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1 "Re-visitando" o Conceito de Reengenharia - O Caso Aventis Pharma - Autoria: João Mário Csillag, Susana Carla Farias Pereira, André Luís de Castro Moura Duarte Resumo A indústria farmacêutica tem passado por profundas transformações nos últimos anos. Fusões e aquisições são bastante utilizadas como fonte de crescimento e combate à concorrência. Juntamente com essas fusões, e principalmente em decorrência destas, há a necessidade das empresas se reestruturarem internamente. Muito contestada, a reengenharia foi encarada como um modismo de rápida obsolescência dentro do meio empresarial e carrega, ainda hoje, uma conotação negativa de repressão, métodos truculentos e radicais de um capitalismo selvagem e predatório. Este trabalho tem como objetivo "re-visitar" o conceito e a adoção da reengenharia como uma ferramenta gerencial de transformação e melhoria do desempenho de uma organização. Por meio de um estudo de caso na indústria farmacêutica pretende-se avançar na compreensão do processo de adoção e implantação da reengenharia. A análise do caso apresenta evidências de que a reengenharia é um conceito, ou uma ferramenta de gestão, que continua sendo utilizada e valorizada pelas empresas. Entretanto, a complexidade e o desafio de compreender e implantar a reengenharia, ou a organização por processos, persiste. 1. Introdução A reengenharia, surgida de forma avassaladora no início dos anos 90, causou grandes transformações no mundo dos negócios e trouxe muita discussão para o ambiente acadêmico. A reengenharia passou rapidamente por um estágio de grande euforia e, pouco tempo depois, caiu no descrédito de gerentes e diretores sendo alvo de muitas críticas e vista com grande desconfiança por parte de gerentes e funcionários das empresas que optavam por esta ferramenta gerencial. Pode-se destacar três principais críticas feitas à reengenharia como veremos a seguir. A primeira e talvez a maior crítica feita à reengenharia, e principal razão de sua impopularidade nos meios acadêmicos e de negócios, é seu foco na redução de custos por meio da redução de níveis hierárquicos e conseqüente redução de pessoal dentro de uma organização. A reengenharia passou a ser considerada para muitos uma técnica para se realizar o downsizing. Visando aumentar a produtividade e eficiência dos funcionários, a reengenharia acabava por gerar um efeito adverso de grande insatisfação, insegurança e baixa moral das equipes de uma organização. O próprio Hammer (1997), considerado um dos pais desta ferramenta, reconhece que deveria ter enfatizado mais o lado humano da reengenharia. O autor reconhece a importância das pessoas no processo de reengenharia e afirma que se a empresa não tiver sucesso com as pessoas, todo o processo de implantação fracassará. Outra crítica é realizada em função da obsessão com que a reengenharia trata de seus processos em lugar de produtos. Segundo Micklethwait e Wooldridge (1998), a tentativa de desviar a vantagem competitiva de uma empresa do produto que ela fabrica para como esse produto é fabricado pode ser uma estratégia viável para uma empresa madura que produz um produto já estável no mercado. Entretanto, se pensarmos num setor altamente dinâmico que esteja fabricando o produto errado, não há downsizing, reengenharia ou redução de custos que faça a empresa melhorar seu desempenho no mercado. Melhorar o processo produtivo é

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"Re-visitando" o Conceito de Reengenharia - O Caso Aventis Pharma -

Autoria: João Mário Csillag, Susana Carla Farias Pereira, André Luís de Castro Moura Duarte Resumo

A indústria farmacêutica tem passado por profundas transformações nos últimos anos. Fusões e aquisições são bastante utilizadas como fonte de crescimento e combate à concorrência. Juntamente com essas fusões, e principalmente em decorrência destas, há a necessidade das empresas se reestruturarem internamente.

Muito contestada, a reengenharia foi encarada como um modismo de rápida obsolescência dentro do meio empresarial e carrega, ainda hoje, uma conotação negativa de repressão, métodos truculentos e radicais de um capitalismo selvagem e predatório.

Este trabalho tem como objetivo "re-visitar" o conceito e a adoção da reengenharia como uma ferramenta gerencial de transformação e melhoria do desempenho de uma organização. Por meio de um estudo de caso na indústria farmacêutica pretende-se avançar na compreensão do processo de adoção e implantação da reengenharia.

A análise do caso apresenta evidências de que a reengenharia é um conceito, ou uma ferramenta de gestão, que continua sendo utilizada e valorizada pelas empresas. Entretanto, a complexidade e o desafio de compreender e implantar a reengenharia, ou a organização por processos, persiste. 1. Introdução

A reengenharia, surgida de forma avassaladora no início dos anos 90, causou grandes transformações no mundo dos negócios e trouxe muita discussão para o ambiente acadêmico. A reengenharia passou rapidamente por um estágio de grande euforia e, pouco tempo depois, caiu no descrédito de gerentes e diretores sendo alvo de muitas críticas e vista com grande desconfiança por parte de gerentes e funcionários das empresas que optavam por esta ferramenta gerencial. Pode-se destacar três principais críticas feitas à reengenharia como veremos a seguir.

A primeira e talvez a maior crítica feita à reengenharia, e principal razão de sua impopularidade nos meios acadêmicos e de negócios, é seu foco na redução de custos por meio da redução de níveis hierárquicos e conseqüente redução de pessoal dentro de uma organização. A reengenharia passou a ser considerada para muitos uma técnica para se realizar o downsizing. Visando aumentar a produtividade e eficiência dos funcionários, a reengenharia acabava por gerar um efeito adverso de grande insatisfação, insegurança e baixa moral das equipes de uma organização.

O próprio Hammer (1997), considerado um dos pais desta ferramenta, reconhece que deveria ter enfatizado mais o lado humano da reengenharia. O autor reconhece a importância das pessoas no processo de reengenharia e afirma que se a empresa não tiver sucesso com as pessoas, todo o processo de implantação fracassará.

Outra crítica é realizada em função da obsessão com que a reengenharia trata de seus processos em lugar de produtos. Segundo Micklethwait e Wooldridge (1998), a tentativa de desviar a vantagem competitiva de uma empresa do produto que ela fabrica para como esse produto é fabricado pode ser uma estratégia viável para uma empresa madura que produz um produto já estável no mercado. Entretanto, se pensarmos num setor altamente dinâmico que esteja fabricando o produto errado, não há downsizing, reengenharia ou redução de custos que faça a empresa melhorar seu desempenho no mercado. Melhorar o processo produtivo é

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sempre muito importante, porém, nem sempre este foco deve ser voltado ao processo e sim ao produto.

A terceira principal crítica foi realizada por Hamel e Prahalad (1995) em seu livro Competindo pelo Futuro. Para estes autores, a reengenharia dá importância excessiva ao corte de custos e não se preocupa com novos investimentos e novos negócios que podem fazer a empresa crescer. Repensar seus processos internamente, eliminar etapas que não agregam valor, reduzir tempos de ciclo, melhorar a agilidade e reduzir custos é muito importante para a organização, porém, segundo esses autores, é necessário pensar no futuro, no aumento da riqueza e na criação de novos negócios. Desta forma a reengenharia acaba por cegar toda uma organização na busca por novas oportunidades de negócio e conseqüente crescimento.

Muito contestada, a reengenharia foi encarada como um modismo de rápida obsolescência dentro do meio empresarial. O termo reengenharia carrega, ainda hoje, uma conotação negativa de repressão, métodos truculentos e radicais de um capitalismo selvagem e predatório.

No entanto, os resultados de uma recente pesquisa, desenvolvida anualmente pela Bain & Company e divulgada pelo site da empresa (www.bain&company.com), mostram que o uso da reengenharia dentro das empresas voltou a crescer após um período de 5 anos de declínio (figura 1). Pode-se verificar que no ano de 2001 a taxa de empresas pesquisadas que fizeram uso da reengenharia foi de 48% contra 38% do ano anterior. No Brasil também houve um aumento na utilização desta ferramenta, saindo de 30% em 2000 para 33% em 2001. A reengenharia chegou a ser a 5a ferramenta (entre 25 ferramentas pesquisadas) mais utilizada no ano de 1995, atualmente é apenas a 18a ferramenta mais utilizada. Outro dado interessante sobre a reengenharia mostra que o índice de satisfação mundial, em escala de 1 a 5, com a utilização da reengenharia é de 3,16. No Brasil, este número pula para 4,17 e a reengenharia corresponde à 11o ferramenta com maior índice de satisfação para as empresas.

Dentro deste contexto apresentado, este trabalho tem como objetivo "re-visitar", mais de uma década após o seu surgimento nos meios empresarial e acadêmico, o conceito e a adoção da reengenharia como uma ferramenta gerencial de transformação e melhoria dos objetivos de desempenho de uma organização. Por meio de um estudo de caso na indústria farmacêutica pretende-se avançar na compreensão do processo de adoção e implantação da reengenharia.

Figura 1: Taxa de utilização da Reengenharia. Pesquisa realizada pela Bain & Company.

67% 71%

78%72%

64% 60%

45%38%

48%

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001

Fonte: Management tools 2001: Global Results, www.bain&company.com.

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A primeira parte deste trabalho corresponde a uma introdução teórica sobre o tema

reengenharia definindo e apresentando seus conceitos básicos. O objetivo não é aprofundar numa discussão teórica, mas fornecer um referencial para leitura do caso prático.

A segunda parte começa com uma descrição da empresa pesquisada e uma breve análise do mercado farmacêutico e suas transformações.

A terceira parte retrata a experiência da Unidade de Negócios da Aventis Pharma no Brasil, na utilização da reengenharia de processos como estratégia para alcançar a melhoria dos seus objetivos de desempenho. A Aventis é um grupo dedicado às Ciências da Vida que atua e investe em duas necessidades humanas básicas: a saúde e a nutrição. Criada após uma grande reestruturação desencadeada pela recente união entre duas gigantes do setor farmacêutico, Hoechst e Rhodia, a empresa passou por uma grande reestruturação das suas operações industriais na América Latina. Essa união foi anunciada no ano de 1999 e efetivada em 2000. Com o objetivo de se ajustar à nova configuração estabelecida após o programa de reestruturação e alcançar os objetivos de desempenho — custo, qualidade e flexibilidade — a operação brasileira deu início a um projeto de reengenharia de processos.

A quarta e última parte deste trabalho faz uma síntese dos pontos mais importantes do estudo de caso e procura ressaltar os cuidados e as diferenças na abordagem de implantação da ferramenta analisada, nos dias atuais.

2. Revisão Teórica 2.1 Vantagem Competitiva em Manufatura e seus Objetivos de Desempenho

Não se tem dúvida sobre a importante contribuição da função produção na busca de vantagem competitiva pelas empresas. Operações de manufatura afinadas e coerentes com a estratégia da empresa podem dar à empresa força para suportar o ataque da concorrência, vigor para manter um melhoramento contínuo de seu desempenho e, pode ainda, proporcionar versatilidade operacional na resposta às constantes mudanças do mercado (Skinner, 1969).

Durante muito tempo a prioridade competitiva da função produção foi a busca incessante da eficiência. Atualmente, verifica-se que esta não é mais a única prioridade do setor e que, dependendo do mercado e dos desejos dos clientes, outras poderão ser mais valorizadas que a busca da redução dos custos. Entre estas prioridades, pode-se citar a qualidade, o prazo, a flexibilidade, a inovação e os serviços.

Segundo Slack (1993), consumidores e concorrentes são ambos centrais para uma operação de manufatura competitiva, pois estes definem as metas de uma empresa de forma sucinta: satisfazer um e ser melhor do que o outro. Sendo assim, uma operação de manufatura de sucesso baseia-se em trazer para dentro da fábrica uma mentalidade que considere tanto o consumidor quanto os concorrentes. A meta é desenvolver uma operação que possa dar à empresa uma vantagem preponderante no seu mercado.

Slack (1993) define 5 objetivos de desempenho para uma operação de manufatura: - Qualidade: significa fazer certo, sem retrabalho e sem desperdícios; - Velocidade: fazer rápido internamente para entregar rapidamente seus produtos; - Confiabilidade: fazer pontualmente, manter a promessa de prazos de entrega; - Flexibilidade: ser capaz de variar e adaptar a operação quando necessário; - Custo: fazer produtos a custo mais baixo que os concorrentes. Ser melhor nestes objetivos de desempenho contribui para o sucesso competitivo da

empresa. É importante que a organização consiga distinguir entre objetivos de produção externos e os internos. Os aspectos externos dos objetivos de desempenho são vistos pelos consumidores externos, os aspectos internos pelos consumidores internos. Deve-se destacar

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ainda, que o desempenho interno de cada operação contribui para o desempenho externo da operação inteira, mais do que isto, observa-se uma relação entre todos os objetivos internos de desempenho, ou seja, todos os objetivos de desempenho se apóiam e se reforçam uns aos outros. Isto quer dizer que, por exemplo, uma melhora nos índices de qualidade reduz custos, assim como pode melhorar a velocidade e confiabilidade das operações internas de uma empresa.

2.2 Reengenharia: um caminho para melhoria dos objetivos de desempenho

A reengenharia segundo Harrington (1991) pode ser definida como uma metodologia sistemática para auxiliar as empresas a fazerem importantes avanços na maneira de operar seus processos, fornecendo um sistema para tornar suas operações mais simples e eficientes, assegurando que seus clientes externos e internos passem a receber produtos e serviços de qualidade superior, e conseqüentemente melhorem seus objetivos de desempenho. Na busca pela competitividade e conseqüente melhoria nos objetivos de desempenho, as empresas têm procurado uma estrutura que se adapte às necessidades e prioridades de um mercado em constante mutação. Uma organização ou se adapta ao seu ambiente (mercado), ou deixa de existir. A necessidade de adaptação cada vez mais freqüente tem levado empresas a mudanças nas suas estruturas organizacionais. Uma das formas que as empresas encontraram para melhorar a eficiência na obtenção de produtos e serviços, facilitar a adaptação às mudanças e obter maior integração de seus esforços na velocidade requerida pelo mercado é a gestão por processos.

Segundo Gonçalves (2000-a), processo pode ser definido como qualquer atividade ou conjunto de atividades que toma um input, adiciona valor a esse input e fornece um output a um cliente específico. Todo trabalho importante realizado nas empresas faz parte de algum processo. Não existe um produto ou um serviço oferecido por uma empresa que não esteja ligado a um processo empresarial. Para Rummler e Brache (1994) os processos podem ser vistos como uma “cadeia de agregação de valores”. Desta forma, para criação ou entrega de um produto ou serviço, cada etapa de um processo deve acrescentar valor às etapas precedentes.

Para Kenn (1997) os processos são a fonte das competências específicas da empresa que fazem a diferença em termos de concorrência são, portanto, a fonte da vantagem competitiva de uma organização. Uma organização é tão efetiva quanto seus processos (Rummler e Brache, 1994), desta maneira os objetivos de uma organização só podem ser atingidos por processos lógicos.

As estruturas organizacionais convencionais normalmente priorizam as funções ao invés dos processos. Desta forma estas organizações acabam por ter estruturas departamentalizadas e hierárquicas rígidas e pesadas, pois tudo é enxergado na “vertical”. Os departamentos buscam alcançar o ótimo individual sem se preocupar com a empresa como um todo. A otimização dos objetivos de um departamento quase sempre significa a subotimização dos objetivos de desempenho da organização como um todo. Isto ocorre, pois os objetivos de cada função são estabelecidos de maneira independente. Ocorre ainda que os funcionários de cada departamento acabam por enxergar o colega do outro departamento como um inimigo. A figura 2 mostra como esta estrutura pode ser representada dentro da organização.

A organização orientada por processos pressupõe uma nova filosofia de trabalho, ela inclui mais três ingredientes: o cliente (interno/externo), o produto e o fluxo de trabalho. Desta forma, permite enxergar como os processos cortam as fronteiras funcionais de uma organização e mostra os relacionamentos internos entre clientes e fornecedores.

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Figura 2: Visão funcional tradicional de uma organização.

Fonte: RUMMLER, G. A. e BRACHE, A. P. Melhores Desempenhos das Empresas: uma abordagem prática para transformar as organizações através da reengenharia. São Paulo, Makron Books, 1994.

Rummler e Brache (1994) acreditam que as maiores oportunidades de melhoria de

desempenho estão nas interfaces funcionais de uma organização. A visão horizontal das empresas é uma maneira de identificar e aperfeiçoar estas interfaces funcionais. São estas interfaces as grandes responsáveis pela maior parte da diferença entre o tempo de ciclo e o tempo de processamento nos processos empresariais.

Diferentemente da visão vertical, a visão por processos valoriza o trabalho em equipe ao invés do trabalho individual, valoriza a cooperação entre as pessoas, dá a estas pessoas uma visão ampla do processo e da importância de seu desempenho para o desempenho global da empresa. Por tudo isto, é necessário repensar a forma de gerenciar o trabalho e as pessoas dentro da empresa. Deixam de existir as metas departamentais e a empresa passa a medir diretamente o resultado do processo. A figura 3 abaixo representa a visão por processos de uma organização.

Figura 3: Visão horizontal por processos.

Função P & D

Função Produção

Função Marketing

Processo 1

Processo 2

Processo 3

MERCADO

Produtos Serviços

Produtos Serviços

Produtos Serviços

Função P & D

Função Produção

Função Marketing e

Vendas

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Fonte: RUMMLER, G. A. e BRACHE, A. P. Melhores Desempenhos das Empresas: uma abordagem prática para transformar as organizações através da reengenharia. São Paulo, Makron Books, 1994.

Hammer e Stanton (1999) acrescentam que os donos dos processos não são chefes diretos, e não podem usar do poder autoritário ou do controle, por isto devem ter como ponto forte o poder de negociar e exercer influência sobre os colaboradores do processo.

Em resumo, Gonçalves (2000-b) mostra que a essência da gestão por processo é a coordenação das atividades realizadas na empresa, em particular aquelas executadas por diversas equipes de diversas áreas. O sucesso do funcionamento da empresa e dos processos depende da competência desta coordenação. Bons produtos são conseqüência natural de bons processos.

Por fim, muitos autores acreditam que o salto da indústria japonesa se deve ao foco que suas empresas deram aos processos, diferentemente das empresas americanas que focavam a melhoria do produto. Através do foco em processos a indústria japonesa conseguiu melhorar sua eficiência, ganhar em qualidade, flexibilidade, confiabilidade e agilidade.

2.4 Reengenharia de Processo X Reengenharia de Negócios

A reengenharia foi considerada uma das mais ambiciosas teorias da administração dos anos 90 e foi o primeiro grande modismo gerencial desta década. Micklethwait e Wooldridge (1998) argumentam que a popularidade da reengenharia na época se deu a sua capacidade de combinar “tecnologia da informação” e “qualidade”.

Na época, Micklethwait e Wooldridge (1998) relatam que os gerentes sentiam-se frustrados com duas idéias nas quais haviam investido muito dinheiro e uma devoção quase cega: a primeira foi a tecnologia, especialmente o computador pessoal. Os computadores se tornavam mais baratos, rápidos e fáceis de se usar, porém, não tornavam as pessoas mais eficientes. Apesar dos grandes investimentos em tecnologia de informação, números mostravam que as empresas haviam lucrado pouco com ela. A segunda idéia foi a gestão da qualidade total, ou TQM. A qualidade total tornara-se uma necessidade básica em lugar de vantagem competitiva, pois todas as empresas começavam a empregar seus conceitos.

Tanto a tecnologia quanto a qualidade foram ferramentas utilizadas de maneira independente e buscavam executar as mesmas atividades, com a mesma força de trabalho, porém, usando computadores e trabalhando com maior esmero. A forma ou o processo de se realizar o trabalho não era questionada, foram adicionadas algumas engenhocas às empresas, porém, a máquina empresarial não havia sido reprojetada. Era preciso uma ferramenta que unisse os conceitos de qualidade e a tecnologia da informação de forma a repensar e reprojetar a empresa.

Neste trabalho de reprojetar a empresa, é preciso distinguir duas classificações para projetos de reengenharia: uma abordagem mais restrita chamada reengenharia de processo e uma outra mais ampla que se propõem a guiar a empresa por um processo completo de transformação chamada reengenharia de negócio.

Abreu (1995) apresenta 4 estágios na implementação da reengenharia (figura 4). Uma empresa pode ou não decidir passar de um estágio a outro dependendo das suas necessidades. A empresa pode considerar que um estágio intermediário seja o mais adequado para suas operações. Abaixo sumarizamos alguns pontos básicos destas etapas:

• Fase I - Estratégia: nesta fase a organização deve romper com as tradicionais formas de agir e adequar-se para a mudança. O foco organizacional deve ser a busca de uma nova direção e a avaliação do negócio. É crítico o reconhecimento da tecnologia da informação (TI) como uma ferramenta determinante em todas as atividades da organização. Nesta fase deve ser realizado todo o processo de planejamento

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estratégico e alinhamento da organização com esta estratégia para implementação do processo completo de reengenharia. A organização deverá ter aqui uma clara visão de seu futuro.

• Fase II – Ativação: uma vez definidos os processos-chave pela nova orientação estratégica, o foco organizacional passa a ser interno e a atenção foca-se nos ganhos de performance relacionados com a reengenharia de processos, objetivando o aumento da produtividade e eficiência. Busca-se a excelência operacional nos cinco objetivos de desempenho: qualidade, custo, flexibilidade, confiabilidade e rapidez. Esta fase se caracteriza pelo uso de técnicas de mapeamento dos processos, redesign dos processos, ferramentas de TQM e controle estatístico de processo, e a TI deve ser implementada de maneira a melhorar o serviço ao cliente.

• Fase III – Melhoria: aqui o foco é transferido da otimização das operações internas para a agregação de valor aos processos e serviços oferecidos aos clientes e nos recebidos dos fornecedores. Busca-se a satisfação do cliente e a ampliação dos mercados. Os instrumentos a serem utilizados nesta fase são o QFD (Quality Function Deployment), Grupos de Foco, Pesquisas de Mercado, utilizados de forma a aumentar a satisfação do cliente. Para conseguir precisão do negócio deve-se buscar a microsegmentação e a customização em massa, sendo necessários sistemas produtivos altamente flexíveis.

• Fase IV – Redefinição: envolve a formação de novas unidades de negócios com novas estratégias de negócios. Uma nova core competence pode ser percebida como essencial oferecendo novas oportunidades de negócio.

Figura 4: Reengenharia: as quatro fases de transformação

Fonte: Abreu, F. de S., Reengenharia - em busca de uma teoria., p.60-83, in Gonçalves, J. E. L. e Dreyfuss, C., Reengenharia das Empresas – passando a limpo., Ed. Atlas, São Paulo, 1995.

Fase I Estratégia

Fase II Ativação

Fase III Melhoria

Fase IV Redefinição

Reengenharia de Processos

Foco da Performance (Resultados)

Foco Organizacional

Nova direção e avaliação dos

negócios i t t

Operações Internas

Interface Cliente e

Fornecedor

Novas unidades de

negócio

Alinhamento estratégico e

reestruturação

Excelência e Eficiência

Novos serviços e processos que agregam valor

Nova Core Competence

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O caso descrito neste trabalho é um exemplo típico de reengenharia processos dentro de uma organização indo até a etapa II do modelo proposto por Abreu (1995). A seguir vamos acompanhar como a Aventis implantou com sucesso este processo de reengenharia. 3. O Caso Aventis Pharma 3.1 A Organização

A Aventis Pharma, uma empresa que nasceu líder no mercado de medicamentos no Brasil, resultou da união da Hoechst, MMD e Rhodia exclusivamente na área farmacêutica. Possui uma linha de produtos muito conhecida no mundo, abrangendo 3 das 4 classificações de produtos farmacêutico: novas moléculas, medicamentos sob prescrição, genéricos e over the counter - OTC (Csillag e Campos, 1999). Novalgina, Profenid, Dorflex, Cepacol e Flagyl são exemplos de medicamentos fabricados pela Aventis no Brasil.

Com o lançamento do Synergy Process — um projeto de racionalização iniciado pela Aventis América Latina em 2000, que defende que a América Latina não deve ser vista como vários países separados, mas sim como um todo — foi estabelecida uma única orientação para a excelência industrial, onde os sites deveriam buscar excelência em processos e ambiente de trabalho adequado, a fim de se preparar para grandes mudanças na estrutura organizacional. O pano de fundo de todo o processo de racionalização era de ordem econômica/financeira, onde a redução do custo fixo era o grande direcionador.

Uma equipe multidisciplinar, criada especialmente para esse projeto, estabeleceu os objetivos e a estratégia de foco segmentado para quatro áreas de atuação da empresa na América Latina: México, Brasil, CANAN (América Central e Andina) e Cone Sul. O objetivo principal era racionalizar os produtos nos sites, concentrar as formulações e reduzir os números de transferências. Esse projeto foi dividido em duas fases: a transferência física de produtos e as mudanças de registro necessárias para os novos sites.

Foram fechadas cinco das dez fábricas existentes na América Latina e as operações concentradas nas cinco remanescentes. No Brasil, a operação conta atualmente com duas plantas sendo uma localizada na cidade de Suzano e a outra em São Paulo (Santo Amaro). A previsão é de que até 2003 a produção da operação brasileira seja toda concentrada no site de Suzano, inclusive a produção de injetáveis da Venezuela e Argentina. O Synergy Project, foi concluído de acordo com o planejado, resultando em uma economia de cerca de U$ 20 milhões por ano, no custo operacional das plantas.

As fábricas da Aventis no mundo são divididas em três categorias: - Fábricas estratégicas: fabricam os chamados produtos mundiais, remédios mais caros e

lucrativos. Existe uma nos USA e seis na Europa. - Fábricas táticas: possuem importância regional. Duas são localizadas na América

Latina, uma no Brasil (Suzano) e outra na Venezuela. - Fábricas Locais

A Aventis Pharma é dividida em dois grandes mundos: as operações comercial e a industrial. Segundo um gerente da empresa, a “parte comercial é outro mundo, e a área industrial segue as previsões da comercial”. O grande objetivo da re-estruturação é possibilitar que a área industrial possa assegurar o estoque mínimo necessário para atender as demandas da área comercial, com qualidade e custo reduzido.

Atualmente, os custos da operação da Aventis no Brasil estão divididos da seguinte forma: 40% Marketing, 40% Comercial e 20% Produção. O maior gasto individual da Aventis Pharma no Brasil é a folha de pagamento de representantes. 3.2 O Projeto de Reengenharia

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Como parte do projeto de racionalização, a Aventis determinou que todas as fábricas táticas trabalhem como Primary Process Unit, ou Unidades de Processo Produtivos (UPPs). Entretanto, apesar da idéia geral e do conceito de UPP terem vindo como determinação da matriz, a maneira de realizar e gerenciar essa mudança foi delegada a cada operação local. No caso da operação brasileira, o Diretor Industrial do site de Suzano, convidou um engenheiro especialista em Estratégia de Manufatura, para assumir a liderança do projeto denominado “Re-engineering of the Site Organization”.

Esse projeto, que teve por objetivo conduzir a implantação das UPPs na Operação Industrial em Suzano, foi iniciado em junho de 2001. Ao todo foram implantadas três UPPs em Suzano: UPP Líquidos, UPP Sólidos e UPP Injetáveis. A proposta era que essas UPPs fossem administrativamente independentes, mas com a idéia de compartilhar conhecimento e informações entre si.

Os princípios direcionadores do Projeto de Reengenharia da Aventis-Suzano foram: • desenvolver a energia para a mudança: dar mais poder e motivar as pessoas; • partir do consumidor e das suas necessidades: foco no consumidor externo e interno; • eliminar as atividades que não agregam valor; • reduzir o tempo das operações; • melhorar a comunicação; • alinhar todos os aspectos da organização.

Para tanto, foi definida a estratégia de conseguir o comprometimento de todos os

funcionários com uma nova filosofia de trabalho que integra processos industriais, pessoas e tecnologia da informação. 3.2 Metodologia de reestruturação adotada pela Aventis

A fim de realizar o projeto de Reengenharia da Operação Industrial e implantar o conceito de UPP, foram idealizadas e realizadas diversas ações que, em conjunto, configuram a metodologia adotada pela empresa (quadro 1). Todas as soluções foram desenvolvidas in house e algumas são descritas a seguir:

Estruturação do Projeto

Na primeira etapa, a de estruturação do projeto, foram alocadas equipes de projeto para cada UPP. Estas equipes foram, por sua vez, dividas em 7 áreas: Process Excellence; Manufatura; Qualidade Operacional; Desenvolvimento de Processos; Tecnologia Industrial; Supply Chain; Manutenção. O comitê central, estabeleceu ainda, 7 Equipes de suporte denominadas: Utilities; Controle de Qualidade; Controladoria; Compras; Environment, Health and Safety(EHS); Recursos Humanos; e Integration Project.

O conceito e a cultura de processos não existia para a operação brasileira. Antes do projeto, as operações eram controladas por um Gerente de Manufatura com preocupações e responsabilidades exclusivamente operacionais/funcionais. Havia pouca, ou quase nenhuma delegação de poder e as decisões eram concentradas nas mãos dos gerentes das fábricas. A idéia agora é de ter um líder de UPP, e não um gerente, com preocupações e responsabilidade por todo o processo necessário ao atendimento das necessidades do cliente; o líder é o dono do processo. No caso das UPPs da Aventis, o cliente é a área comercial. Buscou-se aqui, a conscientização por parte dos executivos de que os procedimentos de trabalho precisavam ser alterados e, além disto, o envolvimento do corpo gerencial no projeto era fundamental.

Definição da Missão/Visão/objetivos

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Nesta fase foram definidos os desafios e as expectativas do projeto, bem como seus aspectos estratégicos para o futuro da organização. A missão do projeto de reestruturação era a de promover melhorias com foco na competitividade em custos, flexibilidade, qualidade e no excepcional desempenho nas áreas ambientais, da saúde e segurança a fim de superar as expectativas dos clientes internos e externos.

A visão do projeto era de que o Site de Suzano fosse uma das melhores fontes de suprimento para produtos terapêuticos dentre as Operações Industriais da Aventis Pharma no mundo.

O objetivo do projeto era o de promover uma mudança cultural e comportamental de maneira que o setor fabril da empresa passasse a operar com forte foco em processos. Essas mudanças foram sustentadas pelas ações que compõem a metodologia desenvolvida para o projeto de reengenharia da Aventis. Com destaque para o redesenho dos processos críticos; a redefinição da estrutura organizacional; e a recolocação física das pessoas. Quadro 1: Metodologia do Projeto de Reengenharia Etapas Responsáveis Objetivos/Resultados Esperados Estruturar o Projeto Comitê Central - Definição das Equipes de Projeto

- Definição das funções de SuporteDefinir Missão/Visão/Objetivos Comitê Central - Working Encontros de Comunicação Comitê Central

Equipes de Projeto - Compartilhar os conceitos e as idéias do projeto com todos os funcionários

Avaliar situação atual Equipes de Projeto - Mapeamento da situação pré projeto: estrutura, organização, formas de trabalho, treinamento, fluxo de pessoas e material, restrições, avaliações dos clientes externos.

Definir Visão Operacional Equipes de Projeto - Plano de ação - Benchmarking - Melhores práticas - Objetivos operacionais - Fatores críticos de sucesso

Redesenhar Processos Equipes de Projeto - Plano de ação detalhado - Definição das PPU´s - Recolocação das pessoas - Definição das atividades - Definição das responsabilidades - Novas maneiras de trabalhar

Treinar as pessoas Process Excellence - Montagem das equipes - Definição dos lideres das equipes - Gerenciamento do tempo - Solução de Problemas - Treinamento técnico e operacional

Redefinir a Estrutura Organizacional

Comitê Central - Designar as PPUs - Equipes de gerenciamento da PPU

Recolocar as Pessoas Comitê Central - Trabalho em Equipe - Flexibilidade - Comunicação - Organização enxuta

Revisar/Retroalimentar Comitê Central PPUs

- Melhoria

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Os objetivos de desempenho do negócio da Aventis são: qualidade, custo e flexibilidade. Estes objetivos são desdobrados da seguinte forma:

• Qualidade - qualidade na primeira vez (reduz a variabilidade do processo); - melhorar o serviço para o cliente interno e externo; - superar as expectativas dos clientes; - melhorar a cultura e a consciência da qualidade e do Environment, Health and Safety (EHS);

• Custo - aumentar a produtividade; - reduzir o estoque total; - eliminar desperdícios;

• Flexibilidade - reduzir tempo de ciclo; - aumentar a flexibilidade do mix de produtos; - aumentar a flexibilidade organizacional (adaptar às mudanças dos processos e apoiá-los).

Encontros de Comunicação A fim de deixar a organização em prontidão para assimilar as mudanças necessárias à

implantação das UPPs, foi realizada uma preparação das pessoas por meio de encontros e palestras sobre o projeto e seu objetivo. Segundo o engenheiro líder da UPP Suzano, o treinamento formal não fazia muito sentido naquele momento. Em paralelo aos encontros e palestras, foram formadas equipes responsáveis pelo levantamento e redesenho dos processos. Os objetivos e estratégias foram compartilhados com o restante da empresa envolvida neste processo de reengenharia.

Redesenho dos Processos Críticos Ao todo, foram mapeados e redesenhados 17 processos envolvendo mais de 120

pessoas das diferentes áreas da empresa. O objetivo desta etapa era obter maior rapidez e agilidade dos processos críticos. Os processos críticos foram desenhados em dois momentos: antes e após as melhorias. Na verdade foram realizados dois trabalhos: o primeiro foi levantar e mapear o fluxo existente, que não estava clara para todos, inclusive para os que faziam parte desse processo. Em seguida, junto com as pessoas envolvidas no processo, foi feita uma análise crítica sobre quais atividades não agregavam valor e poderiam ser eliminadas. A seguir esses fluxos foram refeitos, ou seja, os processos redesenhados.

Todas as atividades desenvolvidas por diferentes áreas foram repensadas. Por exemplo, identificaram todas as atividades que uma pessoa de Garantia de Qualidade executa, e a seguir fizeram o exercício de definir se cada atividade deveria pertencer à estrutura da UPP ou à do Departamento (qualidade central), ou ainda se era uma atividade que deveria ser desempenhada pela UPP ao invés da qualidade. Essa mesma discussão foi realizada para Supply Chain, Manutenção e IT (Industrial Technology), que são as áreas que têm uma interface forte com a produção.

Alguns resultados do redesenho de processos são apresentados no quadro 2, sendo que além destes, outros processos que foram redesenhados: Manutenção preventiva; Manutenção corretiva; Lubrificação; Tolling in & out; Planejamento da Produção; Expedição; Recebimento de matéria-prima; Suprimento da produção; Treinamento operacional.

Redefinição da Estrutura Organizacional

A redefinição de estrutura organizacional foi desenvolvida com o objetivo de quebrar os silos existentes, focar nos processos e aumentar o poder de decisão e as responsabilidades das pessoas. O resultado foi uma estrutura matricial onde fica clara a tendência de se priorizar

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o fluxo produtivo ao invés dos departamentos. A três UPPs definidas na nova estrutura organizacional — Líquidos, Sólidos e Injetáveis — são apoiadas por quatro processos denominadas: Industrial Technology Center; Quality Operation; Supply Chain; e Site Services (ver anexo 1).

Foram definidos os seguintes processos de suporte: Production Technology, Qality Control, Planning & Inventory, Utilities, Engineering, Quality Assurance Systems, Sales & Operation, Central Maintenance & Systems, Validation Systems, Warehouse e General Services.

A nova função, a Sales & Operations (S&OP) — responsável por realizar a interface entre a área Industrial e a Comercial — foi criada em decorrência da preocupação de assegurar uma maior proximidade com os clientes das UPP´s. Quadro 2: Resultados do redesenho de processos Processo Redesenhado Resultados Obtidos Change Control:

• reduzido o número médio de assinaturas para aprovação de 8 para 3; • tempo médio para Ter um processo de Change Control aprovado, reduziu de mais de 3 meses para uma semana; • número médio de submissões de Change Control por mês, reduziu de 108 para 36; • participação ativa das pessoas da área comercial no processo de redesenho.

Batch record

• número médio de de approvers resuzido de 9 para 5; • número médio de páginas por batch reduzidas pela metade; • eliminação de duplas checagens tarefas não críticas

Quality deviation • o conceito de “deviation” foi redefinido • acabaram com a necessidade de assinaturas aprovando, pois as insvestigações são feitas “just in time” • espera-se uma redução de 50% no número de deviations.

Returned goods • forte cooperação entre as áreas comercial e industrial no redesenho dos processos • returned goods não serão mais reprocessadas • eliminação das assinaturas de aprovação dos gerentes. A decisão é tomada na PPU. •Controle do processo • reclamações externas

Processo de Manutenção • alguns processos doram criados • manutenção preventiva-calibração: redefinição de instrumentos críticos. • Redução de 800 para 300 calibrações/ano • Redução das despesas: US$ 60 mil • Benefícios intangíveis: clientes internos já percebem a diferença na maneira como eles estão sendo atendidos.

Recolocação Física das Pessoas

O objetivo de realizar um trabalho de layout e recolocação física era o de assegurar uma maior proximidade entre as pessoas envolvidas nos mesmos processos; estimular a formação de equipes multidisciplinares; e melhorar o processo de comunicação. 4. Conclusões

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Atualmente, a fábrica da Aventis em Suzano está dividida em duas Unidades de Processos Produtivos (UPPs), uma responsável pela produção de sólidos e outra de líquidos e cremes. A fábrica de injetáveis, localizada em Santo Amaro (São Paulo) foi vendida e continua operando sob regime de comodato até o final da construção da unidade de injetáveis em Suzano, prevista para o final de 2003.

As UPP's são hoje uma realidade dentro da operação industrial da Aventis. Considerando as 4 fases de transformação do modelo proposto por Abreu (1995) pode-se concluir que a Aventis realizou completamente as duas primeiras fases com sucesso na implementação de sua reengenharia de processo. Foi definida uma nova orientação estratégica com objetivos de desempenho alinhados a estratégia mundial de operações. Foram estabelecidos indicadores de avaliação de desempenho para cada um dos fatores críticos de sucesso previamente definidos. Os processos críticos foram mapeados e redesenhados de forma a eliminar todas aquelas atividades que não agregavam valor.

O esforço de aperfeiçoar os processos essenciais, cortando as atividades e funções que não agregam valor já foi feito. A empresa redistribuiu todos os seus recursos ao longo de seus processos essenciais, e já atribuiu a responsabilidade de gestão de cada processo essencial a um líder de processo. A empresa hoje se encontra mais preparada para empreender as próximas etapas do modelo de transformação (Abreu, 1995), podendo a partir de uma reengenharia de processo alcançar a reengenharia de negócio, mais ampla e envolvendo toda a organização.

Uma característica na implantação da reengenharia adotada na Aventis é que a reestruturação foi idealizada exclusivamente para a área industrial, mas tendo como um dos princípios direcionadores do projeto o foco no consumidor externo e interno. A área industrial parece atuar em função das necessidades e prioridades de seu cliente, a área comercial.

Algumas questões merecem destaque na metodologia utilizada pela Aventis para implementar o conceito de reengenharia. A primeira e talvez a que configura a maior mudança ocorrida na absorção do conceito e implantação da reengenharia pela empresa, é a inexistência de planos de demissão ou redução do quadro. O projeto da Aventis envolveu recolocação do pessoal, mas em nenhum momento o projeto chamou a atenção para a necessidade de demissão, cortes de pessoal ou downsizing.

Uma segunda questão importante se relaciona ao principal foco da reengenharia: os processos e não o produto, conforme crítica de Micklethwait e Wooldridge (1998). No caso específico deste projeto de reestruturação, a Aventis buscou a excelência em operações desvinculada do processo de desenvolvimento de novos produtos. Sendo assim, não houve nenhum esforço no sentido de desviar a vantagem competitiva da empresa, claramente focada no produto que ela fabrica, para como esse produto é fabricado – o processo. A estratégia de reengenharia adotada parece adequada para uma empresa que atua num setor altamente dinâmico, uma vez que os objetivos definidos para os processos estão alinhados com uma estratégia maior da organização.

Um terceiro ponto a ser discutido, referente à crítica feita por Hamel e Prahalad (1995) à reengenharia no início do texto. A empresa adotou a reengenharia como uma ferramenta de melhoria de seus processos internos, o que vem lhe trazendo benefícios competitivos nos mercados em que atua. A reengenharia para o caso apresentado faz parte de uma estratégia maior da empresa com o objetivo de melhorar seus objetivos de desempenho. A empresa em nenhum momento deixou de focar seus esforços em criar novas oportunidades de negócios e gerar maior riqueza para a organização.

Uma última lição deste caso, é que a reengenharia não precisa ser aplicada em toda organização. Deve-se pesquisar os setores dentro da empresa em que esta ferramenta possa ser mais facilmente implementada e que gere maior impacto nos resultados da companhia.

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Acreditamos que as áreas de fabricação e logística são áreas mais indicadas para se iniciar um processo de reengenharia, pois tendem a agilizar o processo de atendimento ao cliente.

Para concluir, pode-se afirmar que a reengenharia não deve ser totalmente abandonada pelas empresas, mas sim aprimorada e estudada para aplicação em cada caso. A análise do caso que descreve o processo de reengenharia empreendido pela Aventis na operação industrial no Brasil apresenta evidências de que a reengenharia é uma ferramenta de gestão, que continua sendo utilizada e valorizada pelas empresas.

Seu sucesso depende muito mais da forma com é implementada. A reengenharia não deve ser imposta a uma força de trabalho hostil, ao invés disto, deve-se envolver os funcionários num processo de mudança que gere evolução e não revolução. A participação e o envolvimento de toda organização é fundamental para que se tenha êxito nesta tarefa de implantação. A reengenharia não deve visar apenas o corte de custos em curto prazo, deve visar a competitividade da empresa em longo prazo.

5. Bibliografia

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GONÇALVES, J. E. L. As Empresas são Grandes Coleções de Processos. RAE, Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.40, n.1, p.6-19, Jan./Mar. 2000-a.

HAMMER, M. e CHAMPY, J. Reengenharia: revolucionando a empresa em função dos clientes, da concorrência e das grandes mudanças da gerência. Rio de Janeiro, Editora Campus, 1994.

KEEN, P. G. W. The Process Edge: creating value where it counts. Harvard Business School Press, Boston, Massachusetts, 1997.

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SLACK, N. Vantagem Competitiva em Manufatura: atingindo competitividade nas operações industriais. São Paulo: Atlas, 1993.

SKINNER, W. Manufacturing - the missing link in corporate strategy, Harvard Business Review, Boston, May-June, 1969, pp-2-10.

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HARRINGTON, H. J. Business Process Improvement. New York: McGraw-Hill, 1991. MICKLETHWAIT, J. e WOOLDRIDGE, A. Os bruxos da administração: como entender

a babel dos gurus empresariais. Rio de Janeiro: Campus, 1998. ABREU, F. de S., Reengenharia - em busca de uma teoria., p.60-83, in GONÇALVES, J.

E. L. e DREYFUSS, C., Reengenharia das Empresas – passando a limpo., São Paulo, Ed. Atlas, 1995.

HAMEL, G. e PRAHALAD, C. K. Competindo pelo futuro. Rio de Janeiro, Campus, 1995.

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ANEXO 1: Estrutura organizacional da operação industrial brasileira após a reestruturação

QA SYSTEMS

QARL

BRAZIL INDUSTRIAL OPERATIONS

INF. SOLUTION IND. EXCELL.

Technolog PROD. TECHN.

QUALITY QUALIT QUAL. CONTR.

PLANNING PLANNIN PLANNING & INVENTORY

MAINTEN.

SITE UTILITIES

SO&P

MAINT. & SYSTEMS

Warehouse

GENERAL SERVICES

HUMAN RESOURCES

Technology

INDUSTRIAL TECH. CENTER

SITE SERVICES

SUPPLY CHAIN

Technology

QUALITY

PLANNING

MAINTEN.

ENGINEER.

PPU LIQUID

Manufat.

PPU SOLID

Manufat.

PPU

Manufat.

Shared Services Units

SupportProcessUnits

Primary Process Units

VALIDAT. SYSTEMS

ADM. ASSIST.

QUALITY OPERATION

CONTROLLING PURCHASINGEHS

AD/AS