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Relações de Poder e Formação de Representações Sociais: A Construção do “Mundo Islâmico”. Vanessa Fonseca Henriques da Silva 1 Introdução: No dia 11 de setembro de 2001 o mundo recebeu atônito a notícia de que o World Trade Center, símbolo do poder econômico dos Estados Unidos da América, havia sido destruído após ser atingido por aviões. Os acontecimentos, imediatamente, caracterizados como “ataques terroristas” pelo então presidente George W. Bush Filho, desencadearam uma série de reações por todo o mundo. Guerras foram iniciadas, se proliferaram reportagens, artigos, documentários que tinham o Islã e a região comumente chamada de Oriente Médio como seu principal assunto, Políticas Externas foram modificadas e criadas. A fim de garantir que as guerras iniciadas pelos Estados Unidos tivessem aceitação da sociedade civil, foram feitos discursos inflamados que tinham a “Guerra ao Terror”, - com a consequente punição dos culpados pelos ataques que haviam matado milhares de cidadãos estadunidenses – a necessidade de disseminar os ideais democráticos e a libertação de povos das mão de Governos fundamentalistas e ditadores, como o fomentador e justificador da Política Externa que seria implementada e que ficou conhecida como “Doutrina Bush”. Iniciou-se o que caracterizo como uma “guerra de representações”, a necessidade de abastecer e satisfazer uma opinião pública sedenta por informações de um mundo até então pouco conhecido, atrelada à vontade e necessidade de um Governo de ter suas ações e políticas aprovadas pela maioria da sociedade civil, fez com que se criasse, difundisse e disseminasse nos mais diversos âmbitos uma série de representações sociais 2 que buscavam explicar e diferenciar o que Edward Said caracteriza como a dicotomia “o nosso e o deles”. 1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense. Bolsista Capes.

Relações de Poder e Formação de Representações Sociais: A ... · ideias de Michel Foucault sobre relações de poder em várias escalas e níveis, ondeos ... um entrelaçar

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Relações de Poder e Formação de Representações Sociais: A Construção do

“Mundo Islâmico”.

Vanessa Fonseca Henriques da Silva1

Introdução:

No dia 11 de setembro de 2001 o mundo recebeu atônito a notícia de que o World Trade

Center, símbolo do poder econômico dos Estados Unidos da América, havia sido

destruído após ser atingido por aviões. Os acontecimentos, imediatamente,

caracterizados como “ataques terroristas” pelo então presidente George W. Bush Filho,

desencadearam uma série de reações por todo o mundo. Guerras foram iniciadas, se

proliferaram reportagens, artigos, documentários que tinham o Islã e a região

comumente chamada de Oriente Médio como seu principal assunto, Políticas Externas

foram modificadas e criadas.

A fim de garantir que as guerras iniciadas pelos Estados Unidos tivessem aceitação da

sociedade civil, foram feitos discursos inflamados que tinham a “Guerra ao Terror”, -

com a consequente punição dos culpados pelos ataques que haviam matado milhares de

cidadãos estadunidenses – a necessidade de disseminar os ideais democráticos e a

libertação de povos das mão de Governos fundamentalistas e ditadores, como o

fomentador e justificador da Política Externa que seria implementada e que ficou

conhecida como “Doutrina Bush”.

Iniciou-se o que caracterizo como uma “guerra de representações”, a necessidade de

abastecer e satisfazer uma opinião pública sedenta por informações de um mundo até

então pouco conhecido, atrelada à vontade e necessidade de um Governo de ter suas

ações e políticas aprovadas pela maioria da sociedade civil, fez com que se criasse,

difundisse e disseminasse nos mais diversos âmbitos uma série de representações

sociais2 que buscavam explicar e diferenciar o que Edward Said caracteriza como a

dicotomia “o nosso e o deles”.

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense. Bolsista

Capes.

2

Baseada nos estudos de Denise Jodelet que assim definem o lugar das representações na

sociedade, “reconhece-se que as representações sociais – enquanto sistemas de

interpretação que regem nossa relação com o mundo e com os outros – orientam e

organizam as condutas e as comunicações sociais” (JODELET, 2001, p.22). E nas

ideias de Michel Foucault sobre relações de poder em várias escalas e níveis, ondeos

meios de difundir e enraizar novas ideias são os mais variados possíveis, indo desde

conversas impessoais entre pessoas comuns até medidas oficiais de governos e órgãos

governamentais que visam expor a visão adotada e defendida pelos mesmos. O presente

trabalho traz charges veiculadas pelo jornal francês Courrier International a fim de

demonstrar como as mesmas são instrumentos de poder e como tal corroboram na

criação e instituição de valores e morais que fazem parte da construção do pensamento

Ocidental e como tal contribuem para enraizar as mudanças propostas num âmbito

global.

Da Guerra Fria à Guerra ao Terror:

A Doutrina Bush, como ficou conhecido o conjunto de estratégias adotadas no pós-11

de setembro, tinha a “Guerra ao Terror” como finalidade central e para que ela

ocorresse, uma série de medidas no âmbito externo e interno seriam a ela subordinadas.

No entanto, diferente do que pôde parecer à época, as premissas de tal doutrina não

foram traçadas no calor dos acontecimentos, as mesmas vinham sendo traçadas desde

fins dos anos 80, por eminentes intelectuais ligados a áreas estratégicas do governo

estadunidense.

Com o colapso da União Soviética muitos intelectuais começaram a questiona como o

mundo ficaria dividido e qual o papel os EUA deveriam assumir nessa nova ordem

colocada. Importantes intelectuais, tais como Condoleezza Rice, Robert Kagan, Henry

Kissinger e Samuel P. Huntington, se debruçaram sobre essas questões. Segundo os

estudos desses autores, o momento pós- Guerra Fria era de um mundo unipolar, onde os

Estados Unidos se destacavam como a maior superpotência.

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Para Huntington, um momento unipolar não era garantia da inexistência de ameaças e

de Estados rivais, pelo contrário, as ameaças tinham se diversificado. Se antes o inimigo

a ser batido era o socialismo, no pós Guerra Fria o narcotráfico, o terrorismo e o

fundamentalismo religioso apareciam como ameaças difusas e mais difíceis e controlar.

Huntington, já no início dos anos 90, deixa claro sua preocupação com o

fundamentalismo religioso, sobretudo, o islâmico.

Assim sendo, após análise das principais ideias formuladas por esses importantes

intelectuais, fica evidente que a Doutrina Bush implementada no pós-11 de setembro já

vinha sendo elaborada e já possuía alvos e estratégias traçadas, a fim de que os ideais e

interesses dos EUA fossem preservados. Necessitando apenas de um acontecimento que

servisse ao mesmo tempo de estopim e justificativa, o governo Bush explorou o medo e

o terror que os atentados geraram.

A implementação da Doutrina Bush dá início ao processo objeto da presente pesquisa,

uma vez que as estratégias utilizadas seja no âmbito político- militar, seja no âmbito

cultural- simbólico, inaugura no pensamento ocidental a construção da ideia de um

“mundo islâmico”, que começa a redesenhar inclusive a geopolítica da região e que

está em processo até os dias atuais.

A construção de um “Novo Imaginário”:

O que possibilita que EUA e outros países do “Ocidente” sejam os responsáveis pela

elaboração e disseminação dessas representações sociais? De que forma e através de que

meios essas representações são formadas, veiculadas e arraigadas na sociedade, se

tornando parte do pensamento da mesma? São sobre essas questões que o presente

artigo busca se debruçar.

Estados Unidos e proeminentes países europeus, tais como, Alemanha, Inglaterra e

França são caracterizados por serem Estados fortes, com importantes instrumentos de

poder e dominação estáveis e institucionalizados. Porém, o objetivo desse artigo é

trabalhar com relações de poder, que perpassam a lógica de um domínio imposto pelo

Estado e por seus órgão competentes. Poder que está em todos os lugares e que possui

um entrelaçar de redes que o torna mais eficaz no domínio da lógica social.

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Para tanto, os estudos filosóficos de Michel Foucault trazem importantes contribuições

que corroboram para o entendimento de como as charges de um jornal francês, são

importante instrumento de poder e formação de representações sociais, capazes de

formar e transmitir valores formadores do pensamento dito ocidental, no que concerne a

visão que este vem construindo de um “Mundo Islâmico”.Foucault defende o que

chama de “onipresença do poder” e assim a explica:

“Onipresença do poder: não porque tenha o

privilégio de agrupar tudo sob sua invencível unidade, mas

porque se produz a cada instantes, em todos os pontos, ou

melhor, em toda relação entre um ponto e outro. O poder está

em toda parte; não porque englobe tudo e sim porque provem

de todos os lugares. E ‘o’ poder, no que tem de permanente,

de repetitivo, de inerte, de auto-reprodutor, é apenas efeito de

conjuntos, esboçado a partir de todas essas mobilidades,

encadeamento que se apoia em cada uma delas e, em troca,

procura fixá-las. Sem dúvida, devemos ser nominalistas: o

poder não é uma instituição e nem uma estrutura, não é uma

certa potência de que alguns sejam dotados: é o nome dado a

uma situação estratégica complexa numa sociedade

determinada.”(FOUCAULT, 1988: 89)

A ausência de informações sobre a religião islâmica por todo o Ocidente conferiu

grande importância aos intelectuais e aos órgãos estatais dos quais eles participavam e

davam suporte. Baseado no que Foucault chama de saber-poder, se o homem

muçulmano se constituiu como domínio a se conhecer, foi a partir de relações de poder

que o instituíram como possível; e em troca, se o poder pôde tomá-lo como alvo, foi

porque se tornou possível investir sobre ele através de técnicas de saber e de

procedimentos discursivos.

Assim sendo, os discursos oficiais ganharam força entre os membros da sociedade.

Porém, para que esses discursos sejam entendidos e se tornem, efetivamente, parte do

pensamento instituído, é preciso que se relacionem a uma rede de conhecimentos já

existente na sociedade. Caso contrário, estariam fadados a estagnação e,

consequentemente, suas ideias desapareceriam. Pierre Bourdieu quando estuda as

distinções sociais das classes traz uma importante contribuição para entendermos como

esse processo é importantes.

“A obra de arte só adquire sentido e só tem interesse

para quem é dotado do código segundo o qual ela é

codificada. A operação, consciente ou inconsciente, do

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sistema de esquemas de percepção e de apreciação, mais ou

menos explícitos, que constitui a cultura pictórica ou musical

é a condição dissimulada desta forma elementar de

conhecimento que é o reconhecimento os estilos.” (BOURDIEU, 2007:10)

Com isso, o que se busca entender é a relação que se tem entre esses mecanismos de

poder que formam representações sociais e que estão presentes em todos os lugares -

nesse trabalho representados pelas charges - e os discursos e práticas oficiais,

representado, sobretudo, pela Doutrina Bush. Como tornam possíveis essas espécies de

discursos e, inversamente, como esses discursos lhe servem de suporte?

O desconhecimento do outro contribui para a criação de representações que na maioria

das vezes não condizem com a realidade e que são usadas por detentores do saber-poder

a fim de criarem valores e ideários nas sociedade que permitam sua manipulação. Assim

surgem as representações sociais que são constantemente criadas pela sociedade

Ocidental identificando, de forma geral, as populações do mundo islâmico como

exóticas, violentas e fundamentalistas e a sua geografia, “o corpo da região” como

espaço da violência. Características essas constantemente presentes nas charges que

serão aqui analisadas.

Edward Said, deu importantes contribuições para as investigações das representações

que norteiam as relações Ocidente-Oriente. Said mostra, através da explicação de

Claude Lévi-Strauss, que a mente humana requer uma ordem e esta é alcançada pela

discriminação, pela atribuição de valores e identidades que deixam o indivíduo num

“lugar” seguro. E, assim sendo, a mente humana é capaz de criar características

distintivas que muitas vezes são puramente ficcionais, embora pareçam ter uma

existência objetiva.

“Em outras palavras, essa prática universal de

designar mentalmente um lugar familiar, que é ‘o nosso’, e

um espaço não familiar além do ‘nosso’, que é ‘o deles’, é

um modo de fazer distinções geográficas que pode ser

inteiramente arbitrário. Uso a palavra ‘arbitrário’ nesse ponto,

porque a geografia imaginativa da variedade ‘nossa terra –

terra bárbara’ não requer que os bárbaros reconheçam a

distinção. Basta que ‘nós’ tracemos essas fronteiras em

nossas mentes; ‘eles’ se tornam ‘eles’ de acordo com as

demarcações, e tanto o seu território como a sua mentalidade

são designados como diferentes dos ‘nossos’.” (SAID,

1995:91)

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A construção dessa “geografia imaginativa” se torna mais radical após os atentados de

11 de setembro de 2001, e trazem à tona as diversas relações de poder que são

responsáveis por apontar quem são os inimigos, bem como diferencia-los a partir da

diferenciação entre “eles” e “nós”. Assim sendo, as charges se apresentam enquanto

importante instrumento de poder, uma vez que através delas é possível traçar essas

diferenças, bem como difundi-las e cristaliza-las na sociedade.

Fundamentalistas, violentos e exóticos: O “mundo muçulmano” nas charges.

O estudo com charges são ainda incipientes e portanto, não contam com metodologias

de análise definidos. Assim sendo, a metodologia que aqui será utilizada foi adaptada

daquela proposta por Ana Maria Mauad para análise de fotografias; tendo como

referencial três pontos de análise o autor, o texto e o leitor.

Tendo em vista que as duas charges foram retiradas do mesmo jornal, a análise acerca

do autor e do leitor, para o entendimento das representações sociais, se fazem

necessárias previamente, pois cabem para as mesmas. Deixando apenas a análise do

texto propriamente dito como acompanhamento das imagens.

O jornal Courrier International, aqui entendido como autor, tem como proposta traduzir

para a língua francesa reportagens dos jornais de todo o mundo, permitindo que seus

leitores tenham facilidade no acesso à informações veiculadas na mídia escrita

estrangeira. Porém, seria ingênuo acreditar numa imparcialidade dos editores do dito

jornal, pois vários fatores contribuem para a manipulação da informação, por exemplo,

a tradução e a composição da matéria juntamente com seus elementos extra-textuais.

As notícias não são dispostas no Courrier International como foram expostas em seus

jornais de origem, as charges que serão aqui analisadas são provenientes de outros

jornais ou mesmo de autores independentes e muitas vezes desconhecidos. Com isso,

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podemos concluir que a escolha

do texto e da charge que vai

acompanhá-lo é realizada pelos

editores do jornal francês, com um

objetivo próprio, além do de

traduzir as informações, sendo este entendido, então, também como formador e

veiculador de representações sociais.

Essa imagem é veiculada para leitores que vivem em constante estado de alerta contra

possíveis atentados “terroristas”. Uma sociedade ocidental que busca sua informação

nos meios de comunicação, conferindo ao seu alcance o status de compromisso com a

verdade. E que, portanto, se torna refém da manipulação dos meios de comunicação,

bem como daqueles que dominam seus códigos sociais e que acabam por fornecer

informações que serão responsáveis por formar ou contribuir para a formação de

representações

Figura 1: “Un scrutin orchestré et joué d’avance”

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Fonte : Courrier International,nº 905, 6-12 de março de 2008.

A presente charge foi veiculada na edição de 6-12 de março de 2008, acompanhando

notícias sobre as eleições do Irã que deveriam se desenrolar no dia 14 de março do

mesmo ano e que não contaria com candidatos “reformadores”, que foram se afastando

sistematicamente devido ao contexto progressista no Teerã (“Les élections législatives

qui doivent se dérouler le 14 mars em Iran se feront sans le candidats réformateurs,

systématiquement écartés de la compétiotion, constate le grand quotidien progressiste

de Téhéran”).

A notícia é proveniente do jornal Etemaad Urdu Daily, um jornal Indiano, enquanto a

charge tem sua origem na Noruega. Com isso, podemos perceber a influência do jornal

Courrier International na formação de representações, pois a partir do conteúdo da

notícia buscou-se uma imagem que não somente ilustrasse como também representasse

a mensagem que se buscava passar.

Assim sendo, a mensagem constante na imagem é um exemplos claro de representação

do fundamentalismo religioso, apresentados como características marcantes do mundo

islâmico. Seus adornos fazem referência a um chefe espiritual religioso, possivelmente

um aiatolá, sobre o qual recaem grandes críticas do Ocidente por ser dotado de muita

influência política, este é considerado o Guia Supremo nos Estados muçulmanos. O

turbante preto assim como sua vestimenta deixa clara a característica religiosa da

imagem, enquanto o pulso cerrado e empunhado para o alto transmite e ideia de

extremismo e violência atrelado ao chefe religioso que se pretende representar.

Na cultura muçulmana a maior parte do corpo fica tapado pelas vestes, sendo a região

da face, a mais exposta e que é, portanto, uma importante forma de expressão do

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indivíduo. Com isso, pode-se perceber o papel simbólico que o punho cerrado colocado

no lugar do rosto possui.

A união entre os adornos que dão forma a imagem passa uma ideia de fundamentalismo

atrelado à religião, que compõe o quadro de representações ocidentais. E que são

utilizadas na incrementação do discurso adotado após os atentados.

Figura 4: “Les talibans font ce qui leur plaît”

Fonte: Courrier International,nº 989, 15-21 de outubro de 2009.

Essa charge foi retirada do jornal inglês The Guardian e publicada junto a uma

reportagem do Daily Time, um jornal paquistanês. Nela fica explícito o discurso

característico do Ocidente, que atrela a violência como característica do mundo

muçulmano, a começar pelo título da mesma “Os talibãs fazendo o que lhes dá prazer”

(tradução própria).

Um soldado, com farda do exército estadunidense, pele e olhos mais claros, se encontra

acorrentado, preso por cordas pregadas ao chão (juntamente com sua arma) numa forma

bem rústica de se manter um prisioneiro. O soldado com um semblante de medo, se

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encontra na mira de um monte de “homenzinhos”, que portam uma AK-47. Esta é a

arma mais retratada em se tratando de mundo islâmico.

As proporções dadas aos desenhos chamam a atenção, e também devem ser encaradas

como formas de representações. O soldado ocidental possui dimensões de gigante se

comparado aos “pequeninos” talibãs, sendo necessário cinco destes para prender um

gigante ocidental. Esses homens que o fizeram prisioneiro, novamente são retratados

usando turbantes, longas barbas e narizes protuberantes. Além das armas que carregam

apontadas para o ocidental e da grande quantidade de munição que trazem presa a sua

roupa.

Deixando claro, a enorme – literalmente – diferença entre os ocidentais civilizados que

ficam aterrorizados com atos violentos e terroristas, e os bárbaros, representados pelos

indivíduos muçulmanos que se utilizam de formas arcaicas e violentas para impor a sua

vontade.

Conclusão:

Tzvetan Todorov em seu trabalho intitulado “O Medo dos Bárbaros” diz que em

qualquer tempo ou lugar, civilizado é aquele que aceita a humanidade do outro. Para

tanto, são necessárias duas etapas, a primeira é descobrir que o outro possui modos

próprios e, portanto diferentes dos seus, enquanto à segunda etapa cabe a aceitação

dessa diferença.

O mau entendimento ou a ausência de entendimento da primeira etapa é o que muitas

vezes leva a sobreposição de civilizações, “(...) a razão é que, por ser incompreensível, a

cultura dos estrangeiros é julgada inexistente; ora, sem cultura, o homem não chega a

ser humano.” (TODOROV, 2010:40)

No entanto, o ato de negar a humanidade do outro e o julgar por ser diferente de si,

infligindo um tratamento ofensivo ou mesmo violento é uma forma de barbárie. Ora,

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não foi então o que ocorreu com os Estados Unidos após os atentados? Ao

supostamente revidarem, como este tentou fazer parecer, os atentados “terroristas”

promovendo a “guerra ao terror”, os EUA adotaram medidas tão bárbaras quanto aquela

que julgavam como tal.

Essas colocações são de extrema necessidade para entendermos o processo de criação

das representações sociais explícitas nas charges analisadas. Entender como os

atentados do 11 de setembro, modificaram a forma como o Ocidente “enxerga” o

Oriente, percebendo como o discurso e a manipulação da informação pelo Estado cria e

influência a criação de imagens estereotipadas sobre o outro, muitas vezes

desconhecidos. E como a criação desse imaginário representacional atrelados a

estratégias políticas vem contribuindo para a modificação da geopolítica da região, uma

vez que a união dessas característica contribui para a construção de um “mundo

islâmico” físico que pode ser atingido tanto por discursos quanto por bombas.

Bibliografia:

BOURDIEU, Pierre. A Distinção: Crítica Social do Julgamento. Edusp, São Paulo, 2002.

FOUCAULT, Michael. História da Sexualidade I: a vontade de saber. Edições Graal. Rio de

Janeiro,1988.

HUNTINGTON, Samuel P. Choque de Civilizações e a Recomposição da Ordem

Mundial.Objetiva, São Paulo, 1997.

JODELET, Denise. As representações sociais. Tradução, Lílian Ulup – Rio de Janeiro. EdUERJ,

2001

MAUD, Ana Maria. Através da Imagem: Fotografia e História Interfaces. Revista Tempo, RJ,

volume1, nº2, 1996.

SAID, Edward. Orientalismo, o Oriente como Invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das

Letras, 1995.

SANTORO, Mauricio. O 11 de setembro e a Doutrina Bush. Dissertação de Mestrado pelo

IUPERJ. 2003.

TODOROV, Tzvetan. O Medo dos Bárbaros: Para além do choque das civilizações. Petrópolis,

RJ: Vozes, 2010.