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Felipe Lavignatti GEOLOCALIZAÇÕES E O PAPEL DO INDIVÍDUO NOS MAPEAMENTOS INTERATIVOS Projeto de pesquisa apresentado ao programa de pós-graduação em Divulgação Científica e Cultural, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) e do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor/Nudecri) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Campinas, agosto de 2013

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Felipe Lavignatti

GEOLOCALIZAÇÕES E O PAPEL DO INDIVÍDUO NOS MAPEAMENTOS INTERATIVOS

Projeto de pesquisa apresentado ao programa de pós-graduação em Divulgação Científica e Cultural, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) e do Laboratório de Estudos

Avançados em Jornalismo (Labjor/Nudecri) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

Campinas, agosto de 2013

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ResumoAntes do ser humano desenvolver a escrita, os desenhos eram usados como forma

de comunicação. Cenas do cotidiano ainda podem ser vistas em cavernas com desenhos datados de cerca de 42 mil anos. As primeiras tentativas de escrita descobertas até hoje datam de cerca de 5.500 anos. Os primeiros mapas surgem justamente neste intervalo de tempo.

É difícil precisar quando, por que, como e onde surgiu o primeiro mapa. Muito do que foi desenhado na pré-história e na antiguidade se perdeu. Os propósitos dos mapas na história vão se adequando conforme as necessidades das comunidades que os criaram. Hoje, vivemos em um mundo onde a tecnologia está cada vez mais presente e afeta também a forma como os mapas são usados.

A proposta deste projeto de pesquisa é investigar como o indivíduo se insere nos mapas atuais com o uso das novas tecnologias. Espera-se descobrir o papel deste novo ingrediente humano como elemento protagonista dos mapas e como o indivíduo e sua percepção sobre o ambiente estão sendo alterados com estas novas formas de mapeamento.

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I - IntroduçãoO uso de mapas na humanidade, mais antigo que a própria escrita, vem se moldando

conforme as necessidades humanas. Um dos mais antigos mapas ainda existentes fica na cidade de Çatal Hüyük, na Turquia, datado de 6.200 a.C. Em uma parede da antiga cidade, descoberta em 1963, há um desenho representando suas ruas e casas. Segundo arqueólogos, não havia uma função prática para esta representação. Sua função seria somente ritualística.Com as expansões das cidades, mapas passaram a ser usados para registrar domínios e limites de propriedades. Rotas marítimas só se tornam comuns na Idade Média na Europa. Descrições topográficas, somente no século 18.

A revolução mais recente se dá no começo na segunda metade do século passado, com o desenvolvimento do sistema de posicionamento global, popularmente conhecido por GPS (do original inglês Global Positioning System). Podemos dizer que a história do sistema se iniciou em 1957, ano em que a União Soviética lançou o primeiro satélite artificial da história, fato que deu início aos primeiros estudos sobre o uso de satélites na localização de pontos sobre a superfície terrestre.

Mas foi nos EUA que o GPS nasceu, tendo como base o projeto NAVSTAR, desenvolvido em 1960 pelo Departamento de Defesa dos EUA. O sistema oferecia diversas informações sobre qualquer parte do planeta, como localização e clima, a qualquer hora do dia, algo que era de grande importância para o uso militar. Após vários ajustes e correções, o projeto NAVSTAR se tornou totalmente operacional em 1995.

Devido à suas inúmeras vantagens, o sistema acabou se disseminando entre os civis (assim como a Internet, também de origem militar). Com a popularização dos computadores e da internet, o GPS passou a fazer parte do cotidiano de todos. O aumento dos leitores dos sinais enviados por estes satélites e o acesso à internet fizeram com que o usuário do leitor acabasse também por criar um banco de dados que só cresce. Mapas virtuais, disponíveis na internet como programas ou sites, estão se tornando rapidamente a forma mais usada de mapeamento do começo deste século. Foi calculado que, em 2001, cerca de metade de todos os usuários de internet nos Estados Unidos (aproximadamente 87 milhões de pessoas) consultou um mapa virtual pelo menos uma vez no mês. O número de websites com mapas virtuais - sejam estáticos ou interativos - chega hoje na casa das dezenas de milhares. Dependendo do assunto, alguns deles, como os mostrando clima ou tráfego, têm atualizações diárias e em alguns casos em tempo real.

Uma das principais vantagens desta mais recente forma de se fazer mapas virtuais é a possibilidade de interação. Elementos dos mapas podem ser aumentados, reduzidos. Cores, fontes e símbolos podem ser alterados. Cada um pode fazer seu mapa personalizado sem precisar ser um cartógrafo. As camadas que podem ser acrescentadas em um ambiente virtual são quase ilimitadas.

As principais redes sociais da internet já trabalham com georreferenciamento. Assim, uma pessoa que queira postar um comentário, uma foto, um vídeo em uma dessas redes pode associar à esta postagem uma localidade. Um usuário que produza muito conteúdo constroi um banco de dados que diz muito sobre sua vida baseada nestes dados geográficos. Com uma grande quantidade de informação coletada, é possível saber os lugares mais frequentados pelos usuários, dias da semana, hora e até mesmo cruzar estas informações com usuários semelhantes.

Das cinco redes sociais da internet mais usadas no mundo hoje, quatro oferecem a opção de georreferenciamento (Facebook, Twitter, LinkedIn e My Space. Apenas o Pinterest não oferece). Ou seja, cada conteúdo destas quatro redes (gerando um total

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1.180.500.000 visitas mensais somadas: http://www.ebizmba.com/articles/social-networking-websites) podem conter informações que se encontram em um mapa virtual.

Nenhuma dessas redes mais populares obriga o usuário a fazer o georreferenciamento, é opcional. Mas existem redes que trabalham com a premissa da geolocalização, como o Waze e o Foursquare. O Waze é uma aplicação para celular que permite que um motorista construa e use mapas em tempo real (acompanhando outros usuários se movimentando, inclusive), coletando e distribuindo informações sobre tráfego e outros dados, como acidentes ou postos móveis da polícia. O Foursquare funciona como uma rede para informar onde você está. Os usuários com maior número de entradas em um local ganham títulos como "prefeito".

Hoje, qualquer pessoa com um celular pode ser rastreada. O Google, inclusive, está contando com este banco de dados para gerar seus boletins de trânsito. Já existem inclusive alguns serviços de telefonia móvel que permitem rastrear usuários, como Verizon Family Locator. Com ele é possível monitorar pela internet a localização exata de membros da sua família. O uso tem que ser permitido pelos celulares cadastrados. Como é um serviço voltado para os pais, há uma imposição dos chefes da casa para os filhos. Este tipo de serviço mostra como é possível rastrear movimentos de qualquer usuário de telefone. E quanto mais integrado o aparelho for às redes sociais da internet, existe uma possibilidade maior de informações georreferenciadas serem transmitidas, facilitando ainda mais a localização em tempo real.

Cada usuário ajuda a alimentar este banco de dados de formas diferentes. O trânsito pode ser medido assim (caso do Waze), informações sobre localidades como bares e clubes, horários e locais com mais usuários. Todas estas informações já estão sendo geradas e algumas já sendo utilizadas por algumas empresas, como o exemplo do Google citado acima. Com o aumento crescente dos aparelhos móveis com acesso à internet, e da própria internet residencial, esta rede de informações cresce ainda mais e fica cada dia mais complexa.

Com tantas possibilidades de usar uma rede social que utilize georreferenciamento, o usuário pode se expor de uma forma não pretendida. Pelo uso crescente destas redes e a popularização da internet nos aparelhos móveis, este trabalho pretende esclarecer os usos desta nova forma de se fazer mapas. Uma forma digital, com possibilidade de ser colaborativa, porém, aberta o suficiente para expor dados indesejados.

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II - Justificativa Hoje, no mundo, mais de 1,74 bilhões de pessoas utilizam os serviços de redes

sociais (http://www.emarketer.com/Article/Social-Networking-Reaches-Nearly-One-Four-Around-World/1009976). A maior parte destes usuários estão em redes que possibilitam o uso de georreferenciamento em suas postagens. Ou seja, uma atualização significa não só subir um conteúdo na rede, mas também associar este material a uma localidade. Deste total, o Facebook possui 1,11 bilhão de perfis em sua rede. Na sequência, surgem o Twitter, com 500 milhões de usuários, LinkedIn, com cerca de 225 milhões. Como vimos anteriormente, estas duas redes também utilizam geolocalização em suas postagens.

Com o aumento do uso de banda larga pelas pessoas, estas atualizações se dão cada vez mais em aparelhos móveis. Nos EUA, este uso do Facebook já supera o uso tradicional em computadores. O tempo médio gasto por mês do usuário atualizando de um aparelho móvel é de 441 minutos contra 391 de computadores fixos (http://techcrunch.com/2012/05/11/time-spent-on-facebook-mobile/).

Este padrão já observado nos EUA, com uma rede móvel bem estabelecida, deve se repetir em outros países conforme suas redes de dados se aprimorem. Com o crescimento do uso móvel das redes sociais, os dados sobre os usuários se tornam cada vez mais dinâmicos. Em alguns casos até em tempo real, como no Waze, a rede em que é possível ver a movimentação ao vivo das pessoas e interagir com elas.

Esta quantidade de informações georreferenciadas já está sendo utilizada por algumas empresas, como atualizações de trânsito, por exemplo. Porém, seu potencial ainda não foi totalmente explorado. Com estes dados é possível fazer cruzamentos de gostos, personalidades, hábitos, tudo com base geográfica. Saber em que parte da cidade estão pessoas com seu gosto musical, pesquisar rotas mais curtas com bases em determinados usuários, procurar casa para alugar em um bairro que seus amigos virtuais indiquem que a qualidade de vida seja melhor. A possibilidade de cruzamentos destes dados com um mapa abre caminhos para uma forma de navegação baseada em coordenadas.

Porém, ao lidar com dados pessoais tornados públicos para um grupo da rede, levanta-se a questão da privacidade. Um usuário que poste constantemente dados sobre seus hábitos já se expõe de alguma forma. Ao ligar estas informações com locais, é possível saber onde ele frequenta todos os dias e horários, um tipo de informação que nem todos querem compartilhar. Não é obrigatório fazer esta ligação, mas algumas redes incentivam. É o caso do Instagram.

Esta rede social nasceu para aparelhos móveis da Apple. Em 2012, passou a funcionar também em Android, sistema operacional com o maior número de usuários no mundo. Até hoje, seus usuários não podem atualizar em computadores fixos. Seu sistema de atualizações sempre permitiu associar as postagens com uma localidade. Em uma de suas atualizações em 2012, o Instagram abriu uma forma de navegação totalmente baseada em mapa. Agora é possível pegar todas as fotos já tiradas nesta rede social e dispor em um mapa. Ou seja, as informações já estavam sendo coletadas com georreferenciamento, mas não era possível ver um mapa com estas postagens. O novo item do menu de navegação desta rede social agora se chama Mapa de Fotos e tem mais destaque que os outros dois botões que já existiam: visualização em grade e em lista.

Existe ainda o caso das redes sociais que não deixam claro qual vai ser o uso do material que você está subindo para a rede. O Google Latitude, por exemplo, que era uma

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rede social baseada nos locais que você frequenta, vive e trabalha, coletava informações que estavam sendo usadas por outras redes da empresa. Em janeiro de 2012, o Google anunciou que unificaria as políticas de seus produtos, permitindo que dados coletados por um fossem usados em outro. Esta medida gerou críticas inclusive no Brasil, onde o Google foi chamado pela Câmara dos Deputados e pelo Ministério da Justiça para se explicar. Esta rede social foi desativada em agosto de 2013. O Facebook também já trabalha em um recurso para saber onde estão seus amigos em tempo real.

Estes dados georreferenciados estão cada dia mais mais fáceis de serem acessados. Nos mapas interativos, os seres humanos e seus hábitos são pontos cada vez mais fundamentais. Estes dados coletados nas redes sociais online muitas vezes estão sendo usados sem o consentimento dos usuários. Nem sempre a política de uso está clara para o usuário, como nesta mudança de política do Google.

O matemático Norbert Wiener falava do Homo communicans, um ser voltado para o social, que só existe através da troca e da informação. Este modelo de homem é principal fornecedor diário de conteúdo para os mapas virtuais. Qualquer ser que se comunique em um certo nível de complexidade é digno de ver reconhecida sua existência enquanto ser social. De um certo modo, não há mais "ser humano" mas, ao contrário, "seres sociais", inteiramente definidos por suas capacidades de se comunicar socialmente. Agora ele ocupa um lugar na grande corrente da comunicação - onde as "máquinas inteligentes" também são parceiras - e seu pensamento individual não é mais distinguível como tal. O laço social funciona com base na razão, no cálculo - seu modelo se torna o computador - e, ao mesmo tempo, o jogo social se torna um jogo totalmente informacional. O vínculo social na base da comunicação deixa pouco espaço para o indivíduo: esse não é mais um ator individual, mas um ser reativo (http://www.fundacaotidesetubal.org.br/blog/nccsaomiguelnoar/ver/2988). Na rede, o indivíduo é mais um fornecedor de dados, de sinais informacionais, como qualquer máquina ou computador. Ao fazer isso, um grande banco de dados está sendo construído.

Nos objeto desta pesquisa, nos limitaremos às informações que contenham dados de localização e suas consequências. A ideia é investigar como este novo tipo de ser humano é afetado, como sua visão dos espaços, do mundo e de individualidade mudam com base nos mapeamentos que surgem das informações fornecidas por ele mesmo.

Este estudo visa identificar o componente humano desta nova fase de se fazer mapas, onde os conteúdos virtual e interativo se sobressaem. Estes dados pessoais estão construindo um banco de dados e gerando uma infinidade de conteúdos que podem ser usados em forma de mapas. Em alguns casos, como os relatados acima, já estão sendo usados. O princípio desta pesquisa se dará ao identificar as formas já existentes de mapeamentos que apresentam banco de dados que são gerados pelos próprios usuários.

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III - ObjetivosObjetivo geral:- Identificar a construção de conteúdo georreferenciado construído com dados coletados de usuários de internet ou celular.

Objetivos específicos:- Identificar as principais redes sociais da internet que usam dados georreferenciados e como usam estes dados;- Identificar como dados georreferenciados são coletados e utilizados pelas companhias de telefonia móvel;- Estudar como a privacidade de dados está sendo tratada nos exemplos identificados pela pesquisa;- Identificar o papel do componente humano nesta nova cartografia baseada em um meio virtual;- Analisar a mudança de percepção das pessoas sobre o mundo ao seu redor com o uso dos mapas virtuais e interativos;- Estudar as possibilidades do uso dos mapas virtuais, os com atualizações em tempo real e os interativos com base nestes dados fornecidos por usuários de internet e de celular.

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IV - Proposta de desenvolvimento da pesquisa A proposta inicial desta pesquisa se dá levantando um histórico dos usos de mapas

pela humanidade. É importante entender como chegamos ao atual uso da tecnologia para a cartografia em um meio virtual. As redes sociais serão também abordadas do ponto de vista histórico, no que diz respeito ao uso de dados georreferenciados. Da mesma forma, também será feita uma pesquisa histórica sobre o uso dos sinais de telefonia móvel para identificar a exata localização de um aparelho. Com estes dados, será possível identificar como informações fornecidas por usuários de celular e de internet podem ser utilizadas para fornecer dados a um mapa.

Após a pesquisa histórica, serão identificadas as redes sociais online que lidam com dados georreferenciados e como esta informação é usada. Da mesma forma, será feito um levantamento do uso de aparelhos móveis com geolocalização, como tablets e celulares, para identificar o potencial número de pessoas que podem fornecer dados para estes mapas virtuais.

Uma das tarefas da pesquisa será descobrir algumas atitudes - e pensar em formas de disseminá-las - que possam ajudar os fornecedores dos dados destes mapeamentos para que as informações não sejam usadas de uma forma indesejada.

Eventuais pesquisas encontradas sobre usuários de internet ou aparelhos móveis que tratem de privacidade ou georreferenciamento poderão ser utilizadas.

Espera-se que, ao final da pesquisa, esteja claro o panorama da construção de mapas virtuais com base em dados fornecidos por usuários de internet ou aparelhos móveis. O objetivo é esclarecer como estes dados georreferenciados fornecidos pelo componente humano - muita vezes em tempo real - estão sendo usados para os mais diversos fins.

Espera-se, ainda, que o usuário alimentador destes bancos de dados entenda como funciona estes mapas virtuais criados a partir de suas atualizações, para que informações indesejadas para alguns (como o endereço de residência ou trabalho) não estejam visíveis para ninguém que ele não queira.

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V - Referências bibliográficas

BROWN, Lloyd A. The Story of Maps. EUA: Dover Publications, 1980

HARMON, Katharine. You Are Here: Personal Geographies and Other Maps of the Imagination. EUA: Princeton Architectural Press, 2003

HARWOOD, Jeremy. To the Ends of the Earth: 100 Maps That Changed the World. EUA: David & Charles, 2006

MONMONIER, Mark. How to Lie with Maps. EUA: University Of Chicago Press, 1996

VÁRIOS. An Atlas of Radical Cartography. EUA: Journal of Aesthetics and Protest Press, 2008

WIENER, Norbert. Cibernética e Sociedade: o Uso Humano de Seres Humanos. São Paulo: Cultrix, 1984

WOOD, Denis. Rethinking the Power of Maps. EUA: The Guilford Press, 2010

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