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RECURSOS HDRICOS E SANEAMENTO
MASATO KOBIYAMA
ALINE DE ALMEIDA MOTA
CLUDIA WEBER CORSEUIL
MASATO KOBIYAMA
ALINE DE ALMEIDA MOTA
CLUDIA WEBER CORSEUIL
RECURSOS HDRICOS E SANEAMENTO
1 Edio
Curitiba - PR
2008
ii
Capa
Camila de Almeida Mota
1 edio
1 impresso 2008
_______________________________________________________________
Kobiyama, Masato Recursos hdricos e saneamento / Masato Kobiyama, Aline
de Almeida Mota, Cludia Weber Corseuil Curitiba: Ed. Organic Trading, 2008.
160p. Inclui bibliografia ISBN - 978-85-87755-04-9
1. Recursos hdricos. 2. Saneamento. 3. Ruralizao. _______________________________________________________________
Reservado todos os direitos de reproduo total ou parcial pela
Editora Organic Trading
Impresso no Brasil
2008
iii
AUTORES
Masato Kobiyama
Professor Associado II, Departamento de Engenharia Sanitria e Ambiental (ENS),
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Caixa Postal 476, Florianpolis SC,
CEP 88040-900, (48)3721-7749, [email protected]
Aline de Almeida Mota
Acadmica do Curso de Graduao em Engenharia Sanitria e Ambiental,
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Caixa Postal 476, Florianpolis SC,
CEP 88040-900, [email protected]
Cludia Weber Corseuil
Professora, Departamento de Engenharia Sanitria e Ambiental (ENS), Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC), Caixa Postal 476, Florianpolis SC, CEP 88040-
900, (48)3721-7749, [email protected]
iv
v
Sumrio
AUTORES.......................................................................................................iii
APRESENTAO........................................................................................vii
PREFCIO ..................................................................................................... ix
ABREVIAES............................................................................................xii
1. INTRODUO ........................................................................................... 1
2. RECURSOS HDRICOS ............................................................................ 7
2.1. GUA.................................................................................................. 7
2.2. USO DOS RECURSOS HDRICOS ................................................... 9
2.3. DISTRIBUIO DOS RECURSOS HDRICOS ............................. 12
3. REAS URBANAS E RURAIS ............................................................... 15
4. SANEAMENTO......................................................................................... 19
4.1. SANEAMENTO BSICO................................................................. 19
4.2. SANEAMENTO AMBIENTAL........................................................ 26
4.3. RELAO ENTRE SANEAMENTO E RECURSOS HDRICOS.. 27
5. TCNICAS DE SANEAMENTO ............................................................ 29
5.1. FOSSA SPTICA E SUMIDOURO ................................................. 30
5.2. SISTEMA WETLAND ....................................................................... 33
5.3. APROVEITAMENTO DE GUA DA CHUVA.............................. 35
5.4. COMPOSTAGEM............................................................................. 39
6. CONCEITOS BSICOS DA HIDROLOGIA ........................................ 43
6.1. DEFINIO ...................................................................................... 43
6.2. BACIAS HIDROGRFICAS............................................................ 44
6.3. PRINCPIOS HIDROLGICOS DOS RECURSOS HDRICOS..... 46
7. PRESERVAO DE MANANCIAIS..................................................... 55
7.1. CONCEITO ....................................................................................... 55
vi
7.2. ZONA RIPRIA................................................................................ 57
7.2.1. Termologia ............................................................................. 57
7.2.2. Tamanho da zona ripria....................................................... 68
7.2.3. Processos geobiohidrolgicos na da zona ripria................. 73
7.2.4. Cdigo Florestal e sua aplicao .......................................... 88
7.3. FLORESTA X GUA....................................................................... 95
8. GERENCIAMENTO DE RECURSOS HDRICOS ............................ 107
8.1. APLICAO DA HIDROLOGIA NO GERENCIAMENTO........ 107
8.2. BACIA-ESCOLA ............................................................................ 110
8.3. REDE DE BACIAS-ESCOLA: ESTUDO DE CASO..................... 113
9. ASPECTOS FILOSFICOS.................................................................. 129
9.1. SMALL IS BEAUTIFUL E SEUS ORIUNDOS ASPECTOS....... 129
9.2. APLICAO................................................................................... 133
9.3. REA RURAL ................................................................................ 137
10. CONCLUSES...................................................................................... 139
REFERNCIAS........................................................................................... 141
POSFCIO .................................................................................................. 157
vii
APRESENTAO
gua. Dois tomos de hidrognio e um de oxignio. Parece to
simples para algo que vital. Mistrio e paradoxo da simplicidade e
complexidade da vida. Parece to simples colet-la e utiliz-la. Talvez por isso
nem todos ainda se preocupem com ela. Aos incautos, o descuido com a gua
poder comprometer nossa existncia.
Ao ler o livro Recursos Hdricos e Saneamento percebe-se como a
gua importante e ao mesmo tempo como muitos de ns a desprezamos ao
utiliz-la com desperdcio e ao polu-la e contamin-la.
Como colocam os autores, a gua bela. Belo tambm este livro que
percorre com destreza os assuntos relacionados gua. De leitura fcil,
apresenta ao leitor conceitos e aplicaes. Perpassa por temas espinhosos para
alguns e belos para outros de forma suave, didtica e elegante.
Ensina como usar a gua, como no polu-la ou contamin-la e se
poluda ou contaminada como trat-la. Inter-relaciona recursos hdricos e
saneamento e demonstra que no so entidades excludentes como
normalmente so consideradas.
Examina a presso sobre os recursos hdricos decorrente da maior
demanda em regies com escassez ou que caminham para a escassez em
decorrncia o aumento da populao.
Apresenta tcnicas de saneamento para tratamento de esgoto, introduz
os conceitos de hidrologia, de alterao do ciclo hidrolgico pelo avano de
reas urbanizadas sobre o ambiente terrestre, ressalta a indissociabilidade entre
qualidade da gua e uso da terra e ensina como implementar medidas
viii
preventivas para a manuteno da qualidade e da quantidade de gua nos
mananciais destacando o servio ambiental das florestas.
D-nos lio de filosofia, algo raro na engenharia. Aos que esto com
esse livro em mos, boa leitura, aproveitem o conhecimento nele contido e,
mais importante, exaltem-se em aplic-los.
Dr. Luiz Antonio Daniel
Professor da Escola de Engenharia de So Carlos
Universidade de So Paulo
ix
PREFCIO
Todos os autores do presente livro pertencem ao Grupo de Estudo de
Bacias Hidrogrficas que est no Laboratrio de Hidrologia (LabHidro:
www.labhidro.ufsc.br) de Departamento de Engenharia Sanitria e Ambiental
(ENS) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pelo fato de
viverem no mundo da engenharia sanitria, diretamente e indiretamente tm
pensado no saneamento cotidianamente.
Sem saneamento, ns, seres humanos, no podemos ter boa qualidade
da vida, conseqentemente no podemos viver com felicidade. Embora o
saneamento tenha sido discutido extensa e intensamente hoje em dia no Brasil,
seu avano ainda no observado. Por isso, os autores do presente livro
tentaram elabor-lo de maneira bem didtica para explicar o que deve ser feito
para melhoria do saneamento.
Nos dias 14 e 15 de agosto de 2008, os dois primeiros autores do livro
participaram do evento Seminrio Municipal de Saneamento no municpio
de Rio Negrinho/SC, organizado pelo Ncleo de Meio Ambiente da
Associao de Comrcio e Indstria de Rio Negrinho (ACIRNE). Para esta
participao, dois artigos Recursos Hdricos e Saneamento e Saneamento
Rural (Kobiyama & Mota, 2008; Kobiyama et al., 2008) foram elaborados, e
tambm seus respectivos materiais para apresentaes orais.
O presente livro foi produzido com base nesses dois artigos. Portanto,
o agradecimento especial cabe advogada Camila Gessner, organizadora
principal do seminrio acima mencionado. Sem o convite para participao
com palestras no seminrio, o presente livro no existiria hoje.
x
Na elaborao do livro, alguns tpicos foram adicionados, sendo
alguns bastante avanados. Portanto podem servir para pesquisadores e alunos
de ps-graduao. E outros para alunos de graduao e tambm tcnicos que
trabalham com saneamento e/ou gerenciamento de recursos hdricos. Apesar
disso, a princpio, o presente livro serve para todas as pessoas que esto
preocupadas e interessadas com o saneamento e recursos hdricos.
Os autores agradecem aos membros do LabHidro/UFSC. Sem o apoio
cotidiano deles o presente trabalho no existiria. Tambm agradecem
Battistella Florestas e Companhia Volta Grande de Papel pelo apoio
realizao dos estudos hidrossedimentolgicos na regio de Rio Negrinho. O
presente livro faz parte dos projetos Monitoramento e modelagem
Hidrossedimentolgica da Bacia Hidrogrfica do Alto Rio Negro Regio Sul
Brasileira financiado pelo MCT/FINEP CT-Hidro Bacias Representativas
04/2005 e Estudo tcnico-participativo de viabilidade para o abastecimento
de gua no municpio de Rio Negrinho/SC financiado pelo MCT/CNPq/CT-
Hidro/CT-Agronegcio 05/2006. Alm disso, agradecem ao amigo Dr. Luiz
Antonio Daniel, professor de saneamento do Departamento de Hidrulica e
Saneamento da Universidade de So Paulo pela contribuio com a bela
apresentao para o livro.
Os autores ficaro bastante gratificados e satisfeitos se a motivao
dos leitores for despertada com o presente livro. Para incentivar a leitura o
acesso a este material livre. Ento os autores disponibilizam o presente livro
no site do LabHidro (citado inicialmente). E tambm pretendem estudar ainda
mais este assunto. Portanto, as crticas sobre o livro sero bem-vindas. Caso
tenham opinies sobre isso, pedimos aos leitores que faam contato com os
autores.
xi
Enfim, informam que este ano de 2008 especial para o Curso de
graduao em Engenharia Sanitria e Ambiental da UFSC por duas razes. O
primeiro motivo que o curso faz aniversrio de 30 anos. O segundo que
2008 foi declarado o Ano Internacional do Saneamento pela Organizao das
Naes Unidas. Nesse ano comemorativo, os autores conseguiram publicar um
livro relacionado ao saneamento. Isto d alegria especial aos autores. Ento,
dedicam o presente livro a todos que passaram, e esto passando pelo curso.
Os autores
REFERNCIAS
Kobiyama, M.; Mota, A.A. Recursos hdricos e saneamento. In: Seminrio Saneamento Ambiental (2008: Rio Negrinho), Rio Negrinho: ACIRNE, Anais, 2008. 33p. CD-rom. Kobiyama, M.; Mota, A.A.; Corceuil, C.W. Saneamento rural. In: Seminrio Saneamento Ambiental (2008: Rio Negrinho), Rio Negrinho: ACIRNE, Anais, 2008. 24p. CD-rom.
xii
ABREVIAES
ABAL: Associao Brasileira do Alumnio ANA: Agncia Nacional de gua APP: rea de preservao permanente CNPq: Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico CONAMA: Conselho Nacional do Meio Ambiente DBO: Demanda Bioqumica de Oxignio DQO: Demanda Qumica de Oxignio FINEP: Financiadora de Estudos e Projetos IBGE: Instituto Nacional de Geografia e Estatstica NBR: Norma Brasileira OMS: Organizao Mundial de Sade (World Health Organization WHO) PESR/SC: Programa Estadual de Saneamento Rural de Santa Catarina PNSR: Projeto Nacional de Saneamento Rural PNMH: Programa Nacional de Microbacias Hidrogrficas PRONAF: Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar PRORURAL: Programa Nacional de Saneamento Rural SAMAE: Servio Autnomo Municipal de gua e Esgoto SC: Estado de Santa Catarina
xiii
SNIS: Sistema Nacional de Informaes sobre Saneamento SS: sedimento em suspenso UNESCO: United Nation Educational, Scientific and Cultutal Organization
xiv
1
1. INTRODUO
"A histria do mundo , essencialmente, histria de
idias."
H. G. Wells
"Se queremos progredir, no devemos repetir a histria,
mas fazer uma histria nova."
Mahatma Gandhi
Segundo OMS (1946), a sade definida como um estado de
completo bem-estar fsico, mental e social, e no apenas a ausncia de doena.
Pela definio, fica bem claro que sem sade cada indivduo no consegue
alcanar a felicidade, e conseqentemente uma boa qualidade da vida. Um dos
fatores que influenciam na garantia da sade o saneamento. Embora existam
vrios conceitos e definies para o saneamento, o presente trabalho o define
como o conjunto de medidas que promovem nveis crescentes de salubridade e
suas condies resultantes. Alm disso, a idia de sade como direito de cada
cidado surgiu nos anos 80 (Borja & Moraes, 2005). Portanto, cada indivduo
possui direito de ter condies de saneamento adequadas no seu ambiente.
A gua uma das substncias mais importantes do Planeta Terra, pois,
dela depende a maioria dos processos fsicos, qumicos e biolgicos nos
ecossistemas. Para o homem a gua sempre foi determinante no ritmo de sua
evoluo. Ao longo da histria da humanidade as primeiras grandes
2
civilizaes se desenvolveram s margens de rios (Tigre e Eufrates na
Mesopotmia, Nilo no Egito, Indus na ndia, e Amarelo na China) de onde
garantiam o abastecimento de gua e, conseqentemente, seu desenvolvimento
social e econmico.
A presena de vrias obras nessas regies evidencia que o ser humano
tinha algum conhecimento sobre gua. Segundo Biswas (1970), a evidncia
mais antiga das obras hidrulicas foi um canal para irrigao construdo no
Egito na poca do rei Escorpio (aproximadamente 3200 a.C.) Desde ento, o
ser humano vem tentando controlar os recursos hdricos.
O advogado francs Pierre Perrault (1608-1680) realizou medies
pluviomtricas e fluviomtricas no rio Sena, e concluiu que a vazo do rio
Sena no resultou da gua subterrnea oriunda do mar, mas sim da gua da
chuva. Assim, ele publicou o livro De lorigine des fontaines (A origem das
fontes) em 1674 (Biswas, 1970). Esse trabalho considerado como o primeiro
da hidrologia quantitativa. A UNESCO considera que o ano 1674 o ano do
nascimento da hidrologia. Ento, a partir desse ano a hidrologia vem sendo
cada vez mais conhecida e estudada pela sociedade.
A histria da humanidade mostra que o avano da hidrologia resulta
do avano das obras relacionadas aos recursos hdricos. Tambm, o avano das
obras resulta do avano da hidrologia. Assim, a cincia e a tecnologia
relacionadas aos recursos hdricos vm interagindo entre si e se desenvolvendo.
Entretanto, hoje existem srios problemas relacionados aos recursos
hdricos e conseqentemente ao saneamento. Porque existem tantos
problemas? Porque existe uma enorme preocupao sobre os recursos hdricos
e o saneamento? Para responder parcialmente a essas questes, o presente livro
3
apresenta conceitos bsicos e tcnicas de saneamento e de recursos hdricos, e
algumas atividades que tm sido realizadas na regio do municpio de Rio
Negrinho/SC e umas idias filosficas sobre esses aspectos.
A Figura 1.1 apresenta o esquema estrutural do livro. Como observado
nesta figura, a filosofia que engloba todos os assuntos tratados pelo livro.
Mesmo que as cincias e tecnologias sejam excelentes, se a filosofia adotada
no for correta, no ser possvel obter o desenvolvimento sustentvel.
Portanto, deseja-se que os leitores analisem o captulo 9 do livro com maior
ateno.
Figura 1.1 Estrutura do livro. (Nota-se que os nmeros na figura indicam os respectivos captulos do livro)
4
Mesmo que o livro tenha nascido por conta do intuito de debater sobre
saneamento, os recursos hdricos so o enfoque principal do livro. Por isso,
esses preciosos recursos naturais so tratados no Captulo 2. Neste captulo,
esto descritas algumas caractersticas da gua.
Os espaos onde a sociedade atua podem ser classificados de diversas
maneiras. Uma das maneiras mais comuns pode ser que os espaos so
classificados em dois tipos de reas: rea urbana e rural. O Captulo 3 descreve
a diferena entre as duas reas, e introduz um novo conceito, o da ruralizao.
Tanto para rea urbana quanto para rural, a importncia da ruralizao
discutida.
Os conceitos e as tcnicas so tratados nos Captulos 4 e 5,
respectivamente. A relao entre o saneamento e os recursos hdricos
discutida e as tcnicas adequadas no saneamento so tambm recomendadas
no contexto de gerenciamento de recursos hdricos.
O Captulo 6 apresenta os conceitos bsicos da hidrologia que base
principal para gerenciamento de recursos hdricos. As trs principais
caractersticas dos recursos hdricos em relao hidrologia so analisadas.
A condio favorvel ao desenvolvimento sustentvel depende da
obteno de mananciais preservados. Ento, o Captulo 7 define o manancial e
tambm discute os conceitos relacionados zona ripria (mata ciliar). Por fim,
a relao entre os recursos florestais e hdricos (assunto principal para a
hidrologia florestal) apresentada.
Aps entender a hidrologia, se torna mais fcil gerenciar os recursos
hdricos (Captulo 8). Introduzindo a rede de bacias-escola, esse captulo
5
apresenta atividades desenvolvidas na regio adjacente ao municpio de Rio
Negrinho/SC, isto , Bacia do Alto Rio Negro.
Finalmente, os aspectos filosficos, que representam a contedo mais
relevante do livro, so discutidos no Captulo 9. Sendo o principal, o conceito
de Small is beautiful de Schumacher (1983), Simple is beautiful, Slow is
beautiful e Science is beautiful tambm so discutidos com relao aos
aspectos hidrolgicos.
Cada captulo praticamente independente dos outros. Portanto, os
leitores podem realizar a leitura em ordem aleatria, iniciando-a em qualquer
captulo. Entretanto, para compreender a inteno dos autores, recomenda-se
que leiam o livro do inicio ao fim.
6
7
2. RECURSOS HDRICOS
... a gua para o mundo, o mesmo que o sangue para o
nosso corpo e, sem dvida, mais: ela circula segundo regras
fixas, tanto no interior quanto no exterior da Terra, ela cai
em chuva e neve, ela surge do solo, corre em rios, e depois
retornam aos vastos reservatrios que so os oceanos e
mares que nos cercam por todos os lados ...
Leonardo Da Vinci
2.1. GUA
A gua extremamente linda, saborosa, importante e interessante.
indiscutvel e inexplicvel a beleza de gotas de gua cristalina e das cascatas
de elevada vazo. A gua simplesmente linda! E quando linda, normalmente
saborosa tambm.
Alm disso, a gua muito interessante. O tpico exemplo interessante
da gua a variao da sua densidade com a temperatura (Figura 2.1).
Normalmente, uma substncia qualquer reduz sua densidade com o aumento
da temperatura. A gua tambm se comporta quando a temperatura est maior
do que 4oC. A parte interessante da gua na fase lquida ocorre na faixa de 0oC
at 4oC. Nesta faixa, ela aumenta sua densidade com o aumento da temperatura.
um intervalo de apenas 4oC. Entretanto, com esse comportamento, na regio
8
fria a temperatura da gua no fundo de lagos est de 4oC. E a formao de
gelos ocorre na superfcie da gua nos lagos, no no fundo.
Figura 2.1 Variao da densidade da gua nas fases slida e lquida.
Este fenmeno extremamente importante no ecossistema aqutico
frio. Se acontecesse a formao de gelo no fundo do lago, seria muito difcil
manter as atividades biolgicas desse ecossistema.
Embora uma substncia normalmente aumente sua densidade na
transformao da fase lquida para a slida, a densidade da gua bem maior
do que a do gelo. Por isso, pode-se ver o gelo flutuando na gua no copo e a
geleira no oceano. Aqui, apresentou-se apenas a densidade da gua. Mas ela
possui outras caractersticas fsico-qumicas tambm muito interessantes.
SLIDO
LQUIDO
9
Embora bem reconhecido, a gua muito importante tambm. dito
que 70% do corpo humano constitui-se de gua, e que o ser humano pode
morrer se no beber gua por 4 dias. Assim, a gua to importante e
conseqentemente chamada recursos hdricos.
2.2. USO DOS RECURSOS HDRICOS
Os recursos hdricos so compreendidos como fontes de valor
econmico essencial para a sobrevivncia e desenvolvimento dos seres vivos.
Eles so abundantes na natureza e, por isso, durante muitos anos se pensou que
a falta de gua potvel era impossvel. Isso causou certa despreocupao com a
preservao desse recurso e as sociedades modernas continuaram a se
desenvolver formando grandes centros urbanos a qualquer custo, deixando de
lado a preocupao com a possvel contaminao do meio ambiente.
O problema que as guas de superfcies e subterrneas, utilizadas
para o abastecimento humano, esto mal distribudas e, atualmente, a sua
escassez em vrios locais tem chamado a ateno dos governantes em todo o
mundo, pois, a falta dgua j atinge milhes de pessoas, o que desacelera e
limita o desenvolvimento social e econmico dos pases. Isso acontece,
principalmente, pelo aumento crescente da populao mundial que
conseqentemente ocasiona uma excessiva extrao dos recursos hdricos, sem
permitir que as devidas reposies naturais tenham tempo para acontecer.
Tambm preocupante a elevada contaminao dos corpos hdricos, que
recebem altas cargas de esgotos urbanos, efluentes industriais, resduos slidos
10
e agrotxicos que somados s baixas vazes, diminuem a capacidade de
recuperao e impedem o estabelecimento do equilbrio natural.
Os aqferos, apesar de estarem mais protegidos, quando
contaminados, apresentam autodepurao muito lenta e o seu equilbrio fica
ainda mais difcil de ser alcanado. Atualmente as guas subterrneas so
muito utilizadas para abastecimento pblico, j que possuem tima qualidade e
valor acessvel e, alm disso, so essenciais na manuteno de mangues e do
nvel de gua dos rios, pois atuam como escoamentos de base.
Em geral, so dados trs usos dos recursos hdricos (Tabela 2.1).
Tabela 2.1 Usos dos recursos hdricos. Uso Municipal Industrial Agrcola Total Descrio Casa
Escola Hospital Restaurante
Fbrica Lavagem Resfriamento
Irrigao Animal
Brasil* 26% 18% 56% 100% Mundo** 8% 23% 69% 100%
*: ANA (2007); **: UNESCO (2008)
Atualmente os diversos e numerosos usos da gua esto contribuindo
para sua escassez e contaminao. Entre eles pode-se citar: o abastecimento
pblico, as prticas agrcolas, a gerao de energia eltrica e as atividades de
lazer.
O abastecimento de gua um dos usos que mais consomem os
recursos hdricos, principalmente onde ocorre o processo de expanso urbana.
Com o crescimento dos centros urbanos as redes de distribuio de gua se
11
estendem e o consumo aumenta, tanto pela populao, como pelo comrcio e
as indstrias locais que necessitam aumentar suas produes para atender as
crescentes necessidades da comunidade.
As prticas agrcolas tambm so grandes consumidoras de gua,
principalmente para as atividades de irrigao. Acredita-se que as mudanas
climticas esto provocando muitas alteraes nos regimes de chuvas que,
muitas vezes, no coincidem com os perodos de crescimento das culturas.
Com isso, os prejuzos na produo agrcola so freqentes, gerando grandes
variaes nos preos dos produtos e conseqentemente enormes disputas
econmicas. A produo de monoculturas, como soja e trigo, por exemplo, s
tem rentabilidade significativa quando plantadas em grande escala e isso s
possvel atravs de investimentos na irrigao. Essa prtica, quando feita de
maneira incorreta provoca a poluio dos rios e riachos que drenam e
abastecem as lavouras, pois recebem as guas de lavagem das culturas que
sofreram tratamento com agrotxicos e fertilizantes.
A gerao de energia eltrica um grande desafio para a humanidade.
Muitos rios, quando sofrem represamento, adquirem grandes vazes de forma
a moverem com mais eficincia dispositivos geradores de energia eltrica.
Com o crescimento populacional e o avano da tecnologia, a dependncia
desse recurso muito grande e as usinas hidroeltricas so as alternativas que
mais suprem essa necessidade. Conseqentemente a construo de uma usina
hidroeltrica exige uma destruio significativa do meio ambiente, causando
um grande desequilbrio ambiental, sendo os recursos hdricos os mais
prejudicados, pois sofrem mudanas nos seus ecossistemas transformando rios
em lagos, comprometendo a qualidade de suas guas.
12
A natureza sempre foi inspiradora da qualidade de vida dos homens e
os recursos hdricos fazem parte disso sendo nos dias de hoje ainda mais
procurados. As atividades de lazer como banhos de cachoeiras, esportes
aquticos, pesca, etc., so freqentes nos momentos livres das pessoas, que
buscam atravs disso fugir das constantes rotinas urbanas. Para que no se
perca a possibilidade de realizao dessas atividades, principalmente para as
futuras geraes, fundamental a preservao da qualidade das guas.
Portanto, preservar os recursos hdricos, com usos e gerenciamentos
inteligentes, no deve ser apenas uma necessidade do ser humano e sim uma
forma de manter o equilbrio de todo o meio ambiente e de sua prpria vida.
2.3. DISTRIBUIO DOS RECURSOS HDRICOS
Observando o planeta Terra, pensa-se que h muita gua. Mas, toda a
gua no mundo pode ser aproveitada? A resposta NO. Pois, a quantidade
de gua contaminada est aumentando em todas as partes do mundo. A gua
quando excessivamente contaminada no pode mais ser aproveitada, ento,
no pode ser mais considerado como recurso hdrico. Portanto, pode-se dizer
que no mundo existe uma quantidade abundantemente de gua, mas poucos
recursos hdricos. Estes preciosos recursos faltaro no futuro, como
conseqncia das atividades humanas que vm sendo realizadas de forma
inadequada.
Existem diversos estudos sobre a quantidade de vrios tipos de gua
no mundo. E encontra-se uma pequena divergncia entre esses estudos.
Entretanto, analisando esses dados, criou-se a Tabela 2.2. Estima-se que 97,5%
13
da gua do planeta compem os oceanos e mares. Sendo assim, apenas 2,5%
da gua existente doce e encontra-se distribuda em diversos locais. Observa-
se que a quantidade de gua doce disponvel pequena, se comparada
quantidade total de gua do planeta. Alm disso, a maior parte encontra-se em
formas no prontamente disponveis ao homem (geleiras).
Tabela 2.2 - Quantidade de guas e seus tempos de circulao.
Volume (103 km)
Taxa (%)
Quantidade transportada (103 km/ano)
Tempo de circulao (ano)
Oceano 1.349.929,0 97,50 418 3229 Glaciar 24.230,0 1,75 2,5 9692
gua subterrnea 10.100,0 0,73 12 841 gua do solo 25,0 0,0018 76 0,3
Lagos 219,0 0,016 38 5,7 Rios 1,2 0,00009 35 0,034 (= 13 dias)
Fauna e flora 1,2 0,00009 - - Vapor na atmosfera 12,6 0,0009 483 0,026 (= 10 dias)
Total 1.384.518,0 100
O tempo de circulao aquele no qual o sistema consegue
naturalmente substituir toda a poro de gua, e pode ser estimado pela razo
entre o volume total e a quantidade transportada. Esse tempo para os rios no
mundo aproximadamente 13 dias. Obviamente, este valor mdio, e
depende do tamanho (comprimento) de cada rio. Mas de qualquer maneira, o
tempo de circulao para os rios bastante curto. Isto significa que os rios
alcanam uma limpeza natural rapidamente. Por outro lado, o tempo de
circulao para a gua subterrnea 841 anos, e bem maior do que a
expectativa mdia de vida do ser humano. Ento, pode-se dizer que, uma vez
poluda a gua subterrnea, algumas geraes da comunidade humana no
14
conseguem despolu-la. Por isso, a maior ateno deve ser colocada na
preservao das guas subterrneas.
15
3. REAS URBANAS E RURAIS
"Qualquer pessoa pode ser boa no campo."
Oscar Wilde
"No fique to ocupado ou viva to apressadamente que
voc no possa ouvir a msica do campo ou a sinfonia que
glorifica a floresta."
Dale Carnegie
A agricultura a arte de saber esperar.
Riccardo Bacchelli
H vrios critrios para classificar o ambiente ou o espao, um deles
separar as reas em urbanas e rurais. Segundo Instituto de Economia (2007)
que realizou o Projeto Rurbano, as reas urbanas so definidas como aquelas
efetivamente urbanizadas dentro dos limites do permetro urbano dos
municpios. Essas compreendem as reas com construes, arruamentos e
intensa ocupao urbana; as reas afetadas por transformaes decorrentes do
desenvolvimento urbano, tais como, reas de lazer, aterros, entre outros; as
reas reservadas expanso urbana e adjacente s reas anteriores. As reas
que no satisfazem essas condies so classificadas como rurais.
Este tipo de classificao muitas vezes til, pois as atividades
humanas dependem das caractersticas da rea. Isto , as caractersticas
ambientais so diferentes entre reas urbanas e rurais, sendo assim, cada rea
16
necessita de aes humanas especficas adequadas e diferenciadas. Por
exemplo, embora sua finalidade principal seja a mesma, as tcnicas detalhadas
de drenagem urbana e rural so diferentes.
A populao tambm pode ser classificada como urbana e rural. Com
essa viso, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) vem
realizando a pesquisa demogrfica no Brasil desde 1940. Uma anlise simples
dos dados obtidos e disponibilizados pelo IBGE mostra a evoluo da
populao no Brasil em termos de reas urbana e rural (Figura 3.1). Essa
figura mostra que a populao urbana ultrapassou a rural na dcada de 60 no
Brasil, sendo hoje aquela populao cinco vezes maior do que esta.
Figura 3.1- Evoluo da populao no Brasil.
A ao humana predominante no sistema urbano, provocando
mudanas intensas e rpidas (Mota, 1999). Muitas vezes, a urbanizao destri
parcialmente ou totalmente ecossistemas importantes, causando impactos
17
negativos sobre a flora e fauna, bem como, prejuzos s atividades humanas
com danos scio-econmicos. Assim, o sistema urbano tem caractersticas
diferentes dos ecossistemas naturais.
Kobiyama (2000) definiu a urbanizao como o conjunto de trs
aes: (1) retirada da vegetao e do solo, (2) revestimento do terreno com
concreto e asfalto, e (3) rejeio de gua (escoar a gua da chuva o mais rpido
possvel). Na hidrologia, o grau de urbanizao avaliado atravs da taxa de
reas impermeabilizadas. Portanto, aparentemente a urbanizao em excesso e
sem controle apresenta efeitos hidrologicamente negativos. Assim, as reas
urbanas vm freqentemente sofrendo inundaes. Procurando um maior
conforto, a populao passou a viver em um meio totalmente inorgnico, de
concreto, no qual os rios se tornaram o lugar de destino da gua pluvial (uma
espcie de aterro sanitrio para gua). Dessa maneira, as cidades vm
abandonando os preciosos recursos hdricos, crescendo economicamente e
demograficamente sem planejamento. A atitude de rejeitar a gua da chuva
agravou ainda mais o problema da falta e excesso da gua. Ironicamente,
quanto mais avana a drenagem urbana na cidade, mais freqentemente
ocorrem racionamentos e inundaes.
Criticando a situao em que o avano da urbanizao aumenta os
problemas ambientais, Kobiyama (2000) props a ruralizao no meio urbano,
como processo contrrio urbanizao, e a definiu como a convivncia com as
plantas, terra e gua da chuva ou, conjunto das aes de recuperao da
vegetao, da terra e da gua com seus aproveitamentos e convivncia em
harmonia. Essa ruralizao pode ser considerada como nova fase para o
desenvolvimento urbano (Figura 3.2).
18
Figura 3.2 - Ruralizao para o desenvolvimento sustentvel.
Nesse contexto, a rea rural pode ser considerada como exemplo de
onde realmente valorizam a convivncia com plantas, terra e gua. Para ter o
melhor saneamento, as sociedades rurais devem aproveitar ainda mais esses
trs elementos. Alm disso, valorizar essa oportunidade de contato ntimo com
a natureza. E as sociedades urbanas precisam buscar vegetao, terra e gua e
traz-las s urbanas.
Devido maioria populacional, nos dias de hoje a rea urbana recebe,
geralmente, maior ateno dos governos Federal, Estadual e Municipal. Porm,
no presente livro o enfoque para rea rural, pois se acredita que a soluo se
encontra no ambiente rural. Justamente por isso, o presente livro valoriza e
discute a descentralizao do saneamento.
19
4. SANEAMENTO
"Quando agredida, a natureza no se defende. Apenas se
vinga."
Albert Einstein
4.1. SANEAMENTO BSICO
O saneamento bsico definido como o conjunto de servios e aes
com o objetivo de alcanar nveis crescentes de salubridade ambiental, nas
condies que maximizem a promoo e a melhoria das condies de vida nos
meios urbano e rural, segundo projeto de lei federal 5.296/2005 que estabelece
o marco regulatrio para o saneamento. Alm disso, especifica os quatro
conjuntos de servios pblicos que o constituem: abastecimento de gua, o
esgotamento sanitrio, o manejo de resduos slidos e o manejo de guas
pluviais. Embora exista esta enumerao dos servios, no se deve restringir a
busca pela segurana sanitria e o bem-estar ambiental da populao a apenas
estas atividades.
A complexidade do funcionamento e dos processos necessrios para
manuteno da vida humana, segundo o modelo econmico capitalista,
principalmente no permetro urbano, torna essencial a implantao, execuo,
e manuteno de um sistema saneamento bsico eficaz (Figura 4.1). Essas
20
aes vm garantir a integridade e qualidade do meio ambiente para as
geraes atuais e futuras.
Precipitao
Consumo de gua
Consumo
Resduos slidos
Escoamento
Esgoto
Centro urbano
Figura 4.1 - Modelo explicativo para demanda e produo de resduos.
O abastecimento de gua consiste em produzir gua potvel a partir de
uma fonte de gua bruta e distribu-la sem interrupes e com o mnimo
possvel de falhas (Figura 4.2). A captao de gua bruta pode ser feita, tanto
de um manancial superficial (cursos dgua, lagos e represas), quanto de um
manancial de gua subterrnea.
21
Figura 4.2 - Sistema de abastecimento de gua, com captao em curso de gua. (1-Estao Elevatria)
A necessidade de gua para atender as necessidades da populao
surgiu a partir do desenvolvimento da agricultura que passou a demandar gua
para a irrigao. Ainda existem, na Mesopotmia e no Egito, runas de canais
de irrigao, considerados as primeiras obras para controlar o fluxo da gua
(Tsutiya, 2006). Apesar de esse setor ser to antigo, ainda existem muitos
desafios, como: atender a 100% da populao, pois, muitas pessoas no so
atendidas por redes de abastecimento; melhorar a qualidade da gua
distribuda, j que muitas vezes os padres de potabilidade no so alcanados,
e ainda, diminuir as perdas, principalmente na rede de distribuio, onde, em
alguns casos, perde-se at 60% da gua j tratada e potvel.
A gua depois de consumida d origem ao que chamamos de esgoto,
que pode ser classificado de trs formas: domstico, industrial e pluvial. Assim,
o uso da gua nas residncias, seja para higiene pessoal, preparao de
alimentos e limpeza em geral, d origem ao esgoto domstico. Nas indstrias,
os processos produtivos acabam por gerar o esgoto industrial. E quando chove,
a gua carreia poluentes atmosfricos, escorre por telhados, ruas e caladas
22
limpando a cidade, originando o que chamamos de esgoto pluvial, que possui
alta carga poluente, sendo que muitas vezes, impossvel conter seu fluxo para
trat-lo. Conseqentemente, esse fluxo acaba poluindo os corpos dgua
(Figura 4.3).
O esgotamento sanitrio compreende as aes de coleta, tratamento e
disposio dos efluentes produzidos nos domiclios e em processos produtivos
cabveis. O objetivo preservar o meio ambiente impedindo, que as guas
poludas pelo homem durante os processos anteriormente citados, contaminem
os corpos de gua. Na Figura 4.3 pode-se notar a importncia do esgotamento
sanitrio que, assim como garante a integridade do manancial, tambm
possibilita que este seja utilizado para abastecimento de gua.
Figura 4.3 - Ciclo de uso da gua e gerao de esgoto.
23
A primeira evidncia de sistema de esgoto planejado e implantado que
se tem notcia a Cloaca Mxima de Roma, construda no sculo VI a.C. Sua
funo era essencial, pois controlava a malria atravs da drenagem superficial
(Tsutiya & Sobrinho, 1999). Apesar de h muito tempo o homem j conhecer a
importncia do esgotamento sanitrio, ainda hoje contamos com um sistema
deficiente e majoritariamente inexistente (apenas 48,3% da populao urbana
brasileira conta com coleta e tratamento de esgotos).
So produzidas cerca de 160 toneladas de lixo por dia no Brasil, sendo
que 20% da populao no tm seus resduos coletados. A coleta no permetro
urbano tem uma abrangncia de pouco mais que 90%, considerando uma
freqncia de duas a trs vezes por semana (SNIS, 2006).
O manejo de resduos slidos configura os servios de coleta,
tratamento e/ou disposio final dos resduos slidos. Esses servios so muito
importantes, pois sem tratamento e disposio final adequada dos resduos,
pode ocorrer a contaminao do solo e dos corpos hdricos, disseminao de
doenas e poluio atmosfrica pelo gs metano.
Hoje em dia, os resduos podem seguir diversos destinos, como: lixes,
incinerao, aterros sanitrios, aterros controlados, centros de triagem de
materiais reciclveis e compostveis. Nos lixes o resduo deixado a cu
aberto sem nenhum controle, por isso, configura a maneira mais primitiva de
disposio do lixo. No caso dos aterros controlados feito o recobrimento do
lixo com terra. Com informaes do SNIS (2005) construiu-se a Tabela 4.1,
em que observa-se o modo mais utilizado atualmente para disposio do lixo
domiciliar: o aterro sanitrio. Nos aterros sanitrios o solo impermeabilizado
24
e o lixo compactado e depois recoberto com terra. Alm disso, existe
tratamento dos efluentes gasosos e lquidos e o controle de animais.
Tabela 4.1 - Disposio dos resduos slidos urbanos. Destino dos resduos slidos (%) Aterro sanitrio 39,4 Aterro controlado 32,4
Lixes 28,2
O problema que todo aterro, ou local para disposio de resduos
possui uma capacidade limite de acomodao do lixo. Sendo assim, a
necessidade de reduo da gerao de lixo evidente. Neste contexto, so
importantes as atividades de triagem dos resduos slidos, pois com esta
atividade feita a separao entre lixo seco, de acordo com sua composio, e
lixo mido (orgnico) que em seguida pode ser tratado utilizando a
compostagem. A reciclagem dos materiais secos contribui para a diminuio
da: (i) quantidade de lixo enviada para os aterros sanitrios, (ii) extrao de
recursos naturais, (iii) consumo de energia, entre outros. No Brasil, quase
metade da massa recuperada de materiais reciclveis papel e em segundo
lugar os plsticos (Figura 4.4). O provvel motivo para isso o valor
econmico desses materiais e a quantidade de resduos produzidos. Segundo
ABAL (2004) o Brasil o primeiro em reciclagem de alumnio (89% da
produo em 2003), apesar disso a massa produzida menor que a de papel.
Por essa razo, a massa de metais reciclada no maior que a dos outros
materiais.
25
Figura 4.4 - Massa de materiais reciclveis recuperados.
O manejo de guas pluviais consiste no conjunto de intervenes
estruturais e no estruturais, com o objetivo de controlar o escoamento
superficial nas cidades (Bernardes et al., 2006), evitando assim desastres
naturais relacionados ao excesso de gua e doenas decorrentes de inundaes.
No contexto de sade pblica, o manejo de guas pluviais uma
atividade muito importante. notvel que as inundaes podem acarretar
contaminaes, quando os poos e fossas spticas se rompem e transbordam
espalhando os detritos que antes estavam alojados. Em conseqncia disso,
ocorre por toda a regio a proliferao de moscas e roedores que so vetores
de muitas doenas (Assar,1971).
As aes que visam a efetivao de condies adequadas de
saneamento dependem no somente do poder pblico, mas tambm da
26
comunidade. A coleta seletiva, por exemplo, tem resultados muito mais
significativos quando a prpria populao separa seus resduos (Figura 4.5).
Figura 4.5 - Importncia da participao da comunidade na adequao das condies de saneamento.
4.2. SANEAMENTO AMBIENTAL
A realidade em que se vive hoje requer uma maior integrao entre
rea urbana e rural, para que se possa alcanar a to almejada sustentabilidade.
Neste contexto, importante que fique claro o conceito de saneamento
ambiental, um domnio muito mais amplo que o saneamento bsico. Para que
simplificar e legalizar os servios pblicos que garantem a integridade
sanitria do ambiente onde vive a populao, foi criado o conceito de
saneamento bsico. Este conceito como definido anteriormente engloba os
servios de abastecimento de gua, o esgotamento sanitrio, o manejo de
27
resduos slidos e de guas pluviais. Entretanto, essa simplificao no garante
que se alcancem os nveis crescentes de salubridade ambiental, previstos pelo
saneamento ambiental que consiste no s nos servios enumerados no
saneamento bsico, mas tambm, no que diz respeito ao controle de doenas,
garantindo sade pblica.
Quando se trata do saneamento bsico, a filosofia se baseia no fato de
que o ser humano o foco principal do sistema ou ecossistema. Normalmente
pensa-se que somente as tecnologias podem melhorar o saneamento bsico.
Mas, no sculo XX observou-se que o desenvolvimento do saneamento bem
limitado utilizando somente as tecnologias. Isto fez com que, naturalmente,
fosse dada mais ateno ao meio ambiente.
A meta final de ambos os saneamentos, bsico e ambiental, a mesma.
Porm, enquanto o saneamento bsico possui uma viso mais antropocntrica
e conseqentemente tecnolgica, o saneamento ambiental procura a
preservao do ambiente, papis dos organismos no tratamento de resduos,
etc. Assim, o saneamento ambiental enfatiza o aproveitamento do meio
ambiente para obter o bom saneamento. Nesse sentido, o saneamento
ambiental possui alta potencialidade na contribuio para alcance do
desenvolvimento sustentvel.
4.3. RELAO ENTRE SANEAMENTO E RECURSOS
HDRICOS
A qualidade de vida da populao depende diretamente do saneamento.
Este consiste quase que totalmente em aes relacionadas gua, como
28
abastecimento de gua, manejo de guas pluviais e tambm aquelas que
garantem a integridade dos mananciais, como esgotamento sanitrio e manejo
de resduos slidos. evidente que as aes de saneamento possuem relao
com os recursos hdricos qualitativamente e/ou quantitativamente. Ento a
obteno de boas condies de saneamento requer o gerenciamento adequado
dos recursos hdricos que, por sua vez, engloba aes de saneamento bsico.
Segundo Lanna (2004), as funes da engenharia de recursos hdricos
so as adequaes espaciais, temporais, qualitativas e quantitativas dos
padres de disponibilidade aos das necessidades hdricas. Sem essas
adequaes, no possvel melhorar o saneamento.
29
5. TCNICAS DE SANEAMENTO
"A natureza fez o homem feliz e bom, mas a sociedade
deprava-o e torna-o miservel."
Jean-Jacques Rousseau
No perodo de 1986 a 1990, o Programa Nacional de Saneamento
Rural (PRORURAL) foi elaborado pelo Instituto de Planejamento Econmico
e Social atravs do Projeto Nacional de Saneamento Rural (PNSR). O
programa foi lanado em 1990 e implementado em 1991 (Lacerda, 1995). O
objetivo do programa "desenvolver uma ao sistemtica e vigorosa no
campo de saneamento rural, objetivando a melhoria da qualidade de vida da
populao rural carente de servios adequados de saneamento" (Ministrio da
Sade & Ministrio da Ao Social, 1990). Para apoiar o saneamento rural,
ainda existem diversos projetos e programas, por exemplo, Programa Nacional
de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), Programa Nacional de
Educao Sanitria em Defesa Agropecuria, Programa de Combate Pobreza
Rural. No caso do estado de Santa Catarina, foi criado o Programa Estadual de
Saneamento Rural de Santa Catarina (PESR/SC).
Assim, vm sendo obtidos avanos significativos no contexto do
saneamento rural. Aqui sero discutidas algumas tcnicas muito teis para
tratamento e disposio de efluentes e resduos, bem como obteno de gua
30
no meio rural principalmente. Aps a descrio, ser apresentado o aspecto
filosfico.
5.1. FOSSA SPTICA E SUMIDOURO
evidente que o despejo de esgoto sanitrio sem tratamento nos
mananciais piora a qualidade da gua. Este fato j foi comprovado por muitos
autores, um exemplo Valente et al. (1997), que concluram que o despejo do
esgoto sanitrio proveniente da cidade de Botucatu torna invivel o uso da
gua dos rios da regio para abastecimento. Sendo assim, importante tratar e
dispor adequadamente o esgoto. Na rea rural, se torna mais complicada essa
questo, devido ao afastamento em relao s estaes de tratamento de esgoto
o que tornaria a rede coletora muito extensa. Neste contexto, uma soluo seria
a descentralizao do tratamento do esgoto domstico, com a implantao de,
por exemplo, fossas spticas e sumidouros, privadas de vrios tipos (de buraco,
tubular, estanque, de fermentao, qumica).
A fossa sptica uma caixa dimensionada para deter os esgotos
domsticos por tempo pr-determinado suficiente para que ocorra
sedimentao dos slidos, reteno de gorduras, reduo da carga orgnica e
diminuio da quantidade de patgenos. Aps o processo de sedimentao, o
efluente lquido (livre de slidos) disposto em poos absorventes, conhecidos
como sumidouros. Nesta etapa, o efluente infiltra no solo, caracterizando um
processo de filtrao bem lenta. No caso de solos com taxa de absoro muito
baixa, no devem ser empregadas as valas de filtrao como escrito na NBR-
7229/93. indiscutvel que a implantao de fossas spticas e sumidouros
31
trazem benefcios, como: evitar a contaminao das guas superficiais e
subterrneas; eliminar a ocorrncia de efluentes correndo a cu aberto;
diminuir a incidncia de doenas veiculadas pelo esgoto.
O sumidouro deve ser localizado a uma distncia mnima de 20 metros
de qualquer fonte de gua subterrnea de acordo com as prescries mnimas
estabelecidas pela NB-41/81 (Figura 5.1). Esta norma rege a construo e
instalao de fossas spticas e disposio dos efluentes finais. Para o
dimensionamento deve-se seguir os procedimentos adequados de clculo.
Alm disso, estabelece tambm que as paredes do sumidouro devem ser
revestidas com tijolos furados e no fundo uma camada de cascalho, pedra brita
ou coque de pelo menos 50 cm de espessura.
Figura 5.1 - Esquema simplificado da posio do sumidouro de acordo com a NB 41/81.
Existem alguns detalhes importantes dos procedimentos de
manuteno e operao deste sistema, um deles a limpeza do tanque sptico,
32
que deve ser no mximo com intervalos de 5 anos. Antes da limpeza ela deve
ser mantida aberta para evaso do gs produzido e danoso sade. O lodo
retirado deve ser enterrado em local adequado e o adubo futuramente gerado,
somente deve ser utilizado aps um ano (perodo de maturao segurana
para a sade).
Apesar de ser considerado um procedimento acessvel e simples de
disposio e tratamento de esgoto domstico, para construo de fossa sptica
e sumidouro (ou valas de infiltrao) deve ser feito um projeto, levando em
considerao as NBRs relacionadas (Figuras 5.2 e 5.3). Estes clculos devem
levar em considerao o nmero de pessoas que vivem na residncia a ser
atendida, a distncia at a captao de gua e os detalhes construtivos. Com
um planejamento adequado, este sistema tem todos os requisitos para ser
muito eficiente na preservao dos mananciais.
Figura 5.2 - Corte esquemtico de uma fossa sptica.
33
(a) (b)
Figura 5.3 - Disposio final e/ou tratamento do efluente de fossa sptica. (a) Sumidouro; e (b) vala de infiltrao.
5.2. SISTEMA WETLAND
O termo wetland pode ser traduzido do ingls como banhado, ou
literalmente terra mida. Na natureza so zonas de transio entre os
ecossistemas terrestres e aquticos. sabido que, geralmente, essas reas
(entre ambiente aqutico e terrestre) apresentam alta variabilidade nos
processos constituintes, e conseqentemente possuem importante papel
ecolgico. Segundo Kent (1994) existem dois fatores essenciais para
caracterizao destas zonas, (i) superfcie coberta por gua (sempre ou
intermitente) e (ii) desenvolvimento de vegetao de solo mido. Nas reas de
wetland encontrada vegetao emergente. Alm disso, muitos autores j
comprovaram a capacidade dessas zonas em melhorar a qualidade da gua,
possuindo caracterstica de depurao da gua (Kent, 1994).
A princpio, essas reas naturais foram utilizadas para depurao de
esgotos, e posteriormente, serviram como inspirao para o ser humano que
34
passou a construir esses sistemas para tratamento de esgoto, chamados
wetlands. Essas tcnicas apresentam eficincia comprovada de degradao da
matria orgnica, precipitao do fosfato e remoo do nitrognio por
nitrificao e denitrificao microbiana (Philippi & Sezerino, 2004). Alm
disso, tambm ocorre sedimentao e filtrao de slidos suspensos,
eliminao de metais e patgenos. Esses sistemas podem ser chamados
tambm de filtros plantados com macrfitas. A execuo simples, se constri
uma espcie de tanque diretamente no solo impermeabilizado com manta
plstica ou revestido de alvenaria (dependendo da profundidade do lenol
fretico), preenche-se com o material filtrante ou material de recheio (brita,
areia, cascalho) para que servira como suporte para as macrfitas (vegetao
prpria para essas zonas). A Figura 5.4 mostra um esquema de um tipo de
sistema wetland.
Figura 5.4 - Esquema representativo do corte longitudinal do sistema de wetland.
A escolha do material de recheio parte importante na construo do
sistema. Ele deve ser capaz de manter ao longo do tempo boas condies de
35
fluxo e se possvel tambm possuir caractersticas adsorventes. So vrias as
plantas que podem ser utilizadas, mas existem caractersticas que devem ser
consideradas, como: tolerncia a altas taxas de poluentes, produtividade,
adaptao s condies climticas do local, entre outras. A rizosfera uma
regio muito importante onde h o contato entre meio filtrante e as razes.
Outra importante parte integrante do sistema a fauna associada, ou seja, os
microorganismos que podem ser autotrficos e heterotrficos.
Para comprovao da eficincia dos sistemas wetland foram
monitoradas algumas unidades por Philippi & Sezerino (2004). As
porcentagens de remoo so muito altas (entre 69 e 99%) para os parmetros
de DQO, DBO, amnia, entre outros, apesar disso, muitas vezes, no se obtm
concentraes aceitveis para o lanamento em corpos hdricos devido s altas
concentraes no incio do tratamento. importante ressaltar que cada
efluente ter um sistema com material de recheio, plantas e microorganismos
adequados. Alm disso, a maior aplicao do sistema wetland para ps-
tratamento, como por exemplo, do efluente de fossa sptica, no descartando a
possibilidade de aplicao apenas daquele sistema.
5.3. APROVEITAMENTO DE GUA DA CHUVA
Porque ocorre falta e excesso de gua (racionamento e inundao) na
mesma regio? Para responder a essa questo, um grupo de diversos
profissionais japoneses (Group Raindrops, 2002) escreveu um livro como a
concluso da Conferncia Internacional de Tquio sobre Aproveitamento de
gua da Chuva organizada pelo mesmo. Quando falta gua, geralmente
36
constri-se barragens para represar rios a montante. Isso ocasiona a destruio
de importantes reas florestais, agrcolas, arqueolgicas e residenciais.
Portanto, os membros desse grupo propuseram a construo de milhares de
mini-tanques (cisternas) em reas urbanas, em vez, de gigantes represas. Eles
justificaram isso, pelo fato de que, em Tquio, a quantidade de gua que cai na
forma de chuva, maior que aquela consumida pela populao.
Kobiyama et al. (2005 e 2007b) apresentaram as vantagens e as
desvantagens do aproveitamento da chuva em relao a trs aspectos:
econmicos, sociais e ambientais (Tabela 5.1). Dentre as desvantagens
apontadas, uma em especial tende a ser desconsiderada com o passar dos anos,
o alto custo inicial para o investimento, dependendo da tecnologia
empregada. Esse custo tende a diminuir com o aumento da produo de
equipamentos especficos, como filtros e demais acessrios, pela concorrncia
dos fabricantes e pelo surgimento de tecnologias mais simples. Ainda, o gasto
com energia eltrica pode no ocorrer, se a topografia do terreno permitir e se
o sistema for desenvolvido de modo a funcionar no todo ou em parte por
gravidade.
37
Tabela 5.1 - Vantagens e Desvantagens do aproveitamento da gua da chuva. Aspecto Vantagens Desvantagens
Econmico
Reduo do gasto mensal com gua e esgoto. Aumento da renda familiar mensal, aps retorno do investimento inicial. Garantia da qualidade de vida pela certeza da no falta de gua e seus inconvenientes.
Dependendo da tecnologia empregada, pode ter alto custo inicial. Pode aumentar o gasto com energia eltrica.
Social Melhora da imagem perante a sociedade, rgos ambientais, etc.
No
Ambiental
Preservao dos recursos hdricos, principalmente dos mananciais superficiais. Contribui na conteno de enxurradas que provocam alagamentos e enchentes.
No
Kobiyama et al. (2007b) realizaram a anlise custo-benefcio de vrios
casos. Todos os casos mostraram que o sistema de aproveitamento de gua traz
benefcios. A Tabela 5.2 apresenta o investimento, o tempo de retorno e o
ganho anual relacionado com seu respectivo projeto.
38
Tabela 5.2 - Economia pelo aproveitamento da gua da chuva.
Projeto (Local) Investimento Ganho anual Tempo de retorno
Biblioteca Central (UFSC)
US$ 41.750,00 US$ 15.000,00 2 anos e 8 meses
Schulz (Joinville) R$ 180.353,02 R$ 100.000,00 2 anos
Centro Tecnolgico (UFSC)
R$ 35.931,05 R$ 332,70 9 anos
(Modificao de Kobiyama et al., 2007b)
Outra vantagem do sistema de aproveitamento de gua da chuva a
grande contribuio para a educao ambiental (Kobiyama & Hansen, 1998).
As pessoas percebem diretamente, todos os dias, fontes de gua e bem perto de
onde residem. Quando observam a reduo do armazenamento da gua no
sistema, comeam naturalmente economizar gua. Nas pessoas que convivem
com o sistema despertado maior interesse em fenmenos hidrolgicos e,
conseqentemente, elas comeam a respeitar os recursos hdricos ainda mais.
Isto a verdadeira educao ambiental.
Kobiyama et al. (1998b) enfatizaram a importncia da educao
ambiental para preservao de mananciais. Segundo Lee (1993), uma das
concluses da Dcada Internacional de Abastecimento de gua e Saneamento
(1980-1990) que, apenas a tecnologia no suficiente e o fator humano
(educao ambiental) indispensvel. Assim, o subproduto do aproveitamento
de gua da chuva, ou seja, a realizao da educao ambiental pode ser a
maior vantagem do mesmo.
39
No Brasil, existem ainda ensaios com relao a esse assunto, por
exemplo, Dacach (1979) e Silva et al. (1984 e 1988). A forma com que se faz
o aproveitamento de gua de chuva varia com o tipo de rea e clima. Assim,
cada local deve realizar um ensaio prtico, objetivando obter dados bsicos
para uma implementao adequada. Aqui nota-se que Kobiyama (2000)
mencionou que a realizao do aproveitamento de gua uma das tpicas
aes na ruralizao.
5.4. COMPOSTAGEM
A disposio dos resduos slidos configura um cenrio problemtico
nos dias de hoje devido a vrios fatores, um dos principais a falta de espao
fsico adequado para criao de aterros sanitrios. Segundo IBGE (2000),
apenas 13,3% dos domiclios brasileiros da rea rural contam com servio de
coleta de lixo. Alm disso, mesmo que fosse vivel transportar os resduos da
rea rural at os aterros, obviamente o custo de se alocar e tratar os mesmos no
prprio local de gerao muito menor. A compostagem uma tcnica que
atende perfeitamente as necessidades da populao rural, onde a maior frao
dos resduos orgnica.
Existem vrias maneiras de separar os resduos, a mais simples entre
lixo seco e mido (inorgnico e orgnico, respectivamente). O correto
instruir a populao a separe dessa maneira, e atualmente, tambm existem os
centros de triagem que realizam a separao fina dos resduos. Os materiais
como plsticos, papis, metais, vidro, em geral, podem ser reciclados, e os
ditos orgnicos podem ser usados na compostagem.
40
A compostagem uma tcnica simples que, atravs da decomposio
natural dos resduos slidos orgnicos, produz o que chamamos de composto
(Figura 5.5). Este composto pode ser utilizado como adubo, desde que, se
tomem alguns cuidados com o lixo que utilizado.
A execuo e a manuteno da compostagem so simples, porm deve
ser constante e intermitente. Primeiramente deve-se optar por um local de fcil
acesso, com solo de boa drenagem e protegido de ventos intensos e insolao.
Neste local, deve ser feita uma camada de material vegetal seco com 15 a 20
cm de profundidade. Esta camada garante a absoro do excesso de gua e a
circulao de ar. Em seguida, deve-se regar a camada, sem encharcar. Na
segunda camada j podem ser colocados os restos de alimentos e os resduos a
serem decompostos.
importante estar atento para cada detalhe da fase de execuo, por
exemplo, a forma das pilhas deve atingir no mximo 1,5 m de altura e pode ter
seo triangular ou trapezoidal. Em pocas chuvosas, indicado utilizar a
forma triangular, e j em pocas secas, a trapezoidal, pois facilita a penetrao
da gua reduzindo a necessidade de rega. A pilha deve ser coberta,
protegendo-a da chuva e de ventos intensos, com exceo da base.
A decomposio total do composto ocorre em, aproximadamente, 3 a
4 meses. Neste perodo so feitos 2 a 3 revolvimentos. Esse procedimento
importante para o controle da temperatura, sendo essencial para o bom
funcionamento dessa tcnica e para a produo de um composto de qualidade.
A utilizao deste composto traz muitas vantagens para agricultura,
melhorando a produtividade das culturas.
41
Os microorganismos anaerbios e aerbios so os verdadeiros
operrios da tcnica de compostagem. Entre eles esto os fungos, protozorios
e insetos. Existem vrios mitos com relao a essa tcnica, dentre eles que as
composteiras atraem roedores e produzem odores desagradveis, mas isso s
acontece se a tcnica for aplicada de forma incorreta, sem tomar as devidas
precaues.
Figura 5.5 Fluxograma da entrada e sada de produtos na compostagem.
Resduos orgnicos gua
Gs Carbnico (CO2)
Microorganismos
Calor (energia)
Composto estabilizado
+ Oxignio
(O2)
+
42
43
6. CONCEITOS BSICOS DA HIDROLOGIA
"A natureza tem para tudo o seu objetivo."
Aristteles
6.1. DEFINIO
A hidrologia a cincia (logia) da gua (hidro). Segundo UNESCO
(1964), Hydrology is the science which deals with the waters of the earth,
their occurrence, circulation and distribution on the planet, their physical and
chemical properties and their interactions with the physical and biological
environment, including their responses to human activity. Hydrology is a field
which covers the entire history of the cycle of water on the earth. Ento,
internacionalmente a hidrologia definida como a cincia que lida com a gua
da Terra, sua ocorrncia, circulao e distribuio no planeta, suas
propriedades fsicas e qumicas e sua interao com o ambiente fsico e
biolgico, incluindo suas respostas para a atividade humana. A hidrologia o
campo que cobre a inteira histria do ciclo da gua na terra.
A hidrologia trata dos processos fsicos relacionados gua que
ocorrem no meio natural. O ser humano, por sua vez, cria tecnologias de modo
a adequar sua ocupao no ambiente, por isso a quantificao da
disponibilidade hdrica utilizada para o planejamento e o gerenciamento dos
recursos hdricos. Aprimorando e possibilitando assim, atividades como,
44
abastecimento de gua, agricultura com a irrigao e a dessedentao de
animais, aqicultura, navegao, gerao de energia eltrica, recreao e lazer
e preservao da fauna e flora.
6.2. BACIAS HIDROGRFICAS
Hoje em dia, consenso que deve ser feito o manejo de (micro) bacias
hidrogrficas. A bacia hidrogrfica uma rea geogrfica, que compreende
todas as nascentes de um rio principal e de seus rios afluentes, juntamente com
as reas ao redor desses rios. Em outras palavras, uma regio sobre a terra,
na qual o escoamento superficial em qualquer ponto converge para um nico
ponto fixo, chamado exutrio (Figura 6.1).
Freqentemente o termo microbacia hidrogrfica empregado para
designar uma bacia de pequena extenso (rea). Entretanto, o tamanho algo
relativo, pois depende daquilo que se toma como referncia. Para realizar o
Programa Nacional de Microbacias Hidrogrficas (PNMH), o Ministrio da
Agricultura (1987), definiu a microbacia hidrogrfica como, uma rea
fisiogrfica drenada por um curso de gua ou por um sistema de cursos de
gua conectados e que convergem, direta ou indiretamente, para um leito ou
para um espelho da gua, constituindo uma unidade ideal para o planejamento
integrado do manejo dos recursos naturais no meio ambiente por ela definido.
Nesta definio, no consta a diferena entre bacia e microbacia. Assim,
bacias e microbacias apresentam caractersticas iguais, sendo que a nica
diferena entre elas seu tamanho.
45
Figura 6.1 - Exemplo de bacia hidrogrfica.
46
O fluxo de matrias, como solo, gua, nutrientes e poluentes,
coordenado dentro dos contornos da bacia, em uma dinmica estabelecida pelo
comportamento da gua nesta unidade. Portanto, a bacia hidrogrfica a
unidade ideal (tima) para o gerenciamento integrado dos recursos naturais,
inclusive hdricos. Dessa maneira, as atividades rurais como a agricultura, o
reflorestamento e a pecuria tambm devem ser tratadas em nvel de bacia
hidrogrfica.
Alm disso, atualmente, o manejo integrado de bacias vem sendo
enfatizado. Na fase inicial da ao de utilizar as bacias, como objeto de estudo,
ela era considerada como um sistema fsico. Por isso, o manejo de bacias era
sinnimo de conservao ou manjo do solo. Mas, os estudos avanaram e foi
notado que a bacia inclui, alm do solo e gua, a flora e a fauna. Hoje,
considera-se a bacia hidrogrfica composta por corpos de gua de todos os
tipos (arroios, rios, banhados, lagos, entre outros), solo, subsolo, rocha,
atmosfera, fauna, flora, espao construdo e sociedade. Assim, se faz
necessrio o conceito de Manejo Integrado de Bacias Hidrogrficas.
6.3. PRINCPIOS HIDROLGICOS DOS RECURSOS
HDRICOS
Todo tipo de gua se movimenta em qualquer lugar no mundo. Nas
trs fases em que pode ser encontrada (gasosa, lquida e slida), circula no
mundo. A circulao que a gua realiza chamada de ciclo da gua ou ciclo
hidrolgico, objeto principal da hidrologia (Figura 6.2). Os componentes desse
ciclo denominam-se os processos hidrolgicos. Entre eles, a condensao,
47
precipitao, interceptao, infiltrao, deteno, percolao, escoamentos
superficiais e subsuperficiais, escoamento subterrneo, escoamento fluvial e
evapotranspirao (evaporao + transpirao) so os de maior relevncia. O
objetivo da hidrologia quantificar os volumes de gua armazenados nos
componentes terrestres e as quantidades transportadas de gua entre eles.
Figura 6.2 - Ciclo hidrolgico (em bacia hidrogrfica)
A gua est em constante movimento sob diferentes estados, formando
um ciclo, e assim est em constante renovao, compondo rios, lagos, chuvas,
nuvens, oceanos, neve, etc., ao mesmo tempo em que consumida pelos seres
vivos. A gua um recurso natural renovvel, ao contrrio de recursos que vo
se esgotando medida que so consumidos, como exemplo dos minerais e do
48
petrleo. Por isso, a primeira grande caracterstica hidrolgica dos recursos
hdricos essa circulao totalmente natural.
A gua da chuva que cai na vegetao e no solo atravessa acima e
dentro dos mesmos e sofre reaes bioqumicas. Assim, a qualidade da gua se
altera. evidente que a qualidade da gua subterrnea bem diferente daquela
do rio. Isso porque a gua subterrnea passou muito tempo em contato com o
solo e as rochas, e no processo de infiltrao foi sendo filtrada.
Devido ao ciclo hidrolgico, ocorre a variabilidade (ou
heterogeneidade) espacial dos recursos hdricos. A concentrao da gua no
planeta Terra no de forma uniforme, ou seja, h regies, pases, que
possuem mais gua do que outros, de acordo com o clima, vegetao e
caractersticas prprias do local. O Brasil, por exemplo, um pas que possui
bastante gua na forma de rios. Grande parte da extenso territorial do pas se
caracteriza por ser de clima tropical, e por isso chove bem mais que em outros
locais do mundo, como o Egito, onde tem pouca gua e chove menos.
O tipo de vegetao existente em uma regio est intimamente ligado
variabilidade espacial dos recursos hdricos do mesmo. No Brasil, ocorrem
formaes como a Floresta Amaznica, Caatinga, Cerrado, Floresta Atlntica,
entre outras. A distribuio da vegetao coincide com o clima da regio
(Figura 6.3).
49
Figura 6.3 - Mapa do Brasil: (a) Vegetao; e (b) Clima
50
Essa variabilidade pode ser encontrada localmente. A Figura 6.4
mostra, por meio de isoietas, a variao espacial da precipitao na regio do
municpio de Rio Negrinho. Isoietas so linhas que unem locais com o mesmo
valor de precipitao.
Doutor Pedrinho
Jos Boiteux
Rio dos Cedros
Corup
So Bento do Sul
Mafra
Itaipolis
Benedito Novo
Rio Negrinho
620000 630000 640000 650000 660000 670000
7030000
7040000
7050000
7060000
7070000
7080000
7090000
0m 10000m 20000m
Localizao das Estaes Pluviomtricas Utilizadas
Mapa de Isoeietas Diviso Poltica dos MunicpiosLegenda:
IsoerosividadeMunicpio de Rio Negrinho
e Vizinhana
620000 630000 640000 650000 660000 670000
7030000
7040000
7050000
7060000
7070000
7080000
7090000
620000 630000 640000 650000 660000 670000
7030000
7040000
7050000
7060000
7070000
7080000
7090000
Figura 6.4 - Mapa com isoietas traadas para regio do municpio de Rio Negrinho-SC.
51
Atualmente, a transposio da bacia do rio So Francisco est gerando
polmica nacional. Por conta da maneira como essa discusso est sendo
exposta pela mdia, muitas pessoas acreditam que a transposio das bacias
hidrogrficas no pode ser feita! Isto acaba criando uma generalidade, onde se
acredita que a transposio de qualquer bacia tem que ser proibida!!!!
Entretanto, essa proibio sem base cientfica, e acaba prejudicando a prpria
sobrevivncia do homem. Como existe a variabilidade espacial dos recursos
hdricos devido ao ciclo hidrolgico natural, muitas vezes imprescindvel que
se faa uma transposio de bacias para, por exemplo, garantir o
abastecimento de gua em uma regio.
Aqui, deve-se deixar bem claro que, neste momento, os autores do
presente livro no apiam a transposio do rio So Francisco, pois a bacia
to grande que se torna muito difcil avaliar o impacto ambiental da
transposio sem que se faa estudos mais aprofundados. Desta forma,
enquanto no se sabe o impacto ambiental dessa transposio, a obra no deve
ser executada.
O ciclo hidrolgico gera tambm a variabilidade (ou heterogeneidade)
temporal dos recursos hdricos. De acordo com a poca do ano a quantidade de
gua tambm varia. Assim, tm meses que chove mais do que outros.
Realizando-se uma simples anlise dos dados de precipitao e vazo
do municpio de Rio Negro/PR, disponibilizados pela Agncia Nacional das
guas (ANA), obtm-se os comportamentos mensal e anual da precipitao e
da vazo na bacia do rio Negro (Figura 6.5.). Observa-se que nos meses de
abril, julho e agosto ocorre pouca pluviosidade, j nos meses de janeiro a
maro aumenta. H muita variao em anos subseqentes.
52
(a)
(b)
Figura 6.5 - Comportamento da precipitao e vazo para a regio de Rio Negro/PR. (a) Variao mensal; e (b) variao anual. (P1 e P2 so
precipitaes obtidas nas estaes Rio Negro (Cdigo 02649006) e Rio Negro (Cdigo 02649021), respectivamente e Q vazo obtida da estao Rio Negro
(Cdigo 65100000)).
53
Assim, pode-se dizer que os trs princpios hidrolgicos dos recursos
hdricos so: (1) ciclo hidrolgico que ocorre naturalmente; (2) variabilidade
espacial; e (3) variabilidade temporal. Esses princpios regem sua
disponibilidade em cada regio e, assim, acabam por influenciar muito no
gerenciamento de recursos hdricos.
54
55
7. PRESERVAO DE MANANCIAIS
"Para dar ordens natureza preciso
saber obedec-la"
Francis Bacon
7.1. CONCEITO
Devido ao fluxo contnuo dos cursos dgua, as influncias de
qualquer atividade atingem sempre as partes jusantes. Baseados nessas
influncias, Grant et al. (1984) criaram o conceito dos efeitos cumulativos
ou efeitos jusantes. Na rea de ecologia fluvial, Vannote et al. (1980) j
tinham falado sobre o conceito de contnuo fluvial. Isto implica que
qualquer local manancial e todas as atividades em qualquer local tm seus
reflexos, pelo menos, na parte jusante da bacia.
A respeito destes efeitos no Japo, a relao entre o desmatamento e a
produo pesqueira vem sendo seriamente discutida. Por exemplo, Matsunaga
(1994) mostrou, atravs de monitoramento, que aumentos das reas de
desmatamento e reflorestamento causaram reduo e aumento da produo
pesqueira no mar, respectivamente. Ento, existe uma forte conexo entre as
nascentes do rio, encostas e o mar. Isto indica que no se pode tratar um
problema pontualmente dentro da bacia, mas sim considerando a bacia inteira.
56
Dentro de uma bacia, locais de rios nascentes so normalmente
considerados como mananciais. Estes locais devem ser protegidos com
florestas e quando a prtica agrcola for permitida, deve ser utilizada a tcnica
de agricultura orgnica.
Os mananciais so locais que disponham de gua em condies
sanitrias adequadas, de maneira que possa suprir totalmente ou parcialmente a
demanda e que seja permitida a retirada para uso. Na escolha de uma rea
como manancial, deve-se considerar a quantidade e a qualidade da gua que
ele dispe, assim como a viabilidade econmica para a sua utilizao. Podem
existir vrias formas de mananciais, tais como: poos, fontes, audes, lagos,
rios, etc.
Hoje em dia, a maior parte da populao vive em zonas costeiras que
so partes finais da bacia hidrogrfica. Assim, h grande possibilidade de que
a gua seja usada e despejada na parte jusante e novamente utilizada pelos
moradores costeiros, pois a gua chega at l, devido a seu ciclo dentro da
bacia.
Dessa maneira, pode-se dizer que qualquer lugar potencialmente
manancial. Em reas de mananciais, onde permitido o uso agrcola das terras,
deve ser dada preferncia ao cultivo orgnico. Ento, pode-se dizer que em
qualquer lugar que seja praticada agricultura, deve ser executada a agricultura
orgnica para no contaminar os recursos hdricos.
57
7.2. ZONA RIPRIA
7.2.1. Termologia
A faixa de vegetao ao longo dos rios , sem dvida, uma das partes
mais importantes dos mananciais e deve ser protegida (ou recuperada) para a
conservao do ambiente fluvial. Esta faixa de vegetao ou rea recebe
denominaes de zona ripria, mata ciliar, floresta de galeria, entre outros, nas
sociedades, ambas, comum e cientfica. Tomando como base a imprensa falada
e escrita, assim como atividades de educao ambiental, pode-se dizer que o
termo mata ciliar mais popular na sociedade brasileira.
Procurando apenas termos utilizados para este assunto (tal vegetao e
tal rea), nota-se que h diversidade dos termos. Esta diversidade implica, e
resulta da complexidade deste assunto. Entretanto, para fazer cincia, deve-se
que uniformizar alguns termos tcnicos.
Em ingls, a floresta (vegetao) que ocupa o espao prximo ao rio
se chama riparian forest (vegetation). Segundo Gregory & Ashkenas (1990), o
termo riparian (ripria) derivado do latina, e significa banco de areia ou de
terra depositada junto margem dos rios e/ou terra perto da gua e
simplesmente refere-se rea prxima ao corpo da gua.
A Tabela 7.1 apresenta diversos termos utilizados em idiomas como o
ingls, portugus e japons. Nota-se uma enorme diversidade da terminologia.
Mesmo quando empregam termos iguais, os autores definem de diferentes
maneira, por exemplo, Gregory et al. (1991) e Georgia Adopt-A-Stream
58
(2002) para a zona ripria e Schiavini (1997) e Barbosa (1997) para a floresta
de galeria.
Alm disso, a terminologia possui uma regionalidade. Por exemplo, no
Cerrado o termo de mata (floresta) de galeria mais comum, e em plancie
sulina usa-se mata de fecho ou de anteparo (Mantovani, 1989).
Mencionando diversos nomes, Barbosa (1996) comentou que os termos mais
utilizados pelos tcnicos e cientistas no Brasil so floresta ciliar e floresta de
galeria.
Rodrigues (2000) fez outro comentrio. Segundo ele, o termo floresta
(ou mata) ripria mais comumente usado para floresta ocorrente ao longo do
curso da gua em regies onde a floresta cobre as vertentes (interflvios). Na
legislao brasileira, o termo floresta (ou mata) ciliar vem sendo utilizada de
forma extremamente genrica. O mesmo autor definiu a formao ribeirinha e,
ainda, a classificou em trs categorias: formao ribeirinha com influncia
fluvial permanente; formao ribeirinha com influncia fluvial sazonal; e
formao ribeirinha sem influncia fluvial.
59
Tabela 7.1 - Termos empregados para zona ripria. (a)ingls; (b)portugus; e
(c)japons.
(a) Autor(es) Termo utilizado Definio Dillaha et al. (1989)
Faixa vegetal de filtragem (vegetative filter strip)
rea de vegetao estabelecida para remover sedimentos e outros poluentes a partir do escoamento superficial atravs de filtragem, deposio, infiltrao, adsoro, absoro, decomposio, e volatilizao.
Gregory & Ashkenas (1990)
rea ripria Ecossistema aqutico (EA) e pores do ecossistema terrestre (ET) prximas ao EA, que diretamente afetam ou so afetados pelo EA. Inclui rios, lagos, banhados, plancie de inundao, uma parte de vertente.
Gregory & Ashkenas (1990)
Zona de manejo riprio rea especificamente estabelecida para objetivos do manejo riprio. Est dentro da rea ripria, mas no necessariamente inclui toda parte da mesma.
Gregory et al. (1991)
Zona ripria Interface entre ecossistemas terrestre e aqutico. ectono. Estende-se horizontalmente at o limite que a inundao alcana, e verticalmente at o topo da copa da vegetao. reconhecida como corredor para movimento de animais dentro do sistema de drenagem.
Bren (1993) Zona ripria rea de maior proximidade dos rios
Hupp & Osterkamp (1996)
Zona ripria Uma parte da biosfera inundada e suportada pela paisagem fluvial atual. Inclui barranco, plancie de inundao
60
Continuao Tabela 7.1 (a)
Autor(es) Termo utilizado Definio NRCS (1997) Armazenamento
florestal ripariano (Riparian Forest buffer)
rea de rvores e arbustos, localizada prxima de rios, lagos, lagoas e banhados.
Bren (1997) Armazenamento do rio (Stream buffer)
rea adjacente ao rio, a partir da qual o desamamento no permitido.
Bren (1998) Faixa de armazenamento (Buffer strip)
rea de terra ao longo do rio, protegida da prtica de uso do solo na bacia hidrogrfica, para proteger o rio dos impactos de montantes.
Georgia Adopt-A-Stream (2002)
Zona ripria rea de vegetao (natural) em torno do corpo de gua.
McKergow et al. (2003)
rea ripria Terra bem prxima a rios, podendo potencialmente minimizar impactos da agricultura sobre os mesmos. Minimizar impactos da agricultura sobre rios.
Webb & Erskine (2003)
Zona ripria Conjunto de canal, barraco e plancie de inundao.
61
(b) Autor(es) Termo utilizado Definio Salvador (1987) Floresta ripcola ou ciliar Vegetao arbrea das margens
dos rios, que desempenha funes ecolgicas e hidrolgicas importantes em uma bacia hidrogrfica.
Mantovani (1989)
Floresta ripria Formaes com particularidade florstica, em funo das cheias peridicas, variveis em intensidade, durao e freqncia e da flutuao do lenol fretico.
Mantovani (1989)
Floresta de condensao Floresta situada no fundo de vales, em condies mesoclimticas que favorecem a condensao e a permanncia de neblina nas primeiras horas do dia, ao menos em algum perodo do ano.
Mantovani (1989)
Mata aluvial Floresta que se situa sobre aluvies
Mantovani (1989)
Floresta paludosa ou de vrzea
Floresta que se situa em vrzeas
Rodrigues (1991)
Floresta ripria Faixa de vegetao sob as interferncias diretas da presena de gua em algum perodo do ano.
Rodrigues (1992)
Mata ciliar Qualquer formao s margens de cursos da gua, incluindo as matas riprias, de galeria e at de brejo, quando se tem um curso da gua bem definido.
Torres et al. (1992)
Floresta de brejo Floresta sobre solos permanentemente encharcados, com fluxo constante de gua superficial.
Schiavini (1997)
Floresta de galeria Florestas situadas nas faixas marginais dos cursos da gua, formando uma galeria. Dessa maneira, um caso especial da floresta ciliar.
62
Continuao Tabela 7.1 (b)
Autor(es) Termo utilizado Definio Barbosa (1997) Floresta de galeria Formaes vegetais
caractersticas de margens de corpos da gua com espcies altamente tolerantes e resistentes ao excesso da gua no solo.
Brazo & Santos (1997)
reas das formaes pioneiras com influncia fluvial ou lacustre (vegetao aluvial)
reas de acumulao dos cursos de gua, lagoas e assemelhados, que constituem os termos aluviais sujeitos ou no a inundaes peridicas.
Souza (1999) Vegetao ripria Toda e qualquer vegetao de margem, no apenas a que est relacionada ao corpo da gua, seja este natural ou criado pelo homem.
Rodrigues (2000)
Formao ribeirinha Formao vegetal e fitogeogrfica em reas de entorno de cursos de gua, definindo uma condio ecotonal (ectono ciliar).
Dias (2001) reas de preservao permanente ciliares
reas com qualquer formao s margens de cursos da gua (ciliares), legalmente protegidas, de acordo com o Cdigo Florestal.
Selles et al. (2001)
Mata ciliar Faixa de mata na margem da gua.
63
(c) Autor(es) Termo utilizado Definio Ohta & Takahashi (1999)
Zona ripria Ecossistema aqutico, tais como rios e lagoas, e ecossistema terrestre que influencia diretamente os mesmos.
The Japan Society of Erosion Control Engineering (2000)
Zona ripria Zona prxima a rios, lagos, pntanos, etc. Esta zona influencia fortemente a transferncia de energia, nutrientes, sedimentos etc. entre os ecossistemas terrestre e aqutico. Incluem plancie, vertente, vegetao, e a estrutura subterrnea onde a gua subterrnea se movimenta.
The Japan Society of Erosion Control Engineering (2000)
Zona de armazenamento (buffer)
Zona que minimiza efeitos fsicos, qumicos e biolgicos dos usos da terra sobre outros ambientes vizinhos.
The Japan Society of Erosion Control Engineering (2000)
Zona de manejo riprio. Zona florestal protegida, em torno de rios e lagoas, pela legislao.
NRCS (1997) classificou a rea mais detalhadamente com critrio de
geomorfologia e uso da terra (Figura 7.1). Nesta figura, a Zona 3 considerada
como faixa de filtragem que exclusivamente para reduzir a quantidade dos
sedimentos e solutos (fertilidade e agrotxicos) que vm da rea de cultivos e
entram no rio.
64
Figura 7.1 - Zoneamento da faixa de armazenamento (Fonte: NRCS, 1997).
No caso da proposta de Gregory & Ashkenas (1990), a zona de manejo
riprio no coincide com a ripria. Isso natural, pois para melhorar a
condio da zona ripria, o manejo deve ser efetuado no somente nela, mas
tambm em seu redor (Figura 7.2). Nesta figura, a zona ripria coincide com a
plancie de inundao.
65
Figura 7.2 - Zona de manejo riprio (Fonte: Gregory & Ashkenas, 1990)
Analisando os termos e suas respectivas definies, aqui se colocam
alguns comentrios. Comparando mata e floresta, observa-se que o termo
mata mais utilizado para o aspecto geral de vegetao e, literalmente, mais
empregado que vegetao. Neste caso, floresta j implica existncia de rvores
de grande porte, e tambm d uma conotao mais cientfica do que mata.
Vegetao um termo geral que inclui no somente floresta, mas tambm
arbustos e gramneas.
O termo ciliar originado de clios, significando ento, proteo.
Neste sentido, floresta utilizada para quebra-vento poderia ser mata ciliar
tambm. Entretanto, ripria significa prximo ao corpo de gua, e leva em
considerao conceito de distncia e gua. Portanto, o termo ripria mais
correto do que ciliar para o presente assunto do livro.
66
Na literatura em ingls, encontram-se os termos filter (filtragem) e
buffer (tampo e armazenamento). Estes indicam mais a funo que floresta
ripria possui. Os termos faixa e rea do impresso de conceito de bi-
dimenso horizontal. Nesse sentido, a zona ripria pode ser tambm
bidimensional.
De fato, precisa-se tratar o espao de forma tridimensional incluindo
vegetao (rvore, arbusto, ervas, gramneas, entre outros), solo e rio (corpo da
gua). Com esse objetivo, que o presente livro recomenda o uso do termo
zona ripria, que trata o espao acima descrito. Resumindo, a zona ripria
definida como um espao tridimensional que contm vegetao, solo e rio. Sua
extenso horizontalmente at o alcance de inundao e verticalmente do
regolito (abaixo) at o topo da copa da floresta (acima). A determinao desta
extenso horizontal e vertical semelhante de Gregory et al. (1991). A
plancie de inundao , geralmente, uma superfcie plana e inundada, em
mdia, uma vez por 1 a 3 anos (Hupp & Osterkamp, 1996). Na parte de baixo
da superfcie, o leito do rio, a zona ripria inclui a zona hyporheic que
segundo Stanford & Ward (1988), um espao importante para ecologia dos
organismos aquticos no fundo do canal.
Takahashi & Ohta (1999) definiram a zona hyporheic como aquela
onde gua fluvial entra por baixo do leito do canal e a condio hidrulica da
gua fica entre as das guas fluviais e subterrneas