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https://bibliotecaesasgaia.wordpress.com/ Artigos de jornal BIBLIOTECA ESASGAIA Outubro 2019

PRÉMIOS NOBEL 2019 · 2019. 10. 14. · Antes do Nobel, que recebe este ano, Ratcliffe foi distinguido com uma série de importantes prémios internacionais, entre os quais se incluem

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Artigos de jornal

BIBLIOTECA ESASGAIA

Outubro 2019

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Nobel da Medicina distingue descoberta sobre mecanismo celular que regula oxigénio

https://www.dn.pt/vida-e-futuro/nobel-da-medicina-para--11379494.html Filomena Naves 07 Outubro 2019

A Medicina abre a temporada Nobel 2019 e distingue William G. Kaelin, Gregg Semenza e Peter Ratcliffe pelas suas descobertas sobre os mecanismos celulares relacionados com o oxigénio

Os trabalhos de William G. Kaelin, Gregg Semenza e Peter Ratcliffe, que permitiram desvendar o mecanismo celular fundamental que permite às células adaptar-se à disponibilidade de oxigénio no ambiente valeram-lhes este ano o prémio Nobel da Medicina, anunciado esta segunda-feira pela Academia de Ciências sueca.

"Este é um dos mecanismos críticos dos organismos para a adaptação à vida", explica a academia sueca.

"A importância fundamental do oxigénio para a vida é conhecida há século, mas a forma como as células se adaptam aos níveis de oxigénio disponíveis era desconhecida", afirma o júri do prémio, sublinhando que "este mecanismo é central numa série de doenças", lançando assim as bases para "novas e promissoras estratégias para combater patologias como a anemia, o cancro e muitas outras doenças".

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William G. Kaelin, Gregg Semenza e Peter Ratcliffe, sublinha o comité Nobel, "identificaram a maquinaria celular que regula a atividade dos genes em resposta aos níveis variáveis de oxigénio".

Num Twitter publicado pelo comité Nobel, o britânico Peter Ratcliffe mostra-se radiante no início de um novo dia de trabalho, o primeiro já com a distinção Nobel.

Um mecanismo celular básico

Em resposta a uma situação de níveis baixos de oxigénio - o organismo entra em hipoxia - são desencadeados mecanismos fisiológicos de adaptação, em que se dá o aumento dos níveis de uma hormona chamada eritropoetina, ou EPO, que por sua vez induz o aumento da produção de glóbulos vermelhos no sangue.

A importância deste mecanismo já era conhecida desde o princípio do século XX, mas a forma como este processo era controlado permanecia um mistério, explica o comité Nobel.

O americano Gregg Semenza, que é professor e investigador na Universidade de John Hopkins, nos Estados Unidos, estudou o gene EPO e a forma como ele é regulado pelos níveis de oxigénio variáveis. Utilizou ratinhos geneticamente modificados e descobriu que há sequências genéticas específicas que regulam a resposta celular em situação de hipoxia.

O britânico Peter J. Ratcliffe

© EPA/PAUL WILKINSON / UNIVERSITY OF OXFORD

O britânico Peter Rattcliffe, professor e investigador na Universidade de Oxford, no Reino Unido, estudou também aquele mecanismo genético e chegou também a resultados idênticos. Os grupos liderados pelos dois cientistas descobriram independentemente que este mecanismo celular relacionado com a regulação do oxigénio está presente em todos os

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tecidos do organismo, e não apenas nas células dos rins, onde a EPO é normalmente produzida.

O cientista americano Gregg Semenza

© EPA/JOHNS HOPKINS UNIVERSITY

Gregg Semenza descobriu ainda que sequências genéticas, ou seja, que genes, estão associados a este mecanismo de regulação do oxigénio celular. Faltava apenas identificar um último gene relacionado com todo este processo e essa última peça do puzzle chegou pela mão de William Kaelin, professor e investigador na Universidade de Harvard.

Na mesma altura em que Gregg Semenza e Peter Rattcliffe estavam a fazer o seu trabalho pioneiro sobre este mecanismo celular, o americano William Kaelin estava a estudar uma doença chamada Hippel-Lindau, causada por uma mutação genética, e cujos portadores têm um elevado risco de desenvolver determinados tipos de cancro.

O cientista americano William Kaelin

© EPA/DANA-FARBER CANCER INSTITUTE

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William Kaelin descobriu que o gene relacionado com essa doença, designado VHL, codifica uma proteína que inibe o desenvolvimento do cancro e mostrou que as células que não contêm o VHL exibem um estado crónico de baixos níveis de oxigénio.

Na prova dos nove, ao reintroduzir o VHL nessas células, William Kaelin mostrou que elas recuperavam o normal controlo dos níveis de oxigénio, ficando assim demonstrada a participação desse gene no complexo mecanismo de regulação dos níveis de oxigénio nos tecidos celulares.

Novas estratégias para algumas patologias

A Academia sueca destaca a importância das descobertas dos três cientistas para o conhecimento de um processo celular e fisiológico básico à vida,

Este mecanismo, sublinha o comité Nobel, "permite às células adaptarem-se o seu metabolismo a condições ambientais de baixos níveis de oxigénio", como acontece por exemplo nos tecidos musculares durante o exercício físico intenso. Outros exemplos, destaca, são as situações de produção de novos vasos sanguíneos ou de glóbulos vermelhos.

Uma série de patologias estão também relacionadas com este mecanismo, como é o caso da anemia, sendo que é central também em doenças como o cancro, pelo que a sua compreensão permite novas estratégias para tentar combatê-las, destaca ainda o comité Nobel.

Dois americanos e um britânico

Nascido em 1957 em Nova Iorque, William Kaelin, é professor e investigador da Harvard Medical School, em Boston, Estados Unidos. Formou-se em matemática e bioquímica na Universidade de Duke e enveredou por uma carreira de investigação sobre os mecanismos moleculares e celulares na área do cancro.

O prémio Nobel da Medicina culmina uma série de prémios anteriores, entre os quais se destacam, em 2016, o Albert Lasker Award for Basic Medical Research, atribuído pela Fundação Lasker, que distingue contributos pioneiros na área da investigação médica, ou o Wiley Prize in Biomedical Sciences, em 2014. No ano passado, foi também galardoado com o prémio Massry, atribuído pela Fundação Meira and Shaul G. Massry, que distingue contributos inovadores na área da investigação médica.

O britânico Peter Ratcliffe nasceu em 1954, em Lancashire. Formou-se em medicina na Universidade de Cambridge, e mudou-se para Oxford, onde se mantém ainda hoje, para se dedicar ao estudo dos mecanismos relacionados com a regulação do oxigénio a nível renal

Antes do Nobel, que recebe este ano, Ratcliffe foi distinguido com uma série de importantes prémios internacionais, entre os quais se incluem igualmente o Albert Lasker Award for Basic Medical Research (2016) e o Massry (2018), para além de outros, como a medalha Buchanan, que lhe foi atribuída em 2017 pela Royal Society.

Gregg Semenza, que nasceu em 1956, em Nova Iorque, médico especialista em química médica e oncologia, formou-se na Universidade da Pensilvânia e é professor e investigador

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na Universidade Johm Hopkins. Tem igualmente uma carreira recheada de prémios, entre os quais o Lasker, em 2016, o prémio Wiley, em 2014, ou aida o Scientific Grand Prize da da prestigiada fundação Lefoulon-Delalande.

Os três premiados deste ano sucedem ao americano James P. Ellison e ao japonês Tasuko Honjo que no ano passado foram distinguidos com o Nobel da Medicina pelo seus trabalhos sobre imunoterapia aplicada ao cancro.

Vídeos:

https://www.youtube.com/watch?v=F--oWq-gRtE

http://g1.globo.com/globo-news/videos/v/premio-nobel-de-medicina-vai-para-trio-que-pesquisa-adaptacao-de-celulas-e-oxigenio/7983126/

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O cientista a quem o prémio tinha escapado e o laureado que ensinou os astrofísicos portugueses. Quem são os vencedores do Nobel da Física?

Peebles queria o Nobel pela descoberta da radiação de fundo mas chegou um ano atrasado. Mayor trabalhou com os melhores astrofísicos portugueses. Ganharam o Nobel da Física esta terça-feira.

08 Oct 2019

https://observador.pt/2019/10/08/nobel-da-fisica-para-cientistas-que-descobriram-um-exoplaneta-a-orbitar-uma-estrela-semelhante-ao-sol/

O prémio Nobel da Física de 2019 foi entregue a James Peebles, Michel Mayor e Didier Queloz, revelou esta terça-feira a Academia Real das Ciências da Suécia. Os três cientistas foram laureado pelas “contribuições para a compreensão do universo e do cosmos”. O primeiro contribuiu “para melhor entender a estrutura do universo”. Os outros dois descobriram um exoplaneta a orbitar uma estrela semelhante ao Sol, indicou a Academia numa conferência de imprensa em Solna, nos arredores de Estocolmo, na Suécia.

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James Peebles foi distinguido “pelas descobertas teoréticas na cosmologia física”. Nos últimos 20 anos, James Peebles dedicou-se a estudar a radiação cósmica de fundo — uma forma de radiação eletromagnética que atravessa o universo desde o momento do Big Bang — e conseguiu criar uma “linha do tempo” da evolução do universo desde os primeiros segundos após o Big Bang até à atualidade. É por isso que recebe metade do Nobel da Física deste ano.

A outra metade foi entregue a Michel Mayor e Didier Queloz, que em 1995 anunciaram a descoberta de um planeta fora do Sistema Solar que orbitava uma estrela semelhante à nossa. “Foi uma revelação que mudou para sempre a nossa perceção do lugar da Terra no nosso universo”, explicou Mats Larsson, presidente do Comité do Nobel da Física. Desde então que mais de quatro mil exoplanetas foram descobertos, alguns dos quais com a possibilidade de terem vida.

Nobel da Física contribuiu para a “fantástica equipa de astrofísicos” em Portugal

Nuno Santos, investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, ainda não conseguiu conversar com Michel Mayor: “Tem o telefone desligado e eu consigo compreender porquê”. Nuno e Michel são amigos desde os tempos em que o cientista português foi aluno de doutoramento do novo Nobel da Física: “É também graças a ele que há em Portugal uma fantástica equipa de astrofísicos formados por ele”.

Michel Mayor foi o maior responsável pela descoberta do primeiro planeta a orbitar outra estrela parecida ao Sol. “Houve muita controvérsia, mas ele teve a coragem e a ousadia científica de acreditar que era verdade. Aquele planeta não era esperado naquele lugar, de acordo com aquilo que sabíamos na altura”, explica Nuno Santos, em conversa com o Observador.

Os modelos de formação de sistemas planetários diziam-nos aquilo que tínhamos perante os nossos olhos — que pelo universo fora, assim como no Sistema Solar, os planetas mais pequenos e rochosos orbitavam as imediações das estrelas; e que os gigantes gasosos existiam longe delas. “Ele olhou para os dados e disse que não devia ser sempre assim. Aquilo que tinha à frente só faria sentido se houvesse um planeta gigante e gasoso a orbitar uma estrela nas proximidades delas”, conta Nuno Santos.

A comunidade científica torceu o nariz às ideias revolucionárias de Michel Mayor, mas teve de se render a elas quando se comprovou que eram verdadeiras — e que aquele não era caso único no universo. “Com esta descoberta abriu-se uma nova área de astrofísica, que é uma das de maior impacto. É uma pessoa extremamente humana. E um profissional que dava excelentes ideias o tempo todo”, adjetiva Nuno Santos, que assina muitos artigos científicos em co-autoria com o novo Nobel da Física, todos sobre os exoplanetas e as estrelas que eles orbitam.

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A importância de Michel Mayor e Didier Queloz é reiterada no comunicado da Academia Real das Ciências da Suécia: “Esta descoberta iniciou uma revolução na astronomia. Novos mundos estranhos ainda estão a ser descobertos. Eles desafiam as nossas ideias sobre sistemas planetários e estão a obrigar os cientistas a rever as suas teoria“, comenta.

James Peeble, o cientista a quem o Nobel escapou há 55 anos

Cinquenta e cinco anos depois, James Peeble vê-se finalmente com um Prémio Nobel na mão.

Em 1964, quando era colaborador de Robert Henry Dicke na Universidade de Princeton e montou uma antena na esperança de ser o primeiro a descobrir a radiação cósmica de fundo, o prémio escapou-lhe. Arno Penzias e Robert Wilson adiantaram-se e, apenas um ano depois, anunciavam a descoberta. O nome de Bob Dicke e James Peeble surgem no relatório. Mas o Nobel de 1978 não o mencionava.

É o que nos conta José Pedro Mimoso, professor associado do Departamento de Física da Faculdade de Ciências de Lisboa e investigador na área da Cosmologia e Astrofísica Relativista: “A partir dali, James Peebles, um recém-doutorado dedica-se a desenvolver utensílios teóricos da cosmologia observacional”, explica. Como assim? “São cálculos teóricos que nos permitem saber a distribuição das galáxias pelo universo, coisas que nos permitem descrever a estrutura do mundo“, prossegue.

Para José Pedro Mimoso, os estudos de James Peebles são importantes porque confirmam aquilo que temos vindo a perceber desde o século XX: “Para a física teórica, até essa altura, o universo era o palco onde simplesmente existíamos segundo umas regras. Depois disso percebemos que essas regras regem o próprio palco, o próprio universo, que é responsivo e evoluiu conforme as leis que vamos descobrindo“, conclui.

Em comunicado de imprensa, a Academia Real das Ciências da Suécia indica que “as ideias de James Peebles sobre cosmologia física enriqueceram todo o campo da investigação e estabeleceram as bases para a transformação da cosmologia nos últimos 50 anos, da especulação à ciência”: “O seu referencial teórico, desenvolvido desde meados da década de 1960, é a base de nossas ideias contemporâneas sobre o universo”, conclui.

Ora, a radiação cósmica de fundo que James Peebles perseguia no início da carreira é uma das provas mais sólidas do modelo de Big Bang, segundo o qual o universo evoluiu nos últimos 14 mil milhões de anos de um estado extremamente denso e quente para outro em expansão e mais frio.

Quatrocentos mil anos depois do Big Bang, o universo tornou-se transparente e os raios de luz começaram a viajar pelo espaço fora. Desde então que o universo é atravessado por radiação eletromagnética no espetro das micro-ondas que “codificada nela muitos dos segredos do universo”: “Usando as suas ferramentas e cálculos teóricos, James Peebles

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foi capaz de interpretar esses traços desde a infância do universo e descobrir novos processos físicos“, termina o comunicado.

828 mil euros para os vencedores do Nobel

Este ano, a organização do Prémio Nobel oferecerá nove milhões de coroa suecas — o equivalente a quase 828,5 mil euros — ao vencedor do galardão. Neste caso, James Peebles vai receber metade do prémio, enquanto a outra metade será dividida por Michel Mayor e Didier Queloz.

O valor monetário é uma tradição que vem dos tempos em que Alfred Nobel deixou um fundo avaliado atualmente em 1.701 milhões de coroas suecas (15,7 milhões de euros) para ser “distribuído anualmente a quem, no ano anterior, tenha feito um grande benefício para a humanidade”.

No ano passado, o Nobel da Física tinha sido entregue a Gérard Mourou, Arthur Ashkin e Donna Strickland por terem desenvolvido “ferramentas feitas de luz”: o primeiro desenvolveu um “método para gerar impulsos óticos ultra-curtos e de alta intensidade”; o segundo inventou “pinças óticas com aplicação aos sistemas biológicos”; e Donna Strickland, a primeira mulher a receber o Nobel da Física nos últimos 55 anos, trabalhou com Gérard Mourou naquela invenção.

Dos 112 Prémios Nobel da Física entregues até 2018— o primeiro dos quais em 1895 — três foram entregues a mulheres (Marie Curie em 1903, Maria Goeppert-Mayer em 1963 e Donna Strickland em 2018), 25 estão entre os mais novos a receber um galardão Nobel e 96 entre os mais velhos. Ao longo destes 124 anos, houve 210 vencedores. John Bardeen foi o único a receber o galardão por duas vezes — uma em 1956 pela investigação em semicondutores e pela descoberta do transistor; e outra em 1972 pelo desenvolvimento da teoria da supercondutividade.

O mais jovem vencedor de um Prémio Nobel foi William Lawrence Bragg, que recebeu o galardão em 1915 com apenas 25 anos na altura. William Lawrence Bragg foi distinguido por ter analisado as estruturas cristalinas através da difração de raios-X. O mais velho vencedor foi Arthur Ashkin, com 96 anos, que ganhou o prémio no ano passado com o desenvolvimento das pinças óticas. A invenção vem da física, mas tem aplicações em várias áreas científicas, sobretudo na biologia.

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Prémio Nobel da Química para o desenvolvimento das baterias de lítio As baterias de lítio permitiram um "mundo recarregável", segundo o anúncio do Nobel da Química. Três investigadores contribuíram para a revolução tecnológica que podemos levar para qualquer lado.

09 Oct 2019

https://observador.pt/2019/10/09/premio-nobel-da-quimica-para-o-desenvolvimento-das-baterias-de-litio/

Vera Novais Texto

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O prémio Nobel da Química foi atribuído, esta quarta-feira, a John B. Goodenough, da Universidade do Texas (Austin, Estados Unidos), M. Stanley Whittingham, da Universidade Binghamton (Universidade Estatal de Nova Iorque) e Akira Yoshino, da Universidade Meijo e Asahi Kasei Corporation (Japão), pelo desenvolvimento das baterias de lítio. O trabalho começou já nos anos 1970, mas mudou a sociedade para sempre. Se não acredita, pegue no telemóvel ou no computador portátil e vai perceber porquê.

O desenvolvimento desta tecnologia é considerado uma revolução técnica. Primeiro, porque os

laureados tiveram de ultrapassar vários desafios químicos para permitir que os iões de lítio

pudessem viajar de um lado para o outro na bateria de forma durável — e segura. Depois, a

investigação permitiu criar baterias recarregáveis mais leves e que duram

muito mais tempo — o que para o desenvolvimento dos equipamentos tecnológicos foi um

passo muito importante.

Atualmente, temos baterias de lítio em vários tipos de equipamentos, dos pacemakers aos

telemóveis, dos carros elétricos às baterias que armazenam energia renovável. E é no campo do

armazenamento de energia renovável que as baterias de lítio ainda podem

mostrar o seu potencial.

O lítio é um elemento pequeno e leve, o que permite “empacotar” uma grande quantidade de

átomos numa bateria, também ela, pequena e leve. E é extremamente reativo, o que

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representa simultaneamente uma vantagem e desvantagem. O grande desafio para os laureados

foi conseguir ter uma bateria estável com um elemento tão reativo.

A seleção dos laureados nesta área foi feita e anunciada pela Real Academia Sueca das Ciências,

em Estocolmo (Suécia). O prémio tem um valor total de nove milhões de coroas

suecas (cerca de 830 mil euros) e vai ser distribuído de forma equivalente pelos três.

O Nobel da Química 2018 foi atribuído a três cientistas pelo desenvolvimento de duas técnicas

que permitiram a criação de proteínas dirigidas, ou seja, a possibilidade de criar novas proteínas

com os objetivos específicos que o investigador lhes atribuiu.

Como a crise do petróleo levou às baterias de lítio

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A crise do petróleo dos anos 1970 fez com que Stanley Whittingham (1941) começasse a pensar em tecnologias que permitissem uma menor dependência dos combustíveis fósseis. A pequena bateria de lítio, que conseguiu criar na altura, mostrava um grande potencial, mas ao mesmo tempo era “demasiado explosiva para ser viável”, como descreve o comunicado de imprensa do Nobel. A capacidade de os átomos de lítio libertarem facilmente eletrões era ao mesmo tempo a melhor e a pior característica deste elemento.

Stanley Whittingham tinha criado uma bateria com uma parte feita de lítio metálico (o ânodo), que libertava os eletrões, e outra de dissulfeto de titânio (o cátodo), que recebia e acomodava esses eletrões — como o os sinais de – (menos) e de + (mais) que vemos nas pilhas. A empresa Exxon, para quem trabalhava, estava disposta a pô-la no mercado. Mas problemas no ânodo faziam com que a bateria entrasse em curto circuito depois de ser recarregada umas quantas vezes. Muitos incêndios tiveram de ser apagados no laboratório onde estavam a ser testadas.

O sonho de Stanley Whittingham é que estas baterias pudessem um dia alimentar um automóvel, mas com a queda abrupta do preço do petróleo, a companhia petrolífera Exxon deixou de financiar o desenvolvimento das baterias de lítio.

John Goodenough, agora com 97 anos — e o mais velho laureado de sempre —, também foi afetado pela crise do petróleo e também sonhava com uma fonte de energia alternativa. Goodenough teve conhecimento do trabalho de Whittingham, mas achou que a melhor forma de acomodar iões de lítio seria com um óxido metálico, neste caso óxido de cobalto, em vez de um dissulfeto metálico, como o dissulfeto de titânio. Esta nova bateria mostrou ser duas vezes mais potente que a anterior.

A queda nos preços do petróleo fez cair também o interesse nas energias renováveis e na criação de carros elétricos, mas, no Japão, as baterias leves e recarregáveis não passaram despercebidas às empresas de tecnologia. E em 1985, Akira Yoshino (1948) criava a primeira bateria de lítio para ser comercializada. Yoshino substituiu o ânodo de lítio por um material de carbono (um subproduto da industria petrolífera) que podia acomodar iões de lítio — tal como o cátodo já fazia.

As baterias evoluíram e o risco de explosão ou incêndio diminuíram. Se no início, bastava que o lítio entrasse em contacto com a humidade do ar para incendiar, atualmente, o processo de fabricação, o isolamento da bateria e a conceção da mesma, permitem que um telemóvel caia na água sem se incendiar.

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Nas baterias (ou pilhas) convencionais, a energia é produzida por reações químicas, que vão acontecendo lentamente, mas que acabam por esgotar todo o conteúdo da pilha. No caso das baterias de lítio, o fluxo de iões não reage com o resto da pilha, o que permite que seja carregadas centenas de vezes antes de o seu desempenho se começar a deteriorar. As baterias de chumbo e níquel também podem ser recarregadas, mas comparadas com as de lítio têm de ser muito maiores e mais pesadas para produzirem a mesma quantidade de energia.

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“As baterias de iões de lítio revolucionaram as nossas vidas desde que entraram no mercado em 1991. Criaram as bases para uma sociedade sem fios [wireless] e livre de combustíveis fósseis”, escreve o comunicado do Nobel, referindo-se, por exemplo, aos computadores portáteis e aos carros elétricos.

São do maior benefício para a humanidade”, conclui o comunicado, cumprindo assim os desejos expressos no testamento de Alfred Nobel para a atribuição dos prémios. O sucesso das baterias de lítio fez com que investigadores em todo o mundo começassem a procurar outros elementos que pudessem fazer um trabalho tão bom ou melhor do que o lítio, mas ainda não existem outras no mercado que lhe possam fazer concorrência.

“Neste momento, a bateria de lítio é a solução de mercado consolidada. Estão a ser estudadas alternativas que ainda estão muito na fase da investigação ou de teste dos primeiros protótipos”, diz ao Observador Fátima Montemor, investigadora no Instituto Superior Técnico. “Existem muitas soluções promissoras”, acrescenta. “Mas ainda não existe uma solução que se posicione como muito competitiva para os próximos anos.”

Entre as soluções promissoras estão, por exemplo, as baterias de sódio, que têm um modo de funcionamento muito semelhante, mas com uma diferença fundamental: usam sódio em vez de lítio. “O sódio é muito mais abundante”, diz a investigadora. “A água do mar tem 3% de cloreto de sódio [vulgo, sal de cozinha].”

Mas também há opções que mantém lítio, como ânodos feitos de sílica em vez de um material de carbono (porque podem acomodar muito mais iões de lítio) ou cátodos de enxofre, mais barato que os óxidos de metal e capaz de acomodar mais iões de lítio — mas para isso é preciso que o enxofre não reaja com o lítio —, refere a Science Magazine.

Explorar, reciclar e reutilizar de forma sustentável

A revolução proporcionada pela baterias de lítio fez com que a procura aumentasse muito — aumentando a exploração e o preço — e o lítio passasse a ser um “metal muito precioso”, diz Fátima Montemor. As baterias de sódio ou outras alternativas podiam diminuir a procura por lítio, mas até isso acontecer é preciso encontrar outras soluções.

O aumento da procura de lítio significa também um aumento da exploração mineira para o recolher, o que pode constituir um problema ambiental. “A exploração tem de ser sustentável”, diz Fátima Montemor, e cabe a cada país implementar as melhores medidas para o fazer. Para a investigadora, a União Europeia e a Austrália — que tem uma das maiores reservas de lítio — estão muito conscientes da importância desta exploração sustentável.

250 mil milhões de euros em baterias por ano

A Europa quer liderar a transição para uma energia limpa e isso passa, também, pelo fabrico de baterias. Se a Europa for bem sucedida no empreendimento, isso pode representar 10 a 20 fábricas de produção em massa de baterias e um mercado de 250 mil milhões de euros por ano, a partir de 2025. Fonte: European Battery Alliance

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Mas a preocupação não pode passar apenas pela exploração, alerta a investigadora. “A parte da reciclagem é muito importante. Não podemos simplesmente deitar fora.” O material é tão precioso que deve ser recuperado e as próprias baterias podem ter uma nova vida. “Quando uma bateria deixa de estar boa para um carro, pode perfeitamente ser usada para armazenar energia do Sol ou do vento.” Aqui soma-se uma vantagem: “O preço [das baterias usadas] será muito competitivo.”

Depois da capacidade de tornar a tecnologia portátil e de os carros elétricos entrarem no mercado, o grande futuro das baterias de lítio é armazenamento de energia produzida por fontes renováveis para que possa ser usada em momentos em que essa produção é menor — por exemplo, para usar energia de origem solar durante a noite. “Será uma realidade a implementar em poucos anos.”

Cinco mulheres distinguidas com o Nobel da Química em 118 anos

Os prémios Nobel da Química são atribuídos desde 1901 e já distinguiram 180 cientistas — Frederick Sanger conseguiu-o duas vezes. Nem sempre os laureados são químicos e a bioquímica tem sido a área de investigação mais vezes reconhecida nos últimos anos.

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Dos cientistas até hoje distinguidos com o Nobel da Química, apenas cinco foram mulheres. A primeira delas, Marie Curie, em 1911, por ter descoberto o rádio e o polónio, dois elementos químicos radioativos — a radioatividade também já lhe tinha valido o Nobel da Física em 1903. E foram, também, os trabalhos na área da radioatividade que permitiram que outro Nobel da Química fosse atribuído a uma mulher, em 1935: Irène Joliot-Curie, filha de Marie Curie.

Cerca de 30 anos depois, em 1964, Dorothy Crowfoot Hodgkin ganhou o Nobel da Química por ter usado técnicas de raios-X para determinar estruturas bioquímicas, mas foi preciso esperar 45 anos para ver uma mulher laureada novamente: Ada E. Yonath, em 2009, pelo estudo da estrutura e funções dos ribossomas. Em 2018, foi a vez de Frances H. Arnold, com o trabalho sobre a evolução das enzimas.

Este ano, nenhuma mulher foi laureada com o Nobel da Química, assim como também não houve nenhuma laureada com o Nobel da Medicina ou da Física.

As apostas deste ano para o Nobel da Química

Todos os anos é criada uma grande expectativa em relação à atribuição dos prémios Nobel. Alfred Nobel, no seu testamento, estabeleceu que o prémio deveria referir-se a uma grande descoberta com impacto para a humanidade que tivesse sido realizada no ano anterior, mas, em muitos casos, passaram mais de 30 anos até que os investigadores fossem distinguidos pelo seu trabalho.

Com um máximo de três cientistas laureados em cada ano e com a evolução da investigação, têm-se acumulado potenciais candidatos e todos os anos se fazem apostas sobre qual será o tema escolhido pela comissão designada para o efeito.

Este ano, as apostas do site Inside Science recaiam sobre a química no espaço, técnicas que permitem identificar porções específicas de ADN ou nanoesponjas feitas de uma rede biometálica com uma capacidade de absorção incrível. Mas nenhuma delas se concretizou. Talvez no próximo ano.

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Prémio Nobel da Literatura atribuído a Olga Tokarczuk e Peter Handke https://observador.pt/2019/10/10/premio-nobel-da-literatura-atribuido-a-olga-tokarczuk-e-peter-handke/

Depois de um interregno de um ano, foram anunciados esta quinta-feira os vencedores do Nobel da Literatura de 2018 e 2019. É a primeira vez que a Academia Sueca atribui dois prémios ao mesmo tempo.

Os prémios Nobel da Literatura de 2018 e 2019 foram atribuídos aos escritores Olga Tokarczuk e Peter Handke, respetivamente. O anúncio foi feito ao final da manhã desta quinta-feira, em Estocolmo, na Suécia, seguindo-se uma justificação exaustiva das razões que levaram à escolha de Tokarczuk e Handke por parte do júri, uma novidade que pretende tornar o processo de seleção do vencedor do prémio mais transparente depois da polémica que levou à suspensão do Nobel da Literatura durante um ano.

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A escolha para 2018 recaiu sobre a polaca de 57 anos, vencedora do Man Booker Prize International no ano passado, pela sua “imaginação narrativa, que com uma paixão enciclopédica representa o cruzamento de fronteiras como forma de vida”. O júri descreveu-a como uma escritora que está preocupada “com a vida local”, mas que “olha para a Terra de cima”. “O seu trabalho está repleto de inteligência e astúcia.”

Já a atribuição do Nobel da Literatura de 2019 ao austríaco Peter Handke, de 76 anos, foi justificada pelo seu “trabalho influente de engenharia literária” e pela sua capacidade de “explorar a periferia e a especificidade da experiência humana”.

Os dois laureados foram escolhidos a partir de uma shortlist de oito finalistas, que foi apresentada à Academia Sueca e aprovada, revelou Anders Olsson, presidente do Comité do Nobel. Cada um dos autores receberá cerca um prémio de 830 mil euros.

Esta é a primeira vez que o mais alto galardão literário é entregue a dois autores ao mesmo tempo. Esta decisão, anunciada no início deste ano, surgiu na

sequência de um escândalo sexual que abalou a Academia com 233 anos de

existência em finais de 2017 e que, nas palavras do presidente da Fundação

Nobel, Carl-Henrik Heldin, fez com que o prémio perdesse credibilidade. São

aos membros da Academia Sueca que são responsáveis por escolher

anualmente o vencedor do Nobel da Literatura.

Isto levou à suspensão temporária do galardão e à decisão de adiar o anúncio

do galardoado de 2018. O Nobel da Literatura foi atribuído pela última vez em

2017, ao escritor britânico Kazuo Ishiguro, pelos seus “romances de grande

força emocional”e a sua capacidade de “revelar os abismos por trás da ilusória

sensação de conexão com o mundo”.

Olga Tokarczuk diz que prémio traz otimismo à Europa Central

Numa primeira reação telefónica, contactada quando estava numa viagem de automóvel na Alemanha, Olga Tokarczuk confessou ter ficado surpreendida com a atribuição do prémio e não saber ainda como reagir aos “milhares de telefonemas e mensagens” que já recebeu: “A Academia ligou-me apenas uns minutos antes [do anúncio]. Fiquei muito surpreendida, ainda estou tão surpreendida que ainda não consegui encontrar as palavras certas para me expressar”. Já questionada sobre a importância do Nobel da Literatura ter sido atribuído a uma autora da Europa central e sobre a diferença entre autores da Europa Ocidental e escritores da Europa central, respondeu:

“Isto daria para uma discussão muito longa, mas acho que temos neste

momento um problema democrático na Europa central. Estamos a tentar

encontrar uma forma própria de lidarmos com esses problemas e penso que um

prémio literário como este vai dar-nos otimismo para acreditarmos que temos

algo para dizer ao mundo, que ainda estamos ativos, que temos capacidade de

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nos expressarmos e que temos algo de profundo para contar ao mundo. É

muito, muito especial para mim e sinto-me muito orgulhosa”, referiu ainda.

Já o editor da Cavalo de Ferro (chancela do Grupo 20|20 Editora), que publicou em Portugal o livro Viagens — obra que deu à autora a vitória no Man Booker Prize Internacional — e que colocará à venda na próxima semana o novo romance de Olga Tokarczuk, sublinhou a “satisfação” mas também a “surpresa” com a distinção. Em declarações à Rádio Observador, Diogo Madredeus contou que “tinha alguma esperança” na entrega do Nobel à escritora mas que não a considerava previsível, “porque é uma autora ainda muito jovem”. “Fiquei muito feliz porque é uma aposta no que de bom os leitores podem encontrar hoje em dia na literatura. Funciona como uma revelação, também, porque muitos leitores portuguesas não a conheciam”, disse ainda.

Olga Tokarczuk “é uma autora que aborda a escrita de forma muito iconoclasta, não tem medo de pôr em questão as fronteiras tradicionais entre a ficção e a não ficção, por exemplo. Tem vários registos literários e mistura-os”, referiu ainda o editor.

(David Levenson/Getty Images)

“Espantado”, Peter Handke enaltece “coragem” da Academia Sueca

O escritor austríaco que venceu o Prémio Nobel da Literatura correspondente ao ano de 2019, Peter Handke, também já reagiu à distinção. Aos jornalistas que o esperavam à porta da sua residência — em Chaville, Paris, onde vive há muitos anos —, afirmou ter ficado “espantado”, face a “todas as discussões”.

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O autor não especificou que “discussões” foram essas, mas referir-se-ia à reputação polémica do seu posicionamento político, depois de ter sido acusado de conivência com o regime genocida de Slobodan Milošević por ter ido ao seu funeral e por ter falado durante a cerimónia.

Este tipo de decisão revela muita coragem da parte da Academia Sueca”, apontou ainda o autor, citado pela Agência Lusa.

A “traidora” polaca que soube olhar para o mundo “a partir de cima”

Olga Tokarczuk nasceu em Sulechów, uma pequena cidade polaca, em 1962. Formada em Psicologia, publicou o seu primeiro livro em 1989, uma coletânea de poesia. A estreia na ficção aconteceu no ano de 1993, com The Journey of the Book-People, mas foi com Primeval and Other Times (1996) que começou a ter atenção da parte do público e da crítica. O romance, passado num “lugar mítico algures na Polónia”, traça a história do povo polaco desde a Primeira Guerra Mundial até à sua independência, em 1989.

Em 1998, a autora publicou House of Day, House of Night, “um romance composto por muitas histórias e episódios, um género de micro-épico, típico de Tokarczuk, que lhe possibilitou representar uma comunidade com fés e culturas diferentes”, resumiu o presidente do Comité do Nobel durante o anúncio desta terça-feira. “É uma escritora que está preocupada com a vida local, mas que ao mesmo tempo se deixa inspirar por mapas e pensamentos especulativos, olhando para a vida na Terra a partir de cima. O seu trabalho centra-se na migração e nas transições culturais, [uma preocupação] visível num dos seus trabalhos de prosa mais fascinantes, Flights“, um trabalho de 2007 que só foi traduzido para a língua inglesa em 2017.

Foi com Flights (traduzido para português pela Cavalo de Ferro) — uma narrativa de viagem que atravessa diferentes séculos e personagens e uma história da anatomia humana, que é ao mesmo tempo uma reflexão profunda sobre o corpo, a vida, a morte, o movimento e a migração — que Olga Tokarczuk venceu o Man Booker Prize International no ano passado, um prémio que lhe permitiu atrair atenção para a sua escrita “profunda e hábil”. Na altura da atribuição do prémio de tradução para inglês, o júri chamou a atenção para a “inteligência” de Tokarczuk, a sua “imaginação e brio literário maravilhosos”.

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(Beata Zawrzel/NurPhoto via Getty Images)

Além desta obra, que é seu dúvida a mais ambiciosa da autora, Comité do Nobel disse ter ficado muito impressionado com o romance histórico Jacob’s Scriptures, de 2014 e ainda sem tradução para inglês. “Estas mil páginas de uma longa crónica oferecem-nos um retrato vívido do líder sectário do século XIX Jacob Franks [nascido na Lituânia polaca, em 1726] dado pelos seus seguidores”, que acreditavam ver nele o Messias. “Apresenta um panorama rico de um capítulo pouco conhecido na história da Europa”, apontou ainda Anders Olsson.

Este ano, a escritora voltou a estar nomeada para o Man Booker International, com Drive Your Plow Over The Bones Of The Dead, “um romance criminal original” publicado originalmente em 2009 e recentemente traduzido para inglês. A tradução portuguesa, Conduz o Teu Arado Sobre os Ossos dos Mortos, vai chegar às livrarias na próxima semana pela Cavalo de Ferro.

Feminista e vegetariana, Tokarczuk tem criticado publicamente o conservadorismo polaco e mantido uma postura de oposição em relação à extrema-direita, que tem vindo a ganhar cada vez mais força no seu país de origem. Numa entrevista depois de ter recebido o Nike, o mais importante prémio literário polaca, a autora disse que, apesar de o seu país ter sobrevivido à opressão, também cometeu “atos horrorosos” de colonização durante a sua história. Por essa razão, foi apelidada pela extrema-direta como “targowiczanin”, uma expressão antiga que quer dizer “traidor”. A sua editora teve de contratar guarda-costas para a proteger.

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Peter Handke, o controverso escritor da “periferia” que discursou no funeral de um criminoso de guerra

Poderão as dúvidas de 2016 em torno do laureado Bob Dylan — “recebe o Nobel ou não recebe?” — ressurgir com a atribuição do prémio a Peter Handke?

A pergunta não retraiu a Academia sueca de entregar o grande prémio literário ao escritor austríaco, mas havia motivos de sobra para não ter certezas: não só tinha uma relação tensa com distinções, já tendo recusado por mais do que uma vez somas económicas de outros prémios, como em 2014 disparou diretamente à reputação do prémio Nobel da Literatura, pedindo que fosse abolido por trazer à obra do autor premiado simplesmente uma “falsa canonização” e “um momento de atenção [e] seis páginas no jornal”, como recordou a estação France 24. Desta vez, porém, já terá confirmado que se deslocará a Estocolmo em dezembro, para receber o prémio, tendo elogiado ainda a “coragem” do comité que lhe atribuiu o Nobel.

(ALAIN JOCARD/AFP via Getty Images)

Peter Handke nasceu Griffen, na Áustria, em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, mas cresceu na Berlim ocupada pelas forças soviéticas. Com uma vasta obra publicada, que atravessa diferentes géneros, como a ficção, o ensaio e o drama, o autor que tem agora 76 anos tem um percurso também diretamente ligado ao cinema e ao teatro, tendo sido dramaturgo, realizador e argumentista de filmes. De acordo com o Comité do Nobel, Handke é, “há algumas décadas, um dos escritores mais influentes da ficção contemporânea”, um lugar que ficou estabelecido com a publicação do primeiro

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romance, Die Hornissen, e de uma peça de teatro, em 1966. Entre muitos outros livros posteriores publicados está a obra A Angústia do Guarda-redes Antes do Penalty, editado em Portugal pela Relógio d’Água. “Com grande mestria, explora a periferia e os lugares desconhecidos”, afirmou Anders Olsson.

“A sua narrativa mais lida é Wunschloses Unglück [publicada em 1972], traduzida em 1975 para inglês com o título A Sorrow Beyond Dreams, escrito sobre o suicídio da sua mãe, em 1971. Handke produziu a maioria dos seus trabalhos fora da Áustria e vive há 30 anos em Chaville, no sudoeste de Paris. Com mestria artística, explora tematicamente a periferia e os lugares que não são vistos”, apontou o presidente do Comité do Nobel, em conferência de imprensa.

A escolha, contudo, não está isenta de polémica. Controverso e provocador, Handke foi fortemente criticado depois de ter discursado no funeral do antigo presidente sérvio e alegado criminoso de guerra (morreu antes da sentença final judicial) Slobodan Milošević, em 2006. O autor, que tem ascendência sérvia do lado da mãe, tinha recusado testemunhar em seu favor quando Milošević foi julgado por crimes de guerra, mas assistiu às sessões de julgamento e escreveu posteriormente um livro sobre elas que disputava o entendimento generalizado sobre a ação do antigo presidente do país.

(STR/AFP/Getty Images)

A posição de dúvida de Handke sobre o genocídio dos sérvios em Srebrenica e sobre o regime sanguinário de Milošević levou a que o seu nome fosse retirado da lista de

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nomeações ao prémio Heinrich Heine desse ano. Quando lhe foi atribuído o International Ibsen, em 2014, o anúncio foi recebido em Oslo com protestos. Handke foi acusado de ser “fascista” e “negacionista de genocídios” e, como em outras ocasiões em que foi distinguido com galardões, acabou por recusar receber o valor monetário. Na sequência da atribuição do Nobel, um porta-voz da Academia Sueca, contactado pelo jornal The New York Times, afirmou que nenhum dos membros da Academia comentaria se as posições políticas de Handke tinham sido discutidas pelo júri e se este era “um recetor apropriado para o prémio”.

Embaixadora do Kosovo nos EUA fala em “decisão absurda e vergonhosa”

A reação política mais dura à atribuição do Nobel da Literatura a Peter Handke veio da embaixadora do Kosovo nos Estados Unidos da América. Na rede social Twitter, Vlora Çitaku acusou o escritor de ter “glorificado Milosevic [sic]” e “apoiado o seu regime genocida” e criticou o comité da Academia sueca: “É uma decisão absurda e vergonhosa”.

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O regresso do Nobel depois do escândalo que abalou uma Academia com 233 anos

Em novembro de 2017, o diário sueco Dagens Nyheter publicou uma reportagem com a denúncia de 18 mulheres que teriam sido abusadas sexualmente pelo dramaturgo francês Jean-Claude Arnault, ligado à Academia através do seu clube literário e casado com um dos seus membros, a escritora Katarina Frostenson. A Academia Sueca cortou com todas as ligações a Arnault, mas o escândalo levou à saída de sete dos seus membros, incluindo de Frostenson.

Isso fez com que não fosse possível haver quórum relativamente ao vencedor do Nobel, obrigando a que a decisão fosse adiada para 2019. Numa entrevista à rádio sueca Sveriges, o diretor-executivo da Fundação Nobel chegou até a avançar com a hipótese de que o prémio só vir a ser restituído em 2020. Segundo defendeu na altura Lars Heikensten, o Nobel da Literatura só poderia voltar a ser atribuído quando a Academia recuperasse “a confiança do público”, seriamente danificada depois do escândalo em torno de Arnault, atualmente a cumprir pena de prisão por violação. O dramaturgo está ainda a ser acusado de divulgar nomes de laureados.

Tal não veio a acontecer — o anúncio acabou por ser marcado para esta quinta-feira, 10 de outubro –, e desde então foram feitas algumas mudanças que pretendem tornar a Academia Sueca mais transparente. Além da entrada de novos membros, a partir de agora, é possível a quem pertence à Academia Sueca sair quando bem entender. Isso não podia ser feito anteriormente, já que os lugares eram vitalícios, uma obrigatoriedade que levava a que muitos membros deixassem simplesmente de aparecer.

Mas há quem defenda que esta alteração não é suficiente. Por altura da divulgação das acusações contra Jean-Claude Arnault, o presidente da Fundação Nobel apelou a uma reestruturação urgente da Academia Sueca, que, em boa verdade, não é assim tão fácil de levar a cabo. Além do óbvio conservadorismo de uma instituição com mais de 200 anos de existência, os seus estatutos só podem ser alterados com a aprovação do rei, como explica a Reuters.

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Nobel da Paz de 2019: "Este é um prémio para África" O premiado com o Nobel da Paz de 2019 é o primeiro-ministro da Etiópia Abiy Ahmed. No poder desde abril de 2018, o laureado, de 43 anos, foi destacado pelos acordos de paz com a vizinha Eritreia

https://www.dn.pt/mundo/nobel-da-paz-2019-vai-para-primeiro-ministro-da-etiopia-11395118.html

O premiado com o Nobel da Paz de 2019 é o primeiro-ministro da Etiópia Abiy Ahmed, foi esta sexta-feira anunciado em Oslo, na Noruega. O prémio, que será entregue a 10 de dezembro, vale nove milhões de coroas suecas, ou seja, cerca de 830 mil euros.

"O primeiro-ministro Abiy Ahmed Ali foi galardoado com o Prémio Nobel da Paz deste ano pelos seus esforços em prol da paz e da cooperação internacional, em particular pela sua iniciativa decisiva de resolver o conflito fronteiriço com a vizinha Eritreia", indicou a presidente do Comité Nobel, Berit Reiss-Andersen.

Decidido à porta fechada por um comité de cinco pessoas nomeadas pelo Parlamento norueguês, este era um dos prémios aguardados com maior expetativa desta temporada Nobel, face às especulações sobre o eventual vencedor.

"Sinto-me humilde e emocionado... Muito obrigado. Este é um prémio para África, atribuído à Etiópia, posso imaginar que os restantes líderes de África vão vê-lo como algo positivo e

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trabalhar no processo de construir a paz em todo o continente. Estou muito feliz e emocionado com esta notícia. Muito obrigado, é um grande reconhecimento", declarou o chefe do governo etíope, ao ser contactado por telefone pelo comité para o informar de que tinha ganho o Nobel da Paz de 2019.

Ouça aqui a gravação do telefonema:

https://www.youtube.com/watch?time_continue=4&v=_D2E3yxeUtg

O primeiro-ministro etíope era, nalgumas apostas, o segundo entre os favoritos para vencer o Nobel da Paz. Em causa está o seu trabalho para reforçar a democracia na Etiópia desde que tomou posse, em abril de 2018, com a libertação de presos políticos e a nomeação de um governo paritário, assim como a assinatura dos acordos de paz com a vizinha Eritreia, a 9 de julho de 2018.

A Eritreia acedeu em 1993 à independência pela qual lutava desde 1961, fazendo perder à Etiópia a sua única fachada marítima, sobre o Mar Vermelho. Entre 1998 e 2000, os dois vizinhos travaram uma guerra, que provocou pelo menos 80 mil mortos, com a questão da delimitação da fronteira a figurar entre as razões do conflito. Desde então, os dois países mantinham numerosas forças ao longo da fronteira comum, de mil quilómetros, apesar de terem assinado em 2000 um acordo de paz em Argel, que nunca foi implementado. O clima entre os dois países era bastante instável, apesar de não haver nem guerra aberta, nem paz.

Na carta de nomeação de Abiy Ahmed, divulgada pelos jornais locais, lê-se que o político de 43 anos é "um símbolo de paz e justiça numa região onde os líderes políticos têm governado pela violência, tirania e violação dos direitos humanos" e por ser "um líder transformacional em equidade e direitos humanos dentro da Etiópia".

Filho de mãe cristã e de pai muçulmano, Abiy Ahmed, chegou ao poder em fevereiro de 2018, após a demissão de Hailemariam Desalegn, no contexto de uma profunda crise política. Converteu-se no líder mais jovem de África. Chegado ao poder, tentou conter os confrontos, libertou centenas de presos políticas, retirou o estado de emergência e permitiu o regresso à Etiópia de figuras destacadas da oposição que se tinham exilado.

Reagindo ao prémio, através do Twitter, o gabinete do chefe do governo da Etiópia declarou: "Expressamos o nosso orgulho na escolha do primeiro-ministro da Etiópia para Prémio Nobel da Paz de 2019. Este reconhecimento é um testemunho dos ideais da unidade, da cooperação e da coexistência mútua, que o primeiro-ministro tem vindo consistentemente a defender".

"A paz não surge das ações de uma das partes apenas. Quando o primeiro-ministro Abity estendeu a mão do presidente Afwerki, este agarrou-a e ajudou a formalizar o processo de paz entre os dois países. O Comité Nobel Norueguês espera que este acordo de paz traga mudanças positivas para todas as populações da Etiópia e da Eritreia (...) Sem dúvida, algumas pessoas acharão que este prémio está a ser atribuído demasiado cedo. O Comité Nobel Norueguês acredita que os esforços de Ahmed Abiy merecem reconhecimento e precisam de ser encorajados", disse aos jornalistas em Oslo a presidente daquele comité.

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No passado, críticas surgiram sobre o Nobel da paz atribuído ao ex-presidente dos EUA Barack Obama, há precisamente dez anos. Algumas vozes consideraram essa atribuição precipitada e alguns chamaram-lhe mesmo o Nobel da Paz preventivo. Questionada pelos jornalistas presentes em Oslo esta sexta-feira sobre se, precisamente, o prémio não foi precipitado, uma vez que o jovem líder etíope ainda tem que introduzir reformas democráticas, a presidente do comité respondeu: "Reconhecemos as suas intenções de levar a cabo eleições democráticas no próximo ano e não concordo com a premissa da sua pergunta, porque, definitivamente, há muito que já foi conseguido em termos de fazer reformas democráticas na Etiópia, mas há ainda um longo caminho a percorrer. Roma não foi feita num dia e a paz e o desenvolvimento democrático também não são atingidos num curto espaço de tempo".

A favorita nas apostas era a jovem sueca de 16 anos Greta Thunberg, ativista em defesa do clima, mas acabou por não ser escolhida pelo comité Nobel. Entre os nomes falados estava também o da chefe do governo neo-zelandês, Jacinda Ardern, pela sua resposta ao atentado terrorista contra as mesquitas de Christchurch. E o de organizações como a Repórteres Sem Fronteiras ou o Comité para a Proteção dos Jornalistas.

Questionada sobre se o primeiro-ministro da Etiópia era um nome mais consensual - do que por exemplo o da jovem sueca Thunberg - e sobre quando é que o comité pensa regressar às questões ambientais na hora de decidir o prémio, a presidente do comité norueguês afirmou: "No dia em que anunciamos o prémio, não fazemos comentários sobre quem não recebeu o prémio e sobre quem poderia ter recebido o prémio. Portanto, não faço comentários sobre isso".

Em 2004, o Nobel da Paz foi para uma ambientalista queniana, Wangarĩ Muta Maathai (entretanto falecida em 2011), a primeira mulher africana a receber este galardão. Maathai ficou conhecida pela sua luta pela conservação das florestas e do meio ambiente. Ativista, fundou o movimento Cinturão Verde, ainda nos anos 1970, no Quénia, uma iniciativa no âmbito da qual foram plantadas 30 milhões de árvores. Antes de morrer, em 2011, estava a ajudar a ONU no projeto de plantar mil milhões de árvores.

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Também a Comissão Europeia reagiu, no Twitter, à distinção do chefe do governo etíope. "Congratulamos o vencedor do Prémio Nobel da Paz, o primeiro-ministro etíope Abiy Ahmed Ali. Com a sua coragem, ele constrói pontes na região, recomeçando as conversações de paz depois de 20 anos de impasse com a Eritreia. Estamos ao lado da Etiópia na sua caminhada para a democracia e a paz".

A ex-eurodeputada portuguesa Ana Gomes, uma das pessoas que no Parlamento Europeu mais lutaram pela defesa dos direitos humanos e pelos direitos da oposição etíope, reagiu ao Nobel da Paz deixando no Twitter uma mensagem ao galardoado e a todo o povo da Etiópia. "Parabéns Etiópia e primeiro-ministro da Etiópia. Isto é não só um reconhecimento pelos extraordinários passos dados para fazer a paz com a Eritreia, mas também um incentivo para construir e consolidar a paz e a democracia dentro da Etiópia e entre todos os povos da Etiópia!", escreveu a ex-eurodeputada do PS, que em fevereiro foi distinguida na Etiópia.

Localmente, disse ao DN na altura, é conhecida como "Anna Gobese" - termo local que

significa bravo ou corajoso.

No Twitter, o escritor britânico de origem etíope Lemn Sissay, publicou uma fotografia sua com Abiy Ahmed e escreveu: "Ele libertou todos os jornalistas da cadeia. Ele nomeou mulheres para metade das pastas do seu governo. Nomeou uma grande mulher para presidente [Sahle-Work Zewde]. Ele fez a paz com a Eritreia. Ele é primeiro-ministro da Etiópia e hoje foi laureado com o Prémio Nobel. Ele é o primeiro-ministro Abiy Ahmed".

Ao ser laureado agora com o Prémio Nobel da Paz 2019, o primeiro-ministro da Etiópia sucede aos premiados com o Nobel da Paz em 2018: o médico Denis Mukwege, que dedicou sua vida à defesa de vítimas de violência sexual em tempo de guerra no seu país, a República Democrática do Congo; e a Nadia Murad, a yazidi que foi vítima de violência sexual por parte do Estado Islâmico no Iraque. Nadia Murad conseguiu fugir e denunciou ao mundo as atrocidades sofridas - por ela própria e por muitos outros jovens e mulheres da sua etnia.

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Na segunda-feira, 14 de outubro será conhecido o vencedor - ou vencedores - na área da Economia, o último Nobel desta temporada.

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Nobel da Economia vai para

Banerjee, Duflo e Kremer. Estudam

como aliviar a pobreza

Economistas vencem o prémio pelos seus contributos no campo da economia do

desenvolvimento, nomeadamente pela utilização de métodos experimentais para

estudar quais as melhores políticas de alívio da pobreza.

Sérgio Aníbal 14 de Outubro de 2019

O prémio Banco da Suécia de Ciências Económicas em Memória de Alfred

Nobel, mais conhecido por Nobel da Economia, foi atribuído esta segunda-feira

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a Abhijit Banerjee, Esther Duflo e Michael Kremer , anunciou a Real Academia

Sueca das Ciências.

Os três laureados têm desenvolvido o seu trabalho no campo da economia do

desenvolvimento e o prémio foi atribuído, como explicou a Real Academia

Sueca das Ciências, pelos métodos inovadores utilizados para analisar quais as

melhores políticas para o alívio da pobreza. Michael Kremer nos anos 1990 e,

mais tarde, Abhijit Banerjee e Esther Duflo (que são casados), os três

trabalhando muitas vezes em parceria, adoptaram métodos experimentais para

obterem respostas mais fiáveis a uma questão onde muitas vezes os

economistas têm falhado: qual a melhor forma de retirar o maior número de

pessoas possível de uma situação de pobreza extrema?

Em vez de tentarem encontrar uma única e grande solução, os economistas

dedicaram-se à análise de vários pequenos problemas realizando experiências

económicas no terreno das quais resultaram respostas sobre qual o melhor tipo

de políticas de combate à pobreza utilizar. Conseguiram, dizem os responsáveis

da Academia no seu comunicado, “melhorar consideravelmente a nossa

capacidade para combater a pobreza no globo”. “Em apenas duas décadas, o

seu novo método baseado em experiências transformou a economia do

desenvolvimento, que é agora um campo de investigação florescente”, afirmam.

Michael Kremer, da Universidade de Harvard, e Abhijit Banerjee,

do Massachusetts Institute of Technology (MIT), têm nacionalidade norte-

americana. Esther Duflo, também do MIT, é francesa.

Esther Duflo, com 46 anos, tornou-se na vencedora mais jovem da história do

Nobel da Economia e é também apenas a segunda mulher a ser distinguida com

este prémio. Até agora, a única mulher a receber o prémio Nobel da Economia

tinha sido a norte-americana Elinor Ostrom, em 2009, pela “sua análise na área

da governação económica”.

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A economista francesa, a responder por telefone aos jornalistas que, em

Estocolmo, acompanhavam o anúncio do prémio, manifestou-se surpreendida

por ter recebido este prémio tão cedo e explicou o trabalho realizado pelos três

economistas vencedores como uma tentativa de compreender “as raízes

profundas e interligadas da pobreza”. “Demasiadas vezes, os responsáveis pelas

políticas generalizam sobre as pessoas em situação de pobreza”, diz,

assinalando que tanto se se chega à conclusão simplista que os pobres são

preguiçosos ou que são empreendedores, sem verdadeiramente se conhecerem

as causas. “O que nós fazemos é distinguir os problemas, um de cada vez,

examinando-os o mais cientificamente possível”, afirma.

Em relação ao facto de ser, em meio século, apenas a segunda mulher a receber

o prémio, Esther Duflo disse esperar que o anúncio desta segunda-feira possa

“inspirar muitas mulheres a continuarem a trabalhar”, mas assinalou as

dificuldades que uma mulher pode sentir para ser bem sucedida no campo da

investigação económica. “Estamos numa fase em que nos começamos a

aperceber nesta profissão que a forma como nos comportamos uns com os

outros em privado e em público nem sempre contribui para criar um bom

ambiente para as mulheres”, disse.

Page 36: PRÉMIOS NOBEL 2019 · 2019. 10. 14. · Antes do Nobel, que recebe este ano, Ratcliffe foi distinguido com uma série de importantes prémios internacionais, entre os quais se incluem

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O Nobel da Economia é atribuído desde 1969 e o seu nome oficial é Prémio

Banco de Suécia de Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel.