Protocolo clínico preliminar HIV Aids 2013

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    Ministrio da Sade

    Secretaria de Vigilncia em Sade

    Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais

    PROTOCOLO CLNICO E DIRETRIZES

    TERAPUTICAS PARA ADULTOS VIVENDO

    COM HIV/AIDS

    Verso preliminar

    Braslia - 2013

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    2013 Ministrio da Sade.

    permitida a reproduo parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que no seja para

    venda ou qualquer fim comercial.

    A responsabilidade pelos direitos autorais de textos e imagens desta obra da rea tcnica do

    Departamento de Aids, DST e Hepatites Virais.

    Diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais

    Dirceu Bartolomeu Greco

    Diretor-Adjunto

    Eduardo Barbosa

    Diretor Substituto

    Ruy Burgos Filho

    Coordenao de Cuidado e Qualidade de Vida

    Marcelo Arajo de Freitas

    Edio

    Angela Gasperin Martinazzo

    Projeto grfico

    Alexsandro de Brito Almeida

    Organizao e Reviso

    Amanda Rodrigues Costa

    Helena Bernal

    Ronaldo Hallal

    Informaes:

    MINISTRIO DA SADESecretaria de Vigilncia em SadeDepartamento de DST, Aids e hepatites viraisSAF Sul Trecho 2, Bloco F, Torre 1, Edifcio PremiumCEP: 70070-600, Braslia DFE-mail: [email protected]

    Home Page: www.aids.gov.br

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    Sumrio

    1. Histria natural da doena .................................................................. 41.1. Infeco aguda .......................................................................................................... 41.2. Latncia clnica e fase sintomtica ............................................................................ 51.3. Sndrome da Imunodeficincia Adquirida ................................................................. 6

    2. Abordagem inicial e seguimento do adulto infectado pelo HIV ............ 72.1. Histria e manifestaes clnicas iniciais ................................................................... 72.2. Exames complementares .......................................................................................... 92.3. Neoplasias e HIV ........................................................................................................ 12

    2.4. Preveno Positiva .................................................................................................... 132.5. Imunizao ................................................................................................................ 132.6. Abordagem da transio: da adolescncia para o ambulatrio de adultos .............. 162.7. Sndrome inflamatria da reconstituio imune ...................................................... 162.8. Genotipagem pr-tratamento .................................................................................. 19

    3. Critrios para incio de tratamento antirretroviral ............................... 213.1. Incio de TARV em indivduos sintomticos .............................................................. 223.2. Incio de TARV em indivduos assintomticos ........................................................... 253.3. Incio de TARV em gestantes ..................................................................................... 29

    3.4. Incio de TARV para pessoas vivendo com HIV em parcerias sorodiscordantes ....... 29

    4. Escolha do esquema inicial .................................................................. 334.1. Escolha da dupla de ITRN/ITRNt ............................................................................... 344.2. Qual classe deve compor o esquema com a dupla de ITRN/ITRNt: ITRNN ou IP? .... 354.3. Escolha do ITRNN ..................................................................................................... 364.4. Escolha do inibidor de protease (IP) nas situaes de contraindicao ou

    intolerncia a ITRNN ................................................................................................. 37

    5. Falha ao tratamento antirretroviral e terapia de resgate ..................... 41

    5.1. Caracterizao de falha teraputica ......................................................................... 425.2. Causas de falha teraputica ...................................................................................... 435.3. Teste de genotipagem .............................................................................................. 445.4. Princpios gerais da terapia de resgate ..................................................................... 465.5. Escolha da terapia de resgate em situaes especiais ............................................. 57

    Referncias ............................................................................................ 60

    Equipe Tcnica ....................................................................................... 73

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    1. Histria natural da doena

    A infeco pelo HIV-1 cursa com um amplo espectro de apresentaes clnicas, desde a fase

    aguda at a fase avanada da doena. Em indivduos no tratados, estima-se que o tempo mdio

    entre o contgio e o aparecimento da doena esteja em torno de dez anos.

    1.1. Infeco aguda

    A infeco aguda definida como as primeiras semanas da infeco pelo HIV, at o

    aparecimento dos anticorpos anti-HIV (soroconverso), que costuma ocorrer em torno da quartasemana aps a infeco. Nessa fase, bilhes de partculas virais so produzidas diariamente, a

    viremia plasmtica alcana nveis elevados e o indivduo torna-se altamente infectante.

    Como em outras infeces virais agudas, a infeco pelo HIV acompanhada por um

    conjunto de manifestaes clnicas, denominado Sndrome Retroviral Aguda (SRA) que se apresenta

    geralmente entre a primeira e terceira semana aps a infeco. Uma parte significativa dos

    indivduos infectados apresenta SRA, variando de 50 a 90% em diferentes sries.

    Os principais achados clnicos de SRA incluem febre, adenopatia, faringite, exantema, mialgia

    e cefaleia. A SRA pode cursar com febre alta, sudorese e linfadenomegalia comprometendo

    principalmente as cadeias cervical anterior e posterior, submandibular, occipital e axilar. Podem

    ocorrer, ainda, esplenomegalia, letargia, astenia, anorexia e depresso. Alguns pacientes

    desenvolvem exantema de curta durao aps o incio da febre (frequentemente inferior a trs dias),

    afetando geralmente a face, pescoo e/ou trax superior, mas podendo se disseminar para braos,

    pernas, regies palmares e plantares.

    Sintomas digestivos, como nuseas, vmitos, diarreia, perda de peso e lceras orais podem

    estar presentes. O comprometimento do fgado e do pncreas raro na SRA. Cefaleia e dor ocular

    so as manifestaes neurolgicas mais comuns, mas a SRA pode cursar tambm com quadro de

    meningite assptica, neurite perifrica sensitiva ou motora, paralisia do nervo facial ou sndrome de

    Guillan-Barr.

    A SRA autolimitada e a maior parte dos sinais e sintomas desaparece em trs a quatro

    semanas. Linfadenopatia, letargia e astenia podem persistir por vrios meses. A presena de

    manifestaes clnicas mais intensas e prolongadas (superior a 14 dias) associa-se progresso mais

    rpida da doena.

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    Os sinais e sintomas que caracterizam a SRA, por serem muito semelhantes aos de outras

    infeces virais, so habitualmente atribudos a outra etiologia e a infeco pelo HIV comumente

    deixa de ser diagnosticada. Portanto, muito importante que o mdico, diante de um quadro viral

    agudo, considere a infeco pelo HIV entre os diagnsticos possveis e investigue potenciais fontes

    de exposio ao vrus. A sorologia para a infeco pelo HIV geralmente negativa nessa fase, mas o

    diagnstico pode ser realizado com a utilizao de mtodos moleculares para a deteco de RNA do

    HIV.

    1.2. Latncia clnica e fase sintomtica

    O exame fsico costuma ser normal na fase de latncia clnica, exceto pela linfadenopatia,

    que pode persistir aps a infeco aguda. A presena de linfadenopatia generalizada persistente

    frequente e seu diagnstico diferencial inclui doenas linfoproliferativas e tuberculose ganglionar.

    Podem ocorrer alteraes nos exames laboratoriais nessa fase, sendo a plaquetopenia um

    achado comum, embora sem repercusso clnica na maioria dos casos. Alm disso, anemia

    (normocrmica e normoctica) e leucopenia leves podem estar presentes.

    Enquanto a contagem de linfcitos T-CD4+ (LT-CD4+) permanece acima de 350 clulas/mm3,

    os episdios infecciosos mais frequentes so geralmente bacterianos, como as infeces

    respiratrias ou mesmo tuberculose, incluindo a forma pulmonar cavitria. Com a progresso da

    infeco, apresentaes atpicas das infeces, resposta tardia antibioticoterapia e/ou reativao

    de infeces antigas comeam a ser observadas.

    medida que a infeco progride, os sintomas constitucionais (febre baixa, perda ponderal,

    sudorese noturna, fadiga), diarreia crnica, cefaleia, alteraes neurolgicas, infeces bacterianas

    (pneumonia, sinusite, bronquite) e leses orais, como a leucoplasia oral pilosa, tornam-se mais

    frequentes. Nesse perodo, j possvel encontrar diminuio na contagem de LT-CD4+, situada

    entre 200 e 300 clulas/mm.

    A candidase oral um marcador clnico precoce de imunodepresso grave. A presena de

    candidase oral foi associada ao subsequente desenvolvimento de pneumonia por P. jirovecii.

    Diarreia crnica e febre de origem indeterminada, bem como leucoplasia oral pilosa, tambm so

    preditores de evoluo para aids.

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    1.3. Sndrome da Imunodeficincia Adquirida

    O aparecimento de infeces oportunistas e neoplasias definidor da Sndrome da

    Imunodeficincia Adquirida. Entre as infeces oportunistas destacam-se: pneumocistose,

    neurotoxoplasmose, tuberculose pulmonar atpica ou disseminada, meningite criptoccica e retinite

    por citomegalovrus.

    As neoplasias mais comuns so sarcoma de Kaposi, linfomas no Hodgkin e, em mulheres

    jovens, cncer de colo uterino. Nessas situaes, a contagem de LT-CD4+ est, na maioria das vezes,

    abaixo de 200 clulas/mm.

    Alm das infeces e das manifestaes no infecciosas, o HIV pode causar doenas por

    dano direto a certos rgos ou por processos inflamatrios, tais como miocardiopatia, nefropatia e

    neuropatias que podem estar presentes durante toda a evoluo da infeco pelo HIV-1.

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    2. Abordagem inicial e seguimento do adulto infectado pelo HIV

    Um dos objetivos da abordagem inicial de uma pessoa com diagnstico de infeco pelo HIV

    estabelecer uma slida relao mdico-paciente. O uso de uma linguagem acessvel fundamental

    para a compreenso dos aspectos essenciais da infeco, da avaliao clnico-laboratorial, da adeso

    e do tratamento.

    2.1. Histria e manifestaes clnicas iniciais

    Conhecer e compreender as condies psicossociais que envolvem o paciente representa

    uma ferramenta importante para a abordagem da pessoa vivendo com HIV (PVHA). Os itens listados

    na Tabela 1 servem para estruturar um roteiro que deve ser individualizado a partir das necessidades

    de cada paciente. A investigao no deve se esgotar na primeira consulta, mas precisa ser

    complementada e atualizada nos atendimentos subsequentes. Esses aspectos podem ser abordados

    pelo mdico ou outro membro da equipe de sade, conforme as particularidades de cada servio.

    Tabela 1. Roteiro de aspectos a serem abordados nos atendimentos iniciais

    Informaes especficas sobre a

    infeco pelo HIV

    Reviso e documentao do primeiro exame anti-HIV Tempo provvel de soropositividade Contagem de LT-CD4+ ou carga viral anterior Uso de antirretrovirais e eventos adversos prvios Compreenso sobre a doena: transmisso, histria natural, significado da

    contagem LT-CD4+ e carga viral Impacto da terapia antirretroviral combinada (TARV) na morbimortalidade

    Abordagem do risco Prticas sexuais Utilizao de preservativos Histria de sfilis e outras DST Uso de tabaco, lcool e outras drogas Interesse em reduzir os danos sade

    Histria mdica atual e passada Histria de doena mental Histria de tuberculose: prova tuberculnica e tratamento prvio Doena oportunista prvia ou atual e necessidade de quimioprofilaxia

    Outras doenas atuais e/ou pregressas Imunizaes Uso de outros medicamentos, prticas complementares e/ou alternativas

    Histria reprodutiva Desejo de ter filhos Estado sorolgico do parceiro e filho(s) Mtodos contraceptivos

    Histria psicossocial Reao emocional ao diagnstico Anlise da rede de apoio social (famlia, amigos, organizaes no

    governamentais) Nvel educacional Condies de trabalho e domiclio Alimentao Aspectos legais

    Histria familiar Doenas cardiovasculares e hipertenso Dislipidemias Diabetes

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    A infeco pelo HIV tem um acometimento sistmico, sendo necessrio, portanto, estar

    atento a sinais clnicos comumente associados doena (Figura 1). O exame fsico deve incluir a

    aferio da presso arterial, peso, altura, clculo do ndice de massa corprea e medida da

    circunferncia abdominal.

    Figura 1. Manifestaes clnicas da infeco pelo HIV no exame inicial

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    2.2. Exames complementares

    A abordagem laboratorial no incio do acompanhamento clnico auxilia a avaliao da

    condio geral de sade, a indicao de incio de TARV e a pesquisa de comorbidades. A contagem de

    LT-CD4+ estabelece o risco de progresso para aids e morte, sendo, portanto, o indicador

    laboratorial mais importante, em pacientes assintomticos, para definio do incio do tratamento.

    O Quadro 1 indica os exames sugeridos para estruturar a abordagem complementar inicial.

    Quadro 1. Exames complementares para abordagem inicial

    Hemograma Contagem de LT-CD4+ e carga viral do HIV Avaliao heptica e renal (AST, ALT, Cr, Ur, Na, K, exame bsico de urina) Exame parasitolgico de fezes

    Testes no treponmicos (VDRL ou RPR)

    Testes para hepatites virais (anti-HAV, anti-HCV, HBs Ag e anti-HBc) IgG para toxoplasma Sorologia para HTLV I e II e Chagas (considerar triagem na rotina para indivduos oriundos

    de reas endmicas)

    Dosagem de lipdios Glicemia de jejum Prova tuberculnica (PT) Radiografia de trax

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    O Quadro 2 indica a frequncia de realizao de exames complementares no seguimento dos

    pacientes.

    Quadro 2. Exames de seguimento adaptado do Guidelines DHHS Panel 2011

    Exame Pr-TARV Seguimento Comentrio

    Hemograma Sim 3-6 meses Repetir com maior frequnciaem pacientes sintomticos ouem uso de medicamentosmielotxicos

    Contagem de LT-CD4+ Sim 3-6 meses Intervalo de 6 meses parapacientes em TARV comestabilidade imunolgica (LT-CD4+ > 200 em duas aferies)

    Carga viral (CV) Sim 6 meses Repetir 2 a 3 meses aps oincio/troca de TARV paraavaliao da resposta virolgica

    Avaliao heptica e renal (AST, ALT,Cr, Ur, Na, K, exame bsico de urina)

    Sim Anual Intervalo de 3-6 meses empacientes em TARV

    Clculo do clearance da creatinina

    ou

    Taxa de filtrao glomerular1

    Sim Anual, em pacientescom risco acrescidode insuficincia renal(diabticos,coinfectados comHCV, negros,hipertensos)

    Intervalo de 3-6 meses empacientes em TARV

    Escore de risco cardiovascular deFramingham

    2

    Anual Homens > 40 anos e mulheres >50 anos, na ausncia de riscoscardiovasculares

    Prova tuberculnica (PT) Anual, caso o exameinicial seja < 5 mm

    Indicar tratamento da infecolatente quando PT 5mm

    Testes no treponmicos (VDRL ouRPR)

    6 meses

    Anti-HCV Anual, em caso desorologia noreagente

    Dosagem de lipdios Sim Anual

    Glicemia de jejum Sim Anual Considerar teste de tolerncia a

    glicose caso o resultado daglicemia de jejum esteja entre100 e 125 mg/dL

    Densitometria ssea 2-5 anos, emmulheres psmenopausa ehomens aps 50anos

    Fundoscopia 6 meses,emindivduos com LT-CD4+ < 50

    clulas/mm3

    1 http://www.sbn.org.br/equacoes/eq1.htm; http://mdrd.com/2 http://dab.saude.gov.br/cnhd/score_framingham/framingham.php

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    Recomenda-se que seja feita uma avaliao do risco cardiovascular global como rotina em

    toda pessoa com infeco pelo HIV, utilizando a escala de Framingham. O rastreamento

    neurocognitivo tambm deve ser realizado como rotina, utilizando questes que avaliem memria,

    lentificao psicomotora e ateno, no momento do diagnstico da infeco pelo HIV, antes do incio

    da TARV e depois, anualmente.

    A prova tuberculnica (PT) um importante marcador de risco para o desenvolvimento de

    tuberculose ativa. Caso a PT seja menor que 5 mm, recomenda-se que seja repetida anualmente e

    tambm aps a reconstituio imunolgica com o uso da TARV. Para indicar o tratamento da

    infeco latente, deve-se excluir tuberculose ativa utilizando critrios clnicos, exame de escarro e

    radiografia de trax. Uma vez que se trata da principal causa de bito em PVHA, a tuberculose deve

    ser pesquisada em todas as consultas.

    A infeco pelo HIV eleva o risco de desenvolvimento de tuberculose ativa em indivduos com

    tuberculose latente, sendo o mais importante fator identificado de risco para TB. O tratamento

    da infeco latente com isoniazida recomendado para todas PVHA com PT 5 mm, desde que

    excluda tuberculose ativa.

    A periodicidade das consultas mdicas deve adequar-se fase do tratamento e s condies

    clnicas do paciente. Aps a introduo ou alterao da TARV, recomenda-se retorno entre 7 e 15

    dias com o propsito de se observar eventos adversos e dificuldades que possam comprometer a

    adeso; em seguida, retornos mensais at a adaptao do paciente TARV. Pacientes com quadro

    clnico estvel podero retornar para consultas em intervalos de 3 a 4 meses; nesses casos, exames

    de controle tambm podero ser realizados com periodicidade maior.

    Ressalta-se que, nos intervalos entre as consultas mdicas, a adeso dever ser trabalhada

    por outros profissionais da equipe multiprofissional, quando o paciente comparecer ao servio para

    retirar medicamentos, realizar exames, participar de encontro de grupos e outras consultas.

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    2.3. Neoplasias e HIV

    Aps o advento da TARV, observou-se uma reduo acentuada das neoplasias relacionadas

    aids e, paralelamente, um aumento da incidncia das no relacionadas, principalmente pulmonar,

    anal, heptica e linfoma Hodgkin. As trs ltimas neoplasias so sabidamente correlacionadas

    presena de outros vrus e o cncer pulmonar ao tabagismo, apresentando uma maior incidncia nos

    portadores do HIV.

    Diante disso, destaca-se a necessidade da adoo de medidas preventivas e rastreamento

    adequado para a diminuio da incidncia e diagnstico precoce de neoplasias. De maneira geral, as

    neoplasias em PVHA devem ser rastreadas da forma habitual. O Quadro 3 resume as principais

    recomendaes para triagem de neoplasias frequentemente encontradas em pessoas vivendo comHIV. Ainda no existe diretriz definida de rastreamento para neoplasia de pulmo; assim, os servios

    devem trabalhar na perspectiva de reduo do risco, com a diminuio do tabagismo.

    Quadro 3. Rastreamento das neoplasias

    Local Pacientes Procedimento Frequncia

    MamaMulheres acima de40 anos

    Mamografia Anual

    Colo uterinoMulheressexualmente ativas

    PapanicolauAnual; realizar colposcopiana presena de alteraespatolgicas

    nus

    Relao receptivaanal, antecedente deHPV, histologia vulvar

    ou cervical anormal

    Toque retal ePapanicolau anal

    Anual; realizar anoscopiana presena de alteraespatolgicas

    FgadoPacientes cirrticos eportadores de HBsAgpositivos

    Dosar alfa-fetoprotena erealizar ultrassom

    Semestral

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    2.4. Preveno Positiva

    Essa abordagem tem como objetivo prevenir a transmisso do HIV e evitar a reinfeco e a

    aquisio de outros agravos, como sfilis, hepatite B e/ou hepatite C, o mais precocemente possvel.

    Visa, alm disso, estimular a adoo de um estilo de vida mais saudvel, que inclua atividade fsica

    rotineira e alimentao equilibrada.

    Entre as medidas que devem ser sistematicamente realizadas na ateno s PVHA, destacam-

    se:

    Aconselhar o paciente a reduzir as situaes de risco relacionadas a exposies sexuaisdesprotegidas, incluindo prticas orais;

    Pesquisar sintomas de possveis DST e trat-las; Estimular a avaliao das parcerias sexuais; Discutir o uso de lcool e outras drogas na perspectiva da reduo de danos; Discutir a questo do tabagismo e oferecer suporte para aqueles que desejem parar de

    fumar;

    Disponibilizar insumos de preveno (preservativos, gel, seringas e agulhas descartveis parausurios de drogas injetveis) e orientar o portador sobre o uso correto destes.

    2.5. Imunizao

    Adultos e adolescentes que vivem com HIV podem receber todas as vacinas do calendrio

    nacional, desde que no apresentem deficincia imunolgica importante. medida que aumenta a

    imunodepresso, eleva-se tambm o risco relacionado administrao de vacinas de agentes vivos,

    bem como se reduz a possibilidade de resposta imunolgica consistente.

    Sempre que possvel, deve-se adiar a administrao de vacinas em pacientes sintomticos ou

    com imunodeficincia grave (contagem de LT-CD4+ < 200 clulas/mm3), at que um grau satisfatrio

    de reconstituio imune seja obtido com o uso de terapia antirretroviral, o que proporciona melhora

    na resposta vacinal e reduo do risco de complicaes ps-vacinais.

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    A administrao de vacinas com vrus vivos atenuados (poliomielite oral, varicela, rubola,

    febre amarela, sarampo e caxumba) em pacientes com imunodeficincia deve ser condicionada

    analise individual de risco-benefcio e no deve ser realizada em casos de imunodepresso grave

    (Tabela 2).

    Tabela 2. Parmetros imunolgicos para imunizaes com vacinas de bactrias ou vrus vivos empacientes infectados pelo HIV com mais de 13 anos de idade

    Contagem de LT-CD4+(percentual)

    Recomendao para uso de vacinas com agentes vivos atenuados

    > 350 clulas/mm3 (> 20%) Indicar o uso

    200-350 clulas/mm3 (15-19%)

    Avaliar parmetros clnicos e risco epidemiolgico para a tomadade deciso

    < 200 clulas/mm3 (< 15%) No vacinar

    Fonte: Ministrio da Sade. Fundao Nacional de Sade (Funasa). Recomendaes para vacinao empessoas infectadas pelo HIV. Braslia, 2002.

    A imunogenicidade e eficcia da vacina contra hepatite B so inferiores em pacientes

    imunodeprimidos em relao aos imunocompetentes. Doses maiores e nmero aumentado de doses

    so necessrios induo de anticorpos em nveis protetores. Por esse motivo, so recomendadas

    quatro doses de vacina contra hepatite B, com o dobro da dose habitual(Tabela 3).

    importante lembrar que vacinaes podem causar variaes transitrias da carga viral do HIV-1.

    Desse modo, os exames de rotina no devem coincidir com as vacinaes, devendo ser realizados

    com pelo menos 30 dias de intervalo destas.

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    A Tabela 3aborda o esquema vacinal bsico para adultos e adolescentes que vivem com HIV.

    Tabela 3. Esquema vacinal para pacientes maiores de 13 anos infectados pelo HIV

    Vacina Recomendao

    Triplice viral1 Uma ou duas doses nos suscetveis com LT-CD+> 200 clulas/mm3

    Varicela2 Duas doses com intervalo de trs meses nossuscetveis com LT-CD4+ > 200 clulas/mm3

    Febre amarela3 Individualizar o risco/benefcio conforme asituao imunolgica do paciente e a situaoepidemiolgica da regio e, em caso deexposio, vacinar quando LT-CD4+ > 200

    clulas/mm3

    Dupla do tipo adulto (dT) Trs doses (0, 2, 4 meses) e reforo a cada 10anos

    Haemophilus influenzae tipo b (Hib) Duas doses com intervalo de dois meses nosmenores de 19 anos no vacinados

    Hepatite A Duas doses (0 e 6 meses) em indivduossuscetveis hepatite A (anti-HAV negativo),portadores de hepatopatia crnica, incluindoportadores crnicos do vrus da hepatite Be/ou C

    Hepatite B Dose dobrada recomendada pelo fabricante,administrada em quatro doses (0, 1, 2 e 6 ou12 meses) em todos os indivduos suscetveis hepatite B (anti-HBc negativo, anti-HBsnegativo)

    Streptococcus pneumoniae(23-valente)

    Uma dose para indivduos com contagem deLT-CD4+ > 200 clulas/mm3. Apenas umreforo aps cinco anos

    Influenza Uma dose anual da vacina inativada contra o

    vrus influenza1 Considerando os atuais surtos de sarampo na Europa e nos EUA, eventuais viajantes HIV+ que receberam

    apenas uma dose em seu histrico vacinal devem receber uma segunda dose se estiverem com LT-CD4+ >200 clulas/mm

    3.

    2 Existem poucos dados que respaldem seu uso de rotina em adultos e adolescentes HIV+ suscetveis varicela. contraindicada em gestantes.

    3 Contraindicada em gestantes.

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    2.6. Abordagem da transio: da adolescncia para o ambulatrio de adultos

    O acesso universal TARV proporcionou aumento na sobrevida e na qualidade de vida de

    crianas infectadas pelo HIV por transmisso vertical. O nmero de adolescentes e adultos jovens

    vivendo com HIV/aids que chegam aos servios de adultos cada vez maior, impondo novos desafios

    equipe de sade.

    Esses adolescentes geralmente apresentam longa exposio TARV, resultando em eventos

    adversos acumulados, resistncia virolgica e opes teraputicas reduzidas, habitualmente

    necessitando de acesso a novas classes de antirretrovirais e esquemas mais complexos. Deficincias

    neurocognitivas e pndero-estaturais so comuns, alm de graves questes psicossociais, tais como

    orfandade, desestruturao familiar e institucionalizao, aspectos que devem ser considerados nocuidado integral a essa populao.

    A transio de um servio peditrico para um servio de ateno a adultos deve ser

    entendida como um processo intencional e planejado que aborde as necessidades mdicas,

    psicossociais, vocacionais e educacionais dos adolescentes e adultos jovens que convivem com HIV.

    Essa transio, quando mal conduzida, pode impactar negativamente o cuidado, resultando em m

    adeso ou abandono do seguimento, com consequncias ligadas ao aumento de intercorrncias

    clnicas, progresso de doena e mortalidade.

    No h um modelo nico de transio aplicvel a todos os servios. Um modelo bem-

    sucedido geralmente baseia-se em uma transferncia gradual, sendo este um processo que requer

    flexibilidade e interao entre os servios. importante que a transio no seja determinada apenas

    pela faixa etria, mas pelo preparo e amadurecimento do adolescente. Portanto, esse momento

    deve ser tratado de forma cuidadosa, visando adaptao do adolescente nova etapa do seu

    cuidado, promovendo sua adeso ao tratamento com qualidade de vida.

    2.7. Sndrome inflamatria da reconstituio imune

    A reconstituio imune uma das metas da terapia antirretroviral (TARV). Em algumas

    situaes, todavia, observa-se um quadro clnico de carter inflamatrio exacerbado, chamado de

    Sndrome Inflamatria associada Reconstituio Imune (SIR) e associado ao incio da TARV.

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    Essa sndrome se manifesta como piora paradoxal de doenas infecciosas preexistentes,

    geralmente autolimitadas, mas que podem assumir formas graves. So descritas reaes inflamatrias

    relacionadas a infeces fngicas, virais e bacterianas, neoplasias e fenmenos autoimunes.

    A SIR tambm pode se apresentar como agravamento de uma doena j diagnosticada, como

    no caso da tuberculose, tradicionalmente cursando com aumento de linfonodos: nessa situao pode

    tambm ser chamada de reao paradoxal. Em outras situaes, ocorre o aparecimento de uma

    doena no diagnosticada previamente, exacerbando uma doena subclnica preexistente.

    O incio da TARV em pacientes com baixas contagens de LT-CD4+ um fator preditor para

    ocorrncia de SIR, especialmente havendo histria pregressa ou atual de coinfeces ou de infeces

    oportunistas. A preveno das complicaes associadas com SIR envolve identificao e manejo

    precoce.

    O diagnstico de SIR clnico e deve ser considerado quando sinais ou sintomas inflamatrios

    ocorrem 4 a 8 semanas aps o incio da TARV, na reintroduo de um esquema interrompido ou na

    modificao para um esquema mais eficaz aps a falha teraputica. Observa-se, em geral, aumento na

    contagem de LT-CD4+ e reduo na carga viral, demonstrando a efetividade do tratamento.

    Uma vez que no existem critrios bem estabelecidos para o diagnstico de SIR, normalmente

    necessria uma combinao de achados para orientar a suspeita clnica (Quadro 10).

    Quadro 10. Critrios para suspeita clnica de Sndrome da Reconstituio Imune

    1. Piora de doena reconhecida ou surgimento de nova manifestao aps incio da TARV.

    2. Presena de imunodepresso grave (contagem de LT-CD4+ < 100) antes do incio oumodificao do esquema.

    3. Relao temporal entre o incio da TARV e o aparecimento das manifestaes inflamatrias

    (dentro de 4 a 8 semanas do incio da TARV).

    4. Presena de resposta imune, virolgica ou ambas aps incio da TARV.

    5. Excluso de falha teraputica, reao adversa ou superinfeco.

    O Quadro 11 resume as principais apresentaes de SIR conforme as infeces oportunistas.

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    Quadro 11. Apresentao da SIR conforme as infeces oportunistas

    Tuberculose Agravamento dos sintomas pulmonares ou das imagens radiolgicas, alm deaumento nos linfonodos ou sintomas menngeos.

    Alteraes hepticas, difceis de diferenciar da hepatoxicidade induzida pelosmedicamentos.

    Complexo Mycobacteriumavium (MAC)

    Linfoadenite localizada, doena pulmonar ou inflamao sistmica.

    Cryptococcus Agravamento dos sintomas de meningite.

    Citomegalovrus (CMV) Surgimento ou agravamento de retinite, vitrete ou uvete.

    A retinite ocorre na maioria das vezes no local das inflamaes anteriores.

    SIR devida ao CMV ocular pode levar a rpida e permanente perda de viso.

    O tempo mdio para vitrete por SIR de 20 semanas aps o incio da TARV.

    Hepatite B ou C Elevaes transitrias das transaminases, difceis de distinguir da hepatite

    induzida por medicamentos.

    Leucoencefalopatiamultifocal progressiva (LEMP)

    Leses de LEMP podem aparecer com agravamento ou novos dficitsneurolgicos focais.

    Sarcoma de Kaposi Agravamento da doena.

    Doenas autoimunes Exacerbao de doenas autoimunes preexistentes, como sarcoidose.

    Vrus herpes simples (VHS) e

    vrus varicela-zoster (VVZ)

    Pode haver reativao de VHS e VVZ aps o incio da TARV.

    Complicaes dermatolgicasinespecficas

    Aparecimento ou piora das manifestaes dermatolgicas, tais comofoliculites, verrugas orais e genitais.

    No diagnstico diferencial, deve ser excluda falha da TARV por m adeso ou resistncia

    viral, falha ao tratamento da coinfeco ou da manifestao oportunista, interaes medicamentosas

    e eventos adversos associados TARV.

    Na suspeita de SIR, deve-se priorizar diagnstico e tratamento da doena oportunista. Na

    maior parte dos casos, sua resoluo espontnea, envolvendo, algumas vezes, tratamento

    sintomtico, tais como anti-inflamatrios no hormonais. Ressalta-se que a TARV no dever ser

    interrompida, exceto em casos graves.

    A terapia com corticosteroides suprimindo a resposta inflamatria deve ser utilizada nos

    casos graves. Pode ser necessrio o uso de prednisona 1-2 mg/kg, ou equivalente, durante 1 a 2

    semanas, com posterior retirada gradual. Devem-se considerar riscos e benefcios dessa terapia.

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    2.8. Genotipagem pr-tratamento

    O impacto da genotipagem pr-tratamento foi avaliado a partir de uma reviso sistemtica

    de estudos publicados sobre resistncia primria ou transmitida, com informaes sobre desfecho

    teraputico. A maioria desses estudos retrospectiva e apresenta resultados conflitantes. Alguns

    demonstraram maior probabilidade de falha teraputica em pacientes com mutaes de resistncia

    antes do incio da terapia, enquanto outros no encontraram diferenas em relao a esse desfecho.

    Mais recentemente, novas tcnicas de deteco de populaes virais minoritrias, mais

    sensveis do que a genotipagem convencional, permitiram detectar um maior nmero de mutaes

    de resistncia, correlacionando-as com maior chance de falha teraputica.

    Dados de uma grande coorte europeia demonstraram que a presena de mutaes de

    resistncia primria a pelo menos um antirretroviral utilizado no tratamento inicial aumentou o risco

    de falha teraputica no primeiro ano de acompanhamento.

    Apenas um estudo foi delineado e conduzido prospectivamente para avaliar a resposta

    teraputica em pacientes com presena ou ausncia de mutaes de resistncia primria. A

    proporo de supresso viral foi semelhante entre os dois grupos; entretanto, os esquemas

    teraputicos iniciais foram orientados pela genotipagem.

    Embora existam alguns resultados favorveis adoo da genotipagem pr-tratamento, h

    fragilidade metodolgica nos estudos e, por consequncia, nos resultados obtidos.

    Outro aspecto importante para a anlise de efetividade e custo-efetividade da adoo da

    genotipagem pr-tratamento a prevalncia da resistncia primria ou transmitida do HIV-1 na

    populao, uma vez que esta determina o nmero de testes de genotipagem necessrios para

    encontrar um caso em que o exame efetivamente influenciaria na deciso teraputica. Desse modo,

    considerando que a prevalncia da resistncia primria ou transmitida apresenta significativas

    diferenas regionais, a avaliao de custo-efetividade dessa estratgia deve ser avaliada em cada

    contexto epidemiolgico.

    Estudos realizados nos EUA e Europa sugerem que a prevalncia de resistncia primria a

    pelo menos um antirretroviral naquelas regies varia entre 6% e 16%. Na Venezuela e Argentina,

    utilizando a metodologia recomendada pela OMS, a prevalncia foi de 5% e 8,4%, respectivamente.

    Os dados nacionais de resistncia virolgica so discrepantes, seja pela heterogeneidade

    metodolgica dos estudos ou por possveis diferenas da prevalncia regional.

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    Dois estudos recentes adotaram as mutaes propostas pela OMS e incluram amostras das

    cinco regies do Brasil, embora no representativas do pas, ou mesmo das regies brasileiras.

    Nesses estudos, a prevalncia nacional de mutaes de resistncia primria a qualquer classe de ARV

    foi de 8,1% e 12,3%. Apesar da sua importncia como alerta para fins de vigilncia, esses resultados

    no subsidiam a deciso da adoo da genotipagem pr-tratamento universal, pelos motivos j

    expostos.

    Em sntese, inexistem evidncias publicadas com metodologia adequada que sustentem de

    modo inequvoco o benefcio da implantao rotineira de genotipagem pr-tratamento no Brasil.

    Alm disso, preciso ponderar vantagens e desvantagens de sua utilizao na rotina pr-tratamento,

    incluindo o potencial retardo no incio da TARV e o impacto desfavorvel na Rede Nacional de

    Genotipagem (Renageno). Por fim, so necessrios estudos representativos para avaliar a magnitude

    da resistncia primria do HIV no Brasil.

    Assim, neste momento, recomenda-se a realizao de genotipagem pr-tratamento apenas

    para pessoas que tenham se infectado com um parceiro em uso atual ou prvio de TARV, uma vez

    que a possibilidade de transmisso de mutaes de resistncia mais provvel nessa situao. A

    genotipagem pr-tratamento tambm est indicada para gestantes infectadas pelo HIV.

    O Ministrio da Sade indica a realizao de genotipagem pr-tratamento nas seguintes

    situaes:

    - Pessoas que tenham se infectado com parceiro em uso de TARV (atual ou pregresso)

    - Gestantes infectadas pelo HIV

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    3. Critrios para incio de tratamento antirretroviral

    A instituio da terapia antirretroviral (TARV) no tem o objetivo de erradicar a infeco pelo

    HIV, mas diminuir sua morbidade e mortalidade, melhorando a qualidade e a expectativa de vida das

    pessoas que vivem com HIV/aids (PVHA). Definir o melhor momento para o incio de tratamento

    uma das decises mais importantes no acompanhamento clnico, devendo ser considerados os riscos

    associados infeco no tratada frente aos da exposio prolongada aos medicamentos.

    Desde o surgimento dos primeiros esquemas antirretrovirais, busca-se definir critrios para

    incio do tratamento com base nas estimativas de risco de infeces oportunistas, evoluo para aids

    e bito. Entretanto, j existem evidncias de que, mesmo em indivduos assintomticos com

    contagens elevadas de LT-CD4+, a replicao viral e a ativao imune crnica so associadas ao

    desenvolvimento de doenas no tradicionalmente relacionadas infeco pelo HIV, tais como

    eventos cardiovasculares.

    Tambm se observa que pessoas com reconstituio imune, em uso de TARV, que mantm

    contagens de LT-CD4+ acima de 500 clulas/mm3 e carga viral indetectvel atingem expectativa de

    vida semelhante da populao geral. Ressalta-se que, quando o tratamento iniciado

    precocemente, aumentam-se as chances de se alcanar nveis elevados de LT-CD4+.

    Evidncias robustas demonstram o benefcio da TARV em pessoas com aids ou outros

    sintomas relacionados imunodeficincia provocada pelo HIV e em indivduos assintomticos com

    contagem de LT-CD4+ inferior a 350 clulas/mm3.

    Mais recentemente, tem-se observado reduo da morbimortalidade com o incio mais

    precoce de TARV. Contudo, muitas dessas evidncias provm de estudos observacionais que

    possuem importantes limitaes, tais como falta de aleatoriedade na seleo de grupos, dificultando

    o controle estrito dos fatores de confuso.

    Alm do impacto clnico favorvel, o incio mais precoce da TARV vem sendo demonstrado

    como ferramenta importante na reduo da transmisso do HIV. Todavia, deve-se considerar a

    importncia da adeso e o risco de efeitos adversos no longo prazo.

    Assim, evidncias de benefcios clnicos e de preveno da transmisso do HIV providas por

    estudos intervencionistas e observacionais, somadas disponibilidade de opes teraputicas

    progressivamente mais cmodas e bem toleradas, justificam o estabelecimento de novos critrios

    para o incio do tratamento antirretroviral, que incluem a recomendao de incio mais precoce.

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    3.1. Incio de TARV em indivduos sintomticos

    A TARV est indicada para todos os indivduos sintomticos, independentemente da

    contagem de LT-CD4+. Entendem-se por sintomticos os pacientes que apresentam sintomas

    indicativos de:

    Imunodeficincia (Quadro 4):o Avanada (doena definidora de aids)o Moderada

    Manifestaes clnicas atribudas diretamente ao HIV:o Nefropatia associada ao HIV (NAHIV): uma forma clssica de acometimento

    glomerular que pode ocorrer com qualquer nvel de LT-CD4+. Manifesta-se por

    proteinria intensa e hipoalbuminemia, habitualmente sem sinais clnicos de

    hipertenso arterial ou edema.

    oAlteraes neurolgicas atribudas ao HIV, incluindoalteraesneurocognitivas, comoperda da memria, lentificao psicomotora e dficit de ateno. Em uma fase inicial da

    demncia associada ao HIV, esses sintomas costumam ser leves, evoluindo para dficits

    mais graves, tais como distrbios da marcha, tremor e perda da habilidade motora fina.

    o Cardiomiopatia associada ao HIV.

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    Quadro 4. Manifestaes de imunodeficincia associadas ao HIV

    Manifestaes de imunodeficincia avanada1 (doenas definidoras de aids)

    Sndrome consumptiva associada ao HIV (perda involuntria de mais de 10% do peso habitual)associada a diarreia crnica (dois ou mais episdios por dia com durao 1 ms) ou fadigacrnica e febre 1 ms

    Pneumonia por Pneumocystis jirovecii Pneumonia bacteriana recorrente (dois ou mais episdios em um ano) Herpes simples com lceras mucocutneas (durao > 1 ms) ou visceral em qualquer localizao Candidase esofgica ou de traqueia, brnquios ou pulmes Tuberculose extrapulmonar Sarcoma de Kaposi Doena por Citomegalovrus (retinite ou outros rgos, exceto fgado, bao ou linfonodos) Neurotoxoplasmose Encefalopatia pelo HIV Criptococose extrapulmonar Infeco disseminada por micobactrias no-M. tuberculosis Leucoencefalopatia multifocal progressiva Criptosporidiose intestinal crnica (durao > 1 ms) Isosporase intestinal crnica (durao > 1 ms) Micoses disseminadas (histoplasmose, coccidiomicose) Septicemia recorrente por Salmonella no-thyphi Linfoma no-Hodgkin de clulas B ou primrio do sistema nervoso central Carcinoma cervical invasivo Reativao de doena de Chagas (meningoencefalite e/ou miocardite) Leishmaniose atpica disseminada Nefropatia ou cardiomiopatia sintomtica associada ao HIV

    Manifestaes de imunodeficincia moderada2

    Perda de peso inexplicada (> 10% do peso) Diarria crnica por mais de um ms Febre persistente inexplicada por mais de um ms (> 37,6C, intermitente ou constante) Candidase oral persistente Candidase vulvovaginal persistente, frequente ou no responsiva terapia Leucoplasia pilosa oral Tuberculose pulmonar Infeces bacterianas graves (por exemplo: pneumonia, empiema, meningite, piomiosite,

    infeces steo-articulares, bacteremia, doena inflamatria plvica grave)

    Estomatite, gengivite ou periodontite aguda necrosante Anemia inexplicada (< 8 g/dL), neutropenia (< 500 clulasl/L) e/ou trombocitopenia crnica ( 10%, candidase, prurigo, diarreia crnica e contagem de linfcitos totais < 1.000 no

    hemograma. Nessas situaes, a TARV dever ser introduzida no 15 dia do tratamento da TB ativa.

    Recomenda-se iniciar TARV para todas as PVHA com TB ativa, independentemente da forma clnica

    e contagem de LT-CD4+. Seu incio deve ser precoce, entre a 2 e 8 semana aps o incio do

    tratamento da tuberculose.

    Ressalta-se que, nos casos de tuberculose menngea, o incio precoce de TARV no altera o

    prognstico da doena e ainda relaciona-se maior ocorrncia de eventos adversos de grau 4

    (eventos limitantes ou com risco vida). Assim, nessa forma de TB, recomenda-se que o incio da

    TARV seja postergado para aps 2 meses de tratamento da TB, independentemente da contagem de

    LT-CD4+.

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    3.2. Incio de TARV em indivduos assintomticos

    O impacto favorvel do incio mais precoce da terapia antirretroviral vem sendo observado

    em diversos estudos clnicos nos ltimos anos. O limiar de LT-CD4+ mais elevado para desencadear o

    comeo do tratamento foi favorecido por dois ensaios clnicos randomizados, apesar de no terem

    sido desenhados para essa finalidade. Nesses estudos, comparou-se o incio de TARV com LT-CD4+

    acima de 350 clulas/mm3 com o incio do tratamento quando a contagem fosse inferior a 250

    clulas/mm3.

    O estudo SMART (2008), que comparou terapia intermitente em relao terapia contnua,

    demonstrou reduo da morbimortalidade nos pacientes que iniciaram o tratamento maisprecocemente, em relao queles que o iniciaram quando a contagem de LT-CD4+ atingiu um

    patamar mais baixo (> 350 vs. 250 clulas/mm3).

    Recentemente, resultados de um estudo com casais heterossexuais sorodiscordantes

    (HPTN052) tambm corroboraram o incio mais precoce de TARV. O estudo objetivou avaliar a

    reduo da transmisso entre os casais e a reduo de eventos clnicos na populao tratada. Foram

    recrutados 1.763 casais, em vrios pases, incluindo o Brasil, em que o parceiro HIV+ era virgem de

    TARV e com LT-CD4+ entre 350 e 550 clulas/mm3

    , tendo-se comparado a introduo imediata da

    terapia com o tratamento postergado at que o LT-CD4+ estivesse abaixo de 250 clulas/mm3, em

    dois exames consecutivos.

    Neste estudo, observou-se reduo de 96% na transmisso com a terapia mais precoce (RR

    0,04; IC 95% 0,01-0,27, com p < 0,001). Refora-se a este achado, uma reduo significativa em

    eventos clnicos ou morte no grupo de terapia imediata. Aps mediana de 1,7 anos de

    acompanhamento, ocorreram 40 eventos clnicos ou morte no grupo de terapia imediata, contra 65

    eventos clnicos ou morte no grupo de terapia postergada (RR 0,59; IC 95% 0,4-0,88). Essa diferena

    foi principalmente devido maior incidncia de tuberculose extrapulmonar no grupo da terapia

    postergada. A mortalidade, analisada de forma isolada (RR 0,77; IC 95% 0,34-1,76), no teve

    diferena significativa entre os grupos.

    Alm disso, estudos observacionais tambm tm respaldado o incio mais precoce da TARV.

    Essas evidncias provm de estudos que avaliaram evoluo para aids e mortalidade em grandes

    coortes de indivduos virgens de tratamento, que iniciaram TARV em vrios nveis de LT-CD4+ (ART-

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    CC, NA-ACCORD, CASUAL, CASCADE). Como j enfatizado, nesses estudos observacionais no h

    aleatoriedade e no possvel o controle estrito dos fatores de confuso.

    O NA-ACCORD analisou dados de 22 coortes (17.517 pacientes virgens de TARV, sem

    diagnstico prvio de aids, acompanhados de 1996 a 2006, em 60 centros de pesquisa). Foram

    realizadas duas anlises independentes, utilizando os seguintes limiares de LT-CD4+ para incio da

    TARV: 350 e 500 clulas/mm3. Definiu-se como TARV imediata a iniciada antes do limiar de LT-

    CD4+ estipulado e adiada aquela postergada para depois de atingido o limiar. O objetivo do estudo

    foi comparar as taxas de bito dos grupos TARV imediata vs. TARV adiada, para os dois limiares

    de LT-CD4+.

    Nesse estudo, postergar TARV para quando a contagem de LT-CD4+ atingisse 350

    clulas/mm3 levou a um aumento de 69% no risco de morte. De modo semelhante, quando o limiar

    considerado foi de 500 clulas/mm3, o grupo que adiou a TARV at esse valor apresentou risco de

    bito 94% mais elevado, em relao ao que iniciou de imediato a terapia. A idade mais avanada foi

    um preditor independente de mortalidade.

    A relevncia do NA-ACCORD reside no tamanho da populao observada, na utilizao de

    bito por qualquer causa como desfecho principal e na possibilidade de registrar os eventos

    ocorridos antes do incio da TARV. Por outro lado, pelos motivos previamente expostos, a

    interpretao de dados observacionais demanda cautela. Alm disso, uma grande proporo de

    pacientes no foi includa na anlise, uma vez que estes no seguiram a estratificao inicialmente

    definida, no iniciaram TARV ou no evoluram para o extrato inferior de LT-CD4+. Dados sobre o

    impacto na toxicidade e resistncia viral com o incio mais precoce da TARV no foram avaliados.

    O estudo ART-CC agregou resultados de 18 coortes que incluram pacientes assintomticos,

    no usurios de drogas intravenosas e virgens de tratamento, que iniciaram TARV a partir de 1998,

    com contagem de LT-CD4+ abaixo de 550 clulas/mm3. O objetivo do estudo foi avaliar a

    probabilidade de aids e/ou bito com o incio da TARV em diferentes patamares de LT-CD4+.

    Observou-se um aumento estatisticamente significativo de 28% na taxa combinada de aids e

    bito quando a TARV foi iniciada na faixa de LT-CD4+ de 251-350 clulas/mm3, em comparao com

    o incio na faixa de 351-450 clulas/mm3 (risco relativo RR 1,28; IC 95% 1,04-1,57). No houve

    diferena significativa no desfecho bito isolado com incio mais precoce de TARV. Em faixas de LT-

    CD4+ mais elevadas, adiar a TARV no se associou a maior risco de progresso de doena.

    O grande nmero de pacientes observados por longo perodo e a incluso de eventos

    ocorridos antes do incio da TARV, ainda que estimados, aumentam a consistncia dos achados desse

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    estudo. A estratificao em faixas estreitas de LT-CD4+ permite identificar com mais preciso a faixa

    ideal para o incio do tratamento. A comparao de faixas mais amplas leva a valores de risco relativo

    elevados e mais impactantes, tendo, porm, menor relevncia clnica, j que alguns pacientes que

    iniciaram TARV com LT-CD4+ na faixa de 100 clulas/mm3 acabaram sendo comparados com outros

    que iniciaram com LT-CD4+ acima de 500 clulas/mm3, por exemplo.

    Por fim, importante enfatizar que a elevao do risco de progresso, quando se adia a

    introduo da TARV para a faixa de LT-CD4+ de 251-350 clulas/mm3 (quando comparada de 351-

    450), foi de apenas 28%. Isso representa uma diferena absoluta muito pequena, j que a taxa de

    aids e bito nessa fase da infeco muito baixa, em torno de 3%.

    Outro estudo de coortes colaborativas da Europa e Estados Unidos (the HIV-CASUAL

    Collaboration) incluiu 8.392 pacientes virgens de TARV, com LT-CD4+ > 500 clulas/mm3, que tiveram

    declnio desse marcador para valores inferiores a 500 clulas/mm3. O estudo estimou que aguardar o

    incio da TARV com valores menores que 350 clulas/mm3 associou-se a um maior risco de

    desenvolvimento de doena definidora de aids ou morte, em comparao com incio de TARV entre

    350 e 500 clulas/mm3 (RR 1,38; IC 95% 1,23-1,56). Avaliando-se apenas mortalidade, no houve

    diferena entre os grupos (RR 1,01; IC 95% 0,84-1,22).

    Uma coorte coolaborativa da Europa, Austrlia e Canad (the CASCADE Collaboration) incluiu

    5.527 pacientes virgens de TARV, com LT-CD4+ entre 350 e 499 clulas/mm3. Foram comparados dois

    grupos: pacientes que comearam tratamento nessa faixa e os que esperaram para come-lo

    quando os valores baixaram para menos de 350 clulas/mm3. Os que iniciaram TARV com LT-CD4+

    entre 350 e 499 clulas/mm3 tiveram reduo estatisticamente significativa quando o bito foi

    analisado isoladamente (RR 0,51; IC 95% 0,33-0,80) e uma tendncia diminuio do risco de doena

    definidora de aids ou morte (RR 0,75; IC 95% 0,49-1,14).

    Somam-se ao exposto evidncias do impacto da TARV na reduo do risco de tuberculose em

    regies de alta endemicidade. Resultados de uma metanlise recente, que incluiu onze estudos,

    demonstraram que o incio do tratamento fortemente associado reduo da incidncia de

    tuberculose em PVHA, em qualquer um dos nveis de LT-CD4+ analisados (< 200, 200-350, > 350),

    principalmente se associado ao tratamento da infeco latente com isoniazida.

    Desse modo, a recomendao de incio precoce da TARV considera, alm dos benefcios

    relacionados reduo da morbimortalidade em PVHA, a diminuio da transmisso da infeco e o

    impacto na reduo da tuberculose, a qual constitui principal causa de bitos em PVHA no Brasil.

    Refora-se a importncia de se trabalhar a adeso para garantir que essa estratgia alcance seus

    objetivos.

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    Recomenda-se o incio de TARV para todos os indivduos assintomticos nas seguintes situaes:

    LT-CD4+ menor ou igual a 500 clulas/mm3 LT-CD4+ acima de 500 clulas/mm3 na coinfeco pelo vrus da hepatite B (HBV)

    A progresso da hepatite B mais rpida em coinfectados pelo HIV e pelo HBV do que entre

    os monoinfectados pelo HBV, e o risco de morte por complicaes decorrentes de doena heptica

    superior em indivduos com LT-CD4 < 500 clulas/mm3. Pacientes com indicao de tratamento para

    hepatite B, e para os quais o interferon no esteja recomendado, devem iniciar mais precocemente a

    TARV.

    Considerar o incio de TARV nas seguintes situaes:

    LT-CD4+ acima de 500 clulas/mm3- Doena cardiovascular estabelecida ou risco cardiovascular elevado (acima de 20%,

    segundo escore de Framingham);

    No estudo SMART, os pacientes que suspenderam TARV tiveram maior frequncia de evento

    cardiovascular e bito quando comparados ao grupo de tratamento supressivo. Pacientes que

    iniciam TARV melhoram significativamente a funo das clulas endoteliais, ainda que ocorra uma

    piora metablica, o que pode aumentar o risco cardiovascular. A durabilidade da melhora da funo

    das clulas endoteliais transitria, pois mesmo os pacientes com carga viral indetectvel continuam

    a ter marcadores inflamatrios alterados quando comparados aos pacientes HIV negativos, ou seja,

    mantm o quadro de inflamao. A depleo do LT-CD4+ do tecido linfoide associado ao trato

    gastrointestinal (GALT) parece ser precoce, o que representaria um facilitador de translocao

    antignica e manuteno da ativao imune e do risco cardiovascular. Nessas situaes, deve-se

    individualizar a conduta sobre o incio mais precoce de TARV.

    - Neoplasias no definidoras de aids com indicao de quimioterapia ou radioterapia.

    Em pessoas que iniciaro tratamento potencialmente imunossupressor, pode-se considerar o

    incio mais precoce de TARV.

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    Recomenda-se monitorizao frequente para definir possvel incio mais precoce de TARV nas

    seguintes situaes:

    Coinfeco pelo vrus da hepatite C (HCV)No caso de pacientes com contagens de LT-CD4+ 500 clulas/mm3, recomenda-se iniciar TARV

    e aguardar o aumento dos LT-CD4+ para o incio do tratamento do HCV. Nos casos de LT-CD4+

    superiores a 500 clulas/mm3, recomenda-se tratar inicialmente a hepatite C, protelando o uso de

    TARV, para evitar interaes medicamentosas e sobreposio de toxicidades. Em todas as situaes,

    a abordagem deve ser individualizada e a prioridade de cada um dos tratamentos discutida com

    profissionais experientes no manejo de ambas as infeces.

    Carga viral acima de 100.000 cpias/mLEm pacientes com contagem de LT-CD4+ > 500 clulas/mm3 e carga viral superior a 100.000

    cpias/mL, recomenda-se monitorizao laboratorial frequente e considerar incio de TARV quando o

    LT-CD4+ estiver prximo a 500 clulas/mm3.

    3.3. Incio de TARV em gestantes

    Est recomendado o incio de TARV para todas as gestantes, independentemente da

    presena de sintomas ou da contagem de LT-CD4+. Recomenda-se tambm a manuteno da terapia

    antirretroviral aps o parto, independentemente do nvel de LT-CD4+ no momento do incio.

    3.4. Incio de TARV para pessoas vivendo com HIV em parcerias sorodiscordantes

    Diferentes fatores esto associados transmisso sexual do HIV, tais como carga viral, tipo

    de relao sexual, presena de doenas sexualmente transmissveis, momento do ciclo menstrual,

    ocorrncia de traumatismos, entre outros. De modo geral, a magnitude da replicao viral o

    principal fator biolgico associado transmisso sexual.

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    O aconselhamento a casais e parcerias sorodiscordantes deve ser contnuo, assim como a

    abordagem a respeito da sexualidade, esclarecendo-os sobre potenciais riscos associados s prticas

    sexuais desprotegidas. A testagem da parceria sexual soronegativa deve ser oferecida quando

    ocorrer exposio sexual de risco, ou mesmo periodicamente, devendo-se individualizar essa

    conduta.

    Vrios estudos demonstram que o uso de antirretrovirais representa uma potente

    interveno para a preveno da transmisso do HIV. Uma metanlise de 11 estudos de coorte que

    incluram 5.021 casais heterossexuais sorodiscordantes descreveu 461 episdios de transmisso e

    nenhum episdio quando o parceiro infectado estava sob tratamento e com carga viral plasmtica

    abaixo de 400 cpias/mL.

    Posteriormente, foram publicados os resultados de um estudo prospectivo em uma coorte

    africana envolvendo 3.381 casais heterossexuais sorodiscordantes, em que 349 indivduos iniciaram

    tratamento durante o perodo de seguimento. Apenas um caso de transmisso ocorreu nas parcerias

    dos participantes que estavam em tratamento e 102 quando a pessoa infectada pelo HIV no estava

    em tratamento, o que representou reduo de 92% no risco de transmisso.

    Mais recentemente, foram publicados os resultados do estudo HPTN052, o primeiro ensaio

    clnico randomizado que avaliou a transmisso sexual do HIV entre casais sorodiscordantes. Foram

    randomizados 1.763 casais com contagem de LT-CD4+ entre 350 e 550 clulas/mm3 para incio

    imediato do tratamento ou para inici-lo quando a contagem de LT-CD4+ estivesse abaixo de 250

    clulas/mm3.

    Durante o estudo, ocorreram 39 episdios de transmisso, dos quais 28 foram

    virologicamente vinculados ao parceiro infectado; apenas um episdio ocorreu no grupo de terapia

    precoce, observando-se diminuio de 96% na taxa de transmisso quando a pessoa que vive com

    HIV iniciava tratamento com contagem de LT-CD4+ entre 350 e 550 clulas/mm3.

    Ressalta-se que 97% dos casais envolvidos no estudo eram heterossexuais, quemajoritariamente os casais reportavam parceiro nico e sexo protegido e que no foi avaliada a

    transmisso em faixas de LT-CD4+ superiores a 550 clulas/mm3.

    Diante do exposto, informaes sobre o efeito da TARV na transmissibilidade do HIV devem

    ser discutidas com as pessoas inseridas em relaes sorodiscordantes, no contexto da estratgia de

    preveno, ressaltando-se a inexistncia de dados conclusivos a respeito do benefcio clnico de se

    iniciar o tratamento em faixas de LT- CD4+ acima de 500 clulas/mm3.

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    A TARV deve ser iniciada desde que a pessoa que vive com HIV esteja esclarecida sobre

    benefcios e riscos, alm de fortemente motivada e preparada para o tratamento, respeitando-se a

    autonomia do indivduo. Deve-se enfatizar que a TARV, uma vez iniciada, no dever ser

    interrompida.

    Apesar da escassa evidncia de benefcio da TARV para preveno em populaes de homens

    que fazem sexo com homens (HSH), considera-se que a recomendao deva ser estendida a essa

    populao. No entanto, a magnitude do efeito protetor pode ser diferente, uma vez que a

    probabilidade de transmisso difere de acordo com o tipo de prticas sexuais.

    O emprego do tratamento antirretroviral com a finalidade de reduzir o risco de transmisso do

    HIV deve ser discutido e oferecido a pessoas que vivem com HIV e que estejam em

    relacionamentos sorodiscordantes, independentemente de sua orientao sexual. Deve-se

    inform-las sobre riscos e benefcios da antecipao do tratamento, respeitando sua autonomia

    no processo decisrio.

    Caso ocorra exposio sexual de risco, deve ser utilizada profilaxia ps-exposio sexual (PEP

    sexual) para o parceiro soronegativo, especialmente nos casos em que tenha ocorrido ruptura ou

    no utilizao do preservativo.

    Ressalta-se que a utilizao da TARV pela pessoa que vive com HIV no dispensa o uso de

    preservativos e a adoo de outras prticas seguras: o emprego de estratgias combinadas

    potencializa a preveno da transmisso do HIV e previne a transmisso das hepatites B e C, sfilis e

    outras doenas sexualmente transmissveis.

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    O Quadro 5 resume os critrios para incio da terapia em PVHA.

    Quadro 5. Recomendaes para incio de terapia antirretroviral (TARV) em pessoas vivendo comHIV/aids

    Status clnico e imunolgico Recomendao

    Sintomticos

    Independentemente da contagemde LT-CD4+ Iniciar TARV

    Assintomticos

    LT-CD4+ 500 clulas/mm3 Iniciar TARV

    LT-CD4+> 500 clulas/mm3 Recomendar incio de TARV na coinfeco HIV-HBV com indicao de

    tratamento para hepatite

    Considerar incio de TARV nas seguintes situaes:- Neoplasias no definidoras de aids com indicao de quimioterapiaou radioterapia- Doena cardiovascular estabelecida ou risco cardiovascular elevado

    Sem contagem de LT-CD4+disponvel

    No iniciar TARV

    Gestantes

    Independentemente da contagemde LT-CD4+

    Iniciar TARV

    PVHA em parceria sorodiscordante

    Independentemente da contagemde LT- CD4+

    Oferecer TARV na perspectiva de reduo da transmissibilidade doHIV. A deciso deve ser individualizada, considerando motivao daPVHA

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    4. Escolha do esquema inicial

    Os medicamentos recomendados para iniciar a TARV compem esquemas eficazes,

    geralmente mais simplificados, menos txicos e de menor custo, e pertencem a trs classes

    amplamente utilizadas:

    Inibidores da transcriptase reversa anlogos de nucleosdeos e nucleotdeos (ITRN/ITRNt); Inibidores da transcriptase reversa no anlogos de nucleosdeos (ITRNN); Inibidores da protease reforados com ritonavir (IP/r).

    A deciso em relao escolha do esquema antirretroviral deve considerar alguns fatores:

    - Eficcia e toxicidade imediata e no longo prazo;

    - Presena de coinfeces e comorbidades;

    - Uso concomitante de outros medicamentos;

    - Potencial de adeso;

    - Adequao rotina de vida do paciente;

    - Interao com a alimentao;

    - Custo dos medicamentos.

    A terapia inicial deve sempre incluir combinaes de trs antirretrovirais, sendo dois

    ITRN/ITRNt associados a um ITRNN ou IP/r (Quadro 6).

    Quadro 6. Esquemas recomendados para terapia inicial

    2 ITRN/ITRNt +ITRNN Preferencial

    IP/r Alternativo

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    4.1. Escolha da dupla de ITRN/ITRNt

    A associao zidovudina/lamivudina (AZT/3TC) uma das mais estudadas em ensaios

    clnicos randomizados: apresenta eficcia e segurana equivalentes a outras combinaes de dois

    ITRN/ITRNt, sendo habitualmente bem tolerada. Est disponvel em coformulao no Sistema nico

    de Sade (SUS), o que contribui para maior comodidade posolgica, devendo-se ingerir 1

    comprimido 2 vezes ao dia. amplamente utilizada, apresenta menor custo comparativo dentro da

    classe e produzida no Brasil, o que fortalece a sustentabilidade do acesso universal.

    Os ITRN esto mais associados a toxicidade mitocondrial, hiperlactatemia e acidose ltica. A

    toxicidade hematolgica um dos principais efeitos adversos do AZT, o que pode resultar na sua

    substituio. Recomenda-se evitar o uso desse medicamento em casos de anemia (Hb < 10g/dL) e/ouneutropenia (neutrfilos < 1.000 clulas/mm3). Em pacientes com anemia secundria infeco pelo

    HIV, o uso do AZT pode reverter esse quadro laboratorial; porm, os ndices hematimtricos devem

    ser monitorados at a estabilizao da anemia. Outro efeito adverso do AZT a ser considerado a

    lipoatrofia. As causas so multifatoriais e de difcil manejo. Esse evento pode comprometer a adeso

    TARV.

    A associao tenofovir com lamivudina (TDF/3TC) apresenta um perfil de toxicidade

    favorvel em relao lipoatrofia e toxicidade hematolgica quando comparado ao AZT, e permite

    tomada nica diria. O TDF um anlogo de nucleotdeo (ITRNt) e sua maior desvantagem a

    nefrotoxicidade, particularmente em diabticos, hipertensos, negros, idosos e no uso concomitante

    de outros medicamentos nefrotxicos. Pacientes com doena renal preexistente devem usar

    preferencialmente outra associao de ITRN. A diminuio da densidade ssea tem sido relacionada

    ao uso de TDF.

    A dupla de ITRN/ITRNt recomendada para compor o esquema de tratamento antirretroviral

    inicial AZT/3TC ou TDF/3TC: a deciso deve ser individualizada, de acordo com as

    caractersticas do paciente.

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    A combinao abacavir com lamivudina (ABC/3TC) alternativa para os pacientes com

    intolerncia ou contraindicao aos esquemas com AZT/3TC ou TDF/3TC. Alguns ensaios clnicos

    mostram que essa associao apresentou maior risco de falha virolgica em pacientes com carga

    viral mais elevada, devido baixa barreira gentica. Reaes de hipersensibilidade esto

    relacionadas ao incio do tratamento com ABC.

    A combinao didanosina com lamivudina (ddI/3TC) recomendada na terapia inicial

    apenas nas situaes de intolerncia ao AZT, TDF e ABC. Pancreatite e neuropatia perifrica esto

    relacionadas ao uso do ddI.

    A estavudina (d4T) no recomendada como opo de ITRN para incio de terapia devido

    existncia de outras opes teraputicas com melhor perfil de toxicidade. Recomenda-se que

    pacientes ainda em uso desse medicamento tenham seu esquema reavaliado e substitudo, de

    acordo com a Nota Tcnica no 90/2012 CQV/D-DST-AIDS-HV/SVS/MS.

    4.2. Qual classe deve compor o esquema com a dupla de ITRN/ITRNt: ITRNN ou IP?

    Achados de uma metanlise envolvendo 53 ensaios clnicos randomizados mostraram

    equivalncia na proporo da resposta virolgica ao esquema inicial entre pacientes que receberam

    2 ITRN/ITRNt + ITRNN (efavirenz) e 2 ITRN/ITRNt + IP/r.

    Um ensaio clnico randomizado (ECR) comparou diretamente esquemas iniciais contendo 2

    ITRN/ITRNt + efavirenz (ITRNN) e 2 ITRN/ITRNt + lopinavir/r (IP/r). Em uma anlise por inteno de

    tratar, os resultados de supresso viral (carga viral < 50 cpias/mL) foram superiores em esquemas

    estruturados com ITRNN.

    Esquemas estruturados com ITRNN, particularmente com efavirenz (EFV), possuem melhor

    perfil de toxicidade, maior comodidade posolgica, maiores taxas de adeso ao tratamento em longo

    prazo, elevada potncia de inibio da replicao viral, maior efetividade e maior durabilidade da

    supresso viral, quando comparados a esquemas estruturados com inibidores da protease.

    A longa meia-vida do efavirenz permite a manuteno da supresso da replicao viral caso

    ocorra irregularidade no horrio de tomada de doses, embora possa haver maior risco de falha

    quando h perda de doses.

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    Quando comparados aos IP/r, os ITRNN so raramente associados a manifestaes

    gastrintestinais, tais como nuseas, vmitos ou diarreia. Alm disso, dislipidemia e resistncia

    perifrica insulina parecem ser menos frequentes com o uso de esquemas contendo ITRNN.

    Por outro lado, a vantagem de esquemas estruturados com IP/r est relacionada sua maior

    barreira gentica de resistncia. Para que se desenvolva resistncia a um IP/r, h necessidade de um

    nmero maior de mutaes do que para o desenvolvimento de resistncia a um ITRNN. A potencial

    consequncia desse fato a menor proteo da dupla de ITRN/ITRNt quando o esquema

    baseado em ITRNN, determinando a necessidade de identificao precoce de falha virolgica.

    Diante dos resultados de equivalncia dos esquemas com ITRNN em relao a IP/r, e porvantagens potenciais no manejo da TARV, recomenda-se ITRNN como preferencial a IP/r para

    compor o esquema de tratamento inicial.

    4.3. Escolha do ITRNN

    Os dois ITRNN utilizados na terapia inicial no Brasil so o efavirenz (EFV) e a nevirapina

    (NVP). Uma metanlise envolvendo sete ensaios clnicos randomizados mostrou que no existem

    diferenas de eficcia entre o efavirenz e a nevirapina. No entanto, os perfis de toxicidade foram

    distintos: o efavirenz est mais associado a eventos adversos do sistema nervoso central, e a

    nevirapina, elevao de transaminases.

    O EFV apresenta posologia mais confortvel (1 comprimido ao dia), facilitando a adeso ao

    tratamento. Promove supresso da replicao viral por longo prazo e possui perfil de toxicidade

    favorvel. Seus efeitos adversos mais comuns tonturas, alteraes do sono, sonhos vvidos e

    alucinaes costumam desaparecer aps as primeiras duas a quatro semanas de uso. A indicao

    do efavirenz deve ser avaliada criteriosamente em pessoas com depresso ou que necessitam ficar

    em viglia durante a noite.

    A nevirapina (NVP) considerada preferencial em relao ao EFV em algumas situaes,

    como em mulheres que desejam engravidar ou durante a gestao. Na contraindicao ou

    intolerncia ao EFV, a NVP uma opo segura, efetiva e de baixo custo, alm de ser produzida pela

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    indstria nacional. Sua indicao preferencial em relao aos inibidores da protease, exceto nos

    casos de exantema com EFV.

    Alguns estudos demonstram melhor perfil metablico, com reduo de LDL e aumento de

    HDL colesterol, com uso de NVP quando comparada ao EFV e ao ATV,

    sendo a NVP, portanto, uma

    opo para pacientes com diabetes melitus, portadores de coronariopatia ou indivduos com risco

    cardiovascular elevado (escore de Framingham > 20%).

    A NVP est associada a maior toxicidade heptica, exantema e risco de sndrome de Stevens-

    Johnson. Um estudo realizado na Tailndia sugere que a NVP pode estar relacionada a maior risco de

    hepatotoxicidade em mulheres com contagem de LT-CD4+ 250 clulas/mm e em homens com LT-

    CD4+ 400 clulas/mm; tais achados podem ser determinados por caractersticas metablicas e

    genticas dessa populao, no devendo, portanto, ser generalizados.

    Sempre que o tratamento for iniciado com NVP, suas doses devem ser aumentadas de forma

    escalonada para diminuir o risco de exantema: inicia-se com 1 comprimido de 200 mg durante 14

    dias e aps esse perodo a dose deve ser aumentada para 1 comprimido a cada 12 horas. No Brasil, a

    apresentao da NVP no permite seu uso 1 vez ao dia.

    O ITRNN recomendado para compor o primeiro esquema antirretroviral o efavirenz (EFV),

    exceto em gestantes. Quando houver contraindicao ou ocorrncia de evento adverso com EFV,

    a opo preferencial a NVP, com exceo de exantema; nesse caso, dar preferncia a IP/r.

    4.4. Escolha do inibidor de protease (IP) nas situaes de contraindicao ou intolerncia a

    ITRNN

    As vantagens da combinao de IP com ritonavir como adjuvante farmacolgico esto em

    proporcionar nveis sricos mais elevados e estveis do medicamento, por tempo mais prolongado e

    com menor risco de mutaes que confiram resistncia viral. Por outro lado, mais frequente a

    ocorrncia de eventos gastrintestinais (diarreia) e dislipidemias em esquemas com IP/r, quando

    comparados a associaes que envolvem ITRNN, particularmente o efavirenz. Na falha virolgica, os

    esquemas com IP/r demonstram menor nmero de mutaes de resistncia na transcriptase reversa

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    do que os esquemas com ITRNN, corroborando a hiptese da maior proteo contra resistncia

    dupla de ITRN/ITRNT conferida pelo IP/r.

    Sempre que for necessrio utilizar IP para compor o esquema inicial, est recomendado

    seu uso potencializado por ritonavir.

    Na contraindicao ou intolerncia a EFV e NVP na terapia inicial, o lopinavir/r (LPV/r) deve

    ser o IP/r preferencial, pelas seguintes razes: coformulao com ritonavir, experincia de uso, maior

    nmero de estudos clnicos com seguimento no longo prazo, potncia e durabilidade conferidas ao

    esquema, alm de menor custo e facilidade logstica, pois prescinde de armazenamento refrigerado.

    Na impossibilidade de uso de ITRNN na composio do esquema inicial, o LPV/r a opo

    preferencial na classe dos inibidores da protease.

    A associao atazanavir/r (ATV/r) opo alternativa ao LPV/r, devido ao seu perfil de

    toxicidade favorvel e eficcia na supresso viral. Desvantagens relacionadas a essa associao so o

    seu elevado custo e o fato de no ser coformulada com o ritonavir, o que acarreta risco potencial de

    que o atazanavir seja tomado isoladamente, ocasionando falha virolgica. Ressalta-se tambm a

    necessidade de refrigerao do ritonavir. As doses dirias de atazanavir potencializadas com ritonavir

    so 300 mg e 100 mg, respectivamente.

    Convm salientar que a combinao LPV/r est associada a maior ocorrncia de dislipidemia

    e que o ATV/r determina hiperbilirrubinemia indireta e ictercia em 4% dos casos. O uso do ATV/r

    deve ser evitado em indivduos que necessitem de inibidores de bomba de prtons (por ex.,

    omeprazol).

    A opo de ATV sem ritonavir como adjuvante farmacolgico foi mantida exclusivamente

    para os raros casos de intolerncia a doses baixas de ritonavir. Nessa situao, o TDF no deve

    compor o esquema teraputico, pois ele pode reduzir a meia vida do ATV. Quando no

    potencializado com ritonavir, a dose do ATV dever ser de 400 mg/dia.

    O fosamprenavir/r(FPV/r) opo no manejo da toxicidade ao LPV/r e ATV/r.

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    O Quadro 7 resume os principais esquemas para incio da terapia antirretroviral no Brasil.

    Quadro 7. Esquema antirretroviral em pacientes virgens de tratamento

    Esquemapreferencial

    ITRNN AZT (ou TDF) + 3TC + EFV AZT (ou TDF) + 3TC + NVP

    Esquema

    alternativoIP/r AZT (ou TDF) + 3TC + LPV/r

    Existem algumas situaes clnicas nas quais a terapia inicial deve ser particularizada,

    conforme descritas no Quadro 8.

    Quadro 8. Escolha da terapia antirretroviral em situaes especiais

    Condioclnica

    Recomendao Comentrios

    Hepatite B A dupla de ITRN/ITRNtpreferencial TDF + 3TC

    Essa dupla tem ao contra o HBV

    Nefropatia A dupla de ITRN/ITRNtpreferencial AZT + 3TC

    Evitar uso de TDF em razo danefrotoxicidade

    Tuberculose EFV deve preferencialmentecompor o esquema

    Evitar uso de IP/r

    Iniciar TARV entre a 2 e a 8 semana apso incio do tratamento de TB

    Gestao Esquema preferencial deve serAZT + 3TC + LPV/r

    EFV contraindicado

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    O Quadro 9 descreve os principais efeitos adversos observados no incio do tratamento

    antirretroviral.

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    Quadro 9.Efeitos adversos mais comuns nas primeiras semanas de tratamento antirretroviralMedicao Eventos adversos Manejo

    AZT - Nuseas, anorexia, cefaleia, alteraes nopaladar, mal-estar e insnia.- Anemia e neutropenia.

    - Administrar sintomticos e orientarmanuteno da medicao, uma vez queesses sintomas desaparecem ao longo daterapia, com melhora considervel do apetite.

    - O medicamento deve ser substitudo casoHb < 10,0 g/dL e/ou neutrfilos < 1.000clulas/mm3.

    3TC Eventualmente, pode ocorrer pancreatite ouneuropatia perifrica.

    - Avaliao e acompanhamento.

    ddI EC - Nuseas, vmitos, diarreia e anorexia sofrequentes.- Pancreatite, com ou sem dor abdominal, podeocorrer nas primeiras semanas, mas geralmente mais tardia.

    - Administrar sintomticos, se necessrio.- Suspender medicao.

    TDF - Risco de toxicidade renal com elevao da ureia ecreatinina (reduo de depurao estimada),

    disfuno tubular proximal (Sndrome de Fanconi)e diabetes insipidus.A disfuno tubular proximal demonstradalaboratorialmente mediante o aumento da beta-2microglobulina urinria, glicosria, fosfatria,hipouricemia, hiperuricuria, hipofosforemia,hipocalemia e acidose metablica.

    - Realizar exame bsico de urina, ureia,creatinina e DCE a cada 3 meses.

    EFV - Sintomas associados ao sistema nervoso central,tais como: tonturas, sensao de embriaguez,sonolncia ou insnia, dificuldade de concentraoe sonhos vvidos (sensao forte de realidade).- Exantema, geralmente maculopapular (1,7%),

    podendo evoluir para formas graves, como aSndrome de Stevens-Johnson ou necrliseepidrmica txica.

    - Orientar sobre tais eventos e informar quenormalmente desaparecem ao final dasprimeiras semanas de tratamento.- Os efeitos adversos neurolgicos podem serexacerbados com o uso concomitante de

    lcool. necessrio que se aborde o usorecreativo de lcool e outras drogas,aconselhando o paciente para que omedicamento no seja interrompido.

    NVP - Exantema (7%), geralmente maculopapular, detipo eritema multiforme; menos de 1% progridepara Sndrome de Stevens-Johnson ou paranecrlise epidrmica txica.

    - Suspender quando o exantema cutneo forextenso, comprometer mucosas, estiverassociado a manifestaes semelhantes a umresfriado e/ou houver ocorrncia delinfadenopatias.- Dos pacientes que apresentam esse tipo dereao nevirapina, 40% no apresentamreao cruzada com o efavirenz.

    LPV/r - Diarreia (14 a 24%), nuseas, fezes mal formadas,astenia, dor abdominal, cefaleia, vmitos ehiperlipidemia com hipertrigliceridemia.- Outros eventos adversos menos frequentesincluem: hiperglicemia, aumento de enzimashepticas e hiperamilasemia.

    - A diarreia pode ser manejada comadequaes de dieta e medicamentossintomticos, como a loperamida.

    ATV/r - Nuseas, vmitos, diarreia, exantema, cefaleia,tontura.- Aumento da bilirrubina total, s custas da fraoindireta (35 a 47% dos casos), com ictercia emalguns casos. Elevao das transaminases podeocorrer em cerca de 2 a 7% dos casos

    - Possibilidade de toxicidade renal, comonefrolitase

    - A ocorrncia de ictercia pode afetar aimagem e a autoestima do paciente,devendo, portanto, ser cuidadosamenteavaliada e considerada a suspenso domedicamento quando houver desconfortopara o paciente.

    - Cautela com esquemas com TDF

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    5. Falha ao tratamento antirretroviral e terapia de resgate

    Os avanos na terapia antirretroviral levaram ao aumento progressivo nas taxas de

    resposta teraputica. Inmeros estudos mostram que aproximadamente 80% dos pacientes

    alcanam carga viral plasmtica inferior a 50 cpias/mL aps um ano de tratamento e que a

    supresso viral se mantm ao longo do tempo, demonstrando sua durabilidade tanto para terapia

    inicial quanto para esquemas de resgate.

    Embora as taxas de sucesso da TARV sejam elevadas, pacientes em falha virolgica

    normalmente necessitam de alteraes em seus esquemas antirretrovirais, sendo o novotratamento denominado esquema de resgate. O reconhecimento precoce da falha virolgica e a

    escolha adequada e oportuna do novo tratamento so fundamentais para minimizar as

    consequncias da supresso viral parcial ou incompleta. As principais consequncias da supresso

    viral incompleta so:

    1. Elevao menos robusta e duradoura da contagem de LT-CD4+.2. Maior progresso de doena, uma vez que h correlao entre nveis de carga viral e risco

    de progresso clnica.

    3. Acmulo de mutaes de resistncia aos antirretrovirais e perda de futuras opesteraputicas. Destaca-se que cerca de 60% dos pacientes mantidos com supresso viral

    parcial desenvolvem novas mutaes de resistncia aps 18 meses. Aps um ano sob

    viremia persistente, h perda de uma opo de medicamento em cerca de um tero dos

    casos.

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    5.1. Caracterizao de falha teraputica

    O conceito de falha teraputica costuma englobar trs diferentes aspectos: falha virolgica,

    imunolgica e clnica.

    Falha virolgica: caracterizada por carga viral plasmtica detectvel aps seis meses do

    incio ou modificao do tratamento antirretroviral, ou por deteco da carga viral nos indivduos

    que a mantinham indetectvel na vigncia de tratamento. Em todos os casos, a viremia deve ser

    confirmada em coleta consecutiva aps intervalo de pelo menos quatro semanas da anterior. A

    falha virolgica pode reduzir os benefcios em relao recuperao imunolgica e aumentar o

    risco de progresso de doena, alm de levar emergncia de resistncia aos antirretrovirais.

    Portanto, deve ser o principal parmetro para a definio de falha terapia antirretroviral,particularmente aps a terapia inicial.

    No respondedores imunolgicos (falha imunolgica): de 15% a 30% das pessoas que

    iniciam TARV podem apresentar deficincia na recuperao dos nveis de LT-CD4+ (a despeito da

    supresso da replicao viral), definida como incremento inferior a 30% dos nveis de LT-CD4+ aps

    1 ano de tratamento. Esse grupo de no respondedores imunolgicos est geralmente associado ao

    incio tardio de TARV (contagens de LT-CD4+ muito baixas) e idade avanada. Nesses casos, mesmo

    na ausncia de benefcio imunolgico pleno, a supresso viral completa constitui um fator protetor

    contra manifestaes oportunistas. Assim, falha imunolgica na presena de supresso viral

    mxima raramente indicao de mudana do esquema antirretroviral.

    Falha clnica: a ocorrncia de doenas oportunistas na ausncia de falha virolgica no

    indica falha da TARV, mas pode refletir recuperao imunolgica insuficiente, falha de

    quimioprofilaxia para infeces oportunistas ou sndrome inflamatria de reconstituio imune.

    A falha virolgica o principal parmetro para a caracterizao da falha teraputica.

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    5.2. Causas de falha teraputica

    Inmeros fatores podem contribuir para falha aos antirretrovirais, devendo ser considerados

    na sua investigao (Quadro 12).

    Quadro 12. Fatores associados falha teraputica

    Baixa adeso ao tratamento

    Considerada uma das causas mais frequentes de falha virolgica, a baixa adeso TARV relaciona-se,

    sobretudo, complexidade posolgica e ocorrncia de efeitos adversos, devendo ser abordada em todos

    pacientes em falha. Destaca-se que a supresso viral pode ser obtida, mesmo sem alterao da TARV, nos

    casos de falha associada m adeso precocemente identificados.

    Potncia virolgica insuficienteA utilizao de esquemas subtimos, tais como terapia tripla contendo apenas ITRN ou nmero insuficiente

    de medicamentos ativos, pode levar supresso viral incompleta.

    Fatores farmacolgicos

    Deve-se pesquisar a possibilidade de administrao incorreta dos ARV, tais como quebra de comprimidos,

    interaes medicamentosas ou erros de prescrio, alm de outros fatores que resultam em m absoro ou

    eliminao acelerada dos medicamentos.

    Resistncia viral

    A resistncia genotpica do HIV aos antirretrovirais pode ser identificada no momento da falha em at 90%dos casos, podendo ser tanto causa como consequncia daquela.

    Alguns fatores podem acarretar elevao na carga viral sem, no entanto, representar falha

    virolgica, devendo ser considerados no seu diagnstico diferencial:

    - Blips: viremia transitria e isolada entre medidas de carga viral indetectvel, abaixo de

    500 cpias/mL; normalmente no predizem falha virolgica.

    - Carga viral baixa: a presena de viremia baixa (50-400 cpias/mL) nos primeiros seis

    meses de tratamento no est necessariamente associada seleo de cepas resistentes aos

    antirretrovirais e, em geral, pode ser manejada apenas com estmulo adeso.

    - Transativao heterloga: processos infecciosos ou vacinao podem promover viremia

    transitria sem ocasionar seleo de resistncia ou repercusses clnicas e no configuram falha

    virolgica. Esse processo geralmente dura at quatro semanas.

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    - Falha no processamento da amostra: o uso inadequado de tubos contendo gel separador

    do plasma ocasiona carga viral falsamente detectvel, normalmente com nveis inferiores a 5.000

    cpias/mL).

    5.3. Teste de genotipagem

    Recomenda-se o exame de genotipagem para o HIV, disponvel no SUS na Rede Nacional de

    Genotipagem (Renageno), como ferramenta de deteco de resistncia aos antirretrovirais. Entre

    suas principais vantagens destacam-se:

    1. Possibilitar a escolha de esquemas antirretrovirais com maior chance de supresso viral,com base na identificao de mutaes de resistncia;

    2. Propiciar o uso de medicamentos ativos por perodos mais prolongados;3. Evitar trocas desnecessrias de antirretrovirais;4. Evitar toxicidade de medicamentos inativos;5. Melhorar a relao de custo-efetividade.

    O teste de genotipagem otimiza a escolha do esquema de resgate, reduzindo a chance de

    acmulo progressivo de mutaes e de ampla resistncia a antirretrovirais.

    Critrios para realizao do teste de genotipagem pela Renageno:

    1. Falha virolgica confirmada em coleta consecutiva de carga viral aps intervalo de quatrosemanas;

    2. Carga viral superior a 1.000 cpias/mL;3. Uso regular de TARV por pelo menos seis meses.

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    A Tabela 4 enfatiza alguns conceitos sobre a genotipagem.

    Tabela 4. Consideraes para uso adequado do teste de genotipagem para deteco deresistncia aos antirretrovirais

    Consideraes Observaes

    O teste de genotipagem deve ser realizado

    com carga viral detectvel.

    Quanto maior a carga viral do paciente em TARV,

    maior o nmero de mutaes. Entretanto, carga

    viral elevada na ausncia de resistncia pode

    indicar falta de adeso ao tratamento.

    O exame deve ser coletado na vigncia do

    esquema antirretroviral.

    As mutaes podem persistir at duas semanas

    aps a interrupo do tratamento, mas algumas

    podem desaparecer rapidamente na ausncia de

    medicao.

    A interpretao do teste e a escolha do

    melhor esquema de resgate so complexas e

    demandam experincia no manejo da falha

    virolgica.

    Recomenda-se que os esquemas de resgate sejam

    estruturados a partir da orientao de Mdicos de

    Referncia em Genotipagem (MRG), capacitados e

    atualizados periodicamente pelo MS.

    O teste de genotipagem pode apresentar

    valor preditivo positivo alto.

    Uma vez detectadas mutaes de resistncia,

    muito provvel que o medicamento no

    apresente ao ou tenha ao reduzida in vivo.

    O teste de genotipagem pode apresentar

    valor preditivo negativo baixo.

    A ausncia da deteco da resistncia no significa

    necessariamente que o medicamento esteja ativo,

    posto que mutaes de resistncia podem no ter

    sido detectadas.

    A histria de exposio antirretroviral e asgenotipagens prvias devem ser consideradas

    na interpretao do exame atual.

    Mutaes selecionadas no passado podemdesaparecer na ausncia do medicamento;

    contudo, reaparecem rapidamente quando o

    medicamento reintroduzido.

    Os resultados devem ser considerados

    atuais at seis meses aps a coleta de

    amostra para o teste.

    Considerando-se o ritmo mdio de acmulo de

    novas mutaes na vigncia de falha, aps um

    perodo de seis meses podem surgir novas

    mutaes e ocorrer perda adicional de opes de

    tratamento.

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    5.4. Princpios gerais da terapia de resgate

    O desenvolvimento de novas classes de antirretrovirais e novos medicamentos de classes j

    existentes tem permitido um significativo progresso no manejo de indivduos multiexperimentados ecom cepas resistentes. Evidncias produzidas por ensaios clnicos nos ltimos anos contriburam para

    a ampliao do conhecimento sobre terapias de resgate; todavia, no permitem compar