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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 1

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 1

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 3

APRESENTAÇÃO

PROFESSOR/A MEDIADOR/A ESCOLAR E COMUNITÁRIO/A (PMEC)

PENSANDO A VIOLÊNCIA

UM POUCO SOBRE A BRASILÂNDIA

OS PRIMEIROS PASSOS

CAMINHANDO

Conhecendo as escolas

Professores/as

Pensando a formação para professores/as

Alunos

CONSTRUINDO COM AS ESCOLAS

Rodas de conversa

Comissão de mediação de conflitos

Biblioteca

Grêmio estudantil

Fanzine e Podcast

TRABALHANDO TEMAS QUE SE REPETEM

Por que discutir drogas na escola?

Discussões de gênero chegam à escola

CONCLUINDO

Por que investir nos/as alunos/as?

Terminando para recomeçar

ANEXOS

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SUMÁRIO

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Este material é dedicado aos/às profissio-nais que participaram e apoiaram o Projeto, apostando em novos caminhos para a edu-cação. É, também, dedicado aos/às alunos/as que insistem em não se acomodar.

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 5

APRESENTANDO

O Instituto Sou da Paz (ISDP) é uma organização não governamental cuja missão é contribuir para a efetivação de

políticas públicas de segurança e de prevenção da violência que sejam eficazes e pautadas pelos valores da demo-

cracia, da justiça social e dos direitos humanos. Está na Brasilândia, zona norte da cidade de São Paulo, há dez

anos, sendo que, desde 2013, em parceria com a Prefeitura Municipal de São Paulo, vem atuando para: 1) influen-

ciar políticas públicas de prevenção à violência e para inclusão social e 2) contribuir para trajetórias de adolescen-

tes e jovens em situação de extrema vulnerabilidade e risco.

O Projeto Construindo Pontes, tocado pela equipe de Prevenção da Violência do ISDP, ocorreu entre os meses de

agosto/2015 e dezembro/2016, em escolas da rede estadual de ensino do distrito da Brasilândia, tendo como públi-

co principal alunos/as em cumprimento de medidas socioeducativas e/ou considerados/as indisciplinados/as pelas

equipes pedagógicas.

Com a orientação de pensar as escolas enquanto comunidades pedagógicas, três eixos principais foram trabalha-

dos: formação continuada para professores/as, supervisão do Professor/a mediador/a escolar e comunitário/a

(PMEC) e grupos de reflexão e debate com alunos/as, para a criação de intervenções de ocupação e cuidado do

espaço escolar. As ações nasceram da construção coletiva com profissionais e alunos/as, considerando singulari-

dades, potências e desafios de cada escola participante, e estiveram estruturadas nos seguintes princípios: parti-

cipação voluntária, construção coletiva, inclusão, respeito e colaboração.

Acreditando na educação como, também, uma forma de encontro entre pessoas, este material foi elaborado para

inspirar práticas que demais escolas poderão testar e adotar: não exigem muito além do material humano, da aten-

ção educadora e do respeito por aqueles/as que compõem as unidades escolares.

Boa leitura!

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES6

PROFESSOR/A MEDIADOR/A ESCOLAR E COMUNITÁRIO/A (PMEC)

O ponto de contato do Projeto nas escolas foi o/a PMEC, que ajudou a conduzir e a estruturar cada passo caminhado. A função do/a PMEC está vinculada ao Sistema de Proteção Escolar da rede estadual de ensino, consolidada pela Resolução SE 19/2010 da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Entre suas atividades, está a de acompanhar alunos/as na relação com seus pares e facilitar o diálogo entre estes/as, professores/as e familiares.

Deslocado/a da sala de aula, pode atuar nos conflitos nascidos na escola, amplian-do “os fatores de proteção próprios àquela comunidade escolar, coibindo eventuais fatores de vulnerabilidade e conflitos inerentes a esta convivência”1. Neste Projeto, o/a PMEC foi considerado/a uma parceria fundamental: a partir de sua função, aju-dou a pensar a viabilidade e a encaminhar as propostas junto à equipe pedagógica.

Quando as múltiplas condições inclusivas e de garantia de direitos ocorre, é possível afirmar que o/a PMEC, a partir de sua função, contribui para o cumprimento do Esta-tuto da Criança e do Adolescente (ECA), especialmente o proposto nos artigos:

1. Fonte: http://www.educacao.sp.gov.br/spec/sobre-programa-spec/. Acesso em 23/02/2016.

Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

Art. 53: a criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I - igualdade de condi-ções para o acesso e permanência na escola; II - direito de ser respeitado por seus educadores; III - direito de contestar critérios avaliativos, poden-do recorrer às instâncias escolares superiores; IV - direito de organização e participação em entidades estudantis; V - acesso à escola pública e gra-tuita próxima de sua residência.

A FUNÇÃO DO/A PMEC POR ELE/A MESMO/A

“O PMEC, diferentemente da mediação técnica, seria a voz do aluno den-tro da escola...”.

“Haja vista a localização desta escola e a questão de ser uma comunidade exposta e vulnerável, é através do diálogo que a gente tá conseguindo que eles [os alunos/as] sintam que o espaço é deles; acho que é essa parte mais importante”.

“Professor Mediador é um professor que veio para trabalhar, eu diria que na proteção das crianças. Porque as crianças estavam “assim”, estão ain-da, não é uma coisa que já resolveu. Tem muitos conflitos e agora com essa figura [o PMEC] deu pra criança ser ouvida. Foi assim, um projeto que deu a escuta, eles são escutados agora. E isso faz toda a diferença”.

“O PMEC é aquele que vai mediar conflitos. O conflito é diferente de vio-lência. Os conflitos são coisas boas, que acontecem na vida de cada um e existe para provocar mudanças boas”.

“Quando eu procurei a mediação, eu não procurei por conta de não querer ficar na sala de aula; eu procurei a mediação porque eu acreditei que ela fosse o perfil daquilo que eu acredito, de poder conversar com aluno, de poder garantir algumas coisas para o aluno, de poder explicar para ele também os direitos dele”.

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PENSANDO A VIOLÊNCIA

Parte da sociedade, a escola é atravessada pelas questões que a constituem e que, muitas vezes, dificultam que práticas educativas sejam, de fato, adota-das. Por isso, o Projeto focou processos que têm dificultado a escolarização de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas e daqueles/as considerados/as indisciplinados/as pelas equipes pedagógicas, uma vez que são estes alunos/as que compõem o público com maior probabilidade de evasão escolar.

O cotidiano das escolas, em especial as de ensino público, é revestido por diferentes formas de enfrentamento vividos tanto por alunos/as quanto por professores/as:

Os temas que apareceram nos grupos com alunos/as tratavam das agressões que vivenciam e/ou testemunham cotidianamente, como a violência – física e psicológica – sofrida pela polícia e o mundo do crime, a discriminação em fun-ção da raça, da orientação sexual e do gênero, a fome, os trabalhos domésticos, entre outras. Também os/as professores/as levavam às formações temas sen-tidos como violadores, como a desqualificação da profissão, a reduzida autono-mia em sala de aula, as longas jornadas de trabalho e outras condições.

Somado a isso, as equipes pedagógicas, de maneira geral, são desafiadas por indisciplinas cometidas por alunos/as. Estes/as, é preciso lembrar, vivendo a adolescência, tendem a ser mais curiosos/as em relação às coisas do mundo. O adulto pode apoiá-los/as a fim de que conheçam diferentes relações e ex-periências nas quais se apoiarão para tomar suas próprias decisões.

“É uma ilusão crer que se possa fazer desaparecer a agressividade e, como consequência, a agressão e o conflito. [...] Concretamente, isso significa que o problema não é fazer desaparecer da escola a agressivi-dade e o conflito, mas regulá-los pela palavra e não pela violência – fi-cando bem entendido que a violência será bem mais provável, na medida em que a palavra se tornar impossível”.

Fonte: CHARLOT, B. A violência na escola: como os sociólogos franceses abordam essa questão.

“A pobreza, o tráfico, o sofrimento, a violência, o abuso, a solidão, a miséria, a doença, as más condições de trabalho, o excesso de aulas, a banalização e naturalização dos acontecimentos cotidianos, entre ou-tros, estão presentes em muitas histórias”.

Fonte: MACHADO, A. M. Formas de pensar e agir nos acontecimentos escolares: abrindo brechas com a psicologia.

É preciso lembrar que a todo tempo fazemos nossa história e que a cada dia construímos quem somos, e isso não é diferente para o/a adolescente em con-flito com a lei. A escola, entendida como fator de prevenção à violência, precisa ser pensada em intensidade e continuidade para que possa usar a potencialida-de de apoiar os/as alunos/as, inclusive aqueles/as tidos como “mais difíceis”. O primeiro passo é recusar a ideia de que a violência é algo a ser combatido, como se fosse possível excluía-la totalmente da vida das pessoas.

Se há uma intensa violência externa à escola que, certamente, nela entra, há, também, formas de se opor a ela a partir da proteção que o ambiente escolar pode promover: a escuta, a comunicação construtiva e colaborativa, a qualifica-ção das aulas, a realização de atividades extraclasse, a abertura à comunidade, o cuidado...

A escola, quando reforça as condições que propiciam o diálogo colaborativo, quando luta pela permanência do/a aluno/a que evade ou que é considerado/a “difícil”, enfim, quando é atenta e percebe as condições de omissão e/ou abuso, cuida do/a aluno/a e permite que outras histórias, mais felizes, possam ganhar espaço. Para que isso ocorra, é necessário que os/as profissionais, para além de receberem formação continuada, possam se perceber amparados/as.

Para saber mais: A escola e o adolescente em conflito com a leihttp://jota.info/artigos/escola-o-o-adolescente-em-conflito-com-lei-02052016

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UM POUCO SOBRE A BRASILÂNDIA...

A Brasilândia está localizada em um dos extremos da zona norte da cidade de São Paulo; seus limites são os bairros Vila Nova Cachoeirinha, Freguesia do Ó, Piritu-ba, Cajamar e Perus. Nascido a partir do desmembramento de chácaras e sítios ali localizados, o bairro foi loteado e ocupado, desde sempre, por uma população de “classe baixa”. Território marcado historicamente pela pobreza econômica e pela escassez da oferta de serviços socioassistenciais, de atendimento à saúde, de cultura e de lazer, é, também, conhecido pela constante violência policial e pela elevada letalidade de jovens. Escrever “Brasilândia SP” nos sites de busca é encon-trar inúmeras matérias sobre roubo, tráfico, mortes, chacinas e violência policial - a primeira opção de busca, ao digitar a palavra, foi: “Brasilândia SP é perigoso”.

Jovens moradores/as e estudantes na Brasilândia o definem como um local pe-rigoso, mas, também, lugar de laços comunitários fortes, uma espécie de apoio mútuo obrigatório para a sobrevivência. A sociabilidade destes/as é principalmente vivenciada nas escolas, já que o bairro dispõe de poucos atrativos para a juventude. Como equipamentos públicos, tem-se a Casa de Cultura da Brasilândia e a Fábrica de Cultura da Brasilândia; nas proximidades, há o CEU Paz, o CEU Jardim Paulis-tano, a Fábrica de Cultura da Cachoeirinha, a Casa de Cultura da Freguesia do Ó e o Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso (CCJ). No entanto, são poucos/as os/as jovens que frequentam tais espaços, por conta da distância de suas residências .

Assim, o lazer, a diversão e a socialização da juventude local se dão, principalmen-te, nas praças, nos campos de futebol, nas pistas de skate, nas “quebradas”. Atra-vés da cultura do Sound System, são montadas nas ruas estruturas de som que oferecem uma variedade de estilos musicais de forma gratuita; alguns exemplos são o Natural Dub SP, Dubrasa e Raízes Sound System. Não é diferente com o funk e os “fluxos”, como o do “Iraque”, que ocorrem nas ruas e recebem forte repressão policial. Ainda no campo da cultura, o bairro agrupa saraus que já são referencia-dos em outras partes de São Paulo, como o Sarau da Brasa, além das apresenta-ções musicais de grupos locais, como o Raiz Criola e o Útero Punk. Há, também, o futebol de várzea, que mistura gerações e que “força” as pessoas a acordarem cedo nos finais de semana para assistirem aos jogos de times como o Vida Loka e o The Waillers. O bairro tem uma rádio comunitária de renome, a Rádio Cantareira,

Outras sugestões para pensar a comunidade escolar a partir destas possibilidades são:

1. Estimular situações e espaços de diálogo, para que os jovens exponham suas ideias e reivindicações sobre o universo escolar, respeitando sua autono-mia, sua linguagem e sua maneira de pensar;

2. Traçar estratégias específicas de ação que permitam integrar os discentes considerados “problemáticos”;

3. Sensibilizar os estudantes sobre o fato de as microviolências e a violência simbólica serem um problema tão sério quanto quaisquer outras violências;

4. Investir na criação ou no fortalecimento de grêmios e outras entidades re-presentativas dos estudantes;

5. Estimular a concretização de atividades artísticas, como cursos de grafite, res-tauração e outros, que incentivem o sentimento de pertencimento a suas escolas;

6. Desenvolver programas de mediação escolar, possibilitando que os próprios estudantes analisem os conflitos e proponham soluções para eles.R

Fonte: ABRAMOVAY, M. Conversando sobre violência e convivência nas escolas.

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“A Brasilândia pra mim é tipo uma casa, porque vim pra cá pequeno e tive muitas histórias. Na Brasilândia, toda a etapa da vida vai mudando as visões; e hoje, com 15 anos, falo que não gostaria de sair daqui por-

que aqui é um lugar onde a gente tem lazer, de má qualidade, só que dá pra usufruir. Um lugar onde a gente pode curtir um baile “da hora”, um “rolê” gostoso. Porém, em nosso bairro tá acontecendo muitas mortes devido ao final do ano. É só mudar a “crocodilagem” que fica tudo tranquilo”.

Aluno de 15 anos, participante do Projeto.

OS PRIMEIROS PASSOS

Tendo apresentado o território no qual o Projeto Construindo Pontes foi desen-volvido, neste ponto contaremos brevemente sobre como foi iniciado nas escolas. A primeira etapa foi sua apresentação para a Diretoria de Ensino Norte 1: (DE), especificamente, para a supervisão dos PMECs da região, vinculada ao Sistema de proteção escolar. A Supervisão foi importante parceira ao longo de todo o caminho.

A partir daí, apresentamos a proposta para os/as PMECs participantes do Polo Freguesia do Ó/Brasilândia. Desse encontro, nove PMECs inscreveram suas es-colas, sendo que o Projeto Construindo Pontes foi realizado em parceria com cinco delas, conforme proposta inicial do Instituto Sou da Paz.

Também apresentamos o projeto para os/as demais PMECs da DE - Norte 1, em sua reunião de orientação técnica (OT), para que todos/as estivessem cientes que o Projeto Construindo Pontes ocorria na região de atuação das respectivas escolas. Por fim, foram realizadas reuniões para pactuação com a gestão de cada escola participante.

e diversos grupos cênicos e circenses, como o Akalantys, além de movimentos que dão cor ao bairro, através do graffiti, como o Entre Becos e Vielas. Brasilândia é, assim, lugar onde “dá para curtir um rolê gostoso”, mas que é palco de “muitas mortes”, como disse um aluno de uma das escolas em que trabalha-mos. É local onde a juventude vivencia mais a marginalidade das atividades autô-nomas do que os benefícios que o poder público ofereceria.

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As escolas da rede estadual de ensino da cidade de São Paulo enfrentam desafios muito semelhantes, como a vulnerabilidade dos territórios em que estão locali-zadas, a superlotação das salas de aula, a defasagem de recursos pedagógicos e financeiros, entre outros. São, também, diferentes, uma vez que são formadas por equipes e alunos/as que demonstram interesses e desafios próprios. A proposta do Projeto Construindo Pontes foi conhecer as escolas para, a partir de seus olhares e demandas mais urgentes, apoiá-las na construção de mudan-ças a partir de atividades pontuais e/ou de longo prazo. Com esse saber “cons-truindo a muitas mãos”, duas tarefas se deram: 1) em grupos semanais e/ou quinzenais, foram planejadas atividades de intervenção com os/as alunos/as, e 2) mensalmente, foram promovidos encontros para formação com as equipes docentes, a fim de com elas pensar em hipóteses para o que as desafiava no tra-balho pedagógico e buscar alternativas possíveis. Em ambas, o/a PMEC esteve presente para facilitação e organização; em diversas ocasiões, foram realizadas reuniões apenas com os/as PMECs, a fim de discutir situações na escola e apoi-á-los/as a encaminhá-las.

Desta forma, o desenvolvimento das metodologias propostas pelo Projeto foi construído em conjunto com cada equipe pedagógica e com os/as alu-nos/as que participavam dos grupos. O mais importante era que as pessoas se sentissem parte e gostassem do-que faziam. Que lutassem para que cada passo pudesse ser dado.

Todas as etapas foram pensadas considerando os recursos que as escolas pos-suíam: alunos/as, professores/as, ideias e disposição. Por esse motivo, as ati-vidades se deram de modos e com resultados diferentes em cada uma delas. Abaixo, vamos contar um pouco mais sobre os espaços de atuação.

CAMINHANDO

Há muitos discursos que apostam na formação de professores/as como alter-nativa para as dificuldades que as escolas enfrentam. Se, por um lado, isso é bastante positivo, ao promover a troca e a renovação de ideias, por outro, sem a devida reflexão sobre o tema, é como se disséssemos que a formação, sozinha, daria conta de responder todas as questões sociais, políticas e culturais do nosso mundo; e como se o/a professor/a não fizesse parte dele e não fosse atravessado por dinâmicas que interferem no seu trabalho. A formação é, certamente, um elemento importante para fortalecer as práticas pedagógicas. Mas, acreditamos que há mais a ser falado sobre esse assunto.

Considerando que são diversos os desafios que as equipes pedagógicas relatam enfrentar, que eles são recorrentes e, ao mesmo tempo, diferentes, a proposta de formação para professores/as foi promover encontros nos quais pudessem apontar suas demandas a cada reunião e, a partir do debate e das sugestões de todos/as, coletivamente, produzir alternativas. Para isso, as reflexões propostas conduziam perguntas sobre o cotidiano da escola, de suas práticas e das con-dições de trabalho. Nesses momentos, ao mesmo tempo, se ensina e aprende. Entendemos que qualquer alternativa precisa ter base na realidade ou logo mor-rerá, ampliando a sensação de que não há nada a ser feito. O professor/a é fun-damental para que sejam pensadas alternativas para os desafios escolares.

A formação não se dá apenas quando há convidados/as especialistas em deter-minados temas. Muitas vezes, quem está envolvido/a na questão tem muito a

• Conhecendo as escolas • Professores/as

• Pensando a formação para professores/asÉ importante lembrar que a escola é uma comunidade. Portanto, precisa da participação colaborativa de todos/as. Cada segmento pode contribuir de um jeito, pois, possui responsabili-dades e potencialidade diferentes. É preciso debater para encontrar for-mas de utilizá-los da melhor maneira de ajudar a todos/as!

“Para se opor às resistências à mudança, o professor deve ser formado não como um portador de verdades a serem aplicadas a uma situação es-colar abstrata, mas incentivado a procurá-las na variedade social e cultu-ral de escolas concretas”.

Fonte: AZANHA, J. M. P. A formação do professor e outros escritos.

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 11

Fonte: AZANHA, J. M. P. A formação do professor e outros escritos.

Fonte: EPS EM MOVIMENTO. Uma possibilidade de fazer diferente.

“[...] Diferentemente de outras situações profissionais, o exercício da profissão de ensinar só é possível no quadro institucional da esco-la, que deve ser o centro das preocupações teóricas e das atividades praticas em curso de formação de professores. O professor precisa ser formado para enfrentar os desafios da novidade escolar contem-porânea. Nessas condições, qualquer proposta de formação docente deve ter um sentido de investigação e de busca de novos caminhos. A premência do problema educacional não justifica o apressamento de soluções, que devem ter sempre o caráter de tentativas [...]”.

“É preciso tentar problematizar com delicadeza, procurando aproveitar o que cada um pode oferecer. Tensionamentos e diferenças estarão pre-sentes e podem ser manejados, desde que a disposição não seja para a ´guerra´ ou ´para aniquilar o outro em sua incompetência”.

dizer sobre ela. O/A especialista poderá ajudar as equipes a pensarem em al-ternativas práticas para seus dilemas, mas, primeiro, a própria equipe escolar deverá entender suas questões e seus desafios.

Os momentos de formação podem se dar, por exemplo, nas Aulas de Traba-lho Pedagógico Coletivo (ATPCs) e podem servir para investigar dificuldades, compartilhar como pensam os/as profissionais e discutir soluções. Nesses momentos, é possível debater, por exemplo: “Será que meu colega tem al-guma sugestão para a dificuldade que estou tendo?”, “Será que ele/a vive o mesmo que eu junto a determinado/a aluno/a? Se sim, como lidou com is-so/a?”, “Será que alguém estaria comigo na atividade que quero desenvolver, para me apoiar?”.

Junto aos/às professores/as fomos aprendendo que, muitas vezes, o modo como se sen-tem no espaço de trabalho exerce influência sobre suas posições em sala de aula: se sentem medo, tendem a reagir; se escutam o tempo todo que devem evitar “certo tipo de aluno/a”, talvez se dediquem menos a eles/as; se não se sentem confiantes no bairro onde a escola está localizada, podem faltar. Enfim, há muitas questões que tornam as escolas lugares bastante complexos; entendê-las pode oferecer pistas para novos cami-nhos pedagógicos. As escolas possuem meios para desvendar muitas delas.

UMA SUGESTÃO...

Debater problemas não é o mesmo que discutir quem os causou – ou seja, as pessoas. Ao propor questões, as equipes pedagógicas precisam ter em mente as perguntas: “O QUE MAIS REFORÇA O PROBLEMA?” e “O QUE MAIS FORTALECE O TRABALHO EDUCATIVO?” Assim, poderão pensar quanto tempo e energia colocarão no debate de um assunto que as ajude a chegar a uma solução viável e proveitosa para a educação.

Fortalecer professores/as e demais profissionais tem a ver com construir esco-las melhor preparadas para acolher situações que aparecem na convivência com alunos/as e suas famílias e dar sentido para elas. “Estranhar” algumas coisas que acontecem é entender que algo não está dado – se acontece de tal jeito e em tal lugar, há motivos! Por isso, sugerimos perguntar antes de agir. É possível pensar, por exemplo:

1. “Por que isso aconteceu?”2. “Por que dentro da escola?” 3. “Podemos fazer algo para proteger quem se coloca em risco?” 4. “O que somente a escola pode fazer nesta situação e qual sua responsabilidade na proteção dos/as alunos/as?”

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O trabalho com alunos/as sempre se deu em grupo, entendendo que mesmo comportamentos individuais, muitas vezes, têm uma causa comum social. Para iniciar o processo, o combinado foi o de que, como não conhecíamos os/as alu-nos/as, os/as PMECs fariam o convite para o grupo. No primeiro dia, apresen-tamos a proposta do Projeto para que pudessem avaliar se gostariam ou não de participar dele. Em algumas escolas, havia nos grupos alunos/as cumprindo medida socioeducativa e/ou considerados/as indisciplinados/as junto com alu-nos/as consideradas/os “bons/boas”; em outras, o grupo era formado apenas por aqueles/as considerados/as “problemas” dentro da escola.

[Bom/boa aluno/a era entendido/a como aquele/a que consegue notas altas e não possui ocorrências relacionadas a comportamentos inadequados; “problema” é quem não tira notas boas e apresenta ações que são tidas como indisciplinadas].

De início, os grupos eram realizados sem a presença de profissionais da escola e tínhamos de dar sentido àquele espaço a ponto de que as alunas e os alunos voltassem, já que sabiam que a participação era livre. Pontuamos que no grupo poderíamos falar sobre normas e regras da escola, docentes, direção, uso de drogas, o final de semana de cada pessoa, violência policial, tráfico de drogas... Nenhum assunto era proibido, pois era importante que falarem para que am-pliassem seus repertórios e pontos de vista sobre os temas, inclusive os mais difíceis de serem escutados por nós.

Em algumas escolas, a violência policial tomava o maior tempo nas discussões; em outras era, o machismo, a relação docente discente, o uso de uniformes, pos-turas de inspetores/as, entre outros temas. Os assuntos sempre partiam das/dos alunas/os e orientavam o grupo. Nossa escuta sempre se pautou em um real interesse por aquilo que os/as alunos/as levavam, sem a intenção de que fosse assumida uma “verdade absoluta” ou o ordenamento dos comportamentos.

• Alunos/as

Com a saída e a entrada de alunos/as, em razão de transferência de matrícula por solicitação destes/as ou da própria escola, em algumas delas, o grupo não se manteve o mesmo durante a vigência do Projeto, dificultando para que os vínculos estivessem mais sólidos para a construção de ações.

Aos poucos, os grupos foram tomando corpo. As propostas de ações vieram depois que os vínculos já estavam mais sólidos e percebíamos a importância deste pro-cesso para os/as alunos/as. Tudo foi sempre discutido e debatido, tendo em vista o consenso. A aposta era a de que, através dele, os/as participantes teriam mais interesse em se tornar responsáveis pelos encaminhamentos. Caso alguém não concordasse, o debate sempre se apresentava no horizonte.

“Ao experimentar cotidianamente situações em que a igualdade de di-reitos é proposta e os adultos a respeitam, as crianças e adolescentes poderão descobrir as importantes dimensões do relacionamento social que possibilitam o estabelecimento da noção de alteridade, assim como o aprendizado dos valores que viabilizam a construção e a convivência numa sociedade democrática. Isso poderá acontecer, por exemplo, nos simples e antigos rituais existentes em quase todas as salas de aula: o professor irá atender, pela ordem, quem primeiro levantar a mão, independente de quem seja. Na condição de alunos, todos têm os mesmos direitos, e a es-cola precisa ter regras para que cada um aprenda a compartilhar o espaço coletivo com seus semelhantes”.

Fonte: SAYÃO, Y. Seriam eles indomáveis protagonistas?

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Lidar com as situações disparadas por essas questões é um desafio para as escolas. No entanto, ao não serem debatidas em profundidade, continuam se repetindo, mudando apenas as pessoas em foco. Tudo isso desgasta as equipes e dificulta o caminho para a promoção de um ambiente seguro e tranquilo para alunos/as e professores/as.

CONSTRUINDO COM AS ESCOLAS

Nesse ponto vamos contar, especificamente, sobre as atividades que foram cria-das em conjunto com os/as alunos/as e que avaliamos que poderão ser desenvol-vidas por equipes pedagógicas a partir dos próprios recursos humanos. Como dissemos, a proposta foi, a partir de reflexões sobre questões como “o que é a escola para você?”, criar alternativas para melhorar o ambiente escolar. Esse movimento tinha a ver com ampliar a apropriação dos/as alunos/as em relação à escola, apostando que isto lhes traria interesse em cuidar, permanecer e criar. Que fossem orgulhosos/as de suas escolas!

As propostas eram primeiro pensadas e montadas com os/as alunos/as para, de-pois, serem apresentadas à gestão da unidade escolar. Cabe dizer: as propostas que caminharam foram as que tiveram adesão e participação da gestão escolar ao longo de todo o processo.

Pensando em como lidar com esta questão, surgiu a ideia de desenvolver rodas de conversa nas escolas que envolviam, ao mesmo tempo, alunos/as e professores/as. Esse espaço de discussão foi “inventado” quando entendemos que havia muita abertura das escolas para falar sobre os temas, mas que precisavam criar um modo de fazê-lo que deixasse equipes e alunos/as à vontade para dizer aquilo que pensavam, além de aprenderem um novo ponto de vista.

Em algumas ocasiões, a mediação de pessoas convidadas contribuiu para um ambiente colaborativo e o acesso a novas informações. Para mediação das rodas foram convidados/as profissionais da rede local e externa, contribuindo para a ar-ticulação das escolas com o território. Teve, inclusive, uma roda mediada por uma ex-aluna da escola que hoje trabalha com cultura. Foram alguns temas:

1. Uso de drogas e redução de danos2. Preconceito racial e religioso 3. Condição da mulher nas periferias 4. Cultura 5. Escolha profissional e entrada na universidade 6. Lançamento de livros infantis e roda de leitura com os autores

Alguns temas aparecem com frequência especial nas escolas, como: uso de dro-gas por alunos/as, bullying, racismo, machismo e homofobia. Ainda que desa-fiem com intensidade as equipes, não são sempre trabalhados por elas por dife-rentes motivos, como o desconhecimento dos profissionais, a falta de tempo para a organização de debates e a prática já adotada de lidar com eles individualmente, por meio de conversas com as pessoas diretamente envolvidas em alguma situa-ção de conflito e/ou com seus responsáveis.

A partir das reflexões sobre a escola, alguns alunos decidiram que qualquer pos-sibilidade de melhoria passaria por conversar com a gestão. Entendiam que era preciso dizer o que os/as incomodava e como estavam dispostos a ajudar a fazer diferente. Assim, além de discutir sobre respeito e outros temas, o grupo entendeu que era importante apresentar uma alternativa.

Para isso, foi montada uma comissão para mediação de conflitos, que se reuniria semanalmente para resolver desentendimentos entre alunos/as e professores/as, de modo a trabalhá-los na escola e sem a necessidade de convocar os/as res-ponsáveis pelos/as alunos/as. Na primeira formação da comissão estavam: ins-petores/as, PMEC, coordenação pedagógica, professores/as voluntários/as e 04 alunos/as (duas meninas e dois meninos, decididos/as por consenso). Uma impor-tante decisão da Comissão foi a de que os desentendimentos seriam discutidos e encaminhados coletivamente e com a participação de todas as partes envolvidas, que poderiam compartilhar seus pontos de vista.

• Rodas de conversa

• Comissão de mediação de conflitos

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES14

Divergências ocorrerão! Elas poderão ser úteis se debatidas coletivamen-te e sem juízos de valor. Então, pense: sua escola vem discutindo mais que calando? O que precisaria haver no ambiente escolar para que, seja mais harmonioso e propicie tanto ensino quanto aprendizagem? Como conse-guir isso?

. . .Para montar uma Comissão na sua escola, sugerimos:

1. Decidir, por consenso, quem serão os/as representantes dos diferentes segmentos da escola que comporão a comissão. Essas pessoas podem ser rotativas, permitindo que outras participem também.

2. Definir os princípios que nortearão as discussões. No caso da que des-crevemos aqui, os alunos/as adotaram: respeito, igualdade, responsabili-dade, compreensão, caráter, mudança e personalidade.

3. Agendar os encontros para dias e horários que todos/as estarão disponí-veis e poderão se comprometer com o grupo. ISSO É MUITO IMPORTANTE PARA A CONTINUIDADE DA COMISSÃO!

4. A comissão precisa definir ações que sejam possíveis para todos/as. De-liberar compromissos que as pessoas ainda não estão preparadas para assumir pode ser um caminho para o desgaste e a desistência.

. . .

Há escolas que desenvolvem uma diversidade de projetos extraclasse que cami-nham com força especial em razão da frequente presença e participação da ges-tão, do/a PMEC e de docentes. Nos espaços em que encontramos esta condição, os grupos com alunos/as tiveram participação quantitativa e qualitativa, com o anseio em fazer ações na escola, com a proposição de discussões envolvendo discentes e docentes ou com a ocupação de espaços que a escola não vinha uti-lizando. A proposta de fazer a gestão de uma biblioteca veio desta “urgência”.

De início, com uma quantidade maior de alunos/as, estes/as se prepararam para limpar, reorganizar e redesenhar a biblioteca: passaram dias na organização, re-agrupando os livros, pensando em outras formas de o espaço se organizar e até levando as cortinas para serem lavadas em suas casas. No primeiro momento, a escola via esta movimentação com alguma desconfiança, pelo fato de não terem docentes acompanhando o processo; aos poucos, a confiança foi conquistada e o trabalho prosseguiu, com a abertura da biblioteca no período noturno, possibili-tando o empréstimo de livros.

No segundo semestre, duas alunas ficaram responsáveis pela gestão da biblio-teca, passando a chegar mais cedo na escola para abri-la no período da tarde. Arrumaram o que havia sido danificado com o tempo e formataram um controle de cuidados necessários para manutenção do espaço, pensando em regras para os/as visitantes. Pouco a pouco alunos e alunas do período da tarde passaram a compor a gestão e a ajudar na promoção de atividades no espaço, para as quais convidavam diversas pessoas, tendo a apresentação de livros, de coletivos cultu-rais do bairro e de outras vivências que puderam ser compartilhadas e somadas ao repertório de experiências dos/as alunos/as. Foi gravado um podcast contan-do o processo de ocupação e gestão do espaço:https://tinyurl.com/y9a6383o.

Estivemos junto a estas alunas, as apoiando em suas decisões e fortalecendo o que elas entendiam que poderíamos ajudar. Ambas se formaram em 2016, mas “o pessoal da tarde” continua, já tendo afirmado seu desejo em prosseguir com a biblioteca em 2017. Que a autonomia discente prossiga!

• Biblioteca

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Fazia tempo que não se via tamanha movimentação de alunas e alunos na escola em que o grêmio foi organizado. O PMEC contava que experiências de grêmios, festas e campeonatos organizados pelos/as próprios/as alunos/as haviam aca-bado há pelo menos cinco anos!

Começamos a construir pontes na escola em 2015, com dificuldade para reunir alunos/as; em 2016, a partir de sugestões de um aluno sobre como convidar os/as demais, ou seja, explicando de maneira mais clara a proposta do grupo, engatamos na parceira. Rodas de conversa sobre diversos assuntos teceram as atuações, compartilhando vivências e construindo vínculos. O assunto do grêmio estudantil surgiu em uma dessas rodas, com alunos/as comentando que haviam montado uma chapa e sobre suas promessas de campanha.

Após as eleições, integrantes do grêmio eleito levavam diversas dúvidas sobre como prosseguir, encaminhar suas pautas e se estruturar na escola. Foi nesse movimento que pudemos contribuir para a construção do grêmio e de outras articulações dis-centes coletivamente discutindo quais seriam os melhores encaminhamentos para as pautas estabelecidas. Assim, convidamos o presidente do grêmio de outra escola da Zona Norte para compartilhar suas experiências e ajudar a estruturar as propos-tas dos/as alunos/as: lemos e discutimos materiais (https://tinyurl.com/y8l26lu7), documentos sobre os marcos legais para estabelecimento do grêmio estudantil e construímos juntos/as o estatuto deste grêmio.

Depois disto, o grêmio, junto com outras movimentações de alunos/as da escola, organizou um campeonato de futebol e de outras modalidades esportivas, além da festa junina e da festa do Halloween. Mesas de pingue-pongue foram levadas para o pátio, organizaram uma campanha do agasalho e houve até festa de des-pedida dos terceiros anos do Ensino Médio.

Incentivar o hábito da discussão coletiva, da busca pelo consenso nas ações e o compartilhamento das vivências são algumas das receitas que fizeram com que uma escola onde não havia organização discente há tempos retornasse a desejar e a realizar atividades pedagógicas e culturais, comprovando que a escola é mui-to mais do que aquilo que se passa em sala de aula.

2. Um dos materiais que embasaram esta construção foi o Caderno Grêmio em Forma, produzido pelo Instituto Sou da Paz e disponível em: http://www.etepb.com.br/etec/arq_alunos/downloads/gremio/caderno_gremio_estudantil.pdf

Lousa, giz, caderno, caneta, lápis, borracha, papel almaço, cartolina e lápis colori-dos. Um/a professor/a lá na frente, falando, falando, escrevendo, escrevendo e os/as alunos/as, nas cadeiras, escrevendo, copiando, decorando. Avaliação com con-sulta, com uso da apostila, prova surpresa ou um trabalho para fazer em casa. Dos primeiros anos do Fundamental II ao terceiro ano do Ensino Médio, este é o normal. Buscar alternativas metodológicas para a sala de aula é uma urgência; tornar au-las mais atrativas para os/as alunas/os é uma responsabilidade do docente que, na maioria das vezes, é impedida pela rotina intensa de trabalho.

Na atuação do Projeto Construindo Pontes, uma das estratégias para sistematizar discussões e divulgar aquilo que foi sendo amadurecido coletivamente nas rodas de conversa foi o uso de duas ferramentas que costumeiramente são classificadas como mídia independente: o fanzine e o podcast. O primeiro é uma espécie de jor-nal que pode ser feito de forma manual ou digital. Seu conteúdo é livre: pode ser uma história em quadrinhos, contos, denúncias, letras de músicas... O podcast é como um programa de rádio disponibilizado na internet; é livre também, podendo ser sobre futebol, música, novela e outros.

A apropriação dessas ferramentas é sugerida pela facilidade de construção de am-bas em um contexto escolar. Para o fanzine é preciso folhas sulfite (ou qualquer outra), dobrar, montar como um livro, elaborar todo o seu conteúdo, xerocar e di-vulgar. Para o podcast pode ser usado um gravador, computador e até mesmo o celular para gravar sons; depois, elaborar um roteiro, programar e editar no com-putador, utilizando programas de fácil manejo.

Na área de História, por exemplo, podem ser construídos fanzines sobre as di-versas fases da história do Brasil; para a Era Vargas, em outro exemplo, teria um grupo responsável pela parte econômica, outro pelas leis trabalhistas, outro pela atuação sindical e assim por diante. Nas aulas de Matemática poderiam ser feitos fanzines sobre como resolver problemas matemáticos, que poderiam ser replica-dos para séries anteriores, fazendo a conexão do conhecimento aluno/a - aluno/a.

O podcast pode ser uma boa ferramenta para trabalhar discussões; por exem-plo, pode ser gravado um debate, com uma pessoa mediando, sobre a redução da

• Grêmio estudantil2 • Fanzine e Podcast

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES16

maioridade penal, com uma pessoa discursando a favor e a outra contra. Ou pod-casts que tratem de explicar a fauna e a flora de determinado território brasileiro ou as cavidades rochosas de algum parque.

Se o/a docente se apropriar destas ferramentas e conseguir construí-las junto com seus/suas alunos/as, sem dúvida, terá um diferencial em sala de aula e na escola. Para alunos e alunas, é a possibilidade de desvendarem outras formas de comunicação (um jornal e uma rádio do grêmio, convites para festas, divulgação dos campeonatos de futebol e o que mais desejarem). A escola também pode se apropriar, repassando informes gerais através do formato de fanzine e do podcast para divulgar passeios, reuniões de pais e de conselho.

TRABALHANDO TEMAS QUE SE REPETEM

Há situações às quais os/as alunos/as se expõem por curiosidade, por pressão ou vonta-de de acompanhar seus/as amigos/as, ou porque foram apresentados/as a eles/as desde a infância. Questões como o uso de drogas e de gênero são duas que mostraram bastante presença no cotidiano dos/as alunos/as. Fechar os olhos para elas pode ser mais danoso, uma vez que não impede que retornem e, principalmente, atrapalha para que aquelas pessoas que poderiam – e deveriam – cuidar dos/as alunos/as, consigam fazê-lo.

Por que discutir drogas na escola?

Próximo às escolas há pontos de venda de drogas; alunos/as, em geral, co-nhecem pessoas que fazem uso; outras, que estão ou estiveram presas em razão da guerra às drogas, que continua matando e gerando sofrimento, sem se mostrar eficaz para prevenir o consumo e a venda.

Palestras e repressão têm se mostrado ferramentas pouco eficazes para isto. É preciso pensar: o que pode ser criado na escola para contribuir para o pensamento crítico? Como a escola pode ajudar a pensar? É possível levar à escola outras pessoas que falem e, também, escutem, sem inibições?!

Ao discutir o tema das drogas, a escola cuida do/a aluno/a e passa a mensa-gem de que a escola é um espaço de proteção – ao sentir que pode confiar, as chances de o/a aluno/a cuidar da escola serão maiores! A sugestão é que a equipe pedagógica contribua para o debate pensando em como cuidar do/a aluno/a. Por exemplo: é possível debater na escola os fatos de que as drogas não afetam todas as pessoas da mesma forma?; O uso combinado de drogas pode ser mais fatal?; Comer e beber água, na medida certa, pode prevenir quadros graves no caso do uso excessivo?; Quem chamar se não se sentir bem após o uso de alguma(s) droga(s)?

Fanzine realizado pelos alunos/as das escolas participantes do projeto.

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Outros temas também podem ser discutidos na escola, uma vez que nem sem-pre os/as adolescentes encontram quem os/as ouça. Escutá-los/as dá “dicas” sobre o que e como debater questões. Então, por que não inventar jeitos novos de discutir assuntos antigos? Lembre-se: a punição não tem mostrado qualquer resultado efetivo.

Discussões de gênero chegam à escola3

Foi frequente em todas as escolas o questionamento em relação ao ves-tuário de suas alunas: o tamanho da saia, a blusa curta (que mostrava o umbigo), o uso de regatas; muitas vezes, alunas foram proibidas de entrar na escola e direcionadas a voltarem para casa. Essa situação apareceu nas falas de muitas delas, que questionavam a diferença de regras em relação aos alunos (meninos).

Nos grupos realizados pelo Projeto, essa situação abriu discussões sobre as diferenças de gênero existentes nas escolas e na sociedade patriarcal da qual fazem parte, uma vez que geravam um sem-número de violên-cias, por vezes, menos perceptíveis, mas carregadas de intensidade. Res-postas masculinas àquilo que entendem como formas de traição eram sempre relatadas como carregadas de violência.

É possível – e preciso – debater também outras situações cotidianas, como o comportamento de garotos ligados a uma concepção de masculi-nidade e que podem ser vividas como abusivas e humilhantes para as me-ninas, como as “cantadas”, por exemplo. Além disso, as meninas vivem a diferença de gênero também a partir das diferenças nas obrigações das tarefas domésticas, precisando organizar uma série de atividades na vida, como limpar a casa, estudar, trabalhar, cuidar do irmão menor, e outras. Um dos efeitos da compreensão comum de que meninas e meninos são diferentes se reflete na escolarização.

Debater o patriarcado dentro da instituição escolar é urgente para funda-mentarmos um mundo mais igual amanhã, “tocar na ferida” é necessário para rever posturas e estabelecermos relações menos opressivas. Dizer que isto é “ditadura de gênero” é legitimar a violência contra a mulher.

Para saber mais: http://educacaointegral.org.br/reportagens/igualdade--de-genero-pressupoe-uma-sociedade-justa-para-meninos-e-meninas/

CONCLUINDO

Com tantos desafios enfrentados pela escola pública – professores/as com extensas cargas horárias e remunerações baixas, muitos/as alunos/as por sala de aula, alu-nos/as que passam fome e frio e que dividem o tempo com o cuidado de casa e com o trabalho, para não dizer de outras condições que, certamente, se fazem presentes nesses espaços –, é importante lembrar que investir na escolarização é cuidar de um contexto muito mais amplo:

As histórias e sugestões que preenchem estas páginas ocorreram no ambiente das escolas que, voluntariamente, participaram do Projeto Construindo Pontes. Foram concebidas e desenvolvidas a partir do que nos diziam ser mais urgente e importante. Mais do que isso, foram construídas com os recursos das próprias escolas: pessoas interessadas e dispostas a criar algo diferente em um contexto que tende a permane-cer o mesmo – constantemente desafiador. Apostamos, apenas, que há condições e discussões que possibilitam processos inventivos e que processos inventivos, produ-tivos e colaborativos poderão engajar alunos/as e professores/as pelo bem da escola. A fórmula é simples: para se cuidar de um lugar ou de alguém, é preciso que se sinta cuidado/a. É muito difícil que haja relação sem antes haver encantamento.

• Por que investir nos/as alunos/as?

“A educação é processo imprescindível para a formação do sujeito. Na escola, é possível aprender a ler, escrever, interpretar, participar de ro-das de conversa, fazer amigos, apaixonar-se, pesquisar, inventar formas de se expressar, problematizar os acontecimentos históricos, entender a colonização, calcular as quantidades, operar raciocínios, inspirar-se em pintores impressionistas, desenhar, entusiasmar-se por um passeio”.

Fonte: MARCONDES, A. Formas de pensar e agir nos aconteci-mentos escolares: abrindo brechas com a psicologia.

3. Outros temas e metodologias relacionados a gênero e diversidade podem ser encontrados no guia Gênero Fora da Caixa, elaborado pelo Instituto Sou da Paz. Disponível em: http://www.soudapaz.org/upload/pdf/genero_fora_da_caixa_web.pdf

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES18

Acontece que muitas pessoas vivem situações que os fazem, constantemente, sentir que são como o poema de Eduardo Galeano:

Apostar em melhorias a partir do que a própria escola oferece, a partir dos/as alunos/as que, tantas vezes, são considerados/as “difíceis” em razão de situa-ções de indisciplina, é ter sempre em mente que ninguém é uma coisa ou outra; somos a somatória dos encontros que tivemos, das pessoas que conhecemos, das experiências que nos apresentaram, das discussões que tivemos e de como aprendemos a entender tudo isso... E, como sempre podemos viver tudo de novo e de outros modos, apostar na educação é confiar na mudança de alguém a par-tir da presença afetuosa, cuidadora e atenciosa de outro alguém. Todos os “al-guéns” precisam disso – crianças, adolescentes e adultos.

Há espaços e espaços na vida de um adolescente. A escola é um deles e pode de-senvolver maneiras diferentes das que a família, a polícia, o médico, o psicólogo criariam para lidar com situações. De todas as conversas que tivemos com os mais diferentes alunos/as, todos/as concordavam: o modo como eram tratados/as na escola possuía um papel fundamental em suas vidas e em sua autoimagem.

É certo que comportamentos diferentes geram reações diferentes. Por isso, nem sempre é fácil, enquanto adulto, lidar da melhor maneira com um/a aluno/a “difí-cil”. É importante lembrar que adultos e adolescentes são diferentes: os primeiros têm outra maturidade, viveram mais, aprenderam outras maneiras de reagir para além de gritar, bater ou ofender. Os momentos de resolver conflitos são, também, de ensino para que os/as alunos/as aprendam outras maneiras de lidar com situa-ções conflituosas. Mas, atenção, pois, o/a aluno/a estará atento e esperará coerên-cia, assim, é necessário fazer o que se fala ou se sugere ao outro.

“Os ninguéns: os filhos de ninguém, os donos de nada.Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo a vida, fodidos e mal pagos: que não são, embora sejam.[...] Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata”.

Fonte: GALEANO, E. O livro dos abraços.

A partir de uma atividade concentrada e planejada pelos/as alunos/as, diversos as-pectos das relações escolares eram trabalhados. Por exemplo: para uma reunião com professores/as, precisava ser pensado o que falar, como falar, quem faria o registro, quem representaria o grupo. Ou, para montar um grêmio, foi preciso pensar em quais seriam as melhorias necessárias na escola, qual verba teriam disponível, como montar pauta e ata. Em outras situações, pensávamos sobre como dialogar com a gestão da escola, como apresentar os pontos de maneira que fossem enten-didos como relevantes, como usar a crítica de modo estratégico, entre tantos outros.

Para fortalecimento das atividades desenhadas, a aproximação dos/as alunos/as em relação à gestão escolar se mostrou importante, fazendo com que os/as adolescen-tes organizassem pautas e buscassem o corpo gestor para discuti-las. Esse movi-mento permitiu que alunos/as se responsabilizassem pelas metas que colocavam, além de ampliar e fortalecer os canais de comunicação com a equipe pedagógica. Ao acolher propostas como esta, o corpo pedagógico contribui para o previsto no artigo 1º da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) (1996):

Investir na escolarização qualificada dos/as adolescentes é cuidar de um con-texto muito amplo. A aposta do projeto foi a de que, se sentindo respeitados/as e pertencentes à escola, professores/as e alunos/as cuidariam dele e daqueles/as que dela fazem parte, assumindo o caráter preventivo que a escola carrega e que nem sempre é potencializado.

Pensando coletivamente em soluções para aquilo que apontavam como dificuldades no ambiente escolar e que tinha a ver com dinâmicas que nasciam da interação en-tre as pessoas que estavam naquele espaço, a punição foi um tema frequentemente discutido com os/as alunos/as. Com o passar dos encontros e através de muitas reflexões que propunham pensar a responsabilidade de cada um/a, foi compreendi-do que a punição não vinha ajudando a melhorar as relações; no limite, todo mundo “descobria” uma nova medida punitiva para utilizar contra aqueles/as que enten-diam, os/as haviam agredido.

• Terminando para recomeçar...

Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 19

“Qualquer relação, com pessoas ou com coisas, possui o potencial de mobilizar em nós um aprendizado, ainda que ele seja obscuro, isso é, algo de que não temos consciência durante o processo. É apenas ao final que aquele conjunto de signos passa a fazer sentido; e, pronto, deu-se o aprender, somos capazes de perceber o que aprendemos durante aquele tempo, que nos parecia perdido”.

GALLO, S. As múltiplas dimensões do aprender.

O que disseram os/as professores/as

A partir desta reflexão, outras foram ganhando corpo. Em algum momento foi possível ser verbalizado pelos/as alunos/as que o objetivo não era punir inspetores/as e demais profissionais, mas, sim, buscar uma mudança de atuação que fosse coletiva. Um aluno afirmou: “a gente quer igualdade, sem punição para ninguém”. Falaram ser importante reconhecer deslizes e pensar em como poderiam se aproximar das pessoas com quem tinham divergências. Os/as alunos/as passaram a afirmar nos grupos o diálogo como uma alternativa para a relação com colegas e professores/as; diversas vezes compar-tilharam que realmente desejavam que houvesse mais espaços de diálogo na escola. A partir das histórias que narravam, ficou claro que passaram a mediadores/as de situa-ções entre professores/as e demais alunos/as. Isso, em nossa percepção, teve relação não apenas com o modo como passaram a olhar para as divergências, mas, também, para eles/as mesmos/as e para o mundo compartilhado: porque valia a pena cultivá-lo, cuidavam daqueles/as que o faziam também. Interessava menos o formato da comissão e mais o quanto a mediação passou a habitar o cotidiano daqueles/as alunos/as, que poderiam ser as pessoas que, em alguma medida, afetariam os/as profissionais para a construção de outros modos de se relacionar.

“Minha maior dificuldade na escola é a falta de condições de trabalho como, por exemplo, uma sala particular para atendimento, e assim, ter mais priva-cidade”.

“Ter participado dos grupos com alu-nos/as junto ao Projeto Construindo

Pontes foi cada dia mais indescritível porque os via mudando a cada encontro e sempre pra melhor”.

“Pela reação dos alunos, foi muito bacana e, melhor, esse grupo de alunos é multiplicadores e muito do que se discutia nas reuniões era compartilhado com a escola como um todo”.

“Após a entrada do Projeto Cons-truindo Pontes, minha relação com os alunos mudou. Até então, eu ainda era visto como um coordenador disci-plinar, alguém que tivesse a punição como único caminho e, após a entrada do projeto, percebi uma aproximação maior e mais positiva”.

“O que mais gosto na escola é de ouvir o aluno, sentir seus desejos. Às vezes, consigo ajudar.”

“Entendo que continuar o trabalho em grupo com os alunos é necessário. No meu plano de ação, foi colo-cado a “roda de conversa”.

Participantes relataram mudanças, tais como: elevação das notas e da participação dos alunos nas aulas; redução das situações de indisciplina; relação mais respeitosa e colaborativa entre alunos e professores; maior conhecimento destes em relação aos alunos, promovido pela escuta coletiva e continuada ao longo dos encontros.

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES20

O que disseram os/as alunos/as

1. Como você se sente na sua escola?

“Gosto muito, encontrei aqui pessoas que são parecidas comigo e aqui pode ter voz e fazer algo pela escola”.

“Agora eu me sinto parte da escola, porque antes eu era excluída”.

“Eu me sinto bem, principalmente por ter visto que ainda existem pessoas que procuram mudar as coisas”.

“Bem acompanhada, instruída, vários professores que fazem mais do que dar aula, dão conselhos pra vida, pra ter sucesso”.

O que disseram os/as alunos/as

2. O que você acha que precisa ter na sua escola para você gostar dela?

“Eu gosto da minha escola, eu só acho que eles devem respeitar mais e deve-riam fazer mais passeios”.

“Professores que queiram mais que dar apenas aulas e, claro, alunos que permitam que eles façam o trabalho deles”.

“Precisa ter mais reuniões com os alunos para eles expressarem suas ideias”.

“Voz ativa dos alunos, boa socialização entre diretoria e alunos”.

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 21

O que disseram os/as alunos/as

3. Depois do Projeto, você percebeu alguma diferença no seu jeito de estar na escola? E fora dela? Comente um pouco sobre isso:

“Eu vejo as coisas de um jeito diferente. Nada é o que parece, as pessoas podem ser muito mais do que aparentam e percebi isso na escola, no projeto, e quero levar essa experiência para todo o sem-pre”.

“Eu sei quem eu sou de verdade e esse projeto me ajudou a mostrar meu jeito legal e divertido”.

“Sim, cuido mais da escola. Eu gosto da escola, é onde me sinto livre e ter amigos me faz bem”.

“Sim, eu aprendi a ter mais calma e paciência e aprendi a dialogar com as pessoas”.

“Sim, comecei a compreender melhor a visão dos professores e entender melhor a aula deles. Depois do projeto, ou melhor, durante ele, me achei e escolhi a profissão que devo seguir e isso foi o mais importante pra mim nesse momento da minha vida”.

“Eu senti que meu modo de pensar mudou totalmente, e de agir, passei a ser mais humana”.

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES22

Com o fim do Projeto Construindo Pontes se aproximando, fizemos algu-mas perguntas sobre as impressões dos/as alunos/as participantes sobre as atividades realizadas:

Perguntamos, também, o que pensavam em relação a contribuir com a cons-trução de suas escolas. Compartilhamos algumas destas respostas abaixo:

73%

27%

80%

20%

57%

32%

11%

93%

7%

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES 23

ANEXOS

1. Cartilha podcast e fanzine:

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RELATÓRIO FINAL - PROJETO CONSTRUINDO PONTES24

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DIRETOR-EXECUTIVOIvan Marques

GERENTE DA ÁREA DE PREVENÇÃORodrigo Pereira

GERENTE DA ÁREA DE COMUNICAÇÃO INSTITUCIONALJanaina Baladez

EQUIPE TÉCNICA DO PROJETO

Beatriz Saks e Fernando Araújo

RELATÓRIO DE ATIVIDADES DO PROJETO CONSTRUINDO PONTES

Elaboração: Beatriz Saks e Fernando Araújo

Revisão: Beatriz Miranda, Beatriz Saks, Renata Itaborahy e Izabelle Mundim

Projeto gráfico, diagramação, gráficos e tabelas: Tiago Cabral

Dezembro/2017

Rua Luis Murat, 260 / CEP: 05436-040 / São Paulo - SP / Tel: 11 3093.7333 / www.soudapaz.org

tvsoudapaz@isoudapaz instituto.soudapazinstitutosoudapaz

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