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racismo - ONU Mulheres · 4. A meritocracia, ou seja, o sistema em que aquel@s supostamente mais aptos ou preparados ocupariam as melhores posições na hierarquia será desenvolvida

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racismo institucional uma abordagem conceitual

“Estamos convencidos de que racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata revelam-se de maneira diferenciada

para mulheres e meninas, e podem estar entre os fatores que levam a uma deterioração de sua condição de vida, à pobreza, à violência, às múltiplas formas de discriminação e à limitação ou negação de seus

direitos humanos”.

Declaração da III Conferência Mundial contra o Racismo, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, parágrafo 69.

expediente:Realização: Geledés – Instituto da Mulher Negra Coordenação: Geledés – Instituto da Mulher Negra e Cfemea – Centro Feminista de Estudos e Assessoria Consultoria e Redação: Jurema Werneck* Grupo de Trabalho: Ana Carolina Querino (OIT), Fernanda Lopes (UNFPA), Guacira Cesar de Oliveira, Nina Madsen (Cfemea), Joana Chagas (ONU Mulheres), Jurema Werneck (consultora), Fernanda Lira Goes, Luana Simões Pinheiro, Natalia de Oliveira Fontoura, Tatiana Dias Silva(IPEA), Felipe Hagen Evangelista da Silva, Mariana Marcondes (SPM), Monica de Oliveira (Seppir), Nilza Iraci (Geledés). Projeto Mais Direitos e Mais Poder para as Mulheres Brasileiras desenvolvido por: Coletivo Leila Diniz, Cfemea – Centro Feminista de Estudos e Assessoria, Cunhã Coletivo Feminista, Geledés – Instituto da Mulher Negra, Instituto Patrícia Galvão – Mídia e Direitos, Redeh – Rede de Desenvolvimento Humano, SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democraci. Com o apoio do Fundo para a Igualdade de Gênero da ONU Mulheres Editoração e Design: Trama Design Impressão Digital: Ibraphel Gráfica

* Possui graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense (1986), mestrado em Engenharia de Produção pela Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia/COPPE/UFRJ (2000) e doutorado em Comunicação e Cultura pela Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (2007). É coordenadora de Criola, organização não governamental fundada em 1992. Desenvolve ações, projetos e pesquisas nas áreas de saúde da população negra, mulheres negras, racismo e cultura negra.

Apresentação3

Parte 1 - Racismo, Racismo Institucional e Gênero5

Racismo e sua (inter)face de gênero7

Racismo institucional13

Parte 2 - Proteção, Desproteção Social e Racismo Institucional17

Proteção social: conceituando 19

Financiamento de políticas públicas: a política tributária 23

Desproteção social: o papel do racismo

27Parte 3 - Indicadores de Racismo Institucional ou Sistêmico

31 Indicadores: discussão inicial

33Monitoramento e avaliação: definição de indicadores como momento do processo de

planejamento e avaliação37

Indicadores de Racismo Institucional nas políticas de Proteção Social 39

Quadros de Indicadores 41

Bibliografia51

sumário

O texto aqui apresentado visa oferecer novos elementos que ampliem a visão do marco conceitual adequado aos objetivos do Projeto Mais Direitos e Mais Poder

para as Mulheres Brasileiras - Componente: Indicadores de Racismo Institucional1 , que se referem a “construir indicadores de racismo institucional que permitam:

a. Refletir sobre os resultados da manutenção do racismo no âmbito do Estado, a serem detectados na análise das relações institucionais, dos dados de registros administrativos e demográficos e dos dados referentes a fluxos de trabalho na execução das políticas públicas;

b. Incidir na formulação e monitorar a implementação de políticas públicas nas áreas de Seguridade Social e Trabalho, com especial enfoque para a mulher negra, promovendo o reconhecimento do racismo institucional como violação dos direitos da população negra;

c. Revelar desigualdades no atendimento às mulheres brancas e mulheres negras (os dados devem ser desagregados por gênero e por raça);

d. Consolidar uma metodologia que possa ser replicada para as demais áreas/setores das políticas públicas.”

A tarefa aqui desenvolvida buscará dialogar com o estudo preparado pelo Prof. Dr. Ronaldo Sales2 , que introduziu informações e reflexões acerca do racismo institucional e algumas de suas formas de participação nas políticas públicas e no mundo do trabalho.

Aqui, o trabalho será desenvolvido em três partes, quais sejam:

Parte 1: abordar a relação entre racismo, racismo institucional e seus impactos de acordo com papéis e identidades de gênero;

Parte 2: o conceito de proteção social, o lugar do racismo institucional em seus processos e resultados, buscando exemplificar sua incidência na vida das mulheres negras e no seu acesso às políticas públicas de proteção social;

Parte 3: os indicadores. Aqui buscaremos apontar, de modo preliminar, dimensões prioritárias da proteção/desproteção social, além de propor um conjunto preliminar de indicadores.

1. O Projeto Mais Direitos e Mais Poder para as Mulheres Brasileiras reúne sete organizações não-governamentais feministas (CFEMEA, Coletivo Leila Diniz, Cunhã, Geledés – Instituto da Mulher Negra, Instituto Patrícia Galvão, Redeh e SOS Corpo) a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM/PR) e é apoiado pelo Fundo para a Igualdade de Gênero da ONU Mulheres.

2. Estudo preliminar apresentado ao Projeto.

apresentação

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parte 1

racismo, racismo institucional

e gÊnero

O racismo é uma ideologia que se realiza nas relações entre pessoas e grupos, no desenho e desenvolvimento das políticas públicas, nas estruturas de governo e nas formas de organização dos Estados. Ou seja, trata-se de um fenômeno de abrangência ampla e complexa que penetra e participa da cultura, da política e da ética. Para isso requisita uma série de instrumentos capazes de mover os processos em favor de seus interesses e necessidades de continuidade, mantendo e perpetuando privilégios e hegemonias.

Por sua ampla e complexa atuação, o racismo deve ser reconhecido também como um sistema, uma vez que se organiza e se desenvolve através de estruturas, políticas, práticas e normas capazes de definir oportunidades e valores para pessoas e populações a partir de sua aparência3 atuando em diferentes níveis: pessoal, interpessoal e institucional conforme a figura 1:

3. Jones, C P. Confronting institutionalized racism, Phylon, s/ data, pp. 10-11.

racismo e sua (inter)face de gÊnero

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Já tem sido fartamente explicitado que nas sociedades da diáspora africana o racismo se desenvolve estabelecendo o que W. E. B. DuBois definiu como “linha de cor”. Ou seja, sob o racismo, uma separação (segregação) é feita a partir da cor da pele das pessoas, permitindo aos mais claros ocuparem posições superiores na hierarquia social, enquanto os mais escuros serão mantidos nas posições inferiores, independentemente de sua condição (ou seus privilégios) de gênero ou quaisquer outros. Note-se que a linha de cor, aind que guarde certa flexibilidade em relação às diferentes tonalidades, reivindicará e resguardará, nas disputas cotidianas e gerais, o lugar de privilégio sempre para o mais claros4 .

Portanto será somente a partir desta segregação que outras hierarquias serão estabelecidas, tendo forte participação nas iniquidades baseadas na valoração diferenciada e hierárquica dos diferentes papéis e identidades de gênero das pessoas, permitindo aos homens e a heterossexuais ocuparem posições superiores nos diferentes polos acima e abaixo da linha de cor. A masculinidade heterossexual, então definida como polo superior e como norma, leva as diferentes expressões do feminino 5 , dos diferentes grupos raciais, a posições de inferioridade. No entanto, a linha de cor determinará, para todas as pessoas de pele escura, os lugares de maior desvalorização tanto do ponto de vista simbólico quanto de inserção no mundo material, nas relações sociais e políticas. Nesta complexa teia de valores e exclusões, lésbicas e bissexuais, ao lado de transexuais e travestis atingid@s por ampla e forte rejeição, ocuparão as piores posições na hierarquia de gênero, reafirmando-se, a partir destas exclusões, a heterossexualidade “biológica ou inata” como obrigatória entre as pessoas de pele clara, mas também entre as de pele escura.

Uma expressão da desigualdade injusta marcada pela linha de cor pode ser vista nos dados sobre a renda média de brasileiras e brasileiros (figura 2 ):

4. A meritocracia, ou seja, o sistema em que aquel@s supostamente mais aptos ou preparados ocupariam as melhores posições na hierarquia será desenvolvida a partir da associação perversa entre ocupação de posições de privilégio e indicadores de valor.

5. As diferentes expressões do feminino aqui descritas reúnem tanto os diferentes tipos de pessoas nascidas com o sexo biológico feminino com diferentes orientações sexuais, como também as travestis e as transexuais.

Figura 2: Renda média da população, segundo sexo e raça/cor. Brasil, 2009

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A figura permite apresentar um importante mecanismo de estabelecimento da subordinação racial, qual seja, a administração desigual do acesso aos resultados do trabalho coletivo e das riquezas produzidas segundo a raça de indivíduos e grupos. Dizendo de outro modo, poderemos verificar a forma como o racismo permite a apropriação desigual da renda e da riqueza, a partir do privilegiamento d@s branc@s, especialmente dos homens deste grupo racial.

Outro aspecto desta produção da inferioridade negra pode ser visto na Previdência Social. Construída sob regras contributivas, ou seja, a partir da individualização da contribuição como forma de acesso, ela se apoia nas regras de segregação estabelecidas pela sociedade racista, como veremos a seguir (figura 3):

Figura 3: Previdência Social

Assim, uma vez tendo participação precária no mundo do trabalho e na obtenção de renda equivalente, negras e negros estarão em posição inferior no que se refere à capacidade contributiva para a Previdência Social. Neste cenário, as mulheres negras terão participação ainda mais prejudicada.

Não será coincidência, portanto, a maior participação das mulheres negras entre os grupos que vivem em extrema pobreza, conforme demonstram os dados a seguir:

Figura 4: Indigência

O que se demonstra nestes dados são exemplos da realização daquilo que afirma Stuart Hall ao dizer que “raça é a modalidade na qual a classe é ‘vivida’”6 , expondo-se o forte componente de superexploração econômica subjacente às relações raciais. Ou seja, a produção da pobreza e da indigência está diretamente relacionada ao modo como o racismo incide sobre direitos sociais, especialmente aos direitos de proteção social.

Este trabalho não localizou fontes de dados que possibilitassem a análise da extensão das iniquidades raciais por diferentes identidades de gênero. Assim, não será possível delimitar aqui de que forma o racismo impacta a vida socioeconômica de lésbicas, gays, transexuais e travestis nos diferentes grupos raciais. No entanto, já é reconhecida a capacidade deste, incorporando mecanismos de subordinação de gênero, de impor barreiras à livre expressão dos direitos sexuais, impondo a indivíduos e grupos com identidades de gênero diferentes da norma inúmeras barreiras à livre circulação social, o que certamente têm impactos tanto nos níveis de escolaridade quanto nas possibilidades de livre participação no mundo do trabalho. O exemplo das travestis de todas as raças, aprisionadas em um conjunto restrito de ocupações, em grande parte sub-remuneradas, ajuda a trazer algumas luzes sobre esta dimensão da iniquidade.

6. “Race is thus, also, the modality in which class is ‘lived”. Hall, Stuart, Race, articulation and societies structured in dominance, p. 341. In: Hall, Stuart, C. Critcher, T. Jefferson, J. Clarke & B. Roberts (1978): Policing the Crisis. London: Macmillan.

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Chamaremos aqui a este fenômeno de hierarquização de gênero a partir da raça como racismo patriarcal heteronormativo. A partir dele, a pirâmide social vai permitir a mulheres brancas maior mobilidade social, em especial as heterossexuais, colocando-se superiormente a homens e mulheres negr@s e, em muitos casos, a lésbicas, gays, travestis e transexuais dos diferentes grupos raciais.

Sob o império do racismo patriarcal outras hierarquias serão produzidas e/ou ampliadas. Esta colaboração entre mecanismos de hierarquização ou, como apontou Kimberlé Crenshaw, de eixos de subordinação, retratam o fenômeno da interseccionalidade.

Diferentes eixos de subordinação estão ativos em sociedades como a nossa, entre eles:

» de geração, dando a adult@s melhores posições em relação a jovens e idos@s;

» de condição física ou mental, onde pessoas com deficiências e pessoas com doenças crônicas enfrentam as maiores barreiras;

» de situação territorial, que confere privilégios @s habitantes dos centros urbanos em detrimento das populações periféricas, rurais, ribeirinhas e da floresta. E, para além, desempoderando tod@s @s que vivem nas regiões do país mais espoliadas política e economicamente, quando comparados @s residentes, no caso do Brasil, nas regiões sudeste e sul.

Assim, desigualdades e iniquidades assumirão uma gama variada de expressões, tendo a raça como determinante das posições de gênero vividas sob regime heteronormativo, marcas estas fortalecidas ou desqualificadas por outras condições individuais e coletivas.

A interseccionalidade permite também aprofundarmos a compreensão da amplitude dos desafios enfrentados pelas mulheres dos grupos raciais inferiorizados, vistos de forma integrada.

Em interessante artigo, Nikol Alexander-Floyd (2012) destaca que a interseccionalidade deve ser vista de dois modos complementares: como ideia ou conceito que traduz a intersecção de racismo, sexismo e classismo, reconhecidos co-determinantes da subordinação; mas também como ideograma. Nesta perspectiva, a interseccionalidade reunirá em um único termo aglutinador todas as forças opressivas que limitam a vida das mulheres dos grupos racialmente inferiorizados – e das mulheres negras em especial. Assim, a interseccionalidade nos libertaria, de certa maneira, dos esforços até então empreendidos por diferentes ativistas e pesquisador@s, de tentar traduzir a magnitude da opressão vivida por estes grupos de mulheres através do exercício impreciso de encaixe de diferentes formas de opressão. Desafiando-se a partir daí as formas de produção conceitual e de conhecimento a respeito destas mulheres, bem como as formas de luta libertárias em desenvolvimento, especialmente aquelas no interior do feminismo, mas não somente estas.

Se é fato que as mulheres (no conceito estendido para além da biologia, o que inclui as travestis e as transexuais) dos diferentes grupos raciais estarão em desvantagem em muitos aspectos em relação aos homens (idem) de seu grupo racial, é possível verificarmos também a miríade de diferenças e desigualdades injustas que se estabelecem entre as primeiras. Nesta complexidade, cada mulher ou grupo homogêneo de mulheres vivenciará de forma específica os efeitos do racismo patriarcal heteronormativo. Estas variações corresponderão aos modos como são atravessadas pelos demais eixos de subordinação que se colocam em uma sociedade complexa e altamente hierarquizada como a brasileira.

A figura seguinte retrata alguns destes eixos de subordinação que participam da construção da inferiorização de umas e do privilégio de outras:

Figura 5: Interseccionalidades ou eixos de subordinação

Baseada no modelo proposto por Kimberlé Crenshaw para o conceito de interseccionalidade

A partir da perspectiva acima compreenderemos o racismo institucional, também denominado racismo sistêmico, como mecanismo estrutural que garante a exclusão seletiva dos grupos racialmente subordinados - negr@s, indígenas, cigan@s, para citar a realidade latino-americana e brasileira da diáspora africana - atuando como alavanca importante da exclusão diferenciada de diferentes sujeit@s nestes grupos. Trata-se da forma estratégica como o racismo garante a apropriação dos resultados positivos da produção de riquezas pelos segmentos raciais privilegiados na sociedade, ao mesmo tempo em que ajuda a manter a fragmentação da distribuição destes resultados no seu interior.

O racismo institucional ou sistêmico opera de forma a induzir, manter e condicionar a organização e a ação do Estado, suas instituições e políticas públicas – atuando também nas instituições privadas, produzindo e reproduzindo a hierarquia racial. Ele foi definido pelos ativistas integrantes do grupo Panteras Negras Stokely Carmichael e Charles Hamilton em 1967, como capaz de produzir:

A falha coletiva de uma organização em prover um serviço apropriado e profissional às pessoas por causa de sua cor, cultura ou origem étnica. (Carmichael, S. e Hamilton, C. Black power: the politics of liberation in America. New York, Vintage, 1967, p. 4).

Atualmente, já é possível compreendermos que, mais do que uma insuficiência ou inadequação, o racismo institucional é um mecanismo performativo ou produtivo, capaz de gerar e legitimar condutas excludentes, tanto no que se refere a formas de governança quanto de accountability. Ou, nas palavras de Sales Jr:

o “fracasso institucional” é apenas aparente, resultante da contradição performativa entre o discurso formal e oficial das instituições e suas práticas cotidianas, sobretudo, mas não apenas informais. Esta contradição é (...) fundamental para entender os processos de reprodução do racismo, em suas três dimensões (preconceito, discriminação e desigualdade étnico-raciais), no contexto do mito da democracia racial. (Sales Jr, mimeo, 2011).

O racismo institucional é um dos modos de operacionalização do racismo patriarcal heteronormativo - é o modo organizacional - para atingir coletividades a partir da priorização ativa dos interesses dos mais claros, patrocinando também a negligência e a deslegitimação das necessidades dos mais escuros. E mais, como vimos acima, restringindo especialmente e de forma ativa as opções e oportunidades das mulheres negras no exercício de seus direitos.

racismo institucional

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Dizendo de outro modo, o racismo institucional é um modo de subordinar o direito e a democracia às necessidades do racismo, fazendo com que os primeiros inexistam ou existam de forma precária, diante de barreiras interpostas na vivência dos grupos e indivíduos aprisionados pelos esquemas de subordinação deste último.

Podemos perceber que, para que seja efetivo, o racismo institucional deve dispor de plasticidade suficiente para oferecer barreiras amplas - ou precisamente singulares - de modo a permitir a realização da hegemonia branca, privilegiando o interesse dos homens brancos heterossexuais em muitos aspectos, mas das mulheres brancas em vários deles. Esta plasticidade visa também adequá-lo à interação com os demais eixos de subordinação já apontados aqui, tornando seus mecanismos de exclusão mais seletivos e profundos.

O conceito de racismo institucional guarda relação com o conceito de vulnerabilidade desenvolvido por Mann e Tarantola (1992) para analisar aspectos da epidemia de HIV/AIDS. Para Ayres o conceito de vulnerabilidade abrange:

O conjunto de aspectos individuais e coletivos relacionados ao grau e modo de exposição a uma dada situação e, de modo indissociável, ao menor ou maior acesso a recursos adequados para se proteger tanto do agravo quanto de suas consequências indesejáveis. (O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios, 2003).

Desenvolvido como forma de deslocamento do olhar e da ação desde as culpas e riscos dos atingidos para as causas do acometimento, este conceito vai permitir também a visibilização e o enfrentamento de diferentes fatores concorrentes para a produção da infecção, expondo o plano das ações, políticas e, fundamentalmente, dos direitos.

Três diferentes dimensões interligadas foram apontadas como atuantes na produção de maior ou menor vulnerabilidade de pessoas e populações a determinadas condições - no caso estudado pelos autores, trata-se da vulnerabilidade à infecção pelo vírus HIV. São elas:

a. dimensão individual – onde estão inseridos comportamentos que desprotegem;

b. dimensão social – destaca as condições políticas, culturais, econômicas e etc., a partir do que se produz e/ou legitima a vulnerabilidade;

c. dimensão política ou programática – refere-se à ação institucional voltada para a geração da proteção e/ou redução da vulnerabilidade de indivíduos e grupos, na perspectiva de seus direitos humanos.

Pelo exposto, podemos verificar a proximidade entre os conceitos de vulnerabilidade, particularmente sua dimensão programática, e racismo institucional. Desta perspectiva, racismo institucional equivaleria a ações e políticas institucionais capazes de produzir a vulnerabilidade de indivíduos e grupos sociais vitimados pelo racismo.

A figura a seguir retrata os diferentes momentos onde os mecanismos de vulnerabilidade, desproteção ou exclusão podem ser acionados, em relação às políticas e mecanismos de gestão, construindo as iniquidades:

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Figura 6: Modos e momentos de operacionalização do RI

Em cada um destes momentos, mecanismos seletivos de privilegiamento e barreiras – por exemplo: linguagens, procedimentos, documentos necessários, distâncias, custos, etiquetas, atitudes etc. - poderão ser interpostos sem qualquer controle ou constrangimento, dificultando ou impedindo a plena realização do direito e o atendimento às necessidades expressas.

Assim, instaura-se em cada um destes momentos e em todo o percurso lógicas, processos, procedimentos, condutas, que vão impregnar a cultura institucional – o que se não os torna invisíveis, os faz parte da ordem “natural” das coisas - capazes de dificultar ou impedir o alcance pleno das possibilidades e resultados das ações, programas e políticas institucionais, perpetuando a exclusão racial. Importante salientar que este conjunto de mecanismos e atitudes poderão produzir efeitos tanto no polo representativo d@s agentes do Estado nas diferentes posições da hierarquia organizacional, quanto sobre indivíduos e grupos.

No entanto, é importante também não perdermos de vista que, antes e além da ação institucional, o racismo se coloca como marco ideológico legitimador e definidor de prioridades, reivindicando e legitimando culturas e condutas cotidianas ou profissionais dentro e fora das instituições. Desse modo, podem propiciar e reafirmar a exclusão racial e o fortalecimento de seus resultados sobre os diferentes grupos raciais.

ACESSO E UTILIZAÇÃO PROCESSOS RESULTADOS

• Grau de vivência e/ou internalização da subrdinação• aceitabilidade• cultura• linguagem/alfabetização/ escolaridade• atitudes, crenças/preferências• envolvimento no cuidado• renda• Estrutural• informação• disponibilidade• grau de organização• transporte• Financeiro• suporte público• cobertura (sistema privado)• capacidade de desenbolso

• Compromisso de gestor@s• Atuação intersetorial e interinstitucional• Planejamento adequado• Monitoramento, avaliação e retroaimentação • Qualidade dos serviços• competência cultural, racial e de identidade de gênero• capacidade de comunicação• conhecimentos• enfrentamento a preconceitos/estereótipos• Atenção e assistência apropriados• Eficácia do procedimento• Compreensão e adesão d@ sujeit@ da ação• Participação social

• Proteção / desproteção social• saúde• previdência• assistência social• bem estar• Equidade/ iniquidade • Visões d@ sujeit@ da ação• experiências• satisfação• paceria efetiva

Fonte: Cooper, Lisa A et al, Desingning and Evaluating Interventions to Eiminate Racial and Ethinic Disparties in Health Care, JGIM, vol. 17, June 2002. Adaptação do modelo proposto especialmente para este trabalho.

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Foi em relação a esta capacidade do racismo atuar em nome de seus próprios parâmetros, perpetuar-se e legitimar-se produzindo privilégios, que Gary King chamou atenção para o fato de que:

Pessoas e organizações que se beneficiam do racismo institucional são refratárias a mudanças voluntárias do status quo. (King, Gary. Institutional Racism and the Medical/Health Complex: a conceptual analysis, p. 33, 1996).

Com isso, justifica-se a criação de medidas e mecanismos capazes de quebrar a invisibilidade do racismo institucional, de romper a cultura institucional, estabelecendo novas proposições e condutas que impeçam a perpetuação das iniquidades.

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parte 2

proteção, desproteção social e

racismo institucional

Existem diferentes definições para o termo proteção social. Em todas, o que se assinala são mecanismos e políticas públicas capazes de garantir patamares adequados de estabilidade (física/mental, laboral, econômica) a tod@s @s sujeit@s e grupos nas sociedades democráticas.

Segundo Márcio Pochmann (2004), falar de proteção social implica reconhecer um quase monopólio estatal na produção do bem-estar social. Isto, ao lado do reconhecimento da necessidade de se impor limites a livre atuação do capitalismo nas sociedades sob seu regime. Limitações estas que devem ser capazes de controlar a abrangência das desigualdades e iniquidades produzidas ou ampliadas pelo sistema, o que, podemos verificar, tem se tornado cada vez mais urgente após a instauração da crise no centro do capitalismo ocidental.

Para o mesmo autor, três diferentes vertentes ou motivações principais estiveram (estão?) por trás da criação de diferentes modelos de Estado de Bem-Estar Social nas sociedades capitalistas. São elas:

» a necessidade de se proteger os mais fracos, incapazes de se incorporar à sociedade competitiva;

» o desejo de favorecer indivíduos, grupos e populações de trabalhador@s necessári@s ao mercado;

» a necessidade de redistribuição de renda (especialmente através da tributação progressiva).

A opção pelo privilegiamento de uma destas vertentes vai determinar a abrangência da proteção social como conceito e como atuação Estatal.

No Brasil, a ação estatal de proteção social ampara-se fundamentalmente na Constituição Federal de 1988, em seu Título VII (Da Ordem Social), capítulo II (Da Seguridade Social). Segundo este documento legal, a ordem social tem como prioridade o trabalho, objetivando o bem estar e a justiça social. Desse modo estabelece que:

A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. (CF Art. 194).

proteção social: conceituando

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Este conjunto integrado deve ser regido segundo objetivos de:

I. universalidade da cobertura e do atendimento;

II. uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III. seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV. irredutibilidade do valor dos benefícios;

V. equidade na forma de participação no custeio;

VI. diversidade da base de financiamento;

VII. caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados. (Idem, parágrafo único).

Vista como um avanço social conquistado pelas forças democráticas que influenciaram a redação do texto constitucional – ou pelo menos, como um “empate” em relação aos interesses das forças representativas do conservadorismo e do mercado - a definição de seguridade social aponta para a busca de patamares mínimos de bem-estar social no país.

Ao longo das duas décadas de vigência da Constituição, é importante assinalar que as disputas ideológicas em torno da qualidade e abrangência da democracia brasileira têm repercutido de modo intenso sobre o ordenamento jurídico e, principalmente, sobre a capacidade do Estado brasileiro em cumprir a determinação constitucional, especialmente no que se refere aos direitos sociais materializados no capítulo da seguridade social. É possível verificarmos que as três vertentes apontadas por Pochmann ainda permanecem sob tensão na realidade brasileira e na abrangência das obrigações estatais - e as disputas entre elas permanecem.

Podemos reconhecer também que a força com que o pensamento neoliberal penetrou os governos brasileiros de cunho social-democrata (anos FHC, anos Lula e, aparentemente, o atual governo) têm imposto restrições ao exercício dos direitos sociais, substituindo-os pelo alargamento de formas de assistência social de cunho semi-filantrópico. Isto, ao lado de mudanças nas relações e direitos trabalhistas que cursaram com amplo estímulo à informalidade ou à redução dos deveres do Estado brasileiro. Esta retração trouxe também ampliação da participação privada na Saúde e na Previdência Social para trabalhador@s do campo privado e para servidor@s públicos, secundária à adoção de mecanismos de redução da atuação da previdência pública.

Ao reconhecermos a necessidade expressa por este Projeto, de produzir mecanismos que permitam o enfrentamento das iniquidades, em particular aquelas instauradas sob o regime do racismo patriarcal heteronormativo, expõe-se a determinação de utilizarmos aqui o conceito de proteção social na concepção mais ampla do que as políticas reunidas no capítulo constitucional da seguridade social, apontando para perspectivas redistributivas, de equidade. Assim, será útil o recurso ao conceito conforme assinalado por Sonia M. Draibe:

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O termo proteção remete à ideia de proteção contra riscos sociais, tanto os velhos e clássicos – perda previsível da renda do trabalho – quanto os contemporâneos – ter emprego decente, educar os filhos, viver nas megalópoles, habitar e alimentar-se condignamente etc. Dessa forma o conceito afasta-se muito do tradicionalmente referido apenas à seguridade social. (Proteção e insegurança sociais em tempos difíceis, 2005, P.6).

Ou seja, optamos aqui por afirmar a proteção social como um conjunto de políticas públicas – e também sua qualidade e abrangência - capazes de estabelecer padrões mínimos de igualdade e estabilidade social a pessoas e grupos, garantindo oportunidades para seu desenvolvimento e existência em patamares confortáveis. Desse modo, impondo restrições e confrontando as formas como as ideologias e práticas excludentes restringem direitos e produzem sofrimentos e injustiças.

Importante destacar que a opção pela forma ampla - ou pela forma restrita - do conceito traz embutida uma definição da abrangência do capitalismo e da democracia entre nós. Neste cenário assumem relevância opções conceituais (ideológicas) relativas ao escopo (e abrangências) dos direitos sociais, dos direitos trabalhistas, dos deveres do Estado (e da accountability), da descentralização das políticas públicas, dos significados de eficiência administrativa e de participação social.

Nestes tempos de crise do capitalismo neoliberal nos países centrais ocidentais (América do Norte e Europa), tais opções vão demarcar continuidades e/ou rupturas com as opções governamentais feitas no período dos dois governos liderados pelo presidente Fernando Henrique Cardoso/FHC e no período Lula, também ao longo de dois governos, ressignificadas agora no Governo Dilma.

De todo modo, abordar a proteção desde a perspectiva redistributiva implica dirigir o olhar mais amplo, além das políticas de assistência social, ou mesmo para além do conjunto de políticas reunidas no capítulo constitucional da seguridade social.

No contexto da iniquidade racial e suas variantes sexistas, assumem relevância também as políticas e mecanismos que visam enfrentar as iniquidades estruturais. No caso brasileiro, será também parte da proteção social as seguintes políticas:

» promoção da igualdade racial;

» políticas para as mulheres;

» políticas de promoção de direitos humanos;

» políticas para a juventude;

» acesso à terra e regularização fundiária;

» políticas para os povos indígenas. Tais políticas vão atuar de modo a qualificar as políticas para o enfrentamento do racismo institucional e demais iniquidades, ao mesmo tempo em que propõe uma nova cultura governamental e para a sociedade.

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Esta amplitude, que inclui trabalho e emprego e educação, bem como segurança pública e enfrentamento às violências, além de outros setores, pode ser vista na figura a seguir:

Figura 7: Políticas públicas de proteção social

Proteção Social

Promoção da igualdade racial

Politicas para as mulheres

Direitos Humanos

Juventude, Idosos, LGBT

Políticas para povos indígenas

Seguridade social

Assitencia social e combate à pobreza;

Saúde; Previdência social

Trabalho das mulheres

Trabalho doméstivo

Emprego e proteção ao desemprego

Educação

Habitação e Saneamento

Cultura

Esporte e lazer

Segurança Pública

TransporteAcesso à terra e regularização

fundiária

A trajetória histórica do desenvolvimento do Estado de Bem-Estar Social não foi homogênea, tampouco linear, nos diferentes cenários do capitalismo central ocidental. Alguns condicionantes estiveram – e ainda estão - relacionados à maior ou menor capacidade de investimento financeiro nas iniciativas de delimitação e reparação dos efeitos do desenvolvimento capitalista.

Para a constituição de sistemas de proteção social redistributivos nos países inspirados em princípios socialdemocratas foi fundamental, como destacou Marcio Pochmann (op cit), a constituição de fundos públicos como estrutura secundária de redistribuição, que contava com regimes de tributação progressiva da renda e da riqueza. Tal situação não se repetiu no Brasil. Para países como o nosso, onde as iniquidades estruturais, especialmente a desigualdade racial, foram incorporadas ao tipo de capitalismo periférico a nosso alcance, o desenvolvimento de sistemas e políticas de proteção social tem esbarrado em disputas de poder profundas, que atingem diretamente as formas de concepção e desenvolvimento do Estado nacional. Em tais disputas, estão em jogo definições do modelo de democracia moderna que somos e seremos capazes de produzir, considerando as pressões advindas das necessidades do capitalismo central, ao lado das pressões internas por redução ou eliminação da exclusão social e para a constituição de patamares razoáveis de redistribuição. Estas opções têm como pré-requisito fundamental a ação de uma sociedade civil fortalecida, capaz de angariar espaços dentro e fora de partidos políticos mais afinados com seus princípios e necessidades de mudança. Sendo, principalmente, capaz de produzir hegemonias consistentes no pensamento brasileiro quanto aos projetos de nação e de relações sociais mais justas.

No Brasil atual, no entanto, persiste um sistema tributário fortemente regressivo, que penaliza os estratos mais baixos da pirâmide de renda, tendo seus resultados investidos principalmente na manutenção dos privilégios conferidos pelo status quo. Conforme assinalaram Salvador e Yannoulas (2010):

O sistema tributário brasileiro (...) tem sido um instrumento a favor da concentração de renda, agravando o ônus fiscal dos mais pobres e aliviando o das classes mais ricas. O Imposto de Renda (IR) tem sido utilizado como instrumento de renúncias fiscais e favorecido a elisão e o planejamento tributário, além de dar tratamento mais gravoso aos rendimentos do trabalho e isentar os rendimentos do capital, como a distribuição do lucro. (Orçamento e financiamento de políticas públicas para a equidade de gênero, raça e geração, p.8).

financiamento de políticas públicas: a política tributária

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Assim, a hiperconcentração da riqueza capitalista nas mãos de poucos tem sido um importante mecanismo em favor dos grupos privilegiados e um entrave importante para a realização e expansão da proteção social, a partir da interposição de barreiras e filtros para a implementação adequada das políticas públicas e dos direitos sociais.

Nas palavras de George E. M. Kornis, o Brasil desenvolveu:

Um welfare state, em síntese meritocrático-particularista fundado na capacidade contributiva do trabalhador e num gasto público residual financiado por um sistema tributário regressivo. Um sistema não-redistributivo e montado sobre um quadro de grandes desigualdades e de misérias absolutas (...). (Kornis, 1995, pp. 58-59, citado por Fiori, J. L., 1997).

Esta perspectiva é válida tanto para as políticas anteriores à Constituição Federal atual, quanto para as ações e reformas posteriores. De fato, as sucessivas alterações e reformas instauradas no campo das políticas sociais e da política tributária não lograram alterar substancialmente estes padrões, restando sempre desafios não enfrentados na direção da redistribuição das riquezas e da equidade, mesmo após as determinações constitucionais de 1988.

A onda neoliberal instaurada no Brasil a partir dos anos 90, a exemplo de outros países da América Latina, trouxe como principal contraponto à implementação adequada da proteção social, a imposição da ideia de Estado mínimo. Definido como incompetente e desnecessário à democracia de mercado, o Estado deveria ser reduzido a tarefas básicas. Este Estado mínimo teria como aliado um tipo de cidadania que se apoia e se estabelece a partir de relações de consumo de produtos (no lugar de políticas) oferecidos por empresas privadas, regulados pelas dinâmicas próprias do mercado capitalista. Para este, a proteção social que interessa deve ser aquela dirigida somente aos mais fracos, incapazes de competir, deixando ao mercado a tarefa de regular as demais relações sociais e estabelecer os mecanismos de proteção considerados mais adequados a suas necessidades. Dessa forma, restringe-se a proteção social a medidas de assistência social semi-filantrópicas afastadas da perspectiva de direitos sociais e de seguridade.

Nestes anos de influência neoliberal, as reformas da Previdência desenvolvidas implantaram dispositivos necessários para a redução da responsabilidade estatal, permitindo a apropriação de importante fatia desta política pelo mercado de previdência privada e os fundos de pensão, estabelecendo um teto previdenciário público e mantendo-se regime contributivo vinculado ao trabalho formal.

Já a reforma tributária do período não enfrentou a taxação regressiva injusta (ver tabela 1), instaurando ou reforçando mecanismos capazes de promover maior arrecadação, ladeados por forte carga de renúncia fiscal ofertada às classes empresariais mais privilegiadas. Para as populações na base da pirâmide social, a contrapartida foi uma maior capacidade gerencial nas políticas compensatórias, maior amplitude destas em termos populacionais e financeiros e a retomada do estímulo à presença de segmentos privados filantrópicos ou não na seguridade social, reduzindo os direitos de cidadania e os deveres do Estado.

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A busca de flexibilização das legislações trabalhistas também fez parte da agenda destes governos, ao lado do estabelecimento de concursos públicos de modelo restritivo (como tempo pré-determinado entre 2 e 5 anos de contratação em muitos casos) e de estratégias de contratação em regime de CLT ou por produto (as chamadas consultorias) para ampliação do quadro de servidores federais.

Assim, tem se buscado ao longo dos anos aprovar legislações que garantam o barateamento do custo da mão de obra, a flexibilização das regras de formalização e a redução da participação dos gastos patronais no custeio da proteção ao trabalho. Neste período, um forte estímulo ao empreendedorismo cursou com um aumento do trabalho sem cobertura previdenciária, o que ajudou a elevar o chamado déficit previdenciário. Mais recentemente, medidas de estímulo à maior participação previdenciária de trabalhador@s dos extratos mais baixos e informais tem resultado no aumento da participação estatal no pagamento dos custos da inclusão previdenciária destes segmentos, ao lado de desembolsos diretos de usuári@s, sem qualquer aporte por parte das empresas ou do mercado financeiro.

Vemos então uma redução da capacidade de investimento estatal na proteção social, seja pela crescente crise dos mercados financeiros internacionais, exigente de mais aportes de recursos para salvar seus proprietários e processos; ou pela redução da arrecadação secundaria à escalada de isenções de impostos para empresas e a continuidade da política fiscal regressiva. O crescente sub-financiamento da

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seguridade social tem resultado na redução das possibilidades de desenvolvimento de proteção social redistributiva, apesar de reconhecermos o forte impacto que os programas de assistência social e combate à pobreza extrema em curso têm tido sobre a desigualdade de renda e o Índice de Gini.

Outra característica importante do pensamento neoliberal foi a invisibilização das ideologias produtoras e justificadoras das iniquidades, de modo a permitir sua livre circulação num ambiente acrítico. Para o neoliberalismo, buscar confrontar o racismo patriarcal heteronormativo é colocar-se em rota de colisão com seus interesses de acumulação embutidos na afirmação de um modelo de democracia desregulada e desenvolvida sob a liderança do mercado.

Não foi por acaso, portanto, que no cenário conturbado da expansão neoliberal no país, os primeiros anos do governo Lula não lograram cumprir os compromissos de campanha relativos a mudanças profundas nas políticas públicas de inspiração neoliberal (erigidas, como já afirmamos, sobre o arsenal de estratégias, políticas e ações do racismo patriarcal heteronormativo), na direção de políticas redistributivas capazes de inaugurar um ciclo virtuoso de bem-estar social e equidade. Ao contrário, além de reformas levadas a cabo segundo a cartilha neoliberal, estratégias e mecanismos de promoção da equidade e eliminação das desigualdades racial, de gênero, de geração, e outras foram inseridas ou desenvolvidas na estrutura governamental de modo subordinado e precário.

Ao eleger a erradicação da fome e a redução da pobreza como eixos da proteção social, o Governo Lula abriu mão das concepções e perspectivas de justiça e equidade ofertadas pelos direitos sociais inseridos na Constituição (o que inclui sua adesão a tratados internacionais neste campo) e pelas lutas sociais que possibilitaram sua eleição como representante das forças democráticas de transformação social. De fato, este governo abriu mão de promover alterações significativas na estrutura do Estado brasileiro e de romper, de fato e de direito, com a verdadeira “herança maldita” que o racismo patriarcal heteronormativo representa. Assim, deixou intocadas as causas das causas da fome e da pobreza, entre elas, a naturalização das inquidades e de sua concentração principalmente entre os mais escuros; a apropriação da riqueza e o exercício de privilégios econômicos, políticos e culturais pelos mais claros. Tais medidas foram traduzidas não apenas na destinação de maiores parcelas dos recursos públicos para as classes financeiras e proprietárias, mas também pela manutenção da dívida social em padrões muito altos. Padrões visíveis na ausência de decisão e de investimentos no reordenamento político, jurídico e de governança. Além do excesso de timidez ou da falta de vontade política para a criação, implantação e implementação de políticas públicas capazes de promover mudanças consistentes na vida dos segmentos femininos de pele escura e de pele clara; das residentes nas áreas distantes dos centros urbanos; entre as mais jovens e as idosas; entre outras. Tais medidas implicariam inversão radical nas formas de financiamento público e na estrutura de arrecadação; de participação e representação pública (nos mecanismos formais e nas dinâmicas da sociedade); e de organização e administração governamental, de modo a reduzir a fragmentação por um lado, ao mesmo tempo em que, por outro, permitissem a singularização das ações segundo grupos homogêneos de pessoas de acordo com os eixos de subordinação a serem enfrentados e desfeitos. Assim, ousando e realizando o projeto coletivo elaborado ao longo de todo o século XX e intensificado após a década de 60 por diferentes segmentos sociais onde se destaca, ao menos por sua longevidade, o Movimento Negro, de propor e conduzir mudanças significativas na cultura e nas relações sociais brasileiras como projetos de longo prazo, para o século XXI.

Como vimos anteriormente, a participação do racismo patriarcal heteronormativo na constituição das hierarquias sociais no Brasil é fenômeno amplo e complexo, com mecanismos ativos nos níveis pessoal (internalizado), interpessoal e institucional. Assinale-se que estas três dimensões atuam de modo concomitante e cooperativo para produzirem o quadro de destituição e exclusão material e simbólica experimentados por pessoas e grupos racialmente subordinados.

No que se refere ao estado de direito e às políticas públicas, o racismo patriarcal heteronormativo propicia um conjunto de lacunas e destituições, seja a partir de jogos explicitamente excludentes ou de adoção de perspectivas inerciais que permitam continuidade ao status quo de privilegiamento da branquitude e, nela, da masculinidade heterossexual.

Reconheça-se, mais uma vez, que o racismo institucional é um mecanismo produtivo, capaz de gerar e retroalimentar a exclusão racial, muito mais do que um suposto efeito colateral ou inercial da ideologia. Daí podermos verificar, em suas várias formas de atuação, diferentes momentos e oportunidades de realização da hegemonia racista da branquitude. Ao mesmo tempo, significarão possibilidades e oportunidade para a intervenção transformadora.

Tais momentos serão exemplificados no quadro a seguir, tendo a proteção social como direito:

Quadro I: Racismo e controle

estrutura estado políticas publicas ações/programas/projetos

Controle ideológico e operacional do Estado.

Controle dos poderes constitutivos: formação e perpetuação de maiorias.

Objetivos dirigidos aos interesses do grupo dominante.

Critérios de planejamento e priorização definidos sob a perspectiva do grupo dominante.

Propriedade e controle dos meios de produção de hegemonia cultural, política e econômica.

Mecanismos de controle acessíveis especialmente aos grupos dominantes: critérios, mecanismos (partidos políticos, universidades); escolaridade, processos seletivos (concursos, currículos).

Administração a cargo de representantes do grupo dominante: controle dos critérios de acesso a cargos superiores.

Objetivos e metas dirigidas aos interesses de manutenção do status quo.

desproteção social:o papel do racismo

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Como podemos verificar, diferentes posições e iniciativas precisam estar sob o monopólio ou o controle dos grupos racialmente dominantes, para agirem de modo eficaz na produção de discursos e perspectivas legitimadoras do privilégio. Assim, as escolhas, caminhos gerenciais e lógicas empreendidas guardaram relação de continuidade com a constituição de facilidades ou barreiras operacionais, ao lado da produção de mecanismos que permitam sua naturalização. O que implica também em diversificação das oportunidades e momentos adequados de agir visando à eliminação destas barreiras e destas facilidades interpostas pelo racismo. Fique claro que tais oportunidades devem ser apropriadas, de forma concomitante ou escalonada, segundo planejamento bem estruturado para, desse modo, atingir o racismo de forma profunda, confrontando-o e possibilitando, no longo prazo, sua eliminação.

No campo da proteção social no sentido amplo, o racismo institucional atua em diferentes níveis, propiciando maior ou menor proteção, segundo veremos abaixo:

1. Estrutural: a. produz e legitima a apropriação dos mecanismos e resultados das

políticas públicas pelo grupo racialmente hegemônico;

b. deslegitima perspectivas redistributivas.

Exemplo: a crescente perspectiva contributiva, de consumo, no desenvolvimento de políticas sociais; adoção de critérios mercadológicos de gestão e de avaliação de resultados; invisibilização ou abandono dos princípios de isonomia, equidade, igualdade racial e redistribuição de renda e riqueza como balizadores das ações do Estado e das politicas públicas (redução da eficácia constitucional).

2. Estado:

a. reduz a capacidade de controle e gerenciamento dos recursos e políticas públicas sociais;

b. mantém ou amplia o controle do grupo racialmente hegemônico sobre políticas econômicas.

3. Políticas públicas:

a. mantém identidade de objetivos e resultados de apropriação de riquezas materiais e simbólicas com interesses do grupo racialmente dominante;

b. amplia a participação privada na gestão das políticas sociais.

Exemplo: participação crescente de empresas, OS, OSCIP, filantrópicas nas políticas de seguridade social, habitação, transporte, saneamento, cultura, ao lado da insuficiência e incompetência dos mecanismos de promoção da equidade. Controle e administração das políticas – ocupação de cargos na hierarquia superior - nas mãos de representantes dos grupos racialmente hegemônicos.

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4. Programas, projetos, ações:

a. amplia e dissemina práticas de ação focalizadas nos tidos como incapazes de gerar riqueza própria: re-filantropização das políticas sociais;

b. reduz os objetivos das políticas públicas à remediação dos efeitos colaterais da competição capitalista;

c. abandona a perspectiva de redistribuição e transformação social;

d. reduz a capacidade de redução ou eliminação das disparidades raciais e de gênero, entre outras.

Exemplo: crescente adoção de metodologia gerencial “por produção” ou outras segundo a lógica do capitalismo central. Ao lado da inexistência ou inoperância de mecanismos de enfrentamento ao racismo institucional.

É possível verificarmos, nas questões colocadas, a complexidade das relações entre racismo patriarcal e o sistema econômico hegemônico. Desnecessário recordar que esta vinculação subsiste desde a empresa colonial escravocrata, cuja exploração exponencial da mão de obra humana possibilitou a acumulação primordial que esteve na origem das modalidades modernas de relações econômicas e de trabalho.

Ainda assim, para a continuidade de modalidades de exploração, de acumulação e de aprisionamento de Estados nacionais pelos interesses de grupos racialmente hegemônicos – em grande parte representados pelas populações brancas ocidentais – tem sido necessária a adesão e atualização de visões inferiorizantes de outras populações, a reiteração do domínio do Estado e a naturalização de perspectivas reduzidas de democracia e igualdade.

Como vemos, o racismo como fenômeno produtivo guarda profundas relações com a constituição da modernidade capitalista ocidental, bem como seus processos econômicos e sociais. E ele se confunde de variadas formas, com a democracia institucionalizada em nossa região. Não será coincidência, portanto, sua invisibilização diante de quadros tão exuberantes de hegemonia branca.

parte 3

indicadores de racismo institucional

ou sistÊmico

O recurso a números, estatísticas e indicadores não é uma novidade atual. De fato, trata-se de um elemento presente nos processos de implantação de modernos Estados-nação europeus, a partir do século XIX. Utilizados como forma de reafirmação e garantia de deslocamento do poder de informação e decisão da mão das elites aristocráticas para os novos grupos de poder nas democracias incipientes, os indicadores marcaram também a valorização de conhecimentos científicos – e especialmente de seus autores/atores – supostamente transparentes, neutros e mais objetivos. Desse modo, trata-se também de um deslocamento das deliberações e seus fundamentos da esfera dos valores e da política – sujeitas a subjetividades, interesses particulares, hegemonias - para a tecnocracia científica.

Ao longo do tempo, o uso dos números e indicadores passou a fazer parte das rotinas e das ferramentas utilizadas no mundo corporativo. Já nos anos 70 do século XX, houve uma primeira tentativa de se estender seu uso para outros campos: diferentes instituições buscaram elaborar indicadores capazes de medir fenômenos sociais e suas transformações, sendo firmemente rechaçados pelas organizações sociais à época, que denunciavam a simplificação de processos, sua parcialidade e preconceitos.

No entanto, a partir da década de 90, novos processos passam a disseminar o uso de tais ferramentas, redundando em maior aceitação ao uso de indicadores. Tal ampliação retrata, principalmente, o fortalecimento de lógicas e processos propagandeados nos anos neoliberais e que tiveram o Banco Mundial como um de seus importantes propulsores, mas que inclui também os organismos das Nações Unidas, especialmente aqueles voltados para a garantia de direitos. Maior controle sobre processos e resultados, maior eficiência e transparência, são colocados como razões que justificam a inserção de indicadores desenvolvidos na perspectiva de direitos na rotina de ONGs e movimentos sociais.

Por outro lado, a disseminação do uso de indicadores no campo das lutas sociais expõe também a fragilidade das organizações da sociedade civil no período, que passam a obedecer e implantar regras e procedimentos condicionados à obtenção de fundos corporativos ou públicos, em grande parte distantes de suas metodologias e objetivos de trabalho.

Um importante aspecto que a utilização de indicadores traz é que, apesar de afirmar-se segundo objetividades e transparências, seus processos estão, na prática, distantes disso. Via de regra, os processos de escolha de seus componentes, interpretação de seus resultados e disseminação de informações permanecem

indicadores: discussão inicial

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vinculados os seus “donos”, propositores ou autores. Estando assim, afastados das possibilidades de amplo manejo e compreensão pelo público em geral, escondendo ou revelando interesses em grande medida particulares e depositados, de forma elitista, na mão de especialistas.

No plano geral, trata-se de cultura disseminada a partir dos países do capitalismo central, produtores de uma profusão de dados, modelos lógicos e marcos conceituais identificados com sua visão de mundo e modos de fazer, ainda que tal cultura seja apropriada por sujeitos e coletividades na periferia global, sejam cientistas, oficiais de organizações multilaterais, governos e corporações especialmente, mas também ativistas e organizações da sociedade civil. Mesmo nestes casos, a padronização necessária aos processos de comparação e ranqueamento embutem relações de poder e posições de autoridade que excluem outr@s sujeit@s, suas lógicas, linguagens e procedimentos. Nas palavras de Sally Engle Merry:

Um indicador permite uma transição da ambiguidade para a certeza; da teoria para fatos; e da variação complexa e contextual, para a veracidade comparável dos números. Em outras palavras, o processo político de julgar e avaliar é transformado em assunto técnico de medição e contagem pelo trabalho de especialistas diligentes. Práticas de medição de fenômenos que são facilmente contados, como dinheiro ou inventários de bens, são transplantadas para domínios muito menos suscetíveis de quantificação, como a frequência de tortura ou a prevalência de doenças. Tecnologias de conhecimento desenvolvidas na esfera econômica movem-se com dificuldade dentro destes novos campos. (Merry, S. E . Measuring the World: Indicators, Human Rights, and Global Governance. Current Anthropology Volume 52, Supplement 3, April 2011, p. S88.Tradução minha.)

Ainda assim, é possível reconhecer a utilidade dos indicadores: padronização, legibilidade, comparabilidade, capacidade de organização, controle ou ranqueamento, entre outros, têm sido úteis não apenas a corporações e governos, mas também a agentes das lutas sociais de transformação. E, uma vez traduzidos para linguagens cotidianas, diferentes indicadores podem ter ampla circulação nas diferentes sociedades. Ao mesmo tempo em que, assumindo metodologias hegemônicas, buscam diálogo direto com estes grupos, porém visando o estabelecimento e explicitação do contraditório.

Não devemos nos esquecer, de todo modo, que quaisquer indicadores embutem o risco de fazer desaparecer contextos, especificidades, complexidades, individualidades e sutilezas que somente a singularização é capaz de expor. Além de diminuir o espaço para processos políticos baseados em outras formas de discernimento e avaliação. E, por fim, não garantindo a democratização dos processos avaliativos e decisórios.

A par destas contradições, resta ainda ao processo aqui em desenvolvimento um longo caminho de escolhas, apropriações, rupturas, de modo a permitir que os indicadores ofereçam condições de fortalecimento da sociedade civil e suas lutas, especialmente no que se refere ao enfrentamento ao racismo patriarcal heteronormativo e seus mecanismos institucionalizados.

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Isto significa, em primeiro lugar, a constituição de processos de escolha e definição de indicadores, sua metodologia de produção e disseminação, bem como suas possibilidades interpretativas, abertos o suficiente para realidades distintas e para olhares diversos. Para isto, algumas decisões foram tomadas pela coordenação deste capítulo do Projeto Mais Direitos e Mais Poder para as Mulheres Brasileiras, a respeito do escopo e formato dos Indicadores de Racismo Institucional ou Sistêmico nas Políticas de Proteção Social, a saber:

E mais, os indicadores a serem propostos aqui deverão considerar:

É importante assinalar que o racismo se estabelece e desenvolve acima e além das instituições. Desse modo, podemos compreender os limites colocados aos indicadores e à capacidade das instituições per se, de produzirem transformações mais profundas nas relações sociais. O que os indicadores poderão assinalar refere-se ao engajamento da instituição específica, de governos e, no limite (de setores) do Estado, para o enfrentamento do racismo enquanto dimensão ideológica e pragmática. Do mesmo modo, aspectos da análise dos indicadores poderão apontar também os caminhos para o enfrentamento dos diferentes eixos de subordinação que atravessam indivíduos e grupos, garantindo-se sua adequação e tempestividade nos processos de planejamento, monitoramento e avaliação, ampliando e aprofundando a ação e a visão sobre os caminhos da mudança.

Assim, o que se quer aqui é delinear ferramentas que apoiem a observação e a análise acerca da presença e do impacto do racismo institucional nos organismos e políticas dirigidas à proteção social, bem como fornecer suporte para a ação de enfrentamento ao Racismo Institucional neste campo.

1. Devem ser amplos e inespecíficos, de modo a poderem ser utilizado nas diferentes áreas, políticas e serviços.

2. Devem reunir informações quantitativas e qualitativas de modo simplificado e acessível a não-especialistas.

3. Devem ser elaborados na perspectiva dos movimentos e sujeitos sociais, organizações e ativistas, para seu manejo mais apropriado. Ainda que também sirvam para uso por técnicos e gestores das instituições governamentais ou corporativas.

4. Devem ser úteis tanto para o diagnóstico de situações e processos, como também para sugerir caminhos de superação e reorganização, numa perspectiva didática.

1. Que o racismo institucional ou sistêmico garante as condições para a perpetuação das iniquidades socioeconômicas que atingem a população negra e outras atingidas pelo racismo.

2. Que o racismo institucional se associa a outras iniquidades, produzindo ou ampliando as desigualdades experimentadas pelas mulheres negras e as demais atingidas pelo racismo patriarcal. Da mesma forma, associando-se a diferentes eixos de subordinação, agrava as condições de vida e aprofunda iniquidades.

3. Que o racismo institucional traduz escolhas institucionais atuais ou passadas reeditadas por decisão ou inércia. E sua destruição requer novos compromissos, processos e práticas.

Indicadores são ferramentas que permitem a observação e apoiam análises acerca de mudanças que se quer produzir ou observar a partir de determinada ação. Ou seja:

Indicadores são peças de informação que oferecem uma visão clara a respeito de questões mais amplas e que tornam perceptíveis tendências que não são imediatamente detectáveis (Hammond et al, citados por FRANCO, Fernando S. et al. Monitoramento Qualitativo de Impacto Desenvolvimento de Indicadores para a Extensão Rural no Nordeste do Brasil, p. 32).

Sua definição e adoção são partes de um processo mais amplo de observação (monitoramento) e análise (avaliação), podendo beneficiar-se da participação dos diferentes sujeitos sociais a quem se deve ou quer atender, e para quem as mudanças são necessárias.

A figura a seguir permite compreendermos o processo dinâmico e cíclico em que a definição de indicadores está inserido:

Figura 8: Seis passos de implementação do monitoramento de impacto

Fonte: FRANCO, Fernando S. et al., op. cit.

monitoramento e avaliação: definição de indicadores

como momento do processo de planejamento e avaliação

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Neste processo, o grau de participação dos grupos diretamente interessados (beneficiári@s) pode variar, sendo possível em todos os momentos, conforme a figura a seguir. Mas assinale-se que, desde a perspectiva aqui abordada, a participação é desejável ou mais que isso, mandatória.

Figura 9: Diferentes níveis de participação de sujeitos da ação (beneficiári@s) no monitoramento:

Fonte: FRANCO, Fernando S. et al., op. cit.

A escolha de indicadores para evidenciar o Racismo Institucional e para o monitoramento dos processos empreendidos para sua erradicação guarda forte carga de ineditismo. Isto devido à baixa incorporação do conceito de racismo institucional nos processos de trabalho das organizações governamentais e sociais, como também pela ausência ou insuficiência de experiências prévias de políticas e estratégias de erradicação do Racismo Institucional e, consequentemente, de seu monitoramento e avaliação.

Assim, buscaremos apoio nas formulações gerais de definição de indicadores para diferentes objetivos e fenômenos, que podem contribuir com a empreitada aqui em desenvolvimento.

Segundo diferentes especialistas já apontaram, existem critérios importantes para a escolha de indicadores, quais sejam:

Sensibilidade:

O indicador reage quando há mudanças pequenas?

O indicador reage rapidamente e em escala suficientemente exata?

O indicador mostra o grau de mudança?

Validade:

O indicador mede aquilo que estamos pensando e não está sendo influenciado por outros fatores?

O indicador mede mais direto possível ou mostra efeitos causais?

Relação custo / benefício:

Requer muito equipamento ou tempo para medir esse indicador?

Os custos para medir esse indicador são muito altos?

Mensuração:

É possível contar e medir esse indicador?

Qualquer um pode conferir o indicador?

Temporalidade:

É pontual?

Pode-se medir em intervalos, por exemplo, cada semana ou mês?

indicadores de racismo institucional nas políticas de

proteção social

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Pode-se aplicar esse indicador com continuidade e regularidade?

Consegue reagir quando foge de um intervalo fixo?

Simplicidade:

É simples para usar, medir e interpretar?

Todos podem entender o indicador?

Não precisa de muitas explicações?

A partir destes critérios apontamos um conjunto de fenômenos a serem visibilizados e seus indicadores para evidenciação e monitoramento dos processos de eliminação do racismo institucional e das disparidades raciais nas políticas de proteção social.

Importante assinalar que as definições adotadas neste trabalho apoiam-se no pressuposto central de que a eliminação do racismo institucional deve ser parte das iniciativas, ações, políticas institucionais governamentais e Estatais. O que responde às determinações da Declaração e Plano de Ação da III Conferência Mundial contra o Racismo, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, aos princípios constitucionais, à Lei 12. 288 de 2011 (Estatuto da Igualdade Racial) e demais normas jurídicas e políticas de promoção da equidade, de erradicação das disparidades raciais e de gênero e de reafirmação democrática da vigência dos DHESCAs, direitos humanos, econômicos, sociais, culturais e ambientais no país. O que implica considerar que a linha de base para a formulação de indicadores é a obrigação institucional de desenvolver, monitorar e avaliar seus processos de eliminação do Racismo Institucional na totalidade de suas ações e processos. Desse modo, o que os indicadores deverão ressaltar é a vigência, pertinência e adequação das inciativas de eliminação do Racismo Institucional nas políticas de proteção social.

Some-se a isto a necessidade de, diante da perspectiva sistêmica do racismo, atuar-se em diferentes momentos de sua operacionalização, de modos diversificados. Dessa forma, almeja-se tornar possível a instabilização de seus processos, a partir do que poderemos alcançar a eliminação paulatina de seus efeitos.

A seguir propomos um elenco de indicadores a partir da perspectiva assinalada neste trabalho, que aponta três momentos de incidência do RI havendo, portanto, três diferentes níveis ou oportunidades de agir segundo os princípios estabelecidos na legislação, para sua eliminação, quais sejam:

a. acesso e utilização;

b. processos institucionais internos;

c. resultados das ações e políticas públicas.

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modos e momeNtos de operacioNaliZaçÃo

do riresposta açÃo iNdicadores

Grau de vivência e/ou internalização da subordinação pel@s sujeit@s:• aceitabilidade• cultura• linguagem/alfabetização/escolaridade• atitudes, crenças, preferências• envolvimento na ação• renda

Desenvolvimento de estratégias de aproximação e diálogo com diferentes populações excluídas; por exemplo: estratégias de abordagem singularizadas, deslocamento de equipes etc.

- Diagnóstico das características da população segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero - Ação integrada com outras políticas setoriais como educação e emprego;- Treinamento de equipes: para abordagem singularizada e para enfrentamento ao racismo;- Estabelecimento de metas de cobertura para grupos populacionais excluídos;

- Mapa das populações diversas no território segundo raça/cor e identidade de gênero atualizado periodicamente;- Número de equipes intersetoriais preparadas para abordagem diferenciada;- Porcentagem de abordagens de pessoas e grupo excluídos segundo raça/cor e identidade de gênero.

Quadro I: Indicadores de eliminação RI no acesso e utilização de políticas públicas:

a-Acesso e utilização: os indicadores propostos para medir as ações de eliminação do RI neste nível, para ampliação do acesso e utilização das políticas públicas de proteção social pelas mulheres negras devem permitir a verificação da adequação das ações adotadas para a aproximação física e cultural entre instituições públicas e as mulheres negras. Tais iniciativas de aproximação implicam não apenas na eliminação de entraves que impedem o agente público de alcançar as mulheres negras e cada uma entre elas, como também em maior disponibilização de infraestrutura acessível a estas mulheres negras. Ou seja, estes indicadores deverão destacar os esforços da instituição em deslocar-se - fisicamente e quanto à cultura institucional - em direção a este grupo excluído ou sub-representado entre o público de suas ações e serviços.

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modos e momeNtos de operacioNaliZaçÃo

do riresposta açÃo iNdicadores

Estrutural:• informação• disponibilidade• grau de organização• transporte

- Ampliação da destinação de recursos materiais e humanos às políticas destinadas à redução das iniquidades raciais, de gênero e de classe social- Ampliação da participação social da população negra.

- Inserção da promoção da equidade racial e de gênero como dimensão estratégica e )objetivo dos ciclos de planejamentos e orçamento públicos nas três esferas de gestão- Ampliação da representação negra, com equidade de gênero, nos diferentes mecanismos de participação e controle social nos diferentes setores das políticas públicas e nas três esferas de gestão;- Ampliação da participação negra, com equidade de gênero, e das informações para a promoção da equidade na comunicação pública e privada.

- Número de inserções midiáticas de temas de promoção da equidade em horário nobre para comunicação e informação de políticas públicas e de promoção da equidade - Porcentagem de utilização de mídias comunitárias para a informação pública- Porcentagem de disponibilização de turnos alternativos de atendimento à população nos diferentes órgãos de públicos- Mapa da distribuição de serviços pelos territórios segundo % de população negra;- Porcentagem de horas de treinamento para a promoção da equidade de servidores e profissionais;- Porcentagem de equipes lotadas por turno de trabalho segundo clientela prevista.

Financeiro:• suporte público• cobertura (pública e privado)• capacidade de desembolso (contributivo ou privado)

- Criação do orçamento da seguridade social com maior participação da taxação da riqueza;- Ampliação do orçamento público para as políticas de enfrentamento ao racismo e as iniquidades de gênero.

- Ampliação do investimento público dirigido à eliminação do racismo e à iniquidade de gênero;- Ampliação das redes públicas de serviços nas regiões de maior presença de população negra;- Redução da participação previdenciária contributiva das mulheres negras.

- Utilização da raça/cor e sexo/identidade de gênero para cálculo e prestação de contas do investimento público per capita nas diferentes políticas públicas;- Porcentagem de gasto das famílias com saúde e previdência segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero.

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processos para elimiNaçÃo do ri

resposta açÃo iNdicadores

Compromisso de gestão - Criação de um sistema de enfrentamento ao racismo institucional na gestão pública;- Adoção do enfrentamento ao racismo e redução das iniquidades raciais e de gênero como marcas dos diferentes governos.

- Estabelecimento de normas e protocolos institucionais de enfrentamento ao RI;- Criação e funcionamento articulado de mecanismos institucionais de enfrentamento ao RI com fonte estável de financiamento adequado, transparência, prestação de contas; - Comunicação pública de compromisso com a diversidade e o enfrentamento ao racismo;- Estabelecimento de ações afirmativas para ampliação da participação de mulheres negras nos diferentes níveis de gestão: programas de qualificação, cotas, treinamento das equipes para maior aceitabilidade etc.;- Ampla divulgação de estratégias, ações e resultados segundo raça/cor e explicitação da realização de metas diferenciadas.

INDICADORES

- Número de protocolos de enfrentamento ao racismo institucional assinado segundo setores e organismos de políticas públicas;- Número instâncias de coordenação de ações de enfrentamento ao RI em funcionamento segundo setores e organismos de políticas públicas;- Número de campanhas de promoção da diversidade e de enfrentamento ao racismo desenvolvidas nos diferentes órgãos públicos;- Número de mulheres negras em postos de chefia segundo número de cargos de chefia disponíveis.

Atuação intersetorial e interinstitucional

Atuação intersetorial e interinstitucional

Atuação intersetorial e interinstitucional

- Número de protocolos intersetoriais estabelecidos e assinados.

b-Processos institucionais internos: os indicadores voltados para esta etapa devem realçar alterações nos processos institucionais. Ou seja, trabalhar os modos e os movimentos organizativos internos para responder às necessidades expressas ou coletadas e disponibilizar ações e serviços capazes de atender de modo adequado às diferentes mulheres negras, diminuindo e eliminando as diferenças na prestação de serviços e em seus resultados. Vejamos a seguir:

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processos para elimiNaçÃo do ri

resposta açÃo iNdicadores

Planejamento adequado - Estabelecimento de mecanismos de participação de mulheres negras nos processos de planejamento, monitoramento e avaliação das políticas públicas;- Estabelecimento de processos ascendentes de planejamento de políticas, a partir das localidades e territórios.

- Inserção de mulheres negras nos processos de planejamento institucional;- Inserção de objetivos de eliminação do RI e das disparidades raciais e de gênero nas diferentes políticas públicas;- Inserção de indicadores de melhoria da qualidade de vida das mulheres negras nos critérios de avaliação de sucesso e qualidade das políticas públicas;- Divulgação ampla de processos e resultados;- Utilização das informações originadas nos processos de M&A no novo ciclo de planejamento.

- Percentual de mulheres negras participantes dos ciclos de planejamento, monitoramento e avaliação de políticas segundo a população a que estas se dirigem; - Estabelecimento de metas diferenciadas segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero para as ações e políticas.

Monitoramento, avaliação e retroalimentação

- Estabelecimento de metodologias simplificadas e amigáveis de monitoramento e avaliação de políticas para eliminação do RI.

- Participação de mulheres negras na definição de processo e indicadores de avaliação;- Incorporação de indicadores de enfrentamento ao RI aos critérios de avaliação de políticas públicas;- Utilização das informações resultantes no novo ciclo de planejamento.

- Percentual de mulheres negras inseridas nos processos de monitoramento e avaliação desenvolvidos;- Percentual de políticas e estratégias de enfrentamento ao RI bem avaliadas.

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processos para elimiNaçÃo do ri

resposta açÃo iNdicadores

Qualidade dos serviços:•competência cultural, racial, e de identidade de gênero•capacidade de comunicação•conhecimentos•enfrentamento a preconceitos e estereótipos

- Desenvolvimento de políticas públicas singularizadas segundo grupos raciais e de gênero, território e identidades;- Ampliação da descentralização e autonomia da gestão voltadas para ampliação da participação e da resolutividade;- Ampliação da capacidade indutora e reguladora dos mecanismos de promoção da igualdade racial e de gênero.

-Estabelecimento de ações afirmativas para ampliação da diversidade cultural, racial, e de identidade de gênero na gestão e nas equipes de trabalho;- Ampliação da disponibilidade de treinamentos para a capacidade institucional de diálogo e acolhimento da diversidade e para o enfrentamento ao RI;- Desenvolvimento de processos de avaliação periódica da competência institucional para enfrentamento ao RI;- Posicionamento dos mecanismos de enfrentamento ao RI e eliminação das iniquidades de gênero nos estratos superiores da hierarquia administrativa.

- Percentual de participação de mulheres negras nas ações afirmativas e outros estímulos à contratação de diferentes profissionais adotadas;- Proporção de participação de mulheres negras nas equipes de trabalho segundo a população no território; segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero;- Localização dos mecanismos de enfrentamento ao RI e eliminação das iniquidades de gênero no organograma institucional.

Atendimento adequado - Ampliação do grau de satisfação das mulheres negras em relação às ações e políticas públicas.

- Definição de estratégias de acolhimento às mulheres negras e à população;- Adequação da infraestrutura de serviços às necessidades das mulheres negras e da população negra;- Equiparação do tempo de espera para atendimento segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero.

- Estabelecimento e divulgação de ouvidorias para organismos e políticas públicas;- Inserção dos quesitos raça/cor e sexo/identidade nos formulários administrativos, inclusive nas ouvidorias;- Tempo de espera para atendimento segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero;- Grau de satisfação da população atendida e não atendida segundo perfil cultural, racial, e de identidade de gênero.

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processos para elimiNaçÃo do ri

resposta açÃo iNdicadores

Eficácia dos procedimentos

- Redução do RI nos organismos e nas políticas públicas;

- Estabelecimento de metas de redução do RI e das disparidades raciais e de gênero nas políticas.

- Percentual de população satisfeita segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero;- Percentual de alcance dos resultados das ações e políticas segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero.

Compreensão e adesão de sujeit@s da ação

-Estabelecimento de estratégias de aproximação entre organismos de gestão e execução de políticas públicas e as mulheres negras;

- Estabelecimento de mecanismos de singularização de ações e políticas voltados para as necessidades das mulheres negras;- Disponibilização de canais de informação, diálogo e denúncias sobre ações desenvolvidas em locais e horários acessíveis às mulheres negras.

- Percentual de mulheres negras que responderam adequadamente às perguntas sobre objetivos e mecanismos das políticas em avaliações institucionais.

Participação social - Estabelecimento de ações afirmativas para ampliação da participação das mulheres negras nas diferentes instâncias e processos.

- Criação de vagas para mulheres negras proporcionais e sua presença na população nas diferentes instâncias e mecanismos de participação e controle das políticas públicas.

- Percentual de mulheres negras participando das diferentes instâncias segundo população;- Metodologia de incorporação de demandas das mulheres negras no planejamento institucional aplicada.

c-Resultados das ações e políticas públicas: Neste nível, os indicadores devem ser capazes de realçar o desenvolvimento de ações que atestem a mudança institucional, vista como adoção de práticas capazes de aproximar os objetivos institucionais das necessidades das mulheres negras. Assim, tais indicadores buscarão traduzir os esforços institucionais de eliminação do RI a partir da análise do resultado das políticas públicas. Vejamos:

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modos e momeNtos de operacioNaliZaçÃo

do riresposta açÃo iNdicadores

Proteção social• saúde• previdência social• assistência social• emprego e proteção ao desemprego• educação• habitação e saneamento• transporte• cultura• esporte e lazer

- Estabelecimento de metas de ampliação da proteção social das mulheres negras;- Estabelecimento de metas de redução do RI e das iniquidades de gênero nas políticas públicas.

- Pactuação de metas sanitárias de redução da morbimortalidade segundo raça/cor;

- ampliação da cobertura previdenciária de mulheres negras: MEI, trabalho doméstico;

- Ampliação da cobertura das políticas de assistência social segundo raça/cor a grupos específicos: usuári@s de saúde mental, população de rua;

- Redução do desemprego e informalidade entre mulheres negras;

- Redução dos diferencias de escolaridade/ renda segundo raça/cor e identidade de gênero e situação regional;

- Redução da carga horária de trabalho das mulheres negras;

- Redução da disparidade racial nas taxas de escolaridade entre mulheres segundo idade e situação territorial;

- Ampliação da participação de mulheres negras nos programas de moradia;

- Distribuição de opções de moradia nos diferentes territórios (eliminação da segregação territorial) dando prioridade de aquisição às mulheres negras;

- Ampliação da disponibilidade, integração e eficácia de transportes coletivos;

- Redução dos custos individuais de utilização do sistema de transporte coletivo;

- Simplificação de mecanismos de acesso e disponibilização de financiamento público para iniciativas culturais comunitárias;

- Estabelecimento de metas de redução das disparidades raciais pactuadas em cada política;

- Percentual de mulheres negras associadas à previdência pública;

- Proporção de brancas e negras com cobertura previdenciária;

- Elaboração de mapa da população com direito à assistência social segundo perfil cultural, racial, e de identidade de gênero atualizado;

- Percentual de candidat@s à assistência atendid@s segundo perfil cultural, racial e de identidade de gênero;

- Percentual da população infantil atendida em creches segundo raça/cor;

- Percentual de mulheres negras matriculadas em escolas e cursos;

- Mapa do déficit habitacional segundo raça/cor e identidade de gênero atualizado;

- Mapa da distribuição de empreendimentos habitacionais populares por região das cidades;

- Mecanismos de redução tarifária e integração em curso, p. ex: bilhete único etc.;

- Novas modalidades de acesso à moradia utilizadas: comodato, hipoteca crédito simplificado etc.;

- Raça/cor e identidade de gênero como critérios de elegibilidade e qualificação para moradia popular; financiamento a empreendimentos culturais.

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modos e momeNtos de operacioNaliZaçÃo

do riresposta açÃo iNdicadores

Ampliação da disponibilização de equipamentos esportivos públicos com flexibilização dos horários de utilização, dando prioridade às atividades e esportes preferidos pelas mulheres negras.

Equidade - Ampliação da divulgação, compreensão e incorporação do princípio da equidade nas políticas públicas.

- Desenvolvimento de estratégias de comunicação do princípio da equidade para gestor@s, trabalhador@s e para a população em geral, especialmente as mulheres negras;- Adoção de metas de equidade nas políticas públicas.

- Número de mecanismos de promoção da equidade atuantes;- Número de campanhas de promoção da equidade em curso para os diferentes públicos.

Visões d@s sujeit@s da ação• experiências• satisfação• parceria efetiva

- Maior adesão ao enfrentamento ao RI e à redução das iniquidades de gênero.

- Ampliação das noções de direito pelas mulheres negras;- Ampliação da participação de gestor@s e profissionais nas ações e políticas de eliminação do RI e das iniquidades de gênero.

- Percentual de avaliações positivas das mulheres negras acerca da qualidade e dos objetivos das ações e políticas em curso;- Número de reclamações, denúncias e elogios apresentados às ouvidorias segundo raça/cor e sexo/identidade de gênero.

Cabe ressaltar que o monitoramento e avaliação dos processos necessários à eliminação do racismo institucional nos três níveis apontados aqui requer a constituição de sistemas intra e interinstitucionais com autonomia, capacidade operacional e competência gerencial, adequadas ao desenvolvimento contínuo e sustentável das ações necessárias ao cumprimento de seu mandato. Tais atribuições requerem também transparência de diálogo permanente com a sociedade civil, especialmente com as diferentes mulheres negras e suas representações.

Por outro lado, é fundamental que, no lado da sociedade civil, se constitua múltiplos observatórios, articulados entre si, de modo a garantir a replicabilidade e a sustentabilidade das ações ao longo do tempo, de modo a permitir que aprofundem seu alcance de mudança do Estado e suas relações.

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