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FEAD-MINAS CENTRO DE GESTÃO EMPREENDEDORA NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO MODALIDADE: PROFISSIONALIZANTE RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL: ESTUDO DE CASO NA INDUSTRIA ALIMENTÍCIA EMBARÉ S/A Claudia Lacerda de Castro Belo Horizonte 2006 Cláudia Lacerda de Castro

RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL: ESTUDO DE …livros01.livrosgratis.com.br/cp020257.pdf · LISTA DE TABELAS 1- Prioridades de empresas socialmente responsáveis: visão do público

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FEAD-MINAS CENTRO DE GESTÃO EMPREENDEDORANÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃOMODALIDADE: PROFISSIONALIZANTE

RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL:ESTUDO DE CASO NA

INDUSTRIA ALIMENTÍCIA EMBARÉ S/A

Claudia Lacerda de Castro

Belo Horizonte2006

Cláudia Lacerda de Castro

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1

RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL:ESTUDO DE CASO NA

INDUSTRIA ALIMENTÍCIA EMBARÉ S/A

Dissertação apresentada ao Curso de Mestradoem Administração: Modalidade Profissionalizanteda FEAD - Minas – Centro de GestãoEmpreendedora, como requisito parcial para aobtenção do título de Mestre em Administração.

Área de Concentração: Gestão Estratégica deOrganizações

Orientador: Prof. Dr. Múcio Tosta Gonçalves

Belo HorizonteFEAD-MINAS

2006

2

3

A meus filhos, Diego, Vítor e Thales, cujo amor

é o maior estímulo para a superação das dificuldades.

4

Agradeço a todos os que estiveram presentes de alguma forma, nesta trajetória,

especialmente a meu orientador, Prof. Dr. Múcio, pela competente e segura orientação,

dedicação e paciência; a Marildes, fonte inspiradora; a Empresa Embaré, de forma particular

a Alexandre e Reinato, pela oportunidade, disponibilidade e confiança; a meus pais, pelo

apoio; a André, pelo incentivo, amor e dedicação em todos os momentos.

5

“O que faz com que os homens formem um grande

povo é a lembrança das grandes coisas que fizeram

6

juntos e a vontade de realizar outras.”

Renan

RESUMO

A responsabilidade social empresarial se constitui atualmente, em um tema relevante nocontexto das organizações e da sociedade. Esta pesquisa teve como principal objetivo buscarconhecer as percepções e expectativas dos segmentos direta e indiretamente afetados pelaspolíticas e ações sociais da Indústria Alimentícia Embaré S/A: stakeholders (gestores,funcionários, fornecedores e membros da comunidade local). Atuando no mercado desde1935, a Embaré projetou-se no mercado nacional, por nortear sua produção por três diretrizesessenciais: tecnologia moderna, mão-de-obra qualificada e matéria-prima de primeiraqualidade. Com essa visão empreendedora, a empresa em ascendente trajetória de progresso,tem buscado implementar ações de responsabilidade social (RSE) junto ao seu público internoe externo, comprometida com os princípios defendidos pelo Instituto Ethos deResponsabilidade Social, ao qual é filiada. A avaliação dessas ações pelos citados segmentosconstitui o alvo deste estudo. A pesquisa é um estudo de caso de natureza qualitativa. Aamostra foi selecionada através da técnica não-probabilística, por tipicidade, no caso dosgestores e do representante dos fornecedores. Para seleção da amostra dentre os demaisstakeholders, utilizou-se a técnica não-probabilistica por acessibilidade. Para o levantamentodos dados foram realizadas entrevistas semi-estruturadas e aplicação de questionárionão-estruturado para cada um dos públicos definidos como estratégicos – gestores,funcionários, fornecedores e membros da comunidade. O tratamento dados às informaçõesobtidas fundamentou-se na análise de conteúdo.Os resultados evidenciaram que o stakeholdersda Embaré tem uma percepção positiva com relação à responsabilidade social da empresa, cujofoco vem privilegiando as condições de seus funcionários, o meio ambiente e a comunidade deLagoa da Prata, e apontam uma coerência entre as práticas da empresa e as expectativas deseu público.

Palavras-chaves: responsabilidade social empresarial, stakeholders, percepção e expectativa.

7

ABSTRACT

The enterprise social responsibility is nowadays a relevant theme in the context oforganizations and the society. The main objective of this research was to get knowledge of theperceptions and expectations of the segments that are direct and indirectly affected by thepolicies and social actions of the Indústria Alimentícia Embaré S/A: the stakeholders(managers, employees, suppliers and the community's members). In business since 1935,Embaré has gained projection in the national market by directing its production by threeessential guidelines: modern technology, qualified labor and first quality raw materials. Withthis enterprising vision, the company, in its rising progress path, has pursued implementingsocial responsibility actions (RSE) close to its internal and external public, committed with thefoundations indorsed by the Instituto Ethos de Responsabilidade Social, to which is affiliated.The evaluation of those actions by the above mentioned segments constitutes the target of thisstudy. The research is a case study of qualitative nature. The samples were selected throughthe non-probabilistic technique, by tipicity, in the case of the administrators and suppliersrepresentatives .For sample selection among the other stakeholders, it was used thenon-probabilistic technique by accessibility. For data collection, semi-structured interviewswere conducted and non-structured questionnaires were applied on each of the audiencesdefined as strategic: Managers, employees, suppliers and the community's members. Theobtained information was handled based on the content analysis. The results pointed out thatEmbaré’s stakeholders have a positive perception regarding the social responsibility of thecompany, which has its focus on privileging their employees' conditions, the environment andthe community of Lagoa da Prata, and demonstrates coherence between the company’spractices and its public’s expectations.

Key words: enterprise social responsibility, stakeholders, perception and expectation.

8

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1- Responsabilidade social empresarial: inovações

conceituais...........................................................................................23

Quadro 2 - Visões diferenciadas quanto à responsabilidade social empresarial..........................................................................................27

Quadro 3 - Diferenças básicas entre a filantropia e a responsabilidade social .................................................................................................30

Quadro 4 - Doutrinas sobre responsabilidade social das empresas...................... 44

Quadro 5 - Nova racionalidade social empresarial : características corporativas..57

Quadro 6 – Amostra da pesquisa: os gestores......................................................82

Quadro 7 – Amostra da pesquisa: funcionários, fornecedores e membros dacomunidade....................................................................83

Figura 1 – Modelo da Teoria doStakeholder........................................................49

Figura 2 – Pirâmide daRSE..................................................................................52

Figura 3 – Localização da

9

Embaré........................................................................72

Figura 4 - Construção da empresa na rua doada pelo município...........................73

Figura 5 – O Centro Infantil Arlette Antunes.......................................................74

Figura 6 – Anfiteatro do Centro Infantil...............................................................75

Figura 7 – As crianças do Centro Infantil............................................................75

Figura 8: Modelo da Teoria do Stakeholder, com adaptações............................ 81

Figura 9 – A construção da quadra poliesportiva no Centro Infantil..................94

LISTA DE TABELAS

1- Prioridades de empresas socialmente responsáveis: visão do público interno e dos fornecedores daEmbaré......................................................................114

2- Prioridades de empresas socialmente responsáveis: visão da comunidade externa da Embaré

.....................................................................................................114

3- Percepção dos Stakeholders ( fornecedores, funcionários, e comunidade local) sobre os benefícios e ações sociais da

Embaré............................................................116

10

LISTA DE SIGLAS

ABRINQ- Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos

ADCE - Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas

ADVB - Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil

APAE - Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais

EUA - Estados Unidos da América

GIFE - Grupo de Institutos, Fundações e Empresas

IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

IBGE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

INSS - Instituto Nacional do Seguro Social

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

ISO - International Organization for Standardization

ONG - Organização não-governamental

ONU - Organização das Nações Unidas

PIB - Produto Interno Bruto

RSE - Responsabilidade Social Empresarial

SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

11

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................

12

2 REFERENCIALTEÓRICO..........................................................................

18

2.1 Responsabilidade social empresarial: origem e evolução do conceito........ 182.1.1 Diferenças conceituais entre responsabilidade social, filantropia e cidadania

empresarial........................................................................................................

26

2.2 O conceito de responsabilidade social noBrasil...........................................

34

2.3 Principais doutrinas sobreRSE.....................................................................

44

2.3.1 A Doutrina do acionista: visão dostockholder.................................................

45

2.3.2 A Doutrina da responsabilidade social: a visão dos stakeholder...................... 482.4 RSE: por quê e para

quê............................................................................... 57

3 A INDÚSTRIA ALIMENTÍCIA EMBARÉ S/A........................................

69

3.1 Contexto local: aspectos básicos do desenvolvimento do município deLagoa daPrata................................................................................................

69

3.2 Perfil da empresa...........................................................................................

70

4 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA................................... 774.1 Classificação da

pesquisa.............................................................................. 77

4.1.1 Quanto aos fins...............................................................................................

77

12

4.1.2 Quanto aosmeios............................................................................................

78

4.2 População e amostra .................................................................................... 814.3 Coleta de

dados............................................................................................. 83

4.4 Análise dosdados..........................................................................................

85

5 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMBARÉ NA PERCEPÇÃODOS STAKEHOLDERS .............................................................................. 89

5.1 Percepção dos Gestores - quanto à responsabilidade social daEmbaré..................................................... 89

5.2 Percepção dos funcionários, fornecedores, comunidade e clientes quantoà responsabilidade social da Embaré.......................................................... 108

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................... 123

7 REFERÊNCIAS............................................................................................ 131

8 ANEXOS E APÊNDICES............................................................................ 137 Anexo A: O Balanço social da Embaré......................................................... 138 Anexo B: Fotos da Embaré........................................................................... 139 Roteiro das Entrevistas ................................................................................ 141

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, o mundo empresarial passou por diversas mudanças, dentre as quais

se destaca a mudança de comportamento dos consumidores, que passaram a demandar mais

qualidade, preços competitivos e o comprometimento das empresas com uma série de

posicionamentos sociais e ambientais. Com a globalização, as empresas passaram por um

processo de transformação, buscando cada vez mais obter diferenciais, investindo em novos

processos de gestão. Conforme argumenta Ashley,

13

O crescente aumento da complexidade dos negócios, principalmente emdecorrência do processo de globalização e da velocidade das inovaçõestecnológicas e da informação, impõe ao empresariado nacional uma nova maneirade realizar suas transações. Além disso, as crescentes disparidades e desigualdadesde nossa sociedade obrigam a repensar o desenvolvimento econômico, social eambiental (ASHLEY,2003 p.03).

Assim, assiste-se hoje a uma crescente preocupação das empresas no âmbito da

responsabilidade social. Um levantamento realizado em 2004, pelo Instituto Brasileiro de

Estatística (IBGE) e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), revela que existem

mais de 274 mil entidades brasileiras dedicadas a este setor (MATOS, 2004).

A expressão “Responsabilidade Social” refere-se, na verdade, a uma categoria de ação

e a um conceito em construção, e seu uso suscita uma série de interpretações. Bowen (apud

ASHLEY, 2003, p. 6) , em 1953, nos primórdios da literatura que hoje se define como sendo

sobre responsabilidade social dos executivos, apresentou a responsabilidade social como sendo

“a obrigação do homem de negócios de adotar orientações, tomar decisões e seguir linhas de

ação que sejam compatíveis com os fins e valores da sociedade.”

Mediante diversos conceitos encontrados na literatura sobre o tema, adotou-se neste

estudo uma visão expandida do termo, considerando a responsabilidade social como toda e

qualquer ação que possa contribuir para a melhoria da qualidade de vida de uma dada

comunidade ou sociedade, entendida essa ação como sendo emanada de uma organização

empresarial que tenha essa melhoria como um de seus compromissos aliando essa

interpretação à visão do Instituto Ethos de Responsabilidade Social, que considera como

empresa socialmente responsável aquela que age "além da obrigação de respeitar as leis, pagar

14

impostos e observar as condições adequadas de segurança e saúde para os trabalhadores"

(Instituto Ethos de Responsabilidade Social, 2005).

Percebe-se uma evolução na atuação das empresas no Brasil que começaram com

filantropia e contaram com alguns setores internos para assumirem a gestão pelo

comportamento social responsável entre os seus membros.

Pelo fato de a ação social ser um movimento recente a ser incorporado pelas empresas,

as expressões filantropia empresarial e responsabilidade social vêm sendo utilizadas em

diversos sentidos e até mesmo como sinônimos (TENÓRIO,2004, p.28). Alguns autores

como, Neto e Froes (2001) e Tenório (2004), destacam algumas diferenças conceituais entre

filantropia empresarial e responsabilidade social: a ação filantrópica é caracterizada como uma

ação de caráter assistencialista, caridosa e predominantemente temporária. Já as ações sociais

possuem caráter permanente, e buscam o fomento da cidadania.

Os motivos que têm levado as empresas, inclusive as brasileiras, a investir recursos

humanos e financeiros no desenvolvimento de ações de responsabilidade social são diversos,

complexos e interdependentes. Para alguns autores, como Ashley (2003,p.03), a

responsabilidade social empresarial - RSE é uma tendência decorrente da mudança de

comportamento dos consumidores, que passaram a se sentir atraídos pelos produtos e práticas

que tragam melhoria para a comunidade ou ao meio ambiente. Trata-se, assim, de uma questão

de combinação de estratégias individuais e corporativas, já que o “mundo empresarial vê, na

responsabilidade social, uma nova estratégia para aumentar seu lucro e potencializar seu

desenvolvimento” (ASHLEY, 2003, p. 3). Mais ainda, segundo a autora,

A responsabilidade social disseminada como uma atitude estratégica permite criaruma nova cultura dentro da empresa, sendo praticada e incorporada na gestão e ematividades regulares como produção, distribuição, recursos humanos e marketing(ASHLEY, 2003, p. 13).

15

Para Neto e Froes (2002), os empresários que possuem maior discernimento elegeram

o social como foco de suas ações empreendedoras, internalizando os conceitos de cidadania

empresarial e responsabilidade social.

Segundo Peliano (2003) e Paoli (2002), com o crescente aumento da desigualdade

social e a incapacidade do Estado para responder às questões sociais de forma eficiente,

reforçou-se o papel das organizações não-governamentais e o das empresas privadas no

envolvimento na causa social.

A relevância desta pesquisa reside no fato de que esta temática vem assumindo

progressiva importância na esfera das decisões estratégicas das corporações, tanto as de

grande como as de médio porte. Ademais, a questão tem também atraído o interesse de

pesquisadores da área das Ciências Sociais, por relacionar-se com a questão das relações entre

empresa e sociedade, campo ainda bastante ofuscado por interpretações baseadas em juízos de

valor.

Escolheu-se como objeto de pesquisa uma empresa do ramo alimentício instalada no

município de Lagoa da Prata, no estado de Minas Gerais. Trata-se de uma organização filiada

ao Instituto Ethos de Responsabilidade Social, fato que reforça a importância deste estudo, por

ser o citado Instituto um pólo de organização de conhecimento, troca de experiências e

desenvolvimento de ferramentas a serviço de empresas vinculadas que buscam analisar suas

práticas de gestão e aprofundar seus compromissos com a responsabilidade corporativa. É hoje

uma referência internacional no assunto e desenvolve projetos em parceria com diversas

entidades, em âmbito mundial. Em 2000, reunia 240 associados, e atualmente, conta com 1041

empresas de diferentes setores e portes, que faturam anualmente cerca de 30% do PIB

brasileiro e empregam cerca de 1 milhão de pessoas, tendo como característica principal o

16

interesse em estabelecer padrões éticos de relacionamento com funcionários, clientes,

fornecedores, comunidade, acionistas, Poder Público e com o meio ambiente (Instituto Ethos

de Responsabilidade Social, 2005).

Independentemente dos motivos que têm suscitado a um movimento ascendente das

empresas em termos de investimento no plano social, é indiscutível que tal iniciativa gera

resultados positivos para a empresa e para os atores a ela vinculados. Ao adotar uma gestão

socialmente responsável, a empresa incorpora valores essenciais à formação de uma imagem

admirada por seu público tanto externo como interno, oferecendo um novo sentido à vida dos

seus colaboradores e dirigentes, além de se tornar parceira na construção de uma sociedade

mais justa e sustentável.

Adicionalmente, os resultados da pesquisa poderão ser de grande utilidade para o

crescente movimento empresarial em prol da responsabilidade social bem como para a própria

empresa em estudo.

Tendo em vista as razões expostas, buscou-se lançar um olhar sobre as práticas da

Indústria Alimentícia Embaré S/A, sob a ótica da RSE, objetivando responder à seguinte

questão, foco desta pesquisa: quais são as percepções e expectativas dos indivíduos e grupos

direta ou indiretamente ligados à Embaré ( stakeholders ) quanto à sua política de

responsabilidade social empresarial?

O objetivo geral desta dissertação foi conhecer as percepções e as expectativas dos

stakeholders de uma empresa produtora de alimentos, a Embaré, instalada no município de

Lagoa da Prata, no estado de Minas Gerais, quanto à sua política de responsabilidade social.

No presente estudo, os stakeholders analisados foram os gestores, os fornecedores os

funcionários e os membros da comunidade local direta e imediatamente afetados pelas

políticas e ações sociais da empresa.

17

Os objetivos específicos foram:

identificar as razões que levam a empresa a investir em responsabilidade social;

identificar os objetivos da empresa com relação à implantação e o desenvolvimento de

sua política de responsabilidade social;

identificar o que os stakeholders esperam de uma empresa quanto à responsabilidade

social;

analisar se a política de responsabilidade social adotada pela empresa selecionada

atende às expectativas dos stakeholders;

analisar onde a empresa se enquadra, entre as duas principais correntes teóricas

existentes acerca do debate sobre responsabilidade social empresarial.

A pesquisa é qualitativa e a metodologia utilizada é o estudo de caso. A população

da pesquisa compreende os stakeholders da Indústria Alimentícia Embaré, empresa filiada ao

Instituto Ethos de Responsabilidade Social e a amostra foi selecionada através da técnica não-

probabilística, por tipicidade, no caso dos gestores, por desempenharem papel determinante

nas decisões da empresa. Também foi selecionado por esta técnica, o representante do

Sindicato dos fornecedores da empresa. Para a seleção da amostra dentre os funcionários e

membros da comunidade local utilizou-se a técnica não- probabilística por acessibilidade,

totalizando quinze funcionários, cinco dos quais em exercício de cargo de coordenação , e dez

trabalhadores de setores operacionais. Adicionalmente, foram ouvidos vinte membros da

comunidade, moradores de diferentes bairros do município.

Alem de terem sido realizadas entrevistas semi-estruturadas com os gestores ,

aplicou-se um questionário não-estruturado, com a presença do entrevistador e procedeu-se à

análise de documentos da empresa, com vistas a verificar as percepções e expectativas da

população pesquisada.

18

Os resultados evidenciaram que os stakeholders da Embaré têm uma percepção

positiva com relação à responsabilidade social da empresa, cujo foco tem buscado privilegiar

as condições dos seus funcionários, o meio ambiente e o desenvolvimento da comunidade de

Lagoa da Prata, atendendo prioritariamente ao setor de educação, com base em princípios

legais e éticos.

19

2 REFERENCIAL TEÓRICO

A fundamentação teórica está estruturada em quatro partes: a primeira trata da origem

e da evolução do conceito de responsabilidade social empresarial, partindo da idéia de

filantropia e obrigação das empresas em direção a uma visão mais ampla, voltada para o

reconhecimento da relevância das ações sociais como parte do “negócio” das empresas. São

apresentadas algumas conceituações sobre RSE presentes na literatura, enfocando-se as

diferenças conceituais entre filantropia, RSE e cidadania empresarial. Na segunda parte é

enfocado o conceito de RSE no Brasil. Na terceira parte, são apresentadas as duas principais

correntes teóricas sobre o tema: a visão do stakeholders e a dos stockholders. Finalmente, o

último tópico busca identificar os motivos pelos quais as empresas estão cada vez mais

preocupadas em investir recursos em ações sociais.

2.1 Responsabilidade social empresarial: origem e evolução do conceito

De acordo com Alves (2003), a origem da idéia de responsabilidade social empresarial

remonta ao final do século XIX e início do século XX. Alves (2003) aponta como um dos

pioneiros no assunto Andrew Carnegie, que publicou em 1889 nos Estados Unidos da América

a obra O evangelho da riqueza, na qual concebe que o principio da responsabilidade social

baseia-se na premissa de que as organizações são instituições sociais, e ressaltando dois

princípios básicos relativos à responsabilidade social da empresa: o da caridade e o do zelo.

20

De acordo com o principio de caridade na visão de Carnegie (1889) citado por Alves

(2003), os mais afortunados da sociedade deviam cuidar dos demais, especialmente, dos

desempregados, doentes, pobres e das pessoas deficientes. Tal obrigação não cabia à empresa,

mas ao indivíduo, que deveria decidir quanto à caridade que pretendia praticar. Com relação

ao principio de zelo, defendia o entendimento de as empresas e os indivíduos ricos, como

depositários de sua propriedade, podiam utilizar seus bens para qualquer finalidade

considerada legítima pela sociedade.

Para Stoner e Freeman (1985), esses princípios eram amplamente aceitos na sociedade

americana nas décadas de 1950 e 1960. À medida que as companhias passaram a admitir que o

poder traz responsabilidade, começaram a perceber que, se não aceitassem os princípios de

responsabilidade social, por sua livre iniciativa, seriam obrigadas a aceitá-los por imposição do

governo.

De acordo com Stoner; Freeman e Gilbert Jr citados por Maximiniano (1997), o papel

da empresa é também o de aumentar a riqueza da sociedade, através de investimentos

prudentes e do uso cauteloso dos recursos sob sua responsabilidade.

Duarte e Dias (1986) apontam vários outros autores que se manifestaram sobre o

assunto anteriormente à década de 1950, tais como Charles Eliot, em 1906, Arthur Hakley, em

1907 e John Clark, em 1916, cujos estudos basicamente consistiam em ressaltar a importância

de as empresas oferecerem bens e serviços necessários ao bem-estar da comunidade.

Ashley (2003) aponta a relevância, para o fomento da discussão do tema

“responsabilidade social”, do julgamento ocorrido em 1919 nos EUA, do caso Dodge versus

Ford, quanto à competência de Henry Ford, presidente e acionista majoritário da Ford, para

tomar decisões contrárias ao interesse dos acionistas da empresa, John e Horace Dodge. Em

1916, Ford decidiu não dividir uma parte dos dividendos da empresa, revertendo-os para

21

investimentos na capacidade de produção, aumento de salários e fundo de reserva para a

redução esperada de receitas, objetivando diminuir o preço dos carros.

A decisão judicial foi favorável aos Dodges, o que justificou a tese de que a empresa

existe com o objetivo de favorecer os acionistas e diretores, não podendo ser usados os lucros

para outros objetivos. Esse resultado confirmou a tese restrita de que “a filantropia corporativa

e o investimento na imagem da corporação para atrair consumidores poderiam ser realizados

na medida em que favorecessem os lucros dos acionistas” (ASHLEY, 2003, p. 19).

Após os efeitos da Grande Depressão e o período da Segunda Guerra Mundial, a noção

de que a corporação deveria responder apenas a seus acionistas sofreu ataques na academia,

principalmente pelo trabalho de Berle e Means, The Modern Corporation and Private

Property ( BERLE e MEANS,1932 apud FREDERICK, 1994) cujo argumento é de que os

acionistas eram passivos proprietários que abdicavam do exercício do controle e

responsabilidade para a direção da corporação. Nesta época, em um contexto econômico de

expansão das corporações e de seu poder sobre a sociedade, diversas decisões nas Cortes

Americanas foram favoráveis às ações filantrópicas das empresas (ASHLEY et al, 2000).

Duarte e Dias (1986) chamam a atenção para o trabalho de Oliver Sheldon (1923), o

qual sugeria basicamente que a administração das empresas fosse guiada pela noção geral de

serviço à comunidade e defendia a inclusão de outros objetivos, além de lucros dos acionistas,

entre as preocupações da empresa, contudo, tais idéias não tiveram maior aceitação nos meios

acadêmicos e empresariais americanos.

Os anos 1940 assinalaram a transição de uma economia predominantemente liberal para

uma maior intervenção estatal. Deste período até 1950, a RSE nos EUA se ampliou, incluindo

o bem-estar dos funcionários, compreendidos aí a segurança, os cuidados médicos, os

programas de aposentadoria, e outros (CARROL; BUCHHOLTZ, 2000). Contudo, foi

22

somente com o trabalho de Bowen, publicado em 1953 nos Estados Unidos da América e em

1957 no Brasil, intitulado Responsabilidades sociais do homem de negócios, que foi

demarcado o inicio de uma análise mais criteriosa sobre o tema (DUARTE; DIAS,1986).

A partir de 1950, segundo Ashley (2003), tornaram-se conhecidos os primeiros

Códigos de Ética empresariais elaborados com o objetivo de definir os padrões éticos a serem

seguidos pelos empregados. Desde então, os benefícios da instituição ética começaram a ser

traduzidos em resultados financeiros surgindo uma nova visão: a da responsabilidade social nas

empresas.

Inicia-se assim uma discussão no meio acadêmico e empresarial acerca da importância

da responsabilidade social corporativa pela ação de seus dirigentes, inicialmente nos EUA e,

posteriormente, no final de 1960, na Europa, por diversos autores (ASHLEY, 2003).

Bowen (1957), nos primórdios da discussão científica sobre a responsabilidade social

dos executivos, observa que a responsabilidade social dos homens de negócios consistia em

sua obrigação de adotar orientações, tomar decisões e seguir linhas de ação compatíveis com

os fins e valores da sociedade. Para Bowen os empresários tinham o dever moral de

implementar políticas e tomar decisões em torno dos objetivos e dos valores da sociedade.

Segundo Souza (2003), as pesquisas de Bowen tiveram sua origem em uma enquete

sobre homens de negócios, realizada pela revista Fortune, em 1946. A principal questão a ser

respondida era: Quais responsabilidades deveriam os homens de negócios assumir perante a

sociedade? Do total dos entrevistados, 93,5% responderam que deveriam assumir

responsabilidades sobre suas ações.

Bowen se baseou na crença de que “centenas de grandes negócios são centros vitais de

força e tomada de decisões, fazendo com que as ações das empresas toquem a vida dos

cidadãos em muitos pontos” (CARROL, 1999, p. 269). Observa a autora que o conceito de

23

Bowen, que via as empresas como reflexo dos “objetivos e valores”, opõe-se ao princípio da

caridade e de zelo, que eram interessantes para aqueles que tinham o interesse oculto de

preservar o sistema de livre iniciativa com garantias de liberdade em relação a outras formas de

pressão social.

É pertinente destacar que o trabalho de Bowen (1957) tinha um forte cunho religioso,

uma vez que foi patrocinado pelo Conselho Federal das Igrejas de Cristo da América,

demonstrando que uma primeira percepção do assunto estava fortemente ligada ao caráter

religioso da sociedade norte-americana (ALVES, 2003, p. 38).

A Igreja Católica exerceu grande influência no envolvimento das entidades em causas

sociais. Suas maiores contribuições foram a condenação do apego à riqueza e a divulgação do

ideal de divisão com os carentes, em busca da igualdade. Dessa doutrina surgiu a idéia do

amor à humanidade, manifestada mediante atos filantrópicos (SOUZA, 2003, p. 3).

A filantropia empresarial ganhou força em 1953, com a decisão de um litígio nos EUA,

conhecido como o caso A.P.Smith Manufacturing Company versus Barlow. Nesse caso em

que se discutia a inserção da corporação na sociedade e suas respectivas responsabilidades, a

justiça foi favorável à doação de recursos para a Universidade de Princeton, contrariando os

interesses dos acionistas. A Suprema Corte de Nova Jersey determinou então que uma

corporação pode buscar o desenvolvimento social, estabelecendo em lei a filantropia

corporativa (ASHLEY, 2003, p. 19). A partir daí surgiram diversas argumentações no sentido

de que, se a filantropia é uma ação legítima da empresa, quaisquer outras ações que priorizem

objetivos sociais, em relação ao retorno financeiro dos acionistas têm igual legitimidade,

como, por exemplo, abandonar a produção de linhas de produtos lucrativas, porém nocivas

aos ambientes natural e social.

24

No início dos anos de 1960, há uma popularização crescente do tema

“Responsabilidade Social”, através de sua divulgação em programas de televisão americanos

(CARROL; BUCHHOLTZ, 2000). Nesta época, são encontrados diversos autores

interessados em aprofundar o debate sobre a RSE.

Souza (2003, p. 4), reafirma tal tendência: “Marcada por muitas convulsões sociais na

Europa, a década de 60 chamou a atenção para a urgente necessidade de mudanças nos

métodos de atuação das empresas”. Algumas das idéias defendidas pelos autores desse período

estão sintetizadas no quadro 1.

QUADRO 1

Responsabilidade social empresarial: inovações conceituais

Autores/obras Conceitos

Keith Davis (1960) Argumentou que as decisões tomadas pelosdirigentes das empresas vão além dospróprios interesses técnicos e econômicosafetando todo o sistema social.

Willian C. Frederick (1960) Ponderou que as empresas devemsupervisionar o sistema econômico e atenderàs expectativas do público.

Joseph McGuire (1963) Defendeu o direito de que as empresasdevem se interessar pelo bem-estar dacomunidade, a educação e a “felicidade” dosfuncionários.

Keith Davis (1967) Ampliou o conceito anterior e adicionou aconseqüência ética das ações que afetam osinteresses das outras instituições.

Clarence C. Walton (1967) Enfatizou a inclusão de outros ingredientes:ações voluntárias, opondo-se às regras dasempresas, assumindo alguns custos quepodem não medir retornos econômicos.

FONTE : Souza 2003, p. 5, com adaptações.

25

De forma geral, os autores citados buscavam atribuir às empresas a responsabilidade

por afetarem não somente seus próprios interesses, mas também os de toda a sociedade,

introduzindo a questão ética e o bem-estar dos funcionários.

As décadas de 1970 e 1980 foram marcadas pela preocupação com o como e o quando

as empresas deveriam responder por suas obrigações sociais. Observa-se nesta década um

crescimento dos movimentos em prol da defesa dos interesses das minorias e da formação de

grupos voluntários lutando por causas específicas como a paz, os direitos humanos e a

degradação dos recursos ambientais do planeta, visando ao desenvolvimento sustentável.

Conforme argumenta Borger (2001b,p.39) que,

[...] as pesquisas e estudos sobre responsabilidade social empresarial estavam maisvoltados à especificação do que era responsabilidade social empresarial e refletemuma visão da mudança do contrato social entre os negócios e a sociedade, àincorporação das emergentes e novas responsabilidades sociais surgidas no contextodo final de 1960 e inicio dos anos 70, com os movimentos ambientais, àpreocupação com a segurança do trabalho, consumerismo e regulamentaçãogovernamental .

Nessa década, pesquisas sobre a atuação das empresas começaram a ser desenvolvidas

na Europa, e os trabalhos acadêmicos sobre o tema passaram a ganhar destaque (SOUZA,

2003, p. 6).

Paralelamente, em face também aos acontecimentos que, desde a década de 1970 vêm

colocando em evidência a preocupação com as questões referentes à sustentabilidade do

desenvolvimento econômico, o conceito de RSE vem sendo ampliado pela incorporação dos

resultados das ações das empresas, que passaram a ser consideradas partes de um sistema

26

maior, onde todos os impactos gerados ao ambiente onde ela se insere devem ser levados em

consideração (DALLABRIDA, 2005, p. 14).

Nos anos de 1970, Friedman (1970), importante economista liberal norte-americano,

causou polêmica com a publicação de um artigo, em que afirmava ser objetivo único da

empresa obter lucro para os acionistas. A partir daí, o assunto “Responsabilidade Social” e

sua operacionalização começou a ganhar amadurecimento, cercado de debates filosóficos

acerca do dever ou não das empresas de investirem no social (COELHO, 2004, p. 21).

Johnson (1971, apud SOUZA, 2003) desenvolveu algumas concepções sobre RSE:

“[...] uma empresa socialmente responsável é aquela cujo pessoal administrativo leva

em conta diversos interesses (dos empregados, dos fornecedores, da comunidade e da

Nação), além do lucro;”

RSE diz respeito a “ [...]aqueles negócios que levam a cabo programas sociais para

somar lucro para a sua organização.” Nessa concepção , o autor relaciona RSE à

lucratividade;

“ [...] a empresa não existe por si só, ela tem deveres para com a sociedade;”

“ [...]visão lexicográfica de responsabilidade social: empresas fortemente motivadas

pelo lucro podem vir a ter um comportamento socialmente responsável.”

Em 1979, Carrol citada por Souza (2003) definiu responsabilidade social das empresas

como um conjunto de obrigações para com a sociedade, incorporadas em quatro dimensões:

responsabilidade econômica, responsabilidade legal, responsabilidade ética e responsabilidade

discricionária, aspectos que serão tratados oportunamente.

Em 1973 o presidente da França constituiu uma comissão para estudar a Réforme de l’

Entreprise, que resultou na aprovação da lei que , em 1977, obrigou as empresas francesas que

27

tivessem 300 ou mais empregados a realizarem anualmente seu Balanço Social. A França que

deu portanto, o passo oficial na formalização do assunto, sendo o primeiro País a obrigar as

empresas a fazerem balanços periódicos de seu desempenho social quanto à mão-de-obra e às

condições de trabalho (DUARTE,1985,p.75-79).

Em 1984, R. Edward Freeman (1984), divulgou no meio acadêmico e gerencial a idéia

de que as organizações tem stakeholders, definidos como “ qualquer grupo ou indivíduo que

pode afetar ou que é afetado pela realização dos objetivos da organização. Os grupos de

stakeholders mais comuns apontados por Freeman (1999) são: acionistas, empregados, clientes

entre os quais os consumidores, fornecedores e distribuidores, concorrentes, a sociedade local

e a sociedade em geral. Para Freeman (1999), os gestores têm atribuição ética de preocupar-se

com os problemas sociais envolvendo seus stakeholders.

2.1.1 Diferenças conceituais entre responsabilidade social, filantropia e cidadania

empresarial

Pela abordagem dos vários autores apresentados, conclui-se que a RSE é um conceito

em construção.

Nos primórdios da literatura sobre RSE, conforme se relatou, os autores a tratavam

como um tipo de dever das empresas para com a sociedade. Em um segundo momento, as

teorias sobre RSE agregavam ao conceito, além da obrigação legal, as obrigações sociais,

concebendo a empresa como um membro da sociedade. Atualmente, o conceito de

responsabilidade social da empresa vai além do argumento clássico, envolvendo o conceito de

28

stakeholders e questões que vão além das leis e obrigações das empresas, na busca do

desenvolvimento sustentável.

Essa evolução de visões é sintetizada no Quadro 2, a seguir.

QUADRO 2

Visões diferenciadas quanto à RSE

Autores/obras Conceitos

1ª visão: obrigação social Maximização do lucro;Satisfação apenas das obrigações legais;Atividades empresariais centradas emcritérios econômicos.

2ª visão: aprovação social Satisfação das obrigações legais eobrigações sociais que afetam diretamentea empresa;Concepção da empresa como membro dasociedade.

3a visão: stakeholders theory Satisfação das obrigações legais e sociaisprevistas, relativas a tendências/problemasque estão surgindo;Abordagem sistêmica da interdependênciaentre os agentes sociais: rede derelacionamentos;Antecipação de questões sociais paraserem resolvidas no presente, evitando quese transformem em problemas futuros paraa sociedade.

FONTE: Aliglery (2001, apud PEREIRA & MARANHÃO, 2004), com adaptações.

Atualmente, existem diferentes opiniões a respeito do que venha a ser realmente RSE.

Alguns autores a tratam como vantagem competitiva, outros a vêem ainda como uma

obrigação; há aqueles que a tratam como filantropia e ainda outros que a definem como um

compromisso ético que as empresas devem ter. Para Neto e Froes (2001), a maior dificuldade

para definir responsabilidade social está na amplitude do tema e na extensão do seu espectro:

29

da conduta ética às ações comunitárias; de tratamento dos funcionários ao dinamismo das

relações que a empresa mantém com seus diversos públicos.

Para Lozano (1999, apud COELHO, 2004), não é possível afirmar que exista um

termo consensual nem eleger um único termo que defina RSE. É igualmente impossível definir

que comportamentos estão associados à idéia de uma empresa socialmente responsável ou

cidadã. À seguir, são apresentados alguns conceitos encontrados na literatura sobre o tema:

Responsabilidade social significa algo, mas nem sempre a mesma coisa para todos.Para alguns, ela representa a idéia de responsabilidade ou obrigação legal; paraoutros, ainda, o significado transmitido é o de responsável por, num modo casual.Muitos, simplesmente, equiparam-na a uma contribuição caridosa; outrostornam-na pelo sentido de socialmente consciente (VOTAW, 1975 apud DUARTEe DIAS, 1986, p. 55).

Responsabilidade social é o compromisso que uma organização deve ter para com asociedade, expresso por meio de atos e atitudes que a afetam positivamente, demodo amplo, ou a alguma comunidade, de modo específico, agindo proativamente ecoerentemente no que tange a seu papel específico na sociedade e à sua prestação decontas para com ela (ASHLEY, 2003, p. 6).

Responsabilidade social corporativa significa a tentativa de sistematizar aspectossocial, cultural nas suas operações, incluindo questões relacionadas a direitoshumanos, trabalho e relações comunitárias, e relações fornecedores/consumidores(LUNHEIN, 2002 apud COELHO, 2004,p.24 ).

A responsabilidade social das empresas tem como principal característica acoerência ética nas práticas e relações com seus diversos públicos, contribuindopara o desenvolvimento contínuo das pessoas, das comunidades e dosrelacionamentos entre si e com o meio ambiente. Ao adicionar às suascompetências básicas a conduta ética e socialmente responsável, as empresasconquistam o respeito das pessoas e das comunidades atingidas por suas atividades,o engajamento de seus colaboradores e a preferência dos consumidores(INSTITUTO ETHOS, 2005).

Responsabilidade social pode ser também o compromisso que a empresa tem com odesenvolvimento, bem-estar e melhoramento da qualidade de vida dos empregados,suas famílias e comunidade em geral (JARAMILLO & ÁNGEL,1996 , apudASHLEY, 2003, p. 7).

A responsabilidade social nasce de um compromisso da organização com asociedade, em que sua participação vai mais além do que apenas gerar empregos,impostos e lucros. O equilíbrio da empresa dentro do ecossistema social dependebasicamente de uma atuação responsável e ética em todas as frentes, em harmoniacom o equilíbrio ecológico, com o crescimento econômico e com o desenvolvimentosocial (BARBOSA e RABAÇA, 2001, apud TENÓRIO, 2004, p. 25).

30

Para Votaw (apud DUARTE e DIAS, 1986), a responsabilidade social pode ser

definida como sinônimo de contribuição caridosa ou como comportamento social no sentido

ético. Dessa forma, trata-se de uma forma de a empresa investir em ações sociais sem se

preocupar em obter nenhum tipo de retorno.

Paoli (2002) tem a mesma percepção que Votaw (1975 apud DUARTE E DIAS,1986),

ao atribuir um sentido filantrópico à RSE. Para a autora, as ações corporativas são de natureza

civil e voluntária, conseqüências de uma percepção da responsabilidade social das empresas

diante das carências e desigualdades sociais da população. De acordo com suas palavras,

Uma parcela desse empresariado, diante do aumento das desigualdades sociais e dapobreza no país, lança-se ativamente no campo social, chamando seus pares àresponsabilidade para com o contexto no qual se desenvolvem seus negócios, enesse movimento redefine o sentido e o modo de operar da velha filantropia,aproximando-se da noção de cidadania (PAOLI, 2002, p. 385).

Já Alves (2003) apresenta uma percepção contrária, ao afirmar que a RSE abre uma

nova visão de empresa e de seu papel na sociedade: a empresa passa a ser encarada como

cidadã, fazendo parte de uma sociedade com a qual se relaciona, tendo, portanto, obrigações

e deveres que vão além dos limites estabelecidos por lei.

Segundo Grajew (2000), a responsabilidade social é uma forma de gestão empresarial

que envolve ética em todas as suas atitudes, o que significa fazer todas as atividades da

empresa e promover todas as relações com seus stakeholders de forma socialmente

responsável. Para o autor, ética é o que se traduz em ações concretas, que vão desde a escolha

de um produto à política de recursos humanos.

Responsabilidade social é um estágio mais avançado da cidadania corporativa. Neto e

Froes (2001,p.26) consideram que tudo teve início, com a prática de ações filantrópicas, ou

31

com o conceito de contribuição caridosa por parte dos empresários bem sucedidos em seus

negócios, que decidiram retribuir a sociedade , contemplando-a comparte dos seus ganhos.

Pelo fato de a RSE constituir ainda um conceito em construção, sujeito a muitas

discussões, as pessoas ainda a confundem com filantropia. Segundo Neto e Froes (2001, p.

28), existem algumas diferenças básicas entre responsabilidade social e filantropia, sintetizadas

no quadro 3.

QUADRO 3

Diferenças básicas entre filantropia e responsabilidade social

Filantropia Responsabilidade social

Ação individual e voluntária Ação coletivaFomento à caridade Fomento à cidadaniaBase assistencialista Base estratégica

Restrita a empresários filantrópicos eabnegados

Extensiva a todos

Prescinde de gerenciamento Demanda gerenciamento

Decisão individual Decisão consensualFONTE: Neto ; Froes , 2001, p. 28, com adaptações.

A filantropia desenvolve-se através das atitudes pessoais dos empresários, que podem

ser denominados “filantropos”, enquanto as ações de responsabilidade social refletem

iniciativas de empresas em prol de cidadania, o que tem a ver com consciência social e dever

cívico.

Enquanto a filantropia baseia-se no assistencialismo, visando a auxiliar os pobres,

excluídos e desfavorecidos, a responsabilidade social compreende um conjunto de ações

extensivas a todos os membros da sociedade, buscando estimular o desenvolvimento do

cidadão e fomentar a cidadania individual e coletiva (NETO; FROES, 2001, p. 26).

32

Segundo os referidos autores, em geral, as ações filantrópicas assumem a forma de

doações a entidades ou grupos, partindo de interesses e desejos individuais de empresários

filantrópicos, contrariamente às ações de responsabilidade social, que exigem periodicidade,

método e seu gerenciamento. O objetivo da filantropia é contribuir para a sobrevivência de

grupos menos favorecidos, enquanto o da responsabilidade social é buscar a sustentabilidade

de grandes e pequenas comunidades.

Shommer (2000) define filantropia como sendo um comportamento ou atitude que

significa amor ao homem ou à humanidade, pressupondo uma ação altruísta e desprendida. É

também relacionado à caridade, considerada por este autor como uma virtude cristã.

Azambuja (2001) , citado por TENÓRIO (2004), expressa sua opinião quanto à

filantropia da seguinte forma:

O ato de filantropia ou assistencialismo, por mais meritório que seja, é voluntário,circunstancial e se esgota em si mesmo. Pode criar, ainda, expectativas para ofuturo que não venham, necessariamente, a se realizar, dado o caráter episódico egratuito de muitos atos filantrópicos (AZAMBUJA,2001 apudTENÓRIO,2004,p.29).

De acordo com o Instituto Ethos (2005), a responsabilidade social trata diretamente

dos negócios da empresa e como ela os conduz. A filantropia é individualizada, porque a ação

parte do empresário; já a responsabilidade social é uma atitude coletiva, pois compreende as

ações de todos os segmentos de stakeholders de uma empresa: empregados, diretores,

fornecedores, clientes, comunidade e acionistas.

Para Neto e Froes (2001), a filantropia não busca retorno algum para a empresa;

apenas o conforto pessoal e moral, enquanto a responsabilidade social busca retorno social,

institucional, tributário-fiscal, podendo ser considerada então, uma ação estratégica da

empresa. Ainda segundo os autores, “a responsabilidade social é coletiva, mobilizadora,

33

porque valoriza a cidadania, promove a inclusão social e restaura a civilidade” (NETO;

FROES, 2001, p. 28).

Manzano (2004) aponta alguns requisitos que caracterizam a RSE: assegurar a

fidelidade dos clientes, motivar os empregados, construir relações duradouras com os

fornecedores, praticar a ecoeficiência, adotar a gestão de ciclo de vida do produto, respeitar o

meio ambiente e ser transparente na governança corporativa.

Após a década de 1990, tem se notado no Brasil a tendência a uma redefinição na

prática da filantropia, que, conforme também afirma Paoli (2002), vincula-se à palavra

“solidária”, pontuada agora como uma abertura voluntária das empresas privadas no que se

refere à questão da carência do povo brasileiro e à preocupação com o futuro. Esse fato pode

ser comprovado pela prioridade dada a temas referentes à infância, à proteção à família e à

educação, como áreas prioritárias da responsabilidade social empresarial.

Agrega-se também a esse novo conceito a palavra “cidadania”, percebendo-se o intuito

de se criar uma consciência cidadã entre o empresariado brasileiro, que se torna, então, um

parceiro na luta pelo social:

O empresariado brasileiro se agrega ao elogio da sociedade civil e do assimchamado “terceiro setor”, aparecendo como um ator que, junto com outrasorganizações não-governamentais, afirma sua disponibilidade civil em contribuir,no âmbito privado e mercantil, para a redefinição do modo de operar as políticaspúblicas que se dirigem à integração social e profissional de parcelas da população(.PAOLI, 2002, p. 387).

Nesse sentido, pode-se afirmar o surgimento de um novo termo relativo à ação

empresarial: a cidadania empresarial. Para Neto e Froes (1999), a cidadania empresarial

corresponde ao pleno exercício da responsabilidade social pela empresa. Uma empresa

torna-se cidadã quando oferece uma contribuição para o desenvolvimento da sociedade através

34

de ações sociais direcionadas a suprimir ou a atenuar suas principais carências em termos de

serviços e infra-estrutura de caráter social.

Fisher e Shommer (2000) apresentam o conceito de cidadania empresarial como uma

relação de direitos e deveres entre empresas e seu âmbito de relações e participação ativa

empresarial na vida de suas cidades e comunidades, participando das decisões e ações relativas

ao espaço público em que se inserem.

Neto e Froes (2001) apontam as seguintes características em uma empresa alinhada com

os princípios de cidadania empresarial:

tem alto comprometimento com a comunidade;

atua em parceria com o governo, demais empresas e entidades, em programas e

projetos sociais;

apresenta progressão de investimentos em áreas sociais;

viabiliza projetos sociais, independentemente dos benefícios fiscais existentes;

realiza ações sociais, cujo principal objetivo não é o marketing, mas um

comprometimento efetivo com a comunidade;

incentiva seus funcionários, conscientes da responsabilidade social da empresa, a

atuarem como voluntários em campanhas e projetos sociais;

incorpora responsabilidades diversas, além dos referentes a valores e princípios

empresariais ligados à sua missão e visão estratégica, envolvendo o seu relacionamento

com o governo, clientes, fornecedores, comunidade, sociedade, acionistas e demais

parceiros.

Nesse sentido, conforme argumentam Neto e Froes (2001,p.35-36),

35

[...] empresa socialmente responsável torna-se cidadã porque dissemina novosvalores que restauram a solidariedade social, a coesão social e o compromisso socialcom a equidade, a dignidade, a liberdade, a democracia e a melhoria da qualidadede vida de todos os que vivem na sociedade.

A participação das empresas nas práticas de responsabilidade social, fruto da crença na

cidadania social, representa, portanto, compromisso com o desenvolvimento sustentável. A

empresa participante passa a ser vista como colaboradora na construção de uma nova ordem

social.

A partir da análise das diferentes percepções de RSE apresentadas, optou-se pela

concepção de Ashley (2003,p.06), a qual norteará esta pesquisa, por se tratar de uma visão

mais ampla: “toda e qualquer ação que possa contribuir para a melhoria da qualidade de vida

de uma dada comunidade ou sociedade”. Também para efeito desta pesquisa, considerar-se-á

uma empresa socialmente responsável aquela que vai “além da obrigação de respeitar as leis,

pagar impostos e observar as condições adequadas de segurança e saúde para os

trabalhadores" (INSTITUTO ETHOS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL, 2005).

2.2 O conceito de responsabilidade social no Brasil

No Brasil, a atenção à RSE iniciou-se em 1960, com a criação da Associação dos

Dirigentes Cristãos de Empresas - ADCE, cujos princípios defendem a posição de que a

empresa possui uma função social que se realiza em nome dos trabalhadores e do bem-estar da

comunidade, além da produção de bens e serviços (COELHO, 2004).

36

Contudo, foi somente na década de 1990 que a responsabilidade social ganhou forte

impulso no Brasil, através da ação de entidades não-governamentais, institutos de pesquisas e

empresas sensibilizadas com a questão, especialmente o Instituto Brasileiro de Análises Sociais

e Econômicas - IBASE, cujo empenho na promoção e divulgação do Balanço Social, merece

ressalva.

O IBASE foi criado em 1981 como uma instituição de utilidade pública federal, sem

fins lucrativos e desvinculada de partidos políticos e religião, com a missão de colaborar com a

construção da democracia, combatendo a desigualdade e estimulando a participação cidadã.

Trata-se de uma entidade autônoma, comprometida com a defesa dos direitos humanos, a

justiça e o bem-estar social.

Um dos objetivos dessa instituição é orientar as empresas quanto à elaboração do

Balanço Social. Conforme mencionado anteriormente, a publicação do Balanço Social no

Brasil ganhou força a partir de 1997, com a campanha idealizada por seu presidente, Herbert

de Souza, buscando sensibilizar os empresários para o tema.

O Balanço social surgiu com a crescente demanda, por parte da sociedade, deinformações a respeito dos impactos que as atividades empresariais exercem sobreos trabalhadores, a sociedade, a comunidade e o meio ambiente (TENÓRIO, 2004,p. 37).

O IBASE, em parceria com diversos representantes de empresas privadas e públicas,

desenvolveu um modelo simples de Balanço Social que estimula as empresas a o divulgarem,

independentemente do tamanho e setor. No Brasil tal idéia começou a ser discutida na década

de 1970, contudo, apenas nos anos de 1980 surgiram os primeiros balanços sociais de

empresas. A partir da década de 1990, corporações de diferentes setores passaram a publicar

seu balanço social anualmente. Hoje é possível contabilizar o sucesso dessa iniciativa e afirmar

37

que o processo de construção de uma nova mentalidade e de novas práticas no meio

empresarial está em pleno curso (BALANÇO SOCIAL, 2005).

O Balanço Social, conforme argumentam Silva e Freire (2001, apud COELHO, 2004)

tem sido considerado pelos especialistas como peça fundamental no desenvolvimento de

estratégias de responsabilidade social, pois torna público a intenção e os resultados efetivos

das ações empresariais nesse campo, construindo vínculos entre a empresa e os stakeholders.

Em 1982, surgiu, por iniciativa do Comitê de Comunicação das Câmaras Americanas

de Comércio de São Paulo, o PRÊMIO ECO cujos principais objetivos são estimular e

premiar projetos de ações sociais e relações comunitárias em benefício do bem-estar social,

desenvolvidos pela iniciativa privada, além de promover o reconhecimento público das ações

sociais e culturais que contribuem para o exercício da cidadania no País (REGULAMENTO

DO PRÊMIO ECO, 1995, apud PAULA e ROHDEN, 1998).

O PRÊMIO ECO é concedido anualmente, através de concursos nas áreas de cultura,

educação, saúde, preservação ambiental e participação comunitária. Desde sua criação, em

1982, o Prêmio ECO já teve 1.372 empresas participantes, somando com 1.653 projetos

inscritos, 117 projetos vencedores e mais de US$2,8 bilhões investidos em suas cinco áreas.

Além de seu objetivo principal, o Prêmio Eco tornou-se uma forma de motivar o empresariado

a investir em projetos de ações sociais .

Outra iniciativa que merece ressalva é a da Fundação Abrinq, fundada em fevereiro de

1990, a partir da mobilização da Associação brasileira dos fabricantes de brinquedos e animada

por sua principal figura, o politizado empresário Oded Grajew, sem fins lucrativos, sua missão

é “promover a defesa dos direitos e o exercício da cidadania da criança e do adolescente .” A

Fundação Abrinq é voltada para o atendimento a crianças carentes brasileiras, em questões

38

referentes a má nutrição, fome, desagregação familiar, trabalho infantil forçado, violência, falta

de acesso às escolas, e outras.

Para sua atuação, a Fundação Abrinq conta com recursos de toda a sociedade, exceto

do Poder Público, criando um elo de ligação com todos aqueles que querem trabalhar na

construção de um mundo mais justo e solidário. Os recursos arrecadados na sociedade, entre

pessoas físicas e jurídicas, são utilizados para:

divulgação dos direitos das crianças, chamando a atenção da sociedade para as

questões mais urgentes;

articulação política junto aos governos municipais, estaduais e federal, para influenciar

políticas públicas;

viabilização de programas e projetos realizados em parceria com empresas, governos,

e organizações sociais nacionais e internacionais;

reedição e divulgação das melhores experiências, transmitindo conhecimentos e

engajando novos parceiros.

Um dos programas da Fundação Abrinq tem como objetivo conceder um selo de

certificação ( o selo “Empresa Amiga da Criança”) às empresas que assumirem dez

compromissos em benefício da infância e envolverem seus colaboradores para melhorar a

qualidade de vida das crianças brasileiras. Os compromissos são:

1. dizer não ao trabalho infantil, não empregando menores de 16, exceto na condição de

aprendizes, só a partir de 14 anos;

2. respeitar o jovem trabalhador, não empregando menores de 18 anos em atividades

noturnas, perigosas ou insalubres;

39

3. alertar seus fornecedores, por meio de cláusula contratual ou outros instrumentos, de

que uma denúncia comprovada de trabalho infantil pode causar rompimento da relação

comercial;

4. fornecer creche ou auxílio-creche para filhos de funcionários.

5. assegurar que os funcionários matriculem seus filhos menores de 18 anos no ensino

fundamental e empreender esforços para que todos freqüentem a escola;

6. incentivar e auxiliar as funcionárias gestantes a realizar o pré-natal e orientar todas as

funcionárias quanto à importância dessa medida;

7. estimular a amamentação, dando condições para que as funcionárias possam

amamentar seus filhos até no mínimo os 6 meses de idade;

8. orientar seus funcionários a fazer o registro civil de nascimento dos seus filhos;

9. fazer investimento social na criança ou adolescente compatível com o porte da

empresa, conforme estabelecido pela Fundação Abrinq;

10. contribuir para Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente, com o equivalente

a 1% do imposto de renda devido, conforme estimativa de lucro tributável da empresa

em cada exercício.

Paoli (2002,p.401) ressalta em relação à esta certificação, que

[...] é fora de dúvida seu sucesso em atrair todo tipo de empresa., mais do queisso, a Fundação Abrinq concentrou sua campanha pelos direitos das crianças emsetores acusados de exploração ao trabalho infantil, e muitas destas empresas,atualmente estão certificadas e até mesmo apoiando programas que beneficiamcrianças.

Em 14 anos de atuação, mais de um milhão de crianças e adolescentes beneficiaram-se

por ações desenvolvidas pela Fundação Abrinq e por seus parceiros. Apoiada na questão da

40

ética empresarial, empenha-se na mobilização de empresas para uma responsabilidade social

mais ampla, envolvendo seu quadro de funcionários, a comunidade na qual está inserida e

regras éticas nos negócios, através de incentivos para a visibilidade das próprias empresas,

além de propor projetos e programas de ações, disponibilizando às empresas seu know-how em

captar recursos e repassá-los para os beneficiários.

De acordo com Paoli (2002), a Fundação Abrinq criou os novos moldes de filantropia

empresarial cidadã no Brasil, abrindo caminhos para que outras organizações adotassem

alguns programas sociais.

Peliano (2003) destaca alguns movimentos dessa época, especialmente o Movimento

pela Ética na Política e o da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, este

último lançado em 1993 por Herbert de Souza e o IBASE, sendo considerado um marco na

aproximação dos empresários brasileiros com ações sociais.

No ano de 1995 foi criado o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas – GIFE,

primeira associação da América do Sul a reunir organizações de origem privada que financiam

ou executam projetos sociais, ambientais e culturais de interesse público.

O GIFE, fruto do processo de consolidação da democracia brasileira, tem como

objetivo contribuir para a promoção do desenvolvimento sustentável do Brasil, por meio do

fortalecimento político-institucional e do apoio à atuação estratégica de institutos e fundações

de origem empresarial e de outras entidades privadas que realizam investimento social

voluntário e sistemático, voltado para o interesse público.

Uma das prioridades do GIFE é procurar ampliar e fortalecer uma esfera pública

não-estatal, formada por empresas, fundações e institutos de origem privada comprometidos e

dispostos a investir recursos privados para fins públicos. Para tal, o GIFE busca a

concretização da reforma do marco legal do terceiro setor, com vistas a oferecer um ambiente

41

legal, fiscal e tributário mais propício ao investimento social privado, porque acredita que a

contribuição do terceiro setor para a superação das desigualdades sociais do país pode ser

fortemente acelerada com uma legislação mais favorável.

Os serviços oferecidos pelo GIFE às empresas socialmente responsáveis contribuem

para o aperfeiçoamento e a difusão dos conceitos e práticas do uso de recursos privados para o

desenvolvimento de projetos sociais.

Em 1997, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas - IBASE lançou o

selo do Balanço Social , para estimular as empresas a divulgarem-no. O selo é um

demonstrativo de que a empresa assume publicamente seus investimentos e práticas divulgadas

anualmente por seu Balanço Social. Este reconhecimento é concedido apenas a empresas que

preenchem o Balanço Social no modelo IBASE na íntegra, comprometendo-se a distribuí-lo

entre seu corpo funcional e a publicá-lo em jornal ou revista de grande circulação. Outra

exigência é uma carta-compromisso assinada pela presidência ou direção, declarando a

não-utilização de mão de obra escrava e/ou infantil, sendo vedado o uso do selo por empresas

que negociam armas, cigarros e bebidas alcoólicas – ainda que preencham todos os requisitos

(IBASE, 2005). Em 2005, sessenta e quatro empresas brasileiras receberam o selo

(BALANÇO SOCIAL, 2005).

No ano de 1998, Oded Grajew fundou o Instituto Ethos de Responsabilidade Social

com o objetivo de mobilizar, ajudar e incentivar as empresas a gerirem seus negócios de forma

responsável, tornando-as parceiras na construção de uma sociedade mais próspera e justa

(INSTITUTO ETHOS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL, 2005).

O Instituto Ethos de Responsabilidade Social é uma organização sem fins lucrativos,

fundada em 1998, reunindo atualmente 1041 empresas associadas, de diferentes portes e

setores de atividade em operação no Brasil.

42

Para fortalecer o movimento pela responsabilidade social no Brasil, em 2000, o

Instituto Ethos concebeu os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social como um sistema

de avaliação do estágio em que se encontram as práticas de responsabilidade social das

empresas nacionais.

Os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social constituem uma ferramenta de

auto-diagnóstico, cuja principal finalidade é auxiliar as empresas a gerenciarem os impactos

sociais e ambientais decorrentes de suas atividades, objetivando mobilizá-las para a causa da

responsabilidade social empresarial, por meio de uma ferramenta de gestão abrangente, e

melhorar a qualidade dos relatórios e balanços sociais. Trata-se de um instrumento de

auto-avaliação e aprendizagem de uso essencialmente interno, cujos principais temas estão

sintetizados a seguir:

Valores, transparência e governança

Auto-regulação da conduta: compromissos éticos; enraizamento da cultura

organizacional; governança corporativa;

Relações transparentes com a comunidade: diálogo com os stakeholders;

Relações com a concorrência; balanço social.

Público interno

Diálogo e participação: relações com sindicatos; gestão participativa;

Respeito ao indivíduo: compromisso com o futuro das crianças; valorização da

diversidade;

Trabalho decente: política de remuneração, benefícios e carreira; cuidados com saúde,

segurança e condições de trabalho; compromisso com o desenvolvimento profissional e

43

empregabilidade; comportamento em face a demissões; preparação para a

aposentadoria.

Meio ambiente

Responsabilidade em relação às gerações futuras: comprometimento da empresa com a

melhoria da qualidade ambiental; educação e conscientização ambiental;

Gerenciamento do impacto ambiental e do ciclo de vida de produtos e serviços;

minimização de entrada e saída de materiais.

Fornecedores

Seleção, avaliação e parceria com os fornecedores: critérios de seleção e avaliação de

fornecedores; trabalho infantil na cadeia produtiva; trabalho forçado na cadeia

produtiva; relações com trabalhos terceirizados; apoio ao desenvolvimento de

fornecedores.

Consumidores e clientes

Dimensão social do consumo: política de comunicação comercial; excelência de

atendimento; conhecimento e gerenciamento dos danos potenciais dos produtos e

serviços.

Comunidade

44

Relações com a comunidade local: gerenciamento do impacto da empresa na

comunidade de entorno; relações com organizações locais;

Ação social: financiamento da ação social; envolvimento da empresa com a ação social.

Constam ainda no questionário do diagnóstico, temas referentes ao governo e à

sociedade, relativos à transparência política e liderança social.

A estrutura desse instrumento permite que as empresas planejem a forma mais

conveniente de alcançarem melhores resultados. Ao responder aos Indicadores Ethos, a

empresa pode verificar quais são os pontos fortes de sua gestão e as oportunidades de

melhoria. Os dados fornecidos pelas empresas e os relatórios elaborados pelo Instituto Ethos

são tratados de forma confidencial (INSTITUTO ETHOS DE RESPONSABILIDADE

SOCIAL, 2005).

Além dessas iniciativas, cabe destacar, em 2000, a agenda do chamado Global

Compact, proposta pelo Secretário Geral da ONU, Kofi Annan, à comunidade empresarial

internacional, como estratégia para o avanço da postura ética nos negócios. O principal

objetivo do Global Compact é mobilizar a comunidade empresarial para a promoção de

valores fundamentais nas áreas de direitos humanos, trabalho e meio ambiente.

A responsabilidade social nos negócios é um tema ainda em desenvolvimento no Brasil.

De acordo com Ashley (2003, p. 75), “não houve registro de nenhum boom que merecesse

menção honrosa nas diversas mídias existentes”, contudo, sem dúvida, esse cenário tende a

mudar gradativamente, e algumas empresas brasileiras já têm a RSE como assunto constante

em suas agendas.

45

A importância crescente atribuída ao reconhecimento das iniciativas das empresas em

áreas sociais é um indicador de que a prática social tende a estar cada vez mais presente no

meio empresarial brasileiro (ASHLEY, 2003, p. 75).

As muitas premiações atribuídas nesse âmbito demonstram a evolução da atenção

dispensada ao tema: Selo Empresa Cidadã (Câmara Municipal de São Paulo), Top Social

ADVB (Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil), Prêmio Eco (Câmara

Americana de Comércio) e Selo Empresa Amiga da Criança (Fundação Abrinq).

2.3 Principais doutrinas sobre RSE

De acordo com Filho e Zylbersztajn (2004) é no meio acadêmico amplamente aceita a

idéia de que a atividade de negócios tem uma dimensão ética, além da econômica e da legal,

contudo, há crescentes debates quanto à natureza dessa dimensão ética e sobre quem deve

responsabilizar-se por ela. As opiniões dividem-se em duas correntes principais: um grupo

defende a visão dos stokholders e outro a dos stakeholders.

Maximiniano (1997) discute as duas visões denominando-as de Doutrina da

Responsabilidade Social e Doutrina do Acionista, cujas características estão respectivamente

apresentadas no Quadro 4, a seguir.

QUADRO 4

Doutrinas sobre responsabilidade social das empresas

Doutrina da responsabilidade social( visão do stakeholders)

Doutrina do interesse do acionista( visão do stockholders)

as empresas são depositárias derecursos sociais.

A responsabilidade primária daempresa é defender o interesse de seus

46

As empresas existem com aautorização da sociedade.

As empresas, e outras organizaçõesafetam a qualidade de vida dasociedade.

As empresas têm obrigação de agirsegundo os interesses da sociedade.

As empresas devem prestar contas desua ação à sociedade.

acionistas.

Defendendo o interesse do acionista, aempresa faz o que sabe fazer melhor ebeneficia a sociedade pela produçãode riquezas.

Não cabe à empresa resolverproblemas sociais que pertencem aoâmbito das organizações de caridade edo governo.

FONTE: Maximiniano ,1997, p.308, com adaptação.

De acordo com Maximiniano (1997), o principio da responsabilidade social baseia-se

na premissa de que as organizações são instituições sociais, que existem com a autorização da

sociedade, utilizam os seus recursos e afetam a qualidade de vida da sociedade. A corrente

alternativa, denominada “Doutrina do interesse do acionista”, propõe que as empresas têm

obrigações primordialmente com seus acionistas. De acordo com esta doutrina, a ética das

decisões dos negócios consiste em procurar as alternativas que produzam mais dinheiro,

porque esta diretriz promove a utilização mais eficiente e eficaz dos recursos individuais,

ambientais, sociais e organizacionais.

A discussão sobre a existência de responsabilidade social por parte das organizações, à

medida que o comportamento delas afeta o de outras instituições, organizações, grupos e

pessoas, tem se restringido à análise das visões dos stockholders e dos stakeholders, como já

mencionado anteriormente. Segundo Ashley (2003), nos últimos trinta anos, o tema RSE vem

sendo atacado e apoiado por vários autores, conforme relatado a seguir.

47

2.3.1 A Doutrina do acionista: visão do stockholder

Os autores contrários à ampliação da RSE baseiam seus argumentos principalmente nos

pontos de vista de Friedman (1970), sobre o direito da propriedade, os quais são

desfavoráveis às atividades de responsabilidade social empreendidas pelas empresas. Friedman

1970) defende a visão dos stockholders, contrapondo-se à dos stakeholders, argumentando

que os gestores, ao incrementarem os lucros da empresa, respeitam os direitos da propriedade

os acionistas e/ou cotista, promovendo dessa forma o bem-estar social. Quando os

administradores direcionam sua atenção aos problemas sociais, eles podem estar violando suas

atribuições de interesses da empresa e interferindo na habilidade do mercado de promover o

bem-estar geral, numa economia de livre mercado.

Friedman (1985, apud TENÓRIO, 2004), assim se refere à função social empresarial:

Ultimamente um ponto de vista específico tem obtido cada vez maior aceitação – ode que os altos funcionários das grandes empresas e os líderes trabalhistas têm umaresponsabilidade social além dos serviços que devem prestar aos interesses de seusacionistas ou de seus membros. Este ponto de vista mostra uma concepçãofundamentalmente errada do caráter e da natureza de uma economia livre. Em taleconomia só há uma responsabilidade social do capital – usar seus recursos ededicar-se a atividades destinadas a aumentar seus lucros até onde permaneçamdentro das regras do jogo, o que significa participar de uma concepção livre eaberta, sem enganos ou fraude ( FRIEDMAN ,1985, apud TENÓRIO, 2004, p.15).

A premissa básica de Friedman é de que, ao buscar a maximização dos lucros em um

sistema de livre mercado, as empresas já estariam gerando condições para um equilíbrio social:

o pagamento de salários justos acionaria a dinâmica de crescimento do mercado e o aumento

do nível de renda; a arrecadação de tributos levaria a uma distribuição eqüitativa dos recursos

e das condições necessárias para a vida social, e o investimento em outros negócios ou no

48

próprio negócio criaria as condições de equilíbrio econômico e social. Assim, “De acordo com

esta visão, os recursos destinados a ações sociais deveriam ser sabiamente gastos, sob a

perspectiva social, no incremento da eficiência da firma” (FILHO, 2002, p. 19).

Esta corrente defende a idéia de que empresas socialmente responsáveis estariam em

desvantagem competitiva, por incorrerem em maiores custos. Para Friedman (1970), as ações

sociais reduzem os retornos dos acionistas, aumentam os custos dos produtos e,

consequentemente, os custos para os clientes , concorrendo para a redução dos salários dos

funcionários, já que o investimento em ações sociais poderia estar sendo destinado à melhoria

de salários. Do ponto de vista do autor, acionistas, clientes e funcionários é que teriam que

decidir se querem ou não investir seus próprios recursos em ações sociais.

Pela perspectiva do direito da propriedade, argumenta-se que os gestores não têm o

direito de fazer nada, a não ser a maximização do lucro dos acionistas. Agir de outra forma

seria violar as obrigações legais, morais e institucionais na direção da empresa. Gerentes de

grandes corporações não possuem competência técnica, tempo ou mandato para tais

atividades, que constituem uma tarefa sobre o lucro dos proprietários. As instituições como

igreja, governo, sindicatos e organizações sem fins lucrativos existem para atuar sobre as

funções necessárias ao cumprimento da responsabilidade social (ASHLEY, 2002, apud

DURÃO, 2004, p.17).

Friedman (1984, apud DURÃO, 2004 ,p.17) entende que :

Há poucas coisas capazes de minar tão profundamente as bases da nossa sociedadelivre do que a aceitação por parte dos dirigentes das empresas de umaresponsabilidade social que não a de fazer tanto dinheiro quanto possível para seusacionistas. Trata-se de uma doutrina fundamentalmente subversiva. Se homens denegócios têm outras responsabilidades sociais que não a de fazer tanto dinheiropara seus acionistas, como poderão eles saber qual seria ela? Podem os indivíduosdecidir o que constitui interesse social?

49

Friedman (1970) vai além nos seus argumentos, afirmando que as empresas não são

seres humanos, não podendo, portanto, ser portadoras de qualquer responsabilidade, que é

uma função das pessoas. Segundo seu entendimento, se os homens de negócios se sentirem

responsáveis pelo bem-estar coletivo, ou promover o bem-estar social, devem agir de forma

individual, sem colocar em jogo o capital das empresas.

A visão economicista defendida por Friedman (1970) vem perdendo força, à medida

que as práticas de responsabilidade social avançam entre as empresas. A maioria dos autores

que tratam do tema RSE mantêm uma posição antagônica à de Friedman, conforme

argumenta Drucker (1997,p.70-71),

É inútil alegar, como faz o economista e laureado com o Prêmio Nobel MiltonFriedman, que uma empresa tem somente uma responsabilidade: o desempenhoeconômico. O desempenho econômico é a primeira responsabilidade da empresa.Uma empresa que não apresente lucro no mínimo igual ao seu custo de capital ésocialmente irresponsável. Ela desperdiça recursos da sociedade. O desempenhoeconômico é a base; sem ele a empresa não pode cumprir nenhuma outraresponsabilidade, nem ser uma boa empregadora, uma boa cidadã, uma boavizinha. Mas, o desempenho econômico não é a única responsabilidade de umaempresa.

Também Borger defende posição divergente:

[...] a atuação das empresas para a responsabilidade social não implica que a gestãoempresarial abandone seus objetivos econômicos e deixe de atender os interessesdos seus proprietários e acionistas; pelo contrário, uma empresa é socialmenteresponsável se desempenha seu papel econômico na sociedade, produzindo bens eserviços, gerando empregos, retorno para seus acionistas dentro das normas legais eéticas da sociedade. Mas cumprir seu papel econômico não é suficiente; a gestãodas empresas é responsável pelos efeitos de sua operação e atividades na sociedade ( BORGER, 2001b, p. 6).

2 A Doutrina da responsabilidade social: a visão dos stakeholders

50

Segundo Marens e Wicks (2000, apud FILHO, 2004), Freeman foi o primeiro autor a

discutir explicitamente a teoria dos stakeholders, na qual propôs que as corporações definam

amplamente a responsabilidade social em relação aos grupos de interesses que afetam a

organização ou são afetados por ela.

Freeman (citado por BORGER, 2001b) classificou esses grupos de interesses em

primários e secundários. Os grupos primários são aqueles que influenciam diretamente os

negócios da empresa, ( acionistas, sócios, empregados, fornecedores, clientes e a população

residente na área de atuação da empresa, o ambiente natural, a espécie humana e as futuras

gerações). Os grupos secundários são os que não são afetados diretamente pela sua atividade

e não estão diretamente engajados em suas transações nem são essenciais para sua

sobrevivência ( a mídia e os grupos de pressão).

Mitchel, Agle e Wood (1997), por sua vez, chamam a atenção para o fato de que o

conceito apontado por Freeman é o conceito mais amplo do termo e abre uma possibilidade

infinita para qualquer um que possa afetar ou que é de fato afetado pela organização, pois até

mesmo fatores climáticos podem exercer este papel. Starik (1993 apud CAMPOS, 2003),

baseando-se em Freeman (1984), propõe que o conceito seja estabelecido a partir do corte

feito pelo pesquisador, pois o que pode afetar ou ser afetado pela organização pode incluir a

atmosfera, os seres inanimados e todos os seres vivos.

Outros autores definem stakeholders em um nível mais restrito, como Clarkson (1984,

apud CAMPOS, 2003), que define o termo a partir do risco envolvido. Desta forma,

stakeholders voluntário é aquele que incorre algum risco por ter investido de alguma forma na

organização; e involuntário é aquele sujeito a riscos decorrentes das ações da empresa.

51

Mitchel et al. (1997) propõem identificar os stakehoders a partir de alguns princípios:

poder para influenciar a firma; legitimidade dessas relações e impacto de suas exigências sobre

a organização. Neste estudo, adota-se o conceito de stakeholders proposto por Freeman (apud

FILHO e ZYLBERZTAIN, 2002), de acordo com a figura 1, a seguir, com adaptações.

Free

m a n

(1999)

defend

e a

doutrin

a da

gest ão

com base na teoria dos stakeholders. Segundo o autor, a gestão envolve, além da alocação

dos recursos organizacionais, a consideração dos impactos dessa alocação nos diversos grupos

de interesses internos e externos à organização, cabendo aos gestores a atribuição ética de

respeitar os direitos e promover o bem-estar entre todos os agentes afetados pela empresa (

fornecedores, clientes, funcionários, acionistas e comunidade). Os defensores dessa visão

argumentam que atitudes socialmente irresponsáveis culminarão em um aumento de custos,

resultando em desvantagem competitiva.

Filho e Zylbersztajn (2002) corroboram essa idéia, ao afirmarem que o resultado final

da atividade de uma organização deve levar em conta não apenas os retornos dos acionistas,

mas também de todos os stakeholders, ou seja, sendo assim, as empresas precisam incorporar

em suas ações uma relação mais ética e transparente com seu público.

A organização

Gestores

Comunidade local

Clientes

Funcionários

Proprietários(stockholders)

Fornecedores

FIGURA 1: MODELO DA TEORIA DO STAKEHOLDER

52

As ações de responsabilidade social baseadas na teoria dos stakeholders se

justificariam, conforme salientado por Wood (1991, apud FILHO e ZYLBERZTAIN,2002

,p.91) pelo fato de que a empresa e a sociedade “[...] são entidades interligadas e não distintas;

portanto, a sociedade tem certas expectativas em relação ao comportamento e resultado das

atividades de negócios.”

Borger (2001b) ressalta que o ponto crucial dessa teoria é que os interesses de cada um

dos grupos são diferentes. As organizações têm interdependência entre todas as partes

interessadas, mas não da mesma forma: cada uma das partes espera que as decisões

estratégicas venham ao encontro de seus objetivos.

Conforme este modelo sugere, os proprietários ou acionistas que possuem uma porção

financeira da organização, na forma de cotas ou ações, esperam um retorno financeiro da

empresa: os funcionários têm seus empregos e são, em grande parte, dependentes da

organização, já que, em troca de seu trabalho, esperam salários, segurança, benefícios e outras

vantagens; os fornecedores, por sua vez, têm fundamental importância no processo, pois são

os que fornecem insumos e matérias-primas decisivas para determinar a qualidade e o preço

final dos produtos (por outro lado, a organização é cliente desses fornecedores e,

consequentemente, um stakeholder deles); os clientes, por outro lado, efetuam as trocas com

a organização: eles esperam receber produtos e serviços de qualidade e confiabilidade,

fornecendo recursos monetários vitais para a sobrevivência da organização; por fim, a

comunidade onde a empresa se instala garante à organização o direito de construir suas

instalações e recebe em troca benefícios como empregos, taxas e contribuições.

Freeman ( 1999 apud FILHO e ZYLBERZTAIN, 2002) não inclui os competidores e o

governo em seu modelo; contudo, destaca que nem sempre os interesses dos competidores em

53

determinada indústria geram conflitos, e enfatiza o papel das associações e organizações de

classe na busca do atendimento ao interesse comum.

De maneira ampla, o modelo apresentado estabelece uma relação da empresa com seus

diversos públicos. Na visão de Stoner e Freeman (1985), os stakeholders exercem influência

direta na organização, razão pela qual a empresa deve ficar atenta às suas expectativas , pois

são eles que lhe dão sustentação. Pensar na responsabilidade social para com seu stakeholder é

pensar na obrigação que se tem para com aqueles que podem afetar o objetivo (BERKOWITZ

et al., 2003, apud FORMENTINI, 2004).

A administração do modelo exposto consiste, então, em identificar os grupos de

interesses, e quando não for possível satisfazer a todos e responder à demanda, deve-se

priorizar o atendimento a esses grupos (WINTER e STEGER, 1998, apud BORGER, 2001b):

O modelo do stakeholder, segundo Wood e Boatright, é uma visão de gestãopromissora; é uma ferramenta valiosa para identificar e organizar a multiplicidadedas obrigações de uma empresa com os diferente grupos. Por enquanto é umarcabouço teórico para iniciar uma tarefa muito difícil: de decidir exatamente asobrigações de uma empresa sobre a RSE (BORGER, 2001b, p. 26).

Outro autor que defende esta visão é Archie Carrol (1979) , citado por Borger,

(2001a), cuja contribuição para a literatura é relevante após analisar diversos conceitos sobre

RSE, a autora desenvolveu o seguinte modelo piramidal das dimensões da responsabilidade

social (FIG.2), o qual integra a maioria dos argumentos a favor da RSE em uma única

estrutura. Este modelo abrange as quatro dimensões da responsabilidade social: econômica,

legal, ética e filantrópica, esta última surgida das expectativas da sociedade.

54

FIGURA 2: PIRÂMIDE DA RSEFONTE: Carrol 1991, apud Borger, 2001a, p. 43, com adaptações.

Borger (2001b) assim explica a posição de Carrol, com relação ao modelo piramidal:

a) Responsabilidade econômica: “Os negócios têm uma natureza econômica, pois, antes de

mais nada, a instituição de negócios é a unidade econômica básica da nossa sociedade”

(BORGER, 2001b, p. 9). Os negócios têm de produzir bens e serviços, para servir à

sociedade mediante a obtenção de lucros, considerados como uma recompensa à

eficiência e eficácia da organização. Produzir e vender em troca de lucro é a base do

sistema capitalista. Carvalho (2002), por sua vez, concorda com o modelo proposto por

Carrol quanto ao entendimento de que a responsabilidade econômica é a base das

ResponsabilidadesfilantrópicasSer um bom

cidadãoContribuir comrecursos para

melhorar aqualidade de vidada comunidade

Responsabilidades éticasSer ético

Fazer o que é certo, justo e

Responsabilidades legaisObedecer à lei

Respeitar a legislação por ser a codificação do certo e doerrado .

Jogar dentro das regras do jogo

Responsabilidades econômicasSer Lucrativo

55

dimensões da RSE, salientando que “sem lucros, a companhia não pode investir em

programas sociais e ambientais” (CARVALHO, 2002, p. 13).

b) Responsabilidade legal: diz respeito ao cumprimento das leis existentes. A sociedade espera

que os negócios respeitem a lei, pois atuar em consonância com as regras estabelecidas é

condição para a existência de negócios na sociedade. Espera-se que os negócios ofereçam

produtos que atendam aos padrões de segurança e obedeçam às regulamentações

ambientais;

c) Responsabilidade ética refere-se a comportamentos e normas que os negócios devem

seguir, de acordo com as expectativas sociais. A responsabilidade ética “tem adquirido

cada vez mais importância, principalmente porque os níveis de tolerância da sociedade em

relação aos comportamentos antiéticos estão cada vez menores” (BORGER, 2001b, p. 9).

Esse fato implica maior análise e reflexão ética por parte das empresas, cujas decisões

devem ser tomadas levando-se em conta as conseqüências de suas ações, de forma a

cumprirem seus deveres, sem prejudicar os outros e buscando a justiça e o equilíbrio na

defesa dos interesses dos stakeholders.

d) Filantropia empresarial: consiste nas ações discricionárias tomadas pela gerência, em

resposta às expectativas sociais. Reflete o desejo comum de que as empresas se envolvam

em projetos sociais que tragam melhorias para o ambiente social.

O modelo de Carrol contempla, de certa forma, o significado amplo de RSE, pois

estabelece um conjunto de componentes interdependentes na relação da empresa com a

sociedade. Através desse modelo pode-se avaliar como as empresas vêm gerindo sua política

de RSE.

56

Formentini (2004, p. 48) aponta algumas práticas de ações sociais dirigidas aos

stakeholders de uma organização:

Público interno: As pessoas devem ser motivadas e valorizadas, para que atuem em

coesão com os objetivos organizacionais. A cultura organizacional deve ser voltada

para o tratamento dos colaboradores com dignidade e liberdade de iniciativa. Deve

também ser estimulado o trabalho voluntário, inserindo as pessoas em projetos

sociais da comunidade.

Comunidade: A aproximação da comunidade onde se insere a empresa é uma

prioridade das organizações socialmente responsáveis. A empresa precisa gerenciar

os impactos de sua atividade produtiva, buscando manter um bom relacionamento

com a comunidade; deve direcionar suas ações de responsabilidade social a quem

está próximo, de acordo com os interesses da comunidade e os objetivos

organizacionais.

Fornecedores: A empresa socialmente responsável deve cumprir os contratos de

forma ética, em consonância com o código de conduta, respeitando todos os

componentes da cadeia produtiva.

Acionistas, proprietários e investidores: A empresa socialmente responsável deve-

se basear em princípios éticos,empenhando-se no sentido de distribuir corretamente e

com transparência seus resultados aos acionistas.

Governo: A empresa deve ser comprometida com a cidadania na sociedade, além de

assumir atitude contrária à oferta e ao recebimento de propinas. A parceria entre

governo e iniciativa privada é importante para a sociedade.

57

Concorrentes: A empresa deve evitar práticas monopolísticas e oligopolísticas, bem

como a formação de trustes e cartéis, no sentido de fortalecer a livre concorrência no

mercado.

Clientes/consumidores: A responsabilidade social para com os clientes relaciona-se

com a diminuição dos custos e com o aumento da segurança, da qualidade dos

produtos e serviços, da confiabilidade e da ética nas transações. Uma questão

fundamental é a informação, que dá ao cliente a liberdade de escolha. A partir do

momento em que os consumidores levam em conta a reputação da empresa, no

momento da compra, a responsabilidade social passa a ser estratégica.

De acordo com Ashley (2003), os argumentos dos autores a favor da RSE podem ser

direcionados a duas linhas básicas: a instrumental e a ética. A primeira considera que existe

uma relação positiva entre o comportamento socialmente responsável e o desempenho

econômico da empresa; A segunda é voltada para os princípios religiosos e as normas sociais,

considerando que as empresas e seus empregados deveriam se comportar de maneira

socialmente responsável por ser a ação moralmente correta, mesmo que acarrete despesas

improdutivas em termos econômicos.

Jensen (2000 apud FILHO, 2002) apresenta algumas contradições na teoria dos

stakeholders. Para este autor, os múltiplos objetivos dessa teoria são, na verdade, estratégias,

e a criação de valor é o principal objetivo a ser seguido como referência.

Dentro dessa mesma ótica, Stemberg (1999, apud FILHO, 2002) ressalta que há um

desvio implícito na teoria dos stakeholders, que tende a mascarar a possibilidade de avaliação

da performance da gestão, observando que os gestores podem se amparar nos diversos

58

objetivos difusos da organização para justificar decisões tomadas não necessariamente na

direção da busca de maximização de valor dos acionistas.

Cabe ressaltar que tanto a argumentação de Jensen como a de Stemberg não são, em

principio, contrárias às práticas de responsabilidade social nas empresas, mesmo porque esses

autores reconhecem que tais práticas podem servir estrategicamente ao processo de busca de

valor por parte das organizações (FILHO, 2002, p. 97).

Independentemente dos argumentos teóricos, o fato é que atualmente, os diversos

stakeholders das empresas, a sociedade e o mercado interno exigem, cada vez mais, que as

organizações adotem medidas de valorização da responsabilidade empresarial (PAULA e

ROHDEN, 1998). Cada vez mais, as organizações são pressionadas a assumir seu papel como

membros efetivos da sociedade e das comunidades onde estão inseridas. Acredita-se que, além

da instauração de novas práticas empresariais, essa questão coloca em discussão a construção

de outra imagem do empresariado. Além da exigência de mercado, existem diferentes motivos

que têm levado as empresas a dirigir maior atenção à RSE, bem como um leque de benefícios

que tal política pode trazer às empresas.

2.4 RSE: por quê e para quê

Neto e Froes (2001) observam que diante de inúmeros riscos envolvidos na adoção

indiscriminada da lógica econômica da globalização, as empresas optaram por uma nova lógica

59

e uma racionalidade social, não para substituir a lógica existente, mas para tentar diminuir seus

riscos sistêmicos. Surgem assim, uma nova filosofia empresarial, um novo modo de conceber

as relações entre os fatores de produção e uma nova concepção da empresa e de seu papel na

sociedade.

Ocorre então, a passagem de uma visão exclusivamente econômica para a percepção

das empresas na perspectiva do desenvolvimento sustentável, por força do mercado,

configurando uma nova racionalidade empresarial, cujas características, no ponto de vista de

Neto e Froes (2001), estão situadas no quadro 5.

QUADRO 5

Nova racionalidade social empresarialCaracterísticas corporativas

Atuação das empresas como principais agentes

Foco na comunidade (não na sociedade)

Ênfase na prática da solidariedade empresarial ( não local ou regional)

Desenvolvimento da comunidade a partir das ações sociais empresariais

Relevância da empresa como grande investidor social ( não o Estado ou a sociedade)

FONTE: Neto; Froes , 2001, p. 7

De acordo com a nova racionalidade, o Estado não deixa de ter importância, pois só

ele é capaz de formular e implementar políticas sociais capazes de atingir a toda a sociedade.

As empresas atuam como principais agentes, e o foco de suas ações é a comunidade local, não

sendo portanto, tão abrangente, como seria, se fosse o Estado: “Cada unidade produtiva da

empresa global interage com a comunidade mais próxima, preferencialmente situada em seu

entorno” (NETO;FROES, 2001, p. 7).

60

Muitos são os argumentos buscando propor conexões entre a sociedade, a cidadania, as

empresas privadas e suas ações, voltadas para a promoção social. Paoli (2002) afirma que a

privatização da esfera pública e a “publicização” dos interesses privados levaram ao advento

do ativismo social voluntário do setor privado e de ONGs, dirigido para a melhoria da situação

das pessoas mais vulneráveis da sociedade, apesar de o Estado continuar a ter todas as

obrigações legais relativas à questão social.

A autora exemplifica com um texto oficial, o qual admite que deve o Estado ser o ator

principal na definição de uma política de desenvolvimento social; contudo,

[...] não tem condições nem para elaborar sozinho esta política, nem paraimplementá-la [...] Somente com uma ampla mobilização da sociedade serápossível reunir recursos suficientes para enfrentar o problema [ a exclusão socialbrasileira]. Trata-se, portanto, de buscar parceiros fora do Estado, isto é, nasociedade, ou mais especificamente, nas empresas privadas e no terceiro setor, [ eestes, constituídos] o protagonismo dos cidadãos, rompe a dicotomia entre público eprivado, na qual o público era sinônimo de estatal, e o privado, de empresarial(PELIANO, 2000, apud PAOLI, 2002,p.390).

De acordo com Singer (2002, apud TENÓRIO, 2004, p. 24), “os problemas sociais se

intensificaram com a retomada vigorosa de políticas econômicas e de estratégias de

intervenção econômica por organismos supranacionais, utilizando-se do (neo)liberalismo

econômico, o que resultou no surgimento de diversas organizações não-governamentais e na

consolidação do terceiro setor.” Contudo, na opinião do autor, é necessária a atuação do

Estado como promotor e direcionador das políticas sociais, visto que o mercado e as ONGs,

somente, não são capazes de reduzir as desigualdades sociais.

Para Ashley (2003), o equilíbrio de uma sociedade depende do governo, da família e da

empresa; contudo, a autora afirma que o futuro do Brasil está nas mãos da empresa, pois já

não se pode esperar muito do governo. Por sua vez, a família está centrada na luta para

comunicar os valores morais e culturais aprendidos por tradição, os quais mantinham os

61

cidadãos na integridade. Cabe às empresas, então, exercer o papel principal de cuidar de

reconstruir o país, produzindo, criando, investindo e gerando conhecimentos.

A empresa é o foco irradiador da solidariedade, “um grande investidor social” e

principal agente do desenvolvimento local ou regional. De acordo com Peliano (2001), as

empresas brasileiras, apesar de, há algum tempo, já realizarem ações filantrópicas, somente

iniciaram uma nova forma de participação no campo social, de uma forma mais ativa e

estruturada, nos anos 1990. Com o crescente aumento da desigualdade social e diante da

incapacidade do Estado de responder às questões sociais de forma eficiente, reforçou-se o

papel das organizações não-governamentais e o das empresas privadas no envolvimento na

causa social.

Coutinho e Macedo-Soares (2002) partilham dessa percepção, conforme pode-se

perceber na análise que fazem da relação entre problemas estruturais e mudanças no

comportamento empresarial:

Devido ao agravamento de problemas sociais e ambientais por todo o planeta –desemprego, exclusão, poluição, exaustão dos recursos naturais – e à dificuldadedos governos de solucioná-los, as forças da sociedade estão passando por umprocesso de reorganização. É nesse contexto que as empresas sentem a pressão paraadotarem uma postura socialmente responsável na condução dos negócios(COUTINHO e MACEDO-SOARES, 2002, p. 76).

Segundo Paoli (2002), o desenvolvimento da ação empresarial solidária e responsável

se dá no contexto onde ocorre uma disputa por uma forma de regulação social que busca a

legitimação, através da deliberação sobre a interdependência dos bens públicos e privados. A

ação responsável empresarial legitima-se, sobretudo, no interior do “terceiro setor”, que

busca um modelo de regulação social mais eficaz do que o realizado pelo Estado. Apesar de

ser a urgência de uma gestão eficaz nos serviços sociais de assistência no Brasil uma condição

62

a legitimação desse setor, o que se propõe para a sua expansão é um novo modelo para

resolver as questões sociais, centrado na generalização de competências civis descentralizadas,

exercidas pelo ativismo civil voluntário.

Bresser (1999, apud PAOLI, 2002) apresenta uma versão da passagem de uma

sociedade organizada por referência aos direitos fundamentados na solidariedade coletiva para

uma sociedade organizada pela ação solidária privada, disposta a se incumbir de serviços

sociais. Segundo o referido autor, os direitos básicos do ser humano (saúde, educação,

cuidado da infância e da velhice) são transformados em investimentos em capital humano, que

devem receber uma boa gestão, a qual será realizada em um espaço denominado de “público

não-estatal”, aberto pela redução das políticas públicas voltadas para as garantias dos direitos

sociais, o qual começa a ser ocupado por uma parcela do empresariado brasileiro.

Contudo, tais idéias significam que o governo está transferindo para o âmbito privado

a responsabilidade social pública brasileira. Trata-se de uma reflexão sobre o compromisso dos

atores privados com a busca de redução da desigualdade social.

No caso do Brasil, especificamente, país com enormes desigualdades e carências

sociais, a responsabilidade social possui uma relevância ainda maior (COELHO, 2004). De

acordo com Itacarambi (2003, apud COELHO,2004), a concentração de renda no País

mantêm na pobreza mais de cinqüenta milhões de pessoas, convivendo com problemas de

acesso à saúde, insegurança alimentar, falta de acesso à educação, moradia e assistência social.

Tal esta situação levou as instituições a se organizarem e reagirem, posicionando-se como

partes de um processo voltado para a busca de uma sociedade mais justa:

Percebe-se, nos últimos tempos que a sociedade organizada – indivíduos,empresas, entidades, ONGS - vem enfatizando a necessidade de assumir desafiosna área social, que vão além da conscientização, fazendo, sim, uma verdadeiramobilização econômico-social, que visa à contínua melhoria da qualidade de vida edo bem-estar social dos setores carentes e mais fragilizados da sociedade(FORMENTINI, 2004, p. 23).

63

Além do mais, nota-se que o governo parece não ter conseguido arcar com todas as

suas responsabilidades no âmbito social, como demonstram os elevados índices de miséria em

nosso País, passando o empresariado brasileiro a assumir um compromisso social no contexto

onde está inserido, o que pode ser considerado inédito na história do País (PAOLI,2002)

Peliano (2003) afirma que a história de vida dos empresários, sua formação pessoal e a

necessidade de se sentirem úteis e participantes da sociedade também são fatores que

contribuem para o aumento de sua participação em ações sociais. Tal constatação é resultado

da pesquisa coordenada pela autora em empresas privadas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte

e São Paulo em 2001, onde se constatou que o envolvimento das empresas na realização de

ações sociais para a comunidade é geralmente uma iniciativa dos executivos pertencentes a

seus quadros de alta direção.

Ainda de acordo com pesquisa do IPEA realizada em 2001 e coordenada por Peliano,

50% das empresas declararam que o que move os dirigentes a operar no campo social é a

vontade de contribuir para a solução dos problemas sociais do País e de atender às

necessidades ou solicitações da comunidade. Paula e Rohden (1998), por sua vez, afirmam que

o compromisso pessoal do empresário se faz presente, sobretudo, porque a responsabilidade

social faz bem à alma do indivíduo.

Tenório (2004, p. 33) ressalta que “existem vários elementos que podem motivar as

empresas a atuar de forma socialmente responsável. Isso pode ocorrer por pressões externas,

pela forma instrumental ou por questões de princípio”. Esclarece o citado autor que as

pressões externas dizem respeito às legislações ambientais, à exigência dos consumidores, à

atuação dos sindicatos, às reivindicações das comunidades afetadas e ainda à globalização que

exerce forte pressão para a prática de RSE; a forma instrumental, por sua vez, diz respeito ao

64

meio de obtenção de algum tipo de benefício, de natureza econômica ou não; finalmente,

explica o autor que, quando a RSE é motivada por questões de princípios, os riscos de

descontinuidade dos investimentos sociais são menores, visto que estes valores estão inseridos

na cultura da empresa.

Aliada ao desenvolvimento de uma consciência social entre o empresariado brasileiro,

encontra-se a questão das exigências de mercado. Em termos políticos, as ações de

responsabilidade social remetem, em um primeiro momento , à idéia de aumento de custos para

as empresas; no entanto, uma empresa lucra socialmente quando suas ações internas dão bons

resultados, o que pode ser percebido quando há aumento de sua produtividade, diminuição de

gastos com saúde dos funcionários e desenvolvimento de seu potencial (habilidades e talentos)

. Externamente, esse lucro retorna em termos de maior confiança e credibilidade depositados

pelos clientes na empresa, refletindo-se no aumento das vendas, no reforço da imagem da

organização e na maior capacitação profissional da mão-de-obra local

( NETO; FROES,2001, p.24).

Conforme observado anteriormente, tudo começou com a idéia de filantropia: se a

empresa recebe recursos da sociedade, tem o dever de restituí-los, não somente sob a forma de

produtos e serviços comercializados mas, principalmente, por meio de ações sociais voltadas

para os problemas que afligem as sociedades. Assim, começaram a surgir novas formas de

inserção social, inicialmente por meio de doações e apoio a programas e campanhas do

governo e, mais recentemente, mediante projetos sociais de fomento ao desenvolvimento

cultural, social e educativo (NETO ;FROES, 2001, p. 10).

Nesse contexto, a “inteligência empresarial” funcionou e surgiu a necessidade de

comunicar suas ações ao mercado, através do marketing social. As empresas aprenderam que

as ações sociais lhes trazem retorno (NETO; FROES, 2001, p. 10).

65

Os dirigentes da Fundação Abrinq (apud PAOLI, 2002), reconhecem a importância não

apenas do surgimento de consumidores atentos às informações referentes aos problemas

sociais, como também da urgência das empresas em dar-lhes uma resposta, com vistas ao

sucesso de mercado e à competitividade:

Não tenho ilusões. A lógica empresarial é o lucro e não a solidariedade. Mas derepente há a percepção que lucro depende de posturas mais éticas e solidárias. Estaé uma conquista da sociedade civil e as empresas estão tendo que se adaptar(GRAJEW, 1998 apud PAOLLI, 2002, p. 393).

Segundo Paoli (2002), a RSE contribui para reforçar a imagem da empresa perante seu

público. Assim sendo, as ações sociais empresariais fazem parte da lógica de lucro da empresa.

Atualmente, há diversas discussões voltadas para a ação social, mais como uma oportunidade

de negócio do que como uma simples atitude filantrópica. A preocupação das empresas com o

“valor agregado à marca”, através de ações sociais, ilustra a questão.Tudo tem início com a

percepção do surgimento de uma melhoria na imagem da empresa. Ao implementar ações

sociais, a organização torna-se uma empresa-cidadã, que se traduz numa imagem corporativa

de consciência social comprometida com a busca de solução para os problemas sociais.

A imagem é um ativo intangível das organizações e vem sendo valorizada nos últimos

tempos, mediante o aumento da competitividade do mundo globalizado, onde os ativos

tangíveis são de fácil imitação, enquanto que os intangíveis são difíceis de serem copiados:

Os ativos intangíveis fazem parte da estratégia competitiva das empresas em umambiente de mudanças globais. Na medida em que a velocidade das aquisições deativos tangíveis se acelera e o processo de produção se padroniza globalmente, asempresas que desejam sustentar uma vantagem competitiva distinta (diferenciação)devem proteger, explorar e aprimorar seus ativos intangíveis ( FILHO, 2002, p. 65).

66

A imagem diz respeito às idéias, às opiniões e às percepções das pessoas sobre uma

empresa ou indivíduos. Barich e Kotler (1991, apud TAVARES, 1998, p. 65), definem

imagem como “a soma de crenças, atitudes e impressões que uma pessoa ou grupo de pessoas

têm de um objeto”. Para Tavares (1998), a imagem que se constrói de uma empresa decorre

das impressões positivas, negativas ou neutras que cada um dos seus públicos desenvolve a

partir dos contatos com ela.

O processo de melhoria de imagem ocorre de diferentes formas e decorre de diferentes

ações empresariais, dentre as quais se destacam as ações sociais. Quando uma empresa investe

recursos em ações sociais, de forma planejada e bem gerenciada, seguramente está se

fortalecendo perante seus stakeholders. A vinculação entre o investimento social e o negócio

da empresa é vital para o reforço de sua imagem empresarial. Com uma imagem empresarial

fortalecida, a empresa canaliza sua busca de competitividade, potencializando sua marca,

ganhando maior visibilidade e adquirindo o status de empresa-cidadã (NETO; FROES, 1999,

p. 97).

Cabe ressaltar que, no Sudeste, região mais rica do País, 65% das empresas

multinacionais e 37% das empresas nacionais confessam que empreendem ações sociais para

promover sua imagem e as organizações responsáveis por comandar tais ações motivam as

empresas à responsabilidade social, para a criação de uma boa imagem da empresa

(PELIANO,2000 apud PAOLI, 2002).

Com a imagem reforçada, a empresa torna-se mais conhecida e vende mais, à medida

que sua marca ganha maior visibilidade, aceitação e potencialidade. Por um lado, os clientes

tornam-se orgulhosos por adquirir marcas ou comprar serviços de empresas consideradas

socialmente responsáveis; por outro lado, os fornecedores sentem-se motivados a trabalhar

com uma empresa dessa natureza; o governo e a sociedade tornam-se parceiros da empresa em

67

seus empreendimentos sociais; os funcionários sentem-se orgulhosos de fazerem parte da

organização, e os concorrentes reconhecem o valor da empresa. É o uso da RSE como

vantagem competitiva (NETO;FROES, 2001, p. 95).

Schiffman e Kanuk afirmam nesse sentido que

a maioria das empresas reconhece que atividades socialmente responsáveismelhoram suas imagens junto aos consumidores, acionistas, comunidade financeirae outros públicos relevantes. Elas descobriram que práticas éticas e socialmenteresponsáveis simplesmente são negócios saudáveis que resultam em imagemfavorável, e, no final das contas, em maiores vendas. O contrário também éverdadeiro: percepções de falta de responsabilidade social por parte de umaempresa afetam negativamente as decisões de compra do consumidor(SCHIFFMAN; KANUK, 2000, p.12).

De acordo com Durão (2004), a RSE passou a ser, atualmente, condição para as

empresas se estabelecerem no mercado, valorizando o ativo reputação. Para Vinha (2003), na

era da globalização e da chamada sociedade da informação, os ativos intangíveis (isto é, o

conjunto de recursos não materiais, como o conhecimento e a reputação) adquiriram

importância estratégica nos negócios. A empresa que vier a ter sua reputação abalada, pode

sofrer grandes prejuízos.

A relação entre imagem corporativa e práticas de RSE decorre da maior

conscientização do consumidor, resultando na busca por produtos e práticas que gerem

melhoria na qualidade de vida da sociedade:

As práticas de responsabilidade social são uma forma de criar uma identificaçãomaior da empresa com os seus públicos socialmente conscientes, ou seja, aquelesque, como elas, procuram adotar comportamentos politicamente corretos em suavida (FORMENTINI e OLIVEIRA, 2003, p. 9).

Ou seja, “ [...] fazer o bem também compensa economicamente” (PELIANO, 2003, p.

26). Investir no social dá retorno econômico, pois melhora a imagem da empresa perante seu

público. O ambiente competitivo exige que as empresas se diferenciem, e a imagem

68

socialmente responsável é um diferencial. Contudo, muitas vezes, a empresa transmite imagens

a seus públicos incoerentes com seus valores, sua cultura e seus objetivos, gerando, assim,

desgaste institucional. A percepção dos stakeholders sobre a responsabilidade social da

empresa deve estar alinhada com os objetivos organizacionais, para que ocorra harmonia e

coerência entre imagem e identidade da empresa. Para que a empresa possa compreender seu

papel perante os stakeholders, é necessário que ela saiba ouvir o que realmente eles necessitam

ou desejam.

Peliano (2003) aponta como um dos resultados de sua pesquisa o fato de ser

generalizada entre os entrevistados a percepção de que a responsabilidade social traz retorno

positivo para a empresa. Neto e Froes (2001, p. 96) listam alguns dos principais benefícios

decorrentes das ações sociais das empresas:

ganhos de imagem corporativa;

popularidade dos seus dirigentes, que se sobressaem como verdadeiros líderes

empresariais , com elevado senso de responsabilidade social;

maior apoio, motivação, lealdade, confiança e melhor desempenho dos funcionários e

parceiros;

melhor relacionamento com o governo;

maior disposição dos fornecedores, distribuidores e representantes em realizar

parcerias com a empresa;

maiores vantagens competitivas (marca mais forte e mais conhecida, produtos mais

conhecidos);

maior fidelidade dos clientes atuais e maior possibilidade de conquista de novos

clientes.

69

No entendimento de Silva e Freire (2001) e de Machado e Lage (2002), além da

obtenção de vantagens competitivas, conforme já exposto, há ainda outros motivos que

justificam as ações empresarias neste campo:

fundamentação religiosa ou moral;

promoção de valores de solidariedade interna, identificando e desenvolvendo a

liderança entre os funcionários;

resposta a incentivos do governo;

orientação da matriz, no caso das multinacionais;

visão estratégica de longo prazo(desenvolvimento sustentável);

fomento ao desenvolvimento do consumidor, por meio do aumento do poder

aquisitivo das classes menos favorecidas.

Quando uma gestão socialmente responsável é implementada em toda a cadeia produtiva,

ocorre além do aumento da eficiência do processo produtivo, o desenvolvimento da cidadania

como um todo, ou seja,

[...]esse processo resulta na consolidação da parceria conquistada mediante orelacionamento transparente entre as empresas e a extensão da gestão social aosstakeholders. O engajamento de toda a cadeia produtiva nas práticas de RSEamplia significadamente os resultados e consolida os benefícios econômicos, sociaise ambientais, proporcionando o desenvolvimento sustentado (TENORIO, 2004, p.129).

Conforme ressalta Peliano (2003), as motivações das empresas vão desde a questão

humanitária ( vontade de contribuir e retribuir os benefícios recebidos), até e tentativa de suprir

o papel do Estado, no que se refere aos problemas sociais e à questão da responsabilidade

social (como fator de competitividade), tendo em mente que a empresa socialmente

70

responsável promove sua imagem junto a seus fornecedores, trabalhadores e consumidores e

ainda melhora seu relacionamento com a comunidade onde se insere. Enfim, pressões sociais,

exigências mercadológicas e sentimentos de solidariedade são os fatores que mais contribuem

para aumentar a atuação social das empresas.

Dallabrida (2005) ressalta que um dos grandes desafios dos pesquisadores do tema

RSE é discernir entre as empresas que utilizam esse conceito unicamente com o propósito de

gerar vantagens competitivas ou reforçar sua imagem perante o publico, e aquelas

compromissadas com os valores da responsabilidade social.

De acordo com Tenório (2004), as empresas que se preocupam somente com os

benefícios comerciais da gestão socialmente responsável acabam por cair em descrédito e não

colhem os benefícios esperados.

Finalmente, Ashley, Coutinho e Tomei (2000, p. 9) ressaltam que, embora se esteja em

um contexto em que prepondera a racionalidade econômica, percebe-se que “o conceito de

RSE requer, como premissa para sua aplicabilidade não reduzida à racionalidade instrumental,

um novo conceito de empresa e, assim, um novo modelo mental das relações sociais,

econômicas e políticas.”

2

71

A INDÚSTRIA ALIMENTÍCIA EMBARÉ S/A

3.1 Contexto local: aspectos básicos do desenvolvimento do município de Lagoa da Prata

O município de Lagoa da Prata situa-se no Centro-oeste mineiro, a aproximadamente

200 km de Belo Horizonte-MG. Sua origem data do século XIX (1896), e seu fundador foi o

Cel. Carlos José Bernardes Sobrinho que, deu ao município o nome de “Pântano”, por se

tratar de uma região alagadiça na época. Seu nome atual origina-se, segundo crenças, dos

reflexos do sol nas águas limpas da lagoa, que refletiam a cor prateada referida por padres

missionários em visita à região.

Ocupando uma área de 443 Km2 e com uma população de 38.758 habitantes o

município tem características agropecuárias, dedicando-se principalmente à produção de

laticínios e açúcar.

Lagoa da Prata tem também uma característica peculiar, que lhe conferiu a

denominação de “cidade dos rifeiros”. A “rifa” é um trabalho informal , para escoamento da

produção artesanal local e outros produtos industrializados , por todo o Brasil ( colchas,

bichinhos de pelúcia, e outras). Os trabalhadores chegam a ficar até quatro meses fora da

cidade, colocando seus produtos no mercado. A rifa é considerada uma excelente fonte de

renda para as pessoas com menor formação escolar.

Quanto à educação, o município conta com quatro escolas particulares de nível médio,

pré-escolar e ensino fundamental; quatorze escolas públicas de ensino fundamental; três

72

escolas públicas de ensino médio; onze escolas públicas de ensino pré-escolar e uma

universidade particular, que oferece os cursos de Pedagogia e Gestão de Pequenas e Médias

empresas.

A carência de universidade leva muitos estudantes a se deslocarem para Arcos (PUC),

Divinópolis (FADON) e Bom Despacho( UNIPAC).

Situada às margens do Rio São Francisco, a cidade oferece alguns pontos turísticos de

privilegiada beleza natural, como cachoeiras, grutas e a praia municipal.

As indústrias de médio porte existentes na cidade são: a Embaré Indústria Alimentícia;

a Coimbra – Usina de Açúcar e Álcool e a Pharlab – indústria farmacêutica. Com poucas

indústrias e um variado comércio varejista, de forma geral, a comunidade considera a Embaré

a principal fonte de empregos da cidade.

3.2 Perfil da empresa

Esta pesquisa teve como foco a Indústria Alimentícia Embaré - empresa alimentícia

instalada no município de Lagoa da Prata, no Estado de Minas Gerais. A organização atua no

mercado alimentício desde 1935 e vem se consolidando no mercado nacional de alimentos

lácteos com a produção de leite em pó (atualmente líder de venda do produto no Nordeste

brasileiro), creme de leite, leite condensado, achocolatado, manteiga, doce de leite e caramelo

de leite ( segmento em que é líder nacional). Em 1975, a empresa penetrou no mercado

internacional, e hoje seus produtos são distribuídos em diversos países, em todos os

continentes.

73

A história da Embaré começou em 15 de maio de 1935, na cidade de Taubaté, no

interior de São Paulo, época em que sua a produção e comercialização eram limitadas a

quatro produtos: doce de leite, geléia, doce de fruta e sopa de legumes.

Em 1955, descontinuou sua linha de sopas e doces de frutas, iniciando a fabricação de

caramelos de leite Embaré. Em 1961, os atuais controladores da Embaré compraram a

indústria de Laticínios Lagoa da Prata S/A e em 1963 a Embaré, em Taubaté. A fusão das duas

empresas ocorreu em 1969, adotando-se a atual denominação de Embaré Indústrias

Alimentícias S/A. Também foram nessa época unificadas as operações industriais em Lagoa da

Prata.

Atuando no mercado desde 1935, a Embaré sempre norteou sua produção por três

diretrizes essenciais: tecnologia moderna, mão-de-obra qualificada e matéria-prima de primeira

qualidade. Com essa visão empreendedora, a Empresa vem trilhando um caminho de

incessante progresso, com a produção de leite em pó, creme de leite e manteiga ( marca

Camponesa), e os famosos caramelos de leite Embaré.

A empresa, nos últimos anos, tem passando por um processo de reestruturação,

incluindo modernização, ampliação e crescimento. No final do ano de 2000, finalizou o projeto

de ampliação de sua fábrica, concretizando o maior investimento de sua história em uma única

etapa (32 milhões de reais), com recursos próprios. Este projeto visou à ampliação da

capacidade instalada no segmento de laticínios, dos atuais 300.000 litros de leite/dia para

800.000 litros/dia. No ano de 2005, a empresa construiu sua nova unidade, a fábrica de leite

condensado, creme de leite e bebida láctea.

Desde então, a Embaré produz mensalmente 3,3 mil toneladas de leite condensado, 1

mil toneladas de bebidas lácteas, 2,8 mil toneladas de leite em pó, 150 toneladas de manteiga,

300 toneladas de doce de leite e de 1,8 mil a 2 mil toneladas de caramelos , dos quais 40% são

74

exportados para Estados Unidos, Canadá e Ásia, e passou a conquistar 8% do mercado

nacional.

A Confederação Nacional da Agricultura- CNA, divulgou através da Associação Leite

Brasil, que a Embaré é a 6ª maior empresa de laticínios do Brasil. A estatística é baseada pelo

volume diário de compra de leite in-natura, diretamente dos produtores e também através de

terceiros, com números referentes ao ano de 2005.

Apenas em Lagoa da Prata, sua fábrica é responsável por 1192 empregos diretos.

Atualmente, a administração central da empresa encontra-se em Belo Horizonte, além de

manter filiais, distribuidores e representantes em todos os principais centros comerciais do

Brasil. O faturamento da Embaré em 2004 foi de R$286 milhões, e em 2005, o faturamento

foi cerca de R$358 milhões.

F I G URA 03: Localização da Embaré FONTE: Pesquisa,2006.

75

A fábrica da Embaré está instalada em edifício de estrutura civil moderna, com desenho

e triagem específicos para suas linhas de produção; contudo, localiza-se no centro da cidade,

fato que dificultou seu processo de ampliação. Para tornar possível seu projeto, a Prefeitura

Municipal, com o aval da comunidade do município, autorizou a doação de uma rua à

empresa.

76

FI

GURA 04: Construção da empresa na rua doada pelo município. FONTE: Pesquisa, 2006.

Em contrapartida, a empresa deveria construir uma creche no bairro mais carente do

município, seguindo a padronização imposta pela Prefeitura: uma construção de 172 m2,

adequada aos moldes estabelecidos pela legislação. Superando esse acordo, a Embaré

construiu uma creche de 450 m2 em terreno de 3.000m2, extrapolando o que foi determinado

pela Prefeitura Municipal.

Após ser construída, a empresa resolveu, por livre iniciativa, criar uma Fundação para

gerir e arcar com todos os custos da creche. Esse projeto foi inaugurado em 2002, e a creche

passou a se denominar “Centro Infantil Arlete Antunes”, que, segundo a empresa, é uma

forma de agradecimento e retribuição à população lagopratense, que a acolhe.

77

O Centro Infantil Arlette Antunes atende atualmente a 90 crianças carentes moradoras

no bairro, na faixa etária de seis meses a seis anos e onze meses . Por um período integral, as

crianças contam com berçários, maternal e pré-escola, além de receberem alimentação,

assistência médico-odontológica e educação de higiene . O Centro Infantil também oferece

assistência às mães das crianças, através de palestras educativas, oficinas de artes e cursos.

Atualmente está sendo construída no Centro Infantil uma quadra poliesportiva coberta, para

atender suas crianças, bem como os alunos da Escola municipal do bairro e seus moradores.

FIGURA 05: O Centro Infantil Arlette Antunes FONTE: Pesquisa, 2006.

78

FIGURA 06: Anfiteatro do Centro Infantil FONTE: Pesquisa, 2006.

FIGURA 07: Alunos do Centro Infantil FIGURA 07: As crianças no Centro Infantil Arlette Antunes

79

FONTE:Pesquisa,2006.

Para a realização de suas atividades, o Centro Infantil recebe todos os recursos da

Fundação Embaré. A Fundação Embaré é o braço social da Embaré. Trata-se de uma entidade

jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, cujo principal objetivo é prestar assistência

através de creches e outras atividades que auxiliem a comunidade ( cursos e programas de

educação, preservação do patrimônio histórico e cultural e gestão de projetos relacionados à

conservação da bio-diversidade e educação ambiental).

Destaca-se como práticas sociais da Embaré dirigidas aos stakeholders: a manutenção

do Centro Infantil; o oferecimento de cursos profissionalizantes aos funcionários e membros da

comunidade local; o incentivo financeiro destinado aos funcionários, para cursos de graduação

e pós-graduação; a promoção de oficinas de artes a membros carentes da comunidade; a

criação de um Coral; o tratamento dispensado a seus colaboradores e o bom gerenciamento

dos impactos de sua atividade produtiva na comunidade local. Além de desenvolver diversas

iniciativas sociais, a Embaré faz parte do Instituto Ethos de Responsabilidade Social, publica o

seu Balanço Social; obteve certificação ISO 9001, que evidencia o alto nível de qualidade de

seus produtos, e ISO 14001, uma das mais importantes certificações de gestão ambiental e

também, cabe ressaltar, a certificação pela Fundação Abrinq, que lhe conferiu o selo e o

diploma de “Empresa Amiga da Criança”.

Como se pode constatar, a empresa Embaré estabeleceu uma política de condução de

seus negócios em estrita conformidade com as normas legais vigentes no País e dentro dos

mais elevados princípios de ética comercial.

80

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

De acordo com Demo (1985, p. 19), “a metodologia é uma preocupação instrumental.

Trata das formas de se fazer ciência. Cuida dos procedimentos, das ferramentas, dos

caminhos”. Partindo dessa perspectiva, a presente seção tem por objetivo descrever os

procedimentos que orientaram esta pesquisa, ou seja, “como se planejou conduzir a

investigação de modo a atingir o objetivo e/ou a responder às questões propostas ”

(ALVES-MAZZOTTI e GEWANSZNAJDER, 1999, p. 149).

4.1 Classificação da pesquisa

Utilizando-se a taxonomia proposta por Vergara (2004), é possível classificar esta

pesquisa em relação a dois aspectos: quanto aos fins e quanto aos meios adotados para a

investigação.

4.1.1 Quanto aos fins

81

Quanto aos fins, esta pesquisa é descritiva, porque visa a descrever percepções,

expectativas e sugestões dos públicos interno e externo da empresa quanto às suas práticas de

responsabilidade Social.

De acordo com Gil (1999), o objetivo primordial das pesquisas descritivas é descrever

as características de determinada população ou fenômeno, ou o estabelecimento de relações

entre as variáveis. Neste caso, serão descritas as percepções dos stakeholders da Indústria

Embaré, em relação à sua política de responsabilidade Social.

2 Quanto aos meios

Procedeu-se na presente pesquisa um estudo de caso, envolvendo procedimentos de

natureza bibliográfica, documental e pesquisa de campo.

Ressalta Vergara (2004,p.48) que “ a pesquisa bibliográfica é o estudo sistematizado

desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas, jornais, redes eletrônicas,

isto é, material acessível ao público em geral.” Esta pesquisa é portanto, bibliográfica,

porque, para fundamentação teórica do trabalho, foi realizada investigação em livros, fontes

eletrônicas e outros materiais disponíveis sobre os seguintes assuntos: origem e evolução do

conceito de RSE; razões que levam as empresas a investir no social, a doutrina do

stakeholders e do stockholders; aspectos referentes ao Instituto Ethos de Responsabilidade

Social; os Indicadores Ethos e outras entidades afins no Brasil.

82

A presente pesquisa também é documental, uma vez que obteve dados a partir de

documentos da Embaré, sobretudo relatórios anuais, publicação do Balanço Social da

empresa, artigos de jornais e revistas, além de outras informações consideradas relevantes

para este trabalho.

Constituiu também uma pesquisa de campo, pois foi realizada uma investigação

empírica no local onde a empresa atua, por oferecer relevantes elementos para a explicação do

objeto estudado.

Quanto aos meios de investigação desta pesquisa, foi usado o estudo de caso, com

enfoque prioritário nos stakeholders de uma única empresa e o estudo de caso, conforme

salienta Vergara (2004), circunscreve-se a uma ou poucas unidades, entendidas como pessoa,

família, produto, comunidade, país ou empresa. O estudo de caso tem caráter de profundidade

e detalhamento:

[...] a principal tendência em todos os tipos de estudo de caso, é que ela tentaesclarecer uma decisão ou um conjunto de decisões: o motivo pelo qual foramtomadas, como foram implementadas e com quais resultados ( SCHRAMM, 1971apud YIN, 2002, p. 31).

Para Yin (2002, p. 33), “o estudo de caso como estratégia de pesquisa compreende um

método que abrange tudo – com lógica de planejamento incorporando abordagens específicas

à coleta de dados e à analise de dados.”

Conforme salienta Gil (1999, p. 73),

[...] estudo de caso vem sendo utilizado com freqüência cada vez maior pelospesquisadores sociais, visto servir a pesquisas com diferentes propósitos, tais como:explorar situações da vida real cujos limites não estão claramente definidos;descrever a situação do contexto em que está sendo feita determinada investigação;e explicar as variáveis causais de determinado fenômeno em situações muitocomplexas que não possibilitam a utilização de levantamentos e experimentos.

83

Para Goldenberg (1999, apud COELHO, 2004) o estudo de caso reúne significativos

números de informações detalhadas, por meio de diferentes técnicas de pesquisa, com o

objetivo de apreender a totalidade de uma situação e descrever a complexidade de um caso

concreto.

Para Yin (2002), o estudo de caso é geralmente a estratégia escolhida, ao se

examinarem acontecimentos contemporâneos, quando não se podem manipular

comportamentos relevantes. Ainda na visão do autor, o estudo de caso é uma estratégia

interessante, quando o pesquisador apresenta questões do tipo “como” ou “por que” , quanto

a um conjunto contemporâneo de acontecimentos sobre o qual ele tem pouco ou nenhum

controle.

No estudo de caso referente à Embaré, buscou-se identificar quais são as ações de

responsabilidade social desenvolvidas pela empresa, seus objetivos, as razões que a levam a

investir recursos em ações sociais e os impacto dessas ações nos stakeholders envolvidos, ou

seja, foram enfocadas de forma detalhada questões ligadas ao “como“ e “ por quê.”

Para Becker (1993, p. 131), o estudo de caso também é empreendido com o objetivo

de fornecer orientação para administradores e outros que possam desejar intervir na

organização, a fim de mudar alguma condição considerada ineficiente, desagradável ou

prejudicial ao bem-estar do grupo.

No estudo da percepção dos stakeholders quanto às ações de responsabilidade social

implementadas pela empresa envolvida, é imprescindível a compreensão de aspectos subjetivos

dos participantes. Assim, o estudo de caso se mostra mais adequado, por permitir o

aprofundamento da dimensão dessa percepção, além de oferecer subsídios para a análise dos

gestores da empresa quanto à mudança ou não da percepção dos stakeholders.

84

4.2 População e amostra

De acordo com Marconi e Lakatos (1999) , é fundamental escolher a amostra de tal

forma que ela seja o mais representativa possível do todo, para que, a partir dos resultados

obtidos , infira-se , o mais legitimamente possível, os resultados da população total.

Adaptando o modelo da “Teoria do stakeholders” proposto por Freeman(2000), a

população da pesquisa compreendeu os seguintes sujeitos, afetados direta e indiretamente

pelas ações sociais da Indústria Alimentícia Embaré: os gestores ( Diretores e Gerentes), os

funcionários, os fornecedores e a comunidade local. Para efeito da pesquisa, não foram

incluídos nessa população, os proprietários, uma vez que os mesmos, quando consultados,

indicaram como seus representantes os Diretores ( com os quais inclusive, possuem laços de

parentesco). Também não foram incluídos os clientes, localizados principalmente no Nordeste

do país e no exterior, o que dificultou bastante acessá-los e obter quaisquer informações

precisas. Nesse último caso, optou-se pela desconsideração proposital desses sujeitos.

85

FIGURA 8: MODELO DA TEORIA DO STAKEHOLDER, COM ADAPTAÇÕESFONTE: Freeman 2000, apud Filho e Zylberztain,2002,p.92.

Uma amostra foi selecionada através da técnica não-probabilística, por tipicidade, no

caso dos gestores e do representante dos fornecedores da empresa. De acordo com Vergara

(2004), a amostra selecionada por tipicidade é constituída pela seleção de elementos que o

pesquisador considera representativos da população alvo.

A amostra dos gestores foi escolhida dentre aqueles que desempenham papel

determinante nas decisões da empresa.

Para a seleção da amostra dentre os funcionários e membros da comunidade utilizou-se

a técnica não-probabilística por acessibilidade. Foram selecionados quinze funcionários, cinco

dos quais exercem cargo gerencial e dez são trabalhadores de setores operacionais.

Adicionalmente, foram ouvidos vinte membros da comunidade, moradores de diferentes

bairros do município, cuja escolha teve como condição básica, não serem funcionários da

empresa em estudo.

Os sujeitos da pesquisa e suas respectivas funções são apontados nos Quadros 6 e 7,

apresentados a seguir.

Gestores

Comunidade localFornecedores A organização

Funcionários

86

QUADRO 6

Amostra da pesquisa : os gestores

Designação Cargo ocupado QuantitativoA e B Diretor 02C Gerente 01D Conselheiro 01

TOTAL 04FONTE: Dados da pesquisa: Embaré Indústria Alimentícias S/A, 2006.

QUADRO 7

Amostra da pesquisa : funcionários, fornecedor e membros da comunidadeDesignação Segmento apresentado Quantitativo

E,F,G,H,I Coordenação 05J Trabalhadores dos setores

operacionais10

K Representante do Sindicato dosFornecedores

01

L Membros da comunidade 20TOTAL 36

FONTE: Dados da pesquisa: Embaré Industria Alimentícia S/A, 2006

Os entrevistados são identificados no texto como A,B..... já que não se pretende

identificar os sujeitos, mas, sim, o contexto.

87

4.3 Coleta de dados

Os instrumentos de coleta de dados utilizados nesta pesquisa foram: pesquisa

bibliográfica, análise documental e entrevistas.

Inicialmente, foi feita uma pesquisa bibliográfica, com o objetivo de realizar uma

revisão da literatura disponível sobre o tema, ou seja, um levantamento sistematizado de livros,

artigos de revistas e periódicos, anais de congressos, teses, dissertações e outras publicações

sobre o assunto, visando a fundamentar teoricamente o trabalho e subsidiar a análise dos dados

coletados.

Num segundo momento, analisaram-se documentos internos da Empresa (relatórios,

históricos, publicações do Balanço Social, artigos de jornais e revistas).

Finalmente, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os Gestores, para

conhecer as ações de responsabilidade social desenvolvidas pela empresa, seus objetivos, os

motivos que levam a empresa a realizar investimentos sociais e os resultados percebidos.

De acordo com Alves-Mazzotti & Gewandsznajder (1999, p. 168), “[...] a entrevista

permite tratar temas complexos, que dificilmente poderiam ser investigados adequadamente,

através de questionários, explorando-os em profundidade.”

Para Goode e Hatt (1969, apud MARCONI e LAKATOS, 1999, p. 94), “a entrevista

consiste no desenvolvimento de precisão, focalização, fidedignidade e validade de um certo ato

social como a conversação.”

Marconi e Lakatos (1999) ensinam que há vários tipos de entrevistas, as quais variam

de acordo com o propósito do entrevistador. Neste estudo, foi utilizada a entrevista

semi-estruturada.

88

Para Trivinõs (1987, p. 152), a entrevista semi-estruturada parte de questionamentos

básicos, os quais são sustentados por algumas teorias e hipóteses, e se amplia à medida que o

pesquisador vai obtendo mais resultados. Segundo o mesmo autor, é um tipo de entrevista que

“favorece não só a descrição dos fenômenos sociais, mas também sua explicação e a

compreensão de sua totalidade, tanto dentro de sua situação específica como de situações de

dimensões maiores.”

Inicialmente, foi feito um contato com a empresa, ocasião em que foram apresentados

os objetivos da pesquisa e o cronograma, a partir do qual foram agendadas as entrevistas na

empresa.

A entrevista foi feita por pauta, onde se agendaram os pontos principais a serem

explorados, com a finalidade de conhecer e descrever o objeto em estudo, bem como analisar

onde a empresa se enquadra, entre as duas correntes teóricas existentes acerca do debate

sobre a responsabilidade social.

As entrevistas com os gestores foram gravadas. Segundo Ludke e André (1986, p.

37), a gravação tem a vantagem de registrar todas as expressões orais deixando o entrevistador

livre para concentrar sua atenção no entrevistado. É importante que o pesquisador esteja

atento às expressões faciais, aos gestos e a toda comunicação não-verbal do entrevistado,

aspecto que o gravador não capta. Posteriormente, foi feita a transcrição das fitas.

Para captar a percepção dos demais stakeholders envolvidos ( funcionários,

fornecedores e comunidade), utilizaram-se questionários não-estruturados, uma versão

específica para cada tipo de público, porém, com alguns pontos em comum.

Os questionários destinados aos funcionários e à comunidade foram aplicados com a

presença do entrevistador, que fazia intervenções, quando necessário, tendo o preenchimento

durado cerca de 20 minutos cada. Foi enviado ao representante do fornecedor, o questionário

89

para que fosse respondido sem a presença do entrevistador, com o prazo estipulado de três

dias úteis para a devolução.

Antes da aplicação dos questionários, os instrumentos foram pré-testados em

turma-piloto com dez integrantes para verificar eventuais falhas existentes, tendo alguns itens

sido modificados. Marconi e Lakatos (1999) ressaltam que, após um questionário ser

redigido, ele precisa ser testado, antes de sua utilização definitiva, em uma pequena

população.

4.4 Análise dos dados

De acordo com Vergara (2004), os dados de uma pesquisa podem ser tratados de

forma quantitativa ou de forma qualitativa, podendo também ocorrer as duas abordagens ao

mesmo tempo. Triviños (1987, p. 118) afirma que “toda pesquisa pode ser ao mesmo tempo

quantitativa e qualitativa”.

“ As pesquisas qualitativas são carateristicamente multimetodológicas, isto é, usam uma

grande variedade de procedimentos e instrumentos de coleta de dados” (ALVES-MAZZOTTI;

GEWANDSZNAJDER, 1999, p.163).

Esta pesquisa é de natureza essencialmente qualitativa; contudo, alguns dados

quantitativos, como freqüência absoluta, foram utilizados como apoio e complemento das

informações obtidas.

Malhotra (2004) observa que a pesquisa qualitativa baseia-se em metodologia de

pesquisa não-estruturada, a partir de pequenas amostras, a qual proporciona melhor visão e

90

compreensão do contexto do problema. Segundo esse autor, nem sempre é conveniente utilizar

métodos plenamente estruturados, pois pode ser que as pessoas não queiram ou não saibam

responder a certas perguntas, que consideram causadoras de desconforto ou invasivas de sua

privacidade. Além disso, as pessoas podem não ser capazes de dar respostas precisas a

perguntas que apelem para seu subconsciente. Os valores, emoções e motivações que se situam

no nível subconsciente são disfarçados do mundo exterior pela racionalização.

A abordagem fenomenológica foi a base deste estudo. Triviños (1987,p.43) define

fenomenologia como o estudo das essências. Todos os problemas, segundo a autora levam à

definição de essências: a essência da percepção, a essência da consciência. A fenomenologia

eleva a importância do sujeito no processo de construção do conhecimento e ressalta a idéia de

que a realidade é construída socialmente.

Para Triviños (1987), a pesquisa qualitativa com abordagem teórica fenomenológica é

essencialmente descritiva, e a interpretação dos resultados surge como a totalidade de uma

especulação baseada na percepção de um fenômeno em determinado contexto. Esse enfoque

teórico vai ao encontro dos objetivos propostos para esta pesquisa.

Para a análise e interpretação dos dados, utilizou-se a análise de conteúdo. Bardin

(2004) define análise de conteúdo como um conjunto de técnicas de análise das comunicações

com vistas a obter, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do

conteúdo das mensagens, indicadores que possam permitir a inferência de conhecimentos

referentes às condições de produção/recepção dessas mensagens. Ainda segundo o citado

autor, “[...] não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou com rigor, será

um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um

campo de aplicação muito vasto: as comunicações” (BARDIN, 2004, p. 27).

91

Franco (2005) apresentando algumas idéias sobre as bases teóricas da análise de

conteúdo, afirma que o ponto de partida dessa modalidade de análise é a mensagem sob suas

diferentes formas: a mensagem expressa um significado e um sentido. Varlotta (2002 apud

FRANCO,2005,p.13) ressalta que

[...]os diferentes modos pelos quais o sujeito se inscreve no texto correspondem adiferentes representações que tem de si mesmo como sujeito e do controle que temdos processos discursivos textuais com que está lidando quando fala ou escreve.

Franco (2005), ressalta que a análise de conteúdo requer que as descobertas tenham

relevância teórica, pois um dado sobre o conteúdo de uma mensagem pode estar relacionado a

outro dado.

De acordo com Bardin (2004), a análise de conteúdo deve organizar-se em torno de

três pólos cronológicos: a pré-análise; a exploração do material e o tratamento dos resultados,

( inferências e interpretação dos dados).

Com base nessa orientação, foram inicialmente realizadas as duas primeiras etapas da

técnica de análise de conteúdo, ou seja, a pré-análise e a descrição analítica do material

levantado na pesquisa . De acordo com Bardin (2004), as atividades da pré-análise consistem

em: leitura flutuante, escolha dos documentos, formulação das hipóteses, referência aos

índices e elaboração dos indicadores.

Nessa fase de pré-análise, foi feita a “leitura flutuante” , ou seja, o estabelecimento do

contato inicial com os documentos a serem analisados, buscando-se de conhecimento acerca

dos textos e das mensagens neles contidas, deixando-se invadir por conhecimentos, impressões

e expectativas. A seguir, foram escolhidos os documentos a serem submetidos a análise: o

92

corpus. Bardin (2004, p. 90) define corpus como “conjunto dos documentos a serem

submetidos aos procedimentos analíticos”.

Não foram estabelecidas hipóteses neste estudo. Franco (2005) e Bardin (2004)

argumentam que não é obrigatório tê-las como guia para se proceder à análise de dados, o que

não significa deixar de utilizar técnicas adequadas e sistematizadas.

Na segunda fase, após serem definidas as unidades de análise, foram definidas as

categorias. Franco (2005) observa que a categorização é uma operação que trata de classificar

os elementos que constituem um conjunto, por diferenciação, seguida de um reagrupamento

baseado em analogias, a partir de critérios definidos.

De acordo com Franco (2005), existem duas formas de elaboração de categorias: a

criação a priori (quando elas são predeterminadas em função da busca de uma resposta

específica) e a não-definição a priori, quando as categorias emergem da fala, do discurso e do

conteúdo das respostas. Neste estudo as categorias não forma definidas aprioristicamente.

A partir da elaboração de um quadro, para facilitar o conhecimento das respostas dos

entrevistados, elas passaram a se constituir como indicadores para a criação de categorias.

Neste caso, as categorias foram criadas à medida que surgiam nas respostas, sendo depois,

interpretadas à luz das teorias explicativas .

5 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMBARÉ NA PERCEPÇÃO

DOS STAKEHOLDERS

93

Tendo por base as entrevistas realizadas com os stakeholders da Embaré (Gestores,

fornecedores, funcionários e comunidade local) são relatadas e analisadas suas principais

percepções quanto ao tema RSE, a seguir.

1 Percepção dos Gestores - quanto à responsabilidade social da Embaré

Tendo como base o conceito de RSE adotado neste estudo, percebe-se que, na visão

da Embaré, a RSE compreende todas as ações que vão além das obrigações da empresa. Tal

constatação se confirma claramente nas definições de RSE enunciadas por este grupo, que

representa os gestores da empresa. Apesar de formalmente correta, essa visão aponta uma

dimensão meramente funcional do conceito:

Empresa socialmente responsável é aquela que analisa, se preocupa, participa dosproblemas sociais da comunidade na qual está inserida, assumindo aresponsabilidade e condução de alguns destes problemas, visando minimizar osimpactos negativos gerados pela ausência de investimentos por parte do PoderPúblico ( ENTREVISTADO A).

Conforme o entrevistado B:

Uma empresa socialmente responsável é aquela que não age apenas conformeestipulado por leis, e se preocupa apenas com seus resultados, mas que leva emconta todas as pessoas envolvidas no processo, principalmente a comunidade ondeestá inserida.

94

Tal concepção de RSE da empresa confirma-se prática, com o “caso da doação da

rua” pela Prefeitura do município, para sua ampliação. Em troca, a empresa deveria construir

uma creche nos moldes das creches municipais; contudo, a Embaré resolveu construir uma

creche-modelo, mantê-la e transformá-la em um Centro Infantil para alunos de maternal ao

terceiro período, além do berçário.

É importante destacar que o Centro Infantil não atende aos funcionários da empresa,

mas somente às pessoas carentes residentes no bairro onde está instalado:

Já tínhamos em nossos planos a criação de algo para retribuir ao povo de Lagoa daPrata a confiança depositada ao longo dos anos. Julgamos que o projetoapresentado pela Prefeitura era muito bom, porém, diferente de nossos anseios.Decidimos colocar em prática um projeto de maior envergadura, que tem nos dadobastante trabalho, mas satisfação incomensurável (ENTREVISTADO A).

A idéia da Creche surgiu em uma reunião de vereadores, que decidiram qual seriauma contrapartida que a empresa deveria dar pela doação da rua, para a ampliaçãoda empresa. Ficou definido que deveríamos construir uma Creche em um dosbairros mais carentes da cidade, que não possuía outra creche. A creche deveria serconstruída nos moldes das creches da prefeitura. Ao visitarmos esta creche,constatamos que não estava de acordo com o que gostaríamos, por considerarmosprecárias, desinteressantes e, sobretudo mal administrada ( no que se refere aoPoder Público). Daí resolvemos construir uma Creche-modelo em nível nacional.Verificamos que estava de acordo com nosso orçamento e começamos. Contudo,no decorrer da construção, fomos nos apegando ao projeto e resolvemos ir além,mantendo esta creche. Hoje, esta ação nos dá uma imensa satisfação. A partir daí,a empresa despertou ainda mais para o lado social e foi criada a Fundação Embaré,responsável pelos projetos sociais ( ENTREVISTADO A).

De acordo com o entrevistado B:

95

Teria que ser construída pelos moldes estabelecidos pela Prefeitura, que seriaorçado em 50.000,00. A empresa construiu uma creche-modelo com 300.000, e, apartir daí, resolvemos criar a Fundação Embaré, mantenedora da creche, que, naverdade, se tornou um Centro Infantil para crianças, até completarem o ensinoprimário.

Nota-se que, paralelamente à definição de responsabilidade como cuidado com o

ambiente social, aparece a idéia de que esse cuidado deve ser conduzido pela própria empresa,

não requerendo, pelo menos à primeira vista, a participação da sociedade ou da comunidade

afetada e envolvida, ações que nascem para suprir a ausência do Estado na solução de

questões dessa natureza.

O desenvolvimento de ações relacionadas com a responsabilidade social pela empresa

amadureceram, a partir da década de 1990, como resultado do crescimento da Embaré e do

aumento da preocupação com os problemas sociais no Brasil. Nota-se uma evolução de

filantropia, para responsabilidade social. É nesse sentido que se pode compreender a seguinte

afirmativa do entrevistado A:

As ações sociais da Embaré são parte de sua história. Desde que os atuaiscontroladores assumiram a gestão da Companhia, estabeleceram a distribuição deleite em pó para os filhos dos colaboradores, a comemoração das festas de Natalcom distribuição de presentes aos filhos dos colaboradores. Posteriormente,iniciaram a distribuição de material escolar, e, atualmente, o foco de nossas ações éo desenvolvimento humano, através da Educação infantil.

No mesmo sentido, manifesta-se o entrevistado D,

A empresa sempre praticou atos filantrópicos, mas sem muito envolvimento daDireção. Desde 1995, a empresa cresceu muito, e diante de um cenário onde oassunto também estava em voga, iniciou-se um processo de dar maior atenção àsações sociais, onde a criação da creche foi considerada a pedra fundamental desteprocesso.

Já conforme o entrevistado B,

96

[...] as efetivas ações sociais da Embaré, de liberalidade, ou seja, sem nenhumaexigência sindical, legal etc., incrementaram-se a partir do ano de 1993, inclusive,quando os Srs. Haroldo Antunes e Herbert Schmidt reassumiram a administraçãoda Embaré, após uma ausência de 13 anos, à frente dos negócios da Companhia(época da Kraft e da Diretoria Executiva sem participação de acionistas) (Destaqueda autora).

Por sua vez, na percepção da alta direção, o papel socialmente responsável que a

empresa vem tentando desempenhar parte da postura de seus acionistas, como valor

incorporado na empresa, pela vontade de contribuir.

Segundo o entrevistado C, o início das atividades sociais ocorreu de cima para baixo,

gerado pela crença e convicção dos acionistas da empresa, que acabaram por determinar

políticas de RSE. De acordo com o entrevistado D, “Todas as ações sociais partiram da

vontade dos acionistas da empresa manifestados pela vontade de contribuir de alguma forma

para o desenvolvimento do País”.

Ressalta ainda o entrevistado D:

A criação da Fundação Embaré surgiu como uma retribuição à cidade de Lagoa daPrata pela boa acolhida que tivemos quando aqui chegamos. Dois empresários que ,em 1961, resolveram se estabelecer na cidade, sem nenhum vínculo com qualquerpessoa, foram bem recebidos, acreditaram nos projetos que eles tinham, confiaramem seus princípios. A cidade cresceu, os sonhos deles tornaram-se realidade. Dosiniciais 5.000 litros captados diariamente e cinqüenta funcionários, a indústriaprosperou, desenvolveu novos produtos, conta com 1.100 funcionários (21% dosquais com mais de 10 anos de casa) e capta 1.000.000 litros/dia. Das diversascontribuições à cidade, qual poderia ser a contribuição a ser criada fora do escopoindustrial? Acreditamos que, pela necessidade, a de cunho social seria a maisrecomendada. Criamos então a Fundação Embaré, responsável por diversosprojetos, dentre os quais o Centro de Educação Infantil Arlette Antunes (que cuidade 90 crianças), o Coral da Fundação e o Centro Cultural Hilde Schmidt.

Na percepção deste grupo, o que tem levado as empresas a investirem recursos em

ações sociais, e nesse caso se inclui também a Embaré, é a necessidade de suprir a

97

incapacidade do Estado de resolver as questões sociais. Trata-se de um anseio pessoal dos

acionistas das empresas, e não de questões de natureza estratégica:

Acredito que o que tem provocado o crescente aumento de atenção às causassociais na empresa é a vontade pessoal dos donos e dirigentes de contribuir para asociedade em setores que o governo não cumpre com o seu papel ( ENTREVISTADO B).

O entrevistado A afirma por seu turno que,

Por vontade própria, as empresas estão assumindo a responsabilidade que o Estadodeveria assumir. As empresas estão visualizando que a sociedade, principalmente aparcela menos favorecida, está ficando à margem do desenvolvimento da parcela dasociedade que tem acesso a escolas, trabalhos formais, etc., e estão trazendo parasi as responsabilidades que deveriam ser do Estado (destaque da autora).

Esta posição é reiterada pelo entrevistado D, o qual afirma que a empresa é

“absolutamente substituta do Estado”. A pesquisa constatou unanimidade de opiniões

contrárias à idéia de que as empresas estão se tornando parceiras do Estado na luta pelo

social: “ Para mim, a empresa não é parceira do Estado e sim um substituto do que o Estado

não vem conseguindo fazer e que fez com que os dirigentes sentissem vontade de agir”

(ENTREVISTADO C).

Ressalta-se que a construção da quadra poliesportiva coberta (FIG 08) que está sendo

realizada atualmente, para atender não só as crianças do Centro Infantil, mas também as

crianças da escola municipal do bairro e seus moradores ilustra a posição da empresa como

substituta do Estado nas questões sociais, visto que, esta iniciativa surgiu para suprir a falta

que uma quadra coberta faz para a escola municipal do bairro e seus moradores.

98

FIGURA 09: A construção da quadra poliesportiva no Centro InfantilFONTE: Pesquisa, 2006.

É pertinente ressaltar que o sentido que os gestores atribuem à questão constitui uma

lacuna no entendimento de RSE, uma vez que, embora não consideram a empresa como

parceira do Estado, pode-se verificar que, no caso da criação do Centro Infantil, houve um

99

tipo de parceria, onde o Estado cedeu a rua à empresa, e em contrapartida, a empresa lhe

ofereceu um investimento social.

Quanto ao gerenciamento das ações sociais, sabe-se que a RSE demanda método,

periodicidade e planejamento ( NETO; FROES, 2001). Em consonância com tal entendimento,

a empresa criou a Fundação Embaré, que administra e direciona suas ações sociais:

Toda a planificação das atividades é programada, estudada e debatida entre osmembros de cada segmento. Após a conclusão dos diversos programas, estes sãoapresentados à administração da Fundação para análise, discussão, sugestões eaprovação. Durante o desenvolvimento dos projetos, estes são monitorados e, casonecessário, são revistos os procedimentos, para que os objetivos sejam alcançados( ENTREVISTADO A).

A Fundação Embaré não adota apenas critérios formais para selecionar o alvo de suas

ações sociais, exceto quanto à educação infantil, que é o foco estabelecido. Nesse sentido,

ressalta o entrevistado D:

Não há um critério totalmente formal, mas eu procuro inicialmente separar açõesisoladas e particulares daquelas que possam ter maior sustentabilidade e estar deacordo com nossos ideais. A Fundação Embaré é responsável pelas ações sociais daempresa. O foco é o Centro Infantil e, para o resto, há um planejamento anual, oque não impede de abraçarmos alguma causa que vai surgindo durante o ano, quesão avaliadas e aprovadas ou não.

A empresa reconhece portanto, a importância de se traçarem objetivos para os

investimentos sociais. Embora tenha eleito como prioridade a área de educação, isso não

impede que sejam avaliadas algumas outras eventuais necessidades, inclusive filantrópicas.

Porém, percebe-se no discurso dos entrevistados, que o atendimento a necessidades de caráter

assistencialista está sendo deixado em segundo plano.

100

O foco na área da educação demonstra o esforço da empresa no sentido de estimular o

desenvolvimento do cidadão e fomentar a cidadania individual e coletiva, tanto dos seus

colaboradores diretos quanto da comunidade onde está inserida.

Ainda com relação ao planejamento estratégico da empresa, é pertinente observar que,

por determinação dos seus acionistas, a empresa não divulga sua visão e missão, “porque isto

faz parte do planejamento estratégico formal, que é fechado” , conforme revela o entrevistado

C, mas adota um Código de Ética, disseminado entre todos os seus colaboradores.

O Código de Ética da empresa está organizado na forma de um livreto, para facilitar a

assimilação e adoção dos princípios nele contido nas decisões, práticas e relações da empresa e

de seus colaboradores.

Todos os funcionários, ao serem contratados, passam por um treinamento, em que lhes

é dado conhecimento do Código de Ética, para que conheçam a cultura da empresa e suas

normas de conduta. É de responsabilidade de cada gestor assegurar que seus subordinados

compreendam e cumpram a política e as normas dispostas nesse manual, em consonância com

o entendimento de que “a ética, assim como a excelência, são valores que se formam e se

fortalecem na prática do cotidiano”. (CODIGO DE ÉTICA DA EMBARÉ, 2006, p.24)

De acordo com os gestores, em qualquer situação em que ocorra o descumprimento

das normas de conduta, o funcionário é chamado a prestar contas à empresa. Eis alguns

princípios do Código de Ética da Embaré:

A Embaré, seus diretores, gerentes e demais colaboradores de todos os níveis têm o

dever ético de conhecer e aplicar as leis referentes à condução do negócio.

Sempre competimos no mercado por meio de condutas éticas.

Sempre honramos compromissos comerciais, fiscais, trabalhistas, legais e quaisquer

outros.

101

A cortesia e o respeito orientam nossas ações, considerando as diferenças individuais e

o espaço alheio, assegurando o tratamento justo às pessoas.

É fundamental reconhecer o mérito de cada um e propiciar igualdade de acesso às

oportunidades de desenvolvimento profissional existentes, segundo as características,

competências e contribuição de cada subordinado.

Nas atividades produtivas, promovemos o uso racional dos recursos naturais e a

preservação do meio ambiente, com base no conceito de desenvolvimento sustentável.

As informações necessárias ao pleno desenvolvimento dos trabalhos do dia-a-dia

deverão ser prestadas com honestidade e precisão, constituindo prática inaceitável o

fornecimento de informações deliberadamente incompletas ou desonestas, bem como

declarações falsas ou enganosas, que serão punidas de acordo com a gravidade.

Os colaboradores ou familiares não poderão aceitar presentes, serviços ou dinheiro, em

quaisquer circunstâncias, nem pleitear junto a fornecedores, clientes ou instituições

financeiras algum tipo de benefício em favor pessoal.

Com os seus parceiros ( instituições aliadas à organização e com ela comprometidas), a

Embaré estabelece relacionamentos diferenciados e duradouros baseados no respeito e

na confiança mútua.

A Embaré reconhece o retorno que uma empresa socialmente responsável pode ter,

principalmente em relação à construção de uma imagem positiva; contudo, não tem uma

política de marketing social, visto que divulgar suas ações não é um dos objetivos da empresa.

A Embaré não utiliza do marketing social, não é seu foco. Parte mesmo da vontadepessoal dos acionistas, mas, com certeza, reconheço que as ações sociais reforçam aimagem institucional da empresa, contribuindo para a empresa se projetarnacionalmente e internacionalmente. Por exemplo, a empresa ganhou recentemente(por dois anos consecutivos) um prêmio promovido pela [Revista da Editora 3]

102

“Isto É Dinheiro”, onde um dos pontos avaliados são as açõessociais.(ENTREVISTADO B).

Para o entrevistado C:

Por vontade pessoal dos acionistas, não divulgamos muito nossas ações sociais.Acreditamos que isto contribui muito para nossa imagem, mas não é nosso foco. OCentro Infantil, por exemplo, poucas pessoas conhecem o trabalho maravilhoso queé realizado lá.

Nas palavras do entrevistado D:

Não achamos por bem explorar o marketing social. O tempo mostra isto àspessoas, o boca-à-boca é muito forte. Colocamos nos produtos o selo empresaAmiga da Criança, bem pequeno e sutil. Não nos preocupamos em mostrar o quefazemos às pessoas. (Destaques da autora).

Conclui-se, portanto que não faz parte do planejamento estratégico da Embaré,

promover sua imagem perante seu público, nem mesmo entre os funcionários e a comunidade,

através de suas ações sociais. Apesar de reconhecer que a divulgação é importante, para que

outras empresas possam se conscientizar quanto à importância da RSE, a organização não

dispõe de equipe ou responsável para a realização de trabalho dessa natureza, nem tem planos

futuros neste sentido. A única forma de divulgação nos produtos é o pequeno selo da Abrinq

nas embalagens, com os dizeres “Empresa amiga da criança” e os certificados ambientais, que,

conforme se verá oportunamente, não chama a atenção da comunidade e dos clientes . No

site da empresa, há uma divulgação referente à Fundação Embaré .

Neto e Froes (2001,p.28) afirmam que a RSE busca retorno econômico, social,

institucional e tributário-fiscal. De outra forma, as ações sociais, se transformam meramente

em filantropia, que, ao contrário, não busca retorno algum, apenas o conforto pessoal e moral

103

de quem a pratica. Pode-se afirmar que a empresa em questão é ciente de que a RSE tem base

estratégica, mas, por opção corporativa, não trata suas ações sociais como política estratégica

da empresa, não buscando retorno econômico e tributário, contudo, percebe-se que busca um

retorno social e institucional.

A intenção, quando da criação da Fundação Embaré, não foi a RSE como fatorestratégico e continua não sendo. Nossa intenção foi, dentro dos objetivos traçadospara a Fundação, a de ajudar os mais necessitados, mas estas atividades têm sidoreconhecidas pelo mercado como um todo. Como consumidor, se tenho queescolher entre fornecedores de um determinado item, sendo da mesma qualidade emesmo preço, certamente irei optar pela empresa que tem, dentre seus princípios,responsabilidade social, ambiental etc (ENTREVISTADO A).

Apesar dessa conduta da Embaré, os gestores têm a percepção de que o investimento

em ações sociais lhe traz retornos positivos em relação à comunidade, aos funcionários e aos

consumidores, embora não tenha uma forma de medi-los:

Não dá para medir os resultados positivos, mas posso afirmar que nunca estivemostão bem. O crescimento da empresa pode ser associado justamente a quando aempresa adquiriu a consciência social, e o que vejo é que outras empresas no nossomeio que não se preocupam com ações sociais, não possuem uma imagem tãopositiva. As maiores mudanças dizem respeito à melhoria da imagem para osfuncionários, os consumidores, a população e o envolvimento dos funcionários coma empresa. Acredito haver também relação com o aumento de vendas dos produtos,credibilidade e captação de profissionais ( ENTREVISTADO D).

O entrevistado A confirma essa percepção:

A RSE se traduz em resultados de imagens positivas para a empresa. Aquela visãode “lucro somente para os acionistas”, defendida por alguns autores, e que existe nacabeça de grande parte da população, deixa de existir. O respeito e a admiraçãoficaram mais evidentes. As decisões empresariais, quando tomadas, são mais bemaceitas.

104

No entendimento do entrevistado B,

[...] uma empresa não pode gerar apenas lucro: precisa também gerar ações sociais.E essas ações sociais valorizam a empresa perante seus clientes, fornecedores,colaboradores e a comunidade. O conceito da organização e sua credibilidade setornam mais acentuados, facilitando seus negócios.

Na visão dos entrevistados, os resultados positivos são percebidos das seguintes

formas:

Com relação aos funcionários: os funcionários revelam alto nível de envolvimento.

Ademais, como se manifestou o entrevistado D

sentimos esta imagem positiva aliada ao grande número de pessoas que buscamemprego nesta empresa, bem maior que a nossa demanda, não só por questõeseconômicas, pois, muitos estão empregados em outras empresas satisfeitos comseus salários, mas tem o desejo de trabalhar nesta empresa.

Com relação à comunidade: a comunidade de Lagoa da Prata sempre demonstrou

muita receptividade à empresa, apesar de estar localizada no centro da cidade, o que

poderia ser um incômodo para os moradores; contudo, a atenção especial que a

comunidade dedica à empresa pode ser comprovada pela ausência de resistência à

doação da rua para que pudesse ampliar suas instalações;

Com relação aos consumidores: a empresa teve um grande aumento no seu

faturamento nos últimos anos, coincidindo com o período de seu envolvimento em

ações sociais. Além disso, obteve bastante reconhecimento através de certificações

105

como: ISO 14001, Selo de Empresa Amiga da Criança, Prêmio do Jornal O Valor, e

outras:

De acordo com o entrevistado C, as certificações que a empresa recebeu nos últimos

anos reforçam esta imagem positiva:

Por três anos, recebemos o prêmio do jornal O Valor - valor de carreira, melhoresempresas na gestão de RH, o que é um orgulho para mim. No primeiro ano, fomoseleitos dentre as trinta e cinco melhores empresas e no terceiro ano, ficamos entreas quarenta. Também na Isto é Dinheiro ficamos entre as cinco melhores empresasdo Brasil no setor de alimentos, sendo a única empresa que obteve esse resultadopor dois anos. Temos também o Selo da Abrinq, que, inicialmente, é feito com aaceitação dos termos exigidos e, anualmente, são verificados se estão sendocumpridos. Além das certificações de ISO 9000 e 14000.

A Embaré é filiada ao Instituto Ethos, por reconhecer a importância do Instituto,

apesar de não ter utilizado ainda suas ferramentas de auto-avaliação. Cabe observar que um

dos entrevistados mencionou a complexidade do questionário: “são cento e trinta questões,

que exigem familiaridade com o assunto e clareza quanto às atividades

desenvolvidas.”(ENTREVISTADO C)

Para os gestores, a relevância de se fazer parte do Instituto Ethos decorre do fato de

se estar buscando e disseminando novos conhecimentos e práticas: ”O Instituto Ethos dá um

subsídio muito bom em relação às práticas de RSE, promove intercâmbio de conhecimentos,

de práticas, oferece sistematização e planejamento das práticas “ ( ENTREVISTADO C).

O entrevistado C ressaltou ser de extrema importância saber o que se passa no nosso

País, com outras empresas, quanto a essa questão, de forma a permitir contínua

auto-avaliação e comparação com outras organizações empresariais. Nesse sentido, fazer

parte do Instituto Ethos abre tais possibilidades.

106

A empresa publica o Balanço Social no jornal mineiro Diário do Comércio, e considera

pertinente essa iniciativa, como forma de estimular as outras empresas (Balanço Social 2005,

anexo A).

No entendimento geral dos entrevistados, a responsabilidade social engloba todas as

ações que extrapolem a obrigação da empresa. O entrevistado C listou, durante a entrevista,

as principais ações sociais propiciadas pela Embaré a seus stakeholders, as quais são

relacionadas a seguir. Apesar de consideraram tais ações como parte de um trabalho social

junto à comunidade local, os entrevistados não as distinguem quanto ao caráter filantrópico ou

de responsabilidade social.

Ações sociais destinadas a atingir o público interno da empresa: fornecimento de

cesta básica; adiantamento salarial; pagamento de adicional por tempo de serviço;

complementação salarial por ocasião de afastamento; INSS; assistência médica; auxílio

funeral; distribuição de leite em pó aos filhos de funcionários até 05 anos de idade;

fornecimento gratuito de uniforme e material escolar aos filhos de colaboradores;

assistência odontológica; venda de produtos próprios a preços subsidiados e com

prazo para pagamento; empréstimo parcelado, sem juros; associação recreativa;

seguro de vida em grupo; plano de cargos e salários; transmissão de aulas do

Telecurso 1º e 2º graus; área de lazer; realização de festa de confraternização, com

distribuição de presentes para os filhos de colaboradores que tenham até 11 anos de

idade; plano de previdência privada; subvenção educacional para cursos de graduação

e pós-graduação; ginástica laboral.

107

A empresa destaca a importância de incentivo à formação educacional de seus

funcionários, oferecendo-lhes bolsas de estudos. Semestralmente eles são avaliados, sendo-lhes

exigindo um rendimento de 70% de aproveitamento e o cumprimento de carga horária mínima

obrigatória.

A Embaré pensa na formação integral do profissional e, por isso, incentiva a reflexão

entre seus colaboradores. Várias campanhas educativas são feitas internamente na Empresa,

como palestras de prevenção contra AIDS e outras, voltadas para a promoção da qualidade

de vida. A saúde também é prioridade. São desenvolvidas campanhas de vacinação contra

gripe (subsidiada) e vacinação antitetânica.

Quanto aos planos de carreira, a empresa tem um plano de cargos e salários baseados

em meritocracia, porém, alega que sua estrutura, por ser muito enxuta, dificulta a execução

do plano de carreira. Há também o gerenciamento de currículo, sendo oferecidas vagas

internas, às quais os funcionários podem se candidatar.

Um dos benefícios considerados relevantes pelos Gestores é a previdência privada que

a empresa oferece como benefício adicional. Apesar de ser de livre adesão, atualmente 100%

dos funcionários aderiram ao benefício.

A empresa preocupa-se sempre em ouvir seus colaboradores. A Embaré adotou o

"Plano de Sugestões" , para que haja a participação efetiva dos colaboradores na melhoria dos

processos de produção. O projeto abre um canal de comunicação entre a Empresa e seus

colaboradores, possibilitando a todos os funcionários a oportunidade de participarem,

mandando sugestões de melhorias para a área em que atuam e até mesmo para outros setores.

As melhores sugestões concorrem a prêmios diversos, escolhidos por uma comissão julgadora.

Ainda no âmbito da atuação socialmente responsável , envolvendo os funcionários, foi

comentado durante as entrevistas que a empresa não leva em consideração o trabalho

108

voluntário por ocasião da contratação, mas é oferecido um pequeno estímulo dentro da

empresa para tal tipo de engajamento:

A empresa incentiva pontualmente, por exemplo, através de campanhas isoladas,como a de doação de sangue etc. A empresa oferece apoio natural para a FundaçãoEmbaré, onde todos os funcionários dos setores fazem trabalho, na parte financeira,contábil, RH etc. A empresa, desde 2000, incentiva seus colaboradores a doaremvalores monetários a entidades que prestam assistência a crianças e adolescentes,como o PRÓ-FIA. Para facilitar a doação, a Embaré adianta o valor a ser doado atéo final de dezembro do corrente ano, e o colaborador ressarce a empresa em abril,quando da declaração do ajuste. A empresa elaborou uma cartilha para osfuncionários, onde explica o sistema, incentiva a doação e presta conta do destinodos recursos do ano anterior. Essa cartilha é acompanhada de uma carta doPresidente da empresa, que reforça o incentivo (ENTREVISTADO B).

Ressalta-se que pode ser observado a partir da lista de ações apresentada, que alguns

dos denominados benefícios sociais são modalidades de complementação salarial que não se

constituem em ação deliberada ou espontânea da empresa, com vistas a substituir a ação

estatal.

Destaca-se que em 2005, a empresa ofereceu um prêmio monetário a todos os seus

funcionários, em virtude da comemoração dos seus 70 anos, o que pode demonstrar o

envolvimento e reconhecimento pelos trabalhos prestados à empresa.

Ações sociais destinadas a atingir a comunidade: convênio com a Associação dos

Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE, local para desenvolvimento de atividades

de valorização humana pelo trabalho com pessoas portadoras de deficiências (mentais

e múltiplas). É possibilitada a alunos da Associação a oportunidade de trabalharem

meio expediente em diversas áreas da empresa, de forma a proporcionar-lhes maior

integração social, além de desenvolvimento ocupacional. É também feita a doação

mensal de duas toneladas de leite em pó a entidades beneficentes, hospitais, creches,

fundações e associações; Outra ação que merece ressalva é a parceria com a Fundação

109

Educacional da Escola Agrotécnica Federal de Bambuí, participando de seu Conselho

Administrativo e proporcionando intercâmbio técnico e programa de estágios. Cabe

ainda citar entre as alies envolvendo a comunidade, a manutenção do Centro Infantil

Arlete Antunes construído com recursos próprios da empresa que atende 90 crianças

em programa educacional; oferta, em parceria com o SENAI, de cursos

profissionalizantes de mecânica e de eletro-eletrônica para jovens da cidade de Lagoa

da Prata com 17 anos, que tenham concluído o primeiro grau; criação e manutenção

do Coral da Fundação, formado por 60 integrantes, parte dos quais colaboradores e

parte recrutada entre os demais membros da comunidade.

Uma das principais ações da empresa é o respeito às questões ambientais, atuando

sempre dentro dos limites estabelecidos pela lei. Conforme menciona o entrevistado C, como

decorrência da conscientização quanto à importância de se preservar a natureza e proteger o

meio ambiente, a Embaré investiu na construção de uma Estação de Tratamento de Efluentes

Industriais, onde na qual mais de 1.050.000 litros de efluentes industriais recebem tratamento

diariamente. Já tratada e analisada em laboratório exclusivo para essa finalidade, a água é

devolvida aos mananciais que desembocam na Lagoa Verde, antes da sua integração ao rio

São Francisco.

A coleta seletiva do lixo é parte da cultura da Embaré, cuja proposta visa a diminuir o

desperdício, identificando e valorizando as possibilidades de reciclagem, como meio de

preservação ambiental. Segundo os entrevistados esta é uma questão sine qua non.

Por iniciativas dessa natureza que extrapolam suas obrigações legais, a Embaré

conseguiu uma das mais importantes certificações de gestão ambiental: a ISO 14001. Da

110

mesma forma, a preocupação com a qualidade de seus produtos e com o meio ambiente

possibilitaram à Embaré receber a certificação ISO 9001. Para os gestores, a regra é clara:

conviver de forma harmônica com a natureza, mesmo que, para tanto, seja necessário realizar

alterações na estrutura da fábrica.

Ações sociais destinadas a atingir os fornecedores: com vistas a promover os

fornecedores de materiais, a Embaré oferece-lhes assistência técnica e qualificação,

principalmente se não há outro concorrente, de forma a auxiliá-los a melhorar o

processo produtivo. Destaca-se que, em 2005, a Embaré construiu acomodações

especiais para receber estes fornecedores, em caso de visita à empresa. Quanto aos

fornecedores de leite, apurou-se nas entrevistas ser política da empresa apoiar o

produtor rural, facilitando seu acesso a informações e treinamento. Essa é uma

premissa básica da Embaré, que há anos vem trabalhando para fortalecer seus

parceiros de campo, oferecendo-lhes assistência técnica e gerencial, acesso a novas

tecnologias, curso de capacitação, treinamento de mão-de-obra envolvida na produção

leiteira, monitoramento da coleta granelizada e do transporte do leite da fazenda até a

indústria, além de incentivo à aquisição de insumos e equipamentos básicos para a

produção leiteira.

De acordo com os gestores entrevistados, existem critérios para a seleção dos

fornecedores a serem contratados, salientando-se que o principal é a qualificação técnica

exigida por lei. Ressaltaram que não se inclui entre esses critérios a responsabilidade social dos

fornecedores, mas não descartaram a possibilidade de se pensar a respeito, como forma de

estimulá-los.

111

É importante destacar um fato mencionado pelo entrevistado D, segundo o qual,

recentemente, um fornecedor visitou o Centro Infantil e, sensibilizado com o trabalho

desenvolvido, dispôs-se a custear as despesas de mais dez crianças para o Centro. Este fato

mostra o reconhecimento do trabalho realizado pela empresa e evidencia que propagar o bem

social mobiliza as pessoas.

Ações sociais destinadas a atingir os consumidores: o respeito aos consumidores é

o compromisso assumido pela Embaré, que além de lhes oferecer produtos de alta

qualidade e confiabilidade, age sempre de acordo com os princípios éticos,

mantendo-os sempre informados acerca da qualidade dos produtos. Uma questão

destacada pelos entrevistados é também a pontualidade na entrega.

Os gestores entrevistados destacaram que procuram ouvir sempre os clientes quanto à

sua satisfação com a empresa e os produtos, e buscam ouvir as reclamações e/ou sugestões

apresentadas.

Um dos grandes problemas considerados pela empresa é sua localização no centro da

cidade. A entrada da indústria localiza-se na principal rua da cidade, onde há bastante

movimento, principalmente de bicicletas dos trabalhadores da empresa e de caminhões.

Conforme demonstra o entrevistado D:

A localização é um grande problema. Quando começamos, havia um córrego quenos separava da cidade; não estávamos no centro. Nem podemos afirmar quemcresceu em volta de quem. Recebemos constantemente oferta de terrenos em outracidade para nos instalarmos. Há muita dificuldade para expansão. Ganhamosoutra rua recentemente e então vamos tirar o trânsito de entrada de funcionários,caminhões, desta rua principal da cidade. Por outro lado, os funcionários adoramnossa localização, pois, a maioria vem trabalhar de bicicleta.

112

Para minimizar esse problema, a Embaré está mudando sua entrada principal para a rua

que recebeu do município; contudo, já faz parte dos seus planos, construir uma nova unidade

industrial em outra cidade, pois considera-se limitada, em função de sua localização.(ANEXO

B)

Enfim, os gestores afirmam que o objetivo maior da empresa é gerar lucros para os

acionistas, mas acreditam que a missão da Embaré não se esgota aí. Os entrevistados

percebem, de modo geral, que houve uma ampliação da visão da função da empresa nas

últimas décadas. Atualmente, é maior o comprometimento com o bem-estar social, com os

colaboradores, com o meio ambiente e com a comunidade onde está inserida. Essa visão se

enquadra na doutrina do stakeholders:

A responsabilidade social é dever do Estado e de seus órgãos de ação, mas discordode que uma empresa não deva ter responsabilidades sociais. Gostaria de saber dosautores que afirmam que uma empresa somente deve pensar em gerar lucros paraseus acionistas, o que fazer quando o Estado não cumpre com suas obrigações?Devemos deixar que, a exemplo do país mais pobre do mundo, o caos se instale,enquanto as esferas do Estado discutem quem deverá se responsabilizar pelocrescimento da sociedade? A meu ver, é de difícil solução a convivência, numamesma comunidade, de camadas da sociedade extremamente abastadas e outrassem a mínima oportunidade na vida. Adicionalmente, acredito que os investimentosadvindos da responsabilidade social das empresas coloquem o Estado em evidência,gerando uma certa cobrança por parte da população sobre ele. Exemplo desse fatofoi termos recebido a visita do Secretário de Educação do Estado do Nordeste, paraanalisar nosso projeto do Centro Educacional para desenvolver algo igual em seuEstado ( ENTREVISTADO A).

Para o entrevistado C:

113

Acredito que esta visão de que a única função da empresa é gerar lucros para seusacionistas já era. Não há como fugir deste novo contexto, onde a desigualdadesocial está fortemente presente, e as empresas podem contribuir. A empresa tem dasociedade os recursos de que precisa, nada mais justo do que tentar devolver dealgum modo. Uma empresa que não pensar em RSE está fadada ao fracasso.

Em face dos depoimentos colhidos, conclui-se que, de fato, desde 1990 até hoje houve

uma mudança do conceito de RSE, tendo a empresa ampliado seus objetivos para garantir o

retorno à sociedade de parte dos seus resultados.

5.2 Percepção e expectativas dos funcionários, fornecedores e comunidade local quanto

à responsabilidade social da Embaré

Este tópico apresenta a visão da RSE a partir da percepção dos seguintes stakeholders

da empresa: funcionários (coordenadores, identificados pelas letras de E a I, e trabalhadores

dos setores operacionais, identificados de J1 a J10), fornecedores e comunidade local,

conforme já foi discriminado anteriormente no Quadro 7.

As entrevistas revelaram que o conceito de RSE entre os coordenadores da Embaré

está fortemente relacionado aos colaboradores/parceiros da empresa e ao meio ambiente. É

exemplo disso a opinião do entrevistado G, para o qual “Responsabilidade Social empresarial é

a empresa que além de cumprir as obrigações legais, ainda pratica atos e ações voltadas para o

bem social dos seus colaboradores e da comunidade.”

Ressalta ainda o entrevistado I:

114

Uma empresa socialmente responsável é aquela que busca mobilizar a comunidadena promoção dos direitos humanos, preocupa-se em melhorar as relações detrabalho e com a preservação do meio ambiente, ou seja, é a empresa excedernaquilo que seja relevante para o bem-estar da coletividade e dos seuscolaboradores.

De acordo com a visão dos funcionários de nível operacional, uma empresa socialmente

responsável é aquela que se preocupa sobretudo com seus funcionários, com a qualidade de

seus produtos e com o meio ambiente:

[...] uma empresa socialmente responsável é aquela que trabalha com o objetivo demelhorar sempre a qualidade dos seus produtos, sem afetar de forma negativa omeio ambiente e preocupando-se com seus funcionários ( ENTREVISTADO J1).

Ter responsabilidade social empresarial é a empresa estar sempre preocupada como bem-estar dos seus funcionários, oferecendo-lhes benefícios, melhorando ossalários, oferecendo oportunidades de crescimento, para isto, ela deve oferecerprodutos de qualidade para que os consumidores sintam-se satisfeitos, sem agrediro meio ambiente (ENTREVISTADO J2).

A visão de uma empresa socialmente responsável, na concepção do representante dos

fornecedores, restringe-se ao atendimento a seus funcionários: “Empresa socialmente

responsável é aquela que oferece salários justos, capacita os seus funcionários e oferece outros

benefícios como acesso à saúde e lazer ( ENTREVISTADO K).

Quanto aos membros da comunidade de Lagoa da Prata , as entrevistas revelaram que,

de um modo geral, sua percepção quanto à responsabilidade social empresarial, contempla a

“preocupação com a sociedade, especificadamente com a própria comunidade onde está

inserida”. (ENTREVISTA L1). Dentre estes stakeholders, houve ainda quem dissesse que,

A RSE é o compromisso que as empresas têm com a sociedade, desenvolvendoprojetos que visam melhorar a vida dos membros da comunidade onde ela seencontra (ENTREVISTADO L2).

115

É a responsabilidade que as empresas têm com a sociedade, contribuindo com opagamento de impostos e desenvolvendo projetos que visem o bem-estar social(ENTREVISTADO L3).

Solicitados a expor sua visão sobre a Embaré se constituir uma empresa socialmente

responsável e por que motivos, este grupo de stakeholders foram consensuais no

entendimento de que a Embaré é uma empresa socialmente responsável, porque valoriza os

funcionários e se preocupa com seu bem-estar, cuida do meio ambiente e atende à

comunidade.

Eis o teor da manifestação dos coordenadores sobre esse aspecto, durante as

entrevistas:

A Embaré é uma empresa com responsabilidade social porque é uma empresa quedá atenção aos problemas sociais da comunidade, valoriza seus funcionários,preocupa com o meio ambiente. Esta preocupação com o meio ambiente pode sercomprovada através da certificação que ela recebeu: ISO14001 ( ENTREVISTADOH).

Segundo os entrevistados E e F:

[...] eu acredito que a Embaré é uma empresa socialmente responsável, pois elasempre tem cumprido seu papel com os funcionários, com a família dosfuncionários e também com os menos favorecidos da comunidade.

Sim, devido às diversas atitudes que a empresa demonstra em relação ao cuidado epreocupação com o meio ambiente. A construção de uma estação de tratamento de eseus afluentes industriais, demonstra sua preocupação com o meio ambiente. Alémdisso a Embaré é uma “mãe” para seus funcionários e seus beneficiários, ajudandomuito a vida de seus colaboradores.

116

Para o entrevistado da categoria dos fornecedores, a Embaré é uma empresa

socialmente responsável, devido ao tratamento dispensado a seus funcionários e fornecedores:

A Embaré é uma empresa socialmente responsável, o que podemos ver claramente,a partir da valorização de seus colaboradores e assistência aos seus familiares efornecedores. A Embaré tornou-se hoje não só referência na região, mas,nacionalmente, fazendo constar seu nome no ranking das melhores empresas de setrabalhar no Brasil ( ENTREVISTADO K).

Quanto à avaliação da Embaré na visão da comunidade de Lagoa da Prata, os dados da

pesquisa revelam que as ações de cunho social que têm implementado em prol da comunidade

vão além de suas obrigações legais. Além disso, dispensa a seus funcionários especial atenção e

apoio:

Para mim, a Embaré é uma mãe para Lagoa da Prata, tanto pelos benefícios queela proporciona aos seus funcionários quanto pela preocupação que percebo queela tem com a população carente da comunidade, por isso ela é uma empresa quetem responsabilidade social (destaque da autora) (ENTREVISTADO L20).

A Embaré é uma empresa socialmente responsável porque ela vai além das obrigações impostas pelo governo. Podemos ver pelos compromissos que elaassume com seus funcionários [...] ( ENTREVISTADO L12)

Um dos itens da entrevista teve como objetivo conhecer se este grupo de stakeholders

sabia que a Prefeitura Municipal de Lagoa da Prata doou uma rua para a empresa ampliar sua

fábrica, exigindo como contrapartida a construção de uma creche. Procurou-se ainda, verificar

como esses stakeholders avaliam essa situação.

Todos os funcionários de nível de coordenação e o fornecedor entrevistado,

declararam ter conhecimento dessa negociação e consideraram tal atitude digna de elogios,

por demonstrar a preocupação da empresa com as questões sociais:

117

Esta atitude comprova a responsabilidade social da Embaré em relação àcomunidade que está inserida, pois, ela não tinha nenhuma obrigação de mantercom os custos de manutenção do Centro Infantil e não se utilizou de nenhummarketing para divulgar essa atitude ( ENTREVISTADO H).

O entrevistado E avalia o ocorrido como uma atitude que mostra a intenção da empresa

em fazer algo mais do que a sua obrigação de pagar impostos, prestando, assim, um serviço à

comunidade onde ela se encontra.

Dentre os funcionários de nível operacional, 85% sabiam da doação do espaço pela

Prefeitura, para a expansão da empresa, mas não tinham conhecimento de que haviam partido

da Embaré as iniciativas de manter a creche e de transformá-la em Centro Infantil. 99% dos

entrevistados avaliaram como muito positiva tal atitude, comentando que fortalece a imagem

da empresa como socialmente responsável:

Eu sabia que tinha recebido a rua, mas não sabia que não era obrigação da empresamanter a creche. Acho esta atitude muito bacana, pois mostra que a empresapreocupa-se com a comunidade carente de nossa cidade. Isto é muito bom(ENTREVISTADO J10).

Eu sabia que a Prefeitura doou a rua, mas a Embaré não divulgou que partiu delaesta iniciativa de construir uma creche tão equipada. Acredito que esta atitudedemonstrou a grandeza da empresa e sua preocupação com o bem estar- social(ENTREVISTADO J5).

A pesquisa evidenciou que 98% dos entrevistados da comunidade local não sabiam

deste acordo da Prefeitura. Mostraram-se surpresos e declararam desconhecer o objetivo do

Centro Infantil, avaliando a situação como extremamente positiva:

Avalio esta atitude como muito positiva, pois demonstra que a empresa não sepreocupa somente com os custos, mas, sim, com o desenvolvimento de suacomunidade ( ENTREVISTADO L8).

118

Não sabia desse acordo, mas acho que esta atitude mostra a responsabilidade socialda empresa. Esta atitude merece elogios e admiração e, para mim, criou umamelhor imagem da empresa (ENTREVISTADO L14).

Quanto à doação da rua, os depoimentos da maioria dos entrevistados revelaram sua

concordância com a doação da Prefeitura para que a empresa pudesse ampliar sua fábrica em

Lagoa da Prata, alegando-os seguintes motivos: a empresa gera mais empregos com a

expansão; a rua não era de grande circulação, e sua exclusão não afetou o trânsito na cidade; o

Centro Infantil trouxe ganhos maiores para a comunidade; a empresa não tinha outra

alternativa de solução para o problema de espaço:

Concordo com esta ação, pois a Embaré fez até mais do que lhe foi sugerido fazer em troca da rua, além do mais, esta ampliação levou à geração de novos empregospara a comunidade ( ENTREVISTADO E).

Na visão do entrevistado L19:

Concordo plenamente com a Prefeitura, visto que a Embaré não tinha opção, pois,precisava ampliar e se não tivesse recebido a rua, ela teria que se deslocar paraoutro lugar, e talvez até para outra cidade, e causaria um grande desemprego emLagoa da Prata. Além do mais não tinha como ninguém ser contra uma empresaque só orgulha os moradores desta cidade.

As expectativas deste grupo de stakeholders com relação à RSE foi outro item

abordado nas entrevistas. Os discursos deste grupo apontaram como prioritários as demandas

sociais sintetizadas nas tabelas 1 e 2. Para facilitar a organização fez-se necessário agrupar as

respostas dos dois grupos: funcionários e fornecedores na tabela 1 e as da comunidade na

tabela 2.

As falas dos funcionários (coordenadores e operacionais) evidenciaram que uma

empresa socialmente responsável deve dirigir maior atenção ao público interno, através da

119

melhoria dos salários e concessão de benefícios. Tal visão coincide com a percepção desse

mesmo grupo quanto ao conceito de RSE exposto anteriormente: responsável é a empresa que

se preocupa sobretudo com o bem-estar dos seus funcionários.

TABELA 1Prioridades de empresas socialmente responsáveis: visão do público interno e de

fornecedores da Embaré

Ações prioritárias Percentual das respostasMelhoria das condições salariais do público interno..............

Melhoria das qualidades dos produtos...............................

Desenvolvimento da comunidade.......................................

Meio ambiente.....................................................................

83%

1%

15%

1%

TOTAL 100%

FONTE: Dados da pesquisa, 2006.

TABELA 2Prioridades de empresas socialmente responsáveis: visão da comunidade externa local da

Embaré

Ações prioritárias Percentual das respostasApoio à educação dos membros da comunidade ..............

Saúde.....................................................................................

88%

12%

TOTAL 100%

120

FONTE: Dados da Pesquisa, 2006

A opinião geral da comunidade local externa, por sua vez, convergiu para o

entendimento de que uma empresa socialmente responsável deve dirigir maior atenção às

causas sociais referentes à coletividade, em especial nas áreas de educação e saúde.

Conclui-se com base nas entrevistas, que as ações sociais que a Embaré vem

desenvolvendo nos últimos tempos atende às expectativas dos stakeholders. Quanto aos

funcionários e fornecedores, que demandam prioritariamente melhorias nas condições salariais,

90% dos entrevistados afirmaram estar satisfeitos com suas condições de trabalho, no que se

refere a salários, plano médico, odontológico, plano de aposentadoria, segurança no trabalho e

flexibilização do horário da jornada de trabalho( turnos alternados dia/noite).

Com relação à percepção do segmento comunidade local, concluiu-se igualmente que

as ações da Embaré atende plenamente às suas expectativas, tendo sido reiteradamente

mencionados nas entrevistas, o investimento em educação tanto da população carente (através

do Centro Infantil) quanto da população beneficiada com os cursos profissionalizantes que a

empresa oferece à comunidade, bem como os incentivos monetários à formação dos

funcionários e de seus familiares.

Outro aspecto enfocado nas entrevistas foi a percepção da diferença entre obrigações

da empresa e ações sociais espontâneas, na visão dos stakeholders.. Esta questão não teve

como objetivo apontar o que é certo ou errado no entendimento dos respondentes, mas

entender como as pessoas percebem alguns benefícios que a empresa proporciona. À medida

que cada beneficio era mencionado, o entrevistado o classificava como obrigação ou como

ação social da empresa. As respostas obtidas de todos os stakeholders, foram reunidas na

Tabela 3.

121

TABELA 3 Percepções dos stakeholders ( funcionários, fornecedores e comunidade local) sobre os

benefícios e ações sociais da Embaré

Benefícios/ ações% das respostas obtidas

Obrigação daempresa

Açãosocial

Auxíliomédico................................................................

Auxílioodontológico......................................................

Cursos profissionalizantes para os funcionários emembros dacomunidade................................................

Plano de aposentadoriacomplementar...........................

Fornecimento de material escolar para os filhos dosfuncionários ..................................................................

Cesta básica para osfuncionários..................................

Ajuda de custo para cursos de graduação epós-graduação para os funcionários....................................

Doação de leite em pó para outras entidadesfilantrópicas dacomunidade..........................................

Criação de um Coral....................................................

Área de lazer para osfuncionários................................

Manutenção de uma creche para crianças

65,0

20,0

20,0

31,5

9,0

13,0

17,0

5,0

0

20,0

0

35,0

80,0

80,0

68,5

91,0

87,0

83,0

95,0

100,0

80,0

100

122

carentes.......

FONTE: Dados da pesquisa, 2006.

De acordo com 65% dos entrevistados, o auxílio médico é obrigação da empresa.

Deve-se ressaltar que, na verdade, oferecer planos de saúde não é uma obrigação legal

aplicável às empresas, apesar de uma crença equivocadamente difundida. Acredita-se que a não

percepção de que uma empresa investe na saúde dos funcionários, com vistas à possibilidade

de oferecer-lhes maior segurança, justifique o percentual de respostas obtido. O mesmo não

ocorreu, contudo, com relação ao auxilio odontológico, o qual foi percebido claramente como

ação social por 80% dos entrevistados.

Essa percepção conflitante de que o plano de saúde é obrigação da empresa, mas um

atendimento especializado à saúde não é pode ser explicada pelo fato de que a saúde do

funcionário traz benefícios para a própria empresa, tais como, redução do índice de

absenteísmo e de licenças, incremento da produtividade e outros. Já o atendimento

odontológico não está diretamente ligado à produtividade dos funcionários.

Quanto aos cursos profissionalizantes oferecidos pela empresa aos membros da

comunidade e a seu público interno, bem como a ajuda de custo aos funcionários para cursos

de graduação e pós-graduação, foram considerados pela grande maioria desse grupo de

stakeholders como ações sociais da empresa, aliás, coerentes com sua política social de

incentivo e reiterada pelo entrevistado B: capacitar os seus funcionários para que possam

123

“crescer” profissionalmente dentro da empresa é uma preocupação constante. Os cursos

oferecidos à comunidade são uma forma de preparar as pessoas para o mercado de trabalho,

assim como as oportunidades de estágio nas áreas de formação disponibilizadas pela Embaré,

com possibilidade de efetivação futura do estagiário em seu quadro de funcionários.

Quanto ao plano de aposentadoria, 36,5% dos entrevistados declararam acreditar que

se trata de obrigação da empresa, enquanto 68,5% perceberam tal benefício como ação social.

Este resultado remete à conclusão de que, na visão deste grupo de stakeholders, aquilo que é

benefício que ultrapassa a legislação trabalhista é tomado como uma ação social, enquanto

aquilo que se espera que a empresa faça para melhorar ou garantir as condições de contrato de

trabalho assalariado é tomado como obrigação. Percebe-se portanto, entre esses stakeholders,

a tendência à percepção de um papel da empresa como promotora do bem-estar social,

complementado ou ampliando os direitos dos consumidores para além do previsto na

legislação.

Quanto ao fornecimento de material escolar para os filhos dos funcionários, foi elevada

a percepção de que constitui uma ação social (91%). De acordo com o entrevistado B, tal

iniciativa surgiu como incentivo à educação e como forma de atender aos filhos dos

funcionários, já que o Centro Infantil não atende a estas crianças, a não ser que sejam

moradoras do Bairro onde está localizada a referida unidade.

A doação de leite em pó para algumas entidades do município também foi vista como

ação social pela maioria dos entrevistados (95%).

Para 80% dos entrevistados, o acesso a área de lazer foi considerado uma ação social

da empresa. Para a maioria dos entrevistados (87%), também a concessão de cesta básica a

todos os funcionários foi considerada ação social da empresa. A cesta básica é concedida a

todos os funcionários.

124

Foram consensualmente percebidos como benefício de ação social (100%), o Coral

Embaré e a creche. O coral foi criado em 2002 e atualmente conta com mais de 50 vozes

(entre colaboradores da Empresa e integrantes da comunidade), sendo mantido integralmente

pela Embaré. São três seus objetivos principais: estar presente nas festas de Natal e outras

festividades internas; participar do desenvolvimento artístico e cultural da cidade de Lagoa da

Prata; promover e difundir a imagem da empresa através do comparecimento a atos públicos e

regionalistas, dentro ou fora de Lagoa da Prata.

A manutenção do Centro Infantil, por sua vez, apesar de não ser conhecido pela

maioria dos entrevistados, foi reconhecida por todos os entrevistados como a ação social mais

relevante da Embaré. Novamente pode-se aventar aqui a hipótese sugerida anteriormente, e

que torna a imagem da empresa para os stakeholders a de uma agência de promoção de bem

estar local.

Outro aspecto alvo de consideração nas entrevistas foi a distinção entre papel da

empresa e do Estado, objetivando saber a opinião do segmento comunidade/clientes quanto ao

papel social da Embaré. Conforme os gestores da empresa, as ações sociais implementadas

surgiram da vontade de seus acionistas, que se vêem como substitutos do Estado, cujo papel

social consideram que não vem sendo cumprido de forma satisfatória.

Mas, de acordo com a maioria dos demais stakeholders entrevistados, a empresa não

tem obrigação de ser parceira do Estado na luta pelo social, visto que já contribui pagando

seus impostos, gerando empregos e produzindo com qualidade seus produtos:

O papel social é dever do governo. As empresas já estão bastante oneradas com acarga tributária. Este dinheiro é que deveria ser bem administrado pelo governo etentar combater estes problemas sociais. A empresa tem o dever de gerarempregos, produzir com qualidade e pagar seus impostos em dia(ENTREVISTADO L16).

125

Os representantes da comunidade local , foram solicitados a expor seu ponto de vista

quanto à influência da RSE na imagem da empresa. O objetivo era saber se, quando o

consumidor escolhe um produto, é levado a dar preferência àquele que, em iguais condições de

oferta, foi fabricado por empresa comprometida com o meio ambiente, ou que desenvolve

algum tipo de trabalho social, ou ainda que recebeu algum tipo de prêmio por seu

comportamento social responsável.

É interessante destacar que 97% dos entrevistados responderam que tal fato nunca lhes

chamou a atenção. Especificadamente quanto aos produtos da Embaré, constatou-se que todos

os entrevistados compram produtos da empresa e nenhum tem conhecimento de que, na

embalagem dos produtos há o selo “Empresa Amiga da Criança” ou a certificação ambiental e

de qualidade. O que a maioria dos entrevistados leva em conta é o preço e a qualidade do

produto.

Outro item da entrevista, dirigido especificamente aos representantes do segmento

comunidade de Lagoa da Prata, visa a verificar se estão informadas sobre todas as ações

sociais que a empresa realiza. Concluiu-se que é consensual entre os entrevistados o

conhecimento de que a empresa oferece cursos técnicos à comunidade, além de muitos

benefícios a seus funcionários; contudo, a maioria ignora que a empresa obteve a certificação

de “Empresa Amiga da Criança”, mesmo estando tal informação estampada no rótulo de seus

produtos.

Além disso, 96% dos entrevistados não sabem que a Embaré distribui mensalmente

2.000 litros leite para creches e outras instituições da cidade, e que a empresa obteve os

certificados IS0 14001 e 9001. Dentre os stakeholders entrevistados, verificou-se que 88% já

ouviram falar no Centro Infantil; contudo, 93% não sabem qual é o trabalho realizado em seu

âmbito nem qual é seu objetivo. Acreditam, equivocadamente, que o Centro Infantil cuida

126

somente dos filhos dos funcionários da empresa: “Já ouvi falar que o Centro Infantil é uma

maravilha... Se eu trabalhasse na empresa, queria que meus filhos ficassem lá, pois, sei que é

uma creche que cuida dos filhos dos funcionários (ENTREVISTADO L7).

Ainda em relação a esta questão, constata-se o surgimento de um equívoco quanto ao

prêmio monetário concedido aos funcionários da Embaré em 2005, em virtude da

comemoração dos 70 anos da empresa. Este prêmio remete o sentido de comemoração ou

reconhecimento pelo trabalho de seu público interno. Contudo, membros da comunidade,

mencionam o fato, como se fosse um 140 salário, ou um compromisso para com os

funcionários, o que demonstra novamente que a empresa não divulga suas ações sociais.

[...] podemos ver pelos compromissos que ela assume com seus funcionários, porexemplo, no ano de 2005, sei que ela pagou 140 salário a todos e podemos vertambém os benefícios que ela oferece à comunidade, através de doações,treinamentos, etc ( ENTREVISTADO L12).

Finalmente, foi indagado aos entrevistados sobre a imagem que têm da empresa com

relação à sua localização, à valorização profissional e ao sentimento de tê-la inserida na

comunidade de Lagoa da Prata.

Quanto à localização da empresa no centro da cidade, 100% dos stakeholders

afirmaram que não haver qualquer inconveniente. Tal percepção contraria o entendimento dos

diretores, que afirmam ser a localização da empresa um problema para a comunidade e para a

própria empresa.

Verificou-se que 91% dos entrevistados sentem vontade de trabalhar na Embaré, por

ser uma empresa que se compromete com o bem-estar dos seus funcionários.

127

Os entrevistados não abordaram o cuidado da empresa com o meio ambiente nem seu

apoio ao desenvolvimento da comunidade, dados coerentes com o fato de que a maioria dos

entrevistados desconhece tais ações sociais da Embaré.

Apesar de a empresa não divulgar suas ações sociais, observou-se ser generalizado

entre os stakeholders o sentimento de orgulho por tê-la em sua comunidade: 100% dos

entrevistados declararam ser a Embaré , um motivo de orgulho:

Claro que tenho orgulho. Se não fosse esta empresa, o desemprego seria muito altoaqui. Além disso, nossa cidade só tem a ganhar com uma empresa que valorizatanto os seus funcionários, preocupada até mesmo com suas famílias. É umaempresa projetada até internacionalmente, reconhecida pela qualidade de seusprodutos (ENTREVISTADO L15).

Em síntese, os stakeholders participantes desta pesquisa (gestores, comunidade,

fornecedores, funcionários) foram unânimes em afirmar que a RSE reforça a imagem da

empresa, em consonância com a visão de NETO e FROES (1999; 2001), BORGER (2001) e

ASHLEY (2002), os quais entendem que RSE contribui para a formação de uma imagem

positiva da empresa, contudo, a pesquisa revelou que ainda a RSE não é valorizada, como

seria desejável, no momento de decisão de compra de produtos.

128

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo de caso realizado, além de contribuir para elucidar as questões propostas,

suscitou outras, que demandam aprofundamento conceitual e empírico em futuras pesquisas.

O objetivo geral deste estudo foi analisar as percepções e expectativas dos stakeholders

da Embaré quanto à política de Responsabilidade Social Empresarial -RSE. Cabe ressaltar que,

no meio acadêmico, a concepção de RSE não se esgota em uma única definição. Apesar de

levar-se em consideração as diferenças conceituais entre filantropia e RSE enfocadas por Melo

Neto e Froes (2001), optou-se , neste trabalho, por um conceito mais amplo de RSE, tomando

como base a conceituação construída por Ashley(2003) e o Instituto Ethos de

Responsabilidade Social, entendida como qualquer ação de cunho social que ultrapasse as

129

obrigações das empresas estabelecidas pela legislação, com vistas a contribuir para a melhoria

das condições de vida da sociedade.

O resultado das entrevistas com os Gestores da Embaré revelou que a RSE está

presente na cultura corporativa fortemente marcada pelos eventos históricos da década de

1990 que determinaram o aumento dos problemas sociais brasileiros, a ação de entidades

não-governamentais sensibilizadas com a questão e a maior demanda por competitividade no

mercado, impulsionando o envolvimento do setor privado com o tema no Brasil:

Para ser bem sucedida em seus negócios como empregador e como membro dacomunidade, a Embaré deve operar de forma tal que lhe permita gozar decredibilidade e confiança de seus clientes, colaboradores e fornecedores, do públicoem geral e do governo, em todos os níveis com os quais se relaciona (CÓDIGO DEÉTICA DA EMBARÉ, 2006,p.01).

Os dados da pesquisa revelaram que, na Embaré, todas as iniciativas de ações

socialmente responsáveis originaram-se da vontade pessoal de seus dirigentes, não estando

claramente diferenciadas das ações caracterizadas como filantropia empresarial. Observou-se,

quanto a esse aspecto uma junção dos conceitos, uma vez que onde os dirigentes apontam

como ações sociais algumas ações filantrópicas, tais como doação de leite em pó para outras

entidades.

Na percepção dos funcionários e fornecedores, por sua vez, o conceito de empresa

socialmente responsável está fortemente ligado a ações que levam em conta o interesse dos

funcionários e os impactos causados pelo processo produtivo ao meio ambiente. Já para os

membros da comunidade de Lagoa da Prata, a concepção de RSE diz respeito aos benefícios

oferecidos à comunidade em geral. Dessas concepções derivam as expectativas desse grupo

quanto às políticas a serem implementadas pela empresa, especialmente, melhoria das

130

condições salariais e dos benefícios concedidos aos trabalhadores e desenvolvimento da

comunidade através da educação.

Para Ashley (2002) citada por Tenório (2004, p. 163), o conceito contemporâneo de

RSE apresenta o desafio de descentralização do foco de atuação da empresa responsável, ou

seja, deve haver o comprometimento com todas as partes, sem priorizar nenhuma delas, de

forma específica.

Tendo em vista essa concepção, pode-se concluir que os stakeholders da Embaré

(excetuando-se os stockeholders) têm uma visão restrita de RSE , voltada para seus próprios

interesses. As diferentes concepções a respeito do tema comprometem seu claro entendimento,

revelando uma percepção difusa, que pode ser percebida na dificuldade de distinção entre o

que é obrigação da empresa e o que é ação social responsável.

Para evitar que possam surgir na empresa problemas internos decorrentes de políticas

sociais que não sejam consideradas como RSE, a empresa deve buscar desenvolver

ferramentas de comunicação interna para promover a disseminação do conceito de RSE, bem

com de suas ações, para que possa estar mais preparada para equilibrar os objetivos dos

diferentes segmentos de stakeholders.

A partir de um trabalho de conscientização de todas as partes envolvidas, no tocante a

um redesenho do conceito de RSE, abre-se a possibilidade de se promover o envolvimento

coletivo no desenvolvimento e na implementação de programas sociais que beneficiem todo o

stakeholders, inclusive estimulando o trabalho voluntário na empresa, aspecto que se revelou

incipiente na Embaré.

A motivação que a empresa teve para iniciar seu envolvimento em ações de RSE,

decorreu exclusivamente da vontade de contribuir com o desenvolvimento social,

principalmente da comunidade onde está inserida, como uma forma de retribuição ao que lhe é

131

oferecido: mão-de-obra, espaço, recursos e meio-ambiente. Essa posição é coerente com os

resultados de pesquisa realizada pelo IPEA em 2003, englobando empresas da Região Sudeste,

onde se constatou que o envolvimento das empresas na realização de ações sociais é

geralmente iniciativa dos altos executivos, tendo 50% das empresas participantes concluído

que os dirigentes são impulsionados a operar neste campo, movidos pela vontade de contribuir

para a solução dos problemas sociais do País (PELIANO,2003,p.25).

Tenório (2004,p.35) e Grajew (2001) são consensuais no entendimento de que quando

a responsabilidade social é motivada por questões de princípios, corre-se menor risco de

descontinuidade das ações, pois tais valores tornam-se fazem parte da cultura da empresa,

norteando as relações com todos os seus stakeholders.

Percebe-se que a história de vida dos empresários, a formação pessoal e a necessidade

de se sentirem participantes na luta pelo social contribuem para o seu envolvimento nas causas

sociais. No caso da Embaré , as iniciativas de natureza social soam como uma forma de

retribuição , principalmente à comunidade de Lagoa da Prata, que se orgulha de tê-la no

município.

Os principais stakeholders beneficiados pela política de ação social da Embaré são seus

funcionários e a comunidade local. De maneira geral, o foco social da empresa é a promoção

da educação. Além da criação do Centro Infantil e da oferta de cursos profissionalizantes que

atendem à comunidade, a empresa estimula de diferentes formas, os funcionários e seus

familiares a participarem das atividades de capacitação e educação oferecidas, o que remete à

idéia de desenvolvimento sustentável, base da cidadania empresarial.

O caráter assistencialista ou filantrópico vem aos poucos cedendo lugar a uma visão de

longo prazo, de caráter prioritariamente educacional, com vistas à formação do cidadão. A

132

empresa em buscado atingir com suas ações tanto a comunidade externa quanto seu público

interno.

Outro aspecto objeto de atenção da Embaré é a gestão social. Buscando consolidar o

pressuposto de que a maioria das atividades sociais implementadas dificilmente se mantêm sem

um trabalho de gerenciamento e controle de suas ações, a empresa criou uma Fundação para

gerir os recursos sociais, evidenciando estar em fase de profissionalização com relação à RSE.

Apesar de estar a caminho da profissionalização, há aspectos a serem aprimorados,

como a falta de atenção ao fator competitividade, que a RSE deve levar em conta. Esse fato

demonstra que a Embaré encontra-se ainda em fase incipiente, em termos de RSE, que deveria

ser encarada como fator estratégico da empresa, não só para reverter benefícios para si

própria, como sendo para de estimular outras empresas a se engajarem neste caminho.

A pesquisa comprovou que, além de os objetivos sociais da Embaré não serem usados

como política estratégica, a empresa não utiliza o marketing social. Evidenciou-se nas

entrevistas o desconhecimento do público interno e externo com relação ao trabalho social

desenvolvido pela empresa, que não apresenta razões que justifique esta postura.

Recomenda-se portanto, que a empresa implemente atividades de marketing social, visando

um retorno social , institucional e ainda, tributário-fiscal, passando a considerar a RSE como

ação estratégica da empresa.

Ressalta-se que o Centro Infantil, que pode ser considerado uma referência em termos

de educação infantil, deveria ser encarado como uma ferramenta a ser usada não só como

marketing social mas, sobretudo, como uma forma de auxiliar o Estado ( principalmente o

município local) a desempenhar com eficiência seu papel no campo da educação, estendendo a

experiência realizada no Centro Infantil a outras entidades congêneres locais. Dessa forma,

haveria uma disseminação de conhecimentos da empresa para o Estado, formando uma

133

parceria importante para a sociedade local e construindo um exemplo significativo para outras

municipalidades em situação similar.

De acordo com Tenório (2004, p.45) a RSE surgida a partir de a mudança de valores

proposta pela sociedade pós-industrial, propicia condições para a valorização do ser humano e

o respeito ao meio ambiente, além de uma sociedade mais justa e organizações empresariais de

múltiplos objetivos, razões pelas quais é de fundamental importância para as empresas lidarem

com essas variáveis, de maneira a obter retornos positivos, tais como melhoria da imagem e

lucratividade, num ambiente competitivo. Nesta perspectiva, torna-se necessária a agregação

de valor social ao negócio, de forma estratégica.

Dentre as duas visões teóricas apresentadas neste estudo, a Embaré enquadra-se na

visão dos stakeholders. De acordo com a cultura da empresa, os gestores têm atribuições

éticas de respeitarem e colaborar com todos os que estão ligados à organização, não apenas

buscando o retorno dos acionistas, mas também no desenvolvimento da sociedade.

Em oposição à percepção dos gestores observou-se entre os demais stakeholders o

ponto de vista de que a empresa não tem o dever de contribuir com o desenvolvimento social,

por ser este o papel do Estado; além disso, a empresa já contribui gerando empregos e

pagando seus impostos. Como se vê, este grupo de stakeholders tem, embora de forma

indireta, entendimento consonante com a doutrina do stockeholders, segundo a qual a empresa

não tem função social. De forma incoerente com essa visão, funcionários e fornecedores têm

expectativas em relação às ações sociais passíveis de serem implementadas pela empresa,

voltadas principalmente para o público interno e para os membros da comunidade, com vistas

à melhorias da comunidade.

134

A pesquisa evidenciou também o reconhecimento dos stakeholders de que as ações

sociais trazem uma imagem positiva para a empresa, despertando entre os membros da

comunidade e nos clientes, o desejo de se tornarem membros da organização.

Em síntese, pode-se afirmar que a percepção da empresa com relação à RSE é coerente

com o conceito adotado neste estudo, de que a responsabilidade empresarial diz respeito às

ações implementadas para o desenvolvimento social, que se encontram além das suas

obrigações. O melhor exemplo desse conceito, nesse estudo, está no “caso da doação da rua”,

parceria entre Prefeitura do município e empresa, gerando bons frutos para a comunidade.

Os stakeholders pesquisados ( gestores, comunidade local, funcionários, fornecedores)

revelaram, consensualmente uma percepção bastante favorável com relação à empresa, no que

se refere à RSE. Mesmo tendo dificuldade de entender o conceito de RSE, esse grupo de

stakeholders percebe a Embaré como uma empresa socialmente responsável, por se preocupar

com seus funcionários, com a comunidade e com o meio ambiente, visão condizente com os

conceitos do Instituto Ethos (2005) e de Jaramillo & Angel (1996) , citado por Ashley (2003).

Acredita-se que tenha sido por essa razão que os funcionários, fornecedores e

comunidade local consideraram acertada a decisão do município de doar a rua para que a

empresa pudesse ser ampliada, mesmo não conhecendo a contrapartida oferecida pela Embaré

em termos de excelência do atendimento prestado no Centro Infantil.

Dentre as características de empresas cidadãs apontadas por Neto e Froes (2001)

comprovou-se na pesquisa a presença das seguintes características na Embaré: alto

comprometimento com a comunidade; atuação em parceria com o governo e com outras

entidades, em programas e projetos sociais; viabilização de projetos sociais independentemente

dos benefícios fiscais existentes; realização de ações sociais desvinculadas de interesse

prioritário em marketing; incorporação de responsabilidades diversas aos valores e princípios

135

empresariais, envolvendo o seu relacionamento com o governo, clientes, fornecedores,

comunidade, sociedade, acionistas e demais parceiros.

Enfim, a RSE da Embaré pode ser identificada, no discurso e na prática, como uma

nova forma de gestão que a empresa vem buscando desenvolver nos últimos anos, onde o a

busca pela excelência passa a ter um novo ingrediente: a qualidade das relações e a

sustentabilidade econômica, social e ambiental, que parte prioritariamente do atendimento às

necessidades sociais de seu público interno, para os seus diversos públicos.

Nas entrevistas, foi consensual o entendimento dos stakeholders de que a Embaré, tal

como se apresenta, pautada por princípios legais e éticos e interessada em atuar de forma

socialmente responsável, preocupando-se com uma gestão social sistematizada, com vistas ao

desenvolvimento sustentável da comunidade de Lagoa da Prata, principalmente mediante

atenção especial à educação, está contribuindo aos poucos, para a formação de uma

comunidade cidadã no município.

Cabe ainda ressaltar as limitações deste estudo, por se tratar de aspecto orientador de

futuras pesquisas:

A diversidade de conceitos de RSE e o fato de ser um tema recente dificultaram a

definição dos conceitos a serem adotados neste estudo.

O método utilizado nesta pesquisa (estudo de caso) restringe a aplicação dos

resultados à realidade estudada, não se estendendo a outras empresas, inclusive do

mesmo ramo de produção.

Na pesquisa qualitativa, os sujeitos essenciais a serem ouvidos, são escolhidos

intencionalmente, segundo o ponto de vista do investigador, o que pode levar a uma

exclusão de atores que poderiam ser relevantes.

136

Os questionários elaborados de forma diferenciada para cada público, dificultaram a

análise, impossibilitando algumas comparações.

É também pertinente acrescentar que a busca da forma de utilização do marketing

social, sem ferir os padrões éticos da empresa é um campo potencial para futuras pesquisas.

Espera-se que esta dissertação, a despeito das limitações percebidas, tenha propiciado

um melhor entendimento sobre o desenvolvimento de ações sociais no âmbito de empresas e

possa servir de base a pesquisas futuras atinentes ao tema da RSE, já que são inúmeros os

desafios que o permeiam. Espera-se também que a pesquisa tenha agregado valor ao campo de

estudo da Ciência da Administração.

137

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