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Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro Questões atuais sobre o instituto da transação penal e sua (in)constitucionalidade Paula Umbelino de Souza Albernaz Rio de Janeiro 2013

Questões atuais sobre o instituto da transação penal e sua ... · repercussão processual, obstando o processo criminal de cunho condenatório e o exercício da ação penal, traz

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Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro

Questotildees atuais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal e

sua (in)constitucionalidade

Paula Umbelino de Souza Albernaz

Rio de Janeiro

2013

PAULA UMBELINO DE SOUZA ALBERNAZ

Questotildees atuais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal e

sua (in)constitucionalidade

Artigo Cientiacutefico apresentado como exigecircncia de conclusatildeo de Curso de Poacutes-Graduaccedilatildeo Lato Sensu da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro Professores Orientadores Mocircnica Areal Neacuteli Luiza C Fetzner Nelson C Tavares Junior

Rio de Janeiro 2013

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Questotildees atuais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal e

sua (in)constitucionalidade

Paula Umbelino de Souza Albernaz

Graduada pela Pontifiacutecia Universidade

Catoacutelica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Advogada

Resumo O presente artigo analisa o instituto da Transaccedilatildeo Penal introduzido no ordenamento juriacutedico nacional por meio da Lei 909995 que instituiu e regulamentou os Juizados Especiais Ciacuteveis e Criminais previstos na Constituiccedilatildeo Federal Aprofundando o estudo doutrinaacuterio e junsprudencial sobre o tema busca-se avaliar o conceito requisitos e a constitucionalidade ou natildeo da transaccedilatildeo penal bem como abordar as questotildees atuais relativas ao respectivo instituto Em especial sobre a possibilidade de transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada em razatildeo da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da disponibilidade e da oportunidade Por fim restou apontado que embora o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal o requisito da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo pode ser considerado inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

Palavras-chave Transaccedilatildeo penal juizados especiais penas alternativas constitucionalidade

Sumaacuterio Instroduccedilatildeo 1 Linhas gerais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal 2 A (in) constitucionalidade da transaccedilatildeo penal 3 Anaacutelise dos atuais entendimentos jurisprudenciais sobre o tema Conclusatildeo Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

O trabalho ora proposto tem como objetivo analisar o instituto da transaccedilatildeo penal a sua

constitucionalidade ou natildeo bem como abordar os atuais entendimentos jurisprudenciais sobre o

tema

A Lei nordm 909995 foi fruto de uma ideologia inspirada no Movimento da Nova Defesa

Social que busca em siacutentese a humanizaccedilatildeo da atividade punitiva com ecircnfase na socializaccedilatildeo

do preso e na despenalizaccedilatildeo

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Isto porque diante da constataccedilatildeo que a prisatildeo dificilmente socializa o condenado e a

necessidade de o Estado investir seus recursos materiais no combate aos crimes que efetivamente

chocam a sociedade se buscou distinguir a partir da natureza do delito em foco os infratores

verdadeiramente temiacuteveis dos criminosos de pequena e meacutedia periculosidade dando a estes

uacuteltimos a despenalizaccedilatildeo em grau proporcional ao crime praticado

Assim a transaccedilatildeo penal bem como outros instrumentos despenalizantes como a

suspensatildeo condicional do processo disciplinados na Lei nordm 909995 satildeo exemplos da ldquoondardquo

despenalizante positivada no ordenamento juriacutedico brasileiro

Com o passar do tempo o rol de crimes sujeitos agrave aplicaccedilatildeo de penas alternativas foram

ampliados A tiacutetulo exemplificativo cite-se a lei nordm 1025901 que ao dispor sobre os Juizados

Especiais Criminais Federais alargou o elenco dos crimes de menor potencial ofensivo

ampliando significativamente o campo da incidecircncia da transaccedilatildeo penal

O presente trabalho pretende aprofundar o estudo sobre a transaccedilatildeo penal instituiacuteda pela

Lei 909995 conceituando-o e apresentando em breve resumo seus principais elementos

caracteriacutesticas e pressupostos

Delimitadas essas premissas iniciais conveacutem apreciar a constitucionalidade ou natildeo da

transaccedilatildeo penal Ou seja apoacutes a fixaccedilatildeo de linhas gerais sobre o respectivo instituto seraacute possiacutevel

aquilatar com seguranccedila se esta coaduna ou natildeo agrave Constituiccedilatildeo Federal ressaltando as principais

criacuteticas e respostas apresentadas pela doutrina e jurisprudecircncia

Posteriormente seraacute demonstrado que o referido instituto tem sido empregado muito

aqueacutem de suas possibilidades eacute mal compreendido e pouco considerado em sua importacircncia E

justamente em razatildeo de sua complexidade eacute que haacute inuacutemeras controveacutersias atinentes agrave transaccedilatildeo

penal

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Por fim seratildeo abordados os atuais entendimentos jurisprudenciais acerca do tema

demonstrando assim que a transaccedilatildeo penal como medida despenalizadora ainda estaacute longe de ser

um instituto paciacutefico do ordenamento juriacutedico brasileiro

1 LINHAS GERAIS SOBRE O INSTITUTO DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

A transaccedilatildeo penal consiste em linhas gerais num acordo entabulado entre o Ministeacuterio

Puacuteblico e o autuado no qual o primeiro propotildee ao segundo a aplicaccedilatildeo imediata de uma pena

pecuniaacuteria ou restritiva de direitos Aceita a sanccedilatildeo pelo pretenso autor do fato devidamente

assistido por um defensor o magistrado homologa por sentenccedila a avenccedila impondo-lhe a

reprimenda ajustada

Como se vecirc do conceito acima a medida cuja previsatildeo legal estaacute no art 76 caput e sectsect 3ordm

e 4ordm da Lei 909995 decorre de um ato eminentemente negocial ndash daiacute o nome transaccedilatildeo ndash entre a

acusaccedilatildeo e a defesa onde esta uacuteltima sem reconhecer a procedecircncia da acusaccedilatildeo que lhe eacute feita

aceita submeter-se a uma pena restritiva de direitos ou a uma multa livrando-se do desconforto

do processo e suas consequumlecircncias incertas Cabe ressaltar que o uacutenico ocircnus imposto ao autuado

traduz-se na impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal nos proacuteximos 05 anos

Pode-se dizer que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto pois embora apresente niacutetida

repercussatildeo processual obstando o processo criminal de cunho condenatoacuterio e o exerciacutecio da

accedilatildeo penal traz implicaccedilotildees de ordem penal como a preservaccedilatildeo do estado de inocecircncia do

autuado bem como a conservaccedilatildeo da primariedade e bons antecedentes

Quando da ediccedilatildeo da Lei nordm 909995 houve grande discussatildeo acerca da amplitude dos

institutos despenalizantes sendo que de acordo com o entendimento amplamente majoritaacuterio da

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doutrina os institutos despenalizantes previstos na referida lei quais sejam a composiccedilatildeo ciacutevel

dos danos e a transaccedilatildeo penal abarcariam qualquer infraccedilatildeo apenada ateacute 01 (um) ano tivesse ou

natildeo rito especial Neste sentido posicionaram-se dentre outros Ada Pellegrini Grinover

Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes 1 e Damaacutesio

Evangelista de Jesus2

Posteriormente com o advento da Lei nordm 1025901 que instituiu os Juizados Especiais

Ciacuteveis e Criminais no acircmbito da Justiccedila Federal no seu art 2ordm paraacutegrafo uacutenico definiu-se as

infraccedilotildees de menor potencial ofensivo como sendo os crimes a que a lei comine pena maacutexima

natildeo superior a dois anos ou multa

Tendo em vista que o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico natildeo fez alusatildeo agraves contravenccedilotildees penais

entende-se que na realidade o art 61 da Lei nordm 909995 foi derrogado e natildeo ab-rogado pelo art

2ordm paraacutegrafo uacutenico da lei nordm 1025901 pois seu comando permanece em vigor em relaccedilatildeo agrave

contravenccedilotildees

Assim atento agrave presunccedilatildeo de constitucionalidade das aludidas leis admite-se atualmente

que o novo conceito de infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo previsto no art 2ordm paraacutegrafo uacutenico

da Lei nordm 1025901 estende-se aos Juizados Especiais Criminais Estaduais derrogando por

conseguinte o art 61 da Lei nordm 909995

No que tange ainda ao conceito de transaccedilatildeo penal haacute um dissenso na doutrina se seria a

transaccedilatildeo uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica feita pelo Parquet ou uma fase preacute-

processual

1 Ver GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47 2 JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

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Para a imensa maioria dos doutrinadores tais como Paulo Rangel 3 Fernando Capez4

Tourinho Filho5 a concessatildeo da transaccedilatildeo penal se daacute numa fase ainda preacute-processual sendo

portanto um instrumento mitigador da obrigatoriedade da accedilatildeo penal puacuteblica Isto porque em se

tratando de crimes de menor potencial ofensivo ainda que presentes as condiccedilotildees para o regular

exerciacutecio da accedilatildeo penal o que tornaria obrigatoacuterio o oferecimento da denuacutencia esta poderaacute natildeo

ser proposta em prol de uma soluccedilatildeo consensual entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autuado

Partindo desta premissa outra indagaccedilatildeo vem agrave tona como eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo

imeditada de uma ldquopenardquo ainda que natildeo privativa de liberdade nos moldes do art 76 caput da

Lei nordm 909995 sem a existecircncia preacutevia de um processo

A doutrina em sua expressiva maioria entende que natildeo haveria inconstitucionalidade

alguma Entendem os professores Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho e

Luiz Flaacutevio Gomes que com base no art 98 I da CRFB88 a transaccedilatildeo penal teria matiz

constitucional tal qual o princiacutepio do devido processo legal (art 50 LIV) Logo seria uma

exceccedilatildeo constitucionalmente prevista ao princiacutepio segundo o qual ningueacutem pode ser condenado

sem o devido processo legal Tampouco haveria violaccedilatildeo agrave ampla defesa uma vez que a

aceitaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal exige a anuecircncia do defensor do autuado nos termos do art 76 sect3ordm

da Lei 909995

Outro argumento que reforccedila o fato de a transaccedilatildeo penal ser mero procedimento preacute-

processual eacute a proacutepria literalidade do art 76 caput da Lei nordm 909995 Ao disciplinar a transaccedilatildeo

penal a referida lei natildeo se reporta ao autuado como ldquoreacuteurdquo ou ldquoacusadordquo e sim como ldquoautor do

fatordquo

3 RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369 4 CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528 5 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

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Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

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De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

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forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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PAULA UMBELINO DE SOUZA ALBERNAZ

Questotildees atuais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal e

sua (in)constitucionalidade

Artigo Cientiacutefico apresentado como exigecircncia de conclusatildeo de Curso de Poacutes-Graduaccedilatildeo Lato Sensu da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro Professores Orientadores Mocircnica Areal Neacuteli Luiza C Fetzner Nelson C Tavares Junior

Rio de Janeiro 2013

2

Questotildees atuais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal e

sua (in)constitucionalidade

Paula Umbelino de Souza Albernaz

Graduada pela Pontifiacutecia Universidade

Catoacutelica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Advogada

Resumo O presente artigo analisa o instituto da Transaccedilatildeo Penal introduzido no ordenamento juriacutedico nacional por meio da Lei 909995 que instituiu e regulamentou os Juizados Especiais Ciacuteveis e Criminais previstos na Constituiccedilatildeo Federal Aprofundando o estudo doutrinaacuterio e junsprudencial sobre o tema busca-se avaliar o conceito requisitos e a constitucionalidade ou natildeo da transaccedilatildeo penal bem como abordar as questotildees atuais relativas ao respectivo instituto Em especial sobre a possibilidade de transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada em razatildeo da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da disponibilidade e da oportunidade Por fim restou apontado que embora o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal o requisito da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo pode ser considerado inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

Palavras-chave Transaccedilatildeo penal juizados especiais penas alternativas constitucionalidade

Sumaacuterio Instroduccedilatildeo 1 Linhas gerais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal 2 A (in) constitucionalidade da transaccedilatildeo penal 3 Anaacutelise dos atuais entendimentos jurisprudenciais sobre o tema Conclusatildeo Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

O trabalho ora proposto tem como objetivo analisar o instituto da transaccedilatildeo penal a sua

constitucionalidade ou natildeo bem como abordar os atuais entendimentos jurisprudenciais sobre o

tema

A Lei nordm 909995 foi fruto de uma ideologia inspirada no Movimento da Nova Defesa

Social que busca em siacutentese a humanizaccedilatildeo da atividade punitiva com ecircnfase na socializaccedilatildeo

do preso e na despenalizaccedilatildeo

3

Isto porque diante da constataccedilatildeo que a prisatildeo dificilmente socializa o condenado e a

necessidade de o Estado investir seus recursos materiais no combate aos crimes que efetivamente

chocam a sociedade se buscou distinguir a partir da natureza do delito em foco os infratores

verdadeiramente temiacuteveis dos criminosos de pequena e meacutedia periculosidade dando a estes

uacuteltimos a despenalizaccedilatildeo em grau proporcional ao crime praticado

Assim a transaccedilatildeo penal bem como outros instrumentos despenalizantes como a

suspensatildeo condicional do processo disciplinados na Lei nordm 909995 satildeo exemplos da ldquoondardquo

despenalizante positivada no ordenamento juriacutedico brasileiro

Com o passar do tempo o rol de crimes sujeitos agrave aplicaccedilatildeo de penas alternativas foram

ampliados A tiacutetulo exemplificativo cite-se a lei nordm 1025901 que ao dispor sobre os Juizados

Especiais Criminais Federais alargou o elenco dos crimes de menor potencial ofensivo

ampliando significativamente o campo da incidecircncia da transaccedilatildeo penal

O presente trabalho pretende aprofundar o estudo sobre a transaccedilatildeo penal instituiacuteda pela

Lei 909995 conceituando-o e apresentando em breve resumo seus principais elementos

caracteriacutesticas e pressupostos

Delimitadas essas premissas iniciais conveacutem apreciar a constitucionalidade ou natildeo da

transaccedilatildeo penal Ou seja apoacutes a fixaccedilatildeo de linhas gerais sobre o respectivo instituto seraacute possiacutevel

aquilatar com seguranccedila se esta coaduna ou natildeo agrave Constituiccedilatildeo Federal ressaltando as principais

criacuteticas e respostas apresentadas pela doutrina e jurisprudecircncia

Posteriormente seraacute demonstrado que o referido instituto tem sido empregado muito

aqueacutem de suas possibilidades eacute mal compreendido e pouco considerado em sua importacircncia E

justamente em razatildeo de sua complexidade eacute que haacute inuacutemeras controveacutersias atinentes agrave transaccedilatildeo

penal

4

Por fim seratildeo abordados os atuais entendimentos jurisprudenciais acerca do tema

demonstrando assim que a transaccedilatildeo penal como medida despenalizadora ainda estaacute longe de ser

um instituto paciacutefico do ordenamento juriacutedico brasileiro

1 LINHAS GERAIS SOBRE O INSTITUTO DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

A transaccedilatildeo penal consiste em linhas gerais num acordo entabulado entre o Ministeacuterio

Puacuteblico e o autuado no qual o primeiro propotildee ao segundo a aplicaccedilatildeo imediata de uma pena

pecuniaacuteria ou restritiva de direitos Aceita a sanccedilatildeo pelo pretenso autor do fato devidamente

assistido por um defensor o magistrado homologa por sentenccedila a avenccedila impondo-lhe a

reprimenda ajustada

Como se vecirc do conceito acima a medida cuja previsatildeo legal estaacute no art 76 caput e sectsect 3ordm

e 4ordm da Lei 909995 decorre de um ato eminentemente negocial ndash daiacute o nome transaccedilatildeo ndash entre a

acusaccedilatildeo e a defesa onde esta uacuteltima sem reconhecer a procedecircncia da acusaccedilatildeo que lhe eacute feita

aceita submeter-se a uma pena restritiva de direitos ou a uma multa livrando-se do desconforto

do processo e suas consequumlecircncias incertas Cabe ressaltar que o uacutenico ocircnus imposto ao autuado

traduz-se na impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal nos proacuteximos 05 anos

Pode-se dizer que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto pois embora apresente niacutetida

repercussatildeo processual obstando o processo criminal de cunho condenatoacuterio e o exerciacutecio da

accedilatildeo penal traz implicaccedilotildees de ordem penal como a preservaccedilatildeo do estado de inocecircncia do

autuado bem como a conservaccedilatildeo da primariedade e bons antecedentes

Quando da ediccedilatildeo da Lei nordm 909995 houve grande discussatildeo acerca da amplitude dos

institutos despenalizantes sendo que de acordo com o entendimento amplamente majoritaacuterio da

5

doutrina os institutos despenalizantes previstos na referida lei quais sejam a composiccedilatildeo ciacutevel

dos danos e a transaccedilatildeo penal abarcariam qualquer infraccedilatildeo apenada ateacute 01 (um) ano tivesse ou

natildeo rito especial Neste sentido posicionaram-se dentre outros Ada Pellegrini Grinover

Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes 1 e Damaacutesio

Evangelista de Jesus2

Posteriormente com o advento da Lei nordm 1025901 que instituiu os Juizados Especiais

Ciacuteveis e Criminais no acircmbito da Justiccedila Federal no seu art 2ordm paraacutegrafo uacutenico definiu-se as

infraccedilotildees de menor potencial ofensivo como sendo os crimes a que a lei comine pena maacutexima

natildeo superior a dois anos ou multa

Tendo em vista que o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico natildeo fez alusatildeo agraves contravenccedilotildees penais

entende-se que na realidade o art 61 da Lei nordm 909995 foi derrogado e natildeo ab-rogado pelo art

2ordm paraacutegrafo uacutenico da lei nordm 1025901 pois seu comando permanece em vigor em relaccedilatildeo agrave

contravenccedilotildees

Assim atento agrave presunccedilatildeo de constitucionalidade das aludidas leis admite-se atualmente

que o novo conceito de infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo previsto no art 2ordm paraacutegrafo uacutenico

da Lei nordm 1025901 estende-se aos Juizados Especiais Criminais Estaduais derrogando por

conseguinte o art 61 da Lei nordm 909995

No que tange ainda ao conceito de transaccedilatildeo penal haacute um dissenso na doutrina se seria a

transaccedilatildeo uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica feita pelo Parquet ou uma fase preacute-

processual

1 Ver GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47 2 JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

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Para a imensa maioria dos doutrinadores tais como Paulo Rangel 3 Fernando Capez4

Tourinho Filho5 a concessatildeo da transaccedilatildeo penal se daacute numa fase ainda preacute-processual sendo

portanto um instrumento mitigador da obrigatoriedade da accedilatildeo penal puacuteblica Isto porque em se

tratando de crimes de menor potencial ofensivo ainda que presentes as condiccedilotildees para o regular

exerciacutecio da accedilatildeo penal o que tornaria obrigatoacuterio o oferecimento da denuacutencia esta poderaacute natildeo

ser proposta em prol de uma soluccedilatildeo consensual entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autuado

Partindo desta premissa outra indagaccedilatildeo vem agrave tona como eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo

imeditada de uma ldquopenardquo ainda que natildeo privativa de liberdade nos moldes do art 76 caput da

Lei nordm 909995 sem a existecircncia preacutevia de um processo

A doutrina em sua expressiva maioria entende que natildeo haveria inconstitucionalidade

alguma Entendem os professores Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho e

Luiz Flaacutevio Gomes que com base no art 98 I da CRFB88 a transaccedilatildeo penal teria matiz

constitucional tal qual o princiacutepio do devido processo legal (art 50 LIV) Logo seria uma

exceccedilatildeo constitucionalmente prevista ao princiacutepio segundo o qual ningueacutem pode ser condenado

sem o devido processo legal Tampouco haveria violaccedilatildeo agrave ampla defesa uma vez que a

aceitaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal exige a anuecircncia do defensor do autuado nos termos do art 76 sect3ordm

da Lei 909995

Outro argumento que reforccedila o fato de a transaccedilatildeo penal ser mero procedimento preacute-

processual eacute a proacutepria literalidade do art 76 caput da Lei nordm 909995 Ao disciplinar a transaccedilatildeo

penal a referida lei natildeo se reporta ao autuado como ldquoreacuteurdquo ou ldquoacusadordquo e sim como ldquoautor do

fatordquo

3 RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369 4 CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528 5 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

7

Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

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De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

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forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

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pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

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Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

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Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

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[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

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Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

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Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

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Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

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instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

2

Questotildees atuais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal e

sua (in)constitucionalidade

Paula Umbelino de Souza Albernaz

Graduada pela Pontifiacutecia Universidade

Catoacutelica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Advogada

Resumo O presente artigo analisa o instituto da Transaccedilatildeo Penal introduzido no ordenamento juriacutedico nacional por meio da Lei 909995 que instituiu e regulamentou os Juizados Especiais Ciacuteveis e Criminais previstos na Constituiccedilatildeo Federal Aprofundando o estudo doutrinaacuterio e junsprudencial sobre o tema busca-se avaliar o conceito requisitos e a constitucionalidade ou natildeo da transaccedilatildeo penal bem como abordar as questotildees atuais relativas ao respectivo instituto Em especial sobre a possibilidade de transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada em razatildeo da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da disponibilidade e da oportunidade Por fim restou apontado que embora o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal o requisito da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo pode ser considerado inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

Palavras-chave Transaccedilatildeo penal juizados especiais penas alternativas constitucionalidade

Sumaacuterio Instroduccedilatildeo 1 Linhas gerais sobre o instituto da transaccedilatildeo penal 2 A (in) constitucionalidade da transaccedilatildeo penal 3 Anaacutelise dos atuais entendimentos jurisprudenciais sobre o tema Conclusatildeo Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

O trabalho ora proposto tem como objetivo analisar o instituto da transaccedilatildeo penal a sua

constitucionalidade ou natildeo bem como abordar os atuais entendimentos jurisprudenciais sobre o

tema

A Lei nordm 909995 foi fruto de uma ideologia inspirada no Movimento da Nova Defesa

Social que busca em siacutentese a humanizaccedilatildeo da atividade punitiva com ecircnfase na socializaccedilatildeo

do preso e na despenalizaccedilatildeo

3

Isto porque diante da constataccedilatildeo que a prisatildeo dificilmente socializa o condenado e a

necessidade de o Estado investir seus recursos materiais no combate aos crimes que efetivamente

chocam a sociedade se buscou distinguir a partir da natureza do delito em foco os infratores

verdadeiramente temiacuteveis dos criminosos de pequena e meacutedia periculosidade dando a estes

uacuteltimos a despenalizaccedilatildeo em grau proporcional ao crime praticado

Assim a transaccedilatildeo penal bem como outros instrumentos despenalizantes como a

suspensatildeo condicional do processo disciplinados na Lei nordm 909995 satildeo exemplos da ldquoondardquo

despenalizante positivada no ordenamento juriacutedico brasileiro

Com o passar do tempo o rol de crimes sujeitos agrave aplicaccedilatildeo de penas alternativas foram

ampliados A tiacutetulo exemplificativo cite-se a lei nordm 1025901 que ao dispor sobre os Juizados

Especiais Criminais Federais alargou o elenco dos crimes de menor potencial ofensivo

ampliando significativamente o campo da incidecircncia da transaccedilatildeo penal

O presente trabalho pretende aprofundar o estudo sobre a transaccedilatildeo penal instituiacuteda pela

Lei 909995 conceituando-o e apresentando em breve resumo seus principais elementos

caracteriacutesticas e pressupostos

Delimitadas essas premissas iniciais conveacutem apreciar a constitucionalidade ou natildeo da

transaccedilatildeo penal Ou seja apoacutes a fixaccedilatildeo de linhas gerais sobre o respectivo instituto seraacute possiacutevel

aquilatar com seguranccedila se esta coaduna ou natildeo agrave Constituiccedilatildeo Federal ressaltando as principais

criacuteticas e respostas apresentadas pela doutrina e jurisprudecircncia

Posteriormente seraacute demonstrado que o referido instituto tem sido empregado muito

aqueacutem de suas possibilidades eacute mal compreendido e pouco considerado em sua importacircncia E

justamente em razatildeo de sua complexidade eacute que haacute inuacutemeras controveacutersias atinentes agrave transaccedilatildeo

penal

4

Por fim seratildeo abordados os atuais entendimentos jurisprudenciais acerca do tema

demonstrando assim que a transaccedilatildeo penal como medida despenalizadora ainda estaacute longe de ser

um instituto paciacutefico do ordenamento juriacutedico brasileiro

1 LINHAS GERAIS SOBRE O INSTITUTO DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

A transaccedilatildeo penal consiste em linhas gerais num acordo entabulado entre o Ministeacuterio

Puacuteblico e o autuado no qual o primeiro propotildee ao segundo a aplicaccedilatildeo imediata de uma pena

pecuniaacuteria ou restritiva de direitos Aceita a sanccedilatildeo pelo pretenso autor do fato devidamente

assistido por um defensor o magistrado homologa por sentenccedila a avenccedila impondo-lhe a

reprimenda ajustada

Como se vecirc do conceito acima a medida cuja previsatildeo legal estaacute no art 76 caput e sectsect 3ordm

e 4ordm da Lei 909995 decorre de um ato eminentemente negocial ndash daiacute o nome transaccedilatildeo ndash entre a

acusaccedilatildeo e a defesa onde esta uacuteltima sem reconhecer a procedecircncia da acusaccedilatildeo que lhe eacute feita

aceita submeter-se a uma pena restritiva de direitos ou a uma multa livrando-se do desconforto

do processo e suas consequumlecircncias incertas Cabe ressaltar que o uacutenico ocircnus imposto ao autuado

traduz-se na impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal nos proacuteximos 05 anos

Pode-se dizer que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto pois embora apresente niacutetida

repercussatildeo processual obstando o processo criminal de cunho condenatoacuterio e o exerciacutecio da

accedilatildeo penal traz implicaccedilotildees de ordem penal como a preservaccedilatildeo do estado de inocecircncia do

autuado bem como a conservaccedilatildeo da primariedade e bons antecedentes

Quando da ediccedilatildeo da Lei nordm 909995 houve grande discussatildeo acerca da amplitude dos

institutos despenalizantes sendo que de acordo com o entendimento amplamente majoritaacuterio da

5

doutrina os institutos despenalizantes previstos na referida lei quais sejam a composiccedilatildeo ciacutevel

dos danos e a transaccedilatildeo penal abarcariam qualquer infraccedilatildeo apenada ateacute 01 (um) ano tivesse ou

natildeo rito especial Neste sentido posicionaram-se dentre outros Ada Pellegrini Grinover

Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes 1 e Damaacutesio

Evangelista de Jesus2

Posteriormente com o advento da Lei nordm 1025901 que instituiu os Juizados Especiais

Ciacuteveis e Criminais no acircmbito da Justiccedila Federal no seu art 2ordm paraacutegrafo uacutenico definiu-se as

infraccedilotildees de menor potencial ofensivo como sendo os crimes a que a lei comine pena maacutexima

natildeo superior a dois anos ou multa

Tendo em vista que o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico natildeo fez alusatildeo agraves contravenccedilotildees penais

entende-se que na realidade o art 61 da Lei nordm 909995 foi derrogado e natildeo ab-rogado pelo art

2ordm paraacutegrafo uacutenico da lei nordm 1025901 pois seu comando permanece em vigor em relaccedilatildeo agrave

contravenccedilotildees

Assim atento agrave presunccedilatildeo de constitucionalidade das aludidas leis admite-se atualmente

que o novo conceito de infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo previsto no art 2ordm paraacutegrafo uacutenico

da Lei nordm 1025901 estende-se aos Juizados Especiais Criminais Estaduais derrogando por

conseguinte o art 61 da Lei nordm 909995

No que tange ainda ao conceito de transaccedilatildeo penal haacute um dissenso na doutrina se seria a

transaccedilatildeo uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica feita pelo Parquet ou uma fase preacute-

processual

1 Ver GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47 2 JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

6

Para a imensa maioria dos doutrinadores tais como Paulo Rangel 3 Fernando Capez4

Tourinho Filho5 a concessatildeo da transaccedilatildeo penal se daacute numa fase ainda preacute-processual sendo

portanto um instrumento mitigador da obrigatoriedade da accedilatildeo penal puacuteblica Isto porque em se

tratando de crimes de menor potencial ofensivo ainda que presentes as condiccedilotildees para o regular

exerciacutecio da accedilatildeo penal o que tornaria obrigatoacuterio o oferecimento da denuacutencia esta poderaacute natildeo

ser proposta em prol de uma soluccedilatildeo consensual entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autuado

Partindo desta premissa outra indagaccedilatildeo vem agrave tona como eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo

imeditada de uma ldquopenardquo ainda que natildeo privativa de liberdade nos moldes do art 76 caput da

Lei nordm 909995 sem a existecircncia preacutevia de um processo

A doutrina em sua expressiva maioria entende que natildeo haveria inconstitucionalidade

alguma Entendem os professores Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho e

Luiz Flaacutevio Gomes que com base no art 98 I da CRFB88 a transaccedilatildeo penal teria matiz

constitucional tal qual o princiacutepio do devido processo legal (art 50 LIV) Logo seria uma

exceccedilatildeo constitucionalmente prevista ao princiacutepio segundo o qual ningueacutem pode ser condenado

sem o devido processo legal Tampouco haveria violaccedilatildeo agrave ampla defesa uma vez que a

aceitaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal exige a anuecircncia do defensor do autuado nos termos do art 76 sect3ordm

da Lei 909995

Outro argumento que reforccedila o fato de a transaccedilatildeo penal ser mero procedimento preacute-

processual eacute a proacutepria literalidade do art 76 caput da Lei nordm 909995 Ao disciplinar a transaccedilatildeo

penal a referida lei natildeo se reporta ao autuado como ldquoreacuteurdquo ou ldquoacusadordquo e sim como ldquoautor do

fatordquo

3 RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369 4 CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528 5 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

7

Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

8

De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

9

forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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3

Isto porque diante da constataccedilatildeo que a prisatildeo dificilmente socializa o condenado e a

necessidade de o Estado investir seus recursos materiais no combate aos crimes que efetivamente

chocam a sociedade se buscou distinguir a partir da natureza do delito em foco os infratores

verdadeiramente temiacuteveis dos criminosos de pequena e meacutedia periculosidade dando a estes

uacuteltimos a despenalizaccedilatildeo em grau proporcional ao crime praticado

Assim a transaccedilatildeo penal bem como outros instrumentos despenalizantes como a

suspensatildeo condicional do processo disciplinados na Lei nordm 909995 satildeo exemplos da ldquoondardquo

despenalizante positivada no ordenamento juriacutedico brasileiro

Com o passar do tempo o rol de crimes sujeitos agrave aplicaccedilatildeo de penas alternativas foram

ampliados A tiacutetulo exemplificativo cite-se a lei nordm 1025901 que ao dispor sobre os Juizados

Especiais Criminais Federais alargou o elenco dos crimes de menor potencial ofensivo

ampliando significativamente o campo da incidecircncia da transaccedilatildeo penal

O presente trabalho pretende aprofundar o estudo sobre a transaccedilatildeo penal instituiacuteda pela

Lei 909995 conceituando-o e apresentando em breve resumo seus principais elementos

caracteriacutesticas e pressupostos

Delimitadas essas premissas iniciais conveacutem apreciar a constitucionalidade ou natildeo da

transaccedilatildeo penal Ou seja apoacutes a fixaccedilatildeo de linhas gerais sobre o respectivo instituto seraacute possiacutevel

aquilatar com seguranccedila se esta coaduna ou natildeo agrave Constituiccedilatildeo Federal ressaltando as principais

criacuteticas e respostas apresentadas pela doutrina e jurisprudecircncia

Posteriormente seraacute demonstrado que o referido instituto tem sido empregado muito

aqueacutem de suas possibilidades eacute mal compreendido e pouco considerado em sua importacircncia E

justamente em razatildeo de sua complexidade eacute que haacute inuacutemeras controveacutersias atinentes agrave transaccedilatildeo

penal

4

Por fim seratildeo abordados os atuais entendimentos jurisprudenciais acerca do tema

demonstrando assim que a transaccedilatildeo penal como medida despenalizadora ainda estaacute longe de ser

um instituto paciacutefico do ordenamento juriacutedico brasileiro

1 LINHAS GERAIS SOBRE O INSTITUTO DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

A transaccedilatildeo penal consiste em linhas gerais num acordo entabulado entre o Ministeacuterio

Puacuteblico e o autuado no qual o primeiro propotildee ao segundo a aplicaccedilatildeo imediata de uma pena

pecuniaacuteria ou restritiva de direitos Aceita a sanccedilatildeo pelo pretenso autor do fato devidamente

assistido por um defensor o magistrado homologa por sentenccedila a avenccedila impondo-lhe a

reprimenda ajustada

Como se vecirc do conceito acima a medida cuja previsatildeo legal estaacute no art 76 caput e sectsect 3ordm

e 4ordm da Lei 909995 decorre de um ato eminentemente negocial ndash daiacute o nome transaccedilatildeo ndash entre a

acusaccedilatildeo e a defesa onde esta uacuteltima sem reconhecer a procedecircncia da acusaccedilatildeo que lhe eacute feita

aceita submeter-se a uma pena restritiva de direitos ou a uma multa livrando-se do desconforto

do processo e suas consequumlecircncias incertas Cabe ressaltar que o uacutenico ocircnus imposto ao autuado

traduz-se na impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal nos proacuteximos 05 anos

Pode-se dizer que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto pois embora apresente niacutetida

repercussatildeo processual obstando o processo criminal de cunho condenatoacuterio e o exerciacutecio da

accedilatildeo penal traz implicaccedilotildees de ordem penal como a preservaccedilatildeo do estado de inocecircncia do

autuado bem como a conservaccedilatildeo da primariedade e bons antecedentes

Quando da ediccedilatildeo da Lei nordm 909995 houve grande discussatildeo acerca da amplitude dos

institutos despenalizantes sendo que de acordo com o entendimento amplamente majoritaacuterio da

5

doutrina os institutos despenalizantes previstos na referida lei quais sejam a composiccedilatildeo ciacutevel

dos danos e a transaccedilatildeo penal abarcariam qualquer infraccedilatildeo apenada ateacute 01 (um) ano tivesse ou

natildeo rito especial Neste sentido posicionaram-se dentre outros Ada Pellegrini Grinover

Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes 1 e Damaacutesio

Evangelista de Jesus2

Posteriormente com o advento da Lei nordm 1025901 que instituiu os Juizados Especiais

Ciacuteveis e Criminais no acircmbito da Justiccedila Federal no seu art 2ordm paraacutegrafo uacutenico definiu-se as

infraccedilotildees de menor potencial ofensivo como sendo os crimes a que a lei comine pena maacutexima

natildeo superior a dois anos ou multa

Tendo em vista que o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico natildeo fez alusatildeo agraves contravenccedilotildees penais

entende-se que na realidade o art 61 da Lei nordm 909995 foi derrogado e natildeo ab-rogado pelo art

2ordm paraacutegrafo uacutenico da lei nordm 1025901 pois seu comando permanece em vigor em relaccedilatildeo agrave

contravenccedilotildees

Assim atento agrave presunccedilatildeo de constitucionalidade das aludidas leis admite-se atualmente

que o novo conceito de infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo previsto no art 2ordm paraacutegrafo uacutenico

da Lei nordm 1025901 estende-se aos Juizados Especiais Criminais Estaduais derrogando por

conseguinte o art 61 da Lei nordm 909995

No que tange ainda ao conceito de transaccedilatildeo penal haacute um dissenso na doutrina se seria a

transaccedilatildeo uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica feita pelo Parquet ou uma fase preacute-

processual

1 Ver GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47 2 JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

6

Para a imensa maioria dos doutrinadores tais como Paulo Rangel 3 Fernando Capez4

Tourinho Filho5 a concessatildeo da transaccedilatildeo penal se daacute numa fase ainda preacute-processual sendo

portanto um instrumento mitigador da obrigatoriedade da accedilatildeo penal puacuteblica Isto porque em se

tratando de crimes de menor potencial ofensivo ainda que presentes as condiccedilotildees para o regular

exerciacutecio da accedilatildeo penal o que tornaria obrigatoacuterio o oferecimento da denuacutencia esta poderaacute natildeo

ser proposta em prol de uma soluccedilatildeo consensual entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autuado

Partindo desta premissa outra indagaccedilatildeo vem agrave tona como eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo

imeditada de uma ldquopenardquo ainda que natildeo privativa de liberdade nos moldes do art 76 caput da

Lei nordm 909995 sem a existecircncia preacutevia de um processo

A doutrina em sua expressiva maioria entende que natildeo haveria inconstitucionalidade

alguma Entendem os professores Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho e

Luiz Flaacutevio Gomes que com base no art 98 I da CRFB88 a transaccedilatildeo penal teria matiz

constitucional tal qual o princiacutepio do devido processo legal (art 50 LIV) Logo seria uma

exceccedilatildeo constitucionalmente prevista ao princiacutepio segundo o qual ningueacutem pode ser condenado

sem o devido processo legal Tampouco haveria violaccedilatildeo agrave ampla defesa uma vez que a

aceitaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal exige a anuecircncia do defensor do autuado nos termos do art 76 sect3ordm

da Lei 909995

Outro argumento que reforccedila o fato de a transaccedilatildeo penal ser mero procedimento preacute-

processual eacute a proacutepria literalidade do art 76 caput da Lei nordm 909995 Ao disciplinar a transaccedilatildeo

penal a referida lei natildeo se reporta ao autuado como ldquoreacuteurdquo ou ldquoacusadordquo e sim como ldquoautor do

fatordquo

3 RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369 4 CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528 5 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

7

Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

8

De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

9

forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

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instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

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MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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4

Por fim seratildeo abordados os atuais entendimentos jurisprudenciais acerca do tema

demonstrando assim que a transaccedilatildeo penal como medida despenalizadora ainda estaacute longe de ser

um instituto paciacutefico do ordenamento juriacutedico brasileiro

1 LINHAS GERAIS SOBRE O INSTITUTO DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

A transaccedilatildeo penal consiste em linhas gerais num acordo entabulado entre o Ministeacuterio

Puacuteblico e o autuado no qual o primeiro propotildee ao segundo a aplicaccedilatildeo imediata de uma pena

pecuniaacuteria ou restritiva de direitos Aceita a sanccedilatildeo pelo pretenso autor do fato devidamente

assistido por um defensor o magistrado homologa por sentenccedila a avenccedila impondo-lhe a

reprimenda ajustada

Como se vecirc do conceito acima a medida cuja previsatildeo legal estaacute no art 76 caput e sectsect 3ordm

e 4ordm da Lei 909995 decorre de um ato eminentemente negocial ndash daiacute o nome transaccedilatildeo ndash entre a

acusaccedilatildeo e a defesa onde esta uacuteltima sem reconhecer a procedecircncia da acusaccedilatildeo que lhe eacute feita

aceita submeter-se a uma pena restritiva de direitos ou a uma multa livrando-se do desconforto

do processo e suas consequumlecircncias incertas Cabe ressaltar que o uacutenico ocircnus imposto ao autuado

traduz-se na impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal nos proacuteximos 05 anos

Pode-se dizer que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto pois embora apresente niacutetida

repercussatildeo processual obstando o processo criminal de cunho condenatoacuterio e o exerciacutecio da

accedilatildeo penal traz implicaccedilotildees de ordem penal como a preservaccedilatildeo do estado de inocecircncia do

autuado bem como a conservaccedilatildeo da primariedade e bons antecedentes

Quando da ediccedilatildeo da Lei nordm 909995 houve grande discussatildeo acerca da amplitude dos

institutos despenalizantes sendo que de acordo com o entendimento amplamente majoritaacuterio da

5

doutrina os institutos despenalizantes previstos na referida lei quais sejam a composiccedilatildeo ciacutevel

dos danos e a transaccedilatildeo penal abarcariam qualquer infraccedilatildeo apenada ateacute 01 (um) ano tivesse ou

natildeo rito especial Neste sentido posicionaram-se dentre outros Ada Pellegrini Grinover

Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes 1 e Damaacutesio

Evangelista de Jesus2

Posteriormente com o advento da Lei nordm 1025901 que instituiu os Juizados Especiais

Ciacuteveis e Criminais no acircmbito da Justiccedila Federal no seu art 2ordm paraacutegrafo uacutenico definiu-se as

infraccedilotildees de menor potencial ofensivo como sendo os crimes a que a lei comine pena maacutexima

natildeo superior a dois anos ou multa

Tendo em vista que o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico natildeo fez alusatildeo agraves contravenccedilotildees penais

entende-se que na realidade o art 61 da Lei nordm 909995 foi derrogado e natildeo ab-rogado pelo art

2ordm paraacutegrafo uacutenico da lei nordm 1025901 pois seu comando permanece em vigor em relaccedilatildeo agrave

contravenccedilotildees

Assim atento agrave presunccedilatildeo de constitucionalidade das aludidas leis admite-se atualmente

que o novo conceito de infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo previsto no art 2ordm paraacutegrafo uacutenico

da Lei nordm 1025901 estende-se aos Juizados Especiais Criminais Estaduais derrogando por

conseguinte o art 61 da Lei nordm 909995

No que tange ainda ao conceito de transaccedilatildeo penal haacute um dissenso na doutrina se seria a

transaccedilatildeo uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica feita pelo Parquet ou uma fase preacute-

processual

1 Ver GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47 2 JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

6

Para a imensa maioria dos doutrinadores tais como Paulo Rangel 3 Fernando Capez4

Tourinho Filho5 a concessatildeo da transaccedilatildeo penal se daacute numa fase ainda preacute-processual sendo

portanto um instrumento mitigador da obrigatoriedade da accedilatildeo penal puacuteblica Isto porque em se

tratando de crimes de menor potencial ofensivo ainda que presentes as condiccedilotildees para o regular

exerciacutecio da accedilatildeo penal o que tornaria obrigatoacuterio o oferecimento da denuacutencia esta poderaacute natildeo

ser proposta em prol de uma soluccedilatildeo consensual entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autuado

Partindo desta premissa outra indagaccedilatildeo vem agrave tona como eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo

imeditada de uma ldquopenardquo ainda que natildeo privativa de liberdade nos moldes do art 76 caput da

Lei nordm 909995 sem a existecircncia preacutevia de um processo

A doutrina em sua expressiva maioria entende que natildeo haveria inconstitucionalidade

alguma Entendem os professores Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho e

Luiz Flaacutevio Gomes que com base no art 98 I da CRFB88 a transaccedilatildeo penal teria matiz

constitucional tal qual o princiacutepio do devido processo legal (art 50 LIV) Logo seria uma

exceccedilatildeo constitucionalmente prevista ao princiacutepio segundo o qual ningueacutem pode ser condenado

sem o devido processo legal Tampouco haveria violaccedilatildeo agrave ampla defesa uma vez que a

aceitaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal exige a anuecircncia do defensor do autuado nos termos do art 76 sect3ordm

da Lei 909995

Outro argumento que reforccedila o fato de a transaccedilatildeo penal ser mero procedimento preacute-

processual eacute a proacutepria literalidade do art 76 caput da Lei nordm 909995 Ao disciplinar a transaccedilatildeo

penal a referida lei natildeo se reporta ao autuado como ldquoreacuteurdquo ou ldquoacusadordquo e sim como ldquoautor do

fatordquo

3 RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369 4 CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528 5 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

7

Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

8

De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

9

forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

5

doutrina os institutos despenalizantes previstos na referida lei quais sejam a composiccedilatildeo ciacutevel

dos danos e a transaccedilatildeo penal abarcariam qualquer infraccedilatildeo apenada ateacute 01 (um) ano tivesse ou

natildeo rito especial Neste sentido posicionaram-se dentre outros Ada Pellegrini Grinover

Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes 1 e Damaacutesio

Evangelista de Jesus2

Posteriormente com o advento da Lei nordm 1025901 que instituiu os Juizados Especiais

Ciacuteveis e Criminais no acircmbito da Justiccedila Federal no seu art 2ordm paraacutegrafo uacutenico definiu-se as

infraccedilotildees de menor potencial ofensivo como sendo os crimes a que a lei comine pena maacutexima

natildeo superior a dois anos ou multa

Tendo em vista que o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico natildeo fez alusatildeo agraves contravenccedilotildees penais

entende-se que na realidade o art 61 da Lei nordm 909995 foi derrogado e natildeo ab-rogado pelo art

2ordm paraacutegrafo uacutenico da lei nordm 1025901 pois seu comando permanece em vigor em relaccedilatildeo agrave

contravenccedilotildees

Assim atento agrave presunccedilatildeo de constitucionalidade das aludidas leis admite-se atualmente

que o novo conceito de infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo previsto no art 2ordm paraacutegrafo uacutenico

da Lei nordm 1025901 estende-se aos Juizados Especiais Criminais Estaduais derrogando por

conseguinte o art 61 da Lei nordm 909995

No que tange ainda ao conceito de transaccedilatildeo penal haacute um dissenso na doutrina se seria a

transaccedilatildeo uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica feita pelo Parquet ou uma fase preacute-

processual

1 Ver GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47 2 JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

6

Para a imensa maioria dos doutrinadores tais como Paulo Rangel 3 Fernando Capez4

Tourinho Filho5 a concessatildeo da transaccedilatildeo penal se daacute numa fase ainda preacute-processual sendo

portanto um instrumento mitigador da obrigatoriedade da accedilatildeo penal puacuteblica Isto porque em se

tratando de crimes de menor potencial ofensivo ainda que presentes as condiccedilotildees para o regular

exerciacutecio da accedilatildeo penal o que tornaria obrigatoacuterio o oferecimento da denuacutencia esta poderaacute natildeo

ser proposta em prol de uma soluccedilatildeo consensual entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autuado

Partindo desta premissa outra indagaccedilatildeo vem agrave tona como eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo

imeditada de uma ldquopenardquo ainda que natildeo privativa de liberdade nos moldes do art 76 caput da

Lei nordm 909995 sem a existecircncia preacutevia de um processo

A doutrina em sua expressiva maioria entende que natildeo haveria inconstitucionalidade

alguma Entendem os professores Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho e

Luiz Flaacutevio Gomes que com base no art 98 I da CRFB88 a transaccedilatildeo penal teria matiz

constitucional tal qual o princiacutepio do devido processo legal (art 50 LIV) Logo seria uma

exceccedilatildeo constitucionalmente prevista ao princiacutepio segundo o qual ningueacutem pode ser condenado

sem o devido processo legal Tampouco haveria violaccedilatildeo agrave ampla defesa uma vez que a

aceitaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal exige a anuecircncia do defensor do autuado nos termos do art 76 sect3ordm

da Lei 909995

Outro argumento que reforccedila o fato de a transaccedilatildeo penal ser mero procedimento preacute-

processual eacute a proacutepria literalidade do art 76 caput da Lei nordm 909995 Ao disciplinar a transaccedilatildeo

penal a referida lei natildeo se reporta ao autuado como ldquoreacuteurdquo ou ldquoacusadordquo e sim como ldquoautor do

fatordquo

3 RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369 4 CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528 5 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

7

Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

8

De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

9

forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

6

Para a imensa maioria dos doutrinadores tais como Paulo Rangel 3 Fernando Capez4

Tourinho Filho5 a concessatildeo da transaccedilatildeo penal se daacute numa fase ainda preacute-processual sendo

portanto um instrumento mitigador da obrigatoriedade da accedilatildeo penal puacuteblica Isto porque em se

tratando de crimes de menor potencial ofensivo ainda que presentes as condiccedilotildees para o regular

exerciacutecio da accedilatildeo penal o que tornaria obrigatoacuterio o oferecimento da denuacutencia esta poderaacute natildeo

ser proposta em prol de uma soluccedilatildeo consensual entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autuado

Partindo desta premissa outra indagaccedilatildeo vem agrave tona como eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo

imeditada de uma ldquopenardquo ainda que natildeo privativa de liberdade nos moldes do art 76 caput da

Lei nordm 909995 sem a existecircncia preacutevia de um processo

A doutrina em sua expressiva maioria entende que natildeo haveria inconstitucionalidade

alguma Entendem os professores Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho e

Luiz Flaacutevio Gomes que com base no art 98 I da CRFB88 a transaccedilatildeo penal teria matiz

constitucional tal qual o princiacutepio do devido processo legal (art 50 LIV) Logo seria uma

exceccedilatildeo constitucionalmente prevista ao princiacutepio segundo o qual ningueacutem pode ser condenado

sem o devido processo legal Tampouco haveria violaccedilatildeo agrave ampla defesa uma vez que a

aceitaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal exige a anuecircncia do defensor do autuado nos termos do art 76 sect3ordm

da Lei 909995

Outro argumento que reforccedila o fato de a transaccedilatildeo penal ser mero procedimento preacute-

processual eacute a proacutepria literalidade do art 76 caput da Lei nordm 909995 Ao disciplinar a transaccedilatildeo

penal a referida lei natildeo se reporta ao autuado como ldquoreacuteurdquo ou ldquoacusadordquo e sim como ldquoautor do

fatordquo

3 RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369 4 CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528 5 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

7

Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

8

De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

9

forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

7

Cabe ressaltar que o Ministeacuterio Puacuteblico ao propor a transaccedilatildeo penal deveraacute provar que

estariam presentes as condiccedilotildees para o regular oferecimento da denuacutencia pois do contraacuterio

pleitearia o arquivamento E uma vez ofertada a transaccedilatildeo o acusado devidamente assistido pelo

seu defensor teria a oportunidade de se manifestar a respeito aceitando-a ou natildeo

Autores como Afracircnio Silva Jardim6 e Cezar Roberto Bitencourt7 sustentavam que a

natureza juriacutedica da sentenccedila que chancelasse a transaccedilatildeo seria condenatoacuteria poreacutem improacutepria

porquanto o juiz natildeo faz mais do que homologar um acordo de sorte que a aplicaccedilatildeo da pena

conta com o assentimento do autuado Sendo assim a condenaccedilatildeo natildeo configuraria tiacutetulo

executivo judicial pois por forccedila do Coacutedigo de Processo Civil eacute tiacutetulo executivo judicial apenas

as sentenccedilas penais condenatoacuterias proacuteprias

Entretanto haacute autores como o promotor de justiccedila Rogeacuterio Pacheco Alves 8 que se

recusam a enxergar na transaccedilatildeo penal como uma forma de exerciacutecio da accedilatildeo penal definindo-a

assim como um procedimento de jurisdiccedilatildeo voluntaacuteria

Frise-se que este entendimento estaacute em desacordo com o que fora defendido por

Carnelutti acerca da definiccedilatildeo do processo o qual dizia ser o processo um conflito de interesses

qualificado pela resistecircncia a uma pretensatildeo

Hoje a caracteriacutestica principal de um processo deixou de ser a lide e passou a ser a

pretensatildeo Ou seja somente existiraacute atividade jurisdicional onde houver pretensatildeo Como o

Estado ao ofertar a transaccedilatildeo penal natildeo exige que o autuado se submeta agrave proposta ateacute porque a

caracteriacutestica principal da transaccedilatildeo eacute exatamente o acordo entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o autor

do fato natildeo haveria pretensatildeo

6 JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354 7 BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 8rdquoTransaccedilatildeo Penal como Ato da Denominada Jurisdiccedilatildeo Voluntaacuteriardquo In Revista EMERJ Rio de Janeiro v 4 n13 2001

8

De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

9

forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

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JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

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MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

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TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

8

De acordo com este entendimento a transaccedilatildeo penal seria um procedimento de jurisdiccedilatildeo

voluntaacuteria porquanto encerraria um negoacutecio juriacutedico bilateral entre o Ministeacuterio Puacuteblico e o

autuado no qual o primeiro deixa de exercer a accedilatildeo penal aceitando o segundo a imposiccedilatildeo de

uma sanccedilatildeo administrativa Natildeo teria natureza penal pois para tanto indispensaacuteveis seriam a

propositura de uma accedilatildeo penal condenatoacuteria e por conseguinte a procedecircncia do pedido do autor

com base no princiacutepio nulla poena sine judictio e nulla poena sine culpa

Eacute importante esclarecer que embora a lei 909995 tenha denominado de ldquosentenccedilardquo a

decisatildeo que aplica a medida isto significa uma imprecisatildeo teacutecnica sendo tal decisatildeo de natureza

interlocutoacuteria mista

Resta patente que ateacute hoje haacute profunda divergecircncia doutrinaacuteria quanto ao conceito de

transaccedilatildeo penal

Prevalece o entendimento da maioria da doutrina ao enquadrar a transaccedilatildeo penal como

uma fase preacute-processual porquanto o escopo deste instituto eacute obstar o exerciacutecio da accedilatildeo penal

puacuteblica ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto

Entretanto esta mesma doutrina se equivoca ao entender que transaccedilatildeo penal teria

natureza de pena restritiva de direitos interpretando literalmente o disposto no art 76 da Lei

909995 (ldquoHavendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal puacuteblica incondicionada

natildeo sendo caso de arquivamento o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute propor a aplicaccedilatildeo imediata de

pena restritiva de direitos ou multas a ser especificada na propostardquo)

A partir do momento em que as ldquopenasrdquo aludidas pela Lei 909995 satildeo encaradas

verdadeiramente como reprimendas penais a transaccedilatildeo penal acaba consubstanciando a

aplicaccedilatildeo antecipada de uma reprimenda sem que houvesse qualquer processo preacutevio E desta

9

forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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forma fica evidente a ofensa ao princiacutepio do devido processo legal previsto no art 5ordm LIV da

Constituiccedilatildeo Federal

Assim caso o conceito de transaccedilatildeo penal seja interpretado literalmente conforme o

disposto no art 76 da Lei 909995 a inconstitucionalidade da norma torna-se patente pois fere

princiacutepios de ordem constitucional

Ademais tal entendimento traria agrave tona questotildees de suma importacircncia vislumbrando a

transaccedilatildeo como modalidade de incidecircncia imediata de uma sanccedilatildeo penal viaacutevel seria a aplicaccedilatildeo

do art 181 da Lei de Execuccedilotildees Penais ou seja seria possiacutevel a conversatildeo da ldquopenardquo restritiva de

direitos para agrave prisatildeo sem ter sido sequer o autuado processado e julgado

Frise-se que o objetivo primordial do art 98 I da Carta de 1988 foi limitar a preceituar

que o procedimento nos Juizados Especiais fosse oral e sumariacutessimo Ou seja este artigo parte da

premissa de que existiu um processo anterior

Sendo assim se a transaccedilatildeo penal fosse vista como aplicaccedilatildeo antecipada de uma pena

indispensaacutevel seraacute a existecircncia de um processo natildeo bastando um singelo procedimento

preliminar Afinal o direito penal protege o maior bem juriacutedico qual seja a liberdade do

autuado Caso natildeo se entenda desta maneira os princiacutepios da ampla defesa e do contraditoacuterio

tambeacutem ficariam violados

Eacute paciacutefico na jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores que o princiacutepio da ampla defesa natildeo

mais se contenta com a defesa meramente formal do acusado Eacute necessaacuteria uma defesa material

efetiva

Desta forma ainda que esteja prevista a intervenccedilatildeo do defensor no art 76 sect3ordm da Lei

909995 a defesa do autuado limita-se agrave aceitaccedilatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal Ou seja tal defesa

10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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10

pode ser enquadrada como meramente formal revelando-se assim um prejuiacutezo para a ampla

defesa do autuado

A fim de relativizar a necessidade de defesa material no que diz respeito agrave transaccedilatildeo

penal alguns autores entendem que a transaccedilatildeo penal autorizaria a flexibilizaccedilatildeo de certas

garantias constitucionais como a ampla defesa e o processo legal

Entretanto natildeo se recomenda tal relativizaccedilatildeo Isto porque com base no histoacuterico de

nosso paiacutes quanto ao desrespeito aos direitos humanos e reflexos de anos de ditadura as partes

que litigam no acircmbito do processo penal jaacute satildeo desiguais de um lado temos um Estado com bom

amparato promotores de justiccedila e delegados com uma excelente formaccedilatildeo profissional de outro

temos o acusado que na maioria das vezes (infelizmente) satildeo pobres negos com baixa

escolaridade

Diante da realidade brasileira flexibilizar os princiacutepios do devido processo legal do

contraditoacuterio e da ampla defesa em mateacuteria de transaccedilatildeo penal seria uma perpetuaccedilatildeo desta

desigualdade original Em outras palavras sem os referidos princiacutepios natildeo haveria a

possibilidade de o reacuteu litigar em peacute de igualdade

Por fim haacute ainda uma uacuteltima contradiccedilatildeo que eacute consequecircncia do entendimento de

grande parte da doutrina de que a transaccedilatildeo penal seria a imposiccedilatildeo antecipada de uma pena com

base no princiacutepio da natildeo culpabilidade previsto no art 5ordm LVII da Carta de 1988 eacute inconcebiacutevel

a imposiccedilatildeo de uma pena sem reconhecimento da culpa

Com base no conceito analiacutetico de crime seraacute imputado a algueacutem uma pena caso a sua

conduta tenha sido tiacutepica iliacutecita e culpaacutevel Assim caso natildeo houvesse presunccedilatildeo de culpa natildeo

seria a ele imposta uma pena

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

11

Ocorre que o instituto da transaccedilatildeo penal natildeo importa em admissatildeo de culpa O proacuteprio

art 76 sect4ordm dispocircs claramente que a transaccedilatildeo penal natildeo gera reincidecircncia e tampouco maus

antecedentes Natildeo sendo possiacutevel ostentar a natureza criminal diante da ausecircncia de culpa que eacute

elemento integrante do tipo penal natildeo eacute possiacutevel falar-se em sanccedilatildeo

Descabiacutevel portanto tratar a reprimenda decorrente de uma transaccedilatildeo como pena

propriamente dita pois natildeo haacute sanccedilatildeo criminal sem preacutevio reconhecimento de culpa Caso se

entenda diversamente haveria incompatibilidade com as garantias previstas na Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica

Diante disso vem agrave tona a seguinte questatildeo como seraacute a transaccedilatildeo uma accedilatildeo se o seu

escopo eacute exatamente evitar um processo

Para uma melhor compreensatildeo do que estaacute sendo indagado eacute importante ressaltar que a

lei 909995 apresenta um espiacuterito inegavelmente despenalizante Essa despenalizaccedilatildeo foi

regulada com a seguinte escala decrescente

1ordf) o art 74 paraacutegrafo uacutenico empresta agrave composiccedilatildeo civil dos danos entre a viacutetima e o

autor do fato efeitos penais preconizando que a homologaccedilatildeo judicial do pacto acarreta a

renuacutencia taacutecita ao direito de queixa ou de representaccedilatildeo sepultando de vez qualquer possibilidade

de exerciacutecio da accedilatildeo penal puacuteblica condicionada ou privada

2ordf) no art 76 a lei determina que embora natildeo obtida a composiccedilatildeo civil dos danos a

accedilatildeo penal puacuteblica seja condicionada ou incondicionada natildeo seraacute ajuizada embora presentes as

condiccedilotildees para tanto se o Ministeacuterio Puacuteblico formular proposta de transaccedilatildeo penal Homologada

a transaccedilatildeo penal natildeo haacute a instauraccedilatildeo de qualquer processo criminal

3ordf) Por fim o art 89 da lei 909995 cuida de etapa posterior isto eacute embora inviaacuteveis a

composiccedilatildeo civil dos danos e a transaccedilatildeo penal tendo sido ofertada a accedilatildeo penal o Miniteacuterio

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

12

Puacuteblico e o acusado poderatildeo consensualmente suspender o processo por um prazo determinado

mediante o estabelecimento de certas condiccedilotildees Uma vez aceitas e observadas as condiccedilotildees

impostas ao final do periacuteodo de suspensatildeo satildeo extintos o processo e a punibilidade conservando

o denunciado sua primariedade porquanto natildeo foi julgado

Como eacute perceptiacutevel em uacuteltima anaacutelise essas disposiccedilotildees visam a evitar que o agente seja

julgado e condenado resguardando a sua primariedade e a presunccedilatildeo de inocecircncia que milita em

seu favor

Retomando a indagaccedilatildeo feita acima se a transaccedilatildeo penal fosse uma accedilatildeo a sua

homologaccedilatildeo pelo juiz traduziria verdadeira sentenccedila penal condenatoacuteria resultando na

imposiccedilatildeo de uma sanccedilatildeo criminal ao acusado e uma vez cumprida acarreta a extinccedilatildeo da

punibilidade preservando o estado de inocecircncia do reacuteu e por conta disso a primariedade

A Lei 909995 foi coerente com a sua ratio devendo o disposto no art 76 da referida lei

em especial o termo ldquopena restritiva de direitos ou multardquo ser interpretada em conformidade com

a Constituiccedilatildeo Federal

Embora a lei se refira a ldquopenardquo eacute certo que a mens legis natildeo foi admitir a aplicaccedilatildeo

antecipada de uma sanccedilatildeo penal ao infrator ateacute porque o objetivo da lei eacute exatamente o oposto

isto eacute despenalizar evitando uma condenaccedilatildeo e a consequente imposiccedilatildeo de uma pena

Outro aspecto que demonstra ter sido ateacutecnico por parte do legislador o uso do termo

ldquopenardquo eacute que a sanccedilatildeo penal emana da soberania do Estado sendo uma de suas principais

caracteriacutesticas a imperatividade Ou seja concorde ou natildeo o reacuteu com a pena que lhe foi imposta

teraacute que cumpriacute-la

Tal caracteriacutestica natildeo estaacute presente na transaccedilatildeo penal cuja aplicaccedilatildeo depende

necessariamente da preacutevia anuecircncia do reacuteu

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

13

Outro aspecto que demonstra a imprecisatildeo de se enquadrar a transaccedilatildeo penal como accedilatildeo

penal eacute que caso fosse uma accedilatildeo a pretensatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico consubstanciaria na

aplicaccedilatildeo imediata de uma pena restritiva de direitos ou multa Ocorre que a procedecircncia ou natildeo

dessa pretensatildeo dependeria exclusivamente da vontade do reacuteu se aceitasse a proposta seria

julgada procedente do contraacuterio improcedente Ocorre que no ordenamento juriacutedico brasileiro

natildeo haacute qualquer accedilatildeo cujo ecircxito ou insucesso dependa exclusivamente do reacuteu pouco importando

a postura tomada pelo autor ou o entendimento do juiz

Portanto resta evidente que a transaccedilatildeo ocorre em uma fase preacute-processual mediante uma

negociaccedilatildeo entre o autor do fato e o Ministeacuterio Puacuteblico no qual o primeiro aceita cumprir uma

regra de conduta em troca do natildeo exerciacutecio da accedilatildeo penal Por esta razatildeo natildeo implica

condenaccedilatildeo nem tampouco assunccedilatildeo de culpa

Homologada a negociaccedilatildeo pelo juiz e cumprido o ocircnus assumido pelo autuado extingue-

se a punibilidade sem que isso importe em reincidecircncia ou em anotaccedilatildeo na folha penal do

autuado

Por fim cabe aqui uma uacuteltima indagaccedilatildeo a sentenccedila homologatoacuteria da transaccedilatildeo penal eacute

encoberta pelo manto da coisa julgada material ou natildeo

Por muito tempo tal questionamento causou grande divergecircncia na doutrina e

jurisprudecircncia dos nossos tribunais Ateacute meados de 2011 entendia o Superior Tribunal de Justiccedila

que a sentenccedila homologatoacuteria de pena restritiva de direitos decorrente de transaccedilatildeo penal fazia

coisa julgada formal e material9

No entanto a partir do RE 602072 GO que reconheceu a repercussatildeo geral da referida

mateacuteria o Supremo Tribunal Federal passou a entender que

9 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Maria Thereza de Assis Moura HC 90126 MS j 10062010 Disponiacutevel em lt wwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

14

[] natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura de accedilatildeo penal em decorrecircncia do natildeo

cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal E isto porque a homologaccedilatildeo da

transaccedilatildeo penal natildeo faz coisa julgada material e descumpridas as suas claacuteusulas retorna-se ao

status quo ante possibilitando-se ao Ministeacuterio Puacuteblico a continuidade da persecuccedilatildeo penal []

E o STJ em cumprimento de sua funccedilatildeo de uniformizaccedilatildeo da jurisprudecircncia passou a

adotar o mesmo posicionamento

2 DOS REQUISITOS DA TRANSACcedilAtildeO PENAL E SEU CONTROLE JURISDICIONAL

O primeiro requisito essencial para que ocorra a transaccedilatildeo penal diz respeito agrave sanccedilatildeo

maacutexima da infraccedilatildeo penal supostamente praticada De acordo com o art 2ordm paraacutegrafo uacutenico da

Lei 1025901 comportaratildeo a transaccedilatildeo apenas os delitos apenaos ateacute 02 (dois) anos

Cabe ressaltar que a concessatildeo ou natildeo da transaccedilatildeo penal tem como referencial a sanccedilatildeo

maacutexima prevista in abstrato para o injusto Este dado eacute de suma importacircncia pois pode-se estar

diante de um crime que a princiacutepio natildeo admitiria a transaccedilatildeo entretanto com a causa de

diminuiccedilatildeo de pena aquiete-se em patamar igual ou inferior a 02 anos e com isso cabiacutevel a

transaccedilatildeo penal Tambeacutem eacute possiacutevel que ocorra o inverso ou seja concorrendo uma causa de

aumento de pena um crime cuja reprimenda maacutexima natildeo fosse superior a 02 (dois) anos venha a

ultrapassar tal patamar e com isso inviabilizando a transaccedilatildeo

Frise-se ainda que tal procedimento se restringe no que tange agrave aplicaccedilatildeo das causas de

aumento ou de diminuiccedilatildeo de pena e agraves qualificadoras ou atenuantes especiais pois incidem na

sanccedilatildeo in abstrato As circunstacircncias judiciais as agravantes e as minorantes geneacutericas natildeo

podem ser consideradas pois repercutem na reprimenda aplicada (in concreto)

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

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Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

15

Se houver concurso de crimes seraacute seguida a mesma loacutegica pois tanto o concurso formal

como o crime continuado repercutem na sanccedilatildeo in abstrato cominada ao delito atuando como

verdadeiras causas de aumento de pena

Tal entendimento foi acolhido pela jurisprudecircncia tanto do Supremo Tribunal Federal 10

como do Superior Tribunal de Justiccedila 11 ressaltando que o mesmo natildeo eacute comungado por Fernando

da Costa Tourinho Filho12 Para ele a lei preocupou-se em identificar quais crimes seriam de

menor potencial ofensivo pouco importando a quantidade da pena decorrente de eventual

concurso delituoso Desta forma para o cabimento da transaccedilatildeo bastaria que cada infraccedilatildeo

isoladamente considerada apresente pena maacutexima ateacute 02 (dois) anos

Embora a tese do referido doutrinador seja bastante sedutora a mesma deve ser rechaccedilada

com base na proacutepria ratio das leis 909995 e 1025901 Isto porque para fins de admissibilidade

ou natildeo da transaccedilatildeo natildeo foi levado em consideraccedilatildeo a qualidade dos crimes e sim o quantum

penal maacuteximo previsto in abstrato na imputaccedilatildeo delituosa que informa a proposta de transaccedilatildeo

penal

O segundo requisito indispensaacutevel para a transaccedilatildeo penal estaacute previsto no art 76 sect2ordm II

da Lei 909995 o qual afirma que o autor do fato natildeo pode ter sido condenado anteriormente

pela praacutetica de crime agrave pena privativa de liberdade por sentenccedila definitiva

Alguns dados importantes que podem ser retirados de tal dispositivo 1) Natildeo haacute qualquer

oacutebice para se beneficiar da transaccedilatildeo penal aquele que fora condenado anteriormente pelo

cometimento de contravenccedilatildeo visto que o dispositivo acima citado se refere agrave crime 2)

10 BRASIL Supremo Tribunal Federal Rel Min Moreira Alves HC 77242-SP j 180399 Disponiacutevel em ltwwwstfjusbrgt Acesso em 25 out 2013 11 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Ministro Felix Fischer HC 80773- RJ j 04102007 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 12TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 27-30

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

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Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

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preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

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controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

16

Tampouco obstaraacute a transaccedilatildeo penal a condenaccedilatildeo anterior cuja sanccedilatildeo imposta fora de restritiva

de direitos ou multa afinal a lei se refere apenas agrave imposiccedilatildeo de pena privativa de liberdade 3)

Por fim se existirem processos em curso em face do autuado tal fato natildeo obstaraacute que o mesmo

goze da transaccedilatildeo penal pois a lei se refere agraves sentenccedilas penais condenatoacuterias transitadas em

julgado

O uacuteltimo requisito objetivo tem a sua previsatildeo no art 76 sect2ordm II da Lei 909995 e diz

respeito agrave impossibilidade de nova transaccedilatildeo penal se entre a homologaccedilatildeo da primeira proposta

e a data do cometimento do novo fato tiver transcorrido periacuteodo de tempo inferior a 05 anos

Aleacutem dos requisitos objetivos acima enumerados para a concessatildeo da transaccedilatildeo ainda eacute

necessaacuterio o preenchimento de certos requisitos subjetivos De acordo com o art 76 sect2ordm II da

Lei 909995 satildeo eles os bons antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem

como as circunstacircncias e motivos da infraccedilatildeo supostamente implementada

Diante da importacircncia de tal medida despenalizadora eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico

formular a proposta de transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos acima

expostos Natildeo se deve negar tal benefiacutecio quando natildeo presentes os requisitos subjetivos pois

demandam uma avaliaccedilatildeo pessoal e por conseguinte apta a incorrer em arbitrariedades

Portanto prevalece o entendimento de que a recusa dos requisitos subjetivos somente

deveraacute ocorrer quando estes se mostrarem inegavelmente graves Ou seja a inconveniecircncia da

transaccedilatildeo penal deveraacute ser osteniva sendo facilmente aferiacutevel pelo senso comum

No que tange ao controle jurisdicional da transaccedilatildeo penal existe ateacute hoje por parte da

doutrina grande divergecircncia acerca de seus limites Para alguns se consubstancia em um direito

subjetivo do autuado Para outros seria um dever-poder do Minististeacuterio Puacuteblico e por fim

alguns entendem ser a transaccedilatildeo penal uma condiccedilatildeo especial de procedibilidade

17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

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que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

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pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

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Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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17

Para os que defendem ser a transaccedilatildeo penal verdadeiro direito puacuteblico subjetivo do

autuado uma vez preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessatildeo

nada impediria que o juiz a outorgasse caso o Ministeacuterio Puacuteblico assim natildeo procedesse

Poreacutem esta interferecircncia do magistrado estaacute em desacordo com o sistema acusatoacuterio cujo

principal objetivo eacute separar o julgador daquele que exerce o papel de acusador Ou seja tal

conduta poderaacute trazer como consequecircncia um julgamento imparcial aleacutem de o proacuteprio art 76

caput da Lei 909995 deixar claro que a proposta de transaccedilatildeo penal parte do Ministeacuterio Puacuteblico

Fato eacute que caso o juiz outorgasse a transaccedilatildeo penal estaria usurpando uma funccedilatildeo que natildeo eacute sua

Somente o Ministeacuterio Puacuteblico tem a competecircncia para tomar a iniciativa de propor a

transaccedilatildeo penal uma vez que tal instrumento tem o condatildeo de impedir o exerciacutecio da accedilatildeo penal

ainda que presentes as condiccedilotildees para tanto mitigando o princiacutepio da obrigatoriedade

No entanto haacute uma corrente oposta capitaneada pelo professor Julio Fabbrini Mirabete 13

para quem a transaccedilatildeo penal seria uma faculdade do Ministeacuterio Puacuteblico orientada pelo princiacutepio

da discricionariedade limitada

Com todas as vecircnias o entendimento acima exposto ignora elementos previstos na proacutepria

lei Isto porque a partir do momento em que a Lei 909995 prevecirc a transaccedilatildeo penal ao autor de

uma infraccedilatildeo de menor potencial ofensivo e enumera os requisitos necessaacuterios agrave sua concessatildeo

natildeo se pode dizer que sua outorga eacute uma simples faculdade do Parquet Satisfeitos os requisitos

legais o autuado faraacute jus agrave transaccedilatildeo cumprindo ao Ministeacuterio Puacuteblico propocirc-la Apenas a

iniciativa da proposta eacute exclusiva do Parquet

Sendo assim haacute de se concluir que a transaccedilatildeo penal eacute mais do que uma simples

faculdade ministerial Eacute um dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico 1) dever pois uma vez

13 MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

18

preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

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instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

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preenchidos os requisitos legais o oferecimento da transaccedilatildeo ao autuado eacute premente ou seja

qualquer negativa do Parquet haacute de ser devida e substancialmente fundamentada e 2) poder

porque eacute dele a iniciativa da transaccedilatildeo penal Caso se entenda diversamente isso traria como

consequecircncia a prevalecircncia do principio da oportunidade e consequentemente a ocorrecircncia de

sucessivas discriminaccedilotildees

Tal entendimento traz como consequecircncia o fato de que em se tratando de infraccedilotildees de

menor potencial ofensivo a accedilatildeo penal puacuteblica apresenta uma condiccedilatildeo especial de

procedibilidade que eacute a inviabilidade da transaccedilatildeo penal

Em outras palavras caso o Ministeacuterio Puacuteblico natildeo ofereccedila a transaccedilatildeo penal e ajuiacuteze a

accedilatildeo penal o juiz discordando desse entendimento deveraacute rejeitar a denuacutencia obtemperando

que em sendo possiacutevel a transaccedilatildeo penal natildeo pode o Ministeacuterio Puacuteblico denunciar o autuado

sem antes lhe propor o aludido instituto despenalizante Faltaria essa condiccedilatildeo especial de

procedibilidade

Outra questatildeo que estaacute intimamente relacionada agrave transaccedilatildeo penal diz respeito agrave

discricionariedade ou natildeo do magistrado em refutar o acordo proposto pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Ou seja poderaacute o magistrado refutar tal acordo ou deve se limitar a homologaacute-lo em respeito agrave

autonomia da vontade das partes

Primeiramente cabe ao magistrado verificar se foram preenchidos os requisitos objetivos

e subjetivos da transaccedilatildeo penal Caso entenda negativamente deveraacute indeferir a transaccedilatildeo penal

Compete ainda ao magistrado verificar a legitimidade da transaccedilatildeo penal

Deveraacute ainda o magistrado realizar um controle de razoabilidade sobre a regra de conduta

ou a injunccedilatildeo contida na proposta do Parquet O proacuteprio art 76 sect1ordm da Lei 909995 admite tal

19

controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

20

que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
  • Artigo Cientiacutefico pronto R1

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controle pois autoriza o juiz a reduzir o valor da multa aplicada ateacute a metade em virtude da

situaccedilatildeo socioeconocircmica do autuado

Consequentemente se o juiz pode realizar tal controle no que tange agrave multa eacute certo que

igualmente poderaacute fiscalizar a razoabilidade das demais regras de conduta arbitradas na transaccedilatildeo

penal evitando que sejam impostas medidas excessivamente rigorosas ao autuado

Cabe por fim uma uacuteltima indagaccedilatildeo deve o juiz permitir a transaccedilatildeo penal em se

tratando de crime de accedilatildeo penal de iniciativa privada

Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes e

Luiz Flaacutevio Gomes14 entendem ser perfeitamente possiacutevel a transaccedilatildeo nas accedilotildees penais de

iniciativa privada mediante proposta da proacutepria viacutetima

Cabe observar ainda que o Superior Tribunal de Justiccedila tambeacutem admite a possibilidade de

transaccedilatildeo penal nos crimes de accedilatildeo penal de iniciativa privada A tiacutetulo exemplificativo vide o

acoacuterdatildeo abaixo

HABEAS CORPUS DIFAMACcedilAtildeO E INJUacuteRIA ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA DE

COMPETEcircNCIA DE TRIBUNAL REGIONAL APLICACcedilAtildeO DA LEI 909995 AUDIEcircNCIA

PARA A PROPOSTA DA TRANSACcedilAtildeO PRECLUSAtildeO PELO RECEBIMENTO DA QUEIXA-

CRIME SUSPENSAtildeO CONDICIONAL DO PROCESSO POSSIBILIDADE ORDEM

PARCIALMENTE CONCEDIDA

1 Recebida a queixa-crime sem oportuna e especiacutefica oposiccedilatildeo do magistrado ou do querelado

quanto agrave mateacuteria resta preclusa a discussatildeo acerca da aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal Precedente do

STF (HC 86007RJ Rel Min SEPUacuteLVEDA PERTENCE Primeira Turma DJ1906)

2 A Lei nordm 909995 desde que obedecidos os requisitos autorizadores permite a suspensatildeo

condicional do processo inclusive nas accedilotildees penais de iniciativa exclusivamente privada sendo

14 GRINOVER Ada Pellegrini et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

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que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

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pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

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Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

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instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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que a legitimidade para o oferecimento da proposta eacute do querelante (APN 390DF Rel Min

FELIX FISCHER Corte Especial DJ 10406)

3 Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal de origem que sem prejuiacutezo da

regular tramitaccedilatildeo da accedilatildeo penal intime o querelante para que se manifeste sobre a suspensatildeo

condicional do processo em conformidade com o art 89 da Lei 909995 15

Eacute importante ressaltar que no caso de accedilatildeo penal privada cabe ao querelante a opccedilatildeo pela

formulaccedilatildeo de proposta de transaccedilatildeo penal Natildeo eacute possiacutevel forccedilaacute-lo a oferececirc-la ainda que sob o

argumento de preenchimento dos requisitos por parte do acusado sob pena de desnaturar-se o

instituto que importado para a accedilatildeo privada exige muacutetuo consentimento das partes Assim a

ausecircncia de manifestaccedilatildeo por parte do querelante por evidenciar falta de interesse na transaccedilatildeo

acarreta o prosseguimento do feito com a consequente deliberaccedilatildeo sobre o recebimento da

queixa Neste sentido

PENAL E PROCESSUAL PENAL ACcedilAtildeO PENAL ORIGINAacuteRIA QUEIXA INJUacuteRIA

TRANSACcedilAtildeO PENAL ACcedilAtildeO PENAL PRIVADA POSSIBILIDADE LEGITIMIDADE DO

QUERELANTE JUSTA CAUSA EVIDENCIADA RECEBIMENTO DA PECcedilA

ACUSATOacuteRIAI - A transaccedilatildeo penal assim como a suspensatildeo condicional do processo natildeo se

trata de direito puacuteblico subjetivo do acusado mas sim de poder-dever do Ministeacuterio Puacuteblico

(Precedentes desta e Corte e do c Supremo Tribunal Federal) II - A jurisprudecircncia dos Tribunais

Superiores admite a aplicaccedilatildeo da transaccedilatildeo penal agraves accedilotildees penais privadas Nesse caso a

legitimidade para formular a proposta eacute do ofendido e o silecircncio do querelante natildeo constitui oacutebice

ao prosseguimento da accedilatildeo penal III - Isso porque a transaccedilatildeo penal quando aplicada nas accedilotildees

penais privadas assenta-se nos princiacutepios da disponibilidade e da oportunidade o que significa que

o seu implemento requer o muacutetuo consentimento das partes IV - Na injuacuteria natildeo se imputa fato

determinado mas se formulam juiacutezos de valor exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos

que importem menoscabo ultraje ou vilipecircndio de algueacutem V - O exame das declaraccedilotildees proferidas

15 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Arnaldo Esteves Lima HC 60933DF j 20052008 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013

21

pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

22

Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

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JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

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pelo querelado na reuniatildeo do Conselho Deliberativo evidenciam em juiacutezo de prelibaccedilatildeo que

houve para aleacutem do mero animus criticandi conduta que aparentemente se amolda ao tipo inserto

no art 140 do Coacutedigo Penal o que por conseguinte justifica o prosseguimento da accedilatildeo penal

Queixa recebida16

Portanto conclui-se que embora a doutrina e jurisprudecircncia do STF e do STJ entendam

pela admissibilidade da transaccedilatildeo em accedilatildeo de iniciativa privada o art 76 caput da Lei 909995 eacute

de uma clareza solar ao dispor que havendo representaccedilatildeo ou tratando-se de crime de accedilatildeo penal

puacuteblica incondicionada poderaacute o Ministeacuterio Puacuteblico transacionar com o autuado Trata-se

portanto de posicionamento predominante da doutrina e jurisprudecircncia poreacutem contra legem

3 DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSACcedilAtildeO PENAL

Embora hoje o entendimento que prevalece eacute pela constitucionalidade da transaccedilatildeo penal

insta tecer algumas criacuteticas ora levantadas quando do surgimento da referida medida

despenalizadora

O professor Geraldo Prado17 foi um dos principais doutrinadores brasileiros que

questionou seriamente a constitucionalidade da transaccedilatildeo penal A principal criacutetica apresentada

pelo renomado doutrinador diz respeito ao fato da maioria da doutrina processual penal associar

tal instituto ao garantismo Para ele a transaccedilatildeo penal natildeo eacute sinocircnimo de um processso justo mas

sim de um processo penal de resultados

16 BRASIL Superior Tribunal de Justiccedila Rel Min Felix Fischer Accedilatildeo Penal nordm 634RJ j 21032012 Disponiacutevel em ltwwwstjjusbrgt Acesso em 25 out 2013 17PRADO Geraldo Elementos para uma anaacutelise criacutetica da transaccedilatildeo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p15-16

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Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

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instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

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JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

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Outra criacutetica apresentada por ele diz respeito ao seu empregado generalizado nos Juizados

Especiais Criminais A transaccedilatildeo penal passou a ser um verdadeiro contrato de adesatildeo restando

ao autuado aceitar ou rechaccedilar a transaccedilatildeo tal qual lhe foi apresentada natildeo podendo discutir o

teor do ldquoacordordquo com o Ministeacuterio Publico

Para este autor a soluccedilatildeo seria a busca da descriminalizaccedilatildeo com a possibilidade de

adoccedilatildeo do princiacutepio da oportunidade regrada de maneira que observados criteacuterios objetivos

pudessem os litigantes acusaccedilatildeo e defesa negociar soluccedilotildees natildeo punitivas ao processo

As censuras trazidas por Geraldo Prado satildeo impertinentes Isto porque as suas criticas

partem de uma premissa equivocada qual seja de que a transaccedilatildeo penal seria uma pena diante

da literalidade do art 76 da Lei 909995

Primeiramente alegar que a transaccedilatildeo penal afrontaria os direitos constitucionalmente

assegurados ao devido processo legal ao contraditoacuterio e agrave ampla defesa natildeo procede pois natildeo se

trata de uma condenaccedilatildeo criminal A transaccedilatildeo penal eacute tatildeo somente um acordo que visa mediante

o cumprimento de certas regras de conduta pelo autuado evitar o ajuizamento da accedilatildeo penal

Caso o autuado venha a violar o pacto o Ministeacuterio Puacuteblico o denunciaraacute

Natildeo haacute que se defender tampouco que com o advendo da transaccedilatildeo inverteu-se o ocircnus

probatoacuterio vulnerando-se o princiacutepio da natildeo culpabilidade Isto porque com a aceitaccedilatildeo da

proposta ministerial pelo autuado natildeo estaraacute o mesmo assumindo culpa Aleacutem disso o Ministeacuterio

Puacuteblico soacute iraacute oferecer a transaccedilatildeo penal caso fique demonstrada a plausibilidade faacutetica para o

oferecimento de futura accedilatildeo penal Por fim se o autuado descumprir a transaccedilatildeo seraacute denunciado

pelo Parquet a quem incumbiraacute provar a veracidade da imputaccedilatildeo ao longo do processo

Finalmente cabe esclarecer que o ordenamento juriacutedico penal brasileiro se tornaraacute mais

justo quando sobrevier uma profunda descriminalizaccedilatildeo de vaacuterias infraccedilotildees conforme muito bem

23

sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

24

instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

26

JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

TOURINHO FILHO Fernando da Costa Coacutedigo de Processo Penal Comentado Vol 01 5 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 82

  • Artigo Cientiacutefico pronto R1
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sustentado pelo professor Geraldo Prado No entanto a transaccedilatildeo penal natildeo deixa de representar

uma evoluccedilatildeo em direccedilatildeo agrave referida descriminalizaccedilatildeo

Por tais razotildees natildeo haacute que se falar em inconstitucionalidade alguma na transaccedilatildeo penal tal

qual foi disciplinada pela Lei 909995 No entanto grande atenccedilatildeo deve-se ter com relaccedilatildeo ao

uacutenico inconveniente criado pelo legislador

O art 76 sect2ordm II e sect4ordm da Lei 909995 estabelece que celebrado e cumprido o acordo com

o Ministeacuterio Puacuteblico o autuado nos 05 (cinco) anos subsequentes natildeo faraacute jus agrave nova transaccedilatildeo

penal Para alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover Antonio Magalhatildees Gomes

Filho Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flaacutevio Gomes a ratio essendi deste dispositivo

subsume-se no natildeo incentivo agrave impunidade 18

Entretanto tal previsatildeo violaria a presunccedilatildeo de natildeo culpabilidade Isto porque se o

autuado natildeo foi julgado submetendo-se a um processo regular onde teria a oportunidade de se

defender amplamente eacute oacutebvio que a transaccedilatildeo penal nunca poderia encerrar uma presunccedilatildeo de

culpa Assim natildeo poderia a lei impedir uma nova transaccedilatildeo nos proacuteimos cinco anos

Assim o oacutebice temporal de 5 (cinco) anos sem a possibilidade de transacionar deve ser

considerado insconstitucional pois parte da presunccedilatildeo de que o autuado tenha de fato perpetrado

o injusto descrito no termo circunstanciado

CONCLUSAtildeO

Por meio do presente trabalho buscou-se apresentar o conceito e as principais

caracteriacutesticas do instituto despenalizador da transaccedilatildeo penal aleacutem de trazer as principais

questotildees debatidas acerca do tema em especial a sua constitucionalidade ou natildeo Embora o

18 GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p151

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instituto da transaccedilatildeo penal tenha trazido grandes debates a sua utilizaccedilatildeo e importacircncia ficou

sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

REFEREcircNCIAS

BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

JARDIM Afracircnio Silva Direito Processual Penal 6 ed Rio de Janeiro Forense 1997 p353-354

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JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

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PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

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sedimentada ao longo desses anos

Restou demonstrado que a transaccedilatildeo penal eacute um instituto misto porquanto ostenta uma

finalidade duacuteplice evitar o execiacutecio da accedilatildeo penal (direito processual) e resguardar o estado de

inocecircncia e de natildeo culpabilidade do autuado preservando-lhe a primariedade (direito material)

Aleacutem disso ficou claro que tal instituto despenalizador natildeo possui natureza juriacutedica de

accedilatildeo penal pois busca evitar a instauraccedilatildeo do processo Tanto isso eacute verdade que esta se

desenvolve numa fase preacute-processual

Ademais ficou evidenciado que a palavra ldquopenardquo prevista no art 76 da Lei 909995 foi

empregada de maneira ateacutecnica pelo legislador natildeo significando sanccedilatildeo criminal Caso fosse

entendido desta maneira a inconstitucionalidade de tal medida restaria evidenciada porquanto o

autuado seria condenado sem que tivesse havido um processo

Restou claro que o escopo da transaccedilatildeo penal eacute evitar o oferecimento da denuacutencia pelo

Ministeacuterio Puacuteblico Sendo assim a proposta de transaccedilatildeo penal apenas deveraacute ser veiculada se

houver justa causa suficiente para o exerciacutecio da accedilatildeo penal do contraacuterio deveria o Parquet

opinar pelo arquivamento do termo circunstanciado

Foram abordadadas ainda as diversas correntes acerca do controle jurisdicional da

transaccedilatildeo penal sendo o entendimento majoritaacuterio aquele que defende ser a transaccedilatildeo penal um

dever-poder do Ministeacuterio Puacuteblico ou seja eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico formular a proposta de

transaccedilatildeo penal quando presentes todos os requisitos objetivos pois a presenccedila destes por si soacute

jaacute indica a conveniecircncia da transaccedilatildeo

Foi dada ainda grande ecircnfase agrave nova jurisprudecircncia dos Tribunais Superiores ao

entenderem que natildeo fere os preceitos constitucionais a propositura da accedilatildeo penal em decorrecircncia

25

do natildeo cumprimento das condiccedilotildees estabelecidas em transaccedilatildeo penal Portanto atualmente natildeo

haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

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CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

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JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

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PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

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haacute que se falar em coisa julgada formal e material da sentenccedila que homologa a aplicaccedilatildeo de pena

restritiva de direitos ou multa decorrente de transaccedilatildeo penal

Outro aspecto explorado no presente trabalho diz respeito ao entendimento

jurisprudencial acerca da admissibilidade da transaccedilatildeo penal na accedilatildeo penal privada Embora tal

posicionamento seja o predominante natildeo deixa de ser contra legem diante da literalidade do art

76 caput da Lei 909995

Foram apontados os principais argumentos acerca da inconstitucionalidade do instituto

despenalizador da transaccedilatildeo penal defendido em especial pelo professor Geraldo Prado os quais

foram posteriormente rebatidos

Natildeo obstante o entendimento majoritariacutessimo seja pela constitucionalidade da transaccedilatildeo

penal foi feita uma uacuteltima criacutetica acerca da proibiccedilatildeo da transaccedilatildeo penal nos 05 (cinco) anos

subsequentes agrave celebraccedilatildeo do acordo (art 76 sect2ordm II e 4ordm da Lei 909995) Restou demonstrado

que tal requisito eacute inconstitucional pois presume implicitamente a culpa do autuado e por

conseguinte viola preceitos constitucionais como a ampla defesa e o contraditoacuterio

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BITENCOURT Cezar Roberto Manual de Direito Penal Parte geral Vol I 6 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000

CAPEZ Fernando Curso de Processo Penal 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999 p 528

GRINOVER Ada Pellegrini Antonio Magalhatildees Gomes Filho Antonio Scarance Fernandes et al Juizados Especiais Criminais 4 ed Satildeo Paulo RT 2002 p47

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JESUS Daacutemasio E De Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada 7 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 25

MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

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MIRABETE Julio Fabrini Juizados Especiais Criminais 5 ed Satildeo Paulo Atlas 2002 p 131

PRADO Geraldo Luis Mascarenhas Elementos para uma Anaacutelise Criacutetica da Transaccedilatildeo Penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003

RANGEL Paulo Direito Processual Penal 7 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 pp366-369

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