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Cadernos de Letras da UFF – Dossiê: Letras, linguística e suas interfaces n o 40, p. 153-175, 2010 153 PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DE LETRAS E RECEPÇÃO DO PROFESSOR 1 Joelma da Silva Santos Maria Auxiliadora Bezerra RESUMO Nosso trabalho tem como objetivo investigar como alu- nos recém-ingressos no Curso de Letras de uma univer- sidade pública da Paraíba produzem seus textos, con- siderando-se as condições de produções (para quem se escreve, o que se escreve e como se escreve); bem como de que forma suas produções são corrigidas pelo pro- fessor. Como dados de análise temos textos de gêneros variados, escritos em situações diversificadas. Palavras-Chave: Produção textual, condição de produ- ção, alunos-professores. Introdução Nosso trabalho se respalda no interacionismo sociodiscursivo de Bron- ckart (1999/2006) 2 , que considera a linguagem como forma de ação social in- serida nas relações entre os indivíduos. É nessa direção que tomamos a moda- lidade da língua escrita como uma prática a ser ensinada e estudada mediante as diferentes esferas comunicativas socialmente. 1 Trabalho apresentado na XIV Semana de Letras da UEPB – Campina Grande – PB, em setembro de 2008. Este trabalho faz parte de um projeto de pesquisa maior financiado pelo CNPq (Processo 473750/2007-4) e intitulado como “A escrita em contexto de formação inicial do professor de língua materna: objeto de estudo e objeto de ensino”, sendo seu objetivo: identificar e descrever os saberes sobre escrita que se constitui como objeto de estudo na formação do professor de língua materna. 2 BRONCKART, J.- P. Atividades de linguagem, textos e discursos – por um interacionismo sócio- discursivo. Tradução de Anna Rachel Machado; Péricles Cunha. São Paulo: EDUC, 1999. ______.Por que e como analisar o trabalho do professor. In: MACHADO, A. R., MATÊN- CIO, M. L. L. (Orgs.) Atividade de linguagem, discurso e desenvolvimento humano. Campinas – SP: Mercado de Letras, 2006. – (Coleção ideias sobre linguagem).

Produções textuais de alunos de letras e recepção do professor

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ProDuÇÕES TExTuAiS DE AluNoS DE lETrAS E rEcEPÇÃo Do ProFESSor1

Joelma da Silva Santos Maria Auxiliadora Bezerra

RESUMO

Nosso trabalho tem como objetivo investigar como alu-nos recém-ingressos no Curso de Letras de uma univer-sidade pública da Paraíba produzem seus textos, con-siderando-se as condições de produções (para quem se escreve, o que se escreve e como se escreve); bem como de que forma suas produções são corrigidas pelo pro-fessor. Como dados de análise temos textos de gêneros variados, escritos em situações diversificadas.

Palavras-Chave: Produção textual, condição de produ-ção, alunos-professores.

introdução

Nosso trabalho se respalda no interacionismo sociodiscursivo de Bron-ckart (1999/2006)2, que considera a linguagem como forma de ação social in-serida nas relações entre os indivíduos. É nessa direção que tomamos a moda-lidade da língua escrita como uma prática a ser ensinada e estudada mediante as diferentes esferas comunicativas socialmente.

1 Trabalho apresentado na XIV Semana de Letras da UEPB – Campina Grande – PB, em setembro de 2008.

Este trabalho faz parte de um projeto de pesquisa maior financiado pelo CNPq (Processo 473750/2007-4) e intitulado como “A escrita em contexto de formação inicial do professor de língua materna: objeto de estudo e objeto de ensino”, sendo seu objetivo: identificar e descrever os saberes sobre escrita que se constitui como objeto de estudo na formação do professor de língua materna.

2 BRONCKART, J.- P. Atividades de linguagem, textos e discursos – por um interacionismo sócio-discursivo. Tradução de Anna Rachel Machado; Péricles Cunha. São Paulo: EDUC, 1999.______.Por que e como analisar o trabalho do professor. In: MACHADO, A. R., MATÊN-CIO, M. L. L. (Orgs.) Atividade de linguagem, discurso e desenvolvimento humano. Campinas – SP: Mercado de Letras, 2006. – (Coleção ideias sobre linguagem).

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Compreendemos que escrever sempre foi uma tarefa árdua, que exige do sujeito produtor certa proficiência, adquirida mediante constantes práticas de escritas, não meramente a solicitada pela academia, mas também a escrita com outras finalidades, objetivos, dependendo do que o contexto exigir. Partindo de tal pressuposto, nosso trabalho tem como objetivo investigar como alunos recém-ingressos no Curso de Letras de uma universidade pública da Paraíba produzem seus textos, considerando-se as condições de produções (para quem se escreve, o que se escreve e como se escreve), bem como a forma pela qual suas produções são corrigidas pelo professor.

Condições de produção e produção textual

A linguagem é uma prática social que se efetiva a partir do uso entre os diferentes sujeitos sociais. Por meio dela nos comunicamos com o outro, expressamos desejos, sentimentos, negociamos sentidos, trocamos ideias, in-fluenciamos e somos influenciados. Somos frutos de trocas, de diálogos que se constituem a partir da interação social. De acordo com Marcuschi (2008, p. 240)3 “a língua é um fenômeno cultural, histórico, social e cognitivo que varia ao longo do tempo e de acordo com os falantes: ela se manifesta no seu funcionamento e é sensível ao contexto”.

As palavras escritas ou pronunciadas não são ditas à toa. Nós selecio-namos o que dizer de acordo com a situação comunicativa, ou seja, falamos ou escrevemos a partir de gêneros discursivos. Para tanto, se faz necessário compreendermos que os mesmos são compostos considerando os seguintes aspectos: tema, estilo e composição. (BAKHTIN, 1997)4

Do ponto de vista temático, quem escreve deve manter coerência com o tema em questão; em relação ao estilo, Bakhtin (op. cit.) ressalta que a escrita deve tomar os recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua, conside-rando o público destinado, isto é, “conforme as diferentes funções que se pre-tende cumprir” (ANTUNES, 2003, p. 49); quanto ao aspecto composicional, a ênfase é dada aos discursos variados que irão ser estabelecidos mediante a relação entre o locutor e os parceiros da comunicação verbal.

3 MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. – São Pau-lo: Parábola Editorial, 2008.

4 BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros discursivos. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

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Dessa forma, entendemos que gênero não é só o texto, mas o conteúdo, sua forma organizacional e situação comunicativa. Marcuschi (op. cit, p. 243) defende que “os gêneros não são simples formas textuais, mas formas de ação social”. Daí ser pertinente que a escola tome a escrita como um processo, com-preendendo que os alunos não nascem sabendo dominá-la, mas que a apreen-dem por meio de práticas de inserção social. É nas relações significativas que o sujeito se sente motivado para dizer algo a alguém. A escrita só é relevante para o aluno quando ele tem a possibilidade de desempenhar determinados papéis na sociedade de maneira significativa, com vistas a situações vivenciáveis por ele (MOTTA-ROTH, 2006)5:

O aprendizado da escrita é visto como um processo implícito, que ocorre através da participação em eventos de escrita socialmente situados, com objetivos relevantes e significativos para os aprendi-zes. Aprender a escrever implica aprender não só a compor e cons-truir um texto em termos linguísticos, mas entender por quem, onde, quando, em que condições, com que recursos, e para que fins o texto é escrito. (FIGUEIREDO E BONINI, 2006, p. 428)6

Concordando com o grupo Didactext7 (2006, p. 114), acreditamos que ensinar a escrever implica considerar as práticas de escrita que os alunos têm em seus cotidianos, a fim de que eles escrevam objetivando a comunicação com o outro, haja vista, na maioria das vezes, “os alunos associarem a escrita escolar apenas com os aspectos formais e normativos (caligrafia, ortografia) e como realização de seus deveres”.

5 MOTTA-ROTH, Désirée. O ensino de produção textual com base em atividades sociais e gêneros textuais. In: BONINI, A. & FURLANETTO, M. M. (Orgs.). Linguagem em discurso: Gêneros textuais e ensino-aprendizagem. Tubarão, SC. v. 6, n. 3, set/dez. 2006.

6 FIGUEIREDO, Maria M. F.& BONINI, Adair. (Orgs.) Linguagem em discurso: Gêneros textuais e ensino-aprendizagem. V.6, n.3, set/dez. 2006.

7 Grupo de pesquisadores espanhóis composto pelos seguintes membros: Silvia A. Rieira, Teodoro A. Ângulo (coordenador), zahyra C. Martínez, Teresa C. García, Pilar F. Martinez, Isabel G. Parejo, Carmen G. Landa, Miguel P. Milans, Roberto R. Bravo, Eduardo T. Roble-do e Graciela U. alvarez. http//www.didactext. net. DIDACTEXT, G. La escritura de textos expositivos en aulas de primaria. In: CAMPOS, Anna. (Coord.). Diálogo e investigación em las aulas. Barcelona: GRAO, de IRIF, S. L. 2006.

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Os alunos, para escrever, necessitam estar situados em um contexto só-cio-histórico, pois ninguém escreve no vazio, isto é, sem um interlocutor. Em-bora seja isso o que a escola muitas vezes faça, não é essa a proposta de Bakhtin (1997), Antunes (2003), Marcuschi (2008), Schneuwly, Dolz (2004)8 e ou-tros, defensores de que todos os textos produzidos são baseados em gêneros. É sob essa ótica que priorizamos o ensino e o estudo da escrita pautado a partir da diversidade dos gêneros que permeiam nossa sociedade. Para Motta-Roth (op. cit p. 501) é o contexto que determina o “critério para se escolher o que e como dizer ou escrever”.

Quando falamos ou escrevemos somos conduzidos a nos adequar à esfera comunicativa, considerando, portanto, o contexto, ou as condições de produ-ção – o que dizer, para quem dizer e como dizer. Confirmando, assim, a fala de Marcuschi (op. cit. p. 174): “o conteúdo [do dizer] não muda, mas o gênero é sempre identificado na relação com o suporte”9, ou seja, dependendo de onde falamos ou escrevemos o gênero é moldado.

É comum a maioria de nossas escolas priorizar um ensino voltado para práticas pedagógicas em que escrever restringe-se, meramente, à prática de codificação, não considerando, desse modo, a língua escrita como uma prática social, que só se efetiva na relação com o outro, “cumprindo diferentes funções comunicativas” (ANTUNES, 2003, p. 47)10. Em virtude de tal prática, nossos alunos são submetidos ao ato da escrita sem saber, contudo, por que escre-vem, tampouco compreendem o sentido de suas escritas. Ainda para Antunes (2003, p. 46),

embora o sujeito com quem interagimos pela escrita não esteja presente à circunstância da produção do texto, é inegável que tal sujeito existe e é imprescindível que ele seja levado em conta, em cada momento. [...] quem escreve na verdade escreve para

8 SCHNEUWLy, B. e DOLz, J. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2004.

9 Entendemos aqui como suporte de um gênero um locus físico ou virtual com formato es-pecífico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto. (MARCUSCHI, 2008, p. 174).

10 ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro & interação. – São Paulo: Parábola Edito-rial, 2003 – (Série Aula; 1).

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alguém, ou seja, está em interação com outra pessoa. Essa oura pessoa é a medida, é o parâmetro das decisões que devemos tomar acerca do que dizer, do quando dizer e de como fazê-lo.

É função da escola oferecer situações de ensinoaprendizagm da escrita, pautado na diversidade dos gêneros discursivos, que incite o aluno a escrever, atendendo as suas reais necessidades, a fim de que não seja uma escrita me-cânica, mas dinâmica e significativa. É imprescindível que o professor deixe claro o gênero solicitado, seja um resumo, uma resenha, um artigo, uma mo-nografia etc., assim como que finalidade tem cada gênero, como se estrutura e qual seu destinatário. Essas questões são relevantes, pois os alunos precisam produzir seus textos compreendendo o que vão escrever, para quem e como vão escrever.

Tipos de correções de redação que circulam no contexto escolar

As práticas de correções das redações dos alunos, quase sempre, são pau-tadas em riscos vermelhos, que não dizem nada, ou seja, o professor se exime da sua responsabilidade de conduzir o aluno a refletir sobre seus equívocos ocorridos em seus textos, apontando apenas traços vermelhos sem nenhum esclarecimento.

Corrigir redações sem deixar claro para o aluno o que ele necessita fazer para não cometer o mesmo desvio em suas produções consiste em uma prática pouco significativa, uma vez que o aluno, por não saber em que momento “er-rou”, não terá a possibilidade de rever sua produção, nem aprimorá-la. É papel do professor mediar os conhecimentos que os alunos já possuem acerca da es-crita, seja nos aspectos semânticos como nos de ordem estrutural e ortográfica, promovendo, assim, “uma interferência efetivamente positiva no processo de aquisição da escrita do aluno” (RUIz, 2001, p. 15)11.

Garcez (2002)12 destaca que o ato de escrever não é algo inato ao homem, mas que se adquire mediante as práticas de escrita que circulam socialmente.

11 RUIz, Eliana M. S. Donaio. Como se corrige redação na escola. – Campinas, Sp: Mercado de Letras, 2001. – (Coleção Idéias sobre Linguagem)

12 GARCEz, Lucília. Técnica de Redação: O que é preciso saber para bem escrever. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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Escrevemos textos nas mais diferentes condições de produções, para interlo-cutores diversos. É, portanto, preciso que o professor compreenda na hora das correções que

todas as pessoas podem chegar a produzir bons textos, e que isso não é uma questão de ser “ungido” pelos deuses que esco-lhem os mais talentosos. É necessário também identificar blo-queios porventura construídos ao longo da vida escolar e tentar eliminá-los. (GARCEz, 2002, p. 3)

As redações dos alunos também são aplausíveis, não há como escrever-mos tudo “errado”. No entanto, o que a maioria dos professores aponta é apenas esses “desvios”. Dificilmente um professor elogia algum aspecto in-teressante nas redações corrigidas. De acordo com Serafini (1998, p. 112)13,

a correção deve levar em conta a capacidade do aluno e estimu-lá-lo a melhorar. Para que o estudante faça progressos é impor-tante que ele adquira certa “segurança comunicativa”, o que lhe garantirá a construção de uma boa autoimagem. O estudante muito criticado, cujos textos vêm cheios de correções, sente-se mal a ponto de se tornar incapaz de escrever.

Ruiz (2001), citando o trabalho de Serafini (1998), discute três tendên-cias de correções, confirmadas em análise de redações de alunos de níveis es-colares diversos, com idades entre 9 e 23 anos: a correção indicativa, a correção resolutiva e a correção classificatória. Além dessas correções, propostas por Sera-fini (1998), Ruiz (2001), constatou uma outra espécie de intervenção, que ela denominou de correção textual-interativa.

As análises realizadas por Serafini (op. cit) e por Ruiz (op. cit.) consta-taram que as correções mais corriqueiras dos professores são a indicativa e a resolutiva. A correção indicativa se limita a destacar, nas produções dos alunos, incoerências estruturais, lexicais e ortográficas, consistindo em uma correção

13 SERAFINI, Maria Teresa. Como escrever textos. Tradução de Maria A. B. de Castro. Adapta-ção Ana Maria M. Garcia. – 9ª ed. – São Paulo: Globo, 1998.

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superficial, sem abordar o sentido. Além disso, apenas localiza o “erro”, sem deixar claro para o aluno que tipo de “erro” cometeu e como saná-lo. É um tipo de correção que tem a escrita como um fim em si mesmo, esgotando-se nela as possibilidades de reescrita ou de reflexão. (RUIz, 2001)

Na correção resolutiva, por sua vez, o professor se detém em focalizar as intenções dos alunos e em seguida reescrever os trechos que para ele parecem confusos. O problema maior atribuído a esse tipo de correção é que, no mo-mento em que o professor refaz o que estava confuso na redação do aluno, ele tira do sujeito que produz a oportunidade de refletir sobre sua própria redação, uma vez que quem produziu não consegue perceber seus prováveis equívocos.

A correção classificatória diferencia-se das anteriores devido ao fato de o trabalho do professor ocorrer de forma mais clara, deixando o aluno ciente do que precisa fazer em sua redação para aprimorá-la. Para isso, o professor sugere as modificações de modo que o aluno as compreenda e tente refazer seu texto sozinho. Esse tipo de correção é eficaz porque indica onde e que tipo de “erro” o aluno praticou, bem como sugere modificações de maneira clara.

A quarta e última correção, encontrada por Ruiz (2001), é a correção tex-tual-interativa. Esse tipo de correção vai além da correção feita pelo professor na classificatória. Nesta os comentários, geralmente, são abordados em forma de “bilhetes”, que Ruiz (op. cit) denomina como pós-texto. Não cabendo em suas margens, o professor dispõe de maiores informações sobre a escrita dos alunos no espaço em branco deixado por eles.

Esses comentários deixados pelo professor aos alunos não se limitam apenas aos “erros” encontrados em suas redações, mas referem-se também à boa progressão que o texto teve. Neste tipo de correção, percebemos um con-tato mais próximo do professor com as escritas dos alunos. São recadinhos que o professor coloca nas produções deles, a fim de que percebam o que precisa ser melhorado em seus textos e o que teve de bom também, implicando, desse modo, um incentivo maior para que refaçam seus textos com mais cautela, atentando para as sugestões do professor.

Após as discussões apresentadas acerca dos tipos de correção, nós nos de-teremos em verificar que tipo de correção tem predominado ou sido aplicado, pelo professor da disciplina Prática de Leitura e Produção Textual I (PLPT I) às produções dos alunos recém-ingressos no curso de letras (tópico 5).

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Procedimentos metodológicos

Para obtenção dos dados, apoiamo-nos na perspectiva interacionista só-cio-discursiva, de Bronckart (1999, 2006), considerando as reais condições de produção. O contexto da coleta dos dados foram as aulas da disciplina PLPT I, que tem como objetivo maior tentar fazer com que os alunos se apropriem de práticas de leitura e consequentemente de produção textual. Vale ressaltar que essa disciplina aborda de maneira reflexiva a escrita, mas não se detém nesta modalidade, pois é em PLPT II que os alunos irão trabalhar com tal modalidade da língua de forma mais específica.

A disciplina PLPT I é oferecida no primeiro período do curso de Letras, com carga horária de 60 horas/aula. No período de 2008.1, foi ministrada por uma professora doutora em Linguística, da instituição UFCG de Campina Grande – PB, a uma turma composta por 21 alunos.

Para análise, selecionamos textos de gêneros variados, escritos em situa-ções diversificadas, em sala de aula e extra-sala. São textos produzidos por três alunos do primeiro período da Licenciatura em Letras, os quais demonstram níveis de proficiência em escrita diferentes. Classificamos seus níveis de escrita como proficiente, mediano e iniciante.

Contextualizando a coleta dos dados

Os sujeitos de nossa pesquisa foram selecionados pela professora minis-trante da disciplina. Para sua seleção, forma contemplados os seguintes crité-rios: por proficiente, consideramos aquele que domina “bem” a leitura e escrita, assim como o registro linguístico, ou seja, que tem convivência com a leitura de diversos textos, facilidade em expressar sua opinião oralmente comentando sobre o que lê coerentemente. O aluno proficiente manifesta envolvimento com as leituras indicadas pela professora, que, na maioria das vezes, apresen-tou textos coerentes e concisos, com ideias bem articuladas entre si. Possui boa argumentação, domínio das condições de produção – o que escrever, para quem escrever e como escrever –como também demonstrou conhecimento e domínio do código – ortografia, pontuação, acentuação – e das variações relativas aos textos formais, semi-formais e informais e da estruturação das orações e períodos – aspectos morfossintáticos e semântico-pragmáticos. O

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aluno considerado mediano oscila em sua escrita, ora escreve “razoavelmente bem”, ora apresenta problemas significativos, como leituras mais restritas do que aquelas solicitadas pela professora, isto é, relativas às teorias de base. Na escrita, houve problemas de concatenação das ideias, embora com uma baixa incidência e em relação ao código linguístico. Apresentou dificuldades mais acentuadas sobre pontuação, ortografia, acentuação. O iniciante demonstrou pouco conhecimento, tanto do código como da própria organização do texto e do domínio do texto que circula socialmente. Este aluno foi o que mais apresentou dificuldades em suas produções escritas, demonstrando pouco do-mínio na leitura, na escrita e no registro linguístico formal. Em sala de aula raramente se posicionava e, quando o fazia, era de forma muito tímida, sem apresentar conhecimentos mais aprofundados sobre a temática abordada. Suas produções escritas demonstraram muitas falhas de organização textual, de es-truturação de frases e parágrafos, suas ideias eram confusas, sem concatenação. Quanto ao domínio linguístico, o aluno demonstrava pouco conhecimento de ortografia, acentuação e pontuação.

Para constituição de nossos dados de análise obtivemos, de cada aluno com níveis de escrita diferentes, duas provas referentes ao primeiro e segundo estágio14 e um artigo referente ao terceiro estágio – não conseguimos mais produções escritas devido à ênfase da disciplina não ser a escrita de forma específica, mas a leitura.

De posse dos dados coletados, analisamos as condições de produções e as correções, realizadas nos textos dos alunos, que serão apresentadas nos tópicos a seguir.

Condições de produção de escrita e correções de escrita dos alunos recém-ingressos no curso de letras

l Condições de produção fornecidas aos alunos do curso de letras

As condições de produção fornecidas pela professora estão baseadas na perspectiva do ISD, numa linguagem social interativa, compreendendo o con-

14 Cada disciplina tem quatro meses de duração e, como forma de organização, elas se subdi-videm em três estágios, que correspondem a três avaliações realizadas pelos alunos.

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texto da produção a partir dos parâmetros essenciais para a escrita de um tex-to, a saber: o lugar social, a posição social do emissor, a posição social do receptor e o objetivo. Essas orientações foram identificadas tanto nas questões de provas, quanto nas demais atividades. O procedimento metodológico da professora em suas aulas inclui discussão teórica – apoiada em textos diversos –, seguida de exemplos retirados de fontes variadas, tais como textos jornalísticos, filmes, charges e outros. 

De acordo com Bronckart (1999), para que o texto esteja pautado em uma escrita social, sua orientação deve levar em conta o lugar social, a posição social do emissor, a posição social do receptor e o objetivo que se pretende, ou seja, deve ficar claro para o aluno o que escrever, para quem e como.

Apresentaremos neste capítulo de análise as orientações de atividades escritas, cuja produção nos pareceram esclarecedoras e norteadoras, para que os alunos produzissem seus textos de forma precisa, sabendo o que escrever, para quem escrever e como escrever. Vejamos os exemplos que se seguem15:

Exemplo 1 (trecho da prova do 1º estágio – 2008.1):

Observe os dois comportamentos descritos a seguir e responda:

I. Durante a atividade de leitura, Lara (sete anos, em fase de alfabetização) lê vagarosamente sílaba por sílaba até pronunciar a palavra toda e a partir de então, processar a sua significação através de um processamento analítico-sintético.

II. Durante a atividade de leitura, Pedro (estudante de violão, dezessete anos) olha rapidamente uma revista de música e faz um reconhecimento instantâneo do assunto que lhe interessa e através de pistas gráfico-visuais apreende rapidamente o todo do texto.

1) Qual a relação que você pode estabelecer entre esses comportamen-tos e o processamento de leitura realizado pelos sujeitos? (Considere: estra-tégias de leitura, sistemas de conhecimento, tipos de leitura, entre outros aspectos estudados em Leffa, Kleiman e Martins, por exemplo).

15 Para não sermos repetitivos, apresentaremos nesta primeira categoria apenas as condições de produção oferecidas pela professora, deixando para a categoria posterior a recepção dos alunos às orientações dadas pela professora, bem como a correção feita a suas produções. A partir dessa análise estaremos comprovando se suas respostas foram adequadas ao que pedia a questão.

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A professora, utilizando-se de recursos de exemplificações, como os dois depoimentos postos na questão acima (exemplo 1), conduz os alunos a refleti-rem acerca das concepções de leitura discutidas em sala. Para isso, solicita dos alunos que demonstrem conhecimento teórico aplicado a um caso prático. A questão exige também, dos alunos, a habilidade de identificar pontos teóricos que são pertinentes para a explicação de um caso prático, por exemplo: “Qual a relação que você pode estabelecer entre esses comportamentos e o processamento de leitura realizado pelos sujeitos? Considere: estratégias de leitura, sistemas de conhecimento, tipos de leitura, entre outros aspectos estudados em Leffa, Kleiman e Martins, por exemplo”.

Como se trata do gênero prova, a professora elaborou a questão visando à escrita escolar. Em se tratando de orientações de escrita, a professora con-segue situar o aluno na redação de seu texto, embora não esteja explícito no comando da questão, deixando claro o que vai escrever (defender com base em Leffa, Kleiman e Martins que relação está imbricada entre os comportamentos dos sujeitos e o processamento de leitura realizado); para quem escrever (professo-ra); e para quê escrever (obtenção de uma nota avaliativa, e, consequentemente, demonstrar à professora que sabe relacionar a teoria a um caso especifico).

Exemplo 2 (trecho da prova do 2º estágio – 2008.1)

3. Com base no texto Gay e Patético (Veja, 25 de junho de 2008), em anexo, res-ponda as questões que seguem: (4,0)a) A intenção do autor quanto à temática está posta no texto? Exemplifique. Que aspectos permitem tal identificação?b) Caracterize a eficácia e adequação desse texto segundo o grau de informatividade nele contido.c) A situação de produção desse artigo é conveniente em relação ao público-leitor previsto na revista? Justifique.

A questão acima, exemplo 2, conduz o aluno a refletir sobre as marcas de organicidade presentes em um texto – intencionalidade, eficácia, adequação e situ-acionalidade. Este conteúdo foi trabalhado em aulas anteriores das seguintes for-mas: 1) discussões teóricas embasadas no texto de Costa Val (2000); e 2) a partir da discussão do filme Os irmãos Grimm, em que toda a turma buscava identificar

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trechos que apresentassem as marcas de organicidade presentes no filme, identifi-car essas marcas no texto “Gay e Patético” (Veja, 25 de junho de 2008).

Desse modo, percebemos que a questão, exemplo 2, se configura de ma-neira adequada, uma vez que não foge ao que foi discutido em sala de aula – as marcas de organicidade de um texto – , o que demonstra um domínio do assunto no momento de sua escrita. Para tanto, a professora, nesta questão, indicou o que os alunos deveriam escrever: a) A intenção do autor quanto à te-mática está posta no texto? Exemplifique. Que aspectos permitem tal identificação? b) Caracterize a eficácia e adequação desse texto segundo o grau de informatividade nele contido. c) A situação de produção desse artigo é conveniente em relação ao pú-blico-leitor previsto na revista? Justifique. Novamente, apesar de não estar dito na questão, os alunos compreendem que seu destinatário será, no caso, a professo-ra; e terão que escrever, objetivando demonstrar conhecimentos no assunto em questão, a fim de lograrem uma boa nota, já que é uma escrita escolar – prova.

Outro ponto a ser considerado é que as questões foram elaboradas de forma precisa ao que se objetiva em cada item – a, b e c –, solicitando aos alunos que exemplifiquem o que responderam (item a) e se posicionem ante suas respostas (itens b e c). Assim como acontece com a questão do exemplo 1, trata-se de uma escrita com função escolar, ambas enquadradas nas condi-ções de produção do ISD, contemplando o lugar social, que neste caso seria o texto escrito no ambiente de sala de aula, já que é uma prova; o enunciador é o aluno, que terá como receptor do seu texto o professor da disciplina. Para o emissor, o objetivo a ser alcançado é provocar no seu destinatário o efeito espe-rado – em específico, atender às questões da prova de forma coerente.

Referente ainda ao 2º estágio, a professora propôs uma atividade com-plementar com a seguinte condição de produção:

Exemplo 3 (atividade complementar – 2º estágio – 2008.1)

Atividade de produção e leitura com base no texto de Costa e Val (2000)

Ao resumir o capítulo, coloque-se na posição de um estudioso que precisa sele-cionar as informações que vão figurar numa monografia cujo tópico central seja: O papel do leitor e os múltiplos aspectos do processamento da textualidade na diversidade textual (20 linhas, em média)

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Neste enunciado, as condições de produção acionadas pela docente fo-ram: o aluno escreveria um resumo para ela [docente], objetivando a capaci-dade de síntese do capítulo indicado oralmente [Repensando a textualidade de Costa e Val (2000)].

Vemos que a professora indica como o aluno vai escrever seu texto. Aponta o gênero: “Ao resumir”; depois diz o capítulo, oralmente, “Ao resumir o capítulo, coloque-se [...]”, não deixando claro no enunciado o capítulo soli-citado, talvez pelo fato de os alunos já saberem. No entanto, este é um fator que pesa na hora da produção, pois pode prejudicar o como escrever; e por último, por se tratar de um gênero no contexto acadêmico, o para quê resumir o capítulo mencionado consiste na obtenção de uma nota que complementará a prova do 2º estágio, porém coloca o aluno em uma situação de simulação, quando diz: coloque-se na posição de um estudioso que precisa selecionar as in-formações que vão figurar numa monografia: embora não seja real, o aluno irá ver-se como um outro sujeito que está escrevendo para outros: seu orientador, a banca e futuramente os leitores da monografia – ao menos é o que se pensa que os alunos vão compreender. Ainda não é uma escrita com plena função social, mas simula ser.

As condições de produção do enunciado do exemplo 3 são, predomi-nantemente, de caráter também de uma escrita escolar, com simulação de es-crita social; a circulação permanece no lugar social sala de aula, o destinatário continua sendo a professora e o objetivo final também permanece sendo uma nota. É uma questão pautada nas condições de produção do ISD por atender os parâmetros principais: o lugar social, o emissor, destinatário e o objetivo.

Para a solicitação do gênero, a ministrante explicou em que consiste a elaboração de um resumo, indicando sua estrutura (em parágrafo único) e funcionalidade (apresentação das principais ideias do texto de forma sucinta). Observem que no final do enunciado a professora indica quantas linhas ela quer que o texto tenha, o que compõe, também, a estrutura do resumo – 20 linhas, em média.

No terceiro estágio a docente propôs, ao invés de uma prova, a elabora-ção de um artigo. Antes de solicitar a escrita desse gênero, foi trabalhado com a turma o texto teórico de Antunes “Lutar com as palavras – coesão e coerência” (2005), bem como artigos de opinião de revistas, com temas atuais, como: “Gay e patético” (Veja, 25 de junho de 2008) e “A fé dos homofóbicos” (Veja,

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2 de julho de 2008), de André Petry. Com esses artigos, se discutiu o texto teórico de Antunes, buscando relacionar a teoria com a escrita dos artigos e a argumentação que os autores faziam em seus textos.

 Outro gênero que foi utilizado pela professora para apresentar a argu-mentatividade presente nos textos foi a carta do leitor. Foram retiradas várias cartas da revista Veja (9 de julho, 2008) e se solicitava que os alunos identifi-cassem em cada carta que tipo de opinião o leitor estava emitindo ou se não ti-nha argumentos. Vale salientar que sempre a docente pedia que justificassem.

Após as aulas sobre gêneros textuais – funcionalidade e objetivos –, to-mando como base Dell’Isola (2007) e outros, os alunos foram incumbidos de ler o livro de Antunes com a finalidade de produzir um artigo de opinião considerando o seguinte objetivo:

Retomar o aspecto teórico citado pela autora (páginas 176-177), em que destaca o funcionamento do texto como uma peça comunicativa que, além de contar com o material linguístico, conta também com a interação de outros fatores, a saber: contextual, extralinguístico, pragmático; enfim, fatores que colaboram para a continuidade, unidade e coerência.

(Fala da professora ministrante, orientando os alunos a escreverem o artigo)

Notemos que a professora, durante um período de aproximadamente um mês, trabalhou teorias acerca dos gêneros textuais, dando ênfase à produ-ção do gênero textual artigo de opinião, que seria a culminância da disciplina de PLPT I. Para tanto, foram dados os seguintes comandos para que os alunos elaborassem seus textos:

Exemplo 4 (enunciado para produção do artigo – 3º estágio – 2008.1)

Produza UM ARTIGO DE OPINIÃO, considerando:

l Objetivo: defender uma concepção de ensino de língua e de leitura que deve privilegiar diferentes fatores, não apenas o material linguístico; l Público-alvo: professores do ensino fundamental e médio e pais de alu-nos do ensino fundamental e médio; l Circulação: publicação em um site ou em uma revista impressa que atinja esse público-alvo.

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As orientações da professora para a elaboração do artigo, como podemos constatar no exemplo 3, baseiam-se na escrita como prática social, diferente-mente das demais propostas, que se circunscreviam em uma atividade escolar, em virtude do gênero ser prova. Verificamos isso quando do pedido para a elaboração de um artigo que considere o tema a ser tratado (defender uma concepção de ensino de língua e de leitura); o interlocutor (professores do ensino fundamental e médio e pais de alunos do ensino fundamental e médio) e o local de circulação (site ou uma revista impressa). As orientações para esse artigo podem motivar16 os alunos a escrever, pois suas escritas passam a ter um interlocutor real e um significado para eles, isto é, se publicados seus artigos, o sujeito esta-rá desempenhando um papel na sociedade de maneira significativa, obtendo, assim, prazer em escrever.

Mediante as orientações presentes nas elaborações dos enunciados, tanto da prova como do artigo, verificamos que os textos solicitados se fun-damentam em gêneros, que, para se constituírem como tais, apresentam características próprias, atendendo ao contexto em que circulam. Dessa for-ma, a professora, ao elaborar a prova e o artigo, o fez de forma que os alunos compreendessem quem era o interlocutor e que objetivo se pretendia em cada questão.

As respostas dos alunos17, no geral, para responderem as questões dos exemplos 1, 2 e 3, variaram conforme os critérios de níveis de escrita dos alunos, que selecionamos a partir das seguintes características: aluno profi-ciente (P), mediano (M) e iniciante (I). O aluno proficiente demonstrou, no gênero prova e no artigo, que compreendeu as instruções dadas pela professora, e suas produções foram realizadas de forma coerente com o tema proposto, estrutura e gênero. Para comprovar tal fato, em todas as suas pro-duções o aluno P obteve notas máximas, atendendo, assim, ao objetivo que cada questão pedia.

16 Dizemos “podem motivar”, pois, talvez, algum aluno não se sinta motivado e escreva por mera necessidade, já que se trata primeiro de uma escrita escolar e só depois social – publi-cada no blog.

17 Para não sermos repetitivos, colocaremos algumas de suas respostas no próximo tópico, onde analisaremos que tipo de correção a professora fez das respostas dadas pelos alunos. A partir dessa análise estaremos comprovando se suas respostas foram adequadas ao que pedia a questão.

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O aluno mediano, por sua vez, apresentou um avanço em suas produ-ções. No primeiro estágio, percebemos que ele, ou não compreendeu o que a professora solicitou na prova, ou não estava preparado para fazê-la, pois suas respostas demonstraram, de acordo com a pontuação atribuída pela profes-sora, não estar totalmente coerentes com o que foi pedido, obtendo, desse modo, notas abaixo da média, como 3.6 (a prova valia 6.0). Já na segunda prova o aluno correspondeu ao que a questão pedia de forma pertinente e conseguiu nota acima da média, 8.0. Na elaboração do artigo, mais uma vez, o aluno surpreendeu [comentário da professora]. Segundo ela este aluno me-lhorou muito em suas últimas produções. Fez uma boa produção e conseguiu tirar 4.5, quase a nota máxima, 5.0. Devido a seu progresso, o aluno não pre-cisou ser submetido ao exame final.

O aluno iniciante demonstrou em suas respostas uma escrita que não correspondia ao solicitado pela professora. Além dos problemas de ordem gra-matical, estrutural e outros (ver exemplo 11), este aluno parece não responder ao que é solicitado nos enunciados das questões. Em todas as provas e na elaboração do artigo, o aluno I apresentou dificuldades, principalmente em desenvolver suas ideias de forma pertinente ao que era pedido. Isso, talvez, não seja devido à falta de clareza presente nas questões, mas à incipiência do aluno em sua escrita acadêmica. Suas notas foram inferiores à média e ele foi submetido ao exame final.

l Correção das escritas dos alunos de letras

A professora da disciplina PLPT I, ao corrigir as produções escritas dos alunos recém-ingressos no curso de Letras, se utilizou das correções do tipo in-dicativa, classificatória e interativa-textual de maneira diferentes. As correções feitas das produções do aluno P foram predominantemente interativa-textual; já as correções dos alunos M e I foram, predominantemente, indicativa e clas-sificatória.

Percebemos que, ao corrigir as produções do aluno P, a professora se uti-lizou predominantemente da correção interativa-textual e classificatória. Foi o único aluno que recebeu mais elogios e sugestões de como melhorar suas produções. Vejamos alguns exemplos de suas produções:

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Exemplo 4 (resposta dada a uma questão da prova pelo aluno P)

Exemplo 5 (resposta dada a questão de uma prova do aluno P)

Exemplo 6 (trechos do artigo produzido pelo aluno P)

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Continuação do artigo do aluno P

Nas produções do aluno P, a professora faz correções do tipo textual-inte-rativa, deixando-lhe recados e elogiando suas colocações, como podemos ver nos exemplos 4, 5 e 6, quando o professor atribui os adjetivos “ótimo”, “parabéns”, “excelente resposta”, “[...] você vai longe. Até PLPT II”. Em se tratando ainda de correção textual-interativa, percebemo-la nos exemplos 4 e 6, nos quais a profes-sora coloca algumas observações com o intuito de encorajar o aluno a melhorar seu texto e continuar escrevendo “bem”. Por exemplo: “gostei da auto-avaliação. Isto revela uma postura crítica e amadurecida” e “neste último parágrafo ficaria perfeito se você destacasse os outros fatores também ou igualmente importantes na produção de sentido do texto [...] no geral, muito bem articulado[...]”.

Mediante essas correções observadas nas produções de P, constatamos o que Ruiz (2001) aponta acerca da correção textual-interativa, a qual apresenta uma maior aproximação do professor com o aluno, que se dá a partir de elogios e identificação de “erros”. Essa aproximação entre produtor (aluno) e leitor (pro-fessor) é percebida logo no título do artigo, quando a professora não entendeu o que o aluno P tinha colocado e deixou a pergunta: “EURECA, é isso?”, o aluno respondeu quando viu o comentário: “não, é EEEEECA”. Apenas no exemplo 6, no começo do artigo, notamos que a professora fez uma correção do tipo classificatória, deixando claro para o aluno P, que tipo de “erro” foi cometido.

Com as produções de M, o professor se detém mais nos aspectos gra-maticais, realizando mais uma correção, no geral, indicativa. Em alguns mo-mentos apresenta correções classificatórias, fazendo comentários ao texto do aluno, sem apresentar estímulos maiores para o aluno desenvolver melhor sua

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habilidade de escrita. Como afirma Serafini (1998), a correção deve considerar também a capacidade do aluno e é relevante que o estimule a melhorar seu texto. Seguem alguns exemplos de produções do aluno M.

Exemplo 7 (aluno M)

Exemplo 8 (aluno M)

Exemplo 9 (aluno M)

Exemplo 10 (aluno M)

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Nos exemplos 7, 8 e, principalmente, o 10, constata-se uma correção totalmente indicativa. Não é apontado nas produções de M que tipo de “erro” foi cometido, há apenas rabiscos em vermelho. Isto é o que Ruiz (1998) consi-dera uma correção que apenas busca os “erros”, mas não se detém em analisar o sentido do texto, não o considerando como uma prática que ainda está sendo desenvolvida pelo aluno.

Os comentários colocados nas produções do aluno M não visaram es-timulá-lo em sua escrita. O máximo que foi feito de elogio se restringiu ao “ok” do exemplo 7. No exemplo 9, o aluno M deixa uma nota de esclareci-mento para a professora; no entanto a resposta dada ao aluno não esclarece sua inquietação. Para respondê-lo, ela diz o seguinte: “vejamos o objetivo da atividade. Retomarei em sala”, ou seja, não houve interação com o aluno por meio do bilhete, o esclarecimento viria depois, em conjunto com toda turma, e não sabemos se realmente houve esclarecimento. Isso revela uma postura excludente, pois, com o aluno P, a professora interage por meio de recadinhos, mas, com o aluno M, não houve essa interação. Além disso, ela não aponta nas produções de M que tipo de erro ocorreu, como no caso das correções de P, apenas faz riscos vermelhos, sem situar o aluno nos seus equívocos, como podemos perceber nos exemplos 7, 8 e 10.

Nas produções do aluno iniciante, a professora apresenta uma correção semelhante à de M – indicativa e classificatória. Como a escrita de I é mais problemática, a professora apresentou mais comentários com relação às suas respostas, se compararmos com as correções das produções de M, indagando, geralmente, o aluno I de suas colocações e colocando comentários seus, a fim de que ele reflita sobre sua produção. Alguns trechos das produções de I:

Exemplo 11 (aluno i)

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Nessa produção do aluno I, vemos que a correção realizada pela profes-sora foi, ora indicativa, ora classificatória. Na indicativa, ela, assim como na correção das produções de M, apenas aponta o “erro”, mas não deixa claro para o aluno qual o tipo de erro. Percebemos os riscos vermelhos circulando o local em que se encontra o problema, mas, se o aluno não domina o código linguístico, ele dificilmente saberá como proceder para melhorar sua produ-ção. No que concerne à correção classificatória, notamos, a partir do exemplo 11, que a professora, à medida em que vai corrigindo o texto do aluno, coloca comentários, os quais, por sua vez, ajudam o aluno a perceber onde errou, e, consequentemente, a melhorar sua produção.

Contudo, notamos que os comentários do exemplo 11 foram de ordem meramente semântica, não se atendo às questões gramaticais. Segundo Ruiz (2001), a correção é eficaz quando é apontado o “erro” de forma precisa, e apresentadas sugestões que venham ajudar os alunos a melhorar suas produ-ções. Embora o professor faça uma correção classificatória dando sugestões para o aluno I, ele peca por não fazer uma correção indicativa de forma mais clara, a fim de que o aluno não tenha dúvidas sobre seus erros e na hora de refazer seu texto não tenha dificuldades.

Considerações Finais

Como considerações finais, apontamos para um ensino de escrita que privilegie as condições de produção de maneira precisa, a fim de que os alunos saibam o que escrever, como escrever e para quem escrever, produzindo, dessa forma, bons textos, adequados ao contexto social comunicativo.

Quanto às práticas de correções utilizadas, percebemos que são as do tipo classificatória e textual-interativa as mais eficazes, uma vez que deixam claro para o aluno o tipo de “erro” cometido e como fazerem para aperfeiçoa-rem seus textos. São correções que requerem do professor mais tempo, porém são as mais significativas para os alunos. Esse tipo de correção deve ser apli-cado de igual modo a todos, principalmente aos alunos que apresentam mais dificuldades em suas escritas.

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ABSTRACT

 Our work aims to investigate how Freshmen in the Lan-guage Course of a public university of Paraíba produce their texts, considering the conditions of production (to whom you write, what you write and how to write), and , how their productions are corrected by the teacher. As data analysis we have different genres of texts, written in diverse situations.

 KEyWORDS: Textual production, condition of pro-duction, students-teachers.

Recebido: 30/04/2010Aprovado: 09/06/2010