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Universidade de São Paulo Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” Alterações nos parâmetros biológicos de Diatraea saccharalis (Lepidoptera: Crambidae) e Cotesia flavipes (Hymenoptera: Braconidae) causadas por Nosema sp. (Microsporidia: Nosematidae) Renata Araújo Simões Tese apresentada para obtenção do título de Doutor em Ciências. Área de concentração: Entomologia Piracicaba 2012

Renata Araújo Simões

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Page 1: Renata Araújo Simões

Universidade de São Paulo

Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”

Alterações nos parâmetros biológicos de Diatraea saccharalis (Lepidoptera:

Crambidae) e Cotesia flavipes (Hymenoptera: Braconidae) causadas por

Nosema sp. (Microsporidia: Nosematidae)

Renata Araújo Simões

Tese apresentada para obtenção do título de Doutor em Ciências. Área de concentração: Entomologia

Piracicaba

2012

Page 2: Renata Araújo Simões

Renata Araújo Simões Engenheiro Agrônomo

Alterações nos parâmetros biológicos de Diatraea saccharalis (Lepidoptera: Crambidae)

e Cotesia flavipes (Hymenoptera: Braconidae) causadas por Nosema sp. (Microsporidia:

Nosematidae)

Versão revisada de acordo com a resolução CoPGr 6018 de 2011

Orientador: Prof. Dr. ITALO DELALIBERA JÚNIOR

Tese apresentada para obtenção do título de Doutor em Ciências. Área de concentração: Entomologia

Piracicaba

2012

Page 3: Renata Araújo Simões

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação DIVISÃO DE BIBLIOTECA - ESALQ/USP

Simões, Renata Araújo Alterações nos parâmetros biológicos de Diatraea saccharalis (Lepidoptera:

Crambidae) e Cotesia flavipes (Hymenoptera: Braconidae) causadas por Nosema sp. (Microsporidia: Nosematidae) / Renata Araújo Simões. - - versão revisada de acordo com a resolução CoPGr 6018 de 2011. - - Piracicaba, 2012.

110 p. : il.

Tese (Doutorado) - - Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, 2012.

1. Brocas (Insetos nocivos) 2. Cana-de-açúcar 3. Controle biológico 4. Microsporidia 5. Patologia de insetos I. Título

CDD 632.78 S593a

“Permitida a cópia total ou parcial deste documento, desde que citada a fonte – O autor”

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Page 5: Renata Araújo Simões

3

A Jacy,

mãe, refúgio, companheira e guardiã solidária de

todos os meus dias

Dedico

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4

Page 7: Renata Araújo Simões

5

AGRADECIMENTOS

À Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, pela

oportunidade de aprendizagem e qualificação.

Ao Programa de Pós-graduação em Entomologia, que foi fundamental na conclusão de mais

uma etapa da minha realização profissional.

Ao professor Italo Delalibera Jr., pela orientação no decorrer do doutorado.

Aos professores dos Departamentos de Entomologia e Acarologia, especialmente Sérgio B.

Alves (in memorian) que inspirou primariamente este trabalho.

A Solange Aparecida Vieira, Neide Graciano Zério, Ane Hackbart de Medeiros e Karina

Lucas, pelo auxílio na execução dos experimentos e/ou análise de resultados.

A Mônica Lanzoni Rossi e à professora Neusa de Lima nogueira (CENA/ESALQ/USP) pela

ajuda imprenscindível na microscopia eletrônica de transmissão.

Ao professor Elliot Watanabe Kitajima (NAP/MEPA/ESALQ/USP) pelo uso do microscópio

eletrônico de transmissão.

A Luiz Carlos de Almeida do Centro de Tecnologia Canavieira, Piracicaba/SP, pelo apoio e

solicitude.

A Leellen F. Solter pela orientação para executar diversas etapas do meu trabalho.

Aos funcionários do Departamento de Entomologia e da Biblioteca Central da ESALQ, que

me auxiliaram durante o desenvolvimento da pesquisa.

Ao CNPq pela concessão da bolsa de doutorado.

Aos amigos e companheiros do Laboratório que de forma direta e/ou indireta me ajudaram

muito a concluir este trabalho.

Às minhas famílias, pois incluo aqui as pessoas que me adotaram: Julia Rozzatti e Cirlene

Rozzatti, pela dedicação e apoio.

A Joabe Strazzacapa pela companhia e incentivo.

Page 8: Renata Araújo Simões

6

Page 9: Renata Araújo Simões

7

SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................... 11

ABSTRACT ............................................................................................................... 13

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15

Referências ................................................................................................................. 21

2 MICROSPORÍDEO ISOLADO DE Diatraea saccharalis (LEPIDOPTERA:

CRAMBIDAE): CARACTERIZAÇÃO MORFOLÓGICA E MOLECULAR,

PATOGENICIDADE A LEPIDÓPTEROS DE IMPORTÂNCIA AGRÍCOLA E

PREVALÊNCIA EM D. saccharalis e Cotesia flavipes (HYMENOPTERA: BRACONIDAE)

................................................................................................................................... 29

Resumo....................................................................................................................... 29

Abstract ...................................................................................................................... 30

2.1 Introdução ............................................................................................................. 30

2.2 Desenvolvimento ................................................................................................... 32

2.2.1 Material e métodos ............................................................................................. 32

2.2.1.1 Isolamento de esporos ...................................................................................... 32

2.2.1.2 Ciclo de vida do microsporídeo em D. saccharalis ............................................ 32

2.2.1.3 Microscopia eletrônica de transmissão .............................................................. 33

2.2.1.4 Extração de DNA, PCR e sequenciamento de SSU rRNA ................................. 33

2.2.1.5 Análises filogenéticas....................................................................................... 35

2.2.1.6 Patogenicidade do microsporídeo isolado de D. saccharalis a lepidópteros de

importância agrícola .................................................................................................... 37

2.2.1.7 Prevalência do microsporídeo em populações de D. saccharalis e C. flavipes no

Estado de São Paulo .................................................................................................... 37

2.2.2 Resultados .......................................................................................................... 38

2.2.2.1 Ciclo de vida do microsporídeo em D. saccharalis ............................................ 38

2.2.2.2 Microscopia eletrônica de transmissão .............................................................. 39

2.2.2.3 Sequenciamento e análise filogenética de SSU rRNA ........................................ 41

2.2.2.4 Patogenicidade do microsporídeo isolado de D. saccharalis a lepidópteros de

importância agrícola .................................................................................................... 43

2.2.2.5 Prevalência do microsporídeo em populações de D. saccharalis e C. flavipes no

Estado de São Paulo .................................................................................................... 44

2.2.3 Discussão ........................................................................................................... 50

Page 10: Renata Araújo Simões

8

2.3 Conclusões ............................................................................................................ 53

Referências ................................................................................................................. 53

3 PROPAGAÇÃO E VIRULÊNCIA DE Nosema sp. (MICROSPORIDIA:

NOSEMATIDAE), IMPACTO NA BIOLOGIA DE Diatraea saccharalis (LEPIDOPTERA:

CRAMBIDAE) E USO DE PRODUTOS ANTIMICROBIANOS PARA SEU CONTROLE

................................................................................................................................... 59

Resumo ...................................................................................................................... 59

Abstract ...................................................................................................................... 60

3.1 Introdução ............................................................................................................. 60

3.2 Desenvolvimento................................................................................................... 62

3.2.1 Material e métodos ............................................................................................. 62

3.2.1.1 Infecção das lagartas de D. saccharalis em laboratório ...................................... 62

3.2.1.2 Propagação de Nosema sp. em D. saccharalis ................................................... 63

3.2.1.3 Sintomatologia................................................................................................. 64

3.2.1.4 TL50 e DL50 de Nosema sp. a lagartas de 1º e 3º ínstar de D. saccharalis ............ 64

3.2.1.5 Efeitos de Nosema sp. na biologia de D. saccharalis ......................................... 64

3.2.1.6 Avaliação de produtos antimicrobianos para redução de Nosema sp. em D. saccharalis

................................................................................................................................... 66

3.2.2 Resultados .......................................................................................................... 67

3.2.2.1 Propagação de Nosema sp. em D. saccharalis ................................................... 67

3.2.2.2 TL50 e DL50 de Nosema sp. a lagartas de 1º e 3º ínstar de D. saccharalis ............ 68

3.2.2.3 Efeitos de Nosema sp. na biologia de D. saccharalis ......................................... 70

3.2.2.4 Sintomatologia................................................................................................. 74

3.2.2.5 Avaliação de produtos antimicrobianos para redução de Nosema sp. em D. saccharalis

................................................................................................................................... 75

3.2.3 Discussão ........................................................................................................... 76

3.3 Conclusões ............................................................................................................ 79

Referências ................................................................................................................. 79

4 ALTERAÇÕES NOS PARÂMETROS BIOLÓGICOS E NO COMPORTAMENTO DO

PARASITOIDE Cotesia flavipes (HYMENOPTERA: BRACONIDAE) CAUSADAS PELO

PATÓGENO Nosema sp. (MICROSPORIDIA: NOSEMATIDAE) .............................. 87

Resumo ...................................................................................................................... 87

Abstract ...................................................................................................................... 88

4.1 Introdução ............................................................................................................. 88

Page 11: Renata Araújo Simões

9

4.2 Desenvolvimento ................................................................................................... 90

4.2.1 Material e Métodos ............................................................................................. 90

4.2.1.1 Criação de C. flavipes não infectados e infectados por Nosema sp. .................... 90

4.2.1.2 Efeitos de Nosema sp. no desenvolvimento de C. flavipes ................................. 91

4.2.1.3 Impacto de Nosema sp. no desempenho de C. flavipes quanto à seleção de seu

hospedeiro D. saccharalis............................................................................................ 93

4.2.1.4 Transmissão de Nosema sp. em C. flavipes ....................................................... 94

4.2.2 Resultados .......................................................................................................... 95

4.2.2.1 Efeitos de Nosema sp. no desenvolvimento de C. flavipes ................................. 95

4.2.2.2 Impacto de Nosema sp. no desempenho de C. flavipes quanto à seleção de seu

hospedeiro D. saccharalis.......................................................................................... 100

4.2.2.3 Transmissão de Nosema sp. em C. flavipes ..................................................... 102

4.2.3 Discussão ......................................................................................................... 103

4.3 Conclusões .......................................................................................................... 106

Referências ............................................................................................................... 106

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RESUMO

Alterações nos parâmetros biológicos de Diatraea saccharalis (Lepidoptera: Crambidae)

e Cotesia flavipes (Hymenoptera: Braconidae) causadas por Nosema sp. (Microsporidia:

Nosematidae)

O Filo Microsporidia é composto por parasitas intracelulares obrigatórios que infectam de invertebrados a mamíferos. Alguns gêneros de microsporídeos entomopatogênicos são de extrema importância, visto que diversos estudos epizootiológicos indicam tais agentes como detentores de um papel fundamental na regulação da densidade populacional de seus hospedeiros. Além disso, esses patógenos são considerados como um dos principais obstáculos na manutenção da sanidade nas criações de insetos em laboratório. No Brasil, a partir de 1977, foram relatadas as primeiras ocorrências de nosemoses em criações de laboratório da broca-da-cana, Diatraea saccharalis (Fabr.) (Lepidoptera: Crambidae). Este problema agravou-se no decorrer dos anos em função de alterações nas técnicas de criação da broca visando aumentar a escala produtiva deste inseto e do parasitoide Cotesia flavipes (Cam.) (Hymenoptera: Braconidae). Os objetivos deste trabalho consistiram na: (i) caracterização morfológica e molecular do patógeno, abordando ciclo de vida, patogenicidade a outros lepidópteros de importância agrícola e prevalência em populações de laboratório e campo de D. saccharalis e C. flavipes; (ii) determinação da virulência de Nosema sp. a D. saccharalis em laboratório; (iii) caraterização da propagação do patógeno nas lagartas e sua disseminação pelas fezes; (iv) efeitos da infecção na biologia de D. saccharalis e de C. flavipes e no desempenho do parasitoide quanto à seleção de hospedeiros infectados e não infectados; (v) transmissão do patógeno por C. flavipes a sua progênie e seus hospedeiros e (vi) controle de Nosema sp. em D. saccharalis por produtos antimicrobianos. Foi confirmado que o microsporídeo isolado de D. saccharalis pertence ao gênero Nosema, sendo patogênico à todas as espécies-praga avaliadas. A prevalência do patógeno em C.

flavipes foi maior que a prevalência nas criações de D. saccharalis. Os esporos de Nosema sp. foram liberados nas fezes de D. saccharalis, variando o tempo até a liberação e a quantidade de esporos de acordo com o inóculo inicial de infecção. Embora Nosema seja considerado por muitos cientistas como enzoótico e com baixo potencial como agente de controle microbiano para ser usado de forma inundativa, a DL50 para D. saccharalis de 1º ínstar foi estimada em 5,6 esporos, demonstrando como as lagartas recém-eclodidas são muito suscetíveis ao microsporídeo. Infecções por Nosema sp. afetaram negativamente a biologia de D.

saccharalis, exceto a duração da fase de pupa, sendo transmitido horizontal e verticalmente. Não foram observadas diferenças significativas na mortalidade de D. saccharalis infectadas por Nosema sp. tratadas com os antimicrobianos utilizados neste estudo em comparação à mortalidade do tratamento controle. Os parâmetros biológicos e o comportamento de C.

flavipes sofreram alterações causadas pelo patógeno Nosema sp., que foi transmitido pelo parasitoide para o hospedeiro e por pelo menos quatro geraçõe de C. flavipes. Estes resultados ressaltam a relevância dos estudos sobre o impacto de Nosema sp. em D. saccharalis e C.

flavipes, justificando esforços futuros no manejo da doença, dada a importância dessas espécies no agroecossistema da cana-de-açúcar.

Palavras-chave: Microsporidia; Broca-da-cana; Cana-de-açúcar; Patologia de insetos; Controle biológico.

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ABSTRACT

Alterations in biological parameters of Diatraea saccharalis (Lepidoptera: Crambidae)

and Cotesia flavipes (Hymenoptera: Braconidae) caused by Nosema sp. (Microsporidia:

Nosematidae)

The phylum Microsporidia consists of obligatory intracellular parasites that infect from invertebrates to mammalians. Some genera of entomopathogenic microsporidia are extremely important, considering that several epizootiological studies indicate that these agents as having a key role in density population regulating of their hosts. In addition, these pathogens are considered a major obstacle in maintaining healthiness in laboratory insect rearing. In Brazil occurrences of nosemoses were first reported in laboratory rearing of sugarcane borer, Diatraea saccharalis (Fabr.) (Lepidoptera: Crambidae), in the 1977. This problem has worsened over the years due to changes in the rearing methods aiming to increase the production scale of this insect and the parasitoid Cotesia flavipes (Cam.) (Hymenoptera: Braconidae). The objectives of this project consisted of (i) morphological and molecular characterization of the pathogen, addressing life cycle, pathogenicity to other lepidopterans of agricultural importance and prevalence in D. saccharalis and C. flavipes in laboratory rearing and in sugarcane plantations in the State of São Paulo, (ii) virulence of Nosema sp. to D. saccharalis in laboratory, (iii) transmission of the pathogen in D.

saccharalis larvae and their dissemination in feces, (iv) the effects of infection on D.

saccharalis and C. flavipes biology and performance of the parasitoid on the selection of infected and uninfected hosts, (v) the transmission of the pathogen by C. flavipes to their progeny and their hosts and (vi) the control of Nosema sp. in D. saccharalis by antimicrobial products. It was confirmed that the microsporidium isolated from D. saccharalis belongs to the genus Nosema, being pathogenic to all pest species evaluated in the host specificity study. The prevalence of the pathogen in C. flavipes was higher than the one in the D. saccharalis rearing facilities. Nosema sp spores were disseminated in the feces of D. saccharalis, varying the time until their release and the quantity of spores according to the initial inoculum of infection. Although Nosema is considered by many scientists as enzootic and low potential as a microbial control agent to be used inundatively, the LD50 for 1st instar D. saccharalis was estimated as 5.6 spores, demonstrating how that the newly-hatched larvae are very susceptible to this pathogen. Nosema sp. infections negatively affected the biology of D. saccharalis, except in the duration of the pupal stage, being transmitted horizontally and vertically. There were no significant differences in mortality of D. saccharalis infected by Nosema sp. treated with the antibiotics used in this study compared with the mortality of the control treatment. The biological parameters and behavior of C. flavipes suffered adverse effects caused by the pathogen Nosema sp., which was transmitted to the host by the parasitoid and its progeny to four C. flavipes generation. These results underscore the relevance of studies on the impact of Nosema sp. in D. saccharalis and C. flavipes, justifying future efforts in managing the disease, given the importance of these species in the sugarcane ecosystem.

Keywords: Microsporidia; Sugarcane borer; Sugarcane; Insect pathology; Biological control.

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1 INTRODUÇÃO

Os organismos pertencentes ao Filo Microsporidia são parasitas intracelulares

obrigatórios que infectam aproximadamente 1200 espécies de eucariotos, desde invertebrados,

principalmente insetos e crustáceos, a vertebrados mamíferos. Possuem estratégias de

infecção única e complexa, sendo sua sobrevivência fora da célula hospedeira restrita à forma

de esporos. Os esporos apresentam paredes que são constituídas por camadas formadas por

quitina e proteína (WITTNER; WEISS, 1999).

O primeiro relato de associação entre microsporídeo e inseto foi realizado por Carl

Wilhelm Von Nägeli em outubro de 1857, quando o organismo responsável pela doença de

Bombyx mori L. (Lepidoptera: Bombycidae) denominada pebrina foi chamado Nosema

bombycis (NÄGELI, 1857 apud FRANZEN, 2008; KUDO, 1924). No entanto, um marco

histórico foi o colapso da sericicultura francesa no século XIX devido à doença pebrina em B.

mori, quando em 1865 o químico francês Louis Pasteur conduziu estudos patológicos acerca

do agente causal desta doença. Pasteur investigou ainda as vias de transmissão do

microsporídeo e desenvolveu técnicas sanitárias com a finalidade de manter as criações de

bicho-da-seda livres desse entomopatógeno (ALVES et al., 1998).

A maioria dos microsporídeos entomopatogênicos pertence ao gênero Nosema, sendo

descritas mais de 150 espécies encontradas em 12 ordens de insetos (BECNEL;

ANDREADIS, 1999), dentre elas Lepidoptera, Hymenoptera, Diptera, Orthoptera e

Coleoptera.

A espécie de microsporídeo de insetos mais estudada é Nosema pyrausta, patógeno da

broca europeia do milho Ostrinia nubilalis (Hubner) (Lepidoptera: Pyralidae) (ANDREADIS,

1984, 1987; HENRY, 1990; ORR et al., 1994; SOLTER; BECNEL, 2000). Kramer (1959) foi

o primeiro a documentar a incidência sazonal deste patógeno e a mortalidade resultante da

infecção por N. pyrausta em populações de O. nubilalis, relacionando as condições

ambientais adversas com a prevalência da doença. Para o controle desta praga, em 1929 foi

introduzido na América do Norte o parasitoide Macrocentrus grandii Goidanich

(Hymenoptera: Braconidae) (BAKER et al., 1949; LEWIS, 1982). Fato interessante nesta

associação inseto-microsporídeo refere-se a pesquisas relatando que estes parasitoides são

indiretamente infectados por N. pyrausta. A infecção ocasiona redução na sobrevivência pré-

imaginal, longevidade e fecundidade de M. grandii (ANDREADIS, 1980, 1982; SIEGEL et

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16

al., 1986; COSSENTINE; LEWIS, 1987; SAJAP; LEWIS, 1988). Outros exemplos de

microsporídeos do gênero Nosema associados a insetos de importância econômica ou mesmo

que ocorrem naturalmente em populações de insetos terrestres são: N. locustae em populações

de gafanhotos (HENRY, 1972), N. fumiferanae, incidindo em populações da broca da madeira

Choristoneura fumiferana (Clemens) (Lepidoptera: Tortricidae) nas florestas da América do

Norte (WILSON, 1973, 1981; BAUER; NORDIN, 1989); N. apis em abelhas da espécie Apis

mellifera L. (ZANDER, 1909 apud BRANCO JR., A.C., 1998); N. tortricis, reduzindo a

densidade de populações de Tortrix viridana L. (Lepidoptera: Tortricidae) a níveis abaixo de

dano econômico (FRANZ; HUNGER, 1971); N. heliothidis, regulando populações naturais da

broca do milho Heliothis zea (Boddie) (Lepidoptera: Noctuidae) (BROOKS, 1968;

GAUGLER; BROOKS, 1975; BROOKS; CRANFORD, 1978) e N. whitei, comum no tecido

adiposo das pragas de grãos armazenados Tribolium confusum Jacquelin Du Val e T.

castaneum (Herbst) (Coleoptera: Tenebrionidae), sendo responsável pela redução do

crescimento da população hospedeira (PARK; FRANK, 1950; MILNER, 1972a, 1972b, 1973;

SPRAGUE, 1976; BURGUES; WEISER, 1977; ARMSTRONG, 1980, 1982; MADDOX,

1987).

Atualmente os microsporídeos têm assumido importância sob o ponto de vista médico

e evolucionário. No primeiro caso, devido às descobertas recentes de microsporídeos

associados a infecções em humanos imunodeprimidos como portadores de HIV positivo,

transplantados e pacientes em radio- e/ou quimioterapia (DIDIER, 2000).

Quanto à importância evolucionária, estudos filogenéticos baseados no

sequenciamento molecular sugerem que estes patógenos estão mais próximos aos fungos.

Dessa forma, os microsporídeos passam a constituir um Filo pertencente ao Reino Fungi,

deixando de serem classificados como protozoários (GILL; FAST, 2006).

Além disso, diversos estudos epizootiológicos de associações inseto-microsporíodeo

indicam que tais agentes têm papel fundamental na regulação da densidade populacional de

seus hospedeiros. Este fato, provavelmente, está relacionado à persistência e eficiência de

transmissão vertical e horizontal destes micro-organismos via alimento, hábitat contaminado

e, em alguns casos, parasitoides (HENRY, 1990).

No Brasil, a partir da década de 1970, foram relatadas as primeiras ocorrências de

nosemoses em criações de laboratório de Diatraea saccharalis (Fabr.) (Lepidoptera:

Crambidae). Este lepidóptero é considerado como principal praga na cultura da cana-de-

açúcar (GALLO et al., 2002). Infestações por Nosema spp. ocasionam danos e prejuízos à

Page 19: Renata Araújo Simões

17

criação de D. saccharalis. Criações desta praga agrícola apresentam grande importância

econômica, pois esta espécie é utilizada na produção massal do parasitoide Cotesia flavipes

(Cameron) (Hymenoptera: Braconidae), sendo este parasitoide o responsável pelo controle

biológico da broca-da-cana, utilizado anualmente em mais de três milhões de hectares no

Estado de São Paulo (PARRA; BOTELHO; PINTO, 2010). De forma geral, tais ocorrências

são de natureza enzoóticas com fases epizoóticas. Entretanto, devido a mudanças nas técnicas

de criação de D. saccharalis em laboratório, principalmente quanto à elevação da densidade

de lagartas por unidade de criação, observou-se o aumento na frequência de epizootias

geradas por nosematídeos. Os sintomas de infecção são mais evidentes em insetos imaturos,

onde as lagartas apresentam coloração branco-leitosa e redução significativa de tamanho.

Estes patógenos possuem transmissão vertical e horizontal, mantendo-se no hospedeiro

durante todo seu desenvolvimento (LASTRA; GÓMEZ, 2006).

Algumas espécies de microsporídeos causam alta mortalidade nas larvas de insetos

hospedeiros, como por exemplo, Nosema tortricis que produz epizootias em T. viridana

(FRANZ; HUGER, 1971). No entanto, a maioria das espécies ocasiona infecções crônicas

(GAUGLER; BROOKS, 1975), acarretando efeitos menos expressivos no indivíduo

hospedeiro ou mesmo em sua população. Os efeitos deletérios relatados em insetos

hospedeiros envolvem acréscimo na mortalidade larval, atraso no desenvolvimento, redução

na fecundidade e longevidade e aumento na suscetibilidade a condições de estresse

(SOLTER; BECNEL, 2000). É sabido que patógenos com mecanismos de transmissão mais

eficientes e com virulência moderada possivelmente são agentes mais efetivos em táticas de

controle microbiano (ANDERSON, 1982 apud MADDOX, 1987). Neste contexto, os

microsporídeos apresentam grande potencial como agentes de controle em longo prazo

(SWEENEY; BECNEL, 1991).

Apesar do grande número de espécies de Microsporidia descritas e referidas em

insetos, são poucos os estudos referentes à dinâmica destes micro-organismos em populações

de insetos. Ainda menor é o conhecimento sobre o impacto das introduções de microsporídeos

em populações de insetos-praga. As pesquisas desenvolvidas com estes patógenos são

direcionadas para seu uso como agente de controle biológico sob dois aspectos: como

inseticida microbiano ou como inimigo natural (SOLTER; BECNELL, 2000).

Page 20: Renata Araújo Simões

18

N. locustae foi o único microsporídeo utilizado extensivamente como inseticida

microbiano. Este patógeno foi descrito por Canning (1953) em gafanhotos africanos Locusta

migratoria migratorioides (Reiche & Fairmaire).

Devido a características como processo de infecção, vias de transmissão e virulência,

o uso destes entomopatógenos no controle de insetos-praga é considerado mais adequado em

estratégias de introdução inoculativa, aumento ou incremento e conservação ou proteção

(ROBERTS et al., 1990).

O uso da microscopia eletrônica com finalidade taxonômica em microsporídeos foi

introduzido em meados dos anos 70, quando Weiser (1977) listou 70 caracteres para

identificação destes organismos (FRANZEN, 2008). Outras importantes contribuições para

identificação de gêneros de Microsporidia foram sugeridas por Issi (1986), que encontrou 11

características visíveis através de microscopia óptica e eletrônica distinguindo 68 gêneros, e

Larsson (1986, 1988), que associou 11 características na distinção de 66 gêneros de

microsporídeos.

Sendo assim, estes patógenos podem ser identificados em nível de gênero, e em alguns

casos de espécie, baseando-se nas características morfológicas de seus esporos através da

estrutura única formada pelas espirais do filamento polar, das formas de proliferação, dos

métodos de divisão e da natureza das interações entre célula hospedeira e parasita

(FRANZEN; MÜLLER, 1999).

No entanto, as técnicas moleculares estão se tornando rapidamente parte importante e

integral dos estudos referentes à sistemática destes patógenos. O uso de análises filogenéticas

baseadas no sequenciamento de DNA é extremamente profícuo em Microsporidia, devido à

existência de um número relativamente pequeno de caracteres morfológicos úteis. Filogenias

moleculares têm solucionado, por exemplo, diversas questões sobre a evolução dos

microsporídeos (FRANZEN, 2008).

Vossbrinck et al. (1987) publicaram o primeiro sequenciamento de dados de SSU

rRNA de um microsporídeo, Varimorpha necatrix. A espécie Encephalitozoon cuniculi foi o

primeiro microsporídeo a ter seu genoma sequenciado por completo (KATINKA et al., 2001).

N. bombycis e N. spodopterae são exemplos de espécies do gênero Nosema cujo genoma

também foi sequenciado por completo (HUANG et al., 2004; TSAI et al., 2005). No entanto,

um número limitado de genes tem sido utilizado para análises filogenéticas, sendo as

pesquisas de sequenciamento destes genes restritas a poucas espécies de microsporídeos.

Page 21: Renata Araújo Simões

19

Apesar dos microsporídeos serem organismos eucariotos, seus genes rRNA

apresentam características semelhantes aos procariotos (CURGY et al., 1980;

VOSSBRINCK; WOESE, 1986). O RNA ribossômico é caracterizado pela presença de 16S

(SSU) rRNA e 23S (LSU) rRNA, sendo separados por um espaço intergênico não transcrito

(VOSSBRINCK et al., 1987).

Outros genes de eucariotos têm sido estudados, como é o caso dos genes pertencentes

à família tubulina, cujas subfamílias mais abundantes são α- e β-tubulina. Em contraste com

as sequências de rRNA e de muitas outras proteínas em outros organismos, são raros os casos

de deleção e inserção em genes tubulina (FRANZEN; MÜLLER, 1999). Os sequenciamentos

de genes α-tubulina de N. locustae (acesso nº U66907) estão disponíveis no GenBank ou

EMBL databases (KEELING; DOOLITTLE, 1996). No entanto, análises filogenéticas usando

α- e β-tubulina apresentam geralmente resultados diferentes quando comparados aos

resultados obtidos nas análises com rRNA para alguns Microsporidia (EDLIND et al., 1994).

Considerando-se apenas o gênero Nosema, além de genes rRNA e α- e β-tubulina,

somente genes que codificam isoleucila-tRNA sintase (acesso nº L37097) e glutamil-tRNA

sintetase (AF005490 e AF005489), homólogos de U2 e U6 spliceossoma RNA (SnRNA)

(AF053588 e AF053589), proteína chaperone Hsp70 (U97520) e actina (ACTI) (AF031702)

em N. locustae tem sido parcialmente caracterizados em Microsporidia (BROWN;

DOOLITTLE, 1995; GERMOT et al., 1997; DELBAC et al., 1998; FAST et al., 1998).

A observação de esporos de microsporídeos pode ser realizada em insetos vivos

(tecidos frescos) ou em material preservado (insetos ou tecidos). No primeiro caso, é mais

fácil examinar a infecção ao microscópio, visto que, provavelmente, não há atividade

microbiana secundária. O preparo do material é relativamente simples. Insetos pequenos

podem ser macerados por completo, diretamente sobre lâminas com pequenas alíquotas de

água destilada ou deionizada. Em insetos maiores é possível macerar partes isoladamente,

evitando, por exemplo, resíduos de cutícula do inseto (VÁVRA; MADDOX, 1977;

UNDEEN; VÁVRA, 1997).

Em material preservado a observação dos esporos ao microscópio pode ser

comprometida, devido ao fato de muitas das características para identificação de

Microsporidia serem perdidas quando os esporos são submetidos a técnicas de preservação.

Formaldeído é considerado como a substância mais adequada para preservar insetos

infectados por microsporídeos (UNDEEN; VÁVRA, 1997).

Page 22: Renata Araújo Simões

20

Para purificação de esporos de Nosema spp. existem diversos métodos, os quais

apresentam vantagens e desvantagens de acordo com as exigências do estudo realizado. Ou

seja, em função de critérios como: tamanho do inseto infectado; nível de infestação

(quantidade de esporos); velocidade e praticidade da extração e purificação; pureza, perda,

viabilidade e germinação dos esporos (UNDEEN; VÁVRA, 1997).

Os métodos utilizados para purificação de esporos são: por triangulação (COLE,

1970), por gradiente de Ludox (UNDEEN; ALGER, 1971), por gradiente de Ludox adaptado

(KELLY; KNELL, 1979), por sedimentação natural (HOSTOUNSKÝ, 1981) e por gradiente

de centrifugação contínua (UNDEEN; AVERY, 1983).

Em geral, a concentração de esporos em suspensão é determinada através da câmara

de Neubauer. Para obtenção de resultados significativos é importante o uso correto da câmara

e o número adequado de leituras das amostras. Burges e Thompson (1971) descreveram os

procedimentos corretos no uso de câmaras de contagem para determinar a concentração de

micro-organismos em suspensão.

O armazenamento dos esporos de Microsporidia pode ser realizado através de vários

processos. Esporos purificados podem ser mantidos em água destilada ou deionizada sob-

refrigeração (4 a 5ºC). Outro processo a ser considerado é o congelamento, que pode ser

realizado em freezers, para conservação de esporos em glicerol (50%) e cadáveres, ou em

nitrogênio líquido, para esporos (imersos em substância crioprotetora), cadáveres e culturas de

célula (VÁVRA; MADDOX, 1977; UNDEEN; VÁVRA, 1997). Além dessas técnicas, os

esporos podem ser armazenados após submetidos a dessecação ou a liofilização, ou mesmo in

situ, onde são conservados em hospedeiros vivos (UNDEEN; VÁVRA, 1997).

Apesar da importância destes patógenos, não são desenvolvidas no Brasil pesquisas

que abordem seu impacto nos parâmetros biológicos de D. saccharalis e de C. flavipes ou

mesmo sua incidência nas populações de laboratório e de campo destes insetos. Este trabalho

teve como objetivos estudos sobre a caracterização morfológica e molecular deste

microsporídeo, os efeitos do patógeno na biologia e desempenho de D. saccharalis e C.

flavipes, a virulência de Nosema sp. a D. saccharalis e sua patogenicidade a outras espécies

de lepidópteros-praga, a prevalência e o controle destes entomopatógenos.

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2 MICROSPORÍDEO ISOLADO DE Diatraea saccharalis (LEPIDOPTERA:

CRAMBIDAE): CARACTERIZAÇÃO MORFOLÓGICA E MOLECULAR,

PATOGENICIDADE A LEPIDÓPTEROS DE IMPORTÂNCIA AGRÍCOLA E

PREVALÊNCIA EM D. saccharalis e Cotesia flavipes (HYMENOPTERA:

BRACONIDAE)

Resumo

O gênero Nosema destaca-se por conter a maioria das espécies do filo Microsporidia patogênicas a insetos. No Brasil, desde a década de 1970, microsporídeos vêm sendo relatados em populações de laboratório e de campo de Diatraea saccharalis. O objetivo deste trabalho foi realizar a caracterização ultraestrutural e molecular do microsporídeo isolado em D. saccharalis, abordando estudos sobre o ciclo de vida, patogenicidade a outros lepidópteros de importância agrícola e prevalência deste entomopatógeno em populações de laboratório e campo de D. saccharalis e C. flavipes. O desenvolvimento do patógeno foi estudado através da observação em microscópio com contraste de fase (1000x) de lagartas de D. saccharalis

após inoculação em diferentes intervalos de tempo e coradas com Giemsa (50%). Tecidos do trato digestivo de cadáveres de D. saccharalis no 4º ínstar com nosemose foram submetidos à análise em microscópio eletrônico de transmissão (3000, 4400 e 7000x). Os esporos apresentaram forma elipsoide, com 5,72 x 2,03 µm de tamanho e filamento polar com 16 espirais e 114 nm de diâmetro. O gene 16S rRNA do patógeno foi sequenciado e comparado com 35 sequências de Microsporidia depositadas no GenBank. Baseando-se nos estudos de microscopia e filogenética o isolado foi atribuído ao gênero Nosema. A divergência genética na sequência SSU rRNA do isolado estudado (0,010) em relação aos táxons de Nosema recuperados no mesmo clado da árvore de NJ (grupo 3) foi maior que a encontrada entre os esses táxons (0,006). A patogenicidade do isolado foi avaliada em sete espécies de lepidópteros-praga, inoculando-se lagartas de 3º ínstar via dieta com 104 esporos de Nosema

sp.indivíduo-1. Após 15 dias foi analisada a presença de esporos nos tecidos do mesêntero de cada lagarta. Nas condições de laboratório Nosema sp. foi patogênico a todas as espécies, com níveis diferentes de propagação de esporos e de mortalidade nos hospedeiros. A prevalência do patógeno foi obtida através de amostragens realizadas mensalmente em 4 usinas de cana-de-açúcar do Estado de São Paulo. Foram amostrados D. saccharalis provenientes de laboratório e campo, adultos de C. flavipes das criações massais e fezes das populações de laboratório da broca. A presença do patógeno nas lagartas foi baixa, sendo maior nos indivíduos oriundos do campo em relação aos de criações em laboratório. A prevalência de Nosema sp. nas amostras de C. flavipes atingiu valores elevados durante o ano, chegando, em média, a 83,3% das amostras contendo 100 adultos apresentando resultado positivo para Nosema na usina D.

Palavras-chave: Broca-da-cana; Nosemoses; Análise filogenética; SSU rRNA; Patogenicidade a hospedeiros; Prevalência.

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Abstract

The Nosema genus stands out for containing the majority of species in the phylum Microsporidia pathogenic to insects. In Brazil, since the 1970’s, these pathogens have been reported in field and laboratory populations of Diatraea saccharalis. The objectives of this study were to characterize molecular and ultrastructurally the microsporidium isolated from D. saccharalis, as well as to study the life cycle, pathogenicity to pest lepidopterans and prevalence of this pathogen in laboratory and field populations in the State of São Paulo. The development of the pathogen was studied by observation with phase contrast microscope (1000x) of D. saccharalis larvae after inoculation in different time intervals and stained with Giemsa (50%). Tissues of the digestive tract from cadavers of 4th instar D. saccharalis were analyzed in a transmission electron microscope (3000, 4400 and 7000x). The spores have ellipsoidal shape, with 5.72 x 2.03 mm in size and polar filament with 16 coils and 114 nm in diameter. The 16S rRNA gene of the pathogen was sequenced and compared with 35 Microsporidia sequences from GenBank. Based on phylogenetic and microscopic studies, it was assigned to the Nosema genus. The genetic divergence in sequence SSU rRNA of the studied isolate (0.010) compared with other taxa of Nosema recovered in the same clade of NJ trees (group 3) was higher than that found among those taxa (0.006). The pathogenicity of the isolate was evaluated in seven species of lepidopteran pests, inoculating 3rd instar larvae with an average 104 spores.larva-1 through diet. After 15 days, the larval midgut tissues were analyzed for the presence of Nosema sp. spores. Under laboratory conditions Nosema sp. was pathogenic to all species, with different levels of mortality and spread of spores in the hosts. The prevalence of the pathogen was determined from samples collected monthly at four sugarcane mills from São Paulo State. We sampled D. saccharalis from laboratory rearing and field, C. flavipes adults from laboratory rearings and sugarcane borer feces from laboratory populations. The infestation in D. saccharalis larvae from laboratory rearing was low, being higher on field larvae compared with field larvae. The Nosema sp. prevalence in C.

flavipes reached high values during the year, reaching an average of 83.3% of samples with 100 adults positive for Nosema in one sugarcane mill (D). Keywords: Sugarcane borer; Nosemosis; Phylogenetic analysis; SSU rRNA; Pathogenicity;

Prevalence.

2.1 Introdução

A maioria dos microsporídeos entomopatogênicos pertence ao gênero Nosema, sendo

descritas mais de 150 espécies encontradas em 12 ordens de insetos (BECNEL;

ANDREADIS, 1999), ressaltando-se as seguintes ordens: Lepidoptera, Hymenoptera, Diptera,

Orthoptera e Coleoptera.

A broca-da-cana Diatraea saccharalis (Fabricius, 1794) (Lepidoptera: Crambidae)

ocorre desde o sul dos EUA às Antilhas e da América Central até a Argentina e é considerada

uma das principais pragas da cana-de-açúcar nas Américas (GALLO et al., 2002;

MENDONÇA, 1996).

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31

No Brasil, a partir do final da década de 1970, foram relatadas as primeiras

ocorrências de microsporidioses em criações de laboratório de D. saccharalis (ALVES, S.B.,

informação pessoal). Alves et al. (1985) realizaram um levantamento de patógenos associados

a D. saccharalis em diversas regiões do Brasil e relataram a presença de um microsporídeo

não identificado em insetos adultos e imaturos provenientes de campo e de criações em

laboratório. A ocorrência de um nosematídeo não identificado também foi observada em

populações de laboratório de D. saccharalis no Texas por Solter, L.F. (informação pessoal).

Infecções por Nosema spp. ocasionam danos e prejuízos às criações de D. saccharalis,

que são de grande importância econômica, visto que esta espécie de lepidóptero é utilizada na

produção massal do parasitoide Cotesia flavipes (Cameron) (Hymenoptera: Braconidae). C.

flavipes é liberado de forma inundativa em mais de três milhões de hectares todo ano no

Estado de São Paulo para o controle da broca-da-cana (PARRA; BOTELHO; PINTO, 2010).

De forma geral, tais ocorrências são de natureza enzoóticas com fases epizoóticas. Entretanto,

devido a mudanças nas técnicas de criação de D. saccharalis em laboratório, principalmente

quanto à elevação da densidade de lagartas por unidade de criação, observou-se o aumento na

frequência de epizootias geradas por microsporídeos. Os sintomas de infecção são mais

evidentes em insetos imaturos, onde as lagartas apresentam coloração branco-leitosa e

redução significativa de tamanho. Estes patógenos possuem transmissão vertical e horizontal,

mantendo-se no hospedeiro durante todo seu desenvolvimento (LASTRA; GÓMEZ, 2006).

Apesar da importância deste patógeno, não haviam sido desenvolvidas pesquisas que

abordassem aspectos básicos sobre esse microsporídeo. Neste trabalho é apresentada a

caracterização ultraestrutural e molecular desta espécie de microsporídeo encontrada em D.

saccharalis, com ênfase nos estágios de desenvolvimento, patogenicidade a outras espécies de

lepidóperos de importância agrícola e prevalência deste entomopatógeno em populações de

laboratório e campo de D. saccharalis e do seu parasitoide, C. flavipes, no Estado de São

Paulo.

Page 34: Renata Araújo Simões

32

2.2 Desenvolvimento

2.2.1 Material e métodos

2.2.1.1 Isolamento de esporos

Os esporos do microsporídeo foram isolados a partir de lagartas de D. sacharalis

provenientes da criação estabelecida no Laboratório de Patologia e Controle Microbiano de

Insetos (ESALQ/USP). Os insetos com microsporidiose foram homogeneizados em solução

salina estéril (0,85% NaCl) + 0,05% de antibiótico (Pentabiótico Veterinário Reforçado, Fort

Dodge® Saúde Animal Ltda). A suspensão resultante foi filtrada através de camadas de gaze,

com auxílio de seringa, e submetida a três séries de centrifugação: 2 000 rpm por 10 minutos,

seguida de 2 séries a 12 000 rpm por 1 minuto. Após cada centrifugação o sobrenadante foi

descartado e os esporos acumulados na parte final do tubo formando um “pellet” foram

suspensos em solução salina estéril. Os esporos purificados e suspensos em solução salina

estéril foram quantificados em câmara de Neubauer e armazenados a 4ºC para uso por até 3

horas (adaptado de ALVES et al., 1998).

2.2.1.2 Ciclo de vida do microsporídeo em D. saccharalis

Lagartas de D. saccharalis de 3º ínstar foram inoculadas individualmente via oral

adicionando 1 µL de suspensão de esporos do microsporídeo em 0,1 cm3 de dieta artificial de

King e Hartley (1985), preparada sem metilparabeno (Nipagin®) e formaldeído,

correspondendo à dose média de 2,4x104 esporos.lagarta-1. Somente permaneceram no

bioensaio os insetos que consumiram toda a dieta contaminada. Estes foram mantidos em

placas de Petri (60 x 15 mm) em condições controladas (26 ± 1°C, fotofase de 12 h), sendo a

dieta trocada diariamente. Para o estudo do ciclo de vida do patógeno, 2 lagartas foram

examinadas a cada 24 h, a partir da inoculação inicial, até que o patógeno completasse seu

ciclo. Cada lagarta foi comprimida entre uma lâmina e uma lamínula com uma gota de

solução salina. Com uma pinça, foram realizados esfregaços do material macerado em

movimento circular sobre lamínulas, fixados em metanol absoluto por 10 minutos, secos ao ar

e imersos em solução de Giemsa 50% (diluída em água destilada) por 30 minutos. As

lamínulas foram enxaguadas em água destilada por 5 minutos e deixadas ao ar livre até

completamente secas. Os diferentes estágios do microsporídeo foram observados em

microscópio com contraste de fase (1000x).

Page 35: Renata Araújo Simões

33

2.2.1.3 Microscopia eletrônica de transmissão

As amostras de tecidos do trato digestivo de lagartas mortas de D. saccharalis foram

fixadas em solução de Karnovsky (1965) modificada (glutaraldeído 2%, paraformaldeído 2%,

cloreto de cálcio 5 mM em tampão cacodilato de sódio 0,05M (pH 7,2)) durante 48 horas,

lavadas em tampão cacodilato 0,1M e pós fixadas por 1 hora com tetróxido de ósmio 1% em

tampão cacodilato de sódio 0,1M. Após rápidas lavagens com solução salina 0,9%, as

amostras foram coradas por blocos com acetato de uranila 2,5% em água por uma noite e

desidratadas em séries crescentes de acetona em água (25, 50 e 75%) por 5 minutos, seguidas

por 2 tratamentos de 10 minutos cada com acetona 90% e 3 tratamentos de 20 minutos com

acetona pura.

A infiltração foi feita lentamente utilizando resina Spurr na seguite sequência: 1 parte

de resina + 3 partes de acetona – 3 horas; 1 parte de resina + 2 partes de acetona – 3 horas; 1

parte de resina + 1 parte de acetona – por uma noite; 2 partes de resina + 1 parte de acetona- 8

horas e Resina pura- 48 horas.

A emblocagem foi feita em resina pura a 70º C por 48 horas. Os cortes semifinos (90-

120 nm) foram depositados sobre lâminas de vidro, e corados com azul de toluidina 2% em

solução de bórax 1% durante 20 minutos a 45º C. O exame das lâminas foi feito ao

microscópio óptico Zeiss Axioscop 2 para seleção dos materiais a serem observados no

microscópio eletrônico e as imagens digitalizadas.

As secções ultrafinas (60-90 nm) foram depositadas sobre telas de cobre de 200 mesh

previamente recobertas com formvar. O contraste foi feito com acetato de uranila 2,5% e

citrato de chumbo segundo Reynolds (1963).

A análise do material foi realizada ao microscópio eletrônico de transmissão Zeiss

EM900 do NAP/MEPA-ESALQ/USP.

2.2.1.4 Extração de DNA, PCR e sequenciamento de SSU rRNA

A extração de DNA dos esporos do microsporídeo isolado de D. saccharalis foi

realizada com Instagene Matrix Bio-Rad® conforme recomendação do fabricante. A região

small subunit (SSU) do RNA ribossômico foi amplificada utilizando-se iniciadores (primers)

universais para microsporídeos de acordo com Huang et al. (2004). Iniciadores internos foram

Page 36: Renata Araújo Simões

34

desenhados com base nas sequências obtidas e com os iniciadores sugeridos por Huang et al.

(2004) (Tabela 2.1).

Tabela 2.1 - Iniciadores utilizados para a amplificação da região SSU rRNA

Gene/Região Iniciadores Sequência (5’ – 3’) Referência

SSU 18f CACCAGGTTGATTCTGCC

Vossbrinck et al. (1993) 1537r TTATGATCCTGCTAATGGTTC

SSU interno 18aF AAGATGAAATGTGACGACCCTG Dados não publicados

18bF GTAAGCTGGAGGAGCGAAGA

SSU interno HG4F GCGGCTTAATTTGACTCAAC Gatehouse e Malone (1998) HG4Fc GTTGAGTCAAATTAAGCCGC Huang et al. (2004)

Para a amplificação de fragmentos do gene SSU rRNA foi preparada uma reação

contendo 1 X Taq DNA Polimerase Buffer; 0,2 mM de cada dNTP, 1,5 mM MgCl2, 2,5

unidades de Taq DNA polimerase, 10 pmoles de cada iniciador e 10 ng de DNA molde.

A reação de cadeia de polimerase (PCR) foi conduzida com a desnaturação inicial por

3 minutos a 95ºC, seguida por 36 ciclos com desnaturação a 95ºC por 30 segundos, seguida

pela fase de anelamento a 55ºC por 30 segundos e extensão a 72ºC por 1 minuto e 30

segundos e com uma fase final de polimento por 10 minutos a 72ºC.

Para visualizar os produtos da amplificação foi utilizada eletroforese em gel de

agarose 1% corado com SYBR Green (Life Technologies, Cat#S7563). O marcador de peso

molecular Low Range (Fermentas, Cat# SM0383) foi utilizado para verificar a amplificação

do RNA.

A purificação do produto de PCR foi realizada utilizando o QIAquick PCR

Purification Kit (Qiagen, Cat#28104) seguindo as recomendações do fabricante.

O sequencimento por sequenciador automático foi realizado no Centro de

Biotecnologia Agrícola (CEBETEC - ESALQ/USP) utilizando os iniciadores listados na

Tabela 2.1.

As sequências obtidas de SSU rRNA referente ao patógeno isolado de D. saccharalis

foram editadas utilizando o programa BioEdit (HALL, 1999).

Page 37: Renata Araújo Simões

35

2.2.1.5 Análises filogenéticas

O programa BLAST (Basic Local Alignment Search Tool) disponível no National

Center for Biotechnology Information (NCBI) foi usado para encontrar regiões de

similaridade com a sequência do SSU rRNA referente ao patógeno isolado de D. saccharalis.

Foram selecionadas 35 sequências para microsporídeos, baseando-se nos valores de máxima

identidade iguais ou superiores a 97% (Tabela 2.2). Essas sequências foram alinhadas

utilizando o programa Clustal X (2.0) (THOMPSON et al., 1997), e o alinhamento foi

refinado empregando-se o programa BioEdit (HALL, 1999).

O programa MEGA 5.05 (TAMURA et al., 2011) foi utilizado para encontrar o

modelo de substituição nucleotídica que melhor explica essas sequências de SSU rRNA.

Árvores de máxima verossimilhança (MV) e de Neighbor-Joining (NJ) foram construídas

utilizando-se o software MEGA 5.05 (TAMURA et al., 2011) sob o modelo HKY+G (NEI;

KUMAR, 2000), usando o microsporídeo Amblyospora sp. (Nº de acesso GenBank L28960)

como grupo externo. A consistência dos ramos para ambas as análises foi determinada por

1000 replicações do teste não-paramétrico de Bootstrap (FELSESTEIN, 1985).

A distância genética p entre e dentro dos grupos recuperados nas análises de MV e NJ

foi calculada no programa MEGA 5.05.

Page 38: Renata Araújo Simões

36

Tabela 2.2 - Sequências da região SSU rRNA de Microsporidia utilizadas para análise filogenética

Microsporidia (Isolado) Hospedeiro Ordem Nº de acesso Nosema apis 1 Apis mellifera Hymenoptera X73894 Nosema apis 2 (307) Apis mellifera Hymenoptera FJ789790 Nosema apis 3 (333) Apis mellifera Hymenoptera FJ789787 Nosema apis 4 Apis mellifera Hymenoptera U97150 Nosema bombi 1 Bombus terrestris Hymenoptera AY008373 Nosema bombi 2 Bombus hypnorum Hymenoptera AY741101 Nosema bombi 3 Bombus impatiens Hymenoptera GQ254295 Nosema bombycis 1 (GX 3) Bombyx mori Lepidoptera JF443579 Nosema bombycis 2 (Zhenjiang) Bombyx mori Lepidoptera EU864525 Nosema carpocapsae Cydia pomonella Lepidoptera AF426104 Nosema ceranae 1 (82) Apis mellifera Hymenoptera FJ789788 Nosema ceranae 2 Apis mellifera Hymenoptera EU025027 Nosema ceranae 3 Apis mellifera Hymenoptera EU045844 Nosema ceranae 4 (C7) Apis mellifera Hymenoptera FJ481912 Nosema ceranae 5 Apis mellifera Hymenoptera DQ374656 Nosema heliothidis Helicoverpa armigera Lepidoptera FJ772435 Nosema necatrix (ATCC 30460) Apis cerana Hymenoptera U11051 Nosema oulemae Oulema melanopus Coleoptera U27359 Nosema Portugal Lymantria dispar Lepidoptera AF033316 Nosema sp. 1 (3h) Bombyx mori Lepidoptera AY017212 Nosema sp. 2 (4m) Bombyx mori Lepidoptera AY017213 Nosema sp. 3 (CHW-2007a) Apis mellifera Hymenoptera EF585399 Nosema sp. 4 (KU-9) Noctuidae moth Lepidoptera AF141130 Nosema sp. 5 (NIK-1s_mys) Bombyx mori Lepidoptera HQ615699 Nosema sp. 6 (NIS-M11) Bombyx mori Lepidoptera D85501 Nosema sp. 7 (NIWB-12n) Bombyx mori Lepidoptera HQ615701 Nosema spodopterae 1 Spodoptera litura Lepidoptera AY211392 Nosema spodopterae 2 Spodoptera litura Lepidoptera AY747307 Nosema thomsoni (Cc-LB) Choristoneura conflictana Lepidoptera EU219086 Thelohania disparis Lymantria dispar Lepidoptera DQ272237 Vairimorpha necatrix Pseudaletia unipuncta Lepidoptera DQ996241 Vairimorpha sp. 1(C21) - - AY311592 Vairimorpha sp. 2 Lymantria dispar Lepidoptera L39114 Vairimorpha sp. 3 (CHW-2008a) Ocinara lida Lepidoptera EU487251 Vairimorpha sp. 4 (NIS-M12) Bombyx mori Lepidoptera D85502 Nosema sp.* Diatraea saccharalis Lepidoptera * Isolado reportado neste estudo

Page 39: Renata Araújo Simões

37

2.2.1.6 Patogenicidade do microsporídeo isolado de D. saccharalis a lepidópteros de

importância agrícola

As espécies-praga de importância agrícola Anticarsia gemmatalis, Helicoverpa zea,

Heliothis virescens, Pseudoplusia includens, Spodoptera albula, S. eridania e S. frugiperda

utilizadas no bioensaio foram fornecidas pelo Laboratório de Biologia de Insetos

(ESALQ/USP). As lagartas foram inoculadas individualmente no 3º ínstar via oral (n=25)

adicionando 1 µL de suspensão de esporos do microsporídeo em 0,1 cm3 de dieta artificial de

Greene et al. (1976) preparada sem anticontaminantes, o equivalente a uma dose média de 104

esporos.lagarta-1. Os insetos permaneceram sob condições controladas (26 ± 1°C, fotofase de

12 h) recebendo dieta artificial diariamente. A avaliação foi realizada 15 dias após a infecção.

Para isso, as lagartas foram dissecadas, retirando-se uma amostra do mesêntero para

observação em microscópio com contraste de fase (1000x) quanto à presença de esporos do

patógeno. Também foram avaliados o número de insetos que mudaram de ínstar e a

mortalidade das lagartas. O nível de propagação do patógeno foi determinado adotando-se

uma escala com base no número de esporos encontrado por visada em microscópio para cada

amostra (ALVES, S.B., informação pessoal): baixo – de 1 a 5 esporos, médio – de 6 a 10

esporos, alto – de 11 a 15 esporos e muito alto - mais de 16 esporos.

2.2.1.7 Prevalência do microsporídeo em populações de D. saccharalis e C. flavipes no

Estado de São Paulo

A prevalência do microsporídeo estudado em D. saccharalis e C. flavipes foi

determinada a partir de amostragens realizadas em campo e em laboratórios de criação de

insetos de usinas de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo. Foram previamente selecionadas

quatro usinas para a realização da amostragem (usina A em Ribeirão Preto, B em Piracicaba,

C em Assis e D em Jaú), sendo os nomes das usinas omitidos por questões de

confidencialidade. As coletas foram realizadas mensalmente durante o período de 13 meses

(julho/2010 a julho/2011), embora algumas usinas não tenham enviado amostras todos os

meses. Cada amostragem foi composta por:

50 a 100 lagartas no 4º ínstar provenientes de uma única unidade de criação dos

laboratórios das usinas. As lagartas foram enviadas na unidade de criação contendo dieta

ainda não consumida e fezes. As fezes foram analisadas separadamente com o intuito de

Page 40: Renata Araújo Simões

38

determinar a viabilidade da análise de fezes como indicador do nível de infecção nas

populações;

10 amostras contendo 100 adultos de C. flavipes cada, produzidos em laboratório para

liberação em campo;

Todas as lagartas obtidas em campo durante o monitoramento realizado pelas usinas

para estimar a época de liberação de C. flavipes para controle da broca nos canaviais.

Estes insetos foram enviados ao laboratório ainda vivos onde foram submetidos a

lavagens em água destilada estéril. Após a lavagem, as lagartas foram individualmente

maceradas e homogeneizadas em 200 µL de solução salina estéril (NaCl 0,85%). No caso das

amostras de parasitoides, os adultos foram macerados em grupos de 100 em 200 µL de

solução salina estéril. Dez amostras de fezes das lagartas de 4º ínstar provenientes das

criações em laboratório com peso variando entre 0,3 e 0,4 g foram homogeneizadas em 1 mL

de solução salina estéril. A presença de esporos nas suspensões obtidas por lagarta, grupo de

parasitoide ou amostra de fezes foi observada com uso de microscópio com contraste de fase

(1000x) e de acordo com o número de esporos encontrado por visada no microscópio para

cada amostra foi atribuído um nível de contaminação da amostra, seguindo a seguinte escala:

sem contaminação – 0 esporo, baixo – de 1 a 5 esporos, médio – de 6 a 10 esporos, alto – de

11 a 15 esporos e muito alto - mais de 16 esporos (ALVES, S.B., informação pessoal).

Foi realizada análise de correlação (ANOVA) entre o percentual de esporos

encontrados nas fezes produzidas por D. saccharalis (variável “x”) e o percentual de esporos

encontrados nas lagartas D. saccharalis de criações de laboratório (variável “y”).

2.2.2 Resultados

2.2.2.1 Ciclo de vida do microsporídeo em D. saccharalis

O primeiro estágio de merogonia do patógeno foi observado em D. saccharalis 24 h

após inoculação (p.i.), sendo os merontes binucleados de forma esférica. Merontes com 4 e 8

núcleos foram observados 48 h p.i. e após 72 h foram observados esporontes bi- e

tetranucleados. Esporos, ainda em pequena quantidade, foram encontrados nas lagartas

infectadas após 96 h, sendo mais numerosos a partir de 120 h p.i. Os esporos apresentavam-se

altamente refringentes, com forma elipsóide e medindo 5,72 ± 0,2 µm de comprimento e 2,03

± 0,14 µm de largura (n=10) (Figura 2.1).

Page 41: Renata Araújo Simões

39

24 h

96 h

72 h

48 h

120 h

Figura 2.1 – Desenho esquemático do ciclo de vida do microsporídeo nos tecidos do trato digestivo de Diatraea saccharalis (adaptado de Wittner e Weiss, 1999)

2.2.2.2 Microscopia eletrônica de transmissão

Os esporos primários e secundários foram observados em abundância nos tecidos

epiteliais do mesêntero de D. saccharalis mortos 30 dias após serem infectados pelo

microsporídeo (Figura 2.2).

As estruturas internas observadas foram: disco de ancoragem localizado na porção

anterior do esporo, polaroplasto, filamento polar isofilar em fileira única circundando o

núcleo com 16 espirais e diâmetro de 114 ± 5,2 nm (n=7), os dois núcleos ocupando a porção

central do esporo e vacúolo polar na porção terminal (Figura 2.3). A parede do esporo é

composta por duas camadas, exósporo com espessura de 31 ± 2,6 nm (n=8) e endósporo com

121 ± 7,6 nm (n=8) (Figura 2.4). Os esporos encontrados foram morfologicamente

caracterizados como pertencentes ao gênero Nosema.

Page 42: Renata Araújo Simões

40

Figura 2.2 – Esporos do microsporídeo nos tecidos do trato digestivo de Diatraea saccharalis (1000x)

AD

PV

N

PP

(B)(A)

Figura 2.3 – Esporos de Nosema sp. isolado de Diatraea saccharalis: (A) As setas destacam os núcleos (3000x); (B) AD – disco de ancoragem, PP – polaroplasto, N – núcleo, PV – vacúolo polar (4400x)

Page 43: Renata Araújo Simões

41

PF

EN

EX

Figura 2.4 – Esporo de Nosema sp. isolado de Diatraea saccharalis: EX – exósporo, EM – endósporo e PF – filamento polar (7000x)

2.2.2.3 Sequenciamento e análise filogenética de SSU rRNA

O sequenciamento da região SSU rRNA de Nosema sp. isolado de lagartas de D.

saccharalis resultou em um fragmento de 1232 pb. A porcentagem de GC contida no gene

SSU rRNA de Nosema sp. foi de 37,1%, nas demais sequências de microsporídeos oriundos

do GenBank essa porcentagem variou entre 34,1 e 38,7%.

A topologia das árvores encontradas pelas análises de máxima verossimilhança (MV)

e de Neighbor Joining (NJ) foi similar, e as duas análises recuperaram sete grupos

monofiléticos e altamente consistentes cujos hospedeiros pertencem às ordens Lepidoptera e

Hymenoptera (Figura 2.5). As sequências de microsporídeos isoladas de insetos pertencentes

à mesma família não foram recuperadas em grupos monofiléticos. Nosema sp. faz parte do

grupo 3, indicando proximidade com espécies de Microsporidia isolados de lepidópteros da

Família Bombicidae.

As distâncias genéticas calculadas dentro dos grupos recuperados nas análises

filogenéticas com altos valores de confiança do ramo (bootstrap acima de 90)

(FELSENSTEIN, 2004) variaram entre 0 e 0,008 (Tabela 2.3).

Apartir da caracterização molecular do microsporídeo do gênero Nosema isolado de

D. saccharalis foi constatado que se tratar de uma espécie ainda não descrita de nosematídeo.

Page 44: Renata Araújo Simões

42

Figura 2.5 – Árvore de distância genética gerada pelo método de Neighbor-Joining usando o modelo

Kimura-2-parâmetros. Números acima dos ramos indicam os valores de 1000 replicações de bootstrap acima de 50%

Page 45: Renata Araújo Simões

43

Tabela 2.3 – Distância e erro padrão dentro dos grupos da análise filogenética das sequências SSU rRNA de Microsporidia recuperados com valores de bootstrap acima de 90

Grupos* Distância E.P

1 0,008 0,002 2 0,003 0,001 3 0,008 0,002 4 0,008 0,002 5 0,000 0,000 6 0,002 0,001 7 0,001 0,001

*Grupos gerados na construção da árvore de Neighbor Joining apresentada na Figura 2.5

2.2.2.4 Patogenicidade do microsporídeo isolado de D. saccharalis a lepidópteros de

importância agrícola

H. zea, H. virescens, S. albula e S. frugiperda apresentaram alta porcentagem (≥ 85%)

de infecção por Nosema sp. (Tabela 2.4), enquanto que P. includens foi a espécie com menor

porcentagem (11,1% dos insetos avaliados estavam infectados e apenas 5,6% morreram). O

patógeno acarretou a morte de todas as lagartas de S. albula e S. frugiperda, sendo que na

primeira espécie as lagartas morreram antes da mudança de ínstar. Em H. zea, a doença não

causou a mortalidade das lagartas, embora nenhuma delas tenha mudado de ínstar. Da mesma

forma, apesar da alta porcentagem de H. virescens infectados, a mortalidade das lagartas foi

baixa. O nível de infecção estimado pela densidade de esporos no mesêntero das espécies

analisadas foi reduzido em todas as espécies, exceto em H. zea, cuja densidade de esporos foi

muito alta. Não houve mortalidade de lagartas não infectadas (tratamento controle) durante o

bioensaio. Também não foram encontrados esporos do patógeno nas lagartas do controle.

Na figura 2.6 podem ser observados alguns sintomas resultantes da infecção por

Nosema sp. nas espécies de lepidópteros-praga avaliadas.

Page 46: Renata Araújo Simões

44

Tabela 2.4 - Patogenicidade de Nosema sp. isolado de Diatarea saccharalis a espécies de lepidópteros de importância agrícola

Espécies n Insetos infectados (%)

Nível de Infecção

Insetos sem mudança de ínstar (%)

Mortalidade (%)

A. gemmatalis 19 52,6 Baixo 0 26,3 H. zea 14 100 Muito alto 100 0

H. virescens 14 85,7 Baixo 64,3 35,7 P. includens 18 11,1 Baixo 33,3 5,6

S. albula 18 94,4 Baixo 100 100 S. eridania 17 41,2 Baixo 47,1 5,9

S. frugiperda 20 90 Baixo 65 100 Nível de infecção: sem contaminação – 0 esporo, baixo – de 1 a 5 esporos, médio – de 6 a 10 esporos, alto – de 11 a 15 esporos e muito alto - mais de 16 esporos

Figura 2.6 - Espécies de Lepidoptera de importância agrícola infectadas com Nosema sp. A) retenção

da cápsula cefálica, B e C) redução no crescimento D) dilatação na região das falsas pernas E) comparação do crescimento de lagarta não infectada e infectada

2.2.2.5 Prevalência do microsporídeo em populações de D. saccharalis e C. flavipes no

Estado de São Paulo

A porcentagem de lagartas de D. saccharalis provenientes de criações em laboratório

com microsporidiose variou de 0 a 40%, sendo os maiores níveis de infecção observados nos

meses de julho a setembro de 2010 (Tabela 2.5). Em geral, o número de lagartas de D.

saccharalis infectadas provenientes de criações em laboratório foi reduzido, com

Page 47: Renata Araújo Simões

45

porcentagens médias de 5,3; 7,4; 3,2 e 0,9% nas usinas A, B, C e D, respectivamente. O nível

de infecção por Nosema sp. nos insetos de laboratório analisados, estimado pela densidade de

esporos nas lagartas, foi baixo.

Foram encontrados esporos de Nosema sp. nas fezes produzidas por D. saccharalis

criados em laboratório, porém em baixa quantidade por unidade amostral (Tabela 2.7). Não

foi observada uma relação linear de dependência entre o percentual de esporos encontrados

nas fezes produzidas por D. saccharalis (variável “x”) e o percentual de esporos encontrados

nas lagartas D. saccharalis de criações de laboratório (variável “y”).

A taxa de prevalência de Nosema sp. nas lagartas de D. saccharalis coletadas em

campo foi maior, em média, 16,5% na usina A, 18,2% na C e 15,6% na D que a determinada

nas populações de lagartas de laboratório (Tabela 2.6). Não foram realizadas coletas de D.

saccharalis em campo pela usina B. A maior porcentagem de infecção foi observada em

outubro de 2010 na Usina D (81,8%). Os níveis de infecção, medidos pela quantidade de

esporos do patógeno por inseto nas populações de campo, também foram mais elevados que a

quantidade de esporos observada nas populações de laboratório.

O percentual médio de amostras com Nosema sp. de adultos de C. flavipes produzidos

pela usina B foi de 1,1%, enquanto que essa média aumentou para 24,4 e 83,3% nas usinas C

e D, respectivamente. Inferências acerca da prevalência do patógeno nas amostras de insetos

da usina A foram comprometidas devido ao reduzido número de amostras. As maiores

porcentagens de infecção foram observadas nas amostras da usina D, sendo acima de 40% em

todas as amostras e igual a 100% em 6 das 9 amostras. O nível de infecção das amostras de

parasitoides seguiu a mesma tendência, sendo baixo nas amostras da usina B e variando entre

baixo a alto nas usinas C e D (Tabela 2.8).

Page 48: Renata Araújo Simões

Tabela 2.5 – Percentual de insetos infectados e nível de infecção por Nosema sp. em Diatraea saccharalis provenientes de criações em laboratório de quatro usinas de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo

Meses Usina A Usina B Usina C Usina D

% Infectados (n)

Nível da infecção

% Infectados (n)

Nível da infecção

% Infectados (n)

Nível da infecção

% Infectados (n)

Nível da infecção

jul/10 9 (100) baixo 40 (100) baixo 17 (100) baixo ... .. ago/10 21 (100) baixo ... .. ... .. 3 (100) baixo set/10 0 (100) sem 16 (100) baixo 7 (100) baixo 2 (100) baixo out/10 ... .. 5 (100) baixo ... .. 0 (100) sem nov/10 ... .. 6 (50) baixo 3 (100) baixo 0 (50) sem dez/10 ... .. 0 (50) sem 0 (50) sem 0 (50) sem jan/11 2 (50) baixo 0 (50) sem 0 (50) sem 0 (50) sem fev/11 0 (50) sem ... .. 2 (50) baixo ... .. mar/11 0 (50) sem 0 (50) sem ... .. 0 (50) sem abr/11 ... .. ... .. ... .. 2 (50) baixo mai/11 ... .. ... .. 0 (50) sem ... .. jun/11 ... .. 0 (50) sem 0 (50) sem ... .. jul/11 ... .. 0 (50) sem 0 (50) sem ... ...

... Dado numérico não disponível

.. Não se aplica dado numérico Nível de infecção: sem – 0 esporo, baixo – de 1 a 5 esporos, médio – de 6 a 10 esporos, alto – de 11 a 15 esporos e muito alto - mais de 16 esporos

46

Page 49: Renata Araújo Simões

Tabela 2.6 – Percentual de insetos infectados e nível de infecção por Nosema sp. em Diatraea saccharalis de campo provenientes de monitoramentos realizados por quatro usinas de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo

Meses Usina A Usina C Usina D

% Infectados (n) Nível da infecção % Infectados (n) Nível da infecção % Infectados (n) Nível da infecção

jul/10 ... .. ... .. ... .. ago/10 2,1 (48) baixo 6,3 (32) baixo 0 (27) sem set/10 66,7 (21) médio ... .. 23,5 (17) médio out/10 ... .. ... .. 81,8 (11) baixo nov/10 ... .. 17,6 (17) baixo 15,8 (19) médio dez/10 ... .. ... .. 3,3 (30) baixo jan/11 0 (14) sem ... .. 0 (34) sem fev/11 5,9 (17) médio 30 (30) médio ... .. mar/11 7,7 (26) baixo ... .. 0 (25) sem abr/11 ... .. ... .. 0 (35) sem mai/11 ... .. 0 (17) sem ... .. jun/11 ... .. 17,2 (29) baixo ... .. jul/11 ... .. 37,9 (29) baixo ... ..

... Dado numérico não disponível

.. Não se aplica dado numérico Nível de infecção: sem – 0 esporo, baixo – de 1 a 5 esporos, médio – de 6 a 10 esporos, alto – de 11 a 15 esporos e muito alto - mais de 16 esporos

47

Page 50: Renata Araújo Simões

Tabela 2.7 – Percentual e nível de infecção de Nosema sp. nas amostras de fezes de lagartas de Diatraea saccharalis criadas em laboratório por quatro usinas de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo

Meses Usina A Usina B Usina C Usina D

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

jul/10 ... .. ... .. ... .. ... .. ago/10 ... .. ... .. ... .. ... .. set/10 0 sem 20 (10) baixo 0 sem 0 sem out/10 ... .. 0 sem ... .. 0 sem nov/10 ... .. 30 (10) baixo 50 (10) baixo 0 sem dez/10 ... .. 10 (10) baixo 10 (10) baixo ... .. jan/11 ... .. 10 (10) baixo 0 sem 0 sem fev/11 10 (10) baixo 30 (10) baixo 0 sem 0 sem mar/11 0 sem ... .. ... .. 0 sem abr/11 ... .. ... .. 20 (10) baixo 0 sem mai/11 ... .. ... .. 0 sem ... .. jun/11 ... .. 20 (10) baixo 20 (10) baixo ... .. jul/11 ... .. 0 sem 0 sem ... ..

... Dado numérico não disponível

.. Não se aplica dado numérico Nível de infecção: sem – 0 esporo, baixo – de 1 a 5 esporos, médio – de 6 a 10 esporos, alto – de 11 a 15 esporos e muito alto - mais de 16 esporos

48

Page 51: Renata Araújo Simões

Tabela 2.8 – Percentual de amostras infectadas e nível de infecção por Nosema sp. nas amostras de adultos de Cotesia flavipes provenientes de criações em laboratórios de quatro usinas de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo

Meses Usina A Usina B Usina C Usina D

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

% Amostras infectadas (n)

Nível da infecção

jul/10 ... .. 0 sem 10 (10) baixo ... .. ago/10 20 (10) baixo 0 sem 10 (10) baixo 100 (10) médio set/10 0 sem 0 sem ... .. 100 (10) médio out/10 ... .. 10 (10) baixo ... .. 60 (10) médio nov/10 ... .. 0 sem 100 (10) muito alto 100 (10) baixo dez/10 ... .. 0 sem 0 sem ... .. jan/11 ... .. 0 sem 10 (10) baixo 100 (10) alto fev/11 ... .. ... .. 10 (10) médio 50 (10) alto mar/11 40 (10) baixo 0 sem ... .. 100 (10) médio abr/11 ... .. ... .. 30 (10) baixo 40 (10) baixo mai/11 ... .. ... .. 50 (10) médio 100 (10) alto jun/11 ... .. 0 sem 0 sem ... .. jul/11 ... .. ... .. ... .. ... ..

... Dado numérico não disponível

.. Não se aplica dado numérico Nível de infecção: sem – 0 esporo, baixo – de 1 a 5 esporos, médio – de 6 a 10 esporos, alto – de 11 a 15 esporos e muito alto - mais de 16 esporos

49

Page 52: Renata Araújo Simões

50

Considerando a prevalência média de Nosema sp. nas amostragens realizadas nas

quatro usinas do Estado de São Paulo, observou-se que os valores de amostras infectadas nas

populações de laboratório de D. saccharalis são inferiores aos obtidos nas populações de

laboratório de C. flavipes (Figura 2.6).

0

10

20

30

40

50

60

70

80

D. saccharalis C. flavipes

Am

ost

ras

In

fecta

das

(%

)

Figura 2.6 – Percentual médio de amostras contendo uma lagarta de Diatraea saccharalis e 100 adultos de Cotesia flavipes infectadas por Nosema sp. provenientes de criações de laboratório em quatro usinas de cana-de-açúcar do Estado de São Paulo

2.2.3 Discussão

As características morfológicas do microsporídeo isolado de D. saccharalis o inserem

no gênero Nosema de acordo com Undeen e Vávra (1997).

O período entre a contaminação de D. saccharalis e a detecção de esporos de Nosema

sp. nos tecidos do mesêntero das lagartas foi de 96 h após a inoculação (p.i.). Este tempo é

igual ao observado por Rao et al. (2004) nos microsporídeos NIK-2r e N. bombycis (isolados

de B. mori) e menor do que em Nosema sp. infectando Spodoptera litura (168 h) relatado por

Johny et al. (2006).

Os esporos do isolado em estudo apresentaram comprimento de 5,72 µm e 2,03 µm de

largura, sendo o comprimento maior que o descrito como padrão para o gênero segundo

Undeen e Vávra (1997) que é de 4 x 2 µm e do que o comprimento de outros esporos isolados

de Lepidoptera (TSAI et al., 2003; JOHNY et al., 2006), Hymenoptera (FRIES et al., 1996) e

Page 53: Renata Araújo Simões

51

Coleoptera (ZHU et al., 2011). A forma dos esporos é uma característica muito variável, por

se tratar de um atributo passível a interpretação de cada autor. Sendo assim, os esporos de

Nosema são descritos como ovais, ovóides, ovocilíndricos, elipsoides, entre outros.

Outra característica muito inconstante dentro do gênero Nosema é o número de

espirais do filamento polar. Contudo, de acordo com Sato et al. (1982), a variação no número

de espirais do filamento polar distinguem um isolado de Nosema do outro. São reportados em

diversos estudos sobre nosematídeos números variando entre 10 e 23 espirais no filamento

polar (SATO et al., 1982; FRIES et al., 1996; UNDEEN; VÁVRA, 1997; RAO et al., 2004;

ZHU et al., 2011). No presente estudo foram observadas 16 espirais no filamento polar dos

esporos de Nosema sp. Apesar de possuir número variante de espirais, o filamento polar de

microsporídeos deste gênero é isofilar e disposto em fileira única ao redor do núcleo do

esporo.

Observou-se também que o exósporo do microsporídeo de D. saccharalis é formado

por uma camada única e densa, concordando com Slamovits et al. (2004), que propuseram o

uso desta característica, dentre outras, para separação de Nosema e Antonospora em

gafanhotos. A espessura do exósporo e endósporo do isolado em estudo foi de 31 ± 2,6 nm e

121 ± 7,6 nm, respectivamente; valores diferentes dos observados por Fries et. al (1996) para

N. ceranae (14 – 17 nm para exósporo e 134 – 158 nm para endósporo).

Para identificação específica de Nosema nem sempre são suficientes características

como ciclo de vida, tamanho do esporo, forma, e estruturas do esporo incluindo o número de

espirais do filamento polar e a relação hospedeiro-patógeno (RAO et al., 2007). Por isso,

estudos comparativos de genes rRNA são frequentemente utilizados na filogenia e taxonomia

de Microsporidia (FRIES et al., 1996; CANNING et al., 1999; KLEESPIES et al., 2003;

TSAI et al., 2003; RAO et al., 2004, 2007; SLAMOVITS et al., 2004; FRANZEN et al.,

2006; JOHNY et al., 2006; DONG et al., 2010; BJORNSON et al., 2011; KYEI-POKU et al.,

2011; entre outros).

O gene SSU rRNA é adequado para análises das relações filogenéticas entre gêneros,

podendo ser utilizadas na classificação taxonômica ao nível de gênero. Enquanto que para

análises filogenéticas entre diferentes espécies do mesmo gênero, é mais indicado, por

exemplo, o gene ITS do ribossomo em detrimento de SSU (DONG et al., 2010).

Dong et al. (2010) analisaram o conteúdo de GC no gene SSU de 20 espécies de

Nosema definindo dois grupos distintos, com variação entre 33,98 e 38,73%. Em

concordância com essa informação, Slamovits et al. (2004) afirmam que o conteúdo típico de

Page 54: Renata Araújo Simões

52

GC do SSU rRNA de outras espécies de Nosema tem como padrão valores entre 33,9% e

39%. O isolado Nosema sp. de D. saccharalis apresentou um percentual dentro do padrão

para o gênero que foi de 37,1%.

A distância p foi utilizada para analisar a divergência entre as espécies envolvidas,

visto que na matriz de distância foram encontrados valores de p inferiores a 0,20 (NEI, 1991

apud RUSSO et al., 2001). As maiores distâncias dentre os grupos gerados na construção da

árvore de NJ foram referentes aos grupos 1, 3 e 4. Os demais grupos foram compostos por

táxons que tinham como hospedeiros Hymenoptera ou Lepidoptera. Nos grupos 1 e 4 foram

agrupados táxons de isolados cujos hospedeiros eram Hymenoptera e Lepidoptera,

justificando essa divergência. No grupo 3 a distância foi de 0,008, podendo esse valor ser

atribuído à presença do isolado em estudo, visto que esse valor foi reduzido para 0,006 ao

excluí-lo do grupo. A divergência do isolado de D. saccharalis em relação aos demais táxons

do grupo 3 foi de 0,010. Baseando-se em diferenças quanto ao número de pares de bases, ao

conteúdo de GC e à divergência no gene SSU rRNA entre 20 espécies de Nosema Dong et al.

(2010) sugerem a formação de dois grupos dentro do gênero, sendo as espécies do grupo II

mais próximas de Vairimorpha. O microsporídeo isolado de D. saccharalis apresentou

características que se enquadram em ambos os grupos, os quais constituem um grupo maior

chamado de “Nosema verdadeiro”, onde são encontradas espécies dos gêneros Nosema e

Vairimorpha.

Nosematídeos que infectam somente espécies de Lepidoptera são mais estreitamente

relacionados entre si do que aqueles cujos hospedeiros não são lepidópteros (RAO et al.,

2004), ressaltando a afirmação de Baker et al. (1994) de que este fato tem um significado

filogenético. Assim, o agrupamento de espécies distintas de Nosema que parasitam somente

lepidópteros sugere uma coevolução dessas espécies com seu grupo hospedeiro por um longo

período de tempo.

Nosema sp. isolado de D. saccharalis foi patogênico a todas as espécies de Noctuidae

testadas. Esta observação corrobora com estudos de outros autores que demonstraram que

Microsporidia infecta várias espécies dentro da mesma ordem de hospedeiros em testes de

especificidade em laboratório (JOHNY et al. 2006). Normalmente, os microsporídios não

infectam espécies de diferentes ordens de insetos (FANTHAM; PORTER, 1958; UNDEEN;

MADDOX, 1973), entretanto, é preciso levar em consideração que a especificidade em

laboratório (especificidade fisiológica) geralmente inclui um espectro amplo de hospedeiros

em comparação com a atividade do patógeno em campo (especificidade ecológica) (HAJEK;

BUTLER, 2000).

Page 55: Renata Araújo Simões

53

O percentual de Nosema sp. em D. saccharalis coletados em campo foi mais elevado

que o observado nos insetos de criações, contrariando a expectativa de que as populações de

laboratório, devido ao confinamento em unidades de criação, seriam mais contaminadas pelo

microsporídeo. As infecções em D. saccharalis de campo podem ser devido a transmissão de

Nosema sp. por parasitoides infectados provenientes de laboratório e liberados em campo. As

lagartas de campo foram oriundas de monitoramento para definir os períodos de liberações

inundativas do parasitoide e, em sua maioria, continham larvas de C. flavipes em

desenvolvimento.

As maiores taxas de prevalência de Nosema sp. em adultos de C. flavipes provenientes

de criações massais contrastou com o reduzido percentual de D. saccharalis infectados que

são utilizados como hospedeiros na produção do parasitoide. Essa informação tem extrema

importância para pesquisas futuras referentes à manutenção da qualidade do programa de

controle biológico da broca-da-cana, tão difundido no Brasil, principalmente no Estado de

São Paulo.

2.3 Conclusões

O microsporídeo isolado de D. saccharalis pertence ao gênero Nosema e trata-se de

uma espécie ainda não descrita de nosematídeo. Em condições de laboratório, este

microsporídeo também é patogênico a outras sete espécies de lepidópteros de importância

agrícola. A prevalência de Nosema sp. nas amostras provenientes das criações de laboratório

de C. flavipes é maior que a prevalência no seu hospedeiro.

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Page 60: Renata Araújo Simões

58

Page 61: Renata Araújo Simões

59

3 PROPAGAÇÃO E VIRULÊNCIA DE Nosema sp. (MICROSPORIDIA:

NOSEMATIDAE), IMPACTO NA BIOLOGIA DE Diatraea saccharalis

(LEPIDOPTERA: CRAMBIDAE) E USO DE PRODUTOS ANTIMICROBIANOS

PARA SEU CONTROLE

Resumo

No Brasil, a ocorrência de Nosema foi relatada em Diatraea saccharalis (Fabr., 1794) (Lepidoptera: Crambidae) na década de 1970, sendo atualmente, um importante problema na manutenção da sanidade das criações da broca-da-cana em alguns laboratórios. Os objetivos deste trabalho foram estudar a propagação do patógeno nas lagartas e sua liberação nas fezes, a virulência de esporos de Nosema sp. a D. saccharalis em condições de laboratório, avaliar os efeitos do microsporídeo na biologia da broca-da-cana e testar produtos antimicrobianos no controle deste entomopatógeno. O período entre a contaminação e a liberação de esporos nas fezes de D. saccharalis foram avaliados em lagartas inoculadas com 103, 105 e 3x106 esporos.lagarta-1. Os esporos foram detectados a partir do 9º dia após inoculação nas lagartas que ingeriram a menor dose e a partir do 7º dia nas demais doses. Houve diferenças significativas na quantidade de esporos liberados nas fezes entre os tratamentos, com redução no número de eporos nas fezes de lagartas inoculadas com 103 esporos. Para estimar a propagação de esporos em D. saccharalis, lagartas foram inoculadas com 105 esporos, e analisadas quanto ao número de esporos.peso corpóreo-1 após 16 dias. Houve redução no peso das lagartas infectadas em comparação às não infectadas e a produção foi de 9,5x106

esporos.mg de peso corpóreo-1. Foram estimados TL50 e DL50 de Nosema sp. a lagartas de 1º e 3º ínstar inoculadas com 0, 1, 10, 102, 103, 104, 105, 106 e 107 esporos.lagarta-1. O TL50 para lagartas de 1º ínstar variou de 59 a 9 dias, com mortalidades de 25,4 a 100%, para doses entre 1 e 106 esporos.indivíduo-1. Nas lagartas de 3º ínstar, inoculadas com as doses de 102 a 106 esporos, o TL50 variou de 49 a 32 dias, com mortalidades de 26,7 a 98,3%. Lagartas de 1º ínstar foram extremamente suscetíveis ao patógeno com DL50 de apenas 5,6 esporos.lagarta-1. A DL50 estimada para as lagartas de 3º ínstar foi de 1,2x103 esporos.lagarta-1. O impacto de Nosema sp. na biologia de D. saccharalis foi analisado através da avaliação dos efeitos da ingestão de 10 esporos.lagarta-1 na duração e viabilidade das fases do inseto, e no peso de pupas e nos parâmetros das tabelas de vida de fertilidade para casais compostos por fêmeas infectadas e machos não infectados e fêmeas não infectadas e machos infectados, comparados a casais não infectados. A infecção pelo microsporídeo resultou em efeitos adversos nos parâmetros biológicos de D. saccharalis, exceto quanto à duração das fases embrionária e de pupa e ao peso de pupa dos machos, que não diferiram estatisticamente entre os grupos de infectados e não infectados. Os testes com produtos antimicrobianos foram realizados em lagartas inoculadas com 102 e 104 esporos.lagarta-1 e alimentadas durante 30 dias com dieta artificial na qual cada produto foi incorporado. A mortalidade das lagartas que consumiram os produtos testados não diferiu estatisticamente da mortalidade observada nas lagartas infectadas que ingeriram a dieta sem adição de nenhum dos produtos, indicando que os produtos não foram eficazes na eliminação do patógeno.

Palavras-chave: TL50; DL50; Tabela de vida de fertilidade; Patologia de insetos; Nosemose.

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Abstract

In Brazil, Nosema has been reported in Diatraea saccharalis (Fabr., 1794) (Lepidoptera: Crambidae) in the 1970's, and it is currently a major problem in maintaining the healthiness of laboratory rearing of the sugarcane borer. Our objectives were: to study the dissemination of the pathogen in larval tissues, its release in feces; the virulence of Nosema sp. spores to D. saccharalis under laboratory conditions; to evaluate the effects of infection by microsporidium on the biology of sugarcane borer and to test antimicrobial products to control the microsporidium in D. saccharalis. The release of spores in the feces of D.

saccharalis was assessed in larvae inoculated with 103, 105 and 3x106 spores.larva-1. The spores were found on the 9th day after inoculation in the larvae that ingested the lowest dose and on the 7th day to other ingested doses. There were significant differences in the amount of spores released in feces between treatments, with a reduction in the number of spores released in feces of larvae inoculated with 103 spores. To estimate the propagation of spores on D.

saccharalis tissues, larvae were inoculated with 0 and 105 spores, and analyzed for the number of spores.mg body weight-1 after 16 days. The weight of the infected larvae was reduced compared to uninfected ones and the production was 9.5x106 spores.mg body weight-1. In the study on Nosema sp. virulence, LD50 and LT50 were estimated to larvae of the 1st and 3rd instar inoculated with 0, 1, 101, 102, 103, 104, 105, 106 and 107 spores.larva-1. The LT50 ranged from 59 to 9 days, with mortalities from 25.4 to 100% for the respective average doses from 1 to 106 spores in the 1st instar larvae and 49 to 32 days for the 3rd instar larvae with doses of 102 to 106 spores. The estimated LC50 for the larvae of the 1st and 3rd instar were 5.58 and 1.23 x103 spores.larva-1, respectively. First instar larvae were extremely susceptible to the pathogen. The impact of Nosema sp. on the biology of D. saccharalis infected with average dose of 10 spores.larva-1 was analyzed by assessing the biological parameters (duration and viability of development stages and pupae weight) and the parameters of fertility life tables for pairs composed of: “uninfected females and males”, “infected females and uninfected males” and “uninfected males and females infected with Nosema sp.” Infection by

microsporidium caused adverse effects on biological parameters of D. saccharalis in comparison to the range observed in uninfected insects, except for the duration of embryonic and pupal stages, the pupal weight of males, these parameters did not differ statistically between the infected and uninfected groups. Tests were conducted with antimicrobial products in D. saccharalis larvae inoculated with 102 and 104 spores.larva-1, fed for 30 days with artificial diet where each product was incorporated. The mortality of larvae that consumed the products did not differ from mortality observed in infected larvae that ingested the diet without adding any of the products, indicating that the antimicrobials were not efficient against this pathogen.

Keywords: LT50; LD50; Fertility life table; Insect pathology; Nosemosis.

3.1 Introdução

A broca-da-cana Diatraea saccharalis (Fabricius, 1794) (Lepidoptera: Crambidae) é

uma espécie nativa do hemisfério ocidental que ocorre desde o sul dos Estados Unidos às

Antilhas e da América Central até a Argentina. É considerada uma das principais pragas da

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cana-de-açúcar nas Américas. No Brasil está presente em todos os estados onde se cultiva

cana-de-açúcar (GUEVARA; WIENDL, 1980; MENDONÇA, 1996; MACEDO; ARAÚJO,

2000; PARRA et al., 2002). É responsável por danos diretos pela abertura de galerias nos

colmos e indiretos por favorecer a penetração de fungos oportunistas na planta (GALLO et

al., 2002), que podem digerir o açúcar da cana ou contaminar o caldo, ocasionando perdas

tanto à produção de açúcar quanto à de álcool (MACEDO; BOTELHO, 1988).

Atualmente, o controle desta praga nos canaviais é realizado eficientemente por

liberações inundativas do endoparasitoide Cotesia flavipes (Hymenoptera: Braconidae). Para

isso, este parasitoide é produzido em larga escala em laboratório no seu hospedeiro, D.

saccharalis (PARRA, 1993; BOTELHO; MACEDO, 2002).

Na década de 1970, foram observadas perdas em criações de laboratório de D.

saccharalis no Brasil quanto à eficiência de produção da broca-da-cana associadas a

ocorrências de microsporidioses (ALVES, S.B., informação pessoal). A partir disso, Alves et

al. (1985) realizaram um levantamento de patógenos associados a D. saccharalis em diversas

regiões do Brasil, constatando a presença de um microsporídeo não identificado em insetos

adultos e imaturos provenientes de campo e de criações em laboratório. A associação entre

um nosematídeo não identificado e D. saccharalis também foi relatada em populações de

laboratório no Texas por Solter, L.F. (informação pessoal).

Apesar de estudos sobre espécies de Nosema em Pyraloidea datarem da década de

1950 (HALL, 1952), a grande maioria das pesquisas com Microsporidia em lepidópteros

desta Superfamília refere-se ao controle natural da broca europeia Ostrinia nubilalis (Hübner)

por Nosema pyrausta (ANDREADIS, 1984, 1987; HENRY, 1990; ORR et al., 1994;

SOLTER; BECNEL, 2000; INGLIS et al., 2003). Kramer (1959) foi o primeiro a documentar

a incidência sazonal deste patógeno e a mortalidade resultante da infecção por N. pyrausta em

populações de O. nubilalis, relacionando as condições ambientais com a prevalência da

doença. Em levantamento de patógenos associados às brocas do milho Diatraea grandiosella

Dyar e Diatraea crambidoides (Grote) (Lepidoptera: Crambidae) no Mississipi e na Carolina

do Norte, respectivamente, Inglis et al. (2000) encontraram uma espécie de Nosema não

descrita em D. grandiosella, relatando-a como patogênica à broca. Posteriormente, Inglis et

al. (2003) avaliaram o impacto desta espécie nos parâmetros biológicos de D. grandiosella.

Em geral, os microsporídeos desse gênero são descritos por diversos autores como

responsáveis por mortalidade substancial de seus hospedeiros (ZIMMACK et al., 1954;

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ZIMMACK; BRINDLEY, 1957; KRAMER, 1959; SIEGEL et al., 1986), por deformações

em pupas infectadas (SAJAP; LEWIS, 1992), pela redução no peso de pupas, na longevidade

e, principalmente, pelo decréscimo na fecundidade das fêmeas infectadas e na fertilidade dos

seus ovos (INGLIS et al., 2003).

Os objetivos deste trabalho foram estudar a propagação de Nosema sp. em tecidos de

D. saccharalis para estimar a quantidade de propágulo produzidos por lagarta, o período entre

a contaminação de D. saccharalis e a liberação de esporos nas suas fezes, a virulência de

Nosema sp. a D. saccharalis, os efeitos da doença na biologia da broca-da-cana e testar

produtos antimicrobianos adicionados à dieta para reduzir a infecção por este entomopatógeno

nas lagartas.

3.2 Desenvolvimento

3.2.1 Material e métodos

3.2.1.1 Infecção das lagartas de D. saccharalis em laboratório

Os insetos não infectados e infectados por Nosema sp. utilizados no desenvolvimento

dos bioensaios foram provenientes de criações estabelecidas no Laboratório de Patologia e

Controle Microbiano de Insetos (ESALQ/USP).

As suspensões de esporos para utilização nos bioensaios foram obtidas macerando-se

lagartas de D. saccharalis infectadas por Nosema sp. em solução salina (NaCl 0,85%) +

0,05% de antibiótico (Pentabiótico Veterinário Reforçado, Fort Dodge® Saúde Animal Ltda).

Posteriormente, a suspensão de esporos foi submetida a processos subsequentes de filtragem

em gaze, centrifugação e lavagens em solução salina, sendo a quantificação dos esporos

suspensos realizada em câmara de Neubauer.

Anteriormente à infecção, todas as lagartas foram mantidas sem alimento por 8 horas.

Após esse período, o patógeno foi inoculado através da contaminação da superfície da dieta

artificial de King e Hartley (1985), preparada sem metilparabeno (Nipagin®) e sem

formaldeído, e oferecida às lagartas. Para a contaminação da dieta foram usadas suspensões

com concentrações de esporos de Nosema sp.mL-1 de solução salina, respectivas a cada

experimento. As lagartas foram acondicionadas em placa de Petri descartáveis (60 x 15 mm) e

receberam 1 disco de dieta (0,1 cm3) para cada grupo de 5 lagartas, com 5 µL de suspensão.

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Os insetos permaneceram nas placas até o consumo total da dieta contaminada. Para os grupos

de insetos testemunha cada disco de dieta recebeu apenas 5 µL de solução salina estéril.

3.2.1.2 Propagação de Nosema sp. em D. saccharalis

O experimento para avaliar a quantidade de esporos liberados nas fezes de D.

saccharalis com nosemose foi composto por 4 tratamentos referentes às seguintes doses de

esporos de Nosema: (i) 0 – controle, (ii) 103, (iii) 105 e (iv) 3x106 esporos.lagarta-1, com 5

repetições contendo 10 lagartas cada. A propagação de esporos de Nosema sp. em D.

saccharalis foi estimada através de bioensaio contendo dois tratamentos, onde lagartas foram

inoculadas com: (i) 0 – controle e (ii) 105 esporos.lagarta-1, sendo cada tratamento composto

por 20 repetições (indivíduo.repetição-1).

Os insetos foram contaminados no 3º ínstar e mantidos em placas de Petri (60 x 15

mm) permanecendo em câmara climatizadacom temperatura de 26 ± 1ºC, umidade relativa de

60 ± 10% e fotofase de 12 h. Foi realizada diariamente a limpeza das placas com álcool 70% e

substituição da dieta (com anticontaminantes).

As fezes das lagartas foram recolhidas diariamente e examinadas em microscópio com

contraste de fase (1000x) até a constatação de esporos maduros de Nosema sp. A

quantificação dos esporos nas fezes foi realizada no 1º, 3º, 9º e 12º dia posterior ao início da

disseminação do patógeno pelas fezes, procedendo-se a pesagem das fezes. As fezes foram

diluídas em 1 mL de solução salina e filtradas em gaze estéril com auxílio de seringa. A

contagem dos esporos na suspensão obtida foi realizada com uso da câmara de Neubauer. Foi

realizada análise de correlação (ANOVA) entre o número de esporos encontrados nas fezes de

D. saccharalis (variável “x”) e o peso (mg) das fezes produzidas pelas lagartas (variável “y”).

No estudo sobre a propagação de Nosema, a quantidade de esporos de Nosema sp. por

D. saccharalis foi medida 16 dias após serem inoculados com 105 esporos.lagarta-1. Para isso,

as lagartas sadias e infectadas foram pesadas e maceradas individualmente com micropistilo

em 1 mL de solução salina. A suspensão obtida foi filtrada em gaze estéril com auxílio de

seringa e a contagem dos esporos de Nosema sp. foi realizada com uso da câmara de

Neubauer.

Os dados referentes ao número de esporos de Nosema sp. nas fezes e nas lagartas de

D. saccharalis foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de

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Tukey e pelo teste F (ANOVA), respectivamente, ao nível de significância de 5% pelo

programa estatístico SAS – System for Windows 9.1 (SAS INST., 2003).

3.2.1.3 Sintomatologia

As lagartas contaminadas para a condução do experimento descrito no item 3.2.1.2

foram diariamente observadas. Os insetos com sintomas decorrentes da evolução da doença

foram fotografados.

3.2.1.4 TL50 e DL50 de Nosema sp. a lagartas de 1º e 3º ínstar de D. saccharalis

A virulência de Nosema sp. foi avaliada em lagartas de 1º e 3º ínstar D. saccharalis ,

inoculadas com as seguintes doses : (i) 0 – controle, (ii) 1, (iii) 101, (iv) 102, (v) 103, (vi) 104,

(vii) 105, (viii) 106 e (ix) 107 esporos.lagarta-1, com 6 repetições contendo 10 lagartas por

tratamento.

As lagartas foram mantidas em placas de Petri descartáveis (60 x 15 mm) em câmara

climatizada com temperatura de 26 ± 1ºC, umidade relativa de 60 ± 10% e fotofase de 12 h.

As lagartas foram observadas diariamente, sendo realizada higienização das placas com álcool

70% e substituição da dieta artificial com anticontaminantes.

A mortalidade das lagartas foi avaliada a cada 24 h, sendo os cadáveres e adultos

emergidos submetidos à análise em microscópio com contraste de fase (1000x) para constatar

a presença de esporos de Nosema sp. Os dados percentuais de mortalidade de D. saccharalis

foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey ao nível

de significância de 5% pelo programa estatístico SAS – System for Windows 9.1 (SAS INST.,

2003). A estimativa do tempo letal médio (TL50) foi realizada pelo método de Kaplan-Meyer,

mediante utilização do programa SPSS 15.0 (SPSS INC., 2006) e a estimativa da dose letal

média (DL50) foi obtida por Probit, com uso do PoloPlus 1.0 (LeORA SOFTWARE, 2003).

3.2.1.5 Efeitos de Nosema sp. na biologia de D. saccharalis

Foram utilizadas 240 lagartas recém-eclodidas de D. saccharalis contaminadas via

dieta com a dose de 10 esporos.lagarta-1 e no controle a mesma quantidade de lagartas recebeu

dieta contendo apenas solução salina estéril. Para infecção foram formados grupos com 10

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insetos acondicionados em potes de acrílico transparentes (25 x 13 mm), com apenas 1 disco

(0,1 cm3) de dieta [sem adição de metilparabeno (Nipagin®) e formaldeído] inoculado em sua

superfície com suspensão de esporos na dose de 100 esporos.disco-1. Os potes foram mantidos

em câmara climatizada sob condições controladas (26 ± 1ºC, 60 ± 10% U.R. e fotofase de 12

h) até o consumo total da dieta artificial. Após esse período, as lagartas foram transferidas

individualmente para frascos de vidro de fundo chato (25 x 85 mm) contendo 10 mL de dieta

artificial de King e Hartley (1985) completa, onde permaneceram até a fase de pupa.

As pupas foram retiradas da dieta, esterilizadas superficialmente por imersão em

hipoclorito de sódio a 0,2% durante 15 minutos e separadas por sexo. Em seguida, as pupas

foram pesadas e individualizadas em copos descartáveis de poliestireno (50 mL) sobre papel

filtro umedecido com água destilada estéril e vedados com filme de PVC, até emergência dos

adultos.

Dos adultos emergidos, foram formados 22, 11 e 16 casais de mesma idade, nas

respectivas combinações: (i) fêmea e macho não infectados, (ii) fêmea infectada por Nosema

sp. e macho não infectado e (iii) fêmea não infectada e macho infectado por Nosema sp.;

individualizados em gaiolas de PVC (10 x 13 cm) revestidas por papel sulfite branco estéril

como substrato para oviposição. As gaiolas foram fechadas na parte superior e inferior com

placas de Petri (90 x 15 mm), sendo a parte inferior contendo papel filtro estéril umedecido.

Água destilada estéril foi mantida em frascos nas gaiolas dos adultos. A mortalidade de

machos e fêmeas e a duração dos períodos de pré-oviposição, oviposição e pós-oviposição

foram determinados diariamente. Além disso, foram obtidos os parâmetros: razão sexual, peso

de pupas, viabilidade dos estágios de larva e pupa, bem como o percentual de deformações em

pupas e adultos.

As posturas foram recolhidas diariamente, sendo substituídos os substratos para

oviposição. Os ovos foram mantidos em câmara úmida por 2 dias para melhor visualização e

contagem dos mesmos em microscópio estereoscópico. A contagem dos ovos permitiu avaliar

a fertilidade diária dos insetos. Os ovos provenientes da 2ª postura de cada fêmea foram

esterilizados externamente por imersão em sulfato de cobre a 1% por 5 minutos e mantidos

em câmara úmida até a eclosão das lagartas, determinando-se a viabilidade e a duração do

estágio embrionário nas 3 combinações: (i) fêmea e macho não infectados, (ii) fêmea

infectada por Nosema sp. e macho não infectado e (iii) fêmea não infectada e macho infectado

por Nosema sp.

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Os valores referentes à duração das fases de larva, pupa e adultos e ao peso de pupas

foram submetidos à análise de variância e comparados pelo teste de Tukey ao nível de

significância de 5% pelo programa estatístico SAS – System for Windows 9.1 (SAS INST.,

2003). Baseando-se nos dados de sobrevivência e fecundidade de cada fêmea, foram

elaboradas tabelas de vida de fertilidade. Com as informações das tabelas de vida foram

estimados os seguintes parâmetros para cada tratamento:

- Taxa líquida de reprodução (R0): estimativa do número médio de fêmeas gerado por

fêmea ao longo do período de oviposição, indicando quantas vezes a população cresceu no

intervalo de uma geração;

- Intervalo entre gerações (T): tempo médio entre a postura de ovos de uma geração e

a postura da geração seguinte (ovo a ovo);

- Taxa intrínseca de crescimento (rm): fator relacionado com a velocidade de

crescimento da população, sendo seu valor proporcional ao crescimento;

- Taxa finita de aumento ( ): fator de multiplicação de crescimento diário da

população, indicando o número de fêmeas, adicionado por fêmea, ao dia, ao longo de uma

geração.

Os parâmetros das tabelas de vida de fertilidade foram estimadas pelo método de

Jackknife (MEYER et al., 1986) e as médias comparadas pelo teste “t” bilateral, a 5% de

probabilidade pelo programa estatístico SAS – System for Windows 9.1 (SAS INST., 2003).

3.2.1.6 Avaliação de produtos antimicrobianos para redução de Nosema sp. em D.

saccharalis

Lagartas de 3º ínstar de D. saccharalis foram infectadas com 104 esporos de Nosema

sp.lagarta-1 e submetidas a tratamentos com produtos recomendados para o controle in vivo e

in vitro de Microsporidia em insetos e vertebrados. Foram testadas duas doses dos seguintes

produtos por 100 mL de dieta: Itraconazol®(itraconazol) (0,04 e 0,08 g), Flagimax®

(metronidazol) (0,05 e 0,1 g), NeoFedipina® (nifedipino) (0,04 e 0,08 g), Albendy®

(albendazol) (0,04 e 0,08 g), própolis (Laboratório de Insetos Úteis – ESALQ/USP) (0,2 e 0,4

g) e Derosal® (benzimidazol) (0,15 e 0,20 µL). Os produtos foram adicionados na dieta

artificial de King e Hartley (1985) oferecida às lagartas com nosemose. No tratamento

controle foram utilizadas lagartas infectadas recebendo apenas dieta sem adição de nenhum

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dos produtos listados. Sendo assim, o experimento foi composto por 13 tratamentos com 25

lagartas cada (5 lagartas por repetição). As lagartas foram mantidas em tubos de vidro de

fundo chato (25 x 85 mm) contendo 10 mL da dieta respectiva a cada tratamento,

acondicionados em câmara climatizada a temperatura de 26 ± 1ºC, umidade relativa de 60 ±

10% e fotofase de 12 h. O percentual de lagartas mortas foi avaliado após 30 dias. As lagartas

foram examinadas em microscópio com contraste de fase (1000x) para comprovar a infecção

por Nosema sp.

O bioensaio foi repetido usando-se apenas a maior dose dos produtos testados e

metade da dose de inóculo (102 esporos de Nosema sp.lagarta-1), devido à alta mortalidade das

lagartas. Os demais processos adotados na metodologia foram os mesmos descritos no

primeiro bioensaio.

3.2.2 Resultados

3.2.2.1 Propagação de Nosema sp. em D. saccharalis

Os esporos de Nosema sp. foram detectados nas fezes das lagartas infectadas sete dias

após a inoculação com 105 e 3x106 esporos.lagarta-1 e após nove dias pelas lagartas inoculadas

com a menor dose de esporos do patógeno. Não foram encontrados esporos do patógeno nas

fezes das lagartas correspondentes ao tratamento controle.

Não houve diferença significativa quanto ao número de esporos encontrado nas fezes

entre os tratamentos onde as lagartas foram inoculadas com 105 e 3x106 esporos. No entanto,

ambos diferiram em relação ao tratamento com a menor dose (F2, 9=14,6; P=0,0015), que foi

97,3 e 95,5% inferior ao número de esporos liberados pelas lagartas que ingeriram as doses

105 e 3x106 esporos, respectivamente (Tabela 3.1). A quantidade de fezes produzidas por D.

saccharalis não diferiu estatisticamente em relação às doses de inóculo (F2, 9=0,83;

P=0,4662), apresentando apenas redução numérica nas lagartas que ingeriram maior número

de esporos do patógeno. Não foi observada uma relação linear de dependência entre o número

de esporos encontrados nas fezes de D. saccharalis (variável “x”) e o peso (mg) das fezes

(variável “y”). Os resultados indicam que o aumento no número de esporos liberados está

mais relacionado com a quantidade de esporos ingeridos que com a quantidade de fezes

produzidas pelas lagartas.

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Tabela 3.1 – Número médio de esporos de Nosema sp. liberados nas fezes de Diatraea saccharalis

Dose

(esporos/D. saccharalis) Média diária/lagarta

Esporos ± EP (x106) Fezes ± EP (mg)

103 0,05 ± 0,02 a 20,4 ± 8,3 a 105 1,7 ± 0,3 b 26,9 ± 10,3 a

3x106 1,1 ± 0,2 b 12,2 ± 4,5 a C.V.(%) 47,1 81,8

Lagartas de D. saccharalis inoculadas com 105 esporos.lagarta-1 tiveram seu peso

reduzido em 36,5% 16 dias após a infecção, comparando-se com o peso de lagartas não

infectadas (Tabela 3.2). Neste mesmo período foi estimada uma produção média de 9,5x106

esporos para cada mg de peso corpóreo de D. saccharalis infectado por Nosema sp. Foram

encontrados esporos inclusive na hemolinfa das lagartas infectadas.

Tabela 3.2 – Peso médio (mg) de Diatraea saccharalis inoculados ao 3º ínstar com 1x105 esporos/lagarta e número médio de esporos de Nosema sp. nas lagartas 16 dias após inoculação

D. saccharalis Peso (mg) ± EP Média de esporos/mg de

peso corpóreo ± EP

Lagartas sadias (n=20) 95,3 ± 9,5 0 ± 0 Lagartas com Nosema sp. (n=19) 60,5* ± 10,6 9,5± 1,6 (x106)

*Significativo pelo teste F a 0,05% de probabilidade.

3.2.2.2 TL50 e DL50 de Nosema sp. a lagartas de 1º e 3º ínstar de D. saccharalis

Foi observada grande variação do tempo letal médio de esporos de Nosema sp. entre

lagartas de 1º e 3º ínstar inoculadas com diferentes doses do patógeno (Tabelas 3.3 e 3.4). O

TL50 para lagartas de 1º ínstar variou de 59 a 9,0 ± 0,3 dias entre as doses de 1 a 107

esporos.lagarta-1 (Tabela 3.3). Para lagartas de 3º ínstar, o TL50 variou de 49 ± 1,9 a 32,0 ± 0,7

dias entre as doses de 102 a 107 esporos.lagarta-1 (Tabela 3.4). Na dose de 106 esporos.lagarta-

1, por exemplo, o TL50 para lagartas de 1º ínstar atingiu um valor quatro vezes menor que o

estimado para lagartas infectadas no 3º ínstar. No experimento com lagartas recém-eclodidas,

somente no tratamento controle (lagartas que receberam dieta apenas com solução salina) o

valor de TL50 não pode ser estimado devido a baixa mortalidade. Enquanto que no

experimento com insetos de 3º ínstar esses valores só puderam ser estimados a partir do

tratamento equivalente à dose 105 esporos.lagarta-1, que matou mais de 50% dos indivíduos. A

dose de esporos necessária para ocasionar a mortalidade de 50% das lagartas de 3º ínstar

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(1230 esporos) foi aproximadamente 220 vezes maior que a estimada para lagartas recém-

eclodidas (5,6 esporos) (Tabelas 3.3 e 3.4).

As lagartas inoculadas no 3º ínstar com esporos de Nosema sp. tiveram seu

desenvolvimento comprometido a partir da dose de 102 esporos.lagarta-1, onde foram

observadas mortalidade acima de 26% (F8, 45=86,22; P<0,0001). Em lagartas recém-

eclodidas, tais efeitos negativos já foram constatados a partir da dose de 10 esporos.lagarta-1

(F8, 45=35,78 e 24,46; P<0,0001) (Tabelas 3.3 e 3.4). Nos adultos que emergiram das pupas

referentes ao controle não foram encontrados esporos de Nosema sp., diferindo dos adultos

emergidos nos demais tratamentos que possuíam esporos do patógeno em seus tecidos. Os

resultados indicam que lagartas de 1º ínstar são mais suscetíveis ao microsporídeo estudado

que as de 3º ínstar, visto que lagartas recém-eclodidas inoculadas com 103 esporos

apresentaram 90,5% de mortalidade e em doses mais elevadas todas as lagartas morreram.

Tabela 3.3 – TL50 (dias) e DL50 (esporos/lagarta) de Nosema sp. e mortalidade em lagartas de 1º instar

de Diatraea saccharalis infectadas por Nosema sp.

Dose

(esporos/lagarta)

Mortalidade

(%) ± EP TL50 (dias) ± EP IC 95%

DL50 (IC

95%)

0 2,4 ± 0,1 a .. ..

5,58 (1,5 - 1,4)

1 25,4 ± 0,1 ab 59,0 ± 0 a .. 101 55,7 ± 0,2 b 42,0 ± 2,3 b 37,5 - 46,5 102 96,7 ± 0,1 c 22,0 ± 0,8 c 20,4 - 23,6 103 90,5 ± 0,1 c 22,0 ± 1,3 c 19,4 - 24,6 104 100,0 ± 0 c 15,0 ± 0,8 d 13,4 - 16,6 105 100,0 ± 0 c 10,0 ± 0,2 e 9,5 - 10,5 106 100,0 ± 0 c 9,0 ± 0,2 f 8,5 - 9,5 107 100,0 ± 0 c 9,0 ± 0,3 f 8,4 - 9,6

* Médias na coluna seguidas pelas mesmas letras não diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de significância de 5%. C.V.=20,7%. .. Não se aplica dado numérico.

Page 72: Renata Araújo Simões

70

Tabela 3.4 – TL50 (dias) e DL50 (esporos/lagarta) e mortalidade em lagartas de 3º ínstar de Diatraea saccharalis infectadas por Nosema sp.

Dose

(esporos/lagarta)

Mortalidade

(%) ± EP TL50 (dias) ± EP IC 95% DL50 (IC 95%)

0 5,0 ± 0,1 a .. ..

1,23x103

(2,0x102 - 4,7x103)

1 6,67 ± 0,1 ab .. .. 101 8,33 ± 0,1 ab .. .. 102 26,67 ± 0,1 bc 49,0 ± 1,9 a 45,2 - 52,8 103 39,44 ± 0,1 c 47,0 ± 1,0 b 45,0 - 49,0 104 89,81 ± 0,1 d 37,0 ± 0,7 c 35,6 - 38,4 105 93,33 ± 0,1 d 38,0 ± 0,4 c 37,2 - 38,8 106 94,81 ± 0,1 d 36,0 ± 0,8 c 34,5 - 37,5 107 98,33 ± 0,1 d 32,0 ± 0,7 d 30,6 - 33,4

* Médias na coluna seguidas pelas mesmas letras não diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de significância de 5%. C.V.=21,5%. .. Não se aplica dado numérico.

3.2.2.3 Efeitos de Nosema sp. na biologia de D. saccharalis

A viabilidade de larvas e de pupas de D. saccharalis com nosemose foi inferior em

relação à viabilidade calculada para os insetos não infectados, sendo a fase larval mais

sensível à infecção pelo patógeno (Figura 3.1). Foi observado maior percentual de

deformações nos insetos infectados por Nosema sp. em comparação aos insetos não

infectados.

Page 73: Renata Araújo Simões

71

85,6

94,2

6,6 5,4

24,2

68,6

17,4 20,4

Larva Pupa Pupa Adulto

Não infectados Infectados

Viabilidade (%) Deformações (%)

Figura 3.1 – Viabilidade (%) dos estágios de larva e pupa e deformações (%) em pupas e adultos de Diatraea saccharalis não infectados e infectados por Nosema sp.

A duração da fase larval dos insetos com nosemose foi significativamente maior que a

duração observada nas larvas não infectadas (F1, 187=17,83; P<0,0001) (Tabela 3.5). Na fase

de pupa (F1, 162=0,3; P=0,5826), não se observou diferença entre a duração de pupas de D.

saccharalis não infectadas e infectadas. A longevidade dos adultos infectados por Nosema sp.

(F1, 152=8,11; P=0,005) foi 24% menor do que a longevidade dos não infectados. O peso de

pupas das fêmeas de D. saccharalis (F1, 120=4,36; P=0,039) foi significativamente reduzido

devido à infecção por Nosema sp. Já o peso de pupas dos machos com nosemose (F1, 177=0,78;

P=0,3792) não foi estatisticamente diferente do peso dos não infectados.

Tabela 3.5 – Duração média das fases de larva, pupa e adulto e peso médio de pupas de Diatraea

saccharalis não infectados e infectados por Nosema sp.

D. saccharalis Duração das fases (dias) ± EP Peso das Pupas (mg) ± EP

Larvas Pupas Adultos Machos Fêmeas

Não infectados 28,0 ± 0,3 a 9,2 ± 0,1 a 7,5 ± 0,3 a 148,3 ± 2,1 a 239,0 ± 4,1 a Infectados 33,5 ± 1,8 b 9,1 ± 0,3 a 5,7 ± 0,5 b 144,3 ± 3,5 a 221,1 ± 5,5 b C.V.(%) 27,9 14,5 45,1 16,5 16,3

Médias seguidas pela mesma letra nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade

A viabilidade dos ovos provenientes de casais sem nosemose não diferiu

estatisticamente (F2, 42=7,15; P=0,0021) da viabilidade das posturas de fêmeas infectadas e

Page 74: Renata Araújo Simões

72

machos não infectados (Figura 3.2). No entanto, a viabilidade de ovos de fêmeas sem

nosemose cujos machos estavam infectados foi, em média, oito vezes inferior ao percentual

obtido nos demais tratamentos. Não foi observada alteração significativa quanto ao período de

desenvolvimento embrionário (F2, 20=0,44; P=0,6506) entre tratamentos.

Não foram encontrados esporos de Nosema sp. nos ovos provenientes de casais

compostos por fêmeas não infectadas, incluindo os ovipositados por fêmeas que copularam

com machos infectados. No entanto, 62,5% das posturas provenientes das fêmeas infectadas e

submetidas à cópula por machos sem nosemose também estavam infectadas pelo patógeno.

48,9 a 5,5 a54,3 a 5,3 a6,6 b 6 a

Viabilidade de ovos (%) Duração da fase embrionária (dias)

e não infectado infectada e não infectado não infectada e infectado

Figura 3.2 – Viabilidade de ovos (%) e duração da fase embrionária (dias) de Diatraea saccharalis nos seguintes tratamentos: fêmeas e machos não infectados, fêmeas infectadas por Nosema

sp. e machos não infectados e fêmeas não infectadas e machos infectados por Nosema sp. Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade; C.V.=102,8 e 13,7%, respectivamente.

Não houve transmissão via cópula de Nosema sp. em D. saccharalis, pois machos e

fêmeas infectados não transmitiram o patógeno para seus parceiros durante a mesma.

A taxa líquida de reprodução (R0) foi significativamente menor em D. saccharalis

com Nosema sp. comparada à taxa dos casais não infectados. A redução na geração de casais

compostos por fêmeas infectadas e machos não infectados e por fêmeas não infectadas e

machos infectados por Nosema sp., foi de 89,5 e 99,1%, respectivamente (Tabela 3.6).

Page 75: Renata Araújo Simões

73

Quando fêmeas não infectadas e machos infectados foram acasalados o intervalo

médio entre gerações (T) foi menor do que nos casais não infectados. O valor de T para casais

formados por fêmeas infectadas e machos não infectados não diferiu estatisticamente do valor

encontrado nos outros tratamentos.

Foi constatada diferença significativa na taxa intrínseca de crescimento (rm) entre

todos os tratamentos. Os valores de rm foram maiores para os casais com fêmeas e machos não

infectados comparados aos dos tratamentos onde um dos sexos estava infectado. O

crescimento da população de indivíduos não infectados foi 48,2% mais rápido do que a

velocidade de crescimento para casais cujas fêmeas estavam infectadas por Nosema sp.

No que se refere à razão finita de aumento ( ), o valor mais elevado correspondeu ao

tratamento com indivíduos não infectados por Nosema sp., sendo decrescente para casais

compostos por fêmeas infectadas e machos não infectados e casais compostos por fêmeas não

infectadas e machos infectados.

Tabela 3.6 – Taxa líquida de reprodução (R0), intervalo entre gerações (T), taxa intrínseca de crescimento (rm) e taxa finita de aumento ( ) (± EP) de Diatraea saccharalis não infectados e infectados por Nosema sp.

Parâmetros e não

infectado ± EP

infectada e não

infectado ± EP

não infectada e

infectado ± EP

R0 105,6 ± 13,7 a 11,1 ± 4,1 b 0,9 ± 0,2 c T 41,8 ± 0,6 a 41,2 ± 1,3 ab 43,6 ± 1,0 b rm 0,112 ± 0,0 a 0,058 ± 0,0 b -0,003 ± 0,0 c

1,118 ± 0,0 a 1,060 ± 0,0 b 0,997 ± 0,0 c Médias seguidas pela mesma letra nas linhas, não diferem entre si pelo teste de Jackknife a 5% de probabilidade.

A taxa máxima de aumento da população ocorreu no 40º dia para casais com insetos

não infectados, no 39º dia para fêmeas infectadas e machos não infectados e no 49º dia para

os casais formados por fêmeas não infectadas e machos infectados.

Page 76: Renata Araújo Simões

74

3.2.2.4 Sintomatologia

Os sintomas mais comuns da infecção por Nosema sp. em lagartas de D. saccharalis

são apresentados na Figura 3.3. As lagartas infectadas apresentaram mudança de ínstar

incompleto, observando-se a manutenção tanto da cápsula cefálica quanto da epiderme antiga

(Figura 3.3 a, b). As lagartas com nosemose possuiam coloração branco-leitosa, com dilatação

(formação de nódulos) principalmente na parte posterior (Figura 3.3 c, d) e pontos de necrose

em diversas regiões do corpo (Figura 3.3 e, f). Além disso, observou-se diminuição na

alimentação, tendo como consequência direta a redução no tamanho (Figura 3.3 g) e peso das

lagartas e na produção de fezes.

Figura 3.3 – Sintomatologia de nosemose em lagartas de Diatraea saccharalis . (a) e (b) Manutenção de cápsula cefálica e epiderme durante processo de mudança de ínstares, (c) dilatação da região posterior do abdome, (d) coloração branco-leitosa característica, (e) e (f) presença de pontos de necrose e (g) redução do crescimento, lagartas no 6º ínstar infectada (acima) e não infectada (abaixo)

Page 77: Renata Araújo Simões

75

3.2.2.5 Avaliação de produtos antimicrobianos para redução de Nosema sp. em D.

saccharalis

Os insetos avaliados no primeiro experimento, tanto aqueles que ingeriram a dieta com

produtos antimicrobianos quanto os que consumiram a dieta artificial sem adição dos

produtos, apresentaram os sintomas característicos da doença e não atingiram a fase de pupa.

A mortalidade dos mesmos foi muito alta e não diferiu significativamente entre os tratamentos

(F12, 52=1,40; P=0,1975), conforme apresentado na Tabela 3.7.

Tabela 3.7 – Mortalidade média (%) de Diatraea saccharalis inoculados ao 3º ínstar com 104 esporos.lagarta-1 e alimentadas durante 30 dias em dieta artificial de King e Hartley (1985) contendo produtos com atividade antimicrobiana

Produtos testados Dose.100 mL

-1 de

dieta Mortalidade (%) ± EP

Controle* - 96,0 ± 4,0 a

Nifedipino 0,04 g 100,0 ± 0 a 0,08 g 100,0 ± 0 a

Metronidazol 0,05 g 96,0 ± 4,0 a 0,10 g 80,0 ± 6,3 a

Itraconazol 0,04 g 88,0 ± 4,9 a 0,08 g 92,0 ± 4,9 a

Própolis 0,2 g 84,0 ± 11,7 a 0,4 g 96,0 ± 4,0 a

Derosal 150 µL 96,0 ± 4,0 a 200 µL 96,0 ± 4,0 a

Albendazol 0,04 g 96,0 ± 4,0 a 0,08 g 96,0 ± 4,0 a

Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade; C.V.=12,2% *Tratamento sem adição de produtos. - Dado numérico igual a zero não resultante de arredondamento.

No segundo bioensaio, onde os insetos foram inoculados com uma dose 100 vezes

menor que o primeiro (102 esporos.lagarta-1) e foram testadas as maiores doses dos produtos,

a mortalidade foi, em média, 52,2% menor do que as mortalidades obtidas no bioensaio

anterior. Contudo, também não houve diferença significativa na mortalidade das lagartas

infectadas por Nosema sp. (F5, 24=0,47; P=0,7924) entre os produtos avaliados, nem em

relação ao tratamento controle, onde não foram adicionados produtos antimicrobianos na dieta

artificial (Tabela 3.8).

Page 78: Renata Araújo Simões

76

Tabela 3.8 – Mortalidade média (%) de Diatraea saccharalis inoculados ao 3º ínstar com 102 esporos.lagarta-1 e alimentadas durante 30 dias em dieta artificial de King e Hartley (1985) contendo produtos com atividade antimicrobiana

Produtos testados Dose.100 mL-1

de dieta Mortalidade (%) ± EP

Controle* - 48,0 ± 8,0 a Metronidazol 0,1 g 50,0 ± 14,0 a Itraconazol 0,08 g 32,0 ± 15,4 a

Própolis 4000 µL 35,0 ± 15,0 a Derosal 200 µL 50,0 ± 4,5 a

Albendazol 0,08 g 53,0 ± 15,8 a Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade; C.V.=64,4% *Tratamento sem adição de produtos. - Dado numérico igual a zero não resultante de arredondamento.

3.2.3 Discussão

Esporos de Nosema sp. foram eliminados em grande quantidade nas fezes de D.

saccharalis, sendo necessários apenas sete dias para que esporos secundários fossem

liberados para o ambiente através das fezes de lagartas inoculadas com 105 esporos. A

variação na quantidade de esporos encontrados nas fezes ocorreu em função do inóculo inicial

do patógeno, ou seja, de quanto cada lagarta ingeriu de esporos. A liberação de esporos no

ambiente potencializa a capacidade de transmissão horizontal de Nosema sp. por D.

saccharalis, favorecendo a permanência do patógeno no ambiente. Apesar de não ter sido

encontrada uma relação significativa entre o número de esporos e a quantidade de fezes,

observou-se que no decorrer da infecção as lagartas muito debilitadas reduzem o consumo de

alimento e, consequentemente, a quantidade de fezes produzida. Isso mostra que doses de

inóculo muito elevadas podem comprometer o sucesso da transmissão horizontal de Nosema

sp. em D. saccharalis pela redução das fezes. A propagação dos esporos nos tecidos de D.

saccharalis sugere a possibilidade de produção in vivo deste patógeno, favorecida pelo fato de

que a criação em larga escala da broca-da-cana já é bem estabelecida no Brasil, pois este

inseto é utilizado para produção do parasitoide C. flavipes, o que tornaria viável a produção in

vivo de Nosema sp. utilizando D. saccharalis como hospedeiro.

Lagartas de 1º ínstar de D. saccharalis são mais suscetíveis a Nosema sp. (DL50 = 5,6

esporos) que as lagartas de 3º ínstar (DL50 = 1230 esporos). No único estudo sobre a

suscetibilidade de D. saccharalis a uma espécie de microsporídia, Fuxa (1981) demonstrou

que este hospedeiro foi o menos suscetível a Vairimorpha necatrix dentre as seis espécies

Page 79: Renata Araújo Simões

77

avaliadas. Bauer e Nordin (1988) estimaram a dose letal média de 2x105 esporos de N.

fumiferanae em lagartas de 4º ínstar de C. fumiferana.

A alta suscetibilidade de lagartas de 1º ínstar de D. saccharalis a Nosema sp., aliada

ao fato de que sua produção massal já é realizada no país, sugere que este patógeno tem

potencial para uso como agente de controle microbiano de forma inundativa. Embora lagartas

de ínstares superiores sejam menos suscetíveis ao patógeno, liberações inoculativas ou

inundativas poderiam produzir a doença em caráter crônico, com reduções populacionais em

longo prazo.

Algumas espécies de microsporídeos causam alta mortalidade em larvas de insetos

hospedeiros, como por exemplo, Nosema tortricis que produz epizootias em Tortrix viridana

L. (Lepidoptera: Tortricidae) (FRANZ; HUGER, 1971). No entanto, a maioria das espécies

ocasiona infecções crônicas (GAUGLER; BROOKS, 1975), acarretando efeitos menos

expressivos no indivíduo hospedeiro ou mesmo em sua população. O que se observou nos

estudos de Nosema sp. em D. saccharalis foi que a natureza das infecções, agudas ou

crônicas, depende do inóculo inicial e do estádio em que as lagartas foram infectadas. Por

exemplo, as lagartas de 3º ínstar que ingeriram até 10 esporos/indivíduo desenvolveram a

doença de forma assintomática e apenas 30% não puparam. Nessa dose, mais da metade das

lagartas de 1º ínstar morreram e nenhuma das sobreviventes atingiu a fase de pupa durante o

período de avaliação. Em condições de laboratório, mortalidade significativa de larvas ocorre

somente quando estas são inoculadas nos primeiros ínstares e os insetos sobreviventes

sustentam uma infecção crônica e debilitante que se prolonga por todo desenvolvimento larval

(BAUER; NORDIN, 1988). Na maioria das vezes, os efeitos deletérios de Microsporidia

relatados em insetos hospedeiros envolvem, além de acréscimo na mortalidade larval, atraso

no desenvolvimento, redução na fecundidade e longevidade e aumento na suscetibilidade em

condições de estresse (BAUER; NORDIN, 1989; SOLTER; BECNEL, 2000).

Nosema sp. afeta mais drasticamente a fase larval em relação ao estágio de pupa nos

parâmetros viabilidade e duração da fase. Incremento na duração das fases imaturas e redução

no tamanho de pupas também foram evidenciados em D. grandiosella infectados por Nosema

(INGLIS et al., 2003). Provavelmente, o impacto mais acentuado nas pupas de insetos fêmeas

ocorre devido ao maior potencial genético para acúmulo de peso característico das fêmeas

(BAUER; NORDIN, 1988). O aumento no número de insetos deformados, observados em

pupas e adultos de D. saccharalis infectados por Nosema sp, é frequentemente relatado para

outros microsporídeos (WINDELS et al., 1976; SAJAP; LEWIS, 1992).

Page 80: Renata Araújo Simões

78

A viabilidade dos ovos de fêmeas de D. saccharalis infectadas por Nosema sp. não foi

afetada. No entanto, as posturas provenientes de fêmeas não infectadas cujos parceiros foram

machos com nosemose apresentaram um percentual de viabilidade muito baixo. Isso também

foi observado por Inglis et al. (2003) e possivelmente ocorreu porque a infecção por Nosema

sp. afetou a capacidade de cópula dos machos, pois são comuns alterações no percentual de

acasalamentos férteis em insetos infectados por microsporídeos em função da dose de inóculo

(GAUGLER; BROOKS, 1975; BAUER; NORDIN, 1989).

Em geral, a transmissão em Microsporidia é mais comumente efetuada via oral pela

ingestão de esporos, mas a transmissão de geração para geração também pode ocorrer

verticalmente (TANABE; TAMASHIRO, 1967). A transmissão de microsporídeos por

machos infectados tem sido reportada (THOMSON, 1958; KELLEN; LINDEGREN, 1971;

INGLIS et al., 2003), mas é rara (ZIMMACK; BRINDLEY, 1957; BECNEL; ANDREADIS,

1999). Nosema sp. isolado de D. saccharalis foi efetivamente transmitido via oral pela

contaminação da dieta artificial em laboratório. Os machos da broca-da-cana não foram

responsáveis pela transmissão de Nosema sp., ao contrário das fêmeas de D. saccharalis

infectadas que transmitiram o patógeno para sua progênie mesmo quando copuladas por

machos sem nosemose. Foram encontrados esporos de Nosema sp. nas lagartas recém-

eclodidas antes que estas se alimentassem do córion dos ovos, indicando que o patógeno se

propaga durante a fase embrionária da broca-da-cana. A eficiência na transmissão de Nosema

sp. (horizontal e vertical) em D. saccharalis é relevante para a manutenção de alta prevalência

do patógeno nas populações do hospedeiro.

A redução drástica nos valores da taxa líquida de reprodução (R0), taxa intrínseca de

crescimento (rm) e taxa finita de aumento das populações ( ) onde macho ou fêmea estava

infectado por Nosema sp. comprova o impacto negativo do patógeno no crescimento

populacional de D. saccharalis. Por exemplo, a taxa intrínseca de crescimento da população

para fêmeas infectadas e machos não infectados foi aproximadamente metade da taxa para

casais não infectados; e quando fêmeas não infectadas e machos infectados foram usados o

valor de rm foi negativo, indicando que não há crescimento populacional.

A metodologia adotada atualmente para limpeza de Nosema sp. nas criações de D.

saccharalis baseia-se na seleção de posturas provenientes de casais livres de esporos do

microsporídeo. No entanto, este processo torna-se de difícil implementação em larga escala

devido à necessidade de mão de obra e equipamentos especializados para realizar essas

análises. Os produtos testados com atividade antimicrobiana não foram efetivos no tratamento

Page 81: Renata Araújo Simões

79

de nosemose em D. saccharalis. Estes e outros produtos já foram estudados e usados na

tentativa de previnir e/ou controlar Microsporidia in vivo e in vitro em insetos e vertebrados

apresentando resultados muito variáveis (CANNING; HOLLISTER, 1987; HAQUE et al.,

1993; SICHTOVA et al., 1993; BEAUVAIS et al., 1994; COYLE et al., 1998;

FRANKENHUYZEN et al., 2004; GOERTZ et al., 2004; JOHNY et al., 2007; JOHNY et al.,

2009; HIGES et al., 2011). Além do uso de tratamento químico, também são relatadas na

literatura outras técnicas para supressão destes patógenos, como por exemplo, tratamento

térmico (ALLEN; BRUNSON, 1947; RAUN, 1961; WILSON, 1979; MARTÍN-

HERNÁNDEZ et al., 2009) e o uso de radiação ultravioleta (GUERRA et al., 1968; BEARD,

1972; BRUCE, 1975; UNDEEN; MEER, 1990; FARUKI et al., 2007), todos apresentando o

mesmo entrave encontrado no uso de produtos químicos, controlar o patógeno com o mínimo

de impacto negativo ao hospedeiro. De qualquer forma, é importante testar a eficácia do

tratamento térmico e radiação ultravioleta em ovos de D. saccharalis e pupas de C. flavipes

para eliminação de Nosema sp.

3.3 Conclusões

O início da liberação e a quantidade de esporos de Nosema sp. eliminados nas fezes de

D. saccharalis varia em função do inóculo inicial de infecção dos insetos. Lagartas de 1º

ínstar são mais suscetíveis a Nosema sp. que as de 3º ínstar. Nosema sp. afeta negativamente

todos os parâmetros biológicos de D. saccharalis em relação aos insetos não infectados,

exceto a duração da fase de pupa e do peso de pupas de machos. O patógeno é transmitido

horizontal e verticalmente em D. saccharalis e os produtos antimicrobianos, nas condições

testadas, não são eficazes na redução da mortalidade por nosemose em D. saccharalis.

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4 ALTERAÇÕES NOS PARÂMETROS BIOLÓGICOS E NO COMPORTAMENTO

DO PARASITOIDE Cotesia flavipes (HYMENOPTERA: BRACONIDAE) CAUSADAS

PELO PATÓGENO Nosema sp. (MICROSPORIDIA: NOSEMATIDAE)

Resumo

Os principais problemas em criações massais de insetos estão relacionados à sanidade, como é o caso de nosemoses em criações de Diatraea saccharalis (Fabr.), utilizada para produção do parasitoide Cotesia flavipes (Cam.). Embora este parasitoide seja produzido há vários anos no Brasil para o controle de D. saccharalis apenas recentemente observou-se que C. flavipes é indiretamente infectado ao se desenvolver em hospedeiros com Nosema sp. Os objetivos deste estudo foram avaliar os efeitos de Nosema sp. nos parâmetros biológicos de C.

flavipes e no seu desempenho quanto à localização e seleção de hospedeiros sadios e com nosemose, além de observar as vias de transmissão do patógeno. Para avaliar os efeitos de Nosema sp. na biologia de C. flavipes, D. saccharalis no 3º ínstar foram infectados via dieta com esporos de Nosema sp. em diferentes concentrações, e parasitados ao atingirem 5º ínstar por C. flavipes sadios. Um casal de cada repetição dos tratamentos foi utilizado no parasitismo de D. saccharalis sadios, para obter a 2ª geração do parasitoide. Lagartas infectadas com mais de 104 esporos de Nosema sp. não suportaram o parasitismo. Parasitoides que se desenvolveram em D. saccharalis inoculados com ≥ 10

3 esporos apresentaram aumento na duração das fases larval e de pupa e na longevidade dos adultos, decréscimo no número de pupas e adultos de C. flavipes e no percentual de emergência, além de redução no comprimento de tíbia comparado aos parasitoides desenvolvidos em D. saccharalis não infectados. A mesma tendência numérica foi observada nos parâmetros da 2ª geração do parasitoide em função do inóculo inicial de infecção dos hospedeiros. Alterações no comportamento do parasitoide foram verificadas testando fêmeas de C. flavipes não infectadas e infectadas por Nosema sp. em olfatômetro "Y". Parasitoides foram liberados individualmente no braço principal para avaliar sua atratividade por D. saccharalis não infectados e com nosemose. Parasitoides com nosemose não distinguiram entre planta com lagartas não infectadas e os demais tratamentos (ar puro ou planta com lagartas infectadas). Para observar as vias de transmissão do patógeno utilizaram-se C. flavipes infectados por Nosema sp. com 24 h de idade e submetidos à cópula. Cada fêmea foi empregada no parasitismo de uma lagarta não infectada de D. saccharalis de 5º ínstar, permitindo-se uma única oviposição, e assim sucessivamente da geração F0 do parasitoide até a obtenção de F4. Adultos de C. flavipes e D. saccharalis após a pupação dos parasitoides de cada geração foram avaliados quanto à presença de esporos, estimando-se o nível de infecção dos indivíduos. A presença de esporos nas gerações de C. flavipes e em D. saccharalis comprova que Nosema sp. foi transmitido entre os parasitoides e também para os hospedeiros, provavelmente durante a oviposição. Os efeitos do patógeno no parasitoide determinados em laboratório são suficientemente severos para justificar esforços no manejo da doença, visto a importância dessa espécie como agente de controle biológico no cultivo da cana-de-açúcar.

Palavras-chave: Nosemoses; Parasitoides; Broca-da-cana; Patologia de insetos; Transmissão; Controle biológico.

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Abstract

The main problem in massal insect rearing concerns of sanitary conditions; this is the case for nosemosis in rearing Diatraea saccharalis (Fabr.) used in production of the parasitoid, Cotesia flavipes Cameron. Although this parasitoid has been produced for several years in Brazil for biological control of D. saccharalis, only recently it was observed that C.

flavipes is indirectly infected with Nosema sp. when developing inside infected hosts. This study aimed to assess the effects of Nosema sp. on the biological parameters in C. flavipes and its performance regarding location, uninfected host selection, and nosemosis, in addition to observing pathogen transmission patterns. To assess the effects of Nosema sp. on the biology of C. flavipes, third instars D. saccharalis larvae were inoculated with Nosema sp. spores at different concentrations and when the larvae reached the fifth instar was parasitized by uninfected C. flavipes. A mated female of each replicate from each treatment was used to parasitize uninfected D. saccharalis to obtain 2nd generation parasitoids. Larvae infected with more than 1 x 104 of Nosema sp. spores did not support parasitism. C. flavipes exhibited alterations in all of the parameters assessed. Altered parasitoid behavior was found in testing non-infected C. flavipes females and those infected by Nosema sp. in a Y-olfactometer. Parasitoids were individually placed on the main arm to assess their attractiveness by non-infected and infected D. saccharalis. Parasitoids with nosemosis were unable to distinguish between plants with non-infected larvae and those from the other treatments (pure air or plant with infected larvae). To observe the pathogen transmission routes, we used infected and fertilized C. flavipes 24-hour old. Each female was introduced to parasitize uninfected fifth instar D. saccharalis larvae, allowing a single oviposition, and thus successive F0 generation parasitoids until obtaining F4. Adults of C. flavipes and D. saccharalis, after pupation of the parasitoids from each generation, were assessed for presence of spores, estimating the level of infection in each individual. Presence of spores in the generations of C. flavipes and D.

saccharalis indicated that Nosema sp. is vertically transmitted between parasitoids and also to hosts during their development. Pathogenic effects on the parasitoids demonstrated under laboratory conditions are severe enough to justify disease management efforts, considering the importance of this species as a biological control agent in sugarcane cultivation.

Keywords: Nosemosis; Parasitoids; Sugarcane borer; Insect pathology; Transmission; Biological control.

4.1 Introdução

Um dos setores do agronegócio mais importantes para a economia brasileira é o da

cana-de-açúcar, com cerca de 8,5 milhões de hectares plantados no país (UPON, 2012). A

ocorrência de pragas é um dos fatores limitantes na produtividade da cana-de-açúcar,

ocasionando prejuízos ao cultivo e ao aproveitamento industrial da cana. A broca-da-cana

Diatraea saccharalis (Fabr.), que ocorre desde o sul dos Estados Unidos às Antilhas e da

América Central até a Argentina (MENDONÇA, 1996; PARRA et al., 2002), é considerada a

mais importante espécie encontrada no hemisfério ocidental (LONG; HENSLEY, 1972). Ela é

responsável por danos diretos, com a abertura de galerias nos colmos, e indiretos, ao favorecer

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a penetração de fungos oportunistas na planta (GALLO et al., 2002), que podem inverter o

açúcar da cana ou contaminar o caldo, ocasionando perdas tanto à produção de açúcar quanto

à de álcool. Dentre os métodos de controle da D. saccharalis, destaca-se o emprego de

Cotesia flavipes (Cam.) (Hymenoptera: Braconidae), um endoparasitoide larval gregário e

cenobionte que foi introduzido no Brasil em 1974, proveniente de Trinidad, visando o

controle desta praga em canaviais no Estado de Alagoas (MENDONÇA et al., 1977).

O controle biológico por C. flavipes é realizado através de liberações do parasitoide

nos canaviais de forma inundativa em mais de três milhões de hectares todo ano (PARRA;

BOTELHO; PINTO, 2010). As fêmeas de C. flavipes depositam seus ovos na hemocele da

lagarta, sendo capaz de manipular a fisiologia do hospedeiro a fim de permitir seu

desenvolvimento larval (SCAGLIA et al., 2005), interrompendo o crescimento populacional

da broca-da-cana-de-açúcar no campo (BOTELHO; MACEDO, 2002). Para atender a esta

demanda, os parasitoides são produzidos massalmente em seu hospedeiro, D. saccharalis, em

condições de laboratório.

Os principais entraves em criações massais de laboratório são problemas referentes à

sanidade dos insetos. Desde a década de 1970 foram relatadas no Brasil ocorrências de

Nosema (Nosematidae: Microsporidia) em populações de laboratório de D. saccharalis,

utilizadas para a criação de C. flavipes (ALVES, S.B.; informação pessoal). Recentemente,

observou-se que muitos laboratórios de produção de C. flavipes no Estado de São Paulo

apresentam prevalência de nosemose em suas criações.

Associações entre microsporídeos e parasitoides foram anteriormente estudadas em

diversas interações hospedeiro-parasitoide. Paillot (1933, apud TANADA, 1976) foi o

primeiro a sugerir que o parasitoide Apanteles glomeratus (Hymenoptera: Braconidae)

transmitia o microsporídeo Perezia legeri para as larvas de Pieri brassicae. Muitos outros

trabalhos podem ser citados como exemplo, como Brooks (1973) que fez uma revisão sobre

parasitoides suscetíveis a microsporídeos patogênicos a seus hospedeiros. Efeitos negativos

observados em parasitoides que se desenvolveram em hospedeiros infectados por

microsporídeos geralmente são resultantes da infecção direta do parasitoide pelo patógeno ou

também quando o parasitoide ingere uma grande quantidade de esporos, os quais se

acumulam no intestino dos mesmos (ANDREADIS, 1980). Andreadis (1980, 1982) descreveu

os efeitos do patógeno Nosema pyrausta no parasitoide Macrocentrus grandii Goidanich

(Hymenoptera: Braconidae) da broca europeia do milho, Ostrinia nubilalis (Hübner)

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90

(Lepidoptera: Pyralidae), incluindo prolongamento do desenvolvimento pupal e redução da

longevidade de M. grandii. Também, a prevalência de N. pyrausta foi inversamente

correlacionada com a porcentagem de parasitismo de M. grandii em populações de campo de

O. nubilalis. Siegel et al. (1986) avaliaram o impacto de N. pyrausta em M. grandii no Estado

de Illinois (EUA), demonstrando que os níveis de infecção do patógeno em O. nubilalis

correspondem aos níveis encontrados no braconídeo. Os autores concluíram que as fêmeas

infectadas do parasitoide são capazes de transmitir N. pyrausta a sua progênie e atuam como

vetores do patógeno nas criações de laboratório.

Pesquisas referentes à interação entre microsporídeos e braconídeos revelaram que os

tipos e a intensidade de efeitos dos hospedeiros infectados nos parasitoides são variáveis e

dependem das espécies de patógeno e hospedeiro envolvidos, geralmente incluindo alterações

no tempo de desenvolvimento, longevidade, fecundidade e oviposição dos hospedeiros e no

desempenho dos parasitoides, embora em alguns casos tais efeitos não sejam significativos

(BROOKS; CRANFORD, 1972; MOAWED et al., 1997; HOCH et al., 2000; DOWN et al.,

2005).

Apesar de C. flavipes ser utilizado comercialmente em larga escala no Brasil para o

controle de D. saccharalis, nenhum estudo foi conduzido para determinar o impacto de

Nosema nos braconídeos produzidos e liberados em campo. Tais informações são relevantes

para o sucesso do programa de controle biológico de D. saccharalis em canaviais. O objetivo

deste estudo foi avaliar o impacto de Nosema sp. no desenvolvimento de C. flavipes, no seu

desempenho quanto à localização e seleção de hospedeiros e observar a transmissão do

patógeno em laboratório.

4.2 Desenvolvimento

4.2.1 Material e Métodos

4.2.1.1 Criação de C. flavipes não infectados e infectados por Nosema sp.

A criação de C. flavipes foi iniciada com adultos obtidos no Centro de Tecnologia

Canavieira (Piracicaba/SP). As criações de C. flavipes não infectadas e infectadas por Nosema

sp. foram desenvolvidas no Laboratório de Patologia e Controle Microbiano de Insetos

(ESALQ/USP). Para tanto, lagartas de 5º ínstar de D. saccharalis não infectadas e infectadas

por Nosema sp. foram oferecidas aos parasitoides para oviposição. Os parasitoides foram

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91

infectados ao se desenvolverem em D. saccharalis infectados pelo consumo de discos (0,1

cm3) de dieta artificial de King e Hartley (1985), preparada sem metilparabeno (Nipagin®) e

formaldeído, inoculados com suspensões de esporos do patógeno em diferentes

concentrações, adequadas a cada bioensaio. Cada lagarta foi exposta a apenas uma fêmea de

C. flavipes, permitindo-se única oviposição. Em seguida, as fêmeas do parasitoide utilizadas

foram coletadas em tubos de Eppendorf e posteriormente examinadas quanto à presença de

esporos do patógeno em microscópio com contraste de fase (1000x), a partir de esfregaço em

lâmina com 1 gota de solução salina (NaCl 0,85%). As lagartas de 5º ínstar parasitadas foram

mantidas a 26 ± 1ºC e fotofase de 12 h em placas de Petri descartáveis (60 x 15 mm),

contendo um disco (0,9 cm3) de dieta artificial de realimentação (KING; HARTLEY, 1985),

utilizada para o desenvolvimento das lagartas após o parasitismo por C. flavipes, até a fase de

pupa dos parasitoides. Após a pupação dos parasitoides, os hospedeiros (não infectados ou

infectados) foram submetidos à análise em microscópio para confirmar ausência ou presença

de esporos de Nosema sp. Após a emergência, as fêmeas de C. flavipes foram mantidas por 24

horas na presença de machos para cópula antes de serem empregadas nos bioensaios. As

criações foram mantidas, separadamente, em câmara climatizada a 26 ± 1ºC, 75 ± 10%

umidade relativa e 12 h de fotofase.

4.2.1.2 Efeitos de Nosema sp. no desenvolvimento de C. flavipes

Lagartas de D. saccharalis de 3º ínstar, mantidas sem alimento por 8 horas, foram

infectadas através de discos (0,1 cm3) de dieta artificial, sem metilparabeno (Nipagin®) e

formaldeído, inoculados com suspensões em concentrações do patógeno equivalentes a cada

tratamento. As suspensões foram obtidas de tecidos de lagartas D. saccharalis infectadas. Os

esporos para infecção dos insetos em laboratório foram obtidos macerando-se as lagartas

infectadas em solução salina (NaCl 0,85%) + 0,05% de antibiótico (Pentabiótico Veterinário

Reforçado, Fort Dodge® Saúde Animal Ltda). Subsequentemente, a suspensão de esporos foi

filtrada em gaze estéril, centrifugada e os esporos suspensos em solução salina estéril. A

contagem dos esporos foi realizada em câmara de Neubauer. Três discos de dieta foram

inoculados com 5µL de suspensão cada e dispostos em placa de Petri descartável (60 x 15

mm), sendo então transferidas 15 lagartas para cada placa. Após as lagartas terem consumido

toda a dieta, estas foram transferidas para tubos de vidro contendo aproximadamente 15 mL

de dieta artificial completa, e mantidas em câmara climatizada a 26 ± 0,5ºC e fotofase de 12 h

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por 15 dias. Posteriormente, as lagartas foram retiradas da dieta, sendo selecionados para o

experimento 10 indivíduos de cada placa com tamanho de cápsula cefálica semelhante (5º

ínstar). Os demais indivíduos foram submetidos à análise em microscópio para confirmar a

infecção pelo entomopatógeno. O experimento foi constituído por seis tratamentos, incluindo

lagartas não infectadas, que consumiram discos de dieta com solução salina, e lagartas

inoculadas com suspensão de esporos de Nosema sp. em diferentes concentrações: 104, 105;

106, 107 e 108 esporos/mL-1 de solução salina, equivalendo a doses de 101, 102; 103, 104 e 105

esporos/larva-1, respectivamente. Utilizou-se o delineamento inteiramente aleatorizado,

contendo 4 repetições com 10 lagartas cada.

As lagartas foram oferecidas individualmente a uma única fêmea copulada e não

infectada de C. flavipes com 24 h de idade, permitindo-se apenas uma oviposição.

Posteriormente, cada lagarta foi transferida para uma placa de Petri descartável (60 x 15 mm)

contendo um disco (0,9 cm3) de dieta artificial (KING; HARTLEY, 1985) utilizada na

manutenção das lagartas após o parasitismo por C. flavipes.

As lagartas parasitadas foram mantidas até a fase de pupa dos parasitoides a 26 ±

0,5ºC e fotofase de 12 h, sendo realizadas observações diárias e troca da dieta a cada cinco

dias, retirando-se, eventualmente, lagartas mortas e pupas de D. saccharalis. Os casulos de C.

flavipes oriundos de cada lagarta foram transferidos para placas de Petri descartáveis (60 x 15

mm) limpas, permanecendo sob as condições descritas anteriormente.

O número de fêmeas e de machos foi quantificado após a emergência dos adultos. Os

seguintes parâmetros biológicos foram determinados: duração dos períodos larval e pupal,

número de pupas e de adultos, tamanho de tíbia de fêmeas e de machos e percentual de

emergência de C. flavipes desenvolvidos nas lagartas não infectadas e infectadas por Nosema

sp. nas diferentes concentrações de inóculo.

Para avaliação do efeito de Nosema na segunda geração de C. flavipes, os adultos

obtidos de lagartas não infectadas e infectadas na etapa anterior do experimento foram

utilizados no parasitismo de lagartas de D. saccharalis não infectadas. Nesta fase, 10 fêmeas

de cada tratamento foram aleatoriamente utilizadas no parasitismo de lagartas de 5º ínstar sem

nosemose (uma fêmea do parasitoide/lagarta). Após a oviposição, os demais parasitoides de

cada tratamento foram submetidos a investigações quanto à longevidade, dimensão (medindo-

se o comprimento da tíbia do último par de pernas) e presença de esporos do entomopatógeno.

As lagartas parasitadas também foram mantidas em câmara climatizada, nas condições antes

descritas, até a obtenção da segunda geração de C. flavipes, sendo as lagartas avaliadas quanto

Page 95: Renata Araújo Simões

93

à presença de Nosema após a pupação dos parasitoides. Ao emergir, a segunda geração de C.

flavipes foi avaliada em relação aos parâmetros: duração dos períodos larval e pupal, número

de pupas e de adultos e percentual de emergência. Os adultos de C. flavipes obtidos também

foram avaliados quanto à presença de esporos do patógeno em seus tecidos. Os resultados

obtidos foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e comparados pelo teste de Tukey

ao nível de significância de 5% pelo programa estatístico SAS – System for Windows 9.1

(SAS INST., 2003).

4.2.1.3 Impacto de Nosema sp. no desempenho de C. flavipes quanto à seleção de seu

hospedeiro D. saccharalis

Os bioensaios foram realizados em olfatômetro em “Y” no Laboratório de Ecologia

Química e Comportamento de Insetos do Departamento de Entomologia e Acarologia –

ESALQ/USP (Piracicaba, SP). Testes preliminares determinaram como fonte atrativa às

fêmeas de C. flavipes uma planta de cana-de-açúcar com altura de 20 cm (variedade SP-

801842) injuriada por lagartas de D. saccharalis de 4º ínstar associadas às fezes produzidas,

sendo adotado um período máximo de 5 minutos para a resposta dos parasitoides. Para a

obtenção do conjunto planta + lagartas não infectadas ou infectadas por Nosema, um grupo de

5 lagartas recém-eclodidas foram acondicionadas em tubos de vidro contendo dieta artificial

durante 10 dias. Após esse período, cada grupo de 5 lagartas foi transferido para placas de

Petri (60 x 15 mm) contendo um disco (0,1 cm3) de dieta artificial de King e Hartley (1985),

sem metilparabeno (Nipagin®) e formaldeído, inoculado com 5μL de suspensão de esporos na

concentração de 108 esporos.mL-1 de solução salina (dose de 105 esporos.lagarta-1). No

tratamento controle as lagartas receberam dieta com 5μL de solução salina estéril. As lagartas

permaneceram nas placas durante 3 dias, sendo posteriormente transferidas para a planta de

cana-de-açúcar, onde permaneceram por 24 h antes da realização dos bioensaios.

Foi utilizado um olfatômetro em “Y”, cujas dimensões eram 27 mm de diâmetro e 14

cm de comprimento (braço), fabricado em vidro, com fluxo de ar de 0,4 L/minuto. Na

extremidade dos braços foram contrastados os respectivos tratamentos durante os testes,

sendo cada parasitoide introduzido individualmente no tronco comum do olfatômetro.

Foram realizados 5 biensaios, sendo que em 3 foram testados parasitoides não

infectados em relação às combinações: (1) planta + lagartas não infectadas X ar puro; (2)

planta + lagartas não infectadas X planta e (3) planta + lagartas não infectadas X planta +

Page 96: Renata Araújo Simões

94

lagartas infectadas por Nosema sp.; e nos demais foram testados parasitoides infectados por

Nosema sp. em relação à: (4) planta + lagartas não infectadas X ar puro e (5) planta + lagartas

não infectadas X planta + lagartas infectadas por Nosema sp.

Ao fim de cada repetição, os parasitoides foram analisados em microscópio com

contraste de fase (1000x) para confirmar ausência ou presença de esporos de Nosema sp.

Além disso, as lagartas não infectadas também tiveram sua sanidade confirmada e as

infectadas, juntamente com suas as fezes, foram analisadas quanto à presença de esporos do

patógeno. Cada bioensaio foi realizado em 4 etapas (1 etapa.dia-1), sendo testados ao menos

10 parasitoides a cada dia, perfazendo o total mínimo de 40 fêmeas por bioensaio, mantendo-

se os cuidados necessários quanto à lavagem da vidraria, bom funcionamento do olfatômetro

e condições adequadas do ambiente. As análises estatísticas foram realizadas através do

programa R–2.14.0 (Windows) (R, 2008). As diferenças entre as respostas de comportamento

sobre os pares de tratamentos foram analisadas pelo teste de Qui-quadrado (α = 0,01). Os

indivíduos que não fizeram uma escolha foram excluídos da análise estatística.

4.2.1.4 Transmissão de Nosema sp. em C. flavipes

Neste estudo C. flavipes foram infectados ao parasitar em lagartas de D. saccharalis

com nosemose. Posteriormente, os parasitoides infectados obtidos foram utilizados no

parasitismo de D. saccharalis não infectados até a obtenção de quatro gerações do parasitoide.

Fêmeas copuladas de C. flavipes infectadas por Nosema sp. com 24 h de idade foram

empregadas no parasitismo de lagartas não infectadas de D. saccharalis no 5º ínstar,

permitindo-se uma única oviposição (uma fêmea de C. flavipes/lagarta). Os parasitoides

utilizados nessa etapa constituíram a geração “F0 ou matriz” do bioensaio. Após parasitismo,

cada lagarta foi transferida para uma placa de Petri descartável (60 x 15 mm) contendo um

disco (0,9 cm3) de dieta artificial para manutenção das lagartas, sendo mantida em câmara

climatizada a 26 ± 0,5ºC e 12 h de fotofase, até a fase de pupa dos parasitoides. Foram

realizadas observações diárias e troca da dieta a cada cinco dias, retirando-se, eventualmente,

lagartas mortas e pupas de D. saccharalis. As massas de casulos de C. flavipes foram

transferidas individualmente para placas de Petri descartáveis (60 x 15 mm) limpas,

permanecendo sob as condições descritas anteriormente. Os adultos de C. flavipes da geração

F1 foram mantidos em câmara climatizada por 24 h, e após este período foram isoladas cerca

de 10 fêmeas provenientes de cada massa de casulos de F0. Cada fêmea de C. flavipes F1 foi

Page 97: Renata Araújo Simões

95

utilizada no parasitismo de uma lagarta não infectada de D. saccharalis no 5º ínstar, obtendo-

se a geração F2 de parasitoides e assim sucessivamente até a F4.

Adultos de C. flavipes de cada geração foram avaliados quanto a presença de esporos

de Nosema sp., macerando-os em 200 µL de solução salina (NaCl 0,85%) com auxílio de

micropistilos e, em seguida, observando as suspensões em microscópio. A avaliação das

lagartas de D. saccharalis após a pupação dos parasitoides foi realizada removendo-se uma

pequena parte do mesêntero para análise microscópica. Em ambos os casos, também foi

estimado o nível de contaminação dos indivíduos com uso de escala pré-estabelecida quanto

ao número de esporos por visada no microscópio. A escala adotada foi composta pelos

seguintes níveis: (+) de 1 a 5, (++) de 6 a 15 e (+++) mais de 16 esporos/visada (ALVES,

S.B., informação pessoal).

Após o parasitismo, todas as fêmeas de C. flavipes utilizadas nos bioensaios para

produzir uma nova geração foram examinadas individualmente em microscópio para

confirmar a presença de esporos de Nosema sp. e estimar o nível de contaminação, sendo

mantidos no experimento apenas os hospedeiros parasitados por C. flavipes infectados. Para o

tratamento controle, o mesmo procedimento foi adotado usando C. flavipes não infectados no

parasitismo de lagartas de D. saccharalis não infectadas por Nosema sp.

Foi realizada análise de correlação (ANOVA) entre o percentual de progênies

infectadas de C. flavipes (variável “x”) e o percentual de hospedeiros infectados, D.

saccharalis (variável “y”).

4.2.2 Resultados

4.2.2.1 Efeitos de Nosema sp. no desenvolvimento de C. flavipes

Quando C. flavipes se desenvolveram em lagartas de D. saccharalis inoculadas com

cerca de 100 esporos de Nosema sp.lagarta-1, 76,9 ± 0,2% dos parasitoides foram infectados

na 1ª geração, diferindo estatisticamente da infestação observada nos parasitoides expostos a

menor dose de inóculo (F5, 16=74,69; P<0,0001) (Tabela 4.1). 100% dos parasitoides que se

desenvolveram em lagartas inoculadas com mais de 100 esporos foram infectados,

comprovando a infecção do parasitoide pelo consumo de tecidos de D. saccharalis

contaminados por Nosema sp. Na figura 4.1 podem ser observados esporos de Nosema sp.

isolados de adultos de C. flavipes.

Page 98: Renata Araújo Simões

96

O percentual de infecção nos parasitoides da 2ª geração, obtida pela oviposição de F1

em hospedeiros não infectados, não atingiu valores tão altos quanto os observados nos adultos

de C. flavipes da geração F1.

A presença de esporos do patógeno nos adultos da 1ª e 2ª geração demostram que

Nosema sp. foi transmitido entre os estágios de desenvolvimento do parasitoide (F4, 15=4,25;

P=0,0169) (Tabela 4.1).

Figura 4.1 – Esporos de Nosema sp. em adultos de Cotesia flavipes

Tabela 4.1 – Média percentual de adultos da F1 de Cotesia flavipes infectados por Nosema sp. ao se

desenvolverem em lagartas de Diatraea saccharalis inoculadas com diferentes doses do patógeno e de adultos da F2, obtida em hospedeiros não infectados

Esporos/D.

saccharalis

F1 de C. flavipes1 F2 de C. flavipes

2

C. flavipes com

Nosema sp. (%) ± EP Mortalidade de D. saccharalis

após parasitismo (%) ± EP C. flavipes com

Nosema sp. (%) ± EP

0 0 ± 0 a 0 ± 0 a 0 ± 0 a 101 7,1 ± 0,1 a 0 ± 0 a 0 ± 0 a 102 76,9 ± 0,2 b 12,2 ± 0,1 a 7,1 ± 0,1 ab 103 100,0 ± 0 b 20,0 ± 0,1 a 18,3 ± 0,1 ab 104 100,0 ± 0 b 75,0 ± 0,1 b 33,3 ± 0,2 b 105 100,0 ± 0 b 92,5 ± 0,1 b ... C.V 17,6 30,0 117,1

*Médias nas colunas seguidas de mesma letra não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey (α=0,05). 11ª geração de Cotesia flavipes desenvolvida em Diatraea saccharalis sadias e infectadas por Nosema sp. em diferentes concentrações. 22ª geração de Cotesia flavipes obtida a partir da 1ª geração de parasitoides e desenvolvida em lagartas sadias. ... Dado numérico não disponível.

Page 99: Renata Araújo Simões

97

A mortalidade das lagartas de D. saccharalis inoculadas com doses superiores a 104

esporos por indivíduo e parasitadas por C. flavipes foi ≥75%, impedindo que a maioria dos

parasitoides completasse seu ciclo de vida (F5, 18=64,68; P<0,0001) (Tabela 4.1). No

tratamento cujas lagartas ingeriram 105 esporos/lagarta a mortalidade das lagartas e,

consequentemente, de parasitoides foi tão alta que não foram obtidas fêmeas de C. flavipes

aptas ao parasitismo e por isso não foi possível realizar uma avaliação na F2 referente a este

tratamento.

Os parasitoides que se desenvolveram em lagartas de D. saccharalis inoculadas com

dose ≥ 1000 esporos de Nosema sp. foram negativamente afetados em todos os parâmetros

biológicos estudados, indicando que o microsporídeo é patogênico a C. flavipes (Tabela 4.2).

Observou-se aumento gradativo na duração das fases de larva (F4, 120=10,81; P<0,0001) e de

pupa (F4, 118=11,08; P<0,0001) do parasitoide e redução de sua longevidade (F4, 118=16,14;

P<0,0001) em função do inóculo inicial para infecção dos hospedeiros. O número de pupas

(F4, 120=20,51; P<0,0001) e de adultos (F4, 118=21,35; P<0,0001) obtidos foi reduzido à

metade em C. flavipes que se desenvolveram em lagartas cuja dose de inóculo foi de 104

esporos/lagarta, quando comparado ao número de pupas e adultos dos insetos que parasitaram

lagartas não infectadas. Os adultos obtidos em lagartas muito infectadas apresentaram

percentual de emergência (F4, 120=7,97; P<0,0001) e tamanho das tíbias de fêmeas (F4,

88=14,46; P<0,0001) e machos (F4, 86=8,13; P<0,0001) inferiores àqueles obtidos em lagartas

pouco infectadas ou não infectadas.

Os efeitos de Nosema na 2ª geração de C. flavipes, proveniente das fêmeas F1 que se

desenvolveram em hospedeiros com nosemose, foram menores do que aqueles observados na

1ª geração (Tabela 4.3). Houve diferenças significativas apenas na duração das fases de larva

(F4, 88=6,43; P<0,0001) e adulto (F4, 88=6,92; P<0,0001) e no percentual de emergência (F4,

88=1,83; P=0,1298) comparando-se alguns tratamentos com o tratamento controle. A fase

larval mostrou uma tendência a prolongar-se e a redução na emergência foi evidente somente

na maior dose, diferindo estatisticamente da observada em C. flavipes não infectados. Não foi

possível incluir na análise estatística os resultados referentes ao tratamento com dose de 105

esporos/lagarta devido ao número reduzido de indivíduos obtidos neste tratamento (n=1 e n=2

nas 1ª e 2ª gerações, respectivamente).

Page 100: Renata Araújo Simões

Tabela 4.2 – Valores médios de parâmetros biológicos da 1ª geração de Cotesia flavipes desenvolvida em lagartas de Diatraea saccharalis inoculadas com diferentes doses de esporos de Nosema sp.

Dose usada na

infecção de D.

saccharalis

(esp./larva)

F1 de C. flavipes desenvolvida em D. saccharalis infectados com Nosema sp. em diferentes concentrações

Duração média das fases (dias) Nº médio de C. flavipes/D.

saccharalis Emergência

(%) ± EP

Tamanho médio da tíbia

(mm)

Larval ± EP Pupal ± EP Adulta ± EP Pupas ± EP Adultos ± EP Fêmea ± EP Macho ± EP

0 11,1 ± 0,1 a 5,4 ± 0,1 a 3,6 ± 0,1 a 64,3 ± 3,9 a 62,0 ± 3,7 a 95,9 ± 0,03 a 0,61 ± 0,01 a 0,61 ± 0,01 a 1 x 101 11,7 ± 0,4 ab 6,2 ± 0,1 b 3,1 ± 0,1 a 66,6 ± 3,2 a 64,0 ± 3,7 a 94,8 ± 0,04 a 0,61 ± 0,01 a 0,62 ± 0,01 a 1 x 102 11,3 ± 0,2 ab 6,2 ± 0,1 b 3,1 ± 0,1 a 53,6 ± 2,9 a 50,4 ± 2,5 a 94,2 ± 0,03 ab 0,57 ± 0,01 ab 0,58 ± 0,01 ab 1 x 103 12,7 ± 0,3 b 6,1 ± 0,1 b 2,5 ± 0,1 b 32,7 ± 2,8 b 29,5 ± 2,9 b 73,8 ± 2,75 c 0,53 ± 0,01 bc 0,56 ± 0,01 b 1 x 104 14,0 ± 0,1 c 6,3 ± 0,3 b 2,2 ± 0,2 b 33,4 ± 6,2 b 30,2 ± 6,6 b 77,8 ± 0,1 bc 0,51 ± 0,02 c 0,55 ± 0,02 c

C.V 12,0 9,7 20,7 33,9 35,2 21,8 8,7 7,9 *Médias nas colunas seguidas de mesma letra não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey ao nível de significância de 5% de probabilidade.

97

Page 101: Renata Araújo Simões

99

Tabela 4.3 – Valores médios de parâmetros biológicos da 2ª geração de Cotesia flavipes desenvolvida em lagartas de Diatraea saccharalis não infectados e obtida a partir da 1ª geração de parasitoides desenvolvida em lagartas inoculadas com diferentes doses de esporos de Nosema sp.

Dose usada na infecção de

D. saccharalis para obter

F1 de C. flavipes

(esp./larva)

F2 de C. flavipes desenvolvida em D. saccharalis sadios

Duração média das fases (dias) Nº médio de C. flavipes/D. saccharalis Emergência

(%) ± EP

Larval ± EP Pupal ± EP Adulta ± EP Pupas ± EP Adultos ± EP

0 11,1 ± 0,2 a 5,6 ± 0,1 ab 3,1 ± 0,1 a 58,3 ± 4,8 a 57,6 ± 4,5 a 99,3 ± 0,01 a 1 x 101 12,2 ± 0,2 bc 6,1 ± 0,2 a 2,1 ± 0,1 c 60,6 ± 5,9 a 59,8 ± 5,9 a 98,6 ± 0,02 ab 1 x 102 12,1 ± 0,3 bc 6,0 ± 0,2 a 2,6 ± 0,3 abc 49,6 ± 5,8 a 48,5 ± 5,7 a 97,4 ± 0,03 ab 1 x 103 11,5 ± 0,1ab 5,8 ± 0,2 a 2,2 ± 0,1 bc 57,5 ± 3,7 a 56,6 ± 3,7 a 98,2 ± 0,02 ab 1 x 104 12,4 ± 0,4 c 5,0 ± 0,4 b 2,9 ± 0,3 ab 63,7 ± 8,4 a 61,9 ± 2,5 a 97,2 ± 0,02 b

C.V 7,9 13,2 29,3 40,5 39,9 2,7 *Médias nas colunas seguidas de mesma letra não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey ao nível de significância de 5% de probabilidade.

98

Page 102: Renata Araújo Simões

100

4.2.2.2 Impacto de Nosema sp. no desempenho de C. flavipes quanto à seleção de seu

hospedeiro D. saccharalis

O conjunto de “planta + lagartas não infectadas” foi atrativo a C. flavipes (GL= 1 e x²=

12,1), visto que os parasitoides responderam significativamente ao estímulo olfativo em

relação ao ar puro. Pode-se constatar também que fêmeas de C. flavipes não foram atraídas

por plantas sem herbivoria (GL= 1 e x²= 22,5).

As fêmeas não infectadas de C. flavipes foram mais atraídas para a planta cuja

herbivoria foi realizada por lagartas também não infectadas em relação à planta contendo

lagartas com nosemose (GL= 1 e x²= 11,3) (Figura 4.2).

-100 -90 -80 -70 -60 -50 -40 -30 -20 -10 0 10 20 30 40 50

P + LS

P + LS

P + LS

A

P

P + LI

n

63

52

91

Sem resposta

23

12

31

*

*

*

100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 10 20 30 40 50

Fêmeas sadias de C. flavipes (%)

Figura 4.2 – Resposta de fêmeas não infectadas de Cotesia flavipes aos voláteis liberados por planta de cana danificada por lagartas não infectadas de Diatraea saccharalis de 4º ínstar (P + LS) em relação a: ar puro (A), planta de cana sem herviboria (P) ou planta de cana danificada por lagartas de Diatraea saccharalis de 4º ínstar infectadas por Nosema sp. (P + LI). Os números de parasitoides testados e de sem respostas de cada combinação estão dispostos à direita. *Teste de qui-quadrado significativo a 1%

Fêmeas de C. flavipes infectadas por Nosema sp. não distinguiram os estímulos

olfativos liberados pela herbivoria de hospedeiros não infectados em relação aos liberados

pela herbivoria de hospedeiros com nosemose (GL= 1 e x²= 3,6) ou mesmo em relação ao ar

puro (GL= 1 e x²= 4,9) (Figura 4.3). Os altos níveis de contaminação por Nosema sp.,

encontrados nas fêmeas de C. flavipes testadas, reduziram a capacidade das mesmas de

selecionar seu hospedeiro D. saccharalis.

Page 103: Renata Araújo Simões

101

-100 -90 -80 -70 -60 -50 -40 -30 -20 -10 0 10 20 30 40 50

n.s.

P + LS A

P + LIP + LS

n

67

77

Sem resposta

27

37

100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 10 20 30 40 50

Fêmeas de C. flavipes infectadas por Nosema sp. (%)

n.s.

Figura 4.3 – Resposta de fêmeas de Cotesia flavipes infectadas por Nosema sp. aos voláteis liberados

por planta de cana danificada por lagartas não infectadas de Diatraea saccharalis de 4º ínstar (P + LS) em relação a: ar puro (A) ou planta de cana danificada por lagartas de Diatraea saccharalis de 4º ínstar infectadas por Nosema sp. (P + LI). Os números de parasitoides testados e de sem respostas de cada combinação estão dispostos à direita. n.s.

Não significativo pelo teste de qui-quadrado (α=0,01)

O tempo médio de resposta das fêmeas de C. flavipes aos estímulos olfativos

contrastados no olfatômetro “Y” foi de 2,44 minutos para os parasitoides sadios e 2,66

minutos para os infectados por Nosema sp. Com relação ao percentual médio de insetos que

não responderam aos voláteis testados foram encontrados os valores de 35,1% e 44,4% para

parasitoides sadios e infectados, respectivamente.

Page 104: Renata Araújo Simões

102

4.2.2.3 Transmissão de Nosema sp. em C. flavipes

0

10

20

30

40

50

60

70

F1 F2 F3 F4 Média

0

10

20

30

40

50

60

70

L0 L1 L2 L3 Média

Não infectado + ++ +++

(A)

Pro

gên

ies

de C

. fl

avip

es

(%)

Nível de infecção

(B)

La

ga

rta

s d

e D

. sa

cch

ara

lis

(%)

Figura 4.4 – Transmissão de Nosema sp. em Cotesia flavipes e seu hospedeiro Diatraea saccharalis.

(A) Percentual de progênies de Cotesia flavipes não infectadas e infectadas em diferentes níveis durante quatro gerações a partir de parasitoides F0 com nosemose (B) Percentual de lagartas de Diatraea saccharalis que foram infectadas e o nível de infecção após serem parasitadas por Cotesia flavipes com nosemose (lagartas L0 foram utilizadas para produção da geração F1, L1 para F2 e assim sucessivamente)

Em média, 78% das massas de pupas obtidas nos quatro bioensaios com C. flavipes

estavam infectadas pelo patógeno (Figura 4.4). O número de progênies infectadas,

independente do nível da infecção, decresceu nos 3 primeiros bioensaios (F1, F2 e F3) de 96,3

para 50%, aumentando em seguida (F4) para 89,5%.

Page 105: Renata Araújo Simões

103

Lagartas de D. saccharalis (média de 70%) parasitadas por fêmeas de C. flavipes

infectadas por Nosema sp. foram infectadas, indicando que esta espécie foi capaz de transmitir

o patógeno para seus hospedeiros. O nível de infecção variou entre 62,8 e 75,6% das lagartas

usadas nos bioensaios. Esporos de Nosema sp. não foram encontrados nas lagartas de D.

saccharalis mantidas como tratamento controle.

Foi observada uma relação linear significativa (P=0,00056) de dependência entre a

porcentagem de progênies de C. flavipes infectadas (variável “x”) e a porcentagem de

hospedeiros, D. saccharalis, infectados (variável “y”), segundo o modelo: y = 0,46 + 13,36 x

(F=19,73; R2=0,58).

4.2.3 Discussão

A infecção de Nosema sp. em D. saccharalis não só compromete a produção de C.

flavipes pela mortalidade da broca antes que o parasitoide complete seu ciclo, mas também

afeta o ciclo de vida e o comportamento do parasitoide. O incremento na mortalidade das

lagartas parasitadas é diretamente proporcional ao aumento da dose de inóculo das mesmas,

impedindo que o parasitoide se desenvolva. Hoch et al. (2000) também relatam que a

ocorrência de Vairimorpha sp. concomitante ao parasitismo por Glyptapanteles liparidis

resultam em aumento significativo da mortalidade de Lymantria díspar em relação à

mortalidade observada somente em decorrência de microsporídeos.

Não são incomuns infecções em parasitoides por Microsporidia patogênicos a seus

hospedeiros (BECNEL; ANDREADIS, 1999). Normalmente a contaminação ocorre quando

as larvas do parasitoide se alimentam em hospedeiros infectados, podendo acarretar uma

variedade de efeitos na biologia do parasitoide. Futerman et al. (2005) discutiram em seu

trabalho que os efeitos acentuados de Microsporidia na biologia de parasitoides, em geral, não

são específicos ao parasitoide; ou seja, parasitoides himenópteros na maioria das vezes são

suscetíveis a microsporídeos patogênicos de seus hospedeiros (THOMSON, 1960). Por outro

lado, algumas poucas espécies de microsporídeos são relatadas como sendo específicas a

parasitoides, como por exemplo, Nosema muscidifuracis, N. cardiochilis e N. campoletidis

(BROOKS; CRANFORD, 1972; GEDEN et al., 1995).

Resultados variáveis sobre o efeito de Microsporidia no ciclo de vida de parasitoides

são encontrados em grande quantidade na literatura. Dados semelhantes aos apresentados

neste estudo, referindo-se ao aumento na duração das fases imaturas de parasitoides, foram

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encontrados por Hoch et al. (2000) e Down et al. (2005), enquanto que Brooks e Cranford

(1972) observaram atraso no tempo de desenvolvimento dos insetos. Moawed et al. (1997),

Geden et al. (2003) e Futerman et al. (2005) não observaram alterações nas fases do ciclo

biológico de parasitoides (Braconidae, Encyrtidae e Pteromalidae) por microsporídeos dos

gêneros Nosema e Tubulinosema. Infecções por N. pyrauta parecem não afetar negativamente

a habilidade de pupação das larvas de M. grandii; contudo a emergência dos adultos foi

significativamente reduzida em mais de 38% (ANDREADIS, 1980). Andreadis relatou ainda

que a longevidade dos adultos sobreviventes, de ambos os sexos, à infecção pelo patógeno N.

pyrauta foi menor que a reportada nos insetos não infectados.

A infecção por Nosema sp. resultou em alterações negativas na emergência,

fecundidade, longevidade e tamanho de C. flavipes quando se desenvolveram em lagartas de

D. saccharalis infectadas pelo microsporídeo. Estes tipos de alterações já haviam sido

relatadas para outras espécies de parasitoides por diversos autores (SALEH et al., 1995;

MOAWED et al., 1997; SCHULD et al., 1999; HOCH et al., 2000; DOWN et al., 2005;

FUTERMAN et al., 2005). Parasitoides adultos de M. grandii emergiram de 90% dos casulos

referentes ao grupo dos não infectados, enquanto que somente 14% emergiram no grupo de

casulos infectados por N. pyrausta e a maioria da mortalidade observada nos parasitoides

ocorreu durante o 4º ínstar do estágio larval após a saída das larvas de M. grandii do

hospedeiro, O. nubilalis (SIEGEL et al., 1986). Tais alterações foram menos evidentes na

segunda geração de parasitoides. Duas hipóteses podem ser sugeridas para explicar essa

redução: o patógeno pode ter sido transmitido verticalmente à F2 e os parasitoides, embora

infectados, se alimentaram em hospedeiros não infectados que são nutricionalmente

favoráveis ao desenvolvimento de C. flavipes; ou o patógeno foi transmitido a D. saccharalis

pelo parasitoide durante a oviposição, ocorrendo inicialmente a infecção no hospedeiro e, em

seguida, a progênie do parasitoide foi inoculada ao se alimentar dos tecidos infectados. Ou

seja, na primeira hipótese o impacto em C. flavipes seria em razão da qualidade do hospedeiro

e não pela doença propriamente dita e na segunda hipótese, a menor infecção observada na F2

de C. flavipes seria resultante do tempo transcorrido entre a infecção do hospedeiro e dos

parasitoides. Corrobora com a segunda hipótese o fato de que os hospedeiros parasitados por

fêmeas de C. flavipes com nosemose foram infectados, indicando que o parasitoide inocula

Nosema sp. no hospedeiro no momento da oviposição.

Primariamente, pesquisadores atribuíam o impacto negativo de microsporídeos em

parasitoides a massas de esporos não digeridas e acumuladas no trato digestivo das larvas de

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parasitoides, levando a um desequilíbrio nutricional das mesmas (THOMSON, 1958; LAIGO;

TAMASHIRO, 1967; COSSENTINE; LEWIS, 1986, 1988; MOAWED et al., 1997). Hoch et

al. (2002) estudaram a qualidade nutricional de hospedeiros com microsporidiose e acreditam

que as mudanças nos níveis de carboidratos e ácidos graxos analisados nas larvas hospedeiras

infectadas por Vairimorpha sp. são severas o suficiente para explicar, pelo menos

parcialmente, os efeitos adversos no desenvolvimento do parasitoide G. liparidis.

A infecção por Nosema sp. afetou a capacidade do parasitoide C. flavipes em

selecionar hospedeiros, visto que estes sequer foram capazes de distinguir os voláteis

liberados por cana infestada por lagartas não infectadas em relação ao ar puro. Em populações

da broca europeia do milho, onde a incidência de N. pyrausta excedeu 45%, foi altamente

significativa a correlação inversa entre a prevalência da infecção pelo microsporídeo e o

parasitismo por M. grandii, com variação de 88% no parasitismo associada à variação na

infecção (ANDREADIS, 1982). Infecções por Nosema sp. também foram descritas como

sendo substancialmente capazes de limitar a habilidade do parasitoide em sobreviver tempo

suficiente para localizar e parasitar hospedeiros em campo (FUTERMAN et al., 2005). Geden

et al. (1995) demonstraram que Nosema muscidifuracis no parasitoide Muscidifurax raptor

reduz sua capacidade de localizar e parasitar seus hospedeiros, além de reduzir também seu

potencial reprodutivo e longevidade.

A preferência dos parasitoides não infectados por planta infestada com lagartas não

infectadas em detrimento daquele contendo planta infestada por lagartas infectadas

provavelmente ocorreu devido à menor atividade das lagartas infectadas e, portanto, menor

emissão de voláteis. A doença produzida pelo patógeno reduz significativamente a

alimentação das lagartas, tendo como consequência menores danos infligidos à planta e

produção de fezes. Potting et al. (1995) afirmam que uma das principais fontes de voláteis do

complexo planta-hospedeiro é a própria planta injuriada pelo hospedeiro e as fezes produzidas

por eles. Por outro lado, estudos com o braconídeo Glyptapanteles liparidis concluíram que

não houve diferenças no percentual de parasitismo entre larvas de Lymantria dispar

infectadas e não infectadas por Vairimorpha sp. e que Trichogramma nubilale não

discriminaram ovos não infectados daqueles infectados por Nosema pyrausta (SALEH et al.,

1995; HOCH et al., 2000).

A transmissão de Nosema sp. para todas progênies de C. flavipes que se

desenvolveram em D. saccharalis, independente da dose de inóculo ingerida pelas lagartas,

sugere que o consumo dos tecidos contaminados do hospedeiro é uma importante via de

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transmissão nesta espécie. Segundo Futerman et al. (2005), há várias explicações possíveis

para diferentes níveis de impacto sofridos pelos parasitoides, dentre elas, o fato de que os

parasitoides podem ingerir uma dose de esporos efetivamente maior que seu hospedeiro

consumiu, visto que o patógeno pode estar presente em altas densidades nos tecidos do

hospedeiro no momento do parasitismo. Transmissão vertical de Microsporidia em insetos é

muito comum (GEDEN et al., 1995; BECNEL; ANDREADIS, 1999; WITTNER; WEIS,

1999), entretanto, os padrões de transmissão em parasitoides são muito variáveis, sendo muito

eficientes em algumas espécies (BROOKS; CRANFORD, 1972; GEDEN et al., 1995) ou

inexistente em outras (HOCH et al., 2000; FUTERMAN et al., 2005). Neste estudo foi

observada a transmissão do patógeno em progênies das quatro gerações de C. flavipes

avaliadas. No entanto, não é possível afirmar se há ou não transmissão vertical de Nosema sp.

no parasitoide C. flavipes. Pois também foram encontrados esporos de Nosema sp. nos

hospedeiros, visto que o patógeno foi transmitido para D. saccharalis durante a oviposição do

parasitoide. Resultados quanto à transmissão de Nosema entre gerações de parasitoides e entre

parasitoides e seus hospedeiros foram apresentados por Brooks e Cranford (1972) e Siegel et

al. (1986), onde os parasitoides infectaram tanto suas proles quanto seus hospedeiros. Além

disso, em seus estudos, Brooks e Cranford (1972) avaliaram também a dinâmica de infecção

de Nosema, observando variações no percentual de insetos infectados ao longo das gerações

de parasitoides.

4.3 Conclusões

Infecções por Nosema sp. alteram negativamente os parâmetros biológicos e o

comportamento de C. flavipes. O patógeno é transmitido pelo parasitoide para o hospedeiro,

D. saccharalis, e para sua progênie em todas as gerações de C. flavipes avaliadas.

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