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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009 Ano IX - N.º 27 - 21 de Março 2009 a 20 de Junho 2009 Esta Revista faz parte integrante da edição do Jornal de Notícias e não pode ser vendida separadamente • Distribuição gratuita Report: Tornada Wetlands Report : Arouca Geopark Interview: Coast research Reportagem PAUL DE TORNADA Reportagem GEOPARQUE DE AROUCA Entrevista ESTUDOS COSTEIROS

Reportagem PAUL DE TORNADA Reportagem GEOPARQUE DE

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

Ano IX - N.º 27 - 21 de Março 2009 a 20 de Junho 2009

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

FICHA TÉCNICA

Revista “Parques e Vida Selvagem”. Director

Nuno Gomes Oliveira. Editor Parque Biológico

de Gaia. Coordenador da Redacção Jorge Go-

mes. Fotografi as Arquivo Fotográfi co do Parque

Biológico de Gaia. Design Rita Coelho Proprie-

dade Parque Biológico de Gaia, E. M. Pessoa

colectiva 504888773. Tiragem 150 000 exem-

plares. ISSN 1645-2607. N.º Registo no I.C.S.

123937. Dep. Legal 170787/01. Administração

e redacção Parque Biológico de Gaia, E.E.M.

- Rua da Cunha - 4430-681 Avintes – Portugal

- Telefone 227878120. E-mail: revista@parque-

biologico.pt - Página na internet http://www.

parquebiologico.pt - Conselho de Administra-

ção Nuno Gomes Oliveira, Nelson Cardoso, José

Urbano Soares. Publicidade Jornal de Notícias.

Impressão Lisgráfi ca - Impressão e Artes Gráfi -

cas, Rua Consiglieri Pedroso, 90 - Casal de San-

ta Leopoldina - 2730 Barcarena, Portugal. Capa:

Rela, de Albano Soares

39 PAUL DE TORNADAreportagem

O Paul de Tornada, próximo de Caldas da Rai-nha, está prestes a tomar o estatuto de Reser-va Natural Local. A Associação PATO luta pela defesa desta zona húmida há cerca de duas décadas. Para que a conheça melhor, fomos visitá-la num dia cheio de sol.

44 GEOPARQUE DE AROUCA reportagem

Uma ida ao Geoparque desestabiliza as ideias-feitas que guardemos sobre rochas: longe de serem as pedras todas iguais, se umas pare-cem parir, outras contam histórias várias, numa epopeia natural vertida em milhões de anos de evolução.

48 HELENA GRANJA: ESTUDOS COSTEIROSentrevista

O Litoral de Gaia está na lupa de especialistas. Para termos um vislumbre dos resultados, pro-curamos Helena Granja, que nos fala de um assunto mais vasto do que se poderia pensar. É que o litoral não se resume a praia no tempo mais quente...

SECÇÕES

7 Ver e falar

12 Portfolio

14 Fotonotícias

20 Parques de Gaia

22 Dunas

28 Espaços verdes

36 Rio Febros

43 Mindelo

51 Cabo Verde

54 Quinteiro

58 Raízes bibliográfi cas

60 Colectivismo

64 Crónica

Os conteúdos editoriais da revista PARQUES E VIDA SELVAGEM são produzidos pelo Parque Biológico de Gaia, sendo contudo as opiniões nela publicadas da responsabilidade de quem as assina.

Esta revista resulta de uma parceria entre

o Parque Biológico de Gaia e o “Jornal de Notícias”

Primavera 2009

SUMÁRIO 3

João PetronilhoSapinho-de-verrugas-verdes

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O novo Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (Decreto-lei n.º 142/2008), publicado em 24 de Julho, começa a ser aproveitado pelas autarquias locais

A Reserva Natural Local do Estuário do Douro foi a primeira área protegida local cria-da pelo Município de Gaia, logo em Agosto de 2008, ao abrigo desta nova legislação; o seu regulamento, após aprovação da Assembleia Municipal de Gaia, foi publicado no Diário da República de 12/02/2009.

Seguiu-se, a Câmara Municipal das Caldas da Rainha, que aprovou em 27/10/2008 a criação da Reserva Natural Local do Paul da Tornada e a Área Metropolitana do Porto que iniciou em 05/02/2009 a discussão pública da proposta de criação da Paisagem Protegida do Litoral de Vila do Conde como Área Pro-tegida de Âmbito Regional (discussão públi-ca que terminará dentro de dias, em 23 de Abril).

Muitos outros sítios do nosso país aguar-dam que os respectivos municípios apro-veitem a nova lei para os salvaguardar; aqui bem perto, as Serras de Santa Justa, Pias e Castiçal (Valongo, Paredes e Gondomar), a Barrinha de Esmoriz (Espinho e Ovar), o rio Cáster (Ovar) ou Salreu (Estarreja) são alguns exemplos.

Ao Parque Biológico de Gaia incumbe, agora, a tarefa de pôr a funcionar a Reserva Natural Local do Estuário do Douro (*), tarefa já iniciada, com a constituição do respectivo Conselho Consultivo, que reuniu pela primeira vez em 16 de Abril. Em simultâneo, foi apre-sentada uma candidatura aos fundos comu-

nitários (QREN) com vista a equipar a reserva e, nomeadamente, a criar condições de visita-ção. Espera-se o resultado dessa candidatu-ra para Junho, seguindo-se a instalação dos equipamentos.

Mas, em Gaia, temos em estudo outras áre-as de valor biofísico para proteger: o Cordão Dunar, onde já decorrem trabalhos de conso-lidação (comparticipados pelo REN), o Outeiro do Cornalhão, em Crestuma, que será breve-mente um refúgio botânico, e o Vale do Fe-bros, cujos estudos para classifi cação como paisagem protegida local estão em curso.

Mas para que estes sítios possam ser fruí-dos pela população sem que isso atente con-tra a sua conservação, há que cumprir uma série de normas plasmadas no regulamento municipal de Parques e Áreas de Conser-vação da Natureza e da Biodiversidade do Concelho de Vila Nova de Gaia, já aprovado pela Câmara Municipal e sujeito a discussão pública, e que aguarda a deliberação fi nal da Assembleia Municipal.

A par com a defesa dos sítios, importa pro-ceder à sua dinamização e infra-estruturação. Assim, no Parque Biológico estão em curso grandes alterações, sendo a maior a constru-ção dos enormes pavilhões onde fi cará o “Bio-rama” e a exposição “Da fl oresta tropical ao deserto”. Será uma forma inovadora de falar dos ecossistemas e biomas, juntando plantas e animais vivos a réplicas de animais, nomea-

damente dinossauros de grandes dimensões que nos chegaram já das Filipinas.

Esta exposição, com mais de 2000 m2, abri-rá ao público em 5 de Junho e vai juntar-se às outras existentes, nomeadamente à comemo-rativa dos 200 anos de Charles Darwin que teve até esta data, cerca de 20 mil visitantes.

Aproveitamos a época da chuva para fa-zer a plantação de muitas novas árvores no Parque Biológico, este ano especialmente so-breiros, prosseguindo o plano de reconversão do coberto fl orestal existente, predominante-mente constituído por pinheiros e eucaliptos, para fl oresta autóctone, cuja mancha começa a ganhar expressão.

E, por falar em chuva, deixe-se o registo de neve em Gaia, e no Parque Biológico, no dia 9 de Janeiro deste ano.

Durante todo o mês de Março tivemos entre nós 25 técnicos de São Tomé e Príncipe que aqui estiveram a frequentar um estágio práti-co; enquadrou-se esta iniciativa no protocolo que temos com a Direcção-Geral do Ambien-te daquela república africana, cujo director ge-ral, Eng.º Arlindo Carvalho tem feito o favor de ser o “enviado especial” desta revista a vários eventos internacionais (ver página 57).

Em Abril vamos assinalar o Dia Mundial do Ecoturismo, mostrando que esta forma de tu-rismo também se pode fazer em Gaia; abrire-mos ao público um “camping car”, para au-tocaravanas e iniciaremos, em parceria com

Mais espaços verdes públicos em Vila Nova de Gaia

Por Nuno Gomes Oliveira

Director da Revista “Parques e Vida Selvagem”

4 EDITORIAL

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Momentos da construção de um dos pavilhões do futuro Biorama, que abre ao público em 5 de Junho

a Douro Acima, viagens de barco ao Parque Biológico, com partida do Cais de Gaia ou do Porto, chegada ao Cais de Avintes e desloca-ção em autocarro até ao Parque Biológico.

Em Maio será a grande festa da Campanha de Sequestro de Carbono, campanha que, lentamente, vai dando os seus resultados e nos vai permitir iniciar a segunda fase de am-pliação do Parque Biológico.

Mesmo com toda esta actividade, e novas competências, a empresa municipal Parque

Biológico de Gaia encerrou o exercício de 2008 com um resultado operacional positivo de 93 mil euros, e com resultados líquidos (depois de impostos) ligeiramente negativos (cerca de 6 mil euros). Em 2008 a empre-sa municipal investiu perto de 1 milhão de euros, investimento fi nanciado a 25% com receitas próprias. Nas despesas correntes, o Parque Biológico assegurou 40% da receita, sendo o restante atribuído pelo Município de Gaia (cerca de um milhão e seiscentos mil

euros para todos os espaços sob gestão da empresa).

Assim, esta empresa municipal está perfei-tamente equilibrada, cumprindo integralmente o previsto no Regime Jurídico do Sector Em-presarial Local, sem que isso seja espartilho à inovação e ao bom funcionamento dos espa-ços sob sua gestão.

(*) Ver reportagem sobe o Estuário do Douro em: http://ww1.rtp.pt/noticias/index.php?article=374421&headline=98&visual=25&tema=27

Quinta de Santo Tusso vista do local de instalação do Biorama, com neve, em 9 de Janeiro de 2009

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Seis metros quadrados de espaços verdes públicos por habitante até 2010 Em Março de 2007, a propósito das comemorações do Dia da Árvore, anunciei alguns objectivos do Município de Gaia quanto a espaços verdes públicos e áreas de conservação da natureza; tínhamos, então, cerca de 3,80 m2 de espaços verdes públicos por habitante

Por Luís Filipe Menezes

Presidente da Câmara Municipal

de Vila Nova de Gaia

6 OPINIÃO

Dois anos depois, no passado dia 23 de Março, fi zemos um primeiro balanço, e veri-fi camos que essa capitação tinha subido já para 4,11 m2. Com base nos planos e previ-sões que temos, defi nimos uma meta: 6 m2 por habitante até 2010.

E porquê 2010: porque nos queremos as-sociar à campanha da União Europeia Coun-tdown 2010, que visa parar a perda de bio-diversidade na Europa; ora, “biodiversidade” também são espaços verdes de qualidade.

Conseguiremos atingir esse objectivo com a criação dos novos parques de Crestuma, Canidelo, Santa Marinha, Oliveira do Douro e outros que, nessa ocasião, anunciamos.1

A nossa atenção vai, particularmente, para as áreas de grande concentração urbana onde os munícipes foram privados de espaços ver-des: por isso está em início de obra o Parque da Quinta dos Castelos, em Coimbrões (Santa Marinha), e em planeamento um outro, junto à Ponte D. Maria Pia, no limite de Oliveira do Douro e Santa Marinha.

Queremos, já no próximo Verão, colocar alguns destes espaços à disposição da popu-lação que tem recebido, com entusiasmo, os novos parques. No Parque da Lavandeira, por exemplo, domingos com dois e três mil visi-tantes são normais e, à semana, mesmo que chova, há sempre gente a passear.

Mas não esquecemos a importância dos espaços verdes privados e, por isso, o novo PDM (Plano Director Municipal) de Gaia acau-tela os mais signifi cativos que, em conjunto com os espaços verdes públicos, a REN (Re-serva Ecológica Nacional), a RAN (Reserva Agrícola Nacional) e o litoral dunar constituem a Estrutura Ecológica de Gaia.

Continuaremos atentos a novos espaços possíveis para transformação em zonas ver-des públicas, no âmbito da política de recu-peração do pesado passivo ambiental de Vila Nova de Gaia; temos, como único objectivo, melhorar a qualidade de vida dos gaienses e de quem nos vista.

(1) Ver p. f. páginas 20 e 21.

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Parque da Lavandeira

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VER E FALAR 7

Um bater de asa Distribuída a edição anterior, os nossos leitores não se limitaram a enviar palavras de incentivo: fazem-nos chegar também fotografi as. Aqui fi cam algumas...

Em 28 de Janeiro, Fernando Marques escre-ve: «Caros senhores, envio uma das minhas fo-tografi as mais interessantes (ilustra a debanda-da de pilritos na zona do Fluvial-Porto). Espero que seja do vosso agrado e que possa ilustrar a revista e contribuir para o continuar desse trabalho maravilhoso a favor da natureza. Um grande bem-haja».

De Coimbra, Cândida Macedo diz: «(...) A Natureza encanta-me e por isso os vossos arti-gos deleitam-me. Apesar de tantos atentados, ainda há quem a cuide, quem a vigie e proteja!

Por curiosidade, envio-vos duas fotos tira-das em plena fl oresta de Berlim (Tiergarten) em Julho de 2008, onde se pode passear e obser-var coelhos e outros animais em plena tranqui-lidade... e as crianças têm espaços verdadeira-mente concebidos à escala que merecem, ou seja, o máximo.

Poderíamos copiar, mas tristemente nem no betão se faz bem e espaços verdes são ex-cepções por cá, muito menos fl orestas dentro de cidades. Por cá, as fl orestas são os centros comerciais...

Muito obrigada. Bom trabalho. Os meus pa-rabéns pela vossa causa».

O director respondeu: «Boa tarde D. Maria Cândida Macedo. Agradeço as suas simpáti-cas palavras, bem como as fotos enviadas.

Aqui, no Parque Biológico, também poderá obter imagens de coelhos, esquilos e outros animais em liberdade, tal como em Berlim, sem grande receio dos visitantes. Se nunca nos visi-tou, visite quando puder».

Artur Lemos contactou-nos prontamente assim que recebeu um par de números da PARQUES E VIDA SELVAGEM que não tinha conseguido ainda obter, conforme nos disse. Enviadas as revistas com o desdobrável da exposição de fotografi a e dos pirilampos, es-

creve: «Chegado a casa encontrei no correio as revistas que fi zeram o favor de me enviar, e que me apresso a muito agradecer.

Ainda não as vi, mas dir-lhe-ei, desde já, que me maravilhei com o prospecto relativo ao Concurso Nacional “Parques e Vida Selvagem” - Salão de Fotografi a da Natureza 2008. Não há palavras que possam exprimir tanta beleza. Mas também me revi com as fotos dos Piri-lampos.

Embora não me possa considerar um “amante” da natureza, em boa verdade gosto de ver coisas que a ela dizem respeito. No fi m, talvez me tenha de considerar, efectivamente, um “amante”. Naturalmente que também me vou deliciar com o que irei ver nas revistas.

Com os meus 76 anos, fui muito recente-mente “empurrado” pelos meus fi lhos para a Net, para me distrair um pouco, embora tenha sempre o meu tempo ocupado. Portanto, ao assim se verifi car, pedirei para lhe apresentar uma sugestão, embora os meandros sejam muitos, e eu desconheço-os: porque não é preparado um site com coisas da natureza, ba-seado nas fotos que o Parque dispõe? Ou será que já existe? Quando vou ver os que os ami-gos e familiares me mandam, sem sombra de dúvida que os vejo com redobrada atenção e muito prazer, sobremaneira os que dizem res-peito à natureza, ainda que nas diversas áreas possíveis. É para mim uma verdadeira delícia!

Agora o tempo não ajuda para me deslocar até aí, mas logo que possível sem a menor dú-vida que o farei com muita satisfação».

Na resposta, seguiu a dica de que o site do Parque Biológico de Gaia está em obras e que em breve a sua sugestão será tida em conta.

Fernando Marques

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8 VER E FALAR

Adeus guarda-riosApesar de proibido, ainda há quem dispare à socapa sobre aves como os guarda-rios. Rui Farinha, fotógrafo de natureza, conta uma história verídica ocorrida há um ano...Texto e foto: Rui Farinha

«Habitualmente chego cedo ao Estuário do Douro, quando vou fotografar. Nesse dia de sol, e depois de ter estado algum tempo no chão, a fotografar cartaxos (Saxicola torqua-ta), e porque já me doíam as pernas de estar sentado em posição de espargata, com o tripé pelo meio das pernas, decidi mudar de local.

Fui para uma zona com mais água, junto ao sapal. Após poisar o tripé, volto a ligar a má-quina, e quando vou espreitar pelo visor para verifi car a luz do local, num poste de referên-cia, eis que poisa nesse instante, no mesmo, a fêmea de guarda-rios (Alcedo atthis). Por feliz coincidência, nesse preciso momento, a incli-nação dos raios solares era tão favorável que a ave fi cou como que refl ectora (dada a caracte-rística das suas penas). Parecia que tinha laca. Esteve ali parada cerca de 40 segundos. Deu

para tirar cerca de 15 fotos. Parecia um ver-dadeiro modelo. Mudou inclusive de posição, sem nunca sair do dito poste, transformando-o numa verdadeira passerelle…

Agora vem a parte triste da história. Doze dias depois do “estrelato” da sessão fotográfi -ca, ao fi m da tarde, dois fotógrafos de natureza (Tomás Martins e João Luís Teixeira) encontram a ave parada, numa zona próxima, no meio do canavial.

Constatam que está com uma asa partida. De imediato o João calça as galochas, cari-nhosamente apanha a ave, e rapidamente a transportam para a Clínica Veterinária do Par-que Biológico de Gaia. Infelizmente não resistiu mais de 24 horas. É natural, são demasiada-mente selvagens para resistir ao “cativeiro” do pós-tratamento.

E como é que sabemos que era a mesma fêmea que tinha fotografado dias antes? Os casais de guarda-rios nidifi cam em territórios exclusivos, pelo que, sendo na mesma zona, e com uma distância de tempo tão curta, só podia ser a mesma fêmea.

Conclusão; um fotógrafo não se deve “apai-xonar” pelos “modelos”, muito menos na vida selvagem, e estas coisas acontecem, fazem parte da vida.

No entanto, e pelo facto de ter tido conheci-mento de toda a história, assim como do seu triste fi nal, bem como a atitude dos fotógrafos de natureza é muitas vezes mais que “caçar” imagens, decidi partilhar a história de “vida e morte” de uma modelo com os leitores. Nesta história a ave morre no fi nal. É um caso da vida bem real».

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BREVE

Águia-imperial

Uma águia-imperial foi encontrada morta com chumbos de caça-deira, na região do Vale do Guadiana, em 26 Fevereiro.

Terá sido um macho do único casal desta espécie — Aquila adal-berti — que nidifi cou com êxito em Portugal o ano passado.

Classifi cada como Criticamente em Perigo, esta ave de grande porte só existe nalgumas regiões da Península Ibérica.

Confi gurando um pormenor positivo, no fi nal do Verão a cria tinha abandonado o ninho, e hoje já não precisa do cuidado dos proge-nitores.

Pedro Rocha, do Departamento de Gestão de Áreas Classifi ca-das do Sul disse ter sido alertado «por um proprietário da região que a tinha encontrado (...). Inicialmente suspeitámos de envenena-

mento mas depois de fazermos uma radiografi a detectámos vários chumbos espalhados por todo o corpo».

O abate desta águia confi gura uma contra-ordenação ambiental grave, em conformidade com o Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), de 24 de Julho de 2008. O ICNB terá apresentado queixa, apesar de se desconhecer o autor do crime.

Estima-se que deverão existir em Portugal entre dois a cinco ca-sais de águia-imperial, na zona do Vale do Guadiana, no Alentejo Central e na Beira Baixa.

O que mais ameaça esta espécie protegida é o envenenamento, a perseguição directa e a perturbação dos locais de nidifi cação.

Por Ernesto Brochado

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10 CONTRA-RELÓGIO

O tempo da biodiversidadeA biodiversidade – a teia da vida na Terra –

é essencial para a qualidade da existência e bem-estar humanos e constitui um elemento crucial na sustentabilidade da dimensão social, económica e espiritual em qualquer sociedade do mundo. Contudo, a biodiversidade está em declínio. Foram estabelecidos compromissos a nível mundial para travar esta tendência pelo ano de 2010.

A diversidade biológica não é só importan-te como fonte de matéria-prima para os mais diversos artigos ou substâncias necessários à sobrevivência humana, sejam os derivados da agricultura ou outros.

Todas as pequenas ou grandes perdas de diversidade biológica originam efeitos nefastos capazes de se estenderem num amplo leque de aspectos relacionados com o bem-estar das famílias, nomeadamente no campo da seguran-

ça alimentar, da vulnerabilidade a catástrofes naturais, da segurança energética, do acesso a água potável e às mais diversas matérias-primas, desde as do vestuário — 2009 é o Ano Internacional das Fibras Naturais — à saúde.

As sociedades humanas são normalmente competitivas. Quando se altera um ecossistema para prestar um serviço há um efeito em cadeia em grande parte imprevisto que, em essência, vai produzir mudanças nos serviços que outros ecossistemas prestam.

Por exemplo, implementa-se num dado sítio a produção de bens alimentares. Daí pode re-sultar uma signifi cativa redução da água dispo-nível para outros usos.

Há stocks que se degradam como efeito de múltiplas actividades produtoras de uma polui-ção descontrolada ou do mero aquecimento global. O caso da pesca é paradigmático. Ou-

tro indicador é a difi culdade do abastecimento de água nalgumas regiões onde antes isso não ocorria regularmente.

A longo prazo os prejuízos do consumo dos recursos naturais excedem em muito os bene-fícios imediatos oriundos da transformação dos ditos ecossistemas.

E depois de tantos alertas, surgem algumas novidades. Se antigamente não se considerava atribuir um valor de mercado aos benefícios re-sultantes do funcionamento dos ecossistemas naturais, hoje alguns dos importantes serviços prestados pelos ecossistemas à humanidade já começam a ter esse preço. O exemplo da pro-tecção de áreas de fl oresta integradas na con-servação da natureza é um dos exemplos mais conhecidos, tanto pelo contributo ao combate ao aquecimento global como pela retenção da diversidade biológica que lhe é inerente.

Também a boa qualidade da água potável depende da biodiversidade Pedro Daniel Bento

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Concurso de Fotografi a Parques e Vida Selvagem Conforme acontece há vários anos, é na Primavera que surge mais uma edição deste concurso de fotografi a da natureza

Aberto a todos os fotógrafos, amadores e profi ssionais, nacionais ou estrangeiros residen-tes em Portugal, a participação neste concurso determina que cada fotógrafo pode apresentar apenas entre uma e seis fotografi as.

As imagens sujeitas a concurso terão obri-gatoriamente de ser captadas em território português (continente e ilhas) e os seus au-tores não poderão concorrer com fotografi as que já tenham sido premiadas noutros con-cursos.

Até dia 30 de Setembro, cada fotógrafo pode entregar, conforme o regulamento, os seus trabalhos impressos em papel fotográfi -

co no formato de 20 por 30 centímetros. As fotografi as deverão ser entregues ou en-

viadas por correio e devidamente protegidas para Parque Biológico de Gaia – Revista Par-ques e Vida Selvagem – Concurso de Foto-grafi a – 4430-757 Avintes. A data-limite é 30 de Setembro de 2009.

No concurso há diversos prémios, sendo um na vertente de Arte Fotográfi ca a que cor-responde o valor de mil euros. Há outro pré-mio, este na vertente de Registo Documental a que equivale o valor de 200 euros. Por fi m, há o prémio Júnior que se destina a jovens concorrentes até aos 15 anos, devendo esta

idade ser atingida até 31 de Dezembro de 2009 inclusive.

Após reunião do júri, que muda todos os anos, os premiados serão divulgados no site www.parquebiologico.pt.

No fi nal do ano haverá a exposição de meia centena de trabalhos seleccionados pelo júri.

O regulamento pode ser pedido pelos inte-ressados por e-mail para [email protected].

A fotografi a da natureza é uma das formas de dar a conhecer o património natural do país, fazendo com que daí derive uma maior com-preensão no sentido de a conservar.

Joao Petronilho

DAR AO DEDO 11

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Cores da estação

O sol demora mais tempo no céu e os dias crescem.Soou o sinal de partida para cada planta inventar as suas fl ores. A maior parte quer chegar lá cima, para ser vista pelo polinizador, chame-se ele vento, abelha, borboleta. Outra fl ora usa o aroma para cativar insectos. Com as temperaturas a crescerem, há que fazer render cada oportunidade para que o ADN de cada ser se encontre na fantasia de se perpetuar. E o investimento é grande.Os botânicos dizem que as pétalas das fl ores não são mais do que folhas modifi cadas. Para que esta diversidade se mantenha, há que defender a água, resguardando os bosques, e diminuir as plantas exóticas que degradam a terra. Só assim, em cada Primavera, ainda que sejam menos as andorinhas que voam sobre o deserto, as plantas nunca deixarão de sorrir.

Nada retém a água como as plantas

O sinal de partida da fl oração é um espectáculo a que ninguém fi ca indiferente Guilherme Limas

Miguel Teotónio

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A fotografi a é capaz de cristalizar momentos que, vistos no dia-a-dia, são demasiado rápidos para se lhes perceber o pormenor.Um exemplo disso é este conjunto de imagens que dão nota de uma disputa entre rãs. Quem acreditar que o boxe é exclusivo dos humanos, pode tirar o cavalinho da chuva. As rãs, por exemplo, fazem disto há demasiado tempo, e têm regras, embora não estejam escritas num papel.Mandam assim os genes e os mais decididos são quem conquista o prémio supremo de copular com as fêmeas que houver no charco.Mas isto não é tão simples como parece. Antes de chegarem a vias de facto, os rivais coaxam. Para que se consiga ouvir, próximo dos cantos da boca sai algo parecido com uns pequenos sacos amarelo-esverdeados que servem de foles para produzir esse som difícil de ignorar. Posto isso, o combate tornava-se iminente com alguns avanços ameaçadores e, se for necessário gastar mais energia, aí vai a arte da guerra de vento em popa, que esta coisa de perpetuar o ADN não é quimera nenhuma...Enquanto a maioria se concentra no combate territorial, outros machos saltam o procedimento e, com mais expediente, optam por um antigo lema, «Make love, not war» e, como é vulgar dizer, comem os rapazolas beligerantes de cebolada...

Boxe anfíbio

Fotos: João Luís Teixeira. Texto: JG

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OsOs saramagos saramagos são mais que muitossão mais que muitos

No alvorecer da Primavera é fácil encontrar uma qualquer espécie do grupo de plantas co-nhecido por saramago. Quando esta fl ora sorri, surgem num ápice as fl ores discretas que lhes conhecemos.

Os tons de bege não são vistos lá em baixo, a um palmo do chão, por quem lhes passa ao lado sem o cuidado de repousar o olhar na be-leza ali resguardada.

O mesmo não ocorre com os primeiros in-sectos alados do ano, atentos, que deambu-lam junto à haste da planta em busca de néc-tar.

Sem afectação, estes seres vivos desabro-cham com pétalas luminosas assim que a pre-sença do sol inunda a atmosfera.

De noite, a fl or fecha-se a sete chaves, con-forme acontece a milhentas outras. Fenómeno extraordinário esse de gastarem energia a abrir de manhã, fechando-se ao crepúsculo...

Que se passará com o saramago para tal comportamento se cristalizar num padrão?

Provavelmente foi sob a batuta do clima que isso surgiu na evolução das espécies. Das pri-meiras plantas a fl orir ano a ano, transitam de dias frios, em Fevereiro e Março para dias té-pidos, em Maio e Junho. Nos primeiros cinco meses do ano haverá noites geladas, chuva, até alguma saraiva — cuidado com o arremesso!

Fechando-se ao luar, também não repugna pensar que se poderão precaver dos danos que o frio nocturno possa causar…

Esta predilecção das fl ores do saramago pelo turno do dia pode até deixar pensativos os mais curiosos, instalando-se sobre quaisquer dúvidas o facto de os insectos que polinizam as fl ores durante a noite ali não encontrarem guarida, nem em temperaturas subtropicais.

Seja o saramago-de-bico-recurvo ou a granza-dos-campos, seja rábão-silvestre ou

o labresto-branco, o saramago-de-semente-redonda ou o eríssimo, a erva-dos-cantores ou outros que tais, não é fácil distingui-los, até porque nem transportam bilhete de identida-de.

Da família das Crucíferas, um grande grupo de plantas que mostram quatro pétalas em for-ma de cruz ou xis, os saramagos são “primos” quer de fl ora vulgar, como as couves, quer de raridades mundiais — o saramago é parente próximo da Coincya johnstonii, um endemismo localizado no litoral do distrito do Porto que pode ser facilmente visto a fl orir, por exemplo, no Parque de Dunas da Aguda.

Sem sequer se candidatar a algum prémio atribuído por honraria humana, aparecem estas plantas nos campos e na borda dos caminhos, sem perderem fulgor, já que não dependem de qualquer diploma para tocarem o céu da exce-lência, assim como nascem e são.

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Parasitoidismo: a vida secreta dos insectosPor Rui Andrade

Estamos na Primavera, época conhecida pelos campos fl oridos e pelo “acordar” de inú-meros seres vivos que, para se protegerem do frio do Inverno, se mantiveram letárgicos.

É nesta altura do ano que alguns de nós so-frem com as alergias muitas vezes provocadas pela imensa quantidade de pólen que paira no ar. Tudo isto tem uma razão de existir, a repro-dução.

Mas e aqueles seres vivos que se reprodu-zem à custa da vida de outros? Falamos dos insectos conhecidos como parasitóides.

O parasitoidismo é um estilo de vida que se situa entre o parasitismo e a predação, dife-rindo do primeiro no facto do hospedeiro ser morto. Pouca gente os conhece, no entanto somos infl uenciados por eles de uma forma in-tensa e sempre presente.

Existem parasitóides pertencentes a muitos grupos de insectos, mas são sobretudo os hi-menópteros (incluem vespas, abelhas e formi-gas) e os dípteros (moscas e mosquitos) que dominaram de uma forma arrebatadora este estilo de vida oculto.

Os himenópteros parasitóides têm uma im-portância extrema nos ecossistemas terrestres, isto porque são largamente responsáveis pelo controlo populacional de inúmeras pragas de insectos e são, inclusive, muito utilizados pelo Homem como biocontroladores de pragas agrícolas. Como exemplo de parasitóides te-mos a Cotesia glomerata, que se trata de uma minúscula vespa que ataca as borboletas-da-couve (Pieris brassicae e Pieris rapae) chegan-do, em certas alturas do ano, a matar entre 60 a 75% das lagartas de uma população.

Os taquinídeos são uma família de moscas muito diversifi cada usadas no controlo de in-

vertebrados prejudiciais ao ser humano, já que parasitam um enorme número de hospedeiros pertencentes a grupos muito distintos, como os percevejos, borboletas, escaravelhos, etc.

Este modo de vida pode parecer cruel, no entanto na Natureza a palavra não tem signi-fi cado. Estes magnífi cos seres vivos apenas o utilizam para sobreviver não sendo um modo de vida menos nobre do que qualquer outro, ou mais distante do que cada um de nós pro-cura fazer todos os dias. No fundo, a vida tal como a conhecemos só exige equilíbrio, a fi m de que haja espaço para um grande número de espécies.

Vespa Cotesia glomerata

Lagarta de borboleta-grande-da-couve parasitada

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Borboleta-caveiraPor João Pedro Cardoso

Entre as borboletas nocturnas existem espé-cies notáveis pelo seu comportamento, parti-cularidades da sua conformação morfológica e desenhos que apresentam.

É o caso da borboleta-caveira, Acherontia atro-pos, pertence à família dos Esfi ngídeos (Sphingi-dae), sendo uma das maiores em Portugal.

Espécie migradora, frequente em Portugal, é mais abundante em África, onde é residente. Ou-trora apareciam com alguma frequência no nos-so país mas tem vindo gradualmente a tornar-se mais rara na última década devido ao desapare-cimento do seu habitat e à ausência de colmeias em quintas rurais.

A Borboleta-caveira, conhecida pela “grande

devoradora de mel”, tem a particularidade de emitir um som ultra-sónico, que lhe permite en-trar nas colmeias, fazendo com que as abelhas se mantenham imóveis enquanto come o mel. Se a borboleta parar de emitir o som as abelhas atacam e matam-na. Outra causa de morte é, de tanto gulosa, cai no fundo da colmeia fi cando pegada no mel.

O nome vulgar desta borboleta deriva de um desenho perfeito que lembra uma caveira que tem situado na parte superior do tórax.

A envergadura atinge os 120 mm nos machos e nas fêmeas 130 mm. As asas anteriores são escuras e alongadas, as posteriores são amare-las e curtas, o abdómen é largo e escuro com anéis amarelo vivo, parecendo-se com uma abelha gigante. É de destacar a grande robustez

desta espécie já que ao contrário, por exemplo das borboletas diurnas, o seu corpo é maciço e de grandes dimensões.

A borboleta-caveira voa de noite e é atraída pela luz, mas tende a procurar os locais mais es-curos e menos expostos.

As larvas são de cor castanha no corpo e mais clara na cabeça, totalmente amarelas, ou verdes com manchas diagonais mais escuras, possuindo sempre uma saliência em forma de corno curvado e granuloso na extremidade do abdómen. Para se transformarem em crisálida, enterram-se em zonas húmidas e de solos sol-tos até ao seu período de voo, que na Europa é geralmente no Verão, com mais indivíduos a aparecerem em Agosto e Setembro, vindos de África.

Crisálida Borboleta adultaBorboleta-caveira

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Vai choverEu confesso que não sei se vem aí uma car-

ga de água. Mas tudo é possível. O chapim-real avaliará a situação, sendo

certo que, sem água, tudo soçobraria.Perante a expectativa, cuidará esta ave da

sua subsistência.Assim que se anunciava tacitamente o fi m

do frio, no início do ano já deitava a vista ao sítio para aconchegar o precioso ninho.

E não serve um qualquer. Cavernícola, tem de ser o orifício de um tronco, de um muro ou algo parecido.

Não é fácil a missão, pois árvores velhas adornadas no mister são raridades indetermi-nadas.

A mesma inclinação para gostar de bura-cos têm alguns dos seus parentes como o chapim-carvoeiro e o chapim-azul.

No caso do chapim-real, seleccionado e defendido o local, chegou o tempo de chocar os ovos. Quando saem da casca, as crias são

uma trabalheira. Têm de comer, e bem, para crescerem depressa. Larvas e quejandos, cautela, que aí vem o dízimo.

A azáfama de levar alimento às crias é uma entre outras tribulações: sempre que um dos pintos — por vezes contam-se cinco — defe-ca, para evitar cheiros que galvanizam preda-dores, os pais colhem as fezes com o bico e saem a voar, para dispersar esta parte inevitá-vel da nutrição.

Territoriais, quanto maior a concorrência da mesma espécie mais cantam, embora não seja do interesse da família desperdiçar tem-po.

De uma maneira ou de outra, é sempre um mal menor, porque entrar no âmbito da es-talada estraga as penas, origina ferimentos, despende energia.

É o mesmo entre todos os seres vivos: um amigo de infância nos verdes anos falava da sua experiência: quem vai à guerra dá e leva.

Vistas de perto, estas aves têm cores lin-das, que recrudescem na Primavera. Além de casaco que tem de ser bem cuidado para prevenir as mordeduras do frio, é veste de gala para o namoro dos chapins-reais.

Por isso, nas pausas da sobrevivência alisam-nas, lavam-nas e cuidam de reduzir a acção de pequenos parasitas que lhes roem a preciosa veste e, por vezes, o próprio sangue.

Se estas e outras aves não se fi zessem sentir, no mínimo haveria populações descon-troladas de insectos.

Entre árvores num jardim urbano ou num bosque em plena serra, aproveite esta época para os ouvir e ver. É altura de escutar estas aves em múltiplos cantares, quando falam en-tre si, seja a dominarem o sítio, seja alarma-das, seja a pedirem alimento, seja a dizerem aos petizes que se aventuram fora do ninho: «Vem cá, malandreca, se queres encher o papo»...

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Mais zonas verdes para Gaia O presidente da Câmara Municipal de Gaia, Luís Filipe Menezes, em 23 de Março deu uma conferência de imprensa no Parque Biológico de Gaia com vista a actualizar o objectivo de atingir até 2010 a média de 6 metros quadrados de área verde por habitante

O ponto da situação começou por ser feito por Nuno Gomes Oliveira, que descreveu a si-tuação actual de uma série espaços verdes em construção que vão permitir atingir o objectivo previsto para 2010 de 6 m2 de área verde por habitante.

Para além dos espaços verdes já em funcio-namento, durante o Verão deverá estar pronto o Parque da Quinta do Castelo, em Crestuma.

Está na calha também o futuro Parque de Vila D’Este, cuja proposta se insere no Projecto de Reabilitação Física da Urbanização desta parte da cidade.

O mesmo acontece com o Parque de Santa Marinha do Norte, em Oliveira do Douro, cujos trabalhos preparatórios estão em curso.

Entre outros projectos, mereceu referência igualmente o Parque da Ponte D. Luís, que ocupará o espaço de um estaleiro da Junta Autónoma de Estradas.

Luís Filipe Menezes esclareceu que estas áreas verdes resultam de um esforço de «con-quista de espaços» no tecido urbano, já que é aí que se torna mais importante a existência de zonas verdes.

O presidente do Município adiantou que «há

a preocupação constante de não benefi ciar algumas partes do concelho em prejuízo de outras» e que a estas medidas reserva inves-timentos signifi cativos.

Apontou ainda os trabalhos de «recuperação das dunas do litoral de Gaia, o que não é vulgar no nosso país», nomeadamente a «recuperação da frente de mar da Aguda e da Madalena».

Menezes fez uma alusão ao décimo aniver-sário da empresa municipal Águas de Gaia, afi rmando que a mesma «nunca será privati-zada ou concessionada», a exemplo do que deseja também para o Parque Biológico.

A meta consiste em atingir, até 2010, a média de 6 metros quadrados de área verde por habitante, explica Luís Filipe Menezes

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Áreas verdes em altaParque da Vila D´Este– Proposta inserida no Projecto de Rea-

bilitação Física da Urbanização de Vila D´Este (Obras Municipais)

– Concurso público em organização

Parque de Oliveira Do Douro – Santa Marinha Norte– Trabalhos preparatórios em curso

Parque da Quinta do Castelo – Crestuma– Projecto e proposta concluídos– Encontra-se em fase de orçamentação– Início das obras: Março 2009

Parque da Quinta do Castelo – Coimbrões– Estudo prévio concluído– Encontra-se em fase de orçamentação– Início das obras: Abril 2009

Parque da Ponte D. Luís– Estudo prévio concluído– Intervenção em preparação– Início das obras: Maio 2009

Parque do Vale de S. Paio– Início da intervenção: Junho 2009

Bairro Social de S. Félix da Marinha– Projecto para instalação de Hortas

Comunitárias – Obra concluída

Bairro Social das Menesas – Avintes– Proposta para instalação de Hortas

Comunitárias – Aguarda adjudicação por parte da Gaia

Social E. E. M.

Hortas comunitárias – Gaia SocialEncontram-se em fase de concepção

os projectos para instalação de hortas comunitárias para os seguintes bairros:

– Bairro Social do Cavaco – Afurada– Bairro Social de S. Miguel – Olival– Bairro Social Padre Melícias – Lever– Bairro Social do Balteiro – Vilar de Ando-

rinho– Bairro Social de Perosinho – Perosinho– Bairro Social da Aguda – Arcozelo

Designação Área (m2) Por habitante (m2)

SITUAÇÃO DE PARTIDA (21/03/2007) 1 132 000 3,80

Espaços existentes

Parque Biológico de Gaia 350 000

Parque de Dunas da Aguda 30 000

Parque da Lavandeira 110 000

Reserva Natural Local do Estuário do Douro 62 000

Cordão Dunar de Vila Nova de Gaia 63 630

Parque da Luz do Operário 5 000

Jardins urbanos 630 000

Parques privados 12 000

Total actual 1 262 630 4,11

Espaços em Construção ou Estudo

Parque do Vale de S. Paio 55 000

Parque da Quinta do Castelo (Crestuma) 10 000

Parque da Quinta dos Castelos (Santa Marinha) 5 000

Parque da Ponte D. Luís 20 000

Parque Quinta M. Gomes 150 000

Parque da Ponte D. Maria 20 000

Outros espaços 250 000

Total previsto 510 000 1,66

OBJECTIVO 2010 1.772 630 5,77

Futuro Parque Botânico do Outeiro do Cornalhão (Crestuma)

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Poça da Ladra A chuva relembrou este ano que os charcos temporários eram habituais ao pé das dunas

Muitas ribeiras e rios, ao chegarem à areia que antecede o mar, formam lagunas, lagoas permanentes ou temporárias. É no Inverno que atingem a sua maior expressão em de-corrência da chuva mais abundante.

Estando a água na base da vida, esses espaços são, em termos de diversidade bio-lógica, de enorme valor.

Para além da valorização da paisagem, nestas pequenas lagoas abundam oportu-

nidades para que os anfíbios se consigam reproduzir.

De noite, concentram-se ali e, entre coaxar diverso, fecundam os ovos que as fêmeas põem, imersos.

Ao longo de décadas de ocupação do li-toral, uma mão-cheia destes sistemas foi drenada e seca, esvaziando-se da sua im-portância natural.

Em muitos casos essas lagoas receberam durante décadas entulho e, nos terrenos conquistados ao domínio público, foram sur-gindo com o tempo construções.

A Poça da Ladra, na freguesia de Gulpi-lhares, é disso um exemplo. Resultava da acumulação das águas provenientes do rio de Gulpilhares — rio Golpelha, na cartografi a antiga —, que nasce na serra de Canelas, em Vila Nova de Gaia, e de outra linha de água, vinda de sul.

No primeiro mapa de Portugal, elaborado em 1561 por Fernando Álvares Seco, apenas são indicados, imediatamente a sul do Douro, dois hidrónimos: o rio Golpelha e o rio Castos;

o primeiro é, exactamente, o que alimentava a Poça da Ladra e o segundo a Barrinha de Esmoriz.

Ora, sabendo-se que havia, como ainda hoje há, muitos outros ribeiros nesta zona, o destaque dado a estes dois só pode resultar do mesmo motivo — ambos apresentavam amplas lagoas na desembocadura, o que, de resto, a cartografi a regista.

Hoje, grande parte do ano a lagoa está seca por entulhamento e por desvio do rio de Gulpilhares. A centenas de metros para o interior do que hoje resta da lagoa, ainda existe a Rua das Marinhas, a provar que a lagoa pôs ali o seu pezinho no passado.

Fica-lhe o nome pitoresco: Poça da Ladra. Estar-se-ia a pensar numa raposa? O esper-to canídeo bem poderia por ali passar com alguma frequência, tendo em vista desenca-lhar algum petisco...

Texto adaptado de “Dunas: conhecer e conservar”, de Nuno Gomes Oliveira e Henrique Alves, 2.ª edição, 2008, Parque Biológico de Gaia.

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Estuário do DouroPrimeira Reserva Natural Local

Quatro dias antes do Dia Mundial das Zonas Húmidas, comemorado a 2 de Fevereiro, foi criada ofi cialmente a primeira Reserva Natural Local de Portugal: a Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia aprovou, na sua sessão de 29 de Janeiro do corrente ano, a criação da Re-serva Natural Local do Estuário do Douro, com base no novo regime jurídico da conservação da natureza e da biodiversidade

Esta Reserva Natural interliga-se com um outro novo parque a criar até ao fi m do ano: o Parque do Vale de São Paio, com cerca de 5 hectares.

É neste futuro espaço que virá a ser cons-truído o centro de interpretação e recepção de visitantes da Reserva Natural Local do Estuário do Douro.

Neste sítio estará disponível informação so-

bre as espécies que ocorrem na reserva, bem como outra informação pertinente, sem excluir o imprescindível equipamento de observação e monitorização que permite ver as peculiares aves limícolas mais em pormenor.

Prevê-se a instalação de um sistema de ví-deo que possibilite a observação à distância das aves que frequentam o local sem as perturbar e as imagens poderão ser gravadas para poste-rior análise, permitindo ainda desenvolver activi-dades de educação ambiental no local.

Dado o grande poder de ampliação deste equipamento tornar-se-á viável, por exemplo, identifi car aves portadoras de anilha que ali des-cansem e se alimentem nas suas migrações. Colher-se-ão registos da Holanda, da Noruega? Da Islândia? Só o tempo o dirá.

Os visitantes poderão ainda utilizar os teles-

cópios disponibilizados para observar directa-mente as aves que ali ocorrem.

Estes telescópios são já utilizados com esse mesmo fi m em actividades desenvolvidas pelo Parque Biológico, e passarão a estar disponíveis para os visitantes da Reserva.

Passadiços de madeiraO percurso pedonal no interior da reserva,

de acesso ao observatório de natureza, valer-se-á de um passadiço sobreelevado para que a areia se possa movimentar livremente e evitar danos com as cheias do rio Douro.

Simultaneamente a altura do passadiço irá eliminar o pisoteio da sua vegetação.

O que resta do sapal, constituído principal-mente por plantas aquáticas dos géneros Scir-pus, Juncus e Triglochin, terá de ser limpo dos

As andorinhas-do-mar vêm de África na Primavera Garça-realJorge Rocha Luís França

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The Douro Estuary The fi rst Local Nature Reserve in Portugal was offi cially set-up four days before “World Wetlands Day”, which was celebrated on February 2 nd 2009. On January 29th 2009, the Municipal Assembly of Vila Nova de Gaia approved the creation of a Local Nature Reserve in the Douro Estuary, in agreement with the new legal requirements for Nature Conservation and Biodiversity.

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A gestão da Reserva Natural Local do Estuário do Douro prevê o controlo de plantas infestantes – por exemplo, a erva-gorda, a fl or amarela da fotografi a – para que possa ocorrer uma maior diversidade de espécies nativas com todos os benefícios para a biodiversidade que daí decorrem

Montar tendas no estuário já era ilegal há anos e anos, mas agora é mais ainda dado o estatuto de protecção conferido com a criação da Reserva Natural Local do Estuário do Douro; passear em veículos motorizados ou andar a cavalo idem... Acautele-se quem tiver de mudar de hábitos: a multa irá dos 500 aos 37500 euros

24 DUNAS DE GAIA

Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

inúmeros detritos ali depositados ao longo de anos, e recuperado.

A eliminação de plantas invasoras é outra das medidas em vista, a fi m de que a vegeta-ção nativa possa regenerar, o que ocorrerá se os preceitos legais da protecção estabelecida em «Diário da República» do passado dia 12 de Fevereiro forem fi scalizados pelos órgãos competentes.

A ilhota existente no estuário carece de ges-tão: está coberta de chorão-do-cabo (Carpo-brotus edulis) e de outras plantas infestantes. Há ainda plantas caracterizadas por apresen-tarem ciclos de vida curtos e grande produção de sementes1 que importa eliminar, de acordo com a legislação2 existente, de modo a permitir a fi xação de vegetação autóctone.

Abunda ainda outra fl ora, como a erva-gorda (Arctotheca calendula) e a erva-canária (Oxalis pes-capraea) que também são invasoras.

Após esta fase de trabalho, a melhoria am-biental da área protegida será notória.

1 - Encontradas com frequência em ambientes fortemente perturbados onde ocupam estádios secundários da sucessão.

2 - Decreto-lei n.º 565/99 de 21 de Dezembro, e onde são consideradas invasoras.

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Uma mão-cheia de regras: o estuário é de todos

A publicação em «Diário da República» no passado dia 12 de Fevereiro tornou o estuário do Douro a primeira Reserva Natural Local do país.

Sob a alçada da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, esta área protegida revela atri-butos enquadrados na Directiva Habitats, da Comunidade Europeia, e vê assim reconheci-do com força de lei o seu «grande valor paisa-gístico e natural».

Os preceitos da protecção recentemente entrada em vigor impõem uma compreensí-vel alteração de hábitos, já que o estuário se destina ao usufruto de todos e não apenas de alguns.

O comportamento de quem se desloca pelo estuário, embora muitas vezes sem in-

tenção, pode ter consequências devastado-ras.

Passear o cão ou o cavalo, andar pelo es-tuário em veículos motorizados, fazer campis-mo selvagem são alguns exemplos de com-portamentos de alguns cidadãos que terão de mudar, por mera lógica e também porque as multas pesam.

O interesse para o turismo sustentável e a diversidade biológica, duas vertentes de peso que pendem sobre estes 54 hectares fi nais do estuário do Douro, fi cariam de outro modo comprometidos.

Contudo, por exemplo, as actividades tra-dicionais de pesca desportiva e de apanha de moluscos são autorizadas, assim como o surf na praia do Cabedelo.

Hábitos

& costumes«O estuário é de todos, logo posso ir para lá montar tenda neste Verão»...Não atire areia ao ar: por ser de todos é que não deve ser prejudicado para benefício de meia dúzia. O campismo selvagem é ilegal há já uma série de anos.

«Faço praia aqui há muitos anos!»Então está na altura de repensar o hábito. Com uma largura de costa tão vasta, por que tem de ser logo nesta pequena área que quer fazer a sua praia? Agarre a sugestão, varie: vai gostar.

«O meu cão foge-me para lá, é porque não quer outro sítio...»Pois, mas até os canídeos têm de seguir re-gras. O instinto predador faz com que corra atrás dos bandos de aves e os ninhos que ali haja são perturbados.

«As bicicletas não fazem barulho: vão-me impedir de passear na maré-baixa?»O impacto visual de uma bicicleta na vida selvagem do estuário é grande, mais ainda quando atrás de uma vem outra. A ciclovia construída pelo Município é a fi na-fl or dos passeios a pé ou de bicicleta: foi feita para si – use-a!

A fi scalização do Cabedelo e da Baía de São Paio, no estuário do rio Douro, cabe a autoridades como a Polícia Marítima, Polícia Municipal, Guarda Republicana, ao Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA), entre outras autoridades – pense duas vezes antes de passear o cão...

João Luís Teixeira

O comportamento de quem se desloca pelo estuário,

embora muitas vezes sem intenção, pode ter

consequências devastadoras

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Parque de Dunas da Aguda As dunas integram um mosaico natural que apoia a biodiversidade e uma das faces mais visíveis para quem passa perto são as plantas e as aves que ali fazem ninho

Perna alta ou atarracada, de uma cor ou de ou-tra, muitas aves limícolas vivem onde o mar termi-na e começa a terra. É aí que o seu alimento está.

Com bicos sensíveis, moldados para uma especialização singular, assim como um talher ergonómico, ou desenterram da areia húmida sustento ou escarafuncham a capa de mexilhões que veste os rochedos que não tremem diante das ondas do mar. Na maioria migradoras, des-locam-se ao longo do litoral.

Entre viagens, e as de Primavera são mais cé-leres, estas aves têm de reabastecer.

Numa época sob a égide de múltiplas pres-sões no quotidiano, o prazer de observar aves selvagens em liberdade é um grande livro em branco que cada um pode descobrir e nele es-crever por puro deleite.

Mais importante que identifi car as espécies presentes de cor e salteado é decantar os seus comportamentos: como interagem, como se alimentam, como namoram, como cuidam das crias, como sobrevivem...

Na Primavera é altura de fazer ninho. Essa é uma das razões pelas quais algumas partem, e

outras chegam e fi cam. Entre o limo e a areia, os bandos só se reconfi guram onde haja nidifi -cação em colónias.

Não sendo assim, formam casais e, à boa ma-neira humana, se falassem, diriam «quem casa quer casinha». Ao delimitarem os seus territórios de nidifi cação, por exemplo, os borrrelhos-de-coleira-interrompida mostram comportamentos no ar e em terra que não nos deixam dúvidas sobre a sua determinação: as crias, a caminho, merecem tudo e os progenitores assumem a função a cem por cento.

Centáurea, Centaurea sphaerocephala

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DUNAS DE GAIA 27

Observação de aves no Parque de Dunas da Aguda: ao longe, entre o mexilhão andam rolas-do-mar e pilritos. Domingo, 3 de Maio, entre as 10h00 e as 12h00, há observação de aves selvagens no Parque Dunas da Aguda. Basta aparecer...

Nas dunas, em breve haverá ninhos de borrelho-de-coleira-interrompida. Ambos os progenitores cuidam das

crias, que são precoces e assim que eclodem poucas horas depois

abandonam o ninho

Rola-do-mar, Arenaria interpresAlimenta-se na beira-mar, virando pedras e algas, onde encontra insectos, crustáceos, moluscos, anelídeos, equinodermes, pequenos peixes, restos orgânicos. Em Portugal é um visitante não nidifi cante razoavelmente comum. Ocorre quer no Inverno quer durante a passagem migratória, mas é possível ver esta espécie em qualquer altura do ano

Dunes of Aguda ParkThe Dunes are already successfully integrating a natural mosaic of life that supports biodiversity. The most visible aspects of the Dunes are the plants and the birds that are nesting in or near them. With the arrival of Spring, some birds stay and others leave.

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Parque da Lavandeira

ABRIL

Sábados, dias 18 e 25, às 10h30, aula

de yoga.

Dia 18, às 16h00, Teatro circo pela mão

da Associação Nuvem Voadora, com

a peça: “Gato Sapato – Gypsy Lobby

Circus”.

Dia 25, às 16h00, comemoração do Dia

Mundial do Tai chi com aula e demons-

trações com leque e espada; no fi nal

haverá sessões de massagem chinesa.

Sábados, dia 25, às 10h30, “Pais e

fi lhos em movimento”, sessões de exer-

cício físico, dinamizadas por professora

de educação física. Org. Projecto bebé+

(inscrição prévia).

Domingo, dia 19, às 9h30, abertura

de Exposição de Bonsai. Às 10h00,

Workshop de Bonsai, pelo Bonsai

Clube do Porto. Inscrição: geral@

bonsaiclubedoporto.com

MAIO

Aos sábados, às 10h30, há aula de

yoga.

Ao domingo, às 10h30, há aula de Pila-

tes para adultos e Kung-fu para jovens

dos 6 aos 12 anos.

Aos domingos, entre as 10h00 e 12h00,

“Aprenda a jogar Xadrez” com o Prof.

Álvaro Brandão.

Dias 2 e 3 de Maio, fi m-de-semana,

às 15h00, atelier “O palhaço e tudo

à volta”, dinamizado por Associação

Nuvem Voadora.

Sábados, dias 9 e 23, às 10h30, “Pais

e fi lhos em movimento”, sessões de

exercício físico, dinamizadas por profes-

sora de educação física. Organização:

Projecto bebé+ (inscrição prévia).

De 25 de Maio, segunda-feira, abertura

do I Simpósio de Escultura. Artistas

convidados trabalharão ao vivo blocos

de granito. O simpósio decorrerá até 7

de Junho.

Sábado, 30 de Maio, a Comissão de

Prevenção do Tabagismo do CHGaia/

Espinho organiza a 3.ª CAMINHADA

0% FUMO 100% LIBERDADE; Jogos

tradicionais/ Jogos sem fronteiras

disputados pelas Escolas do 2.º e 3.º

Ciclo; Yoga; Workshop “Composição

artística com materiais recicláveis” e um

piquenique.

JUNHO

Aos sábados, às 10h30, há aula de

yoga.

Aos domingos, às 10h30, há aula de

Pilates para adultos e Kung-fu para

jovens dos 6 aos 12 anos.

Aos domingos, entre as 10h00 e 12h00,

“Aprenda a jogar Xadrez” com o Prof.

Álvaro Brandão.

Sábado, 20 de Junho, às 15h00, atelier

“Escrever na Paisagem”, dinamizado

por Nuvem Voadora.

Nos sábados 6 e 27, às 10h30, “Pais

e fi lhos em movimento”, sessões de

exercício físico, dinamizadas por profes-

sora de educação física. Organização:

Projecto bebé+ (inscrição prévia).

JULHO

Aos sábados, às 10h30, há aula de

yoga.

Aos domingos, às 10h30, há aula de

Pilates para adultos e Kung-fu para

jovens dos 6 aos 12 anos.

Aos domingos entre as 10h00 e 12h00,

“Aprenda a jogar Xadrez” com o Prof.

Álvaro Brandão.

Dias 11 e 12, fi m-de-semana, mostra

de Artesanato Contemporâneo, dinami-

zada por Nuvem Voadora, das 12h00

até ao fi m do dia.

Sábados, 4 e 18, às 10h30, “Pais e

fi lhos em movimento”, sessões de

exercício físico. Organização: Projecto

bebé+ (inscrição prévia).

AGOSTO

Aos sábados, às 10h30, há aula de

yoga.

Aos domingos, às 10h30, há aula de

Pilates.

Aos domingos entre as 10h00 e

12h00, “Aprenda a jogar Xadrez” com

o Prof. Álvaro Brandão.

Aos sábados na entrada do parque

há venda de produtos agrícolas sem

pesticidas.

Durante o período de Verão decorrem

à semana aulas de yoga (às quartas

e sextas-feiras, às 9h45) e de Tai chi

(segundas e quintas-feiras, às 9h30).

Durante todo o período de Verão

poderão decorrer actividades ainda

não divulgadas no texto acima.

NOTA: As actividades dinamizadas

por “Projecto Bebé +” obrigam a

inscrição prévia através do email:

[email protected] ou tel.

966 470 355.

Para mais informações: lavandeira@

parquebiologico.pt; geral@projec-

tobebemais.com; nuvemvoadora@

nuvemvoadora.com; Informação

actividade de Xadrez: Álvaro Brandão,

962 186 698.

Situado em Oliveira do Douro, o Parque da Lavandeira proporciona a quem ali se desloca várias vertentes de lazer, nomeadamente percursos pedestres, zonas de merendas e jardins temáticos. Agora que chegou a Primavera, brinda os seus visitantes com uma mão-cheia de actividades extraordinárias. Aqui fi ca a agenda.

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Realizou-se no Parque Biológico de Gaia um Curso de Educação e Maneio de Asininos para as Práticas de Asinoterapia e Asinomediação e outras Actividades Lúdico-pedagógicas, en-tre 27 de Fevereiro e 1 de Março, tendo como organizadores a instituição anfi triã e a Associa-ção para o Estudo e Protecção do Gado Asi-nino (AEPGA).

Curso enriquecedor, os participantes vieram de todo o país e até de além-fronteiras.

No primeiro dia, após as boas-vindas de Nuno Gomes Oliveira, director do Parque Biológico de Gaia, seguiu-se a apresentação de Miguel Nóvoa intitulada “A Raça Asinina de Miranda: importância económica, ecológi-ca e cultural do burro” complementada pelos “Cuidados básicos do burro: alimentação, acondicionamento, escovagem, limpeza dos cascos”.

Da parte da tarde Miguel Quaresma, veteri-

nário, fez uma “Introdução à medicina veteri-nária de asininos” e “Reprodução e cuidados neo-natais”.

No segundo dia do curso havia ainda mais expectativa, com a presença dos oradores estrangeiros. De manhã, Jesus Pérez falou so-bre “A etologia do asinino: os cinco sentidos e outras percepções, comunicação e com-portamento”, o “Treino, Maneio e Educação do Burro: estabelecimento do vínculo, inte-racção e linguagem verbal e não verbal com o burro”, assim como da sua longa experiên-cia na ASZAL. Da parte da tarde escutou-se Cinzia Dutto, vinda da Itália, com uma vasta experiência na vertente da asinoterapia. Num momento alto do curso, falou do “Enquadra-mento da Terapia Assistida pelo Animal” e da “Actividade Assistida pelo Animal”. A oradora pronunciou-se sobre a apresentação dos ob-jectivos da Asinoterapia e da Asinomediação,

bem como sobre as propriedades terapêuti-cas dos burros, sem esquecer os benefícios da relação pessoa-burro e as actividades que se podem desenvolver em Asinoterapia e em Asinomediação no âmbito dos objectivos e da avaliação.

No último dia foi a vez da Joana Braga, da AEPGA, falar da utilização do burro de Miranda como recurso lúdico-pedagógico, encerrando com uma projecção de um fi lme sobre a Raça Asinina de Miranda, um momento muito diver-tido.

Para terminar o curso em beleza houve uma visita guiada aos participantes, que fi ca-ram deslumbrados com o Parque Biológico, possibilitando-se o contacto com os burros ao cuidado do parque, podendo colocar algumas das teorias aprendidas em prática.

Por Daniel Morais

Asininos: curso de educaçãoO curso decorreu no auditório e ao ar livre

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

Exposição sobre fl oraAbriu em 7 de Março na galeria fotográfi ca

do Parque Biológico de Gaia a exposição co-lectiva de fotografi a da natureza «Flora silves-tre: fonte de vida».

Composta por meia centena de trabalhos seleccionados do centro de documentação do Parque, as fotografi as refl ectem algumas das imagens de Primavera que os visitantes en-contram ao sabor da brisa quando visitam o percurso de descoberta da natureza.

Em 4 de Julho, às 15h00, abre outra mostra fotográfi ca, desta vez sobre as aves selvagens que se podem avistar num percurso ornitológi-co feito no parque.

João Luís Teixeira

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

Dunas de CantanhedeSábado, dia 14 de Fevereiro, o Parque Bioló-

gico de Gaia organizou um percurso de desco-berta cujo ponto alto foram as dunas de Can-tanhede, onde se situam as lagoas das Braças e da Vela.

Saída de Avintes de manhãzinha, antes do meio-dia, em Aveiro já se viam por alguns mi-nutos um bando de cerca de 20 fl amingos. Não demoraram muito: numa questão de minutos passam dois parapentes munidos de motor... lá vai aquela fauna toda dali para fora. Antes, nas salinas viam-se com facilidade maçaricos-

de-bico-direito, maçaricos-das-rochas, várias espécies de gaivota, pernas-longas, entre ou-tros.

Na Tocha, as dunas ainda mostram a cama-rinha. Paragem para almoço.

Passando pela velha estrada fl orestal aper-tada entre dunas pejadas de pinheiro-bravo, depressa se chega à lagoa das Braças.

Água não falta e entre as margens delinea-das pela tabua-larga e pelo caniço, ao longe, num choupo da outra margem três silhuetas escuras: corvos-marinhos. Ao longe, um bando

Lagoa da Vela, Quiaios: em vários locais do percurso, um telescópio ajudou a identifi car galeirões, corvos-marinhos, garças, fl amingos, patos-bravos...

Jardim dos sentidosNa Primavera, os aromas andam pela at-

mosfera. Não é por acaso. No caso dos insectos, é necessário que os

seus órgãos do olfacto detectem alimento, so-bretudo quando se têm de alimentar do néctar das fl ores.

A estas também lhes interessa que seja as-sim e é por isso que o seu papel na reprodução de muitas plantas é indispensável e claramente valioso.

O Jardim dos Sentidos, construído no pino da estação fria com o esforço de nu-merosos trabalhadores, desde os criadores do projecto à colaboração dos tutelados da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Defi ciente Mental, está agora a de-sabrochar.

Localizado no percurso de descoberta da natureza do Parque Biológico de Gaia, junto à Casa do Chasco, é visualmente incontornável, dado os diversos materiais que se impõem ao visitante que ali passa.

A ideia, contudo, remete-se ao despertar

de patos-reais com outras espécies à mistura, assustam-se e voam, apesar do observatório.

Ao fi m do dia, o regresso. Alguém pergun-ta quando é o próximo. Será bem diferente: na serra de Aires, em 18 de Abril. Um outro seguir-se-á na serra da Lousã, num sábado, 9 de Maio...

dos cinco sentidos: o olfacto, o tacto, a visão, a audição e o paladar.

Alguns dos recursos a utilizar são algumas

das plantas aromáticas que abundam na Pe-nínsula Ibérica e, por exemplo, frutos silves-tres.

Flamingos nas salinas, Aveiro Jorge Gomes

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

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Ofi cinas e CamposAs ofi cinas de Carnaval do Parque Biológi-

co de Gaia, pensadas para crianças e jovens entre os seis e os 15 anos de idade, decorre-ram nos passados dias 23 e 25 de Fevereiro.

Além das máscaras habituais nesta épo-ca do ano, houve lugar à construção de um espantalho que ainda se encontra orgulho-samente de pé e aperaltado no percurso de descoberta da natureza do parque, mais precisamente junto à eira da quinta de Santo Tusso. Porque ali quando o sol

abre é forte, nem um chapéu à maneira lhe falta.

Mudam-se os tempos, mudam-se as von-tades. Por isso, durante as férias escolares da Páscoa as ofi cinas de Primavera marcaram a sua passagem, entre os dias 30 de Março e 9 de Abril.

Ao longo desse período, múltiplas activida-des animaram a malta miúda que não hesitou em dar as boas-vindas à Primavera. Desco-briram então «Quem é o Horácio?», tomaram

nota do «Ninho de Páscoa», encontraram res-posta para «Onde estáo coelhinho?» e depois sentiram, como convém, a «Boca doce». Por fi m, com convicção evidente, a maior par-te dos participantes não resistiu a sentir que «Quando for grande quero ser tratador de animais»!

De uma forma diferente, até porque esta-rá mais calor, nas férias grandes, em Julho e Agosto, haverá campos e ofi cinas de Verão, com programas lúdico-pedagógicos variados.

A Associação Portuguesa de Anilhadores de Aves organizou nos pas-sados dias 21 e 22 de Fevereiro, no Parque Biológico de Gaia, um curso de muda.

Esta fase da vida das aves, a chamada muda das penas, é uma altura importante que ocorre geralmente assim que termina o esforço da nidifi -cação.

Sob alvo de investigação, neste curso a aferição e registo de dados es-tiveram na mira dos formandos que foram instruídos por Hélder Cardoso, anilhador do Grupo Tornada e autor do manual “Introdução ao estudo da muda em passeriformes europeus”.

Em 18 de Fevereiro, pelas 21h30, foi lançado um novo livro na Esta-ção Litoral da Aguda.

Intitulado «Descobrir o mar», foi escrito numa autoria conjunta de Mike Weber, Assunção Santos e Ana Ferreira, sendo «o sexto e último da série Descobrir», destaca Mike Weber. Os personagens João e Joana dão corpo a uma história: «Estas duas crianças apareceram no 1.º livro, «Descobrir as poças de maré». Depois cresceram («Descobrir a praia»), acabaram o 1.º Ciclo e entraram no 2.º Ciclo («Descobrir as ribeiras»). Aí passaram todos os anos de escolaridade («Descobrir o estuário»), para já no 10.º ano explorarem outros mundos («Descobrir o rio e as albufeiras»). No fi m deste percurso, com a entrada na faculdade, a Joana e o João, já bem crescidos, são confrontados com «Descobrir o mar», afi rma Weber, concluindo ainda: «Este livro vai ao encontro da intenção do presidente da Câmara Municipal de Gaia que, na última revista municipal, anunciou o “Ensino do Mar” para o campo curricular».

Descobrir o marCurso de muda

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

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Fauna: novidades no Parque

No último dia do ano passado, Daniel Mo-rais, técnico de educação ambiental, viu um tritão peculiar. Usando o seu telemóvel, tirou algumas fotos para posterior identifi cação...

O director do Parque Biológico, Nuno Gomes Oliveira, assinalou o facto: «O tritão-marmorado (Triturus marmoratus) é uma es-pécie de anfíbio pertencente ao grupo das Salamandras e dos Tritões, tem cor preta, apresentando manchas verdes; é uma espé-cie em risco, devido à perda de habitats e à poluição.

É a 9.ª espécie de anfíbio identifi cada, no es-tado selvagem, no Parque Biológico de Gaia e a 947.ª espécie de ser vivo».

Tritão-marmorado

A Lesma-de-concha é um molusco da classe Gastropoda, a que também perten-cem os caracóis. Esta lesma possui, na ex-tremidade posterior, uma pequena concha externa, semelhante a uma unha ou a uma orelha, característica da sua família (Testa-cellidae). À primeira vista, a sua cor é acas-tanhada, com duas riscas escuras de lado, mas quando olhada com maior atenção, ve-rifi ca-se que é bege com pontos e manchas castanhas. Vive no solo, quer enterrada, quer sob as folhas mortas e húmidas, sob as pedras e na madeira morta, saindo à noi-te para se alimentar, principalmente de mi-nhocas mas também de moluscos. Enterra-se frequentemente e emerge em noites de muita humidade, particularmente durante o Outono e a Primavera. Quando incomodada contrai-se, fi cando com uma forma cónica,

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Lesma-de-conchaTestacella maugei A. Férussac, 1819

Tritão-marmoradoTriturus marmoratus

Nova espécie de anfíbio

e pode segregar um muco espumoso trans-parente que a envolve por completo. Quan-do se desloca, o corpo é alongado e mais estreito anteriormente.

A Lesma-de-concha distribui-se pela Eu-ropa Ocidental, ilhas Atlânticas e Marrocos. Provavelmente foi introduzida no Reino Unido e na Irlanda. Em Portugal continental, parece ocorrer em todo o território, mas os registos são escassos e maioritariamente antigos.

Texto e fotos: Patrícia Soares-Vieira e J. M. Grosso-Silva (CIBIO-UP)

A partir de agora já pode caçar (com máquina fotográfica, é claro) no Parque Biológico,sem necessidade de licença de caça. E pode levar os seus troféus: corços, bisontes,açores, pica-peixes e muitas outras espécies vão decorar as paredes de sua casa.

Poderá fotografar ao longo do Parqueou utilizar um dos novos abrigos de caça-fotográfica,

instalados em locais calmos e fora do circuito de visitas.

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

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Parabéns Darwin Se Charles Darwin ainda estivesse vivo teria comemorado em 12 de Fevereiro passado o seu 200.º aniversário

Para destacar a data, o Parque Biológico de Gaia estabeleceu uma parceria com a Livraria Lello e organizou neste dia o lançamento da reedição da primeira tradução portuguesa do livro de Charles Darwin, “A Origem das Espé-cies”, obra que em 2009 assinala 150 anos.

Com vista a acentuar a importância da con-tribuição darwiniana no entendimento da vida na Terra, o Parque Biológico de Gaia abriu em simultâneo uma exposição alusiva ao tema, que contou com a presença de numeroso pú-blico.

Na abertura Nuno Gomes Oliveira referiu que Darwin ao sublinhar o conceito da adaptação das espécies e a selecção natural das mesmas foi sobremaneira actual dada a facilidade com que o ser humano hoje altera o ambiente. As modifi cações súbitas e extensas levam à extin-ção e à perda de biodiversidade.

Querendo Homo sapiens dizer «homem que sabe», será de aguardar comportamen-tos orientados no sentido da conservação da

Sábado no Parque2 de MaioTodos os primeiros sábados de cada mês, o Parque Biológico de Gaia propõe um programa diferente e contempla os seus visitantes com várias actividades. Em 2 de Maio será assim: 10h00, atelier “Paparoca da bicharada”; 14h30, Conversa do Mês: As dunas; 15h30, visita guiada pelos técnicos do Parque e percurso ornitológico.Em Junho, o programa é idêntico, muda o atelier no tema (Descobrir as serpentes) e a conversa do mês: Os pirilampos.

Percursos de Descoberta9 de MaioSe se inscrever, pode seguir no autocarro do Parque Biológico para um percurso de descoberta da natureza na serra da Lousã.

Noites dos Pirilampos12 e 13, de 15 a 20 e 22 de JunhoNestes dias o Parque recebe visitas às 22h00 para observação de pirilampos e outros animais nocturnos, podendo também observar os astros com telescópio. O res-taurante serve jantares (reserva obrigatória). Inscrição prévia obrigatória: o limite diário

é de quatro visitas guiadas, cerca de 30 elementos cada.

Exposição Colectiva de Fotografi a sobre Aves Selvagens abre 4 de Julho, sábado, às 15h00Voam de árvore em árvore pelo Parque. Uma mão-cheia de fotógrafos da natureza captura a sua imagem e traz a esta mostra a sua luz.

Mais informações:[email protected]

Telefone directo: 227 878 138

www.parquebiologico.pt

AgendaEis alguns destaques das actividades do Parque Biológico de Gaia para os próximos meses...

natureza. Disse ainda que, «além de Charles Darwin, são também homenageados com este evento Júlio Henriques, ex-director do Jardim Botânico de Coimbra, e William Tait, ornitólo-go, que trocou correspondência com Darwin».

Guilherme Aguiar, em representação do Município, frisou a importância da obra deste conhecido britânico e do darwinismo na «con-tribuição para a mudança de mentalidades da época, com o seu exemplo» que «continua ac-tual nos dias que correm».

O representante da Livraria Lello acentuou que a sua empresa, ao longo da história, tem tradição na variedade de temas disponíveis. A dada altura esta livraria também criou uma área

de títulos naturalistas onde Darwin se enqua-drou. Porém, «este livro esteve esgotado du-rante décadas, até que surgiu agora o repto do Parque Biológico para a reedição desta obra histórica».

A exposição estará patente no horário de abertura do Parque durante um ano e inclui vários painéis, havendo um que revela uma carta de Darwin a William Tait, que residia na Região Metropolitana do Porto. Os grafi smos salientam o tema da mostra e a réplica em ta-manho real do cientista, sentado à secretária, são pontos marcantes que os visitantes levam consigo depois de percorrerem este espaço lúdico-pedagógico.

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Educação ambiental e ecoturismoCerca de 20 são-tomenses frequentaram

no passado mês de Março uma formação na área da educação ambiental e do ecoturismo, que decorreu no Parque Biológico de Gaia.

Perto do fi nal da acção, Ludmila Machado, da Direcção-geral de Ambiente de São Tomé e Príncipe, refere que a formação «superou as expectativas». Antes de chegar, «esperava uma formação à base sala de aula e de papel e lápis», mas «depois vi que havia visitas de estudo, o que me agradou muito». Face ao que recolheu, diz que «levo aquilo que aprendi para passar aos meus colegas são-tomen-ses». E sublinha: «Em São Tomé ainda temos muito trabalho de base para realizar, muita sensibilização para fazer».

Ao seu lado, numa visita à biblioteca, Iata Mota, de 28 anos, técnica de turismo, corro-bora: «Estou a gostar muito. Aprende-se um pouco de tudo. Como houve muitas visitas de estudo, posso pegar em algumas dessas coisas e adaptar à nossa realidade em São Tomé».

A formar-se em jornalismo e membro de uma organização não-governamental, Mayker

Quaresma, de 21 anos, afi rma que está «a aprender muito. Dentro do Parque Biológico sinto-me como se estivesse em São Tomé», sublinha, e diz que «tenho visto animais que nunca tinha olhado de perto, só os conhecia da televisão».

Brito do Espírito Santo é membro da as-sociação Zatona-Adil. Fala da formação que frequenta: «É gratifi cante. Além dos conhe-cimentos que já tinha adquiri outros sobre técnicas de produção em viveiros e educação ambiental. Ao longo do tempo iremos passar estes conhecimentos a outros que não pude-ram vir». De início, «contava que fosse só no Parque, mas depois fomos a outros locais».

Esta visita surge na sequência de uma ge-minação estabelecida entre Gaia e o distrito de Água Grande, de São Tomé. Com base nesse vínculo, surgem várias formas de in-tercâmbio. O ano passado o Parque Biológi-co de Gaia levou um numeroso grupo a São Tomé para participar num seminário sobre ecoturismo e biodiversidade que organizou com a Direcção-Geral de Ambiente daquele país africano. Visita a instalações da empresa municipal Águas de Gaia

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Tráfi co à luz do dia

É por estas e por outras que as apreensões do SEPNA, o serviço de protecção da natureza da GNR, não tem mãos a medir. Sob o epíteto de passarinheiro anda alguém aqui e ali, à socapa, a montar armadilhas das mais diversas para capturar aves e depois as vender a alguém que, alegando gostar delas, as encarcera numa gaiola até que a morte as liberte. Os números não são irrisórios. Em 2008, só no centro de recuperação do Parque Biológico de Gaia foram entregues pelos serviços ofi ciais de protecção da natureza e por particulares interessados no bem-estar animal 1902 animais, contra os 1606 de 2007. O ano passado a taxa de recuperação foi avaliada em 40%, um valor elevado, tendo este cálculo sido feito a partir do número de animais selvagens entrados e não da totalidade de entradas, já que estas incluem um grande número de animais domésticos ou domesticados e exóticos, que não podem ser libertados na natureza. O centro de recuperação do Parque Biológico de Gaia conseguiu recuperar e libertar o total de 376 animais em 2007, enquanto em 2008 superou a fasquia e atingiu os 522. A análise dos números do ano passado aponta a entrada no centro de 1370 aves, das quais 1189 são selvagens. Nos répteis contam-se 343 sendo selvagens apenas 46, e fi nalmente 160 mamíferos dos quais 67 são espécies selvagens. Houve ainda entrada de um número pouco signifi cativo de animais de outros grupos.Entre as aves com saúde para serem soltas nos habitat adequados a maioria é anilhada segundo as normas legais, na esperança de que possa haver dados sobre o êxito da reintegração das aves na natureza, o lugar a que realmente pertencem.

Texto e fotos: Jorge Gomes

Cortada meia asa por trafi cante, para não voar, e chamar outras aves ao cativeiro ou à morte sem aparato de gaiola armadilhada: o stress mata!

Morto, mumifi cado e empalado por passarinheiro para atrair à armadilha os seus iguais

Gaiolas apreendidas em operações de combate ao tráfi co de aves selvagens para destruição

Nem o nome fi dalgo do dom-fafe o retira da lista negra do tráfi co de aves selvagens

RECUPERAR 35

Esta ave, um macho de dom-fafe, foi apreendido a um passarinheiro pelo SEPNA: recuperado no Parque Biológico de Gaia, foi anilhado e está prestes a regressar à natureza

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Parques e Vida Selvagem Parques e Vida Selvagem Primavera 2009Primavera 2009

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36 REPORTAGEM

A face oculta do rio Parecem extraterrestres quando a lupa os revela. Formas impensáveis, de escassos milímetros, variadas, talhadas pela selecção natural, têm nomes que não fi cam no ouvido. Enfrentamos a tarefa e resolvemos dar-lhe uma ideia dos macroinvertebrados que desempenham papéis singulares nos nossos cursos de água doce

Depois da chuva a água passa no açude em rápida correria. Equipadas com botas de cano alto, Ana Sofi a e Maria João estão na água. Empunham aparelhos que dão as medidas do oxigénio, da condutividade, do pH, da tempe-ratura...

«Vamos ver se os resultados conseguem ser interessantes depois do intenso caudal de on-tem», conjecturam.

Nas ciências positivas a experimentação fala alto diante de qualquer teoria.

À margem dessa e de outras dúvidas, a sua presença ali é clara: durante um ano, com co-

ordenação de Alexandre Valente, do Departa-mento de Zoologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, o seu campo de trabalho desdobrar-se-á em diversos pontos do rio Febros, no intuito de monitorizarem a evolução das comunidades aquáticas.

Isto acontece porque este curso de água, que atravessa o Parque Biológico de Gaia, sofreu um acidente em Agosto passado. Um camião com ácido clorídrico tombou na auto-estrada e acabou por verter esse produto quí-mico num afl uente, a ribeira de Jaca. Os efeitos foram devastadores: enguias, ruivacos, góbios

boiavam na madrugada do dia 26 no rio e, nal-gumas partes, uma estranha espuma branca cobria a superfície da água.

Com o apoio da companhia de seguros Tranquilidade, ao longo de um ano, os técni-cos têm pela frente a tarefa de monitorizar a recuperação da vida neste curso de água.

Isso far-se-á através de colheitas de organis-mos aquáticos. Neste momento, acompanha-mos a recolha de macroinvertebrados.

Esta longa palavra agrupa animais como larvas de mosquito e de libélulas, de escarave-lhos e até de borboletas, sem excluir pequenos

Caracterização da água do rio Febros durante uma das colheitas de macroinvertebrados

João

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The hidden face of the riverWhen you look through a magnifying glass, they look like extraterrestrials...! Unimaginable forms, small, created and carved by natural selection, their names are too diffi cult to remember! We decided to point out these fantastic macro-invertebrates to you and show the unique ecological rôle that they perform in our rivers and natural water courses.

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caracóis e búzios, sanguessugas, alguns crus-táceos e umas minhocas conhecidas entre os especialistas por oligoquetas.

Apesar da diversidade das suas formas, têm algo em comum: uma reduzida dimensão. Tudo o que tenha para cima de um milímetro encaixa no perfi l, sendo certo que muitos terão em média talvez meio centímetro.

Enquanto em pleno leito do rio Ana Sofi a coloca a rede de mão de malha fi na contra a corrente e adiante agita o areão imerso com a bota, alguns destes animais fi cam cativos no meio do sedimento. A colheita é recolhida para um frasco ao qual é adicionado formol: «Interessa-nos que os animais se mantenham intactos».

No laboratório, a colheita do rio «passa em vários crivos: um de 1 milímetro, depois de 500 micra e de 250 micra», explica.

Após esta separação volumétrica, o conteú-do de cada crivo é despejado numa tina bran-ca. Nesta fase há que ter vista apurada, pois vão separar seres mínimos que apostaram num grande mimetismo: «Requer muita atenção. Há alguns que são mesmo pequenos e facilmente passam, se não estivermos concentradas». É do interesse deles parecerem detritos, na cor e

na forma, caso contrário vorazes predadores, como góbios e ruivacos, antecipam o fi m dos seus dias.

Ana Sofi a apoia-se numa mesa que supor-ta vários microscópios e uma lupa binocular e continua: «Aqui já os vamos separando e depois observamo-los à lupa, onde os vemos com pormenor. É então que conseguimos chegar à família ou ao género da espécie em causa». A identifi cação de toda esta vida ani-mal é a matéria-prima dos chamados índices bióticos, que mais não são do que índices de qualidade do ambiente aquático.

Há muitos grupos de macroinvertebrados: «Há os detritívoros, que se alimentam de detri-tos orgânicos; há outros que são predadores, portanto, que se alimentam de outros; há os que são raspadores, que se alimentam de al-gas; há os colectores», diz Alexandre Valente, e adianta: «Existem essas relações entre eles. Alguns revelam-se altamente sensíveis à polui-ção e quando presentes indicam boa qualida-de da água. Quando o ambiente está deterio-rado subsistem os que são pouco sensíveis. Por exemplo, algumas larvas de mosca».

Depois da destruição imposta pelo ácido, como irão reagir plantas e animais?

Alexandre Valente sublinha: «Os processos normais de recolonização indicam que os ani-mais não estão fi xos no mesmo sítio. Há os que morrem, os que chegam, os que nascem. Há mobilidade». A tendência é que os que nascem se vão deslocando para jusante: «No sentido contrário é mais difícil, têm de vencer as correntes».

De resto, sejamos realistas: «Os peixes só se podem instalar depois dos macroinvertebra-dos». Destes, «os que dependem de plantas só se podem instalar depois de haver plantas; há um ciclo que é necessário esperar que se cumpra para se dar a recolonização total do rio, um processo que pode demorar». Depen-de «de como eles vão reagir às alterações do meio. Instalam-se algas, depois vêm os herbí-voros, depois vêm os carnívoros».

Ao contrário dos invertebrados, no que toca aos peixes há mais dados a confrontar, alguns deles datados da década de 1980, quando se encontrava ainda toupeira-de-água no rio Fe-bros. Estes estarão por nossa conta na próxi-ma edição desta revista...

Texto: Jorge GomesFotos de lupa binocular: Ana Sofi a e Maria João

Vida cheia de mudança À mesaO ciclo completo de numerosos destes seres vivos pode apresentar quatro fases distintas: primeiro são ovo, depois larva, segue-se a pupa e por fi m o insecto adulto. Uma série destes invertebrados trocam o meio aquático, onde se desenvolvem enquanto larvas, pelo meio aéreo quando são adultos, sendo a sua função principal a de se reproduzirem.

Os macroinvertebrados aquáticos podem ser agrupados segundo um critério que se baseia no seu regime alimentar. Os colectores recolhem alimento nos sedimentos ou fi ltram partículas.Os trituradores e escavadores podem ser detritívoros e a matéria vegetal para eles é sempre o prato do dia. Os raspadores recolhem nutrientes de minerais e de matéria orgânica.Por fi m, os predadores, carnívoros, alimentam-se de outros seres que ingerem ou perfuram para sugarem os seus tecidos.

Efémera: insecto adulto

Ninfa de efémeraPupa de mosca-preta

Mosca-preta adulta

Larvas

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38 REPORTAGEM

Trate-os por tu

Larva de borboleta com fase aquáticaMuitos de nós não sabemos, mas há espécies de lepidópteros que vivem numa certa fase do seu ciclo de vida próximas das barbatanas dos peixinhos...

Ninfas de efémerasPodem ser ninfas durante dois anos ou mais. Em adultos, a longevidade é curta: cerca de três dias. Também não admira: não se alimentam, só pensam em namorar.

GastrópodesEntram aqui os pequenos caracóis aquáticos. Há dois grupos em função da respiração. Alguns utilizam brânquias para obterem

oxigénio da água (Prosobranchia) e outros possuem algo semelhante a pulmões, pelo que necessitam de chegar à tona da água para absorverem oxigénio — algo útil em ambientes poluídos.

TricópterosAnimais parecidos com borboletas, já que produzem seda que usam para construir casulos, “redes” para armazenarem alimento, para se fi xarem ao substrato, etc.

IsópodesAchatados dorsoventralmente, possuem sete pares de patas locomotoras desenvolvidas, estando o primeiro par modifi cado para agarrar partículas.

Com ciclos de vida complicados, ora imersos ora emersos, de pequena dimensão, miméticos e com nomes estranhos, eles são mais que muitos. Mesmo assim, queremos apresentar-lhe alguns dos macroinvertebrados colhidos em Janeiro...

Crustáceo, isópode Gastrópodes, búzios Insecto

Isópodes Sanguessugas

BorboletaEfémerasMosquitos

Mosca-pretaTricópteros

CaracóisBúzios

ARTRÓPODES MOLUSCOS

INSECTOS GASTRÓPODES

ANELÍDEOS

HIRUDINEACRUSTÁCEOSsubclasseclasse

classe classe

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fi lofi lo

Classifi cação de alguns

dos macroinvertebrados colhidos

Diversos invertebrados na mira da lupa binocular

Ninfa de efémera

Anelídeo, vista dorsal

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ACTUALIDADEACTUALIDADE 39 39

Mindelo: de novo área protegida – e as outras?A Reserva Ornitológica do Mindelo, criada pelos Serviços Florestais em 2 de Setembro de 1957, por iniciativa do Prof. Joaquim Rodrigues dos Santos Júnior, foi a primeira área protegida portuguesa

Foi vigiada, desde a criação, pelo guarda-fl orestal António Jesus Pereira, sob a direcção do Prof. Santos Júnior, com quem colaborei nos anos 70, quer na anilhagem de aves quer na gestão da Reserva de Mindelo tendo, em 1973, colocado ali as últimas placas de sinali-zação que teve.

Com o 25 de Abril de 1974, e as alterações legislativas subsequentes, a Reserva do Min-delo não se adaptou aos novos regimes jurídi-cos da conservação da natureza, mas nunca foi desclassifi cada, como comprova o novo Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, aprovado em 2008 (De-creto-lei n.º 142/2008 de 24 de Julho) que de-termina, no seu art.º 49.º que: “4 – No prazo máximo de dois anos a contar da publicação do presente decreto-lei e sob a cominação de perda dos actuais estatutos de protecção, deve ser objecto de ponderação: a) A reclas-sifi cação numa das tipologias de áreas prote-gidas previstas no presente decreto-lei: i) Da paisagem protegida da Reserva Ornitológica de Mindelo, criada por decreto publicado no Diário do Governo, 2.ª série, n.º 204, de 2 de Setembro de 1957, com rectifi cação de área efectuada por decreto publicado no Diário do Governo, 2.ª série, n.º 115, de 15 de Maio de 1959;”.

Isto vem confi rmar a tese que sempre de-fendemos. Assim, o Mindelo só deixaria de ser área protegida se, até 24 de Julho de 2010 não fosse reclassifi cada, o que felizmente não vai

acontecer, pois a Área Metropolitana do Por-to já elaborou e tem em discussão pública o respectivo regulamento de reclassifi cação com o nome de “Paisagem Protegida do Litoral de Vila do Conde”.

Pena é que esse regulamento, embora afi r-me, no seu art.º 3.º, que um dos objectivos da nova área protegida é “A perpetuação do pioneirismo português na conservação da na-tureza e estudo da diversidade biológica, no-meadamente, no âmbito da ornitologia”, não registe expressamente o nome anterior e o dos actores desse “pioneirismo”.

No entanto, o referido art.º 49.º também obriga à reclassifi cação de outros sítios: “ii) Da Reserva Botânica do Cambarinho, criada pelo Decreto n.º 364/71, de 25 de Agosto, ao abri-go do estabelecido no n.º 4 da base IV da Lei n.º 9/70, de 19 de Junho; iii) Do Refúgio Orni-tológico Monte Novo do Roncão, criado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 7/91, de 12 de Março, ao abrigo do estabelecido no Decreto-lei n.º 264/79, de 1 de Agosto”.

A criação de Reserva do Cambarinho tem justifi cação evidente: “A espécie a proteger, conhecida localmente por loendro, tem o nome científi co Rhododendron ponticum L. ssp. bac-ticum (Bss. Et Reut.) Handel-Mazzetti. Esta es-pécie, rara na Europa, reveste-se de interes-se, não só nacional, como internacional: é um testemunho da fl ora do Terciário, endémica da Península Ibérica. Desenvolve-se espontane-amente com notável pujança junto das linhas

de água da região (...) . Dado o valor científi co, educativo, turístico e paisagístico do maciço da vegetação, já foi objecto de classifi cação como espécie de interesse público, nos termos do § único do artigo 1.º do Decreto-lei n.º 28 468, de 15 de Fevereiro de 1938. Esta classifi cação, todavia, não garante a sua protecção efi caz, como merece e convém aos fi ns desejados. No que se considera necessário criar uma re-serva botânica.” (Preâmbulo do Decreto-lei n.º 364/71).

O Monte Roncão sempre foi, para mim, um mistério. A Resolução do Conselho de Minis-tros que o torna área protegida apenas justifi ca o acto deste modo: “A herdade do Monte Novo do Roncão, na freguesia de Alandroal, em Évo-ra, constitui um espaço de valor elevado para um grande número de espécies de aves que nela encontram excelentes condições de ha-bitat, pelo que o Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza enten-deu aí criar uma zona de protecção e defesa ornitológica, projecto para o qual existe a con-cordância do respectivo proprietário.” De fac-to, o Decreto-lei n.º 264/79 permitia a criação de áreas protegidas privadas, designadas por “refúgios ornitológicos” mas, apesar de muitos pedidos, só esta foi criada. Quem será o pro-prietário?

De qualquer modo, quem reclassifi ca e a as-sume a conservação destes dois sítios?

Por Nuno Gomes Oliveira

João Luís Teixeira

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40 REPORTAGEM

Reserva Natural Localdo Paul de Tornada O Paul de Tornada fi ca a cinco quilómetros de Caldas da Rainha e está a adquirir o estatuto de Reserva Natural Local. A Associação PATO luta pela defesa desta zona húmida há duas décadas. Para que a conheça melhor, fomos visitá-la no vestíbulo da Primavera

A névoa deitara-se no paul. Preguiçosa, desperta a contragosto com o sol enquanto o caniço e os salgueiros desenham a paisagem.

À medida que o olhar avança perde-se nos contornos redondos do arvoredo e o horizonte difuso aproxima-se como se quisesse olhar-nos de perto.

Na quietude dos primeiros passos do dia há sons sucessivos de aves imersas na paisa-gem.

Um bando de garças brancas alça voo agora que terminou a noite. É hora de deixar o dormitório e procurar os campos da região. Ouvem-se vocalizações de mergulhão-anão e de frango-de-água.

Há um microclima aqui. Os terrenos alaga-

dos, onde as plantas se juntam para não caí-rem ao vento, criam condições singulares nas zonas húmidas.

Vem ligeiro o dia, sugado pelos sons varia-dos das aves que se ocultam no caniçal.

Prrrih... prrrih... O caimão-comum está per-to. Vê-lo é impossível: as cortinas de caniço são biombos naturais.

Na tarde quente não se vislumbra a cor azul deste animal alado pouco maior que um galei-rão. Há uma dúzia de anos a espécie esteve na corda bamba. Na última década tem recupera-do e aumentou a área de distribuição. Havendo habitat conservado, as espécies reaparecem. Esta ave típica das zonas húmidas só ressurgiu no paul de Tornada há cerca de quatro anos.

Hoje, não só faz parte da lista da avifauna do sítio como já faz ninho.

Quem o diz é Hélder Cardoso, membro da direcção da Associação de Defesa do Paul de Tornada, um geógrafo que se deixou resvalar para a conservação da natureza.

Conversamos sob uma pequena abóbada de salgueiros, cuja folhagem verde reaparecida indica o fi m do Inverno. O sol forte recomenda o abrigo que lembra uma catedral fantástica. A luz coada pela copa anã reduz ruídos e con-centra a mente nos sons que se fazem ouvir entre a vegetação típica desta zona húmida.

«O paul foi formatado pelo ser humano», diz Hélder. «No tempo da rainha D. Leonor servia o cultivo de arroz». Quando a agricultura foi

As zonas húmidas são vitais para as aves do caniçal que, na Primavera, as procuram com o objectivo de nidifi car, chegando para isso a deslocar-se a partir de África

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REPORTAGEM 41

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Tornada Wetlands The Tornada Wetlands, near the town of Caldas da Rainha and roughly 100 Km from Lisbon, is about to be given the status of a Local Nature Reserve. During the last two decades, the Association of the Defence of the Tornada Wetlands (PATO) has fought hard to defend the conservation of this wetland. The Park has an area of 50 hectares. Numerous wild birds are already arriving for the nesting period. To really enjoy this new environment to the full, we paid our fi rst visit on a sunny day.

«Já chegou um garçote. Vi-o ontem. Costumamos ter cinco ou seis casais

a nidifi car», diz Hélder Cardoso

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(1) Visa a obtenção de informação que possa auxiliar a entender e explicar as alterações nas populações de aves, através de um programa de capturas regulares durante a época de reprodução, em locais e habitats específi cos. Insere-se no projecto à escala europeia Constant Effort ringing in Europe promovido pela EURING. (2) 11 de Março.

abandonada no lugar, a vegetação natural re-povoou o espaço e a fauna selvagem depressa se instalou.

Irrompem agora vários cantares. Ouve-se frango-de-água, rouxinol-bravo, felosa-uni-color... a razão está à vista: em pouco tempo surge um milhafre-preto no céu azul, além da copa dos salgueiros. «Está de passagem. Deve ter vindo de África», comenta o guia.

MigraçõesSe estivéssemos no Inverno, andariam ali

patos-bravos. Perante a ameaça, as marrequi-nhas mergulhariam e outros esconder-se-iam na vegetação.

As zonas húmidas — que não abundam — são locais de passagem obrigatória durante as migrações das aves. A forma mais certeira de saber por onde andam algumas delas resume-se à anilhagem científi ca.

O paul conta com anilhadores credenciados que dão corpo ao grupo Tornada: «Há uma estação de esforço constante1 — anualmente anilhamos uma média de 4 mil aves».

Além disso, entre 15 de Julho e 15 de Se-tembro o grupo anilha diariamente: «Chega-mos a apanhar duas mil e tal aves», entre elas «500 rouxinóis-dos-caniços».

Porque há mais para ver, a caminhada segue pelo carreiro que ladeia a vala do Guarda-mato. Uma libélula voa agitada à nossa passagem e as ervas verdejantes sussurram ao toque das botas. Aqui e acolá há um trilho que denuncia a rotina dos coelhos-bravos.

Não longe num salgueiro vêem-se vários corvos-marinhos-de-faces-brancas, uma es-pécie que abunda no Inverno e que tende a desaparecer do paul no Verão, rumo aos locais de nidifi cação, mais perto do mar.

Retoma-se o tema. Hélder Cardoso sublinha que estão de passagem para Norte diversas espécies de felosa: «Ontem2 fi zemos anilha-gem e apanhámos uma felosinha (Phyllosco-pus collybita) com anilha espanhola», mas não é raro terem na mão aves com anilhas belgas, francesas, inglesas. Por ano, «a média é de cinco anilhas estrangeiras».

Muitas destas aves alimentam-se de inverte-brados que recolhem no caniçal. No percurso pelas margens do paul viram-se alguns tabu- Hélder Cardoso

Colheita de insectos do caniçal Centro Ecológico Educativo do Paul de TornadaRouxinol-pequeno-dos-caniços, típico migrador dos caniçais

leiros brancos: «São armadilhas para insectos». Decorre um estudo sobre os picos de eclosão destes bichos no caniço, articulado com uma estação meteorológica que regista a cada 15 minutos a temperatura e a humidade.

Com isto, uma das perguntas a que se pre-tende responder é esta: «Se não houvesse a eclosão sincronizada de mosquitos do caniçal que consequências teria, por exemplo, numa migração de felosinhas?». É que o pico de eclo-são de insectos pode não coincidir com a mi-gração e a reprodução, sobretudo face à emer-gência de alterações climáticas.

Além destas aves de menor porte, o grupo Tornada anilha no ninho algumas das grandes garças. Acabam de chegar de África as primei-ras garças-vermelhas. Neste paul costumam fazer ninho cerca de 15 casais. Também a gar-ça-real ali nidifi ca: «Anteontem já encontrei um ninho com dois ovos».

Nem só de aves se faz o paul

A face mais visível destes ecossistemas reparte-se entre a vegetação e as aves selva-gens, que se contam em 137 espécies já ob-servadas.

As várias espécies de patos-bravos que ali

passaram no Inverno já estão a caminho do Norte da Europa. Se umas foram, outras estão para chegar: a cigarrinha-ruiva e as duas espé-cies de rouxinóis-dos-caniços...

Escondidos estão os peixes cujos alevins se ocultam entre caules dourados do caniço e da tabua, que agora acorda com folhas verdes depois da letargia invernal.

São tainhas (Liza ramada), ruivacos (Chon-drostoma macrolepidotus), enguias, de per-meio com peixes exóticos como carpas, pim-pões e gambúsia.

Entre anfíbios, esta zona húmida dá-se ao luxo de ter as duas espécies de rela do nosso país: «Vêem-se melhor com chuva miudinha», acentua Hélder. Além da rã-verde, é vulgar en-contrar-se a rã-de-focinho-pontiagudo.

Mais difícil será deparar com a salamandra-de-costelas-salientes, o sapo-parteiro ou com o tritão-de-ventre-laranja, embora já tenham sido detectados no paul.

O lagarto-de-água, um endemismo ibérico no grupo dos répteis, aquece-se algures ao sol, mimético como convém face aos muitos predadores do sítio.

As duas espécies de cágado do património natural português também estão representa-das. Uma delas, o cágado-de-carapaça-estria-da está em regressão no país e na Europa.

Entre mamíferos, conta-se desde o javali que procura o paul no Verão para se refrescar na lama e o pequeno musaranho-de-dentes-vermelhos, passando por ginetas, toirões, te-xugos e, claro, pela discreta lontra. O rato-de-água nada no bosque encantado do caniçal, longe do olhar ávido dos predadores alados em tempo de postura.

Educar é precisoOs líquenes agarram-se ao tronco dos sal-

gueiros que ladeiam as margens do paul. Aca-bamos de passar por um marco de madeira, com garridas cores amarela e vermelha.

Está claro que fazem parte de um percur-so pedestre que inicia em Caldas da Rainha e passa pelo paul de Tornada rumo ao grande espelho-de-água que é a lagoa de Óbidos, que fi ca a uma dezena de quilómetros. Por que ra-zão não apostou mais a associação na lagoa do que no paul? Este é bem mais pequeno...

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REPORTAGEM REPORTAGEM 4343

Os primeiros registos históricos alusivos ao paul de Tornada têm a ver com a instalação do hospital termal das Caldas da Rainha por vontade de D. Leonor.

Os livros de receita e despesa, onde des-fi lam os forais e as rendas, dão nota da exis-tência de cinco pauis na região que a rainha terá legado ao hospital.

Designava-se então o paul de Tornada paul da “Boa Vista do Estremo” ou paul de “Cor-naga”. Dizem os registos que naquele tempo rendia “mais de 500 alqueires de trigo e 40 al-queires de segunda e legumes e toda a palha para os boys e cavalgaduras”.

Chegado o ano de 1479 o paul foi entregue ao juiz da Alfândega de Lisboa, e fi dalgo da casa d’el rei D. Manuel, Pero d’Alcáçova.

Em 1518 este paul rendeu 500 alqueires de trigo e 20 de cevada. Em 1524 foi arrendado. Deu 37 alqueires de trigo. Por causa da muita água por drenar, em 1532, semeou-se ape-nas um pedaço.

Vindo o ano de 1956, consta que nas re-dondezas, em Chão de Parada e Reguengo, houve casos de paludismo, que terá desapa-recido com a abertura das valas de drenagem do pântano.

Em 1998 surge a PATO - Associação de Defesa do Paul de Tornada.

Cria-se uma parceria entre esta associa-ção, o GEOTA e o Instituto de Conservação da Natureza (ICNB). Em 2001, dia 24 de Ou-tubro, o paul de Tornada passa a fazer parte da lista de sítios RAMSAR. Em 2009, em data ainda indeterminada, conquista o estatuto de Reserva Natural Local, requerido por uma parceria entre o Município de Caldas da Rai-nha e a Associação de Defesa do Paul de Tor-nada. Virá a ser gerido o paul por um órgão constituído por representantes municipais, da associação PATO e do ICNB.

O paul tem históriaO paul tem história

CONTACTOCONTACTO

Associação de Defesa do Paul de Tornada

Quinta do PaulRua do Paul, n.º 122504-910 Caldas da RainhaTelef. 262881790 - Fax 262881790E-mail: [email protected]

Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

Hélder não tem dúvidas: «A lagoa suporta espécies que o paul não suporta e vice-versa». Têm «ecossistemas com habitat diferentes e o paul assume elevada importância não só a nível regional, mas nacional e se calhar ibéri-co», no que toca «a aves de caniçal», pois está «num corredor atlântico de migração».

Num lugar ou noutro, a educação ambiental ocupa lugar de destaque e há episódios que marcam: «Anteontem fomos a um jardim-esco-la. Os miúdos teriam à volta de 4 anos. Fomos para o campo». Uma semana antes «tinha-lhes mostrado alguns bonecos de aves», que as diferenciam. Ao ar livre «estava um verdilhão a cantar no pátio da escola». Quando «uma das meninas o viu, disse «Olha um verdilhão». E era.

Fora isso, «o que me fascina mais nos mi-údos é que vêm cá muito novinhos e ouvem-nos, fazem a visita connosco». Quando voltam «passados vários anos, ainda se lembram do que lhes dissemos. É incrível a facilidade com que retêm as informações, sobretudo as que recebem nas saídas de campo».

ProjectosAo chegar a esta zona húmida o visitante en-

contra um edifício restaurado: é o Centro Eco-lógico Educativo do Paul de Tornada.

Dotado de auditório, de laboratório, e até de alojamento para visitas de trabalho, ganhou outra valia a antiga casa de moagem, que se encontrava antes de 2000 em ruínas.

Estas paredes são «um espaço privilegiado para a informação e formação ambiental dos cidadãos», até porque «há uma equipa multi-disciplinar que assegura o seu funcionamento diário». No piso de cima do centro há uma janela apetrechada com telescópios que per-mite uma visualização sobre o pântano e as aves que por vezes se deixam olhar de longe nos lagos centrais, de maior profundidade.

Entre o centro ecológico e o paul há duas marcas na paisagem: uma grande eira circular e um centro de recepção de animais selvagens para reabilitação.

A eira foi recuperada em 2002 e confi gura «um vestígio da ocupação antiga deste espaço que era lugar de cereais, como o arroz».

Marginal ao trilho, há algo parecido com uma estufa coberta de rede fi na verde-escura. Ali não há visitas, conforme as regras normais de reabilitação de aves sinistradas: «Funciona como um pólo de recepção», explica Hélder. Os casos mais complicados «seguem para centros de recuperação. Os mais simples são tratados por nós» e estando em condições para isso libertam as aves. Já passaram por ali espécies como coruja-das-torres, águias-de-asa-redonda, mochos e até um bufo-real, a maior ave de rapina nocturna da fauna por-tuguesa.

Hoje, a Associação de Defesa do Paul de Tornada e o Município de Caldas da Rainha colaboram para dotar esta zona húmida de 50 hectares do estatuto de protecção ansiado há já 21 anos.

O primeiro passo está em curso: a aquisição de estatuto de Reserva Natural Local. O se-gundo passa pela aquisição dos terrenos que pertencem ainda a particulares.

Como as aves que ali pousam para segui-rem viagem para Norte, também nós temos de partir.

Não podemos esperar pelas garças-boieiras e pelas garças-brancas-pequenas que fazem dormitório no salgueiral do paul, assim que o sol se esvai no horizonte.

De memória ancorada nos tons verdes e dourados que dominam o paul, mais uma vez partimos, para amanhã voltar.

Texto: Jorge Gomes Fotos: João Luís Teixeira

Vala da Palhagueira

Reguengo

Tornada

Paul de Tornada

Caldas da RainhaSalir do Porto

N

Vala do Guarda-mato

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Texto: Jorge GomesFotos: João L. Teixeira

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«É a maior queda de água de Portugal Con-tinental», sublinha Daniela Rocha, geóloga do Geoparque Arouca.

Do miradouro da Frecha da Mizarela vê-se a água a mergulhar no abismo de uma altura apontada em 97 metros.

A vertigem branca do rio Caima que ali se precipita parece distante na pressa de ver a aldeia de Ribeira, assinalada na paisagem por socalcos, e hoje com apenas dois habitantes, já de idade avançada.

«O desnível do rio não foi resultado de uma falha tectónica», assinala Daniela. Criado por ele próprio, quando sai do domínio do granito da serra da Freita «encontra um leito mais ma-cio» esboçado em xistos e grauvaques. Isso faz com que se atire na vertical face à erosão fl uvial ali cavada de supetão. O rio Caima, o único da serra a procurar o sul, avança no fi to de encontrar um irmão maior, o rio Vouga.

Além da arriba, distante, vê-se a aldeia de Castanheira, ligada ao afl oramento das conhe-cidas pedras-parideiras.

Pedra-mãe«Traga por favor uma dúzia de pedras-pa-

rideiras», diz António Carlos Duarte, coorde-nador executivo da Associação Geoparque Arouca.

Os doces chegam à mesa, apetitosos, de-senhados pela generosa culinária regional. Brancos, tornaram-se irresistíveis: uma trinca dá para saber que são rijos mas nem por isso perdem encanto, à maneira do nome que evo-ca o fenómeno geológico único no mundo das pedras que dizem parir pedra.

Os mitos de fertilidade são referidos por

Ângelo Campelo, presidente da associação: «A fé é que nos salva», destaca, e continua: «Há casais que têm difi culdade em ter fi lhos que procuram estas pedras como estímulo de fertilidade». A natureza cria expectativas ao ser humano e este interpreta-a à sua maneira.

Presentemente, Ângelo Campelo crê que «as pessoas chegam ali e sentem-se desen-quadradas». Por isso, uma solução vem a ca-minho: «Dentro de dois anos, conta-se que já esteja a funcionar no local o centro de interpre-tação das pedras-parideiras, numa casa que já lá existe». Feita a adaptação do imóvel rústico, estarão à disposição dos visitantes explicações para o singular fenómeno.

«O fundamental está feito: adquirimos o imó-vel», afi rma Campelo, sublinhando que «está em curso a candidatura no âmbito da gestão activa de espaços protegidos».

A aldeia de Castanheira fi ca perto. Ali, os muros dos campos mostram concavidades in-vulgares. Cada minicratera é o nicho de onde saiu uma pedra-parideira. No chão rochoso há outros nódulos revestidos de mica preta que ainda não se soltaram do granito.

Afi nal, como compreender este fenómeno que oscila entre rocha-mãe e pedras-fi lhas?

Daniela Rocha recapitula: «Estamos perante um corpo granítico, com a diferença que este tem nódulos», as tais pedras-fi lhas. «Ao con-trário do que as pessoas pensam, formaram-se ao mesmo tempo que a rocha-mãe», mas, alerta a geóloga, as pedras-parideiras «não são constituídas pelo mesmo mineral na totalidade: a capa externa é de mica preta, enquanto o núcleo interno é de quartzo e de feldspato».

Estas pedras assim nascidas variam «desde

o tamanho de um até doze centímetros». E como saem essas pedras da rocha? Esse

efeito tem a ver «com fenómenos erosivos» re-cebendo destaque «as diferenças de tempe-ratura que se fazem sentir. Temos uma rocha clara onde estão intruídos nódulos escuros. No Verão o sol aquece mais os nódulos escuros», o que «provoca uma dilatação dos mesmos. À noite, com o frio, passa-se o contrário». É este o principal factor, a que se ligam outros even-tos: «Se houver enxurradas encontramos mais nódulos soltos».

Um dos problemas que este local ainda sen-te é a pilhagem: «A cultura do levar nunca foi reprimida – há o mito da fertilidade associado a estas pedras especiais. Para outros será a posse, a vaidade de poderem dizer «Tenho uma em casa!».

Em suma, «as pessoas devem encarar este sítio como um monumento da natureza. Ele só existe aqui». Não há em mais lado nenhum do mundo, «é um corpo de 800 por 600 metros – se quem cá vier levar uma pedra, mais cedo, ou mais tarde, muito poucos nódulos restarão aqui», diz Daniela. Podem sempre levar, pela sustentabilidade, uma fotografi a ou, dentro de algum tempo, uma réplica.

Projecto de todosO Geoparque Arouca estende-se ao longo

de 328 quilómetros quadrados. Com 41 sítios de interesse geológico identifi cados, os cha-mados geossítios, não consegue limitar-se às paredes de um museu. A céu aberto, há uma rede de 13 percursos pedestres devidamente assinalados que unem estes locais.

A ideia do Geoparque começa em Artur Sá,

Pedras-parideiras ou granito nodular da Castanheira

REPORTAGEM 45

Nesta casa, na aldeia de Castanheira, será instalado o centro de interpretação das pedras-parideiras

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paleontólogo, da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, que «falou sobre esta realidade num seminário que se realizou em 2005 e apontou este projecto como uma forma de impulsionar o desenvolvimento do turismo», lembra António Carlos Duarte.

O Município de Arouca agarrou a sugestão e gizou o projecto: «Formou-se a equipa cien-tífi ca que fez o inventário geológico» num par de anos. Era necessário um rosto institucional e foi assim que surgiu a Associação Geopar-que Arouca, cujo presidente é nomeado pela autarquia.

As características do Geoparque hoje fazem com que todos o sintam seu. Os pormenores da adopção de nomes na doçaria — o doce pedra-parideira — e, num restaurante, o que-bra-luz em forma de trilobite são indicadores do justifi cado orgulho local.

A associação assenta a sua actividade nes-tas traves-mestras: «Há três grandes objecti-vos: trabalhar a geoconservação, a educação

para a sustentabilidade ambiental e o turis-mo».

Pedra-broaO mato rasteiro abre veredas nesta parte

do planalto de Albergaria da Serra, rumo a um amontoado de rochas graníticas adiante. À medida que nos aproximamos mais crescem.

Daniela Rocha guia o grupo: «Já as vi, estão ali à frente». A geóloga faz questão de mos-trar nestas páginas rochas peculiares, no caso, com textura de… broa.

Nunca tal vira. Desconhecendo-as, para mim afi guravam-se a grandes bolas rochosas, como se um gigante tivesse querido juntá-las dando espaço ao cultivo precioso das plantas bravas da região, até que... eis que se faz luz: a poucos metros, lá está o fenómeno, uma au-têntica textura de broa na face vertical de um bloco granítico. Cínica, a grande pedra não permite uma dentadinha, nem por ali chegar-mos à hora do almoço.

A explicação científi ca quer diluir ilusões so-bre a origem das formas, mas o tema carece de mais estudos: «É um bocadinho discutível. Sabe-se que este aspecto de broa está intima-mente relacionado com as zonas de fractura do granito e este tipo de formas aparece sempre em granitos equigranulares, ou seja, os grãos que os constituem têm todos mais ou menos a mesma dimensão, sejam eles de quartzo ou de feldspato».

Meia dúzia de passos nos blocos e vê-se o fenómeno em fase anterior num penedo vizinho: «Este granito está fracturado na ver-tical. Deste lado e do outro está a formar-se a chamada indentação. É uma fractura cada vez mais profunda que, mais tarde, dá este efeito».

O sol brilha num céu azul e as turfeiras vizi-nhas são esponjas naturais encharcadas, ca-pazes de ao longo do ano soltarem a água por ribeiros à procura de rios como o Caima ou o Paivô. Por isso há que conservá-las em bom

Daniela Rocha, geóloga, explica a formação da pedra-broa: «Sabe-se que este aspecto de broa está intimamente relacionado com zonas de fractura do granito» Ao longe, as peculiares pedras-broa

Muro rústico construído com partes da pedra-mãe

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Na aldeia de Castanheira já foi comprada a casa que servirá de centro de interpretação das pedras-parideiras

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estado, evitar fogos e outra degradação a favor da água pura.

Está cheia dela a serra da Freita! Este ano, além da chuva, os nevões visitaram-na múlti-plas vezes.

Nesta manhã, ainda sem fl or, os carquejais já estão em botão. Dentro de um mês as coro-las amarelas destas plantas mudarão a cor do relevo para se oferecerem ao sopro mágico do vento e dos insectos polinizadores.

Trilobites gigantesO Centro de Interpretação Geológica de Ca-

nelas, próximo de Arouca, alberga as maiores trilobites do mundo, tendo representadas 20 espécies.

O seu interesse não deriva só do tamanho descomunal: os fósseis destes animais mari-nhos hoje extintos rondam em média «cinco a dez centímetros», diz Manuel Valério, proprietá-rio do centro e entusiasta dos fósseis. Os que vemos são muito maiores!

A sua paixão por esta área vem de menino, quando na pedreira de lousa que hoje explora guardava o que ia encontrando para levar para a escola.

Hoje, as inúmeras visitas ao centro de inter-pretação demonstram o valor da mostra.

Os aspectos singulares são diversos. Como privilegiados, escutamos Valério sobre o com-portamento gregário das trilobites: «Não era impensável que as trilobites tivessem capaci-dade de se organizar em grupos. Mas este fós-sil veio tirar dúvidas — a curiosidade é que são sempre exemplares da mesma espécie mais ou menos do mesmo tamanho. Elas juntavam-se!». Isso quer dizer que eram animais mais complexos do que se pensava.

Ao explorar a pedreira, por vezes, abrir a ro-cha lembra «folhear um livro, onde cada peça conta a sua história».

Mais uns passos e «Morte súbita». Não há nenhum acidente. Trata-se do título de um grande fóssil de trilobite. O anfi trião explica:

«Esta morreu quando estava a mudar de ca-rapaça». Grande parte dos fósseis de trilobite representam apenas o revestimento externo, que tinham de abandonar para poderem cres-cer. Não é o caso deste exemplar: «A cabeça moveu-se. Terá morrido neste momento. É um dos poucos exemplares em que se vê isso. Neste caso é uma trilobite, o animal inteiro, não uma carapaça».

Especialista na matéria, Valério aponta os ór-gãos visuais do animal: «As trilobites são quem teve os primeiros olhos que apareceram na evo-lução da vida na Terra, embora diversas espé-cies não tenham chegado a desenvolvê-los».

Há mais sítios de interesse geológico no con-celho. Ao todo são 41! Entretanto, por estes dias o Geoparque Arouca aguarda a inclusão na Rede Europeia de Geoparques. Os peritos esti-veram no terreno e tudo aponta para isso.

Sobreposto o Geoparque Aoruca em grande parte à Rede Natura 2000, fi ca a deixa de que o sol ainda agora acordou.

Centro de Interpretação Geológica de Canelas

Espaço museológicoLocalização GPSLat. 40,96516 - Long. 8,214535HorárioDe 2.ª a sexta-feira10h00/12h00 e 14h00/17h00 Sábado e domingo das 15h00 às 17h00 www.cigc-arouca.com

Geoparque de Arouca

AGA - Associação Geoparque AroucaRua Alfredo Vaz Pinto4540 - 118 Arouca

Telef. 256943575 256940220

www.geoparquearouca.com

Evidência: as trilobites tinham comportamento gregário Uma das maiores trilobites do mundo – Manuel Valério chamou-lhe “Morte súbita”

Centro de Interpretação Geológica de Canelas >

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Num dia de sol aberto, Helena Granja rece-beu-nos na Universidade do Minho, onde é professora. Instalados num gabinete do De-partamento de Ciências da Terra, falamos dos estudos que hoje desenvolve sobre a zona costeira gaiense.

As suas respostas refl ectem a experiência de várias décadas de ligação a estudos do li-toral. Doutorada em geologia, a sua formação de base, especializou-se em geomorfologia e sedimentologia.

Está no início de um trabalho de diag-nóstico da costa de Vila Nova de Gaia. Em que contexto surge este trabalho?

Helena Granja — Recebemos uma pro-posta do Parque Biológico de Gaia no sentido de fazermos o acompanhamento do litoral do concelho de Gaia no âmbito de prever a evolu-ção daquele sector.

O objectivo é fazermos uma monitorização para termos uma base sólida que permita lo-calizar zonas de risco, sítios onde a erosão é grande, e apurar se o risco é médio, se é baixo ou elevado.

Essa pesquisa durará quanto tempo?H. G. — O trabalho começou no fi nal do ano

passado e decorre durante dois anos. Findo esse período, teremos uma ideia do que acon-tece nesse período, o que, é claro, não signi-fi ca que esteja esgotado o estudo, porque a evolução é contínua.

Quanto mais largo é o espaço de tempo, melhor para a investigação, por um motivo: a variabilidade nunca se faz sentir num ano, faz-se sentir num período grande.

Imagine que há dois ou três anos em que não existem grandes tempestades. As mudan-

ças não são muito importantes. Contudo, por vezes, num temporal podemos ter mudanças muito grandes e recuos da costa enormes. Portanto, quanto maior o tempo de observa-ção melhor. Nem sempre isso é possível por-que implica custos e estes processos têm de ser limitados no tempo.

A maior parte da população entende a praia como um espaço em que só vale a pena pensar para o Verão. Quer comen-tar?

H. G. — Penso que falta algum espírito de cidadania na população, de uma maneira ge-ral. Não quer dizer que seja culpa da popula-ção, mas isso ocorre porque os cidadãos não estão bem informados.

A praia, para a maior parte das pessoas, é um espaço que se ocupa no Verão.

Não importa como se faz o acesso nem a maneira como é utilizado, porque é simples-

mente um espaço de lazer. Os cidadãos tra-balham todo o ano. Nessa época, sentem que têm o direito de usufruir da praia.

Além deste, há outro problema, mais grave, que tem a ver com a densifi cação da ocupação com construções que cada vez mais ocupam a faixa costeira — isso é que traz problemas gravíssimos. Isto repercute no comportamento da faixa costeira, uma zona extremamente frá-gil que, no concelho de Gaia, é estreita.

Os sistemas dunares que existem estão an-tropizados, digamos assim.

Sendo uma zona frágil, nesta costa há, con-tudo, uma vantagem: possui afl oramentos ro-chosos. Isso faz com que haja uma protecção natural. Funcionam quase como quebra-ma-res, o que possibilita a ocorrência de uma taxa de evolução menos elevada do que nas praias em que não existe essa defesa natural.

Se reparar, a praia é toda recortada, com pequenas praias em ponta. Estas são resul-tado dos afl oramentos rochosos. Onde estes existem, a praia avança para o mar e, onde eles não existem, ela recua, pois não tem essa defesa. São zonas muito vulneráveis, mas, de qualquer maneira, ainda se têm aguentado, relativamente, com a pressão da ocupação, o que não acontece da Aguda para sul.

Os estudos em curso englobam a parte imersa e emersa?

H. G. — Sim. Estamos a estudar o sistema praia-duna, digamos a parte visível para quem passeia na praia.

Mas interessa-nos, também, colher dados sobre aquele espaço da plataforma continen-tal imersa em que as pessoas habitualmente tomam banho, e até mais além, pois pretende-

O Litoral de Gaia está na lupa de técnicos da Universidade do Minho e da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, coordenados por Helena Granja

Estudos costeiros

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mos ir até aos dez metros de profundidade. Porquê dez metros? H. G. — É que é nessa faixa que se fazem

sentir os processos de transporte perpendicu-lar à praia. Queremos apurar o comportamento dos sedimentos que vêm da zona imersa rumo à zona emersa e vice-versa.

A única forma de saber que sedimentos par-tem e que sedimentos vêm será integrar os es-tudos da zona emersa, com o conhecimento do que está debaixo de água. Essa tentativa está a ser feita com os colegas do Instituto Superior de Engenharia do Porto em colaboração com a Fa-culdade de Ciências da Universidade do Porto.

Uma equipa multidisciplinar está a trabalhar nisto, e é muito importante destacar esta ca-racterística, porque cada um contribui com o seu saber específi co, algo fundamental para o conjunto, sendo possível, depois, fazer um modelo digital do terreno.

Teremos então a situação de referência, ca-paz de descrever a evolução da área durante os dois anos de estudo. Aí perceber-se-ão as razões pelas quais se dirá que uma certa zona é de risco alto, médio ou baixo.

Que aparelhos usam nesse trabalho? H. G. — Não queria entrar em questões

muito técnicas, mas, para a parte imersa, usa-se um sonar, entre outros equipamentos. Este aparelho baseia-se na propagação de ondas sonoras que confi guram o fundo marinho. Na prática obtemos uma imagem que vai mostrar quais são as zonas mais baixas, as zonas me-nos baixas, se existem afl oramentos rochosos, se terá sedimentos…

Esses sedimentos são areia?H. G. — Não disse areia, intencionalmente.

Por vezes, não há areia mas, sim, seixos ou se-dimentos ainda mais fi nos do que os diversos tipos de areia, como os limos e as argilas. Isso reporta-se à parte imersa e o trabalho é ge-orreferenciado com GPS, o que permite saber a localização e a profundidade dos elementos descritos.

Basicamente, funciona assim: telecomanda-do, um catamaran transporta um equipamento ligado a sistemas informáticos que vão proces-sar os dados durante a execução do trabalho.

A recolha de dados decorre ao longo de 14 perfi s. Seria incomportável cobrir a costa toda.

Quanto à praia e duna, aí a cobertura é contínua. Realizamos o trabalho com apoio de um veículo todo-o-terreno que leva o equi-pamento, faz a cobertura da duna até ao limi-te da maré baixa, ao longo da praia, e capta imagens de vídeo, que podem ser usadas em estereoscopia, ou seja, iremos obter imagens tridimensionais.

É feita, também, a inspecção visual. Faz-se o percurso a pé e recolhem-se dados que, muitas vezes, passam despercebidos nesse tipo de trabalho, como pequenas alterações das microformas, uma ou outra modifi cação menos perceptível.

Imagine que vêm ventos fortes. Vamos ver o que se passa e aí podemos ter informação sobre as pequenas dunas que se reorientam em função dos ventos. Com o vento norte têm uma certa orientação, mas se houver dois dias de vento de sudoeste, elas reorientam-se. É interessante ver esses aspectos para perce-bermos como funcionam estes mecanismos a escalas temporais e espaciais diferentes.

Há, ainda, a fotografi a aérea de grande por-menor, que permite apurar a zonação da vege-tação associada às dunas. Com esses dados poderemos avaliar se a vegetação está em progressão ao longo das várias campanhas. Tentamos cobrir dois grandes períodos do ano: o pós-Verão e o pós-Inverno.

Os resultados deste trabalho não serão, pelo menos em parte, um conhecimento anunciado?

H. G. — Não necessariamente. Há grande variabilidade nestes processos costeiros. É uma zona muito móvel e tem uma dinâmica própria.

O que acontece nesta faixa costeira? Há um

entrave a leste que é a ocupação. A própria estrada não permite mais mobilidade, assim como as construções. Isso signifi ca que aque-le sistema praia-duna só se vai movimentar até onde pode. A praia vai fi cando mais estreita até que, eventualmente, poderá desaparecer.

Esse fenómeno já aconteceu noutros locais, nomeadamente em Esposende.

Esta é uma situação. Agora, veja-se o caso da Granja: já está com esse problema. Aí já só há afl oramentos rochosos. Isso acontece por causa do portinho da Aguda. Com ele surgiu um tômbolo, um grande triângulo de areia cuja ponta vai ligar a esse quebra-mar, cujo objecti-vo é funcionar como protecção para os barcos poderem entrar dentro do portinho. Isso fez com que o Parque de Dunas da Aguda, um local que já estava numa zona crítica de ero-são, hoje se encontre numa zona confortável. Aqui, a praia alargou face ao portinho. Como a corrente dominante vem de norte, o que aconteceu a sul da obra? Um défi ce grande em areia.

Essa carência de areais não tem a ver com as areias retidas por barragens?

H. G. — A minha opinião não é a de muita gente que trabalha nesta área. Sempre pugnei pelo direito à diferença de opiniões. Desde que justifi cadas, têm o valor que têm.

Estamos a falar da nossa latitude, do nosso país. Os rios, hoje, não têm caudais tão gran-des que justifi quem a exportação de sedimen-tos para o mar como aconteceu noutros pe-ríodos geológicos. Como se sabe, os nossos rios terminam em estuários, que apresentam uma fl echa arenosa a que se chama cabedelo. Os estuários são locais de aprisionamento de sedimentos e não de exportação de sedimen-tos. Há retenção de materiais que vêm tanto dos rios como do mar, que entram pelas bar-ras e que vão fechá-las - há assoreamento. É, também por isso, que há necessidade de fazer dragagens nas barras.

Já é diferente se houver uma cheia. Aí o rio

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tem um caudal acrescido. Veja-se o Inverno 2000-2001, que foi um período notório em que choveu muito. Os rios abriram os canais de saída e exportaram sedimentos para a costa, em grande abundância. Houve situações invul-gares, como a ligação da ínsua de Caminha a terra. Muitas das praias até encheram tempo-rariamente. Em situações de cheias importan-tes os rios continuam a exportar sedimentos.

É evidente que as barragens retêm sedimen-tos, mas não é isso que provoca o défi ce nas nossas praias, Os sedimentos vêm, em grande parte, da área imersa, razão pela qual agora tentamos saber o que se passa nessa faixa.

Não digo isto ao acaso. Campanhas de mergulho, feitas noutras zonas, mostram que a quantidade de areias disponíveis na zona sub-mersa é relativamente pequena, na proximida-de da costa, a zona trabalhada pela onda.

Mais para o largo, pode haver areia. Se as ondas não trouxerem esses sedimentos para a costa, não interessam para a praia, fi cam lá.

Estas praias estão relativamente cheias, mas deve-se ao contributo das dunas que estão em recuo e que estão a alimentar as praias. No concelho de Esposende verifi ca-se bem isso. A duna recuou e, por isso, a quantidade de areia daí proveniente foi alimentar as praias. Estas têm mais areia, mas é areia que vem da duna. É uma situação temporária que quando desaparecer… acabou. Ficou com menos areia na praia e menos areia na duna. São situações provisórias, em que parece que as coisas se estão a compor mas nem sempre é assim.

Essa instabilidade não será de agora. Há pessoas que pensam que não vale a pena qualquer preocupação porque sem-pre foi assim ao longo da história, o mar vai e volta.

H. G. — Há que saber viver na faixa costeira. Isso obriga a uma certa predisposição e a um certo conhecimento das pessoas, sobretudo dos gestores, para entenderem a faixa costeira como um valor em si e não pela parte edifi ca-da. É difícil as pessoas entenderem isso, so-bretudo quem tem interesses económicos na zona.

Diz-se «sempre aconteceu assim». Claro. É esse o comportamento das zonas móveis. Agora temos outros problemas que resultam da ocupação. Imagine a costa sem esse fac-tor: há ocasiões em que houve erosão mais acentuada, houve períodos em que houve mais acumulação, etc. Mesmo ao longo do ano — se esquecer por um momento as pessoas e as casas — se for a uma praia em situação de Inverno e depois no Verão, vai ver que os perfi s diferem muito. A praia ajusta-se aos dife-rentes factores que intervêm ao longo do ano, como qualquer sistema. O que faz com que esse ajuste não seja possível é exactamente existirem lá barreiras, algo que contraria essa movimentação natural.

Se pensarmos noutro tempo, na Idade Mé-dia ou no pós-século XVII, é evidente que hou-ve situações diferentes da actual. Por exemplo, entre o século XVII e o século XX houve uma grande acumulação de areias na faixa costeira, mas na alta Idade Média já haveria algumas si-tuações semelhantes às que estarmos a viver agora.

Há picos, não só climáticos, como das va-riações do nível do mar, que são naturais. A isto poderemos acrescentar agora os factores antrópicos, mas tudo o que acontece na costa é natural.

Contudo, há bens que fi cam sob ame-aça…

H. G. — Sim. Estive a ver o plano até 2013 para a zona costeira e estão previstas demoli-ções de casas que estão no domínio público marítimo. Esta é uma polémica que existe ao longo de toda a costa. Há casas que estão ac-tualmente nessa situação e que até nem esta-vam há uns anos, quando foram construídas.

Quando o mar avança fi ca na proximidade das habitações. Que fazer? Fazer demolições e permitir construção em situações de risco, como aconteceu em vários locais? Em Espo-sende, até no Porto, aquele edifício transpa-rente. São políticas que não funcionam coe-rentemente. Há aproximações diferentes a um problema que é comum e que tem de ser visto como um todo e não de forma parcelar.

O aquecimento global dá também um empurrão à subida do nível do mar?

H. G. — Está a entrar numa questão polé-mica. Não estou a dizer que não acredito, mas é controversa a questão em si. Há cientistas que o defendem, outros não. Há lobbies im-portantes.

Vamos ao relatório do IPPC (Painel Intergo-vernamental para as Mudanças Climáticas). É um painel de foro internacional e aponta real-mente cenários de subida do nível do mar, de-vidos, precisamente, a esse aumento de tem-peratura, previsível até ao fi nal do século.

Isso vai signifi car que em muitas zonas bai-xas – a admitir que esses cenários previsíveis são reais, porque podem ocorrer outros facto-res que intervenham e que vão contrariar tudo isso! – os problemas se multiplicarão. Imagine, por exemplo, uma nova Idade do Gelo. Há quem defenda que este aumento de tempera-tura pode reconduzir a uma nova idade do gelo precisamente por causa de mudanças introdu-zidas nas grandes correntes oceânicas. Mas isso é outra questão que nos afasta desta.

Se admitirmos como certos os dados do aquecimento, grandes sectores das costas, não só do nosso país como a nível mundial, vão fi car submersos. É um facto, e há que sa-ber viver com isso.

Em suma: deve ser feita uma chamada de atenção para os gestores da zona costeira para a necessidade de impedir a ocupação das faixas costeiras. Vai ser difícil gerir estas situações, a médio e longo prazo, porque isto potencia uma fonte de problemas de largo es-pectro: legais, económicos, sociais...

Algumas das praias vão perder o seu valor, enquanto praias. A razão que levou as pesso-as a concentrarem-se ali foi a existência de um valor patrimonial para usarem — a partir do momento em que a praia fi que degradada ou deixe de existir, fi que apenas o betão, acha que as pessoas vão gostar de estar ali? Não é por acaso que se vêem muitas casas à venda ao longo da faixa costeira.

Texto: JG. Fotos: João L. Teixeira

A equipa de investigadores utiliza diversos aparelhos para colheita de dados Catamaran dotado de sonar que prescruta o fundo marinho

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Apesar de extinto, há quem acalente a esperança de nalgum ilhéu cabo-verdiano ainda se conseguir ver o maior réptil do arquipélago, descrito por Bocage, o Macroscincus coctei, que chegava a atingir 60 centímetros de comprimento…

Alguns dos répteis endémicos de Cabo Ver-de têm as suas populações sob ameaça de extinção. Afi rma-o uma investigadora portu-guesa, Raquel Vasconcelos, do CIBIO da Uni-versidade do Porto.

Na sequência da pesquisa que empreendeu diz que «já estamos perante a extinção de uma dessas espécies».

Como seria de esperar, «desde que foi de-clarado extinto em 1915, voltar a encontrar o lagarto Macroscincus coctei transformou-se no Santo Graal de muitos herpetologistas»,

palavra que agrupa os estudiosos dos répteis e anfíbios.

Dezenas de expedições galgaram terreno na ideia de poderem reencontrar sobreviven-tes e assim apagar este réptil da lista da bio-diversidade perdida: «Eu própria fui à ilha de Santa Luzia, numa barca de pescadores com velas feitas de sacos de cereais, para procurar este sáurio especial», sobretudo depois de, em 2005, um investigador chamado Mateo garan-tir ter encontrado uma mandíbula de juvenil nas fezes de um gato».

Como se terá extinguido este escincídeo gi-gante?

As linhas de força estão à vista: «Os pes-cadores passam temporadas nos ilhéus, que não são habitados. Nas suas viagens, levaram para lá cães e gatos. Além disso, no passado comiam-nos e usavam a gordura de sáurios para fi ns medicinais. Isso pode ter ajudado à extinção». Mas, «mais grave, foi uma época de fome derivada de uma seca violenta ocorrida em 1833. Na altura, o Governo colonial por-tuguês exilou prisioneiros para esses ilhéus e

O menino que venceu o mito das terríveis osgas... Vulcão da ilha do Fogo: duas horas para subir, 10 minutos para descer

Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

ENTREVISTA 51

Em busca do gigante perdidoIlha de Santo Antão

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decerto que, esfomeados, comeram lagartos» para sobreviverem.

Outra ajuda para a extinção deste réptil da família dos escincídeos deve ter sido dada «durante os séculos XVIII e XIX», altura em que «eram uma raridade zoológica. Se não é o maior, é o segundo maior escincídeo mabuifor-me do mundo, e todos os museus da Europa queriam um!».

Os felinos também contribuíram para a ex-tinção. Animais de companhia dos pescadores durante as suas campanhas, os gatos torna-ram-se um novo e terrível predador, até hoje. Instinto mais aguçado que as garras, diante da gataria uma boa parcela de tudo o que mexe marcha do mundo dos vivos.

Clima duroRaquel Vasconcelos esteve nas dez ilhas de

Cabo Verde, onde as estradas, as poucas que existem, são complicadas.

O solo das ilhas é basáltico. A cor ocre é dada pelo óxido de ferro: «Algumas ilhas são tão antigas que tinham relevo e agora são pla-nas devido à erosão».

A paisagem típica de diversas ilhas é terri-tório deserto, quase destituído de vegetação. Para isso contribuem os anos coxos do seu clima, com uma estação seca garantida e nem sempre uma estação das chuvas capaz de dar um ar de sua graça.

Os registos novecentistas indicam que «os espécimes recolhidos há séculos terão vindo dos ilhéus Raso e Branco, e das proximidades da ilha de Santa Luzia».

No século XIX este gigante foi descrito pelos franceses «depois das suas invasões pilharem os exemplares de museu, em Lisboa, conser-vados em formol. Mais tarde, em França, ale-gavam não saber de onde teria saído aquilo». Quando Bocage, o conhecido naturalista luso, foi visitar o museu francês, este investigador achou que eram muito parecidos com os dele: «Os invasores devem ter pilhado parcialmente a

colecção». E assim redescreveu o género e re-solveu o enigma da proveniência deste sáurio.

Diga catorze Muito próximas do lagarto extinto ainda há

duas outras espécies do grupo dos escincí-deos, do tamanho do nosso lagarto-de-água, a que em Cabo Verde chamam lagartixas: o Mabuya vaillanti e o Mabuya spinalis.

Ao todo, contam-se neste momento 14 espé-cies de répteis no arquipélago de Cabo Verde.

Com vista a um maior conhecimento da lo-calização dessas populações Raquel Vascon-celos empreendeu uma investigação iniciada em 2006 durante a qual acumulou conheci-mentos fundamentais para a gestão de áreas protegidas em Cabo Verde.

Num percurso geológico, foram vulcões os responsáveis pelo surgimento do arqui-pélago, a cerca de 450 quilómetros da costa ocidental africana. Mesmo assim, sem que houvesse uma terra fi rme a ligá-lo ao conti-nente em qualquer altura — «o que permitiria

a passagem de fauna» —, Cabo Verde osten-ta muitos endemismos de terra fi rme, reunidos em osgas — Tarentolas e Hemidactylus — e escincídeos Mabuya. Não há serpentes.

«Na Macaronésia — Açores, Madeira, Ca-nárias — este arquipélago soma o maior nú-mero de taxa (não de espécies), se contarmos com as subespécies», sublinha a bióloga.

Impõe-se uma pergunta: Cabo Verde é já um destino para o turismo de natureza?

«Creio que sim», diz Raquel Vasconcelos e continua: «Este arquipélago oferece aos visitantes desde praias fantásticas, onde de-sovam tartarugas marinhas, um vulcão com cerca de 3 mil metros de altura, répteis gigan-tes, até caminhadas de montanha em Santo Antão e São Tiago...». Enfi m, «acho que Cabo Verde tem um potencial imenso».

Calcorrear caminhosRaquel torce para que «o turista descubra

este país não apenas pelas praias da ilha do Sal, mas que explore outras ilhas».

Não havendo bela sem senão, conclui: «Se

Destino: ilha de Santa Luzia, vela feita de sacos de cereais Raquel Vasconcelos percorreu 10% do território cabo-verdiano

Escincídeo: Mabuya vaillanti

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Osga, Hemidactylus lopezjuradoi: uma espécie nova descoberta entretanto Escincídeo: as dunas são um mundo em Cabo Verde

o turismo se tornar massifi cado destrói. São ecossistemas frágeis: «A pressão de cem turis-tas já faz uma diferença enorme, é preciso saber gerir isso».

Para Raquel Vasconcelos, cada período de trabalho de campo tinha um procedimento habi-tual: «Percorri 10% do território e recolhia amos-tras da cauda para fazer análises genéticas». Não é um problema para os animais: «a cauda volta a crescer». Para dizer quem é quem neste grupo de seres vivos não basta olhar: «Podem parecer uma mesma espécie e não o serem».

Foi assim que «o nosso grupo descobriu uma nova espécie em Cabo Verde, na ilha do Fogo: Hemidactylus lopezjuradoi».

Interessava um conhecimento geral: «Marca-mos no GPS cada recolha e, com o sistema de informação geográfi ca, registamos o que existe e onde existe. Tirando a excepção do Macros-cincus coctei não há quase estudos ecológi-cos».

Uma das metas da pesquisa empreendida consiste em apurar as razões que explicam a existência «desta e daquela espécie aqui e ali.

Interessa-lhes depois estabelecer as coordena-das de como conservar».

Estes dados são vitais para a optimização da futura rede de 46 áreas protegidas, nem todas para protecção de fauna e fl ora», já que há ine-gáveis pontos de interesse geológico.

Estas espécies são únicas no mundo: «Algu-mas restringem-se a um ilhéu de 7 quilómetros quadrados», pelo que «valorizam o património cabo-verdiano e podem até promover o turismo de natureza». Pode ser uma fonte de riqueza e de biodiversidade.

«Todas as espécies nativas são endémicas em Cabo Verde mas, por mão do homem ou não, chegaram ali outras espécies, em especial duas outras osgas que são invasoras».

Um dado já se evidencia: «Na ilha da Boavista onde estão umas não estão outras». Isso quer dizer alguma coisa, até porque estas osgas exó-ticas «já extinguiram outras espécies noutros lu-gares do mundo».

Tais répteis, para além de poderem vir a ser «matéria-prima de algum medicamento, são matéria de estudos biomecânicos: as osgas

conseguem subir vidro»! Quanto mais se estuda mais recursos se tornam disponíveis, «na en-genharia, alta competição desportiva, etc. Dali podem resultar conhecimentos viáveis para apli-cação em estruturas para uma bio-engenharia, feita pelo homem».

Sobre o apoio recebido os elogios abundam: «O povo cabo-verdiano foi fora de série. Pela simpatia e inclusive porque os meninos são ca-çadores natos». Ensinaram a Raquel técnicas para capturar répteis que desconhecia: «Por exemplo, há uma com um grão de catchupa, um prato tradicional à base de milho. Enlaçam o grão» como isco «e a fome é tanta que os escincídeos acabam por sair do muro em que se escondem».

Há outra, menos convencional, mas mais prática e de nenhuma maneira menos efi caz: «Também os capturam com cuspo. Cospem à saída dos buracos dos muros em que se es-condem as lagartixas — como eles chamam aos Mabuya — e estes acabam por sair para beber».

Dos répteis que acabamos de referir «não sentem medo. Mas têm bastante repugnância das osgas! Dizem que se tocarmos numa osga podemos fi car pelados. Há vários mitos, dife-rentes em cada ilha».

Receiam tocar-lhes: «Quando os meninos me viam em trabalho de campo, fazia sempre questão de perder uns minutinhos a explicar-lhes que aquela espécie de réptil é exclusiva das suas ilhas, única no mundo, que era mais cabo-verdiana do que eles, que já estavam lá antes deles, que era preciso respeitar estes animais». Uma das coisas que fazia era tocar na osga e desafi á-los a fazer o mesmo.

Depois, «como sou menina, eles tinham de se mostrar valentes».

Num país com tão poucos recursos naturais como Cabo Verde, «vale a pena apostar na con-servação do recurso mais valioso do arquipéla-go: a biodiversidade».

Fotos: Raquel Vasconcelos Texto: Jorge Gomes

Macroscincus coctei em aguarela de Silva Lino

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Outra luz no seu jardim Na Primavera criam-se condições para que a vida do seu jardim acelere e cresça como em nenhuma outra época do ano

O banho do pisco-de-peito-ruivo tem a ver com a importância de manter em bom estado as penas para se proteger do frio e ser senhor de um voo efi caz

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Another light in your gardenAnother light in your gardenIn Spring, conditions are created In Spring, conditions are created for the Natural life in your garden for the Natural life in your garden to accelerate and grow, as in no other season to accelerate and grow, as in no other season of the year. There are the secretive birds, of the year. There are the secretive birds, which hop round your garden and prefer which hop round your garden and prefer to nest in holes. Using ‘found’ holes in this to nest in holes. Using ‘found’ holes in this way was very common up to a few centuries way was very common up to a few centuries ago, when mature trees were excavated ago, when mature trees were excavated by the larvae of some insects, creating by the larvae of some insects, creating these small niches.these small niches.

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Mais luz, temperaturas amenas e humidade quanto baste são os condimentos para que os relógios biológicos dos seus vizinhos sel-vagens despertem e sigam o ritmo primaveril.

A maior parte das vezes estão mais perto de si do que poderia imaginar.

No lago que instalou, com uma exposição solar sufi ciente, reaparecem as rãs-verdes e os machos já se ouvem a coaxar. Saídos da letargia que os toma na estação fria, têm de voltar a alimentar-se de insectos, nem que sejam vespas ousadas e municiadas de fer-rão...

É nesse lago que vão beber os pássaros do quintal e, uma vez por outra, banhar-se, como aconteceu certa vez com um pisco-de-peito-ruivo apanhado em fl agrante à vontade.

Um local de passagem habitual torna-se um dado tão vulgar que ao deslocar-se ali próximo por estes dias nem vê o que aconte-ce nesse momento numa certa planta do seu jardim: na face inferior de uma folha acabam de eclodir vários ovos de uma pequena bor-boleta nocturna.

Sem sequer saberem o que é uma esco-la, as pequenas lagartas estão sincronizadas. Aprontam-se a sair dos ovos, adornados ma-tematicamente com estrias.

Sem livro de instruções, começam por co-mer a casca. Terão sido elas quem levou La-voisier a dizer que na Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma?

De parapente O passo que se segue é engenhoso, caso

não estejam as diminutas lagartas numa das plantas que lhes serve de alimento: quando o vento está de feição, lembram os navegadores quinhentistas, usam-no para voar – soltam um fi o de seda e, quase tão leves como o ar, dei-xam-se ir pela atmosfera. Hão-de cair próximo do alimento, dispersas, e aí tratarão de cres-cer em vários instares até que estejam prontas para se transformarem em crisálidas e, por fi m, surgirem passadas semanas com quatro pro-digiosas asas para, como insectos adultos, se reproduzirem.

Nem todas, contudo, terão esse êxito. Entre fungos, alguns invertebrados, répteis, peque-nos mamíferos e aves, muitas fi carão pelo ca-minho, cedendo a tenra vida para que outras se ergam dos ninhos em que medram.

Esta abundância que a Primavera suscita não é novidade. Os ritmos ditados pelo clima são conhecidos de todos os seres vivos e urge

dominá-los para lograr êxito na epopeia da so-brevivência.

Cantar ao nascer do SolAo amanhecer as aves do seu jardim dão

sinal de mais um despertar. E cantam. Uma mesma espécie pode fazê-lo de maneiras di-ferentes. Dizem os estudiosos que pode haver sotaques, como entre humanos, e até cantares ostensivamente diferentes entre, por exemplo, espécies de chapins de países diferentes...

De uma ou de outra maneira, ao cantarem avisam os rivais: o território está ocupado. Não se trata de um capricho, mas de uma neces-sidade. Há espaços mínimos necessários para que um casal de aves consiga criar a prole.

É também por isso que nesta época algu-mas espécies que antes víamos em bando – como os chapins-rabilongos – andam agora aos pares.

A quantidade de alimento necessária para as crias se não se encontra no território defendido proporciona riscos que não interessam. Para além da pressão das crias em receberem dos pais comida com frequência, ausentar-se do ni-nho durante maiores períodos de tempo pode deixá-lo mais vulnerável aos predadores, como

Uma série de ovos de borboleta acaba de eclodir

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Algumas das aves que saltitam pelo seu jardim gostam de ninhos em buracos, algo habitual até há alguns séculos, quando as árvores velhas escavadas pelas larvas de alguns insectos criavam esses nichos. Com o abate massivo dos bosques, rareiam

outras aves – pegas-rabudas, gaios, pica-paus – ou até, por exemplo, a uma cobra-de-ferradu-ra que ande também em busca de paparoca.

Cavernícolas Há aves que apreciam fazer ninho em bura-

cos. As andorinhas-das-barreiras, que agora re-gressam de África, são conhecidas por fazerem colónias em paredes verticais de saibro, onde es-cavam pequenos buracos, junto uns dos outros. Fazem o mesmo os abelharucos e os guarda-rios. Também os estorninhos se encaixam na fasquia das espécies cavernícolas e, por vezes, até um bloco de cimento esburacado é capaz de servir para a postura dos seus ovos azulados.

Outras aves mais discretas que essas e que saltitam pelo seu jardim também gostam de ni-nhos em buracos, algo habitual até há um par de séculos, quando as árvores velhas escavadas pelas larvas de alguns insectos criavam esses nichos. Com o abate massivo dos bosques, ra-reiam.

É aí que entram as caixas-ninho. Chapins-reais e azuis, chapins-carvoeiros e pardais-monteses são dos mais conhecidos.

As trepadeiras-comuns também são caver-nícolas, mas a caixa-ninho é mais específica e adopta uma forma diferente.

Outras aves gostam de fazer elas próprias os seus ninhos, muitos em forma de taça e com-postos por gravetos, penas e outros materiais aconchegantes.

Com umas e outras, não será difícil fazer do seu jardim um local aprazível para estes animais se hospedarem e lhe oferecerem o privilégio de assistir a algumas partes da história secreta das suas vidas.

Cartaxos, cria e mãe: quando a prole abandona o ninho continua ao cuidado dos pais

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Este tipo de caixa-ninho cai no goto a algumas espécies de chapim e pardais-montesesMaria Olinda Osório

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

BREVES 57

Com cerca de 2400 actividades, 5176 dele-gações e 120 mil participantes vindos de 150 países dos cinco continentes, teve lugar na ci-dade de Belém, no Estado de Pará, na Repú-blica de Brasil, o Fórum Social Mundial.

Conforme foi dito no Fórum, estas organiza-ções, de nações e povos sem Estado próprio, reuniu-se com o objectivo de viabilizar a reali-dade do seu povo, da sua luta pela autodeter-minação e para compartilhar propostas com o movimento altermundialização por outro mun-do possível.

Cada uma das nações e povos sem Esta-dos próprios tem uma realidade social muito diferente, vieram de lugares longínquos e têm também situações políticas diferentes. No entanto, todos compartilham uma vontade colectiva de liberdade e reconhecimento dos seus direitos colectivos como povos livres. Há direitos colectivos democráticos que não estão reconhecidos actualmente, e que muitas vezes estão na base das várias formas de violação dos direitos individuais.

O Fórum teve início com uma grande marcha realizada na tarde do dia 27 de Janeiro, que percorreu várias ruas da cidade de Belém.

O segundo dia do Fórum foi dedicado à Pan-Amazónia, onde foram apresentados di-versos temas regionais ligados aos “500 anos de resistência, conquistas e perspectivas afro-indígenas e popular.”

Os dias 29, 30 e 31 foram dedicados às ac-tividades autogestionárias, dispostas em três etapas, que foram apresentadas na forma de seminários, conferências, painéis e ateliers. É de destacar a apresentação do tema dedica-do à Agenda 21, organizada pelo Ministério

de Meio Ambiente do Brasil, onde foram de-batidas experiências de implementação desta Agenda em diversas partes do mundo.

Os senhores Carlos Minc, ministro do Am-biente de Brasil, o professor Vinod Raina da Universidade de Nova Deli, Sara Larrain, direc-tora do Desenvolvimento Sustentável do Chile, Arlindo Carvalho, director-geral de Ambiente de S.Tomé, Marie Stutz, responsável da Agenda 21 em França, Kathryn Kintzele do Programa da Biosfera nos Estados Unidos de América, apresentaram as suas experiências no proces-so de materialização da Agenda 21 nos seus respectivos países e continentes.

No decorrer do Fórum, foram ouvidas várias denúncias dos povos residentes na Amazó-nia sobre a destruição da fl oresta amazónica, nomeadamente a presença de grandes em-presas madeireiras na área, a desfl orestação para o cultivo de soja e cana-de-açúcar para a produção dos biocombustíveis, e a prática da pecuária. Também foi denunciada a prática de trabalho escravo que ainda se pratica nesta parte do território brasileiro.

Houve no decorrer do Fórum uma grande homenagem a Chico Mendes, morto por de-fender as fl orestas da Amazónia.

No grande acampamento onde se realizou o fórum, foi utilizada uma nova moeda prepa-rada especifi camente para o evento, chamada “AMAZÓNICA”, utilizada na economia solidária praticada no recinto do Fórum. O Real, moeda brasileira, era trocado pela Amazónica, muito utilizada pelos participantes.

Por Arlindo Carvalho, director-geral de Ambiente de São Tomé e Príncipe

Fórum Social Mundial Conservação da Natureza e Educação Ambiental

O Centro Cultural de Macedo de Cavaleiros recebe em 9 e 10 de Maio as X Jornadas sobre Conservação da Natureza e Educação Ambien-tal. Organizado pelo Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens (FAPAS) em parceria com a Câmara Municipal de Macedo de Ca-valeiros, este evento conta com conferências diversas. Umas abordam temas da zoologia à fl ora, outras dirigem-se a assuntos variados como a qualidade da água e o turismo, haven-do ainda oportunidade para os inscritos palmi-lharem alguns percursos e assistirem a ateliers da sua preferência. A data-limite para as inscri-ções é 27 de Abril. Mais: www.fapas.pt

Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos

A Comissão Directiva da Área de Paisagem Protegida das Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos aprovou uma proposta de alteração ao Código de Estrada, que prevê a possibilidade das entidades gestoras das vias rodoviárias na-cionais, regionais, municipais e vicinais poderem conferir prioridade aos animais que circulem ou simplesmente atravessem determinadas vias.

A medida promove os espaços naturais de valor no que concerne à fauna selvagem e aos espaços rurais com predominância de sistemas agro-pecuários de regimes extensivos.

No caso das vias vicinais e municipais, a competência para a atribuição de prioridade seria das assembleias municipais mediante pro-posta dos municípios e, no que respeita às vias regionais e nacionais, a competência seria da entidade responsável pela gestão das mesmas. A iniciativa de proposta partirá dos municípios.

A aceitação da proposta por parte do Go-verno e da Assembleia da República signifi cará uma revolução no processo de reconquista de muitos espaços rurais e naturais, valorizando a fauna própria dos respectivos habitats de ani-mais selvagens e de animais domésticos de uti-lização agro-pecuária ou silvopastoril.

A proposta vai ser enviada ao Ministério da Administração Interna, aos grupos parlamenta-res da Assembleia da República e à Associação Nacional dos Municípios Portugueses, para que seja adoptada como proposta de todos os mu-nicípios com Área Protegida no seu território. A

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Alice Branco e Manuel Silva

Ana Filipa Afonso Mira

Arnaldo José Reis Pinto Nunes

Bernadete Silveira

Carolina de Oliveira Figueiredo Martins

Carolina Sarobe Machado

Caroline Birch

Colaboradores da Costa & Garcia

Cónego Dr. Francisco C. Zanger

Dinah Ferreira

Dinis Nicola

Família Carvalho Araújo

Família Lourenço

Fernando Ribeiro

Francisco Saraiva

Inês, Ricardo e Galileu Padilha

Joana Garcia

Joaquim Pombal e Marisa Alves

Jorge e Dina Felício

José Afonso e Luís António Pinto Pereira

José António da Silva Cardoso

José António Teixeira Gomes

José Carlos Correia Presas

José Carlos Loureiro

José da Rocha Alves

José, Fátima e Helena Martins

Luana e Solange Cruz

Manuel Mesquita

Mário Garcia

Mário Leal e Tiago Leal

Paula Falcão

Pedro Manuel Lima Ramos

Rita Nicola

Rocha, Mota & Soares, SA

Sara Pereira

Serafi m Armando Rodrigues de Oliveira

Sérgio Fernando Fangueiro

Turma A do 8º ano (2008/09) da Escola EB 2,3

de Argoncilhe

Turma E do 10.º ano (2008/09) da Escola

Secundária de Ermesinde

Vânia Rocha

Cada dia que passa há mais empresas e cidadãos a confi arem ao Parque Biológico de Gaia o sequestro de carbono

O regulamento encontra-se disponível em www.parquebiologico.pt/sequestrodocarbono

Para mais informações pode contactar o Parque Biológico ou em [email protected]

Parque Biológico de Gaia, EEM • Projecto Sequestro do Carbono • 4430 681 Avintes – V. N. de Gaia

Nome do Mecenas

Telefone

Email

Endereço

Recibo emitido à ordem de

O Parque Biológico pode divulgar o nosso contributo NãoSim

Junto se envia cheque para pagamento Procedeu-se à transferência para NIB 0033 0000 4536 7338 053 05

apoiando a aquisição de euros.

Para aderir a este projecto recorte o seguinte rectângulo e remeta para:

1 m2 = € 50 = menos 4 kg/ano de CO2

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

AGIR 59

No dia em que a biodiversidade se fará ou-vir de uma forma mais acentuada em todos os cantos do Globo o Parque Biológico de Gaia presenteará tal tema com a apresentação públi-ca do projecto a desenvolver no futuro imediato. Não basta apenas passar as mensagens, há também que concretizar.

Alcançaram-se, com o apoio dos mecenas, os objectivos traçados para pôr em prática a pri-meira fase do compromisso “Confi e ao Parque Biológico de Gaia o Sequestro do Carbono” que integra o apoio à iniciativa do Countdown 2010 – Travar a perda da biodiversidade.

Será apresentado, a 22 de Maio, um novo espaço agro-fl orestal e o plano de intervenção e gestão da responsabilidade do Parque Bioló-gico. A execução terá início na próxima época outonal com o aproveitamento de plantas pro-duzidas nos viveiros do Parque Biológico.

A fi nalidade é desenvolver uma fl oresta es-sencialmente de protecção, tendo por base a escolha de espécies autóctones e folhosas (carvalho, sobreiro, castanheiro e azinheiras) que componham um povoamento misto e tra-gam consigo a função de recreio e paisagem. A densidade da vegetação é um factor impor-tante, visto que se pretende obter espaços fl orestais com copas grandes que permitam o abrigo dos animais e reúnam condições para a criação de parques de merenda ou percur-sos pela natureza e a adopção de compassos apertados pode constituir um elemento de va-lorização da paisagem.

Foi previamente efectuada uma avaliação geral dos recursos como o estado vegetativo e

sanitário do arvoredo já existente. É importante realçar que se irá adoptar por um calendário de intervenções silvícolas restrito, a fi m de se mi-nimizarem as perturbações dos ecossistemas que se pretendem conservar.

O combate às alterações climáticas é con-siderado o maior desafi o para a humanidade. Embora actualmente possam ocorrer espécies com funções semelhantes e aparentemente duplicadas, no futuro e por força cada vez mais do aquecimento global, fruto das múltiplas e diversas conjunturas, essas mesmas espécies poderão vir a representar utilidades únicas nos biomas terrestres e por consequência na so-brevivência da biosfera. A biodiversidade é por este motivo a base para o desenvolvimento sustentável. Salvaguarda o funcionamento dos ecossistemas (ciclo do ar, ciclo da água, ciclo da cadeia alimentar) de modo equilibrado. Um dos serviços mais importantes do ecossistema está relacionado com o ciclo do carbono. A ve-getação sequestra-o da atmosfera e converte-o em biomassa

Ao introduzir mais esta mancha verde no es-paço urbano, o Parque Biológico assume um papel suplementar de pequena reserva natu-ral, aumenta a diversidade fl orística e contribui para a atracção e fi xação da fauna, tornando-se a sua acção um contributo assinalável ao criar novos habitats seguros para as espécies residentes e migratórias. Relembre-se que o parque conta actualmente com 270 espécies de animais selvagens, e são mais de duas cen-tenas as espécies que compõem a fl ora.

Esta será a primeira tranche. Quando a exe-

cução do projecto estiver concluída, no fi nal do ano 2012, data prevista para o término do Pro-tocolo de Quioto, prevê-se que as 9000 árvores plantadas removam em média 920 toneladas de carbono por ano da atmosfera. Tomando como princípio que a capacidade de sumidouro de carbono de uma mancha fl orestal varia entre espécies, idade das árvores, existência ou não de vegetação rasteira, teor de concentração de CO2 existente na atmosfera, entre outros facto-res, contamos com a presença dos mecenas deste projecto, tanto particulares como empre-sas, assim como associações e instituições de ensino que apoiaram esta iniciativa e de ilustres convidados e outras entidades representativas. Serão entregues os respectivos Certifi cados de Garantia aos mecenas aderentes até à data. O programa e outras informações encontrar-se-ão brevemente disponíveis em: www.parquebiolo-gico.pt/sequestrodocarbono

O projecto “Confi e ao Parque Biológico de Gaia o Sequestro do Carbono” trata-se de um conceito único no país. É uma acção que se desenvolve através de um mecenato ambien-tal. A novidade está na forma como o Município através do Parque Biológico pretende criar esta mancha fl orestal fomentando o envolvimento da sociedade civil, visto que empresas e particula-res são convidados a adquirir parcelas de ter-reno. Não se trata do apadrinhamento nem da plantação de árvores isoladamente. O importan-te é criar fl oresta fornecedora de bens e serviços essenciais para a vida na Terra.

Por Vera Lima Afonso, engenheira fl orestal

Sequestro do carbono

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

O Tagis e o Museu Nacional de História Natural (MNHN) vão desenvolver neste Verão um estudo para a implementação no Parque Biológico de Gaia de uma Estação da Biodi-versidade.

Esta estação será um novo trilho sinalizado na área do parque, a percorrer os diversos ha-bitats característicos, com placards informati-vos ao longo do percurso sobre as espécies mais abundantes que podem ser observadas. Será dada particular atenção à diversidade de plantas e insectos, que são a base dos ecos-sistemas terrestres.

A Estação da Biodiversidade do Parque Bio-lógico integra-se num projecto mais amplo do Tagis e MNHN, que está a decorrer em todo o território nacional, em diversos municípios e também em áreas pertencentes à Rede Natura 2000.

Neste momento está já confi rmada a criação de uma Rota da Biodiversidade com a imple-

mentação de 30 estações de norte a sul do país: • Norte: Nogueira/Montesinho, Rio Sabor, Vi-

nhais, Baião, Montemuro, Matosinhos e Par-que Biológico de Gaia.

• Centro: Estarreja, Oliveira de Azeméis, Águe-da, Celorico da Beira, Sabugal, Sicó/Alvai-ázere, Gardunha, Ferreira do Zêzere, Abran-tes (2 estações), Mação e Cadaval.

• Lisboa e Vale do Tejo: Sintra, Odivelas e Bar-reiro.

• Alentejo: Mora, Monfurado, Odemira, Parque Natural de Noudar, Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina.

• Algarve: Loulé, Lagos e Caldeirão.A criação das estações da biodiversidade

permite conciliar actividades diversifi cadas, re-lacionadas com a valorização e protecção do património natural, nomeadamente educação e sensibilização ambiental, monitorização da biodiversidade ou ecoturismo.

A integração numa rede de estações permite por um lado desenvolver acções concertadas a nível regional e nacional, por outro uma troca fundamental de experiências adquiridas. A par-tir das observações registadas pelos visitantes das estações, torna-se também possível con-tribuir para a monitorização da diversidade bio-lógica do país, de extrema importância face às possíveis perturbações nos ecossistemas.

O trabalho de campo de inventariação da biodiversidade está a decorrer. Aguardem notí-cias nossas brevemente! Por Patrícia Garcia Pereira e Frank Pennekamp

O Spring Alive é um projecto de observação de aves, dirigido a todas as pessoas residentes na Europa que queiram participar.

Este projecto é dinamizado pelas organiza-ções parceiras da BirdLife International na Eu-ropa, que em Portugal é representada pela So-ciedade Portuguesa para o Estudo das Aves.

Com este projecto pretendemos conhecer as datas de chegada de algumas espécies de aves migradoras a cada país da Europa, na al-tura da Primavera.

Estas aves regressam ao nosso país, para fazerem o ninho e terem as suas crias, depois de passarem o Inverno em países mais quen-tes, a sul, nomeadamente no continente afri-cano. Os dados obtidos irão contribuir para o aumento do conhecimento sobre a migração das aves!

Temos como principal objectivo envolver as populações na celebração da migração de aves, pelo que quanto mais pessoas participa-rem maior será o sucesso do projecto. Todos podem participar e não é necessário ser um especialista em aves para contribuir.

Para mensageiros da Primavera foram es-colhidas quatro espécies-alvo para este pro-jecto, de hábitos relativamente cosmopolitas na Europa e de identifi cação fácil, e que estão presentes em todos os países participantes: a andorinha-das-chaminés, o cuco-canoro, o andorinhão-preto e a cegonha-branca.

Apesar da maior parte destas espécies se-rem comuns na Europa, e das suas populações serem numerosas e amplamente distribuídas, há alguns perigos para estes mensageiros da Primavera, destacando-se entre eles a perda de habitats adequados para estas aves.

Há diversas formas de contribuir para a sal-vaguarda destas espécies, como a construção de caixas-ninhos para o andorinhão-preto ou a sensibilização das pessoas para não destruí-rem os ninhos de andorinhas. Existem outras opções, como por exemplo tornar-se sócio/a de organizações como a SPEA, e incentivando outras pessoas a fazê-lo. Quantas mais pes-soas apoiarem o trabalho que desenvolvemos mais meios teremos para continuar a actuar em prol da conservação destas e, e de muitas

outras, espécies de aves. Mas para começar, que tal participar neste projecto?

Este projecto decorre todos os anos, desde 2006, durante os primeiros 6 meses do ano. Para participar tem apenas que enviar para o site do projecto a data referente à primeira vez que observou, neste ano, cada uma das espécies-alvo do projecto e o local dessa ob-servação.

Em 2008 participaram 28 países e obtive-ram-se 56 mil registos de observações. E este ano, com a sua contribuição podemos aumen-tar este número. Junte a família, amigos ou alunos e participe! Mais informações em www.springalive.net. As aves mensageiras da Prima-vera estão a chegar. Fique atento e participe no SpringAlive.

Por Vanessa Oliveira e Alexandra Lopes

SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das AvesAvenida da liberdade, nº 105 - 2º - esq.1250 - 140 LisboaTel.: 21 322 0430 / Fax: 21 322 04 [email protected] • www.spea.pt

Censo de aves primaveris

60 COLECTIVISMO

Na rota das estações da biodiversidade

Tagis – Centro de Conservação das Borboletas de PortugalMuseu Bocage – MNHNRua da Escola Politécnica, 58, 1250-102 LisboaTel. + Fax: 21 396 53 [email protected] • www.tagis.org

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Núcleo Português de Estudoe Protecção da Vida SelvagemParque Biológico de Gaia4430 - 757 AvintesTel. + Fax: 227 878 [email protected]

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Rola-brava: qualquer dia não há!O Núcleo Português de Estudo e Protecção

da Vida Selvagem, fundado em 1974 e inactivo durante os anos 90, continua a reorganizar-se e a procurar o seu espaço de afi rmação, na certeza de que, cada vez mais, é necessária uma grande associação de conservação da natureza em Portugal.

Entre as muitas preocupações do NPEPVS ressalta a legislação cinegética, que continua muito permissiva e, ao que parece, ainda o vai ser mais. Nomeadamente as épocas de caça não estão ajustadas à biologia das espécies,

como é fl agrante no caso da Rola-brava, que se pode caçar a partir de 15 de Agosto quan-do, nessa data, ainda há nidifi cação em curso e, muitas aves jovens, mal voam.

O mesmo acontece com outras espécies, como Patos e Galeirões, Galinhas-d´água e pombos-bravos.

Por isso, a Rola-brava tem vindo a diminuir fl agrantemente nas últimas décadas. O NPE-PVS irá promover, ainda este ano, uma acção em favor da Rola-brava. Apelamos a todos os que possam testemunhar a nidifi cação de

Rola-brava a partir de 15 de Agosto (de anos anteriores), que nos contactem. No próximo mês de Agosto, quem localizar ninhos em cria-ção na primeira quinzena, também nos deverá contactar com urgência.

A Direcção do NPEPVS

Parque para famíliasConcebido com o parecer técnico da Fa-

culdade de Motricidade Humana, foi inaugu-rado na manhã do passado dia 4 de Abril pelo Município gaiense, no espaço de merendas do Parque Biológico de Gaia, “Um Modelo de Parque”, na verdade, um ginásio ao ar livre.

A ideia, trabalhada pelos supermercados Modelo, tem em vista “promover o exercício

físico e actividades ao ar livre em família”. É por isso que este projecto supõe “três

áreas distintas — um parque infantil, um par-que sénior e jardim”, podendo os visitantes utilizar aparelhos de exercício físico e um cir-cuito.

De acordo com António Gomes da Silva, director da loja do Modelo de Avintes, “este

projecto é a prova viva do compromisso do Modelo para com as comunidades locais”.

O projecto liga-se a dezoito parques es-palhados por Portugal, resultando de uma parceria estabelecida entre os hipermercados Modelo, a Associação Portuguesa de Famí-lias Numerosas e a Faculdade de Motricidade Humana.

Um ginásio ao ar livre, agora no parque de merendas do Parque Biológico de Gaia

José Guilherme Aguiar representou o Município de Gaia e congratulou-se com a iniciativa, que “promove o exercício ao ar livre e em família”

COLECTIVISMO 61

Parques e Vida Selvagem Parques e Vida Selvagem Primavera 2009Primavera 2009

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

Por Nuno Gomes Oliveira

Entretanto, e no âmbito deste projecto, for-malizamos uma parceria com a Lello Editores para reedição do livro de Charles Darwin “A Origem das Espécies”, que está de novo nos escaparates desde 12 de Fevereiro.

“A Origem das Espécies” teve a primeira edição em português em 1920, da responsa-bilidade da Lello & Irmão, numa tradução do médico Dr. Joaquim Dá Mesquita Paúl. Teria outra edição portuguesa, em 1939, numa tra-dução de Lobo Vilela, e numa publicação da Editorial Inquérito, de Lisboa. A edição por-tuense de 1920 seria reeditada em 1961, em 1979 e agora.

Mas não é esta a única ligação de Darwin à região do Porto. Em Março de 1869 William Tait, comerciante residente no Porto, enviou a Charles Darwin exemplares de Drosophyllum lusitanicum (planta carnívora conhecida por Erva-pinheira-orvalhada ou Pinheiro-baboso, The Portuguese Sundew em inglês) tudo indi-ca colhidos na Serra de Santa Justa.

Em 12 de Março de 1869, da sua casa de Down, Darwin respondeu a Tait: “Rece-bi as suas duas cartas de 2 e 5 de Março, e realmente não sei como lhe agradecer su-fi cientemente pela sua extraordinária bonda-de e energia. Fico satisfeito por saber que os habitantes locais conhecem o poder da Dro-sophyllum lusitanicum para apanhar moscas, pois isto é tema dos meus estudos.

Tenho observado desde há muitos anos o método através do qual isso é efectuado, e os resultados produzidos por várias espécies de

62 BIBLIOTECA

Darwin e a região do PortoProssegue o projecto bibliográfi co “Raízes da História Natural de Portugal”, que reuniu já centenas de obras fundamentais para o conhecimento histórico da fauna, fl ora e paisagem de Portugal. Esse material está a ser trabalhado para dar origem a uma exposição e integrar a biblioteca do Parque Biológico.

Drosera, e pela maravilhosa Dionoea america-na, cujas folhas capturam insectos como se fossem uma armadilha para ratos.

Assim, estava ansioso para saber como se-ria o processo da Drosophyllum lusitanicum, e por isso pedi ao director dos Royal Gardens

em Kew que escrevesse, há alguns anos, para Portugal a fi m de me obter espécimes, mas não teve sucesso. Por isso, veja o grande favor que me fez. (...) E agora é a vez de ou-tros pontos na sua carta. Sou bastante igno-rante quanto a fetos e não posso classifi car o seu exemplar. A variabilidade dos fetos passa todos os limites. Respeitosamente, Charles Darwin”.

No seu livro “Plantas insectívoras”, publica-do em 1875, Darwin escreve a propósito da Drosophyllum lusitanicum: “Esta planta rara foi encontrada apenas em Portugal e, como me disse o Dr. Hooker, em Marrocos, obtive espécimes vivos graças à grande bondade do Sr. W. C. Tait e, depois, do Sr. G. Maw e do Dr. Moore. O Sr. Tait informou-me que ela cresce abundantemente nas encostas das colinas secas perto do Porto [Serra de Santa Justa], e que grande número de moscas adere às suas folhas. Este facto é bem conhecido pe-los habitantes locais, que lhe chamam “mata-moscas” e as penduram nas suas casas para esse fi m.”

A Drosophyllum lusitanicum (L.) Link (1806) foi inicialmente descrita por Lineu, em 1753, como Drosera lusitanica L. (1753). Em 1806 o Prof. Johann Friederich, do Jardim Botâni-co de Berlim, achou por bem integrá-la num novo género, Drosophyllum. Provavelmente Link colheu-a em Portugal na viagem que fez ao nosso país, entre Fevereiro de 1798 e Agosto de 1799, e que deu origem à magnífi -ca Flore Portugaise, que este ano comemora 200 anos e de que o Parque Biológico está a preparar uma edição comemorativa.

Drosophyllum lusitanicum

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

Por Jorge Paiva

Biólogo, Departamento de Botânica

da Universidade de Coimbra

[email protected]

Darwin e as plantas Charles Darwin (1809-1882) foi um “Contra-Corrente”, tal como Nicolau Copérnico (1473-1543) e Galileu Galilei (1564-1642). Copérnico acabou com o geocentrismo aristotélico, o que lhe valeu ser condenado por ir contra as “Sagradas Escrituras” (Josué 10: 13)

Praticamente um século depois, Galileu ao estar de acordo com o heliocentrismo mode-lado por Copérnico (“Da revolução de esferas celestes”; 1543), foi condenado, tendo sido obrigado, já septuagenário, a abjurar de joelhos perante o Tribunal do Santo Ofício Romano (In-quisição); Darwin acabou por renunciar ao cria-cionismo (fi xismo) e ao antropocentrismo base-ados no Génese bíblico. A Ciência demonstrou que qualquer um deles tinha razão. Os princí-pios básicos do evolucionismo ou darwinismo, como lhe chamou, em 1889, Alfred Wallace (1823-1913), estão, actualmente, bem estabe-lecidos por vários ramos da Ciência (Biologia,

Geologia, Bioquímica, Anatomia, Embriologia, Paleontologia, Biogeografi a, Climatologia, etc.). O evolucionismo não é, pois, uma teoria, mas sim um fenómeno natural. Com a Genética, Bio-química e Biologia Molecular comprovou-se que além da selecção natural, que não actua (feno-tipicamente) sobre caracteres adquiridos, mas sim através de variações e mutações genéticas, são também extremamente relevantes factores evolutivos, como recombinações genéticas, mi-grações diferenciais, a deriva genética e diversos mecanismos de isolamento (neodarwinismo). Actualmente, com um melhor conhecimento dos organismos simbióticos, considera-se que a evolução ocorre não só através de processos competitivos, mas também cooperativos, como é a simbiogénese (pós-neodarwinismo).

Charles Darwin, quando iniciou a longa viagem do Beagle era fi xista, mas quando a fi ndou já era “transformista”, ou seja, evolucionista, como o testemunha o diagrama (“árvore evolutiva”) que ele desenhou em 1837 (6 meses depois do re-gresso a Inglaterra), baseado na estrutura rami-fi cada de uma rodófi ta (Amphiroa orbignyana) que colhera nas costas coralígenas da Améri-ca do Sul. Demorou muitos anos a publicar a primeira edição da “Origem das Espécies”, não por receio das críticas e consequências, como muitas vezes se tem escrito e dito, mas porque queria ter a certeza de ter dados comprovativos que explicassem cientifi camente as “transmuta-ções” (designação que ele atribuiu às variações específi cas). A Selecção Natural foi a essência de todas as suas argumentações.

Darwin foi um investigador e naturalista incan-sável, bastando referir que, durante a viagem do Beagle, colheu 1529 espécies conservadas em líquido, 3907 peles secas e etiquetadas, ossos, fósseis e cerca de 2600 espécimes de plantas. Foi um cientista de grande mérito (escreveu mais de uma quinzena de livros e mais de duas centenas de artigos), muito culto, tendo tido o cuidado de não só se manter actualizado com

o que se publicava sobre as Ciências da Terra, como também manteve constante diálogo e correspondência (escreveu cerca de 14500 car-tas) com muitos cientistas contemporâneos.

Como o próprio Darwin dizia, teve a sorte de ser uma pessoa rica, não tendo necessidade de trabalhar para o sustento familiar, o que lhe con-feriu imenso tempo para as suas investigações, assim como também não perdeu tempo em reuniões e actividades da vida em sociedade, por ser um doente que pouco saía de casa.

Foi, assim, que Charles Darwin se tornou numa fi gura marcante, não só cientifi camente, como também fi losofi camente, tendo-lhe sido conferidas, em vida, numerosas honrarias e prémios, como o doutoramento Honoris Causa pela Universidade de Cambridge, Professor Ho-norário do Instituto Livre de Ensino Universitário (Espanha) e membro honorário de 75 Socieda-des Científi cas britânicas e estrangeiras. Foram-lhe erigidas várias estátuas e dado o seu nome a uma cidade (Austrália), a uma Instituição de Investigação Científi ca (Galápagos), a um Insti-tuto Botânico (Argentina), a um Parque Natural (Austrália), a formações geomorfológicas (Ga-lápagos e América do Sul), a uma revista cien-tífi ca e epítetos científi cos a muitas espécies e variedades de animais, plantas e fósseis. Está sepultado na Abadia de Westminster, a alguns metros de Newton.

As plantasA preparação naturalista de Charles Darwin

iniciou-se, praticamente, com a sua infância escolar, em deambulações pelo campo, co-leccionando insectos, conchas minerais e rochas. Depois, ainda muito jovem (16 anos), Darwin aprendeu não só a observar e prepa-rar plantas, como também animais, quando foi para a Universidade de Edimburgo para cursar medicina. Aí frequentou a disciplina de História Natural ministrada por Robert Ja-

CRÓNICA 63

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

meson e trabalhou com o taxidermista John Edmonston, um antigo escravo, que o ensinou a embalsamar. Quando, com 18 anos, foi para a Universidade de Cambridge, a preparação teórica e prática que lhe foi conferida pelo pro-fessor de botânica Steven Henslow, foi crucial para os trabalhos de botânica que desenvol-veu posteriormente. Finalmente, os constan-tes contactos que manteve toda a vida com botânicos dos Royal Botanic Gardens de Kew, particularmente com Joseph Hooker (director de Kew 1865-1885), o cientista a quem, pri-meiramente, expôs por escrito (carta de 14 de Julho de 1844) que estava convencido que as espécies não eram imutáveis e que tinha en-contrado a explicação para o processo como as espécies se adaptavam aos respectivos meios (aqui ainda não utilizou o termo “Selec-ção Natural”). Este botânico foi o que estudou uma grande parte das plantas colhidas por Darwin durante a viagem do Beagle. É elucida-tivo desses contactos o que Darwin refere na “Origem das Espécies” (“On the origin of spe-cies by means of natural selection, or the pre-servation of favoured races in the struggle for life”; 1859) sobre a semelhança que J. Hooker detectou entre a fl ora da ilha Kerguelen (locali-zada entre a África do Sul e a Austrália) e a da Nova Zelândia e a da Terra do Fogo, e não com a de África, mais perto do que a Terra do Fogo. Nessa altura, nada se sabia ainda sobre a deri-va das placas continentais e que a América do Sul estivera unida à Austrália e Nova Zelândia. Assim, Darwin admitiu que sementes teriam sido transportadas por “icebergs” da Terra do Fogo até à Nova Zelândia, como lhe sugeriu C. Lyell professor de geologia em Cambridge, cujos “Principles of Geology” (1830) Darwin lera durante a viagem (27.XII.1831 – 2.X.1836).

Darwin não colheu plantas apenas durante a viagem. Também herborizou na Grã-Bretanha, tanto que os espécimes mais antigos colhidos por ele são de Agosto de 1831, em Barmouth,

no País de Gales (Grã-Bretanha). Trata-se de uma colecção depositada no Herbário (CGE) do Christ’s College (Universidade de Cambrid-ge), pertencente a Malcolmia sinuata, uma Crucífera (família das couves).

Durante os cerca de 5 anos da viagem, Darwin colheu mais de 2600 espécimes de plantas montadas em 950 folhas de herbário, arquivadas no Herbário da Universidade de Cambridge (CGE), não contando com as colhi-das na Grã-Bretanha e as pequenas colecções arquivadas em BM; COL; E-GL; GOET; IH; K; MANCH; MO; NY; P e U. Muitos desses espé-cimes são exemplares tipo das várias espécies novas que ele colheu.

Darwin não herborizava de modo indiscrimi-nado, embora ele afi rme que o fez nas Galápa-gos (…the voyage of H. M. S. Beagle round the world...” ;1839), pois os seus cadernos de notas estão repletos de comentários botâni-cos, assim como nalguns dos livros que pu-blicou, alguns exclusivamente sobre plantas, como “On the contrivances by which British and foreign orchids are fertilised by insects” (1862 e 1877, 2ª ed.); “On the movements and habits of climbing plants” (1865-1882); “The variation of animals and plants under domes-tication” (1868 e 1875, 2ª ed.); “Insectivorous Plants” (1875 e 1888, 2ª ed.); “The effects of cross and self fertilisation in the vegetable king-dom” (1876 e 1878, 2ª ed.); “Different forms of fl owers” (1877); “The power of movement in plants” (1880).

Darwin era um observador perspicaz, como é notório em qualquer destas suas obras botâ-nicas. É célebre a sua previsão sobre o tipo de borboleta que seria o polinizador das grandes fl ores brancas da orquídea Angraecum ses-quipedale, que James Bateman lhe enviara, em Janeiro de 1862. Esta orquídea é endémi-ca de Madagáscar (Darwin não viu esta orquí-dea nesta ilha, como muitos autores afi rmam, pois o Beagle nunca aportou em Madagáscar).

Darwin no capítulo V do referido livro sobre a fertilização das orquídeas pelos insectos (“On the contrivances …”) previu não só que a bor-boleta que polinizaria esta espécie seria noc-turna, como também teria de ter uma tromba (proboscide) extraordinariamente longa, pois esta fl or tem um esporão com cerca de 30 cm de comprimento, no fundo do qual está o néctar. Assim ele diz “…”As polinídias não serão

colhidas senão por uma enorme borboleta nocturna,

munida de uma tromba maravilhosamente comprida….”

E mais, ele previu não só que a borboleta se-ria também um endemismo malgache, como ainda que haveria uma interdependência entre as duas espécies (co-evolução ou “variação correlacionada”, como ele lhe chamava) “…o

desaparecimento da Angraecum seria provavelmen-

te uma perda para estes lepidópteros.” Cerca de 40 anos depois, em 1903, Lionel Rothschild e Karl Jordam descobriram, em Madagáscar, a referi-da borboleta polinizadora da Angraecum ses-quipedale, com a compridíssima tromba, que baptizaram cientifi camente com um epíteto re-ferente à previsão darwiniana: Xanthopan mor-ganii-praedicta. Aliás, esta previsão feita por Darwin foi aproveitada pelos criacionistas para combaterem as suas ideias evolucionistas. As-sim, 5 anos depois de Darwin ter publicitado a referida previsão, George Campbell publicou um livro (“The Reign of Law”; 1867), no qual se diz que uma espécie como essa, implicava ter sido criada por um ser sobrenatural.

Os livros que escreveu sobre plantas resul-taram não só da sua cultura literária (leitura e permuta de opiniões que fazia, por escrito e oralmente, com diversos botânicos e colecto-res), como também de observações e experi-ências que fazia na sua propriedade em Down. Assim, cultivou selectivamente (Selecção Arti-fi cial) cerca de 54 variedades de groselheiras e muitas de feijoeiros, ervilheiras e couves. Procedeu a interessantes experiências, parti-cularmente com plantas insectívoras, como as

Angraecum sesquipedale Xanthopan morgani-praedicta

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

que descreve com Drosera rotundifolia (“In-sectivorous Plants”), colocando, entre outros produtos, pequeninos nacos de carne sobre as folhas; ensaios sobre auto-polinização e polinização cruzada, como as que descreve com Linaria vulgaris (“The effects of cross and self fertilisation…), uma Escrofulariácea (família das bocas-de-lobo) e com orquídeas (“On the contrivances…”); no estudo da heterostilia das fl ores de algumas plantas, como, por exemplo, de Lythrum salicaria, a salguerinha, e de Pri-mula vulgaris, o pão-de-leite (“Different forms of fl owers”); na pesquisa de entendimento dos movimentos e nastias das plantas (“On the mo-vements and habits of climbing plants”) e (“The power of movement in plants”); etc.. Na sua publicação sobre a viagem do Beagle (”Journal of researches into the natural history and geo-logy of the countries visited during the voyage of H. M. S. Beagle round the world.”; 1839) há observações botânicas notáveis, ainda hoje actuais, tais como algumas referentes à fl ora endémica das Galápagos: “Se olharmos agora

para a fl ora descobriremos que as plantas aborígenes

das diferentes ilhas são surpreendentemente diferentes.

Apresento o conjunto dos seguintes resultados valendo-

me da sólida autoridade do meu amigo Dr. J. Hooker.

Tenho de antecipar que recolhi indiscriminadamente to-

das as fl ores encontradas nas diferentes ilhas, e que por

sorte mantive as minhas colecções separadas… Seja

como for, os meus quadros mostram o facto deveras

espantoso de que na ilha James, das trinta e oito plantas

galapaguinas, ou das que não se encontram noutra parte

do mundo, trinta estão exclusivamente confi nadas a essa

ilha; e na ilha Albemarle, das vinte e seis plantas galapa-

guinas aborígenes, vinte e duas a ela se confi nam; isto

é, só se conhecem até hoje quatro que crescem noutras

ilhas do arquipélago; e assim por diante… A Scalesia,

notável género arborescente das Compostas, confi na-se

ao Arquipélago. Tem seis espécies; uma da Chatham,

uma da Albemarle, uma da ilha Charles, duas da ilha

James, e a sexta de uma das três últimas ilhas,… ne-

nhuma destas seis espécies se cria em duas ilhas.” Ou ainda a sua origem americana: “O Dr. Hooker faz-

me saber que a fl ora tem um carácter indubitavelmente

americano ocidental; do mesmo modo, não detecta nela

qualquer afi nidade com a fl ora do Pacífi co.” Na realida-de, actualmente, tudo isso se confi rma, sendo Scalesia um género endémico das Galápagos, com 6 espécies, 5 de autoria de J. Hooker (S. affi nis, S. darwinii, S. gummifera, S. incisa e S. pedunculata) e 1 de G. Arnott (S. atractyloi-des), todas tipifi cadas por exemplares colhidos por Darwin.

A pesquisa de uma explicação plausível para a maneira como as plantas colonizaram as ilhas oceânicas foi uma das suas preocu-pações, como assinala nalgumas publica-ções, como, por exemplo, na “…the voyage of H. M. S. Beagle round the world.” ”Assim,

a fl ora da Madeira parece-se, até certo ponto, com a

extinta fl ora terciária da Europa.” e nalgumas car-tas, como, por exemplo, na resposta que en-viou ao açoriano Francisco Arruda Furtado, a

3 de Julho de 1881 “Se fosse possível, visitaria e

faria recolhas em uma ou várias das ilhas mais distantes

e compararia as plantas e animais com os das outras

ilhas….Devem recolher-se as amostras de todas as

plantas e animais dos pontos mais altos das montanhas

de todas as ilhas…..Existe algum farol nos Açores? Se

existir, provavelmente, haverá por vezes aves terrestres

que voam contra o vidro e morrem. Se assim for, seria

aconselhável examinar não só as suas patas e bicos em

busca de terra, mas também retirar todo o conteúdo

dos seus canais alimentares e observar a existência de

sementes que possam vir a germinar. Se assim acon-

tecer, deixar crescer as plantas e identifi cá-las….O mar

costuma arrastar árvores com raízes até à costa? Se

assim for, as raízes devem ser separadas e qualquer

vestígio de terra, entre elas, deve ser lavado e colocado

em terra queimada e humedecida em areia pura, sob

um campânula de vidro, para que se possa observar se

essa terra inclui algumas sementes vivas….Após ventos

muito fortes,... valeria talvez a pena procurar, entre o lixo

arremessado para a costa, sementes, insectos, etc.”

Numa resenha como esta, não é possível re-ferir todas as observações e estudos que Da-rwin efectuou com plantas, que foram numero-sas, embora ele tivesse estudado e publicado mais sobre geologia e zoologia.

Há muitas espécies de fósseis, animais, fungos e plantas, cujos nomes científi cos têm restritivos específi cos ou de variedades em ho-menagem a Charles Darwin. Como botânico que somos, apresentamos uma lista de nomes científi cos de plantas dedicados a Darwin.

Borboleta da família dos Esfi ngídeos (Hyles livornica) a libar esporas-bravas nas dunas (Linaria polygalifolia)

CRÓNICA 65

João Luis Teixeira

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Parques e Vida Selvagem Primavera 2009

66 CRÓNICA

Briófi tas (avasculares)Frullania darwinii Gradst. & Uribe

Cormófi tas (vasculares)Abutilon darwinii Hook. f.

Acmella darwinii (D.M. Porter) R.K. Jansen

Spilanthes darwinii D.M. Porter

Allochlamys darwinii Moq. = Pleuropetalum darwinii Hook. f.

Asteriscus vogelii (Webb) Walp.

var. darwinii (Webb) Walp. = Nauplius daltonii (Webb) Wiklund subsp. vogeliii (Webb) Wiklund

Astragalus darwinianus Gómez-Sosa

Baccharis darwinii Hook. & Arn. = Neomolina darwinii (Hook. & Arn.) F. Hellweg

Berberis darwinii Hook.

Bonatea darwinii Weale = Bonatea cassidea Sond.

Calceolaria darwinii Benth. = Calceolaria unifl ora Lam.

Fagelia darwinii (Benth.) Kuntze

Carex darwinii Boott

Catasetum darwinianum Rolfe

Chiliotrichum darwinii Hook. f. = Nardophyllym darwinii (Hook. f.) A. Gray

Clinopodium darwinii (Benth.) Kuntze

Micromeria darwinii Benth.

Satureja darwinii (Benth.) Briq.

Coldenia darwinii (Hook. f.) A. Gray = Tiquilia darwinii (Hook. f.) A.T. Richardson

Galapagoa darwinii Hook. f.

Croton scouleri Hook. f. var. darwinii G. L. Webster

* Darwinia Raf. (1817) = Sesbania Scop.

* Darwinia Dennst. (1818) = Litsea Lam.

* Darwinia Rudge (1816)

Darwiniella Braas & Lückel = Stellilabium Schltr.

Darwiniera Braas & Lückel

Darwiniera bergoldii (Garay & Dunst.) Braas & Lückel

Trichoceros bergoldii Garay & Dunst.

Darwiniothamnus Harling

Darwiniothamnus alternifolius Lawesson & Adsersen

Darwiniothamnus lancifolius (Hook. f.) Harling

Erigeron lancifolius Hook. f

Darwiniothamnus tenuifolius (Hook. f.) Harling

Erigeron tenuifolius Hook. f.

Decalophium darwioniodes Turcz. = Chamelaucium ciliatum Desf.

Drosera darwinensis Lowrie

Eucalyptus darwinensis D. J. Carr & S.G.M. Carr

Eugenia darwinii Hook. f. = Pseudocaryophyllus darwinii (Hook. f.) Burret

Eustephia darwinii Vargas.

Fagelia darwinii (Benth.) Kuntze = Calceolaria unifl ora Lam.

Galapagoa darwinii Hook. f. = Tiquilia darwinii (Hook. f.) A.T. Richardson

Garcinia darwiniana Kesh. Murthy, Yogan. & Vasud. Nair

Gossypium barbadense L. var darwinii (Watt) J.B. Hutch.

Gossypium darwinii Watt

Gossypium darwinii Watt = Gossypium barbadense L. var. darwinii (Watt) J.B. Hutch.

Hebe darwiniana (Colenso) Wall.

Veronica darwiniana Colenso

Homoranthus darwinioides (Maiden & Betche) Cheel = Rylstonea darwinioides (Maiden & Betche)

R.T. Baker

Verticordia darwinioides Maiden & Betche

Hoya darwinii Loher

Huperzia darwiniana (Herter ex Nessel) B. Ollg.

Urostachys darwinianus Herter ex Nessel

Hymenophyllum darwinii Hook. f.

Laeliocatlleya x darwiniana Hort.

Lagopsis darwiniana Pjak

Lecocarpus darwinii Adsersen

Lippia darwinii Speg.

Neosparton darwinii Benth. & Hook.

Maihueniopsis darwinii (Hensl.) F. Ritter

Opuntia darwinii Hensl.

Tephrocactus darwinii (Hensl.) Backeb.

Micromeria darwinii Benth. = Clinopodium darwinii (Benth.) Kuntze

Myrtus darwinii Barnéoud

Nardophyllym darwinii (Hook. f.) A. Gray

Chiliotrichum darwinii Hook. f.

Nassauvia darwinii ( Hook. & Arn.) O. Hoffm. & Dusén

Panargyrus darwinii Hook. & Arn.

Neomolina darwinii (Hook. & Arn.) F. Hellweg

Baccharis darwinii Hook. & Arn.

Neosparton darwinii Benth. & Hook. = Lippia darwinii Speg.

Odontospermum vogelii Webb

var. darwinii Webb = Nauplius daltonii (Webb) Wiklund subsp. vogeliii (Webb) Wiklund

Opuntia darwinii Hensl. = Maihueniopsis darwinii (Hensl.) F. Ritter

Oxalis darwinii Ball

Panargyrus darwinii Hook. & Arn. = Nassauvia darwinii ( Hook. & Arn.) O. Hoffm. & Dusé

Pandanus darwinensis H. St. John

Pisonia darwinii Hemsl.

Pleuropetalum darwinii Hook. f.

Poa darwiniana Parodi

Polygala darwiniana A.W Benn.

Pseudocaryophyllus darwinii (Hook. f.) Burret

Eugenia darwinii Hook. f.

Rumex darwinianus Rchb. f.

Rylstonea darwinioides (Maiden & Betche) R.T. Baker

Verticordia darwinioides Maiden & Betche

Homoranthus darwinioides (Maiden & Betche) Cheel

Satureja darwinii (Benth.) Briq. = Clinopodium darwinii (Benth.) Kuntze

Micromeria darwinii Benth.

Scalesia atractyloides Arn.

var. darwinii (Hook. f.) Eliason. = Scalesia darwinii Hook. f.

Scalesia darwinii Hook. f.

Senecio darwinii Hook. & Arn.

Siegfriedia darwinioides C. A. Gardner

Spilanthes darwinii D. M. Porter = Acmella darwinii (D.M. Porter) R.K. Jansen

Tephrocactus darwinii (Hensl.) Backeb. = Maihueniopsis darwinii (Hensl.) F. Ritter

Opuntia darwinii Hensl.

Thelypteris darwinii L. D. Gómez

Tiquilia darwinii (Hook. f.) A. T. Richardson

Galapagoa darwinii Hook. f.

Coldenia darwinii (Hook. f.) A. Gray

Urostachys darwinianus Herter ex Nessel = Huperzia darwiniana (Herter ex Nessel) B. Ollg.

Urtica darwinii Hook. f.

Veronica darwiniana Colenso = Hebe darwiniana (Colenso) Wall.

Verticordia darwinioides Maiden & Betche = Rylstonea darwinioides (Maiden & Betche) R. T. Baker

Zinnia x darwinii Haage & Schmidt

A cinza, sinónimos;

(*) Nomes dedicados ao avô, Erasmus Darwin

Nomes de plantas dedicados a Charles Darwin

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Esta Primavera:

Parque Biológico - Abril: Parque de auto-caravanas

Parque Biológico de Gaia - Junho: Biorama

Parque da Quinta dos Castelos (Santa Marinha)

Reabilitação do Cordão Dunar de Gaia

Parque Botânico do Outeiro do Cornalhão (Crestuma)

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