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Análise das provas admitidas no direito brasileiro
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Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
Valor probatrio das gravaes ambientais1
Nailson Ferreira zara Jnior2, Luiz Henrique B. de Azevedo Silva
3
Resumo: Atravs de uma pesquisa exploratria baseada em reviso bibliogrfica, a proposta deste trabalho
elucidar momentos em que a gravao de conversas servir como fundamento a processo judicial. A
Constituio Federal de 1988 elencou diversas garantias individuais em seu 5 artigo, que, a priori, trouxeram a
interpretao de este tipo probatrio ser ilegal, violando direitos fundamentais da intimidade e privacidade.
Portanto, para que o impasse de admissibilidade ou ilegalidade da gravao seja resolvido, diante da omisso
legislativa e da pequena abordagem doutrinria, torna-se necessria uma anlise especfica dos princpios
constitucionais relacionados, patrocinada pelas decises da jurisprudncia moderna dos tribunais brasileiros.
Palavras chaves: Gravao. Intimidade. Privacidade. Prova ilcita. Jurisprudncia.
Probative value of the ambient recordings
Abstract. Through an exploratory research based on bibliographic review, this study purposes to elucidate
when recording conversations can serve as basis for prosecution. The Brazilian Federal Constitution of 1988
lists several individual guarantees on its 5th article, which, initially, brought the interpretation of this type of
evidence being illegal, since it violates fundamental rights of intimacy and privacy. Therefore, so the
admissibility or illegality impasse of conversation recordings is resolved, taking into account legislative
omission and little doctrinal approach, it becomes necessary to realize specific analysis of constitutional
principles related, sponsored by decisions of modern jurisprudence from Brazilian courts.
Key words: Recording. Intimacy. Privacy. Illicit evidence. Jurisprudence.
1 Artigo produzido para concluso do curso de Direito da Faculdade Montes Belos (FMB).
2 Acadmico do curso de Direito da FMB.
3 Professor orientador da FMB.
2
N. F. Azara Junior & L. H. B. A. Silva Valor probatrio das gravaes ambientais
Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
1.0. Introduo
A tecnologia no mundo contemporneo
trouxe, ao homem, novos meios de se defender nas
demandas judiciais. Com o advento de aparelhos
eletrnicos de gravao e registro de dilogos, a
invaso de privacidade surgiu, trazendo ao Estado
novas preocupaes.
A ameaa de leso aos indivduos obrigou
que o legislador se preocupasse, na redao da
Carta Magna de 1988, com diversos direitos e
garantias fundamentais, enumerados em seu 5
artigo.
No entanto, a existncia de tantos preceitos
normativos, algumas vezes opostos em conflitos
judiciais, fez com que a margem entre o legal e o
ilcito se tornasse indeterminvel aos cidados.
Diversas leis ordinrias e especiais foram
sancionadas para dirimir tais disputas, entretanto,
com a solidificao das normas que definem a
interceptao telefnica, o legislador esqueceu-se
de definir limites aos institutos assemelhados.
Trata-se, o presente trabalho, de uma
pesquisa terica, tomando por base uma
metodologia dialtica na discusso de se saber se a
gravao ambiental ou no legal no Direito
brasileiro.
Assim, sero abordados os princpios
constitucionais que norteiam o tema, bem como as
definies e diferenciaes das espcies de
gravao (ou registro) de conversas trazidas pela
doutrina e, ao final, comparar-se-o as decises
jurisprudenciais mais pertinentes para dirimir o
assunto que ser foco deste trabalho.
2.0. Histrico
Desde o princpio da humanidade, o ser
humano convive com a sua espcie em sociedades.
Auferir vantagens sobre o prximo sempre fez parte
de sua ndole. Regramentos foram criados para
garantir direitos e impor deveres, conforme os
interesses da classe dominante.
Da mesma forma, grande caracterstica do
homem foi sua habilidade de inventar. Passados
anos de sua evoluo, surgiu o aparelho telefnico,
sem o qual a polmica da interceptao
provavelmente jamais teria nascido.
Hoje, no Brasil, sua populao vive sob a
guarda da Constituio Federal da Repblica,
promulgada em 05 de outubro de 1988. Este
documento, primeiro a ser redigido na era ps-
ditadura vivenciada pelo pas, confirmou antigos
direitos conquistados e trouxe novas protees
populao brasileira, focando-se, especificamente,
nos direitos humanos.
Em seu texto, mormente artigo 5, esto
previstas as garantias fundamentais, que so
condies intocveis (artigo 60, 4, IV,
Constituio Federal de 1988) da populao
brasileira. Os direitos e garantias individuais se
tornaram uma verdadeira aquisio do povo,
mediante manifestos e rebelies que marcaram as
dcadas anteriores elaborao do atual texto
constitucional.
Destaca-se, dentre as protees elencadas no
dispositivo, o inciso XII, que, quando da sua
elaborao, trouxe polmica, como tantas outras
redaes inovadoras:
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N. F. Azara Junior & L. H. B. A. Silva Valor probatrio das gravaes ambientais
Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
inviolvel o sigilo da correspondncia e das
comunicaes telegrficas, de dados e das
comunicaes telefnicas, salvo, no ltimo
caso, por ordem judicial, nas hipteses e na
forma que a lei estabelecer para fins de
investigao criminal ou instruo processual
penal (Constituio Federal da Repblica
Federativa do Brasil de 1988, artigo 5, XII).
Com essa novidade legislativa, dvida pairou
diante das interceptaes j existentes no pas,
especialmente quanto s que estavam em curso no
momento. Mas, antes de abordar este assunto,
convm noticiar que a matria to recente que
sequer estava prevista na Constituio de 1946. Na
poca, defendia-se a ilegalidade da violao de
telecomunicao baseando-se no artigo 141, 6, o
qual ilustrava, to-somente, a inviolabilidade do
sigilo de correspondncia (GOMES, 1997).
Todavia, a Constituio Federal de 1967, em
seu artigo 152 2, e, autorizava, durante estado
de stio, a adoo de medidas coercitivas, dentre
elas, censura de correspondncia, da imprensa, das
telecomunicaes e diverses pblicas, admitindo-
se, portanto, a interceptao dos meios de
comunicao.
Posteriormente, com a Carta Magna de 1969,
nasceu a proibio expressa da violao do sigilo das
comunicaes telegrficas e telefnicas (art. 153,
9), ressalvado caso de estado de stio (art. 156, 2,
f, inserido pela Emenda Constitucional n 11 de
1978). Todavia, naqueles anos tambm vigorava o
Cdigo Brasileiro de Telecomunicaes (Lei 4.117 de
27 de agosto de 1962), que assim dizia:
Art 57. No constitui violao de
telecomunicao:
I - A recepo de telecomunicao dirigida por
quem diretamente ou como cooperao esteja
legalmente autorizado;
II - O conhecimento dado:
a) ao destinatrio da telecomunicao ou a seu
representante legal;
b) aos intervenientes necessrios ao curso da
telecomunicao;
c) ao comandante ou chefe, sob cujas ordens
imediatas estiver servindo;
d) aos fiscais do Govrno junto aos
concessionrios ou permissionrios;
e) ao juiz competente, mediante requisio ou
intimao dste.
Pargrafo nico. No esto compreendidas nas
proibies contidas nesta lei as radio-
comunicaes destinadas a ser livremente
recebidas, as de amadores, as relativas a navios
e aeronaves em perigo, ou as transmitidas nos
casos de calamidade pblica (Lei 4.117 de 27 de
agosto de 1962).
Ada Pellegrini Grinover, renomada jurista
talo-brasileira, estudou com afinco o assunto
naquela poca, concluindo pela existncia da
natureza relativa do direito ao sigilo das
comunicaes telefnicas. Desta maneira, tratava-se
de direito sujeito a excees e restries, sendo
admissvel sua violao quando atendidos os
requisitos do art. 57 do Cdigo Brasileiro de
Telecomunicaes (GRINOVER, apud Vrios
autores, 2009).
Seguindo sua postura doutrinria, a
jurisprudncia daqueles anos tratou-se de se
posicionar sobre a ilegalidade desta espcie de prova
quando obtida por particular. O Supremo Tribunal
Federal, ao analisar o HC 63.834-1-SP (julgado em
18/06/1986 e publicado no DJ em 05/06/1987)
decidiu pelo trancamento do inqurito policial em
questo devido obteno de interceptao por
particular, considerando-a prova ilcita. Logo,
tratava-se de meio probatrio exclusivo do Estado.
Todavia, o que ningum esperava era que,
com o advento da Constituio de 1988, houvesse
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Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
uma mudana radical dos preceitos relacionados
interceptao. O que antes era utilizado de forma
banal se tornou direito constitucional inviolvel. De
conformidade nova redao legal, a interceptao
telefnica s era cabvel com autorizao judicial e
para fins de investigao criminal, desde que
respeitadas as hipteses permissveis elencadas em
lei.
Entretanto, a exceo apresentada ainda no
era passvel de utilizao, haja vista existir um
buraco legislativo. O artigo 57 da Lei 4.117 de
1962 j no era mais aplicvel, posto que o
Supremo Tribunal Federal decidiu ser impossvel
sentena penal baseada na quebra de sigilo
telefnico enquanto no fosse editada lei especfica
que regulamentasse o assunto, tornando todas as
provas obtidas em desacordo com este
entendimento ilcitas. Em outras palavras, o
dispositivo do Cdigo Brasileiro de
Telecomunicaes no foi recepcionado pela atual
Lei Mxima, tornando-se impossvel utiliz-lo para
realizar interceptaes telefnicas.
Igualmente, o uso deste meio probatrio
veio a ser incabvel nos demais institutos
processuais brasileiros. Com a Constituio
Cidad taxando o uso apenas no campo penal,
ficou, a contrrio senso, proibida a utilizao nos
demais ramos do direito, a exemplo do civil,
trabalhista e administrativo.
De 1988 a 1996, o Brasil vivenciou um
perodo de muita polmica, com autorizaes
judiciais de escutas telefnicas fundadas no citado
artigo 57 do Cdigo Brasileiro de
Telecomunicaes. E foi pela presena dos
requisitos legais de existncia de autorizao
judicial, dada por juiz competente; operao
realizada por rgos oficiais; e ordem judicial
motivada que Damsio E. de Jesus, da
Procuradoria Geral de Justia, ao ser acionada pela
Ordem dos Advogados do Brasil, acabou por dar
parecer favorvel a uma interceptao telefnica de
magistrado contra um advogado (DAMSIO,
1993).
Posicionando-se contrrio ao entendimento
da Suprema Corte, Damsio assim manifestou:
No deixa de ser curioso: na vigncia da CF
anterior, que, em seu art. 153, 9, previa o
princpio da inviolabilidade da comunicao
telefnica sem abrir exceo, no era proibido
ao Juiz autorizar a interceptao telefnica para
fim de produo de prova judicial. E, hoje,
quando a CF expressamente autoriza a
interceptao mediante ordem judicial, entende-
se proibido faz-lo (JESUS, 1993, p. 24).
Contudo, apenas com o advento da Lei n
9.296, de 24 de julho de 1996, com oito anos de
atraso, que se renovou a possibilidade de violao
do sigilo telefnico no processo penal.
Apesar disso, pelo princpio tempus regit
actum, todas as autorizaes deferidas em processo
judicial antes do dia 25/07/1996, data de publicao
da nova lei, so ilegais e desprovidas de
fundamento jurdico, no podendo produzir efeitos
por violao ao princpio da legalidade (GOMES,
1997).
3.0. Provas lcitas, ilcitas e ilegtimas
Prova, do latim probatio (verificao,
ensaio, exame, aprovao, confirmao) o
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N. F. Azara Junior & L. H. B. A. Silva Valor probatrio das gravaes ambientais
Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
conjunto de aes praticadas pelas partes, e
terceiros (como, por exemplo, peritos), direcionadas
ao Juiz, com o intuito de convenc-lo da existncia
ou inexistncia de um fato alegado, da veracidade
ou falsidade de uma determinada alegao (CAPEZ,
2008). Trata-se de um meio usado para induzir o
magistrado a conceder ou no a tutela jurisdicional
pleiteada.
Tal forma de persuaso produzida com
respeito ao ordenamento jurdico de um pas. Diante
da amplitude das informaes que podem ser listadas
como meios probatrios, e as disparidades
financeiras e de recursos de pesquisa existentes entre
o Estado e o indivduo, necessrio se fez limitar os
meios de produo de provas.
Assim, a elaborao de provas restringida
aos preceitos constitucionais e legais, que visam
diminuir a desigualdade existente entre Estado e
cidado, de forma a proteger este das violaes de
seus direitos e garantias por parte daquele, que detm
os mais amplos poderes de uma sociedade: impor
regras, fiscalizar, julgar e punir.
Portanto, as leis de uma nao existem no
apenas para limitar as aes dos indivduos, mas
tambm para impor permetros aos poderes do
Estado. Grande exemplo desta forma de restrio
o artigo 5, inciso LVI, da Magna Carta de 1988:
so inadmissveis, no processo, as provas obtidas
por meios ilcitos.
O Cdigo de Processo Penal vai alm,
dizendo que devem (...) ser desentranhadas do
processo, as provas ilcitas, assim entendidas as
obtidas em violao a normas constitucionais ou
legais (Cdigo de Processo Penal, 157, caput,
alterado pela Lei 11.690/2008).
Da mesma forma, ser tambm inadmitida a
prova derivada da ilcita, salvo quando no
evidenciado o nexo de causalidade entre elas, ou
quando a derivada puder ser obtida por uma fonte
independente da ilcita (Cdigo de Processo Penal,
157, 1, alterado pela Lei 11.690/2008).
Prova lcita aquela obtida por meios legais
que no contrariam a moral e os bons costumes e
que se limita aos preceitos ticos e jurdicos do
homem. No mbito do direito, lcita a prova
colhida em respeito aos direitos e s garantias
fundamentais. Desta forma, a princpio, o Estado,
ou qualquer cidado, no deve intrometer na vida
particular de um indivduo, de forma a lesionar sua
privacidade e liberdade individual, para formular
prova judicial (GOMES, 1997).
Entretanto, a inviolabilidade da privacidade
tornou-se um empecilho permissivo ao homem para
lesionar o seu prximo ou a coletividade.
Consequentemente, leis surgiram com a finalidade
de fornecer possibilidade para que o Estado consiga
obter, de forma legal, provas que, a princpio,
seriam apenas colhidas ilicitamente.
Como os limites impostos entre a legalidade
e a ilicitude das provas so muito pequenos e, por
diversas vezes, confundidos ou intencionalmente
desiludidos pelos aplicadores do direito, tem-se a
origem das provas ilcitas.
Provas ilcitas so aquelas colhidas com
infringncia ao direito material. Por serem imorais,
ilegais e inconstitucionais, devero ser
imediatamente excludas do processo, no podendo
o magistrado fundar-se nelas para formar sua
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N. F. Azara Junior & L. H. B. A. Silva Valor probatrio das gravaes ambientais
Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
convico. Por exemplo, trata-se da obrigao do
judicirio de inocentar um poltico que, apesar de
sabidamente ter recebido propina para benefcio de
uma empresa, foi processado exclusivamente com a
prova de ter sido flagrado por meio de um grampo
telefnico realizado sem autorizao judicial
(GOMES, 1997).
No se devem confundir provas ilcitas
com ilegtimas, pois estas violam regra de direito
processual no momento em que so obtidas em
juzo. Luiz Flvio Gomes (1997) leciona que tanto a
oitiva de pessoas que no podem depor, a exemplo
do advogado proibido de informar sobre o que
houve no exerccio de sua profisso (artigo 207 do
Cdigo de Processo Penal), quanto o interrogatrio
realizado sem a presena de advogado so meios
probatrios ilegtimos, vez serem nulidades
meramente procedimentais.
Da mesma maneira, Grinover apud Capez
(2009), tambm defendia que a prova ilcita viola
normas de natureza material, enquanto a ilegtima
conflita com normas de carter processual.
Destarte, convm reiterar que as
interceptaes autorizadas previamente publicao
da Lei 9.296, ou seja, antes de 25/07/1996, so provas
ilcitas pela ausncia de previso legal, nos termos do
inciso XII do artigo 5 da Constituio Federal de
1988. Violado o princpio da legalidade, todas as
provas produzidas neste sentido no possuem
qualquer validade jurdica, nem mesmo as derivadas
(GOMES, 1997).
3.1. Provas ilcitas ou ilegtimas por derivao
No Brasil, no havia manifestao legal e
tipificada sobre essa espcie de prova. A
jurisprudncia, ento, viu-se obrigada a adotar o
princpio estadunidense do fruto podre (tainted
fruit) para dirimir tal questo. Desta forma, toda
prova produzida em decorrncia de outra
considerada ilcita, mesmo se fosse licitamente
obtida, tambm seria invalidada. Trata-se de
entendimento do Supremo Tribunal Federal, que
vinha sendo adotado pelos juristas brasileiros.
Assim defendeu o Ministro Seplveda Pertence, em
seu voto vencedor:
(...) o caso demanda a aplicao da doutrina que a
melhor jurisprudncia americana constituiu sob a
denominao de princpios dos fruits of the
poisonous tree; que s provas diversas do prprio
contedo das conversaes telefnicas
interceptadas, s se pode chegar, segundo a prpria
lgica da sentena, em razo do conhecimento
delas, isto , em consequncia da interceptao
ilcita de telefonemas (...) estou convencido de que
essa doutrina da invalidade probatria do fruit of the
poisonous tree a nica capaz de dar eficcia
garantia constitucional da inadmissibilidade da
prova ilcita (...) De fato, vedar que se possa trazer
ao processo da prpria degravao das conversas telefnicas, mas admitir que as informaes nela
contidas possam ser aproveitadas pela autoridade,
que agiu ilicitamente, para chegar a outras provas,
que sem tais informaes no colheria,
evidentemente, estimular e no reprimir a
atividade ilcita da escuta e da gravao clandestina
de conversas privadas (HC 69.912-0-RS, publicado
no Dirio da Justia da Unio de 25/03/1994).
Entrementes, no mbito internacional, h
muita polmica quanto a este tema, pois pensar de
tal forma seria impossibilitar a condenao de um
grande traficante de substncias entorpecentes cuja
mercadoria foi descoberta e apreendida em
decorrncia de uma escuta telefnica que visava
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N. F. Azara Junior & L. H. B. A. Silva Valor probatrio das gravaes ambientais
Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
combater contrabando de produtos, a qual acabou
por ser julgada ilegal.
Ainda assim, pode o magistrado chegar
condenao do ru, desde que a fundamente em
provas colhidas com total independncia que foi
considerada ilcita. Trata-se da teoria da fonte
independente da prova, que deve ser usada com
cautela para se evitar burlar a proibio do uso da
prova derivada.
Para que a teoria da fonte independente tenha
correta aplicao, impe-se a demonstrao ftica
inequvoca de que a prova valorada pelo Juiz
efetiva-mente nasceu de fonte autnoma, isto ,
no est na mesma linha de desdo-bramento das
informaes colhidas com a prova ilcita. (...)
Havendo dvida, tudo se resolve em favor do ru
(in dubio pro reo) (GOMES, 1997, p. 146).
Enquanto grande maioria dos juristas
mundiais defende a inadmissibilidade desse tipo de
prova, existem alguns que manifestam o contrrio.
O alemo Schnke (AVOLIO, 2003) explica que o
interesse da coletividade deve prevalecer sobre uma
formalidade antijurdica no procedimento. Logo, na
busca pela verdade real, poderia o Judicirio fazer uso
de todos os meios de prova possveis,
independentemente de lesar ou no direitos dos
cidados.
Outros defensores admissibilidade da prova
ilcita so o espanhol Jaime Guasp, que reputa eficaz a
prova ilicitamente obtida para aplicao das sanes
civis, penais ou disciplinares cabveis, o norte
americano Fleming, que condena a supresso da
prova ilcita, e Wigmore, que entende que a regra de
excluso prejudica a comunidade lesada diante de um
indivduo criminoso inescrupuloso (AVOLIO, 2003).
A Lei 11.690, de 09 de junho de 2008, foi
responsvel por vrias inovaes no velho texto do
Cdigo de Processo Penal. Dentre elas, destaca-se a
que socorreu este tema, trazendo a seguinte redao
ao 1 do artigo 157: So tambm inadmissveis
as provas derivadas das ilcitas, salvo quando no
evidenciado o nexo de causalidade entre umas e
outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas
por uma fonte independente das primeiras.
Em curta explicao, restou solucionado, no
momento, o problema da prova ilcita por
derivao, sendo admitido apenas se verificar no
ter qualquer ligao com a prova proibida ou
quando existir a figura da fonte independente.
Por exemplo, caso a polcia federal obtenha a
informao de transporte de entorpecentes via
grampo telefnico irregular e, por isso, monte uma
blitz para apreender a droga e flagrar o traficante,
ilcita a prova originria, ou seja, a interceptao.
Entretanto, tambm sero ilcitas todas as provas
derivadas desta, a listar, o auto de priso em
flagrante e os depoimentos dos condutores, devendo
a priso ser relaxada e a ao penal ser
impossibilitada de prosseguimento pela ausncia de
provas vlidas.
Contudo, se o traficante for preso em blitz
montada com finalidade diversa, por autoridade
policial que sequer tinha o conhecimento da
interceptao telefnica irregular, descarta-se
apenas esta prova ilcita, admitindo-se a priso em
flagrante e os depoimentos colhidos como meios
probatrios independentes.
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Revista Faculdade Montes Belos, v. 5, n. 2, Abr. 2012
3.2. Uso da prova ilcita ou ilegtima em favor
do acusado
A inutilizao da prova ilcita pelo Estado
contra o particular garantia constitucional (art. 5,
inciso LVI, CF88). No entanto, no possvel dizer
o contrrio. Existem direitos que so superiores a
esta proibio. Depois da vida, a liberdade a
garantia constitucional mais importante que o
homem detm (SILVA, 2011).
Para Gomes (1997), a nica exceo regra
de inadmissibilidade do uso de prova obtida por
meio ilcito quando interessa mais a proclamao
de inocncia do ru que a preservao da intimidade
ou privacidade.
E assim, grande parte da doutrina nacional
defende esse entendimento. Na coliso de princpios
constitucionais, prevalecer aquele de maior valor,
especialmente quando beneficiar o acusado, ou
melhor, a sua liberdade.
Como exemplo, o ru que gravou,
clandestinamente, sua conversa com outro interlocutor
poder usar tal prova para atingir sua absolvio,
sendo impossibilitado empregar tal dilogo para
condenar outrem. Assim, leciona o mestre que a
gravao poder ser usada apenas pelo interlocutor, e
to somente em seu benefcio, compreendendo-se
inadmissvel a gravao clandestina servir de prova
contra outra pessoa, pois ter uso apenas para
absolver, jamais para condenar (GOMES, 1997).
3.3. Direito intimidade
Previsto no artigo 12 da Declarao da
Organizao das Naes Unidas de 1948, o direito
intimidade atualmente encontra-se moldado em
preceitos constitucionais de diversas naes,
incluindo o Brasil. So inviolveis a intimidade, a
vida privada, a honra e a imagem das pessoas (...),
o que diz a Constituio Federal contempornea,
em seu art. 5, inciso X.
Considerado por vrios juristas como
integrante do princpio da personalidade, juntamente
com os direitos autoral, imagem, defesa do nome
e inviolabilidade do domiclio, o direito
intimidade evoluiu muito nos ltimos sculos.
O que, no passado, era praticamente
inexistente, diante da realidade vivida pela
populao, que dificilmente via sua intimidade
violada pelo fato de residir em comunidades
pequenas e isoladas, hoje passou a ter enorme
importncia perante a crescente evoluo humana
(CARVALHO, 2009).
Para esse autor com o advento das
constantes revolues industriais, a tecnologia e a
informtica, o direito intimidade deparou-se com
frequentes violaes e limitaes, sempre presentes,
independentemente das aes legislativas e
judiciais. Da mesma forma, o direito vida privada
tambm sofre, a cada dia mais, com as constantes
usurpaes decorrentes das aes humanas diretas
(investigaes particulares) e indiretas
(averiguaes policiais).
4.0. Invaso de privacidade.
Para Vianna (2007, p. 73), a privacidade de
um indivduo implica a tutela de uma trade de
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interesses jurdicos bastante definidos: o direito de no
ser monitorado, o direito de no ser registrado e o
direito de no ser reconhecido. Logo, o cidado tem
a garantia de no ser visto, ouvido, ou ter imagens ou
conversas suas gravadas, registradas ou divulgadas
em qualquer meio de comunicao.
O direito vida privada nada mais do que
um poder dado ao particular para selecionar quais
de seus atributos sero revelados ao pblico. Trata-
se, tambm, de direito no intromisso, seja do
Estado ou de qualquer indivduo (indireta e direta),
na esfera ntima de uma pessoa (VERGUEIRO,
2005).
nesta linha de pensamento que o sistema
jurdico brasileiro previu a privacidade como direito
e garantia fundamental, em suas inmeras espcies.
Tm-se as privacidades poltica, do consumidor,
mdica, privada, de informao (proteo de
dados), corporal, de comunicao (inviolabilidade
de correspondncia e telecomunicao), territorial
(inviolabilidade do domiclio) etc.
No entanto, a prpria Lei que veio proteger
a privacidade tambm trouxe hipteses de violao
mesma, permitindo, por exemplo, que segredos
fossem revelados sem a anuncia do particular, que
escutas telefnicas fossem implantadas sem o
conhecimento do interlocutor, e at que um
domiclio fosse invadido sem a liberao de seu
morador, desde que preenchidos os requisitos por
ela indicados.
Corroborando a esta ideia, as leis brasileiras
demonstraram, atravs da Emenda Constitucional
45, de 30 de dezembro de 2004, que o direito
privacidade individual tem menos fora diante do
direito do povo publicidade dos atos processuais.
Logo, a alterao legislativa sobreps o direito
informao ao direito intimidade das partes
(VERGUEIRO, 2005).
Nesta linha de raciocnio, conclui-se que no
se deve considerar o direito individual privacidade
como superior ao direito/dever do Estado de aplicar
sanes aos que descumprem com a Lei.
Destarte, justifica-se a possibilidade de
invaso da privacidade de um particular, por parte
do judicirio, representado pelo magistrado, que d
a ordem, nos termos da lei, e pela polcia civil, que
realiza as investigaes cabveis.
Portanto, no resta dvida com relao
capacidade do Estado de invadir a privacidade de
seus cidados. Entretanto, o que justifica uma
pessoa comum fazer o mesmo com o prximo?
Seria correto permitir que algum faa uso de uma
gravao, por ele feita durante um dilogo, contra o
outro interlocutor? E, o que diferencia a gravao
da interceptao e escuta?
5.0. Gravao, interceptao e escuta
Quando se fala em gravao, interceptao e
escuta, comum ter uma ideia de semelhana entre
os seus significados, pois geralmente so palavras
utilizadas como sinnimos. No entanto, isso no
verdade.
Rabonese (1998) explica que, na gravao, o
registro da conversa feita por um dos seus
interlocutores via aparelho eletrnico ou telefnico.
J na interceptao, h sempre interveno de
terceiro na conversa mantida entre pessoas alheias.
Medeiros-pcRealce
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Adotando-se a conceituao de Rabonese
(1998), comparada de Gomes (2009), possvel
obter dois instantes na diferenciao dos significados.
Em primeiro lugar, em se considerando o
uso de aparelho de telecomunicao como telefone,
celular ou assemelhado, define-se interceptao
telefnica stricto sensu como sendo o registro de
conversa por terceiro, sem o conhecimento de
qualquer dos falantes. Agora, se o dilogo
registrado por terceiro, mas com a cincia de um
dos participantes, tem-se a escuta telefnica. Por
ltimo, ocorre a gravao telefnica (ou gravao
clandestina) quando um dos interlocutores realiza o
registro sem que o outro saiba.
Por outro lado, levando-se em conta o uso
de aparelho eletrnico de gravao, alheio
telecomunicao (p. ex. gravador, mp3/mp4 player)
tem-se que, na interceptao ambiental o registro
realizado por terceiro sem a cincia dos envolvidos
na conversa. Havendo conhecimento de um dos
participantes do dilogo de que este est sendo
gravado por terceiro, tem-se a escuta ambiental. Por
ltimo, a gravao ambiental a captao da
comunicao por um dos dialogadores, sem a
cincia do outro (GOMES, 2009).
Melhor explanando, na interceptao
prevalece o total desconhecimento dos participantes
da conversa de que ela est sendo registrada por um
terceiro. Enquanto isso, na escuta, apesar de ser o
registro feito por pessoa alheia ao dilogo, h o
importante aspecto de um dos interlocutores saber
que tal prtica est ocorrendo. Enfim, se o registro
realizado por um dos comunicadores, sem que o
outro (ou outros) tenha cincia, tem-se a gravao.
Em qualquer dos casos, haver invaso de
privacidade, mas somente ser caracterizada infrao
penal a interceptao stricto sensu, quando no
respeitados os requisitos legais. As outras hipteses
sero tpicas apenas se no houver justa causa e
ocorrer divulgao de segredo de forma a produzir
dano, nos termos do artigo 153 do Cdigo Penal
(SILVA, 2001).
6.0. Admissibilidade da gravao ambiental.
Pela regra, inaceitvel a utilizao de
provas obtidas por meio ilcito ou ilegtimo, bem
como as delas derivadas. Independentemente se a
violao material ou procedimental, o que
prevalece sua inaplicabilidade em processo
judicial, por ferir garantias fundamentais do
cidado. Entretanto, tal norma constitucional e
processual penal possui excees.
Desta maneira, apesar de, a princpio, as
gravaes e interceptaes no terem valor
probatrio, podem vir a ser providas de
admissibilidade quando preenchidos certos
requisitos legais.
Com relao interceptao stricto sensu,
devem estar presentes os seguintes requisitos: (1)
autorizao judicial originada de juzo competente;
(2) indcios razoveis de autoria ou participao em
infrao penal; (3) impossibilidade de obteno da
prova por outro meio legal disponvel; e (4) fato
investigado deve ser punvel com pena de recluso
(Lei 9.296 de 24 de julho de 1996). Todavia, no se
pode dizer o mesmo para a gravao ambiental.
Inexiste legislao, no Brasil, que regulamente seu
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procedimento ou admissibilidade.
Consequentemente, a tarefa de disciplinar esta
matria recai jurisprudncia, a qual tem criado
requisitos de permissividade em analogia.
Assim, a gravao ambiental pode ser
utilizada em processo judicial, como meio de prova,
desde que (1) o interessado tenha tomado parte no
dilogo, (2) haja justa causa para violar o direito
intimidade de outro, e (3) no seja usado em
benefcio de terceiros. Como justa causa, neste
aspecto, entende-se a defesa de um direito
individual que est sendo violado. o caso de
assdio sexual ou moral sofrido pelo indivduo que
realiza a gravao, ou o registro de ameaas para
fins de preenchimento de uma ocorrncia policial.
Em outros termos, a teoria da
proporcionalidade, comentada em vrias obras
sobre provas ilcitas. por meio dela que se
justifica ferir um direito em detrimento de outro,
quando prevalecer um bem maior. Logo, a
intimidade e a privacidade do particular podero ser
violadas, pois nenhum direito absoluto, sempre
podendo perder espao para outros direitos e
garantias constitucionais igualmente importantes
(COSTA JNIOR, 1997).
Ademais, a estas regras existe, tambm, a
exceo pro reo. Havendo possibilidade de um
indivduo se inocentar em processo penal, qualquer
meio de prova permitido, no importando se houve
algum vcio no momento de sua produo. Tanto a
gravao ambiental, quanto qualquer outra forma de
interceptao, gravao ou escuta, ter validade se
estiver em jogo o direito do ru liberdade.
Porm, estes meios probatrios devem ser
usados com moderao, pois o entendimento da
jurisprudncia sobre este assunto ainda novo e
instvel, podendo ser alterado a qualquer instante,
vez que tanto na aplicao da Lei ou dos costumes
h justificao para qualquer pensamento. Os
tribunais superiores so exemplos disso, haja vista
que, apesar de o entendimento aqui descrito ser
adotado pela maioria dos juristas, ainda no
unanimidade.
7.0. Proibies e permissivos.
Ainda no existe uniformidade nas decises
do Judicirio sobre a legalidade de utilizao da
gravao ambiental como meio probatrio em juzo.
No se discute a possibilidade da utilizao da
gravao ambiental em caso de benefcio ao ru no
processo penal, visto que tal possibilidade pode ser
aventada mesmo nos casos da interceptao
telefnica, que uma prova ilcita quando no
autorizada.
A discusso paira no tocante gravao
ambiental ser ou no admissvel como meio
probatrio em processo judicial para motivar
eventual condenao. O Tribunal de Justia de
Minas Gerais, por exemplo, entende ser ilcito o
emprego deste meio de prova em benefcio de
terceiros:
AGRAVO DE INSTRUMENTO -
GRAVAO AMBIENTAL POR UM DOS IN-
TERLOCUTORES - APROVEITAMENTO
PROCESSUAL POR TERCEIRO NO
PARTICIPANTE - PROVA OBTIDA POR MEIO
ILCITO VIOLAO INTIMIDADE E VIDA PRIVADA. - Conforme mencionado no art.
5, LXVI, da Car-ta Magna, "so inadmissveis, no
processo, as provas obtidas por meios ilcitos". A
Constituio veda, portanto, a utilizao processual
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de provas engendradas com violao ao
ordenamento jurdico, consoante propugna a teoria
dos frutos da rvore envenenada (the fruit of
poisonous tree). - Jurisprudncia e doutrina
assentem ser ilcita a prova obtida
mediante gravao ambiental ou telefnica
realizada por aquele que no seja interlocutor, ou
seja, emissor ou receptor do dilogo. - A parte que
no participou da conversa entabulada a partir da
qual se extraiu a gravao digital se equipara a
terceiro no interlocutor, vedada a utilizao da
prova produzida (no obstante forjada por obra de
partcipe do dilogo), sob pena de violao ao art.
5, X, da Constituio da Repblica. V.V.P (TJMG
AI 1290269-90.2004.8.13.0686. Relator Des.
Francisco Kupidlowski. Acrdo em 19/06/2008.
Publicado em 09/08/2008.).
Em linha de raciocnio tambm negativa, o
posicionamento do Tribunal de Justia de Gois
mostrou-se mais conservador ao decidir que a
gravao ambiental realizada pela polcia, por
ocasio do interrogatrio judicial do ru, ilcita:
HABEAS CORPUS. TRFICO ILCITO DE
SUBSTNCIA ENTORPECEN-TE. PRISO
PREVENTIVA.
GRAVAO AMBIENTAL FEITA NA
POLCIA. ESPCIE DE INTERROGATRIO
SUB-REPTCIO. PROVA ILCITA.
DESENTRANHAMENTO DOS AUTOS.
INTELIGNCIA DO ARTIGO 157 DO
CDIGO DE PROCESSO PENAL. 1. A
'gravao clandestina' de conversa informal do
indiciado com policiais constitui modalidade de
'interrogatrio' sub-reptcio e, portanto, prova
ilcita, porquanto, alm de realizar-se sem as
formalidades legais previstas no artigo 6, inciso
V, do CPP, se faz sem que o indiciado seja
advertido do seu direito ao silncio, de assento
constitucional. 2. A prova considerada ilcita
deve ser desentranhada dos autos, conforme
dispe o artigo 157 do Cdigo de Processo
Penal, com a redao que lhe foi conferida pela
Lei 11.690/08. ORDEM CONCEDIDA (TJGO
HC 43918-57.2010.8.09.0000. Relator Des. J.
Paganucci Jr. Acrdo em 22/02/2011.
Publicado no DJ 790 de 31/03/2011).
preciso, entretanto, ressalvar a
particularidade desta deciso onde a gravao foi
feita pela prpria polcia. Houve vcio na obteno
da prova por conta de os desembargadores terem
considerado que a gravao foi feita pela polcia e
compararam-na a um interrogatrio. Assim, diante
da ausncia de advogado e a falta de advertir ao ru
que este pudesse permanecer em silncio, foram
violados diversos preceitos constitucionais,
acarretando na invalidade da prova obtida.
J numa deciso em matria cvel, a 5
Cmara Cvel do Tribunal de Justia de Gois, definiu
pela impossibilidade de admisso da gravao
ambiental. Neste caso, diferente do tribunal de justia
mineiro, a gravao realizada por um dos
interlocutores foi usada em seu proveito, fato que no
impediu a inadmissibilidade da prova colhida.
APELAO CVEL. AO CIVIL PBLICA
POR ATO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. GRAVAO
AMBIENTAL FEITA POR UM INTERLO-
CUTOR. VIOLAO AOS DIREITOS
INTIMIDADE E PRIVACIDADE. PROVA
ILCITA. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. DANO EFETIVO AO
ERRIO. DESNECESSRIO. REPASSE DE
SALRIO DE SERVIDOR PBLICO.
UTILIZAO DE VECULO PBLICO E
OFERECIMENTO DE CARGO PBLICO
PARA FINS PARTICULARES.
INADMISSVEL. ENRIQUECIMENTO
ILCITO. VIOLAO DOS PRINCPIOS DA
MORALIDADE, IMPESSOALIDADE E
DEVER DE HONESTIDADE. 1- A gravao
ambiental feita por um interlocutor sem o
conhecimento do outro no deve ser utilizada
como prova no processo, pois ilcita em
decorrncia da violao aos direitos
intimidade e privacidade do investigado. (Art.
5, X e LVI da Constituio Federal). (...) 4-
Apelo conhecido e provido. Sentena
Reformada. (TJGO Apelao Cvel 151095-
2/188. Relator Des. Geraldo Gonalves. Julgado
em 25/02/2010. Publicado no DJ 550 de
05/04/11).
Posteriormente a esta deciso, o mesmo
tribunal goiano, em sua 1 Cmara Cvel,
reconheceu a admissibilidade, embasando-se em
decises da esfera criminal:
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N. F. Azara Junior & L. H. B. A. Silva Valor probatrio das gravaes ambientais
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APELAO CVEL. AO DE NULIDADE DE
ATO ADMINISTRATIVO. NULI-DADE DA
PORTARIA QUE DEU INCIO AO PROCESSO
ADMINISTRATIVO. AUSNCIA DO
PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
LEGAIS DO RELA-TRIO-DENNCIA.
IRREGULARIDADES NA FORMAO DA
COMISSO PROCESSANTE. CERCEAMENTO
DE DEFESA - DEFENSORES DATIVOS
IMPEDIDOS DE EXERCER A ADVOCACIA GRAVAO SEM AUTORIZA-O
JUDICIAL PENA DE DEMISSO COMINADA
SEM FUNDAMENTAO LEGAL.
AUSNCIA DE SENTENA PENAL
CONDENATRIA. (...) IV - A gravao ambiental
tem sido admitida pela Suprema Corte como
legtima desde que atendidas algumas exigncias,
tais como ser gravao de comunicao prpria e
no alheia, estar em jogo relevantes interesses e
direitos da vtima como, por exemplo, em caso de
ocorrncia de crime. Assim, presentes essas
circunstncias, a prova aceita como vlida e
prescindvel de autorizao judicial. (...)
APELAO CVEL CONHECIDA E
IMPROVIDA (TJGO Apelao Cvel 104195-
0/188. Relator Des. Abro Rodrigues Faria. Julgado
em 25/08/2009. Publicado no DJ 426 de
24/09/2011).
O Tribunal do Rio Grande do Sul, a respeito
de um assunto bastante polmico, que a flagrncia
de violncia praticada por empregada domstica
contra infantes, chegou a decidir pela
admissibilidade da gravao de ambiente.
APELAO CRIME. PRELIMINAR.
GRAVAES AMBIENTAIS. PROVA
LCITA. GRAVAO DE AMBIENTE
RESIDENCIAL FEITA PELOS
EMPREGADORES, QUE SUSPEITAM DE
ABUSO POR PARTE DA EMPREGADA
DOMSTICA. A jurisprudncia dos Tribunais
Superiores firmou entendimento de que as
gravaes efetuadas pelas vtimas dos fatos
tidos como criminosos prova lcita, que pode
servir de elemento probatrio para a instaurao
de ao penal contra os agentes criminosos. No
ocorre ilicitude na gravao ambiental feita
pelos pais do menor a fim de verificar as
suspeitas de maus tratos por parte da empregada
domstica por eles contratada para auxiliar nos
servios domsticos e para cuidar do filho de
sete meses de idade do casal empregador. (...)
Negado provimento (TJRS Apelao Criminal
n 70035930668, Relator Des. Marco Antnio
Ribeiro de Oliveira, Julgado em 25/08/2010.
Publicado em 22/09/2010).
Os julgadores gachos inovaram, neste
acrdo, criando uma ressalva ao conceito de
gravao ambiental, admitindo a filmagem como
meio cabal probatrio, apesar de realizado na
ausncia dos responsveis pelo registro. Priorizaram
a dignidade da criana sobre a intimidade da
empregada domstica, por considerarem-na bem
maior.
Com relao aos tribunais superiores, tem-se
que o STJ legalizou a gravao ambiental, desde que
se trate de (...) registro de comunicao prpria (...)
em que h apenas os interlocutores, e cuja causa
motivadora no foi (...) com o intuito de violar a
intimidade (...) mas com o fito de demonstrar a
coao que vinha sofrendo (...).
PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL.
COAO NO CURSO DO PROCESSO (ART.
344, CP). CONSUMAO. CRIME FORMAL.
GRAVAO AMBIENTAL REALIZADA POR
UM DOS INTERLOCUTORES. LICITUDE DA
PROVA. AUTORIA E MATERIALIDADE
COMPROVADAS. SUBSTITUIO DA
PENA. IMPOSSIBILIDADE. ACRDO
RECORRIDO EM HARMONIA COM A
JURISPRUDNCIA DOS TRIBUNAIS
SUPERIORES. (...) 4. De outra parte, em regra, a
violao do sigilo das comunicaes, sem
autorizao dos interlocutores, proibida, pois a
Constituio Federal assegura o respeito
intimidade e vida privada das pessoas, bem como
o sigilo da correspondncia e das comunicaes
telegrficas e telefnicas (art. 5, XII, da CF 88). 5.
Entretanto, no se trata nos autos de gravao da
conversa alheia (interceptao), mas de registro de
comunicao prpria, ou seja, em que h apenas os
interlocutores e a captao feita por um deles
sem o conhecimento da outra parte. 6. No caso, a
gravao ambiental efetuada pela corr foi obtida
no com o intuito de violar a intimidade de
qualquer pessoa, mas com o fito de demonstrar a
coao que vinha sofrendo por parte da ora
recorrente, que a teria obrigado a prestar
declaraes falsas em juzo, sob pena de demisso.
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7. Por no se enquadrar nas hipteses de proteo
constitucional do sigilo das comunicaes,
tampouco estar disciplinada no campo
infraconstitucional, pela Lei n 9.296/96, a
gravao unilateral feita por um dos interlocutores
com o desconhecimento do outro deve ser
admitida como prova, em face do princpio da
proporcionalidade. (...) 13. Recurso especial a que
se nega provimento (STJ RESP 1113734-SP.
Relator Ministro OG Fernandes. Julgado em
28/09/10. Publicado no DJe de 06/12/10).
Aufere-se, ento, que o emrito julgador
elevou a importncia da legtima defesa sobre o
direito privacidade, ou seja, deixou implcito no
ser, tal meio de prova, ilcito em todas as ocasies,
devendo-se ater causa motivadora do registro, que
deve ser maior que a violao da garantia
constitucional de intimidade.
Com relao ao STF, o seguinte j foi
decidido:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE
INSTRUMENTO. GRAVAO AMBIENTAL
FEITA POR UM INTERLOCUTOR SEM
CONHECIMENTO DOS OUTROS:
CONSTITUCIONALIDADE. AUSENTE
CAUSA LEGAL DE SIGILO DO CONTEDO
DO DILOGO. PRECEDENTES. 1. A gravao
ambiental meramente clandestina, realizada por
um dos interlocutores, no se confunde com a
interceptao, objeto clusula constitucional de
reserva de jurisdio. 2. lcita a prova consistente
em gravao de conversa telefnica realizada por
um dos interlocutores, sem conhecimento do
outro, se no h causa legal especfica de sigilo
nem de reserva da conversao. Precedentes. 3.
Agravo regimental desprovido (STF AI 560223
AgR / SP. Relator Min. Joaquim Barbosa. Julgado
em 12/04/2011. Publicado no DJe 079 de
29/04/2011).
Assim, entende o Supremo ser admissvel
como prova qualquer gravao ambiental, desde
que no viole sigilo ou reserva legal. Neste acrdo,
o entendimento uniforme foi de que (...) o fato de a
conversa ter sido gravada no interior de escritrio
de advocacia no tem relevncia, pois o contedo
do dilogo no guarda qualquer relao com o
exerccio da profisso (...).
Por ltimo, convm destacar a seguinte
deciso do Supremo Tribunal Federal, que
reconheceu repercusso geral para o caso de
admissibilidade da gravao ambiental em Ao
Penal:
AO PENAL. Prova. Gravao ambiental.
Realizao por um dos interlocutores sem
conhecimento do outro. Validade. Jurisprudncia
reafirmada. Repercusso geral reconhecida.
Recurso extraordinrio provido. Aplicao do art.
543-B, 3, do CPC. lcita a prova consistente
em gravao ambiental realizada por um dos
interlocutores sem conhecimento do outro.
Deciso: O Tribunal, por maioria, vencido o
Senhor Ministro Marco Aurlio, reconheceu a
existncia de repercusso geral, reafirmou a
jurisprudncia da Corte acerca da admissibilidade
do uso, como meio de prova, de gravao
ambiental realizada por um dos interlocutores e
deu provimento ao recurso da Defensoria Pblica,
para anular o processo desde o indeferimento da
prova admissvel e ora admitida, nos termos do
voto do Relator (STF RE 583937 OO-RG / RJ.
Julgado em 19/11/2009. Publicado no DJe 237 de
18/12/2009).
Diante das posies jurisprudenciais, aufere-
se que a gravao ambiental pode ser usada como
meio de prova em processo judicial, desde que
exista justa causa que possibilite ferir os princpios
da privacidade e intimidade.
Neste sentido, vital que se fundamente no
princpio da proporcionalidade para justificar a leso
dos bens jurdicos protegidos pela Constituio
Federal. A exemplo disso, os tribunais de justia vm
decidindo que a gravao ambiental meio de prova
cabvel em processo criminal para inocentar ru, a fim
de preservar-lhe a liberdade.
Enquanto isso, nas demais reas do Direito,
a sua aplicabilidade mais limitada e, ainda,
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geradora de polmicas entre os tribunais. Ao passo
que existem decises permissivas que se
fundamentam na proporcionalidade, outras colocam
como incabvel tal meio de prova diante da violao
dos princpios constitucionais.
Todavia, infere-se das decises do STF que,
no estando presentes quaisquer clusulas legais de
sigilo ou reserva de informao, cabvel a
gravao clandestina, com fora de prova lcita em
processo judicial, desde que esteja presente a justa
causa para seu registro, como, por exemplo, a
defesa de algum direito violado do responsvel pela
gravao.
A gravao de conversa entre interlocutores no
constitui prova ilcita; esse entendimento
majoritrio tem foro no s entre os doutrinadores
(Ada Pelegrini Grinover, Antnio Scarance
Fernandes, Nelson Nery Jnior, entre outros)
como tambm em nossos Tribunais Superiores
(CASTRO, 2010, p. 137).
Entretanto, a abordagem da admissibilidade
bastante vaga pelo doutrinador, sendo que, no
prprio acrdo citado em sua obra, existe meno
ao princpio da proporcionalidade, que acaba por
impedir a referida regra de legalidade da gravao
ambiental por ele alegada, impondo-a condies de
admissibilidade.
Castro (2010) comenta, ainda, que Luiz
Flvio Gomes e Celso Damando defendem (...)
que o ato de gravar, to somente gravar, no
configura uma violao intimidade alheia (...).
Muito lgico o seu raciocnio, mas deixa de abordar
o aspecto mais importante, que a utilizao desta
gravao para fundamentar uma ao judicial.
8.0. Consideraes gerais
Abordada com mais importncia, a
interceptao telefnica stricto sensu a muito
comentada pelos doutrinadores brasileiros, restando
esquecidas as figuras da gravao e escuta.
Logicamente, ante o maior carter de
privacidade que envolve uma conversa via telefone,
e face aparente invaso praticada por terceiro em
conversa alheia, h de se compreender que
houvesse mxima preocupao do legislador em
proteg-la, criando dispositivos constitucionais e
legais para tutel-la, olvidando-se das demais
figuras igualmente importantes.
Ento, surge o impasse de ter que mensurar
a capacidade probatria em juzo das escutas e
gravaes, sabendo-se que a sua produo viola
princpios constitucionais, mas que, sem estes
meios probatrios, direitos fossem lesados.
Partindo deste aspecto parte da doutrina se
disps em separar os conceitos de interceptao,
gravao e escuta, bem como oferecer uma opinio
a respeito de sua validade probatria.
Obviamente, para os doutrinadores, a
interceptao somente ter fora de prova lcita se
preenchidos os requisitos legais (Lei 9.296 de
1996). Enquanto isso, a gravao seria uma prova
sempre legal, pois a prpria pessoa que participou
do dilogo fez o registro, no havendo qualquer
invaso de privacidade.
Todavia, este pensamento mostrou-se
fragilizado, especialmente porque quando se trata
dos princpios da privacidade e intimidade, no h
diferena se a violao deles no mbito telefnico
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ou pessoal.
Melhor explicando, no importa se um
terceiro est registrando o dilogo, ou se o registro
feito por um dos interlocutores. O que prevalece a
quebra das garantias fundamentais de intimidade e
privacidade.
Inmeros aspectos devem ser analisados.
Isso foi demonstrado neste trabalho, nas vrias
jurisprudncias citadas. A premissa aplicar o
princpio neoconstitucional da proporcionalidade.
Com ele, o Judicirio pode estudar o caso em
concreto e dizer se, naquela situao, o direito
privacidade ou intimidade foi violado em
detrimento de um bem maior.
Portanto, colocam-se, em cada lado da
balana, os direitos violados da vtima e do ru,
pesando-os, de forma a desvendar qual prevalecer.
Nada mais do que a justa causa tanto aludida nos
acrdos citados.
Todavia, enquanto no houver reforo
legislativo delimitando a matria, no ser possvel
obter segurana jurdica. Apesar de reiteradas vezes
ter sido comentado que a aplicao da proporo
entre os direitos violados a sada lgica mais
adotada, ela no a nica soluo. Os juzes tm
livre convico. Podem decidir conforme desejam,
desde que no ofendam a Lei ou as provas
apresentadas e assim o faam de forma
fundamentada (CF, art. 93, IX). Diante da
imprevisibilidade legislativa, nada os impede de
definir pela inadmissibilidade da gravao
ambiental por violar os direitos constitucionais
privacidade e intimidade.
9.0. Referncia Bibliogrfica
AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas
ilcitas: interceptaes telefnicas, ambientais e
gravaes clandestinas. 3 ed. So Paulo: RT, 2003.
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BRASIL. Tribunal de Justia de Gois. Apelao
Cvel n 151095-2/188. Goinia, GO: 05 de abril de
2011. s.p.
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s.p.
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