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7 - TEMPERATURAS E DANOS TÉRMICOS NA RETIFICAÇÃO
O processo de retificação requer uma grande quantidade de energia por volume de material
removido. Praticamente toda esta energia é convertida em calor que se concentra ao redor da zona de
retificação. As altas temperaturas produzidas podem causar vários tipos de danos térmicos à peça
como queimas, transformações de fases, amolecimento (revenimento) da camada superficial com
possível reendurecimento, tensões residuais de tração indesejáveis, trincas e redução da resistência à
fadiga. Além disso, a expansão térmica da peça durante a retificação contribui para a imprecisão e
distorções do produto final. O volume de produção que pode ser alcançado com a retificação é
frequentemente limitado pela temperatura do processo e sua influência danosa na qualidade da peça.
A retificação ocorre pela interação de grãos abrasivos da superfície do rebolo com a peça. De
acordo com a análise do mecanismo de formação do cavaco na retificação, feita no ítem 4 deste
trabalho, a energia total fornecida ao processo inclui componentes da formação do cavaco, do
riscamento (deformação plástica) e escorregamento (deformação elástica). As temperaturas de pico
aproximam-se do ponto de fusão do material sendo usinado. Contudo, o material permanece nestas
altas temperaturas um período de tempo muito curto e elas estão localizadas nos planos de
cisalhamento microscópicos dos cavacos da retificação. Logo abaixo da superfície, a peça recebe um
fluxo de calor contínuo proveniente da zona de retificação, devido à multiplicidade de interações
com os grãos abrasivos que passam rapidamente através da zona de retificação. Portanto, a
temperatura associada ao contínuo aquecimento, (ao invés da temperatura de pico), pode ser
considerada como a responsável pela maioria dos danos térmicos. Também de interesse é a
temperatura em todo o volume da peça, que causa expansão térmica levando à distorções e
imprecisões da mesma. Em geral, o aumento da temperatura média de todo o volume da peça é
apenas uma pequena fração do aumento da temperatura da zona de retificação.
7.1 - Danos Térmicos
A) Queima da Peça
Um dos tipos mais comuns de danos térmicos é a queima da peça. Este fenômeno tem sido
investigado principalmente quando da retificação de aços, embora seja também um problema com
outros materiais metálicos. A queima visível da peça de aço é caracterizada pela mudança de cor da
mesma (se torna azulada ou amarelada), que é uma consequência da formação de uma camada de
óxidos. Estas cores são normalmente removidas pelo "spark out" no fim do ciclo de retificação,
especialmente na retificação cilíndrica, mas seu efeito é cosmético e a ausência destas cores na
superfície da peça, não significa necessariamente que a queima não ocorreu.
No início do processo de queima, há uma tendência de adesão de partículas do metal aos
grãos abrasivos, o que causa o crescimento das forças, a deterioração da superfície da peça e o
aumento da taxa de desgaste do rebolo. A queima visível normalmente é acompanhada pela
reaustenitização da peça, o que pode ser comprovado pela distribuição da microdureza na
subsuperfície de aços endurecidos. Para um aço endurecido usinado sem queima, há geralmente
algum amolecimento devido ao revenimento perto da superfície. Um exemplo deste comportamento
em um aço para rolamento temperado é mostrado pela curva "sem queima" da figura 34. Com
queima, o reendurecimento do aço também ocorre, como mostrado pela curva "com queima" da
figura 34. O reendurecimento é consequência da reaustenitização seguida pela formação de
martensita não revenida. Isto traz um efeito adverso na vida da peça com respeito à fadiga, que é
atribuído principalmente à formação de martensita não revenida, que é uma fase extremamente dura e
frágil. A queima da peça e a austenitização devido ao aquecimento gerado na retificação de aços
moles, mesmo os tipos temperáveis, não são necessariamente acompanhadas pelo endurecimento da
superfície.
Figura 34 - Dureza da Peça abaixo da Superfície com e sem Queima
B) Revenimento
Os aços são frequentemente retificados no estado temperado. O revenimento devido ao
aquecimento na retificação causa amolecimento junto à superfície acabada, como mostrado na curva
"sem queima" da figura 34.
O revenimento da superfície de aços endurecidos frequentemente ocorre durante a retificação
em condições típicas de produção, embora os seus efeitos possam ser minimizados. A profundidade
da camada revenida pode ser reduzida principalmente pelo uso de maiores velocidades da peça, o que
resulta numa menor penetração do calor e em menores tempos de aquecimento. As curvas de
microdureza da figura 34 foram obtidas na retificação plana tangencial, com uma velocidade da peça
relativamente baixa (Vw = 6.1 m/min), o que causou uma camada termicamente afetada
relativamente profunda. Camadas revenidas similares, mas mais rasas são obtidas com velocidades
da peça maiores, como as que são tipicamente utilizadas na retificação cilíndrica. Algumas ou
mesmo todas as camadas revenidas produzidas durante a retificação em desbaste com altas taxas de
remoção do cavaco, podem ser removidas por uma operação posterior de retificação em acabamento,
com "spark out" no fim do ciclo de retificação.
C) Tensões Residuais
O processo de retificação normalmente conduz a tensões residuais na vizinhança da
superfície acabada, que pode afetar bastante o comportamento mecânico do material. As tensões
residuais são induzidas pela deformação plástica não uniforme perto da superfície da peça. As
interações mecânicas dos grãos abrasivos com a peça resultam principalmente em tensões residuais
de compressão, devido ao fluxo plástico localizado. Este efeito é semelhante ao que acontece nas
peças que são jateadas com esferas. As tensões residuais de tração são causadas principalmente por
tensões termicamente induzidas e pelas deformações associadas com a temperatura de retificação e
seu gradiente da superfície para o interior da peça.. Na zona de retificação, a expansão térmica do
material mais quente próximo à superfície é parcialmente restrita pelo material mais frio da
subsuperfície. Isto gera tensões térmicas de compressão perto da superfície que, se suficientemente
grandes, causam um fluxo plástico. Durante o resfriamento subsequente, depois do passe do rebolo,
o material plasticamente deformado, tende a contrair mais que o material da subsuperfície, mas o
requisito de continuidade do material faz com que tensões de tração se desenvolvam numa fina
camada da superfície. A fim de assegurar o equilíbrio mecânico, as tensões residuais de compressão
devem também se aprofundar na peça, mas elas são muito menores em magnitude que as tensões de
tração. A formação de tensões residuais termicamente induzidas é mais complexa ainda na presença
de transformações de fase que podem ocorrer durante o ciclo de aquecimento e resfriamento, uma
vez que estas transformações estão normalmente associadas à mudanças de volume.
Alguns exemplos da distribuição de tensão residual ao longo da direção de retificação estão
mostrados na figura 35 para um aço liga. Na maioria das operações de retificação em produção, as
tensões residuais são predominantemente de tração, o que indica que elas tem principalmente origem
térmica. Tensões residuais de compressão normalmente tem um efeito benéfico nas propriedades de
resistência mecânica, enquanto tensões residuais de tração tem efeito adverso na resistência.
A influência das tensões residuais é relativamente mais pronunciada para materiais frágeis de
alta resistência. Condições de retificação mais severas em aços de alta resistência e ligas aeronáuticas
geralmente causam tensões residuais de tração maiores, levando à redução da resistência à fadiga e à
trinca. A situação pode ser ainda mais agravada pelo enfraquecimento causado pelo hidrogênio,
devido aos altos níveis de hidrogênio introduzidos no aço como resultado da decomposição do fluido
de corte. Componentes de aço endurecido retificados com condições severas expostos a ácidos em
alta temperatura desenvolvem trincas superficiais, que podem ser atribuídas à presença de tensões
residuais de tração agindo na frágil martensita não revenida formada pela queima da peça. As trincas
induzidas por ataque ácido e pelas severas condições de corte são normalmente perpendiculares à
direção de corte, o que sugere que o componente de tração da tensão residual ao longo da direção de
corte é predominante.
Geralmente é desejável controlar as condições de corte de maneira a induzir tensões residuais
compressivas ou, no mínimo, limitar a amplitude do pico das tensões de tração. Na prática,
demandas por uma produção mais rápida e eficiente resultam em maiores tensões residuais de tração,
como é visto na figura 35. A fim de se obter tensões compressivas é frequentemente necessário
manter a taxa de remoção de cavaco muito baixa. No entanto, a introdução dos abrasivos de CBN em
substituição ao óxido de alumínio induz tensões compressivas ao invés de tensões de tração na
retificação de aços de rolamento endurecidos. Isto sugere que as temperaturas para a retificação com
CBN são menores, devido à energia específica mais baixa. Outro fator que pode ser uma das causas
deste fenômeno é a alta condutividade térmica do CBN, que contribui para o resfriamento da
superfície da peça.
7.2 - Danos Térmicos na Retificação "Creep-Feed"
A retificação "creep-feed" é caracterizada pelo uso de velocidades da peça muito pequenas e
profundidades de corte muito grandes, da ordem de centenas ou milhares de vezes maiores que
aquelas usadas em retificação convencional. Com este processo pode ser possível retificar perfis
complexos ou sulcos profundos em poucos ou mesmo em somente 1 passo do rebolo. Algumas
aplicações típicas da retificação "creep-feed" é a usinagem de canais de brocas helicoidais ou o
perfilamento das pás de turbinas para motores de jatos.
Devido à profundidade de corte muito pesada (normalmente entre 1 e 10 mm), o
comprimento de contato rebolo-peça e a região de retificação também são muito grandes. Portanto,
deve-se esperar energias específicas (energia por unidade de volume de material retirado) muito
maiores que em retificação convencional, devido à perdas maiores com escorregamento
(deformações elásticas). Isto faz com que a retificação "creep-feed" requeira cuidados especiais em
termos de refrigeração para se evitar quaisquer danos térmicos à peça. Da mesma maneira, é muito
importante se manter o rebolo afiado a fim de se reduzir a energia consumida. A tendência de perda
de agressividade do rebolo neste tipo de processo é incentivada pelo longo comprimento em que o
grão somente escorrega sobre a peça (gerando deformação elástica) e também pelo fato de haver
menos auto-afiação do rebolo. Portanto, a dressagem do rebolo é de importância fundamental, para
mantê-lo rebolo sempre agressivo. Muitas vezes se usa dressagem contínua, isto é, enquanto um lado
do rebolo está retificando a peça, do outro lado se encontra o dressador processando a dressagem
simultaneamente.
Rebolos de CBN, devido à resistência ao desgaste dútil, são adequados para a retificação
"creep-feed" de materiais ferrosos e alguns outros tipos de ligas. Rebolos de CBN com liga
vitrificada são especialmente eficientes, porque a sua porosidade facilita a refrigeração da peça.
Apesar da maior taxa de remoção de cavaco e da maior energia específica requerida por este
tipo de processo, o problema de dano térmico à peça não é mais crítico que na retificação
convencional. Isto é devido à grande profundidade de corte, que faz com que uma larga porcentagem
do calor seja dissipado pelo cavaco que possui dimensões bem maiores. Existe porém uma limitação
para a extração de calor pelo cavaco, que é o seu ponto de fusão. Dado que a energia específica da
retificação "creep-feed" é da ordem de 5 vezes a energia requerida para fundir o material, não mais
do que 20% da energia gerada no processo pode ser dissipada pelo cavaco.
Devido à este problema com geração e dissipação do calor, a retificação "creep-feed" requer
um fluxo de fluido de corte com grande vazão e pressão direcionado à região de corte, a fim de
remover o calor da região recém-formada por convecção forçada.
Outro requisito fundamental para este tipo de processo é a utilização de máquinas rígidas e
muito potentes, com sistema de fluido de corte de alta pressão e com tanque grande. Normalmente,
retificadoras convencionais sem nenhuma modificação não são adequadas para a retificação "creep-
feed".
Figura 35 - Tensão Residual abaixo da Superfície da Peça