Upload
maria-luisa-lobo
View
1.209
Download
3
Embed Size (px)
Citation preview
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 1
I - Tipos de acção, formas de processo e providências cautelares
Caso I
1. Aníbal comprou na loja “FNAT”, no Porto, uma televisão da conhecida marca
“XPTO”, pelo valor de €2.500,00.
TEMA: TIPOS DE ACÇÕES E FORMAS DE PROCESSO
a) Passado um tempo, Aníbal verifica que a televisão não tem as características
que lhe foram asseguradas pelo Vendedor e instaura uma acção de anulação
do contrato, com fundamento em erro, no Tribunal cível do Porto. Qual o tipo
de acção e a respectiva forma de processo?
Tipo de Acção
Nos termos do art. 4º/1 CPC podem existir dois tipos de acções: acções declarativas e
acções executivas (pressupõe a existência de um título executivo – art. 45º e ss. CPC)
Nos termos das alíneas constantes do nº2 do art. 4º CPC as acções declarativas
podem ser: de simples apreciação (al. a), de condenação (al. b) e constitutivas (al. c).
Uma vez que no presente caso não existe nenhum título executivo, não estamos face
a uma acção executiva. Deste modo é necessário saber que tipo de acção
declarativa é que está em causa no presente caso.
Em regra, as acções declarativas constitutivas visam o exercício de direitos
potestativos, isto é o autor pretende obter, com a coadjuvação da autoridade
judicial, um efeito jurídico novo, que altera a esfera jurídica do demandado,
independentemente da vontade deste. Sendo que a produção de efeitos da
anulação dependem da declaração de anulação pelo Tribunal, as acções de
anulação são acções declarativas constitutivas, nos termos do art. 4º/1 e art. 4º/2 al. c)
CPC.
NOTA1: nas acções de declaração de nulidade o tribunal limita-se a declarar a
nulidade, ao contrário do sucede nas acções de simples apreciação em que sendo o
negócio nulo tal não produz qualquer efeito.
NOTA2: A anulação de um negócio pode ser acompanhada da restituição daquilo
que já foi pago. Daqui resultam as seguintes teorias:
A restituição do preço que já foi pago é uma acção declarativa de
condenação
Prof. Maria dos Prazeres Beleza: considera que a restituição do preço que já foi
pago não é uma acção declarativa de condenação, mas sim uma
consequências da acção declarativa constitutiva, ou seja da acção de
anulação. A restituição do preço é algo que resulta da lei não sendo
necessário autonomizar o pedido.
Hipóteses Práticas de Processo Civil – Prof. Rita Gouveia
2012/2013
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 2
Forma do Processo
Em primeiro lugar é necessário determinar qual o valor da causa, pelo que se terá de
recorrer ao art. 305º e ss CPC.
Nos termos do art. 305º/1 CPC ‘’A toda a causa deve ser atribuído um valor certo (…)
o qual representa a utilidade económica imediata do pedido’’. A importância da
determinação do valor da causa, tal como é referido no nº2 do art. 305º CPC, assenta
em através desta se determinar qual o tribunal competente, qual a forma de processo
aplicável e a relação da causa com a alçada do tribunal.
Nos termos do art. 306º CPC consagram-se os critérios gerais para a fixação do valor,
salvo se se aplicar um critério especial.
Ora, no presente caso estamos face a uma acção de declaração de anulação de
um contrato, pelo que o art. 310º/1 CPC determina que ‘’Quando a acção tiver por
objecto a (…) validade (…) de um acto jurídico, atender-se-á ao valor do acto
determinado pelo preço ou estipulado pelas partes’’. Deste modo sendo o valor da
televisão de €2.500,00 o valor da causa será este.
Determinado o valor da causa (€2.500,00) é necessário determinar qual a forma de
processo aplicável. Para tal é necessário recorrer às normas constantes do art. 460º e ss
CPC e ao art. 31º da LOFTJ 2008
Nos termos do art. 460º o processo pode ser comum ou especial. Nos termos do art.
461º e 462º o processo comum pode ser ordinário, sumário ou sumaríssimo. Partindo do
princípio que não existe nenhum processo especial, é necessário determinar qual a
forma de processo comum é que se encontra em causa.
Nos termos do art. 31º da LOFTJ 2008 a alçada do Tribunal da Relação é de € 30. 000,
00 e a alçada dos Tribunais de 1ª Instância de € 5. 000, 00. Ora, sendo o valor da causa
€2.500,00 exclui-se a possibilidade de ser processo comum ordinário, uma vez que o
valor da causa é inferior à alçada do Tribunal da Relação. Sendo o valor da acção
inferior ao valor da alçada dos Tribunais de 1ª Instância (critério do valor) e não se
enquadrando em nenhum dos objectos presentes no art. 462º CPC (critério do
objecto) exclui-se a possibilidade de ser processo comum sumaríssimo. Deste modo, no
presente caso estamos face ao processo comum ordinário.
Analisada está questão do ponto de vista do processo comum, é necessário atender
que ainda existe o Regime do Processo Civil Experimental, que é um processo especial.
Este Regime do Processo Civil Experimental foi consagrado em 2006 pelo legislador e
aplica-se às acções declarativas civis comuns (ordinário, sumário e sumaríssimo) e às
acções especiais (acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias
emergentes dos contratos – DL 269/98, de 1 de Setembro).
Nos termos do art. 21º e 22º do Regime do Processo Civil Experimental consagra-se que
este regime só se aplica aos Tribunais que forem determinados por Portaria, sendo que
para o efeito existem duas Portarias a regular a sua aplicação no espaço: a Portaria
955/2006 consagra que este regime se aplica aos tribunais de Almada, Porto e Seixal; a
Portaria 115-C/2001 consagra que este regime se aplica aos tribunais das comarcas do
Barreiro e de Matosinhos e nas varas cíveis do Tribunal da Comarca do Porto. Deste
modo, o Regime do Processo Civil Experimental só se aplica nos casos consagrados
nas Portarias referidas, sendo que nos restantes casos aplica-se o Processo Civil
Comum.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 3
Em suma, tratando-se de uma acção declarativa comum segue-se o processo comum
ordinário nos termos do art. 460º a 462º do CPC; se se tratasse de um tribunal
abrangido pela área de incidência das portarias aplicar-se-ia o Regime do Processo
Civil Experimental.
b) Para pagamento da televisão, Aníbal entrega um cheque, que foi devolvido
pelo Banco por falta de provisão. Que meios tem a FNAT à sua disposição para
obter o efectivo pagamento do preço?
Tipo de Acção
Da conjugação do art. 2º/2 e do art. 4º do CPC resultam duas coisas: primeiro, quanto
à causa de pedir, esta assenta no contrato de compra e venda de onde emerge o
contrato; segundo, quanto ao pedido, este assenta na condenação do réu ao
pagamento do preço.
Nos termos do art. 4º/1 CPC as acções podem ser declarativas ou executivas. Quanto
às acções executivas, da conjugação do referido artigo com o art. 4º/3 CPC, resulta
que tais pressupõe a existência de um título executivo. Da conjugação do art. 45º com
o art. 46º/1 al. c) CPC resulta que o cheque é um título executivo.
Embora tal não seja obrigatório, a verdade, é que é mais vantajoso à FNAT intentar
primeiro uma acção de condenação (art. 4º/1 e art. 4º/2 al. b) CPC) e só depois uma
acção executiva, tal porque as acções declarativas visam reconhecer a existência do
direito. Depois é necessário também considerar a matéria das custa.
Entende-se por acção declarativa de condenação, nos termos do art. 4º/2 al. b) CPC,
a situação em que o autor ou requente, arrogando-se a titularidade dum direito que
afirma estar a ser violado pelo réu, pretende que se declare a existência e a violação
do direito, e se determine ao reu a realização da prestação (em regra, um acção,
mas podendo bem ser uma abstenção ou uma omissão) destinada a reintegrar o
direito violado ou a reparar de outro modo a falta cometida.
Nos termos do art. 446º/2 CPC entende-se que dá causa às custas do processo a parte
vencida, na proposição da acção. Contudo, existe uma excepção tal, excepção
essa consagra no art. 449º CPC.
Nos termos do art. 449º/1 CPC consagra-se a responsabilidade do autor pelas custas
quando (1) o réu não tenha dado causa à acção e (2) o réu não conteste à acção.
É necessário ainda atender ao disposto no art. 449º/2 al. c) CPC que entende que o
réu não deu causa à acção ‘’Quando o autor, munido de um título com manifesta
força executiva, recorra ao processo de declaração’’. Esta norma aplica-se ao caso
concreto. É importante salienar que quando esta norma se refere a ‘’um título com
manifesta força executiva’’ não faz sentido que seja uma sentença, uma vez que o
autor já tem uma sentença em mãos, pelo que se trata de um título extrajudicial
(cheque).
Em suma, o autor terá duas possibilidades: poderá intentar uma acção executiva nos
termos do art. 4º/1, 4º/3, 45º e 46º/1 al. c) do CPC; ou poderá intentar uma acção
declarativa de condenação nos termos do art. 4º/1 e 4º/2 al. b) CPC.
NOTA1: Nos termos do art. 879º al. c) CC, Aníbal incumpriu um dos efeitos essenciais da
compra e venda que assenta na obrigação de pagamento do preço.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 4
NOTA2: O emitir de um cheque sem provisão, em certos casos, pode ser considerado
um crime. Deste modo é necessário atender ao art. 11º do Regime Penal do Cheque.
Em Processo Penal, nos artigos 71º e 72º do Código de Processo Penal, existe o Princípio
da Adesão que assenta no facto de se sofrendo um dano que decorreu da prática de
um crime, em princípio, em Processo Penal, deve fazer-se o pedido de indemnização.
Deste modo, de acordo com o Regime Penal do Cheque o pedido teria de ser
deduzido no Processo Penal.
Forma de Processo
Nos termos do art. 460º CPC consagram-se os tipos de formas de processo, podendo
este ser comum ou especial. O processo comum só se aplica se não existir nenhum
processo especial.
Ora, existe um processo especial para as acções especiais de cumprimento de
obrigações pecuniárias emergentes de contratos constante do Decreto Lei 269/98.
Deste modo, não se irá aplicar o processo comum mas sim o processo especial nos
termos do art. 460º/1 e 2º CPC.
Nos termos do art. 1º do Regime da Acção Declarativa Especial para Cumprimento de
Obrigações Pecuniárias emergentes de Contratos consagra-se que este regime se
aplica a ‘’procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações
pecuniários emergentes de contratos de valor não superior a € 15. 000, 00. No presente
caso, uma vez que se está face a uma quantia no valor de €2.500,00 pode-se aplicar
este regime.
Necessário é atender ao artigo 7º deste Regime, constante em Anexo, que consagra a
Injunção, que tem como propósito dar força executiva, podendo ser usada em duas
situações distintas (situações a que se refere o art. 1º do regime que se está a analisar
e situações de obrigações emergentes de transacções comerciais).
Deste modo, pelo regime da injunção, e de acordo com o art. 7º conjugado com o
art. 1º do Regime em análise o autor terá duas possibilidades: ou intenta uma acção
declarativa especial (art. 1º do Regime), ou intenta uma acção, através do regime da
injunção, ficando a possuir um título executivo (art. 7º do Anexo).
Em suma, existem três soluções possíveis:
1. Pelo artigo 460º/1 e 2 utiliza-se o processo especial e remete-se para o Decreto-
Lei 269/98 e utiliza-se o seu art. 1º
2. Pelo artigo 460º/1 e 2 utiliza-se o processo especial e remete-se para o Decreto
Lei 269/98 e recorre-se ao art. 7º, constante em Anexo.
3. Pelo artigo 460º/1 e 2 utiliza-se o processo especial e remete-se para o Regime
do Processo Cvil Experimental e recorrer-se ao seu art. 1º (‘’acções especiais
para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos’’).
NOTA: ocorre uma remissão do art. 4º/2 al. b) CPC para a Lei dos Julgados de Paz.
Contudo, a aplicação da Lei dos Julgados de Paz fica excluída pelo artigo 9º/1 al. a)
em que, quanto à competência destes, eles serão competentes para decidir ‘’Acções
destinadas a efectivar o cumprimento de obrigações, com excepção das que
tenham por objecto prestação pecuniária’’.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 5
c) No caso de ter optado pela acção declarativa, qual o tipo de acção e forma
de processo adequadas?
Tipo de Acção
Exactamente a mesma solução dada para a resposta na alínea b.
Forma de Processo
Em primeiro lugar é necessário determinar qual o valor da causa, pelo que se terá de
recorrer ao art. 305º e ss CPC.
Nos termos do art. 305º/1 CPC ‘’A toda a causa deve ser atribuído um valor certo (…)
o qual representa a utilidade económica imediata do pedido’’. A importância da
determinação do valor da causa, tal como é referido no nº2 do art. 305º CPC, assenta
em através desta se determinar qual o tribunal competente, qual a forma de processo
aplicável e a relação da causa com a alçada do tribunal.
Nos termos do art. 306º CPC consagram-se os critérios gerais para a fixação do valor,
salvo se se aplicar um critério especial.
Ora, no presente caso estamos face a uma acção de declaração de anulação de
um contrato, pelo que o art. 310º/1 CPC determina que ‘’Quando a acção tiver por
objecto a (…) validade (…) de um acto jurídico, atender-se-á ao valor do acto
determinado pelo preço ou estipulado pelas partes’’. Deste modo sendo o valor da
televisão de €2.500,00 o valor da causa será este.
Determinado o valor da causa (€2.500,00) é necessário determinar qual a forma de
processo aplicável. Para tal é necessário recorrer às normas constantes do art. 460º e ss
CPC e ao art. 31º da LOFTJ 2008
Nos termos do art. 460º o processo pode ser comum ou especial. Nos termos do art.
461º e 462º o processo comum pode ser ordinário, sumário ou sumaríssimo.
Nos termos do art. 31º da LOFTJ 2008 a alçada do Tribunal da Relação é de € 30. 000,
00 e a alçada dos Tribunais de 1ª Instância de € 5. 000, 00. Ora, sendo o valor da causa
€2.500,00 exclui-se a possibilidade de ser processo comum ordinário, uma vez que o
valor da causa é inferior à alçada do Tribunal da Relação. Sendo o valor da acção
inferior ao valor da alçada dos Tribunais de 1ª Instância (critério do valor), mas
enquadrando-se num dos objectos presentes no art. 462º CPC, ou seja no
cumprimento de obrigações pecuniárias (critério do objecto) exclui-se a possibilidade
de ser processo comum sumário, sendo por isso um processo comum sumaríssimo.
Contudo, uma vez que existe um processo especial não se poderia aplicar o processo
comum, contudo existe uma excepção a este ‘’princípio’’.
Nos termos do art. 449º/2 al. d) CPC consagra-se que quando o autor tenha a
possibilidade de (1) propor acção declarativa especial para cumprimento de
obrigações pecuniárias, (2) recorrer a processo de injunção, poderá optar pelo
recurso ao processo de declaração ‘’comum’’.
Prof. Rita Gouveia: é difícil entender a norma do art. 449º/2 al. d) CPC, havendo
autores que defendem que esta norma só se aplica quando não se escolhem
injunções; enquanto outros autores defendem que o art. 460º CPC foi derrogado desta
norma.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 6
d) Se o preço da televisão fosse de €30500,00 a sua resposta seria a mesma?
Nos termos do art. 460º CPC consagram-se os tipos de formas de processo, podendo
este ser comum ou especial. O processo comum só se aplica se não existir nenhum
processo especial.
Ora, existe um processo especial para as acções especiais de cumprimento de
obrigações pecuniárias emergentes de contratos constante do Decreto Lei 269/98.
Deste modo, não se irá aplicar o processo comum mas sim o processo especial nos
termos do art. 460º/1 e 2º CPC.
Nos termos do art. 1º do Regime da Acção Declarativa Especial para Cumprimento de
Obrigações Pecuniárias emergentes de Contratos consagra-se que este regime se
aplica a ‘’procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações
pecuniários emergentes de contratos de valor não superior a € 15. 000, 00. No presente
caso, uma vez que se está face a uma quantia no valor de €30500,00 não se pode
aplicar este regime.
Necessário é atender ao artigo 7º deste Regime, constante em Anexo, que consagra a
Injunção, que tem como propósito dar força executiva, podendo ser usada em duas
situações distintas (situações a que se refere o art. 1º do regime que se está a analisar
e situações de obrigações emergentes de transacções comerciais). Para se poder
aplicar o regime da injunção a situações de obrigações emergentes de transacções
comerciais é necessário considerar o Decreto Lei 32/2003, de 17 de Setembro.
Aníbal seria um consumidor (o decreto lei não define consumidor, pelo que é
necessário recorrer à noção consagrada na Lei 24/96, de 31 de Julho), contudo não se
pode aplicar, neste caso, o regime da injunção uma vez que esta aplicação às
transacções comerciais encontram-se excluídas quando se trate de operações
realizadas por consumidores.
Deste modo, sendo Aníbal um consumidor, a FNAT (credor) não poderá cobrar a
dívida através do recurso à injunção constante do art. 7º do Anexo do DL 269/98,
porque (1) o valor excede aos € 15. 000, 00 (2) e não se trata de uma transacção
comercial.
É necessário agora atender ao facto que ainda existe o Regime do Processo Civil
Experimental, que é um processo especial.
Este Regime do Processo Civil Experimental foi consagrado em 2006 pelo legislador e
aplica-se às acções declarativas civis comuns (ordinário, sumário e sumaríssimo) e às
acções especiais (acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias
emergentes dos contratos – DL 269/98, de 1 de Setembro).
Nos termos do art. 21º e 22º do Regime do Processo Civil Experimental consagra-se que
este regime só se aplica aos Tribunais que forem determinados por Portaria, sendo que
para o efeito existem duas Portarias a regular a sua aplicação no espaço: a Portaria
955/2006 consagra que este regime se aplica aos tribunais de Almada, Porto e Seixal; a
Portaria 115-C/2001 consagra que este regime se aplica aos tribunais das comarcas do
Barreiro e de Matosinhos e nas varas cíveis do Tribunal da Comarca do Porto. Deste
modo, o Regime do Processo Civil Experimental só se aplica nos casos consagrados
nas Portarias referidas, sendo que nos restantes casos aplica-se o Processo Civil
Comum.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 7
Quanto aos Julgados de Paz, resulta do art. 8º da sua Lei conjugado com o art. 31º da
LOFTJ 2008 que a sua competência aplica-se a questões cujo valor não exceda € 5.
000, 00, pelo que no presente caso também não se poderia aplicar.
Não existindo nenhuma forma de processo especial é necessário atender ao processo
comum.
Em primeiro lugar é necessário determinar qual o valor da causa, pelo que se terá de
recorrer ao art. 305º e ss CPC.
Nos termos do art. 305º/1 CPC ‘’A toda a causa deve ser atribuído um valor certo (…)
o qual representa a utilidade económica imediata do pedido’’. A importância da
determinação do valor da causa, tal como é referido no nº2 do art. 305º CPC, assenta
em através desta se determinar qual o tribunal competente, qual a forma de processo
aplicável e a relação da causa com a alçada do tribunal.
Nos termos do art. 306º CPC consagram-se os critérios gerais para a fixação do valor,
salvo se se aplicar um critério especial.
Ora, no presente caso estamos face a uma acção de declaração de anulação de
um contrato, pelo que o art. 310º/1 CPC determina que ‘’Quando a acção tiver por
objecto a (…) cumprimento (…) de um acto jurídico, atender-se-á ao valor do acto
determinado pelo preço ou estipulado pelas partes’’. Deste modo sendo o valor da
televisão de €30500,00 o valor da causa será este.
Determinado o valor da causa (€30500, 00) é necessário determinar qual a forma de
processo aplicável. Para tal é necessário recorrer às normas constantes do art. 460º e ss
CPC e ao art. 31º da LOFTJ 2008
Nos termos do art. 460º o processo pode ser comum ou especial. Nos termos do art.
461º e 462º o processo comum pode ser ordinário, sumário ou sumaríssimo. É necessário
determinar qual a forma de processo comum é que se encontra em causa.
Nos termos do art. 31º da LOFTJ 2008 a alçada do Tribunal da Relação é de € 30. 000,
00 e a alçada dos Tribunais de 1ª Instância de € 5. 000, 00. Ora, sendo o valor da causa
€30500, 00 estamos face ao processo comum ordinários nos termos do art. 460º, 461º e
462º, primeira parte CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 8
Caso II
A sociedade Vinhos do Côa, Lda., aprovou, em assembleia-geral realizada em 10 de
Setembro de 2011, a destituição do sócio António das suas funções de gerente e a
nomeação do sócio Bernardo como gerente, tendo ambos os sócios estado presentes
na referida assembleia. Em 13 de Setembro de 2012, a Vinhos do Côa, Lda., registou as
deliberações perante a Conservatória do Registo Comercial. António, inconformado
com aquelas deliberações e receando que Bernardo lese os interesses da Vinhos do
Côa, Lda., pretende impedir que este assuma as funções de gerente. António dispõe
de algum meio para fazê-lo?
TEMA: PROVIDÊNCIAS CAUTELARES (DELIBERAÇÕES SOCIAIS)
No presente caso estamos no âmbito da matéria das providências cautelares
consagradas no art. 381º e ss CPC, cuja função específica consiste em prevenir os
perigos que, antes da propositura de uma acção ou durante o tempo em que esta se
encontra pendente, possam comprometer os resultados (ou seja, alcançar a
pretensão deduzida na acção), regular provisoriamente o conflito de interesses até ser
lograda a composição definitiva, ou, inclusivamente, em antecipar a realização dos
efeitos jurídicos e do direito que previsivelmente poderá vir a ser reconhecido na
acção.
Nos termos do art. 381º/3 CPC existindo um procedimento cautelar especificado em
que se possa resolver a questão não se pode resolver a mesma com recurso ao
procedimento cautelar comum.
Nos termos do art. 396º e ss CPC encontra-se regulada a suspensão de deliberações
sociais que constitui um procedimento cautelar especificado.
A suspensão de deliberações sociais, providência dirigida às sociedades (civis,
comerciais, ainda que estás últimas esteja irregularmente constituídas, e às
associações de direito privado) é instrumental ou anciliar das acções de declaração
de invalidade (nulidade ou anulabilidade) de deliberações tomadas pelos órgãos
competentes daquelas pessoas colectivas (Assembleia Geral, Conselho de
Administração, Direcção, Conselho Fiscal) por serem contrárias às leis, aos estatutos ou
ao contrato de sociedade, independentemente do desvalor da deliberação social
cuja suspensão seja pedida. É uma providência antecipatória, visto que permite, de
algum modo, adiantar certos efeitos derivados da sentença que, na acção principal,
declare com efeitos constitutivos de nulidade ou anulabilidade dessa deliberação.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 9
É necessário analisar os requisitos contantes do art. 396º CPC para saber se se
encontram reunidas as condições de impugnação de uma deliberação social:
Aprovação de uma deliberação social (‘’A sociedade Vinhos e Côa, aprovou,
em Assembleia geral (…) a destituição do sócio António das suas funções de
gerente e a nomeação do sócio Bernardo como gerente (…)’’) – requisito
verificado
Deliberação Social contrária à lei, aos estatutos ou ao contrato presume-se
que sim)
Impugnação da deliberação social está dependente de quem tenha a
qualidade de sócio (António era sócio) – requisito verificado
A impugnação da deliberação social terá de ser efectuada no prazo de 10
dias, contando-se o prazo desde o momento em que a deliberação social foi
tomada (neste caso, António teria 10 dias a contar de dia 10 de Setembro, ou
seja poderia requerer a suspensão da deliberação social até dia 20 de
Setembro)
É necessário que a deliberação social possa causar um dano apreciável
(António deixaria de ser Gerente, passando a ser Bernardo o gerente, pelo que
o primeiro receava que o segundo lesasse os interesses da sociedade em
causa) – requisito verificado
A deliberação social ainda não tenha produzido efeitos jurídicos, ou seja não
pode ocorrer a consumação da lesão. Quando se diz ‘’suspende-se’’
pretende-se que a deliberação social em causa ainda não tenha produzido
qualquer efeito jurídico. Como é que se sabe se a deliberação social já
produziu ou não efeitos? Em resposta a tal questão existem duas teorias:
Uma parte da doutrina entende que com o registo das deliberações
perante a Conservatória do Registo Comercial a 13 de Setembro, ou
seja com o registo dos órgãos resultantes de uma deliberação social, tal
torna-se intacável, uma vez que não se pode requerer uma providência
cautelar contra a lei, apenas podendo intentar-se uma acção de
anulação ou de nulidade (a acção principal pode sempre propor-se).
Contudo, a boa doutrina e a boa jurisprudência defendem que a
deliberação social em causa é uma deliberação de execução
continuada, ou seja todos os dias aquela produz efeitos jurídicos,
podendo então neste caso a suspensão produzir efeitos.
Deste modo, António poderia intentar uma providência cautelar específica de
suspensão da deliberação social.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 10
NOTA1: coloca-se a questão de saber se se pode impugnar directamente uma
decisão do Conselho de Administração. Tal é uma matéria de direito substantivo que
não será estudada nesta disciplina. A questão que se coloca, concretamente, é se se
pode servir deste procedimento especial ou se tal é exclusivo das deliberações sociais
da Assembleia Geral.
NOTA2: não existe nenhum prazo para requerer uma providência cautelar comum
NOTA3: Razão da Exigência do Prazo de 10 dias para a Impugnação de Deliberações
Sociais – a situação jurídica de uma sociedade comercial tem de estar estabilizada,
não podendo uma deliberação social estar no limo de ser ou não suspensa.
NOTA4: passado o prazo de impugnação de uma deliberação social, ou seja
passados 10 dias, não se pode recorrer ao procedimento cautelar comum, ou seja
para ocorrer a suspensão de uma deliberação social tal tem de ser realizado através
do art. 396º CPC. Problema: se se entender que este procedimento cautelar específico
não se aplica às deliberações do Conselho de Administração (NOTA1) estas poderão
ser impugnadas a todo o tempo, uma vez que o procedimento cautelar comum não
tem prazo (NOTA2)
NOTA5: o procedimento cautelar específico de suspensão de deliberações sociais,
quando é requerido, e após a citação da sociedade, faz com a sociedade quanto à
deliberação social em causa fique paralisada. Ora é muito perigoso poder-se paralisar
deliberações de órgãos sociais. Os procedimentos cautelares podem estar sujeitos a
um controlo prévio do juiz, podendo este indeferir liminarmente o processo, mas só
quando é manifesta a improcedência de tal (por exemplo, o prazo de 10 dias já
passou).
NOTA6: Nos termos do art. 397º/3 CPC se a sociedade mesmo que citada executar a
deliberação tal consubstancia uma situação de responsabilidade civil, havendo quem
entenda que tais actos praticados serão ineficazes. Contudo, o nº3 do art. 397º CPC
regere como efeito a responsabilidade civil e não a ineficácia dos actos, uma vez que
não se pode com a citação antecipar os efeitos que só poderão ser produzidos pela
sentença.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 11
Caso Prático III
Em 9 de Agosto de 2012, Caetano foi citado pelo Tribunal Judicial de Portimão de que
fora decretado o arresto de todos os bens imóveis de que é proprietário, no âmbito do
procedimento cautelar requerido contra si pelo seu credor Diogo. Diogo foi notificado
da citação de Caetano em 13 de Agosto de 2012.
TEMA: PROVIDÊNCIAS CAUTELARES (ARRESTO)
a) Caetano insurge-se contra a sentença por a mesma ter sido decretada sem a
sua prévia audição, não tendo Diogo demonstrado em Tribunal que a sua
audição poria em risco sério o fim ou a eficácia da providência. Tem razão?
No presente caso estamos face a uma situação de arresto que consubstancia uma
providência cautelar conservatória, ou seja estas visam prevenir o efeito útil da acção
principal assegurando a permanência da situação existente à época em que o
conflito de interesses foi desencadeado ou quando se verificou a situação de
periculum in mora.
O arresto, consagrado no art. 406º e ss CPC e no art. 601º e 619º CC, pode ser
requerido por todo aquele que se arroga na qualidade de credor do requerido,
contando que, demonstre a probabilidade da existência do seu crédito e o fundando
ou justo receio da perda da sua garantia patrimonial. Ou seja, o arresto consiste na
apreensão, por parte de um agente de execução, de bens (penhoráveis) do devedor
ou de bens que foram por este transmitidos a um terceiro.
Uma das características dos procedimentos cautelares é o facto de nestes poder ser
dispensada a audiência previa do requerido, ou seja a providência cautelar pode, em
casos excepcionais (art. 3º/2 CPC) ser decretada, sem que o requerido tenha sido
ouvido. O juiz só está autorizado a dispensar a audiência do requerido quando os
conceitos indeterminados ‘’risco sério’’ e ‘’fim ou eficácia da providência’’ estiverem
no caso concreto preenchidos.
Há casos em que no dominio das providências cautelares especificadas, como é o
arresto, é praticamente imposta por lei. Nos termos do art. 408º/1 consagra-se que não
existe audiência prévio, sendo que conjugando este artigo com o art. 406º, é óbvio
que se se provar que o requerido se encontra a praticar actos que coloquem em
causa uma diminuição do seu património, não faz sentido que ele seja ouvido. Nestes
termos o art. 408º/1 relaciona-se com o art. 385º/1 CPC que consagra um desvio ao
Princípio do Contraditório.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 12
b) Caetano, inconformado com a sentença que determinou o arresto porque
baseada em depoimentos de testemunhas da confiança de Diogo, pretende
que o Tribunal Judicial de Portimão ouça o depoimento de outras testemunhas,
pelo que recorreu daquela sentença. Procedeu correctamente?
Decretado o arresto, Caetano será citado para exercer o seu direito de defesa, nos
termos do art. 385º/6 e art. 388º/1 CPC. Tal direito de defesa pode se realizar através
de oposição ou de recurso.
Ora a diferença entre o recurso e a oposição assenta no facto de que recorrer da
decisão serve para atacar a prova, isto é para recorrer da matéria de direito e da
matéria de facto, nos termos do art. 388º/1 al. a) CPC (por exemplo, quando não se
concorda com a apreciação feita pelo tribunal de uma determinada prova recorre-se
da decisão); enquanto a oposição é deduzida quando se pretende alegar factos ou
produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que podem afastar os
fundamentos da providência ou determinar a sua redução, nos termos do art. 388º/1
al. b) CPC.
Tendo em consideração que Caetano pretende a audição de novas testemunhas
deveria ter deduzido oposição nos termos do art. 388º/1 al. b) e não recorrido da
decisão.
c) Em 10 de Setembro de 2012, Diogo propôs uma acção executiva contra
Caetano, requerendo ao Tribunal Judicial de Portimão que o arresto fosse
apenso à esta acção. Em 17 de Setembro de 2012, Caetano apresentou um
requerimento no âmbito do procedimento cautelar de arresto requerendo a
extinção da instância com fundamento em caducidade do mesmo dado que o
arresto não pode ser dependência de uma acção executiva.
Nos termos do art. 383º/1 CPC, o procedimento cautelar pode ser dependente de
uma acção executiva, sendo o procedimento cautelar acessório à acção executiva
nos termos da 2ª parte da norma em análise.
NOTA1: existindo um título executivo, mas sabendo que o executado se encontra a
dissipar os bens, intenta-se primeiro uma acção declarativa e só posteriormente uma
acção executiva. Nos termos do art. 383º/1 CPC o procedimento cautelar é sempre
dependente/acessório de uma acção declarativa ou executiva. Quando a acção
executiva é fundada num título judicial (sentença), sendo requerida antes da citação
do executado, realiza-se logo a penhora dos bens. Deste modo, nestas situações
poder-se-ia dizer que o arresto não seria tão necessário.
NOTA2: nos termos do art. 382º CPC o procedimento cautelar é urgente, ou seja tem
prioridade relativamente aos demais processos não urgentes. Nos termos do art. 143º/2
CPC, a característica da urgência dos procedimentos cautelares manifesta-se
também nesta norma quanto às férias judiciais (15 de Julho a 31 de Agosto (férias de
verão), férias de natal e da páscoa também existem mais com prazos relativamente
mais curtos – LOFTJ 2008)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 13
NOTA3: Quanto ao prazo do arresto, este deverá ser decidido em 15dias, a não ser
que a parte contrária tenha de ser citada, pelo que nesse caso o prazo alarga-se para
2 meses.
d) Caetano invoca que a acção da qual o arresto deveria ser dependente não foi
intentada. Quid iuris? (Hipótese Aula Prática)
Nos termos do art. 389º/1 al. a) CPC a regra é que uma vez decretada providência
cautelar, o requerente tem 30 dias para propor a acção principal sob pena de
caducidade da providência cautelar.
No art. 389º/2 do CPC consagra-se uma regra diferente que assenta em que o
requerente da providência de arresto que foi decretada tem o prazo de 10 dias para
propor a acção principal, contando-se tal prazo a partir do momento em que o
requerente foi notificado de que foi efectuado ao requerido a notificação prevista no
art. 385º/6 CPC.
NOTA1: no arresto existe uma regra, constante no art. 410º CPC, que pode conduzir em
erro. Nos termos do art. 410º CPC englobam-se as situações em que se requer uma
providência cautelar mas intenta-se uma acção de condenação que é objecto de
recursos até que ocorra o seu trânsito em julgado. Neste caos, o legislador quer
assegurar que a partir do momento em que se tem um arresto e uma acção
condenatória, que se promova à execução subsequente da acção declarativa, sob
pena de o arresto ficar sem efeito.
NOTA2: Segundo o Prof. Lebre de Freitas o prazo de 30 dias também se pode aplicar às
situações em que o prazo de 10 dias se encontra compreendido no prazo de 30 dias.
Nesta circunstância o requerente goza do prazo de 30 das uma vez que se confere a
possibilidade de exercer o direito num prazo maior. Contudo, é um tese com
aplicação nula.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 14
II - Personalidade, Capacidade e Patrocínio Judiciário
CASO IV
O condomínio de um prédio situado na Baixa de Lisboa pretende instaurar uma acção
contra Bernardo, proprietário de uma das fracções (4.º Direito), pelo facto de este
último não proceder ao pagamento das quantias devidas nos últimos três anos, após
repetidas solicitações para o fazer. Pode fazê-lo? Em caso afirmativo, como?
TEMA: PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
No presente caso estamos no âmbito dos pressupostos processuais. Entende-se por
pressupostos processuais os elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz
proferir decisão sobre o pedido formulado, condenando ou inferindo a providência
requerida. Trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à
partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa.
Importa ainda salientar que os pressupostos processuais podem ser de dois tipos:
Positivos: requisitos cuja existência é essencial para que o juiz se deva
pronunciar sobre a procedência ou improcedência da acção.
Personalidade judiciária
Capacidade judiciária
Legitimidade
Interesse processual
Patrocínio judiciário
Negativos: factos cuja verificação impede o juiz de entrar na apreciação do
mérito do pedido
Listispendência
Compromisso arbitral
No presente caso, estamos no âmbito da personalidade judiciária que se encontra
consagrada no art. 5º e ss. CPC. Nos termos do art. 5º/1, a personalidade judiciária
consiste na susceptibilidade de ser parte. Entende-se por partes as pessoas pela qual e
contra a qual é requerida, através da acção, a providência judiciária.
Deste modo, a personalidade judiciária consiste na possibilidade de requerer (autor)
ou de contra si ser requerida (réu) , em próprio nome, qualquer das providências de
tutela jurisdicional reconhecidas na lei.
Nos termos do art. 5º/2 do CPC consagra-se o Princípio da Equiparação, ou seja o
critério geral fixado na lei para se saber quem tem personalidade judiciária é o da
correspondência (coincidência ou equiparação) entre a personalidade jurídica (ou
capacidade de gozo de direitos) e a personalidade judiciária.
Nos termos do art. 66º do CC, tem-se personalidade jurídica com o nascimento
completo e com vida, pelo que, consequentemente, todas as pessoas singulares têm
personalidade judiciária.
Todos os indivíduos, quer sejam maiores ou menores, quer sejam capazes, interditos ou
inabilitados, quer nacionais ou estrangeiros gozam de personalidade judiciária, podem
ser partes em juízo, visto que todos eles podem ser sujeitos, em princípio, de quaisquer
relações jurídicas, nos termos do art. 67º do CC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 15
O corolário aplicável às pessoas singulares estende-se de igual modo, quer às pessoas
colectivas, quer às sociedades que seja reconhecida personalidade jurídica. Também
as pessoas colectivas e as sociedades, embora agindo necessariamente em juízo por
meio dos seus representantes estatutários, são as verdadeiras partes da acção,
sempre que esta seja proposta em nome delas ou contra elas.
Contudo, há inúmeras situações em que não há uma correspondência ou uma
coincidência entre a capacidade de gozo de direitos (a personalidade jurídica) e a
personalidade judiciária. Nestes casos, a lei estende ou atribui personalidade judiciária
a entes que não gozam de personalidade jurídica. Deste modo, a lei estende a
atribuição de personalidade judiciária a entres desprovidos de personalidade jurídica,
desde logo, em virtude da tutela de situações de separação ou de diferenciação
patrimonial. Tais casos encontram-se consagrados no art. 6º do CPC.
No presente caso estamos no âmbito do art. 6º al. e) que se conjuga com o art. 1436º
al. e) e 1437º do CC, ou seja ocorre a extensão de personalidade judiciária ao
condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às acções que se
inserem no âmbito dos poderes do administrador. A parte é o administrador e não
cada um dos condóminos, uma vez que o condomínio age através do administrador
que é quem em juízo vai praticar os actos.
Importa ainda salientar que este caso consubstancia um caso particular, uma vez que
existe o regime da propriedade horizontal, que apesar de integrado no CC, possui
legislação avulsa (DL 268/94) que regula toda a matéria relativamente ao condomínio.
Através do referido diploma legal, a acta da assembleia de condomínios na qual se
fixa o valor devido pelos condóminos constitui um titulo executivo (art. 46º al. d) CPC),
pelo que o administrador do condomínio poderia requerer a acção executiva em vez
da acção declarativa.
Em suma, o administrador do codominio poderia pretender que o tribunal declarasse a
existência do direito em causa (pagamento das quantias devidas nos últimos três
anos) através de uma acção declarativa ou de uma acção executiva.
NOTA: quando no exame surge um caso de uma sociedade comercial é errado dizer
que ela tem personalidade judiciária nos termos do art. 6º al. d) do CPC. Nunca se
alude a esta norma quando a hipótese simplesmente se refere a uma sociedade ou
uma sociedade civil. O art. 6º só é utilizado para as sociedades que ainda não têm
personalidade jurídica. Tendo personalidade jurídica necessariamente tem-se
personalidade judiciária nos termos do art. 5º CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 16
CASO V
Caroline, francesa, residente em Paris, celebrou com o Banco Crédit Français, com
sede em Paris, um contrato de concessão de crédito para a compra de um imóvel em
Portugal, onde instalou uma sucursal do seu atelier de arquitectura.. A agência
portuguesa do Banco Crédit Français pretende agora propor uma acção contra
Caroline, com fundamento na falta de cumprimento do contrato de concessão de
crédito, e fazer valer-se do imóvel dado em garantia . Quid Iuris?
TEMA: PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
No presente caso estamos no âmbito dos pressupostos processuais. Entende-se por
pressupostos processuais os elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz
proferir decisão sobre o pedido formulado, condenando ou inferindo a providência
requerida. Trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à
partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa.
Importa ainda salientar que estamos no âmbito de um pressuposto processual positivo
(personalidade judiciária), ou seja de um requisito cuja existência é essencial para que
o juiz se deva pronunciar sobre a procedência ou improcedência da acção.
No presente caso, estamos no âmbito da personalidade judiciária que se encontra
consagrada no art. 5º e ss. CPC. Nos termos do art. 5º/1, a personalidade judiciária
consiste na susceptibilidade de ser parte. Entende-se por partes as pessoas pela qual e
contra a qual é requerida, através da acção, a providência judiciária.
Deste modo, a personalidade judiciária consiste na possibilidade de requerer (autor)
ou de contra si ser requerida (réu) , em próprio nome, qualquer das providências de
tutela jurisdicional reconhecidas na lei.
Nos termos do art. 5º/2 do CPC consagra-se o Princípio da Equiparação, ou seja o
critério geral fixado na lei para se saber quem tem personalidade judiciária é o da
correspondência (coincidência ou equiparação) entre a personalidade jurídica (ou
capacidade de gozo de direitos) e a personalidade judiciária.
Nos termos do art. 66º do CC, tem-se personalidade jurídica com o nascimento
completo e com vida, pelo que, consequentemente, todas as pessoas singulares têm
personalidade judiciária.
O corolário aplicável às pessoas singulares estende-se de igual modo, quer às pessoas
colectivas, quer às sociedades que seja reconhecida personalidade jurídica. Também
as pessoas colectivas e as sociedades, embora agindo necessariamente em juízo por
meio dos seus representantes estatutários, são as verdadeiras partes da acção,
sempre que esta seja proposta em nome delas ou contra elas.
Contudo, há inúmeras situações em que não há uma correspondência ou uma
coincidência entre a capacidade de gozo de direitos (a personalidade jurídica) e a
personalidade judiciária. Nestes casos, a lei estende ou atribui personalidade judiciária
a entes que não gozam de personalidade jurídica. Deste modo, a lei estende a
atribuição de personalidade judiciária a entres desprovidos de personalidade jurídica,
desde logo, em virtude da tutela de situações de separação ou de diferenciação
patrimonial.
Quanto à Caroline, ela terá personalidade judiciária, nos termos do art. 5º e art. 66º do
CC, uma vez que quem tem personalidade jurídica terá personalidade judiciária.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 17
NOTA: Caroline tem personalidade jurídica nos termos do art. 66º CC ou da Lei
Francesa? É um problema de Direito Internacional Privado que não irá ser estudado
nesta disciplina.
Quanto à agência, é necessário saber se tem ou não personalidade jurídica.
Se chegarmos à conclusão que a agência portuguesa é uma sociedade, ou seja uma
pessoa jurídica subsidiária ao banco francês entender-se-ia que, assim, ela teria
personalidade jurídica nos termos do art. 5º do CPC
Se pelo contrário, neste caso, estivermos no âmbito de agência no sentido do art. 7º
do CPC, ela não terá personalidade jurídica, uma vez que é um ramo de uma
sociedade jurídica constituída, mas verificados certos requisitos poderá ter
personalidade judiciária.
Ou seja, a personalidade judiciária é, nos termos do art. 7º CPC, atribuída a
determinadas entidades desprovidas de personalidade jurídica em virtude da
imputação do acto gerador do conflito de interesses. Nos casos do art. 7º está-se
perante empresas em sentido objectivo, estabelecimentos comerciais ou industriais
secundários.
Deste modo, para que a agência em questão possa possuir personalidade judiciária é
necessário que:
Nos termos do art. 7º/1, que a acção proceda de facto por ela praticado. Ora
este requisito não se encontra verificado, uma vez que o contrato de
concessão de crédito para a compra de um imóvel em Portugal foi celebrado
com o Banco Crédit Français.
Nos termos do art. 7º/2, ainda que a acção derive de facto praticado pela
sede da agência em país estrangeiro, a agência poderá demandar desde
que:
A obrigação tenha sido contraída com um português. Ora este requisito
não se encontra verificado, uma vez que Caroline era francesa.
A obrigação tenha sido contraída com um estrangeiro domiciliado em
Portugal. Ora tal requisito não se encontra verificado, uma vez que
Caroline era residente em Paris.
Deste modo, e com base nos artigos 5º, 6º e 7º do CPC a agência não possui
personalidade judiciária pelo que não poderá demandar Caroline numa acção com
fundamento na falta de cumprimento do contrato de concessão de crédito.
Deste modo, faltando um pressuposto processual, a personalidade judiciária (da
Agência) consubstancia uma excepção dilatória nos termos do art. 494º al. c) CPC,
ocorrerá a absolvição da instância do réu (Caroline).
NOTA1: a falta de personalidade judiciária é em princípio insanável. A Falta de
Personalidade Judiciária ocorre sempre que o demandante ou o demandado são
coisas/realidades jurídicas despersonificadas às quais nem o direito processual
concede personalidade judiciária. Tanto pode tratar-se (1) de entes destituídos de
personalidade judiciária; (2) de realidades desprovidas de personalidade jurídica e
consequentemente de personalidade judiciária.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 18
NOTA2: Nos termos do art. 265º CPC, permite-se ao juiz desencadear o processo que
visa a sanação da falta dos pressupostos processuais (condições que permitem ao juiz
conhecer do mérito da causa).
NOTA3: o art. 5º e ss CPC são artigos específicos sobre o pressuposto da personalidade
judiciária. O legislador tem um regime geral sobre os pressupostos processuais quando
se refere às excepções dilatórias que se encontram consagradas no regime da
defesa, na contestação, nos termos do art. 487º e ss CPC.
NOTA4: Nos termos do art. 494º al. c) CPC consagra-se que a falta de personalidade
judiciária consubstancia uma excepção dilatória. Todas as exceções dilatórias, nos
termos do art. 495º CPC, são de conhecimento oficioso, havendo apenas excepção a
esta regra quanto aos casos de incompetência relativa não abrangidos no art. 110º
do CPC e nos casos em que sendo a competência do litigio de um tribunal judiciário
ter-se-ia colocado a acção num tribunal arbitral.
NOTA5: Nos termos do art. 510º/1 al. a) o juiz deve conhecer das expeções dilatórias no
despacho saneador, ou seja na fase do Saneamento e da Condensação. Importa
ainda salientar que nos termos do art. 508º/1 al. a) remete-se para o art. 265º/2 do CPC
provocando a intervenção da administração principal.
NOTA6: O art. 288º CPC refere-se aos casos de absolvição da instância, ou seja o juiz
deverá abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância no caso de
faltar um pressuposto processual.
NOTA7: Nos termos do art. 23º CPC permite-se o suprimento da incapacidade
judiciária e da irregularidade de representação através da intervenção de
representante legitimo.
NOTA8: A falta de personalidade judiciária é insuprível, com excepção do art. 8º CPC
devido aos factos de neste caso muitas vezes os actos serem praticados com as
deslocações comerciais das pessoas físicas.
CASO VI
Duarte comprou a Filipe uma moto quatro pelo valor de 3.000 Euros. Como conhecia
Duarte, Filipe entregou a moto quatro antes de receber a quantia. No entanto, Duarte
nunca chegou a pagar os 3.000 Euros e Filipe resolveu intentar uma acção com a
finalidade de obter a quantia devida. Duarte é menor.
TEMA: PERSONALIDADE JUDICIÁRIA E CAPACIDADE JUDICIÁRIA
a. Imagine que Duarte contestou a acção. Quid Iuris?
No presente caso estamos no âmbito dos pressupostos processuais. Entende-se por
pressupostos processuais os elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz
proferir decisão sobre o pedido formulado, condenando ou inferindo a providência
requerida. Trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à
partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa.
Importa ainda salientar que estamos no âmbito de dois pressupostos processuais
positivos (personalidade judiciária e capacidade judiciária), ou seja de um requisito
cuja existência é essencial para que o juiz se deva pronunciar sobre a procedência ou
improcedência da acção.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 19
Nos termos do art. 5º/1, a personalidade judiciária consiste na susceptibilidade de ser
parte. Entende-se por partes as pessoas pela qual e contra a qual é requerida, através
da acção, a providência judiciária.
Deste modo, a personalidade judiciária consiste na possibilidade de requerer (autor)
ou de contra si ser requerida (réu) , em próprio nome, qualquer das providências de
tutela jurisdicional reconhecidas na lei.
Nos termos do art. 5º/2 do CPC consagra-se o Princípio da Equiparação, ou seja o
critério geral fixado na lei para se saber quem tem personalidade judiciária é o da
correspondência (coincidência ou equiparação) entre a personalidade jurídica (ou
capacidade de gozo de direitos) e a personalidade judiciária.
Nos termos do art. 66º do CC, tem-se personalidade jurídica com o nascimento
completo e com vida, pelo que, consequentemente, todas as pessoas singulares têm
personalidade judiciária.
Todos os indivíduos, quer sejam maiores ou menores, quer sejam capazes, interditos ou
inabilitados, quer nacionais ou estrangeiros gozam de personalidade judiciária, podem
ser partes em juízo, visto que todos eles podem ser sujeitos, em princípio, de quaisquer
relações jurídicas, nos termos do art. 67º do CC.
Deste modo, podemos concluir que tanto Duarte como Filipe, por aplicação do art. 5º
do CPC e dos art. 66º e 67º do CC, têm personalidade judiciária.
Quanto à capacidade judiciária, esta encontra-se consagrada no art. 9º/1 do CPC e
consiste na susceptibilidade de estar por si em juízo ou de se fazer representar por
representante voluntário. Ou seja, a capacidade judiciária é o espelho, na relação
processual, da capacidade de exercício de direitos, pois aquela é aferida por esta:
quem tem capacidade de exercício de direitos (ainda que limitada ou parcial: os
menores nos casos do art. 127º CC) tem também capacidade judiciaria
correspondente à produção dos efeitos possíveis balizados pela concreta
capacidade de exercício de direitos (art. 10º/1, in fine CPC).
Os menores fora dos casos previstos no artigo 127º CC não tendo capacidade de
exercício de direitos também não gozam de capacidade judiciaria, visto que está é a
medida e baseia-se na capacidade de exercício de direitos.
Deste modo, sendo Duarte (comprador) menor é necessário abrir as seguintes
hipóteses:
Nos termos do art. 127º/1 al. a) CC seria válido o acto que o menor (mas maior
de 16anos) tivesse praticado desde que o tivesse adquirido pelo seu trabalho.
Ou seja, se Duarte tivesse trabalho e ‘’amealhado’’ o dinheiro dai resultante e
com tal tivesse comprado a moto quatro, o acto seria válido e Duarte teria
capacidade judiciária
Nos termos do art. 127º/1 al. b) CC seria válido o acto desde que se
enquadrasse dentro dos ‘’negócios jurídicos próprios da vida corrente do
menor’’. Ou seja, o caso não nos dá elementos suficientes para saber se Duarte
seria ‘’muito rico’’ ou não, mas é importante abrir a hipótese (para o filho do
Cristiano Ronaldo três mil euros é uma quantia pequena)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 20
Não se enquadrando em nenhum dos casos do art. 127º do CC, pelo que Duarte não
teria capacidade de exercício para praticar o acto nem teria capacidade judiciária
para agir nos termos do art. 9º e 10º CPC. Sendo esta a hipótese, estamos face a uma
situação de incapacidade judiciária.
Analisando a hipótese de estarmos face a uma situação de incapacidade judiciária,
uma vez que Duarte contestou a acção questiona-se quais os efeitos que a sua
incapacidade judiciária acarreta.
Nos termos do art. 23º/1 do CPC a incapacidade judiciária é suprível. Logo que o juiz
se aperceba da incapacidade judiciária deve oficiosamente e a todo o tempo
providenciar pela regularização, o que ocorre mediante a intervenção ou citação do
representante do incapaz, para o efeito de ratificar ou renovar os actos praticados.
Nos termos do art. 10º/1 do CPC a incapacidade judiciária é suprida através da
assistência e da representação. Nos termos do art. 124º e 1902º do CC e do art. 10º/2
do CPC, normalmente, os representantes dos menores são os pais. Sendo que no nosso
caso o menor é réu ambos os pais serão citados para o exercer o direito de contestar
a acção, podendo praticar, deste modo, uma nova contestação.
Importa salientar que, nos termos do art. 288º al. c) e do art. 494º al. c) CPC a falta de
capacidade judiciária consubstancia uma excepção dilatória que se não for suprida
conduzirá à absolvição da instância.
Respeitando o vício ao réu a sanação verifica-se com a mera citação dos
representantes legitimas dessa parte. Contudo, se a sanação estivesse condicionada
pela pratica de qualquer acto por este representante do incapaz, a sanação era
deixada na sua inteira disponibilidade, o que até lhe seria altamente favorável, visto
que, se nada fizesse, o réu, seria absolvida da instância. deste modo, em último caso
aplica-se o disposto no art. 15º/1 CPC que consagra que incumbe ao Ministério Público
a defesa do réu, para o que será citado.
De qualquer modo, ainda que não seja apresentada qualquer contestação, que
possui como efeito normal a revelia, tal efeito não se produz nos termos do art. 485º al.
b) CPC.
b. Imagine agora que os pais de Duarte estão em desacordo quanto à estratégia
a adoptar no processo. Quid Iuris?
Nos termos do art. 12º do CPC, havendo divergência entre os pais na representação
do menor, a resolução do conflito cabe ao juiz em causa, no respeito pelos melhores
interesses do menor, podendo atribuir a representação a um só dos pais, designar
curador ou conferir a representação ao Ministério Público (nº3).
O art. 12º distingue dois momentos, duas situações:
Litigio surge antes da Instauração da Acção: qualquer um dos representantes
pode requerer ao tribunal competente para a causa a resolução do conflito
(nº1)
Litigio surge no decorrer do processo (caso prático): qualquer dos pais, no
prazo de realização do primeiro acto processual afectado pelo desacordo,
pode requerer ao juiz da causa que providencie sobre a forma de o incapaz
ser nela representado, suspendendo-se a instância para se tentar promover o
acordo e a resolução do litigio (nº2). Importa ainda salientar que a contagem
do prazo suspenso reinicia-se com a notificação da decisão (nº4).
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 21
c. Na situação referida em a) se, em vez de ser menor, Duarte tivesse sido
inabilitado a resposta manter-se-ia?
Nos termos do art. 13º CPC regula-se a capacidade judiciária dos inabilitados. Os
inabilitados, fora das circunstâncias previstas no art. 153º/1, in fine do CC, não tendo
capacidade de exercício de direitos também não gozam de capacidade judiciária,
visto que está é a medida e baseia-se na capacidade de exercício de direitos. O que
o artigo 153º do CC consagra é que os actos de disposição do inabilitado têm de ser
praticados pelo curador, não se estando face a uma incapacidade genérica, não é
uma incapacidade natural, resultando antes de uma decisão judicial.
Deste modo, é necessário analisar o acto e a sentença que inabilitou Duarte para
apurar se ele de acordo com a sentença podia ou não praticar o acto em causa.
Podendo praticar estes actos então não se está face a uma situação de
incapacidade judiciária nos termos do art. 13º CPC, podendo a acção ser proposta
contra ele. Contudo é necessário analisar até que ponto a sentença resultante da
acção não seria um acto de disposição. Um dos efeitos possíveis da sentença seria a
perda da mota quatro (que Filipe lhe entregara) o que conduziria a um acto de
disposição. Se Duarte não pudesse praticar actos de disposição, para efeitos do art.
13º CPC, ele não teria capacidade judiciária.
Assim sendo, a incapacidade judiciária dos inabilitados é suprida através do curador
(art. 153º CC). O inabilitado pode, porém, estar pessoalmente em juízo e intervir,
devendo ser citado quando é reu (art. 13º/1 CPC). Todavia, é o curador que autoriza a
pratica dos actos pelo inabilitado, pelo que, em caso de divergência entre o curador
e o inabilitado, prevalece a orientação do curador nos termos do art. 13º/2 CPC.
CASO VII
João instaurou contra Pedro uma acção de reivindicação de um terreno avaliado em
40.000 Euros.
TEMA: PATROCÍNIO JUDICIÁRIO
a. Pedro, estudante de Direito e convicto de que poderia fazer a sua própria
contestação, apresentou a mesma no prazo legalmente estabelecido. Um
advogado seu amigo, Manuel, fez a revisão da peça e afirmou que a mesma
estava perfeita. Quid Iuris?
No presente caso estamos no âmbito dos pressupostos processuais. Entende-se por
pressupostos processuais os elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz
proferir decisão sobre o pedido formulado, condenando ou inferindo a providência
requerida. Trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à
partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa.
Importa ainda salientar que estamos no âmbito de um pressuposto processual positivo
(patrocínio judiciário), ou seja de um requisito cuja existência é essencial para que o
juiz se deva pronunciar sobre a procedência ou improcedência da acção.
O Patrocínio Judiciário, regulado no art. 32º e ss CPC, consiste na representação e
assistência técnica e profissional das partes em juízo, por parte de advogados e
solicitadores, na condução da lide em geral ou na pratica de certos actos em
especial, fundando-se num contrato de mandato. Através deste contrato de
mandato, a parte atribui ao mandatário poderes para a representar em todos os
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 22
actos e termos do processo (art. 36º/1), incluindo o poder de substabelecer o mandato
(subcontrato de mandato), nisto consistindo os poderes forenses gerais (art. 37º/1
CPC).
É importante salientar que o patrocínio judiciário só é pressuposto processual quando é
obrigatório.
Em geral, as acções em que é admitido recurso ordinário carecem de patrocínio
judiciário nos termos do art. 32º/1 al. a) do CPC.
No presente caso estamos face a uma acção de reivindicação de um terreno
avaliado em quarenta mil euros. A primeira coisa a analisar é o valor da causa.
Para determinar o valor da causa é necessário recorrer ao art. 305º e ss. Nos termos do
art. 311º/1, se a acção tiver por fim fazer valer o direito de propriedade (acção de
reivindicação) sobre uma coisa, o valor da coisa (terreno) determina o valor da causa.
Deste modo, estando o terreno avaliado em quarenta mil euros o valor da causa será
de quarenta mil euros.
O art. 31º da LOFTJ 2008 consagra que a alçada do Tribunal da Relação é de trinta mil
euros e a alçada dos tribunais de 1ª Instância de cinco mil euros. Sabendo que, no
presente caso, o valor da causa é de quarenta mil euros é necessário analisar o
Princípio consagrado no art. 678º/1 CPC. Nos termos do art. 678º/1 é necessário que o
valor da causa seja superior ao valor da alçada do Tribunal da Relação (quarenta mil
euros > trinta mil euros) e posteriormente olhar para a sentença em si. Deste modo,
admite-se recurso até ao STJ.
Sendo assim, admitindo-se, portanto, recurso até ao STJ, seria obrigatório patrocínio
judiciário, não podendo Pedro representar-se a si próprio, tendo, por efeito, de recorrer
à constituição de mandatário judicial.
A Falta de Constituição de Advogado encontra-se consagrada no art. 33º CPC, não
gera imediatamente as consequências típicas da falta de pressupostos processuais. O
juiz deve, antes disso, notificar a parte faltosa para suprir a falta dentro de certo prazo
(despacho convite).
As consequências da falta de constituição de advogado, quanto ao réu, assentam no
não seguimento de recurso (quando é o caso, mas não é o nosso) ou de a defesa
ficar sem efeito (o que seria o nosso caso). Caso a defesa fique sem efeito tal traduz-se
na revelia, consagrada no art. 484º/1 CPC, e dar-se-iam como provados os factos.
NOTA1: regra da dupla conforme – sendo-se condenado em 1ª Instância e
posteriormente no Tribunal da Relação, salvo raras situações, já não se pode recorrer
para o STJ.
NOTA2: Aplicação do art. 40º CPC: só se aplica às situações em que se assume um
mandato e o cliente ainda não mandou a procuração, faltando a demonstração que
o mandatário está constituído. O Tribunal fixa um prazo para ser suprida a falta ou
corrigido o vício. O juiz deve conhecer de tal, nos termos do art. 508º al. a), no
despacho pré saneador.
b. Imagine que Pedro optou antes por pedir ao seu amigo Manuel que o
representasse em juízo. Na contestação apresentada, Manuel fez confissões
expressas de factos. João vem depois invocar a confissão feita na fase dos
articulados. Quid Iuris?
Nos termos do art. 37º CPC consagram-se os poderes gerais forenses, ou seja a
procuração pode atribuir poderes gerais ou especiais. O poder de confessar é um
poder especial, na medida em que o poder de dar ao mandatário o poder de
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 23
confessar ou de desistir pode ter consequências gravosas, exigindo-se para tal uma
ponderação especial.
Nos termos da conjugação do art. 38º e do art. 567º CPC resulta que a confissão, em
principio, é irretractável. As confissões expressas de factos, feitas nos articulados, só
podem ser retiradas (razões de arrependimento), enquanto a parte contrária não as
tiver aceitado especificamente
Em suma, se o João invoca/aceita a confissão, nos termos do art. 567º, esta é
irretractável.
NOTA: O Prof. Alberto dos Reis discutia se o art. 567º CPC (que se insere na matéria da
prova por confissão) abrangia as confissões feita pela parte ou só pelo mandatário,
uma vez que o presente artigo não restringe aos mandatários tal faculdade. É uma
questão de interpretação.
III - Legitimidade
CASO VIII
Ana propôs contra a sua vizinha Beatriz uma acção de condenação no pagamento de
uma indemnização pelos danos causados na sua plantação de morangos, alegando
que Beatriz contaminara a água do ribeiro que separa as duas propriedades, a qual
destruíra a referida plantação.
Beatriz, citada para contestar a acção, requereu ao Tribunal a absolvição do pedido
com fundamento em ilegitimidade, alegando que a responsabilidade pela referida
contaminação era de Carlota, proprietária de uma quinta banhada pelo mesmo
ribeiro e situada a montante da sua.
TEMA: LEGITIMIDADE
a. Como deverá decidir o Tribunal?
No presente caso, nada nos é dito que nos leve a presumir a não existência de
personalidade judiciária (art. 5º do CPC e art. 66º CC), de capacidade judiciária (art.
9º CPC) e de patrocínio judiciário (art. 32º e ss CPC), pelo que partimos do pressuposto
que tais pressupostos se encontram verificados.
A Legitimidade Processual encontra-se consagrada nos artigos 26º e ss CPC,
entendendo-se que ser parte legítima na acção é ter o poder de dirigir a pretensão
dirigida em juízo ou a defesa contra ela oponível.
A parte terá legitimidade como autor, se for ela quem juridicamente pode fazer valer
a pretensão em face do demandado, admitindo que a pretensão exista, e terá
legitimidade como réu, se for ela a pessoa que juridicamente pode opor-se à
procedência da pretensão, por ser ela a pessoa cuja esfera jurídica é directamente
atingida pela providência requerida.
Quanto a Ana não existem dúvidas que ela terá legitimidade processual enquanto
autora. A questão coloca-se relativamente a Beatriz, que invoca que a
responsabilidade pela contaminação seria de Carlota e não dela.
Esta questão reflecte um problema que foi suscitado num caso celebre que envolvia
toneladas de chumbo, existindo para o efeito duas teorias. Trata-se de um caso em
que se realizou um contrato de venda de certo número (60) de toneladas de chumbo.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 24
O vendedor não cumpriu integralmente a obrigação que contraíra e o comprador
propôs acção a exigir a entrega das toneladas (cerca de 20) de chumbo em falta ou,
em alternativa, o pagamento da respectiva indemnização.
A acção foi proposta contra um comerciante português, como se fora ele o
outorgante do contrato como vendedor. Contudo, o réu alegou e provou que agiu
como mero intermediário (‘’sem responsabilidade pessoal’’) duma sociedade
espanhola, que era a verdadeira vendedora:
Prof. Barbosa Magalhães: as partes eram legítimas e acção devia julgada
improcedente, ou seja devia ocorrer a absolvição do pedido uma vez que o
vendedor/intermediário nada devia ao comprador (solução do Tribunal da
Relação) com fundamento de que o autor carecia do direito que se arrogava
sobre a pessoa demandada. Em suma, a relação material controvertida que
serve de base à determinação da legitimidade processual era a relação
material configurada unilateral e subjectivamente pelo autor na petição inicial
– tese subjectivista
Prof. Alberto dos Reis: as partes eram ilegítimas (solução do Tribunal de 1ª
Instância) e o juiz devia abster-se de conhecer do mérito da causa, ou seja
devia ocorrer a absolvição da instância uma vez que existe uma excepção
dilatória resultante da falta de legitimidade processual (saber se do contratou
resultou o direito invocado pelo autor, se o vendedor estava realmente em
falta ou se o não cumprimento resultou de motivo de força maior), porque o
réu nada tinha com a questão de fundo submetida à apreciação do tribunal.
Em suma, a relação material controvertida que serve de base à determinação
da legitimidade processual era a relação material tal como se apresenta real e
objectivamente ao tribunal, ao juiz, depois de ouvidas as partes e de serem
examinas as provas relevantes – tese objectivista
Actualmente vigora a tese do Prof. Barbosa Magalhães consagrando-se no art. 26º/3
do CPC que a legitimidade processual é apurada pela relação controvertida, tal
como ela é configurada pelo autor, na petição inicial.
A favor da tese do Prof. Barbosa Magalhães e contra a tese do Prof. Alberto dos Reis
invoca-se o facto de que não é possível saber à partida se as partes são, ou não, os
sujeitos da relação material controvertida, sem que previamente se conheça do fundo
ou do mérito da questão. Contudo, o Prof. Antunes Varela invoca que não se está a
entrar na questão de mérito da causa, uma vez que quando se analisa o pressuposto
da legitimidade presume-se que a relação exista tal como é descrita pelo autor,
sendo necessário verificar quem são os seus titulares. A ilegitimidade singular acaba
por se verificar em situações residuais, em casos de erro manifesto (exemplo: escreve-
se mal o nome da outra parte).
Deste modo, de acordo com a tese subjectivista do Prof. Barbosa Magalhães e nos
termos do art. 26º/3 CPC o tribunal deverá considerar que Beatriz é parte legítima na
acção.
Além do mais, importa salientar, que Beatriz deveria ter pedido a absolvição da
instância e não a absolvição do pedido, uma vez que a primeira (absolvição da
instância) é a consequência da falta da legitimidade, ou seja da falta de um
pressuposto processual o que consubstancia uma excepção dilatória nos termos do
art. 493º e art. 494º al. e) CPC.
No fim, ao concluir do mérito da causa, se o juiz concluir que ela não é parte legítima
irá absolve-la do pedido.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 25
NOTA1: ter legitimidade e ter interesse em agir são coisas diferentes, uma vez que a
primeira estabelece a relação com o objecto da acção.
NOTA2: A ilegitimidade processual, sendo uma excepção dilatória, nos termos do art.
495º CPC é de conhecimento oficioso. Nos termos do art. 510º CPC o juiz no despacho
saneador conhece das excepções dilatórias formando-se caso julgador.
b. Poderia Ana ter proposto a acção contra Beatriz e Carlota alegando ao
Tribunal não saber qual das duas fora responsável pela contaminação?
Nos termos do art. 31º- B CPC permite-se deduzir um mesmo pedido por autor ou
contra réu diverso do que aquele que demanda ou é demandado a título principal.
Tal só é possível se existir uma dúvida fundada sobre o(s) sujeito(s) que são titulares da
relação material controvertida.
Trata-se de situações em que:
Por um lado, o credor da pretensão ignora, sem culpa, a que título ou em que
qualidade o devedor interveio no acto ou no facto que serve de causa de
pedir. O autor pode demandar (inicialmente) um réu e formular
subsidiariamente contra ele um pedido no caso de dúvida fundamentada
sobre quem é o verdadeiro sujeito passiva da relação material controvertida. O
autor terá que afirmar quais as razões que o levam a não ter a certeza sobe o
titular passivo da relação material controvertida que configura ou apresenta
(pluralidade subjectiva subsidária). Deste modo, se um for absolvido, o outro(s)
serão condenados.
Por outro lado, o credor da pretensão ignora se é titular activo dela ou se é o
único titular activo.
Na opinião do Prof. Castro Mendes, os tribunais não servem para resolver dúvidas
deste teor, devendo o autor fazer o trabalho de casa.
NOTA: o art. 26º-A CPC consagra legitimidade processual aqueles que visem a defesa
dos interesses difusos, mais concretamente no nosso caso prático do ambiente,
devendo tal norma ser conjugada com a Lei da Acção Popular.
Caso IX
Em Dezembro de 2010, Diana e Eugénia compraram um imóvel situado em Ponte de
Lima a Filipa, através de contrato celebrado por escritura pública. Em Fevereiro de
2011, Filipa propôs uma acção contra Diana, na qual peticionou a declaração de
nulidade daquele contrato com fundamento no facto de o mesmo ter sido celebrado
com simulação de todas as partes contraentes. Na contestação, Diana invocou a
ilegitimidade passiva, porquanto a acção deveria ter sido proposta também contra
Eugénia. Como deverá o juiz decidir esta questão?
TEMA: LEGITIMIDADE (LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO E VOLUNTÁRIO)
A regra no processo é a da dualidade das partes (autor e réu), embora no mesmo
processo o autor possa cumular dois ou mais pedidos contra o réu. Contudo, muitas
vezes, em lugar de um só autor ou um só réu, a acção tem vários autores ou é
proposta contra dois ou mais réus.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 26
Nestes casos, à dualidade das partes substitui-se a pluralidade das partes, podendo
esta ser:
Pluralidade activa, se a acção é proposta por dois ou mais autores contra o
mesmo réu
Pluralidade passiva, se o autor demanda simultaneamente vários réus
Pluralidade mista, quando a acção é instaurada por dois mais autores contra
vários réus.
Nos termos do art. 27º e ss CPC distingue-se entre litisconsórcio, que pode ser
necessário ou voluntário, e coligação:
Litisconsórcio: há pluralidade de partes, mas unicidade da relação material
controvertida, existindo como tal um único pedido formulado contra ou por
vários réus; a esta unicidade da relação controvertida corresponde uma
pluralidade de pessoas (e, logo, de partes).
Voluntário (regra): a cumulação depende exclusivamente da vontade
das partes. Se os interessados não forem demandados daí não resulta
qualquer ilegitimidade pois o litisconsórcio verifica-se por iniciativa das
partes ou de uma delas.
Necessário: a cumulação resulta de determinação da lei (litisconsórcio
necessário legal), de prévia estipulação dos interessados (litisconsórcio
necessário convencional) ou da natureza da relação jurídica
(litisconsórcio necessário natural). É necessário que todos os sujeitos da
relação material controvertida se encontrem em juízo para que o juiz
conheça do mérito da causa, sob pena de, nos termos do art. 493º,
494º al. e) e 288º/1 al. d) absolver da instância (a ilegitimidade
processual consubstancia uma excepção dilatória)
Coligação: à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações
matérias litigadas, exigindo-se uma pluralidade de pedidos, sendo a
cumulação pedida em virtude da unicidade da fonte dessas relações, da
dependência entre os pedidos ou da conexão substancial entre os
fundamentos destes.
No presente caso, existe um só pedido que assenta na declaração de nulidade do
contrato de compra e venda pelo que se está face a uma situação de litisconsórcio.
Tendo Diana e Eugénia comprado o imóvel em conjunto tal exclui a possibilidade de
se estar face a um litisconsórcio voluntário uma vez que o direito de Eugénia será
incompatível com o direito de Filipa (é sempre necessário analisar a situação
concreta).
Excluída a coligação e a possibilidade de o litisconsórcio ser voluntário, resta-nos
portanto o litisconsórcio necessário mas é necessário determinar qual a sua
modalidade: não resultando da lei nem tendo sido convencionado estar-se-á face a
um litisconsórcio necessário natural.
O Litisconsórcio necessário natural encontra-se consagrado no art. 28º/2 CPC e é
aquele em que é imposta a presença de todos os interessados na acção (maxime de
todos os titulares da relação material controvertida), pois, doutro modo, a decisão
judicial a obter não produz o seu efeito útil normal, atenta a natureza da relaçao
jurídica em discussão.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 27
O Efeito útil Normal de uma decisão judicial consiste na composição definitiva do litígio
entre as partes relativamente ao pedido formulado, de modo que o caso julgado
material possa abranger todos os interessados, evitando tornar-se incompatível (por
que contraditória, total ou parcialmente) com a decisão eventualmente obtida numa
outra acção. O essencial é que o resultado da composição do tribunal vincule as
partes que estão no processo compondo definitivamente a situação jurídica entre
elas, não podendo esta composição ser afectada por uma outra que, eventualmente,
venha a ser obtida em ulterior acção entre as mesmas partes.
Deste modo, nos termos do art. 28º/2 CPC existe uma situação de litisconsórcio
necessário natural, pelo que não tendo Eugénia sido demandada na acção
intentada por Filipa estamos face a uma situação de ilegitimidade processual, que nos
termos do art. 493º e 494º al. e) consubstancia uma excepção dilatória tendo como
consequência a absolvição da instância.
Contudo, esta excepção dilatória pode ser sanável nos termos do art. 508º/1 al. a) que
se conjuga com o art. 265º/2, ou seja o juiz notifica o autor que existe uma situação de
ilegitimidade processual e confere-lhe o prazo de dez dias para sanar, se quiser, a falta
de legitimidade, provocando a intervenção de Eugénia. A intervenção de Eugénia na
acção terá de ser realizada por Filipa e não pelo Tribunal. Deste modo surge uma
nova parte na acção.
NOTA1: ao considerar que há litisconsórcio necessário está se a obrigar alguém que
não quis ser autor a intentar esta acção. Diz-se que se está a obrigar alguém
efectivamente a intentar uma vez que se ele não quiser intentar a acção
conjuntamente com o outro autor pode-se provocar um incidente de intervenção de
terceiros provocada, passando aquele que não quis intentar a acção a ser parte
obrigatória, ou seja passa a ser obrigado a intervir sem que nada possa fazer para
recusar.
NOTA2: a coligação em regra é voluntária, só sendo necessária nos casos de
acidentes de viação em que não há culpa.
NOTA3: incidente de intervenção de terceiros (art. 325º CPC). É necessário analisar
com atenção o disposto no art. 328º/2 CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 28
Caso X
Com o objectivo de nele construir um empreendimento turístico, a sociedade MMM,
SA, com sede em Lisboa, celebrou com João e Luís, portugueses, domiciliados em
Aveiro um contrato-promessa de compra e venda de um terreno sito em Sintra, com
eficácia real, pelo preço de € 300.000,00.
A escritura pública não se realizou na data marcada porque Luís e João não
compareceram no notário, em violação do que fora acordado.
Entretanto, MMM, S.A., tomou conhecimento que Luís e João prometeram vender o
mesmo imóvel a Nuno, português, domiciliado em Aveiro, por 400mil euros.
MMM, SA, propôs então uma acção contra Luís e contra Nuno pedindo (i) a execução
específica do contrato promessa (contra Luís) e a (ii) declaração de nulidade do
contrato promessa celebrado com Nuno (contra Luís e contra Nuno).
TEMA – LEGITIMIDADE PROCESSUAL (COLIGAÇÃO e COMPETÊNCIA)
a. Podem ambos os pedidos ser feitos simultaneamente na mesma acção?
Uma vez que estamos face a um caso em que existe pluralidade de pedidos estamos
no âmbito da coligação que se encontra regulada nos art. 30º e ss CPC.
A cumulação de pedidos encontra-se consagrada no artigo 470º CPC, estando este
pensado para as situações em que há um autor e um réu estando assegurada a
conexão entre os pedidos. Na coligação existe, contudo, uma pluralidade de relações
materiais controvertidas exigindo-se como tal a conexão entre os pedidos, pelo que
ocorre uma remissão do art. 470º para o art. 31º CPC.
Não se verificando nenhum obstáculo à coligação nos termos do art. 31º podemos
concluir que a cumulação entre pedidos é possível.
Para que se possa verificar uma situação de coligação é necessária a verificação de
certos requisitos que se encontram consagrados no art. 30º, 31º e 470º do CPC:
Compatibilidade substantiva entre os pedidos – art. 470º CPC
Relação de Dependência ou Prejudicialidade entre os pedidos – art. 30º/1 CPC
Compatibilidade Processual (competência e forma) – art. 31º CPC
Requisito 1 – Compatibilidade Substantiva Entre os Pedidos
Nos termos do art. 470º CPC, exige-se uma compatibilidade substantiva entre os
pedidos. No presente caso, é compatível pedir a execução específica com a
declaração de nulidade.
Requisito 2 – Relação de Prejudicialidade ou de Dependência entre os Pedidos
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 29
Nos termos do art. 30º CPC, pode haver coligação quando os pedidos estiverem numa
relação de dependência ou de prejudicialidade entre si, ou seja quando um réu é
demandado como devedor da obrigação fundamental e o outro é demandado
como devedor da relação cambiária, como avalista (coligação passiva), quando dois
filhos maiores deduzem pedidos de fixação de alimentos destinados a completar a sua
formação profissional contra os dois progenitores (coligação activa e passiva);
quando, em razão da identidade da causa de pedir, os diversos trabalhadores lesados
pelo mesmo facto ilícito demandarem, na mesma acção, a entidade patronal e a
seguradora da entidade patronal (coligação activa e passiva).
Ou seja, está em causa uma ideia de economia e celeridade processual que se traduz
no facto de evitar que a máquina da justiça tenha de apreciar duas acções
separadamente quando as mesmas poderiam ter sido apreciadas numa mesma
acção. Contudo, é necessário uma certa relação de dependência ou de
prejudicialidade para o efeito não ser o contrário.
Nos termos do art. 30º CPC consagram-se várias relações de conexão, mas a verdade
é que basta a existência de apenas uma para se verificar a coligação.
No presente caso, estamos no âmbito de uma relação de prejudicialidade ou de
dependência consagrada no nº1 do art. 30º CPC (antigamente só se previa o facto
de ser uma relação de dependência, tendo sido a relação de prejudicialidade
acrescentada posteriormente).
Coloca-se a questão de saber se existe alguma diferença entre a dependência e a
prejudicialidade, e se sim em que termos.
Na opinião do Prof. Alberto dos Reis, na dependência, para além da questão
da prejudicialidade, poderia existir uma Acessoriedade entre os pedidos;
dependência no sentido em que um dos pedidos é acessório relativamente ao
outro pedido. Por exemplo, quando se propõe uma acção de invalidade de
um testamento contra os herdeiros, invocando para o efeito dolo, e acresce-se
um pedido de indemnização, o pedido relevante é o da invalidade do
testamento, sendo a indemnização acessória da invalidade do testamento.
Contudo, no caso concreto é difícil separar a prejudicialidade da
dependência.
A Prof. Rita Gouveia não encontra, para efeitos de coligação, nenhuma
situação que não seja dependente e prejudicial em simultâneo.
No presente caso, só através da acção de execução específica é que o direito de
propriedade surge na esfera jurídica da sociedade MMM, pelo que a acção de
nulidade do contrato promessa celebrado com Nuno encontra-se dependente da
acção de execução especifica.
NOTA1: no exame, quanto a esta questão, deve responder-se ‘’existe uma conexão
entre os pedidos que assenta na dependência e prejudicialidade’’
NOTA2: a aplicação do art. 30º/3 CPC assenta nos títulos de crédito e nas obrigações
cambiárias
Requisito 3 – Compatibilidade Processual (Competência e Forma)
Nos termos do art. 31º CPC exige-se uma compatibilidade processual que se traduz na
competência e na forma de cada pedido.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 30
Importa salientar que, por um lado, a identidade das formas de processo não
necessita de ser absoluta, e por outro lado, a competência é absoluta (em razão da
matéria, da hierarquia e do território).
Uma vez que se está face a dois pedidos é sempre necessário analisá-los em
separado, fazendo-se o seguinte processo: primeiro analisa-se a forma de processo e o
tribunal competente de um dos pedidos e depois analisa-se novamente a forma de
processo e o tribunal competente quanto ao outro pedido. Se a forma de processo e
o tribunal competente forem os mesmos em ambos os pedidos a coligação é possível.
Quanto à Forma do Processo
Pedido1 – Execução Específica do Contrato Promessa
Em primeiro lugar, é necessário determinar o valor da causa, pelo que neste caso é
necessário recorrer às normas constantes do art. 305º e ss CPC.
Estamos face a uma acção de execução específica de um contrato promessa cujo
seu objectivo é o cumprimento do contrato de compra e venda, pelo que de acordo
com o artigo 310º consagra-se que ‘’quando a acção tiver por objecto a apreciação
da existência (…) de um acto jurídico, atender-se-á ao valor do acto determinado
pelo preço’’. Deste modo, de acordo com o art. 310º/1 CPC o valor da acção seria
trezentos mil euros pois este é preço do terreno em causa.
Contudo é necessário atender ao artigo 311º, nomeadamente ao seu nº1 e nº4. Nos
termos do art. 311º/1 CPC ‘’se a acção tiver por fim fazer valer o direito de
propriedade sobre uma coisa, o valor desta determina o valor da causa’’. Aplicando
esta norma, o valor da causa também seria, tal como dispõe o art. 310º/1 CPC, de
trezentos mil euros. Nos termos do art. 311º/4 CPC ‘’tratando-se de outro direito real
(não o direito de propriedade – nº1) atender-se-á ao conteúdo e duração provável.’’
Ora, o artigo 311º/4 CPC exprime uma ideia económica do direito, do valor do direito
quando se refere ao conteúdo do mesmo; quando se refere à duração tal relaciona-
se com o facto de existirem direitos reais temporários. Relacionando o art. 311º/1 com
o art. 311º/4 CPC podemos pressupor que o nº1 pressupõe a titularidade do direito de
propriedade, só sendo então utilizado para acções de reinvindicação.
De qualquer forma, tanto por aplicação do art. 310º/1, do art. 311º/1 e do art. 311º/4
CPC o valor da causa seria de trezentos mil euros. Contudo, se fosse uma acção de
execução específica sem eficácia real nunca se aplicaria nenhuma das normas do
art. 311º CPC aplicando-se apenas o art. 310º/1 CPC.
Determinado o valor da causa é necessário agora atender, nos termos do artigo 4º do
CPC, ao tipo de acção que a acção de execução específica é. Ora, nos termos do
art. 4º/1 e 2 estamos face a uma acção declarativa.
Quanto à forma do processo é necessário recorrer ao artigo 460º e ss CPC. Uma vez
que não existe nenhum processo especial, nos termos do artigo 460º, 461º e 462º
aplica-se o processo ordinário comum, uma vez que nos termos do art. 31º da LOFTJ
2008 o valor da alçada do Tribunal da Relação é de trinta mil euros e o valor da causa
no presente caso prático de trezentos mil euros. Poder-se-ia ainda suscitar-se a
questão do Regime do Processo Civil Experimental devido ao facto de este não ter
limitação de valor.
Pedido2 – Declaração de Nulidade do Contrato Promessa Celebrado com Nuno
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 31
Em primeiro lugar, é necessário determinar o valor da causa, pelo que neste caso é
necessário recorrer às normas constantes do art. 305º e ss CPC.
Estamos face a uma acção de declaração de nulidade do contrato promessa
celebrado com Nuno, pelo que nos termos do art. 310º/1 ‘’Quando a acção tiver por
objecto a (…) validade (…) de um acto jurídico, atender-se-á ao valor do acto
determinado pelo preço ou estipulado pelas partes’’ o valor da causa será de
quatrocentos mil euros.
Determinado o valor da causa é necessário agora atender, nos termos do artigo 4º do
CPC, ao tipo de acção que a acção de declaração de nulidade do contrato
promessa é. Ora, nos termos do art. 4º/1 e 2 estamos face a uma acção declarativa.
Quanto à forma do processo é necessário recorrer ao artigo 460º e ss CPC. Uma vez
que não existe nenhum processo especial, nos termos do artigo 460º, 461º e 462º
aplica-se o processo ordinário comum, uma vez que nos termos do art. 31º da LOFTJ
2008 o valor da alçada do Tribunal da Relação é de trinta mil euros e o valor da causa
no presente caso prático de quatrocentos mil euros.
Em suma, sendo a forma de processo (processo comum ordinário) a mesma, tanto
quanto à acção de execução específica como quanto à acção de declaração de
nulidade do contrato promessa celebrado com Nuno, a coligação é possível.
NOTA: para que a coligação seja possível quanto à forma de processo é necessário
que: (1) exista identidade entre as formas de processo; (2) a diferença entre a forma
de processo devido valor da causa entre os pedidos é possível (processo comum
ordinário e sumário) – art. 31º/1 in fine CPC; (3) diferença entre as formas de processo,
quando não é apenas em relação ao valor da causa, conduz a que seja o juiz a
decidir (processo comum sumário e processo comum sumaríssimo – critério do valor e
do objecto; processo comum e processo especial) – art. 31º/2 CPC
Quanto ao Tribunal Competente
Pedido1 – Execução Específica do Contrato Processo
É necessário analisar os critérios de competência absoluta nesta fase, uma vez que
quanto à competência relativa está só será analisada depois a primeira se encontrar
verificada:
Competência Internacional
O presente litigio encontra-se centrado na ordem jurídica portuguesa, não existindo
nenhum facto de conexão com outra ordem jurídica (poderia existir se o contrato
prevê-se uma cláusula de foro, mesmo que não fosse válida). Deste modo, não é
necessário sujeitar a resolução do processo ao Regulamento de Bruxelas, ao artigo 65º
e ss CPC ou a Pactos de Jurisdição. Conclui-se que os tribunais portugueses têm
competência em razão do território.
Competência em Razão da Matéria (art. 66º e ss CPC)
De acordo com a natureza das matérias que são objecto dos conflitos de interesses,
assim o poder jurisdicional é atribuído a distintos tribunais. Nos termos do art. 66º CPC
consagra-se que a competência dos tribunais judiciais é residual no confronto com as
restantes ordens jurídicas de jurisdição permanente (art. 209º e ss. CRP – Tribunal
Constitucional, Tribunal de Contas, Tribunais Administrativos, Tribunais Fiscais e Tribunais
Militares).
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 32
Deste modo, a competência em razão da matéria distingue os tribunais judiciais
relativamente aos tribunais de outras ordens de jurisdição em função da
especialização das matérias em causa. Nos termos do art. 26º/1 da LOFTJ 2008 as
causas que não sejam da competência de outra ordem de jurisdição são da
competência dos tribunais judiciários.
No presente caso, considerando o art. 209º da CRP, as inerentes leis de organização
das diferentes ordens dos tribunais, o art. 66º do CPC e o art. 26º da LOFTJ 2008
estamos face a uma acção de execução específica entre dois particulares pelo que
a competência pertence aos Tribunais Judiciais.
Dentro da ordem de jurisdição dos tribunais judiciais, a lei distingue diferentes tribunais,
no tocante à competência em razão da matéria. Deste modo, e de acordo com o
art. 73º/2 da LOFTJ, os tribunais judiciais podem ser de:
Competência Genérica (art. 110º LOFTJ 2008): se o autor invoca factos que
permitem várias qualificações jurídicas, o tribunal que tenha sido provocado é
materialmente competente se no seu âmbito de competência couber, pelo
menos, uma das qualificações jurídicas. O tribunal embora competente,
somente pode analisar o caso à luz da qualificação para que seja
materialmente competente.
Competência Especializada (art. 111º e ss LOFTJ 2008): quando os factos
alegados pelo autor apenas autorizam uma determinada qualificação jurídica,
com exclusão de outras qualificações, o tribunal em que ele deduziu a acção
é competente, se e quando essa qualificação for subsumida no âmbito de
competência material desse tribunal.
No presente caso, a acção de execução específica não se insere em nenhum dos
casos de competência especializada previstos no art. 74º/2, com ressalva da al. i), ou
seja no tocante à instância civil.
Deste modo, ou o tribunal competente será de competência genérica ou será de
competência especializada de instância civil, desde que tal exista na comarca em
causa.
NOTA1: Quando é necessário determinar qual o tribunal competente deve-se ter
como pressuposto os vários tipos de tribunais existentes e os conhecimentos de direito
substantivo.
NOTA 2: ocorre um acidente na auto estrada porque o condutor atropelou um peru e
consequentemente sofreu danos. O condutor intenta uma acção de indemnização
contra a concessionária no tribunal judicial ou administrativo? Ora, a indemnização é
uma questão de responsabilidade civil e a concessionária uma entidade privada mas
está a substituir um ente público. Neste caso recorre-se ao art. 4º ETAF.
Competência em Razão da Hierarquia
A ordem de jurisdição constituída pelos tribunais judiciais é dotada de uma hierarquia
de tribunais, qual pirâmide judiciária: os tribunais judiciais de 1ª Instância, os Tribunais
da Relação (tribunais judiciais de 2ª Instância) e o Supremo Tribunal de Justiça.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 33
Nos termos do art. 27º da LOFTJ 2008 os tribunais judiciais encontram-se hierarquizados
para efeitos de recurso das suas decisões, não sendo como tal uma hierarquia do
ponto de vista administrativo (dar instruções aos tribunais inferiores).
Na LOFTJ 2008 a competência dos tribunais judiciais encontra-se consagrada, quanto
ao Supremo Tribunal de Justiça no art. 41º e ss, quanto ao Tribunal da Relação no art.
65º e ss e quanto aos Tribunais de Comarca no art. 73º e ss.
Por exclusão de partes, ou seja por nem ser nem da competência do Tribunal da
Relação nos termos do art. 65º e ss LOFTJ 2008, nem da competência do Supremo
Tribunal de Justiça nos termos do art. 41º e ss LOFTJ 2008, o pedido de acção de
execução especifica do contrato promessa será da competência do Tribunal de 1ª
Instância.
NOTA: é absolutamente errado entender que nos casos em que o pedido é de
trezentos mil euros, por exemplo, por este valor ser superior ao valor da alçada da
Relação, que tal é da competência do Supremo Tribunal de Justiça.
Pedido2 – Declaração de Nulidade do Contrato Promessa Celebrado com Nuno
Quanto aos critérios da competência absoluta é necessário analisar:
Competência Internacional
Exactamente igual ao pedido de execução específica do contrato promessa
Competência em Razão da Matéria
Exactamente igual ao pedido de execução específica do contrato promessa
Competência em Razão da Hierarquia
Exactamente igual ao pedido de execução específica do contrato promessa
Em suma, pode existir coligação uma vez que o tribunal competente para conhecer
do pedido de execução específica do contrato promessa e o tribunal competente
para conhecer do pedido da declaração de nulidade do contrato promessa é o
mesmo, quer em razão da hierarquia, quer em razão da matéria e quer em razão do
território.
b. Pode o pedido ii) ser proposto em simultâneo contra aqueles dois réus?
TEMA: LEGITIMIDADE (LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO NATURAL)
No caso concreto pretende-se saber se a acção de declaração de nulidade do
contrato promessa pode ser proposta contra Luís e contra Nuno.
Estamos face a uma situação em que um terceiro (a sociedade MMM, SA) pretende
propor uma acção de declaração de nulidade de um contrato promessa de que em
que aquele não é parte, uma vez que o contrato promessa foi celebrado com Nuno
por Luís e João.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 34
Nos termos do art. 27º e 28º do CPC, entende-se por litisconsórcio a situação em que
existe uma pluralidade de partes, mas unicidade da relação material controvertida,
existindo como tal um único pedido formulado contra ou por vários réus; a esta
unicidade da relação controvertida corresponde uma pluralidade de pessoas (e, logo,
de partes). O litisconsórcio pode ser:
Voluntário (regra): a cumulação depende exclusivamente da vontade das
partes. Se os interessados não forem demandados daí não resulta qualquer
ilegitimidade pois o litisconsórcio verifica-se por iniciativa das partes ou de uma
delas.
Necessário: a cumulação resulta de determinação da lei (litisconsórcio
necessário legal), de prévia estipulação dos interessados (litisconsórcio
necessário convencional) ou da natureza da relação jurídica (litisconsórcio
necessário natural). É necessário que todos os sujeitos da relação material
controvertida se encontrem em juízo para que o juiz conheça do mérito da
causa, sob pena de, nos termos do art. 493º, 494º al. e) e 288º/1 al. d) absolver
da instância (a ilegitimidade processual consubstancia uma excepção
dilatória)
No presente caso, existe um só pedido que assenta na declaração de nulidade do
contrato de compra e venda pelo que se está face a uma situação de litisconsórcio.
Tendo a sociedade MMM celebrado um contrato promessa de compra e venda de
um terreno com João e Luís e tendo posteriormente estes celebrado outro contrato
promessa com incidência no mesmo terreno com Nuno tal exclui a possibilidade de se
estar face a um litisconsórcio voluntário uma vez que o direito da sociedade será
incompatível com o direito de Nuno (é sempre necessário analisar a situação
concreta).
Excluída a coligação (existe uma pluralidade de partes mas apenas uma única
relação material controvertida) e a possibilidade de o litisconsórcio ser voluntário,
resta-nos portanto o litisconsórcio necessário mas é necessário determinar qual a sua
modalidade: não resultando da lei nem tendo sido convencionado estar-se-á face a
um litisconsórcio necessário natural.
O Litisconsórcio necessário natural encontra-se consagrado no art. 28º/2 CPC e é
aquele em que é imposta a presença de todos os interessados na acção (maxime de
todos os titulares da relação material controvertida), pois, doutro modo, a decisão
judicial a obter não produz o seu efeito útil normal, atenta a natureza da relaçao
jurídica em discussão.
O Efeito útil Normal de uma decisão judicial consiste na composição definitiva do litígio
entre as partes relativamente ao pedido formulado, de modo que o caso julgado
material possa abranger todos os interessados, evitando tornar-se incompatível (por
que contraditória, total ou parcialmente) com a decisão eventualmente obtida numa
outra acção. O essencial é que o resultado da composição do tribunal vincule as
partes que estão no processo compondo definitivamente a situação jurídica entre
elas, não podendo esta composição ser afectada por uma outra que, eventualmente,
venha a ser obtida em ulterior acção entre as mesmas partes.
Deste modo, substancialmente, sendo a sociedade MMM um interessado
juridicamente é possível intentar tal acção. Deste modo, do ponto de vista processual,
estamos face a uma situação de litisconsórcio, mais concretamente uma situação de
litosconsórcio natural.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 35
Em suma, a acção de declaração de nulidade do contrato promessa pode ser
proposta pela sociedade MMM contra Luís e Nuno nos termos do art. 26º (norma geral)
e do art. 28º/2 do CPC.
c. O facto de a acção não ter sido proposta contra João deverá obstar ao
conhecimento do mérito da mesma?
TEMA: LEGITIMIDADE (LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO NATURAL)
No presente caso existem dois pedidos formulados pela Sociedade MMM: o pedido de
execução específica do contrato promessa e o pedido de declaração de nulidade
do contrato promessa celebrado com Nuno.
Pedido de Declaração de Nulidade do Contrato Promessa celebrado com Nuno
Neste caso, o pedido é formulado pela Sociedade MMM e é contra Nuno e contra
Luís, não sendo João parte. Na al. b) contatou-se que é possível este pedido ser
proposto em simultâneo contra Nuno e Luís pelo que se remete para lá neste caso.
Pedido de Execução Específica do Contrato Promessa
Neste caso, o pedido é formulado pela Sociedade MMM contra Luís, não sendo João
parte. É necessário analisar se estamos face a uma situação de litisconsórcio ou de
coligação.
A regra no processo é a da dualidade das partes (autor e réu), embora no mesmo
processo o autor possa cumular dois ou mais pedidos contra o réu. Contudo, muitas
vezes, em lugar de um só autor ou um só réu, a acção tem vários autores ou é
proposta contra dois ou mais réus.
Nestes casos, à dualidade das partes substitui-se a pluralidade das partes, podendo
esta ser:
Pluralidade activa, se a acção é proposta por dois ou mais autores contra o
mesmo réu
Pluralidade passiva, se o autor demanda simultaneamente vários réus
Pluralidade mista, quando a acção é instaurada por dois ou mais autores
contra vários réus.
Nos termos do art. 27º e ss CPC distingue-se entre litisconsórcio, que pode ser
necessário ou voluntário, e coligação:
Litisconsórcio: há pluralidade de partes, mas unicidade da relação material
controvertida, existindo como tal um único pedido formulado contra ou por
vários réus; a esta unicidade da relação controvertida corresponde uma
pluralidade de pessoas (e, logo, de partes).
Voluntário (regra): a cumulação depende exclusivamente da vontade
das partes. Se os interessados não forem demandados daí não resulta
qualquer ilegitimidade pois o litisconsórcio verifica-se por iniciativa das
partes ou de uma delas.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 36
Necessário: a cumulação resulta de determinação da lei (litisconsórcio
necessário legal), de prévia estipulação dos interessados (litisconsórcio
necessário convencional) ou da natureza da relação jurídica
(litisconsórcio necessário natural).
É necessário que todos os sujeitos da relação material controvertida se
encontrem em juízo para que o juiz conheça do mérito da causa, sob
pena de, nos termos do art. 493º, 494º al. e) e 288º/1 al. d) absolver da
instância (a ilegitimidade processual consubstancia uma excepção
dilatória)
Coligação: à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações
matérias litigadas, exigindo-se uma pluralidade de pedidos, sendo a
cumulação pedida em virtude da unicidade da fonte dessas relações, da
dependência entre os pedidos ou da conexão substancial entre os
fundamentos destes.
No presente caso estamos face a uma acção de execução específica proposta pela
Sociedade MMM contra Luís, colocando-se a questão de saber se aquela também
deveria ser proposta contra João, uma vez que o contrato promessa (que não foi
cumprido) foi celebrado entre a Sociedade MMM com Luís e João. Ou seja, existe
apenas uma relação material controvertida e um único pedido (pedido de execução
específica) pelo que se exclui a possibilidade de se estar face a uma situação de
coligação.
Excluída a possibilidade de se estar face a uma situação de coligação, coloca-se a
questão de saber se se está face a um litisconsórcio voluntário ou necessário.
Para responder a esta questão é necessário formular uma outra questão: o efeito útil
normal da sentença produz-se se a acção for proposta apenas contra um dos
promitentes, neste caso Luís?
O Litisconsórcio necessário natural encontra-se consagrado no art. 28º/2 CPC e é
aquele em que é imposta a presença de todos os interessados na acção (maxime de
todos os titulares da relação material controvertida), pois, doutro modo, a decisão
judicial a obter não produz o seu efeito útil normal, atenta a natureza da relaçao
jurídica em discussão.
O Efeito útil Normal de uma decisão judicial consiste na composição definitiva do litígio
entre as partes relativamente ao pedido formulado, de modo que o caso julgado
material possa abranger todos os interessados, evitando tornar-se incompatível (por
que contraditória, total ou parcialmente) com a decisão eventualmente obtida numa
outra acção. O essencial é que o resultado da composição do tribunal vincule as
partes que estão no processo compondo definitivamente a situação jurídica entre
elas, não podendo esta composição ser afectada por uma outra que, eventualmente,
venha a ser obtida em ulterior acção entre as mesmas partes.
Imagine-se a seguinte situação: no pedido de execução específica proposto contra
Luís este é declarado procedente, mas se o mesmo pedido for proposto contra João e
declarado improcedente esta improcedência coloca em causa a procedência do
primeiro pedido. A não oponibilidade conduz a que a sentença não produza o seu
efeito útil normal.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 37
Deste modo, e em suma, para impedir que a sentença não produza ao seu efeito útil
normal e que consequentemente o juiz não possa conhecer do mérito da causa nos
termos do art. 493º e 494º al. e) o autor deverá provocar a intervenção de João quer
de forma espontânea quer de forma provocada, nos termos do art. 320º al. a) e ss.
CPC.
IV - Competência
CASO XI
Fernando, furioso por ter sido despedido pela empresa Transportes Velocidade, S.A., no
âmbito de uma alegada reestruturação motivada pela crise financeira, instaura acção
de condenação no Juízo de Grande Instância Cível contra esta última, pedindo o
pagamento dos salários e das férias em atraso, bem como uma indemnização por
danos morais que alega ter sofrido com um despedimento tão abrupto. Quid iuris?
TEMA: COMPETÊNCIA ABSOLUTA (INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA EM RAZÃO DA MATÉRIA)
No presente caso, Fernando instaura uma acção de condenação contra a empresa
Transportes Velocidade, no Juízo de Grande Instância Cível. É necessário analisar se o
Juízo de Grande Instância Cível teria competência para conhecer do mérito da
causa.
Deste modo, é necessário analisar os critérios de competência absoluta nesta fase,
uma vez que quanto à competência relativa está só será analisada depois a primeira
se encontrar verificada:
Competência Internacional
O presente litigio encontra-se centrado na ordem jurídica portuguesa, não existindo
nenhum facto de conexão com outra ordem jurídica (poderia existir se o contrato
prevê-se uma cláusula de foro, mesmo que não fosse válida). Deste modo, não é
necessário sujeitar a resolução do processo ao Regulamento de Bruxelas, ao artigo 65º
e ss CPC ou a Pactos de Jurisdição. Conclui-se que os tribunais portugueses têm
competência em razão do território.
Competência em Razão da Matéria (art. 66º e ss CPC)
De acordo com a natureza das matérias que são objecto dos conflitos de interesses,
assim o poder jurisdicional é atribuído a distintos tribunais. Nos termos do art. 66º CPC
consagra-se que a competência dos tribunais judiciais é residual no confronto com as
restantes ordens jurídicas de jurisdição permanente (art. 209º e ss. CRP – Tribunal
Constitucional, Tribunal de Contas, Tribunais Administrativos, Tribunais Fiscais e Tribunais
Militares).
Deste modo, a competência em razão da matéria distingue os tribunais judiciais
relativamente aos tribunais de outras ordens de jurisdição em função da
especialização das matérias em causa. Nos termos do art. 26º/1 da LOFTJ 2008 as
causas que não sejam da competência de outra ordem de jurisdição são da
competência dos tribunais judiciários.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 38
No presente caso, considerando o art. 209º da CRP, as inerentes leis de organização
das diferentes ordens dos tribunais, o art. 66º do CPC e o art. 26º da LOFTJ 2008
estamos face a uma acção de condenação proposta por Fernando contra a
empresa Transportes Velocidade pelo que a competência pertence aos Tribunais
Judiciais.
Dentro da ordem de jurisdição dos tribunais judiciais, a lei distingue diferentes tribunais,
no tocante à competência em razão da matéria. Deste modo, e de acordo com o
art. 73º/2 da LOFTJ, os tribunais judiciais podem ser de:
Competência Genérica (art. 110º LOFTJ 2008): se o autor invoca factos que
permitem várias qualificações jurídicas, o tribunal que tenha sido provocado é
materialmente competente se no seu âmbito de competência couber, pelo
menos, uma das qualificações jurídicas. O tribunal embora competente,
somente pode analisar o caso à luz da qualificação para que seja
materialmente competente.
Competência Especializada (art. 111º e ss LOFTJ 2008): quando os factos
alegados pelo autor apenas autorizam uma determinada qualificação jurídica,
com exclusão de outras qualificações, o tribunal em que ele deduziu a acção
é competente, se e quando essa qualificação for subsumida no âmbito de
competência material desse tribunal.
No presente caso, estamos no âmbito de uma relação de trabalho em que Fernando
tinha sido despedido pela empresa Transportes Velocidades, pelo que nos termos do
art. 74º/2 al. c) LOFTJ, existindo um tribunal de competência especializada na região
(que no caso nenhum elemento nos é dado quanto a este facto), seria da
competência especializada do Tribunal do Trabalho, não podendo a acção ser
intentada na Instância Cível (competência residual). Ou seja, por força do art. 73º/2, in
fine e do art. 74º/2 al. c) LOFTJ competentes são os Tribunais do Trabalho.
Deste modo, sendo a acção proposta no Juízo de Grande Instância Cível tal foi
proposta num tribunal que é materialmente incompetente (quem seria competente
seria o Tribunal do Trabalho, estando portanto face a um caso de incompetência
absoluta nos termos do art. 101º CPC (‘’A infracção das regras de competência em
razão da matéria (…) determina a incompetência absoluta do tribunal’’)
Nos termos do art. 102º CPC, a incompetência absoluta pode ser arguida pelas partes.
Nos termos do art. 105º CPC a incompetência absoluta pode conduzir a uma das
seguintes consequências: ou ocorre a absolvição do réu da instância, ou ocorre o
indeferimento em despacho liminar, quando o processo o comportar. A segunda
possível consequência constitui uma excepção pelo que esta norma necessita de ser
conjugada com o art. 234º-A.
NOTA1: Nos termos do art. 102º/1 a incompetência absoluta deverá ser suscitada
oficiosamente pelo tribunal em qualquer estado do processo, enquanto não houver
sentença com transito em julgado sobre o fundo da causa. Ou seja, se a acção tivesse
sido proposta num tribunal administrativo aplicar-se-ia o art. 102º/1 CPC uma vez que é
uma incompetência absoluta mais gravosa.
NOTA2: Nos termos do art. 102º/2 conjugado com o art. 495º, mesmo que não tenha
sido arguida pelas partes, a incompetência em razão da matéria é de conhecimento
oficioso, desde que o seja até ser proferido o despacho saneador, ou, não havendo
lugar a este, até ao início da audiência de discussão e julgamento. Quando se está
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 39
face a uma incompetência absoluta que se situa no seio da jurisdição judicial aplica-
se o art. 102º/2 uma vez que o tribunal judicial poderá conhecer de questões de Direito
do Trabalho (o Contrato de Trabalho encontra-se previsto no Código Civil), uma vez
que embora tenha ocorrido a autonomização do Direito do Trabalho, este continua a
ser um ramo de Direito Civil.
Deste modo, a especialização dos juízes nestas matérias não impõe, do ponto de vista
em sede de recurso, que a acção possa voltar para trás. A incompetência continua a
existir, a ser de conhecimento oficioso, mas tem um prazo mais curto (‘’até ser
proferido despacho saneador (…)até ao início da audiência de discussão e
julgamento’’) – mesmo que aquele tribunal fosse incompetente torna-se competente
(sanação do vício)
NOTA3: Nos termos do art. 103º CPC, sendo a incompetência arguida antes do
despacho saneador o juiz poderá conhecer dela imediatamente ou reservar a sua
apreciação para esse despacho; se a incompetência for arguida após proferido o
despacho saneador ela deverá ser conhecida de imediato.
NOTA4: Quanto às consequências da incompetência absoluta, consagradas no art.
105º, esta constitui uma excepção dilatória nos termos do art. 493º/2 e 494º al. a),
obstando deste motivo ao conhecimento do mérito da causa e gerando a absolvição
da instância nos termos do art. 288º/1 al. a), sendo nos termos do art. 495º é de
conhecimento oficioso.
NOTA5: Nos termos do art. 106º, a decisão sobre a incompetência absoluta possui
força de caso julgado formal, ou seja é uma decisão que será sempre passível de
recurso, pelo que se deve conjugar a referida norma com o art. 678º/2 al. a) CPC.
CASO XII
Ana, francesa, residente em Paris, pretende instaurar uma acção contra a sociedade
Belavista, S.A., com sede em Braga, e que explora um jornal com o mesmo nome,
pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização no valor de
€100.000,00 por danos morais causados por notícia que, no seu entender, viola a sua
honra e o seu bom nome.
a. Qual o Tribunal competente?
TEMA: COMPETÊNCIA ABSOLUTA E COMPETÊNCIA RELATIVA
É necessário analisar os critérios de competência absoluta nesta fase, uma vez que
quanto à competência relativa está só será analisada depois da primeira se encontrar
verificada
Competência Absoluta (Internacional, Matéria e Hierarquia)
Competência Internacional
A competência internacional (dos tribunais portugueses) é a fracção do poder
jurisdicional atribuída a estes tribunais portugueses, no seu conjunto, relativamente à
fracção do poder jurisdicional atribuída, por leis nacionais estrangeiras ou tratados ou
convenções internacionais, a tribunais estrangeiros sempre que o litígio seja
transfronteiriço, isto é, quando apresente elementos de conexão com ordens jurídicas
estrangeiras. Na ordem jurídica portuguesa, a competência internacional é
determinada independentemente da lei material aplicável à apreciação do objecto
do litígio ou mérito da causa: os tribunais portugueses podem ser internacionalmente
competentes ainda quando a causa deva ser apreciada à luz de uma lei estrangeira;
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 40
os tribunais portugueses podem julgar-se internacionalmente incompetentes mesmo
que a acção deva ser apreciada pela lei portuguesa.
As regras da competência internacional (directa) que constam para os regulamentos
comunitários valem tanto para os tribunais do foro (tribunais de um Estado Membro
onde, em concreto a acção foi proposta) como para os tribunais de qualquer outro
Estado Membro, como por exemplo, é o caso do Regulamento nº 44/2001.
Diferentemente, as regras que determinam a competência internacional dos tribunais
portugueses consagradas no art. 65º e 65º-A do CPC são regras unilaterais, pois só
fixam a competência (Internacional) dos tribunais portugueses; um tribunal estrangeiro
nunca se pode sentir condicionado no exercício da sua jurisdição pela existência e
validade daquelas regras.
Deste modo, face a cada caso concreto, é necessário conciliar o âmbito de
aplicação das normas de competência internacional reguladas no CPC com o
âmbito de aplicação das normas de competência internacional directa disciplinadas
em qualquer regulamento comunitário.
O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por
via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido
reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este
Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da
Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.
Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à
matéria civil e comercial.
Da conjugação do art. 1º/1 com o objecto da acção, ou seja a acção de
condenação no pagamento de uma indemnização que Ana pretende propor,
conclui-se que este Regulamento é aplicado.
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser
demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da
aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou
se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 4º/1, se o réu não tiver domicilio em qualquer um dos Estados
Membros (exemplo: Brasil ou Angola) a competência é regulada pela lei processual
interna do Estado Membro onde a acção foi intentada, sem prejuízo da aplicação das
regras sobre competências exclusivas, constantes no art. 22º, e por eventuais pactos
de jurisdição válidos, nos termos do art. 23º.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se
o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União
Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. Nos termos do art. 59º, sendo
a acção proposta em Portugal o tribunal português irá aplicar a lei portuguesa para
determinar se a parte tem domicilio em Portugal. Nos termos do art. 60º/1 al. a)
entende-se que uma sociedade tem domicilio no lugar em que tiver a sua sede social.
No presente caso, o demandando, a sociedade Belavista, tem sede em Braga, pelo
que da conjugação do art. 2º/1, do art. 59º e do art. 60º/1 al. a), se Ana instaurar a
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 41
acção em Portugal, os tribunais portugueses serão internacionalmente competentes
para conhecer da questão
Apesar de já se ter apurado que os tribunais portugueses são competentes
internacionalmente para conhecer da questão em analise, podemos ainda abrir
outras hipóteses.
Nos termos do art. 22º consagra-se uma série de casos de competência
exclusiva dos tribunais dos Estados Membros, as quais prevalecem sobre
quaisquer critérios gerais ou específicos, impedindo, inclusivamente, a
celebração de válidos pactos de jurisdição, quando estes respeitem às
matérias previstas nestas competências exclusivas. Estas regras de
competência exclusiva devem ser aplicadas mesmo que o demandando não
tenha domicilio ou sede num dos Estados Membros. Analisando o art. 22º
conclui-se que no caso em análise o objecto da acção (indemnização) não se
insere em nenhum dos seus números pelo que nesta hipótese não existia
competência exclusiva.
Nos termos do art. 23º consagram-se os pactos de jurisdição. Os pactos de
jurisdição atingem as regras de determinação da competência internacional
dos tribunais portugueses, havendo que distinguir entre:
Pactos Atributivos de Jurisdição: concede-se a competência
internacional a um ou a vários tribunais portugueses, a qual pode ser
exclusiva ou concorrente.
Pactos Privativos de Jurisdição: as partes retiram a competência a um
ou a vários tribunais portugueses e atribuem-na, em exclusivo ou
concorrentemente, a um ou a vários tribunais estrangeiros (art. 99º/2
CPC). Para que a competência seja atribuída em exclusivo ao foro
estrangeiro é preciso que as partes retirem a competência legal aos
tribunais portugueses; se o não fizerem o caso poderá ser apreciado e
julgado concorrentemente pelos tribunais portugueses.
No presente caso, nada nos é dito sobre a celebração de um pacto de
jurisdição entre as partes pelo que considera-se que não existe nenhum.
Nos termos do art. 5º consagra-se um conjunto de critérios especiais de
atribuição da competência internacional, para os casos em que o reu tem
domicilio num dos Estados Membros e o autor pretende que ele possa ser
demandado perante os tribunais de um outro Estado Membro (art. 3º/1).
Quando algum dos critérios especiais constantes do art. 5º se encontra
presente, o autor dispõe da seguinte alternativa: (1) propõe a acção junto dos
tribunais do Estado Membro do domicilio (ou sede) do réu; (2) ou, intenta a
acção noutro tribunal de um outro Estado Membro, uma vez observadas as
regras especiais de competência consignadas no art. 5º e ss.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 42
Quanto ao presente caso podemos equacionar duas possíveis soluções:
Nos termos do art. 5º/3, quanto às matérias extracontratuais o réu pode
ser demandando perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá
verificar-se o facto danoso. A sede do Jornal situa-se em Braga mas se
tal jornal for publicado noutros países (como sucede com o Jornal A
Bola) o facto danoso irá ocorrer no local onde se tem conhecimento da
notícia – a noticia seria realizada em Portugal mas seria publicada em
França. Contudo, parte-se do princípio que os tribunais portuguesas são
competentes internacionalmente.
Nos termos do art. 5º/4, as acções de indemnização baseadas numa
infracção penal são propostas e apreciadas no tribunal do Estado
Membro onde foi intentada a acção pública, ou seja se a lei desse
Estado permitir conhecer do pedido cível. Em Portugal tal é plausível
uma vez que o art. 71º e ss. Código do Processo Penal estatui que o
pedido indemnizatório deve ser apresentado na acção penal, na
esteira do Princípio da Adesão, excepto nas situações previstas no art.
72º/2 do referido Código. Trata-se de pedidos de indemnização cíveis
que foram feitos numa acção penal.
Em suma, quanto à competência absoluta internacional os Tribunais Portugueses
seriam internacionalmente competentes para conhecer do mérito da questão.
NOTA1: o âmbito de aplicação do Regulamento nº44/2001 é definido pelo art. 1º/1 e
não pelo nº2. Primeiro é necessário ver se a situação em concreto se refere a matéria
civil ou comercial e posteriormente há-de verificar-se se tal situação não se enquadra
em nenhum dos casos de exclusão constantes do nº2.
NOTA2: o Regulamento nº 44/2001 entrou em vigor no dia 1-03-2002, nos termos do art.
76º, pelo que as suas disposições aplicam-se às acções instauradas após essa data,
nos termos do art. 66º/1. Quando os casos práticos nada digam em contrário presume-
se que são posteriores à data de entrada em vigor do Regulamento, mais
concretamente, situam-se no presente (exemplo: ano 2012)
NOTA3: o art. 5º/4 do Regulamento não exclui o art. 5º/3 do mesmo.
Competência em Razão da Matéria (art. 66º e ss CPC)
De acordo com a natureza das matérias que são objecto dos conflitos de interesses,
assim o poder jurisdicional é atribuído a distintos tribunais. Nos termos do art. 66º CPC
consagra-se que a competência dos tribunais judiciais é residual no confronto com as
restantes ordens jurídicas de jurisdição permanente (art. 209º e ss. CRP – Tribunal
Constitucional, Tribunal de Contas, Tribunais Administrativos, Tribunais Fiscais e Tribunais
Militares).
Deste modo, a competência em razão da matéria distingue os tribunais judiciais
relativamente aos tribunais de outras ordens de jurisdição em função da
especialização das matérias em causa. Nos termos do art. 26º/1 da LOFTJ 2008 as
causas que não sejam da competência de outra ordem de jurisdição são da
competência dos tribunais judiciários.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 43
No presente caso, considerando o art. 209º da CRP, as inerentes leis de organização
das diferentes ordens dos tribunais, o art. 66º do CPC e o art. 26º da LOFTJ 2008
estamos face a uma acção de condenação proposta por Ana contra a sociedade
Belavista pelo que a competência pertence aos Tribunais Judiciais.
Dentro da ordem de jurisdição dos tribunais judiciais, a lei distingue diferentes tribunais,
no tocante à competência em razão da matéria. Deste modo, e de acordo com o
art. 73º/2 da LOFTJ, os tribunais judiciais podem ser de:
Competência Genérica (art. 110º LOFTJ 2008): se o autor invoca factos que
permitem várias qualificações jurídicas, o tribunal que tenha sido provocado é
materialmente competente se no seu âmbito de competência couber, pelo
menos, uma das qualificações jurídicas. O tribunal embora competente,
somente pode analisar o caso à luz da qualificação para que seja
materialmente competente.
Competência Especializada (art. 111º e ss LOFTJ 2008): quando os factos
alegados pelo autor apenas autorizam uma determinada qualificação jurídica,
com exclusão de outras qualificações, o tribunal em que ele deduziu a acção
é competente, se e quando essa qualificação for subsumida no âmbito de
competência material desse tribunal.
No presente caso, a acção de condenação ao pagamento de uma indemnização
não se insere em nenhum dos casos de competência especializada previstos no art.
74º/2, com ressalva da al. i), ou seja no tocante à instância civil.
Deste modo, ou o tribunal competente será de competência genérica ou será de
competência especializada de instância civil, desde que tal exista na comarca em
causa.
Competência em Razão da Hierarquia
A ordem de jurisdição constituída pelos tribunais judiciais é dotada de uma hierarquia
de tribunais, qual pirâmide judiciária: os tribunais judiciais de 1ª Instância, os Tribunais
da Relação (tribunais judiciais de 2ª Instância) e o Supremo Tribunal de Justiça.
Nos termos do art. 27º da LOFTJ 2008 os tribunais judiciais encontram-se hierarquizados
para efeitos de recurso das suas decisões, não sendo como tal uma hierarquia do
ponto de vista administrativo (dar instruções aos tribunais inferiores).
Na LOFTJ 2008 a competência dos tribunais judiciais encontra-se consagrada, quanto
ao Supremo Tribunal de Justiça no art. 41º e ss, quanto ao Tribunal da Relação no art.
65º e ss e quanto aos Tribunais de Comarca no art. 73º e ss.
Por exclusão de partes, ou seja por nem ser nem da competência do Tribunal da
Relação nos termos do art. 65º e ss LOFTJ 2008, nem da competência do Supremo
Tribunal de Justiça nos termos do art. 41º e ss LOFTJ 2008, o pedido de acção de
condenação ao pagamento de uma indeminização será da competência do Tribunal
de 1ª Instância.
NOTA: A competência dos Tribunais de 1º Instância é residual face à competência da
Relação e do STJ.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 44
Competência Relativa (Território, Valor da Causa e Forma de Processo)
Valor da Causa
Nos termos do art. 305º/1 CPC ‘’A toda a causa deve ser atribuído um valor certo (…)
o qual representa a utilidade económica imediata do pedido’’. A importância da
determinação do valor da causa, tal como é referido no nº2 do art. 305º CPC, assenta
em através desta se determinar qual o tribunal competente, qual a forma de processo
aplicável e a relação da causa com a alçada do tribunal.
Nos termos do art. 306º CPC consagram-se os critérios gerais para a fixação do valor,
salvo se se aplicar um critério especial. No presente caso não existe nenhum critério
especial pelo que se aplica o art. 306º CPC, ou seja ‘’Se pela acção se pretende obter
quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa’’.
Deste modo, sendo o valor da indemnização no montante de € 100. 000,00 será este o
valor da causa nos termos do art. 306º CPC.
NOTA1: O Valor da Causa visa determinar que tipo de tribunal (singular ou colectivo)
irá apreciar o mérito da causa tal como determinar se intervém uma pequena, média
ou grande instância (art. 127º LOFTJ 2008)
NOTA2: O art. 312º é utilizado em situações em que não esteja em causa a
materialidade do direito. Entende-se que são ‘’interesses imateriais’’, por exemplo, as
acções populares em que estejam em causa a defesa ambiental, direitos humanos,
etc.
Forma de Processo
Nos termos do art. 460º o processo pode ser comum ou especial. Nos termos do art.
461º e 462º o processo comum pode ser ordinário, sumário ou sumaríssimo. Partindo do
princípio que não existe nenhum processo especial, é necessário determinar qual a
forma de processo comum é que se encontra em causa.
Nos termos do art. 31º da LOFTJ 2008 a alçada do Tribunal da Relação é de € 30. 000,
00 e a alçada dos Tribunais de 1ª Instância de € 5. 000, 00. Ora, sendo o valor da causa
€100. 000, 00 nos termos do art. 460º, 461º e 462º estamos face ao processo comum
ordinário.
Analisada está questão do ponto de vista do processo comum, é necessário atender
que ainda existe o Regime do Processo Civil Experimental, que é um processo especial.
Este Regime do Processo Civil Experimental foi consagrado em 2006 pelo legislador e
aplica-se às acções declarativas civis comuns (ordinário, sumário e sumaríssimo) e às
acções especiais (acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias
emergentes dos contratos – DL 269/98, de 1 de Setembro).
Nos termos do art. 21º e 22º do Regime do Processo Civil Experimental consagra-se que
este regime só se aplica aos Tribunais que forem determinados por Portaria, sendo que
para o efeito existem duas Portarias a regular a sua aplicação no espaço: a Portaria
955/2006 consagra que este regime se aplica aos tribunais de Almada, Porto e Seixal; a
Portaria 115-C/2001 consagra que este regime se aplica aos tribunais das comarcas do
Barreiro e de Matosinhos e nas varas cíveis do Tribunal da Comarca do Porto.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 45
Deste modo, o Regime do Processo Civil Experimental só se aplica nos casos
consagrados nas Portarias referidas, sendo que nos restantes casos aplica-se o
Processo Civil Comum.
Em suma, tratando-se de uma acção declarativa comum segue-se o processo comum
ordinário nos termos do art. 460º a 462º do CPC; se se tratasse de um tribunal
abrangido pela área de incidência das portarias aplicar-se-ia o Regime do Processo
Civil Experimental.
Analisada a forma de processo iremos agora determinar qual o tipo de tribunal que irá
conhecer do mérito da causa, ou seja se é um tribunal singular ou um tribunal
colectivo, sendo que para tal é necessário recorrer à LOFTJ 2008.
Nos termos do art. 135º e ss da LOFTJ 2008 consagram-se as normas que determinam a
intervenção do Tribunal de Júri (art. 140º e ss), Singular (art. 135º) e Colectivo (art. 136º
e ss).
Nos termos do art. 135º/2 LOFTJ 2008 consagra-se que o Tribunal Singular irá julgar os
processos que não devam ser julgados pelo Tribunal Colectivo ou do Júri. O Tribunal
Singular é, deste modo, residual face ao Tribunal Colectivo e do Júri. Para saber se se o
Tribunal Singular é competente então será necessário primeiro determinar a
incompetência do Tribunal Colectivo e do Júri.
Nos termos do art. 140º e ss, quanto ao Tribunal de Júri, estes possuem uma
competência residual nunca tendo aquela quando se esteja face a uma matéria civil
(como é o caso). Deste modo, os Tribunais de Júri, no presente caso, encontram-se
excluídos.
Nos termos do art. 136º e ss, quanto ao Tribunal Colectivo, estes são competentes
devido ao disposto no art. 137º al. b) (‘’Compete ao Tribunal Colectivo julgar (…) as
questões de facto nas acções de valor superior à alçada dos Tribunais da Relação’’)
Conjugando o art. 137º al. b) da LOFTJ 2008 com o art. 128º/1 al. a) da LOFTJ 2008
(‘’Compete à Grande Instância Cível (…) A preparação e Julgamento das Acções
Declarativas Cíveis de valor superior à alçada do Tribunal da Relação’’) o Tribunal
Colectivo de Grande Instância Cível seria o tribunal competente para conhecer do
mérito da questão.
NOTA1: O Juízo de Média Instância Cível (art. 130º LOFTJ 2008) tem competência
residual
NOTA2: Nos termos do art. 646º do CPC a intervenção do Tribunal Colectivo só
acontecerá quando: (1) existir acordo das partes quanto a tal – nº1; (2) Nas acções
em que alguma das partes haja requerido a gravação da audiência final não será
admissível a intervenção do Tribunal Colectivo, uma vez que a gravação da
audiência já oferece a segurança necessária. Deste modo, normalmente intervirá o
Tribunal Singular.
NOTA3: O CPC antigamente previa a intervenção do Tribunal Singular na Grande
Instância Cível em harmonia com o regime da LOFTJ. Contudo, o CPC foi alterado e a
LOFTJ não. Deste modo, quando se propõe uma acção, embora se saiba que com
toda a probabilidade o Tribunal Colectivo não irá intervir, não se deixa de se intentar
na Grande Instância Cível.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 46
Território
A repartição do poder de julgar, nos tribunais judiciais, é efectuada em função do
território onde cada um destes tribunais desfruta de poderes jurisdicionais. No domínio
da LOFTJ 2008 o território nacional encontra-se dividido em distritos judiciais e
comarcas, nos termos do art. 18º.
Deste modo, constatada a competência internacional dos tribunais portugueses, os
conflitos localizam-se sempre em determinada área do território português. É a lei
processual que fixa os elementos de conexão relevantes, os quais determinam, nos
casos concretos, o tribunal territorialmente competente. Tais elementos de conexão
encontram-se consagrados no art. 73º a 95º do CPC.
Nos termos do art. 86º CPC, uma vez que o réu é uma pessoa colectiva (sociedade
Belavista) consagra-se o foro do réu, correspondendo tal a uma regra supletiva, à qual
se recorre sempre que o caso não esteja previsto noutra norma, ou seja, sempre que
não haja disposição especial em contrário, competente para a acção é o tribunal em
cuja circunscrição o réu tenha o sede da administração principal.
Contudo, existe uma regra especial constante no art. 74º/2 CPC (‘’Se a acção se
destinar a efectivar a responsabilidade civil baseada em facto ilícito ou fundada no
risco, o tribunal competente é o da correspondente ao lugar onde o facto ocorreu’’).
Deste modo, de acordo com o art. 74º/2 CPC é necessário determinar o local onde o
facto danoso ocorreu. Como na hipótese só nos é dito que a sede do Jornal se situa
em Braga, presume-se que foi ai que ocorreu o facto danoso, pelo que seria
competente o Tribunal de Braga (Grande Instância Cível de Braga).
NOTA: A Competência Territorial encontra-se consagrada, no CPC, nos art. 73º a 95º. O
art. 85º consagra a regra geral das pessoas singulares; o art. 86º consagra a regra geral
das pessoas colectivas e o art. 87º a regra geral da pluralidade de pedidos.
b. Imagine que a acção tinha sido proposta no Juízo de Média Instância Cível de
Coimbra. Quid iuris?
TEMA: INCOMPETÊNCIA RELATIVA
Na resolução da alínea anterior conclui-se que a competência pertencia ao Juízo de
Grande Instância Cível de Braga, pelo que sendo a acção proposta no Juízo de
Média Instância Cível de Coimbra tal consubstancia um caso de incompetência
relativa, que se encontra consagrada no art. 108º e ss CPC.
Nos termos do art. 493º/1 e 2 e no art. 494 al. a) CPC os casos de incompetência
relativa consubstancia excepção dilatória. Nos termos do art. 495º CPC consagra-se
que ‘’ o tribunal deve conhecer oficiosamente de todas as excepções dilatórias, salvo
da incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo art. 110º’’. Deste modo, é
necessário analisar o art. 110º CPC a fim de se determinar se tal excepção dilatória
poderá ser conhecida oficiosamente.
Antes de passarmos a analisar o art. 110º e a sua aplicação ou não ao caso concreto
importa salientar que, independentemente do conhecimento oficioso, a parte
demandada (o réu), nos termos do art. 109º CPC, poderá sempre suscitar a questão
da incompetência relativa na contestação, de acordo com o Princípio da
Concentração da Defesa na Contestação. Se não o fizer poderá provocar o
conhecimento oficioso do juiz.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 47
Acção proposta no Juízo de Média Instância Cível quando deveria ter sido proposta
no Juízo de Grande Instância Cível
Neste caso, estamos face a uma incompetência relativa em razão do valor da causa
e da forma de processo. Nos termos do art. 110º/2 ‘’a incompetência em razão do
valor da causa ou da forma de processo aplicável é sempre de conhecimento
oficioso do tribunal’’. O momento até o qual o juiz poderá suscitar e decidir a questão
da incompetência depende da existência ou não de despacho saneador e encontra-
se consagrado no art. 110º/3 CPC. Importa ainda salientar que o art. 110º/4 procede a
uma extensão do art. 110º/2
Acção proposta em Coimbra quanto deveria ter sido proposta em Braga
Neste caso, estamos face a uma incompetência relativa em razão do território. Nos
termos do art. 110º/1 al. a) tal poderá ser conhecida oficiosamente (‘’A
incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal
(…) nas causas a que se refere (…) o nº2 do art. 74º’’). O momento até o qual o juiz
poderá suscitar e decidir a questão da incompetência depende da existência ou não
de despacho saneador e encontra-se consagrado no art. 110º/3 CPC.
Em suma, a incompetência relativa, nos termos do art. 493º/1 e 2, art. 494º al. a) e a
art. 288º consubstancia uma excepção dilatória que, sem prejuízo de poder ser
arguida pelo demandado na contestação nos termos do art. 109º CPC, poderá ser de
conhecimento oficioso nos termos do art. 495º e art. 110º do CPC.
NOTA1: Nos termos do art. 111º/3, existindo um caso de incompetência relativa o
processo será remetido para o tribunal competente.
NOTA2: Ao contrário do que sucede quanto aos casos de incompetência absoluta
(art. 678º), nos casos de incompetência relativa o recurso é admitido apenas até à
Relação.
NOTA3: Nos termos do art. 111º/2, a decisão com transito em julgado toma força de
caso julgado material.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 48
CASO XIII
A sociedade Investimentos Produtivos, S.A. (“IP”), com sede em Luanda, celebrou um
contrato promessa de compra e venda com a sociedade Xin Chao (“XC”), com sede
em Shangai, prometendo comprar um terreno situado em Faro, para aí construir um
empreendimento, tendo ficado acordado que o contrato definitivo seria assinado em
Faro. Qual o Tribunal competente em razão da nacionalidade, considerando que:
IP (Luanda) ----> Contrato Promessa de C/V de um Imóvel (Faro) <---- XC (Shangai)
TEMA: COMPETÊNCIA ABSOLUTA (INTERNACIONAL) & COMPETÊNCIA RELATIVA
(TERRITÓRIO)
a. IP quer demandar a XC pedindo a anulação do contrato com fundamento em
erro, por o terreno não ter as características garantidas por esta última?
IP (Luanda) ---> anulação do contrato com fundamento em erro <--- XC (Shangai)
Competência Absoluta (Internacional)
A competência internacional (dos tribunais portugueses) é a fracção do poder
jurisdicional atribuída a estes tribunais portugueses, no seu conjunto, relativamente à
fracção do poder jurisdicional atribuída, por leis nacionais estrangeiras ou tratados ou
convenções internacionais, a tribunais estrangeiros sempre que o litígio seja
transfronteiriço, isto é, quando apresente elementos de conexão com ordens jurídicas
estrangeiras. Na ordem jurídica portuguesa, a competência internacional é
determinada independentemente da lei material aplicável à apreciação do objecto
do litígio ou mérito da causa: os tribunais portugueses podem ser internacionalmente
competentes ainda quando a causa deva ser apreciada à luz de uma lei estrangeira;
os tribunais portugueses podem julgar-se internacionalmente incompetentes mesmo
que a acção deva ser apreciada pela lei portuguesa.
As regras da competência internacional (directa) que constam para os regulamentos
comunitários valem tanto para os tribunais do foro (tribunais de um Estado Membro
onde, em concreto a acção foi proposta) como para os tribunais de qualquer outro
Estado Membro, como por exemplo, é o caso do Regulamento nº 44/2001.
Diferentemente, as regras que determinam a competência internacional dos tribunais
portugueses consagradas no art. 65º e 65º-A do CPC são regras unilaterais, pois só
fixam a competência (Internacional) dos tribunais portugueses; um tribunal estrangeiro
nunca se pode sentir condicionado no exercício da sua jurisdição pela existência e
validade daquelas regras.
Deste modo, face a cada caso concreto, é necessário conciliar o âmbito de
aplicação das normas de competência internacional reguladas no CPC com o
âmbito de aplicação das normas de competência internacional directa disciplinadas
em qualquer regulamento comunitário.
O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por
via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido
reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este
Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da
Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.
Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à
matéria civil e comercial.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 49
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser
demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da
aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou
se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 4º/1, se o réu não tiver domicilio em qualquer um dos Estados
Membros (exemplo: Brasil ou Angola) a competência é regulada pela lei processual
interna do Estado Membro onde a acção foi intentada, sem prejuízo da aplicação das
regras sobre competências exclusivas, constantes no art. 22º, e por eventuais pactos
de jurisdição válidos, nos termos do art. 23º.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se
o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União
Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. No presente caso, a
sociedade XC tem sede em Shangai pelo que não tem domicilio em nenhum dos
Estados Membros da União Europeia, pelo que não se pode aplicar a regra constante
no art. 2º. Sendo assim, será agora necessário analisar se a situação se enquadra em
algum dos casos de competência exclusiva dos Tribunais dos Estados Membros
constantes do art. 22º.
Nos termos do art. 22º consagra-se uma série de casos de competência exclusiva dos
tribunais dos Estados Membros, as quais prevalecem sobre quaisquer critérios gerais ou
específicos, impedindo, inclusivamente, a celebração de válidos pactos de jurisdição,
quando estes respeitem às matérias previstas nestas competências exclusivas. Estas
regras de competência exclusiva devem ser aplicadas mesmo que o demandando
não tenha domicilio ou sede num dos Estados Membros. Analisando o art. 22º conclui-
se que no caso em análise o objecto da acção (anulação do contrato com
fundamento em erro) não se insere em nenhum dos seus números pelo que nesta
hipótese não existia competência exclusiva.
Não se aplicando o Regulamento nº44/2001 é necessário analisar se existe alguma
convenção internacional entre Portugal e China. A resposta é negativa.
Deste modo, não tendo o demandando domicilio num dos Estados Membros, excluída
a possibilidade de aplicação do Regulamento nº 44/2001 e da existência de alguma
Convenção Internacional, a atribuição da competência internacional aos tribunais
portugueses é efectuada à luz dos art. 65º e 65º-A do CPC, visando-se determinar se o
litigio possui algum elemento de conexão relevante com a ordem jurídica portuguesa.
A atribuição da competência internacional, aos tribunais portugueses, com base no
direito processual civil português, depende da verificação alternativa de algum dos
critérios atributivos de competência consagrados no art. 65º, 65º-A e 99º CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 50
O art. 65º CPC consagra nas suas alienas dois princípios:
Princípio da Coincidência (al. b): se a acção dever ser instaurada em Portugal
segundo as regras da competência territorial (interna) estabelecidas no CPC
(art. 73º a 89º) dai segue que os tribunais portugueses também serão
internacionalmente competentes para julgar o litigio, pese embora este possua
elementos de conexão com ordens jurídicas estrangeiras.
Princípio da Necessidade (al. d): os tribunais portugueses são
internacionalmente competentes quando o direito invocado (pelo autor ou
pelo réu, este último em reconvenção) não possa tornar-se efectivo senão
através de uma acção proposta em território português, perante os nossos
tribunais. Este critério é excepcional e subsidiário: só é mobilizado quando o
anterior o não o possa ser e quando:
Se constata uma situação de impossibilidade de o direito ser tutelado,
através de uma acção, em tribunal português ou em tribunal
estrangeiro (impossibilidade absoluta) conflito negativo de jurisdição
(nenhuma das jurisdições se considera competente para apreciar o
litigio)
Quando a acção pode ser proposta em tribunal estrangeiro, mas se
constata existir uma dificuldade grave (dificuldade considerável ou
apreciável) de o direito se poder tornar efectivo por meio de acção
proposta no tribunal estrangeiro (impossibilidade relativa).
Quando Angola estava em Guerra, se os tribunais angolanos
fossem os competentes, existia uma dificuldade apreciável, pelo
que se poderia aplicar esta alínea.
Hoje, em abstracto, poder-se-ia equacionar a aplicação desta
aliena aos casos em que o país da jurisdição competente não
reconhece o direito (exemplo: países que não reconhecem o
direito ao divórcio).
No presente caso, nada indica que estejamos face a uma situação da al. d) do art.
65º e, uma vez, que estamos face a uma situação de apreciação da validade de um
contrato, tal situação não se encontra abrangida, igualmente, em nenhum dos casos
previstos no art. 65º-A CPC. Deste modo, parece que estamos face a uma situação
constante da al. b) do art. 65º CPC, pelo que agora será necessário analisar o regime
do art. 73º e ss CPC quanto à competência territorial.
NOTA1: O art. 22º do Regulamento nº44/2001 não é aplicável uma vez que o legislador
comunitário não dá tanta importância como aquela que o legislador nacional dá a
este tipo de situações.
NOTA2: Quando se esteja face a uma situação em que se pondera aplicar o art. 65º
ou 65º-A CPC haverá que atender sempre à nova lei (LOFTJ 2008 – art. 187º/1)
NOTA3: Deve começar-se sempre por analisar a norma do art. 65º e só depois,
verificado que tal normal não enquadra a situação em causa, analisa-se o art. 65º-A.
NOTA4: O art. 65º-A (Competência Exclusiva dos Tribunais Portugueses) é uma norma
semelhante à norma que consta no art. 22º do Regulamento nº 44/2001 (Competência
Exclusiva)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 51
Competência Relativa (Território)
A repartição do poder de julgar, nos tribunais judiciais, é efectuada em função do
território onde cada um destes tribunais desfruta de poderes jurisdicionais. No domínio
da LOFTJ 2008 o território nacional encontra-se dividido em distritos judiciais e
comarcas, nos termos do art. 18º.
Deste modo, constatada a competência internacional dos tribunais portugueses, os
conflitos localizam-se sempre em determinada área do território português. É a lei
processual que fixa os elementos de conexão relevantes, os quais determinam, nos
casos concretos, o tribunal territorialmente competente. Tais elementos de conexão
encontram-se consagrados no art. 73º a 95º do CPC.
Nos termos do art. 86º/2 CPC consagra a regra geral quanto às pessoas colectivas,
uma vez que o réu é uma pessoa colectiva (XC) consagra-se o foro do réu,
correspondendo tal a uma regra supletiva, à qual se recorre sempre que o caso não
esteja previsto noutra norma, ou seja, sempre que não haja disposição especial em
contrário, competente para a acção é o tribunal em cuja circunscrição o réu tenha o
sede da administração principal. Analisados os restantes artigos conclui-se que não
existe nenhum critério especial quanto à apreciação de validade dos contratos pelo
que se coloca agora a questão de saber se, de acordo com o art. 86º CPC, os
tribunais portugueses são ou não competentes.
Ora, a sociedade XC tem sede na Shangai, pelo que nos termos do art. 86º CPC os
tribunais portugueses não têm competência para julgar o litígio.
NOTA1: Se o réu fosse uma pessoa singular, e como tal estivéssemos no âmbito de
aplicação do art. 85º (pressupondo que não existia nenhuma norma especial
aplicável), uma interpretação literal do nº3 da norma em análise conduziria a afirmar
que os tribunais portugueses seriam sempre internacionalmente competentes, mesmo
nos casos em que o demandando não tenha domicilio em Portugal. Contudo, a
doutrina tem entendido que a remissão constante do art. 65º al. b) CPC para as regras
da competência territorial não abrange o art. 85º/3, porque tal conduziria a que,
desse modo, os tribunais portugueses fossem sempre competentes.
NOTA2: Se se aplicasse a lei antiga (LOFTJ 99) por força do Princípio da Causalidade
(art. 65º al. c)) consagrava-se que os tribunais portugueses eram, igualmente,
internacionalmente competentes quando ocorressem em Portugal os factos (ou os
acontecimentos reais e concretos) que servissem de causa de pedir na acção, o que
conduziria a que neste caso os tribunais portugueses fossem internacionalmente
competentes.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 52
b. Na data da celebração do contrato definitivo, a sociedade XC não compareceu
e IP quer agora instaurar acção de execução específica do contrato promessa
de compra e venda?
IP ---> Acção de Execução Específica <--- XC
É necessário analisar duas hipóteses: o contrato promessa ter sido celebrado com
eficácia real ou sem eficácia real, uma vez que na primeira hipótese a acção terá
como objecto um direito real, enquanto na segunda hipótese a acção terá como
objecto apenas um direito obrigacional.
Competência Absoluta Internacional
Contrato Promessa Com Eficácia Real (Direito Real)
O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por
via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido
reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este
Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da
Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.
Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à
matéria civil e comercial.
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser
demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da
aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou
se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 4º/1, se o réu não tiver domicilio em qualquer um dos Estados
Membros (exemplo: Brasil ou Angola) a competência é regulada pela lei processual
interna do Estado Membro onde a acção foi intentada, sem prejuízo da aplicação das
regras sobre competências exclusivas, constantes no art. 22º, e por eventuais pactos
de jurisdição válidos, nos termos do art. 23º.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se
o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União
Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. No presente caso, a
sociedade XC tem sede em Shangai pelo que não tem domicilio em nenhum dos
Estados Membros da União Europeia, pelo que não se pode aplicar a regra constante
no art. 2º. Sendo assim, será agora necessário analisar se a situação se enquadra em
algum dos casos de competência exclusiva dos Tribunais dos Estados Membros
constantes do art. 22º.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 53
Nos termos do art. 22º consagra-se uma série de casos de competência exclusiva dos
tribunais dos Estados Membros, as quais prevalecem sobre quaisquer critérios gerais ou
específicos, impedindo, inclusivamente, a celebração de válidos pactos de jurisdição,
quando estes respeitem às matérias previstas nestas competências exclusivas. Estas
regras de competência exclusiva devem ser aplicadas mesmo que o demandando
não tenha domicilio ou sede num dos Estados Membros. Analisando o art. 22º conclui-
se que no caso em análise o objecto da acção, sendo uma acção de execução
específica do contrato promessa com eficácia real tal enquadra-se no nº1 do art. em
análise (‘’Em matéria de direitos reais sobre imóveis (…) os tribunais do Estado Membro
onde o imóvel se encontre situado’’)
Deste modo, conclui-se, que os tribunais portugueses são competentes
internacionalmente para conhecer do litígio por força da aplicação do art. 4º e 22º/1
do Regulamento nº 44/2001, uma vez que o terreno se situa em Faro.
NOTA1: Muitos alunos começam por aplicar primeiro o CPC e só depois o
Regulamento. Tal é absolutamente errado sendo sempre obrigatório começar por
analisar a aplicabilidade do Regulamento ao caso concreto.
NOTA2: Se não existisse o art. 22º do Regulamento e consequentemente este não fosse
aplicado, qual a norma aplicável? Ter-se-ia de ir ao CPC e ver se a situação se
enquadra no art. 65º ou 65º-A. Não se enquadrando no art. 65º enquadrar-se-ia no art.
65º-A.
NOTA3: Quanto o art. 65º-A c) se refere a ‘’direitos reais ou pessoais de gozo sobre
bens imóveis’’ como se deve interpretar tal?
Direitos Reais e Direitos Pessoais de Gozo, ou
Direitos Reais de Gozo e Direitos Pessoais de Gozo
↳ Boa Doutrina: considera que se aplica o primeiro sentido, ou seja Direitos Reais (sem
Gozo) e Direitos Pessoais de Gozo (no caso estamos face a um Direito Real de
Aquisição, pelo que se se defendesse o segundo sentido tal norma não poderia ser
aplicável).
Contrato Promessa Sem Eficácia Real (Direito Obrigacional)
Tendo em consideração o exposto anteriormente, uma vez que não se está face a um
direito real, mas sim a um direito obrigacional, não se poderia aplicar o art. 22º do
Regulamento 44º/2001 pelo que, em suma, não se aplica aqui o Regulamento.
Não se aplicando o Regulamento nº44/2001 é necessário analisar se existe alguma
convenção internacional entre Portugal e China. A resposta é negativa.
Deste modo, não tendo o demandando domicilio num dos Estados Membros, excluída
a possibilidade de aplicação do Regulamento nº 44/2001 e da existência de alguma
Convenção Internacional, a atribuição da competência internacional aos tribunais
portugueses é efectuada à luz dos art. 65º e 65º-A do CPC, visando-se determinar se o
litigio possui algum elemento de conexão relevante com a ordem jurídica portuguesa.
A atribuição da competência internacional, aos tribunais portugueses, com base no
direito processual civil português, depende da verificação alternativa de algum dos
critérios atributivos de competência consagrados no art. 65º, 65º-A e 99º CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 54
O art. 65º CPC consagra nas suas alienas dois princípios:
Princípio da Coincidência (al. b): se a acção dever ser instaurada em Portugal
segundo as regras da competência territorial (interna) estabelecidas no CPC
(art. 73º a 89º) dai segue que os tribunais portugueses também serão
internacionalmente competentes para julgar o litigio, pese embora este possua
elementos de conexão com ordens jurídicas estrangeiras.
Princípio da Necessidade (al. d): os tribunais portugueses são
internacionalmente competentes quando o direito invocado (pelo autor ou
pelo réu, este último em reconvenção) não possa tornar-se efectivo senão
através de uma acção proposta em território português, perante os nossos
tribunais. Este critério é excepcional e subsidiário: só é mobilizado quando o
anterior o não o possa ser e quando:
Se constata uma situação de impossibilidade de o direito ser tutelado,
através de uma acção, em tribunal português ou em tribunal
estrangeiro (impossibilidade absoluta) conflito negativo de jurisdição
(nenhuma das jurisdições se considera competente para apreciar o
litigio)
Quando a acção pode ser proposta em tribunal estrangeiro, mas se
constata existir uma dificuldade grave (dificuldade considerável ou
apreciável) de o direito se poder tornar efectivo por meio de acção
proposta no tribunal estrangeiro (impossibilidade relativa).
No presente caso, nada indica que estejamos face a uma situação da al. d) do art.
65º e, uma vez, que estamos face a uma situação em que se pretende instaurar uma
acção de execução específica de um contrato promessa, tal situação não se
encontra abrangida, igualmente, em nenhum dos casos previstos no art. 65º-A CPC.
Deste modo, parece que estamos face a uma situação constante da al. b) do art. 65º
CPC, pelo que agora será necessário analisar o regime do art. 73º e ss CPC quanto à
competência territorial.
Competência Relativa (Território)
Antes de passarmos a analisar a competência relativa é necessário atender que
anteriormente considerarmos que os Tribunais Portugueses seriam competentes
internacionalmente em virtude do facto de, tendo sido o contrato promessa
celebrado com eficácia real, a competência internacional dos tribunais decorria da
aplicação do art. 4º e 22º/1 do Regulamento nº44/2001; tendo sido o contrato
promessa celebrado sem eficácia real, a competência internacional dos tribunais
decorrida da aplicação do art. 65º al. b) CPC.
A repartição do poder de julgar, nos tribunais judiciais, é efectuada em função do
território onde cada um destes tribunais desfruta de poderes jurisdicionais. No domínio
da LOFTJ 2008 o território nacional encontra-se dividido em distritos judiciais e
comarcas, nos termos do art. 18º.
Deste modo, constatada a competência internacional dos tribunais portugueses, os
conflitos localizam-se sempre em determinada área do território português. É a lei
processual que fixa os elementos de conexão relevantes, os quais determinam, nos
casos concretos, o tribunal territorialmente competente. Tais elementos de conexão
encontram-se consagrados no art. 73º a 95º do CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 55
Nos termos do art. 86º CPC, uma vez que o réu é uma pessoa colectiva (sociedade
XC) consagra-se o foro do réu, correspondendo tal a uma regra supletiva, à qual se
recorre sempre que o caso não esteja previsto noutra norma, ou seja, sempre que não
haja disposição especial em contrário, competente para a acção é o tribunal em cuja
circunscrição o réu tenha o sede da administração principal.
Contudo, existe uma regra especial constante no art. 73º/1 CPC (‘’Devem ser
propostas no tribunal da situação dos bens as acções referentes a direitos reais ou
pessoas de gozo sobre imóveis).
NOTA: poder-se-ia ainda ponderar a aplicação do art. 74º/1 CPC?
Nos casos de aplicação desta norma existem duas opões:
Acção pode ser proposta no tribunal do domicílio do réu (a sociedade
XC tem sede em Shangai)
Acção pode ser proposta no tribunal do lugar em que a obrigação
deveria ser cumprida (por exemplo, no caso de a celebração do
contrato ser em Faro) – neste caso, os tribunais portugueses seriam
competentes territorialmente
Problemas da Aplicação deste artigo ao caso concreto:
Esta norma refere-se a cumprimento das obrigações e não a execução
específica
Para se aplicar esta norma pressupõe-se que o art. 73º se aplica apenas
a situações de execução especifica com eficácia real (‘’é muito
rebuscado’’)
Implicaria seguir a posição que o art. 65º-A al. c) se deverá interpretar
como referindo-se a direitos reais de gozo.
c. Celebrado o contrato definitivo, IP não paga o remanescente do preço,
obrigando XC a instaurar a respectiva acção de condenação?
XC (Shangai) ----> Acção de Condenação <----- IP (Luanda)
Competência Absoluta (Internacional)
O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por
via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido
reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este
Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da
Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.
Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à
matéria civil e comercial.
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 56
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser
demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da
aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou
se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 4º/1, se o réu não tiver domicilio em qualquer um dos Estados
Membros (exemplo: Brasil ou Angola) a competência é regulada pela lei processual
interna do Estado Membro onde a acção foi intentada, sem prejuízo da aplicação das
regras sobre competências exclusivas, constantes no art. 22º, e por eventuais pactos
de jurisdição válidos, nos termos do art. 23º.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se
o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União
Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. No presente caso, a
sociedade IP tem sede em Luanda pelo que não tem domicilio em nenhum dos
Estados Membros da União Europeia, pelo que não se pode aplicar a regra constante
no art. 2º. Sendo assim, será agora necessário analisar se a situação se enquadra em
algum dos casos de competência exclusiva dos Tribunais dos Estados Membros
constantes do art. 22º.
Nos termos do art. 22º consagra-se uma série de casos de competência exclusiva dos
tribunais dos Estados Membros, as quais prevalecem sobre quaisquer critérios gerais ou
específicos, impedindo, inclusivamente, a celebração de válidos pactos de jurisdição,
quando estes respeitem às matérias previstas nestas competências exclusivas. Estas
regras de competência exclusiva devem ser aplicadas mesmo que o demandando
não tenha domicilio ou sede num dos Estados Membros. Analisando o art. 22º conclui-
se que no caso em análise o objecto da acção (acção de condenação) não se
enquadra em nenhuma das situações neste consagradas pelo que o Regulamento
não se poderá aplicar.
Deste modo, não tendo o demandando domicilio num dos Estados Membros, excluída
a possibilidade de aplicação do Regulamento nº 44/2001 e da existência de alguma
Convenção Internacional entre Portugal e Angola, a atribuição da competência
internacional aos tribunais portugueses é efectuada à luz dos art. 65º e 65º-A do CPC,
visando-se determinar se o litigio possui algum elemento de conexão relevante com a
ordem jurídica portuguesa.
A atribuição da competência internacional, aos tribunais portugueses, com base no
direito processual civil português, depende da verificação alternativa de algum dos
critérios atributivos de competência consagrados no art. 65º, 65º-A e 99º CPC.
O art. 65º CPC consagra nas suas alienas dois princípios:
Princípio da Coincidência (al. b): se a acção dever ser instaurada em Portugal
segundo as regras da competência territorial (interna) estabelecidas no CPC
(art. 73º a 89º) dai segue que os tribunais portugueses também serão
internacionalmente competentes para julgar o litigio, pese embora este possua
elementos de conexão com ordens jurídicas estrangeiras.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 57
Princípio da Necessidade (al. d): os tribunais portugueses são
internacionalmente competentes quando o direito invocado (pelo autor ou
pelo réu, este último em reconvenção) não possa tornar-se efectivo senão
através de uma acção proposta em território português, perante os nossos
tribunais. Este critério é excepcional e subsidiário: só é mobilizado quando o
anterior o não o possa ser e quando:
No presente caso, nada indica que estejamos face a uma situação da al. d) do art.
65º e, uma vez, que estamos face a uma situação em que se pretende instaurar uma
acção de condenação, tal situação não se encontra abrangida, igualmente, em
nenhum dos casos previstos no art. 65º-A CPC. Deste modo, parece que estamos face
a uma situação constante da al. b) do art. 65º CPC, pelo que agora será necessário
analisar o regime do art. 73º e ss CPC quanto à competência territorial.
Competência Relativa (Territorial)
A repartição do poder de julgar, nos tribunais judiciais, é efectuada em função do
território onde cada um destes tribunais desfruta de poderes jurisdicionais. No domínio
da LOFTJ 2008 o território nacional encontra-se dividido em distritos judiciais e
comarcas, nos termos do art. 18º.
Deste modo, constatada a competência internacional dos tribunais portugueses, os
conflitos localizam-se sempre em determinada área do território português. É a lei
processual que fixa os elementos de conexão relevantes, os quais determinam, nos
casos concretos, o tribunal territorialmente competente. Tais elementos de conexão
encontram-se consagrados no art. 73º a 95º do CPC.
Nos termos do art. 86º CPC, uma vez que o réu é uma pessoa colectiva (sociedade IP)
consagra-se o foro do réu, correspondendo tal a uma regra supletiva, à qual se
recorre sempre que o caso não esteja previsto noutra norma, ou seja, sempre que não
haja disposição especial em contrário, competente para a acção é o tribunal em cuja
circunscrição o réu tenha o sede da administração principal.
Contudo, existe uma regra especial constante no art. 74º/1 CPC (‘’A acção destina a
exigir o cumprimento de obrigações (…) é proposta no tribunal do domicilio do réu,
podendo o credor optar pelo lugar em que a obrigação deveria ser cumprida’’). Ou
seja, a lei permite que o autor escolha qual o tribunal competente de acordo com os
critérios consagrados nela. Se a sociedade XC escolhesse o domicilio do réu, ou seja
Luanda, os tribunais portugueses não seriam competentes territorialmente; contudo, se
se tivesse acordado que o pagamento do preço deveria ser efectuado no acto da
escritura (e não por transferência bancária) os tribunais portugueses já seriam
competentes territorialmente.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 58
CASO XIV
Por escritura pública lavrada no dia 1 de Abril de 2012, Manuel, brasileiro, vendeu a
Nélia, também brasileira mas residente em Lisboa, um prédio de que era proprietário
situado na cidade do Porto, pelo preço de 250000 euros. Da escritura consta a cláusula
de que parte do preço ainda não paga (100000 euros) seria entregue a Manuel daí a
seis meses, no seu domicílio (Porto).
Manuel instaura contra Nélia uma acção destinada a pedir a declaração de nulidade
do mesmo contrato, por simulação, sendo certo que da escritura constava uma das
seguintes cláusulas:
MANUEL (BRASIL) ---> COMPRA E VENDA DE IMÓVEL <--- Nélia (BRASIL, RESIDENTE EM
LISBOA)
MANUEL (BRASIL) ---> ACÇÃO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE <--- Nélia (BRASIL,
RESIDENTE EM LISBOA)
a. “Se vier a surgir algum litígio relativo à validade deste contrato, a acção
deverá ser proposta, em primeira instância, no Tribunal da Relação do Porto”.
Manuel assim fez. Procedeu bem?
TEMA: COMPETÊNCIA ABSOLUTA (INTERNACIONAL (PACTO DE JURISDIÇÃO) E
HIERARQUIA (PACTO DE COMPETÊNCIA))
Competência Absoluta (Internacional)
O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por
via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido
reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este
Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da
Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.
Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à
matéria civil e comercial.
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser
demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da
aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou
se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 4º/1, se o réu não tiver domicilio em qualquer um dos Estados
Membros (exemplo: Brasil ou Angola) a competência é regulada pela lei processual
interna do Estado Membro onde a acção foi intentada, sem prejuízo da aplicação das
regras sobre competências exclusivas, constantes no art. 22º, e por eventuais pactos
de jurisdição válidos, nos termos do art. 23º.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 59
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se
o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União
Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. Nos termos do art. 59º, sendo
a acção proposta em Portugal o tribunal português irá aplicar a lei portuguesa para
determinar se a parte tem domicilio em Portugal. Nélia reside em Lisboa pelo tem
domicilio no território de um Estado Membro da União Europeia, neste caso Portugal.
Deste modo, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para
conhecer da questão.
Apesar de já se ter apurado que os tribunais portugueses são competentes
internacionalmente para conhecer da questão em analise, podemos ainda abrir a
hipótese da existência de um pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 23º consagram-se os pactos de jurisdição. Os pactos de jurisdição
atingem as regras de determinação da competência internacional dos tribunais
portugueses, havendo que distinguir entre:
Pactos Atributivos de Jurisdição: concede-se a competência internacional a
um ou a vários tribunais portugueses, a qual pode ser exclusiva ou concorrente.
Pactos Privativos de Jurisdição: as partes retiram a competência a um ou a
vários tribunais portugueses e atribuem-na, em exclusivo ou concorrentemente,
a um ou a vários tribunais estrangeiros (art. 99º/2 CPC). Para que a
competência seja atribuída em exclusivo ao foro estrangeiro é preciso que as
partes retirem a competência legal aos tribunais portugueses; se o não fizerem
o caso poderá ser apreciado e julgado concorrentemente pelos tribunais
portugueses
No presente caso estaríamos face a um pacto atributivo de jurisdição, sendo que nos
termos do art. 23º do Regulamento basta que uma das partes esteja domiciliada em
Portugal para que os tribunais deste Estado-Membro tenha competência para decidir
o litígio (se tal tiver sido acordado entre as partes obviamente).
Deste modo, os tribunais portugueses seriam competentes internacionalmente quer
em virtude do art. 2º quer em virtude do art. 23º do Regulamento nº44/2001.
Competência Absoluta (Hierarquia)
A ordem de jurisdição constituída pelos tribunais judiciais é dotada de uma hierarquia
de tribunais, qual pirâmide judiciária: os tribunais judiciais de 1ª Instância, os Tribunais
da Relação (tribunais judiciais de 2ª Instância) e o Supremo Tribunal de Justiça.
Nos termos do art. 27º da LOFTJ 2008 os tribunais judiciais encontram-se hierarquizados
para efeitos de recurso das suas decisões, não sendo como tal uma hierarquia do
ponto de vista administrativo (dar instruções aos tribunais inferiores).
Na LOFTJ 2008 a competência dos tribunais judiciais encontra-se consagrada, quanto
ao Supremo Tribunal de Justiça no art. 41º e ss, quanto ao Tribunal da Relação no art.
65º e ss e quanto aos Tribunais de Comarca no art. 73º e ss.
No presente caso é necessário ponderar a situação se estarmos face a um pacto de
competência.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 60
Em certas eventualidades, as partes podem prevenir a competência territorial do
tribunal (art. 100º/1, 1ªparte do CPC), à margem das regras estipuladas nos art. 73º a
89º CPC.
São várias, no entanto, as acções por cujo respeito não é admissível a celebração de
qualquer pacto de competência para afastar certas regras de fixação da
competência territorial (interna). É o caso das situações previstas no art. 110º/1, ex vi
do art. 100º/1 CPC.
O Pacto de Competência respeita a uma questão que não apresenta, em regra,
elementos de conexão com ordens jurídicas estrangeiras: as partes definem como
componente em razão do território um tribunal português diferente daquele que seria
competente segundo as regras da competência em razão do território previstas na lei
processual.
Para o Pacto de Competência ser válido é necessário que:
Respeite a forma do contrato substantivo, se for um contrato formal ou, não o
sendo, se tiver sido (facultativamente) reduzido a escrito – art. 100º/2 CPC
Mencione as questões submetidas à apreciação do tribunal, bem como o
critério de determinação do tribunal (territorialmente diferente) ao qual é
atribuída a competência – art. 100º/2, 2ª parte CPC
Note-se que, como a competência convencional interna vincula as partes que
subscrevem estes pactos de competência, a sua violação determina a
incompetência relativa do tribunal onde a acção foi indevidamente proposta – art.
108º CPC.
Nos termos do art. 100º/1 CPC consagra-se que ‘’As regras da competência em razão
(…) da hierarquia (…) não podem ser afastadas por vontade das partes; mas é
permitida a estas afastar, por convenção expressa, a aplicação das regras de
competência em razão do território, salvo nos casos a que se refere o art. 110º’’.
Ou seja, as partes, mesmo celebrando um pacto de competência, não poderiam
alterar a hierarquia do tribunal. Deste modo, a cláusula seria nula.
Sendo a cláusula nula, estamos face a uma situação de incompetência absoluta em
razão da hierarquia nos termos do art. 105º, o que consubstancia uma excepção
dilatória nos termos do art. 493º/1 e 2 e 494º al. a) o que conduz à absolvição da
instância nos termos do art. 288º CPC.
NOTA: Poder-se-ia defender que tal cláusula só seria nula quanto à competência
hierárquica. Estando-se a analisar um contrato que, em primeira linha, é substantivo
com efeitos processuais, sendo um contrato nulo pode ser reduzido de modo a
eliminar a parte nula (leia-se o pacto de competência quanto à hierarquia),
considerando-se válido o pacto de jurisdição e pacto de competência quanto ao
território? Depende: as partes têm como vontade hipotética a redução?
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 61
b. “Se vier a surgir algum litígio quanto à validade ou ao cumprimento deste
contrato, o seu julgamento cabe em exclusivo, ao tribunal do Rio de Janeiro,
competente segundo a lei brasileira”. Manuel, porém, propõe a acção em
Lisboa. Procedeu bem?
TEMA: COMPETÊNCIA ABSOLUTA (INTERNACIONAL – PACTO DE JURISDIÇÃO)
O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por
via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido
reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este
Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da
Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.
Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à
matéria civil e comercial.
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser
demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da
aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou
se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se
o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União
Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. Nos termos do art. 59º, sendo
a acção proposta em Portugal o tribunal português irá aplicar a lei portuguesa para
determinar se a parte tem domicilio em Portugal. Nélia reside em Lisboa pelo tem
domicilio no território de um Estado Membro da União Europeia, neste caso Portugal.
Deste modo, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para
conhecer da questão.
Apesar de já se ter apurado que os tribunais portugueses são competentes
internacionalmente para conhecer da questão em analise, podemos ainda abrir a
hipótese da existência de um pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 23º consagram-se os pactos de jurisdição. Os pactos de jurisdição
atingem as regras de determinação da competência internacional dos tribunais
portugueses, havendo que distinguir entre:
Pactos Atributivos de Jurisdição: concede-se a competência internacional a
um ou a vários tribunais portugueses, a qual pode ser exclusiva ou concorrente.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 62
Pactos Privativos de Jurisdição: as partes retiram a competência a um ou a
vários tribunais portugueses e atribuem-na, em exclusivo ou concorrentemente,
a um ou a vários tribunais estrangeiros (art. 99º/2 CPC). Para que a
competência seja atribuída em exclusivo ao foro estrangeiro é preciso que as
partes retirem a competência legal aos tribunais portugueses; se o não fizerem
o caso poderá ser apreciado e julgado concorrentemente pelos tribunais
portugueses
No presente caso estaríamos face a um pacto privativo de jurisdição uma vez que as
partes acordaram que na eventualidade da ocorrência de algum litigio quanto ao
cumprimento ou validade do contrato o tribunal do Rio de Janeiro seria o
componente.
Na medida em que se pretende anular o contrato com base na sua simulação tal
insere-se no âmbito da cláusula (‘’algum litígio quanto à validade’’).
Os pactos de Jurisdição devem observar alguns requisitos, requisitos esses constantes
do art. 99º CPC (e não do art. 23º do Regulamento):
Litígio tem de ter natureza internacional – art. 99º/1
NOTA1: O Regulamento nº 44/2001 visa que a União Europeia seja um
todo, não sendo necessária a exigência de uma relação controvertida
com mais de uma ordem jurídica, isto porque no Regulamento
entende-se a União Europeia como sendo um todo, um único Estado
Membro. O caracter internacional é inerente à União Europeia. Por sua
vez, o art. 99º do CPC visa evitar o ‘fórum shopping’, ou seja que se
escolha a instância mais conveniente.
NOTA2: se as partes não tivessem dito que a competência era exclusiva
(‘’o seu julgamento cabe em exclusivo, ao tribunal do Rio de Janeiro’’),
nos termos do art. 99º/2 CPC tal competência seria alternativa, mas
pelo Regulamento nº 44/2001 essa mesma competência seria exclusiva.
Caso: requisito verificado – ordem jurídica portuguesa e ordem jurídica brasileira.
Só podem incidir sobre situações jurídicas disponíveis – art. 99º/3 al. a) – o que
não abrange apenas as acções sobre o estado das coisas (acções de divórcio
por exemplo)
Caso: requisito verificado uma vez que consiste no direito de anulação de um contrato
Deve ser aceite pela lei do tribunal estrangeiro designado pelas partes – art.
99º/3 al. b)
Caso: nada no caso nos indica que sim ou que não, pelo que terá de se considerar
que este pacto de jurisdição só seria válido na medida em que a lei brasileira assim o
dissesse. O facto de as partes inserirem tal no Pacto de Jurisdição não tem qualquer
influência se a lei brasileira não o aceitar.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 63
Necessitam de ser justificados por um interesse sério de ambas as partes ou de
uma delas e, nesse caso, não envolver inconveniente grave para a outra – art.
99º/3 al. c)
NOTA: o legislador não define interesse sério. Alguma doutrina entende
que o interesse sério deve ser interpretado com recurso ao art. 398º/2
CC, ou seja interesse sério enquanto interesse digno de protecção
legal.
Caso: ter-se-ia de demonstrar que tal escolha corresponderia a um interesse sério e
que não conduziria a nenhum inconveniente grave para a outra parte.
Não podem ofender a competência exclusiva dos tribunais portugueses, nos
casos previstos no art. 65º-A – art. 99º/3 al. d)
Caso: uma vez que no caso nada nos é dito iremos presumir que sim.
Devem constar de documento escrito ou confirmado por escrito – art. 99º/3 al.
e) e nº4
NOTA: O Regulamento tem uma preocupação com a forma (escrita ou
verbal com confirmação escrita), como consta do art. 23º/1 al. a) b) e
c) e nº2, mas abre o âmbito de validade formal do pacto de jurisdição
em muito, uma vez que permite que os usos da relação entre as partes
possam ditar a forma daquele. Por sua vez, o art. 99º CPC quanto à
forma escrita tem também uma certa abertura (art. 99º/3 al. e) e nº4)),
mas não tanta como a amplitude conferida pelo Regulamento.
Caso: requisito verificado nos termos do art. 99º/4 CPC (‘’considera-se reduzido a
escrito o acordo constante de documento assinado pelas partes’’)
Deve mencionar expressamente (directa ou indirectamente) a jurisidição
competente – art. 99º/3 al. e), in fine
Caso: requisito verificado (‘’o seu julgamento cabe em exclusivo, ao tribunal do Rio de
Janeiro, competente segundo a lei brasileira’’)
Embora não se consiga provar com a maior clareza a verificação dos requisitos da al.
b) e d), presume-se que se encontram verificados. Sendo a acção efectivamente
proposta em Portugal, Manuel procedeu mal.
Nos termos do art. 100º CPC as partes podem convencionar as regras de competência
em razão do território, desde que tais não consubstanciem nenhum dos casos previstos
no art. 110º (o que neste caso efectivamente não sucede).
Sabendo que Manuel agiu mal, uma vez analisados e verificados os requisitos dos
pactos de jurisdição, cabe saber quais as consequências que daí derivem. Para tal é
necessário saber se a violação de um pacto de jurisdição conduz a um caso de
incompetência absoluta ou incompetência relativa.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 64
Nos termos do art. 101º CPC consagra-se que a infracção de regras quando haja mera
violação de um pacto privativo de jurisdição não determina a incompetência
absoluta do tribunal.
Nos termos do art. 108º CPC consagra-se que a infracção das regras decorrentes do
estipulado nas convenções previstas no art. 99º e 100º (pactos de jurisdição)
determinam a incompetência relativa do tribunal.
Deste modo estamos face a uma excepção dilatória nos termos do art. 493º/1 e 2 e do
art. 494º al. a), gerando a absolvição da instância nos termos do art. 288º CPC. Esta
excepção dilatória, nos termos do art. 495º CPC, não será de conhecimento oficioso
(‘’O tribunal deve conhecer oficiosamente e todas as excepções dilatórias, salvo da
incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo disposto no art. 110º’’), pelo
que nos termos do art. 109º a incompetência relativa terá de ser arguida pelo réu
(Nélia) para poder ser conhecida pelo tribunal, sendo tal conhecida deste nos termos
do art. 110º/3.
Nos termos do art. 111º/3 CPC consagra-se como consequência ‘geral’ da
incompetência relativa a remessa do processo para o tribunal competente. Contudo,
na parte final desse artigo, consagra-se que tal consequência não se aplica aos casos
de violação de pactos privativos de jurisdição, sendo que nestas situações ocorre a
absolvição da instância do réu. Tal deve-se ao facto de não se dever interferir na
jurisdição de outros Estados. Deste modo, Manuel deveria propor a acção no Brasil.
NOTA1: Quando se realiza um pacto de jurisdição é necessário ter atenção ao seu
âmbito de incidência.
NOTA2: É sempre necessário analisar se o pacto de jurisdição não interfere com
nenhumas das competências exclusivas constantes do art. 22º, uma vez que um pacto
de jurisdição nunca pode violar uma daquelas regras.
NOTA3: O art. 24º do Regulamento nº44/2001 consagra aquilo que costuma ser
designado como pactos tácitos. A norma consagra que ‘’é competente o tribunal de
um Estado Membro perante o qual o requerido compareça’’, ou seja o tribunal torna-
se competente pois o comportamento de comparecer perante aquele tribunal é
como a celebração tácita de um pacto. Mas esta norma têm limites, constantes na
sua segunda parte:
Limite1: a comparência tiver por único objectivo arguir a incompetência
E se o requerido se se defender por impugnação mas invocar a
incompetência do tribunal?
Deve-se ter cuidado na força como se interpreta a palavra
‘’único’’, uma vez que tal é enganoso.
A interpretação correcta deste limite vai no sentido de que a
comparência vise suscitar a incompetência sem prejuízo das
restantes defesas que possam ser suscitadas.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 65
Limite2: existir outro tribunal com competência exclusiva por força do art. 22º
do Regulamento
c. “Se vier a surgir algum litígio quanto à validade, à interpretação ou à execução
deste contrato, as partes comprometem-se a submetê-lo à apreciação de um
tribunal arbitral, constituído de acordo com as seguintes regras…”. Manuel,
porém, propõe a acção no tribunal judicial que, na falta desta convenção,
seria competente. Procedeu bem?
TEMA: COMPETÊNCIA (INSTÂNCIA ARBITRAL – LEI DA ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA)
As partes podem atribuir a composição do seu conflito de interesses a um terceiro
imparcial, por elas escolhido (arbitragem não institucionalizada) ou que esteja
permanentemente à disposição dos interessados para a resolução de controvérsias
que estes resolvam atribuir a esses terceiros (arbitragem institucionalizada). O
submeter, pelos contraentes através de uma convenção de arbitragem, a resolução
de um litigio a um tribunal arbitral traduz a realização de um negócio jurídico
processual que é expressão da autonomia negocial e não da actividade jurisdicional
estadual enquanto poder público inerente à soberania do Estado.
Deste modo, a Arbitragem poderá ser:
Não Institucionalizada: a resolução do lítigio tem lugar através de um ou mais
árbitros, pessoas humanas designadas pelas próprias partes, sendo que estas
podem resultar as regras do processo e o lugar onde funcionará o tribunal. Esta
arbitragem também é uma arbitragem não permanente, pois estes tribunais
arbitrais extinguem-se após a resolução do litígio tipo de arbitragem que, em
particular, foi regulada na Lei da Arbitragem em Vigor em Portugal
Institucionalizada: a resolução do litígio tem lugar através de um ou mais
árbitros sob a égide de uma instituição permanente, já constituída e que está à
disposição dos litigantes – quer antes de o litígio existir entre eles, quer depois
de o litígio ter sido ai eventualmente dirimido
Na Arbitragem Voluntária, a competência jurisdicional dos árbitros radica numa
convenção das partes, que assim emitem declarações negociais convergentes em
submeter um certo litígio a esta forma de composição do seu conflito de interesses.
Neste caso, as partes podem, ou não, submeter um concreto litígio à (hétero)
composição vinculativa de um terceiro (o árbitro).
Por sua vez, na Arbitragem Necessária, a controvérsia somente pode ser decidida por
árbitros em atenção à natureza ou ao objecto do concreto litígio, precisamente
porque uma disposição legal, e não já a vontade das partes, impõe a obrigação de
submeter a árbitros certos lítigios.
No presente caso, e de acordo com o regime do art. 1º/1, estamos face a um caso
em que se consagra que qualquer litígio quanto à validade, interpretação ou
execução do contrato celebrado entre as partes será submetido à apreciação de
uma instância arbitral, pelo que não se está face a nenhuma situação em que exista
legislação avulsa que imponha uma arbitragem necessária nem se encontra
submetido exclusivamente aos tribunais do Estado. Deste modo, e de acordo com a
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 66
mesma norma, estamos face a um contrato que envolve interesses patrimoniais, ou
seja interesses suceptíveis de avaliação pecuniária (critério da patrimonialidade) e
não se refere a um litígio actual mas sim eventual (‘’Se vier a surgir algum litígio’’),
contemplando uma cláusula compromissória ou seja respeita a todo e qualquer litígio
que possa surgir entre as partes relativas a matérias de validade, interpretação e
execução do contrato. Pretendendo Manuel instaurar contra Nélia uma acção
destinada a pedir a declaração de nulidade do contrato, por simulação, tal diz
respeito a uma questão de validade do mesmo, pelo que nos termos do art. 1º/1 é
aplicável a Lei de Arbitragem Voluntária.
Verificado que a presente cláusula compromissória integra o objecto da presente lei
nos termos do art. 1º/1 é necessário ainda que tal observe os requisitos de forma
constante do art. 2º, ou seja terá de ser reduzida a escrita, o que neste caso se verifica
uma vez que da escritura constava está cláusula.
Uma vez que da escritura constava uma cláusula que consagrava o recurso à
arbitragem voluntária e Manuel propôs a acção no tribunal judicial ele procedeu de
forma errada.
Nos termos do art. 493º/1 e 2 e do art. 494º al. j) CPC estamos face a uma excepção
dilatória que conduz à absolvição da instância nos termos do art. 288º CPC. As
excepções dilatórias, nos termos do art. 495º CPC, em regra, são de conhecimento
oficioso, salvo nos casos de preterição do tribunal arbitral voluntário. Deste modo, de
acordo com o disposto no art. 495º in fine CPC, se Nélia, na contestação, não invocar
a violação da convenção de arbitragem voluntária, considera-se que tacitamente
está a aceitar a sua não aplicação, sendo neste caso os tribunais judiciais
competentes para conhecer da questão (‘’Manuel porém, propôs a acção no
tribunal judicial que, na falta desta convenção, seria competente’’).
Contudo, se Nélia, na contestação, tivesse invocado a violação da convenção de
arbitragem, como já foi referido, tal consubstancia uma excepção dilatória nos termos
do art. 493º/1 e 2 e do art. 494º al. j) conduzindo à absolvição da instância nos termos
do art. 288º CPC. Importa salientar que nos termos do art. 5º, o Tribunal Estadual
confrontado com a propositura desta acção, salvo existindo uma manifesta nulidade
da convenção arbitral, deverá considerar-se incompetente para conhecer do mérito
da causa e absolver o réu da instância.
E se em vez de uma cláusula compromissória estivéssemos face a um compromisso
arbitral? Imagine-se que o litígio já existe e que se encontra pendente no Tribunal de
Lisboa. Mais concretamente, imagine-se que, na pendência de tal acção no Tribunal
de Lisboa, surge um justo receio de perda da garantia patrimonial e pretende-se o
arresto dos bens. Sendo que tal arresto se realiza no Tribunal de Lisboa, tal influencia a
acção que corre no Tribunal Arbitral?
Nos termos do art. 7º consagra-se que, independentemente de ser antes ou durante o
processo arbitral, uma convenção de arbitragem não é incompatível com o
requerimento de providências cautelares apresentado a um tribunal estadual.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 67
NOTA1: Actualmente vigora a Lei nº63/2011 em que se consagra o critério da
patrimonialidade e da susceptibilidade de transacção do direito controvertido mesmo
que não respeitem a direitos patrimoniais (art. 1º/1 e 2), mas na Lei 31/86 o critério era
o da disponibilidade dos direitos (que também se encontra consagrado no art. 1º/2)
NOTA2: A lei 31/86 não permitia a arbitragem sobre direitos indisponíveis em sentido
restrito, ou seja uma coisa seria renunciar ou dispor do direito de indemnização de
clientela, por exemplo, quando ele ainda não se formou na esfera jurídica, outra seria
quando ele já se teria formado, pelo que neste caso já se poderia então renunciar ou
dispor daquele.
NOTA3: A cláusula arbitral abrange as cláusulas compromissórias e os compromissos
arbitrais, mas se num caso se disser que existe uma cláusula arbitral por norma
estaremos face a uma cláusula compromissória. Entende-se por cláusula
compromissória a situação em que as partes sujeitam os litígios das matérias
constantes daquela à apreciação de um tribunal arbitral, ou seja de um tribunal
constituído por vontade das partes e cujas decisões têm a força de uma sentença de
um tribunal estadual. O que é exigível num deste tipos de cláusulas assenta em
identificar a fonte possível do litigio. Ou seja, numa cláusula compromissória as partes
comprometem que na eventualidade de surgir um lítigio submete-lo a um tribunal
arbitral. Por sua vez, entende-se por compromisso arbitral algo que pode ter
previamente uma cláusula compromissória, pressupondo que o litígio já surgiu e as
partes submetem tal a um tribunal arbitral. É necessário identificar o litígio e não a sua
fonte. Ou seja, num compromisso arbitral surgindo um lítigio as partes comprometem-
se a submete-lo a um tribunal arbitral a diferença entre ambas é mais ou menos a
diferença entre o contrato promessa e o contrato definitivo.
NOTA4: A Convenção de Arbitragem é uma cláusula compromissória, sendo que para
ser válida terá de incidir sobre direitos disponíveis, sendo que para além do critério do
objecto (art. 1º/1 e 2) existem requisitos quanto à forma da mesma (art. 2º),
nomeadamente o facto de tal cláusula ter de ser reduzida a escrita. Note-se que o art.
2º/5 consagra um incentivo à arbitragem uma vez que pode nunca ter existido uma
cláusula de arbitragem mas se se invocar a existência de convenção e a outra parte
nada dizer em contrário considera-se que tal existe.
NOTA5: a natureza da arbitragem tem particularidades que tornam difíceis os regimes
das providências cautelares previstos no CPC
NOTA6: É necessário analisar com atenção o disposto no art. 22º e 23º, uma vez que
uma ordem preliminar não serve para nada, mas depende sempre do tipo.
NOTA7: Nos termos do art. 27º, a execução das providências cautelares é realizada
pelos tribunais estaduais, não existindo providências cautelares proferidas por um
Tribunal Arbitral que sejam auto suficientes, dependendo sempre do Tribunal Estadual.
NOTA8: O desrespeito por uma providência cautelar no CPC consubstancia um crime.
E o desrespeito de uma providência cautelar no âmbito dos Tribunais Arbitrais? A lei
nada indica a este respeito. A Prof. Rita Gouveia considera que é sempre mais seguro
intentar uma providência cautelar nos Tribunais Estaduais.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 68
NOTA9: A grande vantagem da arbitragem, nos termos do art. 30º, assenta no facto
de as partes poderem escolher quais as regras do processo a aplicar e adaptá-las a
este.
NOTA10: Nos termos do art. 33º consagra-se a forma como se desencadeia o processo
mas nada se refere quanto à possibilidade de réplica ou de tréplica. Tal deriva do
facto de se pretender que o processo arbitral tenha regras adequadas a cada litígio.
V - Marcha do Processo
CASO XV (Caso Típico de Exame)
Por escritura pública celebrada em Lisboa, ARPURO, Lda. (“A”), sociedade de
construção civil, com sede no Rio de Janeiro, vendeu a B, C e D, todos portugueses e
domiciliados em Lisboa, respectivamente, os andares correspondentes às fracções B,
C e D de um prédio que construíra, situado em Lisboa, pelos preços de 250 mil, 150 mil
e 200 mil euros. A continuou proprietário dos restantes andares.
Alegando que B e C se apoderaram indevidamente da garagem do prédio,
sustentando ilegitimamente que era parte comum, A instaurou contra eles uma acção
na qual pediu que o tribunal declarasse que a garagem, à qual atribuiu o valor de 200
mil euros, é uma fracção autónoma, da qual é proprietário e, consequentemente,
condenasse B e C a entregar-lha desocupada.
Aproveitou ainda para pedir a condenação de C no pagamento da parte do preço
que ainda lhe devia (7.500 euros) e para demandar D pedindo igualmente a sua
condenação no pagamento do que faltava pagar do preço do andar que comprara
(2000 euros).
‘’A’’ (RIO DE JANEIRO) -- C/V FRACÇÕES -- B C D (LISBOA)
‘’A’’ (RIO DE JANEIRO) - ACÇÃO GARAGEM --- B C (LISBOA) – PEDIDO 1
‘’A’’ (RIO DE JANEIRO) - ACÇÃO DE CONDENAÇÃO (7.500 euros) -- C (LISBOA) –
PEDIDO 2
‘’A’’ (RIO DE JANEIRO) - ACÇÃO DE CONDENAÇÃO (2000 euros) - D (LISBOA) –
PEDIDO 3
a. Diga, justificando, se a acção foi regularmente proposta e qual o tribunal
competente.
TEMA: INTERESSE EM AGIR, LEGITIMIDADE E COMPETÊNCIA
No presente caso A intenta três pedidos pelo que será necessário analisar cada um
deles individualmente.
No presente caso, uma vez que nada nos é dito em sentido contrário, presume-se que
quanto à personalidade judiciária (art. 5º CPC), à capacidade judiciária (art. 9º CPC)
e ao patrocínio judiciário (art. 32º e ss CPC) estes pressupostos se encontram
verificados.
Quanto ao interesse em agir/processual, tal consiste na necessidade de usar o
processo, ou seja exprime a necessidade ou a situação objectiva de carência (real,
justificada e razoável) de tutela judiciária por parte do autor, face à pretensão que
deduz, ou do réu, à luz do pedido reconvencional que tenha oportunamente
formulado.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 69
Esta situação de carência de tutela exprime-se na concreta utilidade da concessão
dessa mesma tutela judiciária para que a parte que formula a pretensão, estando tal
consagrado no art. 26º/2 CPC.
No presente caso, ‘’A’’ (autor) tem necessidade de obter a tutela judiciária, uma vez
que o bem (garagem) de que se arroga ser proprietário encontra-se a ser violado
(‘’Alegando que B e C se apoderaram indevidamente da garagem do prédio’’).
Analisando a verificação do interesse em agir e presumindo a verificação da
personalidade judiciária, da capacidade judiciária e do patrocínio judiciário, iremos
agora analisar a legitimidade processual.
A regra no processo é a da dualidade das partes (autor e réu), embora no mesmo
processo o autor possa cumular dois ou mais pedidos contra o réu. Contudo, muitas
vezes, em lugar de um só autor ou um só réu, a acção tem vários autores ou é
proposta contra dois ou mais réus.
Nestes casos, à dualidade das partes substitui-se a pluralidade das partes, podendo
esta ser:
Pluralidade activa, se a acção é proposta por dois ou mais autores contra o
mesmo réu
Pluralidade passiva, se o autor demanda simultaneamente vários réus
Pluralidade mista, quando a acção é instaurada por dois mais autores contra
vários réus.
Nos termos do art. 27º e ss CPC distingue-se entre litisconsórcio, que pode ser
necessário ou voluntário, e coligação:
Litisconsórcio: há pluralidade de partes, mas unicidade da relação material
controvertida, existindo como tal um único pedido formulado contra ou por
vários réus; a esta unicidade da relação controvertida corresponde uma
pluralidade de pessoas (e, logo, de partes).
Voluntário (regra): a cumulação depende exclusivamente da vontade
das partes. Se os interessados não forem demandados daí não resulta
qualquer ilegitimidade pois o litisconsórcio verifica-se por iniciativa das
partes ou de uma delas.
Necessário: a cumulação resulta de determinação da lei (litisconsórcio
necessário legal), de prévia estipulação dos interessados (litisconsórcio
necessário convencional) ou da natureza da relação jurídica
(litisconsórcio necessário natural). É necessário que todos os sujeitos da
relação material controvertida se encontrem em juízo para que o juiz
conheça do mérito da causa, sob pena de, nos termos do art. 493º,
494º al. e) e 288º/1 al. d) absolver da instância (a ilegitimidade
processual consubstancia uma excepção dilatória)
Coligação: à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações
matérias litigadas, exigindo-se uma pluralidade de pedidos, sendo a
cumulação pedida em virtude da unicidade da fonte dessas relações, da
dependência entre os pedidos ou da conexão substancial entre os
fundamentos destes.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 70
No presente caso, relativamente a B e C existe um pedido comum (acção em que A
pede que o tribunal reconheça que a garagem é uma fracção autónoma),
relativamente a C existem dois pedidos (acção anterior e acção de condenação) e
relativamente a D um pedido (acção de condenação).
Deste modo, estamos face a uma situação de coligação relativamente a B C D (três
réus e três pedidos), sendo de salientar que quanto a C existe uma cumulação de
pedidos.
Uma vez que estamos face a um caso em que existe pluralidade de pedidos estamos
no âmbito da coligação que se encontra regulada nos art. 30º e ss CPC.
Para que se possa verificar uma situação de coligação é necessária a verificação de
certos requisitos que se encontram consagrados no art. 30º, 31º e 470º do CPC:
Compatibilidade substantiva entre os pedidos – art. 470º CPC
Relação de Dependência ou Prejudicialidade entre os pedidos – art. 30º/1 CPC
Compatibilidade Processual (competência e forma) – art. 31º CPC
Requisito 1 – Compatibilidade Substantiva Entre os Pedidos
A cumulação de pedidos encontra-se consagrada no artigo 470º CPC, estando este
pensado para as situações em que há um autor e um réu estando assegurada a
conexão entre os pedidos. Na coligação existe, contudo, uma pluralidade de relações
materiais controvertidas exigindo-se como tal a conexão entre os pedidos, pelo que
ocorre uma remissão do art. 470º para o art. 31º CPC.
Não se verificando nenhum obstáculo à coligação nos termos do art. 31º podemos
concluir que a cumulação entre pedidos é possível.
Em suma, nos termos do art. 470º CPC, exige-se uma compatibilidade substantiva entre
os pedidos. No presente caso, não é todo incompatível formular os três pedidos em
conjunto pelo que se conclui que este requisito se encontra verificado.
Requisito 2 – Relação de Conexão entre os Pedidos
Nos termos do art. 30º CPC consagram-se várias relações de conexão, mas a verdade
é que basta a existência de apenas uma para se verificar a coligação.
No presente caso, nos termos do art. 30º/1, 1ª parte CPC estamos no âmbito de uma
situação em que a causa de pedir é a mesma (‘’É permitida a coligação (…) por
pedidos diferentes, quando a causa de pedir seja a mesma e única’’), uma vez que
estes pedidos emergem de um mesmo contrato (‘’Por escritura Pública’’, ou seja
evidencia a celebração de um único contrato, embora não seja tal muito frequente
suceder) celebrado entre A com B C D.
NOTA: Se a causa de pedir fosse diferente mesmo assim a coligação seria possível nos
termos do art. 30º/1 in fine (se os pedidos estivessem numa relação de dependência
ou de prejudicialidade) e ainda nos termos do art. 30º/2, 2ª parte (‘’ (…) cláusulas de
contratos perfeitamente análogas’’)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 71
Requisito 3 – Compatibilidade Processual (Competência e Forma)
Nos termos do art. 31º CPC exige-se uma compatibilidade processual que se traduz na
competência absoluta e na forma de cada pedido.
Importa salientar que, por um lado, a identidade das formas de processo não
necessita de ser absoluta, e por outro lado, a competência é absoluta em razão da
matéria, da hierarquia e do território.
Uma vez que se está face a três pedidos é sempre necessário analisá-los em separado.
I - Competência Absoluta: internacional, em razão da matéria e da hierarquia
Quanto à Competência Internacional
Pedido1 (B C) – Acção que tem por objecto o reconhecimento de que a garangem
constitui uma fracção Autónoma
O Regulamento (CE) nº 44/2001 visa facilitar o funcionamento do mercado interno, por
via da unificação das regras de conflito de jurisdição e assegurar o rápido
reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial. Este
Regulamento vincula todos os Estados Membros da União Europeia, à excepção da
Dinamarca, nos termos do seu art. 3º/1.
Nos termos do art. 1º, o âmbito de aplicação deste Regulamento restringe-se à
matéria civil e comercial.
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º/1, os tribunais seriam
competentes internacionalmente uma vez que B e C eram portugueses domiciliados
em Portugal.
Importa ainda salientar que nos termos do art. 22º consagra-se uma série de casos de
competência exclusiva dos tribunais dos Estados Membros, as quais prevalecem sobre
quaisquer critérios gerais ou específicos, impedindo, inclusivamente, a celebração de
válidos pactos de jurisdição, quando estes respeitem às matérias previstas nestas
competências exclusivas. Estas regras de competência exclusiva devem ser aplicadas
mesmo que o demandando não tenha domicilio ou sede num dos Estados Membros.
Analisando o art. 22º conclui-se que no caso em análise o objecto da acção (acção
que declarasse que a garagem seria uma fracção autónoma) enquadrava-se no nº1
da referida norma (‘’Têm competência exclusiva, qualquer que seja o domicilio em
matéria de direitos reais sobre imóveis (…) os tribunais do Estado onde o imóvel se
encontre situado’’), uma vez que o prédio em causa, mais concretamente as suas
fracções autónomas, se situavam em Lisboa. Deste modo, os tribunais portugueses
seriam competentes internacionalmente quer por aplicação do art. 2º/1 quer por
aplicação do art. 22º do Regulamento nº 44/2001.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 72
Pedido 2 (C)– Acção de Condenação no Valor de €7.500
O critério geral da competência encontra-se consagrado no art. 2º, sendo que tal
depende do domicilio ou sede do demandando: se é num dos Estados Membros ou
fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º/1, os tribunais
portugueses seriam competentes internacionalmente uma vez que C era português e
domiciliado em Portugal.
Importa ainda salientar que nos termos do art. 5º consagra-se um conjunto de critérios
especiais de atribuição da competência internacional, para os casos em que o reu
tem domicilio num dos Estados Membros e o autor pretende que ele possa ser
demandado perante os tribunais de um outro Estado Membro (art. 3º/1). Quando
algum dos critérios especiais constantes do art. 5º se encontra presente, o autor dispõe
da seguinte alternativa: (1) propõe a acção junto dos tribunais do Estado Membro do
domicilio (ou sede) do réu; (2) ou, intenta a acção noutro tribunal de um outro Estado
Membro, uma vez observadas as regras especiais de competência consignadas no
art. 5º e ss.
Nos termos do art. 774º CC consagra-se que ‘’Se a obrigação tiver por objecto uma
quantia pecuniária, deve a prestação ser efectuada no lugar do domícilio que o
credor tiver ao tempo do cumprimento’’, contudo existe uma regra especial para a
compra e venda consagrada no art. 885º CC ‘’O preço deve ser pago no momento e
no lugar da entrega da coisa vendida’’. Ou seja, aplicando esta regra e como resulta
da hipótese considera-se que o preço foi pago no momento da escritura que ocorreu
em Lisboa.
Pressupondo a aplicação do art. 885º/1 CC aplicar-se-ia o art. 5º/1 al. a) do
Regulamento que consagra que ‘’Uma pessoa com domicílio no território de um
Estado Membro pode ser demandada noutro Estado em matéria contratual perante o
tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão’’, ou seja
sendo o local do cumprimento em Lisboa os tribunais portugueses teriam competência
internacional. Os tribunais portugueses apenas não seriam competentes
internacionalmente, nos termos do art. 5º/1 al. a), se o cumprimento da obrigação
devesse ser realizado no Rio de Janeiro, mas continuariam a sê-lo por aplicação do
art. 2º.
Deste modo, os tribunais portugueses são competentes internacionalmente quer por
aplicação do art. 2º quer por aplicação do art. 5º/1 al. a) do Regulamento.
Pedido 3 (D) – Acção de Condenação no Valor de € 2000
Exactamente a mesma solução apurada para o Pedido 2 (só difere o valor da acção)
Competência em Razão da Matéria
Pedido1 (B C) – Acção que tem por objecto o reconhecimento de que a garangem
constitui uma fracção Autónoma
De acordo com a natureza das matérias que são objecto dos conflitos de interesses,
assim o poder jurisdicional é atribuído a distintos tribunais. Nos termos do art. 66º CPC
consagra-se que a competência dos tribunais judiciais é residual no confronto com as
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 73
restantes ordens jurídicas de jurisdição permanente (art. 209º e ss. CRP – Tribunal
Constitucional, Tribunal de Contas, Tribunais Administrativos, Tribunais Fiscais e Tribunais
Militares).
Deste modo, a competência em razão da matéria distingue os tribunais judiciais
relativamente aos tribunais de outras ordens de jurisdição em função da
especialização das matérias em causa. Nos termos do art. 26º/1 da LOFTJ 2008 as
causas que não sejam da competência de outra ordem de jurisdição são da
competência dos tribunais judiciários.
No presente caso, considerando o art. 209º da CRP, as inerentes leis de organização
das diferentes ordens dos tribunais, o art. 66º do CPC e o art. 26º da LOFTJ 2008
estamos face a uma acção que tem por objecto o reconhecimento de que a
garagem constitui uma fracção autónoma pelo que tal é da competência dos
tribunais judiciais.
Dentro da ordem de jurisdição dos tribunais judiciais, a lei distingue diferentes tribunais,
no tocante à competência em razão da matéria. Deste modo, e de acordo com o
art. 73º/2 da LOFTJ, os tribunais judiciais podem ser de:
Competência Genérica (art. 110º LOFTJ 2008): se o autor invoca factos que
permitem várias qualificações jurídicas, o tribunal que tenha sido provocado é
materialmente competente se no seu âmbito de competência couber, pelo
menos, uma das qualificações jurídicas. O tribunal embora competente,
somente pode analisar o caso à luz da qualificação para que seja
materialmente competente.
Competência Especializada (art. 111º e ss LOFTJ 2008): quando os factos
alegados pelo autor apenas autorizam uma determinada qualificação jurídica,
com exclusão de outras qualificações, o tribunal em que ele deduziu a acção
é competente, se e quando essa qualificação for subsumida no âmbito de
competência material desse tribunal.
No presente caso, a acção em questão não se insere em nenhum dos casos de
competência especializada previstos no art. 74º/2, com ressalva da al. i), ou seja no
tocante à instância civil.
Deste modo, ou o tribunal competente será de competência genérica ou será de
competência especializada de instância civil, desde que tal exista na comarca em
causa.
Pedido 2 (C)– Acção de Condenação no Valor de €7.500
Exactamente a mesma solução encontrada para o Pedido 1
Pedido 3 (D) – Acção de Condenação no Valor de € 2000
Exactamente a mesma solução encontrada para o Pedido 1.
É necessário, contudo, ainda ponderar a aplicação da Lei dos Julgados de Paz, uma
vez que nos termos do art. 8º da mesma, estes têm competência para questões cujo
valor não exceda € 5 000 (conjugar com o art. 31º da LOFTJ 2008). Contudo, a
aplicação da Lei dos Julgados de Paz fica excluída pelo artigo 9º/1 al. a) em que,
quanto à competência destes, eles serão competentes para decidir ‘’Acções
destinadas a efectivar o cumprimento de obrigações, com excepção das que
tenham por objecto prestação pecuniária’’.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 74
NOTA: mesmo que fosse possível aplicar a lei dos Julgados de Paz tal não obstava à
coligação do Pedido 3, uma vez que estes não possuem competência exclusiva mas
sim alternativa (acórdão de uniformização de jurisprudência), ou seja o autor poderia
escolher entre o tribunal judicial de competência genérica ou especializada de
instância civil ou o Julgado de Paz.
Competência em Razão da Hierarquia
Pedido1 (B C) – Acção que tem por objecto o reconhecimento de que a garangem
constitui uma fracção Autónoma
A ordem de jurisdição constituída pelos tribunais judiciais é dotada de uma hierarquia
de tribunais, qual pirâmide judiciária: os tribunais judiciais de 1ª Instância, os Tribunais
da Relação (tribunais judiciais de 2ª Instância) e o Supremo Tribunal de Justiça.
Nos termos do art. 27º da LOFTJ 2008 os tribunais judiciais encontram-se hierarquizados
para efeitos de recurso das suas decisões, não sendo como tal uma hierarquia do
ponto de vista administrativo (dar instruções aos tribunais inferiores).
Na LOFTJ 2008 a competência dos tribunais judiciais encontra-se consagrada, quanto
ao Supremo Tribunal de Justiça no art. 41º e ss, quanto ao Tribunal da Relação no art.
65º e ss e quanto aos Tribunais de Comarca no art. 73º e ss.
Por exclusão de partes, ou seja por nem ser nem da competência do Tribunal da
Relação nos termos do art. 65º e ss LOFTJ 2008, nem da competência do Supremo
Tribunal de Justiça nos termos do art. 41º e ss LOFTJ 2008, o pedido da acção em
questão será da competência do Tribunal de 1ª Instância.
Pedido 2 (C)– Acção de Condenação no Valor de €7.500
Exactamente a mesma solução encontrada para o Pedido 1
Pedido 3 (D) – Acção de Condenação no Valor de € 2000
Exactamente a mesma solução encontrada para o Pedido 1
Conclusão quanto à competência absoluta: todos os pedidos preenchem os requistos
necessários para a verificação desta.
II Forma de Processo
Pedido 1 (B C) – Acção que tem por objecto o reconhecimento de que a garagem
constitui uma fracção Autónoma
Em primeiro lugar, é necessário determinar o valor da causa, pelo que neste caso é
necessário recorrer às normas constantes do art. 305º e ss CPC.
Estamos face a uma acção que tem por objecto o reconhecimento de que a
garagem constitui uma fracção autónoma de que A é titular nos termos do art. 311º/1
CPC ‘’se a acção tiver por fim fazer valer o direito de propriedade sobre uma coisa, o
valor desta determina o valor da causa’’. Aplicando esta norma, o valor da causa
seria, duzentos mil euros. O art. 311º/1 CPC pressupõe a titularidade do direito de
propriedade, só sendo utilizado para acções de reinvindicação.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 75
Quanto à forma do processo é necessário recorrer ao artigo 460º e ss CPC em que se
consagra que o processo pode ser comum ou especial, sendo que apenas será o
primeiro se não existir nenhum regime especial. Nos termos do artigo 460º, 461º e 462º
aplica-se o processo ordinário comum, uma vez que nos termos do art. 31º da LOFTJ
2008 o valor da alçada do Tribunal da Relação é de trinta mil euros e o valor da causa
no presente caso prático de duzentos mil euros. Poder-se-ia ainda suscitar-se a
questão do Regime do Processo Civil Experimental devido ao facto de este não ter
limitação de valor.
Pedido 2 (C) – Acção de Condenação no Valor de €7.500
Em primeiro lugar, é necessário determinar o valor da causa, pelo que neste caso é
necessário recorrer às normas constantes do art. 305º e ss CPC.
Estamos face a uma acção de condenação no valor de € 7 500 pelo que nos termos
do art. 310º/1 ‘’Quando a acção tiver por objecto (…) cumprimento (…) de um acto
jurídico, atender-se-á ao valor do acto determinado pelo preço ou estipulado pelas
partes’’ o valor da causa será de € 7 500.
Quanto à forma do processo é necessário recorrer ao artigo 460º e ss CPC em que se
consagra que o processo pode ser comum ou especial, sendo que apenas será o
primeiro se não existir nenhum regime especial. Nos termos do art. 31º da LOFTJ 2008 a
alçada do Tribunal da Relação é de € 30. 000, 00 e a alçada dos Tribunais de 1ª
Instância de € 5. 000, 00. Ora, sendo o valor da causa € 7 500 e não se incluindo em
nenhum dos objectos consagrados no art. 462º conclui-se que neste caso estamos
face a um processo um comum sumário.
Contudo, existe um processo especial para as acções especiais de cumprimento de
obrigações pecuniárias emergentes de contratos constante do Decreto Lei 269/98.
Deste modo, supostamente não se irá aplicar o processo comum mas sim o processo
especial nos termos do art. 460º/1 e 2º CPC.
Nos termos do art. 1º do Regime da Acção Declarativa Especial para Cumprimento de
Obrigações Pecuniárias emergentes de Contratos consagra-se que este regime se
aplica a ‘’procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações
pecuniários emergentes de contratos de valor não superior a € 15. 000, 00. No presente
caso, uma vez que se está face a uma quantia no valor de €7 500 pode-se aplicar este
regime.
Necessário é atender ao artigo 7º deste Regime, constante em Anexo, que consagra a
Injunção, que tem como propósito dar força executiva, podendo ser usada em duas
situações distintas (situações a que se refere o art. 1º do regime que se está a analisar
e situações de obrigações emergentes de transacções comerciais).
Deste modo, pelo regime da injunção, e de acordo com o art. 7º conjugado com o
art. 1º do Regime em análise o autor terá duas possibilidades: ou intenta uma acção
declarativa especial (art. 1º do Regime), ou intenta uma acção, através do regime da
injunção, ficando a possuir um título executivo (art. 7º do Anexo).
Contudo é necessário atender ao art. 449º do CPC. Nos termos do art. 449º/1 CPC
consagra-se a responsabilidade do autor pelas custas quando (1) o réu não tenha
dado causa à acção e (2) o réu não conteste à acção.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 76
É necessário ainda atender ao disposto no art. 449º/2 al. d) CPC que entende que o
réu não deu causa à acção ‘’Quando o autor, podendo propor acção declarativa
especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, recorrer ao processo de
injunçã ou a outros análogos previstos na lei, opte pelo recurso ao processo de
declaração’’. Esta norma aplica-se ao caso concreto, uma vez que não parece existir
uma verdadeira exclusão no sentido de o DL 269/98, de 1 de Setembro afastar a forma
de processo comum.
Deste modo, ou se aplica o processo comum sumário (art. 460º a 462º CPC e art. 31º
LOFTJ 2008) ou se aplica o processo especial constante do DL 269/98, de 1 de
Setembro.
Pedido 3 - Acção de Condenação no Valor de € 2000
Em primeiro lugar, é necessário determinar o valor da causa, pelo que neste caso é
necessário recorrer às normas constantes do art. 305º e ss CPC.
Estamos face a uma acção de condenação no valor de € 2000 pelo que nos termos
do art. 310º/1 ‘’Quando a acção tiver por objecto (…) cumprimento (…) de um acto
jurídico, atender-se-á ao valor do acto determinado pelo preço ou estipulado pelas
partes’’ o valor da causa será de € 2 000.
Quanto à forma do processo é necessário recorrer ao artigo 460º e ss CPC em que se
consagra que o processo pode ser comum ou especial, sendo que apenas será o
primeiro se não existir nenhum regime especial. Nos termos do art. 31º da LOFTJ 2008 a
alçada do Tribunal da Relação é de € 30. 000, 00 e a alçada dos Tribunais de 1ª
Instância de € 5. 000, 00. Ora, sendo o valor da causa € 2000 e incluindo-se num dos
objectos consagrados no art. 462º, ou seja cumprimento de obrigações pecuniárias,
conclui-se que se está face a um processo comum sumaríssimo.
Coloca-se a mesma questão e nos mesmos termos que para o Pedido 2 quanto ao DL
269/98, de 1 de Setembro.
Conclusão quanto à Forma de Processo: não ponderando o DL 269/98, existem
divergências quanto à forma de processo de cada pedido. O Pedido 1 consiste num
processo comum ordinário, o Pedido 2 no processo comum sumário e o Pedido 3 no
processo comum sumaríssimo. Ou seja, entre o pedido 1 e o pedido 2 a diferença
entre ambos é apenas quanto ao valor, mas quanto ao pedido 3 além do valor
também se encontra em causa o objecto. Coloca-se então a questão de saber se a
coligação é possível ou se existe algum obstáculo a tal nos termos do art. 31º CPC.
Para que a coligação seja possível quanto à forma de processo é necessário que:
Exista identidade entre as formas de processo (não se verifica)
A diferença entre a forma de processo devido valor da causa entre os pedidos
é possível (processo comum ordinário e sumário) – art. 31º/1 in fine CPC;
A diferença entre as formas de processo, quando não é apenas em relação ao
valor da causa, conduz a que seja o juiz a decidir (processo comum
ordinário/sumário e processo comum sumaríssimo – critério do valor e do
objecto) – art. 31º/2 CPC
Deste modo, conclui-se que a coligação seria admitida (pressupondo que quanto ao
processo sumaríssimo o juiz decidisse a favor) nos termos do art. 31º/1 in fine e do art.
31º/2 CPC
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 77
NOTA1: Nos termos do art. 31º/2 CPC permite-se a coligação entre o processo comum
e o processo especial (por exemplo, DL 269/98, de 1 de Setembro). Existe uma
comparação entre as acções declarativas especiais e o processo comum, estando a
comparação ao nível do processo sumaríssimo. Ou seja, o âmbito de aplicação da
acção declarativa especial acaba por ser uma simplificação. A diferença entre estas
formas de processo não justifica a impossibilidade de coligação.
NOTA2: Chegando à conclusão que os Julgados de Paz seriam competentes, a acção
que ai corresse seguiria uma tramitação diferente daquela que corre quanto ao
processo comum. Antes do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência que
considera que a competência de tais é alternativa, se tal competência fosse exclusiva
os requisitos para a admissibilidade da coligação não estariam verificados.
Competência Relativa: Valor e Forma de Processo e Território
Valor e Forma de Processo
Em primeiro lugar, é necessário determinar o valor da causa, pelo que neste caso é
necessário recorrer às normas constantes do art. 305º e ss CPC.
Nos termos do art. 306º/2 CPC consagra-se que ‘’Cumulando-se na mesma acção
vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma de todos eles’’, pelo que
deste modo o valor da acção seria de € 209500 (€200 000 + €7 500 + €2 000).
Quanto à forma do processo é necessário recorrer ao artigo 460º e ss CPC em que se
consagra que o processo pode ser comum ou especial, sendo que apenas será o
primeiro se não existir nenhum regime especial. Nos termos do artigo 460º, 461º e 462º
aplica-se o processo ordinário comum, uma vez que nos termos do art. 31º da LOFTJ
2008 o valor da alçada do Tribunal da Relação é de trinta mil euros e o valor da causa
no presente caso prático de €209500.
Analisada a forma de processo iremos agora determinar qual o tipo de tribunal que irá
conhecer do mérito da causa, ou seja se é um tribunal singular ou um tribunal
colectivo, sendo que para tal é necessário recorrer à LOFTJ 2008.
Nos termos do art. 135º e ss da LOFTJ 2008 consagram-se as normas que determinam a
intervenção do Tribunal de Júri (art. 140º e ss), Singular (art. 135º) e Colectivo (art. 136º
e ss).
Nos termos do art. 135º/2 LOFTJ 2008 consagra-se que o Tribunal Singular irá julgar os
processos que não devam ser julgados pelo Tribunal Colectivo ou do Júri. O Tribunal
Singular é, deste modo, residual face ao Tribunal Colectivo e do Júri. Para saber se se o
Tribunal Singular é competente então será necessário primeiro determinar a
incompetência do Tribunal Colectivo e do Júri.
Nos termos do art. 140º e ss, quanto ao Tribunal de Júri, estes possuem uma
competência residual nunca tendo aquela quando se esteja face a uma matéria civil
(como é o caso). Deste modo, os Tribunais de Júri, no presente caso, encontram-se
excluídos.
Nos termos do art. 136º e ss, quanto ao Tribunal Colectivo, estes são competentes
devido ao disposto no art. 137º al. b) (‘’Compete ao Tribunal Colectivo julgar (…) as
questões de facto nas acções de valor superior à alçada dos Tribunais da Relação’’)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 78
Conjugando o art. 137º al. b) da LOFTJ 2008 com o art. 128º/1 al. a) da LOFTJ 2008
(‘’Compete à Grande Instância Cível (…) A preparação e Julgamento das Acções
Declarativas Cíveis de valor superior à alçada do Tribunal da Relação’’) o Tribunal
Colectivo de Grande Instância Cível seria o tribunal competente para conhecer do
mérito da questão.
Território
Pedido 1 – Acção que tem por objectivo reconhecer que a garagem é uma fracção
autónoma de que A é o titular
A repartição do poder de julgar, nos tribunais judiciais, é efectuada em função do
território onde cada um destes tribunais desfruta de poderes jurisdicionais. No domínio
da LOFTJ 2008 o território nacional encontra-se dividido em distritos judiciais e
comarcas, nos termos do art. 18º.
Deste modo, constatada a competência internacional dos tribunais portugueses, os
conflitos localizam-se sempre em determinada área do território português. É a lei
processual que fixa os elementos de conexão relevantes, os quais determinam, nos
casos concretos, o tribunal territorialmente competente. Tais elementos de conexão
encontram-se consagrados no art. 73º a 95º do CPC.
Nos termos do art. 87º/1 consagra-se a regra geral quanto à pluralidade de pedidos
segundo a qual ‘’Havendo mais de um réu na mesma causa, devem ser todos
demandados no tribunal do domicilio do maior número; se for igual o número nos
diferentes domicílios, pode o autor escolher o de qualquer deles’’.
Contudo, no presente caso existe a regra especial do art. 73º CPC que consagra que
‘’Devem ser propostas no tribunal da situação dos bens as acções referentes a direitos
reais ou pessoas de gozo sobre imóveis’’, pelo que situando-se o prédio em Lisboa
seria neste tribunal que a acção deveria ser proposta.
Pedido 2 - Acção de Condenação no Valor de € 7500
A regra geral quanto à cumulação de pedidos contante do art. 87º/1 já foi analisada
anteriormente pelo que agora se chama atenção à regra especial constante no art.
74º/1 CPC que consagra que ‘’A acção destinada a exigir o cumprimento de
obrigações (…) é proposta no tribunal do domicilio do réu’’. Sendo que C é
domiciliado em Lisboa seria este o tribunal territorialmente competente.
Pedido 3 - Acção de Condenação no Valor de € 2000
Exactamente a mesma solução do que a referida para o Pedido 2.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 79
b. Identifique os tipos de defesa utilizados por C e diga se são admissíveis.
TEMA: CITAÇÃO (NOÇÃO. EFEITOS. MODALIDADES) E CONTESTAÇÃO
NOTA1: Uma vez recebida pela secretaria e não sendo por ela recusada, a petição é
apresentada a distribuição. Este é o acto processual pelo qual as diferentes petições
são repartidas entre as diferentes secções de processo da secretaria e entre os
diversos juízes (pelo menos dois) que servem o tribunal – art. 209º e ss CPC. Feita a
distribuição, o processo é remetido à secção, juízo ou vara designados onde o
processo vai correr e é aí autuado com os documentos que o acompanham. Feita a
autuação, o processo não é normalmente concluso ao juiz, ou seja não há em regra
despacho liminar sobre a petição inicial, sendo que o juiz só toma contacto, pela
primeira vez com o processo, na fase do saneador. Contudo, nos casos em que não
há despacho liminar pelo juiz da causa, a secretaria pode submeter a petição à
apreciação do juiz, quando julgue ocorre a falta de um pressuposto processual
insanável e de conhecimento oficioso.
NOTA2: Compete à secretaria promover oficiosamente e em regra sem necessidade
de despacho prévio as diligências adequadas à citação do réu – art. 234º/1 e art. 479º
CPC. O acto de citação, uma vez realizado, implica a remessa ao citando do
duplicado da petição inicial e da cópia dos documentos que a acompanham, sendo
o citando advertido de que fica citado para a acção, sendo indicado o tribunal, vara
e secção onde corre o processo – art. 235º/1 CPC. No acto de citação pessoa deve
ser indicado ao réu o prazo dentro do qual pode oferecer a contestação, a eventual
necessidade de patrocínio judiciário e as cominações que sobe ele a lei fará incidir
em caso de falta de contestação – art. 235º/2 CPC. Note-se que a noção de citação
encontra-se consagrada no art. 228º CPC.
NOTA3: Importa salientar quais são os efeitos da citação:
Efeitos Processuais
Impede que o réu proponha contra o autor uma acção com o mesmo
objecto, prevenindo a litispendência – art. 481º/1 al. c) CPC
Constitui uma situação de litispendência se o réu já tiver sido
citado para outra acção idêntica movida pelo mesmo autor –
art. 499º/1, art. 494º al. i), art. 497º e art. 498º CPC
A citação do réu estabiliza os elementos essenciais da causa, ou seja,
os sujeitos (as partes), o pedido e a causa de pedir – art. 268º
Atenção que tal efeito não significa que tais elementos
permaneçam imutáveis, uma vez que podem sobrevir, por um
lado, alterações objectivas (alteração do pedido e da causa de
pedir – art. 270º e 271º CPC), e por outro lado, podem ocorrer
modificações subjectivas (incidentes de intervenção de
terceiros)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 80
Efeitos Substantivos
Com a citação ocorre a cessação da boa fé do possuidor – art. 481º al.
a) CPC. Com a citação o réu fica a saber que está a lesar o direito do
autor (proprietário, usufrutuário), ou seja não pode desconhecer que os
poderes de facto que sobre a coisa exerce estão a lesar o direito do
autor – art. 1260º/1 CC.
Interrupção da prescrição: se o réu for o devedor e estiver a correr em
seu beneficio o prazo de prescrição (pode não estar a correr esse prazo
em seu beneficio – art. 318º a 322º CC) a prescrição interrompe-se com
o acto de citação. Contudo, como a citação depende da promoção
oficiosa da secretaria e esta pode ter muito serviço ou expediente em
atraso, em homenagem aos interesses do autor/credor, a prescrição é
automaticamente interrompida dentro dos 5 dias posteriores à entrada
da petição na secretaria, se a citação não for efectuada dentro desses
5 dias por facto não imputável ao autor – art. 323º/2 CC. Note-se que
quando a citação é anulada, a prescrição é interrompida.
O réu fica constituído em mora se a obrigação for sem prazo, ou seja, se
for uma obrigação pura – art. 805º/1 CC e art. 662º/2 al. b) CPC. A
citação do réu, sendo a obrigação pura produz, deste modo, a
interpelação judicial produtora do vencimento da obrigação.
NOTA4: A citação pode ser de duas modalidades: pessoal ou edital – art. 233º/1 CPC
Citação Pessoal: é a regra, encontrando-se o seu regime consagrado no art.
233º/2 e ss CPC.
Citação Edital: é a excepção, ocorrendo quando o citado se encontre em
parte incerta (art. 244º e 248º CPC) e quando sejam incertas as pessoas a citar
(art. 233º/6 CPC) – art. 251º CPC. Esta modalidade de citação é o ultimo
recurso, sendo que se utiliza tal quando não for possível cita o reu por qualquer
outra via e após terem resultado infrutíferas as buscas efectuadas nas bases de
dados – art. 244º/1 CPC. Realiza-se mediante a afixação de ditais e a
publicação de anúncios – art. 248º a 252º CPC. Sendo a citação edital e não
tendo o réu contestado não se produzem os efeitos da revelia - art. 485º al. b)
in fine CPC.
NOTA5: Sendo a pessoa citada, começa a correr o prazo para constar que, no
processo comum ordinário, é de 30 dias nos termos do art. 486º CPC. Note-se que a
este prazo pode-se acrescer uma dilação.
NOTA6: A contestação é, do ponto de vista material, a peça escrita através da qual o
réu responde à petição inicial, tomando posição perante essa petição e
manifestando oposição ao pedido formulado pelo autor. Em certos casos, o réu pode,
na contestação deduzir pedidos contra o autor (reconvenção). A falta de oposição
pode, por sua vez, traduzir-se na omissão de qualquer conduta reactiva do réu que se
traduz na revelia – art. 484º e 485º CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 81
NOTA7: Se o réu contestar, a sua contestação pode, do ponto de vista formal, assumir
duas modalidades: a contestação-defesa e a contestação-reconvenção. Iremos
agora proceder a uma breve enunciação da matéria em causa:
Contestação Defesa
Defesa por Impugnação
Defesa por Impugnação Directa/Frontal: o réu limita-se a
impugnar os factos articulados pelo autor (dizendo que não é
verdade ou é inexacto ou que não aceita o que o autor afirma
nos artigos X, Y e Z da petição inicial)
Defesa por Impugnação Indirecta: o réu, não impugnando os
factos, afirma que desses factos não resulta o efeito jurídico
pretendido pelo autor (o autor alega que cedeu o gozo ao réu
de um imóvel a título de comodato, a que agora pôs termo
pedindo a restituição do imóvel, alegando o réu que existiu, de
facto, essa cedência do gozo, mas que ela foi feita na
decorrência de um contrato de doação, que teria celebrado
com o autor). Ou seja, o réu aceita os factos alegados pelo
autor, ou alguns deles, mas impugna a qualificação jurídica
fornecida pelo autor e os factos a ela ligados, atribuindo-lhes
uma diferente versão jurídica (negação indirecta). É claro que o
mesmo que o réu não impugne indirectamente, o tribunal
conhece oficiosamente a matéria de direito (a qualificação
jurídica dos factos dados como assentes ou que tenham sido
objecto de prova), podendo (e devendo) controlar se os efeitos
jurídicos pretendidos pelo autor poem ser actuados a partir do
factos alegados.
Defesa por Excepção
Defesa por Excepção Dilatória: o réu aceita os factos narrados
na petição inicial, mas alega factos capazes de obstar à
apreciação do mérito da causa e que conduzam (ou podem
conduzir, se os que forem sanáveis não forem objecto de
sanação) à absolvição da instância ou à remessa do processo
para o tribunal competente – art. 493º. O réu alega a falta de
pressupostos processuais ou outros vícios ou irregularidades da
instância. Sendo as excepções dilatórias (art. 494º CPC) de
conhecimento oficioso pelo tribunal (art. 495º CPC) não pode
entender-se que, a larga maioria, destas são apenas aquelas
cujo relevo depende da vontade do réu em alega-las. Apenas
a incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo art.
110º CPC depende de alegações por parte do réu.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 82
Defesa por Excepção Peremptória: o réu invoca factos
impeditivos, extintivos ou modificativos do efeito jurídico visado
pelo autor; se o conseguir, a consequência é a absolvição total
ou parcial do pedido formulado pelo autor – art. 487º/2 e art.
493º/3 CPC. Se forem julgadas procedentes, a pretensão
originária do autor modifica-se e o tribunal deve condenar o réu
a título condicional, na pretensão subsequente.
Excepções Peremptórias Extintivas: destroem os efeitos
jurídicos resultantes do preenchimento de determinada
previsão da lei
o Caducidade
o Dação em Cumprimento
o Dação Pro Solvendo
o Compensação
o Remissão da dívida
o Consignação em depósito
o Prescrição
o Cumprimento da Obrigação
Excepções Peremptórias Impeditivas: impedem a
produção da consequência jurídica desejada pelo
autor, apesar de se verificarem todos os pressupostos
factuais necessários para realizar a previsão da lei.
o Erro na Declaração
o Dolo
o Incapacidade Acidental
o Erro sobre a pessoa ou o objecto do negócio
o Nulidade do negócio
Excepções Peremptórias Modificativas: a verificação
implica a modificação da pretensão invocada pelo
autor, alterando o objecto da acção.
o Excepção de não cumprimento do contrato
(exemplo: se o réu invocar com sucesso a
excepção de não cumprimento do contrato, o
tribunal deve condená-lo imediatamente a
cumprir o contrato se e quando o autor realizar a
correspondente contraprestação)
o Condição suspensiva (exemplo: se o réu
excepcionar a verificação de uma condição
suspensiva da prestação exigida pelo autor, o
tribunal pode condenar imediatamente o réu a
cumprir a referida prestação quando se verifique
o facto futuro e incerto)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 83
o Modificação oposta a pedido de resolução do
contrato com fundamento em alteração
anormal das circunstâncias
Defesa por Impugnação Indirecta Defesa por Excepção Peremptória
O réu nega simplesmente o efeito
jurídico pretendido pelo autor e atribui
uma diferente versão jurídica aos
factos (que aceita) invocados pelo
autor
O réu opõe ao efeito jurídico
pretendido pelo autor um facto
impeditivo, modificativo ou extintivo
Note-se que as excepções peremptórias respeitam ao mérito da causa, que
não aos pressupostos processuais ou à formação regular da instância, sendo
que deste modo não atingem a relação jurídica processual. A sua
procedência pode ser total ou parcial, visto que pode atingir de diferente
forma o direito material invocado pelo autor.
Quanto ao regime de conhecimento das excepções peremptórias o tribunal
conhece oficiosamente destas cuja invocação a lei não faça depender da
vontade do interessado – art. 496º CPC. Ou seja, somente são de
conhecimento provocado (ou seja, cujo conhecimento brota da iniciativa das
partes, neste caso, do réu) as circunstancias impeditivas, extintivas ou
modificativas do direito invocado pelo autor, quando elas respeitarem a uma
relação jurídica em que a vontade das partes (ou de uma delas, posto que
constitua um direito potestativo) é plenamente eficaz para produzir o efeito
jurídico pretendido pela acção. Deste modo são de conhecimento oficioso as
excepções peremptórias que:
Traduzam nulidades ou o próprio abuso do direito (art.
334º CC) – art. 286º do CC (de contratos ou de negócios
unilaterais) – o pagamento, a novação, a dação em
cumprimento, a remissão ou quaisquer outras causas
extintivas do direito invocado pelo autor. Quanto a estas
basta que os factos que lhe servem de base constem
dos autos para que o juiz possa (e deva) conhece-las,
mesmo que o réu não as tenha invocado na
contestação.
A prescrição, a compensação, a incapacidade, os
vícios do consentimento (erro, dolo, coacção, reserva
mental conhecida) e a caducidade (só em matéria
excluída da disponibilidade das partes)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 84
Contestação Reconvenção: o réu exercita o seu direito de acção contra o
autor. Na contestação a lei dá na verdade a oportunidade ao réu para,
querendo, formular, ele próprio pedidos contra o autor, os pedidos
reconvencionais. O réu pode deduzir reconvenção sem que tenha que
apresentar uma adicional defesa por impugnação ou por excepção,
podendo simplesmente, limitar-se a juntar um pedido reconvencional.
Reconvenção Excepção
Na reconvenção há um pedido
autónomo formulado pelo réu contra o
autor. O réu pretende obter um benefício
económico que não se traduz na mera
extinção, modificação ou impedimento
da pretensão do autor.
Na defesa por excepção peremptória,
embora o réu deduza factos impeditivos,
extintivos ou modificativos do direito
invocado pelo autor e peça que o
tribunal declare, por exemplo, a extinção
desse direito, o certo é que a pretensão
deduzida pelo réu que serve e
fundamento à acção, é dela
intrinsecamente dependente, mais não
passa se não de uma consequência da
excepção invocada contra o autor, por
isso que não transcende a mera
pretensão de improcedência (total ou
parcial) da pretensão do autor.
Condições Processuais de Admissibilidade da Reconvenção: a
reconvenção exige uma certa conexão ou compatibilidade
processual com o objecto processual (pedido e causa de pedir)
definido pelo autor
O tribunal da acção tem que desfrutar da competência em
razão da matéria, hierarquia e da nacionalidade (art. 98º CPC)
para o efeito de apreciar e julgar o pedido reconvencional
Ao pedido inicial do autor e ao pedido reconvencional tem de
corresponder a mesma forma de processo, salvo se a diferença
resultar apenas do diferente valor dos pedidos (art. 274º/3 CPC)
ou o juiz a autorizar, desde que a tramitações de ambas as
formas de processo não sejam manifestamente incompatíveis e
seja indispensável ou conveniente a sua apreciação conjunta.
Não é exigida identidade subjectiva das partes, ou seja a
reconvenção pode ser dirigida contra quem possa vir a
colocar-se ao lado do autor, através do incidente da
intervenção principal provocada (pelo reu). A reconvenção
apresentada pelo reu pode respeitar a terceiros, que possam
ou devam litisconsorciar-se com o autor ou com o réu (art. 325º
e 326º CPC)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 85
À reconvenção do réu não pode o autor, na réplica,
apresentar uma nova reconvenção a esse pedido
reconvencional formulado pelo réu na contestação: é
inadmissível a reconvenção da reconvenção. Na replica o
autor apenas esta salvo de contestar o pedido reconvencional
e responder à matéria das excepções invocadas pelo réu – art.
502º/1 CPC.
▲ Consequência da Falta dos Requisitos Processuais
Reconvencionais: a reconvenção encontra-se viciada
como excepção dilatória o que implica a absolvição do
réu da instância.
Condições Materiais de Admissibilidade da Reconvenção
O pedido reconvencional tem que resultar da mesma causa de
pedir (ou de parte da mesma causa de pedir) que serve de
fundamento à acção ou à defesa – art. 274º/2 al. a) CPC.
É admissível o pedido reconvencional quando o réu deseja
conseguir o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe a
obter – art. 274º/2 al. c) CPC. Nada obsta a que a identidade
do efeito seja apenas parcial.
A reconvenção é também possível quando o réu invoca o
direito a ser indemnizado, pelo autor, de benfeitorias ou de
despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é exigida na acção
– art. 274º/2 al. b) in fine CPC
A Compensação de Créditos: Compensação Excepção vs
Compensação Reconvenção: o pedido reconvencional pode ter
como fundamento a compensação de créditos enquanto forma de
extinção das obrigações (art. 847º CC) – art. 274º/2 al. b) primeira
parte.
A tese da compensação excepção (jurisprudência maioritária):
há quem entenda que só existirá reconvenção quando o
contracrédito invocado pelo réu excede o valor do crédito
reclamado pelo autor e o réu pretende a condenação do
autor no montante da diferença que lhe seja favorável.
Argumentos:
A compensação somente pode ser declarada por uma
parte à outra (art. 848º CC) e nunca é susceptível de
constituir um pedido contra o autor, excepto na parte
em que o contracrédito eventualmente exceder o
crédito. Nos restantes casos haverá defesa por
excepção.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 86
A compensação de um contra crédito cujo montante
não exceda o montante do crédito é uma causa
extintiva da dívida, de tal modo que a sua invocação é
um meio de defesa do réu e só artificialmente pode ser
deduzida através de um pedido reconvencional.
Sendo a acção deduzida num processo sumaríssimo (ou
com o processo especial para cumprimento de
obrigações pecuniárias resultantes de contratos) não há
resposta à contestação e o réu esta impedido de
formular reconvenção, pois que ao autor não seria
então assegurado o contraditório.
A tese da compensação reconvenção gera um
obstáculo à dedução da compensação, já que não são
compatíveis as dividas que tenham que ser deduzidas
em tribunal cuja competência seja diferente em razão
da matéria (credito invocado num tribunal ou juízo de
comercio e o contracrédito somente invocável num
juízo de instancia civil) ou hierarquia ou competência
internacional.
Se a compensação respeita a um crédito ilíquido e o reu
pretende que na acção sejam efectuadas as
operações de liquidação, essa compensação deverá
ser deduzida por reconvenção.
A Tese da Compensação Reconvenção: a compensação,
quando pretenda ser invocada pelo réu, é sempre objecto de
um pedido reconvencional, pois representa uma pretensão
autónoma, ainda quando não exceda o montante do crédito
reclamado pelo autor, sendo que o art. 274º/2 al. b) CPC não
distingue se o contra credito do reu é igual, inferior ou superior
ao credito reclamado pelo autor; pretensão que se pode fazer
valer extrajudicialmente e judicialmente, contrariamente ao
sustentado pela anterior posição.
A Tese Mista: a compensação traduz uma figura hibrida, a um
tempo reconvenção e excepção peremptória. A
compensação, ao mesmo tempo que extingue, total ou
parcialmente, o direito de crédito do autor (pela invocação do
contra credito) realiza e dá execução a este contracrédito do
reu, que é distinto e autónomo daquele direito e pode,
inclusivamente, não exibir qualquer nexo com a pretensão
deduzida pelo autor. Há jurisprudência que admite a dedução
da compensação por via reconvencional, ainda que o
contracrédito seja de valor inferior, quando tal crédito emerge
do mesmo facto jurídico invocado pelo autor.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 87
Posição da Prof. Maria dos Prazeres Beleza: tal não se relaciona
com o valor dos créditos uma vez que a compensação não
assenta no excesso pois este é um pedido autónomo sendo
sempre um pedido reconvencional. Apesar das vantagens e
das desvantagens é preferível aplicar a todo o contra crédito o
regime da reconvenção. Ou seja, a professora defende que
existe sempre reconvenção, não se devendo dividir uma
realidade intrínseca do ponto de vista substantivo. Além disso, o
contra crédito encontra-se relacionado com o crédito: um
resulta de uma relação jurídica societária e o outro de um
contrato de compra e venda (por exemplo). Está-se a trazer
uma nova relação jurídica para a acção e tal faz-se através da
reconvenção e não através de uma mera defesa por
excepção.
i. O A sempre referiu durante a negociação que a compra da fracção
abrangia um local de garagem, pelo que tem direito à utilização da
mesma;
No presente caso estamos face a uma Defesa por Impugnação Directa/Frontal (art.
487/1 e 2): o réu limita-se a impugnar os factos articulados pelo autor, uma vez
enquanto o autor (A) alega que C se apoderou indevidamente da garagem do
prédio, C diz que A sempre referiu que a compra da fracção abrangia um local de
garagem.
Efectivamente o círculo de factos aparentemente novos que são invocados não
consubstanciam excepções; estes factos aparentemente novos são factos que
apenas visam contradizer os factos alegados pelo autor. O facto, em análise, alegado
por C, contraria a ideia de facto, ou seja a apropriação.
NOTA1: Enquanto as excepções dilatórias são pressupostos que impedem o
conhecimento do mérito da causa, as excepções peremptórias são factos que
modificam, extinguem ou impedem o direito alegado pelo autor.
NOTA2: Na impugnação indirecta impugna-se o efeito jurídico que o autor pretende
tirar dos factos que alegou,
ii. Caso assim não se considere, nunca a garagem pode ser considerada
fracção autónoma, por força do estabelecido no regulamento de
condomínio;
No presente caso estamos face a uma Defesa por Impugnação Indirecta: o réu, não
impugnando os factos, afirma que desses factos não resulta o efeito jurídico
pretendido pelo autor. Ou seja, o réu aceita os factos alegados pelo autor, ou alguns
deles, mas impugna a qualificação jurídica fornecida pelo autor e os factos a ela
ligados, atribuindo-lhes uma diferente versão jurídica (negação indirecta). Aplicando
tal ao caso concreto: C invoca as regras constantes no regulamento do condomínio.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 88
PROF. ALBERTO DOS REIS: este autor refere a impugnação de direito existindo, em
qualquer dos factos que se irá mencionar de seguida, sempre um erro de direito:
Erro à Indagação da Norma Aplicável: o autor que faz a indagação comete
um erro aplicando, por exemplo, as regras do contrato de doação em vez das
regras do contrato de compra e venda.
Erro de Interpretação: aplica-se a norma correcta mas interpreta-se de forma
errada.
Erro na Aplicação da Norma: embora se aplica a norma correcta e se faça a
interpretação da mesma de forma correcta a aplicação aos factos no caso é
incorrecta.
iii. Não tem de pagar o remanescente do preço porque a fracção não tem
as características que lhe foram asseguradas por A, vendedor, pelo que
o contrato é anulável;
No presente caso estamos face a uma defesa excepção peremptória impeditiva. Ou
seja, existe uma Defesa por Excepção Peremptória quando o réu invoca factos
impeditivos, extintivos ou modificativos do efeito jurídico visado pelo autor; se o
conseguir, a consequência é a absolvição total ou parcial do pedido formulado pelo
autor – art. 487º/2 e art. 493º/3 CPC. Se forem julgadas procedentes, a pretensão
originária do autor modifica-se e o tribunal deve condenar o réu a título condicional,
na pretensão subsequente.
As Excepções Peremptórias Impeditivas: impedem a produção da consequência
jurídica desejada pelo autor, apesar de se verificarem todos os pressupostos factuais
necessários para realizar a previsão da lei, sendo a nulidade do contrato um exemplo
de tal.
Deste modo, aplicando a teoria ao caso concreto: existe um erro impeditivo (a
fracção não tem as características que lhe foram asseguradas por A, vendedor) que
irá anular o contrato (‘’o contrato é anulável’’), não se chegando a constituir o direito
invocado por A. Este vício que conduz à anulação do negócio significa que o direito
nunca chegou a constituir-se, a existir, na esfera jurídica do autor. Deste modo, sendo
o contrato anulável, o direito ao pagamento do preço nunca chegou a constituir-se.
iv. É titular de um crédito sobre A, resultante de ter sido em tempos
accionista dessa sociedade e ter direito ao reembolso de 10 mil euros
que emprestara (suprimentos). O empréstimo havia sido feito por escrito
do qual constava que o dinheiro deveria ser restituído, quando o credor
o reclamasse, na sede de A, pelo que, caso o Tribunal não considere
procedente a defesa alegada em iii, pretende compensar os créditos e
obter a condenação de A na diferença;
A compensação, consagrada no art. 847º do CC, consiste numa forma de extinção
do cumprimento de uma obrigação. Agora, em Processo Civil, coloca-se a questão
de saber se tal consiste numa situação de reconvenção ou de excepção. A doutrina
diverge.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 89
Na Contestação Reconvenção o réu exercita o seu direito de acção contra o autor.
Na contestação a lei dá na verdade a oportunidade ao réu para, querendo, formular,
ele próprio pedidos contra o autor, os pedidos reconvencionais. O réu pode deduzir
reconvenção sem que tenha que apresentar uma adicional defesa por impugnação
ou por excepção, podendo simplesmente, limitar-se a juntar um pedido
reconvencional.
A Compensação de Créditos será uma Compensação Excepção ou uma
Compensação Reconvenção? O pedido reconvencional pode ter como fundamento
a compensação de créditos enquanto forma de extinção das obrigações (art. 847º
CC) – art. 274º/2 al. b) primeira parte.
A Jurisprudência maioritária defende a tese da compensação excepção: há quem
entenda que só existirá reconvenção quando o contracrédito invocado pelo réu
excede o valor do crédito reclamado pelo autor e o réu pretende a condenação do
autor no montante da diferença que lhe seja favorável. Argumentos:
A compensação somente pode ser declarada por uma parte à outra (art. 848º
CC) e nunca é susceptível de constituir um pedido contra o autor, excepto na
parte em que o contracrédito eventualmente exceder o crédito. Nos restantes
casos haverá defesa por excepção. Ou seja, a compensação opera
extrajudicialmente, bastando que uma das partes a comunique à outra parte.
Resulta do Direito Civil este efeito extintivo não podendo ser o Processo Civil a
impedir que tal efeito se produza dizendo que se trata de um caso de
reconvenção.
A compensação de um contra crédito cujo montante não exceda o montante
do crédito é uma causa extintiva da dívida, de tal modo que a sua invocação
é um meio de defesa do réu e só artificialmente pode ser deduzida através de
um pedido reconvencional.
Sendo a acção deduzida num processo sumaríssimo (ou com o processo
especial para cumprimento de obrigações pecuniárias resultantes de
contratos) não há resposta à contestação e o réu esta impedido de formular
reconvenção, pois que ao autor não seria então assegurado o contraditório.
A tese da compensação reconvenção gera um obstáculo à dedução da
compensação, já que não são compatíveis as dividas que tenham que ser
deduzidas em tribunal cuja competência seja diferente em razão da matéria
(credito invocado num tribunal ou juízo de comercio e o contracrédito
somente invocável num juízo de instancia civil) ou hierarquia ou competência
internacional.
Se a compensação respeita a um crédito ilíquido e o reu pretende que na
acção sejam efectuadas as operações de liquidação, essa compensação
deverá ser deduzida por reconvenção.
Segundo a Tese da Compensação Reconvenção (posição da regente que mais à
frente será desenvolvida): a compensação, quando pretenda ser invocada pelo réu,
é sempre objecto de um pedido reconvencional, pois representa uma pretensão
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 90
autónoma, ainda quando não exceda o montante do crédito reclamado pelo autor,
sendo que o art. 274º/2 al. b) CPC não distingue se o contra credito do reu é igual,
inferior ou superior ao credito reclamado pelo autor; pretensão que se pode fazer
valer extrajudicialmente e judicialmente, contrariamente ao sustentado pela anterior
posição.
Existe A Tese Mista: a compensação traduz uma figura hibrida, a um tempo
reconvenção e excepção peremptória. A compensação, ao mesmo tempo que
extingue, total ou parcialmente, o direito de crédito do autor (pela invocação do
contra credito) realiza e dá execução a este contracrédito do reu, que é distinto e
autónomo daquele direito e pode, inclusivamente, não exibir qualquer nexo com a
pretensão deduzida pelo autor. Há jurisprudência que admite a dedução da
compensação por via reconvencional, ainda que o contracrédito seja de valor
inferior, quando tal crédito emerge do mesmo facto jurídico invocado pelo autor.
A Posição da Prof. Maria dos Prazeres Beleza assenta em que tal não se relaciona com
o valor dos créditos uma vez que a compensação não assenta no excesso pois este é
um pedido autónomo sendo sempre um pedido reconvencional. Apesar das
vantagens e das desvantagens é preferível aplicar a todo o contra crédito o regime
da reconvenção. Ou seja, a professora defende que existe sempre reconvenção, não
se devendo dividir uma realidade intrínseca do ponto de vista substantivo. Além disso,
o contra crédito encontra-se relacionado com o crédito: um resulta de uma relação
jurídica societária e o outro de um contrato de compra e venda (por exemplo). Está-se
a trazer uma nova relação jurídica para a acção e tal faz-se através da reconvenção
e não através de uma mera defesa por excepção.
Deste modo, iremos resolver a hipótese consoante duas teses:
Segundo a Tese da Jurisprudência Maioritária, ou seja da Compensação
excepção, quanto ao excesso (no caso, € 2.500) este será sempre objecto de
reconvenção, mas os €7.500 serão objecto de excepção.
No caso: o tribunal competente para conhecer da acção dos € 7.500 é competente,
igualmente, para conhecer do pedido reconvencional (€ 2.500). Deste modo não se
aplica o art. 98º, como sucede nos pedidos reconvencionais (quando o são no seu
todo).
Segundo a posição da Prof. Maria dos Prazeres Beleza, não só quanto ao
excesso mas também relativamente aos restante crédito, ou seja o crédito no
seu todo é objecto de reconvenção.
No caso: para que tal situação se possa verificar é necessário analisar se os requisitos
constantes do art. 98º e art. 274º/2 e 3 CPC se encontram preenchidos.
Quanto às Condições Materiais de Admissibilidade da Reconvenção
O pedido reconvencional tem que resultar da mesma causa de pedir (ou de
parte da mesma causa de pedir) que serve de fundamento à acção ou à
defesa – art. 274º/2 al. a) CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 91
É admissível o pedido reconvencional quando o réu deseja conseguir o mesmo
efeito jurídico que o autor se propõe a obter – art. 274º/2 al. c) CPC. Nada
obsta a que a identidade do efeito seja apenas parcial.
A reconvenção é também possível quando o réu invoca o direito a ser
indemnizado, pelo autor, de benfeitorias ou de despesas relativas à coisa cuja
entrega lhe é exigida na acção – art. 274º/2 al. b) in fine CPC
No presente caso, poderíamos dizer que existe a conexão subjectiva entre os pedidos
nos termos do art. 274º/2 al. b), contudo embora a compensação incida apenas sobre
os €7.500, a jurisprudência tem na estendido também quanto aos €2.500. Não
aplicando a al. b) poderíamos sempre aplicar a al. a) uma vez que o pedido
reconvencional, na tese em análise, corresponde à parte da defesa por excepção na
tese da jurisprudência maioritária.
Quanto às Condições Processuais de Admissibilidade da Reconvenção: a
reconvenção exige uma certa conexão ou compatibilidade processual com o
objecto processual (pedido e causa de pedir) definido pelo autor
O tribunal da acção tem que desfrutar da competência em razão da matéria,
hierarquia e da nacionalidade (art. 98º CPC) para o efeito de apreciar e julgar
o pedido reconvencional
Ao pedido inicial do autor e ao pedido reconvencional tem de corresponder a
mesma forma de processo, salvo se a diferença resultar apenas do diferente
valor dos pedidos (art. 274º/3 CPC) ou o juiz a autorizar, desde que a
tramitações de ambas as formas de processo não sejam manifestamente
incompatíveis e seja indispensável ou conveniente a sua apreciação conjunta.
Não é exigida identidade subjectiva das partes, ou seja a reconvenção pode
ser dirigida contra quem possa vir a colocar-se ao lado do autor, através do
incidente da intervenção principal provocada (pelo reu). A reconvenção
apresentada pelo reu pode respeitar a terceiros, que possam ou devam
litisconsorciar-se com o autor ou com o réu (art. 325º e 326º CPC)
À reconvenção do réu não pode o autor, na réplica, apresentar uma nova
reconvenção a esse pedido reconvencional formulado pelo réu na
contestação: é inadmissível a reconvenção da reconvenção. Na replica o
autor apenas esta salvo de contestar o pedido reconvencional e responder à
matéria das excepções invocadas pelo réu – art. 502º/1 CPC.
No Caso: é necessário agora a atender à situação de verificar se o tribunal
absolutamente competente para conhecer do pedido 2 (A C) é o mesmo para
conhecer deste pedido 4 (C A: compensar os créditos e obter a condenação de A
na diferença, ou seja nos €2.500)
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 92
Competência Absoluta Internacional
Quanto ao pedido 2 remete-se para a resolução da al. a) do caso constante das
páginas 72 e seguintes: os tribunais portugueses seriam internacionalmente
competentes para conhecer da questão com base na aplicação do art. 2º/1 do
Regulamento 44º/2001 (domicilio do réu, neste caso de C, era em Portugal).
Quanto ao pedido 4: O critério geral da competência encontra-se consagrado no art.
2º do Regulamento 44/2001, sendo que tal depende do domicilio ou sede do
demandando: se é num dos Estados Membros ou fora da União Europeia.
Se o réu tiver domicílio num dos Estados Membros ele deve ser demandado
independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais do Estado do seu domicilio,
nos termos do art. 2º/1. Nos termos do art. 3º/1, este réu somente pode ser
demandando perante os tribunais de um outro Estado Membro se tal resultar da
aplicação de uma competência especial prevista no art. 5º e ss do Regulamento ou
se tiver sido celebrado um válido pacto de jurisdição.
Nos termos do art. 4º/1, se o réu não tiver domicilio em qualquer um dos Estados
Membros a competência é regulada pela lei processual interna do Estado Membro
onde a acção foi intentada, sem prejuízo da aplicação das regras sobre
competências exclusivas, constantes no art. 22º, e por eventuais pactos de jurisdição
válidos, nos termos do art. 23º.
No presente caso, e de acordo com o critério geral do art. 2º, é necessário analisar se
o demandando possui domicílio ou sede no território de um Estado Membro da União
Europeia. Para tal é necessário recorrer ao art. 59º e 60º. No presente caso, a
sociedade A tem sede no Brasil pelo que aplicando o art. 60º al. a) e tomando em
consideração que não é uma situação que incida no âmbito de aplicação do art. 22º,
art. 5º nem que existe nenhum pacto de jurisdição, os tribunais internacionalmente
competentes para conhecer da questão seriam os tribunais brasileiros.
Deste modo, sendo internacionalmente competentes para conhecer do pedido 2 os
tribunais portugueses e sendo internacionalmente competentes para conhecer do
pedido 4 os tribunais brasileiros existe um obstáculo à reconvenção nos termos do art.
98º/1 do CPC.
Contudo, vamos analisar que mesmo que fossem os tribunais portugueses
competentes internacionalmente para conhecer de ambos os pedidos se a
reconvenção seria admitida.
Competência Absoluta em razão da Matéria
Quanto ao pedido 2 remete-se para a resolução da al. a) do caso constante das
páginas 72 e seguintes: os tribunais materialmente competentes seriam os de
competência genérica ou especializada de instância cível.
E quanto ao pedido 4? Quais os tribunais materialmente competentes? De acordo
com a natureza das matérias que são objecto dos conflitos de interesses, assim o
poder jurisdicional é atribuído a distintos tribunais. Nos termos do art. 66º CPC
consagra-se que a competência dos tribunais judiciais é residual no confronto com as
restantes ordens jurídicas de jurisdição permanente (art. 209º e ss. CRP – Tribunal
Constitucional, Tribunal de Contas, Tribunais Administrativos, Tribunais Fiscais e Tribunais
Militares).
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 93
Deste modo, a competência em razão da matéria distingue os tribunais judiciais
relativamente aos tribunais de outras ordens de jurisdição em função da
especialização das matérias em causa. Nos termos do art. 26º/1 da LOFTJ 2008 as
causas que não sejam da competência de outra ordem de jurisdição são da
competência dos tribunais judiciários.
No presente caso, considerando o art. 209º da CRP, as inerentes leis de organização
das diferentes ordens dos tribunais, o art. 66º do CPC e o art. 26º da LOFTJ 2008
estamos face a uma acção que tem por objecto a compensar os créditos e obter a
condenação de A na diferença tal é da competência dos tribunais judiciais.
Dentro da ordem de jurisdição dos tribunais judiciais, a lei distingue diferentes tribunais,
no tocante à competência em razão da matéria. Deste modo, e de acordo com o
art. 73º/2 da LOFTJ, os tribunais judiciais podem ser de:
Competência Genérica (art. 110º LOFTJ 2008): se o autor invoca factos que
permitem várias qualificações jurídicas, o tribunal que tenha sido provocado é
materialmente competente se no seu âmbito de competência couber, pelo
menos, uma das qualificações jurídicas. O tribunal embora competente,
somente pode analisar o caso à luz da qualificação para que seja
materialmente competente.
Competência Especializada (art. 111º e ss LOFTJ 2008): quando os factos
alegados pelo autor apenas autorizam uma determinada qualificação jurídica,
com exclusão de outras qualificações, o tribunal em que ele deduziu a acção
é competente, se e quando essa qualificação for subsumida no âmbito de
competência material desse tribunal.
No presente caso, a acção em questão insere-se nos termos do art. 74º/2 al. d) e art.
121º/1 al. c) (direito social enquanto direito de obter o reembolso de um contrato de
suprimento) pelo que seria competente materialmente o tribunal especializado de
comércio.
Deste modo, o tribunal materialmente para conhecer do pedido 2 (tribunal de
competência genérica ou especializada de instância cível) e o tribunal materialmente
competente para conhecer do pedido 4 (tribunal comercial de competência
especializada) não coincide pelo que existe (mais) um obstáculo à reconvenção nos
termos do art. 98º/1 CPC.
Deste modo, nos termos do art. 98º do CPC a reconvenção não é admissível uma vez
que o tribunal internacionalmente e materialmente competente para conhecer do
pedido 2 e do pedido 4 não é o mesmo. Deste modo, um tribunal conhece do valor
do contra crédito até aos €7.500 mas quanto aos €2.500 ter-se-á de se declarar
incompetente pelo que C terá de intentar uma acção contra a sociedade A, sendo o
objecto de tal a condenação em €2.500. Tal irá conduzir a que existam dois tribunais a
julgar a mesma questão, a avaliar o mesmo facto.
A consequência da não coincidência da competência absoluta do ponto de vista
internacional e material entre o pedido 2 e o pedido 4 tal irá conduzir à absolvição da
instância do réu, nos termos do art. 98º/1 in fine.
NOTA1: Quanto à força do caso julgado tal resulta do facto de se tratar de uma
defesa por excepção ou de reconvenção, encontrando-se a regra geral daquele
consagrada no art. 671º do CPC e a regra especial no art. 96º do CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 94
NOTA2: Em ambas as posições que foram analisadas, ou seja, quer na posição da
jurisprudência maioritária, quer na posição da Prof. Maria dos Prazeres Beleza, existe
sempre a possibilidade de existir réplica, sendo que já quanto à tréplica está só é
admitida quando na contestação tenha existido reconvenção: na primeira posição
quanto aos €7.500 considera-se excepção pelo que não é admissível tréplica, mas na
segunda posição, na posição da regente, tal já seria admissível.
NOTA3: Quanto ao valor da causa, na reconvenção somam-se os valores o que tem
uma enorme relevância para efeitos de recurso.
c. Analise a réplica apresentada por A, considerando que, na mesma, A alegou
que:
TEMA: A RÉPLICA
RÉPLICA: é o terceiro articulado, pelo qual o aturo pode responder à contestação do
réu. É um articulado superveniente, uma vez que a sua dedução, nas acções
ordinárias e sumárias, está dependente da verificação de certos requisitos:
Quando o réu alegue, na contestação, alguma excepção e só serve para
responder à matéria deste – art. 502º/1 CPC
Quando o réu deduza pedido reconvencional, mas só para contestar o pedido
reconvencional e não para formular um novo pedido reconvencional
relacionado com o pedido reconvencional do réu – art. 502º/1 CPC
Nas acções de simples apreciação negativa, para o autor se pronunciar sobre
os factos constitutivos do direito alegado pelo réu: seja para impugnar, seja
para lhes opor factos impeditivos ou extintivos – art. 502º/2 CPC – e
acessoriamente, para o autor alterar o pedido e a causa de pedir – art. 273º/1
e 2 CPC – nos casos que anteriormente foram referidos, ou seja não é possível
apresentar réplica destinada unicamente a alterar o pedido e a causa de
pedir.
PRAZO DE APRESENTAÇÃO DA RÉPLICA: Deve ser apresentado no prazo de 15 dias,
contado a partir da notificação constante no art. 492º CPC, mas se o réu tiver
deduzido reconvenção ou nas acções de simples apreciação negativa o prazo é de
30 dias, (nestes casos, a réplica desempenha a mesma função de uma contestação).
i. Nunca assegurou que a compra da fracção incluía a garagem, pelo
que C alega falsamente e, como tal, deve ser condenado em multa
como litigante de má fé.
Como se pode constatar na resolução da hipótese b) i) o réu, C, defende-se por
impugnação directa/frontal. Oral, tendo em consideração a norma do art. 502º/1 e 2
a réplica apenas pode ser usada nos casos em que o réu se defende por excepção
ou reconvenção (art. 502º/1 CPC) e nas acções de simples apreciação negativa (art.
502º/2 CPC) pelo que neste caso a réplica não seria admitida (não se pode utilizar
uma réplica para responder a uma defesa por impugnação, quer esta seja directa
quer seja indirecta).
Nos termos do art. 201º CPC estamos face a uma nulidade que pode ser de dois tipos:
(1) total ocorrendo a desintegração da réplica no seu todo; (2) parcial ocorrente a
desintegração da réplica na parte em que é nula.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 95
‘’A’’ pretende ainda que C seja considerado litigante de má fé. Nos termos do art.
456º e ss CPC consagra-se a responsabilidade no caso de má fé, sendo que se no
processo, alguém esta a litigar de má fé, de acordo com a referida norma, ‘’a parte
será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta pedir’’.
Para se saber se alguém está a litigar de má fé, neste caso para saber se C é
verdadeiramente litigante de má fé, é necessário recorrer ao nº2 da norma em
análise. No presente caso, tendo em consideração o que foi invocado por A e se tal
for verdade, C seria considerado litigante de má fé por aplicação da al. a) e da al. b)
do nº2. Do nº2 da norma em análise decorre que deste modo, sendo C litigante de má
fé, será sempre admitido recurso mesmo que a outra acção não o admita.
Em suma, estamos face a uma réplica que é nula nos termos do art. 502º/1 e 2 e do
art. 201º CPC, na medida em que tal consiste numa resposta a uma defesa que é feita
por impugnação directa/frontal. Pretendendo o autor, A, fazer um pedido de
condenação por litigância de má fé deverá faze-lo num processo autónomo.
NOTA: Ao contrário do que sucede em Processo Penal, o réu terá de litigar de boa fé
nos termos do art. 456º CPC. Em Processo Civil existe um dever de colaboração das
partes para a descoberta da verdade nos termos do art. 519º CPC. Note-se que o
silêncio poderá conduzir à inversão do ónus da prova.
ii. Nunca recebeu qualquer quantia de C a título de mútuo.
Quando C invoca que já teria dado a A €7.500 (al. b) iv)) como foi analisado
oportunamente tal poderá consistir numa excepção (posição da jurisprudência
maioritária) ou num pedido reconvencional (posição da Prof. Maria dos Prazeres
Beleza). Contudo, posições doutrinárias à parte, na resolução do presente caso, tal é
indiferente, uma vez que nos termos do art. 502º/1 a réplica é admitida tanto como
resposta à defesa por excepção como resposta à reconvenção.
d. Admita agora que nenhum dos réus contestou a acção, sendo certo que C e D
foram citados por carta registada com aviso de recepção e que B foi citado
editalmente.
TEMA: CITAÇÃO, CONTESTAÇÃO E REVELIA
i. explique quais são as consequências resultantes da falta de
contestação, quer do ponto de vista dos réus, quer no que respeita à
marcha do processo;
Nos termos do art. 233º/1 CPC a citação pode ser de duas modalidades: pessoal ou
edital. Quanto a C/D estamos face a uma citação pessoal (‘’’’foram citados por carta
registada com aviso de recepção’’) nos termos do art. 233º/2 al. b) CPC. Quanto a B
estamos face a uma citação edital. Note-se que a citação edital, ao contrário da
citação pessoal que é a regra, é a é a excepção, ocorrendo quando o citado se
encontre em parte incerta (art. 244º e 248º CPC) ou quando sejam incertas as pessoas
a citar (art. 233º/6 CPC) – art. 251º CPC. Esta modalidade de citação é o ultimo
recurso, sendo que se utiliza tal quando não for possível citar o reu por qualquer outra
via e após terem resultado infrutíferas as buscas efectuadas nas bases de dados – art.
244º/1 CPC. Realiza-se mediante a afixação de ditais e a publicação de anúncios –
art. 248º a 252º CPC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 96
Sendo a pessoa citada, começa a correr o prazo para constar que, no processo
comum ordinário, é de 30 dias nos termos do art. 486º CPC. Note-se que a este prazo
pode-se acrescer uma dilação.
No presente caso nenhum dos réus contestou e tendo em consideração que dois dos
réus foram citados pessoalmente e o outro citado editalmente é necessário analisar
estes dois casos de forma autónoma.
Quanto a C/D – Citação Pessoal
Se o réu, citado pessoalmente ou tendo juntado procuração, não contestar dentro do
prazo estabelecido, nem constituir mandatário, ou não intervir de qualquer forma no
processo, diz-se que ele entra em revelia nos termos do art. 484º/1 CPC. Se além de
não deduzir qualquer oposição, o réu não constituir mandatário nem intervier de
qualquer forma no processo, o tribunal verificará se a citação foi feita com as
formalidades legais e ordenará a sua repetição quando encontre irregularidades nos
termos do art. 483º CPC. Se não encontrar irregularidades, o réu entra em revelia e de
seguida apura-se se tal revelia é operante ou inoperante:
Revelia Operante: implica a confissão dos factos articulados pelo autor nos
termos do art. 484º/1 CPC. Esta é uma cominação que atinge o réu pela não
realização da descoberta da verdade material. Ou seja, o réu, mesmo que
nada declare, reconhece ou admite todos os factos articulados na petição.
Há uma cominação semi plena e o tribunal irá julgar a causa conforme o
direito constituído, pese embora tal comportamento omissivo conduza, por via
de regra, à procedência do pedido. Não há, note-se, uma incontornável e
fatal condenação imediata no pedido como consequência da revelia
operante, não há uma cominação plena. Pelo contrário, os factos
reconhecimentos por falta de contestação podem determinar a procedência
da acção como podem conduzir à absolvição do réu da instância ou do
pedido. Se assim for, esse comportamento omissivo altera profundamente a
marcha do processo; este comportamento omissivo do réu produz um efeito
de encurtamento substancial do processo. Não há mais articulados, não há
saneador, pois não há factos que devam ser dados como assentes e também
não há factos controvertidos, a carecer de prova; não há, de igual modo,
instrução, nem logicamente, discussão da matéria de facto uma vez que o
tribunal não tem que considerar provados ou não provados certos factos.
Dado que aqui não há factos controvertidos, os factos articulados pelo autor
serão tomados como tal na sentença final – art. 659º/3 CPC. Ou seja, passa-se
imediatamente da petição inicial para a fase da discussão escrita da causa
(alegações escritas dos advogados, maxime, do advogado do autor, pois o
réu entrou em revelia operante – art. 484º/2 CPC. Note-se, contudo, que na
revelia operante, o réu tem a faculdade de, querendo, alegar por escrito,
sobre a matéria de direito, desde que tenha advogado constituído, pois trata-
se de acções com declarativas comuns na forma ordinária. De seguida é
proferida a sentença, julgando a causa conforme for de Direito. Isto é, o juiz
tanto pode condenar o réu no pedido, total ou parcialmente, como pode
absolve-lo da instância (com base na verificação de excepções dilatórias de
que o tribunal tenha conhecimento oficioso).
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 97
Revelia Inoperante: situações em que, a despeito de o réu não ter
apresentado contestação, e apesar de ter sido citado na sua própria pessoa,
não se consideram confessados os factos articulados pelo autor na petição
inicial
Revelia (Inoperante) Absoluta: embora o réu não tenha contestado,
nem juntado procuração a constituir mandatário judicial e não tendo
praticado qualquer acto de intervenção do processo, não se
consideram confessados os factos articulados, sendo o réu só
notificado da sentença final – art. 255º/4 CPC
Revelia (Inoperante) Relativa: quando o réu não contestou, mas
constitui mandatário no processo ou interveio, de alguma forma, na
acção, não se consideram confessados os factos articulados pelo
autor, sendo o réu revel (ou o seu mandatário – art. 253º CPC)
notificado para actos processuais, mas não podendo requerer
depoimento pessoal do autor – art. 552º/2 CPC a contrario sensu – nem
arrolar testemunhas – art. 638º/1 CPC, a contrario sensu.
⇓
Situações em que, apesar destas cautelas quanto à citação pessoal,
não se consideram confessados os factos articulados pelo autor, ainda
quando o réu não tenha contestado nem junto a referida procuração
forense no prazo da contestação:
1. Não se consideram confessados os factos articulados pelo
autor, havendo vários réus, só algum ou alguns deles
contestarem – art. 485º al. a) CPC. Se o(s) réu(s) contestante(s)
tomarem posição definida sobre os factos alegados pelo autor
na petição, os restantes não contestantes aproveitam dessa
impugnação, mas já sofrem as consequências da falta de
impugnação previstas no art. 490º/2 CPC, relativamente aos
factos que o(s) contestante(s) impugnarem.
Imagine-se que tendo por base o caso em análise, B
contesta o pedido da garagem mas nada diz quanto
ao pagamento de C/D – tais factos dão-se como
confessados.
A norma em análise, art. 485º al. a) CPC, respeita a que
situação de pluralidades de partes: só situações de
litisconsórcio necessário ou também contempla as
situações de litisconsórcio voluntário?
Tendo em consideração o art. 29º do CPC
parece que a interpretação do art. 485º al. a) do
CPC deve ser realizada de forma sistemática.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 98
Litisconsórcio Voluntário: Se os consortes tiverem
posições independentes não pode um consorte
que não contestou beneficiar da contestação
do outro consorte;
Litisconsórcio Necessário: a posição de um dos
consortes não é indiferente da posição dos
outros consortes, independentemente que tal
tenha efeitos favoráveis ou desfavoráveis.
Problema: o processo terá duas velocidades
quanto (1) aqueles que contestaram (ocorrem
todas as fases da marcha do processo); (2)
aqueles que não contestaram (passa-se da fase
dos articulados para a fase da discussão e
julgamento). Ou seja, os mesmos factos, na
mesma acção, para uns são verdade e para
outros não. Tal consubstancia uma situação
anómala e inexequível na prática.
Solução da Doutrina e Jurisprudência: embora
antigamente defendessem uma interpretação
restritiva da situação em análise, ou seja que o
art. 485º al. a) apenas se aplicava às situações
de litisconsórcio necessário, hoje, devido aos
problemas que tal interpretação acarreta,
entendem que deve se considerar que a referida
norma se aplica tanto às situações de
litisconsórcio necessário como às situações de
litisconsórcio voluntário.
2. A revelia inoperante ocorre ‘’Quanto o réu ou algum dos réus
for um incapaz’’ e a relação material litigada se situar na área
da incapacidade – art. 485º al. b) CPC. Note-se que esta
modalidade de revelia inoperante é de difícil verificação, visto
que a falta de contestação do incapaz importa a citação do
MP (art. 15º CPC), correndo novo prazo para a contestação; só
se verifica a revelia inoperante se o MP não oferecer
contestação no novo prazo que lhe é reconhecido.
Embora estejamos a analisar a revelia inoperante na
citação pessoal importa referir que esta alínea se refere
à citação edital: só se aplica a situação de revelia
inoperante às citações editais acompanhadas de
revelia absoluta? Imagine-se que o citado editalmente
apenas nomeia mandatário judicial ou indica a morada
actual: não se pode aplicar esta alínea?
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 99
Segundo a Prof. Maria dos Prazeres Beleza para se
aplicar a regra constante do art. 485º al. b) o citado
editalmente só beneficia de tal ‘’excepção à revelia’’
se tiver se mantido numa situação de revelia absoluta.
3. A revelia é inoperante quando a vontade das partes é ineficaz
para, em exclusivo, produzir o efeito jurídico visado pela acção
– art. 485º al. c) CPC - ou seja quando a acção respeita a
relações jurídicas indisponíveis, o que se coaduna com a regra
do art. 490º/2 CPC (factos inconfessáveis, sobre os quais não
pode haver admissão por acordo) embora este ultima preceito
tenha um âmbito mais limitado, uma vez que só se aplica a
certos factos e não a todos os factos articulados pelo autor na
petição.
Acção de divórcio, sem consentimento de um dos
cônjuges, de investigação da
paternidade/maternidade, de impugnação da
paternidade presumida, de anulação do casamento
civil, etc. – São acções de estado e dizem respeito a
relações jurídicas subtraídas à vontade das partes. A
falta de contestação do réu não exime o autor da
prova dos factos que alega na petição, pelo que terá
de haver saneamento (mas não a selecção da matéria
de facto controvertida), instrução, audiência de
discussão e julgamento (da matéria de facto) e da
sentença final. Tal não significa que a acção seja
julgada procedente, uma vez que pode suceder que,
independentemente da falta de contestação do réu, o
juiz não constitua ou extinga a relação jurídica que lhe é
pedido na petição, julgando a acção improcedente,
por motivo de o autor não ter conseguido provar os
factos subjacentes ao erro sobre as qualidades
essenciais do outro cônjuge ou a coação moral (na
acção de anulação de um casamento).
Esta norma refere-se a direitos indisponíveis. Razão: por
via processual, se tal não consubstanciasse uma
excepção à revelia, obtia-se um efeito que se encontra
vedado a nível substantivo.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 100
Antigamente, o divórcio por mutuo consentimento só
podia ocorrer passados 3 anos uma vez que se visava
evitar os ‘’casamentos à experiência’’. O que acontecia
é que muitas vezes as pessoas queriam separar-se antes
de decorrido o prazo de 3 anos pelo que, se não
existisse esta regra, podiam combinar que um iria propor
a acção e o outro não contestava o que conduzia a
que se produzissem os efeitos da revelia: os factos eram
dados como confessados.
Actualmente, não havendo contestação, em matéria
de diretos indisponíveis, é sempre necessário existir prova
dos factos alegados na petição inicial pelo autor.
4. A revelia é inoperante quando se trate de factos para cuja
prova se exija documento escrito – art. 485º al. d) CPC. Só se
consideram confessados os factos alegados pelo autor que
carecem de prova documental.
Numa acção de execução específica de contrato
promessa em que o autor peça, igualmente, a título de
pedido subsidiário (para o caso de não proceder o
pedido principal), a condenação do réu em
indemnização por responsabilidade civil pré contratual
nos preliminares da celebração desse contrato
promessa – art. 227º CC – a falta de contestação do réu
só inviabiliza a procedência do pedido principal (a
execução especifica do contrato promessa, ai onde a
sentença faz as vezes ou substitui a declaração negocial
do promitente faltoso), uma vez que a prova do
contrato promessa só pode fazer-se mediante a
apresentação do documento escrito comprovativo do
contrato (na hipótese de o autor também não
apresentar tal documento) mas não impede que o
tribunal aprecie e julgue o referido pedido (subsidiário)
de indemnização.
Do ponto de vista do Direito Civil para a prova de certos
factos exigem-se determinados tipos de meios
probatórios. Por exemplo: pode-se provar a celebração
de um contrato de compra e venda de um bem imóvel
através de prova testemunhal? Não, a lei exige para a
prova de tal a existência de escritura pública ou
documento particular autenticado. Exige-se sempre
documento escrito.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 101
No Caso: C/D foram citados pessoalmente como oportunamente foi analisado e nada
fizeram, ou seja: (1) não contestaram; (2) não constituíram mandatário judicial; (3) não
intervieram de qualquer forma no processo. Tendo como pressuposto que a citação
foi feita com as formalidades legais, ou seja realizada correctamente, C/D encontram-
se em revelia absoluta nos termos do art. 483º CPC. Deste modo, nos termos do art.
484º/1 CPC, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor. Estando face
a uma revelia (operante) absoluta, nos termos do art. 484º/2 CPC, ocorrerá uma
supressão de certas fases da marcha do processo, passando-se directamente da fase
dos articulados para a fase da discussão e julgamento da matéria de direito a fim que
o juiz posteriormente a tal realize a sentença.
Nos termos do art. 484º/3 CPC, se a causa for de grande simplicidade a sentença
poderá limitar-se à parte decisória devido à confissão dos factos (trata-se de uma
confissão ficta que assenta numa presunção inilidível sobre a veracidade daqueles
factos).
No presente caso considera-se que não existe nenhuma excepção constante no art.
485º pelo que se considera que os efeitos da revelia, constantes no art. 484º CPC, se
produzem.
Quanto a B – Citação Edital
Nos termos do art. 483º CPC, B encontra-se em revelia absoluta. Contudo não se
podem aplicar as consequências que resultam do art. 484º CPC uma vez que é
necessário atender ao art. 485º al. b) in fine do CPC ‘’Não se aplica o disposto no
artigo anterior (leia-se no art. 484º CPC)(…) Quanto o réu (…) houver sido citado
editalmente e permaneça na situação de revelia absoluta.’’
A razão da protecção oferecida pelo legislador ao citado editalmente deve-se ao
facto de existir uma grande probabilidade deste não tomar conhecimento efectivo
que existe a acção a correr contra ele. A citação edital é um meio que assegura a
cognoscibilidade mas não o conhecimento.
Deste modo, por aplicação do art. 483º, 484º e 485º al. b) in fine do CPC os factos
alegados na petição inicial não são considerados como provados relativamente a B.
O processo irá decorrer normalmente (leia-se terá todas as fases da marcha do
processo), embora possa considerar-se que a fase dos articulados, uma vez que não
existe contestação e consequentemente lugar a réplica, termina neste momento.
Conjugação da situação de C/D com a situação de B
Anteriormente concluímos que quanto a C/D existindo uma citação pessoal e
aplicando o art. 483º e art. 484º CPC os factos serão considerados como confessados
mas quando a D, uma vez que este foi citado editalmente, por aplicação da
excepção constante do art. 485º al. b) in fine CPC os factos não serão dados como
confessados. Ora daqui resulta um enorme problema: estando face a uma situação
em que existem co réus ocorre uma situação em que os mesmos factos são dados
como provados quanto a uns (C/D) e não quanto a outros (B). Tal conduz a que
existam duas tramitações processuais distintas. Tais tramitações processuais,
aparentemente distintas, tem de passar a coexistir. Ou seja, numa situações como esta
a paralisação dos efeitos da revelia aproveita aos outros co réus (C/D) de modo a
salvaguardar dois aspectos: (1) que os mesmos factos, na mesma acção, não sejam
considerados como provados quanto a uns e não provados quanto a outros; (2) existir
uma tramitação a correr em dois planos diferentes. Note-se que a paralisação dos
efeitos da revelia aproveita apenas ao factos que são comuns.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 102
NOTA1: E se o autor, A, na petição inicial tiver anexado a certidão de compra e venda
(art. 523º/1 CPC)? Tal consubstancia uma excepção da revelia, mas concretamente a
que se encontra presente na al. d) do art. 485º? A consequência da revelia presente
no art. 484º CPC não exonera o juiz de cumprir certos deveres a que se encontra
obrigado na descoberta da verdade e na verificação de pressupostos processuais. O
juiz confrontado com a falta de contestação se concluir que a citação ocorreu
normalmente irá aplicar a consequência constante no art. 484º CPC, sendo
necessário, analisando a petição inicial, quais os factos considerados provados, não
podendo considerar como provados factos para os quais a lei exige documento
escrito. Se tais factos se encontram provados na petição inicial o juiz aplicará a
consequência do art. 484º CPC, a menos que outra excepção constante do art. 485º
do CPC se verifique. É sempre necessário atender que em matéria probatória vigora o
Princípio do Inquisitório nos termos do art. 265º/3 CPC.
NOTA2: a al. d) do art. 485º CPC vale para os factos em que a lei exige documento
escrito, sendo que os restantes factos, não sendo objecto de contestação, serão
dados como provados.
ii. diga se, apesar de os réus não terem contestado, C e D podem vir ao
processo, passado o prazo da contestação, invocar:
TEMA: PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO DA DEFESA NA CONTESTAÇÃO E SUAS
‘’EXCEPÇÕES’’
Nos termos do art. 489º/1 CPC, a defesa – toda a defesa que o réu queira apresentar –
deve ser deduzida na contestação. Tal traduz o Princípio da Concentração da Defesa,
sendo que se tal princípio não for respeitado fica precludida a possibilidade de
invocar factos que, devendo ser alegados nesse momento, não o foram.
(i) a incompetência territorial do tribunal onde a acção foi
proposta;
Tendo por base a resolução da al. a) do presente caso o Tribunal Territorialmente
Competente para conhecer do mérito da questão seria o Tribunal de Lisboa (página
78º).
Tendo por base o Princípio da Concentração da Defesa na Contestação consagrado
no art. 489º/1 CPC é necessário atender ao nº2 que consagra ‘’Depois da
contestação só podem ser deduzidas as excepções, incidentes e meios de defesa (…)
que a lei expressamente admita passado esse momento (leia-se a contestação), ou
de que se deva conhecer oficiosamente’’.
Ora, no presente caso C/D pretende invocar a incompetência territorial que sendo um
caso de incompetência relativa e aplicando o art. 109º CPC deverá ‘’ser arguida pelo
réu, sendo o prazo de arguição o fixado para a contestação’’. Contudo, nos termos
do art. 110º/1 al. a) (aplicação do art. 74º/1 do CPC – Tribunal de Lisboa), neste caso,
estamos face a uma situação de incompetência relativa que é de conhecimento
oficioso.
Deste modo, sendo uma questão de conhecimento oficioso, por aplicação do art.
489º/2, art. 109º e art. 110º/1 al. a), C/D poderiam invocar tal incompetência relativa
passado o prazo de contestação.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 103
(ii) o pagamento dos créditos invocados por A.
Tendo sempre por base o Princípio da Concentração da Defesa na Contestação
constante no art. 489º/1 CPC é necessário contudo atender ao constante do nº2 da
referida norma. Nos termos do nº2 é possível invocar-se, passado o prazo da
contestação, factos supervenientes. Tais factos supervenientes encontram-se
consagrados no art. 506º do CPC.
A questão que se coloca é a de saber se o pagamento consubstancia ou não um
facto superveniente nos termos do art. 506º do CPC. Ora, a resposta é negativa. Deste
modo, tomando em consideração o Princípio da Preclusão, até a termo do prazo
para contestar, o réu terá de concentrar na mesma toda a sua defesa.
Note-se que nos termos do art. 264º CPC, o juiz poderá tomar em consideração factos
não alegados pelas partes, desde que tais sejam instrumentais ou concretizadores.
Contudo, o pagamento consubstancia um facto essencial para a procedência da
acção tendo de ser invocado na petição inicial ou na contestação (no caso em
análise, na contestação). Deste modo, nos termos do art. 264º e do art. 489º/1 teria de
ter sido invocado na contestação, não podendo ser invocado posteriormente.
NOTA1: Nos termos do art. 496º do CPC, o tribunal conhece dos efeitos jurídicos da
alegação dos factos. Se na contestação se invocar o pagamento do preço mas não
se disser que consequentemente a dívida se encontra extinta, o juiz poderá no
entanto retirar tal conclusão devido ao facto de o juiz ser libre na interpretação das
normas e na sua aplicação aos factos nos termos do art. 664º.
NOTA2: Analisar atentamente o regime constante do art. 314º e ss CPC.
VI – Prova
CASO XVI
André emprestou a Bernardo a sua casa, na zona de Santarém, para que este a usasse
durante a conclusão da sua tese de doutoramento, por a mesma se situar no campo e
poder proporcionar um ambiente de silêncio e reflexão. Terminada a tese, Bernardo
devolveu as chaves da casa a António. Decorrida uma semana sobre essa devolução,
António foi passar o fim de semana à sua casa de campo e deparou com sinais
evidentes de uma inundação e com prejuízos superiores a € 50.000,00. Após constatar
a rejeição de qualquer responsabilidade pelo acidente por parte de Bernardo, António
propôs uma acção contra aquele, na qual pediu a sua condenação no pagamento
de uma indemnização por € 50.000,00, alegando que Bernardo deixara uma torneira
aberta a pingar, causando a inundação. Bernardo defendeu-se na contestação
dizendo que se a torneira pingara tal se devera ao facto de ser uma torneira antiga,
que vedava mal. Admitindo que ficou provado que a inundação fora causada por
aquela torneira, mas que não ficou provado se a mesma ficara aberta ou se vedava
mal, como deverá o tribunal julgar esta acção?
TEMA: PROVA (EM GERAL) E ÓNUS DA PROVA
ÓNUS DA PROVA SUBJECTIVO: a demonstração da realidade dos factos controvertidos
cabe às partes.
Cada uma das partes deverá tentar demonstrar um acervo de afirmações de factos
constantes dos articulados que juntaram aos autos. Se uma delas (ou ambas) não
cumprir essa demonstração (ou ónus) o tribunal está impedido de se abster de julgar,
mesmo que esteja com dúvidas insanáveis – art. 8º/1 CC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 104
Este sistema subectivo da prova das afirmações dos factos implica a distribuição pelas
partes do encargo de demonstração de um certo conjunto de afirmações. Todavia tal
sistema é temperado por um sistema objectivo: a consequência da falta de
demonstração da realidade desses factos ou a dúvida insanável que sobre essas
afirmações de factos se abate na convicção do julgador importa a demonstração do
facto contrário.
Nos termos do art. 516º CPC, perante a falta de prova das afirmações de facto
aduzidas pelo autor, o tribunal ficciona como provadas as afirmações de facto
aduzidas pelo réu e emite uma decisão desfavorável á parte a quem compre, nos
termos da lei, demonstrar a realidade das afirmações de facto.
O ónus da prova implica a questão de saber a quem compete a prova dos factos
controvertidos. Nos termos do art. 342º/1 CC ‘’Àquele que invocar um direito cabe a
prova dos factos constitutivos do direito alegado’’. À contraparte cabe a prova dos
factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado nos termos do nº2 da
norma em análise. Por exemplo, os factos modificativos favoráveis ao autor devem por
este ser provados. Ao réu cabe demonstrar e convencer o tribunal acerca da
verificação dos factos modificativos que lhe são favoráveis. Ou seja, uma vez que a
identificação dos factos não é sempre a mesma (existem factos de maior facilidade
de identificação do que outros) existe a norma constante do nº2 do artigo em análise,
consagrando-se deste modo a Teoria da Norma. Note-se que em caso de dúvida, nos
termos do nº3 consagra-se que, os factos devem ser considerados como factos
constitutivos do direito.
Conjugando as regras constantes no Código Civil (art. 342º) e a Teoria da Norma
resulta que é necessário identificar a norma que consagra o direito que se pretende
fazer valer na acção, cabendo ao autor fazer a prova que integram a sua provisão; o
réu terá de provar a excepção e a sua previsão para aproveitar da estatuição desta
mesma excepção.
Ou seja, cada parte deverá alegar e provar os factos correspondentes à previsão da
norma que aproveita à sua pretensão ou à sua excepção, ou seja, cada parte tem
ónus de demonstrar a existência de todos os pressupostos das normas que favorecem
e legitimam legalmente a sua pretensão, sem prejuízo de o julgador poder usar
alguma flexibilidade, atendendo à maior u menos verosimilhança dos factos alegados.
Note-se que o art. 342º do CC consagra a regra geral do ónus da prova, mas existem
regras excepcionais que o legislador previu e que fogem aos critérios gerais da norma
que foi analisada. Tais regras excepcionais encontram-se consagradas no art. 343º e
344º CC. Nestes casos o ónus da prova deixa de pender sobre uma das partes e passa
a pender sobre as outras, ou seja, ocorre a inversão do ónus da prova. Nos termos do
art. 345º rege-se ainda o caso das convenções sobre as provas.
No presente caso estamos face a uma acção de condenação em responsabilidade
civil contratual (art. 1129º - contrato de comodato), pelo que o autor (André) que
pretende ser indemnizado uma vez que fora incumprido o contrato terá de provar os
factos constitutivos do seu direito (art. 342º do CC e Teoria da Norma).
No presente caso, André (autor) quando reclama a indemnização está a
responsabilizar Bernardo (devedor) com base no art. 798º do CC, pelo o autor terá de
provar os factos. Ou seja, os factos integradores da responsabilidade civil contratual,
em principio, teriam de provados pelo autor. Contudo, o art. 799º CC consagra uma
situação de inversão do ónus da prova, derivando tal do regime do comodato mais
concretamente do art. 1135º al. a) e d) CC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 105
Mesmo tendo em consideração o art. 798º do CC aplica-se o regime geral do ónus de
prova constante do art. 342º CC, cabendo ao autor provar os factos que alega.
Contudo quando se trata de apurar a culpa do devedor aplica-se o art. 799º CC
cabendo ao devedor provar que a situação (a inundação no caso) não se deveu a
culpa sua. Note-se que o regime geral da responsabilidade civil contratual pressupõe
a culpa.
Note-se que no art. 799º do CC encontra-se consagrado um meio de prova: a Prova
Presunção. Deste modo é necessário provar o facto base por outro meio de prova, por
exemplo o incumprimento. Provando-se tal, dai retira-se o facto presuntivo, ou seja a
culpa. Poderá ocorrer a inversão do ónus da prova quando exista uma presunção
legal nos termos do art. 344º/1 primeira parte (no art. 799º consagra-se uma presunção
legal).
Deste modo, constatando o juiz que exista uma dúvida insanável no tocante à origem
da ‘’abertura’’ da torneira (‘’não ficou provado se a mesma ficara aberta ou se
vedava mal’’) irá decidir contra Bernardo se tal não tiver afastado a presunção de
culpa que sobre ele recai nos termos do art. 799º CC.
NOTA1: O Direito Probatório Material (art. 348º e ss do Código Civil) é constituído pelo
ónus da prova, a admissibilidade dos meios de prova e o valor dos mesmos. Por sua
vez o Direito Probatório Formal (CPC) traduz o procedimento pelo qual a prova é
realizada.
NOTA2: Nos art. 346º e 347º do CC faz-se menção ao valor dos meios probatórios,
podendo tal ser de dois tipos (1) prova com valor probatório bastante; (2) prova com
força probatória plena.
NOTA3: O art. 341º do CC constitui a regra, ou seja as provas têm a função de
demonstração dos factos e não do direito. O art. 348º do CC respeita à invocação do
direito consuetudinário, local ou estrangeiro e constitui uma excepção à norma
referida uma vez que se refere à prova do direito (exemplo: alega-se que existe um
costume com conteúdo tal em local X).
NOTA4: Um facto por vezes pode-se provar sem se ter afastado a presunção de culpa
uma vez que visa-se a descoberta da verdade material e não apenas a formal. Tal
resulta do art. 515º CPC que consagra o Princípio da Aquisição Processual.
NOTA5: A resolução do caso foi realizada com base numa situação de
responsabilidade contratual. Se se tratasse de uma questão de responsabilidade
extracontratual a solução seria difícil uma vez que não existe nesta inversão do ónus
da prova, pelo que nos termos do art. 487º/1 CC caberia ao autor provar os factos
que alega.
NOTA6: Imaginemos uma situação de responsabilidade contratual em que o credor,
face ao incumprimento por parte do devedor, não requer a condenação numa
indemnização mas sim a condenação no cumprimento do contrato. Não ficando
provado o incumprimento do contrato coloca-se a questão de saber a quem cabia o
ónus da prova de tal. O cumprimento é um facto extintivo da obrigação pelo que, nos
termos do art. 342º/2 CC, cabe ao réu provar tal. Contudo, a questão do
incumprimento seria um facto constitutivo do direito do autor pelo que a sua prova
cabia a este. Quando se fala em cumprimento ou incumprimento está se a qualificar
um facto que é o mesmo, sendo que o ónus de prova do mesmo é que varia. Ou seja:
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 106
Quando se pretende provar o cumprimento, tal é um facto extintivo da
obrigação, pelo que cabe ao réu provar – art. 342º/2 do CC
Quando se pretende provar o incumprimento, tal é um facto constitutivo do
direito do autor pelo que cabe a este prova-lo – art. 342º/1 do CC.
NOTA7: Estudar a matéria do ónus da prova pelo PROF. ANTUNES VARELA
CASO XVII
Carlota propôs uma acção contra Diogo pela qual pediu ao Tribunal que declarasse
que nada devia a Diogo ao abrigo do contrato de mútuo celebrado com este dois
anos antes. Alegou para tanto que a obrigação de reembolso da última tranche ficara
sujeita à condição de os juros pagos até determinada data não excederem a quantia
de € 15.000, tendo os mesmos excedido, na verdade, tal valor em € 5.000. Na
contestação, Diogo alegou existir a dívida e impugnou que o reembolso da última
tranche tivesse ficado sujeito a qualquer condição. Considerando que o juiz não
considerou provada a dívida e o acordo sobre a condição, como deverá ele decidir a
causa?
TEMA: (INVERSÃO DO) ÓNUS DA PROVA
Dados do Caso:
Contrato de Mútuo provado (Diogo, na contestação, confirma que havia
celebrado com Carlota tal contrato mas invoca que nunca tal contrato havia
ficado sujeito à verificação de uma condição)
Carlota invoca a existência de uma condição que se admitida e se verificada
a exonerava de pagar a última tranche/prestação a Diogo
Tribunal não consegue apurar se a condição foi ou não combinada
Nos termos do art. 343º/3 CC, as acções fundadas em direito sujeito a condição,
suspensiva ou a termo inicial – direito subordinado, portanto, a cláusulas acessórias do
negócio jurídico de onda brota tal direito – é ao autor que cabe a prova de que o
facto futuro (termo ou condição), de que depende a produção dos efeitos da
situação que invoca, se verificou (in casu, a condição suspensiva) ou venceu (no caso
do termo inicial). Pelo contrário, se o direito estiver subordinado a uma condição
resolutiva ou a um termo final, compete ao réu a demonstração da verificação da
condição ou do vencimento do prazo, já que estes últimos factos são extintivos do
direito do autor. Ou seja, na norma em análise consagra-se um caso especial de
repartição do ónus da prova, dependendo tal de estar se face a uma condição
suspensiva ou resolutiva ou à verificação de um termo.
Contudo aplicando o art. 343º/3 CC ao caso concreto acarreta um problema: as
partes convencionaram uma cláusula acessória pela qual subordinaram os efeitos
jurídicos do contrato? Não. O que as partes convencionaram é que ‘’a obrigação de
reembolso da última tranche ficara sujeita à condição de os juros pagos até
determinada data não excederem a quantia de (…)’’. O contrato foi celebrado e é
válido a questão que se coloca é quanto ao (in)cumprimento da última prestação.
Deste modo não se podendo aplicar o art. 343º/3 CC é necessário atender ao art.
343º/1 CC.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 107
Nas acções de simples apreciação negativa é o réu a quem a lei onera com a prova
da demonstração dos factos constitutivos da situação negada pelo autor ou, o que é
o mesmo, os factos constitutivos do direito em que o réu se arroga. É mais fácil ao réu
provar a existência de um direito ou de facto (o que por ele é alardeado) do que
impor ao autor a demonstração de um facto negativo ou da inexistência de um
direito, já que isso implicaria uma prova quase diabólica.
Ou seja, nos termos do art. 343º/1 CC é ao réu a quem cabe a prova dos factos
constitutivos, uma vez que se considera que, em bom rigor, a acção deveria ter sido
proposta por ele (réu). Note-se que a inexistência da condição consubstancia um
facto constitutivo do direito de crédito.
Divergência Doutrinal entre o PROF. ANTUNES VARELA vs PROF. MARIA DOS PRAZERES
BELEZA:
PROF. ANTUNES VARELA: Defende que quando se está face a uma obrigação
condicional (sujeita a uma condição) cabe àquele que pretende invocar o
direito provar que a sua obrigação é pura (sem condição), pelo que terá de
provar que a condição não existe, que não foi celebrado qualquer acordo
nesse sentido.
PROF. MARIA DOS PRAZERES BELEZA: Defende que quando se alega uma
condição na verdade está se a alegar um facto relativamente ao qual a
produção dos efeitos jurídicos de um contrato fica suspenso ou irá terminar
(suspensiva ou resolutiva).
Se for uma condição suspensiva, os efeitos jurídicos do contrato não se
produzem enquanto a condição não se verificar o que deste modo
impede a produção dos efeitos jurídicos gerando um efeito impeditivo
Se for uma condição resolutiva verificada a condição os efeitos jurídicos
do contrato extinguem-se sendo deste modo um facto extintivo.
⇓
Nesta circunstância aplica-se o art. 343º/3 cc
No presente caso, tratando-se de uma acção de simples apreciação negativa iria-se
aplicar o art. 343º/1 do CC sendo necessário distinguir o seguinte:
Tratando-se de um facto constitutivo caberia ao réu (Diogo) provar. Tal seria
macabro no caso concreto: Diogo teria de provar a existência de uma
condição que invoca que não existe.
Tratando-se de um facto extintivo (solução aplicável ao caso devido ao
resultado que existiria se considerássemos tratar-se de um facto constitutivo)
caberia ao autor (Carlota) provar.
NOTA: O art. 343º/1 é uma norma interpretada pela jurisprudência e pela doutrina de
forma restritiva. Ou seja, a inversão só ocorre quando a dúvida acerca da existência
do direito tiver sido provocada pelo réu, uma vez que só nesta circunstância é que ele
terá de ser onerado pelo ónus da prova.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 108
CASO XVIII
Eduardo instaurou contra Francisco uma acção pedindo a restituição de uma quantia
que diz ter-lhe emprestado, no valor de € 5.000,00. Junta, para o efeito, um
documento, que diz ter sido assinado por ele próprio e por Francisco, com o seguinte
conteúdo:
«Por este documento, Francisco reconhece que Eduardo lhe emprestou a quantia de €
5.000,00, dos quais € 1.000,00 foram já pagos.
Lisboa, ……….
a) assinatura de Eduardo
b) assinatura de Francisco».
Diga se este documento prova o empréstimo e a falta de pagamento.
TEMA: PROVA DOCUMENTAL
Nos termos do art. 362º CC consagra-se que a ‘’Prova documental é a que resulta de
documento; diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim
de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto’’.
No presente caso estamos face a um documento particular simples, uma vez que não
se enquadra no âmbito do art. 362º/2 e 3. Não existe qualquer intervenção notarial ou
de qualquer outra pessoa com poderes de autenticação: este documento escrito é
apenas assinado pelo Eduardo e pelo Francisco.
Note-se que poder-se-ia pensar em aplicar as normas constantes do art. 370º e 371º
CC, mas uma vez que tais respeitam ao valor probatório dos documentos autênticos e
estamos face a um documento particular simples é necessário atender ao disposto no
art. 374º e 376º CC.
É de salientar que sempre que se está face a uma prova documental é necessário
realizar duas fases: (1) identificar a força probatória processual do documento (autoria
do documento); (2) identificar a força probatória material do documento (conteúdo
do documento).
A fim de apurar se o documento em análise prova a celebração do contrato de
mútuo e o (a falta de) pagamento é necessário atender à força probatória processual
do documento que se encontra consagrada no art. 374º do CC. Tal terá força
probatória plena quanto à autoria do documento, ou seja um documento que não
tenha sido impugnado possui força probatória plena. Para se destruir a sua força
probatória plena é necessário fazer-se prova em contrário. Imaginando-se que tal
documento era anexado junto à petição inicial se o réu na contestação tomasse
conhecimento com o mesmo mas não soubesse identificar se aquela assinatura era ou
não dele, tal seria fundamento para impugnar? Não: dizer que não se sabe não é
fundamento de impugnação pelo que não é suficiente para afastar a força
probatória plena deste documento (típica pergunta de oral). Deste modo, uma vez
que ambas as partes (Eduardo e Fernando) assinaram o documento e uma vez que tal
documento não foi impugnado conclui-se que este, nos termos do art. 374º CC, tem
força probatória plena.
Analisando agora o conteúdo do documento, ou seja a sua força probatória material,
é necessário atender ao disposto no art. 376º CC. Nos termos do nº1 da norma em
análise quando se diz ‘’faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu
autor’’ o que tal significa é que o documento prova as declarações (prova que
Francisco declarou que Eduardo lhe emprestou uma determinada quantia e que
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 109
declarou ter lhe pago já uma parte). Deste modo, não ficam provado os factos, ou
seja não fica provado o pagamento e o empréstimo. Uma coisa é declarar-se que se
emprestou e outra é emprestar-se de facto. Ou seja, fica provado com força
probatória plena as declarações, salvo se se provar a falsidade de tais. Nos termos do
nº2 faz-se referência à confissão que consta do art. 352º do CC. Segundo esta norma
se se conseguir, analisando as declarações, retirar das mesmas, factos desfavoráveis a
quem as emitiu, por aplicação do art. 353º CC poder-se-ão considerar tais factos
como provados.
Exposto o anterior coloca-se então a questão de saber se o presente documento
prova o empréstimo. Uma vez que Francisco reconhece que Eduardo lhe emprestou
aquela quantia tal consubstancia uma declaração que lhe é desfavorável pelo que
aplicando o art. 376º/2 e o art. 352º CC tal consubstancia uma declaração
confessória. Tendo em consideração que é sempre necessário enquadrar a acção no
âmbito da acção que está a ser proposta podemos concluir que o empréstimo é
dado como facto provado.
Analisemos agora a questão da falta de pagamento (‘’Francisco reconhece que
Eduardo lhe emprestará a quantia de €5. 000, dos quais €1. 000 foram já pagos’’). Uma
vez que a declaração encontra-se tanto assinada por Francisco (devedor) como por
Eduardo (credor), o facto de Francisco na declaração declarar que já havia pago mil
euros a Eduardo tal consubstancia um facto que lhe é favorável, pelo que em
princípio, aplicando a norma do art. 376º/2 CC, tal não ficara provado com força
probatória plena. Contudo é necessário atender ao facto que a declaração, como foi
mencionado anteriormente, encontra-se assinada por ambos e o facto de Francisco
declarar que já tinha pago tal quantia a Eduardo tal consubstancia um facto
desfavorável para Eduardo. Ou seja, aplicando o art. 376º/2 CC fica provado com
força probatória plena o pagamento de mil euros uma vez que tal é desfavorável
para Eduardo.
Analisemos agora a questão dos €4. 000 que Francisco ainda não pagou a Eduardo.
Tendo em consideração o princípio da indivisibilidade da confissão – art. 360º CC - é
importante contudo salientar que (1) existe um reconhecimento da dívida; e (2) existe
uma declaração que corresponde ao pagamento de mil euros.
Imagine-se que o presente documento era assinado pelo devedor relativamente ao
pagamento dos €1. 000. Tal seria uma declaração favorável para o referido, mas existe
a regra da indivisibilidade da confissão – art. 360º CC – que no caso contrário importa
que não se pode dissociar o reconhecimento do empréstimo e o pagamento dos €5.
000 – art. 361º CC.
Note-se que da leitura do art. 361º CC resultam dois tipos de confissões quanto
à sua indivisibilidade:
CONFISSÃO COMPLEXA: Admite-se um facto favorável e outro desfavorável em
simultâneo. No caso prático, Francisco reconhece que Eduardo lhe emprestara
€ 5. 000, mas ao mesmo tempo declara que já pagou €1. 000
CONFISSÃO QUALIFICADA: Admite-se um facto que em si mesmo é
desfavorável mas dá-se lhe uma conotação favorável. Exemplo: o Bento
reconhece que o Manuel lhe emprestou €10. 000 mas que tal foi a título de
doação.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 110
Ou seja, se o documento em análise só tivesse sido assinado pelo devedor, como o
reconhecimento da dívida no valor de €5. 000 consubstancia um facto que lhe é
desfavorável tal fica provado. Devido à regra da indivisibilidade da confissão e uma
vez que o devedor reconhece que já havia pago €1. 000 tal também fica provado.
NOTA1: Nos termos do art. 360º in fine quando se diz ‘’salvo se provar a sua
inexactidão’’ tal regere-se ao facto de ser admitida prova em contrário. Do ponto de
vista do ónus da prova cabe ao devedor provar que já pagou, alegando o
cumprimento da obrigação que consubstancia um facto extintivo. Contudo, com a
regra da indivisibilidade da confissão quem tem de provar que nada foi pago, apesar
de no documento constar o oposto, é o credor.
NOTA2: A confissão é a rainha das provas: se uma pessoa admite um facto que lhe é
desfavorável existe (quase) toda a probabilidade de esse facto ser verdadeiro.
NOTA3: Método de resolução de casos relativos à força probatória dos documentos:
1. Força Probatória Formal – Autoria
2. Analisar se as declarações se encontram provadas
3. Força Probatória Material – Conteúdo
NOTA4: Quando está em causa uma confissão é sempre necessário analisar e
consequentemente referir o art. 360º do CC.
NOTA5: Note-se que se tal documento consubstancia-se uma escritura pública iria-se
aplicar o regime do art. 370º e 371º do CC. Contudo, no art. 371º não se consagra
nada semelhante ao que é consagrado no art. 376º/2 CC, ou seja em nenhuma parte
daquela norma se refere a confissão. A resolução de tal problema passa primeiro pelo
facto de o art. 370º referir-se à força probatória formal, ou seja o legislador presume
que ‘’o documento provém da autoridade ou oficial público a quem é atribuído (…)’’.
Por outro lado, o art. 371º/1 do CC refere-se à força probatória plena que corresponde
à percepção de que o notário faz da declaração que alguém invoca ter feito. Este
artigo possui uma certa similitude com o consagrado no art. 376º/1 CC: existe a livre
apreciação do julgador uma vez que estamos face a uma situação de força
probatória bastante (força probatória que se afasta por contra prova; é apenas
necessário criar a dúvida).
NOTA6: Nos termos do art. 358º/3 CC consagra-se a situação da confissão quando
esta possui força probatória bastante; nos termos do nº2 da mesma norma consagra-
se a mesma situação mas quando tal já possui força probatória plena.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 111
CASO XIX
Em Janeiro de 2012, Gustavo e Hélio celebraram um contrato de compra e venda de
um prédio, situado em Lisboa, por escritura pública. A 2 de Junho de 2012, Gustavo
instaurou contra Hélio uma acção, pedindo a declaração de nulidade desse contrato,
por simulação. A fim de provar o acordo simulatório, Gustavo indicou, como único
meio de prova, determinadas testemunhas; mas Hélio opôs-se a que sejam admitidas
a depor, invocando o nº 2 do artigo 394º do Código Civil. Quem tem razão?
TEMA: PROVA TESTEMUNHAL (art. 392º a 396º CC)
As testemunhas são as pessoas que, não sendo partes, nem peritos, prestam
informações ao tribunal sobre a descoberta da verdade material, sobre factos
relevantes para o exame e decisão da causa, ou seja sobre os factos controvertidos
ou necessitados de prova.
A prova testemunhal não é admitida nas seguintes situações:
Quando o facto estiver plenamente provado por documento ou outro meio
com força probatória plena – art. 393º/2 CC
Quando a declaração negocial houver de ser reduzida a escrito ou necessitar
de ser provada por escrito
Quanto tiver por objecto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao
conteúdo do documento autêntico ou de documento particular – art. 394º/1
CC. Note-se que esta norma não veda o recurso à prova testemunhal com
vista a convencer o tribunal acerca da divergência entre a vontade real e a
vontade declarada ou da existência de vícios da vontade, salvo no que
respeita ao acordo simulatório e ao negocio dissimulado, quando for invocado
pelos dissimuladores – art. 394º/2 CC
No presente caso, Gustavo invoca a nulidade do contrato de compra e venda com
fundamento em simulação indicando como único meio de prova testemunhas. Ora
nos termos do art. 394º/2 CC consagra-se que ‘’É inadmissível a prova por testemunhas
(…) ao acordo simulatório (…) quando invocados por simuladores’’.
Nos termos do art. 242º do CC, os simuladores podem arguir a nulidade do negócio
simulado, ou seja é possível usar a prova testemunhal, mas só se for de forma
acessória. O legislador coloca reservas relativamente à prova testemunhal devido ao
facto de esta ser falível. Cada testemunha, mesmo que seja integra e empenhada na
descoberta da verdade e da justiça, tem a sua própria percepção da situação.
Ninguém conta os mesmos factos da mesma maneira. Daqui resulta a justificação
para o legislador não admitir prova testemunhal como sanção para os simuladores.
PROF. MOTA PINTO E PROF. CARVALHO FERNANDES: Não se trata de uma sanção, uma
vez que se assim fosse o legislador impedia os próprios simuladores de arguirem a
nulidade do negócio simulado.
DOUTRINA: Tem entendido que a razão da proibição em análise assenta na
falibilidade da prova testemunhal, que por vezes pode entrar em confronto com
outros meios de prova e consequentemente não deve permanecer. Deve-se evitar
que as partes no negócio simulem uma simulação (tal justifica o art. 394º/2 CC). Os
inconvenientes da prova testemunhal podem ser colmatados se esta surgir como meio
complementar de outro meio de prova admitido. Ou seja, não se admite só e apenas
a prova testemunhal.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 112
Não existindo outro meio de prova a não ser a prova testemunhal, a acção será
julgada improcedente.
Em suma: se o único meio de prova for a prova testemunhal esta não será admitida
por força do art. 354º/2 do CC; se for usada apenas como meio complementar então
será admitida.
No caso é nos dito que Hélio ‘’opôs-se a que sejam admitidas a depor’’ levantando
então a questão de saber como é que ele processualmente se opôs? Ora, podemos
estar face a uma situação de incidentes da prova testemunhal constantes no art. 636º
e 637º do CPC. No presente caso não estamos contudo face a uma impugnação mas
sim apenas e só no âmbito do art. 354º/2 do CC que consagra uma proibição.
NOTA1: Apresentar o rol de testemunhas na petição inicial é facultativo. Embora se
possa pedir ao tribunal que estabeleça um prazo para indicar os meios de prova, a
verdade é que o momento indicado para o fazer é na audiência preliminar na
medida em que esta poe ser dispensada. O rol de testemunhas deverá ser
identificado no momento da audiência preliminar nos termos do art. 508º-A/2 al. a) do
CPC. Se não se indicasse o rol de testemunhas na petição inicial (facultativo) nem na
audiência preliminar, nos termos do art. 512º do CPC, a partir desse momento (da
audiência preliminar) estar-se-ia ‘’nas mãos do juíz’’ no sentido que cabe a este
aceitar ou não a apresentar de outro meio de prova.
NOTA2: Havendo audiência preliminar nesse momento requer-se a identificação dos
meios dos prazos e requer-se o estabelecimento do prazo; se não existir audiência
preliminar ser-se-á notificado da lista de provas, sendo o prazo de 15 dias para indicar
os meios de prova.
CASO XX
Numa acção de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges (a mulher), fundado
em violação do dever de respeito, o cônjuge réu (o marido) reconheceu
expressamente na contestação todos os factos alegados pelo cônjuge autor para o
demonstrar. Todavia, o juiz levou-os à base instrutória. E, a final, deu-os como
provados com fundamento no depoimento de parte prestado na audiência pelo
mesmo cônjuge réu. Diga se o juiz procedeu bem.
TEMA: CONFISSÃO E SUA INADMISSIBILIDADE
No presente caso estamos no âmbito de uma acção de divórcio em que a esposa
alega que o marido lhe terá faltado ao respeito. Na contestação o marido admite a
veracidade dos factos alegados. Numa situação comum o juiz levar-lhos-ia à
factualidade assente uma vez que os factos encontram-se assentes não existindo
nenhuma questão controvertida. A solução deste caso seria no seu todo diferente
caso estivéssemos face a uma situação em que se intentasse uma acção de
condenação ao pagamento do preço de um determinado bem e o réu na
contestação confessasse os factos dizendo, por exemplo, que não pagou o preço
porque não dispunha de meios económico financeiros para tal. Neste caso, o juiz não
levaria á base instrutória o pagamento.
A hipótese do caso e a hipótese que entretanto se formulou divergem na seguinte
medida: nas acções relativas ao estado das pessoas encontram-se sempre em causa
direitos indisponíveis, sendo nestas matérias o legislador extremamente cauteloso
vedando nos termos do art. 354º al. b) a possibilidade de confissão.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 113
Note-se que se o réu nada tivesse dito quanto a estes factos, em princípio, nos termos
do art. 490º/2 CPC, consideravam-se admitidos por acordo. Contudo, uma vez que
estamos no âmbito de direitos indisponíveis não existe tal ónus resultando tal da
conjugação do art. 490º/2 do CPC com o art. 354º al. b) do CC. Se o réu não
contestasse não se aplicavam os efeitos da revelia constantes do art. 483º e art. 484º
CPC uma vez que estando no âmbito de direitos indisponíveis aplicar-se-ia a
excepção à produção dos efeitos jurídicos da revelia constante do art. 485º al. c)
CPC.
Deste modo, conclui-se que uma vez que estamos no âmbito de direitos indisponíveis,
sendo factos controvertidos e tendo em consideração as normas referidas, o juiz
procedeu bem em levá-los à base instrutória.
No caso é nos dito que o juiz no final deu tais factos como provados tendo em
consideração o depoimento da parte prestado na audiência. Ora o depoimento da
parte encontra-se consagrado no art. 552º e ss. CPC. O Juiz pode notificar a parte
para esta ir prestar esclarecimentos sobre os factos que estão em discussão nos termos
do art. 553º/3 CPC. Note-se que não se pode requerer o próprio depoimento de parte
mas pode-se requerer o depoimento da parte contrária. Contudo, pode-se tentar que
o seu próprio depoimento ocorra provocando o juiz a fazê-lo. Ou seja, chama-se a
atenção do tribunal para certos factos constantes da base instrutória que só são do
seu conhecimento, requerendo-se ao juiz que este admita o depoimento de parte.
Contudo, tal mecanismo fica sempre à disposição do juiz. Quando ao depoimento de
partes importa ainda salientar que é possível o depoimento da comparte.
A prova do depoimento de parte visa a confissão, uma vez que que ao requerer que
a outra parte deponha pretende-se que esta confesse factos que lhe são
desfavoráveis (razão de só se permitir que se requeira o depoimento da outra parte e
não o seu próprio depoimento (em princípio a parte que pede para depor não visa
confessar factos que lhe são desfavoráveis, pretendendo justamente o efeito oposto)).
JURISPRUDÊNCIA: só é possível requerer o depoimento da comparte quando esta seja
titular de uma posição distinta e conflituante com aquela que requer o seu
depoimento de parte.
Deste modo, e por aplicação do art. 553º/3 à partida poder-se-ia pensar que é sempre
possível requerer o depoimento da comparte, mas atendendo à posição
jurisprudencial tal não é verdade.
No presente caso o cônjuge (marido) reiterou na audiência aquilo que já havia dito
na contestação, dando o juiz por provados tais factos.
Nos termos do art. 354º al. b) do CC em princípio a prova testemunhal não é admissível
uma vez que estamos no âmbito de direitos indisponíveis. Contudo, coloca-se a
questão de saber se mesmo nos casos em que não é admissível se tal possui algum
valor jurídico. Nos termos do art. 361º do CC tal não consubstancia uma confissão
judicial, mas o juiz poderá valorar livremente os factos ‘’confessados’’, sendo que
aquele depoimento de parte terá valor probatório bastante. Ou seja, o juiz poderá dar
tais factos como provados (ou não).
DOUTRINA: Há quem entenda que no âmbito do depoimento de parte, quando a
parte se encontra a depor sobre os factos desfavoráveis e emitir outras declarações
(favoráveis ou desfavoráveis) o juiz, embora não possa verter em acta tais factos, terá
o direito de livremente apreciá-los tendo deste modo, tais declarações, força
probatória bastante. Note-se que quem está do lado contrário tentada, sempre,
invocar que tais declarações não podem ser apreciadas em tribunal.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 114
NOTA1: Nos termos do art. 558º do CPC consagra-se a ordem dos depoimentos,
existindo uma limitação quanto aos factos.
Réu vs Autor: começa pelo réu, uma vez que começando o depoimento de
parte pelo réu pode tal conduzir de imediato a uma confissão sem ser
necessária a produção de outros meios de prova.
Testemunhas do Réu vs Testemunhas do Autor: começa-se pelas testemunhas
do autor.
NOTA2: No processo ordinário o rol máximo de testemunhas que podem ser
apresentadas é de 20, sendo que existe o limite máximo de 5 testemunhas por cada
facto.
NOTA3: Nos termos do art. 559º consagra-se a matéria da prestação do juramento.
NOTA4: Entende-se por acareação colocar em confronto o depoimento de certas
testemunhas (quando contraditórios sobre os mesmos factos). Pode-se acarear uma
testemunha com uma parte? A solução consta do regime do art. 642º e 643º do CPC.
VIII – Caso Julgado
CASO XXI
António comprou a Bento um quadro que julgava ser antigo, pelo preço de 35 mil
euros. Todavia, quando o mandou restaurar, descobriu que tinha sido pintado
recentemente. António instaurou contra Bento uma acção na qual pediu a anulação
do contrato de compra e venda e a condenação de Bento na restituição da parte do
preço já paga (metade).
TEMA: CASO JULGADO (REQUISITOS DO ART. 498º)
a. A acção foi julgada procedente, por sentença transitada em julgado. Mas
Bento não se conforma e propõe uma nova acção contra António, invocando
o contrato e pedindo a sua condenação no pagamento da parte do preço que
não tinha sido paga. Pode António opor-se ao julgamento deste pedido,
invocando a sentença proferida na primeira acção?
No presente caso estamos no âmbito do transito em julgado nos termos do art. 677º
CPC e mais concretamente da força vinculativa do caso julgado material.
Para saber se António poderia invocar a sentença proferida na primeira acção é
necessário atender ao art. 498º do CPC e verificar se os requisitos constantes desta
norma se encontram verificados uma vez que só assim se poderá invocar a existência
de caso julgado.
Identidade de Sujeitos (art. 498º/2 CPC)
Acção1: António (autor) e Bento (réu)
Acção2: Bento (autor) e António (réu)
Conclusão: apesar de nas acções os sujeitos ocuparem posições
jurídicas diferentes a verdade é que em ambas as partes são as
mesmas pelo que a identidade de sujeitos se encontra verificada.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 115
Pedido (art. 498º/3 CPC)
Acção1: acção de anulação do contrato de compra e venda e acção
de restituição da parte do preço já paga
Acção2: acção de condenação ao pagamento do preço que ainda
não foi pago
Conclusão: para existir identidade entre o pedido é necessário que em
ambas as acções se vise obter o mesmo efeito jurídico. Ora no presente
caso tal não se verifica pelo que este requisito não se encontra
verificado.
Causa de Pedir (art. 498º/4 CPC)
Acção1: erro na medida em que existe uma falsa representação da
realidade quanto às qualidades do objecto (António pensava que o
quadro era antigo e consequentemente valioso e afinal não o era)
Acção2: invoca a existência do contrato de compra e venda
Conclusão: para existe identidade entre as causas de pedir é
necessário que o facto jurídico concreto que fundamenta a pretensão
do autor em cada uma das acções seja o mesmo. Ora, no caso
concreto tal não se verifica pelo que este requisito não se encontra
verificado.
Verificado que os requisitos constantes do art. 498º CPC não se encontram verificados
na sua totalidade (não verificação de identidade entre os pedidos e as causas de
pedir) coloca-se a questão de saber se então não se poderá invocar a excepção de
caso julgado anterior. Na segunda acção, para o juiz conhecer do mérito da questão
terá de analisar a validade do contrato de compra e venda. Contudo tal questão já
havia sido apreciada na primeira acção. Ou seja irá se estar a analisar duas vezes o
mesmo facto em acções diferentes, sendo exactamente tal aquilo que o art. 497º e
art. 498º CPC pretendem evitar.
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA: Não obstante não se encontrarem verificados os três
requisitos constantes do art. 498º CPC, o princípio subjacente ao caso julgado e a ratio
do art. 497º CPC impõem que o juiz obste ao conhecimento do mérito da causa nesta
situação. O juiz deverá absolver o réu da instância uma vez que a decisão que viria a
proferir nesta segunda acção poderia contrariar um caso julgado formado
anteriormente.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 116
b. Suponha agora que Bento não contestou, mas que a acção foi julgada
improcedente porque o tribunal entendeu tratar-se de um caso de erro sobre
os motivos (e não sobre o objecto, como o autor o qualificara) e faltar a
alegação e prova do acordo sobre a essencialidade dos motivos, a que se
refere o nº 1 do artigo 252º do Código Civil. A sentença transitou em julgado.
António propôs nova acção, relativa ao mesmo contrato e pedindo igualmente
a sua anulação. Para além do que alegara na primeira acção, alegou terem as
partes reconhecido, por acordo, que António só comprava o quadro porque
estava convencido de que era antigo. Bento opôs caso julgado. Tem razão?
No presente caso é nos dito que a sentença da primeira acção transitou em julgado,
contudo António intenta uma nova acção. É necessário atender ao disposto no art.
498º do CPC a fim de apurar se os requisitos de verificação do caso julgado se
encontram reunidos.
Identidade de Sujeitos (art. 498º/2 CPC)
Acção1: António (autor) e Bento (réu)
Acção2: António (autor) e Bento (réu)
Conclusão: existe uma identidade entre os sujeitos das acções.
Pedido (art. 498º/3 CPC)
Acção1: acção de anulação do contrato de compra e venda e acção
de restituição da parte do preço já paga
Acção2: acção de anulação do contrato de compra e venda
Conclusão: para existir identidade entre o pedido é necessário que em
ambas as acções se vise obter o mesmo efeito jurídico. No presente
caso em ambas acções visa-se obter a anulação do contrato de
compra e venda pelo que existe uma identidade entre os pedidos.
Causa de Pedir (art. 498º/4 CPC)
Acção1: erro na medida em que existe uma falsa representação da
realidade quanto às qualidades do objecto (António pensava que o
quadro era antigo e consequentemente valioso e afinal não o era)
Acção2: António invoca o mesmo que invocara na primeira acção
acrescentando ainda que as partes haviam reconhecido por acordo
que ele só comprara o quadro porque estava convencido de que era
antigo.
Conclusão: para existe identidade entre as causas de pedir é
necessário que o facto jurídico concreto que fundamenta a pretensão
do autor em cada uma das acções seja o mesmo. No presente caso
saber se existe identidade entre as causas de pedir é uma questão
controversa que terá de ser desenvolvida de seguida.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 117
Quanto à causa de pedir na verdade estamos face a um erro sobre o objecto, mas o
juiz é livre de apreciar os factos e consequentemente de atribuir a qualificação
jurídica que considere adequada, nos termos do art. 644º CPC.
Poder-se-ia colocar a questão de eventualmente estamos face a uma violação do
pedido nos termos do art. 661º CPC mas a resposta a tal é negativa nos termos do art.
661º do CPC na medida em que o pedido é o mesmo em ambas as acções
(anulação do contrato de compra e venda).
É necessário reflectir sobre o seguinte: a causa de pedir não é de todo um conceito
que, na prática, seja fácil de determinar, uma vez que o critério do art. 498º CPC
poderá ser interpretado de forma restritiva ou amplamente.
A causa de pedir, no presente caso, coloca dúvidas: será erro sobre o objecto ou erro
sobre os motivos? Sendo os factos independentemente da qualificação jurídica o que
se deverá fazer? Considerando todas as normas aplicáveis a esta acção, o autor
deverá alegar todos os factos que constituem a previsão da norma?
PROF. MARIA DOS PRAZERES BELEZA: O art. 498º do CPC refere-se a factos
concludentes. A causa de pedir é o erro, independentemente da sua qualificação
jurídica.
Contudo, nos termos do art. 664º o juiz é livre de apreciar os factos não estando
dependente das alegações feitas pelas partes. Tal traduz uma excepção ao caso
julgado. Contudo, o caso julgado encontra-se relacionado com o Princípio da
Preclusão, ou seja não se relaciona só com ele mas também se relaciona com o autor,
autor esse que, no presente caso, pretende anular o contrato de compra e venda
com fundamento em erro. O autor tem o ónus de levar ao processo todos os factos
essenciais para a procedência da acção.
Em suma, Bento tem razão uma vez que existe caso julgado ocorrendo a verificação
dos três requisitos constantes do art. 498º CPC (identidades dos sujeitos, identidades
dos pedidos e identidades das causas de pedir).
c. Suponha agora que foi que Bento que instaurou a acção, pedindo a
condenação do António no pagamento da parte do preço não paga. António
defendeu-se invocando a anulabilidade do contrato, pelo erro já descrito; mas
foi condenado a pagar, por sentença transitada em julgado. Passado um
tempo, António instaura contra Bento uma acção de anulação do mesmo
contrato, com os seguintes fundamentos. Bento contesta esta acção invocando
a excepção de caso julgado. Tem razão?
i. No mesmo erro;
No presente caso é nos dito que a sentença da primeira acção transitou em julgado,
contudo António intenta uma nova acção. É necessário atender ao disposto no art.
498º do CPC a fim de apurar se os requisitos de verificação do caso julgado se
encontram reunidos.
Identidade de Sujeitos (art. 498º/2 CPC)
Acção1: Bento (autor) e António (réu)
Acção2: António (autor) e Bento (réu)
Conclusão: existe uma identidade entre os sujeitos das acções.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 118
Pedido (art. 498º/3 CPC)
Acção1: acção de condenação do pagamento do preço em falta.
Acção2: acção de anulação do contato de compra e venda
Conclusão: para existir identidade entre o pedido é necessário que em
ambas as acções se vise obter o mesmo efeito jurídico. No presente
caso tal não sucede pelo que não existe uma identidade entre o
pedido.
Causa de Pedir (art. 498º/4 CPC)
Acção1: incumprimento do contrato de compra e venda (ainda não
pagou a totalidade do preço)
Acção2: erro
Conclusão: para existe identidade entre as causas de pedir é
necessário que a pretensão deduzida nas duas acções proceda do
mesmo facto jurídico. Neste caso tal não se verifica pelo que não existe
identidade entre as causas de pedir.
Deste modo, não existindo identidade quanto ao pedido e à causa de pedir não se
verifica a excepção de caso julgado nos termos do art. 498º CPC. Contudo, no
presente caso, apesar de nem todos os requisitos do art. 498º CPC estarem
preenchidos parece um pouco injusto a solução que daí advém. Coloca-se então a
questão de saber qual a solução aplicável ao caso prático. António, na contestação,
defendeu-se por excepção dilatória (invoca a existência do erro e pede que seja
absolvido da instância). Contudo, o tribunal julga improcedente a excepção dilatória.
Nos termos do art. 96º/2 CPC importa ter presente que ‘’A decisão das questões e
incidentes suscitados não constitui, porém, caso julgado fora do processo respectivo,
excepto…’’
Se alguma das partes requerer o julgamento com essa amplitude
O tribunal for absolutamente competente
Assim, se os requisitos do art. 96º/2 d CPC não se encontrarem verificados a
apreciação da excepção dilatória na pendência da primeira acção não tem força
de caso julgado. Bento tem razão em opor-se uma vez que os fundamentos que estão
subjacentes à primeira acção são também subjacentes à segunda acção conduzindo
a uma frustração dos efeitos da primeira acção.
NOTA1: O art. 497º CPC não é um requisito adicional ao art. 96º/2 CPC, sendo apenas
o artigo que indica a ratio da norma.
NOTA2: Quanto à noção de causa de pedir e de acordo com a Teoria da
Substituição, quanto maior amplitude for conferida à excepção de caso julgado e
consequentemente a cada requisito, maior esforço tal implicará para as partes.
NOTA3: O art. 497º CPC consagra um limite: independentemente de as excepções
não puderem ser abrangidas pela excepção de caso julgado, a segunda acção não
poderá conhecer do mérito da causa.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 119
ii. Em erro causado por dolo (um empregado de Bento convencera-o de
que o quadro era antigo);
Nos termos do art. 498º/4 CPC consagra-se que ‘’Há identidade da causa de pedir
quanto a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico’’, ou
seja o legislador visou que todos os fundamentos que pudessem obstar ao
conhecimento do mérito da causa ou fossem essenciais para proferir sentença fossem
na primeira acção alegados na contestação.
Se se permitir a apreciação da segunda acção com este fundamento o Princípio da
Concentração da Defesa na Contestação não teria qualquer efeito útil, sendo que o
litigio nunca estaria resolvido.
Se se permitir que António venha invocar o que deveria ter alegado na contestação
na primeira acção tal coloca em causa o Princípio da Preclusão. Ou seja, António não
poderá vir invocar tal por força do Princípio da Preclusão estando o juiz impedido de
conhecer do mérito da causa.
NOTA: Com o caso julgado muitas vezes a segurança jurídica prevalece sobre a
justiça.
iii. Em erro só descoberto, segundo alega, depois do trânsito em julgado
da sentença.
Face à alínea c) ii), nesta aliena estamos face a uma diferença substancial António
não sabia do erro até ao transito em julgado da primeira acção, pelo que não o
poderia ter alegado na contestação.
Poder-se-ia colocar a questão se estarmos neste caso no âmbito de aplicação do art.
673º do CPC quando esta norma se refere a ‘’A sentença constitui caso julgado nos
precisos limites e termos em que se julga: se a parte decaiu por não estar verificada
uma condição (…) a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a
condição se verifique’’. Contudo não estamos face a uma condição suspensiva
(António na pendência da primeira acção não sabia que viria a saber que a compra
e venda do quadro tinha como fundamento o erro) pelo que não se poderá aplicar
esta norma.
E estaremos face ao âmbito de aplicação do art. 663º do CPC? Tendo em
consideração que o decurso do primeiro processo pode ter sido muito longo existindo
uma alteração factual tal deveria constar de articulados supervenientes nos termos do
art. 506º do CPC. No caso concreto o erro em análise não se poderia reflectir na
sentença na primeira acção uma vez que António só vem a ter conhecimento dele
após o transito em julgado da sentença.
A acção poderá ser proposta nos termos do art. 663º CPC desde que se invoque a sua
superveniência subjectiva, uma vez que o erro já existia (António apenas não tinha
conhecimento dele).
Poder-se-ia questionar a aplicação do art. 814º do CPC, ou seja se estamos face a um
título executivo que fundamenta a oposição à execução. Nos termos do art. 814º/1 al.
g) CPC consagra-se que ‘’Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação,
desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração’’
será um fundamento de oposição à execução da sentença. Contudo no presente
caso o erro é um facto impeditivo e não extintivo ou modificativo pelo que esta norma
não se aplica. Note-se que os factos impeditivos são factos que constam da génese
da obrigação tendo se de ser e só podendo ser invocados na Acção Declarativa.
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 120
PROF. MARIA DOS PRAZERES BELEZA: nos termos do art. 814º do CPC funciona a
excepção de caso julgado.
Note-se que nos termos do art. 663º conjugado com o art. 814º/3 do CPC não relevam
factos supervenientes subjectivos.
PROF. LEBRE DE FREITAS: Defende uma solução oposta que assenta em que os factos
impeditivos são de conhecimento superveniente, consubstanciando tal um
fundamento de oposição nos termos do art. 816º CPC.
CASO XXII
Suponha que Carlota e Diana são comproprietárias de um prédio rústico. Carlota
instaura contra Eugénio uma acção de reivindicação do prédio, sustentando que
Eugénio o detém indevidamente. A acção é julgada improcedente, por sentença
transitada em julgado, por falta de prova da titularidade do direito de propriedade.
Diana instaura contra Eugénio uma nova acção de reivindicação, do mesmo prédio,
com o mesmo fundamento. Eugénio defende-se invocando caso julgado anterior. Tem
razão?
TEMA: CASO JULGADO E (TIPOS DE) TERCEIROS
No presente caso estamos face a um pedido de reivindicação da propriedade face a
um terceiro, sendo a acção julgada improcedente com fundamento em falta de
prova. Quando Eugénio invoca o caso julgado anterior está a defender-se por
excepção dilatória (art. 494º al. i) CPC), sendo tal de conhecimento oficioso nos
termos do art. 495º do CPC. Se a questão não suscitada nem pela parte e se o juiz não
se aperceber de tal (o juiz não tem forma de adivinhar de que uma houve uma acção
anterior que tem força de caso julgado), existindo duas soluções diferentes sobre a
mesma questão, nos termos do art. 675º/1 CPC, irá prevalecer a primeira. Esta norma
visa evitar que se forem casos julgados contraditórios constituindo tal norma uma
‘’válvula’’ de segurança.
No presente caso é nos dito que Eugénio defendeu-se invocado caso julgado anterior,
o que leva a presumir que tal excepção terá sido alegada na contestação. Contudo,
sendo uma excepção dilatória de conhecimento oficioso o juiz poderá conhecer de
tal no despacho saneador ou mesmo na sentença.
Nos termos do art. 498º do CPC, quando se está face a uma situação de caso julgado
tal consubstancia uma repetição sucessiva que se verifica quando exista uma
coincidência (1) de partes; (2) do pedido e (3) da causa de pedir.
Tendo por base o art. 498º/2 concluímos que na presente hipótese não se formou caso
julgado uma vez que não existe uma coincidência de partes no seu todo, ou seja só
existe uma identidade quanto à pessoa do réu: na primeira acção as partes eram
Carlota (autora) e Eugénio (réu) e na segunda acção as partes são Diana (autora) e
Eugênio (réu). Apesar de não existir identidade entre as partes e obstando tal à
possibilidade de estarmos face a uma situação de caso julgado, na segunda acção
continua a discutir-se a titularidade de Eugénio quanto à propriedade em questão.
Sendo o Princípio do Caso Julgado a vinculação das partes nas acções, quando se diz
que este tem força fora do processo o que se quer dizer é que tal continua a vincular
as partes fora do processo mas tal não abrange terceiros uma vez que estes não
foram parte da acção que formou caso julgado e consequentemente não se
puderem defender/contestar. Contudo a verdade é que no caso Eugénio está
PROCESSO CIVIL FDUCP
Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 121
perante uma situação complicada uma vez que é já a segunda vez que se está a
discutir o mesmo facto.
Poder-se-ia questionar a possibilidade de se estar face a uma situação de litisconsórcio
necessário natural mas o art. 1405º/2 CC afasta tal consagrando que ‘’Cada consorte
pode reivindicar de terceiro a coisa comum, sem que a este seja lícito opor-lhe que
esta lhe não pertence por inteiro’’.
Iremos agora analisar a eficácia externa do caso julgado mais concretamente saber
que tipo de terceiro está aqui em causa. Ou seja, a verdade é que na realidade
jurídica existem vários tipos de terceiros, sendo que nem todos são indiferentes. A
verdade é que se na primeira acção a sentença tivesse reconhecido que a
titularidade da propriedade pertencia a Carlota em compropriedade com Diana, esta
poderia invocar numa segunda acção o caso julgado que se havia formado
anteriormente. No caso em análise como a sentença da primeira acção é
desfavorável tal não prejudica o interesse de Diana. Ou seja, existe uma
compropriedade, uma comunhão de interesses que justifica esta solução.
Embora no regime da compropriedade não conste nenhuma norma que justifique a
solução exposta, a doutrina tem invocado o art. 538º/2 CC (norma quanto às
obrigações indivisíveis) para justificar tal solução. Deste modo, Eugénio não teria razão
ao invocar o caso julgado anterior na medida em que este é desfavorável ao
comproprietário sendo que consequentemente deverá se conhecer do mérito da
causa desta segunda acção julgando-se a excepção improcedente. Note-se que na
contestação Eugénio poderá provocar a intervenção de Carlota dado que o interesse
em causa pertence a todos os sujeitos (Diana, Carlota e Eugénio), nos termos do art.
320º e 321º do CPC.
NOTA1: A noção de transito em julgado encontra-se consagrada no art. 677º do CPC,
sendo necessário que para tal se verifique que: (1) a decisão não seja susceptível de
recurso ordinário; (2) a decisão não seja susceptível de reclamação (o art. 668º CPC
consagra os fundamentos de nulidade de uma sentença).
NOTA2: A força do caso julgado encontra-se consagrada no art. 671º e 672º CPC.
NOTA3: Nos termos do art. 499º CPC, numa situação de litispendência esta deverá ser
deduzida na acção proposta em segunda lugar, ou seja a acção para a qual o réu foi
citado em segundo lugar. Numa situação de dúvida quanto à data da citação
recorre-se à data de entrada das respectivas petições iniciais.
NOTA4: Quando estamos a analisar a existência de caso julgado, mais propriamente a
coincidência de partes, nada obsta a que tal se verifique se as partes na segunda
acção ocuparem posições jurídicas diferentes. Ou seja, se na primeira acção A for o
autor e B o réu e na segunda acção B for o autor e A o réu existe identidade quanto
às partes.