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RAIMUNDO NONATO QUEIROZ DE LEÃO Coordenador. CLÉA NAZARÉ CARNEIRO BICHARA ESTHER CASTELLO BRANCO MELLO MIRANDA IRNA CARLA DO ROSÁRIO DE SOUZA CARNEIRO MARIA REGINA FERNANDES DE OLIVEIRA NAGIB PONTEIRA ABDON PEDRO FERNAN DO DA COSTA VASCONCELOS BIBIANE MONTEIRO DA SILVA ANDRÉA LUZIA VAZ PAES LOURIVAL RODRIGUES MARSOLA Subcoordenadores I Editora CEjUP Universidade do Estado do Pará Instituto Evandro Chagas ~

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RAIMUNDO NONATO QUEIROZ DE LEÃO

Coordenador.

CLÉA NAZARÉ CARNEIRO BICHARA

ESTHER CASTELLO BRANCO MELLO MIRANDAIRNA CARLA DO ROSÁRIO DE SOUZA CARNEIRO

MARIA REGINA FERNANDES DE OLIVEIRA

NAGIB PONTEIRA ABDONPEDRO FERNAN DO DA COSTA VASCONCELOS

BIBIANE MONTEIRO DA SILVAANDRÉA LUZIA VAZ PAES

LOURIVAL RODRIGUES MARSOLA

Subcoordenadores

.

I

Editora CEjUPUniversidade do Estado do Pará

Instituto Evandro Chagas

~

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Editores: Gengis Freire e Ana Rosa Cal FreireCapa: Ethevaldo Cavalcante

Revisão: Luiz BrancoEditoração Eletrônica: Andréa Pinheiro

índice elaborado por: Maria Lucia Almeida -CRB-2/4Direitos reservados

Composto e impresso na Graficentro, Gráfica e Editora Ltda.-Rua Tiradentes, 392 -

para a Editora Cejup Ltda.

Pará

Trav. Rui Barbosa, 72666053-260 -Belém -PA

Fone: (091) 225-0355/Fax: 241-3184

São Paulo

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01404-000 -São Paulo -SP

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Doenças Infecciosas e Parasitárias: Enfoque Amazônico / RaimundoNonato Queiroz de Leão {coordenadoi}, -Belém: Cejup: UEPA:Instituto EvandroChagas, 1997,

,886 p.

Vários autores.ISBN 85-338-0373-7

!

1. Doenças Parasitárias 2. Doenças Transmissíveis I Leão,Raimundo Nonato Queiroz de.

95-5193 CDD-616.96NLM-WC 695

-índices para catálogo sistemático:

Doenças Infecciosas e Parasitárias: Medicina 616-96

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com apenas 12 casos mundiais, dispersamen-

te registrados. A difusão de seu conhecimento

em nosso país redundou em inúmeras novas

contribuições, que alterariam, consideravel-

mente, esse panorama, resultando num notá-

vel incremento da casuística e na caracteriza-

ção da região Amazônica como a de maior

concentração mundial de casos (Fraiha et alo,

1983,1986,1989).

CONCEITO

Antropozoonose determinada por umnematódeo parasita de tecidos, denominadoLagochi/ascaris /17inor. Caracteriza-se pelodesenvolvimento de lesões tumorais ao níveldo pescoço, da mastóide ou do ouvidomédio, podendo atingir outros órgãos ouestruturas vizinhas, inclusive o sistema nervo-so central e os pulmões. Doença de conside-rável potencial de gravidade, tem sua distri-buição restrita à América Tropical.

ETIOLOGIA

Embora existam cinco espécies conhe-cidas do gênero Lagochilascaris, somente L.minor tem sido associada à patologia huma-na. Trata-se de um nematódeo ascarídeo depequenas dimensões (os adultos medem de 5a 20 mm) e de coloração branco-leitosa, cujaboca é guarnecida por três lábios bem desen-volvidos, separados por interlábios, o queconfere à extremidade cefálica um aspectobem característico, que lembra o lábio lepo-rino (lagos = lebre) (figura 1.46).

HISTÓRICO

Originalmente descrita por Leiper em1909, a partir de dois casos humanos observa-dos na Ilha de Trinidad, a lagoquilascaríasehumana permaneceu por muitos anos aparen-temente restrita a um pequeno número de paí-ses vizinhos (Suriname, Costa Rica, Trinidad eTobago), até que em 1968 -quase seis déca-das depois -Artigas et aI. (1968) descreveriamo primeiro caso brasileiro, originário doEstado de São Paulo. Na Amazônia, essa para-sitose só viria a ser assinalada dez anosdepois, por Leão et aI. (1978). A doença era,até então, considerada extremamente rara,

CICLO EVOlUTIVO

Com base no conhecimento acumula-do (Winckel & Treurniet, 1956; Sprent, 1971;

.Raimundo Nonato Queiroz de leão.Habib Fraiha Neto

CONCEITO

HISTÓRICO

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vestres, provavelmente do grupo dos roedo-res, infectariam esses animais, que desenvol-vem formas larvárias encistadas nos múscu-los, funcionando como hospedeiros interme-diários, obrigatórios para a manutenção dociclo enzoótico natural. Quando devorados,estes animais carreiam consigo esses cistoslarvários, infectando o hospedeiro definitivo efechando o ciclo. O homem, o cão e o gatodomésticos, quando infectados, comportam-se como hospedeiros definitivos acidentais,albergando formas adultas, ovos e larvas doparasito na intimidade dos tecidos do pesco-ço ou de estruturas circunvizinhas, onde sãocapazes de se reproduzir em ciclos sucessi-vos (auto-infecção).

EPIDEMIOlOGIA

.l

Figura 1.46 -Extremidade anterior de um espécimeadulto de Lagochilascaris minar leiper, vista à micros-

copia óptica

Parasitose exclusivamente neotropical,ocorre desde o sul do México até o sul doBrasil. Dos 96 casos humanos registrados atéabril de 1996, 1 foi observado no México, 2na Costa Rica, 2 na Colômbia, 2 na'Venezuela, 5 na ilha de Trinidad e Tobago, 6no Suriname e 78 no Brasil. Nosso paísdetém, portanto, 81,2% da casuística mun-dial (figura 2.46).

O Estado do Pará concorre com 64,0%(50) dos casos nacionais, precisamente52,1% dos casos mundiais; Rondônia, com11,5% (9), Tocantins com 9,0% (7), Acre com5,1% (4), Mato Grosso com 2,6% (2), e MatoGrosso do Sul, Goiás, São Paulo e Paranácom 1,3% cada. Apenas 4 casos brasileirosnão são originários da Amazônia Legal,

Brenes

& Ruiz, 1972; Smith, Bowman &Little, 1983; Moraes, Arnaud & Lima, 1983;

Volcán & Medrano, 1990; Campos et aI.,1992; Paçô, 1994) o ciclo de transmissãopode ser assim resumido: os hospedeirosnaturais, carnívoros silvestres -ao que tudoindica, felídeos -albergando o parasito nasprimeiras porções do sistema digestivo ourespiratório, passariam ovos com as fezespara o exterior, contaminando o solo. Ovosembrionados ingeridos por outros animais sil-

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LAGOQU I LASCARíASE 725

região onde os casos se concentram mormen-te nos vales dos rios Tocantins e Araguaia(figura 3.46).

Todos os casos que temos investigadoprocedem de zona rural e têm história decontato com área de mata. Nossa casuísticainclui uma criança da tribo indígena arawetê,do grupo paracanã, do sudeste do Pará.

A doença tem atingido pacientes dos 2aos 62 anos, predominantemente jovens ecrianças, com 48% dos casos ocorrendo nafaixa etária dos 10 aos 19 anos. O sexo femi-nino tem sido mais vezes atingido (57,3% doscasos), contra 39,6% do sexo masculino e3,1% ignorados.

Figura 4.46 -Ovo de L. minar visto à histopatologia delesão cervical de gato doméstico (Fraihaetal., 1984)

~

Várias hipóteses já foram aventadas

para explicar o mecanismo de infecção e a

localização extravagante das lesões no

homem e nos animais domésticos. As mais

importantes são:

-a de Sprent (1971), de infecção por

ingestão de ovos embrionados, à semelhança

do que ocorre com o Ascaris /umbricoides; as

larvas perfazendo, obrigatoriamente, um

ciclo pulmonar, de que resultariam outras

que, após o trajeto ascendente pela traquéia,

se fixariam à mucosa da orofaringe, para aí

penetrar, se desenvolver, acasalar e reprodu-

zir, dando origem às lesões;

-a de Fraiha ela/. (1983, 1986, 1989),

de infecção por via hídrico-oral, por ingestão

de larvas infectantes (L3) em água não filtrada

proveniente de coleções hídricas contamina-

das com fezes do hospedeiro natural; as lar-

vas assim ingeridas, penetrariam diretamente

na mucosa orofaríngea, dispensando a reali-

zação de um ciclo pulmonar;

-a de Smith el a/. (1983), de infecção

por ingestão de larvas encistadas nos múscu-

los e outros tecidos de animais silvestres.

Esta última hipótese é hoje a mais aceita,

posto que demonstrada experimentalmente por

Campos el aI. (1992) e Paçô (1994) (figura

5.46). Segundo esses autores, as larvas de 3Q

estádio que se libertam dos cistos ao nível do

estômago do hospedeiro definitivo, por um tro-

pismo qualquer ainda não esclarecido migram,

esôfago acima, rumo às áreas comumente afe-

tadas do pescoço e circunvizinhanças.

Há registros de, pelo menos, 8 casosfatais (Oostburg & Varma, 1968; Moraes eta/" 1985; Rosemberg et a/" 1986; Orihuela eta/" 1987; Veloso et a/" 1992; Eulálio et al,

1994; Barbosa, W., comunicação pessoal,1987), o que corresponde a uma letal idade(mínima) de 8,7%.

Felídeos silvestres (a jaguatirica e aonça) figuram entre os grandes suspeitos deserem o reservatório natural do parasito, Ocão e o gato domésticos já foram encontradosnatura)mente infectados (figura 4.46), massão considerados, tanto quanto o homem,hospedeiros acidentais (Fraiha et al, 1989).

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Assim sendo, há indícios de que ohomem, o cão e o gato domésticos se infec-tam por ingestão de larvas L3 encistadas nosmúsculos, nas vísceras e no tecido celularsubcutâneo de animais silvestres -a cutia,por exemplo (figura 6.46), consumidos, crusou mal cozidos.

PATOGENIA

o parasito provoca lesões (nódu los,abscessos e fístulas) quase sempre situadasao nível da região cervical (em 65,3% doscasos), ou da mastóide (38,9%), ou do ouvi-do médio (29,5%), rinofaringe (15,8%), oro-faringe (7,4%), seios paranasais (4,2%),mento, parótida, glândula submandibular(2,1% cada), trompa de Eustáquio (1,1 %) ealvéolo dentário (1,1 %), podendo estender-se ainda a outros órgãos ou estruturas vizi-nhas, tais como o cérebro (7,4%), o cerebelo(2,1%), pulmões (8,4%) e globo ocular. Há 1caso de lesão na região sacra (Monteiro eta/., 1988) e na fossa ilíaca direita, à distânciado foco primário cervical. É apreciável ograu de osteólise observado ao nível das

Figura 5.46 -Carcaça de preá (Cavia porcellus) expe-rimentalmente infectado com L. minar, evidenciandolesões nodulares subcutâneas, de diferentes tamanhos,cada uma correspondendo a uma larva de lJ encista-da (gentileza de D.M.R. Campos & 1.M. Pacô/-IPTESP!UFCO)

Figura 6.46 -Larvas de 3fJ estádio encistadas em tecido muscular de uma cutia (Dasyprocta agouti) experimental-mente infectada (gentileza de j.MPaçó & D.M.R. Campos/IPTESP/UFCO)

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lesões, favorecendo a progressão dos parasi-

tos (Rocha et aI., 1984).

Todos os estádios evolutivos do hel-

minto (ovos, larvas e adultos) podem estar

presentes, simultaneamente, às vezes em

grande número, no interior das lesões, o que

significa que ele aí se reproduz (auto-infec-

ção) (Moraes et aI., 1983).

Do ponto de vista da histopatologia, os

achados fundamentais correspondem a focos

de reação granulomatosa do tipo corpo estra-

nho, e áreas escavadas, de paredes formadas

por tecido inflamatório, também contendo

elementos gigantocitários com restos parasi-

tários. É freqüente a presença de áreas de

infiltração eosinofílica. Vermes adultos, lar-vas e ovos centralizam essa~ lesões.

MANIFESTAÇÕES CLíNICAS

A doença geralmente tem início insi-dioso e apresenta evolução crônica, comperíodos de remissão e recidivas.

As manifestações clínicas variam emfunção da extensão e da localização daslesões. Os quadros mais freqüentes consistemno aparecimento de nódulos cervicais, unilate-rais ou bilaterais, de consistência dura, aderen-tes aos planos profundos, que posteriormentefistulam, abscedam e às vezes ulceram (figura7.46), drenando secreção serossanguinolentaou purulenta; ou de processos de otite supura-tiva e mastoidite (figura 8.46). Além disso,podem ser encontrados quadros de sinusite,

amigdalite, manifestações neurológicas, comosíndrome convulsiva, síndrome cerebelar,

paralisia facial periférica ou de outros pares

cranianos (glossofaríngeo, pneumogástrico,

espinhal e hipoglosso), e manifestações respi-

ratórias, que podem evoluir até a insuficiência

respiratória.É comum a história de eliminação ativa

e intermitente de parasitos vivos pelos pertui-

tos das lesões, ou através do conduto auditi-

vo externo, da boca ou das fossas nasais.

Convém não perder de vista que esse dado

pode ser ocultado pelo paciente, por vergo-

nha; e que em alguns casos, pode, efetiva-

mente, não ocorrer a eliminação, por longo

período, o que dificulta a confirmação do

diagnóstico etiológico, algumas vezes já sus-peitado. A ausência de história de elimina-

ção de parasitos não deve nunca, portanto,

descartar em definitivo esta hipótese diag-

nóstica.

Sinais inflamatórios locais são, colnu-

mente, pouco pronunciados. Pode haver rea-

ção ganglionar satélite. O estado geral emmuitos casos está seriamente comprometido,

com apreciável perda ponderal. Há relato de

imunodepressão, relacionada tanto à imuni-dade celular, quanto à humoral (Botero &

Little, 1984).

Figura 7.46 -Nódulo ulcerado de localização cervical(paciente de Leão et aI., 7986)

Figura 8.46 -lagoquilascaríase de ouvido médio emastóide, com as lesões drenando secreção purulentaatravés de fístula retroauricular esquerda e de petfura-ção timpânica (paciente de leão et al, 1986)

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728 DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITARIAS -Enfoque Amazônico

EXAMES COMPLEMENTARES do haver desde leucocitose (Orihuela et aI.,1987), até leucopenia (Moraes et aI., 1985),eosinofilia (de até 29% em 11.800 leucóci-tos/mm3) ou, paradoxalmente, aneosinofilia(Oostburg & Varma, 1968; Moraes et aI., 1985).

A radiologia tem sido recurso de grán-de valia para a evidenciação de lesões pul-monares (condensações acinares, abscessos),do cavum (h i pertrofi a de paredes), do ouvidomédio e seios paranasais (velamento), dámastóide (esclerose óssea, destru ição de sep-tos intercelulares, abscessos, osteólise, vela-mento das células) e, particularmente, do sis-tema nervoso central (abscessos subdurais,cerebelares ou cerebrais), em que a tomogra-fia axial computadorizada tem permitido boaavaliação da extensão das lesões.

PROVAS ESPECíFICAS

o diagnóstico é feito, habitualmente,pelo achado de ovos do parasito na secreçãodas lesões, ou de ovos, larvas e adultos emmaterial delas retirado. Os ovos medem de 63a 85~m no maior diâmetro, são subesféricos etêm a casca externa espessa, de superfíciemarcada por múltiplas escavações em saca-bocados, lembrando na periferia o aspecto detampinha de garrafa de refrigerante (figura9.46). É característico da espécie o número deescavações não superior a 25 na periferia.

Ovos de L. minar podem ser encontra-dos nas fezes dos pacientes, quando as lesõesse abrem para a luz do trato digestivo, sendomuitas vezes confundidos com ovos de A./umbricoides.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

PROVAS INESPECíFICAS

Embora constituindo recurso quase

sempre dispensável na lagoquilascaríase, a

histopatologia pode também firmar o diag-

nóstico etiológico, caso os cortes permitam a

observação da casca externa de ovos, com

um número de escavações compatível com a

espécie, ou de secções transversais de adul-tos,

mostrando as aletas laterais que Ihes per-

correm longitudinalmente o corpo.

O hemograma é incaracterístico, poden-

ESPECíFICO

Várias drogas têm sido empregadas,experimentalmente, no tratamento dessa hel-

Figura 9.46 -Ovo de L. minar, ao microscópio, mos-trando a casca externa escavada em saca-bocados

Quando não existe história de elimina-

ção de parasitos o diagnóstico diferencial

deverá ser feito com a tuberculose ganglionarcervical,

micobacterioses não tuberculosas,

neoplasias da região cervical, otites médias

supuradas, mastoidites e sinusites de outrasetiologias,

tuberculose pulmonar, paracocci-

dioidomicose e actinomicose.

Nos casos em que o parasito é referido,

trazido à consulta ou encontrado nas lesões,

convém fazer a distinção com larvas de dípte-

ros, agentes de miíases cavitárias. Uma noção

elementar para que se não confunda a lago-

quilascaríase com uma miíase, diz respeito ao

aspecto geral e ao movimento dos parasitos

em questão: larvas de moscas, sendo formas

imaturas de artrópodes, têm o corpo segmen-

tado, e seus movimentos são rítmicos, de esti-

ca-encolhe, como de um bicho-de-goiaba;

larvas ou adultos de Lagochi/ascaris são ver-

mes cilíndricos, filiformes, de corpo não seg-

mentado e movimentos serpiginóides.

TRATAMENTOTRATAMENTO

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729LAGOQU I LASCARíASE

te imediata suspensão das drogas. Parece-nosaconselhável, além disso, a adoção de umesquema de manutenção, quer com o cam-bendazol (novas séries a cada 6 meses), quercom o levamisol (1 comp. em dias alternados,no total de 3, a cada 6 meses), ou ainda coma dietilcarbamazina, na dose de 100 mg, 3vezes ao dia, em curso prolongado de 6meses a 1 ano, pelo menos até que pareçaassegurada a cura radical.

Apesar do aparente insucesso no trata-mento de um caso pediátrico com a ivermec-tina, na dose de 0,4 mg / kg, dividida em duastomadas, em dias subseqüentes (M. Y .5.Oliveira, N. S. Santos, B. Maués e H. Fraiha-dados inéditos), vemos na experiência deBento et a/. (1993) bons motivos para insistirna investigação com esse fármaco, desde queempregado por mais tempo e em doses sema-nais.

Por sugestão de um desses autores

(Motti -comunicação pessoal, 1993), a iver-

mectina poderá ser utilizada, ainda em cará-

ter experimental, portanto observando tódos

os preceitos da ética em pesquisa médica, em

dose única semanal de 0,2 mg/Kg. Essa dose

será mantida até que haja nítida melhora clí-

nica, definida como desaparecimento da eli-

minação de parasitos e da secreção purulen-

ta, e melhora dos sinais inflamatórios locais.

Após constatada a melhora clínica, o pacien-te receberá ainda uma dose mensal, no míni-

mo por 1 ano, a critério dos investigadores. A

ivermectina (Mectizan) é apresentada em

comprimidos de 6 mg, e ainda não está dis-

ponível no mercado brasileiro.

Qualquer que seja a terapêutica adota-

da, somente deverá ser considerado clinica-

mente curado o paciente que apresentar reso-

lução das lesões externas, ausência de absces-

sos profundos comprovada através de método

de imagem adequado, e negatividade ao teste

terapêutico com o levamisol -administração

de apenas 1 comprimido (80 ou 150 mg), de

acordo com a faixa etária, objetivando desalo-

jar parasitos eventualmente ocultos na intimi-

dade dos tecidos -teste que se tem mostrado

eficiente em vários de nossos casos, inclusive

para esclarecimento diagnóstico.

mintíase: a dietilcarbamazina (Winckel &Treurniet, 1956; Draper, 1963; Leão eta!.,1978), o tiabendazol (Oostburg & Varma,1968; Oostburg, 1971; Leão et a!., 1978;Volcan et a!., 1982; Botero & Little, 1984), olevamisol (Corrêa et a!., 1978; Chieffi et a!.,1981; Volcan et a!., 1982; Botero & Little,1984), o cambendazol (Leão et a!., 1985; Leãoet a!., 1991), o mebendazol (Botero & Little,1984), o albendazol, o praziquantel e, por últi-mo, a ivermectina (Bento et a!., 1993). Muitosdesses fármacos não proporcionam bons resul-tados, no sentido da cura radical. São freqüen-tes as recidivas, após meses ou anos de apa-rente cura clínica. Dificuldades de avaliaçãoda cura parasitológica, diante de lesões jáfechadas, impõem o seguimento dos casos porlongos períodos, a rigor, superiores a um ano.

Em nossa experiência as drogas quetêm proporcionado melhores resultados são ocambendazol e o levamisol. Associadas ounão, ambas causam visível impacto sobre osparasitos, que abandonam as lesões, alvoro-çadamente e em grande número, sobretudono primeiro dia de tratamento. No entanto,mesmo empregadas em altas doses, têm elaspropiciado a ocorrência de recidivas. A iver-mectina surge, então, como nova esperança,após tratamento bem-sucedido de um caso(Bento eta!., 1993).

A nosso ver não existe ainda um esque-ma posológico ideal, nem um tratamento efi-ciente de curta duração. Temos preconizadoo emprego do cambendazol em doses múlti-plas e elevadas (20 mg / kg / dia por 5 diasconsecutivos), em séries sucessivas, cujonúmero e intervalos não foram ainda satisfa-toriamente estabelecidos (talvez 4 séries, aintervalos quanto possível regulares de ummês). Em caso de lesão no sistema nervosocentral, a posologia deve ser aumentada para30 mg! kg / dia. A primeira série será precedi-da do uso do levamisol, que hoje recomenda-mos apenas para 3 dias consecutivos, nasdoses de 80 ou 150 mg por dia, conforme afaixa etária. Esses esquemas sugeridos comotratamento de ataque têm sido, em geral, bemtolerados. Em alguns casos, porém, condicio-nam apreciável alopécia, regressível median-

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INESPECíFICO

É evidente que a limpeza cirúrgica daslesões constitui valioso recurso auxiliar, con-tribuindo para abreviar a cura radical.

Deve-se dar, também, especial atençãoaos cuidados nutricionais.

PROFILAXIA

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p.146.

Uma vez comprovado que a formainfectante para o homem e para os animaisdomésticos é a larva encistada nos músculose outros tecidos de animais silvestres, asmedidas de profilaxia deverão visar, sobretu-do, a não ingestão de carnes de caça (princi-palmente de cutia e outros roedores), sem

adequada cocção.Também aqui ressalta-se a importância

da educação em saúde, particularmente nazona rural, com a recomendação de bonshábitos alimentares e de higiene geral.

BIBLIOGRAfiA

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