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05/04/2020 Número: 1006056-69.2020.4.01.3200 Classe: AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL Órgão julgador: 3ª Vara Federal Cível da SJAM Última distribuição : 05/04/2020 Valor da causa: R$ 2.000.000,00 Assuntos: Saúde Segredo de justiça? NÃO Justiça gratuita? SIM Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM Justiça Federal da 1ª Região PJe - Processo Judicial Eletrônico Partes Procurador/Terceiro vinculado MINISTERIO PUBLICO FEDERAL (AUTOR) MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - MPT (AUTOR) DEFENSORIA PUBLICA DA UNIÃO (AUTOR) UNIÃO FEDERAL (RÉU) ESTADO DO AMAZONAS (RÉU) MUNICIPIO DE MANAUS (RÉU) Ministério Público Federal (Procuradoria) (FISCAL DA LEI) Documentos Id. Data da Assinatura Documento Tipo 21359 7877 05/04/2020 15:42 ACP MPF-MPT-DPU - Pop-Rua - versao 05.04.20 13h00 Inicial

PROCESSO: 1006056-69.2020.4.01.3200 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA … · 05/04/2020 Número: 1006056-69.2020.4.01.3200 Classe: AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL Órgão julgador: 3ª Vara Federal

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05/04/2020

Número: 1006056-69.2020.4.01.3200

Classe: AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL

Órgão julgador: 3ª Vara Federal Cível da SJAM

Última distribuição : 05/04/2020

Valor da causa: R$ 2.000.000,00

Assuntos: Saúde

Segredo de justiça? NÃO

Justiça gratuita? SIM

Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM

Justiça Federal da 1ª RegiãoPJe - Processo Judicial Eletrônico

Partes Procurador/Terceiro vinculado

MINISTERIO PUBLICO FEDERAL (AUTOR)

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - MPT (AUTOR)

DEFENSORIA PUBLICA DA UNIÃO (AUTOR)

UNIÃO FEDERAL (RÉU)

ESTADO DO AMAZONAS (RÉU)

MUNICIPIO DE MANAUS (RÉU)

Ministério Público Federal (Procuradoria) (FISCAL DA LEI)

Documentos

Id. Data daAssinatura

Documento Tipo

213597877

05/04/2020 15:42 ACP MPF-MPT-DPU - Pop-Rua - versao 05.04.2013h00

Inicial

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AO JUÍZO PLANTONISTA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO AMAZONAS

URGENTE – COVID-19 – POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO

TRABALHO e a DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, por intermédio do Procurador da

República, da Procuradora do Trabalho e do Defensor Público Federal signatários, vêm

respeitosamente perante esse juízo, com fundamento nos incisos I e II do artigo 5º da Lei 7.347/1985,

propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA

LIMINAR

em face da UNIÃO, pessoa jurídica de direito público, representada pela Procuradoria da União no

Estado do Amazonas, com endereço na Av. Tefé, 611 – Praça 14 de Janeiro, CEP 69020-090,

Manaus/AM, do ESTADO DO AMAZONAS, pessoa jurídica de direito público, representada pela

Procuradoria Geral do Estado, com endereço na Rua Emílio Moreira, 1308 – Praça 14 de Janeiro,

69020-040, Manaus/AM, e do MUNICÍPIO DE MANAUS, pessoa jurídica de direito público,

representada pela Procuradoria Geral do Município, com endereço na Av. Brasil, 2971 – Compensa,

69036-110, Manaus/AM, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos.

1. DOS FATOS

É fato notório a crise sanitária internacional decorrente do alastramento da infecção

humana pelo novo coronavírus (Covid-19), o que levou a Organização Mundial de Saúde (OMS) a

Num. 213597877 - Pág. 1Assinado eletronicamente por: LUIS FELIPE FERREIRA CAVALCANTE - 05/04/2020 15:40:17http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20040515401690300000209904938Número do documento: 20040515401690300000209904938

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declarar situação de pandemia e a recomendar a todos os Estados a adoção das precauções e das

medidas correlatas.

Nesse sentido, o Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo nº 06, de 20 de

março de 2020, reconheceu a existência de estado de calamidade pública no País, com efeitos até 31 de

dezembro de 2020, nos termos de solicitação encaminhada pelo Presidente da República (Mensagem

nº 93, de 18 de março de 2020).

Por sua vez, o Estado do Amazonas e o Município de Manaus, respectivamente, pelo

Decreto n° 42.061, de 16 de março de 2020, e pelo o Decreto nº 4.780, de 16 de março de 2020,

declararam situação de emergência, notadamente na saúde pública, ante os prognósticos de colapso do

sistema público de saúde como consequência da alta transmissibilidade da moléstia, que afeta de forma

ainda mais severa idosos, portadores de doenças crônicas e demais pessoas que se enquadram nos

chamados grupos de risco. Novo Decreto estadual ainda mais restritivo quanto à circulação de pessoas

está em vias de expedição neste fim de semana, conforme fala do Governador do Estado, na data de

ontem (04/04/2020).1

Mundo afora, são sugeridas como medidas indispensáveis para evitar o contágio, entre

outras, lavar as mãos e o rosto com frequência, evitar aglomerações e manter-se em isolamento

social. Segundo cartilha do Ministério da Saude2, as recomendações para se proteger do novo

Coronavírus (COVID-19) são:

a) Lave as mãos com frequência até a altura dos punhos, com água e

sabão, ou então higienize com álcool em gel 70%

b) Ao tossir ou espirar, cubra nariz e boca com lenço ou com o braço, e

não com as mãos;

c) Evite tocar os olhos, nariz e boca com as mãos não lavadas. Ao tocar,

lave as mãos como indicado;

d) Mantenha uma distância mínima de 2 metros de qualquer pessoa

tossindo ou espirando;

e) Evite abraços, beijos e apertos de mãos. Adote um comportamento

amigável sem contato físico, sempre com um sorriso no rosto;

f) Não compartilhe objetos de uso pessoal, como talhares, toalhas, pratos

e copos; 1 https://d24am.com/coronavirus-no-amazonas/wilson-lima-amplia-medidas-restritivas-no-combate-ao-coronavirus-no-am/ 2 http://www.saude.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2020/02/Cartilha-Informacoes-Coronavirus.pdf

Num. 213597877 - Pág. 2Assinado eletronicamente por: LUIS FELIPE FERREIRA CAVALCANTE - 05/04/2020 15:40:17http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20040515401690300000209904938Número do documento: 20040515401690300000209904938

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g) Mantenha ambientes limpos e bem ventilados;

h) Se estiver doente, evite contato físico com outras pessoas,

principalmente idoso e doentes crônico, e fique em casa;

i) Durma bem e tenha uma alimentação saudável.

A população em situação de rua se insere nos agrupamentos de maior vulnerabilidade

à Covid-19, dadas à má nutrição, as péssimas condições de higiene e as doenças pré-existentes a que

invariavelmente se encontram submetidas. Além disso, sua própria condição nas ruas torna

praticamente impossível a adoção de medidas como o isolamento social e a higienização frequente, o

que demanda atuação especial por parte do Poder Público.

Nessa linha, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União, em

25/03/2020, expediram a Recomendação Legal nº 03/2020 5º OFÍCIO/PR/AM e DRDH DPU/AM,

(DOC. 01) elencando dezenove medidas a serem adotadas pelo Estado do Amazonas e pelo Município

de Manaus como forma de assegurar dignidade e proteção à população em situação de rua no contexto

da atual pandemia, quais sejam (grifos nossos):

I - elaborem Plano de Contingência Emergencial Intersetorial,

prevendo um conjunto de medidas de proteção às pessoas em situação

de rua, diante da pandemia do novo coronavírus – COVID-19,

encaminhando-o no prazo de 72 (setenta e duas) horas às instituições

signatárias da presente Recomendação;

II - garantam o regular e continuado funcionamento dos equipamentos e

serviços públicos que atendam à população em situação de rua, em

diálogo com a Secretaria Nacional de Assistência Social, com o

Ministério da Saúde;

III - disponibilizem, nos equipamentos e serviços que atendam à

população em situação de rua, insumos para proteção dos trabalhadores

e da população, tais como: álcool gel, máscaras faciais de proteção

descartáveis, copos descartáveis nos bebedouros, produtos de higiene

pessoal, além de outros que sejam indicados pelos gestores de saúde

pública e órgãos integrantes do Sistema Único de Saúde;

IV - adotem medidas imediatas para assegurar proteção social com

abrigamento protegido, em condições de dignidade, das pessoas em

situação de rua, fornecendo local adequado, recursos ou subsídios para

pagamento de pensão ou aluguel social, hotel ou outras medidas que

Num. 213597877 - Pág. 3Assinado eletronicamente por: LUIS FELIPE FERREIRA CAVALCANTE - 05/04/2020 15:40:17http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20040515401690300000209904938Número do documento: 20040515401690300000209904938

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viabilizem os direitos à moradia adequada e à saúde dessa parcela da

população, garantindo-se o período mínimo de 6 (seis) meses, facultada

a prorrogação;

V - destinem espaço prioritário de moradia às pessoas que se

enquadram no grupo de risco decorrente da pandemia do novo

coronavírus – COVID-19, tais como pessoas idosas, pessoas com

doenças crônicas, pessoas imunossuprimidas (diabéticos e pessoas com

HIV, p. ex.), bem como portadores de doenças respiratórias e outras

comorbidades preexistentes que possam conduzir a um agravamento do

estado geral de saúde a partir do contágio de COVID-19, assim como

gestantes e mulheres em condições históricas de vulnerabilidade social

e em risco quanto às suas maternagens;

VI - reduzam o número de pessoas por quarto nas unidades de

acolhimento institucional, de maneira a evitar a rotatividade,

assegurando-se a disponibilização de cama fixa para cada pessoa

determinada, além de garantir uma distância recomendada entre as

mesmas, a partir de recomendações emitidas da área da saúde;

VII - disponibilizem imediatamente pontos de água potável em praças e

logradouros públicos, iniciando-se pelos mais frequentados pelas

pessoas em situação de rua, franqueando, outrossim, imediato acesso

aos banheiros públicos já existentes, sem prejuízo da implantação de

outros sanitários para uso público, com plano para sua devida

higienização, observado sempre o caráter urgente de tais medidas;

VIII - adotem e intensifiquem, nas respectivas esferas de atribuição e em

todas as divisões, circunscrições e mecanismos de regionalização de sua

atuação administrativa, programas e serviços de redução de danos para

pessoas em uso prejudicial de drogas, de modo a evitar condutas de

risco, ampliando-se as equipes dos Consultórios de Rua do município de

Manaus, implementando, outrossim, tais mecanismos onde ainda não

existam;

IX - ampliem, nas respectivas esferas de atribuição, o número de

profissionais vinculados a programas de enfrentamento à AIDS;

X - garantam, nas respectivas esferas de atribuição, fornecimento das 3

(três) alimentações diárias em restaurantes populares e/ou locais de

estadia temporária em caráter emergencial, atendendo à população em

situação de rua gratuitamente durante todos os dias da semana,

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independentemente de inscrição no CAD-Único;

XI - identifiquem imóveis públicos ou privados ociosos que apresentem

infraestrutura adequada para que possam ser utilizados como moradia

temporária em caráter urgente e imediato; bem como verifique a

viabilidade de destinação de espaços com infraestrutura, em caráter

emergencial, além das pessoas em situação de rua, também para estadia

temporária emergencial de servidores públicos que atuem em atividades

com maior risco de contaminação e que, de forma voluntária, optem por

habitar em caráter temporário e emergencial em tais espaços, como

forma de proteção a familiares e pessoas próximas, conforme solicitação

de alguns servidores em diálogos com o MPF;

XII - antecipem as campanhas de vacinação necessárias para

imunização da população em situação de rua e os trabalhadores da rede

pública que lhe prestem atendimento;

XIII - garantam atendimento emergencial pelo SAMU, assim como

acesso à medicação e aos devidos cuidados;

XIV - em caso de suspeita de contaminação, assegurem espaço adequado

de repouso e cuidados na Rede Pública de Saúde;

XV - em caso de necessidade de internação hospitalar, assegurem à

população em situação de rua leitos em unidades de saúde;

XVI - liberem recursos para serviços de proteção e para a produção de

informações especializadas voltadas à população em situação de rua;

XVII - suspendam imediatamente quaisquer ações de retirada de

pertences da população que se encontre na rua;

XVIII - produzam materiais informativos voltados à população em

situação de rua, em linguagem clara, objetiva e acessível, de maneira a

comunicar efetivamente todos os equipamentos, telefones e outros meios

de contato, a fim de assegurar o pleno exercício do direito à informação

e à saúde da população em situação de rua;

XIX - abstenham-se, a pretexto de efetivar prevenção ao COVID-19, de

qualquer política indiscriminada de internação compulsória de pessoas

em situação de rua.

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Cabe ressaltar que essas medidas foram articuladas com movimentos sociais,

especialistas em saúde pública e assistência social, sendo diversas delas sugeridas por servidores e

técnicos dos órgáos governamentais. Ademais, tiveram como fundamento recomendação com teor

semelhante expedida em Minas Gerais por MPT, MPF, DPU e DPE, bem como carta da Arquidiocese

de Manaus (Igreja Católica) – (DOC. 02), inclusa a Pastoral do Povo da Rua, na qual elenca

proviências a serem adotadas pelo Poder Público e colocando à disposição apoio e espaços físicos da

própeia Arquidiocese. Outros grupos religiosos e da sociedade civil também se colocaram à disposição

para apoio aos órgáos públicos neste momento emergencial e extremamente sensível, em especial para

o público cujos direitos são aqui defendidos.

No texto da Recomendação é possível verificar que outros dos fundamentos foram as

medidas já adotadas em diversos estados do Brasil sobre o tema, antes de qualquer instigação dos

órgáos fiscais:

CONSIDERANDO que outros Estados e municípios da federação já

vêm adotando medidas específicas mais robustas e efetivas em relação

às pessoas em situação de rua, seja com Notas recomendatórias aos

equipamentos e serviços socioassistenciais (como o Espírito Santo), seja

disponibilizando pias e banheiros coletivos, espaços adequados em

estádios ou em outros locais, como por exemplo no Pará, Rio de Janeiro,

São Paulo, Porto Alegre, entre outros, conforme se pode observar nas

notícias seguintes:

https://www.oliberal.com/esportes/futebol/estadio-mangueirao-recebera-

moradores-de-rua-na-luta-contra-o-coronavirus-1.251237

https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-

noticias/redacao/2020/03/21/rio-instalara-pias-e-acolhera-morador-de-

rua-no-complexo-do-sambodromo.htm

https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/03/22/prefeitura-de-sp-

cria-abrigos-para-receber-moradores-de-rua-com-suspeita-de-

coronavirus.ghtml

https://gauchazh.clicrbs.com.br/porto-alegre/noticia/2020/03/prefeitura-

de-porto-alegre-disponibiliza-predio-para-abrigar-moradores-de-rua-

ck84ky4k806y201pqgy35xz9e.html

Ainda no dia no dia 25/03/2020, o Governador do Estado do Amazonas anunciou nas

redes sociais e para veículos de comunicação que a Arena Amadeu Teixeira seria ponto de apoio para

atendimento da população em situação de Rua (local para realização de higiene pessoal, banho,

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pernoite e refeições), com capacidade para 200 pessoas.3

No dia seguinte ao anúncio, várias pessoas em situação de rua ocuparam o lado de fora

da Arena, sendo que muitos não teriam a possibilidade de ser acolhidos no local tendo em vista a

realização de triagem para atendimento das pessoas de maior vulnerabilidade, segundo informações

prestadas pela Secretaria de Estado e Assistência Social, Márcia Saado, em entrevista a veículo

televisivo.4

No dia 27/03/2020, o MPT instaurou procedimento próprio (PA-PROMO

000468.2020.11.000/9) para acompanhar a situação e ratificou as medidas recomendadas pelo MPF e

pela DPU. Contudo, até 01/04/2020 (primeira reunião de MPF/MPT/DPU com os órgáos públicos e

sociedade civil após a expedição da Recomendação) sequer uma pessoa tinha sido acolhida na Arena,

sob alegações de dificuldades sanitárias e outras. Ou seja, do dia 25/03 ao dia 01/04, o Estado

estimulou uma situação de aglomeração ainda pior, sem sequer acolher as pessoas amontoadas ao lado

de fora da Arena, sem acesso à água, sem banheiros. Após a reunião, timidamente, começaram a ser

acolhidos os primeiros, cerca de 30 pessoas apenas, mas ainda permanecendo do lado de fora a

maioria dos que para lá se deslocaram, situação que permanece até agora.

Além disso, até a presente data, o Estado do Amazonas e o Município de Manaus

falharam em apresentar ao MPF, ao MPT e à DPU resposta integrada, informativa e efetiva do

cumprimento das providências recomendadas, com justificativas em relação àquelas que não poderiam

ser atendidas, e limitaram-se a apresentar respostas parciais, por meio de suas respectivas secretarias

de assistência social (SEAS e SEMMASC), e planos de trabalho genéricos e isolados, a demontrar

falta de planejamento e articulação.

De modo, então, a incentivar o diálogo e a colaboração entre os entes públicos e o

cumprimento da Recomendação, o MPF, o MPT e a DPU realizaram, no dia 01/04/2020, reunião por

videoconferência com representantes da Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e

Cidadania (SEJUSC), da Secretaria de Estado de Assistência Social (SEAS), da Secretaria Municipal

da Mulher, Assistênciacia Social e Cidadania (SEMMASC), Secretaria Municipal de Assistencia a

Saude (Consultório na Rua) e de organizações da sociedade civil, dentre elas Arquidiocese de Manaus,

3 https://www.facebook.com/WilsonLimaAM/videos/265975921070136/ 4 https://globoplay.globo.com/v/8435336/

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Pastoral do Povo de Rua, Pastoral do Migrante, Cáritas do Brasil, Cáritas de Manaus e Associação de

Redução de Danos no Amazonas - Ardam.

Na oportunidade a Pastoral do Povo de Rua e a Associação de Redução de Danos do

Amazonas informaram que a população em situação de rua que se encontra na Arena Amadeu Teixeira

foi atraída pelos anúncios realizados e que, apesar de receberem alimentação, estavam passando, mais

uma vez, por uma série de violações: não recebem e nem tem acesso a água potável; não possuem

acesso as instalações sanitárias, tendo que fazer suas necessidades fisiológicas no mato nas

proximidades; que por não acessarem banheiros não conseguem realizar higienização pessoal; que

ficam expostas às intempéries, sol e chuva e aglomeram-se em filas para receber alimentação.

No encontro, frise-se, realizado uma semana após a expedição da Recomendação, os

autores constataram a insuficiência das iniciativas adotadas pelo Poder Publico Estadual e Municipal

em prol da população em situação de rua, especialmente no que tange a acolhimento, informação

quanto aos riscos da Covid-19 e necessidade de proteção e oferta dos serviços necessários para evitar o

contágio, tais como higienização e equipamentos de proteção.

Na ocasião, receberam o Plano Emergencial da Secretaria de Assistência Social do

Estado, o qual trazia metas excessivamente genéricas, com prazos para implementação que já haviam

sido superados e descumpridos pelos próprios órgãos elaboradores. (DOC 03)

Diante do ocorrido, o Ministério Público do Trabalho, acompanhado de representante

da Pastoral do Povo de Rua realizou, na mesma data (01/04/2020), verificação na Arena Amadeu

Teixeira. (DOC.04)

Na oportunidade o que se percebeu foi a total insuficiência da iniciativa, e ao contrário

do que fora alardeado, submetia as pessoas que lá se encontravam a graves violações, tais como:

aglomeração em filas nos locais de distribuição de refeições, sem a observância da distância mínima

necessária a evitar o contágio; longas e demoradas filas para a realização de triagem, sendo a

capacidade de atendimento dentro da arena inferior à divulgada; ausência de local adequado para

proteção contra intempéries, estando a população que aguarda atendimento e que utiliza os serviços de

higienização (banho) e refeições desprotegida; ausência de oferta de banhos e uso dos sanitários pelas

pessoas que aguardam na área externa; trabalhadores (servidores e voluntários) sobrecarregados;

Num. 213597877 - Pág. 8Assinado eletronicamente por: LUIS FELIPE FERREIRA CAVALCANTE - 05/04/2020 15:40:17http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20040515401690300000209904938Número do documento: 20040515401690300000209904938

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atendimento realizado de forma que compromete a saúde e a segurança dos trabalhadores e dos

usuários; ausência de sinergia entre os entes públicos entre si e com as organizações da sociedade civil

atuantes na temática.

No dia seguinte, 02/04/2020, o MPT e a Pastoral do Povo de Rua realizaram

verificação no CECI-Aparecida, local em que o Município de Manaus, em parceria com a SEAS,

iniciou, no dia 01/04/2020, a oferta de apenas uma refeição (almoço) e higienização das mãos, com

capacidade para 250 pessoas, tão somente de segunda a sexta. Ou seja, sem qualquer tipo de

acolhimento com um teto para dormir, bem como sem acesso nos finais de semana (seriam dias de

jejum para a população em situação de rua?).

No local havia pouco movimento, tendo em vista ser recente a iniciativa. À ocasião,

foram feitas sugestões pontuais para facilitar o atendimento, evitar aglomerações e levar informação

adequada e acessível àquele público sobre prevenção à COVID-19, não servindo a entrega de panfletos

que estava sendo realizada. Foi relatado que estava sendo estudada a possibilidade de oferta de banhos,

mas que não possuíam mudas de roupas, nem kits de higiene e nem toalhas para serem utilizadas.

Em ato contínuo, no mesmo dia, foi realizada nova inspeção nas dependências da

Arena Amadeu Teixeira. Na oportunidade, constatou-se que houve melhorias pontuais e atendimento

parcial do recomendado verbalmente no dia anterior, no sentido de permitir o abrigamento

momentâneo das pessoas sob a marquise da Arena, ter sido disponibilizado água potável (um

bebedouro) e acesso ao banheiro químico. Em que pese isso, não eram ofertados copos descartáveis ou

garrafas para captação e consumo da água, o acesso ao banheiro era insuficiente, havia aglomeração de

pessoas em longas e demoradas filas para percepção da alimentação, sem manutenção de

distanciamento mínimo para evitar contágio, recebimento dos alimenos sem viabilizar a higienização

das mãos e ausência de orientação geral e adequada para prevenção à Covid-19. O número de

acolhidos dentro da Arena passou para 55 pessoas, somente público com maiores vulnerabilidades

epidemiológicas (ressaltando ainda que portadores de doenças infectocontagiosas, como tuberculose

ou mesmo o COVID19, estavam sem qualquer local para acolhimento). (DOC.05)

Em vista deste quadro de inércia, os autores realizaram nova reunião por

videoconferência no dia 03/04/2020, com a participação, além dos órgãos que estiveram na reunião

anterior, da Secretaria de Estado da Saúde (SUSAM), da Secretaria Municipal da Saúde (SEMSA) e do

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Comando Militar da Amazônia (CMA), convidado para informar se poderia oferecer suporte a ações

do Estado e do Município.

Mais uma vez, o MPF, o MPT e a DPU observaram a ausência de providências

necessárias a oferecer condições dignas à população em situação de rua no contexto atual de

agravamento da pandemia, notadamente no que diz respeito às soluções efetivas para o acolhimento

dessa população. Durante a videoconferência, a SEAS informou que tinha superestimado a capacidade

máxima da Arena Amadeu Teixeira e afirmou que no máximo conseguiriam atender 100 pessoas,

apenas as com maior grau de vulnerabilidade epidemiológica; que até o presente momento não possui

um lugar complementar para possibilitar o abrigamento, seja para pessoas com tuberculose ou com a

COVID-19, seja para o público restante, estimado em cerca de 2000 pessoas em situação de rua na

capital Manaus.

Ressalte-se que até mesmo o CMA se disponibilizou a apoiar as medidas para a

população em situação de rua na ocasião, sendo que foi informado durante a videoconferência pelo

representante do MPF, em contato com as agências da ONU (ACNUR e OIM), que estas poderiam

contribuir com medidas pontuais, como equipamentos de moradia necessários (barracas, entre outros),

dentro de suas possibilidades.

O Município, por sua vez informou que se encontra responsável pelo acolhimento de

mais de 500 venezuelanos da etnia Warao, não possuindo estrutura e nem equipe para acolher mais

pessoas (situação que já perdura desde 2017, ou seja, que não é novidade, e que em parte é fruto da

própria ausência de iniciativas por partes dos órgãos públicos no estímulo à geração de renda e

autonomia do povo Warao). Destacou que atende 25 pessoas, em sua maioria idosos, no Abrigo

Aminne Down Lindoso, mas que o mesmo já se encontra em sua capacidade máxima. Ou seja, o

município sequer apresentou proposta de nova estrutura de acolhimento (dormida, higiene e refeição,

ou seja, espaço de isolamento efetivo como recomendado pelo Ministério da Saúde), mesmo diante do

cenário caótico.

No que diz respeito aos demais serviços ofertados isoladamente pelo Município

(CENTRO POP) ou em conjunto com a SEAS (CECI DA APARECIDA), os mesmos não são

realizados diariamente, mas apenas durante os dias úteis da semana (repetindo-se a pergunta: fim de

semana é dia de jejum para pessoas em situação de rua?).

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Neste contexto, em que se propõe o acolhimento de 100 (cem) pessoas em situação de

rua pelo Estado (apenas os com maior vulnerabilidade triados), sem qualquer nova proposta pelo

município, e com uma estimativa de cerca de 2000 pessoas nesta situação, fácil é perceber que as

contas não fecham. Neste caso, as contas não fecharem dão como resultado certo mortes e mais

mortes, não só desta população, mas de todos os amazonenses. Explica-se em tópico separado, dada a

gravidade do tema.

2. DO IMINENTE COLAPSO DO SISTEMA DE SAÚDE AMAZONENSE. DAS MORTES

ANUNCIADAS

As pessoas em situação de rua encontram-se precocemente inseridas como um grupo

de risco devido à fragilidade de condições de alimentação e higiene, conforme será detalhado mais à

frente. Muitos na faixa dos 40 ou 50 anos já possuem características e fragilidades idênticas à

população idosa.

Isto significa que o contágio pela COVID-19, nesta população, será mais severo, pois

há índices maiores de comorbidades, o que se alia à omissão do Poder Público ou, no mínimo, à

adoção de medidas extremamente tímidas, incapazes de conter o caos que se anuncia, com a ausência

de possibilidade de isolamento e higienização adequada desta população, fatalmente trazendo mais

casos graves da pandemia para o SUS amazonense. Tal fato, como consequência, trará mais

necessidade de leitos e respiradores ocupados no Hospital de referência em Manaus, Delphina Aziz.

Estes leitos e respiradores são para toda a população amazonense, inclusive do interior do Estado,

como indígenas, quilombolas e ribeirinhos (uma vez que, segundo informações recebidas da SUSAM,

cada calha de rio teria um pólo-cidade com apenas 03 (três) respiradores disponíveis, sendo os casos

além deste número trazidos para a capital Manaus... que já está sem vagas para sua própria população).

Em síntese, a não prevenção com o isolamento social imediato, seja em qual

parcela da população for, acarretará mais casos graves, mais necessidade de respiradores, e

fatalmente muito mais mortes em toda a população amazonense. Esta é uma conta simples que

qualquer cidadão pode realizar, em especial em face do colapso iminente e certo da saúde pública no

Amazonas nos próximos dias (em clara explicação: colapso neste caso significa que não haverá vagas

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nos hospitais e respiradores suficientes a todos, e muitos de nós, nossos pais, amigos e irmãos mais ou

menos próximos, como as pessoas em situação de rua, morrerão por simples falta de tais vagas e

equipamentos).

Um detalhe importante: quem afirma isto da frase acima, não é o Ministério Público

ou a Defensoria Pública, mas o próprio Ministro da Saúde e o Governador do Estado do Amazonas.

Vejamos.

O Ministro da Saúde deu entrevista relatando o colapso iminente da saúde pública no

Amazonas há 02 dias (https://www.cnnbrasil.com.br/saude/2020/04/03/ministerio-da-saude-teme-que-

amazonas-seja-primeiro-estado-a-entrar-em-colapso).

O Governador do Estado, ontem (04/04), repetiu o mesmo fato, inclusive com

assertivas específicas e graves (ressaltou até que já foi contratada câmara frigorífica para colocar os

mortos pela COVID-19 no Hospital Delphina Aziz, dado o alto número de mortes esperadas e o

colapso iminente da saúde, não havendo sequer a possibilidade de velório ou despedida física dos

parentes e amigos diante do cenário de guerra anunciado)5.

Interessante ressaltar algumas falas do Governador no vídeo, as quais se esclarecem

por si mesmas:

1) 2min13s: "a partir de segunda-feira a polícia toda estará na rua para garantir as

medidas tomadas" (ou seja, fechar comércio e garantir que a população permaneça

em casa, exceto para situações essenciais)

2) 4min55s "daqui uma semana irá colapsar o sistema de saúde do AM"

3) 6min36 "os números da doença são muito incertos, não sabemos como ela vai se

comportar no estado do AM" ... "quanto mais as pessoas ficarem em casa, maior a

possibilidade de conter o vírus "

4) 14min00 "por isto temos alertado tanto as pessoas a ficarem em casa, para

5 https://www.youtube.com/watch?v=kMxMQBI15VI

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preservar o máximo de vida que pudermos"

5) 21min "fique em casa para evitar que o vírus se propague com mais rapidez”

O Chefe do Executivo ainda realizou live na data de ontem (04/04/2020), para

informar sobre o quadro da pandemia no Estado (vídeo em anexo). O Governador falou dos problemas

crescentes do novo coronavírus no Amazonas e destacou que “não há outro jeito de interromper a

cadeia de transmissão a não ser o isolamento domiciliar. Não existe, no mundo inteiro, nenhum outro

método eficaz, ainda”. Finalizou dizendo que em razão disso, e da proximidade do esgotamento do

sistema de saúde estará editando ainda no mesmo dia outras medidas mais restritivas para diminuir a

circulação de pessoas.

Ou seja, enquanto os representantes do Poder Público enfatizam e imploram à

população para ficar em casa, quase nada é feito por qualquer ente federativo para disponibilizar um

espaço seguro às pessoas em situação de rua. Ressalte-se: não se fala aqui de um hotel 05 estrelas, mas

de um mero espaço num ginásio, escola, igreja, ou seja o que for, com as distâncias adequadas, para

fins de isolamento social horizontal como preconizado pelo Ministro da Saúde, com a possibilidade de

alimentação, higienização e repouso noturno por um pequeno e emergencial período de tempo, de

semanas ou poucos meses.

Lembremos que grande parte das mortes na Itália ocorreu justamente por falta de

respiradores suficientes, ou seja, muitas pesssoas morriam simplesmente com falta de ar, por ausência

do equipamento que poderia salvá-las em face do gigantesco número de casos simultâneos.

A disponibilização de estruturas com alojamento, refeitório e instalações sanitárias

mostra-se de fundamental importância e deve ter em conta a heterogeneidade dessa população, sendo

recomendável, portanto, que haja espaços diversos para que se respeite essa característica (ou seja,

espaços específicos à população em situação de rua para homens, mulheres com crianças, idosos,

pessoas já com suspeita de infecção pelo COVID, etc). Ressalte-se, também, que nesta população se

encontram também migrantes, indígenas expulsos ou distantes de seus territórios natais e outros

públicos diversos.

Até este momento, contudo, apenas um local de abrigamento foi ofertado pelo Estado,

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com capacidade total absolutamente abaixo do que é necessário (segundo a estimativa, estão ofertando

acolhimento para 5% apenas da população em situação de rua, ou seja, 100 vagas para um público de

2000 pessoas) e nenhuma proposta foi apresentada pelo município para servir de abrigo.

Destaque-se que uma das medidas recomendadas aos entes públicos foi a identificação

de imóveis públicos ou privados ociosos que apresentem infraestrutura adequada para que possam ser

utilizados como moradia temporária em caráter urgente e imediato. Não houve, entretanto, qualquer

resposta quanto a sua adoção.

Assim, vê-se um quadro em que a populção em situação de rua em Manaus se

encontra sem qualquer possibilidade de proteger-se do contágio, o que é de extrema gravidade,

especialmente diante das notícias de iminente colapso do sistema público de saúde amazonense. Vale

ressaltar de novo: a população em situação de rua, deixada como está a sua própria sorte, em breve

contribuirá para a sobrecarga do sistema de saúde local, demandando leitos e equipamentos que a cada

minuto se tornam mais escassos.

Cabe ressaltar que foi realizado contato (telefônico, mensagens e aplicativos) destes

signatários com as assessorias diretas do Vice-Governador e do Prefeito de Manaus, por mais de uma

vez, ressaltando a urgência na adoção de medidas, mas sem resposta adequada.

Na data de ontem, em grupo de Whatsapp formado pelas Secretarias municipais e

estaduais envolvidas, sociedade civil e os autores da presente ação, foi encaminhada ontem

(04/04/2020) como tentativa derradeira de solução extrajudicial, a seguinte mensagem com perguntas

simples e objetivas (na verdade, uma síntese do que gostaríamos de respostas em face da

Recomendação expedida por DPU e MPF/AM mais de uma semana atrás):

Considerando que as respostas apresentadas SEMASC e SEAS a

RECOMENDAÇÃO LEGAL Nº 3/2020 (5º OFÍCIO/PR/AM e DRDH DPU/AM)

expedida no dia 24 de março de 2020 foram insuficientes;

Considerando as informações prestadas pelo Secretário de Saúde de Manaus,

na live transmitida ao vivo no dia 03.04.2020, dão conta da proximidade do

esgotamento do sistema de saúde na próxima semana e que o pico do surto de

coronavírus, no Amazonas, segundo estimativa da FVS-AM está previsto para

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a segunda semana de abril até a primeira quinzena de maio;

Considerando a fala do Exmo. Governador do Estado do Amazonas, em

entrevista transmitida ao vivo na rede CNN Brasil, na manhã do dia

04.04.2020, informando que : o sistema público de saúde do Amazonas não

possui condições de atender toda a população, que o sistema privado também

possui limitações, sendo duas unidades não possuem mais leitos; que acredita

que em breve o sistema atingirá o seu limite de atendimento; que o Estado

passa por dificuldades severas na obtenção de respiradores, devido ao contexto

de pandemia e práticas adotadas por outros países; que expedirá decreto que

aumenta a limitação de circulação de pessoas, no intuito de evitar que mais

pessoas se contaminem; que é necessário que o estado fale uma linguagem só

para atender a população de maneira adequada e salvar vidas;

CONSIDERANDO A GRAVIDADE DA SITUAÇÃO DA POPULAÇÃO EM

SITUAÇÃO DE RUA QUE SE ENCONTRA NO ENTORNO DA ARENA

AMADEU TEIXEIRA E ESPALHADA PELOS SEUS TERRITÓRIOS

(MAPEADOS PELOS ÓRGÃOS DE ASSISTÊNCIA);

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, MINISTÉRIO PÚBLICO DO

TRABALHO E A DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO NOTIFICA OS

REPRESENTANTES DAS SECRETARIAS SEMASC, SEJUSC, SEAS, SUSAM E

SEMSA A APRESENTAREM, COM URGÊNCIA, AINDA NA DATA DE HOJE

E DE MANEIRA SUSCINTA AS SEGUINTES INFORMAÇÕES:

1) Qual a capacidade máxima de atendimento no acolhimento dentro da Arena

Amadeu Teixeira?

2) Quantas pessoas já estão acolhidas e qual o perfil delas?

3) Qual é a previsão para preenchimento de todas as Vagas, a data limite para

funcionamento pleno?

4) o que está sendo feito ou será feito para acolhimento e isolamento de pessoas

em situação de rua já com sintomas/suspeita de covid19 ou doenças

infectocontagiosas?

5) No item anterior deverá ser informado o local de atendimento, resumo de

estrutura ofertada, capacidade máxima de atendimento. E previsão de início

dos serviços e data limite para funcionamento pleno?

6) O que está sendo feito ou será feito em relação ao acolhimento, dormida,

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banho, alimentação e higiene das pessoas em situação de rua do lado de fora

do Amadeu? número máximo de pessoas que podem ser atendidas? Qual a

data limite para funcionamento pleno?

7) o que está sendo feito ou será feito em relação às pessoas em situação de

rua do centro e outros locais de maior aglomeração? Em especial sobre local

para dormida, banho, alimentação e higiene? Foram pensadas e esta sendo

viabilizada soluções alternativas, tais como barracas em áreas de concentração

no centro da cidade (no porto? Proximidade da igreja matriz? Utilização da

estrutura do colégio militar? Na matriz?) Caso sim, informar o local, estrutura

que sera instalada, capacidade de atendimento e data para inicio do

atendimento e a data limite para funcionamento pleno?

CONSIDERANDO A ESPECIFICIDADE DA SITUAÇÃO GERADA PELA

PANDEMIA, A URGÊNCIA DA SITUAÇÃO VIVENCIADA

EXCEPCIONALMENTE AS RESPOSTAS DEVERÃO SER ENVIADAS POR

WHATSAPP, COMO GARANTIA DE UTILIZAÇÃO DE MEIO

TECNOLÓGICO QUE VIABILIZE A PRONTA RESPOSTA PELOS ÓRGÃOS.

Não houve qualquer resposta pelos entes citados.

Enfim, como forma de ampla transparência do cenário atual percebido pelos autores, e

de modo a auxiliar com o conhecimento do juízo, convém destacar que recebemos vídeos gravados

hoje, 05.04.2020, na Arena Amadeu Teixeira, enviados pela Pastoral do Povo de Rua. Nos registros,

percebe-se que houve algumas melhorias no atendimento da população em situação de rua que se

encontra na área externa da Arena, com a disponibilização de cinco barracas (colaboração do

Exército), banheiros químicos e cadeiras, mas ainda bastante insuficientes diante de todo cenário

apresentado. Não foi possível verificar material para higienização dos objetos de uso coletivo e nem

esclarecimentos sobre os cuidados que devem ser adotados para evitar a contaminação. Ainda assim,

permanecem todas as dúvidas quanto às demais pessoas, ou seja, aos cerca de 80% ou 90% da

população em situação de rua sem qualquer possibilidade de acolhimento (que, obviamente, é

voluntário, ou seja, somente serão acolhidos os que assim desejarem; contudo, o que se percebe é que

há um número muito maior de pessoas querendo acolhimento do que vagas disponíveis atualmente).

Tal situação de inércia do Poder Público, como é transparente, vem ocasionando já

muita apreensão por parte das pessoas em situação de rua, organizações e sociedade civil, com

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potencial contaminação em massa já ocorrendo nas ruas, e respectivas mortes associadas. Diante deste

cenário, o dano moral coletivo é totalmente demonstrado e merece ser acolhido pelo juízo em sede de

mérito final.

Desse modo, os autores veem-se compelidos a propor a presente ação, como a única

via capaz de mobilizar o Estado do Amazonas e o Município de Manaus para os direitos das pessoas

em situação de rua e evitar uma tragédia de proporções inimagináveis a essa população, tão

historicamente marginalizada.

3. DA LEGITIMIDADE. DA COMPETÊNCIA. DA POSSIBILIDADE DE LITISCONSÓRCIO

ATIVO

Em breve síntese, os signatários possuem plena legitimidade constitucional para a

defesa dos direitos aqui pleiteados. MPF e DPU em suas atuações amplas nos temas de cidadania,

ressaltando ainda a presença de migrantes e indígenas dentro desta população, e MPT especificamente

em face do agravamento das condições de vida de crianças e adolescentes em situação de trabalho

infantil e outros trabalhadores autônomos marcados pela pobreza extrema e ainda, pela necessidade de

garantir que os trabalhadores que realizam o atendimento da população em situação de rua, tenham

protegidas a sua saúde e segurança.

A competência federal também pode ser sinteticamente afirmada. Seja em face da

atuação tripartite dos entes federativos no tema da saúde pública, seja em face do cofinanciamento

federal das políticas públicas para as pessoas em situação de rua. Seja, enfim, em face das medidas

federais anunciadas de combate à pandemia.

O litisconsórcio ativo dos três entes também é amplamento aceito por doutrina e

jurisprudência, não demandando maiores esclarecimentos.

4. DO DIREITO SOCIAL À SAÚDE E À ASSISTÊNCIA SOCIAL.

A Constituição Federal elenca em seu artigo 6º, como direitos sociais, a saude e a

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assistência aos desamparados, integrantes dos direitos fundamentais disponíveis a todos e todas, no

território brasileiro.

Além disso, a Lei Orgânica da Assistência Social (Lei n.º 8.743/93) estabelece

normas destinadas a todos os entes federativos e tem por objetivo a proteção e defesa de direitos,

garantindo mínimos sociais e promovendo a universalização dos direitos sociais (art. 2º, incisos I, III e

parágrafo unico).

Ainda, a já referida Lei Orgânica da Assistência Social estabelece como competência

dos Municípios, em seu art. 15, a execução dos projetos de enfrentamento da pobreza (inciso III), o

atendimento as ações assistenciais de caráter de emergência (inciso IV) e a prestação dos serviços

socioassistenciais (inciso V). Vale lembrar que o Distrito Federal, ente federativo de natureza híbrida,

possui competências municipais e estaduais, nos termos do art. 32, §1º da CF/88.

Outrossim, a Política Nacional de Assistência Social tem como princípios a

universalização dos direitos sociais e a igualdade de direitos no acesso ao atendimento.

Ademais, estudo realizado na Universidade da Califórnia6 concluiu que condições

geriátricas que costumam afetar idosos de 70, 80 ou 90 anos são encontradas em pessoas sem teto por

volta da idade dos 58 anos. Ou seja, dadas as suas condições de vida, as pessoas em situação de rua

encontram-se precoce e preocupantemente inseridas como grupo de risco para o coronavírus.

Desse modo, além da situação biofisiológica, a população em situação de rua

encontra- se em extremo risco também em razão da impossibilidade de cumprimento das medidas

acauteladoras recomendadas pelo Ministério da Saude e pela Organização Mundial de Saude, ante a

ausência de domicílio próprio para o isolamento, da falta de acesso a água para lavar as mãos ou tomar

banho de modo a manter sua higiene pessoal de maneira apropriada, bem como da notória carência

nutricional.

Assim, considerando que, no atual cenário, é imprescindível que a higiene seja uma

prioridade individual e coletiva, como bem vem frisando o Ministério da Saude, urgindo uma

6 University of California – San Francisco. "Homeless people suffer geriatric conditions decades early, study shows."

ScienceDaily. Science Daily, 26 February 2016 https://www.sciencedaily.com/releases/2016/02/160226085720.html

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necessidade ainda maior de que se assegurem aos cidadãos em situação de rua o necessário para que

possam proceder sua higienização, garantindo minimamente o seu direito a saude nesse contexto

pandêmico.

Considerando também o impacto desproporcional esperado do coronavírus na

população em situação de rua, bem como o fundado receio de que, diante das recomendações de

isolamento social, os serviços voluntários de distribuição de alimentos conduzidos pela sociedade

civil sejam reduzidos ou suspensos, o que deve ocorrer também quanto ao volume de pequenas

ofertas em dinheiro ou alimentos recebidas a título de caridade pelas pessoas em situação de rua

que sobrevivem de coleta ("esmolas").

Conclui-se que devem ser tomadas medidas que reduzam ao máximo o risco a que as

pessoas em situação de rua estão submetidas, acreditando-se que a utilização de equipamentos

publicos que se encontrem temporariamente ociosos e possuam alguma estrutura sanitária

podem servir como alternativa para abrigar e permitir a higienização daqueles que se

encontram na rua e sem locais suficientes para higiene adequada, bem como para fornecimento

de alimentação adequada, em caráter temporário e emergencial.

Além disso, poderia ser utilizada como alternativa a requisição administrativa de

hotéis para abrigamento da população. Registra-se que tais espaços, por serem dotados de vários

quartos, evitariam até a aglomeração de pessoas, podendo a alimentação ser realizada por turnos de

pequenos grupos, no ambiente de refeição. Tal alternativa já fora adotada em alguns estados, como o

Amapá, consoante já explanado.

Desse modo, os pedidos que se seguirão ao final são prioritariamente para abarcar

pontos já expendidos nas Recomendações da DPU/AM e MPF/AM, com integral concordância

posterior do MPT/AM, como abrigamento, alimentação e higiene da população em situação de rua na

cidade de Manaus e região metropolitana, que engloba hoje metade da população do estado do

Amazonas, com estrutura de forma organizada para não configurar aglomeração de pessoas.

5. DA TUTELA DE URGÊNCIA EM CARÁTER LIMINAR

No caso em tela, estão presentes os requisitos para a concessão de tutela de urgência

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em caráter liminar (art. 300, caput e §2º do CPC). O art. 12 da Lei n. 7.347/85 caminha no mesmo

sentido: “Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão

sujeita a agravo”.

A probabilidade do direito desponta de toda a argumentação de mérito expendida nos

articulados antecedentes. Os fatos alegados constam da documentação juntada. Flagrantes são as

ilegalidades apontadas, e o risco de muitas mortes atual e iminente.

Ressalte-se que, no temas mortes, podem ser tratados dois pontos: 1) as mortes

inevitáveis e decorrentes de uma pandemia mundial que estão ocorrendo e ocorrerão, fruto de

caso fortuito ou força maior em que não há qualquer medida a ser tomada quanto a isto, exceto

as já mencionadas pelas autoridades sanitárias e médicas; 2) as mortes decorrentes da omissão,

inércia e lentidão do Poder Público em adotar medidas que o próprio Poder Público recomenda

a todos os seus cidadãos, como o isolamento horizontal, a higienização e a alimentação adequada,

mas que pouco ou nada faz para disponibilizá-las a uma parcela extremamente vulnerável, social

e epidemiologicamente, qual seja, as pessoas em situação de rua que, fatalmente, irão

sobrecarregar ainda mais o SUS e ocupar vagas e respiradores já insuficientes em caso de

permanência desta inércia, em síntese: o Poder Público fomentando o próprio colapso do sistema

de saúde, além das causas naturais e inevitáveis citadas no item 1). Tratamos nesta ação apenas

sobre o item 2).

Em um momento de declaração de situação de emergência na saude publica o zelo

com a população em situação de rua deve ser prestado de modo a respeitar seus direitos básicos e a

evitar aglomerações.

O perigo de dano é inconteste, vez que, não sendo imediatamente disponibilizados

locais reservados e adequados para essas pessoas (com alimentação, higiene e abrigo), elas correm

sério risco de contágio e disseminação do novo coronavírus, o que aumenta a cada dia no país7.

A medida pleiteada é absolutamente razoável, tanto em termos financeiros quanto de

factibilidade. Isto porque, como se requer o emprego de espaços já construídos e sem utilização no

7 Segundo dados de 4 de abril de 2020, existem 10.278 infectados em todos os estados e 431 mortos: https://oglobo.globo.

com/sociedade/coronavirus-numero-de-mortos-no-brasil-sobe-para-432-casos-confirmados-10278-24351975

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momento, não há que se ocupar a administração publica na contratação de quem quer que seja para

erguer local de abrigamento e as instalações sanitárias. Tudo que deve cuidar é de prover os insumos

de limpeza, alimentação e de vestuário se, e somente se, não os tiver em estoque, lembrando sempre

que algo do que será preciso já deve ter sido adquirido anteriormente a suspensão das aulas e dos

eventos esportivos, bastando redirecionar sua utilização. Ainda, que há campanhas fomentadas pelos

órgãos públicos e pela sociedade civil para aquisição de tais insumos no Amazonas, justamente para

este tema, como aqui pode ser visto:

https://www.acritica.com/channels/coronavirus/news/campanha-busca-arrecadar-roupas-

comida-e-materiais-para-moradores-de-rua

https://www.acritica.com/channels/coronavirus/news/arena-amadeu-teixeira-ja-recebe-

doacoes-para-moradores-de-rua-em-manaus

E enfim, que há uma gama de medidas em andamento para disponibilização de

renda, de recursos, bens, materiais, cestas básicas e afins, sendo criadas pelo governo federal e pelo

próprio governo do Amazonas, que podem suprir estas necessidades imediatas de uma população, ao

menos por algumas semanas e meses até o pico da contaminação acabar.

A considerar o tempo tomado pela burocracia, é difícil crer que a administração

publica seja capaz de providenciar todo o necessário em período razoável, o que expõe e agrava ainda

mais os riscos de um grupo de pessoas já extremamente vulnerável e fragilizado.

E, especificamente naquilo que toca aos custos, é inegável que a medida

recomendada pelo Ministério Público e pela Defensoria até mesmo do ponto de vista da

economicidade é mais adequada, considerando que os benefícios do abrigamento e possibilidade de

evitar o aumento de números de pessoas a ocuparem leitos de UTIs, com altíssimo custo, e onerando

ainda mais SUS (sem mencionar as mortes evitadas) em muito superam os custos do abrigamento,

higienização e alimentação aqui proposto.

Como já foi dito, há um universo em torno de duas mil pessoas sem moradia

adequada nas ruas de Manaus, contudo nem todos desejarão ficar nos espaços a serem disponibilizados

pelo Poder Público, parte deles pode ainda ter vínculos familiares e ter retornado a suas casas, outros

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permanecerão nas ruas em face de problemas comuns presentes nesta população, desde questões

mentais, até dependência de álcool e outras drogas.

Sendo assim, em termos práticos, poderíamos falar em provavelmente menos de

1000 (mil) pessoas que seriam abrigadas de maneira emergencial, para a prática do isolamento

horizontal recomendado pelo Ministério da Saúde e pelo próprio Governador do Estado, num

período de cerca de 02 ou 03 meses, ou menos até dependendo do avanço da pandemia.

Lembrando que sociedade civil, Exército e agências ONU já ofereceram apoio ao município e ao

Estado para a situação alarmante vivida.

Recorde-se, enfim, que o município de Manaus não ofertou ainda qualquer nova

estrutura de abrigamento, em que pese haver disponibilidade em ginásios, escolas e outros

espaços municipais atualmente sem uso e vazios, com estrutura para dormir, comer, higienizar

para esta população, limitando-se a expor medidas tímidas já em andamento, muito aquém do

necessário.

6. DA POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA SEM OITIVA DOS

ENTES PÚBLICOS

Embora o art. 12 da Lei da Ação Civil publica já preveja a possibilidade de

concessão de tutela de urgência sem oitiva prévia do ente publico, o art. 2º da Lei n. 8.437/92

menciona a necessidade de oitiva do representante legal da pessoa jurídica de direito publico antes da

concessão da tutela de urgência em caráter liminar:

Art. 2º No mandado de segurança coletivo e na ação civil publica, a

liminar será concedida, quando cabıvel, após a audiência do

representante judicial da pessoa jurıdica de direito publico, que deverá se

pronunciar no prazo de setenta e duas horas.

No entanto, a jurisprudência tem afastado a exigência de oitiva previa diante da

possibilidade de graves danos decorrentes da demora no cumprimento da liminar, uma vez observada a

referida norma.

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Talvez nunca antes na história do Judiciário brasileiro (apesar de parecer

exagero, pensamos assim de fato), uma situação ensejou tanto a liminar imediata quanto esta.

Vejamos:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCESSÃO DE

LIMINAR SEM OITIVA DO PODER PÚBLICO. ART. 2° DA LEI

8.437/1992. AUSÊNCIA

DE NULIDADE. 1. O STJ, em casos excepcionais, tem mitigado a

regra esboçada no art. 2º da Lei 8437/1992, aceitando a concessão da

Antecipação de Tutela sem a oitiva do poder público quando

presentes os requisitos legais para conceder medida liminar em Ação

Civil Pública. 2. No caso dos autos, não ficou comprovado qualquer

prejuízo ao agravante advindo do fato de não ter sido ouvido

previamente quando da concessão da medida liminar. 3. Agravo

Regimental não provido. (AgRg no Ag 1314453/RS, Rel. Ministro

HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/09/2010,

DJe 13/10/2010)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO

NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE

INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA.

LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROPOR

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TRATAMENTO DE SAÚDE. RAZÕES DO

AGRAVO QUE NÃO IMPUGNAM, ESPECIFICAMENTE, A

DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA 182/STJ. MENOR.

COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA VARA DA INFÂNCIA E DA

JUVENTUDE. CONCESSÃO DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS

DA TUTELA, SEM A PRÉVIA OITIVA DO PODER PÚBLICO.

POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ.

QUESTÃO DE MÉRITO AINDA NÃO JULGADA, EM ÚNICA OU

ÚLTIMA INSTÂNCIA, PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. EXAME.

IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 735/STF. REQUISITOS.

IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO, NA VIA ESPECIAL. SÚMULA

7/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. (...) V. A jurisprudência

do STJ, "em casos excepcionais, tem mitigado a regra esboçada no

art. 2º da Lei 8437/1992, aceitando a concessão da Antecipação de

Tutela sem a oitiva do poder público quando presentes os requisitos

legais para conceder medida liminar em Ação Civil Pública. (STJ,

AgRg no Ag 1.314.453/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,

SEGUNDA TURMA, DJe de 13/10/2010). (AgInt no AREsp

1238406/PE, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA

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TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe 27/06/2018);

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL

PÚBLICA. LIMINAR CONCEDIDA, EXCEPCIONALMENTE,

SEM OITIVA PRÉVIA DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO

PÚBLICO. ART. 2º DA LEI N. 8.437/1992. POSSIBILIDADE.

SÚMULA 83/STJ. 1. Cinge-se a controvérsia dos autos se é possível a

concessão de liminar, sem oitiva previa do município, nos casos de ação

civil publica. 2. O entendimento jurisprudencial do Superior

Tribunal de Justiça permite, excepcionalmente, em especial para

resguardar bens maiores, a possibilidade de concessão de liminar,

sem prévia oitiva da pessoa jurídica de direito público, quando

presentes os requisitos legais para a concessão de medida liminar em

ação civil pública. Precedentes. AgRg no REsp 1.372.950/PB, Rel.

Min. HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA; AgRg no Ag

1.314.453/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA

TURMA;REsp 1.018.614/PR, Rel. Min. ELIANA CALMON,

SEGUNDA TURMA; REsp 439.833/SP, Rel. Min. DENISE

ARRUDA, PRIMEIRA TURMA. 3. A iterativa jurisprudência desta

Corte é no sentido de que, para analisar os critérios adotados pela

instância ordinária que ensejaram a concessão ou não da liminar ou da

antecipação dos efeitos da tutela, é necessário o reexame dos elementos

probatórios, o que não é possível em recurso especial, dado o óbice da

Sumula 7 desta Corte. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no

AREsp: 580269 SE 2014/0231638-3, Relator: Ministro HUMBERTO

MARTINS, Data de Julgamento: 06/11/2014, T2 – SEGUNDA TURMA,

Data de Publicação: DJe 17/11/2014)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. PRESENÇA DOS REQUISITOS

ENSEJADORES DA MEDIDA. ILEGALIDADE NÃO

CONFIGURADA. LIVRE CONVENCIMENTO DO JULGADOR.

RECURSO SECUNDUM EVENTUM LITIS. CONCESSÃO DE

LIMINAR SEM OITIVA DO PODER PÚBLICO.

AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. 1 - O agravo de instrumento é recurso

secundum eventum litis, devendo se limitar a atacar o que restou

soberanamente decidido pelo ato agravado, não sendo lícito, dessa

forma, antecipar-se incontinente ao exame da questão de fundo,

cabendo ao relator analisar, unicamente, o acerto ou desacerto da decisão

ferreteada. 2 - Os critérios de aferição para a antecipação da tutela estão

na faculdade do julgador que, exercitando o seu livre convencimento,

decide sobre a conveniência ou não do seu deferimento, observados os

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requisitos do artigo 273 do Código de Processo Civil. 3 - Não é ilegal a

decisão judicial proferida na ação civil pública sem a audiência do

representante judicial da pessoa jurídica de direito público, pois tal

ordem encontra-se mitigada no nosso ordenamento jurídico em face

da possibilidade de ocorrer graves danos decorrentes da demora no

cumprimento da liminar, mormente se há nos autos provas

suficientemente fortes. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO

E DESPROVIDO. (TJGO, AGRAVO DE INSTRUMENTO 210629-

72.2013.8.09.0000, Rel. DES. NORIVAL SANTOME, 6ª CA MARA

CIVEL, julgado em 18/02/2014, DJe 1494 de 27/02/2014)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO O CIVIL PÚBLICA.

PERMUTA DE IMÓVEIS. LEI MUNICIPAL Nº 1483/2008.

PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE OITIVA PRÉVIA DO ENTE

PÚBLICO. VIOLAÇÃO DO ART. 2º DA LEI Nº8437/92. AUSÊNCIA

DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO REPRESENTANTE LEGAL DO

MINISÉRIO PÚBLICO. APRESENTAÇÃO DAS CONTRARRAZÕES

ATEMPADAMENTE. NULIDADE NÃO CONFIGURADA.

DECISÃO ULTRA PETITA CONFIGURADA. I - Não é ilegal a

decisão judicial proferida na ação civil pública sem a audiência do

representante judicial da pessoa jurídica de direito público para

pronunciamento no prazo de setenta e duas (72) horas, pois tal

ordem encontra-se mitigada no nosso ordenamento jurídico em face

da possibilidade de ocorrer graves danos decorrentes da demora no

cumprimento da liminar, mormente se há nos autos provas

suficientemente fortes. II – É de se rejeitar a arguição de nulidade de

intimação do órgão ministerial ante a ausência de intimação pessoal se a

sua representante legal ofertou, dentro do prazo legal, a peça de defesa,

fato que supriu a suposta falha sem que houvesse prejuízo a quaisquer

das partes. III- Em sendo a decisão recorrida proferida além da

quantificação indicada na petição inicial pelo autor, deve-se reconhecer a

sua nulidade em relação ao excesso, cabendo ao órgão recursal extirpá-

lo, adequando-a ao pleito inicial. AGRAVO DE INSTRUMENTO

CONHECIDO E PROVIDO. (TJGO, AGRAVO DE

INSTRUMENTO 260359-57.2010.8.09.0000, Rel. DES. JEOVÁ

SARDINHA DE MORAES, 6ª CÂMARA CÍVEL, julgado em

05/04/2011, DJe 800 de 14/04/2011)

7. DOS PEDIDOS

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Diante do exposto, requerem:

a) A observação das PRERROGATIVAS dos membros do Ministério Público e da

Defensoria Publica, reconhecendo expressamente, ainda, a sua legitimação ad causam;

b) A DISPENSA do adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e

outros encargos, respeitando o bom vezo do artigo 18 da Lei nº 7.347/85;

c) A concessão de TUTELA DE URGÊNCIA EM CARÁTER LIMINAR para o fim

de, sob pena de multa de R$50.000,00 (cinquenta mil reais) por dia de descumprimento de cada item,

cumuladamente, solicitando desde já a incidência de multa sobre o patrimônio pessoal dos gestores

municipal e estadual em caso de recalcitrância no cumprimento da medida judicial determinada, bem

como no mesmo caso, bloqueio de publicidade institucional não emergencial e sequestro de verbas

para publicidade institucional dos dois entes federativos, se necessário, a Prefeitura de Manaus e o

Estado do Amazonas, de maneira imediata atuem no sentido de:

c.1) disponibilizar estruturas públicas esportivas ou educacionais, ou qualquer outro

equipamento público sem uso em razão da pandemia (ou ainda requisição administrativa de hotéis,

como já adotado em outros locais), como pontos de alojamento temporário com a disponibilização de

alimentação e higiene, para toda a população em situação de rua de Manaus e entorno que assim tenha

interesse (cerca de 2000 pessoas no total, mas com provável número inferior a serem acolhidos,

considerando os que não desejam abrigamento ou já conseguiram isolamento horizontal em outros

locais), até que se encerre definitivamente a decretação do Estado de emergência e/ou calamidade no

Amazonas, sendo os locais, caso possível, próximos aos territórios onde se encontram parcela

considerável das pessoas em situação de rua, já mapeados pelas secretarias de assistência social;

c.2) Nos locais disponibilizados para atendimento seja realizada a divisão adequada

entre os espaços, conforme as recomendações dos órgãos de saúde, adotando-se assim todas as

cautelas necessárias para se evitar aglomeração de pessoas;

c.3) Disponibilizar em todos os equipamentos, serviços e locais que atendam à

população em situação de rua, espaço específico para as pessoas que se enquadram em grupo de risco

da Covid-19 (pessoas idosas, gestantes e pessoas com doenças crônicas, imunossuprimidas,

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respiratórias e outros comorbidades preexistentes que possam conduzir a um agravamento do estado

geral de saúde a partir do contágio, com especial atenção para diabetes, tuberculose, doenças renais,

HIV e infecções), bem como com atenção especial às crianças, já identificadas no espaço externo da

Arena Amadeu Teixeira;

c.4) Disponibilizar local apartado para garantir o isolamento das pessoas em situação

de rua que apresentem suspeita de contaminação pelo COVID-19 ou apresente a doença em grau leve e

não precise de internação hospitalar;

c.5) Disponibilizar aos servidores, terceirizados e demais colaboradores que atendam

a população em situação de rua equipamentos de proteção individual (EPIs) e material para

higienização das mãos, adequados a diminuir o risco de contágio, de acordo com o Protocolo de

Manejo Clínico para o Novo corona vírus (2019-nCoV), expedido pelo Ministério da Saúde;

c.6) Promover a vacinação contra gripe dos usuários e funcionários dos

equipamentos socioassistenciais destinados às pessoas em situação de rua;

c.7) Disponibilizar pontos de água potável nos locais de maior concentração de

população em situação de rua;

c.8) Franquear pronto acesso aos banheiros públicos já existentes e implantem outros

sanitários para uso público, ao menos, nas proximidades dos locais referidos, com a presença de

vigilante em cada um deles;

c.9. Evitar, sob quaisquer circunstâncias, aglomerações das pessoas em situação de

rua no momento da distribuição de alimentos;

c.10) Promover a avaliação cotidiana dos processos de atendimento, considerando as

mudanças constantes no combate e prevenção à pandemia, para assegurar que a oferta dos serviços se

dê mediante condições que garantam a segurança e saúde dos profissionais e dos usuários, adotando

medidas de prevenção, cautela e redução do risco de transmissão, encaminhando resposta imediata

sobre o cumprimento da decisão liminar, as medidas adotadas, e relatórios semanais das medidas

adotadas no tema da população em situação de rua a este juízo federal, até o fim do estado de

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emergência.e/ou calamidade no estado do Amazonase no município de Manaus;

d) Citar a parte requerida para, nos termos do Código de Processo Civil e da Lei

7.347/1985, adotar as medidas que reputar convenientes;

e) Ao final:

e.1) julgar PROCEDENTES os pedidos formulados, confirmando-se assim os

pleitos liminares acima expostos;

e.2) Determinar a construção de um plano conjunto entre município de Manaus,

Estado do Amazonas e União, voltado à população em situação de rua, de combate a pandemias e

situações de calamidades / emergências, em diálogo com a sociedade civil, em especial o Comitê de

Políticas Públicas para a Atenção à População em Situação de Rua já existente e suas entidades

participantes, no prazo de 90 dias;

e.3) condenar o município de Manaus e o Estado do Amazonas ao pagamento de 02

(dois) milhões de reais (um milhão cada) em danos morais coletivos, considerando a inércia até agora

apresentada, a apreensão coletiva gerada, e as potenciais contaminações e mortes já em andamento

decorrentes da omissão, que só será possível ter noção maior após a passagem desta crise de

proporções ainda desconhecidas; referido valor deverá ser destinado a uma conta específica da Justiça

Federal, e analisada a sua forma de destinação às políticas para pessoas em situação de rua em

conjunto entre Estado, Município de Manaus e Comitê de Políticas Públicas para a Atenção

à População em Situação de Rua, por meio de projetos específicos a serem apresentados ao juízo, com

participação do Ministério Público e da Defensoria Pública no acompanhamento;

Dão a causa o valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais).

Termos em que,

Pedem deferimento.

Manaus, 5 de abril de 2020.

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Page 30: PROCESSO: 1006056-69.2020.4.01.3200 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA … · 05/04/2020 Número: 1006056-69.2020.4.01.3200 Classe: AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL Órgão julgador: 3ª Vara Federal

Fernando Merloto Soave

Procurador da República

Alzira Melo Costa

Procuradora do Trabalho

Luís Felipe Ferreira Cavalcante

Defensor Público Federal

Num. 213597877 - Pág. 29Assinado eletronicamente por: LUIS FELIPE FERREIRA CAVALCANTE - 05/04/2020 15:40:17http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20040515401690300000209904938Número do documento: 20040515401690300000209904938