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QUEBRAR BARREIRAS HUMANIZANDO O OLHAR DOCENTE … · contribuindo para derrubar as barreiras que afastam os alunos das salas de aula, ... O Programa de Desenvolvimento Educacional

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QUEBRAR BARREIRAS HUMANIZANDO O OLHAR DOCENTE NA EJA: LIMITES

E POSSIBILIDADES.

Autora: NEUSA MARIA DELGADO MIRANDA1

Orientadora: RITA DE CÁSSIA DA SILVA OLIVEIRA2

Resumo

O presente artigo visa relatar resultados da pesquisa junto à Educação de Jovens e Adultos, na qual se destaca particularidades para a compreensão dos mecanismos empregados na proposta de intervenção pedagógica, permitindo fazer proveitosas trocas de experiências, um significativo referencial, favorecendo o desabrochar da consciência do ser humano com sentimentos de pertencimento, como a generosidade, a solidariedade, a amizade verdadeira que exprimem valores essenciais à vida, pois é um processo dinâmico que move e impulsiona em direção a um ideal. Esses sentimentos de pertencimento ajudam manter o auto conceito e a motivação desses jovens e adultos, pois estes se tornam os autores e co-autores do trabalho docente, o que se remete a algumas análises que nem sempre são visíveis num primeiro olhar. É o que se pretendeu esclarecer no decorrer da implementação pedagógica do projeto PDE no CEEBJA Professor Ignácio Alves de Souza Filho, Ensino Fundamental e Ensino Médio, no município de Jaguariaíva, Paraná. Para esta pesquisa, foi utilizada a metodologia da pesquisa-ação, na qual se coletou dados através de entrevistas com alunos e professores das várias áreas do conhecimento, como também foram organizados grupos de estudo, com a participação da direção, equipe pedagógica e os professores para reflexão e discussão das bases teórico-metodológicas que nortearam o projeto de intervenção para ajuda no acompanhamento, desenvolvimento e programação das atividades no decorrer da implementação. Diante deste processo educativo de jovens e adultos, situa-se as buscas dos sujeitos de uma relação com o saber, as diferentes mediações da organização do trabalho docente, como a questão da aproximação, do diálogo permanente, enfim, do acolhimento, como ações intencionais no processo ensino-aprendizagem, procurando criar práticas diferenciadas que atendam as especificidades e expectativas, contribuindo de maneira eficiente para despertar o interesse de todos pela escola e, assim que se possa garantir a permanência até a conclusão dos estudos destes jovens e adultos que em sua

1 Professora pedagoga do CEEBJA Professor Ignácio Alves de Souza Filho.

2 Professora doutora da Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG.

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grande maioria são alunos trabalhadores e que trazem consigo uma grande bagagem no decorrer das suas trajetórias de vida. Com base nos dados coletados, através da pesquisa-ação, passou-se a escolher temas relacionados para uma prática docente mais humana, tendo como norte humanizar o olhar docente contribuindo para derrubar as barreiras que afastam os alunos das salas de aula, onde se fundamentou esta pesquisa. Também com base nos cinco temas estudados, levantados através de entrevistas com professores e alunos, foram analisadas, e a partir destes resultados, percebeu-se que tanto alunos como professores, possuem questões próprias e que precisam ser tratadas como tais, para que se mostre de modo mais claro e pertinente todas as necessidades e demandas dos atores envolvidos nesta modalidade de ensino.

Palavras-chave: CEEBJA; Humanização; Reflexão; Autoanálise; Prática docente.

1 Introdução

O Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, implantado pela

Secretaria de Estado de Educação - SEED, apresenta uma nova concepção de

Formação Continuada com intenção de valorizar os professores que fazem parte da

rede pública estadual de ensino do Estado do Paraná. Esta oferta tem a finalidade

de superar a dicotomia entre teoria e prática na formação continuada dos

professores da educação básica.

Um dos aspectos fundamentais indicado pelo professor PDE, na trajetória do

Programa é a implementação dentro da unidade escolar onde se atua de seu projeto

de Intervenção Pedagógica. Elaborado sob a orientação da Instituição de Ensino

Superior (IES) durante os dois primeiros períodos do Programa. O projeto tem como

objetivo mostrar alguns problemas que se constatou no decorrer do processo

ensino-aprendizagem na Educação de jovens e adultos e apresentar sugestões,

alternativas, sempre respaldadas por embasamento teóricos e experiências reais

vivenciadas por profissionais de como tais problemas podem ser melhor

administrados e, por que não, solucionados.

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Nesta perspectiva, o professor PDE ao retomar suas atividades na unidade

escolar de fixação, e, que ao realizar a sua intervenção pedagógica, terá uma

oportunidade significativa junto com os demais envolvidos neste processo com vistas

ao conhecimento, como um grupo de suporte, capaz de responder, com qualidade à

diversidade de situações que as diferentes realidades apresentam visando reverter o

quadro inquietante, o da “permanência do aluno na escola e o avanço da

escolarização”, numa ação que exige de todos, envolvimento e compromisso. É

fundamental empenhar-se, dedicar-se a sua condução começando pelo seu

conhecimento e pelo estudo cuidadoso de todo o material a respeito, desde a

filosofia que a embasa até os desdobramentos metodológicos que permitirão pô-la

em prática.

A implementação transcorreu no segundo semestre do ano letivo de 2011,

objetivando contribuir para a atuação dos educadores com vistas a possibilidade de

reflexão sobre as práticas e rotinas pedagógicas para, senão resolver, pelo menos

atenuar esta problemática.

Nesta tentativa buscou-se apontar aqui alguns possíveis caminhos para que

se evite o abandono da sala de aula por parte de muitos destes jovens e adultos.

Tendo em vista os resultados das entrevistas realizadas diretamente com

professores e alunos deu-se embasamento para a elaboração de temas que foram

trabalhados em quatro etapas na formação de grupos de estudo.

Nessa perspectiva procurou-se entender melhor quais mecanismos mantém o

aluno em sala de aula, pois este é um grande desafio que deve estar incorporado à

rotina dos professores. Os problemas e as adversidades da vida de um aluno jovem

e adulto, como: auto-desenvolvimento, realização pessoal, o prazer de viver,

autoconfiança, independência, sentido de aceitação social, amizade, associação,

proteção sua e da família, sobrevivência, alimentação, vestuário e moradia são

questões que não podem passar despercebidos pelos professores.

Dentro desta ótica, propõe-se primeiramente um olhar humanizado dos

educadores, uma reeducação do olhar para com os alunos articulando a prática

docente aos problemas que surgem no dia a dia dentro da sala de aula e por

conseguinte ter condições de entender, compreender as características próprias

desses sujeitos com tantas diversidades e especificidades.

Ressalta-se a importância e a atualidade do pensamento de Paulo Freire ao

mencionar que desta forma é que o professor adquirirá uma postura comprometida.

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Dessa forma Freire caminha na mesma direção reflexiva da filosofia existencial ao

considerar a condição humana a partir da sua própria vivência no mundo. E, nesse

propósito, concebe a educação como instrumento necessário à luta pela superação

das condições existenciais desumanizantes. Para ele, o processo educativo deve

atuar na direção de fazer com que os seres humanos despertem criticamente para a

descoberta da sua realidade e possam transformá-la a partir de sua práxis.

Partindo deste pensamento, o docente com sua experiência e sua expressão,

é que terá condições para uma mudança de postura, isto é, de se sensibilizar para

agir com efetividade na sua prática docente, visando o autoconceito e motivação,

que vislumbrem a participação e a intervenção, conscientes dentro da realidade em

que se vive, tendo como horizonte sua permanente humanização, pois se observa

que é nela que se configura a emergência de um olhar docente humanizado, hoje

tão complexo, flutuante e descontínuo e que se encontra na pluralidade das salas de

aula.

2 Desenvolvimento

No cenário educacional de EJA, Educação de Jovens e Adultos, possui um

papel fundamental no sentido de propiciar uma relação pedagógica significativa

entre professores e alunos, para garantir o acesso, a permanência e o avanço da

escolarização. Dessa forma apresenta uma maior urgência no redimensionamento

da prática docente e rotina pedagógica pelas dificuldades enfrentadas para

sobreviver neste cenário social.

A escola precisa possibilitar um ambiente estimulante acolhedor, um ambiente

de alegria, de afetividade, possibilitando uma participação efetiva em sala de aula

para que se sintam autoconfiantes, seguros, pertencidos a esse contexto e possam,

ao mesmo tempo, entrelaçar afeto e cognição, fatores fundamentais para o

desenvolvimento do ser humano.

Numa visão global de vida e de educação, os cinco temas abordados, estão

integrados à vida dos educadores e alunos, enfim, da escola e da sociedade, isto é,

à sua prática social global. A ênfase dos cinco temas estudados apontou na direção

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de um outro enfoque, conduzindo a um encontro da pessoa consigo mesma e a

melhor compreensão do mundo que a cerca, favorecendo a descoberta de uma nova

dimensão para a vida, para a prática docente e rotina pedagógica, o que propicia a

descoberta dos valores essenciais à vida, fonte de humanização, de autoconceito e

motivação que podem gerar mudanças de atitude, de postura de todos os envolvidos

no processo escolar da EJA.

Para tanto é necessário que exista a educação para a emancipação, um olhar

dirigido ao interior da instituição escolar, rompendo com algumas características, que

por certo ainda hoje se fazem presentes em certa medida na escola. É grande a

importância, e na mesma proporção, a responsabilidade do professor na condução

do processo educativo, que está diretamente relacionado à sociedade.

Para a realização da implementação da proposta pedagógica no ambiente

escolar, foi necessário empregar a metodologia da pesquisa-ação, que permitiu

refletir para uma melhor compreensão da realidade estudada, enquanto se

desenvolveu uma intervenção na tentativa de modificá-la. Assim Thiollent (2008, p.

16) define como:

[…] um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. (THIOLLENT, 2008, p. 16).

Ainda Glória Perez Serrano em seu livro “Educação em Valores” - Como

educar para a democracia (2002, p. 235), usa as palavras de Kemmis e Mc

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A pesquisa-ação é uma forma de indagação auto-reflexiva, empreendida por participantes em situações sociais com o objetivo de melhorar a racionalidade e a justeza de suas práticas sociais e educacionais, assim como a compreensão dessas práticas e das situações em que ocorrem. (PEREZ, 2002, p. 235).

Conforme Thiollent (2008), a metodologia da pesquisa-ação tem a finalidade

de consistir na pesquisa, com obtenção de informação sobre um determinado

problema e envolvimento dos atores destinados a encontrar respostas às questões

problemas na prática, de forma ativa e interativa e com a participação de todos

envolvidos na pesquisa. Portanto esta ação transcorreu de maneira descritiva após o

estudo, mediante leitura exploratória, seletiva, analítica e interpretativa com a

finalidade de buscar conhecimento sobre os aspectos históricos da realidade de

Educação de Jovens e Adultos.

A metodologia da pesquisa-ação e a reflexão possibilitam uma melhor

compreensão, orientando para a melhoria da prática pedagógica, ao

aperfeiçoamento, à mudança de atitudes e à transformação da realidade concreta

sobre a qual se opera.

A intervenção conforme a metodologia da pesquisa-ação está voltada para a

tomada de consciência de todos os envolvidos nas atividades pesquisadas, com a

finalidade de encontrar respostas aos assuntos ligados à prática educativa.

2.1 Instrumentos e procedimentos de coleta de dados

Para o processo de implementação foram construídos dois roteiros de

entrevistas, sendo um para alunos e outro para professores, ambos com vinte

perguntas. As respostas foram registradas através da fala e também da escrita a

pedido de alguns e um protocolo individual para cada participante.

A entrevista foi escolhida para iniciar este processo de implementação por ser

a melhor “tentativa de captação do real, sem contaminação indesejáveis nem de

parte do pesquisador nem de fatores externos que possam modificar aquele real

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original”, segundo Haguette (1990, p. 75). O ator social pode manifestar seu ponto

de vista, deixando, portanto, emergir o fenômeno em sua completude e a

observação participante por poder penetrar no cotidiano do fenômeno estudado e

poder ver como a prática é elaborada.

As entrevistas foram feitas com alunos do período noturno do Ensino

Fundamental Fase II e Ensino Médio, onde foram convidados e tiveram a boa

vontade em participar da pesquisa. Foram realizadas com intuito de colher

informações necessárias sobre o que pensam da escola, na busca de encontrar

soluções para os problemas enfrentados e para dar base na elaboração dos temas a

serem estudados.

Também se buscou interpretar com cuidado o sentido das “falas” que vem, às

vezes, carregada de dificuldades na maneira de se expressar, apesar de alguns

alunos se recusarem em responder através da fala, foi solicitado por parte de alguns,

responderem através da escrita e o pedido foi levado em consideração para que

respondessem mais à vontade. Alguns deles estavam tensos e envergonhados para

falar, demonstrando como é difícil vencer o nervosismo, a timidez e o medo, apesar

que quando convive-se diariamente vivencia-se a experiência com jovens e adultos,

não é estranho constatar esta atitude. Kipnis (2004) ilustra esta questão afirmando

que:

“o papel do pesquisador passa a ser do observador que consegue captar a informação, interpretá-la e redigir de forma a que outros possam também “vivenciar” a experiência. Necessita estar próxima o suficiente para conseguir entender o que as pessoas falam, porém devidamente “distanciado” para não “contaminar” a realidade com os seus próprios problemas e emoções”.(KIPNIS, 2004, p. 106).

As entrevistas realizadas com dez professores das várias áreas do

conhecimento, desenvolvidas de forma presencial e foi concretizada um pouco antes

de iniciar as aulas, onde conforme descrito acima, alguns solicitaram para ser

respondido de forma escrita. Também vivenciando o cotidiano escolar, através de

conversas informais com alunos e professores nas salas de aula, no intervalo para o

recreio ou quando muitos destes alunos e professores procuram a equipe-

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pedagógica para sanar dúvidas, angústias, anseios, proporciona-se também coleta

de dados bem fundamentadas, que ajudaram complementar o processo desta

pesquisa.

Na implementação das ações, também se organizou grupos de estudo com os

professores. Para a efetivação do estudo de cada encontro, foi composto por cinco

temas com intuito de atenuar os problemas enfrentados no interior da escola, pois se

acredita que o caminho para a superação dessa problemática é o de assegurar além

do ingresso, a permanência e o avanço da escolaridade dos alunos e uma ação

docente efetiva.

Primeiramente foi preciso conscientizar os professores da importância do

conhecimento das características dos alunos com quem se trabalha e como é nobre

se humanizar dialogar, acolhê-los, criar vínculos de amizade, enfim, ter uma atitude

expressiva de aproximação. Daí a importância da escola, primeiramente como

agente principal do saber, se sensibilizar, refletir, e realizar autoanálise do seu

trabalho docente para ter condições de ajudar o aluno a se conhecer melhor, a ter

um relacionamento mais carinhoso, cooperativo, solidário, buscando transformar

suas carências e fraquezas em desafios e superação, pois a educação para a

convivência em sociedade, que diminui a tendência natural dos homens em se

aniquilarem, promove a preservação da vida e estabelece relações com bases na

solidariedade e na generosidade.

Organizou-se os grupos de estudo com a direção, equipe pedagógica e

docentes (Produção do material Pedagógico - PDE – Caderno Temático) de maneira

bem descontraída, com a intenção dos professores como um laboratório vivo,

participassem de forma ativa e interativa, trazendo suas experiência, e,

principalmente para os professores iniciantes, com a intenção de um despertar, na

tentativa de se humanizar para uma ação docente perante esse universo da EJA,

com a esperança de propiciar uma autoanálise do trabalho docente.

No primeiro encontro foi trabalhado o tema “As características dos alunos da

EJA – A importância desse conhecimento”. A intenção de elaborar esse tema de

fundamental importância, trouxe informações, estratégias e procedimentos que

ajudaram os professores a conhecerem quem são os seus alunos e alunas, também

a considerar a natureza humana, isto é, a essência humana, desses jovens e

adultos atendidos em suas especificidades, além de suas condições sócios

econômicas, culturais e religiosas, como também em relação aos alunos com

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necessidades especiais.

O segundo tema desse estudo “A heterogeneidade na EJA – Compreender

uma necessidade para a prática docente” concentrou-se na compreensão das

diferenças que, quando bem acolhidas, bem entendidas, enriquecem a prática

docente, tornam-se fatores positivos, pois permitem o estabelecimento da

humanização, construindo um conhecimento transparente, possibilitando a esses

alunos ilustrar bem a dimensão da sociabilidade que, a ida à escola imprime na vida

das pessoas, como os conteúdos próprios elegem e correspondem às necessidades

reais deles, que a participação desses jovens e adultos no planejamento

transformam seu modo de ver e atuar na comunidade em que vivem, enfim, que

aprendem, de alguma maneira, seu modo de ver e atuar na comunidade em que

vivem.

O terceiro tema, “Auto conceito e motivação na EJA – Uma ação necessária

para o aluno avançar a escolaridade” foi exposto algumas estratégias capazes de

gerar, desenvolver e manter a sala de aula como um grupo de aprendizagem, onde

cresçam os vínculos de amizade, de afetividade, com os alunos, e, entre eles, de

forma a criar um ambiente prazeroso, de alegria, de entusiasmo, onde todos se

sintam seguros, auto confiantes, enfim, onde todos sejam respeitados em suas

diferenças e especificidades, com a intenção de superarem as dificuldades e

crescerem, para seguir em frente a sua escolaridade.

Nos dois últimos temas foram abordados instrumentos interessantes, ao

mesmo tempo em que os professores tem a tarefa de apresentar aos alunos os

marcos da cultura humana de também conhecer os alunos em relação aos outros

temas expostos que foram trabalhados anteriormente nos grupos de estudo, foi de

sugerir um desenho do que pensam a respeito desses alunos, “A essência humana

na EJA – Um despertar para se humanizar” e “A Solidariedade na EJA – Um valor

essencial”.

Foram desenvolvidos estudos e debates com questões pertinentes aos temas

relacionados úteis ao cotidiano do educador, onde oportunizou a percepção de como

seus alunos vão mudando a maneira de ser, de se comportar e de se relacionar e

como vão transformando seu olhar sobre o mundo, procurando valorizar suas

conquistas e as pequenas vitórias de cada um deles, porém se sabe que falar sobre

a essência humana é algo complexo, mas de extrema importância, para refletir sobre

o significado da escola em proporcionar uma educação voltada para a recuperação

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dos valores que hoje estão adormecidos dentro de cada indivíduo.

Malheiro (2010) afirma que “Desde os tempos mais remotos, educar objetivou

primeiro que o aluno seja uma pessoa humana completa, formada em suas

dimensões racionais, volitivas, afetivas e espirituais”. Acrescenta ainda que é

preciso “Uma escola de corpo e alma. Uma escola que eduque os cidadãos que são

primeiro lugar pessoas que foram criadas para serem felizes”. (Malheiro, 2010, p.

14).

O desenvolvimento do primeiro passo (Grupo de estudo) contemplou uma

prática de leitura, análise e discussão sobre o tema exposto abaixo, tendo em vista a

importância do conhecimento das características dos alunos da Educação de Jovens

e Adultos (EJA).

A tentativa desse estudo foi de abrir espaços e aproveitar as brechas

existentes de conquistar avanços sobre as formas de encontrar caminhos para uma

ação docente efetiva. O professor pode refletir, fazer uma autoanálise do seu

trabalho docente, enfim, de se conscientizar, que mesmo esses alunos com suas

características diferenciadas, são capazes de aprender. O fato de não terem

freqüentado a escola na idade própria, por motivos muitas vezes alheios a sua

vontade, não quer dizer que sejam incapazes: na maioria dos casos, essa lacuna de

freqüência a escola resulta de condições e práticas de ensino inadequadas a essa

característica de alunos.

Apesar de toda essa importância, esse conhecimento até então parecia não

ter merecido a atenção por parte de alguns professores. A necessidade de instalar

certas condições favoráveis de muita reflexão para a sensibilização, e aí acontecer

um desenvolvimento significativo desse trabalho pedagógico da a possibilidade de

enfrentar esse desafio de assegurar o ingresso, a permanência e o avanço da

escolaridade desses sujeitos, que no passado tiveram esse direito violado.

Agir-refletir é o caminho percorrido por todos. É sem dúvida importante que

os professores tenham sua ação orientada para a reflexão permanente do seu fazer

pedagógico, buscando os sinais que apontam para a necessidade de uma mudança

de postura significativa.

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2.2 As características dos alunos da EJA: A importância desse conhecimento

Conhecer as características dos alunos da EJA permite analisar o quanto o

acesso à escolarização obrigatória foi aos poucos conquistada pela população

historicamente excluída, além de indicar o quanto ainda é preciso ser feito para que

a escolarização oferecida garanta além do ingresso, a permanência e o sucesso

desses alunos em suas aprendizagens, numa escola pública de qualidade, que

contribua de forma significativa para a redução das desigualdades sociais.

Pinto (1984) coloca que:

Existencialmente, o adulto é o homem na fase mais rica de sua existência, mais plena de possibilidades. Por isso, é o ser humano no qual melhor se verifica seu caráter de trabalhador. O trabalho expressa e define a essência do homem em todas as fases de sua vida (da infância à velhice), mas é no período adulto que melhor se compreende seu significado como fator construtivo da natureza humana. (PINTO, 1984, p. 79)

Sendo assim é fundamental levar em consideração a natureza humana, isto é,

a essência humana, desses jovens e adultos atendidos, em suas diversidades e

suas especificidades, além de suas condições sócio-econômicas, culturais e

religiosas.

Nesse propósito, a competência técnica e pedagógica individual dos

professores precisa estar no cotidiano a serviço do coletivo da escola cujo desafio é

o zelo pela aprendizagem de todos os seus alunos, independentemente das

condições sociais, econômicas e culturais que esses jovens e adultos se encontram.

Ao reconhecer as características dos alunos da EJA, bem como o papel desta

modalidade de ensino na formação para o exercício da vida cidadã, e, para a

continuidade dos estudos, é preciso oportunizar a todos esses alunos,

conhecimentos das diferentes linguagens, independentemente de raça, etnia,

gênero e classe social.

Isso implica questionar práticas excludentes que ainda persistem no ambiente

escolar e que se não forem superadas por encaminhamentos pedagógicos no

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processo de ensino e de aprendizagem contribuirão para a manutenção das

desigualdades sociais que marcam a história de vidas desses alunos.

A escola deve ter sempre a preocupação em dar atendimento à diversidade

social, econômica e cultural existente que lhe garanta ser reconhecida como

instituição voltada, indistintamente, para a inclusão de todos os indivíduos.

Entretanto para que se efetive e ocorra a universalização do ensino é imprescindível

assegurar o acesso, a permanência e o sucesso nos estudos destes jovens e

adultos.

A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) estabelece a necessidade de uma

formação adequada para se trabalhar com o jovem e o adulto, bem como atenção às

características específicas dos trabalhadores matriculados nos cursos noturnos.

Ainda as Diretrizes Curriculares Nacionais de Jovens e Adultos estabelecem,

no item VIII, que os docentes deverão se preparar e se qualificar para a constituição

de projetos pedagógicos que considerem modelos apropriados e essas

características e expectativas. A EJA deve possibilitar que esses indivíduos

recuperem e transcendam os conteúdos sensíveis de suas experiências e se

apropriem das significações socialmente compartilhadas para que, assim, se tornem

letrados.

O grande desafio dos educadores é estabelecer uma prática docente que

reconheça e valorize práticas culturais de tais sujeitos sem perder de vista o

conhecimento historicamente produzido, que constitui patrimônio de todos.

As Diretrizes Curriculares Estaduais da Educação de Jovens Adultos não se

referem exclusivamente a uma característica etária, mas a articulação desta

modalidade com a diversidade sócio-cultural da parcela de alunos composta por

populações do campo, em privação de liberdade, com necessidades educativas

especiais, indígenas remanescentes de quilombos, assentados rurais, que

demandam uma proposta pedagógica que considere as condições específicas de

aprendizagem desses alunos.

A EJA precisa organizar-se e prever formas de atender às necessidades de

seus alunos, visando à preservação da dignidade, o fortalecimento da identidade e o

exercício da cidadania de cada um dos envolvidos no processo de ensino e

aprendizagem. Mesmo que os alunos apresentem características diferenciadas

decorrentes não apenas de deficiências, mas também de condições sócio-culturais

diversas e econômicas desfavoráveis, eles terão direito a receber apoios

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diferenciados daqueles normalmente oferecidos pela educação escolar.

Nesse contexto, independentemente desses sujeitos, detentores ou não de

necessidades especiais, para que se tornem ativos do processo educacional, todo

professor da EJA, deve reconhecer, compreender e cooperar para que ampliem seus

conhecimentos de forma crítica, possibilitando à reflexão pela busca de seus

direitos, qualidade de vida, pois quando retomam seus estudos trazem consigo,

histórias, cultura própria e costumes, experiências de vida que não devem deixar de

ser esquecidos e sempre respeitados, colaborando para que se apropriem para o

mundo do trabalho e o exercício da cidadania.

A partir da leitura e das discussões ocorridas durante o estudo em questão,

houve um repensar de todos os envolvidos nesse processo, que os alunos jovens e

adultos, caracterizam-se como um grupo heterogêneo, do ponto de vista da faixa

etária, da cultura, da visão de mundo e dos conhecimentos prévios. Contribuiu para

uma percepção que a escola representa para eles um espaço ao mesmo tempo de

recolocação social, de sociabilidade, de formalização do saber e de desenvolvimento

pessoal.

Nesse sentido, os alunos jovens e adultos diferem em muitos aspectos, das

crianças, e isto deve ser considerado. A imersão, por vezes precoce, no mundo do

trabalho e a experiência social, fizeram com que esses alunos acumulassem uma

bagagem rica e diversa de conhecimentos e formas de atuar no mundo em que

vivem.

Esse momento também propiciou a compreensão do enfrentamento das

dificuldades, orientando mais uma vez, para uma reflexão de grande valia, que

permitiu o professor se situar melhor, organizar-se em sala de aula, diagnosticar o

fazer, retomá-lo sempre que houver necessidade, planejando e replanejando sua

continuidade, de forma a conseguir o progresso de todos os alunos com vistas à

promoção da aprendizagem.

2.3 A Heterogeneidade na EJA: Compreender? Uma necessidade para a

prática docente

A EJA reúne alunos de diferentes idades com diferentes níveis de

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aprendizagem e condições sociais. São, portanto, grupos bastante heterogêneos em

gênero, faixa etária, raça, etnia, costumes, culturas, religiões, etc. Muitos deles

permaneceram um longo tempo afastado do cotidiano escolar por motivos adversos

à sua vontade, o que a princípio pode parecer um complicador para o trabalho

docente de sala de aula.

Mas estas diferenças quando bem acolhidas, bem entendidas, são

enriquecedoras para a prática docente, tornam-se fatores positivos, pois permitem o

enriquecimento e estabelecem o humanismo, a construção do conhecimento

possibilitando a esses alunos, jovens e adultos, uma formação de verdadeiros

cidadãos conscientes para que possam lutar por seus direitos.

Um professor que identifica essa heterogeneidade tem as condições

necessárias para sanar as dificuldades do aluno e auxiliá-lo na superação de tais

fatores, dispondo-se a conhecer as suas causas e saber lidar com essa

heterogeneidade, trabalhar com os problemas que surgem no dia a dia da escola.

Para isso, é necessário buscar conhecimentos sobre os aspectos históricos da

realidade da EJA. Arroyo (2007) destaca:

Como um campo das ciências humanas, a educação lida diretamente com seres humanos, e, sendo a EJA um campo da educação que se dedica a seres humanos marcados pela exclusão social ou, no dizer de Paulo Freire, seres humanos que vivenciam o processo de sua “humanidade roubada”, “seres humanos proibidos de ser”, cabe à educação captar como os oprimidos “tentam superar condições que proíbem de ser”, perceber e se contrapor às situações e às condições em que realizam sua existência, em que se deformam e se desumanizam”. (ARROYO, 2000, p. 242, apud, SOARES, 2007, p.2)

A fim de propiciar a efetivação desse conhecimento, é necessário que o

professor também conheça as experiências e expectativas desses alunos, cuidar

das formas de conduzir o trabalho docente para melhor orientar o processo de

aprendizagem, o que é precioso o estabelecimento de rotinas diárias em relação ao

tempo, o espaço da sala de aula e as ações pedagógicas a serem desenvolvidas.

Para que esse tempo do professor e o dos alunos seja melhor aproveitado,

estas ações pedagógicas devem ser bem distribuídas e planejadas ao longo da

conclusão da disciplina que o aluno está cursando. Portanto é preciso analisar as

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ações propostas, bem como as que se pretende desenvolver, planejando sua

distribuição neste tempo certo, pois não se pode esquecer que principalmente os

alunos têm o seu tempo certo, o seu ritmo próprio e este sempre deve ser lembrado

e respeitado.

O Professor também não pode esquecer de que seu componente curricular

não é único. Os alunos apesar de estarem cansados do seu trabalho e muitas vezes

desatentos sentem-se na obrigação de dar conta dos conteúdos e tarefas de

solicitadas. Sendo assim, o professor deve ter essa preocupação em procurar saber

o que os outros colegas estão trabalhando e o que há de interdisciplinar para

elaboração de sua proposta.

O planejamento das rotinas em conjunto com os alunos favorece a

organização pessoal, contribuindo para o sucesso das tarefas escolares. O professor

deve assegurar que todos tenham clareza do que se pretende, pois à medida que

vão entendendo o que têm de fazer e como o professor poderá dedicar mais tempo

àqueles que têm mais dificuldades. Com certeza, de início esse planejar cooperativo

será um tanto difícil e irá demandar certo tempo, no entanto acredita-se que esse

tempo é um investimento que traz pontos positivos, tanto para o professor quanto

para os alunos, propiciando o aumento da autoestima e a confiança necessária para

o avanço da escolaridade.

A sala de aula da Educação de Jovens e Adultos deve ser um espaço para

trabalhar na formação de cidadãos, levando os alunos a produzir o conhecimento

necessário dentro das suas especificidades, pois esse é o grande desafio da escola,

fazer com esses jovens e adultos sejam reconhecidos como sujeitos ativos na sua

trajetória escolar, estimulados a atuar e participar da vida cidadã com dignidade.

Haddad (1998) ressalta que:

“Não basta oferecer escola; é necessário criar as condições de freqüência, utilizando uma política de discriminação positiva, sob o risco de, mais uma vez culpar os próprios alunos pelos seus fracassos”. (HADDAD, 1998, p. 116, apud SOARES, 2003 p. 37).

Diante dessa situação cabe ao professor como agente do saber, munir-se de

muitos recursos para trabalhar neste cenário da EJA com tantas diversidades e

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também providenciar com antecedência os materiais de que irá precisar. Conversar

também com os colegas que trabalharam com os alunos antes e depois dele para

que, dentro do possível, encontrarem formas de organizar melhor os conteúdos que

irão trabalhar com esses alunos de acordo com a sua especificidade e necessidade.

O professor deve se lembrar de que na escola, juntamente com os conteúdos

das diferentes áreas do conhecimento, também se promovem valores morais e

éticos que por vezes estão adormecidos como a generosidade, a solidariedade que

são importantes para esses jovens e adultos construírem a cidadania.

No entanto o professor deve aguçar a percepção para desenvolver atividades

que contemplem momentos de participação coletiva, momentos para os alunos

interagirem em grupos e momentos de trabalho individual; deve ter a percepção que

os momentos coletivos ajudam a fortalecer o conjunto na sala de aula e possibilitam

o diálogo sobre as conquistas e dificuldades gerais, de forma que todos percebam

que formam um só grupo.

Já os momentos de trabalho individual auxiliam a desenvolver a concentração

e a disciplina necessária à atividade intelectual. Além disso é uma ótima

oportunidade para o professor estabelecer uma relação mais próxima com o aluno,

criar vínculos de amizade e investigar ou cuidar de suas dificuldades e necessidades

específicas. Isso é particularmente importante para esses alunos, que precisam

desenvolver a autoconfiança em relação à capacidade de aprender.

Compreendendo essa heterogeneidade, o professor deve também ter a

percepção que cada um tem um jeito de aprender, um ritmo próprio e um acúmulo

de conhecimentos diferenciados, em função das nossas histórias de vida. Apresentar

um determinado conteúdo sempre da mesma forma pode atingir determinados

alunos e não outros, portanto é necessário criar estratégias diferenciadas, alternar

as formas de apresentação e desenvolvimento, bem como as modalidades de

interação.

À medida que um professor adotar a percepção na sua prática docente vai se

desenvolvendo, criando uma autocrítica do seu trabalho, que proporciona uma

mudança sua postura, valorizando a troca de idéias entre docentes sobre a situação

desses alunos trabalhadores e sofridos, planejando em conjunto as intervenções

necessárias.

Talvez seja essa a ocasião para verificar em qual área do conhecimento

determinado o aluno demonstra mais interesse ou facilidade, propondo uma ponte

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para a superação das dificuldades que impedem a aprendizagem e que afastam

muitos desses alunos da escola. Se assim for, somente um trabalho unido dos

professores da EJA pode modificar tal situação, promover a permanência e o

sucesso desses alunos em seus estudos e uma ação docente efetiva.

Fica transparente que a sala de aula é um espaço de encontro entre alunos,

professor e conhecimento. Nela vínculos de amizade, cooperação e confiança, se

constroem e se consolidam, animando o processo de ensinar e aprender. O bom

relacionamento entre professor e aluno, estar disposto a ouvir, a compreender e a

respeitar a história de vida dos alunos, utilizar metodologias diferenciadas, criar

critérios de avaliação que vão de encontro com as necessidades e expectativas dos

alunos pode motivar e assim efetivar o processo de ensinar e aprender.

No entanto para que a sala de aula se torne um espaço verdadeiro de trocas

e aprendizagens é necessário que este espaço seja um ambiente de respeito,

harmonioso, de confiança, de troca de experiências, para que o aluno se sinta bem,

tenha um bom relacionamento com professores e colegas, pois através dessa

interação é que vai acontecer a verdadeira aprendizagem. É nela que se configura a

emergência de um olhar docente humanizado, hoje tão complexo, flutuante e

descontínuo e que se encontra na pluralidade de nossas salas de aula. Assim, o

bom acolhimento e a valorização do aluno pelo professor possibilita a abertura de

um canal de aprendizagem com maiores garantias de êxito.

2.4 Auto conceito e motivação na EJA: Uma ação necessária para o aluno

avançar a escolaridade

Inicialmente pode-se pensar na etimologia da palavra motivação: vem do

verbo latino movere, cujo tempo supino motum e o substantivo motivum deram

origem ao nosso termo motivo: aquilo que move a pessoa, faz mudar de curso

(Bzuneck, 2001). O termo motivação é descrito pela Enciclopédia Encarta como:

[...] causa do comportamento de um organismo e razão pela qual se leva adiante uma atividade determinada. A motivação abrange tanto os impulsos conscientes como os inconscientes. As teorias estabelecem um nível de

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motivação primário, que se refere à satisfação das necessidades elementares (respirar, comer ou beber) e um secundário referido às necessidades sociais. (ENCARTA, 1993-1999)

A imagem que uma pessoa tem de si é, em grande parte, formada a partir da

maneira como ela é vista pelos outros com quem convive e a opinião do outro tem

influência proporcional ao valor que ele tem em nossa vida. Assim, quando pessoas

que são importantes para alguém as elogiam, sentem-se encorajados a enfrentar

desafios, fortalecendo sua autoimagem.

O professor é muito importante para os alunos e constitui uma referência para

a formação de seu autoconceito, a maneira como se relaciona com eles é

fundamental para que se sintam estimulados, entusiasmados e capazes. Para isso,

é bom não só elogiar o aluno na ocasião adequada, mas também lhe mostrar de

forma precisa e direta quais foram suas conquistas. Tais informações ajudam os

alunos a tomar consciência de sua própria aprendizagem e a usar com mais

segurança os conhecimentos de que se apropriaram.

Uma das formas que contribui para o desenvolvimento dessa consciência é

expressar para o outro o que se está sentindo e aprendendo, sendo que a expressão

organiza o pensamento. Muitas vezes da-se conta do que se pensa somente no

momento do diálogo com outra pessoa. Quando alguém indaga por não entender o

que quer dizer, acaba por ajudar a organizar e completar uma idéia que estava

confusa.

No entanto muitas pessoas tem dificuldade para se expressar, pois nem

sempre é fácil. Por isso o professor tem a consciência de que o aluno é o agente

principal da escola, deve ter a percepção em aproveitar esse momento para dialogar,

criando oportunidades para o aluno falar de si, emitir opiniões sobre os

acontecimentos e explicar suas hipóteses nas situações de aprendizagem.

O professor deverá se esforçar para construir vínculos de amizade, de

afetividade com os alunos jovens e adultos e entre eles, de forma a criar um

ambiente prazeroso, de alegria, de entusiasmo onde todos sejam respeitados em

suas diferenças e especificidades para que superem as dificuldades ajudando a

crescerem e a seguirem em frente a sua escolaridade. Barreto (1987) aponta:

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A pedagogia do entusiasmo, muito ligada às do assombro e da alegria, supõe que o professor ou mestre se assuma como animador, como a pessoa mais motivada da sala, capaz de deixar fora dela os seus problemas e dificuldades para não contaminar com eles os alunos. É uma pessoa orgulhosa e feliz de ser professor, que espalha vocação, vontade de aprender, vontade de viver. Mais que transmitir seus conhecimentos, comunica seus desejos e habilidades para que os alunos os adquiram. Vive com eles a aventura da aprendizagem cotidiana, transforma sua sala em uma oficina, um laboratório, um lugar de busca, de encontro e convivência, de construção de novos conhecimentos e valores. (BARRETO, 1987, p. 11, apud ESCLARÍN, 2006, p. 158)

O professor da EJA que de fato se constitui como educador é possuidor de

autonomia, aquele que volta seu olhar para os alunos, que tem percepção aguçada,

proporciona um clima de confiança e respeito mútuo, garantindo um ambiente de

alegria, de entusiasmo, que é propício para a aprendizagem, o que possibilita os

alunos a se sentirem seguros para dizer o que pensam e desejam, num permanente

exercício de democracia.

Nesse contexto o professor sendo o agente principal do saber deve adquirir

espírito de equipe, não pode trabalhar isolado, distanciado, lembrando que, quanto

maior for autoestima, mais eficaz será o tratamento do outro com estima, respeito e

boa vontade, uma vez que não se tende a percebê-los como ameaça, e que o

autorrespeito é a base do respeito pelo outro. Enfim, a autoestima elevada é a base

para a felicidade pessoal. Para Barreto (1987) os olhos:

[…] são janelas do corpo e, junto com a totalidade do rosto, têm um significado muito especial, quando se trata de auto-estima. Olhar de frente é responder por si mesmo, ser responsável. Os olhos expressam vida ou morte, excitação ou passividade, ternura ou desprezo. Os olhos são portas da auto-estima. (BARRETO, 1987, p. 11 apud ESCLARÍN, 2006, p. 57)

Todo educador deve conduzir o aluno para alcançar a verdadeira realização,

pois consegue promover o conceito positivo e o respeito a seus diferentes ritmos de

aprendizagem para que readquiram a confiança na capacidade de aprender, sendo

que uma pessoa só se sente motivada quando se vê como indivíduo participante ou

até encontrar-se como ser humano. É a partir daí que consegue se tornar capaz de

enfrentar os desafios da sua vida com mais êxito.

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Assumir o compromisso com a aprendizagem desses alunos jovens e adultos

com diferentes ritmos de aprendizagem remete a um empenho, a uma revisão da

ação docente do que é realmente necessário

assegurar nesta retomada do percurso, estruturando uma proposta pedagógica

significativa e relevante que recomponha, mediante aprendizagens bem sucedidas,

o autoconceito positivo e confiança desses alunos na escola, na própria capacidade

de aprender, sendo condições básicas para continuarem os estudos com chances de

sucesso.

Estudou-se também os dois últimos temas descritos abaixo, levando em

consideração que assumir o compromisso com o ensino-aprendizagem de alunos

em desvantagem implica empenhar-se na revisão do que realmente é indispensável,

que é de acreditar que todos os alunos são capazes de aprender, é imprescindível

que os professores e a escola como um todo, olhem para os alunos sem atribuir-lhes

rótulos ou classificações prévias, mas o entusiasmo e confiança que trazem consigo.

É necessário que se leve em consideração a ”essência humana” como ser

original e autêntico, atento, desvincular o “eu interior” e olhar para os alunos com

uma visão de entusiasmo, procurando seus pontos fortes, acolhendo-os em suas

dificuldades, olhar ao redor para perceber as particularidades de cada um, visando

auxiliá-los no processo de aprendizagem e principalmente no resgate de valores

intrínsecos a cada indivíduo.

O professor como protagonista na formação de cidadãos deve ter um olhar

mais atento e solidário para conhecer melhor o aluno com se convive, baseado na

igualdade e dignidade humana, buscando alternativas para s solução de problemas

que enfrenta no dia a dia dentro da escola, bem como conhecer seus sentimentos,

emoções e aspirações, relacionando-as com sua realidade, conhecimentos e valores

humanos e éticos.

Quando o aluno reconhece o valor da solidariedade na sua relação com o

professor, o mesmo poderá desenvolver o compromisso e a responsabilidade em

suas ações, tanto internas quanto externas ao ambiente escolar, pois parafraseando

com Antonio Pérez Esclarín, precisa-se, afinal, de Mestres. Pessoas orgulhosas e

felizes de serem mestres, que assumem sua profissão como uma tarefa

humanizadora, vivificante, capazes de refletir que se concebem como educadores de

valores determinados, de uma forma de ser e de sentir.

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2.5 A essência humana na EJA: Um despertar para se humanizar

Falar sobre a essência humana é algo complexo, porém necessário. Perante

o mundo em que se vive com tantos problemas de violência, drogas, álcool, sexo

descompromissado, meios de comunicação descarregando informações negativas,

banais, precisa-se com urgência despertar o olhar para que não se afastem os

conhecimentos verdadeiros de sabedoria, que permitem adquirir um maior

compromisso em não deixar passar despercebida a nobreza, que é uma

característica da essência humana.

O capitalismo mal interpretado que está tomando conta da sociedade atual,

que desenraíza, brutaliza, leva as pessoas para um consumo desenfreado, toma

conta das pessoas e dessa forma o cientificismo positivista, marcado pelo

determinismo científico, fez prevalecer as ciências exatas sobre as ciências

humanas, favorecendo o aparecimento de uma cultura extremamente racionalista,

mecanicista e materialista, que gera homens insensíveis, calculistas, individualistas,

com predomínio da razão sobre os valores morais e éticos.

Os educadores tem que despertar para uma visão de que o desenvolvimento

científico e tecnológico como expressão máxima da verdade, estimulou o homem

para um busca incansável de ter mais, de consumir, sobrepondo os valores

humanos, isto é, temporais e espirituais, o sensacionalismo e a exterioridade sobre a

interioridade e a reflexão, vem transformando as pessoas em máquinas pensantes.

Conforme Finkielkraut (1990):

No exato momento em que a técnica, através da televisão e dos computadores, parece capaz de fazer que todos os saberes penetrem em todos os lugares, a lógica do consumo destrói a cultura. A palavra permanece, mas esvaziada de qualquer idéia de formação, de abertura para o mundo e de cuidado da alma (...) Já não se trata de transformar os homens em sujeitos autônomos, mas de satisfazer seus desejos imediatos, de diverti-los ao menor preço possível. (FINKIELKRAUT, 1990, p. 128)

Isso não quer dizer que o desenvolvimento científico e tecnológico não sejam

importantes, mas que devem ser construídos em bases sólidas da justiça e da

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igualdade para todos.

Porém, a escola além de tratar conteúdos específicos, também é lugar

propício para anunciar a religiosidade como um espaço significativo para exprimir a

essência divina que está em cada Ser e a busca da sintonia com o contexto

cósmico, que a verdadeira experiência cristã saia do coração, da alma de todos os

educadores da EJA, e não de padrões pré-determinados por Instituições Religiosas.

Assim nas palavras de João Malheiro (2010):

Sem religião é mais fácil duvidar se vale a pena ser fiel à ética e mais difícil ver claramente o porquê de se sacrificar em determinadas situações. Há ocasiões em que os motivos de conveniência natural para agir bem são suficientes. Mas existem outras – e não são poucas – em que esses motivos humanos perdem peso em nossa mente, pela razão que seja, e é então que os motivos sobrenaturais assumem papel decisivo. Prescindir da educação religiosa, é, portanto, um grave erro dos educadores. Quando se dão conta, depois, quase sempre já é tarde. (MALHEIRO, 2010, p. 59)

Nesse contexto, o educador deve compreender que frente a toda essa

situação, a religiosidade é importante na escola, pois recupera valores e desperta

para a visão de que o homem está se robotizando, perdendo a sua dignidade

humana, que caminha para um processo de desumanização cada vez mais

crescente.

Esclarín (2002) descreve que:

Educar é ajudar cada aluno a se conhecer, a valorizar-se e a empreender com honestidade o caminho da própria realização. O único conhecimento realmente importante é o conhecimento de si mesmo: “Conheça-se, queira-se, seja você mesmo, atreva-se a viver, a amar e a ser livre”. Este deve ser o objetivo essencial de todo autêntico educador. (ESCLARÍN, 2002, p. 54)

O homem está perdendo aos poucos a visão de sua essência como pessoa,

sua totalidade do Ser, sua originalidade e autenticidade, esquecendo o potencial

interior existente. Os sistemas estão cada vez mais automatizados e menos voltados

para a humanização.

É preciso refletir sobre o significado da escola em proporcionar uma educação

voltada para o resgate dos valores que estão adormecidos dentro de cada indivíduo.

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Malheiro (2010) afirma que “Desde os tempos mais remotos, educar sempre

objetivou primeiro que o aluno seja uma pessoa humana completa, formada em suas

dimensões racionais, volitivas, afetivas e espirituais.” (Malheiro, 2010, p. 11).

Acrescenta que é preciso “Uma escola de corpo e alma. Uma escola que realmente

eduque os cidadãos que são primeiro lugar pessoas que foram criadas para serem

felizes”. (Malheiro, 2010, p. 14).

Talvez a escola hoje, lugar propício para manifestar a criatividade, a

interioridade do Ser humano, se torna causadora de encolhimentos e embaraços,

impedindo o desenvolvimento global das pessoas.

Daí a importância da escola em ajudar o aluno a se conhecer melhor, a ter um

relacionamento mais afetivo, buscando transformar as carências e fraquezas em

desafios e superação.

Caminha-se para um processo de desumanização cada vez mais crescente,

perdendo a sua dignidade de pessoa, considerando-a como objeto. Arroyo (2004)

atenta para o fato de que:

Reeducar nosso olhar, nossa sensibilidade para com os educandos e as educandas pode ser de extrema relevância na formação de um docente-educador. Pode mudar práticas e concepções, posturas a até planos de aula, de maneira tão radical que sejamos instigados(as) a aprender mais, a ler mais, a estudar como coletivos novas teorias; novas metodologias ou novas didáticas. A maneira como enxergamos pode ser determinante da maneira como lhes ensinamos e os educamos. Pode ser determinante da maneira como vemos nossa humana docência. (ARROYO, 2004, p. 62)

Abrir caminhos para a percepção transpõe a essência do outro, ver o mundo e

as pessoas além do mapa que se inventou, do muro que se traçou, na tentativa de

uma convivência mais harmoniosa e interativa. É trabalho de cada ser humano

integrar os níveis intensos de cada ser, para que haja harmonização. Dessa forma, a

escola poderá transferir valores humanos e éticos, auxiliando os jovens e adultos

com que se convive. Conforme Serrano (2002):

Os valores e as atitudes são fomentados sempre em contextos de realidade, de relação e interação da pessoa com os outros, com o meio e com a realidade em que vive. Não é algo abstrato que se aprende e que se

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incorpora conceitualmente na estrutura do conhecimento. Traduzem-se em atividades e em comportamentos concretos, comprometidos com a realidade. Mas ainda, nenhum valor efetivo pode ser vivenciado sem um envolvimento ativo. Precisa-se de espaços significativos para facilitar experiências que ajudem a descobrir, a observar e, sobretudo, a viver a essência comunitária dos valores. (SERRANO, 2002, p. 115)

A EJA deve ser um espaço que favoreça a integração do Ser, o equilíbrio

entre as reações decorridas do hemisfério direito (intuição, emoção, percepção,

sentimentos) e do hemisfério esquerdo (razão, intelecto, raciocínio), em vista à

formação do ser em sua totalidade.

Educar significa “levar a descobrir” a humanidade futura, que se acha na

“criança, jovem ou adulto”, de maneira que o indivíduo educado possa interpretar a

realidade humana.

Existe uma conscientização de um poder controlador, mas resgatar o valor de

que se é o piloto, o capitão, o comandante que controla essa viagem. E, na

proporção que exista união, solidariedade e participação, cada avanço contará para

a superação de todos os limites.

2.6 Solidariedade na EJA: Um valor essencial

Percebe-se que frente ao comportamento de determinados alunos que

procuram a EJA para retomar seus estudos, faz-se necessário de forma cuidadosa,

desenvolver nas práticas pedagógicas este tema que é de fundamental importância,

com a intenção de buscar cada vez mais colaborar com todos os envolvidos, chamar

a atenção para tornar a escola um espaço de comunidade e de companheirismo. Por

isso, esses jovens e adultos, trabalhadores em sua maioria, são todos igualmente

importantes e merecedores de apoio, de atenção, enfim dos cuidados que forem

possíveis.

Nesse contexto, é preciso ter um olhar voltado para a verdadeira realidade,

sendo que se trata de pessoas ou grupos sociais que buscam um mesmo interesse,

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a elevação do conhecimento. Portanto há necessidade de um olhar ser mais atento

e solidário, pois o homem é um ser racional e na medida em que exercer a

racionalidade poderá desenvolver suas potencialidades, uma vez que a

solidariedade se baseia na igualdade e na dignidade humana. Segundo Camps

(1990):

Não deve ser entendido como substituição do dever de justiça, pela educação na solidariedade. Trata-se de valores complementares. A solidariedade deve compensar e complementar as deficiências da justiça. A solidariedade deve ser seletiva em relação aos mais despossuídos, aos que não vêem reconhecida sua categoria de cidadão ou de pessoa. (CAMPS, 1990, p. 52, apud SERRANO, 2002, p. 99)

Dessa forma, a EJA deve ser reconhecida como um centro de aquisição de

conhecimento pela vivência de valores morais e éticos e pelo respeito aos princípios

humanos nas relações interpessoais. Deve ser concebida como uma organização

pública que em nenhuma instância deixa de medir esforços para atender as

exigências, ansiedades e angústias dos que nela buscam alternativas para a solução

de problemas, um espaço de harmonia e interação entre professores e jovens e

adultos trabalhadores, integrados pelo mesmo ideal. Ainda em Camps (1990):

É preciso afirmar que temos a obrigação de nos sentirmos solidários com todos os seres humanos e de reconhecer nossa humanidade comum. Explicar em que consiste ser solidário não significa tentar descobrir uma essência do humano, mas sim insistir na importância de ver as diferenças (raça, sexo, religião, idade) sem abdicar do “nós” que nos contém a todos. Pode-se e deve-se ser etnocêntrico, tornando cada vez mais amplo o universo comum do “nós”. A solidariedade é, em suma, uma possibilidade – e um imperativo – de modo algum contrária ao cuidado de cada um com sua própria pessoa. (CAMPS, 1990, p. 35, apud SERRANO, 2002, p. 101)

O valor da solidariedade remete-se a um compromisso, uma ação docente,

não apenas a uma declaração de intenções. Por isso, o professor entendendo que o

agente principal da escola é o aluno, deve adotar em seu dia a dia, hábitos, atitudes

e valores que busquem caminhos para a criação de alternativas na sua prática

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docente, rompendo com práticas individualistas e egoístas.

Sendo assim, o professor que adotar essa postura, está consciente da

importância da solidariedade, do compromisso na sua ação docente de criar

condições para que esses jovens e adultos apreciem as diversas formas do viver

humano, compreendendo, valorizando e percebendo que a dignidade humana não é

mera opinião, mas princípio fundamental da ética e do convívio democrático. De

acordo com a afirmação de Malheiro (2010):

Podemos afirmar que quem não tiver sendo preparado, através de uma educação global e de valores humanos, para os princípios que fortalecem a solidariedade humana, não estará sendo preparado para sobreviver num mundo que cada vez mais estaremos precisando dos outros. (MALHEIRO, 2010, p. 86)

O professor que ainda acredita, que está comprometido, tem essa importante

contribuição a dar. Enquanto não houver coragem de assumir esse desafio, não

haverá possibilidade de mudança de postura nas suas práticas pedagógicas que

ajudem esses jovens e adultos a “ser mais”.

É preciso afirmar que todos os envolvidos na escola, num esforço conjunto,

tenham uma sensibilidade maior em relação aos valores humanos e éticos, realizem

mudanças necessárias em suas práticas pedagógica, visando formar cidadãos que

busquem a transformação da sociedade para torná-la digna, justa e humana.

3 Conclusão

Ficou evidente, que o tempo destinado para esse desse trabalho foi um

momento privilegiado para todos no qual facilitou uma melhor compreensão de como

eles pensam e se sentem em sala de aula, compreender como eles enfrentam o dia

a dia da sala de aula, de como encontram o equilíbrio da autonomia escolar ou

possibilidade de decidir e controlar os processos em que estamos envolvidos, que é

condição necessária para um desenvolvimento humano de qualidade.

Ainda há muito que se fazer para poder alcançar esse objetivo, seja a médio

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ou longo prazo, mas percebe-se que se está no caminho certo. Esse tempo foi de

condição fundamental para a troca de experiências educativas, que privilegiou o

acompanhamento da prática docente que se deve estabelecer, e que o diálogo é

muito importante entre as experiências vividas e os saberes anteriormente tecidos

pelos educadores e alunos.

O referido tema teve uma importante contribuição no sentido de ajudar a

conquistar e consolidar que valorizar mais o aprendizado científico do que o ético, ou

preocupar-se apenas com o primeiro, é ignorar o que é educar integralmente e

desconhecer a intrínseca relação que existe entre o aprendizado científico e o ético.

Promove ainda a abertura, buscando que a sua comunicação com os demais

participantes da comunidade educativa seja rica em complementaridade, respeito e

serviço. Que o papel da escola não é só ensinar conteúdos, mas deve ser também o

de educar para a descoberta dos valores humanos, morais e éticos, pois, o professor

quando está em sala de aula explicando o conteúdo específico da disciplina, está

transmitindo também um modo de ser para os alunos, que é reflexo de suas

crenças, visões de mundo e virtudes.

Os professores da Educação de Jovens e Adultos, enquanto modalidade

educacional, tem como finalidade e objetivos o compromisso com a formação

humana e com o acesso à cultura geral, de modo que os alunos venham a participar

política e produtivamente das relações sociais, com compromisso ético e

compromisso político, através do desenvolvimento da autonomia intelectual e sócio-

históricos, conforme Kuenzer (2000).

Para a concretização de uma prática docente verdadeira, é necessário que

os levem à emancipação à afirmação de sua identidade cultural, e o exercício de

uma cidadania democrática, reflexo de um processo cognitivo, crítico e

emancipatório, com base em valores como respeito mútuo, solidariedade e justiça.

Tendo em vista a compreensão de que o aluno da EJA relaciona-se com

mundo do trabalho e que através deste busca melhorar a sua qualidade de vida e ter

acesso aos bens produzidos pelo homem, significa contemplar, na organização

educacional, as reflexões sobre a função do trabalho na vida humana.

Dessa forma, para a concretização da prática docente, os alunos precisam

refletir, se sensibilizar acerca do genuíno conceito do que significa e para que serve

educar, percebendo que devem colaborar, trabalhar juntos, que assumam um papel

de animador, promovendo um ambiente motivador, de confiança, de acolhida, de

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respeito, em que cada aluno se sinta estimulado em frequentar a escola.

Só os professores com autoridade moral, isto é, que se esforçam por dar

sempre bom exemplo e exigem dos seus alunos os mesmos valores e virtudes que

vivem, são capazes de compreender o verdadeiro papel da escola: formar um ser

humano que pensa e que ama. Este será sempre o critério para atuar corretamente

na sua prática docente.

Definir um bom professor depende, portanto, da riqueza de sua interioridade.

Ser um bom professor não é sinônimo de ter uma personalidade forte para persuadir

e mover os alunos a estudar. O que realmente move é a interioridade de um coração

limpo e ordenado.

No entanto, se deseja-se que a educação atinja o seu fim primordial que é o

aumento da escolaridade do ser humano, é preciso primeiramente o professor

empenhar-se em recuperar na escola aquelas atividades educativas que enriquecem

a interioridade dos alunos: a aprendizagem das virtudes dos valores morais e éticos

e da sua prática docente, inclusive a valorização dos valores religiosos, práticas que

cultive a cultura da cooperação e da solidariedade dentro e fora da escola, pois,

estes valores estão sendo deixados de lado, porquanto não sejam realidades

quantificáveis pelas ciências, pois, parece que esta visão de mundo é bastante

empobrecedora para o homem e de alguma forma ameaçadora.

É preciso que os professores estejam comprometidos em revitalizar a

sociedade, empenhados em superar, mediante a educação, a atual crise de

civilização que estamos vivendo, capazes de refletir constantemente e de aprender

permanentemente de seu fazer pedagógico. Professores preparados e dispostos a

liderar as mudanças necessárias, que se esforçam a cada dia para serem melhores

e para melhorar a educação e a sociedade.

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REFERÊNCIAS

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