

Brasileira). Nos próximos anos instalaria-se no Brasil a Studebaker (1945), que mais tarde se

transformaria na Vemag do Brasil e em 1949, a FNM transforma-se em empresa de economia

mista e passa atuar na montagem de caminhões. (ANFAVEA 2006)

Para apoiar o setor de transportes e servir como “indústria de base” à expansão do

futuro parque industrial automobilístico, visto como indispensável ao desenvolvimento

nacional devido ao ônus expressivo que a importação de veículos causava à balança

comercial, em nove de abril 1941 é criada pelo governo de Getulio Vargas a Companhia

Siderúrgica Nacional (CSN). Este empreendimento foi peça fundamental na criação de infra-

estrutura indústria automobilística do Brasil. Com um intento parecido ao da criação da CSN,

em três de outubro do mesmo ano, Vargas sancionou a Lei nº 2.0044, que estabelecia o

4 No dia 3 de outubro de 1953, era sancionada a Lei 2.004, que estabelecia o monopólio da União Federal sobre as atividades integrantes da indústria do petróleo: Pesquisa e lavra de jazidas de petróleo e outros

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monopólio da União sobre as atividades integrantes da indústria do petróleo criando a

Petróleo Brasileiro S. A - Petrobras (AZEVEDO, 1989).

Na década de 50, novas montadoras iniciam estudos de viabilidade para instalação de

suas linhas de montagem no país. Naquele momento, empresas como a Volkswagen e

Mercedes-Benz, manifestavam a intenção de fabricar caminhões e ônibus no país

(ANFAVEA, 2002). E instalam-se oficialmente em São Paulo em 1959, durante o governo de

Juscelino Kubitschek5.

Os primeiros passos para instalação da indústria automotiva brasileira foram dados a

partir dos investimentos feitos pelo governo Vargas. Seu governo produziu diversas medidas

para incentivar, tanto o setor privado nacional, como os investimentos estrangeiros no setor.

Através da política geral de desenvolvimento Industrial6, o governo Vargas aprovou medidas

de isenção de impostos às novas indústrias que viessem a se instalar em território nacional.

Em julho de 1951, Vargas criou a Comissão de Desenvolvimento Industrial (CDI) 7 e, apoiado

em uma política nacionalista, restringe as importações para fomentar o desenvolvimento da

indústria nacional. Assim, para estimular a produção nativa, a partir de 28 de abril de 1953, só

poderiam entrar no Brasil veículos CKD que não continham estofamento, forrações de

acentos, encostos, molas etc. Aquelas medidas produziram uma reserva de mercado para a

indústria nacional de autopeças, concretizando mais tarde a produção de pistões pela Metal

Leve e o primeiro bloco de motor fundido, produzido pela empresa nacional Sofunge

(ANFAVEA, 2006).

Mas, de fato, a instalação da indústria automobilística no Brasil começa a se tornar

realidade com a posse de Juscelino Kubitschek, em 19568. O governo Kubitschek inaugurou o

estilo de intervenção estatal que nos 30 anos seguintes serviu de modelo para as estratégias de

substituição de importações na América Latina. Com o Decreto 39.412 de 1956, foi criado o

hidrocarbonetos fluidos e gases raros existentes no território nacional; Refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; Transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados de petróleo produzidos no país; E transporte, por meio de dutos, de petróleo bruto e seus derivados, assim como de gases raros de qualquer origem. A Lei 2.004 estabelecia, também, que a União Federal estava autorizada a constituir a Petróleo Brasileiro S.A. - Petrobras, como empresa estatal de petróleo para execução do monopólio, incluindo a execução de quaisquer atividades correlatas ou afins àquelas monopolizadas. Petrobras. Título da matéria, disp. em: www.petrobras.com.br5 ANFAVEA Op. Cit. p. 1026 Em 1952, já existiam mais de 250 empresas em território nacional produzindo autopeças e sete montadoras instaladas no país (AZEVEDO, 1989)7 Segundo CPDOC, CDI era designada ao estudo e a proposição de medidas econômicas, financeiras e administrativas ligadas à política industrial, onde o órgão formulou um Plano Geral de Industrialização para o país, estabelecendo uma classificação das atividades industriais e designando os setores prioritários em que o governo deveria atuar entre eles energia, metalurgia, transformação mineral, química, têxtil, borracha e material de construção. Sua criação foi um reforço à atuação do governo como agente econômico e favoreceu a colaboração entre setores industriais e o Estado.8 ANFAVEA Op. Cit. p. 94

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Grupo Executivo para a Indústria Automotiva (GEIA)9. De um lado, o GEIA procurou

consolidar diversos tipos de incentivos que até então nunca haviam sido usados nas tentativas

de desenvolvimento industrial no país. Estas medidas incluíam a reserva do mercado

doméstico para as empresas instaladas no país, isenção de impostos nas importações de bens

de capital e outros insumos, redução de outros tributos locais, preços subsidiados de energia, e

auxílios eventuais para despesas de instalação. Por outro lado, o GEIA supervisionava o

cumprimento das metas assumidas pelas empresas em troca dos incentivos, especialmente

quanto aos prazos de nacionalização do processo de produção (ANFÁVEA, 2006, pg. 94-99).

Segundo a ANFAVEA, durante o processo de nacionalização da indústria

automobilística no país, o GEIA recebeu mais de vinte projetos, dos quais apenas dezessete

tiveram aprovação e somente doze foram concretizados: Fábrica Nacional de Motores

(caminhões, ônibus e automóveis); Ford Motor do Brasil S/A (caminhões, automóveis,

utilitários e tratores); General Motors do Brasil S/A (caminhões e automóveis); International

Harvester S/A (caminhões); Mercedes Benz do Brasil S/A (caminhões e ônibus); Scania-

Vabis do Brasil (caminhões e ônibus); Simca do Brasil (automóveis e camionetas); Toyota do

Brasil S/A (utilitários); Vemag S/A (automóveis camionetas e utilitários); Volkswagen do

Brasil S/A (camionetas, furgões e automóveis); Willys Overland do Brasil (utilitários,

camionetas e automóveis) e Karmann Ghia do Brasil (carrocerias de automóveis).

Nos anos seguintes, a recém instalada indústria automotiva no Brasil daria seus

primeiros frutos. Em 1957, saía às ruas o primeiro automóvel fabricado no Brasil, com um

índice de 70% de nacionalização, tratava-se do famoso Romi-Isetta, conhecido também como

carro-bolha. Fabricado pelas Indústrias Romi de Tornos, por um breve período, sua

continuidade não foi possível porque o carro não se enquadrou nos quesitos para o

recebimento de incentivos do GEIA10. O Romi-Isetta tinha apenas uma porta e dois lugares,

sendo necessárias duas portas e quatro lugares para atender aos requisitos do governo. No

mesmo ano era lançado o primeiro modelo dentro das normas do GEIA e com mais de 60%

de nacionalização: a perua DKW, que se tornou um ícone da indústria automotiva brasileira.

Além disso, tanto a Ford como a GM haviam nacionalizado grande parte dos componentes

utilizados em suas linhas de montagem e em 1958, a Willys, nacionalizou totalmente o seu

Jeep Willys. Em 1959, a indústria automotiva já lançava outros modelos: o sedan da DKW, o

9 O Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA), subordinado ao Conselho do Desenvolvimento, foi finalmente criado em junho de 1956. O novo órgão foi presidido por Lúcio Meira. A formação do GEIA, assim como dos demais grupos executivos criados durante o governo Kubitschek, tornou-se um dado importante para a execução do Plano de Metas (cpdoc) disp. em:www.cpsoc.com.br.10 Dana. Há 50 anos nascia a indústria automobilística brasileira, disponível em http://www.dana.com.br/historia acessado em 20/04/08

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primeiro motor Volkswagen 1200, o Simca Chambord, a VW Kombi e o Renault Dauphine

(Fabricante nacional de autopeças: DANA).11

Até meados da década de 70,12 como produto genuinamente nacional, somente o

Gurgel13 entra em produção. Em 1976, o grupo Fiat iniciou a construção de sua fábrica no

país voltada à produção de carros de passeio. Um ano depois é lançada a pedra fundamental da

Volvo em Curitiba, mas a empresa só produz seu primeiro caminhão no país em 1980

(ANFAVEA, 2006). Assim, na década de 8014 a indústria automotiva já estava consolidada no

Brasil, possuindo fornecedores e ampla infra-estrutura para seu funcionamento. Apesar disto a

década de oitenta é marcada pelo desequilíbrio das contas internas e a crescente inflação, o

que afugentou novos investimentos externos no setor. Contudo, em 1987 a Volkswagen e a

Ford sacramentam a formação da Autolatina15 Comércio, Negócios e Participações, criada

para enfrentar as dificuldades acarretadas pela inflação, e a redução do mercado no Brasil.

É chegada a década de noventa, o problema da inflação, ainda persiste e para combatê-

la o governo dá início a abertura das importações, forçando a competitividade da indústria até

então artificialmente protegida pela reserva de mercado. A abertura das importações permitiu

a entrada de automóveis estrangeiros o que afetou diretamente a indústria nacional. Mas, em

1993, através da ação direta e dos subsídios do governo é criado o Programa do Carro

Popular, com motor 1.0 (1000 cilindradas) e com preço equivalente a US$ 7,2 mil para

ampliar a produção nacional de automóveis. (LATINI, 2007, p.295)

Após 199416, novas montadoras instalam-se no país. Em 1996, é constituída a Honda

Automóveis do Brasil e a empresa inaugura sua fabrica no ano seguinte. Em 1998 a Chrysler,

a Land-Rover, a International Caminhões e a Volkswagen-Audi inauguram suas fábricas.

Posteriormente instalaram fábricas no país, o grupo Renault- Nissan em 1999, e o grupo PSA -

Peugeot Citroën em 2001. Tal situação decorreu de um grande conjunto de incentivos que os

estados da federação praticaram para atrair novos investimentos. Naquele contexto, também as

11 Dana. Há 50 anos nascia a indústria automobilística brasileira, disponível em http://www.dana.com.br/historia acessado em 21/04/0812 Neste período a economia global passava por altos e baixos, causados pelas freqüentes crises do petróleo iniciada no final de 1973. Motivado pelo déficit na balança comercial causado pela importação do petróleo o governo brasileiro deu inicio a criação de um plano que visava a diminuir a dependência de importações do petróleo. Entrava em vigor no ano de 1975, o Proálcool.13 Fundada em 1º de setembro de 1969, pelo engenheiro mecânico e eletricista João Augusto Conrado do Amaral Gurgel, que sempre sonhou com o carro genuinamente brasileiro. Devido às exportações que sua empresa passou a fazer com o sucesso dos produtos, ele sempre dizia que sua fábrica não era uma multinacional, e sim "muitonacional". O capital era 100% brasileiro. Fonte: Gurgel www.gurgel.com.br/hitoria14 Instalava-se processo de recessão da economia pela primeira vez desde 194715 Autolatina, constituída de 51% de ações da Volkswagen do Brasil e 49% de ações da Ford Brasil (ANFAVEA).16 Nos primeiros meses de 1994 o então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso toma medidas para novo plano econômico. Em julho lança o Plano Real. Cria a décima moeda do País, o real, sobrevalorizada frente ao dólar, e começa a desindexar a economia. O plano dá certo e a inflação seria contida por anos seguidos. - não há recessão da economia. ANFAVEA 2006

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VeículosProdução acumulada - 1957-2005

46 milhões de unidadesAutomóveis 36.105.689

Comerciais leves 6.894.293

Caminhões 2.843.980

Ônibus 613.767

TOTAL 46.457.719

Fonte: ANFAVEA 2006

estratégias empresariais das corporações estavam sendo repensadas em função do processo de

globalização e a formação de mercados nacionais como o MERCOSUL.

Hoje, a indústria automotiva nacional é parte fundamental para a economia do país. O

setor automotivo, autopeças incluídas, responde por 15% do PIB industrial e segundo a

ANFAVEA, a indústria automobilística nacional,

incluindo autopeças, investiu US$ 32 bilhões no

período 1994-2005, que resultaram na capacidade

produtiva de 3,5 milhões de unidades por ano.

Neste meio século de importadora de tecnologia,

a indústria estrangeira aqui instalada passou a

desenvolver projetos exclusivamente nacionais,

como os carros movidos a álcool, a motorização

1.0, lançada em 1990, a utilização do etanol e hoje a criação dos motores flex-fuel17.

Observa-se assim, que via políticas governamentais de incentivo e da capacidade de

trabalho do setor produtivo privado, a indústria automotiva amadureceu e se consolidou. Neste

pouco mais de meio século as fabricam se expandiram e desenvolveram no país novas

tecnologias. Com isso, o know-how do setor antes pertencente a países como Alemanha, EUA

ou Japão agora também pertence ao Brasil. Criou-se assim, mesmo com a importação de

capitais, de tecnologias e de especialistas uma massa crítica de brasileiros que hoje produz

automóveis com conhecimento, cultura e tecnologias nacionais e acredita-se, isto pode ser

vendido ao mercado internacional.

2. Do Proálcool aos motores flex-fuel: do desenvolvimento a utilização da

tecnologia

Esta parte do trabalho aborda a criação do Proálcool e o desenvolvimento da

tecnologia dos motores flex-fuel na indústria automotiva brasileira. Tal aspecto tem por

finalidade ilustrar os avanços produzidos pelo setor, para no tópico seguinte, identificar as

possibilidades de internacionalização desta tecnologia pela indústria instalada no país. Assim,

para abordar este aspecto é necessário inserir, num primeiro momento, as discussões sobre a

utilização e evolução do uso do álcool combustível no Brasil que se registra já na década de

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1920, quando o álcool era adicionado à gasolina e foi transformada em norma legal, e em

1931 o governo Vargas estabelecia a obrigatoriedade da adição de um mínimo de 5% de

álcool à gasolina importada18. Mas, a utilização da mistura de álcool à gasolina ganhou mais

atenção somente na década de 1970, momento em que a condição necessária para a utilização

deste biocombustível foi aprimorada.

De acordo com Latini (2007), em 1973, o primeiro choque do petróleo (1970 a 1979),

elevou o preço do barril do petróleo de três para onze dólares. Este aspecto afetou

consideravelmente a economia do país e naquela situação o governo começou a discursar

sobre o aumento da mistura de álcool anidro à gasolina, com o objetivo de reduzir a

importação de petróleo19. Assim no dia 9 de outubro de 1975, era criado o Programa Nacional

do Álcool (Proálcool)20, com o objetivo de estimular a produção do álcool (etanol) derivado

da cana-de-açúcar. O programa foi viabilizado através de incentivos financeiros e fiscais, na

forma de financiamentos subsidiados, para reduzir o consumo de petróleo importado. Pode-se

entender melhor este processo observando-se quatro momentos distintos.

No primeiro momento (1975 a 1979), o Proálcool focou-se, sobretudo na tentativa de

contornar o primeiro choque de preços do petróleo. Combinado com a queda de preços do

açúcar no mercado internacional, o governo pretendia melhorar as cotações desta commodity

ao incentivar a produção de etanol para ser usado como combustível misturado à gasolina.

(ÚNICA, 2008) Neste período, o excesso de produção de açúcar rebaixava seus preços no

mercado internacional. Com isso, o Proálcool permitia ao governo combater a queda de preços

do setor açucareiro, alem de diminuir a dependência dos combustíveis fósseis.

A segunda fase do programa (1979 a 1989) enfrenta o segundo choque do petróleo que

agravou ainda mais a balança de pagamentos do país. O preço do barril de petróleo triplicou e

as compras desse produto passaram a representar 46% da pauta de importações brasileiras em

1980. O aumento do preço do barril de petróleo, que passa de U$S 15,00 em 1979, para U$S

30,00, na década de 1980 faz com que o governo estenda de forma mais enérgica a

funcionalidade do Proálcool e, para isto, foram criados organismos como o Conselho Nacional

do Álcool - CNAL e a Comissão Executiva Nacional do Álcool - CENAL. Como um dos

17 O ápice deste amadurecimento pode ser constatado com o desenvolvimento do sistema utilizado nos motores Flex17 pela Bosch do Brasil e pela Magneti Marelli em parceria com diversas montadoras aqui instaladas. Revista Quatro Rodas, outubro de 200618 Decreto- 19.717, de 20 de fevereiro de 1931 19 Em 1974 combustíveis e lubrificantes eram responsáveis por mais de 30% das importações FOB. (Latini, 2007. pg. 283)20 Criado pelo decreto nº76. 593 de 14.11.1975.

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resultados destas ações, a proporção de carros21 a álcool no total de automóveis com motor de

quatro tempos (ciclo Otto) produzidos no país aumentou de menos de 1% em 1979 para mais

de 26% em 1980, atingindo um limiar de 76% em 1986, transformando este período no

apogeu do Proálcool. (LATINI, 2007. p. 284-285).

Contudo, a partir de 1986, o cenário internacional relativo aos preços do petróleo

iniciou uma nova mudança. De acordo com informações disponibilizadas pelo site

BiodieselBR22, o preço do barril de petróleo cai aproximadamente da média de US$ 30,00 a

40,00 para US$ 12,00 a 20,00. Com isto a oferta de petróleo no mercado interno se amplia e a

gasolina volta a ter preços mais competitivos. Esta nova característica afetou os programas de

substituição de combustíveis fósseis no Brasil, pois implicava em maiores gastos do governo

com subsídios ao etanol. O efeito da queda do preço do petróleo foi sentido pela política

energética brasileira a partir de 1988, que coincide com um período de escassez de recursos

públicos para subsidiar os programas de estímulo aos combustíveis alternativos, resultando na

primeira crise de abastecimento do Proálcool. O fim do Programa, em 1989, caracterizou-se

pela falta de álcool hidratado nos postos de combustível, o que abalou seriamente a confiança

do consumidor final e acarretou na redução dramática da venda de carros movidos

exclusivamente a álcool (Jornal O Estado de S. Paulo. 2005).

De 1989 a 2000 pode ser considerado o terceiro momento do Proálcool. Este período

foi marcado pela extinção do conjunto de incentivos econômicos governamentais ao

programa. No ano seguinte foi a vez de extinguir o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), que

regulou o mercado brasileiro sucroalcooleiro por mais de sessenta anos. Com a redução dos

preços do barril de petróleo no mercado internacional durante toda a década de 1990 (Gráfico

1), o governo, gradativamente, entregou à iniciativa privada as decisões referentes a

idealização e a execução de atividades de produção e comercialização do setor. O álcool

hidratado como combustível caiu em desuso a partir do início da década de 1990, com o fim

dos subsídios e também devido à introdução da política de incentivos para o carro popular,

que como já explanado na seção anterior, era na sua maioria, para carros exclusivamente

movidos a gasolina, devido às dificuldades da utilização do álcool em motores de até 1000

cilindradas (ANFAVEA 2006).

Apesar de o governo ter deixado de lado a política do Proálcool, não abandonou a

política de mistura do álcool anidro a gasolina. Em 1993, era estabelecida a mistura

obrigatória de álcool anidro em toda a gasolina distribuída para revenda em postos de

21 Primeiro carro a álcool do Brasil foi o Fiat 147 lançado no ano de 1979

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12

combustíveis no país23, criando assim uma reserva de mercado para o álcool anidro no Brasil

que vigora até hoje.

Observando o gráfico 01 é possível visualizar três períodos do Proálcool. O

comportamento da curva permite entender o impacto causado à economia brasileira pela

flutuação e evolução dos preços do petróleo de 1970 aos dias de hoje, tanto em termos de

comparação entre o preço atual e/ou pelo valor corrigido. Mas, após os anos 1990 os preços

do petróleo iniciaram um processo de queda e estabilidade que perdurou até meados de 2000.

Contudo, em meados dos anos 2000, iniciava-se uma nova escalada do preço do

petróleo tornando, novamente, a utilização do etanol uma alternativa ao problema. Neste ano

foi lançada a revitalização do álcool como combustível e em 2002 foram eliminados os

subsídios aos produtos com a liberalização do preço dos etanos. Em 2003, acontece a

introdução dos veículos flex-fuel. Nessa fase, a dinâmica do setor sucroalcooleiro passou a

depender muito mais dos mecanismos de mercado, em especial do mercado externo, do que de

incentivos governamentais. A partir deste momento, turbinado pelo crescente aumento dos

preços do petróleo, o setor de bicombustíveis realizou investimentos, expandiu a produção,

modernizou-se tecnologicamente e, atualmente, o etanol de cana-de-açúcar produzido no

Brasil é referencia no quesito eficiência, custos e qualidade.

22 Disponível em http://www.biodieselbr.com/proalcool/pro-alcool.htm acessado em 10/05/200823 Lei no 8.723, de 28 de outubro de 1993

Gráfico 01: Evolução dos Preços do Barril de Petróleo: 1970-2010

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13

Desta forma, observando-se os quatro períodos descritos, o comportamento do etanol

combustível pode ser ilustrado pela Figura 01, a seguir:

Cronologia resumida do Proálcool

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO. TERÇA-FEIRA, 8 DE NOVEMBRO DE 2005

Nossa dependência pelo petróleo fez com que no final da década de 1970, juntamente

com a escala do preço do mesmo, fizeram com que o país procurasse uma saída para sua

dependência. Neste quadro é possível observar os principais fatos que ocorreram nessas três

décadas até o amadurecimento e o desenvolvimento da tecnologia flex-fuel.

2.1 O motor flex: amadurecimento e evolução da indústria automotiva nacional

O amadurecimento e nacionalização da tecnologia empregada na indústria automotiva

nacional implicaram no desenvolvimento e estudos provenientes das necessidades e demandas

da indústria automotiva e dos consumidores. Com este ponto em mente, os elevados custos

dos combustíveis fósseis no país fizeram que o combustível a base da cana-de-açúcar

ressurgisse, e seu uso fosse ampliado com a forma da tecnologia dos motores flex-fuel24.

24 Na página oficial da Bosch do Brasil é possível levantar informações sobre a evolução da tecnologia flex, onde se observa que os primeiros passos dados para o desenvolvimento de um veículo Flex começaram há 10 anos, quando a empresa comprou um veículo 2.0 a álcool e passou a estudar uma maneira de tornar o funcionamento do seu motor eficiente com gasolina e/ou álcool. Além do estudo de materiais resistentes, foi necessário adequar o avanço de ignição, o sistema de partida e as velas de ignição ao uso dos dois combustíveis. Para o motor funcionar adequadamente, o sensor de oxigênio passaria a analisar a proporção da mistura álcool/gasolina que estivesse sendo queimada e remeteria essa informação para a central de injeção eletrônica. A partir daí, o sistema encontraria o ajuste ideal para preservar as condições de dirigibilidade. Disponível em www.bosch.com.br

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O desenvolvimento no Brasil desta tecnologia se deu com o grupo Bosch, em 1994,

que apostou na possibilidade de veículos flex-fuel substituírem os carros movidos

exclusivamente a álcool25. Outra empresa que iniciou o desenvolvimento da tecnologia flex no

país no final da década de 1990 foi a Magneti Marelli26 que desenvolveu seu sistema em

parceria com montadoras como VW e Fiat. Esta tecnologia permite que o consumidor faça a

escolha do combustível que vai usar. Podendo usar somente gasolina, álcool (etanol) ou

qualquer mistura destes combustíveis, representa um atrativo diferenciado no acirrado

mercado automotivo27. De acordo com informações disponibilizadas pelo site

“HowStuffWorks” - Como Tudo Funciona1, os motores flex-fuel utilizam-se de diversos

sistemas, como módulo de controle eletrônico desenvolvido para administrar de forma

eficiente os parâmetros diferenciados dos dois combustíveis, seja na relação

compressão/injeção ar, seja no avanço de ignição. Em função das propriedades do etanol os

motores equipados com a tecnologia flex recebem alterações em seus coletores de admissão,

alterados para receber a partida a frio, como nos modelos movidos unicamente a etanol, que

por possuir uma taxa menor de evaporação em relação à gasolina, a partida do motor frio, com

etanol no tanque, em temperaturas ambiente inferiores a 14° C. é dificultada ou até mesmo

impossibilitada. Por esse motivo, os carros dotados da tecnologia flex ainda precisam de um

sistema para ligar o motor nessas condições. Neste caso o carro é dotado de num pequeno

reservatório de gasolina no compartimento do motor e uma bomba elétrica. Quando é preciso

dar a partida a frio no carro com temperatura inferior ou igual a 14° C28 é necessário que uma

pequena quantidade de gasolina seja introduzida automaticamente no coletor de admissão

fazendo com que o motor seja ligado normalmente.

Para tornar a tecnologia flex viável no inicio de 2000, o governo reduziu alíquota de

IPI para os automóveis flex-fuel. Com isso, a produção em série de carros e motores equipados

com a tecnologia virou realidade no país. Em abril de 2003 era lançado o primeiro automóvel

flex-fuel, o Gol “Total flex” da Volkswagen (equipado com o sistema flex-fuel da Magneti

Marelli), com o preço um pouco mais elevado que o modelo movido exclusivamente à

25 Nesta ocasião apresentavam declínio acentuado em suas vendas.26 A Magneti Marelli gastou R$ 3 milhões nos últimos quatro anos para desenvolver o software que, acoplado ao sistema de gerenciamento do motor, identifica qual combustível está sendo usado, faz a adaptação e possibilita o funcionamento normal do carro (disp. em www.magnetimarlli.com.br)27 O desenvolvimento de um motor flex-fuel também implicaria em economia para as montadoras, que não precisariam mais desenvolver projetos em duplicata para veículos a álcool e a gasolina.28 Em função deste problema a Bosch do Brasil está desenvolvendo a segunda geração da tecnologia flex ou o motor flex de segunda geração, estes novos motores serão equipados com um sistema que aposentara o reservatório de gasolina para partidas do motor nos dias mais frios, através de um sistema elétrico o etanol é aquecido antes de ser injetado no coletor de admissão (mais informações no site da Bosch do Brasil)

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gasolina. Este aspecto também contribuiu para quebrar as resistências ao novo produto. O

automóvel flex-fuel que marcou a estréia da tecnologia Bosch foi um modelo Fox 1.6, também

da Volkswagen, lançado em outubro do mesmo ano. A partir de então, a aceitação e

disseminação desta tecnologia pelas montadoras e pelo consumidor tornou os veículos flex-

fuel um sucesso. Hoje os carros equipados com essa tecnologia representam mais de 80% da

produção brasileira de automóveis novos em 2007 e essa tendência deve aumentar nos

próximos anos. (ANFAVEA, 2007).

0

0,5

1

1,5

2

1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2007

Milh

oes

de u

nida

des

Flex-FuelGasolinaÁlcool

O Gráfico 02 resume o que foi dito anteriormente. O exame da curva mostra que até o

início dos anos 80, o principal combustível utilizado foi a gasolina, isso por conta do preço

mais atraente do petróleo naquele momento. Entre 1982 e 1985, houve uma inversão no

consumo de combustíveis automotivos, o etanol ultrapassou a gasolina, favorecido por mais

uma escalada no preço do petróleo. Nos anos seguintes a redução do preço do petróleo e a

falta de etanol nas bombas de combustível tornaram a utilização do biocombustível inviável

até meados de 2000. Com uma nova escalada no preço do petróleo e o desenvolvimento da

tecnologia flex-fuel a utilização do etanol tornou-se novamente atraente, estimulando a

tecnologia flex e o consumo de etanol.

O sucesso dos motores flex-fuel no mercado brasileiro é inédito no mundo, e tem sido

citado com um exemplo de substituição do combustível fóssil por fontes renováveis de

energia, ao mesmo tempo em que reduz as emissões de gases poluentes ao meio ambiente.

Parte deste sucesso se deve as vantagens competitivas da agricultura brasileira e a maior

Fonte: ANFAVEA / Gráfico: Adolph R. Cardoso

Gráfico 02: Produção de Automóveis por Tipo e Combustível

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eficiência da produção de álcool a partir da cana-de-açúcar do que de outras fontes, como por

exemplo, o etanol de milho produzido nos EUA.

Segundo a revista Scientific American (nº19) as pesquisas realizadas no Brasil no

desenvolvimento de biocombustíveis e sua utilização resultaram em uma concepção

tecnológica infinitamente superior à norte-americana29. Enquanto nos EUA os veículos flex-

fuel foram derivados dos veículos a gasolina, no Brasil se aproveitou a experiência com os

veículos a álcool. Com isso, o conceito do motor flex-fuel nacional se mostrou mais eficiente

no que diz respeito a desempenho e economia de combustível, e diferente do sistema norte

americano, a tecnologia desenvolvida no Brasil possibilita uso de até 100% de álcool ou a

mistura de qualquer parte dos dois combustíveis.

A tecnologia flex-fuel é um verdadeiro sucesso no país, hoje mais de 80% dos carros já

são equipados com motores com esta tecnologia. Mas, apesar disso, os avanços do sistema flex

são feitas por empresas que atuam no setor automotivo como a Bosch e a Magneti Marelli e

não pelas montadoras. Nesta nova corrida aos combustíveis alternativos, o Brasil se destaca

pela utilização dos bicombustíveis. No Japão, as montadoras apostam na utilização do

hidrogênio como célula de combustível30. Na Europa as montadoras e outras empresas do

ramo se dividem entre o desenvolvimento de motores híbridos, biodiesel e células de

combustíveis de diversos tipos. Nos EUA a corrida pelas fontes alternativa caminha em

compasso com o desenvolvimento europeu. Esta corrida está acirrada, mas o Brasil é líder

absoluto na utilização dos biocombustíveis e tem boas possibilidades de ser o maior provedor

de tecnologia para o desenvolvimento deste tipo de combustível. Contudo, existem outras

possibilidades tecnológicas. O quadro (01) a seguir mostra algumas alternativas que estão

sendo produzidas pelas montadoras no resto do mundo:

Quadro resumo 01: Alternativas tecnológicas para substituir petróleo ou reduzir seu consumo

Europa Volkswagen: Atualmente a VW (matriz) está desenvolvendo o “Golf Twin Drive”. O novo carro híbrido conceitual que utiliza de forma integrada dois motores, um elétrico e outro à combustão. Esta nova tecnologia da montadora alemã deve chegar ao mercado em 2010. O Golf híbrido apresentado é uma das vinte unidades que serão testadas com motor híbrido movido à diesel e eletricidade por meio de bateria de lítio.

Japão Toyota: A marca foi a pioneira com a criação do Toyota Prius que teve sua produção iniciada em 1997 e continua até hoje. Atualmente a marca disputa a corrida dos carros movidos a hidrogênio numa corrida acirrada com a Honda que iniciará a primeira

29 Os motores Flex surgiram nos Estados Unidos no inicio dos anos 1990 numa alternativa a alta dos preços do petróleo iniciada no período. Os principais fabricantes passaram a oferecer veículos chamados de “flexible-fuel vehicles” (FFV), capazes de rodar tanto com gasolina quanto com etanol contendo 15% de gasolina. Esse etanol é comercializado com o nome de E85, justamente por ser composto de 85% de etanol e 15% de gasolina. O motorista poder abastecer com gasolina ou com E85.(howstuffworks 2008)30 Basicamente a célula a combustível é um aparelho conversor de energia eletroquímica. A célula a combustível converte os elementos químicos como hidrogênio e oxigênio em água, e gera eletricidade enquanto faz isso. (howstuffworks 2008)

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produção em série de um carro movido a Hidrogênio (FCX Clarrity será vendido por aprox.: 21 mil dólares)

EUA GM: desenvolvimento de carros movidos a E87, híbridos(Chevrolet volt) e Hidrogênio, Tesla Motors produziu o primeiro carro esporte produzido em série movido a eletricidade

Tendências: grande parte das principais montadoras vem aprimorando a utilização dos motores a diesel em eficiência e emissão de CO2, utilizando motores de baixa cilindrada e com muita tecnologia embarcada além de uma quantidade superior de cavalos de força criando motores pequenos, econômicos e potentes, e também procuram desenvolver carros movidos a hidrogênio e eletricidade.Elaborado pelo autor a partir de revistas especializadas como Quatro Rodas, Tesla motors, Interpressmotor, howstuffsworks, VW international website

No âmbito internacional o uso da linha de motores flex-fuel não é disseminado, ela

predomina principalmente no Brasil e poucas unidades foram exportadas. Contudo, observa-se

que para o caso brasileiro, a adoção da tecnologia flex produziu ganhos, tanto para as

empresas como para o consumidor. Os consumidores passaram a poder fazer a escolha do

combustível que vai abastecer o automóvel na hora de estacionar no posto de reabastecimento,

em função do comportamento dos preços do etanol e da gasolina. Para as montadoras, no

momento de produzir avanços no desenvolvimento e na evolução dos motores, a concentração

de esforços acontece em apenas um tipo de motor e não em dois como quando havia os

modelos a etanol e gasolina. Com isso elas reduzem custos na linha de montagem e podem

ampliar investimentos no avanço da tecnologia flex-fuel. A próxima seção procura apontar

algumas das tendências mundiais da indústria automotiva a fim de se discutir as possibilidade

de adoção por parte das montadoras da tecnologia flex-fuel, em outras partes do mundo.

3. A adoção da tecnologia flex-fuel na estrutura internacional da indústria

automotiva

Antes de abordar a possível adoção internacional da tecnologia flex-fuel pelas

montadoras, um rápido apanhado sobre o funcionamento dos modelos das empresas

transnacionais e suas estratégias se torna importante para melhor compreensão de como estas

empresas atuam. Jorge Vieira da Silva31, Gerente de Desenvolvimento de Sistemas para

América Latina e Canadá do Setor Farmacêutico da Novartis, trabalha o assunto segundo

uma classificação baseada em três modelos ou tipos ideais: o modelo multinacional, o

global/internacional e o transnacional:

No modelo de organização econômica multinacional a verticalização é o fator

determinante. Sua estrutura, ou seja, o poder de decisão, o desenvolvimento de produtos e a

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gestão financeira permanecem nas mãos da matriz. Para Silva, (2008) “[...] o surgimento do

modelo estratégico mundial vinculado as multinacionais, reproduz, em menor escala, a

estrutura organizacional produtiva, comercial e financeira do país de origem em outros países

de interesse da empresa”. Neste sentido, as subsidiárias ou representantes da matriz no

restante do globo são apenas representações comerciais que possuem pouca ou nenhuma

autonomia na tomada de suas decisões e estratégias corporativas. Assim, este tipo de empresa

simplesmente produz, vende, contabiliza e repassa os lucros auferidos para a matriz remunerar

seus investidores, retirando divisas do país em que está sediada (SILVA, 2008. P 46-50).

Contudo, com o avanço da globalização e a necessidade de adquirir novos mercados,

após segunda metade do século XX as empresas evoluíram para dois novos modelos,

conhecidos como o modelo global e o modelo transnacional. Ainda de acordo com Jorge

Vieira da Silva, nestes dois modelos as empresas ultrapassaram as fronteiras de seus países de

origem, instalando fábricas e escritórios comerciais fora do território de origem da empresa,

“de acordo com uma logística mundial centralizada em um ou mais países (modelo global) ou

conforme o mercado consumidor mundial (modelo transnacional).”

O modelo global não é o mais contemporâneo destes modelos, mas foi o que mais se

intensificou, utilizando-se de estratégias e da análise da reorganização do trabalho e da

produção empresarial, sobretudo na comparação da organização empresarial norte-americana -

Fordismo32 e a japonesa - Toyotismo33. “A vantagem competitiva das companhias globais [...]

31 Texto disponível em http://www.seade.gov.br/produtos/spp/v12n02/v2n02_05.pdf acessado em: 19/8/200832 Criada em Henry Ford em 1909, o Fordismo surgiu da necessidade de acelerar a quantidade de produção e seu preço. Com o objetivo de produzir o modelo T, que atendesse o consumo de massa a um preço relativamente baixo. O Fordismo partiu de 5 princípios de transformação: Atender o consumo - Produção em massa combatendo desperdícios, inclusive de tempo; Parcelamento das tarefas, operário possui uma função pré-determina; Criação de uma linha de ligação entre funcionários - esteira que permite aos operários, realizar produção em equipe de forma fluida; Padronização de peças, mesmo modelo; Automatização das fábricas - A partir de 1914, surge as primeiras linhas de montagens automatizadas, onde os automóveis eram produzidos oito vezes mais rápidos do que o antigo método artesanal e sem distribuição de funções. Em 1921, a Ford fabricava mais da metade dos automóveis do mundo, seu capital de dois milhões de dólares em 1907, solta para 250 milhões de dólares em 1919, forçando a concorrência uma adaptação aos padrões fordistas incluindo salários empregatícios. (GOUNET, 1999)

33 O Toyotismo - Implantado durante as décadas de 50 a 70 é desenvolvido como uma nova organização do trabalho, como idealizador teve o vice-presidente da TOYOTA Taiichi Ohno – utilizando´se do sistema (Just-in-time). O Toyotismo edificou algumas regras que garantiram a TOYOTA o poder e respeito que a montadora possui hoje através da produção apenas do que for consumido, só produz o que é vendido, combatendo o desperdício em quatro operações: transporte, produção, estocagem e controle de qualidade (agregando valor ao produto);Flexibilidade - trabalho de equipe, trabalhador polivalente, operando em média cinco máquinas onde quatro delas funciona automaticamente. Por ser um sistema de organização de produção o Toyotismo apresenta numa proposta imediata as variações da demanda, exigindo organização flexível e integrada do trabalho e dos trabalhadores, caracterizando-se pelos cinco zeros: Zero de atrasos; Zero estoques; Zero defeitos; Zero panes; Zero papéis. (GOUNET, 1999)

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está no aprendizado local em contraste com o original da companhia-mãe, o que os autores

chamam de “aprendizado mundial” 34.

Dada à condição de sobrevivência comercial das empresas mundiais, o modelo

transnacional se apresenta como uma evolução do modelo global. A empresa transnacional

atua em vários países, buscando a competitividade global, uma flexibilidade multinacional e

um aprendizado mundial, de modo a garantir o lucro esperado por seus investidores. Silva

descreve a empresa transnacional como:

Estruturada para agir em um mercado mundial. [...] No âmbito local e, posteriormente, no âmbito mundial, desenvolve um sistema de inteligência de mercado, baseado no estudo dos fornecedores, concorrentes, clientes, intermediários, governo, imprensa e universidades, ou seja, sistema de análise de todas as entidades externas à empresa e de sua interação, de seu posicionamento em relação a essa. A empresa analisa, por exemplo, a legislação e o controle governamental, o conhecimento e a pesquisa desenvolvida nos meios universitários, o comportamento favorável ou desfavorável da imprensa e da opinião pública e, sobretudo, estuda as outras empresas que também atuam no mesmo mercado, desde os fornecedores de matéria-prima até os eventuais intermediários. As variáveis internas à empresa tais como produtos ofertados, preços, propaganda e pontos de distribuição, são também comparadas com a prática das concorrentes que atuam no mesmo mercado consumidor de modo a obter um melhor posicionamento em relação ao mercado e às possibilidades de lucro no mesmo.

Observando a definição de Silva sobre as empresas transnacionais é possível

compreender a estrutura básica deste organismo. Mas, para ampliar a compreensão da

complexa rede transnacional do setor automotivo recorreu-se também a Eloi Martins

Senhoras35. Este autor observa que as empresas transnacionais do setor automotivo atuam de

forma a gerar efeitos de encadeamento entre fornecedores e distribuidores, transferência de

know-how e conseqüências sobre a formação de recursos humanos, por meio das atividades de

treinamento da mão-de-obra e do processo de aprendizado junto à atividade produtiva. Essa

estrutura, criada entre a matriz e suas filiais no processo de importação e exportação de

mercadorias, forma em muitos casos, alianças cooperativas internacionais e/ou clusters

(economias de aglomeração). No Brasil, o setor automotivo recebe Investimentos Externos

Diretos (IED), oriundos de suas matrizes, para investir em novas estratégias de produção

internacional integrada. Com isso, as montadoras substituíram o sistema administrativo

horizontal por um processo de verticalização através de outsourcing36. No processo, os fluxos

34 Texto disponível em http://www.seade.gov.br/produtos/spp/v12n02/v2n02_05.pdf ( pag47) acessado em 19/8/200835 SENHORAS, Eloi Martins. A indústria automobilística sob enfoque estático e dinâmico: uma análise teórica, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP disponível em:http://www.ead.fea.usp.br/semead/8semead/resultado/trabalhosPDF/226.pdf36 Outsourcing designa a ação que existe por parte de uma organização em obter mão-de-obra de fora da empresa, ou seja, mão-de-obra terceirizada. Está fortemente ligado a idéia de subcontratação de serviços.

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de IED permitiram às montadoras suprir as necessidades da estruturas de produção

multidomésticas37 por estruturas globais integradas.

Observando o que foi dito por Silva e também por Martins Senhoras, pode-se apontar

que as montadoras instaladas no Brasil e no restante do mundo procuram maior flexibilidade e

articulação em áreas mais extensas de atuação. Para viabilizar o processo, elas utilizam

cadeias menores de comando nas regiões geradoras de maior densidade de informações e

fluxos materiais. Esse processo continua mantendo a centralização de decisões de toda a rede

na sede, mas com uma desconcentração de responsabilidades e de execução de determinadas

atividades de gerenciamento que antes eram exclusivas da matriz.

O sistema de montagem, chamado de Condomínio Industrial ou Consórcio Modular,

começou a ser estruturado no Brasil, no fim dos anos 80. A concorrência da indústria

automobilística ocidental para com montadoras japonesas, a demanda por novos produtos e a

adoção de novas formas para reduzir os custos na produção fez com que o sistema fosse

utilizado. De acordo com Rachid (1997) o consórcio modular funciona da seguinte maneira:

um pequeno número de fornecedores de primeira linha tornam-se responsáveis pela montagem

dos produtos da montadora. Os funcionários e as máquinas destes fornecedores são instalados

na linha de montagem da montadora para inserir os componentes necessários nos veículos.

Assim, com adoção deste novo processo ou modelo de produção as montadoras retiraram

grande parcela de custos, tanto no desenvolvimento de peças e equipamentos como na

montagem dos carros. Com isso, elas passam a dar mais atenção à coordenação da produção, à

logística, o controle da qualidade, em desenvolvimento de projetos e produtos, no marketing e

ao setor de vendas.

Desta forma, a adoção do consórcio modular acarretou em uma seleção mais rigorosa

dos fornecedores de autopeças. Isso aconteceu porque seus fabricantes deverão garantir um

fornecimento exclusivo durante todo o período em que um determinado modelo estiver em

produção. Este aspecto é importante porque as montadoras procuram garantir a qualidade de

seus produtos e isso implica que seus fornecedores também sejam obrigados a produzir um

veículo com a eficiência e a qualidade requeridas.

Assim, após os anos noventa, as montadoras passaram a utilizar procedimentos

diferenciados e voltados às estratégias de competitividade em cada um dos territórios onde

atuam. Por exemplo, no Brasil, a adoção da tecnologia flex garantiu ganhos, tanto às empresas

como para o consumidor. O consumidor passou a ter o poder de escolha do tipo de

combustível que irão utilizar na hora abastecer seu automóvel, em função do comportamento

37 A estratégia multidoméstica tem como objetivo maximizar o desempenho mundial através da maximização das receitas e lucros. O objetivo da estratégia global é maximizar o desempenho mundial por meio do compartilhamento e da integração, conseqüentemente do ganho de escala. (BORINI, 2006)

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dos preços do etanol e da gasolina. Para as montadoras, a criação e desenvolvimento de novos

motores terão a opção de concentrar os esforços em apenas um tipo de motor e não em dois

como quando haviam os modelos a etanol e gasolina (período do Proálcool). Com a

concentração em um só tipo de tecnologia, as montadoras reduzem custos no desenvolvimento

de engenharia e na linha de montagem e, com isso, elas podem ampliar investimentos no

avanço da tecnologia flex.

Em função das características apontadas sobre as montadoras, a seguir aborda-se a

discussão sobre as possibilidades de internacionalização desta tecnologia pelas empresas

instaladas no Brasil.

3.1 A possibilidade de internacionalização da tecnologia brasileira flex-fuel

Do exposto pode-se assumir o argumento de que as montadoras querem fornecedores

globais que garantam qualidade, redução de custos, logística adequada as suas necessidades

além do domínio tecnológico na área de processos. Partindo desta lógica, para que a

tecnologia flex-fuel seja adotada pelas montadoras no resto do mundo será necessário o

desenvolvimento de fornecedores aptos a garantir a demanda e a qualidade dos produtos.

Neste caso, quando se observa a situação das empresas que produzem o sistema flex-fuel, este

pré-requisito é compatível às duas empresas que lideram o desenvolvimento da tecnologia flex

no Brasil e conseqüentemente no mundo: a Bosch e a Magneti Marelli. Estas empresas

possuem grande capacidade para garantir a logística necessária, além do domínio tecnológico

na área de processos para consolidar uma distribuição mundial “adequada” desta tecnologia.

No que diz respeito ao desenvolvimento e distribuição da tecnologia flex-fuel, a Robert Bosch

América Latina, com sede no Brasil, é o Centro de Competência Mundial da empresa para o

desenvolvimento e utilização do etanol combustível. Sua unidade, localizada em Campinas

(SP), é a única subsidiária da empresa no mundo que produz a bomba de combustível38 para

motores a álcool e flex.

O Brasil pode ser considerado o maior laboratório de testes no que se diz respeito à

utilização do biocombustíveis e do emprego da tecnologia flex, isso garante ao país e às

empresas aqui instaladas um know-how importante. A possibilidade da adoção internacional

da tecnologia flex-fuel depende de alguns fatores como: infra-estrutura de produção,

lucratividade, meio ambiente, produtividade, aceitação do produto pelo consumidor alvo,

dentre outras. Um dos fatores chaves para a internacionalização da tecnologia diz respeito a

atuação governamental para estimular o uso do etanol em outros países. Como exemplo,

destaca-se o recente acordo entre o governo do Brasil e da Suécia para eliminar a sobretaxa

38 Dispositivo mecânico ou elétrico que aspira combustível do tanque e o envia para do carburador ou circuito de injeção.

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imposta à importação do etanol brasileiro. Matéria publicada na revista BRASILALEMANHA

(agosto de 2008), aponta que hoje a Suécia é um dos países mais verdes do mundo e o

principal país da Europa a receber o etanol produzido no Brasil. Pela lei sueca toda gasolina

vendida no país deve ter uma adição de 20% de etanol na mistura do combustível, e hoje

aquele país já possui mais de 35% de sua frota de carros dotados da tecnologia flex.

Em setembro de 2007 foi viabilizada a parceria entre o grupo PSA - Peugeot Citroen e

a Bosch/Brasil para fornecer o sistema flex-fuel que equipa os motores dos Peugeot 307 SW

BioFlex e Citroën C4 BioFlex, com motores de 1,6l de 16V, destinados à Suécia39 e à França.

Foram exportados cerca de 6.500 motores para estes países e em breve novos motores serão

exportados só que agora 2.0 (2000cc), de acordo com a revista AUTO – Esporte de novembro

08. Segundo a Bosh, semelhante ao caso brasileiro, a versão européia do sistema “flex-fuel

Bosch” é capaz de reconhecer e adaptar, automaticamente, as funções de gerenciamento do

motor para trabalhar com qualquer proporção de álcool na mistura de combustíveis que o

usuário abasteça no tanque. Porém, diferentemente do que acontece no Brasil, na Europa esses

combustíveis são do tipo E85: uma mistura de 85% de álcool e 15% de gasolina devido ao

clima local que pode congelar o combustível no tanque se o etanol for puro. (Portal da

autopeça 200740)

Do exposto, e de acordo com Fábio Ferreira41, a adaptação da tecnologia flex-fuel às

severas condições climáticas e às exigentes especificações da legislação ambiental da Europa

implicou na “criação de um novo software e de nova calibração do módulo eletrônico, bem

como um novo módulo de fornecimento de combustível”.

O fator chave para o sucesso da tecnologia flex42fora do Brasil está na implantação de

uma infra-estrutura eficiente de produção e distribuição do etanol que isente de riscos o

consumidor e as montadoras. A adoção por parte das montadoras dessa tecnologia se dará, em

grande parte, com mais oferta de etanol e de sua aceitação pelo consumidor local. Neste

aspecto é importante salientar as recentes tentativas de acordo entre Brasil e EUA para

implantar a padronização do Etanol. O memorando de entendimento entre Brasil (INMETRO

Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) e EUA (NIST-

National Institute of Standards and Technology) tem o objetivo de desenvolver padrões e

materiais de referência para a produção do etanol com rastreabilidade internacional. Os dois

órgãos também estabelecerão padrões de medição de impurezas, o potencial energético dos

39 Na Suécia, entre 30 a 35% da sua frota de carros já é Flex. Além disso, o país determinou por lei a mistura de 20% de etanol a gasolina. (GOITIA, 2008)40 Disponível em: http://www.sincopecas.org.br/noticias/?COD=1545 acessado em 19/10/200841 Gerente de desenvolvimento de produto da Unidade de Sistemas a Gasolina da Robert Bosch América Latina.Disponível em: http://www.sincopecas.org.br/noticias/?COD=154542 Como já apontado na página onze deste artigo, o problema de abastecimento e infra-estrutura ocorrido no Brasil em 1988-1989 culminou, na época, com o fim do Proálcool. O problema caracterizou-se pela falta de etanol nos postos de combustível, o que abalou seriamente a confiança do consumidor final e acarretou na redução dramática da venda de carros movidos exclusivamente a álcool.

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diversos tipos de etanol e, também, a calibragem dos instrumentos de medição. A necessidade

de que as normas sejam fixadas em conjunto é para evitar possíveis distorções de parâmetros

que possam resultar em barreiras técnicas ao etanol43.

Na busca em criar as condições para transformar o etanol em uma commodity, um

grupo de técnicos do Brasil, União Européias (UE) e Estadas Unidos (EUA) encerraram a

primeira etapa do processo de harmonização das especificações técnicas do etanol. Foram

identificadas divergências e convergências entre as normas fixadas por cada país, e com isso o

grupo trabalha para alinhar os diferentes padrões e avaliar os custos ainda neste ano. Foi

estipulado que até o final de 2008 sejam concluídas estas ações, para que a análise das

implicações para o comércio inicie-se até dezembro e continue em 200944.

Segundo o site do CIMM (Centro de Informação Metal Mecânica) o estudo concluiu

que não há especificações técnicas suficientes que representem um impedimento à livre

circulação do etanol no mercado internacional. O ponto que será discutido nos próximos

meses será sobre a questão do volume de mistura de água no etanol que será permitida.

Segundo o relatório, a quantidade mínima de água adicionada ao etanol é de 0,24% na EU, de

até 1,0% nos EUA e no Brasil permite-se a adição de até 0,4% de água ao etanol. Ainda de

acordo com o CIMM, as autoridades e empresários brasileiros observam os trabalhos

realizados pelo grupo para evitar que a padronização do etanol seja feita baseada somente no

padrão da EU e dos EUA, pois se isto acontecer barreiras comerciais podem ser criadas.

Foram examinadas 15 especificações para garantir a qualidade e padronização do etanol, das

quais sete são compatíveis nos três mercados: aparência, densidade, conteúdo de sulfato,

enxofre, cobre, aço e sódio. Seis são diferentes, mas três podem ser alinhadas no curto prazo:

acidez, conteúdo de fósforo e resíduos de evaporação.

O fator ecológico é outro aspecto chave para a adoção internacional da tecnologia flex.

A redução das emissões de CO2 em “um veículo movido a etanol significa evitar a emissão de

quase 2,4 kg de CO2 por litro de combustível, se comparado a um veículo movido a gasolina.

Por isso, a expansão do uso de E85 na Europa é vista como um dos principais fatores para o

cumprimento do protocolo de Quioto pelos governos locais, bem como um meio de atingir a

meta do continente europeu de utilizar 5,75% de energia proveniente da biomassa45”.

43 Mais informações disponível em: http://www.inmetro.gov.br/infotec/publicacoes/boletins/info8968.pdf44New York Times economia Disponível em http://www.nytimes.com/2007/03/03/business/worldbusiness/03ethanol.html?ex=1330578000&en=a3ddca02a18269f0&ei=5090&partner=rssuserland&emc=rss acessado em 10/10/200845 Disponível em: http://www.sincopecas.org.br/noticias/?COD=1545 acessado em 19/10/2008

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Este aspecto pode ser ilustrado tendo como destaque o interesse da Dinamarca46 no

desenvolvimento do etanol de segunda geração. Atualmente empresas brasileiras e

dinamarquesas trabalham no desenvolvimento do etanol de segunda geração, a partir do

bagaço da cana, mais eficiente e ainda menos poluente. Segundo o portal G147 a ministra de

Clima e Energia da Dinamarca Connie Hedegaard iniciou uma excursão por vários países para

preparar a Conferência Mundial de 2009 sobre o meio ambiente em Copenhague48. No seu

itinerário, a ministra incluiu o Brasil por considerar o país importante para a conferência do

ano que vem e ela também demonstrou forte interesse no etanol brasileiro, ao destacar o

possível aumento de demanda da União Européia por este combustível nos próximos anos.

Como já comentada, é a possibilidade de reconversão de parte da indústria automotiva

norte-americana para carros de baixa cilindrada, mais econômico e ambientalmente menos

poluente. Isto permite, em tese, ampliar as exportações brasileiras desta tecnologia para àquele

país. Como a crise econômica norte americana afetou a indústria automotiva local,

montadoras como GM e Ford que sempre adotaram modelo de produção de seus veículos

como sendo o “estilo do norte americano de viver” (“large and bigger”), produzindo

principalmente picapes e utilitários (SUVs) com motores enormes chamados de “BIG-

Blocks”49, movidos na sua maioria a gasolina, estas montadoras passaram a perder mercado.

Este modelo corporativo acarretou num isolamento de seus produtos direcionando-os

basicamente para o mercado interno. Ainda, a produção concentrada em carros grandes, sem

preocupação com o consumo de combustível, é fonte de dor de cabeça para a maioria das

montadoras norte americanas que agora enfrentam um grande problema: o aumento do preço

do petróleo levou o consumidor a mudar seu objeto de desejo, que passou a substituir os

carrões pelos compactos e econômicos. Essas mudanças no processo de escolha do

consumidor norte americano gera uma oportunidade para a adoção da tecnologia flex-fuel, a

qual pode se fazer presente com veículos compactos, equipados com motores de baixa

cilindrada, modelos que o Brasil é um fornecedor importante. (ULTIMO SEGUNDO50,

economia, 2008/03/03)

46 Mais informações: http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM881988-7823-MINISTRA+DO+CLIMA+E+DA+ENERGIA+DA+DINAMARCA+ANUNCIA+PARCERIA+COM+O+BRASIL,00.html47

http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL758526-10406,00-BRASIL+E+DINAMARCA+DESENVOLVEM+TIPO+DE+ETANOL.html48Copenhague será a sede da cúpula mundial sobre o clima em dezembro de 2009, quando deverá ser definido um acordo para substituir o Protocolo de Kyoto, em vigor até 2012.49 Motores na sua maioria V8 com grande potência e alto consumo de combustível50 Disponível em:http://ultimosegundo.ig.com.br/economia/2008/03/03/crise_nos_eua_golpeia_forte_empresas_do_setor_automotivo_em_fevereiro_1214079.html , acessado em 30/10/2008

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As possibilidades futuras de internacionalização da tecnologia flex são promissoras.

Contudo, observa-se que o Brasil é um produtor e importante de diversos componentes que

fazem parte da fabricação dos motores equipados com a tecnologia flex como: “bombas

p/gasolina/álcool, p/motor de explosão; válvulas de admissão ou de escape p/motores de

explosão; injeção eletrônica, para motores de explosão”. Estas e outras autopeças já são

exportadas há alguns anos para utilização em carros com ou sem a tecnologia flex.

Observando os dados disponíveis no portal ALICE - Web, neste caso de 01/2003 a

09/2008 foram exportadas mais de 3.446.798 unidades de bombas p/gasolina/álcool, para a

UE, Suécia, Dinamarca e EUA. Este item é fundamental para o funcionamento dos motores

flex, além do sistema software do módulo de controle eletrônico, dentre outros componentes já

citados.

O exame dos dados aponta que o Brasil já atende um mercado externo significativo no

setor de autopeças. Diversos países demandam componentes para motores a combustão,

produzidos pela indústria brasileira. Desta forma, a possível adoção do uso do etanol por parte

da EU e países como EUA, Dinamarca, Suécia, alem dos países vizinhos ao Brasil, como

Argentina, Paraguai, Uruguai dentre os demais, permite ampliar as exportações da indústria

automotiva a de autopeças que pode atuar como um significativo fornecedor de componentes

e peças para carros equipados com a tecnologia flex.

Já que diversos componentes dos motores que utilizam a tecnologia flex-fuel

necessitaram do aperfeiçoamento ou até mesmo a criação de novas peças para garantir o

funcionamento com a utilização do etanol como combustível. Assim componentes como os

bicos injetores tiveram seu tamanho e a vazão aumentados. As válvulas de escape, a linha de

alimentação e a bomba de gasolina receberam revestimento anti-corrosão, uma vez que o

álcool não tem as mesmas propriedades lubrificantes da gasolina e apresenta o fator corrosivo

a sua mistura. O tempo de abertura e fechamento das válvulas foi modificado. As velas de

ignição contam com três eletrodos de platina, com prolongamento maior para melhorar a

queima na câmara de combustão. A exemplo disto, cada montadora opta por um

desenvolvimento especifico de certas propriedades dos motores flex como a Ford que em dois

de seus modelos o Ford Fiesta e EcoSport, a válvula termostática51 é elétrica e tem

funcionamento diferenciado para cada tipo de combustível, pois o motor funciona mais quente

quando abastecido com etanol, para garantir um melhor aproveitamento da energia da queima

do combustível.( op. cit. “HOWSTUFFWORKS” - como funciona o motor flex)

51 Sistema que mede a temperatura adequada de funcionamento dos motores a combustão interna

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Graças à utilização de carros movidos a etanol desde o final da década de 70 o Brasil

possui soluções mais eficientes e viáveis ao que se refere à corrosão das peças causadas pelo

uso do etanol. Com isto o Brasil se torna o maior especialista em tecnologia flex alem de ser

um dos pioneiros na utilização dos bicombustíveis como principal fonte energética no mundo,

colocando assim o país na vanguarda tecnológica dos bicombustíveis e no emprego da

tecnologia flex-fuel, tornado assim a indústria automotiva e de autopeças aqui instaladas fortes

concorrentes no âmbito internacional no que diz respeito à fabricação, distribuição e

qualidades de peças e componentes que equipam os motores flex.

3. Considerações finais

O estudo realizado no presente artigo evidencia a possibilidade de adoção

internacional da tecnologia flex-fuel brasileira. As matrizes e filiais das empresas montadoras

de automóveis em todo o mundo observam a competitividade do país, no setor automotivo e

de autopeças, na questão da tecnologia flex-fuel. No Brasil, o uso da tecnologia flex superou

todas as expectativas e o sucesso dos motores flex-fuel é destaque, e como já mencionado, o

país é citado como exemplo na tentativa de substituir o uso de combustíveis fósseis por

biocombustíveis entre outras fontes de energia renovável.

Dentre os fatores que possibilitaram o sucesso do uso dos motores flex estão às

vantagens competitivas da agricultura brasileira e a maior eficiência na produção do etanol

proveniente da cana-de-açúcar em relação à produção feita a partir de milho, beterraba e

outros cereais utilizados em outros países. Após a adoção dos carros flex, o Brasil passou por

uma transformação, tornando-se um dos poucos países a utilizar um biocombustível como

principal fonte energética. Isto acontece porque o álcool combustível se tornou mais barato

que a gasolina e mesmo com isso, a tecnologia ainda permite a liberdade do motorista,

abastecer seu automóvel com gasolina se a situação se inverter.

O interesse internacional pela utilização de biocombustíveis e do motor flex é evidente,

mas a adoção internacional da tecnologia flex-fuel pelas matrizes e filiais das montadoras de

automóveis no restante do mundo depende de aspectos como o clima, produção eficiente e até

de incentivos fiscais. Outro aspecto importante está na transformação do etanol em uma

Commodity internacional que seja capaz de promover a garantia de fornecimento ininterrupto

do combustível aos possíveis consumidores internacionais. Para isto, seria necessário o

desenvolvimento de uma rede eficiente de abastecimento que evite a falta de etanol nos postos

de combustíveis.

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É por este motivo que os governos desempenham um papel fundamental para o

sucesso da tecnologia flex. Sem a transformação do etanol em uma commodity a tecnologia

flex-fuel terá dificuldades para ser internacionalizada. Apesar do sucesso no Brasil, sem uma

rede eficiente de distribuição do etanol a venda desta tecnologia no exterior terá muitas

limitações. Como, as montadoras almejam lucros, para isso é necessário que a logística

necessária seja desenvolvida para que o etanol e a tecnologia flex sejam internacionalizados.

Mesmo com os problemas apontados a pesquisa conclui que existem algumas

possibilidades de internacionalização para esta tecnologia. A crescente demanda de países

como EUA, Suécia, França, Alemanha dentre outros por novas fontes de energias renováveis

e a preocupação com o meio ambiente faz com que a tecnologia flex-fuel se torne uma escolha

eficiente para as montadoras, governos e para o consumidor. Governos como o dinamarquês e

o Sueco mostram interesse na utilização do etanol como combustível e conseqüentemente na

tecnologia flex, fazendo destes países possíveis consumidores da tecnologia além de peças e

outros componentes utilizados nos motores equipados com a tecnologia flex-fuel.

Os EUA como já mencionado neste artigo enfrentam uma de suas maiores crises na

sua indústria automotiva. A instabilidade dos preços do petróleo e a atual demanda do

consumidor por carros compactos, mais econômicos e menos poluentes fazem com que a

tecnologia flex-fuel se torne uma alternativa para as montadoras norte-americanas sair da crise

em que se encontram. Assim como nos EUA, a possibilidade de adoção da tecnologia flex

America latina se faz presente. Por diversas vezes países como Uruguai e Paraguai já

discutiram a possibilidade de criação de acordos de cooperação para a produção e utilização

do etanol.

No Brasil a tecnologia flex-fuel surgiu de uma necessidade, a crescente alta do preço

do petróleo fez com que se adotasse um sistema que desse o poder de escolha ao consumidor,

colocar no tanque de seu automóvel o combustível que melhor lhe convir e é por este motivo

que são grandes a possibilidade da tecnologia flex-fuel ser adotada. A indústria automotiva e

de autopeças brasileira está preparada para uma demanda mundial de componentes e sistemas,

e seus técnicos e engenheiros estão aptos para garantir o suporte à tecnologia flex, pois as duas

empresas que lideram o desenvolvimento da tecnologia flex no Brasil possuem os requisitos

necessários para atender a futura demanda global pela tecnologia e por componentes dela. No

momento em que este trabalho é concluído engenheiros brasileiros estão trabalhando na

General Motors dos Estados Unidos para transferir esta tecnologia àquela empresa

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Por fim, devido as tantas variáveis identificadas neste artigo e diante das atuais

transformações que a economia mundial enfrenta em termos de política energética e questão

ambiental, a demanda dos consumidores por carros mais eficientes e menos poluentes pode

contribuir para ampliar possibilidade de adoção da tecnologia flex-fuel pelas matrizes e filiais

da indústria automobilística no restante do mundo.

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