RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAS, AS INTERFACES DA · PDF fileO racismo no Brasil, historicamente, herdou fortes resquícios do regime escravista, constituindo-se em fenômeno arraigado no

  • Upload
    lyminh

  • View
    217

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • RELAES TNICO-RACIAS, AS INTERFACES DA QUESTO RACIAL E

    CULTURAL VIVENCIADAS NO INTERIOR DA ESCOLA PBLICA

    Carmem Dolores Alves UFPE

    [email protected]

    Resumo: O olhar acerca das relaes tnico-raciais nos impulsionou a mover esforos para construo de uma postura terica sobre a problemtica. O texto pretende refletir sobre o racismo na escola, tendo como aporte terico os conceitos marxistas de classe social e sua contribuio para a educao, estabelecendo um breve dilogo entre esse pensamento e a sociologia das relaes de poder, a partir de uma pequena comunidade, defendida por Norbert Elias. Demarcamos como foco a questo racial e suas interfaces vivenciadas no interior da escola. Palavras-chaves: Racismo na escola, luta de classes e estabelecidos-outsiders. Abstract : A look about the ethnical-racial relations moved me to build a view regard the racism in the school. I intend using Marxist social struggle class concepts. As a north/heading, make an account regard the net impact of this Marxist views upon the materialization and development of educational social buildup process; at the same time drawing a short parallel with the power relations sociology, from Norbert Elias view point, of small community. We elected the racial question and its interface inside the school, as the main focus, in a day-to-day over a decade of observation. Introduo Este trabalho parte de uma pesquisa mais ampla, (1) sendo resultante, tambm, das reflexes tericas e prticas, vivenciadas na prtica como gestora escolar de uma escola e no Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE. ______________________________________ 1. Trata-se de uma dissertao de Mestrado em andamento do Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal de Pernambuco- UFPE, 2009

    No dilogo para construo de conhecimentos, nosso esforo ser apresentar uma reflexo acerca das relaes tnico-raciais vivenciadas no interior da escola, privilegiando dois pensadores Karl Marx e Norbert Elias. Para entender a escolha dos autores, propomos algumas consideraes: ressaltamos que no pretenso adentrar na produo de Marx, sua obra abrangente e complexa, optamos por um recorte que considera a luta de classe e sua contribuio para o debate educacional e as relaes raciais nesse contexto. (2) Quanto a Elias recortamos o conceito de configurao, considerando como caracterstica

  • fundamental a interdependncia dos indivduos em sociedade, ligando os seres humanos entre si, no tempo e no espao, estabelecendo, assim, padres flexveis entre as pessoas em sociedade. Nosso olhar est voltado para construo de novos conhecimentos sobre a temtica das relaes tnico-raciais e culturais na educao, destacando a escola como lcus desse processo. Pontuaremos algumas reflexes que permeam esse debate: evidencia-se a importncia da temtica, medida que a repercusso do debate aponta para reparos de danos histricos, sociais, entre outros, sofridos pela populao negra ao longo da histria. Nessa linha de argumentao, destacamos a importncia pedaggica da ampliao do currculo, atravs da Lei 10.639-03 para a construo de novas relaes na escola e na sociedade. Outro aspecto de fundamental importncia a efetivao de direitos sociais, pressupondo a formulao de novos conceitos, sendo inevitvel a contribuio da cincia. A filiao a esse projeto est inscrita em nossa trajetria de vida, como gestora escolar, na luta por direitos sociais por uma escola de qualidade e por uma educao anti-racista.

    Nesse contexto, o debate sobre racismo e cultura de matriz africana na escola pressupe uma contextualizao, enfocando as desigualdades socioeconmicas e os conflitos entre grupos e os aspectos das relaes de poder (3) vivenciados na escola. A abordagem est vinculada a um amplo debate e foi concebida pontuando algumas reflexes que permeiam o estudo e partem das seguintes indagaes: como a escola vem atuando para superao do racismo? Como as relaes harmoniosas e de conflitos so vivenciadas? Quais as diversas faces desse processo? Os questionamentos e reflexes nos levaram a assumir uma postura investigativa visando encontrar respostas para as questes levantadas. ____________________________________ 2. Refiro-me ao capitalismo: Istvn Mszario, Educao para Alm do capital, p, 22 3. Refiro-me ao capitulo: ELIAS, Norbert, e SCOTSON, John. Os estabelecidos e os outsiders: p, 23 Contextualizando o Problema O racismo no Brasil, historicamente, herdou fortes resqucios do regime escravista, constituindo-se em fenmeno arraigado no seio da sociedade brasileira. Suas manifestaes e o reconhecimento de seus efeitos so fundamentais para analisar como esse fenmeno vem operando na sociedade brasileira. Nesse contexto, a preocupao da elite no final do sculo XIX era no comprometer a formao tnica e a identidade nacional, apoiada em teorias racistas da poca que apontavam para influncia negativa do negro, em virtude de sua herana inferior. Evidenciando-se, ento que o racismo no apenas um modo de pensar que minimiza a existncia humana, considerando a superioridade de uma raa em detrimento de outra. (4) Esse procedimento de excluso est vinculado a uma idia do racismo como subproduto da sociedade de classes. O Estado apropriando-se desse pensamento, vem historicamente negando direitos sociais populao negra. Esse processo vem se configurando com as dificuldades de acesso ao mundo do trabalho, ao sistema produtivo, educao, entre outros. Nessa linha de argumentao, a presena do Estado foi decisiva na estruturao de uma sociedade que se estabeleceu com profundas desigualdades econmicas e sociais excluindo alguns de seus segmentos em especial, da populao negra. A partir do contexto apresentado, o racismo institucional configura-se como fracasso coletivo das organizaes, instituies e do Estado em prover servios e atendimentos em todas as instncias, de forma igualitria para todos. O racismo institucional um fenmeno globalizado, haja vista, a abertura das fronteiras agilizando um processo de imigrao jamais visto na histria. Esse processo deu lugar a um crescimento do racismo e da xenofobia em muitos pases da Europa e nos Estados Unidos.

  • As semelhanas existem em vrios contextos e em outras partes do mundo, principalmente pelo racismo institucional ser praticado contra os imigrantes dos pases pobres. (5) Nessa perspectiva, o racismo institucional se revela atravs de mecanismos e instituies pblicas, explcito ou no, que dificultam o fim da desigualdade entre negros e brancos. Pode ser visto ou detectado em processos, atitudes e comportamentos que contribuem para a discriminao por meio de preconceito intencional ou no, ignorncia, desateno e esteretipos racistas que prejudicam determinados grupos tnico-raciais. ______________________________________ 4. MUNANGA, K, Rediscutindo a mestiagem no Brasil 200 p.22 5. PNUD, 2005, p, 78

    Convm destacar, a promulgao da Lei 10.639-03 como uma das possibilidades de superao do racismo institucional na escola. no espao escolar que se estabelecem relaes com estudantes de diferentes ncleos familiares. Nesse contexto, a escola constituiu-se de fato, no primeiro lugar de vivncias das tenses raciais. Esses conflitos, resultantes da apropriao de expresses racistas por vezes incorporado por crianas e adolescentes. De modo que, esse processo leva a ridicularizao dos fentipos individuais, e da cultura, prejudicando a construo da identidade negra ou afrodescendente. A excluso simblica poder ser manifestada por diversas aes constatada em observaes do cotidiano escolar. (6) A excluso identitria de uma parcela considervel da populao inevitvel, a imposio de uma cultura como superior, desqualifica e marginaliza outras culturas, com outros patamares de civilidade, como ndios, africanos e seus descendentes. Pensar em uma escola como promotora da igualdade racial reconhecer seu papel contraditrio de reprodutora das desigualdades, reforando o racismo e a discriminao racial. Segundo Petronila, pouco tem adiantado garantir lugar para todas as crianas nos bancos escolares como um caminho para combater o racismo e a intolerncias, quase nada conseguir se no for garantida a introduo de temas relativos diversidade cultural e social, se pessoas e grupos continuarem interagindo em estruturas e padres viciados e atitudes discriminatrias, se lhes faltar disposio para que novas relaes sejam criadas. (7) Nesse percurso, os negros e afrodescendentes deparam-se, na escola, com diferentes olhares sobre o seu pertencimento racial, sobre a sua cultura e a sua histria, muitas vezes necessrio negar sua identidade e sua prpria viso experimental da negritude. Estamos no complexo campo das identidades, das diferenas, das semelhanas e, sobretudo, das diversas maneiras como essas so tratadas.

    Concebemos que as verdadeiras mudanas perpassem pela escola na construo de relaes de igualdade. A despeito de alguma mudana promissora emergente pensar a possibilidade de vivncias baseadas em uma cultura da igualdade social, de gnero, de orientao sexual e tnico-racial, entre outras, vislumbrando a excluso da intolerncia e a construo de novas formas civilizatrias. ______________________________ 6. CSSIA, Frazzi, O drama racial de crianas brasileiras, 2 edio editora Autntica 2006 p, 62 7. SILVA, Petronilha B. G. e. Diversidade tnico-Cultural Educao e Sociedade, n. 32, 2000 p, 56 Discusso terica Como aporte terico tomaremos como suporte os autores Karl Marx e Norbert Elias. Nesse primeiro bloco, apresentamos um recorte do pensamento Marxista que pressupe no apenas reconhecer o grande pensador e a relevncia de sua obra para as cincias sociais, mas, sobretudo, admitir a complexidade de seu pensamento.

  • Nessa perspectiva, no pretendemos nos referir ao conjunto de sua obra, isso seria inviabilizado pela complexidade de seus conceitos e no corresponderia ao nosso percurso investigativo. O proc