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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL Faculdade de Veterinária Departamento de Patologia Clínica Veterinária Disciplina de Bioquímica e Hematologia Clínica (VET03121) http://www6.ufrgs.br/bioquimica Relatório de Caso Clínico IDENTIFICAÇÃO Caso: 2011/2/06 Procedência: HCV-UFRGS N o da ficha original: 69163 Espécie: canina Raça: SRD Idade: 3 anos Sexo: fêmea Peso: 6,5 kg Alunos(as): Bruna da Silva Fernandes, Cristina Zulian da Silva, Cristine Mari, Tatiana Regina Vieira Ano/semestre: 2011/2 Residentes/Plantonistas: Médico(a) Veterinário(a) responsável: Daniela Fernandes ANAMNESE Primeira consulta HCV-UFRGS: 01/09/2011 Conforme relatado pelo proprietário, o animal sempre foi o menor da ninhada, não acompanhando o desenvolvimento físico dos demais, apresentava dificuldade de locomoção já nos primeiros meses de vida (andar cambaleante e lentidão de movimentos) e o sintoma foi se agravando com o passar do tempo. Quando foi trazido ao HCV o paciente não comia há quatro dias, anteriormente comia um pouco de frango e ração pastosa, o proprietário acredita que este não estava consumindo água. Tinha dificuldade para ficar em pé, não tendo histórico de trauma. O paciente não é vacinado ou vermifugado. O proprietário nega histórico de vômito e diarréia. No dia 26/08 foi levado ao veterinário que prescreveu Enrofloxacina, tal tratamento foi interrompido mais ou menos dois dias antes de ser trazido ao HCV-UFRGS. EXAME CLÍNICO 01/09/2011 (primeira consulta) 06/09/2011 Valores de Referência Temperatura retal (TR): 36,3 °C TR: 33,6 °C (37,5-39,2 °C) Frequência cardíaca (FC): 120 batimentos cardíacos /min FC: 150 batimentos cardíacos /min (60-160 bpm) Mucosas normocorada Mucosas pálidas Alopecia bilateral simétrica (Figura 1) Alopecia generalizada simétrica Estrabismo, mixedema e face trágica (Figura 2) Estrabismo, mixedema Reflexo de ameaça negativo Reflexo de ameaça negativo Aumento de volume abdominal esquerdo firme com sensibilidade Dor na apalpação abdominal, massa no abdômen, distensão abdominal Déficit de propriocepção de todos os membros Tetraparesia Macroglossia Megaglossia (língua levemente aumentada) Glicemia: 88 mg/dL n.m. (65-118 mg/dL) Desidratação: 4% n.m. (até 2%) Defecou e urinou durante a manipulação n.m. Presença de tártaro n.m. Aumento de volume das articulações dos membros torácicos n.m. n.m. Frequência respiratória (FR): 21 movimentos respiratórios /min (18-36) n.m. Tempo de preenchimento capilar (TRC): > 2 segundos (1-2 segundos: animal sadio; 2-4 segundos: animal desidratado; > 5 segundos: animal gravemente desidratado) n.m. Animal apático

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL Faculdade de Veterinária Departamento de Patologia Clínica Veterinária Disciplina de Bioquímica e Hematologia Clínica (VET03121) http://www6.ufrgs.br/bioquimica

Relatório de Caso Clínico

IDENTIFICAÇÃO Caso: 2011/2/06 Procedência: HCV-UFRGS No da ficha original: 69163 Espécie: canina Raça: SRD Idade: 3 anos Sexo: fêmea Peso: 6,5 kg Alunos(as): Bruna da Silva Fernandes, Cristina Zulian da Silva, Cristine Mari, Tatiana Regina Vieira

Ano/semestre: 2011/2

Residentes/Plantonistas: Médico(a) Veterinário(a) responsável: Daniela Fernandes ANAMNESE Primeira consulta HCV-UFRGS: 01/09/2011 Conforme relatado pelo proprietário, o animal sempre foi o menor da ninhada, não acompanhando o desenvolvimento físico dos demais, apresentava dificuldade de locomoção já nos primeiros meses de vida (andar cambaleante e lentidão de movimentos) e o sintoma foi se agravando com o passar do tempo. Quando foi trazido ao HCV o paciente não comia há quatro dias, anteriormente comia um pouco de frango e ração pastosa, o proprietário acredita que este não estava consumindo água. Tinha dificuldade para ficar em pé, não tendo histórico de trauma. O paciente não é vacinado ou vermifugado. O proprietário nega histórico de vômito e diarréia. No dia 26/08 foi levado ao veterinário que prescreveu Enrofloxacina, tal tratamento foi interrompido mais ou menos dois dias antes de ser trazido ao HCV-UFRGS. EXAME CLÍNICO

01/09/2011 (primeira consulta) 06/09/2011 Valores de Referência Temperatura retal (TR): 36,3 °C TR: 33,6 °C (37,5-39,2 °C)

Frequência cardíaca (FC): 120 batimentos cardíacos /min

FC: 150 batimentos cardíacos /min

(60-160 bpm)

Mucosas normocorada Mucosas pálidas

Alopecia bilateral simétrica (Figura 1) Alopecia generalizada simétrica

Estrabismo, mixedema e face trágica (Figura 2)

Estrabismo, mixedema

Reflexo de ameaça negativo Reflexo de ameaça negativo

Aumento de volume abdominal esquerdo firme com sensibilidade

Dor na apalpação abdominal, massa no abdômen, distensão abdominal

Déficit de propriocepção de todos os membros

Tetraparesia

Macroglossia Megaglossia (língua levemente aumentada)

Glicemia: 88 mg/dL n.m. (65-118 mg/dL)

Desidratação: 4% n.m. (até 2%)

Defecou e urinou durante a manipulação

n.m.

Presença de tártaro n.m.

Aumento de volume das articulações dos membros torácicos

n.m.

n.m. Frequência respiratória (FR): 21 movimentos respiratórios /min

(18-36)

n.m. Tempo de preenchimento capilar (TRC): > 2 segundos

(1-2 segundos: animal sadio; 2-4 segundos:

animal desidratado; > 5 segundos: animal

gravemente desidratado) n.m. Animal apático

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Caso clínico 2011/2/06 página 2 n.m. Melanodermia

n.m. Inchaço corporal

n.m. Membros com pequenas crostas

n.m. Sinais de Godet positivo*

n.m. Na ausculta pulmonar murmúrio vesicular com amplitude diminuída

n.m. Ausência de cio (n.m. não mencionado neste exame) * Sinal de Godet: Teste realizado para a verificação da presença de edema, é feita uma compressão sobre a pele, se após retirada a pressão a impressão digital permanecer é indicativo da presença de edema, e o resultado do teste é positivo. EXAMES COMPLEMENTARES Dia 01/09/2011 Hormônio estimulador da tireóide (TSH): 0,52 ng/ml (0,04-0,40) Tetraiodotironina (T4) livre: 0,01 ng/dL (0,5-1,6) Tetraiodotironina (T4) total: 0,10 MCG/dL (1,2-4) Dia 09/09/2011 Proteína plasmática total (refratometria): 78 g/L (60-80) Dia 27/09/2011 Tetraiodotironina (T4) livre: 1,61 ng/dL (0,5-1,6) Tetraiodotironina (T4) total: 2,02 MCG/dL (1,2-4) URINÁLISE Método de coleta: cistocentese Obs.: Exame realizado no dia 09/09/2011 Exame físico cor consistência odor aspecto densidade específica (1,015-1,045) amarelo fluida n.d discretamente

turvo 1,024

Exame químico pH (5,5-7,5) corpos cetônicos glicose pigmentos biliares proteína hemoglobina sangue nitritos6,5 - - - + n.d. + n.d. Sedimento urinário (no médio de elementos por campo de 400 x) Células epiteliais: 1 Tipo: de transição Hemácias: 10 Cilindros: Tipo: Leucócitos: 10 Outros: Tipo: Bacteriúria: moderada

n.d.: não determinado

BIOQUÍMICA SANGUÍNEA Tipo de amostra: soro Anticoagulante: Hemólise da amostra: ausente Proteínas totais: g/L (54-71) Glicose: mg/dL (65-118) FA: 73 U/L (0-156) Albumina: g/L (26-33) Colesterol total: 311 mg/dL (135-270) ALT: 62 U/L (0-102) Globulinas: g/L (27-44) Uréia: mg/dL (21-60) CPK: U/L (0-121) BT: mg/dL (0,1-0,5) Creatinina: 1,0 mg/dL (0,5-1,5) : ( ) BL: mg/dL (0,01-0,49) Cálcio: mg/dL (9,0-11,3) : ( ) BC: mg/dL (0,06-0,12) Fósforo: mg/dL (2,6-6,2) : ( )

BT: bilirrubina total BL: bilirrubina livre (indireta) BC: bilirrubina conjugada (direta)

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Caso clínico 2011/2/06 página 3

HEMOGRAMA Leucócitos Eritrócitos Quantidade: 12.200/L (6.000-17.000) Quantidade: 4,90 milhões/L (5,5-8,5) Tipo Quantidade/L % Hematócrito: 36,0 % (37-55) Mielócitos 0 (0) 0 (0) Hemoglobina: 11,0 g/dL (12-18) Metamielócitos 0 (0) 0 (0) VCM (Vol. Corpuscular Médio): 73 fL (60-77) Bastonetes 0 (0-300) 0 (0-3) CHCM (Conc. Hb Corp. Média): 30,5 % (32-36) Segmentados 10.248 (3.000-11.500) 84 (60-77) RDW (Red Cell Distribution Width): 14 % (14-17) Basófilos 0 (0) 0 (0) Eosinófilos 244 (100-1.250) 2 (2-10) Monócitos 488 (150-1.350) 4 (3-10) Linfócitos 1.220 (1.000-4.800) 10 (12-30)

Observações:

Plaquetas Quantidade: 582.000/L (200.000-500.000)

Observações:

Observações: TRATAMENTO E EVOLUÇÃO Dia 01/09/2011 1Solução fisiológica (NaCl 0,9%) 500 mL, IV – período 01/09 a 04/09 2Buscopan® - 0,92 mg/kg (0,3 ml), IV TID – período 01 a 14/09 repetindo a dose no período de 19 a 20/09 3Dimeticona – 2,31 mg/kg (6 gotas), VO, TID – período 01 a 03/10 Manter aquecido e foi realizada passagem de sonda nasoesofágica. Dia 02/09/2011 4Cloridrato de Tramadol – 2 mg/kg (0,25 mL), IV, TID – período 02 a 09/09 Dia 04/09/2011 Foi observada diarréia sanguinolenta (melena) 5Cloridrato de Ranitidina – 2 mg/kg (0,65 mL), IV/SC, BID – período 03 a 18/09 6Puran 200 mcg – 23,08 mcg/kg (3/4 comp), VO, SID (manhã em jejum) – período 03 a 05/09 Dia 05/09/2011 1Solução fisiológica (NaCl 0,9%) 250 mL, IV Foi observada diarréia sanguinolenta (melena) Dia 06/09/2011 1Solução fisiológica (NaCl 0,9%) 300 mL, IV – período 06 a 18/09 7Eutirox 100 mcg - 23,08 mcg/kg (1 e ½ comp), VO, SID (manhã em jejum) – período 06 a 03/10 Dia 07/09/2011 Observada presença de abscesso no local do acesso venoso (membro torácico direito) Dia 09/09/2011 Foram realizados novos exames sanguíneos e urinálise e efetuada a troca da sonda nasoesofágica. Hemograma Quantidade Valores de referência Eritrócitos 3,67 milhões /µL (5,5-8,50)

Hemoglobina 8,7 g/dL (12-18)

Hematócrito 27 % (37-55)

VCM 73,56 fL (60-77)

CHCM 32,22 % (32-36)

Plaquetas 357.000 µL (200.000-500.000)

RDW 14,10 % (14-17)

Leucócitos

Leucócitos totais 43.200 µL (6.000-17.000)

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Caso clínico 2011/2/06 página 4 Bastonetes 432 µL (0-0)

Segmentados 35.424 µL (3.000-11.500)

Monócitos 3.888 µL (150-1.350)

Morfologia - Eritrócitos

Policromasia 1+

Anisocitose 1+

Outros exames Quantidade Quantidade Contagem de reticulócitos corrigido 2,16 % (0-1,5) IPR (índice de Produção de Reticulócitos ) 1,44% (*) Proteína plasmática total (refratometria) 54 g/L (60-80)

* (IPR>2 resposta regenerativa adequada) Bioquímica sanguínea Quantidade Valores de referência Proteína total 51,21 g/L (54 a 71)

Albumina 19,81 g/L (26 a 33)

Globulinas 31,4 g/L (27 a 44)

Glicose 132,37 mg/dL (65 a 118)

Colesterol 178,92 mg/dL (135 a 270)

Triglicerídeos 53,17 mg/dL (32 a 138)

Uréia 22,4 mg/dL (21 a 60)

Creatinina 0,5 mg/dL (0,5 a 1,5)

Cálcio 8,58 mg/dL (9 a 11,3)

Fósforo 5,64 mg/dL (2,6 a 6,2)

FA 103,94 U/L (<156)

ALT 83,81 U/L (<102)

CPK 304,69 U/L (<121) Dia 14/09/2011 Foi observada secreção nasal purulenta. Dia 16/09/2011 8Acetilcisteína – 69,23 mg/kg (4,5 ml), IV, TID – período 16 a 18/09 9Ampicilina – 20 mg/kg (0,7 ml) – IV, TID – período 16 a 30/09 Dia 27/09/2011 Realizada coleta de sangue para dosagem de T4 A paciente respondeu de forma positiva ao tratamento. Apresentado uma redução significativa nos valores de colesterol, alcançando os níveis de referência para a espécie. Durante a internação a temperatura corporal oscilou tendo como mínimo 32,9 °C e máxima 38,5 °C, havendo um aumento ao final deste período. (Figura 3) Outro aspecto da melhora do paciente foi a possibilidade de alimentação deste sem o auxílio da sonda nasoesofágica. Após receber alta, o animal continua com o tratamento de reposição hormonal de T4, e este deverá ser mantido até o final de sua vida. Está realizando fisioterapia e acupuntura periodicamente e tem apresentado melhoras no quadro de tetraparesia, assim como diminuição generalizada do edema.

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Caso clínico 2011/2/06 página 5

(TID – três vezes ao dia; BID – duas vezes ao dia; SID – uma vez ao dia) (1re-estabelecer o equilíbrio hidrolítico, 2Butilbrometo de escopolamina, anti-espasmódico, 3anti-gases, 4analgésico, 5Protetor gástrico, 6Levotiroxina, reposição hormonal T4, 7Levotiroxina, reposição hormonal T4, 8 expectorante também utilizado em casos de intoxicação por paracetamol e lesão hepática, 9Antimicrobiano beta-lactâmico semi-sintético) NECRÓPSIA (e histopatologia) Patologista responsável: DISCUSSÃO Avaliação dos sinais clínicos: Características de filhote: erupção dental retardada, persistência de pelagem de filhote. O hipotireoidismo congênito grave causa nanismo desproporcional (patas curtas) e estado mental subnormal. (ETTINGER, 1997) Hipotermia: a insuficiência de T3 ou T4 reduz em 50% o consumo de O2 em comparação com animais saudáveis. Os efeitos adicionais são a redução no consumo de oxigênio pelos tecidos muscular e adiposo causando uma diminuição na produção de Co2 e calor. Mixedema: Edema sem sinal de Godet, mais proeminente na pele da região facial, particularmente sobre os olhos e nos maxilares, se desenvolve devido ao aumento da substância básica dérmica (mucopolissacarídeos, ácido hialurônico e água), isso causa a face trágica característica de hipotireoidismo. (TILLEY e SMITH, 2008) Ausência de cio, cabeça desproporcional, alopecia bilateral simétrica e megaglossia são sinais clínicos frequentemente encontrados em animais com hipotireoidismo congênito. Hemograma: Os resultados do primeiro hemograma apresentaram índices compatíveis com anemia normocítica hipocrômica, não sendo possível determinar se esta é regenerativa, pois não foram medidos reticulócitos. Após tratamento com reposição hormonal (T4) o hemograma apresentou índices compatíveis com anemia normocítica normocrômica regenerativa. Tal anemia ocorre devido à hemólise ou hemorragia, a perda de sangue nas fezes observada durante a internação pode justificar este quadro. A regeneração após a reposição hormonal pode ser explicada, pois acredita-se que o T4 atue diretamente na medula óssea estimulando a eritropoiese ou indiretamente estimulando as células da mácula densa a sintetizar eritropoietina. (PETERSON, 1995) O segundo hemograma apresentou, ainda, leucocitose, monocitose e neutrofilia. Segundo Mello (2004), o leucograma de animais com hipotireoidismo é tipicamente normal. Os resultados encontrados no segundo hemograma sugerem um possível quadro inflamatório desencadeado após a internação, tendo em vista que no primeiro exame esses índices estavam dentro dos valores de referência para a espécie. Uma possível causa para esta reação inflamatória aguda seria a presença de soluções de continuidade como o acesso endovenoso e a utilização de sonda nasoesofágica mantidos praticamente em todo período de internação, considerando relatos da presença de flebite que evoluiu para um abscesso no local do acesso endovenoso e a presença de secreção nasal purulenta. O aumento dos leucócitos pode ainda estar associado a micro-organismos no trato urinário, sugerido pela bacteriúria e presença de leucócitos detectados na urinálise. Bioquímica sanguínea: Foi observado hipoalbuminemia. A concentração de albumina é afetada pelo funcionamento hepático, pela disponibilidade de proteínas na dieta, pelo equilíbrio hidroeletrolítico e por perdas de proteínas em algumas doenças. (GONZÁLEZ e SILVA, 2006) A baixa ingestão de proteínas na dieta pode ser um dos fatores responsáveis pela diminuição dos valores de albumina neste caso, considerando que a paciente não se alimentava adequadamente se mostrando inapetente por vários dias. Cerca de 75% da pressão coloidosmótica é atribuída à albumina, qualquer diminuição na concentração desta proteína pode resultar num decréscimo significativo na pressão oncótica resultando num extravasamento do fluido intravascular para o espaço intersticial. (MCGROTTY e TENNANT, 2010) A redução de albumina sanguínea pode ser o responsável pelo quadro de edema apresentado pela paciente. No primeiro exame bioquímico foi observado hipercolesterolemia sendo que este alcançou os níveis de referência para espécie após início do tratamento com T4. Em cães hipotireoideos, 66 a 75% apresentam-se com níveis séricos elevados de colesterol. Embora a síntese de colesterol esteja prejudicada em casos de hipotireoidismo, um decréscimo na lipólise das lipoproteínas e redução dos receptores de lipoproteínas de

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Caso clínico 2011/2/06 página 6 baixa densidade (LDL) resultam no aumento das lipoproteínas de baixa densidade, e de densidade muito baixa (LDL, VLDL). Portanto ocorre hipercolesterolemia.(ETTINGER, 1997) Atividade sérica de Creatina Quinase (CPK) se revelou aumentada. Os casos avançados de hipotireoidismo acompanhados de miopatia podem apresentar atividade sérica elevada para CPK. Isto ocorre devido ao aumento da liberação de Creatina Quinase pelos músculos esqueléticos. Afecções concomitantes, e a administração de medicamentos também são causas de níveis de CPK aumentada. (ETTINGER, 1997) Exames complementares: Dosagem de TSH por quimioluminiscência: Nível de TSH levemente aumentado. Os hormônios tireoidianos deprimem a produção de TSH. A deficiência de hormônios tireoidianos resulta num aumento da produção de TSH. (ETTINGER,1997) Dosagem de T4 livre e T4 total por quimioluminiscência: Os níveis de tiroxina livre foram extremamente baixos (0,01 ng/dL). Resultados abaixo de 0,35 ng/dL são forte indicativo de hipotireoidismo, principalmente quando associado a hipercolesterolemia e aumento do TSH. Em cães o método mais confiável para confirmação do diagnóstico de hipotireoidismo é a demonstração de baixa concentração sérica de T4 em repouso e a falha em aumentar esse valor após a administração de TSH. (BIRCHARD, 2008)

CONCLUSÕES Considerando a anamnese, sinais clínicos, exames realizados e tratamento responsivo foi concluído que a paciente apresenta um quadro de Cretinismo. Os hormônios tireoidianos são essenciais para o crescimento músculo esquelético normal. O hipotireoidismo congênito ou de surgimento juvenil não tratado, resultará num crescimento físico retardado. Muitos dos cães e gatos com hipotireoidismo congênito provavelmente morrem antes da época do desmame. Se o distúrbio é brando ou se o cão ou o gato é alimentado manualmente ele poderá sobreviver. (ETTINGER, 1997) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CHASTAIN, C. B.; PANCIERA, D. L. Afecções hipotireóideas. In: EFTINGER, S. J. FELDMAN, E. C. (Ed.).

Tratado de medicina veterinária: moléstias do cão e do gato. 4. Ed. São Paulo: Manole, 1997. v. 2, cap. 15, p. 2054-2071.

GONZÁLEZ, F. H. D.; SILVA, S. C. Introdução à bioquímica clínica veterinária. 2. ed. Porto Alegre: UFRGS, 2006. 358 p.

MCGROTTY, Y.; TENNANT, K. Disorders of plasma proteins. In: VILLIERS, E.; BLACKWOOD, L. In: BSAVA Manual of Canine and Feline: Clinical pathology. 2. ed. Dorset: John Wiley Professio, 2010. cap. 7, p. 99-112.

MELLO, F. P. S. Transtorno da glândula tireóide. Porto Alegre: UFRGS, 2004. 17 p. Trabalho apresentado na disciplina de Transtornos metabólicos nos animais domésticos, PPGVET, UFRGS.

PANCIERA, D. L.; PETERSON, M. E.; BIRCHARD, S. J. Doenças da glândula tireóide. In: BIRCHARD, S. J.; SHERDING, R. G. (Ed.). Manual Saunders: clínica de pequenos animais. 3. ed. São Paulo: Roca, 2008. cap. 31, p. 331-347.

PETERSON, M.E. Hyperthyroidism diseases. In: ETTINGER, S.J., FELDMAN, E.C. Textbook of veterinary internal medicine. 2.ed. Philadelphia: WB Saunders, 1995, p. 1466-1487.

TILLEY, L. P.; SMITH, F. W. K. Hipotireoidismo. In: TILLEY, L. P. (Ed.). Consulta veterinária em cinco minutos: espécies canina e felina. 3. ed. São Paulo: Manole, 2008. 1550 p.

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Caso clínico 2011/2/06 página 7

FIGURAS

Figura 1. Sinais Dermatológicos. Alopecia bilateral, hiperpigmentação.

Figura 2. Aspecto da face. Mixedema e face trágica.

Figura 3. Gráfico de acompanhamento da temperatura retal durante o período da internação. Aferições da temperatura retal diária, mostrando a elevação da mesma nos últimos dias de internação.