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UNIVERSIDADE REGIONAL DO CARIRI URCA CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS CESA CURSO DE DIREITO TURNO VESPERTINO VIII SEMESTRE 2013.2 DISCIPLINA PROCESSO CIVIL II PROFESSOR MARCELINO OLIVEIRA SANTOS THIAGO DE FIGUEIREDO LUNA PRINCÍPIOS DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO CIVIL CRATO CE 2013

Princípios do Processo e do Procedimento Civil

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Título: Princípios do Processo e do Procedimento CivilAutor: Thiago de Figueiredo LunaBacharelando na Universidade Regional do Cariri

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  • UNIVERSIDADE REGIONAL DO CARIRI URCA

    CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS CESA

    CURSO DE DIREITO TURNO VESPERTINO

    VIII SEMESTRE 2013.2

    DISCIPLINA PROCESSO CIVIL II

    PROFESSOR MARCELINO OLIVEIRA SANTOS

    THIAGO DE FIGUEIREDO LUNA

    PRINCPIOS DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO CIVIL

    CRATO CE

    2013

  • THIAGO DE FIGUEIREDO LUNA

    PRINCPIOS DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO CIVIL

    Trabalho apresentado como requisito

    para obteno de nota na disciplina

    Direito Processual Civil II, do curso de

    Direito da Universidade Regional do

    Cariri.

    Orientador: Marcelino Oliveira Santos

    CRATO CE 2013

  • SUMRIO

    TPICO PGINA

    1. INTRODUO 04

    2. O QUE SO PRINCPIOS? 05

    2.1 - ANTINOMIA 06

    3. DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO 08

    4. DOS PRINCPIOS DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO ANLISE EM

    ESPCIE 10

    4.1 - DEVIDO PROCESSO LEGAL 10

    4.2 - CONTRADITRIO 12

    4.3 - AMPLA DEFESA 15

    4.4 - MOTIVAO DAS DECISES 17

    4.5 - PRINCPIOS DISPOSITIVO E INQUISITIVO (INQUISITRIO) 19

    4.6 - ISONOMIA (IGUALDADE PROCESSUAL OU PARIDADE DE ARMAS) 22

    4.7 - PUBLICIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS 30

    4.8 - PRINCPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL 33

    4.9 - INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS 34

    4.10 - RAZOVEL DURAO DO PROCESSO 36

    4.11 - COOPERAO 37

    4.12 - BOA-F E LEALDADE PROCESSUAL 39

    5. DISPOSIES FINAIS 45

    6. BIBLIOGRAFIA 47

  • 1. INTRODUO

    O Direito Processual Civil o conjunto de princpios e normas jurdicas que regem a

    soluo de conflitos de interesses por meio de exerccio da jurisdio. Na ordem prtica, pode-

    se ainda conceituar o processo civil como o mtodo legal de que dispem as partes envolvidas

    em litgio de ordem privada para ter acesso aos tribunais da Justia brasileira.

    O Direito Processual Civil possui por base legal a Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973, o

    Cdigo de Processo Civil brasileiro. Alm disso, a Constituio Federal de 1988 estatui os

    princpios bsicos de nosso ordenamento jurdico, entre eles diversos aplicveis disciplina

    processualstica civil.

    A legislao processual define diversos princpios, mas alm destes, enumera os tipos

    de processos, os ritos adotados pelo ordenamento jurdico brasileiro, alm dos atos a serem

    praticados em cada um destes ritos, assim como as consequncias da prtica ou no destes atos.

    Sendo assim, este estudo tem por finalidade dissecar os princpios relativos ao processo

    e ao procedimento civil, analisando os principais integrantes desta categoria de normas em

    vigncia no nosso pas, utilizando para tanto as instrues dadas pelos grandes doutrinadores e

    tribunais ptrios.

  • 5

    2. O QUE SO PRINCPIOS?

    Nas palavras de Fredie Didier Jr. (2013): Princpio espcie normativa. Trata-se de

    norma que estabelece um fim a ser atingido. Segundo o autor, se um princpio tem por objetivo

    que a sociedade alcance determinado estado de coisas, faz-se necessrio tomar certos

    comportamentos, que viram necessidades para efetivao do fim almejado.

    Doutrinariamente, v-se os princpios como regras abstratas, de certa maneira

    distanciadas da concretude do fato. Ocorre que ao mesmo tempo que abstrata, a norma

    principiolgica geral, portanto abrangente, de modo a resguardar determinado conjunto de

    situaes jurdicas. Alm disso, alguns princpios tm carter norteador: dirigem a produo de

    novas leis, regras, julgados, enfim, tm a capacidade de promover a unificao de certo

    entendimento adotado no cotidiano do universo jurdico nacional.

    Os aplicadores do Direito vm aperfeioando a distino entre os princpios e regras que

    permeiam os ordenamentos jurdicos. Segundo Marcelo Novelino (2010):

    Os princpios se caracterizam por possibilitar que a medida de seu cumprimento se d em diferentes graus. Segundo conhecida definio formulada por Robert ALEXY, os princpios so mandamentos de orientao, ou seja, normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possvel, dentro das possibilidades

    jurdicas e reais existentes.

    Robert Alexy ainda afirma que os princpios tm o seu cumprimento medido na anlise

    das circunstncias fticas, ou seja, os acontecimentos nicos do caso concreto, e jurdicas, que

    ser a amplitude do princpio frente a outros princpios e regras opostos. Ronald Dworkin

    (1977) ensina que quando um ordenamento adota determinado princpio, este deve ser levado

    em conta pelos aplicadores do Direitos.

    Os dois jusfilsofos desenvolveram teses sobre os princpios e sua aplicao, havendo

    grande identidade entre as obras, at determinado ponto. Ambos afirmam Ambos afirmam que

    a escolha por determinado princpio em detrimento dos demais ocorre de maneira ponderada,

    pois se trata de escolha a ser feita somente mediante o caso concreto, havendo a pesagem de

    qual norma possui maior peso relativo, em outras palavras, qual bem jurdico tem mais

    relevncia no caso concreto.

  • 6

    Segundo os juristas, as regras so determinaes que visam a determinado resultado.

    Quando tal meta no atingida, Alexy e Dworkin afirmam a sua queda em desuso, foi

    abandonada, ou modificada. As regras so mandamentos abstratos acerca de situaes

    concretas: quando se adequam ao caso, tm aplicao automtica. Deste modo, se o resultado

    previsto nela mesma no se realiza, pode-se afirmar o afastamento entre a norma e seu valor

    para a sociedade.

    J os princpios, devido pesagem, ou seja, sua relativizao em relao ao caso

    concreto, no se extinguem pela simples inocorrncia do resultado que prev. Devido sua

    funo orientadora, os princpios podem ser afastados para que outros, mais adequados ao caso,

    sejam utilizados, no comprometendo sua validade no ordenamento jurdico nestas situaes.

    2.1 ANTINOMIA

    O conflito entre normas algo comum nos ordenamentos jurdicos, principalmente nos

    de origem romana, como o brasileiro. A tal espcie de conflito d-se o nome antinomia, que

    se divide em prpria e imprpria, sendo que a primeira se localiza na dimenso da validade da

    norma jurdica, enquanto a segunda ocorre na dimenso da importncia.

    A antinomia jurdica prpria ocorre quando duas normas regulam uma mesma situao

    de maneira diversa, ou seja, uma permite e a outra obriga, ou uma probe a outra obriga, etc.

    Deste modo h a antinomia prpria entre regras, entre princpios e nos conflitos entre um

    princpio e uma regra.

    Vale ressaltar que, por mais abrangente que seja, um princpio no hierarquicamente

    superior a uma regra, sendo a recproca verdadeira. Assim ensina Marcelo Novelino (2010):

    Inicialmente, mister se faz esclarecer que no h hierarquia normativa entre princpios e regras, sendo que qualquer das espcies poder prevalecer sobre

    a outra caso estejam contidas em um estatuto de mesmo grau hierrquico.

    Muitas vezes, apesar de aparentemente estarem em contradio, na verdade

    as regras refletem os princpios. Isso porque, em certos casos, as regras s ganham

    vida naqueles moldes em razo da existncia de um determinado princpio. Nesta

    hiptese, elas conferem a forma e a amplitude de alguns princpios, dando-lhes

    concreo.

  • 7

    A antinomia prpria rara entre princpios. Seria o caso de uma lei ordinria ou

    complementar trazer ao ordenamento jurdico brasileiro o princpio da desigualdade entre os

    sexos, em clara discordncia com o princpio da igualdade, previsto no art.5, I da Carta Magna

    de 1988. Em casos como este, faz-se meno funo orientadora dos princpios, observando-

    se se a ponderao dos mesmos realmente uma possibilidade no mbito do universo jurdico

    do pas.

    J para que haja a antinomia imprpria, necessrio que as normas em coliso sejam

    vlidas, pois no se est avaliando a pertinncia das mesmas ao ordenamento jurdico, mas sua

    predominncia mediante a situao concreta. Tambm denominada coliso, tal espcie de

    antinomia s ocorre quando, na anlise do caso concreto, permite-se o balanceamento de

    princpios, e apenas destes.

    Alexy estabeleceu a teoria dos princpios para orientar o processo de ponderao destes,

    permitindo que houvesse a vinculao da deciso, mas com certo grau de flexibilidade,

    impedindo o esvaziamento dos direitos fundamentais ao mesmo tempo que evitando o

    enrijecimento do sistema jurdico. A sua tese recebeu diversas crticas, as mais duras dirigidas

    por Jurgen Habernas e Klaus Gunther. O primeiro afirmava ser a teoria de Alexy carente de

    critrios racionais e, portanto, declarava que o sopesamento de valores se efetua ou bem de

    forma discricionria e arbitrria, ou bem de forma no reflexiva. J Gunther afirmava que os

    conflitos entre regras tratam-se de comportamento colisivo na dimenso da fundamentao da

    validade, ou resumidamente, coliso interna. J nos conflitos entre princpios, para Gunther,

    a coliso se d na dimenso da aplicao, aps a avaliao de todas as circunstncias do caso

    concreto.

    Para rebater suas crticas em relao discrionariedade e falta de critrios racionais,

    Alexy criou o modelo de fundamentao, em que uma ponderao racional se o enunciado

    de preferncia ao qual conduz pode ser fundamentado racionalmente. Deste modo, Alexy criou

    um critrio objetivo que vinculou a ponderao a teoria da argumentao jurdica racional.

    A construo do jusfilsofo, alm de extremamente importante para a justificao de

    sua teoria, cria diversos vnculos com princpios presente no ordenamento jurdico brasileiro,

    como o princpio da razoabilidade, persuaso racional do magistrado e, principalmente, a

    obrigatoriedade de motivao das decises tomadas pelo mesmo.

    Vencida a questo da definio e aspectos gerais dos princpios, passemos aos conceitos

    de processo e procedimento.

  • 8

    3. DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO

    Antes de discorrer sobre os princpios referentes ao processo e ao procedimento,

    necessrio que estudemos o conceitos de ambos os institutos, de modo a diferenci-los, assim

    como entender de que modo se dar aplicabilidade aos princpios no ordenamento.

    Na viso atual, conforme os ensinamentos de Daniel Amorim Assumpo Neves (2011):

    O procedimento entendido como uma sucesso de atos interligados de maneira lgica e consequencial, visando a obteno de um objetivo final. Costuma-se dizer que o procedimento a exteriorizao do processo, seu aspecto visvel,

    considerando-se que a noo de processo teleolgica, voltada para a finalidade de

    exerccio da funo jurisdicional no caso concreto, enquanto a noo de

    procedimento formal, significando essa sucesso de atos com um objetivo final.

    Observando as palavras do jurista brasileiro, devemos compreender que o procedimento

    no o meio fsico, o papel, a palavra escrita: a isto se d a denominao autos ou ainda

    flios. O procedimento o caminho que as partes devem percorrer para solucionar uma

    querela entre elas. o rito, o modo como se constri o processo.

    J o conceito de processo passou por uma constante transformao no decorrer dos

    sculos. A primeira teoria a tentar explicar a relao entre direito material e ao foi a Teoria

    Civilista ou Imanentista, defendida por Savigny. Para este terico, o direito material e o

    processual eram inerentes um ao outro, no se dissociando. Desta forma, confundiam-se os

    conceitos de processo e procedimento.

    Durante os sculos XVIII e XIX, surgiram teorias que tratavam o processo como um

    contrato ou ainda como um quase contrato, tendo em vista a obrigatoriedade do cumprimento

    da tutela jurisdicional. Tais ideias, entretanto, no vingaram. Oskar Von Bullow, em 1868, na

    obra intitulada Teoria dos Pressupostos Processuais e das Excees Dilatrias elevou o estudo

    do processo a um novo nvel. O doutrinador foi o primeiro a retirar o processo do mbito

    privatista, inaugurando os estudos da processualstica de maneira isolada do direito material.

    Para o jurista alemo, o processo constitudo por duas relaes jurdicas distintas: a

    material e a processual. Foi ao dividir as duas que o doutrinador passou a enxergar a relao de

    direito material como o objeto de discusso na lide, enquanto que a relao de direito processual

  • 9

    a estrutura por meio da qual essa discusso se concretizar. A teoria de Bullow, segundo a

    doutrina nacional, apesar de diversas novas teorias, continua sendo a aceita.

    As teorias do processo como situao jurdica e do processo como procedimento em

    contraditrio, respectivamente desenvolvidas por James Goldschmidt e Elio Fazzalari, ainda

    que no tenham deixado de defender a teoria do processo como relao jurdica, admitem a

    mescla das supracitadas teorias, tendo em vista que se complementam em certos aspectos.

    James Goldschmidt, ao compor a teoria do processo como situao jurdica, aduziu ser

    a natureza jurdica do processo o conjunto de sucessivas situaes jurdicas por quem passam

    os sujeitos processuais. Para os pensadores adeptos desta teoria, o processo possui um

    dinamismo que transforma o direito objetivo, originalmente esttico, em chances, como

    descreveu Daniel Amorim Assumpo Neves:

    [...]representadas por simples possibilidades de praticar atos que levem ao reconhecimento do direito, expectativas da obteno desse reconhecimento,

    perspectivas de uma sentena favorvel e os nus representados pelos encargos de

    assumir determinadas posturas como forma de evitar a derrota.

    Entretanto, a teoria de Goldschmidt no foi recepcionada pela doutrina, retirando-se dela

    apenas aspectos que integraram a teoria do processo como relao jurdica, afirmando-se que

    tal relao traz aos sujeitos envolvidos diversas situaes no decorrer do procedimento.

    Elio Fazzalari, por sua vez deu luz ideia de mdulo processual. A teoria do processo

    como procedimento em contraditrio se baseia na noo de que o procedimento formado por

    atos interligados logica e normativamente, sendo a prtica de cada ato vinculado realizao

    do anterior, conforme a norma jurdico que os rege, e da juno dos atos se formar um conjunto

    lgico com objetivo final. Ocorre que para o doutrinador italiano, condio essencial para a

    prtica de cada ato a participao das partes em contraditrio, sendo justamente a paridade de

    condies dentro do procedimento a caracterstica que garante a este ltimo o status de

    processo. O mdulo justamente a simetria (de distncia, valor, etc.) em relao a um ponto

    em comum, em direes opostas (um e menos um em relao ao zero).

    Por derradeiro, h a teoria do procedimento animado por uma relao jurdica em

    contraditrio. Trata-se de construo mista entre as teses de Bullow e Fazzalari. Parte dos

    doutrinadores que defendiam a teoria do processo como relao jurdica, diante da construo

  • 10

    do italiano, passaram a no se incomodar com a integrao do contraditrio no conceito de

    processo, entendendo porm que o contraditrio puro e simples no o bastante para conceituar

    o instituto, nem mesmo para retirar a relao jurdica do referido conceito.

    Havendo discorrido sobre os conceitos de processo e procedimento, sabendo que ambos

    so distintos, deve-se entender que no h processo sem procedimento. Ora, por mais infeliz

    que seja a comparao, participar de uma lide sem que se saiba quais atos sero realizados, ou

    pelo menos podem a vir se realizar, seria como jogar um jogo sem que soubssemos suas regras.

    E como seria a realizao do processo sem procedimento? Como ser visto adiante, tem-

    se como um princpio quase que universal o devido processo legal. Este axioma, alm de

    pressupor a realizao dos atos processuais na forma da lei, concretiza no ordenamento jurdico

    a caracterstica dos princpios de sempre nortearem a produo jurdica, da criao da lei sua

    aplicao.

    4. DOS PRINCPIOS DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO ANLISE EM

    ESPCIE

    4.1 - DEVIDO PROCESSO LEGAL

    O princpio do devido processo legal, como dito anteriormente, tem por funo

    assegurar que os processos tramitem segundo a lei, de modo a atingir seu objetivo com o

    mximo de perfeio possvel.

    O Princpio do Devido Processo Legal foi consagrado no ordenamento jurdico

    brasileiro pela Constituio Federal, que em seu artigo 5, LIV, disps:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade

    do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos

    seguintes:

    LIV - ningum ser privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo

    legal;

  • 11

    pacfico o entendimento doutrinrio e jurisprudencial acerca do carter basilar do

    princpio em estudo. Os estudiosos e intrpretes da norma consideram o devido processo legal

    norma orientadora de todo o sistema jurdico, conforme sua intepretao (como foi discutido

    no tpico anterior). Trata-se, indubitavelmente, de um superprincpio.

    O axioma em tela deriva das construes jurdicas dos lordes ingleses em sua disputa

    por poder com a coroa britnica durante a Idade Mdia. Segundo os especialistas, a ideia bsica

    para o princpio do devido processo legal surgiu com a Magna Carta, assinada pelo Rei Joo

    Sem Terra, em 1215, documento em que constava a expresso law of the land (do ingls, lei

    da terra ou lei do pas), significando um sistema processual rstico de proteo aos nobres

    contra mandos e desmandos reais. Em 1354, cunhou-se a expresso due process of law (do

    ingls, devido processo da lei).

    Atualmente, os doutrinadores tratam o princpio sob trs ticas: a substancial, a formal

    e a terceira, mais contempornea, sob um ideal de justia.

    O devido processo legal substancial est voltado para o campo da elaborao e

    interpretao das normas jurdicas. O controle destes dois aspectos da atividade jurdica de

    suma importncia para o controle e balanceamento do ordenamento jurdico, posto que a

    atividade legislativa executada de maneira grosseira pode se mostrar abusiva ou mesmo

    inconstitucional. No campo da interpretao, abre-se o espao necessrio ao uso das regras da

    razoabilidade e proporcionalidade, que com o decorrer dos anos vm transbordando a fronteira

    do Judicirio e expandindo sua utilidade para as demais esferas de atuao do Poder Pblico.

    Alm dessa expanso na esfera pblica, o devido processo legal passou tambm a ser

    exigido em relaes jurdicas de carter privado, em virtude da proteo aos direitos

    fundamentais dos envolvidos, devendo-se, entretanto, sopesar a influncia do princpio da

    autonomia da vontade de modo que este no seja completamente obliterado.

    O devido processo legal em sua acepo formal refere-se diretamente ao processo

    judicial e ao controle da jurisdio pelo Estado, tendo em vista que este recebeu o dever de

    obedecer aos demais princpios na conduo do instrumento dado aos jurisdicionados para que

    estes cuidem de seus direitos materiais. A concepo formal do devido processo legal a mais

    tradicional.

    Por fim, o devido processo legal, aps sculos de evoluo, est sendo estudado por uma

    terceira tica, nas palavras de Daniel Amorim Assumpo Neves (2011):

  • 12

    Contemporaneamente, o devido processo legal vem associado com a ideia de um processo

    justo, que permite a ampla participao das partes e a efetiva proteo de seus direitos.

    Deve-se entender que tratar do princpio do devido processo legal falar de todo

    ordenamento, considerando que este basilar, norteador das demais normas, porm de conceito

    ainda indeterminado. Ora, o princpio do devido processo legal est diludo em todos as regras

    e princpios existentes em nosso ordenamento, e sobre alguns destes ltimos, formadores do

    processo e do procedimento civil, que mantemos o foco deste estudo.

    4.2 - CONTRADITRIO

    Conforme visto ao tratarmos da conceituao de processo e procedimento, o

    contraditrio elemento do instrumento a que denominamos processo. De possa dessa

    informao, deve-se entender o contraditrio como requisito oficial ao desenvolvimento de um

    processo legtimo e obediente ao devido processo legal. Segundo a Constituio Federal de

    1988, em seu artigo 5, inciso LV:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos

    seguintes:

    LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral

    so assegurados o contraditrio e ampla defesa, com os meios e recursos a ela

    inerentes;

    Apesar de citados no mesmo dispositivo legal, contraditrio e ampla defesa sero

    tratados separadamente.

    O princpio do contraditrio, conforme a doutrina tradicional, formado por dois

    elementos: informao e possibilidade de reao. Cuida este princpio para que ambas as partes

    estejam cientes dos acontecimentos da lide, de todos os atos praticados por todos os demais

    sujeitos processuais, possibilitando a manifestao da parte informada acerca destes ocorridos.

    Trata-se de verdadeira manuteno da isonomia entre as partes em conflito, dando a estas iguais

    chances de garantir a melhor defesa possvel a seus direitos.

  • 13

    Tratando sobre os elementos do contraditrio isoladamente, a informao a

    necessidade de que seja a parte cientificada de qualquer novidade em seu processo, para que

    assim manifeste-se ou no acerca do novo fato. Entende-se ento que qualquer ato ou disposio

    legal que traga parte obrigao de exarar entendimento no processo, porm sem definir

    maneira que permita a esta ser avisada desta obrigao, fere o princpio do contraditrio.

    Exemplo prtico desta obrigao seria se, por disposio presente na legislao processual civil

    ou no despacho inicial, o magistrado determinasse a citao do ru, porm estipulando o incio

    da contagem do prazo para contestao a partir da data do despacho, ou seja, exigindo do ru

    manifestao (com prazo legal definido em lei, a contar da data da juntada do mandado, aviso

    de recebimento, etc., aos autos), porm acabando por retirar-lhe um ou mais dias para preparar

    sua defesa.

    O processo civil brasileiro reconhece duas formas de comunicao: a citao e a

    intimao. A intimao a primeira comunicao enviada ao promovido, dando-lhe cincia de

    que est sendo acionado em ao judicial, e desta forma, completando a relao jurdica

    processual. A intimao a modalidade de comunicao usada para todos os demais atos do

    processo, dando-lhe cincia destes e frequentemente exigindo aes por parte do promovente

    e/ou promovido. Ambas podem se dar de vrias maneiras: atravs de carta postada nos Correios,

    mandados distribudos aos oficiais de justia, edital afixado em locais de fcil acesso e aberto

    ao pblico ou atravs de meios eletrnicos, sendo esta modalidade tratada em legislao

    prpria. As intimaes tambm podem se realizar pelas mesmas modalidade da citao,

    ocorrendo que em geral so dirigidas aos advogados das partes e publicada na imprensa oficial,

    notoriamente o Dirio da Justia, ocorrendo a intimao pessoal do causdico em situaes

    excepcionais.

    Quanto ao elemento da reao, este se consubstancia na ao ou omisso da parte em

    relao ao ato de que foi informada, isto quando tratando de direitos disponveis. Nestes casos,

    o contraditrio se satisfaz com a informao prestada parte, posto que lhe foi dada

    oportunidade de manifestar-se acerca de assunto que, presumivelmente, de seu interesse.

    O panorama inverso quando o processo trata de direitos indisponveis. Nestas

    situaes, a lei exige que haja reao da parte. Caso a mesma seja omissa, a prpria lei cria

    sistemas de proteo aos direitos objetos da lide. o que ocorre, por exemplo, quando a lide

    trata de direitos indisponveis e ocorre revelia do ru: normalmente, seriam consideradas

  • 14

    verdadeiras as afirmaes da parte autora (art. 319 do CPC), o que no ocorre devido regra

    constante no art. 320, II, do CPC, in verbis:

    Art. 319 - Se o ru no contestar a ao, reputar-se-o verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.

    Art. 320 - A revelia no induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente:

    II - se o litgio versar sobre direitos indisponveis;

    A desconsiderao da revelia do ru em aes que tratem de direitos indisponveis

    perfeito exemplo de fico jurdica que visa a proteo do contraditrio. Da afirmao podemos

    extrair o entendimento de que o contraditrio s alcana sua plena realizao quando so dadas

    as partes as mesmas condies de batalha, o que justifica a existncia de regras de proteo

    quelas pessoas que esto em desvantagem financeira, fornecendo-lhes iseno de custas

    processuais, a designao de defensores pblicos, entre outros tratamentos trazidos pela lei.

    Percebe-se aqui clara ligao com o princpio da isonomia, que ser tratado mais adiante.

    Os doutrinadores alemes, entretanto, descobriram que a simples juno da informao

    com a reao satisfazia apenas o carter formal do princpio do contraditrio. Ora, se o objetivo

    do processo a defesa de direitos questionados perante o Estado, a acepo material do

    contraditrio, segundo os ensinamentos de Leonardo Greco (2011), exige que a reao seja

    contundente o bastante para influenciar o magistrado em seu convencimento sobre a causa.

    Elege-se assim um terceiro elemento do princpio do contraditrio, este bem mais aproximado

    da terceira perspectiva de devido processo legal (ideia de processo justo, conforme visto

    anteriormente).

    O princpio do contraditrio, porm, no deve ser encarado de maneira esttica, muito

    menos absoluta. Sendo criado e constantemente atualizado como uma forma de proteo s

    partes, conforme os novos entendimentos demonstrados acima, o axioma em estudo pode ser

    excepcionalmente restringido quando constatado que no houve prejuzo parte. De mesma

    opinio o doutrinador Daniel Amorim Assumpo Neves (2011):

    O contrrio moldado essencialmente para a proteo das partes durante a demanda judicial, no tendo nenhum sentido que o seu desrespeito, se no gerar

    prejuzo parte que seria protegida pela sua observao, gere nulidade de atos e at

  • 15

    mesmo do processo como um todo. Qual o sentido, luz da efetividade da tutela

    jurisdicional, em anular um processo porque neste houve ofensa ao contraditrio em

    desfavor do vitorioso? O autor no foi intimado da juntada pela parte contrria de

    um documento e a seu respeito no se manifestou. Houve ofensa ao contraditrio,

    no h dvida, mas relevvel se o autor ainda assim sagrou-se vitorioso na demanda.

    A citao ocorreu em homnimo do ru, vcio gravssimo chamado por alguns de vcio transrescisrio pela possibilidade de alegao a qualquer momento, at mesmo

    depois do prazo da ao rescisria que impede a regular formao da relao jurdica processual. Ocorre, entretanto, que o pedido do autor foi rejeitado, ou seja,

    o ru, mesmo sem ter sido citado, sagrou-se vitorioso na demanda. Que sentido teria

    anular essa sentena por ofensa ao contraditrio? A reposta bvia: nenhum.

    As consideraes do autor trazem tona a relevncia dada s regras da

    proporcionalidade e razoabilidade no processo judicial moderno, sem contar a ntima relao

    que h o tema com os princpios da economia processual e motivao das decises.

    4.3 - AMPLA DEFESA

    Vencido o tema do contraditrio, cabe a este estudo tratar do princpio da ampla defesa,

    princpios consagrados pelo mesmo dispositivo constitucional, o art. 5, LV, in verbis:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade

    do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos

    seguintes:

    LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral

    so assegurados o contraditrio e ampla defesa, com os meios e recursos a ela

    inerentes;

    Segundo Fredie Didier Jr. (2013), a ampla defesa consiste no conjunto de meios

    adequados para o exerccio adequado do direito do contraditrio. Como podemos perceber,

    h uma ntida relao entre os princpios do contraditrio e da ampla defesa, tanto que ambos

    so tratados no mesmo artigo da Carta Magna.

    Segundo o doutrinador baiano, a doutrina tradicional distinguia os princpios (ou

    garantias) em questo, embora se afirmasse o vnculo entre os mesmos. Exemplificando, Didier

    faz meno aos ensinamentos de Delosmar Mendona Jr: ...so figuras conexas, sendo que a

    ampla defesa qualifica o contraditrio. No h contraditrio sem defesa. Igualmente lcito

    dizer que no h defesa sem contraditrio. (...) O contraditrio o instrumento de atuao do

  • 16

    direito de defesa, ou seja, esta se realiza atravs do contraditrio. Para o jusfilsofo baiano,

    entretanto, os princpios da ampla defesa e do contraditrio se fundiram em um nico direito

    fundamental: A ampla defesa corresponde ao aspecto substancial do princpio do

    contraditrio, servindo para ambas as partes em conflito.

    Misael Montenegro Filho parece concordar com Fredie Didier Jr. quanto formao do

    amlgama entre princpios do contraditrio e da ampla defesa. O estudioso pernambucano, em

    sua obra Curso de Direito Processual Civil, trata as duas garantias em tpico nico, justificando

    sua consagrao no texto da Carta Magna devido sua relevncia na dinmica processual.

    Montenegro considera que a possibilidade de produo legtima de provas, aliada capacidade

    de lev-las ao conhecimento do juiz e formar tpico relevante nas decises deste.

    Marcelo Novelino, por outro lado, trata os dois princpios de maneira diferenciada. Para

    este doutrinador: A ampla defesa uma decorrncia do contraditrio (reao).

    assegurada ao indivduo a utilizao para a defesa de seus direitos, de todos os meios legais e

    moralmente admitidos. Pode-se inferir Novelino no considera os princpios como um s, ao

    contrrio de Montenegro e Didier, apesar de que todos concordarem sobre dois aspectos dessa

    juno: contraditrio e ampla defesa andam lado a lado, complementando-se mutuamente,

    assim como tm por objetivo oferecer ao processo a maior legitimidade possvel como

    instrumento estatal de resoluo de conflitos entre particulares, o que ocorre atravs dos j

    citados: influncia no convencimento do juiz, produo legalizada de provas, maior

    envolvimento das partes na tramitao do feito.

    Misael Montenegro Filho e Daniel Amorim Assumpo Neves, em suas obras,

    discorrem ainda sobre tema que poderia ter sido tratado no tpico anterior. Entretanto, devido

    proximidade entre os princpios e ao tratamento dado em separado neste estudo, aloquei meus

    comentrios sobre o tema do contraditrio diferido para este tpico.

    O contraditrio diferido uma construo ligeiramente diferente do contraditrio em

    sua estrutura bsica. Esta segue a seguinte sequncia: pedido, informao da parte contrria,

    deciso do magistrado. Esta sequncia lgica permite ao julgador angariar os posicionamentos

    de ambas as partes antes de proferir sua sntese do fato.

    H situaes em que a urgncia torna a celeridade primordial sobrevivncia do feito,

    quando no da prpria parte. Desta maneira, o legislador processualista conferiu s partes a

    opo de requerer ao juiz a antecipao de tutela do direito objeto da lide, pelo menos at a

    sentena final, em que se decidir quem possui maior direito de reivindicar o objeto do conflito.

  • 17

    Alm da antecipao de tutela, h tambm as liminares, que podem conferir ao autor da ao

    algum poder provisrio sobre o objeto da lide antes mesmo que haja possibilidade de resposta

    por parte da parte oposta.

    A priori, ambos os institutos parecem claras ofensas ao contraditrio e ampla defesa.

    Ocorre que os institutos devem ser diferidos pelo magistrado com farta fundamentao

    (princpio da motivao das decises), de modo a justificar tamanha invaso na esfera de

    direitos de algum que nem mesmo pde se manifestar em resposta. Para que haja o deferimento

    de tais pedidos, os autores devem demonstrar ao magistrado a existncia dos seguintes

    requisitos: nas cautelares, a fumaa do bom direito e o perigo da demora; nas liminares,

    prova inequvoca da verossimilhana da alegao e perigo da demora ou demonstrar a clara

    inteno do ru em protelar o feito.

    Inexistentes tais requisitos, devem tais pedidos receber despacho de indeferimento por

    ofensa aos princpios do contraditrio e ampla defesa, posto que sua procedncia incorreria em

    ao inconstitucional por parte do magistrado.

    O processo em que ocorre o fenmeno do contraditrio diferido toma ento a seguinte

    sequncia: pedido, deciso provisria, informao da parte contrria, sua possvel reao e pr

    fim a deciso definitiva.

    O legislador foi atento ao tratar da questo no Projeto de Lei do Novo CPC. o texto

    do art. 9 do Anteprojeto do Novo Cdigo de Processo Civil (Projeto de Lei do Senado n

    166/2010): Art. 9. No se proferir sentena ou deciso contra uma das partes sem que esta

    seja previamente ouvida, salvo se se tratar de medida de urgncia ou concedida a fim de evitar

    o perecimento de direito.

    Portanto, devemos entender que a renovao do sistema processual civil, ao admitir o

    afastamento provisrio do contraditrio para fins de salvaguardar possvel direito da parte

    acionante, atesta que tal instituto legtimo e necessrio ao processo civil brasileiro.

    4.4 - MOTIVAO DAS DECISES

    O princpio da motivao das decises tem ligao direta com a Teoria dos Princpios e

    modelo de fundamentao racional, ambos desenvolvidos por Robert Alexy (conforme visto no

    tpico 2.1 deste estudo).

  • 18

    Este axioma tem previso na Carta Magna brasileira, apesar de esta referir-se

    abertamente apenas ao direito penal, conforme o art. 5, LXI, e esfera judicial, nos ditames do

    art. 93, IX, in verbis:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade

    do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos

    seguintes:

    LXI - ningum ser preso seno em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciria competente, salvo nos casos de transgresso

    militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

    Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, dispor sobre

    o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princpios:

    IX - todos os julgamentos dos rgos do Poder Judicirio sero pblicos, e

    fundamentadas todas as decises, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a

    presena, em determinados atos, s prprias partes e a seus advogados, ou somente

    a estes, em casos nos quais a preservao do direito intimidade do interessado no

    sigilo no prejudique o interesse pblico informao;

    Ocorre que este princpio, conforme os ensinamentos da doutrina ptria, no se restringe

    s esferas citadas no pargrafo anterior. Conforme Daniel Amorim Assumpo Neves, o axioma

    se aplica a todas as decises proferidas em processo judicial ou administrativo, assim como

    aos pertencentes esfera cvel.

    O magistrado ou rgo julgador, conforme a teoria de Alexy, ao proferir deciso, dever

    expor o raciocnio lgico que o levou quela concluso, sendo que tal explanao dever conter

    o entendimento sobre os fatos e os fundamentos jurdicos que embasam a deciso, completando

    assim a sntese do processo pelo juiz.

    Conforme os ensinamentos de Daniel Amorim Assumpo Neves:

    Tradicionalmente, a justificativa do princpio da motivao das decises judiciais era voltada exclusivamente para os sujeitos processuais (justificativa

    endoprocessual). Num primeiro momento voltada ao sucumbente, que sem

    conhecimento das razes da deciso no teria condies de elaborar seu recurso,

    porque ningum pode impugnar de forma especfica uma deciso sem conhecer os

    seus fundamentos. Num segundo momento a fundamentao se mostra imprescindvel

    para que o rgo jurisdicional competente para o julgamento do recurso possa

    analisar o acerto ou equvoco do julgamento impugnado.

  • 19

    Entretanto, tal posicionamento no se mantm como nico a justificar a importncia do

    princpio da motivao das decises, apesar de, obviamente, resguardar valor para o

    ordenamento tendo em vista os atos praticados (sentena, recurso e julgamento de recurso): o

    axioma em questo passou a ter seu enfoque poltico desenvolvido pela doutrina em tempos

    atuais.

    Deste ngulo, a fundamentao das decises tem por objetivo demonstrar o acerto,

    imparcialidade e lealdade do julgador ao avaliar a lide, funcionando o princpio para legitimar

    politicamente a deciso judicial (NEVES. 2011), permitindo o controle da prestao

    jurisdicional no s pelos envolvidos na disputa judicial/administrativa, mas tambm pelo

    jurisdicionado em geral.

    A deciso mal embasada, ou sem fundamentao, contm vcio de grave natureza, pois,

    conforme visto anteriormente, fere a norma constitucional, prejudica as partes envolvidas na

    esfera do juzo a quo (alonga a durao do processo, fora as partes a maior desgaste psicolgico

    e at mesmo financeiro) e ainda dificulta a prestao jurisdicional dos juzos ad quem, seja por

    parte do recorrente como do rgo julgador superior. Como consequncias secundrias, pode-

    se inferir alegaes contra a retido da conduta do julgador a quo, postura esta que prejudica

    no s ao magistrado, mas ao Poder Judicirio como um todo.

    4.5 - PRINCPIOS DISPOSITIVO E INQUISITIVO (INQUISITRIO)

    Como apresentando a todo estudante de direito nas primeiras disciplinas da academia,

    cada pas possui um sistema jurdico prprio, adota modelos e regras distintos, ocorrendo,

    invariavelmente, escolhas semelhantes e conflitantes entre as naes no que concerne a

    organizao de seus sistemas.

    O Brasil e os Estados Unidos da Amrica, por exemplo, tm seus sistemas jurdicos com

    fundaes em ordenaes mais antigas, no Brasil a romana e nos EUA a consuetudinria. Tal

    diferena atenuada quando comparamos o Direito brasileiro ao portugus. Entretanto, todos

    os sistemas aqui citados, por mais que suas razes se assemelhem ou no, possuem traos,

    princpios, normas em comum.

    Um destes traos a escolha do modelo bsico de estruturao do processo. Conforme

    aponta a doutrina de Fredie Didier Jr., possvel apontar diversos modelos estruturais, e todos

    eles podem se adequar ao supra princpio do devido processo legal. Tal adequao, porm,

  • 20

    dependendo do que se entende por devido processo legal, tendo em vista que tanto a

    expresso quanto o axioma tendem a variar consideravelmente de Estado para Estado, assim

    como tempo de sua aplicao. Para fins didticos, a doutrina clssica identifica dois modelos

    bsicos de estruturao processual: o modelo dispositivo e o modelo inquisitivo. Alm destes,

    o estudioso baiano faz consideraes profundas sobre um terceiro e mais recente sistema

    estrutural: o cooperativo (Os trs modelos de direito processual: inquisitivo, dispositivo e

    cooperativo, 2012). Esta terceira modalidade ser tratada brevemente mais adiante.

    Segundo Didier Jr.:

    A doutrina costuma identificar dois modelos de estruturao do processo: o modelo adversarial e o modelo inquisitorial. No obstante haja muita discusso em torno da

    caracterizao de tais modelos, bem como seja criticvel a terminologia, a dicotomia

    ainda continua sendo bastante utilizada e serve, pois, como uma apresentao, ao

    menos para fins didticos, do tema.

    Em suma, o modelo adversarial assume a forma de competio ou disputa,

    desenvolvendo-se como um conflito entre dois adversrios diante de um rgo

    jurisdicional relativamente passivo, cuja principal funo a de decidir. O modelo inquisitorial (no adversarial) organiza-se como uma pesquisa oficial, sendo o rgo

    jurisdicional o grande protagonista do processo. No primeiro sistema, a maior parte

    da atividade processual desenvolvida pelas partes; no segundo, cabe ao rgo

    judicial esse protagonismo.

    Podemos afirmar assim, que em ambos os modelos, cada um dos sujeitos processuais

    caracteriza-se por um papel dentre da estrutura da lide, ocorrendo diferenciao apenas quanto

    protagonizao: no modelo inquisitivo o magistrado protagonista de todo o conflito,

    enquanto que no dispositivo, o juiz senta-se equidistantes das partes, avaliando seus

    posicionamentos e dando seus pareceres quando necessria sua presena, at o ato final, a

    sentena.

    Conforme a explicao dada pelo doutrinador Daniel Amorim Assumpo Neves

    (2011), o sistema brasileiro um misto, com preponderncia do princpio dispositivo. Ao

    menos na jurisdio contenciosa correto afirmar que esse sistema misto essencialmente um

    sistema dispositivo temperado com toques de inquisitoriedade.

    Observemos a regra trazida pelo legislador no art. 262 do Cdigo de Processo Civil:

  • 21

    Art. 262. O processo civil comea por iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso oficial.

    Fica clara a inteno do legislador brasileiro ao adotar uma caracterstica prpria do

    princpio dispositivo, porm traz ao mesmo comando legal detalhe tpico do sistema

    inquisitorial, qual seja o impulso oficial (obrigatoriedade do magistrado em dar condies ao

    processo de tramitar impulsion-lo).

    No somente o art. 262 do diploma processual traz regras de carter misto, que

    evidenciam o uso de ambos os modelos em carter complementar no ordenamento brasileiro.

    Seguem abaixo mais exemplos dados por Daniel Amorim Assumpo Neves, assim como os

    dispositivos citados pelo autor:

    O juiz est vinculado aos fatos jurdicos componentes da causa de pedir, o que depende da vontade da parte, mas as provas a respeito dos fatos podem ser

    determinadas de ofcio pelo juiz (art. 130 do CPC), o que demonstra uma

    caracterstica do sistema inquisitivo. Segundo o art. 131 do CPC, o juiz pode levar em considerao em sua deciso os fatos simples, ainda que no alegados pelas

    partes, regra esta que tambm consagra o princpio inquisitivo. O princpio da

    congruncia (art. 460 do CPC) vincula o juiz aos limites do pedido do autor, no se

    admitindo a concesso de algo diferente nem a mais do que foi pedido, o que,

    inclusive gerar sentena extra e ultra petita, respectivamente. Essa, entretanto, a

    regra, no aplicvel na hiptese dos pedidos implcitos e na permisso de aplicao do princpio da fungibilidade (por exemplo, pedida reintegrao de posse

    o juiz concede manuteno de posse art. 920 do CPC), para as quais se nota a prevalncia do sistema inquisitivo.

    Art. 130. Caber ao juiz, de ofcio ou a requerimento da parte, determinar as provas necessrias instruo do processo, indeferindo as diligncias inteis ou meramente protelatrias.

    Art. 131. O juiz apreciar livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstncias

    constantes dos autos, ainda que no alegados pelas partes; mas dever indicar, na

    sentena, os motivos que lhe formaram o convencimento.

    Art. 460. defeso ao juiz proferir sentena, a favor do autor, de natureza diversa da

    pedida, bem como condenar o ru em quantidade superior ou em objeto diverso do

    que lhe foi demandado.

    Art. 920. A propositura de uma ao possessria em vez de outra no obstar a que

    o juiz conhea do pedido e outorgue a proteo legal correspondente quela, cujos

    requisitos estejam provados.

  • 22

    4.6 - ISONOMIA (IGUALDADE PROCESSUAL OU PARIDADE DE ARMAS)

    Trata o princpio da isonomia sobre um dos temas mais delicados do Direito, no s

    brasileiro, mas como disciplina. Ora, o que igualdade? Seria o tratamento igual? De que

    maneira se d igualdade s pessoas, se individualmente somos todos nicos?

    Tal qual o conceito de devido processo legal, a isonomia uma das caractersticas que

    dependem da cultura do povo, da base do direito, eminentemente social, assim como do tempo,

    das influncias que o ordenamento jurdico recebe das outras naes, entre tantos outros fatores.

    A Constituio brasileira, em seu art. 5, caput, assim como no inciso I, comanda que a

    legislao brasileira como um todo dever tratar a todos de forma igual.

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade

    do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos

    seguintes:

    I - homens e mulheres so iguais em direitos e obrigaes, nos termos desta

    Constituio;

    Tal norma estende o dever de tratamento equitativo no somente aos brasileiros, homens

    e mulheres, mas aos estrangeiros residentes e de passagem pelo pas, nos termos da Constituio

    Federal. Devemos ento considerar que homens e mulheres, brasileiros ou no, so, perante a

    lei, iguais, e tal regra, sem dvidas, aplica-se ao processo, no importando sua natureza.

    No mbito puramente processual, todos possuem os mesmos direitos: prazos

    prescricionais, decadenciais, para recursos. O prazo para oferecer contrarrazes idntico ao

    para intentar o recurso, para que ambas as partes possam se manifestar sem distines; ambas

    devem ser intimadas para audincias, destas podero participar ativamente e em iguais

    propores, se assim o desejarem, etc. Tais regras pontuais, entretanto, no poderiam e no

    conseguem esgotar o princpio da isonomia.

    Tudo o que foi citado no pargrafo anterior trata do processo isonmico de forma

    puramente formal, positivista, no dando azo perspectiva material do axioma em estudo.

    Como dito anteriormente, cada ser humano um indivduo nico, no podendo ser tratado de

    forma igual ao prximo simplesmente por serem de mesma nacionalidade, sexo, ou qualquer

    outra caracterstica: estamos aqui diante do famoso bordo cada caso um caso.

  • 23

    Naturalmente, os legisladores constituintes estavam atentos a tal ideal, e comearam um

    trabalho que muito foi (e ainda !) desenvolvido pelos legisladores ordinrios, doutrina e

    jurisprudncia ptria.

    Podemos extrair do texto da Carta Magna regras que, baseadas no aspecto material do

    princpio da igualdade processual, buscam equilibrar a disputa de vontades entre as partes. Do

    prprio artigo 5 podemos extrair:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos

    seguintes:

    XLVIII - a pena ser cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a

    natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;

    LXXIV - o Estado prestar assistncia jurdica integral e gratuita aos que

    comprovarem insuficincia de recursos;

    Qual a razo de existirem tais dispositivos? Ora, por mais que se trate de regra do

    processo penal, o inciso XLVIII exemplifica o princpio em discusso. Mantendo a

    superficialidade da discusso, homens e mulheres no podem ser dividir acolhimentos para

    cumprimento de pena por motivos de segurana das presas. No podemos afirmas que os

    condenados, simplesmente por estarem presos, viraro estupradores, mas por precauo,

    separam-se os sexos, j que todos esto ali por haverem ferido regras de convivncia em

    sociedade.

    Por que se d ao pobre o benefcio da assistncia judiciria gratuita? O processo, como

    demonstra a prtica no Brasil, dispendioso econmica e psicologicamente, e a regra vem para

    possibilitar aos que esto em pior situao financeira o integral acesso aos prstimos do

    Judicirio. O benefcio desta prerrogativa se refere questo do pagamento das custas

    processuais.

    Exemplificado o aspecto material do princpio da isonomia, podemos traar o objetivo

    da isonomia como um todo: nas palavras de Daniel Amorim Assumpo Neves, permitir que

    as partes atuem no processo, dentro do limite do possvel, no mesmo patamar.

    O legislador brasileiro, em obedincia ao princpio da isonomia, procurou de vrias

    formas criar situaes que deixassem os desiguais em igualdade no mbito processual. Vrios

  • 24

    so os exemplos de regras que buscam ofertar a igualdade processual entre os litigantes. A regra

    bsica foi novamente erigida como o princpio da paridade de armas no Cdigo de Processo

    Civil, em seu artigo 125, I, in verbis:

    Art. 125. O juiz dirigir o processo conforme as disposies deste Cdigo, competindo-lhe:

    I - assegurar s partes igualdade de tratamento;

    So outros exemplos de regras que visam a isonomia, no mbito do Cdigo de Processo

    Civil:

    I Quanto ao incapaz:

    a) Direito a representante processual, assim como a presena do Ministrio Pblico

    como fiscal da lei (art. 82, I);

    b) A no aplicao da presuno de veracidade na revelia (art. 320, II);

    Obs.: Em ambos os casos, podemos nos valer do simples fato do incapaz ser, em

    geral, pessoa com menor discernimento, o que justifica a diferenciao.

    II Quanto aos litisconsortes, o prazo em dobro quando estes no forem assistidos pelos

    mesmos patronos, regra que se justifica pelo fato de muitas vezes o acesso simultneo aos autos

    ser impossvel, conforme o art. 191;

    III O foro privilegiado para as mulheres casada nas demandas de ruptura do

    casamento, regra erigida no art. 100, I. Devido longevidade do Cdigo de Processo Civil, a

    norma pode ser considerada inadequada, mas o Supremo Tribunal Federal, na pessoa do

    Ministro Joaquim Barbosa, justificou sua vigncia: independente da nova posio da mulher no

    mercado de trabalho, a sociedade brasileira possui diversos patamares sociais e econmicos,

    alm da regra cultural de que os filhos permanecem com a me, at deciso em contrrio ou

    fatos que impeam o uso deste costume. Desta maneira, depreende-se que a mulher ter mais

    dificuldades com deslocamento, preocupaes concernentes a com quem deixar suas crianas,

    etc.

  • 25

    Art. 82. Compete ao Ministrio Pblico intervir:

    I - nas causas em que h interesses de incapazes;

    Art. 100. competente o foro:

    I - da residncia da mulher, para a ao de separao dos cnjuges e a converso

    desta em divrcio, e para a anulao de casamento; (Redao dada pela Lei n

    6.515, de 26.12.1977)

    II - do domiclio ou da residncia do alimentando, para a ao em que se pedem

    alimentos;

    III - do domiclio do devedor, para a ao de anulao de ttulos extraviados ou

    destrudos;

    Art. 191. Quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-o

    contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos.

    Art. 320. A revelia no induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente:

    II - se o litgio versar sobre direitos indisponveis;

    No s o diploma processual civil traz regras quanto ao tratamento desigual para gerar

    igualdade. Entre outras legislaes especficas, podemos citar o Cdigo de Defesa do

    Consumidor e o Estatuto da Criana e do Adolescente, alm das regras de prioridade relativas

    aos idosos e mulheres.

    Quanto ao direito consumerista, podemos dizer que a proteo se deve pela simples

    desigualdade de poder econmico entre consumidor e fornecedor. Trata-se de regra que

    privilegia a parte hipossuficiente, a exemplo do que faz o direito do trabalho: o fornecedor

    possui a capacidade de produzir o produto ou realizar o servio. O consumidor compra ou

    contrata porque no tem a possibilidade de produzir ou realizar determinado ato porque no

    tem o know-how, e desta forma depende da qualidade do que oferecido. As empresas

    fornecedoras possuem poderio econmico para contratar causdicos, enquanto que o

    consumidor nem sempre capaz, dependendo dos prstimos da Defensoria Pblica, alm das

    despesas com deslocamento, etc. Podemos citar como regras que consagram o princpio da

    isonomia os artigos 6, VIII, e 101, I, in verbis:

    Art. 6 So direitos bsicos do consumidor:

    VIII - a facilitao da defesa de seus direitos, inclusive com a inverso do nus da

    prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critrio do juiz, for verossmil a alegao ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinrias de

    experincias;

  • 26

    Art. 101. Na ao de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e servios, sem

    prejuzo do disposto nos Captulos I e II deste ttulo, sero observadas as seguintes

    normas:

    I - a ao pode ser proposta no domiclio do autor;

    As crianas e adolescentes, conforme as disposies da Lei Maior, devero dispor de

    toda a assistncia necessria para que atinjam seu pleno potencial como seres humanos, como

    integrantes de uma famlia, de uma sociedade, como cidados, e em todos os aspectos de sua

    vida. O comando constante no artigo 227 da Carta Magna e no poderia ser mais clara sua

    inteno de proteger as futuras geraes de brasileiros. O artigo, em seu 1, VI, refere-se

    especificamente assistncia jurdica s pessoas que tm intenes de acolher, sob forma de

    guarda ou adoo, crianas e adolescentes. O Estatuto da Criana e do Adolescente ainda prev

    a criao de varas especializadas na resoluo de causas envolvendo crianas e adolescentes,

    demonstrando novamente a ateno que se deve dar a estas pessoas.

    Art. 227. dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar criana, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito vida, sade,

    alimentao, educao, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao

    respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria, alm de coloc-los a

    salvo de toda forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso.

    1 O Estado promover programas de assistncia integral sade da criana, do

    adolescente e do jovem, admitida a participao de entidades no governamentais,

    mediante polticas especficas e obedecendo aos seguintes preceitos:

    VI - estmulo do Poder Pblico, atravs de assistncia jurdica, incentivos fiscais e

    subsdios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criana ou

    adolescente rfo ou abandonado;

    Art. 145. Os estados e o Distrito Federal podero criar varas especializadas e

    exclusivas da infncia e da juventude, cabendo ao Poder Judicirio estabelecer sua

    proporcionalidade por nmero de habitantes, dot-las de infra-estrutura e dispor

    sobre o atendimento, inclusive em plantes.

    Andra Gusmo Santos fez um estudo sobre o idoso e a legislao especfica para

    facilitar o acesso dessa classe ao Poder Judicirio, de modo a acelerar a resoluo das lides

    envolvendo as pessoas na terceira idade (observar que o estudo foi realizado em 2003, e houve

    modificao dos dispositivos em 2009):

  • 27

    A instituio de procedimentos especiais, como a ao monitria; a previso dos Juizados Especiais para causas de valor menos elevado e que no exijam prova

    pericial complexa; a limitao s hipteses de cabimento de alguns recursos; a

    previso da assistncia judiciria gratuita da Lei n. 1060/50; a prioridade de

    tramitao dos processos judiciais cujas partes ou intervenientes tenham idade igual

    ou superior a 65 anos, previsto no art. 1211-A, 1211-B e 1211-C do CPC, so alguns

    exemplos entre tantos outros da tentativa de conferir ao processo a maior eficcia

    possvel.

    Neste trabalho, ater-se- apenas a este ltimo exemplo, a prioridade dos processos

    cuja parte possuir idade igual ou superior a 65 anos.

    A advogada ao estudar os citados dispositivos, faz crtica ferrenha aos famosos

    precatrios. Conforme Uadir Lamego Bulos: "chama-se precatrio o instrumento que

    consubstancia uma requisio judicial. Trata-se de uma carta expedida pelos juzes da execuo

    da sentena ao presidente do tribunal, em virtude de a Fazenda Pblica ter sido condenada ao

    pagamento de quantia certa. A causdica com atuao no estado do Piau critica a prtica da

    Fazenda Nacional (cujas prerrogativas processuais ainda sero discutidas neste tpico), que

    sempre exige um prazo mais que dilatado para pagamento dos precatrios, em atitude que acaba

    por desprezar as regras de prioridade e celeridade (assim como a isonomia, mesmo que

    indiretamente) expressas nos artigos do Cdigo de Processo Civil, citados abaixo:

    Art. 1.211-A. Os procedimentos judiciais em que figure como parte ou interessado

    pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, ou portadora de doena grave,

    tero prioridade de tramitao em todas as instncias.

    Art. 1.211-B. A pessoa interessada na obteno do benefcio, juntando prova de sua

    condio, dever requer-lo autoridade judiciria competente para decidir o feito,

    que determinar ao cartrio do juzo as providncias a serem cumpridas.

    Art. 1.211-C. Concedida a prioridade, essa no cessar com a morte do beneficiado,

    estendendo-se em favor do cnjuge suprstite, companheiro ou companheira, em

    unio estvel.

    So os comentrios da advogada sobre a questo dos precatrios:

    O instituto do precatrio est previsto no art. 100 da Constituio Federal. A expedio do instrumento encerra uma atividade de natureza administrativa. A sua

    existncia, sem correspondncia no direito estrangeiro, justifica-se pela no sujeio

    do Estado ao processo comum de execuo, uma vez que este incompatvel com o

    regime de impenhorabilidade dos bens pblicos.

  • 28

    Com a expedio do precatrio, a entidade de direito pblico obrigada a incluir no oramento a verba necessria ao pagamento dos seus dbitos, cujos precatrios

    tenham sido apresentados at 1. de julho, fazendo-se o pagamento at o final do

    exerccio seguinte.

    V-se, ento, o primeiro inconveniente desse sistema, a demora de tempo para o

    pagamento ser efetuado. Esta dilao temporal, desde j, parece ser incompatvel

    com a celeridade que o art. 1211-A do CPC tenta imprimir para processos cujas

    partes sejam pessoas de idade mais avanada.

    O caput do art. 100 da Constituio Federal exclui os crditos de natureza

    alimentcia da submisso ordem cronolgica de apresentao dos precatrios.

    Esse dispositivo constitucional, foi objeto de grande divergncia doutrinria e jurisprudencial. Para uns, o pagamento dos crditos alimentcios dispensava a

    expedio de precatrio, para outros, era necessrio haver o precatrio, sendo

    inexigvel apenas a observncia da ordem cronolgica de apresentao dos ttulos.

    O STF pacificou o entendimento nesse ltimo sentido, consoante deciso proferida

    RE n. 195281-4, relator Min. Moreira Alves, cujo teor o seguinte: "Ementa:

    Precatrio. Prestaes de natureza alimentcia. Art. 100, caput, da Constituio

    Federal. J se firmou jurisprudncia desta corte no sentido de que a exceo prevista no art. 100, caput, da Constituio Federal, em favor dos crditos de

    natureza alimentcia, no dispensa o precatrio, limitando-se a isent-los da

    observncia da ordem cronolgica em relao s dvidas de outra natureza,

    porventura mais antigas. Recurso extraordinrio conhecido e provido". (Informativo STF n.18 DJ de 09.02.96). Destarte, indispensvel a expedio do precatrio, ainda que seja para pagamento de crdito de natureza alimentar.

    O 1.- A, do art. 100 da Constituio Federal elenca os crditos que possuem

    natureza alimentar, quais sejam: aqueles decorrentes de salrio, vencimentos,

    proventos, penses, benefcios previdencirios, indenizaes por morte ou invalidez,

    fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentena judicial transitada em

    julgado. Este rol constitucional, todavia, no exaustivo. Ao contrrio, deve ser

    compreendido de forma a abranger todos os bens indispensveis sobrevivncia do

    ser humano, como moradia, sade, educao.

    Pois bem, os crditos oriundos dos processos judiciais cujas partes possuam idade

    igual ou superior a 65 anos podem ser de natureza alimentar ou no, conforme seja o objeto da ao. Os crditos alimentares, conforme dito linhas atrs, so aqueles

    elencados, expressamente, no 1-A, art. 100 da CF e todos os que embora no

    constem do referido rol, pode-se inferir o seu carter alimentar dada a sua

    indispensabilidade sobrevivncia dos ser humano.

    Fixada a premissa anterior, conclui-se que o fato de uma ou ambas as partes

    possurem idade igual ou superior a 65 anos, sendo beneficirios da prioridade de

    trmite processual prevista no art. 1211-A do CPC, por si s, no suficiente para

    caracterizar o crdito como alimentar. Assim, caso o crdito que o idoso tenha direito

    com o desfecho da demanda no seja alimentar, o pagamento ser condicionado

    expedio de precatrio e observncia da ordem cronolgica de apresentao,

    consoante previsto no art. 100 da CF; constituindo-se crdito alimentar, estar isento

    apenas desta ltima.

    Por fim, quanto s mulheres, o princpio da isonomia foi bem utilizado pelo legislador

    na Lei n 11.340/06, criando as varas especializadas (Juizados, nos termos da lei) para tratar

    dos casos de violncia domstica e familiar contra a mulher, cartrios estes com competncia

    cvel e criminal. Alm disso, a legislao institui foro privilegiado para a mulher nas causas

  • 29

    cveis, podendo esta fazer a opo pelo foro da causa, assim como gozar de assistncia

    judiciria. So os dispositivos:

    Art. 14. Os Juizados de Violncia Domstica e Familiar contra a Mulher, rgos da Justia Ordinria com competncia cvel e criminal, podero ser criados pela

    Unio, no Distrito Federal e nos Territrios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execuo das causas decorrentes da prtica de violncia domstica e

    familiar contra a mulher.

    Art. 15. competente, por opo da ofendida, para os processos cveis regidos por

    esta Lei, o Juizado:

    I - do seu domiclio ou de sua residncia;

    II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;

    III - do domiclio do agressor.

    Art. 34. A instituio dos Juizados de Violncia Domstica e Familiar contra a

    Mulher poder ser acompanhada pela implantao das curadorias necessrias e do

    servio de assistncia judiciria.

    Tema de grande relevncia no atual cenrio do direito processual civil brasileiro, a

    reforma do Cdigo de Processo Civil, devidamente, consagrou o princpio da isonomia. O

    Anteprojeto do Novo Cdigo de Processo Civil (Projeto de Lei do Senado n 166/2010)

    expressamente adotou este importante axioma do ordenamento jurdico brasileiro. Era o texto

    original do art. 7 do citado projeto de lei:

    Art. 7 assegurada s partes paridade de tratamento em relao ao exerccio de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos nus, aos deveres e

    aplicao de sanes processuais, competindo ao juiz velar pelo efetivo contraditrio

    em casos de hipossuficincia tcnica.

    Daniel Amorim Assumpo Neves foi sagaz ao observar que a expresso em casos de

    hipossuficincia tcnica abria um leque de interpretaes bastante variado, e algumas delas

    poderiam vir a perturbar o entendimento acerca da isonomia no mbito processual. So os

    comentrios do autor:

    Ao ler o PLNCPC me perguntei: seria possvel ao juiz dar prazos distintos s partes para se manifestarem sobre um mesmo ato, sem previso legal expressa de prazo

    diferenciado? Seria possvel ao juiz determinar o recolhimento de preparo por uma

  • 30

    parte para evitar a desero de recurso e recus-lo outra, em razo da

    hipossuficincia tcnica? Seria possvel afastar a precluso consumativa par uma

    parte e mant-la para a outra, justificando-se na diferena tcnica entre elas? O

    nmero mximo de testemunhas deve ser diferente, considerando que a parte

    tecnicamente hipossuficiente pode ter maior dificuldade na inquirio?

    Todas as perguntas elaboradas devem ser respondidas negativamente, pois no se

    obtm a isonomia real por meio da discricionariedade judicial. Seria mais adequado

    aos princpios da segurana jurdica, e mesmo da isonomia, se o dispositivo legal

    apenas mencionasse que a paridade de tratamento dependeria de tratamento

    diferenciado, quando necessrio, nos termos da lei. E foi exatamente o que ocorreu

    com o Substitutivo aprovado no Senado Federal, que excluiu do dispositivo legal a parte final que tratava da hipossuficincia tcnica.

    4.7 - PUBLICIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS

    A publicidade dos atos processuais princpio processual constitucionalmente previsto,

    conforme o disposto no art. 93, IX e X, da Constituio Federal brasileira, in verbis:

    Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, dispor sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princpios:

    IX - todos os julgamentos dos rgos do Poder Judicirio sero pblicos, e fundamentadas todas as decises, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a

    presena, em determinados atos, s prprias partes e a seus advogados, ou somente

    a estes, em casos nos quais a preservao do direito intimidade do interessado no

    sigilo no prejudique o interesse pblico informao;

    X - as decises administrativas dos tribunais sero motivadas e em sesso pblica,

    sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros;.

    Tambm se faz meno ao princpio em tela a Declarao Universal dos Direitos

    Humanos:

    ARTIGO 10. Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que

    decida dos seus direitos e obrigaes ou das razes de qualquer acusao em matria

    penal que contra ela seja deduzida.

    Considerando a importncia dos textos jurdicos supracitados, tanto no cenrio nacional

    quanto internacional, pode-se avaliar a importncia dada publicidade dos atos na esfera

    judiciria e administrativa.

  • 31

    Segundo Daniel Amorim Assumpo Neves a publicidade dos atos processuais a

    forma mais eficaz de controle do comportamento no processo do juiz, dos advogados, do

    promotor, e at mesmo das partes. Alm de mtodo de controle endoprocessual, a publicidade

    d validade aos atos perante toda a sociedade. Reza o art. 5, LX da Carta Magna brasileira:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade

    do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos

    seguintes:

    LX - a lei s poder restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da

    intimidade ou o interesse social o exigirem;

    Desta maneira, devemos entender que as informaes, o contedo do processo em si,

    de carter pblico, e pode ser consultado por qualquer do povo que assim o deseje. Tambm

    no se restringe a entrada de pessoas s audincias. Mesmo o Dirio Oficial pode ser consultado

    por qualquer cidado, estando tal ferramenta disponvel na rede mundial de computadores,

    bastando que o interessado possua acesso internet.

    A publicidade, entretanto, pode ser mitigada, conforme a ordem constitucional expressa

    no art. 5, LX, dispositivo que foi complementado pelo Cdigo de Processo Civil, em seu art.

    155:

    Art. 155. Os atos processuais so pblicos. Correm, todavia, em segredo de justia os processos:

    I - em que o exigir o interesse pblico;

    Il - que dizem respeito a casamento, filiao, separao dos cnjuges, converso

    desta em divrcio, alimentos e guarda de menores.

    Pargrafo nico. O direito de consultar os autos e de pedir certides de seus atos

    restrito s partes e a seus procuradores. O terceiro, que demonstrar interesse

    jurdico, pode requerer ao juiz certido do dispositivo da sentena, bem como de

    inventrio e partilha resultante do desquite.

    Ocorre que algumas causas, devido ao contedo nelas tratado, so mantidas em segredo

    de justia. A expresso , pelos leigos, mal interpretada, como se o processo tramitasse em

    sigilo absoluto. O que acontece na realidade a mitigao da publicidade, que se mantm

  • 32

    inclume em relao s partes e seus patronos. Para qualquer pessoa no autorizada, o acesso

    aos autos e atos do processo bloqueado e at mesmo os nomes das partes suprimidos.

    O segredo de justia vem para proteger a intimidade dos envolvidos, ou em que h

    grande repercusso. Tambm restringida a publicidade quando esta puder vir a causar

    prejuzos prestao jurisdicional, seja por causa das partes ou em razo do objeto da demanda.

    possvel ainda que o magistrado mitigue a publicidade dos autos em virtude de dificuldades

    operacionais. Exemplo desta ltima situao oferecido por Daniel Amorim Assumpo

    Neves:

    Em outros casos, possvel que, por uma questo pragmtica, se faam certas limitaes publicidade em razo de dificuldades operacionais, com ntido prejuzo

    ao processo se admitida a publicidade ampla. Cito a falncia de uma enorme rede

    varejista em So Paulo, quando o juiz determinou que somente em um dia da semana

    as centenas de advogados dos credores poderiam acessar os autos, de forma a manter

    o cartrio em regular andamento nos demais dias da semana, regra excepcionada em

    situaes de urgncia.

    O autor cita ainda a proibio da presena da imprensa quando esta puder vir a causar

    dificuldades no decorrer do ato processual, assim como quando o magistrado determina que

    alguns estagirios se retirem das salas de audincias para que estas no fiquem superlotadas.

    Ainda sobre o princpio da publicidade dos atos processuais, a doutrina brasileira faz

    uma crtica de ordem tcnica ao texto do Anteprojeto do Novo Cdigo de Processo Civil

    (Projeto de Lei do Senado n 166/2010). O texto da Constituio Federal faz meno clara aos

    atos processuais. O PLNCPC, em seu artigo 11, caput, faz meno apenas julgamentos dos

    rgos do Poder Judicirio. Segue o texto do dispositivo:

    Art. 11. Todos os julgamentos dos rgos do Poder Judicirio sero pblicos, e fundamentadas todas as decises, sob pena de nulidade.

    Pargrafo nico. Nas hipteses previstas neste Cdigo e nas demais leis, pode ser

    autorizada somente a presena das partes ou de seus advogados.

    Segundo Daniel Amorim Assumpo Neves, o correto seria o uso da expresso atos

    processuais ao invs de julgamentos, de modo a cumprir integralmente a ordem da Carta

  • 33

    Magna. O autor ainda cita o art. 164 do projeto de lei em comento, referindo-se negativamente

    ao uso da expresso segredo de justia, porm elogiando as correes e inovaes do

    dispositivo, com destaque incluso da restrio publicidade nos processo eletrnicos.

    Art. 164. Os atos processuais so pblicos. Correm, todavia, em segredo de justia os processos:

    I - em que o exigir o interesse pblico;

    II - que dizem respeito a casamento, separao de corpos, divrcio, unio estvel,

    filiao, alimentos e guarda de crianas e adolescentes;

    III - em que constem dados protegidos pelo direito constitucional intimidade;

    IV que dizem respeito ao cumprimento de carta arbitral, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juzo.

    1 O direito de consultar os autos de processos que correm em segredo de justia e

    de pedir certides de seus atos restrito s partes e a seus procuradores. O terceiro

    que demonstrar interesse jurdico pode requerer ao juiz certido do dispositivo da

    sentena, bem como de inventrio e partilha resultante de separaes judiciais

    encerradas ou divrcios.

    2 O processo eletrnico assegurar s partes sigilo, na forma deste artigo.

    4.8 - PRINCPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL

    O princpio da economia processual pode ser analisado em trs frentes. Analisando sob

    a tica do ordenamento como um sistema, tem-se que quanto menor o nmero de aes

    tramitando, melhor a qualidade da prestao jurisdicional, no s quanto aos atos do

    magistrado, mas tambm em relao aos trabalho da vara judiciria, dos serventurios da justia

    em geral (tcnicos, analistas, oficiais de justia, etc.).

    A previso das aes coletivas, evitando a diviso da demanda em diversas causas

    individuais agiliza a tramitao do processo, assim como dificulta a possibilidade de decises

    discrepantes em relao a situaes semelhantes. Tambm so disposies que coadunam com

    o princpio da economia processual (no sentido ora analisado), a reunio de demandas conexas

    para julgamento conjunto, prevista no art. 105 do Cdigo de Processo Civil, assim como

    permisso para formao de litisconsrcios, havendo a vedao apenas ao litisconsrcio

    multitudinrio (quando o nmero de litigantes pode atrasar a soluo da lide ou dificultar a

    defesa), conforme disposto no art. 46 do CPC.

    H outros institutos que tm por escopo evitar a repetio de atos processuais e, desta

    maneira, dar concretude ao princpio da economia processual. As intervenes de terceiro,

  • 34

    reconvenes e aes declaratrias, se vistas no caso concreto, podem dar a impresso de irem

    de encontro ao princpio da economia processual, tendo em vista que tendem a tornar mais

    complexa a causa. Tal impresso, entretanto, amplamente recusada pela doutrina.

    Por ltimo, a perspectiva mais bvia do princpio da economia processual, como norma

    que traz ao ordenamento a necessidade de baratear o processo, tanto para os cofres pblicos

    quanto para as partes. Neste sentido, o benefcio da assistncia judiciria gratuita pelas

    Defensorias Pblicas, garantindo o acesso Justia aos que no podem, economicamente,

    enfrentar um processo. Tambm foi de vital importncia a implantao dos Juizados Especiais,

    que garantem a gratuidade do processo at a prolao da sentena. Para os que no podem ser

    considerados pobres na forma da lei, o processo deve ser o mais barato possvel, o que se obtm

    baixando o valor das custas, a utilizao de rgos pblicos para realizao de percias, e

    tambm agilizando-se a prestao jurisdicional (observando-se o ordenamento jurdico

    brasileiro, processos mais demorados tendem a ser mais lentos).

    4.9 - INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS

    Todo ato processual pode ter sua frmula prevista em lei, e quando o tem, tal previso

    deve ser seguida para que a manifestao atinja sua finalidade. Seguida a frmula para que se

    atinja tal objetivo, gera-se para as partes a expectativa que os efeitos do ato sero atingidos.

    Pode-se afirmar, ento, que ao seguir a previso legal para a prtica do ato, ocorre o fenmeno

    da segurana jurdica, pois as partes sabero previamente que praticando o ato em conformidade

    com a norma, conseguiro os efeitos jurdicos programados para o mesmo.

    Entretanto, sempre que a forma legal no completamente seguida, tal manifestao

    no pode produzir os efeitos esperados. Tal consequncia, que para alguns doutrinadores

    assume o carter de uma sano, representa uma nulidade. Ato viciado aquele que praticado

    em desconformidade com as normas legais, sendo a nulidade a consequncia lgica e

    sancionatria.

    Segundo Daniel Amorim Assumpo Neves:

    [...] O princpio da instrumentalidade das formas busca aproveitar o ato viciado, permitindo-se a gerao de seus efeitos, ainda que se reconhea a existncia do

    desrespeito forma legal.

  • 35

    Pelo princpio da instrumentalidade das formas, ainda que a formalidade para a

    prtica do ato seja importante em termos de segurana jurdica, visto que garante

    parte que a respeita a gerao dos efeitos programados por lei, no conveniente

    considerar o ato nulo somente porque praticado em desconformidade com a forma

    legal. O essencial verificar se o descompasso entre o ato como foi praticado e como

    deveria ser praticado segundo a forma legal causou algum prejuzo.

    O apego formalidade torna-se exacerbado quando a prtica do ato viciado no causa

    prejuzo parte contrria e mesmo assim anulado. Ora, a anulao de ato simplesmente por

    desobedincia ao seu formato no somente contrria lgica de justia, mas vai de encontro

    ao prprio sistema jurdico brasileiro, notadamente aos princpios constitucionais do devido

    processo legal (em sua acepo mais abrangente) e economia processual.

    Por exemplo, se Fulano inicia litgio contra Sicrano, requerendo a citao pessoal deste,

    ou seja, atravs de mandado distribudo para Oficial de Justia, o magistrado, por determinao

    da lei processual civil (art. 222, f, do Cdigo de Processo Civil), deve dar seguimento ao

    requerimento do autor.

    Caso o magistrado despache em sentido diverso, mantendo a citao via

    correspondncia ou outra forma, o ato ser nitidamente viciado. Entretanto, se o ato citatrio

    devidamente cumprido e, desta forma, solidifica o trip processual, no h de se falar em

    anulao da citao meramente por capricho. Isto se d em virtude do ato haver se realizado

    sem que haja prejuzo para qualquer das partes.

    O Anteprojeto do Novo Cdigo de Processo Civil (Projeto de Lei do Senado n

    166/2010) contm trs dispositivos que tratam do princpio das instrumentalidade das formas:

    os artigos 163, caput; 252; e 258, pargrafo nico.

    Art. 163. Os atos e os termos processuais no dependem de forma determinada, seno quando a lei expressamente a exigir, considerando-se vlidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.

    Art. 252. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerar vlido o ato

    se, realizado de outro modo, lhe alcanar a finalidade.

    Art. 258. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulao dos atos que

    no possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessrios a fim de

    se observarem as prescries legais.

    Pargrafo nico. Dar-se- o aproveitamento dos atos praticados desde que no

    resulte prejuzo defesa.

  • 36

    4.10 - RAZOVEL DURAO DO PROCESSO

    Segundo o art. 5, inciso LXXVIII, da Constituio Federal de 1988:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade

    do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes:

    LXXVIII - a todos, no mbito judicial e administrativo, so assegurados a razovel

    durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao.

    Sem dvida alguma derivado do devido processo legal, o princpio da razovel durao

    do processo foi expressamente inserido na Constituio Federal pela Emenda Constitucional

    45 de 2004, esta que ficou conhecida como a reforma do Judicirio. Trata-se de garantia a

    um direito fundamental, conforme se observa pela denominao dada a este trecho da Carta

    Magna.

    Os processos judiciais e administrativos no Brasil, conforme demonstra a prtica, so

    extremamente morosos, fato que prejudica no somente as partes, mas causa a perda de

    credibilidade do Poder Judicirio assim como enfraquece os demais Poderes do Estado

    nacional. A lei processual, tanto na esfera civil como nas demais, vem se modernizando e

    paulatinamente tentando encontrar meios de agilizar a resoluo dos processos, atitude dos

    legisladores que obedece ordem expressa no final do dispositivo constitucional: meio que

    garantam a celeridade.

    No devemos, entretanto, confundir celeridade com pressa. A celeridade processual

    procura que a lide tenha a mais rpida soluo possvel, sem que haja prejuzo aos litigantes: a

    prestao jurisdicional deve ser feita de maneira a extinguir o conflito sem que haja lacunas,

    deixando o menor nmero possvel de sequelas. Como afirma Daniel Amorim Assumpo

    Neves: O legislador no pode sacrificar direitos fundamentais das partes visando somente a

    obteno de celeridade processual, sob pena de criar situaes ilegais e extremamente injustas.

    A regra, obviamente, atinge a todos os envolvidos no s na criao de leis, mas tambm na

    sua aplicao e cumprimento.

    Cabe s partes e aos envolvidos com a disciplina jurdica compreender que, apesar do

    sentimento de frustrao, muito pior seria o resultado de uma demanda mal construda, mal

    julgada. Deve-se compreender ainda que a demora, em muitos casos, encontra causas para

  • 37

    ocorrer: no se pode esperar que uma causa de alta complexidade se resolva to rapidamente

    quanto processos de menor nvel tcnico.

    Alm da complexidade da causa, muitas vezes pode-se perceber o descaso de uma das

    partes, o desejo que a causa se estenda o mximo possvel, algumas vezes procurando maneiras

    de simplesmente forar a outra parte ao abandono por pura frustrao, outras, como muito se

    v por parte dos governantes, tentando passar o problema para o sucessor. Estas atitudes, dentre

    tantas, causam a perda de credibilidade do Judicirio em virtude da morosidade.

    Por fim, alguns institutos criados pelos legisladores brasileiros que procuram solucionar

    tal problema, tanto no Cdigo de Processo Civil quanto nas demais legislaes:

    a) Procedimentos Sumrio (art. 275 do CPC) e Sumarssimo (Lei n 9.099/95);

    b) Processo Sincrtico (Leis n 10.444/02 e 11.232/05);

    c) Represso chicana processual (art. 14, pargrafo nico, do CPC);

    d) Comunicao dos atos processuais por via eletrnica (art. 154, 2, do CPC);

    e) Julgamento de improcedncia liminar (art. 285-A do CPC);

    f) Julgamento antecipado do mrito (art. 330 do CPC);

    g) Uso da prova emprestada como mtodo de defesa (art. 332 do CPC);

    h) Smula impeditiva de recursos (art. 518, 1, do CPC);

    i) Julgamentos monocrticos do relator de recurso (art. 557 do CPC); e

    j) Procedimento monitrio (arts. 1.102-A a 1.102-C do CPC).

    4.11 - COOPERAO

    O princpio da cooperao at pouco tempo era um tema pouco debatido no mbito da

    doutrina brasileira, apesar de muito se discutir sobre o mesmo na Alemanha e em Portugal. No

    Brasil, doutrinadores como Fredie Didier Jr. e Lcio Grassi de Gouveia debateram sobre o

    citado princpio.

    Trata o princpio da cooperao acerca da conduta do magistrado no decorrer do

    processo. Ora, a estrutura do processo um trip, em que as partes esto equidistantes do

    julgador, devendo trazer a este fatos e argumentos para melhor construo da prestao

    jurisdicional. Ocorre que o antigo paradigma da imobilidade do julgador, sua neutralidade, no

  • 38

    se aplica a atual situao do Judicirio brasileiro. Chegou-se concluso que nenhum ser

    humano pode ser neutro, mas pode ser imparcial, e que o julgador, por mais que o procedimento

    no preveja tal ao, participe da causa.

    Tratando da imparcialidade, Humberto Theodoro Jnior cita Jos Frederico Marques

    bem se refere como imprescindvel lisura e prestgio das decises judiciais a inexistncia

    da menor dvida sobre motivos de ordem pessoal que possam influir no nimo do julgador.

    Deste modo, admite a existncia de sentimentos e emoes por parte do magistrado, desde que

    tais sensaes no interfiram na sua clareza de pensamento ou tragam prejuzos ao processo.

    Conforme as palavras de Viviane Soares Wanderley, o Princpio da Cooperao

    Intersubjetiva permite que o Juiz ou o rgo Julgador possa incitar, auxiliar, esclarecer,

    questionar, advertir as partes, sem colocar em prejuzo a imparcialidade acima tratada. O

    magistrado, conforme a estrutura de trip, sujeito (e no parte) do processo, devendo a ele

    trazer o maior nmero de acrscimos que lhe for possvel, sem que haja prejuzo claro e de

    ordem subjetiva s partes.

    Fredie Didier Jr. procurou em seus estudos alm de tratar do contedo do princpio da

    cooperao, dar uma dimenso a este, equiparando a cooperao com os sistemas dispositivo e

    inquisitorial: o doutrinador baiano identifica um terceiro sistema processual, o cooperativo,

    assim como suas caractersticas:

    O modelo cooperativo parece ser o mais adequado para uma democracia. DIERLE JOS COELHO NUNES, que fala em modelo comparticipativo de processo como

    tcnica de construo de um processo civil democrtico em conformidade com a

    constituio, afirma que a comunidade de trabalho deve ser revista em perspectiva policntrica e coparticipativa, afastando qualquer protagonismo e se estruturando a

    partir do modelo constitucional de processo.

    Disso surgem deveres de conduta tanto para as partes

    como para o rgo jurisdicional, que assume uma dupla posio: mostra-se paritrio na conduo do processo, no dilogo processual, e assimtrico no momento da deciso; no conduz o processo ignorando ou minimizando o papel das

    partes na diviso do trabalho, mas, sim, em uma posio paritria, com dilogo e equilbrio.

    No entanto, no h paridade no momento da deciso; as partes no decidem com o juiz; trata-se de funo que lhe exclusiva. Pode-se dizer que a deciso judicial

    fruto da atividade processual em cooperao, resultado das discusses travadas ao

    longo de todo o arco do procedimento; a atividade cognitiva compartilhada, mas a

    deciso manifestao do poder, que exclusivo do rgo jurisdicional, e no pode

    ser minimizado. Neste momento, revela-se a necessria assimetria entre as posies

    das partes e do rgo jurisdicional: a deciso jurisdicional essencialmente um ato

    de poder. Em um processo autoritrio/inquisitorial h essa assimetria tambm na

    conduo do processo.

  • 39

    Mais especificamente sobre o princpio da cooperao, nas palavras de Daniel Amorim

    Assumpo Neves, os debates dos doutrinadores brasileiros trouxeram tona trs vertentes

    deste axioma:

    (I) Dever de esclarecimento, consubstanciado na atividade do juiz de requerer s partes esclarecimentos sobre suas alegaes e pedidos, o que naturalmente evita a

    decretao de nulidades e a equivocada e=interpretao do juiz a respeito de uma conduta assumida pela parte;

    (II) Dever de consulta; exigindo que o juiz sempre consulte as partes antes de proferir

    deciso, em tema j tratado quanto ao conhecimento de matrias e questes de ofcio;

    (III) Dever de prevenir, apontando s partes eventuais deficincias e permitindo suas

    devidas correes, evitando-se assim a declarao de nulidade, dando-se nfase ao

    processo