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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ PRÓ REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GEOPOLÍTICA E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS MARCELINO TEIXEIRA LISBOA AS FRONTEIRAS DO BRASIL E O TRÁFICO DE DROGAS CURITIBA JUNHO 2008

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

PRÓ REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GEOPOLÍTICA E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

MARCELINO TEIXEIRA LISBOA

AS FRONTEIRAS DO BRASIL E O TRÁFICO DE DROGAS

CURITIBA JUNHO 2008

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

MARCELINO TEIXEIRA LISBOA

AS FRONTEIRAS DO BRASIL E O TRÁFICO DE DROGAS

Artigo apresentado pelo aluno Marcelino Teixeira Lisboa como requisito parcial para conclusão do curso de Especialização em Geopolítica e as Relações Internacionais, da Pró Reitoria de Pós Graduação, Pesquisa e Extensão, da Universidade Tuiuti do Paraná. Orientador: Prof. Dr. José Soares Coutinho Fº

CURITIBA JUNHO 2008

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“Fronteiras vigiadas, país soberano.”

1º Ten Carlos Pires, 7º BIS – Comando de Fronteira de Roraima

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RESUMO

As fronteiras do Brasil são porta de entrada de drogas advindas de outros países da América do Sul. Estas drogas causam problemas sociais internos e ferem a imagem do país no exterior, visto que parte desta droga segue para a Europa e Estados Unidos. Uma atuação mais efetiva das Forças Armadas na fronteira é imprescindível para resolução destas questões. Este artigo aborda a vigilância das fronteiras e a entrada de drogas no Brasil, enfatizando a responsabilidade institucional da União nesta questão. Foi analisada a legislação constante na constituição federal vigente e nas anteriores sobre este tema. Posteriormente, foram relatadas as características físicas das fronteiras brasileiras e a realidade destas no que diz respeito à vigilância e ao tráfico de drogas, incluindo a presença e ação das Forças Armadas. A metodologia consistiu na confrontação da legislação com a realidade atual. O material utilizado para elaboração deste artigo baseou-se na legislação federal, bibliografia relativa ao assunto, informações eletrônicas on line e publicações em revistas e jornais.

Palavras chave: drogas, Forças Armadas, fronteira, vigilância.

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HISTÓRICO CONSTITUCIONAL

Em outubro de 1988, os que naquela oportunidade eram representantes do

povo brasileiro na Assembléia Nacional Constituinte promulgaram a Constituição da

República Federativa do Brasil, que tinha em seu preâmbulo a afirmação de que se

destinava a assegurar o exercício de diversos direitos aos cidadãos, entre eles o

desenvolvimento, o bem estar e a segurança. A Carta Cidadã, como a denominou o

presidente daquela assembléia, Ulysses Guimarães, é a sétima Constituição

brasileira e está em vigência até os dias atuais, com diversas alterações em relação

ao texto original, ocorridas por meio de emendas constitucionais.

Para que haja um cenário no qual seja possível assegurar aos cidadãos os

direitos previstos na Constituição, diversas medidas político-administrativas devem

ser tomadas, sendo estas previstas na própria Constituição. A preservação da

soberania é um dos pontos fundamentais a serem tratados e, para tanto, a

preservação da integridade nacional nas regiões de fronteira é uma das pontas de

lança para o cumprimento deste objetivo.

Na Constituição de 1937, artigos 15 e 16, verifica-se a competência privativa

da União em legislar e resolver sobre os limites do território nacional com as nações

limítrofes. Os artigos 14 e 74 tratam das responsabilidades do Presidente da

República sobre as Forças Armadas, tendo como prerrogativa a livre expedição de

decretos-leis sobre o seu comando supremo e a sua organização e como

competência privativa decretar a sua mobilização. O artigo 161, que trata

especificamente da segurança nacional, cita as Forças Armadas como “instituições

nacionais permanentes, organizadas sobre a base da disciplina hierárquica e da fiel

obediência à autoridade do Presidente da República”. Por fim, os artigos 15 e 16

tratam da organização da defesa externa, das Forças Armadas e da segurança nas

fronteiras como responsabilidade da União. Porém, em nenhum ponto está citado

que a função operacional pela segurança nas fronteiras seja das Forças Armadas,

embora se entenda que esta seja uma de suas funções primordiais, tanto pela sua

forma de organização como por sua gênese. O artigo 162 trata da criação do

Conselho de Segurança Nacional que teria a função de estudar as questões

relativas à segurança nacional, sendo presidido pelo Presidente da República.

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Sobre o Conselho de Segurança Nacional, a Constituição de 1946 não traz

grandes alterações citando no artigo 179 que as questões relativas à segurança

seriam estudadas pelo CSN. Afirma-se então a função de um conselho consultivo

para o CSN. Mantêm-se também as atribuições e prerrogativas do Presidente da

República como decretar a mobilização das Forças Armadas e nomear seus

comandantes. Nota-se nesta Constituição uma denotação mais evidente para a

explicitação da função das Forças Armadas na segurança das fronteiras. O artigo 5º

trata da competência da União na organização das Forças Armadas, na segurança

das fronteiras e na defesa externa, todos citados no parágrafo IV. O Congresso

Nacional fica incumbido inclusive de votar a lei de fixação (do efetivo) das Forças

Armadas em tempos de paz, conforme o artigo 67. Para fechar o círculo que justifica

a necessidade de se assegurar a soberania nas fronteiras, a Constituição de 1946

trata no artigo 177 da função das Forças Armadas de defender a Pátria e garantir os

poderes constitucionais, a lei e a ordem. Desenvolvimento, bem-estar e segurança

no convívio da sociedade não são citados especificamente nesta carta, porém são

conseqüências de políticas que visam à manutenção da soberania nacional, da qual

o domínio das fronteiras é condição imprescindível.

Na Constituição de 1967, muitas atribuições da União se mantiveram na

mesma forma das constituições anteriores, tais como a organização das Forças

Armadas, planejamento da segurança nacional, fixação das Forças Armadas em

tempo de paz, conforme verificado nos artigos 8º e 46. Porém, verifica-se que no

próprio artigo 8º, parágrafo VII, é prevista como competência da União a

organização e manutenção da Polícia Federal com a finalidade de prover, entre

outros, os serviços de polícia de fronteiras. Outro ponto a ser destacado é o artigo

84, que cita como crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República

que atentarem contra a Constituição Federal, sendo a segurança interna do País

uma das premissas. A segurança interna pode ser afetada pelos fatores externos

indesejados, que podem adentrar ao país através das fronteiras. Sendo assim, a

Constituição de 1967 incitava o Presidente da República a preservar a segurança

nacional, interna e externa, pois caso houvesse falha neste âmbito, o mesmo

poderia ser criminalmente responsabilizado. Mas a maior alteração na questão da

segurança nacional – que tem relação direta com a vigilância e manutenção da

segurança nas fronteiras – foi o decreto lei nº900 de 29 de setembro de 1969 que

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tornou o Conselho de Segurança Nacional o “órgão de mais alto nível de

assessoramento direto do presidente da república na formulação e na execução da

Política de Segurança Nacional”. Na prática o CSN deixou de ser um órgão apenas

de estudo das questões da segurança, passando a ser incumbido de definir as

diretrizes que seriam adotadas pela União e pelo Presidente da República.

A partir da Constituição de 1988, o Conselho de Defesa Nacional passou a

ser o órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos de soberania

nacional e a defesa do Estado democrático, assumindo o papel do CSN, que desde

o início da década de 1980 estava perdendo as suas funções na prática. A principal

atribuição do Conselho de Defesa Nacional é a de propor os critérios e condições de

utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional especialmente,

entre outros, na faixa de fronteira. No artigo 20 consta que “a faixa de até cento e

cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como

faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional”. No

artigo 21 está prevista como competência da União, assegurar a defesa nacional e

não mais a segurança como nas constituições anteriores. Alguns pontos não se

alteraram em relação às Constituições anteriores, como a autoridade suprema do

Presidente da República sobre as Forças Armadas e a função primordial destas, a

defesa da Pátria. A segurança pública é tratada no artigo 144 como dever do

Estado, direito e responsabilidade de todos.

Na atual Política de Defesa Nacional, decreto nº 5484/05 de 30 de junho de

2005, a segurança é citada como uma das condições que garante ao cidadão o

cumprimento dos direitos constitucionais e a defesa é a ação efetiva – com ênfase

na expressão militar – para se manter ou obter o grau de segurança desejado.

Desde 1937 a responsabilidade da União quanto a assegurar a segurança da

sociedade está prevista na Constituição, de maneira explícita. O mesmo ocorre com

a responsabilidade em manter a integridade territorial, mobilizar e organizar a

fixação das Forças Armadas. Junte-se isto ao artigo 144 da Constituição de 1988,

que trata a segurança pública interna como “dever do Estado e direito de todos” e

demonstrar-se-á que a segurança nas fronteiras deve ser tratada como condição

suprema para assegurar direitos constitucionais dos cidadãos como segurança,

bem-estar e desenvolvimento.

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AS FRONTEIRAS BRASILEIRAS

Conforme PALAIA (2002), o território é o limite espacial dentro do qual o

Estado exerce seu poder de império, ou seja, sua soberania, sobre pessoas e bens.

Um Estado é reconhecido por diversos elementos essenciais, entre eles a sua

soberania, que é o poder de governo sobre determinado território. O que delimita a

faixa de abrangência de um território são as fronteiras, de acordo com a Divisão de

Fronteiras, órgão do Departamento das Américas, ligado ao Ministério das Relações

Exteriores. Para KJËLLEN, citado em BOMFIM (2004), as fronteiras são a epiderme

do Estado ou a linha periférica do território dos Estados. Definida então a fronteira

como elemento físico dentro do qual o Estado soberano está inserido, para fechar o

entendimento, cabe a definição da condição política do Estado em relação à

fronteira citada por MEIRA MATTOS, para o qual “a fronteira é o limite da soberania

Nacional”, uma região geopoliticamente sensível.

O Brasil tem como um de seus princípios constitucionais nas relações

internacionais, o reconhecimento da igualdade entre os Estados. As definições

citadas servem, portanto, tanto para um lado da fronteira quanto para o outro. Sendo

as fronteiras zonas de sensibilidade, se faz necessário que as mesmas sejam

reconhecidas e devidamente documentadas por ambas as partes através de

documentação adequada. Em 1492, Portugal e Espanha acirraram a disputa pelas

terras do Novo Mundo, sendo que os portugueses ameaçaram até mesmo entrar em

guerra contra a Espanha devido à decisão do Papa, que favorecia os espanhóis no

direito de explorar as novas terras. O Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494,

antes do reconhecimento formal do descobrimento do Brasil, resolveu esta questão

dividindo o território em duas partes a serem exploradas cada uma por um dos

países divergentes. Este foi um exemplo de uma situação de litígio por disputa de

terras resolvido por uma documentação adequada reconhecida internacionalmente.

Porém o tratado vigorou somente até 1750, quando os portugueses passaram a

avançar para oeste. Este avanço permitiu a conquista de espaço anteriormente de

propriedade espanhola, que foram posteriormente resolvidas em definitivo em

meados do século XIX e início do século XX pelo Barão do Rio Branco e em parte

demarcadas pelo Marechal Cândido Rondon. Atualmente as fronteiras terrestres

brasileiras estão formalmente definidas com todos os países limítrofes através de

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tratados assinados entre os anos de 1851, quando foi assinado o Tratado de Limites

com o Uruguai, até 1907 quando foi assinado o Tratado de Bogotá que definiu a

fronteira com a Colômbia. Fora deste período, somente vigorava o Tratado de Paz e

Amizade de Utretch, que definiu a fronteira do Brasil com a Guiana Francesa, com a

França desistindo da pretensão do direito de posse do território entre os rios

Amazonas e Oiapoque, reconhecendo que esta região, chamada de Cabo do Norte,

eram propriedade da coroa portuguesa. Neste tratado, a França também cedeu de

todo e qualquer direito que tivesse sobre qualquer domínio de Portugal, com ênfase

para o uso e navegação no rio Amazonas. Citava, ainda, o tratado que a coroa

francesa não permitiria que moradores de Cayena, na Guiana, realizassem comércio

em território português e que reciprocamente Portugal não permitiria que os

moradores de seu domínio deslocassem-se a Cayena para realizar atividades

comerciais.

O território brasileiro possui mais de 16 mil quilômetros de fronteiras com

dez países da América do Sul, sendo 55,2 % desta extensão composta por rios e

canais, 33% por divisores de águas, 10,6% por linhas geodésicas1 e 1,2% composto

por lagoas. De acordo com a Divisão de Fronteiras, órgão do Ministério das

Relações Exteriores responsável pela observância dos atos internacionais relativos

a limites assinados pelo Brasil, os países com os quais o Brasil possui maior

extensão de fronteiras são a Bolívia com 3423 km, o Peru com 2995 km e a

Venezuela com 2199 km.

Os limites iniciam-se na foz do rio Oiapoque, seguindo pelas Serras do

Tumucumaque e do Acarai e pelos rios Tacutu e Mau, na porção divisória com a

Guiana Francesa, o Suriname e a Guiana.

A fronteira com a Venezuela é predominantemente de divisores de águas,

iniciando-se na tríplice fronteira Brasil-Venezuela-Guiana, no Monte Roraima,

seguindo pelas Serras Pacaraima, Parima e da Neblina, cortando o Pico da Neblina

por sua face norte e dividindo as bacias do Amazonas e do Orinoco. A partir do

Cerro Cupi, segue em 90 km de linhas geodésicas até a fronteira com a Colômbia.

1 Linha geodésica é a mais curta distância linear entre dois pontos da superfície terrestre.

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Neste ponto inicia-se a fronteira Brasil-Colômbia, a partir do talvegue2 do rio

Negro seguindo pelo divisor de águas da bacia do rio Negro com a sub bacia de seu

tributário, o rio Xié. A partir deste ponto inicia-se uma seqüência de trechos que

alternam linhas geodésicas e canais de rios, compreendendo os rios Içana, Papuri e

Traíra, chegando após 1644 km ao talvegue do rio Solimões, na tríplice fronteira

Brasil-Peru-Colômbia, onde se localizam as cidades de Letícia e Tabatinga.

Inicia-se, então, a fronteira com o Peru, na qual cerca de dois terços são

formados por rios, percorrendo toda a extensão do rio Javari. A partir da nascente do

Javari, em direção ao sul, a fronteira segue pelo divisor de águas da bacia do rio

Ucayali com as bacias dos rios Juruá e Purus até a nascente do rio Acre, finalizando

na foz Yaverija, afluente da margem direita do Acre.

Na fronteira com a Bolívia também predominam os rios. Inicia-se no rio Acre,

seguindo pelos rios Chipamanu, Rapirrãn e Abunã até a foz deste com o rio

Madeira. A fronteira volta a ter o sentido norte sul seguindo pelos rios Madeira,

Mamoré, Guaporé e rio Verde até a sua nascente. Inicia-se a Região das Retas que

formam mais de 750 km de fronteira em linhas geodésicas. Entre as retas situam-se

os 63 km de fronteiras formados pelas lagoas Uberaba, Mandioré e Guaíba, trecho

no qual a fronteira passa pelo pantanal. A Região das Retas acaba no marco Rio

Paraguai, erigido a cerca de 9 km do forte Coimbra e a fronteira segue pelo talvegue

do rio Paraguai até o ponto tripartite Brasil-Bolívia-Paraguai, onde o rio Negro

deságua no rio Paraguai.

Entre Brasil e Paraguai não há fronteiras geodésicas. Inicia-se na Baía

Negra, no talvegue do rio Paraguai, seguindo pelo rio Apa, pelas serras do Amambaí

e de Maracaju até encontrar as águas do reservatório da usina hidrelétrica de Itaipu.

Pelo Lago de Itaipu segue até a barragem da usina, cruzando entre as turbinas 9 e

10 da binacional Itaipu e depois pelo rio Paraná até o ponto onde este encontra o rio

Iguaçu, na divisa com a Argentina.

A fronteira com a Argentina é quase em sua totalidade formada pelos rios

Iguaçu, Peperi Guassu e Uruguai. A exceção fica por conta do trecho do divisor de

2 Talvegue é o local mais profundo de uma vale, onde correm as águas dos rios.

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águas das sub bacias dos rios Santo Antônio e Peperiguaçu, entre as cidades de

Santo Antônio do Sudoeste e Dionísio Cerqueira.

A tríplice fronteira Brasil-Argentina Uruguai situa-se na foz do rio Quaraí e a

fronteira segue pelo rio Quarai e pelo arroio Invernada, até alcançar o divisor de

águas da região do Rincão de Artigas e Coxilhas de Haedo. Segue por trechos que

alternam rios e partes secas, inclusive com o Corredor Internacional, rodovia que em

alguns pontos passa pelo Uruguai e em outros pelo Brasil. A linha divisória entre

Brasil e Uruguai, que marca também o ponto culminante sul do território brasileiro,

localiza-se no alinhamento da divisória marítima, a 128º de azimute3, na margem do

arroio Chuí.

Com tal descrição, verifica-se que as fronteiras do Brasil com estes dez

países possuem uma diversidade de condições fisiográficas. As fronteiras

geodésicas situam-se em regiões de bacias hidrográficas de grande extensão e

importância, Amazônia e Pantanal, enquanto que a região onde predominam as

fronteiras em divisores de águas é o extremo norte, na divisa com a Venezuela e as

Guianas. Nas demais regiões a predominância é de fronteiras naturais marcadas por

rios, com a peculiaridade da fronteira com o Paraguai, que passa por dentro das

instalações da usina de Itaipu. A complexidade física, incrementada pela grande

extensão, torna uma tarefa relativamente complexa a manutenção de uma condição

satisfatória das fronteiras brasileiras no que diz respeito à sua integridade, vigilância

e garantia da segurança nestas regiões.

Para que ocorresse o desenvolvimento de um país em sua plenitude, para

que os cidadãos vivessem com bem-estar e se sentissem seguros dentro do

território de seu país, seria imprescindível que a área que compõem o território

nacional estivesse totalmente livre de ameaças externas que comprometessem a

ocorrência de tal um ambiente. Porém, desde o início da organização do ser humano

de maneira coletiva, esta é uma premissa quase impossível de ser atingida. Nos

dias atuais, com quase a totalidade do planeta sendo governada por um ou outro

país, pode-se considerar impossível a existência de uma região totalmente livre de

ameaças externas. Cabe então a cada país desenvolver mecanismos políticos,

3 Azimute é uma direção definida em graus, que varia de 0º a 360º, sendo a direção norte o ponto 0º, aumentando no sentido horário.

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econômicos, culturais e militares que o habilitem a enfrentar as ameaças externas

existentes de uma maneira que o leve a atingir seus objetivos permanentes e atuais.

Entre os objetivos nacionais do Brasil pode-se citar a manutenção da

soberania, que é um dos fundamentos citados na Constituição de 1988, para

perceber a necessidade de preservação da integridade das fronteiras nacionais.

Fronteiras imaculadas é uma demonstração de soberania de um país e um dos

pressupostos básicos para o reconhecimento de um Estado, na moderna conjuntura

mundial, é a existência de um território definido.

Se esta barreira, a fronteira, for vencida por elementos externos

indesejáveis, pode ter como conseqüência dificuldades para execução de tarefas

como a promoção do desenvolvimento, bem-estar e segurança. Sendo assim,

vigilância e manutenção do controle das fronteiras assumem importante papel

estratégico em todos os âmbitos da administração de um país, pelos múltiplos

efeitos que podem produzir.

Mas de quem é a responsabilidade pela manutenção da situação das

fronteiras sob o controle do país?

O Brasil é um país republicano no qual as atribuições – direitos e deveres –

do cidadão comum e também dos governantes democraticamente eleitos, estão

previstas na legislação. A lei maior que rege as demais é a Constituição.

Atualmente, a Constituição vigente é a de 1988, na qual se ratifica a

responsabilidade institucional da União em manter sob controle do Estado a situação

das fronteiras terrestres brasileiras, fato verificado também nas constituições

anteriores.

As Forças Armadas estão subordinadas ao comando supremo da

Presidência da República sendo estruturadas e com suas ações planejadas desta

forma. De acordo com a Diretriz Geral do Comandante da Força Terrestre Brasileira,

F Ter, de maio de 2007, assinada pelo Gal. Enzo Martins Peri, Comandante do

Exército, o planejamento estratégico, o preparo e o emprego das forças terrestres

deve permanecer perfeitamente alinhado com a Política de Defesa Nacional e com

as políticas e diretrizes emanadas do Ministério da Defesa.

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A administração de um país ocorre através da elaboração de políticas que

visam o cumprimento dos objetivos nacionais, permanentes e atuais, bem como dos

deveres e garantir os direitos constitucionais. As políticas devem ser elaboradas de

acordo com as necessidades do país. Um fator necessário e estratégico das

políticas de administração pública é a previsão da destinação das verbas, que no

Brasil é realizada através da elaboração dos orçamentos plurianuais, previstos na

LDO, Lei de Diretrizes Orçamentárias. Neste orçamento está prevista a verba a ser

repassada às Forças Armadas, inclusive aquela necessária às ações fronteiriças.

Sendo assim, as ações das Forças Armadas nas fronteiras, que necessitam de

recursos financeiros, ficam sujeitas às definições da política orçamentária de cada

governo.

De acordo com o projeto de lei orçamentário de 2008, no documento

denominado Mensagem Presidencial, a proposta é de investimentos de R$ 8,4

bilhões. Os gastos específicos com investimentos em defesa caíram para menos de

R$ 4,0 bilhões ao início do primeiro governo Lula, voltando a aumentar para R$ 6,0

bilhões em 2005 e reduzindo para R$ 5,3 bilhões em 2007. Estão previstos para

2008, investimentos com maior ênfase no reaparelhamento das Forças Armadas e

projeto Calha Norte, que tem relação com a vigilância de fronteiras. Parte dos

investimentos será destinada à manutenção de vinte e cinco e construção de outros

vinte Pelotões Especiais de Fronteira.

Apesar do aumento nominal nos investimentos, analisando-se o contexto e a

distribuição dos recursos, pode-se verificar que há pontos relativos à questão

orçamentária que não são exatamente investimentos puros em defesa nacional. O

aumento para 2008 está em partes relacionado ao SISCEAB – Sistema de Controle

do Espaço Aéreo Brasileiro – que recebeu maior atenção do poder público após a

recente crise aérea, que tem em grande parte um cunho mais econômico do que

relacionado à defesa nacional.

Sobre a responsabilidade da União nas fronteiras, pode-se afirmar que esta

responsabilidade é constitucional, política, financeira e estratégica. Constitucional

pela verificação dos diversos artigos que lhe atribuem esta tarefa. Política, pois cabe

à União a elaboração da política de defesa, tendo as Forças Armadas, o braço

operacional da defesa, sujeitas a tal política. Financeira pela sua atribuição em

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destinar os recursos necessários ao cumprimento das tarefas necessárias à

manutenção da situação sob controle nas fronteiras. Estratégica pela necessidade

do cumprimento de premissas constitucionais como a soberania e promoção do

desenvolvimento, bem-estar e segurança. Sem recursos financeiros e diretrizes

políticas, as Forças Armadas não podem realizar o trabalho de vigilância das

fronteiras. As ações estratégicas e o aparelhamento requerem gestões permanentes

do comando das Forças Armadas junto aos poderes constituídos para viabilizar a

obtenção de recursos orçamentários para este fim, conforme cita o Gal Enzo Martins

Peri, na Diretriz Geral do Comandante de 2007.

AS FRONTEIRAS E AS DROGAS ILÍCITAS

Desenvolvimento, bem-estar e segurança do cidadão ocorrem quando um

país exerce sua plena soberania, atuando com políticas voltadas para o

cumprimento desses objetivos. Sendo a fronteira a epiderme do Estado, qualquer

elemento nocivo que consiga transpor esta barreira, causará algum tipo de dano ao

interior da área invadida. As fronteiras não podem ser permeáveis a qualquer

elemento que possa abalar a estrutura social. As drogas podem causar este abalo.

As drogas ilícitas como cocaína e maconha são um dos grandes problemas

sociais atuais do Brasil. Além de problema social, tais drogas, entre outras, são

denominadas ilícitas devido ao fato de que – assim como a questão fronteiriça – são

devidamente previstas na legislação brasileira. A regulamentação sobre drogas no

Brasil data de 1938, com o decreto-lei 891/38, alterado posteriormente e que desde

sua concepção tratou de maneira criminalizadora esta questão. Diversas alterações,

principalmente no período do governo militar, culminaram com a lei 6368/76, que

não criminalizava o usuário, mas também não diferenciava o portador do traficante.

No início do regime democrático da década de 1980, houve uma

rediscussão da legislação, sob a alegação de vários setores da sociedade de que a

estrutura legal existente para a questão das drogas em alguns pontos era

demasiadamente severa em suas punições, punindo portadores com a mesma pena

de homicidas entre outros argumentos. No governo FHC foi criada a SENAD –

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Secretaria Nacional Anti-Drogas – localizada institucionalmente no Gabinete Militar.

As vertentes de ação da Secretaria eram baseadas na repressão ao uso, prevenção,

tratamento e reinserção do usuário na sociedade. Porém, os resultados não foram

positivos, gerando grandes gastos do dinheiro público sem conseguir reprimir o uso,

notando-se um aumento substancial na violência relacionada às drogas. No governo

Lula, a principal alteração não foi prática, mas simbólica e institucional. A SENAD

passou a chamar-se Secretária Nacional de Políticas Públicas Sobre Drogas, sendo

adequadamente realocada ao Ministério da Justiça. Conforme cita o Dr. Fábio

Mesquita, diretor da Gestão Descentralizada da Secretaria de Saúde Pública de São

Paulo, desde a apresentação do Plano de Governo para a eleição presidencial de

2002, a proposta de política anti drogas de Lula está pautada em um debate mais

amplo, que considera a questão dos direitos humanos, a saúde e bem estar do

usuário e a minimização dos danos sociais das drogas.

As ações das políticas anti-drogas adotadas nos últimos governos buscam

claramente agir na ponta final do caminho das drogas: o consumidor. Se não há

procura, não haverá demanda. O micro tráfico é a parte mais perceptível do

narcotráfico para a sociedade em geral, pois os pontos finais de venda estão

localizados nas favelas e bairros de todo o país e utilizam-se de menores de idade

como mão de obra, atingindo consumidores de todas as classes sociais. Ações mais

efetivas poderiam apresentar resultados profundos se a estrutura educacional do

país fosse envolvida profundamente nesta questão. Estudo da ONU mostra que de

meados da década de 1980 até o final da década de 1990, o consumo de drogas

como maconha, cocaína e anfetaminas entre alunos do ensino médio aumentou

mais de seiscentos por cento. Este fato justifica a proposta de política anti-drogas de

Lula, pautada no debate amplo, que considera a saúde e bem estar do usuário e a

minimização dos danos sociais das drogas. Corrobora com iniciativas neste sentido,

a opinião do sociólogo colombiano Hugo Velásquez, que atuou como subsecretário

de Segurança em Bogotá no período em que a cidade deixou de ser um ambiente

dominado pelo crime organizado para tornar-se um exemplo mundial de sucesso no

combate ao crime e às conseqüências sociais de ordem negativa que o crime

promove. Para Velásquez, é um erro combater o tráfico e esquecer as ruas, sendo

impossível combater o tráfico e o uso de drogas somente usando a força em locais

violentos se não houver conhecimento do número de escolas e postos de saúde que

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existem nestes locais e qual a qualidade do atendimento que proporcionam e do

serviço que oferecem. Esta é a ponta da cadeia das drogas que as políticas públicas

apontam como foco de ação e que se caracteriza como um problema social.

Mas a estratégia para inibir o uso das drogas, bem como sua

comercialização, não pode ignorar que a força antagônica ao Estado são os

produtores e traficantes, que trabalham de maneira articulada para que a cadeia

consumidora aumente cada vez mais. Esta é a outra ponta da rede, por onde é

forçada a entrada das drogas na sociedade: a produção e o tráfico. Conforme afirma

Eloi Pietá, advogado e deputado estadual pelo estado de São Paulo, que atuou na

CPI do Crime Organizado, para que haja êxito na entrada de drogas no país, os

grandes traficantes agem simultaneamente com negócios legais em restaurantes,

hotéis e fazendas, além de serem atuantes na política ou terem relações com

pessoas que exercem cargos públicos eletivos. Conforme Giovanni Quaglia,

responsável no Brasil pelo escritório da UNODC – Escritório das Nações Unidas

contra Drogas e Crimes – a corrupção e a lavagem de dinheiro permeiam todo o

trabalho do narcotráfico para que este se torne lucrativo. Esta é a ponta da cadeia

das drogas onde o Estado tem sido inativo e que se caracteriza como crime

organizado.

Narcotráfico é um negócio lucrativo e os traficantes procuram os mercados

que lhe concedem maiores lucros. Um quilo de cocaína colombiana pode ser

comprada na fronteira do Brasil com a Bolívia por US$ 1.500 e vendida nas favelas

das grandes capitais brasileiras por US$ 5.000 a US$ 7.000, sendo processadas e

revendidas ao consumidor final por até vinte reais o grama ou US$ 20.000 o mesmo

quilo comprado na fronteira boliviana. Porém, se esta cocaína for vendida

diretamente para a Europa, em grandes quantidades, o preço inicial do quilograma é

de US$ 50.000, muito mais lucrativo e atrativo ao narcotraficante. O Brasil encontra-

se localizado geograficamente avizinhado aos maiores produtores mundiais de

drogas, Colômbia, Peru e Bolívia e está no percurso entre os produtores e os

consumidores que lhes concedem maiores lucros: os europeus. No âmbito

geopolítico, um ponto que enfraquece o Brasil no quadro internacional é o fato de

que o país não somente está na rota do narcotráfico internacional, mas está sendo

efetivamente utilizado para este fim pelo crime organizado. A ONU tem cobrado

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oficialmente do Brasil, através da JIFE – Junta Internacional de Fiscalização de

Entorpecentes – providências no sentido de evitar a passagem das drogas pelo país.

A preocupação internacional está no fato de que a partir do Brasil, as drogas

seguem pela África, onde a distribuição é feita em diversos países antes de chegar à

Europa. Estrategicamente é mais eficiente combater o tráfico internacional de drogas

no Brasil, onde está centralizado, do que na África onde está pulverizado.

Visto que a cadeia das drogas tem porta de saída – o consumidor – e porta

de entrada – as fronteiras – cabe à União tomar as medidas cabíveis para quebrar

esta cadeia, evitando assim todas as conseqüências negativas econômicas e sociais

das drogas. Na ponta final da cadeia, as políticas públicas têm obtido resultados

ínfimos, porém há um planejamento para tais ações, com sensível avanço na política

do governo Lula da Silva em relação aos anteriores. Porém a entrada ilegal de

drogas pelas fronteiras brasileiras tem causado problemas sociais internos com

conseqüências econômicas e perda da credibilidade internacional quando faz do

Brasil uma ponte para o tráfico entre América do Sul e Europa. Estes fatores

demonstram a urgência em se desenvolver um planejamento estratégico e estruturar

as Forças Armadas para que o Brasil possa efetivamente garantir aos cidadãos as

condições para o desenvolvimento, bem estar e segurança, além de habilitar-se para

ocupar posições de maior destaque na conjuntura mundial, que conseqüentemente

trarão efeitos positivos internos para a sociedade brasileira. Lembremos que

desenvolvimento, bem-estar e segurança são direitos constitucionais do cidadão e o

arcabouço do narcotráfico é uma estrutura antagonista às ações do Estado para

garantir tais direitos à sociedade.

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O QUE OCORRE NA FRONTEIRA: TRÁFICO VERSUS VIGILÂNCIA

A Guiana Francesa é um território da União Européia encravado na América

do Sul. Chama-se território por ser um Departamento Ultramarino da França, tendo

inclusive seus dados para pesquisa anexados aos da França. Pela fronteira Brasil -

Guiana Francesa ocorre principalmente à entrada de drogas sintéticas como o

ecstasy, voltado para o abastecimento do mercado consumidor de classe média e

alta das grandes cidades brasileiras. Os cerca de oitocentos quilômetros de

fronteiras que o Brasil possui com a Guiana Francesa são de difícil controle devido à

maior parte estar coberta pela floresta. No principal ponto de acesso, entre a cidade

de Oiapoque no Brasil e Saint-Georges na Guiana Francesa, será construída uma

ponte rodoviária ligando as duas cidades, de acordo com o Decreto 6250/07 que

promulgou o acordo entre Brasil e França celebrado em Paris em 15/07/2005. Visto

que a soberania da fronteira de um país é enfatizada com a ocupação da mesma,

este investimento em infra-estrutura é um importante fator que demonstra a

presença brasileira efetiva na região. Na questão da vigilância, esta fronteira é

atualmente guarnecida pela Companhia Especial de Fronteira do 34º BIS e possui

um Órgão Remoto de coleta e envio de dados do SIVAM, Sistema de Vigilância da

Amazônia, que está localizado no Macapá, mas faz o envio de dados da região

fronteiriça ao sistema.. Na celebração do acordo para a construção da ponte

internacional, houve também a colocação da intenção da criação de um arco

setentrional de vigilância a partir de 2010, que abrangeria a área até a fronteira com

a Venezuela. A vulnerabilidade está no fato de que após a criação do Parque do

Tumucumaque, a vigilância do Exército deixou de possuir postos fixos na região.

Suriname e Guiana possuem fronteira com o Brasil na região do estado do

Pará. De acordo com o GEPROC – Grupo Especial de Prevenção e Repressão ao

Crime Organizado – órgão operacional ligado ao Ministério Público do Pará, o

principal problema de tráfico na região é o de produtos contrabandeados,

principalmente advindos da Índia, China e Miami. Ao adentrarem no Brasil pelas

fronteiras com Guiana e Suriname, estes produtos distribuem-se por uma rede fluvial

bastante capilarizada, tornando difícil o controle. Nota-se então a urgente

necessidade de contenção do tráfico na porta de entrada: a fronteira. O professor de

Relações Internacionais Argemiro Procópio, da UnB, cita que o problema das drogas

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nesta fronteira está relacionado às pequenas quantidades transportadas pelos

chamados “mulas”, que fazem o caminho em ambas as direções. Estas drogas

servem para abastecer o consumo de europeus que vem à região amazônica

atraídos pelo turismo sexual. A distribuição das organizações militares da 8ª Região

Militar, circunscrição da qual faz parte o estado do Pará, possui suas bases

concentradas nas cidades de Belém, Marabá e diversas outras da Amazônia

oriental. Na fronteira está instalado o Pelotão Especial de Fronteira de Tiriós, onde

também há um Órgão Remoto do SIVAM. Na região da fronteira da Guiana com

Roraima, está presente o 7º Batalhão de Infantaria da Selva, sediado em Boa Vista,

mas com presença fixa de seis Pelotões Especiais de Fronteira, sendo três deles –

Bonfim, Uiramutã e Normandia – responsáveis pela fronteira com a Guiana e os

demais atuando na fronteira com a Venezuela.

A Venezuela integra a rota das drogas que saem da Colômbia em direção

aos EUA e Europa, conforme alega o secretário anti drogas dos EUA, que cita dados

do DEA – Drug Enforcement Administration – para acusar o governo venezuelano de

conivência com o narcotráfico. A Venezuela nega as afirmações e acusa o DEA de

ter realizado espionagem no território venezuelano, além de realizar levantamentos

sobre o narcotráfico e não informar aos órgãos governamentais. Este impasse

ocorre devido à evidente rota do tráfico diretamente da Venezuela pelo Caribe,

sendo menor a incidência deste tipo de atividade na fronteira com o Brasil. A

fronteira seca poderia facilitar este tipo de ocorrência, mas a existência do Parque

Nacional do Pico da Neblina e de parte da terra indígena Yanomâmi, com presença

de ONGs e visitas freqüentes de autoridades, causa dificuldade aos delitos. A

presença do Exército brasileiro na fronteira com a Venezuela está efetivamente

instalada no estado de Roraima com os Pelotões de Fronteira Pacaraima, Surucucu

e Auaris do 7º BIS do Comando de Fronteira de Roraima e no Amazonas com os

PEFs Cucuí e Maturacá do 5º BIS do Comando de Fronteira Rio Negro. O Pelotão

Maturacá localiza-se no interior do Parque Nacional do Pico da Neblina. Um Órgão

Remoto do SIVAM está instalado na cidade de Surucucu, em Roraima.

A partir da fronteira com a Colômbia, inicia-se o trecho fronteiriço em que é

maior a ocorrência do tráfico de drogas como maconha e cocaína. A Colômbia, junto

com Peru e Bolívia, são os três maiores produtores mundiais destas drogas e as

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fronteiras com o Brasil são rotas dos produtos. A maior parte da fronteira entre Brasil

e Colômbia é seca, definida por marcos geodésicos e localizada dentro da selva

Amazônica. Instaladas na selva também estão as FARC – Forças Armadas

Revolucionárias da Colômbia – grupo que se intitulava marxista-leninista, surgido em

1964 com o cunho de grupo político, mas que se envolveu com o tráfico quando

passou a utilizar-se deste artifício para financiar suas ações e a aquisição de

armamento. Após a aprovação da Lei do Tiro de Destruição – Lei 9614/98

regulamentada pelo decreto 5144/04 que prevê como instância operacional limítrofe

o abate de aeronaves suspeitas em rotas presumivelmente utilizadas pelo tráfico de

drogas, conhecida como lei do abate – o narcotráfico procurou novas rotas por via

terrestre. O Gal. Antônio Martins Mourão, comandante da 2ª Brigada de Infantaria da

Selva, declarou em entrevista ao aluno Fausto Spósito da Universidade Anhembi

Morumbi durante a expedição Brasil-Amazônia que a preocupação que se tem é da

entrada das FARC em território brasileiro não como força organizada, mas como

indivíduos, com drogas que são trocadas por armamentos e comida. Intensificaram-

se estas ações depois da lei do abate e embora as FARC não se aproximem de

forma agressiva da fronteira brasileira, em 2006 chegou a haver confronto direto dos

traficantes com o Exército brasileiro. Para o General Mourão, estes fatos

caracterizam a fronteira Brasil-Colômbia como rota do tráfico. Após o combate de

2006, houve o direcionamento do tráfico pela tríplice fronteira Brasil-Colômbia-Peru,

na região das cidades de Letícia na Colômbia e Tabatinga no Brasil, formando um

gargalo de entrada das drogas que seguem em direção a Manaus. Nesta região, a

presença das FARC não é visível devido à distância que a organização mantém da

fronteira, porém os efeitos de sua atuação no narcotráfico são perceptíveis na

cidade brasileira. Parte da cocaína traficada por Tabatinga fica na cidade para

consumo dos brasileiros que fazem o trabalho de “mulas”, a maioria deles com idade

entre 15 e 25 anos. Além do tráfico, esses jovens realizam assassinatos

relacionados ao tráfico e não temem a presença da polícia. Tabatinga possui mais

de 45 mil habitantes e pouco mais de quarenta policiais federais. O Exército está

presente na região com os PEFs Tunuí, São Joaquim, Querari, Yauaretê e Pari

Cachoeira, todos no município de São Gabriel da Cachoeira e componentes do

5ºBIS do Comando de Fronteira Rio Negro. Na cidade de Tabatinga está a base do

8ºBIS do Comando de Fronteira Solimões, que possui quatro PEFs: Palmeiras do

Javari, Bitencourt, Ipiranga e Estirão do Equador. O Coronel Roberto Avelino,

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gerente do Programa Calha Norte, cita em entrevista ao jornal Hora do Povo, o

apoio do atual governo no programa e nas ações das Forças Armadas na defesa do

território brasileiro, destacando a transformação da 2ªBIMtz em 2ªBIS e sua

transferência de Niterói para São Gabriel da Cachoeira, além da liberação de verba

no plano plurianual 2004-2007 para construção de dois aquartelamentos, em Santa

Isabel do Rio Negro e Barcelos. A construção iniciou-se em 2006 e as OMs

comporão uma brigada que se destinará exclusivamente à vigilância da fronteira

Brasil-Colômbia na região da Cabeça do Cachorro4. O SIVAM possui dois Órgãos

Remotos, sendo um na cidade de São Gabriel da Cachoeira e outro em Tabatinga.

O Peru é o segundo maior produtor mundial de cocaína. Sua fronteira com o

Brasil está situada em partes da região dos estados do Amazonas e Acre, em plena

floresta amazônica. Em quase toda esta região, o problema do desmatamento e

comércio ilegal de madeira é crescente e preocupante. A política de concessão de

áreas para exploração vem promovendo o avanço dos madeireiros na floresta,

causando conflitos com os indígenas, principalmente os Ashaninka, no

departamento de Ucayali no Peru e no estado do Acre, pois os madeireiros avançam

em território brasileiro em busca de madeiras nobres, de maior valor comercial,

escassas em território peruano. Grande parte da cocaína peruana entra no Brasil

pela fronteira com a Bolívia, porém a tríplice fronteira é um dos gargalos de

escoamento para o narcotráfico, na cidade acreana de Assis Brasil. O modo de

operação do tráfico é semelhante ao da cidade de Tabatinga, com o agravante que

não há um posto fixo de fiscalização e controle da Polícia Federal. As poucas

intervenções isoladas da PF apreenderam algumas dezenas de quilos de maconha,

o que é insignificante diante da grande quantidade de drogas que passa por este

ponto. Os traficantes estão abandonando as trilhas abertas na selva e atravessando

por acessos urbanos devido à facilidade de entrada através da cidade de Assis

Brasil, de onde segue principalmente para Rio Branco para ser distribuída a outras

cidades do Brasil. Outro ponto que pode viabilizar o aumento do narcotráfico na

região é a construção da rodovia Transoceânica, que ligará Assis Brasil ao oceano

Pacífico. No acordo para a obra, está prevista a dispensa do passaporte para tráfego

na fronteira e o local está desprovido de fiscalização. O desmatamento, que retira a

4Cabeça do Cachorro é a área situada na fronteira do Brasil com Colômbia e Venezuela. O desenho formado pela linha da fronteira lembra o formato da cabeça de um cachorro com a boca aberta.

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floresta densa das áreas de fronteira, pode motivar a abertura de novas rotas

terrestres de tráfico pela facilidade de acesso. A falta de fiscalização pode facilitar o

trabalho dos traficantes. A influência dos madeireiros e da rodovia Transoceânica na

vida dos índios pode desestruturar suas aldeias e povos, ficando então vulneráveis a

cooptação por parte do tráfico. A presença das Forças Armadas no Acre não conta

com unidades especiais de fronteira. Esta é uma região que necessita da presença

efetiva do Estado, no sentido de dissuadir ações do narcotráfico. O SIVAM está

presente com dois Órgãos Remotos instalados em Rio Branco e Cruzeiro do Sul.

A Bolívia possui fronteira com trinta municípios de quatro estados brasileiros:

Acre, Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A cocaína produzida na Bolívia,

terceiro maior produtor mundial, atrás apenas da Colômbia e do Peru, entra no

território acreano pela cidade de Assis Brasil, seguindo para a capital Rio Branco ou

então pelo município de Brasiléia, de onde a rota toma a direção das cidades de

Ariquemes e Buritis em Rondônia. A capital rondoniense é um dos municípios do

Brasil onde há maior quantidade de apreensão de drogas pela Polícia Federal.

Devido às vias de acesso terrestre e fluvial em direção ao interior, Mato Grosso e

Bolívia, Porto Velho tornou-se um entroncamento, um ponto de distribuição para o

narcotráfico, A principal característica é que não se trata somente de uma rota de

passagem, pois a droga que chega à cidade é processada antes de ser revendida,

tornando o negócio muito mais atrativo aos traficantes e está estendendo-se

também a Nova Mamoré, Guajará Mirim e Costa Marques. A partir de São Francisco

do Guaporé até Cabixi, no extremo sul do estado, é menos intensa a ação do

narcotráfico, sendo mais evidentes os problemas ligados à extração ilegal de

minérios de cobre. Parte deste cobre segue o caminho inverso das drogas, seguindo

de Rondônia para a Bolívia, posteriormente chegando ao mercado internacional. Na

região de Juína a presença da passagem de drogas pela fronteira volta a ocorrer. O

caso mais freqüente é de roubo de automóveis e motocicletas que são trocados em

território boliviano por entorpecentes que abastecem o mercado local. Este fato é

comum desde Juína até Pontes e Lacerda. A Polícia Civil vem trabalhando na região

na vertente da repressão ao tráfico, por considerar as drogas como ponta de lança

de delitos e males sociais que envolvem os jovens. Porém a extensa fronteira do

Brasil com a Bolívia tem dois pontos que se destacam no tráfico, sendo gargalos de

exportação da cocaína boliviana para a Europa pela Brasil. Trata-se da rota

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Cáceres-Cuiabá-Gioânia e mais ao sul a rota Corumbá - Campo Grande. Estas rotas

são bastante utilizadas pelo narcotráfico devido ao acesso rodoviário que a Bolívia

possui com Cáceres e Corumbá, facilitando o escoamento das drogas. Embora a PF

venha realizando diversas apreensões na região sabe-se que os “mulas” presos com

alguns quilos da droga servem como “bois de piranha” para viabilizar a passagem de

até centenas de quilos de pasta base de cocaína e outros entorpecentes pelas

regiões menos vigiadas. Neste sentido, é estrategicamente necessário que haja uma

vigilância efetiva nas fronteiras, nos locais onde não há postos da PF, que age

predominantemente no interior das cidades e nas redes de acesso, como rodovias

ou rios. A ação mais efetiva do poder militar brasileiro – mais precisamente as

Forças Armadas – na fronteira com a Bolívia poderia contribuir para alterar este

quadro alarmante. Na fronteira do Brasil com a Bolívia não há Pelotões Especiais de

Fronteira, visto que estes são um braço operacional existente apenas na região do

Comando Militar da Amazônia e a fronteira com a Bolívia está na jurisdição do

Comando Militar do Oeste. Em Rondônia as fronteiras não possuem efetivo fixo,

estando as fronteiras sob responsabilidade da 3ªCia. do 54ºBIS, instalada em Porto

Velho e do 6ºBIS sediado em Guajará Mirim, mas que possui um Pelotão de

Fuzileiros da Selva com base na cidade de Costa Marques. No Mato Grosso, cerca

de 750 quilômetros de fronteiras formadas por linhas geodésicas tem sua soberania

sob a guarda do 2º Batalhão de Fronteira, localizado na cidade de Cáceres. O

2ºBFron possui seis destacamentos ao longo da fronteira e está subordinado à 18ª

Brigada de Infantaria de Fronteira, sediada em Corumbá. Cabe à União viabilizar

recursos financeiros e humanos para que a 18ªBda Inf Fron possa traçar estratégias

e executar ações de presença e dissuasão na fronteira oeste, atuando efetivamente

como Força de Vigilância do Comando Militar do Oeste, inibindo o tráfico

transfronteiriço e facilitando o trabalho da Polícia Federal. O SIVAM possui ainda os

Órgãos Remotos de Guajará Mirim, Vilhena e Porto Esperidião na fronteira com a

Bolívia.

A partir da cidade de Porto Murtinho no Mato grosso do Sul, até Foz do

Iguaçu no Paraná situa-se a fronteira Brasil-Paraguai. Esta é uma das fronteiras

onde o tráfico de drogas é mais intenso, com três pontos de maior ocorrência. No

primeiro, as drogas passam de Pedro Juan Caballero no Paraguai para Ponta Porã.

O segundo ponto é a divisa nas cidades de Guairá no Brasil e Salto del Guairá no

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Paraguai e o terceiro, o mais conhecido, fica na tríplice fronteira Brasil-Paraguai-

Argentina, onde a droga chega pela Ciudad del Este e entra no Brasil por Foz do

Iguaçu. A cidade de Ponta-Porã é um ponto de entrada de grandes quantidades de

drogas. Em um espaço de tempo de sete dias apenas, houve apreensão de um

carregamento com 14 quilos de cocaína, outro com 10 quilos e mais três com 11, 32

e 45 quilos. A droga com origem no Peru, Colômbia, Bolívia e Paraguai chega à

cidade de Pedro Juan Caballero no Paraguai, passando por Ponta Porá, de onde

segue para grandes cidades brasileiras. Ações da Interpol, em conjunto com a

Polícia Federal do Brasil e a Secretária Nacional Anti Drogas do Paraguai realizaram

prisões, em Ponta Porá e Pedro Juan Caballero, de diversos membros do PCC –

Primeiro Comando da Capital, organização criminosa que atua no território brasileiro

– além de traficantes ligados ao bando comandado por Fernandinho Beira Mar. A

concentração do comando do tráfico na região é um indicador do interesse do

narcotráfico pela região. Em Foz do Iguaçu aumentou a fiscalização e a ação da

polícia, principalmente após as pressões dos EUA, que afirmam sua preocupação na

tríplice fronteira pela possível existência de membros de grupos terroristas islâmicos,

que buscam refúgio ilegal no Brasil, fugindo da guerra anti terror promovida pelo

governo norte americano. A intensificação dos trabalhos de fiscalização na Ponte da

Amizade, que liga Foz do Iguaçu a Ciudad del Este, fez com que parte do tráfico

migrasse para a fronteira Guairá – Salto del Guairá. A fronteira com o Paraguai é

responsável é um ponto de suma importância no combate ao tráfico. Pelos três

pontos de entrada de drogas chegam ao Brasil a cocaína da Colômbia, do Peru e da

Bolívia, além do haxixe boliviano e da maconha produzida no Paraguai. Conforme

Giovanni Quaglia, representante do Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e

Crimes, a droga que adentra ao Brasil via Paraguai tem como destino final a Europa,

sendo que cerca de 20% do total ficam no Brasil para o tráfico interno. Também é

intensa a passagem de automóveis roubados no Brasil que são trocados por drogas

e armas no Paraguai. Porém o tráfico ocorre também em outras regiões da fronteira,

que é predominantemente fluvial e lacustre, com poucos pontos passíveis de

passagem a seco. Isto concede ao serviço de vigilância uma vantagem estratégica,

pois nestas condições um carregamento ilegal que atravessa pelo rio, por exemplo,

pode ser combatido por serviço de vigilância instalado na selva, que teria a

vantagem de ver sem ser visto. Para tanto, a presença da vigilância nas fronteiras

deve ser intensa para ser eficiente. Com a inibição das rotas de tráfico no rio Paraná

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e no reservatório da Usina de Itaipu, através da presença maciça das Forças

Armadas, restaria ao tráfico os gargalos em Foz do Iguaçu, Guairá e Ponta Porã,

facilitando o trabalho de fiscalização da polícia, pois o tráfico estaria concentrado em

poucos lugares. No Mato Grosso do Sul, a 2ª Cia Fron em Porto Murtinho e a 3ª Cia

Fron em Forte Coimbra realizam a vigilância das fronteiras que no estado do Paraná

é realizada pelo 34º Batalhão de Infantaria Motorizado, com base em Foz do Iguaçu

e com a 3ª Cia em Guaíra. A Polícia Federal está presente de maneira efetiva na

Ponte da Amizade, não havendo posto fixo em Guaíra.

A região da fronteira coma Argentina e com o Uruguai não se destaca por

problemas com tráfico de drogas, havendo grande presença da população na região,

com diversas cidades nas quais há intensas atividades econômicas capazes de

suprir as demandas econômicas. Este é um dos fatos que evita que menores e

jovens sejam aliciados pelo narcotráfico, além de ser uma região mais afastada dos

grandes produtores de drogas. Enquanto as drogas permanecerem entrando por

outros estados como Paraná e Mato Grosso, possivelmente o tráfico não procurará

rotas pela Argentina. O Comando Militar do Sul possui na região da fronteira com o

Uruguai e com a Argentina duas Brigadas de Cavalaria Mecanizada com sete

Regimentos de Cavalaria, duas Companhias de Engenharia de Combate, dois

Grupos de Artilharia de Campanha, um Batalhão Logístico, dois campos de

instrução em São Borja e duas baterias de Artilharia Antiaérea. Estas corporações

encontram-se nas cidades fronteiriças de São Borja, Uruguaiana, Bagé, Itaqui,

Jaguarão, Santana do Livramento, Dom Pedrito e Quaraí.

Este é o retrato do que ocorre nas fronteiras brasileiras e da localização das

Forças Armadas na região fronteiriça. Há uma estrutura para vigilância, sendo

necessário estruturá-la de maneira condizente com a necessidade, com os objetivos

e com as obrigações de cada ator envolvido neste processo.

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CONCLUSÃO

As fronteiras brasileiras são de grande extensão e elevada complexidade,

considerando-se todos os aspectos que nelas influenciam. Algumas regiões são

mais e outras menos ocupadas, vigiadas, controladas ou vulneráveis do que outras

para a entrada ilegal de elementos nocivos à sociedade e à nação brasileira. Torna-

se, então imprescindível a presença efetiva do Estado nas regiões fronteiriças, para

tornar perceptível a soberania e possível o controle destas regiões. A presença na

fronteira deve contar com elementos essenciais como ocupação populacional,

presença e ação das forças armadas, além dos demais órgãos estatais

responsáveis pela segurança pública, dos ministérios até a polícia. A União tem a

incumbência de realizar políticas abrangentes para promover o desenvolvimento, o

bem-estar e a segurança, direitos constitucionais do cidadão que, entre outros, deve

permear as ações do Estado brasileiro nas regiões de fronteira.

O tráfico de drogas é um dos principais problemas encontrados nas

fronteiras, por onde entram drogas sintéticas advindas da Europa, cocaína da

Colômbia e da Bolívia, além da maconha do Paraguai. Todas estas drogas

produzem efeitos nocivos em toda a sociedade brasileira, em todo o território

nacional, ratificando a importância de um controle eficiente nas fronteiras do Brasil.

Tanto as drogas sintéticas que atendem o consumidor brasileiro de classe alta e

média como a maconha de baixíssima pureza consumida no interior das favelas das

grandes cidades produzem perdas econômicas e sociais a toda a sociedade,

aumentando as demandas financeiras necessárias à saúde e segurança pública,

limitando assim a disponibilidade de recursos públicos para investimento em

educação e infra estrutura. As Forças Armadas não são responsáveis pela resolução

do problema das drogas no país, mas a eficiente vigilância das fronteiras para evitar

a entrada de drogas em grandes quantidades no território brasileiro contribuiria para

a diminuição deste problema.

A utilização do Brasil como conexão para o narcotráfico internacional traz

conseqüências negativas para o cumprimento de pelo menos um dos objetivos

nacionais, a projeção internacional. Países que não têm interesse em que o Brasil

ganhe espaço no cenário internacional podem utilizar-se do fato do Brasil ser rota do

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narcotráfico para alegar ineficiência ou permissividade do país nesta questão.

Também na liderança regional, a maior ação das Forças Armadas na fronteira teria

importante papel. O Brasil não é um país belicista na resolução de suas questões

internacionais, utilizando-se da diplomacia em detrimento da promoção do conflito

armado, porém ações bélicas de disuassão do narcotráfico nas fronteiras serviriam

para demonstrar a eficiência da “força” na atuação contra atores não estatais.

Fronteiras devidamente controladas pelas Forças Armadas facilitariam o

trabalho de fiscalização da Polícia Federal. Porém, os indivíduos que compõem o

corpo da polícia possuem uma relação muito mais estreita e próxima da população

do que as Forças Armadas. O grande traficante pode facilmente agir de forma a

inibir a ação do policial, envolvendo sua família em ameaças que reduzem sua

capacidade de ação contra o crime. As Forças Armadas agem de maneira incisiva e

dirigida, tornando mais difícil a sua identificação na sociedade e as transferências de

membros de seu efetivo são freqüentes por motivos operacionais. Com a persuasão

ininterrupta das atividades ilícitas pelas Forças Armadas, caberia à polícia Federal o

papel de fiscalização em pontos específicos e encaminhamento de material

apreendido e delinqüentes presos às devidas instâncias penais ou judiciais.

A redução da entrada de drogas pela fronteiras brasileiras pode promover

um quadro positivo para que o governo federal tome medidas político-administrativas

que gerem desenvolvimento, bem estar e segurança. Desenvolvimento pela maior

disponibilidade de recursos para investimento nas áreas sociais, da educação e

infra-estrutura, além da entrada de mais recursos internacionais pela confiança de

outros países no ambiente nacional. Menos recursos necessários para os presídios

e mais recursos disponíveis para as escolas. Bem estar pela sensação de

segurança e liberdade que o cidadão sentiria em um ambiente livre das drogas e de

seus efeitos sociais nocivos. Segurança pela maior capacidade de manter o controle

social, visto que uma utópica sociedade sem drogas necessitaria de uma estrutura

de segurança pública mais simplificada do que um ambiente que sofre com as

conseqüências dos entorpecentes. Estando as fronteiras, as F.A. e a segurança

pública sob a responsabilidade da União, cabe a esta tomar as medidas para

alcançar os objetivos nacionais e promover os direitos constitucionais do cidadão.

Fronteiras incólumes geram um ambiente interno favorável a estes preceitos.

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