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VOZES QUE SE LEVANTAM PELA DIVERSIDADE A VOZ COLECTIVA DE GRUPOS DE IMIGRANTES UMA INICIATIVA: COM O APOIO:

QUE SE LEVANTAM PELA DIVERSIDADE · 2018. 3. 27. · revela na primeira pessoa, do singular ou do plural, as trajectórias de vida, em contexto de imigração para Portugal, nas últimas

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VOZES QUE SE LEVANTAM

PELA DIVERSIDADE

A VOZ COLECTIVA DE GRUPOS DE IMIGRANTES

UMA INICIATIVA:

COM O APOIO:

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ÍNDICE

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OS DEPOIMENTOS | AS VOZESGrupos de depoimento: identificação e código

Depoimentos colectivos1. Depoimento colectivo de imigrantes trabalhadores da Luso Temp:

trajectórias de imigração2. Depoimento colectivo de imigrantes trabalhadores da Luso Temp

3. Depoimento colectivo de adultos do Bairro do Talude4. Depoimento colectivo de imigrantes residentes na área de Quarteira

5. Depoimento colectivo de jovens do Bairro do Talude6. Depoimento colectivo de mulheres imigrantes brasileiras

7. Depoimento colectivo de mulheres imigrantes cabo-verdianas8. Depoimento colectivo de mulheres imigrantes dos países do leste europeu

9. Depoimento colectivo de mulheres imigrantes trabalhadoras domésticas ou do sector da limpeza

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1419252936404549

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INTRODUÇÃO 6

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NOTA FINAL

BIBLIOGRAFIA

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TEMAS EMERGENTESO Processo MigratórioA decisãoInterface com a sociedade de acolhimentoProcesso de RegularizaçãoGanhos e Perdas no Processo MigratórioMercado de trabalhoCarga HoráriaSaláriosRelação com os/as empregadores/asFunções/tarefasCidadania e ParticipaçãoDireito à habitaçãoDireito à saúdeDireito à educação, língua e reconhecimento das competênciasDireito ao créditoDiscriminaçãoEspecificidade das mulheres migrantes

606161626466676868697071727273747578

8081

818383848484

PROPOSTAS | SOLUÇÕESPara a sociedade de acolhimentoPara os poderes e instituições públicas que trabalhamcom as questões da imigraçãoPara as Entidades EmpregadorasPara as Entidades FiscalizadorasPara as Instituições de Educação/formaçãoPara as Entidades que concedem créditoPara a intervenção dos/as próprios/as imigrantes

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INTRODUÇÃO

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ste documento, elaborado no âmbito do projecto “Vamos Utopiar” apoiado pela Iniciativa Comunitária Equal, é a apresentação dos depoimentos colectivos de grupos de

imigrantes e o resultado de uma análise de conteúdo desses depoi-mentos colectivos que relaciona as situações apresentadas com asmedidas no âmbito de políticas de imigração nacionais e internacionais.

A centralidade deste documento são as vozes que se levantampela diversidade, ou sejam os depoimentos colectivos, resultantesdo processo das acções de conscientização, produzidos por oitogrupos de mulheres, homens, raparigas e rapazes, provenientes deÁfrica, Ásia (sub continente indiano), América do Sul e Europa de Leste,constituídos com a colaboração de organizações representativas dapopulação alvo. Cada depoimento revela na primeira pessoa, dosingular ou do plural, as trajectórias de vida, em contexto de imigraçãopara Portugal, nas últimas décadas. Revela que numa diversidade devozes há uma partilha de sonhos, expectativas e problemas comuns.Revela um processo que partiu do sentir interior de cada interveniente,construído e reconstruído em interacção com os/as outros/as.

O presente documento constitui-se, por si só, como uma necessidadeexpressa pelos/as próprios/as imigrantes, uma vez que reflecte asua intenção de tornar “as nossas vozes em conjunto, (…) ouvidas”

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contribuindo assim para “…que os portugueses tivessem uma compre-ensão positiva do trabalho e esforço dos homens e mulheres imigrantesque contribuem para o desenvolvimento e vida económica do país etambém para o desenvolvimento cultural do conhecimento…”.

Considera-se também que este documento se constitui como um desafioao empenho concertado de todos/as, Governo, ONG's e associações,para que se atinja um nível de vida, trabalho, construção social ehumana, numa “convivialidade”, que aponte para uma fase Históricaem termos novos.

Para a construção deste documento criou-se, em primeiro lugar,um guião de leitura dos depoimentos para permitir a sua análise deconteúdo, fazendo emergir de um modo geral as experiências dastrajectórias de imigração, as motivações que levaram à necessidadede imigrar, as expectativas que os/as imigrantes tinham à chegadaao país de destino, os problemas que enfrentaram e as soluções queencontraram ou que desejariam encontrar.

Posteriormente, procurou-se reconhecer de forma mais aprofun-dada os temas emergentes, no dizer e sentir dos grupos de imigrantesexpresso nos depoimentos colectivos. Estes depoimentos revelaramquestões comuns, sobretudo no que concerne: ao processo migratório(a tomada de decisão, as motivações, as vivências experimentadasna interface com a sociedade de acolhimento, o processo de regulari-

zação); ao trabalho (tipos de trabalho, condições de trabalho, horários,vencimentos praticados e também ausência de fiscalização e muitassituações de irregularidade); à cidadania e participação (as barreirase os obstáculos encontrados para uma vivência plena, os direitoshumanos) e à discriminação (do estereótipo à dolorosa exclusão).

A apresentação dos temas emergentes dos depoimentos foi antecedidapor um enquadramento sustentado em medidas políticas no âmbitoda imigração nacional e internacional, assim como outras recomen-dações reguladoras da mobilidade humana.

Este documento estrutura-se em torno de três capítulos. No primeirocapítulo transcrevem-se os depoimentos que resultaram do processodas acções de conscientização e que foram apresentados publicamentepelos/as próprios/as imigrantes no Fórum da Interculturalidade, quedecorreu no dia 19 de Novembro de 2006, no Colégio S. João de Britoem Lisboa.

O segundo capítulo desta publicação construiu-se a partir da análisedepoimentos colectivos nos quais foram identificados temasemergentes relacionando-os com medidas no âmbito de políticas deimigração a nível nacional e internacional.

No terceiro capítulo, são sistematizadas, em áreas chave, as soluçõespropostas nos depoimentos colectivos dos grupos de imigrantes.

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Que as linhas deste documento nos conduzam a uma escuta atentaà voz colectiva dos grupos de imigrantes que nos desafiam de inú-meras formas e que nos fazem lembrar que todos/as somos pessoasem mobilidade quase contínua, fazendo ao longo da vida experiênciasque conhecem possibilidades e limites cada vez mais comuns, nãosó nas nossas vidas, como nos territórios que partilhamos e no planetaem que habitamos.

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“Ao colocarmos em comum os nossos problemas, soluções vãosurgindo e vamos descobrindo que juntos/as somos uma força,somos uma voz”

(Grupo de Imigrantes da Quarteira)

Os depoimentos colectivos são um resultado do processo das acçõesde conscientização, produzidos por oito grupos de mulheres, homens,raparigas e rapazes, provenientes de África, Ásia (sub continente india-no), América do Sul e Europa de Leste, constituídos com a colaboraçãode organizações representativas da população alvo. Cada depoimentorevela na primeira pessoa, do singular ou do plural, as trajectóriasde vida, em contexto de imigração para Portugal, nas últimas décadas.Revela que numa diversidade de vozes há uma partilha de sonhos,expectativas e problemas comuns. Revela um processo que partiudo sentir interior de cada interveniente, construído e reconstruídoem interacção com os/as outros/as.

No primeiro depoimento é apresentada uma viagem clandestina embusca de um sonho de uma vida melhor. Os restantes depoimentossão um reflexo da troca de experiências ligadas às suas trajectóriasde imigração e da partilha de dificuldades enfrentadas nos seusquotidianos na interface com a sociedade de acolhimento e com omercado de trabalho.

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Foram também exploradas as causas destes problemas partilhados,bem como as soluções relevantes para a sua resolução.

Códigos dos depoimentos de imigrantes trabalhadores da LusoTemp:Trajectórias de vida |1| De imigrantes trabalhadores da LusoTemp |2|De imigrantes residentes na área de Quarteira |3| De adultos doBairro do Talude |4| De jovens do Bairro do Talude |5| De mulheresimigrantes brasileiras |6| De mulheres imigrantes cabo-verdianas |7|De mulheres imigrantes dos países do leste europeu |8| De mulheresimigrantes trabalhadoras domésticas ou do sector da limpeza |9|

1. DEPOIMENTO COLECTIVO DE IMIGRANTES TRABALHADORESDA LUSO TEMP: TRAJECTÓRIAS DE IMIGRAÇÃO

Todos/as os/as que imigram começam com uma viagem. Este depoi-

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GRUPOS DE DEPOIMENTO:IDENTIFICAÇÃO E CÓDIGO

mento, centrado na trajectória de imigração na clandestinidade comdestino à Europa, foi assumido pela recém constituída AssociaçãoHumanista Indiana. Foi partilhado nos encontros de um grupo detrabalhadores da área da construção civil oriundos de países daEuropa de Leste: Moldávia, Roménia e Rússia e também da Guiné--Bissau, do Paquistão, da Índia e do Senegal, organizados pela LusoTemp e dinamizados pelo Graal.

Este relato retrata a trajectória de imigração de muitos de nós parachegarmos à Europa na clandestinidade. Foram acontecimentosanteriores à regularização conseguida através da contratação elegalização no mercado de trabalho.

É a história de pessoas que, um dia, decidiram deixar as suas terrasprocurando melhores condições para a sua vida. Ainda que nos seuspaíses até nem vivessem mal, acreditavam que noutro lugar tudopoderia ser bem melhor. Mesmo sem saber o que iriam encontrar,onde iriam morar, o que iriam fazer, só pensavam em ir embora paraoutro país.

São sobretudo os mais jovens, os mais descontentes, aqueles quese movem pela utopia de conseguir vencer noutros países. Parasaírem da sua terra precisam de dinheiro para a viagem e por issopressionam os pais, que arriscam tudo, hipotecam a casa, vendemterrenos.

DEPOIMENTOS COLECTIVOS

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a tiro pelo próprio agente.

Por vezes, ao longo dos percursos encontram-se rios, onde o agentejá tem pequenas embarcações preparadas para transportar o grupode uma margem para a outra. Essas embarcações são pequenasdemais para o número de pessoas cuja única alternativa é avançar,mesmo sem garantias de segurança na travessia. Foi de conheci-mento mundial um acidente, que retrata uma situação idêntica a estae a muitas outras como esta. Em Dezembro de 97/98 cerca de 350pessoas, na sua maioria indianos, perderam a vida numa travessiade barco.

Um sobrevivente contou que foram obrigados a entrar no barco pelouso da violência e sob ameaças de armas. Sete/oito anos depois, afamília destas pessoas continua sem saber o seu paradeiro, sem saberse encontram vivos ou não.

Depois da travessia, o grupo continua a andar pelas florestas e asaltar vedações de arame farpado. Atravessam Praga, Kiew, semprecom intermediários do agente nesses países que procuram levá-losaté Alemanha, porta de entrada da U.E. Chegando à Alemanhacomeçam os contactos telefónicos com a família e amigos empaíses europeus, para os localizarem e se juntarem a eles.

Quando não têm ninguém conhecido, recorrem aos serviços de táxi

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Do dinheiro conseguido, entregam entre 10.000 a 15.000¤ a um agenteque garante tratar da viagem, alimentando a utopia da conquista deuma vida melhor. O agente retém o passaporte e o dinheiro, demorando,muitas vezes, cerca de um ano para dar andamento aos processos.Afirma que é o tempo necessário para se tratar dos preparativospara a viagem, mas durante esse tempo aproveita para pôr o dinheirorecebido a render.

Finalmente, o agente arranja documentos falsos para facilitar a entradana Europa através da Rússia. A saída faz-se em grupos. Primeiroentram na Rússia, onde ficam escondidos durante meses até que sereúnam condições para que seja seguro avançar rumo a países daUnião Europeia. São fechados em quartos (com 30 a 40 pessoaspor quarto) e recebem comida e água uma única vez por dia, Algunscomeçam a ficar débeis, devido às más condições e à falta de umaalimentação adequada.

Alguns meses depois, o agente encontra a solução para que o grupopossa sair para outro país. As pessoas saem finalmente do esconderijo,habitualmente através de uma floresta junto das montanhas, sujeitas,na maioria das vezes, a muito mau tempo: chuva, neve e muito frio.Percorrem a pé durante 10 a 15 horas, um caminho muito longo edifícil, sem comer nem beber. Quando alguém se sente sem forçasou a ficar doente, é abandonado na floresta. São muitos os casos depessoas que nunca chegaram a sair da floresta. Muitos são mortos

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para serem transportados para o país que escolheram. Os motoristascobram muito dinheiro, mas é a única forma, uma vez que não têmdocumentos e não podem correr o risco de ir de avião ou de autocarro,porque nem chegariam a embarcar, seriam logo deportados.

Ao chegarem ao país de destino, começam a procurar alojamento oufamília/pessoas conhecidas com quem possam ficar. Depois inicia-seum dos maiores e mais complicados desafios: encontrar trabalho. Émuito difícil, mas lá vão conse-guindo. Enquanto não têm documentos,os patrões aproveitam-se frequentemente do seu trabalho, pagampouco e muitas vezes nem pagam nada.

Algumas pessoas, sobretudo jovens, vêem-se com dinheiro e esque-cem a situação difícil em que deixaram os seus pais, pensam apenasem gastar esse dinheiro, divertindo-se com álcool, mulheres e emdiscotecas.

Outras pessoas, quando começam a receber os seus salários, enviamdinheiro para a família, para pagarem as hipotecas feitas e os juros.Há situações em que se demora muito tempo para arranjar algumdinheiro que dê para pagar as despesas assumidas. Então, as hipotecasvão vencendo e vão-se perdendo todas as coisas.

A vida de um estrangeiro é uma prisão adocicada; por um lado, porquese deseja estar no país de origem, do qual se têm muitas saudades

e onde se têm todas as raízes; por outro lado, o que se consegueno país de destino é um forte apelo a permanecer. Aqui há algumtrabalho e ganha-se algum dinheiro, que vai permitindo suportardois encargos, os de cá e as despesas da família no país de origem.Nessa altura pensa-se que a vida poderia ser melhor se se tivessedocumentos e a situação legalizada e luta-se por isso.

Até terem documentos há muitos problemas. Por exemplo, só é pos-sível contactarem os pais por telefone ou carta. Se há uma necessidadede assistência à saúde de familiares, um casamento ou um funeral,não é possível deslocarem-se porque não têm documentos que per-mitam retornar a Portugal. Por isso não arriscam, preferem não voltarao seu país.

Não é possível rever este relato sem pensar em tudo o que se vivecomo estrangeiro, na família que se deixou para trás, na solidão quese vive. Não é possível pensar nesta vida forçada pela necessidadesem que os olhos se inundem de lágrimas.

2. DEPOIMENTO COLECTIVO DE IMIGRANTES TRABALHADORESDA LUSO TEMP

Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros de um grupode trabalhadores da área da construção civil oriundos da Moldávia,

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Roménia, Rússia, Guiné-Bissau, Paquistão, Índia e Senegal, organi-zados pela Luso Temp e dinamizados pelo Graal em 3 sessões quedecorreram entre 15 de Janeiro e 15 de Outubro de 2006.

Somos trabalhadores da empresa Luso Temp, que temrepresentação de imigrantes de um grande númerode países. Neste grupo apenas se reuniram participan-tes de países da Europa de Leste: Moldávia, Roménia,Rússia, Guiné-Bissau, Paquistão, Índia e Senegal. Nosencontros de grupo realizados, descobrimos o que nosune e desejamos abraçar o lema do projecto “VamosUtopiar.”

Juntos, ao longo de três encontros, partilhámos as nossas experi-ências e tentativas de integração na sociedade portuguesa. Juntostomámos consciência de que afinal há problemas comuns entre nós,que tantas vezes tentamos resolver na angústia do isolamento e dosilêncio.

A nossa caminhada para um futuro com melhores condições é muitasvezes vivida na solidão, longe do nosso país e dos nossos familiares.Encontrámos barreiras imensas, que nos parecem difíceis de ultra-passar e que nos fazem tantas vezes querer voltar para trás e desistir.

Grande parte de nós, sobretudo os que vimos de países da Europade Leste e do Oriente, tivemos como dificuldade, em primeiro lugar,a compreensão da língua, que tantas vezes se constituiu como umbloqueio à entreajuda entre colegas de trabalho, ou originou diversassituações de intolerância por parte do empreiteiro geral, que afectaramo nosso bem-estar e a produtividade no trabalho.

Muitos de nós trazem na bagagem um diploma de um curso superior,mas na maioria dos casos de nada vale. Não nos são reconhecidas ashabilitações académicas que possuímos ou mesmo a nossa experiênciaprofissional anterior. A tarefa do reconhecimento profissional dealgumas mulheres que possuem experiência comprovada na áreada construção civil torna-se uma verdadeira derrota mesmo antesdo início da batalha. A Inspecção Geral do Trabalho, perante o caso deuma mulher com a carteira de gruista, revelou-se incrédula, temendoalguma irregularidade, simplesmente pelo facto de ser uma mulher acandidatar-se ao desempenho daquela função (situação inexistenteem Portugal), revendo o contrato diversas vezes e adiando a suaintegração profissional.

Ainda que sejamos capazes de exercer funções com maiores respon-sabilidades, mesmo quando já ultrapassamos o problema da língua,continuam a encaminhar-nos apenas para trabalhos de execução.

Quase todos e todas tivemos entidades patronais que não aceitaram

Algés-Oeiras, 2006

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o nosso trabalho enquanto aguardávamos visto de permanência.

Quase todos e todas temos uma história para contar em que algunspatrões nos ficaram a dever dinheiro, ou em que trabalhámos meses,e até anos, sem nunca nos fazerem os prometidos descontos paraa Segurança Social.

Quase todos e todas sofremos a humilhação de sermos tratados deforma agressiva.

Falámos de casos em que nós, homens e mulheres, somos despedidossem justa causa. Outros trabalham diariamente para além do horáriolaboral, fazendo muitas horas extraordinárias, que não lhes pagam.Perguntam-nos “mas porque aceitam isso, porque não recusam?”Se recusamos, somos despedidos…

Nalguns casos aconteceu querermos trabalhar mais tempo e não haverpossibilidade porque alguns horários não podem ser alargados.

Todos nós ouvimos falar de histórias em que trabalhadores são for-çados a aceitar trabalhos geograficamente distantes da sua área deresidência.

Muitos de nós, no início, convivemos com a palavra “despedimento”,uma das primeiras que aprendemos em Portugal.

Alguns passos têm sido dados para melhorar a regularização doprocesso de imigração, mas todos/as nós sabemos o que é o circuitode entidade em entidade (SEF, ACIME, consulados, embaixadas…), oque são horas, dias, meses de espera para que consigamos ver,finalmente, os nossos processos de legalização regularizados. Paraalém das elevadas despesas que um processo de legalização exige,arriscamo-nos muitas vezes a perder o emprego devido a tantasdeslocações, por vezes inúteis, e então resignamo-nos ou vemo-nosforçados/as a regressar ao nosso país, prejudicando sobretudo as nos-sas crianças, que são obrigadas a interromper os estudos em Portugal.

Nesta corrida pela legalização, muitos entraves nos foram colocados.Por exemplo, o acesso ao crédito é condicionado e tantas vezesrecusado. Até a abertura de uma simples conta bancária é muitasvezes uma verdadeira missão impossível.

De entre nós, quantos não recorremos a advogados ou temos pessoasamigas ou conhecidas que o fizeram, numa tentativa de resoluçãode problemas e acabamos também burlados pelos advogados?

Afinal, quem somos nós em Portugal? Quem somos nós para osportugueses? Para uns, estrangeiros e ameaças aos seus locais detrabalhos. Para outros, uma fonte fácil de rendimento?

Acreditamos que a resolução destas dificuldades depende muito de

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Propomos às entidades bancárias que estudem a concessão de créditosa estrangeiros e que desenvolvam práticas uniformes.

Consideramos importante que as instituições de educação e formaçãodivulguem as suas ofertas formativas junto das comunidades deimigrantes e criem melhores oportunidades de acesso.

Desejamos ser uma voz neste país, uma voz que quer participar e in-tegrar-se, com as nossas raízes e culturas diferentes, porque sabemosque podemos contribuir para uma sociedade mais intercultural.

3. DEPOIMENTO COLECTIVO DE ADULTOS DO BAIRRO DO TALUDE

Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros,dinamizados pelo Graal, de um grupo de homens emulheres do Bairro do Talude, maioritariamente deorigem cabo-verdiana, constituído com o apoio daAssociação Melhoramentos e Recreativo do Talude.

É preciso coragem para imigrar. Quando se imigradeixa-se tudo: a família, os amigos, a terra que amamose morre-se de saudades. O corpo está aqui, mas ocoração está bem longe…

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nós próprios. É urgente e prioritário que se trabalhe para a uniãoentre diferentes grupos étnicos e diferentes nacionalidades. É urgenteque procuremos remar contra a maré do individualismo do isolamento.As nossas vozes em conjunto poderão ser ouvidas.

É preciso que acreditem em nós e nos acolham com respeito.

Acreditamos também que uma luz ao fundo do túnel surgirá quandoas entidades que regulamentam as áreas da legalização e do trabalhoestabelecerem entre si melhores redes de comunicação, desenvol-verem mecanismos de aceleração dos processos de renovação elegalização e efectuarem um atendimento ao público mais eficaz, maisrápido e sobretudo mais humanizado.

Consideramos urgente que os serviços do SEF sejam mais des-centralizados, de modo a facilitar o acesso aos trabalhadores e àstrabalhadoras imigrantes, dispersos geograficamente, minimizandoatrasos e faltas ao trabalho.

Apelamos também ao SEF para que torne obrigatória a aceitaçãodos pré-registos por parte de todas as entidades patronais.

Apelamos às entidades fiscalizadoras para actuarem junto de entidadespatronais não cumpridoras da lei criando formas rígidas de penalização. Talude-Loures, 2006

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O acolhimento em Portugal não é o que esperávamos. A discriminaçãopela cor da pele, a diminuição que fazem da nossa língua, da nossaterra, da nossa cultura e dos nossos filhos é uma realidade que temosque enfrentar no dia a dia.

Ninguém se sente acolhido quando são tantas as barreiras à legali-zação, quando se é hostilizado nas ruas, nas escolas e nos empregos.

Ninguém se sente bem acolhido num país que nega a nacionalidadea algumas das nossas crianças que aqui nascem e crescem.

Quem se sentiria acolhido num país onde a justiça não é justa, ondeum mesmo crime é penalizado de forma diferente se for praticadopor um nacional ou por um estrangeiro?

Quem se sentiria bem acolhido num país onde na televisão e nosjornais se passam imagens tão negativas da nossa comunidade, ondeo negro aparece sempre associado a coisas negativas, pouco dignas,onde se repete a ideia de que estamos aqui para roubar e prejudicarPortugal e os portugueses?

Na verdade, tal como fizeram muitos portugueses no passado, parti-mos à procura de uma vida melhor, para trabalhar. No trabalho, osproblemas nunca mais acabam - somos vistos como máquinas, são-nosdadas as tarefas mais pesadas, cansativas e que exigem mais força.

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No geral, são aqueles trabalhos que poucos valorizam e gostam defazer. Não há como negar que somos tratados de forma desigual eque somos explorados por sermos imigrantes.

Quando há trabalho, o que nem sempre acontece, trabalha-se muito,muito mesmo, ao ponto de ser difícil acompanhar a vida dos filhos.No entanto, o que se ganha é muito pouco para cobrir as despesasda casa de cá e da casa de lá, da família que temos perto e da outraque está longe, mas que conta connosco. Os salários são baixos eos impostos que pagamos muito altos. Tudo isto nos coloca numasituação de enorme precariedade…

Piores são os casos, infelizmente frequentes, das pessoas que nãorecebem quando estava acordado ou que nem sequer chegam areceber pelo seu trabalho e das pessoas que fazem os descontosque não chegam à Segurança Social…

As pessoas ficam inseguras porque facilmente são enganadas e preju-dicadas.

Muitas pessoas não beneficiam dos seus direitos e não cumpremcom as suas obrigações porque os patrões lhes negam os contratosde trabalho. Isto não só dificulta a sua regularização no país, comotambém abre margem para situações de despedimentos injustos -despedem-se pessoas porque dizem o que pensam, porque pedem

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contratos de trabalho, porque ficam doentes ou mesmo porque sofremacidentes de trabalho…

Há também quem não tenha a sua situação regularizada no país e noemprego porque as leis são difíceis de compreender e a burocraciadifícil de ultrapassar, sobretudo por quem não sabe ler, não sabe aquem recorrer ou tem vergonha de fazer perguntas. E isto acontecemuito àqueles que, de entre nós, não tiveram oportunidades de estudar.

Sentimos que é pouco o que podemos fazer quando somos exploradose enganados, pois as autoridades não se mostram sensíveis aos nossosproblemas e levantam muitos obstáculos. Como consequência disto,as pessoas sentem que “não vale a pena” apresentar queixas. Quemnão está em situação regular no país, ainda menos pode fazer…Ninguém se vai aproximar das autoridades para fazer denúncias quandoelas são sentidas como uma ameaça…

Por tudo isto, a comunidade africana não se sente motivada para par-ticipar na vida social e cívica do país do qual não se sente parte, doqual se sente excluída. Na verdade, sentimos que se espera de nós queestejamos aqui para servir… Quando nos manifestamos, deixamos deser vistos como úteis para sermos incómodos. Mas as dificuldadesnão nos podem silenciar… Há leis que nos protegem e que têm que seraplicadas, não podemos resignar-nos quando os nossos direitos sãoviolados, quer no local de trabalho, quer nas ruas, quer nas escolas…

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É, por outro lado, urgente uma maior fiscalização às entidades patronais.

Consideramos também prioritário que os processos de regularizaçãosejam facilitados e simplificados.

Pensamos que é importante aproximar-nos e beneficiar do apoio eesclarecimento que a Associação do nosso Bairro nos pode dar e con-sideramos que as associações de imigrantes deveriam ter mais apoiospara poderem apoiar mais as comunidades que representam.

Para que possamos viver melhor aqui, pensamos ser importante po-dermos contar mais uns com os outros, em vez de nos fecharmos nasnossas casinhas, em frente à televisão. Vamos encontrar-nos! Vamosfalar mais entre nós, valorizar a nossa língua e viver mais as nossastradições e a nossa cultura!

A vida exige muito esforço e vamos lutando todos os dias, juntos,para que as coisas melhorem… Vamos tentando encontrar em Portugaluma família, amigos e uma terra para amar. Para além do nossocorpo, também queremos ter o nosso coração aqui, onde vivemos!

4. DEPOIMENTO COLECTIVO DE IMIGRANTES RESIDENTESNA ÁREA DE QUARTEIRA

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Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros de um grupode imigrantes residentes no Algarve, oriundos de diversos países,nomeadamente, da Roménia, Ucrânia, Guiné-Bissau e Brasil, cons-tituído com o apoio da Agência do Banco de Tempo de Quarteira.

Somos um grupo bastante heterogéneo de imigrantesresidentes em Quarteira, Almancil e Faro, oriundosde países como a Roménia, Ucrânia, Guiné-Bissau eBrasil.

Imigrámos por diversos motivos. Deixámos os nossospaíses de origem por necessidade, pelo sonho de teruma vida melhor, pelo projecto de mudança. Mas,também, imigramos por amor, para estudar, ou ainda,por aventura.

Logo na chegada, alguns e algumas de nós encontrámos a barreirada língua portuguesa, o que nos fez passar por algumas situaçõesdifíceis e até humilhantes.

Porém, a pior barreira é o próprio processo de regularização, que ésempre lento, caro e extremamente burocrático. E sabemos que osnossos primeiros obstáculos são os/as próprios/as funcionários/as!Não são suficientemente claros/as e nem disponibilizam toda a infor-mação de que necessitamos.

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Quarteira, 2006

A nossa própria situação de imigrantes leva-nos a recear reivindicar-mos ou reclamarmos, mesmo quando sabemos que essa possibilidadeexiste e que é um direito que nos assiste.

Nem todos/as estamos regularizados/as… É uma tarefa dura conseguirultrapassar tanta burocracia! Um exemplo disto é a complicação quepassamos para conseguir-mos um atestado de residência nas juntasde freguesia, pois temos que apresentar documentos de testemunhas,o que gera nestas pessoas um sentimento de desconfiança e medoda utilização de seus documentos para fins duvidosos.

Sentimos também que nos falta conhecimento acerca da legislação,o que nos coloca numa situação de fragilidade e incapacidade paranos defendermos.

É também no mercado de trabalho que vivemos os nossos maioresdesafios. Alguns/ algumas de nós viemos por pensar que seria fácilganhar dinheiro aqui. Outros/as fomos mesmo atraídos/as por pro-messas ilusórias de emprego, alojamento e viagem.

Muitos/as de nós encontramos grandes dificuldades para conseguirum emprego adequado à nossa formação e experiência profissional.Muitas vezes a barreira está na própria dificuldade em conseguir aequivalência escolar.

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Conseguindo-se um emprego, ganha-se algum ânimo, mas aindaassim, quando se é imigrante e se está em situação irregular no país,corre-se sempre o risco de sermos explorados/as por alguns patrões.Há quem faça descontos indevidos, não queira celebrar o contrato detrabalho, faça pagamentos em atraso e há quem nem faça os paga-mentos. E há ainda casos em que patrões e patroas pagam saláriosmais baixos a trabalhadores/as imigrantes do que a trabalhadores/asnacionais pela realização da mesma tarefa. Por estarmos sem a nossasituação regularizada, temos medo de fazer valer os nossos direitoscomo trabalhadores.

O que não nos facilita nada a vida é o facto de a imigração ser apontadacomo “a má da fita” na crise que o país atravessa… E se alguns/algumas de nós agimos erradamente, muitos/as de nós acabamospagando por isto… Esta má imagem fica associada ao grupo. Issoprovoca desconfiança na sociedade de acolhimento.

Outro problema que sentimos coloca-se na relação com as instituições.Nas instituições da área da saúde, sentimos que, em alguns serviços,somos tratados/as de forma desigual por sermos estrangeiros/as,sendo ainda mais evidente para quem está irregular.

Nestes casos, não temos direito a médico/a de família, só podemoscontar com os atendimentos nas urgências e os planos de saúde de al-gumas clínicas privadas. No caso de imigrantes com visto de estudante,

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o acesso à saúde é também condicionado, apesar de a nossa situaçãoestar regularizada no país.

Até nas instituições bancárias encontramos obstáculos! É quase impos-sível abrirmos uma conta e até nos exigem muito mais burocracia paraas gerirmos. E, para além disto, sentimos dificuldade no acesso aalguma informação mais detalhada para esclarecer as nossas dúvidas.

No que toca a educação, ser estudante estrangeiro não é tarefa fácil,sobretudo, para as crianças imigrantes que são confrontadas com arápida necessidade de adaptação a uma língua, a uma cultura e a umfuncionamento escolar diferentes.

Estas necessidades também se colocam a alguns/algumas de nós,estudantes universitários/as imigrantes, que entrámos em Portugalcom o visto de estudante. No entanto, os problemas que mais nosafectam são as despesas com os estudos. Mesmo estando regula-rizados/as no país, não podemos recorrer às bolsas de estudo doEstado Português. Desta forma, não restam muitas alternativas:procuramos arranjar um trabalho para podermos sobreviver ou entãoregressamos aos nossos países de mãos vazias, sem concre-tizarmos esse sonho.

Ainda no caso da educação, não é fácil ser-se criança imigrante e sema situação regularizada. As crianças podem frequentar normalmente

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o ano lectivo, mas as suas avaliações não constam oficialmente, o quedificulta desde logo a sua integração.

Pensando ainda nas nossas crianças imigrantes, lembramos a grandeinjustiça que é algumas delas não terem acesso à nacionalidadeportuguesa, mesmo nascendo aqui.

Sentimos também que em Portugal há carência de redes formais deapoio às crianças, tanto às nossas como às nacionais. Mas paramuitos/as de nós é muito mais complicado, porque aqui em Portugalnão contamos com uma rede informal consolidada.

Este grupo acredita que as dificuldades e problemas que marcam anossa vida num país que, ainda não sendo a nossa terra de origem,é o país que escolhemos para viver, podem ter uma solução.

Acreditamos que a relação com as instituições pode ser diferente sehouver uma aproximação de parte a parte. A promoção de espaçosde diálogo entre instituições e comunidades imigrantes, com sessõesde esclarecimento das leis e abertura às sugestões das comunidades,permitiria um conhecimento mais real da nossa situação em Portugal.

Uma iniciativa como por exemplo o “SEF - móvel” poderia facilitaressa proximidade e diálogo.

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Para a melhoria da relação entre as instituições e imigrantes propomosainda a criação de um cargo de representante legal das comunidadesimigrantes locais. Acreditamos que esta medida pode promover umacomunicação privilegiada entre os/as imigrantes e as instituiçõesligadas ao processo de regulamentação.

Acreditamos que é possível unirmo-nos para criarmos uma rede devoluntariado para ajudar na integração de crianças e jovens que nãodominam a língua portuguesa. Um espaço dotado de material peda-gógico adequado como, por exemplo, dicionários infantis, permitiriamomentos de transição entre o sistema escolar dos países de origempara o de Portugal. As pessoas voluntárias serviriam de ponte entreas crianças e os jovens e a própria escola. E porque não pensar voarmais alto? E porque não “utopiarmos” propondo um desafio para estaregião tão multicultural? Porque não pensarmos numa Escola de ArtesMulticultural que possa apoiar a integração no país e ao mesmotempo procurar preservar e permitir a interligação de identidades eexpressões culturais?

Apelamos ao Estado Português, em especial aos Ministérios do Tra-balho e Solidariedade Social, da Administração Interna, da Saúde e daEducação para que sejam definidas políticas e medidas que facilitema protecção e regularização dos/as trabalhadores/as imigrantes.

Apelamos aos/às empregadores/as e cidadãos/as para que sejam mais

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sensíveis ao acolhimento de todos/as imigrantes, potenciando asmais valias das suas qualificações e experiências profissionais.

Pensamos que nos eventos culturais que organizamos, tantas vezesisoladamente, devemos procurar comprometermo-nos a promover acomunicação entre grupos e culturas, reunindo as diversas comuni-dades imigrantes e a sociedade de acolhimento. Acreditamos queapostar em espaços de comunicação e trocas culturais é uma formade todos/as ganharmos. Assim, damos a conhecer o que é nosso eaceitamos o que é diferente.

Não podemos, nem devemos ficar remetidos/as ao silêncio e ao como-dismo, acreditando que tudo se há-de resolver por si só. Precisamosempenharmo-nos para procurarmos respostas às nossas dúvidas,devemos persistir e se o nosso esforço individual por vezes pareceuma tarefa impossível, devemos unirmo-nos, como o fizemos nestesdias. Ao colocarmos em comum os nossos problemas, soluções vãosurgindo e vamos descobrindo que juntos/as somos uma força,somos uma voz.

4. DEPOIMENTO COLECTIVO DE JOVENS DO BAIRRO DO TALUDE

Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros de um grupode Jovens do Talude, constituído com o apoio da Associação Melhora-

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mentos e Recreativo do Talude e dinamizados pelo Graal. É umespelho dos seus quotidianos, ligados à sua condição de jovens,negros/as, residentes num bairro periférico de imigrantes.

Aos olhos de outros portugueses, somos encarados como estran-geiros, como imigrantes, mesmo quando nascemos cá. Ser imigranteem Portugal não é um bom estatuto: há uma cultura de “hostilidade”,independentemente da nossa origem.

Parece haver uma cegueira da sociedade portuguesaquanto à riqueza que a imigração traz, nomeada-mente no contacto com ideias, culturas e modos de vidadiferentes. Há também uma cegueira sobre o papeldos imigrantes na economia: Portugal cresceu graçasà imigração! No entanto, atribuem-se aos imigrantesas causas de todos os problemas e a responsabilidadepor roubar o emprego dos portugueses, apesar de nósnos ocuparmos sobretudo dos trabalhos que ninguémmais quer fazer...

Todos sabemos o que é ser rotulado, discriminado, colocado numestatuto inferior devido à cor da pele. Todos sabemos o que é servítima de preconceitos e pagar pelo comportamento de alguns. Oracismo e a negrofobia são frutos da ignorância. Quando se pergunta“é racista porquê?”, as pessoas não conseguem dar justificação.

Talude-Loures, 2006

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Também não se entende como é que o governo autoriza manifestaçõesde extrema direita. Não se pode falar em liberdade de expressão, emdemocracia, quando o que está em causa é o respeito pelos direitoshumanos, quando há ofensas contra outros seres humanos.

Mas para grande parte dos portugueses, “ser preto” é aquilo que nosdefine, mais do que o sermos descendentes de imigrantes africanosou outra coisa qualquer… “Ser branco” é uma superioridade, mesmopara alguns negros, que reconhecem um estatuto mais elevado aquem é mais claro. Este complexo de inferioridade racial leva a quealgumas famílias de mulatos não se misturem com negros, a quefamílias de negros ambicionem casamentos com brancos…

Em situações em que somos alvo de atitudes discriminatórias e racistas,alguns reagem com agressividade, partem para a ofensa e para a“porrada”, mas a maioria de nós sente-se humilhada e não reage,porque já nos habituámos, porque estamos saturados de estar semprea responder, porque não podemos brigar com o mundo inteiro ousim-plesmente porque sentimos que a situação pode piorar… Porcomparação com as mulheres, os homens são tratados com maisrespeito. Talvez por medo, porque se associa o negro à violência eà criminalidade.

Além da discriminação constante, temos que enfrentar as barreirasburocráticas, as leis que oferecem resistências à entrada e à perma-

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nência e que excluem muitos dos que aqui vivem, trabalham e nascem.

Quando procuramos emprego em sectores mais qualificados nãosomos aceites por sermos negros. As oportunidades são vedadasmesmo àqueles que estudaram. Muitos desanimam, sentem que nãovale a pena. Pensam em deixar Portugal e virar-se para outro sítioonde haja mais oportunidades.

E tudo isto faz com que muitos de nós vivam o sentimento de nãopertencer a lado nenhum, de ser um/a “Sem Terra”… Faz com quefiquemos sem resposta quando ouvimos “Vai para a tua terra”.

Ter duas terras, duas culturas, poderia ser uma riqueza, mas isso épara já um sonho.

Esperamos que os nossos filhos e netos não passem pelas mesmassituações. Lá fora, os emigrantes portugueses passam o mesmo quenós aqui. Emigram para outros países e também lhes dizem “volta paraa tua terra”. Há portugueses que passaram por isto, mas quando vêmcá não se manifestam...

Viver no Bairro do Talude é também motivo de discriminação. Há medose ideias negativas em relação às pessoas que aqui vivem, o que fazcom que alguns não entrem sequer no Bairro… Além disso, os acessose os transportes são difíceis. É a forma do sistema nos manter mais

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isolados, guetificados e longe dos olhos do resto da sociedade.

Sentimos que também falta à comunidade imigrante africana a noçãodo seu valor e também sintonia e união para lutar pelos própriosdireitos e interesses. O sistema separou-nos: dividiu os negros, quelutam entre si e que se matam uns aos outros. Há uma separação“tribal”, uma divisão entre grupos de diferentes bairros. A populaçãonegra já passou por tanto que já não tem direcção.

Reconhecemos que é prioritário levar a cabo acções de combate aoracismo e à xenofobia, começando pela Escola. É também necessárioconseguirmos ver e dar uma maior visibilidade aos aspectos positivosdo Bairro e às coisas boas das nossas culturas. Consideramostambém importante alimentar as relações com pessoas de fora doBairro e da sociedade de acolhimento, porque a convivência é umaboa forma de desmontar preconceitos….

6. DEPOIMENTO COLECTIVO DE MULHERES IMIGRANTES BRASILEIRAS

Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros, dinamizadospelo Graal, de um grupo de mulheres imigrantes brasileiras reunidascom o apoio da casa do Brasil em Lisboa.

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As mulheres brasileiras migram com o objectivo de melhorar a vida,para acompanhar os que amam, para conhecer outras realidades ouiludidas com a miragem de um futuro melhor.

A adaptação a uma realidade diferente é exigente. Estão longe aspessoas com quem se conta nos momentos mais difíceis.

Sente-se saudades de tudo: da comida, do clima, do cheiro de terramolhada, das pessoas, das datas festivas, da casa…

As expectativas quanto às possibilidades de melhorar a vida depressasão abaladas: a contabilização dos gastos com a vida em Portugalraramente é feita antes da partida.

Para concretizar este projecto de melhorar, pelo menos, a vida dequem ficou no país, acumulam-se empregos, aceitam-se serviçosdesajustados às competências pessoais e profissionais, realizam-seos trabalhos mais difíceis e mal remunerados, há dificuldades noacesso aos serviços de saúde, vive-se em condições precárias oumesmo sub-humanas de habitação ou partilha-se casa com váriaspessoas estranhas.

Não resta tempo, nem energia para si mesma, para o lazer, para a par-ticipação cívica, para lutar por causas, para as relações com os outros.

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Facilmente as pessoas se isolam, ficam desamparadas e facilmentea desesperança e o individualismo se instalam.

É também difícil lidar com a hostilidade face aos imi-grantes. Ouvir quando se reclama com razão: “se nãogostas, volta para a tua terra”.

Há também discriminação, muitas vezes “velada”, nomercado de trabalho e é muito difícil o acesso aosempregos mais qualificados, o que é agravado pelosinúmeros obstáculos ao reconhecimento dos grausacadémicos e experiências profissionais adquiridasno Brasil.

A falta de clareza e de vontade política nos assuntos da imigração,as burocracias e a morosidade no tratamento dos processos deregularização/legalização, as alterações constantes das “regras” relati-vamente aos direitos e aos deveres da comunidade migrante, sãotambém um problema e uma fonte de insegurança.

É difícil conviver com uma imagem, por parte da sociedade de acolhi-mento, da mulher brasileira como ”sexualmente disponível”, “prostituta”.Para combater esta imagem algumas retraem-se, policiam-se, vestem”golas altas e roupa escura” e tentam, a todo momento, provar que são“sérias”, indisponíveis, comprometidas, “não prostitutas”.

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Lisboa, 2006

Imigrar implica muitas vezes um desconforto, um sentimento dedesajuste aos padrões vigentes. Há diferenças nos padrões de comu-nicação, nos hábitos, no humor, nas regras, nas convenções e aténa língua. Demora alguns meses até que as pessoas se adaptem aoportuguês. E há, por isso, equívocos e mal entendidos que decorremdas diferenças e de uma má interpretação dos factos.

Ao mesmo tempo, este confronto e convivência pode ser uma oportu-nidade em termos de evolução cultural: as pessoas questionam-se nassuas certezas e transformam-se. Tanto a sociedade de acolhimentocomo os imigrantes podem ir buscar o melhor de cada cultura, criandonovos e mais ricos padrões culturais.

As mesmas características que levaram as migrantes a sair do país- a forte motivação para procurar “saídas” e alternativas”, o desejo deaprender, a vontade de trabalhar, de “fazer acontecer” e a abertura aonovo - ajudam a lidar com todos os revezes do processo de migração.São também um estímulo à melhoria das condições de vida pessoaise das famílias no Brasil.

Para as mulheres, este processo de adaptação é favorecido por umamaior facilidade na verbalização dos seus sentimentos e pelo facto dealgumas terem um contacto muito próximo com pessoas da sociedadeportuguesa, o que implica vínculos afectivos mais intensos e um melhorconhecimento da própria cultura e modos de vida, até porque uma

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boa parte se ocupa de trabalhos domésticos, ligados ao cuidado (idosose crianças).

Foi reconhecido como prioritário, no grupo, que as mulheres brasileirasse associem para pensar e resolver os seus problemas, que se unampara serem suporte umas das outras, para terem visibilidade emactividades que as “descolam” da imagem de objecto sexual, mantendoao mesmo tempo o respeito pelas profissionais do sexo.

É urgente este engajamento em actividades associativas, uma atitudemais interventiva e mais política onde, por exemplo, se participe emmanifestações de luta por direitos: dos imigrantes, das mulheres e pelosdireitos humanos no geral.

Foi considerado importante viver-se na sociedade em que se está,ser um membro pleno da sociedade, ser-se activa no processo deintegração: participando na vida social, nos eventos, votando nas autár-quicas, estabelecendo relações e evitando atitudes de isolamento, denegativismo e de resistência ao conhecimento e envolvimento como país de acolhimento. Atitudes que são, muitas vezes, formas nãoconscientes que as pessoas encontram para se protegerem de novasperdas e separações no futuro.

Ao mesmo tempo, foi considerado importante que se exija respeitopelas diferenças, que se mantenha a individualidade e o respeito por

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quem cada uma é. É possível fazer alguma adaptação na forma comose age, mas não prescindindo das coisas que nos definem enquantopessoas: a espiritualidade, o uso da roupa colorida, o sorrir o tempotodo, o não “abrir mão” da própria sexualidade - mesmo que issoperturbe.

7. DEPOIMENTO COLECTIVO DE MULHERES IMIGRANTESCABO-VERDEANAS

Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros, dinamizadospelo Graal, de um grupo de mulheres cabo-verdianas que integramo grupo de Batuque Finka-Pé da Associação Moinho da Juventude.Este relato exprime as suas experiências de vida enquanto mulherese imigrantes e também como mães, amigas, vizinhas, trabalhadorase batucadeiras.

Encontrámo-nos no Moinho da Juventude, antes do ensaio do grupode batuque “Finka Pé”, para partilhar as nossas “estórias” e experiên-cias de vida enquanto mulheres e imigrantes e também como mães,amigas, vizinhas, trabalhadoras e batucadeiras.

Imigrámos para Portugal no desejo de melhorar as condições de vida.A maioria de nós, chegou há quase três décadas para se juntar àsfamílias, principalmente aos maridos que já cá estavam. Outras

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vieram sozinhas, através de conhecimentos ou com promessas detrabalho doméstico interno.

Quando chegámos, quer após uma longa viagem de barco ou umascurtas horas de avião, percebemos que a vida não ia ser tão fácilcomo imaginávamos. A adaptação é difícil devido à chuva, ao frio dosInvernos portugueses, às saudades, às dificuldades em com-preender e falar português e, sobretudo, devido à dis-criminação e aoracismo que enfrentamos no dia-a-dia.

Apesar de sentirmos na pele a discriminação, a relaçãocom alguns portugueses é boa. O importante é ter-se ca-rácter, confiança e existir conhecimento e proximidade.

São vidas de muito trabalho: como empregadas de lim-peza, amas, jardineiras, vendedoras de legumes e peixe,cozinheiras, etc. Muitas vezes, acumulamos empregos,porque os salários são baixos e é preciso conseguirdinheiro para as despesas em Portugal e para enviaràs nossas famílias em Cabo Verde.

Aquelas que, entre nós, tiveram a experiência de trabalhar como em-pregadas internas descrevem-na como uma prisão: fica-se isoladano mundo, sem direito a vida própria e é, por vezes, preciso saberaguentar muitas humilhações…

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Alto da Cova da Moura, 2006

Quando procuramos trabalho encontramos muitas dificuldades, porquehá cada vez mais desemprego em Portugal, porque faltam os estudose porque existe discriminação - não só por causa da cor, mas prin-cipalmente por vivermos no Bairro do Alto da Cova da Moura.

Mas se o Bairro é uma preocupação e um problema, devido ao cres-cente aumento da insegurança (violência, droga, rusgas policiais, etc.)e à má imagem associada e que é transmitida para o exterior, é tambémuma grande fonte de orgulho e de dedicação.

O Bairro preserva a cultura de Cabo Verde, com suas tradições e for-mas de estar e de olhar o mundo. É nele que se encontram e compramos produtos tradicionais africanos, onde se come a melhor cachupa,existem os melhores cabeleireiros, se “fofoca” na rua, se canta e dança.

Também é no Bairro que se desenvolvem as relações de amizade ede família.

Consideramos urgente organizar o Bairro, limpar a má imagem, lutarpela paz e pela segurança, conseguir um Posto de Saúde próximo(de qualidade) e uma boa limpeza e recolha de lixo por parte dosserviços camarários.

Mas o mais importante de tudo é impedir a demolição do Bairro do Altoda Cova da Moura e o posterior realojamento em bairros sociais. A

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possibilidade do desaparecimento do Bairro traz a todas nós umagrande tristeza, pois sem ele perdemos o espírito, as tradições e asolidariedade que há entre os habitantes das “ilhas”. Lutamos, assim,pela requalificação urbana desta área.

Foi no Bairro e na Associação Moinho da Juventude que nos juntámospara ter aulas de alfabetização, para lutar para termos água e esgotosem casa, para criar vários serviços de apoio à criança que nospermitiram ter um trabalho, para criar o grupo de batuque - espíritodo convívio feminino e “medicamento” para os problemas da vida.

A família é, de entre tudo, o que mais ajuda a viver com alegria,mesmo quando as dificuldades são muitas. Ser mãe é o que nos fazandar para a frente e o que nos faz desejar continuar em Portugal.Mas, se os filhos (e netos) são a maior fonte de felicidade, são também,muitas vezes, a maior fonte de “dores de cabeça”. Alguns desmotivam--se na escola, têm dificuldades em arranjar emprego, têm outrosvalores, “maus comportamentos” e preocupam-se pouco com o futuro.Consideramos que a escola devia motivá-los mais e dar-lhes maisperspectivas de arranjar um emprego depois dos estudos.

Conseguir a legalização é uma tarefa dura, confusa e lenta. Pensamosque é importante que se facilitem estes processos, não só pelos imi-grantes mas principalmente pelos filhos, pois muitos vivem revoltadospor não terem a nacionalidade, embora tenham nascido em Portugal.

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S. Bernardo-Aveiro, 2006

Apesar das dificuldades que a migração traz consigo, permitiu-nosconhecer mundo, melhorar as nossas condições económicas e asdas nossas famílias, estudar e ter um emprego (o que teria sido maisdifícil em Cabo-Verde). Além disso, fortaleceu-nos - reconhecemosem nós uma grande capacidade de resistência, de luta e de procurade “saídas” face às agruras da vida.

8. DEPOIMENTO COLECTIVO DE MULHERES IMIGRANTES DOS PAÍSES DO LESTE EUROPEU

Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros, dinamizadospelo Graal, de um grupo de mulheres imigrantes dos países do LesteEuropeu reunidas com o apoio da Associação de Apoio ao Imigrante.

Imigrar é viver numa terra que não é a nossa, vive-sesempre na insegurança, está-se longe da família, dosvizinhos, dos amigos próximos - o que é difícil princi-palmente nas datas importantes.

Para se conseguir juntar algum dinheiro é necessáriotrabalhar muito, muito mais do que se trabalhava no paísde origem. Há que agarrar as horas extraordinárias,viver sem fins de semana, laborar em horários noc-turnos… Há que desempenhar tarefas que envolvem

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esforço físico, por vezes pesadas, e geralmente muito desajustadasàs experiências profissionais e às qualificações académicas adquiridasnos países de origem.

A obtenção de equivalências académicas é um processo moroso,dispendioso e excessivamente burocrático. Estes obstáculos desen-corajam algumas mulheres, muito qualificadas, a tentarem exercera profissão para a qual se prepararam no seu país de origem.

Arranjar emprego não é geralmente um problema. As entidadesempregadoras dão, muitas vezes, preferência a trabalhadoras prove-nientes dos países de leste, porque são mulheres motivadas paratrabalhar, independentemente das condições, porque detêm níveis deescolaridade mais elevados e frequentaram um ensino mais exigente,possuindo, assim, uma maior capacidade para se adaptarem e paraaprenderem as funções a desempenhar. No entanto, a insegurança eo medo de perder o emprego acompanham as mulheres migrantes.

Há situações de exploração, há situações em que as mulheres, desem-penhando as mesmas funções que os homens, têm salários inferiores.Muitas vezes nada se faz face a situações desta natureza porque sequer manter o emprego, porque se desconhece a lei portuguesa ouporque se está em situação de irregularidade jurídica.

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Os processos de legalização são muito burocráticos, morosos edesgastantes.

Uma parte dos portugueses, aqueles que são menos escolarizados,não têm noção da dimensão, da localização e da história dos paísesde origem dos migrantes que estão em Portugal e está enraizada afalsa ideia de que lá se passa fome, que se vive miseravelmente. Esteolhar pesa, porque diminui…

São também as pessoas com menos qualificações que mais discri-minam e têm um discurso contra os imigrantes que vêem comoconcorrentes e ameaça aos seus postos de trabalho.

Seria importante que fosse reconhecido que os imigrantes, homense mulheres, estão a contribuir com o seu trabalho para o desenvolvi-mento e para a vida económica do país e também para o desenvolvi-mento cultural e do conhecimento, por exemplo, nas universidadesportuguesas.

O esforço que é necessário para se aprender português é grande.Há pouco tempo para estudar e no trabalho raramente se fala comos colegas. As mulheres que vieram no regime de reagrupamentofamiliar e que ficam em casa estão mais isoladas e têm ainda maioresdificuldades na aprendizagem do português.

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Para as crianças é fácil, aprendem depressa a língua e adaptam-sefacilmente à cultura, até porque na escola têm um contacto maisintenso com a língua e a cultura portuguesas. Para os adultos émais difícil.

O facto de não se falar bem a língua dificulta o estabelecimento derelações mais próximas com a comunidade de acolhimento e dificultaa resolução de problemas do quotidiano - o que, por vezes, gerasentimentos de vergonha e embaraço.

Estas limitações em termos linguísticos tornam mais difícil dar apoioescolar aos filhos. No entanto, estes são muito acompanhados no seupercurso escolar por parte de pais, para quem a educação é umaprioridade.

A educação formal das crianças é, aliás, uma preocupação partilhadapelas mulheres que são mães. O ensino em Portugal não corresponde,do ponto de vista da exigência e do rigor, às suas expectativas.

Também ter filhos em Portugal traz consigo algumas dificuldades: agravidez entre os portugueses é encarada de forma diferente e nãohá o mesmo cuidado e apoio moral às grávidas. Em muitas fábricasas mulheres grávidas executam as mesmas actividades que realizavamantes da gravidez, inclusive algumas que são perigosas para o bebé.Por outro lado, é esperado que trabalhem até ao último dia, o que é

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pouco comum em países como a Rússia e a Ucrânia.

A duração da licença de maternidade é menor em Portugal e é dema-siado curta na perspectiva das mulheres migrantes dos Países deLeste. Deixar as crianças aos 4 meses ao cuidado de outras pessoasou de instituições é difícil.

Apesar destas dificuldades imigrar permite aumentar os recursosfinanceiros, permite perspectivar um futuro melhor. Também se co-nhece uma outra forma de viver e de ver o mundo, o clima é ameno,o mar próximo…

O suporte social que é oferecido pela Associação de Apoio ao Imigrantena resolução de problemas práticos (aprendizagem da língua, procurade emprego, formação, acesso à internet, acesso ao crédito, apoiojurídico, apoio ao estudo e educação das crianças) ajuda a lidar posi-tivamente com os desafios que vão surgindo. A Associação, por outrolado, cria oportunidades de encontro entre imigrantes, reduzindo oisolamento social e facilitando o contacto entre pessoas que têm emcomum uma raiz cultural diferente daquela que é partilhada pelasociedade em que vivem.

Seria também importante que houvesse mais apoios do governo paraas famílias imigrantes, e em particular, para aquelas que têm filhosem idade escolar e que não podem contar com o apoio da família

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horários dos patrões, sejam eles quais forem. Basta que estes “nãotenham horários” para que a empregada que, por exemplo, cuida dassuas crianças também deixe de ter horário. Situações como estas,tornam difícil organizar a vida, acompanhar a família, cuidar da casa,ter tempo para as suas coisas. Não sobra tempo para nada…

O caso das empregadas internas é ainda mais crítico. Para elas, todoo tempo é tempo de trabalho: há hora de acordar, mas não há horade deitar e, quando há em casa crianças, idosos, pessoas doentes oudependentes, o que acontece muitas vezes, é necessário trabalharmesmo durante a noite.

Este trabalho no sector doméstico e das limpezas é desvalorizadopela maioria das pessoas, não é considerado dignificante, nem vistocomo uma profissão como as outras. Raramente se respeita o direitodas trabalhadoras domésticas a um contrato de trabalho, ao subsídiode férias e de natal, ao gozo de férias, aos descontos para a segurançasocial, ao seguro de acidentes de trabalho… Algumas empregadasdestes sectores desconhecem os seus próprios direitos. Outras,mesmo conhecendo-os, não os reivindicam. Algumas, porque pensamque não valerá a pena. Outras, porque não tendo regularizada a suaautorização de permanência em Portugal, se sentem impossibilitadasde fazer qualquer exigência ou denúncia perante situações de violaçãodos seus direitos do trabalho.

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VOZES QUE SE LEVANTAM

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alargada que está, normalmente, longe. Esses apoios funcionariamcomo um estímulo ao enraizamento e integração plena destas famílias. Apesar das dificuldades as mulheres provenientes dos países deleste encaram a vida de forma positiva, demonstram um forteresistência face às adversidades da vida, uma resistência que seenraíza numa história de dificuldades que foram sendo vencidas.

9. DEPOIMENTO COLECTIVO DE MULHERES IMIGRANTESTRABALHADORAS DOMÉSTICAS OU DO SECTOR DA LIMPEZA

Este depoimento foi elaborado a partir dos encontros, dinamizadospelo Graal, de um grupo de mulheres imigrantes de diferentesproveniências, trabalhadoras domésticas e do sector da limpeza.

Trabalhar nas limpezas ou no serviço doméstico exige muita luta,força e resistência… Há que realizar tarefas duras, pesadas, sujas,que causam repulsa, cuja repetição constante leva a que, muitasvezes, as pessoas nem sequer se apercebam que foram realizadas…

Na maioria das situações os salários são baixos, frequentemente pagoscom atraso e, algumas vezes, em prestações. É necessário trabalharmuitas horas, às vezes, mais do que aquelas que se tinham acordado…

Há pressões para que a pessoa se adapte às necessidades e aos

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país? A quem serve? Talvez aos empregadores menos escrupulosos…

Mesmo quando se está em situação regular, é difícil ser-se mulherimigrante e trabalhar nas limpezas ou no serviço doméstico… Todassabemos o que é receber um tratamento desumano e discriminatóriodevido à cor da pele ou por se ser estrangeira…

Vivemos experiências humilhantes de sermos impedidas de fazeruso dos mesmos talheres e copos dos donos da casa, impedidas decomer da mesma comida e beber da mesma água… algumas de nóssomos obrigadas a usar um uniforme que nos distinga, mesmo quandovamos à rua. Repetem-se as situações em que somos postas à prova,alvos de desconfianças e acusações infundadas. Há mesmo quem, deentre nós, tenha enfrentado situações de assédio/abuso sexual porparte do patrão. Há quem pense que, porque paga, pode exigir tudo…

Quando se é imigrante e se trabalha neste sector, temos que esperarque nos sejam atribuídos os trabalhos mais árduos, mais sujos e estarpreparadas para encontrar barreiras à promoção, especialmente seformos negras. São-nos também reservados os horários mais difíceis,por exemplo os nocturnos, sem que a isto, muitas vezes, correspondaqualquer contrapartida financeira. É preciso contar que toda a genteconsidere natural que as colegas portuguesas sejam as primeiras aescolher as férias, os horários e as folgas.

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VOZES QUE SE LEVANTAM

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As mulheres imigrantes que se encontram em situação irregular noPaís, estão, efectivamente, numa posição muito vulnerável e são, muitasvezes, vítimas de exploração, pressões psicológicas e chantagem.

Há mulheres que são até despedidas ou ameaçadas de despedi-mento quando necessitam faltar por doença, mesmo que esta resultede um acidente de trabalho. Quando reclamam os seus direitos, sãofrequentemente ameaçadas de despedimento ou de denúncia ao SEF.

Por medo ou por falta de alternativas, muitas mulheres imigrantes emsituação de irregularidade aceitam trabalhar em condições desumanas,recebem tratamentos humilhantes e salários ainda mais baixos.

Sem documentos, não temos acesso aos serviços de saúde, aoscréditos bancários, e, por vezes, é quase impossível abrir uma contanum banco…

Esta situação também não é favorável à economia do país: uma vezque quem está em situação irregular tem menos possibilidade deinvestimento do próprio capital no país em que se vive. São tambémmenores as receitas obtidas pelo Estado através dos descontos paraa segurança social e impostos. Ter documentos implica ter direitos edeveres.

Se não serve os nossos interesses? Se não serve aos interesses do

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Talvez assim se diminuíssem as injustiças e abusos e se tornassemais gratificante e valorizado o indispensável trabalho que realizamostodos os dias….

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VOZES QUE SE LEVANTAM

PELA DIVERSIDADE

Acreditamos que cada mulher que trabalhe nestes serviços, seja ounão imigrante, esteja ou não regularizada, deve dar valor a si mesmae ao trabalho que realiza. Nenhuma se deve deixar rebaixar, inferiorizare admitir tratamentos humilhantes.

Do nosso ponto de vista, é fundamental que todas aspessoas conheçam os direitos das empregadas domés-ticas, desde os patrões e patroas às próprias mulheresque se ocupam deste sector de actividade. Se toda agente conhecer a lei é mais fácil reivindicar e denunciaro seu incumprimento.

Pensamos que é urgente diminuir as barreiras deacesso à regularização para as pessoas que vivem etrabalham em Portugal.

Consideramos também que deveriam ser criadas condições paraque as pessoas que estão em situação de irregularidade jurídica emPortugal e que são exploradas, agredidas, enganadas… possamapresentar queixas com a segurança de que não são deportadas apóso contacto com as autoridades.

Seria importante que as mulheres se apoiassem umas às outras eque lutassem pelos seus direitos e interesses, por exemplo atravésda participação em iniciativas sindicais.

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Lisboa, 2006

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A DECISÃO

PRINCÍPIO DE ACÇÃO Nº I: MIGRAR POR DECISÃO PRÓPRIAAs mulheres, os homens e as crianças deverão poder desenvolver oseu potencial, satisfazer as suas necessidades, exercer os seus di-reitos humanos e cumprir as suas aspirações no seu país de origem,e assim, só migrarem por decisão própria e não por necessidade. Asmulheres e homens que migram e entram no mercado de trabalhoglobal deverão poder fazê-lo de forma segura e autorizada, eporque os Estados e sociedades que os acolhem os valorizam eprecisam deles e das suas competências.

Relatório da comissão Mundial sobre as Migrações Internacionais, 2005, pág. 4

“…decidiram deixar as suas terras procurando melhores condiçõespara a sua vida.” (1)

“Caminhar para um futuro com melhores condições”. (2)

“Pensar que seria mais fácil ganhar dinheiro aqui”. (3)

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TEMAS EMERGENTES

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O PROCESSO MIGRATÓRIO

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“Conhecer uma outra forma de viver e de ver o mundo”. (3) (8)

“Imigrámos por necessidade, pelo sonho de ter uma vida melhor, peloprojecto de mudança. Mas também imigrámos por amor, para estudar,ou ainda, por aventura.” (3)

“É preciso coragem para imigrar. Quando se imigra, deixa-se tudo:a família, os amigos, a terra que amamos e morre-se de saudades.O corpo está aqui, mas o coração está bem longe…” (4)

“Melhorar a vida para acompanhar os que amam, para conhecer outrasrealidades, com a miragem de um futuro melhor”. (6)

“Melhorar as condições de vida, para nos juntarmos às famílias, princi-palmente aos maridos que cá estavam.” (7)

“…permite aumentar os recursos financeiros, permite perspectivarum futuro melhor.” (8)

INTERFACE COM A SOCIEDADE DE ACOLHIMENTO

Artigo 15.º (Estrangeiros, apátridas, cidadãos europeus)1. Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em

Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadãoportuguês.

Constituição da Republica Portuguesa, 1976

“Quem somos nós para os portugueses? Para uns, estrangeiros eameaças aos seus locais de trabalhos. Para outros, uma fonte fácilde rendimento? (2)”

“A imigração é apontada como a “má da fita” da crise que o paísatravessa.” (3)

“Na verdade, sentimos que se espera de nós que estejamos aqui paraservir…” (4)

“Vamos tentando encontrar em Portugal uma família, amigos e umaterra para amar.” (4)

“Para além do nosso corpo, também queremos ter o nosso coraçãoaqui onde vivemos!” (4)

“Parece haver uma cegueira da sociedade portuguesa quanto à riquezaque a imigração traz, nomeadamente no contacto com ideias, culturase modos de vida diferentes.” (5)

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“Consideramos também importante alimentar as relações com pessoasde fora do Bairro e da sociedade de acolhimento, porque a convi-vência é uma boa forma de desmontar preconceitos…” (5)

“Imigrar implica um desconforto, um sentimento de desajuste.” (6)

“É possível fazer alguma adaptação na forma como se age, mas nãoprescindindo das coisas que nos definem enquanto pessoas.” (6)

“Apesar de sentirmos na pele a discriminação, a relação com algunsportugueses é boa.” (7)

PROCESSO DE REGULARIZAÇÃO

Artigo 2º(…) 3. As pessoas pertencentes a minorias terão o direito de participarefectivamente nas decisões adoptadas em nível nacional e, quandocabível, em nível regional, no que diz respeito às minorias a quepertençam ou as regiões em que vivam, de qualquer maneira quenão seja incompatível com a legislação nacional. (…)

A Declaração sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes aMinorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas,

Resolução47/137, 1992.

“Para além das elevadas despesas que um processo de legalizaçãoexige, arriscamo-nos muitas vezes a perder o emprego devido a tantasdeslocações, por vezes inúteis (…).” (2)

“Acabamos também burlados pelos advogados (…)” (2)

“E sabemos que os nossos primeiros obstáculos são os/as próprios/asfuncionários/as! Não são suficientemente claros/as e nem disponi-bilizam toda a informação de que necessitamos.” (3)

“Há também quem não tenha a sua situação regularizada no país e noemprego porque as leis são difíceis de compreender e a burocraciadifícil de ultrapassar…” (4)

“…as leis que oferecem resistências à entrada e à permanência e queexcluem muitos dos que aqui vivem, trabalham e nascem.” (5)

“A falta de clareza e de vontade política nos assuntos da imigração, as(…) são também um problema e uma fonte de insegurança.” (6)

“Conseguir a legalização é uma tarefa dura, confusa e lenta” (7)“Os processos de legalização são muito burocráticos, morosos e des-gastantes.” (8)

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GANHOS E PERDAS NO PROCESSO MIGRATÓRIO

“A vida de um estrangeiro é uma prisão adocicada”. (1)

“O que se vive como estrangeiro, na família que se deixou para trás,na solidão que se vive… Não é possível pensar nesta vida forçadasem que os olhos se inundem de lágrimas.” (1)

“Ter duas terras, duas culturas, poderia ser uma riqueza, mas isso é,para já, um sonho.” (5)

“Sente-se saudades de tudo: da comida, do clima, do cheiro de terramolhada, das pessoas, das datas festivas, da casa… ” (6)

“Ao mesmo tempo, este confronto e convivência pode ser uma oportu-nidade em termos de evolução cultural: as pessoas questionam-se nassuas certezas e transformam-se. Tanto a sociedade de acolhimentocomo os imigrantes podem ir buscar o melhor de cada cultura, criandonovos e mais ricos padrões culturais.” (6)

“Apesar das dificuldades que a migração traz consigo, permitiu-nosconhecer mundo, melhorar as nossas condições económicas e as dasnossas famílias, estudar e ter um emprego.” (7)

“Imigrar é viver numa terra que não é nossa, vive-se sempre na inse-

gurança, está-se longe da família, dos vizinhos, dos amigos próximos- o que é difícil principalmente nas datas importantes.” (8)

“Apesar destas dificuldades imigrar permite aumentar os recursosfinanceiros, permite perspectivar um futuro melhor. Também se co-nhece uma outra forma de viver e de ver o mundo, o clima é ameno,o mar próximo…” (8)

Artigo 7ºOs Estados Partes comprometem-se, em conformidade com os ins-trumentos internacionais relativos aos direitos humanos, a respeitare a garantir os direitos previstos na presente Convenção a todos ostrabalhadores migrantes e membros da sua família que se encontremno seu território e sujeitos à sua jurisdição, sem distinção alguma,independentemente de qualquer consideração de raça, cor, sexo, lín-gua, religião ou convicção, opinião política ou outra, origem nacional,étnica ou social, nacionalidade, idade, posição económica, patri-mónio, estado civil, nascimento ou de qualquer outra situação.

Convenção Internacional sobre a Protecção dos Direitos de Todosos Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias

MERCADO DE TRABALHO

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Adoptada pela Resolução 45/158, de 18 de Dezembro de 1990,da Assembleia-Geral

CARGA HORÁRIA

“Outros trabalham diariamente para além do horário laboral, fazendomuitas horas extraordinárias, que não lhes pagam.” (2)

“Quando há trabalho, o que nem sempre acontece, trabalha-se muito,muito mesmo, ao ponto de ser difícil acompanhar a vida dos filhos.” (4)

“Há que agarrar as horas extraordinárias, viver sem fins-de-semana,laborar em horários nocturnos…” (8)

“É necessário trabalhar muitas horas, às vezes, mais do que aquelasque se tinham acordado…” (9)

“O caso das empregadas internas é ainda mais crítico. Para elas, todoo tempo é tempo de trabalho…” (9)

SALÁRIOS

“Trabalho precário e salários baixos.” (1)

“Falta de pagamento pelo trabalho realizado.” (2)

“Horas extraordinárias não lhes pagam” (2)

“Salários baixos (2) (4) e por vezes em prestações.” (8) (9)

“…acumulamos empregos, porque os salários são baixos…” (7)

RELAÇÃO COM OS/AS EMPREGADORES/AS

“Quase todos e todas sofremos a humilhação de sermos tratados deforma agressiva.” (2)

“…somos despedidos sem justa causa.” (2)

“Muitas pessoas não beneficiam dos seus direitos e não cumpremcom as suas obrigações porque os patrões lhes negam os contratosde trabalho.” (4)

“Há pressões para que a pessoa se adapte às necessidades e aoshorários dos patrões, sejam eles quais forem.” (9)

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CIDADANIA E PARTICIPAÇÃOFUNÇÕES/TAREFAS

“Muitos/as de nós encontramos grandes dificuldades para conseguirum emprego adequado à nossa formação e experiência profissional.”(3)

“…somos vistos como máquinas, são-nos dadas as tarefas mais pesa-das, cansativas e que exigem mais força.” (4)

“Quando procuramos emprego em sectores mais qualificados nãosomos aceites por sermos negros. As oportunidades são vedadasmesmo àqueles que estudaram.” (5)

“…aceitam-se serviços desajustados às competências pessoais e pro-fissionais, realizam-se os trabalhos mais difíceis e mal remunerados…”(6)

“Aquelas que… tiveram a experiência de trabalhar como empregadasinternas descrevem-na como uma prisão.” (7)

“…geralmente muito desajustadas às experiências profissionais e àsqualificações académicas adquiridas nos países de origem.” (8)

“Trabalhar nas limpezas ou no serviço doméstico exige muita luta,força e resistência….” (9)

Artigo 1º Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e emdireitos.

Declaração Universal dos Direitos Humanos

“Desejamos ser uma voz neste país, uma voz que quer participar eintegrar-se (…) porque sabemos que podemos contribuir para umasociedade mais intercultural.” (2)

“E tudo isto faz com que muitos de nós vivam o sentimento de nãopertencer a lado nenhum, de ser um/a “Sem Terra”…” (5)

“Não resta tempo nem energia para si mesmo, para o lazer, para aparticipação cívica, para lutar por causas, para as relações com osoutros. Facilmente as pessoas se isolam, ficam desamparadas.Facilmente a desesperança e o individua-lismo se instalam.” (6)

“Foi considerado importante viver-se na sociedade em que se está,ser um membro pleno da sociedade, ser-se activa no processo deintegração.” (6)

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DIREITO À HABITAÇÃO

Artigo 65. (Habitação e urbanismo)Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação dedimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que pre-serve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.

Constituição da Republica Portuguesa, 1976

“Vive-se em condições precárias ou mesmo sub humanas de habitaçãoou compartilha-se a casa com pessoas estranhas” (6)

DIREITO À SAÚDE

1. É facultado aos cidadãos estrangeiros que residam legalmente emPortugal, o acesso, em igualdade de tratamento aos beneficiáriosdo Serviço Nacional de Saúde, adiante SNS, aos cuidados de saúdee de assistência medicamentosa, prestados pelas instituições e ser-viços que constituem o SNS.

Despacho nº 25.360/2001

“…em alguns serviços, somos tratados/as de forma desigual porsermos estrangeiros/as, sendo ainda mais evidente para quem estáirregular.” (3)

“Sem documentos, não temos acesso aos serviços de saúde…” (9)

DIREITO À EDUCAÇÃO, LÍNGUA E RECONHECIMENTO DAS COMPETÊNCIAS

Artigo 15º (Estrangeiros, apátridas, cidadãos europeus)1. Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugalgozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português.

Artigo 1 - ObjectoÉ criado um registo nacional de menores estrangeiros que se encontrem emsituação irregular no território nacional.

Artigo 2 - Âmbito 1. O registo referido no artigo anterior destina-se exclusivamente a asseguraro acesso dos menores ao benefício dos cuidados de saúde e à educação pré--escolar e escolar.

Decreto-Lei n.o 67/2004 de 25 de Março

“Muitos de nós trazem na bagagem um diploma de um curso superior,mas na maioria dos casos de nada vale.” (2)

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“…dificuldade de quem não sabe a Língua.” (3, 5, 9)

“…dificuldades de quem não sabe ler …” (4)

“…a diminuição que fazem da nossa Língua…” (4)

“…diferença dos padrões de comunicação, nos hábitos, no humor, nasregras, nas convenções e até na Língua, equívocos e mal entendidosque decorrem das diferenças e de uma má interpretação dos factos.”(6)

“…o que é agravado pelos inúmeros obstáculos ao reconhecimentodos graus académicos e experiências profissionais adquiridas noBrasil.” (6)

“O esforço que é necessário para se aprender português é grande.Há pouco tempo para estudar…” (8).

“Para as crianças é fácil, aprendem depressa a língua e adaptam-sefacilmente à cultura…” (8)

DIREITO AO CRÉDITO

Artigo 2.

1. As instituições de crédito aderentes disponibilizam às pessoas sin-gulares que o solicitem, mediante celebração de contrato de depósito,o acesso à titularidade e utilização de conta bancária de depósitoà ordem, bem como a possibilidade da sua movimentação.

Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de Março

“Por exemplo, o acesso ao crédito é condicionado e tantas vezesrecusado. Até a abertura de uma simples conta bancária é muitasvezes uma verdadeira missão impossível.” (2)

“Até nas instituições bancárias encontramos obstáculos!” (3)

“Sem documentos, não temos acesso (…) aos créditos bancários, e,por vezes, é quase impossível abrir uma conta num banco.” (9)

Artigo 21 (Não discriminação)1. É proibida a discriminação em razão, designadamente do sexo,raça, cor ou origem étnica ou social, características genéticas, língua,religião ou convicções opiniões políticas ou outras, pertença a uma

DISCRIMINAÇÃO

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minoria nacional, riqueza, nascimento, deficiência, idade ou orien-tação sexual.

2. No âmbito de aplicação do Tratado o que institui a ComunidadeEuropeia e do Tratado da União Europeia e sem prejuízo das dispo-sições especiais destes Tratados, é proibida toda a discriminaçãoem razão da nacionalidade.

Carta dos Direitos fundamentais da União Europeia (2000/C 364/01)

“…a justiça não é justa, onde um mesmo crime é penalizado de formadiferente se for praticado por um nacional ou por um estrangeiro?” (4)

“O racismo, a negrofobia, são frutos da ignorância.“ (5)

“Todos sabemos o que é ser rotulado, discriminado, colocado numestatuto inferior devido à cor da pele. Todos sabemos o que é servítima de preconceitos e pagar pelo comportamento de alguns.” (5)

“…somos alvo de atitudes discriminatórias e racistas, alguns reagemcom agressividade, partem para a violência e a porrada, mas a maioriade nós sente-se humilhada e não reage, porque já nos habituámos,porque estamos saturados de estar sempre a responder.” (5)

“Há também discriminação, muitas vezes “velada”…” (6)

“…existe discriminação… principalmente por vivermos no Bairro doAlto da Cova da Moura.” (7)

“Quando procuramos trabalho encontramos muitas dificuldades… eporque existe discriminação.” (7)

“…está enraizada a falsa ideia de que lá se passa fome, que se vivemiseravelmente. Este olhar pesa, porque diminui…” (8)

“São também as pessoas com menos qualificações que mais dis-criminam e têm um discurso contra os imigrantes que vêem comoconcorrentes e ameaça aos seus postos de trabalho.” (8)

“Todas sabemos o que é receber um tratamento desumano e discri-minatório devido à cor da pele ou por se ser estrangeira…” (9)

“Este trabalho no sector doméstico e das limpezas é desvalorizadopela maioria das pessoas, não é considerado dignificante, nem vistocomo uma profissão como as outras.” (9)

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Mulheres de minorias étnicas são duplamente discriminadas, mar-ginalizadas através de construções subordinadas de género e atravésde estigmatização étnica. A racialização das mulheres de minoriasétnicas toma formas específicas dentro da reprodução das relaçõessociais de género.

Castles, Stephen, 2000. Ethinicity and Globalization: from Migrant Worker to Transational Citizen,

London Thousand Oaks, New Delhi: Sage Publications

“A Inspecção Geral do Trabalho, perante o caso de uma mulher coma carteira de gruista, revelou-se incrédula.” (2)

“Por comparação com as mulheres os homens são tratados com maisrespeito. Talvez por medo, porque se associa o negro à violência e àcriminalidade.” (5)

“Para as mulheres, este processo de adaptação é favorecido por umamaior facilidade na verbalização dos seus sentimentos e pelo facto dealgumas terem um contacto muito próximo com pessoas da socie-dade portuguesa… até porque uma boa parte se ocupa de trabalhos

domésticos, ligados ao cuidado.” (6)

“É difícil conviver com uma imagem, por parte da sociedade deacolhimento, da mulher brasileira como “sexualmente disponível”,“prostituta”.” (6)

“…não há o mesmo cuidado e apoio moral às grávidas. Em muitas fá-bricas as mulheres grávidas executam as mesmas actividades querealizavam antes da gravidez, inclusive algumas que são perigosaspara o bebé.” (8)

“A duração da licença de maternidade é menor em Portugal e é de-masiado curta na perspectiva das mulheres migrantes dos Países deLeste.” (8)

“Há situações de exploração, há situações em que as mulheres,desempenhando as mesmas funções que os homens, têm saláriosinferiores.” (8)

“Há mesmo quem, de entre nós, tenha enfrentado situações de assédio/abuso sexual por parte do patrão. Há quem pense que, porque paga,pode exigir tudo…” (9)

ESPECIFICIDADE DAS MULHERES MIGRANTES

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A partir dos depoimentos colectivos procurou-se igualmente siste-matizar as soluções propostas pelos imigrantes, identificando as áreaschave de intervenção a que se reportam as referidas soluções.

PARA A SOCIEDADE DE ACOLHIMENTO

“As nossas vozes em conjunto, poderão ser ouvidas. É preciso queacreditem em nós e nos acolham com respeito.” (2)

“…que os portugueses tivessem uma compreensão positiva do trabalhoe esforço dos homens e mulheres imigrantes que contribuem parao desenvolvimento e vida económica do país e também para o desen-volvimento cultural do conhecimento, por exemplo, nas universidadesportuguesas.” (8)

“…mais apoios do governo para as famílias imigrantes, e em particular,para aquelas que têm filhos em idade escolar e que não podem contarcom o apoio da família alargada que está, normalmente, longe. Essesapoios funcionariam como um estímulo ao enraizamento e integraçãoplena destas famílias. (8)

PARA OS PODERES E INSTITUIÇÕES PÚBLICASQUE TRABALHAM COM AS QUESTÕES DA IMIGRAÇÃO

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PROPOSTAS | SOLUÇÕES

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“A promoção de espaços de diálogo entre instituições e comunidadesimigrantes, com sessões de esclarecimento das leis e abertura àssugestões das comunidades, permitiria um conhecimento mais realda nossa situação em Portugal.” (3)

“Uma iniciativa como por exemplo o “SEF - móvel” poderia facilitaressa proximidade e diálogo. (3)

“…a criação de um cargo de representante legal das comunidades imi-grantes locais” (3)

“Apelamos ao Estado Português, em especial aos ministérios do Tra-balho e Solidariedade Social, ao da Administração Interna, ao da Saúdee ao da Educação para que sejam definidas políticas e medidas que faci-litem a protecção e regularização dos/as trabalhadores/as imigrantes.”(3)

“A promoção de espaços de diálogo entre instituições e comuni-dades imigrantes, com sessões de esclarecimento das leis e aberturaàs sugestões das comunidades…” (3)

“Acreditamos também que uma luz ao fundo do túnel surgirá quandoas entidades que regulamentam as áreas da legalização e do trabalhoestabelecerem entre si melhores redes de comunicação, desen-volverem mecanismos de aceleração dos processos de renovação e

legalização e efectuarem um atendimento ao público mais eficaz,mais rápido e sobretudo mais humanizado.” (2)

“…SEF para que torne obrigatória a aceitação dos pré-registos porparte de todas as entidades patronais.” (2)

PARA AS ENTIDADES EMPREGADORAS

“Apelamos aos/às empregadores/as e cidadãos/as para que sejammais sensíveis ao acolhimento de todos/as imigrantes, potenciandoas mais valias das suas qualificações e experiências profissionais. “(3)

“Do nosso ponto de vista, é fundamental que todas as pessoas co-nheçam os direitos das empregadas domésticas, desde os patrões epatroas…” (9)

PARA AS ENTIDADES FISCALIZADORAS

“Apelamos às entidades fiscalizadoras para actuarem junto de enti-dades patronais não cumpridoras da lei criando formas rígidas depenalização.” (2)

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PELA DIVERSIDADE

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“…entidades que regulamentam as áreas da legalização e do trabalhoestabelecerem entre si melhores redes de comunicação” (2)

“É, por outro lado, urgente uma maior fiscalização às entidades patro-nais.” (4)

PARA AS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO/ FORMAÇÃO

“Consideramos importante que as instituições de educação e formaçãodivulguem as suas ofertas formativas junto das comunidades imi-grantes, criando melhores oportunidades de acesso.” (2)

“Porque não pensarmos numa Escola de Artes Multicultural que possaapoiar a integração no país e ao mesmo tempo procurar preservare permitir a interligação de identidades e expressões culturais? (3)

PARA AS ENTIDADES QUE CONCEDEM CRÉDITO

“Propomos às entidades bancárias que estudem a concessão decréditos a estrangeiros e que desenvolvam práticas uniformes.” (2)

PARA A INTERVENÇÃO DOS/AS PRÓPRIOS/AS IMIGRANTES

“Depende muito de nós próprios (…) trabalhar para a união entregrupos étnicos e diferentes nacionalidades, remar contra a maré doindividualismo e isolamento.” (2)

“…ser uma voz neste país, uma voz que quer participar e integrar-se,com as nossas raízes e culturas diferentes, porque sabemos quepodemos contribuir para uma sociedade mais intercultural.” (2)

“Precisamos empenharmo-nos para procurarmos respostas às nossasdúvidas, devemos persistir” (3)

“Acreditamos que é possível unirmo-nos para criarmos uma rede devoluntariado para ajudar na integração de crianças e jovens que nãodominam a língua portuguesa (3).

“Devemos procurar comprometermo-nos a promover a comunicaçãoentre grupos e culturas, reunindo as diversas comunidades imigrantese a sociedade de acolhimento.” (3)

“É importante aproximar-nos e beneficiar do apoio e esclarecimentoque a Associação do nosso Bairro nos pode dar e consideramos queas associações de imigrantes deveriam ter mais apoios para poderemapoiar mais as comunidades que representam.” (4)

“Urgente o engajamento em actividades associativas e mais políticas

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na luta por direitos dos imigrantes, das mulheres e pelos direitoshumanos em geral” (6)

“…ser um membro pleno na sociedade em que se está: participandona vida social, nos eventos, actividades no processo de integração,votando nas autárquicas etc. etc.” (6)

“Evitando atitudes de isolamento, de negativismo e de resistência aoconhecido e envolvimento com o país de acolhimento” (6)

“Prioritário para as mulheres brasileiras se associarem para pensare resolver os seus problemas, se unirem, para terem visibilidade emactividades que as descolem da imagem de objecto sexual, mantendoao mesmo tempo respeito pelas profissionais do sexo” (6)

“…consideramos urgente organizar o Bairro, limpar a má imagem,lutar pela segurança, conseguir um posto de saúde próximo e de qua-lidade e uma boa limpeza e recolha de lixo por parte dos serviçoscamarários”. (7)

“A Associação de Apoio ao Imigrante ajuda a lidar positivamente comos desafios que vão surgindo. (…) cria oportunidades de encontro entreimigrantes, reduzindo o isolamento social e facilitando o contacto entrepessoas que têm em comum uma raiz cultural diferente daquela queé partilhada pela sociedade em que vivem.” (8)

“Do nosso ponto de vista, é fundamental que todas as pessoas co-nheçam os direitos das empregadas domésticas, desde os patrõesàs patroas, às próprias mulheres que se ocupam deste sector deactividade. Se toda a gente conhecer a lei é mais fácil reivindicar edenunciar o seu incumprimento “ (9)

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Este documento reflecte o alerta dado por oito grupos de imigrantesa todos os problemas associados à sua experiência de imigração edesafia a todos/as a uma maior compreensão de todos os aspectosinerentes à imigração e ao compromisso com medidas transfor-madoras, que permitam que as vozes de todos/as se levantem emuníssono e digam:

Vamos construir uma sociedade mais aberta, mais participativa eigualitária;

Vamos defender o diálogo intercultural;

Vamos fazer ecoar a voz dos homens e das mulheres imigrantes;

Vamos construir comunidades mais solidárias e unidas;

Vamos Utopiar.

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NOTA FINAL

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Declaração Universal dos Direitos Humanos

Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, 2 de Novembro 2001, Unesco

Constituição da República Portuguesa, Artigos

Anteprojecto para o Plano de Integração dos Imigrantes, Presidência do Conselhode Ministros/ ACIME, 2006

D.L. Nº 34/ 2003, de 25 de Fevereiro (lei da imigração que regula as condições deentrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território português)

Despacho do Ministério da Saúde nº 25 360/2001 (Regulamentação que consagraos mesmos direitos de acesso à saúde

CARNEIRO, Roberto (coor), 2004, Média, Imigração e Minorias Étnicas, ACIME/Observatório da Imigração, Lisboa

LAGES, Mário (coord), 2006, Os Imigrantes e a População Portuguesa ImagensRecíprocas - Análise de duas sondagens, ACIME/Observatório da Imigração,Lisboa

SANTOS, Vanda, 2004, O Discurso oficial do Estado: sobre a Emigração dosanos 60 a 80 e Imigração dos anos 90 à Actualidade, ACIME/ Observatório daImigração, Lisboa

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BIBLIOGRAFIA

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