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DIREITO PROCESSUAL PENAL Princípios Gerais 1. PRINCÍPIOS GERAIS INFORMADORES DO PROCESSO 1.1. Imparcialidade do juiz O juiz situa-se entre as partes e acima delas (caráter substitutivo). O juiz imparcial é pressuposto para uma relação processual válida. Para assegurar essa imparcialidade, a Constituição Federal estipula garantias (artigo 95), prescreve vedações (artigo 95, parágrafo único) e proíbe juízos e tribunais de exceção (artigo 5.º, inciso XXXVII). Observação: tribunal de exceção é um órgão constituído após a ocorrência do fato. 1.2. Igualdade Processual As partes devem ter, em juízo, as mesmas oportunidades de fazer valer suas razões. No processo penal, esse princípio sofre alguma atenuação, devido ao princípio constitucional do favor rei, segundo o qual o acusado goza de alguma prevalência em contraste com a pretensão punitiva. Essa atenuação se verifica, por exemplo, nos artigos 386, inciso VI, 607, 609, parágrafo único, e artigo 621, todos do Código de Processo Penal. Observação: O defensor público tem prazo em dobro no processo penal. A jurisprudência tende a estender o benefício aos advogados dativos. 1.3. Contraditório Esse princípio decorre do brocardo romano audiatur et altera pars e é identificado na doutrina pelo binômio “ciência e participação”. O juiz coloca-se eqüidistante das partes, só podendo dizer que o direito preexistente foi devidamente aplicado ao caso concreto se, ouvida uma parte, for dado à outra o direito de manifestar-se em seguida. Destarte, as partes têm o direito de serem cientificadas sobre qualquer fato processual ocorrido e a oportunidade de se manifestarem sobre ele antes de qualquer decisão jurisdicional. 1

Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

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DIREITO PROCESSUAL PENALPrincípios Gerais

1. PRINCÍPIOS GERAIS INFORMADORES DO PROCESSO

1.1. Imparcialidade do juiz

O juiz situa-se entre as partes e acima delas (caráter substitutivo). O juiz imparcial é pressuposto para uma relação processual válida.

Para assegurar essa imparcialidade, a Constituição Federal estipula garantias (artigo 95), prescreve vedações (artigo 95, parágrafo único) e proíbe juízos e tribunais de exceção (artigo 5.º, inciso XXXVII). Observação: tribunal de exceção é um órgão constituído após a ocorrência do fato.

1.2. Igualdade Processual

As partes devem ter, em juízo, as mesmas oportunidades de fazer valer suas razões.

No processo penal, esse princípio sofre alguma atenuação, devido ao princípio constitucional do favor rei, segundo o qual o acusado goza de alguma prevalência em contraste com a pretensão punitiva. Essa atenuação se verifica, por exemplo, nos artigos 386, inciso VI, 607, 609, parágrafo único, e artigo 621, todos do Código de Processo Penal.

Observação: O defensor público tem prazo em dobro no processo penal. A jurisprudência tende a estender o benefício aos advogados dativos.

1.3. Contraditório

Esse princípio decorre do brocardo romano audiatur et altera pars e é identificado na doutrina pelo binômio “ciência e participação”.

O juiz coloca-se eqüidistante das partes, só podendo dizer que o direito preexistente foi devidamente aplicado ao caso concreto se, ouvida uma parte, for dado à outra o direito de manifestar-se em seguida.

Destarte, as partes têm o direito de serem cientificadas sobre qualquer fato processual ocorrido e a oportunidade de se manifestarem sobre ele antes de qualquer decisão jurisdicional.

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Pergunta: A concessão de medidas judiciais inaudita altera parte configura exceção ao princípio do contraditório?

Resposta: Não, pois o juiz deverá abrir vista à outra parte para se manifestar sobre a medida antes de dar o provimento final. Nesse caso o contraditório é apenas diferido.

Observação: O princípio não se aplica no inquérito policial, que se trata de um procedimento inquisitório. Como no inquérito policial não há acusação, também não há defesa. Os únicos inquéritos que admitem o contraditório são: o judicial, para apuração de crimes falimentares; e o instaurado pela polícia federal, a pedido do Ministro da Justiça visando à expulsão de estrangeiro.

1.4. Ampla Defesa

O Estado deve proporcionar a todo acusado a mais completa defesa, seja pessoal (autodefesa), seja técnica (defensor) (artigo 5.º, LV, da Constituição Federal), inclusive o de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (artigo 5.º, LXXIV, da Constituição Federal).

No processo penal, o juiz nomeia defensor ao réu, caso ele não tenha, mesmo sendo revel (artigos 261 e 263 do Código de Processo Penal) e caso seja feita uma defesa abaixo do padrão mínimo tolerável, o réu poderá ser considerado indefeso e o processo anulado. Se o acusado, citado por edital, não comparece, nem constitui advogado, suspende-se o processo e o prazo prescricional (artigo 366 do Código de Processo Penal).

1.5. Da Disponibilidade e da Indisponibilidade

Disponibilidade é a liberdade que as pessoas têm de exercer ou não seus direitos.

No processo penal, prevalece o princípio da indisponibilidade, pelo fato do crime ser considerado uma lesão irreparável ao interesse coletivo. O Estado não tem apenas o direito, mas sobretudo o dever de punir.

Do Código de Processo Penal, podem ser extraídas algumas regras, a saber:

• A autoridade policial é obrigada a proceder às investigações preliminares (artigo 5.º do Código de Processo Penal);

• Impossibilidade de a autoridade policial arquivar o inquérito policial (artigo 17 do Código de Processo Penal);

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• O Ministério Público não pode desistir da ação penal (artigo 42 do Código de Processo Penal), nem do recurso interposto (artigo 576 do Código de Processo Penal).

A Constituição Federal abranda essa regra, ao permitir a transação em infrações de menor potencial ofensivo e também nos casos de ação penal privada e ação penal condicionada à representação ou à requisição do Ministro da Justiça. A Lei n. 10.409/02, no artigo 37, inciso IV, criou hipótese em que o promotor pode deixar de oferecer a denúncia. Neste caso vigora o princípio da oportunidade controlada.

O Ministério Público não pode desistir da ação penal, mas pode pedir a absolvição do réu. Pergunta: tal possibilidade não fere o princípio da indisponibilidade da ação penal pública? Resposta: não, pois esse pedido não passa de mero parecer que não vincula o juiz, o qual pode proferir sentença condenatória.

1.6. Da Verdade Formal ou Dispositivo

O juiz depende da iniciativa das partes quanto às provas e às alegações para fundamentar sua decisão. Esse princípio busca salvaguardar a imparcialidade do juiz.

Conforme esse princípio, o juiz pode se contentar com as provas produzidas pelas partes devendo rejeitar a demanda ou a defesa por falta de elementos de convicção.

É princípio próprio do processo civil, que vem sendo cada vez mais mitigado, diante de uma tendência publicista no processo, permitindo ao juiz adotar uma posição mais ativa, impulsionando o andamento da causa, determinando provas, conhecendo circunstâncias de ofício e reprimindo condutas abusivas e irregulares (artigos 130 e 342 do Código de Processo Civil).

1.7. Da Verdade Material (ou Verdade Real)

Também denominado princípio da livre investigação das provas. Sempre predominou no processo penal.

O juiz tem o dever de ir além da iniciativa das partes na colheita das provas, esgotando todas as possibilidades para alcançar a verdade real dos fatos para fundamentar a sentença. Somente, excepcionalmente, o juiz deve curvar-se diante da verdade formal, como no caso da absolvição por insuficiência de provas (artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal).

Mesmo vigorando o princípio da livre investigação das provas, a verdade alcançada será sempre formal, pois o que não está nos autos, não está no mundo.

Esse princípio comporta algumas exceções: artigos 406, 475, 206, 207 e 155, 3

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todos do Código de Processo Penal; a Constituição Federal, no artigo 5.º, inciso LVI, veda a utilização de provas obtidas por meios ilícitos.

1.8. Publicidade

É uma garantia de independência, imparcialidade, autoridade e responsabilidade do juiz. Também é uma garantia do indivíduo de fiscalizar a atuação jurisdicional.

A publicidade poderá ser restrita nos casos em que o decoro ou o interesse social aconselharem que eles não sejam divulgados (artigo 155, I e II, do Código de Processo Civil e artigos 483 e 792, § 1º, do Código de Processo Penal).

O inquérito policial é um procedimento inquisitivo e sigiloso (artigo 20 do Código de Processo Penal). O sigilo, entretanto, não se estende ao representante do Ministério Público, nem à autoridade judiciária. No caso do advogado, pode consultar os autos do inquérito policial, mas, caso seja decretado judicialmente o sigilo, não poderá acompanhar a realização de atos procedimentais.

1.9. Do Duplo Grau de Jurisdição

Consiste na possibilidade de revisão, por via de recurso, das causas já julgadas pelo juiz de primeiro grau.

Não é tratado de forma expressa na Constituição Federal. O duplo grau de jurisdição decorre da própria estrutura atribuída ao Poder Judiciário pela Carta Magna.

Há casos em que não há duplo grau de jurisdição, como, por exemplo, as hipóteses de competência originária do Supremo Tribunal Federal (artigo 102, inciso I, da Constituição Federal).

1.10. Juiz Natural

Previsto no artigo 5.º, inciso LIII, da Constituição Federal, que dispõe que “ninguém será sentenciado senão pelo juiz competente”.

Juiz natural é, portanto, aquele previamente conhecido, segundo regras objetivas de competência estabelecidas anteriormente à infração penal, investido de garantias que lhe assegurem absoluta independência e imparcialidade.

Do princípio, decorre também a proibição de criação de tribunais de exceção. (artigo 5.º, inciso XXXVII, da Constituição Federal).

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1.11. Da Ação ou Demanda

Indica a atribuição à parte da iniciativa de provocar o exercício da função jurisdicional.

A jurisdição é inerte. O princípio impede que o juiz instaure o processo por iniciativa própria, o que, certamente, ameaçaria sua imparcialidade. Destarte, a movimentação da máquina judiciária exige a provocação do interessado.

O princípio decorre da adoção do processo acusatório, no qual as funções de acusar, defender e julgar são exercidas por órgãos distintos. Nosso sistema contrapõe-se ao sistema inquisitivo, no qual as funções de acusar, defender e julgar são realizadas pelo mesmo órgão. Questiona-se o sistema inquisitivo, pois quando o juiz instaura o processo de ofício, acaba ligado psicologicamente à pretensão.

1.12. Oficialidade

Significa que os órgãos incumbidos da persecutio criminis não podem ser privados. A função penal é eminentemente pública, logo, a pretensão punitiva do Estado deve ser deduzida por agentes públicos. A ação penal pública é privativa do Ministério Público (artigo 129, inciso I, da Constituição Federal). A função de polícia judiciária incumbe à polícia civil (artigo 144, § 4.º, da Constituição Federal c/c artigo 4.º do Código de Processo Penal).

Admite-se, como exceção, a ação penal privada, a ação penal privada subsidiária da pública – quando da inércia do órgão do Ministério Público – e a ação penal popular – na hipótese de crime de responsabilidade praticado pelo Procurador-Geral da República e por Ministros do Supremo Tribunal Federal (artigos 41, 58, 65 e 66 da Lei n. 1.079/50).

1.13. Oficiosidade

As autoridades públicas incumbidas da persecução penal devem agir de ofício, sem necessidade do assentimento de outrem.

Ressalvam-se os casos de ação penal privada (artigo 5.º, § 5.º, do Código de Processo Penal) e ação penal pública condicionada.

Trata-se de um princípio geral relacionado a todas as autoridades que participam do procedimento criminal, e diferencia-se do princípio do impulso oficial, referente ao magistrado.

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1.14. Do Impulso Oficial

Uma vez instaurada a relação processual, compete ao juiz mover o procedimento de fase em fase até exaurir a função jurisdicional.

1.15. Da Persuasão Racional do Juiz

Situa-se entre o sistema da prova legal, em que os elementos probatórios possuem valor prefixado, e o sistema do julgamento secundum conscientiam, em que o juiz pode decidir com base na prova dos autos, mas também sem provas e até mesmo contra a prova.

No princípio da persuasão racional, o juiz decide com base nos elementos existentes nos autos, mas sua apreciação não depende de critérios legais preestabelecidos. A avaliação ocorre segundo parâmetros críticos e racionais.

Esta liberdade não se confunde com arbitrariedade, pois o convencimento do juiz deve ser motivado.

Exceção: os jurados, no Júri, não precisam fundamentar suas decisões, pois para eles vigora o princípio da íntima convicção.

1.16. Da Motivação das Decisões Judiciais

As decisões judiciais precisam sempre ser motivadas. Esse princípio tem assento constitucional no artigo 93, inciso IX.

Hoje, esse princípio é visto em seu aspecto político: garantia da sociedade que pode aferir a imparcialidade do juiz e a legalidade e justiça das suas decisões.

1.17. Lealdade Processual

Consiste no dever de verdade, reprovando a conduta da parte que se serve de artifícios fraudulentos.

A fraude destinada a produzir efeitos no processo penal pode configurar o crime descrito no artigo 347 do Código Penal.

1.18. Da Economia Processual

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Preconiza o máximo resultado na aplicação do direito com o mínimo emprego de atos processuais. São exemplos da aplicação desse princípio os casos de conexão e continência (artigos 76 e 77 do Código de Processo Penal).

Corolário da economia processual é o princípio do aproveitamento dos atos processuais ou da instrumentalidade das formas, em que os atos imperfeitos só serão anulados se o objetivo não for atingido, pois o que interessa é o objetivo, e não o ato em si mesmo. Tal regra segue o brocardo pas de nullite´sans grief.

No processo penal, não se anulam atos imperfeitos quando não prejudicarem a acusação ou a defesa e quando não influírem na decisão da causa (artigos 566 e 567 do Código de Processo Penal).

1.19. Do Promotor Natural

Também decorre da norma contida no artigo 5.º, inciso LIII, da Constituição Federal, o qual dispõe que ninguém será processado senão pelo órgão do Ministério Público com atribuições previamente fixadas e conhecidas.

O Supremo Tribunal Federal vedou a designação casuística de promotor pela Chefia da Instituição para promover a acusação em caso específico, pois tal procedimento chancelaria a figura do chamado “promotor de exceção” (HC n. 67.759/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, RTJ 150/123).

2. PRINCÍPIOS INFORMADORES DO PROCESSO PENAL

2.1. Estado de Inocência

Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (artigo 5.º, LVII, da Constituição Federal).

Desdobra-se em três aspectos:

• prova: deve ser valorada em favor do acusado quando houver dúvida;

• instrução processual: inverte-se o ônus da prova, ou seja, o réu não precisa provar que é inocente, mas sim a acusação precisa fazer prova de que ele é culpado;

• no curso do processo: trata-se de entendimento expresso na Súmula n. 9 do Superior Tribunal de Justiça: “A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”.

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2.2. “Favor rei”

A dúvida sempre beneficia o acusado.

- Se há duas interpretações, opta-se pela mais benéfica;

- Na dúvida, em caso de insuficiência de provas, absolve-se o réu;

- Alguns recursos são exclusivos da defesa (protesto por novo júri e embargos infringentes).

- Só cabe ação rescisória penal em favor do réu (revisão criminal).

2.3. Da Verdade Real

É princípio próprio do processo penal, indica que o juiz deve buscar descobrir a realidade, não se conformando com o que é apresentado nos autos (verdade formal). Como exemplo, pode ser citado o artigo 156 do Código de Processo Penal, que permite ao juiz determinar diligências de ofício para dirimir dúvida sobre ponto relevante.

Esse princípio comporta algumas exceções: artigos 406, 475, 206, 207 e 155, todos do Código de Processo Penal; a Constituição Federal, no artigo 5.º, inciso LVI, veda a utilização de provas obtidas por meios ilícitos.

2.4. Legalidade

Impõe a observância da lei pelas autoridades encarregadas da persecução penal, que não possuem poderes discricionários para apreciar a conveniência e oportunidade da instauração do processo ou do inquérito.

2.5. Oficialidade

A função penal é eminentemente pública, logo, a pretensão punitiva do Estado deve ser deduzida por agentes públicos. Admite-se, como exceção, a ação penal privada, a ação penal privada subsidiária da pública – quando da inércia do órgão do Ministério Público – e a ação penal popular – na hipótese de crime de responsabilidade praticado pelo Procurador-Geral da República e por Ministros do Supremo Tribunal Federal (artigos 41, 58, 65 e 66 da Lei n. 1.079/50).

2.6. Oficiosidade

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As autoridades públicas incumbidas da persecução penal devem agir de ofício, sem necessidade do assentimento de outrem.

Ressalvam-se os casos de ação penal privada (artigo 5.º, § 5.º, do Código de Processo Penal) e ação penal pública condicionada.

2.7. Autoritariedade

Os órgãos investigantes e processantes devem ser autoridades públicas. Exceção: ação penal privada.

2.8. Indisponibilidade

A autoridade policial não pode determinar o arquivamento do inquérito policial (artigo 17 do Código de Processo Penal). O órgão do Ministério Público não pode desistir (dispor) da ação penal pública, nem do recurso interposto (artigos 42 e 576 do Código de Processo Penal).

Exceções: ação penal privada e transação penal (artigo 76 da Lei n. 9.099/95).

2.9. Publicidade

A publicidade somente poderá ser restrita nos casos em que o decoro ou o interesse social aconselharem que eles não sejam divulgados (artigo 155, I e II, do Código de Processo Civil e artigos 483 e 792, § 1º, do Código de Processo Penal).

2.10. Contraditório

As partes têm o direito de serem cientificadas sobre qualquer fato processual ocorrido e a oportunidade de se manifestarem sobre ele, antes de qualquer decisão jurisdicional.

2.11. Da Iniciativa das Partes (“ne procedat judez ex officio”)

O juiz não pode iniciar ao processo sem a provocação da parte. Cabe ao Ministério Público promover privativamente a ação penal pública (artigo 129, inciso I, da Constituição Federal) e ao ofendido, a ação penal privada, inclusive a subsidiária da pública (artigos 29 e 30 do Código de Processo Penal).

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2.12. “Ne eat judex ultra petita partium”

Indica que o juiz deve ater-se ao pedido feito na peça inaugural, não podendo pronunciar-se sobre o que não foi requerido.

O que vincula o juiz criminal são os fatos submetidos à sua apreciação. Exemplo: se na denúncia o promotor descreve um crime de estupro, mas ao classificá-lo, o faz como sendo de sedução, pode o juiz condenar por estupro, pois o réu se defende dos fatos a ele imputados. Nesse caso o juiz não julgou além do que foi pedido, apenas deu aos fatos classificação diversa (artigo 383 do Código de Processo Penal).

O artigo 384 do Código de Processo Penal trata da mudança na acusação, sempre que os fatos narrados na denúncia ou queixa tiverem de ser modificados em razão de prova nova surgida no curso da instrução criminal.

2.13. Devido Processo Legal

Previsto no artigo 5.º, inciso LIV, da Constituição Federal, o due process of law assegura à pessoa o direito de não ser privada de sua liberdade e de seus bens sem a garantia de um processo desenvolvido de acordo com a lei.

Deve ser obedecido não apenas em processos judiciais civis e criminais, mas também em procedimentos administrativos, inclusive militares.

2.14. Inadmissibilidade das Provas Obtidas por Meios Ilícitos

Ao considerar inadmissíveis todas as “provas obtidas por meios ilícitos”, a Constituição Federal proíbe tanto a prova ilícita quanto a prova ilegítima:

• Provas ilícitas: aquelas produzidas com violação a regras de direito material (exemplo: confissão obtida mediante tortura);

• Provas ilegítimas: aquelas produzidas com violação a regras de natureza meramente processual (exemplo: documento exibido em plenário do júri, sem obediência ao disposto no artigo 475 do Código de Processo Penal).

A doutrina e a jurisprudência tendem também a repelir as chamadas provas ilícitas por derivação, ou seja, as provas lícitas produzidas a partir de outra ilegalmente obtida (exemplo: confissão extorquida mediante tortura, que venha a fornecer informações corretas a respeito do lugar onde se encontra o produto do crime, propiciando sua regular apreensão). As provas ilícitas por derivação foram reconhecidas pela Suprema Corte Norte-Americana, com base na teoria dos “frutos da árvore envenenada” – fruits

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of the poisonous tree -, segundo a qual o vício da planta se transmite a todos os seus frutos.

O Supremo Tribunal Federal, atualmente, não admite as provas ilícitas por derivação.

Entendemos que não é razoável sempre desprezar toda e qualquer prova ilícita, devendo o juiz admiti-las para evitar uma condenação injusta ou a impunidade de perigosos marginais. O direito à liberdade e à vida, por exemplo, não podem sofrer restrição pela prevalência do direito à intimidade. Entra aqui o princípio da proporcionalidade, segundo o qual não há propriamente um conflito entre as garantias fundamentais, devendo o princípio de menor relevância se submeter ao princípio de maior relevância. Por exemplo: uma pessoa acusada injustamente, que tenha na interceptação telefônica ilegal o único meio de demonstrar a sua inocência. A tendência da doutrina é a de acolher essa teoria, para favorecer o acusado (prova ilícita pro reo).

2.15. Da Brevidade Processual

Verificando-se uma divergência, deve-se adotar a decisão mais célere, de acordo com o que normalmente acontece. Exemplo: na dúvida entre tráfico internacional ou nacional, os autos devem ser remetidos à justiça estadual; surgindo fato novo, em razão da matéria, modifica-se a competência.

2.16. Identidade Física do juiz

O juiz fica vinculado ao processo que presidiu a fase instrutória, devendo decidi-lo. Atenção: este princípio não vigora no processo penal.

2.17. Do Promotor Natural

Ninguém será processado senão pelo órgão do Ministério Público com atribuições previamente fixadas e conhecidas (artigo 5.º, inciso LIII, da Constituição Federal).

Da Aplicação da Lei Processual Penal

1. EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL NO ESPAÇO

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A lei processual penal aplica-se a todas as infrações penais cometidas em território brasileiro, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de Direito Internacional. No processo penal vigora o princípio da absoluta territorialidade (artigo 1.º do Código de Processo Penal).

Ao contrário do que pode parecer, os incisos do artigo 1.º não cuidam de exceções à territorialidade da lei processual penal brasileira, mas sim de exceções à aplicação do Código de Processo Penal. O inciso I do artigo 1.º contempla verdadeiras hipóteses excludentes da jurisdição criminal brasileira.

Considera-se praticado em território brasileiro o crime cuja ação ou omissão, ou cujo resultado, no todo ou em parte, ocorreu em território nacional (artigo 6.º do Código Penal).

Considera-se, para efeitos penais, como extensão do território nacional: as embarcações e aeronaves públicas ou a serviço do governo brasileiro, onde quer que se encontrem, e as embarcações e aeronaves particulares que se acharem em espaço aéreo ou marítimo brasileiro ou em alto-mar ou espaço aéreo correspondente.

2. EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO

Toda norma jurídica limita-se no tempo e no espaço. Isso quer dizer que a norma se aplica em um determinado território durante um determinado lapso de tempo.

A eficácia temporal das normas processuais é disciplinada pela Lei de Introdução ao Código Civil, nos artigos 1.º, 2.º e 6.º.

As normas de direito processual têm aplicação imediata, sem efeito retroativo. Adotou-se, portanto, o princípio tempus regit actum.

O artigo 2.º do Código de Processo Penal dispõe: “A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.” A aplicação do dispositivo gera dois efeitos:

1) os atos processuais praticados na vigência da lei anterior são considerados válidos;

2) as normas da lei nova aplicam-se imediatamente, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

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No caso de normas mistas (de natureza processual e material), prevalece o caráter material, devendo ser aplicada a regra do artigo 2.º do Código Penal, ou seja, retroagirá para beneficiar o réu.

A lei tem vigência até que outra expressa ou tacitamente a revogue. A revogação ainda pode ser total (ab-rogação) ou parcial (derrogação).

3. IMUNIDADES

3.1. Imunidades Diplomáticas

Os chefes de Estado e os representantes de governos estrangeiros estão excluídos da jurisdição criminal dos países em que exercem suas funções. A imunidade estende-se a todos os agentes diplomáticos, ao pessoal técnico e administrativo das representações, aos seus familiares e aos funcionários de organismos internacionais (ONU, OEA etc.).

Admite-se a renúncia à garantia da imunidade.

3.2. Imunidades Parlamentares

São de duas espécies:

• material (absoluta): alcança os Deputados Federais, Deputados Estaduais e Senadores, garantindo-lhes a inviolabilidade por suas palavras, opiniões e votos. Para alguns, trata-se de causa de exclusão de ilicitude, para outros, causa funcional de isenção de pena. É irrenunciável. Estende-se também aos Vereadores se o crime foi praticado no exercício do mandato e na circunscrição do Município;

• processual, formal ou relativa: consiste na garantia de não ser preso, salvo por flagrantes de crime inafiançável. Alcança os Deputados Estaduais, mas não alcança os Vereadores.

4. INTERPRETAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL

Artigo 3.º do Código de Processo Penal: “A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.”

Interpretar uma norma significa buscar seu alcance e real significado.

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4.1. Espécies

4.1.1. Quanto ao sujeito que elabora

• Autêntica ou legislativa: feita pelo próprio órgão encarregado da elaboração da lei. Pode ser:

– contextual: feita pelo próprio texto interpretado;

– posterior: feita após a entrada em vigor da lei.

• Doutrinária ou científica: feita pelos estudiosos e doutores do Direito. Observação: as exposições de motivos constituem forma de interpretação doutrinária, uma vez que não são leis.

• Judicial: feita pelos órgãos jurisdicionais.

4.1.2. Quanto aos meios empregados

• Gramatical, literal ou sintática: leva-se em conta o sentido literal das palavras.

• Lógica ou teleológica: busca-se a vontade da lei, atendendo-se aos seus fins e à sua posição dentro do ordenamento jurídico.

4.1.3. Quanto ao resultado

• Declarativa: há perfeita correspondência entre a palavra da lei e sua vontade.

• Restritiva: a interpretação vai restringir o seu significado, pois a lei disse mais do que queria.

• Extensiva: a interpretação vai ampliar o seu significado, pois a lei disse menos do que queria.

4.2. Interpretação da Norma Processual Penal

A lei processual admite interpretação extensiva, pois não contém dispositivo versando sobre direito de punir.

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Exceções: tratando-se de dispositivos restritivos da liberdade pessoal (prisão em flagrante, por exemplo), o texto deverá ser rigorosamente interpretado. O mesmo quando se tratar de regras de natureza mista.

4.3. Formas de Procedimento Interpretativo

• Eqüidade: correspondência ética e jurídica da circunscrição – norma ao caso concreto;

• Doutrina: estudos, investigações e reflexões teóricas dos cultores do direito;

• Jurisprudência: repetição constante de decisões no mesmo sentido em casos semelhantes.

5. ANALOGIA

Consiste em aplicar a uma hipótese não regulada por lei disposição relativa a um caso semelhante.

5.1. Fundamento

Ubi eadem ratio, ibi eadem jus (onde há a mesma razão, aplica-se o mesmo Direito).

5.2. Natureza Jurídica

Forma de auto-integração da lei, ou seja, forma de supressão de lacunas.

5.3. Distinção

• Analogia: inexiste norma reguladora para o caso concreto, devendo ser aplicada norma que trata de hipótese semelhante.

• Interpretação extensiva: existe norma reguladora do caso concreto, mas esta não menciona expressamente sua eficácia.

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• Interpretação analógica: a norma, após uma enumeração casuística, traz uma formulação genérica. A norma regula o caso de modo expresso, embora genericamente (exemplo: artigo 121, § 2.º, inciso III e IV do Código Penal).

Observação: não confundir interpretação analógica com aplicação analógica. Aquela é forma de interpretação e esta forma de auto-integração.

5.4. Espécies de Analogia

• In bonam partem – em benefício do agente.

• In malam partem – em prejuízo do agente.

6. FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL

6.1. Conceito

É de onde provém o Direito.

6.2. Espécies

• Material ou de produção: aquela que cria o Direito; é o Estado.

• Formal ou de cognição: aquela que revela o Direito. Pode ser:

– imediata: lei;

– mediata: costumes e princípios gerais do direito (costume é o conjunto de normas de comportamento a que as pessoas obedecem de maneira uniforme e constante, pela convicção de sua obrigatoriedade jurídica. Princípios gerais do direito são postulados gerais que se fundam em premissas éticas extraídas do material legislativo).

7. DA PERSECUÇÃO PENAL

7.1. Conceito

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É a atividade do Estado que consiste em investigar, processar, comprovar e julgar o fato punível.

7.2. Etapas da Persecução Penal

A persecução penal no Brasil desenvolve-se em duas etapas:

1) Fase de investigação (preliminar);

2) Fase Judicial ou Processual (ação penal).

7.3. Investigação

Compete, em regra, à polícia judiciária desenvolver a fase de investigação.

Porém, outras autoridades também podem investigar desde que haja previsão legal: 1) juiz da falência investiga crime falimentar; 2) agentes fiscais investigam crimes fiscais.

Artigo 4.º, parágrafo único, do Código de Processo Penal: “A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.”

O Ministério Público pode investigar? O Superior Tribunal de Justiça já admitiu.

O particular pode investigar? A investigação feita por particular não é proibida. Poderá ser realizada, mas os resultados devem ser enviados à polícia ou ao Ministério Público.

O juiz pode investigar? Sim, em duas hipóteses: 1) crime falimentar; 2) Lei do Crime Organizado (artigo 3.º).

No Brasil, não há o chamado juizado de instrução, que consiste na possibilidade de o juiz presidir investigação. Somente nas hipóteses de crime falimentar e crime organizado o juiz preside as investigações.

7.3.1. Polícia Judiciária

É exercida por autoridades policiais; visa apurar o fato e sua autoria. É auxiliar da justiça; investiga crimes (artigo 13 do Código de Processo Penal).

O controle externo da polícia está previsto constitucionalmente e é exercido pelo Ministério Público (artigo 129, inciso VII, da Constituição Federal). Na prática, inexiste

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lei complementar para disciplinar a matéria.

No Brasil, a polícia judiciária é exercida:

- pela polícia civil;

- pela polícia federal;

- pela polícia militar nos crimes militares.

A polícia judiciária exerce suas funções conforme alguns critérios:

- territorial: quanto ao lugar da atividade pode ser terrestre, marítima ou aérea;

- em razão da matéria;

- em razão da pessoa (exemplo: delegacia da mulher).

A inobservância de qualquer um desses critérios não implica nulidade; é mera irregularidade que não contamina a ação penal.

Artigo 22 do Código Processo Penal: “No Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrição policial, a autoridade com exercício em uma delas poderá, nos inquéritos a que esteja procedendo, ordenar diligências em circunscrição de outra, independentemente de precatórias ou requisições, e bem assim providenciará, até que compareça a autoridade competente, sobre qualquer fato que ocorra em sua presença noutra circunscrição.”

7.3.2. Polícia de Segurança (Administrativa ou Preventiva)

É a polícia ostensiva, fardada, exercida em regra pela polícia militar. Normalmente, não investiga crime (exceto os militares), pois tem caráter preventivo.

Inquérito Policial

1. CONCEITO

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É o conjunto de diligências realizadas pela polícia judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo (artigo 4.º do Código de Processo Penal).

2. NATUREZA JURÍDICA

O inquérito policial é procedimento persecutório de caráter administrativo e natureza inquisitiva instaurado pela autoridade policial.

É um procedimento, pois é uma seqüência de atos voltados a uma finalidade.

Persecutório porque persegue a satisfação do jus puniendi.

Persecução é a atividade estatal por meio da qual se busca a punição e se inicia, oficialmente, com a instauração do inquérito policial, também conhecido como informatio delicti.

3. FINALIDADE

Conforme dispõe os artigos 4.º e 12 do Código de Processo Penal, o inquérito visa a apuração da existência de infração penal e a respectiva autoria, a fim de fornecer ao titular da ação penal elementos mínimos para que ele possa ingressar em juízo.

A apuração da infração penal consiste em colher informações a respeito do fato criminoso. Apurar a autoria consiste naautoridade policial desenvolver a necessária atividade, visando descobrir o verdadeiro autor da infração penal.

4. POLÍCIA JUDICIÁRIA

Quanto ao objeto, a polícia pode ser administrativa (preventiva) ou judiciária (repressiva). A polícia judiciária tem a função de auxiliar a justiça, apurando as infrações penais e suas respectivas autorias.

O artigo 4.º, caput, do Código de Processo Penal usava inadequadamente o termo “jurisdição”. O termo jurisdição designa a atividade por meio da qual o Estado, em substituição às partes, declara a preexistente vontade da lei ao caso concreto.

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A Lei n. 9.043, de 9.5.1995, trocou o termo “jurisdição” por “circunscrição” (limites territoriais dentro dos quais a polícia realiza suas funções).

O parágrafo único do citado artigo também contém uma impropriedade. Ao dispor que “a competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função”, o legislador foi infeliz, pois a autoridade policial não tem competência, mas sim atribuições. O termo competência aqui empregado deve ser entendido como poder conferido a alguém para conhecer determinados assuntos, não se confundindo com competência jurisdicional, que é a medida concreta do Poder Jurisdicional.

Salvo algumas exceções, a atribuição para presidir o inquérito policial é conferida aos Delegados de Polícia (artigo 144, §§ 1.º e 4.º, da Constituição Federal de 1988), conforme as normas de organização policial dos Estados. A atribuição pode ser fixada, quer pelo lugar da consumação da infração (ratione loci), quer pela natureza da mesma (ratione materiae).

A autoridade policial, em regra, não poderá praticar qualquer ato fora dos limites de sua circunscrição, sendo necessário:

• se for em outro país: carta rogatória;

• se for em outra comarca: carta precatória;

Se for no Distrito Federal ou em circunscrição diferente dentro da mesma comarca, a autoridade poderá ordenar diligências independente de precatórias ou requisições (artigo 22 do Código de Processo Penal).O flagrante deve ser lavrado no local em que se efetivou a prisão, mas se neste não houver Delegado de Polícia, deverá o preso ser apresentado à circunscrição mais próxima (artigos 290 e 308, ambos do Código de Processo Penal). Concluído o flagrante, devem os atos subseqüentes ser praticados pela autoridade do local em que o crime se consumou.

Observação: tem-se entendido que a falta de atribuição da autoridade policial não invalida os seus atos, ainda que se trate de prisão em flagrante, pois a Polícia, por não exercer atividade jurisdicional, não se submete à competência jurisdicional ratione loci. Conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, o inquérito policial é peça meramente informativa, cujos vícios não contaminam a ação penal.

O inciso LIII do artigo 5.º da Constituição Federal não se aplica às autoridades policiais, pois estas não processam (promotor natural) nem sentenciam (juiz natural). Assim, não foi adotado pelo referido dispositivo constitucional o princípio do “Delegado Natural”.

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5. INQUÉRITOS EXTRAPOLICIAIS (artigo 4.º, parágrafo único, do Código de Processo Penal)

Em regra, os inquéritos policiais são presididos por Delegado de Polícia de Carreira (artigo 144, § 4.º, da Constituição Federal), mas o parágrafo único do artigo 4.º do Código de Processo Penal deixa claro que o inquérito realizado pela polícia judiciária não é a única forma de investigação criminal.

Excepcionalmente, portanto, há casos em que são presididos por outras autoridades e não pelo Delegado de Polícia, tais como:

• Inquérito judicial para apuração de infrações falimentares (presidido pelo juiz da vara onde tramita a falência).

• Comissões Parlamentares de Inquérito (artigo 58, § 3.º, da Constituição Federal).

• Crime cometido nas dependências da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal (Súmula n. 397 do Supremo Tribunal Federal – “O poder de polícia da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, em caso de crime cometido nas suas dependências, compreende, consoante o regimento, a prisão em flagrante do acusado e a realização do inquérito”).

• Inquérito civil (instaurado pelo Ministério Público, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; conforme dispõe o artigo 129, inciso III, da Carta Magna).

• Inquérito policial militar.

• Magistrado (o delegado deve remeter os autos ao tribunal ou a órgão especial competente para o julgamento).

• Membro do Ministério Público (os autos devem ser remetidos ao Procurador-Geral de Justiça).

6. VALOR PROBATÓRIO

O inquérito policial tem conteúdo informativo; visa apenas fornecer elementos necessários para a propositura da ação penal.

Tem valor probatório relativo, pois os elementos de informação não são colhidos sob a égide do contraditório e da ampla defesa, tampouco na presença do Juiz de Direito.

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7. DISPENSABILIDADE

O inquérito policial é uma peça útil, porém não imprescindível. Não é fase obrigatória da persecução penal. Poderá ser dispensado sempre que o Ministério Público ou o ofendido (no caso da ação penal privada) tiver elementos suficientes para promover a ação penal (artigo 12 do Código de Processo Penal).

O artigo 27 do Código de Processo Penal dispõe que qualquer pessoa do povo poderá fornecer, por escrito, informações sobre o fato e a autoria, indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção, demonstrando que quando as informações forem suficientes não é necessário o inquérito policial.

Segundo o artigo 39, § 5.º, do Código de Processo Penal, o órgão do Ministério Público dispensará o inquérito se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal.

Atenção: o titular da ação penal pode abrir mão do inquérito policial, mas não pode eximir-se de demonstrar a verossimilhança da acusação, ou seja, não se concebe que a acusação careça de um mínimo de elementos de convicção.

7.1. Juizados Especiais

De acordo com o disposto nos artigos 69 e 77, § 1.º, da Lei n. 9.099/95, o inquérito policial é substituído por um simples boletim de ocorrência circunstanciado, lavrado pela autoridade policial, chamado de termo circunstanciado, no qual constará uma narração sucinta dos fatos, bem como a indicação da vítima, do autor do fato e das testemunhas, em número máximo de três, seguindo em anexo um boletim médico ou prova equivalente, quando necessário para comprovar a materialidade delitiva (dispensa-se o laudo de exame de corpo de delito). Lavrado o termo, este será encaminhado ao Juizado Especial Criminal.

8. CARACTERÍSTICAS

• Procedimento escrito: conforme determina o artigo 9.º do Código de Processo Penal.

• Procedimento sigiloso (artigo 20 do Código de Processo Penal): o sigilo busca salvaguardar a intimidade do indiciado, resguardando-se, assim, seu estado de

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inocência. O sigilo não se estende ao representante do Ministério Público, nem à autoridade judiciária. Advogado pode consultar os autos de inquérito, mas, caso seja decretado judicialmente o sigilo, não poderá acompanhar a realização de atos procedimentais (Lei n. 8.906/94, artigo 7.º, incisos XIII a XV, e § 1.º).

• Procedimento inquisitivo: todas as atividades concentram-se nas mãos de uma única autoridade, que pode agir de ofício e discricionariamente para esclarecer o crime e sua autoria. Não há acusação nem defesa, logo não há contraditório (exceções: há contraditório no inquérito judicial e no inquérito para expulsão de estrangeiro). Não pode ser argüida suspeição da autoridade policial (artigo 107 do Código de Processo Penal). O artigo 14 do Código de Processo Penal dispõe que a autoridade policial poderá indeferir pedido de diligência, exceto o exame de corpo de delito (artigo 184 do Código de Processo Penal).

• Legalidade: o inquérito policial não pode ser arbitrário, ou seja, deve obedecer à lei.

• Oficiosidade: esse princípio se funda no princípio da obrigatoriedade ou legalidade. Sendo um crime de ação penal pública incondicionada, a autoridade tem o dever de instaurar o inquérito policial de ofício (artigo 5.º, inciso I, do Código de Processo Penal).

• Oficialidade: o inquérito policial é dirigido por órgãos públicos oficiais, no caso, a autoridade policial. É uma atividade investigatória feita por órgãos oficiais.

• Indisponibilidade: uma vez instaurado, o inquérito policial não pode ser arquivado pela autoridade policial (artigo 17 do Código de Processo Penal).

• Autoritariedade: é presidido por uma autoridade pública. Trata-se de exigência constitucional (artigo 144, § 4.º).

9. INCOMUNICABILIDADE

Destinada a impedir que a comunicação do preso com terceiros venha a prejudicar o desenvolvimento da investigação.

Mediante despacho fundamentado do juiz a partir de requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, respeitadas as prerrogativas do advogado, poderá ser decretada a incomunicabilidade do indiciado pelo prazo de até três dias, por conveniência da investigação ou interesse da sociedade (artigo 21 do Código de Processo Penal).

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Entendemos que a incomunicabilidade não foi recepcionada pela nova ordem constitucional. A Constituição Federal, em seu artigo 136, § 3.º, inciso IV, proíbe a incomunicabilidade durante o estado de defesa. Assim, se é vedada em situações excepcionais, com mais razão deve ser vedada em situações de normalidade. Em sentido contrário, o Professor Damásio de Jesus entende que a proibição está relacionada com crimes políticos ocorridos durante o estado de defesa.

A incomunicabilidade, de qualquer forma, não se estende ao advogado (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, artigo 7.º, inciso III).

10. “NOTITIA CRIMINIS”

10.1. Conceito

É o conhecimento, espontâneo ou provocado, de um fato aparentemente delituoso pela autoridade policial.

10.2. Espécies

• “Notitia Criminis” de cognição direta, imediata, espontânea ou inqualificada: ocorre quando a autoridade policial toma conhecimento direto da infração penal por meio de suas atividades rotineiras. Exemplo: policiamento, imprensa, pelo encontro do corpo de delito ou até pela delação anônima. A delação anônima (apócrifa) é chamada notitia criminis inqualificada.

• “Notitia Criminis” de cognição indireta, mediata, provocada ou qualificada: ocorre quando a autoridade policial toma conhecimento do delito por meio de algum ato jurídico de comunicação formal, como por exemplo a delatio criminis (comunicação de um crime feito pela vítima ou por qualquer um do povo), a requisição do Ministério Público ou autoridade judiciária e a representação do ofendido.

• “Notitia Criminis” de cognição coercitiva: ocorre no caso de prisão em flagrante, em que a notícia se dá com a apresentação do autor do fato. Observação: se for crime de ação pública condicionada ou de iniciativa privada, o auto de prisão em flagrante somente poderá ser lavrado se forem observados os requisitos dos §§ 4.º e 5.º do artigo 5.º do Código de Processo Penal.

11. INÍCIO

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11.1. Nos Crimes de Ação Pública Incondicionada

• De ofício: a autoridade tem a obrigação de instaurar o inquérito policial, independente de provocação, sempre que tomar conhecimento imediato e direto do fato, por meio de delação verbal ou por escrito, feito por qualquer pessoa do povo (delatio criminis simples), notícia anônima (notitia criminis inqualificada), por meio de sua atividade rotineira (cognição imediata), ou no caso de prisão em flagrante. O ato de instauração é a portaria.

• Por requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público: não obstante a hipótese prevista no artigo 40 do Código de Processo Penal, se não estiverem presentes os elementos indispensáveis ao oferecimento da denúncia, a autoridade judiciária poderá requisitar a instauração de inquérito policial para a elucidação dos fatos. A autoridade policial não pode se recusar a instaurar o inquérito, pois a requisição tem natureza de determinação, de ordem, muito embora inexista subordinação hierárquica.

• Delatio criminis: é a comunicação de um crime feita pela vítima ou por qualquer um do povo. Caso a autoridade policial indefira a instauração de inquérito, caberá recurso ao Secretário de Estado dos Negócios da Segurança Pública ou ao Delegado-Geral de Polícia (artigo 5.º, § 2.º, do Código de Processo Penal). A delatio criminis pode ser simples (mera comunicação) ou postulatória (comunica e pede a instauração da persecução penal). Trata-se de faculdade conferida ao cidadão de colaborar com a atividade repressiva do Estado. Contudo, há algumas pessoas que, em razão do seu cargo ou função, estão obrigadas a noticiar a ocorrência de crimes de que tenham tomado conhecimento no desempenho de suas atividades (artigo 66, incisos I e II, da Lei das Contravenções Penais; artigo 45 da Lei n. 6.538/78; artigo 269 do Código Penal; artigos 104 e 105 da Lei de Falências).

11.2. Nos Crimes de Ação Pública Condicionada

• Mediante representação do ofendido ou de seu representante legal: a representação é simples manifestação de vontade da vítima ou de seu representante legal, não havendo exigência formal para a sua elaboração.

• Mediante requisição do Ministro da Justiça: deve ser encaminhada ao chefe do Ministério Público o qual poderá, desde logo, oferecer a denúncia ou requisitar diligências à polícia.

11.3. Nos Crimes de Ação Privada

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Nesses casos a instauração do inquérito policial depende de requerimento do ofendido, de seu representante legal ou sucessores, conforme disposto no artigo 5.º, § 5.º, combinado com os artigos 30 e 31, todos do Código de Processo Penal.

O artigo 35 do Código de Processo Penal não foi recepcionado pela Constituição Federal, por força do artigo 226, § 5.º, podendo a mulher casada requerer a instauração do inquérito policial independentemente de outorga marital. Nada obstante, a Lei n. 9.520, de 27.11.1997, revogou expressamente a norma contida no artigo 35 do Código de Processo Penal.

11.4. Observações

O inquérito policial também pode começar mediante auto de prisão em flagrante nos três casos (ação penal pública incondicionada, condicionada e ação penal privada). Nos crimes de ação pública condicionada e de ação privada, o ofendido deverá ratificar o flagrante até a entrega da nota de culpa (24h).

A autoridade policial não poderá instaurar o inquérito policial se não houver justa causa (se o fato for atípico ou se estiver extinta a punibilidade). Porém, o desconhecimento da autoria ou a possibilidade do sujeito ter agido sob a proteção de alguma excludente da ilicitude não impede a instauração do inquérito.

Inquérito Policial

1. PROVIDÊNCIAS DA AUTORIDADE POLICIAL

O inquérito policial não tem um procedimento rígido, ou seja, uma seqüência imutável de atos. O artigo 6.º do Código de Processo Penal indica algumas providências que, de regra, devem ser tomadas pela autoridade policial para a elucidação do crime e da sua autoria.

1.1. Dirigir-se ao Local do Crime

A autoridade policial, se possível e conveniente, deve se dirigir ao local do crime e preservar o estado das coisas até a chegada da perícia. Qualquer alteração no estado de coisas pode comprometer as provas a serem produzidas (artigo 169 do Código de Processo Penal).

Exceção: acidente automobilístico, em que os veículos devem ser deslocados com a finalidade de desobstruir a via pública (artigo 1.º da Lei n. 5.970/73).

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1.2. Apreender os Objetos Relacionados com o Fato

Deve também apreender os objetos e instrumentos do crime após liberação pela perícia (artigo 11 do Código de Processo Penal – instrumentos e objetos do crime apreendidos serão anexados ao inquérito policial).

Para essa apreensão, é necessária uma diligência denominada busca e apreensão, que pode ser efetuada no local do crime, em domicílio ou na própria pessoa. A busca domiciliar pode ser realizada em qualquer dia, porém devem ser respeitadas as garantias de inviolabilidade domiciliar (artigo 5.º, inciso XI, da Constituição Federal).

À noite, é lícito entrar no domicílio alheio em quatro situações:

• a convite do morador;

• em caso de flagrante delito;

• para prestar socorro;

• em caso de desastre.

Durante o dia:

• nas quatro situações acima citadas;

• mediante prévia autorização judicial, corporificada em instrumento denominado mandado de busca e apreensão.

Antes, a autoridade policial não precisava de autorização judicial, porém, mesmo com esta, não podia entrar à noite. Aplicava-se o artigo 172 do Código de Processo Civil por analogia, contudo, em dezembro de 1.994, esse artigo teve sua redação alterada, não sendo mais possível sua aplicação.

Domicílio, nos termos do artigo 150, § 4.º, do Código Penal, é qualquer

compartimento habitado; aposento ocupado por habitação coletiva;

compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

Exemplos: o escritório de advogado, na parte aberta ao público, não é domicílio,

mas a sala do advogado sim (observação: a busca em escritório de advocacia

deverá ser acompanhada por um representante da Ordem dos Advogados do

Brasil); o mesmo entendimento se tem quanto a bar, pois considera-se domicílio a

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área interna do balcão, onde é exercida a atividade pelo proprietário ou seu

funcionário, sendo que a parte externa, a freqüentada pelo público, não; quarto

de hotel etc. Automóvel não é domicílio.

A busca pessoal é aquela feita na própria pessoa. Independe de mandado, desde que haja fundada suspeita. Pode ser realizada a qualquer dia e a qualquer hora, salvo se a pessoa estiver em seu domicílio.

1.3. Ouvir o Ofendido e as Testemunhas

Podem ser conduzidos coercitivamente se desatenderem, sem justificativa, a intimação da autoridade policial (princípio da autoritariedade – artigo 201, parágrafo único, do Código de Processo Penal). O ofendido e a testemunha faltosa podem responder por crime de desobediência (artigo 219 do Código de Processo Penal e artigo 330 do Código Penal).

Se o ofendido ou a testemunha for membro do Ministério Público ou da Magistratura deverá ser observada a prerrogativa de serem ouvidos, em qualquer processo ou inquérito, em dia, hora e local previamente ajustados com a autoridade competente.

A testemunha tem o dever de falar a verdade, sob pena de responder pelo crime de falso testemunho (artigo 342 do Código Penal). O ofendido que mentir não comete crime de falso testemunho.

1.4. Ouvir o Indiciado

Deverá a autoridade policial ouvir o indiciado, observando-se os mesmos preceitos norteadores do interrogatório judicial (artigo 6.º, inciso V, do Código de Processo Penal).

1.4.1. Indiciamento

Consiste na suspeita oficial acerca de alguém, ou seja, é a imputação a alguém, no inquérito policial, da prática de ilícito penal, sempre que houver razoáveis indícios de sua autoria. É um ato abstrato, um juízo de valor da autoridade policial que vai reconhecer alguém como principal suspeito.

1.4.2. Interrogatório extrajudicial28

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O termo de interrogatório extrajudicial será assinado pelo delegado de polícia, pelo escrivão, pelo interrogado e por duas testemunhas presentes à leitura do termo (trata-se de testemunhas instrumentárias, que não depõem sobre fatos, mas sobre a regularidade de um procedimento). Observe-se que as duas testemunhas não precisam estar presentes ao interrogatório, mas à leitura do termo.

O interrogatório extrajudicial tem valor probatório relativo; só valerá se confirmado por outros elementos de prova.

A Constituição Federal consagrou o direito de silêncio ao indiciado. A autoridade policial, portanto, deve informá-lo desse direito (artigo 5.º, inciso LXIII, da Constituição Federal), não podendo mais adverti-lo de que seu silêncio poderá prejudicar sua própria defesa, pois o artigo 186 do Código de Processo Penal não foi recepcionado pela Constituição Federal.

Embora tenha o direito de permanecer calado, o indiciado deverá atender à intimação do Delegado de Polícia e comparecer ao ato, sob pena de condução coercitiva (artigo 260 do Código de Processo Penal).

A autoridade policial não precisa intimar o defensor do indiciado para acompanhar o ato, muito menos nomear-lhe um.

1.4.3. Membro do Ministério Público

Se o suspeito for membro do Ministério Público, a autoridade policial não pode indiciá-lo, devendo encaminhar os autos do inquérito ao Procurador-Geral de Justiça.

1.4.4. Indiciado menor

No interrogatório do indiciado menor (maior de 18 e menor de 21 anos), a autoridade deverá nomear-lhe um curador. Não observada essa regra, a ação penal não será afetada, pois o inquérito policial é mera peça informativa e seus vícios não contaminam aquela. No entanto, haverá perda do valor probatório do ato e se houve prisão em flagrante, esta será relaxada por vício formal (retira-lhe a força coercitiva).

No interrogatório judicial, a ausência de curador gerará sua nulidade (artigo 564, inciso III, alínea “c”, do Código de Processo Penal). Qualquer pessoa pode ser nomeada curador. A jurisprudência faz, no entanto, uma restrição em relação aos policiais, pois estes têm interesse na investigação.

A idade do menor a ser considerada é a do dia do interrogatório (tempus regit actum).

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1.4.5. Identificação criminal

A autoridade policial deve proceder à identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, salvo se ele já tiver sido civilmente identificado (artigo 5.º, inciso LVIII, da Constituição Federal).

Embora a Constituição Federal assegure que o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, ressalva a possibilidade de o legislador infraconstitucional estabelecer algumas hipóteses em que até mesmo o portador da cédula de identidade civil esteja obrigado a submeter-se à identificação criminal. O legislador já estabeleceu algumas hipóteses.

As hipóteses previstas na Lei n. 10.054/00, em seu artigo 3.º, são as seguintes:

• indiciamento ou acusação por homicídio doloso, crime contra o patrimônio mediante violência ou grave ameaça, crime de receptação qualificada, crimes contra a liberdade sexual e falsificação de documento público;

• fundada suspeita de falsificação ou adulteração de documento de identidade;

• mal estado de conservação ou distância temporal da carteira de identidade, quando impossibilitar a leitura dos dados essenciais;

• quando constar outros nomes ou apelidos dos registros policiais;

• quando houver registro de extravio da carteira de identidade;

• quando o acusado não comprovar em 48 horas a sua identificação civil.

Observações: na primeira hipótese, a regra nos parece inconstitucional por ofensa ao princípio do estado de inocência, pois a simples razão de o agente estar sendo acusado pela prática deste ou daquele crime não pode, por si só, justificar o constrangimento, exceto no caso de envolvimento em quadrilhas organizadas, capazes de forjar documentos falsos.

Por fim, há outra hipótese em que o portador da cédula de identidade civil está obrigado a submeter-se à identificação criminal: trata-se da identificação criminal de pessoa envolvida com ação praticada por organização criminosa (artigo 5.º da Lei n. 9.034/95).

A identificação criminal compreende a datiloscópica (impressões digitais) e a fotográfica.

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1.4.6. Incidente de insanidade mental

Somente o juiz pode determinar a instauração. A autoridade policial não pode.

1.5. Reconhecimento de Pessoas e Coisas e Acareações

Poderão ser realizadas acareações (artigos 229 e 230 do Código de Processo Penal) e reconhecimento de pessoas e coisas (artigos 226 a 228 do Código de Processo Penal).

Quanto ao reconhecimento, caso haja receio de intimidação, a autoridade policial providenciará para que o reconhecido não veja quem o está reconhecendo, mas, em juízo, o reconhecimento terá de ser feito frente a frente com o acusado.

A acareação é o confrontamento de depoimentos divergentes prestados.

1.6. Exame de Corpo de Delito

Deverá ser determinada a realização do exame de corpo de delito sempre que a infração tiver deixado vestígios, ou de quaisquer outras perícias que se mostrarem necessárias à elucidação do ocorrido (artigos 158 a 184 do Código de Processo Penal).

Observação: os peritos deverão sempre atuar em número mínimo de dois.

1.7. Reprodução Simulada dos Fatos

O artigo 7.º do Código de Processo Penal dispõe sobre a reprodução simulada dos fatos (reconstituição do crime), que não pode contrariar a moralidade e a ordem pública.

O indiciado não pode ser obrigado a participar da reconstituição, o que violaria seu direito ao silêncio e seu corolário, o de que ninguém está obrigado a produzir prova contra si, mas pode ser obrigado a comparecer (artigo 260 do Código de Processo Penal).

1.8. Relatório

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Concluídas as investigações, a autoridade policial deve fazer minucioso relatório do que tiver apurado no inquérito policial, sem, contudo, expender opiniões, julgamentos ou qualquer juízo de valor, devendo, ainda, indicar as testemunhas que não foram ouvidas, bem como as diligências não realizadas.

O relatório é a narração objetiva das diligências feitas pela autoridade. A autoridade somente pode fornecer a classificação jurídica do fato, sem emitir qualquer juízo de mérito, e a classificação não vincula o Ministério Público.

Encerrado o inquérito, os autos serão remetidos ao juiz competente.

2. PRAZO PARA ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL

Deve ser encerrado no prazo de 30 dias, contados a partir da instauração (recebimento da notitia criminis), se o indiciado estiver solto. Se o fato for de difícil elucidação, a autoridade policial poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências a serem realizadas no prazo fixado pelo juiz. Não obstante a omissão do Código, entende-se que o juiz antes de conceder novo prazo deve ouvir o titular da ação penal.

Se o indiciado estiver preso, o prazo para conclusão do inquérito será de 10 dias, contados da data da efetivação da prisão, e não se admitirá qualquer prorrogação.

No caso de ser decretada a prisão temporária, o tempo de prisão será acrescido ao prazo de encerramento do inquérito (Lei n. 7.960/90).

A contagem do prazo atende a regra do artigo 798, § 1.º, do Código de Processo Penal. Despreza-se o dia inicial, incluindo-se o dia final. O decurso não acarretará a perda do direito de punir, apenas o relaxamento da prisão.

2.1. Prazos Especiais

2.1.1. Justiça Federal

Se o inquérito estiver tramitando perante a Justiça Federal, o prazo será de 15 dias, prorrogável por mais 15, se o indiciado estiver preso. Se o indiciado estiver solto, o prazo será de 30 dias, com a possibilidade de prorrogação por mais 30 dias (artigo 66 da Lei n. 5.010/66).

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No caso de tráfico internacional, aplica-se o prazo da Lei de Tóxicos (vide item seguinte), adotando-se o princípio da especialidade.

2.1.2. Tóxicos

• Lei n. 6.368/76: se o indiciado estiver preso o prazo para remessa ao Poder Judiciário é de 5 dias (no caso de tráfico é de 10 dias for força do artigo 35, parágrafo único). Na hipótese de liberdade, o prazo é de 30 dias (artigo 21, § 1.°).

• Lei n. 10.409/02: se o indiciado estiver preso o prazo para remessa ao Poder Judiciário é de 15 dias. Na hipótese de liberdade, o prazo é de 30 dias, podendo ser prorrogado se autorizado pelo juiz (parágrafo único do artigo 29).

Remetemos o aluno ao estudo do módulo IV de Legislação Penal Especial, no que diz respeito à aplicabilidade da lei nova.

2.1.3. Crimes contra a economia popular

No caso de crimes contra a economia popular, o prazo é de 10 dias, estando o indiciado preso ou solto (Lei n. 1.521/51, artigo 10, § 1.º).

3. ARQUIVAMENTO

Só pode ser determinado pelo juiz se houver requerimento do Ministério Público. Se o Juiz discordar do pedido de arquivamento, aplicará o disposto no artigo 28 do Código de Processo Penal, ou seja, remeterá os autos ao Procurador-Geral, que poderá:

• oferecer a denúncia;

• designar outro órgão do Ministério Público para oferecer a denúncia: o promotor ou procurador designado está obrigado a oferecer a denúncia, sem que haja ofensa ao princípio da independência funcional, pois age em nome da autoridade que o designou (por delegação) e não em nome próprio;

• insistir no arquivamento: neste caso, o Poder Judiciário não poderá discordar do arquivamento.

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O juiz, ao remeter os autos ao Procurador-Geral de Justiça, exerce função anormal, qual seja, a de fiscal do princípio da obrigatoriedade da ação penal.

O delegado não pode arquivar o inquérito policial (artigo 17 do Código de Processo Penal).

Arquivado o inquérito policial, não poderá ser promovida a ação privada subsidiária, pois esta só é possível no caso de inércia do Ministério Público.

O inquérito policial, arquivado por falta de provas, só poderá ser reaberto se surgirem novas provas (súmula n. 524 do Supremo Tribunal Federal).

O despacho que arquivar o inquérito é irrecorrível. Cabe recurso nas seguintes hipóteses:

• em casos de crime contra a economia popular, caberá recurso de ofício (artigo 7.º da Lei n. 1.521/51);

• no caso das contravenções previstas nos artigos 58 e 60 do Decreto-lei n. 6.259/44, quando caberá recurso em sentido estrito;

• do arquivamento determinado de ofício pelo juiz cabe correição parcial.

Se o tribunal der provimento a esses recursos, o inquérito policial será remetido ao Procurador-Geral.

Se o promotor de justiça requerer a devolução dos autos à polícia para diligências complementares, o juiz poderá, caso discorde, aplicar por analogia o artigo 28 do Código de Processo Penal. Se assim fizer, caberá correição parcial.

O pedido de arquivamento feito pelo titular da ação penal privada significa renúncia tácita (causa a extinção da punibilidade).

Por fim, salientamos a possibilidade de trancar o inquérito por meio de habeas corpus quando houver indiciamento abusivo ou quando o fato for atípico.

Da Ação Penal

1. DA AÇÃO PENAL

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1.1. Conceito

Ação penal é o direito de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo a um caso concreto. É também o direito público subjetivo do Estado-Administração, único titular do poder-dever de punir, de pleitear ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo, com a conseqüente satisfação da pretensão punitiva.

1.2. Características

A ação penal é um:

• direito público: visa à aplicação do Direito Penal que é público;

• direito subjetivo: pertence a alguém que pode exigir do Estado-Juiz a prestação jurisdicional;

• direito autônomo: não se confunde com o direito material tutelado;

• direito abstrato: independe do resultado do processo.

1.3. Condições Genéricas da Ação

1.3.1. Possibilidade jurídica do pedido

A providência pedida ao Poder Judiciário só será viável se o ordenamento, em abstrato, expressamente a admitir. Assim, a lei penal material deve cominar, em abstrato, uma sanção ao fato narrado na peça inicial.

1.3.2. Legitimidade “ad causam” para agir

É na lição de Alfredo Buzaid a pertinência subjetiva da ação.

É a legitimação para ocupar os pólos da relação jurídica processual. Na ação penal pública o pólo ativo é ocupado pelo Ministério Público; na ação penal privada, o pólo ativo é ocupado pelo ofendido ou seu representante legal. O pólo passivo é ocupado pelo provável autor do fato.

Os legitimados são os titulares dos direitos materiais em conflito. O Estado exerce por intermédio do Ministério Público seu direito de punir que colide com o direito de liberdade do acusado. No caso da ação penal privada, o ofendido age como substituto

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processual (legitimação extraordinária), pois só possui o direito de acusar (jus accusationis), sendo que o direito de punir pertence sempre ao Estado.

1.3.3. Interesse de agir

Consiste na necessidade do uso das vias jurisdicionais para a defesa do interesse material pretendido e na sua adequação ao provimento pleiteado. Por conseguinte, não será recebida a denúncia quando estiver extinta a punibilidade do acusado. Nesse caso, a perda do direito material de punir resultou na desnecessidade de utilização das vias processuais.

1.4. Condições Específicas da Ação

Ao lado das condições que vinculam a ação civil, também aplicáveis ao processo penal (explicitadas no item anterior), a doutrina atribui a este algumas condições específicas, ditas condições específicas de procedibilidade. São elas:

• representação do ofendido e requisição do ministro da Justiça;

• entrada do agente no território nacional;

• autorização do legislativo para a instauração de processo contra Presidente da República e Governadores, por crimes comuns;

• trânsito em julgado da sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento, no crime de induzimento a erro essencial ou ocultamento do impedimento.

1.5. Classificação da Ação Penal

A par da tradicional classificação das ações em geral, levando-se em conta a natureza do provimento jurisdicional invocado (de conhecimento, cautelar e de execução), no processo penal é corrente a divisão subjetiva das ações, isto é, em função da qualidade do sujeito que detém a sua titularidade.

Segundo o critério subjetivo a ação penal pode ser:

• ação penal pública: exclusiva do Ministério Público (artigo 100 do Código Penal). Pode ser:

- incondicionada: nos crimes que ofendem a estrutura social, o interesse geral, e por isso independe da vontade de quem quer que seja;

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- condicionada: depende de representação do ofendido ou de requisição do ministro da Justiça.

• ação penal privada: nos crimes que afetam a esfera íntima do ofendido A ação penal privada pode ser exclusivamente privada, personalíssima ou subsidiária da pública.

1.6. Ação Penal Pública Incondicionada

O Ministério Público independe de qualquer condição para agir. Quando o artigo de lei nada mencionar, trata-se de ação penal pública incondicionada. É regra no Direito Penal brasileiro.

A ação penal pública tem como titular exclusivo (legitimidade ativa) o Ministério Público (artigo 129, inciso I, da Constituição Federal). Para identificação da matéria incluída no rol de legitimidade exclusiva do Ministério Público, deve-se observar a lei penal. Se o artigo ou as disposições finais do capítulo nada mencionar ou mencionar as expressões “somente se procede mediante representação” ou “somente se procede mediante requisição do ministro da Justiça”, apenas o Órgão Ministerial poderá propor a denúncia (peça inicial de toda a ação penal pública).

Somente o Ministério Público pode oferecer a denúncia (artigo 129, inciso I, da Constituição Federal). Esse princípio extinguiu o chamado procedimento judicialiforme ou ação penal ex officio, também chamado de “jurisdição sem ação” (verificava-se nas contravenções penais - artigo 26 do Código de Processo Penal; nas lesões corporais culposas e no homicídio culposo). Nesses casos, o juiz ou a autoridade policial, por meio de portaria ou pelo auto de prisão em flagrante, iniciava a ação penal (não havia denúncia por parte do Ministério Público).

Vale lembrar que apesar de a matéria constar no rol de legitimidade exclusiva do Ministério Público, se o parquet não oferecer a denúncia no prazo legal, pode o ofendido ou seu representante legal ingressar com ação penal privada subsidiária da pública (artigo 5.º, inciso LIX, da Constituição Federal).

Os princípios que regem a ação penal pública incondicionada são os seguintes:

1.6.1. Princípio da oficialidade

Os órgãos encarregados da persecução penal são públicos. O Estado é titular exclusivo do direito de punir e o faz por meio do devido processo legal. O Ministério Público é titular exclusivo da ação penal pública.

No caso de inércia do Ministério Público, este princípio sofre relativização, pois a vítima pode ingressar com ação penal privada subsidiária.

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1.6.2. Princípio da obrigatoriedade ou legalidade

O Ministério Público tem o dever, e não a faculdade, de ingressar com a ação penal pública, quando concluir que houve um fato típico e ilícito e tiver indícios de sua autoria. O Ministério Público não tem liberdade para apreciar a oportunidade e a conveniência de propor a ação, como ocorre na ação penal privada.

Como o Órgão Ministerial tem o dever de ingressar com a ação penal pública, o pedido de arquivamento deve ser motivado (artigo 28 do Código de Processo Penal).

Devendo denunciar e deixando de fazê-lo, o promotor poderá estar cometendo crime de prevaricação.

Esse princípio foi mitigado com a entrada em vigor da Lei n. 9.099/95 (artigos 74 e 76). No caso de infração de pequeno potencial ofensivo, antes de oferecer a denúncia, o Ministério Público pode oferecer a transação, um acordo com o autor do fato.

Há, ainda, outra exceção ao princípio da obrigatoriedade. A Lei n. 10.409/02 (nova Lei de Tóxicos) introduziu o instituto da revelação eficaz, permitindo ao Ministério Público deixar de propor a ação penal ou requerer a diminuição da pena, ao agente que revelar a existência de organização criminosa, ensejando a prisão de um ou mais de seus membros; viabilizar a apreensão da droga ou que, de qualquer maneira, contribuir para os interesses da Justiça (§ 2.º do artigo 32).

Para esses dois casos vigora o princípio da discricionariedade regrada.

1.6.3. Princípio da indisponibilidade

Depois de proposta a ação, o Ministério Público não pode desistir (artigo 42 do Código de Processo Penal). O artigo 564, inciso III, alínea “d”, do Código de Processo Penal prevê que o Ministério Público deve manifestar-se sobre todos os termos da ação penal pública.

Esse princípio também foi mitigado pela Lei n. 9.099/95 (referente a crimes de menor potencial ofensivo e contravenções penais - artigo 61); o Ministério Público pode propor ao acusado a suspensão condicional do processo, conforme artigo 89.

1.6.4. Princípio da intranscendência

A ação penal não pode passar da pessoa do autor e do partícipe. Somente estes podem ser processados (não pode ser contra os pais ou representante legal do autor ou partícipe).

1.6.5. Princípio da indivisibilidade

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O Ministério Público não pode escolher, dentre os indiciados, qual vai processar. Decorre do princípio da obrigatoriedade.

Esse princípio também é aplicável à ação penal privada (artigo 48 do Código de Processo Penal).

Alguns doutrinadores, no entanto, entendem que à ação penal pública aplica-se o princípio da divisibilidade, pois o Ministério Público pode optar por processar apenas um dos ofensores, optando por coletar maiores evidências para processar posteriormente os demais. Esse também é o entendimento da jurisprudência.

1.6.6. Princípio da oficiosidade

Os encarregados da persecução penal devem agir de ofício, independentemente de provocação, salvo nas hipóteses em que a ação penal pública for condicionada à representação ou à requisição do ministro da justiça.

1.7. Ação Penal Pública Condicionada

Apesar de o Ministério Público ser o titular exclusivo da ação (somente ele pode oferecer a denúncia), depende de certas condições de procedibilidade para ingressar em juízo. Sem estas condições, o Ministério Público não pode oferecer a denúncia.

A condição exigida por lei pode ser a representação do ofendido ou a requisição do ministro da Justiça.

1.7.1. Representação do ofendido

Representação é a manifestação de vontade do ofendido ou de seu representante legal, autorizando o Ministério Público a ingressar com a ação penal respectiva. Sem essa autorização, nem sequer poderá ser instaurado inquérito policial.

Se o artigo ou as disposições finais do capítulo mencionar a expressão “somente se procede mediante representação”, deve o ofendido ou seu representante legal representar ao Ministério Público para que este possa ingressar em juízo. A representação não exige formalidades, deve apenas expressar, de maneira inequívoca, a vontade da vítima de ver seu ofensor processado. Pode ser dirigida ao Ministério Público, ao juiz de Direito ou à autoridade policial (artigo 39 do Código de Processo Penal). Pode ser escrita (regra) ou oral, sendo que, neste caso, deve ser reduzida a termo.

A representação tem natureza jurídica de condição objetiva de procedibilidade. É condição específica da ação penal pública.

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A vítima (ou seu representante legal) tem o prazo de seis meses da data do conhecimento da autoria (e não do crime), ou, no caso do artigo 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia, para apresentar sua representação (artigo 38 do Código de Processo Penal). Tal prazo é contado para oferta da representação e não para o ingresso do Ministério Público com a ação penal, podendo este oferecer a denúncia após os seis meses. Tal prazo não corre contra o menor de 18 anos, ou seja, após completar 18 anos, a vítima terá seis meses para representar ao Ministério Público. Em qualquer caso, tal prazo é decadencial (artigo 107, inciso IV, do Código Penal). Esse prazo não se suspende nem se prorroga (artigo 10 do Código Penal).

A Lei de Imprensa, dispondo de forma diversa, prescreve que o prazo para a representação, nos crimes de ação pública condicionada por ela regulados, é de três meses, contado da data do fato, isto é, da data da publicação ou da transmissão da notícia (Lei n. 5.250/67, artigo 41, § 1.º).

Se a vítima for menor de 18 anos, somente seu representante legal pode oferecer a representação. Se o ofendido for incapaz e não tiver representante legal o juiz nomeará um curador especial que decidirá se representará ou não. Se maior de 18 e menor de 21 anos, tanto ele como seu representante legal têm legitimidade, com prazos independentes (Súmula n. 594 do Supremo Tribunal Federal), podem oferecer a representação e, caso haja conflito entre os interesses de ambos, prevalece a vontade de quem quer representar.

Se houver conflito entre o interesse do ofendido e o do seu representante legal, será nomeado um curador especial que verificará a possibilidade ou não da representação.

No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente, o direito de representação transmite-se ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (enumeração taxativa).

Segundo o artigo 25 do Código de Processo Penal, pode o ofendido retratar-se (ou seja, desistir da representação) até o oferecimento da denúncia. Após o oferecimento da denúncia, a representação será irretratável.

Entendemos que não pode haver retratação da retratação (a pessoa retira a representação e depois a oferece de novo – sempre dentro do prazo decadencial de seis meses). Como bem lembra Tourinho Filho, admitir o contrário “é entregar ao ofendido arma poderosa para fins de vingança ou outros inconfessáveis”. A jurisprudência, no entanto, a nosso ver de forma equivocada, tem admitido este inconveniente procedimento.

A representação não vincula (obriga) o Ministério Público a ingressar com a ação; o Ministério Público só oferecerá a denúncia se vislumbrar a materialidade do crime e os indícios de autoria, senão poderá pedir o arquivamento do inquérito policial.

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A representação é autorização para a persecução penal de um fato e não de pessoas (eficácia objetiva). Assim, a representação contra um suspeito se estenderá aos demais.

1.7.2. Requisição do ministro da Justiça

Requisição é o ato político e discricionário pelo qual o ministro da Justiça autoriza o Ministério Público a propor a ação penal pública nas hipóteses legais.

A doutrina entende que os casos de ação penal pública condicionada à requisição do ministro da Justiça são casos em que a conveniência política em instaurar a persecução penal se sobrepõe ao interesse de punir os delitos.

Se o artigo ou as disposições finais do capítulo mencionar a expressão “somente se procede mediante requisição do Ministro da Justiça”, para que o Ministério Público possa oferecer a denúncia, é necessária tal formalidade. Tem natureza jurídica de condição de procedibilidade e, como a representação, não vincula o Ministério Público a oferecer a denúncia, este pode requerer o arquivamento.

Podemos citar as seguintes hipóteses de requisição:

• crimes contra a honra praticados contra o Presidente da República (artigo 141, inciso I, combinado com o artigo 145, parágrafo único, do Código Penal);

• crime cometido por estrangeiro contra brasileiro, fora do Brasil (artigo 7.º, § 3.º, alínea “b”, do Código Penal);

A requisição é autorização para a persecução penal de um fato e não de pessoas (eficácia objetiva).

O ministro da Justiça não tem prazo para oferecer a requisição, pode fazê-lo a qualquer tempo (não se sujeita aos seis meses de prazo como na representação).

A lei silencia sobre a possibilidade de retratação. Sobre o assunto, a doutrina apresenta duas orientações:

• segundo o Prof. Damásio de Jesus, entre outros, deve-se aplicar a analogia com o instituto da representação (artigo 25 do Código de Processo Penal), sendo, portanto, possível a retratação;

• segundo outra parte da doutrina, a requisição é irretratável, pois o artigo 25 do Código de Processo Penal não prevê tal possibilidade

Ação Penal Privada

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Denúncia e Queixa

1. AÇÃO PENAL PRIVADA

1.1. Conceito

É a ação proposta pelo ofendido ou seu representante legal. O Estado, titular exclusivo do direito de punir (artigo 129, inciso I, da Constituição Federal), por razões de política criminal, outorga ao ofendido o direito de ação. O ofendido, em nome próprio, defende o interesse do Estado na repressão dos delitos.

1.2. Substituição Processual

O Estado é o titular exclusivo do direito de punir. Nas hipóteses de ação penal privada, ele transfere ao particular a iniciativa da ação, mas não o direito de punir. O ofendido, portanto, em nome próprio, defende interesse alheio (legitimação extraordinária). Na ação penal pública, ocorre legitimação ordinária porque é o Estado soberano, por meio do Ministério Público, que movimenta a ação.

1.3. Titular

Se o ofendido for menor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, ou seus interesses colidirem com os deste último, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado para o ato (artigo 33 do Código de Processo Penal). Se maior de 18 e menor de 21 anos, o direito de queixa é titularizado por cada um deles, independentemente, conforme a Súmula 594 do Supremo Tribunal Federal. Se maior de 21 anos, a queixa será exercida apenas pelo ofendido, excluindo-se a figura do representante legal, salvo, é claro, se mentalmente incapaz.

No caso de morte do ofendido, ou de declaração de ausência, o direito de queixa, ou de dar prosseguimento à acusação, passa a seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (artigo 31). Exercida a queixa pela primeira delas, as demais se acham impedidas de fazê-lo, só podendo assumir a ação no caso de abandono pelo querelante, desde que o façam no prazo de sessenta dias, observada a preferência do artigo 36 do Código de Processo Penal, sob pena de perempção (artigo 60, inciso II). A doutrina considera esse rol taxativo e preferencial.

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No caso de ação penal privada personalíssima, o direito de ação é intransferível.

1.4. Espécies de Ação Penal Privada

• Ação penal exclusivamente privada: é aquela proposta pelo ofendido ou seu representante legal, que permite, no caso de morte do ofendido, a transferência do direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação ao cônjuge, ao ascendente, ao descendente ou ao irmão (artigo 31 do Código de Processo Penal).

• Ação penal privada personalíssima: é aquela que só pode ser promovida única e exclusivamente pelo ofendido. Exemplo: adultério (artigo 240 do Código Penal), induzimento a erro essencial (artigo 236, parágrafo único, do Código Penal). Assim, falecendo o ofendido, nada há que se fazer a não ser aguardar a extinção da punibilidade do agente.

• Ação penal privada subsidiária da pública: aquela proposta pelo ofendido ou por seu representante legal na hipótese de inércia do Ministério Público em oferecer a denúncia. Conforme entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal, a ação subsidiária não tem lugar na hipótese de arquivamento de inquérito policial.

1.5. Prazo

Em regra, o prazo para o oferecimento da queixa é de seis meses a contar do conhecimento da autoria. Tratando-se de ação penal privada subsidiária, o prazo será de seis meses a contar do encerramento do prazo para o Ministério Público oferecer a denúncia. É um prazo decadencial, pois seu decurso leva à extinção do direito de queixa. A decadência não extingue o direito de punir (o que leva tal direito à extinção é a prescrição). A decadência extingue o direito de ação (queixa) e o direito de representação (nas ações públicas condicionadas).

Trata-se de prazo de direito material contado de acordo com o artigo 10 do Código Penal, computando-se o dia do começo e excluindo-se o do final; não se prorroga se terminar no domingo ou feriado. Interrompe-se com o oferecimento da queixa, e não com o seu recebimento. O recebimento interrompe a prescrição.

A decadência do direito de queixa subsidiária não extingue a punibilidade, só extingue o direito de ação, portanto, o Ministério Público pode oferecer a denúncia a qualquer tempo, mesmo após os seis meses.

1.6. Princípios da Ação Penal Privada

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1.6.1. Princípio da conveniência ou oportunidade

O ofendido tem a faculdade, não o dever de propor a ação penal.

1.6.2. Princípio da disponibilidade

O ofendido pode desistir ou abandonar a ação penal privada até o trânsito em julgado da sentença condenatória, por meio do perdão ou da perempção (artigos 51 e 60 do Código de Processo Penal, respectivamente). A desistência com a aceitação do ofendido equivale ao perdão.

1.6.3. Princípio da indivisibilidade

O ofendido é obrigado a incluir na queixa todos os ofensores. Não é obrigado a apresentar a queixa, mas, se o fizer, é obrigado a interpor contra todos (artigo 48 do Código de Processo Penal). A exclusão voluntária na queixa-crime de algum ofensor acarreta a rejeição da peça inicial em face da ocorrência da renúncia tácita no tocante ao não incluído – esta causa extintiva da punibilidade comunica-se aos demais querelados (artigo 49 do Código de Processo Penal).

O Ministério Público não pode aditar a queixa para nela incluir os outros ofensores, porque estaria invadindo a legitimação do ofendido. Para Tourinho Filho, entretanto, o aditamento é possível com base no artigo 46, § 2.º, do Código de Processo Penal. Mirabete entende que no caso de não-inclusão involuntária de ofensor na queixa-crime (por desconhecimento da identidade do co-autor, por exemplo), o Ministério Público deve fazer o aditamento, nos termos do artigo 45 do Código de Processo Penal.

1.6.4. Princípio da intranscendênciaTrata-se de princípio constitucional que impõe que a ação penal só pode ser

ajuizada contra o autor do fato e nunca contra os seus sucessores.

2. DENÚNCIA E QUEIXA

2.1. Requisitos da Denúncia (artigo 41 do Código de Processo Penal)

• Endereçamento: o endereçamento equivocado caracteriza mera irregularidade, 44

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sanável com a remessa dos autos ao juiz competente.

• Descrição completa dos fatos em todas as circunstâncias: no processo penal, o réu defende-se dos fatos a ele imputados, sendo irrelevante a classificação jurídica destes. O que limita a sentença são os fatos; sua narração incompleta acarreta a nulidade da denúncia, se a deficiência inviabilizar o exercício do direito de defesa. A omissão de alguma circunstância acidental não invalida a queixa ou a denúncia, podendo ser suprida até a sentença (artigo 569 do Código de Processo Penal). Na hipótese de concurso de agentes (co-autoria e participação), sempre que possível, é necessária a descrição da conduta de cada um. A jurisprudência já abriu exceções para não inviabilizar a persecução penal, como nos seguintes casos:

− crimes de autoria coletiva (praticados por multidão);

− delitos societários (diretores se escondem atrás da pessoa jurídica).

• Classificação jurídica dos fatos: a correta classificação do fato imputado não é requisito essencial da denúncia, pois não vincula o juiz que pode dar aos fatos definição jurídica diversa. O réu se defende dos fatos e não da acusação jurídica (juria novit curia – o juiz conhece o direito).

O juiz não pode, ao receber a denúncia, dar uma classificação jurídica diversa da contida na exordial porque a fase correta para isso é a sentença (artigo 383 do Código de Processo Penal); o recebimento é uma decisão de mera prelibação, sem o exame aprofundado da prova; não há ainda prova produzida pelo crivo do contraditório.

• Qualificação do denunciado: individualização do acusado. Não havendo dados para a qualificação do acusado, a denúncia deverá fornecer seus dados físicos (traços característicos), desde que possível.

• Rol de testemunhas: a denúncia é o momento oportuno para o arrolamento das testemunhas, sob pena de preclusão. Perdida a oportunidade, o rol poderá ser apresentado aguardando-se que o juiz proceda à oitiva considerando as testemunhas como suas.

• Pedido de condenação: não se exige fórmula sacramental (“peço a condenação”), basta que fique implícito o pedido. A falta acarreta mera irregularidade.

• Nome, cargo e posição funcional do denunciante: só haverá nulidade quando essa falta inviabilizar por completo a identificação da autoria da denúncia.

• Assinatura: a falta não invalida a peça se não houver dúvidas quanto a sua autenticidade.

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Denúncia alternativa é a descrição alternativa de fatos, de maneira que, não comprovado o primeiro fato, pede-se a condenação do segundo subsidiariamente (princípio da eventualidade). A denúncia alternativa é inepta, pois inviabiliza o direito de defesa. Segundo a Súmula n. 1 das mesas de Processo Penal da Universidade de São Paulo, a denúncia alternativa não deve ser aceita.

2.2. Requisitos da queixa

São os mesmos requisitos da denúncia, acrescida a formalidade do artigo 44 do Código de Processo Penal. Na procuração, devem constar os poderes especiais do procurador, o fato criminoso e o nome do querelado. A finalidade de a procuração outorgada pelo querelante conter o nome do querelado e a descrição do fato criminoso é a de fixar eventual responsabilidade por denunciação caluniosa no exercício do direito de queixa. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a assinatura do querelante na queixa, em conjunto com seu advogado, isentará o procurador de responsabilidade por eventual imputação abusiva, não sendo, nessa hipótese, necessária procuração.

2.3. Omissões

Podem ser suprimidas até a sentença (artigo 569 do Código de Processo Penal).

2.4. Prazo para a Denúncia (artigo 46 do Código de Processo Penal)

O prazo é de 15 dias se o indiciado estiver solto. Se estiver preso, o prazo é de 5 dias. O excesso de prazo não invalida a denúncia, podendo provocar o relaxamento da prisão.

Prazos especiais:

• crime eleitoral: 10 dias;

• crime contra a economia popular: 2 dias;

• abuso de autoridade: 48 horas;

• crime previsto na lei de tóxico: 3 dias (salvo no caso dos crimes definidos nos artigos 12, 13 e 14, em que o prazo será de 6 dias)

2.5. Prazo para a Queixa (artigo 38 do Código de Processo Penal)

Seis meses, contados do dia em que o ofendido vier a saber quem é o autor do 46

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crime. No caso de ação penal privada subsidiária, o prazo será de seis meses, a contar do esgotamento do prazo para o oferecimento da denúncia.

2.6. Aditamento da Queixa

O Ministério Público pode aditar a queixa para nela incluir circunstâncias que possam influir na caracterização do crime e na sua classificação, ou ainda na fixação da pena (artigo 45 do Código de Processo Penal).

O Ministério Público não poderá incluir na queixa outros ofensores se o querelante optou por não processar os demais, pois estaria invadindo a legitimidade do ofendido. Nesse caso, de não inclusão injustificada, há renúncia tácita do direito de queixa e conseqüente extinção da punibilidade dos que não foram processados, que se estende aos querelados, por força do princípio da indivisibilidade (artigo 48 do Código de Processo Penal). No caso de não inclusão justificada (desconhecimento da identidade do co-autor, por exemplo), não se trata de renúncia tácita. Tão logo se obtenham os dados identificadores necessários, o ofendido deverá aditar a queixa incluindo o indigitado, sob pena de, agora sim, incorrer em renúncia tácita extensiva a todos.

O prazo para aditamento da queixa pelo Ministério Público é de três dias, a contar do recebimento dos autos pelo órgão ministerial. Aditando ou não a queixa, o Ministério Público deverá intervir em todos os termos do processo, sob pena de nulidade.

Tratando-se de ação penal privada subsidiária da pública, o Ministério Público poderá, além de aditar a queixa, repudiá-la, oferecendo denúncia substitutiva (artigo 29 do Código de Processo Penal).

2.7. Causas de Rejeição da Denúncia ou Queixa

2.7.1. Quando o fato narrado evidentemente não constituir crime

O juiz rejeitará a denúncia quando concluir que o fato narrado é atípico ou que está acobertado por causa de exclusão de ilicitude, porque falta uma condição da ação – uma verdadeira impossibilidade jurídica do pedido. O artigo 43, inciso I, do Código de Processo Penal faz coisa julgada material (não pode ser oferecida a denúncia novamente).

2.7.2. Quando já estiver extinta a punibilidade do agente

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Falta uma condição da ação, que é o interesse de agir. Faz coisa julgada material (artigo 43, inciso II, do Código de Processo Penal).

2.7.3. Ilegitimidade de parte

Quando se verifica impertinência subjetiva da ação (artigo 43, inciso III, do Código de Processo Penal). Ocorre, por exemplo, quando o Ministério Público oferece queixa em ação privada. Haverá também ilegitimidade quando um menor de 18 anos ingressar com a queixa em uma ação privada. Nesse caso, opera-se a chamada ilegitimidade ad processum (incapacidade processual).

2.7.4. Quando faltar condição de procedibilidade

Exemplo: apresentar a denúncia sem representação quando esta for exigida por lei (artigo 43, inciso III, 2.ª parte, do Código de Processo Penal).

2.7.5. Quando faltar justa causa para a denúncia

É preciso um mínimo de lastro da existência do crime ou sua autoria (artigo 648, inciso I, do Código de Processo Penal).

2.8. Renúncia

É a abdicação do direito de oferecer queixa ou representação. Só é possível renunciar a uma ação penal privada ou a uma ação penal pública condicionada, tendo em vista que o Ministério Público jamais pode renunciar a qualquer ação pública.

A renúncia é unilateral, ou seja, não depende da aceitação do agente, sendo causa extintiva da punibilidade. A renúncia, no entanto, é extraprocessual, só poderá existir antes da propositura da ação.

Existem duas formas de renúncia:

• expressa: quando houver uma declaração assinada pela vítima;

• tácita: quando a vítima praticar ato incompatível com a vontade de processar (exemplo: o casamento da vítima com o agressor).

A renúncia concedida a um réu estende-se a todos, ou seja, quando houver vários

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réus, a renúncia com relação a um deles implica, obrigatoriamente, renuncia a todos.

No caso de dupla titularidade para propositura da ação, a renúncia de um titular não impede a propositura da ação pelo outro.

Não se deve confundir renúncia com desistência, tendo em vista que aquela ocorre antes da propositura da ação e esta depois da propositura da ação. A única situação de desistência da ação está prevista no artigo 522 do Código de Processo Penal.

Pergunta: A aceitação por parte da vítima da indenização civil gera renúncia?

Resposta: Não, por expressa previsão do artigo 104, parágrafo único, do Código Penal. No caso de infração penal de menor potencial ofensivo, contudo, a homologação judicial do acordo civil, realizada na audiência preliminar, implica renúncia ao direito de queixa ou representação (artigo 74, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95).

2.9. Perdão do Ofendido

É possível somente na ação penal privada, tendo em vista que o Ministério Público não pode perdoar o ofendido. O perdão aceito obsta o prosseguimento da ação, causando a extinção da punibilidade. Verifica-se o perdão após o início da ação, pois, tecnicamente, o perdão antes da ação configura renúncia. Admite-se o perdão até o trânsito em julgado final.

Existem duas formas de perdão:

• expresso: quando houver uma declaração assinada pelo querelante;

• tácito: quando o querelante praticar ato incompatível com a vontade de processar.

O perdão é bilateral, depende sempre da aceitação do querelado. Caso não haja aceitação, o processo prosseguirá. A lei assegura ao querelado o direito de provar sua inocência. A aceitação do querelado poderá ser:

• expressa: quando houver uma declaração assinada;

• tácita: se não se manifestar em três dias.

O perdão concedido a um co-réu estende-se a todos, entretanto, se algum dos co-réus não o aceitar, o processo seguirá somente para ele. A doutrina entende que é possível o perdão parcial, como, por exemplo, perdoar por um crime e não perdoar por outro (a lei é omissa a esse respeito).

Se a vítima for maior de 18 e menor de 21 anos (caso em que há dupla titularidade), o perdão concedido por um titular, havendo oposição do outro, não

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produzirá efeitos e o processo prosseguirá. Assim, prevalece a vontade de quem não quer perdoar (artigo 52).

No caso de o querelado ser menor de 21 anos, a aceitação só produz efeitos se houver concordância do seu representante legal (artigo 54 do Código de Processo Penal). Assim, prevalece a vontade de quem não quer aceitar.

2.10. Perempção

Significa a “morte” da ação penal privada em razão da negligência do querelante.

São hipóteses de perempção (artigo 60 do Código de Processo Penal):

• quando o querelante deixa de promover o andamento do processo por 30 dias seguidos, a perempção é automática;

• quando morre o querelante ou torna-se incapaz e nenhum sucessor aparece para dar prosseguimento à ação, em 60 dias;

• quando o querelante deixa de comparecer a ato em que deveria pessoalmente estar presente;

• quando o querelante deixa de pedir a condenação do querelado nas alegações finais;

• quando o querelante é pessoa jurídica que se extingue sem deixar sucessor;

• quando morre o querelante na ação penal privada personalíssima.

Ação Civil “Ex Delicto”

1. AÇÃO CIVIL “EX DELICTO”

Um dos efeitos da sentença penal condenatória é tornar certa a obrigação de reparar o dano causado pelo crime (artigo 91, inciso I, do Código Penal). Assim, a condenação penal imutável faz coisa julgada no cível, para efeito de reparação do dano ex delicto, impedindo que o autor do fato renove, nessa instância, a discussão do que foi

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decidido no crime. Trata-se de efeito genérico que não precisa ser declarado na sentença penal.

O Código de Processo Penal, seguindo o Estatuto Penal, em seu artigo 63, assegura ao ofendido, ao representante legal ou aos herdeiros daquele, o direito de executar no cível a sentença penal condenatória transitada em julgado.

A sentença penal condenatória transitada em julgado funciona como título executivo judicial no juízo cível, possibilitando ao ofendido obter a reparação do prejuízo sem a necessidade de propor ação civil de conhecimento. Com o trânsito em julgado, basta promover a liquidação do dano, para, em seguida, ingressar com a ação de execução civil.

Como a responsabilidade civil é independente da penal, é possível o desenvolvimento paralelo e independente de uma ação penal e uma ação civil sobre o mesmo fato. Assim, se o ofendido ou seus herdeiros desejarem, não necessitarão aguardar o término da ação penal, podendo ingressar, desde logo, com a ação civil reparatória.

Trata-se da ação civil ex delicto, que pode ser proposta pelo ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros, em razão da ocorrência de um delito. Está disposta nos artigos 63 a 67 do Código de Processo Penal. É proposta no juízo cível contra o autor do crime ou seu responsável civil.

Observação: a coisa julgada produzida no cível pela condenação penal não abrange o responsável civil, sob pena de violação a princípios constitucionais, tais como o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Com o trânsito em julgado da ação penal condenatória, torna-se prejudicado o julgamento da ação civil.

Dispõe o parágrafo único do artigo 64 do Código de Processo Penal, in verbis: “Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela”.

Se a ação penal, portanto, ainda estiver em curso, a vítima poderá entrar com a ação civil no juízo cível para requerer a indenização. Como poderá ocorrer, no entanto, o conflito de decisões, o juiz da ação civil poderá suspender o curso dessa ação até julgamento final da ação penal.

Nem sempre a absolvição do réu no juízo criminal impedirá a actio civilis ex delicto. Em regra, esta só não poderá ser proposta quando tiver sido categoricamente reconhecida a inexistência material do fato.

Assim, não impedirão a propositura da ação civil:

• o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;

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• a decisão que julgar extinta a punibilidade;

• a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime;

• a sentença absolutória por insuficiência de provas;

• a sentença absolutória em face de causa excludente de culpabilidade.

Não caberá, entretanto, a ação civil reparatória:

• quando o juiz criminal reconhecer a inexistência do fato;

• quando o juiz criminal reconhecer que o sujeito não participou do fato;

• quando o juiz criminal reconhecer uma causa excludente da ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, exercício regular de direito ou estrito cumprimento do dever legal). Essas causas excluem a ilicitude penal e civil. Há, entretanto, duas exceções: no estado de necessidade agressivo, no qual o agente sacrifica bem de terceiro inocente, este pode acioná-lo civilmente, restando ao causador do dano a ação regressiva contra quem provocou a situação de perigo (artigos 929 e 930 do Código Civil de 2002); na hipótese de legítima defesa, na qual, por erro na execução, vem a ser atingido terceiro inocente, este terá direito à indenização contra quem o atingiu, ainda que este último estivesse em situação de legítima defesa, restando-lhe apenas a ação regressiva contra seu agressor (parágrafo único do artigo 930 c/c o artigo 188, inciso I, do novo Código Civil).

1.2. Execução Civil

A sentença penal condenatória, com trânsito em julgado, poderá ser executada no juízo cível, mas como o juiz criminal não fixa o quantum, é necessário que se faça a liquidação da sentença.

A ação civil de conhecimento, ou a executória, precedida da necessária ação de liquidação, devem ser propostas perante o juízo cível.

O autor da ação cível tem o privilégio de escolher um dos foros especiais, previstos no artigo 100, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Esse dispositivo, na verdade, coloca três opções de foro à disposição da vítima de delito ou de dano sofrido em acidente de veículos: o do seu domicílio, o do local do fato, e, regra geral, o do domicílio do réu.

Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (artigo 32, §§ 1.º e 2.º, do Código de Processo Penal), a execução da sentença condenatória (artigo 63 do Código

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de Processo Penal) ou a ação civil (artigo 64 do Código de Processo Penal) será promovida, a seu requerimento, pelo Ministério Público, nos termos do artigo 68 do Código de Processo Penal.

Jurisdição e Competência

1. JURISDIÇÃO

1.1. Conceito

Jurisdição é a função estatal exercida pelo Poder Judiciário, consistente na aplicação de normas da ordem jurídica a um caso concreto, com a conseqüente solução do litígio. É o poder de julgar um caso concreto, de acordo com o ordenamento jurídico, por meio do processo.

1.2. Princípios

• Juiz natural: ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, que é aquela cujo poder jurisdicional vem fixado em regras predeterminadas (artigo 5.º, inciso LIII, da Constituição Federal); do mesmo modo, não haverá juízo ou tribunal de exceção (artigo 5.º, inciso XXXVII, da Constituição Federal).

• Devido processo legal: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (artigo 5.º, inciso LIV, da Constituição Federal).

• Inércia: a jurisdição não age de ofício; depende de provocação das partes, pois, caso contrário, sua imparcialidade ficaria abalada; ne procedat iudex ex oficio.

• Indelegabilidade: a jurisdição não pode ser delegada a nenhum outro órgão. O Poder Judiciário é um Poder Constituído que recebeu sua função do Poder Constituinte. Não se pode delegar o que se recebeu por delegação; dellegatur dellegare non potest.

• Investidura: apenas aquele legalmente investido no exercício da função jurisdicional é que pode exercê-la.

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• Improrrogabilidade: um juiz não pode invadir a competência de outro, mesmo com concordância das partes. Apenas, excepcionalmente, admite-se a prorrogação da competência.

• Inevitabilidade: consiste na sujeição do réu ao processo e na sujeição de ambas as partes à decisão.

• Indeclinabilidade da prestação jurisdicional: nenhum juiz pode subtrair-se do exercício da função jurisdicional nem o legislador pode produzir leis restringindo o acesso ao Poder Judiciário (artigo 5.º, inciso XXXV, da Constituição Federal).

• Correlação: a sentença deve corresponder ao pedido. Não pode haver julgamento extra ou ultra petita.

• Aderência ao território: a jurisdição é reflexo do poder soberano do Estado; atua dentro do território nacional. Para a jurisdição atuar em outro país é preciso que este outro país a aceite. Exemplo: carta rogatória.

2. COMPETÊNCIA

2.1. Conceito de Competência

Competência é a delimitação do poder jurisdicional (fixa os limites dentro dos quais o juiz pode prestar a jurisdição). Aponta quais os casos que podem ser julgados pelo órgão do Poder Judiciário. É, portanto, uma verdadeira medida da extensão do poder de julgar.

2.2. Critérios de Fixação

O artigo 69 do Código de Processo Penal estabelece os critérios de competência. São eles:

I – o lugar da infração;

II – o domicílio ou residência do réu;

Observação: Os dois primeiros incisos determinam a competência territorial ou foro competente.

III – a natureza da infração;

IV – a distribuição;54

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V – a conexão ou continência;

VI – a prevenção;

VII – a prerrogativa de função.

Observação: a conexão e a continência não são critérios de fixação de competência, são critérios de modificação de competência.

3. COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO LOCAL DA INFRAÇÃO

3.1. Foro

Foro é o território dentro do qual determinado órgão judicial exerce sua parcela de jurisdição.

Foro da Justiça Estadual:

• 1.ª instância – comarca

• 2.ª instância – Estado

Foro da Justiça Federal:

• 1.ª instância – seção judiciária

• 2.ª instância – Região

3.2. Teorias Adotadas

“A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução” (artigo 70 do Código de Processo Penal).

Atenção! Não confundir:

• No caso de um crime ser praticado em território nacional e o resultado ser produzido no estrangeiro (crimes a distância ou de espaço máximo), aplica-se a teoria da ubiqüidade, prevista no artigo 6.º do Código Penal: o foro

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competente será tanto o do lugar em que ocorreu a ação ou omissão, quanto o do local onde se produziu ou deveria se produzir o resultado.

• No caso da conduta e do resultado ocorrerem dentro do território nacional, mas em locais diferentes (delito plurilocal) aplica-se a teoria do resultado prevista no artigo 70 do Código de Processo Penal: a competência será determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução.

• No caso dos crimes de menor potencial ofensivo, sujeitos ao procedimento da Lei n. 9.099/95, adotou-se a teoria da atividade. Esta é a redação do artigo 63 da lei: “A competência do Juizado será determinada pelo lugar em que foi praticada a infração penal”. Assim, entendemos que a infração é praticada no local da ação ou omissão. Esse é o entendimento da Profª. Ada Pellegrini Grinover. Há na doutrina, entretanto, pensamento diverso: para o Prof. Mirabete, o foro competente será o local da ação ou do resultado (teoria da ubiqüidade); para o Prof. Tourinho, o foro competente será o local do resultado (teoria do resultado).

3.3. Regras Especiais

a) Fraude no pagamento por meio de cheque (artigo 171, § 2.º, inciso VI, do Código Penal)

Trata-se do crime de estelionato, sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos. O crime se consuma quando o banco sacado recusa o pagamento. O foro competente será o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado. Esse é o entendimento consubstanciado nas Súmulas n. 521 do Supremo Tribunal Federal e n. 244 do Superior Tribunal de Justiça.

b) Estelionato cometido mediante falsificação de cheque

O foro competente é o local da obtenção da vantagem ilícita, conforme entendimento da Súmula n. 48 do Superior Tribunal de Justiça. Exemplo: Adonilza encontra uma folha de cheque na rua, vai até uma loja e faz uma compra, fazendo-se passar por titular do cheque. O lojista enganado entrega a mercadoria. O foro competente é o local da loja.

c) Homicídio

No homicídio, quando a morte é produzida em local diverso daquele em que foi realizada a conduta, a jurisprudência entende que o foro competente é o da ação ou omissão, e não o do resultado (Superior Tribunal de Justiça, 5.ª T., RHC 793, DJU, 5 nov. 1990, p. 12435). Esta posição é majoritária na jurisprudência, e tem por fundamento a maior facilidade que as partes têm de produzir provas no local em que ocorreu a

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conduta. Contudo, ela é contrária à letra expressa da lei, que dispõe competente o foro do local do resultado.

d) Crime de falso testemunho praticado mediante precatória

A jurisprudência entende que o foro competente será o juízo deprecado. Assim, o local onde ocorreu a oitiva da testemunha será o competente.

e) Crime permanente

Crime permanente é aquele cuja consumação se prolonga no tempo. Exemplo: um empresário seqüestrado em São Paulo é levado para cativeiro em Campinas; depois o cativeiro é mudado para Americana. A consumação desse crime ocorreu em todos esse lugares. A competência, nesse caso, fixa-se pela prevenção (artigo 71 do Código de Processo Penal).

f) Crime que se consuma na divisa entre duas comarcas

A competência será firmada pela prevenção (artigo 70, § 3.º, do Código de Processo Penal).

g) Crime a distância (ou de espaço máximo)

É aquele cujo iter criminis envolve o território de dois ou mais países.

• Se a execução se inicia no Brasil, será competente o local do último ato executório no território nacional.

• Se a execução se inicia no exterior, será competente o local em que ocorreu ou deveria ocorrer a consumação em território nacional. Exemplo: terrorista envia carta-bomba da Argentina para explodir em São Paulo, sendo que a explosão não vem a acontecer. O foro competente para propor a ação será São Paulo.

h) Crime praticado no exterior

Crime cometido por brasileiro no exterior. A execução e a consumação do crime ocorreram no exterior, entretanto, será julgado pelas leis brasileiras em razão da extraterritorialidade da lei penal. O foro competente para julgar o acusado será o da capital do Estado do seu último domicílio. Se o réu nunca teve domicílio no Brasil, será competente o juízo do Distrito Federal (artigo 88 do Código de Processo Penal).

i) Crime praticado a bordo de embarcação

O foro competente será o local do porto nacional onde ocorreu o primeiro atracamento após o crime ou o porto de onde a embarcação saiu do Brasil para o exterior. Para os crimes cometidos a bordo de aeronave, utiliza-se a mesma regra: o foro competente será o local do aeroporto onde ocorreu o primeiro pouso após o crime ou o aeroporto de onde decolou a aeronave antes do crime.

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Observação: “Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar” (§ 1.º do artigo 5.º do Código Penal).

3.4. Domicílio ou Residência – Critério Subsidiário

Conforme o artigo 72 do Código de Processo Penal, não sendo conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo domicílio ou residência do réu.

Exemplo: uma passageira de um ônibus que fazia o percurso São Paulo/Bahia, ao desembarcar, percebe que teve sua carteira furtada. O ônibus esteve o tempo todo em trânsito, não havendo como precisar o local da infração. A ação será proposta no local do domicílio ou residência do réu. Se o réu tiver mais de um domicílio, conforme o artigo 72, § 1.º, do Código de Processo Penal, a competência firmar-se-á pela prevenção. Caso o réu não tenha domicílio certo, ou seja ignorado seu paradeiro, será competente o juiz que primeiro tomou conhecimento do fato.

Na ação penal privada, o ofendido poderá preferir o foro do domicílio ou residência do réu, mesmo quando conhecido o lugar da infração. O critério é optativo, de acordo com o artigo 73 do Código de Processo Penal.

4. COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA

Conforme a natureza da infração, a ação será julgada por uma determinada justiça competente.

Organização da Justiça Penal:

• Comum – Federal e Estadual (a Justiça Estadual também é conhecida como residual; sua competência compreende o que não for da competência das Justiças Eleitoral, Militar e Federal).

• Especial – Eleitoral (artigo 121 da Constituição Federal/88) e Militar (artigo 124 da Constituição Federal/88).

4.1. Justiça Eleitoral

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É estruturada em três níveis:

• Tribunal Superior Eleitoral (Brasília)

• Tribunal Regional Eleitoral (capital do Estado)

• Juiz Eleitoral (Juízes de Direito da Justiça Estadual)

Tem competência para julgar:

• crimes eleitorais definidos no Código Eleitoral;

• crimes eleitorais previstos nas leis extravagantes.

4.2. Justiça Militar

a) Justiça Militar Federal

• Superior Tribunal Militar (Brasília – 2.ª instância)

• Auditorias Militares compostas por um juiz togado e quatro oficiais (1.ª instância).

b) Justiça Militar Estadual

• Tribunal de Justiça Militar ou Tribunal de Justiça (para os Estados que não possuem TJM – 2.ª instância)

• Auditorias Militares compostas por um juiz togado e quatro oficiais (1.ª instância).

Serão Julgados pela Justiça Militar Federal:

• Integrantes das forças armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) que pratiquem crime definido como militar.

• Civil que pratique crime contra instituição militar federal. Observação: assim dispõe a Súmula n. 53 do Superior Tribunal de Justiça: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar civil acusado de prática de crime contra instituições militares estaduais”. Assim, se o civil cometer crime contra instituição militar federal, será julgado pela justiça militar federal; se o civil cometer crime contra instituição militar estadual, será julgado pela justiça comum estadual.

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Serão julgados pela Justiça Militar Estadual (artigo 125, § 4.º, da Constituição Federal/88):

• policiais militares e bombeiros militares, nos crimes definidos em lei como militares.

Crimes Militares:

• Propriamente militar ou próprio: são aqueles definidos no Código Penal Militar (Decreto-lei n. 1.001/69), sem equivalente na justiça penal comum. Exemplo: motim, dormir em serviço, deserção, insubordinação.

• Impropriamente militar ou impróprio: são aqueles crimes definidos na legislação militar com equivalente na lei penal comum. Exemplo: lesões corporais.

Os crimes militares próprios são julgados pela justiça militar. Com relação aos crimes militares impróprios, o Código Penal Militar estabelece em seu artigo 9.º, inciso II, as situações em que o crime é praticado em situação de serviço. Nesse caso, ou seja, se o crime for praticado pelo militar em serviço, será crime militar. Se o militar não estiver em serviço, será julgado pela justiça comum.

Se o militar em serviço pratica crime não definido no Código Penal Militar, será julgado pela Justiça Comum. Exemplo: crime de abuso de autoridade – Lei n. 4.898/65.

A Lei n. 9.299/96 alterou algumas regras do Código Penal Militar e do Código de Processo Penal Militar. Alguns crimes que eram da Justiça Militar passaram para a competência da Justiça Comum:

• crimes praticados por militar fora do serviço com arma da corporação;

• crimes dolosos contra a vida praticados por militar contra civil, mesmo em situação de serviço, também passaram a ser da competência da Justiça Comum, julgados pelo Tribunal do Júri.

Atenção para as seguintes súmulas do Superior Tribunal de Justiça:

Súmula n. 6 do Superior Tribunal de Justiça: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar delito decorrente de acidentes de trânsito envolvendo viatura militar, salvo se autor e vítima forem policiais militares em situação de atividade”.

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Súmula n. 75 do Superior Tribunal de Justiça: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar o policial militar acusado de facilitação de fuga de preso em estabelecimento penitenciário”.

Súmula n. 78 do Superior Tribunal de Justiça: “O policial militar será julgado pela Justiça Militar Estadual de seu Estado, ainda que o crime seja praticado em outro Estado”.

Súmula n. 172 do Superior Tribunal de Justiça: “Compete à Justiça Comum processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade, ainda que praticado em serviço”.

4.3. Justiça Comum Federal

O artigo 109 da Constituição Federal estabelece os crimes de competência da Justiça Federal:

a) Crimes políticos

A lei não define o que é crime político. Os doutrinadores estabelecem dois critérios:

• subjetivo: leva em conta a finalidade, que deve ser política;

• objetivo: leva em conta o bem jurídico violado (crimes que violem o Regime Democrático ou praticado contra as Instituições Políticas); crimes enquadrados na Lei de Segurança Nacional.

b) Crimes praticados em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas autarquias ou empresas públicas

Crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função, são julgados pela Justiça Federal, conforme a Súmula n. 147 do Superior Tribunal de Justiça. Também são de competência da Justiça Federal os crimes praticados por servidor público federal no exercício de suas funções.

Conforme a Súmula n. 38 do Superior Tribunal de Justiça, as contravenções praticadas em detrimento de bens ou interesses da União serão julgadas pela Justiça Comum Estadual.

São de competência da Justiça Comum Estadual os crimes praticados contra sociedade de economia mista (Súmula n. 42 do Superior Tribunal de Justiça).

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São de competência da Justiça Comum Estadual os crimes praticados por indígena ou contra ele (Súmula n. 140 do Superior Tribunal de Justiça).

c) Crimes a Distância previstos em tratado ou convenção internacional

A exemplo dos crimes de tráfico internacional de entorpecentes, tráfico internacional de crianças e tráfico internacional de mulheres.

d) Crimes praticados a bordo de navio ou aeronave, ressalvada a competência da Justiça Militar

As embarcações de pequeno porte são de competência da Justiça Comum Estadual.

e) Crimes contra a organização do trabalho

Trata-se de crimes contra a organização coletiva do trabalho.

f) Crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro

Fatos definidos no Estatuto do Estrangeiro (Lei n. 6.815/80).

4.4. Justiça Comum Estadual

Tem competência residual. Sua competência é encontrada por exclusão. Assim, se o crime não for militar, eleitoral e não estiver inserido na competência da Justiça Comum Federal, será julgado pela Justiça Comum Estadual.

Jurisdição e Competência

1. COMPETÊNCIA PELA PRERROGATIVA DE FUNÇÃO

O foro por prerrogativa de função não é privilégio pessoal, mas sim garantia inerente a cargo ou função. A razão do legislador, ao atribuir o julgamento a um órgão colegiado, é evitar que um juiz monocrático pudesse ceder a eventuais pressões, comprometendo sua imparcialidade. Assim, trata-se de uma garantia à sociedade, pois o que se busca é a imparcialidade do julgador.

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A Lei n. 8.038/90 dispõe sobre o procedimento para os processos perante o Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.

Antes de receber a denúncia ou a queixa, o Tribunal deve notificar a autoridade para apresentar, em 15 dias, a defesa preliminar. É oportunidade de defesa para a autoridade. O Tribunal pode, além de receber ou rejeitar a inicial, julgar improcedente a acusação. Não é possível interposição de recurso visando ao reexame de prova.

Fases do procedimento no Tribunal: 1) oferecimento da denúncia ou queixa; 2) defesa preliminar; 3) recebimento da denúncia ou queixa, com fundamentação; 4) citação; 5) interrogatório; 6) depoimento; 7) audiência de instrução; 8) diligências; 9) alegações finais; 10) sentença.

Se a infração for cometida:

• Por quem tem prerrogativa de função (exemplo: prefeito) e uma pessoa sem prerrogativa, ambos serão julgados pelo Tribunal de Justiça, pela continência.

• Por duas pessoas que têm prerrogativa de função, por exemplo, prefeito (Tribunal de Justiça) e senador (Supremo Tribunal Federal). São competências fixadas pela Constituição Federal/88, não podendo ser reunidas para o julgamento em conjunto, pois a continência prevista no Código de Processo Penal é infraconstitucional; ocorrerá, portanto, a disjunção.

A competência para oferecer a denúncia é do Procurador-Geral da República (PGR), quando for competente o Supremo Tribunal Federal, e do Procurador-Geral da Justiça (PGJ), quando for competente o Tribunal de Justiça.

Se um deputado estadual comete crime doloso contra a vida, a quem competirá o julgamento?

Há duas posições.

Para uma primeira corrente, o deputado estadual deverá ser julgado pelo júri popular, ante a falta de previsão expressa de foro especial na Lei Maior, a qual manda aplicar-lhe apenas suas regras “sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas” (artigo 27, § 1.º). É certo que nada impede venham as constituições estaduais a adotar o foro especial, mas, não o tendo feito a Carta Federal, esta competência não poderia prevalecer sobre a constitucional do Júri (artigo 5.º, inciso XXXVIII, alínea d).

O entendimento que nos parece mais correto, no entanto, é o de que, tendo a Carta Magna estabelecido foro especial para os membros do Poder Legislativo da União, os Estados, ao repetir em suas constituições idêntica garantia para seus parlamentares, estão

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refletindo em seus textos o dispositivo da Lei Maior. Não há qualquer tipo de inovação porque o foro por prerrogativa de função para deputados estaduais está em perfeita sincronia com a Constituição Federal. Esse paralelismo significa que o privilégio estadual consta também da Carta Federal e, por esta razão, sobrepõe-se à competência do Júri.

Importante:

A prerrogativa de função vigora enquanto durar o exercício do cargo ou função, independentemente do momento em que foi praticado o delito (a Súmula 394 do Supremo Tribunal Federal, que dispunha em sentido contrário, foi cancelada em 25 de agosto de 1999). Exemplo: uma pessoa pratica um crime, o processo se inicia perante juiz comum. O infrator, então, é eleito deputado federal. O processo, já em andamento, será remetido para o Supremo Tribunal Federal. Se o processo não alcança seu fim, e acaba o mandato, retorna para o juiz comum. Outro exemplo: se um deputado federal, durante o exercício do mandato, comete um crime, será julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Se o processo não alcança seu fim e o mandato acaba, será remetido para o juiz comum.

Ainda que o crime seja praticado em outra unidade da Federação, a competência continua sendo a do Tribunal que tem competência para julgá-lo.

1.1. Competência Para Julgar Crimes Comuns

O Supremo Tribunal Federal tem competência para julgar por crimes comuns (crimes e contravenções) e por crimes eleitorais:

• Próprios Ministros do Supremo Tribunal Federal;

• Presidente e Vice-Presidente da República;

• Ministros de Estado;

• Ministros de Tribunais Superiores e Tribunal de Contas da União;

• Comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica;

• Parlamentares federais;

• Agentes diplomáticos;

• Procurador-Geral da República.

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O Advogado-Geral da União não está relacionado no artigo 102 da Constituição Federal/88, mas a doutrina entende que seu cargo tem a mesma hierarquia dos Ministros de Estado, portanto, também deve ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Hoje, Medida Provisória já decidiu que tem foro especial.

O Superior Tribunal de Justiça tem competência para julgar todas as infrações penais, salvo crimes eleitorais (neste caso, cabe ao Tribunal Superior Eleitoral apreciar a questão), cometidas por:

• Governador;

• Desembargadores dos Tribunais de Justiças dos Estados;

• Membros do Tribunal Regional Federal, Tribunal Regional Eleitoral e Tribunal Regional do Trabalho, Tribunal de Contas do Estado, Tribunal de Contas do Município e do Ministério Público da União que oficiem perante Tribunais.

O Tribunal Regional Federal tem competência para julgar todas as infrações penais, salvo nos crimes eleitorais, cometidas por:

• Juízes federais da área de sua jurisdição;

• Juízes do Trabalho;

• Juízes militares;

• Prefeito Municipal, nos crimes de competência da Justiça Federal;

• Membros do Ministério Público da União.

Ao Tribunal Regional Eleitoral compete julgar os crimes eleitorais cometidos por:

• Juízes federais e estaduais;

• Membros do Ministério Público da União e dos Estados;

• Prefeitos, nos crimes eleitorais.

O Tribunal de Justiça tem competência para julgar as infrações penais comuns cometidas por:

• Juízes de Direito;65

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• Juízes da Justiça Militar estadual e juízes de Alçada;

• Membros do Ministério Público estadual;

• Prefeitos municipais.

Atenção:

Prefeito Municipal:

• Tribunal de Justiça – crime comum e doloso contra a vida;

• Tribunal Regional Eleitoral – crime eleitoral;

• Tribunal Regional Federal – crimes de competência da Justiça Federal.

Juiz de Direito e Membro do Ministério Público estadual:

• Tribunal de Justiça – crime comum;

• Tribunal Regional Eleitoral – crime eleitoral.

Juiz federal:

• Tribunal Regional Federal – crime comum;

• Tribunal Regional Eleitoral – crime eleitoral.

A Constituição Estadual de São Paulo estabelece foro especial no Tribunal de Justiça para julgar os crimes comuns cometidos por:

• Vice-Governador;

• Deputado estadual;

• Secretário de Estado;

• Procurador-Geral de Justiça;

• Procurador-Geral do Estado;

• Defensor Público Geral;

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• Prefeitos municipais;

• Juízes dos Tribunais de Alçada e da Justiça Militar;

• Juízes de Direito e os auditores da Justiça Militar;

• Membros do Ministério Público;

• Comandante-Geral da Polícia Militar;

• Delegado-Geral de Polícia.

Todas essas autoridades, se cometerem crime federal, serão processadas no Tribunal Regional Federal. É o entendimento do Supremo Tribunal Federal.

Tribunal de Justiça Militar tem competência para julgar crimes militares – Constituição Estadual de São Paulo:

• Comandante-Geral da Polícia Militar;

• Chefe da Casa Militar.

O Ministério Público do Distrito Federal atua perante a Justiça Distrital. Se um de seus membros comete um crime, será julgado pelo Tribunal Regional Federal da 1.ª Região; isso porque é ramo do Ministério Público da União, apesar de atuar na Justiça Distrital.

1.2. Exceção da Verdade

Nos termos do artigo 85 do Código de Processo Penal, nos processos por crime contra a honra, em que o querelante tiver foro especial no Supremo Tribunal Federal ou no Tribunal de Apelação, a esses caberá o julgamento da exceção da verdade. Não cabe a oposição de exceção da verdade:

• Na calúnia:

− se o fato imputado a alguém for crime de ação penal privada, e ele não for condenado;

− se o fato é imputado ao Presidente da República ou a Chefe de Governo estrangeiro;

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− se, do crime imputado, embora de ação penal pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

A exceção da verdade é questão prejudicial homogênea, pois é anterior ao mérito e pode ser objeto de processo autônomo.

Deve ser oposta quando da defesa prévia; mas para alguns esse prazo não é fatal, pois é questão de mérito, e o prazo fatal caracterizaria o cerceamento de defesa. Há posicionamentos contrários.

Oposta a exceção, o querelante tem dois dias para contestá-la. Poderá arrolar no máximo oito testemunhas. Se na queixa já tiver arrolado quatro testemunhas, poderá arrolar mais quatro na contestação da exceção, até completar o número legal. Isso porque, embora o crime seja punido com detenção, o rito é ordinário.

Conforme o artigo 85, do Código de Processo Penal, a exceção será julgada pelo Tribunal competente. Se o Tribunal julga procedente a exceção, o mérito será julgado improcedente. Se julga improcedente a exceção, o mérito será julgado procedente ou improcedente. Observação: o Tribunal só faz o julgamento da exceção, as testemunhas são ouvidas em 1.ª instância. Depois de julgar a exceção, o Tribunal devolve o processo para ser julgado, em 1.ª instância, o mérito.

2. FIXAÇÃO DO JUÍZO COMPETENTE

2.1. Prevenção

Concorrendo dois juízes ou mais, igualmente competentes, fixa-se a competência pela prevenção. Ocorre a prevenção quando um dos juízes anteceder aos outros na prática de algum ato do processo ou medida referente a esse, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou queixa.

Geram prevenção:

• Concessão de fiança;

• Decretação de Prisão Preventiva;

• Decretação de Busca e Apreensão;

• Pedido de explicação em juízo nos crimes contra a honra.

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2.2. Distribuição

Se for constatado que não houve prevenção, a fixação do juízo competente se dará por distribuição, que é o sorteio para a fixação do juiz para a causa.

2.3. Conexão e Continência

A conexão e a continência (artigo 69, inciso V, do Código de Processo Penal) são critérios de modificação, de prorrogação da competência e não de fixação.

a) Conexão

O artigo 76 do Código de Processo Penal estabelece quando a competência será determinada pela conexão. A conexão existe quando duas ou mais infrações estiverem entrelaçadas por um vínculo, um nexo, um liame que aconselha a junção dos processos. Nesse caso, as ações serão reunidas e julgadas em conjunto, simultaneus processus, a fim de se evitar o inconveniente de decisões conflitantes na área penal, bem como possibilitar ao juiz uma visão mais ampla do quadro probatório.

A conexão pode ser:

• Intersubjetiva

– por simultaneidade: quando as infrações houverem sido praticadas por várias pessoas, sem vínculo subjetivo, ao mesmo tempo (exemplo: um caminhão carregado de laranjas tomba, e vários moradores da região apanham as laranjas);

– por concurso: quando as infrações houverem sido praticadas por várias pessoas, com vínculo subjetivo, embora diverso o tempo e o lugar;

– por reciprocidade: quando as infrações houverem sido praticadas por várias pessoas, umas contra as outras.

• Objetiva

– teleológica: quando as infrações houverem sido praticadas para assegurar a execução de outra (exemplo: mata-se o segurança para seqüestrar o empresário);

– conseqüencial: quando as infrações houverem sido praticadas para garantir a ocultação de outra (garantir que a existência da infração permaneça desconhecida), para garantir a impunidade (garantir que a autoria da infração permaneça desconhecida), ou para assegurar a vantagem (produto do crime).

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• Instrumental ou probatória

– quando a prova de uma infração ou qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração (exemplo: prova de um crime de furto em relação à receptação).

b) Continência

O artigo 77 do Código de Processo Penal estabelece quando a competência será determinada pela continência.

A continência pode ser:

• Subjetiva: quando duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração, configurando-se concurso de agentes. Atenção! Na conexão intersubjetiva são duas ou mais infrações, na continência subjetiva há apenas uma infração.

• Objetiva

– concurso formal (artigo 70, 1.ª parte, do Código Penal);

– aberratio ictus – erro na execução com resultado duplo (artigo 73, parte final, do Código Penal);

– aberratio criminis – resultado diverso do pretendido com resultado duplo (artigo 74, parte final, do Código Penal).

O artigo 78 do Código de Processo Penal determina qual o foro deve prevalecer em caso de conexão e continência:

I – Concurso entre jurisdições de categorias diversas (instâncias diferentes): prevalece a mais graduada. Exemplo: Tribunal de Justiça e juiz singular – prevalece o Tribunal de Justiça. Se a conexão for entre crime de competência da Justiça Estadual e da Justiça Federal, para o Prof. Tourinho, são jurisdições de mesma categoria; para a jurisprudência, a Justiça Federal é especial em relação à Justiça Estadual. A Súmula n. 122 do Superior Tribunal de Justiça decidiu a questão, determinando que: “Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do artigo 78, inciso II, ‘a’, do Código de Processo Penal”.

II – Concurso de jurisdições de mesma categoria:

• prepondera o local da infração mais grave, isto é, à qual for cominada pena mais grave (a pena de reclusão é mais grave que a de detenção que é mais grave que a prisão simples). Se a pena máxima for igual, compara-se a pena mínima;

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• sendo iguais as penas (máxima e mínima), prevalece o local onde foi praticado o maior número de crimes;

• se nenhum desses casos fixar a competência, utiliza-se o critério da prevenção.

III – Competência do Júri e de outro órgão da jurisdição comum: prevalecerá a competência do Júri. Observação: se o crime for eleitoral e doloso contra a vida, os processos serão julgados separadamente, não haverá a reunião de processos, pois a competência de ambos é fixada na Constituição Federal/88.

IV – Concurso entre Jurisdição Comum e Jurisdição Especial: prevalecerá a Especial.

V – Concurso entre Jurisdição Eleitoral e Jurisdição Comum, prevalecerá a Jurisdição Eleitoral.

Não serão reunidos os processos para julgamento em conjunto nos casos do artigo 79 do Código de Processo Penal:

I – concurso entre jurisdição comum e militar – Súmula n. 90 do Superior Tribunal de Justiça – “Compete à Justiça Estadual Militar processar e julgar o policial militar pela prática de crime militar, e à Comum pela prática do crime comum simultâneo àquele”.

II – concurso entre Justiça Comum e Justiça da Infância e Juventude.

§ 1.º Superveniência de doença mental a um dos co-réus (suspende-se o processo do enfermo);

§ 2.º Co-réu revel que não possa ser julgado à revelia (infração inafiançável, não comparece no Tribunal do Júri, citação por edital) e na cisão do julgamento durante a sessão plenária do Júri (artigo 461 do Código de Processo Penal).

O artigo 80 do Código de Processo Penal determina os casos em que a separação dos processos é facultativa, apesar da conexão e continência:

• se as várias infrações forem praticadas em diferentes condições de tempo e lugar;

• se excessivo o número de acusados;

• se, por outro motivo relevante, o juiz julgar conveniente a separação (o juiz tem discricionariedade para determinar isso).

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2.4. Perpetuação da Competência (Perpetuatio Jurisdicionis)

A vis atractiva, efeito principal da conexão e continência, desloca para a competência de um mesmo julgador os crimes conexos aos de sua competência. Se o juiz ou o Tribunal absolver ou desclassificar o crime de sua competência, continuará competente para o julgamento das demais infrações (artigo 81 do Código de Processo Penal). Exemplo: concurso de agentes – juiz e escrivão cometem crime de furto. Os dois serão julgados pelo Tribunal de Justiça – vis atractiva. Se o juiz for absolvido, o escrivão continua a ser julgado pelo Tribunal de Justiça.

Exceção: no Júri, se o juiz monocrático desclassificar, impronunciar ou absolver sumariamente o acusado, de maneira que exclua a competência do Júri, remeterá o processo ao juiz competente (artigo 81, parágrafo único, do Código de Processo Penal). O juiz aguarda o trânsito em julgado e remete os autos ao juiz competente (que pode ser ele mesmo se a comarca for pequena, devendo aguardar o trânsito em julgado).

Se os jurados desclassificam o crime, a competência para o julgamento da infração passa para o juiz-presidente, que terá de proferir a decisão naquela mesma sessão. Caso haja crimes conexos, a desclassificação também desloca para o juiz-presidente a competência para seu julgamento, diante da clara redação do artigo 492, § 2.º, do Código de Processo Penal. É também o entendimento do Supremo Tribunal Federal. Se, no entanto, o Júri absolver o acusado da imputação por crime doloso contra a vida, continuará competente para a apreciação dos conexos, pois só pode proferir absolvição quem se julga competente para analisar o fato.

2.5. Avocação de Processos (Artigo 82 do Código de Processo Penal)

Se, mesmo ocorrendo conexão ou continência, foram instaurados vários processos, a autoridade prevalente deve avocar para si os processos que corram perante outros juízes, se ainda não foram julgados em sentença definitiva. Se já houver sentença definitiva, isto é, julgamento de mérito, a unificação dos processos se dará posteriormente, na execução, para efeitos de soma ou unificação das penas.

Questões e Processos Incidentes

1. INTRODUÇÃO

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As questões e os processos incidentes são soluções dadas pela lei processual para

as variadas eventualidades que podem ocorrer no processo e que devem ser resolvidas

pelo juiz antes da solução da causa principal.

Incidente: aquilo que sobrevém, que é acessório.

Questão: controvérsia, discussão.

2. QUESTÕES PREJUDICIAIS

Questões prejudiciais são todas as questões de fato e de direito que, por necessidade lógica, devem ser analisadas antes da questão principal e podem, em tese, ser objeto de processo autônomo. A matéria é tratada nos artigos 92 a 94 do Código de Processo Penal.

Etimologicamente “prejudicial” significa pre-iudicate, isto é, julgar primeiro. A questão deve ser julgada em primeiro lugar, antes da questão principal. Exemplo: um acusado de bigamia (artigo 235 do Código Penal) alega que seu primeiro casamento é nulo. A validade ou não do casamento é questão prejudicial que deve ser decidida antes do mérito, pois influi diretamente na decisão.

A questão prejudicial condiciona a questão prejudicada; a prejudicada está irrecusavelmente subordinada à prejudicial.

Características da questão prejudicial:

• Anterioridade lógica: a questão prejudicial é sempre anterior à prejudicada. Não porque surgiu primeiro na discussão processual, mas por ser logicamente anterior. Primeiro decide-se ou aguarda-se a decisão da questão incidente e, posteriormente, julga-se o mérito.

• Necessariedade: a questão prejudicial sempre subordina o exame da questão principal. O mérito não pode ser decidido antes de enfrentar a questão prejudicial.

• Autonomia: a questão prejudicial pode ser objeto de processo autônomo.

• Competência na apreciação: é julgada pelo próprio juízo penal, mas pode, excepcionalmente, ser julgada pelo juízo cível.

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Atenção: questão prejudicial não se confunde com questão preliminar. A questão preliminar versa sobre pressupostos processuais ou condições da ação. Ambas são espécies do gênero ‘questões prévias’. Apresentam características em comum: anterioridade lógica e necessariedade. Mas apresentam diferenças importantes: a questão prejudicial refere-se a direito material e a questão preliminar refere-se a direito processual. Também se diferem no tocante à autonomia. As questões prejudiciais podem ser objeto de processo autônomo, as questões preliminares não. Exemplo: falta de citação é uma questão preliminar – não se ajuíza processo autônomo para discutir.

Classificação das questões prejudiciais:

a) Quanto à influência:

• Total: condiciona a existência do crime. Refere-se a uma elementar da infração penal.

• Parcial: refere-se a uma circunstância do tipo penal.

b) Quanto ao mérito ou natureza:

• Homogênea: pertence ao mesmo ramo do direito da questão principal. Exemplo: exceção da verdade na calúnia.

• Heterogênea: pertence a ramo do direito distinto da questão principal. Exemplo: anulação de casamento e crime de bigamia (a anulação do casamento pertence ao direito civil).

c) Quanto ao efeito:

• Obrigatória: é a questão que, uma vez presente, obriga a suspensão do processo até o julgamento da questão incidental. Sempre versa sobre questão de estado civil das pessoas. Exemplo: anulação de casamento no cível e crime de bigamia.

• Facultativa: é aquela que não obriga a suspensão do processo principal, mas há nela controvérsia de difícil solução. Exemplo: acusado de crime contra o patrimônio alega ser o legítimo possuidor. São características da prejudicial facultativa que não estão presentes na obrigatória: existência de ação civil em andamento; inexistência de limitação à prova, na lei civil, acerca da questão prejudicial.

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d) Quanto ao juízo competente:

• Questão prejudicial não-devolutiva: deve ser resolvida pelo juízo criminal. São sempre questões prejudiciais homogêneas.

• Questão prejudicial devolutiva absoluta: trata-se das questões prejudiciais heterogêneas que deverão ser resolvidas obrigatoriamente pelo juízo cível. Requisitos: versar a questão sobre o estado civil das pessoas (casado, solteiro, vivo, morto, parente ou não); constituir elementar ou circunstância do fato imputado; que a controvérsia seja séria, fundada e relevante. Preenchidos esses requisitos, o juiz criminal obrigatoriamente deve remeter os autos para o juiz cível e suspender o processo até o trânsito em julgado da decisão no cível. O Ministério Público poderá intentar a ação cível, se as partes não o tiverem feito, ou dar-lhes prosseguimento se estas desistirem do processo.

• Questão prejudicial devolutiva relativa: trata-se das questões prejudiciais heterogêneas que poderão ou não ser resolvidas pelo juízo cível a critério do juízo criminal. Requisitos: que seja da competência do juízo cível; que não verse sobre o estado civil das pessoas; que seja de difícil solução; que não sofra restrições da lei civil quanto à sua prova (no processo penal vigora o princípio da verdade real); que já exista ação civil em andamento. A suspensão, nesse caso, é por prazo determinado, perfeitamente prorrogável, desde que a parte não tenha dado causa ao atraso; findo o prazo, o juiz retoma o processo e decide todas as questões relativas, inclusive a prejudicial. Tratando-se de crime de ação pública, o Ministério Público poderá intervir na ação cível para promover-lhe o rápido andamento (nesse caso, atua como fiscal da lei).

Observações:

• Durante a suspensão do processo fica suspensa a prescrição (artigo 116 do Código Penal).

• Apesar da suspensão do processo, o juiz criminal poderá inquirir testemunhas ou determinar produção de provas que considere urgente.

• O despacho que determina a suspensão do processo por questão prejudicial comporta recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso XVI, do Código de Processo Penal). Da decisão que nega a suspensão do processo, não cabe recurso. Neste caso, a solução será levantar a questão em preliminar de apelação. Se a questão for devolutiva absoluta, o tribunal anula a sentença e ordena a remessa do julgamento da questão prejudicial ao cível. Se for devolutiva relativa, o tribunal não pode anular a sentença, mas absolve o réu.

• Do despacho que indeferir pedido da parte pleiteando a suspensão do feito, cabe correição parcial, alegando-se tumulto na tramitação do processo.

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• A decisão do juízo cível vincula o juízo criminal.

3. EXCEÇÕES

Exceção em sentido amplo compreende o direito público subjetivo do acusado em se defender. Em sentido estrito, a exceção pode ser conceituada como o meio pelo qual o acusado busca a extinção do processo sem o conhecimento do mérito, ou ainda um atraso no seu andamento.

A exceção pode ser:

• Peremptória: visa extinguir o processo (coisa julgada e litispendência);

• Dilatória: visa retardar o curso do processo (suspeição, incompetência e ilegitimidade de parte).

3.1. Exceção de Suspeição

Destina-se a rejeitar o juiz, do qual a parte argüente alegue falta de imparcialidade ou quando existam outros motivos relevantes que ensejam suspeita de sua isenção em razão de interesses ou sentimentos pessoais.

Se o juiz da causa se enquadrar em uma das situações de suspeição, previstas no artigo 254 do Código de Processo Penal, e não se declarar suspeito espontaneamente, a parte pode argüir a exceção de suspeição.

3.1.1. Procedimento

A exceção de suspeição deve preceder as demais, salvo quando fundada em motivo superveniente (artigo 96 do Código de Processo Penal), isto porque as demais exceções pressupõem um juiz imparcial.

Se o juiz reconhecer a suspeição de ofício, ou seja, se o juiz se der por suspeito espontaneamente, ele fundamenta sua decisão e remete o processo ao seu substituto legal.

Se o magistrado não se der por suspeito, qualquer das partes poderá fazê-lo em petição assinada pela própria parte ou por procurador com poderes especiais. A petição deve ser fundamentada e acompanhada de prova documental e rol de testemunhas (artigo 98). Tem legitimidade para argüir a exceção de suspeição: o autor, quando do oferecimento da denúncia ou a queixa, e o réu (ou seu procurador com poderes

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especiais), no momento da defesa. Como o defensor dativo não tem procuração, para que ele possa argüir a exceção, o réu também deve assinar a petição. Se a suspeição for superveniente, a parte tem que se manifestar, nos autos, no primeiro momento em que puder. Se a parte não argüir no momento oportuno, equivalerá a reconhecer a capacidade moral do juiz.

O assistente de acusação tem legitimidade para argüir a suspeição do juiz?

O artigo 271 do Código de Processo Penal relaciona as funções do assistente e nada fala sobre essa possibilidade. Para alguns autores, o rol é taxativo, não admitindo interpretação extensiva. Para Tourinho, o assistente tem interesse processual na imparcialidade do juiz, devendo ser reconhecida a ele essa possibilidade.

Depois de argüida a suspeição, os autos são encaminhados ao juiz, que pode reconhecê-la ou não.

Se o juiz reconhece, remete os autos para seu substituto legal. Dessa decisão não cabe recurso.

Se o juiz não reconhece, determina a autuação da exceção em apartado. O juiz excepto terá três dias para resposta escrita, juntando documentos e arrolando testemunhas, se necessário. Posteriormente, remeterá os autos ao Tribunal de Justiça em 24 horas (em São Paulo é julgada pela Câmara Especial).

Ao chegar no tribunal, a exceção será distribuída a um dos componentes da Câmara Especial (composta pelos quatro vice-presidentes e pelo decano), o qual atuará como relator. Este poderá rejeitar liminarmente a exceção ou decidir pela relevância da argüição, determinando o processamento da exceção. Neste caso, o Tribunal citará o excepto e o excipiente, ouvirá as testemunhas arroladas e julgará independente de novas alegações.

Se o Tribunal julgar procedente a exceção, remeterá os autos ao substituto legal, determinará a anulação dos atos já praticados e, se entender que houve erro inescusável (indesculpável) do juiz excepto, poderá condená-lo nas custas da exceção. Observação: no Estado de São Paulo, a Lei Estadual n. 9.452/85 isenta o pagamento de custas no processo penal.

Se o Tribunal de Justiça julgar improcedente, determinará a continuidade normal do processo. O Tribunal poderá condenar o excipiente ao pagamento de multa, se restar evidenciado que este agiu de má-fé visando tumultuar o processo.

Contra quem a exceção de suspeição pode ser argüida?

A exceção pode ser argüida também contra o membro do Ministério Público e os sujeitos processuais secundários (perito, intérprete, serventuário da Justiça e jurados).

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Súmula n. 234, Superior Tribunal de Justiça: “A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.”

Se o Promotor foi testemunha, não pode participar da ação penal.

3.1.2. Exceção de suspeição de jurado

Instalada a sessão de julgamento com 15 jurados no mínimo, 7 formarão o Conselho de Sentença.

No Júri as partes podem recusar os jurados. As partes podem fazer três recusas peremptórias, isto é, sem justificação. Havendo justificativa, poderão recusar tantos quanto necessários. A suspeição do jurado deve ser argüida oralmente imediatamente após a leitura que o juiz faz da correspondente cédula sorteada (artigo 459, § 2.º, do Código de Processo Penal). Se o juiz não aceitar a recusa, o jurado tomará parte no Conselho de Sentença. Tudo constará da ata.

3.1.3. Suspeição de autoridade policial

Conforme determina o artigo 107 do Código de Processo Penal, as partes não podem argüir a suspeição de autoridade policial. Isso porque o inquérito policial é um procedimento inquisitivo. O próprio delegado, entretanto, poderá declarar-se suspeito.

3.1.4. Observações

Enquanto se processa a exceção, o processo principal flui normalmente. Assim, em regra a exceção não suspende o andamento do processo principal. Se, diante da exceção de suspeição, a parte contrária considerar relevante a argüição, o processo será suspenso (artigo 102). Exemplo: a defesa concorda que a argüição de exceção de suspeição feita pelo Ministério Público é plausível, tem fundamento.

Conforme dispõe o artigo 256 do Código de Processo Penal: “A suspeição não poderá ser declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito ser motivo para criá-la”.

No caso de incompatibilidades (artigo 253) e impedimentos (artigo 252), aplica-se o mesmo procedimento da suspeição.

3.2. Exceção de Incompetência do Juízo

Fundamenta-se na ausência de capacidade funcional do juiz.

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O artigo 109 do Código de Processo Penal determina que, se em qualquer fase do processo o juiz reconhecer motivo que o torne incompetente, declará-lo-á nos autos, haja ou não alegação da parte, prosseguindo-se na forma do artigo anterior.

A incompetência absoluta pode ser reconhecida de ofício pelo juiz. Quanto à incompetência relativa, entendemos que pode ser reconhecida de ofício, desde que antes de operada a preclusão. Observação: A Súmula 33 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que “a incompetência relativa não pode ser declarada de ofício”.

A incompetência absoluta tem um regime jurídico mais severo por versar sobre questões de interesse público. Exemplo: o lugar da consumação do delito facilita busca de provas. Não é só interesse da parte. Há também interesse público.

A exceção pode ser oposta pelo réu, querelado e Ministério Público, quando este atue como fiscal da lei. Todavia, segundo a doutrina, não pode ser argüida pelo autor da ação.

A argüição deve ser feita no prazo de três dias da defesa prévia, tratando-se de incompetência relativa (territorial), sob pena de prorrogação. Se a incompetência for absoluta, poderá ser feita a qualquer tempo.

Procedimento da exceção de incompetência:

• A exceção é autuada em apartado.

• Não há suspensão do processo (artigo 111 do Código de Processo Penal).

• Ouve-se o representante do Ministério Público.

• O juiz decide a exceção: procedente e remete os autos ao juiz competente. Dessa decisão cabe recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso III, do Código de Processo Penal). O juiz que receber o processo não é obrigado a concordar com essa declinação, podendo suscitar o conflito de jurisdição ou competência; ou improcedente. Dessa decisão não caberá recurso. Admite-se habeas corpus ou argüição em preliminar de futura e eventual apelação.

Conforme o artigo 567 do Código de Processo Penal, a incompetência do Juízo anula somente os atos decisórios. Dessa forma somente os atos instrutórios serão ratificados pelo juiz competente, os atos decisórios serão anulados.

Atenção! A Jurisprudência entende que o recebimento da denúncia ou da queixa não tem carga decisória; pode, portanto, ser ratificado. Segundo o princípio da conseqüencialidade, se o recebimento da denúncia ou da queixa fosse nulo, todo o processo estaria perdido. A Jurisprudência, por isso, admite tranqüilamente a ratificação do recebimento da denúncia ou queixa.

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O recebimento da denúncia ou queixa interrompe a prescrição.

Assim, pergunta-se: se a denúncia ou queixa foi recebida pelo juiz incompetente e depois ratificada pelo juiz competente, em que momento estaria interrompida a prescrição?

É a ratificação do juiz competente que interrompe a prescrição. Essa regra aplica-se para qualquer incompetência, inclusive ratione materiae.

Se a regra de competência violada estiver disposta na Constituição Federal de 1988, os atos praticados perante o juiz incompetente são considerados inexistentes. Não há possibilidade de serem ratificados.

3.3. Exceção de Ilegitimidade de Parte

São partes ilegítimas em Processo Penal:

• Ministério Público, se oferecer denúncia em crime de ação penal privada.

• Querelante, se oferecer queixa em crime de ação penal pública.

• Querelante incapaz (a vítima deve ser maior de 18 anos).

• Alguém que se diz representante do ofendido em crime de ação penal privada, mas não é.

A ilegitimidade pode ser ad causam ou ad processum. A ilegitimidade ad causam refere-se a uma condição da ação; ocorre se o Ministério Público oferece queixa e o querelante oferece denúncia. A ilegitimidade ad processum ocorre se o querelante é incapaz ou o representante do ofendido não é o representante legal. Tratando-se de ilegitimidade de causa ou de processo, o instrumento para argüir é exceção de ilegitimidade.

Processamento:

• Reconhecimento de ofício pelo juiz (se for no juízo de admissibilidade, haverá a rejeição da peça inicial – desta decisão cabe recurso em sentido estrito).

• Se o juiz não reconhecer de ofício, o réu ou o Ministério Público poderá argüir.

• A exceção será autuada em apartado.

• Não há suspensão do processo (artigo 111 do Código de Processo Penal).

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• O Ministério Público é ouvido.

• O juiz decide a exceção: procedente (o reconhecimento da ilegitimidade ad causam acarreta a nulidade absoluta do processo; o reconhecimento da ilegitimidade ad processum acarreta a nulidade relativa do processo, admitindo a convalidação, nos termos do artigo 568 do Código de Processo Penal); ou improcedente.

• Da decisão de procedência cabe recurso em sentido estrito; da decisão de improcedência não cabe recurso, mas admite-se habeas corpus ou alegação em preliminar de futura e eventual apelação.

3.4. Exceção de Litispendência

A exceção de litispendência baseia-se na proibição de uma mesma pessoa ser processada mais de uma vez pelos mesmos fatos (non bis in idem).

Será argüida exceção de litispendência quando existirem duas ações penais em curso, processando o mesmo réu pelo mesmo fato. Se um mesmo fato é apurado em dois inquéritos penais não há litispendência.

Os elementos que caracterizam uma demanda são:

• Mesmas partes;

• Mesma causa de pedir (fatos narrados na denúncia);

• Mesmo pedido (condenação).

Instaurado inquérito policial com ação já em curso, sem existir requisição do juiz ou do Ministério Público para realização de diligências complementares, caracteriza-se constrangimento ilegal sanável por habeas corpus.

Havendo duas ações iguais, uma delas será excluída. Exclui-se a segunda.

O Supremo Tribunal Federal entende que, se alguém é absolvido como autor, poderá ser novamente denunciado como partícipe. Desde que não sejam alegados os mesmos fatos pelos quais já foi acusado; a descrição fática deve ser outra.

Há quem entenda que, se alguém foi absolvido, não pode ser pelo mesmo crime novamente processado. Leva-se em conta o fato concreto, não importa a conduta descrita; se foi absolvido pelo fato, não pode novamente ser processado.

Para fins de concurso público, adotar a posição do Supremo Tribunal Federal.

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Processamento:

• O rito é o mesmo da exceção de incompetência.

• Autua-se em autos apartados.

• Não há suspensão do processo (artigo 111).

• Pode ser argüida a qualquer tempo.

• O juiz decide a exceção: procedente (cabe recurso em sentido estrito); improcedente (admite-se habeas corpus).

3.5. Exceção de Coisa Julgada

Funda-se na proibição de uma mesma pessoa ser processada mais de uma vez pelos mesmos fatos (non bis in idem).

A coisa julgada é uma qualidade dos efeitos da decisão final, marcada pela imutabilidade e irrecorribilidade. Tratando-se de sentença condenatória, a imutabilidade é relativa, pois pode haver revisão criminal, indulto, anistia, unificação das penas. A sentença absolutória, todavia, é imutável, pois não há revisão criminal pro societate.

Assim, se um sujeito foi julgado por um fato, resultando uma decisão irrecorrível, não poderá ser julgado novamente pelo mesmo fato. Havendo identidade de demanda (ver item anterior), não poderá haver um segundo julgamento.

Pergunta-se: no caso de concurso formal, no qual ocorreram dois resultados, sendo o réu julgado por apenas um resultado, ocorrendo o trânsito em julgado, poderá ser acusado em outro processo pela prática do segundo resultado?

Resposta: depende. Se a decisão do primeiro processo for de condenação, sim, caso em que as penas serão unificadas no juízo das execuções. Se a decisão do primeiro processo for de absolvição, o sujeito não poderá ser processado pelo outro resultado, sob pena de serem proferidas decisões contraditórias.

Processamento:

• Reconhecimento de ofício pelo juiz (havendo rejeição da inicial caberá recurso em sentido estrito).

• Se o juiz não reconhecer de ofício, o réu ou o Ministério Público poderá argüir;

• Autua-se em autos apartados.

• Não há suspensão do processo.

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• Pode ser argüida a qualquer tempo.

• Ouve-se o réu (se foi o Ministério Público que argüiu) ou o Ministério Público (se foi o réu que argüiu).

• O juiz decide a exceção: procedente (cabe recurso em sentido estrito); improcedente (admite-se habeas corpus).

4. CONFLITO DE JURISDIÇÃO

O assunto é tratado com este título no Código de Processo Penal, mas o correto seria dizer conflito de competência, pois todo juiz tem jurisdição.

O objetivo é preservar o juiz natural. Há dois tipos de conflito de jurisdição:

• Conflito positivo de competência: ocorre quando dois ou mais Juízos ou Tribunais se consideram ao mesmo tempo competentes para o exame de determinada causa.

• Conflito negativo de competência: ocorre quando dois ou mais Juízos ou Tribunais se consideram ao mesmo tempo incompetentes para o exame de determinada causa.

Também ocorre conflito de jurisdição quando houver divergência quanto à unidade de processo, seja sua junção ou sua separação.

O conflito de competência pode ser suscitado:

• pelas partes, por requerimento – artigo 115 do Código de Processo Penal;

• pelo juiz, por representação.

O conflito deve ser suscitado de forma escrita e fundamentado, com cópias da alegação, conforme dispõe o artigo 116 do Código de Processo Penal. Nos termos do § 1.º do mencionado artigo, se o conflito for negativo, os juízes e tribunais poderão suscitá-lo nos próprios autos do processo. Nesse caso, o relator recebe o processo e determina que os Juízos envolvidos prestem informações. Com as informações, colhe o parecer do Ministério Público em segunda instância (Procurador Geral). O conflito então é julgado.

Para o conflito positivo, o procedimento tem forma própria, por meio de instrumento que é remetido ao Tribunal. Como o processo continua tramitando, a suspensão ou não dos atos processuais depende do relator do Tribunal. Saliente-se que

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no conflito negativo, os próprios autos nos quais se suscita o conflito são encaminhados ao Tribunal.

Competência para julgar os conflitos:

• Cabe ao Supremo Tribunal Federal dirimir conflito envolvendo Tribunais Superiores. Se, por exemplo, tratar-se de conflito entre Tribunal Superior e um Tribunal ou entre Tribunal Superior e um juiz, cabe também ao Supremo Tribunal Federal dirimir. Observação: se envolver o próprio Supremo Tribunal Federal e outro Tribunal, não há conflito; o Supremo Tribunal Federal dá a palavra final.

• Cabe ao Superior Tribunal de Justiça dirimir conflito envolvendo Tribunal Estadual ou Tribunal Regional Federal e um Juízo a ele não vinculado. Exemplo: Tribunal de Justiça de São Paulo X juiz do Rio de Janeiro.

• Cabe ao Tribunal Regional Federal dirimir conflitos entre juízes federais da mesma região. Se for região diferente, cabe ao Supremo Tribunal de Justiça. Cabe também ao Tribunal Regional Federal julgar conflito entre juiz federal e juiz estadual com competência federal (exemplo: artigo 27 da Lei n. 6.368/76) – Súmula n. 3 do Superior Tribunal de Justiça .

• Cabe ao Tribunal Regional Eleitoral dirimir conflito envolvendo Juízos eleitorais do mesmo Estado. De Estados diferentes, cabe ao Tribunal Superior Eleitoral.

• Cabe ao Tribunal de Justiça dirimir conflitos entre juízos estaduais do mesmo Estado e Tribunal de Alçada (no âmbito penal só cabe ao Tribunal de Alçada Criminal), ou Tribunal e juiz.

• Entre Tribunal de Justiça e Tribunal de Alçada Criminal, não há conflito. Conforme dispõe a Súmula n. 22 do Superior Tribunal de Justiça (“não há conflito de competência entre o Tribunal de Justiça e Tribunal de Alçada do mesmo Estado-membro”), a competência é do Tribunal de Justiça.

• Cabe ao Tribunal de Alçada Criminal resolver conflitos entre Juízos de primeiro grau quando for sua a competência recursal.

Observação: “reclamação” é a forma pela qual o Supremo Tribunal Federal firma a sua própria competência (artigo 102, inciso I, alínea “l”, da Constituição Federal). Não há conflito de competência entre o Supremo Tribunal Federal e qualquer outro tribunal ou juízo, pois compete ao próprio Supremo decidir sua competência.

4.1. Conflito de atribuições

Regras:84

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• Conflito entre dois Promotores de Justiça do mesmo Estado: é decidido pelo Procurador-Geral de Justiça.

• Conflito entre dois Procuradores da República: é decidido pelo Procurador-Geral da República.

• Conflito entre Ministério Público Estadual e Ministério Público Federal: é decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (artigo 105, inciso I, alínea “g”, da Constituição Federal).

Observação: Quando juízes encampam as manifestações ministeriais, declarando-se incompetentes, há conflito de atribuições (entre promotores) e conflito de competência (entre juízes). Nesse caso, cumpre suscitar conflito de competência.

5. INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL

“Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal” (artigo 149 do Código de Processo Penal).

O incidente de insanidade mental é instaurado quando houver dúvida sobre a saúde mental do acusado. Pode ser instaurado no inquérito policial ou na ação penal, mas somente é instaurado por ordem judicial.

A perícia psiquiátrica realizada no inquérito policial só pode ser instaurada pelo juiz. Se o delegado percebe a insanidade, representa à autoridade judiciária o incidente de insanidade mental, conforme artigo 149, § 1.º, do Código de Processo Penal.

O incidente pode ser instaurado de ofício ou pode decorrer do requerimento das seguintes pessoas:

• membro do Ministério Público;

• defensor;

• curador;

• cônjuge, ascendente, descendente e irmão.

• por representação da autoridade policial (durante o inquérito policial)

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Pergunta: No interrogatório o juiz percebe a insanidade mental do acusado. O defensor alega que seu cliente foi interditado em processo cível; ainda assim deve-se realizar o incidente de insanidade mental?

Resposta: Sim. O incidente é instaurado quando há dúvida sobre a saúde mental e para verificar se na época dos fatos era o indivíduo imputável ou inimputável, conforme dispõe o artigo 26 do Código Penal. Não basta a doença mental, é preciso saber se em virtude dela, ao tempo da ação ou omissão, o agente era incapaz de entender o caráter ilícito da infração. A interdição no cível é irrelevante para o processo penal. A perícia penal visa verificar a imputabilidade do acusado.

Procedimento do incidente de insanidade mental:

O incidente é autuado em apartado (artigo 153 do Código de Processo Penal). O juiz expede portaria de instauração e nomeia curador (se o juiz não nomear curador haverá nulidade absoluta). Se já houver processo em andamento, esse ficará suspenso até julgamento do incidente, mas o juiz pode determinar a produção de provas urgentes (§ 2.º do artigo 149). Determina o juiz que as partes elaborem quesitos. Com os quesitos, é realizada a perícia psiquiátrica. O prazo para realização do exame é de 45 dias, prorrogável por igual período a pedido dos peritos, conforme dispõe o artigo 150, § 1.º, do Código de Processo Penal. As partes examinam o laudo. Se estiver regular, o juiz homologará. A homologação do laudo não significa concordância. A homologação diz respeito somente quanto aos aspectos formais. O juiz não está vinculado ao laudo, em razão do princípio do livre convencimento do juiz.

O laudo pode concluir pela:

• imputabilidade ao tempo da infração;

• semi-imputabilidade ao tempo da infração (artigo 151 do Código de Processo Penal);

• inimputabilidade ao tempo da infração (artigo 151 do Código de Processo Penal);

• doença mental superveniente (artigo 152 do Código de Processo Penal).

Se o laudo decidir pela imputabilidade, prossegue o processo que estava suspenso, dispensando-se o curador que foi nomeado.

Se concluir pela semi-imputabilidade ou inimputabilidade, o processo segue com o curador nos autos.

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Concluindo pela doença mental superveniente, o processo continuará suspenso até que o acusado se recupere. A prescrição continuará correndo.

6. RESTITUIÇÃO DE COISAS APREENDIDAS

Durante o inquérito policial, a autoridade policial, ao ensejo das investigações, pode determinar a apreensão dos instrumenta sceleris e dos objetos que tiverem relação com o fato criminoso (artigo 6.º, inciso II, do Código de Processo Penal).

Nos termos do artigo 240, § 1.º, alíneas b, c, d, e, f, e h, do Código de Processo Penal, as coisas passíveis de apreensão são as seguintes:

• instrumento do crime;

• objeto de valor probatório;

• produto direto ou imediato do crime (exemplo: coisa furtada, coisa roubada).

Não são coisas passíveis de apreensão:

• produto indireto do crime; não é objeto de apreensão mas sim de seqüestro (exemplo: o ouro roubado é derretido e transformado numa corrente – a corrente é produto indireto) ;

• bem ou valor dado ao criminoso como pagamento ou recompensa pela prática do crime.

Em princípio, todos os objetos apreendidos podem ser restituídos.

Coisas não passíveis de restituição:

• coisa apreendida enquanto interessar ao processo (artigo 118);

• objeto de valor probatório enquanto interessar ao processo;

• instrumento do crime cujo fabrico, alienação, porte, uso ou detenção constitua fato ilícito, ressalvado o direito de lesado ou terceiro de boa-fé (artigo 91, inciso II, alínea “a”, do Código Penal);

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• produto direto do crime cujo fabrico, alienação, porte, uso ou detenção constitua fato ilícito, ressalvado o direito de lesado ou terceiro de boa-fé (artigo 91, inciso II, alínea “b”, do Código Penal).

Observações quanto aos últimos dois tópicos:

1) Após a condenação transitada em julgado, são automaticamente perdidos em favor da União (trata-se de efeito genérico da decisão), ressalvado o direito de terceiro de boa-fé e do lesado. No caso de sentença absolutória, no entanto, o perdimento para a União deverá ser declarado pelo juiz, nos termos do artigo 779 do Código de Processo Penal.

2) Quando se restitui instrumento ou produto do crime, é indispensável que o lesado ou o terceiro de boa-fé faça jus, em razão de sua função ou qualidade, ao porte, uso, fabrico, alienação ou detenção da coisa que normalmente é tida como ilícita. Assim, por exemplo, furto de substância entorpecente de um laboratório, que possui autorização para seu fabrico e alienação.

Procedimento (artigo 120 do Código de Processo Penal):

a) Devolução pela autoridade policial:

• na fase de inquérito policial, se o objeto for restituível e não houver interesse na sua retenção.

• não deve haver dúvida sobre o direito do reclamante (a devolução pela autoridade policial é facultativa, pois se houver dúvida o juiz decidirá).

• o objeto não pode ter sido apreendido em poder de terceiro de boa-fé.

• o Ministério Público será ouvido.

b) Devolução pelo juiz:

• a qualquer momento (na fase policial ou judicial).

• quando o direito do reclamante for duvidoso (o requerimento é autuado em apartado, e o reclamante tem 5 dias para provar seu direito – se a questão for complexa, o juiz determinará que o reclamante ingresse com ação própria no juízo cível).

• objeto apreendido em poder de terceiro de boa-fé (o juiz dará prazo de 5 dias para o reclamante e igual prazo ao terceiro, e findo o juiz dará prazo comum de

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2 dias para arrazoar – se a questão for complexa, o juiz determinará que o reclamante ingresse com ação própria no juízo cível).

• O Ministério Público será ouvido.

Teoria Geral da Prova

1. DA PROVA

1.1. Conceito

Prova é todo elemento trazido ao processo, pelo juiz, pelas partes ou por terceiros (exemplo: peritos), destinado a comprovar a realidade de um fato, a existência de algo ou a veracidade de uma afirmação. Sua finalidade é fornecer subsídios para a formação da convicção do julgador.

1.2. Objeto de Prova

São objetos de prova os fatos principais e secundários capazes de influenciar a responsabilidade criminal do réu, a aplicação da pena e a medida de segurança. Alguns fatos, entretanto, não podem ser objetos de prova. São eles:

• O direito não pode ser objeto de prova, pois o juiz o conhece (iura novit curia); salvo se for direito consuetudinário, estrangeiro, estadual ou municipal.

• Os fatos axiomáticos, evidentes.

• Os fatos notórios. O fato axiomático é diferente do fato notório, que é aquele de conhecimento geral, que faz parte da história e refere-se a fatos políticos, sociais ou fenômenos da natureza.

• Os fatos irrelevantes, ou seja, aqueles incapazes de influenciar a responsabilidade criminal do réu no caso concreto.

• Os fatos sobre os quais incide presunção absoluta (iuris et de iure). Exemplo: incapacidade do menor de 18 anos de entender o caráter criminoso do fato; não se admite prova em contrário.

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Atenção: no Processo Penal, os fatos incontroversos também são objeto de prova; não se aplica a regra que incide no Processo Civil.

1.3. Classificação das Provas

• Prova Direta: refere-se diretamente ao tema probandu. Exemplo: testemunha presencial, exame de corpo de delito.

• Prova Indireta: refere-se indiretamente ao tema probandu. Exemplo: álibi apresentado pelo acusado.

• Prova Pessoal: a prova emana de uma pessoa. Exemplo: interrogatório, testemunha.

• Prova Documental: a prova é produzida por meio de documentos.

• Prova Material: refere-se a objetos. Exemplo: instrumentos do crime, arma do crime.

• Prova Plena: é a prova que conduz a um juízo de certeza.

• Prova Não Plena: é a prova que conduz a um juízo de probabilidade. Para a decisão de pronúncia aceita-se a prova não plena, mas para a condenação é necessária a prova plena.

1.4. Meios de Prova

Meios de prova são os métodos por meio dos quais a prova pode ser levada ao processo. Os meios de prova podem ser:

• nominados: são os documentos, acareações, reconhecimento de pessoas e objetos, interceptação telefônica, interrogatório. São todos os meios de prova previstos na legislação;

inominados: são aqueles meios de prova que não estão previstos expressamente na legislação. Exemplo: juntar fita de vídeo, contendo imagens de um programa de TV em que o acusado aparece, a fim de mostrá-lasaos jurados.

1.5. Sujeitos da Prova

Os sujeitos da prova são as pessoas incumbidas de levar ao juiz os meios de prova. São as testemunhas, com o depoimento; o réu, com o interrogatório; o perito, com o laudo etc.

1.6. Princípios Relativos à Prova90

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• Princípio da Comunhão da Prova: uma vez trazida aos autos, a prova se incorpora ao processo. Por essa razão, a prova trazida por uma das partes pode ser usada pela parte contrária. Além disso, uma vez admitida a prova, para que a parte desista dela, deve haver anuência da parte contrária.

• Princípio da Audiência Contraditória: à parte contrária sempre deve ser dado o direito de impugnar a prova produzida pelo ex adverso.

• Princípio da Liberdade dos Meios de Prova: no Processo Penal são admitidos todos os meios de prova, nominados ou inominados, em homenagem ao princípio da verdade real. Esse princípio, contudo, não é absoluto, pois não se admitem as provas ilegais, que se subdividem em provas ilícitas e ilegítimas.

Prova ilícita é a prova produzida com desrespeito à regra de direito material. Exemplo: confissão mediante tortura. Prova ilegítima é a prova produzida com desrespeito à regra de direito processual. Exemplo: exibição em plenário de documento sem dar ciência à parte contrária com pelo menos três dias de antecedência.

No Brasil adota-se a “teoria dos frutos da árvore envenenada” trazida do direito norte-americano. Segundo essa teoria, a prova, ainda que lícita, mas decorrente de outra prova ilícita, não pode ser aceita. Exemplo: o réu, mediante tortura, aponta três testemunhas. Essas testemunhas são chamadas a Juízo. A oitiva dessas testemunhas, apesar de lícita, será considerada ilícita, pois se originou de uma prova ilícita. Não poderá ser aceita.

1.7. Ônus da Prova

O ônus da prova é o encargo que recai sobre as partes, impondo-lhes o dever de provar algo, sob pena de suportar uma situação processual adversa.

A acusação deve fazer prova da autoria e da materialidade do delito. Deve fazer prova plena desses elementos. Compete, ainda, à acusação fazer prova do elemento subjetivo, isto é, do dolo da ação ou do elemento normativo, ou seja, a culpa: provar que o agente agiu com imprudência, negligência ou imperícia.

A defesa deve provar os fatos impeditivos (excludentes de ilicitude), extintivos (causas de extinção da punibilidade) ou modificativos (desclassificação ou causas de diminuição da pena) do direito do autor. A defesa não precisa produzir prova plena, basta o juízo de probabilidade.

1.8. Sistemas de Apreciação da Prova

Sistema Primitivo (hoje abandonado). Utilizavam-se dois sistemas: o sistema religioso e o sistema étnico ou pagão. O sistema religioso invocava a divindade para

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apreciar as provas, qualquer que fosse o julgamento (duelos etc.). No sistema étnico ou pagão, a apreciação das provas era feita de forma empírica, sem qualquer regra.

Sistema Moderno. São três os sistemas modernos:

• Sistema da íntima convicção ou da certeza moral do julgador. Nesse sistema, a decisão fica a cargo do juiz, que decide observando certas regras, porém, não há necessidade de fundamentação do julgamento. Dá ensejo a abusos.

• Sistema da prova legal ou da certeza moral do legislador. A lei fixa um regime tarifado de provas, preestabelecendo o valor de cada prova.

• Sistema do livre convencimento motivado ou persuasão racional do juiz. Nesse sistema, o julgador tem liberdade para decidir, formando sua convicção pela livre apreciação das provas, porém, com a obrigação de fundamentar seu julgamento.

O Código de Processo Penal adota o sistema do livre convencimento motivado. Há uma exceção estabelecida no Código: para o Tribunal do Júri aplica-se o sistema da íntima convicção, uma vez que os jurados não podem fundamentar suas decisões.

Das Provas em Espécie

1. PERÍCIAS

A perícia é um exame realizado por quem tem conhecimento técnico específico. Sua finalidade é prestar auxílio ao juiz em questões fora de sua área de conhecimento profissional.

Natureza jurídica: é um meio de prova nominado. Seu valor probatório é idêntico ao dos demais meios de prova.

A perícia pode ser realizada a qualquer momento, desde o Inquérito Policial até a execução. Quando realizada no inquérito, a perícia é determinada pela autoridade policial, que pode determinar a realização de qualquer perícia, exceto a perícia de insanidade mental, que somente pode ser determinada pelo juiz. O juiz pode determinar a realização de qualquer perícia. Nos termos do artigo 26, inciso I, alínea “b”, da Lei n. 8.625/93, o promotor pode requisitar perícia dentro de procedimento presidido por ele, como por exemplo, durante inquérito civil.

O juiz, ao apreciar o laudo pericial, não é obrigado a acatá-lo, mas, para afastá-lo, deve fazê-lo fundamentadamente.

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O perito é um sujeito processual secundário. Não podem ser peritos: os menores de 21 anos (o novo Código Civil não modificou o inciso III do artigo 279 do Código de Processo Penal), os analfabetos, aqueles sujeitos à interdição temporária de direitos, aqueles que já se manifestaram sobre o objeto da perícia.

O perito pode ser:

• Perito oficial: servidor público (que prestou concurso);

• Perito não-oficial ou louvado: particular nomeado pela autoridade na falta de perito oficial.

O perito louvado é nomeado pela autoridade policial ou judiciária. Assim que assume o encargo, o perito não-oficial deve prestar o compromisso de bem e fielmente cumprir suas funções (a falta de compromisso é vista como mera irregularidade). Deve portar diploma de curso superior, de preferência na área do exame.

As partes não podem interferir na nomeação dos peritos (artigo 276 do Código de Processo Penal). Não há no Processo Penal a figura do assistente técnico. As partes podem requerer, particularmente, uma perícia e juntá-la aos autos.

Na perícia realizada por precatória, quem nomeia o perito é o juiz deprecado. Salvo na Ação Penal Privada em que, havendo acordo entre querelante e querelado, a nomeação será feita pelo juiz deprecante (artigo 177 do Código de Processo Penal).

O laudo pericial deve conter:

• histórico e introdução (doutrina);

• descrição minuciosa do objeto (Código de Processo Penal);

• fundamentação (doutrina);

• respostas aos quesitos (Código de Processo Penal);

• conclusão (doutrina).

Sempre a perícia deve ser realizada por dois peritos, sob pena de nulidade relativa.

O Exame de Corpo de Delito é o exame pericial obrigatório, destinado a comprovar a materialidade das infrações penais que deixam vestígios, isto é, infrações não transeuntes. Sua falta acarreta a nulidade absoluta do processo. Pode ser direto, quando se examinam diretamente os vestígios do crime (exemplo: cadáver); ou indireto, quando se analisa elemento secundário no qual o vestígio foi registrado (exemplo: os peritos não examinam a vítima, mas a ficha hospitalar). Excepcionalmente, na impossibilidade de realização do

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exame de corpo de delito, pode ser suprido pela prova testemunhal. A confissão nunca supre a falta do exame de corpo de delito.

O Exame Necroscópico é o exame pericial realizado em cadáver. Seu objetivo é determinar a causa da morte. Só pode ser realizado seis horas após o óbito. Será dispensado em caso de morte natural ou morte violenta.

Laudo ou exame complementar é qualquer perícia que vise complementar a perícia anteriormente realizada. No caso de lesão corporal grave, a perícia complementar deve ser realizada logo depois dos 30 dias da ocorrência do delito.

2. INTERROGATÓRIO

2.1. Introdução

Interrogatório é o ato processual pelo qual o acusado é ouvido pelo juiz sobre a imputação contra ele formulada. O interrogatório possibilita ao acusado o exercício de autodefesa.

Como já dissemos, o interrogatório é ato processual, logo a oitiva feita na delegacia não se trata tecnicamente de um interrogatório. O indiciado é ouvido e não interrogado. Observe-se, no entanto, que o que será dito a seguir sobre interrogatório também se aplica à oitiva realizada pelo Delegado de Polícia.

Discutia-se se o interrogatório é meio de prova ou meio de defesa. O Código de Processo Penal trata como verdadeiro meio de prova. Hoje, na doutrina e na jurisprudência, predomina o entendimento de que o interrogatório tem natureza mista, pois além de servir como meio de prova serve também como meio de defesa, pois é uma oportunidade do réu apresentar sua versão dos fatos (direito de audiência).

O princípio constitucional da ampla defesa (artigo 5.º, inciso LV, da Constituição Federal/88) constitui-se da defesa técnica, que é aquela realizada pelo defensor do acusado, pelo causídico e da autodefesa, que é ato exclusivo do acusado.

A autodefesa pode ser renunciada pelo acusado. Constitui-se a autodefesa de: direito de presença, que é o direito do acusado acompanhar a realização dos atos processuais, depoimentos das testemunhas; e direito de audiência, que é o direito do acusado ser ouvido, participando da formação do livre convencimento do juiz. O réu também tem a garantia constitucional de permanecer calado em seu interrogatório, sem que qualquer sanção lhe seja aplicada.

O interrogatório do réu presente é ato indispensável. Sua falta acarretará a nulidade absoluta do processo. Exceção: poderá haver processo de réu presente sem interrogatório nos crimes constantes do Código Eleitoral e da Lei de Imprensa. Para o réu revel (citado

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pessoalmente que não comparece nem constitui advogado), o interrogatório será dispensado. Se comparecer no decorrer da instrução, espontaneamente ou preso, será interrogado.

Para o interrogatório, é indispensável a citação do réu.

O artigo 188 do Código de Processo Penal estabelece o roteiro das perguntas que devem ser feitas no interrogatório.

2.2. Características do Interrogatório

• Ato público (excepcionalmente, a publicidade poderá ser restringida, nos termos do artigo 792 do Código de Processo Penal).

• Ato processual oral. Exceções: para o surdo, as perguntas serão feitas por escrito e respondidas oralmente; para o mudo as perguntas serão feitas oralmente e respondidas por escrito; para o surdo-mudo, as perguntas e as respostas serão feitas por escrito. Se o réu for estrangeiro ou surdo-mudo e analfabeto, será nomeado um intérprete que funcionará também como curador.

• Ato personalíssimo. Só o réu pode ser interrogado.

• Ato individual.

• Ato privativo entre juiz e réu. As partes não podem fazer reperguntas. O defensor poderá, entretanto, zelar pela regularidade formal do processo. Com a entrada do Novo Código Civil, não se exige mais a presença de curador para o menor de 21 anos.

2.3. Momento do Interrogatório

Como regra, o momento do interrogatório é posterior à citação e anterior à defesa prévia. Mas como o Código de Processo Penal não fixou prazo, entende-se que o interrogatório pode ser realizado a qualquer momento. É ato não preclusivo. Pode realizar-se inclusive após a sentença, desde que antes do trânsito em julgado. Assim, se o réu comparecer em Juízo antes do trânsito em julgado e manifestar o desejo de ser ouvido, o juiz deverá interrogá-lo. Caso já exista apelação, o julgamento deverá ser convertido em diligência para que o réu seja ouvido, sob pena de cerceamento da defesa. Em situações excepcionais, entende-se ser o interrogatório – após a sentença – facultativo, dispensável quando, por exemplo, for possível antever a absolvição do acusado.

Caso o juiz entenda necessário, o réu já interrogado poderá ser novamente interrogado.

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No procedimento da Lei n. 9.099/95, o momento do interrogatório é posterior à oitiva das testemunhas.

2.4. Direitos do Réu no Interrogatório

O réu, durante o interrogatório, tem o direito de permanecer em silêncio, conforme artigo 5.º, inciso LXIII, da Constituição Federal de 1988. O réu que responde ao interrogatório não está obrigado a dizer a verdade, poderá mentir sem sofrer qualquer sanção. A mentira do réu no interrogatório só será considerada crime se fizer auto-acusação falsa, conforme artigo 341 do Código Penal.

O réu ainda tem o direito de entrevistar-se com seu advogado antes do interrogatório. Esse direito vem previsto no Pacto de San José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário.

2.5. Interrogatório por Precatória

O provimento CXCI (1984) do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo possibilita a realização de interrogatório por precatória, pois, no processo penal, não vige o princípio da identidade física do juiz. O provimento vige somente no Estado de São Paulo.

No tocante ao interrogatório on line, sistema de vídeo conferência, a doutrina questiona sua validade pela ausência física de um juiz, pois o interrogado poderá estar sofrendo alguma coação e essa não ser percebida. A jurisprudência o admite excepcionalmente.

2.6. Interrogatório do Menor de 21 anos

Antes da promulgação do novo Código Civil, se o réu fosse menor, o interrogatório deveria ser feito na presença de um curador. A omissão gerava nulidade relativa. A idade do menor era aferida na data da realização do ato e não na do cometimento da infração penal. A Súmula n. 352 do Supremo Tribunal Federal dispõe que não é nulo o processo penal por falta de nomeação de curador ao réu menor que teve a assistência de defensor dativo. A idade do acusado é provada por meio de documento hábil, como a certidão de nascimento ou a carteira de identidade. Não havia nulidade do processo se o réu mentisse acerca de sua idade.

O artigo 194 do Código de Processo Penal foi ab-rogado, à semelhança do artigo 15, pois o acusado maior de 18 e menor de 21 anos não é mais relativamente incapaz, podendo realizar todos os atos da vida civil, dispensando curador.

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Será necessária, todavia, a nomeação de curador para o interrogatório do silvícola não adaptado e do doente mental.

3. CONFISSÃO

3.1. Conceito

Confissão é a admissão pelo réu da autoria dos fatos a ele imputados. A confissão refere-se à autoria do fato. A materialidade do delito não é objeto da confissão. A confissão feita perante a autoridade judicial configura atenuante genérica nos termos do artigo 65, inciso III, alínea “d”, do Código Penal. A confissão não é mais considerada a rainha das provas; ao magistrado caberá apreciar a confissão em consonância com as demais provas produzidas.

3.2. Espécies de Confissão

• Simples: quando o réu admite a autoria de fato único, atribui a si a prática de infração penal.

• Qualificada: quando o réu admite a autoria dos fatos a ele imputados, mas alega algo em seu benefício, opõe um fato modificativo ou impeditivo, por exemplo: excludente de antijuridicidade, culpabilidade.

• Complexa: quando o réu admite a autoria de fato múltiplo.

• Judicial: é a confissão prestada perante o juiz competente, no próprio processo.

• Extrajudicial: é a confissão prestada no Inquérito Policial, ou fora dos autos da ação penal.

• Explícita: quando o acusado reconhece ser o autor da infração.

• Implícita: quando o acusado não admite a autoria, mas realiza atos que levam indiretamente à conclusão de que ele é o autor do delito. Exemplo: quando o acusado procura ressarcir o ofendido dos prejuízos causados pela infração.

3.3. Características da Confissão

A confissão é ato personalíssimo do réu.

É ato livre e espontâneo.

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A confissão é um ato retratável, isto é, o acusado pode desdizer a confissão prestada. A confissão é ainda um ato divisível, isto é, o juiz poderá cindir a confissão feita pelo acusado, acatando-a em parte ou no todo.

3.4. Confissão Ficta

A confissão ficta ou presumida não se verifica no processo penal, em virtude da verdade real que norteia o processo penal. Ainda que o processo corra à revelia do réu, não haverá presunção de veracidade dos fatos alegados pela acusação.

3.5. Confissão Delatória ou Chamada de Co-Réu

Ocorre quando um réu, no interrogatório, imputa a terceiro a responsabilidade pela prática do crime, além de confessar sua própria participação. No tocante a imputação a terceiro, seu valor equivale à prova testemunhal, havendo a possibilidade de reperguntas pelas partes. Para alguns autores, no entanto, a confissão delatória é uma prova nula, pois não se sujeita ao princípio do contraditório, uma vez que nem o co-réu delatado nem seu advogado acompanham o interrogatório do delator.

4. PROVA TESTEMUNHAL

4.1. Conceito

Testemunha é toda pessoa estranha ao processo e eqüidistante das partes, chamada em Juízo para depor sobre os fatos que caíram sobre seus sentidos.

4.2. Classificação

• direta ou “de visu”: depõe sobre os fatos que presenciou – teve contato direto;

• indireta ou “de audito”: depõe sobre os fatos que tomou conhecimento por terceiros, que “ouviu dizer”;

• própria: presta depoimento acerca do tema probandu, do fato objeto da prova;

• imprópria ou instrumentária: é a testemunha chamada a presenciar a prática de atos processuais ou atos do inquérito policial;

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• referida: são aquelas citadas no depoimento de outra testemunha; serão ouvidas como testemunhas do Juízo;

• informante: são as testemunhas que não prestam compromisso de dizer a verdade;

• numerária: testemunha arrolada pela parte de acordo com o número máximo legal e que são compromissadas (número máximo: 8 no processo comum; 5 no processo sumário; 5 no plenário do júri; 3 no juizado especial criminal);

• extra-numerária: não entra no cômputo legal. São as referidas, informantes, testemunhas que nada souberam a respeito dos fatos.

4.3. Características

• Retrospectividade: depõe sobre fatos passados.

• Oralidade: a prova testemunhal é oral, exceto para o surdo, o surdo-mudo e o mudo. A testemunha não pode trazer o depoimento por escrito, sendo permitida a consulta a apontamentos. Podem responder por escrito: o Presidente e o Vice-Presidente da República, os Senadores, os Deputados Federais, os Ministros de Estado, os Governadores, os Secretários de Estado, os Prefeitos, os Deputados Estaduais, os Membros do Judiciário, os Membros do Tribunal de Contas da União e os Membros do Tribunal Marítimo.

• Objetividade: é vedado à testemunha emitir opinião pessoal, assim como é defeso ao juiz consigná-la, salvo se inseparável da narrativa.

4.4. Deveres da Testemunha

• Comparecer no dia, hora e local: se o desrespeitar, a testemunha pode ser conduzida coercitivamente; pode ainda responder por crime de desobediência e pagar multa fixada pelo juiz. O juiz só pode obrigar a comparecer a testemunha que resida dentro dos limites do território da sua jurisdição. As testemunhas residentes em outra comarca (testemunhas de fora da terra) devem ser ouvidas por carta precatória. As pessoas impossibilitadas, por enfermidade ou por velhice, de comparecer para depor, serão inquiridas onde estiverem (artigo 220 do Código de Processo Penal). As autoridades mencionadas no artigo 221 serão inquiridas em local, dia e hora previamente ajustados entre elas e o juiz.

• Comunicar mudança de endereço: “as testemunhas comunicarão ao juiz, dentro de 1 (um) ano, qualquer mudança de residência, sujeitando-se, pela simples omissão, às penas do não-comparecimento” (artigo 224 do Código de Processo Penal).

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• Depor e dizer a verdade: acerca do que souber e sobre o que lhe for perguntado. O juiz deverá advertir a testemunha das penas do falso testemunho. A testemunha não pode se recusar a depor. O cônjuge, o ascendente, o descendente e o irmão do réu, entretanto, são dispensados de depor, exceto se não for possível, por outro modo, obter-se ou integrar-se a prova do fato e de suas circunstâncias. Eles têm a obrigação de comparecer, mas não de depor. Se vierem a depor, não prestam compromisso de dizer a verdade (artigo 208 do Código de Processo Penal).

Pergunta-se: Aqueles que não prestam o compromisso de dizer a verdade, de que trata o artigo 203 do Código de Processo Penal, podem ser acusados de cometerem o crime de falso testemunho?

Resposta: Há divergência. A doutrina majoritária entende que sim. Para esses autores, dentre os quais estão Damásio de Jesus e Nélson Hungria, o compromisso não é elementar do crime. O tipo do artigo 342 do Código Penal menciona “testemunha”, que pode ser compromissada ou não. Para esses autores, o dever de dizer a verdade não decorre do compromisso. Todos têm o dever de dizer a verdade em Juízo. Para a doutrina minoritária, seguida por Heleno Cláudio Fragoso, os que não prestam compromisso são informantes e não testemunhas; se não prestam compromisso, não têm o dever de dizer a verdade, já que esse dever decorre do compromisso. Por isso não respondem pelo crime de falso testemunho.

A jurisprudência está dividida. O Supremo Tribunal Federal decidiu que há crime de falso testemunho, mesmo que a pessoa não preste compromisso.

Algumas pessoas, em razão da função, ofício, ministério ou profissão que exercem, devem guardar segredo e por isso são proibidas de depor (exemplo: padres, advogados etc.). Poderão depor desde que: 1) sejam desobrigadas pela parte beneficiada pelo sigilo; 2) queiram depor. Observe-se que a lei não dispensa essas pessoas de prestarem compromisso de dizer a verdade, caso elas queiram depor. Assim, se mentirem, não há dúvidas de que poderão responder pelo crime de falso testemunho.

Observação: função pressupõe atividade de natureza pública; ofício diz respeito a atividade predominantemente manual (exemplo: mecânico, sapateiro etc.); ministério trata-se de atividade de cunho eclesiástico ou assistencial; e profissão refere-se a atividade predominantemente intelectual (exemplo: advogado, psicólogo etc.).

4.5. Informantes

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Informantes são as pessoas que não prestam compromisso de dizer a verdade. São os menores de 14 anos e os deficientes mentais.

4.6. Contradita

É o meio adequado de se argüir a suspeição ou a inidoneidade da testemunha. O momento de se contraditar é logo após a qualificação da testemunha. Se contraditada, o juiz ouve a parte contrária e decide antes de iniciar a oitiva da testemunha. O juiz poderá ouvi-la como informante.

4.7. Intimação

Apesar da lei referir-se a intimação, doutrinariamente trata-se de notificação, pois a testemunha é comunicada sobre a realização de ato futuro.

As testemunhas são notificadas por mandado cumprido por oficial de justiça.

O preso deve ser requisitado.

O militar deve ser requisitado à autoridade superior.

O funcionário público deve ser notificado por mandado, devendo a expedição do mandado ser imediatamente comunicada ao chefe da repartição (artigo 221, § 3.º, do Código de Processo Penal). Atente-se para o fato de que o Código de Processo Civil (artigo 412, § 2.º) exige que o funcionário público seja requisitado ao chefe da repartição.

4.8. Sistema de Inquirição

O sistema de inquirição vigente é o presidencialista ou do exame judicial: “as perguntas das partes serão requeridas ao juiz, que as formulará à testemunha. O juiz não poderá recusar as perguntas da parte, salvo se não tiverem relação com o processo ou importarem repetição de outra já respondida” (artigo 212 do Código de Processo Penal).

Exceção: no plenário do Júri adota-se o sistema do exame direto. As partes direcionam as perguntas à testemunha.

5. DECLARAÇÕES DO OFENDIDO

Sempre que possível, o juiz deverá ouvir o sujeito passivo da infração (artigo 201 do Código de Processo Penal).

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A esse meio de prova se aplicam as mesmas regras da prova testemunhal, observado o seguinte:

· Vítima presta declarações e não depoimento.

· Vítima não é computada no número legal de testemunhas.

· Vítima não responde pelo crime de falso testemunho (observação: se der causa a investigação policial ou a processo judicial, imputando a alguém crime de que o sabe inocente, responderá pelo crime de denunciação caluniosa).

· Vítima não precisa ser arrolada pelas partes, devendo ser ouvida de ofício pelo juiz.

Dos Sujeitos Processuais

1. DOS SUJEITOS PROCESSUAIS

Os sujeitos processuais dividem-se em principais e acessórios. Principais ou essenciais são aqueles cuja ausência torna impossível a existência da relação jurídico-processual: o juiz e as partes. O juiz é o sujeito processual imparcial e as partes são os sujeitos processuais parciais, representados pela acusação, que é o Ministério Público ou o querelante, e pela defesa, que é o réu ou o querelado. Os sujeitos acessórios ou secundários não são indispensáveis ao processo, mas nele intervêm de alguma forma: são os órgãos auxiliares da justiça, o assistente de acusação e os terceiros (interessados e não-interessados).

O rol de terceiros interessados consta do artigo 31 do Código de Processo Penal. Os terceiros não-interessados são as testemunhas, os peritos, o tradutor e o intérprete.

1.1. Juiz

O juiz exerce o papel de maior relevo no processo. A lei confere-lhe os poderes necessários para zelar pelo processo e solucionar a lide em nome do Estado.

Vedadas que estão, em matéria penal, a autotutela e a autocomposição, exceção feita em casos restritos, o Estado assume o dever de prestar jurisdição, sempre que

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presentes determinadas condições, sendo defeso ao juiz, diante de um caso complexo ou incômodo, eximir-se de sentenciar (artigo 5.º, inciso XXXV, da Constituição Federal). Trata-se do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional.

Para desempenhar suas funções, o Estado confere ao juiz poderes que são na verdade instrumentos para que o juiz possa julgar (artigo 251 do Código de Processo Penal). Esses poderes são:

•Poderes de polícia ou administrativos: representa o poder de praticar atos para manter a ordem e o decoro no decorrer do processo. É o que ocorre, por exemplo, nas hipóteses dos artigos 792, § 1.º, 794 e 497, todos do Código de Processo Penal.

•Poderes jurisdicionais: podem ser:

− Poderes-meios: são os poderes ordinatórios consistentes nos atos de condução do processo até a sentença (exemplo: intimar o réu) e poderes instrutórios destinados a colher material para a formação da sua convicção, podendo determinar até de ofício a realização de diligências (exemplo: Código de Processo Penal, artigos 209, 407, 502 etc.).

− Poderes-fins: são os atos de decisão e de execução (decretação de prisão provisória, concessão de liberdade provisória, arbitramento e concessão de fiança, extinção da punibilidade do agente, absolvição ou condenação).

O juiz penal exerce, ainda, funções anômalas, tais como:

•Fiscalizar o princípio da obrigatoriedade da ação penal (artigo 28 do Código de Processo Penal);

•Requisitar a instauração de inquérito (artigo 5.º, inciso II, do Código de Processo Penal), bem como arquivá-lo;

•Receber a notitia criminis (artigo 39 do Código de Processo Penal) e levá-la ao Ministério Público (artigo 40 do Código de Processo Penal);

Para tanto, são necessários alguns pressupostos processuais subjetivos relativos à função de juiz. São eles:

•Investidura: a jurisdição só pode ser exercida por quem tenha sido regularmente investido na função de juiz, atualmente pela aprovação em concurso público de provas e títulos, observando-se nas nomeações a ordem de classificação (artigo 93, inciso I, da Constituição Federal).

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•Imparcialidade: o juiz deve estar, no processo, acima e eqüidistante das partes, super et inter partes. O juiz não pode ter qualquer interesse na solução da lide. Se presentes algumas das causas de suspeição (artigo 254 do Código de Processo Penal), impedimento (artigo 252 do Código de Processo Penal) ou incompatibilidade (artigo 253 do Código de Processo Penal), o juiz deverá ser afastado do processo. Os casos de impedimento são mais graves e acarretam a inexistência do ato realizado pelo juiz impedido. Na suspeição, o juiz tem interesse no resultado do processo, assim a suspeição gera a nulidade absoluta do processo. Para a jurisprudência e parte da doutrina, o rol que trata do impedimento e da suspeição, por ser restritivo de direitos, é um rol taxativo que não pode ser ampliado. No processo penal, o juiz também pode declinar de sua atuação por motivo de foro íntimo.

• Competência: o juiz deve ser o competente para julgar a lide, segundo as regras de competência previstas na Constituição Federal e em leis infraconstitucionais.

1.2. Autor

Autor, no processo penal, é o Ministério Público, no caso da ação penal pública, e o querelante (ofendido ou seu representante legal), no caso de ação penal privada. A ação penal privada pode ser: exclusivamente privada; ou subsidiária da pública no caso de inércia do Ministério Público.

O Ministério Público atuará sempre no processo penal, seja como autor na ação penal pública, seja como custus legis, isto é, fiscal da lei, na ação penal privada. Mesmo enquanto autor da ação penal pública, o Ministério Público não deixa de atuar como fiscal da lei, em razão dos interesses públicos que representa.

1.2.1. Ministério Público

“O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (artigo 127 da Constituição Federal).

A Constituição Federal, no artigo 129, inciso I, atribuiu ao Ministério Público, além de outras, a função de propor a ação penal pública com exclusividade, com exceção apenas no artigo 5.º, inciso LIX, ao conferir ao ofendido a titularidade da ação penal privada subsidiária da pública, em caso de desídia do membro do parquet.

As funções do Ministério Público só podem ser exercidas por integrantes da carreira (artigo 129, § 2.º, da Constituição Federal). Com isso, a Carta Magna vedou a possibilidade do promotor ad hoc, isto é, a nomeação de uma pessoa que faça às vezes do promotor para algum ato processual.

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O Ministério Público tem natureza jurídica de parte no processo penal, mas não se trata de uma parte qualquer, pois age motivado por interesses públicos. Por isso, possui algumas peculiaridades, como a possibilidade de impetrar habeas corpus e de recorrer em favor do réu.

Vale lembrar ainda que, conforme dispõe o artigo 68 do Código de Processo Penal, o Ministério Público também tem legitimidade para promover a ação civil ex delicto em nome do ofendido se este for pobre. Nesse caso, o Ministério Público atua como substituto processual.

A atuação do Ministério Público deve ser imparcial, e para que isso seja possível a Constituição Federal assegura ao órgão como um todo e aos seus membros algumas garantias. Ao Ministério Público garante: estruturação em carreira, autonomia administrativa e orçamentária, limitações à liberdade do chefe do executivo para nomeação e destituição do procurador-geral, vedação de promotores ad hoc etc. Aos membros a Constituição Federal garante: ingresso na carreira mediante concurso público de provas e títulos, vitaliciedade, inamovibilidade, irredutibilidade de vencimentos etc.

Seus membros estão sujeitos à mesma disciplina dos magistrados quanto às suspeições e impedimentos, no que lhes for aplicável (artigo 258 do Código de Processo Penal).

São princípios do Ministério Público:

•Unidade: os membros de cada Ministério Público integram um só órgão.

•Indivisibilidade: seus membros podem ser substituídos por outros no curso do processo, pois funcionam em nome da instituição.

•Independência funcional: seus membros não se sujeitam às ordens de quem quer que seja, nem do procurador-geral. Também não estão subordinados a nenhum dos poderes. O princípio não exclui, entretanto, a subordinação administrativa do órgão à autoridade que lhe for, dentro da instituição, hierarquicamente superior, sujeitando-se a fiscalizações, correições, punições etc.

1.2.2. Querelante

Em regra a acusação é feita pelo órgão do Ministério Público.

Excepcionalmente, a acusação será feita pelo ofendido, que é o sujeito passivo da infração penal, nas seguintes hipóteses:

• ação penal privada subsidiária da pública: quando houver desídia do membro do Ministério Público (artigo 29 do Código de Processo Penal) ;

• ação penal exclusivamente privada: nos casos previstos na lei penal. 105

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1.3. Acusado

O acusado é aquele contra quem se dirige a pretensão punitiva estatal. É o sujeito passivo da relação jurídico-processual.

O acusado deve ser identificado com o nome e outros qualificativos (prenome, estado civil, profissão, filiação, apelido, residência e idade). O Código de Processo Penal, entretanto, permite a propositura da ação penal somente com a descrição física do indivíduo quando impossível sua identificação por seu verdadeiro nome (artigo 259 do Código de Processo Penal). Descobrindo-se o verdadeiro nome do acusado, a correção da irregularidade pode ser feita a qualquer tempo (inclusive após o trânsito em julgado) por simples termo nos autos.

É necessário que o acusado tenha capacidade:

• “legitimatio ad causam”: deve haver coincidência entre a pessoa apontada na peça inicial como o autor do fato e o suspeito da prática do crime, indicado no inquérito ou nas peças de informação;

• “legitimatio ad processum”: é a capacidade de estar em juízo, que no processo penal advém com a idade de 18 anos. Ao amental maior de 18 anos poderá ao final do processo ser imposta medida de segurança.

Não podem ser acusadas as pessoas que dispõem de imunidade parlamentar ou diplomática.

A Constituição Federal prevê uma série de garantias ao acusado no processo penal, entre as quais:

•Devido processo legal (artigo 5.º, inciso LIV, da Constituição Federal).

•Contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (artigo 5.º, inciso LV, da Constituição Federal). A ampla defesa compreende a defesa técnica, exercida por profissional habilitado, e a autodefesa, manifestada no interrogatório, no direito de audiência com o juiz, possibilidade de interpor recurso etc. Observação: o acusado poderá, sem o defensor: impetrar habeas corpus, interpor recurso (salvo algumas exceções), promover revisão criminal, pagar fiança arbitrada pelo juiz e argüir suspeição.

•Direito de estar em juízo, devendo para tanto ser regularmente citado. Sendo citado, o acusado poderá ou não comparecer em juízo, conforme sua conveniência. Poderá até utilizar sua ausência como meio de defesa. Há casos,

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entretanto, em que a presença do acusado é obrigatória, como nos crimes inafiançáveis da competência do Tribunal do Júri, cujo julgamento não se realiza à revelia (artigo 451, § 1.º, do Código de Processo Penal). Há também outros atos que reclamam a presença do acusado. “Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que sem ele não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença” (artigo 260 do Código de Processo Penal). Quanto ao interrogatório vale a seguinte observação: o réu pode calar-se quanto aos fatos, mas deve comparecer para ser qualificado.

•Direito à defesa técnica. “O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado” (artigo 5.º, inciso LXIII, da Constituição Federal). “Nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor” (artigo 261 do Código de Processo Penal). Se o réu não tiver advogado constituído, o juiz deverá nomear um. A ausência de defesa técnica gera nulidade absoluta. A defesa deficiente poderá gerar nulidade, se houver demonstração de prejuízo para o réu.

•Direito de permanecer em silêncio.

•Direito à integridade física e moral.

A Constituição Federal assegura ao acusado muitos outros direitos em seu artigo 5.º:

XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;

L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

LVIII - o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei;

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LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;

LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;

LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;

LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;

Além desses, outros dispositivos da Constituição Federal dispõem sobre direitos individuais (artigo 5.º, § 2.º, da Constituição Federal).

A Constituição Federal previu a possibilidade de a pessoa jurídica ser o sujeito passivo da infração penal nos casos de crime contra a economia popular, contra a ordem econômica e financeira e nas condutas lesivas ao meio ambiente.

1.4. Defensor

O defensor não é sujeito processual. O defensor age em nome e nos interesses do acusado. Exerce a defesa técnica do acusado, que é tão importante e indisponível que poderá ser exercida ainda que contra a vontade do representado ou mesmo na sua ausência. No processo civil, o contraditório se designa pelo binômio “ciência necessária e participação possível”. No processo penal o contraditório deve ser real e efetivo, ou seja, exige-se no processo penal “ciência e participação necessárias”.

A ampla defesa, no processo penal, constitui-se de:

•autodefesa (dividida em dois aspectos: direito de presença e direito de audiência);

•defesa técnica, desempenhada por pessoa legalmente habilitada, que é o advogado (artigo 133 da Constituição Federal).

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Pelos motivos já expostos, a defesa técnica é indispensável. A autodefesa, entretanto, poderá ser dispensada pelo réu (nunca pelo juiz), o que caracterizará a revelia.

O Código de Processo Penal utiliza as seguintes denominações para o representante do réu:

•procurador: é o advogado constituído por procuração ou indicado pelo réu no interrogatório, sendo que neste caso dispensa-se a procuração;

•defensor: é nomeado pelo juiz e pode ser dativo (para o réu que, podendo, não constitui procurador) ou público (para o réu necessitado que não tem condições de constituir procurador);

•curador: patrono do réu maior de 18 e menor de 21 anos, seja ele constituído ou nomeado.

Se o acusado possuir habilitação técnica, ele mesmo poderá se defender.

Para a realização de alguns atos no processo, o defensor precisa de poderes especiais, como poderes para argüir a suspeição, argüir falsidade de documento e concordar com perdão do querelante.

Se o juiz nomear defensor, o réu, a qualquer tempo, poderá constituir outro ou pedir a substituição do primeiro.

Se o réu tiver condições de pagar procurador e não constituir um, o juiz nomear-lhe-á defensor dativo, mas nesse caso ser-lhe-ão cobrados honorários advocatícios, arbitrados pelo juiz.

O defensor nomeado pelo juiz tem o dever de aceitar a função, só podendo recusá-la por motivo justificado, sob pena de infração disciplinar.

Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, o defensor dativo não tem a obrigação de recorrer, mas, se o acusado interpuser recurso, o defensor dativo tem a obrigação de arrazoar o recurso.

A intimação do defensor dativo é feita pessoalmente e a intimação do defensor constituído é feita por publicação na imprensa oficial. A Lei n. 1.060/50, artigo 5.º, § 5.º, que trata da assistência judiciária, prevê o prazo em dobro para o defensor público. A jurisprudência estende a prerrogativa do prazo em dobro ao defensor dativo e aos advogados com convênio na Procuradoria-Geral do Estado.

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Se existirem vários réus, o juiz deverá nomear um defensor para cada um deles, a fim de evitar colidência das teses defensivas, o que ensejaria nulidade absoluta.

A falta do defensor, ainda que motivada, não implica adiamento do ato processual, devendo o juiz nomear ao réu um substituto ad hoc para o ato.

Entendíamos desnecessária a nomeação de curador para o réu menor de 21 anos que já tenha defensor dativo ou constituído (súmula n. 352 do Supremo Tribunal Federal). Com a entrada em vigor do novo Código Civil, desapareceu a necessidade de curador para o menor de 21 anos.

1.5. Assistente de Acusação

1.5.1. Introdução

O assistente de acusação é parte contingente, eventual, no processo.

Podem intervir no processo, como assistentes do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou na falta desses, o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão do ofendido (artigo 31 do Código de Processo Penal), sempre por intermédio de advogado (artigo 268 do Código de Processo Penal). Entendemos que o rol do artigo 31 é taxativo, mas não podemos deixar de mencionar que há autores que defendem a possibilidade do (a) companheiro (a) ser assistente.

O Poder Público pode intervir como assistente da acusação?

Para Tourinho, o Estado não pode intervir, pois o Ministério Público já defende o interesse público. Não há necessidade de o Estado participar como assistente da acusação.

Para o Vicente Greco, é possível a intervenção do Estado, pois o Ministério Público, quando atua, defende interesse público primário (sociedade), e o Estado, quando se habilita como assistente da acusação, vai defender interesse público secundário (patrimonial).

Algumas leis, entretanto, permitem que a Administração Pública habilite-se como assistente:

•O Decreto-lei n. 201/67, que trata da responsabilidade dos prefeitos, no artigo 2.º, § 1.º, prevê expressamente a possibilidade de a Administração Pública federal, estadual e municipal atuar como assistente da acusação.

•No mesmo sentido, o artigo 26, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86 (crimes contra o sistema financeiro), permite a intervenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do Banco Central do Brasil em alguns casos.

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•Artigo 80 do Código de Defesa do Consumidor - Lei n. 8.078/90 - nos crimes previstos nessa lei.

O co-réu pode ser assistente de acusação? Exemplo: lesões corporais recíprocas. Ambos são denunciados pelo mesmo delito. Serão ao mesmo tempo co-réus e vítimas. Um deles poderá habilitar-se como assistente de acusação?

O artigo 270 do Código de Processo Penal dispõe que o co-réu no mesmo processo não poderá intervir como assistente do Ministério Público, concluindo-se, portanto, pela impossibilidade da intervenção do co-réu como assistente da acusação. A doutrina, entretanto, observa a seguinte possibilidade: no processo, um deles é absolvido, o Ministério Público conforma-se com a decisão e esta transita em julgado, enquanto o outro é condenado e apela de sua decisão. Aquele que foi anteriormente absolvido posteriormente pode intervir como assistente da acusação, pois não é mais co-réu.

1.5.2. Finalidade do assistente de acusação

Qual o interesse do assistente de acusação em ingressar no processo penal?

Para uma primeira corrente, dominante na doutrina e na jurisprudência, o assistente tem o interesse de auxiliar o Ministério Público na busca da realização da justiça, reforçando a acusação, e de maneira secundária garantir a reparação do dano causado pelo ilícito. Essa é a posição de José Frederico Marques.

Para uma segunda corrente, perfilhada por Tourinho, a intervenção do assistente fundamenta-se exclusivamente no interesse em obter uma sentença penal condenatória, título executivo judicial a ser executado no juízo cível, reparando os danos decorrentes do ato ilícito. É a posição que adotamos.

A solução de muitas questões envolvendo o tema assistência dependerá da opção em se adotar a primeira ou a segunda corrente.

Por exemplo: se no processo foi aplicado ao réu o sursis na sentença condenatória e o Ministério Público se conforma, o assistente de acusação poderá recorrer, interpondo apelação?

Para os adeptos da primeira posição, o assistente quer a realização da justiça, a correta aplicação da lei ao caso concreto, podendo, portanto, interpor apelação.

Para os adeptos da segunda posição, o assistente já alcançou seu objetivo, a sentença penal condenatória, restando executá-la no juízo cível.

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1.5.3. Admissão do Assistente

O assistente da acusação intervém em todos os termos da ação pública, enquanto não passar em julgado a sentença. Desta feita, não toma parte do inquérito policial nem da execução. Assim, pode intervir a partir do recebimento da denúncia até o trânsito em julgado da decisão.

Deferida a habilitação, receberá o processo no estado em que se achar; não poderá, pois, pretender a renovação de atos processuais sobre os quais já ocorreu a preclusão.

Sua intervenção se dará por meio de advogado com capacidade postulatória e poderes especiais.

No Júri, se o assistente quer participar do julgamento, deve requerer a habilitação três dias antes do julgamento, salvo se já admitido anteriormente. A ausência do assistente não causa o adiamento do julgamento.

O Ministério Público será ouvido previamente sobre a admissão do assistente. O órgão ministerial manifesta-se somente sobre a legalidade. No tocante à avaliação pelo Ministério Público acerca da conveniência e oportunidade para a intervenção do assistente, existem duas posições:

•Para o Prof. Tourinho, seguido pela maioria, o Ministério Público somente examina a legalidade da intervenção.

•Para o Prof. Magalhães Noronha, além da legalidade, o Ministério Público pode manifestar-se sobre a conveniência e a oportunidade da intervenção do assistente.

Da decisão que admite ou não o assistente de acusação não cabe recurso, podendo, entretanto, ser impetrado mandado de segurança. Se o juiz excluir ofendido já habilitado, caberá correição parcial.

1.5.4. Atividades do assistente

O artigo 271 do Código de Processo Penal relaciona os poderes do assistente no processo penal. É um rol taxativo:

a) Propor meios de prova

O assistente pode propor perícias, acareações etc., sendo que sobre a proposta o juiz decide, ouvido o Ministério Público.

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O assistente pode arrolar testemunhas?

O momento para a acusação arrolar testemunhas é no oferecimento da denúncia, e o assistente intervém no processo após o recebimento da inicial, quando, portanto, já ocorreu a preclusão. Há, no entanto, duas posições:

• O momento para arrolar testemunhas já precluiu, não sendo possível posteriormente propor tal meio de prova. Entende, porém, que se o juiz deferir pedido eventualmente formulado pelo assistente, não há nulidade, podendo aqueleouvir a testemunha como se fosse sua.

• É possível, desde que o número de testemunhas arroladas pelo Ministério Público somado ao número das arroladas pelo assistente fique dentro do limite legal.

b) Requerer perguntas às testemunhas

Sempre posteriores às do Ministério Público.

c) Aditar o libelo

O prazo para aditamento do libelo é de dois dias, por analogia ao artigo 420 do Código de Processo Penal. O assistente não pode aditar a denúncia, que é peça exclusiva do Ministério Público.

d) Aditar articulados

•alegações finais no prazo de 3 dias, sucessivo ao do Ministério Público, no procedimento comum (artigo 500 do Código de Processo penal);

•alegações no Júri no prazo de 5 dias, conjuntamente com o do Ministério Público (artigo 406, § 1.º, do Código de Processo Penal).

e) Participar dos debates orais

Sempre após o Ministério Público.

f) Arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público

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Apelação interposta pelo Ministério Público deve ser arrazoada no prazo de 3 dias (artigo 600, § 1.º, do Código de Processo Penal). O recurso em sentido estrito, no silêncio da lei, deve ser arrazoado em 2 dias, pois é o mesmo conferido ao parquet (artigo 588 do Código de Processo Penal).

Apesar do silêncio do legislador, o assistente pode contra-arrazoar recurso da defesa.

g) Arrazoar os recursos por ele interpostos

O Código de Processo Penal só permite ao assistente de acusação interpor:

•recurso de apelação no procedimento do Júri e no Juízo singular, no caso de o Ministério Público não apresentar recurso;

•recurso em sentido estrito contra decisão de impronúncia e que julga extinta a punibilidade.

Conforme a Súmula n. 210 do Supremo Tribunal Federal, o assistente pode recorrer, inclusive extraordinariamente (e especial), contra acórdãos que julguem apelação ou recurso em sentido estrito.

Da decisão concessiva de habeas corpus, o assistente de acusação não pode recorrer, conforme a Súmula n. 208 do Supremo Tribunal Federal.

O prazo para o assistente interpor recurso em sentido estrito e de apelação é de 5 dias se ele já estiver habilitado nos autos, ou de 15 dias se não estiver habilitado, pois, nesse caso, não é intimado da decisão. O termo inicial para o assistente interpor recurso é supletivo e inicia-se no primeiro dia subseqüente ao término do prazo do Ministério Público. Se o Ministério Público já interpôs recurso, não cabe ao assistente propor novamente. Se o Ministério Público só recorreu de parte da decisão, o assistente pode recorrer da parte não recorrida.

1. DA PRISÃO E DA LIBERDADE PROVISÓRIA

1.1. Conceito

Prisão consiste na privação da liberdade de locomoção, mediante clausura, decretada por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, ou decorrente de flagrante delito. Conforme o art. 5.º, inc. LXI, da Constituição Federal,

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ninguém será preso senão em flagrante delito, ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

A prisão será efetuada sem o respectivo mandado somente nos casos de prisão em flagrante, transgressão militar, durante estado de sítio e no caso de recaptura do evadido.

O Código Eleitoral prevê que, 5 dias antes e 48h depois do dia da eleição, não podem ser cumpridos mandados judiciais de prisão processual. Tal disposição visa assegurar o exercício do direito político. Podem, entretanto, ser efetuadas as prisões em flagrante e as decorrentes de sentença penal condenatória com trânsito em julgado.

1.2. Espécies

As espécies de prisão são:

• Prisão Penal ou Prisão com Pena. É a prisão decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado, irrecorrível.

• Prisão Processual, Provisória ou Cautelar. É a prisão decretada no curso do processo. Como tem natureza cautelar, precisam estar presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora para ser decretada. São espécies de prisão processual:

− prisão em flagrante;

− prisão preventiva;

− prisão temporária;

− prisão para apelar;

− prisão por sentença de pronúncia.

• Prisão Civil. A Constituição Federal não permite a prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel, conforme art. 5.º, inc. LXVII, da Constituição Federal.

• Prisão disciplinar. É a prisão para as transgressões militares e os crimes propriamente militares.

• Prisão administrativa. Com a Constituição Federal de 1988, a autoridade administrativa não pode mais aplicar a pena de prisão, sendo necessária a decretação pelo Poder Judiciário, respeitando-se o devido processo legal.

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1.3. Mandado de Prisão

O Código de Processo Penal, nos arts. 285 e ss., trata do mandado (ordem) de prisão. Conforme dispõe esse diploma, a autoridade judicial que ordenar a prisão expedirá o respectivo mandado, que será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade competente. Além de designar pelo nome ou sinais característicos a pessoa a ser presa, o mandado mencionará a infração penal que motivou a prisão, declarará o valor da fiança, se afiançável o delito, e será dirigido a quem tenha qualidade para executá-lo. O mandado será apresentado em duplicata, e o preso passará recibo em uma das vias. A execução do mandado será realizada em qualquer dia e horário, guardadas as disposições sobre inviolabilidade de domicílio. Na prisão em flagrante, não há inviolabilidade de domicílio. Exemplo: guardar entorpecentes em casa é um crime permanente, sua consumação se prolonga no tempo. A prisão em flagrante pode ocorrer a qualquer momento.

1.4. Prisão em Domicílio e em Perseguição

A prisão decorrente de mandado deve respeitar a inviolabilidade do domicílio, prevista no art. 5.º, inc. XI, da Constituição Federal. O mandado de prisão só poderá ser cumprido durante o dia, compreendido o interregno das 6 às 18h. Alguns entendem que o direito ao cumprimento do mandado de prisão se inicia com a aurora e se encerra com o crepúsculo. Nesse período, a prisão pode ser efetuada ainda que sem o consentimento do morador, podendo o executor arrombar as portas se preciso, conforme art. 293 do Código de Processo Penal. O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa cometerá o crime de favorecimento pessoal, art. 348 do Código Penal. Estão excluídos o cônjuge, ascendente, descendente e irmão (cadi) do réu.

Durante a noite, o mandado de prisão só será cumprido se houver concordância do morador. A recusa, nesse caso, não configura crime, é um exercício regular do direito. Se não houver concordância do morador, como cautela, as saídas devem ser vigiadas, tornando a casa incomunicável. Ao amanhecer será efetuada a prisão.

No caso de perseguição, passando o réu para outra Comarca, o executor da prisão poderá prendê-lo onde o alcançar, apresentando-o imediatamente à autoridade policial local, que lavrará o auto de prisão em flagrante, se for o caso, e providenciará sua remoção para apresentação ao juiz que determinou a prisão.

1.5. Prisão Especial

Algumas pessoas, em razão de sua função, cumprirão a prisão processual em celas especiais ou quartéis – tal prisão só vigora até a sentença condenatória definitiva. É

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assegurado: alojamento condigno, alimentação, recreio, uso de vestuário próprio, assistência do advogado, assistência religiosa, assistência médica particular, visita de parentes e amigos em horário previamente fixado, visita de parentes próximos durante o expediente, sem horário determinado, recepção e transmissão de correspondência livremente, salvo casos especiais, e transporte diferenciado. O art. 295 do Código de Processo Penal relaciona aqueles que têm direito à prisão especial. Além desses, há outros previstos em leis especiais também.

Se não houver estabelecimento adequado, poderá ser concedido o regime de prisão provisória domiciliar, na própria residência, de onde o preso não poderá se afastar sem prévio consentimento judicial.

Conforme art. 86, § 3.º, da Constituição Federal, o Presidente da República não estará sujeito à prisão enquanto não sobrevier sentença condenatória transitada em julgado.

1.6. Prisão em Flagrante

A palavra ‘flagrante’ vem do latim, significando ‘queimar’. Flagrante delito é o crime que ‘ainda queima’, isto é, que está sendo cometido ou acabou de sê-lo. A prisão em flagrante é uma medida restritiva da liberdade de natureza processual e cautelar. Consiste na prisão – independente de ordem escrita e fundamentada de juiz competente – de quem é surpreendido enquanto comete ou acaba de cometer a infração penal. Aplica-se também à contravenção.

1.6.1. Espécies de flagrante

• Flagrante próprio: é o flagrante propriamente dito, real ou verdadeiro. O agente é preso enquanto está cometendo a infração penal ou assim que acaba de cometê-la– art. 302, incs. I e II, do Código de Processo Penal.

• Flagrante impróprio: é o flagrante irreal ou “quase-flagrante”. O agente é perseguido logo após cometer o ilícito, em situação que faça presumir ser ele o autor da infração– art. 302, inc. III, do Código Penal.

• Flagrante presumido: é o flagrante ficto ou assimilado. O agente do delito é encontrado, logo depois, com papéis, instrumentos, armas ou objetos que fazem presumir ser ele o autor do delito– art. 302, inc. IV, do Código de Processo Penal.

• Flagrante compulsório: as autoridades policiais e seus agentes têm o dever de efetuar a prisão em flagrante, não possuindo qualquer discricionariedade.

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• Flagrante facultativo: é a faculdade que qualquer um do povo tem de efetuar ou não a prisão em flagrante, conforme os critérios de conveniência e oportunidade.

• Flagrante preparado ou provocado: é o delito de ensaio, delito de experiência, delito putativo por obra do agente provocador. Ocorre quando alguém, de forma insidiosa, provoca o agente à prática de um crime e, ao mesmo tempo, toma providências para que ele não se consume. No flagrante preparado, o policial ou terceiro induz o agente a praticar o delito e o prende logo em seguida, em flagrante. O Supremo Tribunal Federal considera atípica a conduta, conforme a Súmula n. 145.

• Flagrante esperado: essa hipótese é válida. O policial ou terceiro esperam a prática do delito para prender o agente em flagrante. Não há qualquer induzimento.

• Flagrante prorrogado: é o flagrante previsto no art. 2.º, inc. II, da Lei n. 9.034/95, que trata das organizações criminosas. O policial tem a discricionariedade para deixar de efetuar a prisão em flagrante no momento da prática delituosa, tendo em vista um momento mais importante para a investigação criminal e para a colheita de provas. Só é possível nesses crimes.

• Flagrante forjado: é o flagrante maquinado, fabricado ou urdido. Policiais ou terceiros criam provas de um crime inexistente para prender em flagrante. Exemplo: o policial, ao revistar o carro, afirma ter encontrado drogas, quando na verdade foi ele quem colocou a droga dentro do carro, visando a incriminação. Apesar da dificuldade de sua prova, quando ela se dá é considerado crime inexistente, e o policial responde por abuso de autoridade.

O flagrante em crime permanente pode ocorrer enquanto não cessar a permanência do delito. No tocante ao flagrante em crime habitual, surgiram duas correntes:

•A primeira entende que o crime habitual exige a reiteração de condutas, logo, não cabe a prisão em flagrante.

•A segunda afirma que, se já existe prova da habitualidade, pode ocorrer a prisão em flagrante.

A ação penal privada não impede a prisão em flagrante, desde que o ofendido autorize a lavratura do auto ou a ratifique no prazo da entrega da nota de culpa, ou seja, em 24h.

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Não podem ser presos em flagrante:

• Menor de 18 anos (menor é apreendido).

• Diplomatas estrangeiros.

• Presidente da República.

• Agente que socorre a vítima de trânsito– art. 301 da Lei n. 9.503/97.

• Aquele que se apresenta espontaneamente à autoridade após o cometimento do delito. Nada impede, entretanto, que lhe seja decretada a prisão preventiva, se necessário.

Podem ser presos em flagrante apenas nos crimes inafiançáveis:

• membros do Congresso Nacional;

• deputados estaduais;

• magistrados;

• membros do Ministério Público;

• advogados no exercício da profissão.

A autoridade policial competente, para lavrar o auto de prisão, será aquela do local onde se efetivou a prisão. Se for local diferente de onde ocorreu o delito, os autos devem ser posteriormente para lá remetidos a fim de instauração do inquérito policial e propositura da ação penal. Se se desrespeitar essa regra, o auto será válido, haverá mera irregularidade.

No caso de infração militar, o auto de prisão em flagrante é lavrado pela autoridade oficial militar. Nos crimes cometidos no interior da Câmara ou do Senado, a Mesa da Câmara ou outra autoridade competente, designada no regimento interno, lavrará o auto.

Se o fato foi praticado contra autoridade ou em sua presença, ela própria, desde que investida de suas funções, poderá lavrar o auto.

Como o prazo para a entrega da nota de culpa ao preso é de 24 horas, por dedução lógica, o prazo para lavratura do auto também é de 24 horas.

1.6.2. Etapas da prisão em flagrante

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• Comunicação ao preso de seus direitos, dentre eles os de permanecer em

silêncio no interrogatório. Deve-se também comunicar sua família ou seu

advogado sobre a prisão. O direito do preso é o de comunicar e não o de ser

assistido.

• Iniciam-se as oitivas do condutor do preso e depois, no mínimo, de duas

testemunhas. Na falta de uma testemunha, o próprio condutor poderá ser a

testemunha. Não havendo testemunhas, devem ser ouvidas duas testemunhas

que presenciaram a apresentação do preso à autoridade policial – são as

testemunhas instrumentárias. Se for possível, ouve-se também a vítima.

• Interrogatório do preso. Segue os mesmos requisitos do interrogatório judicial.

Até a entrada em vigor do novo Código Civil, se o acusado era menor de 21

anos, havia nomeação de curador, sob pena de relaxamento do flagrante.

• Após 24 horas, deve ser entregue ao preso a nota de culpa, que é o instrumento

que informa ao preso os motivos da prisão. Deve ser assinado pelas

testemunhas. A falta da nota de culpa também acarreta o relaxamento da prisão.

• Encerrada a lavratura do auto, a prisão é comunicada ao juiz, que dará vistas ao

Ministério Público. Com essa comunicação, a autoridade policial se

desincumbe da sua obrigação.

1.7. Prisão Preventiva

A prisão preventiva é uma prisão processual de natureza cautelar. Pode ser decretada desde o inquérito policial até antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Como é exceção, só pode ser decretada quando demonstrado o fumus boni iuris e o periculum in mora.

Será decretada a requerimento do Ministério Público, por representação da autoridade policial, ou de ofício pela autoridade judicial, tanto em ação penal pública como em ação penal privada.

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Se o Ministério Público, ao invés de oferecer a denúncia, devolver os autos para diligências complementares, não poderá ser decretada a preventiva, pois não estão caracterizados os indícios da autoria – falta o fumus boni iuris.

A apresentação espontânea do acusado não impede a decretação da preventiva.

A decisão que denega o pedido de prisão preventiva comporta recurso em sentido estrito, conforme art. 581, inc. V, do Código de Processo Penal. A decisão que concede pedido de prisão preventiva comporta o pedido de habeas corpus.

A prisão preventiva não pode ser decretada nas infrações penais em que o réu se livra solto.

Pressupostos para decretação da prisão preventiva:

• Fumus boni iuris: Prova da materialidade e indícios de autoria.

• Periculum in mora:

− Garantia da Ordem Pública (GOP): Visa impedir que o agente, solto, continue a delinqüir ou acautelar o meio social. Maus antecedentes e reincidência evidenciam provável prática de novos delitos. Também cabível quando o crime se reveste de grande violência e crueldade.

− Conveniência da Instrução Criminal (CIC): Visa impedir que o agente perturbe ou impeça a produção de provas.

− Garantia da Aplicação da Lei Penal (GALP): Há iminente risco de o acusado fugir, inviabilizando a aplicação da lei penal. Cabível principalmente nos casos do agente não ter residência fixa ou ocupação lícita.

− Garantia da Ordem Econômica (GOE): Foi introduzida pela lei antitruste (Lei n. 8.884/94), visando coibir graves crimes contra a ordem econômica, ordem tributária e o sistema financeiro.

• Só se admite a decretação da preventiva nos crimes dolosos:

− punidos com reclusão;

− punidos com detenção, se o acusado for vadio ou de identidade duvidosa;

− se o réu foi condenado por outro crime doloso em sentença transitada em julgado.

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1.8. Prisão Temporária

A prisão temporária não está prevista no Código de Processo Penal, mas na Lei n.

7.960/89. Suas principais características são:

• Somente é decretada durante o inquérito policial.

• Nunca pode ser decretada de ofício, somente por requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial.

• Tem prazo determinado. Esgotado o prazo, o acusado deve ser solto. Em regra, o prazo é de 5 dias, prorrogáveis por mais 5 em caso de extrema e comprovada necessidade. Nos crimes hediondos e assemelhados (Lei n. 8.072/90), o prazo é de 30 dias prorrogáveis. Apesar de ter prazo predeterminado, pode ser revogada antes disso.

• É uma prisão de natureza cautelar, só tem razão de ser quando necessária. Após esgotado o prazo, o acusado pode continuar preso, se houver a conversão da prisão temporária em prisão preventiva.

O art. 1.º da Lei n. 7.960/89 determina os requisitos necessários para a decretação da prisão temporária. São eles:

• quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;

• quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos suficientes para sua identificação;

• quando houver fundadas razões– provas de o agente ser autor ou ter participado dos seguintes crimes:

− atentado violento ao pudor;

− crimes contra o sistema financeiro nacional;

− extorsão;

− extorsão mediante seqüestro;

− estupro;

− epidemia com resultado morte;

− envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal, qualificados por morte;

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− genocídio;

− homicídio doloso;

− quadrilha ou bando;

− roubo;

− rapto violento;

− seqüestro ou cárcere privado;

− tráfico de drogas.

O rol do art. 1.º, inc. III, da Lei n. 7.960/89 é taxativo, mas não se esgota ali; a Lei n. 8.072/90 o complementa.

Os requisitos do art. 1.º, incs. I a III, são alternativos ou cumulativos?

Posições:

•Uma primeira corrente, sustentada pelos Profs. TOURINHO e MIRABETE, afirma que os requisitos são alternativos.

•Uma segunda, sustentada pelo Prof. SCARANCE, estabelece que os requisitos são cumulativos e que todos devem estar presentes para que seja decretada a temporária. Inviabiliza, na prática, a aplicação da lei..

•Uma terceira corrente, sustentada pelo Prof. VICENTE GRECO FILHO, entende que os requisitos são alternativos, porém, o juiz só poderá decretar a prisão temporária se presentes os fundamentos da preventiva (GOP, GOE, GALP, CIC).

•Uma quarta, sustentada pelos Profs. DAMÁSIO DE JESUS e MAGALHÃES GOMES FILHO, sustenta que, como em toda prisão cautelar, devem estar presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora. Na temporária, o periculum in mora é o requisito do art. 1.º, incs. I ou II, da Lei n. 7.960/89; e o fumus boni iuris é o requisito do art. 1.º, inc. III, da Lei 7.960/89. O juiz, portanto, no caso concreto, vai decretar a temporária se estiverem presentes:

− o inc. III combinado com o inc. I;

− o inc. III combinado com o inc. II.

É a posição dominante e acolhida pela jurisprudência.

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Prisão e Liberdade Provisória

DA PRISÃO E DA LIBERDADE PROVISÓRIA

Prisão Por Sentença Condenatória Recorrível (Prisão Para Apelar)

O artigo 393, inciso I, do Código de Processo Penal dispõe que um dos efeitos da sentença condenatória recorrível é ser o réu preso ou conservado na prisão, seja no caso de infrações inafiançáveis, seja nas afiançáveis – enquanto não prestar fiança. O artigo 594 do Código de Processo Penal dispõe que o réu não poderá apelar sem estar recolhido à prisão ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes – assim reconhecido na sentença condenatória – ou condenado por crime de que se livre solto. Em virtude desses dispositivos, são requisitos da prisão por sentença condenatória recorrível:

Sentença condenatória recorrível a pena privativa de liberdade não suspensa e não substituída (inexistência de sursis penal ou pena alternativa).

Ser o réu reincidente ou primário de maus antecedentes. Se for primário e de bons antecedentes poderá apelar em liberdade.

Ser a infração inafiançável ou, se afiançável, não tiver sido paga a fiança.

A prisão por sentença condenatória recorrível não é decretada no caso de infrações em que o réu se livra solto, em que não é aplicada pena privativa de liberdade ou quando o máximo da pena privativa de liberdade não exceder a 3 meses (artigo 321 Código de Processo Penal).

1.1.1. Regras específicas

A Lei n. 8.072/90 (crimes hediondos), no artigo 2.º, § 2.º, e a Lei n. 9.613/98 (lavagem de capitais), no artigo 3.º, determinam que o juiz decidirá, fundamentadamente, se o réu apelará em liberdade ou não.

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A Lei n. 6.368/76 (tóxicos), no artigo 35, e a Lei n. 9.034/95 (organizações criminosas), no artigo 9. º, vedam a possibilidade de o réu apelar em liberdade.

Na visão da doutrina, o réu só poderá ser preso por força de sentença condenatória recorrível quando o encarceramento se mostrar necessário. Isso ocorre quando presentes os requisitos da prisão preventiva (fumus boni iuris, que é a sentença condenatória recorrível; e o periculum in mora, garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal, garantia da aplicação da lei penal). Deve-se compatibilizar essa prisão com o princípio constitucional do estado de inocência. Só os requisitos do artigo 594 do Código de Processo Penal não podem determinar a prisão, pois seria execução antecipada da pena.

Quanto à jurisprudência, há duas posições:

Parte dela aplica o artigo 594 do Código de Processo Penal in totum.

Para outra parte, o tratamento depende de como o réu respondeu o processo, se preso ou solto. Se durante o processo o réu estava solto, não há porquê prendê-lo para recorrer da sentença. Se estava preso durante o processo, não há razão para soltá-lo; ele permanecerá preso, ainda que primário e com bons antecedentes.

Prisão Por Pronúncia

O artigo 408 do Código de Processo Penal dispõe que o juiz, se convencido da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, deverá pronunciá-lo, indicando os motivos do seu convencimento. Conforme o § 1.º, a sentença de pronúncia indicará o dispositivo legal em cuja sanção for julgado incurso o réu, e o recomendará na prisão em que se achar, ou expedirá ordem para sua captura. Dispõe o § 2.º que, se o réu for primário e de bons antecedentes, poderá o juiz deixar de decretar-lhe a prisão ou revogá-la, caso já se encontre preso.

Em virtude desses dispositivos, são pressupostos para que o réu seja preso por sentença de pronúncia:

réu pronunciado;

réu reincidente, ou primário com maus antecedentes;

ser o crime inafiançável ou, se afiançável, o réu não ter pago fiança (nos crimes dolosos contra a vida, são afiançáveis o infanticídio, artigo 123 do Código Penal, e o aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento, artigo 124 do Código Penal);

a prisão deve ser necessária, sob pena de violar o princípio da presunção de inocência. Para a doutrina, são necessários os requisitos da prisão

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preventiva. Para a jurisprudência, se permaneceu solto durante o processo, continuará em liberdade. Se já estava preso durante o processo, permanecerá preso, ainda que primário e com bons antecedentes.

Liberdade Provisória

Aplica-se a liberdade provisória para a prisão em flagrante (salvo se houver irregularidade ou nulidade que enseje o relaxamento da prisão em flagrante), para a prisão por pronúncia (artigo 408, § 2.º, do Código de Processo Penal) e para a prisão para apelar (sentença condenatória recorrível, artigo 594 do Código de Processo Penal). Para a prisão preventiva e para a temporária, pede-se a revogação da prisão.

A Liberdade Provisória é obrigatória nas infrações penais em que o réu se livra solto, ou seja, naquelas apenadas exclusivamente com multa e naquelas apenadas com pena privativa de liberdade não excedente a 3 (três) meses (artigo 321, incisos I e II, do Código de Processo Penal). A Lei n. 9.099/95, em seu artigo 69, parágrafo único, instituiu nova hipótese de liberdade provisória obrigatória: quando o autor do fato, surpreendido em flagrante, assumir o compromisso de comparecer à sede do juizado.

A Liberdade Provisória é permitida nas infrações em que há o pagamento de fiança. De acordo com o artigo 322 do Código de Processo Penal, são afiançáveis as infrações punidas com detenção ou prisão simples (fiança concedida pelo juiz ou pela autoridade policial) ou punidas com reclusão cuja pena mínima não exceda 2 (dois) anos (fiança concedida somente pela autoridade judicial e fundamentadamente).

São inafiançáveis conforme os artigos 323 e 324 do Código de Processo Penal:

crimes punidos com reclusão, em que a pena mínima for superior a dois anos;

contravenções de mendicância e vadiagem;

crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade, se o réu for reincidente doloso;

réu comprovadamente vadio;

crimes punidos com reclusão e que provoquem clamor público, ou que tenham sido cometidos com violência contra a pessoa ou grave ameaça;

quebra de fiança anteriormente concedida no mesmo processo, ou infringência de obrigação imposta;

prisão por mandado do juiz cível, prisão disciplinar, administrativa ou militar;

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o réu estiver no gozo de suspensão condicional da pena ou de livramento condicional;

quando presentes os motivos que autorizam a prisão preventiva.

A Súmula n. 81 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que, em caso de concurso material, para se determinar a afiançabilidade ou não no caso concreto, as penas devem ser somadas.

Até 1977, obtinha-se a liberdade provisória somente mediante o pagamento de fiança. Em 1977, a Lei n. 6.416 acrescentou um parágrafo único ao artigo 310 do Código de Processo Penal, criando-se a possibilidade da obtenção da liberdade provisória sem fiança, sempre que estiverem ausentes os motivos da prisão preventiva, até mesmo nos crimes inafiançáveis.

Assim, em qualquer caso, o juiz deverá se fazer a seguinte pergunta: se o réu

estivesse solto, haveria motivos para ser decretada a prisão preventiva?

Se houver motivos, não se concede a liberdade provisória.

Se não houver motivos, concede-se a liberdade provisória.

A liberdade provisória independente de fiança criou, na prática, uma situação injusta. Se não é o caso de prisão preventiva e o delito é afiançável, a liberdade provisória somente poderá ser concedida mediante o recolhimento de fiança. Se o delito é inafiançável, a liberdade provisória poderá ser concedida sem qualquer pagamento. Exemplo: o juiz recebe um processo de furto simples, cuja pena é de 1 (um) a 4 (quatro) anos e que admite a fiança. Arbitrada e paga a fiança, é concedida a liberdade provisória. Em outro processo de roubo simples, com a pena de 4 (quatro) a 10 (dez) anos de reclusão – em pena mínima superior a 2 (dois) anos não cabe fiança –, conclui o juiz que, se o réu estivesse solto, não seria o caso de decretação da prisão preventiva e, então, concede também a liberdade provisória. Percebe-se uma injustiça da lei: no crime menos grave há o pagamento de fiança; no mais grave, não. Na prática, por razões de política criminal, o juiz, verificando o preenchimento dos requisitos, concede a liberdade provisória independente do pagamento de fiança em ambos os processos.

A Lei n. 8.035/90 determinou que, nos crimes contra a economia popular e de sonegação fiscal, a liberdade provisória somente será concedida mediante recolhimento de fiança.

A liberdade provisória é vedada:

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nos crimes hediondos e assemelhados, salvo em caso de tortura que, apesar de

inafiançável, admite a liberdade provisória;

no artigo 7.º da Lei n. 9.034/95, que trata das organizações criminosas;

no artigo 3.º da Lei n. 9.613/98, que trata da lavagem de bens e capitais.

Pergunta: A vedação da liberdade provisória é inconstitucional?

Resposta: Não, pois a Constituição prevê que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória com ou sem o pagamento de fiança”, logo, nos casos em que a lei não admite a liberdade provisória, pode vedá-la.

Fiança

Fiança é a caução destinada a garantir o cumprimento das obrigações processuais do réu. É um direito subjetivo constitucional do acusado. Pode ser prestada pelo acusado ou por terceiro em seu favor, nas modalidades de depósito ou hipoteca.

São infrações inafiançáveis, além dos casos previstos nos artigos 323 e 324 do Código de Processo Penal:

crime hediondo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e terrorismo;

crimes de racismo;

ação de grupos armados civis e militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

A autoridade policial pode arbitrar a fiança nas infrações punidas com detenção e prisão simples; nos demais casos, compete ao juiz (artigo 322 do Código de Processo Penal).

1.4.1. Obrigações do réu

São obrigações do réu, sob pena de quebramento da fiança:

comparecimento a todos os atos processuais a que for intimado;

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obrigação de comunicar ao Juízo qualquer mudança de endereço;

não se ausentar da Comarca por mais de 8 dias sem autorização do juiz.

A fiança é cabível desde o inquérito policial até o trânsito em julgado da sentença.

Consistirá no depósito de bens, valores, pedras preciosas, títulos da dívida pública ou na hipoteca de imóvel.

1.4.2. Valor da fiança

O valor da fiança será fixado pela autoridade, conforme o disposto no artigo 325 do Código de Processo Penal. Será de 1 (um) a 5 (cinco) salários mínimos quando a pena privativa de liberdade for de até 2 (dois) anos; de 5 (cinco) a 20 (vinte) salários mínimos quando a pena privativa de liberdade for de, no máximo, 4 (quatro) anos; de 20 (vinte) a 100 (cem) salários mínimos quando a pena privativa de liberdade for superior a 4 (quatro) anos.

Conforme a situação econômica do réu, o valor da fiança pode ser reduzido até o máximo de dois terços ou aumentada até o décuplo (artigo 325, § 1.º, incisos I e II, do Código de Processo Penal).

Para determinar o valor da fiança, será levado em consideração:

natureza da infração;

condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado;

circunstâncias indicativas da periculosidade do agente;

importância provável das custas do processo até o final do julgamento.

1.4.3. Reforço da fiança

Poderá ser necessário o reforço da fiança, nos casos previstos pelo artigo 340 do Código de Processo Penal; não sendo reforçada, a fiança será cassada e o réu será recolhido à prisão. Será exigido o reforço quando:

por engano, for fixada abaixo do patamar legal;

houver alteração da classificação do delito para outro mais grave;

houver depreciação do objeto da fiança.

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Se o juiz verificar que é impossível ao réu prestar fiança, por motivo de pobreza, poderá conceder-lhe a liberdade provisória, sujeitando-o ao cumprimento das obrigações, que, se não cumpridas, acarretarão a revogação do benefício, conforme o artigo 350 do Código de Processo Penal. Esse dispositivo é anterior ao surgimento da possibilidade da liberdade provisória sem fiança.

As atenuantes e as agravantes não são levadas em conta para a fixação da fiança, pois não alteram o mínimo e o máximo da pena.

1.4.4. Cassação da fiança

A fiança será cassada quando se verificar, posteriormente, que não era cabível (artigos 338, 339 e 340, parágrafo único, do Código de Processo Penal). Se a fiança foi concedida por autoridade policial, compete ao juiz cassá-la; se foi concedida por juiz, será cassada por tribunal mediante recurso da acusação.

Nesses casos, o valor da fiança será integralmente restituído ao acusado.

1.4.5. Quebra da fiança

Haverá quebra da fiança nos seguintes casos:

quando o réu descumprir suas obrigações processuais;

quando praticar nova infração penal.

São conseqüências do quebramento da fiança:

perda da metade do valor da fiança;

obrigação de recolher-se à prisão;

impossibilidade de concessão de nova fiança no mesmo processo.

1.4.6. Questões finais

Quando o réu deixar de recolher-se à prisão, sendo isso necessário, perderá todo o valor depositado a título de fiança.

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O recurso adequado para as decisões sobre fiança será o recurso em sentido estrito (artigo 581, incisos V e VII), da decisão que concede, cassa, julga inidônea, decreta o seu quebramento, nega, arbitra e declara perdido o seu valor.

O Ministério Público não precisa ser ouvido para concessão de fiança; deverá, contudo, ser intimado da decisão, para interpor recurso se achar necessário.

Se o réu não for condenado, o valor da fiança lhe será restituído, deduzido eventual montante declarado perdido.

Se o réu for condenado, o valor da fiança será destinado ao pagamento das custas processuais (no Estado de São Paulo não há custas processuais no processo penal), ao pagamento de multa criminal e ainda pode ser revertido no pagamento de indenização civil ex delicto.

Nas infrações penais de competência do Juizado Especial Criminal, não se imporá

prisão em flagrante nem se exigirá fiança, se o autor do fato for imediatamente

encaminhado ao Juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer (artigo 69,

parágrafo único, da Lei n. 9.099/95).

1. CITAÇÃO

1.1. Conceito

A citação é o ato processual por meio do qual é oferecido ao acusado conhecimento oficial acerca do teor da acusação, abrindo-se oportunidade para que ele produza sua defesa, triangularizando-se, assim, a relação jurídico-processual. Até o momento anterior à citação, a relação era angular (autor e juiz).

É determinada pelo juiz e cumprida pelo Oficial de Justiça.

A falta de citação no processo penal causa nulidade absoluta do processo (art. 564, III e IV, do CPP), pois contraria os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Exceção: o art. 570 do Código de Processo Penal dispõe que se o réu comparece em juízo antes de consumado o ato, ainda que para argüir a ausência de citação, sana a sua falta ou a nulidade. Nesse caso, o juiz ordenará a suspensão ou o adiamento do ato.

O Código de Processo Penal tratou da citação em um título próprio, compreendendo os arts. 351 ao 372.

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A citação pode ser de duas espécies:

citação pessoal;

citação ficta (por edital).

No processo penal não há citação ficta por hora certa. A citação ficta é somente a editalícia.

1.2. Diferença entre Citação, Intimação e Notificação

Citação é o ato processual por meio do qual se chama a juízo o réu para comparecer e defender-se.

Intimação, segundo o Prof. Mirabete, é a ciência dada à parte, no processo, da prática de um ato, despacho ou sentença.

Notificação é a convocação para o comparecimento ou a prática de ato futuro.

O Código de Processo Penal não diferencia intimação e notificação, referindo-se a uma quando deveria aludir a outra.

1.3. Quem Deve Ser Citado

Somente o acusado pode ser citado, ainda que seja mentalmente enfermo, a citação não poderá ser feita na pessoa do representante legal. Exceção: se já houver sido instaurado incidente de insanidade mental e a perturbação for conhecida do juízo, a citação se fará na pessoa do curador do acusado.

Se a perturbação mental ainda não for conhecida do juízo, mas o Oficial de Justiça a constata por ser aparente, deverá certificar a ocorrência no verso do mandado, a fim de que o juiz possa determinar a instauração do incidente de insanidade mental.

As pessoas jurídicas deverão ser citadas na pessoa de seu representante legal.

1.4. Conseqüências do Não-atendimento à Citação

O réu regularmente citado, pessoalmente ou por edital, mas com defensor constituído que não comparece, permanecendo inerte ao chamado, pratica a “contumácia”, ausência injustificada.

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O efeito da contumácia é a revelia. O processo prosseguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado, deixou de comparecer ou, no caso de mudança de endereço, não comunicou o novo endereço ao juízo (art. 367 do CPP).

Em virtude do princípio da verdade real, sobre ele não recairá a presunção de veracidade quanto aos fatos que lhe forem imputados. O réu poderá retornar ao processo a qualquer momento, independente da fase em que esteja.

1.5. Efeitos da Citação Válida

No processo penal, o único efeito da citação válida é o de completar a relação jurídica processual. Com ela se instaura o processo e passam a vigorar todos os direitos, deveres, ônus e princípios que regem o processo penal.

A citação válida no processo penal não torna prevento o juízo, não interrompe a prescrição e não induz à litispendência.

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1.6. Citação Real ou Pessoal (espécies e comentários)

1.6.1. Citação pessoal

A citação pessoal é aquela realizada na própria pessoa do réu por meio de mandado citatório, carta precatória, carta rogatória, carta de ordem e requisição. Há a certeza da realização da citação.

A citação por mandado (prevista nos arts. 352 ao 357 do CPP) é cumprida por Oficial de Justiça. Destina-se à citação do réu em local certo e sabido dentro do território do juiz processante. O mandado de citação indicará o nome do juiz, do qual emanou a ordem; o nome do réu ou querelante; sua residência, se for conhecida; o fim para que é feita a citação; o juízo; o lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer; a subscrição do escrivão e a rubrica do juiz.

O Oficial de Justiça deverá ler ao citando o mandado e entregar-lhe a contrafé, na qual são mencionados dia e hora da citação, ato que o Oficial deverá declarar na certidão, bem como a aceitação ou recusa do réu.

A citação pode ser realizada em qualquer tempo, dia e hora, inclusive domingos e feriados, durante o dia ou à noite. Não se deve, todavia, proceder à citação: de doente, enquanto grave o seu estado; de noivos, nos três primeiros dias de bodas; de quem estiver assistindo ato de culto religioso; de cônjuge ou outro parente de morto (consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, em segundo grau) no dia do falecimento e nos sete dias seguintes.

Entre a citação e o interrogatório deve haver um prazo mínimo de 24 horas.

1.6.2. Citação por requisição

A citação por requisição é destinada à citação do militar e do preso. É feita mediante ofício requisitório expedido pelo juiz ao comandante (chefe de serviço), no caso da citação do militar, ou ao diretor do estabelecimento prisional, no caso do preso, requisitando sua apresentação em juízo, no dia e hora designados, cabendo a esses e não ao Oficial de Justiça a citação.

A requisição deve conter os mesmos requisitos do mandado de citação.

Se o militar ou o preso se encontrar em outra comarca, o juiz processante expedirá carta precatória, cabendo ao juiz deprecado a expedição do ofício requisitório. Conforme a Súmula n. 351 do Supremo Tribunal Federal, se o réu estiver preso na mesma Unidade da Federação do juiz processante, será nula sua citação por edital, sendo válida, portanto, a citação por edital do réu preso em outra Unidade da Federação diversa daquela do juiz processante.

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1.6.3. Citação por carta precatória

A citação por precatória destina-se à citação do réu que está em lugar certo e sabido, porém fora da jurisdição do juiz processante (art. 353 do CPP). A precatória indicará o juiz deprecante e o deprecado, suas respectivas sedes, o fim da citação e o juízo do lugar, dia e hora em que o réu deverá comparecer.

A principal característica da citação por precatória no processo penal é o seu caráter itinerante (art. 355, § 1.º, do CPP). Se o juiz deprecado verificar que o réu se encontra em território sujeito à jurisdição de um terceiro juiz, a este remeterá os autos para a efetivação da citação, desde que haja tempo.

1.6.4. Citação por carta rogatória

A citação por carta rogatória destina-se à citação do réu que se encontra em lugar certo e sabido, mas no estrangeiro ou em legações estrangeiras (embaixadas).

Anteriormente, o réu que estava no estrangeiro era citado por edital. Hoje, com a Lei n. 9.271/96, a citação é pessoal, através de rogatória. Exceção: se o Estado estrangeiro se recusar a cumprir a rogatória do Brasil, o réu será citado por edital. Nesse caso, considera-se que ele está em local inacessível (art. 363, I, do CPP).

Como o trâmite da rogatória é demorado, o Código de Processo Penal autoriza a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional até a efetivação da citação (art. 368 do CPP).

1.6.5. Citação por carta de ordem

A citação por carta de ordem tem disciplina idêntica à da citação por precatória. É expedida por um órgão superior para ser cumprida por órgão inferior. Em geral são determinadas pelos tribunais nos processos de sua competência originária. Ex.: o TJ pede para o juiz de primeira instância cumprir um mandado citatório de um réu residente em sua comarca e que goze de prerrogativa de foro.

1.6.6. Citação do funcionário público

O funcionário público será citado por mandado (atenção: somente são citados por requisição o preso e o militar), mas é necessária a expedição de um ofício ao chefe da repartição onde o citando trabalha, notificando-o do dia, hora e lugar em que o funcionário deverá comparecer (art. 359 do CPP). Visa possibilitar a continuidade do

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serviço público, providenciando-se a substituição do funcionário. A falta da expedição desse ofício não invalida a citação. Se o citando for magistrado, deverá ser comunicado ao Presidente do Tribunal de Justiça; se for membro do Ministério Público, deverá ser comunicado ao Procurador-Geral de Justiça.

1.7. Citação por Edital ou Ficta e a Lei n. 9.271/96

A citação por edital é medida excepcional, só sendo utilizada quando frustradas as possibilidades de citação pessoal, por ser impossível localizar o réu (art. 361 do CPP).

Será feita a citação por edital nos seguintes casos:

quando réu está em lugar incerto e não sabido (“LINS”), o prazo será de 15 dias;

quando for incerta a pessoa do réu a ser citada, o prazo será de 30 dias (art. 363, inc. II, do CPP);

quando o réu estiver se ocultando para não ser citado, o prazo será de 5 dias (art. 362 do CPP);

quando o réu estiver em lugar inacessível, em virtude de epidemia, de guerra ou por outro motivo de força maior, o prazo será de 15 a 90 dias (art. 363, inc. I, do CPP).

O edital será afixado na porta do juízo e será publicado na imprensa, onde houver.

A Lei n. 9.271/96 trouxe grandes inovações para a citação editalícia. Anteriormente, se o réu citado por edital não comparecesse nem constituísse advogado, o processo tinha prosseguimento normal. Muitas vezes, o réu nem tomava conhecimento de que fora processado e condenado à revelia. A lei alterou o art. 366 do Código de Processo Penal e determinou que se o réu citado por edital não comparecer nem constituir advogado, o processo ficará suspenso e também será suspenso o prazo prescricional (atenção: se o réu foi citado pessoalmente e não comparecer nem constituir advogado, será decretada sua revelia).

O juiz, mesmo aplicando o art. 366 do Código de Processo Penal, se presente os motivos, poderá decretar a prisão preventiva do acusado. Poderá também determinar a produção das provas consideradas urgentes. Se o fizer, nomeará um defensor dativo.

O processo e o prazo prescricional ficarão suspensos por prazo indeterminado até que o réu seja encontrado. Como a Lei n. 9.271/96 não estabeleceu um limite máximo para a suspensão do prazo prescricional, poderia ser criado no caso concreto um crime imprescritível. Somente a CF pode, no entanto, prever crimes imprescritíveis (que são o

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racismo e a ação de grupos armados civis ou militares contra o Estado Democrático de Direito e a Ordem Constitucional – art. 5.º, incs. XLII e XLIV).

Para compatibilizar a Lei n. 9.271/96 com a Constituição Federal, a doutrina concluiu que o juiz deverá, nos processos em que aplicar o art. 366 do Código de Processo Penal, estabelecer um prazo máximo para a suspensão da prescrição, que deverá corresponder ao prazo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato, conforme a tabela do art. 109 do Código Penal. Essa posição é a predominante na jurisprudência e tem como um de seus expoentes o Prof. Damásio de Jesus.

Essa regra do art. 366 do Código de Processo Penal é híbrida, isto é, tem dispositivos de direito processual (quando trata da suspensão do processo) e dispositivos de direito penal (quando trata da suspensão do prazo prescricional). Em normas híbridas, a parte que trata de direito material comanda a retroatividade ou não da norma, pois afeta o direito do Estado de punir. Nesse caso, como a norma estabelece uma situação pior para o réu, ela não se aplica aos processos existentes antes de sua publicação, pela proibição da reformatio in pejus.

Da decisão que aplica o art. 366 do Código de Processo Penal cabe recurso em sentido estrito por analogia ao art. 581, inc. XVI, do Código de Processo Penal. Há acórdãos entendendo que interposta a apelação, essa poderá ser recebida em razão do princípio da fungibilidade.

1.8. Intimação

Intimação é o conhecimento dado à parte de um ato já praticado no processo.

Conforme o art. 370 do Código de Processo Penal, nas intimações dos acusados, testemunhas e demais pessoas que devam tomar conhecimento de qualquer ato, serão observadas as regras previstas para as citações. A intimação também pode ser feita pelo escrivão – o que não é permitido nas citações – por despacho em petição que servirá de mandado, por termos nos autos, pela publicação no órgão oficial e pelo correio.

As intimações judiciais são duplas, ou seja, é necessária a citação do réu e de seu defensor dativo ou constituído, permitindo-se a intimação dos advogados pela imprensa oficial.

A intimação do defensor nomeado, do réu, das testemunhas e do Ministério Público será pessoal (art. 370, § 4.º, do CPP).

As intimações poderão ser realizadas no curso das férias forenses, pois os prazos correm da data da intimação. Conforme a Súmula n. 310 do Supremo Tribunal Federal, quando a intimação tiver lugar na sexta-feira ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir.

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1. SENTENÇA

Conceito

Sentença em sentido estrito é a decisão que julga o mérito da causa.

1.2. Classificação das Decisões em Processo Penal

As decisões em processo penal classificam-se em:

Despachos: são os atos judiciais sem carga decisória, incapazes de trazer prejuízo às partes e que determinam a marcha do processo. Os despachos, em regra, são irrecorríveis; excepcionalmente admite-se correição parcial ou mesmo habeas corpus.

b) Decisões interlocutórias:

simples: resolvem questões incidentes no processo sem ingressar no mérito da causa, como, por exemplo, concessão de liberdade provisória e relaxamento da prisão em flagrante. As decisões interlocutórias simples são, via de regra, irrecorríveis; porém, se houver previsão no art. 581 do Código de Processo Penal, caberá recurso em sentido estrito.

mistas:

não-terminativas: encerram uma fase, uma etapa processual, sem pôr fim ao

processo. Ex.: decisão de pronúncia.

terminativas: encerram o processo sem julgamento do mérito. Ex.: decisão de impronúncia.

As decisões interlocutórias mistas (assim como as sentenças terminativas de

mérito) são recorríveis. É cabível o recurso em sentido estrito se estiver previsto no rol

do art. 581 do Código de Processo Penal, ou apelação, caso prevista no art. 593 do

Código de Processo Penal.

c) Sentenças: 138

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terminativa de mérito: é a decisão que julga o mérito sem condenar ou absolver o réu, como, por exemplo, extinção da punibilidade. É recorrível via recurso em sentido estrito, ou apelação;

absolutória:

própria: julga improcedente a pretensão punitiva e não impõe qualquer

sanção penal;

imprópria: proferida para o réu inimputável, não acolhe a pretensão

punitiva, mas reconhece o cometimento da infração penal e impõe

medida de segurança (art. 386, par. ún., inc. III).

O juiz, ao absolver o réu, deverá mencionar na parte dispositiva a causa, reconhecendo (art. 386 do CPP):

a inexistência do fato;

a ausência de prova da existência do fato;

o fato não constituir infração penal (ser atípico);

não haver prova do réu ter concorrido para a infração penal;

existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena;

não existir prova suficiente para a condenação.

condenatória: julga procedente no todo, ou em parte, a pretensão punitiva.

As sentenças absolutórias e as condenatórias são apeláveis. Exceção ao recurso cabível contra a absolvição sumária do Tribunal do Júri é o em sentido estrito.

Quanto ao sujeito, as sentenças podem ser:

subjetivamente simples: sentença proferida por órgão monocrático, juiz de primeiro grau;

subjetivamente plúrima: sentença proferida por órgão colegiado homogêneo, tribunais;

subjetivamente complexa: sentença proferida por mais de um órgão, como o Tribunal do Júri, que decide o crime e a autoria, e o juiz, que decide a pena a ser aplicada.

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Chama-se sentença suicida aquela cuja fundamentação conflita com o dispositivo.

1.3. Requisitos da Sentença

Requisitos intrínsecos:

relatório: deve conter o nome e a qualificação das partes, a exposição sucinta da acusação e da defesa e o resumo dos atos incidentes processuais. É a maneira de se comprovar que o juiz examinou o processo e tem conhecimento de seu conteúdo. O relatório é imprescindível, pois assegura o contraditório. Sua falta acarreta a nulidade absoluta da sentença. A exceção encontra-se na Lei n. 9.099/95, que admite sentença proferida sem relatório.

fundamentação: é uma obrigação constitucional a fundamentação das decisões (art. 93, inc. IX, da CF). A fundamentação da sentença relaciona-se com o princípio da apreciação da prova (livre convencimento motivado, ou a persuasão racional do juiz). A fundamentação garante a atuação equilibrada e imparcial do juiz, controla a legalidade das decisões e garante que os argumentos da partes foram examinados. A sentença sem fundamentação é nula, salvo a do Tribunal do Júri – o veredicto é absolutamente sigiloso não podendo ser fundamentado.

Fundamentação per relatione ocorre quando o julgador, em sua decisão, adota como razões de decidir a fundamentação utilizada em manifestação anterior no processo. Ex.: quando o Tribunal adota a fundamentação do juiz de primeiro grau. Alguns doutrinadores criticam essa possibilidade, afirmando que nesse caso é como se não houvesse fundamentação. O Supremo Tribunal Federal e a jurisprudência, no entanto, aceitam essa prática. O julgador pode utilizar as razões do Ministério Público se este atuou como custos legis.

dispositivo: contém a substância da sentença, o julgamento da pretensão punitiva. Extrai-se do dispositivo os limites objetivos da coisa julgada.

A pretensão punitiva pode ser julgada procedente no todo ou em parte (condenatória), ou improcedente (absolutória). Mesmo a pretensão punitiva sendo julgada improcedente, muitas vezes verifica-se o interesse recursal, como no caso da absolvição imprópria em que se impõe medida de segurança ou no caso da absolvição própria para evitar uma ação civil ex delicto (quando não fundamentada nos incs. I, IV e V do art. 386 do CPP).

A sentença sem dispositivo é inexistente. Também é inexistente a sentença elaborada por juiz sem jurisdição (em férias, licenciado, afastado, aposentado).

Requisitos extrínsecos: são a publicação e a intimação da sentença.

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A publicação da sentença é uma formalidade de suma importância; enquanto não for publicada, a sentença não pode ser considerada como um ato processual. A publicação da sentença ocorre:

com a entrega da sentença ao escrivão do cartório;

quando proferida em audiência como no Tribunal do Júri, no momento de sua leitura.

A sentença penal tem o efeito de interromper a prescrição, o que ocorre na data da sua publicação.

Após a publicação da sentença, segue-se a intimação das partes.

A intimação do Ministério Público e do defensor dativo é pessoal.

A intimação do querelante e do assistente de acusação é feita pessoalmente ou na pessoa do advogado. Se nenhum deles for encontrado no lugar da sede do Juízo, a intimação acontecerá por edital com prazo de 10 dias (art. 391 do CPP).

A intimação da sentença deverá ser feita pessoalmente ao réu e seu defensor. Se não forem encontrados, serão intimados por edital.

A regra trazida no art. 370, §§ 1.º e 2.º, do Código de Processo Penal (intimação do defensor constituído pela imprensa) não é verificada para a sentença, que possui disposição específica no art. 392 do Código de Processo Penal.

A fluência do prazo recursal se inicia a partir da última intimação (do réu ou de seu defensor), ou, se por carta precatória, da juntada da carta cumprida aos autos. O prazo do edital será de 90 dias se a pena privativa de liberdade imposta for igual ou superior a um ano, e de 60 dias nos demais casos. O prazo da apelação correrá após o término do prazo fixado no edital.

1.4. Princípio da Correlação

Exige que, entre a sentença e o pedido, haja uma correlação, não admitindo decisões de modo diverso, além ou aquém (extra, ultra ou citra petita) do que consta na denúncia ou queixa.

Trata-se de uma garantia fundamental da defesa, que oferece resistência àquilo que foi descrito na peça inicial.

Tal princípio decorre da inércia da jurisdição, que limita o julgador aos termos da provocação. Se desbordar essa restrição, o juiz estará violando a imparcialidade.

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1.5. Emendatio Libelli e Mutatio Libelli

A emendatio libelli, prevista no art. 383 do Código de Processo Penal, ocorre quando a denúncia ou a queixa descreve perfeitamente o fato concreto de determinado crime, mas dá a ele classificação jurídica diversa. Ex.: a denúncia narra um furto mas classifica o delito como roubo. O juiz, então, na sentença, pode “emendar” a denúncia ou queixa, dando ao fato definição jurídica diversa da que consta na exordial, mesmo que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. Não ofende a ampla defesa do réu, que se defende dos fatos e não da classificação jurídica do delito.

A mutatio libelli, art. 384 do Código de Processo Penal, ocorre quando o juiz, na sentença, reconhece a possibilidade de dar ao fato descrito na inicial nova caracterização – não se trata de classificação jurídica diversa, mas sim de modificação (mutatio) dos fatos narrados na acusação, em virtude de:

provas produzidas nos autos;

circunstância elementar não contida explícita ou implicitamente na denúncia ou na queixa ( exs.: qualificadoras, causas de aumento e diminuição, agravantes e atenuantes).

A nova classificação do fato pode ensejar uma pena menor, igual ou maior que a anteriormente prevista.

Se a pena for menor ou idêntica à anterior deve-se observar o disposto no art. 384, caput, do Código de Processo Penal. O juiz deve baixar os autos para a manifestação da defesa, que no prazo de 8 dias deverá produzir provas, podendo arrolar até 3 testemunhas.

Se a pena for maior que a anterior, deve ser observado o art. 384, par. ún., do Código de Processo Penal. O juiz deve baixar os autos para o Ministério Público aditar a denúncia no prazo de 3 dias (usa-se por analogia o prazo do art. 46, § 2.º, do CPP). Em seguida, abre-se o prazo de 3 dias para a defesa se manifestar, arrolar até 3 testemunhas, e requerer a produção de provas.

No art. 384, caput, do Código de Processo Penal, o prazo da defesa é maior porque impõe a produção da prova; no parágrafo único, o prazo é menor porque serve apenas para a parte requerer a produção das provas.

1.5.1. Observações sobre a mutatio libelli

Se o promotor perceber que é caso de aditamento, pode aditar a qualquer momento, não precisando esperar o juiz se manifestar na sentença.

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O juiz, ao baixar os autos para o Ministério Público aditar a denúncia e a defesa se manifestar, deve ser cauteloso para não antecipar o julgamento. Ex.: não pode afirmar “não foi furto, foi roubo”. O juiz também não pode ser lacônico a ponto de não indicar às partes a razão pela qual aplica o art. 384, par. ún., do Código de Processo Penal, devendo, por exemplo, dizer: “... baixem-se os autos nos termos do art. 384, par. ún., do CPP, em virtude das declarações prestadas a fls...”

Se o Ministério Público recusa-se a aditar a denúncia, deve ser usado por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal (que determina a remessa dos autos ao Procurador-Geral).

P.: O art. 384, par. ún., do Código de Processo Penal aplica-se também à ação penal privada?

R.: O art. 384, caput, do Código de Processo Penal é aplicável à ação penal privada. O parágrafo único do Código de Processo Penal aplica-se à queixa na ação penal privada subsidiária da pública; quanto à ação penal privada propriamente dita, a doutrina diverge:

Sim, aplica-se por analogia, já que o processo penal permite a utilização da analogia (Prof. Tourinho).

Não, não se aplica porque a lei exclui essa possibilidade. Não foi esquecimento do legislador, foi omissão proposital. Se fosse possível a aplicação do parágrafo único do art. 384 do Código de Processo Penal à ação penal privada, estar-se-ia admitindo a possibilidade de o juiz obrigar o querelante a aditar a queixa, ampliando a acusação, o que seria incompatível com o princípio da disponibilidade da ação penal privada. O juiz não pode obrigar o ofendido a iniciar a ação, nem a aditar a queixa. O querelante, por iniciativa própria, pode fazê-lo, mas não pela aplicação do art. 384, par. ún., do Código de Processo Penal.

Se durante a instrução descobre-se que o autor praticou outros crimes, além do descrito no processo, ou que mais pessoas concorreram para a prática do delito, não se aplica o art. 384 do Código de Processo Penal; será preciso nova acusação, que pode ser feita:

com o oferecimento de nova denúncia;

com o aditamento da denúncia, realizando-se nova citação, interrogatório, defesa prévia, audiência de instrução, diligências, alegações finais e sentença.

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1.5.2. Súmulas

Súmula n. 453 do Supremo Tribunal Federal: proíbe a aplicação do art. 384, caput, e parágrafo único do Código de Processo Penal, em segunda instância. Visa garantir o duplo grau de jurisdição. Se o Tribunal reconhecesse e condenasse pelo outro delito, estaria suprimindo o primeiro grau de jurisdição.

Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal: o Tribunal não pode reconhecer de ofício, em prejuízo da defesa, nulidade não argüida no recurso da acusação, mesmo que seja nulidade absoluta. Ex.: processa-se por furto e, durante a instrução, apura-se que o delito cometido foi roubo. O Tribunal percebe que era caso da aplicação do art. 384 do Código de Processo Penal, mas, como ninguém argüiu:

não pode manter a condenação por furto;

não pode condenar por roubo, pois violaria o princípio da correlação;

não pode aplicar o art. 384 do Código de Processo Penal, pois violaria o duplo grau de jurisdição;

não pode anular a sentença porque não pode reconhecer de ofício nulidade prejudicial à defesa que não foi argüida pela acusação.

O Tribunal, então, deverá absolver o réu, instaurando-se novo processo para o crime de roubo, se esse ainda não prescreveu.

Se, por exemplo, o réu foi processado por dano simples (ação penal privada) e durante a instrução verifica-se que o bem não era particular, e sim público o dano torna-se qualificado e a ação penal pública incondicionada. Pela modificação da natureza da ação penal, o processo não deveria ter sido instaurado por queixa, mas sim por denúncia. A solução é anular a ação penal desde o início pela ilegitimidade ad causae.

1.6. Efeitos da Sentença

Os efeitos da sentença variam conforme sua natureza.

1.6.1. Sentença absolutória (art. 386, par. ún., do CPP)Será o réu posto em liberdade, se for o caso.

As penas acessórias provisoriamente aplicadas serão cessadas.

Se cabível, será aplicada medida de segurança.

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1.6.2. Sentença condenatória (art. 393 do CPP)

Ser o réu preso ou conservado na prisão nas infrações inafiançáveis, ou nas afiançáveis enquanto não prestar fiança.

Ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.

São também efeitos da sentença condenatória os previstos nos arts. 91 e 92 do Código Penal.

1. DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO

Processo é o conjunto dos atos processuais interligados pelo vínculo da relação jurídica processual.

Procedimento é a uma seqüência de atos processuais, com ordem lógica, dirigida à prolação da sentença.

O Código de Processo Penal divide o processo em:

Comum: constituído de regras gerais aplicáveis sempre que não houver disposição em contrário, abarca os procedimentos ordinário e sumário.

Especial: afasta-se do procedimento comum, engloba o procedimento nos crimes funcionais, falimentares, contra a honra, contra a propriedade imaterial, o procedimento do Júri, procedimentos previstos nas leis de abuso de autoridade (Lei n. 4.898/65), Lei de Economia Popular (Lei n. 1.521/51), Lei de Tóxicos (Lei n. 6.368/76) e Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67).

Obs.: para parte da doutrina, que diverge da classificação do Código de Processo Penal, o procedimento do Júri é comum e o procedimento sumário é especial.

Procedimento Ordinário

O procedimento ordinário é cabível para todos os crimes punidos com reclusão, ressalvadas as hipóteses de procedimento especial.

Visão geral:

recebimento da denúncia ou queixa;

citação do réu;

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interrogatório do réu;

defesa prévia (prazo de 3 dias);

audiência de oitiva das testemunhas de acusação;

audiência de oitiva das testemunhas de defesa;

diligências (art. 499 do CPP – prazo de 24 horas);

alegações finais (art. 500 do CPP – prazo de 3 dias);

sentença (prazo impróprio de 10 dias).

1.1.1. Recebimento da denúncia ou queixa

No recebimento da denúncia ou queixa, o juiz deve verificar se estão presentes os seguintes requisitos (art. 41 do CPP):

exposição do fato criminoso;

qualificação do acusado;

classificação do crime;

rol de testemunhas.

O momento para a acusação arrolar as testemunhas é a denúncia.O número máximo de testemunhas é oito. As que excederem esse número poderão ser ouvidas como testemunhas do Juízo, a critério do juiz.

O juiz não fundamenta o recebimento da denúncia ou da queixa, pois não há carga decisória nesse ato. Além disso, se fundamentasse, correria o risco de antecipar o julgamento.

Em algumas hipóteses, entretanto, é necessária a fundamentação. Conforme a Súmula n. 564 do Supremo Tribunal Federal, o despacho que recebe a denúncia nos crimes falimentares e nos crimes de competência originária dos tribunais exige fundamentação. Nesses procedimentos se estabelece um contraditório prévio ao recebimento da exordial, permitindo a lei que a ação penal seja julgada improcedente no despacho liminar (na fase do recebimento).

O recebimento da denúncia ou queixa não enseja a interposição de qualquer recurso. Ao contrário, se o juiz rejeitar essas peças, cabe a interposição de recurso em sentido estrito, conforme o art. 581, inc. I, do Código de Processo Penal. No caso de não existir justa causa para a ação penal, é cabível o habeas corpus.

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A Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67), no entanto, prevê que do recebimento da denúncia ou da queixa cabe o recurso em sentido estrito. Do despacho que rejeita a denúncia cabe apelação no prazo de 5 dias. A Lei n. 9.099/95 prevê que do despacho que rejeita a denúncia cabe apelação no prazo de 10 dias.

A denúncia será rejeitada parcialmente se ao réu for imputado mais de um crime e o juiz receber a denúncia apenas com relação a um deles.

1.1.2. Citação

A citação do militar e do preso é feita por requisição. O funcionário público é citado por mandado com expedição de ofício, sendo notificado o chefe da repartição. O réu que não for encontrado para ser citado pessoalmente será citado por edital, suspendendo o processo e o curso da prescrição (art. 366 do CPP).

Obs.: sobre o tema citação rever o Módulo XVI.

1.1.3. Interrogatório

A principal característica do interrogatório é a judicialidade, ou seja, o ato é privativo do juiz. Admite-se a realização do interrogatório por carta precatória, conforme provimento do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. Tratando-se de réu preso, o interrogatório deve realizar-se em 8 dias. Se o réu não comparecer ao ato, será considerado revel. O juiz nomeará defensor dativo tanto ao réu que não comparecer ao ato como ao réu que comparecer mas não indicar advogado.

O efeito da revelia é a não-intimação do réu para os demais atos do processo.

Não há contraditório nesse ato. Terminado o interrogatório, abre-se o tríduo para defesa prévia.

1.1.4. Defesa prévia

Na defesa prévia não há o ônus da impugnação específica como no Processo Civil. O prazo é de 3 dias. Nesse ato deverão ser arroladas as testemunhas de defesa, no máximo oito para cada fato criminoso e para cada réu, e ser requeridas as diligências necessárias. O defensor público goza da prerrogativa do prazo em dobro. Em razão do princípio da ampla defesa, se a defesa prévia não for apresentada no prazo, a jurisprudência, por complacência, aceita a apresentação posterior.

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Início do prazo da defesa prévia:

réu sem advogado: a partir da notificação da nomeação de um advogado dativo;

réu que se apresenta com advogado: a partir do interrogatório, se o advogado dele participou;

réu com advogado que não participou do interrogatório: a partir da intimação do defensor para a apresentação da defesa prévia (intimação pela imprensa).

A defesa prévia tem por finalidade:

arrolar testemunhas de defesa;

requerer diligências;

formular pedidos;

juntar documentos (de acordo com o art. 400 do CPP, é possível juntar documentos em qualquer fase do processo).

A defesa prévia é o último momento para:

argüir exceção de suspeição;

argüir exceção de incompetência relativa.

A defesa prévia é peça de apresentação facultativa. Mas, se não for apresentada por falta de oportunidade, há nulidade absoluta.

1.1.5. Audiência de oitiva de testemunhas

A ordem de oitiva das testemunhas é a seguinte:

testemunhas de acusação;

testemunhas de defesa.

A inversão dessa seqüência gera nulidade se ficar demonstrado o prejuízo para a parte – a nulidade é relativa, pois depende da demonstração do prejuízo.

As testemunhas que se encontram fora da comarca serão inquiridas por carta precatória. A precatória não suspende o processo e é estabelecido prazo para o seu cumprimento.

A Súmula n. 155 do Supremo Tribunal Federal determina que causa nulidade relativa a não intimação das partes acerca da expedição da carta precatória: basta que o

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juiz comunique às partes a expedição da carta; não será preciso comunicar a data marcada para a oitiva da testemunha; à parte incumbe acompanhar seu trâmite.

Se a testemunha, em seu depoimento, refere-se a uma terceira pessoa, essa pode ser ouvida como testemunha do Juízo (testemunha referida).

Em uma mesma audiência podem ser ouvidas todas as testemunhas presentes, desde que respeitada a ordem de oitiva: primeiro acusação, depois defesa.

As testemunhas não encontradas podem ser substituídas no prazo de 3 dias.

1.1.6. Diligências

O art. 499 do Código de Processo Penal impõe o prazo de 24 horas para que a acusação e depois a defesa requeiram as diligências. As partes podem nessa fase reiterar o pedido de diligência não-realizada ou não-concedida.

O assistente do Ministério Público pode manifestar-se, nessa fase, após a manifestação do promotor.

O Código de Processo Penal determina que o prazo do art. 499 corre para a defesa em cartório, independente de intimação. A jurisprudência, todavia, não aplica essa regra por considerar que viola o princípio do contraditório, da ampla defesa e da isonomia entre as partes.

1.1.7. Alegações finais

O prazo para a apresentação das alegações finais é de 3 dias – art. 500 do Código de Processo Penal. Cabe aqui um alerta: não confundir com as alegações do Júri, cujo prazo é de 5 dias (art. 406 do CPP).

A ordem para a apresentação das alegações finais é: primeiro a acusação, depois a defesa.

A apresentação das alegações finais é obrigatória para o Ministério Público, em razão do princípio da indisponibilidade da ação penal pública. Mas o promotor não é obrigado a pedir a condenação do réu, porque tem independência funcional e age conforme sua convicção. Se o promotor não apresenta as alegações finais, o juiz utiliza o art. 28 do Código de Processo Penal por analogia – remete os autos ao procurador-geral para que apresente ou designe outro promotor para apresentar a peça.

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O querelante não é obrigado a apresentar alegações finais, mas a sua não-interposição traz conseqüências, quais sejam:

se a ação penal é privada, ocorre a perempção;

se a ação penal é privada subsidiária da pública, o Ministério Público reassume a titularidade da ação.

A apresentação das alegações finais pela defesa é obrigatória, salvo no procedimento do Júri. Para não ocorrer nulidade processual é preciso que seja dada a oportunidade de apresentação da peça (princípio do contraditório e da ampla defesa). O juiz deve intimar, ainda que pessoalmente, o defensor e o réu para se manifestarem sobre a ausência das alegações. Se a defesa é omissa, o juiz nomeia defensor dativo para suprir sua falta.

Nas alegações finais devem ser argüidas as nulidades relativas; é o último momento para essa argüição, sob pena de sanar o vício, conforme o art. 571 do Código de Processo Penal. (Obs.: esse artigo é de alta incidência nos concurso do Ministério Público).

A inversão da ordem de apresentação das alegações finais gera a nulidade absoluta, por violar o princípio do contraditório.

1.1.8. Sentença

Sentença é o ato processual pelo qual o juiz põe fim ao processo, decidindo ou não o mérito da causa.

(Obs.: para maior aprofundamento rever o Módulo XVII).

O prazo para a sentença é de 10 dias, mas é prazo impróprio. O juiz pode, antes da sentença, determinar diligências adicionais.

1.1.9. Prazos

Como regra, o prazo do procedimento ordinário é de 81 dias, compreendendo o período que vai do inquérito policial até o encerramento da prova de acusação. No caso do réu preso, os prazos não podem ser excedidos sob pena de constrangimento ilegal, possibilitando a impetração do habeas corpus. Não se considera excesso de prazo se houver justo motivo como, por exemplo, pluralidade de réus, exame de insanidade mental, retardamento causado pela própria defesa (Súmula n. 64 do STJ).

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PROCEDIMENTO SUMÁRIO

O procedimento sumário previsto nos arts. 531 e ss. do Código de Processo Penal aplica-se a todos os crimes apenados com detenção, excluindo-se aqueles que possuem procedimento especial e as infrações penais de menor potencial ofensivo.

O procedimento sumário é idêntico ao procedimento ordinário até a audiência de oitiva das testemunhas de acusação (recebimento da denúncia ou queixa, citação, interrogatório, defesa prévia, audiência de oitiva das testemunhas de acusação).

Após essa audiência, o juiz profere um despacho saneador, em que verifica se há nulidade a ser sanada e diligência importante a ser realizada, designando em seguida data para audiência de instrução, debates e julgamento. Esse despacho não tem caráter de decisão interlocutória.

Na audiência de instrução são ouvidas as testemunhas de defesa, ocorrem os debates orais (cada parte tem 20 minutos, prorrogáveis por mais 10) e o julgamento.

Os debates podem ser substituídos por memoriais, sendo a sentença prolatada em 5 dias (prazo impróprio); havendo debates orais, a sentença será proferida em audiência.

O número de testemunhas para o procedimento sumário é de no máximo cinco.

JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS (Lei n. 9.099/95)

Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais foram instituídos pela Lei n. 9.099/95. Contrariando os princípios da indisponibilidade e da obrigatoriedade que norteiam a ação penal pública, essa lei introduziu no sistema penal o princípio da oportunidade ou da conveniência para o início ou prosseguimento da ação penal, com propostas de suspensão do processo, composição dos danos e penas alternativas.

O processo perante o Juizado Especial orienta-se também pelos critérios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, visando sempre à reparação dos danos sofridos e à aplicação de pena não-privativa de liberdade.

Uma importante alteração trazida pela lei foi a de que as ações penais, nos crimes de lesão corporal leve e culposa, passam a depender de representação no prazo decadencial de 6 meses.

A Lei n. 9.099/95 traz normas mistas ou híbridas, ou seja, que possuem ao mesmo tempo natureza processual e material. Nesses casos deve prevalecer o cunho penal da norma, retroagindo quando for mais favorável ao acusado. São normas mistas :

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renúncia tácita ao direito de queixa ou representação, na hipótese de composição dos danos civis (quando a ação penal for pública condicionada à representação, ou privada);

proposta de pena restritiva de direitos ou multa, feita pelo Ministério Público (transação penal);

proposta de suspensão condicional do processo, quando do oferecimento da denúncia;

representação nos crimes de lesão corporal leve e culposa.

O art. 90 da Lei dos Juizados Especiais traz a seguinte redação: “As disposições desta Lei não se aplicam aos processos penais cuja instrução já estiver iniciada.”

Ocorre, porém, que na lei encontram-se algumas disposições penais benéficas, e o art. 5.º, inc. XL, da Constituição Federal prevê: “A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Verifica-se que o art. 90 da Lei n. 9.099/95 viola o referido preceito constitucional.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil intentou Ação Direta de Inconstitucionalidade (n. 1719) e o Supremo Tribunal Federal, interpretando o art. 90 da Lei dos Juizados conforme a Constituição, definiu o alcance da expressão disposições contida na norma. As disposições da lei que não se aplicam aos processos penais com instrução iniciada são as normas materiais que agravam a situação do réu e as normas processuais. Os dispositivos benéficos contidos no sistema dos Juizados Especiais devem ser aplicados aos processos cuja instrução já estiver iniciada – por força do art. 5.º, inc. XL, da Constituição Federal.

Ao Juizado Especial Criminal compete processar e julgar as contravenções e os crimes cujas penas máximas não excedam 1 ano – são os denominados crimes de menor potencial ofensivo –, exceto aqueles que tenham procedimento especial (artigo 61 da Lei n. 9.099/95).

A Lei n. 10.259, de 12.7.2001, criou os Juizados Especiais Criminais na Justiça Federal, competente para julgar feitos de competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo (artigo 2.º, “caput”). Essa lei ao conceituar infrações de menor potencial ofensivo o faz no parágrafo único do artigo 2.º: “Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa.”

Observe-se que a Lei n. 9.099/95 fixa a pena máxima cominada aos crimes em quantidade não superior a um ano e a Lei n. 10.259/01 determina que a pena máxima não pode ser superior a dois anos.

As duas leis conceituam “infração de menor potencial ofensivo”. Diante dessa afirmação, surge a questão: a Lei n. 10.259/01 derrogou a Lei n. 9.099/95? Entendemos

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que sim. Essa é a posição do Professor Damásio de Jesus. Se esse entendimento não for adotado, poderão ocorrer na prática, em prejuízo de princípios constitucionais, alguns absurdos. Citamos como exemplo o crime de paralisação do trabalho (artigo 201 do Código Penal) o qual é de competência Federal quando o fato atinge a organização do trabalho como um todo (art. 109, inc. VI, da CF). Quando individual, a competência é da Justiça Comum. Não se acatando a nossa posição, o crime mais grave, que atinge a coletividade, seria considerado de menor potencial ofensivo, enquanto o crime menos lesivo, por atingir somente um indivíduo, teria qualificação de maior potencial ofensivo.

A Lei n. 9.099/95 ao conceituar crime de menor potencial ofensivo, excepciona os casos em que a lei prevê procedimento especial. A Lei n. 10.259/01 silencia a respeito dessa exceção. Assim, a lei nova, além de ampliar o rol dos delitos de menor potencial ofensivo por meio da elevação da pena máxima abstrata cominada ao crime, estende mais ainda o conceito de infrações de menor potencial ofensivo, pois não traz a exceção da lei anterior. Entendimento diverso acarretaria situações de desigualdade jurídica, como por exemplo o crime de abuso de autoridade, previsto na Lei n. 4.898/65, o qual tem rito processual especial: o crime seria de menor potencial ofensivo se o autor fosse autoridade federal, e de maior potencial ofensivo se tratando de autoridade estadual.

Em suma, entendemos que o parágrafo único do artigo 2.º da Lei n. 10.259/01 derrogou o artigo 61 da Lei n. 9.099/95, devendo ser considerados delitos de menor potencial ofensivo aqueles aos quais a lei comine, no máximo, pena detentiva não superior a dois anos, ou multa, ainda que tenham procedimento especial.

Cumpre ressaltar que o Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo recomendou aos integrantes do Ministério Público, por meio do Aviso n.º 74/02, de 6.2.2002, a não incidência da Lei dos Juizados Federais Criminais no âmbito estadual.

Utilizando-se a teoria da atividade, é competente o Juizado do local da execução do ato criminoso (art. 63 da Lei n. 9.099/95). Para alguns doutrinadores, o foro competente é o do local da consumação. A divergência não tem relevância tendo em vista tratar-se de competência territorial, que, por ser relativa, não acarreta nulidade.

Afasta-se a competência do Juizado Especial quando não obtida a citação pessoal do réu (porque a Lei n. 9.099/95 não prevê a citação por edital) e quando a complexidade ou as circunstâncias do caso indicarem a necessidade de deslocamento da causa à Justiça Comum.

Não há inquérito policial nesse procedimento: a autoridade policial lavra apenas um termo circunstanciado e encaminha ao Juizado o autor do fato e a vítima. Se o autor do fato for imediatamente encaminhado ao Juizado, ou prestar o compromisso de a ele comparecer, não será imposta prisão em flagrante, nem se exigirá fiança (art. 69, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95). A Lei n.º 10.455, de 13 de maio de 2002, alterou a redação do parágrafo único, conferindo ao juiz a possibilidade de determinar, como medida de cautela, o afastamento do autor do fato de seu lar, domicílio ou local de convivência com a vítima, em casos de violência doméstica.

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3.1. Procedimento

3.1.1.Audiência preliminar

Se o autor da infração e a vítima foram encaminhados de imediato, junto com o termo circunstanciado, ao Juizado:

realiza-se a audiência preliminar;

se, por qualquer razão, não for possível a realização da audiência, designa-se uma determinada data, da qual saem cientes as partes.

Se o autor do delito não for encaminhado, junto com o termo circunstanciado, à Secretaria do Juizado (cartório), ao recebê-lo, o juiz designará data para audiência preliminar e mandará intimar as partes.

O art. 68 da Lei dispõe que na intimação do autor do delito deve constar a

necessidade de comparecimento com advogado, com a advertência de, na falta desse, ser

nomeado dativo.

No dia designado, devem estar presentes (art. 72):

o representante do Ministério Público;

o autor do fato e a vítima – se menores, acompanhados de seus responsáveis;

o juiz;

os advogados das partes.

As fases na audiência preliminar dependem da ação penal prevista para o delito cometido.

a) Se o crime for de ação privada (dano simples)

a.1.Tentativa de composição civil dos danos

Se vítima e autor do delito chegarem a um acordo, esse é submetido à homologação do juiz – que pode não homologar se o entender desfavorável à vítima.

Homologado o acordo, automaticamente ocorrerá renúncia ao direito de queixa e extinção da punibilidade – art. 74, parágrafo único.

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Se o autor da infração não honrar sua parte no acordo, o procedimento criminal não pode ser reaberto (porque houve extinção da punibilidade), restando à vítima execução civil do acordo homologado (que é título executivo judicial - art. 584, inc. III, do CPC).

Se infrutífera a composição civil, a advogado da vítima oferecerá queixa imediatamente de forma oral ou, se preferir, poderá apresentá-la por escrito em momento posterior – desde que dentro de prazo decadencial.

Pelo texto legal, não cabe transação na ação penal privada; entretanto, a jurisprudência vem admitindo essa possibilidade.

O art. 104, par. ún., do Código Penal, dispõe que a reparação civil do dano não obsta a ação penal, mas no Juizado é diferente: havendo acordo, a conseqüência automática é a renúncia ao direito de queixa.

b) Se o crime for de ação pública condicionada à representação

b.1. Tentativa de composição civil

Se frutífera, implica renúncia ao direito de representação e extingue a punibilidade.

É hipótese de renúncia (instituto exclusivo da ação privada) aplicável na ação penal pública.

Se infrutífera, a vítima pode oferecer representação oral, reduzida a termo, ou posteriormente, dentro do prazo decadencial.

Oferecida a representação na audiência, o Ministério Público deve analisar as provas existentes no termo circunstanciado:

se não há indícios suficientes, o promotor deve requerer o arquivamento do feito;

se o promotor entender que há necessidade de novas diligências para complementação da prova (art. 77, § 2.º), requererá o envio dos autos à Justiça Comum para requisição de inquérito policial;

se o promotor verificar que existem provas para o oferecimento da denúncia, antes de fazê-lo analisará se é possível a transação penal.

Presentes os requisitos da transação, o Ministério Público deve fazer a proposta de aplicação de pena de multa ou restritiva de direitos (especificando seu valor ou a espécie de restritiva).

se o autor da infração aceitar a proposta, será submetida à homologação do juiz.

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P.: Pode o juiz alterar o acordo feito entre as partes?

R.: Como regra, não; porém existe exceção: quando em abstrato for prevista apenas multa para aquela infração penal, o juiz pode reduzir o valor pela metade (art. 76, § 1.º).

Homologado o acordo, será aplicada a pena avençada. Se o juiz não homologar a transação, por entender ser caso de denúncia, a lei é omissa, e aplica-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.

Se o autor da infração não aceita a proposta do Ministério Público, é oferecida denúncia oral, reduzida a termo – não pode ser apresentada por escrito porque a lei não a prevê como queixa.

P.: Em que hipóteses é oferecida a denúncia?

R.: Quando não estão presentes os requisitos para transação; quando o autor do delito recusa a proposta de transação; quando o autor da infração, intimado para audiência preliminar, não comparece nem justifica sua ausência.

O fato de o autor da infração ter aceitado a transação não implica reconhecimento de culpa; portanto, se a vítima quiser ser indenizada, precisará ingressar com ação de conhecimento na esfera civil.

A transação não retira a primariedade do autor do delito e não constará de certidões para serem utilizadas extrajudicialmente.

Requisitos para transação (art. 76, § 2.º ):

que o autor da infração não tenha sido condenado pela prática de crime à pena privativa de liberdade (portanto, em caso de contravenção, qualquer que seja a pena, cabe transação se preenchidos também os demais requisitos);

que o acusado não tenha sido beneficiado por outra transação penal, no prazo de 5 anos;

requisitos subjetivos: personalidade do agente, conduta social etc., suficientes à adoção da medida.

c) Se o crime for de ação pública incondicionada

Tentativa de composição civil, mesmo sendo ação pública incondicionada, porque vale como título judicial evitando a discussão no cível.

Havendo homologação ou não, passa-se para fase de transação, porque, por ser ação pública incondicionada, mesmo ocorrendo acordo, a punibilidade não se extingue.

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3.1.2. Disposições comuns

Se o agente estava presente na audiência, recebe uma cópia da denúncia ou queixa e com isso estará citado, com ciência de que deve comparecer à próxima audiência com advogado, sob pena de ser-lhe nomeado dativo.

P.: É possível a citação do acusado antes do recebimento da denúncia ou queixa?

R.: Sim, no Juizado Especial.

Se o acusado não estava presente na audiência preliminar, será citado por mandado, na forma da legislação comum.

Se não for encontrado para citação pessoal, os autos serão remetidos para a Justiça Comum para citação por edital, que não é prevista pela Lei dos Juizados.

3.1.3. Audiência de instrução, debates e julgamento

Se o autor da infração não compareceu à audiência preliminar e comparece nessa,

devem ser observadas as regras da audiência preliminar (composição cível, transação),

com todas as suas conseqüências.

Fora dessa hipótese:

é dada a palavra ao advogado do réu para, oralmente, sustentar a rejeição da denúncia ou queixa;

o juiz recebe ou rejeita a denúncia ou queixa;

oitiva da vítima;

oitiva das testemunhas da acusação, arroladas na denúncia;

oitiva das testemunhas da defesa, que o réu levará à audiência independente de intimação ou das quais apresentará rol em cartório, com 5 dias de antecedência, para serem intimadas; o número máximo de testemunhas é três, conforme dispõe a parte civil da lei; porém, alguns doutrinadores entendem ser cinco, de acordo com o procedimento sumário; outros, oito, utilizando analogia com o procedimento comum ordinário;

interrogatório do réu;

debates orais, por 20 minutos, prorrogáveis por mais 10;

sentença.

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3.1.4. Recursos

Os recursos são julgados por Turmas Recursais compostas por juízes de primeiro grau, na forma estabelecida na legislação estadual.

A lei trata apenas da apelação e dos embargos de declaração. Porém, não é por esse motivo que só cabem esses dois recursos: os demais também são aplicados (recurso em sentido estrito, recurso especial, mandado de segurança, habeas corpus etc.). A lei apenas citou os dois para trazer regras específicas para eles.

Não cabe recurso especial porque esse é cabível de decisão de tribunal (art. 105, inc. III, da CF), e o recurso no Juizado é julgado por Turma Recursal (art. 82 da Lei dos Juizados Especiais). Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça consubstanciado na súmula 203.

Da decisão que rejeita a denúncia ou queixa e da sentença de mérito cabe apelação. O prazo é de 10 dias, e as razões acompanham a interposição.

Os embargos de declaração possuem prazo de 5 dias, e a interposição suspende o prazo para interposição de outros recursos.

3.2. Observações Finais

Aplicada pena de multa na sentença, se o condenado não pagar, cabe execução, persistindo a polêmica da competência para execução da multa.

P.: Aplicada pena de multa na transação penal, se o autor da infração não pagar, o que deve ser feito?

R.: A questão é divergente:

executa-se a multa;

com o descumprimento do acordo por parte do acusado, o Ministério Público também pode descumpri-lo, oferecendo a denúncia para prosseguimento do processo, porque a homologação da transação fez apenas coisa julgada formal.

Há julgado nos dois sentidos.

P.: E, se na transação for aplicada pena restritiva de direitos, como executá-la?

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R.: Nesse caso, a única solução é o oferecimento da denúncia.

P.: A lesão leve passou a ser delito de ação penal pública condicionada. Como ficam as vias de fato – contravenção cuja ação penal é pública incondicionada?

R.: As vias de fato constituem infração menos grave do que a lesão leve; logo, a ação passou a ser também pública condicionada à representação. Fundamento, analogia in bonam partem.

P.: Se o promotor denunciar, classificando o fato como tentativa de homicídio, e o Júri desclassificar para lesão corporal leve, como proceder?

R.: Transitando em julgado a desclassificação, designa-se audiência preliminar

para que sejam cumpridas as fases previstas na Lei dos Juizados Especiais.

P.: E, se tiver ocorrido decadência, caberá decurso do prazo de 6 meses para representação?

R.: Duas posições:

a vítima perde o direito de representar;

a vítima não pode ser prejudicada; cabe a representação, e o prazo de 6 meses tem início com a intimação da vítima da desclassificação do delito.

Procedimentos Especiais

1. PROCEDIMENTO DOS CRIMES FUNCIONAIS

O procedimento dos crimes funcionais é aplicado a todos os crimes em que a condição de funcionário público funcione como elementar ou circunstância do tipo penal. Ex.: o Título XI, Capítulo I, do Código Penal aborda os crimes praticados por funcionário público contra a Administração Pública, e o Capítulo IV trata dos crimes praticados contra as finanças públicas.

O procedimento dos crimes funcionais segue o rito ordinário após o recebimento da denúncia ou queixa subsidiária; a peculiaridade que o torna especial é a possibilidade de o funcionário apresentar defesa preliminar antes do recebimento da peça inicial.

Para tanto, o acusado é notificado com prazo de 15 dias para se defender (art. 514 do CPP). Se não for encontrado, ser-lhe-á nomeado defensor dativo para exibir a resposta preliminar.

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O próprio acusado pode apresentar a defesa preliminar, mesmo não sendo advogado.

Descumprida essa formalidade prévia, a nulidade é relativa (anulam-se os atos seguintes mediante comprovação de prejuízo). Essa é a orientação do Supremo Tribunal Federal. Nada obstante, consigna-se a posição minoritária do Professor Tourinho a favor da existência de nulidade absoluta pela violação do contraditório e da ampla defesa.

O objetivo da defesa preliminar é evitar que ocupantes de cargos públicos sejam alvo de acusação infundada, tendo aplicação apenas aos crimes funcionais afiançáveis (são inafiançáveis o excesso de exação e a facilitação do contrabando e descaminho – arts. 316, § 1.º, e 318, do CP).

P.: Há algum meio para garantir a apresentação da defesa preliminar?

R.: Sim, pela correição parcial, caso o juiz não conceda a oportunidade para a sua apresentação.

P.: Se o funcionário público, aposentado ou exonerado, for processado por um fato que praticou enquanto exercia a função de funcionário público, terá direito a defesa preliminar?

R.: O entendimento atual é no sentido de não ter direito à defesa preliminar, em

razão da revogação da Súmula n. 394 do Supremo Tribunal Federal. A súmula não se

refere a esse procedimento, mas o fundamento de sua revogação é o mesmo dessa

questão.

A súmula determinava que: “Cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito policial ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício”.

Com o cancelamento dessa súmula, os fatos ocorridos durante a existência do foro especial são processados após o término dessa prerrogativa na primeira instância e não no foro especial, pois este existe em razão da função que a pessoa desempenha (do cargo), não se tratando de um privilégio individual.

Ex.: se um funcionário público pratica um crime durante o exercício de sua função, mas só vem a ser processado quando já estava aposentado ou exonerado, não será adotado o procedimento que permite a defesa preliminar, mas sim o procedimento comum.

Verificado o concurso de agentes no crime, os co-autores e partícipes, que não sejam funcionários públicos, não serão notificados para a apresentação da defesa preliminar – pois não possuem essa faculdade.

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Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, o recebimento da denúncia ou da queixa deve ser fundamentado. Isso porque os crimes funcionais têm o contraditório antecipado na defesa preliminar. Trata-se de exceção, pois, em regra, no despacho que recebe ou rejeita a denúncia ou a queixa não há fundamentação.

Recebida a denúncia ou a queixa, o acusado é citado – seguindo-se o procedimento ordinário.

2. Crimes Contra Honra (arts. 519 a 523 do CPP)

Trata-se de procedimento subsidiário previsto para os crimes contra honra, cuja ação penal é privada. O art. 519 do Código de Processo Penal ratifica ao descrever que o rito será observado no processo “para o qual não haja outra forma estabelecida em lei especial”. Ex.: crimes cometidos pela imprensa, Lei n. 5.250/67; pessoas que gozam de foro especial pela prerrogativa de função, se a competência for do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal, Lei n. 8.038/90.

Apesar do Título II, Capítulo III, do Código de Processo Penal, referir-se somente à calunia e à injúria, esse procedimento também é aplicável à difamação pela utilização da analogia (art. 3.º do CPP).

O emprego da analogia pressupõe a omissão involuntária do legislador, porque se a omissão foi proposital, não cabe o uso do instituto. A lacuna do art. 519 do Código de Processo Penal não foi espontânea; o Código Penal em vigor na época em que o Código de Processo Penal foi criado era o de 1890, e previa os crimes contra honra em dois artigos, encontrando-se a difamação descrita no parágrafo do tipo da calúnia (como sua espécie e não como crime autônomo).

Em regra, os crimes contra a honra são de ação penal privada, iniciando-se mediante queixa-crime. Exceções:

a ação penal será pública incondicionada se da injúria real resultar lesão corporal.

será pública condicionada à representação nos crimes contra a honra de funcionário público, em razão de sua função.

será pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça nos crimes contra a honra do Presidente da República ou de Chefe de Governo estrangeiro.

2.1. Peculiaridades do Procedimento dos Crimes Contra a Honra

a) Audiência de reconciliação (ou conciliação): o objetivo dessa audiência é que autor e réu se reconciliem (art. 520 do CPP).

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Deve ocorrer após o oferecimento da denúncia e antes do seu recebimento.

O juiz ouvirá cada uma das partes isoladamente; percebendo a possibilidade de conciliação, chamará as partes e seus advogados e tentará o acordo na audiência, que, se frutífero, será homologado. O querelante assinará termo de desistência da ação com a conseqüente extinção da punibilidade.

Não havendo acordo, será frustrada a conciliação e o juiz chamará à conclusão os autos para receber ou não a queixa.

Recebida a queixa, apesar de o crime ser o de detenção, adota-se o procedimento ordinário.

P.: Qual a causa extintiva da punibilidade para a hipótese de conciliação?

R: Não é a renúncia, porque essa ocorre quando o querelante não exerce seu direito de oferecer a queixa, e no caso em estudo já houve o oferecimento da exordial. Também não é a perempção, pois a ação penal ainda não se iniciou. Portanto, a causa extintiva da punibilidade é a desistência – que não está prevista no rol do art. 107 do Código Penal, mas esse é exemplificativo e não taxativo (art. 522 do CPP).

Para grande parte da doutrina, a falta da audiência de reconciliação gera nulidade absoluta.

O não-comparecimento do querelado à audiência preliminar indica desinteresse na conciliação. Não acarreta sanção; o juiz passa a analisar se é caso de receber ou rejeitar a queixa.

O não-comparecimento do querelante, posição minoritária, gera a perempção, pois deixa de comparecer a um ato fundamental (art. 60 do CPP). Esse entendimento é falho, pois ainda não houve o recebimento da queixa, e, assim, não há que se falar em perempção. Posição majoritária na doutrina, na jurisprudência e no Superior Tribunal de Justiça, indica desinteresse na conciliação.

b) Exceção da verdade (art. 523 do CPP): é a possibilidade do querelado provar que o alegado é verdadeiro. Admite-se nos crimes de calúnia, salvo o expresso no art. 138, § 3.º, do Código Penal:

se, constituindo o fato crime de ação penal privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;

se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no inc. I do art. 141 do Código Penal (Presidente da República ou Chefe de Governo Estrangeiro);

se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

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Também é cabível nos crimes de difamação, quando a vítima for funcionário público, por fato relativo a suas funções (art. 139, par. ún., do CP).

O momento da apresentação da exceção da verdade é o mesmo da defesa prévia (art. 395 do CPP – logo após o interrogatório ou no prazo de três dias).

O querelante tem dois dias para contestar, podendo arrolar testemunhas, desde que com esse novo rol não se ultrapasse o número legal. Ex.: na queixa foram arroladas quatro testemunhas; poderá o querelante na contestação da exceção da verdade oferecer mais quatro testemunhas.

Todas as testemunhas, inclusive as da exceção da verdade, serão ouvidas durante a audiência de instrução.

O juiz, antes de analisar o mérito, na própria sentença decide a exceção da verdade.

Obs.: parte da doutrina sustenta que o prazo da exceção da verdade não é fatal em nome da ampla defesa. Ainda que apresentada após o lapso previsto no art. 395 do Código de Processo Penal, poderá ser aceita e julgada na sentença.

Atenção: conforme determina o art. 85 do Código de Processo Penal, se o querelante for pessoa que goze de foro especial, a exceção da verdade será julgada pelo tribunal competente para processar originariamente o querelante. Ex.: querelante é deputado federal; torna-se vítima de calúnia e oferece queixa na primeira instância. O querelado apresentará a exceção da verdade que será julgada no Supremo Tribunal Federal. Obs.: a exceção da verdade é processada e instruída na primeira instância e remetida para o tribunal competente apenas para o julgamento.

c) Pedido de explicações em Juízo (art. 144 do CP): é uma medida preliminar, utilizada quando a ofensa é equívoca, dúbia. Ex.: alguém se referindo a uma moça diz que ela é muito cara. Essa frase possibilita duplo entendimento: ou a moça é muito especial, com valiosas qualidades, ou é uma meretriz que cobra caro por seus trabalhos.

A situação que conduz ao duplo entendimento, permite o pedido de explicações em Juízo, que não é obrigatório. Visa esclarecer as dúvidas para que a queixa fique bem fundamentada.

Ajuizado o pedido de explicações, o autor da frase é notificado para prestar esclarecimentos. Com ou sem as respostas, os autos do pedido são entregues ao requerente.

O juiz é um intermediário, não analisa o mérito. Configura um elemento a mais para o exame da justa causa para o recebimento da queixa.

O prazo de seis meses para oferecer a queixa é peremptório e decadencial; não se suspende nem se interrompe com o ajuizamento do pedido de explicações.

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O pedido de explicações torna prevento o Juízo.

O querelado somente será condenado na ação penal privada, nunca no pedido de explicações em Juízo.

3. PROCEDIMENTO NOS CRIMES FALIMENTARES

Os crimes falimentares classificam-se em:

antefalimentares: a conduta se realiza anteriormente à sentença declaratória de falência;

pós-falimentares: a conduta se verifica após a sentença declaratória de falência.

O crime falimentar prescreve em dois anos, a contar do encerramento da falência (art. 199 da Lei n. 7.661/45). A Súmula n. 147 do Supremo Tribunal Federal determina que: “A prescrição do crime falimentar começa a correr da data em que deveria estar encerrada a falência, ou do trânsito em julgado da sentença que a encerrar ou que julgar cumprindo a concordata”.

Mas quando deveria se encerrar a falência?

Conforme a regra do art. 132, §1.º, da Lei n. 7.661/45, a falência deve encerrar-se em dois anos, a contar da data de sua declaração.

A prática de crime falimentar é apurada no inquérito judicial presidido pelo próprio juiz da falência, baseado na exposição circunstanciada apresentada pelo síndico da falência. A exposição é instruída com o laudo do perito, encarregado de examinar as escriturações do falido. Podem requerer a instauração do inquérito judicial o síndico ou qualquer credor interessado.

O falido terá o prazo de cinco dias para contestar as alegações do inquérito judicial. Encerrado esse prazo, os autos serão conclusos ao juiz que, em 48 horas, deferirá a produção de provas.

Realizadas as provas, os autos serão remetidos ao Ministério Público que, no prazo de cinco dias, poderá oferecer a denúncia ou requerer o apensamento dos autos aos autos da falência, arquivando o inquérito judicial. Se o juiz não concordar com o apensamento, remeterá as peças ao Procurador-Geral, para os fins do art. 28 do Código de Processo Penal.

Quaisquer dos credores ou mesmo o síndico poderá oferecer a queixa subsidiária, caso o Ministério Público não ofereça nem requeira sem apensamento dentro do prazo.

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Se o Ministério Público oferecer a denúncia, o seu recebimento deve ser fundamentado sob pena de nulidade (Súmula n. 564 do STF).

Os autos, então, serão remetidos ao Juízo criminal, onde a ação penal prosseguirá pelo rito ordinário, independentemente de ser o crime de reclusão ou de detenção. No Estado de São Paulo, por força da Lei Estadual n. 3.947/83, o Juízo da falência tem competência universal, inclusive para o julgamento dos crimes falimentares. O recebimento da denúncia impede a concessão da concordata suspensiva.

Diverge a doutrina com relação à natureza jurídica da sentença declaratória da falência. O Professor Fernando Capez elenca os entendimentos:

“1.ª) é elementar do tipo falimentar, segundo José Frederico Marques;

2.ª) Nelson Hungria entende que é condição objetiva de punibilidade (adotada);

3.ª) Trata-se de condição de procedibilidade, embora em alguns casos possa constituir elementar do tipo. Como exemplo, os arts. 186, inc. III, e 189, inc. II, ambos da Lei de Falências.

4.ª) Segundo Mirabete, trata-se de ‘condição objetiva de punibilidade quanto aos crimes antefalimentares, e pressuposto quanto aos crimes pós-falimentares, excluídos os crimes em que é a quebra elemento do próprio fato típico’.”

4. Procedimento dos Crimes Contra a Propriedade Imaterial

Os crimes contra a propriedade imaterial são os que ferem os direitos autorais (arts. 184 e 185 do CP) e os direitos da propriedade industrial (Lei n. 9.279/96).

São, em regra, crimes de ação penal privada, pois processam-se mediante queixa; porém, também há previsão de ação penal pública, de acordo com o art. 186 do Código Penal.

O procedimento desses crimes varia, conforme o delito deixe ou não vestígios.

Se o crime deixar vestígios, crime não-transeunte, a denúncia ou a queixa será recebida se instruída com o exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito (art. 525 do CPP).

O autor deve comprovar seu direito à ação (art. 526 do CPP). Para tal deve requerer, antes da queixa ou da denúncia, a busca e apreensão e perícia, apresentando os quesitos.

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A diligência será realizada por dois peritos do Juízo, que farão a vistoria e apreensão de objetos suficientes para a prova da infração. Caso o laudo seja contrário aos interesses do autor, este poderá impugná-lo.

Encerradas as diligências, o juiz homologa o laudo pericial sem examinar o mérito. Homologado o laudo, o autor será intimado para, em 30 dias, oferecer a queixa-crime instruída com a perícia, sob pena de sua ineficácia.

Com o recebimento da denúncia, passa-se para o rito ordinário.

Se o crime não deixar vestígios, crime transeunte, o rito será o ordinário, ainda que a pena seja a de detenção.

5. PROCEDIMENTO NOS CRIMES DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS

Algumas pessoas, em razão do cargo que ocupam, se cometerem uma infração penal, devem ser processadas e julgadas originariamente nos tribunais, na instância superior. Trata-se de uma prerrogativa da função. Ex.:

Prefeito é processado e julgado no Tribunal de Justiça;

Governadores, Desembargadores, membros do Tribunal de Contas dos Estados, entre outros, são julgados no Superior Tribunal de Justiça;

Presidente da República, Vice-Presidente, membros do Congresso Nacional e o Procurador-Geral da República são julgados pelo Supremo Tribunal Federal.

O rito é previsto na Lei n. 8.038/90: oferecida a denúncia ou a queixa perante o tribunal competente, o acusado é notificado para apresentar uma resposta prévia antes do recebimento da petição inicial.

O relator do tribunal pedirá dia para que o tribunal decida sobre o recebimento ou não da denúncia ou da queixa, ou ainda sobre a improcedência da acusação (art. 6.º da lei).

Recebida a denúncia ou a queixa, passa-se para o interrogatório do acusado, a defesa prévia (com prazo de cinco dias), a instrução etc., observando-se o procedimento comum. O julgamento será na forma prevista no regimento interno de cada tribunal.

Obs.: para maior aprofundamento sobre esse tema é interessante rever o módulo VIII, que trata da competência.

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Do Procedimento do Júri

1. HISTÓRICO

O Júri tem a sua origem na Magna Carta de 1215. No Brasil, surgiu na Lei de 18.6.1822, que criava o julgamento pelo Júri para os crimes de imprensa. Depois, a Constituição Imperial de 1824 passou a prevê-lo como um órgão do Poder Judiciário e ampliou sua competência para julgar causas cíveis e criminais (quanto às causas cíveis não houve regulamentação). A Constituição de 1891 manteve o Júri como instituição soberana. A Constituição de 1934 disciplinou o Júri no capítulo do Poder Judiciário.

O “período obscuro do Tribunal do Júri” foi o de 1937; a Constituição Federal de 1937 não se manifestou a respeito do instituto, o que tornou possível a um decreto (o Decreto n. 167/38) suprimir a soberania dos veredictos do Júri. Tal decreto permitiu que os tribunais reformassem o julgamento do Júri pelo mérito. Atualmente, se o Júri condena, o Tribunal não pode, ao rever a decisão, absolver. Esse princípio suprimido foi restabelecido na Constituição de 1946. A Constituição de 1967 não fez referência ao princípio da soberania dos veredictos.

2. O JÚRI NA ATUAL CONSTITUIÇÃO FEDERAL

O Júri na atual Constituição encontra-se disciplinado no capítulo dos Direitos e Garantias Individuais, e como tal não pode ser suprimido nem por emenda constitucional, constituindo verdadeira cláusula pétrea (núcleo constitucional intangível). Tudo por força da limitação material explícita contida no artigo 60, § 4.º, inciso IV, da Constituição Federal.

A Constituição Federal prevê o Júri em seu artigo 5.º, inciso XXXVIII. Esse dispositivo traça os quatro princípios fundamentais da instituição do Júri, quais sejam: plenitude de defesa; sigilo nas votações; soberania dos veredictos; competência mínima para julgamento dos crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados.

Vejamos cada um desses princípios:

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a) Plenitude de defesa

A defesa plena é mais abrangente do que a ampla defesa, pois além da autodefesa, o réu terá direito à defesa técnica, podendo fazer uso de argumentos jurídicos e extrajurídicos.

O advogado tem liberdade para elaborar a defesa do réu, podendo alegar o que melhor lhe aprouver, ainda que sem amparo jurídico. Exemplo: na tréplica, o advogado alega que o crime foi praticado há 11 anos; depois disso, o réu arrumou um emprego, teve sete filhos, tornou-se líder comunitário etc.

Se o juiz constata que a defesa desenvolvida em plenário é inepta, pode dissolver o conselho de sentença declarando o réu indefeso (artigo 497, inciso V, do Código de Processo Penal).

O juiz deve quesitar, além das alegações desenvolvidas pela defesa técnica, aquelas alegadas pelo réu em sua autodefesa, mesmo que incompatíveis. Exemplo: o réu, no seu interrogatório em plenário, alega que agiu em legítima defesa. O defensor considera que é difícil convencer os jurados da legítima defesa e então sustenta outra tese; alega que o réu não conhece o instituto da legítima defesa, argumenta que as qualificadoras não existiram e que há um privilégio. O juiz irá quesitar as duas defesas alegadas: legítima defesa e privilégio. Esse entendimento nos parece ser o melhor, pois garante efetivamente a defesa plena, mas há decisão do Supremo Tribunal Federal no sentido de que só deve ser quesitada a tese apresentada pela defesa técnica.

b) Sigilo nas votações

Trata-se de princípio informador específico do Júri; a ele não se aplica o disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal (princípio da publicidade).

O Código de Processo Penal prevê várias maneiras de manter o sigilo nas votações, cabendo citar, entre outras:

Incomunicabilidade dos jurados: os jurados não podem emitir qualquer opinião sobre o processo. Podem conversar entre eles, desde que não seja sobre o caso. Os jurados são impedidos de se comunicar com qualquer terceiro estranho ao processo. A comunicação dos jurados com o mundo externo ocorre somente por meio do oficial de justiça.

O julgamento é feito em sala secreta: isso evita que uma das pessoas que esteja no plenário perceba qual foi o voto dos jurados e, também, qualquer tipo de constrangimento.

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O julgamento feito pelos jurados tem por base a íntima convicção: assim, não há fundamentação da decisão. É exceção à regra do livre convencimento motivado.

Observação: Há quem sustente deva a votação do quesito ser interrompida assim que surgir o quarto voto idêntico; sendo apenas sete os jurados, não haveria como ser modificado o destino daquele quesito.

c) Soberania dos veredictos

Conceito do Professor José Frederico Marques: “A soberania consiste na impossibilidade dos juízes togados se substituírem aos jurados na decisão da causa.”

O mérito no Júri é decidido exclusivamente pelos jurados. Esse princípio não é absoluto, ou seja, encontra limitações.

O artigo 593, inciso III, alínea “d”, do Código de Processo Penal, permite a apelação das decisões do Júri quando consideradas manifestamente contrárias às provas dos autos. A apelação é julgada pelo tribunal. Se o tribunal der provimento à apelação, anula o julgamento e determina a realização de outro. O tribunal não decide o mérito. A apelação com esse fundamento só pode ser interposta uma vez.

“Na revisão criminal, a mitigação desse princípio é ainda maior, porque o réu, condenado definitivamente pode ser até absolvido pelo tribunal revisor, caso a decisão seja arbitrária. Não há anulação nesse caso, mas absolvição, isto é, modificação direta do mérito da decisão dos jurados.”1

A soberania do Júri é um princípio relativo, pois não pode impedir a busca da verdade real que também é princípio informador do processo penal.

Observações: 1. A absolvição sumária ocorre quando provada excludente de ilicitude ou de culpabilidade. Nesse caso, o réu não vai a Júri, e sim, o juiz togado julga o mérito.

2. A revisão criminal é a ação rescisória de coisa julgada penal. Sempre em favor do réu, nunca pro societate. No caso de Júri, interposta a revisão criminal, ela será julgada por 10 desembargadores (normalmente o recurso é julgado por três) e os juízes togados decidirão o mérito nesse caso.

d) Competência mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados1 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

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Os crimes dolosos contra a vida são:

homicídio (artigo 121 do Código Penal);

induzimento, instigação ou auxílio a suicídio (artigo 122 do Código Penal);

infanticídio (artigo 123 do Código Penal);

aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento e aborto provocado por terceiro (artigos 124 a 126 do Código Penal).

Esses são os crimes de competência do Júri; todavia, sua competência pode ser ampliada por lei ordinária. Já existe uma lei ordinária ampliando: o artigo 78, inciso I, do Código de Processo Penal prevê que também é da competência do Júri o julgamento dos crimes conexos com os crimes dolosos contra a vida.

Atenção:

1. A competência para julgar o latrocínio é do juiz singular, pois é um crime contra o patrimônio ( Súmula n. 603 do Supremo Tribunal Federal).

2. A competência para julgar o genocídio (crime contra a humanidade) é do juiz singular da justiça federal.

3. O policial militar, que pratica crime doloso contra a vida de civil, ainda que em serviço, será julgado pelo Júri.

4. Pessoas que têm prerrogativa de foro em razão da função não são julgadas pelo Júri (exemplo: promotor de justiça).

5. Quanto ao Júri, não se aplica a regra do artigo 70 do Código de Processo Penal, pois a jurisprudência entende que no local da conduta (e não do resultado) existe maior facilidade para produção de provas.

3. ORGANIZAÇÃO DO JÚRI

O Júri é um órgão da justiça comum. Pode ser estadual ou federal.

A competência do Júri federal é para julgamento de:

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crimes dolosos contra a vida de funcionários públicos federais, em razão de suas funções;

crimes dolosos contra a vida praticados a bordo de navio ou aeronave.

3.1. Características do Júri

Trata-se de órgão:

colegiado: o Júri é composto por um juiz togado e 21 jurados leigos.

Atenção: 21 jurados formam o Tribunal do Júri; 15 jurados presentes, no mínimo, instalam a sessão de julgamento; 7 jurados formam o conselho de sentença.

heterogêneo: é composto por órgãos de natureza distinta, juiz togado e jurados leigos.

horizontal: não há hierarquia entre os jurados e o juiz-presidente do Júri. O que existe são divisões de competência.

temporário: os jurados são sempre renovados.

Observação: o Júri não se confunde com o escabinado, pois neste não há divisão de competência. No Brasil, exemplo de escabinado é encontrado na justiça militar; nas auditorias há um juiz togado e cinco oficiais, sendo que seus votos têm o mesmo valor.

Compete ao juiz-presidente organizar a lista geral dos jurados, baseado em informações fidedignas ou conhecimento pessoal (artigo 439 do Código de Processo Penal). Normalmente, o juiz requer listas com nomes no Tribunal Regional Eleitoral, em repartições públicas, sindicatos de classes etc.

No mês de novembro de cada ano, o juiz publica uma lista provisória com o nome dos jurados que irão atuar no próximo ano. Na segunda quinzena de dezembro, o juiz publica a lista definitiva (artigo 439, parágrafo único, do Código de Processo Penal).

Enquanto a lista não é definitiva, qualquer pessoa pode impugná-la. O juiz decide sobre aquele pedido de exclusão de nome da lista. Se o juiz indefere o pedido e inclui o nome, aquele que argüiu a exclusão pode interpor recurso em sentido estrito no prazo de 20 dias (em outras hipóteses o recurso em sentido estrito tem prazo de cinco dias), conforme o artigo 581, inciso XIV, e artigo 586, parágrafo único, ambos do Código de Processo Penal. Quem julga o recurso é o Presidente do Tribunal de Justiça.

Da lista definitiva são sorteados os 21 nomes que formarão o Tribunal do Júri, sendo renovados a cada reunião periódica. O sorteio é realizado em audiência pública e um menor de 18 anos realiza o sorteio (presume-se a pureza do menor).

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As qualidades da pessoa para ser jurado são as seguintes:

ser brasileiro (nato ou naturalizado);

estar no gozo dos direitos políticos;

ser maior de 21 anos (a exigência não trata da antiga menoridade relativa processual penal, logo, subsiste o requisito, mesmo com a entrada em vigor do novo Código Civil – tanto é que o menor de 21 anos, casado, e o emancipado civil não podiam ser jurados);

ser residente na comarca onde acontecerão os julgamentos;

ter notória idoneidade moral;

ser alfabetizado.

A lei prevê expressamente nos artigos 434 e 436, parágrafo único, do Código de

Processo Penal aqueles que são isentos do serviço do Júri. Entre eles estão os maiores de

60 anos, os que já exerceram a função de jurado por um ano, ministros de confissão

religiosa, parteiras, entre outros.

Um cidadão convocado a prestar o serviço do Júri, não estando no rol dos isentos, não pode recusar-se a essa obrigação. Poderá, todavia, por razões de convicção filosófica, política ou de crença religiosa, invocar em seu favor a denominada escusa de consciência. O artigo 435 do Código de Processo Penal (determina que aquele que alega escusa de consciência para não prestar o serviço do Júri perde os direitos políticos) não foi recepcionado pela Constituição Federal, estando, portanto, revogado.

Segundo a Constituição Federal, aquele que invoca escusa de consciência para se livrar de obrigação a todos imposta, deverá prestar um serviço social alternativo. Havendo a recusa da prestação alternativa, ocorrerá a perda dos direitos políticos (artigo 5.º, inciso VIII, e artigo 15, inciso IV, da Constituição Federal). Essa obrigação alternativa deve ser prevista em lei, mas como no caso do Júri ainda não há lei regulamentando esta situação, entendemos que a escusa de consciência não traz nenhuma conseqüência.

O exercício efetivo da função de jurado, segundo o artigo 437 do Código de Processo Penal, é considerado um serviço público relevante. O jurado terá as seguintes prerrogativas:

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presunção de idoneidade moral;

prisão especial em caso de crime comum, até o julgamento definitivo;

preferência em igualdade de condições, em concorrências públicas.

Os jurados poderão ser responsabilizados criminalmente por concussão, corrupção e prevaricação.

4. JUDICIUM ACCUSATIONIS

O procedimento do Júri é bifásico ou escalonado. É o procedimento mais solene do Código de Processo Penal. Trata-se de um rito especial.

A primeira fase do Júri é denominada sumário da culpa ou judicium accusationis. Inicia-se com o oferecimento da denúncia ou da queixa (ação penal privada subsidiária da pública) e termina com o trânsito em julgado da pronúncia. Essa fase tem por objetivo verificar a admissibilidade da acusação e verificar se há requisitos mínimos para a acusação (juízo de prelibação). A instrução criminal segue o procedimento comum aos crimes apenados com reclusão:

oferecimento da denúncia ou da queixa;

recebimento da denúncia ou da queixa;

citação do acusado;

interrogatório;

fixação do tríduo para a defesa prévia (apresentação facultativa);

oitiva das testemunhas de acusação (número máximo de oito).

oitiva das testemunhas de defesa (número máximo de oito).

alegações finais (artigo 406 do Código de Processo Penal). Atenção: o prazo é de cinco dias para cada parte. Se houver querelante, este apresentará antes do Ministério Público. Se houver assistente de acusação, terá prazo comum com o Ministério Público. O prazo corre em cartório para o defensor.

Pergunta: As partes são obrigadas a apresentar as alegações finais?

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Resposta: O Ministério Público é obrigado a apresentar as alegações devido ao princípio da indisponibilidade da ação penal. A defesa não tem obrigação de apresentar, podendo preferir falar sobre o mérito apenas em plenário (pode se reservar o direito de apresentar sua tese em plenário). Para o assistente de acusação também é faculdade. No caso do querelante, depende se a ação é subsidiária ou exclusiva: se for subsidiária, a não apresentação faz com que o Ministério Público reassuma o processo; no caso de ação exclusivamente privada, se o querelante não apresentar as alegações escritas ocorre a perempção.

Observação: nessa fase fica proibida a juntada de qualquer documento pelas partes. Novo documento só será apresentado posteriormente no libelo ou nas contra-razões do libelo (artigo 406, § 2.º, do Código de Processo Penal).

Após as alegações, os autos vão conclusos ao juiz, que ordenará diligências para sanar nulidades ou suprir falhas. Em seguida, os autos vão conclusos para a sentença. O juiz pode tomar as seguintes decisões:

- decisão de pronúncia;

- decisão de impronúncia;

- desclassificação;

- absolvição sumária (depende de reexame necessário, que é condição de eficácia).

Todas essas decisões podem ser impugnadas por meio do recurso em sentido estrito (artigo 581, incisos II, IV e VI, do Código de Processo Penal).

4.1. Pronúncia

Trata-se da decisão do juiz que entende existir prova da materialidade e indícios suficientes de autoria. Julga admissível a acusação, submetendo o réu a julgamento pelo Tribunal do Júri.

“Na fase da pronúncia vigora o princípio in dúbio pro societate, uma vez que há mero juízo de suspeita, não de certeza. O juiz verifica apenas se a acusação é viável, deixando o exame mais acurado para os jurados. Somente não serão admitidas acusações manifestamente infundadas, pois há juízo de mera prelibação”.2

2 CAPEZ, Fernando. Op. cit.174

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Essa decisão, na verdade, não é uma sentença, pois não julga o mérito. Tem a natureza jurídica de decisão interlocutória mista não-terminativa. O Código de Processo Penal fala em sentença porque a decisão de pronúncia deve seguir os mesmos requisitos da sentença (relatório, fundamentação e dispositivo).

O dispositivo da decisão de pronúncia contém o julgamento da admissibilidade da acusação, da pretensão punitiva (exemplo: “... julgo admissível a acusação e pronuncio o réu.”).

A fundamentação não precisa analisar com profundidade o mérito da causa como na fundamentação da sentença, sob pena de influenciar na decisão dos jurados. O juiz, na pronúncia, deve utilizar uma linguagem comedida e cautelosa, sem referir-se a culpado ou inocente, pois levaria à nulidade da decisão.

São efeitos da pronúncia:

Submeter o réu a julgamento pelo Júri.

Fixar a classificação jurídica do fato.

Observação: o artigo 416 do Código de Processo Penal permite a mudança da classificação quando ocorrer circunstância superveniente que altere a mesma. Exemplo: o réu é pronunciado por tentar matar a vítima. A vítima que estava na UTI vem a falecer. O réu deverá ser julgado por homicídio consumado. Altera-se a pronúncia.

Interromper a prescrição (interrompe-se no momento da publicação). A Súmula n. 191 do Superior Tribunal de Justiça determina que a pronúncia é causa interruptiva da prescrição, ainda que ocorra a desclassificação do crime pelo Júri. Essa súmula veio pacificar os entendimentos, pois alguns defendiam que se os jurados desclassificassem para o procedimento comum ordinário, não teria ocorrido a interrupção, e muitas vezes o crime já estaria prescrito.

Decretação da prisão, se for o caso. O § 2.º do artigo 408 do Código de Processo Penal dispõe que se o réu for primário e de bons antecedentes, poderá o juiz deixar de decretar-lhe a prisão ou revogá-la, caso já se encontre preso. Trata-se de mera faculdade, pois o juiz deverá avaliar a existência de elementos que indiquem a necessidade da prisão (artigo 312 do Código de Processo Penal). Tratando-se de reincidente ou portador de maus antecedentes, atendendo-se ao disposto no artigo 408, § 2.º, do Código de Processo Penal, o réu terá, obrigatoriamente, de aguardar preso a realização de seu julgamento. O Superior Tribunal de Justiça, recentemente, voltou a decidir que, em face do princípio da inocência presumida, somente é admissível a imposição de prisão processual quando suficientemente demonstrado por decisão plenamente motivada a necessidade da cautela, em face da presença de uma das circunstâncias inscritas no artigo 312 do Código de Processo Penal. Para o

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Supremo Tribunal Federal, no entanto, é perfeitamente possível a prisão provisória obrigatória nos casos dos artigos 594 e 408, § 2.º, do Código de Processo Penal.

Observação: Conforme dispõe a Súmula n. 21 do Superior Tribunal de Justiça, pronunciado o réu, fica superada a alegação de excesso de prazo na instrução criminal.

Não há mais o lançamento do nome do réu no rol dos culpados. O dispositivo que determinava essa providência não foi recepcionado pela Constituição Federal em razão do princípio da presunção de inocência.

O juiz, na pronúncia, pode excluir a qualificadora incluída na denúncia se for manifestamente improcedente, arbitrária ou se não houver qualquer prova nos autos sobre ela.

Pergunta: Se a denúncia foi oferecida por homicídio simples, e na instrução apura-se que há uma qualificadora, o juiz pode incluir essa qualificadora na pronúncia?

Resposta: São duas as posições. Prevalece na doutrina o entendimento de que o juiz pode incluir a qualificadora na pronúncia após aplicar o artigo 384 do Código de Processo Penal - mutatio libelli - sob pena de violar a defesa plena. Já o Supremo Tribunal Federal entende que o juiz pode incluir qualificadora na pronúncia, independentemente da aplicação do artigo 384 do Código de Processo Penal, por força da regra específica prevista no artigo 408, § 4.º, do Código de Processo Penal.

Essa regra acima analisada também se aplica nas hipóteses de desclassificação de crime doloso menos grave contra a vida para outro crime doloso mais grave contra a vida. Exemplo: desclassificação de infanticídio para homicídio.

Pergunta: No caso de classificação jurídica errada, o juiz pode pronunciar o réu com outra classificação, sem dar vista às partes?

Resposta: Sim, aplicando o artigo 383 do Código de Processo Penal – emendatio libelli. Nesse caso não há violação ao princípio da correlação ou da congruência, pois o réu se defende dos fatos narrados. Assim, aplica-se o artigo 408, § 4.º, do Código de Processo Penal.

Ao juiz é vedado manifestar-se na pronúncia sobre:

causas de aumento de pena;

causas de diminuição de pena;

circunstâncias agravantes;

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circunstâncias atenuantes.

As causas de aumento de pena só serão incluídas no libelo. As circunstâncias agravantes vão ser incluídas no libelo ou nos debates durante a sessão de julgamento.

A única agravante que deve constar na pronúncia é a reincidência, pois irá interferir na prisão ou na liberdade do réu.

A intimação da decisão de pronúncia varia conforme a situação do réu:

Se o réu está preso, será intimado pessoalmente.

Se o réu está solto, será intimado pessoalmente. Caso não seja encontrado, a intimação será feita por edital, dependendo da natureza da infração:

Se o crime é afiançável, a intimação será feita por edital.

Se o crime é inafiançável, o réu só pode ser intimado pessoalmente. Ficando o réu em local incerto e não sabido o processo ficará parado até que aquele seja localizado. Nesse caso, ocorre a chamada crise de instância, isto é, há o estancamento da marcha processual. Nesse caso, o juiz pode decretar a prisão preventiva do réu para assegurar a aplicação da lei penal.

4.2. Impronúncia

A decisão de impronúncia julga inadmissível a acusação. Não há prova da materialidade e nem o menor indício de autoria. A decisão de impronúncia tem natureza jurídica de decisão interlocutória mista terminativa. Não julga o mérito, mas extingue o processo.

Essa decisão só faz coisa julgada formal. Surgindo novas provas, o processo poderá ser reaberto se não estiver extinta a punibilidade (exemplo: se o crime ainda não prescreveu).

Exceção: a decisão de impronúncia fará coisa julgada material nos seguintes casos:

atipicidade do fato (o fato narrado não constitui crime);

comprovação da inexistência material do fato (não houve crime).

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No que se refere à competência para o julgamento dos crimes conexos em caso de desclassificação, há dois entendimentos na doutrina. Entendemos que todos os delitos passarão para a esfera do juiz togado, pois, se o Júri reconhece que não tem competência para julgar o crime principal, seria um contra-senso que decidisse os demais. Alguns afirmam que, mesmo ocorrendo a desclassificação, o Júri continuaria competente para julgar os crimes conexos ante o disposto no artigo 81, caput, do Código de Processo Penal.

4.2.1. Despronúncia

É a decisão judicial que revoga uma decisão de pronúncia. Pode ocorrer se houver interposição de recurso e o tribunal revogar a decisão ou se o próprio juiz da causa, no juízo de retratação, voltar atrás e impronunciar o réu.

4.3. Desclassificação

A desclassificação ocorre quando o juiz se convence de que o réu não cometeu um crime doloso contra a vida, mas sim cometeu um crime diverso, da competência do juiz singular.

Se o juiz tiver dúvida entre tentativa de homicídio ou lesão corporal, deverá pronunciar o réu e deixar que o Júri decida se houve ou não o animus necandi, isto é, intenção de matar. Visa preservar-se, assim, a competência constitucional do Júri. Se o Júri decidir que o réu não teve intenção de matar, o processo será remetido ao juiz competente. O Júri não se manifesta sobre agravantes ou qualificadoras, nem menciona para qual delito o crime foi desclassificado; caso se manifeste acerca disso, não estará vinculando o juiz, que será competente.

Pergunta: O juiz, ao desclassificar, deve apontar o novo crime?

Resposta: Não, sob pena de invadir a competência do juiz monocrático. Espínola Filho entende que se a desclassificação for para crime afiançável, o juiz deve indicar, para que o réu possa ser solto.

Atenção: se o juiz do Júri desclassifica o crime e as partes não recorrem (é cabível recurso em sentido estrito), a decisão transita em julgado e o processo é remetido ao juiz singular.

Se o juiz singular, ao receber o processo, concluir que o juiz do Júri se equivocou, e que o réu deveria ter sido pronunciado, qual medida deve tomar? Entendemos que o juiz para o qual o processo foi remetido não pode suscitar conflito de competência, pois a decisão de desclassificação já transitou em julgado. Se ele se convencer que era mesmo o crime doloso contra a vida, ainda que tentado, deverá absolver o réu. Há, no

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entanto, entendimento no sentido de que a decisão tem natureza processual e tem-se somente a preclusão, sendo possível, pois, suscitar conflito de competência.

A desclassificação é decisão interlocutória mista não terminativa (encerra uma etapa do processo, sem julgar o mérito).

Contra essa decisão cabe recurso em sentido estrito com fundamento no artigo 581, inciso II, do Código de Processo Penal, embora alguns doutrinadores prefiram a hipótese no inciso IV (o argumento é o de que a desclassificação contém embutida uma impronúncia).

4.4. Absolvição Sumária

É a absolvição do réu pelo juiz em razão de estar comprovada a existência de causa de exclusão da ilicitude (exemplo: legítima defesa) ou da culpabilidade (exemplo: inimputabilidade).

É uma sentença, pois nela há o julgamento do mérito. Faz coisa julgada material. Para ter eficácia deve ter o reexame necessário.

A Súmula n. 423 do Supremo Tribunal Federal dispõe que, enquanto não houver o recurso de ofício, a sentença não transita em julgado.

Pergunta: se o Juiz tem certeza da excludente de culpabilidade (há laudo que comprova a inimputabilidade do réu) e tem dúvida sobre a excludente de ilicitude (há dúvida quanto à legítima defesa) ele deve absolver ou pronunciar o réu?

Resposta: O Juiz não pode reconhecer a legítima defesa e absolver o réu no sumário da culpa, pois esta não restou provada. Deverá pronunciar o réu, pois o Júri pode reconhecer a legítima defesa e absolver o réu. Se o juiz no sumário da culpa reconhecer a excludente de culpabilidade, terá de dar a absolvição imprópria, impondo ao réu uma medida de segurança. No caso dele pronunciar, o réu terá uma chance de o Júri reconhecer a legítima defesa e o absolver; ou, na pior das hipóteses, será condenado e receberá uma medida de segurança pela inimputabilidade já comprovada.

Conforme já foi dito, se o juiz reconhecer que o fato é atípico deverá impronunciá-lo (essa impronúncia fará coisa julgada material), mas ressalvamos que há quem entenda que o juiz deverá absolvê-lo. Na prática, a diferença é que no caso da absolvição sumária há recurso de ofício.

Contra a decisão de absolvição sumária, as partes podem oferecer recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso VI, do Código de Processo Penal). A defesa tem interesse em recorrer no caso de absolvição sumária imprópria.

A absolvição sumária é a única sentença definitiva de absolvição que se ataca com recurso em sentido estrito.

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Encerramos aqui o estudo da primeira fase do procedimento do Júri.

A segunda fase do Júri é denominada juízo da causa ou judicium causae. Inicia-se com o oferecimento do libelo e termina com a sessão de julgamento. Essa fase julga o mérito. Será estudada no próximo módulo.

1. JUDICIUM CAUSAE

A segunda fase do procedimento do Júri, após a sentença de pronúncia, é o juízo da causa ou judicium causae, o qual se inicia com o oferecimento do libelo pela acusação. Para o início da segunda fase, a pronúncia deve transitar em julgado.

1.1. Desaforamento

Durante essa fase é possível que ocorra o pedido de desaforamento (artigo 424 do Código de Processo Penal). Desaforamento é o deslocamento da competência territorial do Júri. Somente a sessão de julgamento é que se desafora. Os demais atos são praticados na comarca onde corre o processo.

É impossível o pedido de desaforamento durante o sumário da culpa, pois nessa fase ainda não há certeza de que haverá julgamento pelo Júri. Só a pronúncia transitada em julgado dá a certeza do julgamento pelo Júri.

O desaforamento deve ser sempre para a comarca mais próxima, desde que nela não existam os mesmos motivos que ensejaram o desaforamento. Assim, por exemplo, um crime que causou revolta em toda uma região, não adianta desaforar para uma cidade vizinha.

São causas do desaforamento:

motivos de ordem pública;

dúvida a respeito da imparcialidade dos jurados (Atenção: a dúvida não é sobre a imparcialidade do juiz – essa enseja exceção de impedimento ou suspeição);

risco à segurança do réu;

quando, passado um ano do recebimento do libelo, o julgamento não tiver se realizado.

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Tem legitimidade para pleitear o desaforamento:

qualquer das partes, por requerimento;

o juiz, por representação; salvo no último caso (d), em que só as partes podem requerer.

O pedido é formulado ao Tribunal de Justiça; a Câmara Criminal com competência para julgar os recursos do Júri irá decidir, ouvindo sempre o Procurador-Geral de Justiça.

O desaforamento pode ser pedido até um dia antes da sessão do julgamento. Por não ter efeito suspensivo, deve ser requerido o quanto antes.

Pergunta: Concedido o pedido de desaforamento, é possível requerer um segundo desaforamento?

Resposta: Sim. É possível novo desaforamento desde que, na nova comarca, surjam novos motivos.

Reaforamento é a volta do julgamento para ser realizado pelo Júri da comarca de origem, sendo necessário que ali tenham desaparecido os motivos que provocaram o desaforamento e que algum motivo tenha surgido na comarca para onde o julgamento fora remetido. Portanto, em tese, admite-se o retorno do julgamento para a comarca de origem.

1.2. Libelo

O libelo é a “peça inaugural do judicium causae, consistente em uma exposição escrita e articulada do fato criminoso, contendo o nome do réu, as circunstâncias agravantes e todas as demais que influam na fixação da sanção penal. (...) O libelo é composto de três partes: introdução, articulado e pedido. Na introdução, consta a menção ao processo-crime, a designação do acusador, pelo seu cargo, e o nome do réu (exemplo: ‘Por libelo-crime acusatório, diz a Justiça Pública, por seu Promotor de Justiça infra-assinado, nos autos do processo-crime 428/90, que move contra o réu Ernestino de Souza, o seguinte: (...)’). No articulado, o fato criminoso e suas circunstâncias vêm expostos em artigos sintéticos e objetivos (exemplo: ‘Que provará: 1) que o réu efetuou disparos de arma de fogo contra a vítima, produzindo-lhe os ferimentos descritos no laudo de fls.; 2) que esses ferimentos foram a causa da morte da vítima; 3) que o réu é reincidente’). No pedido, a acusação deve requerer a procedência da ação, com o recebimento do libelo e a condenação do acusado pelo Júri, como incurso no tipo incriminador, pelo qual foi pronunciado (exemplo: ‘Isto posto, requeiro

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seja o presente libelo recebido, e o réu levado a julgamento perante o júri, como incurso no artigo 121, caput, do Código Penal, a fim de ser condenado’)”3.

O libelo é oferecido pela acusação (Ministério Público) somente contra o réu que foi intimado da decisão de pronúncia. A pronúncia só transita em julgado após a intimação do réu.

O libelo é totalmente vinculado à pronúncia. Isto é, no libelo o Ministério Público não pode alterar a classificação jurídica do crime constante na pronúncia. “A pronúncia bitola o libelo”. Também não pode o Ministério Público incluir, no libelo, qualificadora que não conste da pronúncia. Se a acusação não concorda com a pronúncia, deve recorrer, mas não inovar no libelo.

O Ministério Público pode incluir agravantes e causas de aumento de pena no libelo.

Pergunta: Se o Ministério Público não incluir no libelo as agravantes, pode fazê-lo em momento posterior?

Resposta: No dia do julgamento, nos debates, a acusação pode alegar as agravantes, mas não as causas de aumento da pena.

O libelo é uma peça articulada, ou seja, deve ser escrita na forma de artigos. Se houver mais de um crime na pronúncia, deverá ser elaborada uma série de artigos para cada crime. Se houver mais de um réu, deve ser realizado um libelo para cada réu.

No libelo, a acusação pode requerer a juntada de documentos, as diligências ainda não realizadas e apresentar o rol de testemunhas, no máximo cinco, que serão ouvidas em plenário.

Pergunta: Se o Ministério Público não juntar documentos no libelo, pode requerer a juntada posteriormente?

Resposta: Sim. No processo penal é possível a juntada de documentos a qualquer momento, cientificando a parte contrária. O limite temporal no judicium causae à juntada de documentos é dado pelo artigo 475 do Código de Processo Penal. Segundo esse dispositivo, os documentos a serem exibidos em plenário devem ser juntados e comunicados à parte contrária com antecedência de, pelo menos, três dias do julgamento.

3 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 580182

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As testemunhas podem ser arroladas em caráter de imprescindibilidade. A parte que arrolou a testemunha com esse caráter pode se recusar à realização do julgamento se essa não comparecer. O julgamento será adiado. Para desistir de testemunha imprescindível no julgamento, deve haver anuência da parte contrária, bem como dos jurados, se já formado o conselho de sentença.

O não-comparecimento da testemunha arrolada em caráter de imprescindibilidade não impedirá a realização do julgamento, nos seguintes casos:

se a testemunha estiver em lugar incerto e não sabido;

se a testemunha residir em comarca diversa da jurisdição do Júri.

Prazo para o oferecimento do libelo:

cinco dias (a contar da intimação pessoal para o oferecimento) para o Ministério Público, na ação penal pública;

dois dias para o querelante, tanto no caso de queixa subsidiária quanto no de queixa exclusivamente privada.

Se o Ministério Público não oferece o libelo, o juiz não pode mais nomear promotor ad hoc para apresentá-lo, já que essa figura viola o artigo 129, § 2.º, da Constituição Federal de 1988. Hoje, o juiz aplica o artigo 28 do Código de Processo Penal, por analogia. Também não há que se falar em aplicação de multa pelo juiz, pois isso violaria a autonomia do Ministério Público (artigo 127, § 2.º, da Constituição Federal).

Se o querelante não oferecer o libelo, ocorre o seguinte:

na ação penal exclusivamente privada – a perempção;

na ação penal privada subsidiária da pública – o Ministério Público reassume a ação (artigo 420 do Código de Processo Penal).

Observação: pode haver libelo em ação exclusivamente privada no caso de conexão em que há litisconsórcio ativo entre querelante e Ministério Público.

O fenômeno do lançamento do libelo ocorre quando o querelante, na ação penal privada subsidiária da pública, apresenta o libelo intempestivamente, fora do prazo legal de dois dias. O Código de Processo Penal determina que ele seja lançado dos autos

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(artigo 420 do Código de Processo Penal), quer dizer, seja excluído dos autos. Os autos serão remetidos ao Ministério Público.

Oferecido o libelo, esse será examinado pelo juiz, que poderá ou não recebê-lo. Caso não o receba, o juiz deverá notificar o Ministério Público para que apresente outro em 48 horas (artigo 418 do Código de Processo Penal).

Recebendo o libelo, o juiz, neste mesmo despacho, deve determinar a entrega de cópia ao réu em três dias e notificar a defesa para apresentar a contrariedade ao libelo, no prazo de cinco dias.

A falta da entrega da cópia do libelo ao réu e da notificação para a apresentação da contrariedade gera nulidade, evidentemente relativa (artigo 564, inciso III, alínea “f”, do Código de Processo Penal), dependendo de prova do efetivo prejuízo4.

1.3. Contra Libelo

O contra libelo segue as mesmas regras do libelo. Deve ser apresentado no prazo de cinco dias. A defesa pode requerer a juntada de documentos, a realização de diligências e apresentar o rol de testemunhas, em número máximo de cinco, que irão depor em plenário. As testemunhas da defesa também podem ser arroladas em caráter de imprescindibilidade.

Para a defesa é uma peça de apresentação facultativa, assemelhando-se à defesa prévia. Deve ser dada a oportunidade de apresentação, mas, caso a parte não apresente, não causa nulidade, porque pode ser uma técnica da defesa só se manifestar em plenário.

1.4. Saneador

Apresentados o libelo e o contra libelo, o juiz determina a realização das diligências necessárias. Após isso, profere um despacho saneador e marca a data para a sessão de julgamento.

JULGAMENTO EM PLENÁRIO

A sessão de julgamento em plenário é composta pelas seguintes fases:

instalação da sessão;

4 Op. cit. p. 583.184

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formação do Conselho de Sentença;

atos instrutórios;

debates;

julgamento.

2.1. Instalação da Sessão

Presente o Ministério Público, no dia e na hora designados para a reunião do Júri, o juiz-presidente da sessão verifica se a urna contém as cédulas com os nomes dos 21 jurados sorteados, e determina que o escrivão faça a chamada. Declarará instalada a sessão se comparecerem no mínimo 15 jurados. Caso contrário, convoca nova sessão para dia útil imediato (artigo 442 do Código de Processo Penal).

O juiz anuncia o processo que será submetido a julgamento e ordena ao porteiro que apregoe as partes e as testemunhas.

Observação: Esse é o momento para a argüição de nulidade relativa, ocorrida após a pronúncia sob pena de convalidação (artigo 571, inciso V, do Código de Processo Penal). Se ocorrer nulidade após esse momento, deverá ser argüida imediatamente a sua ocorrência, sob pena de preclusão (artigo 571, inciso VIII, do Código de Processo Penal).

2.1.1. Ausências

a) Se o réu regularmente intimado não comparece

Ausência justificada: o julgamento é adiado.

Ausência injustificada:

se a infração for inafiançável, o julgamento somente se realiza com a presença do réu e, nesse caso, o juiz pode decretar a prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei penal;

se a infração for afiançável, o julgamento será realizado à revelia do réu.

b) Se o advogado não comparece

Ausência justificada: o julgamento é adiado.

Ausência injustificada: o juiz deverá adiar a sessão de julgamento, nomear por cautela um advogado dativo e oficiar à Ordem dos Advogados do Brasil o

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ocorrido. Se no dia do novo julgamento o antigo advogado comparecer, é ele quem participa do julgamento.

c) Se o Ministério Público (acusação) não comparece

Ausência justificada: o julgamento é adiado.

Ausência injustificada: o juiz deverá adiar a sessão de julgamento, oficiar ao Procurador-Geral da Justiça e comunicar ao substituto automático do promotor. Não há mais a figura do promotor ad hoc.

d) Se o querelante não comparece

Ausência justificada: o julgamento é adiado.

Ausência injustificada: ocorre a perempção, em caso de ação penal exclusivamente privada, ou o Ministério Público reassume a titularidade, em caso de ação penal subsidiária da pública.

e) Se o assistente de acusação não comparece

Sua ausência nunca provoca o adiamento da sessão.

f) Se a testemunha não comparece

Se arrolada em caráter de imprescindibilidade: adia o julgamento, salvo se estiver em local incerto e não sabido ou for de fora da terra.

Se arrolada sem caráter de imprescindibilidade: não adia o julgamento, mas pode sofrer condução coercitiva, multa e processo-crime por desobediência.

g) Se o jurado não comparece

Ausência injustificada: sujeita-se ao pagamento de multa.

2.2. Formação do Conselho de Sentença

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O juiz, após verificar que se encontram na urna as cédulas relativas aos jurados presentes, realiza o sorteio de sete deles para formarem o conselho de sentença (artigo 457 do Código de Processo Penal).

Antes do sorteio, o juiz adverte os jurados dos impedimentos do Júri. No mesmo conselho de sentença, são impedidos de servir marido e mulher, ascendente e descendente, sogro e genro ou nora, irmãos, cunhados durante o cunhadio, tio e sobrinho, padrasto ou madrasta e enteado. Dos impedidos entre si por parentesco, servirá ao Júri aquele que houver sido sorteado em primeiro lugar. Também advertirá sobre as incompatibilidades legais por suspeição – parentesco com o juiz, promotor, advogado, réu ou com a vítima (artigo 458 do Código de Processo Penal).

Conforme a Súmula n. 206 do Supremo Tribunal Federal, é nulo o julgamento ulterior por Júri do qual participe jurado que tenha tomado parte em julgamento anterior do mesmo processo.

Na medida em que as cédulas vão sendo abertas, a defesa, e depois a acusação, podem recusar os jurados sorteados. Recusa motivada, isto é, com fundamento em impedimento ou suspeição, as partes podem fazer quantas recusas forem necessárias. Já a recusa imotivada ou peremptória, isto é, sem qualquer justificativa ou fundamento, cada parte só tem direito a três.

A recusa de jurado pode provocar a cisão do julgamento. Existindo dois ou mais réus, com diferentes defensores, se um defensor aceita um jurado e o outro o recusa, havendo aceitação desse jurado pela acusação (Ministério Público), o julgamento será cindido. Só haverá o julgamento de um réu; o outro réu terá seu julgamento adiado.

Se o jurado, aceito por um defensor e recusado por outro, também for rejeitado pelo Ministério Público, será excluído, e não haverá cisão do julgamento.

Escolhidos os sete jurados, o juiz faz a seguinte exortação: “Em nome da lei, concito-vos a examinar com imparcialidade essa causa e a proferir a vossa decisão, conforme a vossa consciência e os ditames da Justiça.” Os jurados prometem e estarão compromissados. A partir desse momento, passa a vigorar a incomunicabilidade dos jurados.

A incomunicabilidade não significa mudez. Os jurados podem conversar entre si, desde que não seja sobre o processo. Não podem conversar com terceiros estranhos ao processo; a comunicação com o mundo exterior ocorre somente via oficial de justiça. Tal medida visa garantir o sigilo das votações.

2.3. Atos Instrutórios

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O juiz-presidente inicia os trabalhos com o interrogatório do réu. Nesse interrogatório, além do juiz-presidente, os jurados também podem fazer perguntas ao réu.

Em seguida, o juiz elabora um relatório do processo, com os fatos, as provas e as conclusões das partes. É um resumo de todo o processo e destina-se aos jurados (artigo 466 do Código de Processo Penal). Se requerida pelas partes, ou por jurado, o escrivão fará a leitura das principais peças do processo (artigo 466, § 1.º, do Código de Processo Penal). A leitura deve ser feita sem qualquer entonação.

Inicia-se a oitiva das testemunhas. Primeiro, são inquiridas as testemunhas de acusação e a vítima, se o crime foi tentado. O juiz, o promotor (parte que arrolou), o assistente, o advogado do réu e os jurados fazem as perguntas. Segue-se a inquirição das testemunhas de defesa. O juiz, o advogado do réu (parte que arrolou), o promotor, o assistente e os jurados fazem as perguntas. As partes fazem a inquirição da testemunha diretamente.

Após ser inquirida, a testemunha deve permanecer incomunicável até o final do julgamento, salvo se for dispensada pelas partes. Isso porque o Código de Processo Penal permite a reinquirição da testemunha a qualquer momento, até na tréplica.

2.4. Debates

Terminada a inquirição das testemunhas, o promotor lerá o libelo e os dispositivos da lei penal em que o réu se acha incurso e produzirá a acusação. Concluída a acusação, o defensor terá a palavra, para a defesa. O tempo será de duas horas para cada parte. Havendo mais de um réu, o tempo será acrescido em uma hora.

Encerrada a fala da defesa, o juiz indagará à acusação se fará uso da réplica. Em caso negativo, o promotor deve se limitar a dizer “não”, pois se fizer qualquer comentário em seguida, dará direito à tréplica. Em caso positivo, a defesa terá direito a tréplica. O tempo será de 30 minutos para cada um. Havendo mais de um réu, o tempo será acrescido em mais 30 minutos.

A defesa não pode inovar sua tese no momento da tréplica devido ao princípio do contraditório. Se inovar, essa tese não será quesitada.

Se a acusação for composta pelo promotor e pelo assistente de acusação, eles deverão combinar entre si a distribuição do tempo. Não havendo acordo, o juiz marcará o tempo de cada um, não excedendo o limite previsto em lei.

Apartes são as intervenções que uma parte faz na fala da outra. Não estão previstos em lei. Segundo a jurisprudência, são possíveis desde que exista concordância do orador, e devem ser feitos de forma cordial e que não visem atrapalhar o orador.

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2.5. Julgamento

Após os debates, o juiz pergunta aos jurados se eles estão habilitados a julgar ou se precisam de mais esclarecimentos (artigo 478 do Código de Processo Penal). Esses esclarecimentos devem relacionar-se somente com matéria de fato.

Em seguida, o juiz lê os quesitos e explica a significação legal de cada um. Indaga se os jurados têm algum requerimento ou alguma reclamação a fazer. O juiz, então, anuncia que vai se proceder ao julgamento e determina que o réu seja retirado do plenário.

O juiz, os jurados, o promotor, o advogado, o escrivão e dois oficiais de justiça dirigem-se à sala secreta. Os jurados passam à votação dos quesitos sob a presidência do juiz. O jurado vota sim ou não, sem qualquer discussão ou fundamentação, em razão do sigilo das votações. Se a resposta a qualquer dos quesitos estiver em contradição com outra já proferida, o juiz, explicando aos jurados em que consiste a contradição, submeterá novamente à votação os respectivos quesitos. O veredicto apura-se por maioria.

2.6. Quesitação

Atenção: assunto muito perguntado na fase oral!

Quesitação é o questionário; são as perguntas feitas pelo juiz aos jurados, que deverão responder sim ou não. É elaborado com base no libelo, no contra libelo, no interrogatório e nos debates. Como no Júri vige a defesa plena, todas as teses devem ser quesitadas, ainda que incompatíveis. Haverá um questionário para cada réu, e uma série de quesitos para cada crime.

Conforme a Súmula n. 156 do Supremo Tribunal Federal, é causa de nulidade absoluta do julgamento a falta de quesito obrigatório. Também a Súmula n. 162 do Supremo Tribunal Federal determina que é causa de nulidade absoluta do julgamento se os quesitos da defesa não precederem os quesitos das agravantes (a jurisprudência também inclui as qualificadoras).

A ordem dos quesitos ocorre da seguinte forma:

Autoria e materialidade (exemplo: “O réu efetuou disparos de arma de fogo contra a vítima, produzindo-lhe os ferimentos descritos no laudo de fls. 12?”).

Letalidade, no caso de crime consumado (exemplo: “Estes ferimentos foram a causa da morte da vítima?”), ou animus necandi, no caso de tentativa (exemplo: “Assim agindo deu o réu início à execução de um crime de

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homicídio que só não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade?”).

Teses da defesa (Súmula n. 162 do Supremo Tribunal Federal). As teses da defesa devem ser quesitadas na seguinte ordem:

Tese da defesa relativa à desclassificação, no caso do crime ser consumado (desclassificação imprópria). Exemplo: “O crime foi praticado por imprudência, consistente em ter o réu experimentado a arma, sem certificar-se previamente que estava municiada?”. Aceitando essa tese, interrompe-se a votação porque cessa a competência dos jurados, deslocando-se para o juiz-presidente. Atenção: se o crime for tentado, não há necessidade de formulação de quesito próprio para a desclassificação, que se dá com a simples negativa do segundo quesito, relativo ao animus necandi (desclassificação própria);

teses relativas às excludentes de ilicitude (nesse caso, deve haver quesito sobre a existência ou não do excesso doloso ou culposo); se alegada a legítima defesa, cada requisito deve ser quesitado, como, por exemplo, "O réu defendia direito próprio? Defendia-se de agressão injusta? Utilizou-se dos meios necessários?".

teses relativas às causas de exclusão da culpabilidade;

teses sobre o privilégio.

Os relativos à existência de qualificadoras.

Os relativos à existência de causas de aumento ou diminuição.

Os relativos à existência de agravantes e atenuantes.

Observações:

Ainda que não se alegue a existência de circunstâncias atenuantes, o juiz deverá elaborar um quesito genérico da atenuante, sob pena de nulidade absoluta. Exemplo: "Existe alguma atenuante em favor do réu?".

Se os jurados reconhecerem que o réu agiu em legítima defesa, o juiz deve fazer os quesitos sobre o excesso. Se os jurados reconhecerem a existência do excesso, surgem dois caminhos:

reconhecem o excesso doloso: continua o homicídio doloso. O juiz prossegue nos quesitos.

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reconhecem o excesso culposo: desclassificam o delito para homicídio culposo;

Se os jurados reconhecerem a existência de privilégio, ficam prejudicados os quesitos referentes às qualificadoras subjetivas. Reconhecido o privilégio, somente podem ser formuladas perguntas sobre as qualificadoras objetivas.

No crime de aborto é necessário elaborar um quesito autônomo a respeito da existência da gravidez. No crime de infanticídio é necessário elaborar um quesito autônomo sobre a existência do estado puerperal.

Em se tratando de concurso de agentes no crime de homicídio, o primeiro quesito será elaborado de forma não-individualizada. Exemplo: "Terceira pessoa efetuou os disparos?". A participação do réu só será indagada no quesito seguinte, de forma detalhada. Exemplo: "O réu é o mandante do crime? O réu é o autor intelectual do delito? O réu teve contribuição para a consumação do delito?".

2.7. Desclassificação no Júri

Se os jurados desclassificam o crime, o julgamento desse crime competirá ao juiz-presidente do Júri (artigos 74, § 3.º, e 492, §2.º, do Código de Processo Penal).

A desclassificação pode ser:

própria: ocorre quando os jurados desclassificam a infração sem estabelecer a tipificação do fato; o juiz-presidente tem liberdade para definir a infração e julgar o fato; Exemplo: “O réu iniciou a sua conduta visando um resultado que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade?” Resposta: Não. O réu não tinha o animus necandi (dolo de matar).

imprópria: ocorre quando, na desclassificação pelos jurados, fica estabelecido o enquadramento do fato, cabendo ao juiz-presidente apenas a aplicação da pena. Exemplo: “O réu agiu com imprudência?”. Resposta: Sim. Agiu com culpa, homicídio culposo. Ao juiz resta aplicar a pena.

Pergunta: Se o Júri absolve o réu de crime doloso contra a vida, a quem compete julgar os crimes conexos?

Resposta: Na doutrina predomina o entendimento que os crimes conexos serão julgados pelo Júri. Se houve absolvição é porque os jurados conheceram o mérito. Se foram competentes para julgar o crime doloso, também o são para julgar os crimes conexos. Ocorre a perpetuatio jurisdiciones (artigo 81 do Código de Processo Penal). Na jurisprudência, a questão é mais dividida. Há tendência a serem julgados pelo juiz-

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presidente em razão de aplicação analógica do artigo 492, § 2.º, do Código de Processo Penal.

a) Desclassificação no Júri para a infração de menor potencial ofensivo

Exemplo: tentativa de homicídio, desclassificada para lesão corporal dolosa leve ou lesão corporal culposa. Segundo a doutrina, deve-se aguardar o trânsito em julgado da desclassificação e remeter o processo ao Juizado Especial Criminal (artigo 98 da Constituição Federal). Há precedentes do Supremo Tribunal Federal acolhendo essa posição.

b) Desclassificação de crime militar

Exemplo: no Júri, o advogado, sem negar a autoria, sustenta que não houve dolo eventual, mas sim culpa imprópria. O crime de homicídio culposo praticado por militar em serviço é da competência da justiça militar. A justiça comum é incompetente para julgar esse delito. Deve o juiz aguardar o trânsito em julgado da desclassificação e remeter o caso para a justiça militar, sob pena de violar regra constitucional de competência.

2.8. Sentença

“Encerrada a votação e assinado o termo referente às respostas dos quesitos, o juiz deverá proferir a sentença.

No caso de absolvição, o juiz deve colocar o réu imediatamente em liberdade, salvo se estiver preso por outro motivo.”5

2.9. Atribuições do Juiz-presidente na Sessão de Julgamento (artigo 497 do Código de Processo Penal)

Observação: é obrigatória a leitura desse artigo antes de uma prova.

As atribuições do juiz-presidente na sessão de julgamento são:

Regular os debates. Para isso o Código de Processo Penal lhe concede o poder de polícia.

5 CAPEZ, Fernando. Op. cit. p. 590192

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Interromper a sessão de julgamento, por tempo razoável, para repouso ou refeição dos jurados.

Dissolver o conselho de sentença, caso constate que o réu está indefeso.

Resolver todas as questões de direito que não dependam do julgamento dos jurados (exemplos: preliminares, eventuais nulidades invocadas).

Determinar de ofício, ou a requerimento, a realização de diligências consideradas imprescindíveis. Essas diligências, de preferência, devem ser realizadas de imediato, sem dissolver o conselho de sentença; se não for possível, deve dissolver o conselho e marcar novo júri.

1. DAS NULIDADES

Conceito

Nulidade é a sanção cominada pelo ordenamento jurídico ao ato praticado em desrespeito às formalidades legais.

Ao estabelecer as formalidades, o legislador quer garantir que o réu tenha ciência da acusação, que seja citado regularmente e que esteja sendo a ele oferecida a oportunidade de defesa. São normas de Direito Público.

O Código de Processo Penal, em seus artigos 563 a 573, trata das nulidades. (Atenção: é obrigatória a leitura desses artigos antes da realização das provas.)

O artigo 564 do Código de Processo Penal apresenta o rol das nulidades; todavia, algumas nulidades relativas constantes desse rol, em razão da Constituição Federal de 1988, estão desatualizadas – deveriam ser nulidades absolutas. Além disso, as hipóteses de nulidades deveriam ser verificadas, no caso concreto, pelo juiz.

As nulidades podem ser absolutas ou relativas. Ao lado delas, existem algumas situações em que o vício é tão grave que gera a inexistência do ato. Em outras situações, o desatendimento da formalidade é incapaz de gerar qualquer prejuízo ou anular o ato, pois trata-se de mera irregularidade.

Diferenças entre Nulidades Absolutas e Relativas

1.2.1. Quanto ao fundamento

A nulidade absoluta ocorre quando a regra violada houver sido instituída para resguardar, predominantemente, o interesse público.

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A nulidade relativa ocorre quando a regra violada houver sido instituída para resguardar, predominantemente, o interesse das partes.

Sempre que ocorrer a violação a um princípio constitucional, a nulidade será absoluta. Para alguns autores, se a ofensa for muito grave, o ato será inexistente.

1.2.2. Quanto ao prejuízo

A nulidade relativa exige demonstração do prejuízo.

Na nulidade absoluta, o prejuízo é presumido.

Quanto ao momento de argüição

A nulidade relativa deve ser argüida no momento oportuno, sob pena de preclusão. Cada procedimento tem um momento último para a argüição. Conforme o artigo 571 do Código de Processo Penal, as nulidades devem ser argüidas nos seguintes momentos:

Procedimento Ordinário: até as alegações finais (inciso II).

Procedimento do Júri: as que ocorrerem no sumário da culpa, até as alegações do Júri (inciso I); as que ocorrerem posteriormente, depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes (inciso V); e as do julgamento em plenário, logo depois que ocorrerem (inciso VIII).

A nulidade absoluta pode ser reconhecida a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição. Exceção: conforme a Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal, “é nula a decisão do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício”.

1.2.4. Quanto ao interesse

As nulidades relativas dependem de provocação pela parte interessada, no momento oportuno.

As nulidades absolutas não precisam de provocação; o próprio juiz pode reconhecer de ofício, salvo a exceção da Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal.

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Inexistência e Irregularidade

Inexistência é a sanção mais grave que pode ser cominada a um ato processual. Para a doutrina, não se trata de ato processual inexistente, mas sim de um não-ato ou ato processual atípico por não se enquadrar no modelo legal.

Ocorre quando o ato não reúne elementos essenciais para existir. É a violação frontal da regra constitucional que gera a inexistência. Ex.: um processo por crime eleitoral que tramitou na Justiça Militar.

Para o Professor Tourinho, a violação de qualquer regra constitucional que trate de competência torna o ato inexistente. Já, para a jurisprudência, trata-se de nulidade absoluta.

Característica própria da inexistência: se o ato for inexistente, não produz efeitos, independente de declaração judicial.

Na nulidade absoluta o ato produz efeitos até que seja declarado nulo. Enquanto isso não ocorrer, produz efeitos.

Exemplos:

sentença sem relatório: nulidade absoluta;

sentença sem fundamentação: nulidade absoluta;

sentença sem dispositivo: inexistente;

sentença proferida por juiz em férias ou aposentado: inexistente, por não ter jurisdição;

sentença proferida por juiz suspeito: nulidade absoluta;

sentença proferida por juiz impedido: inexistente.

Ocorre irregularidade sempre que a formalidade desrespeitada for considerada inócua. Tal desrespeito é incapaz de gerar prejuízo, seja para a acusação, seja para a defesa. O ato produz seus efeitos normalmente.

Exemplos: falta de leitura do libelo no início da fala da acusação; falta de compromisso pelo perito louvado ou particular (o perito oficial é funcionário e, ao tomar posse, já assume esse compromisso); oferecimento de denúncia fora do prazo legal (5 dias para o réu preso e 15 para o solto) acarreta o relaxamento da prisão em flagrante, mas a denúncia em si é válida.

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2. PRINCÍPIOS DAS NULIDADES

2.1. Prejuízo

Não há nulidade se não houver prejuízo (artigo 563 do CPP). Esse princípio aplica-se à nulidade relativa, na qual precisa ser demonstrado o prejuízo, pois, na nulidade absoluta, esse é presumido.

No processo penal, a falta de defesa acarreta a nulidade absoluta e a defesa deficiente produz nulidade relativa (ver a Súmula n. 523 do Supremo Tribunal Federal). Exemplo: réu não tem defensor constituído e o juiz não nomeia um defensor dativo, ou esse é nomeado e nada faz no processo; ; o réu fica indefeso, acarretando nulidade absoluta.

2.2. Interesse

Ninguém pode alegar nulidade que só interesse à parte contrária (artigo 565 do CPP). Esse princípio só se aplica à nulidade relativa, pois a absoluta pode ser alegada por qualquer pessoa.

Ninguém pode argüir nulidade para a qual tenha concorrido ou dado causa. Como exceção o Ministério Público pode argüir nulidades que interessem somente à defesa.

2.3. Instrumentalidade das Formas

Não se declara a nulidade de ato que não influiu na apuração da verdade real e na decisão da causa (artigo 566 do CPP) e também de ato que, apesar de praticado de forma diversa da prevista, atingiu sua finalidade (artigo 572, inciso II, do CPP).

2.4. Causalidade ou Conseqüencialidade

Segundo o artigo 573, § 1.º, do Código de Processo Penal: “A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam conseqüência”. Todos os atos visam a sentença; os atos processuais são entrelaçados entre si. Assim, se um ato é nulo, os demais que dele dependam também o serão.

O juiz deve declarar expressamente quais são os atos contaminados.

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A Professora Ada Pellegrini Grinover estabelece duas regras úteis para saber se há contaminação dos atos subseqüentes:

A nulidade dos atos da fase postulatória, como regra, anula todo o processo. Exemplo: nulidade na denúncia, citação.

A nulidade de atos da fase instrutória, via de regra, não contamina os demais atos da mesma fase processual. Exemplo: laudo elaborado por um só perito.

Observação: tribunal reconhecer a nulidade relativa, ela deve ser apresentada nas alegações finais (artigo 500 do CPP). Apenas será anulada a sentença; a inquirição de testemunhas não precisa ser anulada.

2.5. Convalidação

Todas as nulidades no processo penal admitem convalidação, até mesmo as absolutas. Somente as nulidades relativas precluem se não argüidas no momento oportuno.

Entretanto, existem outras formas de convalidação além da preclusão. O Código de Processo Penal elenca três formas de convalidação:

Ratificação: prevista no artigo 568 do Código de Processo Penal. É uma maneira de se convalidar a nulidade decorrente de ilegitimidade de parte. Se a parte legítima comparecer e ratificar os atos anteriormente praticados, a nulidade se convalida.

A ilegitimidade pode ser: ad causae ou ad processum.

- Ilegitimidade ad causae: Exemplo: o Ministério Público oferece denúncia em crime de ação penal privada.

- Ilegitimidade ad processum: Exemplo: a queixa na ação penal privada é apresentada pela vítima menor de 18 anos ou por um terceiro que não é o representante legal da vítima.

A ratificação só é possível na ilegitimidade ad processum tratando-se essa de nulidade relativa.

Suprimento: de acordo com o artigo 569 do Código de Processo Penal “As omissões da denúncia ou da queixa, ... poderão ser supridas a todo o tempo,

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antes da sentença final.” É a maneira de se convalidar possíveis omissões constantes na denúncia ou na queixa.

Substituição: segundo o artigo 570 do Código de Processo Penal é a maneira de convalidar nulidades da citação, intimação ou notificação. Exemplo: réu processado é procurado em um dos seus endereços, mas não é encontrado. Em vez de procurá-lo nos demais endereços, o juiz ordena a citação por edital. No dia do interrogatório, o réu comparece para argüir a nulidade da citação. Convalesce o vício e é aberto novo prazo para apresentação da defesa. A medida deveria ter sido realizada de uma forma, mas foi substituída por outra.

3. NULIDADES EM ESPÉCIE

O artigo 564 do Código de Processo Penal apresenta os seguintes casos de nulidade:

I – Por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;

Incompetência

Competência é a medida da jurisdição.

A competência em razão da jurisdição (comum ou especializada), da hierarquia e da matéria, assim como a competência recursal, são hipóteses de competência absoluta, imodificáveis pelas partes (questões de ordem pública). A não-observância dessas regras de competência acarreta nulidade absoluta do processo; o vício não se convalida, podendo ser reconhecido a qualquer tempo, de ofício, independentemente da demonstração do prejuízo.

A competência em razão do foro territorial, por ser relativa, depende de argüição da parte, sob pena de preclusão, com a prorrogação da competência. Nesse caso, o vício é sanável.

Sendo reconhecida a incompetência relativa, serão anulados apenas os atos em que exista decisão de mérito.

Suspeição e suborno do juiz

O impedimento no processo penal é gerador de inexistência e não somente de nulidade dos atos praticados. A suspeição acarreta a nulidade absoluta do ato. O juiz deve declarar-se suspeito ou impedido quando for o caso; se não o fizer, o vício pode ser argüido por qualquer das partes (artigo 112 do CPP). “Não aceitando a argüição, o juiz mandará autuar em apartado a petição; dará a sua resposta dentro de três dias, podendo instruí-la e oferecer testemunhas, e, em seguida, determinará sejam os autos da exceção

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remetidos, dentro de vinte e quatro horas, ao juiz ou tribunal a quem competir o julgamento (CPP, artigo 100). Julgada procedente a exceção de suspeição, ficarão nulos todos os atos praticados (CPP, artigo 101)”6.

O suborno ou peita é a pratica dos crimes de concussão (artigo 316 do CP), corrupção passiva (artigo 317 do CP) e corrupção ativa (artigo 333 do CP). Também é causa geradora da nulidade absoluta do ato.

II – Por ilegitimidade de parte;

A ilegitimidade pode ser:

Ad Causam: o autor não é o titular da ação ajuizada, ou o réu não pode integrar a relação jurídica processual (por ser inimputável, ou por não ter evidentemente concorrido para a prática do fato típico e ilícito). O vício jamais se convalida nesse caso; trata-se de nulidade absoluta e insanável.

Ad Processum: é a falta da capacidade postulatória do querelante (exemplo: o querelante leigo assina sozinho a queixa-crime), ou é sua incapacidade para estar em Juízo (exemplo: o ofendido, menor de 18 anos, ajuíza a ação privada sem estar representado por seu representante legal). Essa nulidade pode ser sanada pela ratificação dos atos processuais (artigo 568 do CPP). Configura nulidade relativa.

III – Por falta das fórmulas ou dos termos seguintes;

Falta do preenchimento dos requisitos no oferecimento da denúncia ou queixa (artigo 41 do CPP), na representação do ofendido ou na requisição do Ministro da Justiça.

Falta de exame de corpo de delito nos delitos não-transeuntes, isto é, aqueles que deixam vestígios. “A jurisprudência não tem pronunciado essa nulidade ante a falta do exame de corpo de delito, direto ou indireto, optando por absolver o réu, por insuficiência de provas. Entendemos, contudo, que, mesmo não tendo sido realizado o exame pericial, caso sua elaboração ainda seja possível, deve o juiz determiná-la, nos termos dos artigos 156, parte final, e 502 do Código de Processo Penal, ao invés de simplesmente proferir a decisão absolutória, sob pena de ser nula a sentença, nos termos do artigo 564, III, “b”. Nesse sentido: STF, RT 672/388”7.

6 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 624.7 CAPEZ, Fernando. Op. cit. p. 632.

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Falta de nomeação de defensor ao réu presente, que não o tiver, ou ao ausente. A alínea c, que também cuidava do curador do réu menor de 21 anos foi derrogada, pois a hipótese não subsiste em face do artigo 5.º do novo Código Civil. O entendimento dominante era o de que a falta de nomeação de curador causava nulidade relativa; no entanto, o Superior Tribunal de Justiça já havia se manifestado em sentido contrário (com o novo Código Civil, esta questão está superada). Por fim, a falta de nomeação de defensor configura nulidade absoluta.

Falta de intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação penal pública ou subsidiária.

Falta ou nulidade de citação do réu para se ver processar. A falta ou nulidade da citação ficará sanada desde que o interessado compareça antes de o ato consumar-se (artigo 570 do CPP). A citação em hora certa, no processo penal, é causa de nulidade absoluta.

Falta do interrogatório do acusado.

Falta de concessão de prazo para a defesa prévia, para o oferecimento de alegações finais, ou para a realização de qualquer ato da acusação ou da defesa.

Falta de sentença.

São causas de nulidade no procedimento do Júri:

Falta, omissão ou irregularidade na sentença de pronúncia, no libelo ou na entrega de cópia do libelo ao réu.

Falta de intimação do réu para julgamento no Júri.

Falta de intimação de testemunhas arroladas no libelo ou na contrariedade.

Presença de pelo menos 15 jurados para a constituição do Júri.

Falta ou irregularidade no sorteio dos jurados.

Quebra na incomunicabilidade dos jurados.

IV – Por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.

Formalidade essencial é aquela sem a qual o ato não atinge a sua finalidade. Exemplo: a denúncia que não descreve o fato com todas as suas circunstâncias.

Pelo princípio da instrumentalidade das formas, não se anula o processo por falta de formalidade irrelevante.

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Observação: contra a decisão que anula o processo no todo ou em parte, em virtude de nulidade relativa ou absoluta, cabe recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso XIII, do CPP).

Recursos

1. RECURSOS

1.1. Introdução

O Professor Fernando Capez8 ensina que: “recurso é a providência legal imposta ao juiz ou concedida à parte interessada, consistente em um meio de se obter nova apreciação da decisão ou situação processual, com o fim de corrigi-la, modificá-la ou confirmá-la. Trata-se do meio pelo qual se obtém o reexame de uma decisão”.

1.2. Características

O recurso é meio voluntário; é extensão do direito de ação. O Poder Judiciário só atua se provocado. Ao prolatar a sentença, o órgão jurisdicional entrega a prestação tornando-se inerte. Logo, para que volte a apreciar a questão, deve ser provocado novamente com a interposição de um recurso. A inércia da jurisdição é a garantia da imparcialidade.

O princípio da voluntariedade do recurso é mitigado pelo recurso de ofício (recurso obrigatório, recurso necessário), ou seja, o juiz deve interpor recurso da decisão.

A natureza jurídica do reexame necessário é uma condição de eficácia da decisão, não transitando em julgado a sentença em que tiver sido omitido.

O artigo 574 do Código de Processo Penal estabelece: “Os recursos serão voluntários, excetuando-se os seguintes casos, em que deverão ser interpostos de ofício, pelo juiz:

I – da sentença que conceder habeas corpus;

8 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 384.201

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II – da que absolver desde logo o réu com fundamento na existência de circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena, nos termos do artigo 411."

Há outras hipóteses de cabimento de recurso de ofício, além das mencionadas no artigo 574 do Código de Processo Penal:

sentenças absolutórias referentes aos crimes contra a economia popular ou a saúde pública;

despachos que determinarem o arquivamento dos autos do inquérito policial referentes a esses crimes;

indeferimento in limine da revisão pelo relator que dará recurso para as câmaras reunidas ou para o tribunal (artigo 625, § 3.º, do Código de Processo Penal);

decisão que conceder a reabilitação.

1.3. Classificação dos Recursos

1.3.1. Quanto ao conteúdo

Total ou pleno: quando se questiona toda a decisão. O órgão ad quem reexaminará toda a decisão.

Parcial ou restrito: quando se questiona apenas parte da decisão. Será reexaminada pelo tribunal apenas a parte impugnada.

1.3.2. Quanto às fontes informativas

Constitucionais: previstos pela Constituição Federal com a finalidade de levar aos tribunais superiores o conhecimento ou a defesa dos direitos fundamentais do indivíduo.

Legais: previstos no Código de Processo Penal e nas leis processuais especiais.

Regimentais: instituídos nos regimentos dos tribunais.

1.3.3. Quanto à motivação

Ordinário: é o recurso que visa à defesa de um direito subjetivo. Baseia-se no mero inconformismo.

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Extraordinário: é o recurso que possui requisitos próprios, como, por exemplo, protesto por novo júri.

Pressupostos Recursais

Pressupostos recursais são os requisitos de admissibilidade que o recurso deve possuir.

1.4.1. Pressupostos objetivos

a) Cabimento

O recurso deve estar previsto em lei.

b) Adequação

Não basta que o recurso esteja previsto em lei; é necessário que seja adequado à decisão que se deseja impugnar. Esse pressuposto confere lógica ao sistema recursal.

Cada decisão, em regra, só comporta um recurso, em face da aplicação do princípio da unirrecorribilidade das decisões. Esse princípio, da irrecorribilidade das decisões, é mitigado por algumas exceções legais, como, por exemplo, protesto por novo júri pelo crime doloso contra a vida e apelação pelo crime conexo; interposição simultânea de recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal e de recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça.

P.: Qual a conseqüência para a parte que interpõe recurso incorreto?

R.: O recurso, ainda que inadequado, pode ser recebido e conhecido pelo princípio da fungibilidade. É exceção ao princípio da adequação (artigo 579 do Código de Processo Penal). Portanto, o recurso, mesmo equivocado, deve ser oferecido dentro do prazo correto e que não esteja de má-fé o recorrente.

c) Regularidade formal

O Código de Processo Penal estabelece a forma segundo a qual o recurso deve ser interposto. São formalidades legais para o recurso ser recebido. Ex.: a apelação pode ser interposta por petição ou por termo nos autos.

d) Tempestividade

O recurso deve ser interposto no prazo legal. Os prazos começam a correr a partir do primeiro dia útil após a intimação, e, conforme prevê a Súmula n. 310 do Supremo Tribunal Federal: “quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira

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imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir”.

No caso de carta precatória, o prazo é contado a partir da juntada da carta aos autos do processo.

e) Ausência de fatos impeditivos ou extintivos do direito de recorrer

Fatos impeditivos são aqueles que impedem a interposição do recurso ou seu recebimento, quais sejam:

Renúncia: é ato de disposição, ou seja, abre-se mão do direito de recorrer. É diferente de deixar escoar o prazo sem interpor recurso. Na renúncia há manifestação expressa nesse sentido.

O Ministério Público não pode renunciar.

A renúncia antecipa o trânsito em julgado.

P.: Em sentença condenatória, o defensor e o réu têm de ser intimados da sentença e ambos podem interpor recurso. Se houver divergência de vontades, um deles quer renunciar e o outro não, qual prevalece?

R.: Na doutrina, prevalece entendimento de que a vontade do acusado deve prevalecer sobre a do defensor. Na jurisprudência, sustenta-se que prevalece a vontade técnica do defensor. Há, no entanto, entendimento que sustenta prevalecer a vontade daquele que quer recorrer, com base na garantia da ampla defesa.

Não recolhimento à prisão nos casos previstos em lei (artigo 594 do Código de Processo Penal).

Fatos extintivos são fato supervenientes à interposição do recurso:

Desistência: é ato de disposição, porém sempre posterior à interposição do recurso. O Ministério Público não pode desistir dos recursos interpostos (artigo 576 do Código de Processo Penal).

Deserção: ato de abandonar o recurso. Pode ocorrer pelo não pagamento das custas processuais (artigo 806, § 2.º, do Código de Processo Penal).; ou pela fuga do réu no caso de apelação, sempre quando for negada a possibilidade de apelar em liberdade.

1.4.2. Pressupostos subjetivos

a) Legitimidade

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A legitimidade refere-se às partes legítimas para interposição do recurso (artigo 577 do Código de Processo Penal).

b) Interesse jurídico

O interesse deriva da sucumbência. A sucumbência ocorre sempre que a parte teve frustrada alguma expectativa legítima. Estabelece o parágrafo único do artigo 577 do Código de Processo Penal: “não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão”.

2. APELAÇÃO

2.1. Conceito

O Professor Fernando Capez9 ensina que apelação é: “recurso interposto da sentença definitiva ou com força de definitiva, para a segunda instância, com o fim de que se proceda ao reexame da matéria, com a conseqüente modificação parcial ou total da decisão”.

2.2. Classificação

2.2.1. Quanto à extensão

Ampla ou plena: devolve o conhecimento pleno de toda a matéria decidida.

Restrita, limitada ou parcial: impugna tópicos da sentença; pede-se apenas o reexame de parte da decisão.

O que fixa a extensão da apelação é o ato de interposição. Caso isso não ocorra entende-se que a apelação foi total.

2.2.2. Quanto ao procedimento

Ordinária: ocorre nos casos de apelação de crimes punidos com reclusão (artigo 613 do Código de Processo Penal).

Sumária: ocorre nas contravenções e nos crimes punidos com detenção.

9 Op. cit. p. 403.205

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2.3. Hipóteses de Cabimento da Apelação

2.3.1. Decisões proferidas por juiz singular

São hipóteses em que cabe a apelação:

decisões definitivas de condenação ou absolvição;

decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz singular nos casos não previstos no artigo 581 do Código de Processo Penal, pois a apelação tem caráter subsidiário;

P.: Todas as decisões condenatórias e absolutórias são apeláveis?

R: O fato de serem apeláveis não significa que são sinônimos de recorríveis. Todas as decisões condenatórias e absolutórias são recorríveis, mas nem todas apeláveis. A decisão de absolvição sumária no júri é recorrível mediante recurso em sentido estrito e não apelação (artigo 581, inciso VI, do Código de Processo Penal).

2.3.2. Decisões proferidas pelo júri (artigo 593, inciso III, §§ 1.º a 3.º, do Código de Processo Penal)

Nas decisões proferidas pelo júri, a apelação é cabível se prevista em uma das hipóteses do inciso III do artigo 593 do Código de Processo Penal:

Nulidade posterior à pronúncia: a nulidade posterior, se relativa, o momento de arguição é imediatamente depois de anunciado o julgamento e apregoada as partes. Se o tribunal reconhecer a nulidade anula o ato e todos os demais dele decorrente (artigo 571, inciso VI, do Código de Processo Penal). Se a nulidade relativa tiver ocorrido durante o julgamento, o protesto deve ser feito logo após a sua ocorrência, sob pena de ser convalidada (artigo 571, inciso VIII, do Código de Processo Penal).

Decisão contrária à letra expressa da lei ou à decisão dos jurados.

Quando houver erro ou injustiça na aplicação da pena ou medida de segurança.

Decisão dos jurados manifestamente contrária a prova dos autos: decisão arbitrária. Essa apelação só é cabível uma vez.

2.4. Artigo 593, § 4.º, do Código de Processo Penal206

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Quando de parte da decisão for cabível apelação e de outra parte for cabível recurso em sentido estrito, o único recurso cabível será a apelação, ainda que se recorra somente de parte da decisão. A apelação absorve o recurso em sentido estrito.

2.5. Apelação na Lei n. 9.099/95

Hipóteses de cabimento:

sentença do procedimento sumaríssimo;

sentença homologatória da transação penal;

rejeição da denúncia ou da queixa no procedimento sumaríssimo.

O prazo dessa apelação é de 10 dias para a interposição e apresentação das razões de apelação.

2.6. Efeitos da Apelação no Código de Processo Penal

Os efeitos da apelação no Código de Processo Penal são:

Devolutivo (tantum devolutum quantum appellatum): o Judiciário irá reexaminar a decisão; devolve-se o conhecimento da matéria à instância superior.

Suspensivo: efeito que impede que a decisão proferida produza efeitos, que seja eficaz. Obsta os efeitos da sentença.

Regressivo: efeito que permite ao próprio órgão prolator da decisão reexaminá-lo. Permite o juízo de retratação. A apelação do Código de Processo Penal não tem efeito regressivo.

Extensivo: todos os recursos nos processos penais têm esse efeito (artigo 580 do Código de Processo Penal). A decisão proferida no recurso interposto por um co-réu beneficia os demais que não recorreram, salvo se o recurso for fundado em motivos de ordem pessoal.

2.7. Reformatio in Pejus

A reformatio in pejus é a situação na qual o réu tem a sua situação prejudicada em razão de recurso exclusivo da defesa. A reformatio in pejus é proibida com base no princípio do “tantum devolutum quantum appellatum”, segundo o qual só é devolvido ao tribunal o pedido recursal. O tribunal só pode reexaminar o que foi pedido. Ex.: a

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defesa recorre pedindo a absolvição. O tribunal nega a absolvição e coloca uma agravante.

O artigo 617 do Código de Processo Penal proíbe expressamente a reformatio in pejus.

2.7.1. Reformatio in pejus indireta

Segundo ensinamento do Professor Fernando Capez10: “anulada sentença condenatória em recurso exclusivo da defesa, não pode ser prolatada nova decisão mais gravosa do que a anulada. Por exemplo: réu condenado a um ano de reclusão apela e obtém a nulidade da sentença; a nova decisão poderá impor-lhe, no máximo, a pena de um ano, pois do contrário o réu estaria sendo prejudicado indiretamente pelo seu recurso. Este é o entendimento pacífico do STF (RTJ 88/1018 e 95/1081).

(...)

Obs.: No caso de a sentença condenatória ter sido anulada em virtude de recurso da defesa, mas, pelo vício da incompetência absoluta, a jurisprudência não tem aceitado a regra da proibição da reformatio in pejus indireta (...)”.

2.7.2. Reformatio in pejus no júri

A lei que proíbe a reformatio in pejus (artigo 617 do Código de Processo Penal) não pode prevalecer sobre o princípio constitucional da soberania dos veredictos.

Anulado o júri, em novo julgamento, os jurados poderão proferir qualquer decisão.

Se o réu foi pronunciado e condenado por homicídio simples, a defesa interpõe apelação. O tribunal dá provimento e anula o primeiro julgamento. No segundo julgamento o júri condena por homicídio qualificado. Houve reformatio in pejus, a pena aumentou só por recurso da defesa, e, no caso, reformatio in pejus indireta.

2.8. Reformatio in Mellius

10 Op. cit. p. 419.208

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A reformatio in mellius ocorre quando o tribunal melhora a situação do réu em recurso exclusivo da acusação.

Parte da doutrina sustenta que é possível a reformatio in mellius, com base no próprio artigo 617 do Código de Processo Penal, que apenas proíbe a reformatio in pejus.

2.9. Processamento da Apelação

O prazo para a interposição da apelação, segundo o Código de Processo Penal, como regra é de cinco dias, salvo para o assistente de acusação não-habilitado, pois o Supremo Tribunal Federal manteve posicionamento no sentido de que o prazo é de cinco dias, a contar da intimação, para assistente habilitado, e 15 dias, após o vencimento do prazo para o Ministério Público apelar, para o não-habilitado.

A apelação é interposta por termo ou petição, no juízo que proferiu a decisão. Ele fará o exame do preenchimento dos pressupostos recursais. Se o juiz denegar a apelação ou a julgar deserta, caberá recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso XV, do Código de Processo Penal).

Interposta a apelação, o apelante e, depois dele, o apelado terão o prazo de oito dias cada um para oferecer razões (exceto nos processos de contravenção em que o prazo será de três dias).

Após a apresentação das razões ou contra-razões do Ministério Público, se houver assistente, este arrazoará, no prazo de três dias.

Se a ação penal for movida pelo ofendido, o Ministério Público oferecerá suas razões, em seguida, pelo prazo de três dias.

Com as razões ou contra-razões, podem ser juntados documentos novos.

O artigo 576 do Código de Processo Penal estabelece que: “O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto”.

Inexiste juízo de retratação na apelação.

É praticamente pacífico que a apresentação tardia das razões de apelação não impede o conhecimento do recurso.

2.10. Artigo 600, § 4.º, do Código de Processo Penal

O § 6.º do artigo 600 do Código de Processo Penal estabelece que: “Se o apelante declarar, na petição ou no termo, ao interpor a apelação, que deseja arrazoar na superior

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instância serão os autos remetidos ao tribunal ad quem onde será aberta vista às partes, observados os prazos legais, notificadas as partes pela publicação oficial”.

O apelante pode requerer a apresentação das razões no tribunal.

1.1. Recurso em Sentido Estrito (art. 581 e ss. do CPP)

O recurso em sentido estrito é interposto em primeira instância e classifica-se em:

Recurso em sentido estrito pro et contra: o recurso é cabível em ambas as hipóteses de sucumbência. Exemplos: artigo 581, inciso IV, do Código de Processo Penal - da pronúncia ou impronúncia; artigo 581, inciso X, do Código de Processo Penal - da decisão que concede ou nega habeas corpus.

Recurso em sentido estrito secundum eventum litis: o recurso só é admitido em uma das hipóteses de sucumbência. Ex.: artigo 581, inciso I, do Código de Processo Penal - da decisão que rejeita a denúncia ou a queixa (se houver recebimento, não cabe recurso).

1.1.1. Hipóteses de cabimento

O artigo 581 traz o rol de cabimento do recurso em sentido estrito. Esse rol é taxativo?

A doutrina e a jurisprudência tradicionais consideram esse rol como taxativo. De uns tempos para cá está ocorrendo uma leve flexibilização na interpretação do rol do artigo 581 do Código de Processo Penal. Isso porque esse diploma é de 1941, e o rol do recurso em sentido estrito não acompanhou as mudanças por ele sofridas. Tal fato vem motivando o entendimento de que, ainda que o rol seja taxativo, admite-se a interpretação extensiva e a aplicação analógica.

Ex.: A jurisprudência majoritária entende ser cabível recurso em sentido estrito da decisão que suspende o processo nos termos do artigo 366 por analogia ao inciso XVI do artigo 581, ambos do Código de Processo Penal.

Segundo o rol do artigo 581 do referido diploma, caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:

I) Que não receber a denúncia ou a queixa

Se o juiz recebe a denúncia, cabe habeas corpus. Se rejeita, cabe recurso em sentido estrito.

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Rejeitada denúncia de crime previsto na Lei n. 9099/95 cabe apelação no prazo de dez dias.

Tratando-se de crime previsto na Lei n. 5.250/67, se o juiz recebe a denúncia ou a queixa, cabe recurso em sentido estrito; se rejeita, cabe apelação no prazo de cinco dias.

É necessário intimação do acusado para apresentar contra-razões, no caso do recurso em sentido estrito, pelo fato do juiz não receber a denúncia?

O Código de Processo Penal não exige essa providência. Houve quem sustentasse a aplicação do Código de Processo Civil subsidiariamente, pois, antes da reforma do Código de Processo Civil em 1994, o acusado era intimado para contra-razoar. Hoje, com a reforma do Código de Processo Civil, não se aplica mais essa regra.

II) Que concluir pela incompetência do juízo

Nesse caso, o juiz reconhece de ofício a incompetência.

“Para parte da doutrina, da sentença que desclassifica o crime de competência do Júri, para crime não doloso contra a vida, cabe recurso em sentido estrito com base nesse fundamento, pois o juiz está, na verdade, concluindo pela incompetência do Júri.”11

III) Que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição

A decisão a respeito da exceção de suspeição é irrecorrível. As exceções podem ser de: litispendência, coisa julgada e ilegitimidade de parte.

Esse inciso trata de recurso em sentido estrito secundum eventum litis. Só são recorríveis as decisões que julgarem procedentes as exceções.

IV) Que pronunciar ou impronunciar o réu

V) Que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança, indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante

A cassação ocorre quando se verifica que a fiança anteriormente concedida não era cabível.

Fiança inidônea é aquela prestada – por engano – em quantia insuficiente ou cujo valor se depreciou com o tempo, havendo necessidade de ser reforçada, sob pena de ficar sem efeito.

Atenção: lembre-se que em 90% dos casos referentes à fiança o recurso cabível é o recurso em sentido estrito. E, nos casos de prisão e liberdade provisória, lembre-se que só cabe o recurso em sentido estrito quando a acusação for sucumbente; se a defesa for sucumbente não cabe.

11 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.211

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VI) Que absolver o réu sumariamente

Trata-se da única sentença absolutória que não é apelável.

VII) Que julgar quebrada a fiança ou perdido o seu valor

A quebra da fiança ocorre quando (arts. 328 e 341 do CPP):

o réu descumpre as obrigações às quais se submete;

pratica outra infração penal na vigência do benefício.

Artigo 343 do Código de Processo Penal: “O quebramento da fiança importará a perda de metade do seu valor e a obrigação, por parte do réu, de recolher-se à prisão, prosseguindo-se, entretanto, à sua revelia, no processo e julgamento, enquanto não for preso”.

A perda do valor se dá quando o réu condenado não se recolhe à prisão (art. 344 do CPP).

VIII) Que decretar a prescrição ou julgar, por outro modo, extinta a punibilidade

IX) Que indeferir o pedido de reconhecimento da prescrição ou de outra causa extintiva da punibilidade

Exceção: durante a fase de execução, o recurso cabível será o agravo (art. 197 da LEP).

X) Que conceder ou negar a ordem de habeas corpus

Atenção: o dispositivo refere-se somente à decisão do juiz de primeirainstância. Normalmente, o habeas corpus é julgado no tribunal. Do acórdão denegatório de habeas corpus proferido pelos Tribunais Regionais Federais e pelos tribunais dos Estados cabe recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça. Se a sentença concede o habeas corpus, há o reexame necessário.

XI) Revogado pela Lei de Execução Penal

XII) Revogado pela Lei de Execução Penal

XIII) Que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte

XIV) Que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir

Atenção: nesse caso, o prazo para interposição do recurso em sentido estrito é de 20 dias. A legitimidade é de qualquer do povo. O órgão competente para o julgamento é o presidente do Tribunal de Justiça.

XV) Que denegar a apelação ou julgar deserta

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XVI) Que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial

XVII) Revogado pela Lei de Execução Penal

XVIII) Que decidir o incidente de falsidade

É a decisão – definitiva – que julga o incidente de falsidade documental.

O recurso em sentido estrito disposto nesse inciso é pro et contra.

XIX ao XXIII) Revogados pela Lei de Execução Penal

XXIV) Esse inciso já estava revogado pela Lei de Execução Penal. Atualmente, em virtude da Lei n. 9.268/96, nem o juiz das execuções pode proferir decisão convertendo a multa em prisão.

Efeito do recurso em sentido estrito

a) Devolutivo: todos os recursos têm esse efeito; a decisão é reapreciada.

b) Suspensivo: como regra, o recurso em sentido estrito não possui efeito suspensivo, salvo o artigo 584 do Código de Processo Penal. Assim, o recurso em sentido estrito terá efeito suspensivo se interposto contra:

decisão que denegue conhecimento à apelação ou a julgue deserta;

decisão que declare perdido o valor da fiança;

decisão de pronúncia apenas no tocante ao julgamento do réu pelo júri;

decisão que determine quebra da fiança somente no tocante a perda da metade de seu valor.

c) Regressivo: o recurso em sentido estrito permite ao órgão prolator da decisão que se retrate.

d) Extensivo: o recurso em sentido estrito possui esse efeito (art. 580).

Processamento do recurso em sentido estrito

O prazo para interposição do recurso em sentido estrito, em regra, é de cinco dias (art. 586 do CPP). Exceções:

15 dias, no caso de recurso contra impronúncia interposto pelo assistente de acusação não-habilitado nos autos;

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20 dias, contra a decisão que inclui ou exclui jurado da lista-geral (art. 586, par. ún., do CPP).

Se o recurso em sentido estrito não for recebido, contra essa decisão é cabível a carta testemunhal.

Se o recurso em sentido estrito for recebido, intima-se o recorrente para apresentar as razões e o recorrido para apresentar as contra-razões.

O juiz vai então reexaminar sua decisão podendo mantê-la ou se retratar. Caso ele mantenha a sua decisão, o recurso sobe para o tribunal competente; caso ele se retrate, intima as partes da nova decisão.

O prazo para a apresentação das razões, contra-razões e retratação é sempre de dois dias.

Em segunda instância o recurso em sentido estrito segue o rito da apelação sumária.

O prejudicado com a retração pode interpor recurso cabível no prazo de cinco dias e o recurso subirá diretamente ao tribunal, independentemente de razões ou contra-razões (art. 589, par. ún., do CPP).

A nova decisão pode não ser impugnada por recurso em sentido estrito.

Ex.: se o juiz indefere um requerimento de prisão preventiva, oMinistério Publico interpõe recurso em sentido estrito. O juiz retrata-se e defere a prisão. As partes são intimadas. A defesa só pode impetrar habeas corpus, mas não recurso em sentido estrito.

O recurso em sentido estrito poderá subir nos próprios autos do processo ou em autos apartados. Nesse último caso, faz um instrumento que será examinado pelo tribunal.

O recurso em sentido estrito sobe nos próprios autos nos seguintes casos (art. 583 do CPP):

quando interpostos de ofício;

nos casos do artigo 581, incisos I, III, IV, VI, VIII e X;

quando o recurso não prejudicar o andamento do processo.

2. PROTESTO POR NOVO JÚRI (ARTS. 607 E 608 DO CPP)

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Page 215: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

O protesto por novo júri possui as seguintes características:

é um recurso exclusivo das decisões do júri;

é um recurso exclusivo da defesa;

só pode ser interposto uma vez;

é um recurso que dispensa a fundamentação;

é interposto perante o juiz-presidente julgado por ele mesmo.

Hipótese de cabimento: o protesto por novo júri será cabível sempre que houver condenação a uma pena de reclusão igual ou superior a 20 anos por um só crime, segundo entendimento da doutrina e da jurisprudência .

Obs. : cabe protesto por novo júri quando a pena imposta for em grau de apelação? Está em vigor o artigo 607, § 1.º, do Código de Processo Penal?

Pelo artigo 607, § 1.º, do Código de Processo Penal não cabe o protesto por novo júri quando a pena imposta for em grau de apelação. Esse artigo faz, todavia, uma remição expressa ao artigo 606 do mesmo diploma, artigo esse revogado desde 1948. Em razão disso, a posição dominante entende que a revogação expressa do artigo 606 do Código de Processo Penal produziu a revogação tácita do artigo 607, § 1.º. A posição minoritária (Professor Tourinho) afirma que o artigo 607, § 1.º, está em vigor, pois sua regra é compatível com os demais dispositivos do Código de Processo Penal: quando da revogação do artigo 606 do Código de Processo Penal a regra nele contida foi deslocada para o artigo 593 do Código de Processo Penal; logo, onde está escrito artigo 606, leia-se artigo 593 e parágrafos do Código de Processo Penal. Para tal corrente não se trata de revogação, mas sim de uma remição não atualizada.

2.1. Concurso de Crimes

Atenção: assunto muito abordado em concursos públicos.

Concurso material: se a pena igual ou superior a 20anos resultar de concurso material, não será cabível protesto (as penas devem ser consideradas isoladamente para o protesto).

Crime continuado e concurso formal: se a pena igual ou superior a 20 anos resultar de concurso formal e crime continuado, admite-se o protesto. Entende-se que em tais situações prevalece a unidade da conduta ou a ficção legal.

2.2. Processamento

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O prazo de interposição é de cinco dias.

É interposto perante o juiz-presidente. O juiz-presidente pode admitir o protesto ou indeferi-lo.

Se o juiz admite o protesto, desde logo marca novo júri. Não há apresentação de razões ou contra-razões.

No novo julgamento não poderão fazer parte do Conselho de Sentença os jurados que já tenham tomado parte no julgamento anterior (art. 607, § 3.º, do CPP). A Súmula n. 206 do Supremo Tribunal Federal estende essa regra a qualquer caso de novo julgamento.

Da decisão que indefere o protesto, qual a medida cabível?

São duas as posições:

Carta Testemunhável: esse recurso destina-se a promover o reexame do recurso indeferido.

Habeas Corpus: corrente defendida pelos Professores Vicente Greco e Frederico Marques. Essa corrente entende não ser cabível a carta testemunhável pelo fato do seu rito ser o mesmo do recurso indeferido. No protesto, a carta seria interposta no próprio juízo e por ele mesmo analisado. Para ser reexaminado pelo órgão superior é necessário impetrar habeas corpus.

2.3. Artigo 607, § 2.º, do Código de Processo Penal

O pedido de protesto por novo júri provocará a revisão da decisão. Dessa forma ele invalida qualquer outro recurso interposto, mesmo que seja recurso da acusação.

2.4. Artigo 608 do Código de Processo Penal

O protesto suspende a apelação até que haja o segundo julgamento. Isso acontece se o réu for condenado por outro crime que não caiba protesto. Após a decisão do segundo julgamento, julga-se a apelação.

Atenção: nesse caso, a defesa poderia apenas interpor o protesto, aguardar o novo julgamento e depois apelar de tudo?

Não, porque se assim fizer, o crime em que não cabe o protesto transitará em julgado; por isso a necessidade de se interpor o protesto e a apelação.

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3. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

O artigo 382 do Código de Processo Penal trata dos embargos de declaração contra a sentença. São os chamados “embarguinhos”.

Os artigos 619 e 620 do Código de Processo Penal tratam dos embargos de declaração contra acórdão.

É possível a interposição dos “embarguinhos” também contra decisão interlocutória.

Toda decisão, sentença ou acórdão para ser impugnada por embargos de declaração tem de ser omissa, contraditória, ambígua ou obscura.

O prazo para interposição dos embargos de declaração é de dois dias. Interposto os embargos de declaração, aplica-se o Código de Processo Civil subsidiariamente, isto é, interrompe-se o prazo dos demais recursos.

P.: É necessário a oitiva da parte contrária nos embargos de declaração?

R.: A jurisprudência dominante estabelece que a oitiva da parte contrária é providência desnecessária, salvo quando os embargos tiverem caráter infringente, isto é, efeito modificativo.

P.: Os embargos de declaração podem ter efeito modificativo?

R.: Sim, principalmente nos casos em que os embargos de declaração visarem sanar omissão.

P.: Cabe embargos de declaração de embargos de declaração?

R.: Sim, desde que o segundo embargo vise suprir omissão da decisão do primeiro embargo.

P.: Qual o recurso cabível quando o juiz não acolhe os embargos?

R.: Embargos em primeira instância: a parte deve argüir em preliminar de apelação o equívoco da sentença. Embargos em segunda instância: contra acórdão, cabe agravo regimental.

3.1. Embargos de Declaração na Lei n. 9.099/95

Os embargos de declaração serão opostos nesse caso, no prazo de cinco dias. Opostos por escrito ou oralmente. Nesse caso, os embargos de declaração suspendem o prazo para os demais recursos.

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4. EMBARGOS INFRINGENTES E EMBARGOS DE NULIDADE

Embargos de nulidade é o nome dado aos embargos infringentes quando a divergência for relativa à decretação ou não de nulidade processual.

Os embargos só têm cabimento contra acórdão não unânime.

O voto vencido pode divergir total ou parcialmente. Se for parcial, somente quanto ao tópico em que ocorreu a divergência serão interpostos os embargos.

A divergência se apura quanto à conclusão do voto e não quanto a sua fundamentação.

No processo penal, os embargos infringentes configuram recurso exclusivo da defesa. Assim, se dois votos absolvem e um voto condena o réu, a acusação foi sucumbente e não cabe embargos infringentes.

Atenção: é necessário que o acórdão se refira ao julgamento de uma apelação ou recurso em sentido estrito.

Não cabe embargos infringentes de decisão não unânime em habeas corpus.

Processamento:

interposição em 10 dias;

oitiva do querelante ou do assistente de acusação se houver – também em 10 dias;

parecer do Procurador-Geral de Justiça;

parecer do relator;

parecer do revisor.

O relator e o revisor não podem ter participado do primeiro julgamento.

O relator e o revisor do primeiro julgamento podem modificar a sua decisão. Isso porque a turma julgadora é composta de cinco desembargadores: três desembargadores que proferiram a primeira decisão e o relator e o revisor. Dessa forma, podem manter ou reformar a primeira decisão. Logo, os embargos infringentes têm efeito regressivo, diante da possibilidade da mudança de voto de quem já votou.

4.1. Embargos Infringentes nos Tribunais Superiores

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No Superior Tribunal de Justiça não cabe embargos infringentes. Nesse tribunal, só cabem embargos de declaração e divergência.

No Supremo Tribunal Federal há embargos infringentes no âmbito penal no prazo de 15 dias. Cabe em três casos:

acórdão não unânime em ação penal julgada procedente;

acórdão que julga improcedente revisão criminal;

acórdão denegatório de recurso criminal ordinário (art. 102, inc. II, da CF).

5. CARTA TESTEMUNHÁVEL

A carta testemunhável surgiu na época do Brasil-Colônia: duas testemunhas comprovavam que o recurso havia sido interposto.

As partes são chamadas :

testemunhante: parte que interpõe a carta.

testemunhado: juízo que indeferiu o seguimento, o processamento do recurso.

É cabível quando for denegado seguimento a recurso, não importando o motivo da denegação.

Tem caráter residual. Só será cabível se não existir nenhuma outra medida expressamente prevista para isso.

Exemplos:

Decisão denega apelação: interpõe-se recurso em sentido estrito;

Decisão denega recurso em sentido estrito: interpõe-se a carta testemunhável;

Decisão denega protesto por novo júri: para alguns, cabe a carta testemunhável; para outros o habeas corpus;

Decisão denega embargos de declaração em primeira instância: preliminar de apelação;

Denega embargos de declaração em segunda instância: agravo regimental;

Agravo em Execução: carta testemunhável.

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5.1. Processamento

O prazo para a interposição da carta testemunhável é de 48 horas. Conta-se o prazo de minuto a minuto. O termo inicial para a interposição é a partir da intimação desfavorável. Na prática, é impossível determinar o minuto inicial. Contam-se dois dias.

É interposto perante o escrivão. O escrivão é quem forma o instrumento. Trata-se de função burocrática. Se ele se omite, fica sujeito a uma pena funcional de suspensão por 30 dias.

Formando o instrumento, o escrivão deve entregar a carta ao testemunhante. Após isso, segue-se o rito do recurso indeferido. No tribunal, segue-se o rito da apelação sumária.

Chegando ao tribunal, o disposto no Código de Processo Penal permite que o mesmo, caso dê provimento à carta, admita o recurso indeferido e o julgue no mérito, desde que a carta esteja devidamente instruída. É economia processual. O próprio tribunal pode julgar no mérito.

Obs.: fim dos recursos no processo penal. A seguir estão algumas ações impugnativas de decisão.

6. REVISÃO CRIMINAL

Os processualistas mais antigos, baseados no Código de Processo Civil, o chamavam de recurso sui generis. Mas não é um recurso. É uma ação impugnativa autônoma. Instaura-se nova relação jurídica processual com o seu ajuizamento. Não tem prazo de interposição. Seu pressuposto é a decisão transitada em julgado.

É ação rescisória de coisa julgada penal, mas difere da ação rescisória civil.

Ação rescisória:

prazo – preclusivo – 2 anos;

pode ser ajuizada pelo autor, pelo réu ou por terceiros prejudicados.

Revisão Criminal:

não há prazo para interposição;

só pode ser ajuizada pela defesa;

é sempre pró-réu.

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Page 221: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

Se houve erro judicial que beneficiou o réu e transitou em julgado, essa decisão

não pode ser rescindida.

No pólo ativo figura o próprio réu pessoalmente (não precisa de advogado) ou

o procurador do réu (alguém em seu nome). Não é necessário procuração com poderes

especiais. Se o réu já faleceu, podem ingressar o cônjuge, o ascendente, o descendente

ou o irmão do mesmo. Nesse último caso, tutela-se o status dignitatis, isto é, a honra, a

moral do réu.

Para assegurar o status dignatis é possível entrar com revisão criminal:

quando o réu já faleceu;

quando o réu já cumpriu a pena.

P.: Se, no curso da revisão criminal, o réu morre quem assume a ação?

R.: O Código de Processo Penal estabelece que o presidente do tribunal deve

nomear um curador para prosseguir na ação. Esse curador pode ser o cônjuge,

ascendente, descendente ou irmão.

P.: O Ministério Público pode figurar no pólo ativo?

R.: Há polêmica na doutrina quanto ao assunto. Para a Professora Ada

Pellegrini Grinover, sim. Mas a posição dominante na doutrina e na jurisprudência é a de

que não. O Ministério Público pode impetrar habeas corpus, mas não revisão criminal.

Ao Ministério Público cabe ocupar o pólo passivo na revisão criminal em defesa

da coisa julgada.

P.: Quais são os fundamentos possíveis da revisão criminal? Qual é a causa de

pedir?

R: Conforme o artigo 621 do Código de Processo Penal são fundamentos:

221

Page 222: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

a) Quando a decisão for contrária à letra expressa da lei ou contrária à evidência

dos autos. Nesse caso, a contrariedade precisa ser marcante, facilmente perceptível.

Atenção: se no final do julgamento da revisão criminal não se chega a uma

certeza, tendo-se apenas uma probabilidade da inocência, qual a solução?

Na revisão criminal vigora o princípio do in dubio pro societati. Na dúvida, a

revisão será julgada improcedente.

Não cabe revisão criminal quando houver uma mudança na interpretação dos

tribunais. A contrariedade é somente a texto expresso de lei.

b) Quando a decisão se fundar em depoimentos, documentos ou exames falsos.

Devem ser comprovadamente falsos. Exige-se a prova pré-constituída da falsidade do

depoimento, documento ou exame.

P.: Como o requerente consegue uma prova pré-constituída?

R.: É possível que o autor dos crimes (do falso testemunho) tenha sido

condenado. Junta-se a cópia da decisão, da condenação ou por meio de justificação

criminal. Segue o rito do Código de Processo Civil. É com base nele que no Juízo Penal

a justificação é ajuizada.

c) Quando surgirem provas novas de inocência do réu ou causa de diminuição de

pena.

O pedido da revisão criminal é a rescisão da coisa julgada ou a correção da

injustiça.

O tribunal possui juízo rescindente e rescisório.

Obs.: quando se reconhece na revisão criminal alguma nulidade processual o

tribunal limita-se a rescindir a coisa julgada. O processo é anulado. O juiz de primeiro

grau retomará o processo. Haverá nova sentença, salvo se ocorreu a prescrição.

222

Page 223: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

P.: E a reformatio in pejus?

R.: A nova sentença não pode ser mais gravosa para o réu do que a sentença

rescindida. É a proibição da reformatio in pejus indireta.

P.: Sempre é possível o pedido de indenização por erro judiciário?

R.: Em alguns casos não. O autor da revisão precisa pedir expressamente. Não é

um efeito da revisão. Não é possível o pedido de indenização nos seguintes casos:

quando o réu de alguma forma colaborou na produção do documento falso;

quando o réu colaborou com a ocultação da prova.

Se o autor da ação limitar-se a pedir a diminuição da pena, nada impede que o

tribunal, se for o caso, absolva-o. Mas cabe ressaltar que no julgamento da revisão

vigora o princípio in dubio pro societati.

P.: É possível o ajuizamento de segunda revisão criminal?

R.: O ajuizamento só será possível se tiver outro fundamento.

Obs.: não cabe revisão criminal de decisão de pronúncia. Não há coisa julgada

material.

6.1. Competência

Cada tribunal é competente para o julgamento de seus próprios julgados. Se a

decisão condenatória transitou em julgado na primeira instância, a revisão criminal deve

ser ajuizada no tribunal que tem competência recursal para aquela matéria.

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6.2. Procedimento

A revisão criminal é uma ação. Inicia-se com o oferecimento da petição inicial,

acompanhada da certidão do trânsito em julgado e de algum documento que comprove

as alegações do autor. A prova é sempre pré-constituída, conforme o artigo 625, § 1.º, do

Código de Processo Penal.

É encaminhada ao presidente do tribunal, o qual pode indeferi-la liminarmente.

Se não indeferir, ele encaminha a um relator; este também pode indeferi-la

liminarmente.

O Procurador-Geral dá um parecer em dez dias. É uma contestação

defende a coisa julgada.

A revisão volta para receber os pareceres do relator e do revisor, no prazo de

dez dias para cada. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, o relator e o revisor não

podem ter proferido nenhuma decisão no processo originário.

A revisão é julgada.

6.3. Recursos

Do indeferimento liminar da revisão criminal cabe recurso inominado – em São

Paulo esse recurso é o agravo regimental.

Do acórdão que julga a revisão criminal cabe recurso especial ou recurso

extraordinário.

Obs.: cabe embargos infringentes do acórdão não-unânime que julga revisão

criminal?

Segundo o Código de Processo Penal não cabe. Exceção: cabe na revisão

criminal julgada improcedente pelo Supremo Tribunal Federal.

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Page 225: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

P.: Cabe revisão criminal para rescindir sentença absolutória?

R.: Sim, no caso de absolvição imprópria.

P.: É requisito para a revisão criminal o prévio recolhimento do réu à prisão?

R.: Não, não é uma condição.

P.: A revisão criminal tem efeito suspensivo, isto é, suspende a execução da

pena?

R.: Não. O ajuizamento da revisão criminal não suspende a execução da pena.

Mas, segundo os Professores Magalhães Noronha, Scarance e Ada Pellegrini Grinover, é

possível a aplicação subsidiária do artigo 273 do Código de Processo Civil, isto é, a

antecipação de tutela.

P.: A revisão criminal tem efeito extensivo? Por exemplo: três indivíduos são

condenados por homicídio. Um deles prova que o fato não ocorreu. Estende-se para os

demais?

R.: Sim, aplica-se o artigo 580 do Código de Processo Penal na revisão

criminal.

7. HABEAS CORPUS (“Traga-me o Corpo”)

O habeas corpus teve sua origem na Magna Carta da Inglaterra, em 1215,

promulgada pelo Rei João Sem-Terra.

Momentos importantes desse instituto:

Habeas Corpus Act: período de consolidação do habeas corpus em 1679.

No Brasil: o habeas corpus teve sua origem:225

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implícita na Constituição Federal de 1824;

expressa em 1832 no Código de Processo Criminal;

em textos constitucionais, a partir da Constituição de 1891, artigo 72, § 22.

7.1. Teoria Brasileira do Habeas Corpus

Rui Barbosa percebeu que o ordenamento jurídico brasileiro precisava ampliar

o âmbito de atuação do habeas corpus, para garantir ao cidadão a defesa de abusos

anormais que impusessem mácula a direitos individuais de outro que não o de

locomoção.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu expressamente, naquela época, a

“teoria brasileira do hábeas corpus” desenvolvida por Rui Barbosa, reconhecendo-o

como meio hábil para a defesa de outros direitos ameaçados por ilegalidade ou abuso de

poder.

Essa teoria que vigorou até 1926, quando uma emenda constitucional passou a

limitar o habeas corpus.

Atualmente, o habeas corpus está previsto no artigo 5.º, inciso LXVIII, da

Constituição Federal.

O artigo 142, § 2.º, da Constituição Federal, restringe a abrangência do habeas

corpus para as punições disciplinares militares. Sobre essa disposição, que já existia em

outras constituições, Pontes de Miranda sustenta a não possibilidade desse remédio

constitucional discutir o mérito da punição, mas poderá ser impetrado para questionar:

a existência do poder hierárquico daquele que determinou a punição sobre o

punido;

a existência do poder disciplinar no caso concreto;

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Page 227: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

se o ato censurado é ou não ligado à função militar;

se a pena imposta é suscetível de ser aplicada disciplinarmente.

7.2. Disciplina do Habeas Corpus (Arts. 647 a 667)

O habeas corpus não é recurso; não tem prazo para a sua interposição; não é

obrigatório sua existência em um processo. É ação constitucional de caráter penal e

procedimento especial.

A Constituição Federal de 1988 institui duas espécies de habeas corpus:

habeas corpus preventivo ou salvo conduto: não houve dano consumado, havendo

risco futuro de se sofrer uma coação.

habeas corpus repressivo ou liberatório: visa combater o dano à liberdade de

locomoção, coação ou violência que se encontram consumados.

7.3. Partes

As partes no habeas corpus são:

Impetrante: pessoa que pede a ordem. Pode ser qualquer pessoa (física ou jurídica,

com ou sem capacidade civil plena). Não precisa ser advogado, em razão da

importância do direito a ser tutelado.

P.: E o Ministério Público pode impetrar habeas corpus?

R.: Sim, a teor dos artigos 127 da Constituição Federal e 654 do Código de

Processo Penal.

O Juiz de Direito não pode impetrar habeas corpus nos processos de sua

competência.227

Page 228: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

Paciente: pessoa em nome de quem se pede a ordem.

Autoridade coatora: pessoa responsável por determinar a ordem ilegal ou

abusiva; é o pólo passivo do habeas corpus. A autoridade coatora será sempre

aquela responsável pela ordem e não a que se limitou a executar o ato.

P.: Admite-se habeas corpus contra ato de particular?

R.: Posição dominante admite a impetração contra ato de particular. Ex.: contra

diretor de hospital que se recusa a liberar o paciente que não tem recursos para pagar a

conta.

7.4. Rito do Habeas Corpus

A impetração do habeas corpus se faz por meio de petição inicial, que deverá

conter os seguintes requisitos mínimos:

nome do paciente;

descrição da atual ou futura violência ou coação à liberdade de locomoção;

petição escrita em língua portuguesa;

assinatura do impetrante ou de alguém a seu rogo;

documentos que comprovem os fatos alegados.

7.5. Hipóteses de Cabimento (Art. 647/648 do CPP)

P.: O rol do artigo 648 do Código de Processo Penal é taxativo ou

exemplificativo?

228

Page 229: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

R: Discussão sem razão de ser, pois o rol do artigo 647 do Código de Processo

Penal é suficientemente amplo para abranger várias situações.

São hipóteses de cabimento do habeas corpus:

Quando não houver justa causa: haverá justa causa sempre que a persecução

penal possuir fundamentos fáticos e jurídicos.

Sempre que alguém estiver preso por mais tempo que a lei permita: dispositivo

que vale para prisão penal e para prisão processual.

Quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo.

Quando houver cessado o motivo que autorizou a coação.

Quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a

autoriza.

Quando o processo for manifestamente nulo: a nulidade deve ser manifesta.

Quando extinta a punibilidade. Ex.: instaura-se inquérito policial para apurar

crime prescrito.

P.: É possível o impetrante alegar em habeas corpus alguma hipótese e o

tribunal conceder por outra?

R.: Sim. O tribunal pode até conceder habeas corpus de ofício, não estando

vinculado à alegação.

7.6. Competência

7.6.1. Competência do Supremo Tribunal Federal

229

Page 230: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

Quando a autoridade coatora for Tribunal Superior.

Quando forem pacientes as seguintes pessoas: Presidente da República e Vice-

Presidente; Ministros de Estado, dos Tribunais Superiores, do Tribunal de

Contas da União; comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica; deputados

federais e senadores; Procurador-Geral da República e chefes de missão

diplomática.

7.6.2. Competência do Superior Tribunal de Justiça

Quando a coação partir de tribunal sujeito à sua jurisdição ou de Ministros de

Estado ou Comandante-Geral da Marinha, Exército e Aeronáutica.

Obs.: sempre que o habeas corpus envolver comandante do Exército ou Ministro

de Estado, sendo paciente, a competência será do Supremo Tribunal Federal, mas se

forem autoridade coatora, a competência será do Superior Tribunal de Justiça.

Quando o coator ou paciente for autoridade sujeita à jurisdição: Governador do

Estado (o vice-governador não) ou do Distrito Federal; desembargador;

membros do Tribunal Regional Federal, Tribunal Regional do Trabalho,

Tribunal de Contas do Estado, Tribunal de Contas do Município; membros do

Ministério Público da União que oficie perante tribunais.

7.6.3. Competência do Tribunal Regional Federal

Quando o paciente ou coator for juiz federal, juiz do trabalho ou membro do

Ministério Público Federal de primeira instância.

7.6.4. Competência do Tribunal de Justiça

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Page 231: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

Quando forem pacientes ou coator: prefeito municipal; vice-governador;

secretários de Estado; deputados estaduais; membros do Ministério Público

Estadual; Juiz de Direito (nos casos de sua competência recursal); Delegado-

Geral de Polícia; Procurador- Geral do Estado; Comandante-Geral da Polícia

Militar; Juiz de Alçada, Auditor da Justiça Militar.

7.7. Os Recursos no Habeas Corpus

Sentença que concede habeas corpus em primeiro grau: recurso de ofício (art.

574, inc. I, do CPP) e recurso em sentido estrito (art. 581, inc. X, do CPP).

Habeas Corpus por Tribunal: recurso ordinário, se denegatória a decisão ( arts.

102, inc. II e 105, inc. II, da CF e Lei n. 8.038/90).

8. MANDADO DE SEGURANÇA NA ÁREA CRIMINAL

O mandado de segurança encontra-se previsto nos incisos LXIX e LXX do artigo

5.º da Constituição Federal.

Desde seu surgimento discutia-se a possibilidade de cabimento contra ato

jurisdicional. Hoje não há dúvida: é cabível contra aquele ato jurisdicional para o qual

não se previu recurso.

Ex.: pedido de habilitação do assistente de acusação negado; decisão que

determina a apreensão de objetos não relacionados ao crime, para garantir as

prerrogativas do advogado.

E se o ato for recorrível? Segundo a Lei do Mandado de Segurança não será

cabível. É válida essa restrição?

231

Page 232: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

Não. Essa restrição não é aplicada. Prevalece o entendimento de que o mandado

de segurança poderá ser impetrado contra ato jurisdicional que admita recurso, sempre

que o recurso não possuir efeito suspensivo, pois, nesse caso, a interposição do recurso

não impede que a decisão produza seus efeitos, de tal forma que não obsta a consumação

da lesão a direito líquido e certo em virtude de ilegalidade ou abuso de poder.

Cabe também o Mandado de Segurança para obter efeito suspensivo em agravo

interposto contra decisão que em sede de execuções concede livramento condicional ou

progressão de regime sem o preenchimento dos requisitos legais ou para obter efeito

suspensivo contra a concessão de liberdade provisória em crime hediondo.

8.1. Direito Líquido e Certo

Após grande discussão doutrinária, chegou-se ao consenso de que a expressão

“direito líquido e certo” deve ser tomada no sentido processual, para indicar direito

apurável sem necessidade de dilação probatória. Disso decorre a exigência de prova pré-

constituída do direito para que se cogite a concessão de mandado de segurança.

8.2. Partes

São legitimados para impetrar o mandado de segurança a pessoa física ou jurídica

- e, até, ente despersonalizado - titular do direito líquido e certo ameaçado ou violado

pela ilegalidade ou abuso de poder. Normalmente, no processo penal, esse remédio será

utilizado pela acusação – pois a defesa pode fazer uso do habeas corpus.

O órgão do Ministério Público pode impetrar mandado de segurança perante

tribunais.

No pólo passivo, segundo a doutrina dominante, encontra-se a pessoa jurídica de

direito público a cujo quadro pertence a autoridade coatora.

232

Page 233: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

8.3. Competência

Como se trata de mandado de segurança em face de ato jurisdicional, a

competência será sempre dos tribunais – originariamente.

8.4. Procedimento

Prazo para impetração: 120 dias contados da ciência do ato impugnado.

A petição inicial deve atender aos requisitos dos artigos 282 e 283 do Código de

Processo Civil e estar munida da prova pré-constituída do direito do

impetrante.

O tribunal pode ou não conceder a liminar.

A autoridade coatora será notificada para prestar informações no prazo de 10 dias.

O órgão do Ministério Público deve apresentar parecer em 5 dias – atua como

custos legis.

8.5. Liminar

A lei do mandado de segurança assegura a possibilidade de concessão de liminar

ao impetrante sempre que a ameaça ao direito líquido e certo for atual e objetiva (art. 70,

inc. II).

Obs.: a notificação da autoridade coatora para apresentação das informações tem

valor de citação.

Atenção: o Supremo Tribunal Federal entende que o mandado de segurança,

quando impetrado pelo Ministério Público contra decisão favorável a defesa, 233

Page 234: Processo Penal - Resumo Para Concursos - Marcato

deverá também requerer e o tribunal determinar a citação do réu como

litisconsórcio necessário. Sem isso, o Supremo Tribunal Federal anula o mandado

de segurança.

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