Profissionais criativos

Embed Size (px)

Citation preview

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    1/25

    Sandro Ruduit Garcia I

    PROFISSIONAIS CRIATIVOS EM CINCIAS E ARTESNA CIDADE DE PORTO ALEGRE1

    A expanso mundial de uma nova economia baseada no conhecimento e na

    criatividade instiga o questionamento sobre as relaes entre criatividade e

    mercado (Comisso Europeia, 2010; UNCTAD, 2008, 2010; Unesco, 2013). As an-

    tigas e influentes formulaes sobre as indstrias culturais denunciaram, com

    base na observao de sociedades industriais de massa, a impossibilidade

    da criao autntica sob as condies alienantes do mercado e da tecnologia

    (Adorno & Horkheimer, 1985). O processo de acumulao capitalista mercanti-

    lizaria a cincia e a arte, corrompendo seus propsitos crticos. Em contraste,

    os conceitos derivados das formulaes sobre indstrias criativas (economia

    criativa, classe criativa, cidade criativa) destacam a recente centralidade ad-

    quirida pela criatividade no processo econmico, em razo de mudanas na

    tecnologia, no direito e na sociedade (Caves, 2003; Florida, 2011; Howkins, 2013;

    Landry, 2011). Neste caso, as instituies e regras da economia atual propicia-

    riam mais liberdades e recursos para a expresso de talentos e habilidades de

    agentes individuais. Em alternativa, a proposta deste artigo tentar oferecer

    uma compreenso sobre a complexidade do processo de criao de artefatos e

    de sua transformao em bens e servios com valor mercantil, indagando: Que

    tipos de interesses e de interaes sociais sustentam as atividades de criao

    de profissionais das cincias e das artes?O estudo utiliza-se da abordagem da sociologia econmica, especial-

    mente a perspectiva compreensiva e multidimensional de Max Weber (2003;

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.0

    3:857882,dezembro,2015

    I Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Depar tamento de

    Sociologia, Brasil

    [email protected]

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    2/25

    858

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    2004; 2006). Esse approachpode oportunizar um novo ngulo de observao

    dessa realidade, ainda pouco investigada pela sociologia como fenmeno eco-nmico. Estudos recentes em sociologia econmica tm apontado para os ga-

    nhos cientficos em se buscar uma abordagem mais processual e relacional das

    atividades de criao que se traduzem em inovaes nos mercados. Segundo

    Swedberg (2006), os estudos sobre indstrias criativas poderiam encontrar na

    sociologia clssica elementos para pensar a integrao entre economia, arte

    e empreendedorismo, identificando os contornos de um empreendedorismo

    cultural. Outros (Htter et al., 2010) chamam a ateno para o fato de que a

    criao da novidade, em geral, e da inovao, em particular, dependeria da

    combinao entre cognio, condies tcnicas e constelaes culturais, sendo

    mais adequadamente concebida como processo sociomaterial e pela cogniodistribuda. O processo criativo requereria, na contribuio de Ramella (2013),

    a confluncia de diversos fatores, como a inteligncia e motivao individual,

    a dinmica empresarial e setorial, os recursos e ativos territoriais, e o enrai-

    zamento social.

    Neste artigo, argumento, em resumo, que as atividades de criao dos

    agentes dependem de uma complexa combinao entre diferentes interesses

    e interaes sociais, exprimindo-se sempre de forma contextual. Os profis-

    sionais criativos em cincias e artes tendem a se interessar no apenas pela

    busca de bem-estar material, mas tambm pelo reconhecimento pessoal e pelosentido tico do que fazem, criando artefatos com valor econmico e com a

    atribuio de significado social, aspirando conciliao entre crescimento na

    carreira e qualidade de vida, e construindo trajetrias e redes de interaes

    diversificadas que lhes permitem acessar recursos relevantes. Neste sentido,

    a criatividade no seria uma substncia contida em mentes isoladas no labo-

    ratrio ou no ateli, nem o resultado estrito da racionalidade econmica. Esse

    tipo de atividade amparar-se-ia nas possibilidades de uma nova materialidade

    tecnolgica e na legitimao de ideais, como a sustentabilidade e a qualidade

    de vida, demarcando lgicas de ao distintas do mundo industrial.

    O pressuposto da anlise que a ao socioeconmica seria, predo-

    minantemente, movida por interesses materiais e ideais, orientando-se para

    a gerao de utilidades (bens e servios) e para o comportamento de outros

    agentes. O costume e as emoes podem, secundariamente, constituir motivos

    para a ao socioeconmica. Nesse sentido, os fenmenos econmicos seriam,

    complexa e probabilisticamente,condicionados: a) por variadas combinaes

    (e pesos) entre interesses materiais (racionalidade formal/ instrumental) e

    interesses ideais (racionalidade substantiva/de valor); b) por costumes (mo-

    do tradicional) e emoes (modo afetivo); e c) por sentidos atribudos pelos

    agentes nas interaes (passadas, presentes e como expectativas futuras) comoutros agentes (Weber, 2004). Esse pressuposto desenvolvido de forma inte-

    grada com formulaes mais recentes em sociologia econmica em especial,

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    3/25

    859

    artigo | sandro ruduit garcia

    o enfoque relacional da chamada nova sociologia econmica no que se refere

    s dimenses: a) das combinaes entre interesses diversos dos agentes eco-nmicos; e b) das atividades econmicas e arranjos de interao dos agentes.

    A discusso conduzida com base na experincia de profissionais das

    cincias e das artes na cidade de Porto Alegre. A cidade tem sido destacada

    como polo de criatividade, detendo duas importantes universidades do pa-

    s, e hospedando diferentes incubadoras e parques criativos e tecnolgicos.

    Agentes empresariais, educacionais e governamentais tm se esforado para

    transformar a cidade em referncia em tecnologias da informao e comuni-

    cao (TICs). Ao mesmo tempo, pode-se constatar importantes iniciativas de

    criao de conhecimentos e inovao requeridos para a explorao pelo pas

    dos recursos energticos relacionados ao pr-sal. Ademais, a cidade reconhe-cida como um dos polos culturais do Mercosul, e uma das sedes da Copa do

    Mundo de Futebol de 2014 no Brasil, ensejando movimentaes nas indstrias

    de comunicao, design, arquitetura, entretenimento e gastronomia. Tudo isso

    indica a existncia de curiosas dinmicas econmicas em torno de pequenos

    empreendimentos e universidades, consultorias e agncias culturais, consti-

    tuio e crescimento de empresas de tecnologia, envolvendo profissionais j

    consolidados e ingressantes nas suas carreiras em cincias e artes.

    O objetivo central do artigo , portanto, compreender e analisar con-

    dicionantes das atividades de criao de profissionais em cincias e artes nacidade de Porto Alegre, considerando-se, como dimenses de anlise, as dife-

    rentes combinaes de interesses que os movem e os arranjos e interaes

    estabelecidas pelos mesmos nesse processo (alm das prprias atividades de

    criao). O processo de amostragem orientou-se pela representatividade te-

    rica dos dados empricos, com a inteno de alargar a amplitude de interesses

    e de arranjos de interaes dos agentes. Foram acessados profissionais em ci-

    ncias e artes na cidade que se implicaram na gerao de artefatos singulares

    transacionados em mercados de produtos. A partir de investigao exploratria

    na Internet, contataram-se casos de interesse, privilegiando-se aqueles que

    atuassem em universidades centro de criatividade e trocas de conhecimentos

    entre profissionais de excelncia e, ao mesmo tempo, prestassem servios

    para empresas, assim como em diferentes tipos de pequenos empreendimen-

    tos, observando-se significativos e variados segmentos de atuao e momentos

    na carreira.2

    O corpus de pesquisa alcanou certa diversidade, envolvendo dados so-

    bre a experincia de doze profissionais criativos em diferentes momentos da

    carreira: seis atuantes em universidades (no caso, a Universidade Federal do

    Rio Grande do Sul UFRGS), sendo trs seniores e trs juniores; e seis atuantes

    em atelis, agncias, estdios, editora e start up, sendo tambm trs seniorese trs juniores. Consideram-se seniores os profissionais cuja formao e ex-

    perincia se acham consolidadas; juniores so os profissionais que aspiram

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    4/25

    860

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    complementao na sua formao e experincia na rea de atuao. Os entre-

    vistados pertencem a distintas profisses: quatro pesquisadores em geologia,trs designers, um arteso, um msico, um profissional da publicidade, um

    profissional da literatura e um arquiteto. A pesquisa de campo foi realizada

    entre abril e novembro de 2013, mediante entrevistas individuais semiestru-

    turadas em profundidade que se pautaram pelas dimenses de anlise acima

    indicadas. As entrevistas ocorreram nos locais de atuao dos profissionais,

    sendo gravadas, transcritas e codificadas para anlise.

    Seguem-se exposio de aspectos relevantes da literatura especializada;

    caracterizao dos profissionais e produtos criativos investigados; e anlise,

    em diferentes sees, dos interesses dos profissionais (cientistas e artistas),

    e dos arranjos e interaes em que os entrevistados se acham envolvidos noprocesso de criao.

    CONTRIBUIES TERICAS

    O fenmeno econmico em discusso neste estudo se traduz nas atividades

    de criao de produtos (bens e servios) pelos profissionais de setores liga-

    dos economia baseada no conhecimento e na criatividade, tentando melhor

    conhecer aspectos de alguns dos seus condicionantes. Esse debate ganhou

    mpeto em torno do que se tem chamado de economia criativa. Sem entrar emdetalhes sobre a construo, origens e crticas ao conceito, 3vale mencionar,

    sucintamente, algumas das principais contribuies ao mesmo, sublinhando

    a sua ntima relao com a nova economia e suas diferenas em relao ao

    mundo industrial de massa (Flew & Cunningham, 2010; Pine & Gilmore, 1998).

    A economia criativa consistiria, para Howkins (2013), em transaes mer-

    cantis de produtos considerados criativos, em razo de sua novidade ou origina-

    lidade. A fonte de riqueza seria a criao de ideias e contedos simblicos trans-

    formados em produtos no mercado, destacando que a criatividade floresceria,

    igualmente, nas cincias e nas artes. Tais produtos (bens e servios) tenderiam

    a ser protegidos por direitos de propriedade intelectual (patentes, marcas, dese-

    nhos e, em especial, direitos autorais).4Florida (2011) identifica a constituio de

    uma classe criativa, no contexto da economia e sociedade atuais. Essa tenderia

    a priorizar a criatividade, a individualidade e o mrito, demarcando um ethos

    distinto do mundo industrial. O profissional criativo seria aquele propenso a se

    envolver na concepo de produtos criativos, sendo, hoje, o principal fator de

    atrao de empresas de alta tecnologia e, com isso, de promoo do crescimento

    econmico de uma regio.5O estudo em tela refere-se estritamente ao ncleo

    da economia criativa (atividades de concepo de artefatos).

    Os processos de criao seriam expressos em diferentes fases como adescoberta/construo de um problema, a anlise da situao e identificao

    de alternativas e o desenvolvimento de soluo original traduzindo-se em

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    5/25

    861

    artigo | sandro ruduit garcia

    termos de unicidade (ideia sem precedentes) ou de novidade (ideia com novo

    carter pela combinao de ideias j existentes) (Amabile, 1998; Ramella, 2013).Essas atividades podem resultar em artefatos que proporcionam realizao

    pessoal (conceber e dar forma a um objeto), ou gerar, alm disso, produtos

    associados a um mercado e a um aparato legal (inovao). A criatividade por si

    s no teria valor econmico, dependendo de diretrizes sobre leis e contratos,

    de convenes e normas sobre razoabilidade dos negcios e de existncia de

    mercados (Howkins, 2013). Em qualquer caso, as atividades no processo de

    criao dependeriam da combinao de habilidades dos agentes (estilos cog-

    nitivos, conhecimentos, motivao) e condies ambientais (tecnologias, nor-

    mas e convenes, reconhecimento) (Amabile, 1998). Mais do que isso, pode-se

    conjecturar sobre a criatividade como um processo sociomaterial e distribudo,envolvendo um conjunto de relaes heterogneas que, no caso de bens e ser-

    vios, perpassam o mercado (Callon, 1986; Htter et al., 2010).

    Como antes mencionado, entende-se que o curso da ao socioecon-

    mica seria movido por interesses plurais, correspondendo a um contexto de

    significados (Weber, 2004). Os agentes sociais no realizariam atos gratuitos

    ou desinteressados, sustentando-se sempre por uma complexa lgica das pr-

    ticas sociais: interesse estar em, participar, admitir, portanto, que o jogo

    merece ser jogado e que os alvos engendrados no e pelo fato de jogar mere-

    cem ser perseguidos (Bourdieu, 1996: 139). Os interesses seriam as foras quemovem a conduta dos agentes sociais, justificando-se a relevncia sociolgica

    em tentar compreend-los e situ-los em contextos de ao (Swedberg, 2005),

    pois os interesses so sempre socialmente construdos e podem apenas se

    concretizar tipicamente por meio de relaes sociais (Swedberg, 2004: 26).

    Quanto aos profissionais criativos, especialistas tm discutido o pe-

    so que estes agentes atribuem s oportunidades econmicas e ao estilo de

    vida, na escolha de um lugar para viver e trabalhar, constatando, em maior

    ou menor medida, a relevncia de atributos no econmicos nas suas esco-

    lhas sobre a conduo das carreiras (Eikhof & Haunschild, 2006; Florida, 2011;

    Golgher, 2011; Tremblay & Darchen, 2011). Bendassolli e Borges-Andrade (2011)

    abordam, com base numa amostra de profissionais das artes e da cultura, os

    significados do trabalho para esse tipo de profissional no Estado de So Paulo.

    Constatam que esses indivduos atribuem grande importncia ao trabalho em

    suas vidas, sugerindo forte comprometimento afetivo dos mesmos com suas

    carreiras. Isso se refletiria, sob certo aspecto, nos fatores associados a um tra-

    balho que tenha significado para esses indivduos, pela ordem, a possibilidade

    de aprender e se desenvolver pelo trabalho, sua utilidade social, a oportuni-

    dade de identificao e de expresso por meio do trabalho, autonomia, boas

    relaes interpessoais e respeito s questes ticas. Ademais, pesquisas recen-tes (Novy & Colomb, 2013) apontam envolvimentos polticos de profissionais

    criativos em aes coletivas, constatando, no contexto das cidades de Berlim

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    6/25

    862

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    e Hamburgo, crescente participao de membros da classe criativa (no caso,

    produtores culturais e trabalhadores artisticamente criativos) em movimentossociais urbanos, tornando-se foras sociopolticas capazes de influir no curso

    de polticas de desenvolvimento no mbito local. Portanto, tais estudos aju-

    dam a pensar sobre os interesses desses profissionais, extrapolando a estrita

    racionalidade econmica.

    Como antes indicado, o estudo concebe o curso da ao socioeconmica

    no apenas como sendo movido por combinaes de interesses materiais e

    ideais, mas tambm orientado, de forma relacional, para o comportamento de

    outros agentes, tornando-se crucial a compreenso do sentido das interaes

    do agente com o contexto social. Afirma Ramella: A anlise da atividade, ao

    contrrio, necessita de uma perspectiva integrada, capaz de perceber a inven-o como o resultado de um processo complexo de construo social (Ramella,

    2013: 79, traduo minha). Caberia explorar o papel de processos de sociali-

    zao (relaes passadas) e suas implicaes na construo de disposies e

    interesses nos indivduos, podendo favorecer ou dificultar o desempenho em

    atividades de criao (Lahire, 2006). Isso leva a indagar sobre a relevncia de

    trajetrias educacionais e profissionais como condicionantes de atividades de

    criao de artefatos/utilidades.

    Sabe-se que os profissionais criativos teriam melhor desempenho no

    contexto de ampla disponibilidade de tecnologias da informao, de diversi-dade cognitiva e de conhecimentos, e de organizaes flexveis que lhes possi-

    bilitem liberdade e autonomia para o trabalho de inveno/inovao (relaes

    presentes) (Powell & Snellman, 2004). Empresas com procedimentos rgidos

    e burocratizados, com excessiva especializao de tarefas e com comandos

    autoritrios, representariam condies desfavorveis criatividade, ao passo

    que empresas mais flexveis, com reconhecimento e estmulo s novas ideias

    e diferentes tipos sociais, e com liberdade e autonomia de ao, tenderiam a

    gerar condies mais propcias ao processo de criao (Alencar, 1998; Florida,

    2011). As pequenas empresas tenderiam a reunir essas condies favorveis

    mais facilmente do que as grandes organizaes (Almeida, 2012; Howkins,

    2013; Reis, 2008).

    Ademais, o processo de criao apoiar-se-ia em redes de colaborao

    diversas, que extrapolam o empreendimento em que se d forma ao produto,

    falando-se em novos modelos de negcios para sustentar o processo de criao

    e comercializao desse tipo de produtos (Almeida, 2012). Esses modelos de

    negcios em setores da economia criativa estariam envolvendo no apenas

    esquemas de financiamento amparados em capital de risco, mas tambm no-

    vas estratgias de distribuio de resultados financeiros em face da gesto e

    distribuio de direitos de propriedade intelectual (Barrier, 2011; Cunningham,2008). Outros analistas (Comunian, 2012; Glaeser, 2011) chamam a ateno

    para o papel desempenhado por redes de interao e sociabilidade urbana na

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    7/25

    863

    artigo | sandro ruduit garcia

    construo e expresso de diferentes e novos estilos de vida e de culturas de

    vanguarda. A literatura aponta maiores chances nas cidades para interaoarte-cincia-negcios, para oferta de lazer e cultura e para disponibilidade

    de infraestrutura de comunicao e tecnolgica, estimulando a formulao

    e combinao de ideias e produtos (Eikhof & Haunschild, 2006; Markusen &

    Gadwa, 2010).

    Essas consideraes brevemente referidas acima consistem em balizas e

    conjecturas para a anlise dos dados empricos sobre os interesses e interaes

    sociais dos profissionais criativos em Porto Alegre feita a seguir.

    PROFISSIONAIS E PRODUTOS CRIATIVOS

    O perfil dos profissionais entrevistados envolve atuao em setores dinmi-

    cos da nova economia baseada no conhecimento e na criatividade, na cidade

    de Porto Alegre (arquitetura, publicidade/designde msica, mercado editorial,

    designgrfico e digital, designde moda, pesquisa e desenvolvimento, e arte-

    sanato). Esses profissionais tm alto grau de escolaridade comparativamen-

    te ao conjunto da economia e do mercado de trabalho: foram entrevistados

    trs doutores (Geocincias, Paleoclimatologia e Informtica na Educao

    dois realizaram estgio de ps-doutorado), dois doutorandos (Engenharia da

    Produo e Geocincias), dois mestrandos (Msica e Geocincias), dois gradu-ados (Arquitetura e Jornalismo) e trs profissionais com graduao incompleta

    (um em Nutrio e dois em Publicidade e Propaganda). Trata-se de quatro

    entrevistados do sexo feminino e de oito do sexo masculino, sendo seis em

    fase de ascenso/consolidao na carreira (jnior) e seis j consolidados e

    com ampla experincia profissional nas suas reas de atuao (snior). Como

    supramencionado, os entrevistados so vinculados a universidades (seis pro-

    fissionais) e a atelis, estdios, agncias e start ups (seis profissionais), na con-

    dio de servidores pblicos (quatro profissionais), empreendedores (quatro

    profissionais), autnomos (trs profissionais) e assalariados (um profissional).

    Todos trabalham na cidade de Porto Alegre, residindo predominantemente

    nesta capital (apenas um entrevistado tem residncia na cidade vizinha de

    Canoas, na Regio Metropolitana de Porto Alegre). Quase todos os profissionais

    entrevistados detm algum tipo de direito de propriedade intelectual sobre

    artefatos produzidos (direitos autorais, patentes, marcas e desenho industrial):

    excepcionalmente, o arteso no detm registro de propriedade intelectual. As

    caractersticas e o perfil dos entrevistados so esquematizados no Quadro 1.

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    8/25

    864

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    Entrevistados Setor Vnculo Organizao

    Estgio da

    Carreira

    Propriedade

    Intelectual

    Entrevistado 1

    (Masculino; Doutorando) Arquitetura

    Funcionrio

    Pblico Universidade Jnior

    Direitos autorais,

    projetos de edificaes

    e artigos

    Entrevistado 2

    (Masculino; Graduao)

    incompleta) Publicidade Empreendedor

    Agncia de

    publicidade Snior

    Direitos autorais, peas

    publicitrias

    Entrevistado 3

    (Masculino; Graduao)

    Editorial/

    Literatura Empreendedor Editora Snior Livros

    Entrevistado 4

    (Masculino; Graduao) Grfico Empreendedor Estdio Snior Logomarca

    Entrevistado 5

    (Feminino; Doutoranda) P&D Autnoma

    Universidade/

    empresa Jnior

    Direitos autorais

    artigos

    Entrevistado 6

    (Feminino; Mestranda) P&D Autnoma

    Universidade/

    empresa Jnior

    Direitos autorais

    artigos

    Entrevistado 7

    (Feminino; Doutorado) Moda

    Funcionria

    Pblica

    Universidade/

    Ateli Snior

    Direitos autorais,

    colees e artigos

    Entrevistado 8

    (Masculino; Graduao

    incompleta) Artesanato Autnomo Ateli Jnior NA

    Entrevistado 9

    (Masculino; Mestrando) Publicidade

    Empregado

    Assalariado

    Agncia

    publicidade Jnior

    Direitos peas

    publicitrias

    Entrevistado 10

    (Masculino; Graduaoincompleta) Grfico Empreendedor Jnior Sinalizao urbana

    Entrevistado 11

    (Feminino; Doutorado) P&D

    Funcionria

    Pblica

    Universidade/

    empresa Snior Artigos

    Entrevistado 12

    (Masculino; Doutorado) P&D

    Funcionrio

    Pblico Universidade Snior Artigos

    Fonte: Pesquisa de campo, Porto Alegre, abril-novembro de 2013.

    Quadro 1

    Caractersticas dos profissionais entrevistados

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    9/25

    865

    artigo | sandro ruduit garcia

    Os profissionais entrevistados criam, com apoio em TIC, diferentes tipos

    de produtos cuja novidade ou singularidade tende, nas convenes e diretrizesatuais sobre a transformao da criatividade em produto, a se traduzir em

    direitos de propriedade intelectual (Howkins, 2013). Cabe apresentar, breve-

    mente, tais produtos. Entre os seniores em universidades, os profissionais da

    geologia desenvolvem, em seus respectivos laboratrios/parcerias/projetos,

    modelos sobre as condies das rochas que geraram e das que armazenam

    petrleo na camada do pr-sal da costa brasileira, resultando na produo de

    conhecimentos e de tecnologias mais adequados ao acesso e ao processamen-

    to da commodity(entrevistados 11 e 12). O profissional do designde moda cria,

    entre a universidade e o ateli, peas e colees de vesturio voltadas para a

    singularidade do artefato, predominando a concepo e confeco de peasnicas que no se replicam (entrevistado 7).

    O profissional da publicidade desenvolve o som de campanhas/peas

    de propaganda para televiso e rdio, requerendo a formulao do conceito

    do produto com base em linguagens de comunicao ora de mbito nacional,

    ora de mbito regional (em menor medida, o profissional tambm desenvolve

    produtos para o mercado internacional: Espanha e Mercosul) (entrevistado 2).

    O profissional da literatura escreve, predominantemente, romances, crnicas e

    narrativas histricas. Ademais, trabalha na editorao/publicao/divulgao/

    circulao de obras de terceiros (entrevistado 3). O profissional do designgrficoe digital concebe artefatos de comunicao visual tais como logomarcas, emba-

    lagens, folhetos, encartes e sinalizao/comunicao de lojas (entrevistado 4).

    Os entrevistados juniores (em universidades e em empresas) envol-

    vem-se, igualmente, com artefatos que expressam novidade ou singularidade.

    Os profissionais da geologia tm realizado estudos e investigaes sobre ma-

    peamento ssmico e sobre condies do paleoclima, relacionados s rochas que

    armazenam petrleo na camada do pr-sal, permitindo acesso mais preciso ao

    recurso natural (entrevistados 5 e 6). O profissional da rea de arquitetura tem

    trabalhado na criao de softwarespara modelagem grfica de edificaes e na

    concepo de modelos e softwaresaplicados circulao e mobilidade urbana

    (entrevistado 1). O profissional do artesanato desenvolveu, no ateli familiar,

    uma tcnica de tratamento e recomposio de papel que se combina com a

    prospeco de formas, imagens e fotografias pelas tecnologias da informao,

    produzindo artefatos de uso e decorao domstica e comercial (por exemplo,

    porta-copos) (entrevistado 8). O profissional da msica compe, arranja e grava

    melodias para peas publicitrias em rdio e televiso (entrevistado 9). O pro-

    fissional do designgrfico cria marcas e sistemas de sinalizao urbana, como

    a indicao de roteiros tursticos e de transporte pblico (entrevistado 10).

    Cabe referir um achado de pesquisa no que tange percepo dos en-trevistados sobre direitos de propriedade intelectual. Estes so considerados

    relevantes entre profissionais da publicidade e literatura (entrevistados 2, 3 e

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    10/25

    866

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    9). Porm, parte dos profissionais entrevistados parece atribuir relativamente

    pouca importncia aos mesmos (em especial, no design: entrevistados 1, 4, 8e 10), percebendo-os, inclusive, em alguns casos, como uma dificuldade no

    processo de circulao de conhecimentos e produtos (em especial, pesquisa-

    dores: entrevistados 11 e 12). Para um dos profissionais, seria um equvoco,

    hoje, focar a estratgia empresarial na obteno de patentes em razo de que

    a propriedade intelectual deixou de ser um grande vetor da economia nos

    setores de rpida inovao (como no caso do design). Justifica sua concluso

    pela percepo de que o que vale hoje velocidade e abrangncia, ganhar

    adeso do usurio e ser rpido (entrevistado 10). Cumpre notar as diferen-

    as percebidas por alguns profissionais sobre o comportamento de empresas

    nacionais e estrangeiras usurias dos conhecimentos em relao aos direitosautorais: comum que empresas parceiras nacionais avoquem direitos e im-

    peam a divulgao e caracterizao de resultados de pesquisa, ao passo que

    uma empresa parceira estrangeira no reivindica direitos sobre a produo

    intelectual, estimulando a publicao de resultados pelos pesquisadores (en-

    trevistados 11 e 12).

    Assim, parte dos entrevistados parece, paradoxalmente, cumprir os re-

    quisitos legais sobre direitos de propriedade intelectual, em cada caso, mais

    como uma imposio da legislao do que como estratgia para integrar-se ou

    para auferir lucro nos mercados. Caberia pensar se tais achados exprimiriama dificuldade dos agentes em manejar os condicionantes legais e burocrticos

    da propriedade intelectual no pas (Reis, 2012), ou expressariam uma tendncia

    global entre certos setores econmicos e grupos sociais a eles relacionados

    de conceber o conhecimento e seus artefatos como bem pblico global que se

    difunde pela lgica de compartilhamento proposta na Internet (Kaul, Grunberg

    & Stern, 2012).

    Portanto, os profissionais das cincias e das artes selecionados para

    a pesquisa tm envolvimento com atividades baseadas em conhecimento e

    criatividade na cidade de Porto Alegre, concebendo novos artefatos (bens e

    servios) e detendo, via de regra, algum tipo de direito de propriedade inte-

    lectual. De maneira geral, as atividades de criao dos artefatos, sucintamente

    caracterizados acima, requer uma complexa amarrao entre investigao e

    concepo, interao com materiais e suas surpresas, e manuseio de TIC e suas

    possibilidades. Segundo os depoimentos colhidos nas entrevistas, o projeto e a

    concepo dos artefatos dependem de um ativo trabalho de pesquisa sobre re-

    cursos/insumos envolvidos e sobre necessidades/expectativas do usurio que

    se traduz seja em prticas de laboratrio (entrevistados 1, 5, 6, 7, 11 e 12), seja

    em estudos sobre linguagens/orientaes culturais e tradies comunitrias

    (entrevistados 2, 3, 8 e 9), seja, ainda, em diagnstico de demandas e tendn-cias de mercado (entrevistados 4 e 10). Cabe, pois, saber sobre as dimenses

    de anlise propostas na investigao.

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    11/25

    867

    artigo | sandro ruduit garcia

    INTERESSES PROFISSIONAIS

    Os interesses que movem os profissionais das cincias e das artes entrevista-

    dos podem ser expressos pelo exame dos significados atribudos aos artefatos

    que resultam das atividades de criao, das avaliaes que so feitas sobre o

    mercado e sua insero na atividade econmica e sobre o local de moradia, e

    do grau de satisfao com trabalho e carreira.

    No que se refere ao significado do produto das atividades de criao,

    os entrevistados tendem a revelar uma dupla preocupao em relao ao pro-

    cesso de prospeco, concepo e consecuo dos artefatos, combinando-se a

    avaliao sobre a viabilidade e retorno financeiro do bem ou servio, e a identi-

    ficao de acrscimos de conhecimentos e experincias relevantes na sua car-reira e de significado social dos artefatos (como sustentabilidade ambiental,

    qualidade de vida, novos conhecimentos e tecnologias, crtica e sensibilizao

    pblica sobre temas considerados importantes na agenda da comunidade ou

    do pas). Isso se aproxima das constataes propostas em estudos recentes

    (Bendassolli & Borges-Andrade, 2011; Florida, 2011; Golgher, 2011).

    Entre os profissionais seniores, isso se expressa de diferentes formas.

    Os cientistas que atuam na universidade destacam no apenas o prazer da

    descoberta e da identificao do dado novo, mas tambm a importncia da

    integrao dos conhecimentos que esto produzindo e dos recursos humanosque esto formando ao desenvolvimento da cadeia do petrleo e gs no pas

    (entrevistados 11 e 12). O profissional snior do designde moda que tambm

    atua na universidade busca imprimir conceitos e valores crticos ao consumis-

    mo nas suas atividades de criao (preo justo, sustentabilidade e contracul-

    tura de consumo). O entrevistado refere, por exemplo, o desenvolvimento de

    uma parceria entre seu ateli e o banco do vesturio (da cidade de Caxias do

    Sul, no interior do estado). O banco do vesturio consiste em uma parceria en-

    tre indstria txtil e artesos daquela cidade, fornecendo resduos de tecidos

    ao ateli de Porto Alegre que retribui com a prestao de servios de consul-

    toria e de treinamento de artesos envolvidos. Esses so, sob outra forma, os

    casos do publicitrio e do designer grfico e digital, que buscam, nos projetos

    de produo de campanhas e desenvolvimento de logomarcas, escapar s con-

    venes estticas do setor, propiciando no apenas inovaes na empresa que

    lhes permitem acessar novos clientes e mercados, mas tambm o regozijo pro-

    fissional e pessoal pela criao de produtos que consideram como relevantes

    (entrevistados 2 e 4). Ademais, o profissional da literatura e edio recusa-se

    a trabalhar em publicaes destitudas de sentido, no contexto da sua carreira

    e valores, embora pudessem representar retorno financeiro. O editor/escritor

    deixa, por exemplo, de publicar textos considerados como do gnero autoajuda,assim como escreve seus textos com base na seleo de histrias percebidas

    como identificadas com a preservao da memria e da cultura locais e como

    de relevncia ao debate pblico (entrevistado 3).

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    12/25

    868

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    Entre os profissionais juniores, pode-se identificar, a exemplo dos senio-

    res, diversos interesses que movem suas atividades de criao. Os profissionaisjuniores da pesquisa em geologia destacam o prazer em pesquisar e em produ-

    zir novo conhecimento (entrevistados 5 e 6). igualmente significativa, sobre

    isso, a experincia do profissional da arquitetura e professor que direcionou

    seus projetos e atividades para a criao e aplicao de softwaresde mode-

    lagem grfica para edificaes, acreditando que a rea de arquitetura perdeu

    sua identidade e pouco contribui na formulao de solues para demandas

    da sociedade avaliadas como importantes pelo entrevistado (entrevistado 1).

    O profissional jnior do designgrfico identifica uma nova rea de atuao no

    setor a partir da formulao de uma concepo sobre o uso do espao pblico

    urbano em que reflete, criticamente, sobre a poluio visual das cidades nopas. Isso implicou a criao de novos produtos em designe sinalizao urbana,

    que encontrou resistncias no empreendimento anterior ao qual o profissional

    se manteve associado, partindo disso a motivao para o estabelecimento da

    start upatual (entrevistado 10). O profissional da msica que atua em agncia

    de publicidade refere sua orientao em integrar ao produto uma dimenso

    artstica, empenhando-se na criao dos artefatos pela aplicao de elementos

    eruditos da msica contempornea (sua rea de formao, pesquisa e interesse

    atuais) (entrevistado 9). O profissional do artesanato foca suas atividades de

    criao em produtos inditos cujo significado encontrado na observao davida urbana cotidiana (o profissional vale-se tambm da fotografia), empre-

    gando a tcnica de tratamento do papel e o uso de TICs. O entrevistado avalia

    criticamente o artesanato que se repete, seja pela produo em escala, seja

    pela simples reproduo da tradio (entrevistado 8).

    Quanto s avaliaes sobre mercado, vnculos com a vida econmica e

    local de moradia, os profissionais entrevistados tendem a perceber o merca-

    do mais como um meio para veicular sua produo do que como empecilho

    expresso ou distoro de suas ideias em cincias e artes. Entendem, no

    mais das vezes, como vivel a compatibilizao entre satisfao profissional

    e competio no mercado, embora expressem reiteradamente presso das de-

    mandas do trabalho sobre a vida pessoal e familiar. Os entrevistados tendem

    a dar certa prioridade para sua qualidade de vida em face das demandas do

    trabalho, empenhando-se com a delimitao do tempo de trabalho e com o cul-

    tivo das relaes familiares (por exemplo, almoar com a famlia, acompanhar

    os filhos) e de atividades de lazer e entretenimento (como literatura, filmes,

    exposies, esportes, culinria, viagens, amigos). Desse modo, as indicaes

    acima parecem compatveis com a hiptese sugerida pela literatura de que

    profissionais criativos empenham-se em conjugar progresso e perspectivas na

    carreira com qualidade e estilo de vida, embora a concepo sobre o que sejaisto possa variar entre contextos culturais (Eikhof & Haunschild, 2006; Florida,

    2011; Golgher, 2011; Tremblay & Darchen, 2011).

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    13/25

    869

    artigo | sandro ruduit garcia

    Os profissionais entrevistados mostram-se interessados em viver em

    Porto Alegre, embora alguns juniores tenham assinalado a possibilidade de vi-ver em cidades economicamente mais dinmicas do pas Rio de Janeiro e So

    Paulo (entrevistados 1 e 6). Identificam limitaes na dimenso dos mercados

    em Porto Alegre, mas acreditam que seu estilo de vida seja incompatvel com

    cidades do interior do estado, justificando sua permanncia pela qualidade

    de vida encontrada na cidade e pela manuteno de afetos. As tecnologias

    de informao e comunicao favorecem as trocas distncia, tornando-se

    desnecessria a mudana de cidade para realizar seus projetos profissionais.

    Alguns entrevistados mostram-se crticos em relao ao que consideram certo

    conservadorismo na cultura empresarial e no mercado de Porto Alegre e do in-

    terior do estado, que criaria, em certos casos, obstculos a produtos inovadoresque so bem aceitos em outros mercados (entrevistados 1, 2, 4 e 10).

    Quanto ao grau de satisfao e s expectativas futuras destes profis-

    sionais, pode-se identificar, em geral, interesse em prosseguir na carreira, em

    ambientes organizacionais em que se percebam reconhecidos, em permanecer

    na cidade (em especial, seniores), e em privilegiar o que consideram como qua-

    lidade de vida. Os profissionais entrevistados tendem a expressar satisfao

    com a carreira e perspectivas positivas em relao s oportunidades nas suas

    reas de atuao (juniores e seniores), declarando-se, em geral, satisfeitos

    com a carreira. frequente entre entrevistados a percepo de expanso daschances de trabalho e carreira, destacando-se oportunidades criadas pela Copa

    do Mundo, pelos Jogos Olmpicos e pela explorao de petrleo na camada do

    pr-sal. Entendem, em geral, que os seus vnculos e organizaes atuais lhes

    permitem desenvolver atividades significativas e prazerosas, embora o entre-

    vistado 1 mostre-se crtico em relao ao ambiente encontrado na universidade.

    Caberia mencionar um achado de pesquisa que se refere propenso

    dos entrevistados em envolverem-se em aes coletivas e em questes perce-

    bidas como importantes para a comunidade: criao de museu, fundaes para

    a manuteno de museu e memorial, criao de sindicato, associaes pro-

    fissionais e de classe, atuao em divises de Ministrios do Governo Federal,

    qualificao e formao profissional, comisses de avaliao profissional, e

    partidos polticos. Os profissionais entrevistados expressam, em maior ou me-

    nor intensidade, interesse em atividades polticas, assumindo, em alguns casos,

    posies de liderana que revelam insero no debate pblico e influncia na

    vida da comunidade, aproximando-se de resultados sugeridos em outros estu-

    dos (Novy & Colomb, 2013). Isso contraria a ideia de que profissionais criativos

    no se perceberiam como agentes polticos (Florida, 2011).

    Em suma, o que se tem, no conjunto dos dados, uma orientao pro-

    fissional em criar bens e servios no apenas com valor econmico, mas tam-bm com a afirmao de significados sociais e de posies sociopolticas dos

    profissionais. Isso os situa no jogo. Outro trao comum a diversidade de

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    14/25

    870

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    experincias nas trajetrias sociais, representando acmulos de conhecimen-

    tos e de redes de interao socioprofissional que so mobilizadas nos agen-ciamentos envolvidos no processo de criao dos artefatos. Observa-se, entre

    os entrevistados, empenho em conciliar crescimento na carreira, autonomia

    intelectual e qualidade de vida.

    ARRANJOS ENTRE INTERAES SOCIAIS

    O curso de atividades de criao desenrola-se em meio a complexos arranjos entre

    interaes sociais para o agenciamento de ideias, lugares e materiais (Callon, 1986;

    Htter et al., 2010) por profissionais seniores e juniores no contexto de universi-

    dades e de empreendimentos diversos (ateli, estdio, agncia, editora, start up).Essas interaes oferecem, em muitas situaes, novas possibilidades

    de concepo original de bens e servios. oportuno notar que o projeto inicial

    dos artefatos frequentemente alterado em face das exigncias e surpresas

    oferecidas, por exemplo, pelos materiais empregados. Esse o caso do pro-

    fissional do designde moda que refere o dilogo com os materiais, com os

    resduos, identificando as diferentes reaes dos tecidos aos tratamentos

    de superfcie, s tcnicas de colagem, lavagem e aplicao de tintas: cada

    material age de uma maneira. Os profissionais indicam surpresa diante das

    consequncias imprevistas da complexa combinao e do trabalho de experi-mentao com os insumos e recursos utilizados no processo de criao.

    Uma implicao disso a percepo sobre a inadequao (e mesmo a

    rejeio pelos profissionais) da prescrio no processo de criao, expressa,

    por exemplo, na crtica, de alguns entrevistados, aos modelos de gesto ba-

    seados em programas de qualidade e produtividade com vistas obteno de

    certificao. Segundo entrevistados, esse tipo de estratgia tolhe a criao e

    a inovao, na medida em que estas envolvem, sempre, erro e risco. Os entre-

    vistados mostram-se, pois, ciosos de sua autonomia intelectual e profissional.

    As TICs adquirem centralidade entre os profissionais estudados no

    apenas porque possibilitam a integrao e mobilizao de capacidades distri-

    budas no tempo e no espao (funes, empresas, profissionais, informaes e

    conhecimentos), mas tambm porque geram novas possibilidades de ao, co-

    mo novos tipos de produtos e mesmo nichos de mercado (Markusen & Gadwa,

    2010; Powell & Snellman, 2004). recorrente o relato entre os profissionais

    seniores de que as suas reas design, publicidade, edio e pesquisa foram

    revolucionadas por essas tecnologias, reduzindo o custo de equipamentos e

    instrumentos nas atividades de criao. Ademais, os profissionais entrevista-

    dos tendem a desenvolver habilidades de gesto e de induo colaborao

    entre capacidades envolvidas no processo de criao dos seus produtos.Podem-se identificar, ainda, aspectos relevantes quanto aos lugares,

    materiais e agentes associados s atividades de criao dos cientistas e artis-

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    15/25

    871

    artigo | sandro ruduit garcia

    tas estudados, destacando-se o grau de complexidade implicado nas mesmas.

    As Tecnologias de Informao e Comunicao permitem no apenas integraragentes e recursos em ambientes cognitivos e organizacionais diversos, mas

    tambm acelerar e vislumbrar novas possibilidades no processo de criao

    de bens e servios (Almeida, 2012; Htter et al., 2010). Neste caso, o domnio

    dessas ferramentas tecnolgicas tende a significar antecipao em relao

    concorrncia no mercado e mesmo a prospeco de mercados inexplorados.

    H clara utilizao no apenas de dispositivos de interao cognitiva e social

    a distncia, mas tambm de trocas de ideias e conhecimentos em situaes

    de copresena. No mais das vezes, entrevistados indicam que o trabalho em

    equipe e multidisciplinar requer a interao presencial no local de trabalho,

    em razo de que possibilita a discusso mais gil e abrangente de problemase o encaminhamento mais rpido de decises. O entrevistado 9, por exemplo,

    refere-se importncia da linguagem corporal no trabalho musical, embora

    tambm trabalhe com colaboradores a distncia; o entrevistado 1 refere a

    importncia da copresena no trabalho interdisciplinar em face da necessi-

    dade de ajustamento e comunicao entre diferentes linguagens e conceitos

    envolvidos na criao dos artefatos. Outro trao marcante dessa complexidade

    a diversidade e complementaridade de agentes envolvidos. So sobejamente

    apontadas as necessidades de trocas entre conhecimentos especializados em

    artes, negcios, tecnologia e cincias (entrevistados 2, 3, 4, 7, 8, 9 e 10) e entredisciplinas cientficas e tecnolgicas (entrevistados 1, 5, 6, 11 e 12).

    O complexo agenciamento de capacidades (tecnolgicas, materiais e

    cognitivas) parece, pois, levar os profissionais a circular por diferentes ambien-

    tes organizacionais e sociais. Os depoimentos colhidos revelam uma complexa

    identificao e integrao de recursos no processo de criao, requerendo do

    profissional a aquisio e aplicao no apenas de conhecimentos que lhes

    permitam conceber, ajustar e mesmo reformular projetos no curso de sua

    execuo, mas tambm de habilidades de gesto e induo cooperao entre

    mltiplos agentes neste percurso (Almeida, 2012; Amabile, 1998).

    Essas atividades de criao sustentam-se em arranjos que podem ser

    expressos pela combinao entre formas organizacionais e trajetrias educa-

    cionais e profissionais dos agentes entrevistados. No que se refere organi-

    zao das atividades, constatam-se caractersticas comuns nos ambientes de

    criao dos artefatos. A despeito de se tratar de tipos dspares de organizaes

    (grande universidade pblica e pequenos empreendimentos), h tendncias

    comuns nesses ambientes que se associam ao processo de criao, conside-

    rando-se a percepo dos profissionais entrevistados. Segundo os depoimentos

    colhidos, as atividades de criao tendem a exigir a combinao de funes e

    conhecimentos diversos que se desenvolve, especialmente, pelo trabalho emequipe. Isso oferece complementaridades e estmulos criao. Outra tendn-

    cia se refere percepo de relativa autonomia e expresso no processo de

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    16/25

    872

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    criao, bem como de reconhecimento ao produto do trabalho (Almeida, 2012;

    Howkins, 2013). De modo geral, os entrevistados buscam ambientes que lhesconferem possibilidade de expresso e tomada de deciso sobre o curso das

    atividades de criao.

    Cabe assinalar, adicionalmente, que os projetos de criao tendem a

    envolver algum tipo de financiamento pblico (exceto entrevistados 2 e 4) e,

    como se esperaria, atendimento a diferentes legislaes, requerendo ateno

    s exigncias do controle e a aquisio de habilidades para operar na buro-

    cracia estatal (Barrier, 2011).

    Ao mesmo tempo, os profissionais entrevistados apontam diferentes

    tipos de dificuldades e crticas em relao s organizaes em que se acham

    envolvidos. Por exemplo, o profissional jnior da arquitetura que atua na uni-versidade ressente-se da falta de titulao (o entrevistado estava com dou-

    torado em engenharia em curso no momento da entrevista) e das barreiras

    departamentais para a realizao de atividades interdisciplinares que, a seu

    juzo, so cruciais na produo de conhecimentos aplicados na sua rea de in-

    teresse e atuao (entrevistado 1). Um dos profissionais da geologia identifica,

    tambm na universidade, o paradoxo de que a geologia experimenta momento

    de expanso de oportunidades de carreira e pesquisa, porm, isso tende a

    se concentrar em reas relacionadas ao petrleo, em detrimentos de outras

    possibilidades de expanso na especialidade (entrevistado 12). O profissionaldo designgrfico e digital chama a ateno para que o uso de horrio flexvel

    outra tendncia identificada entre os entrevistados depende de relaes de

    confiana entre os agentes envolvidos e de disciplina e capacidade de gesto

    do tempo, requerendo conhecimento mtuo e aprendizado (entrevistado 4).

    O profissional do designgrfico iniciou as atividades de sua start upem um

    escritrio de trabalho colaborativo (co-working), em razo dos menores custos,

    da disponibilidade de infraestrutura adequada e da possibilidade de intera-

    o com agentes e profissionais diversos nesse tipo de ambiente. Entretanto,

    o alto grau de flexibilidade e a excessiva circulao e demandas por trocas

    profissionais tornaram, na sua avaliao, o ambiente dispersivo, reduzindo o

    desempenho e a produtividade de suas atividades de criao (entrevistado 10).

    Igualmente, o profissional do artesanato destaca a necessidade de disciplina

    e compromisso com o trabalho que precisam ser adquiridos pelo iniciante

    (entrevistado 8).

    Esses registros parecem se aproximar das hipteses sobre uma cog-

    nio distribuda e sobre o papel de coletividades de pesquisa, pois as ati-

    vidades de criao parecem envolver a mediao e conciliao no somente

    entre funes, conhecimentos, legislaes e exigncias diversas, mas tambm

    entre tecnologias, linguagens, instrumentos e insumos que se influenciammutuamente (Almeida, 2012; Callon, 1986; Htter et al., 2010).

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    17/25

    873

    artigo | sandro ruduit garcia

    Em relao s trajetrias educacionais e profissionais, os entrevistados

    revelam algumas convergncias nos seus percursos, em especial, a formaoem universidades de reconhecida qualidade e a diversidade de experincias

    profissionais, com passagem anterior em grandes organizaes no caso dos

    seniores (Amabile, 1998; Alencar, 1998; Glaeser, 2011). Trata-se de experincias

    profissionais em diferentes organizaes (assalariados em grandes e peque-

    nas empresas, servio pblico, organizaes sem fins lucrativos, autnomos

    e empreendedores as combinaes variam conforme o caso). Essa tendn-

    cia verificada de experincias plurais suscita a hiptese sobre uma combina-

    o entre disposies para acmulos de novas capacidades e habilidades, e a

    constituio de redes sociais, que so mobilizados no processo de criao dos

    artefatos (Comunian, 2012). Ao mesmo tempo, esse tipo de percurso relativizaformulaes sobre capital humano que reduzem a aquisio de competncias

    trajetria escolar, chamando a ateno para a disposio desse tipo de profis-

    sional por buscar uma experincia plural, que representa acmulos cognitivos

    e de redes sociais, refletindo-se no processo de criao.

    Cabe mencionar um achado de pesquisa que se refere ao fato de que

    parte dos profissionais entrevistados tem origem social e familiar nas classes

    mdias e, parte, nas classes populares, experimentando trajetria de ascen-

    so social. O dado aproxima-se de formulaes mais recentes que concebem

    o patrimnio de disposies adquiridas pelos indivduos como tendncias deconduta aplicadas ativamente a contextos de ao, relativizando-se dicotomias

    e automatismos na reproduo dos interesses e gostos de classe (Lahire, 2006).

    Como ilustrao, pode-se mencionar o caso do publicitrio cuja origem se si-

    tua no interior do Estado do Rio Grande do Sul, em famlia de operrios sem

    frequncia a curso superior (entrevistado 2). Diferentemente, o editor-escritor,

    que natural de Porto Alegre, tem, na sua famlia, jornalista e poeta/cronista

    premiados por suas obras (entrevistado 3). Em qualquer caso, parece haver

    um trao comum nessas trajetrias: o apoio familiar que se pode transformar

    em autoestima e perseverana no percurso profissional. Isso mereceria novos

    estudos e aprofundamento da anlise.

    Como apontam especialistas (Htter et al., 2010; Ramella, 2013;

    Swedberg, 2006), o processo de criao de inventos ou de inovaes ocorre-

    ria mediante esforos individuais que, no entanto, se realizam no contexto

    de interaes dos agentes com condies tcnicas, com organizaes e com

    sistemas sociais e territoriais. Numa palavra, interaes passadas, presentes

    e como expectativas futuras tornam-se relevantes fontes de criatividade para

    os agentes nesse tipo de processo.

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    18/25

    874

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    CONSIDERAES FINAIS

    Como inicialmente posto, o estudo apoia-se no princpio sociolgico de que a

    ao socioeconmica seria, predominantemente, movida por interesses ma-

    teriais e ideais, orientando-se para a gerao de utilidades (bens e servios) e

    para o comportamento de outros agentes (Weber, 2004 [1921]). Desse prisma,

    aborda-se o significado das relaes entre criatividade e mercado em face da

    ascenso de uma nova economia que se baseia na criatividade e no conheci-

    mento, inquirindo sobre os tipos de interesses e de arranjos de interaes dos

    agentes que sustentam as atividades de profissionais criativos.

    Os profissionais criativos (em cincias e em artes) estudados na cida-

    de escolhida envolvem-se em atividades de concepo de produtos originais,requerendo complexa amarrao entre investigao e concepo (prticas de

    laboratrio, pesquisa de linguagens e identidades comunitrias, diagnsticos

    de tendncias e nichos de mercado), manuseio de TIC e suas possibilidades, e

    interao com ativos diversos. Tais profissionais se notabilizam no apenas

    pelo alto grau de escolaridade, mas tambm pelo nvel de especializao nos

    seus conhecimentos em cincias ou em artes. Isso se combina com disposies

    adquiridas pela trajetria de apoio afetivo de suas famlias (seja nas classes

    mdias, seja nas classes populares), pela formao em universidades de reco-

    nhecida qualidade e pela diversidade de experincias profissionais (Lahire, 2006).Nas atividades de criao, os agentes tendem a conjugar a preocupao

    sobre a viabilidade e retorno financeiro do artefato com a identificao de

    experincias relevantes, em termos de acrscimos de conhecimentos ou de

    significado social do produto; mostram-se, ainda, empenhados em conciliar

    crescimento na carreira, autonomia intelectual e qualidade de vida, expres-

    sando certa seletividade nas suas escolhas de trabalho e na defesa de posi-

    es sociopolticas. O agenciamento desses ativos depende de autonomia, de

    flexibilidade e de experincias plurais, envolvendo a mediao e conciliao

    entre conhecimentos, tecnologias, insumos, funes, linguagens e legislaes

    (Htter et al., 2010; Ramella, 2013; Swedberg, 2006).

    Entre as dificuldades encontradas no processo de desenvolvimento des-

    sa economia, merece destaque a relativa limitao do mercado para esses pro-

    fissionais em Porto Alegre, que tentam superar com apoio nas comunicaes e

    interaes a distncia, tendo em vista preservar a boa qualidade de vida e de

    trabalho que consideram ter na cidade. Cabe ressaltar que os dados obtidos

    referem-se ao ncleo da economia criativa, e sua interpretao requer parci-

    mnia. Por exemplo, pouco se sabe sobre diferentes elos/setores da economia

    criativa, no pas.

    Portanto, as atividades econmicas criativas ocorreriam em meio a com-plexas e particulares combinaes de diferentes tipos de interesses e arran-

    jos de interaes de agentes (Swedberg, 2005). Tais atividades se desenrolam

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    19/25

    875

    artigo | sandro ruduit garcia

    no apenas em meio s novas condies tecnolgicas de comunicao e de

    conhecimento, mas tambm no momento em que ideais em torno da susten-tabilidade e da qualidade de vida ganham fora. Os resultados alcanados

    na pesquisa (que no aspiram generalizao) contribuem ao questionar no

    apenas a concepo sobre o desinteresse do gnio do cientista no laboratrio

    ou do artista no ateli, que se achariam corrompidos sob as condies de

    mercado, mas tambm relativizam as formulaes que enfocam regras formais

    capazes de estimular respostas e induzir comportamentos reflexos de talentos

    individuais autointeressados.

    Finalmente, cumpre notar que o fenmeno merece novas investigaes

    desde diferentes abordagens e metodologias. As formulaes sobre indstrias

    culturais contriburam ao apontar a instrumentalizao da cincia e da arte nomundo da produo em massa. No entanto, as recentes teses sobre indstrias

    criativas avanam ao chamar a ateno para as rupturas tecnolgicas, econ-

    micas e institucionais no mundo atual. O tema vem ganhando destaque no

    debate pblico e acadmico internacional e a perspectiva multidimensional e

    relacional da sociologia econmica mostra-se frutfera, ao permitir compre-

    ender aspectos, mais contextuais, que escapam s formulaes anteriores. O

    debate e a crtica cientfica podero contribuir para melhor conhecer e precisar

    os contornos dessa economia e seu alcance num mundo em transformao.

    Recebido em 10/05/2014 | Aprovado em 15/04/2015

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    20/25

    876

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    Sandro Ruduit Garcia Doutor em Sociologia pela

    Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e professor adjun-

    to no Departamento de Sociologia e no Programa de Ps-Graduao

    em Sociologia desta mesma Universidade. Atua, principalmente, na

    rea de Sociologia Econmica, dedicando-se ao estudo das indstriascriativas, da inovao e das relaes entre agentes globais e locais.

    autor, entre outras publicaes, de Pequena empresa inovadora e

    desenvolvimento: indstria naval em Rio Grande (2014).

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    21/25

    877

    artigo | sandro ruduit garcia

    NOTAS

    1 O artigo baseia-se em resultados da pesquisa Nova econo-

    mia do conhecimento: agentes criativos e arranjos scio-

    organizacionais em Porto Alegre, realizada com financia-

    mento CNPq Edital Universal. A pesquisa foi coordenada

    pelo autor, contando com o pesquisador Lus Fernando

    Santos Corra da Silva (UFFS), com os estudantes de ps-

    graduao Alexandre P. Karpowicz e Rodrigo C. Dillio, e

    com a bolsista IC-Fapergs Gabriela R. de Freitas.

    2 Os profissionais selecionados para estudo pertencem a

    setores significativos nas trocas internacionais, situando-se

    entre os cinco principais em termos de exportaes mundi-

    ais em indstrias criativas: para dados de 2008, os produtos

    de designrepresentaram 40,87% das exportaes das inds-

    trias criativas; em seguida, arquitetura, 14,38%; produtos

    editoriais, 8,15%; produtos de artesanato, 5,46%; e servio de

    pesquisa e desenvolvimento, 5,25% (UNCTAD, 2010).

    3 O leitor encontra em Corazza (2013) uma boa resenha de

    alguns dos principais estudos sobre o tema. Para uma

    interessante apresentao e comparao de diferentes

    classificaes de setores da economia criativa, ver Valiati

    (2013). Para uma crtica ao uso da noo de economia cria-

    tiva como categoria de anlise, ver Alves & Souza (2012).

    4 A UNCTAD (2010) classifica as indstrias criativas em gru-

    pos: a) Patrimnio (stios culturais e expresses culturais

    tradicionais); b) Artes (visuais e performticas); c) Mdia

    (publicaes e audiovisual); e d) Criaes funcionais (design,

    servios criativos e novas mdias). As indstrias criativas

    seriam definidas como os ciclos de criao, produo edistribuio de produtos e servios que utilizam a cria-

    tividade e capital intelectual como insumos primrios

    (UNCTAD, 2010: 8). Essa classificao tem sido amplamente

    utilizada (inclusive no Brasil), permitindo a comparao de

    estudos e resultados entre diferentes pases.

    5 O autor identifica um centro hipercriativo no conjunto

    de ocupaes da classe criativa, envolvendo profisses

    ligadas computao e matemtica, arquitetura e en-

    genharia, s cincias biolgicas, naturais e sociais, edu-cao, treinamento e biblioteconomia, e s artes, design,

    entretenimento, esportes e mdia.

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    22/25

    878

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    Adorno, Theodor & Horkheimer, Max. (1985) [1944].

    Dialtica do esclarecimento:fragmentos fi losficos. Rio de

    Janeiro: Zahar.

    Alencar, Eunice M. L. S. de. (1998). Promovendo um am-

    biente favorvel criatividade nas organizaes. RAE -

    Revista de Administrao de Empresas, 38/2, p. 18-25.

    Almeida, Maria I. M. de. (2012). Criatividade contempo-

    rnea e os redesenhos das relaes entre autor e obra: a

    exausto do rompante criador. In: Almeida, Maria I. M. de& Machado-Pais, Jos (orgs.). Criatividade, juventude e novos

    horizontes profissionais. Rio de Janeiro: Zahar, p. 21-55.

    Alves, Elder P. M. & Souza, Carlos A. de C. (2012). A eco-

    nomia criativa no Brasil: o capitalismo cultural brasileiro

    contemporneo. Latitude, 6/2, p. 119-173.

    Amabile, Teresa M. (1998). How to kill creativity. Harvard

    Business Review, 76/5, p. 76-87.

    Barrier, Julien. (2011). La science en projects: financements

    sur projet, autonomie professionnelle et transformationsdu travail des chercheurs acadmiques. Sociologie du

    Travail, 53, p. 515-536.

    Bendassolli, Pedro F. & Borges-Andrade, Jairo E. (2011).

    Significado do trabalho nas indstrias criativas. RAE

    Revista de Administrao de Empresas, 51/2, p. 143-159.

    Bourdieu, Pierre. (1996). Razes prticas: sobre a teoria da

    ao. Campinas: Papirus.

    Callon, Michel. (1986). Some elements of a sociology of

    translation: domestication of the scallops and the fisher-

    men of St Brieuc Bay. In: Law, power, action and belief: a

    new sociology of knowledge?Londres: Routledge, p. 196-223.

    Caves, Richard. (2003). Contracts between arts and com-

    merce.Journal of Economics Perspectives, 17/2, p. 73-83.

    Comunian, Roberta. (2012). Uma cidade criativa de tipo

    relacional: para uma cartografia das ligaes em rede en-

    tre os setores pblico, privado e sem fins lucrativos nas

    indstrias criativas. Revista Crtica de Cincias Sociais, 99,

    p. 99-124.

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    23/25

    879

    artigo | sandro ruduit garcia

    Comisso Europeia. (2010). Livro verde: realizar o poten-

    cial das indstrias criativas e culturais. Bruxelas: ComissoEuropeia.

    Corazza, Rosana I. (2013). Criatividade, inovao e econo-

    mia da cultura: abordagens multidisciplinares e ferramen-

    tas analticas. Revista Brasileira de Inovao, 12/1, p. 207-231.

    Cunningham, Stuart D. et al. (2008). Financing creative in-

    dustries in developing countries. In: Barrowclough, Diana

    & Kozul-Wright, Zeljka (orgs.). Creative industries and devel-

    oping countries: voice, choice and economic growth. Londres/

    Nova York: Routledge, p. 65-110.Eikhof, Doris R. & Haunschild, Axel. (2006). Lifestyle meets

    market: bohemian entrepreneurs in creative industries.

    Creativity and innovation management, 15/3, p. 234-24.

    Flew, Terry & Cunningham, Stuart. (2010). Creative in-

    dustries after the first decade of debate .The Information

    Society, 26/2, p. 113-123.

    Florida, Richard. (2011). A ascenso da classe criativa. Porto

    Alegre: L&PM.

    Glaeser, Edward. (2011). Os centros urbanos:a maior inveno

    da humanidade. Rio de Janeiro: Elsevier.

    Golgher, Andr B. (2011). A distribuio de indivduos qua-

    lificados nas regies metropolitanas brasileiras: a influn-

    cia do entretenimento e da diversidade populacional. Nova

    Economia, 21/1, p. 109-134.

    Howkins, John. (2013). Economia criativa. So Paulo: M.

    Books do Brasil.

    Htter, Michael et al. (2010). Research program of the unitCulture sources of newness. Discussion Paper SP III 2010-

    405. Berlim: Wissenschaftszentrum Berlin fr Sozial

    Forschung (WZB).

    Kaul, Inge; Grunberg, Isabelle & Stern, Marc. (2012). Bens

    pblicos globais: cooperao internacional no sculo XXI. Rio

    de Janeiro/So Paulo: Record.

    Lahire, Bernard. (2006). A cultura dos indivduos . Porto

    Alegre: Artmed.

    Landry, Charles. (2011). Prefcio: cidade criat iva. A hist-ria de um conceito. In: Reis, Ana Carla & Kageyama, Peter

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    24/25

    880

    profissionais criativos em cincias e artes na cidade de porto alegre

    sociologia&antropologia|riodejaneiro,v.05.03:8

    57882,dezembro,2015

    (orgs.). Cidades criativas: perspectivas. So Paulo: Garimpo

    de Solues.Markusen, Ann & Gadwa, Anne. (2010). Creative placemak-

    ing. Washington, DC: National Endowment for the Arts.

    Disponvel em . Acesso em 29 nov. 2015.

    Novy, Johannes & Colomb, Claire. (2013). Struggling for the

    right to the (creative) city in Berlin and Hamburg: new ur-

    ban social movements, new spaces of hope? International

    Journal of Urban and Regional Research, 35/5, p. 1816-1838.

    Pine, B. Joseph & Gilmore, James H. (1998). Welcome tothe experience economy. Harvard Business Review, s.n., jul.-

    ago., p. 97-105. Disponvel em . Acesso em 29 nov.

    2015.

    Powell, Walter & Snellman, Kaisa. (2004). The knowledge

    economy.Annual Review of Sociology , 30, p. 199-220.

    Ramella, Francesco. (2013). Sociologia dellinnovazione econo-

    mica. Bolonha: Mulino.

    Reis, Ana Carla F. (2012). Cidades criativas: da teoria prtica.

    So Paulo: Sesi.

    Shin, Haeran & Stevens, Quentin. (2013). How culture and

    economy meet in South Korea: the politics of cultural

    economy in culture-led urban regeneration. International

    Journal of Urban and Regional Research, 35/5, p. 1707-1723.

    Swedberg, Richard. (2006). The cultural entrepreneur and

    the creative industries: beginning in Viena.Journal Culture

    Economic, 30, p. 243-261.

    Swedberg, Richard. (2005). Max Weber e a ideia de sociologia

    econmica. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ.

    Swedberg, Richard. (2004). Sociologia econmica: hoje e

    amanh. Tempo Social, 16/2, p. 7-34.

    Tremblay, Diane & Darchen, Sbastien. (2011). The attrac-

    tion/retention of knowledge workers and the creative city

    paradigm: can we plan for the talents and at what coast?

    The case of Montreal. Research note of the Canada Research

    Chair on the Socio-organizational Challenges of the KnowledgeEconomy. Montreal, Universit du Qubec, maro.

  • 7/25/2019 Profissionais criativos

    25/25

    881

    artigo | sandro ruduit garcia

    UNCTAD. (2010). Creative economy: Report 2010. Genebra:

    Naes Unidas.UNCTAD. (2008). Creative economy: Report 2008. Genebra:

    Naes Unidas.

    UNESCO. (2013). Creative Economy Report 2013. Special edi-

    tion: widening local development pathways. Genebra:

    Naes Unidas.

    Valiati, Leandro. (2013). Indstria criativa no Rio Grande do

    Sul . 2a. ed. Porto Alegre: FEE.

    Weber, Max. (2004) [1921]. Economia e sociedade. Braslia:

    Ed. UnB.

    Weber, Max. (2006) [1919]. Histria geral da economia. So

    Paulo: Centauro.

    Weber, Max. (2003) [1904]. Ensaios sobre a teoria das cin-

    cias sociais. So Paulo: Centauro.