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ARTIGO ORIGINAL ISOLAN GR, CHEM CC, WEBSTER R, STEFANI MA, OPPITZ PP, FRANCISCATO AC, ANTUNES ACM – Reconstrução da base do crânio – Enxertos e retalhos regionais J Bras Neurocirurg 18(1), 5-13, 2007 Sinopse Um dos maiores problemas após os procedimentos que envolvem a base do crânio é quando o espaço intracraniano não pode ser isolado das áreas adjacentes. Visando resolver este problema, juntamente com a evolução da cirurgia da base do crânio, tem havido uma grande evolução nas técnicas de reconstrução da base do crânio. A anatomia da base do crânio pode ser dividida em anterior, média e posterior. O objetivo dos autores é descrever as técnicas de reconstrução da base do crânio em uma série de pacientes neurocirúrgicos, realizadas por uma equipe de neurocirurgia, e em uma série de pacientes Reconstrução da base do crânio – Enxertos e retalhos regionais – Duas séries diferentes provenientes de um Departamento de Neurocirurgia e de um Departamento de Cirurgia Plástica Gustavo Rassier Isolan 1 Carlos Correa Chem 2 Ronaldo Webster 3 Marco Antônio Stefani 1,7 Paulo Petry Oppitz 4 André Ceruti Franciscato 5 Apio Cláudio Martins Antunes 1,6 1 Serviço de Neurologia (Unidade de Neurocirurgia) – Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). 2 Fundação Faculdade de Ciências Médicas de Porto Alegre (FFFCM- PA), Departamento de cirurgia plástica da Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. 3 Serviço de Cirurgia Plástica do Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. 4 Neurocirurgia do Hospital Cristo Redentor. 5 Serviço de Neurocirurgia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). 6 Serviço de Neurocirurgia da Faculdade de Medicina, UFRGS, Unidade de Neurocirurgia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). 7 Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) com carcinoma de cabeça e pescoço realizadas por uma equipe de cirurgia plástica, bem como fazer uma revisão crítica da literatura sobre anatomia da vascularização da base do crânio, tipos de enxertos mais utilizados e retalhos miocutâneos. Os vários métodos de reconstrução são descritos seqüencialmente, iniciando com sintéticos e enxertos livres, estendendo-se aos retalhos miocutâneos. Palavras-chave Base do crânio, reconstrução, retalhos, enxertos, abordagens cirúrgicas. Abstract Skull base reconstruction – Regional flaps and grafts – two different series from a neurosurgical department and a plastic surgery department One of the biggest problems after skull base surgery occurs when the intracranial space cannot be isolated from the adjacent areas. To address this, along with the evolution of skull base surgery, there has been a great evolution in the reconstruction techniques to the skull base. The anatomy of the skull base is described with classification into the anterior, medial and poste- rior skull base. The purpose of the author’s is to described skull base reconstruction techniques in a neurosurgical patients series performed by neurosurgeon and in head and neck carcinoma patients performed by plastic surgeon, as well as a literature review regarding skull base vascularization, grafts and myocu- Recebido: 04/07/2007; Aprovado 08/08/2007

Reconstrução da base do crânio – Enxertos e retalhos ...ceanne.com.br/revista/wp-content/uploads/2014/11/Reconstrucao-da... · Um dos maiores problemas após os procedimentos

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ARTIGO ORIGINAL

ISOLAN GR, CHEM CC, WEBSTER R, STEFANI MA, OPPITZ PP, FRANCISCATO AC, ANTUNES ACM – Reconstrução da base do crânio – Enxertos e retalhos regionais

J Bras Neurocirurg 18(1), 5-13, 2007

Sinopse Um dos maiores problemas após os procedimentos que

envolvem a base do crânio é quando o espaço intracraniano não pode ser isolado das áreas adjacentes. Visando resolver este problema, juntamente com a evolução da cirurgia da base do crânio, tem havido uma grande evolução nas técnicas de reconstrução da base do crânio. A anatomia da base do crânio pode ser dividida em anterior, média e posterior. O objetivo dos autores é descrever as técnicas de reconstrução da base do crânio em uma série de pacientes neurocirúrgicos, realizadas por uma equipe de neurocirurgia, e em uma série de pacientes

Reconstrução da base do crânio – Enxertos e retalhos regionais – Duas séries diferentes provenientes de um Departamento de Neurocirurgia e de um Departamento de Cirurgia Plástica

Gustavo Rassier Isolan1

Carlos Correa Chem2

Ronaldo Webster3

Marco Antônio Stefani1,7

Paulo Petry Oppitz4

André Ceruti Franciscato5

Apio Cláudio Martins Antunes1,6

1 Serviço de Neurologia (Unidade de Neurocirurgia) – Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).

2 Fundação Faculdade de Ciências Médicas de Porto Alegre (FFFCM-PA), Departamento de cirurgia plástica da Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.

3 Serviço de Cirurgia Plástica do Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.

4 Neurocirurgia do Hospital Cristo Redentor.5 Serviço de Neurocirurgia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre

(HCPA).6 Serviço de Neurocirurgia da Faculdade de Medicina, UFRGS,

Unidade de Neurocirurgia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).

7 Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

com carcinoma de cabeça e pescoço realizadas por uma equipe de cirurgia plástica, bem como fazer uma revisão crítica da literatura sobre anatomia da vascularização da base do crânio, tipos de enxertos mais utilizados e retalhos miocutâneos. Os vários métodos de reconstrução são descritos seqüencialmente, iniciando com sintéticos e enxertos livres, estendendo-se aos retalhos miocutâneos.

Palavras-chave Base do crânio, reconstrução, retalhos, enxertos, abordagens

cirúrgicas.

AbstractSkull base reconstruction – Regional flaps and grafts – two

different series from a neurosurgical department and a plastic surgery department

One of the biggest problems after skull base surgery occurs when the intracranial space cannot be isolated from the adjacent areas. To address this, along with the evolution of skull base surgery, there has been a great evolution in the reconstruction techniques to the skull base. The anatomy of the skull base is describedwithclassificationintotheanterior,medialandposte-rior skull base. The purpose of the author’s is to described skull base reconstruction techniques in a neurosurgical patients series performed by neurosurgeon and in head and neck carcinoma patients performed by plastic surgeon, as well as a literature review regarding skull base vascularization, grafts and myocu-

Recebido: 04/07/2007; Aprovado 08/08/2007

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ISOLAN GR, CHEM CC, WEBSTER R, STEFANI MA, OPPITZ PP, FRANCISCATO AC, ANTUNES ACM – Reconstrução da base do crânio – Enxertos e retalhos regionais

J Bras Neurocirurg 18(1), 5-13, 2007

taneousflap.Thevariousmethodsofreconstructionbasedonthe principle of the reconstructive ladder are described, starting withsyntheticsandfreegraftstomyocutaneousflaps.

Key-wordsSkullbase,reconstruction,flaps,grafts,surgicalapproaches.

Introdução

As abordagens cirúrgicas para a base do crânio constituem um dos principais capítulos na evolução da neurocirurgia, tendo um impacto sensível na diminuição da morbimortalidade de afecções localizadas nesta região. Esses procedimentos têm como pedra angular uma abordagem mais direta, diminuindo a distância entre o cirurgião e o campo cirúrgico, em comparação com as abordagens convencionais, além de maior retirada de tecido ós-seo, objetivando diminuir a retração cerebral. Essas vantagens reduzem significativamente a morbimortalidade cirúrgica. No entanto, um dos maiores problemas, depois das abordagens complexas para a base do crânio, ocorre quando o espaço intracraniano não pode ser isolado das áreas adjacentes, o que pode resultar várias complicações, tais como fístula liquórica, exposição da dura-máter, pneumoencéfalo, infecção do sítio cirúrgico, meningite e abscesso. Visando evitar estas compli-cações, juntamente com a evolução de complexas abordagens usadas no armamentarium neurocirúrgico, houve uma grande evolução nas técnicas de reconstrução da base do crânio.

Os objetivos da reconstrução da base do crânio, além do isola-mento asséptico do compartimento intracraniano, são reduzir o espaço morto, posicionar tecido vascularizado ao redor de estru-turas vitais e melhorar os aspectos pós-operatórios cosméticos e funcionais da ferida cirúrgica.

Existe uma seqüência gradativa de opções na reconstrução da base do crânio. Em linhas gerais, podem ser consideradas, em uma escala iniciando com defeitos menores e se estendendo a grandes defeitos, à cola de fibrina, aos enxertos de gordura, aos enxertos de fáscias não-vascularizados, aos retalhos de fáscias vascularizados (fáscia temporal superficial, fáscia temporal profunda, pericrânio e gálea frontal), ao músculo temporal, aos retalhos miocutâneos (músculos peitoral, trapézio e grande dorsal) e, finalmente, aos retalhos livres1,9,15,18.

A exposição cirúrgica inicial deve ser cuidadosamente plane-jada pela equipe multidisciplinar, devendo o cirurgião da base do crânio levar em conta que tecidos, como gordura e músculo, diminuem de tamanho com o passar do tempo9,15.

Em razão da complexidade do tema, este artigo está dividido em duas partes. Na primeira parte, os autores apresentam duas séries de pacientes. Uma série de pacientes neurocirúrgicos, nos quais enxertos e retalhos de fáscia e músculo temporal foram utilizados, e uma série proveniente de um serviço de cirurgia plástica em que retalhos miocutâneos foram utilizados em pacientes para tratar defeitos da base do crânio em virtude de neoplasias de cabeça e pescoço. Este artigo tem como objetivos discutir a anatomia relevante na reconstrução da base do crânio,

bem como os enxertos, os retalhos locais, os retalhos miocutâ-neos, entre outras modalidades. A segunda parte deste artigo versará sobre os retalhos livres e as indicações da utilização específica de cada retalho em relação à determinada região da base do crânio.

Casuística e métodos

Entre dezembro de 2006 e junho de 2007, 15 pacientes com tumores nas fossas média, anterior e posterior do crânio e um paciente com fístula liquórica espontânea no nível do tegmen timpani foram submetidos à reconstrução da base do crânio por um dos autores (GRI) (Tabela 1).

Entre 2003 e 2006, 17 pacientes oncológicos foram submeti-dos a retalhos musculares e miocutâneos pediculados para re-construção da base do crânio por uma equipe de cirurgia plástica coordenada por um dos autores (CCC). Todos os casos referiram-se a reconstruções pós-ressecção oncológica. Foram utilizados oito retalhos temporais, quatro retalhos de trapézio e cinco reta- lhos de músculo grande dorsal (um com pedículo subcutâneo e quatro com pedículo externo, com posterior secção).

Uma revisão de literatura na base de dados Lilacs e PubMed foi realizada, sendo os artigos submetidos à análise crítica. A revisão abrangeu os tópicos de anatomia do suprimento arte-rial da base do crânio, o uso de enxertos, as fáscias, o músculo temporal, a cola de fibrina e os retalhos miocutâneos.

Resultados

Entre os 14 pacientes neurocirúrgicos, o de número 5 apre-sentou fístula liquórica após reintervenção no terceiro dia pós-operatório para remover hematoma temporal em conseqüência de infarto venoso temporal (embora o sistema venoso superficial tenha sido preservado e não tenha havido retração importante do lobo temporal), que estava causando deterioração do sensório. No quarto dia após a reintervenção, o paciente apresentou coleção no tecido subcutâneo na área da craniotomia por causa de fístula liquórica. O paciente foi submetido à reintervenção e pequena abertura dural na porção mais anterior, na linha de sutura da dura-máter, foi corrigida. O local onde foi realizado a reconstrução com retalho de músculo temporal sobre a área da mastóide “drilada” não apresentava extravasamento de liquor. No caso número 1, a artéria cerebelar póstero-inferior estava englobada pelo tumor e sua manipulação alterava o potencial evocado motor e somatossensitivo, e optou-se por ressecção tumoral parcial para não acarretar déficits neurológicos ao pa- ciente. O paciente 10 apresentou deiscência de ferida operatória, provavelmente, em razão do déficit nutricional diagnosticado mediante critérios clínicos, necessitando de retalho miocutâneo em um segundo tempo. Os demais pacientes não apresentaram qualquer complicação no sítio cirúrgico e as características desta série estão descritas na Tabela 1.

Entre os 17 pacientes oncológicos que foram submetidos a retalhos miocutâneos, as principais complicações observadas

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J Bras Neurocirurg 18(1), 5-13, 2007ISOLAN GR, CHEM CC, WEBSTER R, STEFANI MA, OPPITZ PP, FRANCISCATO AC, ANTUNES ACM – Reconstrução da base do crânio – Enxertos e retalhos regionais

TABELA 1Série de pacientes neurocirurgicos com descrição do retalho utlizado para reconstrução da base do crânio.

Caso Diagnóstico Abordagem Reconstrução Ressecção Complicações no sítio cirúrgico*

Déficit neurológico novo

1 Paraganglioma do forâmen jugular com volumoso componente intracraniano

Combinada fossa infratemporal – fossa posterior

Retalho pediculado musculotemporalŧ

Parcial Não Não

2 Meningioma tentorial I Petrosectomia anterior Retalho pediculado de músculo temporal anteriorŧŧ

Total Não Não

3 Meningioma tentorial IIIB/A

Petrosa pré-sigmóidea supra/infratentorial

Retalho pediculado de músculo temporalŧ Total Não Não

4 Meningioma tentorial IVA/B

Occipital supra/infratentorial

Duroplastia com fáscia do músculo esternoclidomastóideo

Total Não Não

5 Meningioma tentorial III B/A

Pré-sigmóidea supra/infratentorial

Músculo temporalŧ + gordura + cola**

Total Fístula liquórica Não

6 Meningioma do tubérculo da sela

Frontoorbital + drilagem do teto do canal óptico

Retalho pediculado de gálea aponeurótica Total Não Não

7 Meningioma esfenopetroclival com invasão do canal óptico e perda progressiva da visão no OD

Cranioorbitozigomática + petrosectomia anterior + drilagem do teto do canal óptico

Retalho pediculado de músculo temporal anteriorŧŧ > 90% Não

Lesão III par com recuperação em 5 meses. Recuperação total da perda visual

8 Meningioma esfenopetroclival

Crânio-orbitozigomática + petrosectomia anterior

Retalho pediculado de músculo temporal anteriorŧŧ

Subtotal NãoHemiparesia e déficit cognitivo (infarto venoso)

9 Meningioma petroso Pré-sigmóidea supra/infratentorial

Retalho pediculado de músculo temporalŧ + gordura

Total Não Não

10 Carcinoma do meato acústico externo com invasão do osso temporal (T4)

Ressecção do osso temporal em bloco + ressecção da glândula parótida e esvaziamento cervical

Retalho pediculado de músculo temporalŧ

Total Deiscência na ferida operatória, corrigida com retalho miocutâneo pediculado de músculo deltóide

Não

11 Meningioma da goteira olfatória

Frontorbital Retalho pediculado de gálea aponeurótica Total Não Não

12 Meningioma do forâmen jugular

Combinada supra e retrojugular

Retalho pediculado musculotemporalŧ Total Não Não

13 Meningioma em placa da asa do esfenóide com invasão da fossa infratemporal

Cranioorbitozigomática abordando fossa infratemporal entre V2 e V3

Retalho pediculado de musculotemporal Total Não Não

14 Hipotensão liquórica em virtude da fístula espontânea no nível do tegmen timpani

Mastoidectomia Retalho pediculado de músculo temporalŧ

– Não Não

15 Meningioma em placa da asa do esfenóide com invasão da fossa infratemporal

Crânio-órbito-zigomática abordando fossa infratemporal entre V2 e V3

Retalho pediculado de músculo temporal

Total Não Não

*Fístula líquórica, infecção do sítio cirúrgico e/ou hematoma; **Beriplast®; ŧ: as fáscias temporoparietais e temporal profundo são dissecadas do músculo temporal. A porção posterior do músculo temporal é incisada e o retalho pediculado deste músculo rotado inferiormente, preenchendo a mastóide drilada e sendo suturada ao músculo esternoclidomastóideo + cola biológica**; ŧŧ: retalho pediculado da porção anterior do músculo temporal, preenchendo o triângulo de Kawase drilado e a fossa média + cola biológica**; ACP: artéria cerebral posterior.

Nota: A classificação dos meningiomas tentoriais é baseada em Aguiar PHP. Meningiomas tentoriais – classificação anatomocirúrgica e sistematização das vias de acesso à região tentorial. Tese de livre-docência apresentada na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, 2006.

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J Bras Neurocirurg 18(1), 5-13, 2007

foram infecção e perdas parciais de retalho associadas à fístula liquórica, o que ocorreu em dois casos. A hipótese biológica nestes casos é que com a cicatrização externa do pedículo ocor-reu a formação de tecido de granulação e contração da ferida exposta, causando tensão na zona receptora com posterior deis-cência de sutura, contaminação e perda do retalho por deficiência de circulação venosa.

Não houve óbitos derivados dos procedimentos cirúrgicos, dois dos quatro casos de reconstrução com retalho de músculo grande dorsal de pedículo externo necessitaram de revisão pós-operatória, sendo corrigidos com retalhos locais de escalpo e região frontal.

Com o emprego dos retalhos livres em nosso departamento, o uso de retalhos pediculados miocutâneos foi praticamente abandonado em reconstruções de grande porte, por causa da dificuldade de manejo dos pacientes no pós-operatório. Uma exceção é a região póstero-lateral do crânio, onde o arco de rotação do músculo trapézio alcança adequadamente a região sem tração excessiva.

Defeitos anteriores e craniais apresentam pobre resultado com a utilização de retalhos convencionais, exceto aqueles do mús-culo temporal, que são úteis nestas situações específicas. Deve ser salientado que a sua vascularização deve estar preservada no sítio da artéria maxilar interna.

Discussão

AnAtomiA do suprimento sAngüíneo dA bAse do crânio

A base do crânio pode ser dividida em fossas anterior, média e posterior. O suprimento sangüíneo dos tecidos moles da parte anterior da base do crânio é dado pelos ramos da artéria carótida interna. A gálea frontal é suprida, principalmente, pelas artérias supra-orbital e supratroclear, existindo também um menor su-primento oriundo do ramo anterior da artéria temporal superficial. As artérias supra-orbital e supratroclear dividem-se próximo ou acima do rebordo orbitário em ramos superficiais, que passam dentro da gálea frontal, e ramos profundos, que nutrem o peri-crânio. O tronco superior da artéria supra-orbital é o principal suprimento do retalho de pericrânio frontal21. As artérias da parte anterior da base do crânio não têm calibre suficiente para realiza-ção de anastomoses microvasculares. Nesse caso, retalhos livres necessitam de um pedículo vascular que se estenda até os vasos da porção cervical alta ou da porção lateral da face, onde podem ser encontrados vasos calibrosos, como a artéria facial e outros vasos calibrosos com origem na artéria carótida externa1,9.

Na parte média da base do crânio, ou fossa craniana média, o suprimento vascular dos tecidos extracranianos origina-se dos ramos terminais da artéria carótida externa. As artérias temporais profundas anterior e posterior originam-se da artéria maxilar na fossa infratemporal e são responsáveis pelo principal suprimento arterial do músculo temporal. A artéria temporal média é um pequeno ramo da artéria temporal superficial que também supre o músculo temporal, nele adentrando lateralmente8. Baseado nos

aspectos anatômicos da vascularização do músculo temporal, a dissecção subperiosteal deve ser realizada para preservar as artérias temporais profundas11. A artéria temporal média, um vaso menos calibroso, geralmente é lesada na dissecção dos retalhos cutâneos, envolvendo o músculo e as fáscias da região temporal. Quando o músculo temporal é deslocado inferiormente para expor a fossa infratemporal em algumas abordagens para a base do crânio, seu suprimento deve ser preservado, de modo essencial nos casos nos quais o músculo será usado para recon-strução. Nos enxertos livres, os vasos temporais superficiais, geralmente, têm calibre suficiente para anastomoses microvas-culares, mas comumente sua luz é menor do que as dos vasos doadores. O fluxo venoso também é um problema nos casos em que a dissecção simultânea da região cervical é realizada. Mui-tas vezes é necessário estender a anastomose vascular à região cervical superior, onde vasos mais calibrosos são encontrados. Esses fatores tornam essencial o conhecimento da anatomia microcirúrgica da base do crânio.

gordurA

Após ressecção tumoral, a regra é que a área adjacente à ressecção colapse e oblitere o espaço morto. Em cirurgia da base do crânio, no entanto, isso comumente não ocorre em virtude da grande quantidade de osso que é removida. Quando o defeito ósseo é pequeno, o enxerto de gordura pode ser empregado, a gordura abdominal a mais utilizada. Embora seja esperada reabsorção de 60% a 70% da gordura transplantada para o lo-cal da base do crânio1,9,10,15, o objetivo inicial desta gordura é evitar fístula liquórica através de pressão sobre a dura-máter. Em mulheres jovens visando prevenir cicatriz abdominal, realiza-se incisão supra-púbica e a gordura é removida profundamente à fáscia de Escarpa15. Embora não exista aumento na incidência de infecção, caso ocorra, a gordura deve ser removida1,9,15. Enxertos de gorduras provenientes do abdômen, além de deixarem cicatriz, podem produzir compressão do tronco encefálico ou meningite lipóide, como recentemente mencionado em cirurgias realizadas na topografia do forame jugular16. As contra-indicações relativas ao uso de enxerto de gordura para reconstrução da base do crânio são irradiação prévia do local e área contaminada por conteúdo proveniente da abertura da faringe1,9,10,15. Um retalho de gordura com pele é utilizado quando há tecido abdominal redundante. Nesses casos, a epiderme da pele é retirada. Em abordagens, tais como petrosectomias e abordagens à região selar, enxertos de gorduras são freqüentemente utilizados juntamente com cola de fibrina para reconstruir defeitos da base do crânio.

FásciA temporAl

O retalho vascularizado mais utilizado em reconstrução da base do crânio é a fáscia temporal superficial, também chamada, de acordo com a Nomina Anatômica, fáscia temporoparietais. Quando os defeitos são pequenos, um enxerto de fáscia ou de gordura ou a associação de ambos podem ser utilizados. Para de-feitos maiores do que 6 cm15, no entanto, um retalho pediculado da fáscia temporoparietal pode ser utilizado. A fáscia temporal profunda pode ser incluída juntamente no retalho. Este tipo de

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retalho pode ser usado na maioria dos defeitos durais da região jugulotimpânica10,15,16. Nas abordagens laterais para a base do crânio (abordagens petrosas, por exemplo), a incisão da pele inicia anterior ao trágus no nível do zigoma, contorna a orelha e estende-se inferiormente 4 cm inferior ao processo mastóide. A pele é refletida anteriormente e a fáscia temporal é incisada e separada do músculo temporal nas bordas superior, anterior e inferior da incisão9, mantendo sua continuidade com o músculo esternoclidomastóideo, que tem sua inserção na porção mastóide do osso temporal e no osso occipital. Esse retalho da fáscia dos músculos temporal e esternoclidomastóideo tem abundante vascularização e tem sido utilizado pelos autores para obliterar o espaço morto nas mastoidectomias (Figura 1). Ramina e col.17 relataram uma série de tumores do forâmen jugular com invasão intracraniana, nos quais foi empregada uma técnica de reconstrução com três camadas. A primeira sendo a dura-máter reforçada por cola de fibrina; a segunda, a metade posterior do músculo temporal encobrindo a dura-máter e preenchendo a

cavidade mastóide. Esta camada foi suturada nas fáscias cervical e parotídea. A terceira camada foi composta pelas fáscias tempo-ral e cervical e pelo músculo esternoclidomastóideo. De acordo com os autores, a incidência de fístula liquórica e os resultados cosméticos foram aceitáveis. O pericrânio, que tecnicamente não é uma fáscia, tem uma perspectiva cirúrgica semelhante à da fáscia do músculo temporal. Ambas podem ser utilizadas para o fechamento de aberturas durais, mas a fáscia temporal superficial é mais espessa do que o pericrânio.

A fáscia temporal é dissecada elevando-se a pele imediata-mente profunda à hipoderme e aos folículos pilosos, o que, semelhantemente ao retalho de pericrânio, possui o risco de causar alopecia ou perda do escalpo ao longo das margens da incisão, quando grandes segmentos de pele são elevados. Nos casos em que há a necessidade de uma grande extensão de fáscia, maior que aquela localmente disponível, fáscias de locais distantes, como fáscia lata, podem ser necessárias, o que comumente ocorre em casos de recorrência tumoral.

FIGURA 1.Caso 9. Retalho pediculado da porção posterior do músculo temporal utilizado para reconstruir a base do crânio depois da abordagem

combinada pré-sigmóidea supra/infratentorial. (A) RM com gadolíneo em T1, corte coronal, evidenciando a topografia do tumor (inicialmente pensou-se tratar de um meningioma tentorial, mas o transoperatório revelou a origem petrosa do tumor); (B) Marcação do

local da incisão da pele e da craniotomia; (C) Dissecção conjunta das fáscias temporal profunda e temporoparietais, mantendo-as em continuidade com a fáscia do esternoclidomastóideo; (D) Dissecção subperiosteal da porção posterior do músculo temporal; (E) A porção

posterior do músculo temporal é rotada ínfero-posteriormente para o interior da cavidade mastóide. Enxerto de gordura e cola são colocados no local. As fáscias temporais, previamente dissecadas, são suturadas no músculo temporal remanescente na fossa temporal, comprimindo o retalho de músculo e o enxerto de gordura da cavidade mastóidea; (F) TC evidenciando ressecção tumoral e imagem hipodensa na parte

posterior da porção petrosa do osso temporal, correspondendo ao enxerto de gordura.

A B C

D E F

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músculo temporAl

O retalho de músculo temporal é útil para reconstruir o assoa- lho da fossa média, a nasofaringe e a fossa infratemporal1,9,10,15. Muitas vezes a extensão do retalho do músculo temporal é insuficiente para alcançar defeitos na região do canal auditivo ou da articulação temporomandibular9,15. Durante a dissecção subperiosteal da fossa temporal, as artérias temporais profun-das devem ser preservadas, pois são o principal suprimento do músculo, como mencionado anteriormente. Para rotar o mús-culo temporal para reconstruir defeitos na região esfenoclival, é necessário separar sua inserção do processo coronóide da mandíbula ou mesmo cortar este processo, deixando-o aderido ao músculo. Essa manobra, no entanto, vai desvascularizar o músculo temporal13. Geralmente, a atrofia do retalho de músculo temporal ocorre por lesão das artérias temporais profundas ou por ressecção de V3 durante ressecção de tumores malignos da fossa infratemporal. Adicione-se a isso, o músculo temporal em si não é considerado um bom retalho para a reconstrução de grandes defeitos. O defeito estético na fossa temporal é uma desvantagem deste método, porém este defeito pode ser mini-mizado com implantes sintéticos.

retAlhos de pericrânio e gáleA AponeuróticA FrontAl

Dentro deste grupo, o mais utilizado é o retalho pediculado de pericrânio, que consiste do periósteo da região frontoparie- tal. O retalho de pericrânio é considerado a primeira escolha na reconstrução dos defeitos da fossa anterior1,9,15. Embora o suprimento sangüíneo deste retalho seja limitado, a incidência de fístula liquórica é muito baixa15. O retalho de pericrânio é uma modalidade-padrão no reparo de defeitos da linha média da parte anterior da base do crânio. O tamanho do retalho pode ser aumentado estendendo a incisão da pele posteriormente. Um retalho aumentado pode ser utilizado para defeitos que ultrapas-sam o clívus, alcançando a nasofaringe e a coluna cervical13.

O retalho de gálea frontal com o músculo frontal é mais vas-cularizado que o retalho do periósteo de modo isolado, mas a utilização conjunta da gálea com o músculo frontal tem como resultado uma pele fina e pobremente vascularizada sobre o osso. Em razão disso, a irradiação prévia do local é uma contra-indi-cação para este tipo de retalho. Deformidades do contorno da testa e necrose de pele são riscos associados14. Baseado em um estudo anatômico, o retalho de pericrânio é bem vascularizado quando o pedículo é amplo o bastante para incluir as anastomo-ses entre a artéria supra-orbital e os ramos profundos da artéria temporal superficial e quando a dissecção não se estende 10 a 15 mm do rebordo supra-orbitário. Nesse estudo, contrariamente a conceitos prévios, o tronco principal da artéria supra-orbital não passou pelo forâmen supra-orbitário como esperado, pas-sando somente o ramo profundo do nervo supra-orbitário e uma fina artéria profunda o acompanhando21.

retAlhos dA mucosA do septo nAsAl

O uso da reconstrução através de procedimentos endoscópicos para reconstruir defeitos da base anterior do crânio, menores que

3 cm de diâmetro está aumentando, devido ao maior treinamento e prática com o uso do endoscópio14. Os retalhos da mucosa do septo nasal podem ser usados ocasionalmente para fechar defeitos no teto da cavidade nasal e do etmóide. Infelizmente, o grau de viabilidade da mucosa que permanece após remoção do tumor é pequeno, sendo este tipo de retalho mais utilizado para remover tumores pequenos ou reparar fístulas liquóricas.

enxertos ósseos

Os enxertos ósseos são retirados de uma das camadas da calvária, podendo ser da tábua interna após ser realizada a craniotomia ou da tábua externa das porções intactas dos ossos parietais. A crista ilíaca é a segunda escolha como fonte de enxertos ósseos, quando grandes porções de osso são necessárias. A reconstrução pode ser feita também com substitutos ósseos, por exemplo, polietileno poroso6,7. A utilização de enxerto ósseo na reconstrução da base do crânio é controversa. Por um lado, alguns autores têm realizado reconstrução da base craniana anterior com três camadas: placa de titânio, enxerto ósseo proveniente da calvária e retalho de pericrânio19 ou mesmo titânio sem enxerto ósseo. Por outro lado, a maioria dos centros de cirurgia da base do crânio acredita que a reconstrução óssea não é necessária quando é usado tecido vascularizado adequado ao ta-manho da falha5,8,20. Imola e col. consideram o uso de osso somente para defeitos “extremamente largos” que resultarão em herniação do lobo frontal ou quando partes dos ossos da órbita são afetados, causando deformidade estética9. O uso de enxerto ósseo é também indicado em defeitos que resultam deformidade facial, má oclusão e alterações na função mastigatória. Consideramos que o teto da órbita deva sempre ser reconstruído após abordagens para a base do crânio, como a craniotomia cranioorbitozigomática, por exemplo, pois isso evita enoftalmia2. Retalhos contendo osso são raramente indicados em razão de sua pouca maleabilidade e a sua pobre vascularização9. Os materiais aloplásticos, como a tela de titânio, são uma boa opção para reconstruir defeitos da base do crânio4. Um aspecto importante neste caso é que estes materiais devem ser encobertos por tecido vascularizado e não devem estar em contato direto com a cavidade nasal ou nasofaringe9. Outros materiais alo-plásticos são cimento de hidroxiapatita, polietileno poroso e placa de fixação reabsorvível. Entretanto, para grandes defeitos ósseos da base do crânio e do esqueleto craniofacial associados a defeitos da pele sobre superfícies mucosas, uma boa opção são os retalhos livres9, que será discutida na segunda parte deste artigo.

Materiais AloplásticosA hidroxiapatita é um excelente material para cranioplastia

que pode ser usada não somente para reconstruir defeitos ósseos causados pela drilagem óssea, mas também para reconstruir a fossa temporal e a área frontoorbital. Embora possa ser utilizada para reconstruir defeitos no osso mastóide, reconstruímos a mastóide reposicionando o córtex deste osso, que é retirado previamente à sua drilagem mediante corticotomia mastoidéia. O resultado estético é muito satisfatório. As placas reabsorvíveis e os parafusos de fixação são úteis nos pacientes pediátricos porque não restringem o crescimento do crânio.

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Materiais alográficosMateriais alográficos são obtidos de fonte humana após

apropriado tratamento visando à redução de infecção micro-biana. Dura liofilizada, osso congelado, derme acelular tratada quimicamente e cola de fibrina são alguns exemplos. Estes materiais têm uma duração menor quando comparados com enxertos autólogos, mas são úteis quando estes últimos não estão disponíveis.

Cola de fibrinaA cola de fibrina é útil para fixar os retalhos e os enxertos

quando a realização da sutura está dificultada pela anatomia irregular da base do crânio, sendo extremamente importante não somente para evitar fístula liquórica, mas também pneu-moencéfalo hipertensivo. Origitano e col. reconstroem a base

craniana anterior com pericrânio superiormente e, se possível, gordura e cola inferiormente por via endoscópica. A cola de fibrina é rotineiramente usada pelos autores.

retAlhos miocutâneos

Os retalhos miocutâneos fornecem uma melhor proteção contra a invasão bacteriana quando comparados com os retalhos de pele3. Além disso, os retalhos miocutâneos são longos o bas-tante para alcançar grandes áreas da base do crânio. Retalho de músculo peitoral, porção inferior do músculo trapézio e grande dorsal são os mais comumente utilizados. Embora este tipo de retalho tenha sido revolucionário em diminuir a morbimortali-dade após procedimentos complexos da base do crânio, tais como carcinomas, nos quais a nasofaringe era amplamente exposta, atualmente, os retalhos livres vascularizados são melhores na

FIGURA 2.Retalho pediculado miocutâneo de músculo temporal para preencher a porção lateral da base do crânio depois da ressecção de

carcinoma de cabeça e pescoço. (A) Exposição da base craniana a ser reconstruída; (B) Dissecção do músculo temporal e da pele no sítio doador do retalho; (C) Exposição da superfície interna do retalho evidenciando o pedículo vascular deste; (D) Posição final da

reconstrução. A porção exposta do músculo estará localizada sob a pele da região cervical ao final do procedimento.

A B

C D

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FIGURA 3.Retalho pediculado miocutâneo do músculo grande dorsal utilizado para reconstruir a base do crânio depois da ressecção de

carcinoma na região occipital. (A) Inspeção da região occipital evidenciando necrose e invasão da pele pelo tumor; (B) Ressecção em bloco da porção óssea comprometida pelo tumor, bem como da pele e dos músculos da região cervical posterior. Nota-se a

dura-máter da fossa posterior exposta; (C) Delimitação dos limites cirúrgicos do sítio doador; (D) Aspecto final da reconstrução.

correção de muitos defeitos, principalmente aqueles situados na região do clivo. A porção mais distal de um retalho miocutâneo é a que possui o suprimento sangüíneo mais escasso. Tensão no local do pedículo pode causar isquemia da borda do retalho com conseqüente necrose e meningite13. Outra desvantagem em relação aos retalhos livres é que o retalho miocutâneo não pos-sui, muitas vezes, o volume necessário de tecido para obliterar um grande espaço morto. De qualquer forma, ambos os tipos

de retalhos, miocutâneo e livre, aumentam o tempo cirúrgico e conseqüentemente a morbidade, déficits motores relacionados ao músculo utilizado e resultados cosméticos pobres. Sempre que possível, os enxertos de gorduras são preferíveis aos musculares porque a atrofia muscular pode causar retração e estenose da naso e da orofaringe quando adjacente a estes espaços9.

O retalho miocutâneo de músculo peitoral (Figura 2) é empregado, principalmente, em tumores malignos na região

A B

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parotídea que invadem a região inferior do osso temporal. A base do retalho é o ramo peitoral da artéria toracoacromial. Quando este retalho é estendido acima do canal auditivo externo, a tensão pode diminuir a vascularização no segmento superior do retalho. O alcance do retalho de músculo peitoral maior na base do crânio é limitado em algumas situações, como defeitos orbitários, e nos seios paranasais, envolvendo a base craniana anterior. Na porção lateral da base do crânio, a extensão do retalho acima do ouvido externo é difícil. A perda do músculo peitoral afeta a função do ombro.

O retalho miocutâneo da porção inferior do músculo trapézio tem seu suprimento da artéria escapular. Esse retalho tem um importante design em virtude de seu longo arco de rotação. As melhores indicações são reconstruções cutâneas na região temporal quando a pele da orelha necessita ser ressecada jun-tamente com o tumor, sendo particularmente útil no tratamento de fístulas liquóricas persistentes, infecção da ferida operatória, perda dural extensa e reconstrução em local com tecido pobre-mente vascularizado em conseqüência da irradiação prévia. A morbidade funcional é diminuída quando o rombóide maior e a porção superior do trapézio são preservados. Deve-se ressaltar que no caso de a artéria escapular ter sido seccionada durante a dissecção cervical prévia, este retalho não pode ser utilizado.

O retalho miocutâneo do músculo grande dorsal (Figura 3) é indicado para extensos defeitos da base do crânio, ou seja, quando o retalho livre não pode ser utilizado. Este retalho é suprido pela artéria toracodorsal, podendo todo o hemicrânio ser encoberto com este retalho. A principal desvantagem é o longo túnel subcutâneo através do qual o pedículo tem de passar.

Conclusão

Existe ampla variedade de técnicas para reconstruir a base do crânio. O conhecimento anatômico das fáscias da região temporal é fundamental para reconstruir defeitos laterais das fossas média e posterior12. O mesmo conceito é válido para a gálea aponeurótica e os retalhos miocutâneos. O envolvimento de equipe multidisciplinar nos grandes defeitos é indispensável para a melhor indicação e o conseqüente sucesso da técnica.

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Endereço para correspondência: Dr. Gustavo Isolan Rua Ramiro Barcellos, 2171 ap. 31 – Floresta90035-007 – Porto Alegre – RSe-mail: [email protected]