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UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA PRO-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO PROGRAMA DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO DIANA CRUZ RODRIGUES REDE DE INOVAÇÃO INTERORGANIZACIONAL: ANÁLISE DA APROPRIABILIDADE E CONVERGÊNCIA COM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL BELÉM-PA 2014

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UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA

PRO-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO

PROGRAMA DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO

DIANA CRUZ RODRIGUES

REDE DE INOVAÇÃO INTERORGANIZACIONAL:

ANÁLISE DA APROPRIABILIDADE E CONVERGÊNCIA COM

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

BELÉM-PA

2014

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DIANA CRUZ RODRIGUES

REDE DE INOVAÇÃO INTERORGANIZACIONAL:

ANÁLISE DA APROPRIABILIDADE E CONVERGÊNCIA COM

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Administração da Universidade da

Amazônia como requisito para obtenção do título de Mestre em Administração.

Linha de Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável.

Orientador: Prof. Dr. Mário Vasconcellos Sobrinho.

BELÉM-PA

2014

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Biblioteca Central

658

R696r Rodrigues, Diana Cruz.

Rede de inovação interorganizacional: análise da

apropriabilidade e convergência com desenvolvimento sustentável /

Diana Cruz Rodrigues. – Belém, 2014.

236 f.: il.; 21 x 30 cm.

Dissertação (Mestrado) – Universidade da Amazônia, Programa

de Pós- Graduação em Administração, 2014.

Orientador: Prof. Dr. Mário Vasconcellos Sobrinho.

1. Inovação interorganizacional – apropriação. 2. Rede

interorganizacional. 3. Relações interorganizacionais. 4.

Desenvolvimento sustentável. 5. Biodiversidade – Amazônia I.

Vasconcellos Sobrinho, Mário. II. Título.

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DIANA CRUZ RODRIGUES

REDE DE INOVAÇÃO INTERORGANIZACIONAL:

ANÁLISE DA APROPRIABILIDADE E CONVERGÊNCIA COM

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Administração da Universidade da Amazônia como requisito para obtenção do título

de Mestre em Administração.

Linha de Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável. Orientador: Prof. Dr. Mário Vasconcellos

Sobrinho.

BANCA EXAMINADORA:

Data de aprovação: ___/___/_____.

_______________________________________

Prof. Dr. Mário Vasconcellos Sobrinho / Unama

Orientador

_______________________________________

Prof. Dr. Emílio Arruda Filho / Unama

_______________________________________

Prof. Dr. José Márcio de Castro / PUC-Minas

Conceito:__________

BELÉM-PA

2014

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AGRADECIMENTOS

Aos colegas da turma do mestrado 2012, pela companhia em percorrer essa mesma estrada e

sonhar o mesmo sonho. Em especial, agradeço as amigas Nayara Baraúna, Renata Fares e

Socorro Viegas pelo apoio nos trabalhos e estudos, pelo compartilhar dificuldades e desafios,

e pelos risos que fizeram com que tudo ficasse mais leve e colorido.

Ao Programa de Pós Graduação em Administração da Unama e todos os professores que se

dedicam a formar alunos para este campo. Cada um ao seu modo e todos em sua diversidade,

colaboraram para fortalecer meu aprendizado, minhas capacidades e decisões. Em particular,

ao meu orientador, Prof. Mário Vasconcellos Sobrinho, pela sua paciência, compromisso e

incentivo ao meu crescimento acadêmico com uma confiança que muitas vezes foi além da

minha própria.

À Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP) da Fundação Getúlio Vargas,

em nome dos professores Maria Rita Loureiro, Marco Antonio Teixeira, José Carlos Barbieri

e, em especial, à Marta Farah pela acolhida generosa e pelo aprendizado muito além da

vivência de excelência acadêmica, exemplos de vida e dedicação.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela

oportunidade por meio do Programa Nacional de Cooperação Acadêmica (PROCAD) de

realizar intercambio acadêmico na EAESP/FGV.

À Fundação de Âmparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp) e todos os amigos que lá

fiz, pela trajetória de aprendizado e amadurecimento profissional e pessoal, proporcionado o

tempo e espaço para este sonho surgir na forma de decisão.

À UFPA, Amazon Dreams e ao Grupo Petruz (Belaiaçá) pela colaboração e confiança no

compartilhamento de relatos e informações para desenvolvimento desta pesquisa, sem os

quais este trabalho não seria possível. Também gostaria de agradecer a paciência e disposição

dos entrevistados (destas organizações e de outras) pelas longas horas de conversa. E, em

particular, minha admiração ao Prof. Hervé Rogez por acreditar em seu sonho e fazer

acontecer.

À minha família e amigos, pela convivência, carinho e amor. Em especial: Aos meus pais, à

minha mãe, pelo apoio e incentivo sempre, e ao meu pai pelo cuidado silencioso e confiança;

aos meus tios e tias sempre de algum modo presentes e seus exemplos de superação; à

Heletéia pelo reencontro e apoio em São Paulo; e à Renata pela afinidade e aprendizado dos

encontros e desencontros.

A Deus, pela fé na realização e na busca da verdade, quando tudo mais se desconecta.

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RESUMO

Esta dissertação teve como objetivo analisar as condições de apropriabilidade de uma

inovação baseada em ativo da biodiversidade da região amazônica desenvolvida por uma rede

de relações interorganizacionais, sob a perspectiva de diretrizes do desenvolvimento

sustentável. A pesquisa se baseou em um estudo de caso de uma rede de inovação formada

pela Universidade Federal do Pará e as empresas Amazon Dreams e Belaiaçá para o

desenvolvimento e comercialização de uma linha de produtos inovadores de compostos

antioxidantes de açaí. O desenho do estudo se fundamentou por três níveis de análise: (1) o

contexto em que a rede de inovação interorganizacional atua, no qual são examinados os

constructos de paradigma tecnológico e de regime de apropriabilidade; (2) os atores

organizacionais com a investigação do constructo de capacidades de inovação; e, (3) a rede de

relações interorganizacionais, tendo como constructo a orquestração de redes de inovação.

Entendemos que o arranjo em rede interorganizacional configurou-se em uma resposta

adequada para superação das dificuldades individuais das organizações locais em termos de

capacidades para inovação, proporcionando a congregação de capacidades tecnológicas e de

produção necessárias. Também consideramos que o caso estudado confirma o potencial de

oportunidades biotecnológicas baseada em bioativos amazônicos, no entanto o impacto de

diretrizes de desenvolvimento sustentável sobre as condições de apropriabilidade no modelo

de negócio implementado foi limitada pela falta de coevolução de mudanças sociais, políticas

e institucionais convergentes com um projeto de desenvolvimento regional. Além disso,

observamos dificuldades relacionadas a falhas na constituição de capacidades de

comercialização e proteção da inovação na rede de inovação e barreiras na estrutura das

relações interorganizacionais quanto ao estabelecimento de reciprocidade entre os atores

organizacionais.

Palavras-chave: Apropriação de benefícios da inovação. Rede interorganizacional.

Desenvolvimento sustentável.

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ABSTRACT

This dissertation aims to analyze the appropriability of an innovation based on the

biodiversity asset of the Amazon region developed by a interorganizational network, from the

perspective of sustainable development guidelines. The research was based on a case study of

an innovation network that involves the Federal University of Pará, Amazon Dreams and

Belaiaçá for the development and trading of a set of innovative antioxidants products from

acai. The study design was based on three levels of analysis: (1) the context of innovation

network, in which addressed the constructs of technological paradigm and regime of

appropriability; (2) organizations of network to research the construct of innovation

capabilities; and (3) the inter-organizational relationships network to study the construct of

orchestrating innovation networks. We understand that the arrangement of interorganizational

network configured in a response to overcoming individual difficulties of local organizations

in terms of innovation capabilities, and provided the gathering of technological and

production capabilities required. We also consider that the case study confirms the potential

of biotechnology opportunities from Amazon biodiversity, however the impact of sustainable

development guidelines on appropriability conditions in the business model was limited by

the lack of coevolution of social, political and institutional innovations in the region.

Furthermore, we observed problems in the network organizations related to difficulties in

building trading and protection of innovation capabilities and in barriers in the structure of

interorganizational relations to establish a sense of reciprocity between them.

Keywords: Appropriating the returns from innovation. Network of interorganizational

relationships. Sustainable Development.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AD Amazon Dreams

ALI Agentes Locais de Inovação do SEBRAE

BASA Banco da Amazônia

C&T Ciência e Tecnologia

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CDB Convenção sobre Diversidade Biológica

CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos

CGEN Conselho de Gestão do Patrimônio Genético

CMMAD Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico

COFRUTA Cooperativa de Fruticultores de Abaetetuba

CRIATEC Fundo Criatec de Capital Semente do BNDES e BNB

CT&I Ciência, Tecnologia e Inovação

EMBRAPA/CPATU Embrapa Amazônia Oriental

EMBRAPII Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial

EMI Electrical Musical Industries

EPO European Patent Office

FEA Faculdade de Engenharia de Alimentos do Instituto de Tecnologia

(ITEC) da UFPA

FNDCT Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

FUNAI Fundação Nacional do Índio

GMA-SAFE Grocery Manufacturers Association - Supplier Assessment for Food

Excellence Program

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

Renováveis

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IEC Instituto Evandro Chagas

INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

INPI Instituto Nacional da Propriedade Industrial

ISO 22.000 Norma ABNT NBR sobre Sistemas de Gestão de Segurança de

Alimentos

ITEC Instituto de Tecnologia da UFPA

JAS Japan Agriculture Standard

JPO Japan Patent Office

MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MCTI Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação

MEC Ministério da Educação

MMA Ministério do Meio Ambiente

MPEG Museu Paraense Emilio Goeldi

OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

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OMC Organização Mundial do Comércio

OMPI Organização Mundial de Propriedade Intelectual

ONU Organização das Nações Unidas

ORAC Oxygen Radical Absorbance Capacity

P&D Pesquisa e Desenvolvimento

PAPPE Programa de Subvenção à Pesquisa em Microempresas e Empresas de

Pequeno Porte da FINEP

PIB Produto Interno Bruto

PIEBT Programa de Incubação de Empresas de Base Tecnológica

PINTEC Pesquisa Nacional de Inovação Tecnológica

RHAE Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas

do CNPq

SAGRI Secretaria de Estado de Agricultura (Pará)

SECTAM Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Pará -

Até 2007)

SECTI Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação (Pará - A

partir de 2011)

SEDECT Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia (Pará

- Entre 2007 e 2011)

SPE Sociedade de Propósito Específico

SPI Setor de Propriedade Intelectual da Agência de Inovação da UFPA

TRIPS Acordo sobre os Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao

Comércio

UFOPA Universidade Federal do Oeste do Pará

UFPA Universidade Federal do Pará

UFRA Universidade Federal Rural da Amazônia

UNIFESPA Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará

UNIVERSITEC Agência de Inovação da UFPA

USDA United States Department of Agriculture

USPTO United States Patent and Trademark Office

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Principais elos da cadeia produtiva do açaí. 66

Figura 2 - Quantidade da Produção Total, Cultivada e de Extração Vegetal de Açaí

no Estado do Pará no período de 2003 a 2012.

67

Figura 3 - Gráfico da evolução do número de cursos de pós graduação stricto sensu

na UFPA – período de 2008 a 2012.

111

Figura 4 - Registros de pedidos de patentes da UFPA publicados junto ao INPI. 115

Figura 5- Gráfico de distribuição de membros da Amazon Dreams por

departamento (em dezembro de 2012).

120

Figura 6 - Imagens da marca, produtos e reportagens da Amazon Dreams. 124

Figura 7 - Imagens do site, produtos e instalações da Belaiaçá. 132

Figura 8 - Quadro de referência sobre processos de orquestração de redes de

inovação.

152

Figura 9 - Rede de relações interorganizacional durante o período de invenção da

linha de produtos inovadores.

155

Figura 10 - Quadro comparativo entre o composto concentrado antioxidante

desenvolvido pelas AD e UFPA, e demais produtos disponíveis no

mercado em termos da proporção ORAC por dólar.

158

Figura 11 - Rede de parcerias durante a implementação do negócio (inovação). 166

Figura 12 - Demonstrativo de distribuição de percentuais a serem apropriados pelas

organizações sobre o resultado da comercialização dos produtos da linha

de antioxidante do açaí.

168

Figura 13 - Mapa conceitual dos constructos da pesquisa. 227

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Percentual da distribuição de empresas industriais que realizaram

atividade inovativa no triênio 2006/2008, por região.

34

Tabela 2 - Percentual de aplicação de recursos pelos governos estaduais em CT&I

por região do Brasil em 2007.

56

Tabela 3 - As quatro dimensões de habilidades que compõem a capacidade absortiva

por Zahra e George (2002).

89

Tabela 4 - Padrões Setoriais de Mudança Técnica. 96

Tabela 5 - Tabela de categorias de capacidades relacionadas à acumulação

tecnológico.

101

Tabela 6 - Número de Cursos de Pós Graduação Stricto Sensu na UFPA – por área

de conhecimento – período de 2008 a 2012.

111

Tabela 7 - Análise do padrão de mudança técnica da Amazon Dreams. 122

Tabela 8 - Análise do padrão de mudança técnica da Belaiaçá. 133

Tabela 9 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Regime de

Apropriabilidade.

182

Tabela 10 - Evidências no estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à

sustentabilidade ao constructo Regime de Apropriabilidade.

184

Tabela 11 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Trajetória Tecnológica. 187

Tabela 12 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à

sustentabilidade ao constructo Trajetória Tecnológica.

189

Tabela 13 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Capacidades. 192

Tabela 14 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à

sustentabilidade ao constructo Capacidades.

193

Tabela 15 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo de Relações

Interorganizacionais.

197

Tabela 16 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à

sustentabilidade ao constructo de Relações Interorganizacionais.

198

Tabela 17 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados de inovação. 223

Tabela 18 - Matriz de constructos sobre apropriação de inovação e interveniência de

aspectos vinculados à sustentabilidade a serem explorados.

224

Tabela 19 - Constructos referentes a análise de interação interorganizacional

relacionados à apropriabilidade.

226

Tabela 20 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados em rede de

inovação.

229

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 14

1 INTRODUÇÃO AO DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE

BENEFÍCIOS EM UMA REDE DE INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA

DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

18

1.1 INTRODUÇÃO 18

1.2 REDES DE INOVAÇÃO 19

1.3 APROPRIAÇÃO DE RESULTADOS DE INOVAÇÕES 21

1.4 INOVAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 24

1.5 REDES DE INOVAÇÃO NA AMAZÔNIA E BIODIVERSIDADE 29

1.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS: LACUNAS NO CONHECIMENTO

SOBRE REDES DE INOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL NA AMAZÔNIA

35

2 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO UMA ALTERNATIVA

PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

37

2.1 INTRODUÇÃO 37

2.2 PARADIGMAS TECNOLÓGICOS 38

2.2.1 Trajetórias tecnológicas 41

2.2.2 Oportunidades tecnológicas 44

2.2.3 Convergência com o desenvolvimento sustentável 47

2.3 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO OPORTUNIDADE DE

DESENVOLVIMENTO NO PARÁ: O CONTEXTO EMPÍRICO DA

PESQUISA

51

2.3.1 Breve histórico sobre as bases institucionais da inovação 51

2.3.2 Biotecnologia como oportunidade de negócio 57

2.3.3 Cadeia produtiva do açaí e o potencial da exploração da biotecnologia 62

2.4 REGIME DE APROPRIABILIDADE 73

2.4.1 Mecanismos de apropriação de inovações 75

2.4.2 Convergência com o desenvolvimento sustentável 77

2.4.3 Apropriação sobre inovações baseadas na biodiversidade: regulamentação

de acesso ao patrimônio genético e regime de apropriabilidade

79

2.5 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 83

3 ATORES ORGANIZACIONAIS E SUAS CAPACIDADES 85

3.1 INTRODUÇÃO 85

3.2 RECURSOS E CAPACIDADES DAS ORGANIZAÇÕES 85

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3.2.1 Capacidades dinâmicas 87

3.2.2 Capacidades absortivas 88

3.2.3 Capacidades de inovação 90

3.2.4 Padrões de mudança técnica setorial 93

3.2.5 Acumulação tecnológica em países em desenvolvimento 98

3.2.6 Capacidades, aprendizado e apropriabilidade 104

3.2.7 Capacidades e sustentabilidade 106

3.3 ATORES ORGANIZACIONAIS 109

3.3.1 Universidade Federal do Pará 110

3.3.2 Amazon Dreams 116

3.3.3 Belaiaçá 125

3.4 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 134

4 REDE DE RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS E O PROCESSO

DE INOVAÇÃO

137

4.1 INTRODUÇÃO 137

4.2 FORMAS DE ORGANIZAÇÃO EM REDE 137

4.2.1 Estrutura de redes 138

4.2.2 Governança em organização em rede 140

4.2.3 Funções 141

4.2.4 Disfunções 144

4.3 REDES DE INOVAÇÃO E BIOTECNOLOGIA 145

4.3.1 Biotecnologia 147

4.4 GESTÃO DE PROCESSOS DE APROPRIABILIDADE EM REDES DE

INOVAÇÃO

150

4.5 COMPOSTOS ANTIOXIDANTES DE AÇAÍ: PROCESSO DE INOVAÇÃO

E RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS

153

4.5.1 O processo de inovação e as relações interorganizacionais 153

4.5.2 Benefícios identificados pelos atores organizacionais da rede de inovação

interorganizacional

177

4.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 180

5 CONCLUSÃO PARA O DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE

BENEFÍCIOS DA INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DO

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL À LUZ DA INOVAÇÃO EM

BIOTECNOLOGIA NA REDE INTERORGANIZACIONAL NO PARÁ

182

5.1 INTRODUÇÃO 182

5.2 REGIME DE APROPRIABILIDADE 182

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5.3 TRAJETÓRIA TECNOLÓGICA 187

5.4 CAPACIDADES 190

5.5 RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS 194

5.6 A GERAÇÃO DE BENEFÍCIOS COM A INOVAÇÃO E A PERSPECTIVA

DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

199

5.7 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 206

REFERÊNCIAS 211

APÊNDICE A – DESENHO TEÓRICO E METODOLOGIA DA PESQUISA 221

A.1 DESENHO TEÓRICO DA PESQUISA 221

A.1.1 DESENVOLVIMENTO DOS CONSTRUCTOS DE ANÁLISE 221

A.1.1.1 Apropriação da inovação 221

A.1.1.2 Interveniência de critérios de sustentabilidade 223

A.1.1.3 Estrutura e processos de redes interorganizacionais 224

A.1.1.4 Apuração de resultados da inovação (variável dependente) 226

A.1.2 NÍVEIS DE ANÁLISE DOS CONSTRUCTOS 227

A.1.3 CONTRIBUIÇÕES E LIMITAÇÕES DO DESENHO DE PESQUISA 229

A.2 METODOLOGIA 230

A.2.1 OBJETO DE ESTUDO 230

A.2.2 MÉTODO 231

A.2.3 TÉCNICAS DE COLETA DE DADOS 231

A.2.4 SELEÇÃO DE CASO PARA ESTUDO 232

A.2.5 LIMITAÇÕES DO MÉTODO 233

APÊNDICE B – ROTEIROS DE ENTREVISTAS 234

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14

APRESENTAÇÃO

Não é comum fazer apresentação em uma dissertação, mas escrevo este texto inicial na

intenção de expor dois importantes aspectos deste trabalho acadêmico. O primeiro aspecto é

buscar esclarecer minha relação com o objeto de pesquisa e o “lugar de onde falo”1. O

segundo aspecto é explicar a razão pela qual optei por não fazer uma dissertação no formato

comumente adotado nos Programas de Pós-Graduação, inclusive o PPAD da UNAMA.

O objeto desta dissertação versa sobre a temática de inovação na Amazônia. Este foi

construído de forma a discutir possíveis caminhos e descaminhos de uma rede de inovação

interorganizacional como oportunidade de promoção de desenvolvimento sustentável na

região. Esta rede de inovação nasce de uma parceria entre a Universidade Federal do Pará

(UFPA) e a pequena empresa Amazon Dreams, uma spin off da universidade, para

posteriormente abranger também uma agroindustrial local, a Belaiaçá.

Minha trajetória profissional até o mestrado foi marcada pela vivência na UFPA, onde

fiz meu curso de graduação. Ao concluí-lo, ingressei para trabalhar como bolsista em um

projeto de pesquisa sobre o estuário amazônico do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos

(NAEA) e, chegando ao seu fim, fui trabalhar na Fundação de Amparo e Desenvolvimento da

Pesquisa, que apoia o desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação na UFPA e em

outras organizações do estado e região. Assim, durante 12 anos tive contato com diversos

projetos da Universidade, envolvendo parcerias com organizações públicas e privadas,

acompanhando conflitos e cooperações, conquistas e fracassos por trás de cada convênio ou

contrato.

Neste contexto, houve muita repercussão na Universidade e em outras instituições de

pesquisa no Pará a aprovação da Lei de Inovação e seus desdobramentos políticos, porém

também foi (e continua sendo) muito difícil sua efetiva aplicação, seja por entraves jurídicos e

administrativos, seja pela colisão de posições quanto às diferentes papéis e mecanismos

vinculados à Universidade neste cenário político de fomento à inovação no país.

Quando tive a oportunidade de escolher o tema de pesquisa me direcionei à temática

de inovação na Amazônia, no âmbito da perspectiva que o desenvolvimento da região poderia

ser alcançado por meio da busca do conhecimento e avanço científico, o que noto ser

extremamente condizente com a trajetória percorrida por mim até então. E isso me torna

consciente de que estou neste campo temático para aprender a fazer ciência, mas também,

1 Termo utilizado por Eliane Barbosa da Conceição (2013) em sua tese de doutorado qual tomei a liberdade de

replicar e agradeço à inspiração.

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inevitavelmente, participo (com uma ínfima contribuição) do campo enquanto um ator no

processo coletivo que discute, cria convergências e divergências em busca do avanço de um

projeto de desenvolvimento para Amazônia e da Amazônia, baseado no conhecimento e na

inovação.

Ao reconhecer minha limitada capacidade de aprendiz neste campo, busquei construir

esta pesquisa centrando atenção a uma pequena iniciativa que, no entanto, retrata os grandes

esforços, muitas vezes isolados, de atores da esfera pública e privada para desenvolver uma

rede de inovação e alcançar um processo bem sucedido que gere transbordamentos à

sociedade e suscite um exemplo a ser seguido. E, assim, nutri-se a esperança de criar

conexões com outros projetos, emergindo o que possa ser efetivamente um espaço de

discussão e alinhamento de ações e políticas integradas de desenvolvimento à região.

Contudo, cabe aqui admitir que, se por lado esta minha vivência dentro da fronteira

entre Universidade e seus parceiros pode facilitar a visão de alguns processos internos e suas

relações; por outro lado, presume que sofri também de vícios de percepção. O que fui capaz

de ver na pesquisa e, também, o que não fui, são resultados de minha trajetória profissional e

acadêmica. Neste sentido, espero que este esclarecimento possa ajudar os leitores a

compreender melhor minhas falhas e expandir o canal de contribuição sobre minhas análises e

resultados.

Esse anseio de buscar conexões e integração influenciou o próprio formato

diferenciado desta dissertação. Este “fazer diferente” não deve ser visto como uma crítica ao

formato convencional em uso, mas sim como o exercício de desenvolver um ângulo diferente

para a bricolagem dos dados da pesquisa e da elaboração de análises.

Assim, esta dissertação não possui um capítulo específico para a discussão teórica ou

um capítulo para apresentação dos dados empíricos e análises. Inicio com um capítulo de

introdução ao debate das redes de inovação na Amazônia, a fim de contextualizar as questões

de pesquisa e definir um escopo da contribuição esperada deste trabalho.

A estrutura de desenvolvimento da dissertação está organizada por três (3) níveis de

análise: o contexto (1), os atores organizacionais (2) e suas relações interativas no processo de

inovação (3). Dentro de cada nível de análise, procurei integrar a orientação teórica, os dados

da investigação empírica e as análises específicas para, ao final, à guisa de conclusão, tentar

promover uma discussão integrada destes diferentes níveis de estudo, explorando as conexões

entre seus constructos. Esses três blocos contemplam:

- O capítulo dois trata sobre a análise contextual que engloba os constructos teóricos

de paradigma tecnológico e regime de apropriabilidade. Abrange também a pesquisa empírica

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16

sobre a trajetória de fomento à inovação no Pará e a emergência da oportunidade da

biotecnologia, fazendo a relação com a cadeia produtiva do açaí;

- No capítulo três, apresento os atores organizacionais que se ressaltaram no processo

de inovação em estudo em termos de capacidades. Para tanto, faço uma discussão teórica do

constructo de capacidades no nível organizacional e a caracterização empírica dessas

organizações que compõem a rede de inovação (Amazon Dreams, UFPA, Belaiaçá); e,

- No capítulo quatro, utilizo uma fundamentação teórica sobre redes de relações

interorganizacionais e desenvolvo a descrição e análise do processo de inovação em si,

incluindo a apuração dos resultados da inovação alcançados pelos membros da rede.

A orientação metodológica foi uma preocupação recorrente para que conseguisse

desenvolver o estudo, considerando esta diversidade de constructos e níveis análise sem,

entretanto, fragilizar o foco das perguntas de pesquisa. Deste modo, no apêndice A apresento

o desenho teórico detalhado e a metodologia da pesquisa.

Pelo tema a que me dedico neste trabalho, reconheço que toda inovação possui riscos,

assim, sei que esta inovação de formato traz vantagens e desvantagens para a elaboração do

trabalho e sua compreensão pelos leitores. Mas, me parece que neste campo, o arriscar faz

parte do aprendizado; e o desenvolver do formato em si, representou para mim uma

oportunidade de tentar um olhar diferente da realidade que possa contribuir, de alguma forma,

em meio aos demais olhares para o avanço do campo.

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Em agosto de 2012, a Natura Cosméticos S.A., maior fabricante

brasileira de cosméticos, lançou suas primeiras chamadas de projetos

de pesquisa científica, tecnológica e de inovação a serem executados

em parceria por meio da construção de redes colaborativas de

inovação. As propostas de projetos podiam envolver como

participantes instituições públicas, privadas e a sociedade civil

organizada.

Foram duas chamadas de projetos inicialmente lançadas: Uma de

escopo geral denominada de “Ciência, Tecnologia e Inovação”, e a

outra, denominada de “Amazônia”.

Para a primeira chamada, que estava aberta a propostas de

instituições nacionais ou internacionais, a Natura definiu entre suas

diferentes frentes de pesquisas para colaboração, estudos sobre o

próprio funcionamento de redes de inovação, buscando contemplar

“um olhar sociocultural, metodológico e ferramental para criar novas

interações, troca de conhecimento em redes de inteligência e

compartilhamento de riscos e resultados inerentes à inovação de

produtos, serviços e formas de comercialização da Natura”.

Para a segunda chamada (Amazônia), cujas propostas deveriam ser

lideradas por instituições com sede nos Estados da Amazônia Legal

Brasileira, foram selecionados como temas de pesquisa prioritários o

uso sustentável da sociobiodiversidade da região e a valorização

do conhecimento tradicional e da cultura regional.

(NATURA, 2012a, 2012b, grifo nosso).

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1 INTRODUÇÃO AO DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE BENEFÍCIOS EM

UMA REDE DE INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL

1.1 INTRODUÇÃO

Examinamos nesta dissertação como ocorre a apropriação de resultados de uma

inovação realizada por uma rede de relações interorganizacionais tecidas para o

desenvolvimento de produtos inovadores baseados em ativos da biodiversidade na região

amazônica. Especificamente, buscamos analisar as condições de apropriabilidade sobre a

inovação, e o modo efetivo de apropriação de resultados pela rede interorganizacional, e cada

uma de suas organizações membros.

A questão central da pesquisa foi: em que medida os resultados obtidos por um

processo de inovação em rede baseado em ativos da biodiversidade são apropriados por suas

organizações membros? Para o exame deste questionamento central é necessário entender,

primeiramente: quais fatores contribuem para a composição e dinâmica de uma rede de

inovação alicerçada em ativos da biodiversidade; quais os atributos são determinantes no

processo de inovação quando envolve ativos da diversidade biológica; e os critérios de

sustentabilidade socioambientais que influenciam as relações em redes de inovação na

Amazônia, particularmente nas condições de apropriabilidade.

O arcabouço teórico da pesquisa é delineado na interseção entre inovação e

desenvolvimento sustentável. Utilizamos as literaturas de inovação sustentável e de economia

e gestão de inovação, e procuramos explorar suas conexões com os conceitos de redes de

relações e sustentabilidade socioambiental.

O estudo tem como objeto empírico de análise uma rede de inovação estabelecida no

estado do Pará para produção e comercialização de compostos antioxidantes de açaí, que em

diferentes momentos do processo de inovação, apresentou entre seus membros organizações

como a Universidade Federal do Pará (UFPA), e as empresas Amazon Dreams e Belaiaçá.

Partimos do entendimento que a interação entre diferentes organizações é importante

para o desenvolvimento de inovações, e que a cooperação entre o público e o privado é

reconhecida como aliada do desenvolvimento sustentável, entretanto com a concepção que a

capacidade de um arranjo interorganizacional com atores que respondem por múltiplos, e não

sempre convergentes interesses, depende de uma estrutura social, política, legal e econômica

que priorize o interesse coletivo sobre o individual de cada organização.

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Por meio desta pesquisa esperamos contribuir para o debate da convergência dos

campos da inovação e do desenvolvimento sustentável, ao tentar compreender como atributos

característicos da análise de sustentabilidade (aspectos socioambientais) podem influenciar na

análise e aplicação do conceito de apropriação da inovação, e consideramos que esta

contribuição pode gerar subsídios tanto no campo da gestão da inovação em organizações,

quanto das políticas públicas de promoção de inovação e desenvolvimento regional.

Para consubstanciar um debate inicial sobre o problema de pesquisa, este capítulo foi

estruturado de forma a primeiro discutir no âmbito conceitual questões que se apresentam

como desafiadoras na literatura sobre redes de inovação (1.1), apropriação dos resultados de

inovação (1.2) e a relação entre inovação e o desenvolvimento sustentável (1.3). Assim,

buscamos estabelecer as bases para a problematização de redes de inovação na Amazônia e

biodiversidade (1.4) e, deste modo levantarmos os fundamentos para a compreensão sobre a

apropriação de benefícios em uma rede de inovação sob a perspectiva do desenvolvimento

sustentável.

1.2 REDES DE INOVAÇÃO

A inovação tem sido considerada fator chave para a competitividade das empresas por

vários autores (CASSIOLATO; LASTRES, 1998, p. 8; REZENDE; TAFNER, 2005, p. 46),

uma vez que a capacidade de inovar de forma sistemática é considerada como uma fonte de

vantagem competitiva (TEECE; PISANO; SHUEN, 1997, p. 515). A inovação torna as

empresas aptas a desenvolver constantemente novas respostas às necessidades dos clientes, ao

mesmo tempo em que dificulta sua imitação pelos concorrentes, reforçando sua distinção

estratégica (TEECE; PISANO; SHUEN, 1997, p. 515).

Ao analisar a estrutura institucional da inovação na economia capitalista, Teece (1989,

p. 35) observa que os processos de inovação vêm sendo desenvolvidos por uma variedade de

relações entre diferentes empresas, e destas com outros tipos de organizações, como

universidades e institutos de pesquisa, sendo que tais vínculos estabelecem impactos

significativos em termos de resultado sobre a produtividade e lucratividade dessas empresas.

Gulati e Singh (1998, p. 781) demonstram em seu estudo sobre as estruturas de

governanças em redes interorganizacionais uma expansão destes formatos nas últimas

décadas, e argumentam que a relevância desta ampliação de formatos de redes reflete-se não

somente em um crescimento quantitativo destas parcerias, mas em termos de diversidade de

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escopo e objetivos dessas relações, além da multiplicidade da nacionalidade e natureza dos

parceiros.

Vários são os motivos que podem levar a formação de redes de parcerias para o

desenvolvimento de inovações, como a complementaridade de recursos e competências, o

acesso estratégico a novos mercados, ou o compartilhamento de investimentos e riscos

inerentes ao processo (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996; POWELL; GRODAL,

2005).

Powell e Grodal (2005, p.58) mostram que as redes envolvendo empresas,

universidades e órgãos governamentais são críticas para o desenvolvimento de muitas

indústrias, principalmente em campos de intenso avanço tecnológico, como computadores,

semicondutores, farmacêutica e biotecnologia. Estes setores econômicos apresentam uma base

de conhecimentos que se expande rapidamente, impulsionando também o desenvolvimento

tecnológico, de modo que se tornam cada vez mais complexos (POWELL; KOPUT; SMITH-

DOERR, 1996, p. 142).

Para Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p. 142), a necessidade de incorporação

destes novos conhecimentos e tecnologias nos processos de inovação das empresas nestes

setores faz com que o lócus da inovação não possa mais se restringir a atividades internas de

uma única organização, passando a estar predominantemente em redes de parcerias

interorganizacionais, onde se constroem os processos de aprendizado indispensáveis à

inovação.

No entanto, se por um lado, as redes de inovação surgem como formatos

organizacionais adequados, ou mesmo necessários, para o desenvolvimento de inovações, por

outro lado, a articulação em rede impacta profundamente a forma como as organizações

inovam (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 660), demandando um novo conjunto de

capacidades e processos para sua gestão.

As redes de inovação se apresentam de várias formas, tanto baseadas em acordos

formais (contratos de cooperação, alianças estratégicas, joint ventures), como laços informais

de associações ou comunidades tecnológicas, e podem ainda abranger diferentes períodos

temporais (curto e longo prazo), e uma combinação distinta de características quanto à

flexibilidade, autonomia, responsividade e coordenação (POWELL; GRODAL, 2005, p. 60).

Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661) analisam que, tendo as redes de inovação

características de uma organização frouxamente acoplada, a orquestração da rede torna-se

essencial de forma a assegurar tanto a criação de valor (via inovação) como a apropriação

equitativa deste valor pelas organizações membros da rede.

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1.3 APROPRIAÇÃO DE RESULTADOS DE INOVAÇÕES

A apropriação dos resultados da inovação é realçada nas relações em redes de

inovação, em virtude de sua característica de dualidade entre a ação conjunta da rede

(cooperativa) e escolhas particulares das organizações que a compõe (competitivas), que cria

uma tensão entre interesses coletivos e individuais. Contudo, o conceito de apropriação não

representa uma apreensão exclusiva das redes de inovação, estando presente de forma geral na

literatura de economia da inovação.

Dosi (1988, p. 1139) indica que a apropriação privada dos benefícios da inovação é

concebida tanto como incentivo necessário ao esforço de inovação, quanto o resultado

alcançado pelo processo inovativo, representado, por exemplo, pelos rendimentos econômicos

efetivamente gerados pela inovação auferidos pela empresa inovadora.

Neste sentido, a apropriabilidade corresponde às condições tecnológicas, institucionais

e econômicas que permitem o desenvolvimento da inovação e sua proteção, como ativo

rentável, contra possíveis imitadores, enfatizando-a como fator necessário para gerar

comprometimento das empresas com processos de inovação (DOSI, 1988, p. 1140).

Teece (1986, p. 285) ressalta a preocupação com o fato de que muitas vezes as

empresas inovadoras não conseguirem captar os rendimentos gerados por suas inovações,

uma vez que, devido aos processos de transbordamentos da inovação, estes podem ser

distribuídos entre os demais atores de mercado, como seus concorrentes, fornecedores ou

clientes. O autor ilustra essa apreensão citando um caso clássico envolvendo a Electrical

Musical Industries (EMI).

A EMI lançou o primeiro equipamento de tomografia computadorizada do mundo no

início dos anos de 1970, e a tecnologia desenvolvida foi reconhecida como o maior avanço na

área da radiologia desde a descoberta dos raios-x. Todavia, apesar do equipamento inovador

ter tido pleno sucesso na área médico-hospitalar, a EMI em menos de dez (10) anos de

comercialização saiu desse ramo de negócios, sem conseguir competir com as grandes

empresas tradicionais da área, que continuaram fabricando este tipo de equipamento (TEECE,

1986, p. 286).

Diante de casos como este, Teece (1986, p. 286) propôs um referencial teórico com

três blocos de fatores explicativos para melhor compreender a dinâmica de apropriação de

resultados da inovação. O primeiro é o regime de apropriabilidade que corresponde um a

conjunto de fatores externos à empresa que influenciam a capacidade do inovador em reter os

lucros gerados pela inovação. As dimensões indicadas como mais importantes deste regime

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são a natureza da tecnologia do setor (mecânica, química,...) e a eficácia da proteção de

instrumentos legais à inovação, como regulamentações sobre propriedades industriais e

comércio internacional (TEECE, 1986, p. 287).

O segundo fator relevante para estudo dos mecanismos de apropriação refere-se ao

domínio de um design ou padrão tecnológico industrial específico em um determinado setor.

Teece (1986, p. 288) indica que o desenvolvimento de inovações tecnológicas pode ser

interpretado em similaridade com a evolução científica, apresentando dois estágios distintos:

um estágio pré paradigmático ou de ruptura de paradigma, e outro estágio caracterizado por

paradigma dominante consolidado.

Na correlação com o desenvolvimento industrial de inovações tecnológicas, o primeiro

estágio representa um período de implementação de inovações radicais, apresentando projetos

de produtos fluídos e processos de produção adaptativos, com baixo grau de especialização de

equipamentos e plantas industriais, de modo que a competição entre as empresas no setor é

marcada pela disputa de propostas de projetos e designs diferenciados com ênfase na inovação

de produtos (TEECE, 1986).

Entretanto, em certo ponto, um design começa a emergir como dominante, tornando-se

referência para o setor, é o segundo estágio, onde há a consolidação de um padrão industrial.

Neste estágio, um conjunto de necessidades especializadas passa a ser requerido para o

aperfeiçoamento da tecnologia dominante, com a ênfase de desenvolvimento de inovações

incrementais, e a dinâmica de competição altera-se para o nível de preços, a escala de

produção e a aceleração da curva de aprendizado, com ênfase na inovação de processos

(TEECE, 1986, p. 288; TEECE, 2006, p. 1133).

Teece (1986, p. 288) defende que a identificação do estágio do setor em que uma

empresa está atuando é imprescindível para adoção de estratégias mais adequadas de

competição e apropriação pelas empresas, bem como para o desenvolvimento de capacidades

específicas.

E, a última das três categorias de análise sugeridas por Teece (1986, p. 288) é a posse

de ativos complementares que representam um conjunto de capacidades, como serviços de

logística, produção e estrutura de marketing e pós venda, os quais podem não estar na

essência da inovação desenvolvida, mas são indispensáveis para sua inserção com sucesso no

mercado. Caso a empresa inovadora não possua os ativos complementares necessários para

sua inovação, estará em uma posição frágil para apropriar-se de seus resultados.

A questão da apropriabilidade também é tratada por Pavitt (1984, p. 355), em sua

pesquisa sobre padrões setoriais de mudança tecnológica, que a considera um dos fatores

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relevantes na determinação da taxa e direção de implementações de inovações e mudanças

tecnológicas. Para este autor a apropriabilidade relaciona-se às possibilidades dos inovadores

se apropriarem de parte suficiente dos benefícios gerados por suas inovações que justifiquem

seus esforços e investimentos, e esta pode apresentar diversos mecanismos de

operacionalização, como patentes, segredo industrial e desenvolvimento de capacidades e

conhecimentos específicos (PAVITT, 1984, p. 355).

Cabe ressaltar que a discussão sobre apropriabilidade origina-se pela própria natureza

do processo de inovação, pois não é possível ao inovador apropriar-se integralmente de

benefícios gerados pela inovação. Isso ocorre seja em razão de benefícios representados por

avanços tecnológicos ou de ampliação da base conhecimentos, visto que estes possuem

equilíbrio específico entre aspectos de bens públicos (coletivos) e fatores apropriáveis

privadamente (proprietários) (DOSI, 1988, p. 1139; PAVITT, 1984, p. 348). Ou ainda, por

benefícios referentes a resultados econômicos, em virtude de processos de difusão da

inovação no sistema de produção e consumo (OCDE, 2007, p. 24).

Neste aspecto, Maculan (2010, p. 166) ressalta a tensão existente entre a importância

de prover condições de apropriação de inovações que estimule os esforços inovativos de

potenciais inovadores por um lado, e a busca pela “ciência aberta” que gere oportunidades de

compartilhamento do conhecimento para a disseminação de melhorias de práticas produtivas e

de fontes de novas inovações a sociedade, por outro lado.

Maculan (2010, p. 170) enfatiza dois aspectos desta tensão nos processos de

desenvolvimento de inovações atuais, a interação cooperativa e a centralidade do

conhecimento, que criam a necessidade de reflexão sobre as modalidades possíveis de

cooperação e os impactos dessas sobre a apropriação por diversos atores.

A maior interação entre organizações diferentes em redes de inovação representa

oportunidade estratégica para as empresas, porém, com risco elevado, pela incerteza inerente

ao processo de inovação e pelo acesso concedido a recursos intangíveis internos como

informações e conhecimentos, o que demandaria fortalecimento dos mecanismos de

apropriação por estas (MACULAN, 2010, p. 170). Enquanto a centralidade do conhecimento

baseada na atuação de diferentes organizações geradoras de conhecimento, tais como

universidades e institutos de pesquisa públicos, realça a necessidade de modalidades de

circulação, compartilhamento e difusão do conhecimento na sociedade (MACULAN, 2010, p.

170). Desta forma, dar-se evidência ao potencial conflito entre as demandas de fortalecimento

de mecanismos de apropriação e a importância da difusão da ciência e do conhecimento.

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Essa tensão cria um debate sobre qual seria o ponto de equilíbrio em termos de

políticas públicas e formatos institucionais que permitisse garantir condições adequadas de

apropriabilidade a atores inovadores, e expandir oportunidades de disseminação de

conhecimentos e avanços tecnológicos a toda a sociedade, cujo pano de fundo é o papel

relevante da inovação para o processo de desenvolvimento das sociedades, que se aprofunda

com as discussões sobre desenvolvimento sustentável.

1.4 INOVAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A relação entre inovação e desenvolvimento econômico não é recente, Freeman (1995,

p. 5) retrata estudos pioneiros de Friedrich List no final do século XIX sobre desenvolvimento

industrial e catching up da Alemanha, fundamentados sobre ideias de acumulação de

conhecimento e valorização da capacitação e aprendizagem tecnológica em seu Sistema

Nacional de Economia Política (1841).

No início do século XX, Schumpeter (1997) introduz a inovação no centro do sistema

econômico como a fonte de mudança que, pela inserção de novos produtos, processos e

suprimentos, ou mesmo pela criação de novos mercados e setores industriais, impõe um

processo evolucionário de desenvolvimento econômico.

Tigre (2005, p. 207) ressalta que os trabalhos de Schumpeter são retomados pela

corrente evolucionista ou neoschumpeteriana a partir da segunda metade do século XX. As

novas teorias iluminam o progresso técnico como variável chave para a compreensão do

processo evolucionário da firma e do mercado, tendo entre seus princípios que a dinâmica

econômica é baseada em inovações (TIGRE, 2005, p. 208).

De forma geral, entende-se que a capacidade de aprender e inovar de empresas,

ancorada em interações dinâmicas com outras instituições (universidades e institutos de

pesquisa, governo, sindicatos), permite a melhoria de produtividade no sistema econômico

nacional, convergindo-se na chamada competitividade autêntica de países (VIOTTI, 2003;

CASSIOLATO; LASTRES, 1998).

Contudo, a ampliação do escopo das discussões sobre desenvolvimento lançaria nova

luz à dinâmica da inovação. Segundo Sachs (2008, p. 30), a reflexão sobre desenvolvimento e

a construção de modelos como se conhece atualmente começou na década de 1940 no pós-

guerra com objetivos de reconstrução de países afetados pela guerra e da busca de superação

de problemas sociais e econômicos em países periféricos no âmbito das disputas entre o bloco

capitalista e o socialista.

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A partir 1970, se fortalece na ONU e em outros círculos, como o Clube de Roma, um

debate que visava incluir na agenda de desenvolvimento, além das preocupações econômicas

e sociais, às questões relacionadas ao meio ambiente, surgindo o conceito de desenvolvimento

sustentável no contexto da Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento

(CMMAD) das Nações Unidas, estabelecendo princípios norteadores de sustentabilidade

ambiental, social e de viabilidade econômica (SACHS, 2008, p. 36).

Mas Becker (2010, p. 17) em uma análise crítica da atuação da CMMAD quanto à

disseminação da agenda de preservação ambiental e do desenvolvimento sustentável em nível

mundial, entende que os trabalhos da Comissão não trouxeram novidades relevantes no

campo conceitual, mas sim cumpriram papel no campo político, criando espaços para uma

grande pressão geopolítica de países centrais sobre aqueles periféricos, muitos destes com

recursos ambientais abundantes e elevada demanda por acelerar seus processos de

crescimento econômico.

Para Becker (2010, p. 17) enquanto a proposta de desenvolvimento sustentável é

lançada aos países periféricos por meio de recomendações de políticas de contenção

demográfica, de preservação ambiental e desenvolvimento endógeno, nos países centrais o

movimento baseia-se no avanço científico-tecnológico com a máxima eficiência e qualidade

nos processos produtivos, com pesquisas sobre novos materiais e fontes de energia. Assim,

diferentes perspectivas sobre desenvolvimento sustentável e suas respectivas estratégias

passariam a ser concebidas em países desenvolvidos e em países em fases de

desenvolvimento.

Outra crítica sobre o conceito de desenvolvimento sustentável é ressaltada por

Rennings (2000, p. 321) que reconhece a existência de um contínuo debate sobre a

possibilidade de sua definição operacional, que para alguns chega a representar um ideal

heurístico, portanto, um processo não determinístico que não pode ser plenamente definido ex

ante. Porém, independente dessas interpretações, o autor considera que qualquer ação

concreta em busca de tal conceito exige o delineamento da direção e dos problemas alvos a

serem enfrentados e deve contemplar dois fatores chaves: a multiplicidade de dimensões

(econômica, social e ambiental) e a necessidade de inovações substanciais (RENNINGS,

2000, p. 321). Isso porque nos complexos sistemas de produção e consumo mundiais atuais,

os elos interdependentes de cadeias de suprimentos e as travas de infraestrutura e de

conhecimento representam desafios que requerem um conjunto de inovações, tanto de

natureza incrementais, quanto (e principalmente) radicais, que perpassam as atividades diárias

das empresas, governos e cidadãos.

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Neste contexto, Brito e Berardi (2010, p. 156) entendem que a inserção da

sustentabilidade na agenda das organizações empresariais, pela incorporação da

responsabilidade socioambiental, tem envolvido duas perspectivas. Uma abordagem

institucionalista em que sobressaem esforços de indução de regulamentações governamentais

e pressões de grupos da sociedade civil para engajamento das empresas em busca de

legitimação social (BRITO; BERARDI, 2010, p. 163). A outra abordagem tem como foco o

alcance de melhor desempenho econômico e ambiental, e baseia-se em incentivos

relacionados à maior eficiência de recursos, com redução de custos ou exploração de

oportunidades para novos negócios (PORTER; VAN DER LINDE, 1993, p. 372; HART;

MILSTEIN, 2004, p.66).

Sobre o confronto de perspectivas que buscam lidar com a temática, Rennings (2000,

p. 329) defende a necessidade de pluralismo. Ele reconhece limitações nos instrumentos de

mercado para indução de inovações para o desenvolvimento sustentável, principalmente

aquelas que se constituírem em mudanças radicais, em função de falhas de mercado, seja pela

não internalização de custos ambientais por concorrentes, seja pela possibilidade de

transbordamento de externalidades positivas do avanço inovativo a estes, tendo como

consequência a percepção de não apropriabilidade de benefícios pelo inovador (RENNINGS,

2000, p. 325).

Neste caso, as inovações direcionadas para a sustentabilidade demandam apoio

regulatório e medidas específicas de estímulos à inovação, não somente tecnológica, mas

também de caráter institucional e social (RENNINGS, 2000, p. 326). Entretanto, Rennings

(2000, p. 330) ressalva que inovações incrementais, importantes para melhoria contínua dos

processos e produtos, poderiam ser abrangidas por instrumentos de mercado, defendendo uma

visão integrada das abordagens econômicas.

Seja por questões institucionais ou pelo direcionamento de forças de mercado, a busca

de meios de operação mais sustentáveis pelas empresas engloba uma série de desafios. Daroit

e Nascimento (2004, p. 1) ressaltam implicações quanto à modificação dos pressupostos de

gestão e desempenho nas empresas, uma vez que se passa a exigir destas uma nova

configuração de capacidades para inovar e provocam-se mudanças em processos, estruturas

organizacionais e padrões tecnológicos.

Boons e Lüdeke-Freund (2012, p. 8) ao pesquisar sobre modelos de negócios para

inovação sustentável indicam que estes devem basear sua proposição de valor na concertação

de objetivos e métricas econômicas, ecológicas e sociais, de modo que o desenvolvimento de

inovações orientadas para a sustentabilidade requer inter relações de diversos atores para

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complementaridade de recursos e alinhamento de demandas no decorrer do processo de

transição de regimes tecnológicos, envolvendo redes interorganizacionais para sua execução.

Similarmente, Kleef e Roome (2007, p. 38), ao estudar as capacidades para a gestão de

negócios sustentáveis com foco em inovação, também encontram evidências da importância

da organização em redes. Esses autores defendem que as redes de inovação para

sustentabilidade tornam-se mais complexas por demandar capacidades distintas das redes de

inovação sem exigência de atendimento a requisitos socioambientais.

De acordo com Kleef e Roome (2007, p. 44), a colaboração de atores em redes para o

desenvolvimento de inovação sustentável apresenta as seguintes bases principais: orientação a

problemas, aprendizado e ação conjuntos, e a construção de conhecimento dependente do

contexto. Tais bases exigem uma diversidade maior de atores, com uma perspectiva

includente, de modo que representem as dimensões e interesses relacionados ao problema

para o qual a inovação será orientada, bem como requer a capacidade de proporcionar o

aprendizado em múltiplos níveis de análise, com a ação contextualizada localmente,

regionalmente e globalmente (KLEEF; ROOME, 2007, p. 44).

Neste ponto, é possível retomar a temática de redes de inovação, especificamente sob

a perspectiva do desenvolvimento sustentável, ao considerarmos a relevância da interação

entre esses temas e novas questões referentes à apropriabilidade que surgem em um cenário

mais complexo. Sob o ponto de vista da constituição de condições de incentivo às inovações

sustentáveis, entendemos que se acrescentam novos requisitos institucionais, tanto por novas

regulamentações socioambientais, como selos e certificações de referência nacional e

internacional (seja implementado pelo poder público, seja exigido por integrantes do

mercado), quanto pelo estabelecimento de mecanismos especiais de proteção, como a criação

pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) da categoria de “patentes verdes” que

recebem prioridade de análise (INPI, 2013).

No entanto, do outro lado da balança, compreendemos que se potencializam as

relações de conflito entre a importância de mecanismos de difusão para tecnologias

sustentáveis com vistas ao atendimento de interesses coletivos frente às proteções

proprietárias sobre tais inovações, as quais teriam sido em si também concebidas de acordo

com princípios de sustentabilidade. Questões como estas suscitam esforços para maior

compreensão dos conflitos e formas de construção coletiva de soluções.

Destaca-se também o tema da distribuição equitativa da apropriação de resultados de

inovação, quando estes são realizados no âmbito de uma rede. Zílio et al (2007, p. 10) em

apresentação de caso sobre a gestão de inovação da empresa Natura S.A. reconhecem como

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estratégico para inovação em rede a gestão da apropriação de inovações, entendida como

meio para assegurar a contínua colaboração de parceiros nas redes. Assim, descrevem que a

Natura S.A. “estabeleceu um processo de distribuição do valor de cada inovação entre os

diversos atores”, com “preocupação de manter uma estrutura justa de trabalho conjunta”

(ZÍLIO et al, 2007, p. 11, grifo nosso).

Gulati e Singh (1998, p. 788) ao estudar estruturas de governança em redes

interorganizações também discorrem sobre preocupações com a apropriabilidade, entendendo

esta como a habilidade de capturar o justo compartilhamento dos resultados das parcerias

implementadas. Isso em virtude de que nesse cenário de atuação em redes surge uma série

incertezas associadas a problemas coordenação de atividades interorganizacionais, além de

possíveis ameaças de comportamentos oportunistas, pela dificuldade de avaliar a contribuição

dos parceiros. Considera-se que a proposição de “justo compartilhamento” de resultados entre

os membros de uma rede demonstra-se assertiva em reconhecer a interdependência decorrente

das atividades colaborativas que em geral abrangem uma combinação de ações de cooperação

imbricadas. Porém, não se encontra nestes trabalhos um aprofundamento maior sobre critérios

que regeriam a distribuição “justa”, ou os procedimentos conjuntos entre os membros da rede

que conduziram a construção das distribuições acordadas.

Contudo, em um sentido ampliado, consideramos que discussões sobre distribuição

equitativa também podem se aplicar em termos de uma cadeia de valor em si, de forma que a

visão sobre os benefícios da inovação seja entendida como relevante não somente ao nível de

empresas individuais, mas para construção de sustentabilidade de setores nacionais. E, assim,

possa direcionar políticas de desenvolvimento em uma perspectiva includente perante a

diversidade de atores em uma cadeia produtiva.

Apesar da complexidade da problemática da aplicação de conceitos de inovação

atrelados à sustentabilidade, este é o caminho apontado por Becker (2010, p. 24) para o

desenvolvimento sustentável na região Amazônica. Becker (2010, p. 24) defende que para

alcance do desenvolvimento sustentável da Amazônia, é necessária uma revolução científico-

tecnológica baseada em um novo modo de produzir com foco em cadeias produtivas da

biodiversidade e serviços ambientais, que garanta a geração de inovações e o

desenvolvimento regional.

A trajetória histórica da Amazônia como uma região periférica, e pensada

exogenamente, tem se baseado em um modelo econômico primário exportador ancorado em

commodities relacionadas ao extrativismo madeireiro, mineração e agropecuária, cujos

processos, em geral, têm apresentado forte geração de impacto ambiental. Para Enríquez

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29

(2013), a região Amazônica foi considerada uma reserva de recursos naturais para regiões

mais desenvolvidas. O estímulo a atividades como a pecuária, indústria madeireira e a

propagação da produção da soja, apesar de ter elevado a renda regional, não proporcionou

uma equidade social adequada, e se desvia da construção de um modelo de sustentabilidade

para região (ENRÍQUEZ, 2013).

Ao considerar esta trajetória, o tamanho do salto para alcance do desenvolvimento da

região representa um desafio de criatividade e de inovação (BECKER, 2009, p. 39). Não

obstante a Amazônia tenha se tornado foco de discussões com forte pressão preservacionista,

Becker (2010, p. 21) salienta que a geração de desenvolvimento sustentável na região

demanda esforços bem superiores àqueles relacionados a incentivos que visem preservar

florestas intactas, ou seja, é necessário articular atividades de conservação com

desenvolvimento regional efetivo. A solução estaria na atribuição de valor econômico à

floresta, de forma a competir e superar as commodities (GCEE, 2006a, p.7).

1.5 REDES DE INOVAÇÃO NA AMAZÔNIA E BIODIVERSIDADE

Em trabalho do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE, 2006a, p.7; 2007, p.

144), vinculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a biodiversidade

amazônica é vista como elemento fundamental ao desenvolvimento regional e nacional,

considerando a própria magnitude potencial de biodiversidade do Brasil estimada em 20% de

toda a biodiversidade existente no mundo. Como oportunidades para geração de valor

econômico baseado na biodiversidade e alinhadas com aspectos socioambientais são

sugeridas seis categorias de atividades: patrimônio natural, ecoturismo, serviços ambientais,

agricultura, extrativismo e bioprospecção (CGEE, 2006a, p.12).

Em relação à bioprospecção, esta abrange a exploração e descoberta de aplicações dos

recursos genéticos e bioquímicos da biodiversidade, cuja utilização engloba diversas áreas

como: saúde e nutrição, cosméticos, e higiene pessoal, além de produtos mais sofisticados

como fármacos, incluindo fitoterápicos, bioenergia e agronegócio (CGEE, 2006a, p. 13).

Neste sentido, Enríquez (2013) destaca a bioindústria como um mecanismo essencial

para, por meio da inovação tecnológica, agregar valor aos produtos da biodiversidade

amazônica. No entanto, o autor afirma que, embora já existam como experiências pilotos de

bioindústrias na região, principalmente apoiadas em incubadoras e parques tecnológicos, para

que estas se transformem em uma estratégia de desenvolvimento regional é necessário a

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30

implantação de políticas públicas específicas e proporcionar escala de produção à

biodiversidade.

Cabe acrescentar que a valorização da biodiversidade não tem seu fortalecimento

amparado somente no crescimento da demanda de produtos, como fármacos e cosméticos, ou

em demais serviços ambientais vinculados a atividades produtivas ou de bem estar na

sociedade (CGEE, 2006a, p. 21). Sua importância também se encontra em proporcionar

avanços na fronteira do conhecimento científico em si, por meio de novas descobertas, como

o desenvolvimento da biotecnologia e da biologia molecular (CGEE, 2006a, p. 21).

Assim, a biodiversidade da Amazônia é entendida como área de atuação potencial para

a integração de atividades de pesquisas científicas e produção de bens de serviços, com a

geração de inovações, visando à promoção o desenvolvimento regional (CGEE, 2006a, p. 6).

Contudo, muitos são os desafios a percorrer para que este fator potencial de desenvolvimento

torne-se efetivo, envolvendo não somente o esforço de construção de bases à inovação

tecnológica, mas principalmente referentes a inovações institucionais e sociais.

O CGEE ressalta alguns desses desafios. Um deles é a insuficiência de conhecimento

científico e tecnológico para o aproveitamento sustentável da biodiversidade, pois da

estimativa de 20% do estoque total de diversidade biológica mundial existente na Amazônia,

seu conhecimento corresponde a somente 1% do acervo científico mundial das coleções

biológicas (CGEE, 2006a, p. 7).

Também é problemático o reconhecimento não só de valor econômico, mas também

do valor estratégico da biodiversidade e dos serviços ambientais, pois são de difícil

mensuração, englobando um conjunto de relações complexas relacionadas ao próprio valor de

existência destes recursos, e seu componente de poder, seja pela concentração deste estoque,

seja pela possibilidade de dispor de serviços sem equivalente no planeta (BECKER, 2009, p.

120).

Neste sentido, o estabelecimento de um quadro regulatório de atribuição de valor ao

conjunto de serviços naturais que seja claro e consistente com interesses nacionais e regionais,

considerando-se ainda regras do jogo internacional, torna-se urgente (BECKER, 2009, p.

120). Becker (2009, p. 120) cita como exemplo sobre a falta de regulamentação de valor

econômico a serviços ambientais o caso da comercialização do carbono, o qual até o momento

somente foi estabelecido pelo mercado em termos de preço, tratando-se de uma valoração

extremamente limitada. Ainda que se reconheça a existência de controvérsias sobre os reais

efeitos do carbono na atmosfera do planeta, o exemplo demonstra que a falta de relevância

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política e estratégica concedida a determinados serviços ambientais implica em uma

fragilidade institucional a sua efetiva valorização econômica.

No que tange especificamente à biodiversidade, sua proteção tornou-se objeto da

Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) firmada pelo Brasil durante a Conferência das

Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1992, e aprovada pelo

Congresso Nacional em 1994 (MMA, 2000, p. 7). A CDB busca estabelecer uma base de

regulação sobre o uso e a apropriação de recursos genéticos, e constituir um fórum global de

discussão e superação de conflitos, sendo destacada a tensão entre países detentores de

biodiversidade, que pretendem garantir oportunidades de aproveitamento econômico e social

com controle sobre estes recursos, e aqueles países avançados tecnologicamente no seu uso e

manuseio, que demandam acesso a tais recursos (ALBAGLI, 2005, p. 20).

Contudo, apesar do Brasil ter assinado a CDB no início de 1990, somente em 2000,

por meio de medida provisória do Governo Federal, é estabelecido um regulamento nacional

sobre o acesso e proteção ao patrimônio genético e conhecimento tradicional associado,

contemplando a repartição de benefícios e o acesso, desenvolvimento e transferência de

tecnologia para sua conservação (Medida Provisória 2.052/00, posteriormente substituída pela

Medida Provisória 2.186-16/01).

E em 2002, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), organismo

nacional deliberativo e normativo sobre o tema, efetivamente inicia suas operações, entretanto

seu funcionamento apresenta limitações, tanto em decorrência de problemas de natureza

operacional, como por falta de clareza conceitual da legislação em vigor (CGEE, 2006a, p.

127).

Embora se reconheça que a CDB representou um avanço no âmbito de negociações

internacionais, e que a construção nacional de quadro institucional sobre temática tenha

buscado formar bases de regulamentação sobre o uso de recursos genéticos e de

conhecimentos tradicionais associados, Albagli (2005, p. 23) defende que, além de

instrumentos legais de proteção e garantia de apropriação sobre estes recursos e

conhecimentos, são necessárias estratégias mais amplas, envolvendo questões culturais,

políticas e econômicas.

O debate quanto ao uso e apropriação justos dos recursos genéticos e dos

conhecimentos tradicionais associados está em aberto. Segundo a página do CGEN no site do

MMA:

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32

Historicamente, o uso dos recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais

associados têm ocorrido de forma injusta. A importante contribuição destes

componentes para o desenvolvimento de novos produtos comerciais, muitos deles patenteados, tem sido apropriada pelos países desenvolvidos sem que tenha havido

previamente alguma solicitação para o acesso, o respeito a algum tipo de

consentimento prévio ou alguma forma de repartição de benefícios para com os

países de origem da biodiversidade ou para com as comunidades tradicionais detentoras. (MMA, 2001, não paginado).

Conforme Albagli (2005, p. 19), não obstante os esforços da CDB, acentua-se uma

tendência de apropriação privada por grupos econômicos e produtivos dominantes

tecnologicamente de informações e conhecimentos sobre a biodiversidade, por meio de

instrumentos legais cada vez mais rigorosos de proteção a patentes e outras formas de

propriedade intelectual estabelecidas por acordos internacionais.

Grande parte da discussão gira em torno do modo como tem ocorrido a apropriação

dos resultados de inovações baseadas em elementos da biodiversidade brasileira, com

destaque à amazônica, entre empresas, governo e comunidades, considerando seus impactos

no desenvolvimento regional e nacional. A apropriabilidade neste caso específico tem como

um dos pontos importantes do debate realçado por Albagli (2005, p. 25) sobre o entendimento

da natureza privada (sujeita a apropriação) e pública (interesse coletivo de bens de uso

comum) desses recursos da biodiversidade, principalmente de seu conhecimento tradicional.

O conhecimento tradicional sobre uso e manuseio da biodiversidade é relevante ao

desenvolvimento de inovações, pois pode direcionar prioridades de pesquisa e bioprospecção,

conforme características previamente conhecidas pelas populações locais, contudo este

conhecimento não é protegido por sistemas existentes de propriedade intelectual (ALBAGLI,

2005, p. 20). Assim, a falta de instrumentos adequados de proteção sobre este tipo de

conhecimento implica em uma frágil capacidade de proporcionar direitos de apropriação de

seu uso por seus detentores, quando envolvidos no desenvolvimento de inovações, em

comparação aos métodos de proteção de propriedade industrial hoje já estabelecidos, tais

como patentes, desenhos industriais e marcas.

A CDB busca introduzir algumas recomendações no tratamento dos recursos da

biodiversidade (ALBAGLI, 2005, p. 24). Reconhece a autoridade (direitos e deveres) dos

Estados nacionais sobre estes recursos, e vincula sua conservação ao uso sustentável e

incorpora preocupações específicas em relação interesses das populações tradicionais, além de

aconselhar que benefícios decorrentes da utilização de tais recursos sejam compartilhados de

forma justa e equitativa.

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Entretanto, a temática ainda é nova e faz permear muitas dúvidas sobre a

operacionalização destas diretrizes em relação à apropriabilidade de inovações. As análises

abrangem um conjunto diverso de assuntos, pois mesclam categorias de investigação típicas

de inovação, como regimes de apropriabilidade e características tecnológicas de setores

específicos, com temas relacionados às políticas de desenvolvimento regional e atendimento

de necessidades locais.

Consideramos que explorar as conexões entre esses assuntos deve ser aplicado de

modo a encontrar formas de assegurar o estabelecimento de arranjos institucionais na

Amazônia que gerem condições de incentivo ao investimento e esforços de inovação, ao

mesmo tempo em que promovam o compromisso aos critérios de sustentabilidade e

desenvolvimento regional.

Especificamente em relação à biotecnologia, Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p.

123) apontam que esta corresponde um conjunto de tecnologias que envolve várias indústrias,

como farmacêutica, química, agricultura, energia, medicina, entre outras. Enquanto é possível

realçar suas oportunidades, como citado anteriormente, cabe lembrar que é uma área que

apresenta foco na intensificação da velocidade de geração de novos conhecimentos, com a

expansão desta fronteira baseada no aumento da produtividade amparada por forte base de

desenvolvimento tecnológico, constituindo-se em um campo que se torna cada dia mais

complexo e excede capacidades de atores individuais (POWELL, KOPUT; SMITH-DOERR,

1996, p. 122). Assim, é um campo onde as estruturas cooperativas como as redes de inovação

têm se destacado como meio de organização e mobilização de aprendizado e ação conjunta

(POWELL; GRODAL, 2005, p. 58).

Porém, de acordo com estudo do CGGE (2006a, p. 66) sobre rede de inovação em

biodiversidade na Amazônia, constatou-se que as redes de inovação na região ainda são

poucas, dispersas e com abrangência limitada. Assinala-se que, entre as redes identificadas,

predominavam as redes de ciência e tecnologia (C&T), direcionadas para a produção de

conhecimento, sem preocupação direta com sua aplicação imediata no desenvolvimento de

produtos ou processos produtivos, e mesmo aquelas redes observadas que envolviam o setor

produtivo, tinham origem também nas instituições de ensino e C&T (CGGE, 2006a, p. 66).

Isso sugere um ponto a ser ressaltado em relação à temática mais ampla sobre

inovação na Amazônia, que se refere à atuação das empresas da região. Dosi (1988, p. 1141)

ao discutir categorias de análise relevantes para a indução de atividades de inovação

tecnológica, indica que além das oportunidades de mercado, do desenvolvimento científico e

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tecnológico e de condições de apropriabilidade, também são fatores essenciais ao

desenvolvimento de inovações as capacidades e competências tecnológicas das empresas.

Ainda segundo Dosi (1988, p. 1141) problemas de lacunas em competências

tecnológicas são comumente encontradas em empresas de países em desenvolvimento.

Conforme o CGEE (2011, p. 27) esta realidade se confirma de modo geral no Brasil, ao se

analisar a obtenção de patentes por empresas brasileiras no escritório de patentes dos Estados

Unidos (USPTO), uma referência para mercados internacionais, verifica-se que a posição do

Brasil é bastante desfavorável, com quantidade ínfima de pedidos (0,34 mil) em comparação

com outros países como Coreia do Sul (10,60 mil) e o próprio Estados Unidos (218,50 mil).

Outro dado de alerta refere-se à estrutura industrial do país, com setores de baixa e média

intensidade tecnológica ocupando grandes dimensões de sua matriz industrial (CGEE, 2011,

p. 28).

No caso específico da região Norte, onde se encontra a maioria dos estados do bioma

amazônico, considerando-se as extremas desigualdades regionais, a situação dos indicadores

se agrava. Com base na Pesquisa de Inovação Tecnológica (PINTEC) 2008 elaborada pelo

IBGE, o CGEE (2011) identificou que o menor percentual de empresas inovadoras (somente

3,2%.) corresponde à região Norte, com uma concentração destas no Sul e Sudeste do país,

conforme tabela abaixo:

Tabela 1 - Percentual da distribuição de empresas industriais que realizaram atividade inovativa no

triênio 2006/2008, por região.

Percentual da distribuição de empresas industriais que realizaram atividade

inovativa no triênio 2006/2008, por região

Região Percentual (%)

Norte 3,2

Nordeste 9,4

Centro-Oeste 6,0

Sudeste 52,9

Sul 28,4

Total 100

Fonte: Baseada em CGEE, (2011, p. 35).

O quadro delineado indica dificuldades em termos de capacidade de inovação

industrial na região Norte em comparação com as demais regiões do país, o que pode

corroborar com os dados referentes à fraca participação de empresas em redes de inovação na

região, apresentando-se como um desafio adicional ao projeto de desenvolvimento regional

baseado na biodiversidade por meio de inovações sugerido por Becker (2010, p. 24).

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Portanto, reconhecemos que, se por um lado há potencial da geração de inovações

baseadas na biodiversidade regional como fator de desenvolvimento em bases sustentáveis,

por outro lado, sua efetiva realização econômica envolve um conjunto de capacidades e

arranjos industriais complexos, para os quais não tem se conseguido a mobilização adequada

na região. Esta mobilização abrange entre outras ações a promoção de condições e

instrumentos que viabilizem o desenvolvimento de inovações que proporcionem a criação e

apropriação de valor econômico em conformidade com critérios sustentabilidade no âmbito

regional.

1.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS: LACUNAS NO CONHECIMENTO SOBRE

REDES DE INOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA

AMAZÔNIA

Diante deste cenário, consideramos que a discussão da temática de redes de inovação,

particularmente sobre condições de apropriação apresenta-se aberta não somente em termos

acadêmicos quanto à exploração de interconexões entre processos de apropriabilidade de

inovação e critérios de sustentabilidade já anteriormente mencionada, mas também em termos

empíricos na análise da relação a condições de incentivos e restrições efetivas ao processo de

inovação na região baseado em ativos da biodiversidade.

Deste modo, propomos a partir deste estudo um exame sobre a apropriação de

resultados de uma inovação desenvolvida por uma rede de relações interorganizacionais para

o desenvolvimento, a produção, e comercialização de produtos inovadores baseados em ativos

da biodiversidade na região amazônica. Compreendemos como relevante analisar os fatores

que contribuem para a composição e dinâmica de uma rede de inovação alicerçada em ativos

da biodiversidade, os resultados efetivos alcançados por seus membros e seus possíveis

transbordamentos para sociedade, observando se e como critérios de sustentabilidade

socioambientais influenciam em suas atividades produtivas e comerciais, bem como nas

condições de apropriabilidade da rede inovação.

De forma específica, estabelecemos como proposta de pesquisa a análise da forma de

apropriação de resultados da inovação pelas organizações no âmbito de uma rede (1), e a

influência de diretrizes do desenvolvimento sustentável sobre os condicionantes de

apropriabilidade (2). Para tanto o objeto empírico da pesquisa deve se caracterizar por uma

rede de relações interorganizacionais com foco no desenvolvimento de uma inovação baseada

em ativos da biodiversidade, com atividades inovativas localizadas na região amazônica.

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Entendemos que o escopo relacionado a atividades vinculadas à biodiversidade na

região Amazônica reúne dois elementos contextuais importantes à pesquisa, por um lado a

existência de certo grau de pressão institucional e de mercado quanto a condicionantes de

responsabilidade socioambientais, e por outro lado o fato da natureza dos recursos da

biodiversidade vincular-se a instrumentos normativos de diretrizes sobre desenvolvimento

sustentável, como a Convenção de Diversidade Biológica (CDB).

Diante da formação de uma rede de inovação no Estado do Pará para produção e

comercialização de compostos antioxidantes de açaí, ativo da biodiversidade amazônica, cujas

principais organizações em termos de capacidades constitutivas ao processo inovativo foram a

Universidade Federal do Pará (UFPA), a Amazon Dreams e a Belaiaçá2, acreditamos que este

caso possa iluminar como tem ocorrido as condições de apropriabilidade sob a perspectiva de

uma rede regional de inovação para o Desenvolvimento Sustentável.

Cabe ressaltar que a cadeia produtiva do açaí tem grande importância econômica e de

segurança alimentar no Estado do Pará, que é o maior produtor de açaí do país (SAGRI,

2014a). Em 2011, a produção de açaí gerou aproximadamente R$677,2 milhões para

economia paraense, e conforme estimativa da Secretaria de Estado da Agricultura 60% da

produção é consumida internamente no Estado (SAGRI, 2014a). No entanto, apesar da

relevância da cadeia produtiva para o Estado, F. Costa (2009, p. 345), ressalta a existência de

carências tecnológicas elementares, seja em sua etapa de produção rural, seja na etapa de

processamento industrial, apresentando baixa capacidade de absorver e de produzir inovações.

Para a compreensão sobre a apropriação de resultados de uma inovação em uma

relação com o conceito de Desenvolvimento Sustentável na Amazônia, entendemos que deve-

se percorrer três passos que são distintos e inter relacionados. Primeiro, o exame do contexto

que envolve a rede de inovação interorganizacional. Depois, analisar os atores organizacionais

e suas capacidades para o processo de inovação. E, terceiro, analisar as redes de relações

interorganizacionais durante o desenvolvimento da inovação. Portanto, é dentro desta linha de

raciocínio que seguiremos nos próximos capítulos deste trabalho.

2 Informações detalhadas sobre o desenho e a metodologia da pesquisa estão disponíveis no Apêndice A desta

dissertação.

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2 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO UMA ALTERNATIVA PARA O

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

2.1 INTRODUÇÃO

Este capítulo tem o objetivo de compreender as dimensões contextuais, tanto do ponto

de vista teórico quanto empírico, nas quais tem feito emergir os negócios inovadores

sustentáveis na Amazônia, em particular no estado do Pará. Assim, buscamos discutir os dois

constructos teóricos que norteiam as análises em nível contextual: o paradigma tecnológico e

o regime de apropriação, fazendo um esforço de explorar convergências e controvérsias

emergentes nestes temas quando de sua interseção com diretrizes do desenvolvimento

sustentável.

A partir de cada constructo teórico, desenvolvemos a apresentação e análises de dados

empíricos sobre o âmbito regional onde a rede de inovação atua, e as características do setor

industrial em que está envolvida. Essa abordagem é denominada por Hagedoorn (2006, p.

672) como enraizamento ambiental (environmental embeddedness), ao reconhecer a

relevância das influências de padrões históricos e condições contextuais no comportamento

das organizações.

Partimos do entendimento de que o paradigma tecnológico contribui na compreensão

dos desafios de adoção e implementação de diretrizes de um projeto de desenvolvimento

sustentável, ao explicar os lock in em trajetórias tecnoeconômicas, em que sua ruptura

depende da emergência em conjunto processos de transição tecnológicas, econômicos, sociais,

políticos e institucionais em coevolução. Desta forma, é necessário o desenvolvimento de

certo nível de maturidade nas trajetórias emergentes alternativas, em termos de construções de

novos arranjos e consensos dentro da sociedade para que possam sobrepor-se ao conjunto de

dependências paradigmáticas anteriores.

Em nossa perspectiva, este constructo corresponde a um nível macro de análise, e a

sua investigação empírica contemplou uma breve perspectiva da trajetória de formação das

bases institucionais da dinâmica de inovação em nível nacional e regional, para depois

focarmos no Estado do Pará, com vistas a compreender as oportunidades e os desafios postos

ao desenvolvimento de inovações baseadas na biotecnologia e na biodiversidade amazônica.

Após esta visão mais ampla, enfocamos em um nível meso de análise que visa

verificar aspectos chaves da cadeia produtiva específica do açaí no Pará, caracterizado como o

ambiente de atuação direto da rede de parceria interorganizacional em estudo. A análise do

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desenvolvimento de inovações baseadas em biotecnologia por meio de arranjos locais torna

relevante a compreensão das relações na cadeia produtiva. Particularmente no que tange as

condições de interação entre os atores (governo, indústria, produtores rurais, instituições de

C&T), de modo a identificar as formas de articulação e seu potencial para proporcionar tanto

capacidades de investimentos conjuntos no arranjo, como o incentivo a esforços inovativos e

a criação de eficiências coletivas.

Posteriormente, retomamos a abordagem teórica para analisar o constructo do regime

de apropriabilidade de inovações, tanto na perspectiva de entender seus efeitos sobre a

efetividade de exploração de oportunidades tecnológicas, quanto o impacto deste na forma de

distribuição de benefícios de inovação. Também examinamos o conjunto diverso de

mecanismos de apropriação sobre inovações, além da tradicional proteção da propriedade

intelectual. Na convergência deste constructo com diretrizes do desenvolvimento sustentável,

buscamos com temática central no debate sobre a interação do sistema legal de proteção à

propriedade intelectual e a convenção da diversidade biológica. Em seguida, investigamos as

condições de apropriação sobre inovações baseadas na biodiversidade em termos da

regulamentação de acesso ao patrimônio genético no país e sua aplicação na cadeia produtiva

local do açaí.

Em síntese, este capítulo está dividido em quatro (4) seções a partir desta. Uma seção

sobre paradigmas tecnológicos suas trajetórias e oportunidades, acrescentando um debate

sobre a convergência destes conceitos com as diretrizes de desenvolvimento sustentável. Na

próxima seção, abrimos a apresentação de dados empíricos sobre as oportunidades de

inovação biotecnológica no Pará. A seguir, retomamos o debate teórico, agora sobre o

constructo de regime de apropriabilidade, seus mecanismos de apropriação e relação com a

temática de desenvolvimento sustentável, incluindo apontamos sobre a cadeia produtiva do

açaí. Por fim, fazemos algumas considerações finais do capítulo.

2.2 PARADIGMAS TECNOLÓGICOS

A perspectiva teórica orientadora deste estudo sobre a emergência de negócios

inovadores na relação com o desenvolvimento sustentável tem como enfoque a análise da

dinâmica da mudança tecnológica e processos de inovações. Todo processo de inovação é

resultado da interação entre capacidades e estímulos gerados dentro das organizações, com

fatores mais amplos como desenvolvimento cientifico, condições de mercado sobre

crescimento de demanda e competição entre firmas, facilidades financeiras e padrões de

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alocação de recursos, tendências macroeconômicas, e políticas públicas (DOSI, 1988, p.

1121).

Dosi (1982, p. 151) indica que na teoria econômica ortodoxa a tecnologia é vista como

um dado conjunto de combinação de fatores produtivos, definido em termos quantitativos e

qualitativos para o alcance de determinados resultados. Neste contexto, o progresso

tecnológico dentro da empresa é visto em geral por movimentos na curva de possibilidades de

produção ou aumento no número de produtos, enquanto que o desenvolvimento científico e

descobertas de avanços tecnológicos significativos eram entendidos como atividades

exógenas à empresa (DOSI, 1982, p. 151).

Contudo, Dosi (1982, p. 151) critica essa visão, em virtude de não permitir a

compreensão das interações efetivas entre fatores de mercado e desenvolvimento científico na

construção da trajetória de tecnologias nas indústrias e o papel das organizações na dinâmica

de geração e difusão de inovações e mudanças técnicas.

Tecnologia, então, foi definida por Dosi (1982, p. 151) como um conjunto de peças de

conhecimento (empíricos e teóricos), know-how, rotinas, métodos, e experiências (sucesso ou

fracasso), além de recursos físicos e equipamentos relacionados, de modo que o

desenvolvimento tecnológico seja considerado uma atividade de resolução de problema.

Dosi (1988, p. 1128) desenvolve a noção que o desenvolvimento de uma determinada

tecnologia transcorre por meio de uma trajetória ao longo do tempo, que sofre influências

econômicas, institucionais, sociais e do próprio estágio de conhecimento tecnológico. Estas

influências implicam no estabelecimento de uma série de mecanismos de seleção que

restringe um amplo conjunto de possibilidades de direções de desenvolvimento até que se

constitui um padrão de solução para problemas tecnológicos selecionados, baseados sobre

princípios e regras de decisão e materiais selecionados, quando o autor sugere que se alcança

um estágio paradigmático (Dosi, 1982, p. 152).

Apesar de Dosi (1982, p. 152) reconhecer diferenças entre tecnologia e ciência,

particularmente em relação ao conhecimento tecnológico ser menos articulado que o

científico, mais informal e tácito (implícito em experiências e habilidades), além de ter foco

na busca de soluções, e não no alcance de uma base explicativa bem consolidada. O autor,

com esta concepção de trajetória de desenvolvimento, também identifica atributos

equivalentes aos dois tipos de conhecimento, e sugere uma analogia entre os estágios de

desenvolvimento científico paradigmático e pré paradigmático proposto por Kuhn (DOSI,

1982, p. 152).

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Neste sentido, o estágio de desenvolvimento tecnológico pode apresentar-se de forma

paradigmática ou pré paradigmática. A fase pré paradigmática é marcada por uma intensidade

de incerteza maior, não somente sobre os resultados da busca inovativa, mas também em

relação aos princípios científicos e tecnológicos e os processos de resolução de problemas que

podem ser aplicados para o avanço tecnológico não terem sido ainda estabelecidos por meio

de um conjunto de heurísticas (regras de decisão) que possam orientar seu desenvolvimento

(DOSI, 1988, p. 1134).

Este é um estágio em que um progresso técnico extraordinário acontece quando do

desenvolvimento de um novo paradigma. Neste momento, os fatores contextuais econômicos,

sociais e institucionais impactam de forma mais forte nas mudanças de direções e esforços

dos processos científicos e tecnológicos para promoção da emergência do novo paradigma

(DOSI, 1988, p.1142).

Na fase paradigmática, Dosi (1988, p. 1142) sugere que ocorre o chamado progresso

técnico “normal”, com processos de inovação e mudança técnica dentro das fronteiras do

paradigma tecnológico corrente, e limitados ao escopo específico das características de sua

trajetória, mesmo mediante alterações em fatores contextuais. Assim, cada paradigma

tecnológico, restringe a percepção de oportunidades e reduz as fronteiras nas quais os efeitos

de incentivo do mercado pode ser exercidas, afetando condições apropriabilidade para

explorar oportunidades tecnológicas (DOSI, 1988, p. 1142).

O paradigma tecnológico é uma perspectiva que envolve um conjunto de rotinas e

procedimentos, e uma definição de problemas relevantes e da base de conhecimentos

específica para busca de soluções (DOSI, 1982, p. 148). Em cada paradigma tecnológico é

estabelecido o conceito de progresso próprio (direção e taxa de avanço), baseado nos tradeoffs

tecnológicos e econômicos selecionados a partir da interação de fatores científicos,

econômicos, sociais e institucionais frente a dificuldades e problemas anteriormente não

resolvidos (DOSI, 1982, p. 147).

Assim, um paradigma tecnológico envolve fortes prescrições sobre o progresso

técnico ao se estabelecer o que deve ser priorizado e o que não deve. São definidos

contextualmente quais as necessidades significativas, os princípios científicos a serem

utilizados e a tecnologia de materiais adequada, caracterizando assim um padrão de solução

para determinados problemas tecnoeconômicos, ao mesmo tempo em que também se exclui

outros tipos potenciais de soluções, materiais e necessidades que são negligenciados (DOSI,

1982, p. 152, 1988, p. 1127). Por exemplo, na indústria automotiva foi estabelecido no início

do século XX o paradigma tecnológico baseado no motor de combustão interna.

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O paradigma tecnológico é economicamente explorado e reproduzido através do

tempo, assim como abrange o desenvolvimento conjunto (coevolução) de estruturas

institucionais e sociais (DOSI, 1988, p. 1128). No decorrer do tempo, as características

tecnoeconômicas são progressivamente melhoradas, embora restringidas às combinações reais

possíveis, no âmbito do sistema socioeconômico.

Desta forma, regras específicas para desenvolvimento de competências e capacidades

por parte das empresas, além de um pacote de recursos e equipamentos característicos,

moldam a direção dos esforços tecnológicos a problemas, oportunidades e alvo típicos (DOSI,

1988, p. 1127). Um exemplo representa a inovação em máquinas instrumentais (engenharia

mecânica) que apresenta como dimensão de referência o desempenho de gerações ou

máquinas anteriores, são relevantes as condições típicas de uso e os requisitos produtivos dos

usuários, e possui processos de busca de melhorias tecnológicas que focam em geral em

tradeoffs que envolvem características de velocidade, precisão e flexibilidade.

A principal implicação deste formato paradigmático do desenvolvimento tecnológico é

que os processos de inovação tornam-se extremamente seletivos, seguindo direções muito

precisas e com forte efeito cumulativo sobre a aquisição de capacidades pelos agentes (DOSI,

1988, p. 1128). Esta configuração por um lado pode dotar de maior eficiência o avanço

tecnológico dentro da trajetória instituída, porém pode trazer problemas de travamento (lock

in) frente a soluções que demandem rupturas no padrão de mudança técnica constituído.

Esta visão é caracterizada pela perspectiva do path dependency, em que se destacam

como vistos anteriormente mecanismos de retornos crescentes dentro da trajetória,

aprendizado cumulativo e aspectos de irreversibilidade e não linearidades (DOSI, 1988,

p.1142). A seguir, discutimos em maior detalhe o progresso tecnológico dentro de trajetórias

estabelecidas.

2.2.1 Trajetórias tecnológicas

Uma trajetória tecnológica representa o processo de desenvolvimento tecnológico ao

longo de tradeoffs econômicos e tecnológicos, constituída de acordo com um paradigma

tecnológico (DOSI, 1988, p. 1128). É um padrão de resolução de problemas técnicos, cuja

fronteira tecnológica é o nível de progresso mais elevado em termos de múltiplos pontos entre

as dimensões tecnológicas e econômicas relevantes (Dosi, 1982, p. 152).

Bell e Pavitt (1993, p. 165) consideram que seja mais acurado falar em tecnologias do

que em tecnologia, em virtude haver diferentes tecnologias em desenvolvimento com

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trajetórias concorrentes ou mesmo com fortes complementaridades, assim como há diferentes

áreas e perspectivas de conhecimentos científicos. Neste caso, o desenvolvimento de uma

tecnologia pode estimular ou inibir o desenvolvimento de outras tecnologias (Dosi, 1982, p.

154).

As mudanças técnicas envolvem aspectos exógenos e endógenos do sistema

empresarial (DOSI, 1988, p. 1144). Apesar de algumas características do progresso técnico

terem base sob aspectos exógenos às empresas, como o desenvolvimento científico ou

oportunidades relacionadas ao mercado e a estrutura de setores industriais, a aplicação da

mudança tecnológica nos meios de produção se dá endogenamente em cada organização

direcionada por processos comportamentais de busca competitividade (DOSI, 1988, p. 1142).

Cabe destacar que a natureza do conhecimento tecnológico é reconhecida como

cumulativa e com substancial base tácita (DOSI, 1988, p. 1131). Segundo Bell e Pavitt (1993,

p. 166) uma parte considerável do aprendizado tecnológico abrange conhecimentos tácitos,

não codificáveis e incorporados nas pessoas (e organizações) por meio de suas vivências e

habilidades adquiridas. Portanto este tipo de conhecimento não pode ser adquirido sem

investimentos ou rapidamente, e sua transferência depende da interação entre as pessoas

(BELL; PAVITT, 1993, p. 166).

Ao considerar este aspecto tácito do conhecimento tecnológico, o papel das empresas

como local de aprendizado, operação e desenvolvimento de sistemas produtivos concede-lhe

também a característica de específico. A acumulação tecnológica ocorre por meio de

processos de aprendizado path dependent diretamente vinculados às capacidades e estrutura

de produção das organizações, assim acumulação tecnológica toma variadas formas e graus

entre os diferentes setores, tamanhos e níveis de desenvolvimento das empresas que as

habilita para a realização de mudanças ou inovações tecnológicas (BELL; PAVITT, 1993, p.

167).

A estrutura de produção de qualquer inovação técnica é endógena à dinâmica

tecnológica das empresas e relacionada tanto ao aprendizado inovativo, quanto a extensão em

que este aprendizado é internalizado e apropriado pelas empresas como fator de rentabilidade

(DOSI, 1988, p. 1162). Portanto, a busca por novos produtos e processos tecnológicos não é

nunca um processo aleatório, mas fundamentado sobre todo o conjunto de fatores de

oportunidades tecnológicas e de mercado (DOSI, 1982, p. 159).

Neste sentido, Dosi (1982, p. 148) aborda de forma crítica os modelos de inovação

baseados em processos lineares como market pull (baseado em fatores de mercado) e

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technological push (baseado em fatores científicos e tecnológicos), de forma a questionar a

definição de determinantes unidirecionais de processos inovativos.

Em relação ao modelo market pull indica como fragilidade a incerteza no

reconhecimento a priori de necessidades de usuários e consumidores nos processos de

inovação, principalmente aqueles não incrementais, de modo que essas demandas potenciais

apresentam uma atratividade limitada (DOSI, 1982, p. 150).

Além disso, esse modelo não propicia bases explicativas para as decisões e

mecanismos de seleção da fase do processo que abrange, após a identificação da necessidade

até o resultado final do produto inovador, considerando direções de esforços, níveis de custos

e limitações do processo de criação e produção na empresa (DOSI, 1982, p. 150).

Perspectivas baseadas em fatores de demanda tendem a considerar a tecnologia como

mecanismos passivos ao mercado, e mais responsiva e versátil do que a complexidade de

procedimentos de mudança tecnológica na realidade (DOSI, 1982, p. 150).

Contudo, o modelo technological push, ao fundar-se sobre uma visão restrita de oferta

de avanços científicos e tecnológicos, falha ao não explicar como fatores de mercado

interferem em processos de mudança técnica e na direção de esforços de inovações, não

permitindo considerar a natureza interativa destes mecanismos na trajetória tecnológica

(DOSI, 1982, p. 151). Portanto, Dosi (1997, p. 1536) defende o abandono de qualquer modelo

linear de inovação e o reconhecimento de uma perspectiva de coevolução de fatores

científicos, de mercado e institucionais, incorporando constantes feedback entre estes.

Ao procurar identificar as principais interações entre fatores de progresso científico e

demais aspectos econômicos e institucionais para o desenvolvimento tecnológico efetivo,

Dosi (1988, p. 1136) destaca em relação a fatores institucionais dois pontos: A relevância de

organizações de não mercado, particularmente as instituições pontes para a aplicação

instrumental de avanços teóricos para desenvolvimento de recursos práticos, mesmo na

insuficiência de incentivos econômicos; e as intervenções via fatores institucionais de

agências públicas no financiamento de programas de desenvolvimento tecnológico em áreas

ou direções específicas, por exemplo, na saúde para busca de tratamentos a doenças

específicas.

No que tange aos fatores de mercado, Dosi (1997, p. 156) ressalta incentivos advindos

de mudanças em condições e oportunidades de mercado, como alterações nos padrões de

demanda, na distribuição das participações de mercado relativas de cada empresa, e de custos

de produção que cria uma pressão ascendente sobre a busca de melhorias tecnológicas.

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As interações entre atributos científicos e tecnológicos e de mercado acontecem em

duplo sentido, tanto pelas tentativas de exploração de novas tecnologias por empreendedores e

por processos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) das organizações, quanto pela demanda

e direcionamento de avanços científicos focados em requisitos de mercado e solução de

tradeoffs tecnoeconômicos de usuários existentes (DOSI, 1988, p. 1136), como gargalos

tecnológicos ou escassez de suprimentos críticos (DOSI, 1988, p.1145).

2.2.2 Oportunidades tecnológicas

Oportunidades tecnológicas representam as possibilidades de avanços técnicos e

inovações, especificamente reconhecidas como fontes de mudanças técnicas dentro de um

determinado domínio (DOSI, 1997, p. 1532). Nesta perspectiva de paradigmas tecnológicos,

considerando fatores de irreversibilidade e retornos crescentes dentro de cada trajetória, cada

base de conhecimento específico define as oportunidades possíveis de futuro avanço técnico,

bem como os limites do conjunto de coeficientes de entradas do processo de inovação

(investimentos e esforços) viáveis sobre esta mesma base de conhecimento (DOSI, 1997, p.

1534).

Assim, na prática, em cada paradigma tecnológico, é improvável haver uma fronteira

de possibilidade de inovação idealmente ilimitada (DOSI, 1997, p. 1534). A proposição de

fronteiras de oportunidades deve configurar o alcançável sobre as bases dos paradigmas

tecnológicos disponíveis e nos limites dos efeitos de incentivos possíveis, abrangendo

também os contextos econômicos, institucionais e sociais, tanto em relação às direções de

busca, quanto à intensidade desta busca e às taxas de avanços efetivos (DOSI, 1997, p. 1535).

Portanto, as oportunidades tecnológicas e os níveis de produtividade inovativa são específicos

para cada trajetória tecnológica e seu grau de maturidade (DOSI, 1988, p. 1137).

Segundo Dosi (1988, p. 1138) a medida que se avança ao longo de trajetórias

tecnológicas por meio do crescimento acumulado de resultados inovativos decorre, em geral,

uma gradual exaustão de oportunidades tecnológicas. Não obstante, cabe ressalvar que não se

observa a emergência de retornos decrescentes nos processos de busca por inovações pelo

mercado, como consequência de um possível desestímulo a inovação em trajetórias saturadas,

em virtude do surgimento de novos paradigmas tecnológicos em que as empresas passam a

atuar, e que remodelam os padrões de oportunidades de progresso técnico e proporcionam

novos escopos potenciais (DOSI, 1988, p. 1138).

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As oportunidades tecnológicas apresentam variação também de acordo com os setores

econômicos de atuação, em função de suas trajetórias tecnológicas particulares e por

influências de fatores de crescimento, tamanho e competitividade de mercado que impactam

na propensão a inovar. Neste caso, as oportunidades tecnológicas são um fator explicativo

para os diferentes níveis de comprometimentos de investimentos e esforços de busca

inovativa entre os diversos setores industriais (DOSI, 1988, p. 1138). Conforme Dosi (1988,

p.1151) setores industriais como químico, elétrico e eletrônico haviam sido identificados no

final do século XX com nível mais elevado de oportunidades tecnológicas que outros setores.

Mas, além de diferenças intersetoriais, cabe destacar a existência de assimetrias

intrasetoriais. Ao considerar que o conhecimento tecnológico é especifico em cada

organização por possuir características tácitas e de cumulatividade, uma implicação é que

tanto a percepção de oportunidades de inovação (tecnológica), e como o desenvolvimento de

capacidades para efetivamente aproveitá-las são atributos idiossincráticos das organizações

(DOSI, 1988, p. 1137). E, assim, contribui para explicar níveis diferentes de exploração de

oportunidades de inovação entre empresas de um mesmo setor.

Contudo, o comprometimento por parte de empresas da exploração das oportunidades

tecnológicas não depende somente da percepção destas e da aquisição de capacidades, estes

são fatores necessários, mas não suficientes (DOSI, 1988, p. 1160). Para o efetivo

comprometimento é preciso que uma empresa identifique condições de apropriabilidade dos

retornos econômicos gerados pelas inovações (DOSI, 1988, p. 1140).

A apropriabilidade de resultados de inovação corresponde àquelas propriedades do

conhecimento tecnológico, de mercados e do ambiente legal que permite o desenvolvimento

de inovações por agentes privados e sua proteção em termos de rentabilidade contra a rápida

imitação pelos concorrentes (DOSI, 1988, p. 1139). O grau de apropriabilidade em uma

trajetória tecnológica relaciona-se por um lado com a natureza da tecnologia específica, por

outro com o ciclo de vida do desenvolvimento tecnológico.

Em relação à natureza da tecnologia, Teece (1986, p. 287) indica que a base de

conhecimento dos produtos e processos de cada indústria influência na escolha adequada de

mecanismos de apropriação. Segundo Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 14) as principais

características tecnológicas que afetam sua apropriabilidade são seu grau de codificação,

complexidade e facilidade de aplicar engenharia reversa.

Como exemplos, Levin et al (1987, p. 831) indicam que as patentes são em geral

importantes para as indústrias químicas, em virtude dos produtos serem mais facilmente

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identificados pela sua estrutura de moléculas, isso permite maior clareza e, portanto,

condições melhores de comprovação de validade e eventualmente a prova de infrações.

Além disso, cada tecnologia contém um equilíbrio específico entre aspectos de bem

público e fatores apropriáveis privadamente (DOSI, 1988, p. 1139), de modo que se torna

importante analisar a natureza da base de conhecimento no que tange a seu conteúdo de

dimensão pública e universal, e sua dimensão tácita e específica para o setor e a empresa.

Cabe ressaltar que uma vez que toda a inovação demanda algum nível de desenvolvimento ou

melhoria de procedimentos técnicos implementados na empresa, há algum grau de esforço e

geração de conhecimento tecnológico específico na empresa (DOSI, 1988, p. 1126).

Os aspectos públicos do conhecimento tecnológico caracterizam-se por duas formas:

elementos de “bens livres” decorrentes do livre fluxo de conhecimento e informação, como

em publicações científicas ou jornalísticas abertas e relatórios públicos (1); e as

interdependências não negociáveis entre setores e empresas que assume a forma de

tecnologias complementares por meio de externalidades tecnológicas (2) (DOSI, 1988, p.

1146).

A externalidade tecnológica ocorre quando um avanço tecnológico realizado em um

setor industrial ou uma empresa pode ser apropriado por outras empresas ou indústrias devido

a complementaridades e vínculos entre esses agentes. Os vínculos podem se configurar em

uma relação entre usuários e produtores de uma dada tecnologia, ou em uma relação entre

diferentes indústrias que sejam usuárias da mesma tecnologia e assim compartilham gargalos

e oportunidades tecnológicas similares (DOSI, 1988, p. 1146).

Dosi (1988, p. 1161) indica que os graus de apropriabilidade e a eficácia relativa de

mecanismos de apropriação (como patentes e segredo industrial) mudam significativamente

no decorrer de uma trajetória tecnológica. Esta mudança pode ser provocada por uma

combinação de fatores como o ritmo de inovações e difusão no mercado, eventuais

intervenções institucionais, requisitos de clientes, e pelo padrão particular de mudança técnica

setorial (a ser discutido no próximo tópico).

O processo de inovação envolve equilíbrio complexo e variado entre diversas formas

de conhecimento publico e proprietário, e diferentes combinações entre oportunidades de

inovação, capacidades das firmas e incentivos econômicos, entre esses os mecanismos de

apropriabilidade, além de aspectos institucionais mais amplos.

Mesmo quando trajetórias tecnológicas estão bem estabelecidas, as variáveis

institucionais podem contribuir para moldar e determinar a taxa pela qual o avanço técnico

ocorre, Dosi (1982, p. 160) destaca três fatores institucionais relevantes: as instituições pontes

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de acumulação do conhecimento científico e aplicado (como universidades e centros de

pesquisa); as intervenções institucionais de política pública de incentivo ao desenvolvimento

da Ciência e Tecnologia (C&T); e os efeitos seletivos em interesses sociais não econômicos

em termos stricto sensu, como em áreas da defesa, autosuficiência em energia e saúde

pública.

E ainda que neste estágio o avanço técnico transcorra por muitas formas endógenas de

dinâmica econômica, a incerteza dos processos de P&D e a existência de aspectos não

comercializáveis e externalidades da mudança técnica não desaparecem (DOSI, 1997, p. 160).

Por isso, mesmo normativas econômicas tradicionais indicam que alguma forma de

intervenção pública deve ser implementada para corrigir o que se denomina de falhas de

mercado relacionadas a diferentes entre as taxas de retorno sociais e privadas, bem como

diferentes níveis de investimentos e descontos sobre riscos sociais e entre agentes privados

(DOSI, 1997, p. 160).

Além disso, há a necessidade de coevolução das diversas dimensões econômicas,

sociais e institucionais em cada trajetória tecnológica de forma a consolidar os

desenvolvimentos de infraestruturas específicas. Ao longo da formação e desenvolvimento do

paradigma tecnológico, surgem exigências relacionadas a requisitos de infraestrutura e

tecnologias complementares para produção como de energia, transporte e suprimentos, e

demandas de constituição de sistemas e fluxos de economia de escala, e de padrões técnicos

particulares que possam positivamente retroalimentar seu padrão de mudança técnica

(mecanismo de autoreforço), e resultam na configuração da estrutura industrial de cada setor

econômico (DOSI, 1988, p. 1146).

2.2.3 Convergência com o desenvolvimento sustentável

A visão da inovação tecnológica enquanto “resolução de problemas” direcionada aos

tradeoffs de cada trajetória tecnológica deve ser compreendida com base nos contextos

históricos e institucionais específicos de uma sociedade. Neste sentido, ressalta-se dois pontos

de análise referente a teoria evolucionária em relação à orientação normativa de políticas de

desenvolvimento.

O primeiro ponto corresponde ao problema da externalidade em relação à geração de

custos e benefícios por novas tecnologias ou inovações que as estruturas institucionais

existentes não foram preparadas a atentar e atuar sobre estes (NELSON; WINTER, 2005, p.

522). Deste modo, os processos de mudança técnica provocam contínuas redefinições sobre o

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que a sociedade considera externalidade (NELSON; WINTER, 2005, p. 522), dificultando

análises prévias de impacto e a maior assertividade na busca de correções às falhas no

mercado.

O segundo ponto é o entendimento de uma perspectiva dinâmica da linha divisória

entre o que a sociedade quer manter privado ou tornar público, a qual está em contínuo

redesenho (NELSON; WINTER, 2005, p. 523). Os autores indicam duas razões principais

para que o caráter de bem público não seja constante: Uma das razões é que o conceito do que

deve ser público depende parcialmente de determinados atributos tecnológicos em produtos e

serviços disponíveis na sociedade (NELSON; WINTER, 2005, p. 522). Outra razão é a

alteração em nível coletivo na sociedade do que as pessoas consideram importante ou valioso,

e a amplitude da aplicação e demanda desses conceitos de bem estar em termos de espaço (de

cidades ao globo) (NELSON; WINTER, 2005, p. 522).

Estes dois aspectos fazem com que as bases de avaliação da sociedade de alternativas

tecnológicas mudem ao longo do tempo, e, ainda, que não seja possível antecipar efeitos

futuros das trajetórias tecnológicas que possam intervir dinamicamente nestas mesmas bases

coletivas de definição de externalidades e bem público. A ideia de progresso técnico, em

virtude de ser concebida dentro de dependências de trajetórias particulares, cria dificuldades

substanciais de sombreamento ao se procurar comparar a adequação de dois diferentes

paradigmas tecnológicos, seja ex ante, seja ex post (DOSI, 1997, p.159).

Neste sentido, Nelson e Winter (2005, p. 507) ao reconhecerem que a inovação

tecnológica envolve abordagens sobre bens públicos e externalidades abrangentes, entendem

que a economia política não consegue gerar um sistema eticamente ideal para redistribuição

da riqueza na sociedade. Portanto, os autores defendem que a sociedade deve se engajar na

experimentação, priorizando a importância da diversidade e pluralismo, gerando informação e

feedback constante, como foco central para a orientação da evolução do sistema econômico

(NELSON; WINTER, 2005, p. 567).

Para Nelson e Winter (2005, p. 523) fica colocada a questão da distribuição de renda,

que deve ser entendida tanto pelo ponto de vista de segurança de renda (compensar carências

iniciais a fim de subsidiar um padrão básico), quanto de induzir transições sociotécnicas de

forma a (re)habilitar comunidades para a promoção do progresso tecnológico e

desenvolvimento econômico.

Embora concepção de Nelson e Winter (2005) de orientações normativas para

economia política relacionadas ao desenvolvimento acima mencionada tenham ênfase em

tradeoffs nas dimensões tecnológicas e econômicas, percebe-se que há uma incorporação

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implícita nesta última dimensão de preocupações relacionadas a dimensões de bem estar

ambiental e equidade social.

No entanto, estes fatores ambientais e sociais ascendem de forma mais explícita em

estudos de inovação quando de sua interação com pressupostos de desenvolvimento

sustentável e seu desdobramento em termos do conceito de sustentabilidade aplicado a

organizações, seus produtos e operações.

Kneipp et al (2011) constataram a emergência de estudos na temática denominada de

“inovação sustentável” (resultado da convergência dos temas inovação e desenvolvimento

sustentável), ao verificar através de um levantamento bibliométrico um crescente aumento de

pesquisas e publicações sobre esta temática específica, destacando entre as principais áreas de

conhecimento pautadas a de gestão e negócios.

O conceito de inovação sustentável pode ser entendido como uma extensão do

conceito original de inovação, qualificado por objetivos normativos vinculados ao

desenvolvimento sustentável. Deste modo, os conceitos elaborados, em geral, relacionam-se a

um processo de inovação que não deve somente ser orientado para resultados econômicos,

mas também a explicitamente atender requisitos de sustentabilidade social e ambiental,

ressaltando-se a importância da abordagem integrada dessas três dimensões (SMITH; VOß;

GRIN, 2010; DAROIT; NASCIMENTO, 2004; CARVALHO; BARBIERI, 2010; KLEEF;

ROMME, 2007).

Portanto, busca-se expressar que o atendimento a requisitos de sustentabilidade social

e ambiental tornam-se elementos essenciais imbricados a sustentabilidade econômica,

caracterizando-se inclusive como novas direções de oportunidades de atuação para a

competitividade de empresas (PORTER; VAN DER LINDE, 1993; HART; MILSTEIN,

2004; HANSEN; GROSSE-DUNKER; REICHWALD, 2009).

É neste cenário que surgem discussões sobre modelos de negócios baseados em

propostas de inovação sustentável, cuja operacionalização de diretrizes do desenvolvimento

sustentável ainda está em construção. Este debate se estabelece seja em termos dos

parâmetros de sustentabilidade (econômica, ambiental e social) a serem aplicados, seja em

termos das novas bases para regras de decisão e comportamento organizacional que devem ser

desenvolvidos.

Ao desenvolver um método de avaliação da sustentabilidade de inovações, Hansen,

Grosse-Dunker e Reichwald (2009) propõem de forma geral que a inovação sustentável deve

gerar um resultado líquido positivo no estoque global de capitais da empresa (capital

econômico, humano, social e estoque de recursos naturais do ambiente). Mas os autores

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reconhecem que uma avaliação absoluta de sustentabilidade não é possível, visto que sempre

será influenciada por fatores relativos ao contexto institucional, tecnológico e sociocultural

(como já mencionado anteriormente) onde a inovação é implementada.

Esta sensibilidade ao contexto também é ressaltada por Boons e Lüdeke-Freund

(2012) ao refletirem que uma proposição de valor sustentável está atrelada a um determinado

contexto de tempo e espaço, onde os diversos atores participantes, as condições ambientais, o

modelo de gestão adotado, a natureza e a trajetória da tecnologia em curso afetam o

desenvolvimento da inovação e os resultados que se busca alcançar.

Kleef e Roome (2007) destacam a importância da articulação do contexto ao nível

local das operações com arranjos institucionais mais amplos e seus efeitos quanto à

globalização de fluxos de mercado, indicando que é fundamental mapear a influência de

atores regionais, nacionais e internacionais e concertar suas participações.

Esta abordagem foi mais abrangente para a inovação, na busca de soluções a

problemas relacionados ao desenvolvimento da sociedade e à sustentabilidade, é necessária ao

se visualizar os complexos sistemas de produção e consumo ao nível global estabelecidos e os

lock in tecnológicos tanto em trajetórias particulares, quanto pela complementaridade entre

elas.

Neste caso, Rennings (2000, p. 320) destaca a importância da promoção de alterações

em regimes tecnológicos em sistemas de infraestrutura, principalmente nos sistemas de

energia e transporte pela sua complementaridade com demais trajetórias tecnológicas. O autor

ainda informa como prioritário a condução de processos de aprendizado e de análise de

transições tecnológicas ambientalmente sustentáveis acompanhadas de correspondentes

coevoluções sociais e institucionais.

A superação das travas tecnológicas e transição de paradigmas nesta direção

demandam convergência de diferentes políticas públicas (econômica, ambiental, C&T,

educação) com objetivos de promoção da inovação baseada em critérios coletivos de

sustentabilidade (VOLLENBROEK, 2002; RENNINGS, 2000). A implementação de

regulamentações institucionais (coerentes entre si) que realinhem as mudanças em definições

de bens públicos e externalidades (especificamente as de efeito sistêmico), é essencial para

prover condições adequadas de apropriabilidade de inovações no âmbito dos novos escopos

de oportunidades tecnológicas sustentáveis que emergem.

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2.3 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO OPORTUNIDADE DE

DESENVOLVIMENTO NO PARÁ: O CONTEXTO EMPÍRICO DA PESQUISA

O Brasil é um dos países detentores de megadiversidade, com estimativa de abranger

no território brasileiro em torno de 20% das espécies existentes na Terra (MOREIRA, E.,

2003, p. 39), com destaque para a região amazônica. A região amazônica representa o maior

bioma do território brasileiro, equivale a 30% da área de floresta tropical do planeta, sendo

reconhecida por conter uma das maiores diversidades genéticas do mundo (CGEE, 2007, p.

144).

Diante deste cenário, na região amazônica há potencial oportunidade de geração de

negócios, emprego e renda baseados em inovações biotecnológicas que possam propiciar o

uso sustentável de sua biodiversidade e um processo de desenvolvimento regional

economicamente mais dinâmico e socialmente mais justo. Contudo, até o momento não se

identifica o aproveitamento efetivo dessa potencialidade, e os ciclos de uso e exploração de

recursos ambientais na região não lograram a construção de um desenvolvimento regional

sustentável (CGEE, 2007, p. 124).

Assim, torna-se relevante ao objeto deste estudo fazermos uma análise sobre como a

dinâmica de incentivos e obstáculos em termos de desenvolvimento de processos de

inovações baseados em oportunidades biotecnológicas ocorre do Estado do Pará. Contudo,

para entendermos tais dinâmicas no contexto do Pará, consideramos antes necessário

conhecer um breve histórico da trajetória de formação das bases institucionais e de políticas

de fomento à inovação em âmbito nacional e regional. Estas características nacionais e

regionais são importantes por terem forte influência na formação e no desenvolvimento dos

processos políticos e institucionais internos no Estado.

2.3.1 Breve histórico sobre as bases institucionais da inovação

Suzigan e Albuquerque (2008) argumentam que o Brasil apresentou um processo

histórico de formação de instituições de CT&I tardio, limitado, e problemático. Esta situação,

combinada ao caráter também tardio e limitado da industrialização do país, implicou

importantes debilidades às interações entre ciência, tecnologia e inovação (SUZIGAN;

ALBUQUERQUE, 2008).

O processo de formação das bases de CT&I foi tardio não somente em relação a países

de economia avançada, mas também em comparação com outros países da América Latina

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ainda no período colonial. Portugal mantinha restrições a instalações de universidades ou

instituições de pesquisa no território colonial brasileiro, de modo que, somente com a

mudança da corte portuguesa ao Brasil em 1808, as primeiras faculdades para ensino superior

puderam ser criadas, e os institutos de pesquisa começam a ser estabelecidos, tendo um

impulso maior no final do século XIX (SUZIGAN; ALBUQUERQUE, 2008).

No entanto, estas primeiras faculdades e instituições de pesquisa em geral atuavam de

forma separada, sem articulação entre um embrionário desenvolvimento científico e o ensino

superior, o que permanece como tal até o início do século XX (SUZIGAN;

ALBUQUERQUE, 2008). Esta separação entre atividades de ciência e ensino leva Suzigan e

Albuquerque (2008) a denominarem de limitada a constituição das instituições de C&T.

Contudo, além de tardio e limitado, o desenvolvimento de instituições de C&T

também foi problemático por ser marcado por desigualdades, tanto na distribuição das

instituições no território nacional, quanto à dificuldade de acesso da maior parte da população

a estes ambientes de produção científica e tecnológica, como universidades e instituições

científicas (SUZIGAN; ALBUQUERQUE, 2008).

A partir da década de 1950, evidenciam-se iniciativas do governo federal em constituir

uma política para estruturação institucional da CT&I no país. O Estado brasileiro incentivou a

industrialização do país, utilizando o modelo de substituição de importações, fazendo

investimentos diretos por meio de bancos de desenvolvimento, e criando grandes empresas

públicas em setores considerados estratégicos, além de apoiar a implantação de

empreendimentos industriais privados, com destaque à instalação de fábricas de

multinacionais estrangeiras (CASSIOLATO; LASTRES, 1998; VIOTTI, 2008).

Esta estratégia de política de desenvolvimento, Viotti (2008) caracteriza como a busca

do desenvolvimento pelo crescimento econômico e industrialização extensiva. A política de

CT&I baseou-se na promoção de infraestrutura e atividades de P&D, notadamente pela

criação e fortalecimento de universidades, instituições de pesquisa, e agências nacionais de

fomento (CNPq, CAPES e FINEP) (VIOTTI, 2008). Deste modo, foi marcada por uma

concepção “ofertista”, pelo qual se acreditava na progressiva absorção do conhecimento

tecnológico pela nascente industrial nacional (CGEE, 2010; CASSIOLATO; LASTRES,

1998; VIOTTI, 2008).

Neste período, a maioria das atividades de P&D foi feita por institutos e empresas

públicas, com participação reduzida de empresas privadas, em que a base particularmente

multinacional, manteve sua estrutura de desenvolvimento tecnológico de novos produtos e

processos em seus países de origem (CASSIOLATO; LASTRES, 1998; VIOTTI, 2008).

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53

Uma segunda fase de orientação política à CT&I começa no final dos anos de 1970,

marcada pela crise econômica internacional e fortes problemas fiscais em países em

desenvolvimento (VIOTTI, 2008). De acordo com políticas de orientação neoliberal, uma

série de medidas para a redução do papel e tamanho do Estado foi efetivada, entre elas a

desregulamentação, a abertura ao comércio internacional e privatizações, e observa-se a uma

instabilidade no nível de investimentos públicos em CT&I no período, com momento de

grave retração (CRUZ; PACHECO, [20--?]; PACHECO, 2007; VIOTTI, 2008).

Para Viotti (2008), a estratégia de desenvolvimento deste período é representado pela

busca da eficiência, com destaque a implementação do Programa Brasileiro de Qualidade e

Produtividade. Entretanto, as dificuldades do legado das políticas “ofertistas” anteriores não

conseguiram ser superadas (PACHECO, 2007).

Manteve-se a assimetria entre atores do sistema de CT&I, uma vez que o

fortalecimento da pesquisa acadêmica não havia sido acompanhado pelo desenvolvimento de

capacitação tecnológica das indústrias (PACHECO, 2007). Neste sentido, Suzigan e

Alburquerque (2008) defendem que as relações entre as instituições de C&T e empresas no

Brasil são representados por poucos pontos de interações em setores específicos. Apesar de

haver setores, como aeronáutica e agricultura, em que houve a construção em longo prazo de

relações entre indústria e centros de pesquisa com esforços sistemáticos apoiados pelo

governo, estas são exceções frente ao conjunto de atividades do país.

Pacheco (2007) ressalta que as políticas de CT&I não tiveram aderência no terreno da

política macroeconômica do governo. Um dos principais desafios se configura como a

histórica desarticulação entre a política de CT&I e a política macroeconômica e industrial no

Brasil, com substancial instabilidade do gasto público na área de CT&I e extremamente baixo

investimento privado (PACHECO, 2007).

Neste contexto, uma terceira fase das políticas de CT&I tem início no final da década

de 1990, em um cenário de recuperação econômica, onde o tema da inovação assume

relevância nas proposições de políticas de desenvolvimento (PACHECO, 2007). Pacheco

(2007) ressalta três aspectos centrais: Uma melhora nos padrões de financiamento com a

criação dos Fundos Setoriais que passam a abranger o Fundo Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (FNDCT) com aumento do orçamento de CT&I (1); a ênfase no

estímulo de variados tipos de arranjos público-privado (2); e uma mudança mais ampla da

legislação (3).

Destaca-se a criação da Lei de Inovação (BRASIL. LEI Nº 10.973/2004) e da Lei do

Bem (BRASIL. LEI Nº 11.196/2005), além do estabelecimento de novas instituições de

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articulação, como a implantação da Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação

Industrial), e a execução de programas com diferentes desenhos políticos, na busca de

inclusão de novos atores, como governos estaduais e municipais, e organizações do setor

privado (CGEE, 2010).

A promoção da inovação se tornou cada vez mais explícita nas principais políticas da

área de CT&I (VIOTTI, 2008). A própria mudança no nome do Ministério da Ciência e

Tecnologia (MCT) em 2011 para Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) pode retratar

simbolicamente este cenário.

Entretanto, os desafios antigos ainda precisam ser enfrentados, Pacheco (2007)

entende que uma política de incentivo à inovação faz parte da orientação de política

econômica geral de um país, seja por ação, seja por omissão. Portanto, a continua

incompatibilidade entre a política de CT&I e as políticas macroeconômicas (por exemplo,

com a elevação de juros) no Brasil é incoerente para o autor.

Em sentido similar, Viotti (2008) e Salerno e Kubota (2008) levantam o problema da

coordenação de políticas de inovação tanto no nível vertical como horizontal das esferas de

governo. É necessário a busca de uma coordenação política vertical entre as esferas federal,

estaduais e municipais, bem como uma integração política horizontal em cada esfera, por

exemplo, entre os diferentes ministérios e órgãos do governo Federal, em vez ocorrerem ainda

considerável disputa entre estes, ou mesmos órgãos que atuam sem considerar seus impactos

sobre a CT&I (VIOTTI, 2008; SALERNO; KUBOTA, 2008).

Outro obstáculo para Cruz e Pacheco (s/d) é a inconsistência de instrumentos de

políticas de promoção à inovação empresarial. Em geral, estes instrumentos são formulados

com base em modelos acadêmicos, que apesar de serem bastante conhecidos para

pesquisadores de instituições de ensino e pesquisa, não o são para empresários (CRUZ;

PACHECO, [20--?]). Além disso, a maior parte das ações de apoio são executadas dentro do

legado institucional das políticas anteriores, em instituições como FINEP, CNPq e Fundações

de Apoio a Pesquisa (FAP) que foram historicamente voltadas ao relacionamento com

universidades e centros de pesquisa públicos, o que também provoca dificuldades de

implementação (CRUZ; PACHECO, [20--?]).

Enríquez (2003, p. 169) corrobora que as dificuldades de comprometimento do setor

produtivo com atividades de inovativas relacionam-se a um histórico de políticas

protecionistas anteriores e a dependência tecnológica das empresas. O autor acrescenta

também barreiras com a escassez de crédito em condições adequadas para projetos de

inovação, e o foco das empresas ao mercado interno, em que há menor competitividade.

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Deste modo, percebe-se que há uma retomada na promoção de um ambiente

institucional de incentivo à inovação no país, principalmente buscando o aproveitamento da

infraestrutura e capacidade científica instalada nas instituições de C&T do país para fomentar

interações com indústrias e empresas de diferentes setores e assim auxiliar no aumento da

capacidade tecnológica dos agentes privados. No entanto, essa desarticulação entre os agentes

é dependente de trajetórias históricas, e sua superação implica no desenvolvimento de longo

prazo de vínculos institucionais e no estabelecimento de relações de confiança e

reciprocidade.

Cabe destacar também que são expressivas as desigualdades na distribuição regional

de agentes e de instituições do sistema de C&T, assim como as disparidades de

desenvolvimento industrial no país (CGEE, 2007, p. 135). Por isso, outro desafio é tornar o

sistema de CT&I capaz de identificar as particularidades regionais, valorizar suas

potencialidades e atuar sobre seus pontos críticos específicos, tornando cada região capaz de

se integrar a cadeias globais tanto por possibilidades geradas pela inovação de novos produtos

e processos em setores tradicionais, como implantação de novas atividades industriais (CGEE,

2007, p. 135).

Em termos de estudos em contextos regionais, o CGEE (2011) identificou que a região

Norte apresentava o menor percentual de empresas inovadoras (somente 3,2%.) entre as

regiões do país. Segundo o CGEE (2010) alguns dos fatores estruturais mais proeminentes

para a desigualdade de CT&I entre os estados brasileiros são: Disparidade do legado histórico

da distribuição de ativos tecnológicos e institucionais (1); graves diferenças orçamentárias e,

portanto, de potencial de gasto (2); e a elevada diferenciação regional da estrutura industrial e

esforço em P&D das empresas (3).

No Estado do Pará, um reflexo destes fatores é concretizado na formação da estrutura

de instituições pontes em C&T. As principais instituições de pesquisa científica no Estado

foram criadas, ou posteriormente incorporadas, pelo governo federal, como a Universidade

Federal do Pará (MEC), Universidade Federal Rural da Amazônia (MEC), o Museu Paraense

Emílio Goeldi (MCTI), e a unidade EMBRAPA (MAPA), entre outros.

Na esfera de governo estadual, a estruturação de base institucional de CT&I inicia-se

somente no final da década de 1980, com a previsão na constituição estadual de criação de

fundo específico para C&T. Na década de 1990, o fundo de investimento em C&T foi

regulamentado pela Lei Estadual 29/1995, e passou a ser gerido pela Secretaria Estadual de

Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (SECTAM). Neste período, é criada a Universidade do

Estado do Pará (PARÁ. LEI Nº 5.747/1993).

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Após essa estruturação inicial, mudanças significativas somente voltam a ocorrer em

2007, quando é criada a Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia

(atual Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação), com a desvinculação da área

de C&T da antiga SECTAM. O Estado passou a ter uma secretaria estadual específica

dedicada ao tema (PARÁ. LEI Nº 7.017/2007), e no mesmo ano a implantação da Fundação

de Amparo à Pesquisa do Estado do Pará (Lei complementar 061/2007), no período dentro

das diretrizes políticas estaduais, destaca-se o projeto de instalação de Parques de Ciência e

Tecnologia. Entendemos que esta formação de base institucional do Estado do Pará em CT&I

foi tardia em comparação com a trajetória da maioria dos Estados da federação, apesar de ter

se caracterizado por uma fase recente de desenvolvimento das novas instituições.

Porém, estes investimentos são fortemente baseados no governo federal (CGEE,

2010). Entre os novos investimentos federais no Estado, pode-se ressaltar a criação de novas

universidades federais (Universidade Federal do Oeste do Pará e Universidade Federal do Sul

e Sudeste do Pará) e de uma unidade local do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

(INPE) na área do Parque de Ciência e Tecnologia Guamá.

Cabe ressaltar que as substanciais disparidades orçamentárias entre os Estados

brasileiros e a heterogeneidade de políticas de CT&I desses governos subnacionais têm como

consequência uma expressiva desigualdade também na distribuição de gastos dos estados em

CT&I. De acordo com dados do CGEE (2010), em 2007, a aplicação de recursos dos

governos estaduais em CT&I por região ocorreu conforme a tabela abaixo:

Tabela 2 - Percentual de aplicação de recursos pelos governos estaduais em CT&I por região do Brasil

em 2007.

Percentual de aplicação de recursos pelos governos estaduais em

CT&I por região do Brasil em 2007

Região Perc. de recursos aplicados

Norte 2,68%

Nordeste 9,06%

Centro-Oeste 2,53%

Sudeste 75,43%

Sul 10,31%

Total 100%

Fonte: Baseado em CGEE (2010, p. 76).

O aporte específico do Estado do Pará neste ano de 2007 representou 0,52% do total

de recursos estaduais aplicados em C&T, e em termos relativos ao PIB estadual, o aporte foi

equivalente a 0,06% de seu PIB, ocupando assim a 18ª posição em proporção de investimento

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relativo ao PIB entre os estados brasileiros (CGEE, 2010, p. 75-76). Neste caso, observa-se

uma considerável restrição de aporte de recursos estaduais à CT&I na região Norte como um

todo, e no Pará, o que é um ponto de preocupação relevante quanto ao estabelecimento de

políticas de desenvolvimento amparadas no progresso científico e tecnológico.

Em relação à estrutura institucional de C&T na esfera municipal, durante a pesquisa

não foram identificados órgãos específicos de C&T vinculados aos governos municipais

paraenses. Poucas prefeituras apresentaram secretarias municipais explicitamente dedicadas

ao tema, sendo as encontradas localizadas somente nos municípios de Ananindeua e Marabá,

e apenas duas prefeituras foram identificadas como associadas ao Fórum Nacional de

Secretários e Dirigentes Municipais de CT&I, sendo estas as de Castanhal e Ananindeua.

Por fim, a região amazônica, com exceção à zona franca de Manaus, possui escassa

atividade industrial (CGEE, 2008, p. 19). Enríquez (2003, p. 170) afirma que, enquanto a

conjuntura industrial do Brasil se configurou pouca inovadora tecnologicamente, com baixa

capacidade de competitividade e precária interação das empresas com instituições de pesquisa

(com exceção de setores específicos), a situação na região Amazônia é ainda mais crítica,

reportando-se ao próprio modelo histórico de produção econômica baseado na exploração de

matérias primas com baixa intensidade tecnológica.

De forma que na região Norte em geral, incluindo-se o Estado do Pará, processos de

inovação tecnológica são ainda incipientes, em termos quantitativos e qualitativos, sendo o

conhecimento tecnológico acumulado e as oportunidades de aprendizado constantemente

subutilizados quanto aos potenciais arranjos institucionais possíveis entre universidades,

institutos de pesquisa, empresas e demais atores locais, nacionais e internacionais (CGEE,

2007, p. 136).

Obstáculos à formação de tais arranjos interorganizacionais tem um forte impacto

quanto à possibilidade de aproveitamento de oportunidades tecnológicas na área da

biotecnologia. Isso porque o desenvolvimento de inovações biotecnológicas é geralmente

caracterizado pela cooperação entre instituições de pesquisa e o setor produtivo, em função do

alto nível complexidade cientifica e tecnológica que envolve, além do volume de

investimentos necessários (ENRÍQUEZ, 2003, p. 172).

2.3.2 Biotecnologia como oportunidade de negócio

Contínuos avanços científicos e tecnológicos em engenharia genética e molecular

desde a década de 1980 têm permitido desenvolver e difundir a biotecnologia, processo

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tecnológico capaz de proporcionar uma considerável agregação de valor aos produtos naturais

(ENRÍQUEZ, 2003, p. 171).

A biotecnologia tem conseguido transpassar horizontalmente e verticalmente vários

setores da economia, criando novos paradigmas tecnológicos (ENRÍQUEZ, 2003, p. 172). No

entanto, reconhece-se que a trajetória da biotecnologia não é linear em todos os setores,

variando de acordo com a base de conhecimento e trajetória tecnológica desenvolvida te então

(ENRÍQUEZ, 2003, p. 172). Por exemplo, no setor farmacêutico seu avanço é mais complexo

e envolve ruptura de base de conhecimento com a trajetória de química sintética, no setor de

alimentos funcionais até o momento a complexidade de sua aplicação é menor.

Para Assad (2003, p. 32), a biotecnologia deve ser vista não somente como uma

oportunidade de mercado para serviços e produtos inovadores, como novas rotas

farmacêuticas e melhor produtividade agrícola, mas também pode ser útil para a preservação

da diversidade genética ex situ. Por meio da biotecnologia é possível conhecer e preservar

melhor espécies e seus conjuntos de genes, contribuindo para a conversação in situ e seu uso

sustentável (ASSAD, 2003, p. 32).

O processo de biotecnologia para desenvolvimento de produtos ou processos pode ser

dividido em três etapas: pesquisa científica, bioprospecção, e desenvolvimento tecnológico. A

pesquisa científica abrange as atividades de investigação que a priori não tem identificado

potencial de uso econômico (MMA, 2005, p. 9). Assim, por sua natureza de baixo grau de

apropriabilidade de investimentos, há forte presença de instituições públicas ou sem

finalidade lucrativa nesta etapa.

A etapa de bioprospecção é a busca de princípios ativos, refere-se ao estudo de

organismos com potencial de uso comercial que possibilitem a descoberta de novos produtos

(ENRÍQUEZ, 2003, p. 174; MMA, 2005, p. 9). Nesta fase, há a direção e intensidade das

atividades já passam a sofrer maior influência do mercado, e múltiplos arranjos cooperativos

tanto entre entidades públicas e privadas, quanto entre setores e entidades privados, com forte

presença de starup de base tecnológica (como explicado mais adiante). E, finalmente, a fase

de desenvolvimento tecnológico objetiva à produção de inovações de produtos ou processos,

com aplicação econômica (MMA, 2005, p. 9).

Ao considerar a complexidade, incerteza e nível de investimentos necessários para as

atividades, Enríquez (2003, p. 172) indica que um fator essencial para o desenvolvimento da

biotecnologia é cooperação entre instituições de pesquisa e o setor produtivo, sendo que este

último exerce considerável influência na intensidade e direção das trajetórias tecnológicas a

serem seguidas. Esta característica de interação entre instituições de pesquisa e empresas é,

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contudo, uma dificuldade já comentada em países em desenvolvimento, particularmente no

Brasil, onde esta interação é, em geral, incipiente.

Além da interação entre empresas e unidades e institutos de pesquisa, a biotecnologia

é um terreno fértil também para o desenvolvimento de parcerias entre empresas do setor

privado. Neste contexto, há espaço para as pequenas empresas de base biotecnológica, que

têm se especializado em nichos específicos de mercado de pesquisa de bibliotecas de

compostos químicos e naturais, e no desenvolvimento de produtos primários às indústrias

maiores (ENRÍQUEZ, 2003, p. 181). Este tipo de parceria interorganizacional entre pequenas

empresas baseadas em competências tecnológicas e grandes empresas que dominam

processos de produção e capacidades complementares está sendo típica na área farmacêutica,

como retrato por Powell, Koput e Smith-Doerr (1996). Segundo Assad (2003, p. 32) no Brasil

já havia 304 empresas de biotecnologia em 2003.

Se por um lado a necessidade de articulação entre empresas e entre estas e instituições

de pesquisa é um desafio, por outro lado é uma ocasião conveniente para aproveitar a

infraestrutura de pesquisa existente na região, e encontrar alternativas para fortalecer e

disseminar os conhecimento e competência já adquiridos pelos pesquisadores e instituições

instaladas na região (CGEE, 2007, p. 144).

Em termos de capacidade de C&T para biotecnologia, estudos do CGEE (2006a;

2008) destacam-se no Pará as seguintes instituições: Universidade Federal do Pará (UFPA),

Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG), Embrapa Amazônia Oriental e Universidade Federal

Rural da Amazônia (UFRA) (CGEE, 2006a, p. 89; CGEE, 2008, p. 69, 48, 31, 81).

Acrescenta-se a esta lista também o Instituto Evandro Chagas (IEC), na área específica de

pesquisa biomédica e saúde pública (IEC, 2014).

Os pontos positivos da capacidade instalada de C&T no Estado referem-se a um

quadro de pessoal científico e infraestrutura tecnológica alto nível3 (CGEE, 2008, p. 223). Há

dois herbários credenciados do fies depositórios (Museu Paraense Emilio Goeldi e Embrapa

Amazônia Oriental), e a UFPA possui autorização do CGEN para montagem de coleção ex

situ e acesso especial a bioprospecção (CGEE, 2008, p. 16, 30).

As instituições possuem um parque de equipamentos heterogêneo, de acordo com suas

especialidades, de forma geral, este parque é amplo e capaz de realizar múltiplas análises

3 Neste relatório do CGEE (2008) é realizado um mapeamento das principais instituições de pesquisa na região

Amazônica, contemplando o levantamento no Estado do Pará quanto a capacidade de atuação na área de

biotecnologia. São analisados itens como estrutura física e acadêmica, incluindo instalações e equipamentos,

recursos humanos, e projetos relevantes na área. Entre as páginas 126 e 136 é elaborada uma nota específica

para o Estado do Pará.

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biológicas, químico e físicas, estando em condições niveladas às instituições nacionais

(CGEE, 2008). Estas instituições detêm experiência em diversas áreas científicas interligadas

a biotecnologia (biologia, química, física, engenharias química e de alimentos), inclusive a

UFPA possui cursos de graduação e pós graduação (mestrado e doutorado) específicos em

biotecnologia (CGEE, 2008; UFPA, 2013, 2014a).

No entanto, também se identificam dificuldades que são relacionadas principalmente a

restrições de recursos para manutenção e renovação apropriada de infraestrutura, deficiência

de pessoal técnico e de apoio, reduzido orçamento para pesquisas (dependência de captação

externa), e interação limitada com o setor produtivo (CGEE, 2008, p. 36, 54, 79-80, 85;

ENRÍQUEZ, 2013, p. 170).

Além da capacidade de C&T, Enríquez (2003, p. 186) chama atenção para as

especificidades de cadeias produtivas da biodiversidade quanto a seu potencial de

aproveitamento econômico. Alguns aspectos particulares de cadeias produtivas baseadas em

produtos da biodiversidade na região amazônica também precisam ser discutidos, pois se

distingue de cadeias produtivas tradicionais da indústria e tem impactam na possibilidade

efetiva de competitividade desses produtos tecnológicos em mercados globais, como a

garantia de qualidade e quantidade de matérias primas, com dificuldades abrangendo desde a

colheita, seleção, transporte e comercialização até os mecanismos de gestão (ENRÍQUEZ,

2003, p. 186).

Assim, é necessário considerar as características específicas das cadeias da

biodiversidade, no que tange a produção de escala, qualidade e quantidade de matéria prima

disponível, organização e logística de produção, políticas de preços, relevância de marcas, e

fatores socioambientais (CGEE, 2007, p. 22).

Em uma cadeia de ativo da biodiversidade em geral os produtos (matérias primas)

estão dispersos na natureza, bem como os fornecedores também estão dispersos

espacialmente, não há economias de escopo e escala estabelecidas ou uma rede de prestadores

de serviços e de assistência técnica organizada (CGEE, 2007, p. 22).

Em geral, neste tipo de cadeia a transação comercial entre o extrativista e a

bioindústria é instável, há grande dificuldade de se instituir uma frequência de fornecimento,

pois nem o fornecedor pode garantir a existência da produção, e nem o consumidor em geral

consegue assegurar o nível de demanda, o que pode gerar agudas oscilações nos preços

(CGEE, 2007, p. 23). Na transação comercial, aparece também forte presença do

atravessador, porém este não agrega valor substancial aos produtos, de forma que há um

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aumento dos custos de transação e da assimetria de informação entre os agentes, em prejuízo

dos extrativistas (CGEE, 2007, p. 23).

A logística é outro aspecto crítico, há dificuldades para acessar as áreas produtivas,

deslocar o produto aos locais de armazenagem e posteriormente comercializar e transportar os

produtos para processamento industrial (CGEE, 2007, p. 23). Cabe ainda indicar como fator

complicador que os produtos da biodiversidade são comumente muito vulneráveis, sujeitos a

contaminação e rapidamente perecíveis, isso enfraquece também a posição dos extrativistas,

enquanto ente econômico (CGEE, 2007, p. 23).

Ao contrário de cadeias tradicionais, onde fornecedores constroem marcas para

identificação de mercado, em cadeias da biodiversidade é possível fazer identificação com uso

de valores e símbolos imateriais que se vinculam a um valor intrínseco (CGEE, 2007, p. 23)

da floresta, da comunidade ou de um meio de vida. Em razão disso, há um potencial de

agregação de valor por estes significados.

No que tange a fatores socioambientais, deve-se ter em mente que a manutenção da

cadeia da biodiversidade extrapola a lógica puramente econômica, uma vez que contribui para

a conservação dos ecossistemas e de serviços ambientais, pois convive com os sistemas

florestais e áreas preservadas (CGEE, 2007, p. 23). Isso abre a possibilidade de criação de

mecanismos de biocomércio e comércio justo, o que é socialmente relevante, pois se por um

lado o extrativismo tradicional da região colaborou para a manutenção da floresta, por outro

lado não tem contribuído para uma justiça social no território (CGEE, 2007, p. 16, 24).

A divulgação de propriedades especiais e qualidade diferenciada dos produtos naturais

(principalmente em termos de benefícios à saúde e de serem menos agressivos ao meio

ambiente) têm levado a uma intensificação do uso desses produtos naturais (CGEE, 2007, p.

118). Contudo, ao considerar tais especificidades das cadeias de biodiversidade, verifica-se

que há desafios em sua organização que precisam ser superados para que a possibilidade de

criação de bioindústrias se consolide.

Entre as principais limitações ressalta-se a não adequação da oferta à demanda e vice-

versa, com mercados ainda não consolidados e pouca diversificação de setores demandantes.

Deste modo, percebe-se que os arranjos produtivos são ainda incipientes e há uma deficiência

na coordenação entre os agentes da cadeia com um grande número de intermediários. Tais

problemas de informação e coordenação reforçam dificuldades em se estabelecer

regularidades entre oferta e demanda (CGEE, 2007, p. 20, 121).

Há ainda a necessidade de implementar melhorias de padrões de qualidade e práticas

produtivas que garantam adequação consistentes a normas exigidas no mercado, inclusive

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quando a certificações ambientais, além de uma infraestrutura para a produção e distribuição

dos produtos adequadas (CGEE, 2007, p. 20).

Um exemplo de não superação desses problemas é indicado pelo CGEE (2007, p. 29)

na cadeia da castanha-do-pará: O Brasil ocupou a primeira posição no fornecimento do

mercado mundial da castanha até 1990 (80% do comércio mundial/produção de 51.000 t). No

entanto, em meados da década de 2000 a produção já havia reduzido para 30.000 t, e a Bolívia

passou a ser a principal exportadora mundial. Os principais motivos apontados para esta

queda de produção foram a redução de castanhais produtivos, deficiências de logística e de

atendimento de normas fitossanitárias, e ausência de programas de incentivo a sustentação de

renda de extrativistas.

É preciso conceber que a sustentabilidade das atividades a serem estabelecidas na

cadeia será alcançada não somente pela implantação de práticas de uso sustentável em si, mas

também terá que vencer a concorrência por espaços frente a alternativas de produção

convencionais e predatórias em curso na região.

A superação deste conjunto de questões relacionado às cadeias produtivas baseadas

em biodiversidade é de fundamental importância para assegurar a viabilidade de geração de

inovações tecnológica e sua competitividade à cadeia, de modo a torná-la sustentável. No

entanto, sua solução passa por um amplo diálogo entre todos os atores das cadeias,

comunidades produtoras, empresários, instituições de apoio e financiamento, e destes com os

representantes governamentais para alinhamento coerente de políticas públicas.

2.3.3 Cadeia produtiva do açaí e o potencial da exploração da biotecnologia

O açaí produzido no Pará é fruto do açaizeiro (Euterpe oleracaea Mart.), uma

palmeira nativa da Amazônia, cujo principal centro de dispersão está no Estado do Pará

(NOGUEIRA, 2002). As qualidades do fruto relacionam-se a um alto valor energético e

nutricional (proteínas e minerais), com elevado teor de compostos fenólicos, principalmente

de antocianinas, que são compostos bioativos antioxidantes (COHEN et al, 2006).

Estas características atraem os interesses de indústrias como de alimentos funcionais e

nutracêuticos, cosméticas e farmacêuticas por inovações tecnológicas que permitam agregar

tais qualidades em produtos de desempenho superior aos existentes no mercado consumidor

atual.

Contudo, conforme Homma et al (2006, p. 13, 20) a qualidade (níveis de

componentes) nos frutos do açaí apresentam grande variação, e alta perecibilidade, de modo

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que a conservação de polpa do açaí exige cuidados especiais, pois sendo alcalino, facilita a

proliferação de fungos e bactérias.

Além da polpa do açaí, a fibra e o caroço do fruto também podem ser aproveitados e

ressalta que o palmito derivado do açaizeiro, é um produto de destaque em que o Pará

abastece quase 90% da produção do País, bem como atende demanda do exterior (SAGRI,

2014a).

O consumo de açaí no Pará tem raízes culturais profundas, baseadas por estruturas

produtivas com microescalas, predominantemente vinculadas à produção familiar extrativista,

espacialmente difusas, atendiam uma demanda estritamente regional (COSTA, F., 2009, p.

344). A partir da década de 1970 até o final da década de 1990, a extração de palmito

apresentava uma remuneração mais atrativa, o que causou um extensivo corte de palmeiras

em açaizais e considerável redução da oferta de açaí, posteriormente, o aumento de demanda

e, portanto, dos preços do fruto do açaí alcançaram novos níveis atrativos à cultura do açaí, e

impactou positivamente na conservação de açaizais nativos (SILVA; SANTANA; REIS,

2006, p. 31; HOMMA et al, 2006, p. 10).

Até os dias atuais, o Estado do Pará continua sendo o maior produtor e consumidor de

açaí do Brasil, entretanto, a descoberta e divulgação dos benefícios do açaí, fizeram com que

surgisse uma forte demanda nacional e internacional por produtos derivados da sua polpa

(HOMMA et al, 2006, p. 14). Assim, constatou-se um aumento da demanda de polpa para

comercialização em outros estados brasileiros e para o exterior, além da ampliação de

consumo interno municípios tradicionais de consumo, e em outros onde a produção dessa

fruta era pequena ou inexistente (HOMMA et al, 2006, p. 21)

Em 2010, as vendas para o mercado internacional de polpa de açaí alcançaram o valor

total de US$ 18,6 milhões, o que equivaleu naquele ano a 65,5% da pauta de exportação de

sucos do Estado. Em 2012, foram exportados mais de 6 mil toneladas da polpa, no valor

acima de US$ 17 milhões (SAGRI, 2014a). Os EUA lideram as demandas de exportações

com cerca de 79% do total exportado destinados a este país, seguido do Japão (14%); e mais

recentemente, países da América do Sul, como Argentina e Chile, tem aparecido como

potenciais compradores (SAGRI, 2014a).

No mercado nacional, o total comercializado para demais estados é em torno de 40 mil

toneladas/ano, e os principais demandantes são os estados de Rio de Janeiro e São Paulo que

consomem em torno de 650 toneladas/mês de polpa, e mais de 1.000 toneladas/mês no

formato de mix com guaraná e granola (SAGRI, 2014a).

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A Secretaria Estadual de Agricultura do Pará (SAGRI, 2014a) estima que do total da

quantidade total produzida no Estado, 10% é exportada para outros países, enquanto que 60%

é comercializado para consumo no próprio estado, e 30% destinado a outros estados da

federação. De modo que é possível afirmar que a demanda de açaí apresenta-se crescente com

necessidade de atendimento no mercado local, nacional e internacional.

Este novo cenário econômico de crescente aumento de demanda no mercado de polpa

de açaí pressionou os preços para alto (SILVA; SANTANA; REIS, 2006, p. 27). Em pesquisa

sobre elasticidade-preço da oferta e demanda do açaí no período de 1980 a 2004, Silva,

Santana e Reis (2006, p. 32) concluíram que a oferta tornou mais inelástica frente ao preço, de

modo que uma variação de 1% no preço do açaí, corresponde a um aumento da quantidade

ofertada em somente 0,25%,

Na interpretação de Silva, Santana e Reis (2006, p. 32) a limitação na oferta do açaí

diante da crescente demanda por mercados consumidores em outros estados do Brasil e no

exterior resultou em um aumento de preços do fruto a partir do início da década de 2000, e

tornou a demanda de açaí no mercado local (Belém) mais elástica, alterando-se de um estado

inelástico que a caracterizou anteriormente. Ainda em termos de mercado local, Homma et al

(2006, p. 20) indicam que esta pressão de demanda vinda destes novos mercados provocou

uma exclusão das populações locais de menor poder aquisitivo ao acesso ao produto, o qual

no passado era característico desta categoria.

Em pesquisa posterior, Nogueira e Santana (2009, p. 20) identificaram que entre 2004

e 2007, a demanda pelo açaí mantém-se em crescimento mais rápido em volume que a oferta.

Neste mesmo estudo, os autores também constataram um forte padrão sazonal de preços do

fruto, devido aos períodos de safra e entressafra (como será visto adiante), o qual apresentou

significativa amplitude de variação de preços.

Segundo dados da SAGRI (2014a, 2014b), o Pará é o maior produtor nacional, com

uma produção anual em 2012 de 928.183 toneladas de fruto, tendo apresentado um aumento

de 9% na produção de 2011 para 2012, gerando um valor aproximado de R$677,2 milhões.

Com este movimento de aumento da demanda do produto emergiu na região

metropolitana de Belém e nordeste paraense uma estrutura de processamento industrial de

frutas formada por empresas de maior porte que os pontos antes tradicionais de

comercialização de polpa de açaí para consumo imediato, conhecidos como batedores

(COSTA, F., 2009, p. 344). As principais razões para constituição dessas agroindustriais para

comercialização do açaí, além do aumento da escala de produção, refere-se a necessidade do

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emprego de processos fitossanitários (pausterização e congelamento) para conservação

adequada do produto, extremamente perecível e sujeito a contaminações.

Apesar de reconhecerem que o surgimento destas plantas industriais focava o

atendimento do mercado nacional e internacional, Homma et al (2006, p. 20) entendem que

este movimento pode trazer como tendência futura desdobramentos como a substituição em

médio e longo prazo dos pequenos empreendimentos batedores de açaí, de modo que

fornecimento do mercado local passa a ser realizado por oferta de produtos beneficiados nos

supermercados.

Para F. Costa (2009, p. 345), no centro deste processo de emergência e consolidação

de dinâmicas associadas à economia do açaí, mediante o crescimento da demanda por esse

produto, está o desenvolvimento da produção rural. Os plantios e o melhoramento do manejo

de áreas nativas tem garantido uma adequação mínima entre oferta de matéria prima e

demanda por polpa, assegurando uma expansão de mercado (COSTA, F., 2009, p. 345).

Contudo, embora esta compatibilidade mínima esteja permitindo uma rentabilidade

suficiente para ampliar a atividade, F. Costa (2009, p. 345), chama a atenção para a existência

de carências tecnológicas elementares tanto na fase rural e logística da cadeia produtiva,

quanto na sua configuração industrial, o que resulta em uma considerável capacidade ociosa

de processamento e uma ínfima capacidade de absorver e produzir inovações (COSTA, F.,

2009, p. 345). F. Costa (2009, p. 346), acrescenta que se estabelece uma situação ímpar em

que ao mesmo tempo há uma subutilização do potencial produtivo na indústria e na

agricultura e extrativismo, de forma que muitos na indústria atribuem o problema ao setor

rural e vice-versa. De modo geral, os principais elos da cadeia produtiva do açaí podem ser

vistos na Figura 1:

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Figura 1 - Principais elos da cadeia produtiva do açaí.

Fonte: Da autora (2014).

Ao considerar os dois elos críticos indicados acima por F. Costa (2009, p. 346),

examina-se a seguir em maior detalhe a trajetória implementada pela produção rural e

agroindústria na cadeia.

- Produção rural:

Em relação à produção rural, identifica-se como principais dificuldades o

acompanhamento do fornecimento do fruto da crescente demanda do produto, com a

expansão de sua produção e, particularmente, redução de sua forte sazonalidade (COSTA, F.,

2009, p. 346). De acordo com Homma et al (2006, p. 7-9), o crescimento da demanda do açaí

teve como efeito um grande interesse no manejo de açaizeiros em áreas de várzeas e no

plantio em áreas de terra firme.

Conforme levantamento de Silva, Santana e Reis (2006, p. 35), até o ano de 2000, em

torno de 95% da produção de açaí do Pará tinha origem no extrativismo (açaizais nativos em

áreas de várzea), mas, em 2004, 80% da produção já correspondia a áreas manejadas ou de

cultivos racionais. Ainda neste estudo, os autores verificaram que as áreas em que foram

implantadas melhorias tecnológicas de cultivo alcançaram uma produtividade em média

130,02% superior às áreas do sistema extrativo original (SILVA; SANTANA; REIS, 2006, p.

32).

Este movimento pode ser observado conforme conjunto de gráficos de produção

disponibilizados no site da SAGRI, com base em dados do IBGE para a produção total, e de

áreas de cultivadas e de extração vegetal distintamente disposto na Figura 2:

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Figura 2 - Quantidade da Produção Total, Cultivada e de Extração Vegetal de Açaí no Estado do Pará

no período de 2003 a 2012.

Fonte: SAGRI (2014b).

Nos gráficos da Figura 2 é possível observar que o aumento na produção de açaí anual

de 2003 a 2012 tem sido alcançado por crescentes elevações da produção em áreas cultivadas

(inclusive manejadas), enquanto que a produção extrativista apresentou queda no período e

uma fraca capacidade de expansão. Assim, observamos que tanto em termos da quantidade

absoluta de produção, quanto em termos de produtividade, o cultivo de açaizais é superior ao

sistema extrativo original, predominante anteriormente.

Silva, Santana e Reis (2006, p. 27) entendem que a utilização de novas tecnologias de

manejo e cultivo são fundamentais para uma exploração sustentável da cultura do açaí. Neste

sentido, Homma et al (2006, p. 9) consideram o plantio de açaizeiro em áreas de terra firme

uma alternativa para a recuperação de áreas desmatadas, e uma forma de reduzir a pressão

sobre o ecossistema de várzea, bem mais frágil, evitando sua transformação em bosques

homogêneos dessa palmeira.

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Como vantagem adicional do plantio em áreas de terra firme está a facilidade de

transporte e um beneficiamento mais rápido, além da possibilidade de adubação que permite

ampliar a produção e a produtividade e também da irrigação como alternativa para se obter o

açaí em maiores quantidades na entressafra (HOMMA et al, 2006, p. 10).

Além disso, Homma et al (2006, p. 10) expressam preocupação com o manejo

extensivo de açaizais nativos nas várzeas, pois isso estaria promovendo a derrubada “verde”

de áreas ribeirinhas sujeitas às inundações. Para esses autores, a forma que tem ocorrido a

expansão da cultura única do açaí e a construção de canais com grande movimentação de

canoas e barcos em larga escala, pode esconder sérias consequências para a flora e a fauna na

foz do rio Amazonas em médio e longo prazo.

Cabe acrescentar que nas áreas de várzea as práticas de adubação não são

recomendadas, em virtude das inundações diárias que sofrem e do risco de contaminação do

ecossistema (HOMMA et al, 2006, p. 9). Esta inundação tem sido considerada uma fonte de

nutrientes para aos açaizais, no entanto, o aumento da carga de produção na várzea traz

incertezas quanto a sua sustentabilidade em longo prazo, pois ainda não se têm informações

consistentes sobre se a reposição de nutrientes pelos sedimentos das inundações periódicas

estão em quantidades adequadas (HOMMA et al, 2006, p. 9).

Diante disso, Homma et al (2006, p. 7) consideram que a tendência futura de expansão

do plantio é ocorrer em áreas de terra firme, inclusive com possível incorporação em sistemas

agroflorestais, não somente no Pará ou na Amazônia, mas também em outros estados

brasileiros, particularmente aqueles situados na Mata Atlântica, e mais próximos dos maiores

centros consumidores. Estes autores também não descartam o risco do cultivo do açaizeiro ser

transferido para outras regiões tropicais do mundo em razão de sua valorização econômica.

Entretanto, a produtividade do cultivo de açaí (e dos demais elos da cadeia) é

criticamente afetada pela sazonalidade de sua produção. Esta sazonalidade se diferencia

conforme a área de produção. No nordeste paraense, a safra concentra-se nos meses de agosto

a dezembro, quando se produzem em média 67% do total anual, e nos meses seguintes há uma

escassez com correspondente elevação de preços (COSTA, F., 2009, p. 346).

Na entressafra, o mercado local paraense é abastecido parcialmente com frutos

produzidos nos estados do Amapá e Maranhão, mas, em geral, devido ao substancial aumento

de preço e baixo volume disponível, as agroindústrias não processam açaí em suas plantas no

Pará neste período, a exceção do processamento de polpa congelada de origem da fase de

safra (HOMMA et al, 2006, p. 20). Tem sido um movimento comum estas indústrias

constituírem filiais ou alugarem plantas industriais no Amapá, e transferirem parte de seus

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funcionários para este estado na entressafra a fim de garantir o processamento e abastecimento de

seus estoques (HOMMA et al, 2006, p. 20).

No Estado do Amapá, o período de safra ocorre de dezembro a abril, com pico nos

meses de fevereiro e março, contudo cabe esclarecer que quase a totalidade de produção é

oriunda de municípios paraenses no noroeste da Ilha de Marajó (Chaves e Afuá), que por

razões de proximidade tem esta produção direcionada a este Estado (HOMMA et al, 2006, p.

14). Há ainda no Amapá alguns açaizais de várzea localizados em Mazagão e Anauerapucu

que produzem no período de entressafra local (HOMMA et al, 2006, p. 14).

No Estado do Maranhão, a safra é janeiro a maio com parte desta produção é

deslocada para o Estado do Pará, e no Estado do Amazonas, a extração de açaí (variedade

Euterpe precatória) acontece de março a julho, entretanto sem condições de comercialização

para o Estado do Pará em decorrência da distância (HOMMA et al, 2006, p. 14).

Conforme o pesquisador João Tomé Faria da Embrapa Amazônia Oriental durante

entrevista de campo, deve se esclarecer que o açaizeiro é capaz de dar frutos durante a

entressafra, mas em um volume bem menor. Mas, estudos têm sido realizados na implantação

de plantações irrigadas e com sementes geneticamente melhoradas no nordeste paraense que

demonstram que é possível alcançar produtividades equivalentes entre o primeiro e segundo

semestre do ano.

Neste contexto de produção rural, percebe-se o desenvolvimento de melhorias em

processos produtivos com apoio de estudos de universidades e institutos de pesquisa. Um

destaque é o lançamento em 2004 da cultivar de açaí “BRS Pará”, uma inovação tecnológica

desenvolvida pela Embrapa Amazônia Oriental (HOMMA et al, 2006, p. 14). A atividade de

melhoria genética continua e nos próximos anos novas variedades mais produtivas devem ser

disponibilizadas. Além disso, estudos quanto a seleção de características qualitativas

relevantes do fruto, como o teor de antocianina, também devem ser incorporados como

critérios de melhoria genética, segundo João Tomé Faria.

Contudo, o alcance e aplicação dessas melhorias tecnológicas a um conjunto amplo de

produtores, incluindo aqueles produtores familiares, dependem de um direcionamento de

políticas públicas adequadas a um projeto de sustentabilidade e competitividade da cadeia do

açaí no Estado. Segundo estimativas indicadas por João Faria para atender o crescimento da

demanda teriam que ser expandidas as áreas plantadas em torno de 40 mil hectares, e hoje no

Estado do Pará devem existir somente 2 mil hectares plantados.

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A perspectiva a médio e longo prazo de haver um alto volume de produção do fruto

fora do Estado, poderá ser configurar em uma ameaça à cadeia, e eliminar as vantagens

comparativas em que tem se baseado a agroindústria da região.

- Processamento industrial:

A implantação do processamento em escala industrial tem possibilitado o

aproveitamento da oportunidade da venda do açaí para outras regiões e no mercado

internacional com rentabilidade, tendo como vantagens a melhoria da qualidade do produto e

condições fitossanitárias, como uso de água adequada, pasteurização, e procedimento de

redução de riscos de contaminação microbiológica ao máximo (HOMMA et al, 2006, p. 20).

Contudo, do ponto de vista industrial há muitos desafios ainda a serem superados. Um

dos principais é a necessidade de ampliar a capacidade tecnológica sobre o processamento

industrial do açaí, a implementação desta estrutura inicial pode ser caracterizado conforme o

padrão de mudança setorial proposto por Bell e Pavitt (1993), como dominado pelo

fornecedor. Este padrão indica uma baixa capacidade tecnológica das empresas para a

realização de mudanças técnicas, e dependência de inovações em outros setores.

Neste aspecto, conforme entrevista de campo com funcionário de uma agroindústria,

em virtude da novidade de implantação de processo industrial para o açaí, houve dificuldades

na montagem de plantas pela ausência de conhecimentos específicos da indústria de bens de

produção sobre o processamento de açaí, assim fornecedores tiveram que realizar ajustes em

vários equipamentos. No entanto, até o momento a absorção destes conhecimentos específicos

e adaptações parecem estar sendo realizadas pelos fornecedores de bens de capital e não pelas

agroindústrias locais.

Outro desafio importante é a agregação de valor ao produto por meio de inovações,

seja aumentando sua durabilidade ou diversificando suas aplicações, além da possível

diversificação do próprio portfólio de linhas de produto da empresa. Quanto ao tipo de

produto, em geral, a maior parte dessas agroindustriais produzem exclusivamente polpa de

açaí, algumas diversificaram a produção também para produção de polpas de outros produtos

regionais, e poucas diversificaram em termos de aplicação do açaí em novos produtos, como

sorvetes e sucos (COSTA, F., 2009, p. 344).

Uma das razões da diversificação da base de matérias primas para outras frutas deve-

se a sazonalidade do açaí. Na entressafra, a redução da disponibilidade do açaí e a

concorrência do consumo local tradicional, com a consequente grande elevação de preços,

inviabiliza o abastecimento regular das agroindústrias, as quais buscam no processamento de

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outras frutas uma alternativa de renda, em virtude disso há níveis elevados de flexibilidade

das plantas industriais (COSTA, F., 2009, p. 346). No entanto, ressalta-se que a rentabilidade

das polpas das demais frutas é bem abaixo do açaí, pois ou não possuem demanda

estabelecida nos mercados, ou enfrentam concorrência de outros Estados (COSTA, F., 2009,

p. 346).

Do lado das relações com os clientes, uma baixa capacidade de armazenagem da

produção da safra, pode fazer com as empresas percam poder de barganha frente aos

compradores, os quais mantém relativo poder de negociação sobre os preços e afetam a

rentabilidade das indústrias (COSTA, F., 2009, p. 346).

Homma et al (2006, p. 20) indicam também a relevância do fortalecimento da

capacidade gerencial de muitas agroindústrias. O salto de complexidade de processos, sejam

relacionados à produção e comercialização industrial, sejam do conjunto de relações

institucionais que precisam ser estabelecidas para superação dos desafios da cadeia produtiva

demandam o desenvolvimento de competências de gestão diferenciadas.

Além disso, há a advertência de F. Costa (2009, p. 345), sobre a insuficiência de

mecanismos de regulação, coordenação e promoção de redes horizontais é uma dificuldade

para o desenvolvimento das agroindústrias na cadeia produtiva. A criação destes mecanismos

poderia amenizar os riscos da concorrência predatória e do comportamento oportunista em

torno das fontes de matérias primas e dos mercados consumidores, ao mesmo tempo em que

cria bases para elevar a conectividade entre as empresas, incentivar capacidades de

investimentos e a interação com fontes de inovação (COSTA, F., 2009, p. 345).

- Atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D):

A importância cultural e econômica do açaí atua em favor de uma grande inserção

deste como tema de pesquisas em universidades e institutos de C&T no Estado. Além da

cultivar de açaí “BRS Pará” citada anteriormente, há uma série de outros progressos

relacionados a melhorias tecnológicas na produção rural no que tange a técnicas de manejo

adaptadas para as áreas de várzea e para a terra firme, à nutrição e adubação de culturas e

processos que aumentem a produtividade da mão de obra na colheita (HOMMA et al, 2006, p.

21).

Outros exemplos de projetos de desenvolvimento tecnológicos no Estado do Pará

sobre o açaí, são mencionados em levantamento de grupos de pesquisas sobre produtos

florestais não madeireiros realizado por W. Costa (2009, p. 173), como:

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- A continuidade de atividades de pesquisa pela Embrapa Amazônia Oriental para

identificação de genótipos do açaí, em que cerca de 50 genótipos já foram disponibilizados

para programas de melhoramento com foco na produção de frutos, e 29 genótipos com foco

na produção de palmito.

- Desenvolvimento e Patenteamento de “evidenciador” de placa bacteriana a base

de açaí (2007) pela Universidade Federal do Pará em parceria com a Embrapa Amazônia

Oriental, com estudos sobre o processamento do açaí para a produção de corante.

- Pesquisa para otimização dos parâmetros tecnológicos para produção de estruturados

funcionais a partir de polpa de açaí e mix de frutas pela Embrapa Amazônia Oriental.

Podemos identificar uma multiplicidade de direções das pesquisas em curso nas

atividades das instituições C&T sobre o açaí, e os exemplos demonstram certo estágio de

amadurecimento tecnológico. Isso corrobora indicações em relatórios do CGEE (2006a; 2008)

de que há disponibilidade de competências tecnológicas no âmbito das instituições de C&T

no Pará, que podem auxiliar na melhoria dos produtos e processos tecnológicos.

As informações empíricas reunidas sobre oportunidades tecnológicas no contexto

deste estudo nos conduzem a confirmar que as trajetórias biotecnológicas em curso em

diversos setores industriais são relevantes, inclusive com substancial escopo de uso potencial.

Reconhecemos a presença de incentivos de mercado do lado da demanda (market pull) pela

atratividade por produtos de base naturais com desempenho relacionado a saúde e bem estar.

Desta descrição de atratividade a produtos naturais, distingue-se o potencial anunciado de

ativos existentes na biodiversidade amazônica, especificamente referindo-se ao ativo objeto

da pesquisa (açaí), posto os dados sobre sua qualidade energética, nutricional e antioxidante.

Do ponto de vista da “oferta” tecnológica (technology push), as instituições de C&T

no Estado possuem competências tecnológicas na área, contudo há baixo nível de interação

com a indústria. A agroindústria processadora de frutas no Estado, particularmente do açaí,

apresenta-se como uma indústria nascente, com forte incentivo de demanda de mercado,

porém pequena ou nenhuma capacidade tecnológica.

As relações institucionais na cadeia produtiva, de forma geral, possuem pouca

intensidade de interação entre os atores (governo, indústria, produtores rurais, instituições de

C&T). Esta falta de diálogo e coordenação institucional mantém grandes assimetrias seja no

sentido vertical (entre os elos da cadeia), seja no nível horizontal (entre diferentes atores no

mesmo elo da cadeia). Tais circunstâncias dificultam a articulação de soluções

interdependentes, como o desenvolvimento de capacidades de investimentos conjuntos no

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arranjo local, esforços para aprendizado e inovação e a criação de eficiências coletivas, que se

tornam obstáculos para a efetiva exploração de oportunidades biotecnológicas.

2.4 REGIME DE APROPRIABILIDADE

O desenvolvimento de inovações tecnológicas é resultado da interação de

oportunidades tecnológicas com a cumulatividade e capacidade tecnológica das empresas por

um lado, e os vários tipos de incentivos de mercado e condições de apropriabilidade de outro

lado. O conceito de apropriabilidade apresenta vínculos diretos com o processo de criação de

valor por meio de inovações, e sua proteção frente a outros atores do mercado.

Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 14) informam que o regime de apropriabilidade

baseia-se em fatores tecnológicos e legais que influenciam o custo e tempo requerido para

imitação de inovações. Os aspectos legais referem-se ao grau de efetividade de proteção aos

direitos de propriedade intelectual e industrial; enquanto as características tecnológicas

correspondem a dificuldade de imitação tecnológica por outros atores, como o nível de

codificação, de complexidade, e a possibilidade de uso de mecanismos de aprendizado, como

a engenharia reversa (CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 14).

Aspectos institucionais, como políticas e funções relacionadas a agências públicas,

também são uma parte importante do ambiente que molda condições de apropriação no

mercado, uma vez que os regimes de regulação restringem e ordenam certas ações privadas

(NELSON; WINTER, 2005, p. 525).

Para Nelson e Winter (2005, p. 515), a teoria econômica ortodoxa entende que os

direitos de propriedade e as obrigações contratuais são elaborados sem custo para os agentes,

e uma vez que são claros, a sua imposição seria perfeita. Contudo, as externalidades e o

caráter público parcial das inovações impõem a necessidade de regulamentações institucionais

e instrumentação de escolha coletiva, em uma tensão entre equidade distributiva e eficiência

na alocação de recursos (NELSON; WINTER, 2005, p. 519).

Cabe esclarecer que externalidades refere-se a custos ou benefícios correspondentes a

efeitos secundários da ação produtiva econômica (NELSON; WINTER, 2005, p. 521). Um

tipo de externalidade comum na inovação é a geração de novas aplicações tecnológicas, as

quais podem ser imitadas por outros agentes econômicos. Já o caráter público vincula-se a

indivisibilidade do produto principal pretendido, que atinge uma determinada população, em

vez de somente alguns indivíduos com os quais mantém contratos, neste sentido pode ser

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considerado um bem público. O conhecimento e a pesquisa básica são exemplos de bens

públicos. (NELSON; WINTER, 2005, p. 521).

Neste sentido, Dosi (1988, p. 1123) explica que atividades de ciência básica

caracterizadas como de caráter de publicidade relativa, são financiadas principalmente pelo

estado ou por instituições não lucrativas, devido a sua baixa apropriabilidade. E que empresas

investem preponderantemente em pesquisa aplicada e desenvolvimento tecnológico,

guardadas diferenças setoriais entre indústrias e entre países (DOSI, 1988, p. 1123).

A preocupação em termos de política pública é que condições de apropriação guiam a

alocação de recursos no mercado em termos de direção e taxa de esforço, e que uma

apropriabilidade frágil poderia levar a um subinvestimento em processos de acumulação

tecnológica. Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 26; 30) indicam que a crença na importância

de instrumentos de apropriabilidade como a proteção de patentes e propriedade intelectual,

relaciona-se a função de estimular à inovação, e ao mesmo tempo promover a difusão do

conhecimento tecnológico, crescentemente vistos como fontes de competitividade e

crescimento econômico.

Este argumento é apontado por Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 30) como a base

principal para a tendência nas duas últimas décadas de fortalecer a proteção de patentes,

citando como exemplo as decisões da corte americana de tornar patenteável softwares e novas

formas de vida. Para estes autores, esse fortalecimento, particularmente na década de 1980,

tornou as patentes mecanismos de apropriação mais efetivos.

Levin et al (1987, p. 784) também reconhecem um fortalecimento do sistema de

propriedade industrial em vários países e ampliar o escopo de proteção para softwares,

designs e cultivares, por exemplo. Para estes autores, a legislação de propriedade industrial,

como leis de patente, buscam resolver a tensão entre fornecer incentivos para inovação e

assegurar o transbordamento de benefícios da difusão (LEVIN et al, 1987, p. 783).

Assim, uma patente, em termos normativos, conferiria uma perfeita apropriabilidade

ao inovador, que exerceria um monopólio sobre a invenção por um período de tempo

determinado, em troca de conhecimento público sobre esta invenção que posteriormente

(quando da expiração da patente) permitiria um amplo processo de difusão dos benefícios

(LEVIN et al, 1987, p. 783).

Porém, Levin et al (1987, p. 784) ressaltam que por um lado a garantia de

apropriabilidade estabelecida no sistema institucional não é perfeita, seja pela possibilidade de

ser burlada (desrespeitada) por outros agentes de mercado, seja por dificuldade do regime

legal quanto a questões como exigências de comprovação de propriedade e para prova de

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fraude. Por outro lado, nem sempre é possível assegurar a também a ampla difusão em termos

competitivos dos benefícios da invenção, uma vez que o conhecimento público por si só pode

não prover o adotante das capacidades necessárias tanto pela carga de conhecimento tácito

envolvido, como por características de mercado e contínuos avanços de aprendizado já

conquistados pelo inovador (LEVIN et al, 1987, p. 784).

Neste cenário, as patentes podem não ser mecanismos adequados, ou pelo menos

exclusivos, para a apropriação de determinados tipos de inovação, dependendo da trajetória

tecnológica e das condições de mercado e institucionais do contexto no qual o inovador atua

(LEVIN et al, 1987, p. 784).

Levin et al (1987, p. 787) também destacam que não deve-se tomar a premissa que

uma maior apropriabilidade é sempre melhor, ou seja, que uma proteção mais forte

necessariamente conduz a um maior nível de inovação e competitividade. Isso em função de

que uma proteção mais forte pode produzir maior comprometimento de recursos da sociedade

em esforços duplicados de inovação, ou atrasar o acesso amplo de benefícios em termos

competitivos (LEVIN et al, 1987, p. 788). Para esses autores, por vezes, permitir a difusão de

inovações tecnológicas existentes é benéfico não somente aos consumidores e usuários, mas

também para promoção de melhorias tecnológicas pela interatividade e processo de

cumulatividade de conhecimento.

2.4.1 Mecanismos de apropriação de inovações

O sistema legal de propriedade intelectual e suas instituições relacionadas devem ser

entendidos como estruturas sociais que visam melhorar a apropriabilidade de retornos de

inovações (LEVIN et al, 1987, p. 815). Mas estas estruturas não são as únicas nem

necessariamente a barreira primária que evita o acesso ao conhecimento e informações

gerados, que de outra forma seria bens públicos puros.

Outros meios pelos quais os inovadores buscam assegurar seus ganhos são o

pioneirismo (que gera vantagens para o inovador), o sigilo, a vinculação de marca, e esforços

de vendas e serviços diferenciados que podem prover proteção adicional (LEVIN et al, 1987,

p. 816). Os mecanismos utilizados para apropriação de inovações se diferenciam em virtude

de variados fatores, como o tipo de inovação (processos ou produtos), o tamanho e

comportamentos estratégicos adotados pelas empresas inovadoras, e a natureza do paradigma

tecnológico (LEVIN et al, 1987, p. 803, 831).

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Levin et al (1987, p. 803), com base em pesquisa empírica sobre o uso de mecanismos

de apropriação por empresas, destacam como principais limitações percebidas na efetividade

de patentes: limitação na amplitude de patenteabilidade de novos processos ou produtos (1);

patente improvável de ser validada se questionada (2); falta de meios na empresas de fazer

cumprir as patentes (3); concorrentes podem inventar legalmente baseadas nas patentes (4); e

documentos de patentes expõe muita informação (5).

Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 29) defendem que as empresas que adotam

patentes como mecanismo de apropriação, o fazem quando os benefícios líquidos são

positivos, o que eles chamam de patente Premium (incremento proporcional ao valor de uma

inovação quando patenteada).

Assim, ao avaliar o patenteamento de uma invenção, a empresa pode avaliar se seu

valor aumenta (compensa patentear) ou reduz, devido a custos de oportunidade, como custos

de descoberta da informação por concorrentes, probabilidade de invenção sobre a patente,

custos com vigilância para garantir o cumprimento da patente (CECCAGNOLI;

ROTHAERMEL, 2008, p. 29). No entanto, os autores ressalvam que mesmo uma patente

Premium, não é condição suficiente para garantir lucratividade sobre a inovação, sendo que as

estratégias de patentes devem ser integradas com outros mecanismos de apropriação.

Cabe destacar que a proteção da patente em relação a oportunidades de ganhos da

empresa inovadora não reside somente em exercer a exclusividade de produção e/ou

comercialização de produtos, mas também cria um mercado de direitos a informação e

propriedade intelectual (LEVIN et al, 1987, p. 788), no qual o licenciamento e outras formas

de transferência de conhecimento tecnológico podem ser comercializados.

Para Levin et al (1987, p. 797) o licenciamento de tecnologia protegidas por patentes

pode ser uma forma relativamente efetiva para apropriação de investimento em P&D por

pequenas empresas start up, com base de competências tecnológicas, em função destas

poderem ter outros meios de apropriação (marca, esforços de vendas e serviços) mais frágeis.

Neste sentido, os autores afirmam que a empresa orientada tecnologicamente pode

considerar a patente como ativos de mercado, apesar de atentarem para a questão de difusão

tecnológica por meio de contratos de transferência tecnológica ainda possuírem consideráveis

custos de transação sobre o compartilhamento de informação e conhecimento, recursos como

vimos intangíveis e com o alto teor tácito.

Teece (2006, p. 1145) acrescenta que um regime de propriedade intelectual

fortalecido, que promova relativa eficiência ao mercado de direitos a informação e

propriedade intelectual, contribuiu para um conjunto mais diverso de formas organizacionais,

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como joint ventures e empresas desenvolvedoras de tecnologia sem fábricas. Este cenário

coaduna com a perspectiva de Bell e Pavitt (1993, p. 202) quanto ao desatrelamento entre o

desenvolvimento de capacidades produtivas e tecnológicas.

2.4.2 Convergência com o desenvolvimento sustentável

Estudo do CGEE (2006b) aponta que alguns países, particularmente em fase de

desenvolvimento, passaram a partir do início da década de 2000 a buscar influenciar de forma

mais enfática a agenda internacional da propriedade intelectual para a reflexão sobre o

desenvolvimento e os possíveis efeitos deletérios da propriedade intelectual, se não forem

preservados o equilíbrio de interesses entre as nações, e certas flexibilidades mínimas no

sistema mundial atual.

Esta perspectiva visa incorporar nos debates internacionais relativos à propriedade

intelectual a dimensão do desenvolvimento, de forma a estabelecer um espaço político em que

os países em desenvolvimento possam tentar assegurar o acesso ao conhecimento (CGEE,

2006b). Neste sentido, o Brasil e outros 14 países procuram patrocinar uma iniciativa

denominada de “agenda para o desenvolvimento” na Organização Mundial de Propriedade

Intelectual (OMPI), vinculada à ONU, quanto à necessidade de garantir que a propriedade

intelectual não seja uma finalidade em si mesma, que poderia comprometer as alternativas de

desenvolvimento de países em situação menos favorecida (CGEE, 2006b).

Seu embasamento está no mandato conferido pela ONU à OMPI no que tange a

promover a atividade intelectual e facilitar a transferência de tecnologia para países em

desenvolvimento, que lhes sejam úteis para acelerar seu desenvolvimento econômico, social e

cultural (CGEE, 2006b). A conclusão geral é que os países em diferentes estágios de

desenvolvimento, particularmente aqueles em desenvolvimento, devem desenvolver

estratégias diferenciadas em propriedade intelectual que sejam adequadas ao seu catching up

tecnológico (BRANDELI, 2006).

Contudo, esta recomendação envolve um grau de flexibilidade na regulamentação de

propriedade intelectual que vai de encontro com a agenda de implementação do Acordo

TRIPS (Acordo sobre os direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio)

administrado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) (CGEE, 2006b). Este

acordo foi estabelecido em 1994 durante a chamada rodada Uruguai, em que se criou a OMC,

e todos os seus membros passaram a obrigatoriamente integrar o acordo TRIPS (FARIA,

2003, p. 51). Deste modo, os países em desenvolvimento para serem membros da OMC foram

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obrigados a ajustar sua legislação de propriedade intelectual ao padrão estabelecido no acordo

internacional, ampliando direitos e abrangência da propriedade intelectual, em muitos

aspectos desfavorecendo sua economia interna (CGEE, 2006b).

Um dos pontos de conflito, que é particularmente relevante à discussão em torno da

ascensão da biotecnologia, refere-se ao contexto de proteção dos recursos genéticos de países

e os conhecimentos tradicionais no âmbito da Convenção da Diversidade Biológica (CDB). A

CDB foi criada em 1992 no âmbito de uma série de diretrizes internacionais para o

desenvolvimento sustentável. Faria (2003 p. 50) informa que até então os recursos biológicos

eram considerados patrimônio da humanidade, e a partir da CDB passa a ser reconhecida a

soberania dos Estados nacionais sobre estes recursos com duas premissas importantes ao

debate: O princípio do acesso aos recursos genéticos ser sujeito a prévio consentimento, e o

princípio da repartição equitativa de benefícios oriundos de sua utilização e de conhecimento

tradicional associado. A desobediência destes princípios configura a chamada biopirataria.

Conforme E. Moreira (2003, p. 38), a consolidação da biotecnologia em diversos

setores econômicos, como farmacêutico, criou várias interseções entre o tema de proteção da

biodiversidade e da propriedade intelectual, seja em seus regimes nacionais e internacionais.

E nesta conjuntura, um debate sobre conflitos entre TRIPS e CDB é provocado pela

relevância dos resultados do desenvolvimento científico e tecnológico baseados na

biodiversidade para o mercado e para sociedade (MOREIRA, E., 2003, p. 41).

Faria (2003, p. 51) entende que o TRIPS não impede a biopirataria, em virtude deste

estabelecer como requisitos para o patenteamento somente três condições (atividade

inventiva, aplicação industrial e novidade), e permitir exceção a plantas e animais, cuja

possibilidade de patente é deixada à discricionariedade de cada país membro. Ainda segundo

a autora (2003, p. 52), o Brasil havia proposto (em 2002 e 2003) o acréscimo de mais três

requisitos no TRIPS, quando a patente for referente a materiais biológicos ou conhecimentos

tradicionais, que seriam: a identificação da origem do recurso biológico (1), a explicitação do

consentimento prévio (2), e a definição da repartição de benefícios (3).

E. Moreira (2003, p. 41), considera que a efetividade da CDB somente ocorrerá por

meio da construção de instrumentos de diálogo entre o TRIPS e o regime de acesso especial à

biodiversidade previsto na CDB. As premissas como as de respeito ao direito a Soberania, ao

uso sustentável da biodiversidade, valorização dos conhecimentos tradicionais associados, e

do desenvolvimento distributivo, além da estrita observância da atividade inventiva para a

concessão de patentes biotecnológicas devem se constituir em critérios da função

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socioambiental de um sistema de propriedade intelectual, que se alia a princípios éticos do

desenvolvimento científico e tecnológico (MOREIRA, E., 2003, p. 46).

2.4.3 Apropriação sobre inovações baseadas na biodiversidade: regulamentação de

acesso ao patrimônio genético e regime de apropriabilidade

De acordo com o CGEE (2008, p. 16), o Brasil alcança destaque como um país

produtor de conhecimentos científicos sobre biotecnologia, incluindo sobre ativos da

biodiversidade de algumas cadeias produtivas amazônicas. Porém quando se trata de verificar

o uso e proteção deste conhecimento em termos de patentes, especialmente aquelas voltadas

para aplicação em produtos ou processos, o país possui apresenta sérias dificuldades .

Um retrato desta situação é exemplificado em relatório do CGEE (2008, p. 16) no que

tange a estudos sobre a copaíba, em que o Brasil aparece como o principal gerador de

publicações científicas, sendo mais de 50 no período de 1999 a 2008. No entanto, a

quantidade de patentes baseadas na Copaíba requeridas pelo país é mínima, sendo somente

uma (1) no escritório de patentes Europeu, e nenhuma no escritório americano (referência

mundial) enquanto outros países que apresentam números expressivos de patentes

depositadas, como os Estados Unidos com mais de 30 patentes depositadas de produtos ou

processos relacionados à copaíba (CGEE, 2008, p. 16). Este caso levanta um questionamento

sobre a eficácia do Brasil em estabelecer estratégias que gerem (e protejam) benefícios a sua

sociedade por meio do desenvolvimento de produtos e serviços biotecnológicos baseados em

ativos da sua biodiversidade.

Segundo Enríquez (2003, p. 186), até 2003, cerca de 95% das patentes biotecnológicas

no mundo correspondiam às empresas multinacionais e instituições governamentais de países

desenvolvidos. O valor estratégico deste conhecimento pode ser simbolizado pela ação da

chamada Cooperação Trilateral, entre os três principais escritórios de patentes do mundo,

Japão (JPO), EUA (USPTO) e a maior parte dos Estados Europeus (EPO), no sentido de

criarem uma base de dados de patentes não supérfluas na área da biotecnologia (CGEE,

2006b, p. 24).

Como visto no tópico anterior, a CDB procurou estabelecer marcos para um regime

especial de acesso e uso da biodiversidade e conhecimento tradicionais associados

fundamentados na conservação e uso sustentável da biodiversidade, soberania de Estados

nacionais sobre recursos naturais e distribuição equitativa de benefícios (MOREIRA, E.,

2003, p. 39).

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O Brasil atualmente possui uma regulamentação extensa, porém de eficácia limitada

sobre o acesso ao patrimônio genético e conhecimentos tradicionais associados, e uma série

dificuldades institucionais estão postas sobre esta. As bases legais do acesso ao patrimônio

genético, em conformidade com a CDB, foram estabelecidas pela Medida Provisória

2.052/2000 que instituiu que as autorizações de acesso para fins de pesquisa científica,

bioprospecção e desenvolvimento tecnológico são de competência da União (MOREIRA, T.,

2003, p. 99). A MP 2.052/2000 foi reeditada várias vezes até a MP 2.186/2001, ainda em

vigor. O projeto de lei para implantação de uma legislação definitiva ainda está em

discussões.

Para T. Moreira (2003, p. 100), do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético

(CGEN) do MMA, a Medida Provisória estabeleceu regras para as atividades relacionadas ao

patrimônio genético, em virtude do reconhecimento de interesses globais sobre tais recursos, e

mesclam questões éticas, sociais, políticas, ambientais, econômicas e tecnológicas. Ainda de

acordo com T. Moreira (2003, p. 101), devido a novidade de abrangência envolvida na

regulamentação, verificou-se dificuldades e forte resistência da sociedade, especificamente

das instituições de pesquisa científica e acadêmica pelo processo constituído de solicitações

de autorizações para as atividades de pesquisa realizadas.

Entre as dificuldades admitidas estão questões de deficiências quanto a clareza de

conceitos e aplicações, lacunas na composição e representatividade do CGEN, falta de ações

educativas e de divulgação, e excessos em procedimentos administrativos exigidos. Quanto a

problemas conceituais estão a própria caracterização perante a lei de “patrimônio genético” e

“conhecimento tradicional associado” (MOREIRA, T., 2003, p. 100). Como exemplo, T.

Moreira (2003, p. 100-101), indica que é importante compreender a diferença entre o que

representa uma simples coleta de material biológico (isento de atendimento das

regulamentações em discussão) e o que configura acesso ao patrimônio genético quanto a

amostras de componentes na forma de moléculas e substâncias. Há a necessidade de

tratamento desta diferenciação diante das possibilidades tecnológicas de acesso em distintos

níveis de informação (MOREIRA, T., 2003, p. 100).

Outra dificuldade mencionada foi a própria composição estabelecida para o conselho,

que somente envolvia instituições públicas, excluindo assim representantes da sociedade civil

organizada e empresas privadas, posteriormente em 2003 houve um movimento no sentido de

permitir a participação de “convidados permanentes”, mas estes somente tem direito a “voz”,

e não a voto, e regulamentações ainda são necessárias. Além disso, considera-se que há um

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pequeno número de reuniões por mês (12) frente a grande demanda de solicitações

(MOREIRA, T., 2003, p. 101).

Reconhece-se ainda certa falta de informação tanto no setor privado e acadêmico,

quanto nas próprias comunidades, e em outros órgãos do governo para que seja possível a

implementação adequada da regulamentação (MOREIRA, T., 2003, p. 102). Também é

indicada a necessidade de alinhamento do fluxo de atividades entre os diversos órgãos

estatais, em função de uma “evidente duplicação” de ações entre CNPq, IBAMA, FUNAI e

CGEN (MOREIRA, T., 2003, p. 102).

A fim de superar essas questões, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente algumas

as propostas elaboradas para discussão no projeto de lei, que substitua a MP 2.186/2001,

incluem a consolidação do consentimento prévio pelos provedores locais de patrimônio

genético e conhecimentos tradicionais; a implantação de um sistema simplificado para

instituições de pesquisa na etapa de pesquisa científica; definição de regras mais claras para

repartição de benefícios, e a modificação da composição do conselho, incluindo

representantes da sociedade civil organizada (MOREIRA, T., 2003, p. 103).

A regulamentação sobre o acesso ao patrimônio genético e conhecimentos tradicionais

associados é considerada uma temática institucional crítica para o desenvolvimento de

processos de biotecnologia no país, e a construção de um consenso tanto na esfera

governamental, como em termos sociais mais amplos ainda está a ser superada. Para Assad

(2003, p. 36) do MCTI:

Não adianta colocarmos porteiras e impedimentos, pois somente vamos expandir a

biopirataria. Então, cabe construirmos leis transparentes e factíveis de

implementação e que o retorno, realmente, ocorra por meio de contratos eficientes,

claros, objetivos, que contenham detalhamento a repartição de benefícios, caso a

caso... sabemos que temos que incentivar a parceria público-privada, envolvendo

empresas e academia e organizações não governamentais voltadas ao uso econômico

da biodiversidade.

Contudo, como destaca o CGEE (2007, p. 20) o não desenvolvimento de aplicações

economicamente dinâmicas com base em produtos da biodiversidade, representa um elevado

custo de oportunidade à sociedade, seja pela não geração de renda e trabalho a população

local, seja pelo não desenvolvimento tecnológico industrial em diversos setores, ou pelo não

acesso de consumidores a potenciais produtos de qualidade ou eficácia superior (por exemplo,

pela possibilidade de descobertas de novas drogas ou tratamentos a doenças). De forma que,

para o CGEE (2008, p. 14) a redução de biopirataria e conservação da biodiversidade na

Amazônia exige o desenvolvimento de soluções para transformação dos recursos da

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biodiversidade em atividades econômicas que possam gerar emprego e renda adequados para

a melhoria da qualidade de vida da população regional.

No entanto, em termos da cadeia produtiva do açaí no Pará, devemos atentar para duas

características que particularmente acrescentam desafios à aplicação da regulamentação atual

sobre ativos da biodiversidade: alto volume de produção do fruto, e comercialização da polpa

como principal produto da agroindústria.

O grande volume de produção na cadeia do açaí é um atributo atípico em relação a

cadeias da biodiversidade, bem como é um produto com preços já regulados por parâmetros

típicos de mercado (oferta e demanda). Este cenário configura um ambiente de

comercialização que torna difícil controle por parte do produtor de açaí (extrativista ou

agricultor) em relação a se o fruto por ele produzido será objeto de processamento industrial

que se qualifique como acesso a patrimônio genético, que poderia ser foco de negociação

quanto à forma a equitativa de repartição dos benefícios entre os elos da cadeia.

Além disso, o principal produto das agroindústrias locais é a polpa do fruto para vendo

no mercado nacional ou internacional. A fabricação da polpa não é classificada como acesso a

patrimônio genético, o que não vincula em termos de regulamentação nacional à produção de

polpas dessas agroindústrias às diretrizes da CDB. Cabe ainda levantar a possibilidade de que,

ao se destinar parte dessa produção à exportação, estas polpas sejam no exterior objeto de

processamento industrial que se caracterizariam como acesso ao patrimônio genético,

conforme regulamentação do GCEN, mas neste caso já estariam fora do alcance regulatório

nacional.

Assim, na configuração atual da cadeia produtiva local, compreendemos que a

regulamentação institucional em vigor quanto à gestão do patrimônio genético não alcança

eficácia na proteção do açaí como bioativo, e no estabelecimento de condições mais

equitativas na repartição dos benefícios entre os elos desta cadeia. Isso suscita a necessidade

de criação de instrumentos de regulamentação que atendam com eficácia a proteção da

biodiversidade em um contexto de maior multiplicidade de condições de produção e

comercialização deste tipo de recursos.

Por fim, cabe destacamos que conforme F. Costa (2009, p. 345), a cadeia produtiva do

açaí no Pará caracteriza-se uma apresentar uma baixa capacidade tanto de inovar como de

absorver inovações por processos de disseminação. Mesmo a mudança técnica ocorrida em

agroindústrias locais que visou a modernização de plantas industriais para o aumento da

escala de produção e o emprego de processos fitossanitários seguiu um padrão cujo

conhecimento técnico era dominado por fornecedores de bens de capitais e consultorias.

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Neste contexto com carência tecnológica e baixa incidência de inovação não

encontramos dados de levantamentos secundários sobre a utilização ou eficácia de

mecanismos de apropriação de inovações na cadeia produtiva do açaí local, cujo principal

produto comercializado é a polpa do fruto.

Entendemos que as principais inovações biotecnológicas que tenham o açaí como base

têm ocorrido fora do estado do Pará, realizadas ou exploradas por grandes indústrias no ramo

de cosméticos e alimentos funcionais. Estas grandes indústrias em geral exercem vantagem na

apropriação dos lucros destas inovações frente aos elos a montante da cadeia produtiva, dadas

as dificuldades do quadro institucional na cadeia produtiva local tanto em proporcionar uma

distribuição mais equitativa de benefícios, quanto em gerar incentivos ao esforço inovativo

local.

2.5 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS

Este capítulo visou analisar as dimensões contextuais em que a rede de inovação

interorganizacional formada pela UFPA, Amazon Dreams e Belaiaçá, desenvolveu o processo

de inovação de uma linha de produtos baseada em compostos antioxidantes de açaí. Deste

modo, representa a primeira aproximação do nosso objeto de estudo, quanto a recorte teórico

e a investigação empírica.

Em relação à análise da biotecnologia enquanto paradigma tecnológico, entendemos

que este contempla oportunidades tecnológicas com aplicação potencial aos ativos da

biodiversidade da Amazônia. Compreendemos que a cadeia produtiva de açaí no estado do

Pará apresenta condições positivas necessárias para exploração desta oportunidade

biotecnológica em termos de oferta tecnológica (instituições de CT&I locais) e de incentivos

de mercado (demanda crescente de produtos com qualidades antioxidantes). Porém, também

constatamos falhas no quadro institucional e de políticas públicas, particularmente

relacionadas a fraca intensidade de interação entre atores (governo, indústria, produtores

rurais, instituições de C&T), além de dificuldades no estímulo do desenvolvimento de

capacidades tecnológicas e esforços inovativos nas empresas.

Inferimos que estas falhas são reflexos da conformação histórica da região Amazônica,

e do Pará, enquanto região periférica, fundamentada em um modelo econômico primário

exportador com forte presença de commodities relacionadas ao extrativismo de recursos

naturais e minerais, cujas trajetórias tecnoeconômicas não requereram o desenvolvimento de

capacidades de inovação e a concatenação de quadros políticos e institucionais que

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influenciassem positivamente a formação de arranjos locais para investimentos conjuntos e a

criação de eficiências coletivas. Deste modo, uma inflexão na trajetória tecnoeconômica atual

em direção a um desenvolvimento regional baseado em inovações tecnológicas a partir de

ativos da biodiversidade e serviços ambientais exige a emergência de um conjunto de

processos de mudanças sociais, políticas e institucionais em coevolução ao avanço

tecnológico.

Portanto, a geração de processos de desenvolvimento regional na Amazônia baseados

na oportunidade de inovações biotecnológicas não depende exclusivamente de questões

relacionadas a esforços de desenvolvimento de competências tecnológicas ou da

disponibilidade de ativos da biodiversidade, mas abrange a construção de convergências

econômicas, sociais, políticas e institucionais que permitam superar a trajetória até então

percorrida.

Diante desta conjuntura, a responsabilidade do papel do envolvimento governamental

deve ser realçada, é necessário estabelecer políticas públicas convergentes com o valor

estratégico da cadeia produtiva. É necessária a promoção de instrumentos e vínculos

institucionais que assegurem condições de geração de renda adequadas a todos os elos da

cadeia, ao mesmo tempo em que garanta o uso sustentável da biodiversidade, auxiliando na

transição tecnológica de atores. Chamamos atenção que o não aproveitamento das

oportunidades biotecnológicas de uso da biodiversidade por meio de inovações que gerem

emprego e renda, em alinhamento à conservação ambiental, constitui um custo de

oportunidade elevado.

Ao termos uma visão geral deste contexto, e sua mescla de pontos fortes e fracos, tem-

se o pano de fundo para atuação dos atores organizacionais no desenvolvimento do processo

de inovação, por meio da formação de redes de parcerias interorganizacional. No próximo

capítulo, pretendemos compreender cada organização que fez parte desta rede de relações

através da lente teórica do constructo de capacidades de inovação a fim de entender suas

contribuições e limitações durante o processo de inovação tecnológica.

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3 ATORES ORGANIZACIONAIS E SUAS CAPACIDADES

3.1 INTRODUÇÃO

No presente capítulo temos como foco a análise de organizações que foram

protagonistas na composição de capacidades tecnológicas e de produção necessárias para o

desenvolvimento e comercialização da inovação de linha de produtos baseados em compostos

antioxidantes de açaí. Como no capítulo anterior, discutiremos por um lado os aspectos

teóricos do constructo de capacidades organizacionais e, por outro lado, faremos a análise

empírica no âmbito das organizações da rede.

Em termos teóricos, pretendemos compreender como a dinâmica de construção de

portfólio de capacidades de uma organização influencia no processo de desenvolvimento de

uma inovação tecnológica tanto em relação a sua propensão a inovar, quanto a sua efetividade

em gerar resultados positivos e se apropriar de benefícios.

Em termos empíricos, o objetivo é delinear as principais características de cada ator

organizacional proeminente na rede de inovação foco do estudo, neste caso Amazon Dreams,

Belaiaçá e Universidade Federal do Pará (UFPA). Para isso, apresentamos o levantamento de

dados que consistiu em inicialmente estabelecer um breve histórico de cada organização,

incluindo um panorama de processos inovativos realizados e do padrão de inovação

desenvolvido, e posteriormente enfatizamos no conjunto de suas capacidades a análise dos

atributos que favorecem ou limitam o desenvolvimento de inovações.

Cabe indicar que, a análise das relações de interação interorganizacional, envolvendo

as organizações foco deste capítulo, e o desenvolvimento do processo de inovação em si, e

seus respectivos resultados alcançados, é realizada no capítulo seguinte (4).

3.2 RECURSOS E CAPACIDADES DAS ORGANIZAÇÕES

A visão da empresa como um amplo conjunto de recursos e capacidades, os quais

constituem ativos que podem ser fontes de vantagens em termos de eficiência e efetividade

tem origem em trabalhos como de Edith Penrose em 1959 (A teoria do Crescimento da

Firma), e posteriormente continuados por acadêmicos como Wernerfelt (1984) e Barney

(1991) desenvolvendo a perspectiva teórica da visão baseada em recursos (VBR). Esta

perspectiva foca nos recursos e capacidades da empresa como fontes para a geração de renda

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e lucratividade (WERNERFELT, 1984) e a conquista de vantagens competitivas, sob

pressupostos da heterogeneidade e mobilidade imperfeita de recursos (BARNEY, 1991).

Para Barney (1991, p. 105-106) um recurso da empresa para ser considerado gerador

de vantagens competitivas sustentáveis, no sentido de duráveis ao longo prazo, devem ter

quatro características: ser valioso para a exploração de oportunidades ou para neutralizar

ameaças; ser raro entre as empresas concorrentes atuais e potenciais; ter imitabilidade

imperfeita; e não haver outros recursos equivalentes no mercado que possam o substituir.

Ao basear-se em uma perspectiva baseada em recursos, Teece (1986, 2006) propõe um

referencial teórico sobre a análise de apropriabilidade e distribuição dos resultados de

inovação, que contempla três blocos de constructos: O regime de apropriação e padrão

tecnológico industrial, que foram discutidos no capítulo anterior, e a posse de ativos

essenciais (tecnológicos) e complementares à atividade inovadora, com ênfase a estes últimos

no contexto de sua cadeia de valor.

Neste sentido, Teece (1986) defende que uma empresa para obter lucratividade sobre

uma inovação deve possuir não somente as competências e ativos necessários para o

desenvolvimento tecnológico do produto ou processo, mas também assegurar competências e

ativos complementares para sua produção (escala, eficiência, etc) e comercialização (canais

de vendas, marketing, etc) bem sucedida em termos competitivos no mercado, de forma a

garantir um retorno econômico adequado sobre esta inovação.

Teece (1986, p. 289, 2006, p. 1134), então, classificou os ativos complementares em

genéricos, especializados e coespecializados. Os ativos genéricos são aqueles que já existem

no mercado, e mesmo que a empresa inovadora não os possua, é possível contratá-los em

termos competitivos (TEECE, 1986, p. 289; CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 15).

Os ativos especializados são aqueles desenvolvidos de forma exclusiva para a

inovação, em que há uma relação de dependência unilateral entre a inovação e o ativo. Neste

caso, ativos complementares especializados, em geral, não são encontrados facilmente no

mercado, sendo construídos dentro de trajetórias específicas. Se o inovador não possuir os

ativos complementares especializados necessários para sua inovação, poderá sofrer com

problemas de barganha potencial junto a concorrentes ou fornecedores que os possuam

(CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 15).

Os ativos coespecializados, por sua vez à semelhança com os especializados, são

caracterizados por uma relação de interdependência entre o desenvolvimento da inovação e do

ativo complementar (dependência bilateral) (TEECE, 1986, p. 289). Ceccagnoli e Rothaermel

(2008, p. 20), advertem que, ao serem organizações distintas que detenham os ativos

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tecnológicos e ativos complementares de uma inovação, poderia gerar tendência a uma

corrida de aprendizado, em que a empresa detentora de ativos complementares teria interesse

em desenvolver capacidades de P&D, enquanto que o inovador teria a motivação contrária.

Esta classificação proporciona um quadro de referência ao inovador para analisar o

conjunto de competências necessárias vinculadas à comercialização de sua inovação, e a

compreensão de eventuais poderes de barganha entre este inovador e concorrentes ou

fornecedores quanto a apropriação dos ganhos sobre a inovação (TEECE, 2006, p. 1134).

Teece (2006, p. 1135) considera que este tipo de avaliação crítica para orquestrar os

ativos e capacidades dentro de uma empresa em relação a uma determinada inovação, no

entanto, reconhece que o foco é especificamente sobre a fase de comercialização da inovação,

e que o modelo de análise é estático.

Teece, Pisano e Shuen (1997, p. 510) observam que apesar da perspectiva de recursos

reconhecer a importância econômica dos recursos e competências diferenciadas das empresas

como geradores de rendas e vantagens competitivas distintas, esta apresentava uma visão

estática do portfólio de competências e recursos da empresa ao não explicar como estes

recursos e ativos eram desenvolvidos, combinados, aplicados e protegidos ao longo do tempo.

Diante disso, estes autores sugerem a necessidade de uma abordagem de capacidades

dinâmica, onde tais questões possam ser aprofundadas.

3.2.1 Capacidades dinâmicas

A abordagem de capacidades dinâmicas proposta por Teece, Pisano e Shuen (1997, p.

516) entende que em um mercado em que as mudanças ocorrem com maior rapidez, as

organizações tem que desenvolver habilidades de gerar novas formas vantagens competitivas.

Deste modo, a habilidade de promover respostas inovativas constantes a tendências de

mercado se configura na base da criação de valor diferenciado, e reforça as dificuldades de

imitação pelos concorrentes pela sua persistente transformação.

Assim, Teece, Pisano e Shuen (1997, p. 516) definem capacidades dinâmicas de uma

empresa como a concertação de habilidades para desenvolver, adaptar, integrar e renovar

competências internas e externas para alcançar um desempenho superior frente a ambientes de

negócios de rápidas mudanças. Para Zahra e George (2002, p. 185), as capacidades dinâmicas

tornam organizações aptas a reconfigurar sua base de recursos e adaptá-la de acordo com as

condições de mercado, de forma a alcançarem vantagens competitivas.

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As capacidades dinâmicas estão imbricadas nos processos e rotinas organizacionais,

na posição estratégica de ativos e na trajetória das empresas (TEECE; PISANO; SHUEN,

1997, p. 516). Seu conceito pressupõe uma hierarquia entre diferentes níveis de competências

e capacidades, em que a implementação de uma capacidade de nível superior integra

competências, rotinas e ativos de um nível inferior sob seu escopo (WINTER, 2003).

Esta hierarquia entre capacidades é exemplificada por Zahra e George (2002, p. 186),

que concebem a capacidade absortiva (a ser vista em seguida) como uma capacidade dinâmica

(nível superior), composta por capacidades específicas de aquisição, de assimilação, de

transformação e de aplicação do conhecimento, que são combinadas e integradas de modo a

gerar uma vantagem competitiva diferenciada.

Teece (2006, p. 1143) afirma que a perspectiva dinâmica em relação a capacidades

deve ressaltar a importância tanto da acumulação, quanto da orquestração de capacidades

como fator crítico para a competitividade por meio do desenvolvimento de inovações. Reforça

a noção que a gestão da organização precisa ter a habilidade de desenvolver ou adquirir um

conjunto de capacidades de inovação, envolvendo capacidades essenciais (tecnológicas) e

complementares, que combinadas que produzam escopos econômicos, bem como aumentem a

sua apropriabilidade sobre estes.

3.2.2 Capacidades absortivas

A inovação tecnológica pode ser realizada tanto por meio de uma atividade interna na

empresa que pode envolver capacidades de pesquisa e desenvolvimento verticalmente

integrada com as demais áreas de produção, marketing, distribuição e vendas, como também

pode se relacionar a importação de tecnologias externas em um mercado de transferência de

inovação e competências com o uso de instrumentos como o licenciamento e consultorias

técnicas (DOSI, 1988, p. 1132). Contudo, mesmo essa “transferência” de tecnologia demanda

uma capacidade interna na empresa adotante para reconhecer, avaliar, negociar, e fazer as

adaptações necessárias da tecnologia ao seu processo produtivo (DOSI, 1988, p. 1132). Esta

capacidade está relacionada a função de capacidades absortivas.

O conceito de capacidade absortiva foi proposto por Cohen e Levinthal (1990) ao se

referir a habilidade da uma organização em reconhecer o valor de um conhecimento novo

externo, e assimilá-lo e aplicá-lo internamente em seus processos (COHEN; LEVINTHAL,

1990, p. 128). Esta capacidade de absorção de conhecimentos externos e sua incorporação na

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base de competências da organização é de importância crítica para o contínuo

desenvolvimento de capacidades inovativas.

Zahra e George (2002, p. 185) propuseram a reconceituação de capacidade absortiva

como uma capacidade dinâmica relacionada à criação e utilização de conhecimentos que

aumenta a habilidade da firma em obter e sustentar vantagens competitivas (ZAHRA;

GEORGE, 2002, p. 185). Desta forma, a capacidade absortiva representa um conjunto de

habilidades da organização para gerenciamento do conhecimento, contemplando rotinas e

processos organizacionais pelo qual as empresas adquirem, assimilam, transformam, e

aplicam conhecimento (ZAHRA; GEORGE, 2002, p. 186).

As quatro dimensões da capacidade absortiva de acordo com Zahra e George (2002, p.

189) são:

Tabela 3 - As quatro dimensões de habilidades que compõem a capacidade absortiva por Zahra e

George (2002).

Dimensões de Habilidades da Capacidade Absortiva

Habilidade Descrição

Aquisição do conhecimento

Identificar e adquirir conhecimento, externamente

gerado, que seja crítico para as operações da

organização.

Assimilação do conhecimento Analisar, processar, interpretar, e compreender o

conhecimento obtido das fontes externas.

Transformação do conhecimento

Desenvolver e refinar as rotinas existentes na

organização com base no conhecimento recentemente

adquirido e assimilado.

Aplicação do conhecimento

Estender e alavancar as capacidades existentes na

organização, ou criar novas capacidades, ao incorporar

o conhecimento adquirido e transformado em suas

operações.

Fonte: Baseado em Zahra e George (2002).

Zhara e George (2002, p. 185) distinguem estas habilidades em dois grupos, o que

denominam de capacidade absortiva potencial, abrange a aquisição e assimilação de

conhecimento; e capacidade absortiva realizada (ou revelada) refere-se a sua transformação

em conhecimento interno e sua efetiva aplicação e desenvolvimento (ZAHRA; GEORGE,

2002, p. 185).

A importância desta distinção é compreender que a capacidade absortiva potencial

pode tornar uma organização receptiva para adquirir e assimilar conhecimento externo, sendo

fonte de renovação da base de conhecimentos, porém não garante o uso destes conhecimentos

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e possíveis benefícios decorrentes deste (ZAHRA; GEORGE, 2002, p. 196). Enquanto que a

capacidade absortiva realizada, com a função de aplicar e alavancar o conhecimento, atua

como a fonte primária de melhoria de desempenho (ZAHRA; GEORGE, 2002, p. 190).

Cohen e Levinthal (1990, p. 141) e Zahra e George (2002, p. 196) defendem que a

capacidade absortiva modera os efeitos da apropriabilidade e das oportunidades tecnológicas

sobre a atividade inovativa das organizações. No que tange a oportunidades tecnológicas, caso

uma organização não desenvolva capacidades absortivas tende a não identificar (ou identificar

de forma limitada) o surgimento de novas oportunidades, o que implica em bloqueios no

desenvolvimento tecnológico subsequente (COHEN; LEVINTHAL, 1990, p. 136).

Em relação à apropriabilidade, para Cohen e Levinthal (1990, p. 142), apesar de

reconhecer que regimes de baixa apropriabilidade, em geral, são pouco estimulantes para as

organizações para realização de investimentos em aprendizado em virtude dos

transbordamentos de conhecimento, esses autores indicam que se houver substancial

transbordamento de conhecimento, este pode proporcionar um incentivo positivo ao

desenvolvimento de capacidades absortivas, que parcialmente compense os efeitos negativos

da baixa apropriabilidade.

Contudo, para Zahra e George (2002, p. 196), em regimes de baixa apropriabilidade,

as empresas devem exercer um esforço extra ao desenvolver capacidades absortivas, pois

devem, de forma adicional, estabelecer mecanismos de isolamento das capacidades

desenvolvidas, como o sigilo, para proteger suas vantagens e captar benefícios de seus novos

processos ou produtos.

3.2.3 Capacidades de inovação

Figueiredo (2000, 2003) diferencia linhas distintas de pesquisas sobre capacidades de

inovação, uma direcionada para a inovação e criação de conhecimento na fronteira

tecnológica em economias industrializadas, e outra relacionada ao aprendizado e acumulação

de capacidades em empresas de economias de industrialização tardia e países em

desenvolvimento.

A primeira corrente enfatiza questões sobre como as empresas podem sustentar,

renovar, criar rotinas e integrar competências tecnológicas e de inovação frente a bases de

conhecimento já acumuladas, seja nos indivíduos ou nas organizações, sem conferir enfoque

quanto a forma de construção inicial dessas competências e seus problemas (FIGUEIREDO,

2000; MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010).

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Portanto, enquanto esta primeira corrente se concentra em preocupações com

atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de produtos e processos na fronteira

tecnológica, a segunda linha de pesquisa busca compreender como empresas de países de

economia emergente podem se engajar em processos de aprendizado que possibilitem a

construção de suas próprias capacidades (MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010). O

desenvolvimento de capacidades internas e a implementação de atividades inovadoras

partindo-se de processos e produtos já disponíveis no mundo, por meio da difusão em

empresas, são extremamente importantes para as empresas em países em desenvolvimento,

bem como os diferentes tipos de processos de aprimoramento contínuo e inovações

incrementais daí decorrentes (FIGUEIREDO, 2000).

Lall (1992, p. 166) entende que os avanços sobre questões tecnológicas em países em

desenvolvimento tem se baseado em estudos sobre os esforços tecnológicos internos para o

domínio de tecnologias novas (geradas externamente), com vistas a adaptá-las as condições

locais, melhorá-las e difundi-las na economia, além de explorá-las para a diversificação e

criação de novas tecnologias (internamente), as quais possam ser inclusive exportadas.

No entanto, em função de deficiências em relação a experiências e habilidades

limitadas de produção industrial, Lall (1992, p. 168) considera que uma empresa típica de um

país em desenvolvimento seja provavelmente menos eficiente em comparação com uma

empresa típica de um país desenvolvido ao usar a mesma tecnologia. Miranda e Figueiredo

(2010) também indicam que em contextos de países em desenvolvimento, por um lado, é

comum as empresas não terem o mínimo de capacidade ou conhecimento tecnológico durante

seu funcionamento inicial, e por outro lado, a fronteira tecnológica internacional está em

constante movimento.

Por isso, é necessário que os países em desenvolvimento acelerem o processo de

acumulação tecnológica a uma taxa mais rápida do que a atualmente observada nas empresas

de economias altamente industrializadas, de modo a alcançar a fronteira tecnológica

internacional, e viabilizar a condução de atividades inovadoras de forma independente

(MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010). Contudo, Miranda e Figueiredo (2010, p. 78) observam

que não somente a velocidade relativa de acumulação tecnológica que é importante, mas

também a direção dos esforços, visto que a emergência de descontinuidades radicais em

alguns setores pode alterar as composições de capacidades relevantes, destruindo

competências previamente desenvolvidas e criando novas demandas de conhecimentos.

Neste sentido, Miranda e Figueiredo (2010) defendem que descobertas em relação à

dinâmica e velocidade de acumulação de capacidades tecnológicas são relevantes para

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subsidiar decisões tanto de empresários, como de gestores públicos, para orientação quanto

aos esforços de construção de capacidades inovadoras ao longo do tempo, e ter informações

sobre quando e como se materializariam seus retornos. Para tanto os estudos referentes à

acumulação de capacidades buscam explicar a forma, direção e velocidade dos processos de

aprendizado e acumulação de capacidades tecnológicas nas empresas são fundamentais.

A capacidade de inovação é compreendida como um contínuo de atividades com

crescentes graus de dificuldade e complexidade que consiste da combinação de um conjunto

de diferentes fatores (estrutura, estratégia, competências, trajetória, entre outros), e em

constante mudança pela interação com o meio externo (MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010).

Em um sentido processual, as organizações que alcançam maior capacidade de inovação

aumentam sua probabilidade de manter-se ou elevar seus níveis de competitividade, bem

como ao obter maior competitividade aumentam sua probabilidade de desenvolver sua

capacidade de inovação (DOSI, 1988, p. 1161).

Figueiredo (2011, p. 422) ao reconhecer que existem diferentes níveis de capacidade

de inovação, enfatiza a importância em compreender sua dinâmica e propõe como central a

esta abordagem a noção de “capacidades reveladas”. No sentido em que, em vez de avaliar o

desempenho inovativo por indicadores tradicionais, como quantidade de patentes ou

investimentos em P&D, busca-se identificar os diferentes desempenhos de inovação das

organizações, em termos de distintos graus de acumulação de capacidades e da novidade e

complexidade de suas atividades e do resultado alcançado (FIGUEIREDO, 2011, p. 422;

MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010, p. 78).

O processo de acumulação tecnológica se caracteriza pelo desenvolvimento de

capacidades relacionadas a geração e gerenciamento de mudanças técnicas (BELL; PAVITT,

1993, p. 163). As chamadas capacidades tecnológicas, ou capacidades inovativas,

contemplam os recursos necessários para implementar atividades inovativas em produtos,

processos ou sistemas organizacionais, envolvendo mudança tecnológica (MIRANDA;

FIGUEIREDO, 2010; FIGUEIREDO, 2011, p. 422). Novamente, diferentes graus de

acumulação tecnológica permitem desempenho inovativos distintos.

Ao buscar identificar as trajetórias de desenvolvimento de capacidades tecnológicas de

uma organização, em termos de seus focos tecnológicos, da frequência e formas de buscas de

aprendizado para a acumulação dos diferentes níveis de capacidades, é possível compreender

as suas diferentes direções, intensidade e velocidade (FIGUEIREDO, 2000, p. 8).

Esta compreensão é relevante ao se considerar que a existência de assimetrias entre

empresas intra e intersetorial é uma das consequências de características como a

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cumulatividade tecnológica a nível da organização, seu conhecimento tácito e o conjunto

diverso de mecanismos de apropriabilidade utilizado sobre inovações (DOSI, 1988, p. 1153).

Em uma indústria, segundo Dosi (1988, p. 1157), a heterogeneidade entre as empresas

é relacionada a três aspectos: o grau de assimetria representado pela dispersão de níveis de

eficiência de recursos e qualidade de produtos de cada empresa (1); a variedade tecnológica

que resulta de rotinas técnicas diferenciadas, escalas de produção e parque de equipamentos

(2); e, a diversidade de comportamento que se refere ao desenvolvimento idiossincrático de

regras de decisão e estratégias particulares de cada organização (3).

Entendemos que estas três características abrangem relações vinculadas ao

desenvolvimento de capacidades e as buscas de aprendizado presentes em capacidades de

produção (diferentes graus de eficiência e qualidade alcançados), tecnológicas (direção e

intensidade tecnológica) e na própria construção de dinâmicas organizacionais mais gerais,

como a estratégia de negócio e a forma de interações sociais intra e interorganizacional, que

também envolve capacidades relacionais, conforme indicado por Capaldo (2007, p. 585, 605).

Estes processos de desenvolvimento de capacidades e inovação pelas organizações

implicam na formação, e constante reconfiguração, de uma dinâmica estrutura industrial para

setores econômicos específicos, que ao mesmo tempo atuam como resultante e como

direcionador da constante mudança tecnológica e organizacional, em virtude de gerar padrões

em termos de investimentos para inovação, taxas de inovações e desempenho (DOSI, 1988, p.

1157).

3.2.4 Padrões de mudança técnica setorial

Para Bell e Pavitt (1993, p. 177) os padrões e trajetórias tecnológicas tendem a se

diferenciar entre industriais (intersetoriais) e entre organizações empresariais

(intrasetorial/interorganizacionais). Os setores econômicos específicos desenvolvem

características próprias em termos de necessidades de mudança técnica das empresas, fontes

de tecnologia utilizadas, possibilidades de apropriação dos conhecimentos gerados e outras

questões relacionadas com respeito às atividades de inovação.

Dosi (1988, p. 1140) corrobora com esta visão ao entender que padrões de mudança

técnica setorial são resultados da interação de vários tipos de incentivos de mercado por um

lado, e oportunidade tecnológica e apropriabilidade de outro lado. Assim, o autor indica a

importância de desenvolver análises que permitam vincular características de fontes e direção

de oportunidades tecnológicas, mecanismos de apropriabilidade, e capacidades de empresas

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em relação a emergência de padrões de mudança técnica específicos nas diferentes estruturas

industriais (DOSI, 1988, p. 1158).

Neste sentido, com o objetivo de identificar e compreender regularidades setoriais ao

longo de trajetórias tecnológicas Pavitt (1984) e Bell e Pavitt (1993) analisaram padrões

setoriais de inovação, considerando critérios tecnológicos e econômicos de forma a propor

uma taxonomia e embasamento teórico para análise da interação entre trajetória tecnológica e

dinâmica inovativa setorial (padrões setoriais de mudança técnica e acumulação tecnológica).

A taxonomia foi desenvolvida inicialmente por Pavitt (1984), e posteriormente

ampliada por Bell e Pavitt (1993) e contempla cinco categorias de modelos de mudança

técnica. As análises fundamentam-se em características de trajetórias tecnológicas, como o

foco e a direção da mudança técnica, fontes de conhecimento e acumulação tecnológica,

escalas de produção envolvidas, tipos e requisitos de usuários, e variáveis de comportamento

estratégico e apropriabilidade (POSSAS, 2003, p. 233). As cinco categorias de mudanças

técnicas setoriais são denominadas de “dominada por fornecedor”, “intensiva em escala”,

“intensiva em informação”, “base científica” e “fornecedor especializado”.

De forma sintética, empresas dominadas pelos fornecedores se encontram em setores

de manufatura tradicional, como têxtil e madeireiro, produtores artesanais e agricultura,

possuem escalas de produção menores, e baixa capacidade tecnológica e de engenharia

(DOSI, 1988, p. 1148; PAVITT, 1984, 356). O desenvolvimento de mudança técnica advém

quase que exclusivamente de fornecedores de bens de capital e outros suprimentos de

produção fabricados por indústrias fora do setor de aplicação (BELL; PAVITT, 1993, p. 178).

O processo de mudança técnica neste caso caracteriza-se mais como um processo de

difusão de inovações e melhores práticas (DOSI, 1988, p. 1148). O conhecimento e

investimentos inovativos das empresas destes setores tendem a focalizar melhorias

incrementais no processo produtivo e sua eficiência, além de inovações organizacionais

(DOSI, 1988, p. 1148). Apesar das principais oportunidades tecnológicas terem origem

exógena ao setor específico de utilização, o funcionamento pleno e eficiente do potencial da

nova tecnologia somente acontece por meio de processos de aprendizado das empresas

usuárias, o qual é facilitado ou dificultado pelas capacidades e condições de mercado em que

estas operam (DOSI, 1988, p. 1144).

As empresas intensivas em escala são, em geral, grandes indústrias de bens de

consumo duráveis, como a automobilística, e materiais industriais, como a metalúrgica

(PAVITT, 1984, p. 359; BELL; PAVITT, 1993, p. 178). A tecnologia é acumulada pela

capacidade de design e construção de componentes, equipamentos e subsistemas, ou design

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de e construção de larga escala e sistemas complexos (BELL: PAVITT, 1993, p. 178). Riscos

e custos relacionados com mudanças radicais são elevados (escala e complexidade de

produção), portanto o desenvolvimento de processos e produtos é incremental e as principais

fontes de mudança de técnica são design, engenharia de produção, curva de experiência em

operações, fornecedores de equipamentos e componentes (BELL: PAVITT, 1993, p. 178).

As empresas intensivas em informação representam setores como bancos e grandes

empresas financeiras, de propaganda e publicidade, e de processamento de dados (BELL:

PAVITT, 1993, p. 179). Esta forma de acumulação tecnológica emergiu do desenvolvimento

da capacidade de armazenar, processar e transferir informação, por meio do design,

construção, operação e melhorias de sistemas de informações complexos (BELL: PAVITT,

1993, p. 179). As mudanças técnicas tendem a ser incrementais, e as fontes principais são

fornecedores de sistemas e aplicativos e a experiências de departamentos internos de grandes

empresas usuárias (BELL: PAVITT, 1993, p. 179).

As empresas de base científica estão tipicamente em setores químicos, eletrônicos e

biotecnologia (DOSI, 1988, p. 1149; PAVITT, 1984, p. 362). A acumulação tecnológica

emerge principalmente de atividades de P&D em grandes industriais ou de empresas de base

tecnológica, sendo que é bastante dependente de conhecimento, habilidades e tecnologias

originadas na pesquisa acadêmica (DOSI, 1988, p. 1149; BELL: PAVITT, 1993, p. 179). A

principal direção de mudança técnica é a busca horizontal (dentro do próprio setor) de um

amplo conjunto de produtos novos, ou tecnologicamente melhorados, baseados em

descobertas científicas (BELL: PAVITT, 1993, p. 179). As capacidades tecnológicas mais

relevantes são engenharia reversa, P&D e atividades de design, e requer treinamento de

cientistas e engenheiros em pesquisas com contatos internacionais (BELL: PAVITT, 1993, p.

179).

E, por fim, os fornecedores especializados tendem a ser não ser muito grandes,

atuando em setores como engenharia mecânica, instrumentos e softwares com foco na

produção de bens de capital e suprimentos para montagem de sistemas complexos (DOSI,

1988, p. 1149; BELL: PAVITT, 1993, p. 179). Estes fornecedores especializados se

beneficiam da interação com usuários avançados com grande experiência de operação, e

acumulam conhecimento em requisitos e design de sistemas caracterizados pela complexidade

e interdependências de processos de produção. Há uma ênfase na relação de confiança e foco

no desempenho dos produtos e processos, sendo que a maior parte destes fornecedores

representam um movimento de desintegração vertical e convergência tecnológica em grandes

indústrias (BELL; PAVITT, 1993, p. 179, 182).

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96

A seguir apresentamos uma tabela síntese das principais características de cada

categoria na Tabela 4:

Tabela 4 - Padrões Setoriais de Mudança Técnica.

Variáveis de

análise

Categorias de Setores

Dominado por

fornecedor

Intensivo em

escala

Intensivo em

informação Base científica

Fornecedor

especializado

Setores típicos

Agricultura,

têxteis,

madeireiro

Bens duráveis,

automobilística,

metalúrgica

Bancos,

Seguradoras,

Propaganda e

publicidade

Químico,

biotecnologia,

eletrônico.

Equipamentos e

bens de capital,

Softwares,

Instrumentos

Tamanho de

empresas Pequeno Grande Grande Grande Pequeno

Tipo de

usuários

Sensível ao

preço

Sensível a preço

e desempenho

Sensível a preço

e desempenho

Sensível a preço

e desempenho

Sensível ao

desempenho

Principais

focos das

atividades

tecnológicas

Redução de

custo

Redução de custo

e melhoria de

produto

Redução de

custo e melhoria

de produto

Redução de custo

e melhoria de

produto

Melhoria de

produto

Principais

fontes de

acumulação

tecnológica

Fornecedores,

aprendiz. na

produção, serv.

de consultorias

Engenharia de

Produção;

aprendiz. nas

operações,

projetos,

fornecedores

Engenharia de

sistemas interna,

fornecedores de

equipamentos e

aplicativos

P&D interno;

pesquisa básica;

engenharia de

produção; Design

de produto

P&D interno,

Usuários

avançados

Principal

direções da

acumulação

tecnológica

Tecnologia de

processo e

equipamentos (foco ascendente

na cadeia, baixa

diversificação de

produto)

Tecnologia de

processo e

equipamentos (foco ascendente

na cadeia, baixa

diversificação de

produto)

Tecnologia de

processo e software

(concêntrica e

ascendente)

Desenvolv. de

tecnologias para

produtos (concêntrica: alta

diversificação

com foco no

mesmo setor)

Melhoria de

produto

(concêntrica: baixa

diversificação de

produto com foco

no mesmo setor)

Principais

canais de

imitação e de

transferência

de tecnologia

Aquisição de

equipamentos e

serviços

relacionados

Aquisição de

equipamentos;

licença de know-

how e

treinamentos;

engenharia

reversa

Aquisição de

equipamentos e

softwares;

engenharia

reversa

Engenharia

reversa; P&D;

contratação de

pessoal técnico

especializado

Engenharia

reversa,

Aprendiz. c/

usuários

Principais

meios de

apropriação

(proteção

contra

imitação)

Mecanismos não técnicos

(Marketing,

marca, etc)

Segredo industrial; know-

how projeto e

operação

Direito Autoral; know-how

projeto e

operação

Patentes, know-how em P&D,

know-how em

projeto e

operação

Patentes, conhecimento de

necessidades de

usuários, know-

how de projetos

Principais

incumbências

administrativas

de caráter

estratégico

Uso de

tecnologias

produzidas em

outro setor para

reforçar as

vantagens competitivas.

Integração

incremental de

tecnologias;

desenvolv. e

difusão de

melhores

práticas;

exploração das vantagens de

tecnologia de

processo

Projeto e

operação de

sistemas

complexos de

processamento

de informações;

Desenvolv. de produtos

Desenvolv. de

produtos afins;

exploração da

ciência básica;

obtenção de

ativos complementares

Monitorar as

necessidades de

usuários

avançados,

integrar novas

tecnologias em projetos

Fonte: Baseada em Bell e Pavitt (1993, p. 180).

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97

Como ressaltado por Possas (2003, p. 233) a taxonomia dos padrões setoriais de

mudança técnica não objetiva fornecer critérios de enquadramento a priore para os diferentes

setores industriais, mas sim busca sugerir um conjunto de variáveis sobre padrões estratégicos

adotados pelas organizações que podem iluminar as análises de dinâmicas de inovação em um

setor ou a compreensão de atuação inovativa de uma empresa.

Archibugi (2001, p. 419) destaca que a taxonomia classifica perfis típicos de

comportamento tecnológico de empresas em setores, e não a análise de variáveis

correspondentes ao nível setorial em si, por isso defende que a classificação de forma ideal

deveria ser aplicada diretamente no nível das empresas, e não a um nível agregado de dados

de setor industrial. Neste ponto, há o reconhecimento de que a alta variedade tecnológica em

empresas classificadas dentro do mesmo setor é considerada uma das fragilidades existentes

na taxonomia, contudo, se a taxonomia for empregada para análise no nível de empresas, esta

variedade diminui (ARCHIBUGI, 2001, p. 419).

Esta última observação refere-se à constatação de Bell e Pavitt (1993, p. 182) que há

empresas que podem ser ativas em mais de uma categoria, como exemplificam a IBM no

início da década de 1990 em que atuava tanto de forma intensiva em escala, como de base

científica. Este exemplo é o que Archibugi (2001, p. 420) denomina de empresa com

multitecnologias, a qual atua sobre múltiplas trajetórias tecnológicas.

Archibugi (2001, p. 422) indica que apesar da taxonomia apresentada ser caracterizada

como uma classificação estática de padrões de mudança tecnológica (o que em si oferece

contribuições relevantes), também é possível usar a taxonomia proposta em uma leitura

dinâmica do processo de evolução econômica. Em termos estáticos, o modelo reconhece uma

substancial variedade de comportamentos inovativos e permite explorar as interações entre

estes diferentes comportamentos (links usuários-produtores), além de conjecturar prováveis

direções e principais influências no desenvolvimento tecnológico para cada categoria de

empresas (ARCHIBUGI, 2001, p. 422).

Em relação à perspectiva dinâmica, Archibugi (2001, p. 422) informa que a taxonomia

auxilia na compreensão da geração de novos diferentes tipos de empresas inovativas no

decorrer do tempo, sem que se tenha extinto os tipos anteriormente existentes, associando o

surgimento de certas categorias e ondas de desenvolvimento econômico.

Archibugi (2001, p. 422-) exemplifica com a separação durante a primeira revolução

industrial entre empresas de produção de bens de consumo e de bens de capital, que criou

inicialmente os tipos distintos “dominado por fornecedor” e “fornecedor especializado”. O

autor ainda cita as descobertas científicas na química e eletrônica que geraram oportunidade

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98

de novos negócios e o estabelecimento de empresas de base científica, e os avanços mais

recentes na tecnologia de informação e comunicação que proporcionaram a criação de

negócios intensivos em informação (ARCHIBUGI, 2001, p. 422).

Bell e Pavitt (1993, p. 182) afirmam que estes padrões setoriais de mudança

tecnológica ajudam a explicar os vínculos entre os processos de acumulação tecnológica

(aprendizado) em setores industriais com dois importantes fatores relacionados aos padrões de

desenvolvimento industrial de países: alterações nas bases das vantagens competitivas e

alterações nas composições de resultados.

Em países desenvolvidos a acumulação tecnológica ocorreu de forma progressiva

entre todas as categorias estabelecidas, proporcionando a composição de uma estrutura

industrial ampla e complexa, com aprendizados e desenvolvimentos tecnológicos interativos

(entre as categorias e setores industriais) e cumulativos (BELL; PAVITT, 1993, p. 182).

Como cada padrão de mudança técnica alude à diferentes graus de importância de fatores de

produção, percebe-se que em países desenvolvidos há maior concentração em setores cuja

vantagem competitiva se baseia em níveis mais elevados de capacidades tecnológicas (BELL;

PAVITT, 1993, p. 184).

Enquanto em países em desenvolvimento tendem a ter um histórico de

desenvolvimento baseado em setores dominados por fornecedores, com presença menos

dinâmica em setores de maior ênfase competitiva baseada em elevados coeficientes

tecnológicos, e uma estrutura industrial de composição menos diversificada, que restringe

oportunidades de aprendizado interativo.

3.2.5 Acumulação tecnológica em países em desenvolvimento

Ao analisar o processo de acumulação tecnológica em diferentes países, Bell e Pavitt

(1993, p. 166) destacam distinções fundamentais no processo de acumulação tecnológica

entre países desenvolvidos e em desenvolvimento que possuem implicações relevantes aos

contextos de aprendizado tecnológico e desenvolvimento de mudanças técnicas e inovações.

A aprendizagem tecnológica em função de seu conhecimento tácito e específico move-

se ao longo de uma trajetória particular, em que o aprendizado anterior (estoque de

conhecimento e experiências) contribui para reforçar uma direção e taxa específica de

mudança técnica (BELL; PAVITT, 1993, p. 169).

Disso resultam três implicações (BELL; PAVITT, 1993, p. 169):

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99

- Diferentes eficiências técnicas entre países relacionam-se a diferentes competências

técnicas acumuladas ao longo do tempo;

- Não é possível alterar rapidamente tais competências tecnológicas acumuladas, uma

vez que padrões setoriais de acumulação tecnológica são relativamente estáveis; e,

- A taxa e a composição da acumulação tecnológica influência tanto a eficiência

competitiva no curto prazo, quanto a própria evolução de novas bases de vantagens

competitivas ao longo prazo.

Bell e Pavitt (1993, p. 167) ressaltam que nos países desenvolvidos a acumulação

tecnológica construiu suas bases na importância central das organizações empresariais, como

local de aprendizado (learning by doing), de operação e desenvolvimento de sistemas

produtivos. Mas, apesar de enfatizar o papel das empresas, reconhecem que a mudança

técnica envolve complexas interações entre empresas (fornecedores, concorrentes, clientes) e

outras organizações da sociedade, como universidade, centros de pesquisa e agências públicas

(BELL; PAVITT, 1993, p. 168).

Assim, uma parte importante da acumulação de capacidades tecnológicas nestes países

decorre da construção de uma complementaridade entre instituições infraestrutural e

organizações empresariais, na qual estas organizações empresarias interagem, criando e

melhorando as tecnologias utilizadas (BELL; PAVITT, 1993, p. 168). Bell e Pavitt (1993, p.

176) ainda acrescentam que as organizações empresariais nestes países não costumam

procurar esse tipo de instituição para compensar a ausência de capacidades tecnológicas, mas

sim buscam conhecimento específico necessário para complementar atividades inovativas

internas em desenvolvimento.

Outro destaque é que a tecnologia importada (criada no exterior e incorporada à base

de conhecimento do país via assimilação dinâmica) e a acumulação tecnológica local não são

vistas como meios alternativos de geração de mudança técnica, mas são complementares para

promoção do avanço tecnológico (BELL; PAVITT, 1993, p. 171).

Contudo, sobre a acumulação tecnológica em países em desenvolvimento, Bell e

Pavitt (1993, p. 185) expõem que, embora se tenha, em geral, avançado e diversificado a

capacidade de produção industrial, há expressivas diferenças entre os países em relação aos

padrões de expansão e diversificação tecnológica, à dinâmica de eficiência do crescimento

industrial e às taxas de acumulação tecnológica industrial.

Entre os principais obstáculos identificados por Bell e Pavitt em trajetórias de

acumulação tecnológica desses países, os autores mencionam falhas em políticas de

intervenção implantadas para fomentar o avanço industrial, por um lado em políticas baseadas

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100

na importação (difusão) de tecnologia contida em máquinas e equipamentos, e nos

conhecimentos e habilidades necessárias para operar uma produção de bens (BELL; PAVITT,

1993, p. 158). Por outro lado, há políticas fundamentadas em programas de financiamento do

governo a laboratórios e centros de pesquisa, no entanto, sem prover incentivos diretos para

acumulação tecnológicas em empresas, o que dificulta a interação entre estes atores e,

portanto, tolhe o desenvolvimento de aplicações na indústria dos conhecimentos científicos

básicos (BELL; PAVITT, 1993, p. 168).

Lall (1992, 171) ao mesmo tempo em que defende um papel central para as políticas

governamentais nos países em desenvolvimento para a intervenção em função de falhas nos

mercados e para criação de estruturas institucionais necessárias, também reconhece que a

implementação de políticas não representa condição suficiente, e, por vezes, as intervenções

governamentais sejam excessivas, equivocadas, ou ainda com falhas na execução (LALL,

1992, p. 172).

Particularmente, Lall (1992, p. 180) questiona políticas de intervenção relacionadas a

ajustes somente em níveis de preços da economia, pois podem levar a uma especialização em

atividades baseadas em vantagens comparativas estáticas. As configurações de preços e custos

podem não ser uma base consistente para promover a investimentos das organizações para o

desenvolvimento em capacidades, principalmente aquelas de maior complexidade

tecnológica, em função de externalidades, complementaridades tecnológicas, incerteza de

ganhos com aprendizado (problemas de apropriabilidade) ou falhas nos mercados (LALL,

1992, p. 181).

Lall (1992, p. 170) cita os exemplos do Japão e Coreia do Sul como países cujas

distintas políticas governamentais conseguiram equilibrar os investimentos estrangeiros

diretos e a importação de tecnologia externa, com exigências de estágios de desenvolvimento

tecnológico nas industriais locais e esforço tecnológico para absorção ativa destas tecnologias

importadas.

No entanto, é comum países em desenvolvimento, como o Brasil, apresentarem um

esforço na assimilação de capacidades de produção, porém com o desenvolvimento de

capacidades tecnológicas restrito, devido a forma conduzida de seu processo de

industrialização (BELL; PAVITT, 1993, p. 158). A capacidade de produção consiste de

recursos utilizados para produção industrial de bens conforme uma dada tecnologia (neste

caso predominantemente tecnologias importadas), dentro um determinado nível de eficiência

e englobando certa combinação de inputs e recursos (equipamentos, sistemas, processos

organizacionais e habilidades de trabalhadores).

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101

Já capacidades tecnológicas abrangem os recursos necessários para gerar e gerir a

mudança técnica, de realizar inovações tecnológicas, considerando habilidades,

conhecimento, experiência e estrutura institucional (BELL; PAVITT, 1993, p. 163). A

mudança tecnológica nas empresas é caracterizada por Lall (1992, p. 166) como um processo

contínuo de absorção e criação de conhecimento tecnológico, ressaltando a importância das

interações com fontes externas de conhecimento, e da dependência da acumulação de

conhecimento e habilidades do passado.

Bell e Pavitt (1993, p. 163) argumentam que é crescente a distinção e especialização

entre os tipos de conhecimento e habilidade requeridos para operar um sistema de produção

(uso de tecnologia), e aqueles necessários para mudá-los (mudança de tecnologia). E, assim,

os recursos intangíveis requeridos para gerar e gerir a mudança tecnológica (habilidades,

conhecimento, vínculos institucionais) não podem mais serem concebidos como um

alinhamento marginal de recursos que constituem a capacidade de produção, pois estes se

tornaram muito mais significativos pelo aumento da intensidade de conhecimento e de

mudanças da produção industrial.

Lall (1992, p. 167) em sua análise sobre capacidades tecnológicas propõe três

categorias de capacidades distintas relacionadas à acumulação tecnológica conforme Tabela

5:

Tabela 5 - Tabela de categorias de capacidades relacionadas à acumulação tecnológica. Categorias de capacidades relacionadas a acumulação tecnológica

Capacidades Descrição

Capacidade de

investimento

tecnológico

Corresponde a habilidades em diferentes níveis de complexidade para identificar,

selecionar e obter tecnologia para novas operações ou expansões, e relaciona-se com

questão como adequação da escala de produção, mix de produtos, avaliação de

tecnologias e equipamentos alternativos.

Capacidade de

produção tecnológica

Envolve habilidades para operação, manutenção e controle de qualidade de produtos e

processos, incluindo adaptações, melhorias e até “stretching” em equipamentos, que é

o alongamento de níveis limites de produtividade. Estas habilidades determinam

como uma tecnologia é operada e melhorada na organização, assim como os esforços

internos para absorção de tecnologias externas.

Capacidade de

vínculos

Abrange as habilidades relacionadas a transmissão e captação de informações,

capacidades e tecnologias de outros atores do mercado ou institucionais, sendo

relevante tanto para a melhoria da eficiência produtiva da organização, quanto para o

desenvolvimento industrial, seja pela difusão de tecnologias na economia, seja pelo

enraizamento da estrutura industrial.

Fonte: Baseada em Lall (1992).

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102

Cabe esclarecer que, apesar da noção de diferentes categorias de capacidades e

distintos graus de complexidade em cada uma destas, não significa que a acumulação destas

capacidades obrigatoriamente ocorrerá de forma linear ou sequencial, pois dependem das

trajetórias de aprendizado de cada organização (MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010, p. 82;

LALL, 1992, p. 168).

Estas trajetórias de desenvolvimento de capacidades das organizações são resultados

de um processo que compreende características internas e respostas a estímulos externos,

incluindo a interação com outros agentes econômicos, privados e públicos, locais e

estrangeiros (LALL, 1992, p. 169).

Neste sentido, o conhecimento tecnológico não é compartilhado entre as empresas de

forma igual, nem pode ser facilmente transferido, pois devido a sua natureza tácita que exige

investimento, esforço e habilidade para seu aprendizado (LALL, 1992, p. 166). Assim, o

conhecimento aprendido por uma empresa é diferente do aprendizado de outra empresa

mesmo que trabalhe com tecnologias similares, e é ainda mais diferente de outras empresas

que trabalhem com tecnologias alternativas dentro do mesmo setor (LALL, 1992, p. 166).

Segundo Lall (1992, p. 169), a OCDE (Organização para Cooperação e

Desenvolvimento Econômico) justifica as diferenças de desempenho de economias industriais

avançadas por um conjunto de interações entre incentivos e capacidades, operando dentro de

um quadro institucional. As capacidades indicariam o melhor desempenho que as

organizações podem alcançar, e os incentivos guiam e estimulam sua utilização, expansão,

renovação ou desaparecimento, enquanto que um conjunto de regras institucionais são

estabelecidas para direcionar o desenvolvimento constante dessas capacidades e

aprimoramento de incentivos (LALL, 1992, p. 169).

Os incentivos que afetam o desenvolvimento de capacidades emergem de forças do

mercado, funções institucionais e políticas governamentais (LALL, 1992, p. 170). Os fatores

de mercado devem funcionar para evitar o subinvestimento de empresas no desenvolvimento

de capacidades tecnológicas, e basicamente referem-se à eficiência de mercados de capitais

em termos de linhas de financiamento adequadas, eficiência de mercados de trabalho,

responsivo às necessidades de habilidades individuais, e eficiência de mercado de tecnologia,

vinculados a fluxo de informação e infraestrutura de C&T (LALL, 1992, p. 171). Também

deve-se considerar os incentivos relacionados aos aspectos macroeconômicos e incentivos da

competição (doméstica e internacional).

As instituições referem-se a uma preocupação de relevância especificamente quando o

mercado não consegue criar naturalmente as instituições de “não mercado” necessárias ao

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103

desenvolvimento tecnológico, como as instituições de apoio industrial (promoção de vínculos

em cadeias de valor, apoio a pequenas empresas, etc); instituições de formação e treinamento;

e instituições de pesquisa e tecnologia (LALL, 1992, p. 172). Neste caso, novamente são

necessárias intervenções que visem criar instituições e atividades que gerem

transbordamentos positivos, cujos retornos sociais excedam a apropriação percebida de

retornos por agentes privados (LALL, 1992, p. 172).

No entanto, em países em desenvolvimento, em virtude da natureza e custos das

atividades de aprendizado tecnológico, assim como de externalidades e complementaridades

geradas, os incentivos às empresas para o desenvolvimento de capacidades tecnológicas

podem ser insuficientes, por falha em mecanismo de mercado e regimes institucionais (LALL,

1992, p. 166).

Bell e Pavitt (1993, p. 190) também indicam problemas de alinhamento e

infraestrutura institucional em países em desenvolvimento, particularmente nas áreas de

educação e formação profissional, e de apoio ao desenvolvimento de P&D na indústria, o que

resulta na fragmentação de iniciativas de aprendizado e inovação por diferentes instituições, e

a não geração das complementaridades necessárias, anteriormente comentadas.

Um dos pontos ressaltados de falhas nestes vínculos por Bell e Pavitt (BELL;

PAVITT, 1993, p. 175) corresponde a compreensão que a principal contribuição da pesquisa

científica acadêmica ao desenvolvimento tecnológico não deve estar baseada na publicação de

resultados científicos, mas na formação de cientistas e engenheiros para a indústria com

elevadas habilidades de resolução de problemas, apropriabilidade científica (base de

conhecimento sólida e familiaridade com métodos e instrumentos científicos), e interação

com redes de profissionais.

Este fluxo de profissionais entre instituições da infraestrutura de CT&I e empresas

permitiria um maior equilíbrio de capacidade tecnológica entre estas esferas, e maior

acumulação tecnológica interna nas empresas, entretanto, na maioria dos países em

desenvolvimento, incluindo o Brasil, ainda há substancial desequilíbrio com mínima presença

nas empresas de quadro de profissionais mestres e doutores (BELL; PAVITT, 1993, p. 193).

Outra preocupação em relação a condições adequadas para a acumulação tecnológica

refere-se a desenvolver um sistema de apoio institucional financeiro e corporativo que

assegure que os processos de mercado sejam avaliados e encorajados em direção ao

aprendizado tecnológico cumulativo (BELL; PAVITT, 1993, p. 177).

A dificuldade está na percepção de fraca apropriabilidade destes investimentos que

pode levar ao subinvestimento, em função do alto grau de incerteza quanto a retornos em

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104

processos de desenvolvimento e aprendizado tecnológico e que seus benefícios são realizados

em prazos mais longos (não imediatos) (BELL; PAVITT, 1993, p. 177). Outra questão é a

necessidade de conhecimentos específicos para avaliar de forma acurada o valor potencial de

um desenvolvimento tecnológico, que cuja competência são raras ainda em países em

desenvolvimento (BELL; PAVITT, 1993, p. 177).

Diante do exposto, fica evidente que as condições efetivas de aprendizado para

desenvolvimento tecnológico em países de industrialização tardia são atualmente bastante

diferentes daquelas trajetórias realizadas historicamente por países de economias avançadas.

Em particular, se observa que as capacidades tecnológicas têm se tornado desacopladas das

capacidades de produção, bem como se distinguem também os contextos tecnológicos,

econômicos e institucionais das mudanças técnicas e inovações (BELL; PAVITT, 1993, p.

202).

Sobre estas assimetrias entre países, Dosi (1982, p. 160) acrescenta que o processo de

mudança técnica nesta conjuntura é improvável de conduzir a convergência entre países que

partem de níveis de desenvolvimento tecnológico diferentes. Portanto, para Dosi (1982, p.

160) a imitação de políticas tecnológicas de países desenvolvidos não deve ser suficiente para

o catching up, de modo que a intervenção pública deve atuar de forma mais ampla sobre

fluxos de investimentos, comércio exterior e estrutura da indústria interna. É fundamental

atentar para estas condições diferenciadas (econômicas, políticas, institucionais), seja para

construir cenários de políticas públicas para imprimir mudanças nas dinâmicas econômicas,

seja ao se pretender desenvolver processos de inovações tecnológicas em empresas.

3.2.6 Capacidades, aprendizado e apropriabilidade

Dosi (1988, p. 1133) sugere que o escopo das capacidades de uma organização pode

definir as suas fronteiras, ao afetar tanto o escopo de sua eficiência para integração vertical,

como seu limite de diversificação de atividades. Deste modo, a relação entre capacidade

tecnológica, aprendizado e apropriabilidade vincula-se a conceitos de barreiras de mobilidade

e de entrada em indústrias (DOSI, 1988, p. 1160). E mesmo dentro de uma determinada

indústria, a velocidade da curva de aprendizado de empresas sobre a produtos ou processos

inovadores também é considerada um mecanismo importante para a apropriação de resultados

de uma inovação (DOSI, 1988, p. 1140).

Levin et al (1987, p. 805) discutem um entrelaçamento entre incentivos de

aprendizado e efeitos de eficiência do transbordamentos de conhecimento entre empresas.

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105

Apesar do entendimento que a maior facilidade de uma empresa rival para aprender sobre a

tecnologia de um inovador poderia reduzir incentivos para investir em P&D, mas ao mesmo

tempo este aprendizado facilitado, poderia evitar desperdícios de duplicação de esforços de

P&D entre concorrentes que não seria socialmente eficiente (LEVIN et al, 1987, p. 805).

Também é possível que o conhecimento tecnológico sirva de tecnologia complementar para

outros projetos de P&D (LEVIN et al, 1987, p. 805).

Assim, em pesquisa realizada sobre apropriação em indústrias, Levin et al (1987, p.

805) identificaram que as organizações além de utilizarem o P&D interno e a engenharia

reversa como meios de aprendizado, empregavam como meios alternativos de aprendizado

alguns instrumentos interrelacionados a apropriação, como o licenciamento de patentes de

tecnologia e as patentes expiradas / descobertas. Também teve destaque mecanismos baseado

no transbordamento do conhecimento via comunicação interpessoal, como publicações ou

encontros técnicos, e interações ou contratações de empregados de firmas inovadoras.

Jensen e Webster (2004, p. 6) consideram que não somente ocorra um tradeoff entre o

nível de apropriação e aprendizado de capacidades, mas também pode haver conflitos entre os

estilos de apropriação e de aprendizado empregados pela empresa. Os autores indicam dois

aspectos distintos que influenciam aplicação de formas de apropriação e estilos de

aprendizado.

O primeiro aspecto é a natureza da base de conhecimento pode ser excluir ou restringir

a eficácia do uso de alguns métodos de apropriação ou tipos de aprendizado. Por exemplo, o

uso de patentes (apropriação) e manuais descritivos (aprendizado) são inconsistentes ou, no

mínimo, perdem considerável eficácia se o conhecimento for predominantemente tácito

(JENSEN; WEBSTER, 2004, p. 6).

De forma similar em que cada inovação, de acordo com a natureza de sua tecnologia

entre outras questões, demanda diferentes mecanismos de apropriabilidade, o esforço para

aquisição de capacidades tecnológicas envolve variados tipos de meios de aprendizado. Lall

(1992, p. 181) indica que capacidades menos complexas podem ser adquiridas em

treinamentos de curto prazo com atividades de learning by doing, desenvolvimento de

habilidade sem busca tecnológica ou experimentação. No entanto, capacidades mais

complexas exigem obrigatoriamente mais treinamento, inclusive formação científica, e

atividades de P&D para dominar a tecnologia (LALL, 1992, p. 181).

O outro aspecto mencionado por Jensen e Webster (2004, p. 6) é que a consistência

interna das relações interorganizacionais repercute no sentido de que comportamentos de

caráter altamente individualista se contrapõem com atividades de aprendizado cooperativo.

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106

Assim, a forma como a empresa escolhe interagir com seus pares em relação a apropriação

sobre conhecimentos, como comportamentos agressivos de estratégias de apropriação máxima

de rendimentos, pode ter como consequência uma dificuldade de compartilhamento de

conhecimentos em uma rede de organizações (JENSEN; WEBSTER, 2004, p. 6).

É necessário encontrar pontos de equilíbrios de acordo com a estratégia de cada

organização e o ambiente de mercado e institucional, que viabilize a interação para

aprendizado, ao mesmo tempo em que conceda nível de apropriabilidade adequado aos

investimentos dos agentes.

3.2.7 Capacidades e sustentabilidade

De acordo com Sharma e Vredenburg (1998, p. 729) a emergência da concepção

normativa das empresas como atores com papel positivo em relação a sustentabilidade do

planeta ocorre nos movimentos da Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o

Desenvolvimento (CMMAD) das Nações Unidas. No entanto, na prática, o real envolvimento

das empresas nestes aspectos não se dá sem questionamentos sobre como ou porque devem

assumir este papel.

No que tange a busca de respostas a estas questões, Sharma e Vredenburg (1998, p.

729) identificam três linhas de abordagens diferentes. A primeira linha tem foco na

conceituação de desenvolvimento sustentável, e defende uma redefinição do papel das

empresas na sociedade, tem uma perspectiva mais prescritiva, e não aprofunda discussões

sobre os efeitos desta redefinição na competitividade das empresas.

A segunda abordagem se contrapõe à primeira, ao argumentar que uma redefinição

ampla de papéis e responsabilidade pode ser prejudicial ao bem estar financeiro das empresas,

e assim recomendam que sejam desenvolvidos frameworks mais restrito de custos e

benefícios, em que investimentos em práticas ambientais alcancem compensação econômica

em determinado período de tempo em relação a redução de custos mediante o estabelecimento

de um regime regulatório, como economia de energia ou redução de desperdícios (SHARMA;

VREDENBURG, 1998, p. 729).

Por fim, a terceira abordagem defende que, quando apoiadas em incentivos de regimes

institucionais, estratégias de sustentabilidade podem não somente proporcionar ganhos em

termos de eficiência (economias e redução de desperdícios), mas também gerar vantagens

competitivas, através da criação de novas oportunidades de mercado, de legitimidade social

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ou do desenvolvimento de capacidades diferenciadas (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p.

730).

Ao considerar esta diversidade de abordagens, entende-se que diferentes organizações

podem apresentar comportamentos distintos em relação à adoção ou não de práticas de

sustentabilidade. Segundo Sharma e Vredenburg (1998, p. 733), em termos de

comportamento ou postura de resposta da organização, esta pode configurar-se como proativa

ou reativa à adoção de práticas de sustentabilidade.

A empresa é considerada proativa quando possui um padrão consistente de práticas

ambientais em suas diversas atividades com iniciativas voluntárias de adoção de critérios de

sustentabilidade (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p. 733). Uma postura reativa representa

um padrão de comportamento em que o atendimento de critérios de sustentabilidade somente

tende a ser adotado quando ocorrem regulamentações institucionais ou como resposta a uma

pressão isomórfica no setor (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p. 733).

Com vistas a verificar a diferença dessas posturas, Sharma e Vredenburg (1998, p.

749), ao realizar uma pesquisa identificaram que empresas com postura proativa à práticas

sustentáveis desenvolveram capacidades organizacionais distintivas, que geram benefícios

percebidos como vantagens competitivas no setor. Enquanto que em empresas reativas, cuja

adesão a critérios de sustentabilidade acontecia dentro das fronteiras regulatórias, em geral

por um movimento conjunto do setor de atuação, não foi observado o desenvolvimento de

capacidades diferenciadas e vantagens vinculadas. As principais capacidades organizacionais

desenvolvidas nas empresas proativas abrangiam três temáticas: Integração com stakeholder,

aprendizado de ordem superior e inovação contínua (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p.

736).

Esta relação entre o atendimento a critérios de sustentabilidade e o desenvolvimento

de capacidades vinculadas a interação com stakeholders, aprendizado e inovação condiz com

o encontrado por diversos autores em pesquisa sobre inovações para o desenvolvimento

sustentável, em que a realização de inovações orientadas ao atendimento de critérios de

sustentabilidade implicava na emergência de capacidades distintas nas organizações (HALL;

VREDENBURG, 2003; DAROIT; NASCIMENTO, 2004; KLEEF; ROMME, 2007).

A ênfase de preocupações com as interações com stakeholders ocorre em virtude de a

inovação para o desenvolvimento sustentável ser caracterizada por um aumento da

diversidade de atores envolvidos, tendo em vista a necessidade da pluralidade de perspectivas,

em relação a problemas e oportunidades de solução na sociedade. Essas diferentes visões da

sociedade são ao mesmo tempo complementares (pela junção de perspectivas), e ambíguas

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(pelos conflitos de interesse entre eles) (HALL; VREDENBURG, 2003; DAROIT;

NASCIMENTO, 2004; KLEEF; ROOME, 2007).

Diante do que chamam de adensamento na rede de relações das empresas, Hall e

Vredenburg (2003) classificam os stakeholders em dois grupos, os stakeholders primários que

são clientes, fornecedores, concorrentes e órgãos de regulação, e os chamados stakeholders

secundários (comunidades e grupos da sociedade civil afetados pelas inovações

desenvolvidas), em geral, estes secundários são com os quais a empresa não tinha contatos

frequentes e, portanto, não havia acumulado capacidades relacionais prévias.

Outra característica da inovação sustentável que influencia o desenvolvimento de

capacidades é a multidimensionalidade, pois além dos elementos econômicos e tecnológicos,

deve-se considerar também requisitos de sustentabilidade social e ambiental, o que demanda a

convergência de bases de conhecimento, e o desenvolvimento de novas tecnologias (HALL;

VRENDENBURG, 2003; HANSEN; GROSSE-DUNKER; REICHWALD, 2009). Isso cria

maior complexidade para o processo de aprendizado, que deve ser proporcionar ao mesmo

tempo a expansão de áreas conhecimentos e uma visão integrada desta diferentes áreas

(SHARMA; VREDENBURG, 1998, p. 736).

A busca de sustentabilidade nas operações empresariais, com a redução de danos

ambientais e a melhoria de padrões de vida, impõe a necessidade de um conjunto de

inovações radicais e incrementais nos sistemas de produção e consumo mundiais

(RENNINGS, 1998; KLEEF; ROOME, 2007). No entanto, as inovações radicais baseadas em

novas tecnologias sustentáveis representam descontinuidades tecnológicas (mudança de

paradigma tecnológico) que criam um alto grau de incerteza sobre os padrões tecnológicos

que serão consolidados (KLEEF; ROOME, 2007; SMITH, VOß E GRIN, 2010).

Neste caso, Smith, Voß e Grin (2010) informam a importância de espaços para

experimentação e aprendizagem de tecnologias sustentáveis, incluindo novos materiais,

designs e instrumentos, com que habilitem as empresas a articularem suas capacidades quanto

a mudanças de relações sociais e institucionais que devem ser envolvidas nas transições

tecnológicas.

Apesar da identificação de benefícios vinculados ao desenvolvimento de capacidades e

vantagens competitivas, e de abordagens normativas de orientação sobre as temáticas, Brito e

Berardi (2010, p. 163), em pesquisa sobre responsabilidade socioambiental em cadeia de

suprimentos, constataram que as iniciativas de gestão sustentável ainda se enquadravam em

sua maior parte no contexto de uma pressão ambiental por padrões mínimos de desempenho e

paridade competitiva, em que exigências externas (regulamentação, mercado e/ou sociedade)

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são preponderantes. O que caracteriza uma postura reativa das empresas quanto à adoção de

critérios de sustentabilidade e de desenvolvimento de capacidades correspondentes.

Assim, compreendemos que este aspecto da tendência de comportamento das

organizações em relação a adoção de critérios de sustentabilidade, bem como da medida em

que pressões regulamentares são exercidas, particularmente quanto a aplicação de inovação a

ativos da biodiversidade amazônica, são pontos de análise importantes do presente estudo,

com vistas a explorar a inter relação entre desenvolvimento de capacidades e diretrizes do

desenvolvimento sustentável, e propiciar embasamento para análise empírica das

organizações que compõe a rede de inovação objeto desta pesquisa.

3.3 ATORES ORGANIZACIONAIS

Esta pesquisa se baseia no estudo de caso de uma rede de relações interorganizacionais

formada com o objetivo de desenvolver e comercializar uma linha de produtos baseados em

compostos antioxidantes de açaí, um ativo da biodiversidade amazônica, com foco na

indústria de cosméticos e alimentos funcionais. As principais organizações em termos de

capacidades constitutivas ao processo inovativo foram a Universidade Federal do Pará

(UFPA), a Amazon Dreams e a Belaiaçá.

Por isso, consideramos necessário entendê-las em termos de suas trajetórias

tecnológicas e capacidades organizacionais de inovação, de forma a melhor compreender suas

contribuições e limitações no desenvolvimento do processo inovativo a ser tratado no

próximo capítulo. Assim, o objetivo desta seção é apresentar essas três organizações (Amazon

Dreams, Belaiaçá e UFPA) que participaram da configuração de capacidades necessárias para

o desenvolvimento e comercialização da inovação.

Na análise empírica, inicialmente, estabelecemos um breve histórico de cada

organização, com um panorama de processos inovativos realizados. Posteriormente, nos

baseamos em um levantamento de capacidades de produção e tecnológicas vinculadas ao

padrão de mudança técnica característico (aplicado as duas organizações empresariais), bem

como buscamos enfatizar o conjunto de suas capacidades específicas relacionadas ao

desenvolvimento de inovações de base biotecnológicas.

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3.3.1 Universidade Federal do Pará

A UFPA é reconhecida como uma das principais instituições de ciência e tecnologia

da região amazônica, e busca atender o princípio fundamental da integração das funções de

ensino, pesquisa e extensão. Em um contexto de promoção da inovação, se caracteriza como

uma instituição ponte de C&T para a região com atividades de formação de quadro de

profissionais e de estrutura para pesquisas científicas e tecnológicas. Sua missão declarada é

“Produzir, socializar e transformar o conhecimento na Amazônia para a formação de cidadãos

capazes de promover a construção de uma sociedade sustentável” (UFPA, 2013).

A Universidade é constituída como autarquia federal vinculada ao Ministério da

Educação (MEC), e sua criação corresponde a um movimento nacional do Governo Federal

na década de 1950 para a formação de instituições de ensino superior, e ciência e tecnologia

no país (UFPA, 2014b). Atualmente, a UFPA está instalada em Belém e em 10 campi no

interior do Estado do Pará, com atividades de ensino que abrangem todas as áreas do

conhecimento (Artes, Biológicas, Saúde, Humanas e Sociais Aplicadas, Jurídicas, Exatas e

Naturais, Engenharias, Geociências, Letras, Comunicação Social e Filosofia) (UFPA, 2013).

Segundo anuário estatístico de 2013 (UFPA, 2013), a UFPA, em 2012, empregava

2.722 professores e 2.379 servidores técnico-administrativos, e em relação ao quantitativo de

alunos, havia 39.236 alunos de graduação matriculados e 3.721 estudantes de cursos de pós-

graduação stricto sensu. Na UFPA, são ofertados 513 cursos de graduação e 56 programas de

pós graduação, sendo 26 no nível de doutorado, conforme tabela 6 (UFPA, 2013).

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Tabela 6 - Número de Cursos de Pós Graduação Stricto Sensu na UFPA – por área de conhecimento –

período de 2008 a 2012.

Área de Conhecimento Nível 2008 2009 2010 2011 2012

Ciências Exatas e da Terra Mestrado 6 6 6 7 8

Doutorado 3 3 5 5 5

Ciências Biológicas Mestrado 6 6 6 7 7

Doutorado 6 6 6 7 7

Ciências Humanas Mestrado 7 7 8 9 10

Doutorado 3 3 4 5 5

Linguística, Letras e Artes Mestrado 1 2 3 3 3

Doutorado 0 0 0 0 0

Ciências da Saúde Mestrado 3 3 3 6 6

Doutorado 1 1 1 1 1

Engenharias Mestrado 5 5 6 6 7

Doutorado 2 2 2 2 2

Ciências Agrárias Mestrado 3 4 4 4 4

Doutorado 0 1 1 2 2

Ciências Sociais Aplicadas Mestrado 3 3 3 6 7

Doutorado 1 1 1 1 1

Multidisciplinar Mestrado 4 5 4 4 4

Doutorado 1 2 2 3 3

Subtotal Mestrado 38 41 43 52 56

Doutorado 17 19 22 26 26

Total Geral 55 60 65 78 82

Fonte: UFPA (2013).

Também é possível se observar no período de 2008 a 2012 um crescimento constante

do número de cursos de pós graduação na UFPA, conforme Figura 3. Este crescimento no

decorrer do período representa uma tendência importante tanto em termos de ampliação da

capacidade de formação de pessoal qualificado, quanto uma potencial expansão da geração de

pesquisas e avanços na ciência e tecnologia na região.

Figura 3 - Gráfico da evolução do número de cursos de pós graduação stricto sensu na UFPA –

período de 2008 a 2012.

Fonte: UFPA (2013).

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Contudo, apesar de estar presente nas várias regiões do Estado do Pará, suas atividades

de pesquisa e pós graduação stricto sensu ainda são extremamente concentradas na capital

(Belém), onde funcionam cinquenta e quatro (54) programas de pós graduação, enquanto em

campi do interior estão em funcionamento somente quatro (4) (UFPA, 2013).

Recentemente, um de seus campi passou por processo de desvinculação para

constituição de nova universidade federal, que é o caso do campus de Santarém, uma das

plataformas de criação da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), e do campus de

Marabá que está dando origem a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará

(UNIFESPA).

- Capacidades relacionadas a inovação em biotecnologia:

Ressalta-se duas vertentes da UFPA em relação à contribuição por meio de suas

capacidades a uma estrutura de apoio à inovação baseada em biotecnologia: Uma vertente

refere-se a sua capacidade de pesquisa científica e tecnológica na área específica, e outra

vertente a sua estrutura de suporte a inovação e incubação de empresas de base tecnológica.

No que tange a capacidade de pesquisa cientifica e tecnológica, conforme CGEE

(2008, p. 79), a UFPA detém o maior contingente de profissionais de alta qualificação na

região Amazônica, e possui um grande parque de equipamentos científicos4.

Apesar de no citado relatório do CGEE (2008, p. 71, 78) serem descritas listagens de

dados como pesquisadores líderes, alguns projetos relevantes, laboratórios e equipamentos,

não encontramos dados sistematizados que contivessem uma lista completa de projetos da

UFPA na área de biotecnologia, com informações como volume de recursos, parceiros e

resultados alcançados. Esta lacuna impede análises mais aprofundadas em termos de

capacidades e trajetória geral da universidade em pesquisas biotecnológicas, de forma que

focaremos nas unidades da UFPA diretamente envolvidas no desenvolvimento da linha de

produtos inovadores em estudo, que são a Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) e a

Agência de Inovação (UNIVERSITEC).

A Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) oferta um curso de graduação em

Engenharia de Alimentos (implantado em 2000), e um curso de mestrado em Ciência e

Tecnologia de Alimentos, reconhecido pela CAPES em 2003. A FEA tem como objetivos a

formação de engenheiros com domínio de conteúdos técnico-científicos para absorver e

4 No relatório do CGEE pode-se encontrar relações de pesquisadores em posição de lideranças de pesquisa da

UFPA em áreas relacionadas a biotecnologia (página 71 a 72), de projetos relevantes na área (página 72 a 74),

de laboratórios (página 75 a 76), e de equipamentos (páginas 76 a 78).

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desenvolver novas tecnologias, e o desenvolvimento de projetos de pesquisa de novas

tecnologias com valorização de matérias-primas regionais, no sentido de verticalizar a

produção de alimentos, com a implantação, modernização e ampliação de agroindústrias

locais (UFPA, 2014d).

De forma específica ao desenvolvimento tecnológico de matérias-primas da

Amazônia, as atividades são direcionadas para caracterizar estas matérias e seus resíduos

agroindustriais quanto a propriedades nutricionais, físico-químicas, bioquímicas (propriedades

funcionais de proteínas, poder antioxidante e atividade enzimática) e microbiológicas. E, de

acordo com esta caracterização desenvolver tecnologia em processos de extração,

concentração, conservação (pasteurização, secagem, congelamento) e geração de formulações

de alimentos funcionais das matérias-primas e de seus resíduos. (UFPA, 2014d, UFPA,

2014e)

Entre os laboratórios e infraestruturas de pesquisa da FEA para o desenvolvimento de

atividades estão uma usina piloto de processamento de alimentos, uma usina piloto de

operações unitárias e laboratórios de análises físico-químicas, microbiologia, microscopia,

análise sensorial (UFPA, 2014e).

Em relação ao apoio a inovação e incubação de empresas, hoje a UFPA possui uma

Agência de Inovação Tecnológica, denominada de Universitec, criada com o objetivo de

“promover a inovação tecnológica para o fortalecimento da economia paraense, agregando

valor a produtos da biodiversidade local” (UFPA, 2014f). Observamos que o discurso

expressado pela Universitec encontra aderência com o papel normativo de universidades

como instituições pontes à inovação, e que esta reconhece como fator relevante a base de

bioativos local.

As agências ou núcleos de inovação tecnológica de instituições de C&T no Brasil se

baseiam em termos de regulamentação pela Lei da Inovação (BRASIL. LEI Nº 10.973/2004),

que os tornou responsáveis têm pela gestão da política de inovação tecnológica dessas

instituições públicas de ciência e tecnologia e no estímulo da inovação junto ao setor

produtivo.

No entanto, a UFPA iniciou as primeiras atividades de apoio à inovação e

desenvolvimento tecnológico em empresas de forma estruturada em 1995 com a criação do

Programa de Incubação de Empresas de Base Tecnológica (PIEBT), uma iniciativa pioneira

na Região Amazônica (UFPA, 2010). Hoje em dia, a incubação de empresas faz parte das

ações desenvolvidas pela Universitec, já tendo sido atendidas 37 empresas, com 18 empresas

graduadas ao longo de sua existência.

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A Universitec engloba três linhas principais de atividades: uma de consultorias e

serviços tecnológicos, uma de incubação de empresas de base tecnológica, e um escritório de

propriedade intelectual (UFPA, 2014f). As atividades de consultorias e serviços tecnológicos

buscam articular a prestação de serviços pela Universidade a empresas e organizações da

sociedade, com a promoção da interação da UFPA com os diversos segmentos do mercado.

A incubação de empresas atua por meio do Programa de Incubação de Empresas de

Base Tecnológica (PIEBT) com ações de formação de empreendedores, e de disseminação e

transferência de conhecimentos gerados na própria Universidade. Este programa possui mais

de 15 anos, e também já contribuiu na promoção de novas incubadoras de empresas e parques

tecnológicos no Pará.

A área de Propriedade Intelectual realiza registros de direitos autorais (obras literárias,

artísticas e científicas), e de propriedade industrial junto ao INPI (patentes, marcas e desenho

industrial, indicações geográficas e cultivares), além de registro de softwares e projetos

arquitetônicos da UFPA. Outra atividade é a formalização de contratos de transferência de

tecnologia da UFPA para o setor empresarial.

Em entrevista concedida, Gonzalo Enríquez, atual Diretor da Agência de Inovação da

UFPA, a biotecnologia pode ser dividida em três etapas, a bioprospecção, a proteção do

conhecimento e finalmente a transferência tecnológica. Para ele, em termos de bioprospecção

a UFPA possui capacidades tecnológicas fundamentais para o seu desenvolvimento na região:

“[...] temos núcleos estabelecidos em biologia e química que possuem uma força muita

grande, uma competência muito grande na UFPA, e fora da UFPA, você encontra muito

pouco (competência)”. (Informação verbal)5.

No entanto, ressalta-se o esforço ainda a ser realizado na Amazônia, visto que somente

uma pequena parte da biodiversidade da região está catalogada. Enríquez menciona a questão

de ter se consciência que o uso da biodiversidade se trata de potencialidade, pois é necessário

um substancial volume de bioprospecção para encontrar ativos que se adequem aos requisitos

dos produtos: “Nós já trabalhamos com mais de 5.000 produtos da biodiversidade, e nós

temos agora 7 ou 8 ou 10 que podem ir para o mercado?”. (Informação verbal)6.

Neste aspecto, reconhece como gargalo a interação com empresas, o setor produtivo

deve ter papel importante no direcionamento e na intensidade das buscas de bioprospecção. A

interação com empresas é visto como o principal gargalo hoje por Enríquez, pois indica que

por mais que a UFPA tenha o discurso sobre transferência de tecnologia, há dificuldade em

5 Entrevista concedida pelo Diretor da Agência de Inovação da UFPA em 15/01/2014. 6 Entrevista concedida pelo Diretor da Agência de Inovação da UFPA em 15/01/2014

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encontrar empresas locais com perfil para atividades com bioativos, em geral, as que

identificam são as pequenas empresas que são incubadas no programa da Agência.

Esta situação retrata problemas de articulação institucional quanto ao contexto de

implementação da estrutura de C&T no Brasil (que repercuti na trajetória de relações entre

instituições de C&T e setor produtivo no Pará), o qual por muito tempo foi focado no modelo

ofertista de tecnologia, sem conseguir promover o desenvolvimento de capacidades

tecnológicas internas nas empresas locais.

Sobre esta conjuntura histórica o próprio Enríquez (2003, p. 187) entende que para

melhorar a cooperação entre centros de pesquisa e setor produtivo, entre outras ações, é

necessário fomentar e articular no setor produtivo a formação de quadros profissionais e a

capacidade tecnológica por um lado, e promover atividades interdisciplinares que

potencializem a capacidade de resposta, em termos de tempo e conteúdo, das universidades e

centros de pesquisa à demandas das empresas.

Em relação à proteção do conhecimento, o Diretor da Universitec considera que a

UFPA tenha competência e estrutura para seu exercício. A UFPA possui uma área específica

de propriedade intelectual desde 2000, que realiza registros de interesse da instituição. Na

Figura 4 são apresentados o quantitativo anual de registros publicados junto ao INPI pela

UFPA:

Figura 4 - Registros de pedidos de patentes da UFPA publicados junto ao INPI.

Fonte: UFPA (2012).

0

1

2

3

4

5

6

7

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Número de pedidos de registro de patentes da UFPA

publicados junto ao INPI no período de 2001 a 2010.

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No entanto, o primeiro processo pelo qual uma patente da UFPA foi objeto de acordo

de licenciamento é o referente aos produtos inovadores baseados em compostos antioxidantes

de açaí em estudo, assinado em outubro de 2013. Assim, embora a universidade tenha

experiência em realizar proteção do conhecimento, o caso em estudo foi a primeira

experiência de licenciamento para comercialização de uma patente.

De modo geral, compreendemos que a UFPA possui capacidades tecnológicas

vinculadas as atividades de pesquisa científica básica e aplicada em bases de conhecimento de

biotecnologia, e com foco de interesse na biodiversidade da região. Contudo, identificamos

dificuldade com a articulação com o setor produtivo, o que implica em duas deficiências

principais: a pouca interação em projetos de desenvolvimento tecnológica com o setor

produtivo que reduz sensibilidade da Universidade às direções e velocidades adequadas de

busca inovativa; e a falta de experiências relacionadas à transferência e comercialização de

tecnologias produzidas pela Universidade para efetiva aplicação produtiva, antes do

desenvolvimento da inovação em estudo.

Não foi aplicada à UFPA a análise de padrão de mudança técnica, em virtude do

framework elaborado por Bell e Pavitt (1993) ser focado em organizações do setor produtivo

industrial, de forma que esta análise é desenvolvida nesta pesquisa somente para a Amazon

Dreams e Belaiaçá. Também não buscamos discutir capacidades de produção quanto à UFPA,

pela sua natureza de instituição de C&T pública não vinculada a objetivos de produção

comercial de bens.

3.3.2 Amazon Dreams

A Amazon Dreams (AD) é uma pequena empresa de base tecnológica que tem como

objetivo desenvolver produtos de alto valor agregado baseado na biodiversidade da

Amazônia, utilizando os recursos naturais da região de forma sustentável (AMAZON

DREAMS, 2013).

A empresa desenvolve suas atividades em três eixos principais: Processos de extração

de compostos antioxidantes de espécies vegetais amazônicos (1); processo de purificação de

compostos antioxidantes (2); e, controle de qualidade dos processos e produtos desenvolvidos

(3).

A AD foi criada em 2002 por pesquisadores e ex-alunos da Faculdade de Engenharia

de Alimentos do ITEC da UFPA. Nesta trajetória inicial, a AD pode ser caracterizada como

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uma firma nascente do transbordamento da UFPA (spin off), conforme Rapini (2007), uma

vez que foi formada por pesquisadores e ex-alunos desta universidade.

Em entrevista concedida por um dos sócios, o objetivo da criação da empresa era

transformar a tradicional lógica de produção e comercialização extrativista para exportação de

commodities da região, por meio do desenvolvimento tecnológico de produtos baseados no

aproveitamento sustentável de sua biodiversidade. Identifica-se que a construção do modelo

de negócio envolveu uma noção de geração de desenvolvimento regional com base no

conhecimento científico e tecnológico visto como uma finalidade socialmente relevante, de

modo que trazia em seu escopo anseios acadêmicos e empresariais.

Logo nos primeiros anos de criação, a AD teve seu funcionamento baseado no

processamento de polpas, mas em 2006 começa em conjunto com a UFPA o desenvolvimento

de produtos com maior complexidade tecnológica. Em 2009, já tendo protocolado junto ao

INPI o pedido de patente do processo tecnológica de produção da primeira linha de produtos a

base de açaí desenvolvido em parceria com a UFPA, a AD se candidatou como forma de

capitalização do negócio ao Fundo Criatec de Capital Semente do BNDES e BNB para

investimentos de capital de risco no Brasil, parte de uma política nacional de incentivos a

atividades empresariais inovadoras.

A AD foi selecionada para obtenção do financiamento e, no conjunto de 50 empresas

do país, foi a única empresa da região norte. Amato Neto e Amato (2009) citam a relevância

da criação de fundos especiais, por parte do governo, para o financiamento de inovação nas

empresas, de modo que estas possam realizar investimentos que visem o aumento de

competitividade e eficiência. Estes fundos permitem que as empresas de pequeno porte

compartilhem riscos e incertezas, e nesta perspectiva, o aporte de capital do Fundo Criatec

representou uma importante contribuição de capital a AD, uma vez que o processo de

desenvolvimento tecnológico foi longo, e sua produção efetiva requeria investimento para

instalações industriais.

O Fundo Criatec realizou um aporte de R$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil

reais) a AD, e também trouxe outros benefícios, como acesso a contatos empresariais em

nível nacional e a programas de aceleração de processos de negócio, inclusive com suporte a

serviços de consultoria, estruturação de auditorias e controles formais na empresa. Como

exigência da operação de financiamento, também houve a alteração da natureza jurídica da

empresa que passou para o formato de Sociedade Anônima.

Esta mudança implicou na constituição de uma estrutura de governança mais

complexa na AD, pois o Fundo Criatec passou a compor seu quadro de acionistas, com 51%

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de suas ações. O objetivo do compartilhamento de ações era proporcionar maior grau de

controle formal entre os sócios originais da AD e o Fundo Criatec, e o estabelecimento de

mecanismos de monitoramento de desempenho da gestão e alinhamento dos incentivos entre

as partes (GULATI; SINGH, 1998). Nota-se também com a aproximação da AD ao processo

de capital venture e atividades a ele relacionadas a conduz a uma maior imersão no setor

empresarial, que antes era centrada em sua forte relação com a universidade.

Uma dificuldade informada no relacionamento da AD com o Fundo Criatec se refere a

pouca intensidade de interação, pois não há escritórios do BNDES e/ou BNB na região Norte,

e como a AD foi a única empresa da região contemplada no programa, o agente do fundo

responsável pelo acompanhamento da empresa tem como base a região sudeste do país, e na

percepção da AD, isso tem como consequência contatos menos frequentes do Fundo, e um

menor entendimento deste do contexto local de atuação da empresa.

Além do aporte financeiro do BNDES, a AD conseguiu aportes complementares por

meio de prêmios e programas de fomento à inovação (estes aportes complementares até

dezembro de 2012 atingiram o equivalente 85% do aporte do Fundo Criatec). Os principais

prêmios foram: Em 2010, conquistou o Prêmio Professor Samuel Benchimol e Banco da

Amazônia de Empreendedorismo Consciente de abrangência regional; em 2011 ganhou o

Prêmio SEBRAE/FNQ Estadual de Competitividade de Micro e Pequenas Empresas do Pará;

e, em 2012, ganhou o Prêmio FINEP de Inovação na categoria micro e pequena empresa na

etapa regional (Norte) e nacional.

Entre os programas de incentivo à inovação, os principais em que conseguiu aporte de

recursos foram: o Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas

(RHAE) do CNPq; Agentes Locais de Inovação (ALI) do SEBRAE; e, o Programa de

Subvenção à Pesquisa em Microempresas e Empresas de Pequeno Porte nas Regiões Norte,

Nordeste e Centro-Oeste (PAPPE Integração) da FINEP.

Atualmente, a empresa possui em seu portfólio de produtos, além da linha de produtos

do açaí (Puro Antioxidante de Açaí, Açaí Clarificado e Óleo Refinado de Açaí), um Puro

Antioxidante a base de folhas da árvore de Ingá, e um Puro Antioxidante de a base de folhas

da árvore de Muruci, ambos também desenvolvidos em parceria com a UFPA.

- Capacidades de produção e tecnológicas:

Inicialmente cabe esclarecer que a análise referente a capacidades de produção e

tecnológica, conforme conceito de Bell e Pavitt (1993) e Figueiredo (2011), se baseia em

informações concedidas em entrevistas e pesquisa documentais, nas quais se buscou

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identificar avanços relatados, mas sem a construção de matriz sistematizada de evolução de

níveis capacidades.

A AD desenvolveu capacidade de elevada complexidade em um nicho de negócio

relacionado à tecnologia de processos para extração, fragmentação e purificação de bioativos,

qual tem buscado expansão na base de ativos com que trabalha para o desenvolvimento de

novos produtos, com previsão de lançamento de produtos de 4 a 6 bioativos diferentes em

fase de P&D. Segundo sócio da AD:

Desenvolvemos um pool de competências sobre os usos potenciais desses extratos, partes deles, hoje a gente trabalha com atividades anti inflamatórias, atividades

cicatrizantes, antialergênica, e anticancerígenas, existe muitas outras atividades, mas

a gente se focou nessas quatro porque são muito compatíveis com cosméticos.

(Informação verbal).7

Conforme relato de sócio da AD, houve melhoria de desempenho de P&D da empresa

nas atividades inovativas desde o primeiro desenvolvimento (linha do açaí) em relação ao

tempo requerido de desenvolvimento, cujo processo inicial levou 60 meses, e dos novos

produtos levaram 30 meses8.

Também se observa que durante a fase de desenvolvimento da linha de produtos do

açaí, havia maior concentração da equipe nesta base de ativos e, atualmente, há o

desenvolvimento de produtos de múltiplos bioativos. O alcance de um processo de P&D mais

eficiente e diversificado indica aprendizado e melhoria da capacidade de desenvolvimento

tecnológico da AD.

Compreende-se que a capacidade organizacional está amparada por um quadro de

profissionais com elevada qualificação na empresa, de modo que, conforme dado de

dezembro de 2012, 45% de seus membros eram mestres ou doutores (AMAZON DREAMS,

2012). Também se constata a concentração de profissionais na área de P&D da empresa em

comparação com as demais, de acordo com a Figura 5 a seguir:

7 Entrevista concedida pelo sócio da Amazon Dreams em 13/01/2014.

8 Anotação em diário de campo durante visita técnica.

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Figura 5 - Gráfico de distribuição de membros da Amazon Dreams por departamento (em dezembro

de 2012).

PD&I

55%

Produção

17%

Back Office

11%

Diretoria

17%

Distribuição de membros da Amazon Dreams por

departamento (em dezmbro/2012)

Fonte: Amazon Dreams (2012).

Contudo, este gráfico revela outra questão sobre as capacidades da empresa, pois se

por um lado a AD desenvolveu capacidades tecnológicas relevantes, por outro lado, possui

deficiências em termos de capacidade produtiva para operação de lotes industriais grandes,

tanto em termos de limite de volume processamento da planta industrial, quanto em termos

capacidades gerenciais em relação a rede de suprimentos e logística, com obtenção de

certificações internacionais.

A limitação em relação a capacidade de produção de lotes de produtos em grande

volume é relevante, pois o segmento de mercado da linha de produtos do açaí é focado no

fornecimento à grande indústria de cosméticos e alimentos, que precisa de uma escala de

abastecimento grande, e suficiente para oferta regular do produto final ao consumidor, o que é

uma característica já discutida em termos dos desafios de cadeias produtivas da

biodiversidade (ENRÍQUEZ, 2003, p. 186; CGEE, 2007, p. 22). Essa demanda de

fornecimento industrial associada aos entraves de safra do açaí torna-se complicador

adicional, pois exige uma capacidade de processamento da linha de produtos concentrada

somente durante a safra do açaí, que produza o suficiente para todo o fornecimento anual de

matéria prima para os clientes industriais.

Além da capacidade de processamento da linha de produtos, ainda há a necessidade de

capacidades gerenciais vinculadas, uma destas é a de gerenciamento da rede de suprimentos

do açaí, que requer habilidades de garantir o fornecimento em um mercado com concorrência

acirrada pela matéria prima (COSTA, F., 2009, p. 345), e de obter certificados internacionais

de procedência.

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121

Entendemos que por um lado esta configuração de capacidades com ênfase

tecnológica da empresa pode representar uma estratégia de especialização da empresa ao

buscar um nicho de mercado viável para seu tamanho (pequena empresa) e limitações de

investimentos, contudo, por outro lado, a carência de capacidades relacionadas a produção

pode fragilizar a posição da empresa quanto as condições de apropriabilidade sobre o

resultado a ser gerado pela inovação. Esta limitação de capacidades nos termos estabelecidos

por Teece (1986) pode corresponder a fragilidades seja pelo aumento do poder de barganha de

empresas detentoras destas capacidades produtivas em eventual acordo de comercialização de

tecnologia, seja frente a concorrentes diretos que detenham tais capacidades de produção e

possam desenvolver produtos similares.

- Padrão de mudança técnica:

Como indicado anteriormente, o padrão setorial de mudança técnica (BELL; PAVITT,

1993) é um instrumento de análise ao nível de empresa, usado para identificar o perfil típico

de atividade inovativa de um setor. Neste caso particular de estudo, o padrão de mudança

técnica é utilizado como uma referência de pontos de exame ao nível de cada empresa para

auxiliar na caracterização das atividades inovativas destas empresas.

De acordo com os padrões de mudança tecnológica, identifica-se a AD como uma

empresa de base científica, conforme pontos de análise na Tabela 7.

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Tabela 7 - Análise do padrão de mudança técnica da Amazon Dreams.

Variáveis de

análise

Padrão de Mudança

Técnica:

Base científica

Observações de análise sobre a Amazon Dreams

Setores típicos Químico, biotecnologia,

eletrônico.

Considera-se biotecnologia um campo típico para esta

estratégia de mudança técnica, em função de requerer

substancial intensidade tecnológica e processos de

bioprospecção para desenvolvimento de produtos.

Tamanho de

empresas Grande

Neste ponto não há aderência ao padrão de grande empresa,

mas conforme Enríquez (2003, p. 181) em virtude da ascensão

base de conhecimento específica da biotecnologia, o perfil de pequenas empresas com atuação em nichos de mercado

tecnológico surge como uma possibilidade viável de

competitividade. Esta constatação também é encontrada em

Powell, Koput e Smith-Doerr (1996) sobre pequenas empresas

de biotecnologia atuando no setor farmacêutico em parcerias

com as grandes empresas globais.

Tipo de usuários Sensível a preço e

desempenho

Os produtos devem se basear em elevado desempenho

diferencial, em comparação com os produtos existentes

(particularmente aqueles baseados em química sintética),

mantendo a proporção de custo/benefício equilibrada. Um

exemplo é o puro antioxidante de açaí desenvolvido, conforme

informações da AD, possui desempenho 66% superior ao líder de mercado, em termos de ORAC*/USD.

Principais focos

das atividades

tecnológicas

Redução de custo e

melhoria de produto

Ao considerar o desempenho acima, verifica-se que o produto

desenvolvido oferece a empresa compradora menor custo por

desempenho superior.

Principais fontes

de acumulação

tecnológica

P&D interno; pesquisa

básica; engenharia de

produção; Design de

produto

Principais fontes da AD indicadas baseadas em sua capacidade

de P&D em termos de produto e de definição de processos de

produção complexos.

Principal direções

da acumulação

tecnológica

Desenvolv. de

tecnologias para

produtos

(concêntrica: alta

diversificação com foco no mesmo setor)

Foco da AD é o desenvolvimento de tecnologias de extração,

fragmentação e purificação de bioativos, o que tem buscado

aplicar a várias espécies da biodiversidade da região, para

diversificação de portfólio.

O foco geral dos produtos é nos setores de cosméticos,

alimentos funcionais, e saúde e nutrição. O setor farmacêutico

é considerado uma oportunidade, no entanto não efetivada por envolver processos regulatórios e institucionais mais

complexos depende de interações e alinhamento com

demandas de pesquisas específicas.

Principais canais

de imitação e de

transferência de

tecnologia

Engenharia reversa;

P&D; contratação de

pessoal técnico

especializado

Os três principais meios de absorção de conhecimento e

transferência tecnológica identificados na AD são P&D,

contratação de pessoal especializado para equipe científica

(particularmente com apoio do RHAE) e cooperação com

instituição de C&T (principal UFPA).

Principais meios de

apropriação

(proteção contra

imitação)

Patentes, know-how em

P&D, know-how em

projeto e operação

Os dois meios de apropriação usados são patentes e sigilo.

Principais

incumbências

administrativas de

caráter estratégico

Desenvolv. de produtos afins; exploração da

ciência básica; obtenção

de ativos

complementares

Principais atividades identificadas foram o desenvolvimento

de produtos similares (antioxidantes puros) a base de outros bioativos da Amazônia, em geral cujas propriedades

bioquímicas já tenham sido objeto de pesquisas anteriores na

universidade; e a busca de parceria para produção de grandes

lotes industriais, em função de não possuir capacidade de

produção suficiente.

*ORAC: Oxygen Radical Absorbance Capacity.

Fonte: Itens de análise (coluna 1) baseados em Bell e Pavitt (1993, p. 180); e conteúdo das análises (colunas 2 e

3) da autora.

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Compreendemos que a AD tem evoluído para a especialização no nicho de mercado

B2B9 (business to business) de bioprospecção e desenvolvimento tecnológico de produtos de

alto desempenho antioxidante baseado em ativos de biodiversidade da Amazônia, o que se

caracteriza pela necessidade de uma forte interação tanto com instituições de pesquisa e como

com empresas.

Esta estratégia é exemplificada por Enríquez (2003, p. 181) no sentido em que

pequenas empresas de base biotecnológica, que têm buscado uma especializado em nichos de

pesquisa de bibliotecas de compostos (bioprospecção) e no desenvolvimento de tecnológico

da aplicações em produtos primários às indústrias maiores.

De forma geral, entendemos que a AD tem se apresentado bem sucedida no

desenvolvimento de capacidades tecnológicas e no reconhecimento das inovações

tecnológicas realizadas, de acordo com prêmios e projetos de financiamento captados,

entretanto demonstra baixo desenvolvimento de capacidade de produção, o que pode

fragilizar as condições de apropriabilidade sobre as inovações desenvolvidas.

9 O mercado B2B (business to business) representa um segmento de comercialização entre empresas, sem

envolver o consumidor final.

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Figura 6 - Imagens da marca, produtos e reportagens da Amazon Dreams. Marca:

Açaí

Clarificado

Óleo Refinado de

Açaí

Açaí Puro

Antioxidante

Exemplo de embalagens de produtos:

Matérias primas de produtos:

Inserções na imprensa:

Fonte: Amazon Dreams (2012).

Nas imagens da figura 6, na primeira linha mostramos a identidade visual da marca da

empresa que realça a comunicação em relação a tecnologia em antioxidantes, e também as

fotos dos três produtos desenvolvidos no âmbito da linha de compostos baseados em açaí. Na

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segunda linha, demonstramos os três ativos da biodiversidade que a Amazon Dreams

divulgou (até o momento de finalização desta dissertação) como produtos antioxidantes

desenvolvidos. E, por fim, na terceira parte, há algumas inserções da empresa na imprensa

referente tanto a prêmios recebidos como a repercussão do desenvolvimento da linha de

produtos inovadores.

3.3.3 Belaiaçá

A empresa Belaiaçá é uma indústria de processamento de frutas de médio porte, tendo

o açaí como principal base de produto, atua no mercado nacional e internacional

(BELAIAÇA, 2014; SILVA, 2013). A empresa possui quatro plantas industriais, sendo duas

no estado do Pará (município de castanhal), uma no Amapá (para funcionamento no período

da entressafra no Pará), e outra no Ceará.

A Belaiaçá faz parte do grupo Petruz, seu portfólio de produtos se baseava

principalmente na polpa de frutas, particularmente do açaí, e recentemente desenvolveu uma

diversificação para produção de sorvetes e bebidas mistas de açaí, além da ampliação das

frutas processadas, em função da sazonalidade do açaí, de forma a melhor utilizar a estrutura

industrial instalada.

A Belaiaçá foi criada em 2005 com a instalação de sua primeira planta industrial em

Castanhal, seus proprietários tinham longa experiência com o transporte e comercialização do

açaí in natura, com a atividade de intermediação ao comprar de coletores e produtores e

vender a agroindustriais e batedores (SILVA, 2013). Durante os anos de 2003 e 2004,

operaram uma planta industrial alugada em Belém quando fizeram contatos com grandes

clientes, e um desses clientes, em 2005, ofereceu uma antecipação para montagem de

infraestrutura própria de produção, a qual seria paga por meio do fornecimento de produtos

durante a safra do açaí, somado a este recurso, os proprietários aportaram recursos

complementares para a montagem da fábrica (SILVA, 2013).

Foi fundamental a parceria dos clientes para o desenvolvimento dessas industriais,

mas a gente não vê nenhum investimento do próprio governo para potencializar as

indústrias que estão aqui dentro que vão trazer benefício para cá mesmo... Mas

imagina só se o Governo do Estado tivesse alinhado com esse crescimento que

aconteceu com o mercado de açaí e melhorasse, desse condições para poder a coisa acontecer. A Bolt House, por exemplo, ela veio para cá para o Pará para gerar

emprego e renda, e ela só funciona 24 dias por ano, e a maioria dos profissionais que

trabalhavam lá a nível técnico eram de fora, não gerava essa quantidade toda de

emprego, e ela ganhou todos os benefícios, ganhou um terreno, ganhou todos os

benefícios que as indústrias que são daqui do Pará não tem. (Informação verbal)10

10 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.

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Em um ano de operação a empresa dobrou seu volume de produção e começou a

exportar (SILVA, 2013). E a partir de 2006 até 2009, estimulada pela crescente demanda do

açaí, a empresa realizou uma expansão de sua estrutura industrial, implantou uma unidade de

produção e distribuição no Ceará (município de Maracanaú), e posteriormente adquiriu outras

unidades, sendo uma em Castanhal e outra no Amapá (município de Santana) (SILVA, 2013).

O crescimento da produção e expansão da atuação geográfica trouxe uma maior

complexidade às operações, considerando ainda a logística de contratações e de matérias primas

para o volume demandado. Deste modo, em 2010, a Belaiaçá conduziu um processo de

reestruturação administrativa, auxiliada por uma consultoria em gestão empresarial para estruturar

o modelo de negocio, além do quadro profissional técnico e gerencial (SILVA, 2013).

Esta reestruturação orientou um processo de diversificação do portfólio de produtos da

empresa, com o desenvolvimento de produtos focando novos mercados. Segundo entrevista

concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiacá, a empresa buscou uma diferenciação das

demais agroindústrias da região que baseiam sua produção somente na polpa do açaí para

fornecimento a grandes indústrias nacionais. Por isso, a Belaiaçá passou a desenvolver

produtos para o mercado de autoserviço voltado para o consumidor final, comercializado por

canais de venda como supermercados e lojas de varejo.

É, desses produtos formulados, (nos diferenciamos) das outras industriais de açaí,

porque a gente, na verdade, fez o que lá em São Paulo já fazem com o nosso

produto, mas como marca, como produto, como fábrica daqui, local, nós somos os

primeiros de fato. (Informação verbal)11

Com foco neste mercado, a Belaiaçá realizou o desenvolvimento de produtos como o

mix de açaí com frutas, polpas de açaí diferenciadas (como o açaí adoçado para consumo

local), e a bebida mista de açaí com camucamu e soja. Estas inovações foram realizadas pela

área de P&D interna, algumas baseadas em modelos de produtos já difundidos no mercado

por grandes industriais nacionais, como o caso do mix de açaí com frutas, e outras como

inovações incrementais de produtos existentes, como a polpa adoçada e a bebida mista.

A empresa também identificou uma oportunidade no mercado para produtos de

ingredientes (compostos para produção industrial) junto a indústria de alimentos funcionais e

nutrição durante seu processo de planejamento estratégico em 2010, no entanto, reconheciam

também que a entrada neste setor exigiria inovações de produtos com maior densidade

tecnológica que a empresa não detém em suas capacidades internas12

.

11 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 12 Anotação em diário de campo durante visita na Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing.

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Cabe indicar que, a polpa do açaí e seus demais produtos derivados representam em

torno de 90% da produção anual da Belaiaçá, sendo também a principal fonte de renda

(SILVA, 2013). A empresa também passou a comercializar os resíduos provenientes do

processamento de frutas, particularmente os caroços de açaí (vendido como biomassa), e

resíduos de outras matérias primas para processamento de óleos e outros produtos

alimentícios (sementes de cupuaçu, maracujá, bacuri) (SILVA, 2013).

- Capacidades de produção e tecnológicas:

A Belaiaçá se destaca pelo desenvolvimento de sua capacidade de produção, de forma

rápida, iniciando suas instalações em 2005, e alcançando nível de exportação já em um ano

(2006), realizando expansões de plantas industriais nos três anos seguintes. Atualmente,

conforme o Diretor de Marketing a empresa não possui problemas relacionados a capacidade

de volume de produção industrial, e, em termos de ampliação produtiva, quando necessário,

executa-se um planejamento de aumento de turnos de trabalho para intensificar a

produtividade das plantas existentes13

.

As funções críticas identificadas são em relação a gestão da cadeia de suprimento do

açaí, o alcance de escala produtiva larga, e a produção e comercialização do açaí em padrão

de exportação que atendam a diversos certificados internacionalmente reconhecidos.

Sobre a rede de suprimento do açaí in natura para a indústria, esta é uma atividade

liderada diretamente por dois sócios, baseados em sua extensa experiência na atividade

anterior de logística e comercialização.

Os donos daqui da fábrica eles iniciaram comprando frutos, eles tem muito

conhecimento no campo, então eles conhecem o seu José da comunidade fulano de

tal, então, assim, nas comunidades ribeirinhas eles são muito conhecidos, e, assim,

por eles terem uma origem humilde, eles honram muito com pagamento... eles têm

uma credibilidade muita boa, um nome muito bom no campo, então tem muita gente

que quer vender para a fábrica... e como eles já tiveram do lado do fornecedor, tem

muita fábrica que por exemplo estipula que quer comprar 100 latas, se o cara tiver

com 150, ele não vai comprar as 150, ele só quer as 100. Aqui na fábrica, pelo fato

da gente ter um volume grande de produto, e pelo fato deles já terem trabalhado

como fornecedor, eles jamais deixam fornecedor joga fruto fora, se tem 150 a gente

dá um jeito e traz os 150 para processar, isso os fornecedores amam. (Informação verbal)14

A Belaiaçá possui estrutura própria de transporte e logística, e comunidades e

cooperativas fornecedoras “fidelizadas”, a empresa desenvolveu uma relação de confiança

junto a essas comunidades, e já realizou, quando necessário, melhorias na estrutura de

13 Anotação em diário de campo durante visita à Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing. 14 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.

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escoamento de comunidades (como a construção de pontos de ancoragem), e em geral faz

antecipações financeiras a esses fornecedores durante a entressafra, o que garante certo nível

de comprometimento dessas comunidades para com a empresa.

Quem faz as compras até hoje são dois sócios... porque eles sabem como lidar com

as pessoas, eles conhecem, então eles vão até as comunidades, passam para a

comunidade o volume que a gente vai precisar, a comunidade vai dizer olha eu

consigo de fornecer tanto por semana, eles começam a adiantar o dinheiro antes da

safra começar... Um dos motivos é para garantir que eles vão vender realmente para

a gente porque na época da safra existe a concorrência muito grande, é uma forma de firmar aquele contrato. (Informação verbal)15

O Diretor de Marketing da Belaiaçá também indica que há conhecimento na empresa

de certo mapeamento do tipo de fruto que cada região, em relação a paladar, cor e densidade.

Existem algumas comunidades que fornecem um açaí melhor, então a gente

seleciona aquela região que o fruto que dá maior rendimento, que tem uma cor

melhor, que o sabor é melhor, e tudo é contratado antes da safra começar.

(Informação verbal)16

Esta capacidade de garantir matéria prima em grande volume é fundamental para a

produção e comercialização em grande escala de seus produtos, uma vez que há competição

pelo fruto durante a safra entre as agroindustriais locais como indicado em F. Costa (2009, p.

345). Em relação a política interna de preços de compra de matéria prima (açaí), conforme

informação do Diretor de Marketing da Belaiaçá, hoje o preço do açaí em Belém, e

municípios próximos, é definido diariamente pelo preço negociado no ver-o-peso.

Ele (preço de compra do açaí) é estipulado pelo mercado, e a gente tem um comprador que fica lá no ver-o-peso, então o valor do açaí que dá lá no ver-o-peso é

o valor geralmente que vai ser praticado no outro dia no campo, ou então em torno

daquele valor. (Informação verbal)17

Os preços do açaí como matéria prima, assim, são definidos por região de

comercialização, independente do produto que será produzido, o que é direcionado

internamente pela empresa, somente há diferenciação para o açaí orgânico, no qual ao preço é

acrescentado uma bonificação de R$0,50.

15 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 16 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 17 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.

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Existem alguns produtos, por exemplo, o fruto que vem do Marajó, ele é mais caro

que o fruto que vem de Igarapé Mirim, e o fruto do Marajó é um fruto que a gente

usa para fazer produto formulado porque ele é melhor. Mas só que é assim, porque

que a gente faz isso, porque lá no mercado de Marajó esses produtos não se

encontram, eles estão em regiões diferentes, dá para trabalhar por região, mas eu não

digo que eu pago um real mais caro se você me der o açaí Premium, não, a gente

mesmo seleciona internamente, tá pagando o valor de mercado, não tá pagando mais

caro por isso. O fruto orgânico sim a gente paga 50 centavos mais caro quando o

fruto é orgânico, até para incentivar os agricultores a trabalhar com os conceitos de

orgânico que é vantagem para gente, eles e para todo mundo. (Informação verbal)18

Neste sentido, percebemos que a comercialização do fruto do açaí in natura tem uma

comercialização próxima a de uma commodity, cujo preço é determinado por mecanismos

com ênfase em demanda e oferta e por região de comercialização, ainda que sejam

reconhecidas diferenças qualitativas entre frutas de uma mesma região por parte da

agroindústria, que diferencia tais frutos no momento de sua produção. Assim, a

comercialização de um produto mais agregado e mais valorizado economicamente pela

agroindústria não gera necessariamente um desdobramento de benefícios a montante da

cadeia produtiva, visto que a maior parte do mercado se baseia na produção em larga escala

de polpa do fruto, um produto com pouca agregação tecnológica e com valor de

comercialização com menor poder de barganha junto aos clientes industriais.

No que tange ainda a capacidade de produção em larga escala, esta se desenvolveu de

forma conjunta com o atendimento de requisitos para exportação, quanto a diversas

certificações exigidas por clientes internacionais e regulamentos nacionais sobre legislação de

segurança alimentar e vigilância sanitária. Os principais certificados da empresa são a ISO

22.000 e o GMA-SAFE em relação a segurança de alimentos para o consumo final,

certificados junto a órgãos regulatórios de países estrangeiros como USDA (United States

Department of Agriculture) para acesso ao mercado norte-americano, e JAS (Japan

Agriculture Standard) para acesso ao mercado orgânico japonês. Além disso, a Belaiaçá

realizou certificações específicas como o Kosher (atendimento de normas específicas da dieta

judaica ortodoxa) e o Halal (atendimento a normas da cultura mulçumana), e certificados de

agricultura orgânica dos produtos.

Conforme indicação do Diretor de Marketing, a empresa não possui certificados

relacionados a “comércio justo” (um selo com ênfase maior no atendimento de aspectos

sociais, que ambientais de sustentabilidade), o qual já foi mencionado por clientes,

principalmente da Europa, mas nunca exigido.

18 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.

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Clientes da Europa geralmente valorizam muito este tipo de certificado (comércio

justo), mas só que nunca foi um requisito. Os outros não, se não tiver o orgânico dos

Estados Unidos não vou conseguir vender, aí a gente pegou e foi... (Informação

verbal)19

Como certificações internacionais correspondem a custos muitas vezes elevados para a

empresa, esta, em geral, somente realiza as certificações quando se caracterização como

exigências à comercialização, com exceção dos selos Kosher e Halal, que de acordo com o

Diretor de Marketing a adesão foi voluntária da empresa.

Já as outras certificações, porque têm várias outras, a gente só seguia nelas quando o

cliente pedia, por exemplo o GMA-safe, o cliente disse, olha, na próxima safra eu só

compro se você tiver esse certificado, a gente foi e certificou. Pra não ser um custos a mais, até porque pra determinadas certificações o custo de trazer um auditor

internacional... a gente só investe se realmente tiver a necessidade e for cobrado... é

sempre o mercado que impulsiona esses certificados. (Informação verbal)20

[...] O certificado, ele agrega valor ao produto. Halal e Kosher, por exemplo, a gente

certificou sem ser cobrado, sem ninguém pedir, porque a gente entendia que quando

eu vendo no mercado internacional o consumidor final destes produtos pode ser um

judeu ou árabe. (Informação verbal)21

Segundo o Diretor de Marketing, os clientes informam a empresa quais serão as

exigências em termos regulatórios, incluindo de critérios de sustentabilidade, que serem

requisitos para compras na safra seguinte, de modo que a empresa faça as adaptações de

processo e certificações. Atualmente, “selos” relacionados a critérios de sustentabilidade são

basicamente de produção orgânica. Ao considerar o conceito de tipo de comportamento

organizacional de reposta de Sharma e Vredenburg (1998), essa postura da empresa se

caracteriza como reativa.

No entanto, a empresa esclarece que possui alguns critérios de aquisição do açaí, em

que 95% de sua matéria prima é comprada junto a comunidades fornecedoras extrativistas de

origem de açaizais nativos, e que não estimulam estas a trabalharem com o fornecimento de

palmito na entressafra, devido a necessidade de cortes e devastações na várzea.

A gente compra de área que é nativa, natural. Nós não valorizamos a cooperativa

que faz palmito porque a gente entende que o palmito, ele precisa desmatar para

poder tirar, e hoje existem fazendas que plantam o açaí só para tirar o palmito, e eu

acho que tem que ser assim mesmo e não tirar de uma vegetação natural.

(Informação verbal)22

19

Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 20 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 21 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 22 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.

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131

Apesar de reconhecer como válidas as preocupações da empresa, principalmente

quanto a manutenção de renda as comunidades extrativistas, lembra-se que especialistas tem

levantado fortes advertência (verificadas no capítulo 2) quanto à pressão pelo crescimento da

produção de açaí em áreas de várzea, e que mesmo áreas de açaizais nativos, hoje em dia,

sofrem intensas intervenções de manejo, cujos efeitos sistêmicos ainda não podem ser

estimados em relação a manutenção do ecossistema de várzea. Assim, a enorme demanda de

volumes de produção de açaí para atendimento de mercados locais, nacionais e internacionais,

segundo especialistas (HOMMA et al, 2006; SILVA; SANTANA; REIS, 2006) não poderá

ser atendida de forma sustentável exclusivamente em áreas de várzea.

Deste modo, entendemos que ao nível da cadeia produtiva, os desafios para assegurar

a sustentabilidade tornam-se mais complexos, que soluções de empresas individuais, uma vez

que a interdependência das ações e estratégias adotadas por atores individuais precisariam ser

alinhadas.

Ainda em relação às capacidades tecnológicas, observamos que há avanços da

Belaiaçá no sentido de desenvolver seu departamento de P&D:

A gente tem um plano de investimento, e dentro do plano de investimento a gente

pega uma parte desse valor e coloca para pesquisa e desenvolvimento... esse ano,

por exemplo, a gente vai investir em ampliação de laboratório, a gente vai comprar

mais equipamentos para poder fazer análises mais específicas. (Informação verbal)23

Em síntese, entendemos que a Belaiaçá iniciou esforços de inovações internas em

produtos a partir de 2010, principalmente baseados em mudanças incrementais de produtos já

difundidos no mercado nacional, diversificando seu portfólio, no entanto, estas inovações

ainda não se caracterizam por uma substancial acumulação tecnológica industrial.

23 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.

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132

Figura 7 - Imagens do site, produtos e instalações da Belaiaçá. Site da empresa:

Mix de Açaí com

Banana

Bebida Mista de Açaí

com Soja e Camu Camu

Fachada de uma planta industrial no município de Castanhal:

Estrutura de Processamento Industrial

Fonte: Belaiaçá (2014).

Na figura 7, apresentamos na primeira linha a página inicial do site da empresa, em

que é ressaltada a responsabilidade ambiental de produção, e fotos de dois produtos

desenvolvidos internamente. Na segunda e terceira linha, demonstramos fotos externa e

interna da instalação da empresa em Castanhal (Pará), cuja produção segue padrões de

qualidade internacionalmente reconhecidos.

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133

- Padrão de mudança técnica:

De acordo com os padrões de mudança tecnológica, identifica-se a Belaiaçá como uma

empresa ainda mais próxima da categoria de dominada pelo fornecedor, em virtude suas

mudanças técnicas se caracterizarem por processos de difusão de inovações e melhores

práticas, embora se reconheça a emergência de alguns aspectos de busca inovativa mais

independente, conforme pontos de análise da Tabela 8.

Tabela 8 - Análise do padrão de mudança técnica da Belaiaçá.

Variáveis de

análise

Padrão de Mudança

Técnica:

Dominado por

fornecedor

Observações de análise sobre a Belaiaçá

Setores típicos Agricultura, têxteis,

madeireiro

A cadeia do açaí possui industrialização recente, e a maior parte de suas agroindústrias trabalha com produto de baixo

agregação tecnológica (polpa), com forte dependência de

conhecimento dos fornecedores de sistemas industriais.

Tamanho de

empresas Pequeno

A empresa nos últimos sofreu processo de expansão, hoje configurando-se como uma empresa de médio porte conforme

legislação nacional.

Tipo de usuários Sensível ao preço

O principal produto da agroindústria, e da empresa ainda é a polpa, que é reconhecido pela Belaiaçá sendo altamente

sensível ao preço. A estratégia de diferenciação de produtos

busca desviar a empresa de competições mais predatórias e

buscar produtos de maior valor agregado, mas dada a novidade

destes novos produtos, eles ainda não possuem consolidação

no mercado.

Principais focos

das atividades

tecnológicas

Redução de custo Atividades nos departamentos de produção buscam metas de redução de custos, apesar de neste caso haver forte busca de

melhorias de produtos no esforço de diferenciação.

Principais fontes

de acumulação

tecnológica

Fornecedores, aprendiz.

na produção, serv. de

consultorias

A acumulação tecnológica para infraestrutura fabril é fortemente baseada em fornecedores de bens de capitais que se

responsabilizam pela montagem das estruturas industriais.

Também foi relatado a busca de parcerias com instituição de

pesquisa e empresa de base tecnológica (Amazon Dreams),

estas representam a emergência de maior independência de

fornecedores de bens de capital padrão, no entanto como são atividades ainda incipientes, entende-se que a base principal do

negócio e o padrão de expansão até então utilizado ainda

caracteriza de forma predominante como dominado por

fornecedores.

Principal direções

da acumulação

tecnológica

Tecnologia de processo e

equipamentos

(foco ascendente na

cadeia, baixa

diversificação de

produto)

As expansões industriais realizadas pela empresa, e mesmo a

diferenciação de produtos iniciada, tem forte foco na definição

de tecnologia de processo produtivo e dos equipamentos a

serem utilizados.

Principais canais

de imitação e de

transferência de

tecnologia

Aquisição de

equipamentos e serviços

relacionados

O principal canal de transferência tecnológica para produção é

a seleção e aquisição de equipamentos.

Principais meios de

apropriação

(proteção contra

Mecanismos não

técnicos

(Marketing, marca, etc)

A empresa afirma não utilizar de forma deliberada meios de

apropriação, provavelmente em virtude de suas inovações não

serem de caráter absoluto (novidade para o mundo) e sim

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Variáveis de

análise

Padrão de Mudança

Técnica:

Dominado por

fornecedor

Observações de análise sobre a Belaiaçá

imitação) inovações no âmbito da empresa, o que exclui meios como

patente, e dificulta o sigilo, principalmente porque os

processos de mudanças se baseiam em tecnologias de

fornecedores que tem interesse em sua difusão.

Mas a empresa indica que para alguns processos realiza uma

fragmentação de etapas de produção, de modo que os

funcionários em geral não tenham acesso a compreensão de

todo o processo, exceto aqueles de nível gerencial, esta estratégia entende-se como uma forma de sigilo industrial.

Também se percebe uma busca recente de atividades de

marketing, em virtude da diferenciação de produtos com foco

no consumidor final.

Principais

incumbências

administrativas de

caráter estratégico

Uso de tecnologias

produzidas em outro

setor para reforçar as

vantagens competitivas.

A empresa busca basear suas inovações na aplicação em seus

processos e produtos de tecnologias já desenvolvidas, com

foco na seleção e aquisição de equipamentos, e licenciamento.

Fonte: Itens de análise (coluna 1) baseados em Bell e Pavitt (1993, p. 180); e conteúdo das análises (colunas 2 e

3) de autora.

A Belaiaçá apresenta-se como uma agroindústria em expansão, com considerável

velocidade de desenvolvimento de capacidades de produção, principalmente em comparações

com outras agroindústrias locais. Embora a empresa não tenha em sua constituição uma base

prévia de capacidade tecnológica, observa-se a emergência de ações de busca de

desenvolvimento desta capacidade, como estratégia de diferenciação de mercado, no entanto

ainda com pouca intensidade de esforços tecnológicos efetivos.

3.4 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS

Este capítulo teve como foco as três organizações que contribuíram em termos de

capacidades tecnológicas e de produção ao desenvolvimento da inovação de linha de produtos

baseados em compostos antioxidantes de açaí. Inicialmente, foi realizada uma revisão teórica

sobre os conceitos de capacidades organizacionais para compreensão da relação entre a

dinâmica de construção destas capacidades e o desenvolvimento de processos inovativos, bem

como as condições de apropriabilidade das organizações sobre este.

Também se buscou delinear algumas discussões relacionadas a temática de

capacidades de inovação e o atendimento de critérios de desenvolvimento sustentável, em que

se identificou pontos de debate sobre a postura das empresas e possíveis vantagens ou

dificuldades envolvidas.

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135

Uma conexão entre este tema de desenvolvimento de capacidades para geração de

novas tecnologias sustentáveis com o conceito de paradigma tecnológico, pois muitas destas

tecnologias representam descontinuidades aos paradigmas tecnológicos em vigor, o que

explicar que as dificuldades destas buscas inovativas sustentáveis não estão baseadas somente

na expansão da base de conhecimentos científico e tecnológico, mas na articulação conjunta

de mudanças nas relações econômicas, sociais e institucionais estabelecidas. Neste caso, são

alguns aspectos normativos, como a importância da ampliação da base de stakeholders nos

processos de inovação e de uma visão mais integrada das múltiplas dimensões incidentes

sobre a inovação.

As informações empíricas corresponderam a caracterização das organizações foco do

estudo, que são UFPA, Amazon Dreams e Belaiaçá. O levantamento de dados objetivou

identificar as forças e fraquezas em termos de capacidades destas organizações para a

realização de processos de inovação, considerando um breve histórico de atividades

inovativas e análise do padrão de mudança técnico aplicado as duas organizações empresarias.

Cabe esclarecer que alguns conceitos discutidos na revisão teórica, como de ativos

complementares e capacidades absortivas não foram explorados no exame empírico deste

capítulo, mas sua abordagem é aplicada no próximo capítulo (4) no âmbito das relações

interorganizacionais do processo de inovação.

A UFPA se caracteriza como instituição de C&T com capacidades tecnológicas

vinculadas à pesquisa científica e tecnológica, com bases de conhecimento desenvolvidas

sobre biotecnologia alinhadas ao interesse sobre o uso sustentável da biodiversidade da

Amazônia. No entanto, apresenta limitações quanto a articulação com o setor produtivo, o que

restringe a contribuição da Universidade no desenvolvimento de processos de inovação na

região.

A Amazon Dreams é uma empresa de base tecnológica, spin off da UFPA, com

capacidades tecnológicas desenvolvidas para bioprospecção e desenvolvimento tecnológico

de produtos originados da biodiversidade da Amazônia, com foco em setores como

cosméticos, alimentação funcional, saúde e nutrição. Seu modelo de negócio vincula-se à

proposta de valorização econômica dos ativos da biodiversidade amazônica por meio da

biotecnologia para assegurar condições adequadas de uso sustentável e desenvolvimento

regional. Apesar de ser bem sucedida na criação de produtos de alto valor agregado, a

empresa apresenta baixo desenvolvimento de capacidade de produção. Esta configuração de

capacidades, em geral, requer atuação em regimes de apropriação forte que lhe assegurem

proteção sobre os retornos das inovações desenvolvidas.

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A Belaiaçá é uma agroindústria de médio porte que atua predominantemente na cadeia

produtiva do açaí. A empresa encontra-se em expansão, em parte pelo crescimento da

demanda por produtos baseados no açaí no mercado nacional e internacional. Embora sua

constituição no setor da agroindustrial ser relativamente recente realizou avanços em sua

capacidade de produção, diferenciando-se da maioria das agroindústrias locais, contudo ainda

apresenta uma capacidade tecnológica incipiente. A Belaiaçá demonstra preocupações em

relação a sustentabilidade da cadeia de valor do açaí, particularmente em relação as

comunidades extrativistas, contudo sua postura tem se mostrado reativa quanto a

implementação de capacidades e de práticas socioambientais efetivas.

Ao considerar que o desenvolvimento do processo de inovação tecnológica para

comercialização da linha de produtos baseada no açaí envolveu a interação dessas

organizações, o próximo capítulo tem como objetivo compreender a rede de relações

interorganizacionais construída no decorrer do processo de inovação, com vistas a analisar o

seu desenvolvimento e os resultados alcançados, inclusive quanto a efetividade de

apropriação de benefícios pelas organizações em foco.

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137

4 REDE DE RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS E O PROCESSO DE

INOVAÇÃO

4.1 INTRODUÇÃO

Após realizar a análise do contexto (capítulo 2) e das capacidades das organizações

âncoras (capítulo 3) que contribuíram no desenvolvimento do processo de inovação para

comercialização da linha de compostos antioxidantes baseados no açaí, o objetivo deste

capítulo é compreender como ocorreu esse processo de inovação em si, a rede de relações

estabelecidas e, finalmente, os resultados alcançados até o período de estudo, tendo como

foco o entendimento da dinâmica de apropriação de benefícios gerados.

Para embasar a análise sobre a rede de relações interorganizacionais, a primeira parte

do capítulo corresponde a uma revisão teórica sintética sobre a temática de organização de

redes, e especificamente sobre redes de inovação, enfatizando às condições de

apropriabilidade.

Na segunda parte do capítulo, descrevemos o processo de inovação e as relações entre

as organizações, com foco na UFPA, Amazon Dreams e Belaiaçá, porém não se restringindo a

elas, dado que a dinâmica de interação envolve organizações correlacionadas a estas em

diferentes momentos do processo de inovação. O estudo das relações interorganizacionais

durante o processo de inovação busca examinar o impacto destas interações em relação a

geração de resultados e apropriabilidade das organizações. Além disso, investigamos as

conexões com os constructos ao nível de contexto (trajetórias tecnológicas e regime de

apropriabilidade) e ao nível da organização (capacidades).

Por fim, empreendemos a apreciação crítica dos resultados observados do processo de

inovação, e da apropriação destes resultados, quanto às perspectivas e limitações em

contribuir para a construção de uma nova lógica produtiva alicerçada em ativos da

biodiversidade com geração de dinâmicas de desenvolvimento regional.

4.2 FORMAS DE ORGANIZAÇÃO EM REDE

A concepção da forma de organização de rede de relações pode conformar uma série

de categorias de estudos, desde a aplicação de seus componentes estruturais a análise grupos,

organizações e indústrias, até a pesquisas sobre novos formatos organizacionais e a ampliação

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138

de suas fronteiras, emergindo de debates entre diferentes bases de conhecimento como a

economia, sociologia e teoria das organizações.

A teoria econômica de custos de transação define duas formas de organização das

transações econômicas, o mercado e a organização hierárquica, de modo que estes atuariam

como instrumentos de governança alternativos do tipo ideal para realização destas transações

(BARNEY; HESTERLY, 2004). Como tipos ideais, estas duas formas são as duas pontas de

um contínuo ao longo das quais diferentes formas organizacionais reais estariam distribuídas,

podendo haver formas híbridas que combinam elementos de mercado e hierarquia, em que a

organização em redes se enquadraria nesta posição intermediária (PODOLNY; PAGE, 1998,

p. 58).

Contudo, segundo Podolny e Page (1998, p. 57), esta visão da rede como um formato

híbrido passou a ser questionada dentro dos campos da sociologia e da teoria das

organizações, ao se defender que a forma de redes representa uma terceira alternativa

diferenciada, a qual possui uma lógica própria e distinções em termos de vantagens de

eficiência em relação a mercados e hierarquias.

As características da organização em rede apresentam vantagens distintas e únicas

frente às encontradas no mercado e na organização hierárquica, que proporcionam

configurações de governança e funcionalidade que falham em se conformar com estas

definições tradicionais (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 57).

A conjuntura básica deste argumento é que no âmbito da organização em rede, a

estrutura social proporciona uma dinâmica de relações de compartilhamento de recursos e

tomada de decisão que gera oportunidades e vantagens econômicas difíceis de replicar via

transações de mercado ou hierarquia (UZZI, 1997, p. 61).

Neste sentido, Uzzi (1997, p. 35) ressalta a importância de reconhecer que a ação

econômica está imersa em uma estrutura social (embeddedness) que governa processos

intervenientes que afetam (positivamente ou negativamente) fatores de desempenho e

resultados dos agentes econômicos, de modo a compreender que a qualidade das transações

econômicas é influenciada pela qualidade das relações sociais.

4.2.1 Estrutura de redes

Para Podolny e Page (1998, p. 59) de uma perspectiva estrutural, toda forma

organizacional pode ser representada graficamente como uma rede de relações, inclusive

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139

mercados e hierarquias, cujos pontos podem ser organizações, unidades ou pessoas, e suas

relações os laços que os interligam.

Estudos de estrutura de redes em geral focam na análise da natureza de relações entre

os atores, denominadas de laços, que podem ser examinados em termos de tipos de relações

como laços fortes e fracos. Granovetter (1973, p. 1361) distingue a força de um laço entre

dois atores como determinada por uma combinação da quantidade de tempo dedicado à

relação, sua intensidade de vínculo, e o grau de reciprocidade, sendo que estes três aspectos

tendem a ser correlacionados.

Os diferentes tipos destes laços estabelecem padrões de relações distintos, em que

laços fortes estariam relacionados a características como maior confiança, identidade social e

compartilhamento mais profundo de informações e recursos, enquanto laços fracos proveriam

uma maior diversidade informações e acesso a oportunidades ampliadas. Uzzi (1997, p. 59)

entende que cada tipo de relação cumpre funções sociais distintas, sendo ambas importantes

para gerar um desempenho adequado da rede.

Outros estudos relacionam-se a arquitetura que estas relações formam (formato do

conjunto de laços e pontos), como em Ahuja (2000, p. 430) que verificou as funções de laços

diretos e indiretos, e os efeitos de posições centrais ou periféricas dos atores em uma rede e da

densidade desta rede. Neste caso, laços diretos (fortes ou fracos) interligavam dois atores e

laços indiretos representavam atores que entre si não possuíam relação, mas mantinham em

comum um laço com um terceiro ator, por meio do qual poderia fluir informações e recursos.

Deste modo, o autor indicava que o fluxo de comunicação para um ator em rede ultrapassa os

limites de suas relações diretas.

Uzzi (1997, p. 36) defende que a organização em rede proporciona uma estrutura e

qualidade de relações interorganizacionais distintos tanto do mercado quanto das

organizações hierárquicas, o que molda oportunidades e expectativas diferenciais. Em um

mercado, a comunicação tende a ser focada sobre preços, quantidades e requisitos de

produtos, enquanto em uma organização hierárquica esta comunicação se aprofunda no

sentido de uma coordenação de atividades e identidade comum, mas também se restringe em

termos de acesso a novas oportunidades e a informações não redundantes.

Em uma organização em rede, a comunicação e transferência de informação é mais

detalhada e assertiva que no mercado, pois contempla uma natureza mais tácita e holística,

além de que a identidade social entre os parceiros permite a transmissão de preferências e

opções estratégicas que melhora a coordenação interorganizacional (Uzzi, 1997, p.46). Ao

mesmo tempo, esta comunicação é mais abrangente e proporciona maior flexibilidade de

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resposta que na organização hierárquica, pois as fronteiras de uma rede tendem a ser mais

maleáveis (menos rígida que na hierarquia).

4.2.2 Governança em organização em rede

A abordagem de governança da organização em rede é o fator chave de diferenciação

para Podolny e Page (1998, p. 59). Estes autores entendem uma rede de organizações como

um conjunto de atores (igual ou maior que dois) que buscam repetidas relações de trocas

duráveis uns com os outros, ao mesmo tempo em que há uma lacuna de autoridade legitimada

para arbitrar e resolver disputas. Neste sentido, não se enquadram no formato de mercado pelo

tipo de relações duráveis estabelecidas, enquanto que não se conforma com a hierarquia pela

falta da autoridade formalmente instituída de um ator sobre os demais.

Este conceito de governança corresponde a noção expressa por Dhanaraj e Parkhe

(2006, p. 659) que redes interorganizacionais podem ser vistas como arranjos frouxamente

acoplados, onde por um lado os atores estão interligados e conserva-se algum grau de

dependência (“acoplado”), mas por outro lado não há controle hierárquico entre estes, de

modo que eles preservam algum grau de independência entre si (“frouxamente”).

Exemplos deste tipo de perspectiva podem se aplicar a formatos como joint ventures,

convênios de pesquisa ou alianças estratégicas, contudo, Podolny e Page (1998, p. 59)

advertem que a caracterização destes formatos como corresponde a governança de

organização em rede não pode ser feita a priore, mas sim de acordo com a análise dos

aspectos específicos de caso a caso.

Cabe acrescentar que esta forma de governança implica na constituição de alguns

componentes que regulem expectativas e comportamentos entre seus membros, entre os

principais elementos identificados estão a confiança e normas de reciprocidade, e a tomada de

decisão e processos de resolução de problemas conjuntos (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 60;

UZZI, 1997, p. 42). Podolny e Page (1998, p. 61) afirmam que, devido a elementos como

estes, a governança de redes não pode ser reduzida a uma hibridização de mercados e

hierarquias, uma vez que ambos tem como pressuposto uma postura mais de contraposição

entre os agentes.

Nesta abordagem de organização em rede, a confiança atua como facilitadora das

relações de troca de informações, enriquece oportunidades de acesso a recursos, e estende a

flexibilidade entre os atores (UZZI, 1997, p. 45). Então, funciona como uma regra de decisão

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(heurística), ou seja, um processo de decisão que economiza recursos cognitivos e aumenta a

velocidade de decisão, porém sem prejudicar a qualidade da decisão (UZZI, 1997, p. 43).

Entretanto, Capaldo (2007, p. 601) observa que muitas vezes a confiança não é uma

condição prévia necessária ao início da parceria, a confiança pode emergir de repetidas

interações entre os atores como em um processo de evolução das relações

interorganizacionais. A confiança é característica de laços fortes, e de acordo com Uzzi (1997,

p. 54) relaciona-se ao desenvolvimento de “multiplexidade”, que são relações de múltiplos

vínculos entre dois atores, que podem envolver uma multiplicidade de vínculos tanto

econômicos, como sociais, associações políticas ou familiares.

Entre ações importantes que a confiança auxilia a serem adotadas mais facilmente em

redes estão as decisões de investimentos, pois ajuda a reduzir o risco percebido (UZZI, 1997,

p. 52) e o intercâmbio de conhecimento pela menor ênfase em preocupações de

apropriabilidade (GULATI; SINGH, 1998).

Os arranjos para resolução de problemas conjuntos e tomada de decisão coletivas são

mecanismos de voz para construção de consenso, que propicia feedback, aprendizado e

descoberta de novas combinações entre os membros da rede (UZZI, 1997, p. 47). Deste modo,

esse tipo de modelo de decisão substitui a formulação de respostas simplistas do mercado

como “ficar ou sair”, e cria bases para processos de busca de solução de problema via

aprendizado e inovação (UZZI, 1997, p. 47).

Além disso, as soluções em consenso tendem a ser elaboradas em bases mais

integrativas do que distributivas, onde se busca alavancar os resultados da rede como um

todo, em vez de somente dividir funções (UZZI, 1997, p. 50). Assim, a governança de redes

fomenta uma (re)alocação de recursos que, sem piorar as bases já estabelecidas para nenhum

de seus membros, proporcione melhorar condições para pelos menos um membro (UZZI,

1997, p. 55).

4.2.3 Funções

As potenciais distinções em termos de estrutura e governança da organização em rede,

mencionadas acima, propiciam condições para a emergência de funcionalidades específicas

que podem se configurar como vantagens competitivas (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 62).

Estas funcionalidades podem ser interpretadas como os serviços e benefícios advindos dos

recursos de rede conforme Lavie (2006, p. 640). Os chamados recursos de rede são recursos

externos enraizados na rede de uma determinada empresa, os quais provêm acesso a

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oportunidades estratégicas e afeta o comportamento ou valor da empresa (LAVIE, 2006, p.

638).

Segundo Lavie (2006, p. 641), os benefícios obtidos pelos recursos de rede

demonstram que a posse ou o controle exclusivo de recursos não é uma condição necessária

para a obtenção de vantagem competitiva, na realidade, a acessibilidade a estes recursos, de

modo a estabelecer seu direito de uso ou usufruto de seus benefícios é que se torna relevante,

e pode ser suficiente para gerar valor para a empresa.

Podolny e Page (1998, p. 62) destacam as três principais funcionalidades da

organização em rede como o aprendizado diferencial de novas habilidades e conhecimento

(1), os efeitos de status e legitimidade (2), e benefícios quanto ao desempenho econômico (3)

(PODOLNY; PAGE, 1998, p. 62).

- Aprendizado:

As formas de organizações em redes podem preservar maior diversidade de

informações e rotinas de buscas do que as hierarquias, ao mesmo tempo em que permite um

intercambio de informações mais abrangente e complexo do que o mercado, assim são

potencialmente capazes de promover melhores condições de aprendizado (PODOLNY;

PAGE, 1998, p. 63).

O aprendizado em redes interorganizacionais relaciona-se tanto à transferência de

informações que representam oportunidades dos atores de internalizar habilidades de outros

membros, quanto a geração de síntese destas informações por diferentes atores na produção

de novos e distintos conhecimentos (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 62).

Neste contexto de aprendizado, Ahuja (2000, p. 430) chama a atenção que, por um

lado, há o compartilhamento deliberado de conhecimento pelos membros da rede, mas, por

outro lado, há um transbordamento não intencional de conhecimentos via repetidas interações

cooperativas entre os membros, onde uma empresa tem acesso não somente ao conhecimento

de seus parceiros diretos, mas também ao dos “parceiros de seus parceiros” (relações

indiretas).

Para Lavie (2006, p. 647) esses transbordamentos originados de recursos não

intencionalmente compartilhados sugere assumir que, em uma rede interorganizacional, as

oportunidades reais de aprendizado ultrapassam o escopo imediato da parceria firmada, e

reforça a importância do desenvolvimento da capacidade absortiva entre seus membros, de

modo que possam se beneficiar desses transbordamentos.

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- Status e legitimidade:

Podolny e Page (1998, p. 64) indicam que um ator da rede pode obter ou elevar sua

legitimidade ou status decorrente de seu vínculo com outro membro parceiro, sendo que esta

legitimidade pode lhe trazer benefícios econômicos, como aumento de valor de mercado ou

ter acesso a um fluxo de recursos superiores. De outra forma, se uma organização focal

(central) da rede desenvolver relações com um ator externo que possua alta legitimidade na

sociedade, isso pode ter efeitos de transbordamento positivo a toda a sua rede (PODOLNY;

PAGE, 1998, p. 64).

Contudo, cabe também ressalvar que a diferença entre status dos atores pode atuar

como uma restrição a formação de laços, pois um ator com um status superior tende a ser

mais seletivo as suas relações, para evitar efeitos inversos de perdas ou redução de

legitimidade em virtude de problemas relacionados a eventuais parceiros (PODOLNY;

PAGE, 1998, p. 69). Assim como, se o rompimento de laços entre atores representar para uma

das partes algum custos de reputação, haverá um incentivo para a persistência da rede de

relações, mesmo que os efeitos tangíveis de geração de benefícios tenham cessado

(PODOLNY; PAGE, 1998, p. 70).

- Benefícios ao desempenho econômico:

Para Podolny e Page (1998, p. 65), a perspectiva da organização em rede tende a

compreender as oportunidades de melhoria de desempenho econômico do ponto de vista de

ampliação de vantagens em termos das qualidades das relações, em vez de focar na redução

de custos de transações.

Entre as qualidades ressaltadas está o desenvolvimento de melhor coordenação de

atividades produtivas e comerciais entre as empresas em função da confiança e melhoria na

comunicação entre os atores, que permite operações mais eficientes e maior adaptabilidade,

com eventual antecipação, às mudanças no mercado ou no ambiente institucional

(PODOLNY; PAGE, 1998, p. 65).

Outros benefícios também são mencionados relacionados a redução de incertezas,

particularmente pela opção de desenvolvimento de inovações via organização em rede como

joint ventures, e que redes de pequenas empresas ou produtores conduzem a ganhos coletivos

para seus membros, uma distribuição de riqueza mais equitativa e promovem um maior senso

de comunidade quanto aos compromissos firmados (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 66).

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144

4.2.4 Disfunções

Se a forma de organização em rede proporciona efetivamente estas vantagens os seus

membros frente às alternativos convencionais de mercado e de organização hierárquica,

caberia questionar a razão pela qual esta forma não é predominante nas indústrias e setores

econômicos, em detrimento das formas tradicionais. Podolny e Page (1998, p. 67) indicam

que se deve reconhecer que as funções e benefícios informados são eminentemente potenciais,

e que a forma de organização em rede também traz em seu bojo disfunções e restrições para a

adoção de sua forma de governança. Cabe considerar que tais restrições se aplicam tanto a

formação de novas relações em rede, como a persistência ou não das relações em redes

existentes (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 70).

Enfatiza-se dois fatores de restrição, um em relação à natureza da base de

conhecimento e tecnologia dos atores e outro sobre as capacidades necessárias para a gestão

de rotinas neste formato de governança (PODOLNY e PAGE, 1998, p. 69).

A natureza da base de conhecimento e da tecnologia refere-se ao conceito de

capacidade absortiva (COHEN; LEVINTHAL, 1990; ZAHRA; GEORGE, 2002). Uma

condição de restrição a formação de parcerias interorganizacionais acontece quando as bases

tecnológicas dos possíveis atores são muito distantes (sem interconexões claras), o que afeta

negativamente a percepção destes de vantagens quanto ao compartilhamento de conhecimento

e oportunidades de internalização de informações úteis (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 69).

Bem como, quando essas bases são muito similares, há percepção de redundância de

tecnologia, o que também não gera incentivos a formação de laços, de modo que

provavelmente somente haverá estímulo quanto às bases tecnológicas à formação da rede

quando houver distância intermediária entre as tecnologias (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 69).

A outra restrição é a necessidade de desenvolvimento de habilidades para operar em

uma organização em rede, que envolve o aprendizado de capacidades que dependem

parcialmente da experiência adquirida dos atores (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 72). Capaldo

(2007, p. 586) denomina de capacidades relacionais que define como a capacidade

organizacional de gerenciar as relações em rede, e coordenar as atividades e o aprendizado

por meio de rotinas dedicadas, com ênfase ao intercambio de conhecimento

interorganizacional.

Podolny e Page (1998, p. 72) realçam o aprendizado e a adaptação como processos

críticos para efetividade da rede, e algumas características entre os atores atuam como fatores

facilitadores (ou restritivos na sua falta) como o nível de integração das tarefas, a similaridade

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da cultura organizacional, e ter objetivos organizacionais comuns. A existência de parcerias

interorganizacionais anteriores, diretamente com os atores de interesses ou indiretamente,

também funciona como um fator de influência na formação de redes, pois em geral o

desenvolvimento de relações é realizado por meio de instrumentos de referência (seja de

contatos pessoais, seja de uma terceira parte), e de controle social (PODOLNY; PAGE, 1998,

p. 69; CAPALDO, 2007, p. 599; UZZI, 1997, p. 48).

Contudo, mesmo ao superar as restrições para sua formação ou manutenção, a

organização em rede pode não gerar as vantagens esperadas devido a disfunções em suas

operações (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 70). Estas disfunções podem estar relacionadas tanto

a estrutura destas redes como a qualidade das relações, de acordo com o proposto por Uzzi

(1997, p. 57) como o paradoxo do enraizamento (embeddedness), em que haveria uma relação

de “U” invertido entre laços fortes e desempenho.

Neste caso, se houver uma concentração de vínculos somente entre laços fortes em

uma rede, isso levaria a um isomorfismo, que reduz oportunidades de aprendizado e a

flexibilidade (UZZI, 1997, p. 57). Mas se, ao contrário, prevalecer um conjunto de laços

fracos, não será possível desenvolver os processos de confiança, reciprocidade e

compartilhamento necessários para geração das vantagens competitivas (UZZI, 1997, p. 57-

59). Os vínculos sociais tem uma influência importante na ação econômica, mas se essa

influência será negativa ou positiva depende da qualidade das relações interorganizacionais,

da estrutura e da posição das organizações na rede (UZZI, 1997, p. 60).

4.3 REDES DE INOVAÇÃO E BIOTECNOLOGIA

As vantagens relacionadas a melhores condições de aprendizado e desempenho

econômico tem fomentado uma série de estudos que buscam explorar conexões entre a

performance da organização em rede e o desempenho inovativo (CAPALDO, 2007; AHUJA,

2000, p. 426; GULATI; SINGH, 1998; POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996;

PISANO, 1990). Em geral, enfatiza-se as redes de relações interorganizacionais como

mecanismos de acesso a conhecimentos externos, e de construção de novas combinações

destes conhecimentos, ou mesmo de novos conhecimentos (CAPALDO, 2007; AHUJA, 2000,

p. 426; POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996).

Capaldo (2007, p. 585, 605) defende uma relação entre estrutura de rede e inovação ao

nível da organização no que tange a capacidade relacional das empresas para formação de

redes de parcerias interorganizacionais heterogêneas, e demonstra que estas estruturas de

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redes coevoluem de acordo com as estratégias das empresas e as condições de mercado que

enfrentam.

Para o CGEE (2006a) é ressaltada a função de coordenação interorganizacional, ao

indicar que a aplicação da organização em rede para o desenvolvimento de inovação foca nos

processos interativos entre os atores sociais, que buscam nessa forma de associação articular

projetos e problemas delimitados de um modo coordenado e em consenso para atingir

propósitos próprios.

Os processos de aprendizado interorganizacional e o posicionamento do lócus da

inovação nas redes de relações são a ênfase da pesquisa de Powell, Koput e Smith-Doerr

(1996, p. 119). Os autores identificaram que, quando a base de conhecimento é amplamente

dispersa e traz vantagens competitivas significativas, as empresas obtêm nas redes

interorganizacionais acesso a conhecimentos e recursos que não estariam disponíveis via

transações do mercado, e nem poderiam ser desenvolvidos isoladamente nas empresas.

No entanto, se por um lado as redes interorganizacionais proporcionam melhores

condições para o desenvolvimento e a difusão tecnológicos, por outro lado, Gulati e Singh

(1998, p. 807) sugerem que nestes casos as relações em uma rede interorganizacional tornam-

se mais complexas. Quando as relações entre empresas em uma rede envolvem atividades em

torno de componentes tecnológicos, tanto em termos de transferência unilateral de tecnologia,

quanto intercâmbio de tecnologias e codesenvolvimento, aumenta as preocupações referentes

a apropriabilidade e a coordenação e integração das atividades interfirmas (GULATI; SINGH,

1998, p. 798).

A influência de aspectos de apropriabilidade ocorre pelas dificuldades em conceber o

conhecimento tecnológico como um produto, pois tem forte composição intangível e tácita,

assim o conhecimento a ser compartilhado na rede é difícil de ser delimitado e de monitorar

seu uso aos objetivos específicos da parceria, o que amplia as possibilidades de

transbordamentos não desejados pelos parceiros (GULATI; SINGH, 1998, p. 798).

Devido a estas características também é precário para os parceiros avaliarem o valor

preciso deste “produto”, pois por parte de quem recebe o conhecimento tecnológico não há

informações completas de seu conteúdo até que a transferência seja concluída, e por parte de

quem concede o conhecimento não há como prever seu uso potencial ou estabelecer de forma

eficaz os limites de utilização desta tecnologia (GULATI; SINGH, 1998, p. 789).

Diante deste cenário, Gulati e Singh (1998, p. 807) apontam que quando há uma

combinação de uma atividade com componente tecnológico e um setor econômico com baixa

apropriabilidade, as empresas podem ser desestimuladas a participarem em organização em

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147

redes, ou restringir suas participações pelos riscos de apropriabilidade na indústria (GULATI;

SINGH, 1998, p. 807). Além disso, os custos de coordenação também são afetados por

componentes tecnológicos em termos de integração de atividades, particularmente quando

envolvem o desenvolvimento conjunto, e dificuldades de valoração quanto às contribuições

de cada membro para o produto final (GULATI; SINGH, 1998, p. 789).

4.3.1 Biotecnologia

Esta realidade complexa de componentes tecnológicos na interação

interorganizacional é reforçada em processos de descontinuidade tecnológica e ascensão de

novas trajetórias com rápido desenvolvimento, como no caso da biotecnologia, onde o

conhecimento é tanto sofisticado, quanto disperso (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR,

1996, p. 118). Estes aspectos fazem com que o desenvolvimento biotecnológico demande um

conjunto de habilidades intelectuais e científicas que excedem das capacidades de uma única

organização, não somente por uma questão de intensidade de níveis de investimentos e

atividades, mas também pela diversidade de fontes de inovação necessárias, de forma que

diferentes perfis de organizações são demandados a contribuir (POWELL; KOPUT; SMITH-

DOERR, 1996, p. 118). Além de empresas privadas, há presença frequente de instituições de

pesquisas públicas, universidades e laboratórios públicos e privados, e organizações sem fins

lucrativos (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996, p. 118).

Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p. 123) descrevem o processo de

desenvolvimento de produtos biotecnológicos como, em geral, intensivo em pesquisa,

prolongado e com gastos expressivos. O desenvolvimento das capacidades absortivas de cada

organização é fundamental para a aplicação dos conhecimentos e informações gerados nos

diferentes parceiros e progresso das colaborações no projeto (POWELL; KOPUT; SMITH-

DOERR, 1996, p. 142). A colaboração externa é necessária para prover acesso a novos

conhecimentos e recursos que não podem ser gerados internamente, mas ao mesmo tempo

possuir capacidades internas é indispensável para avaliar pesquisas externas já realizadas e

selecionar os conhecimentos a serem aplicados (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996,

p. 119).

Por esta razão, Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p. 119) argumentam que o

desenvolvimento de inovação de base biotecnológica ocorre no âmbito de redes caracterizadas

pelo aprendizado interorganizacional, e que nestas as colaborações não podem ser concebidas

restritamente como meios de compensar a falta de habilidades internas dos membros, nem

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148

devem ser vistas como uma séria discreta de transações estanques (POWELL; KOPUT;

SMITH-DOERR, 1996, p. 119). Neste sentido, pode-se destacar a feição de interdependência

dos membros da rede para alcançar o progresso tecnológico e a inovação.

Gulati e Singh (1998, p. 808) consideram que a interdependência de recursos é um

importante determinante na estruturação de redes de relações interorganizacionais, o acesso e

compartilhamento de recursos e a necessidade de habilidades complementares produzem

incentivos para a formação de novos laços entre organizações.

No entanto, essa complementação de habilidades e recursos para inovação de produtos

e processos biotecnológicos não está somente relacionada às novas competências e fontes de

conhecimentos originadas por esta nova trajetória tecnológica, o cenário é mais imbricado.

Assim, é preciso delimitar os efeitos de mudanças de competências operadas pelo paradigma

biotecnológico.

Teece (2006) ressalta que o processo de inovação envolve diferentes atividades como

a invenção e a comercialização, que exigem para sua execução um conjunto diverso de

capacidades e recursos. Essa visão de atividades distintas relacionada ao processo de inovação

no sistema econômico remete à clássica diferenciação de invenção, inovação e difusão

encontrada em Schumpeter (1997).

Para Schumpeter (1997, p. 95) a invenção corresponde ao processo de descobrir ou

criar uma coisa nova, porém esta descoberta não significa necessariamente sua aplicação

prática na economia, pois pode haver restrições de viabilidade técnica, financeira ou de gestão

empresarial. A inovação propriamente dita somente ocorre quando esta nova ideia ou uma

nova combinação de ideias já conhecidas são empregadas efetivamente no sistema econômico

(SCHUMPETER, 1997, p. 95, 215, 216). E a difusão acontece quando a inovação se propaga

pelo sistema econômico, por meio dos canais de mercado (SCHUMPETER, 1997, p. 216).

A biotecnologia opera um processo de mudança tecnológica que destrói competências

tradicionais de P&D em vários setores, como no farmacêutico (cuja base de conhecimento

tinha ênfase na química orgânica), o que provoca substancial alteração em capacidades nos

processos de invenção e desenvolvimento tecnológico (PISANO, 1990, p. 155; POWELL;

KOPUT; SMITH-DOERR, 1996, p. 118). Porém, as competências de comercialização dos

produtos novos no mercado consumidor foram em sua maior parte preservadas, pois há uma

manutenção dos instrumentos regulatórios nas indústrias e dos canais de distribuição e vendas

de produtos (PISANO, 1990, p. 155). Deste modo, a biotecnologia se caracteriza por provocar

mudanças em competências e base de conhecimento nas atividades a montante na cadeia de

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149

valor, mas há uma tendência que competências e ativos vinculados a grandes indústrias sejam

preservados a sua jusante (PISANO, 1990, p. 155).

Esta configuração é importante para compreender que, apesar da mudança de base

tecnológica ter favorecido a criação de muitas empresas novas de biotecnologia, têm sido

frequentes as alianças destas empresas entrantes com as empresas já consolidadas no mercado

que, por sua vez, possuem ativos complementares relacionados à comercialização

(ROTHAERMEL; HILL, 2005, p. 54-55; ROTHAERMEL, 2001, p. 695).

Segundo Rothaermel e Hill (2005, p. 52), uma vez que ativos complementares

especializados são necessários para comercializar produtos de uma determinada base

tecnológica, isso mantém as empresas consolidadas no mercado atrativas para formação de

parcerias dentro da indústria para processos de inovação, e assim, também as mantêm aptas a

se apropriarem de parte dos rendimentos destas inovações. Por mais que a ascensão da

biotecnologia tenha causado ruptura nas competências tecnológicas de grandes empresas,

estas ainda podem se beneficiar da biotecnologia na extensão que seu conjunto de ativos

especializados continua eficaz para criar e capturar rendimentos das inovações

(CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 22, 24).

Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 22) ressaltam, inclusive, que o grau de maior

especialização das empresas de biotecnologia dentro de nichos de pesquisa e direções

inovativas tem o efeito de reduzir o número de possíveis parceiros estratégicos destas

empresas, o que acentua o valor das grandes empresas consolidadas (com atuação mais

abrangente) ao longo da cadeia de valor.

O desenvolvimento e comercialização de novas tecnologias, como a biotecnologia,

requer a integração de diversas atividades entre os elos da cadeia de valor, sendo necessário

compreender as eventuais alterações de requisitos e consequências (ROTHAERMEL; HILL,

2005, p. 56). Uma descontinuidade tecnológica ao afetar as capacidades de empresas em

setores, e, consequentemente as condições de apropriabilidade, implica, inclusive, em

mudanças na dinâmica de distribuição dos lucros pela cadeia de valor em um processo de

inovação.

Nesta perspectiva, por um lado há extensas oportunidades de parcerias entre diferentes

perfis de empresas no desenvolvimento biotecnológico, possibilitado pela variedade

tecnológica e diversidade de estratégias e comportamentos organizacionais. Contudo, por

outro lado, deve-se atentar que, principalmente as empresas consolidadas que preservam certo

poder de barganha não estão passivas a mudança tecnológica e a perda de parte dos

rendimentos antes apropriados. Por isso, estas empresas tradicionais também estabelecem

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corridas de aprendizado nestas novas capacidades e projetos de desenvolvimento tecnológico

com equipes internas (PISANO, 1990). Portanto, questões de apropriação devem influenciar a

busca de capacidades tecnológicas e moldar as escolhas de formas de governança em que

cada processo de inovação se desenvolverá.

4.4 GESTÃO DE PROCESSOS DE APROPRIABILIDADE EM REDES DE INOVAÇÃO

A interdependência de recursos, os constantes transbordamentos de conhecimentos e

demandas de capacidades relacionais específicas são fatores que tornam as condições de

apropriabilidade mais complexas em redes de interorganizacionais. Neste contexto de

organização em redes, além dos blocos de constructos reconhecidos como conceitos

relevantes como o paradigma tecnológico, o regime de apropriação e as capacidades das

organizações envolvidas, a própria dinâmica das relações interorganizacionais afeta a forma

como o processo de inovação é conduzido e, assim a criação de valor e a captação dos

resultados gerados, seja entre as organizações da rede, seja entre estas e os demais atores da

cadeia de valor.

Com foco nas relações interativas entre as organizações que compõe uma rede de

inovação, Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661) propõe um quadro de análise que enfatiza a noção

dos processos internos na rede, particularmente sobre a mobilidade de conhecimento, a

apropriabilidade da inovação e a estabilidade da rede. Os autores defendem a necessidade de

se orquestrar os recursos e conhecimentos dos diversos membros da rede de modo a alavancar

os resultados a serem atingidos.

A orquestração de uma rede de inovação contempla um conjunto de ações deliberadas

desenvolvidas por uma empresa com posição central na rede para criar e captar valor

(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 659). Um ponto a ressaltar neste modelo é que, em vez de

dar ênfase às variáveis de estrutura da rede (natureza de laços, densidade, centralização,...), a

atenção é sobre os processos exercidos pelos membros na rede (DHANARAJ; PARKHE,

2006, p. 661).

Segundo Parkhe, Wasserman e Ralston (2006, p. 562-563) o foco sobre processos em

estudos de redes insere implicitamente o componente “tempo” nas análises, o que permite a

visão da dinâmica de mudanças, em uma construção de ordem causal dos eventos em

evidência. Os autores apontam que esta abordagem pode proporcionar perspectivas

evolucionárias ao buscar entender a formação, manutenção e dissolução de redes, no âmbito

de conceitos de variações e seleção, desenvolvimento e cumulatividade.

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Cabe ressaltar também que Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 660) sustentam a necessidade

de reconhecer que redes interorganizacionais são intrinsecamente compostas por organizações

individuais, portanto o desenvolvimento de estudos sobre estas redes devem buscar abranger

esta dualidade ator-estrutura, ou seja, os efeitos das interações entre constructos ao nível da

rede e dos atores individuais.

Como indicado, Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 663) definem três processos de análise. O

primeiro é o processo de gestão da mobilidade do conhecimento que se refere às funções de

identificação, socialização e absorção de conhecimentos necessários ao processo de inovação

entre os membros da rede. Os autores vinculam este processo a atividade de criação de valor

via inovação, e expressam que o objetivo do processo seja aumentar o compartilhamento de

conhecimento entre os membros para alavancar as competências existentes na rede

(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 662).

Neste processo percebe-se uma clara vinculação com o conceito de capacidade

absortiva, porém ao invés de relacioná-lo especificamente a uma empresa, é aplicado em

termos de promoção deliberada do aprendizado entre as organizações da rede, em especial

daqueles conhecimentos requisitos às atividades de inovação (DHANARAJ; PARKHE, 2006,

p. 662).

Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 662) também realçam a importância de processos que

reforcem a estrutura social (embeddedness) para facilitar o compartilhamento efetivo de

conhecimentos, como o fortalecimento de uma identidade comum entre os membros e o

incentivo a maior socialização entre membros para expansão do capital relacional (capacidade

relacional), como o estabelecimento de canais de comunicação formais ou informais.

O segundo processo é o de gestão da apropriabilidade na rede, que para Dhanaraj e

Parkhe (2006, p. 662-663) corresponde a atividade de assegurar uma distribuição equitativa

do valor criado e reduzir preocupações com apropriabilidade entre os membros da rede. Os

autores buscam construir um “regime de apropriabilidade” próprio no âmbito da rede baseado

nas funções sociais, como confiança, justiça procedimental e arranjos de solução de

problemas conjuntos.

O processo busca estabelecer um ambiente em que assevere que os custos e benefícios

da colaboração em rede são compartilhados justamente, e que os parceiros percebam isso. O

intuito é aumentar o comprometimento em relação aos objetivos comuns da rede a fim de

compartilhar as recompensas futuras, e assim os membros da rede tenham motivação para

compartilhar conhecimentos (afetando positivamente o processo de mobilidade de

conhecimento), além de mantê-los associados à rede, o que influência a estabilidade da rede

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(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 663). Sobre este último ponto, Hagedoorn (2006, p. 674)

corrobora que a confiança relacional enraizada nos laços interorganizacionais intervém

positivamente na estabilidade de seu relacionamento.

O terceiro processo proposto por Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 663-664) é o de gestão

da estabilidade da rede que visa a manutenção não negativa do crescimento da rede, ou seja,

de acordo com o conceito de estabilidade dinâmica se refere a manutenção do pleno

funcionamento da rede, considerando-se possíveis entradas ou saídas de membros individuais.

Este conceito de estabilidade dinâmica de redes coaduna com a abordagem evolucionária em

relação à análise de redes de relações.

Considera-se estar relacionada a este conceito a ocorrência de mudanças nas próprias

organizações membros individualmente em termos de suas estratégias, estruturas e

capacidades (NELSON, 1991, p. 67), com impactos sobre a dinâmica da rede de inovação.

Em sentido similar, Callon (2004, p. 201-203), em seu estudo sobre a concepção de rede em

projetos de desenvolvimento tecnológico, observa que cada elemento ou organização em uma

rede, contempla em si mesmo uma estrutura interna, que também está suscetível a mudanças

endógenas, e causa alterações na estrutura da rede superior.

Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 664) sugerem que os mecanismos indicados para isso

incluem o fomento a reputação da rede, a construção de perspectivas de ganhos futuros

vinculadas a comportamentos de cooperação, e a multiplicidade de diferentes relações entre

membros, com o encorajamento ao aprofundamento das relações e sua ampliação para outros

projetos (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 664). Na figura 8, trazemos um quadro síntese

com os processos e seus impactos entre si propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661):

Figura 8 - Quadro de referência sobre processos de orquestração de redes de inovação.

Fonte: Baseado em Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661).

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4.5 COMPOSTOS ANTIOXIDANTES DE AÇAÍ: PROCESSO DE INOVAÇÃO E

RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS

A rede de inovação em estudo envolveu a participação da empresa Amazon Dreams,

da Universidade Federal do Pará (UFPA), e da empresa Belaiaçá, e outras organizações

parceiras, para o desenvolvimento de uma linha de produtos de química fina baseada em ativo

da biodiversidade amazônica (açaí) com foco na produção de compostos ricos em

antioxidantes para indústrias de cosmético, de alimentos funcionais e de saúde e nutrição.

Nesta seção, inicialmente descrevemos como aconteceu o processo de

desenvolvimento dos produtos e apresentamos o desenho da rede com a configuração das

principais organizações e relações em duas etapas, a invenção e a inovação. Após esta

descrição, os resultados identificados do processo de inovação são analisados.

4.5.1 O processo de inovação e as relações interorganizacionais

A análise da rede de relações como unidade visa compreender como ocorreu a

dinâmica de relações interorganizacionais, e seus efeitos sobre o processo de inovação no que

se refere aos resultados alcançados. Desta forma, com base nas entrevistas realizadas com

representantes das três organizações, reconstitui-se um historio sobre a formação e

desenvolvimento da rede de relações em torno do processo de inovação, assim como o

desenho da rede, fazendo uma aproximação da estrutura na qual esta se organizou. Por fim,

faz-se um exame em termos dos processos relacionados a apropriabilidade indicados por

Dhanaraj e Parkhe (2006).

Especificamente, esse desenho da rede interorganizacional é composto por “nós”, que

representam as organizações envolvidas no processo de inovação em estudo, e por “laços”,

que representam as ligações de relacionamento entre as diferentes organizações identificadas,

sendo que estas ligações são oriundas de vínculos formais ou informais (POWELL;

GRODAL, 2005, p. 65-72). Cabe ainda ressaltar que, como se trabalha com conceito de

estabilidade dinâmica de redes, observa-se que no decorrer do tempo, conforme a etapa de

processo de inovação, há alterações de alguns membros e mudanças de relações.

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- A invenção:

Esta fase representa o período de concepção inicial do negócio e desenvolvimento de

solução tecnológica de processamento do fruto açaí para a produção de compostos ativos

antioxidantes, e tem sua concretização na submissão de pedido de patente junto ao Instituto

Nacional de Propriedade Industrial (INPI).

Esta primeira etapa caracterizou-se preponderantemente como cooperação para

Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) entre a UFPA e a AD, com aporte de subsídios públicos.

Esta parceria esteve baseada, principalmente, no compartilhamento de conhecimentos

técnicos e científicos e apresentou uma dinâmica reciprocamente interdependente como

sugerido por Gulati e Singh (1998), pois os parceiros precisaram de contínuos inputs e

desenvolveram capacidades em conjunto durante o processo de desenvolvimento científico e

tecnológico que levou cinco anos para ser concluído (de 2006 a 2010).

A UFPA exerceu atividades vinculadas ao compartilhamento de conhecimentos

científicos e serviços especializados de infraestrutura laboratorial, particularmente por meio

da unidade da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) do Instituto Tecnológico (ITEC),

além da atuação da área de Propriedade Intelectual, com assessoria jurídica sobre o processo

de patente. A Amazon Dreams exerceu funções relacionadas ao conhecimento de

desenvolvimento de escala de processamento industrial, com investimentos industriais

específicos no processo de P&D, e gastos com proteção do conhecimento (pedido de patente).

Como a Amazon Dreams foi uma spin off da UFPA, houve grande facilidade de

comunicação, acesso e confiança pré estabelecida entre os membros da empresa e da UFPA

nesta etapa de invenção, principalmente no que tange a ações de desenvolvimento

tecnológico. Os membros da Amazon Dreams detinham alto nível de formação acadêmica,

deste modo os resultados de pesquisas, informações e conhecimentos gerados na UFPA

puderam ser reconhecidos como oportunidades de desenvolvimento tecnológico para

inovação de produtos com valor econômico diferenciado. Assim, observa-se que não houve

barreira de apropriabilidade tecnológica, em virtude da trajetória dos membros da empresa

serem próximas a UFPA, tanto em termos de conexões tecnológicas como em relação a

estruturas sociais.

Neste caso, há uma superação das dificuldades mencionadas por Rapini (2007) quanto

ao pouco aproveitamento pelo setor produtivo da infraestrutura de ciência e tecnologia

nacional, o qual estaria associado a restrições de compreensão de oportunidades tecnológicas

e condições de apropriabilidade do conhecimento científico por parte da empresa e

infraestrutura analítica das universidades (RAPINI, 2007).

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155

Outra característica desta etapa, é que tanto a UFPA como a AD contam com apoio de

financiamentos públicos, no âmbito de parcerias com programas nacionais de fomento e

promoção da inovação, particularmente por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (CNPq). Segundo Dagnino (2003), a relação entre universidades e

empresas tem sido foco de muitas políticas públicas de Ciência, Tecnologia e Inovação

(CT&I) no país. Por um lado, este tipo de parceria pode ser explicado como necessário, seja

para as empresas (acesso a conhecimentos, formação de recursos humanos, compartilhamento

de custos e riscos de produtos em estágio pré competitivo), seja para as universidades

(superação de crescentes dificuldades para obtenção de recursos para pesquisa, e de interesses

de legitimação do trabalho acadêmico junto à sociedade) (DAGNINO, 2003).

Veja a seguir na Figura 9 o desenho da estrutura da rede de relações

interorganizacionais nesta fase da invenção:

Figura 9 - Rede de relações interorganizacional durante o período de invenção da linha de produtos inovadores.

Fonte: Da autora (Software Cmap Tools versão 5.03).

Legenda: ITEC – Instituto de Tecnologia; SPI – Setor de Propriedade Intelectual da Agência de Inovação

(Universitec); CNPq – RHAE - Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas.

De acordo com a estrutura apresentada, observa-se que nesta primeira etapa, a rede de

parceria se caracterizou por um relacionamento preponderante bilateral entre a AD e UFPA,

com a presença de corelações com instituições de fomente, porém estas mais restritas à

concessão de financiamento.

A organização de governança era relativamente informal, com contatos constantes

entre a equipe de desenvolvimento tecnológico da AD, com a equipe da FEA durante todo o

período. E quando da conclusão da invenção do processo tecnológico básico de produção da

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linha de produtos, houve contatos de sócios da AD com a coordenação do SPI, para a

preparação do processo de pedido de patente para o INPI, e neste período que começou a

emergir uma maior formalização das relações.

Cabe mencionar que além do registro do pedido de patentes junto ao INPI no Brasil,

posteriormente a AD também fez a solicitação de patente junto ao escritório de patentes dos

Estados Unidos da América, do Peru, da indonésia, das Filipinas e da Colômbia em 2013,

representando um gasto em torno de 60.000 mil reais entre todos os encaminhamentos

necessários. A seleção dos países para requerimento de reconhecimento da patente seguiu dois

critérios distintos, conforme informação de um dos sócios da AD: A patente requerida nos

EUA teve enfoque de proteção em termos de comercialização pelo seu mercado consumidor,

enquanto que os demais países foram escolhidos com foco na proteção em termos de

produção, em virtude de terem semelhanças climáticas que poderiam no futuro viabilizar a

produção agrícola do açaí, e então o desenvolvimento de toda uma cadeia produtiva

verticalizada.

Esta preocupação com a possibilidade de cultivo do açaí em outras áreas do planeta

corresponde a atenção a um requisito técnico do processamento industrial da linha de

produtos, pois devido o fruto açaí ser muito perecível, o alto teor de antioxidantes dos

compostos inventados somente é conseguido se o processamento for realizado em, no

máximo, 24 horas após a colheita do fruto. Esse prazo exíguo para o processamento a partir

do horário de colheita estabelece uma forte vantagem comparativa para a agroindustrial

regional, visto que outras fábricas no Brasil e no exterior hoje já processam sucos, sorvetes e

combinados a base da polpa do açaí comprada, mas não poderiam produzir os ingredientes

criados pela AD e UFPA por inviabilidade logística. No entanto, a AD concebe como possível

que a alta demanda do fruto incentive a cultura do açaí em outros países, o que extinguiria a

vantagem comparativa regional ora em vigor.

De forma resumida, a invenção desenvolvida referiu-se a solução tecnológica para

processos de extração, fracionamento e purificação do fruto açaí, para a produção em escala

industrial de três produtos: Açaí Clarificado, Açaí Puro Antioxidante e Óleo Refinado de

Açaí. Por um lado, as atividades abrangeram pesquisas relacionadas à descoberta e extração

de compostos bioativos para aplicação industrial e, por outro lado, compreendeu o

desenvolvimento de uma engenharia de processo avançada que permitisse a extração e um

alto teor de purificação dos compostos de interesse em uma escala de produção industrial.

Segundo explicado por um dos sócios da empresa, esse processo tecnológico

possibilitou a oferta de produtos com qualidade diferenciada, ao obter um teor de

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157

concentração de antioxidante acima do produto mais usado no mercado e melhor relação de

custo/benefício, o que representa o alcance de uma alta produtividade da fruta, conforme

estudos realizados pela AD com baseados nas sugestões de uso dos fabricantes dos produtos

no mercado em termos de ORAC (Oxygen Radical Absorbance Capacity), demonstrados no

na Figura 10:

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Figura 10 - Quadro comparativo entre o composto concentrado antioxidante desenvolvido pelas AD e UFPA, e demais produtos disponíveis no mercado em

termos da proporção ORAC por dólar.

Fonte: Amazon Dreams (2012).

852

306

339

3.200

+66%

5.300

2.800

1.241

2.006

1.153

ORAC / USD

180.000

O.N.E 81.900

Monavie 60.534

Genesis Today 90.000

Bossa Nova 180.540

Amazon Dreams 126.000

Zola 90.000

Sambazon Caps

30.000

Sambazon

Smoothie Pack

Bolt House Farms 138.387

90

66

64

28

35

23

198

265

120

ORAC Acumulado Mensal¹ USD / Mês

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159

A proposição de sustentabilidade desta fase de concepção de produto baseia-se em

desenvolver tecnologia que proporcione o melhor aproveitamento da matéria prima, buscando

a utilização de resíduos de cada etapa do processo produtivo para elaboração de diferentes

produtos, alcançando, também, maior eficiência dos demais meios de produção.

Adicionalmente, buscou-se também agrega valor tecnológico no produto de forma a valorizá-

lo economicamente e assim possibilitar a geração benefícios a toda a cadeia de produtiva a

montante.

Cabe examinar que neste período na rede interorganizacional, não se percebe a

atuação de uma organização focal (central) com processos estruturados no sentido daqueles

vinculados a apropriabilidade propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006). No entanto, parte

desses processos se funções são postos em práticas, seja por iniciativas de uma das partes, seja

pela própria necessidade de viabilizar o desenvolvimento inovativo que conduz a construção

de consensos para ações conjuntas dessas partes.

Deste modo, se investigou a possível ocorrência dos três processos (gestão da

mobilidade do conhecimento, gestão da apropriabilidade e gestão da estabilidade da rede),

com vistas a pesquisar seu alcance e limites nas relações interorganizacionais, e as

implicações para os resultados do processo de inovação.

Em relação a gestão da mobilidade do conhecimento, observamos que as duas

organizações possuíam capacidades absortivas para identificar, adquirir e aplicar os

conhecimentos compartilhados pela parceira que precisavam para o processo de

desenvolvimento tecnológico. Ressalta-se a importância da capacidade absortiva para a área

da biotecnologia, em que como defendem Powell, Koput e Smith-Doer (1996, p. 118) a

interação interorganizacional é relevante em virtude de demandar um conjunto de capacidades

e conhecimentos que, em geral, excedem os recursos de uma única organização. Isso,

principalmente pela diversidade de fontes de inovação necessárias, que engloba tanto aspectos

científicos sofisticados, como atributos de mercado e regulatórios, o que abre espaço para a

contribuição de diferentes perfis de organizações (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR,

1996, p. 118), neste caso específico com a interação de uma universidade (perfil com ênfase

acadêmico e científico) e uma empresa privada (perfil como foco em aplicação produtiva e

comercial).

No entanto, essa “transferência” de conhecimentos e tecnologia, e a construção de

novas combinações destes conhecimentos exige capacidades internas das organizações para

reconhecer, avaliar, selecionar, negociar, e fazer as adaptações necessárias e aplicar a

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tecnologia ao seu processo produtivo (DOSI, 1988, p. 1132; POWELL; KOPUT; SMITH-

DOERR, 1996, p. 119).

Este é um ponto importante da relação interorganizacional entre AD e UFPA, e da

composição de capacidades da AD em si. Entendemos como fundamental a AD ter

capacidade absortiva potencial (aquisição e assimilação de conhecimento) para perceber as

oportunidades tecnológicas no campo da biotecnologia aplicada à biodiversidade amazônica,

e assim desenvolver capacidade absortiva realizada com sua efetiva transformação em

conhecimento interno e aplicação em produtos para buscar obter vantagens competitivas.

Neste sentido, pode-se corroborar que as capacidades absortivas moderam o desenvolvimento

de oportunidades tecnológicas, como propõem Zahra e George (2002, p. 185)

Além da perspectiva de desenvolvimento tecnológico, observamos também

aprendizado em termos organizacionais em procedimentos administrativos e de proteção

comercial por ambas as organizações como o processo de proteção à propriedade intelectual

que também demandou um esforço de aprendizado conjunto dos atores para a elaboração

adequada do pedido de patente, se caracterizando em termos de um aprendizado learning by

doing a medida de cada organização avançava em uma proposição e um consenso precisava

ser alcançado, em um processo de interdependência entre os membros da rede para atingir a

forma final do produto e patente.

Um caráter de aprendizado do desenvolvimento da inovação em termos de interação

interorganizacional e das diferentes contribuições de cada organização é reconhecido pela

Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA):

Normalmente, a Universidade, ela tem aquilo que a gente costuma chamar de

patente “mãe”, a patente primeira, que às vezes faz um protótipo em nível de

laboratório, nem sempre, a gente não trabalha muito com escala industrial... Mas entre essa patente mãe e o mercado existe uma distância muito grande, que você tem

que ver matéria prima, ver escala, ver mercado, ver tudo isso e esse não é papel da

Universidade, esse é o papel da empresa. Agora isso depende muito da parceria, nas

primeiras parcerias que esse processo inicia e ele tem um caráter pedagógico.

(Informação verbal)24

Amato Neto e Amato (2009) indicam que outro fator chave para o intercambio de

conhecimento nas relações interorganizacionais é que se baseiam fortemente em relações

informais e interpessoais, neste sentido, a AD ao ter sido criada por um transbordamento da

UFPA colabora em estabelecer um grau de integração e múltiplas relações (profissional,

24

Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 16/01/2014.

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professor/aluno, pessoais) entre os membros da AD e da UFPA, em consonância com a

função de socialização de conhecimentos de Dhanaraj e Parkhe (2006).

De forma geral, em termos da mobilidade do conhecimento, entende-se que as

relações estabelecidas entre UFPA e AD seguem as funções defendidas por Dhanaraj e Parkhe

(2006), proporcionando o aprendizado entre as partes, e contribuíram diretamente para o

compartilhamento efetivo de conhecimento e alcance inventivo do processo tecnológico

criado.

No que tange a gestão da apropriabilidade, compreendemos que nesta fase de

invenção, uma das principais decisões quanto a apropriabilidade referiu-se especificamente a

cotitularidade da patente requisitada. O processo de negociação e elaboração do pedido de

patente foi uma construção de consenso entre as partes parceiras, sendo os percentuais

definidos de divisão de royalties em 20% à UFPA e 80% à AD. Segundo a coordenadora do

SPI se chegou a esta proporção em virtude dos investimentos da AD em ter montado uma

planta piloto de produto, e ficar responsável por todo o processo de fazer os primeiros

produtos, realizar estudos e testes mercadológicos, de acordo com as seguintes indicações:

Em relação à titularidade ela é conjunta, ela é das duas instituições. Agora royalties,

como a empresa que está estabelecendo, por exemplo, planta piloto de produto, ela

que vai fazer os primeiros produtos, ela que vai fazer os ensaios de mercado, ela que

vai fazer o estudo mercadológico, ela assumiu tudo isso... nós temos 20% e a

Amazon Dreams tem 80%. (Informação verbal)25

A divisão de royalties depende do que cada empresa investiu, cada instituição

investiu na tecnologia... Esse percentual já era utilizado dentro da instituição (80% e

20%)... isso não é regra, isso é uma das exceções que a gente trabalha, a regra normalmente é 50%-50%. (Informação verbal)26

Nesta construção de consenso houve, por um lado, dificuldades relatados no âmbito da

parceria correspondente à falta de maior experiência das partes e de parâmetros prévios

definidos por estas para processos de propriedade intelectual, além de muitas etapas

administrativas internas na UFPA, pelas quais esse tipo de processo deve que passar, o que

demandou esforço conjunto e tempo considerável para superação. Muitas vezes o processo

deve que ser chancelado por áreas internas da UFPA que não tiveram contatos prévios ao

processo, a relativa novidade do processo e a falta de interação social com estas instâncias

dificultava também seu andamento.

25 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 16/01/2014. 26 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 16/01/2014.

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162

Por outro lado, nota-se que a existência de confiança entre as partes permitiu que,

apesar das dificuldades apresentadas quanto a negociação ter sido extensa para definição de

parâmetros e atendimento de fases burocráticas de processo da Universidade, houve

substancial consenso em relação ao reconhecimento da cotitularidade e em relação aos

percentuais de royalties acordados, considerando a compreensão das contribuições de cada

organização ao processo de desenvolvimento da linha de produtos. Como pode ser visto na

fala da Coordenadora do SPI, ao informar que apesar de não ser utilizado o percentual

normalmente indicado pela Universidade de divisão de royalties, distingui as contribuições da

AD no processo que justifica seu percentual diferenciado.

Outro ponto a ressaltar é que os benefícios apropriados pelas partes relacionados ao

processo de inovação podem estar associados a outros tipos de ganhos às partes, além dos

econômicos. O caso em estudo envolveu a concepção de uma inovação com uma noção de

promoção de desenvolvimento regional por meio do conhecimento científico e tecnológico, o

qual congregou interesses acadêmicos e empresariais em torno de uma finalidade socialmente

relevante, capaz de ocasionar efeitos positivos a legitimidade social das partes.

E por fim, entendemos que em termos de gestão da estabilidade da rede, a dinâmica de

relações entre UFPA e AD foi efetiva quanto à função de ampliação de perspectivas futuras

positivas à medida que o processo de invenção alcançou resultados de alta qualidade tanto de

produtos como de processo produtivo criado, com a geração de expectativas favoráveis a

continuidade do processo de inovação. Também se registrou uma multiplicidade de relações

entre os membros das organizações, particularmente facilitada pela AD ser uma spin off da

UFPA, que fez com que a maior parte seus membros iniciais tivessem diversos vínculos com

a UFPA (docente, discente, colaboração de pesquisas anteriores, vínculos de amizades).

No entanto, a rede interorganizacional durante a invenção teve uma composição

predominante de relações bilaterais, de modo que por mais que tenham ocorridos avanços em

relação ao fortalecimento dos vínculos e compartilhamento de conhecimentos e recursos,

havia uma diversidade bem restrita de atores. Na próxima fase com a implementação da

inovação torna-se necessária uma expansão e aprofundamento das relações na rede.

- A inovação:

Conforme Barbieri (2004) estabelece, a inovação corresponde a um fato técnico,

econômico e organizacional, que envolve uma combinação de diversos meios de produção,

com vistas ao alcance de resultados específicos. O momento denominado de inovação no caso

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estudado caracteriza-se pelo conjunto de ações relacionadas à implementação produtiva e

comercial da linha de produtos criados no mercado.

Neste estágio observa-se um adensamento de relações e novos atores na rede, o que

implicou em uma demanda de estrutura de governança mais complexa. Entende-se que essa

maior heterogeneidade na rede deveu-se as exigências do processo de inovação em si, com a

aplicação do processo tecnológico em produção de escala industrial e a introdução de

produtos no mercado, havendo uma necessidade de atividades e competências mais diversas

que a fase anterior.

Neste sentido, destaca-se que, enquanto na etapa anterior de invenção o cerne das

relações era o desenvolvimento tecnológico economicamente viável dos processos e produtos,

nesta segunda etapa nota-se a emergência de uma maior atenção para coevoluções de

necessidades de inovações organizacionais, institucionais e sociais (RENNINGS, 2000) para

efetividade do modelo de negócio.

Desta forma, para a implantação dos processos de produção tecnologicamente

avançados era preciso, por exemplo, encontrar fontes de financiamento, gerar

comprometimentos na cadeia de suprimentos para o estabelecimento de determinados padrões

de desempenho, e atuar junto a clientes para persuadi-los quanto às vantagens da linha de

produtos e os valores diferenciais relacionados.

Um dos primeiros destaques de atividades na rede da etapa foi a admissão da AD no

Programa de Incubação de Empresas de Base Tecnológica (PIEBT) da Agência de Inovação

da UFPA. Assim, por parte da UFPA, além da participação preponderante das unidades da

FEA/ITEC e do SPI (que passa neste período a ser vinculado a Agência de Inovação), o

PIEBT também se torna ponto relevante de relações com a Amazon Dreams como empresa

incubada. Conforme Amato Neto e Amato (2009), uma incubadora de empresas atua como

um arranjo interorganizacional que visa prover de infraestrutura física, administrativa e

operacional empresas de pequeno porte durante seus primeiros anos de constituição. Deste

modo, observa-se uma ampliação das relações entre UFPA e AD para uma maior diversidade

de domínios de atividades que envolvem o desenvolvimento da inovação.

As primeiras ações da AD para viabilizar a produção e comercialização da linha de

produtos inovadores foi a montagem de estrutura de produção e gestão, com o aporte de

recursos do Fundo Criatec iniciativa do BNDES e BNB, indicado anteriormente no capítulo 3.

Este financiamento teve uma função de crédito importante na formação desta inovação como

base para o modelo de negócio da AD.

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164

Inicialmente, a AD buscou realizar o processo produtivo e comercial tendo como

fundamento sua própria estrutura em parceria com recursos do PIEBT. Nesta produção contou

com o fornecimento de frutos da COFRUTA (Cooperativa de Fruticultores de Abaetetuba),

localizada no município de Abaetetuba, próximo à Belém, capital do Estado do Pará. A

COFRUTA já era conhecida dos membros da AD e da UFPA (FEA), e tinha participado de

atividades de extensão da universidade.

A COFRUTA com apoio da AD alcançou a certificação orgânica dos frutos de açaí

fornecidos, o que por um lado é importante no âmbito da proposta de valor da linha de

produtos da biodiversidade amazônica da AD, e por outro lado oferece vantagem à

cooperativa pela oportunidade de vender os frutos com um preço premium devido a percepção

de acréscimo de valor pelo mercado.

Contudo, se constatou uma série de entraves neste período para a adequada realização

da inovação. As dificuldades se relacionam, por um lado, a não concessão de licenças e

certificações necessárias para exportação tanto em relação às instalações da COFRUTA e da

operação industrial da AD dentro do programa de incubação da UFPA, em relação

infraestrutura de saneamento e vigilância sanitária. Por outro lado, houve limitações na

infraestrutura interna da AD quanto à escala de produção para atendimento da demanda de

grandes lotes por clientes, que não conseguiu atender todos os pedidos que recebeu durante o

período de safra.

Cabe esclarecer que o foco principal de clientes para a linha de produtos desenvolvida

pela AD é o mercado internacional, a empresa chegou a contatar com algumas grandes

industriais nacionais, mas os retornos de clientes com interesse sobre os produtos foram

predominantemente do exterior. Conforme relatório do CGEE (2007, p. 156), as empresas

exportadoras em geral têm problemas com critérios de vigilância sanitária, em função dos

elevados custos financeiros e administrativos para se adequar às normas específicas de

manejo, armazenamento, beneficiamento, transporte e condições adequadas de

comercialização de produtos da biodiversidade, considerando as normas técnicas para o

produto e as exigências fitossanitárias e toxicológicas.

Estes obstáculos para atendimento de requisitos e volume de fabricação se relacionam

a falta de desenvolvimento na AD de capacidades de produção mais robustas, discutidas no

capítulo 3. Deste modo, apesar das capacidades tecnológicas da AD permitirem a

configuração de um processo de produção avançado para fabricação da linha de produtos, a

ausência de rotinas e estrutura de produção mais amadurecidas impedia a implementação da

inovação no mercado.

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A Amazon Dreams, como vimos no capítulo três (3) caracteriza-se como uma

indústria de pequeno porte, para a qual os investimentos necessários para atingir o

processamento de grandes lotes industriais foram considerados muito altos ao se considerar a

constituição de uma planta industrial mais robusta, bem como os acréscimos de capacidades

de operações, incluindo a coordenação de uma ampla rede de suprimentos, e o atendimento de

requisitos de certificações internacionais. Além disso, destacamos que a opção estratégica da

AD foi identificada como se especializar em um nicho de bioprospecção e desenvolvimento

tecnológico como atividades de core business, de modo que um maciço investimento neste

conjunto de atividades de produção e operações não apresentaria coerência com esta

estratégia.

Entretanto, tais capacidades de produção e operações podem ser caracterizadas como

ativos complementares, que mesmo não tendo estado na essência da inovação desenvolvida,

são indispensáveis para alcance de seu sucesso comercial no mercado, de forma que se a

empresa inovadora precisa desenvolver ou assegurar a obtenção destes ativos complementares

para que esteja em posição de se apropriar dos resultados de sua inovação (TEECE, 1986).

Diante desta situação, a AD realizou estudos para encontrar uma agroindústria já estabelecida

na região com capacidade de produção consolidada para firmar parceria.

Duas empresas foram analisadas pela AD, uma delas foi a Belaiaçá, com a qual a AD

já havia realizado uma transação comercial anteriormente. A Belaiaçá, por sua vez, também

tinha identificado na AD uma oportunidade de parceria para verticalizar sua produção e entrar

no segmento de ingredientes. Segundo o Diretor de Marketing da Belaiaçá, a AD já era

conhecida pelas agroindústrias locais, e um dos sócios, que é professor da UFPA é

considerado como referência sobre o açaí na região27

. Além disso, também receberam uma

indicação de um cliente nos Estados Unidos que estava interessado na aquisição de açaí

clarificado, recomendando o produto desenvolvido pela AD28

.

Desta forma, começou a ser negociada a parceria entre AD e Belaiaçá para

transferência de tecnologia da produção da linha de produtos de açaí por meio de um acordo

de Sociedade de Propósito Específico (SPE), que se caracterizaria como uma joint venture,

chegando aos termos finais no final de 2012.

A negociação definiu papéis e benefícios entre as organizações, em um desenho de

parceria que se caracterizou como de complementação de recursos: A Belaiaçá assumiria

todas as funções de processamento dos lotes de produção, com a gestão da rede de produtores

27 Anotação em diário de campo durante visita à Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing. 28 Anotação em diário de campo durante visita à Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing.

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166

de açaí, e de seus contatos comerciais. Enquanto que a AD seria responsável pela

coordenação da transferência tecnológica com o scale up e validação da produção para a

planta industrial da Belaiaçá, além da gestão da patente, com assistência de contatos técnicos

de requisitos e aplicações da linha de produtos junto aos clientes. Apresentamos na Figura 11

o desenho da rede de relações interorganizações acordada entre AD, UFPA e Belaiaçá para a

implementação da inovação.

Figura 11- Rede de parcerias durante a implementação do negócio (inovação).

Fonte: Da autora (Software Cmap Tools versão 5.03).

Para Gulati e Singh (1998, p. 786), nas joint venture em que há uma alocação formal

dos papeis dos parceiros, a divisão de trabalho e interações se tornam mais previsíveis e

permite que decisões conjuntas sejam mais a regra do que exceção, pois esclarecem as

fronteiras de decisão e atividades. Particularmente entre parceiros em que não há laços fortes

prévios, esta estruturação pode ajudar a estabelecer relações estáveis que possam se

desenvolver em termos de confiabilidade e reciprocidade, o que é o caso entre AD e Belaiaçá,

visto que sua relação até este ponto pode ser qualificada como de laço fraco.

Para Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 19), as joint ventures, baseadas em repartição

de ganhos (equity) com a configuração de uma terceira organização, são instrumentos para

cooperação frequentemente utilizados com a emergência da biotecnologia em indústrias,

particularmente em setores como o farmacêutico. A AD já havia passado por um processo de

equity quando de sua admissão no Fundo Criatec, mas neste caso o instrumento usado foi a

alteração da própria constituição da empresa para divisão de quotas ações com o BNDES e

BNB, o que representou um processo mais abrangente ao envolver o compartilhamento de

capital de toda uma organização.

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167

A criação da Sociedade de Propósito Específico (SPE) com a Belaiaçá representava

um acordo delimitado à linha de produtos do açaí, baseado na propriedade intelectual da AD,

em que havia o estabelecimento de uma produção mínima anual, e conforme desenho de

obrigações das partes, foi determinada a divisão dos resultados em 50% para cada uma das

partes, como indicado pelo sócio da AD: “Os 50%-50% se justifica muito na joint venture... a

gente tem o know-how... mas ele tem toda a expriência de produção em escala, contatos

comerciais”. (Informação verbal)29

No entanto, para que a AD pudesse oficialmente firmar o acordo com a Belaiaçá, era

necessário antes celebrar acordo de licenciamento para exploração da patente junto com a

UFPA, codetentora da patente. Essas negociações entre AD e UFPA foram iniciadas

formalmente a partir de 2011 para celebração de dois acordos. Um referente ao acordo de

titularidade da patente entre AD e UFPA, onde foram estabelecidos parâmetros de

propriedade intelectual entre as partes, por exemplo, de divisão de royalties advindos da

exploração da invenção.

Outro acordo correspondente ao contrato de sociedade para gestão dos ativos

tecnológicos, o qual concedeu exclusividade para AD utilizar a patente, tornando-a

responsável pela exploração econômica e gestão da patente, mediante o pagamento de 2,5%

de royalties a UFPA sobre o faturamento, sendo que se não houver produção anual, a AD

deveria pagar multa a UFPA no valor de R$10.000,00, como relata o sócio da AD: “A

negociação (de royalties) foi na base de 2,5% do faturamento, com uma subclausula que não

havendo o pagamento de R$10.000,00, esse valor de royalties deveriam ser devidos à UFPA,

ou seja, a situação atual, não houve produção, a gente tem que pagar R$10.000,00”

(Informação verbal)30

Este foi o primeiro acordo de licenciamento de tecnologia a ser firmado tanto pela AD

como pela UFPA, por esse motivo, parâmetros e espaços de governança tiveram que ser

construídos. Para a coordenadora do setor de propriedade intelectual da Universitec este é

considerado um “caso paradigmático” para a UFPA, pois apesar da universidade já ter várias

patentes, foi a primeira vez que conseguia fazer o licenciamento para exploração comercial de

uma patente e, deste modo, concluir todo um ciclo de transferência tecnológica que poderá

trazer benefícios à sociedade. A Coordenadora do SPI da UFPA expressa essa relevância do

processo nos seguintes relatos: “Não basta licenciar, você tem acompanhar para ver se dá

29

Entrevista concedida pelo Sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 30 Entrevista concedida pelo Sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.

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168

certo, até porque é o primeiro, então a gente tem tudo o interesse que dê certo... porque é um

caso paradigmático para a gente.” (Informação verbal)31

É a primeira vez que licencia patente que envolve também um professor, então é

uma coisa nova dentro da instituição, ela tem realmente um caráter pedagógico... Foi

um trabalho construído... (os principais pontos de atenção) a própria titularidade, a própria exclusividade, a própria delimitação de mercado, essas questões normais de

contrato. (Informação verbal)32

O resultado das negociações de distribuição de ganhos econômicos entre as três

organizações âncoras do processo de inovação, considerando tanto a divisão de rendimentos

da SPE entre AD e Belaiaçá, como a sobreposição do acordo de royalties entre AD e UFPA,

ficou conformada da forma exposta na Figura 12:

Figura 12 - Demonstrativo de distribuição de percentuais a serem apropriados pelas organizações

sobre o resultado da comercialização dos produtos da linha de antioxidante do açaí.

Fonte: Da autora (2014).

No entanto, um obstáculo importante durante este processo foi o tempo necessário

para conclusão de celebração destes contratos. Segundo sócio da AD, o processo inicial de

solicitação foi protocolado na UFPA em abril de 2011, e o contrato de gestão da patente foi

concluído somente no dia 28 de outubro de 2013, quando, então, a AD estaria apta a assinar o

contrato de SPE com a Belaiaçá:

31 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 6/01/2014. 32 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 6/01/2014.

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Abril 2011 foi a data que eu fui na Procuradoria (da UFPA) entregar a primeira

versão do instrumento de exploração... Fechou quando? 28 de outubro de 2013, dois

anos e meio, para a empresa tu imaginas, eu totalmente desgastado com isso... a

gente perdeu a safra de novo... Quando tava liberado, e a gente podia até que enfim

encomendar a linha para alugar que demorou duas semanas para chegar, mais duas

semanas para montar e tal já tava chegando em dezembro. (Informação verbal)33

Cabe ressaltar que, como a AD e Belaiaçá tinham chegado a um acordo informal dos

termos da SPE no final de 2012, no decorrer do ano de 2013 as organizações haviam realizado

várias atividades, inclusive com investimentos financeiros, visando a produção durante a safra

(segundo semestre). Entre estas atividades estavam tanto associadas a produção como a

comercialização.

A adaptação e validação do processo tecnológico de produção na fábrica de Castanhal

da Belaiaçá da linha de produtos, envolveu a equipe da AD na análise e desenho de infra

estrutura para uma nova escala de processo, sendo definido equipamentos a serem utilizados

da Belaiaçá, e outros usados mediante aluguel, conforme informa um sócio da AD: “A gente

alugou uma linha piloto para colocar na Belaiaçá para fazer scale up industrial de açaí nessa

safra, só de aluguel de equipamentos a gente quase chegou a R$150.000,00 entre aluguel e

deslocamento.” (Informação verbal)34

Portanto, foi feito teste de validação da produção, no qual incidiu tais custos de

aluguel, frete e montagem destes equipamentos, tendo a AD conseguido um aporte de

recursos para esse scale up via fomento do Banco da Amazônia (BASA). Sobre o desafio de

adaptação tecnológica do processo de produção, um sócio da AD relata:

Uma coisa é fazer em bancada de laboratório para publicar, que é a lógica da

unversidade, mas a lógica da empresa é uma lógica de scale up e produção

industrial, então os parâmetros não são os mesmos muitas vezes, porque tu não

podes trabalhar nas mesmas condições em bancada e em chão de fábrica, e quando a

gente saí da Amazon Dreams e vai pra Belaiaçá, em uma escala industrial, daí muda

a escala e é outra realidade... tu tens que rever os processos, pensar os processos para

aplicabilidade deles em escala industrial. (Informação verbal)35

Além dos atributos internos da planta industrial, a fabricação dos compostos da linha

de produtos em estudo também apresentava requisitos relacionados à rede de suprimentos e

matéria prima, pois para a produção dos produtos é necessário utilizar frutos do açaí com alto

teor de antocianina (componente antioxidante). Assim, foi organizado processo para que os

carregamentos de frutos ao chegarem na fábrica da Belaiaçá fossem examinados, e aqueles

33 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 34 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 35 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.

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que apresentam o teor aceitável ou acima do aceitável em antocianina seriam selecionados

para a produção dos compostos, como indicado pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá:

É um fornecimento diferenciado... no caso dos produtos da joint venture é feita uma

análise na recepção do produto do teor de antioxidante que aquele produto tem, se o

teor for aceitável, existe a classificação, existe o teor aceitável ou muito bom, e o

que a gente vai rejeitar, o rejeitado vai ser rejeitado para aquele produto, não é que

seja um produto ruim... (Informação verbal)36

Como o componente antioxidante tem alta perecibilidade, além da identificação do

nível de antocianina, também é necessário realizar um rápido processamento dos produtos de

modo a garantir o teor de antioxidante da ficha técnica dos produtos, por isso também foi

preciso um planejamento de produção em turno diferenciado: “Hoje, ele (fruto) é processado

em menos de 10 horas, e ele é processado durante a noite, a madrugada, para poder ter o

menor tempo possível entre a colheita e o processamento.” (Informação verbal)37

Segundo o Diretor de Marketing da Belaiaçá, a AD expressou interesse que os

produtores que fornecessem os frutos para a produção dos compostos tivessem uma

remuneração diferenciada, porém a Belaiaçá ainda não teria ainda condições para isso, pois

não tinha um mapeamento prévio das áreas com açaí de maior teor de antocianina, somente

descobrem quando o fruto já está na fábrica, o que tornaria difícil uma negociação

diferenciada com os produtores, conforme relato:

Os produtos da joint venture, até o sócio da AD queria que isso fosse feito

(remuneração de forma diferenciada aos fornecedores), só que a gente não

encontrou uma forma de potencializar isso, eu acredito que na próxima safra tenha, porque na verdade a gente analisava o teor de antocianina aqui na hora, não é como

esse que eu sei que dá bom rendimento, não, esse daqui é uma especificação mais

técnica, que uma análise que vai me dizer, mas esse ano a gente tem um mapa já da

região que tem, que é o melhor para isso, e acho que dá para trabalhar, mas não

acontece ainda assim. (Informação verbal)38

A comercialização dos produtos também é vista um desafio importante a ser superado,

pois o lançamento de produtos no mercado de ingrediente contempla um forte domínio

técnico em que requisitos e possibilidades de aplicações tem que ser esclarecidas, amostras

para testes nos clientes devem ser fornecidas, pois seu uso na fabricação de produtos finais ao

consumidor implica em todo um processo de P&D na indústria compradora. Assim, a AD e

Belaiaçá fizeram uma série de contatos comerciais, em que incluiu a realização de três

36 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 37 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 38 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.

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viagens ao exterior de representantes da AD e Belaiaçá para visitar clientes em potenciais e

participar de feiras internacionais, conforme indicou o Diretor de Marketing da Belaiaçá:

A gente fez uma viagem para os Estados Unidos e visitou uma lista de clientes

potenciais, alguns que já eram nossos clientes e outros clientes que poderiam ser, e a

gente foi lá e explicou qual era o produto, qual era a aplicação dele, apresentou as

vantagens, misturou ele com água, mostrou... e deixou amostras para as pessoas

testarem lá, e a gente também está participando de feiras, né, então a gente vai para

encontro internacional, ano passado (2013) nós participamos de três feiras

internacionais para mostrar esse produto. (Informação verbal)39

O Diretor de Marketing da Belaiaçá reconhece que o processo de venda desta linha de

produtos de ingredientes leva um tempo maior de maturação junto a clientes, como relata: “...

a gente entende que ele (produto) precisa de um tempo para as pessoas poderem entender,

para ele começar a ser procurado e consumido.” (Informação verbal)40

. “É um problema

porque não existia antes (produto inovador), e agora a gente tem que lançar no mercado, o

mercado tem que entender qual é o produto, pegar amostra, testar até chegar na aplicação.”

(Informação verbal)41

Apesar destas dificuldades, a AD e Belaiaçá haviam conseguido junto a um cliente

americano uma proposta de compra de quatro (4) containers de açaí clarificado para a safra de

2013. Contudo, como a assinatura e publicação do contrato de gestão de patente ocorreu

somente em outubro de 2013, quando já se aproximava o final da safra e o cliente que havia

realizado a solicitação de açaí clarificado, comprou o produto de outra agroindústria da

região, que segundo informações de sócio da AD, teria violado a patente do processo

tecnológico da AD e UFPA: “Já fomos copiados, tem duas empresas que produzem o

clarificado e tal, produto nosso que a gente sabe que é da nossa técnica pelo laudo técnico que

eu mesmo tenho do laboratório.” (Informação verbal)42

. “A gente perdeu a encomenda que

tinha tido em agosto, a gente não conseguiu cumprir, quem vendeu foi o concorrente que

copia, de Abaetetuba, vendeu esses containers de clarificado, e aí a gente não teve outra

encomenda.” (Informação verbal)43

Diante do final da safra, considerando que a produção da linha de produtos teria um

tempo útil de processamento na safra já bastante reduzido, e também com a perda do único

pedido encomendado previamente, a SPE não chegou a ser assinada entre AD e Belaiaçá na

39 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 40

Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 41 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 42 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 43 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.

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safra de 2013. No entendimento do sócio da AD foram duas as principais repercussões

negativas, a perda de credibilidade da inovação pelos processos de infração de patente e o fato

de não terem conseguido novos pedidos de clientes: “Só que o tempo foi passando, passando,

a gente perdeu muito a nossa credibilidade quanto à inovação, então porque já tinham outros

copiando a nossa patente, o que é um problema... e ao mesmo tempo a gente não conseguiu

fechar contrato comercial.” (Informação verbal)44

A AD ainda procurou acionar duas agroindústrias da região por terem produzido o

clarificado de açaí com base em questionamento de infração de patente, uma delas sendo a

que comercializou com o cliente americano que havia encomendado o pedido anteriormente

junto a Belaiaçá e AD. Foi elaborado um laudo técnico do produto e, por meio de advogada

contratada pela AD cartas de notificação extrajudicial foram encaminhadas junto ao Tribunal

de Justiça Regional de Abaetetuba e de Castanhal, para notificação das empresas via oficial de

justiça, no entanto as empresas responderam alegando que não teriam utilizado do processo

patenteado, mas sem indicar o processo pelo qual produziram, conforme relato:

A gente fez o que se chamou de notificação extrajudicial, então a nossa advogada

por R$4.500,00 reais fez duas notificações como manda fazer a lei, a lei, ou seja,

através do Tribunal Regional de Abaetetuba e Castanhal, para que um oficial de

justiça vai encaminhar a notificação lá e isso custa caro. Isso foi notificado e ambos

nos responderem: ‘Não, a gente não tá fazendo coisa de vocês’... Precisa realmente

poder demonstrar que a pessoa faz, mas como eu vou fazer?... Aí depois para poder indicar que eu seja ressarcido, mas como que eu vou pagar tudo isso hoje, se o INPI

vai levar mais 06 anos para analisar o meu pedido... (Informação verbal)45

Neste caso para dar continuidade ao requerimento a AD deveria formalizar um

processo contra as empresas na justiça. Porém, até o final deste estudo a AD não havia

continuado o procedimento, conforme sócio entrevistado da empresa, a decisão de iniciar o

processo judicial relaciona-se aos custos que a AD teria que arcar e um descrédito em termos

da eficácia e do tempo que o processo levaria para ser concluído.

A AD, como gestora da patente, considera que a demora no trâmite de análise e

aprovação de patente pelo INPI é uma fragilidade no regime de apropriabilidade, sendo

percebida como condição de insegurança quanto ao reconhecimento da propriedade industrial.

De acordo com o relato do sócio da AD, há claro descontentamento quanto ao regime de

propriedade intelectual no país:

44 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 45 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.

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Claramente devidos a esses problemas do INPI (lentidão nas respostas dos

processos de patente), e esses problemas institucionais do Brasil, políticos,

problemas de legislação e tal... sinceramente o meu olhar hoje é ir no caminho do

segredo industrial. A PI só dar dor de cabeça e custa muito... (Informação verbal)46

Como a AD não conseguiu realizar a comercialização de contratos dos produtos

desenvolvidos em 2013, e seus sócios acionistas estão inclusive negociando um novo aporte

de recursos na empresa para mantê-la em funcionamento, nesta situação de dificuldade

financeira, o sócio entrevistado expressou que considera que a alocação de recursos

financeiros na continuidade de um processo judicial sobre a infração de patente não geraria

retorno em tempo hábil à empresa. Foi ainda ressaltado por este sócio que a UFPA se

posicionou de forma a não assinar conjuntamente a notificação, justificando que a AD pelo

contrato firmado é a gestora da patente e, portanto, responsável por todas as despesas

incidentes nesta atividade. Do modo similar este sócio indica que a Belaiaçá se pronunciou no

sentido que este problema deveria ser resolvido pela AD, pois correspondia a questões da

patente que seria responsabilidade na AD nos termos do acordo negociado.

Assim, entendemos que houve um exercício de funções estritamente formais

(contratuais) sobre os mecanismos de proteção de patente, de modo que as relações sociais

estabelecidas entre os parceiros neste aspecto demonstraram-se fracas (fraca reciprocidade), e,

portanto, as habilidades da rede de relações interorganizacionais para exercer e proteger seus

direitos de propriedade intelectual tornaram-se frágeis, pois se contasse com o apoio de todos

seus membros poderiam ter melhores condições administrativas e financeiras para assegurar o

cumprimento desses direitos frente a outros atores de mercado. De forma que neste caso, a

estrutura de laços sociais não foi capaz de fortalecer o desempenho econômico dos parceiros.

A ênfase sobre a patente e seu instrumento de gestão teve como consequência que

outros meios de assegurar a apropriabilidade fossem negligenciados (como segredo industrial)

ou inviáveis de serem utilizados, como a liderança de tempo de lançamento no mercado. E,

embora tenha havido esse enfoque sobre a propriedade industrial, quando levantada a questão

de ocorrência da violação de patente, UFPA e Belaiaçá isentaram-se da participação com a

AD de um arranjo de solução conjunta ao problema.

No que tange às funções e disfunções das relações interorganizacionais desenvolvidas

nesta etapa de inovação, faremos uma análise tendo por base os três processos

interrelacionados à apropriabilidade em redes indicados por Dhanaraj e Parkhe (2006).

Quanto a gestão da mobilidade do conhecimento, entendemos que o desenvolvimento

46 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.

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tecnológico da fase de implementação se concentrou quanto aos aspectos de produção no

processo de adaptação do processo à estrutura industrial da Belaiaçá e quanto aos fatores

comerciais nos requisitos de produtos e potencialidades de aplicação para setores industriais.

No entanto, a configuração e os testes de produção na planta da Belaiaçá ficaram sob a

responsabilidade dos membros da AD, sendo indicado por ambas as organizações que houve

transbordamento mínimo de conhecimento sobre o processo para os membros da Belaiaçá, o

que entendermos ter origem tanto em questões de apropriabilidade como em termos de

capacidade absortiva.

Em relação a questões de apropriabilidade, observamos que segundo a AD houve

precauções de sigilo industrial com a equipe da Belaiaçá, visto que durante todo o processo de

validação de produção o contrato da SPE não havia sido assinado. Portanto, observamos a

interferência de fator vinculado à apropriabilidade sobre atividades de socialização e

compartilhamento de conhecimento, em que a insegurança da celebração do acordo

contratual, juntamente com a caracterização de laços sociais fracos entre os membros das duas

organizações (baixo nível de confiança), provocou um desincentivo a processos de

transferência de tecnologia.

Mas também cabe notar as deficiências da Belaiaçá em termos de capacidade

absortiva, de modo que mesmo a visualização e o acompanhamento por parte de seus

membros de todo o procedimento de montagem e validação industrial não lhe forneceu

elementos necessários ao aprendizado de processo tecnológico avançado.

Contudo, em relação às informações comerciais, identificamos maior

compartilhamento de conhecimento entre a AD e Belaiaçá, entendemos que isso aconteceu

por duas razões principais, uma associada ao fato que o conhecimento da ficha técnica do

produto para comercialização não implica em conhecimento sobre o processo de produção em

si (o produto final não possibilita aplicação de engenharia reversa, por exemplo) o que reduz

preocupações de apropriabilidade. Também notamos um maior componente de capacidade

troca de conhecimento entre as organizações, no sentido que a AD partilhava conhecimento

de características e aplicação do produto, enquanto a Belaiaçá partilhava seus contatos

comerciais.

A Belaiaçá e a UFPA mantiveram laços indiretos no período, assim seu canal de

comunicação comum era a AD. Durante esta fase de implementação da inovação, a relação da

AD e UFPA predominou questões associadas aos acordos contratuais, em que a estrutura de

governança tornou-se mais formal que na etapa anterior de ênfase no desenvolvimento

tecnológico. Observamos que nesta fase o relacionamento de membros da AD se ampliou

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para outros membros da estrutura administrativa e jurídica da UFPA, com uma tendência ao

estabelecimento de instrumentos de governança de mercado, por meio de contratos comerciais

com responsabilidade formais individualizadas entre as organizações (menor senso de

interdependência), como ressaltamos na questão da definição de procedimentos quanto à

situação de alegação de infração de patente.

No entanto, cabe indicarmos que houve continuação de relações em termos de

pesquisas científicas e tecnológicas entre os membros da FEA/UFPA e AD, mas pertinentes a

projetos de P&D de outras linhas de produtos, já não a de açaí. Assim, compreendemos que

entre AD e UFPA foi desenvolvida uma multiplicidade de relações.

No que tange a gestão da apropriabilidade da inovação, observou-se que apesar de

haver a construção de uma estrutura de processos de decisão conjunta entre UFPA e AD,

chegar a um consenso levou um prazo considerável, particularmente dentro da própria UFPA,

pois mesmo internamente entre os membros havia posicionamentos distintos. Apesar de se

reconhecer que era o primeiro caso de licenciamento que a universidade fazia, o tempo que

levou sua condução prejudicou o uso de outros mecanismos de apropriação, como o leading

timing (liderança de lançamento no mercado) e criou maior pressão sobre o segredo industrial.

De forma que como regime de apropriabilidade se mostrou fragilidade, a ênfase da

UFPA sobre o mecanismo de propriedade intelectual parece não ter direcionado o foco quanto

à eficácia de proteção ao processo de inovação específico, em vez disso abrangeu uma

discussão mais ampla de política de propriedade intelectual interna da universidade, enquanto

que a AD, como pequena empresa privada, tinha a necessidade de um procedimento mais ágil

que lhe permitisse o faturamento sobre a comercialização da primeira linha de produtos.

Assim, consideramos que o processo de celebração dos contratos de titularidade e de

gestão da patente entre UFPA e AD não teve o mesmo nível de prioridade entre certas

instâncias da UFPA (desacopladas das atividades fins de fomento à inovação) e a AD, além

de que o foco dos objetivos e expectativas entre as organizações estavam desalinhados, o que

novamente afasta comportamentos típicos de governança de redes entre seus membros

(interdependência, reciprocidade e confiança), e aproxima-se de uma estrutura de negociação

em governança de mercado (independência entre as partes, foco em aspectos formais e

objetivos prioritários distintos).

A estrutura de negociação entre AD e Belaiaçá foi mais ágil, provavelmente por serem

as duas organizações do setor privado, o que facilita um alinhamento de objetivos com foco

prioritário para a apropriação de resultados econômicos da comercialização da inovação.

Contudo, suas relações caracterizavam-se como de laços fracos, e a não assinatura do contrato

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da SPE gerou uma insegurança sobre a estrutura de papéis negociada e a efetividade da

parceria, de modo não houve desenvolvimento de maior grau de confiança, nem o

estabelecimento de um acordo definitivo de apropriabilidade entre as partes. Consideramos

que essa situação gerou efeitos negativos em relação à mobilidade de conhecimento e à

estabilidade da rede, e, inclusive, quanto um possível apoio da Belaiaçá à AD no processo

contra a infração de patentes. Entendemos que isso corrobora a função mediadora da gestão

de apropriabilidade em relação à mobilidade de conhecimento e estabilidade da rede proposta

por Dhanaraj e Parkhe (2006).

Cabe indicar que as negociações de valores percentuais se conformaram em níveis

considerados equitativos entre as partes, entende-se que dificuldades na consistência nos

processos de apropriabilidade não tiveram vínculos com a negociação de distribuição de

resultados, mas sim quanto a eficácia em si dos mecanismos selecionados e sua forma de

execução.

No que concerne a gestão da estabilidade da rede, verificamos que no início deste

período de implementação da inovação houve a construção de perspectivas futuras positivas

entre as partes, com a previsão de compartilhamento de recursos e benefícios, no entanto, ao

final deste período de estudo observamos uma retração destas perspectivas frente ao insucesso

na comercialização dos produtos durante safra de 2013.

Esta retração tem impactos diferentes nas relações entre as organizações. A UFPA e a

AD continuam com uma multiplicidade de relações entre seus membros já anteriormente

estabelecida tanto em termos de atividades (P&D, incubação de empresas, cotitularidade de

patente) quanto em termos de naturezas (profissional, pessoal, acadêmica). Assim, embora a

AD indique que outras empresas privadas (potenciais parceiras) considerem que seu vínculo

com a UFPA perturbe em certa medida sua reputação comercial, o amplo conjunto de relações

desenvolvidas entre as duas organizações tende a manter positivas as expectativas futuras. A

AD e Belaiaçá não desenvolveram relações para outros projetos ou laços de outra natureza,

não formando assim outros mecanismos pelos quais perspectivas futuras positivas pudessem

ser expandidas.

Deste modo, como sugerido por Uzzi (1997, p. 35-48) que a estrutura de relações

sociais (embeddedness) governa processos intervenientes que afetam (positivamente ou

negativamente) a ação econômica e, portanto, influenciam na qualidade das transações

econômicas, entendemos que o conjunto de relações entre os membros da UFPA e AD, apesar

de dificuldades relatadas, tende a estimular uma continuidade de ações de trocas econômicas

entre as organizações, enquanto que o não desenvolvimento de relações sociais mais

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consistentes entre AD e Belaiaçá cria um obstáculo para uma maior diversidade e

aprofundamento de relações econômicas.

4.5.2 Benefícios identificados pelos atores organizacionais da rede de inovação

interorganizacional

Diante do exposto, observamos que, embora as organizações da rede de relações em

estudo tenham realizado uma série de atividades visando criação, produção e comercialização

de uma linha de produtos inovadores a base do açaí, não houve apuração de resultados

econômicos por estes atores advindos da comercialização da inovação até o final da realização

desta pesquisa (fevereiro de 2014).

Consideramos que os dois aspectos acima ressaltados referente a ênfase no

instrumento de patente, e aos laços fracos com frágil grau de reciprocidade entre os parceiros

foram chaves para as dificuldades internas da rede interorganizacional que contribuíram para

não obtenção pela rede de sucesso em se apropriar de resultados econômicos efetivos deste

processo inovativo, os quais teriam sido capturados por concorrentes. E além de tais

dificuldades internas, devemos apontar obstáculos externos à rede interorganizacional,

particularmente no que se refere a fragilidade no regime de apropriabilidade e a falta de

convergências de políticas públicas para o apoio à inovação na cadeia produtiva.

Cabe ressaltar, que está fora do objeto de estudo desta dissertação a efetiva apuração

quanto à infração da patente, mas relata-se as informações fornecidas pelos representantes da

AD e da Propriedade Intelectual da UFPA quanto à alegada infração e procedimentos

adotados. Informa-se ainda que foi feita breve pesquisa sobre a empresa no município de

Abaetetuba que teria fornecido açaí clarificado ao cliente que havia encomendado à AD e

Belaiaçá, e verificou-se que sua trajetória na cadeia produtiva do açaí se baseia na produção, e

eventual exportação, de palmito. Do catálogo de produtos desta empresa, além do palmito, há

outros produtos em conserva como azeitonas, pequi e alcaparras, em que se percebe

similaridade tecnológica. No entanto, a comercialização de polpa de açaí e do açaí clarificado,

cuja base tecnológica é diferenciada, não consta no catálogo de produtos disponibilizado,

somente é indicada em página específica no site da empresa, como em execução a partir de

2010, sem maiores informações técnicas do produto.

Além do resultado econômico de comercialização da inovação, buscamos identificar

outras formas de benefícios com o processo de inovação e as relações interorganizacionais

desenvolvidas. A AD indicou como benefício advindo da inovação a visibilidade regional e

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nacional por meio de prêmios conquistados (os quais também envolveram aporte de recursos

das premiações). Também informa a ampliação da credibilidade junto a agências de

financiamento de pesquisa e inovação, e de capital venture, neste caso com reforço pelo

vínculo com o programa de incubação da UFPA, e fortalecimento de capacidades

tecnológicas pela experiência adquirida no processo inovativo, e pela associação da parceria

com a FEA/UFPA pelo acesso a sua base conhecimento científico e tecnológico.

De forma geral, observamos que a AD, e suas atividades inovativas, ocorrem em meio

a um cenário destacado por Pacheco (2007) de implementação de novos padrões de

financiamento à inovação, predominantemente pelo Governo Federal (CNPq, FINEP,

BNDES) e de mudança de legislação para o estímulo de variados tipos de em um arranjo

público-privado (Lei de Inovação). Ao mesmo tempo em que Cruz e Pacheco (s/d)

mencionam que instrumentos de políticas de promoção à inovação empresarial foram

formulados com base em modelos acadêmicos, o que neste caso beneficiou a AD pelo perfil

de seus sócios iniciais terem origem como pesquisadores da UFPA, o que facilita a

familiaridade com estes tipos de instrumentos.

Contudo, a AD reconhece que o vínculo com a UFPA também trouxe desafios,

particularmente devido a sua estrutura administrativa pesada e o delay entre o timing do setor

público e do setor privado, cria certo desestímulo a parcerias perante outras empresas

privadas. Essa dificuldade na relação entre agentes públicos e privados para inovação no

Brasil pode ser contextualizada em uma desarticulação histórica (PACHECO, 2007), cuja

superação implica no desenvolvimento de longo prazo de vínculos institucionais e no

estabelecimento de relações de confiança e reciprocidade.

Para a UFPA, um dos benefícios do processo de inovação também está associado a

visibilidade e reconhecimento das atividades da universidade e extensão e apoio à inovação, o

que gera legitimidade à instituição pública e alinhamento com programa e políticas públicas

no âmbito nacional. Um resumo disso pode ser notado na frase do Diretor da Agência de

Inovação em relação ao programa de incubação de empresas de base tecnológica: “O nosso

case é a Amazon Dreams, é o mais importante”.

A celebração do primeiro contrato de licenciamento de patente, apesar dos problemas

de execução, também foi considerado um processo de aprendizado e amadurecimento

institucional, o qual como mencionado anteriormente teve forte componente de um

aprendizado learning by doing e de busca de consenso em um processo de interdependência

entre os membros da rede interorganizacional.

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Outra vantagem apontada à UFPA na participação no processo inovativo e nas

relações com a AD referem-se à função pedagógica, seja como case de fomento ao

empreendedorismo para os alunos, seja pela própria interação de alunos e professores com

processos produtivos industriais como um canal privilegiado para troca de conhecimento

acadêmico e empírico, servindo de modelo para o processo de ensino-aprendizagem.

A Belaiaçá teve como prerrogativa na participação da implementação do processo de

inovação a sua inserção no mercado corporativo de ingredientes tecnológicos, e por mais que

não tenha concluído a comercialização, obteve experiência de maior interação de contatos

com clientes internacionais atuais e potenciais, com a oportunidade de amadurecer seus

conhecimentos quanto às oportunidades e limites de atuação neste segmento.

Em relação a transbordamentos à sociedade, o processo de inovação gerou uma linha

de produtos que propicia uma verticalização e agregação de valor potencialmente positiva

para a cadeia produtiva do açaí, no que tange a geração de emprego, renda e desenvolvimento

tecnológico na indústria no Estado, com uma proposta de produto alinhada a perspectiva de

uma indústria de qualidade de vida.

Em termos de sua conexão com diretrizes de desenvolvimento sustentável,

verificamos que a inovação buscou traçar uma trajetória tecnológica que rompesse com a

economia tradicional amazônica baseada na exploração primária de recursos naturais com

considerável impacto ambiental e social, por um modelo de maior agregação tecnológica que,

assim, alcance uma valorização do ativo da biodiversidade. Compreendemos este modelo no

sentido defendido por Becker (2010, p. 24) da promoção um novo modo de produzir com

foco em cadeias produtivas da biodiversidade e serviços ambientais baseado em capacidades

científicas e tecnológicas.

Deste modo, a concepção da inovação estaria orientada tanto para resultados

econômicos (baseado na competitividade dos produtos e produtividade do processo

tecnológico alcançados), mas também dirigi-se ao atendimento de critérios de sustentabilidade

ambiental (valorização de ativos da biodiversidade) e social, a medida que propícia a

possibilidade de geração de externalidades ao longo da cadeia de valor, seja a sua montante

(produtores rurais e extrativistas e fornecedores), seja a jusante junto a clientes pela

disponibilidade de produtos de melhor qualidade e um custo menor.

Contudo, tais transbordamentos como indicamos são potenciais, pois se a difusão

tecnológica ocorreu efetivamente baseada em comportamentos oportunistas e de concorrência

predatória (infração de patente) tem como consequência um desestímulo aos esforços de

inovação tecnológica mais agregada na cadeia. Além do afastamento de uma condição mais

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180

adequada à criação e adesão de mecanismos de coordenação de redes horizontais na cadeia

que gerasse eficiências coletivas aos seus membros.

Neste contexto, o próprio objetivo de proporcionar uma distribuição dos benefícios da

inovação pela cadeia de valor fica restrita à implantação de novas bases para regras de decisão

e comportamento organizacional que devem ser desenvolvidos em paralelo às transições

tecnológicas. Na linha defendida por Rennings (2000) e Vollenbroek (2002) em que

inovações tecnológicas ambientalmente sustentáveis devem ser acompanhadas de

correspondentes coevoluções sociais e institucionais mais amplas, que demandam a

convergência de políticas públicas orientadas por critérios de sustentabilidade construídos

coletivamente.

4.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS

O objetivo deste capítulo foi entender como se desenvolveu o processo de inovação da

linha de produtos de açaí na rede interorganizacional que envolveu a UFPA, a AD e a

Belaiaçá, para com foco na compreensão das relações sociais entre os atores, juntamente com

as características discutidas do contexto local e das capacidades dessas organizações, analisar

os resultados alcançados até o período de estudo e a dinâmica de apropriação de benefícios.

Analisamos o processo de inovação em duas etapas, uma chamada de invenção que

contemplou concepção inicial do modelo de negócio e o desenvolvimento tecnológico da

linha de produtos, e outra etapa denominada de inovação em si, que abrangeu a

implementação de atividades de produção em escala industrial e de comercialização. Em cada

etapa, investigamos as formas de relações entre as organizações e sua influência (negativa ou

positiva) no desenvolvimento da inovação. Além disso, foi realizada análise em termos de

gestão de processos de apropriabilidade em redes de inovação propostos por Dhanaraj e

Parkhe (2006). Ao final, fazemos uma apreciação crítica dos resultados e benefícios

identificados que foram apropriados pelos atores advindos da participação no processo de

inovação em rede.

Na fase de invenção, a rede interorganizacional teve uma conformação

predominantemente de relações diádicas entre AD e UFPA, com a presença de múltiplos

vínculos entre esses atores, uma vez que a AD foi uma spin off da Universidade.

Consideramos que o prévio estabelecimento de laços sociais fortes entre as organizações foi

fundamental para o compartilhamento de conhecimentos e recursos, e no próprio aprendizado

conjunto dos atores, que levou ao desenvolvimento tecnológico alcançado.

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Também observamos que não houve uma atuação focal (central) de uma das

organizações que tivesse deliberadamente estruturado processos de apropriabilidade no

sentido sugerido por Dhanaraj e Parkhe (2006), mas esses processos de mobilidade de

conhecimento, cuidados de apropriabilidade entre as partes e de estabilidades de relações

foram desenvolvidos, seja por iniciativas de uma das partes, seja pela própria necessidade de

construção de consenso entre os atores para o processo inovativo.

Na fase de inovação, houve um adensamento de atividades na rede interorganizacional

para atender aos requisitos do processo de inovação, com a validação do processo tecnológico

em escala industrial e a introdução de produtos no mercado, e a AD busca parceria com a

Belaiaçá, uma agroindústria de maior porte na região, para exploração econômica da patente.

No entanto, verificamos que apesar dos esforços das organizações da rede em realizar

diversas atividades e investimentos para a produção e comercialização da linha de produtos

inovadores, estas não conseguiram se apropriar de resultados econômicos gerados pela

inovação até o final do período deste estudo. Ressaltamos dois atributos para isso, por um

lado uma ênfase no instrumento de patente como mecanismo de proteção à inovação em um

regime de apropriabilidade com fragilidade, e, por outro lado, a presença de laços fracos de

reciprocidade entre os parceiros, que implicou em uma responsabilidade isolada da AD

quanto a iniciativas de proteção (restritas) aos direitos de propriedade intelectual da inovação.

De forma geral, notamos que, como propõe Uzzi (1997), houve uma forte influência

da estrutura de relações sociais (embeddedness) sobre a ação econômica dos atores da rede

organizacional, bem como, comportamentos de concorrência predatória conformam uma

estrutura social que afeta negativamente os incentivos para esforços inovativos.

Assim, por mais que tenhamos observados efeitos positivos de políticas de estímulo à

inovação no caso em estudo, como em termos de financiamento e de proporcionar condições

para arranjos entre universidade pública e empresas, os avanços tecnológicos desenvolvidos

tiveram seus potenciais resultados econômicos restringidos em relação à geração de

desenvolvimento.

Consideramos que parte relevante desta limitação deve-se a falta de convergência

desta política com foco no desenvolvimento tecnológico com programas para o

estabelecimento de mecanismos de articulação social e institucional que propiciem a criação

de relações de interdependência e confiança entre os agentes econômicos envolvidos,

particularmente quanto à definição de consensos mínimos quanto a critérios de

sustentabilidade e desenvolvimento que precisam ser construídos coletivamente para

alicerçada uma possível nova lógica produtiva baseada em ativos da biodiversidade regional.

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5 CONCLUSÃO PARA O DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE BENEFÍCIOS DA

INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL À LUZ DA INOVAÇÃO EM BIOTECNOLOGIA NA REDE

INTERORGANIZACIONAL NO PARÁ

5.1 INTRODUÇÃO

Neste capítulo, à guisa de conclusão, retoma-se o objeto central da pesquisa sobre a

apropriação de resultados de uma inovação baseada em ativos da biodiversidade na região

amazônica desenvolvida por uma rede de relações interorganizacionais. Buscamos analisar as

condições e as formas de apropriabilidade das organizações membros da rede e possíveis

transbordamentos destes para a sociedade, considerando precipuamente a influência de

diretrizes do desenvolvimento sustentável.

O objetivo deste capítulo é retornar aos principais propriedades de cada elemento de

análise (regime de apropriabilidade, trajetória tecnológica e capacidades, além das relações

interorganizacionais) e promover um debate da interação destes no delineamento dos

resultados alcançados pelos membros da rede interorganizacional, e dos efeitos observados

(ou não) de atributos socioambientais no processo de inovação.

5.2 REGIME DE APROPRIABILIDADE

No constructo do Regime de Apropriabilidade buscou-se analisar o sistema legal de

propriedade intelectual, como proteção à inovação, assim como verificar a utilização de

mecanismos de apropriação pelos atores da rede, tanto da patente, como de outros meios. De

forma sintética, no decorrer do estudo observamos evidências contidas na tabela 9.

Tabela 9 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Regime de Apropriabilidade.

Constructo Item de

análise

Síntese de evidências encontradas no caso empírico

Regime de

Apropriabilidade

Sistema de

proteção

legal à

inovação.

Demora no trâmite de análise e aprovação de patente pelo INPI, que é percebida como condição de insegurança quanto ao

reconhecimento da propriedade industrial pela gestora da patente

(AD).

Outros

mecanismos

de

apropriação

utilizados.

Não foram constatados o uso efetivo de outros mecanismos

complementares pelas organizações da rede de inovação para

garantir a apropriação, a como o isolamento do conhecimento, a liderança por tempo de lançamento (leading timing) ou a liderança

da curva de aprendizado.

Fonte: Da autora (2014).

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No regime de apropriabilidade, a demora no trâmite de análise e aprovação de patente

pelo INPI foi considerada uma fragilidade, uma vez que esta pendência na aprovação da

patente é percebida como condição de insegurança quanto ao reconhecimento da propriedade

industrial pela gestora da patente (AD). Junta com esta fragilidade, estava presente uma falta

de confiança da AD na eficácia do órgão de justiça estadual em julgar, em tempo hábil, a

acusação de infração de infração, considerando-se certo grau de dificuldade de comprovação

de direito da propriedade industrial sobre o processo tecnológico.

Nesta concepção as condições do inventor para garantir sua apropriabilidade baseada

em mecanismo de propriedade industrial tornam-se mais frágeis, no entanto, a rede

interorganizacional, particularmente UFPA e AD (cotitulares da patente) derem ênfase na

adoção da patente como principal (quase exclusivo) mecanismo de proteção à inovação.

Entendemos que esta proeminência no uso da patente como instrumento de apropriação

provavelmente ocorreu devido a sua aplicação tradicional a produtos da biotecnologia

internacionalmente, de forma que não se avalia seu uso de modo negativo, porém em um

regime de apropriabilidade com fragilidade a demanda de atenção para utilização de outros

mecanismos de apropriação, principalmente vinculados às capacidades de produção e

comercialização (inclusive relacionadas a vigilância e defesa de seus direitos de propriedade)

como sugerido por Teece (1986).

Neste contexto, a menção de infração de patente por atores da rede corrobora a

necessidade de maior diversidade de mecanismos de isolamento do conhecimento do processo

tecnológico pelos inovadores. A possibilidade de concorrência predatória na cadeia produtiva

já havia sido indicada por Costa, F (2009) em estudo anterior, o que demandaria um conjunto

de ações de apropriação articulados que alavancasse a vantagem competitiva dos inovadores,

como, por exemplo, estratégias de liderança de tempo de lançamento (leading timing) e de

aceleração da curva de aprendizado, aos quais concordamos com Dosi (1988, p. 1139) que

podem atuar como mecanismos mais efetivos para proteger a inovação de processo.

Ao considerarmos a percepção de um regime de apropriabilidade fragilizado e a não

diversificação de uso de mecanismos de apropriação representaram obstáculos para as

organizações cotitulares da patente (Amazon Dreams e UFPA), e posteriormente para a rede

como um todo, em capturar resultados econômicos sobre este direito em face a outras

organizações da cadeia produtiva. Esta situação em combinação com a configuração de

capacidades e das relações interorganizacionais entre os membros da rede (a serem analisadas

nas próximas seções) posteriormente levou a uma perda de confiança na eficácia por parte da

empresa gestora da patente.

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184

No que tange a análise da influência de aspectos vinculados pressupostos de

desenvolvimento sustentável sobre o constructo do regime de apropriabilidade, verificamos o

impacto de fatores institucionais e de mercado quanto ao incentivo à adoção de critérios e selos de

sustentabilidade por parte dos integrantes da rede. A atenção principal se referiu ao atendimento da

regulamentação de acesso ao patrimônio genético e a adesão a selos ou certificados de sustentabilidade

socioambientais. A síntese de evidências deste item está contida na tabela 10.

Tabela 10 - Evidências no estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à

sustentabilidade ao constructo Regime de Apropriabilidade.

Construto Interveniência de

aspectos vinculados

à sustentabilidade

Síntese de evidências encontradas no caso

empírico

Regime de

Apropriabilidade

Fatores institucionais e de mercado que

exercem influência

quanto a adoção de

critérios e selos de sustentabilidade.

O parâmetro de preço comercial do açaí in

natura é definido diariamente em mercados de

comercialização locais de acordo com a oferta e demanda, sendo predominantemente afetado

pela demanda para processamento de polpas

(agroindustriais e batedores locais).

No planejamento de produção da rede

interorganizacional não havia definição de pagamento de preço diferencial ou outro tipo de

benefício aos fornecedores dos frutos para

produção da linha de produtos inovadora.

Não foram identificadas políticas públicas

focadas a prover uma melhor coordenação ao

esforço de inovação entre os atores da cadeia

produtiva.

A exigência de selos e certificados de

sustentabilidade para comercialização da

inovação apresentaram foco em aspectos

ambientais com um escopo limitado (produção

orgânica), não sendo enfatizados critérios

sociais.

A obtenção destas certificações pelas

empresas (AD e Belaiaçá) ocorrem preponderantemente de forma reativa, de acordo

com a exigência de clientes no mercado

internacional. Fonte: Da autora (2014).

Quanto ao acesso a recursos da biodiversidade, a linha de produtos desenvolvida

enquadrou-se como acesso a patrimônio genético, de forma que a AD encaminhou

documentação para processo junto ao CGEN, quanto ao desenvolvimento tecnológico dos

produtos. Apesar desta obrigação legal cumprida pela organização local, percebemos que

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atualmente o acesso ao açaí, como bioativo, é feito com bastante facilidade em função do

comércio de polpas, o qual não envolve obrigações junto ao CGEN.

Consideramos que há possibilidade que estas polpas ao destinarem-se à exportação

sejam no exterior objeto de processamento industrial que caracterize acesso ao patrimônio

genético, conforme regulamentação do GCEN, mas neste caso já fora do alcance regulatório

nacional. Também há dificuldade para uma comunidade diferenciar se o açaí vendido a um

intermediador ou uma agroindústria implica ou não em acesso a patrimônio genético e,

portanto, incidiria em regras mais explícitas de repartição de benefícios.

Assim, compreendemos que o alto volume de produção do açaí, que é atípico em

relação a cadeias da biodiversidade, e a existência de preços regulados por parâmetros típicos

de mercado (oferta e demanda), independente do produto final que será produzido, conforme

relatado em entrevista pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá (capítulo 2) conforma um

ambiente institucional e de mercado de difícil aplicação (ou mesmo adequação) da

regulamentação atual de acesso a recursos da biodiversidade. Entendemos que este caso

aponta a necessidade de revisão da regulamentação atual de modo a buscar estabelecer

instrumentos institucionais que atendam com eficácia a proteção da biodiversidade (e a

repartição de seus benefícios), que considere a multiplicidade de condições de produção e

comercialização destes recursos.

Pelas diretrizes do desenvolvimento sustentável, particularmente a CDB, uma

indústria ao comercializar um produto baseado em ativo da biodiversidade com agregação

tecnológica e valorização econômica, deveria gerar uma “distribuição justa” dos benefícios da

inovação tecnológica a toda sua cadeia produtiva. Neste sentido, a comercialização de um

produto inovador baseado no açaí que alcance um valor econômico maior junto ao mercado

consumidor final deveria criar condições de viabilizar um desdobramento dessa valorização

econômica até a produção rural dos frutos.

No entanto, é necessário criar mecanismos na cadeia produtiva que permitam este tipo

de desdobramento de benefícios entre a etapa industrial e a rural. Inovações de produtos a

base do açaí concentram-se na agroindústria (em menor escala) e nas grandes industriais de

alimentos e cosméticos, as quais exercem vantagem na apropriação dos lucros destas

inovações. Na falta de mecanismos institucionais, fica a cargo destes agentes industriais o

discernimento em relação a construção de uma política interna de aquisição da matéria prima

que contemple critérios de distribuição de benefícios e incentivos a montante da cadeia

produtiva em conformidade com diretrizes da CDB.

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Os desdobramentos da etapa industrial para a produção agrícola e extrativista têm

ocorrido em termos de aumento da demanda quantitativa, o que por sua vez tem levado a

pressão nos ambientes de várzea, e as elevações de preços se fundamentado na limitação da

oferta, e não em uma maior agregação de valor ao produto.

A possibilidade de exigência de certificações de comércio justo (que não é comumente

exigido das agroindústrias) ou de certificações desenvolvidas com base em critérios de

sustentabilidade mais refinados, que possam avaliar e reconhecer os riscos da expansão de

açaizais nas áreas de várzea, em vez somente do selo de produto orgânico (mais

frequentemente requerido) poderiam ser opções de implementação institucional mais

alinhadas ao atendimento das diretrizes de desenvolvimento sustentável para a cadeia

produtiva.

No caso em estudo, se observa um domínio da agroindústria sobre a rede de

produtores rurais, assim é necessária uma reconfiguração do quadro institucional de modo a

contribuir para o desenvolvimento de inovações que incluam a concepção da provisão de

produtos e serviços ambiental e socialmente adequados. Para tanto, não é possível resolver os

obstáculos somente do ponto de vista dos elos industriais da cadeia sobre a produção rural ou

extrativista, mas é preciso fomentar o desenvolvimento de trajetória tecnológica própria

nestes elos da cadeia para que um maior equilíbrio na cadeia produtiva colabore na promoção

de um desenvolvimento sustentável. Como coloca Costa, F. (2009, p. 351), definir e

solucionar os problemas tecnológicos da produção rural a partir da perspectiva industrial pode

conduzir a um aumento da assimetria na relação agricultura-indústria, e distribuir de forma

desigual os resultados na cadeia produtiva.

Desta forma, uma valorização do produtor rural enquanto agente de realização de

inovação tecnológica e a aplicação políticas de fomento ao desenvolvimento de capacidades

na etapa rural são importantes. As políticas de inovação no campo rural na Amazônia,

particularmente junto aos produtores familiares e cooperativas, segue um modelo “ofertista”

em que prevalece a visão que as inovações devam ser produzidas nos centros de pesquisa e

disseminadas aos produtores rurais. A superação deste modelo é um desafio à trajetória

tecnológica estabelecida, e fundamental para o fortalecimento da atividade rural na região

alinhada a princípios de sustentabilidade e de promoção de inovação endógena ao setor, com

atenção a sua própria perspectiva de gargalos e oportunidades tecnológicas.

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5.3 TRAJETÓRIA TECNOLÓGICA

Na análise da trajetória tecnológica o foco da pesquisa foi o estudo em termos de

oportunidade tecnológica quanto ao desenvolvimento de produtos baseados na biotecnologia

aplicada a bioativos regionais, e na compreensão do padrão de mudança técnica vinculado à

biotecnologia. A síntese de evidências identificadas está na tabela 11.

Tabela 11 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Trajetória Tecnológica.

Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico

Trajetória

Tecnológica

Oportunidades

tecnológicas.

A linha de produtos inovadores baseado no açaí apresentou

demanda no mercado e competitividade frente a produtos

similares (qualidade e custo).

Padrão setorial

de mudança

técnica.

Apesar de individualmente as empresas apresentarem

limitações em seus perfis de mudança técnica para a

implementação da inovação biotecnológica, a atuação na rede

proposta proporcionou o compartilhamento de recursos

necessários entre os membros para realização conjunta da inovação.

Fonte: Da autora (2014).

Entendemos que o caso confirma a efetividade de oportunidade tecnológica no âmbito

da trajetória da biotecnologia especificamente relacionada a setores de cosméticos, saúde e

nutrição baseada em qualidades distintas do fruto açaí, espécie endógena do bioma

amazônico, sendo seus desdobramentos potencialmente compatíveis com diretrizes de

desenvolvimento sustentável.

Também constatamos que o desenvolvimento da oportunidade tecnológica contou com

condições favoráveis tanto de oferta tecnológica (technology push), como de incentivos de

mercado (market pull). No entanto, o alcance concreto de benefícios advindos de

transbordamentos positivos do processo inovativo à sociedade em termos de desenvolvimento

regional demandaria uma articulação social e política mais ampla do que a obtida em nível da

rede interorganizacional.

Para explorar esta oportunidade foram necessárias competências tecnológicas

complexas e esforços de desenvolvimento, o que envolveu uma instituição de C&T, com

histórico de pesquisas com o fruto do açaí e infraestrutura de pesquisa, e uma empresa que

investigasse as aplicações potenciais de mercado do produto e se dedicasse a formulação do

processo tecnológico de extração, fracionamento e purificação em escala industrial.

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Assim, do ponto de vista de oferta tecnológica (technology push) se constata que a

instituição de C&T local possuía capacidades tecnológicas na área para dar suporte ao

processo de inovação, e que a interação com o setor empresarial ocorreu por meio da criação

de uma empresa por transbordamento desta universidade. Considera-se essa situação

particular de interação entre a universidade e uma empresa que se formou por membros

(atuais ou anteriores) desta como chave neste caso para a superação da dificuldade histórica

de articulação entre empresas e instituições de CT&I, tanto em termos de constituição de

capacidade tecnológica no setor privado, como no que tange a facilitação de relações

interorganizações, que serão discutidos nos próximos tópicos.

Da perspectiva de incentivos de mercado (market pull), a indústria processadora de

ingredientes como cosméticos, alimentos, nutrição apresenta-se como um segmento

constantemente em busca de novos componentes. A demanda especificamente por açaí tem

um crescimento acentuado com seu uso em outras regiões do país e internacionalmente. Este

aumento de demanda qualificada, combinada a características de perecibilidade da fruta,

estimula a criação de agroindustriais locais, e propicia incentivos de mercado para exploração

de oportunidades tecnológicas, com vantagens comparativas locais até o momento.

Contudo, uma questão que pode ser levantada é por que esse movimento não ocorre

com maior frequência diante da oportunidade identificada, e por que não se alcança a

concretização de uma melhor distribuição na sociedade local de benefícios potencialmente a

serem gerados pela exploração destas oportunidades? Mediante o estudo deste caso

enfatizamos dois pontos importantes: a necessidade de desenvolvimento de capacidades

tecnológicas nos agentes locais (1), e a construção de convergências de políticas públicas

tecnológicas, econômicas e sociais (2).

A pequena empresa de base tecnológica (AD), por um lado, tinha capacidades

tecnológicas para desenvolver a inovação em conjunto com a UFPA, por outro lado, tinha

objetivos e atividades que a aproximavam de outras agroindustriais da cadeia do açaí. De

forma que se pode interpretar que a AD fez um papel de “ponte” ou de “tradução” entre o

conhecimento científico (UFPA) e a aplicação prática deste em escala industrial na

agroindústria regional (Belaiaçá e transbordamentos).

Esta ponte foi necessária para reduzir assimetrias entre os atores da estrutura

institucional e viabilizar os processos de inovação, pois na sua falta o conhecimento científico

e tecnológico permanece inacessível para a maioria das agroindustriais por falta de

capacidades tecnológicas internas, ao mesmo tempo em que a aplicação em escala industrial

de processos fica fora do escopo de desenvolvimento tecnológico específico da universidade,

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centrado em questões predominantemente acadêmicas. Deste modo, entendemos que as

organizações locais, sejam elas de perfil público ou privado, com função governamental, não

governamental ou empresarial precisam buscar uma maior aproximação e superação de suas

diferenças para que relações interorganizacionais possam ser bem sucedidas.

No entanto, apesar desta função de ponte da AD no caso que poderia ser vista como

estratégica para o efetivo aproveitamento das oportunidades biotecnológicas por meio de

arranjos locais, a AD também apresentou limitações de atuação econômica, principalmente

associadas à apropriabilidade sobre suas inovações e capacidade de investimentos,

prejudicada pelas fragilizadas relações institucionais na cadeia produtiva com pouca ou

nenhuma coordenação entre os atores (governo, indústria, produtores rurais, instituições de

C&T). Deste modo, verificamos que a construção de convergências tecnológicas, econômicas,

sociais, políticas e institucionais é necessária para proporcionar que o desenvolvimento de

inovações esteja na base da competitividade e gere desenvolvimento na região.

No que tange a análise quanto à influência de diretrizes relacionadas ao

desenvolvimento sustentável nas características do constructo de trajetória tecnológica,

identificamos as evidências de forma sintética na Tabela 12.

Tabela 12 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à sustentabilidade

ao constructo Trajetória Tecnológica.

Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico

Trajetória

Tecnológica

Transição

sociotécnica com

adoção de critérios

de sustentabilidade.

A inovação foi realizada no âmbito de um modelo

de negócio com objetivo de valorização de bioativos

nativos da Amazônia, por meio da agregação tecnológica.

A inovação biotecnológica com a criação da linha

de produtos baseada em açaí alcançou um processo

com elevado aproveitamento do fruto e produtividade.

Na implementação da inovação no mercado, apesar

de alcançar valorização do produto, não houve

convergência de outras inovações sociais,

institucionais e ou mesmo econômicas nas relações

existentes na cadeia produtiva, não gerando impacto significativo em termos de dinâmica de

desenvolvimento regional.

Fonte: Da autora (2014).

A inovação biotecnológica implementada vinculou-se a uma proposta de modelo de

negócio que visava à valorização de ativos da biodiversidade amazônica, o que identificamos

como em consonância com diretrizes da CDB ao buscar agregar maior valor econômico ao

ativo, o que pode potencialmente criar melhores condições para sua conservação. Além disso,

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os produtos criados apresentarem desempenho tecnológico competitivo no mercado em

comparação com produtos similares existentes, o que pode contribuir para uma transição

tecnológica no uso econômico desses ativos e nas relações sociais na cadeia produtiva.

No entanto, corroboramos com Lall (1992, p. 171-172) que as políticas

governamentais possuem um papel central no incentivo e suporte ao esforço de mudança

tecnológica em países em desenvolvimento, inclusive por meio do estabelecimento e

alinhamento de políticas públicas para a coevolução de mudanças econômicas, sociais e

institucionais que propiciem um significativo impacto na dinâmica de desenvolvimento

regional.

Identificamos no caso pesquisado fomento à inovação tecnológica por meio

principalmente de políticas de financiamento e incentivo de interação da universidade com

atores produtivos. A AD teve acesso a linhas de créditos características de apoio a inovação

do Governo Federal, seja por meio de capital venture (Fundo Criatec), seja por

financiamentos à pesquisa em empresa (CNPq, FINEP, etc). Estas linhas são importantes

principalmente em razão do período pré-competitivo de desenvolvimento tecnológico de

produtos inovadores que tem impacto considerável sobre as finanças de empresas menores,

sem acumulação de capital próprio para investimentos. Porém, cabe observar que tais linhas

também são muito específicas ao perfil de empresa de base científica, e de difícil ao ingresso

a organizações industriais regionais da Amazônia, cujo padrão setorial de mudança técnica é

predominantemente dominado por fornecedores, tendo como o exemplo desta dificuldade no

próprio Fundo Criatec, na qual somente uma empresa era da região Norte (AD).

Outro ponto é que, embora tenha ocorrido o apoio financeiro destes programas, estes

investimentos não foram coordenados com outras ações governamentais complementares,

como incentivos estaduais ou municipais, ou a implementação políticas industriais e de

desenvolvimento regional específicas, inclusive quanto a critérios de sustentabilidades, os

quais são atualmente uma pressão institucional associada a clientes internacionais, e de

escopo restrito (produção orgânica), como indicamos na seção anterior.

5.4 CAPACIDADES

A configuração da rede interorganizacional contempla a formação de um arranjo

inovativo com capacidades necessárias de produção e tecnológicas, que as organizações

individualmente que a compõem não teriam condições de congregar. A trajetória da

biotecnologia é vinculada ao padrão de mudança técnica de base científica, cujas empresas em

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191

geral apresentam conexões com instituições de C&T, o que é efetivamente encontrado no

caso em análise na relação entre AD e UFPA.

Contudo, neste padrão de base científica as organizações típicas seriam de grande

porte, de modo que teriam capacidades tecnológicas e de produção desenvolvidas. Em nossa

análise, consideramos a AD com perfil de base científica por suas características específicas

de desenvolvimento de tecnológico de produtos, mas por ser uma empresa de tamanho

pequeno, apresenta limitações em termos de capacidade de produção e investimentos. Esta

limitação de capacidades fez com que a AD buscasse parcerias para ter acesso aos ativos

complementares que viabilizariam a produção da linha de produtos inovadores e a captura de

partes de seus lucros, resultando em negociações com a Belaiaçá. Neste tipo de cenário,

concordamos com o exposto por Teece (2006, p. 1145) em reconhecer a dificuldade para

pequenas empresas obterem lucros com uma inovação se estiverem em regimes de

propriedade intelectual fragilizado e sem ativos complementares, pois possuirão um conjunto

restrito de alternativas de ação para proteger suas inovações.

A criação da linha de produtos inovadores foi bem sucedida (competitividade em

termos de custo e benefício, e existência de demanda de mercado), e as organizações por meio

da rede de relações reuniram condições em termos de capacidade de produção da linha de

produtos novos. Contudo, observamos limitações relacionadas a capacidades de

comercialização e de proteção da inovação que se caracterizaram como obstáculo à efetiva

exploração econômica da inovação, que foi exercida por outra organização fora do escopo da

rede de relações.

Esta limitação na capacidade de comercialização se refere tanto a comercialização da

tecnologia desenvolvida (patente), quanto da linha de produtos em si dos membros da rede. A

dificuldade de comercialização da tecnologia refere-se a demora na construção de consenso e

definição dos termos dos acordos contratuais entre AD e UFPA, o que demorou longo período

e levou a não assinatura do acordo entre AD e Belaiaçá para a safra 2013, o que prejudicou o

início efetivo da operação da joint venture.

Também consideramos que a rede não conseguiu desenvolver capacidades para fazer

cumprir seus direitos de propriedade intelectual, o que criou prejuízos de expropriação dos

esforços de desenvolvimento tecnológico. Como indicado anteriormente, houve uma ênfase

na adoção da patente como mecanismo de proteção da inovação, sem exercer outros

mecanismos de proteção frente a possibilidade de concorrência predatória na cadeia

produtiva.

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Identificamos ainda restrições na capacidade da AD e Belaiaçá para comercialização dos

produtos inovadores por meio da entrada no mercado de ingredientes, a qual é uma atividade nova

tanto para a AD (primeira linha de produtos), como para a Belaiaçá (nova no segmento). A

comercialização de ingredientes para a indústria de grande porte internacional exige abordagens e

timing diferenciados junto aos clientes corporativos, com maior demanda de informações técnicas, e

acompanhamento de processos de P&D desses.

Na Tabela 13, apresentamos a síntese de evidências encontradas na pesquisa do

constructo de capacidades.

Tabela 13 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Capacidades.

Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico

Capacidades

Capacidades

tecnológicas.

A UFPA apresentou capacidade tecnológica em termos de

pessoal com conhecimento técnico científico e infraestrutura

laboratorial para bioprospecção e ensaios de bancada.

A AD apresentou capacidade tecnológica em termos de

pessoal com formação tecnológica e científica, e realização de

investimentos para desenvolvimento de processo tecnológico em

escala industrial.

A Belaiaçá não participou da etapa de desenvolvimento

tecnológico da linha de produtos, e apresentou capacidade absortiva incipiente no processo de scale up da tecnologia para

sua planta industrial.

Capacidades de

produção.

A UFPA não apresentou perfil e objetivos organizacionais

relacionados a constituição de capacidade produtiva industrial.

A AD apresentou capacidade de produção limitada pelo

pequeno porte de suas instalações e quadro de pessoal.

A Belaiaçá apresentou capacidade produtiva para elevado

volume de produção de acordo com padrões de qualidade

internacionalmente exigidos (certificados de qualidade).

Capacidades

complementares.

Além dos itens já expostos quanto à capacidade produtiva, em relação a outros tipos de capacidades complementares:

A UFPA não apresentou previamente constituída uma

estratégia para comercialização de tecnologia, sendo este caso o

primeiro contrato de exploração comercial de tecnologia realizado.

A AD não apresentou capacidade previamente constituída

tanto de comercialização de tecnologia (primeiro processo de

exploração comercial), quanto de gestão de propriedade

industrial, com fragilidade em termos de estratégias de isolamento e vigilância de uso da patente, e de assegurar o

exercício de seus direitos de propriedade judicialmente. A AD

também apresentou capacidade de comercialização da linha de produtos de ingredientes para indústria ainda em formação.

A Belaiaçá apresentou capacidade de comercialização da

linha de produtos de ingredientes para indústria ainda em

formação.

Fonte: Da autora (2014).

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Na análise da interação das capacidades entre os membros da rede, entendemos que

programas de fomento à inovação em geral possuem foco em capacidades relacionadas ao

avanço e desenvolvimento tecnológico pelas organizações, mas vemos uma lacuna destes em

termos de desenvolvimento equivalente de capacidades organizacionais especializadas em

comercialização, incluindo em múltiplos mecanismos e estratégias de proteção destas

tecnologias que complementem a propriedade industrial. Cabe destacar que Barbieri e Álvares

(2005) anteriormente já haviam expressado preocupação particular quanto a necessidade de

desenvolvimento de competências vinculadas a instrumentos de comercialização de

tecnologias.

Em relação à análise de aspectos vinculados a sustentabilidade no desenvolvimento e

configuração de capacidades as características sintetizadas na Tabela 14.

Tabela 14 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à sustentabilidade

ao constructo Capacidades.

Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso

empírico

Capacidades

Desenvolvimento

de capacidades

específicas para

atendimento a

requisitos de

sustentabilidade.

A UFPA apresenta capacidades relacionadas a

bioprospecção na busca de valorização da qualidade

de componentes originados da biodiversidade amazônica, em conformidade regulamentações

vigentes. Também desenvolve estudos para aumento

da eficiência nos processos produtivos. Apesar disso,

suas instalações na incubadora tem fragilidades para obtenção de certificações de operação.

A AD desenvolveu proativamente, em termos de

capacidades tecnológicas, habilidades relacionadas a

criação de um processo tecnológico eficiente para melhor aproveitamento dos recursos naturais.

Também desenvolveu habilidades relacionadas a

bioprospecção na busca de valorização da qualidade

de componentes originados da biodiversidade amazônica. Contudo, a AD não desenvolveu

habilidades relacionadas ao atendimento de requisitos

de sustentabilidade em termos de capacidades de produção, logística ou comercialização.

A Belaiaçá desenvolveu de forma reativa

capacidades de produção que atendem a requisitos de

sustentabilidade de escopo limitados (produção orgânica) exigidos por clientes internacionais.

Fonte: Da autora (2014).

Compreendemos que as capacidades em termos de biotecnologia que podem trazer

vantagens competitivas para a implementação de inovações e modelos de negócios

diferenciados foram desenvolvidas por UFPA e AD por meio de uma postura proativa. No

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194

entanto, o desenvolvimento de capacidades para atendimento a critérios de sustentabilidade

no que tange logística e operacionalização e comercialização apresentou-se como dificuldade

para UFPA e AD, e é em geral desenvolvida pela Belaiaçá de modo reativo.

Diante disso, observamos que há influência tanto de fatores de mercado como

institucionais atuando no ambiente que impulsiona as organizações a desenvolverem

capacidades. Todavia, estes elementos ainda apresentam uma influência limitada em relação

aos atores da rede e ao escopo de critérios socioambientais exigidos. Neste sentido,

entendemos que ainda há um impacto restrito de pressupostos de desenvolvimento sustentável

quanto à influência dos constructos contextuais na influência do direcionamento do

desenvolvimento de capacidades das organizações. Deste modo, compreendemos que seria

necessário um fortalecimento desses fatores por meio da convergência de coevoluções

econômicas e institucionais (visto anteriormente no constructo de trajetória tecnológica) para

dotar de maior o estímulo às organizações locais para um avanço mais abrangente na

configuração de capacidades para sustentabilidade.

5.5 RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS

No exame das relações interorganizacionais, observamos que a rede é pequena e seus

processos e funções interorganizacionais não se apresentam deliberadamente gerenciados por

uma única organização focal, a qual exerça influência destacada sobre os demais membros. O

perfil das organizações é diversificado e há elevada autonomia destas na condução dos

processos da rede de mobilidade do conhecimento, apropriabilidade de inovação e

estabilidade dinâmica.

O maior grau de dependência entre as organizações é evidenciado na AD, pois a rede

de relações tinha como objeto central (inovação) a sua principal fonte de renda potencial

(exploração da única linha de produtos tecnológicos já concluída pela empresa), enquanto a

UFPA (principal atividade ensino e produção científica) e a Belaiaçá (principal atividade

produção de polpas e combinados) depositaram na rede funções relevantes, porém não as

tinham como principal função ou fonte de renda dominante. Deste modo, apesar das três

organizações terem como objetivo comum o desenvolvimento da inovação na rede de

relações, a expectativa e o comprometimento quanto ao processo inovativo eram diferentes

para cada uma delas.

Nesta perspectiva de expectativas e comprometimento, também podemos concluir que

a AD, sendo uma pequena empresa, possui um volume menor de recursos (financeiro,

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pessoal, infraestrutura) frente à UFPA e Belaiaçá, e estes recursos estavam intensivamente

aplicados ao processo de inovação, de forma esta organização que apresentava maior

sensibilidade quanto ao desempenho da inovação, e, consequentemente, maior impacto face a

um possível fracasso.

Em termos de estrutura de rede, seus membros foram interligados por diferentes tipos

de laços, entre UFPA e AD havia laços fortes, com presença de confiança e multiplicidade de

tipos de relações, e entre AD e Belaiaçá eram laços fracos com tendência a tornarem-se fortes

se a parceria de produção começasse. Entretanto a não celebração da SPE e problemas de

apropriabilidade com a linha de produtos ameaçam a estabilidade de suas relações. Nesta

configuração de relações, a AD assumiu um papel de ponte, tendo relações diretas tanto com

UFPA e Belaiaçá, que possuem relações indiretas entre si.

Assim, enquanto na etapa de invenção prevaleceu uma relação diádica entre UFPA e

AD, na fase da inovação entendemos que a AD assume uma função de ponte como forma de

buscar orquestrar a rede de relações na direção de concluir o processo inovativo. A AD foi o

ator que tomou a iniciativa de procurar novos parceiros para soluções de produção e

comercialização da inovação. E posteriormente foi a organização que apresentou o maior

interesse em superar os entraves das negociações administrativas e contratuais necessárias

com cada uma das outras organizações para dar continuidade às operações de produção e

comercialização da linha de produtos inovadores. Contudo, a AD não demonstrou ter

desenvolvido processos de gestão previamente estruturados de orquestração da rede de

relações, o que pode ter contribuído para limitações no desempenho de apropriação do

resultado econômico da inovação.

Cabe indicar que não identificamos que tais entraves de articulação tenham tido

origem em disputas pela divisão dos resultados econômicos da inovação, visto que nenhuma

das partes expressou insatisfações ou mesmo empecilhos durante as negociações sobre a

distribuição de percentuais sobre os resultados. Entendemos que as barreiras ao adequado

andamento das atividades estabelecidas entre os membros tenderam a se relacionar mais a

aspectos da estrutura social na qual as organizações se inserem (divergências entre perfil e

objetivos prioritários do setor público e setor privado, e falta de laços de confiança e

reciprocidade) do que a problema em transações econômicas específicas. Assim, confirmamos

a relevância a análise das relações interorganizações no processo de inovação, considerando a

influência das relações sociais desenvolvidas sobre as transações econômicas entre os atores,

como indicado por Uzzi (1997).

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Esta limitação nas relações entre os atores na etapa de inovação impactou

particularmente a capacidade de comercialização e proteção da inovação da rede

interorganizacional. Compreendemos que a configuração das relações entre as três

organizações da rede fragilizou a capacidade destas em fazer cumprir os direitos de patentes

ao alocar toda a responsabilidade e ônus do processo de proteção da patente somente sobre a

pequena empresa, AD. E quando da identificação da suspeita de infração da patente,

entendemos que houve uma falha no estabelecimento de relações de reciprocidade entre as

organizações da rede, uma vez que uma reversão da infração de patente beneficiaria além da

AD, tanto a UFPA (com royalties a receber), quanto a Belaiaçá (maior garantia de mercado da

linha de produtos), as quais poderiam ter colaborado, seja por mecanismos jurídicos e

administrativos, seja por meio de aporte de recursos. No entanto, estas duas organizações

optaram por seguir estritamente o determinado em acordos entre as partes, reduzindo a

capacidade de ação da rede como um todo para defender à eficácia da patente.

As evidências empíricas encontradas no caso sobre o constructo de relações

interorganizacionais estão contidas na Tabela 15, seguindo os itens de análise propostos por

Dhanaraj e Parkhe (2006).

As características da estrutura das relações sociais estabelecidas foram relevantes para

definir a forma distintiva como a mobilidade de conhecimento ocorreu entre os membros. A

UFPA e AD apresentaram processos de aprendizado e de troca de conhecimentos intensos,

com destaque à alta capacidade absortiva da AD em sua relação com a UFPA. Entre a AD e a

Belaiaçá, a falta de desenvolvimento de confiança ou de uma segurança legal (contrato de

SPE), junto com uma capacidade absortiva limitada da Belaiaçá, os processos de aprendizado

e transferência de tecnologia foram restritos.

Os membros da rede não conseguiram estabelecer entre si um regime de apropriabilidade

forte, que inclusive representasse uma força interna da rede contra possíveis ameaças de

apropriabilidade do contexto maior em que atuava. Neste sentido, as condições verificadas de

apropriabilidade da inovação relacionadas à insegurança contratual e laços fracos entre AD e

Belaiaçá realmente impactaram tanto na mobilidade do conhecimento, quanto a estabilidade

da rede. Esta constatação corrobora com os efeitos de interação entre esses processos

propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006).

Compreende-se que os atores da rede não conseguiram articular e consolidar uma estrutura de

governança para resolução conjunta de problemas, que gerasse o alinhamento recíproco entre riscos e

a benefícios envolvidos no processo de inovação, e a percepção de eficiências coletivas da atuação

combinada dos membros da rede, independente das funções estritas definidas nos acordos.

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Tabela 15 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo de Relações Interorganizacionais.

Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico

Relações Inter-

organizacionais

Gestão da

mobilidade do

conhecimento.

A mobilidade de conhecimentos foi efetiva entre a AD e a

UFPA, no que tange ao desenvolvimento tecnológico, e foi estendida da linha de produtos em estudo (açaí) para outros

produtos potenciais da AD (muruci, ingá).

A mobilidade de conhecimentos entre AD e Belaiaçá foi

limitada, sem repasse deliberado de tecnologia da AD à Belaiaçá, visto que o contrato de SPE que regulamentaria

estas questões não chegou a ser assinado, e pouca capacidade

de absortiva pela Belaiaçá.

Gestão da

apropriabilidade

da inovação.

Os membros da rede não conseguiram estabelecer entre si

um regime de apropriabilidade forte, houve demora na

celebração de condições de apropriabilidade entre UFPA e

AD, e não chegou a ser formalizado o acordo entre AD e Belaiaçá, com pouco senso de reciprocidade entre os atores.

Os atores da rede conseguiram superar questões

relacionadas à repartição de possíveis benefícios do processo

do processo de inovação, mas não conseguiram acomodar o compartilhamento de riscos e investimentos, conduzindo a

um estabelecimento estrito de funções entre os membros, que

não proporcionou uma colaboração interorganizacional no caso da identificação da violação da patente.

Gestão da

estabilidade da

rede.

A relação entre AD e UFPA pode ser vista como positiva

em termos da construção de perspectivas futuras positivas,

uma vez que esses atores continuam participando do

desenvolvimento conjunto de outros produtos baseados em

diferentes bioativos regionais, que leva a uma multiplicidade de projetos com que se relacionam.

Há também a identificação de fortalecimento de

reputação da UFPA em suas atividades de extensão e apoio à

inovação, devido a premiações conquistadas pela AD; e vantagens percebidas pela AD no relacionamento com fontes

de fomento nacionais à inovação, por seu vínculo como

empresa incubada pela UFPA.

A relação entre AD e Belaiaçá não se projetou para outras

atividades além da transferência de tecnologia negociada,

mas não efetivada, e o problema da violação de patente tende

a limitar a dimensão de expectativa futura entre os atores. Fonte: Da autora (2014).

Identificamos ainda uma interação entre a configuração das capacidades e das relações sociais

dos membros da rede. Quando os atores possuíam capacidades similares em níveis elevados tendiam a

apresentar relações sociais fortalecidas, como a UFPA e AD que possuíam elevadas capacidades

tecnológicas e laços fortes, o que contribuiu para uma melhor qualidade de articulação das atividades

de desenvolvimento tecnológico. No entanto, AD e Belaiaçá possuíam capacidades incipientes para

comercialização de tecnologia/produtos tecnológicos e laços fracos, o que contribuiu para uma

fragilização de suas atividades de comercialização. Mesmo referente a interação UFPA e AD, a falta

de capacidade de comercialização tecnológica mais robusta causou efeitos negativos em suas relações

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sociais neste âmbito, inclusive sobre a percepção de reputação da AD em sua parceria com a UFPA

frente a possíveis prospecções de privados, o que nos leva a entender que a capacidade apresenta uma

influência sobre a qualidade dos laços sociais entre os atores organizacionais.

Quanto a evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à

sustentabilidade ao constructo de Relações Interorganizacionais, apresentamos uma síntese na

Tabela 16.

Tabela 16 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à sustentabilidade

ao constructo de Relações Interorganizacionais.

Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso

empírico

Relações Inter-

organizacionais

Incentivo a processos de

aprendizado e transferência de

tecnologia envolvendo

diversidade biológica.

Processo de aprendizado e transferência de

tecnologia favorável à mobilidade de conhecimento biotecnológico entre AD e UFPA,

porém o mesmo não ocorreu entre AD e Belaiaçá.

Equidade e consistência

nos processos de tomada de decisão.

A equidade de distribuição de resultados

negociada entre os membros da rede interorganizacional mostrou um ponto satisfatório

por parte dos representantes das organizações, no

entanto estes não alcançaram a construção de um processo de governança consistente para tomada

de decisão conjunta.

A valorização de produtos biotecnológicos

tende a ser absorvida de forma concentrada na

cadeia produtiva no nível da agroindústria que realizou a inovação e detém os ativos necessários

para a apropriação, ou no nível dos clientes, em

geral grandes industriais, pelo poder de barganha destes.

Fonte: Da autora (2014).

Em relação a processos de aprendizado e transferência de tecnologia, compreende-se

que a inovação teve aspectos positivos quanto à mobilidade de conhecimento biotecnológico

entre AD e UFPA, apesar de não ter ocorrido transferência similar entre AD e Belaiaçá, por

problemas relacionados a riscos quanto à apropriabilidade. Consideramos que o sucesso

comercial da linha de produtos poderia criar incentivos ao desenvolvimento de novas

inovações tanto pelos membros da rede como por outros atores do mercado, contudo a

possibilidade de ter acontecido efetivamente a violação da patente, pode refletir espaços de

comportamentos oportunistas que prejudicam a articulação na cadeia produtiva de ações

conjuntas para gerar eficiências coletivas e incentivos para esforços inovativos, que

contribuam para a instituição de uma nova lógica de desenvolvimento regional sustentável.

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5.6 A GERAÇÃO DE BENEFÍCIOS COM A INOVAÇÃO E A PERSPECTIVA DO

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

No âmbito do objeto desta pesquisa, no capítulo 4 levantamos os resultados em termos

econômicos e de benefícios não econômicos identificados com processo inovativo realizado

junto aos membros da rede. Por um lado, observamos que não houve comunicação de ganhos

econômicos relacionados à comercialização da inovação absorvidos pelas organizações da

rede, contudo entendemos que a linha de produtos inovadores em si foi implementada no

sistema econômico e teve resultados econômicos apropriados na cadeia produtiva. Também

podemos considerar que a AD obteve benefício econômico indireto com a inovação, apesar de

não vinculado a sua comercialização, mas associado a premiações recebidas cuja linha de

produtos foi relevante para seu alcance, como o Prêmio Samuel Benchimol e o Prêmio FINEP

de Inovação.

Por outro lado, verificamos outros tipos de benefícios gerados pela inovação às

organizações membros da rede, tais como reconhecimento e legitimidade, aprendizados e

evolução de capacidades, e inserção em nova atividade de interesse. Entre as organizações

analisadas, aquela que mais se destacou em identificar benefícios não econômicos foi a

UFPA. Compreendemos a universidade, ao não ter objetivos de atuação produtiva ou de

comercialização direta de produtos, teve sua expectativa na participação da rede

interorganizacional predominantemente focada em benefícios não econômicos, como

reconhecimento, aprendizado e ampliação de suas atividades de extensão e fomento à

inovação. Assim, a realização de ganhos econômicos apesar de considerada relevante pela

UFPA, não era o objetivo mais importante em seu comprometimento institucional no

processo inovativo.

Diante dos resultados apurados, entendemos que a interação dos membros da rede

estudada ao mesmo tempo em que promoveu condições suficientes para a criação e oferta

potencial de uma linha de produtos inovadores baseado em ativos da biodiversidade sob a

concepção de um modelo de inovação sustentável, não conseguiu assegurar requisitos

necessários à apropriação de resultados econômicos originados do processo de inovação,

como indicamos antes.

Ao considerarmos os constructos da pesquisa e aos resultados alcançados pela rede

interorganizacional, apresentamos uma apreciação crítica em termos da caracterização

empírica dos constructos e seu impacto nas condições de apropriabilidade da rede.

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Em termos de regime de apropriabilidade, seu impacto foi considerado negativo pelos

os membros da rede, particularmente pela gestora da patente. O sistema de proteção de

patentes foi indicado como custoso para as empresas, tanto para o registro da patente, quanto

para manter procedimentos de vigilância e de assegurar o cumprimento por outros atores de

mercado desses direitos a cargo dos titulares da patente para que seja possível obter o

benefício de eficácia de proteção. Também não foram utilizados de modo efetivo outros

mecanismos complementares para garantir a apropriação, exceto alguns cuidados com

segredo industrial na transferência de tecnologia ao parceiro (Belaiaçá), o que não evitou o

transbordamento do conhecimento tecnológico gerado, nem concedeu vantagens especiais de

comercialização aos membros da rede.

Em termos do paradigma tecnológico, as oportunidades biotecnológicas foram

visualizadas como positivas à rede interorganizacional, uma vez que o caso confirmou a

obtenção de resultados positivos quanto ao desenvolvimento de produtos competitivos no

mercado (qualidade e custo) por meio da biotecnologia aplicada aos bioativos da região.

Já em relação ao padrão setorial de mudança técnica, compreendemos uma condição

também favorável à rede, pois apesar de individualmente as empresas poderem ter limitações

em seus perfis de mudança técnica para a implementação da inovação sozinhas, a atuação na

rede proposta proporcionava o compartilhamento de recursos necessários entre os membros

para realização conjunta da inovação. As limitações referem-se especificamente à AD, por ser

uma empresa de pequeno porte como de base científica que restringia seus recursos de

produção e comercialização; e à Belaiaçá por seu conjunto de capacidades associadas ao

padrão dominado por fornecedores, apresentar-se incompatível às capacidades tecnológicas

necessárias ao tipo inovação desenvolvida em biotecnologia.

Em termos de capacidades, ao analisar inicialmente as capacidades de produção e

tecnológicas, consideramos a configuração favorável à rede interorganizacional, em razão

similar ao constructo anterior em que, embora a AD, a Belaiaçá ou a UFPA não tivessem

isoladamente as capacidades tecnológicas e de produção para a realização da inovação, o

desenvolvimento do processo inovativo em rede conformou entre os seus membros as

capacidades necessárias para a criação e operação do processo produtivo inovador.

Enquanto que em relação a capacidades complementares a situação caracterizou-se

como parcialmente favorável. Além do conhecimento tecnológico específico sobre o processo

e produtos inovadores, a inovação também demandou know-how de produção e

comercialização na cadeia de valor do açaí. A rede interorganizacional foi construída como

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um arranjo para compilar as capacidades tecnológicas e estas capacidades complementares

que estavam localizadas em diferentes atores.

No entanto, apesar de observarmos o desenvolvimento adequado das capacidades

tecnológicas (desenvolvimento do processo e produtos) e de produção (testes e validação da

produção), notamos dificuldades no processo de comercialização dos produtos inovadores. A

entrada no mercado de ingredientes é uma atividade nova tanto para a AD (primeira linha de

produtos), como para a Belaiaçá (nova no segmento), e exige abordagens e timing

diferenciados junto aos clientes corporativos.

Em termos de relações interorganizacionais, ao analisarmos os três tipos processos de

gestão entendemos que a gestão da mobilidade do conhecimento apresentou um impacto

parcialmente positivo à rede, pois por um lado a mobilidade de conhecimentos foi efetiva

entre a AD e a UFPA, no que tange ao desenvolvimento tecnológico, e foi estendida da linha

de produtos em estudo para outros produtos potenciais da AD, a qual se destaca por possuir

capacidade absortiva para identificar, assimilar e aplicar os conhecimentos provenientes da

parceria com a UFPA. Por outro lado, a mobilidade de conhecimentos entre AD e Belaiaçá foi

limitada, com incertezas quanto a condições de apropriabilidade, e pouca capacidade de

absortiva pela Belaiaçá.

Quanto à gestão da apropriação de resultados da inovação, compreendemos que este

apresentou uma condição negativa na rede interorganizacional, uma vez que seus membros

não conseguiram estabelecer entre si um regime de apropriabilidade (interno na rede) forte,

que pudesse se contrapor à fragilidade do regime de apropriabilidade do contexto institucional

(externo à rede) em que atuavam.

Apesar de considerarmos que a rede conseguiu superar questões relacionadas a

repartição de possíveis benefícios do processo de inovação, interpretamos que não conseguiu

acomodar de forma coletiva o compartilhamento de riscos e investimentos deste processo,

conduzindo a um estabelecimento estrito de funções entre os membros, que não proporcionou

uma colaboração interorganizacional mais ampla, por exemplo, no caso da identificação da

violação da patente.

Assim, entendemos que a rede de relações interorganizacional não consolidou uma

estrutura de resolução conjunta de problemas sobre a inovação, que gerasse o alinhamento

recíproco entre riscos e benefícios. Entre as empresas AD e Belaiaçá este entrave pode ser

ressaltado pela falta de formação de uma relação de confiança, pois a díade caracteriza-se

como de laço fraco.

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Finalmente, em relação à gestão da estabilidade da rede, vemos a situação como

parcialmente favorável à rede, pois a relação entre AD e UFPA pode ser vista como positiva

com a construção de perspectivas futuras, uma vez que esses atores continuam participando

do desenvolvimento conjunto de outros produtos baseados em diferentes bioativos regionais,

que leva a uma multiplicidade de projetos com que se relacionam, incluindo a interseção de

profissionais que possuem vínculos com ambas as organizações, o que reforça seus laços

organizacionais. Também identificamos um fortalecimento de reputação da UFPA em suas

atividades de extensão e apoio à inovação, devido a premiações conquistadas pela AD, e

vantagens percebidas pela AD no relacionamento com fontes de fomento nacionais à

inovação, por seu vínculo como empresa incubada pela UFPA. Portanto, compreendemos que

esses pontos positivos superem eventuais dificuldades de timing da UFPA em procedimentos

relacionados à inovação que impactam negativamente na relação da AD junto a outras

empresas privadas.

No entanto, a relação entre AD e Belaiaçá não se projetou para outras atividades além

da transferência de tecnologia negociada, e o problema da violação de patente tende a limitar

a dimensão de expectativa futura entre estes dois atores.

Cabe também fazermos o exame desses mesmos constructos de pesquisa aplicados ao

caso em que pese a influência de diretrizes do desenvolvimento sustentável. Entendemos que

os fatores institucionais e de mercado relacionados ao acesso a recursos da biodiversidade e a

adoção de critérios e selos de sustentabilidade apresentaram baixo impacto sobre o regime de

apropriabilidade estabelecido. O açaí já possui redes convencionais de produção agrícola e

extrativista, cuja logística de distribuição se baseia na figura de intermediários ou na atuação

das próprias agroindustriais, e o parâmetro de preço comercial do fruto é predominantemente

afetado pelo mercado de processamento de polpas (agroindustriais e batedores locais), com

baixa agregação tecnológica.

Essa condição da cadeia produtiva do açaí implica em uma maior dificuldade de

proporcionar uma distribuição mais fluída (menos concentrada) dos benefícios da inovação

tecnológica a toda a cadeia produtiva. A razão é, por um lado, que o alto volume de produção

e a existência de preços já regulados por mercados não é típica em cadeias da biodiversidade,

e dificulta o controle de aplicação de regulamentos do GCEN na fase rural da cadeia, visto

que os produtores agrícolas ou extrativistas não conseguem identificar se o produto final a ser

produzido implica em acesso a patrimônio genético.

Por outro lado, o fato da produção rural ainda se destinar preponderantemente ao

processamento de polpa (com baixíssima ocorrência de inovação na agroindústria) limita a

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valorização econômica dos frutos. Produtos que apresentem inovação tecnológica na

agroindústria local são raros, o principal produto é a polpa que possui baixa diferenciação e

agregação tecnológica e, portanto, valorização econômica limitada junto ao mercado

consumidor e aos grandes clientes corporativos, o que não permite uma margem maior de

ganho nessas agroindústrias locais que pudesse gerar (potencialmente) como desdobramento

uma valorização maior da produção dos frutos.

Além disso, não há políticas públicas focadas a prover uma melhor coordenação entre

os atores da cadeia produtiva, incluindo na intervenção sobre a distribuição adequada dos

ganhos econômicos entre os elos. No caso estudado, os principais instrumentos institucionais

como selos e certificados de sustentabilidade foram aplicados pela Belaiaçá de forma reativa,

de acordo com a exigência de clientes no mercado internacional. Estas exigências focam em

aspectos ambientais com um escopo limitado, não sendo enfatizados critérios sociais, de

forma que consideramos que os critérios socioambientais não apresentam influência

substancial sobre as condições de apropriabilidade.

No que tange à adoção de critérios de sustentabilidade no âmbito da trajetória

tecnológica também compreendemos com influência limitada no caso. A inovação de

processo e da linha de produtos visou o alcance de elevado aproveitamento de recursos, com

eficiência dos recursos produtivos, além disso, a inovação foi realizada no âmbito de um

modelo de negócio que tinha como objetivo a valorização de bioativos nativos da Amazônia,

por meio da agregação tecnológica, visando geração de benefícios às cadeias produtivas

locais. Deste ponto de vista de concepção da inovação, entendemos sua aderência a diretriz de

valorização da diversidade biológica.

Contudo, na fase de implementação da inovação no mercado, apesar de haver a efetiva

valorização da linha de produtos baseada no desenvolvimento tecnológico, consideramos que

a produção e comercialização se ajustou aos parâmetros de relações de mercado existentes,

não gerando maiores mudanças em termos de dinâmica de desenvolvimento regional.

Consideramos, assim, que somente o avanço tecnológico, sem convergência de outras

inovações sociais, institucionais ou mesmo econômicas nas relações da cadeia produtiva não

são suficientes para criar impactos positivos relevantes em termos de desenvolvimento.

Em relação ao incentivo ao desenvolvimento de capacidades específicas para

atendimento a requisitos de sustentabilidade, consideramos que houve uma influência fraca

como no item anterior, pois, embora as capacidades tecnológicas tenham focado no desenho

de um processo eficiente e de valorização da qualidade de componentes originados de

bioativos, as capacidades de produção e condições comercialização atendem a requisitos

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limitados exigidos por clientes internacionais, apresentando uma postura reativa de

desenvolvimento de capacidades para inovações sustentáveis.

Em termos de relações interorganizacionais, vemos uma influência positiva de

aspectos vinculados à sustentabilidade em relação a processos de aprendizado e transferência

de tecnologia, ao compreender que a inovação apresentou intensa mobilidade de

conhecimento entre AD e UFPA sobre biotecnologia. Porém o mesmo não ocorreu entre AD e

Belaiaçá, por problemas de apropriabilidade.

O transbordamento que pode ter ocorrido na violação da patente, não consideramos

como uma transferência de tecnologia favorável ao desenvolvimento sustentável, pois pode

refletir espaços de comportamentos oportunistas que prejudicariam o estabelecimento de

relações de confiança na cadeia produtiva e a articulação de ações coletivas, além de

potencialmente desestimular esforços inovativos.

A distribuição de percentuais sobre os resultados econômicos negociada entre os

membros da rede interorganizacional mostrou ser um ponto de consenso por parte dos

representantes das organizações, as quais reconheceram uma forma de equidade perante as

contribuições de cada organização a inovação. Contudo, questionamos quanto à concretização

de uma adequada distribuição desses resultados entre todos os elos da cadeia produtiva, pois

percebemos uma tendência que o resultado da valorização de produtos biotecnológicos tenha

sua absorção concentrada na cadeia produtiva no nível da agroindústria que realizou a

inovação e detém os ativos necessários para a apropriação, ou no nível dos clientes, em geral

grandes industriais, pelo poder de barganha destes.

Diante desses pontos de análise, entendemos que o caso demonstra o efetivo alcance

de um desenvolvimento tecnológico de processo e de linha de produtos competitiva baseada

em bioativos amazônicos, com elevado grau de refinamento e concentração, amparado sobre

competências científicas da UFPA e capacidades tecnológicas da AD. Contudo, a inovação

fundamentada na biotecnologia, também demanda capacidades complementares para sua

implementação no mercado, particularmente de capacidades de produção e logística de

suprimento. De forma resolver essas exigências de capacidades complementares, a AD se

propôs a resolver por meio de nova parceria, com a Belaiaçá.

Essa solução de arranjo interorganizacional configurou-se em uma resposta para

superação das dificuldades de capacidades das organizações locais, a fim de transformar uma

oportunidade potencial em produtos concretos. Entretanto, obstáculos no nível do contexto

(regime de apropriação) e da estrutura social nas relações interorganizacionais acima

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indicados reduziram as habilidades dos atores da rede de inovação de capturarem resultados

econômicos da inovação.

Assim, se por um lado, concordamos com Costa, F. (2009, p. 351) que a realização de

projetos de inovação tecnológica, com apoio de instituições pontes de C&T (como a UFPA) é

uma perspectiva de desenvolvimento na região Amazônica que se associa a demandas de um

conjunto de indústrias locais, particularmente na cadeia produtiva estudada, a qual tende a

crescer em termos de volume econômico.

Por outro lado, falhas no ambiente institucional afetam as relações na cadeia produtiva

e entre os membros de uma rede específica, no sentido de restringir a articulação coletiva em

torno de problemas comuns, com a presença de preocupações sobre comportamentos

oportunistas relacionadas à falta de confiança nas relações. Este cenário implica em coibir

ainda mais esforços inovativos por barreiras à apropriação, em um ambiente que já é marcado

por dificuldades de desenvolvimento de capacidades tecnológicas e absortivas pelas

organizações.

Tais falhas na constituição de fatores institucionais incluem a carência de políticas

governamentais específicas que regulem (ou articulem) relações na cadeia produtiva para

direcionar a busca de competitividade por meio de esforços inovativos. Atualmente a cadeia

produtiva do açaí regional se baseia em vantagens comparativas naturais, pela disponibilidade

de cultivo dos açaizais, com baixo grau de verticalização nas agroindústrias que, em geral,

produzem polpas.

Ao contrário de outros ativos da biodiversidade em que o acesso e logística ainda

precisem ser estruturados, o açaí já possui redes de produção e distribuição agrícola e

extrativista para abastecimento de agroindustriais, apesar que o aumento da demanda tem

crescido mais que oferta. Se por um lado, esta característica é uma vantagem potencial para

uma verticalização industrial na cadeia, por outro lado, a predominância do parâmetro de

preço do fruto como matéria prima é para o mercado de polpa, com baixa agregação

tecnológica, há limitada condição de valorização econômica à produção da agricultura ou do

extrativismo.

Em relação a incentivos de mercado, consideramos que os atributos de

responsabilidade socioambientais não apresentam forte influência nas condições de

apropriabilidade no caso. Isso em função das exigências de mercado para comercialização na

cadeia serem preponderantemente focadas em aspectos ambientais, porém com um escopo

estrito quanto à produção orgânica, além de certificações específicas de qualidade de

segurança alimentar na indústria, de forma que não são enfatizados critérios sociais, como,

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por exemplo, selo de comércio justo relacionado a preocupações com a equidade na cadeia de

valor.

Assim, a emergência e desenvolvimento da biotecnologia mostrou-se uma

oportunidade para o desenvolvimento de cadeias produtivas na Amazônia, mas sua

efetividade e a adoção de critérios de sustentabilidade no processo de criação e

implementação de inovação depende não somente de avanços científicos e desenvolvimento

de capacidades tecnológicas, mas principalmente de transformações no quadro institucional

da região, com vistas a promover à realização de inovações e alterar positivamente as relações

sociais e de poder.

Neste sentido, se ressalta a relevância do papel que o apoio governamental deve

desempenhar para promover um alinhamento institucional dos atores do setor produtivo e dos

afetados por este. Como recomendação para atuação do governo neste sentido, corroboramos

com F. Costa (2009, p. 351), que indica que é preciso refletir sobre a vinculação de

instrumentos de fomento produtivo (como linhas de financiamentos ou concessão de

benefícios) ao desempenho das empresas para com indicadores de desenvolvimento,

particularmente à formação endógena de capital humano e social, além de uma postura

prudente ambientalmente.

A revisão do quadro institucional e de relações sociais deve inclusive abranger uma

discussão mais ampla sobre a efetiva aplicação de critérios de sustentabilidade, que se

mostrou com influência limitada no caso empírico. Uma inovação tecnológica por mais que

potencialmente possa gerar benefícios ao longo da cadeia produtiva não o fará se as relações

institucionais, políticas e sociais convencionais forem mantidas. Portanto, para que o avanço

tecnológico e de inovações em processos e produtos engendrem mudanças positivas na

trajetória de desenvolvimento regional, é preciso a convergência de inovações no âmbito

institucional e social, o que, no entanto, ultrapassa o âmbito de governança da rede

interorganizacional analisada.

5.7 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS

Ao analisar as condições de apropriabilidade dos resultados de uma inovação baseada

em ativo da biodiversidade por uma rede interorganizacional na Amazônia, a pesquisa buscou

explorar a convergência entre a temática de inovação e desenvolvimento sustentável. Nas

análises procuramos investigar, por um lado, à influência de diretrizes de desenvolvimento

sustentável sobre os constructos de pesquisa no caso empírico, e, por outro lado, fazer um

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exame de em que medida o resultado alcançado do processo de inovação pela rede

interorganizacional pode contribuir para a construção de uma nova lógica produtiva

(sustentável) na região.

Identificamos que diretrizes de desenvolvimento sustentável e respectivos atributos de

responsabilidade socioambientais tiveram influência limitada nas condições de

apropriabilidade dos resultados gerados pela inovação desenvolvida na rede

interorganizacional, principalmente na etapa de implementação da inovação. Essa influencia

limitada é preocupante ao demonstrar que as instituições até então estabelecidas na região,

aplicadas especificamente à cadeia de produtiva do açaí, não alcançam efetividade em termos

de estimular ou mesmo mediar a utilização de critérios de sustentabilidade em processos

inovativos que são adotados, em geral, de forma reativa e com escopo restrito.

Assim, neste caso não encontramos instrumentos institucional ou de mercado que

regule o acesso ao bioativo específico (açaí) na região, ou ainda reduza possíveis riscos de

danos ambientais ou sociais a este relacionado. Entendemos que isso se deve provavelmente

pela comercialização do açaí já ser estabelecida em maior escala, o que pode facilitar a

instalação e crescimento de agroindustriais na região pela disponibilidade de fornecimento de

volume relevante matéria prima (apesar de haver uma defasagem de oferta frente a elevada

demanda), o que é uma condição diferenciada frente a outras espécies de bioativos. Contudo,

a existência de relações convencionais já firmadas na cadeia de produtiva, requer um esforço

de mudança dessas relações e de ruptura com práticas anteriores. Mesmo no que tange a

exigências de selos e certificações ambientais são de abrangência mais limitados (produção

orgânica) e não foram identificadas demandas específicas por selos de equidade social, como

de comércio justo.

A articulação das organizações em uma rede de relações interorganizacionais foi uma

estratégia fundamental para o sucesso do processo inovativo em termos de linha de produtos

implantada, porém não foi bem sucedida em relação à comercialização da mesma. Assim,

entendemos que a efetividade de processos internos na rede de relações impactou

positivamente o resultado tecnológico e de produção alcançado, mas devido a dificuldades

quanto a questões de apropriabilidade interna e ao não estabelecimento de laços fortes entre as

empresas envolvidas, essas relações impactaram negativamente o potencial de

comercialização e de continuidade das relações.

Entre os fatores específicos vinculados a condições de apropriabilidade, observamos

que em relação a oportunidades tecnológicas, mudança técnica e capacidades de produção e

tecnológicas, a rede interorganizacional obteve condições positivas ao processo inovativo.

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Embora, devamos ressalvar que tal condição não pode ser generalizada como favorável a

todos os agentes da cadeia produtiva, pois nos referimos a uma análise específica do caso em

estudo, e não encontramos durante pesquisa empírica outros casos de desenvolvimento

tecnológico agregado na cadeia produtiva local. Deste modo, compreendemos que esse

conjunto de condições apresentou-se positivo na configuração específica alcançada na rede

interorganizacional, porém não sendo uma característica presente de forma geral na cadeia

produtiva.

Ao analisarmos as condições relacionadas ao regime de apropriabilidade (sistema de

proteção legal e outros mecanismos de apropriação) identificamos fragilidade em termos da

tempestividade de análises de patentes, e combinada a dificuldades de capacidade de

comercialização da tecnologia e da linha de produtos dos membros da rede gerou um impacto

negativo ao caso em estudo. Neste cenário, a apropriação de resultados econômicos da

inovação pelas organizações da rede interorganizacional, apesar dos esforços inovativos

realizados, não se concretizou de forma bem sucedida, e embora sejam identificados outros

benefícios (não econômicos) vinculados ao processo de inovação, entendemos que

apropriabilidade foi limitada em termos de promoção ao desenvolvimento dessas

organizações membros, particularmente às organizações empresariais envolvidas, e também

teve efeitos de transbordamentos restritos à sociedade local.

Na análise do resultado da apropriação da inovação, encontramos ressonância do caso

estudado com preceitos normativos relacionados à necessidade de coevoluções de inovações

sociais, políticas e institucionais para a implantação bem sucedida de inovações tecnológicas

orientadas para a sustentabilidade como sugerem Rennings (2000) e Vollenbroek (2002). E

também constatamos que fatores associados a estrutura de relações sociais, como confiança e

reciprocidade (e a falta destes) afetaram o direcionamento de transações econômicas dos

atores da rede interorganizacional, seja positivamente por exemplo no bem sucedido

compartilhamento de conhecimento entre UFPA e AD para desenvolvimento tecnológica, seja

negativamente, quando do isolamento da AD para resolução da questão de violação de patente

levantada.

Também ressaltamos como uma contribuição da pesquisa proporcionar o exame da

interação de constructos teóricos em múltiplos níveis de análise, de forma que podemos

observar o impacto de fragilidade no regime de apropriabilidade (nível de contexto)

relacionada com a dificuldade de obtenção de capacidades complementares de

comercialização dos produtos (nível organizacional) e afetado por características dos laços

sociais fracos (nível interorganizacional) interagiram em determinar os problemas da rede

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interorganizacional (e seus membros) do alcance de apropriação dos resultados econômicos

da inovação. Esta perspectiva multinível é relevante ao permitir identificar as implicações de

interação entre as diferentes variáveis e proporcionar uma visão mais integrada do processo de

inovação.

Cabe destacarmos que o termo inovação corresponde não somente a um resultado, mas

principalmente a um processo pela qual mudanças e adaptações ocorrem, sendo parcialmente

gerenciado, mas também parcialmente não sujeito a gerenciamento (GUPTA; TESLUK;

TAYLOR, 2007). Assim, a inovação não se encerra um produto resultante em um ponto

determinado do tempo e espaço, é um processo que pode originar transbordamentos e efeitos

(aprendizados, vivências, resultados parciais) em diferentes níveis de análises, ou seja, em

indivíduos, em organizações, em setores industriais, e em regiões (ANDERSON; DE DREU;

NIJSTAD, 2004, p. 160).

As conclusões e reflexões a que chegamos nesta dissertação sobre o processo de

inovação em estudo devem ser entendidas não como respostas definitivas ao processo de

inovação concluído, mas como contribuições para a compreensão do processo de inovação em

desenvolvimento e das relações interorganizacionais em seu entorno.

Reconhecemos que a escolha da metodologia de estudo de caso e a seleção de caso

único implica em algumas limitações a generalizações das descobertas do estudo, em virtude

da não possibilidade de análise de sua validade externa por meio de replicações.

A pesquisa teve um caráter analítico e descritivo ao buscar contribuir para a

convergência entre as temáticas de inovação e desenvolvimento sustentável, assim

procuramos compreender influências de diretrizes do desenvolvimento sustentável sobre a

forma de apropriação de resultados de uma inovação em uma rede interorganizacional. Uma

limitação identificada quanto a este escopo pesquisa foi a abrangência ampla dos constructos

teóricos, o que prejudicou melhor parcimônia na coleta e análise dos dados, no entanto

consideramos essa amplitude em parte justificada pela sua natureza de procurar sondar as

possíveis relações entre constructos econômicos tradicionais e critérios de sustentabilidade.

A condição de estudo de caso incorporado (múltiplos níveis) apresentou como

dificuldade a busca de equilíbrio de atenção nas análises entre os diferentes níveis, pois

poderíamos nos concentrar de forma excessiva em um único nível de unidade, ou mesmo ter

obstáculos a realização de uma análise integrada. Para amenizar este risco, estruturamos a

pesquisa em capítulos divididos por níveis de análise, e procuramos dedicar este último

capítulo de conclusão para uma análise conjunta dos diferentes níveis. Porém reconhecemos

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que análises mais detalhadas de capítulos específicos podem não ter recebido a devida atenção

no conjunto integrado de análise desta conclusão.

Em termos empíricos destacamos duas limitações relevantes ao estudo. A primeira

refere-se a coleta de dados por meio de entrevistas ter sido limitada no caso de AD e Belaiaçá

a somente um informante por empresa, o que pode prejudicar uma visão mais ampla das

expectativas e posições dessas empresas ao processo de inovação. A segunda limitação a ser

ressaltada corresponde à falta de dados sobre a apuração efetiva da violação da patente, pois

seria um ponto esclarecedor sobre condições de apropriabilidade no respectivo processo de

inovação. Contudo, a investigação de tal questão estava fora do escopo gerenciável do

trabalho e de suas competências puramente acadêmicas.

Como sugestões de pesquisas futuras, inicialmente propomos a realização de

investigações mais amplas sobre redes de inovação interorganizacionais em operação no Pará,

e em outros Estados da Amazônia, que possam corroborar ou questionar as constatações a que

chegamos nesta pesquisa, incluindo estudos de casos comparativos que busquem analisar os

constructos em condições distintas.

Outra proposta de pesquisa futura é o aprofundamento de estudos sobre os efeitos da

estrutura de relações sociais, como em redes interorganizacionais, no desenvolvimento de

processos de inovação, que possam conferir a oportunidade de empreender um diálogo entre

conceitos de apropriabilidade da economia da inovação e com aspectos da teoria de redes

sociais.

Neste sentido, destacamos ser propícia a realização de novos estudos de redes de

inovação sob a perspectiva de teorias de parcerias intersetoriais, em que seja possível dar

atenção as condições de conflitos e de cooperação entre organizações relacionadas entre as

próprias relações de distanciamento e aproximação entre os setores públicos e privados com

vistas a ampliação de espaços de construção de consenso social.

Por fim, sugerimos pesquisas focadas na formulação e execução de políticas públicas

de fomento à inovação na Amazônia, buscando investigar questões como o nível de

descentralização, participação e coordenação de políticas em nível Federal, Estadual e

Municipal, avaliando os impactos locais consequentes destas dinâmicas.

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221

APÊNDICE A – DESENHO TEÓRICO E METODOLOGIA DA PESQUISA

Neste apêndice, busco explicitar a construção do desenho teórico da pesquisa, com a

elucidação dos níveis de análise e seus constructos, os quais guiaram a discussão teórica e

investigação empírica contida na dissertação. Assim como, apresentar os aspectos

metodológicos de desenvolvimento da pesquisa, com a indicação das técnicas de coleta de

dados e os critérios que levaram à definição de seleção do caso para estudo, além de

limitações identificadas do método escolhido.

A.1 DESENHO TEÓRICO DA PESQUISA

O objetivo da pesquisa buscou compreender como ocorre a apropriação de resultados

de uma inovação por uma rede interorganizacional, considerando a influência de diretrizes do

desenvolvimento sustentável.

De forma geral, se esclarece que a abordagem teórica direcionadora da pesquisa teve

foco na temática de apropriação de inovação, e como o escopo da pesquisa foi delineado na

interseção entre a temática de inovação e desenvolvimento sustentável, foram também

contempladas questões relacionadas ao desenvolvimento de inovação sustentável como

intervenientes a cada nível de constructos teóricos.

A.1.1 DESENVOLVIMENTO DOS CONSTRUCTOS DE ANÁLISE

Neste tópico se descreve a seleção do conjunto de constructos teóricos ancorada na

temática de apropriabilidade de inovação, e seus respectivos itens de análise vinculados ao

encadeamento com os temas de desenvolvimento sustentável e de redes de inovação.

A.1.1.1 Apropriação da inovação

A análise da apropriação da inovação tem por base principalmente discussões

propostas por autores como Pavitt (1984), Teece (1986, 2006), Dosi (1988) e Bell e Pavitt

(1993). Teece (1986) em seu artigo “Profiting from technological innovation” (PFI) propôs

um quadro de referência sobre a análise de apropriação de inovação composto de três blocos

de constructos (anteriormente mencionados acima), discutidos em termos do objeto da

pesquisa a seguir:

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- Regime de apropriabilidade vigente: Baseia-se em fatores tecnológicos, legais,

institucionais e de mercado que influenciam o custo e tempo requerido para imitação de

inovações (CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 14; LEVIN et al, 1987, p. 784). Em

relação à análise do objeto da presente pesquisa, consideramos este constructo relevante, e se

associa a características da trajetória tecnológica e de condições de mercado e institucionais

(LEVIN et al, 1987, p. 784) no contexto em que a rede de inovação atua. Também permite a

discussão da influência em relação a critérios de sustentabilidade sobre transbordamentos da

inovação à sociedade.

- Paradigma tecnológico dominante: Em termos deste constructo, Teece (1986, p. 288)

concentra sua análise em relação ao estágio de desenvolvimento tecnológico e sua influência

nas capacidades e processos relacionados a ênfases de tipos de inovação radicais e

incrementais. Contudo, tendo como foco redes de inovação no contexto de países em

desenvolvimento, que é o caso desta pesquisa, as inovações tendem a ocorrer dentro da

fronteira tecnológica existente (paradigma dominante), e outros aspectos da trajetória

tecnológica tomam maior relevância analítica, especificamente sugere-se trabalhar o conceito

de oportunidade tecnológica e de padrão de mudança técnica.

- Ativos complementares:

O último constructo proposto por Teece (1986, p. 288) é referente aos ativos

complementares necessários para a comercialização da inovação. No entanto, como

reconhecido pelo próprio Teece (2006, p. 1136) o framework do PFI apresenta um modelo de

análise estático em termos de recursos e capacidades da empresa, e com foco em questões

relacionadas à fase de comercialização de inovações, não dando atenção a fase de invenção.

Deste modo, como a pesquisa envolveu o estudo do desenvolvimento de um processo

de inovação, desde seu início (invenção) até a comercialização, entendemos ser adequada uma

maior abrangência deste constructo do que proposto por Teece (1986), englobando não

somente a noção de ativos complementares, mas também de capacidades tecnológicas

essenciais que em si originam a inovação tecnológica (BELL; PAVITT, 1993, p. 158-9).

Figueiredo (2000; 2003) indica que a linha de pesquisas sobre capacidades em

economias desenvolvidas tendem a não dar ênfase aos processos de aprendizado que

possibilitem a construção de capacidades iniciais de adoção e desenvolvimento tecnológico,

uma vez que suas preocupações referem-se a aspectos de fronteiras tecnológicas. Contudo,

para as empresas em países em desenvolvimento (como aqueles do objeto desta pesquisa), a

formação de capacidades para implementação de atividades inovadoras partindo-se de

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processos e produtos já disponíveis no mundo (difusão), e os diferentes tipos de processos de

aprimoramento contínuo e de inovações incrementais são críticos (FIGUEIREDO, 2000).

Assim, a partir do esquema originalmente proposto por Teece (1986), e considerando-

se as observações acima realizadas específicas ao objeto em foco, foi proposto para o presente

estudo a seguinte matriz de constructos sobre apropriação contida na Tabela 17:

Tabela 17 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados de inovação.

Constructos Item de análise

Regime de Apropriabilidade Sistema de proteção legal à inovação.

Outros mecanismos de apropriação utilizados.

Trajetória Tecnológica Oportunidades tecnológicas

Padrão setorial de mudança técnica.

Capacidades

Capacidades de produção.

Capacidades tecnológicas.

Ativos complementares.

Fonte: Da autora (2014).

Como mencionado anteriormente, o objetivo deste apêndice foi somente apresentar o

escopo teórico utilizado na pesquisa, em termos de seleção de constructos e níveis de análise,

que orientou a coleta e análise de dados empíricos sobre estes. A seguir, propomos pontos de

conexão entre os constructos apresentados e a temática de desenvolvimento sustentável.

A.1.1.2 Interveniência de critérios de sustentabilidade

Na intenção de explorar conexões entre a temática de inovação e de desenvolvimento

sustentável, para cada um dos constructos de apropriação selecionados acima propomos

investigar a incidência ou não possíveis efeitos pertinentes a questões relacionadas a

sustentabilidade, particularmente a critérios socioambientais.

Neste sentido, de forma propositiva usamos os seguintes elementos para análise de

caráter exploratório:

- Regime de apropriação: Compreender como fatores institucionais e de mercado

interferem no potencial de apropriação dos atores da rede de inovação quanto ao acesso a

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recursos da biodiversidade, regulamentações e recomendações da CDB, ou exigências de

adoção de critérios e selos de sustentabilidade.

- Trajetória tecnológica: Pesquisar implicações em função da biotecnologia e acesso a

biodiversidade quanto a aspectos relacionados à adoção de critérios de sustentabilidade, que

possa conduzir a uma possível transição sociotécnica. De forma que se busca compreender em

que medida fatores relacionadas a mudança de trajetórias tecnológicas vinculadas a critérios

de sustentabilidade interferem no potencial de apropriação dos atores da rede de inovação.

- Capacidades: Analisar como desafios tecnológicos para o alcance de critérios de

sustentabilidade em processos e produtos influenciam no desenvolvimento de capacidades nas

organizações, considerando-se a postura (proativas ou reativas) destas.

Portanto, para visualização integrada com os constructos selecionados, acrescentam-se

tais pontos à matriz anteriormente apresentada conforme Tabela 18:

Tabela 18 - Matriz de constructos sobre apropriação de inovação e interveniência de aspectos

vinculados à sustentabilidade a serem explorados.

Constructos Item de análise Interveniência de aspectos vinculados à

sustentabilidade

Regime de

Apropriabilidade

Sistema de proteção legal à inovação. Fatores institucionais e de mercado que

exercem influência quanto ao acesso a

recursos da biodiversidade e a adoção de

critérios e selos de sustentabilidade. Outros mecanismos de apropriação

utilizados.

Trajetória Tecnológica

Oportunidades tecnológicas. Transição sociotécnica pela adoção de

critérios de sustentabilidade. Padrão setorial de mudança técnica.

Capacidades

Capacidades de produção.

Desenvolvimento de capacidades

específicas para atendimento a requisitos

de sustentabilidade.

Capacidades tecnológicas.

Capacidades complementares.

Fonte: Da autora (2014).

A.1.1.3 Estrutura e processos de redes interorganizacionais

Os três constructos até então propostos são fatores reconhecidos por influenciar a

apropriação de determinada organização sobre uma inovação, no entanto o objeto desta

pesquisa abrange o desenvolvimento de um processo de inovação por meio de relações

interorganizacionais. A interação das diferentes organizações e a natureza de suas relações

interorganizacionais afetam o resultado da inovação (coletivo), e, portanto, o potencial de

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criação de valor, bem como a distribuição do valor criado entre os membros. Deste modo,

tornou-se necessário inserir no desenho teórico da pesquisa aspectos associados a dinâmica de

redes sociais.

Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661) estabelecem três processos chaves sobre a

orquestração de redes de inovação no que tange a criação e distribuição de valor, são eles a

gestão da mobilidade de conhecimento (1), a gestão da apropriabilidade da inovação (2) e a

gestão da estabilidade da rede (3).

O processo de gestão da mobilidade do conhecimento refere-se à identificação,

socialização e absorção de conhecimentos necessários entre os membros da rede, de modo a

promover a troca de informações e conhecimentos essencial ao desenvolvimento conjunto de

inovações e criação de valor (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 663),

Contudo, também é preciso assegurar que este valor criado seja adequadamente

distribuído pelos membros da rede, e percebido como tal entre cada um destes. Estas

atividades representam o processo denominado de gestão da apropriação dos resultados dos

esforços inovativos (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 663).

Por fim, o processo de gestão da estabilidade da rede abrange a coordenação de ações

de fomento a reputação da rede, a construção de perspectivas de ganhos futuros vinculadas a

comportamentos de cooperação, e a multiplicidade de diferentes relações entre membros, com

o encorajamento ao aprofundamento das relações e sua ampliação para outros projetos

(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 664).

Cabe ressaltar que estes processos são propostos como escopo teórico para análise de

redes de inovação de acordo com os seguintes pressupostos, de acordo com Dhanaraj e Parkhe

(2006, p.661): na rede de inovação existem atores que assumem papeis focais (hub),

semiperiféricos e periféricos, no entanto, independente da posição, todos esses atores são

ativos na busca de seus interesses, por meio do exercício de escolhas estratégicas, o que

implica na possibilidade de significativas mudanças na rede no decorrer do tempo tanto em

relação a seus membros (quantidade e diversidade) quanto a sua estrutura (densidade e

centralidade).

Entende-se que tal condição se aplica ao objeto de estudo, e que os três processos

indicados podem elucidar pontos chaves da interação das organizações na rede com foco na

questão da apropriabilidade. Assim, além da análise preliminar quanto ao desenho da

estrutura da rede de inovação, os constructos adotados para investigação dos processos são os

propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661), conforme tabela 19, em que já se expõe

aspectos propositivos relacionados a diretrizes de desenvolvimento sustentável:

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Tabela 19 - Constructos referentes a análise de interação interorganizacional relacionados à

apropriabilidade.

Construto Item de análise Interveniência de aspectos vinculados à

sustentabilidade

Relações

Interorganizacionais

Gestão da mobilidade do

conhecimento

Incentivo a processos de aprendizado e transferência de tecnologia (transbordamentos

positivos).

Gestão da apropriabilidade

da inovação

Equidade e consistência nos processos de tomada

de decisão entre os membros da rede.

Gestão da estabilidade da

rede

Fortalecimento do capital social e diversidade de

atores quanto a interesses na área de atuação

(perspectiva includente).

Fonte: Autoria própria.

A.1.1.4 Apuração de resultados da inovação (variável dependente)

Uma vez que o objetivo da pesquisa foi analisar a forma de apropriação dos benefícios

gerados por uma inovação em uma rede interorganizacional, os resultados alcançados pela

inovação e, em sua medida, aqueles apropriados pelos membros da rede, tornam-se a variável

dependente do estudo, para a qual se busca estabelecer as relações de influência dos

constructos acima discutidos.

Estes resultados são analisados em termos econômicos e de benefícios não

econômicos para os membros da rede. A identificação de ganhos econômicos relacionados à

inovação absorvidos pelas organizações da rede pode se basear em informações como receitas

de vendas ou percentuais de royalties negociados, de acordo com as características específicas

de absorção de ganhos e atividades de cada membro.

Além dos ganhos econômicos, se procura verificar complementarmente outros tipos de

benefícios gerados pela inovação que as organizações membros da rede reconheçam terem

sido gerados pela inovação e apropriados, tais como reputação, legitimidade, inserção em

nova atividade de interesse político ou social. Estes benefícios são identificados junto às

próprias organizações da rede, e considerados na análise de forma complementar às

informações econômicas.

Apresenta-se na Figura 13 o mapa conceitual do desenho da pesquisa:

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227

Figura 13 - Mapa conceitual dos constructos da pesquisa.

Fonte: Elaborada pela autora a partir de Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661).

A.1.2 NÍVEIS DE ANÁLISE DOS CONSTRUCTOS

Ao conceber o desenho da pesquisa, foi relevante buscar perceber os efeitos da

interação entre os diferentes constructos selecionados, e atentar para os diferentes níveis de

análise em se encontram. Para Gupta, Tesluk e Taylor (2007, p.885), toda inovação é um

fenômeno que envolve pelo menos dois níveis de análise, um referente ao ator (pode ser

individual ou coletivo) e outro mais amplo correspondente ao ambiente no qual este ator está

inserido, de modo que reconhece que a inovação é um fenômeno caracterizado por variáveis

em múltiplos níveis, cuja interação pode ter distintos impactos.

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Assim, em uma revisão de literatura sobre estudos de inovação com múltiplos níveis,

Gupta, Tesluk e Taylor (2007, p. 888) indicam a importância de reconhecer e articular

diferentes níveis de análise, elucidando as relações de influência entre constructos e níveis, de

forma que propõem classifica estas relações no formato de bottom-up e top-down. O primeiro

formato de interação, Bottom-up, é representado quando se foca nos efeitos da emergência de

eventos que se originam em um nível mais baixo em relação a um nível mais alto, por

exemplo, o impacto de capacidades individuais de organizações sobre o desempenho da rede

interorganizacional que estas compõem.

O segundo processos de interação é top-down, quando se analisa a influência de

variáveis de um nível mais alto sob níveis mais baixos, também denominados de influências

contextuais (GUPTA; TESLUK; TAYLOR, 2007, p. 889), que auxiliam na compreensão das

influências do ambiente de mercado ou institucional sobre processos em organizações, por

exemplo.

Gupta, Tesluk e Taylor (2007, p. 889) consideram uma rede de atores em processos de

inovações um exemplo característico de análise de múltiplos níveis, em virtude de seus

estudos articularem padrões de interação entre diferentes unidades que compõe a rede, com

implicações de tensão de interesses em relações de cooperação (interdependência) e

competição (escassez de recursos).

De forma geral, apresentamos a seguinte proposição de níveis de análises e

constructos a serem explorados na presente pesquisa de acordo com a Tabela 20:

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Tabela 20 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados em rede de inovação.

Constructos Nível de Análise Recorte da interação entre níveis de análise

aplicados na pesquisa

Regime de

Apropriabilidade Contexto

Influência contextual (top-down) sobre as organizações e sobre a rede interorganizacional.

Trajetória

Tecnológica Contexto

Influência contextual (top-down) sobre as organizações e sobre a rede interorganizacional.

Capacidades Organização

Influência bottom-up sob a rede interorganizacional, pela compilação de

capacidades ao nível da rede, cuja origem estão no

nível das organizações.

Gestão da mobilidade

do conhecimento

Interorganizacional

(rede)

Influência das relações interorganizacionais (top-down) que modera o resultado no nível das

organizações, mediada pelos constructos

anteriores.

Gestão da

apropriabilidade da

inovação

Interorganizacional

(rede)

Influência das relações interorganizacionais (top-

down) que modera o resultado no nível das

organizações, mediada pelos constructos

anteriores.

Gestão da

estabilidade da rede

Interorganizacional

(rede)

Influência das relações interorganizacionais (top-down) que modera o resultado no nível das

organizações, mediada pelos constructos

anteriores.

Fonte: Da autora (2014).

A.1.3 CONTRIBUIÇÕES E LIMITAÇÕES DO DESENHO DE PESQUISA

O desenho de pesquisa construído tem um caráter exploratório, que buscou contribuir

para a convergência entre as temáticas de inovação e desenvolvimento sustentável ao procurar

compreender influências de diretrizes do desenvolvimento sustentável sobre a forma de

apropriação de resultados de uma inovação em uma rede interorganizacional. Desta forma,

são sugeridos propositivamente para análise empírica atributos vinculados a critérios de

sustentabilidades para investigação de seus impactos sobre constructos tradicionais de

apropriabilidade de inovação.

Outra contribuição planejada foi a articulação de um processo de inovação no âmbito

de uma rede interorganizacional, o que conferiu a oportunidade de empreender um diálogo

entre conceitos de apropriabilidade da economia da inovação e com aspectos da teoria de

redes sociais.

A principal limitação identificada corresponde ao escopo do desenho que apresenta

abrangência ampla dos constructos teóricos, o que pode prejudicar a parcimônia na coleta e

análise dos dados, contudo sua amplitude em parte deve-se a natureza exploratória da

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pesquisa que busca sondar possíveis relações entre constructos econômicos tradicionais e

critérios de sustentabilidade socioambiental.

A.2 METODOLOGIA

Nesta seção, apresenta-se o objeto do estudo, e o método utilizado para o

desenvolvimento da pesquisa de acordo com o quadro de referência do desenho teórico

apresentado acima. Posteriormente, são indicadas as técnicas de coleta de dados utilizadas,

bem como os critérios que levaram à definição de seleção do caso para estudo, e algumas

limitações identificadas do método escolhido.

A.2.1 OBJETO DE ESTUDO

O objeto teórico da presente pesquisa enquadra-se na intersecção dos temas de

inovação e de desenvolvimento sustentável ao ter como questão central compreender como a

apropriação de resultados de inovação realizada por uma rede interorganizacional ocorre, e

em que medida pode ser influenciada por critérios de sustentabilidade socioambientais.

Portanto, desdobra-se na análise da forma de apropriação de resultados da inovação pelas

organizações no âmbito de uma rede (1), e da influência de diretrizes do desenvolvimento

sustentável sobre os condicionantes de apropriabilidade (2).

O objeto empírico da pesquisa deve se caracterizar por uma rede de relações

interorganizacionais com objetivo de desenvolvimento de uma inovação baseada em ativos da

biodiversidade, com atividades inovativas localizadas na região amazônica. Entende-se que

este objeto de estudo contempla um escopo de atividade relacionado à biodiversidade na

região Amazônica que reúne dois elementos contextuais necessários à pesquisa conforme

segue:

(1) Existência de certo grau de pressões institucionais e de mercado quanto a

condicionantes de responsabilidade socioambientais;

(2) Natureza dos recursos (biodiversidade) vincula-se a instrumentos

normativos de diretrizes sobre desenvolvimento sustentável, como a

Convenção de Diversidade Biológica.

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A.2.2 MÉTODO

Para entender o processo de apropriação de resultados de inovação dentro de uma rede

interorganizacional dinâmica e sua conexão com atributos de desenvolvimento sustentável, a

abordagem qualitativa foi adotada por favorecer a investigação de aplicações conceituais e a

exploração de relações entre os constructos (MAHONEY, 2005, p. 9).

O método escolhido foi de estudo de caso único em virtude da complexidade da

organização em rede e a necessidade de apreensão das interações entre este objeto e seu

contexto (YIN, 2001, p. 32). Cabe acrescentar que a análise dos processos multiníveis é

relevante teoricamente para investigação, de modo a buscar compreender a relação entre a

forma de apropriação de inovação da rede e a interveniência de aspectos contextuais

econômicos, sociais e institucionais que envolvem o desenvolvimento de inovação baseada no

uso de bioativos na região amazônica.

O estudo de caso único permite exploração profunda de dados e informações sobre em

que medida atributos de sustentabilidade socioambientais se correlacionam com a

apropriabilidade de inovações com o objetivo de contribuir para a base de conhecimento

existente, visto que estas conexões estarem ainda em desenvolvimento recente, propiciando a

geração de informação descritiva e o debate de hipóteses ou proposições que possam ser

objeto de estudos futuros (YIN, 2001, p. 51).

Como a pesquisa contempla uma perspectiva teórica multinível, o estudo de caso

caracteriza-se como incorporado (YIN, 2001, p. 64), de modo que envolve, além da análise do

contexto, dois níveis de investigação: a rede interorganizacional como uma unidade, e as

organizações que a compõe, como subunidades incorporadas a esta.

A.2.3 TÉCNICAS DE COLETA DE DADOS

Como o objeto de redes de inovação envolve múltiplos atores sociais e diversas

atividades relacionadas permite abranger uma ampla variedade de técnicas de coleta de dados

e fontes. As técnicas de coleta de dados utilizadas foram entrevistas e pesquisa documental,

complementadas com observação e anotações em diário de campo de visitas às organizações

da rede de inovação, buscando assim a triangulação de meios de coleta (YIN, 2001, p. 120).

Foram realizadas ao todo 04 entrevistas em profundidade com representantes de

organizações membros da rede de inovação, e 02 entrevistas com atores externos à rede, um

especialista na cadeia produtiva do açaí e outra especialista sobre fomento à inovação na

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Amazônia. Antes de cada entrevista, foram construídos roteiros de entrevistas

semiestruturadas específicos para cada ator, com base em um guia de tópicos gerais que

podem ser examinados no Apêndice B.

Ressalta-se também a importância da triangulação de fontes, ao buscar esclarecer os

diferentes significados pelos quais o caso pode ser entendido. Isso é particularmente relevante

no caso em questão, em que interessa a diversidade de percepção das várias organizações que

compõe a rede do processo de inovação desenvolvido, de modo a refletir “diferentes

realidades” vivenciadas, bem como de outros agentes do contexto, pois, as diferentes

perspectivas podem influenciar em variação de percepção quanto à apropriação de benefícios

pelos atores envolvidos.

A.2.4 SELEÇÃO DE CASO PARA ESTUDO

A seleção do caso de estudo baseou-se em critérios de adequação à proposição de

constructos teóricos (EISENHARDT, 1989, p. 537) e de relevância significativa (YIN, 2001,

p. 180-181).

Em relação aos critérios de adequação concentrou na identificação de redes

interorganizacionais formadas com finalidade de desenvolver inovação tecnológica de

produto e/ou processo baseado em algum ativo da biodiversidade da Amazônia. Também era

preciso que a inovação já tivesse sido lançada ou aplicada no mercado, de forma a ter gerado

resultado, cuja apropriação possa ser estimada entre as organizações da rede.

Além desses requisitos, Yin (2001, p. 180-181) recomenda que os casos a serem

selecionados devam ser significativos, de modo que não sejam usuais e de importância ao

interesse público geral com relevância regional ou nacional.

Diante deste quadro de atributos, foi selecionado o estudo do caso da rede de inovação

para produção e comercialização de composto antioxidante concentrado de açaí, cujas

principais organizações em termos de capacidades constitutivas ao processo inovativo são a

Universidade Federal do Pará (UFPA), a Amazon Dreams e a Belaiaçá.

Em relação a adequação teórica, observa-se que a rede atende aos critérios de

adequação ao objeto de estudo, uma vez que realizou o desenvolvimento de inovação de linha

de produtos e processo na região amazônica, especificamente no estado do Pará. A linha de

produtos inovadores é baseada no açaí, fruta endêmica da Amazônia, já tendo sido lançado

comercialmente no mercado.

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Em relação à relevância significativa, a empresa Amazon Dreams (AD) recebeu em

2012 pela FINEP o prêmio regional (outubro) e nacional (dezembro) de pequena empresa

inovadora baseada principalmente no desenvolvimento da linha de produtos de açaí, obtendo

assim reconhecimento significativo, entendendo-se que há reconhecimento público em

relação à inovação desenvolvida.

A.2.5 LIMITAÇÕES DO MÉTODO

A escolha da metodologia de estudo de caso apresenta algumas limitações quanto ao

nível de detalhamento e ao volume e diversidade de dados coletados. Apesar de permitir uma

triangulação de fontes e técnicas de coleta de dados importante, requer atenção à parcimônia e

a priorização no enfoque dos constructos do estudo. Reconhece-se que esta limitação também

decorre da abrangência dos constructos teóricos anteriormente justificada em virtude da

natureza exploratória da pesquisa.

A condição de estudo de caso incorporado (múltiplos níveis) apresenta uma

dificuldade em relação a busca de equilíbrio de atenção na análise entre os diferentes níveis,

pois podem apresentar concentração excessiva em um único nível de unidade (Yin, 2001, p.

65). Para evitar esta situação, a pesquisa foi estruturada em blocos divididos por níveis de

análise.

O caso único pode ser considerado uma limitação a generalizações analíticas das

descobertas do estudo, em virtude da não possibilidade de análise de sua validade externa por

meio de replicações (literais ou teóricas).

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APÊNDICE B – ROTEIROS DE ENTREVISTAS

Guia de orientação para roteiros de entrevistas semiestruturadas.

Coleta de dados via entrevistas:

O objetivo deste guia de roteiros foi contemplar indicações de fontes, questões chaves

e tópicos para as entrevistas semi estruturadas. A técnica de entrevistas foi considerada o

principal meio de coleta de dados, visto que a maioria das informações exploradas em termos

da descrição do desenvolvimento do processo de inovação em si e a apropriação de seus

benefícios, e asa relações interorganizacionais decorrentes são de difícil disponibilidade por

outros canais, como levantamentos documentais ou observações.

Assim, as entrevistas abordaram tópicos que se relacionaram desde a formação das

relações interorganizacionais para o desenvolvimento de inovação, até a obtenção de

informações sobre resultados do processo de inovação.

Informantes chaves:

Em relação a fontes de informações para a condução de entrevistas, se identificou dois

grupos de informantes chaves para realização da pesquisa, que são os representantes das

organizações envolvidas no processo de inovação em rede (1), e especialistas do setor (2).

Grupo de informantes chaves 1:

Representantes de organizações da rede de inovação.

Questões chaves:

(1) Em que medida atributos socioambientais influenciaram as condições de apropriabilidade

dos resultados gerados pela inovação desenvolvida em rede?

(2) Como a efetividade (ou não) de processos internos da rede de inovação impactaram no

resultado alcançado da inovação desenvolvida?

(3) A apropriação de resultados econômicos e de outros benefícios da inovação pelas

organizações da rede ocorreu de forma adequada a promover o desenvolvimento dessas

organizações membros, e proporcionar transbordamentos positivos à sociedade local?

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O roteiro foi dividido por partes, abrangendo um início relacionado a caracterização da

empresa, e depois em blocos abrangendo os constructos de estudo de acordo com o desenho

de pesquisa:

a. Trajetória Tecnológica:

- Caracterização da trajetória tecnológica na cadeia produtiva;

- Mudança técnica na organização e oportunidades tecnológicas percebidas;

- Relações institucionais na cadeia produtiva.

- Influências de atributos de responsabilidade socioambientais na atuação da

organização.

b. Regime de Apropriabilidade:

- Sistema de proteção à propriedade intelectual;

- Mecanismos de proteção de inovações usados;

- Influência de regulamentos relacionados ao acesso à biodiversidade.

c. Capacidades:

- Capacidades de cada organização, particularmente necessárias à inovação;

- Capacidades relacionadas à mobilidade de conhecimento e ao processo de

aprendizado tecnológico;

- Capacidades vinculadas ao atendimento de critérios socioambientais de

sustentabilidade, e mais especificamente ao acesso a ativos da biodiversidade.

d. Rede de Inovação:

- Formação da rede de inovação interorganizacional, e modificações de configurações

ao longo do processo de inovação;

- Principais atribuições das organizações para o desenvolvimento da inovação;

- Descrição do processo de negociação da distribuição de benefícios econômicos dos

resultados da inovação;

- Descrição de processos relacionados à mobilidade (compartilhamento e absorção) de

conhecimento na rede;

- Descrição de processos relacionados à apropriabilidade na rede;

- Descrição de processos relacionados à estabilidade da rede.

- Identificação de benefícios econômicos e não econômicos gerados pelo processo de

inovação e transbordamentos à sociedade.

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Grupo de informantes chaves 2:

Representantes de organizações externas à rede, sendo com conhecimento

especializado sobre:

- Cadeia produtiva do açaí;

- Fomento à inovação na Amazônia.

Questões chaves:

(1) Quais fatores induzem e quais dificultam o desenvolvimento de inovações baseadas em

ativos da biodiversidade na Amazônia?

(2) Em que grau critérios socioambientais tem sido adotados por organizações na cadeia

produtiva do açaí, e como a adoção de tais critérios tem se relacionado ao

desenvolvimento de capacidades e de inovações?

(3) Em que medida atributos socioambientais influenciam condições de apropriabilidade de

resultados gerados por inovações no setor?

Tópicos relacionados - Especialista na cadeia produtiva do açaí:

- Principais dificuldades na cadeia produtiva local;

- Diferenças entre açaizais nativos e plantações planejadas;

- Possibilidade de cultivo do açaí fora do bioma amazônico;

- Infraestrutura geral da cadeia produtiva regional;

- Relações institucionais na cadeia produtiva e poder de barganha entre os atores;

- Cenário sobre políticas públicas, e investimentos em pesquisa e desenvolvimento de

inovações na cadeia produtiva.

Tópicos relacionados - Especialista sobre fomento à inovação na Amazônia:

- Principais avanços e entraves para a biodiversidade da Amazônia constituir-se como

uma plataforma de oportunidade para o desenvolvimento regional;

- Pontos fortes e fracos das instituições de ciência e tecnologia na região;

- Acertos e desafios da atual legislação de acesso ao patrimônio genético no país;

- Influência de exigências institucionais e de mercado quanto a critérios de

sustentabilidade no desenvolvimento de inovações de produtos e processos na região;

- Cenário sobre políticas públicas, relações institucionais e investimentos em pesquisa

e desenvolvimento de inovações na Amazônia.