32
50 SOCIOLOGIAS Sociologias, Porto Alegre, ano 4, nº 7, jan/jun 2002, p. 50-81 A DOSSIÊ * A autora agradece os comentários de Soraya Maria Vargas Cortes e Odaci Luiz Coradini a uma primeira versão deste trabalho. Esse artigo, em versão em Inglês, integrará um livro editado por Christopher Abel e Colin M. Lewis, cujos comen- tários a autora agradece. ** Professora titular do Departamento de Sociologia, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. [email protected]. 1 De acordo com os dados dos censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de fecundidade, no Brasil, que era de cerca de seis filhos por mulher nos anos 50, nos anos 1970/75 era de 4,7, baixando para 2,7 no período 1990/95. Para as áreas rurais do país, onde as taxas de fecundidade são geralmente superiores às das áreas urbanas, no período de 1980/ 85, o maior índice registrava-se no Norte, com uma taxa de 6,8 filhos, enquanto o menor índice ocorria no Sul, com 3,6. Entre 1985 e 1990, as taxas nessas regiões eram de respectivamente 6,0 e 3,1 (Teixeira et al, 1994). No Rio Grande do Sul, de acordo com cálculos feitos por técnicos do Núcleo de Sistematização de Indicadores da Fundação de Economia e Estatística (FEE), do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, baseados em diversos censos do IBGE, a taxa de fecundidade rural, em 1970, era de 5,62 filhos por mulher com idade entre 15 e 44 anos; de 3,78 em 1980; de 2,78 em 1990 e de 2,62 em 1995. 2 Deere e León (2000, p.20), citando Valdés e Gomáriz (1995, p.115), indicam que, na América Latina, em 1950 a esperança média de vida para a mulher era de 53,5 anos e em 1990 era de 71,4. Para o homem o aumento foi menos pronunciado, de 50,2 anos em 1950 para 66,2 anos em 1990, de maneira que a brecha de gênero a favor da mulher se ampliou. Assim como essas taxas variam entre os países da América Latina, elas variam entre regiões e Estados brasileiros, sendo mais elevadas nas regiões Sul e Sudeste quando comparadas com as regiões Norte e Nordeste (de acordo com os Indicadores Demográficos do IBGE, 2000, no Sul do Brasil, em 1990, a esperança de vida ao nascer era de 72,71 anos para as mulheres e de 65,0 anos para os homens; no Nordeste, no mesmo ano, a expectativa de vida para os homens era de respectivamente 67,74 e 60,84 anos). Previdência social rural e gênero Previdência social rural e gênero * ANIT ANITA BRUMER A BRUMER** Introdução s transformações do sistema de previdência social brasilei- ro, nas últimas décadas, ocorreram num contexto de rápi- das e importantes mudanças, registradas tanto no próprio país como em todo o mundo, na economia, na política e nos campos social e demográfico. Como mostram Olivei- ra et alii (1997, p.1), entre os aspectos que têm implicações diretas para a previdência social no Brasil estão a rápida queda da fecundidade 1 e o aumento da expectativa de vida (que provocou um acelerado envelheci- mento da estrutura da população) 2 , afetando o período de gozo (e recebi- mento de benefícios) da aposentadoria. Paralelamente, as transformações ocorridas na economia mudaram as formas de inserção profissional (crian- do categorias novas e ampliando o número dos prestadores de serviços autônomos, de empregados ‘informais’ e de desempregados) e alteraram os valores dos salários e dos serviços, com efeitos sobre o volume de recei- tas e despesas da previdência social.

Previdencia Social Rural e Genero

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Previdencia Social Rural e Genero

Citation preview

  • 50 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    A

    DOSSI

    * A autora agradece os comentrios de Soraya Maria Vargas Cortes e Odaci Luiz Coradini a uma primeira verso destetrabalho. Esse artigo, em verso em Ingls, integrar um livro editado por Christopher Abel e Colin M. Lewis, cujos comen-trios a autora agradece.

    ** Professora titular do Departamento de Sociologia, Instituto de Filosofia e Cincias Humanas, Universidade Federal do RioGrande do Sul, Brasil. [email protected].

    1 De acordo com os dados dos censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), a taxa de fecundidade, no Brasil,que era de cerca de seis filhos por mulher nos anos 50, nos anos 1970/75 era de 4,7, baixando para 2,7 no perodo 1990/95.Para as reas rurais do pas, onde as taxas de fecundidade so geralmente superiores s das reas urbanas, no perodo de 1980/85, o maior ndice registrava-se no Norte, com uma taxa de 6,8 filhos, enquanto o menor ndice ocorria no Sul, com 3,6. Entre1985 e 1990, as taxas nessas regies eram de respectivamente 6,0 e 3,1 (Teixeira et al, 1994). No Rio Grande do Sul, de acordocom clculos feitos por tcnicos do Ncleo de Sistematizao de Indicadores da Fundao de Economia e Estatstica (FEE), doGoverno do Estado do Rio Grande do Sul, baseados em diversos censos do IBGE, a taxa de fecundidade rural, em 1970, era de5,62 filhos por mulher com idade entre 15 e 44 anos; de 3,78 em 1980; de 2,78 em 1990 e de 2,62 em 1995.

    2 Deere e Len (2000, p.20), citando Valds e Gomriz (1995, p.115), indicam que, na Amrica Latina, em 1950 a esperanamdia de vida para a mulher era de 53,5 anos e em 1990 era de 71,4. Para o homem o aumento foi menos pronunciado, de50,2 anos em 1950 para 66,2 anos em 1990, de maneira que a brecha de gnero a favor da mulher se ampliou. Assim comoessas taxas variam entre os pases da Amrica Latina, elas variam entre regies e Estados brasileiros, sendo mais elevadas nasregies Sul e Sudeste quando comparadas com as regies Norte e Nordeste (de acordo com os Indicadores Demogrficos doIBGE, 2000, no Sul do Brasil, em 1990, a esperana de vida ao nascer era de 72,71 anos para as mulheres e de 65,0 anos paraos homens; no Nordeste, no mesmo ano, a expectativa de vida para os homens era de respectivamente 67,74 e 60,84 anos).

    Previdncia social rural e gneroPrevidncia social rural e gnero**ANITANITA BRUMERA BRUMER**

    Introduo

    s transformaes do sistema de previdncia social brasilei-ro, nas ltimas dcadas, ocorreram num contexto de rpi-das e importantes mudanas, registradas tanto no prpriopas como em todo o mundo, na economia, na poltica enos campos social e demogrfico. Como mostram Olivei-

    ra et alii (1997, p.1), entre os aspectos que tm implicaes diretas para aprevidncia social no Brasil esto a rpida queda da fecundidade1 e oaumento da expectativa de vida (que provocou um acelerado envelheci-mento da estrutura da populao)2, afetando o perodo de gozo (e recebi-mento de benefcios) da aposentadoria. Paralelamente, as transformaesocorridas na economia mudaram as formas de insero profissional (crian-do categorias novas e ampliando o nmero dos prestadores de serviosautnomos, de empregados informais e de desempregados) e alteraramos valores dos salrios e dos servios, com efeitos sobre o volume de recei-tas e despesas da previdncia social.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    51SOCIOLOGIAS

    As diferenas nos sistemas de previdncia social de diferentes pasespodem ser explicadas por fatores tanto polticos como financeiros. Devidoa esses fatores, o sistema previdencirio brasileiro que enfatiza uma re-forma paramtrica no sistema contributivo (pay-as-you-go), melhorandosua eficincia e eqidade -, de acordo com Kay (2001), difere das refor-mas iniciadas em pases tais como Chile (em 1981), Colmbia, Peru, Ar-gentina, Uruguai, Mxico, Bolvia e El Salvador (nos anos 90). Esses pasesestiveram na vanguarda da reforma da previdncia social global, ao intro-duzir contas de investimentos individuais privados para complementar ousubstituir os sistemas de tipo contributivo regidos pelo Estado 3.

    O interesse deste trabalho pela previdncia social rural justifica-sepor trs motivos principais: 1) a incluso dos trabalhadores rurais - comdestaque para os trabalhadores familiares - foi tardia em relao a outrascategorias de trabalhadores; 2) no decorrer da histria da previdncia soci-al brasileira, houve momentos em que a concesso de benefcios aos tra-balhadores rurais resultou da ao estatal, ao passo que, em outros mo-mentos foi evidente a mobilizao dos interessados visando a melhoria debenefcios j concedidos e a conquista de novos benefcios; 3) como aprevidncia social rural deficitria, uma vez que o valor total das contri-buies inferior ao montante de benefcios, parece haver uma certa dis-tribuio de rendas do setor urbano para o rural.

    O modelo de previdncia social adotado no Brasil para o setor urba-no, cujos trabalhadores de um modo geral tm empregos assalariados for-mais e rendimentos regulares, no pode ser aplicado ao setor rural, noqual os trabalhadores no contam com rendimentos regulares (muitos vi-vem da produo para o autoconsumo, no auferindo nenhum rendimen-to monetrio) nem se classificam de modo geral como assalariados. Almdisso, dentro da dinmica de desenvolvimento econmico do Pas, nasltimas dcadas, o setor rural subordinado ao urbano, cabendo-lhe fi-

    3 Kay (2001) justifica as diferenas entre as reformas introduzidas no sistema de previdncia social no Brasil e as iniciadas emoutros pases latino-americanos destacando, por um lado, que as contas particulares foram amplamente rejeitadas tantopelos partidrios como pelos opositores ao Presidente Cardoso quando ele primeiramente discutiu o assunto em 1994, emcontraste com seus vizinhos, onde a privatizao recebeu apoio poltico; por outro lado, no lado financeiro, alguns formuladoresde polticas argumentaram que uma reforma no estilo chileno que atenuaria o sistema contributivo no seria financeiramen-te factvel no Brasil devido aos custos de uma brusca transio (Kay, 2001, p.3).

  • 52 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    nanciar investimentos, com transferncia de recursos do setor agrrio aoindustrial, o que faz com que deixe uma vasta extenso de agricultoresfamiliares excludos (Schwarzer, 2000, p.74). Resulta disso que a capaci-dade contributiva do setor rural para a previdncia social muito baixa,tornando praticamente impossvel o equilbrio entre contribuies e bene-fcios. De acordo com Schwarzer (2000, p.74), como indicado pela expe-rincia internacional, h necessidade das estruturas proverem financiamentoalternativo ou complementar contribuio baseada na renda, de modo acriar uma cobertura universal.

    Apesar dessas dificuldades, nos ltimos 30 anos, uma srie de leisavanaram no sentido da cobertura social dos trabalhadores rurais, sejameles assalariados ou autnomos, aproximando-os, em termos de direitossociais, dos trabalhadores urbanos. Esses avanos foram to substanciaisque Schwarzer indica que

    parece possvel afirmar que o subsistema rural da Previ-dncia social brasileira , entre os casos conhecidos empases em desenvolvimento, um programa social excep-cional quanto ao significativo grau de cobertura, altapreciso do targeting (...) e, como resultante do anterior,parece formar um programa que [tem] uma efetividadeindita no combate pobreza no meio rural brasileiro(Schwarzer, 2000, p.72).

    Se a incluso dos trabalhadores rurais foi tardia em relao a outras cate-gorias profissionais, a incluso das mulheres rurais trabalhadoras ocorreu aindamais tarde, principalmente porque, para poder receber os benefcios da previ-dncia social deviam, antes de mais nada, ser reconhecidas como trabalhado-ras rurais. Esse reconhecimento, por sua vez, era de difcil comprovao, ten-do em vista que grande parte do trabalho feito por elas invisvel, sendogeralmente declarado como ajuda s tarefas executadas pelos homens e,com freqncia, restrito s atividades domsticas, mesmo que essas incluamatividades vinculadas produo. Assim, no incio consideradas como de-

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    53SOCIOLOGIAS

    pendentes, seja dos pais ou dos maridos, passam paulatinamente a seremvistas como autnomas, portadoras de direitos individuais, o que lhes permi-te serem incorporadas como beneficirias da previdncia social.

    O objetivo central deste trabalho apresentar a evoluo do sistemade previdncia social rural no Brasil, com destaque para os avanos obtidospelas mulheres trabalhadoras rurais. Ao fazer isto, torna-se importante exa-minar os antecedentes desses avanos, com nfase principalmente em seucarter de doao (por parte do Estado) ou de conquista (por parte dostrabalhadores). Pretende-se ainda analisar os efeitos sociais da previdnciarural para seus beneficirios, focalizando na regio Sul do pas, e considerarseus rumos possveis na atual conjuntura da sociedade brasileira.

    Evoluo da previdncia rural no Brasil

    A previdncia social consiste num seguro social, constitudo por um pro-grama de pagamentos, em dinheiro e/ou servios feitos/prestados ao indiv-duo ou a seus dependentes, como compensao parcial/total da perda decapacidade laborativa, geralmente mediante um vnculo contributivo (Olivei-ra et alii, 1997, p.4). Juntamente com as polticas e aes que visam ao aten-dimento sade da populao e assistncia social dirigida aos necessitados,a previdncia social integra o conjunto de polticas e aes que formam aseguridade social de um determinado pas. O modo como isso feito depen-de da histria institucional do pas e, em cada caso, da conjuntura e do jogo deforas entre os diversos grupos de poder que compem a sociedade.

    A primeira lei referente ao seguro previdencirio, prevendo a criaode Caixas de aposentadorias e penses nas empresas ferrovirias existen-tes na poca, data de 1923 (Lei Eloy Chaves). A vinculao ao sistema erainstitucional: cada empresa possua uma Caixa destinada a amparar seusempregados na inatividade. Outra caracterstica era a forma de adminis-trao, partilhada por empregadores e empregados e sem a participaodo Estado.

  • 54 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    A partir da dcada de 1930, a vinculao previdncia social, com acobertura de aposentadorias e penses, comeou a ser feita por categoria profis-sional, vindo a envolver quase a totalidade dos trabalhadores assalariados urba-nos e grande parte dos autnomos (Oliveira et alii, 1997, p.7). A administraodos Institutos de aposentadorias e penses, desde este perodo, passou a sercomandada pelo Estado, que escolhe e nomeia seus presidentes, alm de defi-nir o formato organizacional de todo o sistema de seguridade social, e a decidiro valor das contribuies dos indivduos (montante a ser poupado) e onde apli-car os recursos extrados da sociedade (Oliveira et alii, 1997, p.1-12).

    De acordo com Santos (1979, p.33), ao introduzir as primeiras leisreferentes proteo social dos trabalhadores, a preocupao central dogoverno estava no esforo de acumulao, procurando, por um lado, conci-liar uma poltica de acumulao que no exacerbasse as iniqidades sociaisa ponto de torn-las ameaadoras e, por outro, estabelecer uma polticavoltada para o ideal da equidade que no comprometesse, e se possvelajudasse, o esforo de acumulao. Como resultado, nas polticas sociaisgovernamentais das dcadas de 30, 40 e 50 foram includos quase todos ostrabalhadores urbanos e a maioria dos trabalhadores autnomos, mas algu-mas categorias profissionais ficaram fora da cobertura: entre estes estavamos trabalhadores rurais, as empregadas domsticas e os profissionais autno-mos. A excluso dos trabalhadores rurais devia-se ao conformismo rural, atmeados da segunda metade da dcada de 50 4, e a das outras categoriasprofissionais explicava-se pela dificuldade de organizao das demandas deprofissionais caracterizados pela fragmentao e disperso.

    Na dcada de 1960, foram tomadas as primeiras iniciativas para es-tender a cobertura previdenciria aos trabalhadores rurais. A primeira des-sas iniciativas, o Estatuto do Trabalhador Rural, de 2 de maro de 1963,regulamentou os sindicatos rurais, instituiu a obrigatoriedade do pagamentodo salrio mnimo aos trabalhadores rurais5 e criou o Fundo de Assistncia

    4 Devido, em grande parte, ausncia de movimentos sociais organizados.

    5 Price chama a ateno para o fato de que, com a aplicao do Estatuto do Trabalhador Rural e graas aos esforos dasassociaes de trabalhadores rurais, estendeu-se o pagamento do salrio mnimo aos trabalhadores assalariados, o que tevepelo menos trs efeitos: 1) desenvolvimento comercial em reas onde havia grande nmero de trabalhadores rurais assala-riados (como em Pernambuco, por exemplo), pois os trabalhadores aumentaram o consumo de produtos que antes lheseram inacessveis; 2) dispensa de trabalhadores rurais de muitas plantaes, pois havia proprietrios que administravamineficientemente suas fazendas e no podiam enfrentar o pagamento do salrio mnimo; 3) aumento do preo dos produtosagrcolas e transformao de muitos estabelecimentos agrcolas em fazendas de criao de gado, que requerem menor forade trabalho (Price, 1964, p.71-4).

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    55SOCIOLOGIAS

    e Previdncia do Trabalhador Rural - FAPTR, posteriormente, em 1969,denominado FUNRURAL)6. Na prtica, a cobertura previdenciria aos tra-balhadores rurais no se concretizou, pois os recursos (financeiros e admi-nistrativos) necessrios sua efetivao no foram previstos na legislao.

    Medidas relativas organizao dos trabalhadores rurais foramadotadas em vrias leis, na dcada de 60, viabilizando posteriormente aassociao entre os sindicatos de trabalhadores rurais e a previdncia soci-al rural. Entre aquelas estavam a Portaria 395, de 17 de julho de 1965, queestabelece o processo de fundao, organizao e reconhecimento dossindicatos e o que significa, para fins de sindicalizao, Empregador Rurale Trabalhador Rural; o Decreto-lei 276, de 1967, que transfere para ocomprador a obrigao de recolher a contribuio de 1% sobre os produ-tos rurais e restringe o plano de benefcios, preconizado no Estatuto doTrabalhador Rural, prestao de assistncia mdico-hospitalar aos traba-lhadores rurais) e o Decreto-lei 789, de 27 de agosto de 1969, que redefine,para fins de sindicalizao, o significado de Empregador Rural e Trabalha-dor Rural, introduzindo o mdulo rural como elemento diferenciador, res-tringindo a existncia de um nico sindicato, em cada municpio, pararepresentar a mesma categoria profissional7. Essa legislao viabilizou aregulamentao dos sindicatos rurais, dando impulso organizao sindi-cal de trabalhadores rurais e de produtores/empregadores rurais no pas.

    Em 1966, os diferentes institutos encarregados da previdncia socialforam unificados (com exceo do IPASE, o instituto que prestava benefci-os e servios ao funcionalismo pblico federal), criando-se o Instituto Na-cional de Previdncia Social (INPS). A administrao do novo instituto pas-sou a ser feita pelos funcionrios estatais, sendo excludos dos conselhosadministrativos os representantes dos trabalhadores.

    Em 1971, foi lanado o Programa de Assistncia Rural (PRORURAL),ligado ao FUNRURAL, que previa benefcios de aposentadoria e o aumentodos servios de sade at ento concedidos aos trabalhadores rurais. Entre

    6 Em 1969, quando a FAPTR passa a denominar-se FUNRURAL, promove-se um novo programa em benefcio dos trabalha-dores rurais, a assistncia odontolgica, por meio de convnios com os sindicatos rurais da categoria patronal e de trabalha-dores, fornecendo ao sindicato o gabinete odontolgico e lhe concedendo um subsdio mensal, destinado manuteno epagamento do dentista (CNBB-CEP, 1976, p.81).7 Ver Brumer, 1971.

  • 56 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    outras medidas, o PRORURAL previa a aposentadoria por velhice e por invalidezpara trabalhadores rurais maiores de 70 anos de idade, no valor de salriomnimo; penso, equivalente a 70% da aposentadoria, e auxlio funeral, paradependentes do beneficirio; servios de sade, incluindo assistncia mdico-cirrgico-hospitalar e tratamento odontolgico; servio social em geral. Asmulheres s seriam beneficiadas diretamente caso fossem chefes de famlia(algo muito raro no Sul do Brasil) ou assalariadas rurais. A efetividade do pro-grama estava garantida, uma vez que a legislao que o criou tambm previua forma de obteno de recursos para sua implementao.

    De acordo com Santos (1979, p.115), o PRORURAL distinguia-se dosistema previdencirio urbano em pelo menos trs aspectos: 1) seu finan-ciamento era feito atravs de um imposto sobre a comercializao dosprodutos rurais e, em parte, por tributao incidente sobre as empresasurbanas, em lugar de uma concepo contratual; 2) os trabalhadores ruraisno faziam nenhuma contribuio direta para o fundo; 3) no existia umaestratificao ocupacional entre os trabalhadores rurais.

    Durante a dcada de 70, a cobertura previdenciria foi estendidaainda s categorias profissionais que haviam sido marginalizadas nos pla-nos anteriores. Entre as medidas deste perodo estavam: a incluso dosempregados domsticos (1972), a regulamentao da inscrio de traba-lhadores autnomos em carter compulsrio (1973), a instituio do am-paro previdencirio aos maiores de 70 anos de idade e aos invlidos nosegurados (1974) e a extenso dos benefcios de previdncia e assistnciasocial aos empregadores rurais e seus dependentes (1976). Em sntese, aprevidncia passou a abranger a totalidade das pessoas que exerciam ativi-dades remuneradas no pas (Oliveira et alii, 1997, p.8), assim como seusdependentes, embora tenham continuado sem cobertura os trabalhadoresinformais, aqueles com trabalhos instveis, os desempregados e os traba-lhadores em ocupaes no regulamentadas por lei.

    Wanderley Guilherme dos Santos (1979, p.75) utiliza a expressocidadania regulada para sintetizar a poltica econmico-social vigente noBrasil entre as dcadas de 30 e 80. Com esta expresso, ele entende

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    57SOCIOLOGIAS

    o conceito de cidadania cujas razes encontram-se, noem um cdigo de valores polticos, mas em um sistema deestratificao ocupacional, e que, ademais, tal sistema deestratificao ocupacional definido por norma legal. Emoutras palavras, so cidados todos aqueles membros dacomunidade que se encontram localizados em qualqueruma das ocupaes reconhecidas e definidas em lei.

    Como indica Coradini (1989, p.62-3), a principal caracterstica das mu-danas poltico-institucionais ocorridas neste perodo a unificao ou centra-lizao administrativa dos organismos pblicos ou paraoficiais que atuam emassistncia social. Entre as novas medidas, esto a criao do Ministrio dePrevidncia e Assistncia Social (MPAS), em 1974, com o objetivo de centra-lizar as polticas previdencirias; a criao do Sistema Nacional de PrevidnciaSocial (SINPAS) e do Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS), em 1977,provocando a extino do FUNRURAL e do IPASE (instituto de previdnciadirigido aos funcionrios pblicos). O INPS foi redefinido, passando a deter omonoplio da concesso dos benefcios pecunirios e reabilitao profissio-nal, resguardando na nova regulamentao as respectivas prerrogativas e privi-lgios das diferentes categorias de contribuintes (Coradini, 1989, p.63).

    A Constituio de 1988, complementada pelas Leis 8.212 (Plano deCusteio) e 8.213 (Planos de Benefcios), de 1991, passou a prever o acessouniversal de idosos e invlidos de ambos os sexos do setor rural previ-dncia social, em regime especial, desde que comprovem a situao deprodutor, parceiro, meeiro e o arrendatrio rurais, o garimpeiro e o pesca-dor artesanal, bem como respectivos cnjuges que exeram suas ativida-des em regime de economia familiar, sem empregados permanentes (Cons-tituio Federal, 1988, art. 195, 8). Neste sentido,

    os riscos cobertos pela previdncia, bem como os valoresmnimos e mximos dos benefcios concedidos, passama ser iguais para todos os contribuintes do sistema, desa-parecendo assim as desigualdades decorrentes do planoanterior, que discriminava a populao urbana da rural(Oliveira et alii, 1997, p.10).

  • 58 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    De acordo com as modificaes introduzidas, as mulheres traba-lhadoras rurais passaram a ter direito aposentadoria por idade, a partirdos 55 anos, independentemente de o cnjuge j ser beneficirio ouno, ou receberem penso por falecimento do cnjuge. Os homens tam-bm tiveram uma extenso de benefcios, com a reduo da idade, paraconcesso de aposentadoria por velhice, de 65 anos para 60 anos, epassaram a ter direito penso em caso de morte da esposa segurada.Outra modificao de impacto sobre a populao rural, implementada apartir de janeiro de 1996, foi a criao do amparo assistencial, no valorde um salrio mnimo, a idosos com 67 anos ou mais e pessoas portado-ras de deficincia fsica, sem necessidade de contribuio prvia (Delga-do e Schwarzer, 2000, p.197-8).

    A legislao de 1988 continua o processo iniciado com a criao doPRORURAL, em 1971, de adoo da noo de cidadania em termos am-plos (contrapondo-se idia de cidadania regulada, expresso propostapor Santos, 1979), atravs da qual todos tm direitos, independentementede contribuio. Neste sentido, pode-se falar em seguridade social e noapenas em previdncia social.

    Em maro de 1990, o Ministrio da Previdncia e Assistncia Social(MPAS) foi extinto e suas funes divididas entre o Ministrio da Assistn-cia Social e Sade e o Ministrio do Trabalho e Previdncia Social (MTPS).O MTPS inclua, como um rgo auxiliar, o Instituto Nacional de SeguridadeSocial (INSS), que tomou o lugar do INPS e do IAPAS. Em novembro de1992, foi feita uma nova reforma administrativa, dividindo o MTPS emdois, o Ministrio do Trabalho e o Ministrio da Previdncia Social. Esteltimo incorporou o INSS.

    A legislao aprovada em 1988, alm da aposentadoria, previa a con-cesso do salrio-maternidade s mulheres trabalhadoras rurais, mas esteitem foi vetado pelo Presidente Collor por ocasio da regulamentao da

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    59SOCIOLOGIAS

    legislao previdenciria em 1990. Posteriormente, graas s pressesexercidas pelos movimentos de mulheres trabalhadoras rurais junto aosparlamentares, seu direito ao salrio-maternidade foi aprovado em agostode 1993 e regulamentado um ano depois. Atravs deste benefcio, quan-do tm um filho(a), as mulheres trabalhadoras rurais passam a receber umbenefcio equivalente a um salrio-mnimo mensal, durante quatro meses(120 dias), benefcio que, na Constituio de 1988, foi estendido de trspara quatro meses para as trabalhadoras urbanas.

    Quando comparada com o sistema previdencirio urbano, a previdn-cia rural mantm algumas especificidades. Em primeiro lugar, em vez dacontribuio sobre os salrios ou rendas recebidos, vlida para os contribu-intes do setor urbano, a forma de contribuio do trabalhador rural que jera praticada anteriormente foi mantida, consistindo numa percentagem sobreo valor da produo comercializada (2,2%), e seu recolhimento fica sob aresponsabilidade do comprador. Em segundo lugar, a idade-limite da apo-sentadoria para os trabalhadores rurais baixou, passando de 65 a 60 anospara os homens e definida em 55 anos para as mulheres, ao passo que foifixada em respectivamente 65 e 60 anos para os trabalhadores urbanos. Emterceiro lugar, diferentemente do setor urbano, os trabalhadores rurais aut-nomos no necessitam garantir um perodo mnimo de contribuio8, bas-tando comprovar tempo de atividade semelhante dos trabalhadores urba-nos, o que pode ser feito por documentao comprobatria do uso da terra(ttulo de propriedade, contrato de parceria ou arrendamento, etc.), notasde venda da produo rural (blocos de notas do produtor rural) ou declara-o expedida pelo sindicato rural e homologada pelo INSS. Outro aspectoque beneficiou os trabalhadores rurais, neste caso aproximando-os dos tra-balhadores urbanos, foi o valor mnimo do benefcio, anteriormente de salrio mnimo, e que passou a ser de um salrio mnimo, em muitos casos

    8 Como indicamos anteriormente (Brumer, 2000), antes da promulgao da Constituio de 1988 e de sua regulamentaopela Lei de Custeio da Previdncia n. 8.212, de 1991, pela Lei 8.213, do mesmo ano, e por outras leis que se seguiram ato final de 1992, a maioria das mulheres rurais nunca tinha contribudo diretamente para o sistema previdencirio nacional.De acordo com Delgado (1997), o pblico beneficirio da previdncia rural caracteriza-se majoritariamente como setorinformal, ou seja, so trabalhadores sem contrato formal de trabalho e no so contribuintes regulares do sistema.

  • 60 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    duplicando ou at mesmo triplicando (no caso do acmulo de aposentado-ria com penso por falecimento de cnjuge) o valor dos benefcios recebidosantes de 1988 (Schwarzer, 2000, p.77).

    Tabela 1. Distribuio de benefcios da previdncia rural no Brasil, entre 1991 e 1998

    Fonte: Anurio Estatstico da Previdncia Social 1991 a 1998 (Apud Delgado eCardoso Jr., 2000, p.3)

    Na tabela 1, pode-se verificar o impacto da reforma previdenciriarural na dcada de 90. Em primeiro lugar, constata-se que, entre 1991 e1998, praticamente dobrou o nmero de beneficirios por idade da previ-dncia rural, com os principais incrementos sendo verificados entre 1991e 1992 e entre 1992 e 1993, quando a nova legislao comeou a seraplicada, e era bastante significativo o nmero de potenciais beneficiriosque esperavam a implementao da lei9. No final da dcada de 90, a

    AnosValor dos benefciosmensais pagos (em

    US$ Mil)

    Nmero totalde benefcios

    (mantidos)

    Nmero debenefcios por

    idade

    Valor unitrio dosbenefcios rurais (em

    US$)

    1991 180,0 4.080,4 2.240,5 44,1

    1992 234,4 4.976,9 2.912,8 47,1

    1993 403,8 6.001,0 3.855,9 67,3

    1994 526,8 6.359,2 4.176,2 82,8

    1995 637,8 6.332,2 4.126,8 100,7

    1996 705,2 6.474,4 4.102,2 108,9

    1997 725,3 6.672,3 4.140,2 108,7

    1998 749,8 6.913,1 4.305,3 108,5

    9 De acordo com Bonato (1996), apud Silva (2000, p.109), em 1993, cerca de 55% das mulheres tinham mais de 60 anosde idade quando tiveram acesso ao benefcio da aposentadoria por idade; em 1994, 48% das trabalhadoras rurais tinhammais de 60 anos quando se aposentaram.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    61SOCIOLOGIAS

    comparao entre a populao de idosos do Pas e a populao de apo-sentados por idade revelou uma taxa de cobertura bastanteelevada10 (Delgado, 1997; Delgado e Cardoso Jr., 2000, p.21). Em segun-do lugar, no caso do nmero total de benefcios, que inclui as aposentado-rias por idade e invalidez, bem como as penses pelo falecimento do cn-juge, o incremento maior deu-se entre 1991 e 1992. Em terceiro lugar, ovalor unitrio dos benefcios tambm aumentou consideravelmente, pas-sando de US$ 44,1 em 1991 para US$ 108,5 em 1998, embora atualmen-te ele provavelmente se situe em torno de US$ 80,00, devido desvalori-zao da moeda brasileira ocorrida no incio de 1999. Finalmente, no quediz respeito aos gastos globais com os benefcios da previdncia rural, hou-ve um aumento importante, superior a quatro vezes o valor gasto em 1991,chegando a US$ 750 milhes mensais e a aproximadamente US$ 10 bi-lhes anuais em 1998.

    Apesar dos avanos adquiridos pelos trabalhadores rurais no sistemade previdncia social no Brasil, a distribuio dos benefcios, comparativa-mente a outros grupos de indivduos, bastante desigual: em agosto de2001, a mdia de benefcios do trabalhador urbano era de US$148, en-quanto a mdia de benefcios do trabalhador rural era de US$73; no mes-mo perodo, a mdia dos benefcios dos funcionrios pblicos era deUS$768 para os funcionrios civis, US$ 1.158 para os militares, US$ 2.082para os funcionrios do Legislativo e US$ 2.547 para os funcionrios doLegislativo (Matijascic, 2001). Adicionalmente, como indicam Oliveira etalii (1997, p.34), a desigualdade na distribuio dos benefcios da previ-dncia social tambm evidenciada pelo fato de que os pobres subsidiamos ricos: os pobres geralmente comeam a trabalhar muito jovens e ospoucos que conseguem aposentar-se por tempo de servio (em contraste

    10 Na pesquisa realizada em 1998, verificou-se que a taxa de excluso de idosos de 7,1%, sendo quase trs vezes maiorentre as mulheres, quando comparadas com os homens. A taxa geral de excluso entre os invlidos, no entanto, chega a42,5%, na qual tambm se repete uma incidncia maior de mulheres excludas do que homens (Delgado e Cardoso Jr.,2000, p.24). Entre as dificuldades apontadas pelas pessoas potencialmente aptas, mas excludas da previdncia rural estoas relativas comprovao documental da idade, invalidez e exerccio da atividade rural na fase adulta (Delgado e CardosoJr., 2000, p.25).

  • 62 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    com a aposentadoria por idade) esto entre os que tm expectativas devida mais baixas. O critrio de considerar o valor mdio das contribuiesnum determinado perodo tambm discrimina os pobres, tendo em vistaque eles raramente apresentam melhorias em seus salrios durante suavida ativa, enquanto os que recebem salrios mdios e altos geralmenteapresentam progressos durante sua vida ativa e tm suas aposentadoriascalculadas com base nos melhores anos de remunerao.

    Quando se considera a distribuio de renda no Brasil, a situaono melhor. Hoffmann (2001) indica que, de acordo com a PesquisaNacional por Amostra de Domiclios (PNAD) de 1998, nas reas rurais,10% dos mais ricos detm 47,2% da renda total. O fato que existampoucos com muito e muitos com muito pouco (Hoffmann, 2001) podeajudar a explicar o paradoxo de que o aumento no nmero de beneficiriosda previdncia social capaz de reduzir a pobreza rural, mas - especial-mente porque os benefcios so muito baixos - tem provavelmente umimpacto pequeno na distribuio de renda da populao brasileira11.

    O papel do Estado e da sociedade civil na evoluo daprevidncia social rural

    No Brasil, o sistema de seguridade social experimentou considervelevoluo, desde sua fase embrionria at nossos dias, ora como fruto deconquistas polticas no contexto democrtico, ora como fruto da aopaternalista e autoritria do Estado (Oliveira et alii, 1997, p.6).

    Alguns analistas tentaram explicar por que a extenso dos benefciosda previdncia social aos trabalhadores rurais foi to tardia em relao aostrabalhadores urbanos e porque isso ocorreu principalmente durante o

    11 Hoffmann (2001b) explica os limites da desigualdade de renda afirmando que claro que um pequeno aumento narenda de uma pessoa pobre diminui a desigualdade da distribuio da renda, e um aumento na renda de um rico faz comque essa desigualdade aumente. Fixado o valor desse pequeno aumento na renda de uma pessoa, seu efeito sobre adesigualdade uma funo crescente do valor prvio dessa renda. Iniciando com uma pessoa pobre e considerando,alternativamente, rendas cada vez maiores, h um ponto em que o efeito sobre a desigualdade muda de sinal, passando denegativo a positivo. Em resumo, se a renda dos pobres aumenta, mas a renda dos ricos aumenta tambm, a distribuio derenda pode no ser alterada ou aumentar a desigualdade entre ricos e pobres.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    63SOCIOLOGIAS

    regime militar, autoritrio e conservador (Malloy, 1976; Malloy e Parodi,1993; Schwarzer, 2000). Sintetizando os argumentos, Schwarzer (2000, p.74)indica que o atraso na extenso dos benefcios aos trabalhadores rurais podeser explicado pelo baixo poder de vocalizao poltica de seus prprios inte-resses, apesar de a populao rural constituir a maioria da populao brasi-leira at pelo menos os anos 70. Por outro lado, Schwarzer (2000, p.75),apoiando-se em estudos anteriores (Malloy e Parodi, 1993), formaliza a jus-tificativa para a atuao do regime militar com base em cinco argumentos:1) a tecnocracia previdenciria identificava-se com o mainstream da poca,orientado por princpios da OIT, que propunha a universalizao da cober-tura; 2) procurava-se evitar as tenses sociais, tendo em vista a poltica demodernizao que caracterizou os anos 50 e 60, envolvendo um alto graude excluso social, devido expanso da grande produo; 3) havia interes-se na cooptao dos sindicatos rurais; 4) tentava-se evitar a intensificao damigrao rural-urbana; 5) graas doutrina de segurana nacional, visava-seintegrar o setor rural ao projeto de desenvolvimento nacional, mantendo apaz social, com a criao de justia social.

    Embora os argumentos justificativos da atuao do regime militar naquesto da previdncia rural sejam convincentes, preciso considerar tam-bm outros aspectos. Em primeiro lugar, a extenso de benefcios aos tra-balhadores rurais no ocorreu apenas durante o regime militar, pois a cri-ao do Fundo de Assistncia e Previdncia ao Trabalhador Rural data de1963, durante o governo populista de Joo Goulart, sendo, portanto, ante-rior ao golpe militar de 31 de maro de 1964; do mesmo modo, a con-quista de benefcios, na legislao de 198812, ocorreu aps o trmino doregime militar. Neste sentido, sem ser exclusiva do perodo da ditaduramilitar, mas importante neste, a legislao social um instrumento atravsdo qual o Estado tenta eliminar o confronto direto entre o capital e o traba-

    12 No final da dcada de 80 e incio da de 90, vrios pases da Amrica Latina tambm aprovaram leis que beneficiaram asmulheres rurais, como resultado da concomitncia de dois fatores: de um lado o amadurecimento dos movimentos demulheres e, de outro, a implantao de governos neoliberais. Ver, por exemplo, os avanos obtidos pelas mulheres emdireo propriedade da terra, em vrios pases da Amrica Latina, em Deere e Len (2000).

  • 64 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    lho, atravs da centralizao das decises referentes modernizaotecnolgica e ao domnio do capital em todos os setores produtivos (Brumer,1985, p.216). Em segundo lugar, a partir de meados da dcada de 50, noperodo que antecedeu ao golpe militar, a agitao social no campo brasi-leiro foi intensa, centrada principalmente na luta pela terra, salientando-sea organizao das Ligas Camponesas, no Nordeste, e a ocorrncia de di-versos conflitos pela posse da terra. Como resultado, parece existir umacerta relao entre lutas sociais e concesso de benefcios, embora a an-lise feita por Rogrigues (1968) indique que os reflexos do movimento sin-dical sobre a evoluo legislativa do trabalho no foram imediatos, nemficaram isentos das influncias extra-legais decorrentes dos acontecimen-tos poltico-sociais (Rodrigues, 1968, p.4-5). Em decorrncia, como indicaHoutzager (1998), as elites governantes precisavam encarar a questo decomo modernizar um setor arcaico amplamente percebido como fator deimpecilho ao desenvolvimento e que representava um potencial parasurgimento do radicalismo agrrio. Durante o regime militar, a ao sindi-cal e a luta pela terra foram rigorosamente reprimidas, o que pode sugerirque a aprovao do PRORURAL em 1971 tenha sido mais uma concessopor parte do Estado do que uma conquista dos trabalhadores, chamando aateno, como fizeram Malloy, Parodi (1993) e Schwarzer (2000), para ospossveis interesses dos militares que comandavam o pas13. Os argumen-tos desses pesquisadores se consolidam com o reconhecimento de que aquesto da previdncia social era secundria no meio rural, naquele per-odo. Por outro lado, preciso considerar que, at a dcada de 60, emboraa sindicalizao rural no fosse expressamente proibida, e apesar de in-centivada por lderes dos movimentos sociais (como Julio, 1962), pratica-mente no ocorria por falta de regulamentao especial14, o que dificulta-

    13 preciso reconhecer que, em alguns aspectos, a legislao promulgada durante o regime militar fez retroceder naquesto de benefcios j concedidos aos trabalhadores rurais, tal como a previso de 3% da renda tributria da Unio, aserem destinados reforma agrria, previstos no artigo 28 do Estatuto da Terra, de 30 de novembro de 1964 (cuja prepara-o anterior ao golpe militar, mas cuja discusso e aprovao foram feitas pelo Congresso durante a fase inicial do regimemilitar, mais favorvel aos interesses dos trabalhadores), suprimidos na legislao de fevereiro de 1968.14 Julio, lder das Ligas Camponesas formadas no perodo 1960-4, dizia que o sindicato rural o guia que mostra aosassalariados rurais o caminho da liberdade, indicando que o fraco sucesso organizacional da classe trabalhadora deve-se a:1) a dificuldade de aplicao das normas legais referentes aos assalariados rurais pela inexistncia de Cmaras de Concilia-o em muitos distritos judicirios do interior; 2) pela falta de recursos financeiros para a luta, devido aos baixos salriosrecebidos pelos trabalhadores; 3) pela instabilidade do trabalho assalariado, devido ao excesso da oferta de trabalho e aocarter peridico da produo (Julio, 1962, p.50-8; p.69-80).

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    65SOCIOLOGIAS

    va a organizao dos trabalhadores e a manifestao de seus interesses declasse. Alm disso, as leis que se seguiram (Estatuto do Trabalhador Rural eEstatuto da Terra) so em grande parte originrias das antigas reivindica-es do perodo populista (Coradini e Belato, 1981, p.162) ou, como diz oassessor da Confederao Nacional de Trabalhadores na Agricultura -CONTAG (Gorenstein, 1981, p.237), essas conquistas no foram frutodas ddivas do Governo da poca, mas foram fruto de lutas, das mobiliza-es freqentes dos trabalhadores em vrios estados do Pas.

    O lanamento do PRORURAL (1971) deixou claro que a distribuioda terra seria um segundo passo, uma etapa posterior a toda regulamenta-o de assistncia ao trabalhador (parte do discurso do Presidente Mdici,por ocasio do lanamento do PRORURAL, in CNBB-CEP, 1976, p.102).

    Examinando os avanos da previdncia social no estado do Rio Grandedo Sul, Coradini (1989, p.329-30) mostra que a reivindicao da extenso dosbenefcios da previdncia social aos assalariados rurais e trabalhadores aut-nomos j estava presente no 1 Congresso de Trabalhadores Rurais, realizadopela antiga Frente Agrria Gacha (FAG), em 1962. A mesma reivindicao,com pequenas diferenas em nfase e em questes especficas, esteve pre-sente em todos os encontros e congressos de trabalhadores rurais que se segui-ram. Devido, por um lado, situao poltica geral, que fixava os limites tantoda atuao quanto do discurso sindical, e, por outro lado, influncia da alaconservadora da Igreja Catlica sobre o sindicalismo rural (Coradini, 1989,p.331), durante toda a dcada de 60 e at meados da dcada de 70, asdemandas dos trabalhadores rurais tinham um tom de reivindicao, no sen-tido de pedido ao governo (e no no sentido de direitos).

    Na maior parte da documentao [a questo da previ-dncia social] aparece como um problema administrati-vo, no sentido de informaes e gesto da apropriaodos benefcios atravs dos sindicatos pelos segurados,bem como exigncias por parte dos sindicatos quanto scondies dos associados usufrurem dos mesmos(Coradini, 1989, p.330).

  • 66 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    Mais adiante, em meados da dcada de 70, a forma de exposio dasreivindicaes e o prprio tom se modifica e j aparecem exigncias quan-to ao comportamento que os demais agentes sociais envolvidos deveria adotar(Coradini, 1989, p.331-2). Finalmente, no Rio Grande do Sul, a questo dasade e previdncia social rural, enquanto lutas e manifestaes pblicasmais generalizadas, passou a ser um tema por volta de 1976, intensificando-se particularmente a partir de 1979/80 (Coradini, 1989, p.334).

    Com o lanamento do PRORURAL, em 1971, e sua posteriorimplementao, ficou evidente o interesse do Estado em cooptar os sindicatosde trabalhadores rurais, atravs de convnios estabelecidos com eles para aadministrao da assistncia mdica, com vistas legitimao de uma deter-minada estrutura social estratificada e contraditria (Coradini, 1996, p.185).Como resultado, esses sindicatos transformaram-se em agncias de prestaode servio antes de entidades representativas de interesses de classe (Delgadoe Schwarzer, 2000, p.190; Schmitt, 1996) e se tornaram dependentes dosorganismos governamentais (Coradini,1989, p.59). Ao mesmo tempo, o inte-resse dos sindicatos em torno da assistncia aos trabalhadores rurais tinha difi-culdade de legitimar-se no discurso sindical que se pretendia mais classista(Coradini, 1996, p.184), contribuindo para o estabelecimento de divises narepresentao sindical, como evidenciado pelo surgimento de sindicatos detrabalhadores rurais de oposio aos sindicatos vinculados s federaes esta-duais de trabalhadores rurais, embora mesmo esses sindicatos se encontremfortemente referenciados ao modelo de prestao de servios (Schmitt, 1996);e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), de orientaoleninista, que adentrou o vcuo poltico aberto pela reduzida nfase da CUTna organizao dos produtores sem terra (Fox, 1996, p.21).

    Desde o final da dcada de 70, quando comea a abertura polticado governo militar, foi intensa a mobilizao dos trabalhadores rurais comvistas ao atendimento sade e ao acesso a ou ampliao dos benefciosda previdncia social. Inicialmente, a preocupao das organizaes sindi-cais centrava-se na aplicao da legislao no tocante gratuidade da pres-

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    67SOCIOLOGIAS

    tao de servios mdico-hospitalares - pela inexistncia de centros pbli-cos de sade na maioria dos municpios do interior e pela tentativa de osmdicos atenderem gratuitamente apenas os pacientes considerados comoindigentes (Coradini, 1996, p.180) - e no aumento do valor da aposenta-doria rural (considerada uma humilhao para os trabalhadores rurais),trazendo, como bandeira de luta, o slogan no somos meio homem parareceber meio salrio mnimo (Coradini, 1989, p.280). J no incio da dca-da de 80, a incluso na pauta das reivindicaes da extenso da aposenta-doria s mulheres trabalhadoras rurais e a mobilizao das prprias mulhe-res foram vistas como uma estratgia poltica (Brumer, 1990; 1993). Essamobilizao, que incluiu encontros com milhares de participantes e cara-vanas a Braslia, para pressionar os parlamentares que deveriam discutir eaprovar a nova legislao, foi intensa e constituiu um fator importante naaprovao das leis includas na Constituio de 1988 (Brumer, 1993;Stephen, 1996, 1997; Teixeira et alii, 1994).

    Nas origens da mobilizao das mulheres trabalhadoras rurais est omovimento de mulheres, que comeou a desenvolver-se no pas no finalda dcada de 70, primeiramente como um movimento nacional de lutapara o retorno da democracia no pas e, em segundo lugar, como ummovimento de luta pelos direitos das mulheres e pela eliminao de suadiscriminao. Como indica Barsted (1994, p.40), entre suas conquistasaps o retorno da democracia est a criao do Conselho Nacional dosDireitos da Mulher (CNDM) em 1985, durante o governo do presidenteSarney que teve um papel muito importante nos debates que antecede-ram a reforma constitucional de 1988, devido sua abordagem progressis-ta da questo de gnero. Tambm foi importante a mobilizao das prpri-as mulheres trabalhadoras rurais, principalmente no Sul do pas, a partir doincio da dcada de 80, com o objetivo primeiro de obteno de direitosreferentes previdncia social, tais como aposentadoria e salrio-materni-dade, mas, medida que o movimento avanava, esses direitos subordi-navam-se ao reconhecimento de sua condio profissional de trabalhado-ras rurais.

  • 68 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    O enquadramento das mulheres como beneficirias da previdnciasocial rural era dificultado pela

    incompatibilizao da organizao do trabalho familiarrelativamente ao enquadramento individual da regula-mentao. Todo o raciocnio e argumentao, tanto daslideranas como dos trabalhadores rurais, seja homemou mulher, pautado no carter familiar einterdependente do trabalho, ao passo que a legislaoenquadra o indivduo trabalhador, chefe da famlia, etc.e seus dependentes (Coradini, 1989, p.280).

    A partir do Governo Collor (1990), o pas adota claramente uma pers-pectiva neoliberal, que se traduz, no que diz respeito previdncia social,na viso dos direitos sociais cada vez mais como problema e menos comoobrigao; chegam a ser apresentados como ameaa democracia, comoobstculo ao saneamento das finanas pblicas, agentes do processo infla-cionrio, pura expresso de interesses corporativos (Nogueira, 2000). Asconquistas sociais da legislao de 1988 passam a ser responsabilizadas pe-los excessos que estariam a turvar a racionalidade do Estado e a prolongarinjustias (Nogueira, 2000). No que se refere previdncia rural, so fre-qentes as notcias divulgadas na imprensa sobre seu carter deficitrio.

    O perodo 1995-1996 pode ser chamado de represamento de be-nefcios da previdncia rural, pois, devido a alteraes nos procedimentosat ento praticados pelo INSS, com vistas a conter fraudes que se verifica-vam nas concesses15, ocorreu um significativo incremento no nmero desolicitaes de aposentadorias indeferidas. Como indica Silva (2000, p.110),at esta data, o principal documento utilizado para o(a) trabalhador(a) ru-ral requerer a aposentadoria era a declarao do sindicato, que era a se-guir homologada pela Promotoria Pblica do Municpio atravs de um

    15 Algumas fontes de fraudes so: 1) vendas de produtos agrcolas sem nota, implicando a reduo do montante decontribuio dos produtores; 2) incluso, nas notas de venda, de membros da famlia que no exercem atividades produti-vas na unidade de produo familiar; 3) falsificao de documentos comprobatrios de atividade rural; 4) escamoteamentode atividades no-rurais remuneradas.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    69SOCIOLOGIAS

    procedimento bastante simples. As novas exigncias do INSS passaram aincluir a apresentao de documentos comprobatrios para atestar os anostrabalhados, entre os quais estavam o Cadastro de Propriedade do Imvelno INCRA, o Contrato de Arrendamento e o Bloco de Notas de venda daproduo, os quais raramente so emitidos em nome das mulheres cnju-ges. Silva (2000, p.111) relata que, em meados de 1996, aps uma sriede presses sindicais e negociaes com o INSS/MPAS, as trabalhadoraspuderam novamente requerer a aposentadoria com a apresentao dedocumentos em nome do companheiro, desde que comprovassem o vn-culo familiar. Elas tambm podiam comprovar a atividade no perodo emque eram solteiras, atravs da documentao em nome do pai, mas com anova reforma da previdncia rural ocorrida em dezembro de 1998, tor-nou-se necessrio comprovar sua afiliao ao sindicato, de forma inde-pendente, durante pelo menos nove anos, perodo que aumentado acada ano. Alm disso, a nova lei extinguiu a possibilidade de somar otempo de trabalho urbano, com carteira de trabalho assinada, com o tem-po de trabalho rural, para fins de aposentadoria rural. Com esta medida, ogoverno pretende manter sob controle o crescimento das despesas com aprevidncia rural, tendo em vista que a populao rural brasileira foi signi-ficativamente diminuda, tanto em termos relativos como em termos abso-lutos16, em grande parte como conseqncia das migraes ocorridas nopas nas ltimas quatro dcadas.

    Ressalte-se que, desde meados dos anos 80, os sindicatos de traba-lhadores rurais no Rio Grande do Sul que assumiram a defesa dos direi-tos relativos previdncia social como uma de suas metas centrais - tmorientado seus associados no sentido de registrar notas de venda da produ-o tanto no nome do homem como no nome da mulher, assim como node seus filhos, o que passvel de aceitao, pelos homens, principalmen-te pelo fato de no resultar em despesas adicionais (Brumer, 2000).

    16 De fato, a populao rural brasileira era constituda por 35,5 milhes de pessoas em 1960, representando 54,9% dapopulao brasileira total, enquanto que, em 1998, a populao rural totalizava 35,2 milhes de pessoas, representando21,7% da populao total (IBGE, 1998, 2000).

  • 70 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    Alguns resultados da implantao da previdncia social ruralno Sul do Brasil

    Uma das caractersticas principais da agricultura da regio Sul doBrasil ser constituda fundamentalmente por pequenas unidades familia-res de produo, independentes das grandes exploraes agropecurias(neste sentido, diferindo fundamentalmente da situao da agricultura emoutras regies do pas). Essas unidades produtivas esto inseridas no mer-cado, tanto nacional como internacional, e sofrem os efeitos das polticasdirigidas ao setor. Ao mesmo tempo, como so fundadas no trabalho fami-liar, enfrentam as crises econmicas de forma distinta das grandes empre-sas do setor e, como esto inseridas no mercado, sua dinmica difere dasunidades familiares baseadas principalmente na auto-subsistncia, predo-minantes na regio Nordeste17.

    Nas duas ltimas dcadas, a agricultura brasileira enfrentou muitasmudanas. Durante a primeira metade da dcada de 80, a poltica agrcolacaracterizou-se pela falta de crdito e pela retirada dos subsdios agrcolas,com efeitos principalmente sobre os mdios e grandes produtores e sobreos cultivos destinados exportao. Os produtores menos afetados foramos que produziam cultivos para o mercado interno, devido existncia deuma poltica de preos mnimos. Na segunda metade da dcada, novaspolticas agrcolas levaram desregulamentao do setor, o que foi agrava-do pela abertura comercial com o exterior, com o favorecimento das im-portaes de produtos agrcolas, muitos dos quais recebem subsdios noexterior. A adoo do Plano Real, em julho de 1994, que resultou na con-teno dos enormes ndices de inflao que vigoravam no pas durantevrias dcadas, teve como efeito o aumento da capacidade de consumoda populao, com resultados positivos para os produtores de cultivos des-tinados ao mercado interno. No entanto vrios problemas decorrentes daabertura s importaes e da falta de recursos pblicos para o financia-

    17 Esta uma das explicaes para os ndices mais elevados de pobreza no Nordeste, quando comparada com outrasregies do pas.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    71SOCIOLOGIAS

    mento da produo permaneceram, com impactos sobre a rea cultivadae sobre a renda da atividade agrcola, que sofreu uma reduo de cerca de40% em comparao com os resultados da primeira metade da dcada de80 (Graziano da Silva, Balsadi, Del Grossi, 1997, p.50).

    Em vista das condies econmicas que afetam os produtores rurais,o acesso aos benefcios da previdncia social tm impactos considerveissobre suas condies de reproduo, o que pode ser constatado em pes-quisas recentes.

    Vrios pesquisadores analisaram os resultados de uma pesquisa do-miciliar, realizada pelo Instituto de Pesquisas Aplicadas (IPEA) no segundosemestre de 1998, em parceria com o Instituto Paranaense de Desenvolvi-mento Econmico e Social (Ipardes) e o Departamento de EstudosSocioeconmicos Rurais (Deser), envolvendo uma amostra de 3000 domi-clios com indivduos beneficirios da previdncia rural nos trs Estados doSul do Brasil18 - Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O objetivo dapesquisa era avaliar as condies de vida e reproduo econmica dasfamlias beneficirias da previdncia rural na regio Sul do Brasil. Comoindicam os dados coletados na pesquisa, os pagamentos previdenciriosso de longe a principal fonte de renda nos domiclios do Nordeste e pra-ticamente a metade da renda domiciliar em 90% dos domiclios pesquisadosdo Sul (Delgado e Cardoso Jr., 2000, p.12).

    A anlise dos dados da pesquisa demonstra o enorme impacto destapoltica, que permite manter, no Sul do Pas, 85% das famlias beneficirias deno mnimo um benefcio da previdncia rural acima da linha da pobreza base-ada em salrio mnimo mensal per capita (equivalente a cerca de US$ 60por ocasio da pesquisa de campo, em 1998), enquanto entre as famlias queno recebem nenhum benefcio, a proporo das que se situam acima dalinha de pobreza de apenas 60% (Delgado e Cardoso Jr., 2000, p.33). Adiferena positiva em favor dos beneficirios da previdncia rural deve-se emgrande parte aos seguintes aspectos: a) os beneficirios da previdncia ten-

    18 Uma outra amostra com 3000 informantes foi utilizada para pesquisar o efeito da previdncia rural no Nordeste. Osdados coletados na pesquisa esto disponveis no site: www.ipea.gov.br.

  • 72 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    dem a receber mais de um benefcio por domiclio (numa mdia de 1,78benefcios por domiclio) 19; b) os domiclios com beneficirios da previdnciarural esto associados a estabelecimentos produtivos, em geral agropecurios;c) o tamanho mdio das famlias no difere muito entre os beneficirios e osno-beneficirios da previdncia rural; d) nos domiclios em que ocorre orecebimento de pelo menos um benefcio da previdncia rural habitam pes-soas ocupadas no mercado de trabalho (Delgado e Cardoso Jr., 2000, p.34).Este ltimo aspecto merece um comentrio especial, pois diferentemente doque ocorre em outros pases, no Brasil, raramente o aposentado pela previ-dncia social deixa de trabalhar, em grande parte porque o valor do benefciode um modo geral insuficiente para atender a todas suas necessidades. Valeressaltar, porm, que a manuteno do trabalho aps a aposentadoria aparen-temente ocorre mais entre os homens do que entre as mulheres, pois Silva(2000, p.126) mostra que, no Sul do Brasil, enquanto 48,1% dos homensbeneficirios declararam-se sem ocupao, isso ocorreu com 74,5% das mu-lheres beneficirias. A explicao para esta diferena provavelmente est nainvisibilidade do trabalho feminino, pois as mulheres envolvem-se principal-mente em atividades no mbito domstico, que, apesar de inclurem inme-ras tarefas destinadas produo de bens de consumo para os prprios mem-bros da famlia, no so vistas como trabalho.

    Considerando ainda o impacto redistributivo do sistema de previdnciarural, outro aspecto que merece destaque o fato de que o benefcioprevidencirio to mais importante na conformao da renda domiciliar quan-to menores as faixas de rendimentos considerados (Delgado e Cardoso Jr, 2000,p.25)20. Alm disso, Sugamosto e Doustdar (2000, p.149) salientam que

    19 Como indicam Sugamosto e Doustdar (2000), o beneficirio poder receber mais de um benefcio previdencirio deprestao continuada. Entretanto, somente possvel a combinao de benefcios concedidos por Aposentadoria por Idadecom Penso por Morte ou Aposentadoria por Invalidez com Penso por Morte. No possvel combinar a Aposentadoriapor Idade com Aposentadoria por Invalidez, tampouco a Renda Mensal Vitalcia com qualquer outro tipo de benefcio. fcil entender as combinaes de benefcios possveis, tendo em vista que tanto a Aposentadoria por Idade como a Aposen-tadoria por Invalidez so direitos do(a) trabalhador(a) ativo, sendo autoexclusivas por natureza, ao passo que a Penso porMorte um direito de herana, ao cnjuge sobrevivente.

    20 Como indicamos acima, apesar da melhoria de renda da populao beneficiada, o impacto sobre a distribuio de rendano evidente. De qualquer forma, o simples fato de um nmero significativo de trabalhadores e trabalhadoras rurais teremacesso ao benefcio significa que sua situao (assim como a distribuio de renda) seria pior sem ele.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    73SOCIOLOGIAS

    uma das principais funes desempenhadas por esse se-guro social diz respeito sua contribuio para a repro-duo econmica e social das unidades familiares, umavez que 63,5% dos beneficirios so chefes do domiclioe que a renda oriunda de benefcios previdencirios naregio Sul representa 41,6% da renda familiar mdia.

    Uma das caractersticas dos beneficirios da previdncia rural na re-gio Sul do Brasil que 63,2% so do sexo feminino e 36,8% do sexo mas-culino (Delgado e Cardoso Jr, 2000, p.18). As principais explicaes para opredomnio das mulheres como beneficirias da previdncia rural so: 1) aidade mnima para ingresso no sistema, para as mulheres, inferior doshomens em cinco anos (respectivamente 55 e 60 anos); 2) como em geraltm maior longevidade, alm de beneficirias por direito da aposentadoriapor idade, as mulheres ainda tendem a herdar mais que os homens os direi-tos da penso por morte do cnjuge (Delgado e Cardoso Jr., 2000, p.19).

    Entre as mulheres beneficirias da previdncia rural, na regio Sul,66% recebem o benefcio aposentadoria por idade (Sugamosto e Doustdar,2000: p.142) e majoritariamente tm 55 anos ou mais (apenas 8,4% dasmulheres beneficirias tm menos de 55 anos de idade) (Delgado e Car-doso Jr., 2000, p.20). Com relao ao estado civil, 52,8% das mulheresbeneficirias da previdncia rural so vivas (situao em que superam oshomens), 39,8% so casadas, 4,2% so solteiras e 3,1% so separadas(Sugamosto e Doustdar, 2000, p.142).

    Deve-se destacar ainda que, entre os produtores familiares beneficiadoscom a previdncia rural, quase todos utilizam parte da renda do benefcio ematividades relacionadas com a agropecuria, evidenciando-se a importnciaassumida pelo seguro agropecurio no financiamento da agricultura familiar,estabelecendo-se, dessa forma, como um seguro agrcola (Sugamosto eDoustdar, 2000). Alm disso, como salientam Delgado e Cardoso Jr (1999),ocorre a revalorizao de pessoas idosas que, aps o recebimento do seguroprevidencirio, passam da condio de dependentes para a de provedores, oque inclui amparo e emprstimos e doaes a membros da famlia e vizinhos.

  • 74 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    Observaes da autora no interior do Rio Grande do Sul indicam ain-da que o salrio-maternidade, recebido durante quatro meses pelas mulhe-res que tiveram filhos, tambm utilizado na reproduo da famlia; dife-rentemente das trabalhadoras assalariadas urbanas, que deixam de exercersuas atividades profissionais neste perodo, dedicando-se apenas s tarefasdomsticas e ao cuidado do beb, as trabalhadoras rurais continuam a exer-cer suas atividades habituais, sem utilizar o dinheiro, por exemplo, parapagar algum para substitu-las em suas atividades agrcolas ou domsticas.

    preciso salientar o valor simblico do recebimento do benefcio pelasmulheres. De pessoas que nunca haviam recebido remunerao pelos tra-balhos realizados (Silva, 2000, p.102), elas passam a ter uma conta e umcarto bancrio em seus prprios nomes, recebendo seus benefcios regulare diretamente. O fato de receber o dinheiro da aposentadoria, da penso eda licena-maternidade diretamente em seus nomes permite que elas pr-prias decidam como gast-lo, o que aumenta seu poder pessoal. Por isso, depessoas que, na terceira idade, passavam condio de dependentes doscompanheiros, filhos ou de outros parentes ainda em idade ativa, elas setornam provedoras e administradoras de um dos poucos recursos existentesna unidade familiar de produo com entrada regular, ms a ms.

    Por outro lado, algumas pesquisas realizadas no interior do Rio Grandedo Sul (Brumer, 2000) tm revelado que homens e mulheres utilizam odinheiro de maneira diferente, da um efeito adicional do acesso das mulhe-res rurais previdncia social. Diferentemente dos homens, as mulheresraramente utilizam o dinheiro que recebem diretamente em gastos pesso-ais, mas, antes de mais nada, procuram garantir o sustento e melhorar aqualidade de vida de suas famlias. Neste sentido, o benefcio da aposenta-doria rural das mulheres proporciona a garantia de sua prpria reproduo ea de suas famlias, enquanto apenas parte embora provavelmente a maiorparte dos benefcios recebidos pelos homens atua nesta direo.

    Outro valor simblico do acesso das mulheres previdncia socialrural como beneficirias diretas a percepo de que foram partcipes dasconquistas, o que aumenta a conscincia sobre seus direitos. No entanto

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    75SOCIOLOGIAS

    preciso dizer que nem as mobilizaes das quais tm participado, nem aconquista de direitos sociais, nem o aumento da percepo de direitos deum modo geral, leva essas mulheres a questionar as relaes de gnero nocotidiano de suas relaes pessoais.

    Questes para reflexo

    Como indicam Delgado e Cardoso Jr (2000, p.16),

    o papel dos movimentos sociais e sindicais que levaram conquista de direitos mnimos no mbito da poltica soci-al e agrria e, principalmente, sua manuteno no difcilembate da atual conjuntura a novidade mais significati-va da dcada de 90 no pas, cujos primeiros frutos pude-ram ser conhecidos e colhidos.

    Assim, uma primeira questo diz respeito aos rumos da previdnciasocial na atual conjuntura da sociedade brasileira. Por um lado, observa-sea tentativa do governo de amenizar o quadro deficitrio da previdnciasocial, incluindo a previdncia social rural. De outro lado, as medidas eco-nmicas implementadas na ltima dcada, incluindo a retirada dos subs-dios agrcolas, tm empobrecido a populao rural brasileira, o que trans-forma o acesso aos benefcios da previdncia social em seguro-agrcola eseguro-reproduo, condies indispensveis para sua manuteno no meiorural, que provavelmente age no sentido de represar de modo relativo oxodo rural. Ao mesmo tempo, devido sua importncia para a reprodu-o dos beneficirios e percepo desses benefcios como conquista eno como doao, a tendncia de os trabalhadores lutarem por suamanuteno e se manifestarem publicamente contra tentativas de alteraras regras ou retirar direitos j conquistados. Deste modo, possvel pre-ver que, do lado do Governo, continuaro as tentativas de controlar oacesso de beneficirios potenciais, atravs de novas exigncias quanto comprovao de tempo de servio e aumento do tempo necessrio para a

  • 76 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    aposentadoria, evitar fraudes e aumentar o valor das contribuies; dolado dos trabalhadores rurais, a nfase principal dever ser no atendimen-to sade, que, embora tenha melhorado a partir da descentralizao dosservios atravs do Sistema nico de Sade (SUS), ainda muito precriono meio rural.

    Outra questo se refere atuao dos sindicatos rurais. Tendo emvista seu comprometimento com a administrao da previdncia socialrural, fundando-se nela sua principal legitimao junto aos agricultores,dificilmente pode-se prever que iro abrir mo de sua vinculaoinstitucional e cooptao para adotarem aes reivindicativas que pos-sam ser consideradas ilegais. Assim, pouco provvel que se tornem maiscombativos do que so atualmente. No entanto, como veculos da admi-nistrao da previdncia social rural, certamente assumiro a vanguardadas lutas para a manuteno de direitos j adquiridos e da ampliao econquista de novos direitos relativos seguridade social dos trabalhadoresrurais autnomos.

    Finalmente importante destacar que, para os que continuam exclu-dos da previdncia social rural tais como as mulheres dos trabalhadoresrurais assalariados e os que exercem atividade no meio rural de formainformal (isto , sem registro em carteira de trabalho, como assalariado, ousem registro de venda da produo em seu prprio nome e no de seusdependentes) -, no h soluo a curto prazo. Com base na legislaoexistente, o nico encaminhamento possvel o registro profissional ou oacesso a programas de assistncia social (programa de renda mnima oudistribuio de cestas bsicas). Ao mesmo tempo, como indica Matijascic(2001), mesmo que as mulheres possam aposentar-se cinco anos antesque os homens e tenham expectativa de vida maior, pouco provvel queo governo tente mudar sua situao relativamente favorvel, devido smaiores dificuldades que enfrentam no mercado de trabalho.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    77SOCIOLOGIAS

    Referncias bibliogrficas

    BARSTED, Leila Andrade Linhares. Em busca do tempo perdido: mulher e polti-cas pblicas no Brasil, 1983-1993. Revista Estudos Feministas (CIEC/Escola deComunicao UFRJ), n. especial (outubro), 1994, p.38-53.

    BONATO, Amadeo. Previdncia Social: incluses e excluses. Curitiba: DESER, 1996.

    BRUMER, Anita. Sindicalismo rural e participao dos agricultores em sindicato,em Candelria, Rio Grande do Sul, Brasil. Porto Alegre: Centro de Estudos e Pes-quisas Econmicas (IEPE), UFRGS, 1971 (dissertao de mestrado).

    BRUMER, Anita. As lutas no campo, no Rio Grande do Sul (1964-1883). Revistado Instituto de Filosofia e Cincias Humanas da UFRGS, v.13, 1985, p.198-218.

    BRUMER, Anita. Consideraes sobre uma dcada de lutas sociais no campo noextremo sul do Brasil (1978-88), Ensaios FEE, ano 11, n.1, 1990, p.124-42.

    BRUMER, Anita. Mobilization and the quest for recognition: the struggle of ruralwomen in Southern Brazil for access to welfare benefits. In: Christopher Abel andColin M. Lewis (eds), Welfare, poverty and development in Latin America. London:Macmillan Press, 1993, p.405-20.

    BRUMER, Anita. Gnero e agricultura: a situao da mulher na agricultura do RioGrande do Sul. Paper presented at the XXII International Congress of the LatinAmerican Studies Association (LASA), Miami, March 16-18, 2000.

    CNBB-CEP (Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil Comisso Episcopal daPastoral), Pastoral da terra; posse e conflitos. So Paulo: Paulinas, 1976.

    CORADINI, Odacir Luiz; BELATO, Dinarte. Observaes sobre os movimentossociais no campo, hoje. In: Assemblia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul,Seminrio Nacional A questo da terra. Porto Alegre: Comisso de Agricultura ePecuria, Assemblia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, 1981, p.161-6.

    CORADINI, Odaci Luiz. Representaes sociais e conflitos nas polticas de sadee previdncia social rural. Rio de Janeiro: Museu Nacional/UFRJ, 1989 (tese dedoutorado em Antropologia Social).

  • 78 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    CORADINI, Odaci Luiz. Ambivalncias na representao de classe e a noo detrabalhador rural. In: Zander Navarro (org.), Poltica, protesto e cidadania nocampo: as lutas sociais dos colonos e trabalhadores rurais no Rio Grande do Sul.Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 1996, p.171-88.

    DEERE, Carmen Diana; LEN, Magdalena. Gnero, propriedad y empoderamiento:tierra, Estado y mercado en Amrica Latina. Bogot, Colombia: Tercer Mundo, 2000.

    DELGADO, Guilherme. Agricultura e comrcio exterior: rumo da regulao esta-tal e suas implicaes para a regulao alimentar. Cadernos temticos do Frumalternativo para a Agricultura Brasileira. Rio de Janeiro: Rede Interamericana Agri-cultura e Democracia, 1994.

    DELGADO, Guilherme. Previdncia rural: relatrio de avaliao socioeconmica.Braslia: IPEA, 1997 (texto para discusso, 477).

    DELGADO, Guilherme; CARDOSO Jr., Jos Celso. O idoso e a previdncia ruralno Brasil: a experincia recente de universalizao. Braslia: IPEA, 1999 (textopara discusso, 688).

    DELGADO, Guilherme; CARDOSO Jr., Jos Celso. Principais resultados da pes-quisa domiciliar sobre a previdncia rural na regio sul do Brasil (Projeto AvaliaoSocioeconmica da Previdncia Social Rural). Rio de Janeiro: IPEA, 2000 (textopara discusso, 734).

    DELGADO, Guilherme; SCHWARZER, Helmut. Evoluo histrico-legal e formasde financiamento da previdncia rural no Brasil. In: Guilherme Delgado e JosCelso Cardoso Jr. (orgs.), A universalizao de direitos sociais no Brasil: a Previdn-cia Rural nos anos 90, Braslia: IPEA, 2000, p.187-210.

    FOX, Jonathan. A poltica e as novas formas de organizao camponesa na Amri-ca Latina. In: Zander Navarro (org.), Poltica, protesto e cidadania no campo; aslutas sociais dos colonos e trabalhadores rurais no Rio Grande do Sul. Porto Alegre:Editora da Universidade/UFRGS, 1996, p.15-28.

    GORENSTEIN, Ossir. In: Assemblia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul,Seminrio Nacional A questo da terra. Porto Alegre: Comisso de Agricultura ePecuria, Assemblia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, 1981, p.237-9.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    79SOCIOLOGIAS

    GRAZIANO DA SILVA, Jos; BALSADI, Otvio Valentim; DEL GROSSI, MauroEduardo. O emprego rural e a mercantilizao do espao agrrio. So Paulo emPerspectiva, vol. 11, n.2, 1997, p.50-64.

    HOFFMANN, Rodolfo. Distribuio da renda no Brasil: poucos com muito e mui-tos com muito pouco, in Ladislau Dowbor e Samuel Kilsztajn (orgs.), Econo-mia Social no Brasil. So Paulo: Editora SENAC, 2001. Tambm em:www.eco.unicamp.br/projetos/ Hoffmann2.html, 2001.

    HOFFMANN, Rodolfo. Os limites da desigualdade de renda. Gazeta Mercantil, 6de novembro de 2001, p.3, 2001b.

    HOUTZAGER, Peter P. State and Unions in the transformation on the brazilian countryside,1964-1979. Latin American Research Review, vol. 33, n.2, 1998, p.103-42.

    JULIO, Francisco. Que so as ligas camponesas? Rio de Janeiro: Civilizao Bra-sileira, 1962.

    KAY, Stephen. Brazils social security reform in comparative perspective. Trabalhoapresentado no XXIII Congresso da Associao de Estudos Latino-americanos (LASA),Washington DC, 6-8 de setembro de 2001.

    MALLOY, James M. A poltica de previdncia social no Brasil. Rio de Janeiro:Graal, 1986.

    MALLOY, James M.; PARODI, Carlos A. Politics, Equity and Social Security Policyin Brazil: A Case-Study of Statecraft and Citizenship, 1965-85. In: ChristopherAbel and Colin M. Lewis (eds), Welfare, Poverty and Development in Latin America.Basingstoke, Hampshire: Macmillan Press/St. Antonys College, 1993, p.341-64.

    MATIJASCIC, Milko. Reformas estruturais e previdncia no Brasil: balano atual eperspectivas. Trabalho apresentado no XXIII congresso da Associao de EstudosLatino-americanos (LASA), Washington DC, 6-8 de setembro de 2001.

    NOGUEIRA, Marco Aurlio. A Seguridade possvel. Jornal do Conselho Regionalde Servio Social (10 regio), n.57, Novembro de 2000.

    OLIVEIRA, Francisco E. B. de; BELTRO, Kaiz Iwakami; FERREIRA, Mnica Guerra.Reforma da Previdncia. Rio de Janeiro: IPEA, 1997 (texto para discusso, 508).

  • 80 SOCIOLOGIAS

    Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    PRICE, Robert. Rural unionization in Brazil. Madison: Land Tenure Center, Universityof Wisconsin (Research Paper14), 1964.

    RODRIGUES, Jos Albertino. Sindicalismo e desenvolvimento no Brasil. So Pau-lo: Difuso Europia do Livro, 1968.

    SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Cidadania e Justia; a poltica social na or-dem brasileira. Rio de Janeiro: Campus, 1979.

    SCHMITT, Claudia Job. A CUT dos colonos: histrias da construo de um novosindicalismo no campo no Rio Grande do Sul. In: Zander Navarro (org.), Poltica,protesto e cidadania no campo; as lutas sociais dos colonos e trabalhadores rurais noRio Grande do Sul. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 1996, p. 189-226.

    SCHWARZER, Helmut. Previdncia rural e combate pobreza no Brasil Resulta-dos de um estudo de caso no Par. Estudos Sociedade e Agricultura, n.14, abril2000, p. 72-102.

    SCHWARZER, Helmut. Impactos socioeconmicos do sistema de aposentadoriasrurais no Brasil evidncias empricas de um estudo de caso no estado do Par.Rio de Janeiro, IPEA, 2000b (texto para discusso, 729).

    SILVA, Enid Rocha Andrade. Efeitos da previdncia social rural sobre a questo degnero. In: Guilherme DELGADO e Jos Celso CARDOSO Jr. (orgs.), Auniversalizao de direitos sociais no Brasil: a Previdncia Rural nos anos 90. Braslia:IPEA, 2000. p.101-30.

    SUGAMOSTO, Marisa; DOUSTDAR, Neda Mohtadi. Impactos da previdncia ruralna regio Sul: nfase nas caractersticas mesorregionais. In: Guilherme DELGADOe Jos Celso CARDOSO Jr. (orgs.), A universalizao de direitos sociais no Brasil: aPrevidncia Rural nos anos 90. Braslia: IPEA, 2000, p.131-64.

    STEPHEN, Lynn. Relaes de gnero: um estudo comparativo sobre as organizaesde mulheres rurais no Mxico e no Brasil. In: Zander NAVARRO (org.), Poltica,protesto e cidadania no campo; as lutas sociais dos colonos e trabalhadores rurais noRio Grande do Sul. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 1996, p.29-61.

    STEPHEN, Lynn. Women and Social Movements in Latin America; Power fromBelow. Texas: University of Texas Press, 1997.

  • Sociologias, Porto Alegre, ano 4, n 7, jan/jun 2002, p. 50-81

    81SOCIOLOGIAS

    TEIXEIRA, Zuleide Arajo et alii (org.). Perspectivas de gnero na produo rural.Braslia: IPEA, 1994 (Estudos de Poltica Agrcola, n. 22).

    VALDS, Teresa; GOMRIZ, Enrique (eds). Mujeres latinoamericanas en cifras:tomo comparativo . Santiago de Chile: Flacso e Instituto de la Mujer, Espaa, 1995.

    WESCHENFELDER, Cansio F. In: Assemblia Legislativa do Estado do Rio Grande doSul, Seminrio Nacional A questo da terra. Porto Alegre: Comisso de Agricultura ePecuria, Assemblia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, 1981, p.141-3.

    Resumo

    O trabalho apresenta uma anlise das principais transformaes da previ-dncia social rural no Brasil, que culminaram com a incluso das mulheres traba-lhadoras rurais como beneficirias (direito aposentadoria por idade e salrio-maternidade) na legislao aprovada pelo Congresso Nacional em 1988. Paralela-mente, faz-se um exame do papel do Estado e da sociedade civil na evoluo dalegislao relativa previdncia social rural, procurando-se evidenciar seu carterde doao por parte do Estado ou da conquista polos prprios trabalhadores(as).Finalmente, so examinados alguns impactos da implantao da previdncia soci-al rural no Sul do Brasil, ressaltando-se seu papel na diminuio da pobreza rurale da desigualdade na distribuio da renda, assim como sua importncia materiale simblica na mudana de relaes de gnero no meio rural.

    Palavras-chave: gnero, mulher rural, previdncia social rural.