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PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ – USJ
CURSO DE PEDAGOGIA
LUANA COSTA DE CÓRDOVA
"EU SOU O HULK, ELE É O BATMAN E ELE, O HOMEM ALANHA": Um estudo
das relações entre o imaginário infantil e as mídias eletrônicas em um contexto
de Educação Infantil.
São José
2011
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ – USJ
CURSO DE PEDAGOGIA
LUANA COSTA DE CÓRDOVA
"EU SOU O HULK, ELE É O BATMAN E ELE, O HOMEM ALANHA": Um estudo
das relações entre o imaginário infantil e as mídias eletrônicas em um contexto
de Educação Infantil.
Trabalho elaborado para a disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II, do Curso de Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José – USJ. Orientadora: Profª. MSc. Andréa Simões Rivero
São José
2011
LUANA COSTA DE CÓRDOVA
"EU SOU O HULK, ELE É O BATMAN E ELE, O HOMEM ALANHA": Um estudo
das relações entre o imaginário infantil e as mídias eletrônicas em um contexto
de Educação Infantil.
Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como requisito parcial para obtenção do grau de licenciada em Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José – USJ avaliado pela seguinte banca examinadora:
_______________________________
Profª Msc. Andréa Simões Rivero Orientadora
______________________________ Profª Msc. Vera Regina Lúcio
Membro Examinador
_______________________________ Profª Drª Gisélia Antunes Pereira
Membro Examinador
São José, 20 de junho de 2011.
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus pais, pelo apoio e motivação em todos estes anos de
estudos.
Ás minhas queridas amigas Monique, Juliana, Ana, Bruna, Sabrini, Camila,
Maria Eliane, Suzi e Gabriela, ufa são tantas, pelos momentos de descontração,
alegria, paciência e de também de choros afinal é sempre bom chorar, pelas trocas
de experiências e pela motivação que cada uma passava para a outra.
Á minha professora orientadora Andréa Simões Rivero, que com toda
paciência e dedicação me acompanhou nessa caminhada, com toda sua calma e
delicadeza.
Ás professoras Vera Regina Lúcio e Gisélia Antunes Pereira, por aceitarem o
carinhoso convite de compor minha banca.
Ás crianças e os professores da instituição em que realizei a pesquisa, por me
acolherem com muito carinho.
Á Secretaria Municipal de Educação de Florianópolis, que carinhosamente
autorizou a realização da pesquisa na instituição escolhida.
Á professora Sidneya Gaspar de Oliveira, pela correção textual em minha
pesquisa.
Ao meu excelentíssimo marido Tulio, por compreender minhas ausências, por
sempre estar ao meu lado, pela dedicação, carinho e amor que ele tem por mim e
por me ajudar nos momentos em que mais precisei.
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no
corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco,
porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho,
intervindo, educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar
ou anunciar a novidade. Paulo Freire, 1996
RESUMO
Este Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), tem como objetivo, principal analisar as relações entre o imaginário infantil e as mídias eletrônicas em um contexto de Educação Infantil. Os objetivos que conduziram o meu olhar durante as observações foram os seguintes: identificar quais equipamentos de mídia as crianças possuem em casa e as condições de acesso aos mesmos; identificar as mídias preferidas pelas crianças e conhecer os modos como elas estabelecem relações com as mesmas e produzem e reproduzem culturas a partir dos conteúdos midiáticos. A pesquisa, de cunho qualitativo, foi realizada em uma instituição de Educação Infantil da rede pública do município de Florianópolis, estado de Santa Catarina, na qual foram realizadas observações participantes, num grupo de constituído de 28 crianças (15 meninos e 13 meninas), com idades entre quatro e cinco anos. Foram realizados registros das situações cotidianas através de fotografias, filmagens, gravações em áudio e anotações, além disso, um questionário foi enviado aos pais/responsáveis pelas crianças. Esta pesquisa possibilitou uma melhor compreensão da presença dos conteúdos veiculados pelas mídias no imaginário infantil, e da necessidade de aproximação da área de Educação Infantil e dos cursos de Pedagogia à temática mídias e infância. Palavras-Chave: Educação Infantil. Imaginário infantil. Mídias.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 7
2 PERCURSO METODOLÓGICOS DA PESQUISA ................................................. 9
3 ANÁLISES E REVISÃO DE LITERATURA .......................................................... 16
3.1 INFÂNCIA, IMAGINÁRIO E MÍDIAS ................................................................... 17
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 43
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 46
APÊNDICES ............................................................................................................. 50
APÊNDICE A – Autorização de imagens .................................................................. 50
APÊNDICE B – Questionário .................................................................................... 51
7
1 INTRODUÇÃO
Durante toda a caminhada no Curso de Graduação em Pedagogia, no Centro
Universitário Municipal de São José (USJ), foram apresentados muitos temas
interessantes, que possibilitariam ótimos trabalhos de conclusão de curso, porém,
um tema específico foi o que chamou minha atenção e despertou a curiosidade em
pesquisá-lo: as relações entre a mídia e a educação.
A televisão sempre me mobilizou, desde muito nova já tinha curiosidade a
respeito desse veículo; com o passar do tempo, outras tecnologias foram surgindo,
computadores de todos os tipos e cada vez mais a curiosidade ia aflorando e a
inquietação sempre presente.
Desta maneira, optei por desenvolver uma pesquisa sobre as relações entre o
imaginário infantil e as mídias eletrônicas em um contexto de Educação Infantil.
Essa opção surge de uma curiosidade sobre como as crianças pequenas estão
estabelecendo relações com esse mundo tecnológico. Ao realizar uma aproximação
introdutória às produções teóricas sobre o assunto ficou evidente que os estudos
sobre esse tema no Brasil – mais especificamente com crianças pequenas - ainda
são incipientes.
Convive-se, no mundo contemporâneo, com o fato de as mídias estarem em
todos os lugares, nas escolas, nas famílias, na comunidade. Percebendo a falta de
estudos sobre essa temática, na área de Educação Infantil, senti a necessidade de
entender melhor como as crianças estão estabelecendo relações com as mídias,
assim como buscar pistas sobre a experiência cultural das crianças com os
conteúdos midiáticos, e suas produções e reproduções culturais.
Minha expectativa é de que essa pesquisa, apesar de seu caráter introdutório,
contribua para a compreensão sobre os modos como as crianças se relacionam com
a mídia e, consequentemente, sobre a importância de considerarmos essas relações
em nossas reflexões e práticas nas instituições de Educação Infantil.
Essa pesquisa tem caráter etnográfico. Foram realizadas 10 observações de
04 horas diárias, num grupo constituído de 28 crianças, sendo 15 meninos e 13
meninas, com idades entre quatro e cinco anos.
8
Outro instrumento utilizado na pesquisa foi um questionário enviado aos
pais/responsáveis pelas crianças, com a intenção de ampliar a compreensão sobre
os modos como as crianças se relacionam com a mídia.
Essa pesquisa tem, portanto, a intenção de investigar a seguinte questão:
quais as relações entre o imaginário infantil e as mídias eletrônicas em um contexto
de Educação Infantil? A partir dessa questão, outras perguntas surgiram: quais os
equipamentos de mídia que as crianças possuem em casa e quais as condições de
acesso aos mesmos? Quais as mídias preferidas pelas crianças? Quais os modos
como as crianças estabelecem relações com as mídias e suas produções e
reproduções culturais, a partir dos conteúdos midiáticos?
O trabalho está estruturado numa seção introdutória em que apresento o
“Percurso Metodológico da Pesquisa”, que traz elementos sobre como a
investigação foi produzida; a seguir, as “Análises e Revisão de Literatura”, em que
apresento produções teóricas a cerca da temática, me dedicando a conhecer os
modos como as crianças estabelecem relações com as mídias, produzem e
reproduzem culturas a partir dos conteúdos midiáticos e, para finalizar, algumas
reflexões referentes à pesquisa na seção intitulada “Considerações finas”.
9
2 PERCURSO METODOLÓGICOS DA PESQUISA
Durante a minha caminhada como acadêmica do Curso de Graduação em
Pedagogia, no Centro Universitário Municipal de São José, tive a chance de
conhecer e estudar diversos autores e temáticas. Entre os mais variados temas, um
especialmente despertou meu interesse. Trata-se de mídias na educação, assunto
com o qual tive o primeiro contato na 6ª fase do curso, na disciplina de Educação,
Mídias e Tecnologia.
Além desse primeiro contato com a temática, percebi a presença de questões
que envolviam as mídias entre as crianças pequenas no Estágio Curricular de
Educação Infantil, realizado na 6ª fase do curso de Pedagogia. Na 7ª fase do curso,
elaborei meu projeto de pesquisa sob o título “O imaginário infantil e as Mídias”, sob
a orientação da Professora Andréa Simões Rivero, na disciplina de Trabalho de
Conclusão de Curso I (TCC I). Nesse período, foram definidos os objetivos, a
metodologia e o cronograma da pesquisa, e teve início a revisão de literatura.
Minha investigação iniciou com a construção deste projeto, quando se fez
necessária a revisão de literatura, com a intenção de conhecer melhor os estudos já
realizados sobre o tema. Desse modo, foi preciso uma etapa exploratória, assim
definida por Agostinho (2008, p. 10): “[...] como um exercício de problematização,
rigor analítico e inventividade, em que se podem descortinar nos momentos
preliminares da elaboração do conhecimento científico importantes contributos”.
Na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II ( TCC II), realizada na 8ª
fase do curso de pedagogia, dei continuidade à investigação iniciada na fase
anterior, cujo percurso detalharei a seguir.
Este estudo tem o objetivo de analisar as relações entre o imaginário infantil e
as mídias eletrônicas em um contexto de Educação Infantil. Os objetivos que
conduziram o meu olhar durante as observações foram os seguintes: identificar
quais equipamentos de mídia as crianças possuem em casa e as condições de
acesso aos mesmos; identificar as mídias preferidas pelas crianças e conhecer os
modos como elas estabelecem relações com as mesmas e produzem e reproduzem
culturas a partir dos conteúdos midiáticos.
10
A pesquisa é de cunho qualitativo, pois a intenção é aproximar-se dos
significados do repertório midiático para as crianças no contexto de Educação
Infantil, e o modo como se evidencia em suas experiências. Segundo Barros (2000,
p. 02), “A pesquisa qualitativa tem como objetivos a observação, a descrição, a
compreensão e o significado”.
Para a obtenção de indícios acerca do repertório midiático das crianças,
realizou-se observação participante e registros das situações cotidianas através de
fotografias, filmagens, gravações, anotações, com o intuito de conhecer melhor os
sujeitos da pesquisa e suas relações com os repertórios da mídia. Segundo Edwards
e Gandini (2002, p. 152), “É necessário que registremos tudo o que vimos e
ouvimos, elaborando registros significativos das nossas observações. Podemos
fazer anotações rápidas [..] gravar em fitas cassete, [...] podemos tirar fotos”. De
acordo com Edwards e Gandini (2002, p. 150);
Na educação infantil, quando documentamos algo, estamos deliberadamente optando por observar e registrar os acontecimentos em nosso ambiente a fim de pensar e comunicar as surpreendentes descobertas do cotidiano das crianças e dos extraordinários acontecimentos que ocorrem nos lugares em que elas são educadas.
Com a escolha da temática, a revisão teórica iniciada e com o projeto
concluído, foi preciso buscar um campo para a minha pesquisa. Havia pensado
numa instituição de Educação Infantil, em que havia um Projeto de Extensão
denominado “Espaço Multimídia Infantil”; porém, após contato com a Secretaria
Municipal de Educação de Florianópolis, fui informada que esse projeto estava
encerrado. Começou, aí, a minha busca por outra instituição.
Moro no bairro de Itacorubi, Florianópolis defronte a uma instituição de
Educação Infantil, pertencente à Rede Municipal de Educação de Florianópolis.
Considerando que essa proximidade contribuiria para a realização das idas a
campo, entrei em contato com a Gerência de Formação Permanente da Secretaria
Municipal de Educação de Florianópolis e demonstrei interesse em realizar a
pesquisa nessa instituição. A Gerência fez um contato com a creche, apresentando
o projeto e, após a análise, a Gerência entrou em contato comigo, informando que a
pesquisa poderia ser realizada naquela instituição.
11
Como já mencionei, a referida creche está localizada no bairro Itacorubi,
município de Florianópolis/SC, a instituição está situada numa área residencial, que
possui comércios de pequeno porte, centro municipal de saúde, igreja.
A instituição, foi inaugurada em abril de 1987, com o nome de Creche do
Itacorubi. Durante o ano de 1999, passou por uma reforma e ampliação durante a
qual o nome da instituição foi modificado para Creche Joaquina Maria Peres.
Atualmente, atende cerca de 140 crianças de zero a seis anos de idade, distribuídas
em sete grupos, atendendo em meio período e/ou período integral. A instituição
possui oito professores e 14 auxiliares de sala, sendo que em cada grupo, há um
professor, e um auxiliar de sala, responsáveis pelas crianças.
Após a oficialização da aceitação da pesquisa, entrei em contato com a
creche e marquei uma reunião para o dia 10 de março de 2011, com a supervisora.
Neste dia, apresentei minha temática, objetivos e metodologia, e expliquei os
motivos que me levaram a fazer esta pesquisa. A supervisora chamou os
professores que atendem o GV, faixa etária entre quatro e cinco, a qual pretendia
fazer a pesquisa. Apresentei também o meu projeto para a professora e para o
auxiliar, os quais demonstraram interesse pela pesquisa, pediram alguns
esclarecimentos e fizeram algumas contribuições sobre o meu tema.
Após a apresentação do projeto, acertamos os dias em que observaria o
grupo e, decidiu-se que as idas a campo ocorreriam duas vezes por semana.
Definimos, então, que começaria no dia 17 de março de 2011. É importante
mencionar que, desde o início, toda a equipe da instituição foi muito atenciosa,
possibilitando que eu me sentisse muito acolhida.
Nesse primeiro dia, antes de eu ir embora, a supervisora me apresentou toda
a instituição, a qual possui duas áreas externas, uma na frente da creche e outra
atrás. Na frente há uma casa de bonecas, um parque e uma árvore maravilhosa,
com uma corda pendurada. Durante as minhas idas a campo, percebi que as
crianças brincavam em cima da árvore, e adoravam ficar penduradas na corda,
sempre acompanhadas por um adulto.
A área aberta, na parte de trás da creche, é um espaço muito grande, cuja
metade é de areia e a outra de grama; neste espaço há outra árvore muito grande
que proporciona uma sombra ótima. Nessa área também há um parque infantil com
balanços, gangorras, escorregadores, etc.
12
Na área interna da creche, na entrada, existe uma sala de espera, com uma
televisão, DVD, sofás, pufs e tapetes, espaço bastante usado pelas crianças
enquanto aguardam ser chamadas para o almoço. Esta refeição acontece sempre
no refeitório, que fica ao lado dessa sala de espera. Há também a sala da diretora e
outra sala para a coordenação pedagógica. Nas salas das crianças, as janelas são
bem grandes com uma altura mediana. Os banheiros são comuns a cada duas salas
sendo assim dois grupos utilizam o mesmo banheiro há pias, vasos sanitários em
tamanho pequenos e espelhos baixos.
O grupo, com o qual realizei a pesquisa, é constituído de 28 crianças, sendo
15 meninos e 13 meninas. Permanecem na creche em período integral 26 crianças e
somente duas crianças ficam apenas no período vespertino, sendo assim observei
um grupo de 26 crianças. A faixa etária do grupo varia entre quatro e cinco anos,
sendo que quase todas as crianças completam cinco anos até o segundo semestre.
No GV, há uma professora que tem uma carga horária de 40 horas semanais,
um auxiliar que trabalha de 30 horas semanais. O auxiliar permanece na instituição
no período matutino e no período oposto uma outra profissional assume o grupo.
A sala do GV possui cinco mesas, em altura proporcional a das crianças,
organizadas de formas diversas, dependendo da atividade proposta a cada dia.
Possui também um armário onde é guardado o material para atividades, uma mesa
onde fica um bebedouro e, ao lado, canecas com as fotos das crianças, identificando
cada uma delas, para que possam beber água em recipiente individual. Há também
uma estante para guardar os brinquedos, e dois cestos que também são utilizados
para tal finalidade. Uma televisão e um aparelho DVD encontram-se fixados na
parede.
Foram realizadas 10 observações participantes, durante os meses de março e
abril de 2011, sempre no período matutino, com duração aproximada de quatro
horas por dia, de modo a conhecer o repertório midiático das crianças, e o modo
como se evidencia no imaginário e nas experiências infantis. Essa observação
proporcionou-me momentos de aproximação com as crianças, como Ferreira (2003,
p. 158) comenta:
Só assim seria possível compreender por <<dentro>> os seus modos de pensar, a sua racionalidade, o significado de símbolos e valores, as regras e princípios de acção constitutivos da sua cultura infantil, as relações sociais que lhe subjazem e as sociabilidades que as desafiam que, de outro modo, me estariam completamente vedadas.
13
Nas observações procurei me inserir na rotina do grupo, ri, brinquei, cuidei,
me emocionei, conversei, participei das atividades propostas pelos professores.
Envolvendo-me dessa forma, consegui criar um vínculo com o grupo e compreender
a rotina da instituição. De acordo com Meksenas (2002, p. 117),
Por isso, ao mesmo tempo em que o investigador deve interagir com o contexto de pesquisa e notar as possibilidades desse seu envolvimento – propiciadas pela observação participante –, deve também saber colocar-se como um estranho, como um viajante, que sabe observar coisas que as pessoas observadas não conseguem ver, dada a imersão total dessas pessoas na cultura em análise.
Além das observações realizei conversas informais com as crianças, sem
seguir um roteiro pré-definido, pois segundo Oliveira (2001, p. 35):
As conversas, sem a tensão que pode ser desencadeada nas crianças pelo fato de ficarem preocupadas em responder corretamente aos questionamentos de seu entrevistador, propiciaram colher junto ao grupo investigado a sua forma própria de expressar-se, de entender o mundo que o cerca e que, [...], é diferente da lógica do adulto.
Aos pais foi encaminhado um questionário1, visando identificar a presença
das mídias no cotidiano das crianças, os equipamentos de mídia disponibilizados às
crianças em casa e, que conteúdos midiáticos, na visão dos pais, são os preferidos
das crianças. Ao todo, 12 questionários foram respondidos. Segundo Munarim
(2007, p. 8),
Afinal, como interpretar o que é ser criança sem levar em conta o contexto do qual ela faz parte (a rotina da família em suas novas configurações, a ida à escola, o preenchimento do tempo com atividades extra-classe), além de considerar que um grande número de crianças atualmente passa boa parte de seu tempo assistindo televisão, na frente do computador, ou jogando vídeo game?
Ressalto que embora eu tenha a autorização das famílias das crianças para a
utilização de registros escritos, fotográficos e fílmicos, de modo a preservar a
identidade das crianças, decidi atribuir-lhes nomes fictícios.
1 O questionário encontra-se no Apêndice-B, localizado na página 51.
14
Realizar pesquisa com crianças requer muito cuidado e ética, pois é
necessário compreender as crianças nas suas singularidades, como afirmam
Batista, Cerisara, Oliveira e Rivero (2004, p. 4):
Compreendê-las na sua singularidades, nas suas diversidades, nos seus jeitos de ser, exige que nós encontremos formas de aproximação aos universos infantis presentes em nossas instituições, considerando que esses universos são compostos por todas as dimensões do humano, por todas as formas de produção e manifestações culturais.
É preciso que as crianças sejam ouvidas, como forma de ampliar a
compreensão das culturas infantis e, consequentemente, estabelecer relações com
as produções das crianças, valorizando-as. Segundo Rocha (2008, p. 5),
[...] auscultar as crianças implica o sentido de reconsideração de seu espaço social, ou seja, “ouvi-las” interessa ao pesquisador e ao educador como forma de conhecer e ampliar sua compreensão sobre as culturas infantis – não só como fonte de orientação para a ação, mas sobretudo como forma de estabelecer uma permanente relação comunicativa – de diálogo intercultural – no sentido de uma relação que se dá entre sujeitos que ocupam diferentes lugares sociais.
Em meu primeiro dia de observação, fui muito bem recebida. Assim que entrei
na sala, as crianças estavam em roda cantando várias músicas com a auxiliar de
ensino, pois o auxiliar da sala não havia chegado e a professora da sala, após me
apresentar para o grupo, apenas fazendo referencia ao meu nome, teve que se
retirar para uma reunião com a diretora. A auxiliar de ensino fez uma pausa durante
as cantigas e me apresentou novamente às crianças, como uma pessoa que vai
observar o grupo por alguns dias. Então me apresentei dando bom dia e falando
meu nome, as crianças demonstraram timidez, olhares curiosos, algum
estranhamento, mas depois pareceram ficar a vontade e logo já entrei na roda,
cantando as músicas. Naquele exato momento, tive a sensação maravilhosa de ser
professora, aqueles olhares brilhantes com vontade de saber as músicas e fazendo
o maior esforço para fazer a coreografia que nós mostrávamos.
Destaco o artigo de Ferreira (2003, p. 154) em que ela conta o seu contato
com as crianças enquanto pesquisadora:
[...] as crianças apenas me concederam olhares furtivos, que esboçados disfarçadamente, de revés, ou subitamente desviados quando surpreendidos por mim, se mantêm apesar da proximidade física e circunstancial em que nos encontramos, “silenciosos”; nem um gesto, nem
15
uma palavra. É no confronto com esses “não” olhares, não sabendo ainda como os interpretar, que é sentida a primeira perplexidade: seriam de ausência de interesse ou de tímida curiosidade face à minha presença?
No decorrer das observações, me senti realmente fazendo, parte daquele
grupo; algumas crianças me chamavam pelo nome e outras me chamavam
professora. Em muitos momentos fui chamada pelas crianças para fazer parte das
brincadeiras, criando assim um vínculo com elas. Sempre ao final das observações
me despedia delas, e escutava a pergunta – amanhã você vem? Eu dizia que só
voltaria depois de alguns dias, as crianças ficavam tristes, mas entendiam e vinham
me beijar e abraçar se despedindo.
No dia 05 de maio de 2011, fui até a creche me despedir das crianças. Passei
a manhã brincando, conversando, e rindo com o grupo; no final, sentei em roda com
elas e expliquei que não íamos nos ver mais, pois a minha pesquisa havia acabado,
mas que voltaria algum dia para ficar com elas, pois moro em frente à instituição, o
que facilita visitas à creche. Percebi suas carinhas tristes, senti que realmente fiz
parte daquele grupo, deixando nele um sentimento de saudade. Não demorou muito,
falei que teria uma surpresa para todos: fiz uma apresentação em slides com as
fotos e uma música de fundo da cantora Shakira “This Time For Africa”, música
escolhida pelas crianças numa apresentação que fizeram para o grupo da creche. A
reação das crianças foi espontânea, com muitas risadas e comentários sobre suas
fotos e de seus colegas.
Enquanto pesquisadora, procurei ser ética nas relações com os sujeitos de
pesquisa para alcançar os objetivos apresentados. Busquei compreender as
experiências culturais das crianças no contexto de uma instituição de Educação
Infantil, com a intenção de ampliar a compreensão sobre os modos como as
crianças se relacionam com a mídia. É o que pretendo apresentar na seção a seguir,
nas análises dos registros obtidos durante esta pesquisa.
16
3 ANÁLISES E REVISÃO DE LITERATURA
As meninas e os meninos do Brasil Tão querendo falar tanto pela tela e pelo fio
Tão buscando a sua cara Tão querendo se ver grandes
No retrato que a TV coloriu. A TV, as revistinhas, a internet
O CD e as figurinhas do chiclete A imagem que é viagem num tapete voador
No retrato que o artista iluminou Tantos cantos pros encontros
Com o brinquedo Com o segredo
Com a magia Tantos cantos pros encontros
Com a Cidade O nó na rede
E a poesia Liga-liga-liga
Toca-salva-clica Passa-passa-passa
Passará. Qual é o teu e-mail? Fim, começo e meio Um meio por inteiro
Pras crianças de qualquer lugar Um sítio neste site para a gente se encontrar
Um plug brasileiro pra crianças de todos os cantos Um meio por inteiro pras crianças de dois mil e tantos.
2
Nesta seção, analisarei o material empírico da pesquisa, obtido por meio de
registros fotográficos, escritos e gravados em áudio, oriundos de observações
participantes realizadas junto ao grupo de criança com idades de quatro e cinco
anos de idade, bem como a partir de informações, as quais tive acesso através de
questionário enviado às famílias e conversas informais com as profissionais.
Procuro, ainda, contemplar as questões indicadas nos objetivos da pesquisa,
que conduziram meu olhar durante as observações. Conforme mencionei na
metodologia, pretendo analisar as relações entre o imaginário infantil e as mídias
eletrônicas em um contexto de Educação Infantil. Para tanto, procurei conhecer os
modos como as crianças estabelecem relações com as mídias, produzem e
reproduzem culturas a partir dos conteúdos midiáticos, identificar os equipamentos
2 Canção tema das jornadas Mídia e Imaginário Infantil, publicada no livro Liga, roda, clica: Estudos em mídia, cultura e infância, São Paulo: Papirus, 2008.
17
de mídia que as crianças possuem em casa e as condições de acesso aos mesmos,
e verificar quais as mídias preferidas pelas crianças.
3.1 INFÂNCIA, IMAGINÁRIO E MÍDIAS
Conhecer a criança é pensá-la como um ser social determinado historicamente. Conhecer a criança é pensá-la num tempo e num espaço interagindo dinamicamente, influenciando e sendo influenciada. Conhecer a criança é pensá-la como um ser de relações que ocorrem no nível da família, da sociedade, da comunidade.
Elza Dias Pacheco
As crianças vêm se destacando e ganhando reconhecimento social como
indivíduos socialmente ativos. Conforme o Referencial Curricular Nacional para a
Educação Infantil (1998, p. 21), a concepção de criança é "[...] uma noção
historicamente construída e consequentemente vem mudando ao longo dos tempos,
não se apresentando de forma homogênea nem mesmo no interior de uma mesma
sociedade e época".
O Parecer 20/2009 (p. 6) sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil define a criança como:
[...] sujeito histórico e de direitos que se desenvolve nas interações, relações e práticas cotidianas a ela disponibilizadas e por ela estabelecidas com adultos e crianças de diferentes idades nos grupos e contextos culturais nos quais se insere. Nessas condições ela faz amizades, brinca com água ou terra, faz-de-conta, deseja, aprende, observa, conversa, experimenta, questiona, constrói sentidos sobre o mundo e suas identidades pessoal e coletiva, produzindo cultura [...].
Deste modo, é indispensável entender as crianças como produtoras de
culturas, e não apenas como seres em desenvolvimento, cujas fases iniciais da vida
são inferiores ou menos importantes que a fase adulta.
Buckingham (2007, p. 19), demonstra como os significados de infância são
variáveis, histórica, cultural e socialmente.
18
As crianças são vistas – e vêem a si mesmas – de formas muito diversas em diferentes períodos históricos, em diferentes culturas e em diferentes grupos sociais. Mais que isso: mesmo essas definições não são fixas. O significado de ‘infância’ está sujeito a um constante processo de luta e negociação, tanto no discurso público (por exemplo, na mídia, na academia ou nas políticas públicas) como nas relações pessoais, entre colegas e familiares.
Quando se procura a valorização da criança como um sujeito ativo em um
grupo social, é preciso compreender que cada criança possui suas particularidades,
sua história social e cultural, experiências próprias. Assim sendo, é imprescindível
saber que cada criança seja considerada a partir das relações com o contexto
histórico e cultural em que está inserida, cada uma com suas particularidades.
Para que as crianças sejam valorizadas nessa fase da vida, é preciso romper
com uma visão adultocêntrica, construindo um olhar sensível em relação a elas.
Esse termo, segundo Gobbi (apud BATISTA et al, 2004, p. 2) remete a:
[...] outro termo bastante utilizado na Antropologia: o etnocentrismo: uma visão de mundo segundo a qual o grupo ao qual pertencemos é tomado como centro de tudo e os outros são olhados segundo nossos valores, criando-se um modelo que serve de parâmetro para qualquer comparação [...].
Perrotti (1990, p. 14) partilha da mesma idéia que Buckingham (2007), no que
se refere à constituição da criança e suas relações com o ambiente histórico, social
e cultural:
[...] o ser criança não pode ser entendido apenas como um feixe de características naturais em desenvolvimento no tempo. Antes, tem de ser visto como um corpo complexo, sujeito a condições históricas e, por isso, variável. Se é verdade, ao menos em princípio, que todas as crianças crescem, é verdade, também, que a direção desse crescimento estará em relação com o ambiente sócio-cultural. (PERROTTI, 1990, p. 14).
As crianças constroem suas culturas a partir das referências que lhes são
apresentadas, contudo a produção cultural infantil não é homogênea.
[...] a cultura infantil é uma rede de significados gestados no interior das relações entre as crianças e se consolida mediante a ressignificação, a reprodução, a produção de vivências socioculturais. Essa cultura tem a diversidade como característica – pois existem culturas infantis e não uma cultura infantil única – e a relação entre a realidade e a fantasia. (COUTINHO, 2002, p. 111).
19
Brougère (apud GIRARDELLO 2010, p. 34), explicita que, na cultura infantil,
“existe um espaço público no qual elas elaboram uma cultura comum, lugar de
apropriação e de circulação de elementos que vem de fontes bem diferentes”, como
a família, a escola, e também as mídias. “Nessa rede complexa”, acrescenta, “as
crianças produzem sua cultura na relação com o grupo”.
Neste mesmo texto, a autora faz referência à cultura de pares e às
descobertas em ambientes digitais: “[...] é preciso que ouçamos também as crianças,
que demos atenção às descobertas culturais que elas fazem nos ambientes digitais,
as vezes por conta própria e muito freqüentemente a partir das culturas de pares a
que pertencem”. (GIRARDELLO, 2010, p. 41).
Girardello (2010, p. 31) ainda vem nos explicar que:
O estímulo imaginativo surge não só no contato com o que pode ser tocado ou percebido – como o calor do fogo, a viscosidade da lama – mas também na experiência do incomensurável (a multidão de estrelas no céu, de grãos de areia na praia, o poder das tempestades, o tamanho do mar). E o assombro diante dos elementos e da infinita multiplicidade da natureza, a emoção estética do encontro com a profundidade absoluta ou mesmo com a ausência de um fundo.
Buckingham (2007, p. 8) afirma que a infância, nas sociedades
contemporâneas, está sendo definida através da relação das crianças com as
mídias eletrônicas; contudo, o autor não coloca a mídia como a “causa única” destas
mudanças, pois entende que, “[...] a infância é uma construção social, que assume
diferentes formas em diferentes contextos históricos, sociais e culturais”.
No bojo deste trabalho, entendo necessário conceituar mídia. A partir de
estudos realizados compreendo mídia como um veículo de comunicação utilizado
por organizações para propagar e divulgar informações e conteúdos diversos, com
objetivo de atingir um determinado público.
Segundo Betti e Pires (2005, s/n),
A palavra “mídia” origina-se do latim media, plural de medium, que significa “meio”. Inevitavelmente encontra-se associada à “comunicação” – a mídia refere-se aos meios de comunicação, no sentido de comunicação humana mediada por algum aparato. Com o advento do jornal, depois do rádio, “da internet”, do cinema e da televisão - meios em que um número relativamente pequeno de pessoas emite suas mensagens para um número relativamente grande de pessoas, vistas como um público homogêneo de receptores - fala-se em meios de comunicação de massa.
20
Orofino (2008, p. 122), refere-se à escola como um ponto de “apropriação” da
mídia:
O conteúdo midiático a que as crianças e os adolescentes têm acesso é trocado, debatido, discutido, confrontando em inúmeras experiências no cotidiano da escola, seja no pátio, na cantina, nos corredores, ou mesmo do lado de fora dos muros, nas calçadas, antes e depois da aula. A mediação escolar é aquela ação institucional planejada de modo participativo pelos professores a fim de que a escola tenha um espaço formal para que o debate sobre a mídia possa ocorrer de forma sistematizada, para além das mediações que informalmente já ocorrem no cenário escolar.
Dentro os diversos perfis de público existentes, o público infantil destaca-se,
pois os profissionais da área descobriram o grande potencial e o retorno que esse
público oferece.
A mídia para Orofino (2005, p. 49) tornou-se,
[...] um dos mais poderosos setores da indústria contemporânea [...], a comunicação tornou-se, portanto, um campo poderoso de controle, manipulação, acumulação e expansão de desejos e valores pautados pelos interesses do mercado e não da sociedade civil [...].
Percebo que antigamente a mídia era voltada para os pais, e atualmente o
maior foco é nas crianças, com o objetivo de que elas façam suas escolhas e as
imponham aos pais.
De acordo com Camurra e Teruya (2008, p. 2),
Atualmente, podemos notar o aumento significativo da quantidade e tipos específicos de propagandas que falam diretamente ao público infantil. Este é tratado como cliente consumidor de mercadorias. As peças publicitárias mostram produtos e difundem conceitos para vender idéias, estilos de comportamento e modos de viver. Mais do que convencer do que é bom e necessário, o propósito é fazer crer em certos valores.
Conhecendo bem o público a ser alcançado, profissionais selecionam a mídia
desejada para ter um maior impacto sobre seu consumidor, determinado por perfil,
classe social, idade, região, etc.
Para Coutinho e Quartiero (2009, p. 57),
Ao elaborar programas para serem divulgados em veículos de comunicação de massa (cinema, televisão, internet) diretores, produtores e roteiristas, espelham, com mais ou menos consciência, um público específico que desejam atingir, cujo perfil geral acreditam conhecer.
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De acordo com um dos meus objetivos, procurei obter inicialmente, através de
questionário encaminhado às famílias das crianças, informações referentes aos
equipamentos de mídia existentes em suas casas. De um total de 26 questionários
enviados às famílias, 12 questionários foram respondidos pelos pais ou
responsáveis pelas crianças.
Apresento, abaixo, em formato de tabela, os dados obtidos a partir dos
questionários respondidos, montada com a finalidade de proporcionar uma melhor
visualização dos resultados:
Tabela 1: Equipamentos de mídia que as crianças possuem em casa.
Aparelho de televisão 100%
DVD 83,33%
Aparelhos de música 75%
Câmera fotográfica ou filmadora 58,33%
Vídeo 41,67%
Computador 41,67%
Videogame 41,67%
Fonte: elaborado pela acadêmica, 2011.
Como se pode verificar na tabela, a televisão é o equipamento de mídia que
está presente em todas as casas. Esse dado nos conduz a pensar sobre a grande
influência que os conteúdos televisivos podem exercer no imaginário das crianças,
contudo, a esse respeito é interessante refletirmos sobre a visão apresentada por
Girardello (2008, p. 132):
[...] a televisão – como um meio – por si só não é prejudicial à imaginação da criança. Seus efeitos perniciosos ou benéficos dependem de seus conteúdos e linguagens, do contexto da recepção e da qualidade geral da vida da criança – física, afetiva e poética – não podendo ser isolados dos demais processos socioculturais.
No mesmo questionário enviado às famílias, perguntei sobre os equipamentos
de mídias preferidos pelas crianças. Percebi que a maioria das respostas à essa
questão retornou em branco. Então resolvi fazer essa pergunta diretamente para as
crianças, não em forma de entrevista, mas fui conversando e perguntando,
22
informalmente, para aquelas crianças que estavam perto de mim, individualmente.
Contudo, não foi possível conversar com todas as crianças, pois, esse dia uma das
profissionais - a auxiliar – estava ausente, além disso a situação estava tumultuada
porque profissionais da área da saúde estavam prestando atendimento às crianças.
Perguntava o seguinte: - Quê coisas de ligar na tomada, você tem em casa e
de qual você gosta mais? Algumas crianças não entendiam a minha pergunta, então
explicava de outra forma, outras entendiam e já se manifestavam, apresento aqui as
respostas:
Paulo: “É do Ben 10 meu computador”, “Eu gosto do bakugan”; Barbara: “Eu gosto do jornal que passa na televisão”; Laura: “Eu gosto de tudo”; Pedro: “Gosto de videogame”; Larissa: “Vê DVD”; Lucas: “De videogame”; Juliana: “Vê DVD”; Leandro: “Goto de ir na internet, poque é legal”; Eduardo: “De televisão”; Bruna: “De videogame”; Jaqueline: “De notbot”; Laura: “Eu também de notbot”.
(Diário de campo, 05.05.2011)
Os pais de algumas dessas crianças a que me refiro acima, não devolveram o
questionário, porém aqueles que devolveram, evidenciaram que o acesso das
crianças aos equipamentos de mídia ocorre na companhia de algum adulto,
geralmente no período noturno.
Das 11 crianças com quem conversei, obtive o questionário devolvido e
respondido de apenas seis. Outra questão que me chamou a atenção, durante essa
conversa e mesmo em outras observações, foi que apesar de não terem
determinado aparelho de mídia em casa, o mesmo foi indicado como o seu
preferido. Duas crianças manifestaram-se nesse sentido e ainda outra criança, cujos
pais não responderam ao questionário, afirmou não ter computador em casa, mas
explicou que aprendeu a utilizá-lo na “lan house” do irmão.
Como se pode observar na tabela dos equipamentos que as crianças
possuem em casa, o computador e o videogame são menos presentes nas casas,
contudo, na conversa com as crianças o computador se destaca como o preferido.
Há uma série de produtos comercializados, a partir de desenhos animados e
filmes infantis. Desde a primeira observação, percebi que a maioria das mochilas,
roupas, calçados das crianças estavam relacionadas com algum personagem de
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desenho animado ou filmes como Ben 10, Barbie, Rebeldes, Hot Wheels, Batman,
Homem Aranha, etc.:
Figura 1: Mochilas das crianças com personagens de filmes e desenhos animados
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo, 21.03.2011)
Em uma das observações, registradas no meu diário de campo, fica evidente
como a relação entre as crianças e o repertório midiático (que provoca sua
imaginação), é permeada pelas questões que envolvem o consumo de
determinados produtos:
Me aproximo de algumas meninas que estavam brincando na frente do espelho, percebo que Letícia3 usa uma escova de cabelo, como se fosse um microfone, vejo que ela está apresentando as meninas que desfilam na frente do espelho. Letícia percebe que as estou observando, me mostra sua sandália e me diz: - É da Hello, ele muda de cor. (referindo-se a Hello Kitty) - É? E quem que comprou? – pergunto - Vi na popaganda e quis compá4, responde Letícia Vou até Jaqueline e Laura e pergunto para elas se gostam de computador. - Adoro mexer no computador, mas minha mãe não deixa, aí quando ela tá domindo eu mexo – me responde Jaqueline. - Eu gosto de mexer no computador. – responde Laura - E você tem computador em casa? – pergunto - Não, mas aprendi a mexer na lan house do meu imão. Eduardo aproxima-se de mim e diz que a mãe dele vai comprar uma cama do Super Homem, Ben 10 e do Batman.
(Diário de campo 21.03.2011)
3 Conforme afirmei na seção sobre o percurso metodológico da pesquisa, ressalto que embora eu tenha a autorização das famílias das crianças para a utilização de registros escritos, fotográficos e fílmicos, de modo a preservar a identidade das crianças, decidi atribuir-lhes nomes fictícios. 4 Optei por transcrever as falas das crianças do modo mais fidedigno possível, com a intenção de respeitar e valorizar o modo como elas se expressam, por isso, algumas palavras não apresentam a escrita correta do ponto de vista ortográfico.
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A respeito das relações entre esses personagens e a comercialização de
produtos, Ruth Sabat (2002), em sua pesquisa referente à heterossexualidade em
filmes longa-metragem infantis de animação dos estúdios Disney, considera que;
A proliferação de imagens chega ao sistema educacional através das mais diferentes formas, sendo que uma das mais eficientes se dá por meio das personagens criadas para desenhos e filmes infantis de animação. O conjunto de produtos comercializados em função de determinadas personagens faz delas um tema bastante popular nas escolas e nas salas de aula, trazendo um vocabulário próprio, permeando as brincadeiras entre as crianças, sugerindo modos de ser, reforçando antigos saberes ou divulgando novos. (SABAT, 2002, p. 9, grifo nosso).
Girardello (2008, p. 133), destaca que “A cultura das mídias [...] assume um
papel cada vez mais importante nesse processo, até porque ela permeia as demais
situações - familiares, escolares e sociais - por onde a criança transita”. Ainda sobre
isso, Fischer (2002, p. 153) ressalta “[...] torna-se impossível fechar os olhos e
negar-se a ver que os espaços da mídia constituem-se também como lugares de
formação – ao lado da escola, da família, das instituições religiosas”.
Outra situação comum, percebida ao longo das observações junto às
crianças, envolveu brinquedos que têm alguma vinculação com desenhos animados,
Eduardo está brincando, quando um carrinho chama sua atenção, pergunto que carrinho é aquele, logo Eduardo responde: - É do Ben10. Nesse instante Lucas pega o tal carrinho e mostra para Paulo: - Olha é do Ben 10 (com uma expressão de quem está surpreso) Paulo olha para o brinquedo, sorri e sai para outro lugar da sala. Lucas, vendo que Paulo não dá muita importância, deixa o carrinho de lado e vai para outro canto da sala.
(Diário de Campo 24.03.2011)
Na situação acima, podemos perceber que Lucas se aproxima de Paulo para
mostrar o carrinho que atrai sua atenção ser de um personagem de desenho
animado. Os pais de Lucas não responderam ao questionário5, mas em outras
observações percebi que o personagem do Ben 10 estava sempre presente em suas
brincadeiras. Mesmo que os meninos não tenham iniciado uma brincadeira, a partir
da fala de Lucas, o brinquedo promoveu uma interação entre as crianças.
Entretanto, pelo fato de Paulo não demonstrar interesse naquele momento pelo
brinquedo, talvez Lucas também não tenha se interessado em brincar. Durante as
5 O questionário está na seção de apêndices.
25
observações, em muitas situações, quando se tratava de brincadeiras com
personagens de desenho animado Paulo era uma das crianças que mais contribuía
para a estruturação dessas brincadeiras. Mesmo que nesse momento a brincadeira
não tenha ocorrido, fica claro, para mim, que o brinquedo evocou os saberes e
provocou a imaginação das crianças sobre o personagem Ben 10.
Essa situação indica que, além de despertarem a curiosidade e o interesse
das crianças, esses brinquedos possibilitam a interação e o compartilhamento de
saberes e repertórios entre elas. Brougère (1995, p. 50), faz referência a
brincadeiras, “A televisão transformou a vida e a cultura da criança, as referências
de que ela dispõe. Ela influenciou, particularmente, sua cultura lúdica”.
Na observação a seguir, é possível refletir sobre o fato de as crianças terem
acesso a conteúdos diversos, para além daqueles classificados como adequados ao
público infantil, que estão disponíveis na mídia, mais especificamente na televisão:
A professora propõe que todos se sentem em roda para uma conversa. De repente a professora fala sobre casa. Nesse momento Manuela e Paulo falam juntos: - Ele tá na casa do BBB 11 A professora pergunta se Bianca assiste e ela responde: - Sim, quem tá na casa é a Maria, o Wesley, o Daniel...
(Diário de campo, 28.03.2011)
O Estatuto da Criança e do Adolescente (2010, p. 46), o Art. 76, refere-se ao
direito da criança e do adolescente quanto a programação de rádio e televisão, que
de acordo com o texto legal “[...] somente exibirão, no horário recomendado para o
público infantojuvenil, programas com finalidades educativas, artísticas, culturais e
informativas.”
De acordo com o questionário enviado para a família de Manuela, ela
costuma assistir a desenhos animados, tanto na TV aberta quanto na TV a cabo, no
período da manhã e acompanhada por adultos. Já os pais de Paulo não
responderam ao questionário, mas em conversas informais com ele, percebi que
adora desenhos animados e que geralmente assiste sozinho.
Embora Manuela conte com a companhia de adultos ao assistir TV e Paulo
geralmente não, eles acabam entrando em contato com conteúdos que não
possuem classificação indicativa para crianças.
Diante dessa observação, quero apontar a importância de refletirmos sobre o
fato e as crianças estarem assistindo a conteúdos impróprios para suas idades; com
isso, percebo que a mediação adulta tem um papel fundamental, não só no contexto
26
familiar, mas também no contexto das instituições de Educação Infantil, pois nesses
últimos, as crianças manifestam, frequentemente entre elas, os modos como estão
significando os conteúdos midiáticos.
Segundo Girardello (2010, p. 33),
Se os problemas das cidades modernas fazem com que a vida das crianças tenda ao confinamento físico, podemos discutir até que ponto as mídias digitais reforçam ou atenuam seu confinamento social e cultural, e qual pode ser o papel dos educadores diante disso.
Pesquisas realizadas por Gilka Girardello e Maria Isabel Orofino (2002)6,
revelam que os estudos sobre a relação das crianças mais novas com a mídia ainda
estão “engatinhando” (Girardello, 2008). É mais comum observar esse tipo de
pesquisa sobre mídia com as crianças pequenas no exterior, já no Brasil, os estudos
são recentes, segundo Girardello e Orofino (2002, p. 3),
Na América Latina, os trabalhos com etnografia de audiência infantil realizados por exemplo por Guillermo Orozco são uma referência fundamental. Para enriquecer o diálogo nesse campo, nos concentramos aqui nas contribuições de alguns autores de língua inglesa que, na Inglaterra, na Austrália, nos Estados Unidos e no Havaí vêm pesquisando intensamente a interação das crianças com as mídias nos últimos anos.
Em outra situação, é possível visualizar a importância que uma dessas mídias
- o computador - está assumindo na vida de algumas crianças:
Observo que Paulo estava com um caixa de papelão, dentro dessa caixa colocava várias peças de lego, bonecos, ursos de pelúcia. Pergunto o que ele está fazendo, com uma expressão séria ele diz: Paulo: - Tô jogando tudo fola! Luana: - Por quê? Paulo: - Poque quando eu era piqueno eu bincava disso! Luana: - É agora, você gosta de brincar de quê? Paulo: - Di computador! Tem que jogá tudo isso fola! (Paulo fala com um tom de irritação) Luana: - Mas por quê? Paulo: - Poque não sô mais pequeno! – responde e sai em direção aos colegas.
(Diário de campo, 31.03.2011)
4 A Pesquisa de Recepção com Crianças: Mídia, Cultura e Cotidiano.In: XI Encontro Anual da COMPÓS -Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Comunicação, 2002, Rio de Janeiro.
27
Figura 2: Paulo “jogando fora” os brinquedos com os quais não brinca mais
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo, 31.03.2011)
Tais indicações das crianças exigem nossa atenção à presença e aos
significados das mídias eletrônicas nos processos de constituição das crianças e de
sua infância.
A mídia, em geral, vem ocupando um espaço de destaque nos últimos anos.
Beck apud Sarmento (2002, p. 15) destaca que, o imaginário infantil “[...] tem vindo a
ser profundamente influenciado e constituído pelo mercado de produtos culturais
para a infância, mercado esse que entronca na globalização social e cultural e que
tende a uniformizar pelo gosto crianças de todo o mundo [...]”. Girardello (2008, p.
131), defende a idéia de que a mediação do adulto na relação da criança com a
mídia tem um:
[...] grande diferencial na qualidade imaginativa da experiência da criança com a televisão. A televisão pode mesmo nutrir a imaginação se a experiência for guiada por um adulto que ajude a criança a contextualizá-la, a assistir TV criticamente e a compreender a linguagem do meio, suas riquezas e limitações. Embora o temor quanto à passividade cognitiva das crianças na Internet não seja uma preocupação freqüente em razão do caráter interativo do meio, é evidente que elas não devem ser abandonadas diante do computador como se este fosse a velha babá eletrônica, agora upgraded. Como forma cultural, a Internet precisa se inserir em um contexto rico em muitas outras formas culturais, para que a experiência imaginativa da criança seja o mais plena possível.
28
Girardello (2006, p. 59) afirma também que a atitude dos adultos “[...] no
ambiente em que a criança vive é outro fator de influência sobre a imaginação. O
papel dos adultos como mediadores entre a criança e o ambiente físico e o clima
social criado pela família faz diferença na qualidade da vida imaginativa das
crianças”.
Sarmento (2002, p. 2) vem nos afirmar que “O imaginário infantil constitui uma
das mais estudadas características das formas específicas de relações das crianças
com o mundo. A investigação sobre a imaginação tem sido dominada pelas
correntes teóricas da psicologia”.
Vygotsky (2003, p. 10), define a imaginação como:
[...] base de toda atividade criadora, se manifesta por igual em todos os aspectos da vida cultural, possibilitando a criação artística, cientifica e técnica. Neste sentido, absolutamente tudo o que nos rodeia e tem sido criado pela mão do homem, todo o mundo da cultura, à diferença do mundo da natureza, tudo isso é produto da imaginação e da criação humana, baseado na imaginação.
Durante as observações as crianças deram alguns outros indícios sobre as
relações que estabelecem com os conteúdos veiculados pelas mídias, como mostra
um registro de meu diário de campo.
A professora perguntou se queriam assistir DVD, alguns meninos falaram; - Sim, do Ben 107! Então a professora colocou o DVD do Ben 10, ela comentou comigo que no dia anterior teve aniversário do Rafael e a festa foi do Ben10. Poucas meninas se interessaram pelo filme, e todos os meninos pegaram as cadeiras e as colocaram bem próximo da televisão. Assim que começou o filme os meninos começaram a falar: Roberto diz: - Sou aquele de azul! Lucas diz: - Sou o Ben 10! Leonardo: - Eu sou o Ben 10, o DVD é meu! Eduardo: - Eu sou o Ben 10! Roberto: Eu sou o Ben 10! Eduardo: Não, eu que sou!
7 Ben 10 é uma animação produzida pelos estúdios de Cartoon Network Studios. A série estreou em 27 de dezembro de 2005, é exibida pelo canal aberto, em televisão por assinatura e encontra-se também episódios em DVD. Há duas versões uma em que o Ben, (o protagonista), tem 10 anos de idade e encontra uma cápsula alienígena com um relógio dentro, que caiu do céu, ele abre a cápsula e o aparelho gruda em seu pulso, ele descobre que o aparelho se chama Omnitrix. O aparelho possui DNA de 10 espécies de heróis alienígenas, com os poderes do relógio Ben pode se transformar em qualquer um dos 10 heróis e com isso ajudar a combater os seres alienígenas que querem acabar com o planeta, mesmo tendo essa responsabilidade Ben adora aprontar e se divertir com seu avô e seus amigos. Na segunda versão, Ben 10 força Alienígena, Ben já está com 15 anos de idade e continua usando seu relógio especial para salvar o planeta.
29
Davi F.: Eu sou o meu Ben 10! A professora brinca com os meninos, e diz: - Eu também sou o Ben 10! Todos os meninos dizem: - Ah menininha! Tu não pode ser o Ben 10. Paulo: - Todos os meninos são o Ben 10! Larissa depois de algum tempo, se interessou pelo filme, pegou uma cadeira e colocou na frente, perto dos meninos, não tirava o olho da televisão, quando os meninos estavam falando ela dizia: - Silêncio, não tô ouvindo! Lucas diz para Leonardo: - Tu não é o Ben 10! Leonardo: - Mas eu sou o do meu DVD! Larissa diz: Ah! vocês vão ser tudo e eu? Roberto responde: - Mas todas as meninas são oh! (apontando para a televisão, onde apareceu uma menina) Como ainda havia tempo, fomos ao parque e ficamos na parte onde havia uma árvore enorme e uma sombra maravilhosa. Artur me chama e diz: - Eu sou o Supe Homen, tenho poderes! Gabrielle que estava perto diz: - Eu sou o fantasma! Kelvin: - Eu sou o mestre do fogo! André: - Eu sou o Ben 10, viro rapidinhu! Foram fazendo suas revelações para mim e saiam correndo pelo parque.
( Diário de campo, 14.04.2011)
A situação descrita reforça a idéia de que as crianças fazem uma apropriação
e ressignificação dos conteúdos midiáticos. Em todas as observações percebi essa
apropriação, principalmente em relação ao personagem de desenho animado – Ben
10.
Quando se trata de imaginação, a mídia destaca-se, pois de acordo com
Girardello (2008, p. 132), “as crianças imaginam enquanto vêem televisão, e depois
ainda recriam as imagens da TV no seu faz-de-conta, elaborando-as e fazendo-as
suas”. Martín-Barbero apud Girardello (2008 p. 134), faz referência quanto à
produção cultural “processo produtor de significações e não mera circulação de
informações, no qual o receptor não é um simples decodificador daquilo que o
emissor colocou na mensagem, mas também um produtor”.
Ainda na mesma linha Girardello (2008, p. 132), nos remete à questão de
que:
Ao trazermos essa noção para uma abordagem cultural da televisão e da Internet, poderemos traduzi-la como a necessidade de processos de criação imaginativa coletiva, em que as crianças se apropriem das histórias e imagens das mídias de tanto brincar com elas ao mesmo tempo em que se apropriam das histórias e estéticas produzidas pelas pessoas que vivem a seu redor. Essa brincadeira e essa apropriação passam pela simbolização em que a criança é a agente, quer por meio da palavra, quer por meio das tantas outras linguagens que utiliza. Quanto mais diverso o repertório que receber da cultura e com o qual brincará, menor tenderá a ser o risco de empobrecimento cultural, temido por tantos autores.
30
Esse desejo de fazer de conta que é um desses personagens, cujas imagens
são veiculadas em determinados produtos, esteve presente também, entre as
meninas. Aconteceu em uma situação quando estávamos indo ao parque, Letícia e
Juliana dizem querer ser uma personagem chamada Jolie8:
Letícia levou ao parque dois livros: um para colar figuras e outro com desenhos para pintar (os livros eram da marca Jolie) Letícia pega o álbum. me chama e diz: - Olha eu sou essa! (apontando para uma das figuras, que era uma menina, a Jolie) Juliana apontando para outro desenho, também da boneca Jolie disse: - E eu sou essa! - A minha mãe também vai compá um pa mim! - fala Juliana.
(Diário de campo, 24.03.2011)
O personagem de desenho animado, o Ben 10 já citado, é um menino como
todos os outros, com família, amigos e adora se divertir. Após encontrar uma
cápsula passa a ter um papel importante na sociedade. A boneca Jolie tem um jeito
meigo, há vários modelos da boneca com cabelos loiro, moreno, ruivo, existem
cadernos, mochilas, canetas, folhas com a imagem da boneca Jolie, assim como do
personagem Ben 10. Nas duas situações, parece que todos esses elementos fazem
com que as crianças se identifiquem com os personagens e as suas histórias e
dessa forma não é de se surpreender que as crianças também desejem se
transformar nos personagens e viver suas extraordinárias aventuras.
Desde o início das minhas observações, junto às crianças, pude presenciar
que elas costumavam construir suas narrativas aliando a imaginação aos elementos
dos enredos de desenhos animados. Na maioria das respostas dos questionários
enviados para os pais ou responsáveis, observei que as crianças costumam brincar
com personagens de desenhos animados em suas casas.
Girardello (1999), relaciona a imaginação infantil e a brincadeira com as
histórias da TV na contemporaneidade. A autora afirma que as narrativas dos
desenhos animados têm um papel considerável na constituição do repertório de
brincadeiras das crianças contemporâneas.
8 Jolie é uma boneca fabricada em quatro versões diferentes: loira, morena, castanha e ruiva. Existem no mercado, produtos licenciados contendo a imagem da boneca, entre eles: cadernos, mochilas, canetas, lápis, etc.
31
Os heróis, heroínas e aventuras da TV são usados como matéria-prima da vida de fantasia das crianças. As narrativas da TV funcionam como uma espécie de pré-roteiro para a brincadeira imaginativa das crianças. Isso acontece inclusive durante a própria experiência, já que as crianças brincam e devaneiam com frequência enquanto assistem televisão (GIRARDELLO, 1999, p. 4).
Durante uma de minhas observações, presenciei outra situação que evidencia
a intensidade da presença de elementos das narrativas dos desenhos animados, os
quais são reelaborados e modificados nas brincadeiras criadas pelas crianças.
Observo que Paulo e outros colegas estão correndo pelo parque, me aproximo de Paulo e pergunto do que eles estão brincando. E Paulo responde: - Nós tamo bincando de supeleroi! Eu sou o Huck, ele é o Batman e ele o Homem Alanha! - Atacaaaa! (grita Paulo ao sair correndo). Acompanho Paulo e vejo ele falando para Eduardo (que também estava na brincadeira): - Supeleroi não podi ficar aí, poque a genti é gandi! (referindo-se à gangorra onde Eduardo estava subindo).
(Diário de campo, 24.03.2011)
Figura 3: Meninos brincando de Super-Heróis
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo 24.03.2011)
De acordo com Girardello (1999, p. 2), frente a programas televisivos a
imaginação ganha espaço, pois, “as crianças imaginam enquanto veem televisão, e
depois ainda recriam as imagens da TV no seu faz-de-conta, elaborando-as e
fazendo-as suas”:
A infância é a grande fonte da nossa vitalidade imaginária. É bem verdade que a imaginação é uma faculdade que se desenvolve em um contínuo, ao longo de toda a nossa vida. Mas é também verdade, que a imaginação na infância tem uma sensibilidade especial, que as crianças tendem a se
32
entregar mais livremente à fantasia, e que da plenitude da experiência imaginária na infância depende em boa parte a saúde psicológica na idade adulta. O poder específico da imaginação da criança tem muitas razões: uma das mais singelas é o fato de a imaginação se nutrir de imagens novas, e para a criança o mundo está cheio de imagens novas (GIRARDELLO, 1999, p. 2).
Assim como os desenhos animados estão nos canais abertos e em canais
pagos de televisão, eles também estão presentes em DVD’s. Desde o primeiro dia
de observação até o último, algumas crianças pediam para os professores
colocarem os DVD’s que eles próprios traziam. O diário de campo abaixo evidencia
como estes elementos estão presentes, não apenas do dia-a-dia das crianças em
suas casas, mas também no das creches e escolas.
Após a roda, a professora propõe que eles brinquem na sala, pois o tempo estava fechado e com algumas gotas de chuva, nesse instante Davi dirigiu-se a mim e pediu para colocar o DVD do “Pica-pau e seus amigos”, expliquei para ele que depois poderia colocar, então ele guardou na mochila sem reclamar. Leonardo ao ver o colega pedindo para colocar o DVD, disse: - Eu tenho um DVD do “Bicho vai pegar”. Sabia que também passa na TV?
( Diário de campo, 21.03.2011)
A professora propõe que as crianças brinquem no parque, pois parou de chover e o sol já estava aparecendo, ficamos pouco tempo, pois começou a chover novamente, então a professora sugere que brinquem de jogo da memória, quando termina o jogo Eduardo vem correndo em minha direção e pede novamente para colocar o DVD, já era hora do almoço e naquela manhã não foi possível colocar o DVD.
(Diário de campo, 21.03.2011)
Paulo foi até sua mochila pegou o DVD “A era do Gelo”, a professora disse que não iria colocar, Paulo fez uma cara, como não tivesse gostado da resposta e resmungou: - Então não tago mais! A professora resolveu colocar um DVD de cantigas de roda. Lucas veio com um DVD, “Avatar”, pediu para colocar, a professora mais uma vez não deixou colocar o DVD. Quando o DVD com as cantigas de roda acabou, Eduardo pegou um DVD da sua mochila e pediu para a professora colocar, argumentando que o DVD que estava tocando, já havia terminado. A professora disse que naquele momento não colocaria. Nesse tempo quase todas as crianças já tinham almoçado e escovado os dentes, foram tirando seus sapatos e deitando na cama. A professora colocou o DVD “Palavras Cantadas” enquanto as crianças se acomodavam.
(Diário de campo, 28.03.2011)
Esses trechos demonstram o quanto as crianças se sentem próximas a essa
mídia, e o quanto os professores precisam, no âmbito da formação inicial e em
serviço, discutir, estudar e aprender a lidar com essa ferramenta de mídia, “[...] não
apenas através do controle do adulto para que o DVD seja rodado ou não, mas
33
através de discussões sobre o uso das mídias entre os professores e as crianças.”
(MUNARIM, 2008, p. 40).
A hora do almoço se aproxima e a professora pede que todos guardem seus brinquedos para lavar as mãos e aguardar a hora do almoço. Vamos para o hall do CEI, onde tem algumas almofadas e uma televisão. Vitória senta do meu lado e diz. - Sabia que tenho um monte de Barbi, só que tem que compá mais, poque aquelas tão velhas, poque meu pai achou. Gabriele aproxima-se também e começa a conversar comigo. - Sabia que na minha casa não passa mais desenho no cartoon, só na cultula. - E que desenhos passa na Cultura? – pergunto. - Na cultula passa, cocolicó, castelo ratibun, passa um monte de desenho que eu não si lembo mais. - É esse canal que não passa na minha casa. (mostrando o desenho que estava passando na televisão) - Sabe o que é carnaval? - O que é? – pergunto para Gabriele (mas ela não responde e continua falando). - Então, passou um monte de desenho legal, pingüim, urso panda, um de uma moça que não sei, ah! os esquilos. - Sabia que tenho um laptop de binquedo e um de verdade, sei botar joguinhu, música, só joquinhue música. – Diz Gabriele. - Esse teu caderno vai ficar cheio daqui a pouco, o caderno do meu irmão ta branquinhu porque ele não faz nada na escola.
(Diário de campo, 24.03.2011)
Outra mídia que me pareceu provocar muito a curiosidade e o interesse de
crianças do G5 foi o computador, e isso se evidenciou a partir de uma de suas peças
- o teclado. Na minha quinta ida à instituição, levei dois teclados de computador para
o grupo. Minha intenção não era propor alguma atividade específica, mas sim
apresentar mais uma possibilidade de brincadeira. Percebi que quando entrei na
sala, os teclados já despertaram a curiosidade das crianças, que fizeram algumas
perguntas de imediato:
Quando cheguei na sala Pedro e Paulo, vieram me receber na porta. - O que é isso? – pergunta Pedro - É para vocês brincarem – respondo - Olha é di apeta! (apertando os botões) – diz Pedro As outras crianças continuaram sentadas, e com seus olhares atentos à porta.
(Diário de campo, 31.03.2011)
Na roda, sentei ao lado de Paulo, ele me chamou bem baixinho e disse: - Eu quelo bincá no computador! - Sim, depois da roda vou dar para vocês brincarem. – falo para Paulo -Esse fio dá choque? – pergunta Paulo - Não dá choque não! – respondo - Poque? – pergunta Paulo
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- Porque está desligado, e tem uma capa que protege! (Diário de campo, 31.03.2011)
Como eu tinha apenas dois teclados, a professora do grupo sugeriu colocar
os teclados em cima da mesa e indicou que as crianças deveriam ir de duas em
duas até a mesa para brincar. Eu não fiquei satisfeita com aquele modo de propor a
situação com os teclados, pois como já mencionei, minha intenção não era propor
algo formal ou sistemático para eles. Passaram-se alguns minutos e as próprias
crianças foram se organizando, algumas vezes ficavam em três mexendo no
teclado, outras vezes ficava uma criança no teclado, manuseavam como desejavam,
ora em cima da mesa, ora no chão, em cima da cadeira, e assim eles próprios foram
conduzindo a situação que assumiu um caráter de brincadeira.
No trecho abaixo, localizei que algumas crianças do grupo não têm muita
familiaridade com o computador. Entretanto, foi muito interessante perceber que
viram no objeto a possibilidade de escrever palavras, isto é, de viver uma
experiência com a linguagem escrita.
Larissa pegou o teclado e disse: - Eu vou esqueve um nome! - Um que começa com a leta G! Fez movimentos como estivesse teclando, e me chamou: - Esquevi o meu nome, agola esqueve no teu caderno! - Sabe que nome é? - Não sei, qual é? – pergunto - Não sei! ( Larissa fala sorrindo) - Poque tem númelo? – Larissa pergunta, referindo-se aos números do teclado. - Para apertar e sair o nome na tela! – explico para Larissa - Ah! É para apeta e sai no telefone? - Isso, mas não sai no telefone, sai na tela do computador! – explico - Ah, então vo apeta um numelo! - Sabia que esse botão é de liga e desliga? – Larissa explica para seu colega Larissa - Acho que um desse é para liga e oto pa desliga!
( Diário de campo, 31.03.2011)
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Fotografia 4: Larissa brincando com o teclado
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo, 31.03.2011)
Ainda no mesmo dia em que propus a experiência com os teclados, uma
situação em que duas crianças estavam com um único teclado brincando, me
chamou a atenção, por indicar que o teclado havia contribuído para desencadear
uma nova brincadeira entre eles.
Leonardo permanecia na mesa com o teclado, observei que ele conectou o plug do teclado numa peça de lego. Ele aperta as teclas, como estivesse digitando. O plug saiu do lego, Leonardo viu que o plug tinha caído e falou: - Por isso que não tava funcionando! – conectou o plug e continuou a teclar. - Agola deu! – fala Leonardo
( Diário de campo, 31.03.2011)
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Figura 5: Cabo conectado
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo, 31.03.2011)
Girardello (2008, p. 135), diz que para as crianças, o computador é mais um
brinquedo, pois elas não viveram no mundo sem o computador. “Para as crianças
hoje recém-chegadas ao mundo, que não possuem essa perspectiva histórica, e que
têm acesso fácil ao computador, ele é desde já primordialmente um brinquedo, ou
um espaço onde se brinca”.
Os pais de Leonardo não responderam ao questionário enviado para eles,
mas nessa situação identifiquei que Leonardo tem ou já teve algum contato com
computadores. Ele parece saber que se o cabo do teclado não estiver conectado,
não será possível digitar pois não sairá nenhuma inscrição na tela.
Ao pensarmos no computador como uma possibilidade de brinquedo na vida
das crianças, Brougère (2004, p. 250), nos ajuda a contextualizar a questão:
O brinquedo não é toda a experiência infantil, mas um objeto entre outros, um elemento, e, sem dúvida, não o mais importante, da experiência complexa e multiforme que vivem todas as crianças.[...] Qualquer que seja a sua importância, o brinquedo está inserido numa experiência complexa nunca isolada, acompanhada de discursos diversos, que desembocam em ações heterogêneas.
Neste mesmo dia ainda, lembro-me de uma situação muito curiosa. Como já
mencionei, quando levei os teclados para o grupo, era para apresentar mais uma
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possibilidade de brincadeira e brinquedo para as crianças. Imaginei que usariam o
teclado de diversas formas, mas até o meio da manhã só observei as crianças
brincarem com o teclado de um modo que evidenciava que algumas conheciam o
objeto e sua função de teclado, imaginando telas, mouses e até a tomada.
Bruna e Caroline estavam brincando no meio da sala com algumas peças de
montar e com um dos teclados. Percebo que estavam colocando algumas peças em
cima do teclado e o fio estava encaixado em outra peça de montar.
Perguntei do que elas estavam brincando. Caroline me responde: - De comida! - Quer comer? Respondo que sim e Caroline me dá uma das peças para “comer”, pego, aproximo da minha boca e faço de conta que estou mastigando e digo. - Está muito gostoso! Logo em seguida pergunto: - E o é isso? (aponto para o teclado) - É o fogão, sai fogo e esse (mostrando o cabo do teclado) é a tomada! – responde Caroline.
(Diário de campo, 31.03.2011)
Figura 6: Brincando de Comida
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo, 31.03.2011)
O trecho acima nos mostra como as crianças se apropriam dos suportes
materiais que colocamos a sua disposição, de diferentes formas, criando e recriando
sentidos e significados em suas brincadeiras. Elas fazem isso a partir de objetos, os
quais transformam em:
[...] seus brinquedos, adaptando-os de acordo com sua imaginação, negando a proposta muitas vezes incompreensível de brincadeira dos adultos, criando novos roteiros, novos cenários, novas descobertas. E os elementos disponíveis para que essa experiência aconteça, os espaços, o
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material a ser compartilhado, são de importância fundamental no acesso a certos aspectos da cultura pelas crianças bem como na diversidade de elementos presentes em seu imaginário. (MUNARIM, 2007, p. 59).
Segundo Girardello (2010, p. 34), “Muitos estudiosos da infância
contemporânea já evidenciaram que a produção cultural entre pares também
acontece, e intensamente, no envolvimento das crianças com as mídias digitais”.
Ao levar a câmera fotográfica para as observações, minha intenção era a de
registrar situações que não conseguia captar em toda a sua riqueza com registros
escritos. Afinal, segundo uma frase que vi em um site de uma escola com a
pedagogia Waldorf, “12 fotos valem mais que 12000 palavras”. Assim, fui com a
intenção de usar a câmera apenas como ferramenta de registro para minha
pesquisa, e não como uma possibilidade de brinquedo, como propus o teclado.
Mas a câmera digital chamou a atenção de algumas crianças do grupo, que
em muitas ocasiões pediam para eu tirar fotos delas e, na maioria das vezes, para
que elas tirassem foto de tudo e de todos.
Em uma observação, estávamos todos no parque, e eu estava com a minha
câmera e o caderno de anotações, em um determinado momento resolvi ir à sala,
pois tinha esquecido a caneta. Quando cheguei na sala algumas crianças estavam
brincando:
Patrícia vê que estou segurando a minha câmera e pede para tirar foto das amigas, não precisei explicar em qual botão deveria apertar, pois ela já sabia e já estava tirando fotos. Então Patrícia pede para uma menina que estava na sala, a filha do auxiliar, tirar uma foto de todas. - Apeta o botão gandi! – diz Patrícia para a menina. Ficamos um bom tempo dentro da sala brincando de tirar foto de tudo e de todos. Depois fomos ao parque, pois o restante da turma estava lá. Patrícia muito entusiasmada conta para a professora e alguns colegas que estavam por perto. - Tilei muitas fotos de todos! – diz Patrícia As outras crianças ficam maravilhadas com o que aconteceu, perguntando se ela tirou mesmo sozinha ou eu ajudei. Patrícia conta que foi ela sozinha quem tirou as fotos, me chama e pede para mostrar para todos pelo visor da câmera as fotos que ela tirou.
( Diário de Campo, 24.03.2011)
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Figura 7: Patrícia fotografando suas amigas
Fonte: elaborada pela acadêmica (Diário de campo, 24.03.2011)
Figura 8: Fotografia de autoria de Patrícia
Fonte: elaborada pela acadêmica (Diário de campo, 24.03.2011)
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Figura 9: “Deixa eu ver”
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo, 24.03. 2011)
Figura 10: Patrícia contando sua experiência fotográfica
Fonte: elaborado pela acadêmica (Diário de campo, 24.03.2011)
A experiência com a câmera fotográfica durante as observações foram
riquíssimas, “[...] mostra a importância da participação das crianças enquanto
agentes na pesquisa.” (MUNARIM, 2007, p. 71)
Estava preocupada com o que faria em minha devolutiva para as crianças no
encerramento das observações, mas foi no dia da experiência com as fotografias
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que tive a idéia de fazer uma apresentação com as fotos feitas por mim e pelas
crianças. Na apresentação, coloquei a música da Shakira “This Time For Africa” que,
como já citei, foi escolhida pelas crianças para uma apresentação que fizeram para
o grupo da creche.
A reação das crianças à apresentação foi de uma alegria espontânea, com
muitas risadas e comentários sobre suas fotos e as de seus amigos:
Laura: Olha eu! Patrícia: Olha a Manuela! Paulo: Cadê eu? Luana: Calma, já vai aparecer, tem a foto de todos! Jaqueline: Olha tu Eduardo! Paulo: Ah, eu ali ó!
(Devolutiva, 05.05.2011)
Diante dessa experiência, concordo com o comentário da autora, pois essas
manifestações “[...] trouxeram a possibilidade de novas percepções e interpretações
da realidade, situações e espaços tão importantes mas muitas vezes imperceptíveis
para um adulto desacostumado com os pequenos detalhes do cotidiano”.
(MUNARIM, 2007, p. 71)
Girardello (1999, p. 2) propõe uma interessante reflexão acerca da
imaginação das crianças e de nosso papel em relação à mesma:
[...] parece que dar as melhores condições ao florescimento da imaginação das crianças assume nesse momento um caráter de tarefa histórica premente. A gente precisa preservar a qualidade desse parque de recreio, a pureza da água dessa fonte, a riqueza da "clareira imaginária" como espaço de ensaio e lugar potencial para a liberdade.
De acordo com Buckingham (2007, p. 295),
Não podemos trazer as crianças de volta ao jardim secreto da infância ou encontrar a chave mágica que as manterá para sempre presas entre seus muros. As crianças estão escapando para o grande mundo adulto – um mundo de perigos e oportunidades onde as mídias eletrônicas desempenham um papel cada vez mais importante. Está acabando a era em que podíamos esperar proteger as crianças desse mundo. Precisamos ter a coragem de prepará-las para lidar com ele, compreendê-lo e nele tornar-se participantes ativas por direito próprio.
As mídias enriquecem muito o imaginário de nossas crianças. Não é possível
negar que essas mídias estão cada vez mais presentes, de modo direto ou indireto,
42
nas instituições de Educação Infantil, nas escolas, nas casas, nos espaços públicos
em geral, etc.
Por fim, vejo a necessidade de que nós, professores, procuremos romper com
uma visão ingênua e/ou preconceituosa e nos aproximemos das mídias, munidos de
uma perspectiva curiosa e crítica, a fim de ampliar e contribuir para tornar mais rica e
significativa as relações entre as crianças, o imaginário e as mídias.
43
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa buscou compreender como as crianças se relacionam com as
mídias eletrônicas. Os registros escritos, fotográficos, fílmicos e as gravações em
áudio foram importantíssimos para a realização de meu trabalho, pois sem observar
e registrar as ações das crianças não conseguiria ter acesso a detalhes riquíssimos
de suas experiências, falas e expressões.
A construção de um olhar sensível em direção às crianças e às suas múltiplas
formas de linguagens, sem dúvida contribuíram para uma primeira aproximação das
relações entre o imaginário infantil e as mídias. Por isso, ressalto o quão importantes
foram os momentos de observação e documentação para depois refletir, interpretar
e analisar as situações descritas. Além disso, foi necessário aprender as sutilezas
do processo de aproximação, que possibilitaram a aceitação de minha presença por
parte do grupo de crianças.
Essa experiência, enquanto pesquisadora, causou-me um certo temor, pois
interpretar situações e falas de outros, especialmente de crianças, é um grande
desafio e exige ética e responsabilidade. Muitos sentimentos manifestaram-se:
medo, receio, emoção, curiosidade; muitos questionamentos também: será que vou
ser bem acolhida? Será que vou dar conta? Será que depois irei sentir saudades?
Muitas perguntas foram feitas, e ao longo das observações, todas esclarecidas.
Esses sentimentos todos transformados em felicidade, satisfação, reconhecimento e
afeto.
A estratégia para me inserir nos pequenos grupos de crianças e conhecê-los,
foi participar de suas brincadeiras, sempre procurando indícios dos elementos
presentes em seus imaginários. Essa aproximação, geralmente, acontecia durante
as brincadeiras, pois não queria interferir nos modos como seus tempos e espaços
eram organizados.
Contudo, a presença da mídia e dos elementos que a constituem, no
imaginário infantil, ficou mais evidente durante as brincadeiras dos meninos, que
enquanto brincavam assumiam geralmente papéis relativos a personagens de
desenhos animados, os quais eram reelaborados e modificados nas suas
brincadeiras. Em relação às meninas, percebi que algumas demonstravam interesse
em se relacionarem com a câmera digital. O desejo de fazerem de conta que eram
44
personagens, cujas imagens são divulgadas pela mídia e veiculadas em
determinados produtos.
Ressalto que em relação ao rádio não foi possível obter informações porque,
durante as observações, as crianças não demonstraram ter interesse por esse tipo
de equipamento.
Evidenciou-se que seria necessário continuar a conviver com as crianças de
forma constante e prolongada para obter mais dados e aprofundar as análises dos
mesmos. Entretanto, isso não foi possível em virtude dos limites de tempo para a
realização do TCC. Contudo, a presença de elementos das mídias no imaginário das
crianças é evidente, além da curiosidade e interesse por aparelhos de mídias.
A experiência de apresentar alguns aparelhos de mídias para as crianças foi
muito rica, ver suas reações, seus olhos brilhando; participar de seus faz-de-conta,
perceber o modo como as crianças se apropriam dos suportes materiais que
colocamos a sua disposição, de diferentes formas, criando e recriando sentidos e
significados em suas brincadeiras, foi muito significativo.
Diante de tantas leituras, posso dizer que este estudo me possibilitou novas
visões acerca da temática investigada. Primeiramente, quando pensei em pesquisá-
la meu conhecimento sobre o tema era o de uma iniciante, mas com a realização do
trabalho foi possível ampliar meus conhecimentos e, no seu decorrer, percebi que a
mídia não é algo que está longe dos olhos e da atenção de nossas crianças, ao
contrário está mais próxima do que imaginamos.
Essa pesquisa foi apenas o começo de uma caminhada, haja vista que essa
temática ainda está para ser conhecida por nós pedagogos. Esse trabalho tem o
intuito de promover uma aproximação entre a Pedagogia, nesse caso mais
especificamente entre a área da Educação Infantil e as diversas mídias, com o
intuito de compreender suas influencias nos repertórios infantis.
Penso, portanto, que esse estudo sobre as mídias e o imaginário infantil foi
uma experiência introdutória e não gostaria de parar por aqui, pois a cada dia que
passa a presença das mídias parece aumentar entre as crianças. Diante desse fato,
não podemos fechar os olhos, as portas, e tentar desconhecer ou esconder de
nossas crianças uma produção que constitui as culturas contemporâneas; o que
devemos é aprender a fazer mediações que contribuam para que as crianças
ampliem e diversifiquem seus repertórios lúdicos, culturais, e imaginários, o que
45
também exige que se tornem crianças não só capazes de fluir, mas também de
refletir sobre o que lhes é oferecido.
É importante ressaltar que essa responsabilidade não é só de professores ou
famílias, pois envolve as políticas culturais e econômicas de nosso país que
precisam avançar significativamente no sentido de possibilitar às crianças e famílias
de todas as classes sociais, o acesso a bens culturais e aparelhos para veiculá-los,
que não se restrinjam às determinações do mercado.
46
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50
APÊNDICES
APÊNDICE A – Autorização de imagens
São José, 17 de março de 2011
Senhores pais ou responsáveis:
Eu, LUANA COSTA DE CÓRDOVA, acadêmica da 8ª fase do Curso de
Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José, venho, através desta,
solicitar sua autorização para utilizar imagens fotográficas e fílmicas, falas e
desenhos de seu filho (a) para a seguinte pesquisa de Trabalho de Conclusão de
Curso (TCC): O IMAGINÁRIO INFANTIL E AS MÍDIAS.
Afirmo que os referidos materiais serão utilizados somente com a finalidade
de estudos e divulgação científica no âmbito da formação de professores de
educação infantil e que a instituição receberá cópia do material produzido, ficando
assim disponível seu acesso aos pais e professores.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
AUTORIZAÇÃO
Eu, _____________________________________________________, através
desta autorizo a utilização de imagens, falas e desenhos de meu filho (a)
_________________________________ para os fins acima descritos.
São Jose, ___/___/___.
ASSINATURA____________________________________
51
APÊNDICE B – Questionário
Senhores pais ou responsáveis:
Eu, Luana Costa de Córdova, aluna da 8ª fase do Curso de Pedagogia do Centro
Universitário Municipal de São José, estou desenvolvendo uma pesquisa sobre “O
imaginário infantil e as mídias”, com a intenção de ampliar a compreensão sobre os
modos como as crianças se relacionam com a mídia. Venho através desta, solicitar
sua participação, respondendo ao questionário abaixo. Afirmo que este material será
utilizado somente com a finalidade de estudos e os nomes não serão divulgados. Ao
término da pesquisa, a instituição receberá cópia do material produzido, ficando
assim disponível seu acesso aos pais, responsáveis e professores.
QUESTIONÁRIO
Nome da criança:_____________________________________________________
Idade:_______
Onde nasceu:________________________________________________________
Com quem mora/reside?________________________________________________
Bairro onde mora/reside:________________________________________________
No bairro há locais (praças, parques, etc.) em que seu filho (a) costuma brincar
quando não está em casa?______________________________________________
Quais equipamentos de mídia possui em casa?
( ) Aparelho de televisão ( ) Vídeo ( ) DVD
( ) Aparelhos de música. Se sim, qual?
( ) Câmera fotográfica ou filmadora. Se sim, é digital?
( ) Computador ( ) Videogame
A criança tem algum computador de brinquedo? _____________________________
Quando a criança está brincando com algum aparelho de mídia, algum adulto
acompanha?_________________________________________________________
Quais equipamentos de mídia a criança prefere?_____________________________
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Quando está em casa ela/ele costuma assistir TV? Em que horários?____________
Ela/Ele assiste TV: ( ) sozinha/o ( ) acompanhada/o
Algum adulto assiste TV junto com ela/ele? ( ) sim ( ) não
Qual o programa de TV favorito da criança?
( ) Desenho animado ( ) esportes ( ) filmes ( ) outros___________
Quando a criança está em casa ela/ele costuma usar o computador? Em que
horários?____________________________________________________________
Ela/Ele usa o computador: ( ) sozinha /o ( ) acompanhada/o
Algum adulto fica junto com ela/ele? ( ) sim ( ) não
Quais os sites ele/ela mais acessa?_______________________________________
Quando está em casa ela/ele costuma usar o videogame? Em que horários?______
Ela/Ele brinca com o videogame ( ) sozinha/o ( ) acompanhada/o
Algum adulto fica junto com ela/ele? ( ) sim ( ) não
Quais os jogos preferidos pela criança?____________________________________
Cite os nomes dos programas de televisão preferidos pela criança?______________
Você tem TV a cabo? Se sim, cite os programas favorito da criança na TV a cabo?_
Você ou algum outro adulto costuma levar a criança ao cinema?______ Quantas
vezes por mês?__________
Em que lugar da casa a criança brinca?____________________________________
Do que ela/ele gosta de brincar em casa?__________________________________
Do que ela/ele gosta de brincar em outros ambientes?________________________
Você costuma brincar com seu filho? De quê?_______________________________
Você já presenciou a criança brincando de ser algum personagem de desenho
animado? Como e com quem ela brincava? ________________________________
Do que você gosta mais? ( ) Ouvir música ( ) Assistir TV ( ) Ler revista ( ) Ler livro ( )
Ver filme ( ) Videogame ( ) Computador/internet ( ) Outro:
A que horas seu filho acorda? E o que faz a seguir?__________________________
O que ele faz quando volta da creche?_____________________________________
Enquanto seu filho brinca, a TV está ligada?________________________________
A criança costuma pedir que você compre produtos com os personagens de
desenhos animados? Quais personagens? _________________________________
Vocês costumam assistir DVD em casa? Quais os DVD favoritos de seu filho?_____