Psicanálise Fundamental

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  • 7/26/2019 Psicanlise Fundamental

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    Esperei a chuva ficar mais amena e sai. Especialmente naquela noite havia poucas

    pessoas na cidade. Talvez se escondendo da tempestade ou de algum medo maior. Dirigi

    da Barra at Copacabana com cautela. Embora os pensamentos continuassem

    embaraados era assim desde o comeo de tudo. s luzes e letreiros borrados pela

    !gua. "eu cora#o borrado pela pai$#o. "eu crebro borrado pela esperana.Estacionei no comeo da rua. Esperei um longo tempo dentro do carro. %#o era o frio

    nem a umidade que me travavam& era uma espcie esquisita e em e$tin#o de medo.

    batia'se sobre mim de modo nunca antes sentido. (m medo indito. )averia* +espirei

    fundo e sai. Caminhei pela calada at o final da Bar#o de ,panema. Encontrei sem

    dificuldades o velho prdio do professor.

    (m cartaz escrito a m#o anunciava que o elevador estava quebrado. -eis andares de

    escada. Encarei. lgumas lmpadas queimadas dava a certeza de abandono daquelevelho edif/cio. Espantei'me pelo fato de que com tanto prest/gio e renome o professor

    bdala morasse ali. 0oderia muito bem morar no 1eblon& com todo lu$o e conforto

    daquele bairro. Bem& deveria ser um trao de sua personalidade& se2a l! o que

    significasse isso. Cheguei ao se$to andar. partamento 343. Toquei a campainha e

    esperei. Em dois minutos ele abriu a porta.

    -egurava um livro de capa preta nas m#os. (ns 5culos pendiam no nariz e um charuto

    na boca. (sava camiseta branca e cala de moleton e umas pantufas meio engraadas.

    6 interior muito bem iluminado& parecia que todas as lmpadas estavam acesas. ampla

    sala era confort!vel& quente muito organizada. (ma estante cheia de livros com capas

    iguais ao que ele tinha nas m#os. (m sof!& o div#& a poltrona e& nas paredes& v!rios

    quadros de pintores surrealistas7 "agritte& Dali& "ir5...

    6 que eu sabia sobre ele que criara um mtodo terap8utico totalmente inovador na

    cura de doenas ps/quicas. 9ia2ou o mundo inteiro pesquisando e finalmente aportou no

    Brasil& no +io de :aneiro. Conseguiu o posto de professor titular de 0rocessos

    0sicol5gicos na (;+: e de Teoria 0sicanal/tica na 0(C. %#o mais clinicava& apenas

    ensinava& dava palestras& escrevia artigos para 2ornais. Era averso& porm& a apari

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    narrativa impressionante que me dei$ou de quei$o ca/do& tamanha a fora argumentativa&

    a doura no di!logo e a paz que transmitia. 0ediu'me que deitasse no div# e lhe contasse

    o motivo de meu pedido de a2uda.

    =Chegou sorrateiramente. -em ser convidado. rrastando'se pelas frestas. -em se

    dei$ar notar. lo2ou'se l! no fundo de mim& e quando percebi sua presena 2! era tardedemais. Causou estragos consider!veis. Tal como o Diabo da Tasmnia dos desenhosanimados& bagunou tudo dentro de mim. +evirou'me internamente de pernas pro ar.>uebrou partes importantes de mim e feriu'me principalmente o cora#o. Cortou'o esangro at ho2e. %#o consigo mais ter paz. 9ivo diariamente a aus8ncia dela. Choro& n#ocomo& n#o durmo...(m verdadeiro inferno t8'la dentro de mim ?@ horas. Em todos osmomentos ela aparece& nas horas mais impr5prias. Ela me vem em sua plenitude& soucapaz de perceber o cheiro do perfume. "as sei que n#o pode haver nada entre n5s. Elan#o me quer. +ecusa'me como se eu fosse um c#o sarnento. Talvez e$agero. "as

    oferece'me apenas amizade. 6ferecer amizade a que tem amor como oferecer bebida aquem fome. %#o sei mais o que fazer& estou desesperado. 0or favor tire'a de dentro demim. A para isso que vim aqui professor& tire'a de dentro de mim& tire'a da minha cabea.0elo amor de Deus& eu n#o aguento mais. Tire'a de dentro de mim.

    Depois de um sil8ncio preocupante& ap5s ter me ouvido& ele perguntou'me se erarealmente isso que eu queria. -e realmente eu tinha ido em busca daquilo. +espondiconvicto que sim. 0erguntou se eu n#o queria repensar e tentar lidar com a situa#o deoutra forma. Eu disse que n#o. >ue queria ser livre do amor. >ueria ter minha vida sem apresena dela. >ue assim se2a& disse ele.

    6rdenou'me que aguardasse no div#. ,a pegar algo para esquentar pois esfriaraconsideravelmente& enquanto l! fora a chuva aumentou. 9oltou da cozinha com duas$/caras de um maravilhoso ch! de cor avermelhada. Tomamos e colocamos as $/carasvazias sobre uma pequena mesinha entre n5s dois. E$plicou'me que ia utilizar de umatcnica utilizada pelo Dr. ;reud no in/cio de suas pesquisas7 a hipnose. ;iquei um poucoapreensivo& mas logo me tranquilizei quando ele disse que havia feito modificaue me concentrasse apenas nisso. Colocou am#o sobre meu peito e apertou com fora. -enti de imediato um aperto& seguido de umador aguda. -ua m#o dava a impress#o de ter entrado em meu peito. bri os olhos e tudoestava mergulhado em trevas. Como em um pesadelo tentei acordar mas estava im5vel.6uvia apenas a msica e um leve sussurrar de palavras estranhas& uma l/ngua que nuncaouvira antes sa/a dos l!bios do professor. E meu corpo ardia. ;echei de novo os olhos epensei nela& como havia me ordenado. (ma confus#o de pesamentos doloridos e dor

    f/sica me dominaram. -uava muito e pensei que ia desmaiar. Fritei& mas minha voz n#osa/a. -enti alguma se desgrudando de mim. Como se minha pele estivesse sendoarrancada. sala estava clara novamente e vi algo que iria me aterrorizar para sempre7 a

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    vi saindo de dentro de mim& pu$ada pela m#o do professor. %#o podia crer naquilo& masela era arrancada de dentro de minhas entranhas e do/a muito.

    )ouve uma e$plos#o de pnico e confus#o& um grande clar#o e minha vista escureceupor alguns instantes. >uando voltei a mim& n#o sentia absolutamente nada. Toda dor& todaconfus#o haviam sumidos. -entei'me no div#& e para minha surpresa& ele estava de

    c5coras no ch#o. Tremia de frio e os cabelos desgrenhados. Batia o quei$o e enrolava osbraos no corpo. Completamente nua. 6 professor& de p& alternava o olhar entre mim eela.

    Totalmente atGnito& perguntei que evento maravilhoso era aquele& que desafiava as leisda l5gica e da compreens#o humanas. 6u eu estava louco* 6 professor dissecalmamente que havia feito o que eu pedira& tirou a pai$#o de dentro de mim. rgumenteiconfusamente que era imposs/vel. Estava dentro de um sonho ou de um pesadelo. "asn#o era. De alguma forma misteriosa o emrito psicanalista havia me curado de uma

    pai$#o& havia tirado ela de dentro de mim. 6 que eu faria agora*

    HHHH