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sociedade civil. Sugere aqui o autor que a doutrina militar do velho general é, em essência, idêntica à doutrina de segurança nacional elaborada pela Escola Superior de Guerra; e que cipa, de mais de 20 anos, a dou- trina militar do regime instau- rado em 1964. A tese de Cam- pos Coelho é bem· clara (e não menos discutível): " ... o pen- samento de Góes Monteiro foi simplesmente retomado e reela- borado em função de uma nova conjuntura" (p. 105 ). E comentando as várias "cri- ses" por que o Exército passou, p.ex., em ·1954, 1955, 1961 e· 1964, afirma que, em síntese, '' ... sua integridade ( ... ) sem- pre se sobrepôs, ainda que nos últimos instantes, às rivalidades internas" (p. 115}. E foi nessa integridade que se baseou a Es- cola Superior de Guerra ( ESG)· quando da elaboração da Dou- trina da Segurança Nacional, cuja eficácia advém, fundamen- talmente, de seu potencial na produção de consenso dentro lias Forças Armadas ( ... } pois estas são órgãos essencial mente polfticos ... " (p. 165-6; grifas no original). Outro ponto essen- cial dessa doutrina é o binômio se g u r a n ç a -de se n v o I v i me nto, onde o primeiro termo deve ser entendido como um fator de produção indispensável ao de- senvolvimento, cabendo à orga- nização militar a produção des- se fator, isto é, ela deve parti- cipar cada vez mais na formação de políticas substantivas relacio- nadas ao desenvolvimento, daí sua interferência crescente na sociedade civil (p. 167). No" último capítulo, Descom- pressão: prospectos, o autor dis- cute a questão da chamada po- 1 ítica de reeducação cívica, apl i- cada a amplos segmentos do espaço social. Afirma que as estratégias de euforia progra- mada podem ser, para os seg- mentos ilustrados - políticos, intelectuais, estudantes e artis- tas - tópicos para irônicos epí- tetos ou para o discurso filosófi- co-moral, mas que isso não al- tera o fato de que o fenômeno da euforia constitui a resultante da aplicação eficaz de uma es- tratégia de legitimação da or- dem política implantada em 1964 (p. 176-7). E mais: que o " ... caráter autoritário e coer- citivo do regime não prejudica sua capacidade em gerar legiti- midade em amplos e impor- tantes segmentos da sociedade. Pelo contrário, razões para supor que, em certos segmen- tos, como o das classes popula- res, um nível alto de autoritaris- mo obterá significativa recep- ção ... " (p. 182-3). Muitos outros aspectos do trabalho de Campos Coelho me- receriam destaque. Entretanto, creio que os comentados já for- necem idéias básicas ao leitor intéressado em conhecer alguns ângulos sob os quais se a participação das Forças Arma- das na v·ida política brasileira. Seu Iivro, apesar de utilizar-se de uma bibliografia teórica ei- vada pelo ranço sistêmico e, conseqüentemente por jargões dos mais indigestos - tais como política de erradicação, hiber- nação, política da escassez, rela- cionamento simbiótico, - colo- ca-se muitos furos à frente dos autores que ultimamente vêm-se dedicando ao estudo da parti- cipação da organização militar na política nacional. Apesar de suas falhas, esse trabalho tem uma virtude crucial: é polêmico! Espera-se que outros o sucedam no tratamento de realidade po- 1 ítico-social tão complexa. O Afrânio Mendes Catani Coronelismo, enxada e voto (O município e o regime repre- sentativo no Brasil). Por Victor Nunes Leal. São Pau lo, Editora Alfa-Omega, 1976. / Coronelismo, enxada e voto de Victor Nunes Leal, publicado pela primeira vez em 1949, já se tornou um clássico da literatura 105 política brasileira, tanto que vem de ser reeditado pela Alfa- Omega, quase 30 anos após sua primeira edição. Tendo em vista a sua atual idade e o seu caráter fundamental para a compreen- são da realidade brasileira con- temporânea, passamos a resu- mi-lo. Nos capítulos primeiro e sé- timo, o autor conceitua o fenô- meno do coronel ismo conside-.. rando-o inicialmente "cor:no re- su Ita do da superposição de for- mas desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econômica e social inadequada. Não é, pois, mera sobrevivência do poder privado, cuja hiper- trofia constitui fenômeno tí- pico de nossa história colonial. É antes uma forma peculiar de manifestação do poder privado, ou seja, uma adaptação em vir- tude da qual os resíduos do nos- so antigo e exorbitante poder privado têm conseguido ·coe- xistir com um regi me pol (ti co Resenha bibliográfica

Resenha Coronelismo Enxada e Voto

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resenha do livro "coronelismo, enxada e voto" de Vitor Nunes leal

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  • sociedade civil. Sugere aqui o autor que a doutrina militar do velho general , em essncia, idntica doutrina de segurana nacional elaborada pela Escola Superior de Guerra; e que ante~ cipa, de mais de 20 anos, a dou-trina militar do regime instau-rado em 1964. A tese de Cam-pos Coelho bem clara (e no menos discutvel): " ... o pen-samento de Ges Monteiro foi simplesmente retomado e reela-borado em funo de uma nova conjuntura" (p. 105 ).

    E comentando as vrias "cri-ses" por que o Exrcito passou, p.ex., em 1954, 1955, 1961 e 1964, afirma que, em sntese, '' ... sua integridade ( ... ) sem-pre se sobreps, ainda que nos ltimos instantes, s rivalidades internas" (p. 115}. E foi nessa integridade que se baseou a Es-cola Superior de Guerra ( ESG) quando da elaborao da Dou-trina da Segurana Nacional, cuja eficcia advm, fundamen-talmente, de seu potencial na produo de consenso dentro lias Foras Armadas ( ... } pois estas so rgos essencial mente polfticos ... " (p. 165-6; grifas no original) . Outro ponto essen-cial dessa doutrina o binmio se g u r a n a -de se n v o I v i me nto, onde o primeiro termo deve ser entendido como um fator de produo indispensvel ao de-senvolvimento, cabendo orga-nizao militar a produo des-se fator, isto , ela deve parti-cipar cada vez mais na formao de polticas substantivas relacio-nadas ao desenvolvimento, da sua interferncia crescente na sociedade civil (p. 167).

    No" ltimo captulo, Descom-presso: prospectos, o autor dis-cute a questo da chamada po-1 tica de reeducao cvica, apl i-cada a amplos segmentos do espao social. Afirma que as estratgias de euforia progra-mada podem ser, para os seg-mentos ilustrados - polticos, intelectuais, estudantes e artis-tas - tpicos para irnicos ep-

    tetos ou para o discurso filosfi-co-moral, mas que isso no al-tera o fato de que o fenmeno da euforia constitui a resultante da aplicao eficaz de uma es-tratgia de legitimao da or-dem poltica implantada em 1964 (p. 176-7). E mais: que o " ... carter autoritrio e coer-citivo do regime no prejudica sua capacidade em gerar legiti-midade em amplos e impor-tantes segmentos da sociedade. Pelo contrrio, h razes para supor que, em certos segmen-tos, como o das classes popula-res, um nvel alto de autoritaris-mo obter significativa recep-o ... " (p. 182-3).

    Muitos outros aspectos do trabalho de Campos Coelho me-receriam destaque. Entretanto, creio que os comentados j for-necem idias bsicas ao leitor intressado em conhecer alguns ngulos sob os quais se d a participao das Foras Arma-das na vida poltica brasileira. Seu I ivro, apesar de utilizar-se de uma bibliografia terica ei-vada pelo rano sistmico e, conseqentemente por jarges dos mais indigestos - tais como poltica de erradicao, hiber-nao, poltica da escassez, rela-cionamento simbitico, - colo-ca-se muitos furos frente dos autores que ultimamente vm-se dedicando ao estudo da parti-cipao da organizao militar na poltica nacional. Apesar de suas falhas, esse trabalho tem uma virtude crucial: polmico! Espera-se que outros o sucedam no tratamento de realidade po-1 tico-social to complexa. O

    Afrnio Mendes Catani

    Coronelismo, enxada e voto (O municpio e o regime repre-sentativo no Brasil).

    Por Victor Nunes Leal. So Pau lo, Editora Alfa-Omega, 1976.

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    Coronelismo, enxada e voto de Victor Nunes Leal, publicado pela primeira vez em 1949, j se tornou um clssico da literatura 105 poltica brasileira, tanto que vem de ser reeditado pela Alfa-Omega, quase 30 anos aps sua primeira edio. Tendo em vista a sua atual idade e o seu carter fundamental para a compreen-so da realidade brasileira con-tempornea, passamos a resu-mi-lo.

    Nos captulos primeiro e s-timo, o autor conceitua o fen-meno do coronel ismo conside- .. rando-o inicialmente "cor:no re-su I ta do da superposio de for-mas desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econmica e social inadequada. No , pois, mera sobrevivncia do poder privado, cuja hiper-trofia constitui fenmeno t-pico de nossa histria colonial. antes uma forma peculiar de manifestao do poder privado, ou seja, uma adaptao em vir-tude da qual os resduos do nos-so antigo e exorbitante poder privado tm conseguido coe-xistir com um regi me pol (ti co

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    de extensa base representativa" (p. 20). Assim, o coronelismo implica um compromisso entre o poder pblico, progressiva-mente fortalecido; e o poder privado, cada vez mais deca-dente, dos chefes locais, princi-pal mente donos de terras. A propriedade da terra constitui, portanto, o fundamento em que se baseia o coronel ismo. Pro-prietrio de terras e dono de votos, eis a essncia do coronel.

    Esse compromisso corone-l ista pressupe um certo grau de debilidade de ambos os lados, ou seja, do coronel e do poder pblico - a extenso da cida-dania a um vasto contingente de eleitores do meio rural, incapa-citados para o exerccio de seus direitos polticos (graas de-pendncia econmica, social e poltica dos donos de terras), vinculou os detentores do poder pblico aos condutores desse rebanho eleitoral, isto , os coronis. Em contrapartida, estes ltimos no mantm o seu poder local sem o apoio e a cumplicidade do poder pblico. Portanto, "os dois aspectos- o prestgio prprio dos coronis e o prestgio de emprstimo que o poder pblico lhes outorga -so mutuamente dependentes e funcionam ao mesmo tempo co-mo determinantes e determi-nados. Sem a liderana do co-ronel' - firmada na estrutura agrri do pas - , o governo no se sentiria obrigado a um tratamento de reciprocidade e, sem essa reciprocidade, a lide-rana do 'coronel' ficaria sensi-velmente .diminuda" (p. 43).

    O fortalecimento do Estado no Brasil no tem sido acompa-nhado de correspondente enfra-queci menta do coronel ismo. "Os prprios instrumentos do poder constitu do que so uti-lizados, paradoxal mente, para rejuvenescer, segundo linhas partidrias, o poder privado re-sidual dos 'coronis', que as-senta basicamente numa estru-tura agrria em fase de notria

    Revista de Administrao de Empresas

    decadncia. Essa decadncia imprescindvel para a compre-enso do 1 Coronelismo' porque, na medida em que se fragmenta e dilui a in fi uncia 'natural' dos donos de terras, mais necessrio se torna o apoio do oficialismo para garantir o predomnio est-vel de uma corrente poltica lo-cal" (p. 255}. Nesta situao, a falta de autonomia legal do mu-nicpio sempre foi compensada com uma ampla autonomia ex-tralegal, doada pelos governos estaduais aos partidos locais de sua preferncia. "Esta contra-prestao estadual no compro-misso coronelista explica, em grande parte, o apoio que os legisladores estaduais - homens em sua maioria do interior -sempre deram aos projetos de leis atrofiadoras do municl'pio" (p. 255).

    Embora a poca urea do coronelismo tenha sido a I Re-pblica, ele persiste at hoje nas regies menos desenvolvidas do Brasil e 'I parece evidente que a decomposio do 'coronel ismo' s ser completa quando se ti-ver operado uma alterao fun-damental em nossa estrutura agrria" (p. 257 ).

    No captulo segundo, o autor analisa as atribuies municipais ao longo da histria brasileira, desde o perodo colonial at a Constituinte de 1946. A partir da extrema concentrao de atribuies (polticas, adminis-trativas, policiais e judicirias) das Cmaras Municipais na fase colonial, a tendncia geral tem sido a progressiva perda de atri-buies por parte dos muni-cpios. Essa tendncia se acen-tua no Imprio e persiste na I Repblica, j que nosso federa-lismo no implicou o fortaleci-mento do municpio mas, ao contrrio, os estados se conso-1 idaram com o sacrifcio da au-tonomia municipal.

    Aps a revoluo de 30, a tendncia geral permanece, com a total submisso dos muni-cpios durante o Estado Novo.

    A relativa reverso dessa ten-dncia ocorre na Constituinte de 1946, caracterizada por um enternecimento municipalista, compensado pela crescente in-terveno econmica do Estado no srasil, que retira do muni-cpio algumas de suas atribui-es: ~~No mundo moderno, po-rm, essa interveno depende de um planejamento que trans-cende os limites do municpio e do Estado e que h de ficar, por isso mesmo, confiado a autori-dades federais" (p. 98).

    No captulo terceiro, Nunes Leal dedica-se anlise da eleti-vidade da administrao muni-cipal. Apesar de as Cmaras Mu-nicipais terem uma longa tradi-o eletiva no Brasil (o que no significa absolutamente repre-sentatividade poltica), o Exe-cutivo municipal s criado pela Constituio de 1891, em-bora j no Imprio algumas pro-vncias tivessem institudo o cargo de prefeito. Na Repblica Velha, os estados tm ampla au-tonomia na organizao das eleies municipais, sendo que em muitos deles vigoraram res-tries eletividade dos prefei-tos.

    As Constitui_es de 1934 e 1946 estabeleceram a eletivi-dade como regra obrigatria, havendo, no entanto, a possibi-1 idade de nomeao do prefeito em alguns casos excepcionais: capitais de estado 1 estncias h i-

    . drominerais e reas de segu-rana nacional (s de acordo com a Constituio de 46). No Estado Novo, todos os prefeitos so nomeados e Francisco .Cam-pos tentou justificar essa centra-lizao autoritria alegando o carter tcnico do exerccio da prefeitura. O autor demonstra a ideologia subjacente a essa po-sio contra-argumentando com o carter eminentemente pol -tico das eleies municipais no Brasil: elas constituem pea b-sica das campanhas eleitorais j que atravs da mediao dos chefes locais que a grande maio-

  • ria da populao brasileira exer-ce os seus direitos polticos.

    O captulo quarto dedicado receita municipal. A esse res-peito h uma constante na his-tria brasileira, ou seja, a exigi-dade das rendas municipais. Elas so escassas na Colnia, no Imprio e nas Repblicas, sendo a Unio a parte sempre mais bem aquinhoada na repartio dos impostos. Mesmo no regime de 91, a Unio continua man-tendo a primazia. Nessa poca o poder tributrio dos municpios deriva do Estado e s na Cons-tituio de 1934 os municpios passam a ter uma esfera tribut-ria prpria, discriminada cons-tituciona I mente.

    No regime de 46 h um au-mento das rendas mu n ici pais (embora elas permaneam mui-to aqum das necessidades do municpio). Este aumento ex-plicado pelo autor como uma forma indireta de elevar o nvel de vida das populaes do inte-rior e, conseqentemente, ex-pandir o mercado interno. No entender de Nunes Leal, tal me-dida teria sido expresso de gru-pos industrial izantes: "A Cons-tituinte de 1946 exigiu que os municpios apliquem, obrigato-riamente, em 'benefcios de ordem rural' pelo menos me-tade do acrscimo de receita que lhes advm da distribuio de 10% do imposto de renda; ( ... ) nem todos quantos se dei-xarem envolver pela atmosfera municipalista dos nossos dias es-taro conscientes de que o au-mento da receita dos munic-pios , com muita probabili-dade, uma conseqncia indi-reta da necessidade de ampliar-mos o mercado interno, pela inverso de tais recursos na me-lhoria de vida das populaes rurais" (p. 168 e 172).

    A explicao para a debil i-dade financeira dos municpios

    . brasileiros , tambm, poltica: ''A maior cota de misria tem tocado aos municpios. Sem re-cursos para ocorrer s despesas

    que lhes so prprias, no podia deixar de ser precria sua auto-nomia poltica. O auxlio finan-ceiro , sabidamente, o veculo natural da interferncia da auto-ridade superior no governo au-tnomo das unidades polticas menores" (p. 178).

    No quinto captulo, o autor analisa a organizao policial e judiciria brasileira, desde a Co-lnia at Constituinte de 46. Depois de fazer observar o acmulo de funes adminis-trativas, judicirias e policiais nas mos da~ mesmas autori-dades na fase colonial, o autor mostra como essas atribuies acumuladas ajudaram a cons-tituir a prepotncia do senho-riato rural; e como, a partir de meados do sculo XVII, prin-cipalmente pela mo dos ou-vidores e juzes de fora, favore-ceram a submisso dos colonos Coroa portuguesa.

    No I mpro, o trao mar-cante da organizao policial e judicirio a persistncia do acmulo de funes e o fato de que, aps a reao centraliza-dora de 1841 r o controle das autoridades judicirias transfe-rido para o governo central. Apesar dessa centralizao, tam-bm caracterstica fundamen-tal do perodo imperial o fato de que a pol(cia e o judicirio so dom i nados pelo esprito par-tidrio e constituem instrumen-tos bsicos de sustentao do poder dos coronis.

    Na Repblica, subsiste a po-1 cia como instrumento de aco poltica, s que esta passa a ~ervir s situaes estaduais, quan-do antes obedecia aos desgnios do poder central. Quanto ao ju-dicirio, inicia-se um processo de estabeleci mente de garantias da magistratura, garantindo-lhe um mnimo de autonomia, que

    se ir acentuando gradativa-mente. Mas, apesar desse pro-cesso de autonomizao do ju-dicirio, nos regimes de 34, 37 e 46, no totalmente afastada a

    participao da Justia na po-1 tica local.

    Quanto ao jri, institudo pela Constituio Imperial, vai tendo suas atribuies reduzidas progressivamente - o tribunal popular r bastante sujeito in-fluncia dos coronis, assegu-rava freqentemente a i mpun i-dade dos amigos, assim como a culpabilidade dos inimigos des-ses coronis.

    Neste mesmo captulo, o au-tor faz um breve apanhado his-trico sobre a Guarda Nacional. Ainda hoje persiste a prtica da "nomeao de delegados e sub-delegados por indicao dos di-rigentes dos municpios, ou com instrues para agir em ai iana com eles, isto , para 'fazer justia' aos amigos e 'apli-car a lei' aos adversrios. Da a ligao indissolvel que existe entre o 'coronelismo' e a orga-nizao policial. Em relao Justia, essa ligao j foi muito mais estreita do que hoje {poca em que o I ivro foi escri-to), e diminui na proporo em que aumentam as garantias do poder judicirio" (p. 217).

    O captulo seguinte dedi-cado legislao eleitoral bra-sileira. So enumeradas detalha-damente todas as leis eleitorais mais importantes desde a pro-clamao da independncia, passando pelos cdigos eleito-rais de 1932 e 1935, at Cons-tituio de 1946. autor de-monstra persistncia da fraude eleitoral -verdadeiro flagelo do Imprio e da I Repblica - e que, embora atenuada, ainda se mantm nos regimes posterio-res, apesar do contnuo aper-feioamento do sist.ema elei-toral no Brasil e da progressiva ampliao do nmero de elei-tores.

    Porm, no a fraude o com-ponente principal da falsifica-o da representatividade pol -tica no Brasil e sim a prpria existncia do fenmeno cor.o-nelsta: "Neste longo perodo,

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    tivemos vrios regimes polticos e numerosas reformas eleitorais; no obstante, permaneceu o fato fundamental da influncia . governista na expresso das ur nas, conquanto diminuda nas eleies que sucederam Revo~ luo de 30. A explicao do fenmeno est no govern ismo dos chefes locais, j analisado anteriormente; e na sujeio do eleitorado do interior, especial mente do rural, a esses mesmos chefes, como conseqncia di reta da nossa estrutura agrria, que deixa o trabalhador do campo ignorante e desampa- rado". (p. 248). D

    Maria Ceclia Spina Forjaz.

    Revista de Administrao de Empresas

    Escola, estado e sociedade.

    Por Brbara Freitag. So Paulo, Edart, 1977. 135 p.

    Sob o argumento segundo- o qual h raros bons estudos so-bre a situo educacional bra-sileira, hoje qualquer esforo

    -inovador no sentido de analisar histrica, sociolgica ou didati-camente aspectos da educao tem sido bem recebido. O volu-me de publicaes sobre o tema tem aumentado significativa-mente ainda que o mesmo no possa ser dito sobre a relevncia dos esclareci mentes que esses estudos trazem.

    Nessa paisagem no muito promissora surge o livro de Br-bara Freitag, com a pretenso de analisar a realidade educacio-nal brasileira, esclarecendo questes do tipo: "por que na ltima dcada passa-se a valori-zar a educao, desenvolven-do-se uma poltica em que ela vista como um dos agentes de institucional izao e fortaleci-mento do modelo brasileiro?"; "Quais as causas mais profundas dessa valorizao'? " e 11 0uais as intenes (explcitas e impl -citas) que tal poltica perse-gue? " '(p. 7) Contando a seu favor com uma bibliografia atualizada e simptica aos estu-diosos da educao que so mais progressistas, pois inclui

    Gramsci, Bourdieu, Althusser, Establet, Poulantzas e outros, e tendo examinado uma do-cumentao oficial rica relativa situao educacional brasi-leira, a autora reuniu elementos para, no mnimo, produzir um trabalho que despertasse aten-es. O interesse que o leitor investe na leitura do I ivro, con-tudo, no total mente bem recompensado e a obra promete muito mais do que em verdade realiza.

    Logo no primeiro captulo, tem-se a proposta de construo de um quadro terico de refe-rncia para a anlise da proble-mtica educacional brasileira. Para isso e para justificar a posi-o por ela adotada, Brbara prope-se a ~~recapitular os limi-tes e as vantagens das teorias mais conhecidas". SegueMse um resumo que prima pela sim-plificao exagerada das idias de Durkheim, Parsons, Dewey e Mannheim que sero depois cri-ticadas base de objees do tipo: "As teorias educacionais at agora revistas pecam por seu alto grau de generalidade e seu extremo formalismo.

    Assim referem-se a indiv-duos e sociedades histricas de caractersticas universais. Todos os indivduos so sujeitos ao mesmo processo de socializao em uma sociedade dada, carac-terizando-se esta por seu funcio-namento global, sua harmonia e sua ordem interna" (p. 16}. Como se v, um dos defeitos desses tericos no levar em conta o modo pelo qual cada sociedade funciona e se man-tm, e uma das insuficincias centrais dessas teorias, , se-gundo a autora, encarar a insti-tuio escolar apenas enqanto mecanismo de perpetuao da ordem social.

    Ainda no mesmo captulo, segue-se uma anlise das pro-posies de tericos mais recen-tes como Bourdieu e Parsns, e no trabalho desses tericos, a